História Do Registro de Imóveis - Alberto Gentil de Almeida Pedroso - 2020

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PRIMEIRAS PÁGINAS

PRIMEIRAS PÁGINAS
COLEÇÃO DIREITO IMOBILIÁRIO - VOL. I

HISTÓRIA DO REGISTRO DE
IMÓVEIS

Coordenação

Alberto Gentil de Almeida Pedroso

Autor

Ivan Jacopetti do Lago

© desta edição [2020]

Thomson Reuters Brasil

Juliana Mayumi Ono


Diretora responsável

Av. Dr. Cardoso de Melo, 1855 – 13º andar - Vila Olímpia


CEP 04548-005, São Paulo, SP, Brasil

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Impresso no Brasil [08-2020]
Profissional
Fechamento desta edição [24.06.2020]

ISBN 978-65-5614-168-8
EXPEDIENTE
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Expediente

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FICHA CATALOGRÁFICA
FICHA CATALOGRÁFICA

Ficha catalográfica

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Lago, Ivan Jacopetti do

História do Registro de Imóveis [livro eletrônico] / Ivan Jacopetti do Lago. -- 1.


ed. -- São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2020. -- (Coleção Direito Imobiliário ;
vol. I / coordenação Alberto Gentil de Almeida Pedroso)

6 Mb ; ePUB

1 ed. e-book baseada na 1 ed. impressa

Bibliografia

ISBN 978-65-5614-168-8

1. Registro de imóveis 2. Registro de propriedade - Brasil 3. Registro de


propriedade - Leis e legislação I. Pedroso, Alberto Gentil de Almeida II. Título III.
Série.

20-39072 CDU-347.235 (81)

Índices para catálogo sistemático:

1. Brasil : Registro de imóveis : Direito civil 347.235 (81)

Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964


PREFÁCIO DA COLEÇÃO
PREFÁCIO DA COLEÇÃO

Prefácio da coleção

Os bens imóveis constituem o lastro de qualquer economia desenvolvida em


um país democrático. A propriedade imobiliária representa 75% do patrimônio de
uma Nação, conforme o Banco Mundial. Para o Brasil, ela significa montante
superior a 13 trilhões de reais, conforme dados do Banco Central.

Assim como ocorre nos países mais desenvolvidos, a organização, a aquisição,


a transmissão e a utilização desse ativo, em todos os seus aspectos jurídico-
econômicos e sociais, são tuteladas pelo direito positivo. O eixo orientador reside
no princípio da publicidade registral, confiada ao registrador imobiliário.

Ao longo dos últimos 170 anos de sua história, o Brasil arquitetou um adequado
sistema de Registro de Imóveis, hoje reconhecido por sua segurança e eficiência
em todo o planeta. Suas bases teórico-conceituais, doutrinárias e jurisprudenciais,
objeto de longa e minuciosa elaboração, mostram-se consistentes e sólidas,
hábeis a suplantar muitos outros sistemas.

Sua origem se vincula ao crédito hipotecário que financiou o desenvolvimento


da agricultura do século XIX. Em seguida, o nosso Registro evoluiu para dar
publicidade às transmissões imobiliárias e, em 1916, se tornou, com raízes no
direito alemão, um verdadeiro registro atributivo de direitos. Sua função é constituir,
publicizar e proteger múltiplos direitos reais. Entre eles, o próprio direito de
propriedade. Isso o torna garantidor da segurança à titulação e ao tráfego
imobiliário.

Afirmo, com ânimo e orgulho, ser “o nosso” Registro, porque, mercê dos
imprescindíveis e constantes aprimoramentos demandados por sua gestão
constitucionalmente privatizada, ele adquiriu singular estágio de maturidade. Valeu
a pena o esforço de doutrinadores, juristas e legisladores ao longo dos últimos dois
séculos. O resultado pode ser considerado uma real conquista. Verdadeiro triunfo,
uma vitória do Brasil e de todos nós, brasileiros.

Deveras, a inserção do serviço registral numa economia cada vez mais digital e
dinâmica, ao lado da necessidade de adoção de estruturas jurídico-imobiliárias
desjudicializantes, faz com que o aprofundamento do estudo do Direito Imobiliário
obtenha significativa e crescente importância. Há de se preservar a tradição
experimentada, sem receio de ousar e de encarar o futuro pleno de novas
perspectivas pós-pandemia COVID-19.

Nessa direção, exsurge a presente obra, Direito Imobiliário, coordenada pelo


brilhante Magistrado e Professor de Direito Registral Alberto Gentil de Almeida
Pedroso, composta por 10 volumes, cujos autores, especialistas na área, encaram,
de forma aprofundada e corajosa, temas nunca enfrentados ou, por vezes,
arrostados sem o devido fôlego.
No Volume I, é tratada a História do Registro de Imóveis, escrita pelo
registrador e coordenador da Uniregistral Ivan Jacopetti do Lago, recém-
empossado no 4º Registro de Imóveis de São Paulo após aprovação em 1º lugar
no 11º Concurso Público de Outorga de Delegações.

Reforçando os estudos dos “Princípios do Registro de Imóveis brasileiro”, no


Volume II, os professores de Direito e registradores paulistas, recém-investidos nas
Delegações de Registro das Comarcas de Jundiaí e Guarujá, Marinho Dembinski
Kern e Francisco José de Almeida Prado Ferraz Costa Junior, trazem questões da
atualidade que desafiam toda a principiologia registral.

Com foco no estudo do procedimento administrativo de Dúvida, no Volume III,


intitulado “A Dúvida no Registro de Imóveis”, contamos com a contribuição de dois
magistrados especialistas na seara extrajudicial e com reconhecida experiência no
âmbito Correcional pela atuação junto às Varas de Registros Públicos de São
Paulo e à Corregedoria Geral de Justiça: Doutores Josué Modesto Passos e
Marcelo Benacchio.

Sempre objeto de estudo no âmbito registral, o tema “Registro de Imóveis e


Parcelamento do Solo. Registro Especial de Loteamento e Desmembramento”
integra o Volume IV da obra, no qual o Desembargador e Professor Vicente de
Abreu Amadei, notável conhecedor da seara extrajudicial, nos brinda com seus
cirúrgicos apontamentos.

Outra matéria que tem despertado paixões ao longo dos últimos anos é a da
REURB e ela não poderia ficar de fora da presente obra. No Volume V, é tratada
sob o título “Regularização Fundiária Urbana e seus Mecanismos de Titulação dos
Ocupantes: Lei nº 13.465/2017 e Decreto nº 9.310/2018”, a cargo da brilhante e
prestigiada registradora Paola de Castro Ribeiro Macedo.

No Volume VI, encontramos a árdua questão “Os Bens públicos e o Registro de


Imóveis” muito bem enfrentada pelos jovens, porém já experientes, registradores
Caleb Matheus Ribeiro de Miranda, Carolina Baracat Mokarzel de Luca e Lorruane
Matuszewski.

Pela sua importância, o “Condomínio e Incorporação Imobiliária”, objeto do


Volume VII, é desenvolvido pelo professor e famoso escritor do meio registral
Leonardo Brandelli e pelo Magistrado Enéas Costa Garcia, com quem tivemos o
prazer de conviver quando integramos a Banca Examinadora do 7º Concurso de
Outorga de Delegações em 2011. Além deles, assinam este volume os renomados
magistrados Celso Maziteli Neto, estudioso do sistema hipotecário norte-
americano, e José Marcelo Tossi Silva, grande conhecedor do Direito Registral e
dono de um volumoso currículo no campo de atuação extrajudicial e correcional.

O “Usucapião em Condomínio” é tratado no Volume VIII pelos admirados e


experientes registradores Henrique Ferraz Corrêa de Mello e Carla Modina Ferrari
que, como todos os grandes escritores, nunca recusam os desafios impostos pelos
temas mais árduos do Direito Registral.
Por fim, as principais questões práticas relacionadas às “Retificações no
Registro de Imóveis” e à “Alienação Fiduciária de Bens Imóveis” estão decantadas
nos Volumes IX e X, de autoria dos preclaros e prestimados registradores Priscila
Alves Patah e Moacyr Petrocelli de Ávila Ribeiro, com os quais tivemos a felicidade
de contar com a participação no “Bate-Bola com Registro”, programa semanal de
debates da TV Registradores, vinculada à Uniregistral.

Em síntese, é uma obra que suscitará reflexões e da qual poderão provir ainda
mais avanços para o já vitorioso Registro de Imóveis da República Federativa do
Brasil.

São Paulo, 12 de junho de 2020.

Flaviano Galhardo

Presidente do Colégio do Registro de Imóveis do Brasil

Presidente da Associação de Registradores


APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO
APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO

Apresentação da coleção

Apresentar uma obra de tamanha importância é uma grande honra!

A soma dos nomes que abrilhantam a coleção Direito Imobiliário da Editora


Thomson Reuters Revista dos Tribunais é de quilate inestimável – Registradores
de Imóveis, Juízes e Desembargadores renomados, pessoas que vivem o Direito
Imobiliário, autores reconhecidos nacionalmente, com currículos recheados de
feitos profissionais e reconhecimentos acadêmicos.

A cada volume um assunto novo – com exceção do tema da alienação


fiduciária, produzido em um só fôlego, mas em dois tomos – com detalhamento
aprofundado sobre o que existe de mais importante dentro do Direito Imobiliário.

Abrindo a coleção, tive a alegria de contar com a participação do Dr. Ivan


Jacopetti do Lago, Oficial do 4º Registro de Imóveis de São Paulo, tratando do
tema História do Registro de Imóveis.

Em seguida, o Volume II trouxe o importantíssimo tema “Princípios do Registro


de Imóveis Brasileiro”, escrito pelos amigos Dr. Marinho Dembinski Kern,
Registrador de Imóveis de Jundiaí, e Dr. Francisco José de Almeida Prado Ferraz
Costa Junior, Registrador de Imóveis do Guarujá.

No Volume III da coleção, o tema tratado foi “A Dúvida no Registro de Imóveis”,


escrito pelos grandes colegas de magistratura paulista, Dr. Josué Modesto Passos
e Dr. Marcelo Benacchio.

O Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Dr. Vicente de Abreu


Amadei, gentilmente nos brindou, no Volume IV, com o tema “Registro de Imóveis
e Parcelamento do Solo. Registro Especial de Loteamento e Desmembramento”.

No Volume V, o assunto tratado foi a “Regularização Fundiária Urbana e seus


Mecanismos de Titulação dos Ocupantes: Lei nº 13.465/2017 e Decreto nº
9.310/2018”, desenvolvido com primor pela Dra. Paola de Castro Ribeiro Macedo,
Registradora de Imóveis de Taubaté.

No Volume VI, o tema tratado com qualidade elogiável foi “Os Bens Públicos e
o Registro de Imóveis”, pelos queridos autores Dr. Caleb Matheus Ribeiro de
Miranda, Registrador de Imóveis de São Vicente, Carolina Baracat Mokarzel de
Luca, Registradora de Imóveis de São José do Rio Pardo, e Lorruane
Matuszewski, Registradora de Imóvel de Palmital.

No Volume VII, o tema tratado foi “Condomínio e Incorporação Imobiliária”,


escrito conjuntamente pelos Dr. Leonardo Brandelli, Registrador de Imóveis de
Jundiaí, Dr. Enéas Costa Garcia, Juiz de Direito em São Paulo, Dr. Celso Maziteli
Neto, Juiz de Direito em São Paulo, e Dr. José Marcelo Tossi Silva, Juiz de Direito
em São Paulo, todos grandes conhecedores do extrajudicial, notadamente do tema
tratado.

O tema “Usucapião em Condomínio” é muito bem enfrentado no Volume VIII


pelos autores Dr. Henrique Ferraz Corrêa de Mello, Registrador de Imóveis de
Itapevi, e Dra. Carla Modina Ferrari, Registradora de Imóveis de Vinhedo.

No Volume IX, a Dra. Priscila Alves Patah, Registradora de Imóveis de


Miguelópolis, abordou com grande felicidade o tema das “Retificações no Registro
de Imóveis”.

Fechando a coleção com grande energia e fôlego, o amigo Dr. Moacyr


Petrocelli de Ávila Ribeiro, Registrador de Imóveis de Pedreira, escreveu, em dois
tomos, sobre a “Alienação Fiduciária de Bens Imóveis”.

Apresentada a obra, é certo que terão o melhor de cada tema para estudo e
consulta. Desejo aos leitores que aproveitem!

Um abraço.

Alberto Gentil de Almeida Pedroso

Professor e Juiz de Direito


SOBRE O COORDENADOR - ALBERTO GENTIL DE ALMEIDA PEDROSO
SOBRE O COORDENADOR - ALBERTO GENTIL DE ALMEIDA PEDROSO

Sobre o coordenador

Alberto Gentil de Almeida Pedroso

Juiz de Direito Titular da 8ª Vara Cível da Comarca de Santo André/São Paulo.


Juiz Assessor da Corregedoria Geral da Justiça nos biênios 2012/2013 (Des. José
Renato Nalini), 2014/2015 (Des. Hamilton Elliot Akel), 2016/2017 (Des. Manoel
Pereira Calças) e 2020/2021 (Des. Ricardo Anafe). Juiz de Direito integrante da 2ª
Turma Cível do Colégio Recursal de Santo André. Especialista e Mestre em
Direito. Professor da Escola Paulista da Magistratura nos Cursos de Pós-
Graduação em Direito Civil e Direito Notarial e Registral. Menção honrosa
acadêmica no CONPEDI XXII. Professor convidado em diversos cursos de
graduação jurídica, preparatório da OAB, atualização profissional e Carreiras
Jurídicas. Autor de diversas obras jurídicas, entre elas Registro Imobiliário (Ed.
RT), Regularização Fundiária (Ed. RT), Comentários à Lei da Multipropriedade (Ed.
RT) e Registros Públicos (Ed. Método). Coordenador acadêmico da revista
Registrando o Direito. Idealizador e Coordenador do projeto de preparação em
registros públicos para Cartório - Registrando com Gentil. Instagram:
@registrandocomgentil.
ESTRUTURA DA COLEÇÃO
ESTRUTURA DA COLEÇÃO

Estrutura da coleção

Volume I: História do Registro de Imóveis

Ivan Jacopetti do Lago

Volume II: Princípios do Registro de Imóveis Brasileiro

Marinho Dembinski Kern

Francisco José de Almeida Prado Ferraz Costa Junior

Volume III: A Dúvida no Registro de Imóveis

Josué Modesto Passos

Marcelo Benacchio

Volume IV: Registro de Imóveis e Parcelamento do Solo. Registro Especial de


Loteamento e Desmembramento

Vicente de Abreu Amadei

Volume V: Regularização Fundiária Urbana e seus Mecanismos de Titulação


dos Ocupantes: Lei nº 13.465/2017 e Decreto nº 9.310/2018

Paola de Castro Ribeiro Macedo

Volume VI: Os Bens Públicos e o Registro de Imóveis

Caleb Matheus Ribeiro de Miranda

Carolina Baracat Mokarzel de Luca

Lorruane Matuszewski

Volume VII: Condomínio e Incorporação Imobiliária

Celso Maziteli Neto

Enéas Costa Garcia

José Marcelo Tossi Silva

Leonardo Brandelli

Volume VIII: Usucapião em Condomínio


Carla Modina Ferrari

Henrique Ferraz Corrêa de Mello

Volume IX: Retificações no Registro de Imóveis

Priscila Alves Patah

Volume X: Tomo I e II: Alienação Fiduciária de Bens Imóveis

Moacyr Petrocelli de Ávila Ribeiro


SOBRE OS AUTORES DA COLEÇÃO
SOBRE OS AUTORES DA COLEÇÃO

Sobre os autores da coleção

Caleb Matheus Ribeiro de Miranda

Especialista em Direito Civil e Direito Notarial e Registral. Bacharel em Direito.


Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídicas
de São Vicente/SP. Diretor e Pesquisador de Novas Tecnologias do Instituto de
Registro Imobiliário do Brasil (IRIB). Membro da comissão de Inovação e
Tecnologia do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM). Membro da
Comissão de Pensamento Registral Imobiliário do IRIB.

Carla Modina Ferrari

Bacharel em Direito. Especialista em Direito Notarial e Registral e pós-


graduada em Direito pelo Complexo Jurídico Damásio de Jesus. Oficial de Registro
de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Vinhedo/SP
desde 2011. Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e
Tutelas do Estado de São Paulo de 2007 a 2011. Membro da Academia
Metropolitana de Letras, Artes e Ciências. Professora do Curso Preparatório VFK
Educação. Já atuou como professora convidada dos cursos de pós-graduação do
Complexo Jurídico Damásio de Jesus, da Escola Paulista de Direito e da Escola
Superior da Advocacia de São Paulo. Autora de diversas obras jurídicas de
Registros Públicos e de Direito Civil.

Carolina Baracat Mokarzel de Luca

Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas


Jurídicas da Comarca de São José do Rio Pardo/SP. Doutoranda em Ciências
Jurídicas e em Sistema Constitucional de Garantia de Direitos. Mestre em Direito
Constitucional. Especialista em Direito Notarial e Registral, em Direito Imobiliário,
em Direito Civil, em Direito de Família e Sucessões, em Direito Empresarial e em
Direito Tributário. Professora em cursos preparatórios, na graduação e na pós-
graduação.

Celso Maziteli Neto

Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP)


em 1996. Pós-graduado em Direito Comparado (Master of Comparative Law) pela
Cumberland School of Law (Birmingham, Estados Unidos, 2016) e Doutorando em
Direito pela University of Indiana – Maurer School of Law (Estados Unidos). Juiz de
Direito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo desde 1998. Coautor do
artigo Blockchain e o Registro de Imóveis (in: Revista de Direito Imobiliário, RT,
2019, v. 42, n. 87, jul./ago.).

Enéas Costa Garcia


Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP)
em 1990. Pós-graduado em Direito Civil pela mesma Universidade, com Mestrado
(2000) e Doutorado (2005). Juiz de Direito do Tribunal de Justiça de São Paulo
desde 1991. Exerceu por mais de duas décadas magistério no ensino superior, na
disciplina de Direito Civil. Autor das seguintes obras: A lei dos Juizados Especiais
Criminais na jurisprudência (obra coletiva) – São Paulo, Oliveira Mendes, 1999;
Direito à identidade pessoal. In: Atualidades Jurídicas, nº 3. Coord. Maria Helena
Diniz, Saraiva, São Paulo, 2001; Responsabilidade civil dos meios de comunicação
– São Paulo, Juarez de Oliveira, 2002; Responsabilidade pré e pós-contratual à luz
da boa-fé – São Paulo, Juarez de Oliveira, 2003; Direito geral da personalidade no
sistema jurídico brasileiro – São Paulo, Juarez de Oliveira, 2007; Responsabilidade
civil por abalo de crédito e bancos de dados – São Paulo, Juarez de Oliveira, 2008;
A proteção do consumidor nos contratos coligados. Jurisprudência do Tribunal de
Justiça, v. 322, março 2008, pp. 2183-2209.

Francisco José de Almeida Prado Ferraz Costa Junior

Doutorando em Direito Civil (História do Direito) pela Universidade de São


Paulo (USP). Mestre em Direito Romano e Sistemas Jurídicos Contemporâneos
pela Universidade de São Paulo (USP). Bacharel em Direito pela Universidade
Presbiteriana Mackenzie. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e
Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Guarujá/SP.

Henrique Ferraz de Mello

Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas


Jurídicas e Naturais no Estado de São Paulo. Mestre em Direito Civil e Doutor em
Direito Processual Civil pela PUC-SP e pós-graduado pela Escola Paulista da
Magistratura no 1º Curso de Especialização em Direito Registral e Notarial.
Membro da Comissão do Pensamento Registral do Instituto do Registro Imobiliário
do Brasil (IRIB) e da Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo
(ARISP). Membro da Academia Brasileira de Direito Registral Imobiliário (ABDRI).
Autor de obras e artigos publicados.

Ivan Jacopetti do Lago

Bacharel, Mestre e Doutor pela Faculdade de Direito da USP – Largo São


Francisco. Pós-graduado pelo CENOR da Universidade de Coimbra e pela
Universidade Autônoma de Madri (CADRI, 2015). Diretor de Relações
Internacionais do IRIB. Coordenador da Revista de Direito Imobiliário (RDI).
Coordenador da Uniregistral da ARISP. 4º Oficial de Registro de Imóveis de São
Paulo (SP).

José Marcelo Tossi Silva

Juiz de Direito no Estado de São Paulo. Professor do 1º, 3º e 4º Cursos de


Especialização em Direito Notarial e Registral ministrados pela Escola Paulista da
Magistratura. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC/SP) na área de concentração Direito das Relações Sociais – Direito Civil.
Especialista em Direito de Família pela Escola Paulista de Magistratura.
Josué Modesto Passos

Especialista em Direito Notarial e Registral Imobiliário pela Escola Paulista da


Magistratura. Juiz de Direito Auxiliar da Comarca de São Paulo.

Leonardo Brandelli

Doutor em Direito pela UFRGS. Mestre em Direito Civil pela UFRGS.


Especialista em Direito Registral – Barcelona/Espanha. Professor de Direito Civil
na Escola Paulista de Direito. Oficial de Registro de Imóveis no Estado de São
Paulo. Diretor da Escola Nacional de Notários e Registradores. Membro da
Academia Brasileira de Direito Registral. Membro da Mensa Brasil.

Lorruane Matuszewski

Doutoranda em Direito. Mestre em Direito pela Universidade de Marília


(Unimar). Especialista em Direito Civil e em Direito Notarial e Registral. Oficial de
Registro de Imóveis no Estado de São Paulo. Membro da comissão de Direito
Notarial e Registral do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM). Membro
da Comissão de Pensamento Registral Imobiliário do Instituto de Registro
Imobiliário do Brasil (IRIB).

Marcelo Benacchio

Mestre e Doutor pela PUC/SP. Professor do Mestrado em Direito da


Universidade Nove de Julho. Professor Titular de Direito Civil da Faculdade de
Direito de São Bernardo do Campo. Juiz de Direito Titular da 2ª Vara de Registros
Públicos do Foro Central da Comarca de São Paulo.

Marinho Dembinski Kern

Doutorando em Direito Civil (História do Direito) pela Universidade de São


Paulo (USP). Mestre em Direito pela Escola Paulista de Direito. Especialista em
Direito Civil e em Direito Notarial e Registral. Bacharel em Direito pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 2º Oficial de Registro de Imóveis,
Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Jundiaí/SP.

Moacyr Petrocelli de Ávila Ribeiro

Registrador imobiliário. Atualmente exerce a delegação do Oficial de Registro


de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas
Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de Pedreira/SP. Aprovado no 8º, 9º
e 10º Concursos de Outorga de Delegações de Notas e de Registros do Estado de
São Paulo. Ex-Tabelião de Notas no Estado de São Paulo. Ex-advogado e
consultor jurídico com atuação em Direito Contratual e Registral Imobiliário.
Especialista em Direito Constitucional e em Direito Notarial e Registral. Professor
convidado dos cursos de Pós-Graduação em Direito Notarial e Registral e em
Direito e Negócios Imobiliários da Faculdade IBMEC – Instituto Damásio
Educacional. Professor convidado de Direito Registral no curso de Graduação em
Direito da Universidade de São Paulo – Campus Ribeirão Preto/SP. Professor em
diversos cursos preparatórios para concursos de outorga de delegações de notas e
de registros da VFK Educação. Pesquisador da Escola Nacional de Notários e
Registradores (ENNOR) com participação nos departamentos de Registro de
Imóveis e de Direito e Economia. Membro da Comissão de Enunciados da
Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo (ARISP). Correspondente
do Banco Mundial (The World Bank) sobre Registro de Propriedades no projeto
Doing Business (2020/2021). Organizador do portal
direitoregistralimobiliario.wordpress.com.

Paola de Castro Ribeiro Macedo

Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-


SP). Mestre em Direito Internacional (LL.M.) pela Georgetown University,
Washington/DC. Especialização em Processo Civil pela PUC-SP. Atuou como
advogada em São Paulo e nos Estados Unidos (1998 a 2008). Membro do Comitê
de Regularização Fundiária da Associação de Registradores Imobiliários do Estado
de São Paulo (ARISP). Autora de artigos jurídicos de Direito Registral Imobiliário.
Professora de Direito Registral em cursos jurídicos. Oficial de Registro de Imóveis
e Anexos de Taubaté/SP, desde 2009, aprovada no 5º Concurso de Outorga de
Delegações do Estado de São Paulo.

Priscila Alves Patah

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Mestre e


Doutoranda em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito (FADISP). Doutoranda
em Direito Privado pela Universidade de Salamanca, Espanha. Especialista em
Direito Notarial e Registral, Civil, Contratual e Processual Civil. Registradora de
Imóveis na comarca de Miguelópolis/SP. Foi advogada, Registradora Civil das
Pessoas Naturais do 15º Subdistrito – Bom Retiro, na comarca de São Paulo/SP,
Registradora Civil das Pessoas Naturais e Tabeliã de Notas de Cedral, comarca de
São José do Rio Preto/SP e Registradora Civil das Pessoas Naturais da comarca
de Extrema/MG. Professora convidada dos cursos de graduação e pós-graduação
em Direito da Universidade de São Paulo (USP), do curso de pós-graduação da
Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São
Paulo e de cursos de extensão. Autora de livros e artigos jurídicos.

Vicente de Abreu Amadei

Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Professor e palestrante


em cursos de extensão e de especialização em Direito Notarial e Registral,
Imobiliário, Urbanístico e Ambiental Urbano em diversas instituições (v.g. PUC/SP,
Escola Paulista da Magistratura, SECOVI-SP, Uniregistral). Membro da Academia
Brasileira de Direito Registral Imobiliário (ABDRI), da Academia Notarial Brasileira
(ANB) e da Academia Maranhense de Direito Notarial e Registral.
APRESENTAÇÃO
APRESENTAÇÃO

Apresentação

A pesquisa necessária para a elaboração do presente volume – e parte de sua


redação – teve início no ano de 2005, no qual o autor iniciou seu mestrado, na
cátedra de História do Direito do Departamento de Direito Civil da Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, sob orientação do Prof. Titular Ignácio Maria
Poveda Velasco.

A dissertação, com o título “História da Publicidade Imobiliária no Brasil”, foi


defendida e aprovada em 06 de junho de 2008.

A despeito disso, em que pese haja ainda algo da dissertação nesta obra, o
texto foi praticamente quase todo reescrito. Em doze anos, quem quer que
continue estudando um determinado assunto, aprende algumas coisas novas aqui
e ali. Além disso, a passagem do tempo permite a tomada de consciência da
existência de outras fontes, além do que, novas obras vão sendo produzidas.

Por outro lado, doze anos é tempo suficiente para que algumas opiniões
mudem após uma reflexão mais madura, implicando na necessária reelaboração
por inteiro de muitos trechos.

Dessa maneira, não só muito conteúdo foi acrescido, como trechos inteiros
foram reescritos e reformulados.

A ideia de uma História do Registro de Imóveis é a de se produzir uma síntese


da evolução das primitivas formas de publicidade até os modernos sistemas de
registro. Em que pese a classificação dos sistemas em francês e alemão estar
superada, é ela ainda muito útil para análises históricas.

Com efeito, não há como se compreender os sistemas de título, de título e


modo, ou de modo, sem que se conheça a evolução da história dos povos em que
foram engendrados.

No que diz respeito especificamente ao Sistema Brasileiro de Registro de


Imóveis, sua evolução tratou, em separado, do Sistema Geral e do Sistema
Torrens. Por suas características, o Sistema Torrens, desde a sua introdução no
Brasil, sempre teve a aparência de um corpo estranho no Sistema Geral e nunca
foi bem assimilado por ele. Dessa maneira, pareceu ser mais acertado tratar dele
em um capítulo específico, contemplando sua evolução primeiramente no exterior,
e então, no Brasil.

Espera-se que a presente obra possa contribuir para situar o leitor não apenas
no quadro mais amplo da evolução histórica dos sistemas de registro, mas também
quanto à sua atual conformação, em especial no Brasil. Por exemplo, a Lei 13.097,
de 2015, mudou substancialmente o sistema, e, infelizmente, ainda não parece ter
sido totalmente assimilada pela doutrina e pela jurisprudência.

A exposição dos sistemas de publicidade existentes na antiguidade – em que


pesem as imperfeições que tais sistemas pudessem padecer – é importante para
se colocar as coisas em perspectiva, em especial sob o ponto de vista de que nada
surge do nada. Os sistemas de registro são o resultado de uma infinidade de
experiências, dificuldades, sucessos e fracassos humanos cotidianos acumulados
ao longo dos milênios.

Os problemas são recorrentes, assim como as suas soluções.

Assim nos ensina Boécio, na tradução portuguesa de Luis Manuel Gaspar


Cerqueira1:

Todas as coisas voltam a procurar

os caminhos que lhes são próprios,

e alegram-se quando a eles regressam,

e não perdura a ordem outorgada a coisa alguma,

a não ser que se trate de algo que ligue o princípio ao fim.

e dê estabilidade ao orbe.
1

Cf. Severino Boécio, Consolação da Filosofia, 2ª Ed., Lisboa, Calouste


Gulbenkian, 2016. p. 83.
SOBRE O AUTOR
SOBRE O AUTOR

Sobre o autor

Ivan Jacopetti do Lago

Bacharel, Mestre e Doutor pela Faculdade de Direito da USP – Largo de São


Francisco. Pós-graduado pelo CENOR da Universidade de Coimbra e pela
Universidade Autônoma de Madri (CADRI, 2015). Diretor de Relações
Internacionais do IRIB. Coordenador da Revista de Direito Imobiliário (RDI).
Coordenador da Uniregistral da ARISP. 4º Oficial de Registro de Imóveis de São
Paulo (SP).
INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO

Introdução
O Registro de Imóveis1 é a peça fundamental da criação das titularidades reais
imobiliárias, mediante o uso da publicidade imobiliária.

No Brasil, o registro tem, desde 1864, o condão de transmitir o domínio sobre


bens imóveis nos atos entre vivos, e é, também, essencial à constituição dos ônus
reais. Compõe, juntamente com a escritura pública, um sistema que combina
autenticidade e publicidade2.

O valor fundante e principal objetivo de qualquer sistema de publicidade


imobiliária é a segurança jurídica3, a qual se funda, no Brasil, num feixe de
presunções e princípios: a presunção absoluta de conhecimento por terceiros das
informações que constam do registro; a legitimação, ou presunção relativa de
verdade de seu teor; um conjunto de princípios inter-relacionados, entre os quais
se destacam a Publicidade, a Especialidade e a Continuidade; e, desde a Lei
13.097, de 2015, a fé pública registral.

Essa segurança jurídica (Rechtssicherheit), ou, melhor dizendo, segurança do


direito, é a segurança do aproveitamento de um certo direito pelo seu titular. Seu
pressuposto fundamental é o de que a existência e o conteúdo desse direito não
possam ser questionados. Assim, tudo aquilo que facilite a sua prova, ou, melhor
ainda, que a torne desnecessária, contribui para a segurança do direito. Por essa
razão, os livros de registro são fundamentais à segurança jurídica, e serão tão
mais fundamentais quanto maior for a eficácia jurídica da inscrição, podendo, por
exemplo, dar origem a presunções, ou mesmo ter uma eficácia saneadora
(heilende Kraft), de maneira a eliminar eventuais defeitos do direito e colocá-los
acima de qualquer dúvida. Assim, de maneira mais específica, tem segurança
jurídica aquele sujeito cuja perda ou limitação de seu direito não pode ocorrer sem
o concurso de sua vontade4. Pense-se, por exemplo, na segurança do proprietário:
terá segurança jurídica plena aquele que somente possa perdê-la voluntariamente
(por exemplo, porque a alienou), ou que somente possa vê-la restringida
voluntariamente (porque, por exemplo, a deu em usufruto a alguém).

Há, porém, um segundo aspecto da segurança para o qual os registros também


são relevantes, que é conhecido como segurança do tráfego (Verkehrssicherheit).
Esta diz respeito à circulação dos direitos e sua aquisição por terceiros, a quem
interessa que a aquisição não seja de qualquer forma afetada por circunstâncias
que lhes sejam desconhecidas, como uma restrição ao poder de dispor do
alienante ou a prévia oneração do bem por algum tipo de garantia5.

A segurança do direito e a segurança do tráfego são potencialmente


conflitantes entre si, já que há situações nas quais se deverá solucionar conflitos
entre o proprietário e um terceiro adquirente de boa-fé. Por um lado, a segurança
do direito significa que não se pode realizar uma modificação desfavorável da
situação anterior sem o consentimento do prejudicado; por outro, a segurança do
tráfego significa que uma modificação favorável da situação anterior não pode ser
frustrada por circunstâncias desconhecidas ao beneficiado6. A maneira de se
superar esse trade off, de forma a aumentar a segurança jurídica, e, ao mesmo
tempo, a liquidez da propriedade – pelo aumento da segurança do tráfego –, é uma
intervenção normativa e institucional do Estado, de modo a se derrogar a
possibilidade de reivindicação ilimitada dos bens, assim como a se criar um
sistema de registro de direitos7.

Por sua importância para o crédito e para a segurança da propriedade, é


relevante o conhecimento de todo o percurso feito ao longo do tempo, até que as
modalidades de realização da publicidade imobiliária no Brasil e no mundo
chegassem em sua forma atual. Por meio da pesquisa histórica, busca-se
compreender as razões, por exemplo, de o registro de imóveis brasileiro
contemporâneo aparentemente se tratar de uma figura híbrida, que combina
elementos de outros sistemas estrangeiros.

Para isso, a exposição se inicia com a definição dos atributos que tornam a
publicidade imobiliária um fenômeno jurídico específico e distinto de outras formas
de publicidade ou de notoriedade, para a seguir enunciar as várias manifestações
da publicidade imobiliária – ou de seus sintomas – ao longo dos tempos.

O foco desta exposição reside nas civilizações do Mediterrâneo e do Oriente


Próximo que, de alguma maneira, contribuíram para a história do fenômeno.

A seguir, passa-se ao desenvolvimento dos principais sistemas de registro de


imóveis que integram a família romanístico-germânica do Direito. Diante da
inexistência de unidade política nas várias regiões da Europa durante um longo
período após a queda do Império Romano, essa análise necessariamente é
fragmentária. Isto é agravado pelo fato de que a descoberta das fontes também é
fragmentária.

Quanto ao desenvolvimento do Sistema Brasileiro de Registro de Imóveis, a


construção histórica se dará segundo uma perspectiva inovadora, qual seja, a de
sua divisão em duas linhas independentes e complementares, calcadas na summa
divisio do direito registral imobiliário alemão: o direito formal e o direito material do
registro.

A construção é feita levando-se em conta a legislação e a doutrina da época,


bem como, em alguns trechos, fontes registrais primárias.

Com tudo isso, tem-se o objetivo de se aprofundar o conhecimento do registro,


sua evolução, sua estrutura e nexos internos, e mesmo distinguir o fenômeno de
outros que lhe possam ser análogos. Há, contudo, dificuldades desde o começo da
empreitada. Além da compreensão do que é o fenômeno do registro de
propriedade, o próprio nome do ramo do Direito dedicado a estudá-lo.

Na Doutrina Brasileira, a disciplina tem sido conhecida como Direito Registral


Imobiliário8. Na Espanha, Lacruz Berdejo e Sancho Rebullida utilizam a
denominação “Derecho Inmobiliario Registral”, advertindo que, naquele país, é
mais usual a denominação “Derecho Hipotecário”9.

Entre os civilistas alemães, Baur10 e Wieling11 distinguem o Direito Formal do


Registro do Direito Material do Registro, chamando o primeiro de “Direito dos
Livros Imobiliários” (Grundbuchrecht) e o segundo de “Direito Imobiliário”
(Liegenschaftsrecht). Já WILHELM12 fala em “Direito Formal e Material dos Livros
de Registro” (Formelles und materielles Grundbuchrecht).

A terminologia “Direito Hipotecário” tem seu valor histórico. Como se sabe, os


modernos sistemas de publicidade imobiliária surgiram como uma resposta às
necessidades do crédito garantido por imóveis e sua circulação. Isto tornava
necessário criar um mecanismo que tornasse seguras as hipotecas13. Isto também
foi assim no Brasil, o que se demonstra por ter servido de início do registro de
imóveis no Brasil exatamente a Lei Hipotecária resultante da Lei Orçamentária
317, de 1843, e do Decreto 482, de 1846. O mesmo ocorreu na França, que, na
primeira década após a revolução, instituiu um sistema de registros pela Lei de 9
messidor do ano III (1795)14.

A despeito disso, a terminologia não mais se mostra adequada. Na atualidade,


o registro de imóveis envolve um feixe de relações jurídicas muito mais abrangente
do que o crédito imobiliário, e, além das garantias, também se destina a proteger a
propriedade em si mesma. Ainda, mesmo relativamente ao crédito, há opções à
hipoteca, das quais a mais notável tem sido a alienação fiduciária em garantia. A
hipoteca é apenas mais um direito entre muitos outros sujeitos a registro.

Já as expressões “Direito Imobiliário” e “Direito dos Livros Imobiliários” deixam


de tratar como uma unidade um ramo do Direito que vem tendo cada vez mais
autonomia, ao mesmo tempo que pode abranger situações que fogem do escopo
que pretendemos tratar. O “Direito Imobiliário” envolve temas que fogem ao
registro, como é o caso da posse e dos direitos de vizinhança. Já o “Direito dos
Livros Imobiliários”, no sentido específico de direito formal, peca por não abarcar
também o tema essencial dos efeitos do registro de imóveis, o nascimento, a
modificação e a extinção de direitos reais sobre imóveis15. De maneira que as
expressões também não são adequadas à definição do ramo do Direito que trata
do modo de ser do registro e de seus efeitos.

As terminologias “Direito Imobiliário Registral” e “Direito Registral Imobiliário”


estão ambas corretas, não obstante tratem da questão sob perspectivas diferentes.
A primeira o faz ao corrigir o excesso da denominação “Direito Imobiliário”, a
restringindo a aquilo que passa, de algum modo, pelo registro. E a segunda por
especificar, em primeiro lugar, que se está a tratar de uma disciplina que trata de
registros – direito registral – e, ainda, que entre os vários “Registros Públicos”,
como o Registro Civil das Pessoas Naturais, o Registro Civil das Pessoas
Jurídicas, e o Registro de Títulos e Documentos, se está considerando
exclusivamente aquele que trata dos Direitos Reais sobre imóveis, ou seja, o
Registro Imobiliário16.

De maneira que, sendo a expressão “Direito Registral Imobiliário” igualmente


correta, e tendo esta, como se mostrou, aceitação mais consolidada na doutrina
pátria, aqui será adotada, a fim de ser preservada a continuidade entre significante
e significado na terminologia jurídica.

Compreende-se como Direito Registral Imobiliário o feixe de normas que trata


da aquisição de posições registrais, o que abrange, por um lado, a maneira como
um determinado título ingressa no registro, e, por outro, os efeitos substanciais e
processuais gerados pela registração17. Abrange, assim, majoritariamente, normas
de Direito Civil, Direito Administrativo e Direito Processual que tratam de um
mesmo objeto: mesclam direito material e processual na disciplina do registro, e,
ao mesmo tempo, conferem ao registrador dos sistemas de Registro de Direitos
uma espécie de “jurisdição extrajudicial”. Tradicionalmente, tem-se compreendido
que o objeto dessas normas é a publicação – ou publicitação – de direitos reais,
aos quais confere uma eficácia civil diferenciada18, dirigida à criação de
titularidades reais. Mais modernamente, contudo, tem-se compreendido que o
objeto do Direito Registral Imobiliário não é a publicidade – a qual é uma
ferramenta, e não um objetivo –, mas sim a própria criação das titularidades reais.

Assim, esclarece Ricardo Dip19 que em acepção normativa pode-se definir o


Direito Registral Imobiliário como “a parte do direito posto que regula o
procedimento de inscrição de títulos relativos a imóveis e disciplina a forma e os
efeitos da publicidade das situações jurídicas imobiliárias”. Nesta definição,
“inscrição” tem sentido amplo, que abrange, no Direito Brasileiro, a matrícula (ou,
mais especificamente, o ato de matricular), o registro e a averbação. “Título”
também é adotado em sentido genérico, como a enunciação de uma causa da
aquisição ou oneração do direito real sobre o imóvel. A “forma”, segundo o autor,
diz respeito ao modo que o registro leva ao conhecimento do público o conteúdo
de seus assentos, o que pode se dar, por exemplo, pela consulta aos livros, em
alguns sistemas; ou, mais comumente, pelo fornecimento mediado pelo registrador
de informações verbais, ou, ainda, pela emissão de certidões. E, finalmente, os
“efeitos” são aqueles gerados a partir da publicação do direito registrado, que
podem variar: em alguns casos, podem ser de mera notícia (ou seja, que não
agregam qualquer eficácia ao ato), em outros podem ser declarativos (ou seja, que
geram efeitos perante terceiros, não obstante o ato já fosse eficaz entre as partes),
ou ainda podem ser constitutivos (ou seja, sem os quais o ato não é eficaz nem
mesmo entre as partes). Além do sentido normativo, o autor ainda apresenta um
sentido objetivo para o Direito Registral Imobiliário, advertindo que a confusão do
sentido objetivo com o sentido normativo resulta dos “preconceitos do positivismo
jurídico-legalista”. Assim, em sentido objetivo, o Direito Registral Imobiliário tratar-
se-ia dos “muitos atos, como sejam as várias etapas do procedimento de inscrição,
o efeito da publicidade correspondente, sua certificação, a isso ligando-se as
correlatas faculdades que identificam o direito registral imobiliário no plano
subjetivo”.

Desse modo, em suma, o Direito Registral Imobiliário abrange normas


procedimentais – o direito formal, que, no Direito Brasileiro, é disciplinado
majoritariamente pela Lei 6.015, de 1973, mas também em outros diplomas legais,
por exemplo, a execução extrajudicial da alienação fiduciária em garantia, na Lei
9.514, de 1997 – e, paralelamente, normas substantivas que tratam dos efeitos do
registro – o direito material, que, no Brasil, é disciplinado majoritariamente pelo
Código Civil, mas também em outros diplomas, como a fé pública registral que foi
prevista na Lei 13.097, de 2015. Esta é a summa divisio deste ramo do direito: de
um lado, os aspectos técnicos do registro, como sua organização, livros e
procedimentos – ou seja, a mecânica do registro, regulamentada por normas de
direito administrativo, e o sistema de aquisição de posições registrais. Tal é o
direito formal. De outro lado, a eficácia que decorre da aquisição da posição
registral, gerando efeitos processuais – vantagens deferidas pela legislação ao
titular da posição registral –, bem como materiais, de direito civil20.

Tem, portanto, o Direito Registral Imobiliário um objeto com uma dupla face:
normas que tratam da organização e do funcionamento do próprio registro, que,
em grande parte, são dirigidas ao registrador, e normas que tratam dos efeitos
jurídicos advindos deste e das posições jurídicas assumidas pelas partes.

Essa dicotomia remonta ao Direito Prussiano do século XVIII, no qual, em


1783, foi editada a Allgemeine Hypothekenordnung, Lei geral hipotecária tratando
dos aspectos do direito formal do registro, e, em 1794, a Allgemeine Landrecht für
die Preussischen Staaten, Lei geral para os estados prussianos que continha,
entre muitos outros temas, aspectos do direito imobiliário material, como a origem
e a transmissão dos direitos reais21.

Uma boa maneira de se vislumbrar a distinção está nos prazos estabelecidos


para o procedimento de registro e para a validade da prenotação. O artigo 205 da
Lei 6.015, de 1973, prevê que cessarão automaticamente os efeitos da prenotação
se, decorridos trinta dias do seu lançamento no protocolo, o título não tiver sido
registrado por omissão do interessado em atender às exigências legais. Por outro
lado, o artigo 188 determina que, como regra, o registro será feito no prazo de
trinta dias contados do protocolo. A despeito de enunciarem o mesmo prazo –
trinta dias – as duas regras contêm conteúdos e destinatários diferentes. Se, por
um lado, o artigo 205 contém uma norma de direito material, cuja infração
repercute no próprio direito material de prioridade concedido à parte pela
prenotação, em relação direta com o artigo 1.246 do Código Civil, por outro o artigo
188 enuncia regra de direito formal, dirigida ao registrador, e cuja infração pode
resultar em sanções disciplinares. Assim, pode-se pensar em normas
administrativas validamente editadas por órgãos correcionais tratando deste prazo
formal, para, por exemplo, reduzi-lo; mas jamais para tratar do prazo do artigo 205,
cuja alteração, por afetar o direito material da parte, somente poderia ocorrer por
meio de lei.

A exposição do desenvolvimento do registro no Brasil e no mundo buscará


prestigiar estes dois aspectos: a organização formal do registro e os efeitos por ele
produzidos em cada etapa do desenrolar do processo histórico.
1

Nota Prévia: Em cada página, as referências conterão todos os dados da obra citada, sendo o
prenome do autor apresentado em primeiro lugar, seguido do patronímico (v.g., “Fustel. de
Coulanges, A Cidade Antiga: Estudo sobre o Culto, o Direito, as Instituições da Grécia e de Roma,
São Paulo, Hemus, 2000”), ressalvadas as hipóteses dos autores espanhóis (em que o
patronímico não ocupa a última posição). Já na bibliografia, o sobrenome pelo qual o autor é
conhecido será sempre grafado em maiúsculo, de forma anteposta a seu prenome ou sobrenomes
intermediários.
2
O Código Civil Brasileiro de 2002 prescreve a necessidade da escritura pública para os negócios
jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre
imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País (art. 108). Ainda,
reafirma a eficácia constitutiva do registro nas transferências entre vivos (art. 1.245).
3

Cf. L. 6.015/73, art. 1º; L. 8.935/94, art. 1º.


4

Cf. Victor Ehrenberg, Rechtssicherheit und Verkehrssicherheit, mit besonderer Rücksicht auf das
Handelsregister, in, Jherings Jahrbücher (47) (1904).
5

Cf. Victor Ehrenberg, Rechtssicherheit und Verkehrssicherheit, mit besonderer Rücksicht auf das
Handelsregister, in, Jherings Jahrbücher (47) (1904).
6

Cf. Victor Ehrenberg, Rechtssicherheit und Verkehrssicherheit, mit besonderer Rücksicht auf das
Handelsregister, in, Jherings Jahrbücher (47) (1904).
7

Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica del Derecho de Propiedad
Privada e Ingeniería Jurídica del Intercambio Personal, 1a Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, p.
119.
8

Cf., e.g., Maria Helena Leonel Gandolfo, O Direito Registral Imobiliário Brasileiro – Princípios
Gerais, in, Registro de Imóveis: Estudos de Direito Registral Imobiliário – XXVII Encontro de
oficiais de registro de imóveis do Brasil – Vitória/2000, Porto Alegre, SAFe, 2002; R. DIP, Do
Conceito de Direito Registral Imobiliário, in, Registro de Imóveis (Vários Estudos), Porto Alegre,
Safe, 2005, p. 49.
9

Cf. José Luís Lacruz Berdejo; Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario
Registral, 2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 20.
10

Cf. Fritz Baur, Sachenrecht, 17a Ed., Munique, Beck, 1999, p. 144.
11

Cf. Hans Josef Wieling, Sachenrecht, 5a Ed., Berlin, Springer, 2007, pp. 267 e 279.
12

Cf. Jan Wilhelm, Sachenrecht, 2a Ed., Berlin, Walter de Gruyter, 2002, p. 214.
13

Cf. Emmanuel Besson, Les livres fonciers et la réforme hypothecaire – Étude historique et critique
sur la publicité dés transmissions immobiliéres em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. Ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 4.
14

Cf. Emmanuel Besson, Les livres fonciers et la réforme hypothecaire – Étude historique et critique
sur la publicité dés transmissions immobiliéres em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. Ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 87-89.
15

A discussão sobre a natureza e efeitos da posse, assim como das ações possessórias, é intensa e
longeva. Nesta distinção, acompanha-se o entendimento de MOREIRA ALVES que, com base no
proposto por BONFANTE, considera a posse um fato, e não um direito (Cf. José Carlos Moreira
Alves, Direito Romano (História do Direito Romano – Instituições do Direito Romano: A) – Parte
Geral; B) Parte Especial: Direito das Coisas), Vol. I, 13ª. Ed., Rio de Janeiro, 2000, p.262). A
despeito disso, o Código Civil de 2002 não inclui a posse no rol dos direitos reais. Ainda, no Brasil,
como regra, não ingressa no Registro de Imóveis, por sua natureza e falta de previsão legal no
elenco de direitos registráveis da Lei 6.015/73, bem como, no passado, dos Decretos 18.527, de
1928 e 4.857, de 1939, e da Lei 1.237, de 1864, e regulamento. Ressalte-se, todavia, que nas
últimas décadas a posse passou a excepcionalmente ser suscetível de ingresso no registro no
caso da imissão provisória na posse em favor da União, estados, Distrito Federal e Municípios, ou
suas entidades delegadas (Lei 6.015/73, artigo 167, I, 36), ou com o fim de ser convertida em
propriedade nos procedimentos de regularização fundiária (Lei 6.015/73, artigo 167, I, 43).
16

Todos presentes na Lei de Registros Públicos – Lei 6.015/1973 e na Lei 8.935/1994.


17

Cf. José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario
Registral, 2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 21.
18

Cf. José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario
Registral, 2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 21.
19

Cf. Ricardo Dip, Do Conceito de Direito Registral Imobiliário, in, Registro de Imóveis (Vários
Estudos), Porto Alegre, Safe, 2005, pp. 40-42.
20

Cf. José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario
Registral, 2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 22. Importante notar que os autores afirmam que, no
Direito Espanhol, a aquisição da posição registral não se confunde com a aquisição do direito
material: a primeira se dá por uma relação entre a pessoa privada e a autoridade exercente da
jurisdição voluntária – o oficial do registro; e a segunda ocorre entre pessoas privadas. O raciocínio
não se aplica ao direito brasileiro contemporâneo, no qual a propriedade imóvel, o próprio direito
material, não se adquire por força do contrato, mas sim pelo registro. Por outro lado, esta sujeição
ao registro da aquisição do próprio direito material torna bastante evidentes os efeitos do chamado
“direito registral imobiliário material”, mais do que na Espanha. Tal ocorre porque, como se verá,
desde o Código de 1916 o Brasil adota um sistema cujo direito material tem matriz no direito
germânico. E foi a Alemanha o berço da distinção entre direito formal e material do registro. O
critério é aplicável a outros sistemas, e esta filiação não é plena; mas, em geral, tem-se o direito
alemão como ponto de referência. Sobre isto, cf. Miguel Maria Serpa Lopes, Tratado dos Registros
Públicos, vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp 43-50; Soriano Neto, Publicidade
Material do Registro Immobiliário (Efeitos da Transcripção), 1ª. Ed., Recife, 1940, p. 57.
21

Cf. Vincent Nossek, Das Konzept “Grundbuch”, 1ª Ed., Tübingen, Mohr Siebeck, 2019, p. 13.
CAPÍTULO 1. O REGISTRO DE IMÓVEIS E A PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA
CAPÍTULO 1. O REGISTRO DE IMÓVEIS E A PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA

Capítulo 1. O registro de imóveis e a publicidade


imobiliária
Nos modernos sistemas de registros de direitos, os assentos registrais não se
limitam a refletir ou a publicar processos transmissivos consumados fora deles,
extrarregistralmente, mas, antes, integram o próprio processo transmissivo. O
Estado, nos países em que vigora a fé pública registral, limita a possibilidade de
reivindicação do imóvel, e, por meio de uma instituição criada especificamente
para publificar 1 direitos sobre imóveis – que é o registrador, em seu vários regimes
jurídico-administrativos – assinala ex ante a titularidade dos direitos reais
imobiliários e seus limites2.

Ou seja, havendo fé pública registral, fica o terceiro adquirente de boa-fé


protegido contra a reivindicação do bem por pessoas que tenham sido
supostamente prejudicadas por um defeito anterior na cadeia de transmissões. E
isto é a limitação da possibilidade de reivindicação. Ainda, torna-se desnecessário
investigar todo o plexo de relações jurídicas presentes e passadas para que se
saiba quem é o titular do bem e em que condições: os direitos reais sobre o bem
específico são aqueles que constam do registro, em favor de quem o registro
indica, e com as limitações também constantes do próprio registro.

Já nos sistemas de registros de documentos, também presentes na


modernidade, a simples publicidade de documentos que contenham atos e
contratos que possam ter efeitos transmissivos sobre o bem, pressupõe a
manutenção de uma regra de reivindicabilidade ilimitada, cujos efeitos negativos
para a segurança jurídica são apenas amenizados pelo registro. Estes sistemas se
limitam a arquivar em ordem cronológica os documentos apresentados. Estes
arquivamentos não compõem o processo transmissivo, mas apenas refletem
processos transmissivos que ocorreram – ou supostamente ocorreram – fora do
registro. Com isso, não contêm nenhuma declaração do Estado acerca da
titularidade e da extensão dos direitos reais imobiliários3.

Em outras palavras, o registro não protege o terceiro adquirente de boa-fé


contra a possibilidade de reivindicação do bem por pessoas que tenham ocupado a
posição de titular em elos anteriores na cadeia filiatória, ou mesmo por
desconhecidos. E isto é a reivindicabilidade ilimitada. Ainda, a publicidade torna
acessíveis alguns dos documentos que possam ter instrumentalizado atos acerca
do imóvel. Estes documentos podem ser válidos ou não, e podem ser eficazes ou
não, não cabendo ao registro avalizar qualquer um deles. Não há uma afirmação
pelo Estado acerca da titularidade do bem, apenas uma divulgação de titularidades
possíveis.

É fundamental à constituição da titularidade real a sua oponibilidade a terceiros,


e mesmo nos sistemas em que o registro não é constitutivo do direito real em si,
cabe à publicidade agregar eficácia erga omnes a situações jurídicas que, de outro
modo, somente teriam eficácia inter partes. Os fatos registrados presumem-se
conhecidos, e, por isso, são oponíveis a terceiros; os fatos não registrados
presumem-se não conhecidos, e, por isso, não são oponíveis a terceiros4.

No entanto, mesmo nesses sistemas, o registro gera algum efeito, ainda que
por exclusão: a regra negativa da inoponibilidade, ou seja, de que os efeitos do
negócio não são oponíveis a terceiros sem o registro; do que decorre
necessariamente um segundo efeito, de preferência: havendo dois negócios
contraditórios entre si sobre o mesmo bem, tem preferência aquele registrado em
primeiro lugar, já que o outro – não registrado –, ainda que firmado em data
anterior, não projetava seus efeitos contra quem dele não fosse parte. Este é o
“efeito relativo” da publicação no Sistema Francês5.

Um direito real vale mais do que um direito pessoal cujo conteúdo econômico
seja o mesmo – por exemplo, o gozo de um certo bem – porque os direitos reais
permitem que o exercício de suas faculdades seja exigido em cumprimento
forçado, de maneira mais fácil do que os direitos pessoais. Veja-se, por exemplo, o
usufruto e a locação sem efeitos reais quando confrontados com a situação de o
bem vir a ser vendido a um terceiro; ou a locação, com ou sem efeitos reais, na
mesma situação. Ainda que a locação sem efeitos reais possa permitir algum tipo
de compensação financeira ao locatário pelo locador que vendeu o bem, o direito
real, ou o direito pessoal com eficácia real, permitem a manutenção do vínculo com
a coisa. O mesmo ocorre com as garantias6.

Dessa maneira, a despeito de os sistemas de registro de direitos modernos não


terem a publicidade como sua finalidade, mas sim como uma de suas ferramentas,
o princípio permanece sendo um dos pilares do registro. E, para isso, será,
necessariamente, uma publicidade qualificada.

A publicidade, tecnicamente, pode ser definida como um sistema de


declarações dirigidas a assinalar as mutações das situações jurídicas privadas no
interesse genérico de todos os cidadãos. Não se presta a atingir pessoas
determinadas, mas sim a quem quer que seja, em abstrato. Assim, em geral, tem
por objeto aqueles direitos que demandam, no mínimo, um dever geral de
abstenção por terceiros, que é o caso dos direitos reais. Mas também se aplica a
direitos obrigacionais cuja eficácia se pretenda ampliar para além das partes, como
é o caso dos contratos de locação para fins de sua vigência7.

É um atributo da publicidade imobiliária moderna a presunção de conhecimento


pelo público dos dados que são publicitados – ou publificados, na concepção de
Fernando Mendez González – pelo registro, presunção esta que, em quase todos
os sistemas modernos, é absoluta e inilidível. Não obstante nem sempre seja
possível concretamente que o fato seja conhecido por alguém que tenha nele
interesse, a admissão da prova em contrário faria ruir a segurança jurídica que se
pretende produzir com o sistema registral. Ninguém pode pretender que um certo
fato registrado não lhe seja oponível em razão de dele não ter tido conhecimento
real8.
Com efeito, há situações em que o Direito tutela o sigilo, caso em que
determina o desconhecimento de algo; outras situações – na verdade a maioria
delas – em que o conhecimento ou desconhecimento de um fato é juridicamente
indiferente; e outras situações nas quais o que se determina é a necessidade de
conhecimento de algo, ou da possibilidade deste conhecimento. Para que seja
atingido este último fim, o Direito dispõe de alguns instrumentos, como as
notificações, a realização de publicações e a publicidade9. A notificação e a
publicidade aproximam-se por se tratarem ambas de procedimentos destinados a
levar ao conhecimento de alguém algum fato; no entanto, as semelhanças
terminam aí. A notificação dá lugar a um procedimento dinâmico, caracterizado por
um movimento conduzido a uma certa direção. Ainda, caracteriza-se por sua
especificidade – seja por atingir pessoa específica, seja por dizer respeito a um
fato específico – e por se tratar de um evento episódico, que tende a exaurir-se no
âmbito do próprio impulso que lhe deu causa. Já a publicidade se dá por um
procedimento estático, caracterizado pela predisposição permanente e ininterrupta
de um determinado mecanismo. Tem, com isso, um caráter geral e permanente,
renovando-se a cada vez que sua atuação é solicitada. Quanto à publicação, em
diário oficial, por exemplo, esta se destina à generalidade das pessoas, como a
publicidade; mas tem origem em um movimento, como a notificação. Ainda, tem
um caráter episódico, e não permanente. Finalmente, a notificação tem em vista
provocar o conhecimento efetivo do fato pela pessoa a quem dirigida; a publicação
tem por finalidade ocasionar ou facilitar esse conhecimento; e a publicidade
funciona por um mecanismo especial, revestido de atributos próprios10.

Tem aqui um papel fundamental a cognoscibilidade. O conhecimento de um


certo fato é sempre algo individual. Quem conhece efetivamente é o indivíduo, e
não a coletividade, que é um ente abstrato11.

A publicidade torna possível o conhecimento de certos fatos, ou seja, produz


cognoscibilidade legal. Esta cognoscibilidade gera uma situação objetiva e geral,
derivada da possibilidade fática e jurídica de se buscar a informação em questão.
A situação geral e objetiva que presume o conhecimento é legal, ao passo que a
possibilidade de se buscarem as informações depende de condições jurídicas e
fáticas. Dela resulta uma espécie de “autorresponsabilidade” geral relativa à
própria ignorância daquele que se omite na busca das informações nos registros
públicos, cabendo-lhe suportar os prejuízos desta omissão12.

Também é um atributo da publicidade imobiliária moderna gerar oponibilidade


dos direitos registrados. Os diferentes sistemas jurídicos estabelecem marcos
temporais distintos para o início desta oponibilidade. Nos sistemas em que o
registro é constitutivo, a data da oponibilidade confunde-se com a data em que o
direito surge – a data do registro13 –, não obstante possa a lei determinar que estes
efeitos retroajam ao protocolo, como ocorre no Direito Brasileiro (Código Civil
Brasileiro, artigo 1.246).

A publicidade também projeta seus efeitos quanto a fatos que estão fora do
registro, e isso constitui seu aspecto negativo: os fatos sujeitos a registro, e não
registrados, são inoponíveis a terceiros14.
Nos sistemas em que o registro é constitutivo isto é uma obviedade: se o direito
real nem mesmo chegou a constituir-se (ou seja, nem mesmo chegou a existir
como direito real – a questão se dá no plano da existência), evidentemente não
poderá produzir qualquer efeito de direito real, não obstante relações jurídicas do
plano obrigacional possam restar preservadas.

Já nos sistemas em que o registro é declaratório, grande complicação envolve


saber quem são estes “terceiros” a quem o direito não se opõe, já que a alguém o
direito será oponível. É vasta a literatura sobre o “terceiro registral” em qualquer
país em que o registro não seja constitutivo.

Ainda quanto à inoponibilidade, é também fundamental a questão da


determinação de quais fatos são inoponíveis por falta de registro. De maneira
geral, estes fatos são previstos nas leis registrais; mas há invariavelmente
situações de conflito.

Por fim, sobre a inoponibilidade, os sistemas em que o registro é declarativo


contam com mais um problema: o dos terceiros que estão cientes acerca do fato,
ainda que este não tenha sido registrado. Para alguns também a presunção de
ignorância é absoluta; para outros não, podendo o interessado demonstrar a
ciência concreta – e, portanto, a má-fé – de um determinado terceiro, quando o
fato não está registrado. Quanto aos registros de imóveis, em regra a legislação
dos vários países inclina-se pela presunção absoluta também neste caso15.

É natural que um sistema de registro de imóveis que pretenda fornecer ao


público informações com presunção absoluta de conhecimento por todos dependa
do estabelecimento não apenas de leis que o amparem, como também,
principalmente, de um arranjo institucional sofisticado.

Um sistema de alcance limitado, regido por regras pouco claras, ou inacessível,


por um lado, aos direitos que os interessados queiram publicitar, ou, por outro, ao
escrutínio do público que queira obter informações sobre eles, que pretenda gerar
a oponibilidade dos direitos registrados, a inoponibilidade dos direitos não
registrados e a presunção absoluta de conhecimento de seu conteúdo, fatalmente
gerará injustiças.

Tenha-se em vista, sempre, que a publicidade registral tal como concebida


modernamente tem características muito próprias: não apenas gera notícias sobre
a existência de direitos, mas também produz efeitos jurídicos16. Por essa razão, um
ofício de registros não é apenas uma biblioteca na qual são depositados livros que
tratam de imóveis. Mais do que isso, são geradores permanentes de efeitos
jurídicos que valem contra todos.

É importante, neste ponto, distinguir a chamada publicidade formal do registro


da publicidade material do registro. A publicidade formal (formelle Publizität)
consiste no direito de “inspeção” do registro, ou seja, de obtenção das informações
nele contidas. Já a publicidade material (materielle Publizität) diz respeito aos
efeitos do registro no tráfego jurídico17, notadamente a legitimação e a fé pública
registral.
Dessa maneira, ao longo da História do Direito, muitos foram os sistemas de
publicidade imobiliária que, se, por um lado, contribuíram para o fluxo do crédito
imobiliário ou para a segurança das transações imobiliárias, ao fornecerem alguma
informação sobre a situação jurídica dos imóveis, por outro, de maneira geral, não
tiveram a ousadia de gerar uma publicidade qualificada, isto é, revestida dos
efeitos já apontados por Carlos Ferreira de Almeida.

Muitas das solenidades encontradas entre os povos antigos nas transações


imobiliárias parecem ter como finalidade mais a autenticidade dos atos do que sua
publicidade. E ainda que seja produzido um documento autêntico – por exemplo,
por um notário – e que a autenticidade seja essencial para a certeza e segurança
dos atos jurídicos, o ato autêntico mantém o conhecimento sobre o ato no âmbito
restrito das partes. Assim, permanece a necessidade de sua publicitação18.

Assim, essas solenidades, muitas vezes, geravam uma publicidade de fato,


mas não de direito. E esta distinção é importante, já que somente a publicidade de
direito está dotada da cognoscibilidade legal.

Cadastros imobiliários e arquivos notariais, por exemplo, são repositórios de


informações relevantes e fundamentais à consecução de seus respectivos fins.
Mas, em que pese estas informações, de maneira geral, estarem disponíveis ao
público e poderem dizer respeito a imóveis, esta publicidade é uma publicidade
imobiliária de fato19.

A publicidade imobiliária de direito apenas se atinge mediante a criação de uma


instituição destinada a realizar o registro imobiliário revestida dos atributos já
apontados, de maneira a produzir certos efeitos de caráter jurídico e impedir que a
clandestinidade perturbe o fluxo regular dos negócios imobiliários.

Como se verá, instituições com essas características somente surgem em


sociedades com um grau avançado de socialidade e sofisticação de suas
instituições.
1

Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica del Derecho de Propiedad
Privada e Ingeniería Jurídica del Intercambio Personal, 1a Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, p.
117.
2

Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica del Derecho de Propiedad
Privada e Ingeniería Jurídica del Intercambio Personal, 1a Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp.
117-118.
3

Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica del Derecho de Propiedad
Privada e Ingeniería Jurídica del Intercambio Personal, 1a Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, p.
119.
4

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, p. 253.
5
Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica del Derecho de Propiedad
Privada e Ingeniería Jurídica del Intercambio Personal, 1a Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp.
119-120.
6

Benito Arruñada, Instituciones del intercambio impersonal: Teoría y método de los registros
públicos, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2013, pp. 46-47.
7

Cf. Renato Corrado, La Pubblicità Nel Diritto Privato, Vol. I, 1ª Ed., Turim, Giappichelli, 1947, pp.
44-45.
8

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, p. 253.
9

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 29.
10

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 379-380.
11

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 8.


12

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 382-383.
13

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, p. 255.
14

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, p. 260.
15

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, pp. 274-275.
16

Cf. José Augusto Guimarães Mouteira Guerreiro, Publicidade e Princípios do Registo, in, Temas de
Registos e de Notariado, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2010, p. 18.
17

Cf. Vincent Nossek, Das Konzept “Grundbuch”, 1ª Ed., Tübingen, Mohr Siebeck, 2019, p. 4.
18

Cf. José Augusto Guimarães Mouteira Guerreiro, Publicidade e Princípios do Registo, in, Temas de
Registos e de Notariado, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2010, p. 17.
19

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 277-278.
CAPÍTULO 2. ANTECEDENTES DA PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA ENTRE OS POVOS DA
ANTIGUIDADE
CAPÍTULO 2. ANTECEDENTES DA PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA ENTRE OS POVOS DA
ANTIGUIDADE

Capítulo 2. Antecedentes da publicidade imobiliária


entre os povos da antiguidade

2.1. Introdução

É frequente que um estudioso que se debruce sobre certo instituto jurídico


busque suas origens históricas, o que pode ser bastante proveitoso e esclarecer as
circunstâncias concretas em que aquele feixe de normas foi produzido. Alguns
cuidados devem ser tomados, contudo.

Ao tratar da publicidade imobiliária no sentido de uma instituição destinada a


levar ao conhecimento do público a situação jurídica dos imóveis, e que gera
algum grau de inoponibilidade daquilo que não foi registrado, deve-se ter em vista
que este fenômeno é, eminentemente, moderno. Nesse sentido, Coviello esclarece
que esta concepção contemporânea dada à publicidade imobiliária é mais jovem
do que parece1.

Um erro comum, para o autor, é o de se confundir a aparência externa de


alguns atos com a sua finalidade, atribuindo-se a este ato uma finalidade moderna
e anacrônica tão somente em virtude da compreensão que contemporaneamente
se tem das necessidades do tráfego jurídico. É fato que há formas solenes de
transmissão da propriedade muito antigas, realizadas em público, e que foram
sendo flexibilizadas gradativamente com o passar dos tempos. Mas, é importante
que se diga desde já, estas formas arcaicas não tinham como escopo dar
publicidade aos atos, ou, mais ainda, à situação jurídica da coisa objeto do
negócio, e, por conseguinte, gerar oponibilidade a terceiros.

A instituição da publicidade imobiliária como veículo da constituição ou eficácia


de direitos reais sobre imóveis pressupõe uma civilização avançada, com um
avançado sentido de socialidade, que enxerga na confiança gerada pelo registro –
e mesmo em juízes que, em última instância, farão valer os direitos registrados –
um mecanismo de se garantir a segurança da circulação da propriedade e do
crédito imobiliário.

O caráter e a natureza do sistema de registros públicos de terras, e as formas


de publicidade imobiliária, são um valioso indicador do tamanho e da complexidade
de uma sociedade, e do nível de desenvolvimento de sua economia e de seu
direito. Isto vai desde a confiança primitiva no conhecimento de vizinhos,
atualizado pela prática de rituais quando ocorriam transações sobre imóveis, até a
sofisticada rede de registros de direitos do mundo moderno2.
A memória de cada indivíduo funciona, de certo modo, como um registro de
direitos nos contextos de contratações pessoais, em que os atores da vida
econômica se conhecem bem, e nos quais as transações imobiliárias são
escassas. Os indivíduos que vivem nesse contexto conhecem os imóveis, seus
limites, suas características, as circunstâncias dos poucos negócios que são
realizados, e, em especial, quais são os direitos – e seus titulares – que recaem
sobre a terra. O nível de informação entre os atores econômicos é alto, e são
pequenas as chances de engano, bem como a desconfiança recíproca.
Caracterizam estes contextos a produção em pequena escala, o comércio local, a
homogeneidade cultural, e, na prática, a desnecessidade de que terceiros
possibilitem o cumprimento forçado das obrigações. Os direitos são seguros e
líquidos, e assim viveu a humanidade na maior parte de sua história econômica3.

O caráter pessoal dos intercâmbios é um atributo mais ou menos constante em


função da natureza mais ou menos pessoal das garantias estabelecidas para
assegurar o adimplemento. E a natureza das garantias afeta a necessidade de
informações que as partes precisam obter antes de decidirem obrigar-se. A maioria
dos intercâmbios estabelecidos entre pessoas que se conhecem são pessoais, já
que se assentam em seu mútuo conhecimento e na expectativa de intercâmbios
futuros. Mas serão também pessoais muitos intercâmbios entre desconhecidos se,
pela natureza das garantias, for necessário obter informações sobre a
probabilidade do cumprimento da obrigação, como sua reputação, antecedentes
etc. Ainda, também são pessoais os intercâmbios cujas garantias são prestadas
por terceiros – mesmo que se trate de intermediários especializados, como
bancos, entidades securitizadoras, auditores etc. – quando forem baseados na
reputação do garantidor, ou em um relacionamento entre ele e seu cliente. E
também são pessoais os intercâmbios em que a garantia se dá por meio de
responsabilidade comunitária, na qual todos os membros do grupo respondem pelo
comportamento de cada um deles – como ocorria, por exemplo, na Idade Média,
entre os comerciantes de uma determinada cidade. A despeito de isto permitir a
contratação com estranhos, o intercâmbio também será feito com base em
informações pessoais que permitam saber a que grupo o indivíduo pertence, e se o
grupo é confiável4.

São ilustrativas sobre este ponto as seculares práticas consuetudinárias da


Albânia, que continuaram em vigor mesmo sendo reprimidas durante os anos de
comunismo. Estas práticas, implícitas no cotidiano das regiões em que vigoram,
mantiveram-se em paralelo às estruturas estatais, e experimentaram um
ressurgimento após o fim do regime comunista, especialmente nos anos 19905. A
fonte principal do Direito Costumeiro Albanês são as compilações chamadas
kanuns, que comportam variações de região a região do país. Dentre as
compilações mais famosas estão o kanun de Lekë Dukagjini, em vigor nos Alpes
Albaneses; o kanun de Scanderbeg, em vigor no vale do Rio Mat; e o kanun de
Dibra, em vigor na região de mesmo nome. Um primeiro aspecto intimamente
ligado às circunstâncias de um intercâmbio pessoal diz respeito ao direito de
preferência, ou preempção, concedido aos parentes em caso de venda de bens
imóveis. Segundo o kanun de Lëke, primos, irmãos e outros parentes do vendedor,
assim como confrontantes da gleba vendida, e outros membros da comunidade a
que pertencia o vendedor tinham preferência na aquisição, com graus distintos
entre si. Somente se nenhum destes tivesse interesse na aquisição a terra poderia
ser vendida a um estranho. Os kanuns de Scanderbeg e Dibra iam além, prevendo
que o preço da venda ao parente deveria ser um pouco inferior ao da venda a
estranhos. O procedimento da venda é pitoresco: segundo o kanun de Lekë, o
procedimento de venda e transmissão somente se considera completo, sob pena
de invalidade, quando o alienante oferece raki (aguardente de uva), ou café aos
presentes na ocasião do negócio. O kanun de Scanderbeg exige, além do
consumo de café, que sejam pronunciadas as palavras sacramentais “que você
aprecie a terra”, e que tudo isso seja feito na presença de outras pessoas: se a
venda for feita a uma pessoa próxima, seus parentes e o patriarca de sua família, a
quem se deve presentear com um quilograma de café; se a venda for feita a algum
estranho, deve o comprador oferecer um almoço ou jantar ao vendedor e sua
família, e presentear o patriarca da família do vendedor com um carneiro. O kanun
de Dibra prevê expressamente que “nenhuma terra é vendida sem café”, que deve
o adquirente oferecer aos presentes um almoço ou jantar, e que após a cerimônia
de venda deve haver uma dança integrada por homens de todas as idades, a qual
serve de meio de prova de que as partes seguiram o costume prescrito para o
negócio6.

Sistemas mais sofisticados de publicidade imobiliária se tornam necessários


quando aumenta o número de pessoas e a quantidade de transações. Já não é
mais possível que todos se conheçam, nem que todos tenham conhecimento de
todas as transações imobiliárias. Quando esta complexidade se torna tal que as
contratações se tornam impessoais, os distintos direitos sobre os imóveis – que se
avolumam em cadeias de relações jurídicas – não mais estão gravados na
memória das pessoas. A informação, então, torna-se cada vez mais incompleta,
trazendo incertezas para as partes das transações imobiliárias. Torna-se, então,
necessária uma intervenção de um terceiro – o Estado – para normativa e
institucionalmente dotar o mercado de mecanismos que solucionem as incertezas
jurídicas. E nisto consistem os registros de direitos7.

As solenidades antigas, segundo o mesmo Coviello, tinham uma razão de ser


mais metafísica do que prática, oriunda daquilo que o autor denomina uma “falta
de capacidade de abstração dos povos antigos, os quais não concebiam a
possibilidade de uma transmissão ideal de direitos”. Ainda segundo o autor, estes
povos confundiam direito (por exemplo, o direito de propriedade) e seu objeto (por
exemplo, uma área de terras), materializando o direito, o qual, em princípio, é um
ente ideal, na coisa concreta sobre a qual incide8.

Em que pese o cronocentrismo do autor, as relações entre direito e magia nas


sociedades antigas, assim como a inspiração metafísica de muitos institutos
jurídicos, são conhecidas. As trocas simbólicas, e a tradição simbólica de certos
objetos sem valor como parte integrante de uma solenidade destinada a produzir
efeitos jurídicos – como o nexum romano, ou o wadium do antigo direito germânico
– remontam às antigas dádivas obrigatórias, que criavam uma ligação metafísica,
sancionada magicamente, entre as partes da troca. Os objetos entregues – tidos
como animados, e portadores de um espírito próprio – criavam esta vinculação9. O
vínculo não surgia da intenção das partes, mas da própria coisa entregue. Isto
explicaria, por exemplo, no Direito Romano, o funcionamento dos contratos reais,
que somente se aperfeiçoam pela entrega da coisa, como também a prevalência
da traditio como modo de aquisição10; e no antigo Direito Germânico, a
necessidade de cauções em contratos de compra e venda, empréstimo ou
depósito na qual a coisa oferecida – em geral, pessoal de quem a entrega,
simbólica e de pouco valor, como uma luva, uma moeda, uma faca – servia como
um “refém”, carregando consigo algo da individualidade de quem a ofereceu11.

Ademais, uma segunda razão histórica havia para a importância dada às


formas solenes. Nos primórdios das civilizações indo-europeias, a propriedade do
solo era coletiva, cabendo como um todo à família ou à comunidade. Ainda não se
concebia a apropriação de partes do solo terrestre por indivíduos12.

Esclarece Max Weber que a própria palavra fundus, que, na época da Roma
Imperial, designava terrenos que atendessem certos requisitos, tinha, em sua
origem, um sentido de pertencimento do indivíduo a uma coletividade13.

Quando um grupamento humano atingia certo número de habitantes, e o


espaço e recursos naturais se tornavam insuficientes, era natural a busca por
novos ambientes, em especial por aqueles que fossem mais aconchegantes, que
tivessem terras mais férteis, que, em suma, oferecesse melhores chances de
sobrevivência. Isto por vezes provocava choques com grupamentos que já viviam
no local escolhido. Uma vez ocupado o território, este passava a ser possuído
coletivamente pela tribo invasora. Assim, dentro de uma mesma tribo, não havia
proprietários individuais. Todavia, entre tribos distintas não havia qualquer espécie
de comunidade: cada tribo, ou cada grupamento, defendia sua posse exclusiva
sobre o território das demais14.

Acompanhava este caráter coletivo da terra o atributo de sua inalienabilidade.


Porém, com a progressiva prevalência da propriedade individual, foi se tornando
possível, em alguns casos, a alienação, mediante a observância de precauções e
regras severas. Por essa razão as formas eram rígidas, as alienações eram
difíceis, e se preservava de certa forma o aspecto coletivo da propriedade15.

Novamente, não havia, a princípio, uma preocupação com a publicidade da


situação jurídica dos bens, mas sim uma renovação da soberania coletiva sobre a
terra.

Com tudo isso, conclui Coviello que a observação dos povos antigos deixa
claro que não há um vínculo histórico linear que encadeie estes costumes e o
moderno sistema de publicidade16. Não se deve ir tão longe. Como afirma
Salvatore Pugliatti, identificam-se nos sistemas arcaicos gérmens dos modernos
sistemas, cujo estudo permite uma melhor valoração daquilo que se tem na
contemporaneidade. Adotar uma compreensão demasiado técnica e restrita do
fenômeno da publicidade imobiliária como parâmetro – seja a de uma
compreensão doutrinária compreensiva dos vários sistemas modernos, ou, por
outro lado, a de um sistema jurídico específico que esteja em vigor – impediriam
qualquer pesquisa útil neste campo17.

Uma vez que estes costumes são, ainda que por simples analogia,
relacionados com os modernos sistemas de transmissão imobiliária, e podem
trazer luzes sobre o funcionamento do tráfico imobiliário em geral, deles se tratará
adiante.
Note-se, contudo, desde já, que, como adverte Salvatore Pugliatti, as fontes
primárias são escassas, e de maneira geral à modernidade somente chegaram
indícios de práticas e costumes análogos ao que conhecemos por publicidade
imobiliária18. Assim, a análise é inafastavelmente fragmentária e sem pretensões
de qualquer sistematização ou completude.

2.2. A publicidade imobiliária entre os antigos hebreus

Há, na Bíblia, certas passagens que tratam de negócios que envolvem imóveis,
nas quais se pode perceber preocupação, no mínimo, com a reafirmação da
soberania coletiva sobre a terra, ainda que se trate de uma soberania “familiar” –
entendendo-se a família aqui como uma coletividade hierarquicamente superior ao
indivíduo19.

A propriedade permanecia sempre ligada à família que primeiramente a havia


recebido. Por conta da regra dos anos de jubileu, a cada cinquenta anos
propriedades alienadas ou hipotecadas retornavam ao domínio da família alienante
ou hipotecante, pelo que a propriedade valia tanto mais quanto mais distante
estivesse a alienação do ano jubilar. Isto permitia a manutenção de certa igualdade
territorial, evitando-se o surgimento de grandes fortunas ou de grandes misérias. O
indivíduo poderia chegar à miséria; mas a família não, pois sempre poderia contar
com o resgate quando preenchido o período jubilar20.

Nesse sentido, em uma passagem do Gênesis, Abraão compra um terreno para


sepultar sua mulher, mediante um contrato firmado na presença de todo o povo, o
qual igualmente presencia o pagamento do preço e a imissão na posse pelo
comprador21. A confirmação e a presença do “povo” – representado no trecho
como “todos os que entravam pela porta da sua cidade” – bem refletem um caráter
ostensivo da aquisição, além da já mencionada soberania coletiva.

Estão aqui evidenciados a publicidade e o necessário consentimento da


comunidade para as alienações de imóveis, indício de que, remotamente, a
propriedade entre os hebreus era coletiva ou ao menos relativamente inalienável22.

Esse caráter permanece mesmo em tempos menos remotos, como o de


Jeremias23, na qual ainda se reconhece a manutenção de “direitos de resgate”:
ainda que terras fossem alienadas, o alienante, ou algum parente seu, conservava
o direito de readquiri-las mediante pagamento. O fato relatado diz respeito à
aquisição pelo profeta de uma área de terra próximo de sua cidade natal de
Anatote à época do cerco de Jerusalém pela Babilônia (597 a.C.)24.

Já nessa época, todavia, o negócio adquire um grande grau de sofisticação


quando comparado com a compra por Abraão do campo, caverna e arvoredo de
Efrom em Macpela. Os contratos, agora, eram feitos por escrito, em duas vias –
uma selada e outra aberta – firmados pelas partes e testemunhas, após o que as
cópias eram entregues a alguém que ficava encarregado de depositá-las em um
vaso de barro.

Como relata Flávio Josefo25, ao tempo das guerras entre os judeus e os


romanos estes vasos ficavam localizados – ao menos em Antióquia e Jerusalém –
em um edifício destinado especificamente à preservação de registros públicos. Em
Antióquia esse edifício foi destruído em um incêndio juntamente com os arquivos, a
praça do mercado e os palácios reais; e em Jerusalém foi incendiado, durante uma
rebelião, juntamente com os palácios de Agrippa e Bernice, ocasião em que os
sediciosos se apressaram em queimar os contratos firmados em favor dos
credores, e, com isso, extinguir as obrigações de pagar dívidas, de maneira a
ganhar a simpatia dos devedores. Os responsáveis pelos registros tiveram de fugir,
e, com isso, “queimaram-se os nervos da cidade”.

Não se pode, porém, dizer que este depósito no vaso era efetivamente um
registro de imóveis. Ao invés, tinha-se aí uma preocupação com a sobrevivência
física do documento26, pelo que a conservação a que se refere aqui é literal.
Pretende-se conservar o suporte material do negócio, seu instrumento; e não o
negócio em si, os direitos, ou a relação jurídica, noções que somente viriam a ser
construídas pelos juristas milênios depois. Ainda que se vislumbre uma finalidade
jurídica de conservação de um meio de prova, não se pode confundir esta
finalidade com os propósitos de um moderno sistema de registro.

Infelizmente, não chegaram a nossos dias documentos que pudessem fornecer


elementos suficientes à caracterização das funções específicas e procedimentos
envolvidos nesse depósito. Contudo, tratando-se de uma sociedade ainda marcada
pela pessoalidade das relações, e desprovida de papéis sociais e funções
altamente especializadas e diferenciadas, é improvável que aí houvesse estruturas
muito complexas27.

