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PERIGOSAS NACIONAIS

PERIGOSAS ACHERON
PERIGOSAS NACIONAIS

Ficha Técnica
Copyright © 2018 by Valentina K. Michael
Segredos indiscretos – Dinastia Capello
Edição 01 - 2019
Capa: LA capas
Revisão: Cristiano Teixeira
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, no todo
ou em parte, sem autorização prévia por escrito da autora,
sejam quais forem os meios empregados.

Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança dos fatos


aqui narrados com pessoas, empresas e acontecimentos da
vida real, é mera coincidência. Em alguns casos, uma notável
coincidência.

PERIGOSAS ACHERON
PERIGOSAS NACIONAIS

Sumário
PRÓLOGO
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
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PERIGOSAS ACHERON
PERIGOSAS NACIONAIS

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EPÍLOGO
PRÓLOGO - ANDREY
CAPÍTULO 01

PERIGOSAS ACHERON
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PRÓLOGO

BENJAMIN
São Luís, janeiro de 2013.

Eu estava ofegante. Não sabia se era ódio ou


tristeza. Tentei buscar na mente fatos que pudessem
me acalmar. Boas lembranças que pudessem me
colocar nos eixos. Eu tinha medo de ter um surto
novamente, como quando eu era adolescente.
Ainda de cabeça baixa, tampando o rosto com
as mãos, ouvia a voz do meu pai, e, mesmo que ele
estivesse apenas querendo me ajudar, eu tinha raiva
porque eu preferia viver feliz, de olhos vendados,
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do que ter sido alertado dessa forma e cair no fundo


do poço. Passei tanto tempo buscando um
significado na vida e, quando enfim, havia
encontrado...
A minha namorada, Danielle, a mulher que
julguei ser minha alma gêmea, só queria a porra do
dinheiro da minha família.
— Filho, eu te alertei sobre essa gente. —
Meu pai se sentou ao meu lado. — Mas não te
culpo, você foi enfeitiçado. Agora sabe que tipo de
mulher é ela.
Não havia como contestar. Ele me mostrou as
câmeras de segurança em que Danielle aparece
entrando no escritório da presidência da Capello,
sentando-se diante de meu pai e do advogado e,
após conversarem, ela assina um papel. As cópias
dos papéis que meu pai me mostrou, e que eu
rasguei de fúria, eram taxativas: ela assinou um

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termo preferindo uma quantia alta a ficar comigo.


— Você ofereceu a porra do dinheiro.
— Não. Acredite em seu pai. Eu pedi para ela
se afastar de você, e ela me propôs isso. Você viu o
documento que ela assinou, acha que se ela te
amasse, iria fazer uma pouca vergonha dessa? —
Ele se aproximou mais de mim no sofá e acariciou
meu ombro. — Meu filho, eu fico de coração
partido de te ver assim, mas foi necessário eu te
mostrar quem era ela.
Assenti para ele e fechei os olhos gostando de
ter meu pai tão perto e sendo gentil comigo. O
abracei e depois fiquei de pé.
— Obrigado pai — falei e saí rápido da sala
dele. No meu celular, procurei o número de uma
antiga parceira de noitadas, apertei em chamar e fui
para a sala de espera.

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***

DIANA

Se eu fosse um dragão, estava agora mesmo


incendiando o prédio do filho da puta. Na verdade,
acho até que saía fumaça do meu nariz. Andando
de um lado para o outro, esperava o maldito descer,
o porteiro não me deixou subir e havia interfonado
avisando sobre minha presença.
Eu ainda não acreditava que ele tinha feito
aquela merda com minha irmã. Ela estava
ameaçando sumir no mundo, angustiada e sofrendo,
depois que foi visitá-lo e viu, com os próprios
olhos, Benjamin transado, ensandecido, com outra
mulher em sua própria cama. Minha irmã estava
devastada. Ela não fazia mal a uma mosca, não
tinha malícia alguma, e eu vivia para protegê-la do
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mundo e de seres asquerosos como Benjamin.


Assim que ele saiu do elevador, sua expressão
era de deboche. Eu voei sobre ele.
— Seu desgraçado! — Acertei-lhe um tapa,
mas ele se defendeu dos outros. Meu corpo todo
tremia, e a visão estava turva. — O dia que você
sonhar em chegar perto da minha irmã, eu te mato!
— Ah, então a golpista mandou a irmã para se
defender? — ironizou.
— Não ouse falar assim dela. — Ele era bem
alto e magro, mesmo assim, eu o estava
confrontando, com o dedo apontando bem no nariz
dele. — Você não vale o chão que ela pisa. Eu só
vim te dar a porra do recado e isso daqui. — Meti
com toda força, na cara dele, a aliança de
compromisso que ela tirou e me deu para trazer.
***

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DIANA

São Luís, setembro de 2013.

Saí correndo do taxi em meio à chuva fina,


assim que vi Benjamin chegar com a família dele.
Seguranças se adiantaram com guarda-chuvas, para
eles não molharem. Era uma festa de gala, todos
muito bem vestidos, sorrindo para as câmeras de
eufóricos fotógrafos.
— Benjamin! — gritei, e ele virou-se na hora.
Tinha passado tanto tempo, oito meses que não nos
víamos. Minha irmã entrara em estado decadente
de depressão, e eu tive que deixar o emprego para
cuidar dela e vigiá-la dia e noite. Eu parecia uma
pedinte diante de tanto luxo à minha frente. Os
olhos de Stela me analisaram com pena.

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— O que você quer? — Benjamin se mostrou


rude no mesmo instante, e eu não o culpava, afinal,
eu tinha batido na cara dele. — O dinheiro que meu
pai deu já acabou? — Apesar da pergunta irônica,
senti que era verdadeira a vontade dele de saber
sobre aquilo.
Eu tinha um orgulho do tamanho do
Maranhão e não estaria aqui mesmo se essa não
fosse minha última opção. E Benjamin tinha sim o
dever de ajudar.
— O quê? Que dinheiro? — Passei os olhos
por cada um deles. — Eu...a Dani precisa de sua
ajuda.
— Leve ele. — O velho João Capello falou
para a irmã de Benjamin.
— Não. Eu quero ouvir o que essa mulher
tem a dizer.
— Filho, não nesse momento, a imprensa está
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toda aí. Olha só para ela. Uma desclassificada que


quer mais dinheiro.
Eu estava prestes a atacar o velho e mandar a
humildade para a puta que pariu. Ele fitou meus
olhos e questionou:
— Não é isso, senhorita?
Engoli em seco. Sim, eu precisava de
dinheiro. Não queria dar o braço a torcer, queria
dizer para ele enfiar tudo no rabo, mas então
lembrei da minha irmã. Limpei uma lágrima de
humilhação e assenti.
— Sim. Preciso de ajuda financeira. Dani está
no hospital e ela precisa...
— Vocês me dão asco — Benjamin grunhiu.
— Por um momento pensei que você diria que não
queria o dinheiro do meu pai. — Ele aceitou que a
irmã o guiasse para dentro e apenas o velho ficou
me olhando com nojo explicito no olhar.
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— Entra no carro — ele falou e entrou sem


esperar o segurança abrir a porta para ele. Corajosa,
entrei pelo outro lado. O velho nem me olhou, e
disse:
— Me conte do que você precisa para não
cruzar mais o caminho do meu filho.

***
BENJAMIN

São Luís, 01 de janeiro de 2014.

Era réveillon, estávamos todos reunidos na


mansão do meu pai. Eu, enfim, me sentia feliz e
realizado depois de um ano de sofrimento, por ter
sido enganado pela mulher que um dia eu quis dar
o céu. Longas sessões de terapia estavam me
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fazendo esquecê-la, e a pintura era minha melhor


aliada, mesmo meu pai reprovando minha escolha.
Ele não precisava saber.
Caminhei com meu pai e Fernando para a sala
de visitas, distante da festa na área externa. Não
imaginava o que ele queria comigo, mas supus que
era sobre a empresa, já que ele chamou Fernando
também.
Ele não se sentou. Andou até uma janela e
olhou a festa lá embaixo.
— Benjamin, quero que saiba que tudo que
fiz, todas as decisões que tomei, sempre foram para
o bem dos meus filhos.
— Sim, pai. Eu sei.
— Espero que seja maduro para entender o
que vou te falar. Meu velho amigo, o padre
Damião, me aconselhou a aparar as arestas. — Eu e
Fernando nos entreolhamos sem entender — Um
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novo ano se inicia, não sei o que será de mim mais


para frente então quero deixar tudo em pratos
limpos.
— Estou ouvindo, pai.
— É sobre aquela garota. — Ele, enfim, me
encarou.
— Que garota?
— A Cristóvão. Eu tramei tudo para acabar
com seu relacionamento. Eu não queria ela inserida
na minha família. Quando eu a chamei no meu
escritório, eu fiz uma proposta alta... Mas ela...
— Mas que porra está falando? — Fiquei de
pé, e Fernando se colocou entre a gente. Eu prendia
a respiração e os pensamentos explodiam em
desespero na minha cabeça.
— Calma, eu fiz isso pelo seu bem. Eu menti
para você, mas depois ela voltou a me procurar...

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Eu nem precisei escutar tudo. Meu pai estava


meio pálido, e eu sabia que a verdade era que Dani
nunca tinha assinado nada querendo dinheiro. Eu
podia ver nos olhos dele que tudo não tinha passado
de uma mentira.
Agora eu entendia por que ele chamou
Fernando para a conversa, porque precisava de
alguém para me segurar. Era meu pai, mas, naquela
noite, eu gritava mais alto que o barulho dos fogos
de artifício mais cedo, tentando acertar um soco
nele. Ele se calou e se encolheu no canto, disposto
a não falar mais nada. Tudo tinha ficado
subentendido. Fernando precisou da ajuda de
Thadeo, que me arrastou para o quarto, sob os
olhos espantados dos convidados, que vieram após
ouvir os gritos.
Meu pai nem teve dignidade de terminar de
falar. Apenas disse que eu não estava pronto para

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ouvir. A única coisa que eu sabia era que ele tinha


armado e destruído a única coisa boa que eu tinha
vivido nos últimos anos.

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01
DIANA
DIAS ATUAIS

Ouvi o som dos meus saltos ecoando na


escada de mármore, mostrando como tudo ainda
estava silencioso na boate. E eu sentia falta do
barulho noturno que começaria em breve. Abri a
porta do escritório, e Almir levantou os olhos e me
encarou.
— O que deseja falar comigo? — Desfilei
lentamente até a mesa onde ele fazia contas. Almir
era meu sócio na boate Luxxo’s, que tinha
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começado em outra cidade e, esse ano, mudamos


para São Luís. Ele Cuidava da parte financeira,
enquanto eu comandava tudo lá embaixo. Além de
disso, diziam por aí, que ele era bem perigoso e
acho que estava associada a ele por saber que me
protegeria diante de qualquer imprevisto. Só não
sei se ser amiga de uma serpente era confiável, eu
poderia acabar machucada.
Sorri para ele, como uma gata manhosa que
sempre sabia fazer a coisa certa para o dono lhe dar
carinho. Almir passou grande parte dos anos
desejando tocar as mãos em mim, e acho que
aceitou minha ideia de investir dinheiro em uma
boate falida, apenas porque cogitou que teria a
oportunidade de ir para a cama comigo.
Mas, com o tempo, soube que para encostar
nesse corpo bem cultivado, precisava estar em
outro patamar.

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Eu não era a mocinha a ser conquistada, eu


escolhia quem me satisfaria e dava ordens.
— Você escolhe: ou contribui na boate, com
suas economias, ou abriremos falência. — Me
pressionou, curto e grosso. Ciente do que estava
acontecendo no caixa da boate, respirei preocupada
e caminhei até o bar para me servir de alguma
bebida.
— Almir, já conversamos sobre isso...
— Então encontre outra forma, porra. —
Aumentou o tom de voz. — Você impôs essa regra
ridícula que as meninas não podem transar.
— Aqui não é um bordel. — Equiparei meu
tom de voz ao dele. — Elas transam com os
clientes se quiserem. Não vou obrigar ninguém a
isso.
— E está afastando a clientela, porque você
deu poder para elas escolherem com quem fazem
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sexo. Puta não escolhe cliente.


— Você é tão babaca...
— Nossas contas no vermelho, enquanto você
mantém o estilo de vida. Venda seu apartamento,
aplique suas economias, faça o que tiver de fazer.
Bebi um gole de uísque, que pareceu queimar
minha garganta diferente das outras vezes que eu
bebi. Meu coração estava acelerado por causa do
estresse de ser pressionada.
— As economias não são minhas, e você sabe
disso — murmurei sem me virar para ele. Ele
conhecia minha vida e sabia por que eu guardava
todo esse dinheiro.
— E o que vai fazer? — Me pressionou. —
Qual sua sugestão?
— Eu não sei — falei baixinho.
— PORRA! — Almir berrou e bateu na mesa

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me assustando. Me virei para observar o homem


magro, alto, na casa dos cinquenta anos. Meu
parceiro de negócios e único que sabia tudo sobre
minha vida. — Você é a porra de uma egoísta. Vai
dar um jeito, sim!
— Não levante a voz para mim, seu filho da
mãe.
Ele controlou a respiração, andou pela sala
mordendo o lábio e olhando o chão. Então me
encarou com uma ideia decidida.
— Vai atrás do ex-namorado de sua irmã.
— O quê? Está louco? — Mostrei com
deboche, minha incredulidade no que acabei de
ouvir.
— Ele é milionário. Faça qualquer coisa para
que ele te dê dinheiro. Ou isso, ou terá que vender
seu apartamento.

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— Você está louco! — A simples ideia me


dava ânsia. Só em pensar naquele maldito, já tinha
vontade de descer a mão na cara dele. É, eu não era
nem um pouco fã daqueles Capellos. — Eu não vou
atrás daquele homem.
— Vai, você vai sim. Ou eu posso
gentilmente marcar um encontro com ele e dizer...
— Você não seria tão filho da puta.
Ele deu alguns passos em minha direção e
assumiu uma pose ameaçadora, o que me deixou
alarmada.
— Diana, minha querida. Você sabe muito
bem quem eu sou e do que eu sou capaz de fazer
para defender os meus interesses. Tome uma
atitude, antes que eu faça do meu jeito.

Não sei quanto tempo fiquei sentada na minha

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sala, olhando minhas perfeitas unhas e meus anéis


de ouro. Almir tinha ficado no escritório de
contabilidade dele e esperava uma resposta. Eu
sabia que ele odiava ter que me chantagear, mas
também entendia que a boate era tudo para ele. Eu
iria encontrar uma opção, sem que precisasse
envolver o maldito Capello.
Eu sou Diana, a mais respeitada dona das
noites, eu poderia dobrar o Almir.

***
Enquanto sorria para os clientes, recepcionava
os mais ilustres e caminhava pela boate — Não tão
cheia como meses atrás. — Dentro de mim, residia
a preocupação. Eu me vi esgotada em poucas horas
apenas, com suposições macabras me atacando.
Almir ia tentar dar um “xeque-mate”, e eu teria que
agir antes para impedi-lo. Sem falar que meu dia
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estava legal, até ele mencionar aquele cara...


Eu vinha observando Benjamin há algum
tempo, desde que Almir e eu trouxemos a boate
para essa cidade, no fim do ano passado. Eu tinha
simplesmente partido de vez, depois de tudo que
aconteceu, e agora que estava de volta, devia
manter meus inimigos bem debaixo dos meus
olhos.
Benjamin procurou a minha irmã por bastante
tempo. Recebi informações sobre vizinhos, amigos
e até do meu ex-chefe, de que ele gastou muito do
seu tempo procurando por nós duas.
— Diana, minha bela. Sua casa é
maravilhosa. — Um homem de terno que eu nem
lembrava o nome, mas sabia que era um figurão, se
aproximou, e eu saí do meu mundo de conjecturas.
— Muito obrigada. Espero que volte outras
vezes.
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— Voltarei, e indicarei.
Acenei para o senhor bem vestido e fiquei
olhando ele ir embora.
— Preocupada?
Olhei para Sabrina, minha prima que tinha
vindo recentemente trabalhar na boate. Às vezes eu
me assustava em como ela parecia minha irmã. Os
olhos, o sorriso... a diferença é que Sabrina tinha
cabelos lisos tingidos de louro e Dani amava seus
cachos castanhos.
Era uma ótima dançarina e vez ou outra saia
com clientes. O pai dela achava que ela trabalhava
no telemarketing.
— Bastante. Como está o movimento hoje?
— questionei.
— É o que você está vendo, prima. — Ela se
recostou no balcão e mostrou em volta o pouco

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movimento. — Depois que fechou o segundo


pavimento dos quartos, a clientela tem se afastado.
Era um lugar ótimo para os caras do sigilo
encontrar diversão. Sair daqui e levar meninas para
motel é complicado, principalmente para os
casados.
— O povo gosta de safadeza, mas não vou
ceder. Não quero ser conhecida como cafetina,
além do mais, acho que isso é crime no Brasil.
Escuta, aquele cara... Voltou a sair com ele?
— O Capello? Não veio essa semana. — Ela
bufou revoltada e emendou: — é uma pena, porque
o cara é um dos mais gostosos que já peguei. Ele
tem certo interesse por loiras . — Ela sugestionou,
passando a mão no corpo sensualmente.
Para meu pânico maior, Thadeo Capello havia
descoberto nossa boate e tinha se tornado
frequentador assíduo. Investiguei um pouco sobre

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ele e vi que o brutamontes de cara fechada era


solitário e não tinha muito contato com os irmãos.
O que me deixou mais aliviada, sabendo que
possivelmente ele não atrairia Benjamin até aqui.
— Se ele voltar, me avise. Volte para o palco,
hora de mexer a bunda e ganhar seu salário. — Ela
jogou um beijinho para mim e, rebolando, voltou
para o palco.
O lugar pareceu pequeno para comportar os
maus presságios que me assolavam. Fui para minha
sala, peguei minha bolsa e bati a mão para o
barman.
— Vinicius, estou indo mais cedo, caso Almir
pergunte.
— Ok, Diana.
No meu carro novo, não de luxo, mas do ano,
dirigi com a minha mente focada em sobrevivência.
Eu sempre tive tudo dentro do meu controle, e
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agora que algo ameaçava minha sanidade, era hora


de usar minhas armas. Almir queria defender os
interesses dele, mas eu também não mediria
esforços para defender os meus.
Cheguei em casa pensando em um banho
demorado na banheira e quando abri a porta do
apartamento, ouvi um gritinho vindo da sala.
— Mamãe!
— Meu Deus. Ainda acordada, minha
princesa?
— Hoje ela disse que tinha que te esperar,
Diana — Amanda, minha amiga, vizinha e babá
veio sorrindo explicar.
— Maya, meu bem, já passa das onze. —
Peguei-a no colo. — Amanhã tem escolinha cedo.
— Eu tinha que te mostrar o vídeo
de bolgleira que eu fiz com uma ajudinha da

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Amanda. — Eu gargalhei e fui com ela para o sofá,


ver em seu tablet o vídeo. Era um vídeo de
maquiagem, eu estaria rindo nesse instante se não
tivesse com a cabeça cheia de medo, mas pronta
para lutar por Maya.

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02
Almir conhecia muito bem sua sócia e não
confiava nem um pingo nela. Sabia que Diana não
tinha como conseguir a grana. Ele pensou bastante
no que faria e tentou amadurecer a ideia para só
depois colocá-la em prática. Tinha ali, nas suas
mãos, um segredo muito precioso. Um segredo que
o Capello caçula pagaria caro para saber. Pegou o
telefone sobre a sua mesa, tocou em uma tecla e
falou:
— Vinicius, peça a Sabrina para subir aqui,
imediatamente.
Enquanto esperava, ele caminhou até o bar, e
se serviu de uma dose de uísque. Pensou que suas
ações poderiam colocar uma grande rachadura na
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relação profissional entre Diana e ele, mas não era


isso que o amedrontaria.
Sorriu para seu reflexo no espelho e virou-se
quando a porta se abriu e Sabrina, a prima de
Diana, entrou.
— Mandou me chamar, Almir? — Seu olhar
estava assustado. Sempre que as garotas eram
chamadas naquela sala, o motivo não era bom, por
isso o medo dela. Sabrina era uma boa dançarina e
a única que ele poderia confiar.
— Sente-se, garota. — Com o copo na mão,
apontou para a cadeira. — Tenho uma missão para
você. — Só agora Almir agradecia por Diana dar
emprego para a prima; a garota estava no lugar
certo, na hora certa.
— Missão? — Ela se sentou, e Almir recostou
o quadril na mesa.
— Por acaso, me veio ao conhecimento, que
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você se divertiu com um dos Capellos, um dia


desses...
— Ah, sim. O Thadeo. Ele vem sempre por
aqui. É um solitário que só quer beber e ver as
meninas dançarem e, às vezes, sexo.
— Ótimo. Você já saiu com ele?
— Sim.
— Para onde?
— Motel. Ele me deixou aqui de novo e foi
embora.
— Nunca mais que isso?
— Thadeo confia em mim... Mas não o
bastante. É um homem... impenetrável e vive
emburrado.
Almir soltou o ar em uma lufada, começando
a pensar em outra forma de dar vida ao plano.
Olhou para a garota que esperava mais explicações
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do por que ela estar ali.


— Sabe que ele é irmão do Benjamin, não é?
— Sim... O ex-namorado da minha prima
Dani. — O semblante dela se encheu de hesitação e
curiosidade. — Diana sabe que estou aqui
conversando com o senhor?
— Esqueça a Diana. Sua lealdade será
comigo, ou seu querido paizinho saberá em que
você está trabalhando. — Ela ficou pálida no
mesmo instante, entendendo a gravidade da
conversa. — Eu preciso que você faça com que
Thadeo te leve além do motel, se possível, para um
lugar onde Benjamin te veja. Tenho certeza que ele
se lembrará de você.
— E por que Benjamin precisa me ver? — A
garota tremia, mas ainda tinha coragem de
questionar.
— Sei que ele virá atrás de você, porque
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sempre procurou por Danielle. E antes que


pergunte como eu sei disso, sua prima me conta
tudo. — Almir riu e deu a volta na mesa para
sentar-se em sua cadeira. — Você acha mesmo que
alguém tão ameaçador para a Diana, seria
esquecido? Ela passou os últimos meses
monitorando o puto e sabe de cada passo dele. —
Inclinou-se sobre a mesa — Apenas atraia ele até
aqui, o resto deixa comigo.

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03
BENJAMIN

Ainda ofegante, saí da cama, fui até a cômoda


e peguei o maço de cigarro.
— Posso? — perguntei para a mulher deitada
esgotada sobre a cama. Ela assentiu, incapaz de
emitir um som, devido a respiração apressada.
Descansei um pé no parapeito da grande janela e
fumei, soltando a fumaça em um fio longo, sem me
importar de talvez estar sendo visto de alguma
janela dos apartamentos próximos.
Fumando pelado, eu senti a brisa da tarde
refrescar meu corpo que estava quente e suado.
— Vem comigo para o chuveiro? — Ela

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perguntou, e eu nem olhei para vê-la se levantar da


cama.
Ignorei-a e continuei olhando a vista lá fora
que era forrada de prédios vizinhos. A cidade
movimentada em pleno fim de tarde me dava
conforto, apesar de nunca ter gostado de grandes
movimentações. Na verdade, nenhum dos meus
irmãos gosta do alvoroço metropolitano.
Olhei no meu relógio de pulso, para confirmar
que eu escolhera perder hora de serviço para foder.
Estava pressionado na porra da empresa e, para não
pirar, tive que buscar uma válvula de escape.
Amassei o cigarro no móvel, ouvi o barulho
do chuveiro, mas não me interessei em dividir a
água com Alana. Vesti minha cueca, peguei a calça
e fui até porta do banheiro.
— Já vou — gritei.
— Benjamin, espera. Eu vou à festa com
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você.
Meu irmão ficará noivo hoje, e adivinha quem
sonha em ser minha acompanhante? Você ganhou
um beijo se pensou na minha foda da vez: Alana.
Era arcaico ter que ir a uma festa
acompanhado? Sim, era. Mas a idiotice do meu pai
não tinha limites e gente velha quando coloca uma
coisa na cabeça, é bem difícil fazer mudar de ideia.
Ele impôs que cada um de nós estivesse
acompanhado na festa, para sermos bem vistos
pelos parceiros de negócios. Como se ter um
relacionamento tornasse uma pessoa confiável e de
caráter. Conheço vários que são casados e não têm
um pingo de moral.
Entretanto, eu gostava de peitar o velho e o
inferno esfriaria antes de eu levar uma
acompanhante.
— Benjamin, espere. — Saiu às pressas do
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banheiro. — O que acha de eu te acompanhar?


Continuei vestindo a roupa sem responder.
Ela sabia que eu vim visitá-la a essa hora, apenas
para aliviar as pressões do dia. Alana era uma das
minhas “bocetas amigas”, ela sempre me atendia
quando a necessidade surgia. Às vezes eu precisava
foder umas três vezes por dia, era uma das formas
que eu encontrava para evitar a porra de um surto.
Ela veio até mim se enrolando em uma toalha,
com o olhar ansioso.
— Nem precisamos dizer que namoramos,
apenas...
Com a camisa aberta, terminei de calçar os
sapatos, peguei terno e gravata e fui para a porta.
— Eu não vou levar ninguém.
Convencida de que não poderia me persuadir,
suspirou e foi para frente do espelho pentear os
cabelos.
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— Não sei por que ainda atendo suas


ligações.
— Porque sabe que eu faço gostoso. Até
qualquer hora.

Saí sem um pingo de culpa na cabeça.


Ela era adulta e sabia as regras de nosso
relacionamento. E sabia que ela era apenas mais
uma de meu vasto harém. E, na minha concepção,
deveria agradecer por ter sido escolhida, entre
várias da minha agenda.
No estacionamento peguei meu carro
esportivo e entrei no fluxo da cidade. No painel,
escolhi alguma música animada e dirigi para meu
apartamento. Todos os dias, esse horário, era a
melhor hora para mim, quando enfim, eu deixava a
empresa.
Eu nunca quis ser um empresário. Nunca quis
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me cobrir com ternos caros, com gravata amarrada


em volta do pescoço e debater negócios com outros
executivos. Mas meu pai me disse certa vez que a
gente não faz só o que gosta. E aqui estou pagando
por todos os meus pecados, fadado a morrer preso
nessa vida.
No meu apartamento, fui direto para o banho.
Podia sentir o cheiro de sexo impregnado em mim;
eu não odiava isso, mas quando estava prestes a ir a
uma festa de família, deveria estar impecável.
Quando saí, meu celular tocava, peguei-o e pulei na
cama. Era Stela.
— Diga, mana.
— Preciso de você mais cedo na casa do
papai, para me ajudar em umas coisas. — Eu ia
perguntar a ela por que não chamava o marido
bundão, mas apenas aceitei.
— Chego em breve.
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— Vai trazer alguém? Miguel precisa


organizar a lista de convidados. Fernando vem com
Isabella e Thadeo com uma tal de Sabrina.
Conhece?
— A gente mal conhece o Thadeo, Stela.
Alana queria ir comigo...
— Alana, Benjamin? Sério? Vir sozinho seria
mais prudente. — Ela nunca conseguia esconder
sua desaprovação com qualquer uma de minhas
“amigas”.
— Eu não vou levar ninguém. Além do mais,
você tem o Miguel, e eu não falo nada. Chego as
seis, tudo bem?
— Sim. Te espero, mano. — Ela desligou e
eu joguei o celular de lado. Stela era minha única
amiga. Amizade do sexo feminino eu quero dizer.
Ela é minha gêmea e, com isso, desenvolvemos um
laço mais estreito que é diferente com os outros
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irmãos. Confiamos um no outro, entendemos a


loucura um do outro, e sempre conseguimos nos
ajudar quando o surto bate forte.
Levantei-me, fui ao meu closet e olhei o que
poderia vestir para a festa logo mais. Acho que de
todos os cinco, eu era o Capello que mais se
preocupava com o visual. Fernando, se deixassem,
apareceria lá de botas, chapéu e jeans. Escolhi um
terno de três peças cinza. Quando terminei de me
vestir, já era quase seis da tarde. Peguei as chaves e
sai de casa.

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04
BENJAMIN

A festa estava um porre, como era de se


esperar. Vim mesmo só porque Stela insistiu. Fazia
tempo que o pai e eu não nos dávamos bem... desde
o réveillon de 2014 quando ele confessou o que
tinha feito. Eu não fazia esforço para melhorar
nossa relação, e ele parecia satisfeito apenas com
minha presença na empresa. O velho gostava de
aparências, mesmo que nos bastidores estivesse
tudo minado, prestes a explodir.
— Viu o Thadeo por aí? — Cheguei na mesa
de doces e perguntei a Stela.
— Sim, ele acabou de chegar. — Ela se virou

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totalmente para mim, deixando a arrumação da


mesa de lado, e sorriu me analisando, convencida
de que minha roupa precisava de pequenos reparos.
— Está bonito. — Ajeitou meu colarinho. — Todo
tampadinho, como o papai gosta. — Se referia às
minhas tatuagens que sempre foram motivo de
briga na nossa casa.
— Ah, para com isso. — Bati na mão dela.
— Como você está, Benji? Estou te vendo
hoje em uma semana...
— Negócios. — Tomei um gole de
champanhe. — Você sabe.
— E vai insistir nisso? Nunca vai enfrentar o
pai e dizer de uma vez por todas que não está
satisfeito?
— Preciso de grana, Stela. — Cortei o velho
discurso motivacional dela. Era a única que não
estava satisfeita por eu não estar satisfeito. —
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Tenho contas a pagar e um padrão de vida a


manter. Não tenho tempo para sonhos.
É. Esse era o único motivo que ainda me
prendia naquele inferno.
— Está falando como nosso velho. Lembre-se
que você é novo, nem chegou aos trinta ainda, dá
tempo de seguir um sonho.
— E você? Quando vai deixar essa vida
pacata de lado e seguir seu sonho? Fez faculdade e
agora é dona de casa.
Ela suspirou diante da minha crítica e
imediatamente se colocou na defensiva.
— O sonho de uma mulher morre quando ela
se torna mãe.
— Fale isso por você, não pelas outras
mulheres.
— É a pura verdade. Ou você é uma boa

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esposa e mãe, ou passa metade de sua vida tentando


agradar o próprio ego. Estou muito bem na minha
vida caseira.
— Que seja. Seu marido, pelo menos, te dá
alguma grana do que é seu por direito?
— Não fale assim comigo. — Advertiu
empunhando um dedo na minha cara.
— Foi mal, aí. Olha lá o Thadeo. — Vi nosso
irmão passando do outro lado da sala — Vou dar
uma palavrinha com ele. A gente só consegue ver
ele em ocasiões especiais...
Andei até Thadeo e antes de chegar perto
dele, meu coração sacudiu descompensado. Fui
pego de susto. A mulher que estava ao seu lado
tinha um sorriso lindo, uma mulher muito elegante,
com um corpo perfeito. Era familiar, entretanto,
não era assim que eu me lembrava dela. Engoli em
seco e caminhei em passos lentos até eles. Nem
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olhei para meu irmão, eu mal conseguia desviar a


atenção daqueles olhos grandes castanhos.
Então ela me viu. E, pela sua surpresa, tive
certeza que não estava enganado. Era a prima da
Danielle. E eu tinha me esquecido como elas eram
parecidas. A diferença era o cabelo liso e loiro de
Sabrina.
— Sabrina...?
— E aí, cara. — Thadeo me cumprimentou,
mas eu acabei ignorando-o. Estava incrédulo,
paralisado assim como ela. Nos encarávamos sem
piscar.
— Vocês se conhecem? — Thadeo
questionou, e eu fiz que sim, assentindo. Me
perguntei por que minha presença a incomodava,
com certeza Dani não contara coisas boas sobre
mim. Ou talvez não soubesse de nada, afinal, estava
saindo com Thadeo, meu irmão...
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— Vocês estão na cidade? — questionei. —


Você sabe onde estão suas primas...? Tentei
encontrar a Dani... mas sumiram.
— Ah... Bom... — Ela olhou para os lados,
totalmente pálida. Meu irmão franziu o cenho
intrigado.
— Olha, Sabrina — continuei. —, se
passaram anos, mas eu gostaria de ter a
oportunidade de conversar amigavelmente com ela.
Não tem um dia que eu não pense...
Ela poderia ter me respondido sim ou não. Ou
ter desconversado. Todavia, o que ela fez foi
estanho. Sabrina simplesmente correu.
— Mas que porra... — Thadeo exclamou
aturdido, e eu não fiquei ali para suposições. Por
que ela estava correndo de mim? Isso era muito
confuso.
Passei por entre os convidados, ouvindo
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Thadeo me chamar, mas só conseguia manter o


foco no vestido prateado à minha frente. Ela só não
corria mais rápido, por causa dos saltos.
Estava prestes a alcançá-la, então fui parado.
Outro irmão no lugar errado, na hora errada.
Fernando me segurou.
— Viu uma mulher alta, cabelos castanhos —
perguntei a Fernando quando ele me segurou.
— Por que está perseguindo uma mulher
aqui? Ficou louco? — Fernando inqueriu intrigado.
— Preciso encontrá-la, porra! Para onde ela
foi?
Antes de ele falar, senti mãos fortes me
puxarem com força e quase me erguer do chão.
Apesar de nós, irmãos Capello, sermos altos e com
músculos em dia, Thadeo era um brutamontes, com
músculos cultivados de trabalho pesado na vinícola
que foi da mamãe, e que ele cuidava.
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— Pra onde ela foi? — Thadeo gritava, rouco,


me sacolejando.
Com ajuda de Fernando, consegui me livrar
das mãos do Hulk e fiquei em uma distância
segura, com Fernando entre a gente.
— Que porra está acontecendo aqui? —
Fernando berrou.
— Esse safado importunou minha
acompanhante e a afugentou. — Thadeo afirmou.
Meu irmão Fernando e Maria Clara, sua
acompanhante, esperavam uma explicação bem
convincente da minha parte. Todo mundo sabia que
eu, o caçula dos Capellos, não queria saber de
relacionamento e era o maior mulherengo que essas
bandas já viram, mas correr atrás da acompanhante
de um irmão? Isso era selvageria. Todavia, eles
pouco sabiam que essa fujona era prima de minha
ex-namorada, por quem procurei por longo tempo.

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— Eu a conhecia, ok? — me defendi. — Eu


tinha que falar com ela. Não entendi por que a
safada correu de mim.
— Gente, pelo amor de Deus. — Stela veio
correndo. — Os gritos estão chegando lá no outro
salão, o papai está aflito. Vocês três acham de
brigar justo agora?
— Ok. Já estou legal. — Ergui as mãos em
sinal de paz.
— Beleza. — Thadeo respirou fundo e sorriu
para Maria Clara. Olhou para cada um de nós e deu
de ombros. — Era só uma acompanhante de luxo
que eu contratei para enganar o velho. Vou ter que
encontrar outra para comer essa noite.
Como é que é? Acompanhante de luxo? A
prima da Dani era uma garota de programa? Mas
que merda estava acontecendo? Por que ela se
submeteria a essa vida fodida?
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Thadeo virou as costas e voltou para o salão


deixando Stela rosada de vergonha pelo que ele
falou.
— Você está legal? — Ela se dirigiu a mim.
— Estou. — Passei o braço na cintura de
Stela. — Vamos ver o Andrey se foder,
oficializando o noivado. — Ela riu, e seguimos
abraçados. Eu não iria contar à minha irmã sobre a
Sabrina. Na época em que eu namorava com
Danielle e aconteceu toda aquela merda, Stela
tomou posição contra Dani, achando que era uma
interesseira que estava me fazendo sofrer.
Me dava nojo pensar em tudo que meu pai
fez, mas era tarde demais para ter rancor do velho.
Ele acabou de descobrir um tumor, e eu não queria
ser um babaca de ter ódio de um idoso doente.
O resto da festa de noivado de Andrey foi um
borrão.
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Passei o resto da festa apenas analisando. Eu


via como meus irmãos, todos os quatro, se
empenhavam para um único propósito: ser bem
visto pelo nosso pai. Como os planetas giram em
torno do sol e precisam dele para sobreviver.
Fernando lutando para destronar Miguel da
vice-presidência da empresa que, por tese, deveria
ser comandada por um de nós.
Andrey nem precisava falar muito. Era o
primogênito que estava se casando só para deixar o
velho feliz e conseguir a presidência da empresa.
Havia um documento testificando que se ele se
divorciasse antes de um ano, seria destronado da
presidência.
Stela estava no paraíso que era regido por
Miguel. E nosso pai a venerava por ser a única
filha, a única a lhe dar netos e a responsável por
oficializar Miguel como membro da família.

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O Thadeo era quieto, na dele, quase nunca era


visto. E era, dos filhos, aquele que meu pai mais
tinha dificuldade em aproximar. Meu irmão era
fodido no inferno particular dele, eu o entendia
perfeitamente.
E, por fim, eu. Que passei toda minha vida
ouvindo as porras que devia ou não fazer.
O que meus irmãos talvez não soubessem é
que a dinastia Capello era formada por nós cinco e,
se o pai faltasse, já estaríamos fortes o suficiente
para levar o nome dele adiante.
E toda vez que estávamos felizes, reunidos
em ocasiões especiais, eu me sentia um merda e
tinha certeza que Thadeo e Stela compartilhavam
desse mesmo sentimento, porque era como se
estivéssemos, mais uma vez, deixando nossa mãe
sozinha, era como se nesse grupo fechado de
pessoas ricas e felizes, uma doida não pudesse

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entrar. Mesmo ela não estando mais nesse mundo.


Stela sabia o que eu pensava quando nosso
irmão, Andrey, trocava a aliança de noivado com
sua noiva. Minha irmã olhou para mim e suspirou.
Tínhamos consciência que esse momento colocaria
um sorriso no rosto de nossa pobre e sofrida mãe.
Stela abaixou os olhos, e quando Miguel percebeu
que ela não estava bem, ele começou a acariciar,
suavemente, sua nuca. Cochichou algo para ela,
arrancando de seus lábios, brevemente pálidos, um
brando sorriso.
Eles se entendiam, ele podia ser um bundão,
mas eu agradecia por cuidar bem dela e ser a
ancora que ela precisava. Até parecia que tinha um
elo mental, que os faziam íntimos.
A noite terminou e, sozinho, fui embora,
acompanhado dos fantasmas dolorosos do passado,
trazidos à tona pela presença de Sabrina. Eu tinha

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que ir atrás dela.

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05
BENJAMIN

Quando eu cheguei em casa, me despi e fui


direto para a cama. Sabe quando você não fez
muita coisa no dia, mas parece que acabou de sair
de uma aula de pilates e, em seguida, foi correr
uma maratona e então só precisa de um tempo na
cama? Eu estava assim.
No escuro, o rosto de Sabrina me inquietou.
Foi como reviver um pedacinho dos dias em que eu
ia visitar Dani e que estávamos apaixonados, com
mil planos para o futuro.
Rolei para o lado, coloquei o travesseiro na
cabeça, tentei bater uma punheta, mas nada

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adiantou. Uma caralhada de pensamentos rondava


diante de mim, e seria impossível dormir.
Pulei da cama e, no escuro mesmo, alcancei o
notebook. Cliquei em uma aba constantemente
aberta e meus olhos baixaram para o valor do
produto que estava em leilão.
Uma pintura de um metro e vinte, estava
rodando pela internet desde o ano passado.
Colecionadores se gladiavam para ter a misteriosa
obra que apareceu do nada em uma loja de
antiguidade em Londres. Autor desconhecido, sem
nada mais no mercado de sua autoria. Mas o que
deixava todos atraídos pela pintura, era a beleza da
mulher ali retratada.
Cabisbaixa, sentada em uma janela, parecia
esperar alguém que nunca chegaria. Era belo olhar
para a mulher na sua eterna espera. A pintura
meticulosa, com cores vivas, tinha o poder de

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prender quem a encarasse.


Danielle era a mulher retratada na pintura, a
minha namorada perdida.
O lance já estava em setecentos mil. Sorri e o
aumentei. Dei o lance de oitocentos mil. Fechei o
notebook e peguei o celular, busquei um número na
agenda e a pessoa atendeu em seguida.
— Fala, Benji.
— E aí, Tucano. Está no ringue?
— Vai começar daqui a pouco. — Ele já sabia
o motivo de minha ligação.
— Tem vaga?
— Chega aí, posso te incluir. Faz tempo que
não vem dar uns murros nos caras.
— Tô chegando.
Eu costumava entrar em um ringue
clandestino apenas quando a cabeça estava
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fervilhando, não tinha sexo para distrair e eu sentia


que poderia surtar. Conheci Tucano ainda na
faculdade, ele traficante e eu experimentando. Ele
me apresentou as lutas, e eu cheguei a disputar
cinco vezes seguidas em uma semana e ganhar
todas, recebendo o título recordista invicto.
Hoje atuo menos nesse tipo de coisa, com
medo de que alguém descubra e jogue na mídia, e
meu pai venha encher a porra do saco. Não é legal
ser um cara de quase trinta, independente, mas
ainda viver sob os comandos do pai.
Me vesti. Regata, conjunto moletom por cima
e saí rápido, olhando no relógio e vendo que já se
passava das duas da manhã.
Cheguei no local marcado, o estacionamento
de um prédio abandonado. Havia tambores em
chamas para iluminar, grupinhos afastados de
pessoas puxando uma palha e uma galera reunida

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em uma grande roda, enquanto os caras se


gladiavam no centro.
Os gritos eram altos, o cheiro forte de macho
e cerveja. Passei por um cara caído, se recuperando
de uma surra. Cheguei à roda, e Tucano veio me
receber com alegria.
— É isso aí, porra! — Puxou minha mão e
deu dois tapinhas no meu ombro. — Faltava algo
para alegrar essa noite fodida.
Isso chamou a atenção de outros homens que
me olhavam com curiosidade. Alguns conhecidos
vieram me cumprimentar.
— Um trago, mané? — Um sujeito me
ofereceu um baseado. Recebi, dei uma baforada e
devolvi a ele.
Tirei o casaco e os tênis, enfaixei as mãos e
esperei Tucano anunciar minha entrada, que seria
com um cara marrento chamado Paçoca. As apostas
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começaram, ouvi os gritos de euforia e me


concentrei no musculoso barbudo à minha frente.
— De um lado, o tatuado Leiteiro, bruto
como uma dinamite. — O apelido que me deram
ironizava a empresa de laticínios da minha família.
— Do outro, um entregador de bebidas, que
costuma amassar a cara dos adversários, Paçoca.
Podem se arrebentar, senhores. Dei um sorrisinho
de ironia e partimos para o ataque, quando Tucano
deu o sinal.
Um soco me alcançou gerando uma dor
suportável e, imediatamente, revidei, despejando
toda minha força na cara dele. O peguei
desprevenido, segurei sua cabeça e levantei meu
joelho dando duas seguidas em seu nariz. O cara
era muito alto e forte, e não foi o suficiente para
derrubá-lo.
O barulho de carne sendo esmagada com

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socos e joelhadas era abafada pelos gritos da


plateia. Em três minutos de luta, eu já estava
ofegante, suado e com sangue escorrendo junto
com suor do meu rosto. Mas nada de pausa, contra-
ataquei dando um chute no joelho do Paçoca, ele se
desequilibrou, meu cotovelo foi em cheio em seu
queixo e foi o suficiente para derrubá-lo.
Pulei por cima e finalizei com uma sucessão
de socos.
— E, sem surpresa, o Leiteiro é o vencedor.
— Tucano ergueu meu braço, confirmando minha
vitória, enquanto a gurizada, com ânimos no alto,
loucos para ver mais sangue, ovacionavam.

Terminou tudo e eu fui beber com Tucano. Eu


estava moído e meu rosto uma merda, cheio de
hematomas. Seriam uns dois dias sem aparecer na
empresa.
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— Tem mulher na parada. — Tucano não


perguntou, afirmou enquanto eu bebia toda a
caneca de cerveja de uma única vez.
— Não fode.
— Você só aparece quando está na seca, ou
quase pirando. Ainda está vendo o médico de
doido?
— Não. — Enchi a caneca com mais cerveja
— Reencontrei uma mulher que me lembrou minha
ex.
— Caralho. Que barra. Ex nunca são as
melhores pessoas.
— Eu procurei por ela por uns dois ou três
anos. E essa mulher que encontrei hoje pode me
levar a ela.
— Então vai fundo. Se der errado, outra luta
te espera. Como vai chegar amanhã vestido de

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playboyzinho na empresa do papai? O Paçoca


estragou seu rostinho.
— Virose resolve tudo. Farei todo o trabalho
lá do meu apartamento. E para de ficar me
chamando de playboy se não quiser levar uma coça.
— Tá legal. A cerveja é por sua conta.
Riquinho.

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06
DIANA

Seis anos antes.

— Di, por favor, ligue para o Benjamin. Diga


a ele que eu o perdoo por tudo, e que ele precisa
vir. Ele tem o direito de saber, e eu o quero aqui,
nesse momento — minha irmã pediu com um belo
sorriso que chegava aos olhos lacrimejantes.
Estava sendo levada para a sala de cirurgia, sua
gravidez era de risco. Ela passou toda a gravidez
sem querer ouvir o nome de Benjamin, ela decidira
não contar a ele sobre a criança, e eu a apoiei, mas
nesse momento, estava fraca e emocionada.

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Eu estava em pânico, ela tinha um problema


de coagulação no sangue e por qualquer coisa,
ocorria hemorragia. E Danielle já estava pálida
quando a levaram.
— Eu falo com ele — prometi a ela. — Logo
ele estará aqui.
— Que bom. Nossa menina vai nascer, Di. E
ela será a reconstrução de nossa família. Seremos
as três meninas superpoderosas.
Esse era o desejo dela desde que o nosso pai
foi embora da noite para o dia, e nunca mais o
vimos: reconstruir a família.
— Sim, seremos. Estou te esperando aqui,
Dani. Traga a Maya ao mundo.
Ela entrou no centro cirúrgico e não saiu com
vida. Quando eu vi aquela expressão da médica,
antes de dar a notícia, eu gritei o mais alto que
pude, sozinha, naquele corredor de hospital,
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enquanto ela tentava me acalmar. Eu só gritava,


gritava, alto e dolorosamente.
Naquele instante, era eu e Maya apenas. E
por ela eu faria tudo.

***
ATUALMENTE

Saí da minha sala na boate e caminhei por


entre as pessoas. Gostei de ver que hoje o
movimento estava melhor. As meninas dançavam
no palco, e havia um número bom de homens,
distribuídos em mesas, assistindo, mas não uma
quantidade o suficiente deles para encher nossos
cofres. Eu queria renovar a boate, dar um ar mais
luxuoso, para se tornar tão requintada como o clube
privado Dama de Copas, de um empresário

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espanhol que abriu uma filial recentemente aqui, e


fomos convidados a visitar. Mas agora outra coisa
bombardeava meus pensamentos: como arrumar
dinheiro para Almir, impedindo-o de agir antes?
Sem olhar para ninguém, atravessei todo
ambiente movimentado e barulhento, sabendo que
os homens sentados nas poltronas me olhavam com
cobiça. Subi as escadas para o segundo piso e
cheguei à porta da diretoria.
Almir e alguns homens que estavam em sua
companhia bebendo e fumando, interromperam a
conversa e olharam interessados para mim. Almir
fez um único gesto, e todos se levantaram,
deixando a sala para nós dois. Entrei desfilando e
ocupei uma poltrona afastada da mesa dele, pois
odiava o cheiro de charuto.
— Algo em mente? — ele perguntou, vendo
na minha expressão que eu andava com a mente

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nos cofres da boate.


— Um empréstimo, talvez. O caso é que... Eu
pensei, talvez se a gente melhorasse o nível da
boate.
Sacudiu a cabeça discordando.
— Só daria mais gastos sem saber se teríamos
o retorno.
— Vamos então reabrir o segundo pavimento.
É o jeito. — Dei o braço a torcer, desistindo do
meu lema. — Só não vamos obrigar as meninas...
— Diana, negócios e humanidade não
combinam. Se elas forem escolher com quem
transar, vai continuar na mesma.
Levantei-me e andei pela sala, pensando em
uma saída. Eu não queria confrontar Almir, uma
vez que ele sabia de todos os meus segredos e,
muito menos, obrigar as meninas.

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— Se não quer ver o Benjamin, volte a falar


com o pai dele. O velho te deu grana uma época...
— Caralho! — Perdi a compostura — Você
só pensa nisso. Esquece essa porra de família. Eu
não quero ouvir o nome.
— Nem mesmo se a Maya ficar sabendo? —
ironizou com ar de desafio.
— Não coloque o nome dela nesse meio. —
Andei até a porta e voltei rápido. — Você não é
doido de expor minha filha. Eu juro... Você não me
conhece.

****

Eu tive o cuidado em manter meu estilo de


vida não muito exagerado. Era o suficiente para dar
conforto a uma criança. Eu não esbanjava luxo,

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porque não queria levantar suspeitas. Não queria


que alguém começasse a questionar ou que
descobrisse minha verdadeira profissão, e algum
dia me denunciar ao conselho tutelar. Muitos juízes
não veriam com bons olhos uma mãe solteira ser
dona de boate para adultos. E, fora da noite, eu era
mãe solteira que a sociedade aprovava.
Eu amava joias, roupas caras, bebidas boas e
homens gostosos de alto nível. Mas tudo isso longe
da minha casa, do lugar onde eu me transformava e
era vista com bons olhos pelos vizinhos. Eu era a
mãe trabalhadora que chegava em casa cansada, e
não podia levar a filha em shoppings e lugares
legais.
Um dia eu iria embora daqui com minha filha
e poderia dar a ela tudo que merecia, sem reservas.
Desde ontem, passei a pensar seriamente em deixar
a boate, pegar o dinheiro que juntei todo esse

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tempo e deixar Almir para trás.


Cheguei ao meu apartamento, esperando o
portão abrir, olhei para o prédio modesto que
morava, desde que Almir e eu voltamos para São
Luís, ano passado. Após deixar o carro em minha
vaga, segurando os saltos e a bolsa, entrei sem
acenar para o porteiro.
— Oi, cheguei. — Joguei as chaves no
aparador, e imediatamente Amanda veio da sala.
Ela é solteira, estudante e sempre fica com Maya à
noite, para eu ir trabalhar. Ela ama o serviço já que
o dinheiro que lhe pago é o suficiente para ela se
manter.
— Oi, Di. Chegou cedo. Ela já jantou e está
dormindo.
— Ah, obrigada. Eu estou só o pó. — Joguei
os sapatos e a bolsa no tapete. — Vou tomar um
banho e cair na cama. — Encarei Amanda sem
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esconder meu olhar de tristeza. — Pensei em ir


embora com Maya — confidenciei, e ela se sentou
ao meu lado.
— Tem a ver com o pai dela? — cochichou.
— Também. A boate está precisando de
grana, e Almir ameaçou chantagear o Benjamin
para obter dinheiro.
— Credo. Que homem demoníaco. Eu nem
sei o que dizer, Di. Mas, uma certeza tenho: não
gosto desse povo... Nem compro o leite ou iogurte
deles. Depois de tudo que você me contou, eu
peguei ranço.
— Por ironia do destino, a Maya adora o
queijo Capello. Não sei qual seria a reação do
Benjamin, talvez ele simplesmente ignorasse a
filha, o que é ótimo para mim, mas não quero
arriscar. Agora vai para sua casa. — Bati na perna
dela. — Já tomei muito do seu tempo.
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Ela foi até a mesa, pegou sua bolsa e livros,


veio até mim e me abraçou.
— Precisando é só chamar. Não tome
decisões no calor do momento. Se cuida, Di.
— Obrigada. — Levei-a até a porta.
No quarto, tomei um banho rápido, vesti um
pijama confortável me olhando no espelho e vendo
nada mais que uma mãe dedicada de quase
quarenta anos, longe de toda aquela casca da Diana
da boate.
Fui ao quarto ao lado. Acendi apenas o abajur
de princesa ao lado da cama. A pequena menina
dormia indiferente aos problemas que poderiam nos
rondar. Tão pequena... Duas lágrimas saíram
desgovernadas dos meus olhos, e o pranto veio
imediato, porque eu lembrei da minha irmã. Eu
deitei ao lado dela na caminha e chorei
silenciosamente, podendo escutar minha irmã dizer
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que Maya iria ser o nosso caminho para a


felicidade.
Eu sentia tanta falta dela que às vezes era
desesperador pensar que jamais iriar ver Dani
novamente. Eu só tinha Maya agora na minha vida,
a única coisa que me mantinha firme e forte,
aguentando quaisquer pedradas e socos da vida.
Uma menina que não era minha filha, mas era
minha razão de viver.
Minha irmã tinha dado à luz e morrera logo
depois. Benjamin jamais poderia saber... Porque ele
não merece conhecer um anjo como Maya.
— Mamãe? Está chorando? — Ela acordou e
virou-se para me olhar.
— A mamãe estava com saudade. Volte a
dormir, meu anjo. Vou ficar aqui com você. — A
beijei várias vezes e a abracei.

