Guia Didatico Apocalipse

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GUIA DIDÁTICO – APOCALIPSE

DENILSON MATOS

1
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................... 4

CAPÍTULO 1 - CONTEXTO HISTÓRICO E SOCIAL ........................................ 5

1.1 Os conflitos que se seguiram após a morte de Jesus .................................. 5

1.2 A Guerra Judaica (66-70 d.C.) ..................................................................... 8

1.3 O Cristianismo da diáspora .......................................................................... 9

1.4 As Perseguições contra os cristãos ........................................................... 11

CAPÍTULO 2 – CONTEXTO LITERÁRIO: AUTOR E DATA ........................... 15

2.1 Autoria ........................................................................................................ 15

2.2 Data ............................................................................................................ 18

CAPÍTULO 3 - CONTEXTO LITERÁRIO: GÊNERO LITERÁRIO, MÉTODOS DE


INTERPRETAÇÃO, UNIDADE E ESTRUTURA .............................................. 25

3.1 Gênero Literário ......................................................................................... 25

3.2 Métodos de Interpretação........................................................................... 30

2
3.2.1 Abordagem Futurista ............................................................................... 31

3.2.2 Abordagem Historicista ........................................................................... 32

3.2.3 Abordagem Preterista.............................................................................. 33

3.2.4 Abordagem Simbólica/Idealista ............................................................... 34

3.3 Unidade e Estrutura ................................................................................... 35

CAPÍTULO 4 – UMA VISÃO PANORÂMICA DAS SETE CARTAS ............... 42

4.1 Prólogo (1:1-8) ........................................................................................... 42

4.2. A Primeira visão (1:9-3:22) ........................................................................ 44

4.2.1 As Sete Cartas (2:1-3:22) ........................................................................ 44

4.2.1.1 A Carta a Éfeso (2:1-7)......................................................................... 46

4.2.1.2 A Carta a Esmirna (2:8-11)................................................................... 48

4.2.1.3 A Carta a Pérgamo (2:12-17) ............................................................... 50

4.2.1.4 A Carta a Tiatira (2:18-28) .................................................................... 52

4.2.1.5 A Carta a Sardes (3:1-6) ...................................................................... 55

4.2.1.6 A Carta a Filadélfia (3:7-13) ................................................................. 57

4.2.1.7 A Carta a Laodicéia (3:14-22) .............................................................. 61

CONCLUSÃO .................................................................................................. 66

BIBLIOGRAFIA BÁSICA ................................................................................. 67

3
Introdução

Caros alunos e alunas,


É com imenso prazer que damos início às aulas da disciplina: Apocalipse.
Para tal, é interessante entender de que se trata esta disciplina.
A disciplina de Apocalipse visa estudar as principais características do
último livro da Bíblia Sagrada. O livro de Apocalipse tem sido um dos livros mais
negligenciados ao longo da história do cristianismo. Isso aconteceu (e ainda
acontece) por causa de sua linguagem simbólica e metafórica, fato que dificulta
sua compreensão. Por esse motivo, em nosso estudo, buscaremos apresentar
os elementos básicos para que se possa ler o Apocalipse com seriedade e
compromisso, levando em consideração a sua complexidade linguística,
simbólica e contextual.
Assim, com o intuito de apresentar, da melhor maneira possível, as
principais características de Apocalipse, organizamos esse guia didático como
segue. No primeiro capítulo trataremos da “Contexto histórico-social” do livro.
Nele, apresentaremos o pano de fundo que contribuiu para a produção do livro.
No segundo capítulo, trataremos do “Contexto literário”. Discutiremos acerca da
autoria da obra e da possível datação de Apocalipse. No terceiro capítulo,
continuaremos a nossa análise do “Contexto literário. Apresentaremos, agora, a
discussão sobre o gênero literário da obra, os métodos de interpretação e a
unidade e estrutura do livro. Por fim, no último capítulo, falaremos de forma
panorâmica das sete cartas às Igrejas da Ásia contidas no início do livro.

4
Bons estudos!
Prof. Denilson Matos.

DIASPORA
ANTIOQUIA
PALESTINA
IMPÉRIO ROMANO
ROMA
ARQUELAU FILHO DE HERODES

CAPÍTULO 1 – APOCALIPSE: CONTEXTO


HISTÓRICO E SOCIAL

Alguns eventos marcaram tanto a história do cristianismo, quanto a


história do judaísmo. Os conflitos civis que se instauraram na Palestina tiveram
um crescimento exagerado após os eventos que culminaram na crucificação de
Jesus. Os governantes romanos designados para organizar politicamente a
Judeia contribuíram muito para que esse agravamento acontecesse, a ponto de
gerar um grande descontentamento entre os judeus e, consequentemente, a
grande revolta que culminou na destruição total de Jerusalém. Pretendemos
analisar neste capítulo esse período de conflitos e discórdias entre os judeus e
romanos, bem como os eventos que geraram a guerra judaica.

1.1 OS CONFLITOS QUE SE SEGUIRAM APÓS A MORTE DE


JESUS

O período em que a Judeia foi administrada por governadores romanos,


foi marcado por intenso descontentamento generalizado e periódicos conflitos
turbulentos na sociedade judaica palestinense. Nesse período temos o período
de formação do judaísmo rabínico, bem como dos eventos que formam a base
OU JUDAISMO FORMATIVO
para o contexto da atividade e da vida de Jesus.

ESSÊNIOS PONCIO PILATOS


ZELOTES VESPASIANO
FELIX
TITO
GUERRA JUDAICA 66-70 D.C FLORO 5
Nesse período surgiram, também, muitos grupos messiânicos em
praticamente cada região da Palestina, alguns deles mais comedidos, outros
mais revolucionários e extremistas, tais como os Zelotes.

Os oficiais romanos não davam muita atenção as reivindicações e aos


protestos dos judeus nesse período. Os protestos aconteciam, às vezes, de
forma espontânea, outras vezes moderados e organizados. Flavio Josefo nos
fornece um incidente de meados do século I d.C., que evidencia quão tensas
eram as relações entre o povo e as forças romanas de ocupação. Esse incidento
aconteceu na Páscoa, a festa em que os judeus celebravam a sua libertação da
escravidão do Egito. Por ocasião dessas festas, nesse período de dominação
romana, os judeus eram obrigados a realizar suas celebrações sob forte
vigilância dos soldados romanos, como atesta Josefo:

Um dos soldados levantou o seu manto e se curvou


indecentemente virando o traseiro aos judeus e fazendo um
ruído tão indecente quanto a sua postura. Isso enfureceu toda a
multidão, que aos gritos pediu a Cumano a punição do soldado.
Mas Cumano, temendo que toda a população o atacasse,
mandou vir reforços. Quando essas tropas se precipitaram nas
RICHARD HORSLEY colunatas, os judeus foram tomados de pânico, voltaram e
fugiram do templo para a cidade. Mas comprimiram-se de tal
modo nas saídas que se pisotearam uns aos outros e mais de
30.000 morreram esmagados. Assim a festa terminou em luto
para toda a nação e perda para cada lar (G.J 2.224-227;
Ant.20.105-12).

Os incidentes entre judeus e romanos aumentaram sob a administração


de Pôncio Pilatos (26 d.C.), quando foi enviado para a Judeia como quinto
prefeito do distrito. Assim como Arquelau, Pôncio Pilatos conseguiu desagradar
os judeus mais do que todos os seus antecessores. Flávio Josefo (Antiguidades
Judaicas 18.3.1-2; 18.4.1-2) registra os três principais acontecimentos durante
seu governo: a implantação de estandartes e escudos militares em Jerusalém
com imagens imperiais e escudos militares, violando o segundo dos dez
mandamentos:

Pilatos, governador da Judéia, enviou dos quartéis de inverno de


Cesaréia a Jerusalém tropas que traziam em seus estandartes
a imagem do imperador, o que é tão contrário às nossas leis que
nenhum outro governador antes dele o fizera. As tropas
entraram de noite, e por isso apenas no dia seguinte é que se
percebeu. Imediatamente os judeus foram em grande número
procurar Pilatos em Cesaréia e durante vários dias rogaram-lhe
que removesse aqueles estandartes. Ele negou o pedido,

6
dizendo que não o poderia fazer sem ofender o imperador. Mas
como eles continuavam a insistir, ordenou aos seus soldados,
no sétimo dia, que secretamente se conservassem em armas e
subiu em seguida ao tribunal que mandara erguer de propósito
no local dos exercícios públicos, porque era o lugar mais
apropriado para escondê-los (G.J 2.224-227; Ant.20.105-12)

O segundo deles foi o desvio de verbas do templo para construir um


aqueduto:

Em seguida, Pilatos tentou retirar dinheiro do tesouro sagrado


para fazer vir a Jerusalém, pelos aquedutos, a água cujas
nascentes distavam uns duzentos estádios. O povo ficou de tal
modo revoltado que veio em grupos numerosos queixar-se e
rogar-lhe que não continuasse aquele projeto. E, como acontece
ordinariamente no meio de uma população exaltada, alguns
chegaram de dizer-lhe palavras injuriosas. Ele ordenou então
aos soldados que escondessem cacetes debaixo da túnica e
rodeassem a multidão. Quando recomeçaram as injúrias,
sinalizou aos soldados para que executassem o que havia
determinado. Eles não somente obedeceram, como fizeram
mais do que ele desejava, pois espancaram tanto os sediciosos
quanto os indiferentes. Os judeus não estavam armados, e por
isso muitos morreram e vários foram feridos. E a sedição
terminou (G.J 2.224-227; Ant.20.105-12)

E, por fim, a repressão de um levante de samaritanos:

Os samaritanos não foram menos atormentados nem isentos de


amarguras. Um impostor, que com nada se importava, para
agradar ao povo e ganhar-lhe o afeto, ordenou-lhes que se
reunissem no monte Gerizim, que nesse país é considerado um
lugar santo, prometendo-lhes fazer ver os vasos sagrados que
Moisés havia enterrado. Com tal promessa, tomaram as armas
e, esperando os que deviam juntar-se a eles de todos os lados
para subir o monte, sitiaram a aldeia de Tirataba; mas Pilatos os
precedeu; avançou com sua cavalaria, ocupou o monte, atacou-
os perto daquela aldeia, pô-los em fuga, prendeu vários, mandou
cortar a cabeça aos chefes (G.J 2.224-227; Ant.20.105-12).

Tais eventos com os samaritanos foi o estopim para a destituição de


Pilatos de seu cargo como prefeito da Judeia. Isso aconteceu porque os mais
ilustres homens de Samaria foram procurar Vitélio, governador da Síria, que
tinha sido cônsul romano, e acusaram Pilatos após o ocorrido. Eles disseram a
Vitélio que o objetivo da organização não tinha como objetivo rebelar-se contra
os romanos, mas somente queriam resistir às violências de Pilatos. Ante essas
queixas, o governador Vitélio mandou Marcelo, seu amigo, cuidar do governo da

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Judeia e ordenou que Pilatos fosse se explicar perante o imperador Tibério, na
cidade de Roma. Assim, Pilatos teve de se dirigir à Roma após dez anos de
governo da Judeia.

1.2 A GUERRA JUDAICA (66-70 D.C.)

A tensão entre judeus e romanos aumentava continuamente na Judeia. A


princípio, as famílias dos sumos sacerdotes, os herodianos e grande parte da
aristocracia estavam empenhados em colaborar mutuamente de forma benéfica,
com o sistema imperial romano, para manter o controle amigável da Palestina.
Segundo Horsley:

Os círculos dominantes judaicos e outros judeus notáveis não


fizeram nenhuma tentativa de desempenhar um papel mediador,
quando as tensões e mesmo os conflitos entre os governantes
(e judeus) e o povo judeu como um todo, nas décadas de 50 e
60, caminhavam para a grande revolta (HORSLEY, 1995, p.52).

Quando a ordem social começou a desmoronar, a elite não só não


manifestou qualquer iniciativa que ajudasse no conflito, como instaurou uma
“guerra de classes”, cujas facções rivais de sumos sacerdotes mantinham
bandos contratados para comprar apoio e manter seus próprios interesses. O
motivo imediato da Guerra Judaica foi a exploração dos governadores romanos.

Desde Félix (52-60 d.C.) a Floro (64-66 d.C.) tornaram a relação na


Palestina cada vez mais repressiva e intransigente. Quando uma delegação da
Síria visitou Jerusalém por ocasião da Páscoa em 64 d.C., o povo protestou
contra a brutalidade de Floro, declarando ser ele a ruína do país. A revolta
estourou quando Floro, sem qualquer permissão, tocou no tesouro templo. As
represálias romanas foram saques e execuções. Inicialmente a revolta judaica
foi um sucesso. Segundo Horsley,

As tropas romanas foram rapidamente expulsas de Jerusalém,


da Judeia e da Galileia. Foi basicamente uma revolta
camponesa. Os sacerdotes de nível inferior e alguns outros
habitantes de Jerusalém participaram intensamente no começo.
Mas a participação de membros da aristocracia leiga ou
sacerdotal, como o capitão do Templo, Eleazar, era uma rara
exceção (HORSLEY, 1995, p.53).

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Após tomar diversos espaços público e religiosos, os rebeldes se viram
cercados pelos romanos. Nero encarregou o general Flávio Vespasiano para
conter e submeter os rebeldes com fortes meios militares. Segundo Gunneweg,

Tito, filho de Vespasiano organizou outras tropas auxiliares em


Alexandria. Pai e filho conseguiram, inicialmente, ocupar, quase
sem luta, a Galileia. Principalmente a fortaleza Jotapata, no
centro da Galileia, resistiu; o comando era de Flávio Josefo.
Quando os romanos tomaram o local fortificado, depois de um
sítio prolongado, muitos defensores se suicidaram. Josefo
passou para o lado de Vespasiano (67 d.C). Em Jerusalém
reinava o terror. A partir desse momento, a ala radical dos
zelotes ditava o destino de Jerusalém. Nesse tempo, ou talvez
já antes, a comunidade cristã de Jerusalém deixou a cidade e
encontrou um lugar provisório em Pela, na Peréia. (GUNNEWEG
(2005, p.299)

Por ocasião de uma guerra civil que eclodira em Roma, após o suicídio de
Nero (68), o general Vespasiano foi nomeado imperador e em um dos seus
primeiros atos oficiais foi nomear seu filho, general Tito, para cuidar da repressão
da Revolta Judaica. Tito começou o sítio de Jerusalém na primavera do ano 70
d.C. No mês de junho do ano 70 d.C., caiu a fortaleza Antônia, e em agosto, o
recinto do templo. O templo foi consumido pelas chamas e os conquistadores
promoveram um banho de sangue entre os últimos defensores.

Gunneweg resume as principais consequências da Guerra Judaica para


os judeus como um todo:

A consequência mais importante da Guerra Judaica foi que os


judeus perderam seu centro cultual e sua autoridade
hierosolomita, na forma do sinédrio. O cargo de sumo sacerdote,
os sacerdotes em geral e, junto com ele, também os saduceus
perderam sua importância. Assim, para os judeus na Palestina e
até na Cidade Santa de Jerusalém, bem como para seus irmãos
de fé na diáspora, restaram somente a lei como centro da vida e
a sinagoga com instituição. (GUNNEWEG, 2005, p.300)

1.3 O CRISTIANISMO DA DIÁSPORA

9
O Cristianismo Primitivo ganha seu contorno fundamental na diáspora.
Desde os primeiros anos que sucederam a morte de Jesus, os primeiros cristãos
seguiram à risca a ordenança de seu mestre e buscaram ocupar os diversos
lugares do primitivo império romano, em especial na Ásia Menor. Com a missão
proposta pela Igreja de Antioquia, lideradas por Barnabé e Paulo, o mundo
ocidental foi alcançado rapidamente, tendo como exemplos citados no Novo
Testamento até mesmo nas regiões interioranas da Ásia havia a presença de
comunidades cristãs. Com a destruição de Jerusalém, e consequentemente com
o fim da Igreja cristã em Jerusalém, as diversas igrejas da diáspora ganharam
força no processo de evangelização e formação do cristianismo primitivo. Com
esse avanço da igreja nas províncias imperiais começaram os conflitos com os
judeus e consequentemente com o império romano, a ponto de causar distúrbios
e conflitos mais severos. Esse capítulo tem como objetivo estudar justamente
esse período de avanço da igreja, mas, também delinear as principais dificuldade
e conflitos enfrentados pelos primeiros cristãos tanto com judeus quanto com o
império romano.
Desde o 6º século a.C havia muitos judeus que não viviam na Palestina.
Esse fator se torna importante na transição do 1º século a.C ao 2º século d.C.
Depois do exílio babilônico, muitos judeus já ocupavam lugar de destaque em
diversos lugares tanto no Oriente, como no Ocidente. Essas comunidades que
já se estabeleceram há séculos na Ásia Menor, destacavam-se por sua
aproximação com a cultura helênica.