2.3. A publicidade imobiliária entre os povos da Antiga Mesopotâmia

A Mesopotâmia é uma das regiões abrangidas por aquilo que os historiadores


novecentistas chamavam “Oriente Próximo”, e compreende, grosso modo, a área
situada entre os rios Tigre e Eufrates. Não obstante o “oriente próximo” seja maior,
e abranja terras que vão do Mar Egeu até o Irã central, e do norte da Anatólia até o
Mar Vermelho, a Mesopotâmia é a área mais estudada pelos historiadores, pela
simples razão de ser aquela que mais documentos escritos legou para a
posteridade. Compõem este estudo civilizações que, ao longo do tempo, ocuparam
territórios com maior ou menor extensão, durante mais ou menos sete mil anos. A
despeito disso, a maioria das pesquisas se concentra no período situado entre
3000 e 300 antes de Cristo, o que, para a ciência histórica, já é um período
longuíssimo28.

No que diz respeito à publicidade imobiliária, a maioria das fontes que


chegaram até nós diz respeito às civilizações Assíria e Babilônia. A Babilônia e a
Assíria estavam situadas em um espaço de terras mais ou menos férteis que
partiam da imensidão desértica da Arábia, passavam pelas pantanosas margens
do Golfo Pérsico, pelos Montes Zagros, pelos planaltos e colinas que se avolumam
em direção aos Montes Tauro e ao Líbano, e findavam no Mar Mediterrâneo e no
Egito. Estas fronteiras, contudo, em especial as do Norte, nunca foram muito
estáveis. Na realidade, estas fronteiras eram bastante porosas, o que permitiu o
contato destas civilizações com os povos das estepes da Ásia Central, bem como
o recebimento de matérias-primas essenciais, como os metais (especialmente o
latão), pedras preciosas e madeira29.

A dicotomia Babilônia-Assíria se apresenta em todos os conjuntos de fontes


primárias que chegaram até nossos tempos, e tem um caráter geográfico dividido
entre o Norte (Assíria) e o Sul (Babilônia)30.

De maneira geral, o Sul da Mesopotâmia se desenvolveu mais rapidamente do


que o Norte, marcadamente a partir do chamado “Período Uruk”, o qual se
caracteriza por um rápido aumento na quantidade de assentamentos urbanos, e
em uma diferenciação hierárquica entre eles. Agora, pela primeira vez, existiam
cidades grandes, paralelamente à existência de cidades pequenas, vilas e
povoados. Também neste período se vê o desenvolvimento de sistemas
administrativos mais complexos, de uma sociedade mais estratificada e de
exércitos. É dessa época, também, o uso, pela primeira vez, de processos
sofisticados de fundição de metais, e, naquilo que nos interessa mais aqui, o uso
de escrita pictográfica em tabletes de argila e de selos por meio de carimbos
cilíndricos. Tradicionalmente se estima que este período se iniciou por volta de
3500 a.C.; mas pesquisas mais recentes sugerem que isto pode ter ocorrido quatro
ou cinco séculos mais cedo. 31. E o final do “Período Uruk”, estima-se, se deu por
volta do ano 3100 a.C.32

Com isso, a Babilônia surge como civilização em período mais antigo do que a
Assíria, e sua formulação mostra uma influência mais óbvia da Civilização
Suméria33. A Suméria estava situada, geograficamente, no mesmo local em que
posteriormente viria a se assentar a Civilização Babilônica. O Povo Sumério
enfrentava condições ambientais muito difíceis, já que a terra em que viviam era
extremamente árida, quente, desprovida de minerais, pedras e de madeira. No
entanto, este povo compensava estas dificuldades com inventividade,
desenvolvendo técnicas de irrigação que lhes permitiram canalizar as águas
barrentas das enchentes dos rios Tigre e Eufrates de maneira a fertilizar seus
campos e jardins. Para compensar a falta de pedras e outros minerais,
aprenderam a transformar, com o uso de fornos, a lama das enchentes em jarros,
potes e ferramentas agrícolas, e, posteriormente, em tijolos. E para compensar a
falta de madeira amarravam feixes de juncos que colhiam das margens do rio. Por
fim, desenvolveram um sistema de escrita em tabletes de argila que acabou por
ser utilizado em todo o Oriente Próximo pelos dois mil anos seguintes. A
dependência da irrigação para a sobrevivência do povo, e a necessidade de
esforços coletivos para sua implementação e manutenção, levou ao crescimento
das instituições governamentais, e à ascensão de um Estado Sumério, tudo isto
em época anterior ao terceiro milênio antes de Cristo34.

A organização econômica da Babilônia, que já abrangia não apenas a moeda,


como também o exercício de atividades bancárias pelos templos demandava não
apenas instituições jurídicas e administrativas, como também arquivos – bem
organizados – de documentos negociais, inventários de bens, cadastros de
empregados e de devedores, entre outros. No que diz respeito aos imóveis, não há
dúvida de que existia na Babilônia um cadastro que organizava informações sobre
as terras distribuídas pelo soberano e as consequentes prestações, inclusive de
caráter militar, a que ficava obrigado o donatário. A maioria dos bens imóveis –
rurais ou mesmo casas – pertencia ao Estado ou aos templos, e possivelmente
existiam em todas as cidades ofícios de livros públicos, ou dos templos, nos quais
havia mapas da cidade ou de seus campos vizinhos indicando os seus respectivos
bens. Não obstante não esteja claro qual era a finalidade destes arquivos, é
possível afirmar que quando havia alguma contestação de um direito se podia
recorrer a eles para análise dos mapas, e, com isso, obter esclarecimentos para a
solução da controvérsia. Mas havia também imóveis privados, como demonstra
uma estela em pedra encontrada no sítio arqueológico de Sippar, provavelmente
do século XXIII a.C., contendo uma série de vendas de imóveis rurais com
indicações de seus limites, preço e nome das partes contratantes35. Esta estela,
encontrada em 1889, contém, em suas duas faces, a gravação de uma série de
contratos de venda de campos, com a indicação de seus limites, preço e o nome
das partes. É da época de Manishtusu, rei de Acade36, e se encontra hoje no
Departamento de Antiguidades do Oriente Próximo do Museu do Louvre37.

Também na Babilônia se encontra uma forma solene e pública de transferência


da propriedade de imóveis específica para o direito de resgate, mencionado pelo
profeta Jeremias. Se, na origem, o exercício do direito de resgate poderia ser feito
pela simples restituição em dinheiro do preço pago, em época posterior foi
introduzido um ato jurídico elaborado e público. Em dias determinados, e em locais
públicos, na presença do povo, eram realizadas proclamações, que se repetiam
certo número de vezes. A seguir, redigia-se um ato de resgate, no qual ficava
estabelecido que as partes não tinham qualquer demanda a fazer uma da outra
quanto ao imóvel que era seu objeto38.

O significado dessa cerimônia pode ser depreendido do fato já mencionado de


que mesmo em épocas em que já havia cidades a propriedade das terras era
majoritariamente coletiva, e de que, na origem, este caráter coletivo não apenas
era majoritário, como era total. Isto resta demonstrado por alguns documentos que
materializam atos jurídicos praticados na cidade de Uruk39, centro do período que
levou seu nome40.

Com o passar do tempo, os babilônios, povo afeito ao comércio, foram sentindo


a necessidade de retirar da propriedade os entraves do antigo direito eminente que
a comunidade tinha sobre os imóveis. Assim, passou a ser permitida a alienação
de imóveis entre vivos que fosse necessária ao pagamento de dívidas – já que,
caso a dívida não fosse paga, o devedor poderia perder sua liberdade – e também
a alienação que fosse feita em forma de doação à esposa ou filha do doador41.

Também com esse espírito liberalizante passaram a empregar em outros casos


a antiga forma de solução de disputas que fora formulada especificamente para o
direito de resgate familiar da propriedade. A cerimônia já descrita, em princípio,
podia ser utilizada apenas pelo próprio alienante ou seus herdeiros, mas passou a
ser empregada na alienação pura e simples dos bens imóveis. A soberania da
comunidade residia na participação do juiz, que sentenciava, e na possibilidade do
demandado de se opor à alienação, se melhor direito tivesse. Por fim, a sentença
de adjudicação extinguia as reclamações futuras contra o adquirente. O caráter de
respeito à propriedade coletiva é demonstrado, ainda, pelo fato de que, com o
passar do tempo, a adjudicação foi se tornando fictícia, perdendo o caráter de
expropriação forçada. Quem intervinha na operação não mais era um juiz, mas um
chanceler, que redigia o ato. Ainda assim, o negócio obrigava o vendedor, seus
herdeiros e toda a tribo a que estes pertencessem42.

Não obstante o fim específico para o qual nasceu, é inegável o caráter de


publicidade do procedimento, ainda que exterior, ou seja, de se levar o fato ao
conhecimento público. Ao se estender seu uso, buscou-se liberar a terra de
eventuais vínculos, ônus ou direitos que a pudessem gravar, não apenas em
relação à outra parte, mas em relação aos membros de toda a comunidade43.

Como herança suméria, os instrumentos jurídicos eram redigidos se seguindo


um padrão rigoroso. Em primeiro lugar a identificação do objeto da transação: uma
casa que seria alugada, um campo que seria vendido, uma moça que se casaria,
ou uma criança que seria adotada. A seguir, vinha a enunciação das pessoas
envolvidas na transação, com o cuidado de se estabelecer quem era o eventual
proprietário da coisa negociada. A relação entre as partes do negócio era
sintetizada em uma fórmula que especificava a natureza da transação: “Ele
comprou de...”, “Ele recebeu em empréstimo de...” etc. A seguir vinham cláusulas
acerca do preço, obrigações assumidas, prazos bem como outras declarações ou
pactos acessórios, que em geral eram reduzidas a fórmulas padronizadas. O estilo
e termos empregados, bem como a forma dos tabletes de argila, muda de região
para região, e de época para época. Mas há algumas constantes. A primeira delas
é o uso de testemunhas, que eram mencionadas ao final do instrumento, e, por
vezes, nele apunham seu selo pessoal. Outra constante era a prática de que uma
pessoa que eventualmente contraísse uma obrigação deveria firmar o instrumento
com seu selo cilíndrico, que era rolado na argila deixando uma impressão; com o
sinete de seu anel; ou ainda com as unhas das mãos, segundo um determinado
padrão. Com isso, ficava representada não apenas sua presença, como também
seu consentimento. Por outro lado, isso não era um método de identificação, e
mesmo se permitia que alguém firmasse utilizando um selo alheio, desde que isso
fosse mencionado no instrumento44.

Os documentos mais antigos de que se tem notícia dizem respeito à venda de


escravos. As vendas de campos e casas são atestadas em textos isolados do
período conhecido como “Terceira Dinastia de Ur” ou como “Ur III” (2112 a.C.-2004
a.C.), mas somente se tornaram uma prática comum a partir do chamado Período
Paleobabilônico (aproximadamente 1894 a.C.-1595 a.C.)45.

Com a finalidade de proteger estes documentos contra adulterações


fraudulentas duas práticas são atestadas pelas fontes. Até a metade do segundo
milênio antes de Cristo, o documento era depositado em um delgado envelope de
argila, no qual seu conteúdo era transcrito. Quando o envelope fosse,
eventualmente, removido pelo juiz a quem fosse apresentado, seu conteúdo
poderia ser comparado facilmente com o do documento depositado. Já no Período
Neobabilônico (626 a.C.-539 a.C.) a proteção do conteúdo do documento se dava
pela elaboração de uma cópia do original, de maneira que cada parte recebia sua
via, observado que a criação dessa cópia deveria ser mencionada no
instrumento46.

Também na Babilônia aparece um sistema de se tornar ostensivas e


registradas em pedra aquisições de terras, por meio dos chamados “kudurrus”. A
palavra kudurru significa limite, ou fronteira. O fundador da Dinastia Neobabilônica,
o famoso Nabucodonosor I, era chamado, na língua babilônica, Nabû-Kudurri-uçur,
ou seja, “Nabu, o guardião dos limites”. Com isso, é adequado chamar estas
pedras de “pedras de limites”, as quais continham não apenas um aspecto jurídico,
como também místico ou sobrenatural47: os kuddurus colocavam a aquisição sob a
proteção dos deuses48.

Há, contudo, como adverte Katrhyn Slanski49, duas gerações de kudurrus,


relativamente distantes no tempo uma da outra. Ambas consistem em gravações
em pedra de uma comemoração pela aquisição de terras por alguém, com a
finalidade de que o resultado da transação documentada seja permanente.
Existem, no entanto, diferenças marcantes na forma, conteúdo e decorações
presentes nos kudurrus de cada geração. As mais recentes, da segunda geração,
contêm uma aquisição de terras por outorga do rei; ao passo que as mais antigas,
da primeira geração, contêm o registro de uma aquisição feita por compra.

A primeira geração de kudurrus – que foi denominada “antigos kudurrus”, em


razão da existência da segunda geração, bastante posterior – começou a ser
produzida ainda no Período Uruk, por volta do terceiro milênio a.C., e o fato de sua
matéria-prima ser pedra, e não argila, certamente contribuiu muito para a sua
preservação. Destaque-se que pedra era um material raro e caro na antiga
Mesopotâmia, pelo que seu uso nos kudurrus significava não apenas que a estes
se dava muita importância, como também que se pretendia que os registros assim
elaborados fossem permanentes e indestrutíveis50.

Essa primeira geração de kudurrus contém textos mais simples e mais diretos.
Tais kudurrus não contêm proibições ou maldições imprecadas contra
transgressores, e, em geral, não contêm relevos ou representações de deuses51.
Podiam ser feitos de pedra calcária, diorito, alabastro, gipsita, ônix, e outros, e no
formato de uma tabuleta quadrada, retangular ou arredondada; de uma laje; de um
obelisco; de uma estela; ou outras. Deve-se observar que eram objetos criados
para serem expostos em público52.

Quanto ao conteúdo, os kudurrus antigos em geral tratam de aquisição de terra


de vários vendedores por uma única pessoa, a qual tem laços de sangue com
aqueles. Dessa maneira, atestam a existência de um sistema de propriedade sobre
a terra detida por famílias, contradizendo ideias de que apenas templos ou o
Estado poderiam ser titulares de bens imóveis53. O texto, em alguns dos kudurrus
escavados, aparece no Idioma Acadiano; em outros, no Idioma Sumério54.

Há evidências no sentido de que no período conhecido como Fara ou Dinástico


Arcaico IIIa (aproximadamente 2700-2500 a.C.) e no Período Pré-Sargônico
(aproximadamente 2500-2334 a.C.) um consentimento familiar ou, de maneira
mais ampla, comunitário, era exigível para a alienação de imóveis por indivíduos
ou por famílias nucleares (isto é, compostas apenas por um casal e seus filhos). A
importância deste consentimento se viu reduzida no Período Sargônico (2334-2279
a.C.). Já no período da Terceira Dinastia de Ur, ou Ur III (aproximadamente 2100-
2000 a.C.) as vendas de campos eram, aparentemente, proibidas, mas não há
mais evidências da exigência do consentimento familiar ou comunal para venda de
casas e pomares. Em substituição, estas transações, neste período, passam a ser
possivelmente supervisionadas e autorizadas pelo Estado55.

Os kudurrus antigos já escavados em geral indicam a profissão das partes


envolvidas na transação, e revelam que homens e mulheres de muitas atividades
diferentes negociavam imóveis. Entre as profissões mais comuns para os homens
estavam as de funcionários públicos ou dos templos, mercadores, escribas e
pastores. Já as mulheres, em geral, eram servas, servas do templo, carpideiras, ou
indicadas como viúvas, filhas ou esposas de alguém56.

Uma vez que os kudurrus em geral continham a indicação de várias vendas em


favor do mesmo comprador, é razoável supor que seu conteúdo consistia, na
verdade, na transcrição de vários tabletes de argila, cada um deles documentando
uma transação individual57. Tem-se, assim, que os kudurrus tinham uma função
que ia além da instrumentalização da transação, a qual já havia sido realizada
anteriormente: conservar um registro mais permanente da transação, e torná-la
pública.

A despeito de haver controvérsia sobre o tema, ao que parece, os kudurrus não


ficavam implantados nos próprios campos de que tratavam, mas sim depositados
em um templo em um local visível. A finalidade desses depósitos não era
propriamente registrá-los em um ofício de registros públicos, mas submetê-los à
proteção dos deuses, e, paralelamente, tornar público o título da compra da terra
por certo indivíduo. Evidências amplas e diretas sobre este “ato de publicidade”
são fornecidas pelos kudurrus do Período Pré-Sargônico, alguns dos quais
continham a fórmula “o vendedor principal pendurou este cone na parede, e
espalhou o óleo no seu lado”, ou seja, realizou certos atos de maneira a simbolizar
e autenticar a transferência do direito ao comprador. A parte exposta deste “cone”
pendurado na parede (i.e., o próprio kudurru), submetia o texto nele escrito ao
escrutínio público58.

A segunda geração de kudurrus apareceu no período médio-babilônico


(aproximadamente 1374 a.C.-1155 a.C.), correspondente à Dinastia Cassita, a qual
viu surgir uma prática que persistiu durante a Segunda Dinastia de Isin
(aproximadamente 1157 a.C.-1026 a.C.). Esta prática consistia na outorga pelo rei
de porções substanciais de terras a membros de sua família, sacerdotes, militares
e outras autoridades – aparentemente, como recompensas por serviços prestados,
ou como maneiras de se patrocinar o culto de certo deus – que eram registradas
em estelas de pedra também denominadas kudurrus. Estas estelas eram
decoradas com símbolos representando deuses, e levavam uma declaração do rei
estabelecendo em detalhes qual área era entregue a quem. Há registros de
doações de áreas muito maiores, mas em média o objeto da outorga eram campos
suficientes para a alimentação de duzentas pessoas, e por vezes incluíam a mão
de obra dos aldeões59.

O primeiro desses kudurrus de segunda geração a ser descoberto na


modernidade foi encontrado nas ruínas de um palácio situado ao sul de Bagdá, no
final do século XVIII, pelo explorador francês Anton Michaux, e consiste em uma
pedra preta polida coberta de figuras e inscrições que então eram indecifráveis. A
pedra foi levada para a França e vendida à Biblioteca Nacional Francesa em 1801,
passando a ser conhecida como Caillou Michaux. Somente em 1850 os esforços
de Edward Hincks, Jules Oppert e Henry Rawlinson finalmente decifrariam a
escrita cuneiforme, e forneceriam subsídios para que fossem dados os primeiros
passos no conhecimento do conteúdo da Caillou Michaux. Ao longo do século XIX
e início do século XX outras pedras semelhantes foram sendo encontradas, e
tentativas de tradução foram empreendidas. Atualmente são conhecidos
aproximadamente 160 destes objetos, em sua maioria presentes em coleções
situadas no Iraque, Israel, Turquia, Alemanha, França, Reino Unido e Estados
Unidos, mais da metade deles extraída de escavações na antiga cidade de Susa60.

Assim como ocorre com os kudurrus mais antigos, da primeira geração, a


historiografia mais tradicional sustentava que também os kudurrus da segunda
geração tinham entre suas funções tornar ostensiva a aquisição por meio da
colocação da estela no limite da área de terras em questão, de maneira a poder
ser vista por todos61. Todavia, evidências arqueológicas mais recentes sugerem
que, na verdade, também os kudurrus da segunda geração ficavam depositados
em templos. São evidências nesse sentido, por exemplo, o fato de que escavações
controladas indicaram que grande parte deles ou de seus fragmentos foi extraída
de ruínas de templos, além de suas boas condições de preservação, as quais
fazem com que seja improvável que estas tenham estado parcialmente enterradas
(já que, na maioria dos casos, não há um obscurecimento de sua porção inferior de
forma distinta do restante de seu corpo), ou que tenham sido submetidas por
tempo prolongado ao vento, areia, sol e chuva dos espaços externos62.

A despeito disso, tem sido sugerido que os kudurrus escritos tinham por função
tornar pública uma aquisição imobiliária por sua exposição não nos campos
diretamente, mas em um local público em que os vários kudurrus eram reunidos,
ao passo que os limites entre os campos eram estabelecidos por pedras sem
inscrições. Apoia essa conclusão o fato de que o formato da base dos kudurrus
parece sugerir que estes eram feitos para serem encaixados e exibidos sobre
algum tipo de plataforma, bem como a praxe babilônica de se ter em arquivos
públicos os tabletes de argila que instrumentalizavam contratos63.

Por outro lado, é difícil afirmar que tal publicidade fosse efetivamente – ou
exclusivamente – jurídica. É verdade que as inscrições na pedra, provavelmente
copiadas de outra igual feita em um tablete de argila, geravam uma prova durável
da aquisição, que podia, até mesmo, demonstrar o direito adquirido por seus
herdeiros. Mas estava bastante presente também o papel de advertir o público de
que aquela aquisição era chancelada e protegida pelos deuses, pelo que
usurpadores se sujeitavam aos efeitos de sua ira64. A despeito disso, não parece
que esta publicidade representasse qualquer condição de validade da aquisição65.

Transcreve-se a seguir parte da tradução da inscrição da peça Nazi-Maruttash


RA 66, apresentada por Kathryn Slanski66. Esta peça foi escavada em Larsa em
1970 em uma sala lateral do templo do deus solar Shamash. Observe-se, contudo,
que em razão de serem escassas as demais fontes para o período, muito da
linguagem, das práticas sociais e jurídicas, e dos nomes referidos nestes
monumentos, ainda nos são desconhecidas67.
A inscrição se inicia pela indicação do monumento: narû (pedra) dos campos,
prebenda, pomar, de Puzru, cantor do Ebabbar; Protetor é seu nome. A seguir,
vem a descrição da primeira parte da doação, os campos: “Um campo de 30 “gur”,
medido na proporção de três “bans” de sementes de trigo para o “iku”, calculadas
de acordo com o “grande cúbito” nos campos de cultivo da aldeia de Rabûti, na
margem do Tigre, província de Shin-asharedu; confrontando por cima, ao norte,
com o Tigre; confrontando por baixo, ao sul, com a propriedade de Takushish; ao
leste, com a propriedade de Paragashitu, filha do rei; pelo oeste, os lados longos,
com a propriedade de Amel-Marduk”.

Após a descrição dos outros componentes da doação, seguem proibições


decorrentes da doação feita a Puzru, relacionadas com a destruição ou ocultação
do kudurru. É interessante observar a preocupação com o fato de a pedra ser
escondida “onde ela não possa ser vista”: “Em qualquer lugar que, no futuro,
alguém, ainda que seja uma autoridade de confiança, ou prefeito, ou alguém do
exército real, quantos sejam, ou alguém da família, parente, ou afins por
matrimônio, que se insurgirem contra, ou que violarem a terra e a prebenda doada
por deus e pelo rei, dizendo que ele é um irmão ou parente, e que enterre este
monumento onde ele não possa ser visto, ou que o queime com fogo, ou que faça
com que um impotente, estúpido, simplório, mentecapto, bruto, tagarela, fraco, a
arrancá-la...”.

A seguir, seguem-se as sanções – na verdade, maldições – impostas a quem


violar as regras: “Que os deuses Anu, Enlil e Ea o amaldiçoem com uma terrível
maldição da qual ele não possa se libertar! Que Ninurta, senhor das fronteiras e
kudurrus, destrua os limites da sua propriedade! Que ele arranque seu kudurru!
Que Shin, grande senhor, o encha de lepra e que ele se deite como um asno
selvagem fora da cidade! Que Belet-ili não povoe com ninguém sua casa e impeça
em sua casa o nascimento de gado, ovelhas, asnos e humanos! Que Gula crie
uma ferida persistente em seu corpo e que ele adquira uma doença incurável! Que
ele se banhe em sangue e pus como se fosse água! (faltam alguns trechos) Que
ele cave um canal, mas que este não traga nenhuma água! Que ele tenha uma
casa na cidade, mas passe a noite na sarjeta! Que ele cerque uma campina, mas
que ela seja tomada pelo salitre!”.

Por fim, o fecho, identificando o rei doador, e o local de depósito do kudurru:


“Nazi-Maruttash, rei poderoso, rei da Babilônia, construiu esta, e no interior do
Santuário de Gula a depositou”.

Quanto à Civilização Assíria, as fontes disponíveis são bem menos ricas, e,


portanto, é muito menor o conhecimento que se tem hoje sobre suas práticas
jurídicas e relativas à publicidade imobiliária.

O sistema legal assírio estava integrado à burocracia administrativa, e não


integrava uma instituição distinta, com suas próprias autoridades e códigos. O
Direito, em geral, era consuetudinário e fundado em precedentes. Não havia cortes
judiciais, pelo que aqueles que se envolvessem em litígios, e que não
conseguissem solucioná-los por si, deveriam procurar uma autoridade
administrativa para solucioná-lo68.
Os assírios apresentavam sua própria história como uma longa sucessão de
reis da cidade de Assur, iniciada em um distante passado pré-sedentário, e
concluída no sétimo século antes de Cristo. O poder real passava muitas vezes de
família a família, mas não é possível dividir sua história em uma sequência de
dinastias. A história desse povo ao longo destes séculos tem um foco particular em
alguns reis individuais que foram muito ativos e bem-sucedidos militarmente. No
período compreendido entre os séculos XIV e XI antes de Cristo, a Assíria se
converteu de uma cidade-Estado centralizada em Assur, para um estado com um
território substancial, e que passou a exercer um papel relevante nos
acontecimentos regionais69.

O primeiro governante relevante que se tem notícia, no período anterior à Idade


das Trevas Assíria – período em que o povo assírio esteve sob dominação
estrangeira – é o rei Shamshi-Adad I (aproximadamente 1813 a.C.-1781 a.C.). Os
duzentos anos anteriores são documentados apenas por documentos produzidos
por mercadores assírios, que faziam negócios na Anatólia e na região de Kirkuk.
No entanto, são desconhecidas as circunstâncias dessa expansão comercial70.

Todavia, alguns textos sugerem que também os assírios mantinham cadastros


e arquivos públicos aptos a fornecer um quadro seguro da propriedade fundiária,
em especial se levando em conta que este povo contava com uma administração
pública centralizada e bem organizada71.

Ainda, um fragmento de legislação provavelmente produzido no período situado


entre os anos 1390 a.C. e 1190 a.C. descreve as formalidades necessárias para a
venda de bens preciosos, entre eles casas e campos, que, originalmente, vigorava
na cidade de Assur, mas depois foi estendido às outras regiões que passaram a
fazer parte do Estado Assírio. Tratava-se de uma espécie de purgação da
propriedade, obrigatória para quem quisesse comprar “uma casa ou campo”.
Quem quisesse fazê-lo deveria, antes da aquisição, e durante um mês inteiro,
fazer proclamar na cidade do deus Assur por um arauto, três vezes, que “estou
comprando o campo e a casa de fulano de tal, filho de beltrano de tal, situada na
área cultivável desta cidade. Aqueles que estejam em sua posse sem direito, ou
que tenham quaisquer pretensões sobre esta propriedade, que as tragam aos
magistrados, que apresentem seus tabletes de argila, que ajuízem suas ações,
que provem seus direitos e recebam o que é seu. Aqueles que, ao longo deste
mês, não me apresentarem seus tabletes de argila, que os apresentem aos
magistrados, e recebam o que lhes é devido”. Feita a proclamação, os magistrados
dariam ao comprador um tablete de argila, que afirmaria que a proclamação foi
feita nos três dias, e que aquele que não tivesse apresentado sua pretensão sobre
o campo e a casa neste período, a perderia. Com isso, a propriedade ficaria
liberada. Tratava-se, efetivamente, de mecanismo de publicidade de uma
aquisição imobiliária, e efetivamente acaba por produzir efeitos que atingem
terceiros72.

Tinham, com isso, os assírios, um mecanismo realmente jurídico de publicidade


imobiliária, que, por meio de proclamação de direitos, purgava a propriedade.

Quanto à conservação dos documentos, também é conhecida a prática pelos


assírios, tal como na Babilônia, do armazenamento dos tabletes de argila que
instrumentalizavam negócios em envelopes de argila, nos quais se transcrevia o
documento e se apunha um selo73.

2.4. A publicidade imobiliária no antigo Egito

Diferentemente do que ocorreu na Mesopotâmia, em que civilizações foram se


sucedendo com o passar dos séculos, ao mesmo tempo em que seus limites
mudavam, o Egito apresentou uma unidade política e a manutenção de seus
limites que permaneceram ao longo da maior parte de sua história.

Seus limites naturais, consistentes em desertos, mares, e rios cheios de


corredeiras ajudaram a proteger o país contra invasores, o que permitiu o
florescimento de sua cultura em relativa segurança. Ainda, sua posição nos limites
entre a Ásia e a África, e sua abertura marítima para a Europa, pelo Mediterrâneo,
e para a Índia, pelo Mar Vermelho, permitiram que o Egito servisse como um
entreposto comercial e uma ponte cultural e econômica entre muitos povos
diferentes, o que contribuiu para o dinamismo de sua história e o enriquecimento
cultural de seu povo74.

Populações de caçadores-coletores começaram a se assentar na região, nas


proximidades do Rio Nilo, por volta do ano 30000 a.C. Este fluxo de caçadores-
coletores aumentou bastante por volta do ano 8000 a.C. em razão de mudanças
climáticas que tornaram o continente cada vez mais árido, o que levava a uma
busca do rio como fonte segura de água. Por volta do ano 5000 a.C. já se
prenunciava um novo modo de vida ao longo das margens do rio, sedentário,
baseado na agricultura e na domesticação de ovinos, caprinos e bovinos, e nesse
período foram estabelecidas as bases de muito da cultura egípcia75.

O Rio Nilo é majoritariamente o resultado da união do Nilo Azul, que nasce no


Lago Tana, na Etiópia, e do Nilo Branco, que nasce no Lago Vitória, em Uganda. É
o aspecto central da geografia e da cultura egípcias, e isto permanece até os dias
de hoje. Com base nele são divididas as cinco regiões principais do Egito, que são
o Vale do Nilo, o Delta, o Deserto do Leste, o Deserto do Oeste, e a Península do
Sinai. Até mesmo os hieróglifos que designam viagens para o norte e para o sul
são baseados no rio: o que designa “ir para o norte” consiste em um barco com as
velas enfunadas, ou seja, seguindo o fluxo da corrente; o que designa “ir para o
sul” é um barco com a vela encolhida, usando aquilo que os egípcios chamavam “a
doce brisa do norte”76.

Mesmo no tema da publicidade imobiliária o Nilo terá um papel central, já que


sua essencialidade para a vida egípcia não reside tanto em servir como meio de
transporte, mas sim em proporcionar aos egípcios terras férteis.

Em razão das chuvas torrenciais nas terras altas africanas, o Nilo alagava
anualmente. O pico das inundações ocorria do final de julho até o início de
setembro, e o imenso fluxo de água depositava em seu leito e margem um mínimo
de 10 cm a cada século de um riquíssimo lodo negro. Assim, a inundação
anualmente trazia para os egípcios terra fresca propícia para a agricultura, bem
como reservas de água que podiam ser distribuídas em canais e armazenada em
reservatórios para uso posterior. Esta terra negra, chamada Kmt, deu ao Egito seu
nome originário, e onde esta findava começava Deshret, a terra vermelha – o
deserto. Como a área da terra negra estava sujeita a inundações, os egípcios
tiveram de ter o cuidado de construir suas cidades e cemitérios fora do alcance das
águas, por vezes construindo em pontos mais altos, e por vezes construindo na
região desértica77.

Infelizmente, as fontes primárias que dizem respeito às relações jurídicas no


antigo Egito são de número bastante limitado. Este tipo de documento, juntamente
com documentos acerca de recolhimento de tributos, correspondências entre
pessoas, documentos literários etc., era, em geral, redigido em papiro, o qual é
demasiadamente frágil para perdurar ao longo dos muitos séculos que nos
separam de sua produção. O papiro esfarela quando o clima está muito seco, e
dissolve quando está muito úmido; e foi reutilizado de muitas maneiras, seja como
instrumento de escrita de novos textos, seja, no período pós-faraônico, como
combustível. Ainda, muitos destes documentos estariam provavelmente
localizados em cidades, e poucas destas foram escavadas, já que continuaram
sendo habitadas ao longo do tempo78.

Por essa razão, muito do que é sabido acerca das transações imobiliária no
Egito Faraônico chegou até nós de maneira muito indireta, como, por exemplo, a
narração nas paredes de uma tumba dos atos praticados em vida pelo defunto.
Como as tumbas eram criadas para durar por toda a eternidade, acabaram
também por servir como um meio fundamental de se conhecer o funcionamento do
mundo dos vivos.

Os historiadores em geral dividem a história do antigo Egito em um período pré-


dinástico, que vai do ano 5000 a.C. até aproximadamente 3100 a.C., e um período
dinástico, ou faraônico, que o sucede e perdura até a submissão ao Império
Romano, com a morte de Cleópatra VII e seu filho, Cesário, no reinado de
Otaviano Augusto. O período dinástico é dividido em diferentes eras, conhecidas
como “impérios” (antigo, médio, novo), épocas de estabilidade e unidade política, e
“períodos intermediários”, épocas de instabilidade e fragmentação. E cada um
destes períodos é dividido em “dinastias”, que, mais ou menos, correspondem às
famílias assentadas no poder79.

Naquilo que diz respeito especificamente à publicidade imobiliária, a primeira


questão debatida pelos historiadores é se havia ou não propriedade privada da
terra no Egito Faraônico80.

Toda a organização política do Egito repousa no poder do faraó, herdeiro dos


deuses. O faraó não é apenas um governante, no sentido moderno: é o garante da
própria ordem cósmica – Maât – da verdade, da justiça, da estabilidade e da
prosperidade, face às forças do mal. O faraó é o proprietário de todo o solo do
Egito, mas consente o desfrute da “terra negra” por meio de delegações de poder,
doações e oferendas. Em qualquer caso, contudo, permanece sempre um domínio
eminente, que se materializa no recebimento de rendas e tributos81.

Assim, se, por um lado, nas origens do período dinástico o único possuidor da
terra era o soberano, a prática de o faraó realizar doações acabou por constituir
um regime feudal, e a propriedade fundiária viria a ser a fortuna principal daqueles
que ocupavam os altos cargos no Estado82.

Essas doações acontecem ao longo de toda a história do Egito Faraônico, o


que leva a crer que, na prática, havia terras sob o poder de particulares, ainda que
submetidos a algum tipo de dependência em relação ao Estado.

O patrimônio imobiliário dos templos é o mecanismo preferido do soberano


para organizar a exploração das terras, e, teoricamente, consiste em uma oferenda
ao próprio deus. Por isso, teoricamente, apenas o faraó pode doar terras a estas
instituições83.

Já no Antigo Império (2663 a.C.-2160 a.C.) há exemplos de doações de terras


pelo faraó a templos, como era o caso dos templos solares. Um templo solar era
um templo destinado ao deus solar Rá, que, nesta época, passou a ser como que
um “deus estatal” egípcio. Cada novo faraó patrocinava a construção de um novo
templo solar, e estes seguiam um formato padrão: um templo em um vale ligado
por uma calçada a um templo superior, em frente do qual ficava um grande
pedestal encimado por um obelisco, símbolo do deus solar. Assim como os
complexos de pirâmides, os templos solares eram dotados de terras, de maneira a
garantir sua subsistência. Estas doações a templos solares, com o passar do
tempo, passaram a consistir em uma forma de reformar a burocracia do Estado
Egípcio. A prática consistia em se retirar dos cargos os membros da família real,
conceder o sacerdócio em um templo solar de maneira meramente nominal a
alguém, e atribuir a esse “sacerdote” funções de estado. As terras do templo
gerariam ao assim nomeado os benefícios esperados de seu cargo enquanto
perdurasse na função84.

Ainda no Antigo Império, os reis começaram a prestar mais atenção às várias


divindades locais reverenciadas nos diferentes assentamentos humanos no país,
doando terras aos santuários também destes outros deuses85.

Assim, não há dúvidas de que mesmo no Antigo Império houve, em alguma


medida, propriedade privada, que era recenseada a cada dois anos, podia mudar
de mãos, e, desde a III Dinastia, era transmitida hereditariamente86.

Essa prática se manteve ao longo dos séculos, e no Novo Império (1549


a.C.-1069 a.C.) levou a abusos, corrupção e crise econômica. O chamado “Grande
Papiro Harris” enumera as doações de terras feitas por Ramsés III, da 20ª
Dinastia, a templos situados em Tebas, Mênfis, Heliópolis e a outras instituições
menores. Conclui que ao final de seu reinado um terço das terras cultiváveis do
país estava em poder de templos, das quais três quartos em poder de um único
templo, o Templo de Amon, em Tebas. Esta situação perturbou o equilíbrio entre
Estado e templo, e entre o rei e os poderosos sacerdotes de Amon. O resultado foi
uma perda generalizada do controle das finanças públicas e crise econômica, com
consequentes aumentos extraordinários no preço dos grãos e o acontecimento da
primeira greve registrada na História87.

Tudo isso acentua o caráter funcional da propriedade egípcia, no sentido de


que todas as terras estão vinculadas a uma finalidade dentro do quadro da
sociedade e instituições então existentes, ao mesmo tempo em que “beneficial”, no
sentido de que doações implicam ao donatário obrigações e deveres de
reciprocidade88.

No Período Ptolomaico (310 a.C.-30 a.C.) a principal preocupação do sistema


político passou a ser fiscal, o que repercutiu no funcionamento da burocracia.
Abaixo do soberano havia um exército de burocratas liderados por um gerente, o
dioiketes, incluindo contadores – eklogistes – e responsáveis pelo patrimônio
pessoal do faraó, os idios logos. Nesse período a terra – que, tecnicamente,
pertencia toda à Coroa – foi dividida, por razões práticas, em duas categorias: as
terras reais (basilike ge), que eram trabalhadas por “fazendeiros reais”, os quais
detinham uma concessão e pagavam à Coroa um aluguel anual; e terras remidas
(ge em aphesei), que eram subdivididas em “terras dos templos” (hiera ge), doadas
aos templos para garantir sua subsistência; “terras em poder dos cleruchs”
(klerouchki ge), que eram lotes atribuídas a soldados em recompensa pelos
serviços militares prestados; “terras recebidas como doação” (ge en doreai),
atribuídas a funcionários da Coroa como estipêndio pelo exercício da função, e a
ela vinculado; as “terras privadas” (idioktetos ge), que eram, ao menos de fato,
detidas por particulares; e as “terras das cidades” (politike ge), atribuídas ao
reduzido número de cidades – no sentido grego de pólis – que existia no Egito89.
Outra categoria também recebia terras em doação nesse período, os soldados
egípcios (machimoi). No entanto, enquanto os soldados de origem grega –
cleruchs – recebiam 20, 30, 70 ou mais arourai de terras (1 aroura =
aproximadamente 0,28 hectares), os machimoi recebiam, tipicamente, 5 ou 7
arourai, o que, em termos de produtividade, significava que a propriedade dos
machimoi não gerava um excedente suficiente para que eles contratassem
pessoas que os ajudassem na lavoura90.

Quanto às “terras privadas”, não é possível precisar qual era exatamente seu
regime jurídico91, bem como que extensão tinha a autonomia de seu titular.
Possivelmente, estas terras eram residuais e surgiam de maneira quase acidental,
abrangendo pequenas hortas e jardins, túmulos, pequenos edifícios de moradia
etc., sempre estando sujeitas ao controle e tributação reais92.

Tudo isso demandava uma administração organizada. O desaparecimento das


fontes escritas pela fragilidade do papiro, relatada anteriormente, mostra-se ainda
mais dramático quando se sabe que o documento escrito formava a base da
imensa burocracia necessária à administração das terras. Era um princípio
amplamente enraizado aquele segundo o qual aquilo que não estivesse escrito,
não existia; e se pode dizer que ao longo de toda sua história os egípcios tinham
uma verdadeira “mania” em escrever, registrar e inventariar coisas93.

E toda essa documentação demandava a criação de arquivos públicos, que já


existiam desde o Antigo Império, para conservar, entre outros documentos,
decretos reais, títulos de propriedade, contratos e testamentos, e que eram
presididos pelo vizir, um funcionário público de altíssimo grau. No Novo Império os
títulos de propriedade eram confiados ao vizir diretamente, que tinha poderes de
análise, investigação e mesmo jurisdicionais em último grau para solucionar litígios
entre proprietários de terra94.
Desde ao menos a II Dinastia, no início do Antigo Império, já existia entre os
Egípcios, também, um cadastro de terras com fins fiscais. A partir da IV Dinastia o
proprietário de terras – ou aquele que de alguma maneira tivesse poder sobre ela –
deveria apresentar uma declaração de propriedade à “Casa dos Atos Selados”, um
ofício ligado à casa real que, após verificar a declaração, emitia para o declarante
um título selado e autêntico. Assim, o Estado Egípcio combinava, de maneira
administrativa, a tributação da terra com a formação de títulos autênticos, havendo
mesmo notícia de que nesta época o documento tributário do imóvel valia como
prova da titularidade da terra. Quanto à importância dessa comunicação ao Estado
de uma aquisição de terras, e da obtenção do título autêntico, há uma fonte
primária do tempo da III Dinastia, consistente na inscrição fúnebre de um alto
funcionário chamado Meten, na qual se relata que um terreno adquirido por ele no
curso de sua vida teve sua aquisição transcrita em um arquivo público, o que lhe
rendeu a obtenção de uma “carta real”, ou seja, um documento autêntico contendo
o selo do Estado. Da IV Dinastia, há um documento em que se atesta que uma
casa foi vendida, a venda foi apresentada à Casa dos Atos Selados, na presença
de testemunhas, e nela registrada95. O registro e a carta real colocam a aquisição
sob a proteção do rei, que passa a garanti-la, ou seja, tem por efeito sujeitar
violações a uma sanção. Mas uma vez feito o registro, nem mesmo o rei pode
revogar o ato. Qualquer litígio deve ser submetido aos tribunais, e, se a aquisição
se deu com base em uma doação real, deverá o rei, para contestá-la, ir ao tribunal
como parte do litígio96.

A história de Meten é bastante ilustrativa, até mesmo por demonstrar a


possibilidade, já no Antigo Império, da aquisição de terras por particulares. Meten
era filho de um escriba judiciário, e seus pais já eram abastados proprietários de
imóveis. Ao longo de sua carreira, Meten dispunha das rendas de doze
propriedades cujo gozo lhe foi concedido a título de remuneração por suas
funções. Com essa renda, pôde adquirir do Estado mais terras – uma área de
aproximadamente 50 hectares, e uma casa situada no meio de um parque
cercado, de aproximadamente um hectare, contendo bosques e vinhas; e ainda
recebeu, como presente do rei, mais uma gleba. Considerando, ainda, que Meten
herdou de seus pais um pouco mais de 12 hectares, Meten chegou a ser
proprietário de aproximadamente 75 hectares de terras, a maior parte delas
adquirida como resultado do exercício de suas funções. Mas havia, também,
proprietários mais modestos, como o escriba Tjenti, da IV Dinastia, que permutou
uma casa por mobília97.

É difícil, porém afirmar que este registro significava uma modalidade de


publicidade imobiliária, e não apenas de titulação autêntica. Contudo, há alguns
decretos, ainda do Antigo Império, que parecem ir além, e que contém, em si, ao
menos em gérmen, o princípio da publicidade.

O primeiro deles é da época da VI Dinastia, e diz respeito ao domínio do templo


do deus Min em Coptos. Neste decreto se afirma que o ato constitutivo do domínio
seria feito por escrito, perante o ofício competente, munido do selo, e subscrito por
muitas pessoas, e, a seguir, registrado no registro público. Observe-se que esta
constituição de domínio era condicionada, e sujeitava o outorgado a uma série de
obrigações. O outro decreto, da mesma época, trata da concessão de isenção das
obrigações anteriormente vinculadas ao domínio concedido no decreto anterior ao
templo do deus Min em Coptos, e acrescenta uma formalidade muito interessante,
que adquirirá relevância em períodos posteriores: a fixação de uma estela de
pedra branca na porta do templo, na qual o decreto seria transcrito98.

A concessão dessa isenção faz concluir, a contrario sensu, que a regra quanto
à concessão de terras implicava uma série de obrigações para o adquirente, de
natureza tributária, ou mesmo de realização de trabalhos e serviços ao Estado99.

É também do Antigo Império – provavelmente da IV ou da V Dinastia – a


chamada “Estela de Gizé”, escavada por Georges Steindorf em 1910 em um
templo no vale da Pirâmide de Quéops. A estela contém um texto consistente em
uma venda de uma casa em construção celebrada entre Serefka, comprador, e
Tjty, vendedor. Provavelmente se trata de um extrato em pedra de um documento
original em papiro. É composto por uma declaração do comprador, no sentido de
que adquire e de que pagou o preço; uma declaração do vendedor, no sentido de
que se obriga a fazer com que todo o combinado se cumpra, e de que o comprador
se veja satisfeito; a menção do preço (que, no caso, não é composto por dinheiro,
mas por certos bens móveis); e a descrição sumária do imóvel; declarações acerca
das formalidades da venda, como o selo oficial; e a identificação das testemunhas
do ato100.

A estela seria fixada na casa vendida, com a finalidade de se identificar o


proprietário, e gerar publicidade de seu direito. Não é casual o emprego de pedra
na produção da estela, nem a utilização de hieróglifos, escrita ritualística e
sagrada. Aquilo que será publicitado se mostra como a verdade, em sentido até
mesmo metafísico, já que a fixação da estela é um ato público e religioso101.

Em textos e murais pictóricos em tumbas são frequentes cenas de fixações de


marcos geodésicos ou de estelas para o aclaramento de limites entre
propriedades. Esta era uma função de alta relevância, o que se revela pelo epíteto
de alguns vizires ser precisamente “aquele que confirma os marcos divisórios” ou
“aquele que estabelece os marcos divisórios”. Cabia ao vizir a responsabilidade
última de fazer cumprir as doações feitas pelo faraó, de realizar sua proclamação
ao público e de coordenar os trabalhos de campo de maneira que os marcos
fossem implantados no solo tal como dispostos “nos livros”102.

São, também, documentados cadastros existentes em períodos mais recentes.


No Médio Império (2066 a.C.-1650 a.C.) a existência de um cadastro é relatada por
Heródoto em sua História (Livro 2, 109). O Faraó Sesóstris (Senaseret), da XII
Dinastia, distribuiu terras ao povo, em igual quantidade para cada homem, ficando
cada donatário obrigado a pagar certa renda anual ao rei. Se o rio diminuísse o
tamanho do lote de algum deles, caberia ao prejudicado relatar o ocorrido ao rei,
que então enviaria alguém para examinar a terra e medi-la de maneira a apurar o
montante da redução de área, e, com isso, reduzir proporcionalmente o valor do
tributo devido. Heródoto ainda afirma acreditar que neste procedimento residiria a
origem da ciência da geometria.

Novamente, é difícil afirmar com segurança que tipo de direito tinham esses
donatários. De todo modo, é possível vislumbrar aí uma concessão de terras pelo
soberano, o qual mantem o seu domínio eminente simbolizado pela imposição do
tributo diretamente sobre a propriedade, bem como a manutenção do uso do
cadastro como mecanismo fiscal.

No Novo Império, há evidências da ocorrência de um censo para o


levantamento de todas as rendas devidas ao Estado durante a XIX Dinastia103; e
no Período Tardio (664-332 a.C.) relata Heródoto (Livro 2, 177) que no reinado de
Amasis (Ahmose II), da XXVI Dinastia, foi estabelecida uma lei segundo a qual
cada um dos egípcios deveria anualmente declarar ao governador de seu distrito
quais eram todas as suas fontes de renda, sob pena de morte em caso de omissão
ou declaração desonesta.

A prática de se utilizar estelas para definição de limites entre propriedades e


externalizar o nome de seu titular seguiu sendo utilizada no Terceiro Período
Intermediário (1064 a.C.-656 a.C.). Foram encontradas estelas de doação em
grande quantidade no norte do país, sugerindo uma expansão agrícola nas regiões
oeste e central do Delta. Estas estelas, datadas em sua maioria da XXII e XXIII
Dinastias, continham doações a templos com a finalidade de serem dotações a
cultos funerários, e também sugerem que a produtividade agrícola das terras
continuava grande o suficiente para gerar excedentes104.

Ainda, se, tradicionalmente, o doador indicado nas estelas dessa natureza era
sempre o rei, neste momento passa a haver estelas com doações feitas por
templos, chefetes líbios e particulares, o que particularmente sugere um notável
enfraquecimento da distinção entre a figura do faraó e a de seus súditos105.

Quanto ao Período Ptolomaico, como já se disse, o Estado passa a ser movido


por uma preocupação eminentemente fiscal, e, com isso, a existência de cadastros
nesse período é fartamente documentada106.

Não obstante, modernamente, cadastro e registro sejam instituições distintas,


com objetivos próprios, e métodos específicos, havia no Egito Antigo alguma
sobreposição entre ambas, já que os dados cadastrais poderiam ser utilizados em
juízo na solução de conflitos entre possuidores de imóveis.

Com isso, pode-se dizer que estes cadastros tinham uma função vagamente
publicitária107.

Um registro com funções precisamente publicitárias, contudo, surgirá no Egito


no Período Ptolomaico, resultado do influxo do Direito Grego e de sua fusão com
os institutos do Direito Egípcio108.

Durante o Período Tardio os faraós das Dinastias XXV e XXVI lutavam para
resgatar a antiga grandeza do Egito de seus antepassados. Além de construções
novas, buscavam restaurar construções antigas, bem como copiar o estilo das
tumbas e murais do Antigo e Médio Império. Os ancestrais estavam sendo
invocados para legitimar o poder real e lembrar o povo do que o Egito havia sido.
Todavia, vários estados estrangeiros disputavam o poder na Ásia e na porção
oriental do Mediterrâneo, e, com isso, em 525 a.C. os Persas, guiados por
Cambises, derrotaram os egípcios em Pelúsio, e Cambises e deus descendentes
formaram a XXVII Dinastia. Após a morte de Cambises ouve uma tentativa de
sublevação pelos egípcios, mas esta foi rapidamente esmagada por Dario, o rei
seguinte. O domínio persa seguiu até o ano 332 a.C., quando Alexandre, o
Grande, derrotou os persas e invadiu o Egito. Alexandre foi entronizado como o
novo soberano, tendo sido coroado no templo de Ptah, em Mênfis. Alexandre
também visitou o oráculo de Amon, no templo de Siuá, onde foi saudado como
filho de Amon e legítimo faraó do Egito. Após fundar uma nova capital na margem
norte do Delta, Alexandria, Alexandre morreu na Babilônia, aos 33 anos, em 323
a.C. Seus associados dividiram os espólios de seu império, cabendo o Egito a um
de seus generais, Ptolomeu, dando origem à última casa real do Egito
independente, no período que recebeu seu nome109.

Não obstante os ptolomeus se apresentassem ao povo como egípcios que


adoravam os deuses egípcios, na verdade falavam grego e se vestiam como
gregos110. Ainda, após a conquista um grande fluxo de gregos e macedônios
migrou para as cidades de Alexandria, Náucratis, Ptolemais e para o interior do
Egito, que, ao manter seus antigos costumes, acabaram por trazer consigo seu
direito e viver segundo ele111.

Assim, era natural que a helenização do Egito passasse também por


repercussões no direito, em especial no Direito Privado. Parte do Direito Egípcio
deste período, portanto, terá o caráter de continuação do Direito Grego anterior às
conquistas de Alexandre.

Isso faz com que esse período seja relevante não apenas para o conhecimento
do Direito Egípcio, como também para o conhecimento do direito das poleis
gregas. Grande parte das fontes disponíveis para este estudo, com efeito, consiste
em papiros egípcios112.

O chamado “Papiro de Halle”, em que pese conter lacunas relevantes, relata


uma prática jurídica vigente em Alexandria segundo a qual uma das partes de uma
compra e venda deveria apresentar uma declaração sobre o negócio a um
funcionário do fisco régio. Esta declaração deveria ser acompanhada de uma
porcentagem do valor do preço, e gerava uma obrigação de se registrar a venda
de acordo com o demo do vendedor, isto é, a circunscrição territorial de sua
procedência, e de acordo com a data, indicando-se os nomes das partes e a
situação do imóvel, sob sua responsabilidade. Se a declaração fosse feita pelo
vendedor, cessava para ele a possibilidade de reivindicar o imóvel do comprador,
não obstante ainda pudesse cobrar o preço, ou parte deste, se ainda não
houvesse sido pago. Não se sabe ao certo em que deveria consistir a atividade do
funcionário do fisco; mas, conjectura-se, deveria ser a de compilar e expor ao
público, em ordem cronológica, o conjunto de contratações sobre imóveis que lhe
haviam sido apresentadas. Teria, assim, uma clara função publicitária. Mais do que
isso: debate-se, até mesmo, a possibilidade de este registro público ter tido
eficácia constitutiva do direito do adquirente113.

É digno de nota que a propriedade se transferia independentemente do


pagamento do preço, o que renega um princípio fundamental do Direito Grego,
segundo o qual o único pressuposto da transmissão era precisamente este
adimplemento, o que reforça a importância da publicidade. Ainda, o fato de que
segundo a prática relatada no Papiro de Halle o processo de venda e transmissão
da propriedade passavam por suas etapas, uma de redação de um instrumento
privado, na qual as partes estabeleciam os termos e condições do contrato, e outra
de elaboração de um documento público pelo funcionário do fisco, após o
pagamento da taxa. Práticas semelhantes eram adotadas nas localidades situadas
fora da capital Alexandria, e há mesmo quem sustente que nestes lugares
houvesse um ofício distinto do fiscal, destinado ao registro com fins
exclusivamente publicitários114.

Já sob dominação romana, no Principado (27 a.C.-284 d.C.), cria-se


propriamente um “registro de propriedade” (Bibliotheke Enkteseon), destinado à
registração de lotes de terras, direitos sobre lotes de terras e escravos. Nele eram
registradas alienações, constituições e extinções de direitos, garantindo-se um
controle dos atos jurídicos praticados sobre os imóveis por meio de um fólio
pessoal. O registro pressupunha a apresentação da transação instrumentalizada
em um documento público. Esta forma pública não era necessária à validade do
ato, mas era para sua inscrição no registro115.

O Egito tinha, desde ao menos o século VII a.C., uma tradição de notariado
privado que os romanos, após a conquista, desenvolveram, notadamente pela
criação de uma série de ofícios notariais nas cidades do interior egípcio. Assim,
mesmo uma cidade de aproximadamente 700 habitantes, como Soknopaiou
Nesos, na região do Oásis de Faium, contava com um notário116.

A criação desse registro, ou, em tradução literal, desta “biblioteca de aquestos”


como instituição, acontece aproximadamente entre os anos 68 e 72 d.C. Não se
trata da criação de uma única biblioteca para todo o país, mas sim da criação de
uma instituição que deveria ter um ofício em cada nomo 117, palavra grega que
significava uma circunscrição administrativa do território egípcio – conhecida pelos
egípcios no Antigo Império como sépat 118 – e que correspondia, em geral, a uma
extensão de 30 a 40 quilômetros nas margens do Nilo, limitada, pelos lados, pelo
rio e pelo deserto119.

Antes da criação desta instituição, mas já com a preocupação de se evitar


alienações a non domino, e onerações de bens não pertencentes ao devedor, os
romanos atribuíram a função de supervisionar a elaboração dos contratos e as
transmissões de direitos a dois arquivos situados em Alexandria, a Adriani
Bibliothéke e o Nanaion. No entanto, esta centralização gerava muitos
inconvenientes práticos, notadamente os custos e perigos de uma viagem até
Alexandria para providenciar o depósito dos contratos. Para descentralizar a
função, utilizaram a estrutura de outra instituição, a Bibliothéke Demosíon Lógon,
arquivo público até então destinado à conservação de documentos oficiais e
declarações apresentadas aos ofícios cadastrais. Este arquivo foi cindido em duas
seções, uma das quais prosseguiu nas funções originárias, e a outra passou a se
dedicar à publicidade das alienações de imóveis. A Bibliothéke Demosíon Lógon já
contava com sucursais em muitos distritos, e essa divisão foi feita ao mesmo
tempo em todos eles, por volta do ano 55 d.C. Todavia, essa nova seção foi
adquirindo cada vez mais importância, e, por isso, demandando uma organização
autônoma. Com isso, em momentos diferentes (por exemplo, em Faium
aproximadamente no ano 72 d.C.; em Oxirrinco, entre os anos 99 e 116 d.C.), já
que cada distrito tinha sua realidade, foi se realizando uma separação completa de
funções, ocasião em que surgiu a Bibliotheke Enkteseon 120 .

O procedimento se iniciava por uma rogação (prosaggelía) dirigida ao


registrador (bibliophylakes), na qual se pedia uma autorização para que o notário
lavrasse o ato. Se o pedido fosse compatível com os dados constantes do registro,
isto é, o imóvel estivesse registrado em nome do alienante ou daquele que
constituía o direito real, e se não houvesse qualquer restrição à possibilidade de
alienação ou circunstância semelhante, expedia-se a autorização (epístalma) para
que a escritura fosse lavrada. Esta autorização era aposta no final do requerimento
apresentado121.

Um exemplo de situação na qual essa autorização da biblioteca podia ser


denegada consiste no uso de uma modalidade de garantia conhecida como
Hypallagma. Tratava-se de uma averbação (parathesis) de uma katoche, instituto
que gerava uma espécie de indisponibilidade de um dado bem. Até o pagamento
da dívida garantida, deveria o bibliophylakes recusar sua autorização (epístalma)
para a prática de qualquer alienação ou oneração que dissesse respeito ao bem
assim arrestado122.

Entabulado o negócio em conformidade com a autorização, apresentava-se ao


registro nova rogação, agora de registro, em duas vias, uma das quais ficaria
depositada no registro, e a outra seria restituída ao apresentante, na qual constaria
a anotação de que o registro fôra feito. Por fim, realizava-se a registração
propriamente dita (parádesis), em uma folha aberta em nome do titular123.

Com base nas diferentes declarações que iam sendo levadas a registro, o
registrador elaborava fichas relativas às propriedades de cada indivíduo. Assim,
passaria a ser impossível a um devedor dar em garantia uma gleba de terras que
não lhe pertencia mais, ou então que já fôra outorgada a outro credor124.

Essa ficha – uma espécie de fólio pessoal dedicada ao devedor no diastroma, o


protocolo geral das transações registradas – provavelmente consistia na pedra de
toque do sistema, não obstante outros detalhes do seu funcionamento sejam ainda
desconhecidos125.

Tal fato produziu uma revolução no crédito privado egípcio, generalizando o


recurso a garantias imobiliárias. Isso elevou o valor médio dos empréstimos em 3,3
vezes (de 107 para 360 dracmas), tornou mais frequentes os empréstimos de
valores relevantes (superiores a 1.000 dracmas), e até mesmo ampliou o acesso
das mulheres ao mercado de crédito126.

A fonte que nos fez conhecer a existência dessa instituição é um edito do


Prefeito do Egito Marcus Mettius Ruffus, do ano 89 d.C. Nesse edito se ordenava
que os proprietários e credores hipotecários fizessem registrar, no prazo de seis
meses, os seus direitos, indicando, ainda, a origem dos bens que estavam em sua
posse. A medida incluía expressamente mulheres e crianças. Por fim, proibia os
notários de lavrarem atos sem antes obter uma autorização da biblioteca de
aquestos, cominando a nulidade do ato, assim como uma multa. Este edito foi
publicado em um contexto de graves problemas no funcionamento da biblioteca de
aquestos do nomo de Oxirrinco. Para remediá-los, portanto, determinava uma
espécie de “registração compulsória”, bem como condiciona a atuação dos
notários127.

É, também, muito relevante o papiro encontrado em Oxirrinco, datado do ano


de 186 d.C., conhecido como “Petição de Dionísia”, no qual uma mulher chamada
Dionísia apresenta uma espécie de contestação contra seu pai, que a havia
demandado judicialmente, na qual, entre outras razões, argumenta que certos
bens, por ele doados, não poderiam ser questionados já que estavam
regularmente registrados nos registros públicos. A peça invoca, ainda, o já
mencionado Edito de Marcus Mettius Ruffus128.

Em que pese a existência de alguma controvérsia quanto a uma suposta


finalidade cadastral e fiscal da instituição, o Edito deixa claro que os registros ali
feitos tinham como objetivo que os contraentes não corressem o risco de se verem
enganados por sua própria ignorância129, ou seja, que não corressem o risco
causado pela existência de algum ônus ou alienação ocultos. É inegável, portanto,
que se tratava de uma instituição cujos fins, diretos e precípuos, diziam respeito à
publicidade imobiliária130.

A criação da Bibliotheke Enkteseon é um evento capital na história da


publicidade imobiliária. Graças a ela, e aos notários egípcios que elaboravam os
instrumentos que lhe eram submetidos, os empréstimos passaram a contar com
garantias sólidas, e um mercado de crédito pôde florescer ainda no primeiro século
da Era Cristã131.

2.5. A publicidade imobiliária na Grécia Antiga

Diferentemente do que ocorreu na História de Roma, em que o Direito Romano


se apresenta como um todo orgânico que atribui unidade ao fenômeno ainda que
tenha havido modificações ao longo do tempo em que se desenvolveu, a própria
expressão “Direito Grego” é problemática quando se tem em vista a Grécia da
antiguidade.

A existência de dezenas de poleis politicamente independentes implica na


existência de dezenas de sistemas jurídicos, que, se tanto, baseavam-se em
princípios ou concepções jurídicas mais ou menos semelhantes. Em que pese a
probabilidade de algumas poleis terem copiado disposições legais de outras, as
evidências disponíveis sinalizam modificações substanciais muito claras de lugar a
lugar. Traços comuns se manifestam apenas em âmbito muito geral, ao passo que
no âmbito da especificidade das regras predominam as diferenças. Por exemplo,
havia uma ideia geral de que o casamento era um arranjo envolvendo o passado,
presente e futuro das famílias, com consequências patrimoniais; mas se em
Atenas uma cidadã não poderia se casar com um escravo, em Gortina, na Ilha de
Creta, esse casamento não apenas era possível, como os filhos dele resultantes
eram considerados legítimos e ingênuos. Há alguma unidade no modo de ser dos
processos e procedimentos das distintas poleis, como, por exemplo, a oralidade, o
tratamento das lacunas na lei, e a ausência de uma profissionalização dos juristas.
As diferenças quanto ao direito substantivos, contudo, impedem um tratamento
unificado132.

Dessa maneira, o tratamento do tema da publicidade imobiliária na Grécia


Antiga é necessariamente fragmentário, e baseado nas evidências disponíveis
para cada local, quando disponíveis. Boa parte do conhecimento que se tem neste
âmbito, que se revelará nas indicações que vêm a seguir, deriva de um fragmento
do perdido “Tratado sobre as Leis” de Teofrasto133.

Para Coviello, não restam dúvidas que também na Grécia – assim como em
muitos outros lugares da antiguidade – a propriedade do solo teria sido
originariamente coletiva, na forma de uma propriedade familiar, e, portanto,
inalienável134.

Nos Tempos Homéricos a propriedade da terra estava intimamente ligada ao


poder das famílias aristocráticas. Na Ítaca da Odisseia quase inexistia a
possibilidade de que, sob condições normais, fosse possível que alguém
adquirisse terras nas regiões já habitadas. Teoricamente alguém poderia
ultrapassar a fronteira e adquirir as terras vagas que ali estivessem; mas este tipo
de ousadia somente seria factível em circunstâncias excepcionais, mediante uma
violenta compulsão, já que o exílio era tido como o mais amargo dos destinos que
alguém poderia ter135.

A conjugação da escassez de terras com o aumento da população, e a


diminuição das parcelas quando alguém morria e a sua terra era partilhada entre
os filhos, levou à emigração. Levas de gregos abandonaram a Grécia Continental e
Insular em direção a lugares como a Espanha e as praias do Mar Negro, mas este
movimento se iniciou, por volta da segunda metade do século VIII a.C., na Itália
Meridional e na Sicília136.

A propriedade de terra era tão importante que um conto de fundo moralizante


relatado por Ateneu de Náucratis no “Banquete dos Eruditos” relata a história de
um homem natural de Corinto chamado Etíops que era tão indisciplinado que
trocou seu direito a uma porção de terras em Siracusa por um bolo de mel durante
a viagem, antes mesmo de chegar ao destino. A anedota revela não apenas a
reprovação social de um mau negócio envolvendo terras, como também o costume
de que as terras fossem, de algum modo, divididas entre os colonos. Não é claro,
contudo, o modo como as terras eram divididas, se em partes iguais, ou se
seguiam algum tipo de hierarquia137.

As restrições sobre a circulação da terra foram sendo gradativamente aliviadas,


com o passar do tempo, e, com isso diversas instituições parecem ter sido
destinadas especificamente a dar publicidade dos atos transmissivos da
propriedade, como o depósito dos documentos em locais públicos, a anotação da
operação em registros públicos, e a existência de livros cadastrais. Para Coviello,
contudo, apesar das aparências, esse depósito era destinado à conservação dos
documentos, e não à publicidade dos atos. Seria uma prova disso o fato de não
terem sido encontrados quaisquer indícios de que fosse franqueado ao público o
acesso aos registros e documentos depositados138.
Em sentido oposto, L. F. Del Pozo entende que a publicidade de certos
negócios sobre imóveis estava disseminada no mundo grego, e a aparente
diversidade e heterogeneidade dos sistemas existentes na Grécia Clássica não
pode levar à conclusão contrária. Em defesa dessa ideia, mostra que mesmo em
tratados internacionais a publicidade era trazida à baila, citando o primeiro tratado
entre romanos e cartagineses, no qual se dava garantia pública aos créditos de
comerciantes contratados por arauto ou perante registrador; ainda, que em um
trecho do retórico e filósofo cínico Dion Crisóstomo, se chamava a atenção às
operações contratadas “em público”, as quais punham “a cidade como
testemunha”. Para o autor, o filósofo expressaria o senso comum da parte oriental
do império de sua época, segundo a qual o registro garantiria ao negócio uma
validade tal, que seria impossível anular seus efeitos. Finalmente, cita um trecho
do pseudo-Demóstenes, em que, a fim de provar que certo Protos é proprietário de
um barco, invoca três fundamentos: que Protos o comprou, que o preço foi pago, e
que a coisa está registrada em seu nome em um ofício público139.

Não obstante os textos citados por L. F. Del Pozo indiquem que, de fato, havia
um costume de dar publicidade a determinadas situações jurídicas, isto não
demonstra que, mais do que publicidade de fato, estes mecanismos eram
destinados a dar publicidade jurídica a elas. Com mais razão, não demonstram que
se tratava de um mecanismo de proteção a terceiros e à boa-fé – pilar do moderno
sistema de publicidade.

A despeito disso, pode-se ponderar que tinham em si “sintomas de


publicidade”, como bem afirma Pugliatti140.

Uma primeira categoria das práticas de publicidade imobiliária que vigoravam


na Grécia tem por objeto a realização de proclamações públicas e a prática de
solenidades em público, sem que do ato, necessariamente, restasse algum registro
escrito. Quando praticadas perante autoridades públicas recebem o nome de
Katagrafé 141.

Na colônia grega de Thurii, atualmente situada na Calábria Italiana, houve,


durante certo tempo, uma regra segundo a qual as vendas dos imóveis e dos
escravos deveriam necessariamente ser praticadas no mercado público.
Posteriormente, essa regra foi abandonada, e foi substituída por outra segundo a
qual a venda deveria ser comunicada a três vizinhos, aos quais seria dada uma
moeda, a fim de que se lembrassem do fato. A mesma prática é relatada em Eno,
na Trácia142.

Esses vizinhos-testemunhas, recompensados por sua participação no ato com


uma moeda, são responsabilizados quando se negam a testemunhar o que viram,
ou quando prestam um falso testemunho sobre a venda. Têm um dever de
testemunhar, e entre os gregos a função de testemunha é considerada de muita
nobreza. Recorde-se que na Ilíada são os deuses que testemunham e garantem
os pactos143.

Em Mitilene, na Ilha de Lesbos, utilizava-se um sistema conhecido como


Prochryxis (literalmente, “pré-anúncio”), e que consistia no anúncio compulsório,
por meio de um arauto, e com vários dias de antecedência, a intenção de vender a
alguém um imóvel. Se em um primeiro momento bastava o arauto, com o passar
do tempo se passa a exigir também a presença de um magistrado. Uma lei do
governante Pitaco (aproximadamente séculos VII-VI a.C.) determinou que o
anúncio fosse feito na presença do rei ou de um pritano, ou seja, um magistrado. A
presença de um magistrado, para alguns, implica uma espécie de investidura em
favor do adquirente, perante autoridade pública. Contudo, ainda que assim não
seja, já implica um avanço em termos de publicidade em relação à proclamação
pura e simples ao público por meio de arauto. Não se sabe, contudo, se a omissão
do eventual interessado em impugnar a venda, após ser comunicado pelas
proclamações, implicava algum tipo de preclusão ou caducidade de seu direito144.

Em Atenas se adotou sistema semelhante, mas bem mais sofisticado: a


Prografí (literalmente, “prescrição”), que consistia da declaração da intenção de
vender perante magistrado, com ao menos sessenta dias de antecedência, período
este em que a manifestação dos interessados ficava inserida no álbum do
magistrado receptor. É então produzido um documento representando um tributo,
no montante de um por cento do preço da venda, que deverá ser pago pelo
comprador. Após o pagamento, o nome do comprador é então inscrito em uma lista
provisória, e, dentro de certo prazo, deverão eventuais terceiros interessados fazer
valer seus direitos. Após o decurso desse prazo, sem impugnação, considera-se
que o comprador adquiriu legitimamente o bem. Tem-se, aí, um procedimento que
reúne a necessária composição de interesses privados, com um interesse fiscal
arrecadatório, condicionando a aquisição ao pagamento do tributo145.

Uma segunda categoria de práticas relacionadas à publicidade imobiliária, nas


quais eram produzidos registros escritos da transação, é denominada Anagrafé.
Podia se dar de duas maneiras. A primeira delas, aparentemente mais recente no
tempo, consistia no depósito em um arquivo de tabletes de cerâmica, ou de
pergaminhos mantido por um ofício ou magistrado mais ou menos especializado. A
segunda, aparentemente mais remota, consistia na exposição ao público de um
registro da transação em um templo, uma praça pública ou mesmo no próprio
imóvel, pelo que, em geral, gerava documentos produzidos em pedra ou outro
material durável e passível de exposição prolongada aos elementos146.

O uso de templos para arquivar leis ou outros documentos com efeitos jurídicos
não era novo. Já desde o século VII a.C. os templos de Apolo em Mileto e Argos
recebiam em depósito leis, decretos e atos jurídicos, e no templo de Diana, em
Éfeso, arquivavam-se transações e segregações imobiliárias147.

A origem desse ofício destinado ao arquivamento de transações imobiliárias


possivelmente se encontra no costume de se depositar uma cópia do contrato,
devidamente firmado e selado, em poder de um terceiro imparcial, em quem as
partes confiam, de forma que, a partir de então, o instrumento não mais possa ser
alterado. Com o passar do tempo, essa função vai sendo assimilada por um
magistrado especializado. É o que ocorreu no caso específico de Atenas148.

Havia registros assemelhados, também, em Éfeso, Turi, Rodes e outras


cidades, nas quais se depositavam transcrições de contratos que tivessem por
objeto transmissão de propriedade de imóveis, e onde se podia descobrir se certos
bens eram livres e sem ônus, bem como se pertenciam ao vendedor. Os contratos
apresentados eram reproduzidos por extrato, indicando-se quem eram as partes,
qual era a natureza do ato, a designação do objeto, bem como um juramento do
adquirente de que adquiria de forma justa, sem colusão, simulação, ou qualquer
tipo de fraude. Segundo Coviello149, pareceria estar aqui, em embrião, a legalidade
do Sistema Germânico. Contudo, para o autor, que resiste à ideia da existência de
mecanismos de publicidade imobiliária na antiguidade, diferentemente dos
sistemas contemporâneos o objetivo seria exclusivamente o da conservação das
provas dos atos jurídicos, somado a um interesse fiscal, incidente sobre as
operações de transmissão de direitos reais. Admite o autor que os atos registrados
passavam a servir como prova autêntica, gerando certa publicidade de fato; porém,
este não parece, para ele, ser o objetivo precípuo do procedimento. Com efeito, os
atos depositados estavam sujeitos a sigilo, e uma lei de Éfeso cominava penas
severas ao funcionário responsável pelos registros que fornecesse a terceiros
cópia de um acordo de quitação entre credor e devedor. Portanto, ainda segundo
Coviello, estes registros não poderiam ser comparados aos sistemas
contemporâneos de publicidade.

Pugliatti discorda das conclusões de Coviello, e também de suas premissas.


Afirma que em Rodes a transcrição das vendas de imóveis em um registro público
era condição de validade do próprio negócio, e que em Éfeso as transações e
partições imobiliárias não apenas eram tornadas públicas por sua afixação em um
quadro no templo de Diana, como também uma cópia do edital era remetida ao
arquivo público, para que com base nesta se pudesse dar conhecimento, mediante
solicitação, a qualquer interessado. E em Thurii o comprador não estava obrigado
a pagar o preço se não lhe fosse exibida uma certidão, expedida pelo registrador
público, atestando que o imóvel se encontrava livre de ônus. Assim, segundo
Pugliatti, o sistema da anagrafé se mostra já como um completo sistema de
publicidade, já que permite saber se o alienante transfere legitimamente a
propriedade, ou seja, se a coisa lhe pertence, e se está livre de ônus ou direitos de
terceiros. Com isso, presume-se, o adquirente se considerava protegido contra
terceiros em sua aquisição150.

O sistema da Anagrafé por meio do depósito em arquivo público inegavelmente


continha mais do que um “sintoma” de publicidade: efetivamente tinha por escopo,
ainda que inconsciente, levar ao conhecimento do público a existência de
eventuais riscos na aquisição, bem como da ocorrência de uma transação que
poderia ter por objeto um bem alheio. É exagerado afirmar que se tratasse de um
sistema “completo” de publicidade; mas, inegavelmente, tratava-se de publicidade.

A segunda modalidade de Anagrafé foi gestada para viabilizar o uso e


aumentar a segurança da hipoteca grega – ou, mais propriamente, da hipoteca
ática. Em Atenas havia o costume de se fixar nos imóveis hipotecados uma pedra,
a qual portava uma inscrição indicando a natureza do imóvel, o nome do credor e a
soma de dinheiro garantida pelo bem. Estes marcos físicos recebiam a
denominação de horós (o Para alguns autores, estaria aqui demonstrado
que a publicidade das hipotecas tem início na Grécia, pelo uso deste sistema151.

Não era esta a única finalidade destas pedras. Os horói eram comuns na Ática,
e, de modo geral, tinham três funções. A primeira delas, mais comum, era a de
servir de marco físico que aclarava os limites entre propriedades ou então que
chamava a atenção a certo objeto, como uma tumba ou um santuário. A segunda
finalidade era relacionada ao arrendamento de propriedades. E a terceira
finalidade era a de tornar pública a existência de alguma oneração, ou vínculo, que
gravasse a propriedade152.

De maneira geral, o texto gravado no horós destinado a tornar públicos os ônus


era bastante sintético. Um exemplo que bem representa o texto “médio” é o de um
encontrado em Eleusis, datado do ano 291 a.C.: “No arcontado de Aristonymos.
Horós da casa hipotecada a Nausístratos de Eleusis, 200 dracmas, nos termos do
acordo depositado com Theodoros de Oinói”153.

É possível estabelecer um paralelo entre os horói gregos e os kudurrus


mesopotâmicos. Em primeiro lugar, o próprio sentido das duas palavras: limite,
fronteira. Além disso, em ambos se vislumbra um intento de tornar pública a
existência de certo negócio que atinge um imóvel por meio de pedras gravadas
com inscrições154.

Muitas centenas desses objetos foram escavadas. Os mais antigos cuja data é
conhecida são de 363 a.C.; os mais recentes de entre 267 e 259 a.C.155 Podiam
ser feitos de qualquer tipo de pedra: mármore, pedra calcária, pedra vulcânica, ou
qualquer outra que estivesse disponível, e eram implantados em locais
apropriados. A qualidade do trabalho de cantaria aplicado à pedra variava do
trabalho claramente amador feito por um camponês, ao profissional, comparável às
melhores estelas gregas. Mas nem sempre diziam respeito a hipotecas. Na
verdade, em um primeiro momento tais objetos eram utilizados como um simples
marco geodésico indicativo dos limites de um imóvel. Posteriormente, com o
passar do tempo, começaram a ser utilizados, também, como um aviso sobre a
existência de ônus gravando o imóvel156, ou mesmo para gerar notícia outros tipos
de notícia. Em um distrito rural da Ática foi encontrado um horós que dizia “Horós
da terra da Fraternidade de Eikadeis. Ninguém deve fazer qualquer tipo de
empréstimo garantido por esta terra”157.

Quanto aos ônus noticiados nos horói, estes não se restringem às hipotecas.
Há, também, mais duas modalidades de garantia, conhecidas como Prasis Epi
Lysei e Apotimema.

A tradução literal de prasis epi lysei é “venda com condição de resgate” ou


“venda com a condição de que o vendedor possa resgatar a propriedade dos
direitos do comprador sobre ela”, modalidade de venda com escopo de garantia na
qual o vendedor é devedor, e o comprador é credor. O vendedor-devedor
permanecia na posse do bem, e pagava ao credor-comprador um aluguel, que, na
verdade, correspondia aos juros da dívida. Se a dívida não fosse paga, a
propriedade permanecia com o credor (não obstante os aspectos desta execução
sejam desconhecidos). Se a dívida é paga, o bem é liberado158.

Já apotimema se traduz por “avaliação” e corresponde à garantia que tinha o


pupilo órfão sobre os bens do tutor, quando o patrimônio administrado por este
último consistia em dinheiro; e da garantia da mulher casada, sobre os bens do
marido, relativamente ao valor de seu dote. Isto se fazia por um procedimento
perante o arconte, no qual os valores eram apurados, e os bens garantidores da
obrigação eram selecionados. Então, fixavam-se os horói nos imóveis
selecionados159.

Trata-se de um instituto tipicamente ateniense, e, quando estes objetos foram


encontrados em outras cidades, como Siros, Lemnos, Amorgos e Naxos, isto se
deu porque nestas localidades havia núcleos atenienses atuantes, que
preservavam seus costumes e instituições160.

Na origem, ao que parece não eram um elemento necessário ao


aperfeiçoamento da garantia, mas em um reconhecimento público do débito pelo
devedor, e em uma advertência pública feita a terceiros pelo credor161, e não resta
demonstrado que estes marcos em pedra eram condição de existência das
hipotecas, ou mesmo de sua validade contra terceiros162.

Ao contrário, em uma passagem de Demóstenes, uma pessoa interessada em


adquirir um imóvel, não vendo nenhum orós sobre ele, ainda assim indagou ao
vendedor sobre a existência de hipotecas, e o fez declarar a inexistência de
gravames perante testemunhas, a fim de se resguardar de qualquer débito
gravado sobre o bem. Assim, não se pode falar aqui em uma publicidade jurídica
das hipotecas, ou na inoponibilidade de uma hipoteca que não houvesse sido
publicitada por esse meio.

Na verdade, a ideia dos marcos em pedra é outra: a de restrição simbólica ao


direito de disposição do proprietário do bem, uma vez que o direito primitivo – tanto
na Grécia como em Roma – não concebe a constituição de uma garantia real sem
dar ao credor disposição física sobre ela, pela transmissão da propriedade (como
na fidúcia do direito romano), ou da posse (como no pignus romano). Na Grécia, tal
como em Roma, a hipoteca é um produto da evolução das garantias reais.
Portanto, os marcos em pedra não eram mais que símbolos da restrição aos
poderes do proprietário devedor hipotecário.

Para Pugliatti, além de tornar públicos os eventuais ônus que atingissem o


imóvel, os horói acabaram também por gerar prova da posse sobre o bem, e, com
base nisso, da propriedade163. No entanto, a evidência arqueológica conduz a
outra conclusão. Das centenas de horói já encontrados, apenas quatro
mencionavam o nome do devedor e suposto possuidor da terra. Na verdade, a
aposição dos horói se tornou uma prática regular precisamente porque o devedor
tinha a posse da coisa, e nela permanecia164.

Deve-se destacar que a criação e fixação dos horói se faz segundo um


procedimento puramente privado, sem participação de qualquer autoridade
pública, e sem efeitos vinculantes, mas cumprindo sua função de informar. Um
eventual credor hesitará em emprestar recebendo como garantia um imóvel no
qual consta um horós relatando a existência de uma hipoteca em favor de um
terceiro, já que poderá ter problemas para fazer valer seu direito165.

2.6. A publicidade imobiliária no Direito Romano

O Direito Romano não chegou a criar institutos ou mecanismos


verdadeiramente dirigidos à publicidade imobiliária. É esta a communis opinio 166.
Em Roma, a falta de publicidade é reconhecida mesmo por autores que a
enxergam entre os gregos, como Luzzati, que culpa o direito romano por ter se
apropriado da hipoteca grega, sem adotar o correspondente sistema de
publicidade167.

Somente na província romana do Egito apareceriam fenômenos concretamente


mais próximos da publicidade, como já se viu. É provável que tenha se espalhado
para outras províncias; mas a ausência de testemunhos nesse sentido impõe certo
cuidado com essa conclusão168.

Em que pese os romanos terem chegado a conhecer a hipoteca, e ser esta


inseparável da publicidade – já que em razão da permanência da posse com o
devedor a existência deste direito pode ficar desconhecida pelo público
longamente – não instituíram um sistema generalizado de publicidade, o que
somente se explica pela repugnância da jurisprudência romana com toda forma de
documentação ad solemnitatem dos negócios. Alguma publicidade – ainda que
tremendamente limitada – aparece somente no período pós-clássico. Segundo
uma constituição do Imperador Leão, do ano 472 d.C. (Codex, 8, 17, 11), passava-
se a considerar privilegiado o pignus publicum, constituído mediante declaração
transcrita no livro de atos de um magistrado, e interpolando esta constituição, os
compiladores de Justiniano enxertaram também um pignus quase publicum,
consistente na redução a escrito do acordo, subscrito por três testemunhas de
ótima fama169.

A história da hipoteca romana, e, por consequência, do crédito em Roma é,


talvez, a melhor maneira de se observar quão visceral é a ligação entre hipoteca e
publicidade, bem como da maneira que se dá a passagem de um mundo de
contratações pessoais a um mundo de contratações impessoais.

Na vida econômica moderna, o crédito pessoal puro entre particulares tem


escassa importância, e, de maneira geral, somente se concede em curto prazo. Os
créditos reais têm maior importância e uma hipoteca de um imóvel rural pode
garantir créditos de longo prazo. Para que a garantia funcione, todavia, é
necessária a existência de um arcabouço jurídico que permita a realização das
finalidades da garantia real. Isto, por vezes, pode chegar a um ponto em que a
propriedade se converta em mera forma, já que o proprietário, acostumado a
trabalhar com dinheiro alheio, onera sua propriedade de modo permanente, de
maneira que o credor passa a ser, na prática, o “dono”170.

