Aula 7 Semântica

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Introdução à Semântica

Meta

Apresentar os conceitos de polissemia e ambiguidade.

Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:


1. reconhecer casos de ambiguidade e o que a gera;
2. conceituar polissemia, distinguindo-a de homonímia.

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Introdução à Semântica

Introdução

Quando aprendemos uma língua, internalizamos as regras que a re-


gem. Assim, qualquer falante é conhecedor de sua língua materna de tal
modo que é capaz de resolver ambiguidades em sentenças sem que as
tenha aprendido um dia, ou de construir tais sentenças de determinada
maneira e não de outra.
A ambiguidade define-se, pois, em função das regras gramaticais.
Quando uma frase possibilita duas interpretações, semânticas ou sin-
táticas, ela é considerada ambígua. Desse modo, temos a ambiguidade
léxica gerada pela homografia, como nos exemplos a seguir:
1. A casa é azul.
2. Meu irmão se casa amanhã.
Nos exemplos 1 e 2, a ambiguidade é exclusivamente semântica.
Agora observe o exemplo 3:
3. Entrei no trem andando.
Esse enunciado apresenta uma ambiguidade que é sintática em razão
da construção feita.
Nesta aula, trataremos de ambiguidade e polisemia, comentando os
problemas de entendimento que surgem em função dessas questões.

Sobre ambiguidade

Segundo Ullmann (1964), linguisticamente, existem três tipos prin-


cipais de ambiguidade: fonética, gramatical e lexical. A ambiguidade
fonética é resultado da estrutura fonética da frase, uma vez que a unida-
de acústica da linguagem pronunciada sem interrupção pode provocar
homonímia.
Como exemplo de ambiguidade fonética, podemos citar:
1.

Sal a gosto?
Especialistas esclarecem 25 dúvidas sobre o consumo de sal, que
está associado ao desenvolvimento de doenças e pode deixar de
ser considerado substância segura.
(Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/eq0510200606.
htm. Acesso em: 20 ago. 2014).

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Introdução à Semântica

2.
Sambinha a gosto de Deus, ou melhor, de São Pedro…
18 de março de 2010
Nesta quinta-feira um grupo de samba de Belo Horizonte pode
contar com uma participação especialíssima no seu show. O pes-
soal do Briga de Galo tem apresentação marcada para as 19h30
no A Gosto de Deus Butiquim, contudo eles só entram na roda
se São Pedro estiver em ritmo de samba. A questão é a seguinte:
como a apresentação é feita ao ar livre, o samba só acontece se o
céu não desabar. Como o grupo tem um excelente repertório e
músicos de qualidade, vale a pena cruzar os dedos e torcer para
que o santo resolva ficar fazendo uma segunda voz ou batucan-
do na caixinha de fósforos, mas caso São Pedro resolva roubar a
cena, o sambinha fica para a outra quinta.
(Disponível em: http://ocenosamba.com.br/2010/03/sambinha-a-gos-
to-de-deus-ou-melhor-de-sao-pedro/. Acesso em: 20 ago. 2014).

3.
Turnê de Doctor Who passará pelo Rio de Janeiro em agosto
Peter Capaldi, Jenna Coleman e Steven Moffat participarão de
eventos e entrevistas.
(Disponível em: http://rollingstone.uol.com.br/noticia/turne-de-idoctor-
-whoi-passara-pelo-rio-de-janeiro-em-agosto/. Acesso em: 20 ago. 2014).

Nos exemplos 1, 2 e 3 temos a homonímia entre agosto, referindo-


-se ao oitavo mês do ano, e a locução adverbial a gosto, que significa “à
vontade”, que pode causar ambiguidade, resultado da forma como os
termos são proferidos, como um único grupo sonoro.
A respeito das ambiguidades de segmentação, Ilari (2013, p.13) diz
o seguinte:

Excetuadas algumas poucas situações (...), as pessoas não costu-


mam separar as palavras, na fala. Separar palavras de um mesmo
texto é um hábito que adquirimos com a escrita. Nesse caso, a
escrita funciona como uma análise da fala, e facilita nossa leitura.
Compare-se, por exemplo, a dificuldade com que lemos a mesma
frase em (1), onde não foi feita a separação de palavras, e em
(2), onde as palavras foram separadas, como é habitual: em (2)
é imediato reconhecer a letra de uma das mais célebres (e mais
bonitas) canções brasileiras.