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07
BENJAMIN

Eu devia mesmo procurar Sabrina, porque


estava me tirando o sono saber que eu tinha como
chegar a Dani novamente depois de anos. E havia
uma pessoa que poderia me levar ao caminho
exato. Thadeo falava comigo ao celular. Dois dias
após ver a prima de Dani, eu me rendi aos
pensamentos masoquistas e decidi saber onde ele
tinha encontrado a mulher que levou ao noivado de
Andrey. E fiquei feliz por ele nem ter pestanejado
antes de me dar o endereço da boate.
— Uma dica, não vá aos sábados. O velhote
disse que é a folga dela.

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— Certo.
Eu já ia desligar quando perguntei:
— Ia transar com ela?
— Não. Ia debater sobre o livro Dom
casmurro. — Soltou um som parecendo um
rosnado irônico. — Claro que sim, não paguei uma
fortuna só por ela parecer sofisticada, e você fodeu
com minha noite.
— Você é tão estranho — resmunguei e andei
no meu quarto com o celular no ouvido. — Se
cuida, bicho do mato. — Desliguei e me encarei no
espelho. Ainda tinha hematomas, mas eu teria que
ir na boate.

Eu não queria levantar suspeitas e acabar com


a missão sendo interrompida. Todo mundo sabe
que as duas coisas chamam atenção: se você chega

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descolado jogando dinheiro para o alto em um


lugar que nunca entrou, ou fica em um canto calado
só observando. Não dou tempo de dois minutos
para te pegarem e levar ao quartinho de
interrogatórios nos fundos.
Portanto, quando entrei na grande boate, em
um local afastado de São Luís, eu desempenhava
um papel. Era o cara rico procurando diversão
aleatória. Passei os olhos em volta rapidamente,
estudando o ambiente. Não era tão luxuoso,
aparentemente precisando de algumas reformas,
mas era bem iluminado e agora entendi por que
meu irmão tinha vindo aqui. Apesar de tudo parecia
sofisticado, e as meninas deviam ser no mesmo
patamar.
Parecia mais uma boate de strip-tease do que
um bordel.
Vermelho e dourado predominavam, e o chão

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era muito brilhoso, combinando com o teto


rebaixado e seus lustres de cristal. Os homens
presentes, que eu concluí serem os clientes, eram
bem-apessoados, mas não tão bem vestidos,
fumavam charutos e bebiam uísques certamente
não caros. Políticos, empresários, ricos
diversificados que buscavam diversão barata.
No balcão, pedi um drinque, e quando o
barman empurrou a bebida para mim, perguntei:
— Se eu quiser uma garota...?
— Conquiste uma delas ou tente convencer o
chefe. — Apontou com o queixo para uma escada
que subia para o segundo pavimento. — Bate lá e
tente a sorte.
— Obrigado. — Me levantei e, ousadamente,
fui até onde ele tinha me indicado. Subi cada
degrau olhando em volta, em alerta e desconfiado.
Ajeitei minha roupa, olhei para os lados e bati na
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porta. Em segundos um homem alto de terno abriu.


Possivelmente um segurança.
— O que quer?
— Falar com seu chefe... Me disseram que se
eu quisesse uma garota...
— Nome?
— Benjamin Capello. — Ele fechou a porta
com brusquidão na minha cara e pouco depois
voltou com outro segurança.
— Entre – o primeiro disse.
Fiquei impressionado com a rapidez. Deixou-
me passar e me vi em um escritório bem
sofisticado. Atrás de uma grande mesa produzida
em madeira de lei, um homem de mais ou menos
sessenta anos ficou de pé e sorriu nem um pouco
surpreso. Parecia me esperar.
— Você é o...

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— Benjamin Capello. — Apertei a mão dele.


— Almir. Sente-se, fique à vontade. Quer
beber alguma coisa, senhor Capello?
— Não, obrigado. — Me sentei — Eu só
queria sair com uma garota... E me disseram que eu
tinha que vir aqui.
— Certo. — Cruzou as mãos sobre a mesa. —
As meninas não saem da boate. E nem interagem
com clientes, mas se eu der permissão...
Abri logo a carteira, peguei meu cartão de
crédito e o coloquei sobre a mesa.
— Creio que com alguns dígitos, terei minha
permissão.
Ele gargalhou e assentiu.
— Gostei de você garoto. Fala minha língua.
E quer saber? Eu sei exatamente quem você
procura.

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Um pouco de desconfiança me atingiu.


— Como é?
— Sabrina. Não é isso?
— Sim. — Olhei para os lados, como se
pudesse entender o que acontecia. — Isso mesmo.
— Ela não se encontra mais. Eu dei umas
férias prolongadas para ela. Mas sei também que
você busca algo bem peculiar... As irmãs Cristóvão.
Sabrina me contou. — Sua expressão não deixava
esconder a pilantragem que brilhava no rosto dele.
Peguei o cartão, guardei e fiquei de pé.
— Essa porra está ficando estranha. O que
você quer?
— Negócios. Fique calmo. Apenas negócios.
E te garanto que essas irmãs esconderam algo de
você que... putz. — Ele fez uma careta. — Precisa
mesmo encontrá-las.

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— E você quer grana para me vender a


informação. Saquei.
— Uma transferência nessa conta, e te conto
tudo que sei sobre elas e onde estão. A escolha é
sua. — A raiva me tomou. Sempre a porra do
dinheiro. Essa merda move a humanidade. E a
coisa que eu mais odiava era uma tentativa de me
extorquir. Olhei o papel que ele me estendeu –
Uma quantia exorbitante. – e ri.
— Você acha mesmo que sou um idiota para
te dar essa quantia? Vai. Se. Foder. — Amassei o
papel, joguei na cara dele e fui para a porta.
— Vai me tratar assim, moleque? — Almir
gritou e abriu a gaveta na mesa. Supus que seria
uma arma, então, mais rápido que ele, abri a porta,
mas tinha um gigante lá fora.
— Segure esse desgraçado — Almir ordenou
furioso, e o segurança tentou colocar suas mãos em
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mim. Entretanto, ele não sabia com quem estava


lidando. Dei um soco no queixo dele pegando-o de
surpresa, mas não o suficiente para derrubá-lo.
Desviei de uma revanche, chutei seu joelho e
quando ele perdeu o equilíbrio eu saí correndo.
Desci as escadas, sabendo que o segurança vinha
logo atrás.
— Segure esse merdinha — ele berrou atrás
de mim para outros que estavam lá embaixo. Ainda
no meio da escada, pulei o corrimão caindo no
salão, assustando os clientes que estavam por perto.
Tentei correr, mas eles me cercaram e facilmente
me arrastaram por um corredor.
— Ei, cara! — gritei tentando me livrar. — O
que está fazendo, porra? — Tive medo pela
primeira vez, porque eu não sabia que inferno de
boate era essa que Thadeo tinha me mandado. E
quando um deles abriu a porta que dava para um

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beco, o pânico foi ainda maior. Me jogaram lá fora


e se aprontaram para me espancar.
— O que está fazendo aqui, playboyzinho? —
Um berrou comigo, e meu sangue ferveu. Desviei
de um chute, fiquei de pé e atingi um deles com um
soco no queixo, dei um chute no outro e quando os
dois se recuperaram e vieram, eu estava preparado,
sorrindo feito um filho da puta doido por sangue e
caí no pau com os dois. Brigamos feio no beco,
senti a dor dos socos, mas isso era apenas
combustível para eu foder a cara deles com mais
pancada.
Foi questão de tempo para conseguir apagá-
los, mesmo saindo ferido com mais hematomas
para a coleção. Eu estava cambaleando e vi uma
mulher parada lá no corredor me encarando. Ela
veio andando rápido, e achei que a minha frente
estava um fruto de delírio. Eu não estava

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acreditando. Era Diana, a irmã de Danielle.


Atônito, fitei-a e ela parecia aterrorizada em me
ver.
— Benjamin? O que está fazendo aqui?
— E você? Também trabalha com esses filhos
da puta golpistas? É a sua cara — ironizei e limpei
o sangue em minha boca.
— Não. Eu.. p...passei aqui para buscar minha
prima, ela trabalha na boate. O que está fazendo
aqui? Ah, meu Deus! — Ela olhou para os homens
caídos. — O que fizeram com você?
— O que eu fiz com eles, você quer dizer,
não?
Ela não me deu ouvidos. Olhou alarmada para
dentro da boate, segurou minha mão e me puxou,
saindo do beco e ganhando a rua.
— Vamos sair daqui, antes que mais

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seguranças venham. — Ela estava certa. Corremos


pela rua e deixei ela me guiar até um bar do outro
lado.
Era a porra de uma coincidência sinistra;
pasmo em vê-la depois de tantos anos e me deparar
com uma mulher tão bela que não lembrava nem
um pouco aquela irmã mais velha de minha
namorada. Diana vestia uma roupa muito elegante,
saltos altos e seus cabelos castanhos estavam soltos
em cachos perfeitos. Além disso, me recriminei por
gostar da porra do perfume dela.
Ela escolheu uma mesa afastada, me fez
sentar e foi até o balcão, falou algo com o garçom e
voltou para a mesa.
— Eu o conheço e pedi um kit de primeiros
socorros. — Ficou me olhando por segundos e
nitidamente não estava nem um pouco feliz com o
reencontro. — O que você estava fazendo lá,

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Benjamin? O que fez para eles te baterem?


— Eu não tenho que te dar a porra de
explicações. — Ela nem piscou diante de minha
brutalidade. Assumi um tom rude para interagir
com ela. — Você não passa de uma interesseira
medíocre que deve ganhar a vida atrás de homens
ricos.
— E que mulher não gosta de dinheiro, não é?
— ela foi irônica e sua risada a seguir soou
maldosa. — Mas, sinto te decepcionar, hoje
escolho meus parceiros com o que eles têm aqui: —
Deu um toque na cabeça. — Entre as pernas, claro
— Piscou maliciosamente —, mas nunca pela
carteira. Em resumo você nunca seria opção. —
Empurrou a cadeira para se levantar, mas eu tive
que engolir minha raiva e me submeter a ela, se
quisesse a informação que sempre busquei.
— Fui lá atrás da Sabrina — falei e ela parou

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e virou-se. —, para tentar pegar com ela


informação sobre vocês que desapareceram do
mapa anos atrás. Por onde tem andando? Onde está
Dani?
Diana olhou para os lados, parecia controlar
as emoções. Voltou e sentou-se novamente. Ela
abaixou a cabeça nas mãos e penteou os cabelos
com os dedos. Quando me olhou, tinha um ar
sofrido.
— Não chegue perto. Aquele cara é perigoso.
Siga sua vida, deixe o passado onde está.
— Ela me esqueceu? Já seguiu a vida? Casou-
se? Me diga alguma coisa, caralho.
— Cacete! Não torne as coisas mais difíceis.
— Você sempre foi essa babaca de merda. —
Dei uma risada seca, me recostando na cadeira. —
Dani é inocente, mas você não. Aquela noite...
pediu dinheiro a meu pai. Caralho, como pode ser
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tão baixa? — Expressei minha revolta com


sobrancelhas levantadas.
— Se me insultar for fazer você afastar, então
fique à vontade. — Mostrou-se invulnerável e fria.
— Eu quero falar com a Danielle.
— Não... Ela não... — Diana calou-se assim
que o cara do bar chegou e entregou para ela uma
caixinha. — Deixei-me olhar seu rosto. Não foram
carinhosos com você.
— Ah, vai para a porra. — Tentei me afastar,
mas com olhar sério, ela puxou minha camisa e
arrastou a cadeira para bem pertinho de mim.
Molhou uma gaze com soro fisiológico e tocou no
machucado acima do meu olho. Franzi o rosto com
a dor e, por impulso, ela me segurou para eu não
me afastar.
— Não vai precisar de pontos — atestou.

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Notei que tinha unhas muito bem-feitas e sua


pele era bem cuidada, lisa e como já tinha
percebido, o perfume leve e refinado se intensificou
com a proximidade. Senti meu corpo responder de
imediato à bela mulher cuidando de mim. Meu pau
latejou animado, e meu coração deu um belo salto,
porque a atração bateu potente em minhas veias.
Diana estava muito gostosa, e eu não consegui ficar
indiferente a isso.
— Eu mereço o céu por fazer curativos no
cara que desejo dar uma surra — murmurou e
segurou meu queixo olhando o resultado.
— Já estou acostumado com essas merdas no
rosto.
Assim que ela terminou, afastou-se e pediu
duas bebidas.
— Vai me deixar ao menos falar com ela? —
Voltei ao assunto.
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Não me respondeu. Ficou de cabeça baixa e


quando me olhou, seus olhos tinham um brilho
doloroso. Mas que porra?
— Eu... não estou confortável. Desculpe. Eu
quero acabar de uma vez por todas com isso e te
contar tudo. Mas não aqui, não quero que aquele
cara da boate venha atrás de você aqui e... se
pudermos ir para algum lugar. Prometo te contar
tudo.
— Tudo bem. — Me levantei, abri a carteira e
escolhi uma nota de cinquenta. Deixei na mesa e
estendi minha mão para ela. — Venha comigo. —
Ela ignorou minha mão, lançou um olhar de pouco
caso e saiu na frente, marchando sobre os saltos.

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08
DIANA

Eu estava com sede para acabar com Almir.


Era tão certo como o sol brilhava todas as manhãs,
que ele atraíra Benjamin para lá. Ele tentou me
passar a perna e, graças a Deus, não contou nada a
Benjamin, que parecia ainda permanecer no escuro
em busca de informações. Foi um milagre eu ter
visto ele e o tirado de lá. Não o arrastei para longe
da boate com medo de uma nova briga, eu queria
era que ele se danasse. Só me fiz de gentil e o
“salvei”, para deixá-lo mais distante de Almir e da
verdade.
Seria melhor assim. Avaliei que era uma
decisão sábia contar a Benjamin, de uma vez por
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todas, o que aconteceu com minha irmã. Assim, ele


seguiria sua vida, e eu poderia ficar em paz com
Maya. Olhei de relance para ele dirigindo e franzi
os olhos sentindo desconforto com seus hematomas
que não pareciam ser problema para ele.
Não me espantei por ele ter colocado os
seguranças da boate para dormir. O Homem não era
o empresário engomadinho sensível que muitos
julgavam. Sua altura e porte físico eram bem
trabalhados em academias e uma luta clandestina
que ele sempre estava envolvido. Um dos meus
homens gravou um vídeo dele na rinha de luta, e eu
fiquei estática com tanto poder masculino,
músculos bem cultivados e belas tatuagens. Ele era
um gato, um homem daqueles que fazia salivar de
desejo, mas minha mente me fez lembrar quem era
ele. O cara que fez minha irmã sofrer. Eu não
deveria me sentir atraída.

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Calado, ele dirigia sem olhar para mim.


Parecia maduro, um homem crescido, e não o
moleque de seis anos atrás. Passei os olhos pelo seu
corpo, as coxas musculosas, os bíceps bem
definidos, era impressionante como estava bonito.
— Como chegou à boate?
Ele me olhou de relance confuso.
— Eu não deveria chegar lá?
— Sabe que não foi isso que perguntei.
— Sabrina acompanhou meu irmão em uma
festa na mansão do meu pai e eu a vi. Então meu
irmão me deu o endereço de onde encontrá-la.
— Sério? Que safada! — Eu não estava
acreditando em tudo que tinha acontecido debaixo
do meu nariz. Ela atraiu Benjamin e tinha certeza
que fora com a persuasão de Almir. Ambos vão me
pagar.

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— Por que safada? Esse não é o trabalho


dela?
— Sim, claro. Esquece. Eu odeio aquele
lugar, só passei lá para buscá-la. — Menti
descaradamente. Ele não precisava saber que eu era
a dona.
Chegamos a um prédio, ele acionou um
pequeno controle, e um portão grande abriu.
— Que lugar é esse?
— Minha casa. — Entrou com o carro, e eu
senti meus nervos sacudirem de temor. A casa dele!
Não era a mesma que vim tirar satisfação, quando
ele foi um babaca com a Dani.
Chegamos ao estacionamento, descemos do
carro e seguimos para o elevador. Só quando entrei
no apartamento, ele me olhou e me dirigiu a
palavra.

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— Fique à vontade, vou pegar algo para


bebermos. — Acabou de falar, desabotoou a camisa
suja e rasgada e a descartou, revelando o corpo
monumental, com belas tatuagens que eu já havia
visto em vídeos e na academia em que ele malha.
Acima do peito tinha uma frase curta e um coração
com asas espetado com um punhal. Um dos ombros
e braço repleto de tatuagem. Acima do umbigo
também tinha e mais alguma descendo pela virilha
e que me deu vontade de ver, não nego.
Merda, eu não queria ser tão fraca por homens
bonitos. Eu tinha que odiar ele e não ficar fazendo
um check-up.
E, para minha surpresa, algo brilhou em seu
mamilo, o que ficou claro se tratar de um piercing.
Sem roupa, não parecia mesmo um homem de
negócios. Eu estava salivando. Gosto de homens
bem cuidados e sempre escolho os mais novos que

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eu. Benjamin seria um peixe e tanto para a minha


rede.
Ele pode ter desconfiando em como fiquei o
analisando despretensiosamente, mas não disse
nada. Saiu me deixando sozinha na sala muito bem
arrumada. Era tudo muito luxuoso, um típico
apartamento de jovem rico. O preto predominava
no sofá, nas cortinas e em uma parede. Isso tudo
pertence à minha filha. Ela não tem uma vida de
luxo porque eu preciso despistar, mas gostaria que,
no futuro, ela viesse reivindicar tudo que lhe
pertence por direito.
Benjamin voltou, me entregou um copo e
sentou-se à minha frente.
— E aí? Por onde andou todos esses anos?
— Por aí. — Fui evasiva.
— Me conte sobre isso. — Ele relaxou no
sofá e abriu os braços no encosto.
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Porra que delícia de homem cafajeste, filho


do cão.
— Bom... Eu tive que sair, estudar. — Não
deixava de ser verdade. Comecei a estudar, mas
parei quando Maya veio. — Depois eu voltei... É
isso.
— E Danielle?
Tinha chegado o momento, mas era
necessário para ele desencantar de vez e sumir do
meu caminho. Eu odiei ter que usar a memória de
minha irmã para isso, mas aqui, os meios
justificavam os fins. Abaixei a cabeça e não deixei
lembranças tristes que pertenciam a mim
particularmente virem à tona em um momento que
eu precisava jogar.
— Éramos nós duas contra tudo. — Falei
olhando o copo com líquido intocado. — Naquela
época eu... eu quis pegar um pouco da dor dela para
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mim, porque éramos assim, dividíamos tudo.


Ele inclinou-se e descansou os cotovelos nas
coxas.
— Eu sei que fiz merdas no passado —
começou a dizer. — Eu feri a Dani e fui maldoso
com vocês, mas, Diana, me escute, eu quero poder
me desculpar...
— Para enfim ter a consciência limpa? — Me
levantei deixando a raiva me tomar. Raiva do que
ele fez e de como foi maldoso comigo.
— Não. Claro que não. Porque eu não sou um
canalha que você pensa. Meu pai armou tudo,
caralho.
Isso era uma informação nova. Franzi os
olhos.
— Como?
— Meu pai me fez pensar que sua irmã queria

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me dar o golpe. — Benjamin estava agitado, passou


as mãos na cabeça e soprou efusivamente.
— Puta merda. Que velho desgraçado! —
Esbravejei, e ele não me corrigiu, assentiu até.
— Nem gosto de lembrar... Eu jamais vou
ficar de consciência tranquila.
Me segurando no pulso da raiva que tinha me
tomando, me virei para ele e joguei na cara dele,
sem aviso:
— Dani morreu, Benjamin. Meses depois de
você ter feito aquilo... Ela faleceu.
Ele ficou alguns segundos me encarando,
absorvendo a notícia, e vislumbrei suas emoções
mudando aos poucos, até deixar o corpo cair
sentado no sofá, olhos saltados, pálido como papel,
me fitando catatônico.
— Não foi sua culpa. — Amenizei — Teve

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uma complicação em uma cirurgia. Mas eu queria


tanto me vingar de você porque durante meses
minha irmã sofreu pelo que você aprontou. Ela te
amava, cacete. — E isso também era a pura
verdade. Não contar para ele sobre a própria filha,
foi uma maneira que eu encontrei de me vingar. Eu
não iria contar, poderiam me chamar de egoísta,
mas ele não merecia saber. Andei pela sala, ficando
de costas para ele. Não queria que visse minhas
lágrimas. Que merda! Eu não queria demostrar
fraqueza aqui.
— Está falando sério? — balbuciou. Eu voltei
e me sentei no sofá.
— Por que eu mentiria? Foi a pior dor que já
passei em toda minha vida. Agora estou sozinha no
mundo, e peço a você que não cruze mais meu
caminho. Você pode ir depois ao cemitério... Mas
siga sua vida, Benjamin.

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Ele ainda estava mudo, sem reação,


completamente catatônico.
— Desculpa... — falei. — Eu tive que te
contar.
Benjamin se levantou, cambaleou pela sala e
foi rápido para uma porta que eu presumi ser o
banheiro. Da sala pude ouvir gritos e barulhos,
parecendo de vidro quebrando. Com as mãos
enfiadas nos cabelos andei, fui de um lado para
outro, colocando o raciocínio em ordem, querendo
me mandar dali, mas com uma indesejada ponta de
preocupação por ele. Eu deveria ir ver se estava
tudo bem?
Voltei a me sentar e, minutos depois ele saiu
do banheiro com a mão enfaixada, mas suja de
sangue, e ficou parado como um zumbi na sala. O
rosto estava úmido.
— Como...? Como ela... se foi? — Sentou ao
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meu lado.
— Foi horrível. Ela teve um problema, teve
que fazer uma cirurgia e não conseguiu... Ela estava
fraca...
— Estava doente?
Não, estava grávida.
— Sim.
— Eu sinto muito, Diana. — Sussurrou — Eu
não posso imaginar sua dor e não espero que
entenda que em mim dói pra cacete também.
— Cinco anos. Vivo todos os dias superando.
Minha vida... Está uma merda, mas tenho algo que
me faz agarrar com força e continuar em frente e
Dani... jamais gostaria de me ver nessa situação. —
Limpei uma lágrima antes dela descer totalmente.
— Porque... eu sempre fui o pilar da família e uma
coluna não pode desabar.

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— De que você precisa, Diana? — Levantei o


rosto para encará-lo. Os olhos dele brilhavam
lacrimejantes.
— Eu quero ir embora... eu preciso voltar. E
peço a você, de todo coração, para seguir em frente.
Ela gostaria disso.
— Uma merda que não precisa. Eu gostaria
de... te ajudar, em qualquer coisa.
— Não preciso de nada, sério. — Ele
assentiu, mas criou forças e desabafou:
— Eu passei anos procurando e, caralho, a
dor que estou sentido por ela ter partido com ódio
de mim. — Ele fungou e virou o rosto.
— Ela não estava mais com ódio de você. —
Toquei em seu braço. — Dani era superior a mim e
a você, Benjamin. Ela não guardava esse
sentimento. Ela lembrava apenas dos momentos
bons.
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— Certo. — Ele ficou de pé e ficou de costas


com as mãos cruzadas na nuca. — Então... me
perdoe por ela. Me perdoe por aquela merda toda.
Eu fui enganado... eu a julguei erroneamente.
— Eu te perdoo e tenho certeza que ela
também. Agora eu preciso ir.
— Durma aqui. — Virou-se com olhar aflito
— Já está tarde. Tem um quarto de visitas...
— Não, obrigada. — Nem pensar. Não
poderia deixar Maya sozinha. — Eu preciso mesmo
ir.
— Eu te levo. — Se prontificou — Só vou
vestir outra camisa porque aquela está parecendo
um lixo.
Esperei ele sair da sala e só então fui até
minha bolsa pegar o celular que começara a tocar.
Era Amanda. Meu coração saltou preocupado.

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— Oi, Amanda, tudo bem?


— Diana, você precisa vir embora. Maya está
com muita dor, precisa vir agora.

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09
DIANA

Para mim, o caminho percorrido do


apartamento de Benjamin até o meu foi um
completo borrão. A aflição e culpa me consumiam
e eu podia sentir minha irmã me julgando por ter
sido tão relapsa em ter deixado Maya sozinha. E
me sentia mais culpada por estar com o homem que
minha irmã amou, e desejar ir para a cama com ele
e, ainda por cima, continuar omitindo sobre a filha
dele.
Eu nem disse a Benjamin que estava saindo.
Apenas saí correndo, na velocidade da luz. Na rua
com a visão turva, vi um taxi e quase me joguei na
frente dele, implorando que me levasse para minha
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casa.
Enquanto ia para o hospital com Maya,
gemendo, encolhida no colo de Amanda no banco
de trás, eu fazia inúmeras promessas. Nunca tinha
sido religiosa, mas agora, me apegava a uma fé que
nasceu espontânea vinda da aflição. Prometi que se
Maya ficasse bem, eu contaria ao menos para ela
sobre quem era o pai, que ela julgava desaparecido.
No hospital, ela foi atendida imediatamente, e
enquanto fazia exames eu apenas clamava aos céus.
A menina era tudo para mim, todo sacrifício que fiz
até esse momento foi apenas por ela. Era mais que
uma promessa à minha irmã, era minha única
família, meu único lar nesse mundo.
Maya foi diagnosticada com apendicite e terá
que ser operada imediatamente. Havia dois grandes
problemas, e o médico veio conversar comigo a
respeito.

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— Mãe — ele começou. —, o caso dela se


complicou. Olhei na ficha dela e estou vendo que
Maya é portadora da doença de Von Willebrand,
que é uma doença hemorrágica, em resumo,
parecido a hemofilia.
— Sim, às vezes ela sangra bastante pelo
nariz... — uma lágrima desceu do meu olho ao me
lembrar de Dani que também tinha o mesmo
distúrbio.
— E isso quer dizer que qualquer cirurgia
pode ser perigosa. Qualquer corte pode ser a causa
de uma hemorragia por falta do fator de
coagulação.
— Sim. Eu a protejo muito... Tenho medo que
se machuque e cause sangramento... — Limpei a
lágrima que já rolava na bochecha. Eu estava
falando no automático, estava preparada para
qualquer bomba que ele fosse jogar em mim.

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— Que bom que entende. Ela precisa ser


operada imediatamente, mesmo com esse risco.
— Ah, meu Deus — lamentei com as mãos na
boca.
— E queremos já nos precaver. Temos que ter
sangue do tipo sanguíneo dela, e esse é mais um
problema, a senhora deve saber é...
— O mais raro — completei aterrorizada.
Parecia que o destino ria da minha cara, em sua
armação perfeita. Todas as peças devidamente
encaixadas. Me levantei exaltada da cadeira e andei
em círculos pelo consultório, quase doida de pedra.
— Ela é “O” negativo que só pode receber de
outro “O” negativo, e precisamos urgente desse
sangue, caso algo ocorra na cirurgia. A senhora é
qual tipo sanguíneo?
— Eu... sou A positivo... — minha voz era
um sussurro de medo. — Mas e o hospital, porra?
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— Perdi a compostura e comecei a gritar. Surpreso,


o médico esboçou uma expressão de alerta.
— Infelizmente, em falta. Mas e o pai... ou
irmãos dela?
— Ela não tem irmãos — berrei e enfiei as
mãos nos cabelos. Estava ofegante e com muito
ódio, porque eu sabia onde isso poderia chegar. Eu
simplesmente não podia aceitar que tudo foi
encaixado para me colocar nesse beco sem saída.
— O pai dela... — o médico começou a falar,
e, em um ataque de loucura, derrubei as coisas da
mesa do consultório. Ele pulou da cadeira e ficou
recostado na parede.
— Ela não tem pai! — Bati a mão na mesa.
— Eu sou a única família dela. Pai não existe!
— A senhora precisa manter a calma. —
Levantou o tom de voz. — Eu só não abandono o
caso e aviso a diretoria, pela criança, porque você
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não está no juízo perfeito para continuar em um


hospital.
— Vá se danar. Eu quero que cuide da minha
filha, dê o seu jeito. — O médico se sentou
novamente e tentou controlar meu surto de raiva.
— Dona Diana, você precisa urgentemente
pedir ajuda a amigos e familiares, tente encontrar
qualquer pessoa nas próximas duas horas.
— Duas horas? Você está me dando a porra
de duas horas?
— Sim. Pode se apressar. — Sustentou meu
olhar.
Sai da sala igual um foguete. Quem eu
conhecia, além das meninas da boate? Amanda
apenas. Rapidamente, fui até ela que me aguardava
na sala de espera. Contei tudo que estava
acontecendo.

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— Meu Deus, Di! Eu não sou esse tipo


sanguíneo. Meu namorado também não. Eu posso
fazer umas ligações, mas... já é tão tarde.
Sentada ao lado dela, segurando um copo de
água, eu nem me mexia, porque sentia que poderia
entrar em pane e perder qualquer razão.
— Tudo bem... eu vou ver o que posso fazer.
— Di, e o cara... — ela interrompeu a fala,
olhou para os lados e cochichou pertinho: — O
Capello. Vai atrás dele.
Sim, minha querida. Essa hipótese estava me
endoidando. Sentia que poderia explodir a qualquer
instante. Eu queria gritar com Amanda, como gritei
com o médico, berrando que eu jamais envolveria
ele nisso, mas consegui me controlar.
— É... Eu pensei... Mas esse cara não pode
saber dela. Eu não vou dividir a minha filha.
Nunca, jamais.
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— Diana! — ela falou alto e me sacudiu — É


a vida dela que pode estar em risco. Sua irmã
morreu assim. Pelo amor de Deus, não pense em
nada agora, só salve a Maya.
Foquei nos olhos desesperados de Amanda.
Ela tinha razão. Não era sobre mim, era sobre a
Maya. Era sobre o amor que eu tinha por ela. Eu
queria ela viva e feliz, independente se fosse
comigo ou com o pai. Esse era o amor que eu tinha
por ela.
Deixei Amanda e voltei correndo ao
consultório. O médico se assustou quando entrei de
supetão.
— Vai acontecer assim. — Apontei um dedo
ameaçador na cara dele.
— Não me ameace. — Ficou de pé antes de
eu falar. — Vou chamar a segurança.
Pela Maya, pela Maya. Eu tinha que manter a
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calma por Maya.


— Tudo bem, desculpa. — Controlei a
respiração, afinal eu precisava da ajuda dele. — O
senhor precisa me ajudar. Vai ter que me ajudar.
— Sente-se aí. Acalme-se e me conte. — Ele
voltou para a cadeira, e eu me sentei também.
— Eu sei quem é o pai dela, mas o senhor tem
que prometer que não vai falar com ele quem é a
paciente.
— Eu posso tentar...
— Não é tentar! — berrei. — É certeza. Se
contar para ele...
— Tudo bem. Calma.
— Alguém do hospital tem que ligar para ele
e implorar para que venha aqui, mas não pode dizer
quem vai receber o sangue.
— Pela menina, ouviu?
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— E você não acha que eu estou fazendo essa


merda toda só por ela? Ligue para a casa dele, por
favor, convença ele a vir.
Eu não ia aceitar numa boa essas tramas
loucas parecidas de novela, que o destino armara
para mim.
Benjamin era um vento passageiro, logo ele
sumiria novamente.

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10
BENJAMIN

Sinceramente? No fundo, eu já esperava que


Diana fosse fugir. Ela estava muito assustada e,
claro, nunca nos demos bem. Eu estava ainda
abalado com a revelação e me sentia derrotado. A
dor de imaginar Dani sozinha, precisando de
ajuda... Eu poderia estar ao lado dela, mas fui um
idiota.
Sentado em frente ao notebook, vendo a
pintura da mulher na janela, eu quase deixei uma
lágrima escapar. Já tinha chorado mais cedo e até
quebrado o espelho do banheiro com socos. Nunca
imaginei que enfrentar essa perda fosse tão
doloroso, afinal já tinha se passado anos que a
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gente não se via.


Por Dani, eu iria cuidar de Diana. Pela
memória dela, eu faria tudo que estivesse ao meu
alcance, para amenizar a dor daquela mulher.
Fechei o computador e sorri ao lembrar do
rosto de Diana. Era uma sensação boa ter ela por
perto, além de ter me sentido atraído, agora eu
sentia empatia por ela. Deixarei para ir atrás dela
amanhã, pegarei o endereço na boate.

Peguei minhas chaves, e saí de casa. Eu não


conseguiria dormir nesse estado. Precisaria
desabafar. Ou era com Tucano ou com Stela.
Escolhi a segunda opção.
Stela ficou assustada quando me viu. Miguel,
com olhos semicerrados, cheios de desconfiança,
logo atrás dela.

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— Benji! O que aconteceu com seu rosto?


— Tem dez minutos de ombro amigo para
mim?
— Claro, mano, venha aqui. — Ela me
puxou, e bastou um olhar para Miguel entender e
subir as escadas deixando-nos sozinhos. Stela me
levou para a cozinha e preparou uma bolsa de gelo
para os hematomas e um café forte.
Na frente dela eu poderia chorar. Nós dois
conhecíamos o melhor e o pior lado um do outro.
De cabeça baixa, vi uma lágrima bater no balcão da
cozinha. Enxuguei-a rapidamente e fitei Stela após
terminar de relatar tudo.
— Eu sinto muito — sussurrou. — Jamais
vou me perdoar por ter julgado a coitada. O papai
foi baixo... — Ela também tinha lágrimas nos
olhos. Segurou forte na minha mão.
— A irmã dela está sozinha no mundo. Fiquei
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tentado a visitá-la depois, tentar de alguma forma


remediar meu erro, mesmo sabendo que não tem
mais conserto.
— Tem conserto, Ben. Essas coisas não
aconteceram por acaso. Você vai achar uma forma
de consertar, ao menos em partes.
— Eu tinha uns sonhos... Meio puff. — Dei
uma risada dolorosa e revirei os olhos. — Sonhos
patéticos. Uma casa e não um apartamento... Ter
filhos com ela... O menino seria Marlon. — Apertei
com força meu celular e Stela apertou sua mão por
cima da minha. — Porque ela amava o Marlon
Brando e a menina seria Maya, porque eu gostava
daquela história que a mamãe contava, da deusa
greco-romana Maya, do qual resultou no nome do
mês de maio. — Stela assentiu sorrindo tristemente.
Maio era o mês que ela e eu nascemos. — Dani
seria enfermeira e eu teria uma noite foda demais

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de exposição das minhas obras e sairia até no New


York Times. — Rimos juntos, com os olhos
encharcados. Olhei a faixa suja de sangue na minha
mão. — Que merda de objetivos.
— Claro que não. Se todo homem tivesse
objetivos tão bonitos como os seus...
— O pai não acha que são objetivos de
homem — ironizei e bebi boa parte do café, na
caneca.
— Não pense mais nele. O pai é assim e
devemos só relevar. Você ainda pode...
— Hoje eu não tenho mais nada, Stela. Eu
tenho que pintar escondido... Até minha moto... O
pai está me obrigando a me desfazer dela. Não
tenho um propósito que me faz querer levantar
todas as manhãs.
— Não pare de lutar, mano. Eu sinto sua
angústia. — Ela se levantou e me puxou para seus
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braços. Eu fiquei sentado na banqueta alta,


abraçado ela até o celular tocar. Observei o número
desconhecido e decidi atender.
— Oi.
— Benjamin Capello?
— Isso. — Olhei para Stela, que se mostrava
curiosa.
— Boa noite. Aqui é doutor Gustavo Ferreira.
Ligamos para a mansão do seu pai, e ele nos passou
seu contato.
— Sim, pois não? Aconteceu alguma coisa?
— Fiz sinal para Stela se aproximar e coloquei a
ligação no viva-voz.
— Não necessariamente. Precisamos muito de
sua ajuda. Verificamos no nosso banco de dados
que você é do tipo sanguíneo “O” negativo.
— Eu estou no banco de dados? — Ela e eu

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nos entreolhamos — Não me lembro de ter me


inscrito...
— Ah... As empresas fizeram isso com
funcionários e sócios, para uma eventualidade.
— Ah, certo. E o que posso fazer pelo
senhor? — Eu estava curioso para entender o que
ele queria de mim a essa hora da noite.
— Uma criança está nesse instante no bloco
cirúrgico e o senhor pode ajudá-la. Por favor, já
ligamos para vários, mas se recusaram...
Stela estava com a mão na boca, de olhos
saltados.
— Puta, merda. Se recusaram a quê?
— Uma pequena quantidade de sangue. O
senhor deve saber que o seu tipo sanguíneo é o
mais restrito e que só pode receber doações de
outros “O” negativos.

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— Sim, eu sei disso.


— Por favor, eu como médico e pai, estou
implorando que venha até aqui ao hospital. Já é
tarde da noite e não sei se podemos encontrar outro
doador.
— Claro que você vai. — Stela sussurrou para
mim. — Eu irei junto.
Eu não iria nem titubear, nem pensar na
hipótese. Eu passei por longas sessões de terapia
para esquecer os traumas de infância, sei do que
passei e sempre que estiver ao meu alcance, não
deixarei de ajudar uma criança.
— Claro. Lógico que vou. Só me dá o
endereço que chego aí em instantes. — Ele me
passou o endereço do hospital, esperei Stela se
trocar e saímos de casa. Miguel ficou com as
crianças.
A chegar ao hospital o médico veio ao meu
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encontro. Ele era responsável pelo caso, me


explicou que se tratava de uma criança em risco na
sala de cirurgia e agradeceu muito por eu ter vindo.
Caminhamos para a sala de coleta, ele andava
rápido mostrando que tinha pressa para o
procedimento.
— E quem é a criança? — perguntei. Ele me
olhou um tanto ressabiado e pigarreou
desconfortável antes de continuar:
— Você não a conhece... E a família pediu
sigilo na identidade. Tem algum problema quanto a
isso?
— Não. Claro que não. Ficarei feliz em
ajudar, depois converso com os pais.
— Sim, claro.
Ele me fez algumas perguntas e olhou os
exames mais recentes que me pediu para trazer.

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Sorte que eu tinha em casa um envelope com uma


bateria de exames que tinha feito há seis meses e
tive que passar lá para pegar, antes de vir.
— Alguma tatuagem dessas é recente, menos
de doze meses?
— Não. Mas eu tomei um pouco de vinho...
há umas duas horas.
— Bom, geralmente pedimos um tempo
maior, caso tenha ingerido bebida alcoólica, mas
como o caso é de urgência...
Assenti. Imediatamente me levaram para uma
poltrona reclinável e fizeram todos os
procedimentos. Em minutos, o sangue saia
lentamente do meu braço e enchia uma bolsa
pequena de 450 ml.
— Sente-se feliz em fazer uma boa ação? —
Stela perguntou, sentada do meu lado.

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— É até legal. Dá uma sensação de um pouco


menos endiabrado. — ela gargalhou.
Eu nunca havia doado sangue e estava feliz
pela primeira vez ser algo tão especial, destinado a
uma criança. Era bom sentir-me útil.
Quando terminou, ele pediu para aguardar em
uma salinha de estar e, um pouco depois, uma
jovem muito assustada entrou. Ela olhou para Stela
e eu, se portando um pouco sem graça e bem
pálida.
— Oi, tudo bem? — Stela se dirigiu a ela,
querendo saber por que nos olhava apreensiva.
— Ah... Eu só queria agradecer. Sou da
família da criança que o senhor ajudou.
— Ah, sim. — Aprumei meu corpo no sofá e
esperei ela chegar mais perto.
— Sou Amanda.

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— Oi, Amanda. Sou Benjamin e essa é minha


irmã Stela. Fico feliz em ter ajudado... A criança é
sua?
— Não. Sou a... tia. A mãe está no bloco
cirúrgico esperando.
— Ah, claro, entendo.
— Bom, eu só quis mesmo agradecer em
nome da família. Nem sei o que faríamos...
Eu ia fazer algumas perguntas como: a
mãe ou o pai não eram compatíveis? Ou a
menina era adotada e não tinha
compatibilidade com o sangue dos pais? Mas
eu estaria sendo invasivo em algo que não me
dizia respeito.
Amanda se despediu e saiu quase
correndo. Minha irmã tinha razão: é bom me
sentir útil, diferente do que meu pai sempre
apregoou de mim. E eu fiquei satisfeito por a
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família da criança ter vindo me conhecer.

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11
BENJAMIN

Na empresa, pela manhã, eu estava um caco.


Bem cansado e com olheiras, além dos hematomas.
Tinha conseguido cochilar só às cinco da manhã e
acordei às sete. Até pensei em faltar, mas estava
uma loucura por lá.
Andrey e Fernando enlouquecidos, querendo
descobrir quem era a mulher que o pai poderia estar
tendo um caso. Quanto a isso, tudo bem, ele podia
ficar com qualquer mulher, mas o que descobrimos
é que ele incluiu mais alguém no testamento e não
conseguimos violar o documento para saber o que
ela herdaria e quem era essa mulher.
Por isso, marcamos uma reunião, só os
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irmãos. Decidimos excluir a Stela porque não


queríamos o Miguel envolvido. Ela contaria tudo
para ele e, claro, ele como um bom puxa saco do
nosso pai, bateria com a língua nos dentes.
— Andou aprontado à noite? — Fernando
bateu no meu ombro. Eu esperava o elevador.
— Cara... Uma doidera. Reencontrei minha
ex-cunhada, ganhei uns murros de uns seguranças,
mas coloquei os dois pra dormir e fui chamado
para doar sangue.
— Está fumando uma, é cara? Que história
maluca é essa?
— Coisa de doido. — Entramos no elevador e
contei para ele, resumidamente, sobre a boa ação
que fiz.
— Nunca achei que empresas enviassem
dados de funcionários e sócios para hospitais, mas
tudo bem, gostei da sua iniciativa em ajudar.
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— Pois é.
Fomos direto para a sala de Andrey onde ele
já nos esperava na companhia de Thadeo. Dos
irmãos, os dois são os mais distantes. Thadeo
estava calado, vendo algo no celular, e Andrey
digitando no computador. Eu acho que de todos
nós, Fernando era o que conseguia ter proximidade
com todos. Ele sempre teve o instinto protetor e
controlador e sabe tudo sobre a vida dos irmãos,
porque quer saber, sente necessidade em se
envolver.
— E aí, manos — cumprimentei. O semblante
de Thadeo se iluminou ao ver que o clima na sala
iria ficar mais leve com nossa presença.
— Que porra aconteceu? — Thadeo olhou
pasmo para meu rosto. — Andou mexendo com
mulher alheia?
— Marcas de herói, meu brother. — Sentei ao
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seu lado.
— Vamos começar? — Andrey, que parecia
mais sério que o normal, falou e entregou uma
pasta para cada um de nós.
— Está aí alguns levantamentos de possíveis
nomes de mulheres que podem estar rondando
nosso velho.
Abri e passei os olhos no primeiro nome e
foto. Bonita, se chama Laura e era fiscal da
empresa.
— Essa aqui vai para a fazenda — alertei a
Fernando.
— É. Já fui comunicado. Estou correndo de
encrenca. Lá em casa já tem uma que vale por dez.
Tem uma para o Thadeo também. — Ele mostrou
em uma página uma morena linda, parecia novinha,
e a profissão: sommelier de vinhos. Fiquei surpreso
em ver todas aquelas mulheres que, de alguma
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forma, tinham ligação com meu pai. Até a


secretária dele estava no bolo.
— Como descobriu tudo sobre essas
mulheres?
— Detetive particular.
— Tem um detetive particular? — perguntei.
— Quem não tem? — Andrey respondeu, e
Fernando riu assentindo, mostrando que também
tinha contato de um.
— Eu até estava precisando antes, porque
queria encontrar uma ex-namorada... Mas agora, já
encontrei. — E me senti triste repentinamente ao
lembrar que ela estava morta.
— Lá vem o cara perseguir as minas —
Thadeo resmungou.
— Isso é pouco diante do que ele fez essa
noite. — Fernando se mexeu na poltrona animado,

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pronto para contar a fofoca. — Reencontrou a ex-


cunhada, aquela irmã da garota que o pai fez um
rolo...
— Daqui a pouco está transando com ela,
querem apostar quanto? — Andrey ironizou.
— Olha quem fala. Você acabou de ficar
noivo e mantém uma amante.
— São coisas diferentes. — Andrey deu de
ombros — Vou me casar por conveniência e nem
ouse falar da minha garota.
— Sua garota. — Dei risada. — Devia ter
noivado com ela, então.
— Eu não preciso assumir uma amante sendo
que posso ter as duas. Mari é gostosa, então estou
no lucro.
— Você é um guerreiro. — Fernando elogiou
Andrey — Se uma mulher já é difícil de lidar...

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imagina duas. Eu não pretendo casar tão cedo.


— E a gostosa que tu levou na festa? —
Thadeo foi ousado e corajoso ao perguntar.
— Cara, dobre a língua para falar dela, porra.
Ela está muito bem servida e cuidada.
— Ok! Vai se foder vocês. Vamos voltar a
essa merda de lista. — Abri a pasta incitando-os a
olharem cada um a sua.

***

Assim que terminei na empresa, corri para a


boate. E, dessa vez, levei um segurança comigo. Eu
estava de terno, queixo empinado, botando marra
ao manter as pisadas duras até o bar. Nem foi difícil
entrar. Não tinha segurança lá fora, e quando um
me viu, já era tarde demais. Eu já estava chegando

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ao balcão. — Estamos fechados, amigo. — O


barman, única pessoa, além dos seguranças, ali no
salão da boate, falou. Estava arrumando garrafas de
bebidas nas prateleiras de vidro.
— Quero falar com seu chefe.
— Nem um dos dois está no momento. Quer
deixar um recado? — Olhei em volta, tudo vazio,
mas estavam preparando para a noite. Um
segurança me observava, mas não era alguém que
eu tinha visto na noite anterior.
— Posso saber onde encontrá-los?
— O seu Almir está em viagem, e dona Diana
não vem por aqui hoje... Problemas familiares. —
Tomei um baque com as palavras dele, que foi
capaz de gelar meu sangue.
— Como assim... dona Diana?
— Você não queria falar com um dos chefes?

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Pois então, Almir e Diana.


— Ela trabalha com aquele velho... —
balbuciei.
— Sim. Os dois dirigem isso, mas gostaria
que ela fosse dançarina. — Ele riu. — Ver aquela
mulherona dançando no poledance. Oh, delícia!
Meu Deus! — Isso foi o suficiente para meu sangue
entrar em ebulição. Antes gelado de choque, agora
borbulhando de raiva. Por cima do balcão alcancei
o colarinho dele.
— Escuta aqui, filho da puta. Primeiro dobre
a língua para falar dela, e que merda está
acontecendo aqui?
— Eu sugiro que o senhor saia. — Um dos
seguranças puxou meu ombro, e eu soltei o barman.
Amedrontado, se afastou e se recostou na prateleira
de vidro.
— Que porra está acontecendo aqui? —
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berrei.
— O senhor precisa sair. — O segurança
puxou meu braço.
— Benjamin. — O meu segurança tocou meu
ombro. — É melhor sairmos, para não perdermos a
razão. Depois voltamos.
Nada fazia sentido. Nada se encaixava. Diana
disse que só tinha passado para buscar a prima.
Fiquei pensando sobre a coincidência de Sabrina
estar na festa na casa do meu pai e de Diana me ver
brigando com os seguranças. Lembrei da tentativa
de extorsão do tal Almir e de como ela apareceu,
anos atrás, à noite, para pedir dinheiro a meu pai.
A maldita estava de conluio com Almir, na
tentativa de me dar um golpe.

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12
DIANA

— Oi, minha pequena. Sente-se bem? —


Acariciei a testa de Maya. Ela acabara de acordar,
depois de um dia inteiro dormindo após a cirurgia,
que tinha corrido bem. Ela teve um início de
hemorragia, mas foi controlada a tempo, e precisou
mesmo do sangue de Benjamin. Eu seria
eternamente grata a ele. Mesmo que ele jamais
soubesse que ajudou a própria filha.
— Minha cabeça está girando, mamãe. —
Voltou a fechar os olhos.
— É normal. Você passou por uma cirurgia,
daqui a pouco sara.

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— Agora eu tenho uma ci... cicratiz?


— Cicatriz. Sim, tem. Bem aqui. — Toquei
de leve no local da cirurgia.
— Igual o Frank do Hotel Transilvânia? —
Ela se referia ao Frankenstein da animação. Dei
risada e abaixei para beijá-la.
— Te garanto que está bem mais linda que o
Frank.
— Ainda dói um pouco — reclamou.
— Logo vai sarar, meu bem.
— Isso aqui é o hospital?
— Sim. Gostou do quarto que te colocaram?
— Sim. É bonito. Eu não consigo ver direito
porque não consigo levantar a cabeça.
— Logo poderá sentar e assistir aos desenhos.
— Acariciei sua mãozinha que, para meu alivio,
estava corada.
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Ela estava em um apartamento particular que


seu plano de saúde cobria. Eu podia não esbanjar
muito, dando uma vida média a Maya, mas da
saúde, eu não abria mão. Ela tinha o melhor plano
de saúde, e, essa noite, eu fiquei feliz por pagar
cada centavo.
Meu celular tocou na bolsa, e eu já pressentia
quem poderia ser. A única pessoa que jamais me
deixava em paz.
— Vou atender o celular e já voltou, tá bom?
— Ela balançou a cabeça, e eu saí do quarto. Era
Almir.
— Fala.
— E aí? Como estão as coisas?
— Precisamos conversar seriamente. Estou
com muita raiva, Almir. Como pode ser tão cara de
pau?

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— Ei, alto lá! Pense bem antes de me


ofender.
— Dane-se. Você tentou acabar comigo por
causa de dinheiro. Por pouco, Benjamin não
descobre tudo, e ainda nem consegui enrolá-lo em
definitivo.
— Sem frescuras, Diana. Está na boate agora?
— Maya precisou passar por uma cirurgia.
Estou no hospital com ela. — Não achei bom
contar sobre a doação de sangue que Benjamin fez
sem saber. Depois do que Almir aprontou, não iria
mesmo contar mais nada da minha vida.
— Melhoras para ela. Diana... Eu errei, mas
você sabe que precisamos do dinheiro.
— Errado. Você tentou vender uma
informação que é minha. Você tentou negociar
minha filha e isso não tem desculpas que cubra.

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— Chego em breve. Conversaremos.


Desliguei e voltei para o quarto.