A despeito disso, a forma de crédito que predominou no Direito Romano


Clássico e no período da República Romana não foi o garantido por garantias
reais, mas o crédito pessoal puro, com ou sem fiadores. A fides romana, a
honradez e a seriedade dos negócios eram os alicerces em que se apoiava essa
forma de crédito, juntamente com a execução pessoal do devedor. Capitalistas que
quisessem investir seu dinheiro em terras preferiam comprá-las e explorá-las
diretamente, ao invés de emprestar dinheiro ao proprietário e receber o imóvel em
hipoteca171. Afirma Plínio, o Jovem, em uma de suas Epistulae: Sum quidem prope
totus in praediis, aliquid tamen faenero, ou seja, quase todo meu patrimônio é
composto de terras, ainda que tenha algum dinheiro emprestado a juros.
Plínio era um típico capitalista do tempo de Trajano, e seu capital não estava
aplicado em empreendimentos industriais ou comerciais, mas sim,
majoritariamente, em terras que eram, provavelmente, cultivadas diretamente por
seus coloni, e, minoritariamente em créditos pessoais. Mesmo em tempos
posteriores o uso da hipoteca seguiu sendo muito restrito. A despeito da evolução
do direito, os capitalistas seguiram preferindo comprar as terras a recebê-las em
garantia hipotecária, e mesmo os tutores eram obrigados a investir o patrimônio do
pupilo na compra de imóveis, e não em empréstimos garantidos por hipotecas172.

Assim, o crédito real e as garantias reais se desenvolvem muito lentamente na


História de Roma, não sendo claro se o modo de ser da economia atrofiou o
desenvolvimento do direito, ou se o modo de ser do direito atrofiou o
desenvolvimento desta modalidade de crédito. A despeito de alguns poucos
progressos – como a concessão de uma ação real, a Actio Serviana, ao credor
hipotecário por um Edito de Adriano – e a já mencionada constituição do Imperador
Leão, somente a criação de um ofício de registro de hipotecas se teria um
aperfeiçoamento real do sistema. Isto, todavia, nunca ocorreu de maneira
generalizada e poucos lugares do Império – como o Egito – contaram alguma vez
com algo desta natureza173.

Ao invés, o Direito Romano Pós-Clássico piorou ainda mais o sistema, ao


passar a admitir hipotecas gerais privilegiadas que oneravam todo o patrimônio do
devedor e eram estabelecidas pela lei. Assim, o caso da hipoteca geral concedida
ao fisco, contra o devedor de tributos, em garantia de seus créditos, ou em favor
da mulher, contra seu marido, em garantia do seu dote. O Direito Justinianeu de
garantias reais é muito criticado, assim como o Direito Romano Clássico. Os
jurisconsultos clássicos viviam em condições econômicas muito diferentes das
modernas, nas quais predominava o crédito pessoal. Além disso, viam a hipoteca
como uma ameaça à pujança da propriedade e à autonomia do proprietário.
Todavia, a inviabilidade do crédito com garantia real produziu consequências
sociais relevantes, como o aparecimento dos latifúndios: os pequenos
proprietários, ao não conseguir crédito em condições favoráveis, acabavam por
vender suas terras, convertendo-se em arrendatários dos latifundiários174.

Para tentar remediar a ausência de publicidade, a única medida que se tinha


era considerar estelionato, punido penalmente, o fato de se alienar ou onerar
alguma coisa, sem se declarar as hipotecas que já a gravavam175.

Pode-se vislumbrar alguma publicidade de fato – mas nunca de direito – nas


solenidades de transmissão da propriedade.

Há, com efeito, em Roma formas solenes, como a mancipatio e a in iure cessio,
que são públicas, pois delas participavam o libripens e as cinco testemunhas na
primeira; e o magistrado e o público do fórum, na segunda. Porém, segundo
Coviello, o objetivo da participação destas pessoas no ato não era a publicidade176,
e, de fato, é inadequado falar aqui em publicidade em sentido jurídico.

Também entre os romanos, tal como se viu com outros povos da antiguidade,
seriam estas formalidades vestígios de um passado de terras comunais.
Segundo Besson, em boa hora os romanos chegaram à propriedade privada,
mas é temerário afirmar que as populações italianas a conheciam e praticavam
desde a mais remota antiguidade. O coletivismo antigo deixou numerosas marcas
nas instituições da Roma Antiga, dentre as quais as formas solenes de
transmissão da propriedade, e as próprias categorias res mancipi e res nec
mancipi. A mancipatio se dava na presença de cinco cidadãos romanos, no papel
de testemunhas, e um oficial público, o libripens, portando uma balança de cobre.
Começava-se pela pesagem de metal bruto, que simbolizava o imóvel. Então, era
feita a entrega do metal, e as partes declaravam, com palavras sacramentais, que
a coisa, doravante, pertenceria ao comprador, ex jure quiritum, pelo bronze e a
balança – per aes et libram. Com o tempo, passou-se a realizar a pesagem do
metal antes da cerimônia, colocando-se na balança, após, apenas um seu
fragmento; até que, com a introdução da moeda, deixou de haver qualquer
pesagem. Com a introdução da moeda, o comprador batia na balança com esta, e
a mancipatio passou a ser uma venda ficta, não perdendo, no entanto, o caráter
solene, e a presença das testemunhas e do libripens. Nessa etapa da civilização
romana, a mancipatio era, de fato, um modo de transferência de propriedade
privada (ainda que a terra se tratasse de res mancipi), sem implicar um direito
eminente da cidade. Mas são fáceis de perceber, aí, os traços do coletivismo
primitivo. Poder-se-ia mesmo concluir que as rei mancipi eram o capital inalienável
das antigas comunidades do Lácio; e que as cinco testemunhas representavam as
cinco classes em que Sérvio Túlio havia dividido a população, significando uma
remota necessidade de um consenso da comunidade para a alienação em antigas
assembleias177.

Prosseguindo, BESSON afirma que a mancipatio – por sua publicidade e


complexidade – assegurava a certeza das transmissões e a conservação da prova,
o que se conseguia não apenas por seu caráter solene, mas também por sua
forma intrínseca: as partes deviam indicar, nos verba nuncupata, o nome e
conteúdo de cada imóvel, servidões e outros ônus, e toda e qualquer restrição ao
direito do comprador. E a ideia de publicidade seria ainda mais presente na in iure
cessio, por ser realizada no fórum, e encerrar um arremedo de registro nas acta
dos juízes – documentos que narravam o desenrolar do processo. Após o
estabelecimento das condições, comprador e vendedor se apresentavam ao
magistrado num litígio fictício. O cessionário reivindicava a coisa, e o cedente nada
opunha após ser indagado pelo juiz, o qual proclamava por uma addictio o direito
do reivindicante. Mas a in iure cessio não dava garantias contra a evicção, razão
por que era pouco usada nas transmissões imobiliárias. Entretanto, com o tempo
os subterfúgios do direito pretoriano vão dando proeminência à traditio, como, por
exemplo, na exceptio rei venditae et traditae, que assegurava a posse pelo prazo
do usucapião. Até que, por fim, Justiniano consagra o uso comum da traditio,
declarando ser esta o único modo voluntário de transmissão da propriedade,
deixando de existir a distinção entre res mancipi e res nec mancipi 178. Com essa
medida, a publicidade sofre grave pena, em especial quando deixa de ser feita por
atos materiais e passa a ser subentendida. Estas transmissões – clandestinas –
abriam as portas para a fraude179.

A In Iure Cessio também era um negócio formal e solene, certamente criado em


tempos mais recentes do que a mancipatio, mas já mencionado na Lei das XII
Tábuas. Tinha uma forma rigorosamente definida, e era um instituto do Direito
Quiritário, pelo que somente estava acessível aos cidadãos romanos.
Caracterizava-se pelo emprego de esquemas e estrutura de um processo judicial
baseado no rito da legis actio sacramenti in rem. Podia ser empregado para
transmissão das rei mancipi, e também das rei nec mancipi, assim como para a
constituição e extinção de servidões, ou mesmo para a aquisição do pátrio poder
na adoção, para a cessão da tutela mulieris ou para a cessão de direitos
hereditários. Adotando a forma de um processo simulado, realizava-se perante
magistrado dotado de iuris dictio, e, a partir de 367 a.C., somente perante o pretor.
Diante do magistrado o adquirente pronunciava a fórmula vindicatória, o pretor
indagava ao alienante se queria contravindicar, e, diante da negativa ou silêncio
deste, pronunciava sua sentença em favor do adquirente180.

É interessante observar que o acordo entre alienante e adquirente estava


implícito e pressuposto, mas não aparecia na in iure cessio. Com isso, esta se
mostrava como um negócio abstrato, desvinculado de sua causa, e que podia ser
realizado em decorrência de uma venda, de uma doação, por conta de um dote
etc. E, diferentemente da venda, por exemplo, a in iure cessio, assim como a
mancipatio, tinha efeitos reais181. Nesse sentido, pode-se dizer que a mancipatio
era uma compra e venda formal que não gera obrigações182.

Novamente, deve-se distinguir publicidade, do sentido específico que deve ser


dado à publicidade imobiliária. Há nessas solenidades publicidade de fato porque
são públicas no sentido de acessíveis, verificáveis por quem as queira presenciar,
e também porque são presididas por magistrados183; mas não há publicidade
imobiliária no sentido de que fossem destinadas a gerar uma informação
duradoura sobre os direitos que incidiam sobre os imóveis.

Ainda, nenhum desses institutos encerrava em si preocupação com a proteção


dos direitos de terceiros. As solenidades eram prescritas tendo em vista uma
necessidade – comum na infância das sociedades – de se ter sob os olhos sinais
materiais dos atos civis. A substituição posterior das formas solenes pela simples
traditio também indica isso. Com efeito, a tradição não gera nem mesmo
publicidade de fato, em especial com sua crescente atenuação que acabará por
desembocar na tradição ficta ou simbólica184.

Se, por um lado, podiam gerar publicidade de fato que atendia aos anseios de
um sistema de publicidade imobiliária de uma sociedade primitiva, certamente já
eram inadequadas para este mister na Itália de Augusto ou no orbis romanus de
Caracala185. Como afirma Schulz, as cinco testemunhas e o libripens necessários à
mancipatio eram substitutos bastante precários da registração186.

Outro fenômeno que é apontado como portador de sintomas de publicidade é a


insinuatio apud acta dos contratos de doação do século IV d.C.

Trata-se de uma modalidade de registração específica para as doações que


possivelmente vigorou a partir do ano 355 d.C. Sob Justiniano, consolidou-se uma
regra segundo a qual doações de valor superior a certo parâmetro – fixado em um
primeiro momento em 300 solidi 187, posteriormente em 500 solidi – eram nulas se
não fossem registradas. Havia algumas exceções, como as doações pias,
antenupciais ou as feitas ao próprio imperador188. Mesmo antes disso, o imperador
Constantino já havia determinado que as doações não apenas deveriam ser por
escrito (scriptura), como também depositada em um ofício público (consignare
actis)189.

Esse “registro” significava a cópia do ato de doação nos gesta ou acta publica,
arquivos ou livros mantidos pelos magistrados romanos. Origina-se na professio
apud acta, formalidade facultativa e mais antiga que era destinada a gerar prova
autêntica da liberalidade feita pelo doador. No entanto, essa formalidade se tornou
obrigatória por determinação do imperador Constâncio Cloro, e recebeu a forma da
insinuatio por edito de Constantino, datado de 323 d.C. Este exigia a formulação
de um documento com o nome do doador e a natureza da coisa doada, seguida da
sua traditio material e solene diante de testemunhas da vizinhança. Por fim, tudo
era consignado nos acta do juiz do domicílio do doador, ou da localização do bem.
A sanção pela falta da formalidade era a nulidade da doação: a insinuação era
elemento intrínseco da doação190.

A finalidade precípua da insinuatio era a de se exigir do doador uma reflexão


madura acerca de seu ato, evitando-se, assim, que um ato impensado pudesse
arruiná-lo. O resultado, contudo, seria o de que o ato seria levado ao conhecimento
do público, pelo que o instrumento, uma vez registrado, transcendia seus fins
iniciais191.

A despeito disso – que permitia a existência de uma publicidade de fato – não


se pode dizer que a insinuatio é um mecanismo de publicidade imobiliária. Não
obstante requisito substancial à validade das doações acima do valor fixado como
paradigma, o instituto tinha por objetivo frear a prodigalidade e gerar prova
autêntica do ato, função esta que se assemelha mais à função notarial
contemporânea192 do que a qualquer sistema de publicidade.

Um último suposto exemplo de publicidade imobiliária entre os Romanos – os


registros do censo, nos quais eram indicados os nomes dos imóveis, localização,
extensão, limites, espécie de cultivo e valor estimado – também não podem ser
considerados meio de publicidade. Apesar das rigorosas leis que asseguravam a
sinceridade nas declarações, o objetivo era meramente o da manutenção de um
cadastro fiscal, sem efeitos ligados ao ato em si mesmo. Seu objetivo era político,
sem qualquer relação com as contratações privadas, transmissão da propriedade
ou incremento do crédito imobiliário193.

Não obstante o censo tenha deslocado o foco da tributação da pessoa para o


seu patrimônio, e o fato de que esta tributação se desse fundamentalmente sobre
a riqueza fundiária, e que, com isso, tenha-se gerado um incipiente cadastro
imobiliário194, isto certamente não autoriza a conclusão de que tenham contribuído
de algum modo à publicidade imobiliária.
1

Essa também é a posição sustentada por José Luís Lacruz Berdejo e Francisco de Assis Sancho
Rebullida. Cf. José Luís Lacruz Berdejo e Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho
Inmobiliario Registral, 2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 23. Em sentido oposto cf. Ippolito Israele
Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del códice civile
italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LII; e E. BESSON, Lês livres fonciers et la reforme
hypothécaire – etude historique et critique sur la publicité dês transmissions immobilières em
France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 5.
Este último, no entanto, deixa claro que, não obstante haja um encadeamento entre as formas
antigas e as contemporâneas, as razões das práticas não permanecem as mesmas. Ou seja, há
alguma filiação histórica; mas a equiparação é mais analógica do que ontológica.
2

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, p. 14.
3

Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica del Derecho de Propiedad
Privada e Ingeniería Jurídica del Intercambio Personal, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp.
73-74.
4

Cf. Benito Arruñada, Instituciones del intercambio impersonal: Teoría y método de los registros
públicos, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2013, pp. 42-43.
5

Cf. Nebi Bardhoshi, Family Property in Albanian Customary Law, in, Albania – Family, Society and
Culture in the 20th Century, 1ª Ed., Zurique, LIT, 2012.
6

Cf. Fatri Islamaj; Engjëll Likmeta, Historical Aspects of Sale Contract according to Albanian
Customary Law, in, Journal on European History of Law (02) (2019).
7

Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica del Derecho de Propiedad
Privada e Ingeniería Jurídica del Intercambio Personal, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, 74-81.
8

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, p.17.
9

Cf. Marcel Mauss, Sociologia e Antropologia, 1ª. Ed., São Paulo, Cosacnaify, 2003, p. 267.
10

Cf. Marcel Mauss, Sociologia e Antropologia, 1ª. Ed., São Paulo, Cosacnaify, 2003, p. 271.
11

Cf. Marcel Mauss, Sociologia e Antropologia, 1ª. Ed., São Paulo, Cosacnaify, 2003, p. 290.
12

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, p.17. No mesmo sentido
Émile De Laveleye, De la proprieté et de sés formes primitives, 1831, trad. Ing. De G. R. L.
MARRIOT, Primitive Property, 1ª. Ed., Londres, Macmillan and Co, 1878 e Emmanuel Besson, Lês
livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique sur la publicité dês
transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a nos jours, 1ª. ed.,
Paris, J. Delamotte, 1891, p. 12. Este último relata que a etnografia comparada dá conta que os
povos nômades ou que viviam do pastoreio, por seu próprio modo de vida, não chegaram a
conhecer a apropriação individual da terra. A propriedade imobiliária – com um sentido de que
certa porção da terra pertence a uma pessoa determinada, e que, por exclusão, não pertence às
demais – somente teria surgido quando os povos se tornaram sedentários, e o regime agrícola,
intimamente ligado à passagem do tempo e à fixação no espaço, passou ao centro da atividade
econômica. Num primeiro momento, já nessa fase, a terra teria pertencido à tribo, ao clã. E, num
segundo momento, passaria, então, a pertencer à família, entendida esta como um grupo de
pessoas aparentadas, descendentes de um ancestral comum, sob a autoridade de um patriarca. A
organização patriarcal, contudo, ainda inviabilizaria a apropriação privada da terra. Os bens eram
de todos, e constituíam um capital necessário à sobrevivência do grupo. Isso teria dado lugar ao
surgimento da classe das rei mancipi no direito romano, cuja alienação estava sujeita ao
consentimento do grupo, materializado na solenidade e formalismo da mancipatio. Ainda, Henry
James Sumner Maine (Ancient Law – Its connection to the history of early society, and its relation
to Modern Ideas, 5ª. Ed., Nova Iorque, Henry Holt and Company, 1864) afirma que, ao invés do
que ocorria no Direito Romano já maduro – em que a copropriedade era excepcional – na Índia
antiga o estado excepcional era a propriedade individual, a qual sempre permanecia tendente a,
mediante certos acontecimentos, retornar ao domínio comum. As pequenas comunidades eram
compostas por irmandades, as quais formavam mais do que um grupo de parente ou de parceiros
associados. Representavam uma sociedade organizada, com um patrimônio comum, que se
aproximava da gens romana, uma extensão da família baseada em razões perdidas na noite dos
tempos.
13

Cf. Max Weber, História Agrária Romana, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 1994, pp. 70-71.
14

Cf. Ettore Salvi, Storia del Diritto di Proprietà, 1ª Ed., Milão, Ulrico Hoepli, 1915, pp. 32-33.
15

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 15-16
16

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 15-16
17

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 34.
18

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 37.
19

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 56.
20

Cf. Ettore Salvi, Storia del Diritto di Proprietà, 1ª Ed., Milão, Ulrico Hoepli, 1915, pp. 106-112.
21

“Respondeu-lhe Efrom: Meu senhor, ouve-me: um terreno que vale quatrocentos siclos de prata,
que é isso entre mim e ti? Sepulta ali a tua morta. Tendo Abraão ouvido isso a Efrom, pesou-lhe a
prata, de que este lhe falara diante dos filhos de Hete, quatrocentos siclos de prata, moeda
corrente entre os mercadores. Assim o campo de Efrom, que estava em Macpela, fronteiro a
Manre, o campo, a caverna e todo o arvoredo, que nele havia, e todo o limite ao redor, se
confirmaram por posse a Abraão, na presença dos filhos de Hete, de todos os que entravam pela
porta da sua cidade. Depois sepultou Abraão a Sara, sua mulher, na caverna do campo de
Macpela, fronteiro a Manre, que é Hebrom, na terra de Canaã. E assim, pelos filhos de Hete, se
confirmou a Abraão o direito do campo e da caverna que nele estava, em posse de sepultura”
(Gênesis 23, 14-20).
22

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 56-57.
23

“Disse, pois, Jeremias: Veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: Eis que Hananeel, filho de teu tio
Salum, virá a ti, dizendo: Compra o meu campo que está em Anatote, pois a ti, a quem pertence o
direito de resgate, compete compra-lo. Veio, pois, a mim, segundo a palavra do Senhor, Hananeel,
filho de meu tio, ao pátio da guarda, e me disse: Compra agora o meu campo que está em
Anatote, na terra de Benjamim; porque teu é o direito de posse e de resgate; compra-o. Então
entendi que isto era a palavra do Senhor. Comprei, pois, de Hananeel filho de meu tio o campo
que está em Anatote; e lhe pesei o dinheiro, dezessete siclos de prata. Assinei a escritura, fechei-a
com selo, chamei testemunhas e pesei-lhe o dinheiro numa balança. Tomei a escritura da compra,
tanto a selada segundo mandam a lei e os estatutos, como a cópia aberta; dei-a a Baruque, filho
de Nerias, filho de Maaséias, na presença de Hananeel, filho de meu tio, e perante as
testemunhas, que assinaram a escritura de compra, e na presença de todos os judeus que se
assentavam no pátio da guarda. Perante eles dei ordem a Baruque, dizendo: Assim diz o Senhor
dos Exércitos, o Deus de Israel: Toma esta escritura, esta escritura da compra, tanta a selada
como a aberta, e mete-as num vaso de barro, para que se possam conservar por muitos dias”
(Jeremias 32, 6-14)
24

Cf. Douglas A. Knight, Law, Power and Justice in Ancient Israel, 1ª Ed., Louisville, WJK, 2011, p.
204.
25

Cf. Flávio Josefo, De bello judaico, cap. 3, 4; e cap. 17, 6.


26

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 18-19.
27

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 58.
28

Cf. Marc Van de Mieroop, A History of the Ancient Near East, 1ª Ed., Oxford, Blackwell, 2004, pp.
1-2.
29

Cf. Adolf Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization,1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, pp. 35-36.
30

Cf. Adolf Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization,1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, p. 37.
31

Cf. Harriet Crawford, Sumer and the Sumerians, 1ª Ed., Cambridge, Cambridge University Press,
1991, p. 13.
32

Cf. Marc Van de Mieroop, A History of the Ancient Near East, 1ª Ed., Oxford, Blackwell, 2004, p.
39.
33

Cf. Adolf Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization,1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, pp. 37-39.
34

Cf. Samuel Noah Kramer, The Sumerians: Their History, Culture, and Character, 1ª Ed., Chicago,
The University of Chicago Press, 1963, pp. 3-5.
35

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 44-46.
36

Cf. Edouard Cuq, Études sur le Droit Babylonien – Les Lois Assyrienes et Les Lois Hittites, 1ª Ed.,
Paris, Librairie Orientaliste Paul Geuthner, 1929, p. 78.
37

Cf. <https://www.louvre.fr/oeuvre-notices/obelisque>.
38

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 47.
39

Uruk, ou Warka é uma cidade localizada a quatro milhas da margem leste do rio Eufrates, cujas
ruínas são consideravelmente maiores que as das cidades de Ur ou de Larsa. O nome “Warka” é
uma corruptela do original, introduzida após a sua conquista pelos árabes. No passado, chamara-
se “Erech” ou “Orech” para os hebreus, “Huruk” nos atlas geográficos escritos em escrita
cuneiforme, e “Orchoe” para os gregos. A respeito, cf. George Rawlinson, The seven great
monarchies of the ancient eastern world: The history, geography and antiquities of Chaldaea,
Assyria, Babylon, Media, Persia, Parthia and Sassanian or New Persian Empire, with maps and
illustrations, vol. I.
40

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 20-21
41

Cf. Edouard Cuq, Études sur le Droit Babylonien – Les Lois Assyrienes et Les Lois Hittites, 1ª Ed.,
Paris, Librairie Orientaliste Paul Geuthner, 1929, p. 79.
42

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 20-21.
43

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, p. 47.
44

Cf. Adolf Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization, 1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, pp. 281-282.
45

Cf. Adolf Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization, 1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, p. 282.
46

Cf. A. Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization, 1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, p. 282.
47

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 48-49.
48

Cf. Edouard Cuq, Études sur le Droit Babylonien – Les Lois Assyrienes et Les Lois Hittites, 1ª Ed.,
Paris, Librairie Orientaliste Paul Geuthner, 1929, p. 87.
49

Cf. Kathryn E. Slanski, The Babylonian Entitlement Narûs (Kudurrus): A Study in Their Form and
Function, 1ª Ed., Boston, American School of Oriental Research, 2003, p. 251.
50

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, pp. 1-2.
51

Cf. Kathryn E. Slanski, The Babylonian Entitlement Narûs (Kudurrus): A Study in Their Form and
Function, 1ª Ed., Boston, American School of Oriental Research, 2003, p. 250.
52

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, p. 5.
53

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, p. 2.
54

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, p. 11.
55

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, p. 17.
56

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, p. 17.
57

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, p. 17.
58

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, Vol. I, 1ª Ed., Chicago, The Oriental Institute of the University of
Chicago, 1991, p. 23.
59

Cf. Marc Van de Mieroop, A History of the Ancient Near East, 1ª Ed., Oxford, Blackwell, 2004, pp.
166-167.
60

Cf. Kathryn E. Slanski, The Babylonian Entitlement Narûs (Kudurrus): A Study in Their Form and
Function, 1ª ed., Boston, American School of Oriental Research, 2003, pp. 1-8.
61

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 49; A. Leo
Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization,1ª Ed. Chicago, University of
Chicago Press, 1977, p. 286.
62

Cf. Kathryn E. Slanski, The Babylonian Entitlement Narûs (Kudurrus): A Study in Their Form and
Function, 1ª Ed., Boston, American School of Oriental Research, 2003, pp. 57-59.
63

Cf. Giorgio Buccellati, The Kudurrus as Monuments, in, Cinquante-deux reflexions sur le Proche-
Orient ancien offertes en hommage a Leon de Mayer, Vol. II, 1ª Ed., Louvain, Peeters, 1994.
64

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 49-50.
65

Cf. Edouard Cuq, Études sur le Droit Babylonien – Les Lois Assyrienes et Les Lois Hittites, 1ª Ed.,
Paris, Librairie Orientaliste Paul Geuthner, 1929, pp. 86-87.
66

Cf. Kathryn E. Slanski, The Babylonian Entitlement Narûs (Kudurrus): A Study in Their Form and
Function, 1ª Ed., Boston, American School of Oriental Research, 2003, pp. 70-74.
67

Cf. Adolf Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization,1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, p. 287.
68

Cf. Albert Kirk Grayson, Assyrian Civilization, in, The Cambridge Ancient History, Vol. 3-2, 2ª Ed.,
Cambridge, Cambridge University Press, pp. 210-212.
69

Cf. Marc Van de Mieroop, A History of the Ancient Near East, 1ª Ed., Oxford, Blackwell, 2004, p.
169.
70

Cf. Adolf Leo Oppenheim, Ancient Mesopotamia: Portrait of a Dead Civilization, 1ª Ed. Chicago,
University of Chicago Press, 1977, p. 164.
71

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 51-52.
72

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 51.
73

Cf. Albert Kirk Grayson, Assyrian Civilization, in, The Cambridge Ancient History, Vol. 3-2, 2ª Ed.,
Cambridge, Cambridge University Press, p. 211.
74

Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, p. 1.
75

Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, pp. 3-4.
76

Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, p. 4.
77

Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, pp. 6-7.
78

Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, pp. 58-59.
79

Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, pp. 69-70.
80

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 59.
81

Cf. Luis Fernandez. Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., pp.
30-31.
82

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 59.
83

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., p. 34.
84

Cf. Jaromir Malek, The Old Kingdom, in, The Oxford History of Ancient Egypt, 1ª Ed., Oxford,
Oxford University Press, 2003, pp. 99-101.
85

Cf. Jaromir Malek, The Old Kingdom, in, The Oxford History of Ancient Egypt, 1ª Ed., Oxford,
Oxford University Press, 2003, p. 101.
86

Cf. Jacques Pirenne, Histoire de la Civilisation de L’Egypte Ancienne, 1ª Ed., Neuchatel, La


Baconniére, 1961, p. 176.
87

Cf. Jacobus Van Dijk, The Amarna Period and Later New Kingdom, in, The Oxford History of
Ancient Egypt, 1ª Ed., Oxford, Oxford University Press, 2003, p. 298.
88

Cf. Luís Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., pp.
56-58.
89

Cf. Alan B. Lloyd, The Ptolemaic Period, in, The Oxford History of Ancient Egypt, 1ª Ed., Oxford,
Oxford University Press, 2003, pp. 404-405.
90

Cf. Alan B. Lloyd, The Ptolemaic Period, in, The Oxford History of Ancient Egypt, 1ª Ed., Oxford,
Oxford University Press, 2003, p. 409.
91

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 62.
92

Cf. Luís Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., p. 50.
93

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 62-63.
94

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 64.
95
Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 66-67.
96

Cf. Jacques Pirenne, Histoire de la Civilisation de L’Egypte Ancienne, 1ª Ed., Neuchatel, La


Baconniére, 1961, p. 191.
97

Cf. Jacques Pirenne, Histoire de la Civilisation de L’Egypte Ancienne, 1ª Ed., Neuchatel, La


Baconniére, 1961, pp. 176-177.
98

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 68.
99

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., p. 37.
100

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., pp.
121-133.
101

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., pp.
134-135.
102

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., pp.
137-138.
103

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 70.
104

Cf. John Taylor, The Third Intermediate Period, in, The Oxford History of Ancient Egypt, 1ª Ed.,
Oxford, Oxford University Press, 2003 p. 344.
105

Cf. John Taylor, The Third Intermediate Period, in, The Oxford History of Ancient Egypt, 1ª Ed.,
Oxford, Oxford University Press, 2003 p. 341.
106

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 71.
107

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 71.
108

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 86.
109

Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, pp. 111-112.
110
Cf. Salima Ikram, Ancient Egypt: An Introduction, 1ª Ed., New York, Cambridge University Press,
2009, p. 112.
111

Cf. Hans-Albert Rupprecht, Greek Law in Foreign Surroundings, in, The Cambridge Companion to
Ancient Greek Law, 1ª Ed., Cambridge, Cambridge University Press, 2005.
112

Cf. Hans-Albert Rupprecht, Greek Law in Foreign Surroundings, in, The Cambridge Companion to
Ancient Greek Law, 1ª Ed., Cambridge, Cambridge University Press, 2005.
113

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 87.
114

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 88-89.
115

Cf. Hans-Albert Rupprecht, Greek Law in Foreign Surroundings, in, The Cambridge Companion to
Ancient Greek Law, 1ª Ed., Cambridge, Cambridge University Press, 2005.
116

Cf. François Lerouxel, Le Marché du Crédit Privé, la Bibliothéque des Acquêts et les Tâches
Publiques en Egypte Romaine, in, Annales. Histoire, Science Sociales, (67) (2012).
117

Cf. François Lerouxel, Le Marché du Crédit Privé, la Bibliothéque des Acquêts et les Tâches
Publiques en Egypte Romaine, in, Annales. Histoire, Science Sociales, (67) (2012).
118

Cf. Georges Posener, Dictionnaire de la civilisation égyptienne, 1ª Ed., Paris, Fernand Hazan,
1959, p. 192.
119

Cf. Guy Rachet, Dictionnaire de la civilisation égyptienne, 1ª Ed., Paris, Larousse, 1992, p. 177.
120

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 107.
121

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 110.
122

Cf. Jose Luis Alonso, The Bibliotheke Enkteseon and the Alienation of Real Securities in Roman
Egypt, in, The Journal of Juristic Papyrology, (40) (2010).
123

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 111.
124

Cf. François Lerouxel, Le Marché du Crédit Privé, la Bibliothéque des Acquêts et les Tâches
Publiques en Egypte Romaine, in, Annales. Histoire, Science Sociales, (67) (2012).
125

Cf. Jose Luis Alonso, The Bibliotheke Enkteseon and the Alienation of Real Securities in Roman
Egypt, in, The Journal of Juristic Papyrology, (40) (2010).
126
Cf. François Lerouxel, Le Marché du Crédit Privé, la Bibliothéque des Acquêts et les Tâches
Publiques en Egypte Romaine, in, Annales. Histoire, Science Sociales, (67) (2012).
127

Cf. François Lerouxel, Le Marché du Crédit Privé, la Bibliothéque des Acquêts et les Tâches
Publiques en Egypte Romaine, in, Annales. Histoire, Science Sociales, (67) (2012).
128

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 108.
129

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 109-110.
130

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 112.
131

Cf. François Lerouxel, Le Marché du Crédit Privé, la Bibliothéque des Acquêts et les Tâches
Publiques en Egypte Romaine, in, Annales. Histoire, Science Sociales, (67) (2012).
132

Cf. Michael Gagarin, The Unity of Greek Law, in, The Cambridge Companion to Ancient Greek
Law, 1ª Ed., Cambridge, Cambridge University Press, 2005.
133

Teofrasto viveu entre 372 e 288 a.C., e a conservação do fragmento que trata das transmissões
imobiliárias se deve ao antologista do século V d.C. Joannes Stobaeus, o qual reuniu em uma
mesma obra trechos educativos oriundos da literatura grega. É o seguinte o teor do documento,
com versão livre para o português a partir da tradução do grego para o espanhol de Luis
Fernandez Del Pozo: “Certas legislações querem que as vendas sejam proclamadas por um
arauto público e que sejam anunciadas com vários dias de antecedência; outras exigem que estas
ocorram perante um magistrado. Assim, a lei de Pittacos ordena que a venda seja realizada
perante um magistrado. Há as que prescrevem que a venda seja publicada no local onde tem sede
o magistrado por ao menos sessenta dias, como em Atenas, e que o comprador pague a
centésima parte do preço, para liberar-se de todo aquele que possa vir a reclamar ou discutir seu
direito, e que se saiba pelo pagamento do preço quem é o justo adquirente. Em outras, ainda, as
vendas devem ser anunciadas durante cinco dias consecutivos antes de confirmadas, com escopo
de dar aos interessados o tempo para intervir e reclamar a propriedade ou a casa. Tais são as leis
de Cízica. Os túrianos suprimiram todas estas formalidades e não publicam as vendas ou outros
atos em praça pública, mas obrigam vendedor e adquirente a reunirem-se e dar a três dos vizinhos
mais próximos uma pequena moeda, como memória e testemunho do fato. Com isso, os
magistrados, em um caso, e os vizinhos, no outro, são responsabilizados ao se negarem a
receber, ou ao receberem duas vezes da mesma pessoa, ou, ainda, se, havendo recebido, se
negam a indicar o nome do comprador. Ademais, não convém esquecer que os anúncios,
proclamações, e tudo que envolver as oposições, não são, na maior parte dos casos, senão
expedientes empregados para remediar a ausência de outra norma. Com efeito, em todos os
lugares onde está estabelecida a inscrição das propriedades e dos contratos, é fácil saber por ela
se os bens são livres e sem ônus, e se o vendedor é realmente proprietário porque o magistrado
inscreve imediatamente o comprador no lugar do vendedor. Como por vezes existem terceiros que
se passam por compradores e vendedores, convém que existam normas sobre este particular.
Existe em algumas cidades previsões para evitar estes abusos, e, ao mesmo tempo, para
assegurar a publicidade do direito de propriedade. Segundo tais normas, aquele que compra uma
casa deve sacrificar sobre o altar de Apolo que preside o distrito, e aquele que compra um campo
deve sacrificar na cidade que mora, e jurar perante o magistrado encarregado da inscrição, e três
moradores da cidade, que adquiriu justamente, sem fraude, simulação, ou vício de qualquer
ordem. O vendedor deve jurar da mesma maneira, que vende sem dolo. Quem não residir na
cidade, deve sacrificar e prestar juramento sobre o altar de Júpiter Agoraios. Os necessitados
podem livrar-se do juramento com uma oferenda de perfumes. Na falta destas formalidades, o
magistrado nega a inscrição.” Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro
de la propriedad em el egipto faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y
Mercantiles de Espana, s.d., pp. 155-157.
134

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 24-30.
135

Cf. Moses I. Finley, The World of Odysseus, 3ª Ed., Londres, The Folio Society, 2002, pp 48-49.
136

Cf. Sarah B. Pomeroy, Stanley M. Burstein, Walter Donlan, Jennifer Tolbert Roberts, Ancient
Greece – A Political, Social, and Cultural History, 1ª Ed., Oxford, Oxford University Press, 1999, p.
72.
137

Cf. Moses I. Finley, Ancient Sicily, 2ª Ed., Londres, Chatto & Windus, 1979, p. 36-37.
138

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 24-30.
139

. Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., pp.
159-160.
140

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 75.
141

São conhecidas como “Katagrafé” as solenidades que continham um elemento que revestia de
autoridade pública os acordos privados. Em alguns casos, como é o de Atenas, adiante descrito,
darão ao acordo oponibilidade contra terceiros, mediante o pagamento de um tributo. Cf. Luis
Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto faraônico,
Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., p. 167.
142

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 75.
143

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., p.
169.
144

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 76.
145

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 77.
146

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., p.
170.
147

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., p.
171.
148

Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad em el egipto
faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de Espana, s.d., pp.
170-172.
149

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, p. 28.
150

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 78-79.
151

Cf., e.g., Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro
III del códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LII; Affonso Dionysio Gama, Da
hypotheca (theoria e pratica), 1ª. Ed., São Paulo, Saraiva, 1921, pp. 9-10; Jose Luís Lacruz
Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario Registral, 2ª. Ed., Madrid,
Bosch, 1984, p. 21.
152

Cf. John V. A. Fine, Horoi – Studies in Mortgage, Real Security, and Land Tenure in Ancient
Athens, 1ª Ed., Baltimore, J. H. Furst, 1951, pp. 42-43.
153

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, p. 4.
154

Cf. Ignace J. Gelb, Piotr Steinkeller, Robert M. Whiting Jr., Earliest Land Tenure Systems in the
Near East: Ancient Kudurrus, p. 24.
155

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, pp. 6-7.
156

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, p. 4.
157

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, p. 5.
158

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, pp. 31-37.
159

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, pp. 38-52.
160

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 83.
161

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 83-84.
162
Com isso concorda L. F. DEL POZO, afirmando que os marcos em pedra não constituíram um
sistema de publicidade propriamente dito, e nem garantiram eficácia constitutiva ou publicidade
erga-omnes. Cf. Luis Fernandez Del Pozo, La propriedad inmueble y el registro de la propriedad
em el egipto faraônico, Madrid, Colégio de Registradores de la Propriedad y Mercantiles de
Espana, s.d., p. 170. Entre nós, no mesmo sentido, cf. LYSIPPO GARCIA, O Registro de Imóveis:
A Transcripção, Vol. I, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 27.
163

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 84.
164

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, p. 10.
165

Cf. Moses I. Finley, Studies in Land and Credit in Ancient Athens, 500-200 BC, 2ª Ed., New
Brunswick, Rutgers University Press, 1951, p. 15.
166

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 92.
167

LUZZATI afirma que na Grécia se encontrava muito desenvolvido o conceito da publicidade das
alienações, uma vez que, nas várias partes do país, a venda não existia independentemente de
certas formalidades mais ou menos solenes. Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione –
Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet,
1905, p. LIV.
168

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 103.
169

Cf. Vincenzo Arangio-Ruiz, Istituzioni di Diritto Romano, 11ª Ed., Napoli, Jovene, 1952. p. 267.
170

Cf. Fritz Schulz, Derecho Romano Clásico, 1ª Ed., Barcelona, Bosch, 1960, pp. 383-384.
171

Cf. Fritz Schulz, Derecho Romano Clásico, 1ª Ed., Barcelona, Bosch, 1960, p. 384.
172

Cf. Fritz Schulz, Derecho Romano Clásico, 1ª Ed., Barcelona, Bosch, 1960, p. 385.
173

Cf. Fritz Schulz, Derecho Romano Clásico, 1ª Ed., Barcelona, Bosch, 1960, p. 385.
174

Cf. Fritz Schulz, Derecho Romano Clásico, 1ª Ed., Barcelona, Bosch, 1960, p. 386.
175

Cf. Raymond Monier, Manuel Elementaire de Droit Romain, Vol. II, 4ª Ed., Paris, Editions Domat –
Montchrestien, p. 323.
176

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 30-33.
177
Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 29-31.
178

Cf. José Carlos Moreira Alves, Direito Romano (História do Direito Romano – Instituições do Direito
Romano: A) – Parte Geral; B) Parte Especial: Direito das Coisas), Vol. I, 13ª. Ed., Rio de Janeiro,
2000, pp. 306-307.
179

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 32-34.
180

Cf. Matteo Marrone, Istituzioni di Diritto Romano, 3ª Ed., Palermo, Palumbo, 2015, pp. 133-134.
181

Cf. Matteo Marrone, Istituzioni di Diritto Romano, 3ª Ed., Palermo, Palumbo, 2015, p. 134.
182

Cf. Ignacio Maria Poveda Velasco, Proteção do Comprador no Direito Romano, 1ª Ed., São Paulo,
Livraria Paulista, 2002, p. 17.
183

Cf. Biondo Biondi, Istituzioni di Diritto Romano, 3ª Ed., Milão, Giuffrè, 1956, pp. 242-243.
184

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LVI.
185

Cf. Vincenzo Arangio-Ruiz, Istituzioni di Diritto Romano, 11ª Ed., Napoli, Jovene, 1952. p. 189.
186

Cf. Fritz Schulz, Derecho Romano Clásico, 1ª Ed., Barcelona, Bosch, 1960, p. 353.
187

Cf. Matteo Marrone, Istituzioni di Diritto Romano, 3ª Ed., Palermo, Palumbo, 2015, p. 561.
188

Cf. William Warwick Buckland, A Text Book of Roman Law from Augustus to Justinian, 3ª Ed.,
Cambridge, Cambridge University Press, 1966, pp. 255-256.
189

Cf. Matteo Marrone, Istituzioni di Diritto Romano, 3ª Ed., Palermo, Palumbo, 2015, p. 139.
190

Cf. Emmanuel Besson, Les livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 37-38. Para o autor, a insinuação demonstraria
que os romanos não elegeram a clandestinidade, mas perceberam a utilidade do princípio da
publicidade. Segundo ele, o grande objetivo da insinuação era a garantia dos terceiros, e, ainda,
os registros romanos estavam abertos de forma facultativa a outros atos, como os testamentos,
emancipações e mesmo as vendas. Quanto aos testamentos, a autoridade intervinha na sua
confecção e abertura: somente podiam ser abertos na presença do magistrado, que o recebia do
testador. Ressalta, ainda, que a semelhança da insinuação com algumas formas germânicas de
transferência da propriedade mostra que não se pode filiar a publicidade a uma ou outra
legislação, mas sim a uma tradição comum dos povos, sendo, portanto, temerário pretender que a
doutrina alemã foi uma força exclusiva na sua evolução. Não obstante as razões do autor, a
intervenção da autoridade na insinuação está muito mais próxima da função notarial do que
efetivamente dos registros públicos, como se tratará adiante.
191

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 116.
192

O direito notarial é um conjunto de normas jurídicas destinadas a regular a função notarial e o


notariado. O notário não se confunde com a figura do registrador, ou do oficial de registro. Não
obstante haja um profundo elo histórico entre eles, bem como, em alguns sistemas jurídicos,
grande semelhança em suas relações com o Poder Público, tratam-se de categorias
ontologicamente diferentes. O objeto do direito notarial é esta figura do notário, o qual tem como
papel auxiliar os particulares na realização pacífica e espontânea do direito por meio de técnicas e
instrumentos postos a sua disposição. O notário – ou tabelião – recebe a vontade das partes,
avalia sua legalidade tanto nos aspectos subjetivos quanto nos objetivos, e autoriza ou não a
lavratura do instrumento público pertinente. Identifica as partes, analisa sua capacidade, e
ingressa até mesmo na validade de certas cláusulas apostas no contrato. Autorizando a lavratura
do instrumento, realiza sua redação, mantêm o original em seus arquivos, e dele fornece cópia aos
interessados. Tem, com isso, a função notarial os deveres de acautelar as partes, e prestar
consultoria jurídica sobre os atos que pretendem realizar sob a forma pública, além da redação e
conservação dos instrumentos públicos. O principal mecanismo que o notário dispões para realizar
esta missão é a fé-pública, força probante atribuída pelo ordenamento aos atos praticados
mediante a sua intervenção. O tabelião dá fé ao ato, revestindo-lhe de autenticidade própria do
direito público. ( Cf. Leonardo Brandelli, Teoria Geral do Direito Notarial, 2ª. Ed., São Paulo,
Saraiva, 2007, p. 119; Afonso Celso F. Rezende, Tabelionato de Notas e o Notário Perfeito: Direito
de propriedade e atividade notarial face a face com o Código Civil de 2002, 4ª. Ed., Campinas,
Millennium, 2006, p. 31; Sylvio Brantes De Castro, Novo Manual dos Tabeliães (Teoria e Prática),
5ª. Ed., São Paulo, Edições e Publicações Brasil Editora, 1964, p. 11; Alexandre Rezende
Pellegrini, Algumas linhas sobre a atividade notarial, in, RDI 54 (2003)). A função notarial –
diferentemente dos registros públicos – é dirigida ao momento da prática do ato, e não à
propagação de seus efeitos após sua realização. Prova disso é a livre escolha do tabelião: não se
tem como objetivo que haja facilidade na localização do original após a prática do ato. Assim, por
este caráter preventivo e acautelador da função notarial, é que se afirma que a intervenção do
magistrado na insinuatio se parece muito mais com a função notarial do que com um sistema de
publicidade.
193

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LVIII.
194

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 93.
CAPÍTULO 3. ANTECEDENTES DA PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA NA IDADE MÉDIA E INÍCIO DA
IDADE MODERNA EUROPEIAS
CAPÍTULO 3. ANTECEDENTES DA PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA NA IDADE MÉDIA E INÍCIO DA
IDADE MODERNA EUROPEIAS

Capítulo 3. Antecedentes da publicidade imobiliária na


Idade Média e início da Idade Moderna europeias

3.1.O contexto jurídico

Na Idade Média, o Direito Romano passa a conviver com os direitos bárbaros,


os quais traziam formas próprias para a transmissão e constituição de direitos
sobre imóveis1.

Com a queda do Império Romano do Ocidente, surgiu um complexo de


costumes e instituições novos, resultantes de um hibridismo entre os preceitos
trazidos pelas populações germânicas que até então viviam nas franjas do império
e a influência do Direito Romano do período tardio. O Direito Romano
remanescente, nos séculos V a XI, coexistiu e se entrelaçou, de modo variado,
com os costumes germânicos2.

Estas novas instituições, como as envolvidas nas relações feudais, não eram
propriamente nem romanas, nem germânicas, mas resultantes da interação entre
os direitos destes dois povos, submetidos às forças atuantes no decorrer destes
séculos3. O que restou da organização romana somou-se à Igreja e suas
instituições, e à tradição escolar da antiguidade tardia4.

No século IX, Carlos Magno criou as bases para uma unidade jurídica e política
em uma tentativa de resgate do Império Romano do Ocidente, denominada Sacro
Império Romano. Nesta época, ocorreu o florescimento do feudalismo, mediante o
estabelecimento de vínculos de dependência entre os poderosos do reino, assim
como entre o rei e eles5.

A transição do século XI para o século XII foi marcada por muitas mudanças na
sociedade e na cultura, notadamente a reforma das ordens religiosas, o aumento
da população, a ampliação das áreas de terras cultiváveis, a introdução de novas
técnicas agrícolas, o reflorescimento do comércio e do artesanato, o renascimento
das cidades, e o fortalecimento das monarquias. Essas mudanças também
deixaram suas marcas no Direito, pela sua redescoberta como ciência pelas
universidades. Essa velha-nova ciência teve sua origem em um centro de estudos
em Bolonha, cujos métodos difundiram-se pela Europa a partir do século XII. As
doutrinas e normas assim criadas passaram a constituir o que se chama o “direito
comum”6.

Essa nova ciência foi construída no contexto da chamada “recepção do Direito


Romano Justinianeu”, iniciada provavelmente entre 1112 e 1125 pelo jurista Irnério.
Irnério dedicou-se a estudar o texto original do Digesto, do Codex, das Institutas e
das Novelas, analisando-as tão somente com sua capacidade crítica, já que não
dispunha de nenhuma chave interpretativa preexistente. À margem do texto
lançava suas observações – as glosas – esclarecendo passagens do texto,
relacionando-as a outras passagens paralelas, ou debatendo a aplicabilidade da
regra a casos semelhantes, mas não idênticos7.

A elaboração da recensão crítica do Digesto que ficou conhecida como littera


Bononiensis aconteceu no Norte da Itália pelo concurso de uma série de
particularidades culturais, como a acessibilidade ao texto do Corpus Juris Civilis
em decorrência de um breve período em que a península havia sido reconquistada
por Justiniano, da tensão entre a tradição romana, o direito popular e a existência
de ordens jurídicas locais fortemente diferenciadas, e do fato de se estar em
território do Império. Ainda, especificamente, as cidades do Norte da Itália viviam
um florescimento comercial e urbano, cujas novas necessidades demandavam
uma compreensão intelectual mais ampla na administração da Justiça, na
advocacia, e no exercício da atividade notarial8.

Testemunham esse novo ambiente jurídico, nas décadas finais do século XI, as
escrituras de compra e venda, permuta, doação e de instituição de dote, cujas
fórmulas, até então desconhecidas, demonstram o preparo dos notários que as
lavraram. Por exemplo, o notário Pietro di Arezzo – autoqualificado como legis
amator – incluía em suas escrituras expressões extraídas do Codex e das
Institutas, demonstrando que conhecia bem o Corpus Juris Civilis 9.

Nessa época também se desenvolveu o Direito Canônico, e os séculos XII e


XIII compuseram a chamada Era Clássica do Direito Canônico. O Direito Canônico
Clássico possuía algumas características singulares, que o diferenciavam dos
direitos do passado. Por exemplo, admitia “direito novo”, resultante da atividade
jurisdicional. Ainda, concebia uma hierarquia de fontes, pelas quais as normas
estavam organizadas em vários níveis, dos quais o vértice insuperável era a
Revelação. Por outro lado, eram concebidas normas rígidas e insuperáveis – por
exemplo, em matéria de sacramentos – e normas acerca das quais se admitia
flexibilização, fundada na aequitas canônica10.

Desde Constantino, ao menos, vinha a Igreja assumindo muitas das tarefas


públicas, sociais e morais do decadente Império, e, depois da queda deste,
subsistiu como refúgio para as populações romanas, e, para as populações
germânicas como algo aceito voluntariamente desde cedo11.

Por outro lado, além do Direito Romano, dos direitos dos povos bárbaros, e do
Direito Canônico, compunham o cenário também os direitos locais. Algumas
cidades conquistaram autonomia política e jurídica, e passaram a legislar, seja pela
redução a escrito de costumes preexistentes, seja propriamente pela via da lei.
Isso, juntamente com as obrigações que os cônsules e demais magistrados
juravam cumprir ao assumir seus cargos, – materializadas em instrumentos
notariais chamados brevia – compôs aquilo que ficou conhecido como “estatutos”
da cidade12.

A convivência de todas estas fontes suscitava problemas teóricos e práticos


que demandavam critérios que permitissem sua interação e coordenação. Essa
tarefa foi empreendida por uma nova geração de estudiosos, que ficaram
conhecidos como pós-glosadores, comentadores, práticos ou ainda consiliadores.
Prosseguiram o trabalho de interpretação do Corpus Juris Civilis, mas, ao mesmo
tempo, tornavam objeto da ciência seu próprio mundo quotidiano, o qual abrangia
os outros fenômenos jurídicos então vigentes. Com isso, transformaram o Direito
Romano Justinianeu em um jus commune europeu, e inseriram em suas
categorias e chaves interpretativas a multidão de direitos não romanos então em
vigor13.

Esse cenário é replicado no desenvolvimento da publicidade imobiliária, que, se


verá, se mostrou de maneira diferente nos vários sistemas que conviveram entre
si. Se, por um lado, se mostrou mais rudimentar nas legislações bárbaras que
incorporaram algo do Direito Romano Justinianeu, ou ainda, nos costumes dos
povos bárbaros, por outro é no direito local, das comunas italianas ou de certas
regiões da França ou da Alemanha que atingiu níveis maiores de sofisticação.

Ainda, foi somente na Idade Moderna que surgiram sistemas de publicidade


imobiliária cuja abrangência pretendia ser mais ampla do que o nível local ou
regional. Dessa maneira, uma vez mais, o estudo do tema mostra-se bastante
fragmentário e casuístico.

3.2.Antecedentes da Publicidade Imobiliária e do Sistema Francês na Idade


Média e Idade Moderna e a origem do Sistema Francês de Registro

É difícil saber a partir de qual momento da História se pode falar em “A França”.


Mesmo os textos do século XIII, que utilizam a palavra Francia, o faziam, ao que
parece, em referência tão somente à região da Ile-deFrance. Antes da França
havia a Gallia, que, segundo Júlio César, se dividia em três partes, a Bélgica, a
Aquitânia e a Gália propriamente dita, divisão esta que é geográfica, baseada nos
rios e nos mares. A Gália “propriamente dita” é a chamada Gália Transalpina.
Quando da conquista pelos romanos de territórios situados no sul da região, pelos
anos 120-100 a.C., não havia ali qualquer unidade política. Ao invés, segundo
César, havia ali numerosos Estados, a quem ele denomina Civitates. Alguns se
organizavam como repúblicas, outros como monarquias. Apenas em momentos de
crise os gauleses praticavam uma aparência de unidade sob a forma de uma dieta
nacional, a que César denominou concilium totius Galliae 14.

A aquisição da propriedade imobiliária na Gália Romana se dava pela traditio


ou pela via do usucapião, mas não pela mancipatio ou in iure cessio, já que se
tratava de terras provinciais. Havia um número considerável de pequenos
proprietários, assim como grandes proprietários, dentre os quais se destacava o
Fisco Imperial, cujos terrenos eram trabalhados por escravos sob a direção de um
intendente15.

No final do século III d.C. um povo de origem germânica, que as fontes


literárias chamavam de “Francos”, juntaram-se a outros bárbaros que já
desafiavam o poder de Roma na Gália. Estes francos, na verdade, abrangiam
vários povos previamente assentados nas regiões norte e leste do Baixo Reno, e,
já no século IV, alguns francos se encontravam assentados ao longo da região
norte da Gália Romana, com o consentimento ou tolerância do Império. Em troca,
os francos forneciam ao Império, recrutas que serviam o exército em todo o
Mediterrâneo. Com o passar do tempo, alguns francos ascenderam à posição de
oficiais, e alguns deles mesmo chegaram a generais16.

É importante deixar claro que francos não são franceses: na verdade, os


franceses são o resultado da fusão de populações célticas mais antigas – os
gauleses – com os seus conquistadores, em um primeiro momento, romanos, e em
um segundo momento, francos, que, na realidade, consistem em populações
germânicas.

A confusão generalizada do século V estimulou os francos a buscar uma maior


ascendência no governo da Gália. Sem a presença permanente de magistrados
romanos nas regiões do norte e do centro, aristocratas gauleses e comandantes
romanos começaram a se unir a chefes bárbaros que buscavam aumentar seu
poder local. Em meados do século V, Egídio, que era natural da Gália e, ao menos
nominalmente, general romano, criou um principado renegado centralizado em
Soissons, e mesmo alguns francos do norte da Gália o saudaram como rei. Na
mesma época, em Trier, governava como um conde aparentemente autônomo,
Arbogasto, que, não obstante fosse franco, havia se convertido ao cristianismo, e
escrevia um latim “livre de barbarismos”. No Norte, Childerico expandiu sua
influência, e provavelmente adquiriu o controle da província da Belgica Secunda.
Sua tumba, em Tournai, continha ao mesmo tempo armas francas e os paramentos
de um magistrado romano. Esse hibridismo foi o produto da assimilação cultural
entre francos e romanos17.

O filho de Childerico, Clóvis, expandiu militarmente as conquistas de seu pai


combatendo vários de seus vizinhos, como os Alamanos e Visigodos, forjou uma
aliança com os Burgúndios ao casar-se com uma princesa burgúndia, Clotilde, e
consolidou seu domínio sobre os francos eliminando seus rivais mediante
assassinatos políticos. Com isso, deu início à Dinastia Merovíngia dos Reis
Francos, que continuou com seus herdeiros após sua morte, em 511 d.C.18

Os quatro filhos de Clóvis, Teuderico, Clodomiro, Childeberto e Clotário,


receberam, cada um, uma capital e um pequeno reino, o que reforçou a
fragmentação política resultante da queda do Império Romano. Ainda, as fronteiras
destes reinos eram pouco estáveis, e seguiram-se guerras intermináveis contra os
vizinhos e mesmo entre os irmãos, o que prosseguiu na geração seguinte. Em 558
d.C., Clotário derrotou em batalha seu filho Chram, e ordenou que este e sua
família fossem queimados vivos. Com sua ferocidade, e seguindo os passos de
seu pai, voltou a reinar como rei único; mas, isso durou somente até sua morte em
561 d.C., ocasião em que seus filhos remanescentes passaram a guerrear entre si
pelos espólios de Clotário19.

Cada rei merovíngio estendia sua autoridade pela nomeação de magistrados,


duques, condes, prefeitos, guardiões e todo o funcionalismo necessário a manter o
controle real, como secretários, estenógrafos e escrivães. A imposição de uma
administração merovíngia foi um processo contínuo ao longo do século VI. Esta
administração foi paga não apenas pelas rendas das terras detidas diretamente
pelo rei, como também dos tributos pagos por seus súditos. Nesse sentido, os reis
merovíngios mantiveram em grande medida o sistema de tributos dos romanos,
por exemplo, havendo a manutenção de registros por seus fiscais20.

Os reis merovíngios se viam mais como grandes proprietários de terras, do que


como chefes de Estado ou como grandes magistrados da nação. Assim, não havia
a concepção da Justiça e do Direito como um conjunto de regras e valores
impostos de maneira uniforme pelo rei ou seus agentes21.

Se no Direito Público prevalecia um princípio territorial do Direito, no Direito


Privado tinha prevalência, em larga escala, a lei pessoal do sujeito22.

Devido ao princípio da personalidade das leis, algo do Direito Romano


sobreviveu entre as populações galo-romanas, por exemplo, a antiga insinuatio.
Após a invasão dos Francos, Burgúndios e Visigodos, ainda era aplicável para os
galo-romanos o Codex Theodosianus nas vendas, doações, testamentos e
sucessões. Para BESSON, pode-se afirmar, com base em atos legislativos (como
a Lex Romana Burgundionum e o Breviário de Alarico), e em documentos como
antigos formulários de modelos de atos e cartulários com cópias de escrituras, que
a insinuatio permaneceu em vigor entre as populações da antiga França do século
VI ao XI. Não obstante facultativa, era comum não apenas para doações, como
também para vendas, mandatos e testamentos, o que se fazia com o objetivo de
produzir prova autêntica23.

Uma doação do ano 804 d.C. permitiu conhecer o complexo procedimento


requerido, naquela época, para a insinuatio. Em um mesmo dia foram realizados
quatro atos documentais: a doação em si mesma, em cujo instrumento se
prescrevia que a insinuação deveria ser realizada na presença da cúria; o ato de
tradição do imóvel; um mandato outorgando poderes a um terceiro para requerer a
insinuação; e o ato de insinuação, a qual se aperfeiçoou pelo cerimonial do Direito
Romano24.

Também os bárbaros francos praticavam a publicidade, ainda na forma primitiva


da subordinação da propriedade imobiliária e das solenidades de transmissão ao
direito eminente da comunidade. Vendedor e comprador compareciam perante o
thing, um tribunal popular. Este, segundo a Lei Sálica, era composto por todos os
homens livres da circunscrição, sob a presidência do thunginus ou thingman, um
chefe eletivo25. A principal função do thunginus que aparece na Lei Sálica é a
judiciária, mas imagina-se que lhe coubessem também algumas funções
administrativas26.

A autoridade real era representada, em cada localidade, pelo conde (graf) e


três sacebarons, autoridades que recebiam os tributos do fisco real. A cerimônia
era solene. As partes compareciam ao tribunal, e afirmavam a intenção de
transferir a propriedade. Então, o vendedor dava ao comprador um pedaço de
palha ou madeira, representando a tradição do imóvel. Mas, também eram
conhecidos a entrega de um bastão, porção de terra ou mesmo um gesto manual.
O objetivo de tudo era gerar prova autêntica da alienação e simbolizar a antiga
supremacia da comunidade. Esta supremacia poderia, em especial, suscitar a
oposição popular contra a aquisição de terras por um estrangeiro27.
O declínio do sistema é marcado, na época Carolíngia, pela substituição da
assembleia popular por scabini e pela prevalência do conde sobre o thingman.
Ainda, pela absorção dos poderes pelo senhor feudal, e as consequentes
transferências feitas por meio da investidura28. Esses scabini, reunidos em um
colégio permanente, vieram a substituir, ao tempo de Carlos Magno, os homens
livres da assembleia. Deveriam ser escolhidos entre pessoas nobres, sábias e que
acreditassem em Deus. O tribunal completo seria composto por doze scabini, e
para funcionar o número de presentes deveria ser de no mínimo sete29. A ideia da
instituição do colégio de scabini era a de atribuir os julgamentos a pessoas
versadas em Direito, e, com isso, estimular a utilização de processos mais
científico de julgamento.30

No entanto, a centralização idealizada por Carlos Magno teve curta duração, e


no século XI as estruturas políticas e sociais da França se transformaram
novamente. O domínio político dos reis sofreu uma grande redução com os
sucessores de Carlos Magno, e mais ainda, com a assunção da nova dinastia, dos
Capetos. Naquela época, surgiram por toda a França castelos, e desenvolveu-se o
feudalismo31. O processo havia se iniciado dois séculos antes, ainda durante o
governo de Carlos Martel, em que terras pertencentes à Igreja eram outorgadas
por ele a seus vassalos cavaleiros32.

Em sentido técnico, a expressão “feudal” indica uma relação pessoal entre um


senhor e seus fiéis, ou vassalos. O surgimento do feudalismo entre os francos
resultou de um amálgama de vários elementos, como o patrocinium dos
aristocratas romanos em relação a seus clientes, a ética guerreira germânica e
seus deveres de fidelidade, e, particularmente, a vassalagem céltica, que, se em
princípio implicava servidão, passou a dar lugar a uma relação entre homens livres.
A entrega da terra aparecia como um elemento material que selava essa relação33.

Assim, o feudalismo introduziu na França um regime fundiário diferente dos


anteriores, calcado na ideia de soberania associada à posse da terra. O senhor
assumia o lugar antes reservado à comunidade de homens livres, sendo protetor e
chefe de seus vassalos e foreiros ou censitários. Ressalvada a propriedade alodial,
herança livre que não devia nada ao rei ou qualquer outra pessoa, não havia na
França feudal, a rigor, propriedade fundiária, mas somente tenures, espécie de
detenção gravada com deveres de fidelidade e homenagem. Tais eram os feudos,
tenures nobres. Por outro lado, havia também terrenos aforados ou submetidos a
censos, os quais formavam o grupo das tenures plebeias. Nobres ou plebeias,
nenhuma destas tenures poderia ser alienada ou transmitida por herança sem o
assentimento do senhor. Este consentimento era dado na investidura. As partes
compareciam perante o suserano, e o novo vassalo, de cabeça nua e sem armas,
se ajoelhava diante dele. Então unia as mãos, e as punha entre as do senhor, em
sinal de obediência e humildade. Ambos prometiam fé e lealdade, e o novo vassalo
dizia solenemente: “Sire, je viens à vostre homage et en vostre foy, et deviens
vostre homme de bouche et de mains, et vous jure et promets foy et loyauté envers
et contre tous”. Então, o suserano beijava o vassalo, se nobre, e fazia a investidura
propriamente dita, entregando um objeto simbólico, o qual era em regra um bastão
pego da mão do cedente e entregue ao adquirente. Nos feudos mais importantes,
empregavam-se símbolos de poder e comando, como a coroa, o chapéu, a
espada, a lança e o estandarte34.
Os bens censitários ou aforados – as tenures plebeias – também tinham sua
transmissão subordinada à vontade do senhor; mas o ato não comportava a “foi et
hommage”, nem a investidura, das tenures nobres. Apenas deveriam fazer a
saisine, ato em que o senhor declarava colocar o adquirente na posição de
censitário. No entanto, a saisine não era presidida pelo próprio senhor: no oeste e
no midi era presidida pela corte senhorial; no norte por um tribunal de echevins 35;
e no leste por uma corte fundiária não exclusivamente senhorial, em que se
afirmava, paralelamente ao poder do senhor, uma “comunidade de possuidores”,
chamada dinghof, cuja ratificação não era menos necessária que a do senhor para
a transmissão. Investidura e saisine eram ambos atos públicos e solenes. Contudo,
não se pode afirmar que eram destinados à proteção de terceiros. Na verdade,
eram uma renovação do pacto feudal, com a marca do direito eminente do senhor,
e somente a ele beneficiando36.

O direito detido por quem recebia um bem nessas condições, seja na


modalidade feudal, seja na foreira ou censitária, não consistia em propriedade,
mas no gozo do bem e em sua posse. Esta posse, contudo, também não era a
posse do Direito Romano, mas uma posse com origens germânicas: a Gewere.
Era, portanto, um direito real sobre coisa alheia, com o que o domínio ficava
dividido em domínio direto, do senhor, e domínio útil, do vassalo37.

É altamente controverso o conceito de Gewere. Ao que parece, em um primeiro


momento significava o ato pelo qual se transmitia juridicamente um imóvel, e no
qual a pessoa que até então tinha exercido a senhoria sobre ele, declarava que
renunciava a seu direito (Auflassung). Posteriormente, passou a significar também
a relação de senhoria entre a pessoa e a coisa, independente da natureza desta.
Um terceiro sentido, ainda, atribui à Gewere a tradução da própria coisa sobre a
qual ela incide. No sentido de relação de senhoria sobre a coisa, a Gewere
corresponde, mais ou menos, à possessio romana. Contudo, apesar da
correspondência, a relação entre Gewere e possessio não é de identidade, mas
apenas de analogia, havendo diferenças importantes entre ambas. Em primeiro
lugar, se para os romanos havia uma clara gradação entre detenção, posse e
propriedade, o mesmo não ocorria entre os povos germânicos quanto à Gewere.
Parece claro que a distinção entre detenção e posse era desconhecida para eles,
e, segundo alguns autores, isso abrangia também a propriedade, estando todos
estes regimes abrangidos pela Gewere. Por isso, grande dificuldade tiveram os
estudiosos modernos para enquadrar o instituto nas claves da ciência do direito,
essencialmente baseadas em conceitos romanísticos. Em suma, parece ser a
Gewere um senhorio de fato sobre a coisa, pelo qual se criava uma presunção de
que quem tinha a Gewere, tinha também direito real sobre ela. Tinha a Gewere
três efeitos, um defensivo, um ofensivo e um translativo. O efeito defensivo dava a
seu titular a possibilidade de defendê-la com o uso da própria força, se alguém
pretendesse despojá-lo da coisa mediante um ataque extrajudicial, bem como em
ação judicial que outra pessoa ajuizasse para que a coisa lhe fosse retirada, caso
em que a Gewere lhe colocava em posição processual favorável. O efeito ofensivo,
em se tratando de bem imóvel, se dava por meio da ação judicial intentada por
quem tinha a Gewere ideal, mas não a posse útil do bem, caso em que a ação era
ajuizada exatamente para que esta posse útil fosse recuperada. E o efeito
translativo, significava que somente poderia transmitir direito real sobre a coisa
quem tivesse sua Gewere, com o que a Gewere atuava de maneira a atribuir a seu
titular legitimação para alienar38.

A propriedade plena ficava restrita aos bens alodiais, que existiam em número
muito reduzido39. Algumas das terras sob esse regime pertenciam à Igreja, e seu
caráter alodial precedia o próprio feudalismo. Outras delas eram pertencentes a
particulares, que, inicialmente, as haviam recebido sob as amarras do sistema
feudal, mas cuja tenure havia, por ato do suserano, sido convertida em doação de
propriedade plena. Outras, ainda, haviam sido adquiridas por ocupação de terras
conquistadas aos sarracenos, que invadiram o sul da França. Essas terras, livres
das obrigações feudais, podiam ser alienadas livremente, bem como transmitidas
hereditariamente. Apesar de tudo, o titular de um bem alodial podia ter
dificuldades. Como se tratava de uma anomalia no mundo feudal, nas regiões em
que o feudalismo havia deitado raízes mais profundas, como Poitou, Touraine,
Blésois e a região de Senlis, cabia ao proprietário provar – prova esta nem sempre
fácil – seu direito, e a natureza de seu bem, já que vigorava a máxima nulle terre
sans seigneur 40.

A partir do século XIII, há uma evolução, especialmente na Bélgica e no norte


da França. Começa a haver um interesse na garantia de terceiros pela publicidade
imobiliária, que se reflete nos usos do povo. Estes passam a indicar o registro das
mutações nos ofícios das cortes feudais. No leste da França, nenhuma
transmissão era válida sem a aprovação do dinghof e inserção do ato em um
protocolo. Em 1284, um edito do Imperador Rodolfo ordenou o retorno da prática
da saisine na cidade de Cambrai, no norte do país, como forma de se evitar a
fraude e assegurar o direito de cada um. Mostra-se nítido, em especial com o
nantissement, um novo papel das solenidades que acompanham a transmissão do
bem: gerar garantias a terceiros por meio da publicidade. Com isso, a transmissão
até mesmo dos bens alodiais passaram a depender da forma pública, realizada
perante juiz real41.

Nesse intuito de evitar a fraude, em 10 de fevereiro de 1538, Carlos V publicou


edital proibindo a alienação e a transmissão de herança sem nantissement. Edital
idêntico seria publicado por Felipe II, em 06 de dezembro de 158642.

Nantissement é uma expressão genérica, que indica o conjunto de solenidades


necessárias à perfeição das transmissões de direitos reais sobre imóveis, bem
como instituição de gravames43. Tal como a saisine, é uma imissão na posse por
proclamação de uma autoridade, composta por dois atos: o vest e o devest. No
devest, o alienante renuncia fictamente à propriedade, entregando-a a um
magistrado; no vest, o magistrado investe o adquirente. Trata-se de ato de
jurisdição graciosa. Cedente e adquirente deveriam comparecer, pessoalmente ou
por procuração específica, de forma voluntária, perante a corte feudal ou o tribunal
dos echevins, em caso de direito feudal; ou, em se tratando de bens alodiais,
perante o juiz real da situação do imóvel. Antes das solenidades, os contratantes
deveriam produzir um título translativo, o qual deveria ter forma autêntica. Ainda,
deveria ser anexada uma declaração detalhada da natureza, conteúdo, situação e
limites de cada bem que seria transmitido. Somente então, era celebrada a
cerimônia, e a operação lançada nos registros, sob pena de nulidade. De tais
registros se podiam solicitar informações, devendo o oficial dar notícia e fornecer
extratos a quem quer que jurasse deles necessitar44. Eram, portanto, semipúblicos,
já que condicionavam a publicidade45.

A transmissão causa mortis, em regra, dispensava o nantissement, com a


exceção de Mons e Valenciennes, que a exigiam para a sucessão de colaterais46.

Já a hipoteca dependia da solenidade, sendo seu grau determinado a partir da


data da inscrição no registro. Mesmo onde não eram realizadas as solenidades do
vest e devest havia publicidade pelo registro nos “cartórios” (greffes), as quais
eram exigidas para conservação dos direitos de quem quer que pudesse ser
afetado pelo gravame. Pode-se, portanto, dizer que nos locais onde se aplicava o
nantissement a hipoteca era pública, e também especializada: o registro dependia
da individualização e definição dos bens sobre que recaísse47.

Para Besson, o nantissement padeceu do mal de depender do título que lhe


deu causa, e não lhe sanou nulidades. Porém, esse vício também estaria presente
em sistemas contemporâneos, e a formalidade apresentou medidas suficientes
para a época. Com efeito, teve grande influência no crédito e nos negócios. Em
comentário sobre o instituto, o parlamento de Flandres declarou que a instituição
era “obra máxima da sabedoria; selo, esteio e firmeza das propriedades, direito
fundamental produzido pelo uso, em todos os tempos, de efeitos inestimáveis,
estabelecendo a confiança que facilitou os negócios”48.

Por outro lado, antes do nantissement, o contrato produzia apenas efeitos


obrigacionais, e o adquirente apenas tinha direitos pessoais contra o alienante; e a
traditio do bem, em caso de ausência de nantissement, não tinha o condão de
transmitir a propriedade. O suprimento do nantissement somente era atingido
mediante posse legítima pelo prazo mínimo de dez anos49.

O sistema, contudo, padecia de um grave defeito prático: a organização dos


ofícios de registro. Uma vez que não havia territorialidade, e, portanto, era possível
registrar uma transmissão de um bem em um ofício muito distante do local de sua
situação, tornava-se possível que um mesmo bem fosse vendido muitas vezes
pela mesma pessoa, frustrando-se uma das finalidades de um sistema de
publicidade imobiliária50.

Na Bretanha, a partir da baixa idade média, surgiu um novo sistema: a


appropriance. Essa poderia ser indicada como a origem do Sistema Torrens, pois
era um meio posto à disposição dos adquirentes para garantir a estabilidade de
seus títulos aquisitivos, por meio de uma investidura judiciária precedida de ampla
publicidade51.

Diferentemente do nantissement, dava ao adquirente uma propriedade


inatacável e livre de direitos de terceiros. Por essa razão, seu procedimento era
mais rigoroso52.

A confirmação da aquisição do imóvel deveria ser feita perante o juiz com


jurisdição sobre o local da situação dos bens. Antes, porém, deviam ser cumpridas
uma série de formalidades, com vistas a assegurar terceiros. Estas formalidades
consistiam na insinuação do contrato, na tomada de posse pelo adquirente, e na
realização de uma série de publicações53.

A insinuação era um registro no greffe próprio, sob pena de nulidade da


transmissão. O registro, e um quadro com os titulares, eram públicos. Conforme
um edito real de agosto de 1626, os oficiais deveriam exibir os registros a todos
que solicitassem, e dar cópia a adquirentes, vendedores e credores que o
requisitassem, mediante o pagamento de seis sous por folha de papel. O oficial
tinha direito ao recebimento de um pagamento pelo registro do ato, segundo seu
valor: 20 sous para contratos de mais de 50 libras; 32, se de 50 a 100 libras; 48, se
de 100 a 300 libras; e assim seguia, progressivamente, até o limite de 12 libras e
16 sous, para contratos com valor a partir de 3000 libras. Em seguida, o adquirente
deveria tomar posse do imóvel, tomada esta que deveria ser efetiva, na presença
de um notário, que lavraria ata do acontecimento. Finalmente, no prazo de seis
meses da insinuação deveriam ser feitas publicações por meio de um oficial de
justiça. Estas ocorreriam em três domingos consecutivos. O meirinho, nestas
datas, leria o contrato em alta voz, bem como a ata da imissão, e declararia que,
por aqueles motivos, o adquirente declarava se apropriar. A leitura seria feita nas
missas, e nos lugares de praxe das publicações. Então, o meirinho afixaria editais
na paróquia da situação dos bens. Oito dias após a terceira publicação, o meirinho
se apresentava à corte competente, e afirmava, sob juramento, que havia realizado
as três publicações, e que declarava o adquirente bem e devidamente apropriado.
Com tudo isso, a appropriance purgava não apenas todos os gravames e ônus
incidentes sobre o bem, mas também, toda e qualquer oposição ao direito do
alienante. Somente não purgava os censos e outros direitos senhoriais. Por outro
lado, não purgava vícios do ato negocial em si, podendo o título ser atacado, por
dolo ou fraude, no prazo de 10 anos54.

Pela prova plena de propriedade que gerava, a appropriance demonstra que a


ideia de certeza absoluta a partir do registro não é totalmente estranha à tradição
francesa55. Ainda, consistiu a appropriance no mais completo e evoluído sistema
de publicidade imobiliária concebido até então56.

Fora do norte da França e da Bélgica – regiões onde havia nantissement e


appropriance – a publicidade sofreu rápido declínio, tendo, já no final do século XII,
a saisine se confundido sensivelmente com a tradição romana, e a investidura
passado a derivar de mera cláusula de estilo inserida no ato notarial. Mas, no pays
du droi ecrit – regiões de maior sobrevivência do direito romano, mais ou menos
correspondentes ao sul do país – renasceu a insinuação, com o mesmo papel que
tinha no Direito Justinianeu: evitar fraudes e proteger patrimônios contra doações
ruinosas57.

Em 1456, o Delfin Luis XI ordenou a publicação das doações em presença de


magistrado do domicílio do doador, a fim de serem prevenidas fraudes e manobras
dolosas. Ordenação semelhante proveio do Rei Francisco I, em 153958.

Contudo, restrita às doações a princípio, foi estendida por edito de Henrique II,
de maio de 1553, às vendas, permutas, cessões, rendas e outras obrigações que
ultrapassassem 50 libras. A extensão tornou-se, porém, letra morta por encontrar
viva resistência dos parlamentares. Foi somente durante o reinado de Luís XIV,
com edito publicado por este em dezembro de 1703, que seu uso se tornou
definitivamente obrigatório para todas as transmissões de imóveis59. Os registros
eram públicos e acessíveis a qualquer pessoa60.

O prazo da insinuação variava. Nas transmissões onerosas os notários eram


pessoalmente responsáveis por requerer o registro em 15 dias da lavratura do ato,
salvo se o imóvel se situasse longe de sua residência, caso em que as partes se
incumbiam do registro. Já nas doações o prazo era de quatro meses, e o registro
cabia às partes. Feito no prazo, o registro retroagia à data da prática do ato que lhe
deu causa. Para Besson, não obstante a publicidade ampla que estes registros
recebiam, seria temerário afirmar que o sistema garantia totalmente adquirentes e
credores. A retroação operada nos registros feitos no prazo derrubava todos os
direitos constituídos nesse ínterim, gerando grave risco de evicção para
adquirentes e credores hipotecários. Ainda, as transmissões onerosas eram
oponíveis a terceiros ainda que não insinuadas. Por essas razões, seria exagerar
sua eficácia equivaler a insinuação e o nantissement, vez que a primeira era
duvidosa e de aplicação restrita. Na verdade, logo deixaria de ser medida de direito
civil, de proteção do crédito, para desvirtuar-se em instituição fiscal, de fins
arrecadatórios61.

Paralelamente funcionava na França outra formalidade análoga, chamada


“Controle dos Atos”. Este era obrigatório para todos os atos dos notários,
registradores (greffiers) e meirinhos, bem como para os atos privados ditos
autênticos, ou os produzidos em juízo. Tal controle não era destinado a assegurar
a publicidade, mas a prevenir as falsificações e, especialmente, a aposição nos
instrumentos de datas simuladas. Pode parecer, à primeira vista, que o objetivo da
medida era impor aos notários a obrigação de fazer controlar seus atos. Contudo,
no fundo, o objetivo era, mais uma vez, fiscal, de arrecadação por meio dos ofícios
de controle dos títulos. Com efeito, o artigo 7º da Ordenação de 1581 reconhece
que o dinheiro arrecadado com os novos ofícios seria destinado em parte ao
pagamento de soldados nos fortes das cidades de fronteira, e a outra parte
destinada a outras despesas para o bem e conservação do estado. De qualquer
forma, independentemente de sua utilidade para a fixação da data dos atos, a
medida era ineficaz para a garantia de terceiros, ou para a consolidação da
propriedade. Não era menos evicto aquele que descobrisse que o bem comprado
já houvera sido alienado anteriormente, ainda que a data de cada ato estivesse
rigorosamente correta. Ainda, os registros de controle dos atos não eram abertos
ao público, e somente poderiam ser consultados por prepostos do fisco62.

A maior deficiência dos sistemas existentes no pays du droit ecrit era a


insuficiência de meios para gerar publicidade das hipotecas. O melhor modo de
resolvê-la seria organizar para a hipoteca um sistema análogo ao nantissement.
Contudo, os legisladores faziam esforços para introduzir cada vez mais o direito
romano, rejeitando qualquer modelo que pudesse ter sua inspiração nas práticas
feudais. Assim, tentaram criar uma solução para o comprador inspirada no direito
romano: a venda por decreto forçado. A princípio, essa purgação somente teria
sido aplicável nas vendas oriundas de expropriação. Por isso, para as vendas
amigáveis, imaginou-se o expediente do Decreto Voluntário, a qual era uma
simulação de uma alienação por decreto forçado. Porém, teve âmbito restrito de
aplicação, pois o procedimento não era menos oneroso, nem menos complicado
do que uma expropriação judicial normal63.

Por isso, um edito de junho de 1771 substituiu essa modalidade pelas “Cartas
de Ratificação” (lettres de ratification). Tendo, no fundo, os mesmos efeitos dos
decretos voluntários, aliviavam sensivelmente as formalidades a realizar. Nesse
novo regime, bastava que o adquirente depositasse seu título no greffe do juízo da
situação dos bens. Um extrato ficava ali afixado por dois meses, como aviso para
os credores do vendedor. Os que não demonstrassem a existência de sua hipoteca
no prazo perderiam o direito; e os que demonstrassem, as teriam inscritas, por
ordem de data. Os greffiers tinham de fornecer certidões por extrato das oposições
apresentadas, ou certidões negativas de oposição. Após o prazo, as cartas de
ratificação seriam escritas pelo greffier, e remetidas à chancelaria do tribunal da
situação dos bens, contendo as oposições eventualmente levantadas. A partir
desse momento, o imóvel estaria livre de todas as hipotecas não opostas e
inscritas regularmente64. Sistema análogo já tinha existido em Veneza, na Idade
Média, e ficou conhecido como giudizio dele grida 65.

Esta obrigação imposta aos credores no sentido de apresentarem seus créditos


gerava publicidade. Porém, a inscrição retroagia à data da constituição das
hipotecas, cujos contratos, quando celebrados, não eram submetidos à
publicidade. Com isso, sempre poderia haver a surpresa de hipotecas anteriores, e
o mutuante que necessitasse de garantia não teria um meio preciso de avaliar a
situação do patrimônio do devedor. Em última análise, as cartas somente
salvaguardavam o adquirente, e mesmo assim, não seria de forma completa, vez
que, na esteira do preceito romano, por elas nunca se transmitia mais do que o
título continha. Ademais, as cartas eram caras. Isto inviabilizava muitas vendas,
em que o procedimento custava mais do que valia o bem66.

O célebre ministro Colbert percebeu a importância de se liberar a riqueza


territorial dos gravames ocultos que tornavam seu valor incerto ou discutível, e a
privavam de crédito. O único meio de conciliar todos os interesses envolvidos era
assegurar a publicidade da hipoteca não apenas no momento da alienação do
bem, mas também a partir de sua própria constituição. Para isso, idealizou e
conseguiu a publicação de um edito em 1673, com o qual pretendia garantir a
preservação de fortunas e impedir que os bens do devedor solvente fossem
consumidos em despesas judiciais, não tendo meios de demonstrar sua solvência.
Com esse intento, o edito ordenava a instalação de cartórios de registro, nos quais
os credores hipotecários poderiam registrar seus direitos, com prioridade sobre os
credores negligentes. Com os registros, cada credor teria certeza do real estado do
patrimônio de seus devedores. Isso mostrava a situação do proprietário
endividado, e o impedia de lucrar com uma falsa aparência de fortuna. Como pedra
angular do sistema tinha-se a prioridade dada aos credores que registrassem,
sendo a data da inscrição o que a fixava. A eficácia da hipoteca ficaria subordinada
à formalidade da inscrição. O registro seria estendido aos demais direitos reais
limitados, e os adquirentes dos bens deveriam comunicar a aquisição aos credores
hipotecários registrados. O sistema tinha vícios, contudo. Não abrangia as
hipotecas das mulheres casadas, menores, senhores feudais e do Estado. Ainda,
permitia a hipoteca geral sobre bens presentes e futuros. Um terceiro problema era
o de não abranger as transmissões dos direitos reais, as quais, por lógica,
deveriam ser registradas antes da inscrição das hipotecas, pois a estabilidade dos
títulos aquisitivos é condição indispensável ao crédito. Apesar de seus problemas,
o edito poderia ter efetuado reformas importantes, as quais não lograram êxito por
chocar-se contra uma coalizão da nobreza e parlamentares, o que levou a sua
revogação no ano seguinte. Não obstante a revogação tenha ocorrido sob o
pretexto de dificuldades em sua execução, para Besson o real motivo era que a
reforma arruinaria uma nobreza perdida em dívidas impagáveis, que vivia à custa
de empréstimos sem lastro e expedientes semelhantes67.