Para muitos no mundo greco-romano, a fé judaica era ridícula e


ininteligível, uma vez que boa parte dos judeus se recusavam a participar dos
rituais e cultos aos deuses do panteão romano. Devido a hostilização, alguns
tentaram fazer a aproximação entre a fé judaica e a filosofia grega, como no caso
de Demétrio e Fílon de Alexandria. Eles procuravam demonstrar a equivalência
entre a literatura hebraica e os escritos filosóficos dos principais filósofos gregos,
tais como Sócrates e Platão.

Entretanto, tanto o judaísmo como o cristianismo enfrentaram uma grande


dificuldade na diáspora, em especial na Ásia Menor e em Roma: O sincretismo
religioso romano e os seus cultos de mistérios. O sincretismo, que consiste na
mistura indiscriminada de religiões, foi característica comum da bacia do
mediterrâneo desde o séc. III a.C. Segundo Justo L. Gonzales,

10
Dentro de certos limites, Roma incentivou, pois, o Império tinha
interesse em que seus diversos súditos pensassem que, ainda
que seus deuses tivessem diferentes nomes e atributos, no final
das contas eram todos os mesmos deuses. Ao Panteão Romano
foram se acrescentando deuses provenientes das diversas
regiões (GONZALES, 1995, p.25).

A intransigência dos judeus e cristãos incomodavam os romanos (em


Roma e nas províncias). Como negavam em participar de tudo isso eram
considerados incrédulos e ateus. Por isso, muitos viam no judaísmo e no
cristianismo formas de religião que deveriam ser extirpadas da sociedade
romana.

1.4 AS PERSEGUIÇÕES CONTRA OS CRISTÃOS

De acordo com Croix, é conveniente distinguir as perseguições aos


cristãos em três fases distintas:

A primeira termina pouco antes do grande incêndio de Roma em


64; a segunda começa com a perseguição que seguiu o incêndio
e continuou até 250; e a terceira abre com a perseguição sob
Décio em 250-1 e dura até 313 - ou, se levarmos em conta as
atividades anticristãs de Licínio em seus últimos anos, até a
derrota de Licínio por Constantino em 324 (CROIX, 1963, p.6).

Segundo Croix, não se sabe a respeito de perseguições até o ano de 64,


e tal prática só veio a existir até aquela executada por Décio. Entre 64 e 250,
existiram apenas perseguições isoladas e locais. A perseguição geral de Décio
deve ter durado pouco mais do que um ano, e aquela de Valeriano 257-9, pouco
menos que três anos. A terceira e última, denominada de “grande perseguição”,
sob Diocleciano em 303, durou dois anos no Oeste. Aconteceram muitas outras
locais, mas houve também longos períodos durante os quais os cristãos
desfrutaram de paz completa sobre a maior parte do império.

Da mesma forma, Jean Comby (1993, p.41) desconhece que os cristãos


foram perseguidos de maneira contínua durante os três primeiros séculos. O
autor fundamenta sua afirmação nos escritos de historiadores romanos como

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Tácito e Plínio, o Moço, que não expressam diretamente indícios de perseguição
geral contra os cristãos.

Tácito fornece informações acerca da perseguição dos cristãos efetuada


por Nero, a despeito do incêndio em Roma acontecido em 64 d.C. Para Comby,
COMBY, 1993, p.43; GONZÁLES, 1995, p.54-58) a prática parece não ter saído
dos limites romanos, e foi estrategicamente usada por Nero para despistar os
rumores que ele mesmo teria sido o responsável pelo incêndio de Roma, a fim
de reconstruí-la conforme seus gostos arquitetônicos. Assim relata Tácito: “Nero,
para desviar as suspeitas, procurou culpados, e castigou com as mais terríveis
penas a certo grupo, já odiado por suas abominações, que o vulgo chamava
cristãos”.

Os dois primeiros séculos, afirma Comby, “não conheceram uma


perseguição geral, nem tampouco uma lei bastante precisa em relação aos
cristãos. Elas continuam a apresentar um caráter local e são muito limitadas no
tempo. ” (COMBY, 1993, p.43).

Um exemplo da falta de leis específicas a respeito dos cristãos é a carta


de Plínio, o Moço, governador da Bitínia (Norte da Ásia Menor), ao imperador
Trajano em 111 d.C. A carta revela a incerteza do jovem governador da Bitínia
em relação ao que fazer com os cristãos que persistiam em sua fé, situação que
cada vez mais crescia em sua província. A quais procedimentos ele deveria
recorrer para julgar os cristãos? Por esse motivo solicita uma instrução por parte
do imperador Trajano, cuja resposta foi breve e taxativa, afirmando que não se
deve nem procurar os cristãos, nem aceitar as denúncias anônimas. Contudo, é
necessário condenar aqueles que persistem dizerem-se cristãos.

Nos dois primeiros séculos, as comunidades cristãs eram mal vistas pela
sociedade romana, por não participarem das reuniões e eventos cívicos, e, por
causa de suas “abominações” e “ódio da raça humana”, como afirma Tácito,
foram acusados de serem os causadores de problemas circunscritos, tal como o
incêndio de Roma no ano 64, e por isso foram perseguidos.

Houve, também, uma imparcialidade por parte da jurisprudência romana,


tendo em vista que, por um lado, utilizavam de mecanismos punitivos para que
os cristãos acusados perante o imperador negassem o nome de Cristo e
sacrificasse aos deuses, e por outro, os cristãos não poderiam ser acusados

12
anonimamente e serem perseguidos pelas autoridades romanas, como
demonstrado na correspondência de Plinio a Trajano.

Entre o ano 64 e 112 d.C. a acusação contra os cristãos, afirma Croix, era
simplesmente porque diziam-se cristãos, punidos unicamente por causa do
nome. O exemplo no qual ele se baseia para tal afirmação é a correspondência
entre Plinio e o imperador Trajano. Ao se referir aos acusados trazidos diante
dele, Plinio diz: “Aqueles que foram acusados de serem cristãos”. Croix observa
que, ao interrogá-los, Plinio simplesmente perguntava se confirmavam serem
cristãos. A reposta de Trajano sobre os que foram acusados é a seguinte: “quem
negar ser cristão e sacrificar aos deuses deve ser livre”. Assim, Croix (1963, p.9)
sustenta que os primeiros cristãos foram acusados e condenados simplesmente
por serem cristãos.

Além disso, outra proposta é sugerida por alguns escritores, diz Croix. Ela
está fundamentada em textos do Novo Testamento, como Apocalipse de João e
I Pedro, supondo que a causa da proibição da “seita cristã” está relacionada com
a negação em participar do culto imperial forçado na Ásia Menor, no tempo de
Domiciano/Nero. Portanto, a acusação contra os cristãos seria de deslealdade
política. Croix (1963, p.10), todavia, não considera aconselhável colocar muito
peso sobre tais fatos, embora acredite que, sem dúvida, alguns cristãos em
Pérgamo sofreram a morte por não tributarem culto ao imperador, como descrito
no Apocalipse de João.

Não há como determinar, antes do terceiro século, quais foram as leis que
fundamentaram a perseguição aos cristãos por parte dos romanos. Dentre as
possibilidades, Luís Alberto de Boni (2014, p.135-168) reconhece três opiniões
diferentes na pesquisa.

A primeira opinião, citada pelo autor, afirma que tal prática contra os
cristãos se baseou numa legislação especial, um senatus consultum ou um edito
imperial. Para De Boni, esta teoria não se sustenta por dois motivos:
primeiramente, Tertuliano menciona em sua obra Apologeticum 4,7: “uma antiga
e confusa floresta de leis” utilizadas contra os cristãos. Por fim:

ela também não explica por que até o edito de Décio, em 250,
só houve esporádicas ações contra os cristãos e por que
também os demais autores cristãos, que sustentaram a

13
existência de uma lei persecutória, não souberam citar qual foi
esta lei (DE BONI, 2014, p.140).

Além disso, as normas eram dirigidas para questões específicas, em


determinadas regiões, sendo aplicadas conforme a intenção do governante. De
Boni (2014, p.141) sugere a aplicação da legislação sobre crime comum, a Lex
Iulia de majestate, a única lei da qual os funcionários públicos poderiam se valer
para condenar os cristãos. Todavia, “a Lex Iulia não se voltava especificamente
contra os cristãos”, mas era “destinada a punir os rebeldes”.

Uma segunda opinião via a perseguição como um castigo devido à recusa


dos cristãos, por inertia, pertinácia ou obstinatio, a celebrar os cultos tradicionais
de Roma. Esse procedimento teria ocorrido com mais frequência nas províncias,
atesta De Boni, e os trâmites judiciais não eram utilizados para essa categoria
de condenação, ficando a cargo dos governantes, mediante a coerção, manter
a ordem pública.

Uma terceira posição aceita nos últimos tempos pela maioria dos
estudiosos, atesta o autor, compreende esse ato hostil como punição por parte
do poder policial, em defesa da ordem pública. Assim:

Os cristãos eram punidos, portanto, pelo direito penal comum,


do qual os funcionários se valiam para impor a pena que
julgassem cabível, e os cristãos seriam então punidos não pelo
fato de serem cristãos, mas por violarem as leis romanas, como
nos crimes de ateísmo, lesa-majestade, magia, superstição e os
flagitia, isto é, atos torpes, como incesto, infanticídio, refeições
onde se servia carne humana, rituais de morte etc. (DE BONI,
2014, p. 142).

Paradoxalmente, se num primeiro momento a causa da hostilidade aos


cristãos foi motivada por motins e levantes locais, e os imperadores não tinham
relações diretas com elas, no terceiro e quartos séculos estes passaram a
desempenhar um papel importante nas ações persecutórias.

Esse cenário histórico é fundamental para compreendermos os conflitos


com o estado romano encontrados no Apocalipse de João. Serve, também, para
a fundamentação de hipóteses sobre os aspectos literários da obra, que veremos
no capítulo a seguir.

14
CAPÍTULO 2 – APOCALIPSE:CONTEXTO
LITERÁRIO: AUTOR E DATA

2.1 AUTORIA

O livro de Apocalipse é um dos poucos livros do Novo Testamento que


apresenta o nome de seu autor. As três epístolas “de João”, bem como o Quarto
Evangelho (também os sinóticos Mateus, Marcos e Lucas), não nomeiam o seu
autor. No Apocalipse, é o próprio João que se apresenta como autor do livro “Eu,
João, irmão vosso e companheiro na tribulação” (Ἐγὼ Ἰωάννης, ὁ ἀδελφὸς

ὑμῶν καὶ συγκοινωνὸς ἐν τῇ θλίψει Ap 1:9). Se identifica como “João, servo


de Jesus, qual testificou da palavra de Deus, e do testemunho de Jesus Cristo,
e de tudo o que tem visto” (Ap.1:2).

Contudo, a identidade desse “João” tem sustentado séculos de


divergências por parte de especialistas, pois ele não se identifica como
“apóstolo”, mas como “servo (dou,loj)” e “profeta (profh,thj)”, possibilitando
algumas sugestões por parte dos estudiosos: 1) João, o apóstolo; 2) o presbítero
João; 3) João Marcos; 4) João Batista; 5) outro João; 6) Cerinto; 7) alguém
usando o nome de João, o apóstolo, como pseudônimo. O nome de João Marcos

15
foi sugerido por Dionísio, o Grande, que foi bispo de Alexandria em meados do
século terceiro:

Há, portanto, ainda outro João nos Atos dos Apóstolos, com o
sobrenome de Marcos (At 12,25), que Barnabé e Paulo tomaram
consigo e do qual diz ainda a Escritura: “Tinham consigo, como
auxiliar, João” (At 13,5). Se é este que escreveu o Apocalipse,
não é muito claro. Pois não está escrito que tenha ido com eles
à Ásia, mas: De Pafos, onde embarcaram, Paulo e os seus
companheiros alcançaram Perge, na Panfília. João, porém,
deixou-os para voltar a Jerusalém” (At 13.13) (EUSÉBIO, H.E,
7.25,15).

Dionísio, portanto, nega sua própria hipótese quando atesta que este João
não conheceu a região da Ásia Menor, berço do Apocalipse. Porém, isso não
significava que Dionísio concordava com a autoria do Apóstolo João, pelo
contrário, afirmava que o Apóstolo não pode ser identificado como o autor do
livro por pelo menos três motivos, como aponta Carson, Moo e Morris (2017,
p.521):

1) O autor do Apocalipse não declara em momento algum ser Apóstolo


ou testemunha ocular e não se identifica com “o discípulo amado”
como faz o autor do evangelho de João;
2) Os conceitos e a disposição do material em Apocalipse são totalmente
diferentes do quarto evangelho e de 1João;
3) O grego de Apocalipse é radicalmente diferente do grego do quarto
evangelho e de 1João.

Para ele, supostamente o livro de Apocalipse foi escrito por outra pessoa
de nome “João”, pois ele tinha ouvido dizer que em Éfeso havia dois túmulos de
cristãos importantes com o nome de João: “Penso ser o autor outro, dentre os
que estavam na Ásia, porque se conta que há em Éfeso dois túmulos, um e outro
ditos de João (EUSÉBIO, H.E, 7.25,16)”.

Osborne (2014, p.2) sublinha que há um único estudioso que sugeriu a


autoria de João Batista, alegando que:

João e seus seguidores produziram o Apocalipse em três


estágios: primeiro, os capítulos 4-11 foram visões que João

16
Batista teve antes de Jesus começar seu ministério; em seguida,
os capítulos 12-22 foram produzidos por um de seus discípulos
antes de 70 d.C.; por fim, os capítulos 1-3, compostos por um
editor final.

Quanto a Cerinto, parece que a autoria foi atribuída a ele devido ao conflito
dos Alogoi e Gaio com os montanistas, na tentativa de desvalorizar o movimento
e o livro de Apocalipse. Não há, contudo, bons indícios que atestem essa
associação.

Dionísio foi acompanhado por Eusébio, Cirilo de Jerusalém e Crisóstomo.


Seus argumentos suscitou uma série de hipóteses na igreja primitiva com
relação a autoria do Apocalipse de João. Eusébio, por exemplo, acreditava que
a resposta para a autoria do livro encontrava-se na afirmação de Papias, quando
se refere ao autor como “João, o ancião”. Ele acreditava existirem duas pessoas
conhecidas como João, em Éfeso, sendo que o Apóstolo havia escrito o
Evangelho, e o ancião, o Apocalipse. Osborne (2014, p.4) sublinha que diante
disso, dois comentários são importantes e necessários:

Primeiro, é bem possível que não se trate de duas pessoas, mas


de apenas um João: a forma do pretérito “disseram” liga João
aos apóstolos do passado e a forma presente “dizem” associa-o
com as testemunhas que ainda estavam vivas na época de
Papias (assim Smalley, 1994: 38). Gundry (1982: 611-12)
defende com vigor a ideia de que Papias reconhecia João, “o
ancião” e “o discípulo do Senhor”, como uma só pessoa. Ele se
baseia no fato de que Papias estava escrevendo antes de 110
d.C., e é mais provável que estivesse se referindo a testemunhas
da primeira geração e não a anciãos da segunda geração. Se
ele estivesse se referindo à segunda geração, seria natural que
falasse de anciãos que receberam as tradições dos discípulos.
Portanto, motivado por seu próprio preconceito contra
Apocalipse, Eusébio deve ter interpretado as evidências como
sendo de duas testemunhas distintas, ao passo que Papias
considerava João, o ancião, e o apóstolo João a mesma pessoa.
Em segundo lugar, mesmo que se tratasse de duas pessoas
distintas, não há nenhum indício de que uma tenha escrito o
Evangelho e outra, Apocalipse. Essa teoria não passa de mera
especulação.