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Introdução à Semântica

(1) Meucoraçãonãoseiporquebatefelizquandotevêeosmeusolhosficam
sorrindo...
(2) Meu coração, não sei por quê, bate feliz quando te vê e os meus olhos
ficam sorrindo...

Carinhoso
(Pixinguinha)

Meu coração, não sei por quê


Bate feliz quando te vê
E os meus olhos ficam sorrindo
E pelas ruas vão te seguindo,
Mas mesmo assim foges de mim.

Ah, se tu soubesses
Como sou tão carinhoso
E o muito, muito que te quero.
E como é sincero o meu amor,
Eu sei que tu não fugirias mais de mim.

Vem, vem, vem, vem,


Vem sentir o calor dos lábios meus
À procura dos teus.
Vem matar essa paixão
Que me devora o coração
E só assim então serei feliz,
Bem feliz.

Ah, se tu soubesses como sou tão carinhoso


E o muito, muito que te quero.
E como é sincero o meu amor,
Eu sei que tu não fugirias mais de mim.

Vem, vem, vem, vem,


Vem sentir o calor dos lábios meus
À procura dos teus.

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Vem matar essa paixão


Que me devora o coração
E só assim então serei feliz,
Bem feliz.
Para ouvir a música, acesse: http://www.vagalume.com.br/pixinguinha/
carinhoso.html. Acesso em: 20 ago. 2014.

Figura 7.1

Alfredo da Rocha Vianna Filho, conhecido como Pixinguinha,


nasceu no Rio de Janeiro, no dia 23 de abril de 1897, e morreu
na mesma cidade, em 17 de fevereiro de 1973. Pixinguinha foi
flautista, saxofonista, compositor e arranjador brasileiro. É consi-
derado um dos maiores compositores da música popular brasilei-
ra, tendo contribuído, diretamente, para que o choro encontrasse
uma forma musical definitiva. Quando compôs Carinhoso, entre
1916 e 1917, e Lamentos, em 1928, que são considerados alguns
dos choros mais famosos, Pixinguinha foi criticado e essas com-

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Introdução à Semântica

posições foram consideradas como tendo uma inaceitável influ-


ência do jazz. Hoje em dia, contudo, são vistas como avançadas
demais para a época. Além disso, Carinhoso, naquele tempo, não
foi considerado choro, e sim uma polca. Pixinguinha morreu na
igreja de Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, quando seria padri-
nho em uma cerimônia de batismo.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Pixinguinha. Acesso em: 20
ago. 2014.

Com relação à ambiguidade gramatical, esta pode se originar pela


indeterminação da estrutura da frase, gerando sentenças equívocas.
Como exemplo, podemos citar: “Yoko Ono falará de seu marido que foi
morto em uma entrevista com Jô Soares”. Esse tipo de ambiguidade é
desfeito pelo contexto ou pela forma como pronunciamos o enunciado,
fazendo as pausas necessárias.
E, finalmente, a ambiguidade lexical diz respeito aos casos de polisse-
mia e homonímia. Segundo Ullmann (1964, p. 354), a polissemia pode
conduzir à ambiguidade no contato entre as línguas, no uso técnico e
científico e na fala vulgar.
No contato entre línguas, a ambiguidade se dá pelo empréstimo se-
mântico. Ainda segundo Ullmann, já citado anteriormente, “o emprés-
timo semântico, apesar de muito comum em certas situações, não é um
processo normal na linguagem cotidiana”.
Como exemplo de ambiguidade provocada por empréstimos de lín-
gua estrangeira, podemos citar o uso do vocábulo bullying, em inglês,
motivando o uso do verbo bolinar no sentido de “prática de crueldades
com outrem”. Sobre isso, Aldo Bizzocchi diz o seguinte:

Bullying e bolinar: alguma coisa a ver?