***

Maya ficou mais três dias internada e, quando


recebeu alta, estava radiante, corada, se
recuperando com rapidez. Tinha sido uma cirurgia
de apenas quatro pontos, nada muito agressivo.
Uma enfermeira nos acompanhou até a saída,
empurrando a cadeira de rodas em que Maya
estava. Ela já estava voltando a caminhar, mas não
podia forçar muito.
Amanda estava lá fora, ao lado do meu carro.
A enfermeira ajudou Maya a entrar, e eu agradeci
por ter sido tão boa com a gente.
— Estou muito feliz. — Maya falou.
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— Está, querida? Eu também estou. Estamos


indo para casa...
— Sim, porque estamos indo para casa! — ela
comemorou. Eu ri e a abracei, aliviada por tudo ter
dado certo. Eu tinha muito tempo para ficar com
ela, até sua recuperação, depois eu me entenderia
com Almir.

***

Na manhã seguinte, acordei cedo para colocar


a casa em ordem. Tinha roupas para lavar, fazer
almoço e dar uma faxina geral. Geralmente eu
nunca fazia isso, preferia pagar por esses serviços
mais pesados. Mas, depois de quatro dias fora, eu
estava com minha filha em casa e tive um surto de
“dona de casa”.

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Estava passando café quando o interfone


tocou. Podia ser algum serviço ou a faxineira que
veio, mesmo eu tendo dispensado. Atendi e prendi
a respiração quando Benjamin se identificou. Meu
coração deu um pulo desesperado.
Como ele soube onde eu morava? E o que
estava fazendo aqui a essa hora da manhã?
— O que quer?
— Se não me deixar subir, será muito pior. Já
descobri tudo, Diana. — Bati o interfone na parede
e, de olhos saltados, olhei para o corredor onde
ficava o quarto de Maya. Não era possível! Mas
que merda estava acontecendo? Quem estava
regendo minha vida de forma tão irônica?
Ele não pode ter descoberto sobre Maya. Não
tinha como. Não tinha...
Será que o médico contou para ele?

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Corajosamente, apertei o botão para liberar a


entrada dele e corri para verificar se Maya estava
dormindo.
Eu ia negar. Negar até o fim. E poderia
enrolar ele e depois fugir da cidade. Esse cara não
ia encostar na minha menina. Ainda que não fosse
culpado por tudo, mesmo assim, não podia saber,
ou, com certeza, tentaria levantar uma ação no
tribunal, para reaver a guarda de Maya. Só em
pensar nisso, o pânico me sufocava.
A campainha tocou, e eu tentei não demostrar
tanta apreensão, e torcendo para não estar pálida, se
eu tivesse sorte, ele apenas passaria e iria embora.
A cara dele não era das melhores. Cara de
puto. Nem falou nada, passou por mim e entrou
olhando o apartamento, que era muito bem
decorado.
— O que você quer? — Cruzei os braços e
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esperei a análise detalhada dele em torno do


ambiente. — Como descobriu onde eu moro?
— Você não tem ideia de como um
funcionário pode abrir a boca diante de uma gorda
oferta. Dona de boate não é, sua safada? — Foi
logo jogando à queima roupa, o sorriso perverso —
O que pensou que estava fazendo?
— Benjamin, estou sem tempo...
— Você vai me escutar. — berrou. — Eu
passei três dias pesquisando por conta própria, para
ter certeza. Aquela porra de boate é sua, tem
apartamento próprio e carro do ano. O que estava
pensando, Diana? O que quer na verdade?
— Para de fazer escândalo na minha casa —
rebati, gritando também. — Sim, a boate é minha.
Foi isso que descobriu?
— Teria mais coisas para descobrir? Por que
mentiu para mim? — Começou a andar em minha
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direção, e eu me afastando. — Está tramando com


aquele velho asqueroso para tirar dinheiro de mim?
Até sua prima está no bolo, porra!
— Eu falei para parar de gritar na minha casa.
— Saí de perto dele e ajeitei os cabelos, expondo as
mãos trêmulas. Caminhei para a cozinha onde a
cafeteira estava ligada. Ele me seguiu.
— Vai me responder! — Segurou com força
meu braço — Ele é seu amante? Seu homem?
— Não seja ridículo. — Puxei meu braço —
Eu lá tenho cara de caridosa, para ficar com um
nojento como ele?
— Então me explique por que ele queria
vender informação para mim? O cara que é sócio
da boate com você. Me fala! Ou vai fazer igual a os
políticos: “eu não sabia de nada”.
— Ok. — Massageei as pálpebras, torcendo
para não surtar e dar mais pano para a manga. —
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Precisamos mesmo de dinheiro, a boate está no


vermelho e...
— Achou que poderia me extorquir?
— Me deixe explicar, caralho!
Antes de ele responder, a porta do corredor se
abriu e Benjamin virou-se para olhar. O que eu
temia, estava acontecendo. Maya com a cara de
sono, vestindo um pijama e abraçando um bichinho
de pelúcia observava o visitante com atenção. Eu
queria pegar ela e sair correndo. Fugir o mais
rápido que podia.
— Mamãe... a voz de vocês me acordou.
— Diana...? — Ele me fitou. — Você tem
uma filha?
Estava nítido que a vida conspirava contra
mim. Parecia que tudo girava e voltava em minha
direção, em uma arrumação perfeita para Benjamin

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descobrir o que guardo debaixo de sete chaves.


— Sim e não é da sua conta — eu murmurei,
sem me mexer, como se estivesse diante de um
bicho selvagem, preste a me dar um bote. Benjamin
não quis saber por que eu não havia mencionado a
menina antes, ou porque não descobriu enquanto
fazia a tal pesquisa sobre mim. Ele apenas me
deixou de lado e voltou-se para ela.
— Oi, pequena. — Seu tom agressivo tinha
caído e se espatifado como vidro, agora, na minha
frente, havia um homem gentil.
— Quem é você? Na minha casa tão cedo?
— Eu sou o Benjamin. E você?
— Meu nome é Maya. Eu gostei só um pouco
do seu nome, parece com beijar. — Vislumbrei,
meio confusa, uma palidez repentina tomar conta
do rosto dele e até engoliu saliva.

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Maya caminhou devagar, mancando, sem dar


importância, sentando-se à mesa. Eu percebi que
abraçava meu corpo em pânico, pensando em um
motivo para colocar ele para fora. Maya descansou
o queixo na mesa e ficou estudando-o.
Quatro dias de operada. Não era para essa
menina estar de pé uma hora dessas, meu Deus!
— Maya? Ela se chama Maya? —
Completamente pasmo, ele balbuciou.
— S...sim. Minha irmã adorava esse nome.
Foi uma forma de homenageá-la. — Isso era meia
verdade, afinal Dani escolhera esse nome desde que
descobriu que seria menina. Ela mesma bordara
várias toalhas e mantas com o nome da filha.
Benjamin encarava a menina como se ela fosse
uma joia arqueológica preciosíssima.
E ela também o encarava, intrigada. Quase
nunca Maya tinha contato com homens. A não ser
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ultimamente, com os médicos. Para ela, era


novidade ver um homem na nossa casa.
— Maya, meu bem, vamos trocar o pijama.
Não fique encarando as visitas. — Ela deu zero
importância para mim.
— Você é o namorado da minha mãe? —
Observava Benjamin, sem piscar.
— Sou amigo dela.
Ah, então agora éramos amigos?
— Que bom. — Ela tirou da testa os cabelos
desarrumados. — A mamãe nunca tem amigos, só a
Amanda. — Quase tive um treco quando ela falou
da Amanda. Reagi imediatamente.
— Maya. — Tentei fazê-la parar de falar.
Benjamin conhecia Amanda muito bem. Ele me
olhou sem entender todo meu nervosismo e voltou-
se para ela.

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— Sua mãe é uma boba...


— Não é não. — Balançou o dedinho,
negando. — É porque ela trabalha à noite e quando
todo mundo estava trabalhando ela estava em casa
e quando todo mundo estava em casa, ela ficava
trabalhando. Aí, nunca tem ninguém para conversar
com ela.
Ele me dirigiu um olhar acusador. Ele sabia
onde eu trabalhava à noite. Fiquei mais tensa e
furiosa.
— É um ótimo raciocínio — Benjamin
elogiou. — Garota esperta.
— Eu já entrei na escola. — Ela empinou o
nariz, cheia de orgulho. Só agora observando os
dois, é que pude ver a semelhança. Ela tem a boca
da Dani, mas os olhos e nariz se parecem muito
com a família Capello.
— Ela fez cinco anos agora em fevereiro. —
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Falei para ele tentando transparecer calma. Mesmo


que não era da conta dele saber isso, eu buscava
algo para disfarçar minha aflição. Comecei a servir
a mesa com acompanhamentos para o café.
— Vai me oferecer café? — ele perguntou,
ainda me julgando com os olhos.
— Aceita café, Benjamin?
— Sim. — Ele aceitou, e eu revirei os olhos
servindo a xícara. Queria jogar na cara dele e sair
correndo do apartamento com a Maya.
— Filha, vamos trocar de roupa? Está de
pijama na frente da visita.
— Mas o Beijamim é seu amigo, mamãe, ele
não se importa.
— Não importo mesmo. — Ele tomou um
gole de café e quando ia abrir a boca para falar algo
comigo, Maya interrompeu.

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— Você é rico?
— Maya!
— Mais ou menos. — Ele sorriu.
— Eu acho que você é muito rico, pois está
vestido igual ao homem da televisão. — Ele vestia
terno e gravata. Hoje estava a lá executivo. — Você
tem uma casa grande?
— Tenho sim. — Agora a atenção dele era
toda para ela.
— Tem piscina? — Maya se animou
arregalando os olhos. Ela era louca por piscina, e eu
sempre prometia que um dia moraríamos em uma
casa com piscina.
— Não. Você sabe nadar, garotinha?
— Não. Mamãe não me deixa aprender. —
Fez carinha triste — Ela tem medo de eu me
machucar e sair muito sangue. E ela não tem tempo

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para me levar no clube. Você pode levar a gente?


— Maya! Para o quarto agora. Está sendo
indelicada.
— Diana, não seja inconveniente — ele me
repreendeu e voltou a fitar a menina — Pois sua
mãe vai sim te levar, afinal ela é a chefe... Pode sair
quando quiser.
— O quê? — exclamei. Ele deixou a xícara na
mesa e andou em direção a sala. Eu o segui.
— Fico pensando como pode trabalhar lá,
tendo uma filha pequena em casa.
— Agora está sendo um porco machista —
critiquei, e ele parou e virou-se para mim.
— Foi bom te conhecer pequena. — Acenou
para Maya, me ignorando.
— Mamãe, o que é machitas ?
— É o Benjamin, querida. Um homem que se
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intromete na vida das mulheres.


— Eu não gosto de machitas. — Ela gritou de
lá da cadeira em tom de protesto.
— Devia explicar a ela o que é pilantragem
— cochichou segurando com força meu braço. —
Hoje à noite, quero conversar em particular com
você. Vai me explicar que tipo de golpe tentou
aplicar em mim junto com aquele velho.
— Vai ficar querendo — devolvi no mesmo
tom baixinho. — Para fora da minha casa, agora.
— Os olhos de Benjamin pararam nos meus lábios
e ele engoliu em seco. Estava vermelho de revolta.
— Ele é pai da menina?
— O quê?
— O velho é...
— Não! Nem ouse tornar dizer uma merda
dessa. Vá embora. — Empurrei ele, mas nem se

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mexeu do lugar. O homem era um touro pesado.


— Então prefere me confrontar? — Sorriu
desafiador. Não, eu não queria nada com ele, nem
mesmo briga.
— Rapaz, você não me conhece.
— Conheço o suficiente para saber que é uma
trambiqueira, cafetina.
— Não sou cafetina. — Empurrei ele mais um
pouco, mesmo sendo em vão, e olhei para Maya.
Ela prestava atenção na gente. Benjamin andou
para a porta e eu fui atrás.
— Devia ter vergonha de deixar a filha em
casa sozinha para ir para o bordel — criticou.
— Isso não é da sua conta.
— Vai me encontrar hoje à noite no meu
apartamento. Vamos conversar direito. Não quero
bater boca com você agora, vou respeitar a criança.

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— Ele saiu antes que eu pudesse meter a mão em


sua cara. Recostei na porta e, de olhos fechados,
contei até três, controlando minha raiva. As merdas
de Almir haviam respingado em mim.

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13
DIANA

Eu não poderia fugir da cidade. Seriam dois


me procurando: Almir e Benjamin. O que eu tinha
que fazer era agir racionalmente e tentar reverter
essa maré de azar. Eu não estava acreditando em
como minha vida tinha virado de cabeça para baixo
em questão de dias.
Nada me amedrontava, eu sempre fui
destemida, dona da noite, senhora do meu destino.
Mas uma ameaça muito maior do que eu poderia
imaginar, pairava sobre mim. Benjamin Capello.
Ele ameaçava a única coisa preciosa que eu tinha
na vida. Sentia o desespero bater só com
pensamentos sobre ele descobrir que é pai de Maya
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e tentar tirar ela de mim. Além do mais, impedir


minhas visitas. Ele teria todo direito, é pai e foi
negado acesso à filha desde a gestação de Dani.
Pedi Amanda para ficar com Maya, me
arrumei e fui com a cara e coragem para o encontro
que ele tinha marcado.
Benjamin me recebeu com sua cara de touro
bravo, que tinha sido adquirida da noite para o dia.
Estava um gato, metido em um jeans e com uma
camiseta regata deixando os músculos e tatuagens
visíveis. Evidenciando como era jovem e vigoroso.
— Então, veio mesmo...
— Eu não sou mulher que foge. — Desfilei
para dentro do apartamento, com meus saltos
ecoando pela sala silenciosa e minha bunda
rebolando mais que o normal. Eu estava um arraso,
com meu corpão dentro de um bom vestido de
grife.
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— Então essa é a verdadeira Diana. — Não


foi uma pergunta dele, mas uma afirmação.
— Nunca fingi nada. Gosta do que vê? — Eu
estava fazendo um joguinho? Que merda. Só queria
distraí-lo.
— Gosto da verdade. Quer beber algo? — Ele
estava tentando ser educado, mas nenhum de nós
conseguia esconder a tensão. Uma tensão que
poderia facilmente ser confundida com algo sexual.
— Me surpreenda. — Me sentei e cruzei as
pernas que, modéstia a parte, eram belas pernas
bem cultivadas. Seu olhar foi atraído para elas e eu
levantei o queixo sorrindo.
Ele estava descalço, despojado. Me entregou
um copo com um líquido que ele informou ser uma
mistura de vodca com dois tipos de suco natural, e
sentou-se à minha frente, na poltrona.
— Então quis me dar um golpe?
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Provei a bebida e o observei com calma. Eu


não queria levantar uma guerra contra ele. Decidi
abaixar a guarda e não brigar.
— Foi a primeira sugestão que Almir deu: te
extorquir.
— E você, como uma santa, não quis? —
Debochou.
— Não sou santa, mas sim. Eu não aceitei,
sabe por quê?
— Por quê?
— Pelo simples motivo que não queria te ver
novamente, não queria nem pronunciar o nome
Capello, responsável pela ruína da minha irmã. —
Ele se empertigou ao ouvir isso — O que te faz
achar que eu gostaria de voltar a me humilhar por
míseros dígitos na conta?
— Você já não fez isso? — Tentou, em um

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último pingo de ironia, me ferir.


— Sim. Porque minha irmã precisava ser
transferida, eu estava sem grana e você era a única
pessoa na cidade capaz de ajudar. Por isso seu pai
me deu dinheiro aquela noite. E quer saber o que
ele me pediu em troca? Nem esperei ele responder
e emendei: — Para não cruzar mais o seu caminho.
Benjamin nem respondeu mais. Sua pose de
ataque tinha desabado e na minha frente estava um
homem completamente pasmo, boquiaberto e
finalmente: ferido. Ele levantou-se e andou um
pouco. Suspirou e virou-se para mim com o quadril
recostado no gigantesco painel da televisão.
— Me desculpe. Eu não quero ter ódio do
meu pai... Eu estou fazendo das tripas coração para
não ter ódio dele nessa altura do campeonato.
— Deixe que eu tenha esse sentimento por
nós dois. — Deixei o copo de lado e me levantei
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também. — Olha, Benjamin, eu odeio jogar essas


coisas na sua cara, porque agora sei que você foi
tão vítima como minha irmã. Eu só quero
esclarecer que, apesar de ser sócia com Almir na
boate, não fiz parte dessa merda de extorsão.
— Sabrina era uma isca?
— Creio que sim. — Virei as costas para ele e
caminhei até uma pintura. Na sala tinha várias, e
eram lindas, mas nenhuma assinada. — São lindas.
— Me virei para ele — Onde as conseguiu?
— Não interessa. — Ele veio até mim e ficou
bem perto de braços cruzados. Estava muito
cheiroso, e eu me odiei por gostar do seu cheiro.
— Eu compro a parte dele na boate —
Benjamin falou.
— Você está louco. — Fiz um ar de pouco
caso, dando descredito à sua proposta.

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— Por que não? Eu gostei do lugar e você


pode ficar tranquila. Dinheiro não vai faltar.
Antes de falar neguei com a cabeça.
— Ele não vai vender. Almir ama aquele
lugar.
— Então eu compro sua parte.
— Eu preciso de uma fonte de renda para
criar minha filha.
— Você pode fazer outra coisa. Além disso, o
pai dela não ajuda?
— Não.
— Que desgraçado.
— É... ele não...
Parei de falar, e ficamos um bom tempo
calados nos encarando. Benjamin deu mais dois
passos em minha direção.

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— Você me acha um merdinha mimado que


bate o pé para tudo quando quer? — Sorriu
cinicamente.
— Não penso...
— Sim. você pensa isso de mim. O que mais
pensa sobre mim, Diana?
Eu engoli em seco. Ele estava próximo
demais e sua voz atingira um tom baixo, quase
sensual. Parecia que havia uma tensão sexual entre
nós...
— Eu preciso ir. — Tentei passar, mas
Benjamin deu um passo para o lado.
Sim, era tensão sexual entre a gente. Coisa
que eu nunca senti igual. Benjamin queria me
odiar, mas era evidente que já estava de pau duro
por minha causa. Quem disse que raiva não é um
bom combustível para sexo?

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Passei a língua nos lábios e sombra de tesão


tomou os olhos dele.
— O que foi?
— Eu vou te colocar para fora da minha casa.
— Deu um passo em minha direção. — Precisa
mesmo ir embora.
— Preciso — ofeguei e concordei.
— E da minha vida — ele sussurrou.
— Não vejo a hora de não te ver nunca mais.
— Eu digo o mesmo. — Outro passo e então
estávamos quase colados. Ele me olhava de cima,
por ser bem alto, e eu aspirei seu cheiro delicioso
de homem que acabara de tomar banho e exalava
excitação.
— Dane-se você, Diana — disse e segurou
meus cabelos por trás, bem forte. Os olhos, em um
tom rude, me fitaram por segundos. Então ele me

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apertou com um braço e beijou minha boca.


Por anos, eu fugi desse homem e agora eu
estava em seus braços, sentindo o quão habilidoso e
delicioso ele era. Me afastei bruscamente e o
empurrei. Estávamos arfando, ele levemente
assustado, não sei se por ter me beijado ou por ter
gostado. Essa ambiguidade me invadia também.
Levantei a mão e, sem pensar, dei um tapa na cara
dele. Benjamin ficou paralisado assustado, eu olhei
seus lábios e avancei para cima dele.
— Patife. — Beijei-o na mesma intensidade
que ele tinha me beijado. Fomos tropeçando,
agarrados, devorando um ao outro com o beijo de
língua mais gostoso que já tive. Ele caiu sentado no
sofá de olhos saltados de surpresa. E eu só queria
me esbaldar na melhor sensação que já tive. Com
batidas apressadas do coração, apalpei seu corpo e
gemi por gostar muito dos músculos quentes sob

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minhas palmas.
Benjamin gemeu e sua língua me possuiu de
uma forma delirante. Ainda segurando
possessivamente meus cabelos atrás na cabeça. O
sujeito tinha uma pegada poderosa, e mais poderosa
ainda era a ereção aparente por baixo da calça. Ele
era mais do que eu havia pensado, era voraz,
sedento e vigoroso. Gostoso era pouco para
descrevê-lo.
Ele apalpou meu corpo mostrando
experiência, sabendo onde tocar e queria mais
quando sua mão puxou o zíper lateral do meu
vestido. Então, eu caí na realidade.
Eu queria ele longe da minha vida e não me
aproximar mais. Além disso... Era o homem que
minha irmã amava. Estava me sentindo uma
traidora.
Empurrei-o e fiquei de pé cambaleando.
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Ajeitei o vestido e corri para pegar minha bolsa.


— O que houve? Diana...
— Não posso. Não podemos! — berrei para
ele e corri para a porta.
— Por quê? — Veio atrás de mim — Você é
comprometida?
— Não, Benjamin. Mas você era namorado da
minha irmã.
— Diana! — Ele tinha surpresa e cautela na
voz. — Dani... não está mais entre a gente.
— Eu sei, caralho. Mas...
— Você vai se guardar para sempre?
— Não. Mas não será com você.
— E você não acha que ela preferiria que
estivesse comigo do que com outro cara qualquer?
— ofegante, contestou.

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— Vá se lascar. Se você não liga, eu ligo e


muito. — Corri para fora e, quando estava entrando
no elevador, ele me alcançou, calçando tênis às
pressas.
— Me deixe, Benjamin. — Bati no botão para
a porta se fechar.
— Você vem comigo. Quero te mostrar uma
coisa. — Entrou comigo no elevador e descemos.

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14
DIANA

Eu nem sei por que entrei no carro com ele.


Mas lá estava eu, tremendo de nervoso, no banco
do carona. A inesperada sensação de culpa voltara
com força ao beijá-lo. As imagens de minha irmã
me voltaram à mente, e eu queria me bater de ódio
por ter sido fraca.
Ele era gostoso? Sim, muito.
Eu tinha algum empecilho para pegar
homens? Não. A única regra era nunca os levar
para minha casa, onde Maya estava.
Benjamin e eu somos livres, e, cada um, dono
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de sua vida. Entretanto, poderia ser qualquer um,


menos ele. Nunca ele... Porque além de tudo, eu
escondia um segredo gigantesco dele.
— Eu sinto muito. — Depois de minutos
apenas dirigindo, se pronunciou. — Eu não sou
esse cara descontrolado.
— É... Eu também fiz, então. Sem culpas, por
favor. Vamos apenas esquecer.
— Certo.
— Para onde está me levando?
Ele respirou profundamente.
— Era uma das primeiras fábricas do grupo
Capello. Meu pai nunca a vendeu, e é para lá que
vamos.
— Está me levando para um lugar
abandonado?
— E eu espero que isso no seu olhar não seja
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medo de mim — protestou.


— Em se tratando de um homem, nunca sei o
que esperar.
Ele não respondeu, mas vi nitidamente
revirando os olhos, discordando do que falei. Era
bom mesmo ficar calado, senão eu teria que dar um
discurso demostrando com fatos tudo que um
homem pode fazer sendo mal-intencionado, e que
nunca dá para as mulheres confiarem cegamente.
Chegamos em um lugar que estava claro e
tinha guaritas, o que me deixou mais calma. Não
era afastado da cidade, e Benjamin disse que
Andrey também usava o lugar como garagem e
motel, na parte de trás da grande construção.
Os portões altos abriram para a gente, e o
carro passou parando a seguir, diante de uma porta
de ferro.
— Os guardas ficam sempre aqui? —
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perguntei.
— Tem troca de turnos. Do outro lado ainda
usamos como deposito, então a segurança precisa
ser reforçada.
— E me trouxe aqui para o quê, mesmo? Usar
o motel improvisado do seu irmão? — Eu não
devia tocar nesse assunto para debochar, mas saiu
sem eu perceber.
Enquanto abria a porta de ferro, ele olhou
para mim e sorriu malicioso.
— Não é uma má ideia. Mas vamos focar no
principal. — Ele entrou, desarmou o alarme e
acendeu as luzes. Eu entrei logo atrás. Tinha várias
portas no corredor, e caminhamos até a última
porta. Ele abriu, entrou e acendeu as luzes. Entrei
logo atrás e fiquei pasma. Era um ateliê de pintura.
Com a mão na boca, perplexa, olhei em volta
para as espetaculares pinturas. Nas paredes,
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recostadas aos montes, em cavaletes.


Ao longe, tinha uma cozinha e uma sala e
duas portas em que ele me informou ser quartos e
um banheiro.
— O que é isso tudo? Você... pintou isso?
— Sim — sussurrou. — As pinturas que você
viu na minha casa...
— Benjamin. — Me aproximei de um quadro
onde tinha duas crianças, um menino e uma menina
de mãos dadas olhando para cima onde cachos de
uvas caiam. — São... lindos.
E eram mesmo. Eu não entendia muito de
arte, mas cada quadro dava uma sensação de leveza
e paz, dava vontade de olhá-los por horas.
— Obrigado. Esse aí sou eu e minha irmã. Na
antiga vinícola da nossa mãe. — Era lindo o fato de
ele ter esse lado sensível, apesar que sensível não

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combinava com um homem de aparência como a de


Benjamin.
Continuei andando olhando as peças até
chegar em uma que era imensa. Muito maior que as
demais e estava coberta.
— Era isso que eu queria que você visse. —
Ele falou e puxou o lençol. E mais, uma vez
coloquei, as duas mãos na boca. Eu estava chocada
e emocionada, era minha irmã. Estava sentada em
uma janela com olhar triste, como se esperasse algo
que nunca chegaria.
— É a Dani — ele falou ao meu lado. — Eu
sempre imaginei ela me esperando... Acho que
porque eu a procurei durante meses, depois que
meu pai falou a verdade. Eu tinha esse desejo de
que ela estivesse me esperando. — Com um fio de
voz, ele concluiu: — eu nunca a esqueci, Diana. Eu
posso ficar com outras mulheres e até beijar você, e

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até amar loucamente outra mulher. Mas o que tenho


por Dani, ficará para sempre comigo.
Eu estava sem fala, completamente
desorientada. Limpei uma lágrima enquanto
observava a maravilhosa pintura detalhista. Ela o
esperou. Esperou todos os dias, que ele aparecesse,
se desculpasse e então ela poderia contar da
gravidez. Mas Benjamin não veio, e Dani foi
embora... E ela estava feliz porque esperava ver a
filha quando abrisse os olhos.
Ela se apegou tanto a ideia de que Maya seria
a chave para a construção de uma nova família, que
passou para mim esse desejo também. Eu sonho em
dar uma família para minha sobrinha. Benjamin
não era qualquer um. Ele amou minha irmã e
jamais a esqueceu, e era a oportunidade de Maya
ter mais além de apenas uma mãe postiça.
Era o momento certo de contar a ele. Deveria

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ser aqui diante do quadro que retratava minha irmã,


mas antes, eu tinha que conversar com Maya. E por
incrível que pareça, senti um enorme peso sair dos
meus ombros, quando cheguei à conclusão de que
ele deveria, sim, saber. Eu lutarei com unhas e
dentes por ela, mas não poderia deixar esse homem
no completo escuro que o pai dele o jogou.
Sem dizer nada, fui até ele e o abracei, e
Benjamin recebeu o meu carinho.

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15
BENJAMIN

Entreguei um copo com drinque à base de


vodca para Diana e me sentei ao lado dela,
observando sua reação diante das minhas
revelações. Agora ela olhava em um notebook, o
leilão que eu vinha fazendo do quadro de Dani.
— Já está em oitocentos mil — exclamou —
É muito dinheiro!
— Não vou vendê-lo, eu mesmo irei
arrematá-lo. Só estou fazendo isso para crescer a
curiosidade em torno do autor da obra.
— Que ainda é anônimo. — Ela deixou o
notebook de lado e cruzou as belas pernas, se

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acomodando em uma posição melhor, para ficar


meio de frente para mim. — Por que não expõe
todo esse estoque que você tem aqui? São peças
lindas, Benjamin.
Soltei o ar com lentidão e olhei para o copo
em minhas mãos.
— Queria que fosse fácil assim. Meu pai teria
um treco se eu fizesse umas paradas dessa. Ele
odeia que eu goste de pintar, porque diz que não é
algo bom para ligar ao nome Capello.
— Como assim? Seu pai é louco, me desculpe
dizer. Mas ele ferrou com várias vidas e continua
fazendo isso. Você não pode mais dar ouvidos a
ele. Tome as rédeas de sua vida, já tem trinta anos?
— Vinte e oito. Meu pai está com um tumor
no cérebro, Diana. Chegamos a um acordo que
ninguém vai dar desgosto a ele, pelos próximos
anos de sua vida.
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Ela soprou um “Meu pai do céu” e balançou


a cabeça.
— Eu entendo. A gente faz sacrifícios pela
família.
— Sim. A dinastia Capello é dividida em dois
grupos: os que amam estar na empresa com meu
pai, e os que odeiam. — Pensei em Stela e Thadeo,
que assim como eu, não faziam questão de estar lá
dentro.
— Pela sua cara, posso apostar que você
lidera a parte dos que odeia.
— Exato.
Fiquei por um tempo a fio a observando, e até
deixei um rápido sorriso se mostrar. Não fiz
questão de desviar ou escondê-lo.
— O que está olhando? — Diana tentou não
sorrir.

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— Temos algo em comum.


— Temos?
— O sacrifício pela família e o amor por uma
única pessoa — antes de ela perguntar quem era a
pessoa, eu acrescentei: — a Dani.
Diana não se colocou na defensiva, apenas
assentiu, sorrindo de modo nostálgico.
— Eu mal te conhecia quando você namorava
minha irmã e te achava muito imaturo. — Deu de
ombros ao concluir a análise.
— E agora?
— Acho instável e gostoso.
— Me acha gostoso? — A sinceridade dela
me impressionou.
— Você sabe que é, Benjamin. Não se faça de
sonso. — Ela se levantou, colocou o copo na
mesinha e andou em volta da sala olhando cada
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coisa. Analisou com cuidado os aparelhos de


musculação e voltou-se para mim. — Para que esse
puxadinho? Você dorme por aqui?
— Às vezes quando quero fugir das pessoas.
Não sei se você também já teve necessidade de
ficar longe de gente.
Ela deu uma risada e assentiu.
— Quase sempre. Pena que não é todo mundo
que tem um local secreto como esse. — Levantei-
me também e fiquei bem perto dela.
— Apenas minha irmã sabe desse local,
apesar de ser da empresa, os outros não sabem que
o uso como atelier.
Ela franziu o cenho quando me viu perto
demais, e possivelmente com olhos brilhando de
tesão. Eu não queria cercar Diana, mas, porra, eu
nunca tinha ficado dão duro por uma mulher.

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Ela percebeu minha ereção e se mostrou


insegura.
— Preciso ir.
— Já?
— Maya está sozinha com a babá.
— Ah, verdade. Eu adorei conhecê-la. Achei
uma criança de ouro.
— Ela é. Então... — Abaixou os olhos, mas
pude ver preocupação. — Eu queria marcar para
nos vermos novamente. Preciso te contar algumas
coisas.
— Que coisas?
— Pode ser lá em casa?
— Sim, claro. Só me dizer quando e eu
apareço lá. — Não estava acreditando. Ela estava
me convidando para que, exatamente?
— Certo. Eu te ligo.
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Ficamos nos olhando. Eu balançando o corpo


com as mãos nos bolsos da calça. Ela despistando e
desviando o olhar. Senti minha boca seca e um
reboliço dos infernos se formando, subindo do meu
pau e acertando em cheio o estômago.
— Diana.
— Diga...
— Que caralho — falei e a puxei para junto a
meu corpo, não lhe dando oportunidade de resistir e
atacando sua boca com pressa e desejo. Ela me
abraçou de imediato e até deixou a sua bolsa cair
no chão, enquanto retribuía o furacão que nos
consumia. Eu estava tão excitado que sentia que
poderia explodir: pau e bolas como dinamites. E
bastava alguns passos para levá-la ao meu quarto.
Mas, não. Não, aqui.
Me afastei.
— Aqui, não — sussurrei.
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— É. Aqui, não.
— Não estamos fazendo nada de errado. —
Passei as mãos nos cabelos.
— Estamos. — Ela discordou, mas não saiu
do lugar. Seus punhos estavam fechados de
nervoso.
— Certo. Eu não quero nada com você —
afirmei de olho na boca dela. Caralho!
— E nem eu com você — ela retrucou.
— Então, ok.
— É, ok.
Continuamos ofegantes, bem pertinho um do
outro, e a nossa palavra, sem um pingo de
credibilidade, não durou segundos. Nos agarramos
novamente, no mesmo instante, como imãs. Diana
era alta, corpo em dia e era uma mulher formada,
diferente de todas as mais novas que já fiquei. Eu

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sentia em seu beijo gostoso para cacete, a


experiência dela. E eu estava gostando muito de me
sentir desestruturado pelo poder de ataque dessa
mulher.
Suas mãos adentraram minha camiseta
enquanto ainda nos beijávamos enlouquecidos, e
quando ela levantou o tecido, eu parecia um louco
dependente, prestes a surtar de prazer, porque ela
abandonou meus lábios e mordeu sensualmente
meu piercing no mamilo, quase cai para trás de
tanto tesão. Ela chupou e lambeu meu peito,
manteve uma trilha de beijos e mordidas até chegar
a meu pescoço, parou um pouco para aspirar e
continuou seu caminho beijando meu queixo e, por
fim, a boca novamente.
Tivemos que ter uma força bruta para nos
afastarmos novamente e, dessa vez, pra valer. Ela
saiu na frente e eu atrás, tentando controlar a ereção

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pesada e bruta que saia por uma perna da cueca


provocando desconforto em atrito com o jeans.

***

No dia seguinte, cheguei à empresa e não


parava de pensar na noite que tive com Diana.
Além de, enfim, ter aberto meu coração, me
sentindo menos culpado, eu tive uma experiência
jamais sentida.
Por todos esses anos meus relacionamentos
tinham sido vazios e frios de minha parte: foder e
partir para a próxima. Beber, brigar e foder. Trepar
e ignorar as mulheres. Sempre assim, criando a
minha fama de mau. Mas, nessa noite, eu pude,
enfim, mostrar a pintura de Dani para alguém que
se importava com ela tanto quanto eu. Era como
dar um passo em direção a um pontinho de luz.
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Diana, além de tudo, me mostrou um esboço


do paraíso. Eu me senti um garotinho inexperiente
quando ela lambeu minha pele, de forma puramente
erótica. Meu ombro tem uma marca de dentes entre
as tatuagens, meu peito tem uma marca de chupão e
meu pau está em um estado de trauma positivo.
Basta lembrar da força e disposição de Diana, e ele
se anima ao ponto de ficar dolorido, implorando,
querendo-a.
Fui direto para a sala de Andrey, porque
tínhamos uma reunião marcada às nove com alguns
frigoríficos que compram o nosso gado.
Antes de chegar à porta, ouvi Mariana aos
berros. Andrey parecia fazer pouco caso, afinal não
ouvi sua voz. Não entrei. Fiquei ali recostado do
lado de fora, ouvindo.
— Nem nos casamos ainda, seu imbecil!
— E aí? Vai desistir, então? Você que sabe
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— ele respondeu friamente. — Tenho que


trabalhar. Se decidir que sim, só me ligar. — Ouvi
passos, e então ele abriu a porta. — Pode ir agora,
Mariana.
— Como pode ser tão idiota? Eu descubro sua
amante, e você nem reage?
— Mariana, nosso casamento é um negócio, e
você sabe disso. A gente trepa bem e fim. Eu não
vou declarar amor eterno e fidelidade a uma única
mulher. Se não quiser prosseguir com o casamento,
tudo bem. Eu conheço várias que vão adorar ser a
senhora Capello.
— Babaca! — Escutei o barulho de um tapa.
Em seguida, ela passou, saindo rápido, se
equilibrando com perfeição em saltos altíssimos.
Mariana era um achado que Andrey deveria dar
graças a Deus. Era alta, tinha um corpão excitante e
muito bonita. Além de ser bem mais nova que ele.

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Entrei e fechei a porta.


— Que merda estava acontecendo?
— Mariana descobriu. — Ele se jogou de
volta na cadeira executiva e soprou exausto. —
Puta que pariu! Porque mulher não se contenta com
um cartão de crédito e uma foda bem-feita? Precisa
ficar fuçando as coisas?
— É a vida, meu irmão. — Me sentei em um
sofá. — Acha que sua posição na presidência vai
ser ameaçada? O pai gosta da Mari, e ele não vai
ficar satisfeito se não acontecer casamento.
Revoltado, Andrey massageou a testa. Ficou
pensando um pouco e assentiu, chegando a uma
conclusão.
— Tem razão. Vou reverter essa situação.
— Mariana é mais importante que Dinah.
Foque nela e deixe sua querida amante de lado.

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Conselho de irmão.
— Nosso pai é um otário com essa história de
casamento. Que porra, velho! — Ele deixou a
irritação de lado e me fitou interessado. — E aí? A
mulher lá, sua ex-cunhada? Conseguiu comer?
— Não. Ela é mais do que apenas uma foda.
Além do mais, tem uma filha de cinco anos.
— Que porra, mano. Tá se envolvendo com
mãe solteira? É um porre, você não vai poder nem
foder em paz. — Revirei os olhos. Andrey pensava
em duas coisas em sua vida: ser nomeado CEO
definitivamente e trepar.
— A menina é uma maravilhosa. — Sorri ao
relembrar da pequena Maya. — Fico pensando nas
duas, mãe e filha... Diana é dona de uma boate de
stripper e tem que sair à noite, deixando a menina
com a babá.
— Isso não é problema seu, mano. Saia fora
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— me aconselhou. — Eu não vou me intrometer


em sua vida, mas vou dar um jeito na minha — ele
deu de ombros e acrescentou, baixinho, como se
falasse apenas para si: — Minha Dinah merecia
muito mais. — Olhou para mim e ficou de pé. —
Bom, vamos aproveitar que ainda sou CEO dessa
merda e tocar o barco.

***

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16
BENJAMIN

Eu passei o dia tenso. O saco dolorido como


se tivesse um ano sem sexo. Pensei em ligar para
uma boceta amiga, mas não seria a mesma coisa.
Parecia que meu pau estava de birra, como criança
que mete na cabeça que quer um tipo de guloseima
e tem que ser aquela, outra não substitui. Terminei
meu expediente na marra e fui direto para o galpão
de Tucano.
Deixei o terno e a gravata no carro e acenei
para os caras na porta que faziam as vezes de
seguranças. Eram parceiros e bateram a mão para

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mim. Entrei dobrando as mangas da camisa e


Tucano me viu, lá do meio do ringue improvisando,
onde os caras treinavam.
O negócio aqui era sério. Rolavam apostas, e
os lutadores sempre recebiam uma porcentagem,
mesmo quando perdiam. Eu não precisava, todavia,
muitos homens aqui tinham que dar duro na vida
para se alimentarem e viverem.
— A que devemos a ilustre visita? Ele veio
até mim e me cumprimentou com um aperto de
mão e batidinha nas costas.
Vim bater nuns caras, para tirar uma mulher
da cabeça.
— Vim ver os parceiros. — Olhei em volta.
— Tem luta hoje?
— Com certeza. Quer se inscrever?
— Claro. Já trouxe o calção. Só vou dar uma

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treinada antes, ultimamente tenho matado dia de


treino.
— Tá vacilando, mermão. Vai lá. Hoje a
disputa promete, Sanguinário vai lutar.
— Deixa que eu pego ele.
Fui para o saco de pancada, e enquanto batia
violentamente nele, pensava na minha falta de
controle, por desejar tanto alguém que, em tese, me
odiava. Essa era a prova concreta de que o pau de
um homem não estava nunca alinhado a seu
raciocínio lógico. Eu deveria apenas respeitar
Diana e não querer comê-la sempre que a via.
Mais tarde, na luta, eu ganhei, como era de se
esperar. Mas não quer dizer que saí ileso. Havia
novamente hematomas no meu rosto e, diferente do
que imaginei, o tesão ainda pulsava em meu corpo.
Acho que mais ainda, depois de tanto esforço
físico. Eu era uma bomba precisando explodir.
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— Tá legal, aí? — Tucano me cercou quando


saí do pequeno cômodo que eles consideravam
como vestiário. Empurrou uma latinha de cerveja
para mim.
— O que faria, se uma namorada que você
ama demais morresse e, anos depois, a irmã dela
aparece em sua vida, mais bela e gostosa do que
antes? — As sobrancelhas dele se ergueram em
sinal de confusão.
— E desde quando pau fica de luto, Leiteiro?
Ou vai enterrá-lo junto à falecida?
Bebi a cerveja, agradecendo o alívio
refrescante. Tucano ainda me observava curioso.
— Eu gostaria de me manter afastado,
respeitar minha ex. Mas é muito forte o que estou
sentindo.
— Eu não vejo problema. Ninguém deve
parar a vida porque outra pessoa morreu. Você
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queria essa irmã enquanto a mina estava viva?


— Não. Tá louco? Claro que não.
— Então pronto.
— Estou indo nessa. — Joguei a latinha em
uma lixeira. — O filho da puta acertou em cheio
minhas costelas. — Eu tinha que chegar em casa e
passar um spray.

Dois dias se passaram, e eu não pude ver


Diana. Ela até ligou para me convidar, mas eu tinha
sido escolhido para representar a empresa junto
com Fernando.
Eu não estava com saco para reuniões, na
verdade, estava com saco para outra coisa. Tinha
uma ereção a todo momento, o que, às vezes, me
causava constrangimento.
Fernando voltou para a mesa onde eu

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esperava. Eu deixei minhas preocupações de lado e


o olhei curioso, tentando desvendá-lo. E assim que
se sentou, curvei sobre a mesa.
— Vamos, desembuche. Que cara é essa?
— Cara nenhuma — respondeu ranzinza. —
Será que eles vão demorar mais? — Olhou no
relógio, conferindo a hora. Estávamos meia hora
adiantados para o encontro com empresários de
uma fábrica de biscoitos e bolachas que estavam
interessados no leite Capello. Eu estava a ponto de
explodir de impaciência. Fernando, na mesma
calma séria.
— Você passou a viagem toda emburrado —
insisti. Ele fitou a taça de vinho à sua frente e
depois levantou o olhar para me encarar.
— A Maria Clara está grávida.
— Puta que pariu. — Fiquei instantaneamente
catatônico. — Sério? E é seu? — Eu sabia que essa
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era uma pergunta delicada, mas nem passou por um


filtro, antes de deixar minha boca.
— É meu. — A certeza que ele tinha era
palpável.
— É a mesma gostosa que tu levou no
noivado...
— Fica esperto não, besta. Quando o murro
comer na orelha vai falar que sou ruim.
— Estou tremendo de medo. Cara, que parada
sinistra. Você vai mesmo ser pai? Acho que estou
mais pasmo que você — pensei um pouco e
confidenciei. — Não sei o que faria se descobrisse
que seria pai.
— É, mete uma camisinha aí, que tudo dá
certo.
— Um pai descuidado dando conselhos
contraceptivos. Quando penso que já vi de tudo.

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— Silêncio, eles estão vindo. — Fernando


ficou de pé e sorriu para os empresários. Ajeitei o
terno e fiquei ao seu lado.
— Saco. Odeio essas porras de reuniões —
murmurei. Era algo insuportável, e eu fazia apenas
por obrigação.

***

Eu queria ligar para Diana, mas vê-la era bem


melhor. Passei em uma loja e comprei um bichinho
de pelúcia. Olhei no relógio, e era oito da manhã.
Eu queria fazer-lhe uma surpresa e, talvez, dar uns
amassos nela se a menina estivesse dormindo. Meu
pau se animou com minha ideia, e eu não tive poder
para controlá-lo.
Parei o carro do outro lado da rua, ajeitei o

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colarinho da minha camisa, peguei o presente, mas,


antes de sair do carro, vi Diana andando pela
calçada em direção ao prédio. Estava com uma
sacola, possivelmente tinha ido à padaria.
Eu estava atônito, olhando-a sem acreditar.
Não por vê-la, mas por ver quem estava com ela.
Amanda. A tia da criança que recebeu minha
doação de sangue. Fiquei observando e, então, as
duas entraram no prédio.
Que merda estava acontecendo?
Uma coincidência apenas? Diana conhecia a
família da criança que estava sendo operada
naquela noite?
“A mãe dela está no bloco cirúrgico.” — A
voz de Amanda reverberou em minha mente, como
lembrança. Em seguida, me veio a imagem de
Maya andando devagar e mancando.
“Eu me chamo Maya.” — a voz da menina
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banhou meus pensamentos. Se chamava Maya,


como Dani e eu planejamos.
Claro que não. Dei uma risada nervosa. Não
existe a possibilidade de ter alguma ligação. Era
coincidência. Elas eram amigas, moravam no
mesmo prédio. Apenas isso. Uma gigantesca
coincidência.
Se informe com o médico.
Isso pulsou em minha mente. Tomei a
decisão. Liguei o carro e saí dali, arrancando em
velocidade. Fui direto ao hospital de onde me
ligaram naquela noite.
Eu nem sabia o que procurar. Meu instinto me
guiou até lá, e eu só queria ter a certeza de que tudo
era um acaso.
Na recepção, fui informado que o médico
estava na clínica particular naquele momento. Eu
poderia desistir, seria coisa da minha cabeça? As
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ilusões da adolescência voltando?


Amanda conhecia Diana. E infelizmente, nela
eu não confiava mesmo. Fui para a clínica.
O doutor Gustavo se assustou quando me viu.
E seu rápido choque me fez entender que ele sabia
de algo. Ele pediu aos pacientes para esperarem um
minuto e me levou para o consultório.
— Benjamin Capello, certo?
— Isso. — Apertei sua mão.
— Sente-se, por favor. — Ele se acomodou
em sua cadeira e eu me sentei à sua frente. — O
que o traz aqui? Algo relacionado à sua doação?
— Sim, doutor. Tem algo que só o senhor
pode me falar. — Fiquei levemente incomodado de
estar parecendo um bobo. — É apenas uma dúvida,
coisa rápida.
— Então diga.

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— Hoje eu vi alguém que me lembrou


daquela noite e preciso que o senhor me diga, quem
era a criança que recebeu meu sangue?
Ele se mexeu na cadeira, seu semblante pesou
e não conseguiu encobrir o incomodo.
— Infelizmente, não posso te dizer. Ética
médica.
— Eu entendo e posso lhe prometer que não
irei atrás dela. — Me flagrei mais agitado que o
normal, e torci para conseguir expressar com calma
— Isso ficará entre a gente, só preciso entender...
— Infelizmente, rapaz... Não posso. — Ele
nem mesmo me encarava olho no olho. Parecia,
inclusive, pálido. Eu não iria sair sem resposta.
— Ok. Vou reformular a pergunta. Naquela
noite, uma mulher chamada Diana Cristóvão esteve
lá no hospital? Sabe me informar?

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— Rapaz... Eu acho melhor você se retirar. —


Ele se levantou rápido e tentou chegar à porta, mas
eu obstruí seu caminho, me colocando em sua
frente, e para o inferno a racionalidade. Eu já estava
a uma gota de explodir.
— O senhor parece estar acobertando alguma
coisa. Por que não pode apenas me responder? Sabe
ou não se essa mulher estava lá?
— Benjamin. Eu prometi à família. Não irei
colocar um dos meus pacientes em risco, dando
essa informação. Você irá atrás da pessoa que
recebeu o sangue...
— Não irei, cacete! — Aumentei o tom de
voz. — Já falei que não vou. Só preciso saber se...
— Você irá atrás. — Dessa vez ele sustentou
meu olhar, quando afirmou que eu faria mesmo
isso.
— Você só pode estar zoando com minha
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cara. — Ri e passei as mãos na cabeça. — Por que


diz isso?
O médico andou no consultório, acariciou a
testa por algum tempo, pensou um pouco e então
me encarou, já estava com a decisão pronta.
— Olha, não quero causar intriga, nem
confusão. Mas eu sou pai e não sei o que
aconteceria se soubesse que alguém escondeu um
filho meu.
— Que porra está falando?
— Diana estava sim no hospital e foi ela
quem pediu para ligar para você.
Ah, caralho!
Eu estava sem fala. Senti meu rosto moldar
para uma expressão de incredulidade e choque.
Medo de continuar ouvindo o que viria.
— Como assim? Ela que pediu para ligar...

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— Você doou sangue para a filha dela e... —


ele fez uma pausa e enfiou os dedos nos cabelos.
— Fala! — berrei. — Continua! Eu já
imaginava o que ele diria, mas queria ouvir, queria
a confirmação. Minhas pernas começaram a falhar.
— E... Bom, eu nem sei como dar essa
informação. Não era eu que deveria te falar isso,
mas ela me disse que você era o único que podia
ajudar, porque é o pai da menina.

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17
BENJAMIN

Demorei para reagir. Fiquei, por segundos,


paralisado encarando-o. Até que meu corpo
recobrou os movimentos.
— Me conte essa história direito. — Me
levantei e andei aflito pela sala, com medo de sentir
novamente as crises de ansiedade que eu tinha na
adolescência.
— Eu não sei grandes detalhes — suspirou
cansado. — Se bem me lembro, a menina chegou lá
no hospital com histórico de apendicite. Mas ela
tem um problema genético que dificulta a

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coagulação, parecido com a hemofilia.


Eu transparecia o choque quando olhei nos
olhos do médico.
— Ela não é filha da Diana. — Constatei em
um murmúrio, e ele deu de ombros como resposta.
— Ela disse que sim.
— Eu não tive nada com ela no passado e sim
com a irmã...
Merda!
Uma ebulição de emoções embolou em minha
garganta e quase tive vontade de gritar alto para
tentar aliviar a sensação. Eu comecei a confiar nela
e a querer estar com ela, mas Diana me apunhalou,
escondendo a verdade. Dani morreu, mas deixou
uma filha. Nossa filha. Tive a sensação triplicada
de soco no estômago. A culpa me tomou e com ela
uma tristeza feroz. Porque eu a deixei desamparada

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e grávida.
Ah, não. Puta merda!
Eu queria chorar em memória dela. Ela foi
vítima do meu pai e ainda teve que aguentar minha
traição e enfrentar sozinha uma gravidez.
Saí rápido e levemente tonto do consultório,
fui para meu carro e liguei para o advogado da
empresa. Eu queria agir imediatamente, queria uma
solução, como se isso fosse aliviar a culpa que me
torturava. Contei a ele tudo que estava
acontecendo. Eu ainda não sabia detalhes, não tinha
acesso ao registro de nascimento dela para saber
como estava a filiação, mas, de uma coisa eu tinha
certeza: a ideia de ter uma filha estava me deixando
maluco e, mais ainda, ao saber que ela já existia e
não me conhecia como pai.
Eu tive um bebê com Dani. A que ponto o
destino poderia ir, para me surpreender de forma
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tão dolorosa?
— Benjamin, pelo que me contou, precisamos
analisar os documentos da menina e pedir
imediatamente um teste de paternidade — o
advogado disse. — Só depois é que você pode
reclamar paternidade.
— Quanto tempo leva? — Senti um grande
teor de desolação em minha voz.
— Bom, eu posso dar entrada, mas acho
melhor você conversar com a mulher que está
criando a criança como filha. Temos que notificá-la
judicialmente.
— Certo. Vou resolver tudo e te ligo.
Esperei mais um pouco, dentro do carro. Em
estado de choque, a ficha nem tinha caído ainda.
A imagem de Maya veio em minha mente, e
instantaneamente meus lábios se curvaram em um

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sorriso, ao mesmo tempo que uma lágrima


abandonou pesadamente o meu olho. Era ela,
minha filha.
Liguei para Stela e contei o que acabara de
descobrir. Eu tinha que falar, expressar meu pânico
e minha crescente felicidade.
— Uma filha? Tem certeza, Benjamin?
— Tenho. Eu ajudei minha filha sem saber,
Stela. E o que mais me magoa é que Diana omitiu
isso de mim. Eu não sou nenhum monstro para que
justifique o que ela fez. Eu não queria estar tão
magoado com a Diana. Porque, no fundo,... eu
gosto dela.
— Mano, essa é uma situação difícil. Ela
pode ter os motivos dela.
— Será que ela achou que eu faria mal a ela?
Faria mal a minha filha?