Com isso, às vésperas da revolução conviviam na França quatro sistemas de


publicidade, que variavam conforme a região de que se tratasse: o nantissement e
a appropriance, a insinuação e as cartas de ratificação. Um dos primeiros atos da
Assembleia de 1789 foi encaminhar ao Comitê numerosos projetos de um novo
regime de publicidade68.

Um decreto de 05 de dezembro de 1790 reorganizou a administração dos


registros, e o Comitê pedia que cada greffier encaminhasse um relatório sobre os
livros, instruções, dissertações jurídicas e demais documentos que empregasse
em seu ofício sobre a matéria da hipoteca, a fim de que se iniciassem estudos para
a reforma. Um decreto de 20 de setembro de 1790 suprimia o nantissement e
outras instituições feudais, no esteio da abolição das cortes senhoriais em 04 de
agosto de 1789. Este mesmo decreto de 20 de setembro fala pela primeira vez na
“transcrição” dos contratos de alienação de imóveis e de hipoteca. Esta transcrição
seria uma transformação do antigo nantissement, com os objetivos de consolidar a
propriedade e dar publicidade à hipoteca. Não era mais o senhor, mas o Estado
que intervinha no ato de transmissão69. Dominava as discussões uma preocupação
com o feudalismo e sua abolição70, ainda que se mantivessem os institutos antigos
com novos nomes e nova aparência.

No entanto, fora do pays du nantissement, foi mantido o anterior regime dos


editos, continuando a haver ali, até a vigência do Code Civil, a insinuação. As
cartas de ratificação permaneceram vigentes até a Lei de 11 brumário do ano VII71.

Em 9 messidor do ano III a Convenção criou uma lei reorganizando a matéria


hipotecária, juntamente a outra tratando de uma declaração obrigatória pelos
proprietários da situação jurídica de seus bens imóveis. A publicidade seria
baseada em distritos, nos quais haveria um escritório de conservação das
hipotecas. Em cada um destes haveria um conservador responsável e seus
prepostos. No topo da hierarquia estava o Conservador Geral, encarregado de
fiscalizar o serviço e prover os serviços vagos. O conservador não era um juiz, mas
um funcionário pessoalmente responsável por danos causados por si ou seus
empregados72.

A base da lei estava em uma obrigação imposta a todos os proprietários de


declarar ao ofício do conservador do distrito de situação os imóveis de sua
propriedade, indicando o respectivo título aquisitivo. A falta de comunicação
impedia a alienação, a constituição de hipotecas ou mesmo a reivindicação do
bem. Essa declaração constituiria um ponto de partida, a partir do qual as
sucessivas mutações reais do bem seriam transcritas73.
A Lei de Messidor trazia em si princípios do Sistema Germânico, como a base
real e a fé pública. Porém, nunca foi aplicada. Sua única medida posta em
execução foi a nomeação do cidadão Jean-Baptiste-Moïse Jollivet, Conservador
Geral de Hipotecas em 1º termidor do ano III74, ou seja, 1795. Jollivet havia sido
notário em Nemoures antes da revolução, e se mostrava um partidário moderado
dos revolucionários. Após a revolução foi administrador do Departamento de
Seine-et-Marne e deputado, notabilizando-se por ter tido a coragem atacar na
tribuna o Club des Jacobins em 1792. Foi nomeado Conservador Geral das
Hipotecas em razão dos talentos que havia demonstrado como administrador, e,
pelo mesmo motivo, foi nomeado por Napoleão conselheiro de estado,
administrador em várias regiões, entre elas a recém-conquistada margem
esquerda do Rio Reno, e encarregado de elaborar diversos projetos de lei, bem
como participar dos debates a respeito dos privilégios e das hipotecas. Feito
“conde do império” por Napoleão em 1811, morreu em 181875.

A aplicação da Lei de Messidor foi prorrogada duas vezes, mas foi


definitivamente suspensa por outra Lei de 28 vindemiário do ano V, e revogada por
outra de Lei 11 brumário do ano VII76.

No ano VI se abre a discussão que dará origem à Lei de 11 brumário do ano


VII. O parlamentar Crassous de l’Herault expõe os motivos da reforma, falando que
o estabelecimento em maior base da publicidade das aquisições – como queria
Colbert – seria o pivô do crédito, ao assegurar ao proprietário a certeza de sua
qualidade como tal. A sujeição de todas as transmissões ao regime da transcrição
seria uma generalização da medida já adotada para o pays du nantissement, pelo
decreto de 20 de setembro de 1790. As bases do novo sistema seriam a
publicidade dos atos transmissivos da propriedade, por meio da transcrição, e a
constituição das hipotecas, por meio da inscrição. Ambas se completariam no novo
regime. Pela transcrição obter-se-ia o efeito da oponibilidade a terceiros da
aquisição. Seria formalidade extrínseca, sem qualquer papel na formação do
contrato, mas sua falta ensejaria a circunstância de que o alienante seria tido como
proprietário perante terceiros. E, havendo conflito entre dois adquirentes,
prevaleceria o direito daquele que primeiro transcreveu77.

Em relação ao fracassado sistema do 9 messidor, o parlamentar apontava que


a base do sistema malogrado seria oposta: ao invés de iniciar o trabalho pela
criação de um cadastro que possibilitasse o sistema de base real, o sistema agora
proposto seguiria o caminho da base pessoal, da publicidade pelos nomes das
partes78. As certidões seriam expedidas a partir do nome de Tício ou de Caio, e
não a partir do imóvel A ou B. Pode-se ver nessa lei, já há clara ideia da
publicidade como instituto dirigido à circulação do crédito, dando aos credores a
possibilidade de conhecer o estado aparente da fortuna de uma certa pessoa, bem
como se dado imóvel basta para garantir uma determinada quantia emprestada79.

Pode-se ver, também, já nesta lei, um princípio que será incorporado no Code
Napoleon e leis posteriores, e marcará o Sistema Francês e todos os que dele
derivaram: o consensualismo. Uma vez que a prática das transmissões imobiliárias
envolvia uma tradição ficta do bem, substituída por cláusulas de desapossamento
ficto ou implícito, o dogma da potência criativa da vontade – em voga entre os
jusnaturalistas – conduziu à teorização da superfluidade da atribuição do direito
real depender de um ato externo, e, portanto, de se dar eficácia real ao consenso.
Os filósofos jusnaturalistas, em especial Hugo Grotius, Heineccius e Pufendorf,
criticavam a noção canonístico-feudal do jus ad rem – o direito à coisa – negando
que pudesse este ser um intermediário entre o crédito e a propriedade. De maneira
particular, se deve a Hugo Grotius a afirmação de que pelo Direito Natural o puro
consenso transmite a propriedade. Mesmo em seu tempo, contudo, isso não era
pacífico, e outros jusnaturalistas, como os jesuítas Luís de Molina e Pedro de
Oñate afirmavam que natural era precisamente a costumeira separação entre título
e modo. A despeito disso, quando o sentimento do leigo quanto à superfluidade do
modo de aquisição se juntou com uma sistematização teórica do tema, criara-se os
pressupostos para a positivação do novo princípio80.

O Code Civil 81 suprimiu a insinuação, prescrevendo a transcrição das doações


de bens hipotecáveis. Contudo, não estendeu a regra às transmissões onerosas.
Em primeiro lugar, afastou a necessidade da tradição para transmissão da
propriedade, pois esta havia se tornado cláusula de estilo, subentendida82. Por
outro lado, a questão da necessidade da transcrição para oponibilidade a terceiros
somente foi tratada quando da discussão do título das hipotecas. De um lado,
Treilhard pugnava pelo sistema de transcrição da Lei de Brumário. Do outro,
Tronchet a combatia vivamente, entendendo ser desastrosa por suas
consequências, e atentatória ao direito de propriedade, por expor, por exemplo, um
proprietário apoiado numa posse de 20 anos, que poderia ser preterido por um
comprador titular de um contrato recém transcrito. Treilhard respondera afirmando
que hipoteca sem publicidade das transmissões seria algo ilusório, e, longe de
comprometer a propriedade, a publicidade lhe daria fundamento mais sólido,
protegendo o proprietário contra causas de evicção clandestinas. A ideia de
Treilhard foi levada em conta pelo Conselho de Estado, que reenviou o projeto ao
Comitê de Legislação, com vistas à inserção do trecho relativo à transcrição. Mas,
por uma causa misteriosa, a disposição desapareceu da redação final do projeto83.
Importa pouco saber o motivo. Intencional ou não, a omissão ab-rogou a regra de
publicidade da lei de brumário, tornando a transcrição ineficaz nas aquisições a
título oneroso84. Com efeito, restariam para a transcrição apenas as hipotecas e as
doações, o que a esvaziou de conteúdo e de importância85.

O Code Napoleon, portanto, rompeu com a tradição romanística que combinava


título e modo de aquisição na transmissão da propriedade, prevendo que os
próprios contratos teriam efeitos translativos. Esse rompimento é devido a um
contexto favorável de jurisconsultos simpáticos às ideias jusnaturalistas e à
observação da praxe da tradição ficta, mas, principalmente, à sanha simplificadora
do legislador napoleônico, que podia ser cientificamente jusnaturalista, mas
positivista em sua atividade legiferante86.

Da leitura dos trabalhos preparatórios do Code se constata que as hesitações


do passado e as tentativas contraditórias do período revolucionário provocaram um
embaraço manifesto no tema dos efeitos em relação a terceiros do regime de
transmissões de propriedade. O Code acaba por não permitir que o adquirente ou
o credor hipotecário realizem uma verificação prévia do direito de propriedade. Mas
a soberania da transmissão pelo simples consenso não resiste à realidade. Assim,
a supressão das formalidades publicitárias ao invés de facilitar a circulação da
propriedade, na verdade, a dificulta. A explicação para esta atitude dos autores do
Code somente pode residir em uma intenção de se limitar a mobilidade dos bens
imobiliários, resultado provável de uma feudalização da burguesia, iniciada no
século XVIII, pela qual a propriedade fundiária seguia sendo compreendida como a
base da riqueza e de poder. Ainda, a propriedade era vista por Napoleão como o
fundamento da família e do Estado. Essa visão é compatível com a reafirmação da
soberania do Estado pelo Code, que contempla numerosas limitações ao direito de
propriedade em prol do interesse geral. Assim, o suposto ideal revolucionário de
liberalização da propriedade deve ser visto com nuances, em especial quando se
tem em conta a versão final do Code 87.

Houve grande reação ao sistema de semipublicidade do Code Napoleon. Em


um estudo denominado “Du danger de prêter sur hypothèque”, um advogado do
barreau de Paris, Decourdemanche, propunha a criação de bônus fundiários,
negociáveis, sob a garantia, doravante absoluta, de a propriedade não estar
gravada de hipotecas e direitos reais. Muito criticado por seu radicalismo
quimérico, teve o mérito de ampliar o horizonte científico da questão88. Ainda,
Loreau, diretor dos domínios, escreveu “Le crédit foncier et le moyen de le fonder”.
O autor compreendia a necessidade da publicidade das transmissões e quaisquer
atos que alterassem o estado jurídico do solo ou de seu titular. Propunha haver, em
cada distrito, um registro com o estado do proprietário, a situação dos imóveis, sua
renda, bem como todos os atos translativos, determinativos ou restritivos da
propriedade. Para ele, tal organização asseguraria a publicidade imobiliária, e,
simultaneamente, a percepção dos tributos89.

A grave falta de publicidade continuava na França. Os direitos reais sobre


imóveis eram transmitidos ao adquirente, mesmo perante terceiros, pelo puro
efeito do consentimento, sem tradição ou qualquer outra formalidade exterior90.

A situação era tão grave que um banqueiro e político chamado Casimir Périer
ofereceu, em 1827, um prêmio de 3.000 francos ao autor de um relatório que
melhor indicasse os meios de melhoramento do sistema hipotecário francês,
sintetizados nas respostas a três questões: “1) Quais são os vícios e lacunas das
disposições legislativas e administrativas relativas à hipoteca? 2) Quais são os
obstáculos que afastam os capitais deste emprego? 3) Quais seriam as melhores
disposições a estabelecer para formar o mais completo projeto de lei, e, ao mesmo
tempo, mais harmônico com as necessidades do Fisco, dos credores e das
garantias exigíveis dos mutuários etc.?”91.

Em sessão da Câmara dos Deputados de 16 de abril de 1836 um deputado,


Lavielle, declarou que a revisão dos títulos hipotecários não poderia ocorrer sem a
aplicação irrestrita da publicidade, sob pena de ser ilusória se mitigada, ao que
obteve a concordância do presidente da câmara, Dupin, o qual declarou haver um
contrassenso na legislação hipotecária do Code Napoleon 92.

Cinco anos depois, em 07 de maio de 1841, uma circular enviada pela Corte de
Cassação às cortes de apelação e faculdades de direito pedia suas opiniões sobre
as condições gerais da revisão da legislação hipotecária. Os resultados foram
publicados em três volume de documentos, constituindo rica fonte de visões
teórica sobre o tema. À exceção das cortes de Bordeaux, Toulouse e metade dos
membros da de Rouen, que se manifestaram pela manutenção do sistema do
Code Napoleon, todas as demais cortes e faculdades reclamaram o retorno à
publicidade da Lei de 11 brumário do ano VII. As únicas divergências tratavam da
forma da publicidade, e sua extensão – por exemplo, a maior conveniência da
transcrição do contrato verbo ad verbum ou da inscrição analítica do seu conteúdo.
Seis cortes e três faculdades pediram a extensão da publicidade às transmissões
causa mortis, divisões e outros atos declaratórios. Ainda, a corte de Montpellier e
as faculdades de Caen e de Paris indicaram as vantagens de um sistema de base
real, combinado com a criação de um cadastro. Ainda assim, pretendiam manter
os efeitos jurídicos presentes na Lei de 11 brumário: ser a transcrição apenas um
meio de gerar oponibilidade a terceiros93.

Um artigo não assinado publicado no Journal des Débats Politiques et


Littéraires de 29 de julho de 1845 expõe bem o a mentalidade do momento. “No
entanto, a reforma hipotecária tem opositores. A grande e eterna objeção é aquela:
Metereis as mãos no Code Civil; tenhais cuidado, perturbareis a bela e sábia
economia! Respeitamos os escrúpulos dos magistrados e jurisconsultos que assim
pensam; mas estamos longe de concordar com eles, e pensamos que eles não
devem atrapalhar o legislador. Nós também admiramos o Code Civil, mas não
fechamos os olhos a suas imperfeições e lacunas. Somos conservadores em
legislação, assim como em política; mas não chegamos à superstição e ao
imobilismo. Cremos que se pode tocar no Code Civil sem cometer um sacrilégio,
desde que isto se faça com reserva e circunspecção. Manter aquilo que está bom,
reformar aquilo que a experiência reconheceu como vicioso e intolerável, eis,
segundo nós, o que se deve fazer segundo o espírito da conservação e o espírito
do progresso”94.

Em 1849, o Presidente da República aprovou a formação de uma comissão


parlamentar para reforma da legislação hipotecária, a qual, após várias reuniões,
apresentou um projeto de lei que foi encaminhado ao Conselho de Estado em 27
de dezembro de 1849. O projeto foi apresentado à Assembleia Nacional em 04 de
abril de 1850, e retornou à comissão. Em 25 de junho de 1850 se iniciou a
discussão sobre a reforma, no seio da qual a comissão viria a pedir o retorno à
publicidade plena da Lei de 11 brumário, a fim de que um credor pudesse avaliar a
fortuna imobiliária de alguém a quem pretendesse emprestar dinheiro mediante
uma simples operação de somar e subtrair95.

O projeto entrou em segunda deliberação em 13 de novembro de 1850. A


discussão perdurou por mais dezessete sessões, e a segunda votação se deu em
10 de março de 1851. A terceira deliberação se iniciou em 01º de julho de 1851,
mas os debates foram interrompidos pela dissolução da Assembleia Nacional e fim
da segunda república francesa ocasionados pelo golpe de Luís Napoleão. Em 11
de maio de 1853 um projeto baseado em uma versão encurtada da que estava em
discussão até então foi apresentado ao Corpo Legislativo, e a comissão
parlamentar designada para sua análise depositou na mesa do parlamento o
resultado de seu trabalho em 21 de março de 1854. A discussão se iniciou no
Corpo Legislativo em 13 de janeiro de 1855 e perdurou até o dia 17 do mesmo
mês, data em que o projeto foi votado e aprovado. Encaminhado ao Senado, este
votou pela aprovação em 14 de março, e em 23 de março de 1855 foi promulgada
a nova lei hipotecária96.
Com isso, ficava restabelecida a transcrição como formalidade necessária à
oponibilidade a terceiros de todos os direitos reais. Por outro lado, aplicava-se com
rigor a especialidade das hipotecas, quer legais ou convencionais. A obrigação de
inscrever a hipoteca do menor e da mulher casada recairiam sobre as autoridades
e notários que houvessem participado na determinação da tutela ou no casamento,
sob pena de multa. Quanto aos efeitos, foi seguida a tradição da lei do ano VII,
exigindo-se a transcrição para oponibilidade a terceiros. Os registros assegurariam
prioridade, mas não provariam a legitimidade do direito transcrito. Foi mantido o
sistema da base pessoal, com busca efetuada por nome das pessoas, e não por
imóvel. Ainda, não foram incluídos todos os atos e fatos modificativos da
propriedade. Com tudo isso, afirma Besson que a lei de 1855 adapta para sua
época os antigos costumes de nantissement 97. Não teria grande repercussão na
consolidação da propriedade. Porém, os resultados foram bastante apropriados
para a proteção do proprietário individual e como um começo no estímulo à
circulação do crédito e dos bens98.

Deve-se mencionar, de passagem, que paralelamente aos debates sobre uma


lei hipotecária na França, a mesma discussão ocorria na Bélgica, com bases
bastante semelhantes. O Sistema Belga de Registro foi instituído pela Lei de 16 de
Dezembro de 1851, estabelecendo a figura do conservateur des hypothèques.
Duas são as modalidades de registro praticadas por eles: os registros de
formalidades, destinados à recepção dos atos apresentados a registro; e os
registros de pesquisa, ordenação e manutenção, destinados a facilitar a consulta
aos registros de formalidades. Os registros de formalidades, por sua vez, dividem-
se em registros de depósito, destinados ao protocolo dos títulos apresentados e a
conferir prioridade; registros de transcrições, destinados à cópia integral dos atos
de transmissão ou constituição de direitos reais limitados, exceto hipotecas e
privilégios; e registros de inscrições, destinados ao lançamento por extrato, em
colunas, dos dados fornecidos pelos bordereaux destinados à constituição,
cancelamento ou redução das hipotecas e privilégios. Já os registros de pesquisa,
ordenação e manutenção são compostos por um repertório formado por folhas
duplas, cada uma delas destinada a uma certa pessoa e à indicação de todos os
atos praticados por ela; e por um quadro alfabético, destinado a facilitar as buscas
no repertório. A consulta ao acervo é sempre mediada pelo conservateur, oficial
público que responde pessoalmente pelos atos que pratica, e é remunerado pelos
valores pagos pelos usuários. A qualificação é muito sumária, abrangendo apenas
aspectos formais do título99, e não vigora o princípio da continuidade, já que não
são registradas as transmissões causa mortis 100. Destaque-se que o Código Civil
Belga é uma derivação imediata do Code Napoleon, com o que adota, também, a
doutrina do consensualismo.

A Lei Francesa de 1855 sofreu uma reforma em 1955, e os decretos de 4 de


janeiro e de 14 de outubro de 1955 integram aquilo que se chama o “veritable petit
code” da publicidade imobiliária francesa atual101. A reforma se deveu às
necessidades da reconstrução das cidades destruídas pela Segunda Guerra
Mundial, bem como aos avanços em temas de condomínio102.

O Sistema Francês atual mantém as mesmas bases de sua origem no século


XIX. A transcrição não cria direito, mas apenas torna público um direito real que a
antecede. A existência do direito real não depende da transcrição, nem é ela prova
da existência do direito. Assim, é um sistema “confortativo” de direitos. Tão
somente assegura ao proprietário que ele não será evicto por uma pretensão de
um terceiro que não tornou público seu título. Assim, o objeto da publicidade é o
ato, e não o direito103.

Ainda, continua não havendo controle de validade dos atos registrados. Não
obstante as sucessivas reformas submeteram à transcrição certos fatos que antes
não eram registrados, como as aquisições causa mortis e as ações judiciais.
Ainda, impuseram uma coordenação do registro com o cadastro, estabeleceram
um detalhado arquivo imobiliário e adotaram uma espécie de continuidade, em
virtude da qual um certo do título não pode ser registrado se o título do alienante já
não houver sido104.

Mantido o princípio do consensualismo, resta ao registro consolidar o direito


real por lhe atribuir oponibilidade erga omnes. Todavia, há uma série de atos para
os quais não obstante o registro seja obrigatório, sua ausência não acarreta a
inoponibilidade do fato, como as certidões notariais que constatem uma
transmissão causa mortis, um ato administrativo que atinja um imóvel pertencente
a um particular, um ato que constate a resolução, revogação ou anulação de um
negócio inter vivos ou mortis causa, e os atos interruptivos da prescrição
aquisitiva105.

Por fim, o registro no Sistema Francês não gera qualquer tipo de presunção em
favor do titular registral de que o direito existe e lhe pertence, já que não há
controle de validade dos atos registrados. Ainda, não obstante o titular que tenha
registrado seu título esteja protegido contra aqueles que não registraram, não há
qualquer proteção contra a inexistência do direito de quem lhe transmitiu. Não há,
portanto, fé pública registral106.

3.3.Antecedentes da Publicidade Imobiliária entre os povos germânicos e o


desenvolvimento do Sistema Germânico de Registro de Imóveis e suas
derivações

Segundo Besson, tudo o que se afirma sobre o cerimonial empregado pelas


populações francas para a transmissão dos bens, também pode ser aplicado às
antigas formas de transmissão das populações que viviam na região hoje ocupada
pela Alemanha107.

Observe-se, novamente, que “francos” não é sinônimo de “franceses”. Na


verdade, os francos têm sua origem em terras atualmente situadas na Alemanha,
pelo que os antecedentes mais primitivos do Sistema Francês são também válidos
para o Sistema Germânico.

Deve-se acrescentar a eles, contudo, mais alguns, relacionados a populações


que permaneceram residindo em regiões mais próxima daquilo que hoje
conhecemos com a Alemanha.

Era comum entre os germanos e os francos sálicos a entrega ao comprador ou


donatário de um signo material da transferência, como uma lança, uma porção de
terra, ou um ramo de árvore108. Esta prática mediante entrega de uma lança,
conhecida como festuca, deu origem a expressões como traditio per festucam, ou
exfestucatio. A entrega era seguida de uma segunda etapa do procedimento, na
qual o alienante abandonava a coisa. Este abandono, também, era ritualizado,
podendo ser corporal, caso em que recebia o nome de exitus (ou seja, o alienante
materialmente saía da coisa, por exemplo saltando o valado que cercava o imóvel),
ou formal, mediante uma abdicação ou declaração solene de abandono (abdicatio,
resignatio)109.

Entre os alamanos era nula a aquisição de bens eclesiásticos sem escritura; e


as escrituras eram nulas se ausentes o dia e o ano em que foram feitas. Disputas
acerca de limites dos bens eram resolvidas por duelo. E entre os bávaros o
contrato de venda era provado pela escritura ou por testemunhas 110.

Consta da Lei Ripuária a descrição do procedimento que deveria ser seguido


pelos Francos Ripuários. Um número certo de testemunhas jovens – seis, si
mediocris res est, ou três si parva, ou seja, seis se a coisa era média, e três se
pequena111 – deveria comparecer ao ato, segundo o valor do bem. Se o bem tinha
valor irrisório, três jovens; se tinha valor mediano, seis; e se tinha valor máximo,
doze. Perante esses rapazes o preço era pago, e, a fim de que se lembrassem e
testemunhassem posteriormente, recebiam um tapa no rosto e um puxão de orelha
(alapes donet et torquat auriculas)112. A solenidade se desenvolvia no próprio
imóvel, e era composta por dois atos: a entrega simbólica da coisa ao adquirente –
sala – e o abandono ritual pelo alienante113.

O necessário comparecimento ao local em que situado o imóvel poderia ser


bastante inconveniente, e, por isso, a própria Lei Ripuária contém rastros de outras
formas de aquisição do bem114.

Observe-se que era um traço comum entre os povos da Alemanha e da


Escandinávia que a convenção não tivesse o condão de transmitir a propriedade
fundiária115. Assim, a exigência de um modo de aquisição da propriedade, e a
insuficiência de um negócio obrigacional, se mantém de maneira constante ao
longo do tempo.

A solução seria realizar a cerimônia perante tribunal ou Conselho da Cidade


(Stadtrath). O condenado à perda de um certo imóvel poderia abandoná-lo perante
o juiz – resignatio, devest – após o que o magistrado outorgava a investidura em
favor do adquirente. Esse expediente passa a ser utilizado na via de um processo
simulado, análogo à in iure cessio romana, no qual, em um exercício de jurisdição
voluntária, o alienante era condenado a abandonar a posse, e o adquirente era
investido na propriedade116.

Portanto, se em um primeiro momento a transmissão se dava em um processo


contencioso, rapidamente se converteu em ato de jurisdição graciosa –
denominado Auflassung – no qual as partes declaravam a transmissão perante o
tribunal. Após esta declaração, uma sentença confirmava a transmissão. Não se
exigia a tradição física do bem. Então, eram emitidos títulos justificativos da
investidura judicial, os quais eram arquivados em repartições oficiais117.
Após a consumação da Auflassung, transmitia-se ao adquirente a Gewere
sobre o bem, da qual já se tratou quando falamos do Sistema Francês. Após o
transcurso do prazo de ano e dia da transmissão, se ninguém houvesse
apresentado qualquer tipo de impugnação, o direito à coisa reputava-se a salvo da
ação de terceiros118.

Em Colônia, já desde o século XII, e, mais tarde, em outras cidades, os acordos


de transmissão operados perante magistrados eram registrados em livros
especiais – os registros imobiliários. Estes, a princípio, eram escriturados em
ordem cronológica das declarações. Não havia uma folha destinada a cada imóvel
ou a cada proprietário. Entretanto, estes foram aparecendo pouco a pouco em
todas as cidades. Os livros, então, passaram a ser divididos por distritos
municipais, ruas, e, finalmente, por cada imóvel. Deixava-se espaço em branco
após cada registro, destinado aos registros futuros relativos ao mesmo bem119.

Isso marca a evolução ao chamado “Fólio Real”. Enquanto em Hamburgo e


Munique a cidade estava dividida em distritos registrais e correspondia um livro a
cada um deles, em Danzig (atual Gdansk na Polônia) e Pressburgo (atual
Bratislava, na Eslováquia) ficavam reunidos em uma certa folha do livro todos os
atos relativos a um determinado imóvel120.

No século XIII houve necessidade de inscrição em livros próprios na Morávia e


na Boêmia. Para os bens nobres – feudos, fideicomissos e terrenos alodiais –
empregava-se um livro denominado Landtafeln; para os bens rurais não nobres, os
Grundbücher, e para os imóveis urbanos, os Stadtbücher. A escrituração era feita
por ordem cronológica das declarações. O Landtafeln foi introduzido
posteriormente, nos séculos XVII e XVIII, também na Silésia, Caríntia, Estíria,
Áustria, dentre outras localidades121.

A evolução dos livros de registro da cidade de Colônia e sua eficácia pode ser
dividida em algumas etapas, as quais são ilustrativas da evolução do próprio
Sistema Germânico122.

Na primeira etapa, os livros apenas recordam um ato já praticado, como uma


crônica dos atos. Suas funções limitam-se ao uso interno do ofício de registro. Em
Colônia, pelo ano 1135, os negócios, já efetuados perante o tribunal, eram também
inscritos, de maneira protocolar, em livros de registro. Assim, sua função externa,
se muito, era a de facilitar a prova do ato praticado alhures, uma vez que constava
do livro a menção das testemunhas que haviam participado (sendo que a prova se
faria com estas, e não com o livro propriamente).

Na segunda etapa, os livros passaram a servir de meio de prova, em um


contexto no qual os negócios já eram praticados perante o ofício de registro. As
autoridades do registro analisavam os pressupostos da aquisição, e, se estes
houvessem sido preenchidos, outorgavam, ao menos desde o ano 1200, uma
certificação acerca da aquisição do direito. Nas localidades em que o ofício de
registro fosse presidido por um juiz, o resultado da análise dos pressupostos de
registro era proferido por meio de sentença, pelo que a certificação do direito tinha
valor de documento judicial. Assim, o livro gerava uma prova dificilmente atacável.
Na terceira etapa, os livros tornaram-se meios de não apenas provar o direito,
como também de declará-lo, o que repercutia na data da aquisição. A inscrição era
realizada antes da sentença ou certificação acerca dos pressupostos da aquisição;
e, se a análise fosse positiva, seus efeitos retroagiriam à data da inscrição. Uma
vez que os livros apenas declaram o direito, contudo, não produzem, ainda prova
que proteja o adquirente de maneira inatacável.

Finalmente, na quarta etapa – que se deu já no século XV – os livros tornaram-


se mecanismo de constituição do direito. A inscrição passa a se confundir com a
Auflassung, tornando-se sua forma substancial. Nasceu, assim, o sistema do livro
de registro – Grundbüch – pelo qual o acordo real – Einigung – seguido do registro
– Eintragung – geram a mutação real.

Os registros nos livros especiais passaram a ter eficácia igual à que tinha o
antigo testemunho judicial e seu título justificativo, e nisso consiste a fé pública do
Sistema Alemão: é a fé pública do livro de registro que protege os terceiros que
nele confiam. Com isso, o registro – a princípio meio de prova da transmissão do
direito – acabou por se tornar parte do suporte fático constitutivo da transmissão.
Assim, as transmissões bem como as instituições de gravames e ônus sobre
imóveis passaram a depender de um acordo declarado perante o tribunal, somado
ao seu registro no livro próprio123.

A adoção do registro como modo de constituição de direitos se converteu em lei


em Lübeck, Bremen, Hamburgo e na Morávia e Boêmia para as transmissões, e
em Munique e Viena para constituição de garantias. Nestes lugares, o registro
tornou-se requisito legal da mutação jurídico-real124.

A recepção do Direito Romano atrapalhou o desenvolvimento do direito


imobiliário germânico. Tornaram-se de direito comum as concepções de que os
direitos reais sobre bens imóveis, assim como os direitos reais sobre bens móveis,
transmitir-se-iam pela tradição. Ainda, as concepções que reputavam válidos os
ônus e direitos reais de garantia clandestinos. No entanto, nos direitos particulares
de cada lugar, continuou viva a ideia germânica originária125.

Naturalmente, houve reações à adoção da concepção romanista nas distintas


regiões da Alemanha.

Uma declaração de princípios do imperador Ferdinando III, datada de 1º de


fevereiro de 1640, afirmava que os bens imóveis somente poderiam ser cedidos no
ofício de registro fundiário. As transmissões por atos materiais não geravam título
de posse, nem ensejavam usucapião. O imóvel deveria ser tido sempre como
próprio daquele que constava do registro fundiário126.

Não passaram ilesas, de qualquer forma, da influência romana, todas as


localidades. E, em especial na Prússia, a recepção do Direito Romano se fez sentir
com mais força. Mas mesmo ali, também, as reações no sentido do retorno às
tradições germânicas não tardaria. A primeira delas se deu por um Edito de
Frederico I da Prússia (então conhecido como Frederico III, Duque da Prússia e
Margraf e Eleitor de Brandemburgo, antes de sua coroação como Rei da Prússia
em 1701), datado de 28 de setembro de 1693, ordenando a inscrição em um
cadastro sob a supervisão de um magistrado de todos os imóveis de Berlim e
Colônia. A despeito de certo borussiocentrismo, em geral se tem apontado este
edito de 1693 como o passo inicial do moderno Sistema Alemão de Registro de
Imóveis. Este edito preocupava-se não somente com o registro das hipotecas,
como também das transmissões de propriedade. Nesse aspecto, condicionava ao
registro a validade das futuras alienações da propriedade, e, para proteção dos
credores, reputava inválidos negócios jurídicos não registrados. Ainda, estabelecia
a publicidade dos registros127.

Um edito de 28 de setembro de 1704, com finalidades fiscais, viria a tornar


mais clara a determinação da adoção pelos registros do fólio real; e a Hypothec –
und – Concurs – Ordnung, de 1722, instituiu uma espécie de registro compulsório
para todo o Reino, pelo qual a falta de registro não somente implicava a invalidade
do negócio, como também a obrigação de pagamento de uma multa. Esta norma
mantinha o fólio real, determinava a necessidade de especialização das hipotecas,
e ainda exigia que antes de um certo registro fosse apresentado o título pelo qual o
outorgante havia adquirido seu próprio direito128.

Em 1783, foi promulgada uma lei que ficou conhecida como a “Lei Hipotecária
Prussiana”, a qual muito mais do que tratar de hipotecas, determinava a instituição
e organização de ofícios de registro que recebessem inscrições de toda sorte de
direitos reais imobiliários. A finalidade principal expressa da organização deste
sistema seria facilitar os empréstimos com garantia imobiliária, mediante a
consolidação da propriedade, inspirando a confiança do público. A Lei tinha 457
artigos, divididos em quatro títulos. O Título I tratava da forma interna e externa
dos registros; o Título II tratava da administração pelos tribunais superiores de
todos os assuntos relacionados ao registro; o Título III tratava do procedimento a
ser seguido pelos tribunais inferiores, em matéria de registro; e o Título IV tratava
da criação de novos registros onde antes não houvesse, bem como da restauração
daqueles desaparecidos por algum incidente. Assim, instituía um verdadeiro
organismo destinado à publicidade imobiliária, e a gerar segurança para a
propriedade e o crédito. A lei já contemplava os princípios registrais da publicidade,
especialidade e legalidade, e a maior parte dos artigos da lei tratava de quais atos
jurídicos eram suscetíveis de inscrição, quais eram os requisitos formais dos
documentos apresentados, quais eram os procedimentos de registro para cada ato
etc. Estavam abrangidos pela necessidade de registro todos os atos inter vivos ou
mortis causa que constituíssem, alterassem ou extinguissem direitos reais sobre
imóveis, assim como os que pactuassem condições ou reservas em favor de uma
certa pessoa. Os atos deveriam ser instrumentalizados em forma autêntica; e,
mantendo-se a ideia da Auflassung, antes do registro deveria o tribunal analisar a
legalidade do seu conteúdo. Os efeitos da inscrição eram substantivos: aquele que
inscreveu seu título era tido como proprietário verdadeiro e exclusivo. Mas a
segurança completa e absoluta somente se atingia quando a aquisição havia se
dado em hasta pública (Afgebot), ou após a obtenção de uma sentença no juízo
conhecido como Präklusion 129.

Esta lei compunha um conjunto de reformas profundas no Direito Prussiano,


cujo gatilho foi um período de excesso de liquidez econômica, ao qual se seguiu
uma crise, resultantes de falhas graves no sistema de crédito. Seu principal
idealizador, o ministro Carl Gottlieb Svarez, estava convencido, já na década de
1770, que o crédito da nobreza somente poderia ser garantido mediante um
sistema hipotecário estatal rigoroso, fundado na publicidade130.

Se a promulgação da Lei Hipotecária Prussiana significou um triunfo do antigo


Direito Germânico, a vitória duraria pouco tempo: pouco mais de dez anos depois,
em 1794, a Allgemeine Landrecht für die Preussichen Staaten – a Lei Nacional
Comum dos Estados da Prússia, grosso modo um Código Geral Prussiano, com
19.156 artigos – traria uma revanche claudicante do Direito Romano Justinianeu.
No que diz respeito ao regime imobiliário da Prússia, em especial no regramento
das transmissões imobiliárias, o código era vacilante, contraditório e inseguro. Em
alguns casos adotava as soluções do Direito Romano Justinianeu; e em outros os
princípios consagrados na Lei Hipotecária de 1783131.

Tivesse o código subscrito integralmente a doutrina da Auflassung, consagrada


na Lei Hipotecária, acabaria por reconhecer que o único modo de aquisição de
bens imóveis era o registro. Por outro lado, tivesse subscrito integralmente a regra
da traditio do Direito Romano Justinianeu, deveria ter feito isso de maneira clara,
atribuindo ao registro a função de tão somente gerar notoriedade da aquisição da
propriedade que já se operara de outra maneira. Tentando compatibilizar e
harmonizar dois princípios opostos, deu origem a um sistema cheio de antinomias,
inconsequências e ambiguidades132.

O Código estabelece como regra geral e absoluta o preceito romano de que


para a aquisição não basta o título, sendo necessário também um modo, que, para
todo tipo de coisas, é a traditio. Assim, sem traditio não há aquisição da
propriedade, ainda que tenha havido o registro. Por outro lado, o adquirente, que
recebeu a coisa por meio da traditio, pode aliená-la validamente, ainda que não
tenha havido o registro133.

Entretanto, de maneira contraditória, o código prescreve que, segundo a Lei de


1783, somente o proprietário cuja aquisição foi registrada pode exercer
validamente certos atos de disposição sobre o imóvel; e, para isso, deve
previamente obter a inscrição da sua própria aquisição no registro imobiliário134.

Tentando solucionar os possíveis conflitos de direitos que surgiriam desse


sistema, o código formula algumas regras de preferência: tem preferência, em
primeiro lugar, aquele cujo título derivou do proprietário que constava do registro;
se todos os títulos em conflito derivavam deste proprietário, teria preferência
aquele que primeiro obtivesse seu registro. Aparecia já aqui, o princípio da “força
probante do registro”: aquele que adquire o bem do proprietário inscrito é posto a
salvo da reivindicação pelo proprietário não inscrito, ou de quem dele tenha
recebido algum direito135. Mas, como se muitas concessões houvessem sido feitas
ao sistema da Lei de 1783, tentaram aplacar os romanistas e canonistas por meio
da influência que a má-fé poderia ter nas aquisições136. Por exemplo, a força
probante do registro não protegia o adquirente ou o credor de má-fé; e era
considerado de má-fé não apenas aquele que soubesse dos vícios do título do
alienante inscrito, como também aquele que tivesse ciência de uma anterior
alienação em favor de um terceiro137.
A jurisprudência acabou se vendo obrigada a reconhecer que havia dois modos
de aquisição da propriedade que coexistiam, a traditio e o registro, a despeito da
profunda contradição que isto implicava. Para isso, a jurisprudência buscou
construir um termo médio: se, por um lado, a traditio produzia a “propriedade
natural”, por outro o registro produzia a “propriedade civil”. Assim, quem recebia a
coisa pela traditio era o “proprietário verdadeiro”; mas só o proprietário civil – que
seria um proprietário ficto – poderia dispor do bem em favor de terceiros, os quais
ficavam protegidos contra todas as relações jurídicas produzidas pelo proprietário
não inscrito138.

Para tentar evitar a absurda situação em que duas pessoas distintas


concorressem como proprietárias do mesmo bem, uma civil e uma natural, o
registro era considerado obrigatório, sob pena de multa139. No entanto, somente
era constitutivo para as hipotecas140.

A Prússia abandonou as influências do Direito Romano Justinianeu em seu


sistema registral imobiliário somente em 1872, eliminando a tradição e voltando à
necessidade de acordo judicial combinado com registro para haver transmissão de
direito real sobre imóvel141. Essa lei resultou de um projeto apresentado pelo
ministro Adolph Leonhardt em 30 de novembro de 1868. Com o objetivo de
estimular o crédito imobiliário, o projeto continha duas inovações substanciais, o
princípio de que somente era proprietário a pessoa que figurasse como tal no
registro; e a possibilidade de existência de uma hipoteca autônoma, ou seja,
independente de uma obrigação principal. Quanto à primeira inovação, o registro
não apenas passava a ser o único modo de transmissão da propriedade
imobiliária, como fé plena passava a ser atribuída àquilo que enunciava o registro.
Mais do que isso, pondo fim a um conflito de quase cem anos de debates, o
projeto consagrava a eficácia formal do registro, ou seja, uma presunção juris et de
jure de verdade, que protegia até mesmo quem havia adquirido a propriedade do
proprietário aparente que figurava no registro. Quanto à segunda inovação, a
hipoteca deixaria de ser acessória ao crédito, podendo ser constituída mesmo
antes da dívida, e ser cedida de maneira separada deste142.

Observe-se que a eficácia formal do registro já era adotada, nessa época, em


Lübeck, Hamburgo e na Saxônia. Nestes lugares, a transmissão já se operava pela
simples inscrição do registro, independentemente da validade do acordo
transmissivo. Esta eficácia purgava até mesmo o vício do título materialmente
falso. Pelas injustiças que poderia causar, a situação foi remediada em 1872,
exigindo-se o prévio acordo como requisito da transmissão. A isso se deu o nome
de “princípio do consentimento material”143.

As inovações propostas por Leonhardt pareceram ao parlamento radicais


demais, com o que foram admitidas com temperamentos. Assim, se, por um lado,
a propriedade passava a depender do registro, por outro foi restabelecida a
distinção entre adquirentes de boa-fé e de má-fé; e quanto à hipoteca autônoma,
esta foi admitida, mas como mais uma opção à hipoteca comum. O projeto,
deixado em suspenso pela guerra de 1870, foi aprovado em 1872, resultando em
quatro leis: a primeira delas tratando da aquisição da propriedade e direitos reais
sobre imóveis; a segunda tratando da ordenação dos livros fundiários; a terceira
tratando da divisão dos imóveis; e a quarta tratando das taxas devidas pelas
mutações reais144.

A legislação de 1872 – Lei de Registro Imobiliário do Reich, com uma


Alemanha já unificada – constituiu, assim, o complemento de direito imobiliário
formal ao direito imobiliário material, o qual se encontra no Código Civil145. O direito
imobiliário formal alemão, é composto por disposições acerca das autoridades
encarregadas do registro, os objetos de matrícula, a organização dos registros, e
os requisitos para a inscrição146.

As autoridades encarregadas do registro são a oficina de registro, não


organizadas por regras de direito comum, mas pelos direitos territoriais. Em quase
todos os estados os encarregados pelas oficinas são magistrados. O tribunal de
apelação é o tribunal territorial, e, acima deste, encontra-se o tribunal territorial
superior147.

Os objetos de matrícula são os imóveis e os direitos a eles equiparados, como


a superfície, a enfiteuse etc. Os imóveis devem ser descritos segundo dados
fornecidos por outras repartições oficiais, como os cadastros, os registros de
terras, os registros de agrimensura etc.148.

Quanto a organização dos registros, muito se reserva à legislação territorial. No


entanto, o direito comum prevê regras gerais, como a necessidade de uma folha
especial destinada a cada bem, evitando-se a escrituração em ordem cronológica
dos atos apresentados no mesmo livro. Admite-se a divisão da folha em três ou
quatro colunas, destinadas ao titular, imóvel, hipotecas e outros gravames. Ainda,
regras sobre a união e cisão de imóveis. Quanto à publicidade, esta não é
ilimitada, pois o interessado em obter certidão deve ter interesse justificado para
ter êxito149.

Os requisitos para a inscrição são a inscritibilidade do direito, os pressupostos


formais (o negócio causal e o acordo translativo); o pedido da parte, já que a
oficina de registro não pode agir de ofício; o consentimento da parte que cederá
seu direito, obtido pela declaração perante a oficina; a prévia inscrição como
proprietário daquele que cederá seu direito150.

Já o direito imobiliário material alemão, trata do imóvel enquanto categoria


jurídica; a constituição e transmissão de direitos sobre imóveis, suas regras, vícios
e requisitos, em especial considerando-se os dois momentos do acordo e do
registro; a extinção dos direitos reais sobre imóveis; e o conjunto de presunções e
a fé pública que emanam do registro imobiliário151.

Em 1896 foi promulgado o Código Civil Alemão, e em 1897 uma Lei de


registros (Grundbuchordnung – GBO), baseada no antigo Direito Prussiano.
Ambas entraram em vigor em 1900. No entanto, a Lei de 1897 ainda respeitava a
autonomia dos distintos direitos territoriais, e somente com a Grundbuchordnung
de 1935 foi possível atingir uma regulação efetivamente unitária para todo o país.
A partir de então, o registro passa a ser realizado pela Justiça Municipal, e o
procedimento é de jurisdição voluntária. O registro é de fólio real, e a inscrição é
constitutiva para qualquer transmissão ou oneração de imóveis152.
Tenha-se em vista, ainda, que o Sistema Alemão resultante do BGB é um
sistema de modo complexo, ou seja, o efeito real independe do negócio jurídico
obrigacional ou causal (Verpflichtungsgeschäft), que cria a obrigação de transmitir.
Na verdade, depende apenas de um negócio de disposição (Verfügungsgeschäft),
real e abstrato, seguindo da inscrição no registro. Se o negócio obrigacional cria
uma obrigação de transmitir, o negócio real tem por objeto a vontade de operar a
própria mutação real, razão por que não tem sua disciplina jurídica no Direito dos
Contratos, mas sim no Direito das Coisas153.

Algumas palavras devem ser ditas sobre a abstração.

O BGB estabeleceu, após uma série de debates, a abstração do negócio


jurídico real em relação ao negócio obrigacional. Isso significa que a causa que dá
origem ao negócio real não é considerada requisito de sua efetividade. Assim, a
manifestação de vontade no negócio jurídico real tem autonomia em relação à sua
causa. A concepção abstrata do negócio é a antítese de uma outra concepção,
causal, na qual a mutação real depende da existência de uma justa causa154.

Os juristas medievais, ao estudar os textos do Direito Romano Justinianeu –


que não eram claros a respeito do sentido de causa –, acabaram utilizando a
terminologia de Aristóteles, por distinguir uma causa efficiens próxima da
transmissão, a traditio, de uma causa efficiens remota, a obrigação subjacente.
Esta distinção viria a antecipar a criação da teoria do titulus e modus 155.

Esta teoria, que vigorava na Alemanha até o século XIX, foi desenvolvida pelos
cultores do usus modernus pandectarum, em especial Apel, segundo a qual a
relação entre os planos obrigacional e real se coordenava pela conjugação entre
título e modo de aquisição. O titulus, ou título, negócio obrigacional, seria a justa
causa da transmissão, operada pelo modus, ou modo156.

Coube aos Jusnaturalistas dar o primeiro passo na construção da teoria do


titulus e modus, enfatizando o momento em que se concentrava a vontade de
transmitir. O reconhecimento geral desta teoria aconteceria somente com Christian
Wolff. Todavia, o requisito de um negócio causal válido era visto com restrições, já
que mesmo os Glosadores admitiam, em alguns casos, uma causa solvendi
putativa, ou seja, pressuposta. O motivo da prestação, assim como a eventual
existência de erro ou discordância sobre o motivo, eram reputados irrelevantes. A
preocupação do jusnaturalismo com a liberdade, e, em especial, a liberdade do
proprietário de poder dispor daquilo que é seu, levaria à construção dos efeitos
reais do contrato obrigacional, na França, e à construção da figura do negócio real,
em Savigny 157.

A unânime aceitação da teoria do titulus e modus viria a mudar no século XIX,


em especial pela obra de Savigny158, inicialmente em 1840, em sua obra System
des heutigen Römischen Rechts, e posteriormente em 1853, na obra
Obligationenrecht 159.

Para Savigny, assim como existem negócios obrigacionais, que criam ou


extinguem obrigações, também há negócios de direito de família, como o
casamento e a emancipação, e negócios reais ou de direito das coisas. Quanto a
estes últimos, a traditio é exemplo de verdadeiro negócio jurídico, já que encerra
um acordo de vontades dirigido à transmissão do bem, e, por conseguinte, produzir
uma mudança nas relações jurídicas das partes. A eventual necessidade de um
elemento exterior, de tomada efetiva de posse, não muda a natureza deste
negócio. O mesmo ocorre com a instituição de uma servidão, enfiteuse, direito de
superfície ou constituição de um penhor. E estes negócios são distintos do contrato
obrigacional – por exemplo, uma compra e venda – que, quase sempre, os
precede e acompanha. Reforça Savigny a autonomia do negócio de direito das
coisas em relação ao negócio obrigacional pela observação de que não obstante a
generalidade dos casos contemple um negócio obrigacional seguido de um real, há
situações de traditio sem obrigação prévia, como a esmola feita a um pobre. A
entrega do dinheiro por quem pratica a esmola é verdadeiro negócio, sem que
tenha havido qualquer obrigação prévia estabelecida entre ele e o receptor. O
acordo de vontades, nesse caso, se restringe à vontade de dar e à vontade de
receber160.

Ainda segundo Savigny, deve-se ter em conta que o verdadeiro sentido da justa
causa da traditio não é aquele que ordinariamente se lhe atribui – a necessidade
de uma obrigação dirigida à realização da traditio, ou de ser a traditio a solução de
uma obrigação. O verdadeiro sentido da justa causa, segundo ele, é a intenção
com a qual alguém realiza uma traditio, que pode ser diferente quando se entrega
a coisa a alguém para transmiti-la, ou para alugá-la, ou para dá-la em garantia. Em
alguns casos, portanto, quer-se transferir a propriedade; em outros, não. Disso
decorre, por um lado, que a traditio transfere a propriedade pelo acordo unânime
das partes, e, por outro, que não transfere sem esse acordo161.

Ou seja, o acordo de transmissão é abstrato em relação ao negócio


obrigacional porque a justa causa da transmissão reside tão somente na vontade
de transmitir, e não na vontade de obrigar-se a transmitir.

Essa separação entre os planos obrigacional e real é conhecida na Alemanha,


além de abstração, também como “Princípio da Separação” (Trennungsprinzip)162.

A inovação foi bem recebida por juristas como Jhering, Zittelmann, Von Tuhr,
Oertmann e outros, que a viam como um mecanismo a serviço da segurança da
propriedade e do tráfico dos bens163. Por outro lado, foi criticada por muitos
romanistas que, de maneira geral, viam a abstração como uma invenção, e não
como algo que, efetivamente, estava nas fontes romanas (que teriam permanecido
fiéis ao sistema de título e modo até o fim)164.

A consequência mais importante da abstração é que a invalidade do negócio


causal não afeta o negócio jurídico real. A validade do negócio jurídico real está
submetida “às condições de validade dos negócios jurídicos em geral, e sua força
vinculante depende de ser reduzido a documento pela via judicial, notarial ou de
ser a manifestação e vontade prestada diretamente no ofício de registro”. Assim,
até que se tenha adotado a forma prescrita, qualquer das partes pode se
retratar165.

Quanto à proteção do adquirente, o Sistema Alemão contempla os princípios da


legitimação e da fé pública registral.
Pela legitimação, tem-se que o adquirente, pela simples posição de titular
registral, presume-se ser o titular do direito, podendo exercer o direito, fazê-lo
valer, e dele dispor. A presunção, contudo, é ilidível mediante prova em contrário,
que, se realizada, enseja a retificação do registro166. Com isso, a proteção gerada
pela legitimação é tão somente um alívio formal quanto ao ônus da prova, não
atingindo o direito material167. Isso ocorrerá somente com a fé pública registral.

O adquirente fica protegido pela fé pública registral, desde que de boa-fé, e que
tenha adquirido o bem por negócio jurídico. Isso significa que o eventual vício no
título aquisitivo de quem lhe transmitiu seu direito, se era o titular registral, não lhe
atinge. Assim, pode-se dizer que a fé pública, quando opera, tem um efeito positivo
(de suprir a eventual falta de direito do alienante) e um negativo (de tornar
inexistente tudo aquilo que não conste do registro e possa limitar ou invalidar o
direito inscrito)168.

Isso é uma decorrência de uma criação do direito medieval alemão que


superou, de certo modo, a velha regra romana de que ninguém poderia transmitir
mais direitos do que possuísse. Se, por um lado, o direito alemão protegia o
proprietário pela Gewere, por outro, para prestigiar a boa-fé do comércio e de
terceiros que, sem suspeitar de qualquer vício, compravam ou permutavam a
coisa, foi-se, pouco a pouco, distinguindo-se a situação na qual o dono desligou-se
da coisa de maneira livre e voluntária, das situações nas quais havia sofrido isso
sem seu consentimento, em especial por furto ou roubo. Quanto ao primeiro caso,
foi-se gradativamente reconhecendo o direito do terceiro de boa-fé, já que se
confiou em alguém a posse da coisa, e esta pessoa a alienou a um terceiro,
compreendia-se que o dono havia assumido ao risco ao ter tal confiança. Disso
surgiu o provérbio popular wo du deinen Glauben gelassen hast, da muss du ihn
suchen, ou seja, onde puseste tua confiança, ali deves procurar. Em suma, na
hipótese de uma alienação a terceiro de boa-fé, caberia ao dono tão somente
pleitear ressarcimento da pessoa que traiu sua confiança, mas não reivindicar a
coisa169.

Teve-se, com isso, uma superação da regra de que ninguém transfere mais
direitos do que possui, e, por conseguinte, um efeito de natureza substancial: o
terceiro adquire a propriedade ainda que o alienante não a tivesse. Essa regra
vigora no Brasil desde, ao menos, o Código Civil de 1916 (artigo 622), mantendo-
se no Código Civil de 2002 (artigo 1.268). A transmissão da propriedade feita por
quem não é proprietário que aliena a coisa oferecendo-a ao público, em leilão ou
estabelecimento comercial, ao adquirente de boa-fé, é precisamente a
transposição à modernidade do princípio da segurança do tráfico das feiras
medievais alemãs.

No que diz respeito aos sistemas derivados do Sistema Germânico, uma breve
exposição deve ser feita quanto o Sistema Austríaco.

A primeira menção da expressão Grundbuch como registro de imóveis aparece


em Viena, em 1389170. O Sistema Austríaco tem suas origens nas Tábuas
Fundiárias – Landtafeln – existentes desde o século XIII nas províncias da Morávia
e Boêmia, ambas na atual República Tcheca. A propriedade e outros direitos reais
sobre imóveis não poderiam ser adquiridas senão pela inscrição nas tábuas
fundiárias provinciais. O efeito desta aquisição, contudo, não era imediato: a
aquisição registrada poderia ser impugnada no prazo de três anos e dezoito
semanas da data do registro. Contudo, com base na fé pública, uma vez
transcorrido este prazo nenhuma prova mais era admitida contra aquilo que
certificava a tábua. Este princípio foi mantido desde sempre, e permanece até
hoje171.

A ignorância do conteúdo do registro era irrelevante; e não se admitia prova


testemunhal em contrário, salvo em caso de falsidade. Ainda, adotava-se, desde
essa época, o princípio da legalidade, já que o registro ficava condicionado à
regularidade das inscrições anteriores172.

Essas tábuas eram destinadas, em princípio, aos bens nobres, fossem feudos,
sujeitos a fideicomisso ou mesmo alodiais. Para os demais bens foram criados,
posteriormente, outros livros de registro (Grundbücher), um destinado a imóveis
situados nas cidades da circunscrição, e outro destinado a imóveis rústicos
situados na circunscrição. Registros dessa natureza, por exemplo, existiam em
Praga desde o século XIV173.

Ao longo dos séculos XVII e XVIII as tábuas fundiárias foram introduzidas nas
outras províncias então submetidas ao Sacro Império Romano Germânico, ou à
Monarquia Habsburgo174.

No final do século XVIII a organização dos livros foi reformulada pela Lei
Hipotecária de 1794, mas o cerne do sistema permaneceu intacto. Foi criado um
Livro Principal – Hauptbuch – no qual todos os imóveis deveriam ser registrados
em uma folha especial, destinada conter sinoticamente todas as notícias
relacionadas à propriedade ou a ônus sobre ele incidentes; e se tentou coordenar
este livro com o cadastro – o fólio de um determinado imóvel deveria estar
coordenado com sua inscrição cadastral. O Código Civil Austríaco de 1811, ainda
em vigor, também não trouxe qualquer mudança. Apenas estabeleceu a
necessidade do registro para a aquisição da propriedade e constituição de direitos
reis sobre imóveis, remetendo à legislação especial no que dizia respeito à
organização e funcionamento do registro175.

O sistema, então, foi integrado pela Lei Geral Austríaca de 1871, e regulamento
de 1872, a qual, por sua vez, após sucessivas reformas deu origem à
Grundbuchgesetz de 1955, ainda em vigor176. Em 1874 foi criado também um livro
para registro das hipotecas das estradas de ferro (Eisenbahnbuch), e em 1975
outro para registro de direitos minerários (Bergbuch)177.

Não obstante uma origem remota comum, o Sistema Austríaco se desenvolveu


de maneira distinta da experimentada pelo Sistema Alemão. Isto pode ser
observado não apenas pela ideia da tábua, própria do Sistema Austríaco178, como
também pela manutenção neste do causalismo e pela necessidade do decurso de
um certo prazo para que a aquisição seja considerada protegida em relação a
qualquer terceiro.

Essa causalidade significa que a aquisição depende de um título, que pode ser
um contrato, uma disposição mortis causa, uma decisão judicial ou uma disposição
legal; e o modo, que é o registro, e o negócio jurídico real (Verfüngsgeschäft) ou de
disposição – no qual as partes, em cumprimento da obrigação, acordam sobre a
constituição, transferência, modificação ou extinção do direito real – que é
pressuposto da inscrição, e cuja validade depende da validade do título179.

Assim, o registro é constitutivo, mas, na ausência de um negócio jurídico


obrigacional e de um negócio jurídico real válidos, não tem o condão de, por si,
criar o direito. Todavia, o adquirente fica protegido pelo princípio da legitimação,
isto é, pela simples posição de titular registral presume-se que é o titular do direito,
presunção esta que somente pode ser afastada por sentença judicial que ordene o
cancelamento do registro. Ainda, fica protegido pela fé pública registral, desde que
de boa-fé, o que significa que o eventual vício no título aquisitivo de quem lhe
transmitiu seu direito, se era o titular registral, não lhe atinge após o decurso do
prazo para impugnação180.

O sistema permanece em vigor na Áustria e também na região norte da Itália.


Em 1985 havia na Áustria 199 Tribunais de Registros e aproximadamente 7.800
ofícios de registro, mantendo cerca de 2,2 milhões de fólios e 12 milhões de
parcelas181.

3.4.Antecedentes da publicidade imobiliária na Itália

Na Itália uma pletora de legislações convive ao mesmo tempo ao longo de toda


a Idade Média e mesmo durante a Idade Moderna, comportando uma certa
variedade de sistemas de transmissão da propriedade, com maiores ou menores
graus de publicidade.

Para Luzzati, o direito romano prevalece - ao menos no espírito do povo –


nunca desaparecendo totalmente. Esta sobrevivência ocorre sem maiores
problemas, ao menos até a invasão pelos Lombardos182.

Os Lombardos – nome que deriva da forma como eles mesmos se chamavam,


Langobards, ou “Barbas-Longas” – eram um povo germânico que vivia nas
proximidades do Baixo Elba no começo do século I a.C., e que, na metade do
século II d.C. praticavam ataques à fronteira do Império Romano ao longo do Rio
Danúbio. Os três séculos seguintes de sua história nos legaram poucas
informações confiáveis, mas suas principais lendas deste período foram incluídas
em sua principal fonte narrativa, a Historia Langobardorum do monge Varnefredo
de Monte Cassino, conhecido como Paulo, o Diácono, no final do século VIII d.C.
Durante o período relatado pelo monge, os lombardos haviam adquirido a fama de
uma tribo pequena, porém feroz. Após passar pela baixa Áustria, pela Panônia e
pela Nórica, serviram como auxiliares de Justiniano no combate aos Persas aos
Ostrogodos, ocasião em que seu então rei, Audoíno (546-565 d.C), casou-se com
a sobrinha de Teodorico o Grande, o que pode ter dado aos lombardos o
sentimento de que deveriam suceder aos Ostrogodos na Itália. Em 567 Alboíno,
filho de Audoíno, aliou-se aos Avaros para derrotar seus vizinhos Gépidas, e então
voltou seus olhos para a Itália. A Itália, neste período, estava bastante
enfraquecida, já que ainda não havia se recuperado de vinte anos de guerra entre
Justiniano e o Reino Ostrogodo da Itália, além de, recentemente, ter sofrido uma
praga, e de estar enfrentando um conflito religioso, em razão da “Controvérsia dos
Três Capítulos”. Assim, na primavera de 568, Alboíno invadiu o norte da Itália
liderando os lombardos e outros povos associados a eles, e, dentro do período de
um ano, já haviam capturado todas as cidades mais importantes ao norte do Rio
Pó, com exceção de Pávia, que resistiu ao cerco durante três anos. Então,
cruzaram os Apeninos, chegando à Emília e à Toscana, e avançara, para o sul da
península. A morte de Alboíno, em 572, e, logo depois, de seu sucessor, Clefo, em
574, levou a uma extinção temporária da monarquia lombarda, mas esta foi
restaurada dez anos depois, em 584, com a elevação ao trono de Autário, filho de
Clefo. Após uma relativa estabilização das fronteiras, em 643 foi publicado por
Rotário Rotário (636 – 652 d.C) um edito contendo a primeira codificação das leis
lombardas. A extensão máxima do poder lombardo se deu sob o reinado de
Liuprando (712 – 744 d.C.), mas o reino deixou de ser independente com a
invasão da Itália por Carlos Magno em 773 e resultante incorporação ao Império
Carolíngio como sub-reino semiautônomo183.

Até a época da invasão, em 568, as instituições preexistentes haviam sido


preservadas por duas circunstâncias, a primeira delas o conhecimento do costume
e a manutenção das leis romanas, por alguns povos bárbaros; e a segunda delas,
a selvageria demasiada de outros184.

A primeira circunstância se deve a uma antiga proximidade política e cultural


entre os romanos e os Godos, em especial com os Ostrogodos. Os Ostrogodos, ou
“Godos do Leste”, surgiram no século IV d.C. como uma confederação organizada
de povos que viviam na região ao norte do Mar Negro e leste do Rio Dniestre,
atualmente na Ucrânia, organização esta que provavelmente se deveu a um
contato próximo com os romanos que já durava havia mais de um século. Este
contato era essencialmente amigável, e já no século IV d.C. havia poderosos reis
ostrogodos que negociavam com Roma em nome de todos os godos. Após
perderem sua independência para os hunos em 375, e, depois da morte de Átila, a
recuperarem em 454, o Rei Valamir obteve do Imperador do Oriente Marciano
autorização para ocupar, como foederati, a província da Panônia. Após um período
em que passaram também pela Ilíria, pela Macedônia, e pela Trácia, o Imperador
do Oriente Zenão I (474-491 d.C.) deu ao então rei Ostrogodo, Teodorico Amalo
(que depois viria a ser conhecido como Teodorico o Grande), a missão de invadir a
Itália e destronar Odoacro, que estava reinando em Roma desde a deposição de
Rômulo Augústulo em 476. Todo o povo ostrogodo marchou para a Itália, e
Odoacro foi derrotado sucessivas vezes. Teodorico, apoiado pela Hierarquia
Católica e pelo Senado Romano concluiu a conquista da Itália aproximadamente
entre 490 e 493, ano em que, após fazer um acordo com Odoacro de dividir com
ele o governo, e, com isso, ter acesso a Ravena, onde o rei derrotado se escondia,
matou Odoacro e seu filho em um banquete oferecido em comemoração ao novo
regime. Teodorico mostrou-se um governante hábil e consciente, mas,
nominalmente reinava em nome do Imperador do Oriente, não tendo sido
reconhecido como Rei da Itália. A despeito disso, governou com autonomia entre
493 e 526, mantendo o funcionamento do sistema administrativo romano bem
como o funcionalismo preexistente, cooperando com o Senado, e, embora ele e
sua família fossem arianos, cooperando também com a Igreja Católica. Apesar de
romanos e ostrogodos permanecerem sendo povos distintos, houve uma
acomodação, ao ponto de a nobreza ostrogoda passar a imitar os modos do
patriciado romano185.

Segundo o próprio Teodorico, “os romanos pobres imitam os godos, e os godos


ricos imitam os romanos”. Há evidências que apoiam esta afirmação: os godos
ricos eram enterrados à moda romana; e os exércitos dos godos estavam repletos
de romanos empobrecidos186.

Após algum tempo de paz, os ostrogodos entraram em guerra com o Imperador


do Oriente em 523, por razões religiosas, período este que, em uma alternância de
tempos de guerra e de paz, durou até 561 quando Bizâncio derrotou a última
cidade ostrogoda. Isso resultou, como já se disse, em consequências terríveis para
a Itália, como o esvaziamento da cidade de Roma e rápido abandono e
degradação de seus monumentos, a destruição da cidade de Milão, e a imposição
de pesados tributos pelo Império do Oriente187.

Assim, a dominação de Roma pelos Ostrogodos foi feita por meio de


instituições inspiradas nos princípios de equidade do direito romano, e pela
manutenção das linhas gerais do sistema romano. Isso pode ser observado no
famoso “Edito de Teodorico”. Neste, por exemplo, seguindo-se o Direito Romano
Pós-Clássico, as convenções se aperfeiçoam pelo consenso, e a propriedade se
adquire pela tradição188.

Já a segunda circunstância que colabou para a sobrevivência das instituições


romanas – a da selvageria demasiada – mostra-se na invasão pelos hunos e
vândalos. Estes povos consistiam em hordas desordenadas, cujo princípio
autoritário demandava mais um líder, ou um chefe militar, do que um governo.
Invadiram o decadente império em busca de uma presa fácil que pudessem
saquear, e não tiveram interesse ou oportunidade de extinguir nos povos vencidos
o sentimento de um direito vigente desde longa data para substituí-lo por outro189.

Os Lombardos, por outro lado, invadiram a Itália e nela implantaram uma


dominação feroz. O destino do direito romano sob o domínio lombardo foi objeto de
estudos por muito tempo190, cujos resultados indicam que os dominadores
admitiram, ainda que de forma excepcional, o sistema da personalidade do direito.
Assim, seja de forma excepcional dentro de um quadro de dominação aberta, seja
como parte integrante do direito público dos dominadores, a personalidade do
direito levou à convivência na Itália, durante a dominação lombarda, com maior ou
menor vigor, de seis leis diferentes: a lombarda, a sálica, a ripuária, a alamana, a
bávara e a burgúndia191.

De maneira geral, nos territórios sob domínio lombardo, a transmissão da


propriedade deveria ser feita na presença de testemunhas, o que implica alguma –
ainda que muitíssimo rudimentar – publicidade de fato. Outros povos bárbaros,
como os francos – sálios e ripuários – alamanos e burgúndios, acrescentaram ao
ato escrito de transmissão um outro, de investidura na posse do imóvel: a Gewere,
da qual já se tratou. Esta investidura originariamente se cumpria in loco, mediante
uma entrega simbólica de algum objeto, que variava. Em momentos posteriores,
esta entrega simbólica foi substituída por um ato praticado perante notário e
testemunhas, e narrado na escritura, o que, para PUGLIATTI consistia em uma
“investidura ideal”. Cabia às testemunhas cumprir o papel de uma imago populi, ou
seja, de uma miniatura da comunidade192.

Com a destruição do Reino Lombardo, o feudalismo se impõe na Itália,


trazendo uma nova configuração territorial para a região. A terra passa a se dividir
em bens feudais e bens alodiais; e os bens alodiais, que já eram já poucos,
reduzem-se ainda mais. Não havia um poder central que impusesse o respeito à
propriedade privada. Com isso, os proprietários dos poucos bens alodiais muitas
vezes acabavam preferindo sujeitar-se “contratualmente” a um senhor feudal em
troca de proteção a manter sua autonomia. Assim, acompanhando o
desaparecimento dos bens alodiais, as formalidades de transmissão de
propriedade entre proprietários livres passariam a dar lugar às investiduras feitas
perante o senhor feudal. O senhor dava o direito ao adquirente, mantendo, assim,
prerrogativas de soberania sobre a terra193.

Paralelamente, já no século XI vão ganhando força e independência as


cidades. Estas promulgam estatutos baseados em seus costumes locais e no
direito romano, que ressurge não mais como tradição popular, mas como ciência e
fonte de lei. Essa influência faz-se sentir especialmente nas normas relativas aos
atos da vida civil, valendo como regra geral, e, eventualmente, cedendo espaço a
algumas modificações estatutárias de caráter local194.

No século XII, em algumas cidades, como Chieri, em 1.131, e em outras


cidades da Lombardia, Romagna e Marche pouco tempo depois foram criados
livros, chamados libri iustitiae, nos quais atos eram transcritos com a finalidade de
se facilitar a sua prova. Com os mesmos fins criam-se em Bolonha memoriais.
Com fins fiscais cria-se em Florença um registro de contratos, idealizado para o
recebimento de uma taxa para a realização de insinuatio. Com o mesmo fim criam-
se cadastros imobiliários em Pisa (em 1.162 ou 1.163), Siena (1.198), Lucca
(1.260), Veneza (1.171) entre outras195. Na Sicília o Rei Rogério criou um cadastro
dividido em duas partes. A primeira delas, mais volumosa, destinava-se à inscrição
de todos os bens imóveis, sejam os da coroa, da cidade, das universidades,
feudais, de burgueses, ou qualquer outro. A segunda parte, chamada Cedolario,
destinava-se somente aos bens sujeitos a tributos. Em Nápoles o Rei Roberto de
Anjou criou um cadastro, por essa época, que além da finalidade tributária, servia
também para a solução de questões relativas a limites das propriedades196.

Segundo Coviello, algumas legislações – como os estatutos de Bolonha de


1250 e de Piacenza de 1336 – mantinham a obrigatoriedade da insinuação para as
doações, herança do Direito Romano Justinianeu. Contudo, nessa época o escopo
era meramente fiscal. Não tinha objetivo publicitário algum, e nem a destinação
romana de se dar solenidade ao ato, a fim de evitar que excessivas liberalidades
arruinassem o patrimônio familiar.197

Luzzati divide esses estatutos, no que diz respeito às formalidades empregadas


na transmissão de imóveis, em estatutos que as prescrevem com fins de fornecer
uma base para a arrecadação de tributos, e os que o fazem tendo em vista a
publicidade do ato, ainda que parcial. No primeiro caso se encontrariam, por
exemplo, os estatutos de Turim e Moncalieri, cujo sistema tributário era fundado
em um censo – um registro patrimonial feito a partir de uma declaração e um
juramento do cidadão. Ainda que em Moncalieri o estatuto determinasse a
inscrição do comprador como novo proprietário no registro, esta inscrição era
despida de eficácia jurídica, apenas indicando o novo devedor dos tributos. Em
Roveredo, cidade que adotava sistema semelhante, esta inscrição ficava a cargo
do vendedor, o que bem demonstra que o interesse era de livrar-se do pagamento
dos tributos incidentes sobre o bem alienado. Também nesta cidade a inscrição
tinha fins exclusivamente fiscais, cobrando-se uma taxa pela insinuação e inscrição
dos contratos nos livros. Já no segundo caso estão estatutos que contêm
disposições que ordenariam uma certa publicidade, ainda que imperfeita por falta
de um real sistema publicitário. Por exemplo, Veneza, pelo apregoamento público,
investidura perante magistrados, e inscrição de créditos hipotecários em livros dos
juízes examinadores, como se verá; e Sassari, onde uma coletânea de estatutos
de 1316 ordenava o registro e publicação dos bens hipotecados198.

Em Veneza, instituiu-se, no início do século XIII um magistrado examinador,


que intervinha nas alienações de prédios. Após serem anunciadas nas ruas e na
igreja, e depois de ouvidos eventuais opositores, obtinha-se do doge, por meio dos
magistrados examinadores, uma estimação do valor da coisa. Então, esta era
posta à venda em público. Não se obtendo preço conveniente, o bem era
arrematado pela república, com um deságio de vinte por cento sobre o preço
estimado. Cumpridas as formalidades, o examinador autenticava o ato de
transmissão, para estabelecer com fé pública a data do ato. Com este fim foi
instituído em 1288 o “notatorio”, um registro público no qual deviam ser inscritos
contratos de transmissão de imóveis, testamentos, codicilos e outros atos199. Até
mesmo os créditos hipotecários ingressavam neste registro200.

Para Coviello, o “notatorio” tinha como função unicamente dar certeza à data
dos atos, e, portanto, não tinha semelhança com os modernos livros de registro.
Ainda, a apresentação do ato para registro não era obrigatória, mas facultativa,
gerando proteção ao apresentante em relação a certos prazos de prescrição, como
direitos de preferência oriundos da antiga copropriedade familiar201. No entanto,
esclarece Pugliatti que era função do notatorio, além de autenticar a data, também
salvaguardar a boa-fé nos contratos202.

Quanto à Sassari, estes estatutos de 1316 tinham a preocupação de que as


hipotecas ocultas fossem eliminadas. Para isso, determinavam que sua
constituição fosse realizada por meio de escritura pública que deveria ser
apresentada ao Podestá – o mais alto magistrado que então existia na cidade – e
ao Conselho. Ainda, a cada ano os atos de constituição de hipoteca deveriam ser
proclamados ao público203.

No século XIV outras cidades criaram também seus mecanismos de


publicidade imobiliária.

Em 1316 um estatuto de Modena instituiu a Camera degli atti para a


conservação, em compêndios, dos atos jurídicos, de maneira a se ter mais
segurança na aquisição. Uma lei de 1488 reconheceu esta finalidade de maneira
expressa, afirmando que o acesso pelo interessado em comprar o bem ao
documento pelo qual o vendedor o adquiriu permitiria que “il comprador possi con
sincero animo comprar”204.
Em Verona, um estatuto ordenava a publicidade por proclamação pública das
alienações de prédios em que o alienante continuasse na posse do bem,
equiparando-se esta publicação à traditio real. Havendo uma dupla alienação do
bem pelo alienante, prevalecia o direito daquele que primeiro houvesse cumprido
uma das formalidades, a traditio real ou a publicação, sem qualquer prioridade
para uma ou outra modalidade205. Esta formalidade, chamada publicatio in
concione o arengo, tinha mais sentido quando o alienante permanecia na posse do
bem, e não obstante não gerasse mais efeitos que a traditio, tornava notória a
aquisição206.

No Ducado de Milão havia um juízo de purgação conhecido como giudizio delle


grida, introduzido pela primeira vez em 1369 por Bernabò Visconti. Este juízo
consistia na publicação pelo vendedor do contrato de alienação por meio de edital
e arautos, perante o prédio do pretório do distrito de seu domicílio e do distrito da
localização do imóvel. Após essa proclamação solene – que deveria ser repetida
durante várias semanas207 – abria-se então um prazo para eventual oposição de
titulares de direitos sobre o bem. Transcorrido o prazo sem oposição, o bem era
adjudicado ao comprador livre de hipotecas ou outros ônus reais. Por outro lado,
se houvesse oposição, o bem era transmitido igualmente livre de ônus; contudo, o
preço seria depositado com um banqueiro, que faria os pagamentos aos credores.
Esse procedimento pretendia garantir segurança ao comprador, mas não era um
real sistema de publicidade, pois pressupunha a existência de hipotecas e ônus
reais clandestinos, cujo mal tentava mitigar com uma imperfeita e insegura forma
de publicação208. Todavia, ao buscar aumentar a segurança das aquisições por
terceiros, cumpria uma das funções que em geral se atribui à publicidade
imobiliária. Em 1385 o procedimento foi estendido também para o confisco de bens
pertencentes a criminosos209.

Em Florença, onde já havia um cadastro, houve tentativas de criação de um


registro público (libri debitorum) em 1346 e outra em 1355. Estas tentativas são
relatadas por um contemporâneo, Mateo Villani, em suas Croniche: “Di questo
mese d’agosto, alquanti cittadini di Firenze, parendo loro che dovesse essere util
cosa al comune per levar ela briga a’ creditori di ritrovare i beni del debitore,
misono innanzi a’signori che si facesse uma távola, nella quale si screvessono tutti
i beni immobili dela città e del contado per popolo e per confini, e diedono il modo a
catuno quartiere dela città e del contado per sè; e`signori misono la petizione, e
vinsesi, parendo a tutti che dovesse esse utile cosa”210. Ou seja, alguns cidadãos
requereram ao governo de Florença a criação de uma tábua das propriedades
imobiliárias do local, por povoação e por limites, com a finalidade de se facilitar a
busca por bens de devedores. Relata o cronista que o empreendimento parecia
aos homens “antigos, sábios e práticos” coisa impossível de se fazer com
perfeição, mas que estes não foram ouvidos, com o que foi determinada a
inscrição de todos os bens, sujeita a omissão a graves penas. Logo surgiram
problemas: mudanças na titularidade dos bens, conflitos quanto aos limites entre
imóveis e outros inconvenientes ainda maiores. Depois de uma longuíssima
escrituração, grande despesa pública, e uma confusão generalizada sem frutos, a
empresa foi abandonada. Como observa Pugliatti, a ousadia e a novidade da
instituição provocaram a “habitual reação dos ‘práticos’, os quais sempre recuam
quando confrontam as inovações que perturbam a sua pacífica praxe”211. Seja pela
despesa demasiada, seja pela incapacidade do funcionalismo, ou seja, ainda, por
conta de resistências subterrâneas dos interessados em esconder seus bens do
fisco, o empreendimento não foi concluído212.

Já na Idade Moderna algumas cidades italianas criaram sistemas mais


próximos do que se compreende contemporaneamente como publicidade
imobiliária.

Em Veneza, durante o governo do Doge Andrea Gritti (1523 – 1538), foram


declaradas inválidas todas as obrigações que atingissem imóveis que não
houvessem sido comunicadas ao magistrato degli esaminatori. Esse magistrado
dispunha, naquela época, de um registro destas obrigações, organizado em ordem
alfabética, que poderia ser consultado por quem quer que fosse. A justificativa
dessa determinação enunciava a razão prática da medida: a ausência desse
registro e a possibilidade de um bem já onerado vir a ser novamente onerado, ou
alienado, causava grave prejuízo a este novo adquirente. Assim, tinha o Doge uma
visão clara do que significava a publicidade, e qual era sua função. Uma decisão
do Conselho de Veneza, de 1535, ainda insistiu neste tema: não apenas cominou
uma pena criminal a quem cometesse “tal fraudolenta et detestanda operatione de
vender alcuna cosa più de uma sola volta”, como também determinou que o
adquirente do bem deveria apresentar o instrumento público da compra à
chancelaria da cidade, onde o reitor deveria tomar nota do ato e de seu conteúdo,
do nome do notário e das testemunhas. A seguir, era feita a registração no livro
próprio, em ordem alfabética213.

Em Nápoles, uma súplica ao rei, de 29 de junho de 1536, tratava do mesmo


tema: aquisição de bens já onerados ou já alienados. Nesta súplica se pedia que
fosse determinada a insinuação e registro das doações, vendas, penhores,
hipotecas e qualquer outra sorte de alienações. O monarca acedeu à súplica, mas
somente em 1609 foi executada sua decisão214.

Na Gália Cispadana – uma das metades da Gália Cisalpilna, mais ou menos


correspondendo à sua porção ocidental – então sob domínio dos Estados Papais,
um decreto de 28 de janeiro de 1544 do Cardial Legado Umberto da Gambara, que
ficou conhecido como Decretum Gambaranum, instituiu um ofício de registros de
doações em Parma. Estabelecia o decreto que todas as doações, inter vivos ou
mesmo mortis causa, assim como todos os contratos de alienação em que a posse
do bem permanecesse com o alienante, bem como contratos entre marido e
esposa, ou entre pais e filhos, com valor superior a um certo parâmetro, deveriam
ser comunicados à chancelaria de Parma. O ato, ainda, deveria ser anunciado na
igreja em que costumeiramente congregam os mais velhos da cidade em questão
– in ecclesia ubi soliti sunt congregari antiani dictae civitatis. A falta de
cumprimento desta formalidade acarretava a nulidade do ato em relação a
terceiros, mas não entre as partes. Cabia ao notário que lavrasse o ato advertir as
partes quanto à necessidade da observância deste dever. Este Decretum
Gambaranum vigorou até 1757215. A finalidade dessa formalidade, afirmada
expressamente, é clara: para que não se possa enganar terceiros com o manto da
ocultação216.

Em 1757, Parma já não mais pertencia aos Estados Pontifícios, mas integrava
o Ducado de Parma. E por um decreto de 26 de agosto de 1757, acompanhado de
um edito de 17 de dezembro do mesmo ano, e confirmado por outro de 21 de
março de 1758, o Duque Felipe de Bourbon criou um rigoroso e sofisticado sistema
de publicidade imobiliária, constituído por arquivos especiais onde seriam mantidos
os registros públicos. Nesses arquivos seriam registrados os contratos, de maneira
que, com facilidade, se tivesse acesso aos dados do patrimônio alheio, de maneira
a evitar as fraudes217.

Esse novo ofício levava o nome de Ufficio dela R. Notulazione, e nele deveriam
ser registrados todos os atos inter vivos, ou testamentos, tanto notariais, quanto
particulares218.

Esse sistema, contudo, durou pouco, sendo extinto já em 1771219.

Os Estados Pontifícios também já vinham tratando de seus arquivos desde o


século XVI, bem como de um depósito centralizado de atos notariais. Uma bula de
1596 do Papa Clemente VIII determinava que ainda que submetidos a vínculos e
cláusulas de inalienabilidade, os bens do devedor deveriam estar sujeitos a
execução mediante venda pública, após prévia afixação de comunicados em local
público ao longo de quinze dias. Esta bula era destinada a acabar com os abusos
cometidos pelos barões que inviabilizavam as garantias imobiliárias por eles
oferecidas com os muitos vínculos e onerações ocultos que sobre elas recaíam.
Permaneciam em vigor apenas os ônus constituídos em favor da igreja, ou que
não houvessem sido causados pelo barão220.

Seu sucessor, o Papa Urbano VIII, modificou essa bula, estabelecendo que a
venda pública não poderia ser feita se o vínculo ou inalienabilidade houvesse sido
previamente registrada no ofício de registro pertinente. Estes registros eram
públicos, e qualquer um poderia solicitar cópias de seu conteúdo. Já em 1689 o
Papa Inocêncio XI outorgou uma constituição segundo a qual estes vínculos,
quando constituídos, deveriam ser comunicados por meio de afixação de editais
nas várias subsedes do ofício, a fim de que os eventuais interessados no bem
estivessem melhor informados sobre sua situação221.

Por fim, na Sicília, no começo do século XVII, foi introduzida uma modalidade
de venda chamada Vendita sub Verbo Regio, que, de maneira análoga à do
Giudizio delle Grida de Veneza, tinha por finalidade purgar imóveis cuja situação
jurídica abrangesse servidões, hipotecas ou outros direitos mal esclarecidos. O
antecedente desta medida foi a já mencionada bula do Papa Clemente VIII, de
1596.