O termo “bullying” é de introdução recente em português. [...]
desde que “bullying” passou a circular no vocabulário escolar, es-
tudantes alegam ter sido “bolinados” ou que fulaninho é um “bo-
linador”. Há algo em comum entre “bullying” e o verbo “bolinar”?
A aproximação das duas palavras é uma dessas curiosas peças
que a língua, em seus cegos meandros, nos prega, mais ou menos

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como a súbita relação que se estabeleceu em italiano entre o subs-


tantivo “choc” (choque, de origem francesa) e o verbo “scioccare”
(chocar, derivado de “sciocco”, bobo) por causa da pronúncia co-
mum – o “sci” do italiano tem o mesmo som do francês “ch”. Em
português, o casamento de “bullying” com “bolinar” foi facilitado
pela pronúncia “bulinar”, de longe a mais corrente no Brasil.
O fato é que “bolinar” é palavra bem mais antiga que “bullying”
e veio da linguagem náutica. Bolinar é apontar a embarcação
na direção do vento, navegar à bolina, de viés. E, segundo o
dicio-nário Michaelis, bolina, do inglês “bowline”, é “cada uma de
duas chapas de aço ou outras saliências longitudinais
semelhantes a uma nadadeira, fixadas uma em cada lado
arredondado do fun- do do navio para evitar grandes balanços”.
Da navegação, “bolinar” passou ao linguajar sexual, designando,
segundo o Houaiss, o ato de “apalpar ou encostar-se a uma outra
pessoa com fins libidinosos, geralmente de modo furtivo”. Para o
Michaelis, é “tocar em alguém com intuitos libidinosos”.
Já “bullying” vem do inglês “bully”, definido pelo American Heri-
tage Dictionary como uma pessoa habitualmente cruel, especial-
mente com pessoas menores ou mais fracas. [...]
Mas como “bolinar” assumiu conotação sexual? [...] Perscrutar
a origem de expressões populares é um dos grandes desafios da
etimologia, já que documentação comprobatória na maioria dos
casos não existe. No entanto, eu lançaria mão de um terceiro
elemento, o verbo “bulir”, sinônimo de “mexer”, que, como este,
também significa “incomodar, importunar, caçoar”. Ora, o boli-
nador escolar aborrece, importuna, leva à loucura suas vítimas
(já houve até casos de suicídio de crianças assediadas na escola);
além disso, quando se dirige às meninas, em geral seu assédio
envolve sexo: propostas indecorosas, obscenidades cochichadas
ao ouvido, apalpadelas...
Essa convergência de sons e sentidos pode ter reunido três pa-
lavras de origens tão diversas numa única família semântica:
“bullying”, “bulir” e “bolinar”. Caprichos da língua.
(Disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos/blog-abizzocchi/
bullying-e-bolinar-alguma-coisa-a-ver-295937-1.asp. Acesso em: 20
ago. 2014).

Há casos em que termos nascidos em um contexto técnico-científico


passam ao uso comum, provocando confusões e equívocos, como é o
caso, por exemplo, do adjetivo culposo que, para aqueles que não estão
ambientados com a linguagem jurídica, poderia significar que quem
pratica ato culposo é culpado pelo delito, sem atenuantes. No entanto,

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quando um ato é considerado culposo no jargão jurídico, não há inten-


ção de praticá-lo por parte do autor, havendo, portanto, atenuantes.
Finalmente, a ambiguidade pode ser ocasionada quando uma pala-
vra produz dois ou mais sentidos em um mesmo contexto. Por exemplo:
A coisa ficou preta para aquele homem preto, de calça preta.
Voltando à ambiguidade lexical, esta pode se manifestar por meio
de três fenômenos: polissemia, homonímia e categorização gramatical.
Trataremos, nesta aula, especificamente da polissemia.

Atividade 1

Atende ao objetivo 1

1. Que tipo de ambiguidade podemos encontrar nos enunciados a


seguir?
a) A empregada lavou as roupas que encontrou no tanque.
b) Comi um churrasco num restaurante que era gostoso.
c) Estivemos na escola da cidade que foi destruída pelo incêndio.
d) O juiz declarou ter julgado o réu errado.

2. Como a ambiguidade pode ser solucionada nesses casos apresentados?

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Introdução à Semântica

3. Explique cada um dos sentidos dos textos a seguir:


a) Texto 1
Um garoto pergunta para o outro:
- Você nasceu em Pelotas?
- Não, nasci inteiro.
b) Texto 2
- Doutor, já quebrei o braço em vários lugares.
- Se eu fosse o senhor, não voltava mais para esses lugares.
c) Texto 3
- Não deixe sua cadela entrar na minha casa de novo. Ela está cheia de
pulgas.
- Diana, não entre nessa casa de novo. Ela está cheia de pulgas.
d) Texto 4
O bêbado está no consultório e o médico diz:
- Eu não atendo bêbado.
- Então quando o senhor estiver bom eu volto – disse o bêbado.