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— Não. Claro que não. Por favor, haja com


razão e não com emoção. Tem uma criança em
jogo.
— Eu não sei. — Tomei uma grande
quantidade de ar. — Quando penso que perdi tudo
sobre ela, desde bebê até agora, me dá muita raiva.
Era o bebê que Dani e eu planejamos. E o nosso pai
tirou isso de mim, Stela.
— Primeiro eu quero que você se controle.
Não vá atrás da Diana nesse estado e nem do papai.
Não tem mais jeito de resgatar o passado, ela já é
uma criança, mas você pode ter muitos momentos
com ela de agora em diante. A pergunta é: você
quer fazer parte da vida dela?
— Claro, Stela. — Me olhei no retrovisor e vi
sinceridade em minha expressão. — Lógico que
sim. É carne da minha carne. Que tipo de homem
eu seria, se soubesse que tem um filho meu por aí, e

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simplesmente viraria as costas para ele? Eu estou


com necessidade de conhecer ela, de saber do que
ela gosta, de ensiná-la e protegê-la. Tudo que nós
devíamos ter tido na infância e não tivemos.
— Esse é um grande começo, Benji. Seu
instinto já é paterno. Estou muito orgulhosa de
você. Pode contar comigo, mano. Para o que
precisar.
— Obrigado.

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18
BENJAMIN

Tinha prometido a Stela que eu não iria tomar


uma atitude impensada antes da resposta do
advogado. Mas não aguentei. Fiquei quase a noite
toda acordado pensando, andando só de cueca pelo
apartamento, bebendo. Querendo me controlar até
ouvir do advogado alguma resposta positiva. Mas
não aguentei mesmo.
Às sete da manhã, eu estava na porta do
apartamento de Diana tocando o interfone. Ela não
relutou em permitir minha entrada e quando abriu a
porta da casa com uma expressão que lembrava

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ternura ao me ver, eu quis berrar o mais alto que eu


podia. Gritar que ela não passava de uma pilantra e
iria perder a guarda da menina. Eu iria mover céus
e terras para tomar a minha filha.
— Oi, Benjamin. Acabei de passar café...
Entrei em passos duros, e quando ela fechou a
porta, a encarei.
— Algum dia iria me contar?
Ela empalideceu no mesmo instante e seus
olhos saltaram, ela entendeu naquele instante sobre
o que eu falava. Eu não dei chance para ela
responder, ou para tentar me enganar novamente.
— O médico me contou, Diana. Me contou
sobre a Maya.
Ela ficou em choque. Estava usando um robe
e o apertou e eu não gostei de seu olhar temeroso,
como se eu fosse um bicho que pudesse machucá-

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la. Sua boca entreabriu e até supus que ela iria


correr. Tipicamente pega no flagra. Calada, Diana
andou para a cozinha e eu fui atrás. Ela se segurou
em uma cadeira e, com tristeza nos olhos, soprou
pesadamente. Em seguida, virou-se para mim. Nem
sabia o que dizer.
— Nunca iria me falar? — Pressionei.
— Sim, eu iria. Eu percebi que deveria te
contar, porque sei que você também foi vítima.
— Quando?
— Eu não sei, tá? Eu estava firme com a ideia
que você não merecia saber... droga! — Ela virou-
se de costas — É minha menina. Minha única
família. O que seria de mim após perder a pessoa
que eu mais amava, perder também o bem mais
precioso que ela deixou?
— Você escondeu a minha filha. — Acusei
com a voz grave sem conseguir ser tocado por seu
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dilema. — Que tipo de pessoa faz isso?


— Minha filha! — ela berrou. — Minha!
Minha irmã estava machucada por sua culpa e...
— A criança não tem nada a ver com nossa
briga — berrei no mesmo tom. — Ela merecia, sim,
saber do pai, e eu merecia conhecê-la. Você não
tinha o direito de decidir isso.
— Tinha, e tenho. Maya é o amor da minha
irmã, e eu não iria entregar ela para uma família de
merda, para você e seu pai aquele velho asqueroso,
que maltratou minha irmã. Dane-se o que acha, eu
não me arrependo de ter protegido a Maya.
— Eu tenho direitos, Diana. — Bati em meu
peito.
— Foda-se. Ouviu bem? Não vou deixar que
ridicularizem minha menina, como se fosse um
fruto de um golpe. Ela não é.

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— Quem está insinuando isso? Você é louca?


— Seu pai. Tenho certeza que é o que ele vai
dizer.
Isso ela tinha razão. Eu nem iria entrar no
mérito da questão para defendê-lo, porque nós dois
o conhecíamos.
— Eu só quero que saiba uma coisa. Já
coloquei advogado no caso, vou exigir um teste de
DNA e reclamar a paternidade. — Aproximei dela
e apontei um dedo ameaçador em sua cara. — Eu
vou levar a Maya comigo, tirar ela
permanentemente de você e ainda impedir que a
visite.
— Não! — Ouvi um gritinho e me enrijeci
todo, sentindo meu sangue gelar ao observar Maya
correndo e abraçando as pernas de Diana. —
Mamãe, eu não quero ficar longe de você.
— Shhh. Está tudo bem, querida. — Diana
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pegou a menina no colo e acalmou acariciando seus


cabelos castanhos — Está tudo bem. Não iremos
nos separar, a mamãe não vai te deixar, tá bom?
Agora, eu a via com outros olhos. Era minha
filha, bem pertinho de mim e senti que meus olhos
se enchiam de lágrimas. Fui tomado de um súbito
desejo de tocar nela, abraçar, conversar com ela,
saber tudo sobre ela. Eu tinha um grande objetivo
agora.
— Ei, Maya. — Toquei em seu ombro,
mantendo a voz suave. — Sou eu, o Benjamin, seu
amigo, lembra?
— Não! Você é mau, eu não gosto de você.
— Continuou com o rosto no ombro de Diana, se
recusando a me olhar.
— Você vai contar para ela — avisei a Diana
e me afastei um pouco. — Estou esperando.

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19
DIANA

Eu poderia ter contado antes para Maya e, em


seguida, ligar para Benjamin e dizer a ele toda a
verdade. Mas falhei. Eu esperei a força vir e, então,
o destino resolveu adiantar as coisas. Mas não era
nada para enlouquecer, por Maya eu manteria a
calma, ela precisava mesmo saber de tudo, o mais
rápido possível e de preferência, ouvindo da minha
boca.
Olhei para Benjamin. Não mais tão
transtornado, entretanto, muito abalado. Eu
subestimei mesmo ele. Achei que seria um rebelde

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fútil, todavia, é um homem muito esperto e suas


emoções são intensas. Sentei Maya na mesa da
cozinha e puxei uma cadeira me sentando bem
pertinho dela.
A primeira coisa, que eu sempre planejei para
quando esse dia chegasse: deixar Maya neutra em
relação à disputa entre adultos. Eu não seria a
cuzona que a colocaria contra o pai e dificultar a
relação entre eles. Eu a mantive escondida e jamais
me arrependerei disso, mas agora que ele sabia da
existência dela, cabia a mim conduzir ela para a
nova família. Jamais causaria qualquer mal a ela.
Por isso, respirei fundo e olhei nos olhinhos dela.
— Meu bem, você é uma mocinha e espero
que possa entender o que a mamãe vai contar.
Ainda um pouco assustada, ela olhou para
Benjamin e apenas balançou a cabeça para mim.
— Você sabe que tem duas mamães, não é?
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— Sim. A mamãe Dani virou uma estrelinha e


é o meu anjo da guarda. — De relance, vi Benjamin
se mexer inquieto, nos observando.
— Sim, isso mesmo. Ela está lá no céu nos
protegendo. Agora, lembra quando perguntou quem
era o seu papai?
— Sim. Porque as minhas coleguinhas tem
pai e eles vão buscar elas na escola. — Maya
continuava ignorando Benjamin. Eu olhei e tinha
bastante emoção explicita nos olhos dele. Ele
estava tocado pelo momento. E como alguém
espera, com suspense, uma notícia decisiva, ele
estava assim, tenso, sem piscar.
— Antes de você nascer, o seu papai
namorava com a mamãe Dani, mas depois ele foi
embora e não conseguiu mais te encontrar.
— Sim. Ele não sabe onde a gente mora.
— Mas agora ele sabe. Maya, querida, olhe
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para o Benjamin. — pedi e ela olhou, mordendo o


lábio, ainda desconfiada. Ele sorriu, mas não foi
retribuído. — O Benjamin é o seu papai. Pode
entender isso? Ele nos encontrou, Maya.
Ela abriu a boca e arregalou os olhos
totalmente pasma, me encarando com
incredulidade, depois abaixou a cabeça um pouco
confusa, mexendo sem parar nas orelhinhas do
coelho de pelúcia. Eu sabia que ela estava
amedrontada por ter visto ele me ameaçar.
— Ele não é mau. — Levantei o queixo dela
— Só está chateado porque quer que você vá morar
com ele.
— Eu não... — ele começou a dizer, mas eu
levantei a mão para ele parar. Ainda fitando Maya,
mantivemos o olhar compenetrado.
— Mas eu não quero, mamãe. Quero ficar
com você.
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— Sim, querida. Nós vamos falar isso com o


Benjamin. Que onde você for, eu também irei. Está
ouvindo, Benjamin? Não pode separar a gente.
Instantaneamente, ela olhou para ele,
esperando a resposta. Ele sabia que eu estava
jogando, uma forma de impedir que ele contra-
atacasse. Benjamin era pai, iria conseguir provar e
se quisesse, teria mais força no tribunal contra
mim, claro que eu também queria a palavra dele.
— Sim. Eu não vou separar você da sua mãe.
— E ele sabia que não poderia voltar atrás com
essa promessa que acabara de fazer.
Ela voltou a me olhar e, dessa vez, estava
sorrindo.
— Está feliz em saber que ele é o seu pai?
— Mais ou menos. — Ela sacudiu a
mãozinha. — Se ele não brigar mais com você, eu
volto a ser amiga dele.
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— Certo. Fechado. — Fechei o punho e bati


no dela. — E a mamãe não vai mais brigar com ele.
— Eu posso ganhar um abraço da menina
mais linda do mundo? — Benjamin deu um passo
em nossa direção e quase morri de pena da
expressão de súplica que ele fazia. Benjamin
perdeu muito em toda vida, nem mesmo o sonho de
pintar ele tem acesso. Então eu gostei desse
momento, de poder ver um pingo de esperança nos
olhos dele.
— Vai filha, dê um abraço nele. — Incentivei.
Vencida, Maya caminhou envergonhada até onde
ele estava apoiando em um joelho esperando. Ela
abriu os braços e aceitou que Benjamin a abraçasse.
Eu observei os dois. Não estava revoltada como
achei que ficaria, quando chegasse esse dia. Era
bonito ver um homem como ele, todo durão e
rebelde, que gostava da bater em outros caras em

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lutas clandestinas, se render às emoções e deixar


uma lágrima rolar em seu rosto.
Uma única lágrima que dizia muito sobre o
que ele sentia em ter a filha nos braços.
Quando ele se afastou, Maya já tinha voltado
às boas.
— Eu vou ganhar dois presentes no meu
aniversário? — Ela questionou com pura alegria
nos olhos. Ele riu.
— Vai sim.
— Você vai vir morar com a gente? Você
poderia dormir com a minha mãe, a cama dela é
grande.
Benjamin e eu trocamos um olhar cheio de
farpas.
— Maya, ele não sabe ainda como vai ficar,
mas eu vou conversar com o Benjamin e acertar

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tudo. Ele pode vir te visitar sempre que quiser.


Em resposta, que eu já esperava, ele fechou a
cara para mim, e eu soube que só visitas, estava
fora de cogitação. O homem era encrenqueiro e iria
querer impor alguma tolice. Guarda compartilhada
era o meu terror.
— O que acha de almoçarmos juntos hoje? —
Benjamin sugeriu. — Sei de um lugar muito legal.
— Maya me olhou buscando a resposta e, pela
carinha dela, era certo que ela queria.
— Claro. A gente vai. — Por ela, apenas por
ela.
— Eba! — ela comemorou.
— Passo às onze e meia. — Ele foi até ela e a
beijou. — Tchau, minha pequena.
— Tchau.
Eu o acompanhei até a porta. Benjamin virou-

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se com raiva.
— Você jogou bem. Mas não fique achando
que eu vou desistir. Quero conviver com minha
filha. Perdi muito da vida dela. — Ele mesmo bateu
a porta me deixando paralisada.

***

Maya só falava nisso. Era uma grande e ótima


novidade para ela. Ter um pai, o seu sonho. Sempre
que me perguntava, eu dizia que ele estava nos
procurando e um dia ia nos encontrar.
Ela queria saber onde o papai Benjamin
morava, queria que ele fosse buscá-la na escola e
eu tive que prometer que iria autorizar que
Benjamin pudesse buscá-la, além de mim. Ela
queria ouvir alguma história que ele contaria,

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porque estava cansada de ouvir as minhas. Maya


estava com sede de viver tudo que podia com um
pai, tudo que ela achava que pais faziam. Inclusive
falou:
— Mamãe, precisa pesquisar na internet
algumas brincadeiras de menino para eu aprender.
— Eu penteava seus cabelos recém-lavados.
— Por quê, filha?
— Porque eu quero poder brincar muito com
meu novo pai.
— Maya — virei ela de frente para mim —,
seu pai não vai querer que você mude, só para
agradá-lo. Ele quer conhecer tudo que você gosta
de fazer. E tenho certeza que ele adorará tomar o
chá das cinco com você e suas bonecas.
— Será, mamãe? — Seus olhinhos brilharam
de expectativa. — Ele é homem e muito grande.
Não sei se ele vai gostar.
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— O que acha de fazer o convite quando ele


chegar?
— Sim. Vai ser um chá magnifico. —
Suspirou com um ar sonhador. Sorrindo, voltei a
pentear os cabelos dela.

***

Às onze e meia, quando Benjamin chegou.


Maya já estava arrumada e muito afoita. Ela mesma
abriu a porta sorriu um pouco tímida para
Benjamin.
— Pronta para o primeiro almoço com o
papai? — Ele parecia longe de mágoa e raiva.
Estava incrivelmente radiante.
— Siiimm! — gritou. Ainda mancava um
pouco, por causa da cirurgia, todavia, isso não a

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impedia de comemorar. Eu peguei a bolsa, tranquei


a porta e observei ele estender a mão para ela. Mais
uma vez, Maya olhou para mim, como se
precisasse de uma autorização. Balancei o pescoço
positivamente, e ela segurou na mão dele, feliz da
vida.
Não tinha como eu ficar com raiva disso, se
estava fazendo bem para ela, fazia bem para mim
também.
— Esse é o seu carro, Beijamim? — Maya
perguntou assim que chegamos à rua.
— Sim. Gostou?
— Sim. É muito bonito. Mas eu gosto de
carro vermelho e não preto.
— Pode deixar, vou me lembrar disso. — Ela
entrou no banco de trás, e eu fiquei observando ele
ajudá-la com o cinto. Benjamin virou-se para mim,
apenas me mirou de olho torto e rodeou o carro
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para entrar no outro lado. Eu revirei os olhos e abri


a porta e entrei. Nada de cavalheirismo para mim,
eu já devia esperar.
Maya estava deslumbrada com tudo. Ao
chegarmos no restaurante, o qual era uma grande e
famosa churrascaria com espaço infantil, sua
felicidade era contagiante.
— Tem piscina de bolinhas! Eu estou tão
alegre — Maya falou, sem gritar, ou correr na
frente. Continuou caminhando segurando a minha
mão.
Parecíamos uma família comum saindo para
almoçar, e eu não gostei nem um pouco disso.
Maya sentou com a gente, mas logo quis ir
para a ala infantil. Já tinha quase duas semanas que
fizera a cirurgia, mesmo assim, ainda me
preocupava.
— Não vá pular. Fique quietinha brincando.
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— Tá bom, mamãe. — Ela se levantou e foi


se reunir com outras crianças. Seu vestido amarelo
e cabelos lisos castanhos eram chamativos.
Benjamin e eu passamos minutos calados olhando
para ela. Como se fosse uma obra de arte para ser
observada.
— Ela está muito encantada — eu falei e
voltei-me para olhá-lo. Não encontrei uma cara
muito boa me fitando.
— Ainda não consigo acreditar que foi tão
baixa, a ponto de quase transar comigo, enquanto
escondia de mim a minha filha.
— Uma coisa não tem nada a ver com a outra.
Ele engoliu a raiva juntamente com um
palavrão.
Um garçom chegou, anotou nossos pedidos e
quando saiu, ele acusou revoltado:

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— Você é uma pilantra sem coração.


— Me ofender não vai resolver a situação.
Agora pense comigo: a Danielle passou a gravidez
inteira sem querer contar para você. Era dela esse
direito, mas ela não quis. Antes do parto ela pediu
para eu te ligar...
— E por que não ligou?
— Eu ia ligar. — Abaixei a cabeça,
lembrando-me daquele dia terrível. — Sim, eu ia
ligar. — Olhei para ele novamente, mostrando-me
firme e deixando que visse toda minha sinceridade.
— Mas então ela veio a óbito. Era eu sozinha,
suportando a dor da perda da única pessoa que eu
tinha na vida. E então olhei para a menininha tão
pequena e inocente. — Virei o rosto para fitar
Maya. Ele acompanhou meu olhar. — A joia rara
de Dani, a promessa de nossa vida diferente. Seria
nós três, sozinhas, felizes. Como eu poderia pegar o

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telefone e ligar para um cara que não via há meses


e que acusou, juntamente com o pai, que minha
irmã estava dando um golpe?
— Não é dessa forma... — ele queria negar,
mas sabia que era verdade.
— Vocês iriam me submeter a todo tipo de
humilhação até comprovarem que a menina é uma
Capello. Então... Eu estudante, desempregada, tia
dela. Você milionário, e pai dela. Quem você acha
que o juiz daria a guarda?
Benjamin se calou. Ficou um bom tempo
pensando, olhando para Maya e, depois, aceitou
meus argumentos.
— Entendo seus medos e tenho certeza que
era justamente isso que aconteceria. Meu pai te
estraçalharia. — Quando voltou a me encarar,
estava com uma decisão firme. — Mas não vou
ceder. Perdi muito tempo na vida dela. E é
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surpreendente como eu gosto da ideia de ser pai


dela. É como ter encontrado algo pelo qual lutar,
um motivo para estar de pé. Você a criou bem,
entretanto isso não é o suficiente.
— E o que você quer? — Meu coração
começou a saltar descompassado. Era isso que eu
temia: negociar Maya.
— Você não quer se separar dela...
— Jamais
— E eu quero uma vida com minha filha a
partir de agora. Por isso te darei duas opções.
— Não vamos fazer isso. Não precisamos
negociar. — Levantei a voz. Ele continuou bem
sério e inalterado.
— Apenas escute. A primeira opção é
levarmos isso ao tribunal e saberemos quem
ganhará a causa, afinal, que juiz daria a guarda para

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uma dona de bordel que sai à noite e deixa uma


criança sozinha? — Quando ele falou isso e seu
lábio curvou-se em pura ironia, eu fiquei de pé
bruscamente.
— Não acredito que está jogando isso...
— Sente-se, Diana. Se você sair e me deixar
aqui com cara de pamonha será pior.
Voltei e me sentei para não chamar atenção,
principalmente de Maya. Prometemos a ela que não
iriamos mais brigar. Eu podia sentir o sangue pulsar
no meu pescoço, e o medo se avançar mais que a
raiva.
— A outra opção é: vai hoje mesmo para
minha casa. Morar lá, para você e eu termos acesso
à menina, sem precisar de tribunal. A escolha é sua.

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20
BENJAMIN

É claro que ela aceitou ir para minha casa.


Diana era uma mulher esperta, mas sabia o
momento de ceder. Ela sabia que se eu levasse o
caso adiante, poderia perder a guarda da menina,
sendo obrigada a vê-la apenas em finais de semana,
mesmo que, de verdade, eu não faria isso. Seria
maldoso separar as duas, fazer minha filha sofrer.
Ela só não precisava saber do meu lado bondoso.
Quando terminamos o almoço, eu as levei de
volta para o apartamento e esperei na sala enquanto
Diana arrumava uma bolsa. Por enquanto, apenas o

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essencial, até a gente decidir de verdade o que


fazer.
— Você fez desenhos no seu braço? — Maya
me perguntou, olhando minhas tatuagens no braço,
que estavam à mostra através da manga da camisa
dobrada.
— É tatuagem. Gostou? — Ela sentou ao meu
lado no sofá e analisou o desenho no meu braço.
— Eu sei que é uma tatuagem, eu só acho
estranho um homem grande desenhar no braço. Eu
não desenho mais no meu corpo, porque mamãe
disse que é coisa de criancinha.
— Mas você ainda é criancinha. — Fiz
cocegas em sua barriga, ela riu e se afastou para o
outro lado. Ela olhou bem nos meus olhos e havia
alegria brilhando em seu rosto.
— Beijamin. Eu vou te chamar de pai?

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Eu fiquei estatelado com a pergunta. Fui pego


desprevenido. Eu não tinha pensado nisso ainda,
mas agora, com ela falando isso, percebi que seria a
coisa mais honrada que já teria acontecido comigo.
— Eu adoraria, pequena.
— Se você é meu papai, vai ser namorado da
minha mãe? Todos os pais e mães que eu
conheço...
— Essa menina conversa demais. — Diana
apareceu rapidamente, sorrindo desconfortável, e a
puxou pela mão. — Vamos nos trocar, vamos para
a casa do Benjamin.
— Eba! Eu estou adorando o meu dia. — Eu
ri, observando-as se afastarem e entrar para o
quarto.
Havia tempos que eu não me sentia tão feliz
com uma escolha minha. Enfim, depois de anos
vivendo no automático, vivendo uma vida que meu
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pai queria, eu sentia que encontrava o meu rumo.

***

Eu moro em um duplex, uma cobertura de


luxo. Minha suíte fica no segundo piso e há uma
outra, para os hóspedes, no andar de baixo, onde
havia um closet e uma cama grande. Fui até as
janelas e conferi se estavam fechadas. Fiz uma
anotação mental de mandar colocar grade ou tela de
proteção.
— Tudo bem para vocês duas...?
— Claro. Será por pouco tempo — Diana se
mostrava confiante que iria escapar de mim. Mas
alguém tinha esquecido de informar que um filho é
ligação eterna, ela não ficaria livre tão cedo.
— Vai sonhando — cochichei, enquanto

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Maya abria a porta de vidro do closet e espiava


dentro.
— Não trabalho com sonhos. Só com
realidade — ela devolveu, e eu apenas assenti. Ela
queria uma guerra e tinha escolhido um lutador
nato, como oponente.
Eu não saí o resto do dia. Fiquei em casa,
porque eu pressentia que se saísse, ela poderia
escapar. Diana estava me olhando torto o tempo
todo. Ela era confiante demais e não ia abaixar a
cabeça facilmente.
Eu dei um tempo para elas e fui trabalhar no
meu escritório. Incrivelmente, eu tinha mais
rendimento quando trabalhava em casa, uma vez
que eu odiava me enfiar em um terno e ir para a
empresa.
Gostava mesmo era de pintar. Desde que uma
merda grande aconteceu na minha infância, e a
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psicóloga me incentivou a me refugiar no que eu


gostava. Isso só não agradou a meu pai que viu a
terapia como coisa de vagabundo sem chances de
ganhar dinheiro. Para ele, os homens da família
tinham que seguir os passos dele, era uma afronta
ter um filho pintor.
Hoje meus quadros são vendidos apenas na
internet, sem assinatura. E o mais famoso é “a
mulher na janela” que é um tributo a Danielle.
Vendo a felicidade nos olhos de Maya, e a
novidade de eu ter uma filha, era certo que ela será
minha próxima pintura.

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21
DIANA

Eu não tive mesmo escolha. O que eu poderia


fazer? Ser a mulher firme, de opinião que sempre
fui, e acabar em frente a ele em uma mesa de
tribunal? Eu tinha que dar o braço a torcer, por ele
ser esperto e me deixar sem saída. O jeito era ceder,
por enquanto.
Já passava de uma da manhã. Olhei para
Maya dormindo tranquilamente, depois de
conversar pelos cotovelos durante o jantar que
Benjamin pediu em um restaurante. Foi a coisa
mais sensacional para ela, ao ir com ele até a porta

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receber o pedido e ajudá-lo a tirar a comida das


embalagens descartáveis.
— Você sabe mexer nas panelas da cozinha?
— Estava boquiaberta, ajoelhada na banqueta do
balcão, vendo-o distribuir a comida nos pratos.
— Sei fazer muitas coisas, princesa —
Benjamin respondeu. — Leite com Toddy, ovo
cozido, lasanha de supermercado. — Enquanto eu
revirava os olhos diante da cara de pau dele, Maya
achava a coisa mais esplêndida do mundo o fato do
pai dela “saber cozinhar”.
— Mamãe, ele sabe fazer muitas coisas. Sabe
até fazer lasanha.
— De supermercado, Maya. Benjamin não é
tão dotado.
Seu sorriso cínico na hora me atingiu.
— Você nem o viu, para saber se sou ou não

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dotado. — Eu me flagrei chocada por ele ter levado


o assunto para o lado sexual, bem diante da criança.
— Você é tão baixo — desdenhei com um
olhar cheio de desprezo. — Uma má influência
para a menina.
Maya nem prestava atenção na gente,
entretida, passando o dedo na embalagem que veio
do restaurante e lambendo.

Agora, ela, enfim dormira. Deixei a porta


entreaberta e um abajur aceso e fui para a sala onde
Benjamin estava assistindo TV.
— Toma cerveja? — ele perguntou sacudindo
uma garrafinha para mim.
— Sim.
— Pegue na geladeira, se quiser.
— Eu prefiro um chá. Trouxe o meu de casa,
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posso ferver a água?


— Você mora aqui, a partir de agora.
Mesmo querendo dizer a ele que não iria ser
definitivo, não contestei. Era o tempo necessário
para eu pensar em uma rota de fuga. Algo que não
envolvesse tribunal e guarda compartilhada. Nem
gostava de pensar em ver minha menina só nos
finais de semana e ainda ter que, depois, presenciar
a convivência dela com a futura mulher de
Benjamin. E se ela não gostasse da menina? E se
não se dessem bem? Sem falar do ciúme que me
corroía, ao imaginar uma família feliz que eu não
fizesse parte.
Fui para a cozinha, fiz o chá e, quando voltei,
sentei no mesmo sofá porém na outra ponta. Ele me
olhou de relance, e eu o analisei sem modéstia.
Estava de bermuda e camiseta regata, gato como
sempre. Uma camada rala de barba contornava o

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maxilar forte e dava um ar maduro e muito


másculo.
— Ainda está bravo?
— Sim — resmungou e bebeu cerveja. Com o
controle remoto na mão, mudou os canais sem
paciência.
— Eu sinto muito. — E de verdade eu sentia.
Ele me olhou com uma acentuada rigidez no
maxilar, mas antes de responder, fui rápida: — Eu
sinto muito agora, nesses últimos dias, após
descobrir quem é realmente Benjamin Capello,
porque antes disso, eu só tinha ódio de você, nada
mais que isso. — era melhor esclarecer.
Ele estava me fitando bem sério e assentiu
inesperadamente. Voltou a olhar a televisão.
— Como você acha que vai ser? — falei e
voltei a beber o chá. — Eu não irei morar aqui para
sempre... E nem venha propor guarda
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compartilhada em que eu fique com as visitas, pois


isso está fora de cogitação.
— O que acha de ficar aqui até Maya
completar dezoito? — ironizou. — Eu também não
vou abrir mão dela, Diana. Não serei aquele que a
vê apenas nos finais de semana. Se quiser ir
embora, terá que ir sozinha. Minha filha, fica.
— Sua filha... — Dei uma risada amarga. —
Você fala como se já fosse íntimo dela. Chegou
agora é já quer sentar na janelinha? Ela é minha
filha também.
— Ela saiu do seu útero, por acaso? —
ale sustentou meu olhar, sendo maldoso.
— Não, e saiu do seu? — debochei.
— Mas saiu do meu saco. Portanto,
mais minha do que sua. É isso que um juiz vai levar
em conta.

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A pose confiante dele me deixou


com raiva, além de triplicar a atração que sinto por
ele. o que era algo inexplicável. Eu queria muito
sentir asco por ele. Eu tinha asco por homens
controladores, e Benjamin estava tentando me
controlar. Só que eu já estava, há muito tempo,
dependente da atração por ele.
— Posso fazer da sua vida um inferno
— ameacei com calma.
— Não espero menos, afinal você já é
o próprio capeta.
— E você queria muito comer o
capeta, não é?
— Que eu lembre, foi você que me
chamou de gostoso e me chupou todo. — Ele
cravou os olhos nos meus. O moleque sabia como
provocar uma contração no ventre. — Aposto que
está louca por mais uma dose do papai aqui. Mas é
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uma pena dizer, titia, que nunca mais encosta a mão


nessa máquina aqui. — Passou a mão no abdômen.
Eu já estava de pé, prestes a jogar o chá na
cara dele, por ter me chamado de titia, quando ouvi
Maya.
— Mamãe? — Benjamin e eu
olhamos ao mesmo tempo para Maya abraçada ao
ursinho. — Eu acordei e não quero ficar lá sozinha.
— Já estou indo querida, seu pai
estava aqui me explicando como funcionam as
máquinas enferrujadas e com pequena alavanca.
— Pequena? — Ele gargalhou
começando a se zangar. — Enorme e consegue
fazer qualquer uma ficar de pernas bambas ao
manuseá-la.
Olhei para Maya com cara de sono,
sem entender nossa a conversa.

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— Para de falar essas putarias na


frente da menina — cochichei. — Você é
definitivamente um péssimo exemplo.
— Ah, você é uma autêntica dona da
moral e dos bons costumes. — Dei as costas para
ele, peguei na mão de Maya e a levei de volta para
o quarto. Frustrada por ter perdido dessa vez e,
mais ainda, por ele me atrair de uma forma
irritante.
Eu não ia cair no joguinho dele. Benjamin
sabia que conseguia me desestruturar facilmente.
Custei a pegar no sono e só consegui dormir enfim,
quando bolei um planinho maléfico de vingança. Já
que ele queria tanto que eu morasse com ele,
deveria aceitar as consequências.

Quando Benjamin acordou no dia seguinte, eu


já estava de pé, fazendo café na cozinha dele. Ele
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estava todo arrumado para o trabalho e desceu


falando ao celular dizendo que já estava chegando
para uma reunião importante.
— O cheiro está bom. — Ele colocou uma
bolsa executiva no balcão e olhou para a garrafa de
café. — Como fez? Em um caldeirão, adicionando
pernas de aranhas, asa de morcego e falou umas
palavras mágicas?
Não respondi ao ataque debochado dele,
apenas esbocei um ar mordaz.
— Maya não vai para a escola? —
questionou.
— Ainda está afastada, por causa da cirurgia.
— Observei ele servir café em uma xícara e bebi
um gole da minha. Antes de beber, Benjamin
levantou para pegar leite na geladeira, e foi minha
chance. Desenrosquei a pedra do meu anel e deixei
o pó azul cair na xicara dele.
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Sorri, na verdade querendo gargalhar. Queria


tanto ver a cena...
As meninas usam esse truque na boate,
quando precisam animar homens mais preguiçosos,
digamos assim.
Benjamin bebeu e me olhou sério.
— Se tentar fugir, saiba que eu posso dar
parte como sequestro. Acho melhor resolvermos
isso como adultos. — Ele tomou mais dois goles e
ficou de pé. — Aproveite que estou tranquilo e
disposto a ceder. Tudo por causa da Maya. —
Tomou o resto do conteúdo da xícara, deu um até
logo para mim e foi embora. E eu gargalhei.
Espero que ele não vá apresentar nada nessa
reunião.

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22
BENJAMIN

O trânsito estava impossível, e, mesmo com o


ar condicionado ligado, ainda sentia meu corpo
esquentar. Afrouxei a gravata e soprei, vendo a fila
à minha frente avançar aos poucos.
E algo muito estranho começou a acontecer.
Senti uma pressão nas partes de baixo, e,
inacreditavelmente, meu pau começou a se animar
sozinho, sem nenhum motivo. Fiz de tudo para me
controlar, mas já era. Ficou tão duro de repente que
já estava dolorido e pulsando, como se eu tivesse
há umas duas horas em preliminares, sem gozar.

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Puxei a calça e esfreguei as pernas, tentando


afrouxar um pouco o aperto e a inquietação
invadindo cada vez mais.
Cheguei à empresa, e o bicho estava mais
duro que uma rocha, tinha escapado da cueca e
fazia um volume na minha calça. Coloquei a bolsa
na frente e entrei correndo. Fui direto para o
banheiro, entender o que estava acontecendo. Meu
corpo me zoando a essa hora da manhã?
Fui de escada mesmo, para não correr o risco
de ficar atrás de alguém no elevador e acabarem
achando que eu estava acochando a bunda alheia.
Assim que cheguei ao andar, corri para o
banheiro. Já estava sorrindo, vendo a porta com a
placa do homenzinho, quando ela se abriu, e
Andrey saiu de lá fechando o zíper. O infeliz nem
lavava as mãos.
— Ei, só estávamos esperando você. — Parou
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na minha frente — Rápido, cara!


— Eu vou... Só irei...
— Nem pensar. Mija depois. O pai já está
quase tendo um treco.
— Andrey... Cara, é questão de vida ou
morte.
— Eita, cacete! Você está suando, mermão.
Vai soltar o barro?
— Mais ou menos isso. — Eu nem sabia o
que eu iria fazer para acalmar minha jeba agressiva.
Meu pau era meu melhor amigo, mas hoje, estava
possuído, e eu não sabia como domá-lo.
— Certo. Cinco minutos, Benjamin. Me dê a
bolsa que eu adianto sua papelada.
Olhei para a bolsa, que tampava o volume da
piroca dura, e voltei a encará-lo. Andrey me fitava
desconfiado.

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— Nem fodendo. Levo em cinco minutos. —


Corri para o banheiro e fechei a porta com o no
trinco. Ninguém poderia entrar.
Olhei nos reservados, e só quando confirmei
que estava sozinho, é que desci minha calça e, em
frente ao espelho, estudei a situação. Estava
enorme, a cabeça vermelha e já tinha melado um
pouco a cueca com pré-gozo. Eu sentia o sangue
pulsando nas veias, que dobraram de tamanho. O
pau estava turbinado.
Claro, eu teria que aliviar.
Mas que merda! Como isso foi acontecer? Até
na minha mãe eu pensei, para tentar murchar o
bicho, pois era um assunto delicado para mim e
sempre me colocava para baixo. Não surtiu efeito.
Ok. O jeito era a mão amiga. Recostei na pia,
fechei os olhos e, instantaneamente, minha mente
elaborou uma imagem de Diana. Ela estava toda
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gostosa, com uma leve camada de suor entre os


seios, enquanto cavalgava em mim, gemia e sorria
libertinamente.
Foi ela. A intuição me avisou. Foi a
desgraçada que fez algo para eu ficar assim. Ela iria
pagar caro por isso.
Não ia jogar sabonete líquido na minha rola.
Cuspi na mão e mandei ver, de olhos fechados,
imaginando-me fodendo Diana com gosto, para me
vingar por ela ter mexido na coisa mais importante
de um homem: o pau.
Os gemidos dela ecoavam em minha cabeça.
O gosto de sua pele quando lambi os seios e o
barulho das socadas fundas e brutas com ela de
quatro na minha cama, era tudo que minha mente
formulava, era tudo que eu queria.
Gozei igual a um boi. Mordi o nó do dedo
enquanto sacudia o corpo e controlava os jatos,
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para não sujar meu sapato. Foi tudo na parede.


Terminei, lavei minhas mãos, mas, para meu
horror, o pau continuava armado para briga. Não
era tesão, era a circulação sanguínea. Ela deve ter
colocado Viagra no meu café.
Safada sem vergonha.
Não tinha como eu ficar mais no banheiro.
Tirei o piercing, para não causar acidente, ajeitei o
pau duro como pude e sai correndo do banheiro.
Cheguei à sala de reunião, cumprimentei todos e
me sentei. Andrey fazia uma explicação. Nem sinal
de Fernando ou Miguel. Eu tinha certeza que
Andrey ia me chamar para ajudá-lo.
Foi dito e certo.
— Benji, traga seus relatórios e apresente-os
para a nossa cliente. — Engoli em seco e sorri sem
graça para a mulher que nos assistia. Justo hoje, o
cliente tinha que ser uma mulher. Ela era séria e
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aparentava ter uns sessenta anos. Era viúva e estava


dirigindo os negócios da família.
— Aqui está, mano. Pode ficar à vontade e
continuar. — Empurrei os papéis.
— Já estou sentado — Andrey falou, e eu
quis afundar ele na porrada.
— Benjamin, por favor, faça as honras —
meu pai pediu, e eu respirei fundo.
Por favor, pau. Eu juro que te darei a boceta
que você quiser, só colabore.
Me levantei, abotoei o terno, que não
escondeu nada, andei meio de lado e sem ter o que
fazer, me posicionei na frente de todos revelando os
meus predicados, como diria meu pai.
A primeira a perceber foi a mulher. Elas
sempre reparam em tudo. Como sou um jovem
bonito e vigoroso, ela fez a avaliação rápida, com o

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olhar que todas as mulheres fazem, e então viu: o


mastro estufando a calça.
Sorri sem graça e fui fazendo a minha
apresentação, meio gaguejando. Andrey rindo por
que percebera e meu pai de boa, olhando para
minha cara, sem se dar contar do vexame.
Quando estava no fim e mirei a cliente, ela
sorria graciosamente e até bateu os cílios quando
nossos olhares se encontraram.
— Negócio quase fechado. — Ela veio
pessoalmente apertar minha mão. Colocou uma
mecha de cabelo atrás da orelha. — Venha jantar
comigo, para decidirmos os últimos detalhes, e
então fecharei negócio. Olhei para Andrey, ele fez
um sinal de faca no pescoço, e meu pai assentiu de
leve, indicando para eu aceitar. E eu tive que
aceitar.
Uma viúva de sessenta anos que estava de
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olho no novinho pauzudo.


— Que porra foi essa? — Andrey me
perguntou, quando eu juntava a papelada. O efeito
do Viagra parecia começar a diminuir.
— Fui dopado. Uma safada me encheu de
Viagra.
— Eita. Você só se mete em furada.
— Venha, vou tomar um suco de maracujá e
te contar tudo. — Ele me seguiu para fora da sala.
— Sabe qual é a nova?
— O quê?
— Tenho uma filha.
— Filha? Que merda andou cheirando?
— Isso mesmo. Uma filha de cinco anos. E
ela é a coisa mais linda do mundo.

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***

Depois do almoço, liguei para Diana.


Demorou um século para que atendesse.
— O que foi? — Cheia de má vontade.
— Eu sei o que você fez, sua cobra. — Cuspi
as palavras com ira.
— Ela fez a cobra subir, a cobra subir... —
começou a cantar debochando, e eu ralhei
interrompendo-a:
— Você vai me pagar caro. Isso não é coisa
de uma mulher da sua idade fazer. Está em casa?
— Sim, estamos.
— Cadê Maya?
— Está aqui.
— Quero falar com ela. Criança não mente —

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ela não protestou e passou o telefone para Maya.


— Oi.
— Oi, filhinha. Onde vocês estão?
— Estamos na sua casa. Eu estou adorando
sua televisão que tem mais canais do que a da
minha casa.
— Essa casa também é sua, meu bem.
— Eba! Mamãe, ele falou que a casa é minha
também. — Escutei Diana falar: “Que bom, filha.”
Maya voltou a falar comigo. — Papai Beijamin, a
casa pode ser da minha mãe também?
Eu não iria dizer que não. Estava
conquistando a menina, teria que deixar as arestas
de lado.
Revirei os olhos imaginando Diana rindo.
— Sim, filha. Pode ser dela também.
— Mamãe, ele falou que pode ser sua
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também.
“Fala com ele que a mamãe agradece pelos
mimos.”
— Ela disse que agradece pelos mimos. O que
é mimo?
“São presentes, querida.” Diana falou.
— Maya, deixe sua mãe de lado e converse
comigo. Já almoçou?
— Sim. Comemos espaguete. A mamãe fez.
Deve ter ficado horrível.
— Deve ter ficado uma delícia — falei.
— Sim, muito. — Soou animada.
— O que acha de você sair um dia comigo?
Só você e o papai?
— Oba! Onde a gente vai?
— No shopping, o que acha? — Sorri para a

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parede.
— Eu amo shopping. Podemos assistir um
filme?
— Faremos tudo que quiser, minha princesa.
Me despedi dela e sorri como um bobo para o
celular. Andrey me aconselhou a contar tudo para
nosso pai, mas eu ainda não falaria nada. Eu queria,
por um momento, tomar decisões sem a influência
severa dele.

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23
DIANA

Depois que Benjamin ligou indignado por ter


ficado exposto de pau duro na reunião, me senti de
alma lavada. Não era uma vingança tão grave,
afinal, eu não queria mesmo brigar com ele. Foi
apenas uma pequena amostra para ele tomar
cuidado comigo.
Enquanto o dia avançava, eu ficava cada vez
mais entediada. Quase não estava indo na boate
esses dias e nem tinha ainda conseguido ter uma
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conversa séria com Sabrina e Almir. Depois do


almoço, Maya não desgrudava os olhos da
televisão, descobrindo vários canais, e eu liguei
para Amanda, querendo saber se ela podia vir ficar
a tarde com ela e, para meu alívio, disse que podia
sim. Dei o endereço e, enquanto esperava por ela,
subi ao quarto de Benjamin para espionar, e Maya
me acompanhou.
— Não mexa em nada — ordenei. Ela me
olhou totalmente dissimulada, se fazendo de
anjinho, quando eu sabia que ela só queria que eu
confiasse nela, relaxasse a atenção, para então agir.
Maya pulou na cama enorme e muito
confortável que eu tive a leve tentação de também
experimentar. Passou pela minha cabeça a imagem
do homem atraente e erótico que era Benjamin, ali
deitado sem roupa. Era tão contraditório eu ter
vontade de bater nele por ser babaca, mas ficar de

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calcinha molhada ao imaginá-lo nessas situações.


O quarto de Benjamin era tão bem decorado
quanto o resto da casa. Cortinas blackout
automáticas, janelões com uma linda vista para a
rua lá embaixo, uma parede inteira de espelho que
servia de porta de correr para o closet.
Olhei para Maya, que fingia desinteresse, e
entrei no closet. A primeira coisa que vi foi a
parede do fundo, pintada à mão. Analisei-a e
percebi que era o mesmo estilo das pinturas de lá
de baixo, e, logicamente, pintada por Benjamin.
Era uma pintura abstrata e fazia qualquer um parar
para admirá-la.
Ele era muito organizado, mas não era o
closet de um executivo. Vi muitas cores, muitas
camisetas com estampa e alguns objetos que me
deixaram admirada: luvas vermelhas de boxer
penduradas junto com as gravatas, várias faixas de

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alguma luta, karatê ou judô, eu não fazia ideia.


Abri uma gaveta e sorri ao encontrar as
cuecas. Um bolo desorganizado de cuecas e sungas.
Possuía muitos sapatos sociais, tênis de
marcas caras, e até uma bota de montaria. Em outra
gaveta, me deparei com algo parecendo um
mostruário de vidro, onde havia alguns relógios,
anéis e pulseiras, mas o que mais me impressionou
foram os piercings. De vários tipos e tamanhos. Eu
nunca fiquei com um homem que tivesse piercing
no pênis, mas eu sabia que aqueles eram para essa
finalidade. Fiquei obcecada olhando cada um deles
e imaginando aqueles pequenos metais preso no
pênis do cara que era completamente proibido para
mim.
Ouvi um barulho e corri para fora do closet.
Maya acabara de derrubar uma gaveta ao lado da
cama.

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— Minha filha! Eu disse para não mexer em


nada.
— Você também estava mexendo — acusou.
Não contestei. Me ajoelhei e comecei a juntar as
coisas da gaveta. Havia muitas camisinhas e até um
tubo de lubrificante. Em meio a tudo, uma foto de
uma mulher bonita sorridente, segurando uma
menina loira que vestia um belo vestido de renda e,
ao redor dela, quatro garotos colocados em fileira,
do maior para o menor.
Com certeza, a família de Benjamin. Mas sem
o pai. Olhei para o menininho menor, e meu
coração se apertou ao vê-lo de olhos saltados e
muito sorridente, mostrando toda a felicidade
infantil.
— Quem são essas crianças, mamãe?
— Não sei querida. Vamos guardar. É feio
mexer nas coisas dos outros.
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Eu sabia que, em algum momento, Maya iria


falar algo do tipo para Benjamin: “Beijamin, não
mexemos no seu quarto, viu?”
Terminei de arrumar tudo, e saímos do quarto.
Amanda chegou, falei com Maya que voltava antes
do jantar e fui para a boate, conferir com os meus
próprios olhos o que estava acontecendo por lá.
E, para minha surpresa, havia uma reforma
acontecendo no segundo piso, e ao ser informada
que era coisa de Almir, logo supus o que ele estava
fazendo.
Antes de tudo, preferi conversar com Sabrina.
Fitei sem entender a touca plástica que ela usava
nos cabelos. Ela estava à minha frente,
demostrando sua tensão, e antes mesmo de eu abrir
a boca, ela começou a explicar:
— Ele me obrigou, Diana. Eu não sabia o que
fazer.
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— Sabrina, eu te conheço e sei que, na


verdade, estava tentada a ser mais que a garota de
estimação de Thadeo Capello. — Levantei e dei a
volta na mesa. Ela me acompanhou com os olhos.
— Imagina ser a Julia Roberts da vida real?
Trabalha como stripper, mas um herdeiro
milionário acaba te resgatando e se apaixonando.
Você queria mais dele do que só a foda, por isso
nem cogitou em negar a proposta de Almir ou
tentar me avisar.
Ela ficou sem resposta por eu ter acertado no
ponto exato. Me sentei na ponta da mesa, de braços
cruzados, fitando-a.
— Eu não te julgo. Qualquer uma gostaria de
ser mais do que amante de um daqueles homens.
Mas não é isso que está em foco aqui e sim o fato
de que devia a mim lealdade. Eu te coloquei aqui,
eu te dei uma chance e te protegeria, caso Almir

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tentasse algo.
— O que vai fazer agora? Me demitir? —
Sustentou meu olhar.
— Não. Podemos reverter isso. Vou aumentar
seu salário, mas com uma condição.
— Qual? — Arregalou os olhos em suspense.
— Será meus olhos aqui dentro. Vai me
informar sobre tudo que se passa. Tudo mesmo.
Quem se encontra com Almir, quando ele sai,
quando chega. Tudo.
— E se...
— Ele não vai descobrir. Qual sua resposta?
— Eu aceito. Eu quero me redimir com você.
— Além de querer um salário maior —
apontei. Comigo não tinha meias verdades.
— Lógico.

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— O que é isso na cabeça?


— Ah. — Ela sorriu. — Uma nova receita das
meninas, para os cabelos.
— Passe para mim, depois. Está liberada. —
Peguei minha bolsa e saí, indo falar com Almir.
Assim que entrei na sala dele, Almir não esboçou
reação alguma, certamente sabendo que eu estava
na boate e viria falar com ele. Encostei a porta e
caminhei até sua mesa.
— Enfim, decidiu dar as caras? — Recostou-
se na cadeira e me fitou cinicamente. — Estava boa
demais a vidinha caseira com o moleque?
Então ele estava a par, mesmo eu não tendo
contado nada ninguém.
— O que você está fazendo com a boate? —
indaguei, me referindo às reformas que vi.
— Não está visível? Estou fazendo negócios.

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Tentando salvar o nosso ganha pão. Ou melhor: o


meu ganha pão. Afinal, nem todo mundo cria uma
criança filha de um herdeiro...
— Você é muito babaca. Vai parar agora o
que estiver fazendo — ordenei. — Essa boate não
será uma casa de prostituição. Além do mais não
temos dinheiro para custear. Você mesmo estava
surtando por causa disso.
— Ok. Volte a trabalhar todas as noites e
então poderá dizer o que posso ou não fazer.
Me empertiguei e o encarei estremecida.
— Não dá. Eu tenho uma filha e estou
passando por um momento crítico. Benjamin
descobriu e...
— Caguei para seus problemas.
— Problemas que você criou — gritei. —
Você o atraiu até aqui, e ele acabou descobrindo

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tudo.
— Não, Diana. Não se iluda dessa forma.
Você sabe que ele descobriu por outro motivo.
Você o fez doar sangue para a própria filha, sem
contar isso a ele. Olha o nível que você chegou.
Senti meu sangue fugir do rosto quando ele
tocou no assunto da doação de sangue. E Almir riu
da minha expressão. Ele deu a volta na mesa e veio
até mim. Tocou na minha bochecha em um gesto
que me deu asco, e eu me afastei rápido.
— Parece que você esquece continuamente
com quem está lindando. Eu sei de tudo querida.
Como sei que acabou de se mudar para a casa dele.
Então, abaixa bem a bola e me deixe trabalhar.
Saí da boate completamente derrotada. Com a
sensação terrível de que tinha sido golpeada com
força e estava sem chão e sem segundas opções. De
um lado Almir me pressionando, do outro,
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Benjamin.
E, para completar, quando cheguei ao
apartamento dele, encontrei Amanda
completamente surtada.
— O que houve, Amanda. Onde está Maya?
— Diana, Benjamin chegou e a levou. Eu
tentei impedir, mas ele disse que é o pai dela, e
Maya ficou muito eufórica para ir com ele.

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24
BENJAMIN

Eu tinha chegado mais cedo em casa, e, para


minha surpresa, Amanda estava lá cuidando de
Maya. Eu fiquei com muita raiva de Diana e juntei
o útil ao agradável. Ia ficar o resto do dia com
minha filha, apenas nós dois, e deixaria Diana sem
qualquer resposta de onde eu estaria com a menina,
como uma espécie de troco pelo o que ela tinha
feito comigo mais cedo.
— Diana, fique tranquila que ela está com o
pai dela.

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— Benjamin, seu patife! Você vai trazer


minha filha agora! Eu sou a responsável por ela.
Perante a lei, você não é nada!
— Tchau, Diana.
— Onde vocês estão... — desliguei e sorri
para Maya no banco de trás.
— Chegamos!
— Eba! Eu amo shopping. — Ajudei-a descer
do carro, segurei em sua mão, e seguimos para a
entrada.
Enquanto caminhava com a menina saltitante
de cabelos castanhos esparramados no meio das
costas, eu me sentia outro homem. Não o executivo
fodido que meu pai insistia que eu deveria ser, e
nem o pintor anônimo envergonhado do próprio
talento. Era uma sensação nova para mim, como se
eu pudesse vencer uma batalha sozinho, tendo essa
pequena menina como motivação. Ela me fazia
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esquecer uma parte nojenta da minha mente, cada


demônio que havia me perseguido até aqui, fazia
me sentir um pai.
Olhei sorrindo para ela, com seu vestido
amarelo, sandálias que eu mesmo abotoei antes de
sair e uma bolsinha da Minnie no ombro.
— O que gosta de fazer? Quer ir a uma loja
de brinquedo?
— A gente pode ir? — Ela tinha um brilho
contagiante nos olhos.
— Só se for agora. — Entramos no shopping
e fomos direto para a loja de brinquedos.
— Olá, boa tarde. — A atendente veio
sorridente nos receber. — Desejam algo específico?
— Ela é minha filha — falei cheio de
orgulho. — Ela vai escolher o que ela quer.
— Tudo bem, podem ficar à vontade. — Ela

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me mediu de cima a baixo, e Maya já estava


andando rápido pelos corredores da loja, olhando
tudo ao redor, sem saber em que focar.
— Diga, Maya, o que mais você gosta?
— Eu não sei, papai Beijamin. Eu gosto da
Barbie, mas também queria muito um carrinho de
bebê de bonecas, mas a mamãe disse que vai me
dar no meu aniversário. — Pensou um pouco com o
dedinho no queixo. — E também amo muitão
quebra-cabeças e alguns heróis.
— Gosta de heróis? Quais?
— Eu gosto do Capitão América e da Mulher
Maravilha. Mas a mamãe não me deixou assistir o
filme de Taunos, porque tem muita violência.
Eu gargalhei ao ouvir ela tentar dizer Thanos.
Meu Deus! Eu estava apaixonado pela minha
pequena filha. Dani e eu tínhamos concebido uma
menina encantadora.
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— Bom, depois vamos resolver sobre o filme.