Em um primeiro momento, o mecanismo servia apenas para os arrendamentos.


Por uma pragmática do rei Afonso de Aragão chamada “De Censibus”, os credores
dos arrendamentos podiam perseguir as dívidas relativas aos bens assim
arrendados com quem quer que estivessem, não apenas para satisfação do crédito
do último ano, como também dos anteriores. Com isso, os arrendatários,
espoliados, muitas vezes abandonavam o cultivo dos campos, já que iniciar um
arrendamento poderia sujeitá-los a arcar com dívidas de períodos anteriores. Para
tentar remediar a situação e estimular os arrendatários a retornar ao cultivo, o
Duque de Maqueda criou um órgão chamado Stati e Feudi, composta por
magistrados nomeados por ele, cuja missão era a de administrar as propriedades
abandonadas. Este órgão oferecia as propriedades em arrendamento, recebiam o
pagamento da renda, e o disponibilizavam aos credores. Os arrendatários, com
isso, recebiam uma salvaguarda – de verbo regio – de que uma vez cumpridas as
obrigações devidas ao órgão, nenhum outro credor da renda fundiária poderia
molestá-los. Se houvesse mais de um credor, ou conflito entre eles, concorreriam
ou disputariam os valores arrecadados pelo órgão222. Com isso, afastavam o
arrendatário do conflito e do risco de responder por dívidas anteriores.

Um documento de 1595 demonstra a extensão desse procedimento também


para as vendas. O Condado de Naso estava tão onerado por garantias de dívidas
que os ônus ultrapassavam o valor das rendas. O Vice-Rei adjudicou a sua
administração a dois magistrados, que acabaram concluindo ser a melhor solução
a venda de tudo em hasta pública. A venda foi autorizada, e seu anúncio público
mencionava a salvaguarda de verbo regio, ou seja, as dívidas não atingiriam o
adquirente. No mesmo ano a venda foi feita. A praxe acabou sendo reconhecida
legalmente, sendo aplicável a todo tipo de bens, por uma pragmática de 1666 do
Duque de Sermoneta. A pragmática apenas condicionava o uso desse instrumento
à prévia instância dos credores. Feita a venda, o valor do preço era depositado em
um banco, e o soberano expedia uma carta de salvaguarda perpétua, que
extinguia ex plenitudine regiae potestatis, os direitos hipotecários ou dominicais
sobre o bem223.

Com a modernidade, a Itália adotou o Sistema Francês de registro em seu


Código Civil de 1865, afastando-se da tradição do Direito Romano. Isso manteve-
se na codificação seguinte.

Assim, o Código Civil Italiano de 1942 determina a necessidade da transcrição


de contratos e outros atos que transferem a propriedade para obtenção de
publicidade (artigos 2643 e seguintes), e a transcrição se mostra como mecanismo
destinado a solucionar conflitos entre duas ou mais pessoas que tenham adquirido
direitos contraditórios sobre o mesmo bem, prevalecendo o direito de quem tiver
transcrito em primeiro lugar sua aquisição224.

Ou seja, o sistema adota aquilo que Mónica Jardim denomina a primeira


dimensão da inoponibilidade, o sujeito ativo de um fato jurídico que deveria ter sido
levado a registro e não o fez, não verá sua posição prevalecer em relação a um
terceiro adquirente que o fez225.

A despeito disso, por vezes introduz exceções à regra de que ninguém pode
transferir mais direitos do que possui ao proteger um terceiro adquirente de boa-fé,
em face da eficácia retroativa da anulabilidade fundada em incapacidade legal do
alienante, ou da nulidade do ato pelo qual este adquiriu o imóvel. Isso ocorreria se
as ações judiciais que impugnavam o ato não houvessem sido levadas ao registro
antes da transcrição da aquisição pelo terceiro em questão, e desde que tenham
transcorrido já cinco anos da data do fato atacado226.

Assim, trata-se de um sistema de publicidade declarativa, e, excepcionalmente,


de publicidade constitutiva, nos casos de hipoteca e de usucapião tabular com
prazo abreviado227. A organização das informações é feita segundo o sistema da
base pessoal; e adota-se o princípio registral da continuidade228.
Observe-se, por fim, que o sistema de transcrição não é o único em vigor na
Itália. Herança do tempo em que parte da Itália fazia parte da Monarquia dos
Habsburgos, adotam um sistema derivado do Sistema Austríaco, de entabulação,
as regiões de Trentino – Alto Adige, Trieste, Gorizia, em parte, Udine, Belluno,
Vicenza e Brescia.

Com a vitória na 1ª Guerra Mundial e consequente anexação de territórios,


optou o legislador italiano, pelo Real Decreto 2.325 de 1928, por manter o sistema
dos livros fundiários nos locais em que já existia, até que novas disposições de
caráter geral sobre a matéria fossem feitas. Várias foram as razões para essa
decisão, tais como a consideração de que o sistema já era profundamente
enraizado na consciência jurídica e na economia das populações destas regiões,
no exemplo francês que, em 1924, havia mantido o Sistema Alemão de registro na
Alsácia-Lorena, e o intento de se adotar, de forma geral para o país, um sistema de
publicidade de matriz germânica229.

A despeito disso, o Código Civil de 1942 manteve o sistema de transcrição


como regra geral, não obstante não tenha suprimido o da entabulação onde este já
vigorava230.

Este sistema é caracterizado pela organização com base real e não pessoal;
pelo princípio de inscrição, segundo o qual o registro é constitutivo para aquisições
inter vivos; pelo princípio da legalidade, ou seja, há rigoroso controle formal e, em
parte, substancial, da validade do título por um juiz tabular que determina o registro
ou sua denegação; pela fé pública registral, protegendo terceiros adquirentes de
boa-fé; e pelo princípio do antecessor tabular, pelo qual não é possível a inscrição
se essa não for justificada por um título em favor de quem a requisita emanado
daquele contra quem a inscrição é requerida, ou seja, do alienante em favor do
adquirente231.

Quanto ao princípio da legalidade, deve-se observar que, não obstante a


qualificação registral seja feita por um magistrado, este atua na esfera da jurisdição
voluntária, do que decorrem alguns pontos relevantes. Por um lado, tratando-se de
jurisdição, não há dúvida de que pode o magistrado, ao qualificar um título,
apreciar questões afetas à constitucionalidade de norma. Todavia, por se tratar de
jurisdição graciosa, sua decisão não faz coisa julgada, e a rejeição do pleito do
requerente não impede a sua reapresentação. Ainda, não deve o magistrado
decidir de maneira ultra petita, ou seja, determinar inscrições não solicitadas pelas
partes, ainda que o documento justificasse um pedido mais amplo (por exemplo, se
foi pedida apenas a prenotação, não se pode realizar o registro); está, em geral,
privado de qualquer poder de iniciativa; e não apenas deve decidir sem
contraditório das partes, como também não pode ouvi-las232.

Da decisão do juiz tabular, cabe recurso a um tribunal colegiado233.

Trata-se, portanto, de um sistema de registro de direitos, permitindo, pela


publicidade de suas inscrições, o conhecimento da situação jurídica atual e
passada do bem.

3.5.Antecedentes da Publicidade Imobiliária na Espanha


Se a Itália foi ocupada pelos Godos do Leste – Ostrogodos – a Espanha foi
ocupada, ao tempo do fim do Império Romano, pelos Godos do Oeste – Visigodos.
Após a derrota de Átila, em 451, os visigodos que estavam assentados no sul das
Gálias se converteram nos principais aliados das tropas imperiais do Ocidente.
Como foederati de Roma, os soldados visigodos enviados por Teodorico II
intervieram na Península Ibérica em 456, para enfrentar e derrotar os Suevos e
ocupar sua capital, Braga, em 457. A despeito de uma reação sueva entre 458 e
468, estes acabaram por ser novamente derrotados e confinados à região da
Galícia. Com isso, a partir de 476 o Reino Visigodo de Eurico se tornou a mais
poderosa monarquia então existente no ocidente234.

Todavia, ao longo de quase toda sua existência o Reino Visigodo foi marcado
por instabilidade. Houve um período de estabilidade a partir do reinado de
Gundemaro, iniciado em 610, e o reino atingiu seu auge no reinado de
Chindasvinto (642 - 649). Neste período o rei dedicava-se a reorganizar o reino,
promulgar novas leis e preparar uma reestruturação do Direito Visigodo, que foi
concluída por seu filho, Recesvindo (649 - 672). O Reino Visigodo de Toledo
acabou em 711, após seu último rei, Rodrigo ser derrotado pelos muçulmanos que
então invadiam a Península235.

As fontes do Direito Visigótico contêm passagens de interesse às transmissões


de direitos reais sobre imóveis e à publicidade imobiliária.

A compilação conhecida como Código de Eurico, do ano 476, estabelecia que a


compra e venda feita por escritura era perfeita, e que a falta da escritura podia ser
suprida pelo pagamento do preço perante testemunhas. Ainda, estabelecia que
nas doações considerava-se transmitida a propriedade pela entrega de seu
instrumento. Esta estrutura permaneceu inalterada na Lex Romana Visigothorum,
de 506, no Código de Leovigildo, de 580, e no Liber Iudiciorum, de 654. Tudo isso
sinaliza, portanto, a existência de uma traditio per chartam na Alta Idade Média
Ibérica236, ou seja, a transmissão da propriedade mediante a entrega de um signo
material, que, neste caso, era o instrumento do próprio ato jurídico.

Assim, nas doações a traditio do bem seria substituída pela traditio do


documento. Se o Direito Romano considerava a escritura meio de prova, o direito
vulgar, sob o influxo doa costumes bárbaros, passa a considerar o documento
como uma materialização do direito de que tratava237.

A traditio per chartam não se confunde com a traditio ficta do Direito Romano
Justinianeu238. O objeto não é o documento em si, mas a coisa cuja propriedade se
pretende transmitir. A despeito disso, a entrega do documento não é simbólica,
mas física, efetiva. Por isso, o instituto não se confunde com a traditio chartae, cujo
objeto é o próprio documento239.

Quanto às vendas, por outro lado, a necessidade de prova escrita, ou a


possibilidade de seu suprimento por testemunhas do pagamento do preço parece
não ter que ver com a transmissão da propriedade em si. Com isso a traditio do
bem em si, real ou ficta, permanecia sendo necessária240.
Uma outra modalidade de traditio presente na Península Ibérica, específica
para as doações feitas à Igreja, foi a traditio super altare, consistente no depósito
solene do documento que instrumentalizava a doação sobre o altar da igreja241.

Mais uma vez, têm-se nestas solenidades modalidades precárias de


publicidade imobiliária, cuja memória reside tão somente na consciência das
testemunhas ou dos circunstantes à prática do ato.

Durante a reconquista vigorou, em Castela, ao longo de toda a Baixa Idade


Média, o sistema do contrato seguido da tradição do bem, estabelecido pelas Sete
Partidas. Tal sistema ocultava dos terceiros as modificações jurídicas sofridas
pelos imóveis, em especial quando se tratava de direitos que não deslocavam a
posse do bem242.

Todavia, fueros municipais de algumas povoações do reino previam regras


diferentes para as transmissões imobiliárias. O mesmo ocorria em Viscaia e
Navarra. Havia em alguns foros particulares formas de publicação, como a
ratificação pública e solene dos negócios (roboración), os anúncios e os
pregões243.

Havia roboraciones na Igreja, durante a Santa Missa, ou nas reuniões do


Conselho Municipal. No primeiro caso, o fuero de Alcalá de Henares, por exemplo,
estabelecia que o comprador de imóvel situado na localidade a afirmasse após a
missa maior, na igreja paroquial da povoação. Disposições semelhantes, com
alguma variação, havia nos fueros de Ledesma, Cuenca, Baeza, Alarcón, Alcázar,
Consuegra e outros. Em Viscaia, deveria o adquirente anunciar solenemente sua
aquisição durante a procissão ou ofertório da Missa Maior, perante notário,
repetindo-se a prática três domingos seguidos244.

No segundo caso, tem-se como exemplo de anúncio no Conselho Municipal, o


fuero de Sepúlveda, pelo qual quem comprasse imóvel em seus limites deveria
afirmar sua aquisição, no Conselho Municipal, no domingo ou em outras datas
predeterminadas em razão do calendário litúrgico245.

Os anúncios e pregões eram feitos por proclamação pública, nas ruas da


cidade. Assim o fuero de Plasencia e o fuero geral de Navarra: o primeiro
determinava que quem pretendesse comprar imóvel em seus limites deveria
apregoar sua aquisição na cidade por três dias; e o segundo dispunha que quem
pretendesse vender sua propriedade deveria anunciá-la, com o som de sinos, em
três domingos seguidos246.

Não obstante a finalidade de muitos desses atos fosse possibilitar o exercício


de direitos como o retrato, acabavam por gerar publicidade, ou, ao menos,
afugentar a clandestinidade247. Porém, sem mudanças visíveis na posse do imóvel,
tais formalidades em geral restavam ineficazes248.

Também na Espanha se manteve a prática da insinuação das doações. Em


Aragão, na Catalunha, em Navarra e Valência a insinuação era praticada com a
finalidade de se evitar doações simuladas, não obstante na Catalunha ainda
houvesse a preocupação com a ruína do doador.
Em Aragão e em Valência a ausência de insinuação eivava de nulidade a
doação. O doador deveria comparecer perante juiz e testemunhas, e o magistrado
determinava a redução a escrito da doação por notário, registrando-se sua
existência em livro da cúria e entregando-se cópia ao interessado. Em Navarra a
doação deveria ser feita perante notário e testemunhas, e insinuada perante juiz249.

Na Catalunha, nesta matéria, ainda vigoravam as regras do Direito Romano


Justinianeu. Todavia, disposições do direito local criaram uma espécie de
registração das doações. Para isso, foi organizado um registro especial com
índice, com caráter judicial. A falta da insinuação e desta registração, contudo, não
ensejavam a nulidade da doação, mas a proibição de que credores fossem
prejudicados por ela. Assim, servia como meio de se evitar a fraude contra
credores e reforçar a ação pauliana250.

Nas Ilhas Baleares, por uma Ordenação do ano 1413, criou-se um juízo
liberatório de cargas, que, assim como outros institutos, se assemelhava ao
Giudizio Delle Grida veneziano. Nas vendas, se o comprador quisesse ter
segurança de adquirir o imóvel livre de hipotecas, vínculos ou outras onerações,
assim como de obrigações, poderia obter a liberação destes mediante um
procedimento judicial de caráter intimatório. Para tanto, publicava-se um edital
convocando todos que pretendessem ter direitos sobre o imóvel a apresentá-los à
cúria durante um certo prazo, sob pena de caducidade251.

Todavia, segundo Lacruz Berdejo e Sancho Rebullida a publicidade imobiliária


se iniciou-se realmente na Espanha com a Pragmática de Dom Carlos e Dona
Joana, atendendo a petição apresentada nas Cortes de Toledo de 1539. Esta
norma criava um livro, em alguns centros urbanos, destinado à inscrição dos
censos e hipotecas. Sem esta inscrição esses direitos não seriam oponíveis aos
adquirentes do bem, nem poderiam ser arguidos em juízo252.

Fora relatado nessas Cortes que abusos vinham sendo cometidos por pessoas
que vendiam como livres bens que estavam gravados por hipotecas, censos,
vínculos e tributos, o que gerava muitos pleitos judiciais. Assim, para remediar
esses inconvenientes, se propôs a criação de um sistema de registros. Assim, em
cada cidade, vila ou sede de comarca deveria haver uma pessoa que mantivesse
um livro em que fossem registrados todos os contratos de censo, tributos e
hipotecas. Os contratos que não fossem registrados no prazo de seis dias não
fariam fé nem obrigariam coisa alguma. O registro em si não seria exibido a
ninguém; mas caberia ao registrador dar fé se havia ou não alguma oneração
dessa natureza sobre o bem253.

No entanto, a disposição não foi cumprida, situação que somente foi remediada
com a aprovação de um regulamento que criava Contadurías de Hipotecas, em
1768254. Antes disso, porém, a petição foi recordada nas Cortes de Valladolid em
1548 e 1555, nas quais se pediu, inclusive, que fosse sancionada criminalmente a
conduta de quem vendesse como livre coisa onerada. Ainda, uma Pragmática de
Felipe V, de 1713, já havia disposto sobre a organização destes registros, sem
êxito255.
A Real Pragmática de 1768, por fim, criou os Ofícios de Hipotecas,
denominados Contadurías de Hipotecas, com força de lei e valendo como lei geral
em toda a Espanha, com exceção de Navarra. Não obstante o sistema previsse
apenas o registro das onerações, e, portanto, não se tratasse de um registro geral,
na Catalunha o sistema foi estendido a todos os atos de alienação de imóveis256.

O ofício seria levado pelos escribanos de ayuntamiento das sedes de comarca,


nomeados pela Justiça. Havendo mais de um, seria nomeado aquele que se
estimasse ser mais idôneo. Estes profissionais deveriam constituir fiança, e
estavam sujeitos à responsabilidade257.

Esse registro somente produzia efeitos negativos, ou seja, os atos não


registrados não teriam efeito perante os tribunais. Todavia, já se tinha nesse
sistema o embrião de um moderno sistema de registro de imóveis258.

Já no início do século XIX passou a ser convicção comum na Espanha que o


sistema então vigente de registros era inadequado para as necessidades jurídicas
de sua época, pelo que uma reforma foi necessária. As principais críticas eram as
de que o regime então vigente era incompleto, já que, direcionado à preocupação
com as hipotecas, apenas abrangia o registro destas e de transmissões de imóveis
hipotecados. Ainda, os efeitos do registro eram muito escassos, pois, como já se
disse, eram apenas negativos. Ainda, o sistema não estava organizado com base
real, mas em ordem cronológica, com os livros divididos em colunas, e os atos iam
sendo lançados segundo a ordem de apresentação dos títulos259.

Assim, em 1861 foi promulgada uma Lei Hipotecária com inspirações ecléticas,
abrangendo tanto elementos originariamente espanhóis, como também aspectos
registrais do Sistema Germânico e do chamado Sistema “Romano”. Assim, a Lei
mantinha o costumeiro sistema de título e modo que sempre vigorou na Espanha,
e, tal como era nas Contadurías de Hipotecas, a escrituração se fazia por extrato,
mediante inscrição. Do Sistema Germânico foram importados os princípios da
publicidade, rogação, especialidade e trato sucessivo, bem como o fólio real, a
necessidade da qualificação registral, e, em embrião, a fé pública registral diferida
no tempo. No entanto, não se adotava o princípio de inscrição: o registro não era
constitutivo, mantendo-se o princípio do Direito Romano Justinianeu de aquisição
pela traditio 260.

A Lei sofreu reformas em 1869 e 1877, e o Código Civil Espanhol de 1889


mantiveram praticamente na íntegra os seus preceitos. Em 1909 houve nova
reforma, reduzindo, por exemplo, o prazo de suspensão da tutela pela fé pública
de cinco para dois anos, estabelecendo a presunção de que o titular registral era
possuidor do direito inscrito, e proibindo a inscrição de títulos de domínio sem que
previamente houvesse sido inscrito o título aquisitivo em favor do transmitente.
Esta Lei mantivera-se em vigor até 1944, ocasião em que foi aprovada nova
reforma hipotecária, dando lugar à Lei Hipotecária de 08 de fevereiro de 1946 e
regulamento de 14 de fevereiro de 1947, ainda hoje em vigor. Nesta reforma
ficariam consolidados os princípios da legitimação e da fé pública registral, sem
diferimento no tempo261.
Assim, tem-se na Espanha um sistema de título e modo em que, salvo no caso
da hipoteca, o modo não é o registro, mas a traditio. Não há distinção entre
negócio jurídico obrigacional e negócio jurídico real, com o que a mutação real
baseia-se no título causal que é, ao mesmo tempo, obrigacional e dispositivo,
embora não seja em si translativo: este efeito fica condicionado ao modo, que é,
como se disse, a traditio. Esta traditio, contudo, é meramente instrumental, já que
segundo o artigo 1.462 do Código Civil Espanhol a outorga da escritura equivale à
entrega da coisa, salvo se da escritura se puder claramente deduzir o contrário262.

Resta ao registro consolidar a mutação real ao lhe dar publicidade. E, em caso


de dupla alienação pela mesma pessoa, terá preferência o adquirente que
primeiramente obteve o registro, e não a quem primeiramente firmou o contrato,
nem a quem primeiramente recebeu a coisa263.

Finalmente, o titular registral é protegido pela legitimação registral. Os registros


estão salvaguardados pelos tribunais, com o que produzem todos os seus efeitos
até que seja declarada sua inexatidão. E, estão protegidos pela fé pública registral,
os terceiros que houverem adquirido o bem de boa-fé, por negócio jurídico
considerado válido em si mesmo, a título oneroso, do titular registral, e que tenham
obtido para si também a inscrição no registro264.

3.6.Antecedentes da publicidade imobiliária em Portugal

No ano 711, os exércitos muçulmanos vindos do Norte da África invadiram e


conquistaram a Península Ibérica, podo fim à já enfraquecida monarquia visigótica.
Os cristãos que não se conformaram com o domínio muçulmano foram expelidos
para uma pequena faixa situada nas montanhas do Norte da península, e iniciaram
a organização de uma resistência. O marco histórico do início da chamada
“Reconquista” é a vitória em Covadonga das tropas lideradas por Pelágio, um
aristocrata godo, contra os invasores muçulmanos265.

Um conjunto de chefes militares, no século VIII, viria a reivindicar a


descendência de Pelágio, e, por isso, proclamarem-se príncipes ou reis das
Astúrias. Durante o governo de um destes reis, Afonso III (866 – 910), os cristãos
chegaram até o Rio Douro, e, em 868 tomaram o povoamento de Portucale, na foz
do rio. No século X a corte transfere-se para Leão, ampliando as fronteiras que
anteriormente restringiam-se às Astúrias. O território do agora Reino de Leão foi
dividido em condados, um dos quais Portucale, cujos condes foram desde a sua
criação até 1071 sempre membros de uma mesma família, os descendentes de
Hermenegildo Gonçalves e Mumadona Dias266.

No século XI, a Reconquista avançou no espaço que viria a ser Portugal. Em


1055 Fernando Magno conquista Lamego e Viseu, e em 1064 Coimbra. Seu
sucessor, Afonso VI, chegou ao Tejo em 1085, e em 1093 os cristãos chegaram à
Santarém e Lisboa, para as perderem novamente um ano depois. Todavia, o último
Conde de Portucale, Nuno Mendez morreu em 1071, levando com ele sua
dinastia267.

Em 1096, Afonso VI concedeu o Condado Portucalense, a título hereditário, a


Henrique de Borgonha, cavaleiro francês ligado por fortes laços de parentesco aos
condes e duques de Borgonha. Selando o contrato, Henrique casou-se com D.
Teresa, filha bastarda de Afonso VI. Este Condado Portucalense resultava do
agrupamento dos antigos condados de Portucale e de Coimbra, destacados do
antigo Reino da Galiza268.

Henrique, líder militar aguerrido e governante competente, havia contribuído


para o desenvolvimento do seu condado, e sempre mantivera boas relações com a
nobreza local. Esta, em grande parte, consistia nos chamados “infanções”,
integrantes de um estrato intermediário da nobreza que gradativamente foram
assumindo funções políticas, administrativas e militares em escala local e regional.
Morto Henrique em 1112, sua viúva, D. Teresa, assumiu o governo, ocasião em
que a linhagem galega da família Trava começou a ter cada vez mais ingerência
na política do condado. A partir de 1116 D. Teresa intitulou-se rainha, e em 1121
passou a viver com Fernão Peres de Trava, que começou a desempenhar funções
de governo em Coimbra. Preocupados com o risco de o Condado Portucalense se
ver submetido a um restaurado Reino da Galiza, e insultados pela concessão de
primazia a um intruso como Fernão Peres Trava, a alta nobreza da corte condal
rompeu com D. Teresa e aliou-se a seu filho, o Infante Afonso Henriques. O conflito
chegou ao campo de batalha, e, em 24 de junho de 1128, no campo de São
Mamede, nas proximidades de Guimarães, Afonso Henriques, acompanhado dos
nobres portugueses, venceu os partidários de D. Teresa e dos Trava. Com isso,
Afonso Henriques adotou o título de príncipe, e impôs-se como governante do
condado, revitalizando a autonomia portuguesa e tornando definitiva a sua
separação com a Galiza269.

Em 1139, após uma década organizando as defesas de Coimbra contra as


incursões dos mouros, o então príncipe Afonso Henriques organizou uma forte
expedição nas terras mouras situadas ao sul, que culminou na célebre Batalha de
Ourique. Vitorioso, Afonso Henriques passou a intitular-se Rei dos Portugueses.
Todavia, Afonso Henriques era vassalo do Rei de Leão e Castela, Afonso VII, seu
primo. Em 1143 Afonso VII reconheceu Afonso Henriques como rei; mas, como
havia se proclamado imperador em 1135, pretendia manter o agora rei português
como seu vassalo. No entanto, Afonso Henriques, pretendendo liberar-se de seu
suserano, prestou homenagem ao Papa Inocêncio II, dispondo-se a lhe pagar um
tributo anual, e o reconhecendo como seu único senhor. O reconhecimento papal,
contudo, tardaria, somente vindo em 1179 pela bula Manifestis Probatum 270.

Com isso, tem-se, finalmente, e sem qualquer dúvida, um Reino de Portugal.


Até então a legislação aplicável à Portugal era a comum a toda a Península
Ibérica, com o que valem também para Portugal as observações já feitas no item
anterior sobre o Direito Visigótico.

Algumas das solenidades de transmissão relatadas são atestadas por fontes


portuguesas. Documentos portugueses do final do século XI e do século XII
relatam a prática da traditio per chartam, assim como a traditio pelo depósito do
documento em altares de igrejas. Outros contêm a declaração expressa de que o
documento foi entregue ao adquirente. Relata-se, também, como etapa prévia à
entrega do documento a realização da roboratio, espécie de confirmação do ato
pelas partes que, após certa data, passou a ser feita pela aposição da assinatura
das partes, mas, que, até então, se fazia pela colocação das mãos sobre a
escritura271.

Já na segunda metade do século XIII e no século XIV começaram a se tornar


raras nos documentos as menções ou referências à Lex Wisigothorum.
Paralelamente, foram aparecendo nas doações e vendas a entrega real ou ficta da
coisa – à moda da traditio romana – como um modus adquirendi distinto da justa
causa, o contrato, era indispensável à transmissão da propriedade. Todavia, esta
traditio tinha algumas características peculiares. As fontes relatam que o ato se
dividia em duas etapas, uma na qual o alienante declarava abandonar a
propriedade e pretender entregá-la ao adquirente; e outra na qual se dava uma
apropriação ou investidura na posse pelo adquirente. Há relatos de traditio
simbólica de imóveis, segundo o qual o adquirente dirigia-se com o tabelião, as
testemunhas, e o alienante ou seu representante até o próprio imóvel, e ali a
investidura era feita. A investidura se dava pela entrega ao adquirente de algo que
simbolizasse o imóvel, havendo referências a torrões de terra, chaves, portas,
telhas, cordas de sinos, molhos de vides, porções de milho, ramos de árvore etc.
Constava da escritura uma fórmula mais ou menos semelhante a “...meter na
posse e corporal possisson por chave e por colmo, por terra e por pedra, assi
como direito e uso é”272.

Nos séculos XIV e XV a substituição da traditio per chartam visigótica pela


traditio romana se tornou definitiva, e as Ordenações Afonsinas a incorporaram.
Com efeito, as Ordenações sancionam a regra do Direito Romano Justinianeu de
que é a tradição, e não o acordo, que transfere a propriedade das coisas. Assim,
não havendo a entrega do objeto vendido, não pode o comprador reivindicá-lo, lhe
cabendo apenas uma ação pessoal para exigir a entrega: ou seja, não tem um ius
in re, mas tem um ius ad rem 273.

Isso se manteve em Portugal até o século XIX, não apenas para a transmissão
da propriedade, como também para a constituição de garantias. O máximo de
publicidade que se concebia era a realização de uma solenidade perante
testemunhas.

Desde a Lei sobre penhor de D. Afonso IV, passando-se pelas três


Ordenações, e até mesmo na Lei de 22 de Dezembro de 1761, que restabelecia
preferências da Fazenda Real, e na de 20 de Junho de 1774, que tratava da
graduação das hipotecas, sempre estiveram na base o Direito Romano Justinianeu
e o Direito Canônico, não havendo, portanto, qualquer exigência de registro ou
outro tipo específico de publicidade imobiliária274.

Assim, até 1836 as hipotecas constituíam-se em Portugal pelo simples


consentimento dos titulares, já que para estas o Direito Romano não exigia nem
mesmo a traditio. Ainda, admitiam-se as hipotecas gerais, e, segundo uma lei de
1774, poderiam resultar de escritura pública ou escrito particular de pessoa
qualificada 275.

O primeiro sistema de registro predial português, destinado expressamente a


“conservar o crédito da propriedade, para facilitar as convenções, evitar fraudes, e
moralizando a Nação, abrir novas fontes à pública prosperidade”, surgiu pelo
Decreto de 26 de Outubro de 1836276.

Esse sistema sofria clara influência do Code Napoleon e dizia respeito, quanto
ao objeto, a embarcações matriculadas na circunscrição do respectivo julgado e a
prédios nele situados, e, quanto à matéria, apenas relativamente às suas
hipotecas, à sua litigiosidade por ação real ou penhora, ou então às suas doações
ou alienações, de qualquer natureza, com reserva de usufruto. Ainda, havia tantas
exceções, que o registro poderia ser considerado exclusivamente hipotecário; e os
registros conservavam seus efeitos por apenas dez anos, após, deveriam ser
renovados sob pena de caducidade. O sistema todo resultou em uma despesa
sem qualquer resultado útil277.

O decreto que pôs em execução o Regulamento de 1836, datado de 03 de


janeiro de 1837, agravou o problema. Criava confusões quanto às preferências
entre hipotecas, uma vez que vigorava uma regra pela qual seus efeitos retroagiam
à data do título. Isso era especialmente problemático em relação às hipotecas
anteriores à criação do registro, e havia previsão de prazos de registro distintos
para hipotecas resultantes de escritura pública ou de escrito particular autorizado
pela lei278.

Diante das críticas severas formuladas à lei, foram elaborados projetos de


reforma do sistema de registro. Destaca-se um projeto de Silva Ferrão,
apresentado em 1858, que contemplava o registro da propriedade – e não apenas
de hipotecas – já fundado em princípios como a publicidade, especialidade,
prioridade, inoponibilidade de ações judiciais não inscritas, legitimação dentre
outros. O sistema, que influenciou a Lei Espanhola de 1861, passou despercebido
em Portugal em virtude de uma mudança de governo279.

A nova lei hipotecária veio em 1863, impondo o registro como requisito absoluto
de eficácia. Sem a registração, os fatos sujeitos a registro não poderiam ser
invocados em juízo nem mesmo entre as próprias partes280. Aqui, tem-se uma
situação curiosa. A Lei não elevou o registro a modo de aquisição, nem o impôs
como necessário à constituição do direito real. Por isso, não se pode dizer que
tenha tornado a registração constitutiva em Portugal. Por outro lado, esse sistema
que impede as partes de invocarem seu direito não registrado até mesmo inter
partes não pode ser chamado declaratório. Tinha-se, assim, uma situação na qual
o direito real poderia ter surgido, o título não ter sido registrado, e, por nunca
precisar ser invocado em juízo, ter assim se mantido. Tratava-se de um direito,
contudo, esvaziado de eficácia281.

Ainda, o sistema de 1863 adotou, entre outros, os princípios da prioridade;


especialidade objetiva, e fólio real; instância; legalidade, com controle de forma e
de fundo dos negócios, e trato sucessivo, não obstante estes últimos estivessem
apenas esboçados282.

O Código Civil de 1867, conhecido como “Código Seabra”, pôs fim ao regime
“semiconstitutivo” de 1863, ao incorporar o consensualismo do Sistema Francês.
Assim, o registro passa a ser meramente declarativo e condição de oponibilidade
em relação a terceiros. Os sucessivos regulamentos de 1868, 1870, 1898, o
Código Do Registo Predial de 1922 e o Código de 31 de março de 1928
mantiveram o mesmo sistema. A reforma do Código do Registo Predial de 1959
manteve como regra o registro meramente declaratório, mas tornou constitutiva a
inscrição das hipotecas, as quais, antes da registração, não são eficazes nem
mesmo inter partes 283.

Tem-se a partir do Código Seabra, portanto, um rompimento em Portugal com a


tradição romanística. Não mais se exigia, como regra, um modus – seja a traditio,
seja ou registro – para que se consumasse a mutação real284. Quanto aos efeitos,
tinha-se tão somente a mera inoponibilidade, destinada a solucionar o conflito no
qual um mesmo alienante efetuasse dois ou mais atos de disposição em favor de
adquirentes distintos, caso em que prevalecia o direito de quem antes houvesse
publicitado o seu título por meio do registro285.

Pelo Decreto-Lei 47.344 de 1966 foi promulgado o novo Código Civil


Português, que seguiu consagrando o princípio do consensualismo em matéria de
transmissão de propriedade. Não havendo distinção entre os planos obrigacional e
real, o contrato produz a um tempo obrigações e direitos reais286.
1

A partir do final do século IV d.C. o Império, já debilitado, começou a receber investidas de hordas
de bárbaros, impelidos pelos hunos. Estes, espalhando-se pela Europa central, forçavam os godos
contra as fronteiras, o que acabou até mesmo levando ao saque de Roma pelo visigodo Alarico.
Os visigodos, bem como outros povos bárbaros, traziam em seus espíritos um sentimento coletivo
de proteção do grupo e respeito às tradições. Entretanto, o contato com o que restara do Império
do Ocidente modificou sua cultura, em especial no concernente ao direito romano. Isso gerou as
leges barbarorum, as quais combinavam o direito consuetudinário dos povos bárbaros com
preceitos oriundos do direito romano. Cf. Luiz Carlos De Azevedo, Introdução à História do Direito,
1ª. Ed., São Paulo, RT, 2005, pp. 97-100.
2

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, p. 13.
3

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, p. 13.
4

Cf. Franz Wieacker, História do Direito Privado Moderno, 3ª Ed., Lisboa, Calouste, 2004, p. 15.
5

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, pp. 39-40.
6

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, pp. 59.
7

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, pp. 63-64.
8

Cf. Franz Wieacker, História do Direito Privado Moderno, 3ª Ed., Lisboa, Calouste, 2004, p. 40.
9

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, p. 61.
10

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, pp. 75; 81-82.
11

Cf. Franz Wieacker, História do Direito Privado Moderno, 3ª Ed., Lisboa, Calouste, 2004, p. 17.
12

Cf. Antonio Padoa Schioppa, História do direito na Europa da Idade Média à Idade
Contemporânea, 1ª Ed., São Paulo, Martins Fontes, 2004, pp. 126-127.
13

Cf. Franz Wieacker, História do Direito Privado Moderno, 3ª Ed., Lisboa, Calouste, 2004, pp. 79-80.
14

Cf. Henri Regnault, Manuel d`Histoire du Droit Français, 5ª Ed., Paris, Recueil Sirey, 1947, pp. 1-4.
15

Cf. Henri Regnault, Manuel d`Histoire du Droit Français, 5ª Ed., Paris, Recueil Sirey, 1947, p. 16.
16

Cf. Raymond Van Dam, Merovingian Gaul and the Frankish Conquests, in, The New Cambridge
Medieval History, Vol. I, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2005, pp. 193-196.
17

Cf. Raymond Van Dam, Merovingian Gaul and the Frankish Conquests, in, The New Cambridge
Medieval History, Vol. I, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2005, pp. 193-196.
18

Cf. Raymond Van Dam, Merovingian Gaul and the Frankish Conquests, in, The New Cambridge
Medieval History, Vol. I, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2005, pp. 197-198.
19

Cf. Raymond Van Dam, Merovingian Gaul and the Frankish Conquests, in, The New Cambridge
Medieval History, Vol. I, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2005, pp. 199-205.
20

Cf. Raymond Van Dam, Merovingian Gaul and the Frankish Conquests, in, The New Cambridge
Medieval History, Vol. I, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2005, p. 209.
21

Cf. Raymond Van Dam, Merovingian Gaul and the Frankish Conquests, in, The New Cambridge
Medieval History, Vol. I, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2005, p. 210.
22

Cf. Henri Regnault, Manuel d`Histoire du Droit Français, 5ª Ed., Paris, Recueil Sirey, 1947, p. 30.
23

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 45.
24

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 146.
25

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 48-50.
26

Cf. Henri Regnault, Manuel d`Histoire du Droit Français, 5ª Ed., Paris, Recueil Sirey, 1947, p. 45.
27

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 48-50.
28

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 51.
29

Cf. Henri Regnault, Manuel d`Histoire du Droit Français, 5ª Ed., Paris, Recueil Sirey, 1947, p. 48.
30

Cf. Paul Fouracre, Frankish Gaul to 814, in, The New Cambridge Medieval History, Vol. II, 1ª Ed,
Cambridge, Cambridge University Press, 2006, p. 106.
31

CF. Constance Brittain Bouchard, The Kingdom of the Franks to 1108, in, The New Cambridge
Medieval History, Vol. IV-II, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2006, p. 121-124.
32

Cf. Janet L. Nelson, Kingship and Royal Government, in, The New Cambridge Medieval History,
Vol. II, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2006, p. 389.
33

Cf. Hans-Werner Goetz, Social and Military Institutions, in, The New Cambridge Medieval History,
Vol. II, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2006, pp. 471-472.
34

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 52-53.
35

“Echevin” era o nome dado a um antigo magistrado municipal francês. Cf. Émile Littré, Dictionaire
de la langue française, Vol. II, Paris, Hachette, 1885, p. 1277. A palavra deriva de scabinus,
singular do plural scabini, de que já se tratou.
36

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 53-54.
37

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 147.
38

Para um bom resumo sobre o tema da Gewere, cf. José Carlos Moreira Alves, A “Gewere” – Um
Instituto do Antigo Direito Germânico, in, Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, (63) (1968).
39

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 147.
40

Cf. Henri Regnault, Manuel d`Histoire du Droit Français, 5ª Ed., Paris, Recueil Sirey, 1947, pp. 107-
108.
41

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 56.
42

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 55.
43

COVIELLO dá conta de que a expressão abrangia uma gama de formalidades com nomes
próprios em cada costume, como devesture e vesture, deshéritance e adhéritance, dessaisine e
saisine, werpissement, devestissement, inaeredatio, erfvenisse ende onderfvenisse, wert et
adhéritement, droiture, investiture, devoirs de loi, ouvres de loi, realisation etc. Cf. Nicola Coviello,
Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, p. 43.
44

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 57-58.
45

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 151.
46

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 59.
47

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 60-61.
48

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 62.
49

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 151-152.
50

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 151-153.
51

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 63-65.
52

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 153.
53

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 63-65.
54

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 63-65.
55

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 66.
56

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 154.
57

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 67-69. Segundo o autor, a sobrevivência da
insinuação é atestada por Placentin, Durandi, Johanus Faber, Pierre de Belleperche, Guido Papa,
e por cartas de doação que chegaram até seu tempo, como uma doação da Condessa Beatriz ao
Conde de Toulouse, datada de 1172, que foi objeto de insinuação.
58

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 155.
59

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 67-69.
60

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 155.
61

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 70-71.
62

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 72-73.
63

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 74-75.
64
Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 76-78.
65

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 156.
66

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 76-78.
67

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 79-82.
68

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 83-86.
69

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 83-86.
70

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 158.
71

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 83-86.
72

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 89-92.
73

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 158.
74

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 89-92.
75

Cf. Louis Gabriel Michaud, Biographie Universelle Ancienne et Moderne, Vol. XXI, 2ª Ed., Paris,
Madame C. Desplaces, 1854, p. 114.
76

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 159.
77

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 92-97.
78

O autor explica que quanto à disponibilidade das informações aos interessados e sua forma de
funcionamento há dois sistemas básicos e opostos: o primeiro, tradicional da Alemanha, chamado
de “publicidade real”, consiste na matrícula de cada imóvel em um registro feito a partir de um
cadastro das terras, de modo que todas as buscas se iniciam a partir do próprio imóvel. O segundo
sistema, da “publicidade pessoal”, agrupa os atos não em torno do imóvel, mas do nome de seu
proprietário. Na França optou-se pela publicidade pessoal. Há, em cada sede de comarca, um
bureau de conservação das hipotecas, gerenciado por um conservador. Este não é um magistrado,
mas um funcionário público. O legislador revolucionário optou por manter a tradição da publicidade
pessoal porque a prática – que exige profundo conhecimento dos arquivos para o exercício de
uma função delicada – demonstrou a competência dos administradores de registros, os quais
acabavam por diminuir os inconvenientes do sistema. Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et
la reforme hypothécaire – etude historique et critique sur la publicité dês transmissions
immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a nos jours, 1ª. ed., Paris, J.
Delamotte, 1891, pp. 161-162.
79

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 92-97.
80

Cf. Edoardo Ferrante, Consensualismo e trascrizione, 1ª Ed., Padua, CEDAM, 2008, pp. 19-22.
81

Para Troplong, o regime hipotecário será sempre a parte mais árdua do Código, por envolver
numerosos e graves interesses, pondo em conflito razões opostas, mas ao mesmo tempo dignas
de atenção. Segundo ele, quando a civilização leva a um povo um grande volume de transações e
negócios e a legislação é simples, com solenidades claras e dirigidas pela ideia de utilidade, e seu
rigor amenizado pela equidade, tem-se, na verdade, uma funesta e fecunda fonte de decepções.
Com esse espírito Napoleão teria proferido as seguintes palavras de advertência sobre a matéria
hipotecária no Código: “Depuis que j’entends deiscuter le code civil, je me suis souvent aperçu que
la trop grande simplicité dans la législation est l’ennemie de la proprieté. On ne peut rendre les lois
extrêmement simples, sans couper le nouer plutôt que de le délier, et sans livrer beaucoup de
choses à l’incertitude de l’arbitraire...que la loi soit moins simple, pourvu qu’elle soit conforme aux
principes de la justice civile”. Com efeito, para Troplong seria muito criticável a excessiva
simplicidade do regime hipotecário francês, principalmente no sistema de alienação dos direitos
reais, expondo a desastres adquirentes e credores. Assim, dois preconceitos deveriam ser
evitados: o desejo de simplicidade, incompatível com a matéria das hipotecas; e, o outro, aceitar
como único ponto de partida possível o estado de coisas sancionado pelo Code Napoleon. Quem
quisesse deixar ao legislador o livre emprego das formas, subjugando as transações civis a uma
simplicidade arbitrária, desconheceria por certo os progressos da ciência legislativa; e quem
quisesse remontar ao passado para ressuscitar as instituições do antigo direito hipotecário teria
perdido as lições da experiência. Cf. Raymond-Theodore Troplong, Le droit civil expliqué suivant
l’ordre des articles du code, depuis et y compris le titre de la vente: des priviléges et hypothèques,
ou, Commentaire du titre XVIII du livre III du Code Civil, Vol. I, 2ª Ed., Paris, Charles Hingray, 1835,
pp. II-V. Para BIANCHI, a grande maioria dos autores do Código pendia pelo retorno à
clandestinidade do direito romano. A publicidade era vista como um retorno à barbárie feudal,
como uma ultrapassada desconfiança da posse. Os que defendiam a publicidade, por outro lado,
apoiavam-se nos efeitos práticos do princípio, afirmando-o necessário à segura e proveitosa
alienação dos imóveis, bem como ao progresso da agricultura e solidez no emprego dos capitais.
Cf. Emilio Bianchi, Delle ipoteche, v. I, 2ª Ed., Turim, Utet, 1914, pp. 68-69.
82

Como já se viu, já na época das discussões sobre a Lei de 11 brumário do ano VIII, um princípio
crescente começava a dominar: os jusnaturalistas haviam combatido a tradição real, tendo mesmo
o próprio Pothier militado em favor da transmissão pelo mero consentimento. Por outro lado, a
regra já havia sido bastante modificada pela prática da tradição ficta. Assim, tudo leva a crer,
segundo RIVIÈRE e HUGUET que o princípio espiritualista do código já havia triunfado quando da
redação da Lei de 11 brumário. Nesta lei, por um lado, havia a transmissão do direito real entre as
partes pelo mero consenso; e, por outro, a necessidade de uma formalidade para sua
consolidação perante terceiros. Cf. Henry. F. Riviére – Auguste Huguet, Questions theoriques et
pratiques sur la transcription em matière hypothécaire dans l’ordre des articles de la loi du 23 mars
1855, 1ª ed., Paris, Marescq e Dujardin, 1856, pp. 10-11.
83

Segundo Troplong, a nova redação foi abandonada por influência de Tronchet, o qual dizia ser a
emenda “desastrosa”. Para Tronchet, a segurança dada pela Lei bastava: o interessado poderia
consultar os títulos, e a posse do vendedor. Não se poderia, a pretexto de dispensar esse exame,
comprometer a propriedade de um cidadão que se apoiava na segurança de um contrato
legalmente firmado. A Lei de brumário teria tido interesse puramente fiscal, não tendo apoio nos
princípios da matéria hipotecária. Cf. Raymond-Theodore Troplong, Le droit civil expliqué suivant
l’ordre des articles du code, depuis et y compris le titre de la vente: des priviléges et hypothèques,
ou, Commentaire du titre XVIII du livre III du Code Civil, Vol. I, 2ª Ed., Paris, Charles Hingray, 1835,
p. XXXVIII.
84

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 98-103.
85

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 159.
86

Cf. Edoardo Ferrante, Consensualismo e trascrizione, 1ª Ed., Padua, CEDAM, 2008, pp. 23-25.
87

Cf. Jean-Philippe Borel, La Transcription hypothécaire des transferts conventionnels de proprieté


immobiliére dans le Code Civil, in, Revue Historique de Droit Français et Étranger, (92) (04-2014).
88

Para TROPLONG, a luta acerca das reformas se definiria entre os defensores de inovações ao
que já havia no Code, como a ampliação do princípio da publicidade, e os defensores da
manutenção do status quo. Segundo ele, não se poderia levar em conta a “seita” que tinha a alta
pretensão de reformar a família, a propriedade, as sucessões e todas as demais relações da vida
social, capitaneada por Decourdemanche, para quem a hipoteca seria contrária aos princípios da
justiça por atentar contra o crédito público não levar em conta a boa-fé. Cf. Raymond-Theodore
Troplong, Le droit civil expliqué suivant l’ordre des articles du code, depuis et y compris le titre de la
vente: des priviléges et hypothèques, ou, Commentaire du titre XVIII du livre III du Code Civil, Vol.
I, 2ª Ed., Paris, Charles Hingray, 1835, pp. V-VIII. Interessante observar que no Brasil posição
semelhante à de Decourdemanche foi defendida por José de Alencar, como se verá.
89

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 108-109.
90

Cf. Henry F. Riviére – Auguste huguet, Questions theoriques et pratiques sur la transcription em
matière hypothécaire dans l’ordre des articles de la loi du 23 mars 1855, 1ª ed., Paris, Marescq e
Dujardin, 1856, p. 1.
91

Cf. Raymond-Theodore Troplong, Le droit civil expliqué suivant l’ordre des articles du code, depuis
et y compris le titre de la vente: des priviléges et hypothèques, ou, Commentaire du titre XVIII du
livre III du Code Civil, Vol. I, 2ª Ed., Paris, Charles Hingray, 1835, pp. XXVIII-XXIX.
92

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 110.
93

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 111-115.
94

Cf. France – Paris, 29 Juillet, in, Journal des Débats Politiques et Littéraires (29-30 de julho de
1845).
95

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 116.
96

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p. 122.
97

Essa também é a posição de TROPLONG. Segundo ele, a origem do sistema não está em teorias
imaginadas em escritórios e deduzidas dialeticamente, sem levar em conta o estado dos povos,
mas sim nos velhos costumes. Quando uma nação ainda está na época feudal, em que as ideias
abstratas de moral e equidade ainda não penetraram nos recônditos da sociedade, o legislador
tem de recorrer a formas palpáveis, que captem, pelo simbolismo, a atenção dos homens,
sinalizando sua importância. O direito, aí, é um drama, em que cada contrato se exterioriza por
gestos, emblemas, palavras sacramentais etc., como ocorria em inúmeras cerimônias da idade
média. Assim, não se poderia conceber em tal época a alienação de um direito pelo mero
consenso, sem recurso a um ato exterior, alegórico. Nessas antiguidades se originariam o
nantissement, o vest e devest etc. As formas teriam sido modificadas pelo progresso dos povos,
mas o senso permaneceria: a alienação de imóveis nunca poderia se dar prescindindo de uma
solenidade. Estes costumes, porém, teriam sido objeto de duras críticas do jurista Bigot de
Preaumeneu, o qual afirmava serem resultado da opressão dos senhores feudais, que buscavam o
entrave das alienações por meio de formalidades, a fim de que ninguém pudesse escapar de sua
fiscalização. TROPLONG rebate as críticas, afirmando que os costumes são independentes de
sua motivação, originando-se na intimidade dos anseios do homem da idade média. Cf. Raymond-
Theodore Troplong, Le droit civil expliqué suivant l’ordre des articles du code, depuis et y compris
le titre de la vente: des priviléges et hypothèques, ou, Commentaire du titre XVIII du livre III du
Code Civil, Vol. I, 2ª Ed., Paris, Charles Hingray, 1835, pp. XIX-XXII.
98

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 116-123.
99

Cf. Henri de Page, Traité Élémentaire de Droit Civil Belge, Vol. 07-1, Bruxelas, Émile Bruylant,
1943, pp. 843-852.
100

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 155.
101
Cf. Comission de Réforme de la Publicité Fonciére, Pour une modernisation de la publicite
fonciére, 2018, p. 7.
102

Cf. Comission de Réforme de la Publicité Fonciére, Pour une modernisation de la publicite


fonciére, 2018, p. 11.
103

Cf. Comission de Réforme de la Publicité Fonciére, Pour une modernisation de la publicite


fonciére, 2018, p. 18.
104

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 229-230.
105

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 234.
106

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 238-239.
107

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 248-249.
108

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXIII-LXV.
109

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 39.
110

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXIII-LXV.
111

Cf. Rudolph Sohm, Lex Ribuaria et Lex Francorum Chamavorum ex Monumentis Germaniae
Historicis Recusae, 1ª Ed., Hannover, Impensis Bibliopolii Hahniani, 1883, pp. 87-88.
112

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXIII-LXV.
113

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 40.
114

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 40.
115

Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme hypothécaire – etude historique et critique
sur la publicité dês transmissions immobilières em France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a
nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, pp. 248-249.
116

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 42.
117

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., p. 131.
118

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 47.
119

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 131-
132.
120

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 50-51.
121

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, p. 58.
122

Sobre todas as etapas, cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica
y diferencias com el nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles
de España, 2012, pp. 48-50.
123

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., p. 132.
124

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 51.
125

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 132-
133. LUZZATI dá conta que a recepção do direito romano na Alemanha proporcionou estudos
importantes no direito público e privado, mas sem a paixão e o caráter revolucionário que obteve
em outras terras. Segundo o autor, tal ter-se-ia se dado por uma maior potência da organização
feudal, advinda da maior proximidade com seu centro de origem, ou da índole natural da mente
alemã em fazer críticas tenazes, lentas e seguras, não levando os juristas alemães a desprezar ou
odiar as instituições vigentes. Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-
pratico al titolo XXII, libro III del códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. CXXII.
Para BESSON, pelos esforços da igreja, imperadores e jurisconsultos, o direito romano fora
penetrando, no século XV, na prática dos tribunais. Era ensinado como lei viva, e do ponto de vista
de sua aplicação no cotidiano. Com isso, o Corpus Iuris Civilis substituia a autoridade dos
costumes locais. Estes, atacados pelos romanistas, foram perdendo o significado, e ao fim
sucumbiram. Assim, nos lugares que receberam esta influência – cujo exemplo maior é a Prússia –
a transmissão dos bens imóveis se daria pela tradição, real ou ficta, sem investidura ou inscrição.
O único efeito das inscrições era gerar presunção de anterioridade em relação às aquisições não
inscritas, nada agregando em sua eficácia. Cf. Emmanuel Besson, Lês livres fonciers et la reforme
hypothécaire – etude historique et critique sur la publicité dês transmissions immobilières em
France et a l’etranger depuis lês origines jusqu’a nos jours, 1ª. ed., Paris, J. Delamotte, 1891, p.
252.
126

Cf Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. CXXI.
127

Cf. Vincent Nossek, Das Konzept “Grundbuch”, 1ª Ed., Tübingen, Mohr Siebeck, 2019, p. 234.
128

Cf. Vincent Nossek, Das Konzept “Grundbuch”, 1ª Ed., Tübingen, Mohr Siebeck, 2019, pp. 236-
237.
129

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 68-73.
130

Cf. Vincent Nossek, Das Konzept “Grundbuch”, 1ª Ed., Tübingen, Mohr Siebeck, 2019, p. 240.
131

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 75-77.
132

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 77-78.
133

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 78.
134

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 78.
135

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, p. 197.
136

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 78.
137

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, p. 198.
138

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 78-80.
139

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 78-80.
140

Cf. Vincent Nossek, Das Konzept “Grundbuch”, 1ª Ed., Tübingen, Mohr Siebeck, 2019, p. 243.
141

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 132-
134.
142

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, pp. 200-201.
143

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., p. 134.
144

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, pp. 200-201.
145

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., p. 134.
146

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 135-
187.
147

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 135-
139.
148

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 139-
142.
149

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 142-
150.
150

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 150-
183.
151

Cf. Martin Wolff, Tratado de Derecho Civil, T. III, Vol. I, 32ª. Ed., Barcelona, Bosch, s.d., pp. 184-
250.
152

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 183.
153

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 185.
154

Cf. Philipp Nicolai Heck, El Negocio Juridico Real Abstracto, in Revista Critica de Derecho
Inmobiliario (Separata) (1965).
155

Cf. Sebastian Martens, Introduction before Art 18:201, in, Commentaries on European Contract
Laws, 1ª Ed., Londres, Oxford University Press, 2018, p. 1975.
156

Cf. Astrid Stadler, Gestaltungsfreiheit und Verkehrsschutz durch Abstraktion, 1ª Ed., Tübingen, J.
C. B. Mohr, 1996, p. 49.
157

Cf. Astrid Stadler, Gestaltungsfreiheit und Verkehrsschutz durch Abstraktion, 1ª Ed., Tübingen, J.
C. B. Mohr, 1996, p. 48.
158

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
pp. 108-109.
159

Cf. Astrid Stadler, Gestaltungsfreiheit und Verkehrsschutz durch Abstraktion, 1ª Ed., Tübingen, J.
C. B. Mohr, 1996, p. 49.
160

Cf. Friedrich Carl Von Savigny, System des heutigen Römischen Rechts, Vol. III, 1ª Ed., Berlim,
Veit und Comp, 1840, pp. 312-316.
161

Cf. Friedrich Carl Von Savigny, Das Obligationenrecht als theil des heutigen Römischen Rechts,
Vol. II, 1ª Ed., Berlim, Veit und Comp, 1853, pp. 256-257.
162

Cf. Jan Wilhelm, Sachenrecht, 2ª Ed., Berlin, De Gruyter, 2002. p. 11.


163

Cf. Philipp Nicolai Heck, El Negocio Juridico Real Abstracto, in, Revista Critica de Derecho
Inmobiliario (Separata) (1965).
164

Para um resumo das críticas formuladas pelos romanistas, cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación
del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de
Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012, pp. 149-193.
165

Cf. Justus Wilhelm Hedemann, Derechos Reales, Vol. II, 1ª Ed., Madri, Editorial Revista de
Derecho Privado, 1955, pp. 118-116.
166

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 190.
167

Cf. Justus Wilhelm Hedemann, Derechos Reales, Vol. II, 1ª Ed., Madri, Editorial Revista de
Derecho Privado, 1955, p. 127.
168
Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 191.
169

Cf. Justus Wilhelm Hedemann, Derechos Reales, Vol. II, 1ª Ed., Madri, Editorial Revista de
Derecho Privado, 1955, p. 183.
170

Cf. Vincent Nossek, Das Konzept “Grundbuch”, 1ª Ed., Tübingen, Mohr Siebeck, 2019, p. 11.
171

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, p. 192.
172

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 164.
173

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, p. 192.
174

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, p. 193.
175

Cf. Orlando Tiraboschi, Catasto e Trascrizione, 1ª Ed., Roma, Stamperia Reale, 1894, p. 193.
176

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 200.
177

Cf. Franz Gschnitzer, Österreichisches Sachenrecht, 2ª Ed., Viena, Springer, 1985, pp. 33-34.
178

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 165.
179

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 201-203.
180

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 205-206.
181

Cf. Franz Gschnitzer, Österreichisches Sachenrecht, 2ª Ed., Viena, Springer, 1985, p. 28.
182

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXI-LXII.
183

Cf. Steven C. Fanning, Lombards, Kingdom of, in, Dictionary of the Middle Ages, Vol. 7, 1ª Ed.,
Nova Iorque, Charle`s Scribner Sons, 1986, pp. 654-657.
184

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXI-LXII.
185

Cf. Katherine Fischer Drew, Ostrogoths, in, Dictionary of the Middle Ages, Vol. 7, 1ª Ed., Nova
Iorque, Charle`s Scribner Sons, 1986, pp. 289-293.
186

Cf. John Moorhead, Ostrogothic Italy and the Lombard Invasions, in, The New Cambridge Medieval
History, Vol. I, 1ª Ed, Cambridge, Cambridge University Press, 2005, p. 145.
187

Cf. Katherine Fischer Drew, Ostrogoths, in, Dictionary of the Middle Ages, Vol. 7, 1ª Ed., Nova
Iorque, Charle`s Scribner Sons, 1986, pp. 289-293.
188

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXI-LXII.
189

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXI-LXII.
190

Cf., e.g., Federigo Sclopis, Storia della legislazione italiana, v. I; F. SCHUPFER, Delle istituzioni
politiche dei Longobardi, Florença, 1863.
191

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
codice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXIII.
192

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 145.
193

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXV-LXVI.
194

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXI-LXX.
195

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 122-123.
196

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 123-124.
197

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, p. 36.
198

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXXII-LXXVI.
199

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 37-38.
200

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 125.
201

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 37-38.
202

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 125.
203

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 127.
204

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 126.
205

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 38-39.
206

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 126.
207

Cf. Ippolito Israele Luzzati, Della Trascrizione – Commento teorico-pratico al titolo XXII, libro III del
códice civile italiano, vol. I, 4ª. ed., Turim, Utet, 1905, p. LXXX.
208

Cf. Nicola Coviello, Della Trascrizione, Vol. I, 2ª. Ed., Turim, Utet, 1924, pp. 38-39.
209

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 126.
210

Cf. Giovanni Villani, Matteo Villani, Filippo Villani, Croniche, Vol. II, Trieste, Sezione Letterario-
Artistica del Lloyd Austriaco, 1858, pp. 181-182.
211

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 127.
212

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 127.
213

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 134.
214

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 134.
215

Cf. Ercole Franco, La Dote Romana Negli Statuti di Parma, in, Archivio Storico per Le Provincie
Parmensi, (7) (1907), pp. 90-91.
216

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 134.
217

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 135.
218

Cf. Ercole Franco, La Dote Romana Negli Statuti di Parma, in, Archivio Storico per Le Provincie
Parmensi, (7) (1907), p. 91.
219

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 135.
220

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, pp. 135 e 140.
221

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 136.
222

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 141.
223

Cf. Salvatore Pugliatti, La Trascrizione, Vol. I, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 1957, p. 142.
224

Cf. Vincenzo Roppo, Diritto Privato, 3ª Ed., Turim, Giappichelli, 2013, pp. 251-252.
225

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 250.
226

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 252.
227

Cf. Vincenzo Roppo, Diritto Privato, 3ª Ed., Turim, Giappichelli, 2013, pp. 254.
228

Cf. Vincenzo Roppo, Diritto Privato, 3ª Ed., Turim, Giappichelli, 2013, pp. 256-257.
229

Cf. Michele Cuccaro, Lineamenti di diritto tavolare, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 2010, p. 4.
230

Cf. Michele Cuccaro, Lineamenti di diritto tavolare, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 2010, p. 5.
231

Cf. Michele Cuccaro, Lineamenti di diritto tavolare, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 2010, pp. 1-2.
232

Cf. Michele Cuccaro, Lineamenti di diritto tavolare, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 2010, pp. 70-71.
233

Cf. Michele Cuccaro, Lineamenti di diritto tavolare, 1ª Ed., Milão, Giuffrè, 2010, p. 89.
234

Cf. Bruno Aguilera Bachet, Historya y Derecho – Manual de iniciación, Vol. I, 1ª Ed., Barcelona, C.
Moreno y J. Serra, 1994, p. 181.
235

Cf. Bruno Aguilera Bachet, Historya y Derecho – Manual de iniciación, Vol. I, 1ª Ed., Barcelona, C.
Moreno y J. Serra, 1994, p. 264-269.
236
Cf. Estevam Lo Ré Pousada, Preservação da Tradição Jurídica Luso-Brasileira: Teixeira de Freitas
e a Introdução à Consolidação das Leis Civis, Dissertação de Mestrado, São Paulo, USP, 2006, pp.
198-202.
237

Cf. Luis Cabral de Moncada, A “traditio” e a transferência da propriedade imobiliária no Direito


Português, in, Estudos de História do Direito, Vol. I, 1ª Ed., Coimbra, Universidade de Coimbra,
1948, pp. 8-9.
238

Cf. Lino Rodríguez Otero, La gestación del sistema registral alemán: Crítica y diferencias com el
nuestro, 1ª Ed., Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2012,
p. 41.
239

Cf. Paulo Merêa, A Traditio Cartae e os documentos medievais portugueses, in, Estudos de Direito
Hispânico Medieval, Vol. II, 1ª Ed., Coimbra, Universidade de Coimbra, 1953, p. 116.
240

Cf. Paulo Merêa, A Traditio Cartae e os documentos medievais portugueses, in, Estudos de Direito
Hispânico Medieval, Vol. II, 1ª Ed., Coimbra, Universidade de Coimbra, 1953, p. 122.
241

Cf. Paulo Merêa, A Traditio Cartae e os documentos medievais portugueses, in, Estudos de Direito
Hispânico Medieval, Vol. II, 1ª Ed., Coimbra, Universidade de Coimbra, 1953, pp. 123-124.
242

José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario Registral,
2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 37.
243

José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario Registral,
2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 37.
244

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, pp. 46-
47.
245

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, pp. 46-
47.
246

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, pp. 46-
47.
247

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, pp. 46-
47.
248

José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario Registral,
2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 37.
249

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, pp. 47-
48.
250

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, p. 48.
251

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, p. 49.
252

José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario Registral,
2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 38.
253

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, p. 51.
254

José Luís Lacruz Berdejo – Francisco de Assis Sancho Rebullida, Derecho Inmobiliario Registral,
2ª. Ed., Madrid, Bosch, 1984, p. 38.
255

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, p. 51.
256

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, p. 52.
257

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, p. 53.
258

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, pp. 54-
55.
259

Cf. Ramón Maria Roca Sastre, Derecho Hipotecario, Vol. I, 6ª Ed., Barcelona, Bosch, 1968, pp. 58-
59.
260

Cf. Juan Carlos Monterde García, Génesis de la Ley Hipotecaria de 8 de Febrero de 1861, 1ª Ed.,
Madri, Colegio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2008, pp. 279-281.
261

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 296-297.
262

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 301-302.
263

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 303.
264

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 308-311.
265

Cf. Bernardo Vasconcelos e Sousa, I PARTE – IDADE MÉDIA (SÉCULOS XI – XV), in, História de
Portugal, 7ª Ed., Lisboa, A esfera dos livros, 2012, pp. 17-18.
266

Cf. Bernardo Vasconcelos e Sousa, I PARTE – IDADE MÉDIA (SÉCULOS XI – XV), in, História de
Portugal, 7ª Ed., Lisboa, A esfera dos livros, 2012, p. 18.
267

Cf. Bernardo Vasconcelos e Sousa, I PARTE – IDADE MÉDIA (SÉCULOS XI – XV), in, História de
Portugal, 7ª Ed., Lisboa, A esfera dos livros, 2012, p. 19.
268

Cf. Bernardo Vasconcelos e Sousa, I PARTE – IDADE MÉDIA (SÉCULOS XI – XV), in, História de
Portugal, 7ª Ed., Lisboa, A esfera dos livros, 2012, p. 25.
269

Cf. Bernardo Vasconcelos e Sousa, I PARTE – IDADE MÉDIA (SÉCULOS XI – XV), in, História de
Portugal, 7ª Ed., Lisboa, A esfera dos livros, 2012, pp. 20-29.
270

Cf. Bernardo Vasconcelos e Sousa, I PARTE – IDADE MÉDIA (SÉCULOS XI – XV), in, História de
Portugal, 7ª Ed., Lisboa, A esfera dos livros, 2012, pp. 38-42.
271

Cf. Luis Cabral de Moncada, A “traditio” e a transferência da propriedade imobiliária no Direito


Português, in, Estudos de História do Direito, Vol. I, 1ª Ed., Coimbra, Universidade de Coimbra,
1948, pp. 11-16.
272

Cf. Luis Cabral de Moncada, A “traditio” e a transferência da propriedade imobiliária no Direito


Português, in, Estudos de História do Direito, Vol. I, 1ª Ed., Coimbra, Universidade de Coimbra,
1948, pp. 16-24.
273

Cf. Luis Cabral de Moncada, A “traditio” e a transferência da propriedade imobiliária no Direito


Português, in, Estudos de História do Direito, Vol. I, 1ª Ed., Coimbra, Universidade de Coimbra,
1948, p. 24.
274

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 330.
275

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, p. 147.
276

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, p. 147.
277

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 331.
278

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 332.
279

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 333.
280

Cf. Carlos Ferreira de Almeida, Publicidade e Teoria dos Registos, 1ª Ed., Coimbra, Almedina,
1966, p. 150.
281

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 336.
282

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 340.
283

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 150.
284

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 349.
285

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 405.
286

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 414-415.
CAPÍTULO 4. HISTÓRIA DA PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA NO BRASIL
CAPÍTULO 4. HISTÓRIA DA PUBLICIDADE IMOBILIÁRIA NO BRASIL

Capítulo 4. História da Publicidade Imobiliária no Brasil

4.1. Periodização adotada

O critério proposto para a construção das linhas históricas de análise baseia-se na tradicional divisão do direito
imobiliário alemão em “direito formal do registro” e “direito material do registro”.

Com efeito, aquilo que se entende por Direito Registral Imobiliário abrange normas de mais de uma natureza. Há
normas de direito civil e outras procedimentais, ou administrativas, todas elas teleologicamente reunidas em um mesmo
conjunto.

No entanto, por suas diferenças essenciais, não podem ser incluídas em uma mesma linha de desenvolvimento, sob
pena de se sacrificar, de um lado ou de outro, contribuições importantes para a história da publicidade imobiliária no
Brasil.

Desse modo, a exposição será feita de maneira a distinguir, de um lado, o procedimento, assim como os vários
sistemas construídos para a registração, e, de outro, os efeitos do registro, que dizem respeito à matéria substantiva.

4.2. Um não antecedente da publicidade imobiliária no Brasil Independente: o Registro das Terras Possuídas ou
“Registro do Vigário”

Pronunciando-se sobre o tema do “Registro do Vigário”, o agrarista Linhares de Lacerda1 leciona que a expressão é
destinada a uma modalidade de registro criada pela Lei de Terras – Lei 601, de 1850 –, segundo a qual todo possuidor
ficava sujeito a declarar sua posse perante cada freguesia do Império.

“Registro do Vigário” é denominação popular e algo sarcástica. Tecnicamente, trata-se do Registro das Terras
Possuídas, tal como é chamado pelo Regulamento da Lei 601.

O Regulamento da lei, Decreto 1.318, de 1854, fixou prazos para referidas declarações, determinando aos vigários
das paróquias que se encarregassem de tomá-las, e, a partir delas, lavrassem registros. Os prazos iniciavam-se e
encerravam-se em datas diferentes conforme a província do Império, pois quem fixava os termos iniciais eram os
presidentes de cada uma delas. Assim, havia prazos sucessivos para a prestação das declarações, a saber, dois anos
da data inicial, três anos da data inicial, ou três anos e seis meses da data inicial. Se perdido o prazo de um ano pagava-
se multa; se perdido o de três anos, a multa era duplicada; e, se perdido o prazo de três anos e seis meses, a multa era
quadruplicada.

As declarações seriam prestadas pelos possuidores ou pessoas em seu nome, ou, em sendo incapazes, por seus
representantes legais.

Deveriam essas declarações conter o nome do possuidor, a freguesia de localização das terras, a extensão da posse
e o nome e os limites do imóvel. A declaração deveria ser feita em duas vias, uma das quais ficaria arquivada com o
registro, e outra seria devolvida ao possuidor anotada com o número de livro e folha em que fora registrado.

A realização desses registros incumbia aos vigários das paróquias. Uma vez que a religião católica era a oficial do
Estado, os sacerdotes eram intimamente relacionados com o governo, razão por que receberam esta atribuição.

O registro era realizado uma só vez, não havia previsão de cancelamentos ou averbações, nem de transmissões ou
onerações. Não se esperava qualquer dinamismo a partir da declaração. Uma vez preenchidos os livros, estes eram
encerrados e remetidos para a formação do registro geral das terras possuídas2.

O Registro do Vigário não tinha valor como título de domínio, apenas consignando as declarações de posse. Por
isso, nada valia como documento de domínio. Acolhia declarações de proprietários, mas também as prestadas por
posseiros. Portanto, não se pode em nenhuma hipótese afirmar que acrescenta qualquer valor ao domínio, ou que o
prova. Contudo, por vezes se faz confusão a esse respeito, dando-se a entender que o registro prova uma posse
legítima, lastreada na propriedade, o que não é verdade.

Antes de mais nada, é importante que se diga: o Registro do Vigário nada tem que ver com o Registro de Imóveis.
Seu conteúdo não diz nada sobre a situação jurídica dos imóveis, nem mesmo no precário nível da posse. Na verdade, o
seu objeto não é a posse, mas sim declarações acerca da posse.

Ainda, não há na lei ou no decreto qualquer previsão no sentido de que caberia ao vigário fornecer algum tipo de
certidão quanto ao conteúdo dos livros, ou mesmo de que devesse franquear os livros à consulta pública. O vigário age,
em relação a esses livros, tão somente como um coletor de informações para o governo.

Ao desenvolver seu trabalho, praticava um levantamento, destinado tão somente a fornecer informações ao Poder
Público; não havia a preocupação com se proporcionar um meio de, por si, gerar publicidade a negócios jurídicos
praticados entre particulares, ou tornar os negócios mais seguros. Não tinha qualquer relação com o direito privado, nem
gerava quaisquer efeitos nessa seara.

Observe-se que mesmo os procedimentos de legitimação previstos na Lei 601 não estão condicionados ao registro
da declaração de posse, nem são por elas afetados. Não se concede nenhum tipo de preferência a quem declarou sua
posse.

Como já relatava Teixeira de Freitas, o conteúdo consistia em mera descrição estatística, não demonstrando títulos
legítimos ou encargos incidentes sobre os bens3.

Por isso, realizar a declaração não é um ônus, mas um dever jurídico: o possuidor declara para não pagar as multas
previstas no artigo 95 do Regulamento, e não para obter alguma modificação benéfica em sua situação jurídica de
possuidor.

Dessa maneira, é duvidoso até mesmo se é possível falar aqui em publicidade imobiliária de fato, não obstante após
a passagem do tempo estes livros tenham sido disponibilizados aos interessados em arquivos públicos.

Mesmo como prova de posse, o conteúdo desses livros não é nem mesmo um meio privilegiado: seu valor é o
mesmo de um testemunho interessado, já que a declaração foi feita pelo suposto possuidor.

Em 1975, o Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão dos efeitos do registro das terras possuídas, no Recurso
Extraordinário 80.416, de Goiás, em sede de ação demarcatória. Em primeiro grau o processo havia sido extinto sem
julgamento de mérito, por carência de ação, e, em segundo grau, o pedido fora julgado improcedente. O fundamento era
o mesmo, contudo: a ausência de prova da propriedade, já que os títulos apresentados consistiam tão somente em
declarações lançadas no “Registro do Vigário”. Em seu voto, o relator, Ministro Cunha Peixoto afirmou que este registro
não tinha finalidades puramente estatísticas, mas sim um papel de “consolidação das posses que, bem ou mal, foram
tomadas em terras às províncias”. Com isso, encaminhava o recorrente à via da usucapião – admitida pelo STF
iterativamente para as posses de mais de quarenta anos anteriores ao Código Civil de 1916 – servindo seus
documentos não como títulos, nem como prova da propriedade, mas como meio de prova de posse. Com isso, o recurso
nem mesmo foi conhecido, por unanimidade.

Assim, quando muito, pode-se admitir que o vigário exercia uma atividade semelhante à notarial4, autenticando o
recebimento de uma declaração. Tratava-se de um simulacro imperfeito, contudo, dado que não tinha o vigário fé
pública.

Em suma o “Registro do Vigário” não deve ser considerado um antepassado nem mesmo remoto do registro de
imóveis brasileiro, nem como um antecedente da publicidade imobiliária. As solenidades medievais de traditio simbólicas
perante testemunhas estão mais próximas da publicidade imobiliária e do registro de imóveis do que esta instituição.

4.3. Fases da publicidade imobiliária no Brasil quanto ao aspecto material

4.3.1. Período anterior à Lei Orçamentária de 1843, regulamentada pelo Decreto 482, de 1846

Até 1846 não havia no Brasil qualquer meio de publicidade imobiliária que produzisse efeitos jurídicos, quer quanto à
constituição dos direitos reais e transmissão da propriedade, quer quanto a seus efeitos em relação a terceiros.

Com efeito, no direito anterior à codificação civil, materializado nas Ordenações Filipinas e na legislação
extravagante, o domínio se transmitia com a tradição do bem. Isto é reproduzido no artigo 908 da Consolidação das Leis
Civis5: Art. 908 – Para aquisição do domínio não basta simplesmente o titulo, mas deve acceder a tradição; e sem esta
só se tem direito a acções pessoaes.

Assim, o Brasil mantinha-se fiel à doutrina do titulus e modus da Escola do Usus Modernus Pandectarum, pela qual a
traditio era necessária para que o adquirente se tornasse titular das ações reais, e, por conseguinte, dos direitos reais
em si mesmos. Diante das próprias limitações do instituto e do princípio enunciado por Ulpiano (Digesto 50.14.54) de
que ninguém transfere mais direitos do que possui – Nemo plus iuris ad alium transfere potest, quam ipse haberet – a
traditio feita pelo verdadeiro titular transmitia o domínio; já a realizada a non domino apenas servia como justo título para
a usucapião.

Nisso mantinha-se o costume peninsular, já que, como já se viu, a tradição – à moda visigótica, ou à moda romana –
era o meio de aquisição da propriedade na Península Ibérica desde a Alta Idade Média.

Pela tradição, o titular do domínio de um bem o transferia a alguém, renunciando a toda posse sobre a coisa. Recaía
o direito, portanto, sempre sobre coisas corpóreas, e tratando-se de tradição de direitos – e não de coisas – adotava-se
o termo “quase tradição”. Para Trigo de Loureiro, que demonstrava simpatia pela doutrina jusnaturalista do
consensualismo, se tratada racionalmente a questão da transmissão do domínio, dever-se-ia reconhecer que basta à
transferência uma palavra das partes, ou mesmo nem isso: bastaria qualquer outro ato externo que significasse esta
vontade de transferir por parte de seu titular. Porém, na experiência do Direito Romano sempre se exigiu, para a
transmissão, algum ato externo, e no Direito Romano Justinianeu, em especial, um ato material de tradição. Assim, este
ato externo mostrava-se como uma necessidade inafastável, que deveria acompanhava o justo título. Por conta da
influência romana, o mesmo teria ocorrido no Direito Português, e, por conseguinte, no Direito Brasileiro, tal como consta
do Título 7 do Livro 4 das Ordenações Filipinas e do Alvará de 4 de setembro de 18106.
O Título 7 do Livro 4 das Ordenações, seguindo disposições semelhantes que já constavam das ordenações
anteriores, trata do clássico problema em matéria de transmissão da propriedade consistente na venda do mesmo bem a
duas pessoas diferentes – ou “desvairadas pessoas”, na dicção das Ordenações. Estabelece o Título 7 que se o
proprietário de alguma coisa de qualquer natureza – as Ordenações não distinguem móveis e imóveis – a vender a
pessoas diferentes, adquirirá a propriedade aquela que, em primeiro lugar, “houver a entrega della”, ou seja, recebê-la
pela tradição, desde que tenha pago o valor do preço. Ainda, se o proprietário vendesse a coisa a alguém, recebesse o
preço, mas não a entregasse, e a vendesse posteriormente a outra pessoa, recebesse o preço, e a entregasse, caberia
ao primeiro comprador tão somente demandar do vendedor a restituição do preço e “seu interesse” (a saber, os juros),
ou seja, teria meramente direito pessoal. Não tem, contudo, qualquer direito sobre a coisa propriamente dita. Tem-se, aí,
a separação relativa entre os planos obrigacional e real. A venda é válida e obriga o vendedor; mas, por si só, não
produz efeitos reais, que depende do modo de aquisição.

O Alvará de 04 de setembro de 1810 reforçou a separação entre os dois planos ao revogar uma regra contida no
título 5, § 2º, do Livro 4. Este parágrafo tratava das vendas a prazo, em que a tradição da coisa já fora feita mesmo antes
do pagamento do preço. Segundo a regra então vigente, havendo o inadimplemento, poderia o vendedor cobrar o preço
ou reclamar a coisa do comprador ou de qualquer outra pessoa em cujo poder se achasse. O Alvará revogou a regra,
determinando que, em caso de venda a prazo – e na qual somente se tenha pactuado a concessão do prazo, e não uma
condição, por exemplo – somente restassem ao vendedor ações pessoais para exigir o pagamento do preço. Nesse
sentido, o Alvará distinguia as ações ex empto e ex vendito da ação reivindicatória, sendo as primeiras pessoais, e a
última real. Ficava, assim, ainda mais claro o papel da tradição como modo de aquisição.

Coelho da Rocha dá conta de que a posse e a propriedade das coisas eram transmitidas por meio de fatos materiais
de apreensão, por meio dos quais compreendia-se que o adquirente se tornara legitimado a dispor daquilo que recebeu.
Esta apreensão não necessariamente se revelava em um ato físico, e poderia se dar por mais de um meio, por exemplo,
naturaliter, ou seja, pela entrega efetiva, a qual, em se tratando de bens imóveis, se representava pelo cultivo, pela
demarcação, ou ainda pela ocupação da área, mediante entrada em seu recinto com a intenção de tomar posse;
symbolice, ou seja, pela entrega de chaves pelo alienante e sua aceitação pelo adquirente; longa manu, ou seja, pela
exibição da coisa pelo alienante com a intenção de transmitir, e a visão dela pelo adquirente, com a intenção de receber;
brevi manu, na situação em que o antigo possuidor declarava ao novo possuidor – que já tinha a coisa sob seu poder –
que lhe transmitia a posse; e, finalmente, ficta, situação em que o possuidor antigo – que ainda tinha a coisa sob seu
poder material, mas que agora o fazia em nome do novo titular – declarava que transmitia ao adquirente a coisa. Esta
declaração poderia ser expressa, como no constituto possessório – também conhecido como cláusula constituti –, ou
poderia até mesmo ser presumida, nas situações em que o antigo titular passava a ser arrendatário da coisa7. Assim, o
domínio se transmitia independentemente da entrega real da coisa quando a alienação era contratada por instrumento
público (ou nas hipóteses em que a lei admitia o instrumento particular) e o alienante fazia consignar que renunciava e
transmitia ao adquirente o domínio e a posse que sobre a coisa tinha8.

Tenha-se em mente, contudo, que a tradição ficta e a simbólica não deixavam de ser tradição, razão por que não se
podia afirmar que no Brasil, em qualquer época, o mero contrato tenha tido força translativa de direitos reais.

A aquisição da propriedade se dava pela conjugação de título e modo de aquisição, e isto se manteve ao longo de
toda a história do Direito Brasileiro.

Contudo, em grande parte do país a maneira mais comum de detenção da terra era a mera posse, sem propriedade.
Afrânio de Carvalho9, contextualizando a história da publicidade imobiliária no Brasil, afirma que o nascimento do registro
de imóveis no país dependia de que o seu território estivesse povoado de forma tão intensa que se tornasse necessário
o conhecimento da extensão e da titularidade de cada gleba de terra, a fim de se proteger a propriedade e o crédito
oriundo de um bem que, em si, representava valor de mercado. Por isso, por longa data predominou no país a mera
posse da terra. Esta foi legitimada oficialmente pela Lei 601, de 1850, e seu Regulamento 1.318, de 1854, mas toda a
documentação resultante desta tentativa de regularização era extremamente desordenada. Isto tornava complexa e
insegura a atividade de se buscar a titularidade verdadeira de um dado imóvel, que dependia de um levantamento da
cadeia filiatória do imóvel mediante o encadeamento dos proprietários, título a título. O problema era agravado pela
dispersão e falta de centralização dos dados sobre cada imóvel, e pela existência de hipotecas ocultas e gerais,
abrangendo bens presentes e futuros de certas pessoas arroladas pela lei.

Se a traditio tinha a aptidão de transmitir a propriedade somente se o alienante fosse o proprietário do bem,
adquiriam máxima importância os demais modos de aquisição da propriedade, já que, em algum momento do passado,
deveria ter ocorrido alguma aquisição originária que tivesse dado início a uma cadeia filiatória legítima. Até a Lei de
Terras de 1850, o meio legítimo de aquisição originária da propriedade por um particular era a obtenção de uma
concessão de terras feita pela Coroa pelo instituto da sesmaria, o qual atribuía domínio pleno ao concessionário após o
preenchimento de algumas condições. A Lei de Terras de 1850 autorizou a revalidação da concessão de sesmarias que
não houvessem preenchidos certos requisitos exigidos pela legislação anterior para a aquisição plena da propriedade, e
a legitimação de posses mansas e pacíficas, mediante a realização de um procedimento de medição e demarcação10.

Assim, a aquisição da propriedade acabava por depender não apenas do titulus e do modus, como também da
legitimidade do alienante para alienar, o que pressupunha que ele, ou aquele de quem havia adquirido a propriedade do
bem, ou ainda algum anterior titular, o tivesse recebido em sesmaria, o tivesse adquirido por ocupação11 antes da Lei de
Terras de 1850, ou por usucapião quando tal era cabível12, ou, após a Lei de Terras, o tivesse comprado do Estado.