Polissemia

Segundo Ullmann (1964, p. 331), “a polissemia é um traço funda-


mental da fala humana, que pode surgir de maneiras múltiplas”. Nessa
mesma obra, o autor lista cinco procedências que poderiam explicitar o
fenômeno da polissemia em uma língua, a saber:
1. Um dado item lexical pode adquirir um maior número de sentidos
graças ao seu posicionamento na frase e aos termos que o circun-
dam. Por exemplo, um adjetivo x adquire outro significado de-
pendendo de seu posicionamento com relação ao substantivo que
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o acompanha. Veja:
a) Amanhã cedo sairemos em comitiva para inaugurar a fábrica nova.
b) Amanhã cedo sairemos em comitiva para inaugurar a nova fábrica.
Nos sintagmas “fábrica nova” e “nova fábrica”, a anteposição do ad-
jetivo “nova” não o coloca em função substantiva, ele continua com o
comportamento de determinante do núcleo (substantivo) “fábrica”;
contudo, há a mudança de sentido. A mudança de posição afeta o cam-
po semântico das orações.

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Introdução à Semântica

2. As palavras adquirem significados diversos e específicos dependen-


do do seu campo de ação e de atuação.
3. Uma palavra pode adquirir um ou mais sentidos figurados sem que
haja a perda do seu significado original; os significados convivem
lado a lado e não se confundem. Ullmann (1964, p. 338) diz que
“esta possibilidade de transposição metafórica é fundamental para a
actividade da língua”. Veja o seguinte exemplo: “Ronaldo, com fome,
perde a fome de bola”.
4. Há palavras, segundo o mesmo autor, que são homônimas, uma vez
que têm origens diferentes, mas os falantes desconhecem esse fato e
são incapazes de estabelecer relações de significado entre elas. Ca-
sos como esses são raros e imprecisos: “Quando duas palavras têm
som idêntico e a diferença de significado não é muito grande, temos
certa tendência a considerá-las como uma única palavra com dois
sentidos” (ULLMANN, 1964, p. 340). Como exemplo, podemos citar
as palavras “senso” e “censo”. Elas existem na língua portuguesa, pos-
suem a mesma pronúncia, porém seus significados são diferentes. A
palavra “senso” se refere a um juízo, um raciocínio e um sentido, bem
como à capacidade de apreciar e julgar alguém ou alguma coisa. A
palavra “censo”, por sua vez, se refere ao recenseamento da popu-
lação, ou seja, à contagem e ao levantamento estatístico de dados
referentes a um grupo de indivíduos. “Senso” tem sua origem na pa-
lavra em latim sensos, enquanto “censo” tem sua origem na palavra
em latim census.
5. Influência estrangeira, em que há a mudança de sentido de uma pa-
lavra já existente num sistema linguístico por importação de signi-
ficado de uma palavra estrangeira. Tende-se à coexistência dos dois
significados: o novo e o antigo, dando origem à polissemia.
A polissemia é um fenômeno que está espontaneamente presente em
uma língua natural, visto que é um fator de economia e de flexibilidade
para a eficiência desse mesmo sistema linguístico. Não importa quantos
significados tenha um vocábulo, o contexto pode fazer com que se evite
qualquer confusão entre eles.
A frequência de uso de uma palavra está relacionada com a sua po-
lissemia. Como afirma Ullmann, “quanto mais frequente é uma palavra,
mais sentidos é possível que tenha” (1964, p. 350). A ampliação do uso
de uma palavra e a metaforização contínua da linguagem acarretam a
frequência de muitas unidades lexicais, gerando a polissemia.