Agora vamos pegar uma cesta e comprar tudo que
você quiser. — Fomos andando pelos corredores e
Maya estava em transe sem saber o que escolher.
No final, ficou com três Barbies que vinham com
assessórios, uma Mulher Maravilha e dois quebra-
cabeças.
— Papai Beijamin. Já compramos muita
coisa. Você precisa guardar um pouco de dinheiro
para podermos comer mec-lanche-feliz. — Mais
uma vez me dobrei de rir com a real preocupação
dela com o meu dinheiro.
— Estou feliz em saber que você já tem
consciência de gastos. Mas vou te contar um
segredo.
— Um segredo?
— Sim, só nosso.
— Tá bom.
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Me abaixei diante dela e confidenciei:


— Lembra quando perguntou se eu era rico?
— Sim.
— Pois eu sou. — Ela abriu a boca surpresa.
— E tenho muito dinheiro para comprar muitas
coisas.
— Então dá para comprar o carrinho de bebê
de boneca?
— Já podemos escolher.
— Eba! — Foi até a atendente e falou: —
Moça, aqui na sua loja tem carrinho de bebê para
boneca?
— Tem sim. Venha comigo.
Compramos muita coisa, mas não tanto assim,
porque, mesmo eu dizendo eu era rico, Maya ainda
ficou com um pé atrás, achando que tínhamos
comprado demais. Fomos para a praça de
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alimentação e, enquanto comíamos o hambúrguer,


ela confidenciou:
— Papai Beijamin.
— Diga.
— Eu e a mamãe não mexemos no seu quarto,
viu?
— Não?
— Não passamos nem perto da porta. Pode
ficar tranquilo.
Então a safada da Diana estava bisbilhotando
minhas coisas. Eu não estava com raiva, na
verdade, rindo da inocência dela e me sentindo
muito bem na companhia da Maya. Teria que ser
uma coisa muito grande para me tirar do sério hoje.
— Podemos comprar uma coisinha de nada
para a mamãe? — Maya reclamou logo depois. —
Eu ganhei muitos presentes e ela não ganhou nada.

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— O que você acha que ela gostaria?


— A mamãe ama as joias dela. Mas também
gosta de maquiagem. Você poderia me dar uma
maquiagem para crianças e um lindo batom para
minha mãe.
Eu queria fazer todas as vontades de Maya e
ter mais intimidade com minha filhinha, entretanto,
de uma coisa eu estava ciente: ela era muito mais
íntima da Diana, e nada poderia mudar isso.
Mesmo eu lhe dando tudo, não seria o suficiente
para cobrir uma possível falta que Diana faria para
Maya. Deixamos as compras de brinquedos no
carro e voltamos para procurar uma loja de
maquiagem.
Compramos um batom e ajudei a escolher a
cor. Para minha surpresa, me vi tentado a ver os
lábios de Diana percorrendo meu corpo nu,
deixando marcas desse batom. Da mesma forma

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esfomeada que ela me mordeu e chupou meu


pescoço, quando estávamos no meu estúdio. Eu não
tirava a mulher da minha cabeça um segundo
sequer.
Quando saímos da loja, dei de cara com
Alana, minha antiga boceta amiga. Ela parou e deu
um grande sorriso que quase considerei fascínio .
— Benji! — Se achou na intimidade de vir
beijar meu rosto. — Fiquei esperando uma ligação
sua...
— É... Surgiram algumas coisas. — Olhei
para Maya, e ela observava Alana com atenção. E
assim, o olhar da mulher foi atraído para a
menininha de mãos dadas comigo.
— É a filha de Stela?
— Não. Ele é o meu pai. — Maya foi rápida
em responder. Alana tomou um susto e voltou seu
rosto assombrado para mim.
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— Que loucura é essa, Benjamin?


— É uma longa história, Alana. — Massageei
a testa, incomodado. — Mas acho que você nem
precisa perder tempo ouvindo. Foi bom te ver. —
Tentei dar um passo para me afastar, mas ela se
colocou no meu caminho.
— Espera aí? Uma filha? Desse tamanho?
— Alana, acho que não é o momento...
— Essa conversa está tão chata. Já estou com
sono — Maya falou, demostrando sua revolta com
os braços cruzados e olhar distante. Alana a fitou
horrorizada, como se tivesse sido ofendida.
— Benjamin, você não é desse jeito. Você
sempre foi frio, pouco se importou com as pessoas
e agora está com uma pirralha a tiracolo no
shopping?
Olhei em volta sem querer ser protagonista de

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uma discussão. Eu queria dar o melhor exemplo


para Maya.
— As coisas mudam, Alana. Eu não te devo
explicações.
— Papai, vamos logo. A mamãe precisa ver o
batom que você comprou para ela. — Maya puxou
minha mão e o que ela disse foi o mesmo que ter
dado um soco em Alana.
— Tem uma mãe no rolo? Logo você, está
caindo num golpe...
— Nunca mais ouse dizer uma merda dessas,
ouviu? — Apontei um dedo na cara dela. — Por
favor, bloqueia meu número no seu celular, pois é o
que farei com o seu. Vamos, meu bem. — Puxei a
mão de Maya, não antes de ela mostrar língua para
Alana. Era um gesto feio, mas que me deu vontade
de rir. Em dois dias de convivência, minha filha
estava me defendendo.
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No carro, de volta para casa, ela estava calada


no banco de trás. Olhei para seu rostinho pensativo
pelo retrovisor.
— Está bolando um plano?
— Papai Beijamin, você não gosta da minha
mãe?
Suspirei diante da indagação dela. Eu não
gostava e nem desgostava. Diana entrou como um
furação em minha vida, e as coisas estavam
acontecendo rápido demais. Em um dia, eu era um
homem solteiro e sozinho, no outro, já estava
levando minha filha e a mãe postiça dela para
minha casa. Foi uma decisão precoce, a gente nem
mesmo conversou. E, no fundo, eu sabia que não
era só o fato da Maya ser minha filha, o que me
ajudou a tomar essa decisão foi a crescente atração
que estava sentindo por Diana.
— Sua mãe é bem teimosa às vezes. Mas eu
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não tenho raiva dela. Mas porque pergunta?


— Quando você casar e não for com minha
mãe, eu não vou mais querer morar com você.
— Não? Por quê?
— Porque todas as madastras são malvadas.
A da Branca de Neve, a da Cinderela. A sua
namorada hoje no shopping não gostou de mim.
Se ela tivesse tido tempo de conversar com
um adulto, eu ia jurar que alguém havia colocado
essas coisas na cabeça dela. Mas Maya se mostrava
como toda criança moderna: muito precoce.
— Nem todas as madrastas são ruins, Maya.
E eu não vou me casar por enquanto. De verdade,
me assustava pensar que minha filha poderia sofrer
nas mãos de uma pessoa que não fosse nada dela.
Como eu e meus irmãos sofremos com o filho da
puta... o nosso padrasto.

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— Que legal! — ela vibrou.


— Ah, e aquela moça não era minha
namorada. — Pisquei para ela, em cumplicidade.
Chegamos em casa, e quando abri a porta,
Maya entrou berrando:
— Mamãe, chegamos! — Entrei logo atrás
com as sacolas, e Diana veio desesperada e a
abraçou.
— Minha filha! Eu estava morrendo de
preocupação. — Beijou Maya e a olhou dos pés à
cabeça — Onde você foi? Ele te levou na casa do
pai dele?
Ah, que bela merda! Esse era o medo dela. De
que eu levasse minha filha para conhecer o avô.
Mas não ia brigar, o medo dela tinha fundamento.
Ela só não queria que a menina sofresse.
— Não mamãe, fomos ao shopping.

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— Graças a Deus! — Só então me olhou,


consumida de fúria. — Vai ter troco — sussurrou e
levou Maya para a sala. — Conte para a mamãe o
que vocês fizeram?
— O papai Beijamin me deu muitos
brinquedos e comemos um lanche desse tamanho.
— Ela mostrou o tamanho do lanche com as mãos.
— Aguentei comer toda a batata frita, mamãe, e ele
até tentou roubar algumas minhas, mas não deixei.
— Maya inclinou-se em direção a Diana e
confidenciou — O papai Beijamin brigou com a
namorada dele. Ela não gostou de mim.
Diana levantou os olhos para mim, estava
pasma, sem conseguir disfarçar o horror e a raiva
crescente.
— Mamãe, também compramos um presente
para você. — Maya nem deu tempo para Diana
digerir a informação. Ela pegou a sacolinha e

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entregou a Diana.
— Para mim? Que coisa mais fofa!
Me sentei no mesmo sofá, ao lado de Diana.
— Obrigado por me achar fofo — cochichei.
— Se enxerga — ela resmungou e deu um
gritinho quando abriu a embalagem. — Um batom
novo! Eu adorei, meu bem. — Beijou Maya.
— Agora vamos abrir os meus presentes. —
Maya se jogou no meio das sacolas esparramadas
pela sala. Diana e eu ficamos observando-a.
— Levou a Maya para um dos seus encontros
pervertidos?
— Claro que não. Geralmente meus encontros
são em motéis, proibidos para crianças.
— Cretino. Quem foi a safada? Fez alguma
coisa contra Maya?
— Não, Diana. Mesmo que não precise te dar
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explicações, foi apenas um esbarrão com uma


antiga foda minha. Ela não gostou da Maya, e eu a
mandei passear. Satisfeita?
— Não. Não estou satisfeita. Estou muito
revoltada com sua irresponsabilidade.
— Use o batom depois — Bati na perna dela.
—, quero conferir se foi uma boa compra. — Ela
tentou me dar uma cotovelada, mas me levantei
rápido e me ajoelhei ao lado de Maya, se divertindo
com seus presentes.
— Papai Beijamin, o que acha de um chá com
as bonecas?
— Estou sendo convidado para um chá? Meu
Deus, eu vou adorar!
— Ebba! Você pode ficar com a Lulu. —
Entregou uma Barbie ruiva para mim. — E eu fico
com a Lala. Depois a Lala vai nos levar ao salão de
maquiagens dela.
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— A Lulu está preparada para ser maquiada.


— Balancei a boneca.
— Só depois do chá, papai.
— Só depois do chá — falei e pisquei para
Diana, que me assistia com os olhos semicerrados e
fazendo um bico torcido de raiva.

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25
DIANA

Foi uma noite longa. Maya brincou até cair


cansada no tapete, em meio às bonecas. Como ela
já havia comido no shopping, eu nem a acordei
para jantar. Levei-a para o quarto, ajeitei-a na cama
e só então meus ombros caíram de alívio. Estava
tranquila, mais um dia que tinha dado tudo certo. A
preocupação latente ainda existia, tanto pela boate,
como por minha situação com Benjamin. Mas, por
hoje, era hora de me tranquilizar.
Tomei um banho relaxante, escolhi um baby-

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doll e decidi ir falar com Benjamin. O que ele tinha


feito foi horrível, era o pai, mas para sair com a
menina precisava, sim, da minha autorização.
Legalmente, eu era a única responsável por ela. E
acho que meu desespero maior foi pensar que ele
poderia levá-la para conhecer os irmãos dele ou o
pai. E eu não imaginava qual seria a reação deles.
Eu poderia estar apenas enciumada por ele ter
conseguido o afeto da filha rápido demais,
entretanto, eu insistia em negar essa hipótese. Tinha
mesmo que ir falar com ele.
Na sala, estava tudo quieto, ele não se
encontrava lá. Pensativa, olhei para a escada. Eu
seria tão invasiva a ponto de bater na porta do
quarto dele? Acho que não. Dei meia volta, mas
parei no meio da sala.
Qual horário eu teria oportunidade de
confrontá-lo? Com Maya acordada, seria

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impossível. Voltei, subi um degrau e fiquei olhando


para cima. Era cedo demais para ele já estar
dormindo. Estaria trabalhando? Subi outro degrau.
Eu poderia chamá-lo daqui... Mas talvez ele não
escutasse, e meu grito poderia acabar acordando
Maya. Subi outro degrau. Observei a sala silenciosa
atrás de mim, mordi o lábio e tomei a decisão. Subi
a escada totalmente.
A porta do quarto de Benjamin estava aberta.
Pigarreei alto e espiei. Nada. Cama vazia e o closet
fechado.
— Benjamin? — Entrei. Analisei tudo em
volta; nem mesmo o som do chuveiro consegui
ouvir, mas a porta do banheiro estava aberta e a luz
acesa. — Benjamin? — chamei mais alto.
— Estou aqui — falou do banheiro. — Pode
vir.
— Está vestido? — Dei um passo em direção
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ao banheiro.
— Totalmente coberto — respondeu, e, sem
qualquer estresse, caminhei para lá. Espiei. Nada
perto da pia. O banheiro dele era imenso, muito
claro e diferente do resto da casa, o branco
predominava. Desde os utensílios até a parede e o
piso.
— Venha até aqui, Diana. — E lá estava ele,
aparentemente nu, dentro da banheira. Seu braço
tatuado jogado para fora da banheira e a cabeça
recostada.
— Ai, meu Deus! — exclamei e virei de
costas. — Você disse que estava coberto.
— Sim, estou. Coberto de água.
— Imbecil. Depois conversamos.
— Espere! — falou assim que eu dei um
passo para sair. — Vire-se para mim, Diana. — Sua

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voz assumiu um tom baixo, suave. Não uma ordem,


era um pedido.
Virei de braços cruzados e o encarei.
Benjamin sorriu preguiçosamente. Um imbecil
muito gostoso. Mais do que eu poderia suportar e
me controlar. Ele era proibido para mim, droga.
— Me fale... O que deseja no meu quarto?
— Podemos conversar outro momento.
— Homem gostoso pelado te assusta? — Ele
debruçou na borda da banheira para me observar.
Sorrindo, ainda bem antipático.
— Talvez se você fosse um pouco menos
arrogante...
— Por causa do “gostoso”? Mas foi uma
qualidade que você rotulou em mim.
E ele estava disposto a continuar lembrando
desse meu deslize.

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— Ok. Eu só queria te dar um recado. Você é


o pai da Maya, eu me submeti a esse circo
lastimável de morar aqui uns tempos...
— Maya não será minha filha só por uns
tempos. Ela mora comigo, sim. Ou quer o tribunal
no meio?
O ignorei e continuei meu apelo.
— Mesmo apesar do circo e de você ser o pai
dela, não pode sair com ela sem minha autorização.
Perante a lei, você não é nada dela.
— Isso vai mudar. Breve irei entrar com os
papéis do reconhecimento de paternidade.
— Sim, mas até não mudar, você não faz nada
com ela sem minha autorização. Era esse o aviso.
Entendido?
Sem sorrir, Benjamin me analisou. Correu os
olhos, compenetrado, pelo meu corpo. Eu estava

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com uma roupa absolutamente pequena, as coxas à


mostra, além de estar sem sutiã. Me senti sendo
despida pelos olhos dele, ao mesmo tempo em que
um calor subia pelas minhas pernas.
— Entendeu? — tornei a pressionar.
— Por que não tomamos uma bebida e
falamos mais sobre o assunto? Você está nervosa?
— Estou calmíssima.
— Ótimo. Eu também. Pode, por favor, me
entregar essa toalha ali e me esperar lá fora?
Soltei o ar pela boca ruidosamente, revirei os
olhos, peguei a toalha e me aproximei da banheira
para jogar na cara dele. Mas como uma serpente
traiçoeira, Benjamin foi mais rápido. Puxou meu
pulso e eu soube o que ele pretendia.
— Benjamin, você não seria louco... — Ele
nem processou minhas palavras, me agarrou e, em

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segundos, eu estava toda molhada dentro da


banheira, praticamente no colo dele. Eu estava toda
exposta, o tecido fino do meu baby-doll só fazia
tudo parecer mais conveniente.
Ele se mexeu dentro da banheira, me
mantendo presa ao seu corpo em um abraço
molhado. Nossos rostos estavam a centímetros de
distância, e eu parecia uma mocinha boba de
romances, sem fala, no meio da pegada do macho
maravilhoso. O que obviamente, eu nunca tinha
sido.
— O que acha que está fazendo? — balbuciei.
— Eu não aguento mais te olhar e não querer
beijar sua boca — confessou provocando uma falha
nos meus batimentos cardíacos. — Quero chupar
demoradamente cada um dos seus seios e depois
passar a madrugada te comendo, até não restar nada
de nossa sanidade.

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Eu era mesmo a mocinha boba, porque a fala,


nesse momento, tinha virado poeira e ido embora.
— Diga que sente o mesmo, Diana. Quero
ouvir de você, olhando nos meus olhos. Diga que
também tem que lutar a cada segundo, para não
pular sobre mim e dar vasão a seu desejo.
— Nem tudo que quero, eu posso fazer.
— Isso, podemos fazer. Somos desimpedidos.
Esqueça de tudo, de qualquer empecilho e vamos
apenas matar o desejo. Esqueça até nossa rixa — eu
estava prestes a contestar, mesmo não querendo.
Então Benjamin puxou minha nuca e travou nossos
lábios em um beijo de língua sufocante e, ao
mesmo tempo, libertador. E eu cedi, naquele
momento, uma vez que a vontade de continuar
beijando-o era maior do que qualquer outro
sentimento em relação a ele.
Que se danasse o resto. Meu corpo, febril de
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desejo, ignorou qualquer alerta. Me acomodei sobre


suas pernas, sentindo-o, embaixo, duro e vigoroso.
Solucei de prazer quando Benjamin deixou minha
boca e chupou meu seio por cima do tecido fino e
molhado do baby-doll. Eu queria a boca dele na
minha pele, na verdade, não só sua boca, eu queria
sentir seus músculos enrijecidos, o calor do seu
corpo grande e molhado. Eu desejava degustar esse
homem aos poucos, entretanto, nosso furor não
permitia tanta paciência.
— Venha para cama, comigo — ele
praticamente implorou e nem esperou uma
resposta.
Ele saiu da banheira pronto a me ajudar a sair
também, e só então pude vê-lo totalmente despido,
no auge de sua virilidade. Músculos na medida
certa, abdômen trincado e um peitoral admirável,
coberto por tatuagens. E lá estava a parte que

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sempre me deu curiosidade. Olhei para baixo e


soltei um gemido ao ver como estava esticado e
grosso de tesão e, na ponta da glande, um reluzente
piercing!
Eu já tinha ouvido falar sobre como era
delirante sentir a sensação de um pau com piercing,
mas, nunca tive o prazer de experimentar um. O
dele era uma argolinha que perfurava a glande e
saía pelo buraquinho do pênis.
— Está surpresa?
— E olha que um pau nunca me impressionou
tanto — falei e o segurei acariciando-o. Eu
ajoelhada dentro da banheira, e ele, de pé, bem
pertinho do meu rosto. Benjamin me assistia com a
respiração suspensa, até que eu me abaixei e lambi
a cabeça e usei minha língua para brincar com a
argolinha de metal. Ele soltou o ar em forma de
gemido, e foi bom constatar que ele era igual a

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qualquer outro homem: fraquejava com uma


simples lambida.
Ele era, ao mesmo tempo, macio e muito
duro, e foi, de longe, um dos melhores que já
encontrei nessa vida libertina. Deixei minha boca
deslizar até o final, permitindo-o chegar à minha
garganta. Benjamin gemeu rouco e afundou as
mãos nos meus cabelos.
— Ah... Que boca macia, porra — sussurrou,
segurando no pau e passando-o nos meus lábios. Eu
o olhava a todo instante, era disso que eles
gostavam, era assim que apreendi com o tempo.
Quando desci a língua ao longo de seu pau e
chupei o saco, puxando-o entre meus lábios,
Benjamin quase subiu pelas paredes do banheiro.
— Puta que pariu, mermão! Que delícia!
Eu ri satisfeita. Saí da banheira notando que
ele estava levemente trêmulo. Sob seu olhar
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luxurioso, tirei meu baby-doll e deixei que ele


tocasse em um de meus seios. Sua mão acariciou
em volta, e o polegar desceu pelo meu ventre,
tecendo uma linha imaginaria até chegar na minha
virilha. Ele engoliu em seco e me puxou de leve,
para mais perto de seu corpo. Me apoiei em seus
ombros, e cravamos nossos olhares, enquanto a
mão dele entrava de modo sutil e suave no meio de
minhas pernas, me encontrando tão quente e
latejante, que eu era capaz de chegar ao orgasmo
apenas com um toque.
No mesmo momento em que ele fazia a
melhor massagem sacana e lenta na minha vagina,
ele observava minha expressão sem pestanejar. Eu
lambi seu peito, mordendo o piercing no mamilo,
cheguei ao ombro rijo e mordi ali também. Um
dedo entrou em mim, e eu soltei um soluço,
mordendo o pescoço dele. A carícia se aprofundou,

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seu dedo curvou-se lá dentro e o polegar tocou meu


clitóris, e eu chupei seu pescoço ainda gemendo.
Eu estava entregue em seus braços, e o próprio
Benjamin tremia com as carícias de minha boca em
sua pele, enquanto tocava em meu sexo com seus
dedos.
Ele era surpreendentemente ágil em conseguir
me fazer chegar ao orgasmo apenas massageando
lentamente a minha vagina. Ainda tremendo pelo
impacto do gozo, ele me levou para a cama, abriu a
gaveta ao lado da cabeceira e pegou um
preservativo.
Tomei-o da mão dele e fiz um gesto para ele
se deitar recostado nos travesseiros. Ele me
obedeceu e, quase sem ar, me observou.
Abri o pacotinho e deslizei a camisinha
protegendo-o.
— Segura aí, garotão — falei. — A titia vai te
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ensinar bons modos. — Me acomodei sobre ele.


Senti a pressão inicial e, quando deslizei para
baixo, recebi uma descarga deliciosa de excitação.
Ele era do tamanho perfeito, e o piercing, mesmo
coberto pela camisinha, gerou uma sensação
diferente. Benjamin segurou minha cintura, fechou
os olhos e flexionou as pernas, chegando o mais
fundo possível.
— Ohh! — gemi. Foi inevitável. Quase chorei
de prazer, pois, em todos esses anos de minha vida
promíscua, essa era a primeira vez que, de verdade,
eu sentia algo formidável. Ele me olhou ofegante,
e, nesse momento, foi como se esquecêssemos
quem éramos um para o outro, nada importava, o
sexo nos consumia.
Empurrei a cabeça dele para trás e lambi seu
pescoço, cheguei ao queixo e o mordi, sem parar de
me mover ritmicamente para cima e para baixo, em

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movimentos acelerados e ruidosos, provocados


pelo choque de nossos corpos suados.
Quando voltei para a sua boca, nos miramos
compenetrados por milésimos de segundos, então
o beijei. Seus braços envolveram as minhas costas,
aplicando uma força perfeita que nos mantinha
grudados ao outro. Ele segurou minha garganta
com uma mão, com a outra empurrou meu rosto
para trás e, com urgência, procurou meus seios com
a boca, para chupá-los, um de cada vez, sem pressa,
interrompendo apenas para gemer com a minha
destreza em cavalgá-lo.
Rebolei sensualmente, girando levemente o
pau dele e sugando-o com a ajuda dos músculos
vaginais. Isso foi demais para Benjamin, ele não
aguentou.
— Não para, vou gozar! — exclamou me
apertando muito forte com seus braços musculosos

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e bem quentes. — Porra!!


Era delicioso montar em um homem tão
gostoso como ele.
Mas o gozo não veio. Eu levei a mão por
baixo, agarrei suas bolas e as puxei de leve o
suficiente para não doer e forte o bastante para
impedi-lo.
— Caralhooo! Por que fez isso?
Levantei de cima dele e cai deitada na cama.
— Venha aqui — chamei.
— O que está pensando...? — Olhou para o
pau, sem acreditar que eu tinha acabado de
interromper sua gozada.
— Ah, cala a boca e não questione. Apenas
venha. — Puxei seu braço.
Benjamin me olhava com gula sexual, então
preferiu me obedecer. Enroscou suas pernas nas
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minhas, puxou meus braços e os prendeu acima da


minha cabeça e sorriu desafiador, olhando dentro
dos meus olhos.
— Quer experimentar o meu poder de fogo?
— Dê o seu melhor — murmurei como pude,
pois minha voz estava embargada de excitação. Eu
quis tocar em seu corpo com urgência, no momento
em que Benjamin aprofundou-se duro e forte dentro
de mim, em uma única estocada. Elevei a pélvis e
me contorci com a sua grossura em meu interior
apertado. Gememos alucinados, e ele continuava
me segurando, indo aos poucos assumindo um
ritmo mais rápido, quase bruto. A pele tatuada me
atraía absurdamente e seu cheiro era muito bom.
Benjamin acariciou meu rosto, correu os
dedos pela minha bochecha e orelha e, quando
chegou na nuca, puxou meus cabelos levando
minha boca até a dele. Minhas mãos, enfim livres,

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arrastaram-se pelo seu corpo em quase devoção.


Os movimentos pesados de sua pélvis me
deixaram sem ar, vendo uma constelação ao meu
redor. A cada estocada um poderoso orgasmo
revivia. Estávamos em sintonia, usufruindo de cada
pedacinho do corpo do outro, gozamos quase
juntos. Dessa vez, eu fui primeiro. E foi a coisa
mais deliciosa em anos. Eu cheguei, de verdade, a
um orgasmo, agarrada ensandecida por um cara
gostoso que tinha um beijo incrível e a pegada
viciante.
Quando Benjamin rolou para o lado e desabou
sobre os travesseiros, eu me sentei na cama e me
levantei, sem me dar ao luxo de me recobrar dos
batimentos cardíacos acelerados, deitada ao lado
dele.
— Está tudo bem? — questionou.
— Sim. Não se preocupe, pois não irei fugir
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arrependida como uma boba. — No banheiro,


peguei uma toalha e assim que voltei para o quarto
com ela ao redor do meu corpo, ele saía do closet,
apenas de cueca.
— Já vai?
— Vou verificar Maya...
— Venha na sala depois, vou preparar uma
bebida.
Eu desci, tomei uma ducha e vesti um
moletom. Tranquei em minha mente todas as
comportas da represa de culpa e ressentimento que
poderia vazar em forma de agonia. Eu não queria
pensar em prós e contras. Saí do quarto e encontrei
Benjamin me esperando, sentado no sofá, de cabeça
baixa. Na mesinha à sua frente, dois copos de
alguma bebida. Me sentei ao seu lado e peguei um
copo.
— Tudo bem? — Eu percebi que ele também
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estava remoendo o que acabamos de fazer.


— Não fomos precipitados — ele afirmou,
como se quisesse se tranquilizar.
— É, não fomos. — Sorvi um gole, e foi
refrescante sentir a bebida gelada. — Eu queria
transar com você — falei. — Era um desejo mútuo.
— Como ficamos agora? — Só então me
olhou, e agradeci por não ver ressentimento em
seus olhos. Assim como eu, ele não se arrependia
do sexo. Dei de ombros e continuei bebendo.
— O que acha de desafetos que transam? —
opinei.
— Quer voltar a trepar comigo?
— Escuta, cara. Eu já tenho quase quarenta
anos e certeza sobre minhas escolhas é algo que
sempre tenho. Você me atrai, mais do que eu
gostaria, mas atrai. E sou adulta o suficiente para

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dizer que sim, acabamos de começar.


Ele riu e, depois de respirar aliviado, pegou o
copo dele.
— Isso não muda nada sobre o que eu penso
sobre você.
— A recíproca é verdadeira. Eu não acredito
que irei dizer isso, mas porque não subimos
novamente para seu quarto?
Ele riu, beijou minha boca puxando meu lábio
inferior com os dentes. Já estávamos pegando fogo
novamente. Levantamos e corremos rumo à escada.

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26
BENJAMIN

Enquanto corria pela rua, às seis da manhã,


me lembrava da noite quente que vivi com Diana.
Transamos mais duas vezes pela madrugada
adentro, até que às três e meia da manhã, ela foi
dormir cambaleando de cansaço.
Quais foram as minhas considerações por ter
trepado com a irmã de Dani?
Sinceramente? Nenhuma.
Eu não tinha contato com Dani e Diana há
mais de cinco anos. Apesar da culpa que me corroía
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pelo o que aconteceu com ela, eu não tinha mais a


mesma ligação. Eu me flagrei sorrindo no escuro ao
ir dormir, depois que Diana desceu. Pela primeira
vez em anos, eu estava feliz de verdade e, de uma
forma assustadora, me sentia realizado. Minha filha
dormindo no andar de baixo, cada vez mais
receptiva a mim em sua vida, e Diana tinha se
tornando uma presença tão forte que conseguia se
sobrepor às minhas loucuras. Eu jamais me sentirei
culpado por gostar tanto de uma experiência como
a dessa noite.
Voltei para casa e quando entrei, vi a
televisão ligada. No sofá, Maya estava encolhida,
abraçada a um bichinho de pelúcia, assistindo
desenho animado.
— Minha princesa, já acordada a essa hora?
— Eu estou com fome.
— O que acha de ir comigo na padaria?
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— Oba! Eu quero. — Ela pulou do sofá.


— Certo. Vá vestir um casaco e calce uma
sandália. — Observei Maya ir para o quarto e subi
para o meu. Tomei uma chuveirada rápida e me
vesti. Quando voltei, ela já subia as escadas para ir
ao meu encontro.
Segurando na mão dela, saímos do prédio e
nos dirigimos até uma boa padaria. Maya estava
encantada e queria um pouco de cada coisa e foi a
atração no local naquela hora da manhã. Sendo uma
criança tão carismática, conversou com uma
atendente e me explicou sobre como odiava
cenouras, mas amava bolo de cenoura com calda de
chocolate. Saímos de lá carregados de compras, e
quando chegamos, fiz leite com Toddy para nós
dois.
Diana veio do quarto com a cara de sono e
olhou para as sacolas no balcão.

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— Minha filha, para que acordar tão cedo? —


Beijou os cabelos de Maya.
— Eu fui na padaria com meu pai. E
compramos pãos de queijo.
— Se fala pães. Cuidado para não derramar o
leite.
— Bom dia. — Cumprimentei, e só então
Diana olhou para mim. Ela não estava me evitando,
era mais como uma cumplicidade, como parceiros
que guardam um segredo indiscreto.
— Bom dia.
— Dormiu bem?
— Sabe que sim. — Ela deu um sorrisinho e
foi colocar água no fogo para fazer chá. — Não vai
trabalhar hoje?
— Quer me ver fora da casa?
— Sim. — Preparou o saquinho de chá na
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xícara e se apoiou na bancada ao lado do fogão, me


fitando de braços cruzados. — Para que eu não caia
em tentação.
Dei uma risada. Olhei de lado e vi que Maya
tinha ido assistir TV. Dei a volta no balcão e fui pra
perto de Diana. Apoiei na bancada um braço de
cada lado do corpo dela, mantendo-a presa bem
perto de mim.
— Qual o grau de tentação que eu provoco?
— Alto — sussurrou, sem desviar os olhos
dos meus.
— Alto quanto?
— Ao ponto de me deixar depravada. —
Sorriu.
— Depravada quanto?
— Estamos no Natal?
— Não. Por quê?
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— E esse peru enorme aqui? — Sutilmente,


acariciou meu pau por cima da minha calça.
Gargalhei, e, sem rir, Diana concluiu: — Esse
é o nível de depravação.
— Isso foi tosco pra cacete — sussurrei.
— É, eu sei.
Eu estava prestes a diminuir a distância
mínima que nos separava, quando ouvi Maya atrás
de mim.
— Mamãe, não quero mais. — Estendeu o
copo de leite, mas sua atenção estava na posição
em que eu me encontrava, cercando Diana. Eu saí
rápido de perto de Diana, e ela foi dar atenção a
Maya.
— Bom, vou me vestir para o trabalho. O que
acha de irmos hoje ao cinema? Nós três?
— Sim! — Maya gritou, e Diana apenas deu

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de ombros.
— Eu preciso ir à boate. — Ouvir isso me
deixou incomodado. Me virei para ela.
— Não acho uma boa ideia você ir.
— É o meu trabalho.
— Falaremos sobre isso mais tarde. —
Afaguei os cabelos de Maya e sai da cozinha. Eu
teria que pensar em algo para persuadi-la a não ir
mais à noite na boate, só não sabia como faria isso.
algo gritava dentro de mim para manter Diana
afastada daquele lugar e daquele cara.

***

Eu nem sei ao certo porque fui trabalhar.


Minha vontade era de ficar em casa aproveitando a
companhia de Maya e Diana. Me sentia como um
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garotinho que acabava de aprender a andar de


bicicleta, não queria mais largar.
Na minha sala, adiantei boa parte do meu
serviço e ainda fui tolerante com Miguel, que veio
falar merda sobre eu ter errado alguns cálculos de
venda, e agora Fernando estava com problemas
para liberar um carregamento de leite. Eu até sorri
pensativo, enquanto Miguel gesticulava à minha
frente sobre meu trabalho mal feito.
Depois, levantei-me, abri a porta e o
empurrei.
— Vai consertar o que aprontou? — ele
perguntou nitidamente incomodado.
— Sai, sai. Fora. Suma. — Coloquei-o para
fora e bati a porta. Sorrindo, voltei para minha
mesa. Mas minha felicidade durou pouquíssimo. A
secretária da presidência me interfonou, dizendo
que meu pai queria falar comigo. Vesti o terno,
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peguei celular e fui conferir o que, dessa vez, o


velho ia me apontar. Não duvidava muito que
Miguel já tivesse ido me delatar.
Quando cheguei à sala que agora era ocupada
por Andrey, encontrei o nosso pai sentado em uma
poltrona, segurando a bengala. A expressão não
muito boa. Andrey me alertou que a coisa não
estava boa, dizendo: “O velho tá brabo” e saiu da
sala me deixando a sós com ele.
— Pai, queria falar comigo?
— Me explique isso. — Jogou na mesinha
uma foto. Caminhei até lá, peguei e engoli em seco
ao ver uma foto de Diana entrando no meu prédio.
Eu poderia enrolar e dizer que não tinha nada a ver,
que era uma coincidência, mas vi a brecha, naquele
momento, para contar a ele, de uma vez por todas,
sobre minha filha. Era melhor que ele soubesse por
mim. Hoje era uma foto de Diana, depois poderia

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chegar a ele uma foto de Maya.


Puxei uma poltrona e me sentei em frente do
sofá que meu pai ocupava.
Apesar de ter oitenta anos, era um homem
forte e carrancudo.
— O que é, Benjamin? Que cara é essa? —
Ele sempre começava na defensiva, quando
conversava comigo. — Eu só quero saber o que
essa mulher estava fazendo no seu prédio.
— Pai, eu queria ser o primeiro a te
comunicar isso. — Torci os dedos, sem querer fitá-
lo. — A Diana é irmã da garota que namorei,
lembra? — Meu pai se tensionou no mesmo
instante, o que achei estranho. Eu julgava que ele
nem lembrasse mais dela. Sua expressão fechou e
assumiu um tom agressivo.
— O que tem ela?

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— Ela está morta, pai. Morreu há cinco


anos...
Ele não pareceu se abalar. Na verdade, não
demostrou nenhuma reação.
— Deus escreve certo por linhas tortas. —
Para mim, considerei que essa fala foi como se ele
tivesse falado: “Ainda bem que ela morreu”.
Relevei, não estava aqui para discutir. Só queria
comunicá-lo qual era minha nova prioridade e
vazar para minha casa.
— Acontece, pai, que Dani deixou um
presente para mim. Algo que é tão belo e que eu
não merecia por ter sido cruel... por ter duvidado
dela.
— Do que está falando, rapaz?
— Ela morreu no parto... da nossa filha. Hoje
a menina tem cinco anos.

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Meu pai me olhou por alguns segundos, sem


surpresa, como eu esperava. Depois pegou a
bengala e ficou de pé, passando por mim e quase
me empurrando. Andou pela sala, mancando, foi
até as imensas janelas e depois resmungou:
— Onde ela está?
— Está no meu apartamento, com a irmã de
Dani, que é tutora legal da minha filha.
Ele se voltou para mim, estava indignado.
Seus lábios se retorciam em uma fina linha.
— Quero que você se afaste dessa mulher,
pode ser um golpe.
Lembrei na hora do que Diana disse. Que
Maya seria rotulada como fruto de um golpe.
Engoli em seco, porque eu odiava imaginar que
meu pai pudesse fazer isso.
— Não é. Tenho certeza, é minha filha.

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— Fez algum exame? — Elevou a


sobrancelha em sinal de desaprovação.
— Não.
— Então não tem certeza.
— Eu tenho sim...
— Dê uma quantia a ela e a mande embora.
Essa mulher só quer dinheiro.
— O quê? — Fiquei de pé. — O senhor não
me entendeu, é minha filha. Uma Capello.
— Você vai se afastar dessa mulher! —
berrou e acertou uma bengalada em um vaso na
mesa. Meus dedos se fecharam em punho. — Você
não vai me fazer essa desfeita — começou a ofegar.
— E se envolver com esse tipo de gente pela
segunda vez. — Veio caminhando até mim. — Eu
já estou sabendo da menina. Você não sabe da
missa um terço, não sabe do que essa família é

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capaz. Não quero você se misturando com essa


gente. Ela é uma bastarda, meu filho...
— Ela não é uma bastarda! — aumentei o tom
de voz, controlando a raiva que me tomava aos
poucos. — Ela tem pai e mãe.
— Ah, rá! — Ele riu. — Um pai. Você é o
pai, certo? E precisa do dinheiro de quem, para
sobreviver? Meu dinheiro! — Bateu no peito. —
Você não tem onde cair morto e quer ser pai de
alguém? Vai tomar juízo e deixe esse assunto
enterrado.
Levantei o queixo e engoli toda a raiva que
chegou ao ápice. Eu jurei a todos meus irmãos que
não voltaria a bater boca com ele. Da última vez,
foi quando ele confessou o que fez com Dani. Isso
não iria acontecer de novo. Eu estava em um nível
superior e não iria cair nas provocações dele.
— Não vim te pedir opinião, vim apenas
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comunicar. Eu tenho uma filha e com ou sem o seu


dinheiro, não virarei as costas para ela. — Me virei
e caminhei para a porta, mas parei quando ele
falou:
— Olha só para você. — Caminhou
mancando até mim e puxou meu colarinho vendo
um pedaço da minha tatuagem. — Olha que
vergonha que eu sinto. Meu caçula, aquele que
deveria estar ao meu lado, que deveria ser meu
espelho, está cada dia mais se tornando um
desajustado... como sua mãe.
Isso era demais para aguentar. Senti minha
respiração acelerar junto com as batidas cardíacas.
— Você não tem o direito de falar dela.
— Não me chame de “você” — gritou
nervoso. — Vai defender também a mulher que
quase acabou com sua vida e dos seus irmãos? Olha
para a Stela e Thadeo hoje, tudo que eles passam
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até os dias de hoje, por causa dela.


— Não foi! — berrei. — Não foi assim.
— Não? — Riu ironicamente. — E como foi?
Como foi que ela deixou que aquele filho da puta
tocasse nos meus filhos? Não foi culpa dela?
— INFERNOOOO! — rugi surtado, fora de
mim. Havia lágrimas nos meus olhos. Fui para
cima da mesa, derrubei tudo no chão, derrubei as
poltronas, e meu pai se manteve parado no mesmo
lugar, com ódio expresso na face. A porta se abriu
e Andrey entrou com Miguel. Eu estava
desmoronando, eu estava deixando escapar a parte
feia de mim.
Cerrei os olhos, mal conseguia respirar de
raiva. Ouvi Andrey me chamar, parecia longe a sua
voz. Fui em direção a meu pai, mas me detive no
último instante. Empurrei Andrey e saí correndo da
sala.
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Minha cabeça fodida, imagens desconexas


voltando com brusquidão. Os gritos de pânico de
Stela, ainda criança, estavam voltando. Mãos me
arrastando e me prendendo em um baú. Lá dentro...
muito escuro e apertado. Sem ar, me sufocando aos
poucos. E minha irmã gritava sem que eu pudesse
ajudá-la. Minha mãe não reagia por mais que eu
gritasse. Por que ela não nos ajudava? Não havia
brilho nos olhos dela, caída no sofá.
Eu bati tanto no baú, que meu pulso quebrou.
E quando eu o abri finalmente, vi aquela cena...
Dirigindo como um louco, eu temi bater o
carro. As imagens em minha mente eram terríveis.
Meu irmão no chão... Havia muito sangue em seu
rosto. Stela no canto do cômodo encolhida...
Passei no sinal vermelho, vagamente pude
ouvir buzinas e vagamente ouvi uma chamada no
painel do carro. Era o nome de Stela. Ela sabia que

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eu não estava bem, e provavelmente já sabia que


nosso pai conseguira foder com o restinho de
minha sanidade.

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27
DIANA

Eu fui à boate depois do almoço, apenas para


me manter informada com tudo por lá. Almir estava
mesmo colocando em prática seu plano de
transformar o lugar em um bordel. E eu me flagrei
totalmente desanimada de continuar nessa
infindável quebra de braço com ele.
Enquanto dirigia de volta para casa, pensava
sobre o momento atual de minha vida. Meu
relacionamento com Benjamin tinha mudado de
patamar, e eu ainda não conseguia criar uma
opinião sincera sobre isso. Eu tinha feito uma

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escolha e não me arrependia. Mas até onde


poderíamos chegar? Essas reflexões enchiam meu
peito de inseguranças.
Passei antes no meu apartamento para pegar
algumas coisas e assim que cheguei ao apartamento
de Benjamin, notei que tínhamos visita. Stela, irmã
de Benjamin. De todos os Capellos, acho que Stela
é a mais humana. O resto me causava tremores só
em pensar. Eram três homens adultos que me
faziam sentir temor, porque eu nunca sabia do que
eles eram capazes.
— Oi, tudo bem? — Veio até mim. — Sou
Stela, irmã de Benjamin.
— Oi, Stela. Sou a Diana.
— Acabei de conhecer minha sobrinha — ela
disse — É um amor. Benji tem muita sorte.
Eu apenas assenti, mantendo meu olhar
analítico, curiosa para saber o que ela estava
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fazendo aqui, na ausência do irmão.


Ela me relatou que o irmão tinha tido uma
briga feia com o pai e que saiu desorientado da
empresa e que, até aquele momento, não tinham
conseguido localizá-lo
— Ele simplesmente não atende minhas
ligações — Stela confidenciou com o semblante
preocupado. Segurava à mão um copo de água que
eu providenciei e vi que tremia de leve. — Andrey
ligou para mim, pedindo para eu falar com ele, pois
eu poderia acalmá-lo, mas desde a hora do almoço
que não consigo.
— Será que ele não está vindo para cá? —
Olhei para a sala e Maya assistia TV na companhia
de Amanda. — Ou talvez tenha se refugiado na
casa de um amigo?
— Benjamin não é assim. Quando ele tem um
problema, a primeira pessoa que ele procura sou eu.
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— O estúdio de pintura — opinei.


— Você sabe do ateliê dele? — Ela estava
boquiaberta.
— Sim, ele me mostrou... Você já verificou?
— Sim, foi o primeiro lugar que fui.
— Ele não tem algum conhecido...? — Tentei
ajudar — O irmão que mora na roça.
Ela sorriu. — Não é roça, é uma fazenda, aqui
perto. Já liguei para Fernando, e o Benji não está lá.
— Ela deixou o copo sobre a bancada. — Tem uma
garota... A Alana. Às vezes eles saem juntos.
Putz. Isso eu não gostei de ouvir. Eu já sabia
que o malandro conhecia mais bocetas que sabores
de sorvete. Todavia, escutar que tinha uma amiga,
entre aspas, fixa, me deixou estranhamente irritada.
— Qualquer coisa, me ligue se ele aparecer.
— Caminhei até a porta com Stela.

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— Ligo, sim. — Ela deixou o número de


celular e foi embora. Olhei para o cartão, e o
preguei na geladeira com um imã e fui para a sala.
— A tia Stela vai encontrar o papai? — Maya
questionou, demonstrando que prestara atenção à
nossa conversa.
— Tia Stela? Conheceu agora e já está
chamando de tia?
— Mas ela disse que é minha tia. — Confusa,
me encarou esperando resposta.
— Sim, é.
— Então, tenho que chamar ela de quê?
— De tia, mesmo. Volte a assistir TV. — Eu
não iria discutir com uma criança. Maya já estava
totalmente a par de sua nova família paterna. No
fundo, eu tinha medo do que ela enfrentaria nessa
família. Stela foi gentil e muito carismática, mas e

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o resto? Os irmãos e o pai de Benjamin eram minha


preocupação. Eu mataria um se a humilhasse.
Amanda levantou-se para ir embora, e eu a
levei até a porta.
— Estranho, não acha? — murmurou. —
Benjamin sumir assim...
— Pois é. Depois quero conversar com você.
Passo em sua casa.
— É fofoca?
— Mais ou menos. — Olhei para a sala
verificando se Maya estava ouvindo e sussurrei: —
Transei com ele.
— Mentira! — Arregalou os olhos — Diana,
sua louca! Está se envolvendo com o cara que você
queria distância?
— Vai me julgar, agora?
— Claro que não. Um gato daquele, quem
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não cederia? Agora eu quero saber tudo!


— Passo depois em sua casa. Até mais.
Ela foi embora, e eu voltei para a sala e sentei
ao lado de Maya. Ajeitei seus cabelos, em seguida
beijei o alto da cabeça.
— O que acha de escolhermos uma roupa
fashion para irmos ao cinema hoje? Daqui a pouco
o Benjamin chega. — Maya não se mostrou tão
eufórica como achei que ficaria, estava pensativa.
Na verdade, estava calada desde cedo. Nem pegou
as bonecas para brincar.
— Não ficou feliz, meu bem?
— Um pouco. — Seu semblante preocupado
me encarou. — E se a mamãe Dani estiver lá? —
Senti o impacto das palavras dela. O susto me
pegou desprevenida.
— Como assim, Maya? Mamãe Dani é uma

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estrelinha no céu.
— Às vezes eu tenho um pouco de medo dela.
Mas só um pouquinho.
— Ah, meu bem! Não diga isso. — Puxei
Maya para meus braços, me perguntando por que
esse repentino medo, sendo que Maya sempre
adorou ver as fotos de Dani. — Ela é um anjinho
para você. Por que diz isso?
— Ela fica me olhando de longe e não fala
nada.
Agora sim, quase tive um treco. Afastei Maya
dos meus braços e a encarei. Até olhei para os lados
na sala, achando que ela estava vendo coisas.
— O quê? Como assim, Maya? Você a viu
enquanto estava dormindo, no sonho?
— Não. — Abaixou a cabeça, como se tivesse
feito uma travessura. — Às vezes é na rua... E hoje

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quando fui na padaria com o papai Beijamin, ela


estava lá do outro lado da rua, olhando para a
gente. E se ela quiser me levar, mamãe? Eu não
quero ir para o céu com ela.
Incrédula, fiquei paralisada encarando Maya,
assistindo um palpável temor em seus olhos. Ela
não estava inventando, ela tinha certeza do que
falava. Puxei-a para meus braços. Eu mesma me vi
tremendo ao escutar isso.
— Esqueça isso, você acha que viu, mas a
mamãe Dani não vai vir aqui. Ela não vai te buscar.
— Você promete?
— Sim, querida. Eu prometo.

***

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Já tinha passado das onze da noite e eu ainda


não tinha notícias de Benjamin. Comecei a andar
pela casa aflita. Pensando o que poderia ter causado
a tal briga e até que ponto isso mexeu com
Benjamin. Maya ainda não tinha ido dormir, apesar
de minhas tentativas.
Procurei não pensar no que ela tinha me
contado sobre Dani. Era uma fantasia infantil, não
tinha nem cabimento, e eu não ia perder meu tempo
me preocupando com isso.
— O papai disse que ia me levar ao cinema.
— Deitada com a cabeça em meu colo, no sofá. —
Ele precisa voltar logo.
Sorri, acariciando os cabelos dela. Ela estava
preocupada com seu passeio.
— Ele fez uma rápida viagem. Daqui a pouco
volta. — E, pela primeira, vez eu desejava ver as
fuças do infeliz e constatar que estava tudo bem.
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Até fiz uma prece para que ele estivesse mesmo


bem.
— Mas a tia Stela disse que ele sumiu.
— Seu pai é adulto, e adultos não somem. —
Nesse momento, a campainha tocou, e eu me
levantei igual a um foguete. Poderia ser ele. Talvez
tivesse perdido a chave. Mas não era, para minha
decepção.
Era Stela novamente e, dessa vez,
acompanhada de dois homens. Um deles era
Andrey, irmão mais velho de Benjamin. O outro
parecia ser o marido de Stela. Maya se levantou e
ficou ao meu lado observando os visitantes.
— Diana — Stela falou. — Esses são Andrey,
meu irmão, e Miguel, meu marido. — Voltou-se
para eles e apresentou: — Essa é Diana, mãe da
Maya. Nossa sobrinha.
Andrey curvou-se em direção a Maya. Era
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impressionante como o primogênito dos Capellos


era tão bonito. O velho filho da puta tinha
caprichado em cada um deles.
— Oi, pequena, sou Andrey irmão do seu pai
— ele se apresentou a Maya.
Maya olhou para mim, mas não ficou tímida.
Semicerrou os olhinhos.
— Você não se parece muito com meu pai.
Ele riu e fez um cafune na cabeça dela.
Andrey me direcionou um olhar mordaz, e Stela foi
direto ao ponto.
— Diana... Você não tem ideia para onde ele
possa ter ido? — Ela olhou para Maya que nos
observava atentamente. Entendi que não era
conversa para criança.
— Filha, por que você não vai até nosso
quarto ver se meu celular está lá?

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— Vocês estão querendo falar coisas que eu


não posso ouvir.
— Ainda bem que você percebeu. Vá
depressa. — Ela abaixou os ombros e me obedeceu
prontamente.
— E o que você ainda está fazendo aqui? —
Andrey foi mais taxativo e desconfiado assim que
Maya deixou a sala.
— Eu estou na casa do pai da minha filha. —
O enfrentei. — Por quê? Está achando que eu fiz
algo com ele?
— Não confio em você. Acho que posso
esperar qualquer coisa vindo da mulher que
escondeu a filha dele.
— Se pode esperar qualquer coisa de mim,
então mantenha essa boca fechava antes que eu, no
auge de minha maldade, lhe dê um soco.

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— Você é muito...
— Andrey, foco — Stela interveio — Vamos
focar no importante.
Ele assentiu, mas manteve a pose agressiva,
me encarando como se fosse me chamar para briga.
— Ok. Eu posso ver... — comecei a falar,
lembrando-me de um lugar onde eu sabia que ele ia
com frequência, escondido da família. — Tudo
bem. Há um lugar que talvez ele esteja lá. Vocês...
ou melhor — Olhei para Stela. — você, poderia
levar Maya para sua casa, enquanto eu vou até lá?
— Eu irei com você — Andrey propôs.
— Não. Farei minha busca sozinha. Se ele
está fugindo de vocês, é porque não quer papo com
a família.
Eu fui até o quarto, arrumei uma mochilinha
para Maya e sentei na cama com ela.