4.3.2. O período compreendido entre a Lei Orçamentária 317, de 1843, regulamentada pelo Decreto 482, de
1846, e a Lei 1.237 de 1864 e o regulamento do Decreto 3.453, de 1865
Assim como em Portugal e na Espanha, a publicidade imobiliária, no Brasil, não teve o início de seu desenvolvimento
baseado na publicidade da propriedade em si, mas sim na da hipoteca. A hipoteca foi o grande instituto do direito civil
oitocentista, marcadamente pelas necessidades de garantia da circulação do crédito. Até a edição da Lei 1.237, de
1864, as transmissões de direitos reais sobre imóveis continuaram a ser feitas pelo contrato seguido de tradição, sem
qualquer publicidade.

Era o propósito do registro tornar público o estado da fortuna dos cidadãos quanto à situação jurídica de seus bens
imóveis, de maneira a reprimir fraudes que poderiam afligir terceiros e prestigiar a boa-fé. Com isso, pretendia-se criar
mecanismos mais eficazes de satisfação dos credores, por meio da obtenção, na excussão do bem, do valor que lhes
era devido. Estas melhorias dependiam da existência de um bom sistema hipotecário, instituição que já vinha sendo
criada, nesta altura, em muitos países europeus. Sem o arranjo jurídico e institucional que representa um sistema
hipotecário – isto é, a conjugação de regras claras e meios eficientes e seguros de publicidade – as hipotecas não
seriam eficazes nem poderiam gerar efeitos contra terceiros13.

Entretanto, se, por um lado, se pode dizer que havia no século XIX um clamor generalizado por sistemas dessa
natureza, por outro se deve reconhecer que não era unânime o sentimento acerca das vantagens da disseminação das
hipotecas no país. Em monografia sobre a propriedade, José de Alencar bradava contra o instituto da hipoteca, a qual
considerava mecanismo pelo qual se operavam grandes injustiças14. Para o romancista, a hipoteca legal fora criada com
os mais nobres intuitos, ou seja, a proteção dos bens das mulheres e dos órfãos. Mas o instituto, insinuando-se na
legislação, espraiou-se em outros recintos, passando a abranger os bens do Estado, das vítimas de crimes, coerdeiros e
das corporações de mão-morta. A forma que se deu à hipoteca legal acabou por atrair grandes críticas, uma vez que,
por seu próprio mecanismo, gerava injustiças contra outros credores legítimos, ainda que estes fossem protegidos por
outras hipotecas convencionais15.

Cinquenta anos antes da publicação da monografia de José de Alencar, um primeiro projeto, com singelos seis
artigos, foi apresentado, em 03 de julho de 1830, pelo deputado Ernesto Pereira França. Propunha a criação de “livros
das hipotecas” por todo o Império, nos quais seriam lançadas tão somente as hipotecas. Caberia ao “primeiro tabelião
do lugar” assumir a função concomitante de registrador de hipotecas. As hipotecas constituídas após a publicação da lei
e não lançadas no livro seriam “nullas”, assim como as anteriores que não o fossem no prazo de dois anos16.

Outro projeto foi elaborado pelo deputado João Manuel Pereira da Silva, o qual o defendeu perante a Comissão de
Justiça Civil no dia 18 de março de 1843. Afirmava o deputado que era absolutamente necessária a adoção de uma lei
que estabelecesse regras claras e invariáveis para a constituição e o funcionamento das hipotecas, de maneira a se
assegurar a propriedade individual e coibir abusos. O deputado apresentou o projeto em 1º de abril de 1843, mas este
foi esquecido, não tendo servido nem mesmo de base para a elaboração de projetos posteriores17.

A despeito disso, em 21 de outubro de 1843 foi editada a Lei Orçamentária 317, a qual continha em seu artigo 35
uma única disposição criando um “registro geral de hipotecas, nos lugares e pelo modo que o Governo estabelecer nos
seus regulamentos”.

Observe-se que o dispositivo não determina propriamente a criação de um sistema hipotecário, ou de uma lei
hipotecária. Na verdade, não apenas determina, mas cria um registro hipotecário, atribuindo ao Governo toda a sua
regulamentação.

Por aviso de 27 de março de 1844, a Seção de Justiça do Conselho de Estado foi encarregada de organizar esse
regulamento. Em seu parecer, datado de 09 de dezembro do mesmo ano, a Comissão, integrada por Honório Hermeto
Carneiro Leão, pelo Visconde de Monte Alegre e pelo Bispo de Anemúria, advertia, preliminarmente, sobre a
conveniência de se realizar uma reforma completa do sistema hipotecário, e não apenas estabelecer um registro
hipotecário. Todavia, uma vez que a Lei 317 já havia criado o registro, apenas atribuindo ao Governo a missão de
regulamentá-lo, entendiam que apenas lhes cabia dar execução à ordem. Reconheciam, contudo, que o projeto de
regulamento era apenas um ensaio, e que, fatalmente, estaria repleto de imperfeições, o que seria agravado por ser a
matéria “complicadíssima” e por faltar aos membros da Seção meios, tempo e conhecimentos necessários para seu
estudo. O modelo mais facilmente accessível – o Código Civil Francês – não era guia seguro, já que mesmo os juristas
franceses nesta altura o criticavam neste ponto, clamando por reformas. Assim, tomando como missão do Governo,
neste momento, tão somente o estabelecimento dos lugares e modo de instalação dos registros de hipotecas, focam o
projeto e o parecer nestes temas. Trata, por exemplo, da conveniência de que haja um registrador de hipotecas por
comarca – e não um por município, ou um por província – e de que o registrador seja formado em direito e possa
oferecer garantia de que tem meios de responder pelos prejuízos eventualmente causados por ele. O parecer ainda
cuida de dois pontos importantes: esclarece que a Seção optou por manter a validade das hipotecas legais dos menores
órfãos e das mulheres casadas sob regime dotal independentemente de registro, para proteção destas pessoas; e
afirma categoricamente que cabia ao registrador “uma tal ou qual jurisdicção ou autoridade”, destinada à deliberação
“sobre a validade dos títulos com os quais se lhe requer o registro de hypothecas, ou de sua baixa e extincção”18.

Recebido o parecer, o Imperador determinou, em 07 de junho de 1845, que fosse ouvido o Conselho de Estado. Em
25 de setembro de 1845, o Conselho de Estado encaminhou um texto com emendas ao projeto, consolidadas em um
substitutivo19. Curiosamente, das várias críticas formuladas pelo Conselho de Estado, nenhuma delas dizia respeito ao
ponto que ensejaria mais críticas nos anos seguintes: a ausência no regulamento do registro das transmissões.

O regulamento foi editado pelo Decreto 482 em 14 de novembro de 1846, adotando, como base, o texto proposto
pela Seção de Justiça, incorporando algumas sugestões do Conselho de Estado, e acrescentando alguns elementos
novos.
A legislação brasileira somente exigia a inscrição das hipotecas convencionais, não o fazendo quanto às legais e às
judiciais, o que seria muito proveitoso20. Com isso, o artigo 35 da Lei Orçamentária 317, de 21 de outubro de 1843,
regulamentado pelo Decreto 482, de 14 de novembro de 1846, acabou introduzindo muito acanhadamente o registro de
hipotecas no Brasil21.

A despeito disso, o sistema de 1843 constitui efetivamente publicidade imobiliária. Mais do que sintomas de
publicidade, a publicidade gerada era qualificada, e produtora de efeitos jurídicos. Tem-se em 1843, portanto, a primeira
manifestação do fenômeno do registro imobiliário no Brasil.

Com efeito, a inscrição das hipotecas no registro gerava os efeitos legais, enumerados no artigo 13 do regulamento.
Eram eles a “nulidade”, em favor do credor, das alienações de bens dados em hipoteca posteriores ao registro, a título
gratuito ou oneroso; a possibilidade de o credor penhorar e executar os bens dados em hipoteca, com quem quer que se
encontrassem; e garantir ao credor cuja hipoteca foi registrada sua prioridade em relação a outros credores22.

Teixeira de Freitas deixa claro que não se tratava propriamente da nulidade das alienações, mas sim de uma
ineficácia perante o credor hipotecário. O ato em si não era nulo, e, extinta a hipoteca pelo pagamento, por exemplo, o
bem continuaria nas mãos do adquirente23.

O regulamento, ainda, condicionou os efeitos das hipotecas anteriores à lei ao registro. Quanto a estas, fixou prazo
de um ano após a instalação do registro para que os credores com títulos anteriores as registrassem, a fim de manter
seus direitos. Ultrapassado este prazo, o registro não mais retroagiria seus efeitos à data da constituição do gravame, e
a hipoteca valeria a partir da data da inscrição, fazendo com que o credor perdesse seu direito de prioridade24. O que
garantia a prioridade era a data do registro, mas, se registradas duas hipotecas no mesmo dia, a prioridade seria
determinada pela data das escrituras25.

Esse estranho preceito deixou marcas que persistem até hoje em nossa legislação registral. O artigo 192 da Lei
6.015/1973 excepciona a regra de prioridade determinada pela prenotação nas hipóteses em que se tenha escrituras
públicas, lavradas na mesma data, apresentadas na mesma data, e que determinem a hora de sua lavratura, caso em
que a prioridade será dada não à prenotação anterior, mas sim à escritura lavrada em primeiro lugar.

O sistema, porém, carregava a grande falha de não abrigar as transmissões de bens imóveis, ou a constituição de
direitos reais limitados, com a exceção das hipotecas, com o que, no Brasil, o crédito precedeu a propriedade26. Com
isso, não se tinha a segurança da propriedade e nem das próprias hipotecas, uma vez que o credor não dispunha de
meios para saber se o hipotecante realmente era titular da propriedade do bem. Ademais, não foram extintas as
hipotecas gerais sobre bens futuros, absolutamente incompatíveis com um sistema de publicidade. A reforma em si já
nasceu imperfeita, exigindo nova mudança27.

Segundo Lafayette, a legislação de 1843 e 1846 foi um ensaio de publicidade, imperfeito e manco, e os interesses
agrícolas do país exigiam um sistema que “organizando a hipoteca sobre a larga base da publicidade, assegurasse ao
crédito territorial a força e a expansão de que era capaz”28.

Em relatório apresentado à Assembleia Geral Legislativa em 1847, o então ministro da justiça José Joaquim
Fernandes Torres tratou do recém-instituído registro de hipotecas. Afirmava que não teria sido possível chamar ao
registro as hipotecas legais, dado o estado em que se encontrava a legislação, pois nem mesmo havia um consenso
acerca de seu significado. Entretanto, reconhecia que as medidas adotadas no regulamento de 1846 não atendiam aos
anseios da sociedade, já conclamando uma reforma que extirpasse o intrincado jogo de prioridades que se dava entre
vários gêneros de hipotecas e privilégios29.

Com isso, um ano após a vigência do sistema instituído pelo Decreto 482 já se percebia a necessidade de sua
reforma.

4.3.3. O período compreendido entre a Lei 1.237, de 1864, e o regulamento do Decreto 3.453, de 1865, os
Decretos 169-A e 370, de 1890, e o Código Civil de 1916

A primeira tentativa de reforma hipotecária destinou-se a desenvolver o crédito imobiliário, tornando o imóvel um
capital vivo – ou seja, apto a garantir dívidas – com a finalidade de se gerar riqueza pública e privada. A lavoura
brasileira sofria sob o peso de dívidas subordinadas a juros altíssimos, e a hipoteca do imóvel, feita com segurança,
poderia proporcionar ao proprietário condições mais favoráveis. Para isso, foi necessário revogar a legislação sobre as
hipotecas que até então havia, com base em qual os prestadores de capitais não tinham segurança em emprestar, por
falta de garantias do pronto reembolso. Mesmo as dívidas garantidas por hipotecas convencionais inscritas não tinham
segurança, pois eram preteridas em benefício de hipotecas ocultas e gerais, dos privilégios e dos ônus que incidissem
sobre o bem hipotecado. Como se não bastasse, devedores, por vezes, injustamente negavam a existência de dívidas,
algumas contraídas até mesmo por instrumento público. Nos dizeres de Perdigão Malheiro, “A chicana e as tricas
forenses ostentavão-se soberbas contra o credor, e mil outros embaraços, que o desanimavão de sujeitar seus capitaes
a tantas eventualidades.” 30

Com isso, a propriedade imobiliária restava à margem do crédito, o que gerava para os credores uma tendência a
optar pelo crédito pessoal, baseado na fiança, a despeito da precariedade desta modalidade de garantia. A mudança na
legislação era urgente; e, a fim de que se fomentasse o surgimento de sociedades de crédito real, também era urgente
que a estas se desse prioridade sobre quaisquer outros créditos ou privilégios.
O sistema do registro das hipotecas de 1846 não havia surtido os efeitos esperados. A falta dos princípios da
especialidade e da publicidade, e os problemas gerados por isso, acabaram por contribuir para a criação de um
mecanismo de registro que proporcionasse uma base segura para as garantias, pelo que era fundamental que
contemplasse também as transmissões imobiliárias. Assim, as críticas à Lei de 1843 catalisaram os anseios por
mudança31.

É uma medida interessante do anseio por mudanças a importância que o próprio Imperador Dom Pedro II dava ao
tema. A Lei Hipotecária aparece na “Fala do Trono” – discurso anual em que o imperador abria e encerrava a sessão
legislativa – nada menos do que sete vezes entre 1850 e 1864, mais precisamente nos anos de 1854, 1855, 1857, 1859,
1860, 1863 e 186432.

No intuito de se empreender uma reforma, foram analisados e buscados elementos nos sistemas conhecidos de
publicidade imobiliária, com vistas a se realizar no Brasil uma combinação daquilo que de melhor cada um poderia
oferecer. E este intuito deve guiar a interpretação dos dispositivos que constam da Lei de 1864 e seus regulamentos.

Incumbiu-se de elaborar um projeto de reforma o Ministro da Justiça, Conselheiro Nabuco de Araújo, que já assumiu
sua posição no gabinete com este intuito. O Conselheiro Nabuco compreendia que era preferível uma reforma de toda a
legislação civil; mas diante das dificuldades desta empreitada e da crença de que a melhoria da proteção dos direitos
naquele momento não impedia que o codificador no futuro a fundisse em moldes mais perfeitos, levou a cabo seu
intento33.

A lei tinha alguns eixos centrais. O primeiro deles era o de que a hipoteca é um instituto que deveria gravar imóveis,
somente; poderia gravar também seus acessórios – até mesmo escravos – desde que isso se fizesse juntamente com o
principal. O segundo eixo determinava que toda hipoteca, quer fosse legal, quer fosse convencional, deveria ser
especial, ou seja, dizer respeito a um imóvel, ou a imóveis, específicos (e não a todo o patrimônio do devedor), e deveria
ser registrada, sob pena de não valer contra terceiros. Algumas exceções permaneceriam, contudo, como as hipotecas
legais concedidas à mulher casada, aos menores e aos interditos, que poderiam permanecer válidas, ainda que gerais,
e, por conseguinte, não registradas. Como uma tentativa de se remediar os riscos gerados por essas exceções, previa-
se que a hipoteca geral não poderia concorrer com as especiais enquanto houvesse outros bens livres do devedor – ou
seja, a hipoteca convencional prevalecia sobre aqueles bens específicos, desde que o crédito garantido pela hipoteca
geral pudesse ser satisfeito pela execução de outros bens. O terceiro eixo, e mais importante, foi a necessidade de
transcrição das aquisições de bens hipotecáveis, bem como das instituições dos ônus reais constantes do rol da lei.
Com isso, pretendia-se, o registro acabaria funcionando como uma espécie de cadastro da propriedade, evitando aos
credores hipotecários e aos adquirentes de boa-fé surpresas quanto ao estado patrimonial de um devedor ou quanto à
propriedade de um bem alienado. Entretanto, o registro não provaria o domínio – este sempre ficava a salvo de quem
fosse. Um último eixo, também importante para os fins a que a reforma se propunha, foi a extinção dos privilégios
creditórios. Por exemplo, nas situações em que um imóvel hipotecado fosse arrematado ou adjudicado em sede de
execução, não mais subsistia o chamado “privilégio de senhor de engenho”, que impedia que propriedades pertencentes
a tais pessoas fossem arrematados em execuções; também não mais subsistiria a proibição de um bem ser alienado em
execução quando o seu valor excedesse o dobro da importância da dívida. O credor passaria a ter direito de pagar-se
pela forma que lhe fosse mais conveniente34. Isto representava um grande rompimento com a tradição, e até mesmo
uma mudança de mentalidade sobre o sentido e as funções da propriedade35.

Para tanto, o Conselheiro apresentou à Câmara o seu projeto de reforma hipotecária, na sessão de 25 de julho de
1854. Esse projeto estabelecia três classes de hipotecas: privilegiadas, legais e convencionais. Ainda, o projeto regulava
a matéria da preferência, e, principalmente, criava o registro das transferências de domínio e das constituições de ônus
reais, a cargo de um “Conservador”, consagrando o princípio da não indução de prova de domínio pela transcrição36.

Observe-se que “conservador” e “transcrição” fazem parte da terminologia do Sistema Francês de registro, o que não
significa, como se verá, que o Brasil tenha adotado este sistema. Na verdade, eram simplesmente termos muito em
voga. Recorde-se que ainda hoje em Portugal o registrador é conhecido como Conservador do Registo Predial, no Chile
como Conservador de Bienes Raíces, e na Bélgica ainda há o Conservateur des Hypotheques.

Em 22 de agosto de 1854, foi emitido um parecer da comissão de deputados, afirmando que o projeto trazia para o
Brasil dois princípios inovadores e nascidos na Alemanha: a publicidade e a especialidade. Ainda, afirmava o desejo da
comissão de se dar à transcrição o valor de prova da propriedade37.

Um dos nós górdios do debate era, precisamente, a adoção ou não da transcrição como prova suficiente, e, quiçá,
irrefutável da propriedade. É preciso compreender o que isto significava. Dar à transcrição a eficácia de prova da
propriedade autorizaria o adquirente que obtivesse a transcrição a fundar na certidão do registro uma ação
reivindicatória, por exemplo, ainda que a prova gerada por ela não fosse irrefutável. Em um tempo acostumado à ideia
da probatio diabolica da propriedade, e à posse como solução costumeira de litígios dominiais, atribuir qualquer tipo de
presunção de propriedade ao registro era uma inovação revolucionária.

Por conta disso, e das demais disposições do projeto, havia também grande preocupação com a formulação de um
todo coerente. Uma discussão ocorrida na Câmara em 06 de junho de 1855 acerca de dever o projeto ser discutido em
bloco, ou artigo por artigo, é reveladora sobre a mentalidade da época. São as palavras do deputado cearense Araujo
Lima: “Porque é impossível a discussão artigo por artigo? A camara sabe que em debates semelhantes se essa
discussão devesse versar artigo por artigo, seria mui difícil ou quasi impossivel obter-se um resultado definitivo. Nesta
materia são tantas as cabeças quantas as opiniões. Uns adoptarão o systema francez; seguirão outros o systema
allemão; agradará a outros o systema mixto, e a outros a nenhum dos systemas de que se trata. O corpo legislativo,
composto de tantas intelligencias, em que as opiniões divergem sobre tantos assumptos, não poderia apresentar um
systema de legislação seguido, um systema uniforme, apresentaria uma machina desmantelada, apresentaria um
monstro de Horácio”38. “O Monstro de Horácio” é um ser descrito na Ars Poetica, com cabeça de mulher humana,
pescoço de cavalo, penas nos membros e “pés” de peixe, simbolizando os poemas malfeitos. Ou seja, receava-se que,
ao se discutir artigo por artigo o projeto, a coerência dada pelo Conselheiro Nabuco se perdesse, dando lugar a uma
monstruosidade.

Em segunda discussão, ainda em 1855, manifestaram-se favoráveis ao valor probante da transcrição Nunes
Gonçalves, Ferraz Rodrigues e Barreto Pedroso. Este último afirmou que o Registro Hipotecário de 1846 – de sua
autoria – não rendera os resultados esperados exatamente por lhe haverem faltado a publicidade e a especialidade.

Na sessão de 09 de julho de 1856, foi apresentado substitutivo, que foi enviado ao Senado, onde foi apresentado
parecer, datado de 11 de setembro de 1857, da lavra de Silveira da Motta, Muritiba e Souza Ramos39. Note-se que o
projeto teve uma tramitação bastante acidentada, que se arrastou por dois anos na Câmara, e mais sete no Senado.
Quando da tramitação no Senado até mesmo foram apresentados novos projetos. Além do substitutivo de 1856, também
outro, de 1859, de autoria do próprio Ministro da Justiça, Muritiba40.

Nesse meio tempo, em sessão de 20 de agosto de 1856, o Conselheiro Nabuco compareceu no Senado, para a
terceira discussão do projeto. Afirmava a urgência e a importância do projeto, em especial pelas contingências em que
se via o credor hipotecário quanto à existência de “hypothecas occultas, posteriores, infinitas e arbitrárias”. O registro de
1846 não oferecia muito alento, já que, ainda que o credor tivesse a informação de não haver hipotecas convencionais
sobre o bem, nada lhe garantia que não houvesse hipotecas privilegiadas e ocultas, ou mesmo que a propriedade já não
havia sido alienada. Quanto aos efeitos da transcrição, afirmava que se ter a transcrição como prova inafastável de
domínio dependeria de decisão fundada em jurisdição contenciosa, com citação das partes e dos interessados, exibição
dos títulos de domínio, discussão das provas e prolação de decisão que abrangeria a validade do contrato, a
legitimidade dos contraentes e a legitimidade da propriedade. Isto faria com que cada transcrição fosse uma demanda e
com que toda a propriedade ficasse em litígio, o que seria agravado pela intenção, de alguns deputados, de determinar a
transcrição não da vigência da lei em diante, mas sim de toda a propriedade.

O Conselheiro Nabuco, como se pode ver, refere-se a um procedimento judicial de liquidação de domínio bastante
semelhante ao que será proposto, três décadas depois, por Ruy Barbosa em seus decretos acerca do Registro Torrens.

Prosseguia Nabuco afirmando que pela inviabilidade de se instituir no Brasil de então um sistema de publicidade
absoluta, tinha-se o registro, no projeto, a missão de atestar o fato da alienação. E, apesar de incompleto, este registro
não seria inútil, já que ministrava o necessário a um sistema hipotecário, pois com base nele seria possível saber se
teria havido alienação, se havia outras hipotecas, e se havia ônus reais sobre o imóvel; mas não poderia, naquele
momento, informar se era legítimo o proprietário, se era válido o contrato ou se era capaz o contratante.

O parecer da Comissão, de 11 de setembro de 1857, concluía condenando o registro constante do projeto,


considerando-o inútil, incômodo e dispendioso em razão de não contar com os pressupostos da consolidação e certeza
do domínio: a realização da mutação real por meio de um procedimento judicial em que se liquida o domínio, aliada à
existência de um cadastro do solo41.

O ministro da justiça consultou Teixeira de Freitas a respeito, opinando este, em resposta datada de 06 de março de
186042. O Jurisconsulto inicia seu parecer manifestando seu desconforto com a distração que a consulta gerara em seu
espírito, na ocasião em que, segundo ele, “todas as faculdades do meu espírito se achão absorvidas com o trabalho do
Projeto do Código Civil”. O primeiro ponto analisado por ele foi o de ser ou não exequível no Brasil, naquele momento,
uma reforma geral do regime hipotecário baseada na especialidade e na publicidade. A isso respondia enfaticamente
que sim, não apenas no Brasil, como também em qualquer país politicamente constituído e cuja propriedade imóvel
tivesse uma organização qualquer, já que a questão da necessidade da publicidade e da especialização das hipotecas já
havia sido “peremptoriamente resolvida pela história, pelo raciocínio, pelas legislações contemporâneas e até pela nossa
legislação actual”43.

Observe-se que ao falar em especialidade nesse parecer, Teixeira de Freitas não tratava do princípio registral da
especialidade, intimamente relacionado com a determinação do imóvel. Na verdade, tratava da necessidade de que as
hipotecas recaíssem sobre bens específicos do devedor, e não sobre todo o seu patrimônio. Isto fica claro quando afirma
que se deve tratar da especialidade e da publicidade de maneira separada, já que a especialidade se refere somente às
hipotecas, e a publicidade não apenas às hipotecas, como também à transmissão da propriedade e à constituição de
direitos reais limitados44.

O segundo ponto tratado por Teixeira de Freitas no parecer diz respeito à necessidade de que também fossem
inscritas no registro, além das hipotecas, as transmissões dos imóveis. Quanto a isso afirma que se, por um lado, o
Sistema Germânico é aquele que contém prova irrecusável da propriedade com todos os ônus a que esta possa estar
sujeita, por outro há sistemas que mais ou menos realizam esta ideia, ainda que com efeitos menos amplos, que, nem
por isso, deixam de ter suas vantagens assim como inconvenientes. A respeito disso, opinava que o exequível e
apropriado no Brasil daquele momento seria a criação de um sistema que contemplasse também as transmissões da
propriedade e a constituição de outros direitos reais, sistema esse que, se, por um lado, não desse certeza legal da
propriedade – o que, naquele momento, era impossível – por outro criasse um modo público e uniforme de tradição e
aquisição de direitos reais45. A despeito disso, entendia que o ideal seria aguardar o advento do Código Civil, já que
“tudo estreitamente se liga na harmonia das relações jurídicas”46.

A seguir, o projeto passou pelas Comissões de Legislação e Fazenda, as quais exararam parecer em 20 de julho de
1861 e 28 de julho de 1862. Em primeiro de março de 1864 foi posto em segunda discussão no Senado. Retornou às
comissões porque o Conselheiro Nabuco – tendo realizado mais estudos sobre o tema – apresentaria emendas. Em 23
de maio de 1864 é emitido novo parecer das Comissões Reunidas de Legislação e Fazenda, acompanhado de
substitutivo. Então, o projeto do Conselheiro Nabuco foi aprovado com poucas emendas e remetido à Câmara, que o
aprovou sem discussão e o converteu na Lei 1.237, de 24 de setembro de 186447.

Segundo Furtado de Mendonça, o regime da Lei de 1864 trazia elementos do Sistema Francês e do Sistema Alemão,
como que os tentando conciliar. Aproveitava o que havia de melhor em cada um para melhorar o crédito imobiliário, e, ao
mesmo tempo, garantir o patrimônio da família. O sistema submetia-se às leis preexistentes em matéria de transmissões
causa mortis, isentando-as de qualquer formalidade para a aquisição dos direitos. Mas as alterava quanto à aquisição
nos atos entre vivos, os quais antes dependiam apenas da tradição48.

Essa ideia de o sistema brasileiro ser um “híbrido” dos sistemas francês e alemão é algo que perdura, e, não
obstante, não descreve adequadamente o Sistema Brasileiro. O Sistema Francês é um sistema de título; o Sistema
Alemão, após a introdução da abstração, tornou-se um sistema de modo; e o Sistema Brasileiro é um sistema de título e
modo, e, portanto, algo distinto dos dois. Considerar que por adotar o princípio da inscrição, mas não a fé pública
registral, tem-se um híbrido entre os sistemas francês e alemão, é desconsiderar os traços essenciais do sistema.

Em se tratando de direitos reais limitados, estes dependiam de transcrição para valer contra terceiros. Assim, a
servidão, o uso, a habitação, a anticrese, o usufruto, o foro, e o legado de prestação ou alimentos expressamente
consignados no imóvel. Quaisquer outros ônus não poderiam ser transcritos, sendo havidos como meros direitos
pessoais. Por outro lado, não dependiam de transcrição os privilégios do fisco, por decorrerem de dívidas de impostos
incidentes sobre os imóveis49.

Nesse ponto, a Lei 1.237, de 1864, mostra-se como um marco fundamental não apenas do Direito Registral
Imobiliário, como também da própria disciplina dos direitos reais no Brasil. Até então, não havia um rol legal de direitos
reais, aplicando-se, na matéria, essencialmente o Direito Romano Justinianeu, como direito subsidiário às Ordenações
Filipinas, que muito pouco tratavam do tema.

No sistema da Lei 1.237, os direitos reais limitados não poderiam ser opostos a credores de hipotecas inscritas
anteriormente a eles. No entanto, ônus instituídos por atos causa mortis valiam independentemente de transcrição,
mesmo contra os credores hipotecários. Neste ponto – tratando dos direitos reais limitados – o Sistema Brasileiro se
assemelhava ao Sistema Alemão, já que se adotava o princípio da inscrição50.

As transmissões causa mortis não teriam sido submetidas à transcrição, segundo Furtado de Mendonça, por duas
razões: em primeiro lugar, não era exigido pelo crédito, vez que as fraudes não ocorriam tal como se dava nas
transmissões entre vivos; em segundo lugar, porque o Alvará de 9 de Novembro de 1754 dava aos herdeiros legítimos e
testamentários a posse civil dos bens herdados, com os mesmos efeitos da posse natural. De forma que, segundo o
pensamento dominante, não poderia o legislador sujeitar estas transmissões a uma tradição legal, da qual os herdeiros
já eram isentos anteriormente, ao menos que pretendesse revogar esta isenção, o que deveria fazer de maneira
expressa51.

Quanto à transmissão da propriedade por ato inter vivos, havia polêmica sobre a natureza e os efeitos do registro.

Para Teixeira de Freitas, o Brasil filiara-se aos países que tinham no registro a tradição legal do bem. Na França, em
virtude da doutrina do consensualismo, bastava o consentimento das partes para a transmissão da propriedade,
servindo a data do contrato para fixar o momento da aquisição. Já em outros países – como ocorria no Brasil – havia a
necessidade de registro para haver prova oficial do domínio, publicidade, gerando prioridade àquele que primeiro
registrara, e era o ato inoponível a terceiros até que o registro fosse realizado52.

A mesma opinião tinha Albuquerque Sobrinho53, afirmando que a transcrição formalizava a tradição da coisa, mas
não tinha o poder de gerar direito real, nem muito menos purgar vícios do negócio; e, com isso, não derrogava o
brocardo segundo o qual não poderia ninguém transferir mais direitos do que possuísse. Por isso, via a transcrição como
uma formalidade extrínseca, voltada à publicidade, nada agregando ou retirando da substância do próprio título que
transmitia o domínio. Não o supria ou retificava. Assim seria o direito racional, depreendido na interpretação do
parágrafo 4º do art. 8º da lei.

Opinião semelhante tinha ainda Furtado de Mendonça, para quem, quanto aos efeitos do registro, o regime brasileiro
adotara o princípio da inscrição do Sistema Germânico, pelo que a transcrição dos títulos translativos de domínio nos
atos entre vivos era constitutiva. Com isso, segundo a doutrina majoritária, acabou por substituir o ingresso na posse
pela tradição do bem, necessário à aquisição. Por essa razão, segundo ele, poder-se-ia dizer que no regime da Lei
1.237 a transcrição operava a tradição dos títulos translativos de propriedade, e a quase tradição dos direitos reais
limitados54.

Isso seria demonstrado pelo artigo 8º da Lei, o qual, por fazer, em última instância, prevalecer a transcrição da
alienação em favor de certa pessoa, em face da tradição feita a outra, acabaria por revogar a Ordenação do Livro 4º,
Título 7º, parágrafo, segundo, a qual era a tradição que servia como de aquisição da propriedade55.

No mesmo sentido, Martinho Garcez, para quem a tradição e a transcrição eram dois fatos externos que
manifestavam a transferência da propriedade, segundo a lei. A lei sujeitava as transmissões a atos externos por ser o
domínio um direito absoluto, oponível a terceiros, e que, portanto, deveria ter suas mutações conhecidas por todos. A
tradição em si era insuficiente para dar esse conhecimento, podendo haver tradições secretas do mesmo prédio a
pessoas diferentes. Por isso, foi criada a transcrição, garantia dos adquirentes e base do sistema hipotecário. Assim, a
transcrição era o modo legal de transmissão da propriedade de imóveis, ao passo que a tradição transmitia a
propriedade dos bens móveis. Seria, portanto, a transcrição uma tradição solene dos imóveis alienados, e até sua
realização o domínio não se transmitia ao adquirente. Sem ela, este não poderia dispor do bem, gravá-lo de ônus reais,
hipotecá-lo, reivindicá-lo, ou mesmo opor exceções de domínio56.

Para Lafayette, na mesma linha, a natureza dos direitos reais e sua oponibilidade a terceiros exigiria que sua
transmissão se realizasse por atos materiais e visíveis. A fim de obrigar a todos, o ato de transmissão deveria ser
conhecido por todos. A publicidade seria necessária para evitar fraudes que poderiam ser perpetradas sob o manto da
clandestinidade e da ocultação dos direitos. No Direito Francês, as ideias de Hugo Grotius, Wolf, Puffendorf, Burlamaque
e outros fizeram com que se eliminasse do sistema a tradição, dando ao contrato eficácia de transmitir o domínio.
Entretanto, a legislação é uma obra prática, e, esta praticidade não pode ser sacrificada para dar lugar a especulações
filosóficas. Por isso, o Código Napoleão restabeleceu, para bens móveis, a tradição como modo de aquisição, e, em
1855, foi instituído na França o regime da transcrição para dar publicidade às transferências de bens imóveis57.

No entanto, ainda segundo Lafayette, a tradição pura não geraria publicidade suficiente. Por isso, no seu regime, um
mesmo prédio poderia ser alienado clandestinamente a mais de uma pessoa. Essa possibilidade deu azo ao surgimento
de um novo sistema de publicidade: a transcrição dos títulos aquisitivos em registros públicos. A transcrição seria
inaplicável a bens móveis, pela incessante circulação a que estão sujeitos, bem como pela dificuldade na fixação de sua
identidade; mas para os imóveis seria adequada, já que estes podem ser perfeitamente identificados, e estão sujeitos,
ao longo de sua história, a bem menos mutações jurídicas do que os bens móveis. Por essa razão, a transcrição seria
empregada, em alguns sistemas, como verdadeiro modo de transmissão da propriedade. Já em outros sistemas, por
timidez e receio de se abandonar costumes, a transcrição seria apresentada como mero requisito de oponibilidade a
terceiros, como se deu na lei francesa de 1855. Em qualquer das modalidades, a transcrição geraria publicidade e daria
segurança ao adquirente no esclarecimento de pontos que poderiam vir a comprometer a segurança da aquisição, por
exemplo, informar se o alienante ainda figurava como proprietário, se o domínio se mantinha igual ou se havia sido
desdobrado pela instituição de direitos reais limitados etc. Por outro lado, seria a transcrição também um pilar do regime
hipotecário, sendo o conhecimento do estado jurídico da propriedade imobiliária fundamental ao credor garantido pela
hipoteca: não sabendo se o devedor é ou não proprietário do bem, ou se já deu o bem em garantia a outro credor que
goze de preferência, não há como ter segurança de que, em caso de inadimplemento, terá seu crédito satisfeito pela
excussão58.

Em suma, a transcrição era, no Brasil, na vigência da lei de 1864, o modo legal de transmissão da propriedade de
bens imóveis. A tradição permanecia no sistema apenas para transmissão da propriedade dos bens móveis ou da posse
dos imóveis. A transcrição, em sua essência, nada mais seria do que a tradição solene do imóvel alienado. Portanto, até
a transcrição do título, o domínio continua a ser do alienante59.

Entretanto, uma outra corrente defendia que a transcrição não representava realmente a tradição legal do bem, mas
seria somente meio de publicidade, nos moldes do Direito Francês. Para Perdigão Malheiro, a escritura bastava à
transferência do domínio. O registro, por não provar a propriedade, não gerava efeitos entre as partes, e sua ausência
não implicava a não transmissão do domínio60. Esta interpretação era baseada na interpretação literal do artigo 8º da Lei
1.237, o qual afirmava que “A transmissão entrevivos por titulo oneroso ou gratuito dos bens susceptiveis de hypothecas
(art. 2.º § 1.º) assim como a instituição dos onus reaes (art. 6.º) não operão seus effeitos a respeito de terceiros, senão
pela transcripção e desde a data della.”. Com isso, entendia o autor que, na falta de transcrição, os efeitos da
transmissão apenas não se operariam contra terceiros, não deixando de ocorrer, por outro lado, a transmissão do
domínio entre as partes.

Também sustentava a adoção do Sistema Francês Oliveira Machado61, para quem a ideia principal do registro era
garantir o comprador ou o credor contra a fraude e a má-fé, as quais eram maximizadas pelo desconhecimento do
estado das mutações reais da propriedade. A transcrição, portanto, somente geraria efeitos perante terceiros, pois cada
ato em si já era do conhecimento das partes que o praticaram – por conseguinte, nada poderia acrescentar entre elas.
Mesmo antes da transcrição, segundo ele, poderia o adquirente que não recebeu a coisa propor uma ação
reivindicatória contra o alienante; no entanto, se este vendeu a coisa uma segunda vez, e o segundo adquirente a
transcreveu antes do primeiro, prevaleceria o direito daquele em face deste. Portanto, a produção de efeitos entre as
partes não dependia da transcrição, sendo esta necessária apenas para oponibilidade a terceiros.

Tinham o mesmo entendimento Joaquim José Rodrigues Torres, senador e Visconde de Itaboraí, e o Conselheiro
Andrade Figueira62.

Curiosamente, há representantes dessa corrente também entre os autores mais modernos. Caio Mário da Silva
Pereira63 e Washington de Barros Monteiro64 consideravam que no Direito Civil Brasileiro pré-codificado vigorava o
Sistema Francês.

A respeito disso, em resposta a seus contemporâneos, argumentava Lafayette que a Lei Hipotecária Brasileira falava
em terceiro, sem fazer qualquer restrição. Por isso, seria impossível ao adquirente reivindicar o imóvel de qualquer
pessoa, salvo do próprio alienante. Nem mesmo de um usurpador poderia o adquirente reivindicá-lo. Ora, o domínio é
um direito absoluto oponível contra todos, e, não existindo perante terceiros, também não poderia existir entre as partes.
Uma propriedade que existisse entre os contratantes mas não perante terceiros seria uma monstruosidade que repugna
a inteligência humana. A lei francesa, nesse ponto, não era igual à brasileira – os efeitos do domínio antes da transcrição
não seriam negados perante qualquer terceiro, mas somente aqueles que tinham direitos ou interesses sobre o imóvel.
Por isso, antes da transcrição o domínio já havia sido transmitido perante terceiros não titulares de direitos sobre o bem,
como esbulhadores e credores quirografários 65.
Já pela lei brasileira, na verdade, não haveria domínio perante quaisquer terceiros até a transcrição, e, portanto, não
o havia também entre os contratantes. O mero contrato não transferia domínio. Isso poder-se-ia se depreender do artigo
257 do Decreto 3.453, que afirmava que “até a transcripção, os referidos actos são simples contractos que só obrigam
as partes contractantes”, donde se deduz que o contrato não transcrito apenas gera direitos e obrigações pessoais. Em
suma, diferentemente da lei francesa, que gerava grandes complicações sobre saber quais terceiros foram obrigados e
quais não, a lei brasileira adotava um princípio claro: antes da transcrição não havia domínio.

Acrescentava Martinho Garcez, também em resposta, que a expressão “a respeito de terceiros” teria gerado
sentenças errôneas, as quais entendiam que a lei restringiria a terceiros os efeitos da transcrição, sendo esta
desnecessária à geração de efeitos perante as partes, seus herdeiros e sucessores. O erro estava no fato de se
desnaturar a propriedade, admitindo que esta valesse e existisse entre as partes, mas não perante terceiros. Ora, se até
a transcrição o título somente gerava efeitos entre as partes, tais efeitos somente poderiam ser pessoais, nunca reais,
não tendo havido, portanto, transferência de domínio nem mesmo entre as partes66.

Antes da transcrição não poderia o adquirente reivindicar de quem quer que fosse, alienar, gravar de hipoteca, e nem
mesmo opor exceções de domínio a ações reais promovidas por terceiros.

Por outro lado, ainda segundo Martinho Garcez, a eficácia da transcrição dependia de certas formalidades, e também
de certas condições, como a capacidade das partes e a legitimidade do título que deu causa à transferência. Quanto à
capacidade, aplicar-se-iam as regras da tradição. Se o alienante não era proprietário do imóvel, tal como na tradição a
transcrição não sanava o vício67. Este saneamento era próprio do Sistema Germânico, o qual não fora adotado no Brasil.
Nos debates anteriores à lei de 1864 houve quem defendesse a adoção deste último, o que seria temerário e
incompatível com o estado da organização da propriedade imobiliária do Brasil, e também com alguns princípios do
direito nacional. Em primeiro lugar, eram incertos os títulos de propriedade brasileiros quanto à origem e aos limites da
propriedade, em especial nas aquisições por sucessão, repletas de dubiedades. Por isso, eram muitas as usurpações de
terras, e o saneamento de vícios por uma formalidade erigida em modo de aquisição poderia legalizar inúmeras
situações de espoliação e fraude. Em segundo lugar, a Constituição de 1824 garantia no inciso 22 do seu artigo 179 a
propriedade e a perpetuidade do domínio. Este, uma vez adquirido, não poderia ser expropriado contra a vontade do
dono, salvo por motivo de utilidade pública. Ora, a transcrição com eficácia de firmar o domínio na pessoa do adquirente
de forma absoluta geraria muitos casos de uma verdadeira expropriação, o que, como se viu, era vedado. Em terceiro
lugar, a implantação do Sistema Alemão demandaria a criação de uma jurisdição especial para liquidação do domínio, e,
com isso, cada transcrição tornar-se-ia um processo contencioso. O processo nasceria da intervenção da autoridade, e
não da iniciativa das partes, o que, em si, já pervertia o sistema processual. Ainda, a verdade sobre o domínio somente
surgiria com a presença de todos os interessados, o que demandaria citações, provas etc. Em quarto lugar, sempre
segundo Martinho Garcez, somente teria havido um bom funcionamento do sistema na Alemanha porque lá a
propriedade era constituída por grandes domínios, os quais, por substituições fideicomissárias e morgados, acabaram
por se manter por gerações com as mesmas famílias. Assim, sendo poucas as mutações do estado jurídico do bem, ter-
se-ia tornado possível a formulação de um cadastro que organizasse o conjunto de imóveis. No Brasil, em que as
alienações ocorriam em número muito maior, e com muito maior fracionamento, o sistema seria inaplicável68.

Há de se reconhecer que o Brasil nunca adotou o Sistema Francês, nem muito menos o consensualismo. Se a
transcrição não era, no regime da Lei 1.237, modo de aquisição da propriedade, então este posto continuaria cabendo à
tradição. A instituição de um sistema de registro em si não pode ser vista como uma mutação do regime jurídico dos
direitos pessoais e reais, sob pena de o acessório subordinar o principal. Não se pode, de modo algum, presumir que
uma vez criado um sistema de registro que prevê a oponibilidade a terceiros, os contratos tenham passado a ter eficácia
real, sem previsão expressa nesse sentido. Ainda, ao que parece, efetivamente a transcrição do sistema da Lei 1.237
era modo de aquisição da propriedade, em especial porque o artigo 257 do regulamento do Decreto 3.453 claramente
trata de uma separação, ainda que relativa, dos planos obrigacional e real. Isto é o compatível com os efeitos propostos
para a transcrição, ou seja, tornar um direito oponível erga omnes, o que significa transformar um direito pessoal em
direito real. Se é certo que o contrato não foi elevado ao status de produtor de direitos reais; e se é certo que é a
transcrição, e não a tradição que marca a data da aquisição; então deve-se concluir forçosamente que o modo de
aquisição era a própria transcrição.

Observe-se que considerar a transcrição como tradição solene é uma maneira de se adequar o sistema das
transcrições ao disposto nas Ordenações: a propriedade ainda se adquiria pela tradição, todavia a tradição agora
passava a ter um novo formato, entre os muitos que já havia tomado ao longo da História. Entretanto, ao se observar a
dinâmica da transmissão da propriedade essa afirmação se mostra inadequada. Em um sistema de separação relativa
entre os planos obrigacional e real, se o negócio se inicia por um contrato obrigacional – por exemplo, de compra e
venda – no qual o alienante se obriga a transmitir a propriedade, o cumprimento da obrigação deverá acontecer também
por uma conduta do alienante. Tratando-se de bens móveis, isto se dá pela tradição, e não há maiores problemas. A
questão se coloca quando se tem em vista bens imóveis, já que a transcrição não é conduta das partes, mas ato
administrativo de um agente público. A transcrição, em si, portanto, é ato do Estado, e não das partes não podendo ser
confundida com a tradição. Trata-se, em suma, especialmente em um sistema de registro constitutivo, como, conclui-se,
foi o da Lei 1.237, de ato de soberania, que atribui a propriedade a alguém.

Reforça essa noção a previsão contida no artigo 68 do Decreto 3.453, segundo a qual “Os officiaes do registro não
podem examinar a legalidade dos titulos apresentados antes de tomarem nota da sua apresentação e de lhes conferirem
o numero de ordem, que lhes compete em razão da data da mesma apresentação”. Ou seja, após o protocolo, ou, nas
palavras do Decreto, a tomada de nota e conferência de um número de ordem, deveriam os registradores examinar a
legalidade dos títulos apresentados. Isto significa que a atividade do registrador não era passiva, de mero receptor de
títulos que, em si, já produziram seus efeitos, e que seria típica de um Sistema de Registro de Documentos. Ao
contrário, cabia ao registrador examinar a legalidade e decidir sobre sua aptidão para ingressar no registro. Assim, o
registro era ato jurídico do Estado representado pelo registrador, condicionado a requisites próprios de validade, e não
um mero fato jurídico.

O Regulamento do Decreto 3.453, também elaborado pelo Conselheiro Nabuco de Araújo69, revela a maturidade do
agora ex-ministro, solucionando questões que haviam permanecido em aberto na Lei 1.237, como uma maior clareza na
elevação do registro a modo de aquisição da propriedade.

Independentemente de uma concepção ou de outra, não havia prazo para transcrição das transmissões ou
instituições de direitos reais limitados, mas seria a data da transcrição que definiria sua eficácia contra terceiros,
princípio este encontrado já na lei francesa de 11 brumário do ano VII, derrogado pelo Código Napoleão, e restaurado
quando da reforma da legislação hipotecária francesa. Outra questão refere-se ao modo de escrituração do título no
registro. Nas normas da família germânica, o ato padrão para a publicidade é a inscrição, ao passo que no Brasil, tal
como na França, adotou-se a terminologia transcrição. Entretanto, a transcrição brasileira se fazia por extrato, o que a
torna pouco diferente da inscrição germânica. Vale dizer, no entanto, que havia no Brasil um livro de inscrições destinado
somente às hipotecas; e que se as partes assim pedissem, o ato também seria transcrito por extenso em livros
auxiliares. Em tal caso, porém, as mutações subsequentes se dariam no livro escriturado por extrato, e não no das
transcrições por extenso70.

O Decreto 169-A, de 1890, não trouxe grandes mudanças para o direito material do Registro que já vigorava desde a
Lei 1.237, de 1864. Permaneceu a ideia da transcrição como modo de aquisição da propriedade, ou, como prefere
Martinho Garcez, tradição solene do bem71. No art. 10 do Decreto 169-A, de 1890, havia uma expressão mal
empregada, “proprietário primitivo”, que poderia levar a confusões quanto aos efeitos da transcrição no regime da nova
legislação. Ora, até a transcrição ele seria proprietário atual, e não primitivo, ainda titularizando as ações decorrentes do
domínio. O contrato dava ao adquirente direitos pessoais, somente. Por outro lado, a transcrição não purgava vícios do
domínio, apesar de ser condição essencial da transferência da propriedade.

Assim, melhor seria ter empregado a expressão devedor hipotecante.

A única mudança de maior impacto foi a imposição da obrigação da inscrição e especialização das hipotecas legais
de órfãos e mulheres casadas, sob pena de não serem eficazes contra terceiros. Não se devia censurar a lei; contudo, a
desídia fazia com que fossem raríssimas ou mesmo inexistentes hipotecas dessa qualidade regularizadas, incorrendo na
caducidade.72

Após uma clamor de que a lei de 1864 – em especial em seus aspectos processuais – deixava o devedor indefeso na
mão do credor hipotecário, ávido e impaciente por obter seu lucro, tentou-se equilibrar a situação, dispensando o
sequestro como condição de ação e dando ao devedor o direito de opor embargos, tanto os fundados nas nulidades
constantes da lei quanto os demais embargos autorizados pelos artigos 577 e 578 do regulamento 737, de 1850. No
entanto, a lei de 1890, ainda que reproduzindo parte da Lei 3.272, de 1885 – que tratava da execução das hipotecas, e
não propriamente de matéria registral – tomou do executado os embargos que eram previstos no Regulamento 737.
Disso resultou grande divergência na doutrina e na jurisprudência73.

Com 408 artigos dedicados especificamente ao Registro de Imóveis e ao crédito real (o que inclui também
dispositivos processuais relacionados à execução das hipotecas), o Decreto 370, que regulamentava o Decreto 169-A,
também não inovou quanto aos efeitos do registro, mas continha alguns dispositivos de interesse, e não
necessariamente por uma boa razão.

Quanto ao dispositivo de interesse por uma boa razão, o artigo 234 previa que até a transcrição “os referidos actos”,
isto é, os atos de transmissão inter vivos, a título oneroso ou gratuito, de imóveis suscetíveis de hipoteca, “são simples
contractos, que só obrigam as partes contractantes”. Ou seja, mais uma vez a separação relativa entre os planos
obrigacional e real era reafirmada, estando expresso que selo o modo de aquisição o contrato é somente um contrato, e,
portanto, somente produz obrigações que, por definição, valem inter partes.

Já os dispositivos que são de interesse, mas não por uma boa razão, são dois. O primeiro deles é o tristemente
célebre artigo 11, parágrafo único, que ordenava a incineração dos antigos livros de transcrição do penhor de escravos,
transportando-se eventuais outros registros para os livros correntes. Tristemente célebre em virtude do evidente
desrespeito pelo passado e pela História, além de possíveis interesses escusos na supressão destes registros.

Outro, ou melhor, os outros, são os artigos 44 a 46, que tratam de prioridade, mantendo algo que já constava dos
artigos 47 a 49 do Decreto 3.453, de 1865. Segundo o artigo 44, quando duas pessoas “concorrem ao mesmo tempo” os
títulos apresentados são prenotados sob o mesmo número de ordem. E esclarece o artigo 45 que “o mesmo tempo” quer
dizer de manhã, das 06 às 12 horas, e de tarde, das 12 às 6 horas. Não há prioridade entre títulos que têm o mesmo
número de ordem; e, neste caso, a preferência se regula pela data do título. Tenha-se, assim, uma situação na qual uma
pessoa apresenta a registro um título às 07 horas da manhã, e outra, no mesmo dia, apresente um título sobre o mesmo
imóvel às 11 horas da manhã. Esta apresentação seria considerada “ao mesmo tempo”, pelo que a preferência
abandonaria o registro e passaria à data do título. Além dos evidentes riscos e confusões que um dispositivo dessa
natureza gerava, tem-se, ainda, como seu fruto um dispositivo incompreendido – e anacrônico – da Lei 6.015, de 1973, o
artigo 192. A fattispecie do dispositivo é a situação na qual duas escrituras públicas, que tenham sido lavradas no
mesmo dia, que tenham sido apresentadas no mesmo dia, e na qual se mencione a hora em que foram lavradas, terão
sua prioridade regulada pelo título, e não pela apresentação a registro. Com efeito, não há qualquer sentido em um
sistema que adota fólio real e no qual o protocolo dos títulos é praticamente imediato, abandonar a segura regra de
prioridade estabelecida pelo número de ordem no protocolo, para outra que sofra tantos condicionantes.
O terceiro Decreto de 1890, 451-B, trata do Registro Torrens, mas deste sistema não se falará neste momento.

4.3.4. O período compreendido entre o Código Civil de 1916 e o Código Civil de 2002

O Código Civil de 1916 foi decisivo para que fossem lançadas as bases do sistema de registro que vigorou no Brasil
ao longo de todo século XX e parte do século XXI, e, logo após sua entrada em vigor, já começou a gerar vívida
polêmica na doutrina civilista nacional no campo da eficácia do Registro de Imóveis. Com autores, em geral, filiando-se a
uma de duas posições, a discussão durou, ao menos, até os anos 194074.

O problema girava em torno da interpretação do artigo 859 do Código, copiado do Código Civil Alemão. O dispositivo
prescrevia que “Presume-se pertencer o direito real à pessoa em cujo nome se inscreveu, ou transcreveu”, constituindo
o cerne do problema saber se, com isso, ter-se-ia transplantado para o Brasil o Sistema Germânico de publicidade
imobiliária, e, de maneira específica, a fé pública registral. Em caso positivo, haveria, no Brasil, os efeitos da fé pública
do registro, dando respaldo às aquisições de terceiros de boa-fé, ainda que, posteriormente, se constatasse que o
alienante não era o real proprietário da coisa.

Capitaneou a corrente em defesa da fé pública Lysippo Garcia, afirmando que o projeto do Código Civil tinha como
objetivo obter a consolidação da propriedade imóvel, modificando o sistema existente e conferindo ao registro força
probante em relação a terceiros. Submetido a uma comissão composta por Olegário Herculano de Aquino e Castro,
Joaquim da Costa Barbosa, Amphilophio Botelho Freire de Carvalho, Francisco de Paula Lacerda de Almeida e João
Evangelista Sayão de Bulhões Carvalho, o projeto fora emendado, sendo acrescentado um parágrafo único ao artigo
530, prescrevendo que “A inscrição não induz prova de domínio que fica a salvo a quem de direito”75.

Essa emenda gerou grandes debates na Câmara dos Deputados. O conselheiro Andrade Figueira manifestou-se
contrário à necessidade da inscrição para transferência do domínio entre as partes contratantes. Ainda, discordava do
parágrafo único, pois seria contraditório haver uma inscrição ou transcrição essencial, e, ao mesmo tempo, não induzir
prova do domínio. O autor do projeto, em reunião em 29 de novembro de 1901, apresentou resposta, afirmando que a
ideia original era mesmo a de o registro ser prova cabal e não mera presunção do domínio, o que foi rechaçado pela
comissão revisora, por se achar que o país não estava preparado para esta reforma. Na reunião de 02 de dezembro
acrescentou que o Código seria a ocasião propícia de se introduzir, se não o Sistema Germânico em sua plenitude (o
qual dependia da elaboração de um cadastro), ao menos o que este tivesse de essencial e de aplicável sem o cadastro.
Enfim, por proposta do senador Luiz Domingues foi suprimido o parágrafo, vingando o sistema primitivo que, no artigo
859, consagraria a força probante dos livros de registro, tal como no Código Civil Alemão76.

Contudo, um parecer de Sylvio Romero dava conta que havia na comissão e entre os juristas pátrios da época três
posições: os que acreditavam dispensável a inscrição das transmissões de imóveis; os que a tinham como necessária
tão somente à publicidade; e os que a proclamavam prova irrecusável de domínio. A primeira corrente não chegou a
prosperar; a segunda era a proposta pelos revisores do projeto; e a terceira a que constava do projeto primitivo e que
permaneceu com o abandono do parágrafo único. Com isso, a inscrição seria uma tradição mais cercada de cautelas,
mais solene, à qual, não obstante, dever-se-iam aplicar os mesmos princípios77.

Em 26 de fevereiro de 1902, a Câmara homologou o trabalho da comissão, e o projeto foi remetido ao Senado. O
senador Azevedo Marques apresentou parecer, afirmando que a inscrição era indispensável à transmissão da
propriedade começada pela escritura, mesmo entre as partes contratantes. Contudo, não tinha o condão de sanar
nulidades do título aquisitivo. Para o senador Andrade Figueira, esta depuração de nulidades nunca passou pelo espírito
de nenhum jurisconsulto. Respondendo, Clóvis Beviláqua afirmou que nunca se pretendeu dar à inscrição esta eficácia
depuradora. A intenção era apenas fazer da inscrição a tradição solene dos imóveis; e, como toda tradição, não
transmitiria direitos que o alienante não possuísse. Por fim, por emenda do senador Rui Barbosa, mudou-se o termo
“inscrição” para “transcrição”, ficando a primeira designação reservada às hipotecas78.

Assim, afirmava Lysippo Garcia que o Código Civil de 1916 tinha atentado para o problema que afligia todos os
países calcados no Sistema Francês, reconhecidamente mais imperfeito79. Ora, o que definia o Sistema Germânico era
a força probante dos livros, com inscrições tidas por verdadeiras até prova em contrário; a legalidade, ou seja, o
encarregado do registro deveria examinar os títulos apresentados, podendo recusá-los se não fossem exatos; e a
publicidade, ou seja, o registro consistia em base segura de conhecimento e de fácil demonstração do estado da
propriedade imóvel. E nesse sentido trabalhou o autor do Código de 1916, o que se percebia especialmente pela
retirada do parágrafo único do artigo 530, a qual expelia do Código o Sistema Francês80.

Ainda, o Sistema Germânico não seria incompatível com o caráter de tradição solene dado à inscrição, pois o que o
definia, como se disse, era a força probante dos livros calcada na legalidade, e não a depuração da propriedade. Da
força probante resultaria uma consequência muito importante: a anulação da inscrição do título pelo qual o alienante
adquiriu o bem não atingiria o direito de terceiros adquirentes de boa-fé, que contrataram a título oneroso. Assim, em tal
sistema ficariam expostos os contratantes, quem adquiriu de proprietário não inscrito, e os terceiros de má-fé, ou que
adquiriram o imóvel a título gratuito; e ficariam protegidos os terceiros adquirentes de boa-fé, que contrataram a título
oneroso. O Sistema Francês quase condicionava a propriedade à probatio diabolica dos glosadores, ensejando a
necessidade de investigação da genealogia da propriedade. Mesmo a prescrição – remédio do sistema – trazia os
problemas de saber se a posse era de boa-fé, e se teria sido interrompida ou suspensa. Não se poderia admitir tamanha
insegurança, gerada por uma propriedade vacilante que colocava o interesse de um à frente do interesse de toda a
sociedade. Por isso, o Código de 1916 teria acolhido o sistema da força probante, calcado na legalidade da inscrição e
na presunção relativa de propriedade81.
A mesma posição era defendida por Clóvis Beviláqua. Segundo ele, no Código Civil a transcrição era modo de
adquirir, e não apenas meio permanente de publicidade. Era a criação de direito real pelo ato do registro. Por isso, o
Código adotara o Sistema Germânico, adequando-os às condições do país. Esta adequação, contudo, não prejudicava o
maior mérito do sistema, que era a força probante do registro. Eram princípios fundamentais do Sistema Alemão a
publicidade; a força probante, fundada na fé pública do registro, presumindo-se a titularidade do direito por aquele em
nome de quem se inscreveu ou transcreveu, presunção esta que poderia ser afastada pela anulação do registro; e a
legalidade, consistente na atribuição do encarregado dos registros de opor dúvidas e fazer exigências para assegurar a
legalidade dos títulos apresentados. Os três princípios estavam no Código de 1916, e, portanto, este teria se filiado ao
Sistema Germânico82.

Arnoldo Medeiros da Fonseca também acompanhou a corrente que defendia a incorporação do Sistema Germânico
no Código Civil de 1916. Para ele, a interpretação não podia reduzir-se a pura arte dialética, mas deveria levar em conta
as necessidades práticas da vida em sociedade. Assim, ao ler o dispositivo que afirmava se presumir pertencer o direito
real àquele que estava inscrito como titular – em oposição ao sistema anterior, pelo qual a transcrição não induzia prova
de domínio – deveria o intérprete entender que o Código adotara a força probante dos livros de registro, de forma a não
prejudicar os terceiros adquirentes de boa-fé que confiaram nas informações prestadas pelo registro. Esta interpretação
também se deveria obter levando-se em conta o elemento sistemático, de defesa da boa-fé, presente no Código como
um todo. Isto se observava, por exemplo, na disciplina da ação pauliana, do pagamento indevido, da alienação pelo
herdeiro aparente etc. Assim, entre as partes contratantes, contra terceiro adquirente de má-fé ou terceiro adquirente a
título gratuito, aplicar-se-ia a regra de que ninguém poderia transferir mais direitos do que possuísse. Contudo, uma vez
surgidos direitos de terceiros adquirentes de boa-fé a título oneroso, vigorava plenamente a presunção do artigo 859 do
Código. Contra estes, nem mesmo a usucapião surtiria efeitos; no entanto, o instituto era mantido no Código, pois
aplicar-se-ia em relação aos próprios contratantes, nas aquisições a título gratuito, ou em situações de alienação em que
o título anterior não houvesse sido transcrito, não gerando o benefício da fé pública ao adquirente83. O autor
colacionava, ainda numerosos acórdãos de tribunais brasileiros reconhecendo a impossibilidade da reivindicação contra
o terceiro adquirente de boa-fé84.

Serpa Lopes85 também endossou a posição de Lysippo Garcia, acatando a tese da força probante dos livros de
registro como critério distintivo dos sistemas de publicidade. Em primeiro lugar, haveria, de fato, no Sistema Germânico,
uma sincronia entre o direito formal e o direito material. Contudo, não havia um real vínculo de necessidade entre os
efeitos materiais da publicidade e a existência de um cadastro, nem entre referidos efeitos e a adoção de um sistema de
base real. Seria exagerada a ideia de que qualquer sistema de publicidade não baseado no cadastro, sujeito a uma
constante necessidade de sincronia entre o estado jurídico e o estado geodésico dos imóveis, estivesse fadado ao
insucesso.

A função do cadastro era fixar o conteúdo, os limites e a situação do imóvel; a do livro imobiliário, fixar o direito de
propriedade e suas modificações. A falta de cadastro não seria óbice à prova absoluta ministrada pela transcrição. Em
primeiro lugar, os limites e característicos do imóvel sempre foram requisitos do registro de imóveis brasileiro, cuja falta a
jurisprudência fazia ensejar a nulidade da inscrição. Havia, portanto, um cadastramento – ainda que indireto – da
propriedade que a individualizava, fosse ela urbana, fosse rural. Por outro lado, ainda que com base real, o livro
imobiliário era complementado por um repertório de nomes dos titulares, permitindo facilmente saber quais imóveis
pertenciam a uma dada pessoa. E no sistema de base pessoal havia, seguindo a mesma ideia, um repertório de imóveis
objeto das transcrições e inscrições realizadas naquele livro imobiliário86.

O direito material esperava do direito formal elementos de certeza e visibilidade para prova do domínio. Assim,
mesmo na Alemanha adotava-se a base pessoal nas regiões de grande fracionamento da propriedade, como
Wurtenberg, Hesse e o Palatinado Bávaro. Portanto, a visibilidade do direito se assegurava tanto no sistema de base
pessoal quanto no sistema de base real. Em segundo lugar, a abstração ou a causalidade do contrato que originava a
inscrição não eram requisitos essenciais do sistema, uma vez que o Sistema Alemão baseava-se na abstração do
registro em relação ao título aquisitivo, ao passo que o sistema suíço era causal – e, no entanto, ambos pertencem à
família do Sistema Germânico de publicidade imobiliária, e em ambos vigorava a fé pública registral. Em terceiro lugar, o
princípio da continuidade, longe de afastar os efeitos a força probatória dos livros de registro, os auxiliava, por gerar
precisão e visibilidade do domínio. Em quarto lugar, a existência da “dúvida” dava ao encarregado do registro
prerrogativas semelhantes às que tinha o encarregado do Sistema Germânico, afirmando o princípio da legalidade. Em
quinto lugar, a responsabilidade do Estado pelas faltas ocorridas quando da transcrição – apontada como requisito do
Sistema Germânico – seria matéria dissociada da eficácia probatória dos livros de registro; e, ainda, dever-se-ia dizer
que talvez os oficiais fossem melhores fiadores de seus atos do que o próprio estado, cuja responsabilidade por seus
atos era matéria polêmica, não estando totalmente afastada87.

Serpa Lopes acrescentava que a objeção de direito material à adoção do Sistema Germânico – a qual afirmava que o
parágrafo 891 do Código Civil Alemão, reproduzido no artigo 859 do Código Civil Brasileiro de 1916, conteria uma
presunção meramente processual – não poderia estagnar o direito brasileiro no Sistema Francês. Dar ao artigo 859 uma
função puramente processual seria criar um corpo estranho no organismo jurídico, gerando um sistema que não
participa nem do “esplendoroso” Sistema Germânico, nem do “bisonho” Sistema Francês. A função processual do
parágrafo 891 do Código Civil Alemão direcionar-se-ia à fé pública. Haveria uma presunção de direito, e uma proteção
processual que equivaleria a uma faculdade material de conduzir-se temporariamente como titular do bem imóvel. No
direito brasileiro, considerar que o artigo 859 repeliria a fé pública seria eivar o dispositivo de inutilidade. Se a transcrição
não provava o domínio, não agregava qualquer proteção. A presunção já resultaria do título causal, da escritura em si, e
a transcrição seria mero veículo de publicidade. Tivesse o artigo 859 esse papel puramente processual, nem a este tipo
de defesa se prestaria, na hipótese, por exemplo, de estarem presentes na lide dois títulos transcritos em nomes de
proprietários diferentes88.
Além do mais, não se poderia aceitar que o texto do artigo 859 tivesse implícita a ressalva do direito anterior, tendo
em vista as reiteradas afirmações de seu autor em sentido contrário. Na verdade, havia uma efetiva intenção de se ter
no dispositivo uma presunção absoluta de domínio. A omissão da reprodução de outros dispositivos do Código Civil
Alemão, que complementassem o artigo 859, não poderia ensejar conclusões opostas à intenção do artigo, deslocando-
o totalmente de sua função. Ainda, uma vez que o Código Civil Brasileiro afirmava a aquisição da propriedade pela
transcrição, não se poderia dar a esta o regime do direito anterior, de mero veículo de publicidade e oponibilidade a
terceiros. Não se poderia admitir que a usucapião e a acessão fossem modos absolutos de aquisição de propriedade, e
a transcrição não89.

Outro argumento em favor da força probatória da transcrição seria a prevalência do direito do terceiro adquirente de
imóvel recebido indevidamente pelo alienante em virtude de pagamento indevido, o que, em si, já ensejaria uma
aplicação analógica, transpondo-se os efeitos do artigo que trata do pagamento indevido para todos os terceiros
adquirentes de boa-fé. Esta analogia – a qual geraria estabilidade na circulação de riqueza – não se prestaria a suprir
uma lacuna, mas sim a completar um sistema já firmado no artigo 85990.

Por fim, seriam argumentos, também, em favor da tese da adoção do Sistema Germânico a ação pauliana contra
terceiros de má-fé, e a preservação dos direitos do adquirente de bem alienado por herdeiro aparente, nas quais
prevalece a boa-fé. A interpretação nesse sentido se inseria numa tendência do chamado “fenômeno da legitimação”,
que se dava no âmbito dos móveis e dos imóveis. Com este, ruiu a distinção entre os bens quanto à circulação e
aquisição a non domino, em favor do terceiro de boa-fé. Como ponto central, tinha-se a doutrina da crença, da
confiança, baseada na aparência. Ligava-se com a publicidade numa relação de causa e efeito, tendo a publicidade o
papel de gerar esta aparência, a qual geraria expectativas e segurança do direito. Todo o movimento pela força
probatória dos livros de registro calcava-se na segurança, na precisão na circulação dos imóveis, e na crença que tem a
coletividade na situação jurídica aparente. Serpa Lopes ainda reunia alguns julgados, tratando do problema em vários
sentidos. A partir da análise destes concluiu que, para a jurisprudência, o sistema era híbrido, nem francês, nem
germânico: a transcrição seria uma primeira linha de defesa processual, somente, o que, para o autor, significava grave
recuo91.

A outra corrente – defendendo que o Código Civil de 1916 não implantou no Brasil o Sistema Germânico – teve sua
defesa definitiva em trabalho da lavra de Soriano Neto, catedrático de direito civil da Faculdade de Direito do Recife.
Para ele, em primeiro lugar, o parágrafo 891 do Código Civil Alemão – vertido para o artigo 859 do Código Civil Brasileiro
– representaria presunção processual, somente, não servindo de base à fé pública. Segundo ele, a unanimidade dos
juristas alemães afirmava que a fé pública não estava no parágrafo 891 do Código Civil Alemão, mas no parágrafo 892,
o qual prescreve: “§ 892: Reputa-se exato o teor do registro fundiário a favor daquele que adquire, por ato jurídico, um
direito sobre um imóvel ou um direito sobre um tal direito, a menos que não esteja inscrita uma contradita contra a
exatidão ou não seja conhecida do adquirente a inexatidão.” Assim, como se disse, o parágrafo 891 geraria apenas
presunção iuris tantum de verdade do registro, regulando o ônus da prova. Poderia aquele cujo nome constava do
registro propor ações reais sem necessidade de provar a exatidão da inscrição, legitimado pela aparência de legalidade.
Porém, poderia qualquer interessado afastar esta presunção, provando a inexistência do direito aparente92.

A seguir, o autor apresentava uma plêiade de autores alemães que defenderiam esta ideia, como Wolff, Dernburg,
Biermann, Gierke, Strecker, Heymann, Heck, Staudinger, Heilfron e Pick, e Endemann93.

Em segundo lugar, seria impensável, do ponto de vista do sistema de publicidade como um todo, transplantar para o
Direito Brasileiro da época ou para o Direito Francês a regra da fé pública registral. A fé pública registral seria inerente
ao registro fundiário, ou seja, um sistema baseado em matrículas individualizadas de todos os imóveis da circunscrição,
cadastro atualizado com elementos de agrimensura e cartografia, e legalidade no exame dos títulos94.

Porém, na legislação vigente no Brasil as transcrições eram feitas em ordem cronológica, sem atender a qualquer
das regras do direito formal germânico. Os livros fundiários alemães forneciam a base de segurança do sistema,
refletindo todas as mutações no estado jurídico do bem, e assegurando uma grande coincidência entre a realidade e seu
conteúdo. Era, portanto, a fé pública subordinada e dependente do direito formal do Sistema Germânico95.

Um terceiro argumento de Soriano Neto baseava-se no risco à segurança jurídica gerada pela fé pública. Se, por um
lado, gerava segurança para o tráfego jurídico, por outro poderia fazer com que um proprietário perdesse seu bem sem
culpa e sem direito a indenização. Isto seria ainda mais agravado, à época, por não haver no Brasil responsabilidade do
Estado por danos causados por dolo ou culpa de tabeliães e oficiais de registro no exercício da função96.

A deficiência no direito formal aumentaria os riscos de dano aos titulares de direitos, sacrificando-se a segurança
jurídica no altar da segurança do tráfego. Com isso, ter-se-ia tão somente um deslocamento do problema: dos terceiros
adquirentes de boa-fé, a insegurança passaria a ser dos proprietários97.

Finalmente, não havia no Sistema Brasileiro a abstração do Sistema Alemão: a transcrição do direito brasileiro era
causal, depende do título que lhe dava origem. Assim, tal como no direito anterior, a transcrição na vigência do Código
Civil de 1916 era, ainda uma tradição solene do imóvel98.

Em suma, para Soriano Neto, não havia fé pública no direito brasileiro; a transcrição do direito brasileiro era causal; e
houve no Código Civil de 1916 simples reforço da transcrição por ser ela constitutiva na transmissão do direito.

Essa ideia de simples reforço também foi defendida por Virgílio Sá Pereira, segundo o qual não era o pensamento de
Clóvis Beviláqua fazer mudanças radicais. Houve uma mudança – a transcrição deixou de ser meio de publicidade, para
passar a ser modo de aquisição de propriedade. No entanto, não foi instituída no Brasil a depuração do direito de
propriedade operada pela inscrição do título, própria do Sistema Germânico, por falta do cadastro e seus outros
requisitos formais. Transcrição e tradição fundiram-se. E, respeitados os princípios da tradição, de que ninguém
transmite mais direitos do que possui, retira-se tudo o que possa haver de germânico99.

Outro professor de Recife, Joaquim Guedes Correia Gondim Filho, também afirmou ter sido mantida no Código a
tradição causal do direito romano: o direito não se transferia sem a transcrição, mas, uma vez transcrito, os efeitos eram
gerados pelo próprio ato, e não pela transcrição. Assim, concluiu que, sem seguir qualquer orientação definida, não
houve aumento ou diminuição na segurança do comércio pelo advento do Código Civil de 1916100.

Fernando Euler Bueno, em monografia sobre o problema, criticou Lysippo Garcia e seus seguidores, afirmando que
uma das bases de sua argumentação – as discussões travadas na elaboração do Código – não deveria ser levada em
conta, pois devia o intérprete sempre buscar a vontade da própria lei, e não do legislador concreto. Porém, ainda que se
levasse em conta, os argumentos extraídos da discussão eram fracos. Em primeiro lugar, Clóvis Beviláqua estaria
impressionado pelas críticas contundentes feitas ao sistema de publicidade francês, o que o teria feito sentir-se
compelido a tentar mudar o regime no Direito Brasileiro. Contudo, ao importar somente o artigo do Código Civil Alemão
que tratava da presunção em favor do inscrito, acabou por efetivamente não mudá-lo. Em segundo lugar, a simples
exclusão do parágrafo único do artigo 605 – que afirmava que a inscrição não induz prova de domínio, que fica a salvo a
quem de direito – não poderia levar à conclusão de que, com isso, adotara-se o Sistema Germânico. Seria uma
conclusão excessiva extraída a partir de um não dizer. Ainda, afirmava que Clóvis Beviláqua, quanto a esse objeto,
abrira um parêntese na excelência inigualável de suas teses, claudicando, e proferindo em cada momento, uma posição,
restando estas, ao final inconciliáveis entre si. Por outro lado, o autor tinha reservas com a extensão demasiada da
proteção da boa-fé – isto poderia gerar a espoliação de um direito de alguém que nem mesmo podia manifestar sua
vontade, nem contribuiu para a ocorrência: o proprietário do bem. Tal regra, pelas consequências, deveria vir em texto
legal expresso, e não ser inferida a partir de uma leitura sistemática do código. Ainda, o autor apresentou três outros
argumentos oriundos de interpretação sistemática, contra a implantação do Sistema Alemão: I) a existência no Código
do usucapião ordinário, dependente de justo título e boa-fé, seria inútil, pois a força probante dos livros – purgando o
domínio – dispensaria o requisito do tempo para a aquisição da propriedade por aquele que a recebeu de quem não era
dono, ou não podia alienar; II) a circunstância de somente os adquirentes de boa-fé poderem demandar pela evicção,
pois, com a adoção do Sistema Germânico, o terceiro de boa-fé já estaria abrigado contra a reivindicação, e, portanto, a
evicção perderia sua utilidade; e III) a manutenção no Código de Processo Civil de 1939 do registro Torrens, o qual seria
inútil em um sistema que já garantisse a purgação do domínio pela transcrição101.

Philadelpho Azevedo – autor do decreto regulamentador dos registros públicos de 1928 – reconheceu a erudição, o
brilhantismo, e o conhecimento da cultura alemã de José Soriano Neto. No entanto, propôs-se, em defesa da corrente
de Lysippo Garcia, a “procurar atenuar o golpe e de sustentar a absoluta conveniência, senão necessidade, de se
reforçar aquela corrente, em benefício dos interesses nacionais, sejam quais forem as falhas de origem, verificadas no
exame teórico do problema”102. Então, reconheceu que, de fato, na Alemanha a inscrição era abstrata, sendo
independente do título causal obrigacional; que a marca do sistema era a proteção de terceiros pela força probante do
registro, e não um presunção absoluta e erga omnes da exatidão do registro; e que, no Código Civil Alemão, esta força
probante estava no parágrafo 892, não reproduzido no Código Civil Brasileiro. No entanto, ao invés de reconhecer que
estas falhas retiravam o Brasil da família germânica de publicidade imobiliária, fez exatamente o contrário: propôs que se
deveria extrair do artigo 859 do Código Civil toda a eficácia que este pudesse oferecer. A força probante, segundo ele,
tinha de prevalecer no Brasil, em benefício da segurança das transações e do crédito, não obstante as falhas de origem.
O próprio Sistema Alemão não era perfeito – por exemplo, a existência de um negócio no contrato de compra e venda, e
outro no ato de transmissão, o que seria um excesso da técnica, distante da realidade; o enorme desprezo pela posse; a
possibilidade de ausência de indenização se o encarregado do registro praticasse o erro sem culpa, pela impossibilidade
de perceber uma falsificação sofisticada; e a ocorrência ocasional de o mesmo imóvel figurar em mais de uma folha de
registro, com proprietários diferentes. Isso não fazia com que o Sistema Alemão deixasse de ser o melhor, mas mostrava
que o ideal seria inatingível em qualquer lugar, e que, portanto, os eventuais riscos não poderiam impedir o
desenvolvimento do sistema também no direito brasileiro103.

O Sistema Brasileiro não seria totalmente baseado no francês, pois sempre existira nos ofícios de registro,
juntamente com o índice pessoal, um índice baseado nos próprios imóveis. Assim, não seria tão diferente do Sistema
Germânico; e algumas mudanças nos modelos dos livros utilizados os tornariam ainda mais próximos. Quanto ao
cadastro, a realização deste seria impossível a curto prazo, e dependeria de levantamentos cartográficos e geodésicos.
Mas isto não tornaria o sistema de força probante dos livros impossível no Brasil. Em primeiro lugar, a identificação de
imóveis urbanos era fácil, o que muito contribuiria para a regularização dos títulos. E mesmo quanto aos imóveis rurais,
muitos deles já estavam perfeitamente individualizados e identificados, especialmente os mais valiosos, pois o interesse
econômico seria acompanhado de cautelas e garantias104.

Também seria conveniente ao Sistema Germânico o princípio da continuidade do registro, introduzido no Brasil no
Decreto 18.542, de 1928. Após ampla discussão, concluiu que este decreto não inovou no direito, mas apenas tornou
claro um princípio que já existia no sistema105.

Quanto à usucapião, esta existiria – tal como na Alemanha – para remediar as eventuais falha no sistema, como a
duplicidade de inscrições do mesmo imóvel. Por exemplo, na Alemanha ter-se-ia o chamado usucapião tabular, pelo
qual quem possuísse, fundado em registro, por 3 anos, não poderia ter sua propriedade questionada nem mesmo pelo
alienante106. Quanto ao Sistema Torrens, este seria inviável – em especial nas propriedades de pequeno valor – sem a
criação e manutenção de um fundo público de custeio. Por exemplo, na Tunísia a modalidade fora suprimida, também
por sua inviabilidade. E, por isso, a solução para o Brasil deveria, mesmo, ser buscada no sucessor do velho registro
hipotecário, que deveria ser aperfeiçoado, especialmente pela adoção da força probatória dos livros de registro107.
Era a opinião também do registrador Francisco Bertino de Almeida Prado, para quem o Código Civil de 1916 adotara
os princípios mais importantes do Sistema Germânico, ou seja, a publicidade absoluta – a necessidade de registro para
transmissão da propriedade ou para sua disponibilidade em hipóteses de aquisição causa mortis, por exemplo; o
princípio da prova, pelo qual o titular indicado no registro era presumidamente o proprietário, salvo prova em contrário,
valendo os direitos adquiridos de boa-fé até a data da impugnação; e o princípio da legalidade, que dava ao oficial
atribuição para recusar o título se este não se adequasse às exigências legais108.

Pontes de Miranda apresentou sua opinião em seu Tratado. Não levou em conta as discussões travadas na doutrina
brasileira, e, com base em argumentos inusitados, sustentou que a fé pública do registro protegeria até mesmo o terceiro
adquirente de má-fé.

Segundo o autor, em primeiro lugar o registro não teria nada a ver com a tradição ou com a posse. Era meio de
publicidade, traduzindo em livros situações jurídicas externas. A fé pública do registro daria validade às transmissões
posteriores, bem como geraria a nulidade das transmissões contrárias àquilo que estivesse registrado109. No Código Civil
e legislação posterior de direito material estaria o direito material do registro, abrangendo modificação dos direitos,
pretensões, ações e exceções com efeito real; já nas leis sobre registro estaria o direito formal do registro, com regras
sobre competência dos oficiais, pedido e procedimento de registro, regras sobre o fornecimento de certidões etc.110.

O Código Civil apresentaria uma presunção, que seria menos do que fé pública: a presunção não protegeria o
terceiro, como a fé pública fazia. Seria passível de eliminação pelo cancelamento do registro, ao passo que, havendo fé
pública, os direitos adquiridos antes do cancelamento seriam preservados. Não havia tal presunção no Decreto 169-A,
de 1890, nem na legislação anterior. Nestes, a transcrição não induzia prova do domínio. A presunção do Código Civil
nada teria com a fé pública, e sua relevância seria quase que exclusivamente processual111.

Contudo, não obstante o art. 859 contenha presunção somente, a fé pública dos registros derivaria do próprio ofício
do registro. Todo ofício de registro teria, por definição, fé pública. A aquisição pela transcrição seria amparada pela fé
pública do registro, somente não valendo se pleiteada a declaração de sua inexatidão. Esta fé pública não alcançaria o
negócio das partes, pois se destinaria a proteger o tráfico imobiliário, os terceiros adquirentes112. Assim, o registro
imobiliário no direito brasileiro não seria simples meio de publicidade. Mais do que isso, seria meio de aquisição da
propriedade. Por isso, os terceiros de boa-fé adquiririam pelo registro ainda que o alienante não fosse dono. Insista-se,
para o autor era absolutamente necessário que um registro constitutivo fosse dotado de fé pública. Portanto, a aquisição
independia até mesmo da boa-fé – pelo registro, adquirentes de boa e má-fé adquiririam, pois a fé pública viria do
registro, e não da boa ou má-fé do adquirente. O terceiro adquirente de má-fé poderia ser responsabilizado de forma
pessoal, mas ainda assim adquiriria o bem, se baseado estava na fé pública113.

Ambas as correntes apresentaram bons argumentos. Por um lado, os defensores do Sistema Germânico viam no
Código Civil uma oportunidade de implantá-lo no Brasil, com uma argumentação minimamente consistente. Mas, por
outro, após o trabalho de José Soriano Neto, de um ponto de vista estritamente jurídico-normativo fica mais ou menos
claro que esta corrente se baseia mais em um wishful thinking do que em bases jurídicas sólidas.

E, apesar dos esforços em defesa da implantação do Sistema Germânico, ao final prevaleceu com unanimidade a
ideia de que o artigo 859 apenas gerava uma presunção relativa, equivalente ao princípio alemão da legitimação, com o
que os terceiros adquirentes de boa-fé não estavam protegidos contra a evicção. Esta prevalência se percebe nos
próprios manuais de direito civil, como no de Silvio Rodrigues114, Washington de Barros Monteiro115 e no de Caio Mário
da Silva Pereira116.

Entretanto, apesar da não implantação no Brasil do Sistema Germânico, não se pode dizer que o advento do Código
Civil de 1916 foi despido de mudanças no aspecto material da publicidade imobiliária. Apesar de não haver o princípio
da força probante dos livros, ou da fé pública registral, o Código declarou a transcrição constitutiva, pondo fim ao dúbio
regime do direito pré-codificado, o qual, como se viu, foi objeto de bastante discussão pela doutrina.