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Introdução à Semântica

sema ou
Para Barbosa (1996, p. 245-249), um significado polissêmico existe
se·me·ma
quando, num mesmo significante, unem-se vários feixes de semas ou
(sema + -ema),
sememas, que se diversificam pelas combinações diferentes de semas. substantivo masculino
[Linguística]. Unidade
Dessa forma, um termo polissêmico preserva uma unidade de significa- de significação composta
do, que é garantida pelo núcleo sêmico comum, o que permite ao falante pelo conjunto de semas
de uma palavra ou de um
identificar um único signo linguístico em suas diferentes realizações no morfema”. (Dicionário
discurso. Priberam da Língua
Portuguesa. Disponível
em: http://www.priberam.
Para Rehfeldt, “polissemia [...], segundo os próprios componentes pt/dlpo/semema. Acesso
(poly + sema + ia), é palavra que comporta várias significações” (1980, em 17 jun. 2014).
Na terminologia da
p. 77). Para a autora, a arbitrariedade linguística é uma das causas da análise sêmica, o semema
é a unidade que tem por
polissemia e o reaproveitamento de uma mesma unidade linguística correspondente formal o
pode ser visto como uma deficiência desse sistema, uma vez que não é lexema; ele é composto
de um feixe de traços
consenso que ela seja entendida como economia linguística. semânticos chamados
semas (unidades mínimas
Em contrapartida, Bréal relata a superioridade de uma língua capaz não susceptíveis de
realização independente).
de abarcar novas significações para uma palavra já existente, sem, contu- O semema de cadeira
do, perder de vista o seu significado antigo e primário. De fato, os novos comporta os semas S1,
S2, S3, S4 (“com encosto”,
significados coexistirão, lado a lado, com o antigo. Nesse sentido, diz: “sobre pernas”, “para uma
só pessoa”, “para sentar-se”;
observa-se que a adjunção
de um sema S5 (“com
À medida que uma significação nova é dada à palavra, parece braços”) realiza o semema
multiplicar-se e produzir exemplares novos, semelhantes na for- de poltrona” (DUBOIS et
al., 1973, p. 534).
ma, mas diferentes no valor. A esse fenômeno de multiplicação
chamaremos a polissemia. Todas as línguas das nações civiliza
- das participam desse fenômeno; quanto mais um termo acumu
- lou significações, mais se deve supor que ele represente
aspectos diversos da atividade intelectual e social. (BRÉAL,
1992, p. 103).

Esse mesmo autor atenta para o fato de os diversos sentidos não se


misturarem ou se contradizerem, uma vez que são inseridos cada qual
em um contexto que precisa e antecipa a sua carga semântica. Assim sen-
do, um significado só terá sentido em determinada situação, dado que
os outros significados não existirão (e não se confundirão) na mente
do interlocutor. Com efeito, trata-se de um signo que possui um signi-
ficante e um significado que são empregados em uma pluralidade de
sentidos mais ou menos ampla; a correlação existente entre os diversos
sentidos conduz a um mesmo significante (fato esse que diferencia a
polissemia da homonímia).

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Introdução à Semântica

Atividade 2

Atende ao objetivo 2

1. Entende-se por polissemia:


a) o conjunto de significados unitários relacionados com uma mesma
forma, ou seja, a polissemia consiste em uma palavra que apresenta vá-
rios significados.
b) a tendência que o falante – culto ou inculto – revela em aproximar
uma palavra a um determinado significado, com o qual verdadeiramen-
te não se relaciona.
c) o erro no emprego de uma palavra em um contexto inapropriado de
interação verbal.
d) o erro de sintaxe que torna a palavra incompreensível ou imprecisa,
ou a inadequação de se levar para uma variedade de língua a norma de
outra variedade.
e) a colocação de uma expressão fora do lugar que logicamente lhe
compete.

2. Observe o diálogo a seguir, criado pelo cartunista argentino Quino,


em 2002, e responda:
– Você leu isso? Aqui diz que a TV é um veículo de cultura.
– Um veículo de cultura?
– Se eu fosse a cultura, saltava do veículo e ia a pé.
Nesse diálogo, a palavra veículo foi apresentada com dois sentidos. Essa
multiplicidade de sentidos que uma palavra pode adquirir, nos vários
contextos de uso, recebe o nome de .
Explique esse fenômeno.

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Introdução à Semântica

3. Leia os excertos a seguir.


a)

Rei Juan Carlos da Espanha abdica em favor de seu filho


Príncipe Felipe de Borbón vai assumir o cargo, anunciou premiê.
Rei disse que renuncia para ‘abrir uma nova etapa de esperança’.
Em discurso à nação, Juan Carlos, de 76 anos, afirmou que deci-
diu abdicar em favor do filho para que se possa “abrir uma nova
etapa de esperança na qual se combinem a experiência adquirida
e o impulso de uma nova geração”. “Decidi colocar fim ao meu
reinado e abdicar da coroa da Espanha”, informou o monarca,
ressaltando “um impulso de renovação, de superação, de corrigir
erros e abrir caminho para um futuro decididamente melhor”.
(Disponível em: http://g1.globo.com/mundo/noticia/2014/06/rei-
juan- carlos-da-espanha-abdica-em-favor-de-seu-filho.html. Acesso
em 2 jun. 2014).