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— Meu bem, a mamãe está indo buscar o


Benjamin.
— Eu posso ir? Quero ver ele.
— Não. Você vai para a casa da tia Stela, o
que acha? Até eu voltar.
— Mas, mamãe...
— Maya, será rápido, e a mamãe precisa que
você entenda. Você vai conhecer seus primos.
— E se eles forem chatos?
Ignora eles.
— Não são. A tia Stela disse que eles são
legais. — Coloquei a mochilinha nas costas dela e
segurei em sua mão. — Não vai aprontar na casa
dos outros. Promete?
— Prometo.
Entreguei Maya para Stela, e assim que
saíram, vesti um jeans, uma jaqueta e peguei uma
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bolsa de couro estilo mochila. Amarrei os cabelos


em um rabo de cavalo e liguei para um dos
seguranças da boate vir me buscar. Eu não ia me
arriscar sozinha naquele fim de mundo.

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28
BENJAMIN

— Você não pode simplesmente fugir quando


tem um problema. — Tucano continuou me
importunando, e eu revirei os olhos.
— Se eu quisesse a porra de um conselho,
teria ficado lá. Eu entro na luta.
— Que se foda, então. Já que quer... — Ele
me deixou na ala de treinamento e foi embora com
a sua prancheta debaixo do braço. Enrolei os
punhos com uma faixa, enquanto relembrava do
vexame na empresa mais cedo. Meu pai, mais uma
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vez, tinha extrapolado e me feito perder a cabeça.


Meus irmãos sempre me culpavam e, para não
aturar a conversa que viria de cada um deles, achei
melhor me afastar.
Não sei ainda que merda de rumo vou tomar
na vida. Ou se continuo no inferno que já passo
cotidianamente.
— Leiteiro. — Um dos homens espiou. —
Pro ringue. Tucano está puto. — Ele ficava puto
por eu não querer a merda de conselhos que eu
poderia pegar de graça em qualquer esquina.
Sempre a mesma coisa: “Sua família vai se
preocupar, você não pode simplesmente fugir, você
tem que ser mais responsável.”
Sou adulto e se eu quiser fugir, é isso que irei
fazer. Cacete.
Fiquei lá na roda esperando a minha vez. Eu
iria despejar minha raiva toda na cara do infeliz que
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entraria comigo na roda. Tucano sabia disso e me


dirigia um olhar de desaprovação. Ele não queria
que eu viesse descontar nos rapazes as minhas
frustrações.
Quando entrei, já fui atacando. Sem estratégia
nem nada. Apenas um trator para cima do
adversário. Dei o primeiro soco, ele desviou do
segundo, me acertou um e ganhou mais dois e, em
seguida, uma joelhada. O cara cambaleou, eu o
agarrei. Bati mais, enquanto rugia de fúria. Ele se
safou, me acertou e, quando eu estava me
recuperando, vi uma mulher de braços cruzados,
balançando a cabeça em desaprovação.
— Diana? — indaguei e, no mesmo instante,
recebi um gancho de direita e caí. Que porra dos
infernos! Fui nocauteado e fiquei no chão, ouvindo
os caras gritando, Tucano querendo acabar comigo,
e Diana rindo feito uma bruxa.

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“Uma mulher.” — um cara falou, e todo


mundo olhou, constatando que não era ilusão
minha.
“Eita, porra! Uma mulher.”
“Que gostosa.”
“Ei gracinha, veio ser o prêmio da noite? Eu
ganhei.”
“Podemos dividir.”
Fiquei de pé e empurrei os caras.
— Sai pra lá, seus animais.
— Ihh. Olha lá. A mina é do Leiteiro, porra.
Os ignorei e me aproximei dela.
— Como conseguiu entrar? — fui logo
perguntando.
— Você acabou de ver uma demonstração de
como homem é tudo otário. — Apontou para os

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caras, todos de olho nela. — Não passam de uma


boiada. O cara que fica de segurança me deixou
passar, simplesmente.
— Quem é ela? — Tucano se aproximou. —
Como sabe desse lugar?
Eu entendia que ele poderia ferrar minhas
futuras participações, então teria que fazer uma
média.
— Fique tranquilo. É minha garota.
— Sua o quê? — Diana exclamou.
Passei o braço no ombro dela e a puxei para
longe, antes que colocasse tudo a perder. Levei-a
para a ala de treinamento que estava vazia e a
soltei.
— Que porra está fazendo aqui, Diana? Como
pode ser intrometida dessa forma? Onde está a
Maya?

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— Se você estivesse preocupado com ela, não


estaria aqui nessa espelunca — adquiriu um tom
autoritário. — Sua irmã está desesperada, me
implorou para te procurar e aqui estou. Fiz isso só
porque foi ela que pediu, se fosse aquele merda do
Andrey, você ficaria eternamente desaparecido.
Ela sorriu diante do meu choque. Eu sabia que
ela estava revoltada por precisar ter vindo atrás de
mim e não ter recebido notícias o dia inteiro.
— Andrey foi me procurar? Eu não estou
desaparecido.
— Você pode não acreditar, mas seus irmãos
parecem que gostam de você. E eles estão de
parabéns, pois é um grande sacrifício te suportar.
— Tinha esquecido que você é serpente.
— Vamos fazer o seguinte, que tal a gente ir
se insultar em um lugar menos fedido a macho
troglodita?
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Eu a encarei por segundos. De uma forma


estranha, Diana mexia muito comigo, aflorando
minhas emoções, mas, me deixava confortável ao
seu lado. Ela conhecia meu lado degenerado e não
me julgava como todos os outros faziam, porque
ela, incrivelmente, era igual a mim.
— Vou tomar uma chuveirada, me aguarde
aqui.
— Te espero lá fora.
Tomei um rápido banho, vesti o moletom que
costumava deixar no vestiário, peguei minhas
coisas, passei por Tucano e bati no ombro dele.
— Foi mal aí, cara. Depois te explico quem é
ela.
— Ainda bem que tem uma mulher para te
colocar nos eixos.
— Vai se foder!

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Diana me esperava lá fora, conversando de


boa com um homem enorme. Assim que me
aproximei, já de cenho franzido, querendo saber
quem era a peça, ela o dispensou.
— Obrigada pela carona, Leandro. Diga a
Almir que depois passo lá.
— Vai ficar por aqui?
— É. Vou embora com ele. — Apontou para
mim como se eu fosse um fardo. — Pode ir. — O
cara assentiu, entrou em um carro e partiu.
— Segurança da boate — esclareceu — E aí?
Tem lugar aberto por essas redondezas, para a
gente beber alguma coisa?
Não era uma má ideia. Ela era mesmo igual a
mim.
— Venha, sei de um lugar.
Andamos lado a lado na rua praticamente às

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escuras.
— A duas quadras daqui — expliquei.
— Por que fez isso? Por que desapareceu
deixando sua irmã tão preocupada?
— Meu pai tocou na porra do meu passado.
— E foi algo tão ruim assim?
— Demais. E você, ficou preocupada? —
Instantaneamente, a opinião dela era importante
para mim.
— Não deveria, mas fiquei.
— Meu pai já sabia de Maya. Por acaso, foi
você que contou?
Diana parou de andar e me olhou incrédula,
quase ofendida.
— Eu? Se eu não queria que você, que é o
pai, soubesse dela, iria contar justamente para ele,
por quê? Me desculpe dizer, mas seu pai não
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merece conhecer Maya. Outra pessoa deve ter


contado a ele.
E eu acreditava nela. Diana guardava muito
rancor do meu pai. Ela jamais jogaria Maya nesse
bolo, como moeda de troca. Jamais. Assenti,
voltamos a caminhar até chegarmos a uma casa.
Bati três vezes na porta, uma janelinha se abriu, e
uma voz perguntou:
— Quem é?
— Essa é a portinha do céu — falei, abri a
carteira, peguei o cartão de identificação, entreguei
,e só então a porta se abriu.
— Que merda é essa? — Diana cochichou.
— Um cassino clandestino.
— Legal. Se não for morto no clube de luta
clandestina, pode ser preso no cassino ilegal.
— Não enche.

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Ela parecia ocupada demais olhando o


ambiente, para me retrucar. O lugar era uma réplica
pobre de algum cassino de Las Vegas. Tinha os
caça-níqueis, a mesa de pôquer no andar de cima, a
mesa da roleta, um bar, e muita gente, bebendo,
falando alto, jogando, discutindo.
Diana me seguiu até o balcão do bar
superlotado. Empurrei um bêbado para o lado e
indiquei um banquinho para que ela sentasse. Ela
se sentou, e eu fiquei de pé ao seu lado. O barman
se aproximou da gente.
— O que vai beber?
— Pode me fazer um Long Island? — ela
pediu.
— O quê? Que bicho é esse, dona? — O
barman questionou confuso, dando indícios de que
não estava com saco para frescuras.
— Não dificulte. Pede uma cerveja gelada —
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falei.
— Meu paladar é refinado. Posso? —
perguntou ao barman apontando para o outro lado
do balcão.
Ele fez um gesto com a mão para que ela se
aproximasse.
— O que você está fazendo, Diana? — gritei,
mas, um segundo depois, ela já estava lá do outro
lado do balcão.
— Dois copos grandes, gelo, coca-cola, gim,
rum e limão. — Pediu, e imediatamente o barman a
atendeu. Deu a ela os copos. Diana jogou um pouco
de cada bebida alcoólica na coqueteleira com gelo,
empurrou-a para mim, para que eu a chacoalhasse,
e nos dois copos jogou coca-cola com rodelas de
limão. Tomou a coqueteleira da minha mão e
despejou o conteúdo nos copos com coca e limão.
Piscou para o barman, que a assistia pasmo, e
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voltou para meu lado.


— Minha filha, sendo criada por uma dona de
bordel que faz bico de barman.
— Com dignidade. Beba logo.
Provei a bebida, e estava mesmo deliciosa.
Apesar de ter várias bebidas alcoólicas, não estava
forte. Fiquei de costas para o balcão, olhando para
o salão cheio de gente, se divertindo ilegalmente.
— Costuma vir aqui? — Diana indagou.
— Sim.
— Jogar?
— Passar o tempo.
— Você gosta de transgredir, não é?
— Quê? — Olhei para ela.
— Gosta de frequentar lugares clandestinos.
Me pergunto se existem mais coisas que você

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esconde, principalmente do seu pai.


— Gosto disso — mostrei o salão ao redor
gesticulando — Liberdade, fazer qualquer coisa
que quiser. Gosto de desafiar.
— Eu também gosto. Não sou muito fã da
moral e dos bons costumes. Porque eu acho um
saco pessoas que vivem para cagar regras.
— É o que acho. — Olhei para ela, feliz por
ter encontrado alguém que partilhasse do mesmo
pensamento que o meu. — Alguns executivos que
eu conheço se dizem conservadores e defensores da
moral, mas traem as esposas, têm contas laranjas...
— Você, ao menos, é um imbecil às vezes e
mostra isso. Não tenta esconder.
— Eu posso retribuir seu elogio, mas, além de
imbecil, é também baixa e depravada.
Diana gargalhou, e eu me flagrei observando-

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a e gostando de vê-la sorrir. Mas que porra...


— Por que fugiu o dia todo? — questionou.
— E por que simplesmente não deu o
endereço Andrey, preferiu vir atrás de mim?
— Porque eu achei que seria divertido te
mostrar que eu sei dos seus passos. Quer tentar a
sorte na roleta?
Olhei incrédulo para ela, e Diana nem esperou
minha resposta. Bebeu todo o conteúdo do copo e
caminhou em direção à mesa, abrindo espaço entre
as pessoas.
— Compra umas fichas — ela pediu de modo
divertido, quando me coloquei ao seu lado. Não
contestei, achei uma ideia legal. Comprei algumas
fichas, e Diana as tomou da minha mão.
— Vou apostar no número dez, que é a data
de nascimento de Maya.

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— Ela é do dia dez?


— De janeiro, uma autêntica capricorniana.
— Diana fez um motinho de fichas e as tocou nos
meus lábios. — Beija, gato. Para dar sorte.
— Não deveria ser o contrário? Geralmente
os jogadores fazem as damas beijarem...
— Para de conversa e beija logo.
Revirei os olhos e beijei as fichas sob o olhar
crítico dos homens ao redor.
— Estão olhando o quê? As porras das fichas
são minhas e as beijo se quiser.
— Vai começar. — Ela puxou meu rosto. —
Deixa esse povo pra lá e presta atenção. — O
crupiê encerrou as apostas, girou a roleta e jogou a
bola dentro. Eu nem piscava olhando, assim como
todos à nossa volta. E quando a roleta parou de
girar, lá estava: número dez!

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— Puta que pariu! — Diana gritou surpresa,


virou-se para mim toda animada. — Viu só? Que
beijo de sorte, hein? — Gargalhei e recolhi todas as
fichas ganhas que o crupiê empurrou para mim.
— Alto lá! — um cara berrou. — Essa
vagabunda aí tocou na roleta!
— Cara, não tenho culpa se você não tem
sorte. Tente de novo. — Eu retruquei.
— Acho melhor irmos embora. — Diana me
puxou, um pouco amedrontada.
— Fica tranquila, você está com um lutador
nato.
— O mesmo que foi nocauteado essa noite?
— zombou.
— Por sua culpa.
— Acho melhor tu colocar essas fichas aí de
volta, babaca. — O cara deu a volta na mesa e veio

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em minha direção. Aparentemente tomado pelo


alcool.
— E quem vai me obrigar? Você?
— Benjamin. — Diana empurrou meu peito,
se colocando entre mim e o homem.
Ele e outros jogadores olharam para nós dois.
Quando notei um sorriso irônico na expressão dele,
soube que lá vinha uma ofensa.
— A tia madame está pagando a noitada do
gigolô?
— O que você falou? — Diana deixou de me
empurrar e foi em direção a ele. — Eu lá te dei
ousadia para se dirigir a mim, seu filho de uma
égua?
— Diana, vamos. — Puxei ela.
— Isso, garotinho, leva a tia doida. — Agora
ele tinha chegado ao limite. Eu estava com as mãos

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cheias de fichas e joguei-as na cara dele,


assustando-o. Ao mesmo tempo, sem que ele
pudesse prever, alcancei um banquinho do bar e o
arremessei contra ele. O cara perdeu o equilíbrio,
outros vieram correndo para nos separar, mas não
puderam impedir meu soco em seu nariz. Segurei
na gola de sua camiseta e, ainda caído no chão,
tonto, me encarou.
— Tá precisando aprender a respeitar as
mulheres. Não serei tão bonzinho da próxima vez.
— Soltei a gola dele, olhei ao redor e vi as pessoas
assistindo à cena, assustadas, algumas filmavam.
Eu tinha certeza que se me reconhecessem, estaria
fodido na mídia amanhã. Puxei Diana, e saímos do
lugar, correndo e rindo. Ninguém tentou nos deter.
Eu perdi todas as fichas, mas foi bom demais a
adrenalina de uma briga de bar.
Corremos até onde estava meu carro, e Diana

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me empurrou contra a porta, antes de eu abri-la.


— Deveria ser errado, mas te ver brigar me
encheu de tesão.
— É essa a sensação provocada ao se
relacionar com desordeiros. Enrolei o rabo de
cavalo dela em meu pulso e, com um puxão, sua
boca já estava colada à minha. Diana sabia
exatamente onde me tocar, para me fazer sentir o
melhor prazer. Suas mãos percorreram meu torso, e
quando ela chegou ao pescoço, deixou minha boca
de lado, empurrou minha cabeça e lambeu meu
pescoço, mordendo-o em seguida. Gemi com suas
mãos adentrando meu moletom e alcançando meu
pau — eu estava sem cueca —, que, de tão duro,
era capaz de perfurar o tecido da roupa.
— Porra, Diana — solucei. Seus dedos
chegaram até minhas bolas, e abri as pernas
instantaneamente, para receber a massagem mais

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deliciosa que uma mulher já tivera a ousadia de


fazer em mim. Diana sabia das coisas e gostava do
que fazia.
Ela afastou a boca do meu pescoço, estava
ofegante, olhos turvos de desejo. Parecia uma
vampira maligna, louca por pescoço.
— É minha a parte preferida. — Beijou
novamente meu pescoço e minha boca, em seguida.
Rapidamente, abri a porta traseira do carro e
entramos juntos, enroscados um no outro, nos
beijando com ânsia. Eu me acomodei no banco de
trás e ela sentou em meu colo.
— Tira — rugiu, levantando meu moletom.
— Tira tudo. — Eu tomei minha blusa de suas
mãos para eu mesmo tirá-la, e ela fez o mesmo com
sua blusa de botão. O jeans dela foi a parte mais
difícil, mas nossa loucura por sentir a pele do outro,
deixou tudo mais fácil. Quando, enfim, Diana
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estava nua sobre mim, com minha calça de


moletom abaixada até as coxas, ela saciou sua
vontade de me degustar com calma. Abri os braços
sobre o encosto do banco, inclinei o pescoço para
trás e torci para não pirar durante o melhor banho
de língua que já tive. Sua língua percorreu meu
peito com leveza e depois senti os lábios sugando o
mamilo. Puta que pariu.
Fechei os olhos, apertando as pálpebras,
quando ela esfregou sua boceta sobre meu pau. Eu
a senti quente e muito úmida. Bastava um
empurrãozinho, e eu estaria todinho dentro dela,
dando o melhor de mim.
Quando Diana acabou seu show de língua,
beijando meu bíceps, encontrei um sorriso travesso
me encarando. Era a Coringa de saia. A Arlequim.
Tão malvadamente safada, com o poder de deixar
qualquer macho de joelhos, e, naquele momento,

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dentro do carro, eu era o macho de joelhos por ela.


Ela segurou meus braços abertos e rebolou
sobre meu pau.
— Porra! Assim não dá. Estou sem
camisinha...
— Que merda! — exclamou, sem muita
convicção. Não parecia preocupada. — Seria uma
pena se isso aqui... — Segurou meu pau e esfregou
a cabeça dele bem em sua entrada — acontecesse.
— Ah, vai se danar.
Ela segurou minha garganta, totalmente
dominando a situação, e eu deixei. Estava tão
envolvido que não questionava nada que ela
fizesse. Eu só queria liberar o vulcão que crescia no
meu saco e faria isso da forma que ela impusesse.
Diana continuou acabando comigo até que me
deixou deslizar só um pouquinho para dentro. Eu
queria tudo, queria rápido e tão profundo, sentindo
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seu interior aveludado me aconchegar como a


palma de uma mão macia.
— Está amando me torturar?
— Até que você reaja. Vamos... — soluçou.
— me dê tudo que pode. — E eu não aguentei
mais. Envolvi sua cintura com um braço, e a
empurrei para fora do meu colo. Diana gargalhou
adorando minha pegada animalesca.
— De joelhos. — Arfei e a empurrei para que
ficasse ajoelhada no banco, e me acomodei por trás
dela com dificuldade, devido à exiguidade do
espaço, para um homem do meu tamanho. O
joelho dobrado sobre o banco, um pé no assoalho
do carro, uma mão segurando firme sua cintura e a
outra o seu cabelo. E eu a fodi tão forte e quente,
como desejávamos desde o início, tal era a nossa
excitação selvagem. Arranquei de Diana os
melhores gemidos de prazer, e tinha certeza que o

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carro balançava, como consequência de nossa


explosão de luxúria.
A cada vez que meu pau avançava sem
piedade, recheando-a completamente, eu sentia um
poder de nível máximo nascendo em mim. Era mais
que um orgasmo, era um sentimento de tê-la para
mim. Um sentimento de ter essa mulher gemendo
pelo meu toque. Enfim o sexo não era apenas sexo.
Era a maior cumplicidade que já troquei com
alguém.
Quando eu voltei a sentar no banco e a trouxe
para cavalgar em mim, Diana mostrou como sabia
o que fazer.
— A porra do piercing... — ela gemeu. —
Caramba... Está me matando. — E cravou os dentes
em meu ombro. Elevou seu corpo contra o meu,
ambos suados, dentro do carro abafado. Os vidros
já estavam embaçados.

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Ela segurou no encosto do banco, e manteve o


ritmo como um bate-estaca. Mordi os dentes me
controlando, enquanto meu pau fazia a melhor
invasão sem trégua em seu interior macio,
aconchegante como o calor de uma fogueira. Eu
estava tão perto de gozar, mas não queria terminar
e deixá-la na mão. Então chupei seus seios úmidos
de suor, embriagando-me em seu cheiro feminino,
um cheiro requintado, de algo doce e
provavelmente caro.
Diana berrou apertando meus ombros, e, para
que ela não parasse enquanto tremia com o
orgasmo, segurei sua cintura e mantive as socadas,
e em três arremetidas, me dissolvi sentindo meu
prazer líquido esvaziar-se dentro dela.
Joguei a cabeça para trás e ela deitou-se no
meu ombro. Ficamos parados, ainda conectados,
até recuperar o folego.

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Ela saiu lentamente de cima de mim e se


sentou ao meu lado.
— Caramba! Eu deveria te sequestrar e usá-lo
como escravo sexual. — Olhou para meu pau,
mesmo sem poder enxergá-lo no escuro do carro.
— Piercing no pau não é coisa de Deus.
Gargalhei e continuei observando-a. Estava
pasmo em vê-la tão linda, radiante, ao natural.
Acabara de gozar, e eu já a queria novamente.
Puxei minha calça, que já estava embolada nas
minhas canelas. Me vesti e Diana fez o mesmo.
— Foi sem camisinha — falei.
— Eu uso DIU. E não tenho problema de
saúde nenhum.
— Eu também, não. Mas foi arriscado.
— Se houver uma próxima vez... — ela não
terminou de falar, inclinou-se e deu um beijo na

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minha boca.
— Tomaremos cuidado — completei o que
ela deixou subtendido.
Diana piscou para mim, saiu do carro e foi
para o banco da frente. Eu fui logo atrás, me sentei
ao volante e saímos da rua deserta.
Durante o trajeto, ela ligou para Stela
comunicando-lhe que estávamos chegando em casa
e que estava tudo bem comigo. Quando chegamos,
Diana foi tomar um banho para esperar Maya, e eu
me sentei na sala para ver as milhares de ligações
perdidas. Eu estava simplesmente ignorando todas,
pois eram mensagens de meus irmãos preocupados
comigo. Nenhuma do meu pai. Duas de Diana.
Sorri sozinho na sala ao ouvir o áudio dela.
“Se não aparecer, vou revirar seu quarto. Já
vi sua coleção de piercings”.
Faltava apenas uma mensagem e era um
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número desconhecido. Abri e fiquei confuso com o


que li.

Eu te vejo.
O tempo todo.

Estava prestes a perguntar “Quem é?”, e, no


mesmo instante, o número me bloqueou, me
deixando mais confuso ainda.

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29
DIANA

Os dias se passaram com rapidez, trazendo


muita comodidade para mim. Eu estava me
acostumando com uma vida que não era minha. Eu
não queria continuar morando com o pai de Maya,
nunca quis nada que viesse dele. Entretanto, depois
de experimentar a companhia de Benjamin, eu não
conseguia assimilar meu desejo por ele crescendo
cada vez mais.
Acordei antes do dia clarear, saí e deixei um
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bilhete para Benjamin dizendo para preparar o leite


de Maya, caso ela acordasse antes de eu retornar.
Precisava andar, sozinha, pensar em tudo que vinha
acontecendo, e o meu destino era certo: fui até o
cemitério, como uma forma de tentar amenizar o
mal-estar que eu vinha sentindo. Era uma
contradição querer muito o cara e querer, mais
ainda, afastá-lo de mim. Em frente ao túmulo de
Dani, que fora enterrada com nossa mãe, chorei
com a culpa me apunhalando.
— Eu acho que você iria rir de mim, mana —
falei, limpando as lágrimas. — Você sempre dizia
que eu não suportava macho, a não ser para me dar
prazer e depois descartá-lo, e que, um dia, eu
encontraria um que me fizesse querer ficar. Agora
estou aqui, nesse estado, porque não consigo parar
de querer ele. — Senti como se alguém me
observasse e olhei em volta. Estava tudo silencioso,

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ninguém além de um homem cortando grama em


um túmulo. — Voltei a encarar a foto dela no
mármore da lápide. — Ah, Dani. Eu deveria ter
sido mais forte. Eu deveria ter deixado Maya com
ele e fugido no primeiro sinal de fraqueza. Eu
deveria ter brigado com ele na justiça, mesmo
perdendo. Mas não fiz. Eu fiz o que mais critiquei
nos homens: deixei a libido falar mais alto. Eu só te
peço perdão.
Fiquei pensando sobre esta noite. Assim que
Maya dormiu, eu fui para o quarto dele. Transamos
mais uma vez, na verdade, durante horas pela
madrugada adentro, e acabei pegando no sono no
quarto dele. Acordei às cinco da manhã, agarrada a
Benjamin. Pulei da cama, sem acordá-lo, e fui para
o outro quarto. Foi depois disso que decidi vir falar
com minha irmã no cemitério. Eu tinha dormido
com ele, era mais que apenas sexo, era um caminho

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sem volta.
Ainda com a sensação de que estava sendo
observada, fiz uma prece rápida, de olhos fechados,
beijei meus dedos e toquei na foto de minha irmã.
Andei cabisbaixa, tendo o cuidado para não
tropeçar, uma vez que estava de saltos. Quando
levantei o olhar, por atrás de um túmulo, alguém
me espiava.
— Ei! — gritei, paralisada de medo, tentando
enxergar quem me espionava. Tirei os óculos
escuros. — Eu te vi. O que você quer?
Então, a pessoa saiu correndo, e eu pude ver
nitidamente: era uma mulher. E o que me
assombrou foi que se parecia muito com a minha
irmã! Os cabelos encaracolados com mechas, o tipo
de vestido que ela amava. O grito ficou preso na
minha garganta, e demorou muito para eu recobrar
o susto e correr atrás dela.

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— Ei, volte aqui! — Corri o mais rápido que


eu podia. Não tinha como ter sido uma ilusão. Eu
vi. Era real. Eu vi o vestido amarelo passando por
entre os túmulos. Minha irmã tinha um vestido
daquele.
Lembrei-me do que Maya tinha me dito e
meu sangue gelou no mesmo instante.
— Dani! — gritei e me arrependi no mesmo
segundo. Eu estava louca, não podia ser ela. Não
tinha como. Eu a vi morta. Sim, eu a vi. Continuei
correndo e me vi no meio do cemitério, cercada de
túmulos e lápides. A vi correr para o portão de
entrada e fui atrás o mais rápido que consegui. Mas
ela já tinha desaparecido.
Me apoiei com as mãos nos joelhos e respirei
ofegante.
Eu estava ficando louca. Não era possível.
Minha mente me pregava peças.
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— Ei, moça!
— Aaaahhh! — berrei e me virei. Um homem
vinha atrás de mim, segurando um aparador de
galhos. — Caralho! Você me assustou. — Coloquei
a mão no peito, e percebi o seu constrangimento.
— Desculpa. A senhora está bem?
— Estou ótima. Por acaso você viu uma
mulher de vestido amarelo correndo...
— Sim, eu vi. Por isso quis saber se estava
tudo bem.
Era real. Eu não tinha imaginado coisas.

***

Cheguei em casa às oito da manhã, e


Benjamin tomava café na companhia de Maya. Ele
ria de algo que ela falava.
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— Onde você estava, mamãe? — Virou-se ao


me ver entrando.
— Fui dar uma volta. — Beijei ela e olhei
para ele. — Bom dia.
— Bom dia. Está tudo bem? — Era incrível
como Benjamin estava aprendendo a ler as minhas
expressões.
— Estou sim. Vou me trocar. — No quarto,
esperei até me recobrar ao meu estado normal,
remoendo o que acabara de acontecer. Não tinha
condições porra nenhuma. Não existia a
possibilidade...
Ou existia?
Pus um vestido leve, sem mangas, para ficar
em casa. E, quando voltei, Maya estava assistindo
televisão, e Benjamin ainda na cozinha.
— Me conta o que houve — ele pediu. Fui

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preparar um chá, sem falar nada, e Benjamin


levantou-se e veio até mim, ficando ao lado do
fogão.
— Estava na boate?
Pressionei os olhos com o polegar e indicador
antes de voltar a encará-lo. Eu ia falar sobre o que
vi. Mas ele só me classificaria como louca.
Ninguém, em sã consciência, acreditaria nisso. Eu
não acreditaria, se me contassem, como não
acreditei quando Maya me contou. Sorri
falsamente.
— Sim, passei lá para dar uma olhada.
— Não acho isso legal. — Ele aproximou-se
mais e ajeitou uma mecha do meu cabelo. — Eu
odeio pensar em você perto daquele cara. Ele é
mau.
— Eu sei lidar com ele...

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— Tudo bem, senhora dona, da porra toda. Só


tome cuidado. Sempre um pé atrás. Mas sabe o que
eu também não achei legal? — antes de eu indagar,
ele emendou: — Me deixou sozinho na cama. Eu
quase achei que teria uma foda matinal gostosa.
— Shhiuu. — Cobri com a mão a boca dele e
quando afastei o rosto para verificar os arredores,
Maya estava na entrada da cozinha, nos
observando. Desfiz rapidamente o gesto e sorri para
ela.
— Oi, meu bem.
— Você e o papai só fica perto do fogão —
ela afirmou, com os olhinhos cheios de
desconfiança inocente.
— É porque aqui é mais quentinho. —
Benjamin recebeu o copo da mão dela, colocou-o
na pia e a suspendeu nos braços, pondo-a em seus
ombros. — O que acha de voar com o papai até a
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sala?
— Eba! Vou dirigir! — Ela abraçou a cabeça
dele, e Benjamin correu para a sala, imitando
barulho de avião.

Comi o desjejum na companhia de minhas


lembranças loucas e ouvindo os gritinhos de Maya
e Benjamin ao longe. Não era possível. Não era a
Dani, não tinha como ser. Eu tinha que ligar para
Sabrina. Precisava contar isso para alguém e não
podia ser a Benjamin. Terminei de comer, arrumei
a cozinha e fui para a sala.
— Não vai trabalhar? — questionei,
observando-o ajudar Maya a montar um quebra-
cabeça.
— Não mais. Aquela porra de empresa não
terá mais o meu suor.

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— Mamãe! — Maya gritou chocada. — O


papai Beijamin falou um palavrão.
— Me desculpa, princesa. Juro que não falo
mais.
— Vai ter que pagar um real para minha mãe.
— É? — Benjamin me fitou divertidamente,
interessado no modo de punição para os infratores.
— Sim. Toda vez que alguém falar um
palavrão, deve dar um real, e ela coloca no meu
cofrinho.
— Hum... Genial. Espero que sua mãe seja
uma boa administradora. — Ele pegou a carteira,
achou duas moedas de cinquenta centavos e me
entregou. Satisfeita, Maya voltou a brincar, e ele
sentou-se ao meu lado no sofá.
— Então, quer dizer que se eu falar palavrão
vou ter que pagar... — ironizou baixinho, quase um

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sussurro.
— Sim.
Ele tocou minha coxa por baixo do vestido,
acariciando de leve.
— Aceita só em dinheiro ou posso te pagar de
outra forma?
— Toma vergonha na cara e deixa de baixaria
durante o dia. — Empurrei sua mão.
— Então, suas negociações só são à noite?
— Sim. — Sorri maliciosamente. — À noite
eu costumo cobrar caro.
— Buceta... — ele sussurrou no meu ouvido.
— cu, porra, — continuou sussurrando. — caralho,
piroca...
— O que está fazendo?
— Falando muito palavrão para eu ter que
pagar muito hoje à noite.
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— Eu estou chocada. — Dei uma risada, de


boca fechada, e Benjamin me roubou um beijo se
aprumando no sofá, me deixando louca por mais.
Ficamos ali, em silêncio, trocando olhares furtivos,
repletos de insinuações, fingido que estávamos
assistindo TV. Maya, no tapete, continuava
montando o quebra-cabeça.
— Olha, te admiro por não ir trabalhar —
falei, mudando de assunto e tentando tirar um
pouco a aura de sedução que nos rodeava. — É um
grande passo de libertação.
— Sabe... Eu estive pensando em chutar o pau
da barraca e fazer mesmo uma exposição das
minhas obras.
Me animei e virei meu corpo para ele,
sentando em minha perna.
— Minha nossa! — exclamei. — Você leu
meus pensamentos. Benjamin, você tem um tesouro
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nas mãos. Eu fiquei imaginando o quanto seria


arrebatador se você criasse uma coleção única... E
fazer uma exposição de parar a cidade.
— Essa sempre foi minha vontade. — Ele deu
de ombros, não muito animado. — Eu apenas
exponho anonimamente na internet.
— Se quiser, podemos planejar isso. Eu tenho
contatos e posso arrumar um lugar perfeito para
acontecer uma noite de entrar para a história.
— Sério?
— Só precisamos de aliados.
— Stela.
— Isso, Stela — concordei.
— Eu não sei... Sempre tive insegurança com
o que o povo vai falar.
— Não vai falar, vai adorar! Você tem um
talento incrível e não pode ter vergonha disso. Eu
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tenho certeza de que será um sucesso. Liga para a


sua irmã, vamos marcar um almoço.
— Não é assim, Diana. Esse assunto é algo
para crescer aos poucos, pensar com calma.
— Mas não acha que essa é a oportunidade
perfeita? Você brigou com seu pai. O caldo já
entornou, então não espere fazer as pazes
novamente, para arrumar outro motivo para brigar
com ele. Aproveite o embalo.
Calado, ele ficou me fitando, pensando no que
eu tinha dito.
— Você tem bons argumentos.
— Claro que tenho. Liga para a Stela,
convide-a para vir conversar com você.
Fomos para a outra sala e, animada, observei
ele falar com Stela, convidando-a para vir almoçar
com a gente. Ao desligar o telefone, direcionou um

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sorriso para mim.


— Vamos mostrar para eles que você pode
ser quem você quiser, fazendo o que quiser. — Bati
palmas, feliz. — Para um cara que arrebenta outros
em lutas clandestinas, expor alguns quadros deve
ser fichinha. — Benjamin riu e, inesperadamente,
me abraçou.
— Obrigado. A não ser a Stela, você é a única
que me apoiou nessa ideia.
— Ver uma pessoa se libertar é o melhor
sentimento que existe. Pode não parecer, mas torço
muito por você — ele assentiu, beijou minha boca e
me puxou novamente para um abraço apertado,
carinhoso, de puro agradecimento.

***

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Stela chegou para o almoço e trouxe os filhos.


Benjamin comprou comida e foi um almoço
maravilhoso. Eu me senti muito à vontade à mesa
com ele, a irmã e as crianças. Maya estava radiante
de felicidade. Eu nunca tive isso, uma mesa cheia
de pessoas reunidas. Mesmo quando Dani ainda
estava viva, a gente não tinha esse momento. Eu
trabalhava muito e, quando chegava, a maior parte
das vezes, ela já estava dormindo.
Depois de mais de uma semana vivendo em
um novo lar, Maya já estava acostumada com a
nova vida e, pela primeira vez, eu vi naquele
almoço, o desejo de minha irmã se concretizando:
dar uma família para Maya.
Depois do almoço, as crianças foram brincar e
nós três nos reunimos para falar sobre o projeto.
Stela se mostrava mais eufórica do que Benjamin.
Ver a felicidade do irmão era, sem dúvida, uma

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realização para ela. Ele subiu para buscar uma lista


que tinha feito e, uma vez sozinha com Stela, ela
me confidenciou:
— Diana, não é de hoje que eu imploro para
Benji tomar o rumo do sonho dele. Ele odeia
trabalhar na empresa, e eu estou muito agradecida
por você ter influenciado ele a dar um passo à
frente.
— O fator principal foi a briga com o pai de
vocês, Stela. Isso o fez abrir os olhos. Além do
mais, eu vi as obras, que são de tirar o folego.
— Sim, são magníficas! Vi um lampejo de
incômodo passar em seus olhos, e entendi do que se
tratava quando ela fez a pergunta: — Então... A
garota do quadro gigante é a sua irmã?
Envergonhada, abaixei os olhos e assenti.
— Está tudo bem — ela falou, e eu voltei a
fitá-la. — Meu irmão está tão feliz como nunca
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tinha visto. Você e Maya estão transformando-o,


estão trazendo Benji de volta para a vida.
Olhei para Maya na outra sala, cercada de
brinquedos e dos primos. Soprei e encarei Stela.
— Ele e eu estamos nos relacionando...
— Eu já percebi. — Apertou minha mão
sobre a mesa. — Eu aprovo totalmente. Eu não
conheci a sua irmã, não cheguei a ter contato com
ela, mas nem naquela época em que eles
namoravam, o Benjamin estava tão determinado e
feliz.
— Eu odeio gostar do ex-namorado de minha
irmã.
— E quem pode mandar no coração? Sua
irmã ficaria feliz por Maya estar sendo cuidada por
você e pelo pai. Vocês dois são sangue dela. Às
vezes o destino pega um atalho para a felicidade.

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Era tudo que eu precisava ouvir. Palavras de


conforto e não de crítica.
Ele voltou no momento em que eu me
recuperava do papo intimista que estava tendo com
Stela. Benjamin sentou-se em nossa frente..
— Essa é a lista de pessoas que acho que
podem ajudar. — Benjamin passou um papel para
Stela. — São pessoas influentes na cidade, e quanto
mais nomes de peso, maior será a repercussão.
— Só tire o nome desse retardado — Stela
falou, mordendo os dentes com raiva. Eu não
entendi nada, nem pude ver quem era o tal
retardado a quem ela se referia.
— Deve estar falando do Ulrich. Ele
coleciona obras de arte, é conhecido no meio —
Benjamin defendeu. — Vai ajudar muito.
— Miguel também tem muitos contatos. Você
sabe que se esse cara estiver envolvido, eu não
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estarei. É uma escolha que precisa tomar. — Ela


tinha mudado em segundos de compreensiva para
revoltada. O tal sujeito tinha poder de mexer com
Stela apenas com a menção em seu nome.
— Stela, não é hora de...
— Eu não vou trabalhar com esse homem e
ponto final. Se ele quiser divulgar por fora, apenas
para te ajudar, ótimo. Mas colocá-lo no projeto,
nem pensar.
Benjamin sabia que o apoio dela era muito
importante, porque ela seria a intermediadora
dentro da família. Ele suspirou e assentiu cedendo.
Com a caneta, riscou o nome.
— Ok. Ulrich, fora. — Isso a fez respirar com
alívio.
Mais tarde, quando ela foi embora, Benjamin
ligou para o tal retardado que Stela odiava e pediu
para ele dá uma passadinha aqui no apartamento
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depois do expediente. Quando desligou, ele


explicou:
— Ulrich é um advogado criminal que é o
melhor amigo de Andrey. Ele sempre esteve
presente em nossa família. Todos nós adoramos o
turco abrasileirado, menos Stela. Isso porque ele
faz as melhores piadas sobre o marido dela... No
passado, ele era louco por minha irmã, mas Miguel
chegou antes.
— E vai mantê-lo no projeto sem ela saber?
Não é arriscado?
— Ela não precisa saber.
— Você quem sabe. O próximo passo é
fazermos um inventário de todas as suas obras. E
torcer para Stela conseguir encontrar um bom
marchand para avaliar as obras e fazer a ligação
com as galerias de arte. Ela é mais importante do
que esse fulano.
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Mais tarde o amigo dos irmãos Capellos, e


desafeto de Stela, chegou e eu fiquei pasma ao me
deparar com um homem ridiculamente gostoso.
Aparentava ser da idade de Andrey, uns trinta e
oito talvez. Vestia-se com elegância, tinha fartos
cabelos negros e barba muito bem feita. Além do
sorriso capaz de dissolver o maior dos icebergs.
Menos, é claro, os nervos da Stela.
Benjamin fez as apresentações, e ele não ficou
chocado ao descobrir que Stela o queria fora do
projeto.
— Ah, nem vou dormir essa noite, chorando
por Stela me excluir do projeto.
— Precisa ser segredo, Ulrich — Benjamin
lembrou e entregou a ele um copo de uísque. —
Minha irmã é mais importante que você nesse
projeto, e só estou te convidando porque tem
influência no meio jurídico.

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— Uau, que presente. Eu fui selecionado para


trabalhar de graça como marqueteiro. Estou
comovido.
— Vai se foder, se não quer ajudar, não ajuda.
— Ele perde a razão fácil demais — Ulrich
sussurrou para mim e voltou-se para Benjamin. —
Tudo bem. Só porque me escondeu aqui uma
semana, quando eu fugia de uma perseguidora.
— A pior semana da minha vida. Vou te
mandar as fotos das obras e caberá a você criar uma
lista de convidados impecável.
— Deixa comigo. — Ele virou todo o copo de
uísque, enfiou a mão no bolso do jeans e tirou um
cartão que estendeu ele para mim.
— Caso precise de uma defesa quando for
responder a algum crime, ou talvez precise só de
uma defesa... Só me chamar.

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Antes de eu pegar, Benjamin puxou o cartão,


amassou-o e jogou-o no chão.
— Pode ir embora. Às vezes esqueço porque
minha irmã não te suporta.
Ulrich gargalhou, deu um tapinha no ombro
de Benjamin, piscou para mim e foi em direção à
porta. Benjamin o seguiu, e ficaram lá conversando
baixinho. Quando ele voltou, falei:
— Uau. Que homem, hein? — Abanei o
rosto.
— Como é que é, Diana? — Franziu a testa.
— Esquece. — Revirei os olhos. — Vou ver o
que Maya está aprontando.

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30
DIANA

Quando a noite chegou, eu estava indignada


por ter discutido com Benjamin. Tínhamos passado
o dia tão bem, fizemos planos para o projeto dele,
mas eu precisava conversar com minha prima sobre
o que vi no cemitério, e como ela não atendia ao
telefone, era necessário eu ir até a boate encontrá-
la. Sem falar que lá ainda era o meu trabalho.
— E você vai simplesmente abandonar a
criança que você chama de filha? — Ele estava na
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porta do quarto observando eu me arrumar, e notei


um pingo de estresse tomar o seu rosto. Maya já era
acostumada a me ver sair à noite e não se
importava. Estava na sala brincando.
— Ela é minha filha, e eu não estou
abandonando ninguém. Estou indo trabalhar.
— Em um bordel?
— Você sabe que não é bordel. Além do
mais, pedi ao Leandro para vir me buscar.
— Quem? — Foi divertido ver a expressão
dele se contorcer. Benjamin estava expondo, sem
nenhuma reserva, suas mais íntimas emoções. O
ciúme brilhava em sua cara como luz de LED.
— O segurança da boate.
Peguei minha bolsa, dei mais uma olhada no
espelho e caminhei em direção à porta. Ele se
colocou no meu caminho. Tão sexy, o

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desengraçado, que eu queria deixar a visita à boate


para depois e arrastá-lo para a cama. De camiseta e
bermuda, com os braços cruzados, ele me encarava
pronto para qualquer embate.
— Vamos resolver essa merda. Eu compro
sua parte.
— Já disse que não está a venda, dá licença.
— Talvez eu não queira deixar você sair.
Gargalhei bem alto, provocando nele mais
revolta ainda.
— Querido. Ninguém diz o que Diana
Cristóvão deve fazer, ainda mais um homem que
nem chegou aos trinta ainda. — Eu achei que ele ia
pular sobre mim, ou tentar me responder à altura.
Mas o que vi foi desafio puro em seus olhos.
Benjamin assentiu e apenas deu um passo para o
lado, indicando que eu pudesse sair.

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— Só isso?
— Pode ir, senhora dona do pedaço. Vai.
Ele teria ficado chateado por eu o ter
classificado como homem novo? Bom, não
importava. Tinha surtido efeito, de qualquer forma.
Sorri, fui até ele, beijei seus lábios e sussurrei: —
Volto antes das dez.
Dei um beijo em Maya, disse-lhe que
Benjamin iria providenciar algo para eles comerem.
Para ela, era mais conveniente ficar na companhia
do pai do que com Amanda.
Leandro estava lá embaixo me esperando, e,
durante o caminho, eu sorria, lembrando-me da
instabilidade de Benjamin. Ah! Um tourinho bravo,
o rapaz.
Na boate, para meu desapontamento, fui
informada que Sabrina não havia aparecido para
trabalhar. Leandro tinha me falado sobre isso
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durante o trajeto, mas eu precisava ver para crer.


Subi direto para o escritório de Almir, todavia, para
minha surpresa, ele ainda não tinha chegado. Ao
descer, fiquei sabendo que a noite estava rolando
sem direção. E a casa estava cheia. Eu esboçava
uma reação de surpresa e alegria. Era ótimo ver
tudo lotado, funcionando a todo vapor, mas o
motivo não me agradava: o andar de cima, das
cabines, já estava funcionando. A boate tinha
mesmo virado um bordel! Pedi para Vinicius
mandar um drinque para meu escritório e fui
esperar por Almir lá.
Consegui acessar as planilhas da boate e me
impressionei com a saída do vermelho. Não
entendia o que estava acontecendo. Apesar do bom
número de clientes, o progresso era alto. Almir
tinha investido uma boa quantia nos cofres da
boate. E mais chocada ainda fiquei ao encontrar um

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orçamento de abertura de uma filial. Ele iria abrir


outra boate?
A porta se abriu, e olhei para Vinicius com
uma taça na bandeja. Ele a deixou sobre a mesa e
me olhou quase interessado demais.
— Mais alguma coisa, Vini?
— Aquele cara encrenqueiro está aí, fazendo
a festa com as meninas.
— Que cara? — Cravei as unhas na mesa.
— Um fortão tatuado...
Caralho, Benjamin.
Me levantei rápido, saí da sala, ouvindo
Vinicius vir logo atrás de mim. Ao chegar ao salão,
minha atenção foi imediatamente atraída para o
grande palco, onde as meninas dançavam. E
diferente dos outros homens, tinha um que interagia
euforicamente com elas. Benjamin. Que filho da

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puta! Boquiaberta, o observei colocar uma cédula


na calcinha de uma stripper e ganhar, em seguida,
um beijo dela. Eu não estava me reconhecendo, o
sentimento de posse crescendo a cada bombada do
coração. Eu nunca me permiti experimentar algo
assim e, o mais bizarro, era ter essa carga de
emoção por alguém que não era nada meu. Sim, ele
não era merda nenhuma em minha vida.
Andei cega até Benjamin e o puxei com
brutalidade.
O que está fazendo aqui?
— Me divertindo. — Sorriu cínico.
— Onde está Maya? — gritei acima da
música.
— Muito bem cuidada pela tia dela — ele
gritou também. — Já que a outra tia veio para a
boate. — Debochou, e eu nem vi o momento que
desferi um tapa em seu rosto. Me sobressaltei
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assustada com a minha reação, e Benjamin ficou


irado instantaneamente.
— Nunca mais... — começou a falar, mas eu
o ignorei.
— Essa é a porra do meu trabalho. Você acha
que eu amo estar aqui e deixar a Maya sozinha?
— Fez isso porque quis — berrou. — Porque
ela tem um pai e eu poderia ter dado apoio desde o
início.
— Não. Não poderia. Porque você não passa
de um mimado que sempre teve tudo nas mãos.
Você nunca vai entender porra nenhuma. —
Empurrei ele e corri para o meu escritório. O
sangue quente e as mãos trêmulas. Eu não discernia
que tipo de emoção era essa me pegando
desprevenida. Passei por todos, empurrando quem
houvesse em meu caminho, abri a porta, mas não
consegui fechá-la. Benjamin entrou e a bateu com
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força. Estávamos sozinhos no meu escritório, e ele


não parecia nem um pouco bem.
— E você ao menos procura me entender,
Diana? — berrou se inclinado sobre mim. — Eu
estou todo fodido todos os dias, porque
simplesmente preciso aceitar que a vida não é um
mar de rosa. Minha mãe morreu em um hospício,
meu pai me trata como marionete, eu perdi minha
namorada e acabo de descobrir que tenho uma
filha. Eu passei anos sem ter um motivo para viver
e agora eu tenho. — Ele engoliu saliva e acho que,
também, algumas palavras que decidiu não falar.
Em um tom mais baixo prosseguiu: — Mas você é
que não entende que outras pessoas possam
também estar em um inferno. Você não entende
como era passar todas as malditas horas desejando
que a merda da vida acabasse. Mas agora, eu não
peço mais que tudo acabe, porque eu tenho a Maya

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e me sinto bem ao seu lado, cacete. E eu odeio isso.


Diante de sua expressão de dor e culpa, ao
mesmo tempo, eu baixei todas as minhas armas de
ataque. Era pura sinceridade espelhando em seus
olhos. Ele abriu seu coração para mim e expor seus
medos e aflições. Me senti egoísta, ouvindo o
lamento de Benjamin.
— Desculpe — sussurrei de cabeça baixa. —
Eu não quis falar aquilo...
Ele soltou o ar pela boca, fez menção de falar
algo, mas desistiu. Um vazio me abraçou. Eu não
poderia medir a dor dos outros pela minha régua.
Porque eu sofri, não quer dizer que outros não
tenham passado pelo inferno. Ele fez menção de
sair, mas eu me coloquei em sua frente.
— Espere. — Segurei em sua mão, e ele se
virou para mim. Os olhos levemente avermelhados.
Eu queria me desculpar e dizer que o entendia sim,
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que o pai era um filho da puta e que poderia contar


comigo para qualquer coisa. Mas da minha boca
não saiu um “a”. Eu o empurrei contra a porta e
ataquei, beijando-o com toda a nossa fúria
transformada em excitação.
Ele reagiu de imediato. Me virou de costas e
me empurrou contra a porta. Sua mão enroscou nos
meus cabelos e senti sua boca ofegante no meu
ouvido. De olhos fechados, gemi. Eu adorava o
jeito bruto de Benjamin e a forma como ele
aplicava força e possessão na hora do sexo.
Nenhum outro homem tinha conseguido me levar
nessa montanha russa de emoções, nenhum outro
tinha atingido meu coração de forma tão
animalesca. Tentei alcançá-lo, levando as mãos
para trás, eu queria tocar nele, apalpar seu corpo
grande e duro, lamber cada pedacinho dele e sentir
o cheiro de homem. Mas ele não permitiu.

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Empurrou minhas mãos para o alto da minha


cabeça, segurando-as com uma mão e empurrou
meu pescoço para o lado. Revirei os olhos, tonta de
prazer, ao sentir sua língua quente passar e, em
seguida, um chupão. O gosto por lambidas não era
unilateral. Ele também amava fazer isso. Senti-me
úmida e quente entre as pernas, e meus seios
começaram a manifestar.
As mãos de Benjamin se arrastaram pela
minha pele e, de um modo sensual, subiram meu
vestido.
— Ah, adoro renda! — sussurrou e desceu
minha calcinha. Ele estava fazendo tudo muito
intensamente. Agarrou minhas coxas e, sem
inibição, abriu minhas pernas para ter acesso ao
meu ponto íntimo e dolorido de prazer. E lá estava
sua língua grande, habilidosa e quente. Passou uma
primeira vez, estremeci. Passou outra vez

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percorrendo todo o sexo, e eu choraminguei. No


terceiro contato, a boca inteira a degustou, e eu
achei que cairia no mais profundo abismo de
unicórnios saltitantes, corações voando, anjos
atirando flechas em mim. Eu estava completamente
alucinada com as lambidas de Benjamin.
— Puta merda — solucei apertando os dentes,
e lá se foi um dedo deslizando para dentro enquanto
sugava meu clitóris.
E ele não continuou até que eu pudesse gozar.
Benjamin se afastou. Olhei para trás e vi que ele
estava desabotoando o cinto do jeans. Ele abaixou a
calça com a cueca e tudo até a altura dos joelhos. E
era a cena mais deliciosa que eu já tinha
presenciado: ele me olhando com chamas de tesão
nos olhos, com o pau muito duro na mão. O
piercing brilhava na ponta e meu coração falhou
uma batida, prevendo a delícia de tê-lo inteiro

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bombeando dentro de mim.