Ainda, o Código Civil de 1916 determinou, no artigo 532, o registro também das aquisições causa mortis ou a título
judicial, para sua disponibilidade, e, mais importante de tudo, estabeleceu o princípio da legitimação: a presunção
relativa de que aquilo que está no registro vale, até que o registro venha a ser cancelado. Por essa razão, tem-se aqui o
Código Civil de 1916 como um marco relevante na linha da história da publicidade imobiliária no direito brasileiro em seu
aspecto material.

Um último ponto de interesse diz respeito aos elementos que compõem a mutação real no Sistema Brasileiro de
Registro de Imóveis. Observe-se que estas observações, não obstante digam respeito a um debate que se iniciou na
vigência do Código Civil de 1916, são válidas também para o período da vigência do Código Civil de 2002.

A grande maioria dos autores que consideraram o registro constitutivo, como se viu, o compreendiam como a própria
tradição do bem. O registro seria modo de aquisição porque a antiga tradição havia assumido a sua forma. Contudo, isto
não é pacífico, e houve notáveis entendimentos em sentido diverso na doutrina civilista do Século XX.

Como expunha Pontes de Miranda, quem vende não consente, só por isso, na transmissão. Com a venda, obrigou-
se a cumprir uma obrigação; mas ainda não a cumpriu. O cumprimento da obrigação se dá pelo acordo de transmissão,
que, não obstante possa ser apresentado concomitante à venda na escritura, tecnicamente não se confunde com ela.
Assim, quando a escritura menciona que “e, recebido o preço, disseram que desde já transferem o domínio, direito, ação
e posse...”, têm-se, em sequência, um acordo de transmissão da propriedade e um acordo de transmissão da posse,
que, novamente, não se confundem com a compra e venda117.
O acordo de transmissão também não se confunde com o registro, e, na verdade, há ainda um terceiro elemento, o
consentimento para o registro, que, salvo ressalva, está implícito no acordo de transmissão. O acordo de transmissão é
negócio jurídico cujo conteúdo é precisamente a vontade de se modificar o direito: transmitir a propriedade. Já o
consentimento para o registro é a outorga de um poder para que se solicite ao registrador a prática do registro. O ato de
registro, por fim, é “ato jurídico estatal”, ou seja, ato administrativo118.

Observe-se, por fim, que para Pontes de Miranda o acordo de transmissão era abstrato, ou seja, a nulidade do
negócio jurídico causal, de natureza obrigacional, nenhum efeito projetaria nele119.

Objetando a isso, Clóvis do Couto e Silva afirmava que o Código Civil Brasileiro havia adotado um sistema de
separação relativa – e não absoluta – entre os planos obrigacional e real. Assim, em princípio, a vontade de adimplir, ou
seja, de transmitir, pode ser considerada codeclarada no negócio jurídico obrigacional antecedente. Todavia, se, no
plano psicológico, estas vontades possam ser inseparáveis, no plano jurídico dão origem a negócios jurídicos distintos,
um obrigacional, e outro de direito das coisas, destinado ao adimplemento. Isto não se confunde com os pré-contratos:
na promessa de venda e compra, por exemplo, o objeto é realizar a compra e venda, ou seja, uma obrigação de fazer. A
compra e venda é que terá por objeto a obrigação de dar, e que, por conseguinte, será cumprida por um negócio jurídico
de disposição120.

A admissão da abstração implicaria a aceitação de uma separação absoluta entre os planos obrigacional e real em
um sistema que, tradicionalmente, e no entendimento da grande maioria da doutrina e jurisprudência, sempre foi
causal121.

É perfeitamente adequado – mesmo ao sistema do Código Civil de 2002 – o pensamento de Clóvis do Couto e Silva.
Em que pese não haver no Brasil abstração, é inegável que a mutação real contempla não apenas o negócio
obrigacional – já que o sistema é causal – como também o real, antes da realização do registro.

Eventuais invalidades do negócio jurídico obrigacional, que funciona como etapa anterior à disposição, e serve como
sua causa, contaminam o negócio jurídico de disposição. No mesmo sentido, mas segundo outra perspectiva, a
atribuição patrimonial gerada pelo negócio de disposição necessariamente deve ser justificada122.

O registro, como bem disse Pontes de Miranda, é ato administrativo praticado pelo registrador; e não ato das partes.
Seria uma visão demasiadamente privatística considerar que os autores do registro são as partes, cabendo ao
registrador tão somente receber sua vontade, o que seria o caso se o registro fosse considerado apenas uma tradição
solene.

Sendo o registro constitutivo, como é entre nós, deverá integrar o processo transmissivo de outra maneira.

Assim, a vontade das partes de transmitir é manifestada no acordo de transmissão, e não no registro; e o registro
significa, novamente, um ato de soberania do Estado que o registrador, como agente público, pratica, ao qualificar
positivamente o título que lhe foi apresentado. Os dois momentos integram o modo de aquisição.

A admissão dessa separação relativa explica, na verdade, a possibilidade da venda de imóvel futuro, já que ainda se
está no plano meramente obrigacional; e a impossibilidade do acordo de transmissão desse imóvel, condicionado à
efetiva possibilidade de transmissão da propriedade. No mesmo sentido, a possibilidade de se estipular obrigações
alternativas, ou de dar coisa incerta, em vendas imobiliárias: novamente, as restrições atingiriam o negócio de
transmissão, mas não a compra e venda.

Ainda, coloca em seu devido lugar o numerus clausus dos direitos reais, que não se aplica aos negócios causais: a
compra e venda pode ser da propriedade ou do usufruto123, já que a transmissão ou a instituição do direito real limitado
dependerá da etapa seguinte, o negócio de disposição.

Muitos outros institutos se tornam mais operativos com a adoção sistemática da distinção, e a isso se voltará em
outro momento.

4.3.5. O período compreendido entre o Código Civil de 2002 e a Lei 13.097, de 2015

Tomando-se como premissa o acerto da corrente predominante, o Código Civil de 2002 não inovou em relação ao
Código Civil de 1916 quanto à existência ou não no Direito Civil Brasileiro da Fé Pública Registral.

Contudo, é válida a referência, uma vez que, de forma expressa, o novo Código pôs fim à vexata quaestio que se
desenvolveu ao longo da primeira década do século XX.

O parágrafo único do artigo 1247 prescreve que “Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel,
independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente.”.

Ou seja, o dispositivo claramente contém a fattispecie que em geral condiciona o funcionamento da fé pública
registral: a aquisição por terceiro de boa-fé. A seguir, prescreve que este adquirente não está protegido da evicção nas
situações em que um proprietário não inscrito obtém o cancelamento de um registro, e reivindica o bem.

Com isso, toma posição no clássico conflito entre o proprietário de algum modo espoliado pelo registro e o terceiro
adquirente de boa-fé, que, como já visto na introdução, foi sintetizado por Victor Ehrenberg como um conflito entre a
segurança do direito e a segurança do tráfego. Havendo este conflito, o dispositivo assume a defesa do proprietário, em
prejuízo do terceiro de boa-fé.
Deve-se observar, contudo, que, se por um lado, é amplamente majoritário o entendimento de que o sistema do
Código Civil de 2002 não contemplava os efeitos materiais do registro, ele, entretanto, não é unânime. Para Leonardo
Brandelli, a tutela do terceiro adquirente de boa-fé não é uma decorrência da publicidade registral, mas da tutela da
aparência jurídica. Segundo ele, mesmo no Direito Alemão, ainda que não houvesse no BGB o § 892, que trata da fé
pública registral, estariam protegidos aqueles que confiam na informação registral em virtude, exatamente, da proteção
da aparência. O Direito Brasileiro também contempla o princípio da proteção da aparência, que se manifesta, por
exemplo, no que diz respeito ao herdeiro aparente (Código Civil, artigo 1.827), do casamento aparente (Código Civil,
artigo 1.563), e do credor aparente (Código Civil, artigo 309). O fato de ser o registro em regra constitutivo no Direito
Brasileiro, a existência de uma qualificação jurídica rigorosa fundada no princípio a legalidade, a natureza de agente
público do registrador, e outras circunstâncias, fazem com que o público tenha uma confiança legítima naquilo que
consta do registro. Assim, em que pese o registro não ter um efeito saneador – os eventuais vícios que tornem em rigor
falso algum dado que conste do registro, mas não é disso que se trata – terceiros serão protegidos pela aparência de
regularidade, com o que no Brasil, para Brandelli, efetivamente vigora a fé pública registral124.

Ainda, houve no Código Civil de 2002 um pequeno reforço da eficácia do registro, pelo interessante dispositivo
constante do artigo 1.242, parágrafo único, que, salvo melhor juízo, tem sido mal compreendido pela doutrina brasileira.

Uma leitura apressada poderia sugerir que a modalidade de usucapião descrita nesse parágrafo tem, como
pressuposto fático, a posse por cinco anos, com justo título oneroso, boa-fé e moradia ou investimentos de quem obteve
o registro no Registro de Imóveis, e, por alguma razão, não adquiriu. Ou seja, ter-se-ia, aqui uma usucapião tabular.

Todavia, o parágrafo, quando compreendido como uma unidade, não permite esta interpretação. O ponto central é a
compreensão do significado de “adquirido, onerosamente, com base no registro”. Ora, não se pode pretender que isto
signifique que o título tenha sido registrado. Se há necessidade de usucapião para a aquisição da propriedade, isto
significa que a aquisição não aconteceu com o registro. Compreender que “adquirido, onerosamente, com base no
registro” significa simplesmente que o título chegou a ser registrado, implicaria uma dupla aquisição, se o registro
transmitiu a propriedade; ou uma impossibilidade de usucapir, se não transmitiu (já que, neste caso, não se “adquiriu
com base no registro”).

Na verdade, “com base no registro” deve ser interpretado como “confiando no registro”, ou seja, a aquisição onerosa
teve como alienante aquele que figurava no registro como proprietário; e, por alguma razão, a propriedade não pôde ser
transmitida pela via derivada, donde a necessidade de recurso ao usucapião.

Tem-se, assim, uma situação na qual um terceiro adquirente a título oneroso e de boa-fé, se tiver a posse do bem
acompanhada de moradia ou investimentos, verá a consolidação do seu direito no prazo de vinte anos, o pondo a salvo
de eventuais defeitos na cadeia filiatória que, de alguma maneira, influíssem no direito do alienante que figurava como
proprietário do registro.

E, não obstante não se tenha aqui tecnicamente fé pública registral – já que pressupõe o exercício de posse e a
solução é data pelo usucapião, e não diretamente pelo registro – os efeitos serão os mesmos de uma fé pública registral
diferida, tal como se dava no Sistema Austríaco, em prestígio da confiança no registro.

4.3.6. As modificações trazidas pela Lei 13.097, de 2015

A Lei 13.097 foi promulgada no dia 19 de janeiro de 2015, e trouxe disposições importantes para a matéria do
registro de imóveis em seus artigos 53 a 62. No entanto, os dispositivos já estavam em vigor, e tiveram sua origem na
Medida Provisória 656, de 2014.

A exposição de motivos da Medida Provisória revela a intenção presente na criação dos dispositivos: “O Projeto de
Medida Provisória visa também adotar o princípio da concentração de dados nas matrículas dos imóveis, mantidas nos
Serviços de Registro de Imóveis”. Este princípio, defendido desde muito tempo por Décio Antonio Erpen e João Pedro
Lamana Paiva, significa que todos os atos ou fatos vinculados a um certo objeto devem ser publicitados por um mesmo
e único órgão125. Ainda, que a matrícula do imóvel no registro deve conter informações tão completas sobre a situação
jurídica do bem que se torne prescindível qualquer outra diligência com a finalidade de apurá-la. Segundo os autores,
“nenhum fato jurígeno ou ato jurídico que diga respeito à situação jurídica do imóvel ou às mutações subjetivas pode
ficar indiferente à inscrição na matrícula”126, abrangendo não apenas a transmissão da propriedade, ou a instituição de
direitos reais, mas também atos judiciais, restrições administrativas à propriedade, decretos de utilidade pública etc. Pelo
princípio, portanto, devem convergir ao registro de imóveis e nele estarem reunidas quaisquer informações relevantes do
imóvel, sejam elas jurídicas, ou, em alguns casos, até mesmo, fáticas127, donde o nome concentração.

Essa reunião de informações no registro foi justificada, ainda nos termos da exposição de motivos da Medida
Provisória, por razões econômicas, marcadamente a assimetria de informação. E isto é assim porque o legislador
considerava que as informações estavam dispersas em muitos órgãos distintos, fenômeno a que Ricardo Dip e Nancy
Andrighi denominaram “Dispersão Publicitária”128. A ideia de “assimetria de informações” (information assimetry) foi
desenvolvida por economistas norte-americanos na década de 70, e aparece, pela primeira vez, em um artigo de
GEORGE AKERLOF129. Este artigo tratava dos problemas criados para o mercado de veículos usados pelos “lemons”.
Lemon, segundo o autor, seria a maneira como, popularmente, era conhecido, na época, um carro ruim. O estudo de
Akerloff pretendia responder uma questão bastante concreta: por que um carro que acaba de sair da concessionária vale
consideravelmente menos do que aqueles que são vendidos diretamente por ela? Segundo o autor, a explicação
habitual seria a de que as pessoas aceitam pagar mais pela sensação de ter comprado um carro novo. No entanto,
segundo ele, haveria também uma outra explicação possível. E esta outra explicação levava em conta a existência dos
lemons. Assim, o autor propunha um modelo de mercado no qual existissem carros com apenas quatro qualidades:
novos, usados, bons e ruins, pelo que um carro poderia ser novo e bom; novo e ruim; usado e bom; ou usado e ruim.
Neste mercado, quando um carro novo fosse vendido pela concessionária, ninguém saberia ainda se aquele carro
específico seria bom ou ruim, já que ninguém ainda o utilizara. Então, todos os carros novos seriam vendidos pelo
mesmo preço. Lembre-se que dentre as quatro qualidades possíveis somente uma é conhecida por todos: a de se tratar
de um carro novo. Uma vez vendido o carro, o comprador do carro novo, ao usá-lo – por pouco que fosse – passaria a
ter mais informações sobre ele, tendo, então, mais chances de saber se comprou um carro bom ou um lemon. Se
resolvesse vendê-lo, no entanto, esta informação (a probabilidade de se tratar de um carro bom) seria absolutamente
desconhecida pelo comprador; e, com isso, também os carros usados – bons ou ruins – seriam vendidos pelo mesmo
preço, já que aos olhos do comprador o carro teria apenas uma qualidade: a de se tratar de um carro usado. Assim, o
carro usado necessariamente deve valer menos do que o novo.

Esse fato traz para o mercado de carros usados uma consequência grave: a possibilidade de se estar comprando um
carro usado ruim – ou seja, a incerteza sobre a qualidade do carro – acabará por eliminar, ou dificultar, a venda dos
carros usados bons.

Algumas dessas incertezas têm relevância jurídica. Segundo Fernando Mendez González130, a única maneira de se
obter uma diminuição destas incertezas que assegure proteção à propriedade e liquidez de suas alienações é a
realização de uma intervenção direta do Estado, de maneira normativa e institucional, como já se viu.

As inovações trazidas pelos artigos 53 a 62 da Lei 13.097, de 2015, contribuíram para a consagração, no Brasil, de
um verdadeiro sistema de registro de direitos, tendo como modificação mais relevante, um reforço da eficácia do registro
de imóveis.

Isso foi feito pelo emprego de dois mecanismos diferentes: a inoponibilidade e a fé pública registral. Por meio da
“concentração” necessária na matrícula dos fatos e atos jurídicos que atinjam imóveis, instituiu três modalidades de
proteção gerada pelo registro, as quais variam em requisitos e efeitos, conforme a situação da pessoa protegida.

A primeira modalidade de reforço de eficácia está presente no artigo 54 caput da lei, e consiste na proteção ao
adquirente, credor ou terceiros, independentemente de boa-fé, relativamente aos atos expressamente indicados no
dispositivo: negócios jurídicos em geral, que tenham por objeto constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre
imóveis, são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes nas situações constantes dos seus incisos I a IV, e
somente elas.

Assim, quem eventualmente venha a adquirir o bem, ou venha a recebê-lo em garantia, fica protegido contra ações
reais e pessoais reipersecutórias, constrições judiciais, execuções ajuizadas ou ações em geral em fase de cumprimento
de sentença, restrições administrativas ou convencionais ao gozo do direito registrado, ordens de indisponibilidade, ou
quaisquer outras ações judiciais cujos resultados possam reduzir o titular do bem à insolvência, desde que qualquer
destas circunstâncias não tenha sido levada à matrícula no registro de imóveis.

Trata-se, ainda, de mera inoponibilidade, e não de fé pública, estando presente nesta hipótese apenas a sua primeira
dimensão, na dicção de Mônica Jardim. Seu objetivo é assegurar a eficácia de negócio que constitua, modifique ou
transfira direitos sobre o imóvel (alienações, constituição de direitos reais limitados etc.), recebendo a proteção aquele
que deles se beneficie. E a proteção se dá contra atos precedentes, sejam eles relativos ao alienante, diretamente; ou a
anteriores titulares do bem.

No entanto, esta modalidade protege essas pessoas apenas em relação às hipóteses já mencionadas, e que foram
previstas de maneira expressa no artigo 54 da lei. De maneira geral, estas dizem respeito a riscos à solvência dos
anteriores titulares; à existência de restrições sobre o gozo do bem; ou à litigiosidade da coisa (existência de ações reais
ou pessoais reipersecutórias em curso).

Por outro lado, caberá ao interessado na oponibilidade ao adquirente dos atos anteriores providenciar a sua inscrição
na matrícula dos imóveis que queira ver atingidos por eles, sob pena de inoponibilidade. Assim, inoponíveis são os
direitos mencionados nos incisos ao artigo 54, se não publicitados mediante sua inscrição na matrícula.

Pode-se dizer, com isso, que há um ônus jurídico imposto a estes interessados de levar ao registro o fato que os
beneficia. Não o fazendo, abrem mão de sua oponibilidade.

Em regra, esta inscrição não depende de decisão judicial específica, bastando que se apresente ao registro
requerimento instruído com certidão que comprove o ato. Contudo, excepcionalmente nas hipóteses do inciso IV, há
necessidade de decisão judicial específica. Este diz respeito a outros tipos de ação, isto é, ações judiciais que não sejam
execuções, nem estejam em fase de cumprimento de sentença, mas cujos resultados ou responsabilidade patrimonial
possam reduzir o proprietário do bem à insolvência. Caberá a este, preferencialmente, indicar os bens sobre os quais a
averbação deverá recair; e deve o juiz restringi-la a quantos bastem para garantir a satisfação do direito. Recebida a
ordem, o oficial a prenota e a cumpre, ou devolve com exigências em cinco dias; e, após o cumprimento, deve
comunicar o fato ao juiz, no prazo de dez dias.

A segunda modalidade de reforço de eficácia que foi trazida pela lei tem sua sede no parágrafo único do artigo 54,
pelo qual os terceiros de boa-fé que adquiram ou recebam o imóvel em garantia ficam protegidos, inclusive para fins de
evicção, contra situações jurídicas não inscritas, salvo certas exceções, previstas expressamente pela lei. Esta segunda
modalidade, portanto, protege os terceiros contra quaisquer outras situações jurídicas, como, por exemplo, a de
verdadeiro proprietário, que foi espoliado pela transmissão. Com isso, limita a possibilidade de reivindicação do bem, por
um lado, bem como da sua evicção, por outro.
Há aqui, efetivamente, fé pública, estando contempladas a segunda e terceira dimensões da inoponibilidade de que
trata Mônica Jardim. Ainda que o alienante não fosse o verdadeiro proprietário, e ainda que houvesse um título viciado
na cadeia de transmissões, fica o terceiro protegido. Vale dizer, o registro terá eficácia material, criando, em alguns
casos, direito onde ele não havia.

Essa segunda modalidade tem por objetivo proteger terceiros de boa-fé que venham a adquirir ou receber em
garantia direitos sobre imóveis, contra “situações jurídicas” não constantes da matrícula – por exemplo, a situação de
proprietário; ou a situação jurídica de credor.

Como se disse, diferentemente do que ocorre na primeira modalidade, há aqui exigência de boa-fé. Neste último
caso não há ainda uma ação judicial ajuizada, uma ordem de indisponibilidade proferida, ou uma restrição convencional
ou administrativa que atinja diretamente o bem. No entanto, há uma situação que gera risco – por exemplo, um defeito
na cadeia de transmissões por conta da falsidade de uma escritura, a existência de um crédito ainda não ajuizado etc.

Desse modo, não havia ainda um título que pudesse ser levado ao registro, não vigorando, para o credor, ou para o
verdadeiro proprietário, o mesmo ônus que vigora na primeira modalidade. Essa a razão, portanto, da exigência de mais
um elemento como requisito da proteção: a boa-fé do adquirente.

O ônus de demonstrar a má-fé do adquirente caberá ao titular da situação jurídica não inscrita prejudicial ao
adquirente. Contudo, terá este interessado a possibilidade de fazê-lo, diferentemente do que ocorre na primeira
modalidade de proteção, em que a má-fé do adquirente é irrelevante se o fato em questão não foi publicitado na
matrícula.

O que significa “terceiro” aqui? Por terceiro entende-se alguém que não adquiriu o bem ou direito diretamente
daquele que teve sua situação jurídica violada. Assim, por exemplo, se “B” compra o bem de alguém que se passa por
“A”, proprietário do bem, esta pessoa “B”, mesmo que esteja de boa-fé, não contará com a proteção da eficácia material
do registro. Já se “B” comprou de “A” – que se passou pelo proprietário tabular – e vendeu o bem a “C”, então “C”, se de
boa-fé, contará com a proteção.

Há, contudo, exceções muito relevantes. A primeira exceção trata das hipóteses de aquisição ou extinção da
propriedade que independam de registro, como as aquisições originárias, ou causa mortis. Assim, se alguém adquire
imóvel do titular tabular e registra a transmissão, ainda assim o perderá em favor de quem outra pessoa que já o tenha
adquirido por meio de usucapião, ainda que a ação não constasse da matrícula, ou mesmo que não houvesse sido ainda
ajuizada. O mesmo ocorrerá se adquirir o bem de herdeiro aparente, e o verdadeiro herdeiro vier a reivindicá-lo.

A segunda exceção diz respeito ao disposto nos artigos 129 e 130 da Lei 11.101/2005 (Lei de Falências), que tratam
da ineficácia de certos negócios praticados pelo falido em relação à massa falida. Assim, ainda que não haja na
matrícula qualquer notícia da falência, o credor beneficiado pela garantia real não poderá opô-la contra os credores da
massa se o negócio foi realizado dentro do termo legal da falência. Também serão ineficazes em relação à massa falida
as aquisições gratuitas desde dois anos antes da decretação da falência, bem como as aquisições ou constituições de
direitos reais, a título gratuito ou oneroso, registradas após a decretação, salvo prenotação anterior. Ainda, serão
revogáveis, nos termos do artigo 130, quaisquer atos que tiverem por objetivo prejudicar credores, mediante prova do
conluio fraudulento entre devedor e terceiro. Quanto à esta última situação, a Lei 13.097 já não seria aplicável
independentemente da formulação de exceção expressa, uma vez que a proteção concedida por esta segunda
modalidade exige a boa-fé do adquirente.

E a terceira exceção, constante do artigo 58 da Lei 13.097, trata da aquisição e oneração de imóveis públicos,
pertencentes à União, Estados, Distrito Federal, Municípios, suas fundações e autarquias. Dessa maneira, ainda que um
imóvel esteja registrado como pertencente a um particular, se, posteriormente, mediante os instrumentos próprios, se
constata que na verdade se trata de imóvel público, o terceiro que o adquiriu de quem figurava como proprietário tabular
não ficará protegido, ainda que estivesse de boa-fé.

É importante destacar que essa terceira exceção tem um alcance maior, atingindo todas as modalidades de proteção
previstas pela Lei 13.097. Assim, aplicam-se também à terceira modalidade, que se verá adiante, e à primeira, da qual já
se tratou. E, quanto a esta, deve-se ressaltar que os créditos tributários inscritos em dívida ativa continuam sendo
oponíveis ao adquirente, ainda que não constem da matrícula do bem, o que se depreende da conjugação do artigo 58
da Lei 13.097 com o artigo 185 do Código Tributário Nacional (Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou
oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito
tributário regularmente inscrito como dívida ativa).

São, portanto, exceções de grande importância, e que acabarão por comprometer a segurança do registro, e o
alcance dos objetivos declarados na exposição de motivos da nova lei, sendo salutar, de lege ferenda, a discussão sobre
a conveniência ou inconveniência de sua manutenção no sistema.

A Terceira modalidade de reforço de eficácia está prevista no artigo 55 da Lei 13.097, e tem por objetivo proporcionar
a proteção da eficácia material do registro mediante o preenchimento de menos requisitos em duas situações especiais.
São estas a situação em que a alienação ou oneração têm por objeto unidade autônoma, integrante de incorporação
imobiliária ou instituição de condomínio edilício regularmente registrados; ou lote oriundo de regular procedimento de
parcelamento do solo.

Novamente, há proteção contra evicção ou decretação de ineficácia, e também, efetivamente, fé pública. Ou seja, o
adquirente, nestes casos, fica protegido contra a possibilidade de o “verdadeiro proprietário” reivindicar o bem, bem
como contra a possibilidade de os credores do alienante (os quais ficam sub-rogados no preço pago, ou no crédito)
buscarem a ineficácia da alienação.

A diferença desta proteção “facilitada” em relação à modalidade geral de proteção pela eficácia material está em não
ser exigida a boa-fé do adquirente; nem serem aplicáveis as exceções mencionadas no artigo 54, a saber, aquisições
que independem de registro e alienações ocorridas no bojo de falências. No entanto, é aplicável a exceção que diz
respeito ao Poder Público, já que o artigo 58 é claro ao dizer que “o disposto nesta lei” não se aplica a imóveis de sua
propriedade.

A razão de ser dessa modalidade especial é a de se estimular os empreendimentos imobiliários, sob a forma de
loteamento ou de condomínio edilício, mediante um incremento da segurança pela redução da assimetria de
informações, da qual já se tratou. Deve-se ter em vista, também, que a qualificação registral destes procedimentos já
envolve a exigência e análise de uma grande quantidade de documentos que dizem respeito, em suma, à saúde jurídica
e financeira do empreendimento131.

Finalmente, apesar de a lei não fazer esta restrição, esta modalidade especial de proteção somente faz sentido se o
dispositivo que a concede for interpretado de forma a ser aplicado exclusivamente às transmissões feitas pelo
empreendedor132. Assim, as transmissões posteriores, feitas pelo adquirente do lote ou da unidade autônoma, ou por
quem dele adquira, não estarão protegidas por esta terceira modalidade especial, mas somente pela segunda, de
caráter geral.

O Superior Tribunal de Justiça, não obstante não se tenha invocado a Lei 13.097, de 2015, no acórdão, já decidiu de
maneira a reconhecer a eficácia material do registro em proteção de terceiro adquirente de boa-fé, e, portanto, em
admitir a fé pública registral, no Recurso Especial 1.424.275 – MT. Tratava-se de alienação de imóvel comum por um
homem, sem a participação de sua ex-companheira. O imóvel fora adquirido na vigência da união, mas a companheira
não figurou no negócio aquisitivo, nem no registro. Não obstante, pelo regime de bens em vigor – a comunhão parcial de
bens – tratava-se de bem comum.

É fundamental observar que, pelas razões apontadas, o Tribunal considerou que o caso era de venda a non domino:
uma vez que o bem era comum, e o ex-companheiro o alienou integralmente sem participação de sua então
companheira, acabou alienando coisa que não lhe pertencia. Todavia, não se admitiu a anulação do negócio pela
preocupação com os interesses de terceiros de boa-fé e com a segurança jurídica. Com isso, concluiu que a anulação
do negócio com este fundamento somente seria possível se a existência da união estável houvesse sido levada ao
registro de imóveis. Ainda, “não havendo o referido registro da relação na matrícula dos imóveis comuns, ou não se
demonstrando a má-fé do adquirente, deve-se presumir a sua boa-fé, não sendo possível a invalidação do negócio que,
à aparência, foi higidamente celebrado”.

Ora: proteger um terceiro adquirente de boa-fé, que confiou no registro, de maneira a fazê-lo adquirir algo que o
alienante, em princípio, não poderia transmitir é precisamente a superação dos riscos da traditio e do velho princípio de
Ulpiano segundo o qual Nemo plus iuris ad alium transferre potest, quam ipse haberet (Dig. 50.17.54), ou seja, ninguém
pode transmitir mais direitos do que possui.

Observe-se que no caso não havia dúvidas quanto aos direitos da ex-companheira sobre o imóvel. Em uma
situação de conflito entre dois interesses legítimos, a solução deveu-se à opção – positivada na Lei 13.097 de
2015 – pela segurança do tráfego jurídico e pela proteção do terceiro adquirente de boa-fé.

4.4. Fases da publicidade imobiliária no Brasil quanto ao aspecto formal

4.4.1. Período anterior à Lei Orçamentária de 1843 (Lei 317, de 1843) e Decreto 482, de 1846

Entendida a publicidade imobiliária como um meio de salvaguardar direitos de terceiros pelo conhecimento do estado
da propriedade dos bens, ou seja, como uma publicidade qualificada, que produz efeitos jurídicos próprios, é possível
afirmar que esta não existia no Brasil até 1846.

Contudo, havia já tabeliães, cujas escrituras públicas podem levar erroneamente ao entendimento contrário.

O Tabelião de Notas era o empregado público encarregado de instrumentalizar contratos ou últimas vontades em
livros que deveria guardar. Ainda, lhe cabia lavrar outros documentos ou traslados, firmando-os com um sinal público
que os revestia de autenticidade133.

Segundo as Ordenações Filipinas, somente o rei poderia criar os cargos. O fidalgo donatário de uma capitania que
necessitasse de um novo tabelionato em suas terras deveria representar ao soberano, que entregaria o ofício a alguém
de sua vontade. As nomeações posteriores, porém, poderiam ser feitas pelo donatário, se este tivesse a faculdade de
prover ofícios. Não a tendo, sempre caberia ao rei. E, ainda que nomeados pelo donatário, deveriam sempre se auto
intitular “Tabeliães por El-Rei Nosso Senhor”. Juravam perante a chancelaria mor do reino, em regra; mas, se providos
pelo Corregedor da Comarca, jurariam perante seu chanceler.

Para a obtenção do ofício não bastava a nomeação. O nomeado deveria ser submetido a exame, se encartar, jurar,
prestar fiança, adotar um sinal público, e pedir seu regimento.

Em regra, o exame era feito na Mesa do Desembargo do Paço, onde se avaliava se sabiam ler e escrever bem.
Quaisquer abreviações eram proibidas. E, se passassem a escrever mal após o provimento do ofício, os Corregedores
das Comarcas poderiam suspendê-los134.

A carta que lhe permitia trabalhar era, em regra, passada pelo Desembargo do Paço, depois de pagos os direitos.
Em seguida, juravam bem e verdadeiramente servir seus ofícios, guardando seu regimento a serviço de Deus, do rei e a
bem das partes. O exercício sem carta e regimento era apenado, conforme L. 1, T. 80, parágrafo 19, e Lei de 08 de
dezembro de 1649. Porém, no impedimento de algum tabelião, outro poderia servir sem nova carta, recebendo o ofício
das mãos do Corregedor da Comarca.

Em seguida, deveria o tabelião habilitar-se com escritura de fiança, lavrada por outro tabelião e registrada no livro da
câmara135.

Cabia ao tabelião escolher um sinal público difícil de imitar, o qual ficaria arquivado em livro em poder da Casa de
Suplicação ou do Governador do Porto; ou da Chancelaria da Comarca, para os nomeados pelo Corregedor. O sinal não
era estilo: Deveria ser posto no livro de notas, traslados e outros instrumentos, sem o qual não eram reputados
autênticos136.

Então, deveriam pedir seu regimento, e guardá-lo, podendo os Corregedores exigir sua exibição. O regimento dos
tabeliães estava previsto no Livro 1, Títulos 78, 80 e 84 das Ordenações Filipinas.

Os tabeliães deveriam ter um livro onde escreveriam as escrituras e os testamentos, o qual deveria ser numerado,
rubricado e encerrado pelo juiz do lugar, conforme o estilo. Deveriam ser guardados por toda a vida, embora a lei tivesse
suposto uma vida curta, pois não exigia a guarda dos livros findos há mais de 40 anos. Entretanto, nenhum tabelião
cuidadoso deixaria de guardá-los, ainda mais se neles houvesse contratos relativos a prazos, censos, morgados ou
outras relações jurídicas de longa duração. O novo tabelião deveria exigir a entrega dos livros velhos mediante um
inventário, sob pena de responder pelos descuidos do antecessor137.

Aquele que obtinha o ofício deveria ter 25 anos (mas, tendo 22, poderia obter uma dispensa do requisito pelo
Desembargo do Paço), e casar-se em um ano após o recebimento, sob pena de perdê-lo (embora o Desembargo do
Paço pudesse conceder mais dois anos para atendimento do requisito)138.

Não poderia o tabelião portar coroa, ainda que pequena. E deveria residir na cidade, vila ou concelho em que fosse
exercido seu ofício. Poderia se ausentar até oito dias por ano sem autorização do juiz, ou três meses se houvesse quem
o substituísse. Em regra, exerciam pessoalmente seus ofícios, mas poderiam receber serventuários do Desembargo do
Paço, que os substituiriam, os quais deveriam ser examinados e aprovados pelo juiz local. Estes serventuários deveriam
ter seu provimento renovado constantemente, e somente perderiam o ofício por culpa judicialmente provada, ou por
notória incapacidade. Enquanto realizassem a substituição deveriam entregar até 1/3 do rendimento do ofício ao titular
afastado139.

O tabelião deveria ter algumas virtudes, as quais eram ser verdadeiro, desinteressado, diligente e perito.
Verdadeiros, porque a falsidade leva a suspeita às escrituras por eles produzidas, e, com isso, dele fugiriam as partes.
Desinteressados, porque deveriam contentar-se com seu salário, fixado por regulamento. E, por essa razão, ao fim das
escrituras lançavam o valor recebido. Se cobrassem a mais, receberiam a pena de perder o ofício, ou outras mais
graves. Diligentes, porque prontos para ir à casa das partes, especialmente das pessoas que não podem ou devem ir a
seu escritório; e também prontos e velozes para passar os traslados solicitados. Por isso, convinha que tivessem
ajudantes, que redigiriam os traslados, ao final dos quais assinaria o tabelião. Enfim, peritos porque deveriam aprender
ortografia, para não comprometer o entendimento dos textos dos atos, e também porque deveriam conhecer a matéria
jurídica pertinente aos atos praticados140.

Os tabeliados eram ofícios personalíssimos, não se podendo transmitir direito ou domínio algum de pais a filhos.
Contudo, era estilo do paço não destituir o filho do antigo tabelião, se ambos eram idôneos141.

A escritura pública – seus atos mais frequentes – eram testemunhos autênticos dos contratos ou atos
extrajudicialmente feitos, outorgados pelas partes ou pelo tabelião em nome delas, os quais deviam ser escritos nos
livros de notas. Era tida por essencial na venda dos bens de raiz, e o vendedor deveria declarar se havia foro, servidão
ou qualquer outro gravame desconhecido do comprador142. Uma vez que os bens se presumiam alodiais, a existência de
quaisquer ônus ocultos autorizava o comprador a propor a ação quanti minoris, pelos vícios da cosia comprada. Mas,
ainda assim, deveria suportar os ônus143.

Havendo temor do comprador de a coisa estar hipotecada, poderia requerer depósito judicial do preço, e que fossem
citados eventuais credores do devedor para verem a quem o bem passava a pertencer. Se, por outro lado, receassem
que outro reivindicasse a propriedade, deveriam pedir um fiador da evicção. Deveria sempre verificar antes da compra
se a coisa realmente pertencia ao vendedor, pois, se fosse furtada, a perderia sem nada receber. Ainda, era útil que
houvesse a imissão na posse o quanto antes, pois se o vendedor vendesse a mesma coisa duas vezes, a preferência
estaria com quem primeiro tomou posse. Por isso, convinha declarar na escritura que a posse seria tomada sem
autoridade de justiça, bem como a cláusula constituti, a qual transferiria domínio e posse144.

Portanto, não havia qualquer publicidade, devendo o comprador resignar-se a somente ter ações pessoais na defesa
de seus interesses, bem como confiar nas declarações do vendedor. O tabelião tão somente garantia a autenticidade do
ato, nunca sua publicidade.

4.4.2. Período compreendido entre a Lei Orçamentária de 1843 (Lei 317, de 1843) e Decreto 482, de 1846; e a
Lei 1.237, de 1864, e o Decreto 3.453, de 1865
Como já se viu, o registro criado em 1846 tinha por objeto apenas as hipotecas.

A inscrição da hipoteca no registro se fazia por uma nota da dívida e bens hipotecados lançada em livro criado pela
lei para este fim, cuja escrituração ficava a cargo de um oficial. Dessa forma, constavam em livros oficiais dados sobre o
patrimônio e o estado das finanças dos cidadãos, disponíveis a quem tivesse interesse, que os poderia obter sem
grande custo ou esforço145.

O fim de um registro hipotecário era a notícia ou publicação de uma dívida, e dos bens dados em hipoteca para
assegurá-la, bem como a publicação ou notícia das transmissões entre vivos de imóveis hipotecáveis, ou da instituição
de ônus reais. Tais notícias eram lançadas em certos livros especialmente destinados a este fim pelo oficial de registro, a
fim de constar para qualquer um que nisto tivesse interesse. A finalidade última era a garantia da segurança contra maus
devedores, a fim de movimentar a circulação das riquezas pelos empréstimos lastreados em garantias reais. Ainda, levar
a geral conhecimento o estado jurídico atual dos bens imóveis, novamente elevando o volume de crédito garantido por
eles.

Até a criação do sistema de registro não havia entre nós qualquer publicidade das hipotecas que desse aos terceiros
percepção do estado do patrimônio de seus contratantes, vez que nem o Direito Romano, nem a legislação portuguesa
prescrevia formalidades com esse intuito. O comprador de um imóvel não tinha certeza de se ver livre de uma execução
hipotecária por um credor anterior, e os credores não tinham como saber a quantos outros e por quanto o imóvel já havia
sido dado em garantia anteriormente146.

Em Portugal o registro foi criado por lei de 26 de outubro de 1836, mas esta era tida por muito defeituosa, e não
fixara as prioridades entre os credores. Já no Brasil, o registro surgiu no artigo 35 da Lei 317, de 21 de outubro de 1843,
regulada pelo Decreto 482, de 14 de novembro de 1846. Mas também fora insuficiente para garantir os credores.

O Código Comercial Brasileiro – no artigo 265 – tratou do registro das hipotecas por dívidas comerciais. E tal foi
reiterado nos artigos 62 a 71 do regulamento 738, de novembro de 1850, sujeitando as hipotecas comerciais a registro
no registro geral, na forma do decreto de 1846. Estas disposições foram revogadas pela Lei 1.237, segundo a qual
qualquer hipoteca é regulada apenas pela lei civil.

No regime da Lei de 1843, somente as hipotecas convencionais ingressavam no registro. Por isso – dada a grande
ampliação dos direitos sujeitos ao registro na vigência da nova lei – fez-se necessário criar um novo registro, o Registro
Geral147.

Na vigência do Registro Geral de Hipotecas, estas deveriam ser inscritas no Registro Geral da Comarca de situação
do bem148.

Se compreendessem bens situados em diferentes comarcas, ou se o mesmo bem se espalhasse por mais de uma
comarca, deveriam ser registradas em cada uma delas. A prioridade seria fixada pela data do primeiro registro, desde
que não se demorasse para fazer os outros nas outras comarcas. Para isso, fixava-se um prazo de um dia para cada
duas léguas de distância do lugar do primeiro registro para os outros149.

No entanto, se os municípios de situação dos bens passassem para outra comarca, não seria necessário fazer novo
registro150.

Os tabeliães do Registro Geral das Hipotecas deveriam ter um livro para o registro geral das hipotecas (número 1),
um de protocolo (número 2), e um de índice (número 3). Todos deveriam ser abertos, rubricados, numerados e
encerrados não pelo tabelião, mas sim pela “autoridade competente” – o Juiz de Direito da Comarca151.

O livro de registro teria todas as páginas divididas em duas colunas, por um traço perpendicular. Na parte esquerda
seriam feitos os registros, e a parte direita ficaria em branco, aguardando o lançamento de alterações, baixas, remoções,
substituições e notas sobre certidões a eles relativas passadas pelo tabelião152.

Tinham legitimidade para solicitar o registro, diretamente ou por procuradores, os credores e devedores, ou outras
pessoas interessadas na conservação dos direitos hipotecários153. Para tanto, deveriam apresentar ao registro o título
constitutivo da hipoteca, no original ou por traslado, e uma cópia fiel destes assinada e selada154.

As assinaturas seriam reconhecidas pelo Tabelião do Registro, ou por duas pessoas suas conhecidas, de confiança,
que reconhecessem como próprias das partes155. Então, o título seria protocolado, mediante a inscrição no livro de
protocolo, e lançamento nas cópias do título do número e folhas em que foi protocolado, bem como sua data. Uma das
cópias ficava arquivada no registro, e outra era entregue às partes156.

A seguir os títulos seriam inscritos no Livro do Registro Geral, seguindo a numeração do protocolo e sua data. Sua
forma era a transcrição literal verbo ad verbum da escritura, com as formalidades praticadas pelos tabeliães de notas.
Entre cada registro não deveria haver espaço maior que o necessário para os distinguir157. Uma vez registrado, o
tabelião anotaria no título dado as partes as folhas e livro do registro, bem como sua data158.

Deveriam ser averbadas no Registro Geral de Hipotecas as baixas ou extinções das hipotecas registradas; sua
substituição ou transferência para outro devedor ou credor, ou para outros bens; e quaisquer alterações, ou novações do
contrato ou da obrigação hipotecária159.

As baixas seriam feitas a partir do consentimento das partes, ou de sentenças passadas em julgado. As partes
apresentariam ao tabelião do Registro Geral de Hipotecas o título do contrato e quitação ou a sentença que extinguia,
alterava ou inovava a hipoteca registrada. Todos os títulos deveriam ser autênticos, com a forma prescrita pela lei160.

Os Tabeliães do Registro passavam certidão dos seus livros, independentemente de autorização judicial. Nestas
deveriam transcrever o assento do registro e todas as mais averbações e anotações a ele relativas que existissem em
seus livros, declarando, ainda, a requerimento de quem haviam sido passadas161.

As certidões negativas, declarando a inexistência de hipotecas relativamente a certa pessoa, ou certos bens, teriam
prazo máximo de validade de seis meses, e somente poderiam ser entregues aos donos dos bens, ou seus
procuradores. Ao longo do prazo de validade não poderia o tabelião passar outra certidão do mesmo teor, ainda que as
partes alegassem ter se extraviado a primeira162.

Estas certidões negativas deveriam ser exigidas pelos tabeliães de notas na lavratura de escrituras versando sobre
bens imóveis, e incorporadas em seus textos. E as escrituras de hipoteca apresentadas para registro ao tabelião do
registro geral de hipotecas, se não incorporassem a certidão negativa, deveriam ser recusadas e somente aceitas com
sua exibição. Recusando-se a parte exibi-la, o registro seria feito consignando este fato, sem prejuízo de que fosse
registrada uma segunda hipoteca em cuja escritura estivesse incorporada uma certidão negativa dentro do prazo de
validade163.

Os tabeliães do registro geral das hipotecas eram pessoalmente responsáveis pelos danos que causassem às
partes, e ainda incorriam nas penas imputadas a seus erros, omissões e prevaricações. Não poderiam recusar ou
demorar os registros das hipotecas ou averbações requeridos, nem a expedição de certidões164.

A despesa do registro ficava a cargo do devedor hipotecário, e a das averbações e certidões, a cargo de quem as
requeresse165. Os tabeliães do Registro Geral de Hipotecas eram remunerados por emolumentos no mesmo valor dos
percebidos pelas escrituras dos tabeliães de notas. Receberiam ainda metade do valor fixado, tratando-se de
averbações. E, pelas certidões, o mesmo que recebiam os tabeliães de notas pelas que passavam. Já as certidões
negativas tinham valor fixo: mil réis. Deveriam sempre lançar nos títulos ou certidões a conta do que receberam166.

Com isso, tinha-se o primeiro sistema de publicidade imobiliária implantado no Brasil. Era restrito às hipotecas, mas
já contemplava os princípios registrais da instância e da prioridade, além da publicidade gerada pela expedição das
certidões.

Era escriturado na forma de transcrições em inteiro teor dos títulos apresentados, forma esta que seria abandonada
já na reforma de 1864. Ainda, o livro era dividido em duas colunas, diferentemente dos modelos impressos com várias
colunas dos sistemas posteriores. Esta forma de escrituração dificultava a compreensão dos assentos, uma vez que
cada elemento não estava em uma coluna própria, e, por vezes, a redação era confusa.

Ainda, é bastante claro que a lavratura dos atos seguia o estilo próprio dos tabeliães, o que, como se viu, era
recomendado pela lei, incluindo-se aberturas e fechos nos atos, tal como se dava nas escrituras167.

4.4.3. Período compreendido entre a Lei 1.237, de 1864, e o Decreto 3.453 até a Lei de Registros Públicos
(6.015/1973)

Promulgada a Lei 1.237 em 1864, e baixado o Regulamento pelo Decreto 3.453, de 26 de abril de 1865, o primeiro
passo dado foi a instalação do Registro Geral. Pelo regulamento, este ficava criado em todas as comarcas do Império –
tal como já era na lei anterior – ficando a cargo de um dos tabeliães da Cidade ou Vila principal da comarca, designado
pelos Presidentes da Província, mediante informações prestadas pelos juízes de direito.

Ficavam autorizados a assumir os Ofícios do Registro Geral os tabeliães que já haviam sido designados para o
Registro Hipotecário, bem como os “Tabeliães Especiais”, que haviam sido criados especificamente para aquele
encargo, por nomeações na Corte e capitais das províncias, segundo fosse conveniente.

A data da instalação foi marcada para três meses após a data do regulamento, a partir da qual cessava o
funcionamento dos Registros Hipotecários. Esta mesma data fixava o termo inicial da eficácia dos registros dos títulos
segundo a nova modalidade, bem como da necessidade do novo registro para valer contra terceiros.

O encarregado de fazer a instalação foi o Juiz de Direito (um aviso de 1865, constante do apêndice, declarou que,
onde houvesse mais de um juiz, a instalação seria presidida pelo juiz da 1ª vara; e a este também incumbiria
desempenhar as demais atribuições judiciais do regulamento, as quais eram privativas dele, dada a necessária unidade
que a matéria exigia), o qual devia apregoa-la por editais, assistir na celebração, e mandar lavrar no protocolo do ofício,
na página seguinte à do termo de abertura, um auto de instalação, contendo informações como a que título serve o
oficial, o número e tipos de livros do antigo registro (os quais ficariam arquivados para serem inseridas averbações nas
hipotecas já inscritas), o número e tipo dos livros que passariam a servir no novo Registro Geral.

Na hipótese de, na data prevista, não estar designado o oficial, ou não estarem prontos os livros, a instalação não
seria adiada. Deveria o juiz nomear interinamente um dos tabeliães ou escrivães para desempenhar a função, fazendo
auto de instalação, e sendo lavrados os registros em cadernos legalizados nos termos do regulamento, até que
chegassem os livros e os dados fossem transferidos para estes. A partir disto, os cadernos seriam inutilizados. Tamanha
era a pressa do governo em instalar os registros que um aviso da Fazenda, constante do apêndice, foi encaminhado às
alfândegas, ordenando que estas não atrasassem a liberação dos livros importados destinados aos ofícios de registro.
O juiz deveria, então, ordenar ao oficial que extraísse cópia do auto de instalação, e a remetesse ao Governo da
Corte, bem como aos Presidentes das províncias168.

Os responsáveis pelo registro geral eram tabeliães que receberam uma denominação que os diferenciava – Oficiais
do Registro Geral – e estavam sujeitos somente ao juiz de direito. Os ofícios eram, por sua natureza, únicos, privativos e
indivisíveis. Mas os oficiais poderiam ter os escreventes juramentados necessários ao desempenho do serviço. Estes
eram denominados “suboficiais”, e poderiam realizar toda a escrituração do registro geral. Todos os atos, contudo,
deveriam ser subscritos pelo Oficial, exceto o protocolo, cuja escrituração caberia, a princípio, exclusivamente a este.

O Registro Geral da Lei 1.237 era formado por muitos livros, indicados no regulamento do Decreto 3.453 de 1865, e
enumerados a seguir:

N. 1 – Protocolo, 300 folhas.

N. 2 – Inscrição especial, 300 folhas.

N. 3 – Inscrição geral, 300 folhas.

N. 4 – Transcrição das transmissões, 300 folhas.

N. 5 – Transcrição dos ônus reais, 300 folhas.

N. 6 – Transcrição do penhor de escravos, 300 folhas.

N. 7 – Indicador real, 300 folhas.

N. 8 – Indicador pessoal, 300 folhas.

Havia, ainda, dois livros auxiliares, um para o livro número 2, e outro para o livro número 4169.

A lei anterior, diferentemente, compreendia apenas três livros – um registro geral de hipotecas, destinado ao registro
das hipotecas convencionais sobre bens localizados na comarca, averbações a eles relativas, e certidões positivas que
fossem fornecidas; um de protocolo, onde apontavam-se as minutas, averbações, e certidões negativas fornecidas; e um
índice, que facilitasse o acesso a todos os bens hipotecados registrados naquele cartório.

No texto da lei anterior, os livros eram abertos, rubricados, numerados e encerrados pela “autoridade competente”, a
qual era o Juiz de Direito da Comarca; já na nova lei, a atribuição do Juiz para prática destes atos era declarada
expressamente. Todos os livros deveriam ter grande formato, e deveriam ser uniformes em todas as comarcas, segundo
os anexos do regulamento. O fornecimento seria feito de uma vez só pelo Governo, na Corte, e pelos Presidentes, nas
Províncias, devendo os oficiais indenizá-los pelos gastos dispendidos. Uma vez encerrados, deveriam ser substituídos
pelo oficial. A quantidade de folhas variava segundo o tamanho da localidade170.

Na Corte e capitais das províncias em que houvesse tabeliães especiais, os livros seriam da 1ª classe, com o número
de folhas indicado no regulamento – 300; as comarcas de segunda e terceira entrância teriam livros de 2ª classe, com
metade do número de folhas indicado; e as comarcas de primeira entrância teriam livros de 3ª classe, com um terço do
número indicado171.

O protocolo era a chave do registro, no qual este começava, servindo para apontamento dos títulos apresentados
para serem inscritos, transcritos, prenotados e averbados. O livro de inscrição especial era destinado às hipotecas
especializadas; o de inscrição geral, destinado à inscrição das hipotecas gerais dos menores, interditos e mulheres
casadas; e o da transcrição das transmissões explica-se por seu título, tal como o da transcrição dos ônus reais. O da
transcrição dos penhores de escravos era destinado às transcrições dos penhores de escravos pertencentes às
propriedades agrícolas, celebrados com cláusula constituti. O Livro Auxiliar nº. 2 destinava-se às hipotecas gerais ou
privilegiadas anteriores à execução da nova lei, mas especializadas e inscritas em conformidade com esta. E o Livro
Auxiliar nº. 4, à transcrição por extenso dos títulos apresentados, mediante pedido expresso das partes172.

O Indicador Real era um repertório dos imóveis que figurassem de modo direto ou indireto nos livros 2, 4, 5 e 6.
Seriam destinadas folhas específicas para cada freguesia pertencente à comarca. E sobre cada imóvel deverão ser
inseridos dados acerca de sua denominação, se rural, ou rua e número, se urbano; o nome do proprietário; as
referências aos livros que dele tratem; e eventuais anotações. O indicador pessoal era um índice alfabético de todas as
pessoas que figurassem nos livros de registro, das quais indicaria o nome, domicílio, profissão, e referências aos livros
em que eram mencionadas173.

Diferentemente da lei anterior, que restringia o fornecimento de certidões negativas, a nova lei determinava que os
oficiais deveriam fornecer certidões dos atos registrados a qualquer um que as solicitasse, independentemente de seu
interesse. Deveriam, além disso, mostrar os livros aos que pedissem, prestando esclarecimentos com urbanidade174.

Os oficiais eram remunerados por emolumentos, fixados previamente pela autoridade. Seriam suspensos de um mês
a um ano se violassem seus deveres legais, conforme o caso, o que não os eximia de responsabilidade civil e criminal
pelos atos praticados, em especial quando deles resultasse falsidade ou nulidade que gerasse dano aos interessados175.
Eram funcionários públicos a quem incumbia inscrever em livros próprios os títulos de aquisição da propriedade e as
instituições de ônus reais sobre imóveis. Ambas funções eram ligadas; havia, porém, diferenças, como o fato de o
registro das aquisições ser denominado transcrição, ao passo que a instituição das hipotecas se denominava inscrição.
A transcrição era facultativa, sempre; porém, havia inscrições que eram obrigatórias, como nas hipotecas legais. A
inscrição sempre era feita por extrato; já a transcrição poderia ser feita por inteiro teor, no livro auxiliar número 4. Por
isso, seria, em tese, inteiramente possível desdobrar o cargo de oficial em oficial do registro geral e oficial do registro de
hipotecas, o que não ocorria porque a lei o declarou uno e indivisível176.

Esperava-se do oficial que conhecesse os deveres do cargo, que escrevesse corretamente, fosse prático em
contabilidade; conhecesse o sistema métrico decimal, o direito dos contratos, e os direitos reais limitados. Ainda, que
conhecesse a legislação tributária pertinente à função, e tivesse noções de geografia do Brasil. Quanto a suas
características pessoais, deve ser polido e urbano com as partes, pontual, circunspecto, verdadeiro, discreto, leal,
desinteressado e respeitoso177.

O oficial deveria estar sempre em seu escritório, disponível às necessidades das partes, vez que uma hora a menos
poderia prejudicá-las em problemas de prioridade. No entanto, em hipóteses de viagem ou quaisquer outras de ausência
do oficial, este pode servir-se de cadernos que serão transcritos nos livros, segundo aviso do governo. Esta prática
deveria ser evitada, porém, pois seria perigosa: o registro daí oriundo seria atrasado e imperfeito.

Os oficiais na corte e capitais de província tinham ofícios privativos, somente existindo quando se conferia a seus
titulares a serventia privativa. Para Oliveira Machado, pela importância do ofício, este deveria ser privativo em todas as
comarcas, e não somente na corte e capitais de província. Seria uma temeridade entregá-lo, ainda que
temporariamente, aos tabeliães do interior, os quais, muitas vezes, tinham conhecimentos medíocres. O desejável seria
a sujeição dos candidatos a um concurso especial, austero e exigente178.

Na Corte e nas capitais, eram sempre conhecidos como “Oficiais do Registro Geral”. O cargo, em tais circunstâncias,
era um “ofício de justiça”, pois estava na classe dos serventuários vitalícios, e era sujeito a concurso. Já em outras
comarcas a situação era diversa. Não se tratava de ofício privativo, mas de comissão temporária, cometida aos
tabeliães. Não dependia de provimento vitalício e definitivo, e não estava submetido ao concurso público, mas sim à
designação do presidente da província. A designação não era permanente, podendo ser cassada por motivos de serviço
público; era obrigatória a quem se ordenasse que a executasse; somente poderia ser exercida por tabelião. Com isso,
fora da corte e capitais, a delegação acabava por ser um presente de políticos e juízes, mudando com a mudança
destes179.

Tal situação era ruinosa, pois a escrituração não era uniforme, e desaparecia o arranjo dos livros e papéis do serviço.
Por isso, o aviso n. 347 de 18 de agosto de 1875, constante do apêndice, declarou que convinha manter o titular no
cargo tanto quanto fosse possível, somente sendo cassada a designação nas hipóteses de mudança de sede da
comarca. Por outro lado, o regulamento de 1885 determinava a criação de ofícios privativos também nas demais
localidades, o que aumentaria a credibilidade da instituição. A criação do cargo de oficial do registro geral nas capitais
incumbia às assembleias legislativas provinciais, tendo em vista que o ato adicional, em seu artigo 10, parágrafo 7º
atribuiu a essas a competência para criação ou supressão dos ofícios de justiça. No entanto, o legislativo federal
delegou essa possibilidade aos presidentes das províncias, o que leva a crer que legislativo e executivo estaduais
poderiam criá-los, concorrentemente. Pelas regras da unidade e indivisibilidade, não poderiam ser criadas duas vagas
na mesma cidade, nem se dividir o ofício entre inscrições e transcrições, nem o anexar a qualquer tabelião da capital180.

Não poderiam ser providos no ofício o estrangeiro, o menor de 21 anos, o menor de 30 anos que não houvesse
satisfeito as obrigações do serviço militar; o proibido de ocupar emprego, por sentença crime; o furioso, demente ou
pródigo legitimamente privados da gestão de seus bens; o que não estivesse livre de culpa e pena. O provimento
demandava um exame de suficiência, exames de língua portuguesa e aritmética, folha corrida, certidão de idade,
atestado médico de capacidade física, e certidão, para os menores de 30 anos, de não ter sido refratário ao serviço
militar se convocado181.

O exame de suficiência era uma prova prática de habilitação para o exercício da atividade, prestado perante o juiz de
direito que tinha jurisdição sobre o ofício. Este nomearia para participar dele dois advogados formados, solicitadores,
serventuários de justiça ou mesmo pessoas sem ligação com a justiça, mas idôneas. O exame seria presidido pelo juiz,
e realizado nas formas oral e escrita. Após sua realização, os examinadores e o juiz discutiriam seu valor, e,
secretamente, votariam. A aprovação poderia ser plena – se unânime; simples, se por maioria; e haveria reprovação se
houvesse maioria de votos contra. Cada exame deveria ser feito separadamente, a fim de que um examinado não
seguisse as respostas de outro. Seriam dispensados do exame os doutores ou bacharéis em direito, os formados em
direito por universidades estrangeiras mas licenciados para advogar no Império; os advogados, ainda que provisionados;
os serventuários de ofícios de igual natureza. Não estavam dispensados os graduados em medicina, náutica,
matemáticas, milícia, farmácia, ou ordenações clericais, pois não possuíam em si uma presunção de perícia para o
cargo182.

Os candidatos deveriam, também, se submeter a exame de português e matemática, os quais foram instituídos com
a manifesta intenção de afugentar os ineptos, em benefício dos estudiosos e hábeis. Porém, este intuito foi frustrado
pela criação de comissões locais de avaliação para os residentes a mais de dez léguas das capitais. Estas comissões –
compostas, em tese, por um professor e duas pessoas idôneas – acabavam por desvirtuar o sistema pela camaradagem
e amizade existente entre moradores de circunscrições do interior. O exame, com isso, acabava se tornando mera
formalidade183.

Na Corte o exame deveria ser prestado perante a inspetoria geral de instrução pública; as escolas politécnica, militar,
naval ou normal; perante o tesouro nacional ou outra repartição que exigisse as disciplinas para preenchimento de seus
quadros. Já nas capitais de províncias as provas deveriam ser prestadas perante o curso preparatório das faculdades de
direito; as delegacias de instrução secundária; as escolas oficiais de minas ou farmácia; as escolas normais, liceus,
institutos ou outros estabelecimentos de instrução pública geridos pelos governos provinciais. Estavam dispensados das
provas de português e matemática os doutores e bacharéis em direito, os doutores e bacharéis em medicina,
matemáticas, ciências ou artes, os bacharéis em letras pelo Colégio Dom Pedro II, e os serventuários providos depois de
1881184.

Havia várias graduações de oficial de registro: o efetivo, o sucessor, o substituto, e interino. O efetivo era aquele que
outrora era chamado proprietário, denominação incorreta. Com efeito, antes da Lei de 11 de outubro de 1827 o ofício era
objeto de venda, e era transmitido na herança do titular falecido. Porém, desde referida lei, firmara-se entendimento de
que o ofício era um cargo, e, portanto, ainda que vitalício, não passaria da pessoa de seu titular. O sucessor assumiria o
ofício nas hipóteses de impossibilidade física absoluta ou moral do efetivo, como a surdez total, no primeiro caso, e a
senilidade, no segundo. Ficaria respondendo até o restabelecimento, morte ou renúncia do titular, após o que seria
nomeado um interino, que responderia até que o cargo fosse novamente provido. Em situações de substituição
temporária do titular, assumia o oficial substituto, designado pelo governo imperial, na Corte, e pelo juiz de direito nos
demais lugares185.

A transcrição era feita pela apresentação do título ao oficial do registro, acompanhado de dois resumos que
contivessem os requisitos presentes na lei e fossem assinados pela parte ou advogado. Recebido o título, este era
lançado no protocolo, recebendo um número de ordem o qual – juntamente com a data – fixava sua prioridade no
registro. Passada a fase preliminar, o oficial fazia a transcrição, escrevendo no Livro das transcrições o número de
ordem, a data da apresentação, a freguesia de situação do imóvel; a denominação do imóvel, se rural, e rua e número,
se urbano; as confrontações e características do bem; os nomes e domicílios de adquirente e alienante; a natureza do
negócio translativo, sua forma, e o tabelião que lavrou o instrumento; e, finalmente, as condições e o valor do contrato. A
falta de qualquer dos requisitos ensejava a nulidade da transcrição, ainda que os dados não constassem também do
extrato. A nulidade não dependia de nenhuma prova, verificando-se pela observação da própria transcrição. Após
realizar a transcrição propriamente dita, o oficial consignava no protocolo este fato, inseria as remissões necessárias nos
índices real e pessoal, e retornava à parte um dos extratos com a expressão “registrado no livro tal, número tal, folha
tal”186.

Para serem aceitos, os títulos deveriam atender à forma legal. Deveriam ser lavrados por instrumento público, ou,
nas hipóteses permitidas, por instrumento particular assinados pelas partes, as quais deveriam ser reconhecidas pelo
oficial. Ainda, deveria o título ser acompanhado do selo devido, e do recibo do pagamento do imposto de transmissão de
propriedade. O mesmo tratamento era dado a atos autênticos lavrados no exterior, legalizados pelos consulados
brasileiros e traduzidos para o vernáculo por tradutor habilitado187.

O fim principal da transcrição era levar às pessoas o conhecimento das mutações reais sofridas por um certo bem
imóvel, como um mecanismo de publicidade que gerasse informação sobre a titularidade e a existência de ônus ou
direitos limitados que restringissem o valor e a disponibilidade dos bens. Por isso, abrangia os atos entre vivos, a título
oneroso ou gratuito, o fazendo por presumir que, por suas formas próprias, não alcançariam um grau apreciável de
publicidade. Pela mesma razão, não abrangia os direitos sobre imóveis adquiridos por sucessão, legítima ou
testamentária, presumindo a lei que as formalidades que margeavam estas transmissões já conteriam suficiente
notoriedade. Ainda, a sucessão transferiria o domínio desde sua abertura, e independentemente da tradição. Para
Lafayette, submeter a transmissão a uma formalidade derrogaria de modo inútil um princípio já aceito e determinado por
necessidades práticas188.

Porém, havia certos atos dispensados de transcrição pelo decreto que não gozavam desta publicidade: eram atos
judiciais, como a arrematação e a adjudicação, as sentenças proferidas nas ações divisórias, as sentenças que
adjudicavam bens de raiz aos que pagassem dívidas comuns nos inventários e partilhas. Não havia razões fortes para
serem excluídos da transcrição, podendo gerar fraudes. A simples publicidade do ato judicial não era a publicidade
demandada pela lei para as mutações reais imobiliárias, cuja fonte era o registro. A publicidade dos atos judiciais era tão
insuficiente que a própria lei exigia a inscrição da sentença para validade perante terceiros da hipoteca judicial189.

O Registro Geral teve grande importância por ter aberto as portas da publicidade imobiliária às transmissões por atos
entre vivos de direitos reais sobre imóveis. Quanto ao direito formal, apresentou inovações em relação ao direito anterior,
como a grande ampliação do número de livros, designando séries específicas para a hipoteca, e para as transcrições.
Ainda, estes passaram a ser escriturados de forma padronizada, em livros impressos segundo modelos previstos no
Regulamento e adquiridos pelos oficiais por intermédio do governo. E a escrituração passou a ser feita por extrato, não
obstante a designação “transcrição” aplicada ao registro dos atos translativos de direitos sobre imóveis.

Esta forma de escrituração, bem como as características gerais do sistema quanto ao Direito Formal do Registro
permaneceram fiéis às linhas assentadas pela Lei 1.237 e seu regulamento ao longo dos anos restantes do século XIX e
de boa parte do século XX.

Poucas foram as mudanças operadas pelos sucessivos regulamentos de registros que antecederam a Lei 6.015, de
1973.

O Decreto 370, de 1890, eliminou o livro da Transcrição do Penhor de Escravos, como já se viu. Quanto ao mais,
suas disposições eminentemente repetem tudo aquilo que já constava da Lei 1.237, de 1864. Sem inovar ou acrescentar
à disciplina do registro, era perfeitamente prescindível a substituição da lei anterior, o que demonstra uma tentativa de se
construir a nova realidade do país, sob regime republicano, parasitando-se os espólios da monarquia.

O Decreto 18.542, de 1928, autorizado pelo Decreto Legislativo 4.827, de 1924, e pelo Decreto Legislativo 5.053, de
1926, e o Decreto 4.857, de 1939, a despeito de consistirem em regulamentos destinados a tratar do Direito Formal de
Registro acabam ingressando no âmbito do direito material, ao prever as hipóteses de atos de registro e de averbação.
A rigor, esta matéria deveria, por seu conteúdo, estar tratada no Código Civil, já que, em essência, diz respeito às
situações jurídicas às quais se pretende ligar os efeitos da publicidade imobiliária.

O Decreto 18.542 manteve os mesmos livros que já constavam do Decreto 370, exceto quanto ao livro auxiliar, que
passou a ser único. Isto foi repetido no Decreto 4.857, ressalvado que este criou também um livro-talão de cédulas
pignoratícias. Quanto a seu tamanho, eliminaram a divisão em classes que era prevista no Decreto 370, e que repercutia
no seu número de páginas. Todos os livros, agora, passariam a ter o mesmo tamanho, independente da entrância da
comarca em que situado o registro.

Ainda, o Decreto 18.542 eliminou a necessidade da apresentação de extratos, ou seja, de resumos estruturados do
título que eram apresentados concomitantemente a este. Consistiam tais extratos em uma transposição a nosso sistema
do bordereau do Direito Francês. Se, no Sistema Francês, faziam algum sentido, já que o conservateur poderia praticar
o ato tão somente com base no bordereau, no Brasil significavam retrabalho e risco, já que necessariamente o
registrador teria de concertar o título e o extrato a fim de verificar se eram coincidentes190. Nas palavras de Lysippo
Garcia, sua “única serventia é pejar os cartórios, e fornecer pasto às traças”191.

Como já se disse, coube também ao Decreto 18.542 consagrar de maneira expressa o princípio do trato sucessivo
em seu artigo 206, ao dispor que se o imóvel não estiver registrado em nome do outorgante, deve o oficial exigir o prévio
registro do título anterior, qualquer que seja sua natureza, a fim de manter a continuidade do registro. É interessante
observar a clara ligação deste dispositivo com a inovação do Código Civil de 1916 que determinou o registro também
das aquisições a título judicial, ou causa mortis. Isto também é visível no fato de o Decreto 18.542 trazer uma nova
categoria de títulos formais que poderiam ingressar no registro: as cartas de sentença, mandados, formais de partilha e
certidões extraídas de processos.

Ao tratar das situações em que o título fosse nulo ou falso, e do dever de recusa do oficial em registrar por duvidar da
sua legalidade, o Decreto 370 previa que o cancelamento do registro deveria se dar necessariamente por decisão
judicial ou acordo entre as partes. O Decreto 18.542 não tratou apenas do cancelamento, mas também da possibilidade
de retificação do registro, distinguindo casos em que esta poderia ser realizada pelo próprio oficial – quando houvesse
erro evidente na transposição dos dados do título – daquelas em que a jurisdição era necessária.

Ainda quanto aos títulos, os Decretos 18.542 e 4.857 vão progressivamente incorporando novas modalidades de
instrumento particular. Mudam, também, os requisitos formais que estes devem conter: se pelo Decreto 370 os
signatários deveriam ser “reconhecidos pelo oficial de registro” – o que atribuía ao registrador uma anômala função
tipicamente notarial – os Decretos 18.542 e 4.857 passam a exigir a firma reconhecida e a assinatura também por
testemunhas.

Finalmente, os Decretos 18.542 e 4.857 trouxeram uma disciplina mais pormenorizada sobre os elementos de
escrituração dos atos de transcrição e inscrição, bem como dos livros de protocolo e indicadores, e, por tratar também
de outras especialidades registrais, subtraíram da disciplina específica do Registro de Imóveis temas de interesse geral,
como a publicidade e o fornecimento de certidões, a responsabilidade, o regime funcional dos registradores etc.

4.4.4. O período iniciado após a vigência da Lei 6.015, de 1973

Um projeto de reforma da legislação anterior, de autoria de Afrânio de Carvalho, foi encaminhado ao governo em
1947. No entanto, este não teve andamento, já que compunha um tema maior, tratando da reforma agrária.

O projeto previa a instituição de livros de registro com base real e, paralelamente, de um cadastro, o qual,
teoricamente, já seria viável na época graças às possibilidades criadas pela aerofotografia192.

Nova tentativa foi feita pelo autor em 1969. O anteprojeto seria incorporado ao novo regulamento, o qual recebera
também sugestões das Corregedorias de Justiça dos tribunais da Guanabara e de Sergipe. Previa uma espécie de fé
pública registral, operada pela presunção absoluta da existência do direito em favor do adquirente que desconhecesse a
inexatidão do registro, ao qual não se opusera oportuna contradita, e adquirisse a título oneroso. Previa, ainda, a criação
de um livro fundiário, estabelecendo os registros com base real, a “matrícula” do imóvel como inscrição aquisitiva, ou
seja, aquela que ocuparia o primeiro lugar no fólio, e a coordenação do registro com o cadastro, o qual disciplinava como
uma seção do registro de imóveis. E, em suas disposições finais, entre outros pontos extinguia o Registro Torrens.

No entanto, muito pouco do pré-projeto foi aproveitado na reforma, que se materializaria no Decreto-Lei 1.000, de 21
de outubro 1969. A norma como um todo foi elaborado em sigilo, sem apreciação pela opinião pública, o que levou à
positivação em texto legal cheio de graves erros193. Segundo Elvino Silva Filho, sobre o projeto, “...ninguém viu, ninguém
previamente o conheceu para que pudesse estudá-lo, debatê-lo, e, assim, apresentar sugestões que viessem melhorá-
lo, escoimando-o de imperfeições e obstáculos insuperáveis que, fatalmente, ocorrerão na sua execução prática”194.
Elvino criticava, ainda, a afoiteza do projeto, bem como destacava a importância de que a criação de uma nova lei de
registros fosse feita em compasso com a reforma do Código Civil que então já se iniciava195.

O Decreto-Lei 1.000 mantinha a escrituração em folha corrida. No entanto, concentrava no Livro 2, de Registro Geral,
os atos relacionados à transmissão da propriedade e constituição de direitos reais limitados, abrangendo as hipotecas.
Previa, ainda, livros específicos para emissões de debêntures, loteamentos, incorporações, cédulas de crédito rural e
cédulas de crédito industrial.
Segundo Elvino, a criação do livro de Registro Geral era uma canhestra tentativa de implantação do Brasil do fólio
real, a qual, estabeleceu um modelo prévio com este fim, no anexo do Decreto-Lei mas, sem maiores cuidados, manteve
como disciplina da escrituração as disposições do Decreto 4.857 de 1939, tornando impossível o cumprimento da
norma196.

O artigo 5º autorizava o uso de livros impressos e de folhas soltas. Todavia, como apontava Elvino, na sistemática
dos livros então em uso, de folha corrida, impressos eram somente as divisões das colunas e os dizeres comuns e
usuais. A escrituração era manual. Quisesse o legislador efetivamente autorizar o uso de folhas soltas, e, portanto,
permitir a escrituração datilográfica ou mecânica – e, segundo Elvino, era esta a intenção – deveria tê-lo feito de modo
mais explícito197. Com efeito, entre os “consideranda” formulados pelo então Ministro da Justiça, Gama e Silva, figurava
a ideia de “um registro próprio para cada imóvel”, de maneira a facilitar uma futura “cadastração”.

Quanto aos atos, os distinguia, de forma confusa, em transcrição, inscrição e averbação. A nova norma modificava a
longeva classificação que já vinha desde a Lei 1.237, sem um critério claro que justificasse a inovação.

Dessa maneira, por inovar sem qualquer critério razoável na natureza dos atos praticados pelo registrador, e não
inovar naquilo que se fazia mais necessário – a implantação do fólio real – não é de espantar que o Decreto-Lei 1.000
tenha tido sua execução adiada sucessivamente pelos Decretos 65.905, de 1969, 69.803, de 1971 e 72.406, de 1973,
até ser revogado expressamente pela Lei 6.064, de 1974.

Uma nova tentativa de reforma, que daria origem à Lei 6.015, de 1973, se deu pelo Projeto de Lei 2.267, de 1970,
apresentado ao Plenário da Câmara em 19 de agosto de 1970 pelo deputado paranaense Francisco Accioly Rodrigue da
Costa Filho, conhecido como Accioly Filho. Na justificativa198, Accioly Filho afirmava que o projeto era baseado em
trabalho elaborado por Ruy Ferreira da Luz, que fora durante longos anos, antes de se aposentar, registrador no 1º
Registro de Imóveis de Curitiba. Esclarecia o deputado que os redatores do projeto que resultou no Decreto-Lei 1.000
não haviam compreendido as intenções do Ministro da Justiça para a reforma. A reforma não exigia, a rigor, “um registro
para cada imóvel”, mas sim uma “matrícula para cada imóvel”, e registro, na matrícula, dos atos que tivessem por objeto
o imóvel matriculado. A matrícula diria respeito “à caracterização do imóvel e à indicação de seu proprietário”; e o
registro corresponderia “às anotações das transferências e dos ônus relativos ao imóvel matriculado”. Quanto à
terminologia, a justificativa defendia a substituição dos termos transcrição e inscrição por registro.

Ruy Ferreira da Luz entendia que a mais importante inovação seria, efetivamente, a matrícula dos imóveis, de
maneira a facilitar as pesquisas sobre a situação jurídica do bem – que até então dependia da análise de vários livros
distintos, cada um destinado a uma espécie de assentamentos – e autorizando a mecanização da escrituração. O
registrador remete a Lysippo Garcia a ideia da adoção da matrícula, e deixa claro que, se, por um lado, a matrícula não é
um cadastro, por outro a inovação acabaria por suprir algumas das deficiências da inexistência de um cadastro, e a
perfeita execução da lei poderia contribuir para seu aperfeiçoamento199. Com efeito, já em 1922 Lysippo Garcia, na
observação final de sua obra sobre “A Transcripção”, tratava da conveniência da redução do número dos livros de
registro, de maneira a aproximá-los de um livro fundiário. Para tanto, apresentava um modelo de “indicador Real,
transformado em verdadeira matrícula, na qual a cada folha corresponderá um imóvel, dela constando todos os actos
que o possam affectar”200.

A justificativa deixava claro, no entanto, que não se tratava da implantação do regime imobiliário alemão, mas apenas
o sistema de escrituração utilizado na Alemanha – ou seja, adotava-se o fólio real, mas não se adotava a abstração.
Ainda quanto à escrituração, a justificativa defendia a adoção de folhas soltas em formato distinto daquele que era
adotado nos antigos livros de transcrição, já que “o principal inconveniente do livro reside, precisamente, no seu
tamanho exagerado”. Mas ainda apontava outros inconvenientes, como, por exemplo, o espaço exíguo para lançamento
em algumas colunas. Assim, compreendia que deveria caber ao registrador a liberdade de projetar o modelo das folhas
de acordo com os padrões que julgasse convenientes, desde que autorizados pela autoridade judiciária competente.
Entre as vantagens das folhas soltas apontava a maior facilidade para extração de certidões, e a maior facilidade no
arquivamento.

Com o fim da legislatura, o projeto foi arquivado em 02 de abril de 1971, nos termos do artigo 104 da Resolução da
Mesa de 22 de janeiro de 1964, que consolidava o então vigente Regimento Interno da Câmara. Poucos dias depois, em
22 de abril de 1971 o deputado paranaense Italo Conti requereu ao Presidente da Câmara seu desarquivamento, o que
foi deferido no dia 26 do mesmo mês.

Na Comissão de Constituição e Justiça o relator, Deputado José Sally, do Rio de Janeiro, não apenas sugeriu uma
série de emendas à proposta – algumas de sua autoria, outras sugeridas pela Corregedoria Geral da Justiça de São
Paulo - como apontou a própria conveniência de, mais do que reformar o Decreto-Lei 1.000, revogá-lo e promulgar-se
um novo diploma legal sobre a matéria. Entre as sugestões, dentre muitas outras, estavam a possibilidade de
apresentação de títulos para exame e cálculo dos emolumentos, sem protocolo e a desnecessidade de apresentação de
requerimento escrito para a prática de atos de registro, já que, no Brasil, “o título é indispensável para a validade do ato
e basta para o procedimento do registro, independentemente do pedido formal dos interessados”. A requerimento do
relator, o parecer e a proposta de substitutivo foram publicados, para estudo, em 01º de dezembro de 1971. Após vista
do deputado Hamilton Xavier, o parecer do relator foi aprovado por unanimidade na Comissão em 31 de maio de 1972.

O substitutivo previa a existência de um Livro e Registro Geral, destinado a matrícula dos imóveis e registros e
averbações dos atos atribuídos ao registro de imóveis. Previa, também, a existência de livros específicos para
debêntures, loteamentos, incorporações, cédulas de crédito rural e cédulas de crédito industrial.
O texto e o parecer foram submetidos à primeira discussão na Câmara em 05 de setembro de 1972, e foram
apresentadas duas emendas relativas ao título que disciplinaria o Registro de Títulos e Documentos. Com isso, o projeto
retornou à Comissão de Constituição e Justiça. Foi encaminhado, também, à Comissão de Constituição e Justiça, pelo
presidente da Associação dos Advogados de São Paulo, Waldemar Mariz de Oliveira Jr., o artigo escrito por Elvino Silva
Filho a respeito do Decreto-Lei 1.000, já citado anteriormente. Em novo parecer o relator manifestou-se pelo acolhimento
das emendas, e o parecer, uma vez mais, foi aprovado pela Comissão em 23 de agosto de 1972.

Em 25 de novembro de 1972, o substitutivo do relator e as emendas foram submetidas ao plenário da Câmara em


primeira discussão, aprovados, e encaminhados para redação final. Em 05 de abril de 1973 foi aprovado em segunda
discussão, e encaminhado ao Senado Federal.

No Senado foi proposto um novo substitutivo pelo agora senador Accioly Filho, aproveitando, segundo ele, emendas
dos senadores Carvalho Pinto, Nelson Carneiro e Carlos Lindenberg, assim como sugestões “dos professores Almiro
Couto e Silva e Rui Ferreira Luz”. O substitutivo representava, em parte, um retorno a alguns preceitos do Decreto-Lei
1.000 – como a divisão dos atos em transcrição, inscrição e averbação – e propunha a divisão dos livros principais em
“Registro Geral”, “Auxiliar”, e “Registros Diversos”. Segundo Ruy Ferreira da Luz, o retorno à terminologia transcrição e
inscrição se deu a pedido do Ministério da Justiça, levando em conta o fato de que eram os termos que apareciam em
toda a legislação civil, com o que a adoção do novo termo “registro” dependeria da alteração também das outras
normas201.

Caberia ao Registro Geral, nos termos do substitutivo, a matrícula dos imóveis bem como a realização de registros e
averbações que não fossem destinados expressamente aos outros livros. Já o Livro Auxiliar – que já constava do projeto
primitivo de Accioly, com as mesmas funções, sem figurar entre os livros numerados - seria dividido em colunas, e nele
seriam registradas, por extrato, as convenções antenupciais, assim como os contratos-padrão de que trata o artigo 61 da
Lei 4.380, de 1964. No livro de Registros Diversos seriam debêntures, cédulas de crédito e outros atos de competência
do registro de imóveis que não se referissem a imóveis determinados. Os livros destinados especificamente aos
registros de incorporações e de loteamentos eram mantidos.

O substitutivo do Senado instituía de maneira expressa, também, a regra segundo a qual a matrícula seria realizada
por ocasião do primeiro registro praticado na vigência da nova lei, mediante elementos do título e do registro anterior, e
deixava claro que o encerramento dos livros já abertos não excluía a validade dos atos já registrados, nem impedia que
neles se praticassem averbações e anotações posteriores. Também constavam do substitutivo regras mais detalhadas a
respeito da abertura, desmembramento e cancelamento das matrículas. Por fim, em capítulos próprios, propunha a
disciplina de procedimentos como a instituição de bem de família, a remição de imóvel hipotecado, e o Registro Torrens.

O substitutivo foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, que acatou algumas emendas de
redação, e retornou à Câmara, cuja Comissão de Constituição e Justiça, após também propor emendas de redação,
manifestou-se favoravelmente.

Então, foi submetido ao plenário da Câmara em 04 de dezembro de 1973, para discussão única. Nessa ocasião, o
deputado Aldo Fagundes, da Bancada da Minoria, requereu o adiamento da discussão por dez sessões. Em apoio do
pleito manifestou-se o deputado Walter Silva, em razão da extensão do projeto e de ter este retornado do Senado mais
do que emendado: substituído. Contra o pedido, manifestou-se o deputado Sinval Guazzelli, afirmando que a Bancada
da Maioria compreendia que a matéria já estava esclarecida, e, portanto, apta a ser votada.

Consta da transcrição da sessão no Diário Oficial que o requerimento foi aprovado após os deputados, instados pelo
presidente da Câmara, terem permanecido como se encontravam; todavia a votação foi feita no mesmo dia, à tarde. Nas
discussões, afirmou o Deputado Francisco Amaral que o projeto havia hibernado na Câmara e no Senado, o que
ocorrera, segundo acreditava, “por inspiração do Executivo ou de alguém do Executivo”. A despeito disso, na semana
anterior à votação, com extraordinária rapidez o Senado aprovara um substitutivo total que foi devolvido â Câmara “na
sexta-feira, à última hora, às horas sombrias da noite”. Assim, protestava o parlamentar contra “a volúpia, o desejo
incontido, a ânsia, a aflição do partido majoritário, nesta Casa, no sentido de fazer aprovar, sem que os Parlamentares
tenham conhecimento integral da matéria, um substitutivo que, na verdade, é inteiramente ignorado pela maioria dos
membros da Câmara dos Deputados”. A contrariedade do deputado não dizia respeito ao mérito do projeto, mas sim ao
fato de que a Arena prevalecia-se “de sua esmagadora maioria para obrigar a Minoria a votar, a decidir, a deliberar sobre
um projeto que a maior parte dos Srs. Deputados desconhece”. Em resposta, o Deputado Sinval Guazzelli afirmou que a
Comissão de Constituição e Justiça havia examinado o substitutivo todo e recomendado sua aprovação por
unanimidade. Retorquiu o Deputado Francisco Amaral que a Comissão havia tomado conhecimento do substitutivo na
véspera, apenas por seus nove integrantes – se é que tinham tomado – razão por que o MDB votaria contrariamente à
aprovação. Em resposta, o Deputado Cantídio Sampaio afirmou ser “absolutamente lírica” a tese do Deputado Francisco
Amaral de que deveriam todos os deputados ter conhecimento em profundidade de todas as proposições. Segundo ele,
se assim fosse, “haveria aqui 310 técnicos em Direito Processual Civil, e todos conheceríamos profundamente o novo
Código de Processo Civil. Sabe S. Ex.ª que isto é uma utopia; que é justamente essa divisão de esforços e de trabalho
que caracteriza o procedimento desta Casa em todas as ocasiões em que legisla”.