É importante lembrar que já em meados do século II o livro de Apocalipse


foi atribuído a João, o Apóstolo de Cristo. Em Diálogos com o judeu Trifo, Justino
Mártir, que residiu em Éfeso, afirmava que “certo homem que vivia entre eles,

17
cujo nome era João, um dos apóstolos do Senhor, profetizou através de
Revelação, afirmando que aqueles que acreditam em Cristo habitarão por mil
anos na cidade de Jerusalém” (Ap 20,4-6) (JUSTINO, Dial. 81). Além de Justino,
Irineu (Contra as Heresias 4.14.1; 5.26.1), Tertuliano (Contra Marcião 3.14,24) e
Clemente de Alexandria (Miscelâneas 6.106,7) afirmaram que o apóstolo João
escreveu Apocalipse, e que não existia nenhuma tradição rival antiga quanto à
autoria. Assim, não devemos rejeitar tão depressa a tradição da Igreja primitiva,
tendo em vista que os argumentos contrários podem ser explicados, como
aponta Bloomberg (2019, p.662):

As diferenças no vocabulário podem ser atribuídas ao gênero e


ao conteúdo. Apocalipse não tem os propósitos evangelísticos
ou catequéticos – encontrados nos outros escritos joaninos – de
incentivar a fé; o período descrito reflete muito mais o juízo de
Deus do que seu amor. O estilo tosco pode ser reflexo da
natureza das visões de João – tentando descrever o indescritível
– ou do êxtase do profeta, ou do não uso do amanuense ou
redator, ou do não envolvimento da “escola joanina”. E, no geral,
o vocabulário e o nível da redação de Apocalipse têm mais
semelhança do que dessemelhanças em relação aos outros
escritos de João (ou relação a qualquer dos outros documentos
do Novo Testamento).

Conquanto a discussão sobre a autoria, não há argumentos suficientes


para que os argumentos de Dionísio e de outros autores que o seguiram para
tornarem impossível que o apóstolo João tenha escrito tanto o Evangelho quanto
o Apocalipse. Estamos, assim, ao lado daqueles que aceitaram e muito próximo
da primeira geração de cristãos que atestaram a autoria de João, o apóstolo.

2.2 DATA

O debate contemporâneo sobre a data de composição do Apocalipse


sugere pelo menos quatro datas, baseadas nos argumentos dos primeiros
escritores cristãos. Carson, Moo e Morris (2017, p.527) apresentam o seguinte
quadro com as fontes antigas que datam o Apocalipse:

18
Escritos cristãos antigos e a data de Apocalipse
Fontes que datam Apocalipse segundo um
Imperador Governou em
imperador
Cláudio 41-54 Epifânio (.Haer. 51.12)
Nero 54-68 Versões siríacas de Apocalipse
Irineu (Adv. Haer. 5.30.3)(“perto do final do
reinado de Domiciano”; Vitorino (Apoc. 10.11);
Eusébio (H.E 3.18); Clemente de Alexandria
Domiciano 81-96
(Quis div. 42) e Origines (Matt. 16.6) situam o
Apocalipse no reinado do “tirano”, numa
provável referência a Domiciano.
Uma sinopse da vida e morte dos profetas
Trajano 98-117 atribuída a Doroteu; o comentário de Teofilacto
sobre Mt 20.22

Como atestado na tabela acima, o período que compreende o reinado do


Imperador Domiciano ganha força entre os pais da Igreja quanto à datação do
Apocalipse. Irineu, que aparece como uma fonte que cita diretamente o nome de
Domiciano, tem sido seguido por boa parte dos estudiosos. As datas nos
reinados de Cláudio e Trajano são consideradas muito remotas, e não
expressam o cenário descrito no próprio texto do Apocalipse. Contudo, mesmo
com informações diretas e/ou aproximadas acerca do período de composição do
Apocalipse, Carson, Moo e Morris (2017) apontam áreas básicas que precisam
ser consideradas para se chegar a uma decisão, a saber: A perseguição de
cristãos, adoração ao imperador, as condições das igrejas.

A perseguição contra os cristãos: Embora tenhamos discutido, no


primeiro capítulo, que os cristãos não foram perseguidos de forma generalizada
até meados do século III d.C., precisamos destacar duas perseguições
específicas que aconteceram antes desse período, a saber, a perseguição de
Nero e a de Domiciano.

19
Nero (37-68 d.C.): Nero chegou ao poder em
outubro de 54 após a morte de seu tio Claudio, que
o nomeara como seu sucessor. Nos primeiros anos
de seu governo Nero não cometeu os crimes pelos
quais ficou famoso, pelo contrário, seu governo foi
justo e de benefícios para os mais pobres e
despojados.

Mas, depois de pouco tempo em sua posição de


imperador o jovem imperador deixou-se levar pelo
seu desejo de poder e grandeza, legando um nome que é símbolo de crueldade
e prepotência. Após dez anos de governo ele já era desprezado por grande parte
da população de Roma, condição que se intensificou na noite de 18 de julho de
64, quando se estalou um enorme incêndio em Roma que durou seis dias e sete
noites, atingindo dez dos catorze bairros de Roma. De acordo com González
(1995, p.54),

Em meio a todos seus sofrimentos, o povo exigia que se


descobrisse o culpado, e não faltava quem se inclinasse a
pensar que o próprio imperador havia ordenado o incêndio da
cidade para poder reconstruí-la a seu gosto, como um grande
monumento à sua pessoa. O historiador Tácito, que
provavelmente se encontrava então em Roma, conta vários dos
rumores que circulavam, e ele mês parece dar a entender a sua
opinião, pela qual o incêndio havia começado acidentalmente
num depósito de azeite.

Nero, assim, fez de tudo para afastar as acusações e suspeitas contra sua
pessoa, dentre as tentativas acusou os cristãos pelo incêndio de Roma, tendo
em vista que dois dos quatro bairros que não haviam queimado concentravam
mais judeus e cristãos. O próprio Tácito afirma que a acusação contra os cristãos
foi injusta (Anais 15.44). Ele descreve a crueldade com que os cristãos foram
tratados após as acusações de Nero:

20
Além de matá-los (aos cristãos) fê-los servir de diversão para o
público. Vestiu-os em peles de animais para que os cachorros
os matassem a dentadas. Outros foram crucificados. E a outros
acendeu-lhes fogo ao cair da noite, para que a iluminassem.
Nero fez que se abrissem seus jardins para esta exibição, e no
circo ele mesmo ofereceu um espetáculo, pois se misturava com
as multidões, disfarçado de condutor de carruagem, ou dava
voltas em sua carruagem. Tudo isto fez com que despertasse a
misericórdia do povo, mesmo contra essas pessoas que
mereciam castigo exemplar, pois via-se que eles não eram
destruídos para o bem público, mas para satisfazer a crueldade
de uma pessoa (Anais 15:44).

Domiciano (51-96): Domiciano sucedeu o imperador Tito


no ano 81 d.C. Assim como Nero, Domiciano é conhecido
como um imperador paranoico, tirano e cruel. A principal
característica de Domiciano enquanto no poder era seu
amor e respeito pela história e tradições antigas de
Roma, fato que moveu seu governo e sua política
imperial de restauração de tais tradições. Por causa de
sua rigidez com os costumes romanos, era de se esperar
que não aguentasse por muito tempo a ausência dos
cristãos nos grandes festivais em homenagem à Roma e ao Imperador. O conflito
não se deu apenas com os cristãos, mas com judeus também. Com a destruição
de Jerusalém em 70 d.C., Domiciano obrigou que os recursos que os judeus de
Roma enviavam para a manutenção do templo de Jerusalém deviam enviar para
o tesouro imperial, desatando uma grande crise contra todos os que praticavam
“costumes judaicos”. González (1995, p.60) comenta que,

Em Roma, o imperador fez executar ao seu parente Flávio


Clemente e a sua esposa Flávia Domitila, com a acusação de
“ateísmo” e de “costumes judaicos”. Já que os cristãos adoravam
um Deus invisível, em geral os pagãos os acusavam de serem
ateus. Portanto, é muito provável que Flávio Clemente e sua
esposa tenham sido mortos por serem cristãos”.

Mesmo diante desse cenário, não temos indicação se a perseguição tanto


de Nero como de Domiciano estendeu para todo o império romano,
ultrapassando as fronteiras de Roma. Assim, não há força o suficiente para
aqueles que datam o Apocalipse no tempo de Nero, tendo em vista que ficamos

21
limitados à Roma, e os eventos do Apocalipse destacam a região da Ásia Menor.
No caso de uma data no período de governo de Domiciano, as várias referências
históricas espalhadas pelo Apocalipse (1.9; 2.13; 3.10; 6.9; 17.6; 18.24;19.2;
20.4) se encaixam melhor na década de 90. Assim, as perseguições não são
suficientes para datar precisamente a obra, tendo a necessidade de considerar
outros aspectos e informações importantes.

Adoração ao Imperador: O culto ao Imperador segue padrões já


existentes em nações milenares. Honras divinas a líderes políticos podem ser
encontradas no mundo egípcio e no período helenístico. O primeiro caso de
honras divinas a um ser humano encontrado no período helenístico surgiu no
século V a.C., por ocasião do fim da guerra do Peloponeso (431-404).
Atenágoras de Atenas escreveu ao Imperador Marco Aurélio que os moradores
de Samos deificaram o general Lisandro de Esparta. Da mesma forma Alexandre
Magno, com a conquista do território Egípcio foi aclamado filho de Zeus-Amon
pelos sacerdotes de Amon-Rá do Egito (RIBEIRO, 2008, p.104).

Com relação ao culto imperial romano, Dulcan Fishwick (2002) aponta um


processo gradual e com três estágios:

O primeiro estágio vai de 31 a.E.C., a 14 d.E.C., com o período


de Augusto. Nesse período, encontramos evidências do
desenvolvimento do culto cívico o qual consistia na adoração ao
Imperador em vida, mas não há uma institucionalização do culto.
O segundo estágio aponta, pela primeira vez, a divinização do
Imperador de 14-69, isto é, de Tibério à dinastia flaviana. Por
último, o período que corresponde ao movimento da dinastia
flaviana no processo de padronização do Culto Imperial (69-96).

O culto ao Imperador tornou-se fator primordial para a unidade do Império,


tendo como objetivo a lealdade a Roma e ao Imperador. O culto se tornou, tanto
para a elite de Roma como para as elites das províncias oportunidades para
obtenção de privilégios políticos e econômicos. O culto imperial logrou boa
aceitação nas províncias, pois havia uma irresistível vontade entre a população
em demonstrar sua gratidão e respeito ao Império. Por meio do culto, as
províncias expressavam sua aliança diplomática com Roma. Assim, a veneração
ao Imperador não chegou à Ásia Menor por imposição das autoridades imperiais,
mas por desejo das cidades e uma estratégia política das elites locais.

22
Alguns autores pressupõem que o culto imperial desempenha um papel
proeminente no livro de Apocalipse, por esse motivo se atrela a perseguição aos
cristãos presente no livro como sendo originária do conflito com o culto ao
imperador (Cap. 2 e 3; 13.4; 14.9-11; 15.2; 16.2; 19.20). É importante ressaltar,
conforme aponta Carson, Moo e Morris (2017, p.528),

Que não estamos pressupondo interpretação preterista de


Apocalipse, segundo a qual tudo no livro se aplica somente à
época de João. Alguns desses textos poderiam ser
automaticamente proféticos, vislumbrando uma situação que
não ocorreu no século I. Apesar disso alguns dos textos indicam
que o problema era real para os leitores de João.

E como a questão do culto imperial contribuiria para a datação do livro de


Apocalipse? Possivelmente Domiciano, em seus anos finais, usou o culto
imperial como um teste de fidelidade, justamente no período em que os cristãos
teriam entrado em conflito com tais exigências. Foram encontradas provas que
Domiciano tenha exigido que fosse reconhecido como deus praesens (divindade
presente), e há moedas da década de 90 d.C. que o retratam como entronizado
como “pai dos deuses” (OSBORNE, 2014, p.7).

As condições das Igrejas: Diversos autores atestam que os eventos


presentes nas cartas às Igrejas da Ásia refletem uma data posterior à década de
60 d.C., como aponta Osborne (2014, p.10):

(1) a recuperação independente de Laodicéia (3.17) harmoniza-se melhor


com o terremoto e a reconstrução da cidade em 80 d.C.;

(2) a grande prosperidade reflete melhor a década de 90 do que a de 60;

(3) a frase “não danifiques o azeite e o vinho” (6.6) remete provavelmente

a um édito de Domiciano em 92 d.C., pelo qual se restringia o cultivo de vinhas


na Ásia;

(4) as referências à “sinagoga de Satanás” (2.9; 3.9) podem ser mais bem

situadas no ambiente dos conflitos que aconteceram no período de Domiciano;

23
(5) é possível que a igreja de Esmirna (2.8-11) ainda não existisse na
década de 60;

(6) a “ferida mortal que havia sido curada” (13.3,12,14) pode muito bem

apontar para a lenda do Nero redivivus, que se desenvolveu nas décadas de 80


e 90.

Poderíamos acrescentar, ainda, a ausência de qualquer menção a Paulo,


que havia trabalhado intensamente em Éfeso na década de 50 e Timóteo na
primeira metade da década de 60.

Precisamos destacar que nenhum desses pontos são decisivos e não


admitem conclusões definitivas. Contudo, quando examinamos todos os fatos,
bem como os estudos exaustivos sobre as duas principais opções (Nero e
Domiciano), parece provável que a data da composição mais convincente para
o livro de Apocalipse seja em meados da década de 90, sob Domiciano.

24
CAPÍTULO 3 - CONTEXTO LITERÁRIO: GÊNERO
LITERÁRIO, MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO,
UNIDADE E ESTRUTURA

3.1 GÊNERO LITERÁRIO

Os leitores do livro de Apocalipse se deparam com uma literatura que é


extremamente diferente daquela encontrada no restante das Escrituras
Sagradas. Nos primeiros três capítulos os leitores são introduzidos à situação de
João e sua tarefa de escrever aquilo que Jesus desejava às Igrejas. Contudo, a
partir dos capítulos 4 e 5, somos direcionados para outra esfera, para cenas que
ocorrem no céu, diante do centro de tudo que existe. Nos capítulos seguintes,
vemos cavalos coloridos, almas sob o altar, bestas com diversas cabeças e
chifres e batalhas cósmicas. Assim, a primeira tarefa é entender do que se trata
isso, que tipo de gênero literário é Apocalipse?

A palavra utilizada por João para descrever o seu texto é Ἀποκάλυψις


(Ap 1.1), do verbo grego Ἀποκάλυptw, que significa desvelar, expor, revelar.

A identificação com o “gênero apocalíptico” da obra de João é problemática,


tendo em vista que a própria definição do gênero apocalíptico não goza de
consenso entre os estudiosos do tema. O termo “apocalipse” era usado para
designar várias obras que se assemelhavam em sua forma e estrutura. Os
apocalipses surgem no período conhecido como intertestamentário ou judaísmo
do segundo templo (NOGUEIRA, 2008, p. 16). Esse período é marcado por uma
transformação da visão de mundo presente nas gerações anteriores ao cativeiro
babilônico, bem como o contato com os persas.

Esse mundo dos profetas apocalípticos é o judaísmo que passa por um


processo de helenização e Zoroastrismo. A principal marca da nova visão de
mundo é o Dualismo cósmico. O mundo está divido entre duas forças
antagônicas, bem e mal, que disputam até o fim o domínio do mundo. Tais

25
apocalipses cultivam um descrédito dos valores tradicionais, como, no caso, a
obediência à Torá como elemento fundamental para livrá-los dos impérios
opressores, pelo contrário, a história havia demonstrado o domínio dos Assírios,
Babilônios e Persas (COLLINS, 2010, p. 55-61).