b)

Professores municipais do Rio fazem enterro simbólico da


educação
O magistério municipal está em greve desde 8 de agosto. Em as-
sembleia hoje (9), os professores decidiram manter a paralisação.
Professores da rede de ensino municipal fizeram um enterro
simbólico da educação, na entrada principal da Central do Bra-
sil, ao lado da sede da Secretaria de Estado de Segurança. Os
manifestantes levaram cruzes pretas e uma coroa de flores e se
deitaram no chão, em sinal de luto.
(Disponível em: http://www.portalohoje.com.br/homologacao _20052013/
cidades/professores-municipais-do-rio-fazem-enterro-simbolico-da-
educacao/. Acesso em 21 ago. 2014).

c)
O abacaxi é um fruto-símbolo de regiões tropicais e subtropi-
cais, de grande aceitação em todo o mundo, quer ao natural,
quer industrializado: agrada aos olhos, ao paladar e ao olfato. Por
essas razões e por ter uma “coroa”, cabe-lhe por vezes o cognome
de “rei dos frutos”, que lhe foi dado, logo após seu descobrimen-
to, pelos portugueses.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Anan%C3%A1s)

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Introdução à Semântica

Agora, responda: O que há em comum entre esses sentidos da palavra


coroa?

4. Imagine que a frase a seguir esteja em um cartaz afixado na parede


de uma igreja.

No Dia de Finados, haverá uma missa cantada por todos os mor-


tos da paróquia.

Atenção: “A conjunção por é bem polissêmica, podendo significar em


favor de, em nome de, além de indicar o agente da ação, na voz passiva.”
(Informação disponível na versão eletrônica do Dicionário Houaiss da
língua portuguesa. Rio de janeiro: Objetiva, 2009).
a) Qual sentido assume a frase do cartaz, caso a conjunção por seja
entendida na primeira acepção? E na segunda acepção?

b) Em uma situação como essa, qual teria sido a intenção do autor do


cartaz? Você acha que ele pretendia explorar a polissemia da conjunção
por, ou o duplo sentido que ela acabou adquirindo foi acidental? Explique.

c) Como você reescreveria a frase do cartaz, de modo que ela só pudesse


ser entendida de uma maneira?

d) O que você precisou mudar para eliminar a ambiguidade do cartaz?

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Introdução à Semântica

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Introdução à Semântica

Como distinguir polissemia de homonímia?

Em semântica linguística, ainda existe muita polêmica sobre essas


duas relações semânticas na linguagem. Ambas são fenômenos linguís-
ticos de origens diferentes e, embora distintas entre si, contribuem para
a ambiguidade lexical. Como Ullmann afirma, “embora a fronteira entre
a polissemia e a homonímia seja, por vezes, fluida, os dois tipos são tão
distintos que terão de ser considerados separadamente” (1962, p. 330).
Para Lyons (1977a, p. 27), numa definição comum do termo, homô-
nimos são palavras ou lexemas que têm a mesma forma, mas diferem
no significado; não apenas por terem significados diferentes, mas por
serem completamente estranhos um ao outro é que são homônimos.
Ilari (2002, p. 103 e 152), por sua vez, diz que a homonímia é um
fator “potencial” de ambiguidade de nossos textos e que tais palavras
são aquelas que se pronunciam da mesma maneira, mas têm significa-
dos distintos e são percebidas como diferentes pelos falantes da língua.
Quanto à polissemia, esse autor diz que as formas linguísticas admitem
extensões de sentido e que a relação polissêmica caracteriza-se pelos
diferentes sentidos de uma mesma palavra, percebidos como extensões
de um sentido básico.
Apresentaremos agora, de maneira mais detida, alguns critérios de
distinção entre polissemia e homonímia, propostos por alguns teóri-
cos especialistas no assunto. Como você verá, em todas as propostas há
pontos problemáticos, que podem ser contestados por outras posições
teóricas. Não há um único critério a se propor nessa distinção.
Lyons afirma que, a princípio, a diferença entre homonímia e po-
lissemia está na afirmação de que “a polissemia é uma propriedade de
lexemas simples” (1987, p. 142). Para esse autor, um dos critérios de
distinção entre esses dois fenômenos é o etimológico, uma vez que este
seria uma condição para a classificação de formas léxicas como homô-
nimas. Para a linguística sincrônica, entretanto, esse critério é irrele-
vante: mesmo que duas palavras estejam relacionadas historicamente
quanto aos seus significados, sincronicamente o usuário não estabelece
relação entre elas, dado que seus significados divergiram de tal maneira
a ponto de pensar-se tratar de duas formas completamente diferentes e
que nunca estiveram relacionadas antes. Por outro lado, Lyons consi-
dera importante a relação entre significados de um item lexical como
critério distintivo: os vários significados de um item polissêmico estão
relacionados entre si, ao passo que, se não houver nenhuma relação

