Entrevista - Paulo Henriques Britto
Entrevista - Paulo Henriques Britto
Entrevista - Paulo Henriques Britto
professor da PUC-Rio. Sua obra poética, desde a estreia em Liturgia da matéria (1982),
apresenta interesse pelas formas fixas, cujos limites instigam o autor também pelo
desafio no instante da criação. Poeta que discute a contenção dos versos e das emoções,
Paulo recebeu os prêmios Alphonsus de Guimarães, por seu Trovar claro (1997), e
Portugal Telecom por Macau (2004).
A epígrafe de Emily Dickinson, que abre seu mais novo livro, Nenhuma arte, em
tradução do próprio autor diz: “Não tivesse eu visto o Sol/ Sofrível a sombra seria/ Mas
a Luz fez de meu Deserto/ Terra ainda mais baldia”. Tais versos sugerem a discussão
sobre a iluminação interior, mas também sobre a luminosidade do processo criativo do
poeta — temas que percorrem o livro. Outro tema importante, a perda, aparece já nas
primeiras páginas — propondo um diálogo com Bishop — e se mantém como questão
norteadora atravessando a obra como um todo.
A escrita como tentativa de domar o caos é um dos pontos que vemos nesta entrevista
para o Pernambuco, na qual Paulo também fala sobre os procedimentos de elaboração
de Nenhuma arte, sobre sua poética e sobre poesia em geral. Vamos a ela.
A vida na sua literatura não se romantiza, tampouco se mitifica. Ao contrário, por vezes
passa a sensação de resignação com o que nos é dado neste mundo. Na sua poesia, como
diria Drummond, a vida é uma ordem?
O novo livro se inicia com a palavra nenhum e termina com nada. São quase 110
ocorrências do vocábulo não ao longo dos poemas — além de tantos outros do campo
semântico das negativas. O que tanto precisa ser negado, Paulo?
Sim, Cabral e Kafka são dois dos meus autores prediletos, dos
que mais leio e releio. Tenho a maior admiração pela secura, a
linguagem que diz o mínimo e sugere o máximo. Também admiro o
excesso, mas os artistas do excesso não são os que eu tento
emular. Quanto à questão da influência, acho que depois de uma
certa idade você já não é mais muito influenciável. Mas leio
muita poesia contemporânea, e é possível que eu ainda pegue
alguma coisa aqui e ali.
“Nenhuma arte” também nomeia a série de poemas iniciais que, junto a “Nenhum
mistério” promovem diálogo com Elizabeth Bishop. A perda, que não está nos títulos,
claramente é o tema central. Como você pensa o uso do perder para a elaboração desses
poemas?
Enquanto leitor e professor da poesia que é feita hoje no Brasil, como você vê a opção
majoritária pelo verso livre também aliada à coloquialidade?
Em determinado poema, está dito que, se não é sempre possível amar a vida, temos
sempre o direito de editá-la. Escrever é se editar?
Da série “Caderno” lemos: o fracasso se tornou/ a própria textura da vida (...) Assistir
à própria queda/ agora é todo o espetáculo. Seus eu-líricos encarnam esse movimento
de menos valia ou da própria sensação de fracasso em relação à escrita ou à vida. Esse é
um procedimento irônico diante da sua grandeza de poeta reverenciado e
superpremiado?
Não vejo ironia nenhuma nessa afirmação. A experiência vivida é
sempre um fracasso, na medida em que inevitavelmente se
constitui em um acúmulo de perdas, culminando na morte.
Que luz é essa que, ao nos perpassar, amplifica a sensação de perda e abandono?
A lucidez?
Boa pergunta.