Há uma demonstração de pessimismo quanto à mudança histórica,


restabelecimento do reinado de Davi e Jerusalém como Teocracia; muda-se a
perspectiva: se Deus intervinha na realidade cotidiana do povo, agora, tampouco
vive em Jerusalém, no santo dos santos, mas habita os céus, e suas
intervenções estão reservadas para o grande dia do juízo final. Nas narrativas
apocalípticas, é latente a divisão entre humano e divino, este último estando bem
distante do ser humano. O céu é compartimentalizado, bem estruturado
(NOGUEIRA, 2008, p. 19).

O ser humano não consegue chegar a ele sem uma mediação necessária
e desde que transformações sejam feitas. O mundo está, assim, tomado por
forças antagônicas e se desenrola uma árdua batalha que representa uma não-
reconciliação (NOGUEIRA, 2008, p. 20). A história humana é compreendida,
portanto, a partir desta tensão entre oponentes. A única alternativa é a ruptura,
o fim, o juízo.

Os apocalipses falam do futuro, mas não somente disso. Falam também


das origens. É uma releitura da história a partir da tensão entre criação e final. É
uma visão de mundo: vai das causas da criação para entender o que deu errado
até seus desenvolvimentos que se originaram do mesmo. Tudo está relacionado
com o tempo primordial e, desta forma, pelos desacertos dos tempos da criação
(rebelião humana e rebelião dos anjos) fica comprometido o equilíbrio da
natureza, na política, na religião, na sociedade em geral (TERRA, 2019, p. 79-
83). Essa visão de mundo ganha força não apenas no período do Judaísmo do
segundo templo, mas podemos encontrá-la no período neotestamentário.

Uma das principais características dos Apocalipses é a pseudoepígrafia.


Eles são escritos em nome de grandes personagens do passado de Israel, tais
como Adão, Moisés, Enoque etc. Além da pseudoepígrafia, os Apocalipses se
utilizam de simbolismo em seus resumos da história. Gordon D. Fee e Douglas

26
Stuart (2011, p.301-302) destacam as características em comum entre os textos
apocalípticos do judaísmo intertestamentário e o Apocalipse de João:

1) A raiz mestra da apocalíptica é a literatura profética


veterotestamentária, especialmente como se encontra em
Ezequiel, Daniel, Zacarias e em partes de Isaías. Do mesmo modo
que ocorre em parte da literatura profética, a apocalíptica ocupava-
se com o juízo e a salvação vindouros. No entanto, a apocalíptica
nasceu em meio a perseguições ou em um tempo de grande
opressão. Sua grande preocupação, portanto, já não era com a
atividade de Deus dentro da história. Os apocalipsistas
aguardavam exclusivamente o tempo em que Deus levaria a
história a um fim violento e radical, um fim que significaria o triunfo
do bem e o juízo final de todo o mal.

2) De forma diferente da maioria dos livros proféticos, os apocalipses


são desde o início obras literárias. Os profetas eram geralmente
porta-vozes de Javé, cujos oráculos falados foram posteriormente
registrados por escrito e colecionados num livro. Um apocalipse,
no entanto, e uma forma de literatura. Apresenta estrutura e forma
escrita. João, por exemplo, recebe a ordem: “Escreve, pois, as
coisas que viste” (1.19, grifo nosso), ao passo que os profetas
foram ordenados a falar aquilo que ouviram ou viram.

3) Com mais frequência, o “conteúdo” da apocalíptica é


apresentado na forma de visões e sonhos, e sua linguagem é
enigmática (com sentidos ocultos) e simbólicos. Assim, a maioria
dos apocalipses continha recursos literários que visavam dar ao
livro uma impressão da mais extrema antiguidade. O mais
importante entre esses recursos era a pseudônima, ou seja,
atribuía-se a esses apocalipses a aparência de terem sido escritos
por personagens antigas (Enoque, Baruque, et al.), que receberam
a ordem de “selar tudo” para um dia futuro, esse “dia futuro”
naturalmente se refere a época em que o livro foi escrito.

27
4) As figuras de linguagem da apocalíptica frequentemente são
expressões de fantasia, e não de realidade. Em contrapartida, os
profetas não apocalípticos também faziam uso regular da
linguagem simbólica. Todavia, esse uso, com mais frequência,
envolvia figuras reais como, por exemplo, o sal (Mt 5.13), os
abutres e os cadáveres (17.37), pombas insensatas (Os 7.11),
pães mal assados (Os 7.8), et al. A maior parte das figuras da
apocalíptica, no entanto, pertence à fantasia — como, por exemplo,
uma besta com dez chifres e sete cabeças (Ap 13.1), uma mulher
vestida de sol (Ap 12.1), gafanhotos com caudas de escorpiões e
com cabeças humanas (Ap 9.10), et al. A fantasia não aparece
necessariamente nos itens propriamente ditos (sabemos o que são
bestas, cabeças e chifres), mas sim em sua combinação
sobrenatural.

5) Porque eram literários, a maioria dos apocalipses era


bastante estilizada em termos formais. Havia uma forte tendência
para dividir o tempo e os eventos em pacotes arrumados. Além
disso, também havia grande estima pelo uso simbólico dos
números. Por consequência, o produto final usualmente apresenta
as visões em conjuntos cuidadosamente dispostos,
frequentemente numerados. Muitas vezes, esses conjuntos,
quando reunidos, expressam alguma coisa (e.g., o juízo) sem
necessariamente procurar sugerir que cada quadro separado
segue imediatamente após o anterior.

O Apocalipse de João se enquadra em muitos aspectos da literatura


apocalíptica descritos por Fee e Stuart. Como aponta Carson, Moo e Morris
(2017), a mensagem do Apocalipse vem por intermédio de visões; ela é
comunicada por uso amplo de símbolos; contrasta este mundo com o mundo
vindouro, aguardando o livramento no futuro próximo etc. Mas, é preciso
destacar que o Apocalipse de João apresenta diferenças notáveis de tais textos,

28
o que consequentemente faz com que não se aplique ao gênero apocalíptico.
Conforme aponta Simon J. Kistemaker (2004, p.13),

Quando examinamos cuidadosamente este livro, começamos a


compreender que ele não é uma mera composição humana
semelhante aos apocalipses de 1 Enoque (2 Esdras no OT
Apocrypha) e 2 Baruque. No Apocalipse, o Deus Triúno está
revelando sua Palavra ao leitor, isto é, Deus mesmo está falando
ao seu povo. Isso se faz evidente nas palavras introdutórias:
“Revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe deu” (1.1), e nas
cartas às sete igrejas.

João quebra o gênero literário em vários momentos. Colin J. Hemer (1989,


p.12) diz que se o Apocalipse é “apocalíptico, é apocalíptico com diferença”. A
diferença mais notável (cf. OSBORNE, 2014; CARSON, MOO, MORRIS, 2017;
HEMER, 1989; FEE, STUART, 2011) é que Apocalipse não é uma obra
pseudônima. João não fala em nome de ninguém, não se apropria de nenhuma
figura do passado para dar legitimidade à sua obra. Ele fala em seu próprio
nome. Além disso, a vitória final não está centrada em um evento futuro, como
nos apocalipses judaicos que fundamentaram suas esperanças em eventos
vindouros, pelo contrário, ela está fundamentada no “sacrifício passado de Jesus
Cristo, “o Cordeiro que foi morto” (OSBORNE, 2014, p.15).

É importante lembrar que João apresenta seu texto não apenas como
“Revelação”, mas como profecia escrita em forma de “carta”. Assim, podemos
afirmar que Apocalipse é composto pela combinação de três gêneros, a saber,
apocalíptico, profético e epistolar (CARSON, MOO, MORRIS, 2017, p.532).
Embora alguns estudiosos apontem para a impossibilidade de fazer uma
distinção entre profecia e apocalíptica, uma vez que as duas acham-se
combinadas em muitos livros do Antigo Testamento (Daniel, Zacarias, Isaías),
há certas características que, em parte, distinguem os dois gêneros, como
aponta Osborne (2014, p.14),

a profecia tem a tendência de ser oracular, ao passo que a


apocalíptica é visionária; a profecia tem certo tom de otimismo
(se a nação se arrepender, não haverá julgamento), mas a
apocalíptica tende a ser pessimista (a única esperança está no
futuro e não no presente). Ambas, porém, têm como centro a
ideia de salvação para o fiel e juízo para o infiel. João se refere
a seu texto como profecia (1.3; 22.7,10,18,19) e é provável que
ele tenha sido líder de um grupo de profetas que ministravam às

29
igrejas da Ásia (22.6,9). O chamado de João ao ministério
profético lembra, de certa forma, o chamado de Ezequiel (10.8-
11; ver Ez 2.8-3.3); seu ministério é descrito como profetização
contra “muitos povos, nações, línguas e reis” (Ap 10.11). Os
oráculos de Jesus dirigidos através de João às igrejas, usando
a primeira pessoa, acham-se em 1.8,17; 16.15; 22.7,18,19. As
cartas às igrejas estão na terceira pessoa (Jesus é “aquele que
“), mas também trazem conteúdo profético, principalmente no
chamado para que ouçam e na promessa aos vencedores. O
valor do reconhecimento da natureza profética do livro sublinha
que João não está simplesmente redigindo a própria epístola (à
semelhança de Paulo e Pedro), mas é o canal profético de uma
mensagem cuja origem direta está em Deus e Cristo. A fonte do
livro não é a imaginação fértil de João, mas o próprio Deus.

Como “Epístola”, o Apocalipse se apresenta como uma carta que deveria


circular entre as Igrejas da Ásia Menor. Além de facilitar a leitura no ambiente
cristão, a forma epistolar ajuda o leitor a perceber que o Apocalipse não se
dedica apenas ao futuro, mas que é um livro teológico originado das
necessidades específicas das Igrejas do seu tempo por meio de profecias que
revelam o futuro. Assim, aponta Osborne (2014, p.14):

A expectativa de João era que seus leitores enxergassem a si


mesmos e a situação de seus dias através das lentes do livro,
percebendo que, a exemplo da igreja dos últimos dias, eles
estavam coletivamente identificados com a igreja do fim dos
tempos.

3.2 MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO

Podemos afirmar, sem dúvida, que dentre os livros das Sagradas


Escrituras o Apocalipse é o livro mais difícil de ser interpretado, tendo em vista
seu uso elaborado do simbolismo. Perguntamos, por exemplo, a que se referem
as visões de João? Como entender os seus símbolos? O que fazemos com essa
profecia? A igreja jamais chegou a um consenso sobre tais questionamentos.
Assim, a compreensão do sentido do Apocalipse repousa sobre a perspectiva
hermenêutica adotada. É consenso entre os estudiosos do livro de Apocalipse
que há, pelo menos, quatro escolas de interpretação do livro, a saber, a futurista,
a historicista, a preterista, e a simbólico/idealista.

30
3.2.1 ABORDAGEM FUTURISTA

A abordagem futurista sustenta que, os capítulos 4-22 do Apocalipse se


cumprem nos dias finais da história da humanidade. Esse método foi empregado
por alguns pais da Igreja, a saber, Justino, Irineu e Hipólito (OSBORNE, 2014).
Há duas versões da abordagem futurista, a saber, o dispensacionalista e a
moderada, conhecida também como “pré-milenismo clássico”. Os
dispensacionalistas acreditam que Deus conduziu seu plano de salvação por
meio de estágios com base na eleição de Israel. A era da Igreja, assim, é um
interlúdio nesse plano, onde Deus se volta para os gentios enquanto o povo de
Israel passe por um avivamento nacional. Essa é a visão da maioria dos
Pentecostais, como aponta Stanley Horton (2001, p.9):

A maioria dos pentecostais e fundamentalistas têm uma visão


futurista do livro. Sob esta perspectiva, tudo, ou quase tudo que
é narrado após o capítulo quatro, será cumprido num curto
período de tempo (sete anos) após o término da dispensação da
Igreja. Será um período de tribulação, ira e julgamento, que terá
o seu clímax com o retorno de Jesus em glória para destruir o
exército do Anticristo, e estabelecer seu reino milenial.
Encontramos este período de sete anos nas Setenta Semanas
de Daniel 9.27. De acordo com alguns, apenas os últimos três
anos e meio desse tempo profético. Período este chamado
também de a Grande Tribulação. Por isso, quando os futuristas
falam da Tribulação, ou da Grande Tribulação, não estão se
referindo às tribulações comuns, sofrimentos e pressões, que
são parte do viver diário da história da Igreja neste presente
século. Sofrimentos estes causados tanto pelo mundo quanto
por Satanás. Durante a Grande Tribulação, é bom que se diga,
será o próprio Deus quem trará a ira e o julgamento sobre o
mundo que rejeita a Cristo. A perspectiva de um curto período
de tribulação ao findar a presente era, é sustentada por todos os
futuristas, sendo eles ou não dispensacionalistas.

De forma detalhada, George Eldon Ladd (1986, p.12), apresenta a divisão


dos capítulos do Apocalipse a partir da visão futurista dispensacionalistas:

Entende as cartas como sete épocas sucessivas da história da


Igreja, expressa em símbolos. O caráter das sete igrejas ilustra
as principais características dos sete períodos de declínio e
apostasia (Laodicéia). O arrebatamento de João simboliza o
arrebatamento da Igreja no fim dos tempos. Os capítulos 6-18

31
retratam o período da grande tribulação - o último período, curto,
mas terrível, da história da igreja, quando o Anticristo
praticamente destruirá o povo de Deus. No ponto de vista
dispensacionalista o povo de Deus é Israel, de volta a
Jerusalém, protegido por um selo divino (7.1-8), com o templo
reconstruído (11.1-3); que sofre a ira do Anticristo. A igreja não
está mais na terra, porque foi reunida ao Senhor nos ares.

Acrescenta-se, que no final desse período, virá a parusia, quando Cristo


voltará para julgar, seguido de um milênio literal (20.1-10), do julgamento do
grande trono branco (20.11-15) e do início da eternidade no gozo celestial

(21.1—22.5) (OSBORNE, 2014).

Na abordagem futurista moderada, aponta Osborne (2014, p.23),

Tem uma posição semelhante, mas sem as dispensações.


Assim, há somente uma volta de Cristo, após o período da
tribulação (Mt 24.29-31; cf. Ap 19.11-21), e toda a igreja, não
somente a nação de Israel, passará pelo período de tribulação.
Além disso, os dispensacionalistas se consideram literalistas no
que diz respeito aos símbolos, ao passo que os pré-milenistas
clássicos consideram muitos deles apenas símbolos.

Nesta abordagem não há diferença tão definida entre Israel e a Igreja. Na


perseguição, é a Igreja que sofre ferozmente. Contudo, concorda que o
“propósito do livro é descrever a consumação do propósito redentor de Deus no
fim dos tempos” (LADD, 1986, p.12).

3.2.2 ABORDAGEM HISTORICISTA

A abordagem historicista tem sua origem nos movimentos na Idade


Média, em especial com Joaquim de Fiore, no século 12 (OSBORNE, 2014), que
acreditavam que o milênio era iminente. Assim, usaram o Apocalipse como uma
profecia simbólica que esboçava uma identificação dos diversos eventos da
história da época de Cristo com os acontecimentos da história do mundo
ocidental e da Igreja.

32
Joaquim de Fiore alegava ter tido uma visão acerca dos 1260 dias de
Apocalipse, visão esta que revelava que tais dias profetizavam os
acontecimentos da história Ocidental desde os tempos dos apóstolos até o
presente. Assim,

Os franciscanos seguiram Joaquim e, como ele, interpretavam


Apocalipse como apontando para a Roma pagã e o papado (por
causa da corrupção na igreja). Tempos depois, os reformadores
(e.g, Lutero e Calvino) também foram favoráveis a esse método
e identificaram o papa como o Anticristo (ver Beckwith 1919:
327-29; Johnson 1981: 409). Os dispensacionalistas clássicos
adotaram esse método com relação às cartas às sete igrejas,
acreditando que elas profetizavam os sete períodos da era da
igreja. O chamado movimento profético, representado pelos
pregadores que viam cada detalhe do simbolismo apocalíptico
tanto do Antigo quanto do Novo Testamento como cumprido nos
eventos presentes (a “abordagem jornalística” da profecia),
também se alinharia com essa escola. Os defensores desse
método inclinam-se a ver Apocalipse 2-19, incluindo os selos, as
trombetas, as taças e os interlúdios, como profecias da história
da salvação, ou seja, como desenvolvimento da história da igreja
dentro da história mundial. Por isso, a besta/o Anticristo tem sido
identificado de modos variados como o papa, Napoleão,
Mussolini ou Hitler (OSBORNE, 2014, p.21).