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Introdução à Semântica

entre significados, o item lexical deve ser considerado homônimo. O


autor acrescenta, todavia, que esse critério é difícil de ser aplicado com
segurança e coerência, e afirma, ainda, que a única forma de resolver,
ou talvez de delimitar, o problema tradicional da homonímia e da polis-
semia seja abandonar totalmente os critérios semânticos, na definição
do lexema, contando apenas com os critérios sintáticos e morfológicos.
Para Sandmann (1990), podem-se usar três critérios para a distin-
ção de polissemia e homonímia: o etimológico, o semântico e o formal.
Dentre eles, destacamos o critério formal, que está relacionado à distri-
buição das palavras na frase. Segundo ele, se uma unidade lexical puder
ser classificada em diferentes classes de palavras, haverá homonímia;
caso contrário, preenchendo somente uma mesma classe de palavras,
hverá polissemia.
Segundo Câmara Jr. (1985), o critério mais adequado para se distin-
guir a homonímia da polissemia é o da distribuição das formas. Com isso,
uma mesma distribuição de formas em uma frase é sinal de polissemia,
ao passo que uma distribuição diferente revela homonímia. No critério
distintivo de Câmara Jr., predomina o ponto de vista morfossintático.
Pottier (1968) distingue os dois fenômenos com base na semântica
das palavras. Para o autor, nos casos de homonímia, os sememas são
independentes uns dos outros, enquanto que, nos casos de polissemia,
existe uma interseção de traços significativos entre as formas.
W erner estabelece alguns critérios para que se mantenha a distinção
entre a homonímia e a polissemia, com destaque para o critério etimo-
lógico e o da “consciência linguística dos falantes” (1982, p. 297-314).
Usando o critério etimológico, entende-se que há polissemia quando
significados distintos correspondem a significantes iguais, desde que,
de um ponto de vista diacrônico, tenham mesma origem. Aplicado o
critério com relação à homonímia, dois significados diferentes corres-
pondem a igual significante, desde que, diacronicamente, originem-se
de diferentes significantes. Aplicando o critério da consciência linguís-
tica dos falantes, existe a polissemia quando na consciência do usuário
da língua há uma relação entre os diferentes significados que podem
corresponder a somente um significante. Contrariamente, quando o fa-
lante não estabelece nenhuma relação entre os diferentes significados de
uma única forma, haverá, então, homonímia.

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Introdução à Semântica

Conclusão

Vimos nesta aula que um dos critérios para a definição de homoní-


mia é o que a considera como um mesmo nome com sentidos diferen-
tes, porque, na sua origem, os diversos sentidos se prendem a segmentos
fônicos distintos, que evoluíram para formas sonoras. A existência de
um traço comum de significado entre sentidos diversos de uma mesma
palavra, por outro lado, caracteriza a polissemia.

Atividade final

Atende aos objetivos 1 e 2

1. As orações a seguir apresentam problemas de ambiguidade. Leia-as


e depois responda às perguntas.
a) O deputado conversou com o presidente da Câmara na sua sala.
Na sala de quem foi a conversa?
b) Ela aparecerá brevemente num programa de TV.
Ela ficará pouco tempo no programa ou ela aparecerá daqui a pouco
tempo?
c) Especialistas debatem saída para crise em São Paulo.
O debate é em São Paulo ou a crise é em São Paulo?
d) Mutirão contra a violência do governo completa um ano.
O mutirão é do governo ou a violência é do governo?
(Fonte: Exemplos baseados no verbete “ambiguidade” do Manual de re-
dação e estilo de O Estado de São Paulo).

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Introdução à Semântica

2. Leia o trecho inicial de uma crônica de Clarice Lispector. Depois,


responda às questões.