Ele empurrou minhas costas, fechei os olhos
tentando controlar o desespero da respiração e senti
ele passar o pau na minha vagina latejante.
— Aaai. Porra! — reclamei. E ele não me
atendeu. Manteve as pinceladas, fazendo o metal do
piercing tornar-se algo grandioso e notável, ao
percorrer minhas carnes sensíveis.
— Olha como você implora por meu pau —
ele murmurou. — Você não quer, enfim, concordar
que precisa de mim como preciso de você? — Ele
deixou a cabeça me penetrar e tirou lentamente em
seguida. — Olha que beleza, como nos encaixamos
com perfeição.
— Depressa, porra!
Entrou novamente, só um pouco e, enquanto
isso, tirou um pouco de seu tempo para morder e
lamber meu pescoço, indo para o queixo e, em
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seguida, puxando meu rosto para trás, para beijá-lo.


Gemi no meio do beijo, e isso fez Benjamin sorrir.
Puxou para fora novamente, o pau ensopado da
minha umidade. E pincelou com calma.
— Você precisa entender, Diana, como sua
boceta já entende. Não dá mais para voltar atrás, já
estamos em um jogo sem volta.
E eu entendia isso muito bem. Meus picos de
culpa se davam justamente por entender que não
tinha mais volta.
Ele abriu um pouco mais as minhas pernas,
envolveu meu corpo com o braço e adentrou em
mim tão lentamente que quase cheguei ao orgasmo,
quando ele tocou no fundo. Eu pude sentir o
pequeno metal na ponta se arrastar contra meu
interior macio e pulsante. Era arrebatador. Os dois
braços dele subiram pela minha cintura rumo aos
meus seios, igual a uma serpente. Eu estava presa

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em seu abraço reconfortante, sentindo-o girar o


quadril de forma torturante, com o pau acolhido
inteiramente dentro de mim, dava para sentir as
bolas tocando do lado de fora.
— Que delícia. — Ele soprou e bombeou uma
vez. Não forte, apenas o suficiente para eu
praticamente sambar com a sua investida. A
dolorosa sensação de invasão era indescritível,
tanto pela sua grossura como pelo piercing com
formato de argolinha, em contato com minha carne
latejante de prazer vivo.
— Agora vou te comer com vontade — ele
falou. Manteve uma mão apalpando um dos meus
seios, segurou firme minha cintura, e eu me
preparei. Era, nesse momento, que ele ia aplicar os
golpes devastadores. Respirei estilo cachorrinho,
para me preparar, fechei os olhos e recebi, com
satisfação, as socadas brutas. Aguentei seu pau

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grande com piercing entrar e sair fortemente, por


inteiro, uma vez, duas, três. Na quarta bombeada
minhas pernas já eram gelatinas, e quando
Benjamin achou uma boa ideia enfiar a mão por
baixo das minhas pernas e tocar meu clitóris, já era.
Gritei e me debati enlouquecida com o orgasmo me
sacudindo e impiedosamente, enquanto ele
continuava indo e voltando me recheando com o
seu poderoso pau.
Tentei me livrar dele, levei a mão para trás e
empurrei a pélvis dele, para que parasse um pouco,
para que me desse a chance de tomar folego. No
momento do orgasmo, era quando tudo ficava ainda
mais sensível e sentir a dureza dele e ainda com um
metalzinho preso na ponta do pênis, se arrastando
dentro de mim, era demais para qualquer ser
humano aguentar.
— Ficou molinha, titia? — ainda teve a

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pachorra de zombar de mim.


— Caralho! — Comecei a cair. Ele me
segurou, rindo, e me arrastou para minha mesa. —
Você sabe ser maldoso quando quer, seu pilantra —
balbuciei, deixando-o me ajeitar com metade de
meu corpo deitado em minha mesa.
— E desde quando gozar gostoso é maldade?
— Segurou minhas pernas, empurrou o meu
vestido um pouco mais para minha cintura e
deslizou para dentro e novo. Parecia maior e mais
grosso, entretanto, me dei conta que, com minha
sensibilidade aumentada por causa do orgasmo, eu
iria sentir a sensação triplicada.
Benjamin não foi carinhoso e, segurando
minhas pernas na posição que queria, voltou aos
movimentos fortes. Segurei na borda da mesa como
se fosse voar dali. Vê-lo tão concentrado, gostoso
de uma forma inimaginável, batendo a pélvis dele

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contra a minha, me fez soluçar de prazer e, quando


ele curvou-se para cima de mim e tomou meus
lábios em um beijo de língua, tão quente como o
inferno, gostoso como beber água no verão, um
maldito filho da puta que sabia como beijar e
bombear seu pau vigoroso em um ritmo impiedoso.
— Caralho! O orgasmo... de novo.
Benjamin... espere um... pouco... vou gozar. Pai do
céu! — Eu estava tendo espasmos, meu corpo
inteiro estava sensível como se tivesse ligado à
eletricidade, e ele mantinha o ritmo me invadindo,
me fazendo sentir cada centímetro do seu pênis.
— Tudo bem, pode gozar. — Ele riu com a
boca pertinho da minha. — Goze, Diana, não vou
parar de te comer. — Eu agarrei ele todo.
Segurando seu braço e no cabelo, gritando de
prazer com o barulho da mesa arrastando no chão.
E então alcancei novamente o ápice e, dessa vez,

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ele veio comigo, me enchendo com seu gozo


cremoso e quente. Em seguida, caiu sobre mim,
ofegante. Rapidamente, o abracei forte, querendo
me fundir a ele, desejando estar sempre impregnada
com seu cheiro e toque.

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31
BENJAMIN

Eu estava com o rosto aconchegado sobre o


ombro de Diana. Milhares de coisas passavam em
minha mente, e eu escolhi refletir sobre nossa
relação. Eu havia sido sincero com ela. Nessa
última semana, morando na mesma casa, ela tinha
me transformado de uma maneira inexplicável. Eu
queria continuar vivendo as emoções que ela e
Maya me davam. E ver Diana vindo para a boate
essa noite, foi algo como se eu a tivesse perdendo.
Eu odiava vê-la aqui nesse lugar, ainda mais pensar
que poderia estar na companhia de Almir e que ele
pudesse machucá-la.
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Levantei o rosto para encará-la, e ela estava


tão linda. Seus cabelos castanhos soltos jogados
pela mesa, o rosto corado e os olhos brilhantes. Ela
ficava irresistível depois do sexo. Meu pau
começou a endurecer novamente, e eu o retirei de
dentro dela. Beijei o queixo dela, desci os lábios e
chupei de leve o pescoço e lambi aquela área.
Diana riu e empurrou minha cabeça.
— O que acha de senhor Linguado?
— Quem?
— Um nome apropriado para você. Ama
lamber...
— Olha quem fala. Eu estou todo marcado de
chupões e mordidas. — Levantei-me de cima dela e
puxei minha calça para me vestir.
Diana se sentou. Ver vestígios de meu
esperma em suas coxas, só me lembrou da falta de

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camisinha, mais uma vez.


— Mais uma vez sem camisinha — falei.
— Acha prudente eu tomar uma pílula?
— Você não usa DIU? — Ela estava de pé,
ajeitando o vestido, e eu a ajudei, puxando-o para
baixo.
— Sim. Mas vai que temos um azar.
Eu estava prestes a responder, quando batidas
fortes na porta nos fizeram sobressaltar.
— Diana! — uma voz masculina chamou e,
como resposta, ela revirou os olhos.
— Almir. Fica aí, irei ver o que ele quer. —
Ela terminou de ajeitar o vestido, foi para a porta, e
eu fui junto, para escutar. Diana abriu a porta, mas
sem deixar ele entrar.
— O que você quer?
— Essa é a nova moda? — Almir falou. —
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Trazer macho para te comer aqui no escritório? —


Diana fez sinal para eu esperar, porque eu queria
abrir a porta e acertar as fuças do infeliz.
— Eu mando aqui tanto quando você, Almir.
— Ela tentava manter a calma. — O que você
quer? A propósito, onde está minha prima?
Ele estava fumando um charuto malcheiroso,
e pude ouvir o som de sua risada.
— Querida Diana, enquanto você está indo
com a cana, eu já estou voltando com a cachaça.
Claro que eu sabia que Sabrina seria a sua espiã
aqui dentro. Tive que me livrar dela. — Seu timbre
de voz denotava pouco caso, como se estivesse
falando de um produto estragado. No mesmo
instante, Diana deu um passo para trás horrorizada.
— O que está dizendo? O que fez com ela?
— Digamos que ela está de férias
prolongadas. E escute só uma coisa: se você teimar
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em continuar a aparecer aqui, você será a próxima a


espairecer a cabeça na puta que pariu. Agora saia
da boate.
— Você é um porco doente — Diana
sussurrou, e ele riu mais. — Como eu pude me aliar
a você?
— Venha aqui. — Puxei Diana, e Almir não
se espantou ao me ver. — Vamos embora, Diana.
— Ah, então o garotão está mesmo aqui. —
Ele riu e afastou-se. — Os dois para fora, se não
quiserem sair daqui em sacos plásticos. Fez questão
de levantar a camisa para eu ver a arma. Deu as
costas e foi em direção à escada, sendo escoltado
por dois seguranças.

***

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— O que será que ele fez com minha prima?


— Preocupada, ela ainda tentava ligar para Sabrina,
enquanto eu dirigia. — Acho que temos que ir à
delegacia, Benjamin.
— Calma, acho precipitado ainda. Não sei se
é uma boa ter o Almir como inimigo. Vamos
primeiro resolver o problema da boate. La você não
volta mais.
— Eu devo abandonar o que é meu? É isso
que está querendo dizer?
— Você deve salvar sua vida, Diana. A lei te
assegura o bem material. Ele não poderá fazer nada
quanto a isso — ela ficou calada e, do nada, decidiu
falar sobre ele.
— Eu conheci Almir logo quando minha irmã
faleceu. Eu tinha acabado de conseguir emprego
nessa boate. Não era bom, mas também não era
ruim.
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— Dançarina? — Pensar nela tendo que se


virar com uma criança recém-nascida em casa me
dava agonia.
— Não. Algo como gerente. E quando Almir
chegou para comprá-la, ele me fez a proposta de
sociedade, e eu investi todo o dinheiro que tinha. —
ela desviou o olhar, meio desconcertada, e falou em
tom mais baixo: — Foi o dinheiro que seu pai tinha
me dado, para eu ficar longe de você.
Eu odiei ouvir essa parte da história, porque
me remeteu a um momento ruim. A um momento
que, se eu tivesse ido atrás de Daniela, a teria
salvado. Engoli toda a mágoa e foquei no presente.
Hoje eu tinha Maya e Diana e não iria deixar
acontecer como no passado.
— Era uma boa quantia?
— Generosa. Mas não foi o suficiente para eu
comprar a metade da sociedade. E o acordo foi,
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que com o passar dos anos, eu ia comprando dele a


parte que faltava para chegar à metade. E assim
fizemos, pois éramos parceiros e confiávamos um
no outro. Hoje temos partes iguais no comando da
casa.
— E hoje, ele é esse ser intragável...
— A ganância corrompeu Almir. Ele via você
como uma forma de carta na manga. Sempre soube
que você era pai de Maya e sempre achou que eu
usaria isso para tentar te extorquir. Nossa relação
começou a ruir quando eu neguei que faria isso.
Maya não é um produto para se vender.
Relutante, ela levantou os olhos para mim,
temendo encontrar uma carranca ou algo do tipo.
Mas eu sorri.
— Já fechamos esse ciclo. Fico feliz que
tenha amado tanto a minha filha. — Diana
mostrou-se aliviada com minha compreensão.
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Enfim ela conseguiu falar com a mãe de


Sabrina e, para o nosso alívio, a mãe afirmou que a
filha tinha mesmo viajado, mas estava bem, elas
tinham se falado hoje mesmo, por telefone. Diana
recostou a cabeça no encosto do banco,
aparentemente exausta emocionalmente. Toquei em
sua coxa, e ela me olhou.
— Está tudo bem. Fique calma. Vamos tomar
um banho delicioso de banheira quando chegar em
casa — Diana segurou minha mão e assentiu
sorrindo.
— Esse é um ótimo remédio para essa
ansiedade toda. Estou louca para transar mais com
você, na sua cama.
— Ora, ora. Um pedido que o senhor
Linguado pode resolver. — Ela gargalhou. Segurou
minha mão, beijou e suspirou de olhos fechados,
mas contente.

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Chegamos em casa, liguei para Stela e ela


disse que Maya estava ótima. Já tinha jantado e
estava brincando com as crianças. Ao fundo escutei
Maya gritar implorando para dormir lá. Passei o
telefone para Diana, e a deixei falar com Maya.
Depois de milhares de recomendações, ela permitiu
que a menina dormisse na casa de Stela.
Puxei-a para meus braços, assim que ela
desligou a chamada.
— Nós dois sozinhos por uma noite, alguma
ideia para relaxar?
— O que acha de transar até ficarmos
desidratados?
— Suas propostas são as melhores. —
Peguei-a no colo e caminhei para a escada. — O
que acha de pedirmos algo para comermos,
enquanto você mama em mim na banheira?
— Achei muito depravado. Vamos fazer isso.
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No meu quarto, ajudei-a tirar o vestido e me


despi também. Quando estava nu, Diana passou as
mãos pelo meu abdômen e peito.
— Qual o significado delas? — Traçou com o
dedo o coração espetado com um punhal tatuado no
meu peito.
— Essa é a da Dani. — Segurei sua mão
próximo ao meu coração. Com os olhos levemente
saltados, ela me encarou. — Fiz quando tudo
aconteceu... Um coração atravessado com o punhal,
porque eu achava que era a pior apunhalada da
minha vida. E as asas são a representação de que
aquele amor se foi.
— E ele se foi de verdade?
— Sim. O que sinto hoje por ela é algo mais
elevado. É um carinho sublime... Um tipo diferente
de amor.
— Eu fico muito feliz, de verdade, em saber
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que tem um pedacinho do seu coração só para ela.


— Bom, não vamos falar disso, não é? Dani
está em paz, agora.
— É, não vamos falar mais disso. — Ela riu e
acariciou o piercing no meu mamilo. — Doeu para
colocar?
— Não mais que um soco na cara.
— E esse? — Diana segurou meu pau e
examinou o piercing.
— Eu ainda me pergunto como fui capaz de
fazer essa loucura com o meu bem mais precioso.
Doeu pra cacete e fiquei muito tempo de molho,
sem poder nem pensar em trepar.
— Ainda bem. — Ela assumiu um olhar de
vitória.
— Por quê? Ficou com ciúmes, titia?
— Sim. O Linguado é meu. Fico me coçando
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só em imaginar que você ficava por aí, dando


oportunidades de outras experimentar essa obra de
arte. — Ela continuou massageando de leve meu
pau.
Gargalhei diante do olhar ácido dela. Ergui o
seu queixo e beijei sua boca, devagar, degustando
seus lábios macios. Depois me afastei e me curvei
beijando cada um dos seios dela. Já estávamos
pegando fogo novamente e, se continuássemos,
nem iriamos conseguir esperar encher a banheira.
Eu ainda precisava escolher algum lugar para pedir
comida.
— A banheira — sussurrei e afastei a boca de
Diana. Ela já estava lambendo meu peito e
chupando meu mamilo. Levantou o rosto mordendo
um lábio.
— Meu Deus. Esse corpão molhado para eu
lamber todo. Que vida boa.

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Eu ri, e caminhei para o banheiro, mas antes


de chegar lá, o interfone tocou. Era estranho, pois
eu não estava esperando ninguém, e já era dez da
noite.
— Vai enchendo a banheira, que eu vou ver
quem é. — Alcancei um roupão e sai do quarto
vestindo-o.
Quando cheguei à porta, olhei no olho magico
e tomei um susto do cacete ao ver meu pai! Essa
não. Que merda. O que ele queria uma hora dessas
na minha casa?
Abri a porta e o deixei passar. Meu pai entrou
na companhia de um dos seguranças da mansão.
Fechei a porta e fui até ele.
— O que quer?
— Eu tive que sair da minha casa a essa hora
só para te dar um recado. Eu poderia ligar, mas esse
assunto, quero falar na sua cara.
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Cruzei os braços e esperei o que ele tinha para


falar.
— Se a golpista ainda estiver debaixo do seu
teto, fale com ela para dizer à irmã dela que a fonte
secou. Essa Danielle teve a cara de pau de ligar
hoje querendo mais. Eu paguei uma fortuna para
aquela vagabunda manter a família longe de você e,
nitidamente, ela não cumpriu nosso acordo.
De boca aberta, observei ele olhar em volta do
apartamento. Eu nem sabia o que pensar... Que
loucura era essa?
— Pai. A irmã de Diana está morta.
Ele riu ironicamente.
— Se elas duas conseguem enganar você,
esse problema não é meu. Eu já tentei de tudo para
abrir seus olhos. Só dê o recado a ela. Não vou dar
mais um centavo para ela ou a irmã.

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— O que o senhor está falando? Não existe


uma irmã. — Aumentei meu tom de voz. — Ela
morreu, há cinco anos... — Por um momento, eu
suspeitei que meu pai estivesse começando a
caducar, pois não tinha cabimento um papo desses.
E ele não estava disposto a dar mais informações,
apesar da certeza que existia em sua voz.
— Eu paguei pessoalmente a ela. E não foi no
passado. Foi semanas atrás. Eu fui até Danielle
Cristóvão e a vi no carro.
— O que... Pai...isso não é possível.
— Benjamin, vai chamar seu pai de
mentiroso? Eu mesmo entreguei o cheque. Mas não
foi o suficiente, afinal a irmã dela está aqui de
sanguessuga em um dos meus filhos. Não vou dar
mais um centavo a ela e você só ganhará
rendimentos da empresa novamente quando abrir
os olhos e não ser mais besta. — Ele caminhou para

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ir embora, me deixando paralisado, mas voltou e


falou:
— Tudo indica que a menina é sua, mesmo.
Já entrei com pedido de confirmação de DNA já
que você não moveu uma palha ainda. Se for minha
neta, vamos arrancar ela dessas duas sanguessugas.

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32
BENJAMIN

Eu fiquei um bom tempo sentado no sofá,


depois que meu pai saiu, me segurando no
pouquinho de racionalidade que ainda me restava.
Na verdade, eu não iria surtar facilmente com algo
que provavelmente era invenção dele. Durante
longos anos, meu pai jogou inescrupulosamente
com a vida dos cinco filhos, moldando para que
todos estivessem ao seu gosto e, por isso, não me
assustaria se essa fosse apenas mais uma cartada
dele.

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Ele influenciou Stela até ela se casar com


alguém que ele aprovasse. Fez Fernando entrar em
uma disputa ridícula com Miguel, ainda que fosse
dele o direito à vice-presidência da empresa. Ele
está fazendo o mesmo com Andrey, obrigando-o a
se casar a contragosto. E, com o Thadeo, ele luta
ferreamente para ficar com metade das terras que
eram da nossa mãe. Meus irmãos e eu ainda não
chegamos a um consenso do por que nosso pai quer
tanto aquelas terras.
Pensei em Maya e na sua vulnerabilidade
diante da mente maquiavélica do meu pai. Ela e
Diana precisavam do máximo de proteção possível.
— Benjamin? — Levantei os olhos ao ver
Diana me espiar da escada. — Quem era na porta?
— Ah... — Caminhei até ela. — era o porteiro
para falar de um vazamento que ele achou que era
aqui.

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Ok. O caso é o seguinte: amanhã irei tomar


minhas providências para investigar essa história a
fundo e descobrir o que meu pai anda aprontando.
Enquanto isso Diana, não precisa saber a respeito
dessa podridão envolvendo o nome da irmã.
Eu estou bastante bolado com essa história,
uma vez que ele parecia ter certeza do que dizia.
Mas não tinha cabimento. A própria Maya sabia da
morte da mãe, e criança não mente. Passei o braço
no ombro dela e voltamos para meu quarto.
— Diana, a gente estava falando sobre a
Dani... Tenho uma curiosidade.
— Diga.
— Você a viu... quando ela...
— Sim — respondeu antes de eu terminar de
falar, parou de andar e me encarou. — Eu não
consegui acompanhar tudo, pois estava em choque.
Os pais de Sabrina ficaram à frente das
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providências. Mas eu a vi e... — Ela engoliu as


dolorosas palavras e havia um ar de curiosidade em
suas feições. — Por quê?
— Nada. Eu pensei em como você foi forte,
sozinha, para lidar com tudo aquilo.
— Eu tinha a Maya para me sustentar. E
ainda é a força que me mantém focada.
Eu estava convencido das palavras dela. Meu
pai estava mesmo tentando tirar uma carta da
manga. Eu não iria deixar que ele fizesse o mesmo
que fez no passado comigo e a Dani.
— Venha cá. — Puxei Diana para perto de
mim, e ela se aninhou nos meus braços, com o
rosto no meu peito. — Sabe que pode contar
comigo, não é?
Ela pareceu confortável ouvindo minhas
palavras e levantou os olhos fitando os meus.

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— Você não é tão chato como eu o havia


classificado anteriormente.
— Você nunca me achou chato, só gostoso.
— Com um impulso, a suspendi segurando sua
bunda, e Diana enroscou as pernas na minha
cintura. — Vamos para a banheira?
— Vamos. — Ela riu, retribuiu o beijo que eu
dei, e formos para o banheiro.
Depois do sexo louco que tivemos por todos
os lugares, incluindo sobre a pia, o que não posso
deixar de comentar como sendo um dos melhores
lugares para trepar, descemos e comemos o que
sobrou do almoço. E depois, Diana me
surpreendeu, tirando do congelador sorvetes no
palito que ela tinha comprado ontem e esqueceu de
servir. Era uma coisa enorme e roliça, impossível
de colocar na boca. Observei a safada lambendo em
volta e, em seguida, abocanhando-o, chupando-o

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com avidez.
— Não vai provar? — Ela e eu olhamos, ao
mesmo tempo, para o meu picolé intocado.
Coloquei o picolé em um prato e o cortei com
uma faca, jogando um pedaço na boca.
— O que está fazendo? — Diante do meu ato,
os olhos de Diana saltaram de choque.
— Comendo. — Puxei um banquinho para
sentar ao lado dela, no balcão.
— Isso não se come, Benjamin. Se chupa.
— Tá zoando com minha cara, achando que
eu vou mamar um bagulho desse?
Diana soprou sem paciência.
— Não é mamar. É chupar, lamber, como
qualquer pessoa normal.
Sem dar ouvidos a ela, cortei mais um pedaço
do picolé e joguei na boca.
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— Você já viu um homem chupar uma coisa


dessas? Para você ter uma ideia, Andrey nem
mesmo come banana no sentido vertical. Ele
descasca ela inteira e a come deitada.
Diana ficou por segundos em silêncio com a
mão nos olhos. Tinha um tom de irritação nos olhos
quando me olhou.
— Meu Deus, eu não estou ouvindo isso. É
muita fragilidade masculina. Benjamin, você
chupando um picolé, apenas em minha presença,
não te fará menos homem.
— Dane-se. — Dei de ombros e voltei a
cortar o picolé. Ela já estava espumando de raiva,
como se minha ação fosse profana ao mundo das
sobremesas geladas.
— Vejo cada coisa. — Ela levantou-se e foi
em direção ao quarto.
— Para onde vai?
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— Dormir sozinha. Você é muito frágil pelo


meu gosto.
— É o que vamos ver. — Quando dei um
passo, Diana correu. Olhou em volta e decidiu subir
as escadas. Eu era um atleta. Em duas passadas, já
estava quase tocando nela.
— Benjamin! — berrou no momento em que
a segurei, e esbarramos juntos contra a parede do
corredor.
— Vou te mostrar quem é o macho frágil. —
E a arrastei para o quarto. Joguei Diana na cama,
tirei o roupão e segurei em seu calcanhar, quando
ela tentou rastejar e pular para o outro lado.
— Sem escapatória, gatona. Chegou a hora de
testarmos suas cordas vocais.
E foi mesmo pura loucura. Se o sexo mais
cedo, no banheiro, tinha sido louco, esse foi o
triplo. Diana não era uma menininha indefesa, e ela
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entrou no meu jogo, me atacando e provocando


altas doses de prazer que apenas com ela consegui
chegar. Saí da foda todo mordido e arranhando,
mas com um sorriso largo de satisfação. Assim
como ela que tinha ganhado um par de pernas
bambas e braços moles, lutando para recuperar o
folego depois da nossa explosão tórrida na cama.
Eu estava lá caído ao lado dela, olhando o teto,
suado, cansado e cheio de calor.
Ela se arrastou como pode para cima de mim,
e deitou sua cabeça em meu peito, abraçou meu
tórax e nossas pernas se entrelaçaram
automaticamente. Só deu tempo de puxar um lençol
para nos cobrir, e acabamos dormindo com os
corpos impregnados de sexo e prazer.
Acordei já era dia. Diana estava me
empurrando para levantar-se. O calor estava
insuportável, e eu precisava de um banho urgente.

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— É tarde? — indaguei. Ela sentou-se na


cama, de cabeça baixa, e enfiou os dedos nos
cabelos, ficando nessa posição, em silêncio. —
Diana?
— Sete e meia. Precisamos buscar Maya.
— Está tudo bem?
Ela puxou o lençol, que já estava quase todo
para fora a cama, se enrolou e só então me fitou.
— Estamos pegando uma via sem volta,
Benjamin.
— Do que está falando? Do sexo?
— Não é só sexo. — Ela arfou, fez menção de
ir ao banheiro, mas voltou. — Eu sempre fui
confiante e decidida sobre meus relacionamentos...
— E o que está pegando agora? Não está bom
para você?
— Bom até demais. E esse é o problema.
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Cara... Estamos nos envolvendo sem aparar as


arestas.
Pulei da cama e fui até ela.
— Que arestas?
— A Maya...
— A Maya está ótima, vivendo com o pai e a
mãe dela.
— Você faz tudo parecer mais fácil. — Diana
sorriu e sacudiu a cabeça.
— Porque é fácil. Você mesma disse que é
experiente o suficiente para ser decidida com os
relacionamentos. Chegou a hora de mostrar isso.
Além do mais, olha o calibre do cara que você está
pegado. — Puxei-a pelo lençol e a abracei — Não é
para qualquer uma. Sem pirar, ok, gata?
Ela riu e assentiu. Se desvencilhou dos meus
braços e foi para o banheiro. Não antes de eu a

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alcançá-la.

***

Chegamos à casa de Stela quando ela estava


dando café às crianças. Ela colocou mais dois
lugares à mesa, para mim e para Diana, e sentou-se
com a gente. Ela tomou um gole de café, me
olhando com relutância. As crianças estavam
dispersas, então questionei:
— O que houve?
— O papai esteve aqui ontem, assim que você
saiu, e conheceu a Maya. — Stela falou e Diana
tossiu com ânsia quase cuspindo café sobre a mesa.
Eu já imaginava algo assim, uma vez que ele foi
ameaçar tomar a menina da Diana.
Olhamos em volta e as crianças ainda estavam

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indiferentes à nossa conversa, entretidas entre eles.


— O que... o que ele fez com ela? — Diana
murmurou, aterrorizada. E eu compreendia e
compartilhava com ela esse medo.
— Nada. Ele pareceu gostar da Maya e não
me corrigiu quando eu falei com ela que era o avô.
Maya gostou de conhecer o avô.
Segurei a mão de Diana, mostrando que
estava ali com ela, que nada aconteceria com a
menina. Até pude relaxar os músculos, ao ouvir que
meu pai não tinha sido perverso com uma criança.
— Ele está irritado por você não ter ido
trabalhar — Stela informou. — e disse que vai
esperar você se dar conta de seu erro.
— Erro. — Ri, tripudiando. — Nosso pai
sempre viu como erro nossas escolhas, que não
batem com a dele. Não contou para ele sobre meus
planos, né?
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— Não. Apesar de eu ser contra o fato de


você pegá-lo desprevenido...
— Não irei. Mandarei um convite pra ele,
uma semana antes.
— E serão belos convites — Diana
completou, piscando pra Stela.
— Certamente. — Minha irmã bateu palmas
de felicidade. — Eu tenho muitas ideias para
mostrar a você, mano. Fiz sem o Miguel ver. Odeio
omitir do meu marido, mas será por um bom
motivo.
— Ótimo. — Esfreguei as mãos em
contentamento. Eu mal podia esperar para chegar o
dia em que eu assinaria de uma vez por todas a
minha liberdade.
Depois que saí de lá, deixei Maya e Diana no
meu apartamento, com a desculpa de que iria
resolver algumas coisas no estúdio, mas fui direto
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me encontrar com Andrey. Eu tive que ir até a


empresa, pois era meio difícil conversar com ele
fora dali. E seus momentos de folga estavam
terrivelmente preenchidos pela noiva.
Por sorte, nem topei com meu pai, mas vi
Miguel de longe, o que significava que o velho
saberia da minha visita mais cedo do que o
esperado. Era a primeira vez que entrava no prédio
da Capello sem o uniforme: terno e gravata.
Usando uma camiseta comum que deixava meus
braços tatuados à mostra, jeans rasgado no joelho e
botas estilo esporte fino. O povo parava para me
olhar, a verdadeira face do caçula rebelde que
muitos já desconfiavam. Até me senti andando em
câmera lenta, enquanto percorria os corredores e
chegava à sala de Andrey.
Dei duas batidinhas na porta, e, após ele
ordenar, entrei.

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— Eita, porra. Veio pisar mesmo na goela do


velho. — Sua observação debochada me fez rir. Me
sentei à sua frente.
— Não quero nem topar com ele. O assunto é
sério.
— O que é?
— O pai foi me confrontar com uma história
cabeluda que a irmã de Diana está viva e
extorquindo ele, chantageando, não sei muito bem.
Como posso passar isso a limpo?
— Viva? Cacete, Benjamin! Essas cobras
estão te dando a rasteira.
— A Diana não faria isso. O pai está
inventando história. — Passei as mãos nos meus
cabelos baixos. — Mas tenho que ter certeza. Esse
assunto está fodendo com minha cabeça.
— Enquanto você fode a tia da menina —

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ironizou, e eu o ignorei. Era um assunto para


ignorar.
Ele levantou-se e andou pela sala, pensativo,
coçando a barba.
— Viva? — Olhou para mim, visivelmente
tão abalado quanto eu. — Ele tem certeza disso?
Me refiro ao nosso pai.
— Andrey, ele está inventando. Até parece
que você não o conhece. Mas eu quero provas,
para poder, enfim, enfrentar ele.
— Ok. — Ele voltou para a mesa, pensou em
silêncio por mais alguns minutos e me fitou. —
Tem um jeito.
— Qual?
— Estamos tentando quebrar o sigilo bancário
do pai. Porque houve um cheque de alto valor
descontado da conta da empresa, com a assinatura

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dele. Até tentei barrar, mas o pai me deu um


esporro dizendo que era coisa dele. Temos que
saber o que ele anda fazendo.
Um cheque de alto valor. Puta que pariu. O tal
cheque que ele afirmou, ontem, ter pago à Dani.
Uma Dani que estava, sim, morta. Eu tinha certeza.
Ou eu queria ter certeza?
Porque, de repente, me flagrei pensando como
seria a volta dela, agora que eu já estava tão
envolvido com Diana.
Não comentei com Andrey, mas senti um
calafrio desesperador só de imaginar que talvez
meu pai não estivesse mentindo.

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33
DIANA

Eu fiz o que Benjamin havia proposto:


mergulhei de cabeça em um romance que meses
atrás eu seria a primeira a condenar. Eu nunca fui
uma mulher sonhadora, que fazia planos com um
homem maravilhoso e filhos lindos. Minha irmã,
inclusive, questionava esse meu posicionamento.
Nunca havia me imaginado vivendo um romance
desses, que fazem o estômago flutuar e o corpo se
arrepiar. Ter vontade de estar com a pessoa, beijá-
la e senti-la em todos os pontos Ainda mais com o

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pai de Maya..
Mas agora, aos trinta e oito anos, eu estava,
aos poucos, me reabrindo para um novo mundo e
conseguindo, enfim, superar o fato de que éramos
livres para viver esse romance.
Benjamin mudava também diante dos meus
olhos. A nossa convivência o fazia bem. Pela
primeira vez, ele encontrou quem não o criticasse, e
sim o apoiasse. Ah, pode acreditar, eu estava lá, ao
seu lado para apoiá-lo diante de suas escolhas, dar
o empurrão que ele sempre precisou. Até mesmo
nas lutas clandestinas. Se era algo que o deixava
calmo, então eu não reprovaria.
Os caras, amigos dele, se assustaram no dia
em que entramos de mãos dadas naquele antro
fedendo a suor, briga e bebida. Eu me sentia a
senhora do submundo, com minha calça de couro,
botas altas e jaqueta de couro. Foi delicioso cortar a

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cidade na garupa da moto pilotada pelo meu boy


novo e rebelde e chegar onde ele desfrutaria de sua
sessão de terapia, a luta clandestina.
— Olha só. O Leiteiro veio acompanhado
dessa vez — um dos caras falou, e todos se
juntaram para ver a primeira mulher a participar do
evento. Homens grandes, cheios de músculos e
tatuagens. Sem camisa, suados, sujos e
ensanguentados. Era um horror, mas eu entendi que
Benjamin se juntava a eles para conseguir ali um
ponto de conforto. Toda essa brutalidade era a
forma que ele encontrava para esquecer outras
dores.
— Rapazes, essa é a Diana. Diana, rapazes —
Benjamin me apresentou, com seu braço ao redor
de minha cintura, numa demonstração possessiva.
— Cara, sem mulheres... — O tal Tucano deu
um passo a frente e, imediatamente, se desculpou

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comigo: — Nada contra a senhorita.


— Tem alguma regra? — Benjamin
questionou. — Nunca falamos sobre isso.
— E uma mulher nunca esteve presente.
— Porque nenhuma nunca quis vir. Ou nunca
foram convidadas. Eu posso continuar as lutas
rendendo muito em apostas para a casa, mas ela
fica.
Ele pensou por alguns segundos, encarando
Benjamin, e depois voltou-se para mim.
— E a senhorita? O que vai fazer aqui
enquanto os caras quebram a cara de seu
namoradinho? — Tucano me provocou, e eu deixei
a risada irônica fluir.
— Não farei nada além de torcer para ele
quebrar alguns narizes.
— É isso aí. — Benjamin aprovou minha

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resposta. — Vou me trocar. Ele virou-se, e dei um


tapinha em sua bunda.
— Vai, gostoso, te espero aqui. — Quando
voltei o rosto, os caras ainda me observavam. —
Pois não? Perderam algo aqui? — Foi o suficiente
para dispersá-los. Apenas Tucano ficou me
olhando.
— Parece que ele, enfim, encontrou a tampa
de sua leiteira. — Tucano debochou. — Senta aí
moça, o show vai começar.
E que show.
Foi tenso e desesperador assistir aquelas
rodadas de lutas, pensando que alguém sairia morto
dali. Me ofereceram uma cerveja, e eu agradeci o
líquido gelado e meio amargo que animou meus
nervos. E quando Benjamin subiu no ringue, me
aproximei mais. Ele piscou para mim e se jogou no
combate.
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Caramba! Que homem!


Cada golpe e cada defesa eram
meticulosamente ensaiados. Eu fechava os olhos
quando ele era atingido e vibrava feito louca
quando ele revidava. Eu estava mesmo vivendo o
romance intenso que as garotas sonham. E isso,
além de divertido, era sexy... Era delicioso.

Benjamin era tão bom em lutar como em


pintar. Era uma dualidade impressionante, do bruto
com o delicado. Era lindo ver um homem daquele
tamanho, cheio de músculos e tatuagens, só de
calção, sentado diante de uma tela, colocando ali
cada pequeno traço cirurgicamente calculado,
formando uma imagem perfeita.
Ele estava pintando com mais frequência,
porque nos mudamos para o estúdio, apenas uma
temporada, uma vez que ele estava criando o
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catálogo perfeito para a exposição.


Eu abandonei de vez a boate, por causa das
ameaças de Almir. Minha decisão era vender a
minha parte e ficar livre dele de uma vez por todas,
e eu queria fazer isso depois da exposição. Eu
passava meus dias em casa ou passeando com
Maya no fim de tarde. Meu tempo estava
preenchido com os planos para a exposição de
Benjamin. Stela e eu procurávamos por locais onde
poderia ser o evento, pesquisando nomes
importantes no mundo da arte, elaborando os
convites e os folhetos de divulgação. Tudo estava
se encaixando perfeitamente, conforme os dias
passavam.
Maya, enfim, sabia do meu romance com
Benjamin. Achei que não devia ser uma surpresa
para ela e tomei a iniciativa de fazer a revelação.
— Maya. — Tirei a atenção dela do tablet

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onde gravava seus costumeiros vídeos. — A


mamãe vai contar uma novidade.
— O quê, mamãe? — Virou-se totalmente
para mim, interessada. Olhei para Benjamin no
outro sofá, sorrindo satisfeito por eu ter aceito, na
noite anterior, um relacionamento sério com ele.
Oficialmente, estávamos namorando.
— O papai Benjamin é o meu namorado a
partir de agora.
— Ah, disso eu já sabia. — Fez uma
expressão inteligente surpreendendo nós dois.
Boquiaberta, encarei ele, que preferiu rir diante da
minha incredulidade.
— Já sabia? — Poxa, eu jurava que estava
sendo cuidadosa, pegando-o no sigilo. — Como
você sabia, meu bem?
— Mamãe, eu vi você beijando o meu pai
enquanto ele pintava ali. — Apontou para onde ele
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costumava sentar-se e pintar. — E também eu


acordei mais cedo e fui no quarto dele e você
estava dormindo lá, igual todos os papais e as
mamães dormem juntos na cama grande.
Burro é o adulto que tenta enganar criança
hoje em dia. Me preocupei com o que ela pode ter
visto na cama. Mas lembrei que desde quando
mudamos para o estúdio, eu nunca dormi nua com
ele. Acabei rindo e a abracei.
— Menina esperta.
Benjamin sentou-se do outro lado e beijou os
cabelos de Maya.
— Está feliz, princesa? — ele perguntou.
— Sim. Agora me deixem terminar de gravar
meu vídeo. — Afastou-se dos meus braços e pulou
para o chão, cercada de bonecas e almofadas. E nós
dois ficamos lá, cada um ao lado dela, olhando-a
com sorrisos de lábios fechados.
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— Fiz para você. — Benjamin parou de pintar


e pegou o copo grande na bandeja. Suco natural
com um pouco de vodca e gelo. Ele deu um gole e
envolveu minha cintura com um braço e beijou
meu umbigo. E eu fazia cafuné nos cabelos dele.
— Agora não precisamos mais esconder —
falou.
— Ainda estou chocada por ela ter percebido
e ficado calada. — Puxei um banquinho e sentei-
me ao lado de Benjamin. Ele estava como sempre,
só de calção, com manchas de tinta pelo corpo. Não
havia um momento em que meu corpo não ardesse
de desejo por ele. Era incrível nossa força de
atração, apesar de estarmos quase um mês juntos,
eu não queria que esse desejo poderoso acabasse. É
delicioso sentir desejo por alguém.
— Que lindo. — Eu encarava, quase sem
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pestanejar, a perfeição da pintura escura com traços


roxos e azuis. — Parece o espaço.
— É o espaço. A lua vista do espaço. E
aquela é a mesma imagem vista da terra. —
Apontou para uma tela já pronta. — Pode ser
vendida separadamente, mas eu vou expor em
conjunto.
— É muito bonito. São duas estrelas próximas
à lua? — observei.
— Sim. Representam duas pessoas que já
partiram, e que foram muito importantes na minha
vida. — Ficou um tempo calado, encarando o
desenho e olhou nos meus olhos para revelar: —
Minha mãe e Dani.
— Está muito lindo. Vai expor o quadro da
minha irmã?
— Sim. É o meu quadro mais famoso.
Encerrei o leilão na internet e avisei que ele seria
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exposto em breve. Você não se importa, não é?


— Não. De jeito nenhum.
— Não sei se irei vender. Apenas expor. —
Deu de ombros.
— Eu te apoiarei conforme a sua decisão. —
O semblante dele se encheu de contentamento.
Anuiu e beijou meus lábios.
— Obrigado. Estou querendo parar por hoje,
já é tarde e eu ainda tenho alguns planos.
— Que planos?
— Naquele quarto. Diversão dos adultos com
direito a piercing, álcool e muito suor.
— Planos perfeitos. Pode contar comigo.
— Mas sem gritos — avisou, com a boca
pertinho da minha.
Puta que pariu, que tesão.

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— Sem dar um pio — concordei e pulei nos


braços dele. Eu era tão pervertida, não conseguia
parar de pensar em transar com o boy gato.

***

O dia do exame de DNA chegou, e eu


amanheci apreensiva. Não por ter alguma dúvida da
paternidade, mas porque eu não sabia o que o pai
de Benjamin poderia querer fazer, diante da
comprovação de que Maya era sua neta.
Maya estava assustada e não entendia por que
precisava fazer um teste para comparar o sangue
dela com o de Benjamin. Segundo seu raciocínio,
se ela já o chamava de pai, então ele era o pai dela.
Ela estava sentada em uma cadeira entre
Benjamin e eu, na sala de espera do laboratório.

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Calada, balançando as pernas, provavelmente


preocupada. Maya era esperta e, como toda criança,
gostava de fazer perguntas. Na noite anterior, nos
sentamos com ela e contamos o que teríamos que
fazer: comparar os sangues para ter a prova e então
ela poder usar o sobrenome de Benjamin. Maya
Cristóvão Capello. Nunca achei que chegaria esse
dia, mas agora que chegou, eu estava exultante por
Benjamin querer tanto dar o nome a ela.
— Papai Beijamin.
— Diga, princesa.
— Se o nosso sangue for diferente, então eu e
a mamãe vamos ter que ir embora do seu
esconderijo? — ela questionou, revelando que era
sobre isso que estava pensando. Quando Benjamin
apresentou o galpão a ela, explicou que lá era o
esconderijo dele, como a “Batcaverna”. Maya
achou um máximo. Amou mais do que o

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apartamento.
— Nosso sangue não é diferente. Você vai
ver. — Benjamin beijou os cabelos dela, a
reconfortando. E ela confiou nele.
— Tá bom.
— O papai vai prometer uma coisa. Quando
sair o resultado e mostrar que nosso sangue é
igualzinho, a gente vai fazer uma grande
comemoração.
Calada, sem sorrir, ela apenas assentiu.
Quando chamaram os dois para colher o
sangue, eu fiquei lá, ao lado da cadeira, segurando
a mão de Maya, tentando não passar para ela a
minha apreensão.
— Não vai doer, meu bem. É só uma
picadinha.
— Eu sei, mamãe. Eu já sou uma mocinha. —

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Ela apertou os olhinhos, lutando contra o medo que


era maior que a dor.
O sangue foi retirado, a mulher fez um
curativo e deu um pirulito para Maya.
— Prontinho. Um pirulito para uma menina
forte que não chorou.
— Obrigada. — Recebeu o pirulito. — Moça,
você tem que dar um pilurito para meu pai também,
porque ele também tirou sangue. — A mulher riu,
pegou mais um pirulito e entregou Benjamin.
Fomos comunicados que o resultado sairia no
período de uma a duas semanas. Era muito tempo
para esperar, ainda mais quando a tensão era a
nossa principal companhia. Eu prometi a mim que
esqueceria disso e focaria apenas na preparação da
exposição de Benjamin.
Eu e Maya ficamos em frente ao laboratório,
enquanto Benjamin foi buscar o carro Como o
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estacionamento era subterrâneo, preferi não entrar,


pois eu sentia pânico de lugares assim.
— Mamãe... — ela puxou minha mão. —
Olha lá, mamãe.
— O que, meu bem?
— Parece com a mamãe Dani, de novo,
olhando para mim.
Meu corpo gelou completamente, e quando
olhei para o outro lado da rua movimentada, ela
estava lá mesmo. Foi muito rápido, mas eu pude
vê-la. Ela virou-se no mesmo instante, de cabeça
baixa, e andou rápido se misturando com as pessoas
na rua.
Eu estava aterrorizada. De uma maneira que
me fazia sentir impotente, sem entender o que
estava acontecendo e o que eu poderia fazer a
respeito. No mesmo instante, senti meu celular
vibrar. Abri a bolsa e o peguei. Uma mensagem de
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um número desconhecido. Senti um calafrio terrível


e um medo que eu jamais tive, ao ler a mensagem.

“Você é a pior traidora do mundo.


Ela é minha filha.”

Meu corpo tremia e batia o queixo, de pavor.


Benjamin saía do estacionamento com o carro, e eu
me abaixei diante de Maya.
— Não é a mamãe Dani. É só alguém
parecido. Não conte nada para o papai, tudo bem?
— Sim. Não vou contar.
Beijei a testa dela e fomos para o carro. Eu
não queria que ele soubesse, antes de eu entender,
de uma vez por todas, o que estava acontecendo. Eu
tinha que falar com alguém, e decidi que iria falar
com Stela, já que minha prima tinha sumido do
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mapa.

— Está um pouco estranha — Benjamin


sussurrou para min, quando chegamos ao estúdio.
— Ansiedade apenas.
— Por causa do exame?
— Sim. Isso. Fica tranquilo, não é nada
demais. — Ele foi para o quarto trocar a roupa,
vestiu uma bermuda e foi pintar. Dessa vez, Maya o
acompanhou, em uma tela pequena que ele
preparou especialmente para ela.
Sorri, com lágrimas nos olhos, vendo os dois
juntos, cada um de frente de uma tela. Maya
tentava copiar o que Benjamin pintava.
Ela não era minha filha biológica, mas era
meu bem mais precioso, e se fosse realmente Dani,
ela saberia disso. Peguei o celular e, sem Benjamin

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e Maya verem, tirei uma foto dos dois pintando. No


mesmo instante vi uma nova mensagem chegar.

“Quer entender o que está acontecendo?


Venha me encontrar hoje às quatro da tarde no
endereço a seguir.
Esperarei apenas por dez minutos.”
D.

Li o endereço e o joguei no GPS. Era um


prédio em uma área nobre da cidade. E o que mais
me deixou aterrorizada foi a assinatura, apenas um
“D”.
As horas seguintes, foram necessárias para me
fazer tomar uma decisão. Eu poderia falar com
Benjamin, tentar explicar e levá-lo comigo. Mas
tive medo de ser questionada. Eu não queria, nesse

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momento, perder relação que tinha construído com


ele. O que fiz foi ligar para Leandro, o segurança e
pedir para me esperar no endereço.
Quando estava próximo das quatro, falei com
Benjamin que iria ver minha prima ,que ela estava
na casa dos pais dela. Ele aceitou ficar com Maya,
mesmo estando desconfiado da minha ansiedade.
Saí de lá tremendo, amedrontada, sozinha, sem
imaginar o que poderia encontrar. E torcendo para
não encontrar o que eu cheguei a cogitar.

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34
DIANA

— Algo suspeito? — indaguei a Leandro,


assim que cheguei em frente ao prédio e o vi,
recostado em um carro.
— Não. Até agora tudo tranquilo.
— Ótimo. Você entra comigo. Vamos.
— Dona Diana...
Me virei e ele ainda estava parado, meio
relutante em me encarar.
— O que houve, Leandro?
— A ordem lá na casa é para não servirmos

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mais a senhora. Eu só vim por amizade mesmo.


— Almir fez isso, é?
— Sim. — Ergueu os ombros grandes e, após
coçar a cabeça raspada, seu olhar curioso me
atingiu. — Pode me contar o que está acontecendo?
— Digamos que é um fantasma tentando me
assombrar. Me acompanhe por favor, pode ser uma
armadilha.
— Certo.
Caminhamos para o portão, e após eu me
identificar com o porteiro, ele nos comunicou que
minha entrada já estava liberada com antecedência.
Com pressentimentos tenebrosos e calafrios, subi o
elevador ao lado do segurança da boate. Em minha
mente, brotavam mil pensamentos por segundo, se
atropelando de maneira aflitiva. E o pior deles era
pensar na possibilidade de ter sido enganada por
minha irmã. Ter caído em um desses planos fajutos
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de novelas em que alguém finge a própria morte


por um bem maior.
Se fosse o caso de Dani, qual seria o motivo?
Por que ela teria que fingir a própria morte? Ela
amava a filha crescendo em seu ventre e, mesmo
depois da separação com Benjamin, ainda assim,
ela tinha fome de viver, de dar a volta por cima, de
ser autossuficiente. Simplesmente, não fazia
sentido.
Quando chegamos ao andar, fiz sinal para
Leandro me esperar do lado de fora. Apertei a
campainha e me afastei um pouco. Nada. Nem sons
de passos ouvi. Apertei novamente a campainha, e
nada. A hipótese de que não tinham me esperado
me dava pânico, uma vez que eu sentia ânsia de
entender o que estava acontecendo. Bati mais uma
vez, e nada. Então, por curiosidade, Leandro virou
a maçaneta e ela estava destrancada. Empurrou a

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porta e, à nossa frente, estava um apartamento


vazio. Sem móveis, nem nada.
— Espera — Leandro falou e sacou uma arma
da cintura, me fazendo estremecer. Nem sei por que
me dei ao trabalho de achar estranho um dos
seguranças de Almir andar armado.
— Vou averiguar. — Passou por mim, entrou
no apartamento, demorou segundos para voltar,
com uma expressão surpresa.
— Ninguém aqui. Mas você tem que ver isso.
Confiei nele e entrei depressa. Não tinha
mesmo nada e nem ninguém, mas uma parede
estava repleta de fotos e pequenos recados que me
fizeram dar um passo para trás atordoada. Com a
mão no peito, observei fotos minha e de Benjamin
saindo do prédio dele, Maya no shopping,
Benjamin e eu saindo da boate, entre outras
dezenas. E tudo que estava escrito nos papéis
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colados juntos com as fotos, eram frases que eu


passei parte da vida falando:
“Eu sinto tanta a falta da minha irmã.”
“Maya é tudo para mim.”
“Eu odeio pensar no nome Capello.”
“Jamais deixaria minha filha em segundo
plano.”
“Dani estaria orgulhosa de mim.”
Era claramente uma tentativa de me abalar.
Uma tentativa de me colocar como uma vilã que eu
não era. Eu sabia que era uma indireta bem grande,
pelo o fato de eu estar com o ex da minha irmã.
Quem quer que tivesse feito isso, era um filho da
puta e ao invés de causar pânico, esse mural escroto
gerou ódio dentro de mim. Com fúria, arranquei os
papéis rosnando feito uma onça. Rasguei tudo e
nem falei nada com Leandro, apenas saí rápido,

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desejando que o autor de tamanha babaquice


estivesse por perto para eu o atacá-lo.
Leandro foi embora, e eu não voltei para o
esconderijo de Benjamin. Com mãos trêmulas e
geladas, procurei o número de Stela e liguei para
ela.

***

Stela me observava com um olhar cético


enquanto eu narrava a sucessão de bizarrices que
vinha acontecendo. Eu passei minutos a fio, no
carro, ponderando se seria mesmo prudente contar
a história justamente para a irmã de Benjamin.
Entretanto, não tinha quem pudesse me ouvir e me
dar uma dica. Até Amanda estava indisponível,
viajando.