Essa abordagem, embora muito popular na Idade Média e entre alguns


Reformadores, é adotada por poucos estudiosos do livro de Apocalipse, em
virtude de sua fragilidade em identificar o livro com apenas a história Ocidental,
precisando, assim, ser reformulada a cada ciclo histórico, além de sua
negligência da relevância das cartas enviadas às Igrejas da Ásia no tempo de
João.

3.2.3 ABORDAGEM PRETERISTA

Esta abordagem também é conhecida como “histórica contemporânea”.


Ela é comumente utilizada entre os estudiosos alemães e americanos. Esta
abordagem gira em torno da ideia de que o livro de Apocalipse descreve os
eventos e os contextos histórico, social e cultural do tempo de João e não tem a
pretensão falar sobre acontecimentos futuros. De acordo com Moo, Morris
(2017), considera-se que,

33
os símbolos das visões referem-se todas as pessoas, países e
acontecimentos do mundo da época, e o propósito de João é
mostrar a seus leitores como Deus está na iminência de trazer
juízo sobre aquele mundo que os está oprimindo e, desse modo,
livrá-los para seu reino eterno.

Muitos afirmam que o livro apresenta a situação da Igreja no Império


Romano; além disso, fala da opressão e queda do Império Romano. Há um
destaque para as perseguições ocasionadas pelo crescimento e exigência do
culto ao imperador, tão presente no livro, segundo a abordagem. Assim, a besta
pode ser Roma ou o Imperador. Os selos, as trombetas e as taças são juízos
que Deus derramará sobre a própria Roma. E os eventos que ocorrem na
Palestina por ocasião da destruição do templo em 70 d.C., seria o estopim para
os conflitos entre judeus e romanos, originando o livro de Apocalipse. O livro,
portanto, cumpriu seu propósito de fortalecer e encorajar os cristãos da Ásia
frente à opressão imperial no primeiro século.

3.2.4 ABORDAGEM SIMBÓLICO/IDEALISTA

Tal abordagem supõe o equívoco em tentar encontrar e identificar os


acontecimentos históricos e proféticos nas visões de João. O foco do livro é
ajudar os leitores modernos a compreender a pessoa de Deus e o seu modo de
se relacionar com o mundo. O conflito seria simbólico, ou seja, há um conflito
entre bem e mal, entre a Igreja e o mundo. Os selos, trombetas e taças
representam o juízo de Deus sobre todos os pecadores, de todas as eras. As
bestas são, portanto, uma referência a todos os impérios e governantes
anticristãos em toda a história. Osborne (2014) apresenta os pontos fortes e
fracos dessa abordagem:

Há alguns pontos fortes nessa linha de pensamento: a


centralidade da teologia do livro, sua pertinência para a igreja de
todos os tempos e sua natureza simbólica. Mas existem também
alguns pontos fracos: não se fazem associações históricas, não
se considera a natureza futura de muitas profecias ou elas não
são de algum modo vinculadas à história (como o texto parece
fazer em diversas ocasiões).

34
Em suma, como atestado anteriormente, não há consenso sobre o
método de interpretação do livro de Apocalipse, mas há estudiosos que apontam
para a necessidade de uma visão eclética dos mesmos. Afirma-se que a solução
está em permitir que os métodos preterista, idealista e futurista interajam de tal
forma que os pontos fortes sejam destacados, se sejam minimizados a
fragilidade de cada um deles. Assim, Ladd (1986) e Gordon Fee (2011, p.24)
propõem que a abordagem preterista e futurista sejam mescladas. Carson, Moo,
Morris (2017), seguem a abordagem futurista, assim como Stanley Horton (2001)
e Antonio Gilberto (1984).

3.3 UNIDADE E ESTRUTURA

É possível considerar que a estrutura do livro de Apocalipse é a mais


complexa e a que recebe propostas variadas por partes dos pesquisadores do
livro. É possível identificar o uso de uma técnica de interrupção da narrativa
através de introduções, três no total. O capítulo 1 introduz e apresenta o livro.
Em seu prólogo, João apresenta seu texto da seguinte forma: “Revelação de
Jesus Cristo a qual Deus lhe deu para mostrar aos seus servos as coisas que
brevemente devem acontecer” (1,1-3). Em 1,4-8, há uma introdução às cartas e
em seguida é descrita uma visão de Jesus (1,9-20). Os capítulos 2 e 3 são as
cartas às sete Igrejas. Os capítulos 4 e 5, que descrevem uma visão de louvor
celestial, introduzem o núcleo central do livro, a saber, os capítulos 6-19. O
capítulo 20 prevê o milênio e os capítulos 21 e 22 descrevem o estado eterno,
novos céus e nova terra. O grande debate estrutural envolve os capítulos 6-19,
que apresenta três séries de juízos com pequenos interlúdios (7.1-17; 10.1-
11.14; 12.1-14.20).

Segundo Bloomberg (2019), o entendimento mais simples sobre as três


séries de sete interpreta que elas estão em uma sequência puramente
consecutiva ou cronológica. Isso oferece uma boa explicação para a crescente
intensidade dos juízos à medida que se avança da primeira para a terceira série.

35
Para ele, a melhor opção para as três séries seja pensar que cada série
“nos leva para mais perto do fim, mas o sétimo de cada série não faz a cronologia
avançar tanto, e sim introduz a série seguinte. Ou, melhor dizendo, contém a
série seguinte”. O sétimo selo revela a primeira trombeta, assim como a sétima
trombeta revela as sete taças.

Taças
O

Trombetas F

I
Selos
M
(BLOOMBERG,2019, p.669)

O Apocalipse pode ser organizado, assim, a partir do comissionamento


de João que descreve o que ele havia visto em Patmos, seguido da ordem de
escrever às Igrejas da Ásia, capítulos 2 e 3, bem como a entronização de Deus
e do Cordeiro, capítulos 4 e 5. Por fim, descreve os eventos futuros, a saber, os
capítulos 6-22.

36
Passado Cap.1 Introdução

Caps. 2 e 3 Cartas às Igrejas

Presente Caps. 4 e 5
Louvor Celestial

Sete Selos

Sete Trombetas

Caps. 6-19
Sete taças da Ira de
Deus
Futuro

Milênio

Caps. 20-22 Novos céus e nova


terra

(BLOOMBERG, 2019, p.670)

37
Um esboço detalhado da estrutura do livro de Apocalipse é proposto por
Ladd (1986, p.15-16):

I. PRÓLOGO (1:1-8)

1. O Título do Livro (1:1-3)

2. Saudação (l:4-5a)

3. Doxologia a Cristo (1:5b-6)

4. O Tema do Livro (1:7)

5.O Imprimatur Divino (1:8)

II. A PRIMEIRA VISÃO (1:9-3:22)

1. O Revelador: Cristo Glorificado (1:9-20)

2. As Sete Cartas (2:1—3:22)

(1) A Carta a Éfeso (2:1-7)

(2) A Carta a Esmirna (2:8-11)

(3) A Carta a Pérgamo (2:12-17)

(4) A Carta a Tiatira (2:18-28)

(5) A Carta a Sardes (3:1-6)

(6) A Carta a Filadélfia (3:7-13)

(7) A Carta a Laodicéia (3:14-22)

III. A SEGUNDA VISÃO (4:1-16:21)

1. O Trono Celestial (4:1-11)

2. Os Sete Selos (5:1—8:1)

(1) O Livro Selado (5:1-14)

(2) Os Seis Selos (6:1-17)

38
a. O Primeiro Selo (6:1-2)

b. O Segundo Selo (6:3-4)

c. O Terceiro Selo (6:5-6)

d. O Quarto Selo (6:7-8)

e. O Quinto Selo (6:9-11)

f. O Sexto Selo (6:12-17)

(3) Interlúdio: As Duas Multidões (7:1-17)

a. Os 144.000 (7:1-8)

b. A Multidão Incontável (7:9-17)

(4) O Sétimo Selo (8:1)

3. As Sete Trombetas (8:2-14:20)

(1) As Seis Trombetas (8:2—9:21)

a. Preparação (8:2-6)

b. A Primeira Trombeta (8:7)

c. A Segunda Trombeta (8:8-9)

d. A Terceira Trombeta (8:10-11)

e. A Quarta Trombeta (8:12-13)

f. A Quinta Trombeta (9:1-12)

g. A Sexta Trombeta (9:13-21)

(2) Interlúdio (10:1-11:13)

a. O Anjo e o Pequeno Livro (10:1-11)

b. Medição do Templo e as Duas Testemunhas (11:1-


13)

39
(3) A Sétima Trombeta (11:14-19)

(4) Interlúdio (12:1-14:20)

a. O Dragão, a Mulher e seu Descendente (12:1-17)

b. As Duas Bestas (13:1-18)

c. Visões de Consolo (14:1-20)

4. Os Sete Flagelos (15:1—16:21)

(1) A Preparação (15:1-8)

(2) O Primeiro Flagelo (16:1-2)

(3) O Segundo Flagelo (16:3)

(4) O Terceiro Flagelo (16:4-7)

(5) O Quarto Flagelo (16:8-9)

(6) O Quinto Flagelo (16:10-11)

(7) O Sexto Flagelo (16:12-16)

(8) O Sétimo Flagelo (16:17-21)

IV. A TERCEIRA VISÃO (17:1-21:8)

1. O Mistério da Babilônia (17:1-18)

2. O Julgamento da Babilônia (18:1-19:5)

(1) O Anúncio Angélico da Queda de Babilônia (18:1-3)

(2) Advertências ao Povo de Deus (18:4-5)

(3) O Grito por Vingança (18:6-8)

(4) O Lamento dos Reis e Mercadores (18:9-19)

(5) Irrupção de Louvor (18:20)

(6) A Destruição da Babilônia (18:21-24)

40
(7) Ação de Graças pelo Julgamento da Babilônia (19:1-5)

3. Triunfo e Consumação Final (19:6—21:8)

(1) As Bodas do Cordeiro (19:6-10)

(2) A Vinda de Cristo (19:11-16)

(3) A Batalha entre Cristo e o Anticristo (19:17-21)

(4) A Prisão de Satanás, a Ressurreição e o Reino Milenar


(20:1-6)

(5) A Destruição Final de Satanás e da Morte (20:7-15)

(6) A Nova Criação (21:1-8)

V. A QUARTA VISÃO: A JERUSALÉM CELESTIAL (21:9-22:5)

VI. EPÍLOGO (22:6-21)

41
CAPÍTULO 4 – UMA VISÃO PANORÂMICA DAS
SETE CARTAS

4.1 PRÓLOGO (1:1-8)

O Apocalipse, assim como os demais escritos joaninos, começa com um


prólogo centrado em Cristo. Ele introduz o leitor acerca da natureza do livro, com
a palavra que é responsável pelo seu nome, “Ἀποκάλυψις”, que significa
simplesmente “revelação”. A Revelação que João recebe é de Jesus Cristo
Ἰησοῦ Χριστοῦ (Ap 1:1), que é o objeto e o conteúdo da revelação. O objeto
da revelação também diz respeito às coisas que Deus deu a Cristo, que por sua
vez mostra aos seus servos “coisas que brevemente devem acontecer” (Ap 1:1).
Essa frase tem uma relação direta com o livro de Daniel 2:28: “Há um Deus no
céu que revela os mistérios e que deu a conhecer ao rei Nabucodonosor o que
deve acontecer no fim dos dias”.

Tal revelação é comunicada pelo Filho a João através da mediação de


“seu anjo”. É inegável que os anjos possuem um papel proeminente no livro
(17:5; 19:9; 22:16). João tem a função básica de testificar duas coisas: a palavra
de Deus e o testemunho de Jesus. Assim, tanto João quanto Jesus testificam os
eventos que brevemente devem acontecer. De acordo com Osborne (2014, p.60-
61):

Em Apocalipse, testificar é uma referência à proclamação e


autenticação pública de realidades divinas em palavras e atos,
geralmente em face de grande oposição. Tendo recebido a
revelação de Deus e Jesus, por meio do anjo (1.1), João agora
“testifica” ou apresenta para a igreja e para o mundo provas de
que essas visões constituem “a palavra de Deus” e “o
testemunho de Jesus”.

A expressão que designa a mensagem do livro τὴν μαρτυρίαν Ἰησοῦ

Χριστοῦ (o testemunho de Jesus Cristo) ocorre 6 vezes no Apocalipse (1:2,9;

42
12:17; 19:10 (duas vezes); 20.4). Assim, Jesus é aquele que revela a verdade
divina, que somado ao testemunho de João validam a mensagem e as visões
contidas no livro.

O livro introduz uma bem-aventurança para aquele que lê, e os que ouvem
as palavras da profecia (v.3). O termo Μακάριος (bem-aventurado) aparece no
Apocalipse sete vezes (14:13; 16:15; 19:9; 20:6; 22:7,14). O padrão das bem-
aventuranças é o mesmo encontrado no Evangelho de Mateus, tendo como base
os padrões esperados por Deus e as recompensas concedidas aos fiéis
(OSBORNE, 2014). O destaque proposto por João para o ler e ouvir, implica que
João destina seu livro para ser lido em público, ser uma leitura cultual, litúrgica.
Mas, os ouvintes são classificados como aqueles que “ouvem” e “guardam”. Não
basta apenas ouvir, eles devem guardar “as coisas que nelas estão escritas”.

No verso 4, temos a fórmula tradicional de saudação nas


correspondências do Novo Testamento. A Identificação do autor do livro, a saber,
João1. Encontramos, também, os destinatários diretos do livro, (às sete igrejas
da Ásia Menor) e a saudação, (χάρις ὑμῖν καὶ εἰρήνη, graça e paz seja
convosco). O próprio Deus é quem dará aos destinatários do Apocalipse sua
graça e sua paz.

É importante ressaltar a variação do nome de Deus, uma paráfrase do


nome divino encontrado em Êxodo 3.14-15 “Eu Sou o que Sou”. Em Apocalipse
Deus é aquele que é, e que era, e que “há de vir”. Essa fórmula é exclusiva do
livro de Apocalipse, e aparece por quatro vezes em todo o livro (4.8; 11:17; 16:5).
A substituição do “será” por “há de vir”, revela o intuito do livro de destacar a
intervenção definitiva de Deus na história de forma iminente. Os sete espíritos
que estão diante do seu trono, alguns pensam que são anjos, ou uma referência
a Isaías 11.2 (As virtudes do Espírito) e de Zacarias 4.2.10 (Sete lâmpadas) e
formas de falar do Espírito Santo. A terceira fonte da graça e da paz é o Senhor
Jesus Cristo. João termina sua saudação com uma fórmula trinitária, ressaltando
a obra redentora de Jesus Cristo na cruz, por amor.

1 Para mais informações sobre a autoria, ver o capítulo 2.

43
João, assim, depois da Doxologia, apresenta o tema do livro (v.7), a saber,
“Eis que vem com as nuvens, e todo o olho o verá, até os mesmos que o
traspassaram; e todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele. Sim. Amém. ”
De acordo com Osborne (2014, p.75):

Há quatro elementos no pronunciamento da parúsia, os quais


fazem a fusão de dois textos do AT, Daniel 7.13 e Zacarias
12.10, em ordem invertida se comparada às palavras do Filho
do homem em Mateus 24.30: “Então aparecerá no céu o sinal
do Filho do homem, e, todas as nações da terra se lamentarão
e verão o Filho do homem vindo com poder e grande glória sobre
as nuvens do céu” (ver também Jo 19.37, “Olharão para aquele
a quem transpassaram”, citado de Zacarias 12.10). Logo, é
provável que João esteja citando palavras tradicionais
originadas nos logia de Jesus.

A ênfase aqui é, sem dúvida, a afirmação da volta gloriosa daquele que


foi crucificado, que será reconhecido por todos que, consequentemente, se
lamentarão sobre ele. Deus é o princípio e o fim; Deus controla o princípio e o
fim e tudo que há entre eles. Deus é soberano sobre a história.