Uma esperança
Aqui em casa pousou uma esperança. Não a clássica que tan-
tas vezes verifica-se ilusória, embora mesmo assim nos sustente
sempre. Mas a outra, bem concreta e verde: o inseto.
Houve o grito abafado de um de meus filhos;
– Uma esperança!E na parede bem em cima de sua cadeira!–
Emoção dele que também unia em uma só as duas esperanças,
já tem idade para isso. Antes surpresa minha: esperança é coisa
secreta e costuma pousar diretamente em mim, sem ninguém
saber, e não acima de minha cabeça numa parede. Pequeno re-
buliço: mas era indubitável, lá estava ela, e mais magra e verde
não podia ser.
– Ela quase não tem corpo – queixei-me.
– Ela só tem alma – explicou meu filho e, como filhos são uma
surpresa para nós, descobri com surpresa que ele falava das duas
esperanças. [...]
(LISPECTOR, 1999. p. 192. [Fragmento]).

O texto fala de duas acepções da palavra esperança. Quais são elas?

Resposta comentada

1. Em todas as frases dadas no exercício número 1, encontramos


casosde ambiguidade gerados ou pela estruturação das frases ou
pela polissemia ou homonímia dos termos. Em a), o pronome
sua pode se referirtanto ao deputado, quanto ao presidente. Em
b), a ambiguidade sintá- tica é fruto da posição do termo
brevemente na frase, o que poderia sersolucionado com a sua
simples movimentação para o início da mesma.Em c),
verificamos o mesmo que ocorreu em b), podendo o problema
ser resolvido se trouxermos o adjunto adverbial Em São Paulo
para o início da frase. Em d) também ocorre ambiguidade
sintática: Trazer do governo para junto de mutirão fará com
que este termo não leve ao en-tendimento de que se liga à
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Introdução à Semântica
violência.

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Introdução à Semântica

2. A palavra esperança está sendo usada,


no fragmento do texto apre-sentado, com as
acepções de “sentimento de quem vê como
possível a realização daquilo que deseja,
confiança em coisa boa, fé” e “inseto decor
verde”.

Resumo

Nesta aula vimos que, quando aprendemos


uma língua, internalizamos as regras que a
regem de forma que somos capazes de
conhecer pro- fundamente nossa língua
materna e, assim, evitamos “as armadilhas
da língua”, resolvemos as ambiguidades que
podem surgir e estabelecemos relações entre
as palavras de modo a estender os usos a
outros contex- tos, possibilitando várias
acepções para uma mesma palavra.
Estudando os tipos de ambiguidade que
acontecem quando uma fra- se possibilita
duas interpretações semânticas ou sintáticas,
Ullmann (1964) aponta a ambiguidade
fonética, a gramatical e a lexical. A ambi-
guidade fonética é resultado da estrutura
fonética da frase, uma vez que a unidade
acústica da linguagem pronunciada sem
interrupção pode provocar homonímia; a
ambiguidade gramatical pode se originar
pela ambiguidade da estrutura da frase,
gerando frases equívocas, e a ambi- guidade
lexical diz respeito aos casos de polissemia e
homonímia. Tra- tamos, nesta aula,
especificamente da polissemia, buscando
estabelecer a distinção entre esta e a
homonímia.
A polissemia é um fenômeno que está
espontaneamente presente em uma língua
natural; é um fator de economia e de 22
flexibilidade para a eficiência desse mesmo
sistema linguístico. Não importa quantos sig
Introdução à Semântica

- nificados tenha um vocábulo, o contexto


pode fazer com que se evite qualquer
confusão entre eles. Como exemplo, temos a
polissemia do vocábulo boca, que pode ser
vista nas frases “O bebê coloca tudo na
boca.”, “Rasguei a boca da calça.” e “Bebi na
boca da garrafa.”.
Também vimos que, quanto mais frequente é
uma palavra, mais sen- tidos é possível que
ela tenha. A ampliação do uso de uma
palavra e a metaforização contínua da
linguagem acarretam a frequência de muitas
unidades lexicais, gerando a polissemia.

Polissemia e homonímia são casos distintos. Em semântica linguística, ainda existe muita
polêmica sobre essas duas relações semânticas na linguagem. Ambas são fenômenos
linguísticos de origens diferentes e, embora distintas entre si, contribuem para a ambiguidade
lexical. Na ho- monímia, os significados diferentes são expressos por um mesmo nome

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