O Presidente da Câmara, Deputado Flávio Marcílio, submeteu o substitutivo à votação, e este foi aprovado, sendo
encaminhado à sanção presidencial. Com a sanção, converteu-se o Projeto 2.267, de 1970 na Lei 6.015, de 1973.

Quanto ao seu grau de minúcia, Afrânio de Carvalho afirmava que o diploma o tinha demasiado para uma lei, e, por
outro lado, como regulamento, carecia de profundidade. E ainda trazia matéria estranha ao seu contexto, como o
Sistema Torrens202.
Antes do início de sua vigência a lei já seria alterada. Pela Mensagem nº 37, de 1975 – CN, de 24 de abril de 1975, a
Presidência da República encaminhou ao Congresso Nacional um projeto de lei alterando numerosos dispositivos da Lei
6.015, de 1973. Na exposição de motivos o Ministro da Justiça, Armando Falcão, tratando especificamente das
disposições concernentes ao registro de imóveis afirmava que “acolhendo sugestões do Instituto de Registro Imobiliário
do Brasil, reformula o Projeto todo o Título V (“Do Registro de Imóveis”) da Lei nº 6.015, a fim de aperfeiçoar o sistema
da matrícula que esse Diploma introduziu, em caráter geral, no nosso ordenamento jurídico”.

Para isso, o projeto reduzia o número de livros a cinco, eliminando os livros destinados a “registros diversos”,
“registro de incorporações” e “loteamentos”. Tudo aquilo que não coubesse no Livro 2, por não refletir diretamente em
imóvel matriculado, seria lançado no Livro 3, de Registro Auxiliar. O projeto também eliminava a distinção entre
transcrição e inscrição, englobando-as sob a terminologia registro.

Em 29 de abril a Mensagem foi lida no plenário do Senado Federal, e, no mesmo dia, foi designada comissão mista.
Integrava a comissão, entre outros, o Deputado José Sally, que já havia figurado como relator na passagem do Projeto
2.267, de 1970, pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Numerosas emendas foram apresentadas, entre
outras uma do Deputado Francisco Amaral e do Senador Tarso Dutra, para inclusão do parágrafo único no atual artigo
173, autorizando a substituição dos livros 2, 3, 4 e 5 por fichas; e uma apresentada pelo próprio relator na Comissão,
Senador Italivio Coelho, que deu origem ao atual artigo 217 da Lei 6.015, de 1973, com o que, para a rogação do
registro, não se exigiria mais qualquer interessado, mas sim qualquer pessoa, incumbindo-lhe as despesas respectivas.
O relator, ainda, apresentou um substitutivo integral, reorganizando o texto da lei. A Comissão aprovou o parecer e o
substitutivo em 22 de maio de 1975, e o texto foi encaminhado ao plenário, para discussão em sessão conjunta.

A discussão, em turno único, se deu no dia 04 de junho, e o substitutivo foi aprovado, ressalvado o destaque dos
parágrafos 2º a 6º do artigo 57, permitindo a averbação do sobrenome do companheiro no registro de nascimento da
companheira, que suscitou um intenso debate entre os parlamentares.

Com isso, a Lei 6.015, de 1973, com as alterações da Lei 6.216, de 1975, adotou efetivamente o fólio real no livro
chamado “Registro Geral”. Foi admitido o desdobramento dos livros nos cartórios de grande movimento, e também a
escrituração em folhas soltas, que podem ser escrituradas mecanicamente.

Para Afrânio de Carvalho, o sistema de folhas soltas teria inserido no sistema um elemento de grande risco, pela
possibilidade de extravio, de boa ou má-fé, das folhas, além do desgaste natural que sofrem ao serem manuseadas
neste formato. O autor ainda criticava a nova terminologia “registro”, que, segundo ele, não tinha nenhuma tradição em
nosso direito. Ainda segundo ele, a criação de um assento distinto dos outros – a matrícula - gerava dificuldades, pois
nenhum texto legal brasileiro afirmava que a propriedade se adquiria pela “matrícula” 203.

A despeito das críticas, deve-se reconhecer que a Lei 6.015, de 1973, representou um marco importante na história
da publicidade brasileira pela introdução do sistema de base real. A partir dela, cada imóvel passou a constar de um
determinado fólio real, o qual é aberto com a matrícula. Independentemente do cadastro, este novo sistema forneceu as
bases para o desenvolvimento do regime registral brasileiro em direção a uma maior segurança e precisão.

Todavia, a matrícula em papel tem o defeito de gerar uma aparência de se confundir com o próprio registro, o que
não é verdade. Soma-se a isso a praxe de as certidões serem expedidas em inteiro teor. O inconveniente disto é que, ao
invés de certificar a situação jurídica atual e consolidada do imóvel, acaba o registrador por apresentar ao solicitante um
longo varal, em que foram pendurados, ao longo do tempo, os títulos registrados. De certa maneira, é como se no
interior do sistema de matrícula ainda funcionasse o velho motor do sistema das transcrições.

A adoção definitiva de um sistema de registro de direitos depende da certificação pelo registrador dos direitos que
incidem sobre o imóvel, em especial aqueles que incidem no momento em que a certidão é solicitada. Os atos
praticados compõem o acervo que integra o histórico do imóvel; mas cabe ao registrador, como mediador, informar ao
público o resultado das sucessivas mutações jurídico-reais.

O próximo passo nessa evolução situa-se, pelo que se pode vislumbrar para o futuro, na estruturação dos dados
constantes das matrículas e em sua transposição a um Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis, por meio da primeira
qualificação eletrônica de que trata o artigo 10, III, do Provimento 89, de 18 de dezembro de 2019, da Corregedoria
Nacional de Justiça. Este será, provavelmente, o próximo capítulo de nossa História.
1

Manoel Linhares De Lacerda, Tratado das Terras do Brasil, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Editora Alba Limitada, 1960.
2

Cf. Marcelo Salaroli de Oliveira, Publicidade Registral Imobiliária, 1ª Ed., São Paulo, Saraiva, 2010, p. 107.
3

Cf. Augusto Teixeira De Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 431.
4

Cf. Sérgio Jacomino, Registro do Vigário – um conto sem fim, 2011, Disponível em: <https://arisp.wordpress.com/2011/03/19/registro-do-vigario-
um-conto-sem-fim/>.
5

Cf. Augusto Teixeira De Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 433.
6
Cf. Lourenço Trigo De Loureiro, Instituições de Direito Civil Brasileiro, Vol. I, 4ª Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1871, pp. 253-254.
7

Cf. Manuel Antônio Coelho Da Rocha, Instituições de Direito Civil Portuguez, 2ª. Ed., Rio de Janeiro, H. Garnier, 1907, p. 31.
8

É interessante observar a praxe tabelioa, que, mesmo após a vigência do Código Civil de 1916 e consequente necessidade do registro para a
transmissão dos direitos reais sobre imóveis, seguiu inserindo nos modelos das escrituras públicas expressões como “os outorgantes desde já
cedem e transferem ao outorgado toda a posse, domínio, direitos e ações que sobre o aludido imóvel ora vendido exerciam, para que possa o
mesmo outorgado dele usar, gozar e livremente dispor como seu que é e fica sendo de hoje em diante, por força desta escritura”, ou “os
outorgantes lhe cedem e transferem todo domínio, direito, ação e posse que tinham sobre o dito imóvel”. Para os modelos, confrontar,
respectivamente Sylvio Brantes De Castro, Novo Manual dos Tabeliães (Teoria e Prática), 5ª Ed., São Paulo, Edições e Publicações Brasil,
1963, p. 96 e Carlos Alberto de Motta, Manual Prático dos Tabeliães, 9ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 111. Se isso, por um lado, valia
como tradição ficta antes da criação do Registro Geral, por outro, após a criação do registro, acabou por conter verdadeiro negócio jurídico real
de disposição, em que o alienante manifesta a vontade de transmitir, e o adquirente de adquirir.
9

Cf. Afranio de Carvalho, Registro de Imóveis – Comentários ao sistema de registro em face da Lei No 6.015, de 1975, 3ª Ed., Rio de Janeiro,
Forense, 1982, pp. 1-15.
10

Para mais detalhes, cf. Ivan Jacopetti do Lago, O tratamento jurídico da venda de imóvel com divergência de área na evolução do Direito
Brasileiro; venda ad corpus e ad mensuram, Tese de Doutorado, São Paulo, USP, 2014, p. 32 e seguintes.
11

Cf. Ivan Jacopetti do Lago, O tratamento jurídico da venda de imóvel com divergência de área na evolução do Direito Brasileiro; venda ad
corpus e ad mensuram, Tese de Doutorado, São Paulo, USP, 2014, pp. 47-48.
12

Cf. Ivan Jacopetti do Lago, O tratamento jurídico da venda de imóvel com divergência de área na evolução do Direito Brasileiro; venda ad
corpus e ad mensuram, Tese de Doutorado, São Paulo, USP, 2014, p. 656.
13

Cf. Lourenço Trigo De Loureiro, Instituições de Direito Civil Brasileiro, Vol. II, 4ª Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1871, p. 124.
14

Com um estilo mais literário do que jurídico, o autor cita um exemplo de grande injustiça que a hipoteca poderia causar: “Um homem exhausto
de forças, miserável, talvez enfermo, é socorrido por outro, que lhe empresta o necessário para a sua cura e subsistência até que possa voltar
ao trabalho. Nesse acto o credor é movido, é certo, pelo seu interesse pela confiança que deposita na perícia do artista enfermo; mas não deixa
de consultar os estímulos nobres do coração. O devedor não tem outra garantia a dar, além de esperanças; e essas não são matéria
hypothecavel. Correm os tempos. O artista restabelecido adquire de repente pela sua industria, ou por doação alguns bens e, impellido pela
ambição ou por qualquer circumstancia fortuita, hypotheca estes bens a um novo credor mediante juros enormes. O dinheiro proveniente desse
ultimo empréstimo é consumido na satisfação, quem sabe? – de torpes vícios e paixões desregradas. Como são essas relações jurídicas
apreciadas pela lei civil, por essa mesma lei que em breve se vai mostrar ridiculamente sentimental, sacrificando a justiça a uma falsa
compaixão?Ao homem que conservou uma existência à sociedade e à família; que, promovendo o seu interesse, praticou uma obra de
caridade; ao primeiro credor que, socorrendo o artista, foi o garante da acquisição posterior; a esse a lei nega o direito real, e concede-lhe
apenas um misero direito pessoal, sujeito a mil eventualidades. Ao outro, ao usurário talvez, ao segundo credor, que, no rigor da justiça, fez um
contracto nullo sobre haveres que o artista já não possuía; a esse, talvez usurário e especulador, que veio acoroçoar o vicio e a improbidade; a
lei confere-lhe o direito real, e como corollário infallivel – a preferência. Nem sequer partilha; a um tudo, a outro nada. A quem restituiu a
sociedade um membro útil, a sociedade paga, despojando do que é rigorosamente seu. A quem, ao contrario, prescindiu da creatura racional, e
ateve-se unicamente à cousa, à matéria bruta, a sociedade protege e privilegia! Como é generosa e animadora uma lei que esmaga assim o
coração humano, sob o peso da mais sórdida cobiça! A jurisprudência não cura de homens, mas de proprietários. (...).Em outros termos, o
primeiro credor tinha a hypotheca natural, legitima, racional, que é o resultado lógico do empréstimo: o segundo tem a hypotheca artificial, nulla
e absurda, imposta à força pelo legislador.” Cf. José De Alencar, A Propriedade, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Garnier, 1883, pp. 72-74.
15

Cf. José De Alencar, A Propriedade, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Garnier, 1883, p. 72.
16

Cf. Sérgio Jacomino, PL 1830 – Ernesto Ferreira França, 2009, Disponível em <https://arisp.wordpress.com/2009/05/14/pl-1830-ernesto-
ferreira-franca/>.
17

Cf. Júlia Rosseti Picinin Arruda Vieira, Transmissão da Propriedade Imóvel Pelo Registro do Título e Segurança Jurídica: Um Estudo de História
do Direito Brasileiro, Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, 2007.
18

Cf. José Prospero Jehovah da Silva Caroatá, Resolução de 07 de Junho de 1845, in, Imperiaes Resoluções Tomadas Sobre Consultas da
Secção de Justiça do Conselho de Estado, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Garnier, 1884, pp. 50-53.
19

Cf. José Prospero Jehovah da Silva Caroatá, Resolução de 07 de Junho de 1845, in, Imperiaes Resoluções Tomadas Sobre Consultas da
Secção de Justiça do Conselho de Estado, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Garnier, 1884, pp. 53-64.
20

Cf. Lourenço Trigo De Loureiro, Instituições de Direito Civil Brasileiro, Vol. II, 4ª Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1871, p. 124.
21

Wilson de Souza Campos Batalha, Comentários à Lei de Registros Públicos – Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973, Vol. I, 3ª. Ed., Rio de
Janeiro, Forense, 1984, pp. 16-17.
22
Decreto 482, de 1846, artigo 13: São effeitos legaes do registro das hypothecas: 1.º tornar nulla, a favor do credor hypothecario, qualquer
alienação dos bens hypothecados, que o devedor possa fazer, posteriormente ao registro, por titulo, quer gratuito, quer oneroso: 2.º poder o
credor hypothecario com sentença, penhorar e executar os bens registrados, em qualquer parte que elles se acharem: 3.º conservar ao credor
hypothecario o privilegio de preferencia, nos bens registrados que, pela hypotheca, possa haver adquirido.
23

Cf. Augusto Teixeira De Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 617.
24

Decreto 482, de 1846, artigo 17: Os credores hypothecarios, por titulos de data anterior á installação do Registro geral das hypothecas, na
Comarca onde forem situados os bens hypothecados, conservarão todos os direitos que, a esse tempo houverem adquirido, huma vez que
procedão ao competente registro, dentro de hum anno subsequente á dita installação. As hypothecas referidas que forem registradas depois de
hum anno, só começarão a contar os seus effeitos legaes da data do seu registro.
25

Decreto 482, de 1846, artigo. 14: Depois da installação do Registro das hypothecas, em qualquer Comarca, os effeitos legaes das hypothecas
dos bens n'ella situados, só começarão a existir da data do registro das mesmas hypothecas. Artigo 15: No caso, porêm, em que duas
hypothecas do mesmo devedor sejão registradas no mesmo dia, não terá huma preferencia sobre a outra, ainda que o Tabellião declare que
huma foi registrada de manhã, e outra de tarde. Valerá, em tal caso, em igualdade de circunstancias, a data das escripturas.
26

Cf. Décio Antônio Erpen e João Pedro Lamana Paiva, Panorama Histórico do Registro de Imóveis no Brasil, in, RDI 43 (1998).
27

Cf. Affonso Dionysio Gama, Da Hypotheca (Theoria e Pratica), 1ª Ed., São Paulo, Saraiva, 1921, p. 14.
28

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2ª. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, p. 406.
29

Cf. Relatório da Repartição dos Negócios da Justiça Apresentado à Assembléia Geral Legislativa na 4ª Sessão da 6ª Legislatura em 1847 pelo
Respectivo Ministro e Secretário d’Estado José Joaquim Fernandes Torres, Rio de Janeiro, Typographia do Mercantil, 1847, pp. 8-11.
30

Cf. Augustinho Marques Perdigão Malheiro, Repertório ou Índice Alphabetico da Reforma Hypothecaria e Sobre Sociedades de Crédito Real (L.
n.º 1237 de 24 de Setembro de 1864; Reg. n.º 3741 de 3 de Junho de 1865), 1ª Ed., Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1865, p. V.
31

Cf. Afranio de Carvalho, Registro de Imóveis – Comentários ao sistema de registro em face da Lei nº 6.015, de 1975, 3ª Ed., Rio de Janeiro,
Forense, 1982, pp. 1-15.
32

Cf. Senado Federal, Falas do Trono – Desde o ano de 1823 até o ano de 1889, 1ª Ed., Brasília, Edições do Senado Federal, 2019.
33

Cf. Joaquim Nabuco, Um Estadista do Império, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Garnier, 1897, p. 270.
34

Cf. Augustinho Marques Perdigão Malheiro, Repertório ou Índice Alphabetico da Reforma Hypothecaria e Sobre Sociedades de Crédito Real (L.
n.º 1237 de 24 de Setembro de 1864; Reg. n.º 3741 de 3 de Junho de 1865), 1ª Ed., Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1865, p. VI-VII.
35

Cf. Teresa Cristina de Novaes Marques, Eram os senhores de engenho caloteiros? Reflexões sobre o crédito e os direitos de propriedade no
mundo luso, in, história econômica & história de empresas, (17) (2014).
36

É este o texto do parecer: “No Brasil estes princípios não se haviam introduzido na legislação; a especialidade não se conhecia, e a publicidade
só nos últimos tempos fora admitida e assim mesmo incompleta e manca, não trazendo portanto as vantagens que a deviam acompanhar. Fixar
o direito de propriedade deve ser a primeira condição de um bom sistema hipotecário. Aqui desejaria a Comissão dar à transcrição maior valor
do que lhe dá o projeto; a transcrição deve importar a prova da propriedade e não uma simples presunção.” Cf. Lysippo Garcia, O Registro de
Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 90.
37

É este o texto do parecer: “No Brasil estes princípios não se haviam introduzido na legislação; a especialidade não se conhecia, e a publicidade
só nos últimos tempos fora admitida e assim mesmo incompleta e manca, não trazendo portanto as vantagens que a deviam acompanhar. Fixar
o direito de propriedade deve ser a primeira condição de um bom sistema hipotecário. Aqui desejaria a Comissão dar à transcrição maior valor
do que lhe dá o projeto; a transcrição deve importar a prova da propriedade e não uma simples presunção.” Cf. Lysippo Garcia, O Registro de
Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 90.
38

Cf. Sérgio Jacomino, Reforma hipotecária de 1854: o “monstro de Horácio”, 2010, Disponível em:
<https://arisp.wordpress.com/2010/03/14/reforma-hipotecaria-de-1854-o-monstro-de-horacio/>.
39

“A Comissão não desconhece que seria muito proveitoso para a consolidação e certeza do domínio o registro público dos títulos de
propriedade, de maneira a considerar-se o adquirente, ou o credor hipotecário, perfeitamente seguro e inatacável a respeito do objeto adquirido
ou hipotecado, e dos encargos a que está sujeito; porém, o meio do sistema não produz estes resultados. A propriedade continua sujeita às
variadas ações reais, não só do próprio cedente, mas às que este era obnóxio, visto como, segundo o disposto no projeto, o registro não prova
o domínio, que fica a salvo a quem o tiver. Nos países em que essa formalidade foi adotada, acontece o contrário, porque em alguns constitui a
mutação das propriedades um ato judiciário, em que se liquida o domínio, servindo-lhe de prova; em outros, o solo está demarcado, cadastrado
e dividido cuidadosamente. Se estas condições não existem entre nós, como transplantar o sistema que nelas se baseia?”. Cf. Lysippo Garcia,
O Registro de Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 91.
40

Cf. Sérgio Jacomino, Projeto Nabuco, 2010, Disponível em: <https://arisp.wordpress.com/2010/03/06/projeto-nabuco/ >.
41

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 92.
42

Cf. Didimo Agapito da Veiga, Direito Hipotecário – Comentário ao Decreto 169-A de 19.01.1890, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Laemmert, 1899.
43

Cf. Augusto Teixeira de Freitas, Pareceres do Dr. Augusto Teixeira de Freitas, in, Reforma Hypothecaria – Projectos e Pareceres mandados
coligir pelo Exmo. Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Justiça João Lustosa da Cunha Paranaguá, Rio de Janeiro, Tipografia
Nacional, 1860, pp. 88-89.
44

Cf. Augusto Teixeira de Freitas, Pareceres do Dr. Augusto Teixeira de Freitas, in, Reforma Hypothecaria – Projectos e Pareceres mandados
coligir pelo Exmo. Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Justiça João Lustosa da Cunha Paranaguá, Rio de Janeiro, Tipografia
Nacional, 1860, p. 89.
45

Cf. Augusto Teixeira de Freitas, Pareceres do Dr. Augusto Teixeira de Freitas, in Reforma Hypothecaria – Projectos e Pareceres mandados
coligir pelo Exmo. Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Justiça João Lustosa da Cunha Paranaguá, Rio de Janeiro, Tipografia
Nacional, 1860, p. 92.
46

Cf. Augusto Teixeira de Freitas, Pareceres do Dr. Augusto Teixeira de Freitas, in, Reforma Hypothecaria – Projectos e Pareceres mandados
coligir pelo Exmo. Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Justiça João Lustosa da Cunha Paranaguá, Rio de Janeiro, Tipografia
Nacional, 1860, p. 92.
47

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 89-92.
48

Cf. José Furtado De Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 41-53.
49

Cf. José Furtado De Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 41-53.
50

Cf. José Furtado De Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 41-53.
51

Cf. José Furtado De Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 41-53.
52

Cf. Augusto Teixeira De Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª Ed., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 281. É o teor do artigo 534 da
Consolidação, no qual se baseia o autor: Vendida a mesma cousa a duas differentes pessoas, prefere o comprador à quem primeiro se fez a
entrega, se à esta accedeu o pagamento do preço, ou o vendedor se deu por pago.
53

Cf. Diogo Velho Cavalcanti de Albuquerque Sobrinho, Regimen Hypothecario Brazileiro (Legislação e Doutrina), 1ª Ed., Porto Alegre,
Typographia da Livraria Americana, 1906, p. 26 (nota 9).
54

Cf. José Furtado De Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 41-53.
55

Cf. José Furtado De Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 41-53.
56

Cf. Martinho Garcez, Do Direito das Coisas Segundo o Projeto de Código Civil Brazileiro, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Tipografia do Jornal do
Commercio, 1915, pp. 111-112.
57

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2a. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, s.d., p. 103 (nota 02).
58

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2a. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, pp. 104-107.
59

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2a. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, pp. 104-116.
60

Cf. Agostinho Marques Perdigão Malheiro, Repertório ou Índice Alphabetico da Reforma Hypothecaria e Sobre Sociedades de Crédito Real (L.
n. o 1237 de 24 de Setembro de 1864; Reg. n. o 3741 de 3 de Junho de 1865), 1ª Ed., Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1865, p. VI.
61

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado complete sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc., 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 256.
62

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 94.
63

Segundo o autor, o Direito Brasileiro pré-codificado admitiu a transmissão da propriedade imóvel pelo consenso das partes, independentemente
de tradição, seguindo a doutrina do direito francês e dos demais que a este se filiaram. No entanto, pelos riscos deste regime, foi criado um
sistema de publicidade, para que a transferência tivesse valor contra terceiros. O autor reconhece que haveria aí uma contradição essencial, e
uma incongruência no direito de propriedade, o que, segundo ele, levou a que se preparasse no Código Civil de 1916 uma mudança que a
sanasse. Cf. Caio Mário Da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, Vol. IV, 13ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 90.
64

Para ele, vigorava no Brasil até o advento do Código Civil o Sistema Francês, pelo qual a propriedade imóvel se adquire pelo contrato, servindo
a transcrição para dar publicidade e oponibilidade a terceiros. Nessa época, a escritura de compra e venda, por si mesma, transmitia o domínio,
e, por isso Teixeira de Freitas e Lafayette prepararam a reforma, consubstanciada no Código Civil. Cf. Washington de Barros Monteiro, Curso
de Direito Civil – Direito das Coisas, Vol. 3, 22ª Ed., São Paulo, Saraiva, 1983, pp. 104-105.
65

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2ª. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, p. 116 (nota 02).
66

Cf. Martinho Garcez, Do Direito das Coisas Segundo o Projeto de Código Civil Brazileiro, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Tipografia do Jornal do
Commercio, 1915, p. 115.
67

Cf. Martinho Garcez, Do Direito das Coisas Segundo o Projeto de Código Civil Brazileiro, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Tipografia do Jornal do
Commercio, 1915, p. 117-120.
68

Cf. Martinho Garcez, Do Direito das Coisas Segundo o Projeto de Código Civil Brazileiro, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Tipografia do Jornal do
Commercio, 1915, p. 120 (nota 02).
69

Cf. Relatorio do Ministério da Justiça. Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1865, p. 33.
70

Cf. José Furtado De Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 41-53.
71

Cf. Martinho Garcez, Da Hypotheca e das Acções Hypothecarias – Annotações ao Código Civil Brasileiro (Arts. 809 a 862), 1ª. Ed., Rio de
Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, 1918, p. 135.
72

Cf. Manuel Antônio de Alvarenga, Consolidação das Leis Hypothecarias, 1a. Ed., São Paulo, Andrade, Mello & Comp., 1899, pp. VII-XI. Afirma
o autor: “Funcionários da justiça, obrigados a promover de ofício esta especialização, ao deixar de faze-lo, quantos patrimônios e legítimas
arruinaram! Assim, teria sido melhor a continuação do regime de 1864, pelo qual ficavam gravados de hipoteca todos os bens presentes e
futuros dos reponsáveis, os quais teriam o cuidado de promover a especialização”.
73

Cf. Manuel Antônio de Alvarenga, Consolidação das Leis Hypothecarias, 1a. Ed., São Paulo, Andrade, Mello & Comp., 1899, pp. V-VI.
74

Cf., por exemplo: Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Livraria Jacintho, 1942; Fernando
Euler Bueno, Effeitos da Transcripção no regime do Código Civil Brasileiro, 1ª. Ed., São Paulo, RT, 1941; Soriano Neto, Publicidade Material do
Registro Immobiliario (Effeitos da Transcripção), Recife, Officina Gráfica da Tribuna, 1940.
75

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis, Vol. I: A Transcripção, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, pp. 119-130.
76

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis, Vol. I: A Transcripção, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, pp. 119-130.
77

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis, Vol. I: A Transcripção, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, pp. 119-130.
78

Para Rui Barbosa, a mudança de um termo consagrado – transcrição – não se justificava, tendo ares de modismo. Clóvis Beviláqua refutou a
crítica, afirmando ser frágil o argumento da manutenção pela simples tradição. O termo somente faria sentido onde realmente o título fosse
transcrito integralmente, o que não era o caso, pois, no sistema vigente, a inscrição era feita por extrato, pela inclusão num formulário de dados
específicos constantes do título. Contudo, prevaleceu o argumento posto por Rui Barbosa. Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis: A
Transcripção, Vol. I, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, pp. 142-143.
79

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis, Vol. I: A Transcripção, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, pp. 103-109.
80

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis, Vol. I: A Transcripção, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, pp. 119-130.
81

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis, Vol. I: A Transcripção, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, pp. 119-130.
82

Cf. Clóvis Beviláqua, Direito das Coisas, 1º. Vol., 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1956, pp. 124-125.
83

Cf. Arnoldo Medeiros Da Fonseca, O registro immobiliario e sua força probante em face do Código Civil – Effeitos da Transcripção, in, Archivo
Judiciário, XLII (1937).
84

Cf. Arnoldo Medeiros Da Fonseca, O registro immobiliario e sua força probante em face do Código Civil – Effeitos da Transcripção, in, Archivo
Judiciário, Vol. XLII, 1937, pp. 33-34.
85

Cf. Miguel Maria de Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp. 70-85.
86

Cf. Miguel Maria de Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp. 70-85.
87

Cf. Miguel Maria de Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp. 70-85.
88

Cf. Miguel Maria de Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp. 70-85.
89

Cf. Miguel Maria de Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp. 70-85.
90

Cf. Miguel Maria de Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp. 70-85.
91

Cf. Miguel Maria de Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, pp. 85-88.
92

Cf. Soriano Neto, Publicidade Material do Registro Immobiliario (Effeitos da Transcripção), Recife, Officina Gráfica da Tribuna 1940, pp. 125-
127.
93

Cf. Soriano Neto, Publicidade Material do Registro Immobiliario (Effeitos da Transcripção), Recife, Officina Gráfica da Tribuna 1940, pp. 128-
158.
94

Cf. Soriano Neto, Publicidade Material do Registro Immobiliario (Effeitos da Transcripção), Recife, Officina Gráfica da Tribuna 1940, pp. 61-70.
95

Cf. Soriano Neto, Publicidade Material do Registro Immobiliario (Effeitos da Transcripção), Recife, Officina Gráfica da Tribuna 1940, pp. 162-
163.
96

A responsabilidade do Estado por atos dos notários e registradores sempre foi objeto de muita polêmica, tendo em vista as grandes
dificuldades teóricas em classificá-los como funcionários públicos ou como simples particulares que respondem por seus próprios atos. Serpa
Lopes, nos anos 1960, afirmou que era inegável o seu status de funcionários públicos, e que, portanto, a tese da responsabilidade do Estado
tinha bastante força (Cf. Miguel Maria Serpa Lopes, Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, 4ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960, p. 74).
Maria Sylvia Zanella di Pietro os classifica como “Particulares em colaboração com o Poder Público”, ao lado dos leiloeiros e tradutores
juramentados (Cf. Maria Sylvia Zanella di Pietro, Direito Administrativo, 14ª Ed., São Paulo, Atlas, 2002, p. 437; e Hely Lopes Meirelles os
classifica como “Agentes Públicos Delegados”, ladeados por leiloeiros e tradutores juramentados, e também pelos concessionários e
permissionários de serviços públicos. O autor manifesta-se acerca do tema da responsabilidade do Estado por seus atos, entendendo ser esta
subsidiária, aplicável uma vez comprovada a insolvência do Agente Delegado. Contudo, apresenta decisão do Tribunal de Justiça de São
Paulo, na Apelação Cível 159.914-5, que reconheceu a responsabilidade solidária da Fazenda do Estado por um ato lesivo causado por
tabelião (Cf. Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 32ª Ed., São Paulo, Malheiros, 2006, p. 81). E a linha desta decisão é a que
tem prevalecido em reiterada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sustentando que para efeitos de responsabilidade os notários e
registradores tem status de servidores públicos, e, portanto, o Estado tem responsabilidade direta por seus atos. O Estado mantém a
titularidade da prestação do serviço, o fiscaliza, e o controla. Portanto, não se pode excluir sua responsabilização (Cf. Hércules Augusto da
costa Benício, Responsabilidade Civil do Estado Decorrente de Atos Notariais e de Registro, 1ª Ed., São Paulo, RT, 2005, pp. 243-244). O autor
da citada monografia sobre o tema, à página 250, fixa seu posicionamento contrário à responsabilização direta do Estado, devendo este
somente responder subsidiariamente. Cita o Recurso Extraordinário 201.595/SP – à época em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal –
como um possível leading case deste novo posicionamento. Contudo, a decisão manteve a posição já consolidada, sendo, portanto, pacífica na
jurisprudência a responsabilização direta do Estado por atos notariais e de registro. Todavia, no Recurso Extraordinário 842.846, de Santa
Catarina, julgado em 2019, fixou-se a tese de que o Estado responde objetivamente pelos atos dos notários e registradores que, no exercício
de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, em caso de dolo ou culpa, sob pena de
improbidade administrativa.
97

Cf. Soriano Neto, Publicidade Material do Registro Immobiliario (Effeitos da Transcripção), Recife, Officina Gráfica da Tribuna 1940, pp. 167-
169.
98

Cf. Soriano Neto, Publicidade Material do Registro Immobiliario (Effeitos da Transcripção), Recife, Officina Gráfica da Tribuna 1940, p. 183.
99

Cf. Virgílio de Sá Pereira, Manual do Código Civil, Vol. VIII, Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, 1924, p. 110.
100

Cf. Gondim Filho, Transcrição e Domínio no Código Civil, in, Revista de Direito, Vol. 68, p. 257-263.
101

Cf. Fernando Euler Bueno, Effeitos da Transcripção no regime do Código Civil Brasileiro, 1ª. Ed., São Paulo, RT, 1941, pp. 24-36.
102

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Livraria Jacintho, 1942, p. 6.
103

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Livraria Jacintho, 1942, p. 11.
104

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Livraria Jacintho, 1942, pp. 49-51.
105

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Livraria Jacintho, 1942, pp. 64-67.
106

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Livraria Jacintho, 1942, p. 83.
107

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Livraria Jacintho, 1942, pp. 88-89.
108

Cf. Francisco Bertino de Almeida Prado, Eficácia Probatória do Registro, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1943, pp. 121-122.
109

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado – Parte Especial – Direito das Coisas: Propriedade. Aquisição da
propriedade imobiliária., Vol. XI, 1ª. Ed, Rio de Janeiro, Borsoi, 1955, pp. 206-207.
110

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado – Parte Especial – Direito das Coisas: Propriedade. Aquisição da
propriedade imobiliária., Vol. XI, 1ª. Ed, Rio de Janeiro, Borsoi, 1955, p. 211.
111

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado – Parte Especial – Direito das Coisas: Propriedade. Aquisição da
propriedade imobiliária., Vol. XI, 1ª. Ed, Rio de Janeiro, Borsoi, 1955, pp. 234-235.
112

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado – Parte Especial – Direito das Coisas: Propriedade. Aquisição da
propriedade imobiliária., Vol. XI, 1ª. Ed, Rio de Janeiro, Borsoi, 1955, pp. 237-238.
113

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado – Parte Especial – Direito das Coisas: Propriedade. Aquisição da
propriedade imobiliária, Vol. XI, 1ª. Ed, Rio de Janeiro, Borsoi, 1955, pp. 248-249.
114

Para o autor, a transcrição do título no registro de imóveis corresponde à tradição solene do bem, que os individualiza e dá publicidade.
Presume-se pertencer ao inscrito no registro o domínio da coisa. Não obstante, a presunção é relativa, revertendo o ônus da prova, e
facilitando a defesa do inscrito. Cf. Sílvio Rodrigues, Direito Civil – Direito das Coisas, Vol. V, 5ª Ed., São Paulo, Saraiva, 1975, pp. 92-93.
115

Após o advento do Código Civil, teria o direito brasileiro se aproximado do sistema da família germânica, por ter se tornado a transcrição
formalidade essencial à transmissão do domínio. No entanto, no Brasil não há organização imobiliária semelhante à da Alemanha, e por essa,
razão, a transcrição apenas geraria presunção relativa de domínio em favor do titular inscrito. Contudo, não se trata da mera publicação do
Sistema Francês – é tradição solene do imóvel, transmitindo o domínio ao adquirente. Cf. Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil
– Direito das Coisas, Vol. 3, 22ª Ed., São Paulo, Saraiva, 1983, p. 105.
116

Para CAIO MÁRIO, no projeto de Código Civil, Beviláqua tentou criar um método que adaptasse o Sistema Germânico às condições do Brasil,
resultando na técnica germânica de aquisição pelo registro, mas sem todos os efeitos gerados em tal sistema. Assim, o registro no Brasil cria o
direito real. Não tem, porém, a natureza de negócio jurídico abstrato do direito germânico. É ato jurídico causal, dependente do título que lhe
deu causa, somente operando a transmissão dentro dos limites deste. A presunção gerada seria, portanto, relativa, diferentemente da alemã. O
registro tem, contudo, certa força probante, entendida esta no sentido de que o registro indica um titular de direito real e institui a presunção
relativa de propriedade. Cf. Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, Vol. IV, 13ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1998, pp. 90-94.
117

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, Vol. XI, 1a Ed., São Paulo, RT, 2012, pp. 410-445.
118

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, Vol. XI, 1a Ed., São Paulo, RT, 2012, pp. 410-445.
119

Cf. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, Vol. XI, 1a Ed., São Paulo, RT, 2012, p. 427.
120

Cf. Clóvis do Couto e Silva, A Obrigação Como Processo, 1a Ed., Rio de Janeiro, Editora FGV, 2007, pp. 52-53.
121

Cf. Clóvis do Couto e Silva, A Obrigação Como Processo, 1a Ed., Rio de Janeiro, Editora FGV, 2007, pp 54-55.
122

Cf. Rafael Domingos Faiardo Vanzella, O Contrato e os Direitos Reais, 1ª Ed., São Paulo, RT, 2013, p. 261.
123

Cf. Rafael Domingos Faiardo Vanzella, O Contrato e os Direitos Reais, 1ª Ed., São Paulo, RT, 2013, p. 261.
124

Cf. Leonardo Brandelli, Registro de Imóveis – Eficácia Material, 1a Ed., Rio de Janeiro, Forense, 2016, pp. 273-317.
125

Cf. Décio Antonio Erpen, Registros Públicos, in RT 610 (1986).


126

Cf. Décio Antonio Erpen, João Pedro Lamana Paiva, Princípios do Registro Imobiliário Formal, in, DIP, Ricardo (coord.), Introdução ao Direito
Notarial e Registral, 1ª Ed., Porto Alegre, SafE, 2004.
127

Cf. Marcelo Augusto Santana de Melo, O meio ambiente e o Registro de Imóveis, in, Registro de Imóveis e Meio Ambiente, 1ª Ed., São Paulo,
Saraiva, 2010, p. 39.
128

Cf. Nancy Andrighi, Ricardo Dip, Apontamentos Acerca dos Registros Públicos – Lei Nº 13.097/2015, disponível em
<http://www.irib.org.br/files/obra/20150327_artigo_nancy_desembargador_1.pdf >.
129

Cf. George Akerlof, The Market For “Lemons”: Quality Uncertainty and the Market Mechanism, in, The Quarterly Journal of Economics, (84 – 3)
(1970).
130

Cf. Fernando Pedro Méndez González, Fundamentación Económica Del Derecho de Propiedad Privada e Ingeniería Jurídica Del Intercambio
Impersonal, 1ª. Ed., Cizur Menor, Editorial Aranzadi, 2011, pp. 112-138.
131

Cf. Marcelo Augusto Santana de Melo, Teoria Geral do Registro de Imóveis: Estrutura e Função, 1ª Ed., Porto Alegre, SAFe, 2016, p. 137.
132

No mesmo sentido, cf. Marinho Dembinski Kern, A Lei 13.097/15 adotou o princípio da fé-pública registral?, in, RDI (78) (2015), p. 53.
133

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, p. 5.
134

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, p. 5.
135

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, pp. 6-7.
136

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, pp. 8-9.
137

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, pp. 8-9.
138

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, pp. 8-9.
139

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, pp. 9-11.
140

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, pp. 11-12.
141

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, pp. 9-11.
142

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, p. 14.
143

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, p. 24.
144

Cf. José Homem Correia Telles, Manual do Tabelião ou Ensaios de Jurisprudência Eurematica Contendo a Coleção de Minutas dos Contratos e
Instrumentos Mais Usuais, e das Cautelas Mais Precisas nos Contratos e Testamentos, 1ª Ed., Lisboa, Imprensa Nacional, 1859, p. 28.
145

Cf. Lourenço Trigo de Loureiro, Instituições de Direito Civil Brasileiro, Vol. II, 4ª Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1871, p. 123.
146

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., RIO DE JANEIRO, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 81-82.
147

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., RIO DE JANEIRO, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 83-84.
148

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 2º; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 615.
149

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 3º; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 616.
150

Cf. Augusto Teixeira de Freitas , Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 617.
151

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 22. A lei fala tão somente em “autoridade competente”. Há, no entanto, no apêndice deste trabalho, uma transcrição
do termo de abertura do Livro de Inscrições do das Hipotecas Anteriores à Instalação do Registro do 1º Registro de Imóveis da Capital do
Estado de São Paulo, subscrito pelo Juiz de Direito da Comarca, Manoel de Castro Menezes, o que indica ser esta a autoridade a que a lei se
refere.
152

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 23.


153

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 5º.


154

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 6º.


155

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 8º.


156

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 10º.


157

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 11.


158

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 12.


159

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 18; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 622.
160

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 19; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 622.
161

Cf. Dec. 482 de 1846, arts. 24 e 25; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 623.
162

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 26; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 624.
163

Cf. Dec. 482 de 1846, arts. 27 e 28; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 624.
164

Cf. Dec. 482 de 1846, arts. 29 e 30; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 625.
165

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 33; Augusto Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, 2ª E., Rio de Janeiro, Laemmert, 1865, p. 626.
166

Cf. Dec. 482 de 1846, art. 32.


167

Por exemplo, o encerramento do registro transcrito no apêndice: “O referido hé verdade, de que dou fé a presente. Escrevi, conferi e assigno
nesta Imperial Cidade de São Paulo. Aos quatro de agosto do Anno de Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil, oitocentos e
quarenta e sete. Fortunato José da Silva, tabellião as escrevi, conferi e assigno.”
168

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., RIO DE JANEIRO, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 85-86.
169

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, p. 87.
170

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 88.
171

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 89.
172

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 90-91.
173

Cf. José Furtado de Mendonça, Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 92-93.
174

Cf. José Furtado de Mendonça , Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 101-102.
175

Cf. José Furtado de Mendonça , Direito Hypothecario do Brasil, 1ª Ed., Rio de Janeiro, A. A. Da Cruz Coutinho Editor, 1875, pp. 103-104.
176

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 13.
177

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 13-17.
178

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 18-21.
179

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 22-23.
180

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 24-26.
181

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, pp. 38-39.
182

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, pp. 40-42.
183

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 43-44.
184

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, p. 43-48.
185

Cf. Joaquim de Oliveira Machado, Manual do Official de Registro Geral e das Hypothecas – Tratado completo sobre a definição, criação,
concurso, provimento, virtudes, direitos e deveres, permuta, graduações, férias, licenças, penalidades do cargo, bem como sobre a inscripção
de hypotheca ou penhor e transcripção de transmissão de immoveis ou constituições de ônus reaes. Acompanhado de um formulário de
instalação do registro, prenotação, especialisação, recursos, extractos, etc, 1ª. Ed., Rio de Janeiro, B. L. Garnier, 1888, pp. 71-73.
186

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2ª. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, s.d., pp. 128-130.
187

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2ª. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, s.d., p. 132.
188

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2ª. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, s.d., p. 122.
189

Cf. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Cousas, 2a. Ed., Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, s.d., p. 123.
190

Cf. Sérgio Jacomino, Os extratos e o antigo bordereau do Direito Francês, 2010, Disponível em: <https://arisp.wordpress.com/2010/03/08/os-
extratos-e-os-antigos-bordereaux-do-registro-frances/>.
191

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 337.
192

Cf. Afrânio de Carvalho, Registro de Imóveis, 3ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1982, pp. 482-492.
193

Cf. Afrânio de Carvalho, Registro de Imóvei, 3ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1982, pp. 21-28.
194

Cf. Elvino Silva Filho, Considerações em torno da Nova Lei dos Registros Públicos (Decreto-Lei 1.000, de 21 de Outubro de 1969), in, RT (413)
(1970).
195

Cf. Elvino Silva Filho, Considerações em torno da Nova Lei dos Registros Públicos (Decreto-Lei 1.000, de 21 de Outubro de 1969), in, RT (413)
(1970).
196

Cf. Elvino Silva Filho, Considerações em torno da Nova Lei dos Registros Públicos (Decreto-Lei 1.000, de 21 de Outubro de 1969), in, RT (413)
(1970).
197

Cf. Elvino Silva Filho, Considerações em torno da Nova Lei dos Registros Públicos (Decreto-Lei 1.000, de 21 de Outubro de 1969), in RT (413)
(1970).
198

O dossiê completo da reforma está disponível no website da Câmara dos Deputados, no link
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=5C99D662062B81261A9DAA2213703D43.proposicoesWebExterno2?
codteor=1192155&filename=Dossie+-PL+2267/1970>.
199

Cf. Ruy Ferreira da Luz, Prática do Registro de Imóveis, 1ª Ed., São Paulo, Sugestões Literárias, 1974, pp. 12-13.
200

Cf. Lysippo Garcia, O Registro de Imóveis – A Transcripção, Vol. I, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 350.
201

Cf. Ruy Ferreira da Luz, Prática do Registro de Imóveis, 1ª Ed., São Paulo, Sugestões Literárias, 1974, p. 48.
202

Cf. Afrânio de Carvalho, Registro de Imóveis, 3ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1982, pp. 21-28.
203

Cf. Afrânio de Carvalho, Registro de Imóveis, 3ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1982, pp. 1-15.
CAPÍTULO 5. O SISTEMA TORRENS
CAPÍTULO 5. O SISTEMA TORRENS

Capítulo 5. O Sistema Torrens


Diferentemente do que ocorreu nos sistemas de registro da família romanístico-
germânica, cuja conformação atual resultou de um longo, e em grande parte
anônimo, processo histórico de desenvolvimento, o Sistema Torrens foi pensado
como um todo articulado por um autor específico e para uma finalidade específica.

Seu criador, o irlandês Robert Richard Torrens, começou a se interessar pelo


tema da segurança das transmissões imobiliárias no ano de 1837, ano em que um
amigo seu sofreu as terríveis consequências da então vigente legislação inglesa
sobre a matéria. Esse amigo, um oficial do exército indiano, adquiriu uma
considerável extensão de terreno montanhoso suscetível de conversão em terras
de lavoura, no qual investiu toda a sua poupança em melhorias e mesmo na
construção de uma mansão. Posteriormente, o amigo veio a descobrir que havia
um defeito no título aquisitivo da pessoa de quem havia comprado o imóvel, e, com
isso, acabou perdendo não apenas o imóvel, como também todas as benfeitorias
que havia realizado, em um montante aproximado de 20.000 libras, vendo-se
reduzido à pobreza por ter de suportar, ainda, substanciosas despesas legais1.

Torrens atuou entre 1841 e 1852 como Coletor nas aduanas da Austrália do
Sul, e sua experiência com a transmissão de navios fez com que passasse a
acreditar que poderia reformar a legislação inglesa de transmissões imobiliárias
com base nos princípios da transmissão de navios. Nomeado registrador geral de
Deeds em 1853, candidatou-se nas eleições para a Assembleia da Austrália do Sul
de 1857, como representante de Adelaide. O eixo de sua campanha foi
precisamente a reforma imobiliária2.

É importante esclarecer, ainda que brevemente, em que consiste um sistema


de “Deeds Registration”. Trata-se de um repositório de documentos relativos a
parcelas de terras, os quais deixam de ser detidos apenas pelos proprietários para
tornar-se públicos, no sentido de disponíveis ao público. Não há, todavia, qualquer
tipo de controle de validade intrínseca ou extrínseca destes documentos pelo
registrador. O valor da deed, isto é, do instrumento do negócio de aquisição,
permanece sendo exclusivamente o do negócio nela instrumentalizado, sem
qualquer reforço de eficácia decorrente da registração3. Esse tipo de sistema, que,
em alguns países, pode gerar prioridade do título registrado em relação a outro
não registrado – mas nada além disso – tem sido chamado “Registro de
Documentos”4.

Eleito deputado, Torrens apresentou um projeto de reforma, cuja terceira e


última aprovação se deu em 15 de dezembro de 1857, e cuja sanção se deu em 27
de janeiro de 1858, com entrada em vigor em 02 de julho do mesmo ano. Após a
aprovação da Lei, renunciou a seu cargo na Assembleia e foi designado
Registrador Geral de Direitos, função que desempenhou até 1863, ano em que
regressou à Inglaterra5.
Antes disso, no entanto, Torrens se dedicou a ampliar o uso do sistema que
criara em colônias próximas à Austrália do Sul, com êxito em Queensland (1861),
Victória (1863), Tasmânia (1863), Nova Gales do Sul (1863), Nova Zelândia (1870)
e na Austrália Ocidental (1875). No final do século XIX e no século XX o sistema
expandiu-se para além da Australásia, sendo adotado em alguns estados norte-
americanos, algumas províncias do Canadá, alguns países da África, como Quênia
e Uganda6, na República Dominicana e mesmo no Brasil7.

As propostas de Torrens suscitavam um intenso e apaixonado debate, e


encontraram resistência feroz entre juristas especializados nas operações
imobiliárias, que tinham interesse em manter o hermetismo das transações. Esta
resistência também aconteceu nos Estados Unidos da América, por parte de
juristas, de companhias de title insurance e de private abstractors – profissionais
especializados no levantamento de cadeias filiatórias de imóveis8. Era tamanho o
interesse popular pelo tema que, em outubro de 1862, data já próxima do iminente
regresso de Torrens para a Inglaterra, colonos alemães da cidade de Tanunda
organizaram uma manifestação pública de ação de graças ao registrador pela
criação do sistema9.

Quando Torrens iniciou seu trabalho na Austrália do Sul, ainda como Collector,
em 1841, a colônia estava em vias de encerrar, em 1842, um malfadado
experimento de colonização baseado nas ideias de Edward Gibbon Wakefield10.
Segundo Wakefield, em brevíssima síntese, as terras da colônia outorgadas a
particulares deveriam ser vendidas em leilões públicos, e não doadas,
empregando-se o dinheiro arrecadado com a venda no financiamento das
despesas de viagem de novos colonos, o que asseguraria um suprimento contínuo
de mão de obra. O sistema fracassou de forma retumbante, quase levando a
colônia à ruína em 1839, em razão da especulação imobiliária, da venda da maior
parte das terras a pessoas que não viviam, nem se encontravam, na Austrália do
Sul, e de graves problemas na identificação dos imóveis vendidos. A partir de
1842, imigrantes alemães começaram a chegar, e nos quatro anos seguintes a
população local aumentou em 64%. A partir dos anos 1850, um novo problema
relacionado a terra ganhou relevo: a situação dos squatters, meros ocupantes sem
título11.

Torrens apresentava cinco inconvenientes principais relativamente à aplicação


na colônia do Direito inglês então vigente, acerca das transmissões imobiliárias. O
primeiro deles era a complexidade do sistema, o que fazia com que os colonos não
se aventurassem a negociar suas próprias terras sem recurso aos conveyancers,
advogados experimentados na matéria. O segundo inconveniente era uma
decorrência do primeiro: a necessidade de contratação desses profissionais gerava
um alto custo para a efetivação dos negócios. Este segundo inconveniente poderia
ser tolerado, segundo Torrens, não fosse o terceiro inconveniente: os prejuízos e
perplexidade causados a adquirentes e credores pela incerteza acerca da validade
de todos os direitos adquiridos nesse sistema. O quarto requisito era a delonga nos
procedimentos de transferência, feitos segundo o Direito Inglês; e o quinto requisito
era uma consequência de todos os demais: o valor da terra como base de um
mercado de crédito seguro e conveniente ficava muito reduzido12.
Segundo Torrens, todos estes inconvenientes resultavam de uma única causa:
a natureza dependente dos direitos (“dependent titles”), ou seja, a necessidade de
que cada título aquisitivo fosse fundado em uma cadeia de proprietários anteriores,
demandando, em cada novo negócio, o escrutínio pormenorizado por profissionais
especializados de cada transação anterior, de maneira a se verificar o
preenchimento de requisitos legais, assim como a inexistência de qualquer
interesse de terceiro acerca do imóvel. Segundo ele, “a dependent title is a chain
no stronger than its weakest link”13.

A solução proposta para esses problemas era a criação de um sistema fundado


em direitos independentes, direitos estes que, por sua independência, eram
revestidos do atributo da indefeasibility: a inatacabilidade. Sendo inatacáveis os
direitos resultantes da registração, por outro lado, surgia a necessidade da criação
de um fundo de compensação a pessoas que, eventualmente, viessem a ser
espoliadas por um certo registro, já que não poderiam opor seu direito ao novo
proprietário. A fim de se facilitar a realização dos negócios, Torrens também
propunha o uso de formulários padronizados14.

A despeito de ser o autor do projeto de lei, em nenhum momento Torrens


pretendeu afirmar sua absoluta originalidade. Com efeito, reconhecia como
antecedentes de seu sistema um conjunto de instituições e costumes de diferentes
origens. A primeira fonte era uma mescla de um antigo instituto do Direito Inglês
Medieval, conhecido como copyhold tenure, mesclado com elementos feudais15.

Estas copyhold tenures eram modalidades de apossamento de terra por servos


da gleba, mediante concessão do senhor feudal, que, se em um primeiro
momento, eram feitas a título precário e sujeitas à boa vontade do concedente,
passaram, com o tempo, a conceder um verdadeiro direito ao adquirente,
reconhecido pelo Direito Costumeiro. Já no século XVI, estas concessões –
denominadas copyhold, em virtude de serem provadas por uma cópia de um
documento de concessão cujo original ficava em posse do senhor – perderam seu
traço servil e passaram a ser uma das modalidades mais comuns de detenção da
terra16.

Eram também fontes do novo sistema, o registro que já existia nas cidades da
Liga Hanseática, na Prússia, Holanda e Baviera, que estão nas origens do Sistema
Germânico; o Merchant Shipping Act inglês, de 1854; e o informe da Registration
of Title Comission do Parlamento Inglês, de 1857. Em especial, Torrens afirmava
sua admiração pelo sistema da cidade de Hamburgo, o qual, segundo ele, além de
superior, contava então com uma vigência de mais de seiscentos anos17. Quanto a
este último ponto, permanece em aberto a polêmica sobre o quanto pode ter
influenciado esta opinião, assim como a própria concepção da Lei sancionada em
1858, o contato de Torrens com o jurista alemão emigrado para a Austrália do Sul
Ulrich Hübbe, que em 1857 chegou a publicar um livro intitulado “The Voice of
Reason and the History brought to bear against the present absurd method of
transferring and encumbering Immovable Property”, no qual propunha a adoção do
modelo de Hamburgo18.

Deste sistema, o Sistema Torrens adquiriu os princípios da integridade do


registro, ou seja, o de que não há nenhum direito ou ônus real salvo os que
estiverem registrados; o princípio da inscrição, ou, a aquisição do direito pelo
registro, ou ainda title by registration; a própria indefeaseability, como uma
derivação – e ampliação – da fé pública registral, já que protegia até mesmo a
própria parte do negócio viciado, se a aquisição fosse onerosa e de boa-fé; a
regulamentação da hipoteca, que abandonava o modelo inglês de garantia
mediante transmissão da propriedade pela mortgage; a adoção do fólio real; o uso
de mapas para a identificação dos imóveis; e os caveats, ou seja, um mecanismo
de inibição temporária da prática de atos de registro relativamente a um certo
imóvel, de maneira a proteger provisoriamente direitos ainda não registrados19.

Eram, por outro lado, aspectos originais do projeto apresentado por Torrens à
criação de um fundo de seguro destinado a indenizar prejudicados pelo registro; a
não interferência dos tribunais, já que, enquanto em Hamburgo havia uma etapa
judicial, em que a propriedade era abandonada pelo proprietário e depositada nas
mãos do adquirente (Verlassung) com pregão público (Ausrufung), o sistema de
Torrens concentrava todo o procedimento no registro; e o chamado “Sistema de
Duplicados”, pelo qual cada nova registração é feita em um livro no registro, e
também em uma cópia, que permanece com o adquirente. A cada nova transação,
a via do adquirente deve ser apresentada ao registro para ser atualizada; e a falta
da via duplicada, ou sua desatualização, impediam a negociação20.

O Sistema Torrens foi introduzido no Brasil pelo Decreto 451-B de 1890, e foi
apontado, na justificativa apresentada ao então presidente Deodoro da Fonseca,
assinada pelo Ministro da Fazenda, Ruy Barbosa, da Justiça, Campos Salles, e
dos Transportes e Agricultura, Francisco Glicério, como “a mais adeantada phase
das idéas contemporaneas quanto à propriedade territorial, o mais bemfazejo de
todos os regimens para o seu desenvolvimento e fructificação nas sociedades
hodiernas”. Pretendiam, com o projeto, reunir os vários “institutos da publicidade”
então existentes, como registro de hipotecas, transcrições, cadastros, e, com isso
constituir “uma especie de estado civil da propriedade immobiliaria”. Segundo eles,
o sistema da Áustria e de outras legislações germânicas adotava um mecanismo
sábio, assegurando a propriedade, mas insuficiente, já que não atendia às
necessidades da facilidade da circulação dos direitos. O Sistema Torrens teria a
virtude de combinar uma “publicidade perfeita dos imóveis”, isto é, gerar segurança
dos direitos, com a facilidade de sua circulação21.

A justificativa já apresentava como característica do Sistema Torrens sua


facultatividade como regra, ou seja, caberia ao proprietário da terra optar por
adotá-lo para seu imóvel, ou mantê-lo sob o regime geral. Ao optar por utilizá-lo,
iniciaria o procedimento por providenciar a planta da propriedade, bem como o
memorial declarativo do estado do seu domínio, documentos estes para os quais
não precisaria de “conselheiro profissional”, já que “a repartição do registro
proporciona-lhe fórmulas impressas, de que basta encher os claros”. Reconhecida
a procedência dos títulos apresentados, seguia-se o processo de expurgo do
domínio, franqueando-se aos interessados a possibilidade de impugnar o registro.

Não havendo, ou não sendo procedente a impugnação, o registrador deveria


redigir dois certificados idênticos, em um “livro talão”, descrevendo o imóvel,
fazendo referência ao mapa e consignando os direitos que recaíssem sobre os
imóveis. Uma via permaneceria no registro, denominada “Matriz”; e a outra seria
entregue ao proprietário, lhe servindo de título, e lhe assegurando “valor supremo
contra todas as impugnações ulteriores”, já que “o Estado afiança a certeza jurídica
do certificado”.

Todavia, após algum tempo veio Ruy Barbosa a mudar de opinião quanto a
este ponto, vindo a saber que, mesmo na Austrália, o sistema era obrigatório em
alguns casos, como o das concessões feitas pela Coroa após sua vigência. Assim,
concluiu que a facultatividade deveria ser um estágio inicial da implantação do
sistema, após o que, deveria haver sua generalização coercitiva. Por isso, acabou
propondo o registro obrigatório na então Capital Federal, e o facultativo nas outras
partes do país22, pretendendo, na capital, atribuí-lo “a uma sociedade em
comandita, ou anônima, autorizada pelo ministro da fazenda na Capital Federal”23.
Também seria obrigatório o registro no Sistema Torrens das aquisições de terras
públicas alienadas depois da publicação do Regulamento.

A despeito disso, e da edição de um regulamento em 1918, noticiava


PHILADELPHO AZEVEDO, em 1942, que no Estado do Rio de Janeiro havia
notícia de um único caso de aplicação, e ainda assim incompleta24. Durante toda
sua existência, o sistema padeceu do questionamento de sua constitucionalidade,
ou mesmo de sua vigência25. Todavia, o sistema fez sucesso nos estados de
Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. No final dos anos 1970, somente em
Porto Alegre havia mais de 46.000 matrículas neste sistema26.

Outra característica já apontada na justificativa era a unicidade do título, ou


seja, a cada novo negócio, caberia ao registrador “anular” o título anterior, em todo
ou em parte conforme se tratasse de alienação parcial ou total, e redigir um novo
título, de maneira que na transação seguinte fosse necessário verificar a validade
tão somente do último título anterior.

Também já se apontavam na justificativa outras características que


permaneceriam no sistema, como a responsabilidade do Estado pelos prejuízos
causados pela matrícula do imóvel no sistema ou na entrega dos títulos, e a
publicidade com base real.

O Decreto 451-B e seu Regulamento, Decreto 951-A observavam em grande


parte os paradigmas estabelecidos pela Lei da Austrália do Sul. Todavia, não
observavam a não interferência judicial. Com efeito, cabia ao juiz determinar
intimações de proprietários e interessados, ordenar correções e suprimentos,
decidir sobre a realização ou não do registro e julgar oposições a ele.

A despeito disso, as alienações ordinárias, posteriores a criação da matrícula,


passavam a ser atos caracteristicamente administrativos, com o que o registrador
apenas sujeitava-se ao juiz por ser por ele fiscalizado, tal como no registro geral27.

Não cabia ao registrador analisar a legalidade do título, mas tão somente se a


documentação estava em termos de ser despachada pelo juiz, prevendo-se a
suscitação de dúvida, nesta etapa, caso concluísse pela negativa.

O título que o proprietário recebia quando o registro era realizado em duplicado


– o extracto da matriz – era revestido de certa cartularidade, no sentido que esta
tem quando diz respeito aos títulos de crédito. Se o proprietário perdesse sua via
ou a tivesse, destruída, deveria anunciar por trinta dias consecutivos em jornais de
maior tiragem, e prestar declaração perante o juiz do registro contendo todos os
esclarecimentos necessários a afirmar sua qualidade e hipotecas que porventura
gravassem o imóvel, caso em que lhe seria entregue novo título. Sem este extrato,
não poderia o proprietário alienar ou onerar o imóvel, e nenhum ato poderia ser
registrado na matriz sem que esta via fosse apresentada ao registrador.

Quanto aos efeitos, reconhecia-se o princípio da inscrição, reputando


absolutamente ineficaz qualquer ato translativo de propriedade ou constitutivo de
hipoteca ou outro direito real limitado sobre imóvel sujeito ao Registro Torrens
antes da registração; reputavam-se inoponíveis atos anteriores não registrados; e
concedia-se ao adquirente exoneração quanto a reclamações relativas a direitos
que não constassem do registro.

Quanto ao aspecto formal, o Regulamento previa quatro livros, um de matriz,


em forma de talão, no qual seriam lançadas as matrículas dos imóveis; um de
protocolo, “chave do registro”, para apontamento dos títulos apresentados
diariamente a registro; um de indicador real; e um de indicador pessoal. No
entanto, a transcrição dos títulos de transmissão e a instituição dos ônus reais e
hipotecas ainda seriam feitas, também, nos livros do registro geral, lançando-se na
coluna das anotações uma observação de que o imóvel estava inscrito no Sistema
Torrens. Os dois sistemas, com isso, conviveriam: segundo o Regulamento,
primeiramente se lançavam as transmissões e onerações nos livros do registro
geral, e, em seguida, no livro matriz do Sistema Torrens.

O Código de Processo Civil de 1939 tratou do Registro Torrens, trazendo


algumas poucas mudanças a previsões que, em linhas gerais, já se encontravam
em alguns códigos de processo estaduais28. Estabelecia o Código que poderia o
proprietário do imóvel rural requerer sua inscrição no sistema, não abrangendo,
portanto, os imóveis urbanos. Também passou a prever a participação do
Ministério Público no processo, com poderes para impugnar o registro por falta de
prova completa de domínio ou preterição de outra formalidade legal.

Este tratamento do tema pelo Código Civil de 1939 pôs fim a uma polêmica que
gravitava em torno de ter o artigo 1.807 do Código Civil de 1916 promovido a
revogação dos decretos de 189029, já que o Sistema Torrens, aparentemente, era
incompatível com o sistema geral de transmissão de propriedade pela transcrição
constante dos artigos 531 a 535.

Com isso, a etapa administrativa do registro e seus aspectos materiais seguiam


disciplinadas pelos decretos de 1890 até o advento da Lei 6.015 de 1973.
Paralelamente, o Código de Processo Civil de 1973 manteve em vigor, no artigo
1.218, IV, o procedimento do Código de 1939.

Esta sobrevida, todavia, teve curta duração, já que no mesmo ano foi
promulgada a Lei 6.015/73, revogando tacitamente os dispositivos do Código de
1939 em virtude de ter regulamentado inteiramente a matéria.
A Lei 6.015/73 manteve a exclusividade do Registro Torrens para os imóveis
rurais, tal como já constava do Código de Processo Civil de 1939. Ainda,
estabeleceu requisitos técnicos para a elaboração dos levantamentos e plantas,
como escalas, orientação, e o uso de goniômetro, de maneira a possibilitar a
incorporação dos mapas em cartas gerais de cadastro.

Quanto à disciplina do registro propriamente dito, a Lei 6.015/73 pouco tratou.


Infere-se de seus dispositivos que os antigos livros do Regulamento de 1890 não
mais devem ser utilizados. Prevê o artigo 277 o protocolo do pedido de inscrição
no Registro Torrens, o que, presume-se, deve ser feito no próprio Livro 1.

Se procedente o pedido, e transitada em julgado a sentença que o deferiu, o


oficial deverá, a teor do artigo 288, inscrever na matrícula o julgado que
determinou a submissão do imóvel aos efeitos do Registro Torrens.

Tem-se, assim, que para os imóveis não submetidos a ele na vigência do


sistema anterior, o Registro Torrens não mais consiste em um sistema de registro
paralelo, com livros próprios, mas sim à possibilidade de submeter um imóvel
registrado no registro geral aos efeitos do Sistema Torrens. Assim, a submissão
aos efeitos desse sistema resultará em um ato de registro no Livro 2, na matrícula
que já havia sido aberta para o imóvel pelo sistema geral. Observe-se que antes
da vigência da Lei 6.015 de 1973, e segundo a sistemática do Código de Processo
Civil de 1939, o registro ainda deveria ser feito no “Livro Matriz” dos decretos de
189030. A Lei 6.015/73, como se disse, unificou os sistemas.

Ressalva-se a situação dos imóveis que já haviam sido inscritos no Sistema


Torrens ao tempo em que efetivamente coexistiam dois sistemas, situação esta
que, por vezes, gera uma série de conflitos e se mantém mesmo contra a vontade
do proprietário, que pode se ver obrigado a praticar atos em duplicidade para que
seja constituído um certo direito31.

Não indica, contudo, a Lei 6.015/73 quais seriam estes efeitos do Registro
Torrens a que o imóvel fica submetido, os quais, por essa razão, somente podem
ser os do artigo 43 do Decreto 451-B de 1890, ou seja, a exoneração do
adquirente ou cessionário contra “[...] reclamações, relativas a direitos, que não
constem do registro”, ou, mais tecnicamente, a inoponibilidade ao proprietário de
quaisquer direitos – ou pretensões – não constantes do registro quando da
submissão do imóvel aos efeitos do sistema. Tem-se, com isso, uma sobrevivência
indireta de parte do Decreto, ainda que tenha sido revogado expressamente pelo
Decreto 11, de 18 de janeiro de 1991.

Era esta também a conclusão de JACY DE ASSIS em 1966, ao considerar que


o Código de Processo Civil de 1939 – tal como fazem os artigos 277 a 288 da Lei
6.015 de 1973 – somente tratava de matéria processual. Uma vez concluído o
procedimento e feito o registro, nenhuma ação reivindicatória será mais admissível
contra o proprietário. A certidão do registro consistirá em obstáculo absoluto a
qualquer litígio relacionado ao imóvel, ainda que, na verdade, houvesse defeitos na
cadeia filiatória do bem32.
Tornou-se, assim, no Brasil, o Registro Torrens um método de se expurgar a
propriedade de dúvidas quanto aos títulos anteriores na cadeia filiatória, integrado
ao sistema do Registro Geral. Esta depuração protege aquele que já é proprietário
quando da submissão do imóvel a seus efeitos, pelo que se distingue da fé pública
registral, dirigida à proteção de terceiros adquirentes. Por essa razão, resulta na
inatacabilidade do direito – indefeasibility – reforçada pela eficácia da coisa
julgada, com aptidão para produzir efeitos materiais, e mesmo criar propriedade
onde antes não havia.

Esta sentença é constitutiva, e, por ser antecedida da publicação de editais,


gera efeitos erga omnes 33.

Não se trata, com isso, de mera presunção juris et de jure de domínio, como se
tem afirmado, mas de, juntamente com a fé pública registral trazida pela Lei 13.097
de 2015, exemplo de eficácia material do registro de imóveis no Direito Brasileiro.
1

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, p. 19.
2

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp. 20-21.
3

Cf. Bruce H. Ziff, Principles of Property Law, 2ª Ed., Toronto, Carswell, 1996, p. 408.
4

Cf. Benito Arruñada, Instituciones del intercambio personal: Teoría y método de los registros
públicos, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2013, p. 98.
5

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp. 20-21.
6

Cf. Greg Taylor, Is the Torrens System German, in, The Journal of Legal History, (29) (2009).
7

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, p. 21.
8

Cf. Bruce H. Ziff, Principles of Property Law, 2ª Ed., Toronto, Carswell, 1996, pp. 411-412.
9

Cf. Greg Taylor, Is the Torrens System German, in, The Journal of Legal History, (29) (2009).
10

Para mais detalhes sobre o sistema de Wakefield, e sua repercussão no Brasil cf. Ivan Jacopetti do
Lago, O tratamento jurídico da venda de imóvel com divergência de área na evolução do Direito
Brasileiro; venda ad corpus e ad mensuram, Tese de Doutorado, São Paulo, USP, 2014, pp. 56 e
seguintes.
11
Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp. 23-24.
12

Cf. Robert Richard Torrens, The South Australian System of Conveyancing by Registration of Title,
1ª Ed., Adelaide, Register and Observer General Printing Offices, 1859, p. 8.
13

Cf. Robert Richard Torrens, The South Australian System of Conveyancing by Registration of Title,
1ª Ed., Adelaide, Register and Observer General Printing Offices, 1859, p. 9.
14

Cf. Robert Richard Torrens, The South Australian System of Conveyancing by Registration of Title,
1ª Ed., Adelaide, Register and Observer General Printing Offices, 1859, p. 9.
15

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, p. 45.
16

Cf. Bruce H. Ziff, Principles of Property Law, 2ª Ed., Toronto, Carswell, 1996, pp. 53-54.
17

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, p. 45.
18

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp. 47-55.
19

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp. 61-66.
20

Cf. Nicolás Nogueroles Peiró, El Establecimiento del Sistema Torrens em Australia del Sur y sus
Orígenes, 1ª Ed., Cizur Menor, Aranzadi, 2011, pp. 66-68.
21

Cf. Ruy Barbosa, Manuel Ferraz de Campos Salles, Francisco Glicério de Cerqueira Leite, Decreto
451-B, de 31 de maio de 1890 – Justificativa, disponível em
<https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/518779>. Acesso em: 06/07/2020.
22

Cf. Ruy Barbosa, Lei Torrens, in, Obras Completas de Rui Barbosa, Vol. XVIII – II, 1ª Ed., Rio de
Janeiro, Ministério da Educação e Saúde, 1949, p. 301-303.
23

Cf. Ruy Barbosa, A Execução da Lei Torrens na Capital Federal, in, Obras Completas de Rui
Barbosa, Vol. XVIII – II, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Ministério da Educação e Saúde, 1949, p. 24.
24

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro,
Livraria Jacintho, 1942, p.85.
25

Cf., por exemplo, Spencer Vampré, Registro Torrens – Sua Inconstitucionalidade, in, RT (43)
(1922).
26

Cf. Décio Antônio Erpen, O Registro Torrens e o Sistema Imobiliário Atual, in, RDI (19/20) (1987).
27

Cf. João Afonso Borges, O Registro Torrens no Direito Brasileiro, 1ª Ed., Goiânia, 1957, p. 46.
28

Cf. Philadelpho Azevedo, Registro de Imóveis (Valor da Transcrição), 1ª. Ed., Rio de Janeiro,
Livraria Jacintho, 1942, p.84.
29

Cf. Afrânio de Carvalho, Registro de Imóveis, 1ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1976, p. 478.
30

Cf. Jacy de Assis, Do Registro Torrens, in, RT, (371) (1966).


31

Cf. Décio Antônio Erpen, O Registro Torrens e o Sistema Imobiliário Atual, in, RDI (19/20) (1987).
32

Cf. Jacy de Assis, Do Registro Torrens, in, RT, (371) (1966).


33

Cf. Maria Helena Diniz, Sistemas de Registro de Imóveis, 9ª Ed., São Paulo, Saraiva, 2010, p. 571.
Para Jacy de Almeida, no entanto, o que tem eficácia erga omnes é a matrícula, e não a sentença.
A respeito, cf. Cf. Jacy de Assis, Do Registro Torrens, in, RT, (371) (1966).
A TÍTULO DE CONCLUSÃO: AS TRANSFORMAÇÕES DO SISTEMA BRASILEIRO DE REGISTRO
DE IMÓVEIS
A TÍTULO DE CONCLUSÃO: AS TRANSFORMAÇÕES DO SISTEMA BRASILEIRO DE REGISTRO
DE IMÓVEIS

A título de conclusão: as transformações do sistema


brasileiro de registro de imóveis
Como se viu, o Sistema Brasileiro de Registro de Imóveis surgiu com o Decreto
482 de 1846, destinado ao registro somente das hipotecas. Incompleto por
definição, foi substituído pela Lei 1.237 de 1864 e seu regulamento, que deram
origem a um modo de se organizar formalmente o registro que perdurou até os
anos 70 do século XX.

Desde a origem, o registro das transmissões foi constitutivo. Ainda, mesmo


antes da criação do primeiro registro geral, o Brasil mantinha o Sistema Romano
da combinação de título e modo, pelo que se pode dizer que o consensualismo e o
Sistema Francês nunca se implantaram no Brasil.

O Código Civil de 1916 manteve e explicitou o efeito constitutivo do registro, a


ele agregando mais um efeito: a legitimação, pela qual se presumem válidos os
dados do registro até que este venha a ser cancelado ou retificado. Contudo, ainda
não havia implantado a outra dimensão da eficácia do registro: a fé pública
registral.

Quanto aos elementos da mutação real, o Código manteve a tradição


causalista do Direito Brasileiro, pelo que a transmissão permanecia vinculada à
validade do negócio jurídico causal, de natureza obrigacional. No entanto, sendo o
registro constitutivo, e, ainda, consistindo em ato administrativo, é inafastável a
conclusão de que entre o negócio causal obrigacional e o registro deve
necessariamente haver um terceiro elemento: o acordo de transmissão,
consistente em negócio jurídico de direito das coisas, cuja validade, entretanto, fica
amarrada ao negócio causal.

O Código de 2002, em geral, manteve a sistemática do sistema de Código de


1916, mas agregou mais um elemento à eficácia do registro: o convalescimento,
pela via da usucapião, de prazo abreviado das aquisições feitas por quem confiou
no registro e, com base nele, adquiriu.

Por fim, a Lei 13.097 de 2015 implantou no Brasil a fé pública registral, de


maneira a, como regra, proteger terceiros adquirentes de boa-fé contra situações
jurídicas não constantes da matrícula do bem, até mesmo para fins de evicção.
Advirta-se, contudo, que se a regra é a tutela do terceiro, há numerosas exceções,
casos em que seus efeitos não se operam.

Assim, em suma, o atual Sistema Brasileiro de Registro de Imóveis tem como


características o efeito constitutivo para as aquisições inter vivos, e, quanto a sua
organização, a exigência, para a mutação real, de título e modo composto, ou seja,
da combinação de um negócio jurídico obrigacional, o título, e um modo de
aquisição composto pelo acordo de transmissão e pelo registro.

Quanto aos efeitos, tem-se que o titular registral é protegido pela legitimação,
ou seja, a presunção relativa; e, como regra, os terceiros adquirentes de boa-fé
são protegidos pela fé pública registral, nos termos da Lei 13.097 de 2015.

Beneficia, ainda, os adquirentes que confiaram no registro, a usucapião


abreviada do artigo 1.242, parágrafo único, do Código Civil, desde que preencham
seus demais requisitos.

Tratando-se de imóveis rurais, também permanece em vigor, como uma via


aberta aos interessados, e, agora, integrada no Registro Geral, a depuração do
título e consequente inatacabilidade do direito por meio de sua submissão aos
efeitos do Registro Torrens.

Mónica Jardim aponta como características do modelo puro de Registro de


Direitos, além da fé pública registral, o acesso ao registro das aquisições não
apenas inter vivos, como também mortis causa; a organização pelo uso do fólio
real; o princípio do trato sucessivo; e a maior amplitude possível do princípio da
legalidade, ou seja, do âmbito da qualificação registral1.

O princípio da legalidade, como se viu, está presente no Sistema Brasileiro, em


alguma medida, desde o Decreto 482 de 1846, que, em seus artigos 30 e 31, que
já admitiam a recusa na prática do ato pelo registrador por não se apresentar a
hipoteca habilitada, e a possibilidade de a recusa ou demora no registro ser
fundada e procedente. O princípio se manteve ao longo do tempo, tendo cabido à
Doutrina e à Jurisprudência – como ainda tem cabido – fixar os limites da
qualificação registral. Observe-se que, em razão de o Brasil adotar um sistema de
título e modo, a qualificação abrange também o negócio jurídico causal, de
natureza obrigacional.

O registro das aquisições mortis causa foi introduzido pelo Código Civil de
1916, em seu artigo 532, I, como maneira de se dar aos adquirentes a
disponibilidade do bem em virtude da extinção do estado de indivisão pela partilha.
Com isso, abriu caminho para a introdução da continuidade ou trato sucessivo, que
foi reconhecida expressamente no artigo 234 do Decreto 18.542 de 1928.

O fólio real foi introduzido pela Lei 6.015 de 1973, o que, juntamente com a fé
pública registral de que já se tratou, dotou o Sistema Brasileiro de todas as
características de um sistema de registro de direitos.
1

Cf. Mónica Vanderleia Alves de Sousa Jardim, Efeitos Substantivos do Registo Predial – Terceiros
para Efeitos de Registo, 1ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, p. 150.
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408.
APÊNDICE
APÊNDICE

Apêndice

Os documentos abaixo transcritos se encontram nos arquivos do 1º Registro de


Imóveis de São Paulo, cujo acesso foi mui gentilmente franqueado pelo ilustre
registrador, Flauzilino Araújo dos Santos, e sua valorosa equipe.

Documento 01 – Termo de abertura do livro destinado ao registro de


hipotecas constituídas anteriormente à instalação do registro, do Registro
Hipotecário de São Paulo.

Servirá este Livro para as inscripções das


hypothecas anteriores à installação do Registro, e vai
numerado e rubricado com a rubrica – (rubrica) – de
que faço uso e leva no fim o termo de encerramento.
São Paulo, 16 de julho de 1847. O Juiz de Direito da
Comarca Manoel (ilegível) de Castro Menezes.

Documento 02 – Registro de hipoteca constituída por escritura lavrada


anteriormente à instalação do Registro Hipotecário de São Paulo, datada de
16 de julho de 1847, entre Rafael Pinto de Godoy e Dona Brandina Miquilina
Gomes:

Folha 5

Número quatro = Registro da Escriptura de


Hypotheca que fas Rafael Pinto de Godoy a Dona
Brandina Miquilina Gomes, a qual se segue traslado da
escriptura de hypotheca que faz Rafael Pinto de Godoy
a Dona Brandina Miquilina Gomes de huma Fazenda de
Campos de criar, pela quantia de dois contos, cento e
quarenta e quatro mil, quatrocentos e oitenta e dois réis
a prazo de anno e meio, na falta do prêmio de dois por
cento ao mês e como abaixo declara = Saibam quantos
este público instrumento de escriptura de hypotheca
que no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus
Christo de mil, oitocentos e quarenta e quatro, aos vinte
e dois de maio, nesta Imperial Cidade de São Paulo, na
casa de morada de dona Brandina Miquilina Gomes,
onde fui vindo, sendo ahi compareceo Rafael Pinto de
Godoy, reconhecido das testemunhas abaixo nomeadas
e assignadas perante as quais por elles me foi dito que
elle ora devedor de Dona Brandina Miquilina Gomes da
quantia de dois contos, cento e quarenta e quatro mil,
quatrocentos e oitenta e dois réis e que para segurança
das ditas quantias hypotheca com a mesma huma
fazenda de Campos de Criar, matas, lavradios,
denominada Fazenda Nova, com casas de vivenda, no
distrito de São João do Rio Claro, nas Cabeceiras do
(Corr Catahy), com duas légoas de comprido, e huma
de largura com casas de morada com paredes de
(madeira), cobertas de telhas e taipas socadas para as
casas, a qual de hum lado parte com Modesto Antonio
Cardoso, de outro lado com Manoel Cardoso e pelos
fundos pelas descendências de Manoel da Costa Alves,
e passa às cabeceiras com Joaquim da Cunha Bastos,
cuja hypotheca faria por tempo de anno e meio
contados da data desta. Na falta do pagamento por todo
o mais tempo que ella credora (ilegível) esperar pagará
o prêmio de dois por cento ao mês, que será pago de
seis em seis meses, e quando o não faça será unido ao
principal que tãobem servirá depois o mesmo prêmio,
cuja fazenda não poderia dispor dela sem ter pago toda
a quantia e prêmios a ella credora hypothecaria. E logo
pela dita credora hypothecaria que presente me achava
foi dito perante as mesmas testemunhas que aceitaria a
presente nas formas mesmas declaradas. E de como
assim o disseram, lavrei a presente que me foi
distribuída pelo bilhete do (...).= Escriptura de hypotheca
a que faz Rafael Pinto de Godoy a Dona Brandina
Miquilina Gomes de huma Fazenda de Campos de criar,
matas, lavradios denominada Fazenda Nova, com casa
de vivenda no distrito de São João do Rio Claro, pela
quantia de dois contos, cento e quarenta e quatro mil,
quatrocentos e oitenta e dois réis, apprazo de anno e
meio, e na sua falta o prêmio de dois por cento ao mês,
o que será pago de seis em seis meses e quando o não
faça, será unido ao principal que tãobem acrescerá o
mesmo prêmio. São Paulo, vinte e dois de maio de mil
oitocentos e quarenta e quatro. Eu dou lhes appresente
por mim assignada e lida, acceitarão cópia, fazendo a
vez do hipothecante Joaquim Gomes de Faria, com as
testemunhas presentes, Henrique (...) de Andrada e
Manoel Bernardo da Rocha, reconhecidos de mim
Fortunato José da Silva, tabellião interino, que escrevi a
mando do hypothecante. (nomes das testemunhas).
Nada mais continha nem declararavam em dita
escriptura lavrada no livro actual de notas de onde foi
extraído e appresentado traslado, o qual vai conforme
no original, que aqui deposito. O refferido he verdade
em fé do que apresente escrevi, conferi, e assigno
nesta dita Imperial Cidade de São Paulo, em os
mesmos dia, mês e anno ao princípio declarado. Eu,
Fortunato José da Silva, Tabellião Interino, que escrevi,
conferi e assigno em público e raso de que juro. Em
testemunho da verdade. Estava o sinal público
Fortunato José da Silva conferido. Estava o ato da lavra
pública. Número quatro mil, seiscentos réis. Pagou mil e
seiscentos réis. São Paulo, vinte e um de julho de mil
oitocentos e quarenta e sete. Rodrigues Bittencourt =
Está conforme com o original a que se reporta em mão
do appresentante que tornou a receber o próprio abaixo.
O referido hé verdade, de que dou fé a presente.
Escrevi, conferi e assigno nesta Imperial Cidade de São
Paulo. Aos quatro de agosto do Anno de Nascimento de
Nosso Senhor Jesus Christo de mil, oitocentos e
quarenta e sete. Fortunato José da Silva, tabellião as
escrevi, conferi e assigno. (Segue a assinatura do
tabelião).

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