4.2. A PRIMEIRA VISÃO (1:9-3:22)

João encerra sua introdução destacando os acontecimentos que o


levaram a escrever seu texto. Ele esteve exilado em Patmos, onde teve uma
experiência extática especial que descreve sua primeira visão de Jesus exaltado
e glorificado. O Filho do Homem (Dn 7:13-14) apareceu em meio a sete
candelabros (v.12), que representam as sete igrejas (v.20). Nessa visão, Jesus
comissiona João para escrever esse livro em forma de uma carta circular para
as Igrejas da Ásia Menor (v.19).

4.2.1 AS SETE CARTAS (2:1-3:22)

As cartas, embora não apresentem uma estrutura rígida, possuem uma


estrutura básica em comum. Osborne (2014) atesta que em um estudo crítico da
44
forma das cartas de Apocalipse, pode ser destacada uma estrutura com sete
partes, tais partes são ligadas por uma fórmula que é repetida em todas as
cartas:

I. Introdução

A. Destinatários (“ao anjo da igreja [...] escreve”)

B. Fórmula do mensageiro profético e descrição de Cristo (“assim

diz aquele que...”)

II. Corpo da carta, consistindo em uma análise dos pontos fortes e


dos pontos fracos da igreja, cada um com uma fórmula introdutória

A. Pontos fortes e pontos fracos

1. Pontos fortes (“Conheço tuas obras...”)

2. Pontos fracos (“Tenho contra ti, porém...”)

B. Solução (ordens para “se arrepender” etc.)

III. Conclusão

A. Chamado para ouvir (“Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito


diz às igrejas”)

B. Desafio para vencer (“ao vencedor”), com promessas


escatológicas dirigidas aos que vencerem

É importante ressaltar que essa estrutura não é rígida, e pode acontecer


variações entre elas, como por exemplo, as cartas às igrejas de Esmirna e de
Filadélfia não contêm nenhum ponto fraco, e a carta a Laodicéia não menciona
nenhum ponto forte (é interessante que os pontos fracos dessa igreja são
introduzidos por “Conheço tuas obras”, para produzir um impacto retórico maior).

45
4.2.1.1 A CARTA A ÉFESO (2:1-7)

Éfeso era uma das cidades mais importantes do Império Romano, além
da mais cosmopolita. Ela estava situada na foz do rio Caistro na Ásia Menor,
quase em frente da ilha de Samos. Era um importante centro de tráfego, terrestre
e marítimo entre o Ocidente e o Oriente. Os primeiros habitantes da região
parecem terem sido os Cários. Logo depois, os fenícios teriam fundado no local
um santuário em honra de uma divindade feminina adorada sob o símbolo da
lua. Esse santuário começou a atrair gente de vários países que ali achavam o
direito de asilo.

Sob o domínio dos Jônios, Éfeso tornou-se a principal das doze cidades
que formaram a Confederação Jônica. Passou depois para o domínio dos Persas
e depois Alexandre Magno a conquistou em 334 a.C. Lisímaco, general de
Alexandre, recebeu-a em herança na morte desse. Mas foram os Átalos de
Pérgamo que a embelezaram e enriqueceram.

Em 129 a.C. passou ao domínio romano. Tornou-se a capital da Província


Romana da Ásia. De fato, na época era a maior metrópole da Ásia. No tempo de
Paulo a população da cidade era de aproximadamente de 225 mil habitantes,
que viviam do comércio e do turismo. Éfeso era essencialmente uma cidade
religiosa.

Sua fama se elevou após a conquista de Croeso da Lídia (550 a.C.), que
contribuiu para a reconstrução do templo de Ártemis e fundou a cidade. Éfeso
se tornou, rapidamente, um dos grandes centros do comércio e negócios da
parte Ocidental do Império, e uma das províncias mais prósperas de todo o
Império Romano.

Ali estava o templo da grande Mãe Diana ou Ártemis, divindade da


fecundidade. O templo, uma das maravilhas do mundo antigo, foi construído no
século VI a.C. Em 356 a.C. foi destruído pelo fogo ateado por um certo Erostrato,
que desejava tornar-se célebre. Um dos monumentos mais belos da Ásia estava
em Éfeso, um teatro que poderia oferecer assento para cerca de 24 mil pessoas.

46
Além desses monumentos, Éfeso também era considerada uma neokoros,
guardiã do culto ao imperador, como atesta Kistemaker (2004, 149)

A cidade dedicou o templo dos Sebastoi (a família de


Vespasiano, Tito e Domiciano) em 89-90 d.C., e, segundo o
costume, destinou os jardins do templo ao culto do imperador.
Em Éfeso, a relação entre o culto de Ártemis e a religião do
estado de Roma era bem estreita. Além do mais, os prefeitos
romanos forçavam o povo a adorar o imperador Domiciano e a
fazer uma profissão de fé: “César é Senhor”. Os cristãos se
indispuseram em pôr César acima de Cristo, pois seu moto era:
“Jesus é Senhor” (1Co 12.3). Como resultado, sofreram
perseguição.

Existia, também, em Éfeso um grande número de bruxos e feiticeiros.


Muitos deles se converteram ao cristianismo (At 19,19). Embora sede de um
procônsul, Éfeso era administrada por um conselho de cidadãos aos moldes de
Atenas. Em Éfeso existia uma considerável colônia de judeus.

Sua posição como igreja-mãe da região, bem como sua posição de


metrópole da Ásia, contribuiu para que fosse a primeira igreja da lista a receber
uma carta. Cristo se apresenta como aquele que tem domínio sobre a Igreja de
Éfeso e sobre as demais “Isto diz aquele que tem na sua destra as sete estrelas,
que anda no meio dos sete castiçais de ouro” (Ap 2.1).

A expressão οἶδα τὰ ἔργα σου (oida ta erga sou, conheço tuas obras)
expressa o conhecimento específico, incontestável dos fatos. O verbo ocorre
sete vezes nos capítulos 2 e 3, e a frase “conheço tuas obras” aparece em seis
das sete cartas, sempre denotando sentido positivo ou negativo. A princípio,
Éfeso é elogiada por seu trabalho e perseverança diante de perseguições,
oposições e falsos mestres. Os pontos fracos de Éfeso são introduzidos com a
expressão ἔχω κατὰ σοῦ (echo kata sou, tenho contra ti), fórmula que descreve
os problemas morais e espirituais das igrejas. No caso de Éfeso, eles haviam
perdido o entusiasmo e o fervor da primeira geração, acomodando-se numa fria
ortodoxia sem profundidade espiritual.

Após a identificação do sério problema um imperativo é usado para


evidenciar a necessidade de arrependimento e mudança, seguido de uma
advertência de juízo. Lembra-te (μνημόνευε, mnemonoue) reforça a conduta

47
exigida por Cristo, e a ordem “Arrepende-te” (μετανόησον, metanoeson)
expressa a necessidade de voltar às primeiras obras que praticavas no início,
pois o juízo é iminente. Não sabemos muitas coisas sobre os nicolaítas, pois as
únicas informações que possuímos sobre eles se encontra no Apocalipse.
Contudo, aponta Osborne (2014, p.132):

Em uma declaração controversa de credibilidade dúbia, Irineu


(Contra Heresias 1.26.3) os relaciona com Nicolau, um dos sete
“diáconos” de Atos 6.5, e com os ensinos do herege gnóstico
Cerinto. Clemente de Alexandria discorda da afirmação de que
Nicolau se afastara da verdade, dizendo que seus seguidores
entenderam erroneamente seu ensino (Stromata 2.20). Todavia,
é impossível saber o quanto disso está correto. A maioria dos
estudiosos aceita que havia algum tipo de ligação dos nicolaítas
com o protognosticismo, provavelmente do mesmo tipo
confrontado nas Cartas Pastorais e em 1João (que também se
remetem à Ásia Menor).

A carta termina com um chamado a ouvir: Ὁ ἔχων οὖς ἀκουσάτω τί τὸ

πνεῦμα λέγει ταῖς ἐκκλησίαις (ho echon ous akousato ti to pneuma legei tais
ekklesiais, Quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às Igrejas); e uma
promessa “ao que vencer” (Τῷ νικῶντι to nikonti). No caso de Éfeso, a
promessa é a participação na benção pretendida na Criação, “comer da árvore
da vida”, árvore que Adão e Eva não tiveram a possibilidade de comer (Gn 3:22-
24).

4.2.1.2 A CARTA A ESMIRNA (2:8-11)

A cidade de Esmirna ainda existe atualmente. Seu nome moderno é Izmir.


Estava localizada a 56 quilômetros ao norte de Éfeso. Esmirna gozava de um
bom relacionamento com Roma, assim como Éfeso, Pérgamo e Sardes, sendo
considerada uma das quatro grandes cidades do império. Sua lealdade se
manifestou na construção de um templo dedicado à deusa Roma em 195 a.C.

Esmirna foi destruída pelo rei Alíates, da Lídia, em 600 a.C., mas foi
reconstruída por ordem de Alexandre, o Grande, em 290 a.C. Além do culto à

48
deusa Roma, Esmirna também possuía um templo dedicado ao Imperador
Tibério, e templos dedicados a Zeus e a Cibele. A cidade hospedava uma grande
população judaica, o que instigou diversos conflitos entre cristãos e judeus na
cidade, bem como a perseguição aos cristãos por parte do Império Romano, que
em 155 d.C. levou o famoso bispo da cidade, Policarpo, para a fogueira por
negar-se a chamar César de “Senhor” (OSBORNE, 2014).

Seguindo o modelo de apresentação, Cristo é descrito na carta como o


πρῶτος καὶ ὁ ἔσχατος (protos kai ho eskatos, o primeiro e o último). A descrição
de Jesus como aquele que “foi morto, e reviveu (ὃς ἐγένετο νεκρὸς καὶ ἔζησεν· ,
hos egeneto nekros kai ezesen), aponta para os tempos históricos da morte e
ressurreição de Jesus, assim como a própria Esmirna morreu em 600 a.C. e
reviveu em 290 d.C. Essa igreja é uma das duas igrejas que não possui ponto
fraco (a outra é Filadélfia).

Não há a fórmula “conheço tuas obras”, mas “conheço a tua tribulação”


(οἶδά σου τὴν θλῖψιν, oida sou tem thlipsin). Ela sofria pobreza e perseguição
por parte dos judeus. É nítido o sofrimento da igreja de Esmirna, mas o cuidado
do Senhor era ainda maior. A riqueza de Esmirna não é a mesma de suas
companheiras Sardes e Laodicéia, mas sua riqueza era espiritual.

A blasfêmia (τὴν βλασφημίαν, tem blasfemian) e a oposição dos judeus


era recorrente no cristianismo primitivo, podendo ser vistas em todo o livro de
Atos dos Apóstolos. Contudo, essa oposição não foi maior do que a enfrentada
pelos irmãos de Esmirna, onde organizaram motins e ações legais contra os
cristãos da região. Daí a denúncia severa contra esses que “se dizem judeus”,
da sinagoga de Deus, mas, na verdade, são a sinagoga de Satanás (συναγωγὴ

τοῦ σατανᾶ, sunagoge tou satana).

O imperativo à igreja de Esmirna é γίνου πιστὸς (ginou pistos, sê fiel),


pois a perseguição era iminente, mas se forem fiéis receberão a coroa da vida.
“Ao que vencer” (Τῷ νικῶντι to nikonti), no caso de Esmirna, a promessa é que
não receberá o dano da segunda morte. A perseguição e o martírio podem até

49
dar fim a esta vida, mas a vida eterna está garantida em Deus, pois não haverá
segunda morte para aqueles que vencem o mundo.

4.2.1.3 A CARTA A PÉRGAMO (2:12-17)

A cidade de Pérgamo ficava a 112 quilômetros ao norte de Esmirna. O


desenvolvimento de Pérgamo se deu no II século a.C., quando se tornou a
capital do reino atálida. Edificada sobre a colina escarpada, cerca de 350 metros
acima da planície, tornou-se uma grande fortaleza. Pérgamo também se tornou
o principal centro religioso da Ásia, com santuários, altares e templos dedicados
a Dionísio, Zeus, Atena e Asclépio, deus da cura. Ela era, também, guardiã do
culto ao imperador na Ásia, o que explica a perseguição dos cristãos da região,
que se negavam a adorar ao imperador e participar das celebrações religiosas
locais.

Nesta carta, Jesus é descrito de forma simples como aquele que “possui
a espada”, símbolo da justiça e do juízo divino. O Cristo conhece três coisas: “o
mundo pagão no qual eles vivem, o seu testemunho fiel e sua perseverança
debaixo de perseguição” (OSBORNE, 2014, p.155-156). O lugar onde habitam
está “o trono de Satanás”. Trono, no Apocalipse, é símbolo do exercício de poder
de um governo, portanto, Pérgamo era considerada a sede do poder satânico.

Acerca da expressão “trono de Satanás” temos algumas possibilidades, a


saber,

(1) Por ficar em um platô, a certa distância, a acrópole se parecia


com um trono. Esse tipo de metáfora geográfica fazia sentido
para Esmirna, que foi chamada de “coroa” pelos escritores
antigos; entretanto, não há evidência que apoie essa suposição
no caso de Pérgamo. (2) Os ídolos, altares, santuários e templos
de Pérgamo, bem como seu paganismo excessivo, eram
instrumentos de Satanás. Embora isso seja verdade, é difícil
pensar na própria cidade como trono de Satanás, visto que a
maioria das cidades mencionadas nesses capítulos eram
centros da idolatria e do paganismo. (3) O altar dedicado a Zeus
Soter sobre o cume da montanha tinha uma estrutura magnífica
que dominava a cidade. As pernas dos gigantes na escultura
eram caudas de serpentes e tal estrutura tipificava a idolatria e
o paganismo. Mas aqui também, a adoração a Zeus era central

50
em todas as cidades. (4) Pérgamo era o centro da adoração a
Asclépio, e o símbolo de Asclépio era uma serpente, associada
a Satanás em 12.9 e 20.2. Membros desse grupo religioso
chamavam Asclépio de “salvador”. Embora esta interpretação
faça sentido (na realidade, as três últimas são possíveis), não é
tão provável quanto a próxima opção, pois tanto Zeus quanto
Asclépio eram chamados de “salvador”, e muitos deuses eram
importantes para essa cidade. (5) A melhor opção é o culto ao
imperador, o principal problema presente em todo o livro de
Apocalipse (como veremos) é a essência da religião de
Pérgamo. Foi a adoração ao imperador que mais diretamente
provocou as perseguições nos governos de Domiciano e
Trajano, e Pérgamo era o centro desse culto em toda a província
da Ásia (OSBORNE, 2014, p.156).

Cristo conhece a fidelidade dos crentes de Pérgamo, pois mesmo em face


de perseguição e morte não negaram a fé, e perseveraram em Seu nome. Em
relação a Antipas, não sabemos nada sobre ele e sobre “dias de Antipas”.
Possivelmente foi morto numa perseguição anterior, sob Domiciano.

Um dos problemas é a “doutrina de Balaão (τὴν διδαχὴν Βαλαάμ, tem


didachen Balaam), que dentro da tradição bíblica e principalmente no
Apocalipse, significa levar uma pessoa à apostasia (Nm 22-24; Ap 2.14-15). Ao
contrário da igreja de Éfeso que se opunha aos nicolaítas, e foram elogiados por
isso, Pérgamo é repreendida por tolerar suas práticas. Embora tenhamos
testemunhos fieis entre os crentes de Pérgamo, temos um cenário de
acolhimento e passividade no florescimento de heresias em seu meio.

O contraste com a igreja de Éfeso é nítido, pois essa combateu os hereges


e esqueceu do amor, já Pérgamo era fiel, mas se esqueceu de combater os
inimigos de Deus. A recusa do arrependimento é considerada grave e traz juízo
divino.

“Ao que vencer” (Τῷ νικῶντι to nikonti), no caso de Pérgamo, a promessa


é de receberem duas dádivas divinas, a saber o maná escondido e uma pedra
branca com um novo nome escrito. Diante de tantas possibilidades acerca do
que significaria o “maná escondido” e a “pedra branca”, destacamos a ligação
das dádivas com os eventos do Antigo Testamento e com a manifestação do fim
no presente, como uma escatologia realizada. Assim, conforme aponta Osborne
(2014, p.165):

51
Resumindo, o maná e a pedra branca são símbolos
escatológicos relacionados à festa messiânica no escaton e
também falam da comida espiritual e do novo nome que Deus já
dá aos crentes no presente.

4.2.1.4 A CARTA A TIATIRA (2:18-28)

Tiatira era a cidade menos importante dentre as sete cidades citadas no


Apocalipse. Ela ficava a cerca de 64 quilômetros do Sudoeste de Pérgamo. Ela
foi fundada no século III a.C. como um posto militar por Seleuco I. Tiatira foi
conquistada por Roma em 190 a.C. e conheceu um desenvolvimento regular
como metrópole da Lídia.

As inscrições e evidências arqueológicas encontradas em Tiatira


mencionam diversas corporações profissionais, a saber: padeiros, tintureiros,
curtidores, alfaiates, oleiros, tecelões, sapateiros, fundidores, artesãos etc.

Do ponto de vista religioso, Tiatira não se iguala com as demais cidades


da Ásia Menor. O principal deus adorado em Tiatira era Apolo, conhecido como
deus sol e filho de Zeus. Além da adoração a Apolo, Ártemis também era
adorada na cidade, e o imperador era venerado juntamente com a figura de
Apolo, considerado padroeiro do imperador romano. Sabemos que havia uma
ativa comunidade judaica na cidade, a exemplo de Lídia, a vendedora de púrpura
que se converteu ao cristianismo em Filipos (At 16:14), era uma prosélita judaica
oriunda de Tiatira.

Jesus é apresentado como o “Filho de Deus” (ὁ υἱὸς τοῦ θεοῦ, ho huios


tou theou). Essa é a única vez no livro de Apocalipse que Jesus é descrito com
esse título, embora a relação filial entre o Pai e o Filho seja enfatizado no livro
(1:6; 2:27; 3:5; 3:21; 14:1). O restante da identificação (que tem seus olhos como
chama de fogo, e os pés semelhantes ao latão reluzente) é retirado da visão
inicial de Apocalipse 1:14-15, que faz uma alusão a Daniel 10:6.

Tiatira, assim como Éfeso, foi elogiada por suas boas obras. No caso de
Tiatira, as obras elogiadas são: o amor, o serviço, a fé e a paciência. Esta é uma

52
igreja amorosa, arraigada numa confiança em Deus em meio à perseguição e à
opressão dos inimigos. Tiatira persevera em tempos difíceis a partir de uma vida
de serviço e cuidado pelos seus companheiros de sofrimento. No caso desta
igreja, seu amor, serviço, fé e perseverança não estava em declínio, como no
caso de Éfeso, mas crescendo.

No entanto, as censuras à igreja de Tiatira (ἔχω κατὰ σοῦ, echo kata sou,
tenho contra ti) eram mais graves que as demais igrejas da Ásia. Ela é
condenada pela tolerância aos hereges. O verbo ἀφεῖς tem o sentido de permitir,
deixar e até perdoar. Uma referência é trazida do Antigo Testamento para
identificar a líder do grupo herege em Tiatira, a saber, “Jezabel”. Jezabel era a
esposa fenícia de Acabe, que programaticamente levou o Reino do Norte à
adoração a Baal e à feitiçaria (lRs 16.31-34; 21.25,26; 2Rs 9.22). Como aponta
Osborne (2014) não há uma identificação definitiva sobre quem seria essa
mulher. Contudo, sua intenção era, aponta Kistemaker (2004, p.187):

Enganar o povo de Deus, persuadindo-o a adotar o estilo de vida


que lhe permitiria ser aceito no mundo e a manter sua
membresia na igreja. Ao acomodarem-se ao estilo de vida que
uma associação comercial requeria, os membros da igreja não
mais teriam que temer ser desterrados.

Assim, Jezabel seduzia os crentes de Tiatira, ensinando que não havia


nada de errado em participar nas festas e celebrações das associações, pois era
apenas uma questão civil. Como os ídolos nada eram, os cristãos não
destruiriam sua fé ao participar delas.

Foi lhe dado tempo para que se arrependesse de sua idolatria e


imoralidade, contudo, ela não se arrependeu. Assim, será lançada no leito e
acometida de sofrimentos. Aos seus filhos, aqueles que aceitaram seu ensino,
parece não haver nenhuma possibilidade de arrependimento. Para aqueles que
se prostituíram com ela, ou seja, aqueles membros que foram atraídos por suas
práticas heréticas, ainda havia tempo de abandonarem a prática.

A fala é voltada para os demais crentes de Tiatira (v.24), demonstrando


que havia um grupo distinto na igreja que não havia se corrompido com os

53
ensinos da falsa profetisa. Acerca das “profundezas de Satanás, aponta Osborne
(2014):

(1) a expressão pode ser um comentário sarcástico sobre a


reivindicação de Jezabel de “conhecer as coisas profundas de
Deus” (cf. ICo 2.10), o que na realidade são “as coisas profundas
de Satanás” (2) a expressão pode ser compreendida literalmente
(Beckwith, Farrer, Morris, Johnson, Chilton, Krodel, Talbert).
Talvez com base em princípios protognósticos, Jezabel pode ter
ensinado que os cristãos deveriam experimentar “as coisas
profundas de Satanás”, a fim de triunfar sobre elas. Nesse
sentido, ela admitiria que as festas das associações de classe e
o ambiente pagão eram maus, mas declararia que eles não
tinham poder sobre o crente. Ela ainda teria ensinado que os
cristãos deveriam participar dessas atividades e experimentar as
“profundezas” do paganismo, de modo a mostrar seu domínio
sobre elas.

Nesta carta João inverte o padrão comum das cartas, colocando o


chamado para ouvir por último. Assim como à igreja de Pérgamo, Jesus faz uma
promessa dupla, neste caso, Jesus lhe dará autoridade e a estrela da manhã. A
igreja participará da promessa messiânica do Salmo 2 e da autoridade do Cristo
outorgada em Mateus 28. Assim como o Cristo tem autoridade de governar,
exercer poder e juízo, com Cristo o crente que vencer terá autoridade de
governar, disciplinar e julgar.

O segundo presente escatológico para o vencedor é a “estrela da manhã”


(τὸν ἀστέρα τὸν πρωϊνόν, ton astera ton proinon). Não há muita certeza quanto
ao significado da expressão, entretanto, há uma relação com Ap 22:16 “Eu sou
a raiz e a geração de Davi, a resplandecente estrela da manhã”. Neste caso,
trata-se, também, de uma referência messiânica encontrada em Nm 24:17 (a
estrela de Jacó). Assim, a estrela da manhã é o próprio Cristo, que reforça a
primeira promessa, a saber, que Cristo concede à igreja a participação em sua
autoridade messiânica.

54
4.2.1.5 A CARTA A SARDES (3:1-6)

Sardes era uma das mais belas cidades da Ásia Menor. Ela estava
localizada cerca de 60 quilômetros de Tiatira. Sardes era, também, uma das
cidades mais antigas, foi fundada por volta de 1200 a.C. e tornou-se a capital do
reino da Lídia. A cidade experimentou seu auge com o rei Giges, que reinou no
século VII a.C. Ele foi o principal responsável pela riqueza e pelo poder bélico de
Sardes, sendo um dos mais temíveis governantes de seu tempo. Sob sua
regência dificilmente Sardes perdia uma batalha. Ela foi conquistada por Ciro no
ano de 546 a.C. após um ataque surpresa à cavalaria de Creso, filho de Giges,
e por ocasião da escalada de um precipício por parte dos soldados de Ciro, que
abriram os portões da cidade e Sardes foi capturada.

Sardes sofreu com diversos fracassos militares, até que perdeu sua
importância para Pérgamo, e foi conquista por Roma em 189 a.C. A grande crise
se instaurou quando em 17 d.C. um terremoto de altíssima escala devastou as
cidades de Sardes e Filadélfia. Ela foi reconstruída com a ajuda do Imperador
Augusto. Na cidade havia um templo dedicado à deusa Ártemis, mas sua religião
girava em torno da adoração à natureza, tendo a fonte de águas termais que
ficava localizada a três quilômetros de distância da cidade associada ao deus do
submundo e a temas ligados à morte e a imortalidade.

Havia uma grande comunidade judaica em Sardes, que fora levada por
Antíoco III. Evidências arqueológicas encontraram uma grande sinagoga
construída no segundo século da era cristã na cidade, que fazia parte de um
complexo do ginásio da cidade, o que indica o sincretismo religioso dos judeus
que habitavam naquela região. Assim como os judeus se adaptaram aos
costumes pagãos em Sardes, é possível que os cristãos da igreja também.

Jesus é apresentado como “o que tem os sete espíritos de Deus, e as


sete estrelas”. Os “sete espíritos” é uma referência ao capítulo 1:4 (Zc 4.2.10).
Essa referência possivelmente contrasta com a decadência espiritual da igreja
de Sardes, e Cristo tem a capacidade de gerar vida na igreja. A igreja de Sardes
que se aproxima da morte (v.2), pode voltar a viver! Cristo ressalta seu controle
absoluto da igreja de Sardes quando diz que tem “as sete estrelas”, que de

55
acordo com Ap 1:20 “são os anjos das sete igrejas”. Assim como em Éfeso (que
tem na sua destra as sete estrelas), Sardes deve dobrar-se à soberania de Cristo
e responder só a ele.

Os pontos fortes de Sardes são seus pontos fracos, pois o “conheço tuas
obras (οἶδα τὰ ἔργα σου, oida ta erga sou), na verdade revela sua verdadeira
deficiência. Por esse motivo não há necessidade da fórmula “mas tenho contra
ti” (ἀλλὰ ἔχω κατὰ σοῦ, alla echo kata sou), porque não há pontos fortes. Eles

apenas têm nome de vivo, mas estão mortos (ὄνομα ἔχεις ὅτι ζῇς, καὶ νεκρὸς

εἶ, onoma echeis hoti dzes, kai nekros ei).

A solução para o problema é ser vigilante e mudar seus caminhos. Além


disso, fortalecer o restante, pois alguns ainda “sobreviveram” (v.4) porque não
contaminaram suas “vestes, e comigo andarão de branco; porquanto são dignas
disso”. Os três imperativos finais “lembra-te”, μνημόνευε (lembrança continua),

τήρει (guardar, obedecer) as verdades cristãs recebidas e ouvidas e


μετανόησον (arrepende-te), pois o fim é iminente. Jesus virá como ladrão (uma
referência à falta de vigilância Mt 24:43; 1Ts 5:2-4), de forma repentina e
inesperada.

Para os fiéis (v.4), Cristo promete uma nova vida (andar) de pureza
(vestes brancas), como demonstração de sua resistência à corrupção espiritual
difundida na igreja de Sardes. Portanto, esses são os vencedores que receberão
três recompensas, a saber, serão vestidos de vestes brancas; terão para sempre
seus nomes escritos no livro da vida; e, finalmente, Cristo confessará seu nome
“diante do Pai e dos seus anjos”. Essa última recompensa é uma clara alusão a
Mateus 10.32: “Portanto, todo aquele que me confessar diante dos homens, eu
também o confessarei diante de meu Pai, que está no céu”.

Segundo Osborne (2014, 200):

Na afirmação do Senhor, tanto o lado positivo (“eu o


confessarei”) quanto o negativo (“eu o negarei”) são
apresentados, e é provável que o acréscimo “diante de seus
anjos” faça alusão à forma paralela (negativa) em Marcos 8.38
(par. Lc 9.6): “Quando o Filho do homem vier na glória de seu
Pai com os santos anjos, ele também se envergonhará de quem

56
se envergonhar de mim...”. A maioria na igreja de Sardes havia
“se envergonhado” de Cristo, provavelmente ao abrirem mão de
seus distintivos cristãos a fim de serem aceitos por seus pares.
Por trás da promessa à minoria fiel em 3.5, existe também uma
advertência de juízo para os infiéis na igreja.

Aos fiéis, Cristo tem uma nova identidade, uma nova cidadania e uma vida
nova e eterna no céu.

4.2.1.6 A CARTA A FILADÉLFIA (3:7-13)

A cidade de Filadélfia ficava a cerca de cinquenta quilômetros a sudeste


de Sardes. Estava localizada em uma das principais rotas comerciais do império.
Filadélfia era a cidade mais nova entre as sete cidades às quais João escreveu,
sendo fundada por volta de 189 a.C. por Eumenes, rei de Pérgamo e por seu
irmão Átalo Filadélfo. O nome da cidade deriva de seu nome, e se tornou a
cidade do “amor fraterno”. Seu principal problema era estar localizada em uma
região muito propensa a terremotos. Um dos piores terremos que atingiu a
cidade foi o mesmo que devastou a cidade de Sardes no ano 17 d.C. fazendo o
mesmo com Filadélfia. Por causa da destruição da cidade, o imperador retirou a
obrigatoriedade da cidade de Filadélfia de pagar tributo ao tesouro imperial por
cinco anos, tempo suficiente para reconstruírem a cidade e se recuperarem
economicamente.

No que diz respeito à religião, Filadélfia era semelhante as demais cidades


da Ásia, cultivava uma mistura sincrética de práticas religiosas anatolianas e
helênicas. O padroeiro da cidade era Dionísio, deus do vinho, tendo em vista que
a principal fonte de comércio eram as vinícolas. No início do terceiro século ela
recebeu o título de neokoros e cultivava uma multiplicidade de movimentos
religiosos.

Não possuímos informações acerca de uma comunidade judaica influente


em Filadélfia, tampouco acerca de como a igreja foi fundada na cidade. Osborne
(2014) sugere que alguns discípulos de Paulo evangelizaram aquela região.
Aune (1997), menciona uma carta de Inácio para a igreja dali algum tempo

57
depois de sua visita, em 110 d.C., indicando que ela possuía uma organização
monárquica, com presbíteros e diáconos sob a supervisão de um bispo, e que
havia certa influência judaizante na comunidade.

Assim como a igreja de Esmirna, Filadélfia não recebe repreensão, e são


as igrejas que estavam sofrendo fortes ameaças dos judeus em ambas as
cidades. Jesus é descrito como “o que é santo, o que é verdadeiro, o que tem a
chave de Davi; o que abre, e ninguém fecha; e fecha, e ninguém abre”. ὁ ἅγιος,

ὁ ἀληθινός (ho hagios, ho alêthinos, aquele que é santo, verdadeiro), expressa


a santidade de Cristo, tal como a do Pai (exemplos onde Deus é chamado de “o
Santo; Sl 16.10; Is 1.4; 37.23; Hc 3.3), único digno de adoração e louvor. A
palavra ἀληθινός se refere à fidelidade de Cristo no contexto de Filadélfia,
reforçando a ideia de que eles podem confiar em Cristo como vindicador de suas
tribulações.

Jesus é ὁ ἔχων τὴν κλεῖν Δαυίδ (ho echõn tên klein David, o que tem a
chave de Davi). Essa expressão deriva de Isaías 22:22: “E porei a chave da casa
de Davi sobre o seu ombro, e abrirá, e ninguém fechará; e fechará, e ninguém
abrirá”. No contexto de Isaías, a chave indicava o acesso do rei e a seu palácio.
No Apocalipse, apresenta Jesus,

como o Messias davídico, que controla a entrada no reino de


Deus, a “nova Jerusalém” (3.12). No contexto original, o
paralelismo de “abre/fecha” destaca o poder absoluto e a
autoridade de Eliaquim. Aqui, o sentido é mais amplo do que o
do texto do AT. Os judeus haviam, provavelmente,
excomungado os cristãos de Filadélfia da sinagoga (como em
todo o mundo judaico), mas a expressão afirma
inequivocamente que somente Cristo, não esses judeus, tem tal
autoridade. Somente ele pode “abrir” e “fechar” os portões do
céu (OSBORNE, 2014, p.208).

O “Conheço tuas obras” (οἶδα τὰ ἔργα σου, oida ta erga sou) dito por
Cristo à igreja de Filadélfia ressalta sua fidelidade, pois Jesus enaltece o que
eles estão fazendo de correto. Cristo, que tem o poder sobre as chaves e de
“abrir” e “fechar” concede esse poder aos crentes de Filadélfia Mateus 16.18,19;

58
18.18; João 20.23 (as “chaves do reino” = autoridade para “ligar” e “desligar”).

De acordo com Pringent (2002, p.81),

É, portanto, Cristo que, possuindo o poder supremo no Reino,


promete agora à comunidade de Filadélfia usar em favor dela
esse poder que ninguém pode contestar. A porta que ele abre é,
pois, a deste Reino, a da Jerusalém celeste, que é oferecida aos
cristãos.

Mesmo sendo uma pequena igreja, os crentes da igreja de Filadélfia eram


fiéis e perseveraram na fé. A expressão μικρὰν ἔχεις δύναμιν (mikran echeis
dynamin, tens pouca força) não pode ser considerada um ponto fraco, ou pouco
poder espiritual, pelo contrário, “igreja não tinha tamanho nem estatura dentro
da comunidade, era desprezada e perseguida. Seus membros tinham “pouca
autoridade” ou influência, “mas” eram fiéis, e este é sempre o critério para a
bênção divina, não o sucesso” (OSBORNE, 2014, p.210). Eles não apenas têm
guardado o evangelho, como têm obedecido em meio à severa perseguição. Em
contraste com a igreja de Sardes, os crentes de Filadélfia se recusaram a negar
Jesus.

A descrição dos judeus como “sinagoga de Satanás” remonta a Ap 2:9,


que se apresentam como povo de Deus mas têm rejeitado o Messias e
perseguem o povo dele. No fim, eles reconhecerão o Messias e
consequentemente se submeterão aos fiéis, como aponta Osborne (2014,
p.212):

A passagem alude a Isaías 60.14: “Os filhos dos que te


oprimiram também virão a ti com reverências, e todos os que te
desprezaram se prostrarão junto às plantas dos teus pés” (cf.
também Is 2.3; 14.2; 45.14; 49.23; Ez 36.23; Zc 8.20-23). O AT
ensinava que os gentios seriam obrigados a prestar homenagem
aos judeus no escaton, e agora essa promessa é virada de
ponta-cabeça: os opressores judeus serão obrigados a prestar
homenagem aos crentes gentios. Cristo promete a estes cristãos
perseguidos que eles serão vindicados por Deus, e esse é um
tema recorrente no livro (6.9-11; 16.6; 18.20; 19.2). O ponto
principal a favor dessa interpretação é que eles (os judeus) se
prostrarão “aos teus (sou) pés” e não “aos meus (mou) pés”. Isso
significa submissão, não adoração, e forma um paralelo com
2.26,27, em que os santos fiéis recebem a promessa de que
participarão do julgamento dos inimigos deles (e de Deus).

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Filadélfia está cercada pelos atos amorosos de Jesus e por sua proteção.
Em resposta à perseverança dos crentes de Filadélfia, serão guardados “da hora
da tentação que há de vir sobre todo o mundo, para tentar os que habitam na
terra” (v.10).

A expressão ἔρχομαι ταχύ· (erchomai tachu, eis que venho sem demora)
é enfatizada pela quarta vez até aqui, contudo, a primeira vez de forma positiva.
Para Éfeso (2:5), o retorno de Cristo significaria a remoção de seu candelabro;
para Pérgamo (2:16), o juízo com a espada de sua boca; e, para Sardes (3:3), o
juízo repentino e inesperado, como o assalto de um ladrão à noite. Mas para
Filadélfia, aponta Onsborne (2014, p.216):

sua vinda implicaria vindicação e recompensa. Como a


“provação” de 3.10, a “vinda sem demora” (de Cristo) é uma das
principais ênfases do livro (1.7; 2.5,16; 3.3,11; 22.7,12,20). Sua
recompensa antecipada, como o julgamento de seus
adversários (3.10), é iminente. Ainda, como argumentei em 3.3,
esta “vinda” tem um caráter inaugural, isto é, em primeiro lugar,
esta é a “vinda” de Jesus a eles em conforto e proteção; e, em
segundo lugar, é sua “vinda” final para vindicá-los de seu
sofrimento.

A responsabilidade da igreja de Filadélfia é perseverar e não abandonar


a caminhada.

“Ao que vencer” (Τῷ νικῶντι to nikonti), no caso de Filadélfia, desfrutará


de uma promessa dupla: Ser feito coluna e o nome escrito. De forma simbólica,
aos crentes de Filadélfia é prometido que serão honrados no seio do templo
celestial. Em Apocalipse, o tema do templo celestial é recorrente (7.15;
11.1,2,19; 14.15,17; 15.5,6,8; 16.1,17), bem como a afirmação de que na Nova
Jerusalém não haverá a necessidade de um templo, pois a própria cidade será
o lugar santíssimo. Assim, a “coluna no templo” é uma metáfora para o lugar
permanente que o crente terá no reino final.

A segunda promessa é o nome escrito no crente. Com base no Antigo


Testamento e no próprio livro do Apocalipse, ter o “nome de Deus” significa
pertencer a ele (Nm 6.27; Dt 28.10; Is 43.7; Dn 9.18,19). No Apocalipse, os
santos são selados na testa (7:3) e recebem o nome de Deus (14:1; 22:4). O

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segundo nome, “o nome da cidade do meu Deus, a nova Jerusalém”,
simbolicamente significa a cidadania na Nova Jerusalém, pois a nossa pátria
está no céu (Fp 3:20). Sua pátria não é Filadélfia, tampouco Neocesariana como
foi chamada após a reconstrução em 17 d.C., mas a “Nova Jerusalém, que desce
do céu”.

O último nome, τὸ ὄνομά μου τὸ καινόν (to onoma mou to kainon, meu
novo nome) não é explicado. Qual seria esse novo nome? Em Apocalipse 19:12,
Cristo tem “um nome escrito, que ninguém sabia senão ele mesmo”. Seu nome

é mistério, contudo, “O mais maravilhoso não é saber o sentido do “novo nome”,

mas o fato de que nós compartilharemos dele” (OSBORNE, 2014, p.221).

4.2.1.7 A CARTA A LAODICÉIA (3:14-22)

A cidade de Laodicéia estava a 160 quilômetros de Éfeso. Por causa de


sua localização estratégica, tornou-se uma cidade importantíssima para a
comunicação e comércio da província. Ao lado de Colossos e Hierápolis,
Laodicéia era uma cidade importante da Frígia. Ela foi fundada pelo rei selêucida
Antioco II por volta de 253 a.C. que colocou o nome da cidade em homenagem
à sua esposa Laodice. Sua riqueza cresceu após o domínio romano na região
em meados do segundo século da era cristã, mas sua riqueza provinha da
produção de roupa que superava a produção em sua região e de sua lã macia e
negra. Havia uma forte ligação da cidade com a medicina, com evidências da
criação de um medicamento para a cura dos olhos, chamado de “pó frígio” Como
aponta Kistemaker (2004, 223):

Sua indústria de lã florescia através da produção e exportação


da lã negra, o manufaturamento de vestimentas comuns e caras,
e a invenção de um colírio eficaz para os olhos. Ela tinha uma
florescente escola de medicina que se especializou no cuidado
dos ouvidos e dos olhos e desenvolveu um unguento para o
tratamento de olhos infeccionados. Por causa desse unguento,
a escola se tornou mundialmente famosa.

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Sua religião era sincrética. Zeus e Men Karou (deus do vale e da cura)
eram os principais deuses adorados em Laodicéia, além de uma forte devoção
a Apolo. Acerca da comunidade judaica em Laodicéia, temos evidências que
Antíoco III levou cerca de duas mil famílias judias para Lídia e Frígia em meados
do III século a.C. Nesta carta não há nenhuma evidência de conflitos entre judeus
e cristãos.

Tanto a cidade e a igreja se orgulhavam de sua riqueza. A igreja se


acomodara aos prazeres da cidade, aos costumes pagãos e sincréticos,
acostumando-se a viver uma vida destituída de profundidade espiritual. Por esse
motivo, Laodicéia é a pior das igrejas citadas por João, tendo em vista que não
há nada de bom a dizer sobre ela, superando a igreja de Sardes.

Jesus é descrito como o “Amém” (ὁ ἀμήν, ho amen), que significa

verdadeiro (Is 65:16). O verbo hebraico !ֵmָa significa “confirmar”, por isso era

usado frequentemente para confirmar uma oração (1Cr 16:36) ou um hino (Sl
41:13). Essa fórmula foi muito utilizada por Jesus, inclusive em João 5:24, Ele
usa Ἀμὴν ἀμὴν λέγω ὑμῖν (em verdade vos digo) como ênfase na
confiabilidade divina no que diz. Na carta aos crentes de Laodicéia, Jesus está
enfatizando a confiabilidade e autenticidade de seu testemunho em contraste ao
dos laodicenses. Jesus é ὁ μάρτυς ὁ πιστὸς καὶ ἀληθινός (ho martus ho pistos
kei alethinos, a testemunha fiel e verdadeira), ressaltando que ele é o modelo de
de perseverança e fidelidade. No Apocalipse, “testemunho” e “fidelidade” estão
relacionados ao sofrimento e, especialmente ao “martírio”. Em Laodicéia não há
fidelidade, veracidade e testemunho, devem seguir o modelo ideal, Jesus.

O terceiro título, ἡ ἀρχὴ τῆς κτίσεως τοῦ θεοῦ· (he arché tes ktiseos tou
theou, o princípio da criação de Deus) sublinha a soberania de Jesus.
Possivelmente esse conceito da soberania de Cristo e seu poder criador já era
conhecido pelos laodicenses, tendo em vista que em Colossenses 1:15-16 o
Apóstolo Paulo fala de Jesus como aquele que “é imagem do Deus invisível, o
primogênito de toda a criação; Porque nele foram criadas todas as coisas que
há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações,
sejam principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para ele”. Ele é o

62
ἀρχὴ (Cl 1.18), que não significa apenas “preeminente” ou “soberano”, mas
“fonte” e “origem”. Assim, Jesus é a fonte da criação de Deus e controla,
inclusive, a riqueza e o “poder” dos laodicenses.

Laodicéia não tem ponto forte. O “Conheço tuas obras” (οἶδα τὰ ἔργα

σου, oida ta erga sou) dito por Cristo à igreja de Laodicéia contém ironia. A
declaração οὔτε ψυχρὸς εἶ οὔτε ζεστός (oute psichros ei oute zestos, que nem
és frio nem quente), está relacionada com o abastecimento de água da cidade.
Laodicéia foi fundada no cruzamento das rotas comerciais por causa das
vantagens militares e comerciais. A cidade, portanto, não tinha abastecimento
de água próprio, assim, canalizava água quentes através de aquedutos de
Denizli. A água não tinha tempo suficiente para esfriar nos aquedutos e chegava
morna à cidade, tornando-se imprópria para beber. A metáfora utilizada por
Jesus ressalta que Laodicéia não poderia se igualar ao seu abastecimento de
água, ou seja, assim como as águas mornas eram “inúteis”, as obras “mornas”
deles também eram inúteis e reprovadas por Cristo. Diante disso, Jesus está a
ponto de vomitá-los de sua boca. O juízo de Deus virá de forma iminente.

O motivo para o estado espiritual devastador da igreja era, sem dúvida, a


sua riqueza. Sua riqueza levou os laodicenses à autossuficiência, pois achavam
que se eram materialmente ricos eram, também, espiritualmente abastados. Eles
também afirmavam, οὐδὲν χρείαν ἔχω (ouden chreian echo, de nada tenho
falta). Eles não perceberam que precisavam da ajuda de Deus, por esse motivo
são οὐκ οἶδας ὅτι σὺ εἶ ὁ ταλαίπωρος καὶ ἐλεεινὸς καὶ πτωχὸς καὶ τυφλὸς

καὶ γυμνός (oidas hoti su ei ho talaipõros kai eleeinos kai ptõchos kai typhlos kai
gymnos, e não sabes que és um infeliz, e miserável, e pobre, e cego, e nu). Seu
orgulho e arrogância os deixaram cegos, não permitindo que percebessem sua
condição espiritual deprimente. Eles não sofriam com perseguição por parte dos
judeus ou pagãos; não sofriam com ameaças internas de grupos heréticos, mas
sucumbiram em seus deleites e luxuria.

Eles se acham ricos, mas Jesus os chama de pobres (πτωχὸς); sua forte
ligação com a medicina e com a criação de um medicamento para a cura dos
olhos, não é suficiente para curar a si mesmos, pois estão cegos (τυφλὸς); são

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grandes produtores de roupa e lã, mas estão nus (γυμνός). Cristo os aconselha
que visitem a loja correta. Eles compraram tudo que é possível de comerciantes
e mercadores terrenos, mas somente Cristo possui o que eles realmente
precisam, a saber, ouro puro, vestes brancas e colírio para a cegueira espiritual
(v.18).

Mesmo diante da decadência espiritual da igreja de Laodicéia, Jesus


demonstra o seu amor pela igreja. A repreensão é sinônimo do amor de Cristo
por eles, e o arrependimento era a única opção para os laodicenses. Cristo está
à porta da igreja de Laodicéia desejoso para cear. Mas há uma condição, “se
alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta”, a pessoa precisa tomar a decisão de
abrir a porta e de permitir sua entrada. Isso enfatiza a importância da resposta
pessoal. O resultado é comunhão à mesa. A promessa é de acolhida, perdão e
reconciliação com Deus.

“Ao que vencer” (Τῷ νικῶντι to nikonti), no caso de Laodicéia, é

prometido que καθίσαι μετ᾽ ἐμοῦ ἐν τῷ θρόνῳ μου (kathisai met’ emou en tõ
thronõ mou, se assentará comigo no meu trono). Jesus irá compartilhar o seu
trono com os vencedores. Interessante notar que essa promessa prenuncia o
capítulo 5 de Apocalipse, ou seja, a própria conquista de Cristo e sua
entronização junto ao Pai, como aponta Osborne (2014, p.239):

O tema do Christus Victor é um componente essencial da


teologia do NT. Os atos de expulsão de demônios realizados por
Jesus realmente eram demonstrações de sua vitória sobre
Satanás, como ensinado em Marcos 3.27 e textos paralelos,
considerando Satanás como o homem forte que é amarrado em
sua casa. Na cruz, Satanás foi derrotado definitivamente, como
afirmado em Colossenses 2.15, “e, tendo despojado os
principados e poderes, os expôs em público e na mesma cruz
triunfou sobre eles”. Naquele tempo, Jesus “foi e pregou aos
espíritos em prisão” que eles haviam sido derrotados (1Pe 3.19),
e Deus “o exaltou com soberania e lhe deu o nome que está
acima de qualquer outro nome” (Fp 2.9).

Jesus é o modelo para a vitória dos Santos, ὡς κἀγὼ ἐνίκησα καὶ

ἐκάθισα μετὰ τοῦ πατρός μου ἐν τῷ θρόνῳ αὐτοῦ (hõs kago enikêsa kai
ekathisa meta tou patros mou en tõ thronõ autou, assim como eu venci, e me

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assentei com meu Pai no seu trono). Ὁ ἔχων οὖς ἀκουσάτω τί τὸ πνεῦμα λέγει

ταῖς ἐκκλησίαις “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas”!

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CONCLUSÃO

Em nossa disciplina estudamos os principais aspectos do livro de


Apocalipse. Tratamos dos aspectos ligados ao contexto histórico, social e
cultural que contribuíram para o processo de produção do livro. Percebemos que
uma boa compreensão dos eventos que cercaram a produção do livro é
fundamental para contextualizar a mensagem de Apocalipse. Tratamos,
também, do contexto literário da obra de João. Percebemos como a discussão
acerca da autoria, bem como da datação do livro condicionam a sua
interpretação e a forma como muitas linhas interpretativas compreenderam o
mesmo. Por fim, propomos uma leitura das sete cartas enviadas às Igrejas da
Ásia. Destacamos esse trecho do livro, tendo em vista que são, na maioria das
vezes, esquecidas no processo de interpretação do livro, como se fossem um
adendo à revelação central dele. Foi possível perceber a profundidade de
orientações e promessas contidas nelas, que romperam com as situações
diretas daquelas igrejas locais, fundamentando a esperança de toda Igreja,
sejam as Igrejas da Ásia do tempo de João ou as nossas.

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