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Terminei de falar e tomei um gole do meu


chope. Nós duas estávamos sentadas em uma mesa
de um bar, perto da casa dela.
— Diana... eu nem sei o que falar. — Seu tom
era cauteloso, apesar da grande ansiedade que a
tomava. — A única coisa que tenho certeza é que
meu irmão pode surtar ouvindo uma história
tenebrosa dessas. Olha aqui — Mostrou o braço
dela. — Me arrepiei enquanto você contava.
— Nem me fale. Eu estou em pânico.
Pressinto que quem quer que esteja fazendo isso,
quer cada vez mais me encurralar.
— Eu sei que essa pergunta é ridícula, mas
você tem certeza que viu sua irmã morta?
— Sim. Eu vi. Não cuidei de nada do enterro,
pois estava muito abalada e não saía da
maternidade onde Maya estava. Mas eu a vi pouco
antes de ser enterrada. Eu a vi no caixão. — Acabei
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deixando lágrimas cair e alcancei um lenço que,


habilmente, Stela sacou da bolsa. — Que ódio! —
falei. — Estão profanando minha irmã. Dani não
merecia tudo que passou, não merecia o fim que
teve e não merece que agora alguém profane a sua
memória. — Senti Stela acariciar minha mão em
solidariedade. — Eu tenho certeza que não é ela.
Ela jamais faria isso comigo e com Maya.
— Vamos descobrir o que está acontecendo
— determinada, Stela me animou. — Você tem
alguma ideia de quem pode estar fazendo isso?
— Nenhuma. A aflição não está me deixando
raciocinar. — Limpei os olhos e tomei mais um
pouco de chope. — Eu queria muito desabafar com
Benjamin, mas tenho medo de ele pensar que estou
criando algo, armando um plano, não sei. Queria
falar com ele só quando eu tivesse certeza.
— Eu concordo. Meu irmão pode meter os

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pés pelas mãos. Sabe o que pensei, Diana? Você


poderia armar uma emboscada. Pelo que me
contou, essa pessoa sabe de seus passos e de Maya,
para ficar espionando vocês.
— Sim. É alguém que sabia que Maya ia
colher sangue. Eu só preciso descobrir uma forma
de atrair a atenção...
— O dia da exposição do Benji. Será uma
informação pública de grande divulgação.
— E pode ser que essa pessoa queira ir —
continuei o raciocínio dela. — Seria uma ótima
forma de atraí-la.
— Você nem precisa tentar entrar em contato
com ela. Leve adiante os planos do evento. Vamos
torcer para que essa pessoa esteja lá, então, você a
pegará.
Assenti, pensando em como seria delicioso,
enfim, poder encarar quem estava fazendo isso.
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Quando cheguei ao estúdio, encontrei


Benjamin ainda pintando e Maya gravando vídeos
em seu tablet. Eles não me viram, e eu me recostei
na parede, com lágrimas nos olhos, emocionada
vendo-a gravar. Eu nunca a abandonei, nunca a
coloquei em segundo plano e não quero considerar
como verdade todas aquelas merdas subtendidas
que estavam no apartamento.
— “Este é o meu pai e ele é colorista” —
Maya falava filmando com o tablet. — Manda um
beijo para meus seguidores, papai.
Eu ri com os olhos embaçados de lágrimas.
— Um beijo, seguidores da minha princesa.
— Benjamin jogou um beijo para a câmera e voltou
a se concentrar. Maya continuou.
— “E todos esses quadros foi ele que pintou.
Mas não pode mostrar ainda, porque é uma
surpresa.” — Ela passou por entre os quadros
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pintados e cobertos, e depois voltou para um todo


riscado e pintado de qualquer jeito. — “Esse é o
meu quadro que eu tentei pintar. Não sou muito boa
ainda como meu pai, mas ele vai pintar um
unicórnio gigante no meu novo quarto, na nossa
nova casa que a gente vai mudar.”
Ouvir isso me pegou desprevenida. Ele tinha
planos que não me contara, mas contou para ela.
Era ótimo ele incluir a filha em seus planos, mas,
de repente, me senti isolada. Enfim Maya me viu e
veio correndo até mim.
— “Essa é minha mãe, escondida.” Diga um
olá para meus seguidores, mamãe.
— Olá seguidores. — Acenei, esperei ela
desligar o tablet e a peguei no colo. — Como
passou a tarde? Se comportou direitinho?
— Sim. O papai fez leite com Toddy para
mim.
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— É a única coisa que ele saber fazer —


desdenhei.
— Ao menos para você não preciso fazer
nada, não é Diana? Afinal, você gosta do meu leite
puro...
Sem poder responder à frase maliciosa dele na
presença de Maya, apenas mostrei o dedo.
Ele se levantou e espreguiçou, veio até mim e
me abraçou, junto com Maya.
— Falou com sua prima?
— Sim. — Sorri mentindo.
— Está tudo bem? — Limpou vestígios de
lágrimas no meu olho.
— Ótima. Terminou os quadros?
— Esse é o último. Hoje receberei a visita dos
agentes que vão catalogar tudo. A divulgação
parece estar dando certo.
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— Mal posso esperar para o evento semana


que vem. — E eu queria mesmo que chegasse e
torcia para que a desgraçada aparecesse.
— Eu também. — Ele beijou de leve meus
lábios e, em seguida, a bochecha de Maya.
— Eu também. — Ela gritou contagiada pela
nossa euforia.
Eu queria acreditar que aquele pequeno
mundinho feliz seria indestrutível. Dizem que
apenas garotas têm sonhos fantasiosos, mas eu
estava pronta a intervir com uma argumentação de
que mulher, em qualquer idade, podia sonhar.
Porque essa era a minha realidade. Sempre firme,
forte, tão poderosa, inabalável, e, agora, me
resumia a uma apaixonada que tinha medo de
perder todas essas boas emoções.
Ah, sim, eu estava apaixonada, depois de
quase um mês morando com o caçula dos Capello.
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E não me sentia nem um pouco culpada por querer


continuar assim.
No banho, deixei a água muito quente cair
sobre minhas costas e cabeça por minutos a fio,
enquanto parecia que estava sendo purificada.
Quando saí do banho, encontrei Benjamin deitado
no sofá da sala e Maya pintando as tatuagens dele
após já ter maquiado o seu rosto. Tinha batom,
sombra e blush.
— Maya! O que está fazendo? Ele está
dormindo.
Olhei para o coração no peito dele,
parcialmente pintado de rosa e o punhal pintado de
verde. Pega no flagra, ela escondeu a canetinha
com a mão nas costas e me olhou surpresa.
— Ele deixou eu fazer um momento de
beleza, mamãe.
E ele estava mesmo dormindo. Tão cansado
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que caiu no sono após ela começar a maquiá-lo.


— Tudo bem, ficou ótimo. Agora, vamos para
a cama, seu pai está muito cansado.
— Vou tirar uma foto para amanhã mostrar a
ele. — Ela correu, pegou o tablet e tirou a foto.
Depois foi comigo, saltitando para o quarto dela
ela. A ajudei com o pijama e a levei para o
banheiro, para escovar os dentes.
— Mamãe, um dia eu vou ter uma irmã? —
Quase gelei ao escutar a pergunta. Me fingi de
inabalada e a cobri quando ela se deitou na cama.
— Por que pergunta isso?
— O papai Beijamin tem muitos irmãos, você
tinha uma irmã, meus primos, filhos da tia Stela,
são irmãos. Todo mundo tem irmãos.
Sorri para ela, admirada por ela ter
raciocinado sobre isso sozinha, e me sentei na

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cama, ao seu lado.


— E você gostaria de ter um irmãozinho?
— Uma irmãzinha, porque meninos, às vezes,
são chatos. Se vier um menino, você devolve e
pede uma menina.
Gargalhei, e Maya riu também, sem saber ao
certo o motivo do meu riso.
— A mamãe vai pensar sobre isso, tudo bem?
— Claro que eu não ia nem pensar em uma loucura
dessas. Mesmo que eu quisesse continuar
namorando o Benjamin, era horrível pensar sobre
ter um filho com ele.
— Sim. Boa noite, mamãe. — Ela virou-se de
lado e fechou os olhos. Eu continuei ali sentada,
acariciando seus cabelos até ela começar a
ressonar. Deixei a luminária acesa e a porta
entreaberta. Quando voltei para a sala, Benjamin
estava de pé, juntando as coisas de Maya
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espalhadas.
Caralho! Eu tenho que contar para ele sobre
essa loucura da insinuação de minha irmã estar
viva. Ele precisa saber. Aflita, pensei, observando-
o e tentando imaginar qual seria a reação dele.
Benjamin me viu e franziu o cenho.
— Oi. Tudo bem?
— Viu o que ela te fez? — Caminhei até ele,
lutando para mudar meu ar preocupado.
— Ela é uma artista como o pai. — Deixou a
caixa de canetinhas de lado e veio me puxar para
seus braços. — Por sorte, tenho alguém para me
deixar limpinho.
Meu pai amado! Eu amava quando ele me
puxava para seus braços fortes. Toquei em seu
peito largo e musculoso e já o quis lamber todo.
— Não pode se limpar sozinho? — Mordi de

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leve seu queixo.


— Não, mesmo. Para o banheiro, já. — Me
beijou.
— É horrível beijar uma boca com batom. —
Empurrei a boca dele. — Está parecendo uma bela
Drag queen.
— Chata. — Me pegou no colo e caminhou
para o banheiro. — Vou te mostrar o que um drag
pode fazer.
Foi mesmo divertido limpar o rosto dele, nós
dois pelados dentro da banheira. Quando a
maquiagem toda saiu, eu abri a boca para contar a
Benjamin tudo que estava acontecendo, mas falhei.
Engoli as palavras e me mexi na banheira, sentando
sobre as pernas dele.
— Você está agitada nos últimos dias —
observou.

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— Estou bem. — Beijei os lábios dele. —


Muito bem. Você é um homem muito adorável,
Benjamin Capello. Obrigada por não ter sido
escroto comigo...
— Eu fui. Um pouco. Eu estava com muita
raiva...
— Você compreendeu rápido demais, o
porquê de eu ter escondido a Maya. Se eu soubesse
que você não era como seu pai, eu tinha te ligado
na noite em que Dani... em que ela... nos deixou.
— Eu sei. — Ele me abraçou apertado, como
se quisesse absorver as minhas lembranças ruins.
De olhos fechados, encostei a testa na dele. Enfim,
tinha alguém para me compreender, e eu
compreender a ele. Não podia deixar ninguém vir
estragar isso.

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35
BENJAMIN

Conforme os dias se passavam, eu conseguia


tirar proveito de cada dia e de cada hora, dando
vida ao meu sonho. Tudo estava pronto, convites
prestes a serem entregues, quadros emoldurados e o
ambiente recebendo os retoques para receber o
pintor que o mundo da arte via como uma
descoberta extraordinária. O quadro de Dani tinha
ganhado capas de revistas famosas, e todos
ansiavam em saber sobre o espetáculo para poucos
sortudos convidados.

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Ulrich, com sua destreza e bom


relacionamento, conseguiu elevar o evento para
uma poderosa noite de estreia que eu não havia
imaginado nem mesmo na adolescência. Era meu
sonho realizado, eram meus quadros para serem
apreciados pelas pessoas, e não tinha coisa melhor
do que ver pessoas com os olhos brilhando para um
trabalho meu. Eu mesmo, sozinho, fora da sombra
do meu pai, pela primeira vez.
Ele surtou, como imaginei, quando eu lhe
entreguei o convite ontem. Stela estava comigo e
tentou acalmá-lo, mas meu pai estava fora de si.
— Você vai me dar ouvidos uma vez na vida,
Benjamin? — questionou, cansado, sentado em um
sofá, sem querer me encarar depois de sua
explosão.
— Apesar de tudo, eu ainda estou aqui, pai.
Olhando na sua cara e disposto a deixar tudo para

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trás... Não vou me arrepender das minhas decisões.


Ele até tentou voltar atrás com o assunto do
cheque para a irmã de Diana, mas, segundo
Andrey, a quebra de sigilo não revelou nada demais
do que eles já sabiam. Por isso, eu estava certo que
meu pai tentou, mais uma vez, me enganar.
Eu dei as costas e fui embora. Ele estava
devastado, porque, pela primeira vez, ele não tinha
controle da situação. Meu pai não podia interferir.
Não poderia interferir no desejo das pessoas de
conhecer o artista anônimo. Eu faria a exposição,
nem que fosse no meio da rua.
Saí da casa do meu pai e olhei para os lados
com um sorriso gigante, como se tivesse me livrado
de um caminhão nas costas. Era terrível o peso de
querer, a todo custo, agradá-lo, mesmo passando
por cima da minha vida, minha própria essência.
Passei em meu apartamento para pegar
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algumas roupas, apesar de que já estávamos


planejando voltar em breve. Afinal, eu tinha
concluído os últimos quadros que faltavam para
incluir no catálogo e não havia mais necessidade de
permanecer no estúdio.
Na portaria, peguei as correspondências e
subi. Era estranho ver um lugar tão luxuoso depois
de passar três semanas no estúdio. Mas Diana e
Maya estavam comigo, e minha casa era onde elas
estavam. Joguei as correspondências na mesinha,
sem olhar, e subi para o quarto. Escolhi algumas
peças de roupas, abri a gaveta de relógio e observei
os piercings. Sorrindo com meus próprios
pensamentos, escolhi um imaginando como Diana
se comportaria hoje à noite, quando eu trocasse por
esse um pouco maior e com uma bolinha na ponta,
o que deixava tudo mais delicioso para ela.
Voltei quase correndo, passei para pegar as

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chaves na mesinha, mas antes de sair, algo me


chamou a atenção. Um envelope que não parecia
contas. Peguei-o e notei que não tinha
identificação. Abri e tive que me sentar ao ver fotos
que havia dentro. De cenho franzido, analisei a
imagem onde Diana estava conversando com
Leandro em frente a um prédio. Havia uma data e
era dias atrás quando ela disse que tinha ido ver a
prima Outras fotos mostravam ela entrando no
prédio. Passei as fotos e quase perdi o controle da
minha pulsação ao ver uma foto de ninguém menos
que Danielle, saindo de um carro.

***

Enquanto corria na moto, ultrapassando


carros e rompendo o vento com velocidade, meus
pensamentos estavam como dinamites explodindo
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em minha cabeça. Todas as teorias atacando em


conjunto, não dando brecha para eu respirar. As
imagens que eu vi eram, sobretudo,
amedrontadoras. Porque jogava na minha cara, tudo
que neguei e, como bônus, ainda fazia com que a
palavra do meu pai fosse real.
Era ela. Mesmo estando de cabeça baixa nas
fotos, era Dani. E tinha entrado no mesmo prédio
que Diana. Tudo começou a se encaixar como a
porra de um quebra cabeça maldito. O cheque que
meu pai havia desembolsado, a Diana mentindo
que tinha ido se encontrar com a prima, a reforma
na boate...
Cheguei à boate, deixei a moto lá fora e entrei
feito um furacão. Imediatamente, seguranças
tomaram postos, e eu vi o filho da puta que estava
nas fotos com Diana.
— Você. — Apontei para ele, o convocando.

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— Quero ter uma palavrinha com você.


— Cara, ninguém aqui quer confusão. Vaza.
— Ele respondeu, de braços cruzados em pose
defensiva. Os olhos com um leve tom de sarcasmo.
— Ali fora, agora — rosnei e dei as costas,
saindo da boate. E não demorou muito para ele sair.
Eu estava espumando de raiva. Meus instintos
diziam para eu partir para o cacete. Mas a
racionalidade falou mais alto. Eu deveria descobrir
que merda estava acontecendo.
— O que você quer? — Ele achava mesmo
que seu tamanho me assustava? Montanhas era meu
prato predileto para nocautear.
— Isso aqui. — Tirei uma das fotos dobradas
que estava em minha jaqueta. Me surpreendi por
estar tremendo. Talvez porque eu não queria ouvir
a verdade. — Me fale que porra é essa?
Ele olhou e pareceu assustado, como se
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tivesse sido pego no flagra.


— Mandou seguir a Diana, porra? —
questionou.
— Apenas responda minha pergunta.
— Você não tem que saber sobre nada. — Ele
amassou a foto, jogou contra mim e andou rumo à
porta da boate. Foi o bastante para eu voar sobre
ele, pegando-o desprevenido. O cara ainda tentou
se equilibrar, mas uma vez no chão, eu o imobilizei
com um mata-leão.
— Fala o que eu quero saber — rosnei, e não
precisou de três segundos para ele bater a mão do
lado, se rendendo. O libertei e fiquei de pé.
— Fala. — Eu não estava nem perto de
ofegar, mas a raiva fazia minha respiração
descontrolar junto de todas minhas emoções. Ele
ficou de pé, me dirigiu um olhar furioso e
caminhou para a porta da boate.
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— Eu faço a segurança delas. — Ele disse,


parado lá na porta me encarando. Fazendo meu
mundo cair. — Dani não morreu, apenas fingiu a
morte e agora voltou para a cidade acobertada por
Diana. Até a menina já a viu.
— Como é que é? — Eu nem sei como minha
voz saiu depois do choque de ouvir uma merda
dessas — Minha filha a viu?
— Sim. Agora, se não quiser levar um tiro na
testa, saia daqui. — Nem precisou falar de novo.
Eu já estava montando na moto.
Eu sabia que não devia confiar naquele filho
da puta. Mas agora tinha alguém para confirmar
tudo, e então eu saberia se era ou não verdade. Por
mais que doesse, era hora de enfrentar essa putaria
toda. Eu não queria acreditar que as duas irmãs
fizeram isso comigo, mas sabia que, se fosse para
acontecer, seria possível.

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Ao chegar no estúdio, vi que Diana estava na


sala com Maya. Ela deu um pulo e veio correndo
até mim.
— Papai, eu e a mamãe fizemos um desenho
de como será o meu quarto. Olha só. — Me
mostrou o desenho, e eu nem prestei atenção
direito, apenas sorri para ela, na tentativa de
esconder minha real emoção, que beirava a raiva
maciça.
— Ficou muito bonito. — Afaguei os cabelos
dela. Olhei para o sofá onde Diana nos observava
sorrindo com ar encantado. Ela conseguia fingir
muito bem. Me perguntava se conseguiu fingir
todas as vezes que transamos, que falou com
sinceridade comigo, que me fez acreditar que
estava do meu lado, mudando minha vida. —
Minha princesa, estou indo buscar umas tintas, quer
ir comigo?

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— Quero! — Ela correu para Diana. —


Mamãe, deixa eu ir?
— Claro, querida, nós vamos.
— Ah, Diana, Maya e eu, apenas. Se não se
importar.
Ela se surpreendeu e até franziu o cenho,
creio que buscando entender meu pedido. Por fim,
aceitou.
— Tudo bem. Podem ir. Eu vou adiantando o
jantar. — Parecia decepcionada. — Maya, vá calçar
uma sandália, e obedeça ao Benjamin.
— Tudo bem, mamãe. — Maya correu para
procurar a sandália e ela levantou-se vindo até
mim. Quis dar um passo para trás colocando
distância entre nós, mas não queria que suspeitasse
de nada. Eu precisava tirar Maya de perto dela e,
para isso, Diana precisava confiar em mim.

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— Está tudo bem? — Ela ajeitou meus


cabelos que deviam estar assanhados por causa do
capacete. — Brigou com seu pai?
— O mesmo de sempre.
— Percebi logo que vi sua cara. Vou fazer
algo bem gostosinho para a gente comer quando
vocês voltarem. — Riu, achando que eu falaria algo
de duplo sentido, mas eu mantive minha expressão.
Como ela podia conseguir fingir nessa
naturalidade? Será que ria de mim enquanto estava
com a irmã?
— Tudo bem — sussurrei. Maya apareceu
correndo, eu segurei na mãozinha dela e saí sem
falar nada com Diana.
Maya falava pelos cotovelos no banco de trás,
e eu não conseguia me concentrar no assunto dela.
Minha mente estava em outro lugar, em outra
pessoa. Eu me vi de quatro por uma mulher que
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possivelmente estava zoando comigo. Eu me deixei


apaixonar... O que sempre tive receio que voltasse
a acontecer, porque a última vez tinha sido com
Dani, e a separação quase me matou.
Era a porra de um destino de merda se
apaixonar por duas mulheres, que eram irmãs e
estavam dispostas a foder minha vida. Era um
inferno.
Parei o carro na casa de Stela. Maya olhou
intrigada.
— Essa é a casa da tia Stela — disse ela.
— Sim. Vamos só fazer uma visitinha a ela.
Saí do carro, abri a porta para ela e caminhei até o
grande jardim de Stela. Sentei-me com Maya em
um banquinho, e ela me fitou com interesse.
— Filha, eu quero te perguntar algo muito
sério e não pode mentir para o papai, certo?

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— Sim.
— Promete contar a verdade?
— Prometo.
Ela aguardava a pergunta, me encarando com
olhinhos ávidos, e eu buscava uma maneira fácil de
indagar.
— Você viu a mamãe Dani? — Quando ouviu
minha pergunta ela abaixou o rosto e olhou para os
pés pendurados balançando no banco. Suavemente,
puxei o queixo dela para olhar para mim de novo.
— Não precisa ficar com medo. Pode falar
com o papai.
— É porque a mamãe disse para eu não te
dizer.
— Qual mamãe, a Diana?
— Sim.
Meu coração batia tão desesperado, que até
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tive a sensação de que doía. Os olhos de Maya


eram verdadeiros, e eu tive a conclusão de que
estava mesmo sendo enganado.
— Então... Você viu a mamãe Dani?
— Vi sim. Ela sempre vai me ver, mas não
diz nada.
Eu queria gritar, queria berrar de ódio,
entretanto, a puxei para meus braços e a abracei. Eu
tinha ela. Ao menos isso eu ainda tinha, para não
surtar. Eu tinha uma filha linda, e nada do que elas
fizessem poderia tirá-la de mim.
— Maya, eu preciso ir a um lugar, você vai
ficar aqui com a tia Stela, tudo bem? Depois eu
venho te buscar.
— Tudo bem.
Segurei na mãozinha dela, levei até a porta e
bati na campainha. Stela veio atender, e seu olhar

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surpreso mostrava que ela entendia que havia algo


errado.
— Maya pode ficar um pouco aqui, mana?
— Pode claro. — Curvou-se sorrindo para
Maya. — Oi princesa, como está?
— Muito bem, tia Stela.
— Suba para o quarto da Rachel, ela está lá.
— Tchau, papai. — Maya acenou para mim e
subiu as escadas correndo. Stela voltou-se,
preocupada, para mim.
— O que houve, Benjamin?
— Preciso resolver algo definitivo. Depois te
conto.
— Mano... — me chamou, mas eu já saía a
passos largos, rumo a meu carro. Era hora de
colocar tudo em pratos limpos. Diana iria
desembuchar tudo e depois eu me certificaria em
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acabar com ela.

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36
DIANA

— Quem eu quero, não me quer. Quem me


quer, não vou querer... — Rodopiei na cozinha
improvisada de Benjamin, com um rolo de
macarrão imitando um microfone. Joguei mais
farinha na massa do empadão que eu estava
preparando. Maya e Benjamin adoravam, e era algo
fácil de preparar. — Ninguém vai sofrer sozinho,
todo mundo vai sofrer — cantando e abrindo a
massa dei um grito ao ver Benjamin me olhando
parado a alguns passos de distância. Eu não o
escutei chegar.

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— Porra, cara. Me assustou. — Ele nem se


mexeu. Olhei em volta e estranhei o silêncio
denunciando a falta de uma criança. — Onde está
Maya?
Benjamin não respondeu e pela expressão
dura, com maxilar enrijecido, eu sabia que não
estava nada bem. Sua fúria silenciosa me atingiu, e
eu deixei a massa do empadão de lado. Lavei as
mãos e fui até ele.
— O que houve? — Sequei as mãos no
avental. — Onde está a Maya?
— Eu vou te dar uma chance de me explicar
que merda é essa. — Entregou para mim um monte
de fotos. Demorei a pegar das mãos dele, prevendo
que essas fotos apregoavam uma confusão
iminente. A primeira era eu conversando com
Leandro em frente ao prédio o qual fui atraída dias
atrás.

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Puta que pariu. Eu tinha sido seguida?


Passei cada foto com suspense angustiante e
quando cheguei a uma, toda amassada, quase a
joguei longe. Era a fantasma que vinha
assombrando meus dias, meus sonhos e
pensamentos. Eu estava conversando com Leandro,
e, nas fotos seguintes, ela entrava no mesmo prédio
que eu entrei. Eu deveria parabenizar quem fez
isso. Foi genial. Eram minha irmã e eu, em um
encontro secreto. Olhei para Benjamin entendendo
o motivo da raiva dele.
— Não é ela — sussurrei.
— Não? E como explica meu pai ter vindo
dizer que Danielle o está chantageando e...
— Está acreditando nele novamente? No
homem que manipula vocês desde...
— Não fale essa merda, porque você não
conhece nada da minha família — berrou tão alto
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na minha cara que eu tive que afastar o rosto. Ele


acabara de me tirar do controle com essa explosão
ridícula. Eu tolerava muita coisa, menos opressão
masculina.
— Não grita comigo. — Fui no mesmo tom
dele. — Eu não te dou direito de gritar comigo. —
Me afastei com as mãos na boca, tentando
raciocinar por dois, uma vez que ele já tinha sua
opinião formada sobre tudo que estava
acontecendo. — Tudo que eu sei sobre vocês, eu
ouvi da sua boca. — Falei casualmente.
— Cacete! — Benjamin deu a volta na sala
com as mãos na cabeça. — Eu morrendo de culpa,
me autoflagelando por causa dela, e vocês duas de
boa, rindo de mim. Que espécie de animal maligno
finge a própria morte?
— Você está enganado. — Eu me vi acuada,
olhando para ele surtando aos poucos na minha

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frente e eu só desejava buscar uma saída rápida


para a situação.
— Errado como? Como Diana? Não são
apenas fotos, eu investiguei, fui atrás e comprovei.
Como pode me fazer chorar por uma mulher que
fingiu a própria morte e renegou a filha? — Com
fúria, limpou uma lágrima.
— Ela não fez isso. Dani amava a Maya.
Meça suas palavras. Eu não vou discutir essa
obscenidade, quando estiver mais calmo,
conversaremos. Caminhei para o quarto, mas ele
me alcançou.
— Vá embora daqui — berrou segurando meu
braço — Esqueça que eu existo. Se ainda lhe resta
um pingo de autoestima, saia da merda da minha
vida.
— Olha o que você está falando, cara. —
Agora sim a ficha tinha caído, e eu via meu sonho
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encantado ser destruído. — Temos um


relacionamento e uma criança que depende da
gente.
— Ela depende de mim. Eu sou o pai dela.
Não quero mais olhar para essa sua cara golpista.
Saia!
— Benjamin...
— Acabou a farsa Diana. Eu só preciso que
me fale a verdade porra. Uma vez na vida, me diga
que não usou da minha burrice para tentar me dar
um golpe. Se o que tivemos representou algo para
você, diga a verdade para mim. Fala caralho.
— Ela não está viva. — Uma lágrima quente
escorreu na minha bochecha. — Eu desejava no
fundo da minha alma que ela estivesse, mas
acredite, ela não está. Quem te deu essas fotos? O
que seu pai falou?
— Que Dani o está extorquindo, e houve, sim,
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uma retirada de muito dinheiro na conta do meu


pai. Eu fui atrás do seu segurança, e ele confirmou
que Dani fingiu a própria morte
— O Leandro disse isso?
— E a Maya também. Ela me disse que você
pediu a ela para não me falar sobre Dani.
— Onde está Maya?
— Não interessa a você. Por que estão
fazendo isso? Vocês estão brincando com uma
criança, nem importo que fodam minha vida, mas
nem uma criança vocês respeitaram.
Abalada, caminhei para o sofá e me sentei.
Tudo fazia sentido. Dani estava mesmo morta, e
isso me deixou triste, porque, no fundo, eu gostaria
de vê-la mais uma vez, nem que fosse para brigar
com ela. E como eu cheguei a essa conclusão? Eu
fui arrastada para uma armadilha onde tiraram fotos
minha entrando lá. Mas eu sabia que naquela tarde
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não houve encontro com ninguém. A pessoa se


fazendo passar por minha irmã aparecia para Maya
como forma de dar mais credibilidade ao fato.
Ninguém questionaria uma criança. E ainda tem a
extorsão que devia mesmo ser verdadeira.
E se Leandro mentiu descaradamente, era
porque estava a mando de alguém, e eu sabia
exatamente quem era esse alguém. Lembrei da
reforma grandiosa e dos números bons do caixa da
boate. Interiormente, ri da minha ignorância, por ter
sido usava tão facilmente.
Levantei o rosto para Benjamin, seus olhos
furiosos lacrimejantes esperando de mim uma
resposta. Ele teria que aguentar, ele teria que
suportar o baque do que eu faria, mas tinha que ser
feito porque ele era instável demais para um contra-
ataque que deveria ser frio e calculista. Além do
mais, se eu me ferisse na busca por vingança, ele

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ainda estaria aqui para cuidar de Maya. Todos


tinham que pensar mesmo que eu era uma vadia
sanguinária.
Eu o amava, droga. E estava feliz por aceitar
isso. E aceitar que minha irmã descansava no seio
da eternidade e não era um empecilho entre
Benjamin e eu. Ele era o homem que eu deixei
adentrar o mais profundo do meu ser e conhecer
tudo de mim. O homem que passei a amar
lentamente, vivendo meus melhores dias. Limpei as
lágrimas e fiquei de pé.
— O que vai fazer comigo?
— Eu vou tirar minha filha das suas mãos e
deixar vocês duas na miséria.
Seu rancor quase me fez recuar, mas tinha
chegado o momento de ser fria, como passei a vida
sendo, para enfrentar os problemas. Eu tinha algum
tempo até o exame de DNA ficar pronto. Até lá, ele
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não poderia fazer nada. Maya seria o elo que


seguraria ele, para não surtar aqui sozinho.
Fui para o quarto, peguei algumas coisas,
enfiei em uma mochila, mudei de roupa e quando
voltei, ele estava no mesmo lugar.
O encarei. Meu coração espancando minha
caixa torácica. A angústia fazendo meus nervosos
tremerem.
— Sim, Benjamin, eu armei tudo para te dar
um golpe. Já que descobriu, não adianta mais tentar
fingir.
Vislumbrei a pouca esperança espatifar nos
olhos dele. Foi como se tivesse levado um tiro.
— Que porra, Diana... — lamentou — que
merda!
— Foi delicioso e divertido enquanto durou.
— Eu queria abraçá-lo e dizer que iriamos

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enfrentar isso juntos, mas mantive o tom de ironia.


— Saia da minha casa! — murmurou com a
voz embargada e sentou-se no sofá.
— Com prazer, mas não pense que não lutarei
pela minha filha. Desejo sorte na abertura de sua
exposição. Bye, querido.
Eu estava sozinha assim que coloquei os pés
fora da propriedade dele. Quase caí de joelhos no
chão, aos gritos de ódio puro.
Eu estava sozinha para resolver tudo. E eu só
voltaria quando destruísse Almir. Mesmo que
voltasse morta. Ele usou a memória da minha irmã,
e eu já até imaginava como, usando Sabrina como
isca.
Eu estava abandonando minha menina, meu
Deus. Eu prometi a Dani que jamais deixaria Maya,
ela sempre estaria comigo. Mas agora, eu deveria
buscar forças em um plano superior para seguir
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sem ela. Não poderia contar com Stela, não iria


colocar Amanda nessa enrascada, mas, por sorte,
tinha alguém que conhecia as leis e ainda poderia
vir dar uma força para Benjamin.
Tremula, abri minha bolsa e peguei o
cartãozinho de Ulrich que Benjamin amassou. Não
o conhecia muito bem, mas lembrava do que ele
tinha falado: “Caso precise de uma defesa quando
for responder a algum crime, ou talvez precise só
de uma defesa... Só me chamar”.
Digitei o número no celular e, andando na
estrada que levava de volta à cidade, ouvi a voz
com sotaque atender a ligação.

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37
BENJAMIN

Eu acho que passei umas duas horas batendo


implacavelmente em um saco de pancadas. E
mesmo se uma semana se passasse, ainda seria
pouco para diminuir a raiva que eu estava
sentindo. Meus dedos doíam, meus músculos
estavam trincados e pesados, com as veias
dilatadas. O suor pingava de minha testa, antes suor
do que lágrimas.
Eu não derramaria um pingo de lágrima por
aquela sem-vergonha. Por mais que a dor fosse
insuportável e a vontade desesperada de sumir me

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afogasse a cada segundo, eu não iria derramar


lágrimas. Bati mais violentamente no saco e deixei
meus braços caírem dormentes de cansaço.
Derrotado, para ser mais específico. Eu tinha sido
posto de joelhos duas vezes na minha vida, por
duas irmãs. Parecia até aquelas fábulas infantis com
lição de moral no final, apesar que minha história
fodida, não tinha nenhuma lição de moral.
Olhei para os quadros do outro lado da sala.
Eu desejei tanto que a porra do quadro de Danielle
estivesse aqui, para eu despejar nele toda a minha
fúria. Por azar, ele já foi enviado para o local da
exposição, que será daqui a dois dias.
Eu devotei tanto tempo da minha vida para
Danielle. Tanto espaço na minha mente e coração
por ela, tinha até a porra de uma tatuagem gigante
tomando meu peito, em homenagem a ela. Com
fúria massiva correndo em minhas veias, voltei a

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aplicar força excessiva no saco de pancada, e meus


dedos nus já estavam esfolados quando o interfone
tocou.
Ofegante, olhei para o monitor lá na cozinha.
Será que era ela? Diana teria voltado? Será?
Corri até lá, como uma grande chacota que
ainda mantinha esperança de que ela voltasse e
dissesse que era tudo mentira. Desanimei quando vi
Ulrich no monitor, acenando para mim. Respirei
fundo e liberei a passagem dele.

— Entra aí. — Deixei-o passar e voltei para a


sala, secando o cabelo molhado de suor. — O que
está fazendo por aqui? O motel particular de
Andrey é do outro lado.
— Sikme, Benjhamin. — Ele praguejou,
usando seu idioma natal. — Que porra é esse?

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Olhei para minhas mãos esfoladas e ignorei


qualquer explicação para ele. Com a toalha em
volta do pescoço, mantive um olhar indiferente
dirigido a ele.
— Quer beber alguma coisa?
— Vou olhar seu geladeira. — Às vezes ele
ainda misturava os pronomes com os gêneros
feminino e masculino. Nem esperou minha
permissão, e foi para a cozinha. Abriu a geladeira e
de lá gritou para mim: — Vi sua gata no centro.
Ele tinha visto a Diana? Minha língua
queimava para perguntar onde, mas consegui me
conter.
— Não tenho gata.
Ulrich demonstrou um interesse aparente.
Veio para a sala, jogou no chão duas bonecas de
Maya que estavam sobre a poltrona e sentou-se.
Tomou um gole de cerveja calmamente,
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provocando minha paciência. Em seguida, franziu


os olhos.
— Conte-me sobre isso.
Eu não queria contar para ele, mas eu tinha
que desabafar e era melhor ele do que um dos meus
irmãos.
— A vagabunda me enganou. — Desabei no
sofá à frente. — A irmã dela fingiu a própria morte,
e agora Diana acabou de me ferrar. Você, como
advogado, me diga qual crime ela pode ser
enquadrada e ir para a cadeia?
— Quer jogar Diana em uma cela? — Não
pareceu chocado, era mais um ar de ironia.
— Não é para lá que vão os criminosos?
— Ou para minha casa... Dependendo da
criminosa. A Diana, por exemplo...
— Caralho. Você é muito merda. Tinha me

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esquecido. — Fiquei de pé. — Pra fora da minha


casa.
— Ok. Escuta, Benjha. Me conte isso direito,
prometo ser profissional.
— Você não é profissional nem nos tribunais.
— Tenho um nome a zelar. O tribunal é meu
palco, e lá tenho que fazer meu show. Aqui serei
imparcial e não cobrarei honorário.
Eu nem sei por que me sentei e contei tudo
para ele, desde a falsa morte de Dani até agora,
quando descobri toda a merda. Ao menos ele ouviu
todo relato calado. Ulrich ficou me fitando por
alguns segundos e, por fim, relaxou o corpo dando
de ombros.
— A Diana não pode ser enquadrada em
nada. Apenas a tal irmã morta-viva.
— Mas ela é cumplice.

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— E você tem provas dessa cumplicidade,


além da palavra do tal segurança?
— As fotos, porra. — Já começava a me
zangar.
— Encontros não quer dizer que estão
conspirando. Você não ouviu o que falaram nesse
tal encontro. Ela não pode levar culpa porque
supostamente se encontrou com uma criminosa.
— Ok. E sobre a guarda da minha filha?
— É o que você já sabe. Você precisa esperar
sair o resultado do DNA e então dar entrada no
pedido de guarda total. Apesar de que será quase
impossível. Com certeza, acontecerá uma guarda
compartilhada.
— Isso nunca. — Fiquei de pé, andando
quase surtado pela sala. — Aquela desgraçada não
vai encostar mais na minha filha.

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— Benjha, mantenha a calma. — Senti ele


tocar me meu ombro e me virei. — Você precisa
pensar com racionalidade, não cometer nenhuma
besteira, não tentar fazer justiça por conta própria.
Lembre-se que agora tem um criança de cinco anos
dependendo de racionalidade de adultos.
— Eu sei. — Ouvir isso me acalmou. —
Acalmou todos os pensamentos ruins que estavam
perfurando minha mente desde que Diana foi
embora. Eu não vou fazer nenhuma bobagem.
— E o que pretende agora? — Ulrich estava
mais que interessado, estava preocupado com meus
próximos passos.
— Faz algo para mim?
— Diga.
— Encontre a vagabunda da irmã da Diana.
Eu quero olhar nos olhos dela e perguntar por que
foi tão cruel.
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— Deixa comigo. Farei isso.

Depois que Ulrich foi embora, eu tomei


banho, enrolei band-aid nos dedos machucados e
fui para a casa de Stela. Era hora de encarar Maya e
ela precisava encarar o fato de que seriamos nós
dois de agora em diante. Eu acho que estava sendo
forte o suficiente para manter-me de pé, para não
afundar em lutas clandestinas, sexo e muito álcool.
Eu queria muito isso, Deus sabe como eu queria
jogar meu corpo e alma no mais fundo abismo da
decadência. Entretanto, agora, havia minha filha, e
ela precisava de um pai são.
Pensei em contar tudo para Stela, mas minha
irmã se preocupa à toa com pequenas coisas.
Amanhã será o casamento de Fernando, e todas
essas merdas me fizera esquecer disso. Mas Stela
tinha passado os últimos dias ajudando na

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organização do casamento, e não era justo da minha


parte jogar uma bomba no colo dela um dia antes
da festa. Então, quando cheguei para buscar Maya,
fui obrigado a fingir, porque ela conhecia cada
expressão minha e sabia ler o meu olhar.
— Está tudo bem? — foi a primeira coisa que
me perguntou, quando entrei na casa.
— Sim. Muito bem. Diana ficou em casa,
vamos ter algum tipo de massa para o jantar. —
Lembrei da massa que Diana estava abrindo antes
de tudo acontecer. Meu coração apertou em
desespero, eu chegaria em casa e não a encontraria.
— Muito bom — virou-se para a escada e
gritou: — Maya! O papai chegou. — Segundos
depois, ela desceu rápido. Do terceiro degrau, ela
simplesmente se jogou nos meus braços, e eu a
aparei abraçando-a e cobrindo-a de beijos. Ela era
uma pequena força que me manteria nos eixos.

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— Minha garotinha, estava com saudades?


Pronta para ir?
— Sim, papai. — Deixei-a descer dos meus
braços, segurei em sua mão e saí depois de nos
despedirmos de Stela.
Maya me contava cada minuto de seu tempo
na casa da tia. E eu tentava mostrar que estava
interessado e interagindo com ela. Meus
pensamentos estavam em outro lugar. Imaginando
como seria contar para ela que a mãe não estava em
casa.
Chegamos. Deixei ela entrar e, apreensivo, fui
atrás. Maya correu para o quarto e voltou depois,
indo para a cozinha. Olhou tudo e então voltou-se
para me fitar.
— Onde está a mamãe?
— Venha aqui, princesa. — Levei-a para o
sofá e me sentei com ela. Eu planejei falar muitas
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mentiras maldosas, dizendo que Diana tinha ido


embora, abandonado a gente. Mas agora, com a
raiva um pouco mais aplacada, eu me xinguei
mentalmente por ter cogitado usar minha filha
como meio de vingança. Eu seria baixo e
mesquinho se a usasse como arma. Isso era
alienação parental, o Ulrich havia me explicado
mais cedo. Por isso, optei por uma mentira boa.
— A mamãe precisou fazer uma rápida
viagem, mas daqui a pouco ela volta. Tudo bem?
— Maya arregalou os olhos e ficou por segundos
em silêncio, olhando meu rosto e, na sua expressão,
vi a surpresa dar lugar à tristeza.
— Mas ela nem se despediu de mim. —
Sussurrou em um lamento.
— Ela disse que vai ligar para você em breve.
Ela teve que ir rápido, porque o ônibus já estava
saindo.

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Ela assentiu, mas os lábios exprimidos se


curvaram para baixo, indicando vontade de chorar.
— Eu não gosto de ficar sem minha mãe.
— Mas eu estou aqui. Vamos nos divertir
muito, prometo. Até ela voltar. — Limpei uma
rápida lágrima do olhinho dela. — Não fica triste,
tá?
Ela me olhou e balançou a cabeça
positivamente, mesmo se sentindo triste. Ainda
assim, ela era compreensiva e não era um tipo de
criança que gritava e fazia birra. Beijei seus cabelos
e a abracei.
— O papai está aqui, vamos ficar bem.
Eu queria arrancar a tristeza de Maya, que era
parecida com a minha. Ambos tristes sentindo a
falta da mesma pessoa.
Deixei-a tomar banho e, enquanto isso,

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escolhi uma roupa para ela. Ela entrou no quarto,


um pouco envergonhada, e ficou de pé no cantinho.
Era tão pequena minha filha, e parecia tão frágil e
desprotegida enrolada na toalha, tremendo, um
pouco, de frio. Me doía perceber que eu era quase
um estranho para ela. Um pai aprendendo a ser pai.
— Essa roupa não, papai.
— Não?
— Eu queria aquele vestido. — Apontou para
o vestido rosa, e imediatamente o peguei e, por
baixo da toalha, ajudei-a vestir a calcinha. Depois,
já vestida, foi a vez do cabelo. Eu não fazia ideia do
que tinha que ser feito, nem mesmo como pentear
um cabelo de menina. Coloquei-a em frente ao
espelho e, com cuidado, passei a escova em uma
mecha.
— É assim?
— Tem que pentear aqui em cima também,
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papai.
— Está bem. Vou fazer o melhor que consigo.
E você vai me ensinar.
Acho que demorou mais do que o necessário
para, enfim, eu conseguir penteá-lo todo. Observei
ela pegar uma tiara e, sozinha, ajeitar sobre os
cabelos.
Enquanto eu tomava banho e me vestia, ela
ficou à minha espera, sentada no sofá, em frente da
televisão desligada. Maya permaneceu na mesma
posição, apenas pensando. Ela nunca tinha ficado
um dia longe da mãe, e mesmo quando Diana
trabalhava na boate, era só na parte da noite, elas
ficavam o dia todo juntas.
Por mais que eu odiasse, não poderia tirar ela
de vez da vida da menina.
Fomos para uma lanchonete, fiz de tudo para
fazê-la sorrir, mas só sorriu mesmo quando Diana
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ligou. Eu atendi, era um número desconhecido. E a


única coisa que ela perguntou foi:
— Maya está bem? — Sua voz reacendeu em
mim todo tipo de sentimento, mas a raiva
predominava.
— Sim.
— Eu quero falar com ela.
Eu queria berrar, dizendo que golpista sem-
vergonha não ia falar com minha filha e desligar
em seguida, mas os olhinhos esperançosos à minha
frente imploravam para que a ligação fosse de
Diana. Fechei os olhos, engoli a frustração e passei
o celular para Maya.
— A mamãe quer falar com você.
Eu fiquei por quase meia hora vendo a alegria
dela por falar com Diana. Contando tudo que
aconteceu no dia, inclusive como tomou banho

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sozinha, e que eu não sabia pentear os cabelos dela.


Não sei o que Diana disse, mas o resto da
noite foi perfeita para Maya. Riu, conversou,
comeu muito e, na hora de dormir, estava feliz,
ansiosa para que a mãe voltasse logo com o
presente que havia prometido.
Ela dormiu, e eu fiquei lá, sentado ao lado de
sua cama, observando-a. Eu sentia um amor tão
grande por ela. Era reconfortante ver um filho feliz,
e só agora eu podia saber disso.

***

Quando o dia clareou, eu já estava de pé. Foi


uma noite horrível, sozinho na cama, com
pensamentos odiosos envolvendo as irmãs
serpentes. Na cozinha, fiz café, e logo Maya

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apareceu olhando a sala com curiosidade, creio que


imaginando que Diana já estivesse em casa.
— Bom dia, neném. Comprei pães de queijo
quentinhos.
Sem muito interesse, Maya apenas assentiu e
sentou-se em frente à televisão. Fui até ela e me
ajoelhei ao seu lado, no tapete.
— Não fica triste, filha. A sua mãe logo estará
de volta.
— Tá bom.
— Hoje iremos em uma festa na fazenda, o
que acha?
— Em uma fazenda que tem cavalos? — Ela
se animou. Seus olhos se iluminaram.
— Sim. Com cavalos, um lago com patos e
muitos bois. É o casamento do meu irmão, o seu tio
Fernando. Você vai adorar.

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— E a mamãe não vai?


— Ela ainda não chegou, mas vamos tirar
muitas fotos para mostrar para ela.
— Eba! Eu vou adorar, papai. Precisamos
escolher um vestido lindo de casamento para eu ir.
E foi justamente isso que fizemos. Levei
Maya ao shopping, escolhemos um vestido e a
deixei na casa de Stela, para ela arrumá-la e levar
ao casamento, que será à tarde.
Depois passei na galeria, preparada para a
exposição depois de amanhã. Conferi a arrumação
e passei um bom tempo encarando o quadro gigante
da mulher na janela com olhar triste. Eu queria
destruí-lo de tanta raiva, mas ele estava avaliado
em um preço alto, e não iria jogar dinheiro fora por
alguém que não merecia nem uma lágrima.

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***

— Mano, abre um pouco mais o sorriso. —


Stela me cutucou. Estávamos prestes a entrar na
passarela. Fernando se mostrava radiante de
felicidade, uma alegria que eu não entendia. Mulher
só ferrava com a vida dos homens e eu era a prova
disso. Mas ele parecia ter, de verdade, encontrado
sua alma gêmea.
Eu estava muito puto com Diana, além de
aguentar meu pai me olhando torto. Só queria ir
embora logo, mesmo que Maya estivesse se
divertindo como nunca. Não parava de falar que
queria ver logo a noiva e depois queria tirar foto
com a noiva, perto do bolo.
— Estou legal, mana. Fica tranquila. —
Respondi a Stela. Ela me virou de frente para ela e
ajeitou minha gravata.
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— A maninha ainda troca a fralda do irmão?


— Olhei para quem acabava de chegar à roda de
padrinhos. Claro que Fernando tinha que convidar
Ulrich para ser um dos padrinhos. Dei um sorriso e
o abracei com tapas nas costas.
— Então, saiu um pouco da porta da cadeia à
espreita de clientes? — zombei.
— Ah, vá se foder. — Olhou direto para
Thadeo, que estava emburrado por causa da
aglomeração. — Enfim, conseguiram enfiar um
terno no bicho do mato. — Thadeo sorriu e veio
cumprimentá-lo.
— O que perdeu por aqui, urubu de presídio?
— Thadeo rebateu. Andrey e eu rimos da cara de
Ulrich, e ele apenas deu de ombros.
— Gente, por favor. É hora de nos
concentrarmos. Parem de conversa boba e vão
todos para seus lugres. — Stela berrou revoltada, e
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quando Ulrich, enfim, deixou de ignorá-la, ela


ficou vermelha.
— Olha só. A voz da sabedoria está por aqui.
Como vai estrelinha? Ainda casada com aquele que
não pode ser nomeado? — Miguel não estava por
perto, mesmo que estivesse, Ulrich falaria a mesma
coisa.
— Stela se casou com Voldemort? — Andrey
soou sarcástico.
— Antes fosse — Ulrich respondeu.
Stela empinou o queixo e o encarou
perigosamente.
— Estou muito bem, Ulrich. Para você,
senhora Medeiros. — Estendeu a mão com a
aliança na cara dele.
— Você não usa seu nome Capello que é bem
mais importante? — ele zombou.

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— E você? Ainda usa “Ulrich”, achando que


abre portas no país?
— Portas não, mas pernas sim.
Thadeo gargalhou — o que era raro vindo da
parte dele — e eu comprimi os lábios para não rir.
Eu era o gêmeo dela e sempre estava do lado dela,
tinha que ficar neutro.
Os punhos dela se fecharam, e eu vi o
momento que o advogado do diabo receberia um
soco da minha irmã. E como eu o conheço, ele
cairia rindo.
— Ok, vamos procurar o Fernando —
interrompi o início da tragédia e a puxei pelo braço.
— Nos vemos por aí, estrelinha. — Ulrich
acenou, mas ela nem ligou, já estava de costas me
acompanhando. E resmungou apenas para eu ouvir:
— Desgraçado.

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A festa foi ótima, Maya estava deslumbrada e


eu acabei relaxando um pouco, na companhia de
minha família e amigos. E quando fomos tirar a
foto da família, Maya, com sua simplicidade
infantil, cumprimentou meu pai.
— Oi, vovô. — E fiquei pasmo ao vê-lo
responder com um sorriso genuíno.
— Oi, pequena princesa. Fique aqui, ao meu
lado.
Eu jamais saberia o que se passa na mente do
velho, só sabia que esse era um dia feliz para ele.

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38
DIANA

Olhei no relógio, ocultando a aflição que me


tomava. A exposição de Benjamin era hoje, na
verdade, daqui a uma hora. Três dias tinham se
passado desde que saí do estúdio de Benjamin, e eu
não sabia de onde estava tirando forças para ficar
esse tempo todo sem Maya. Três dias inteiros,
ouvindo apenas a voz dela e mentindo, dizendo que
estava fazendo uma viagem. Acabei chorando
muito quando vi algumas fotos do casamento de
Fernando, em que Maya estava tão radiante e feliz,
ao lado da família dela. Eu me sentia realizada.

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Sinceramente, devo agradecer por Benjamin


não ter colocado coisas más na cabeça dela. Ele
também entendeu que não podia enfiar Maya em
uma briga que era de adultos. Todos os anos que eu
a escondi dele, nunca inventei coisas ruins do pai
dela, porque eu sabia que um dia eles se
encontrariam. E agora ele pagou com a mesma
moeda, preservando o afeto que Maya tem por
mim. Isso era o que me permitia dormir à noite.
E, pelo andar da minha investigação, mais
rápida do que imaginei, voltaria com provas para
esfregar na cara de Benjamin. Ele teria que me
pedir desculpas, porque eu não estava disposta a
abrir mão dele.
Dentro de um carro, com Ulrich ao meu lado,
eu observava a casa onde Sabrina estava escondida.
Enfim, eu a tinha encontrado. Depois de muito
procurar, e de uma tocaia perfeita plantada por

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Ulrich, seguindo Leandro, nós a encontramos. E eu


estava com sede de colocar as mãos nela.
Enfiei uma batata na boca e tomei um longo
gole de refrigerante. Não desgrudava os olhos da
casa adiante, como se fosse um filme de suspense.
Ao meu lado, Ulrich também comia batatas fritas.
— Precisamos estar às sete na galeria. A
imprensa toda já está lá — falei. Eu tinha meu
convite e aparecerei lá acompanhada de Ulrich,
Benjamin nada poderá fazer. Além do mais, Maya
disse que ela vai e será a oportunidade perfeita para
eu revê-la.
— Quer sair comigo, depois da exposição?
— Como é que é? — Tirei a atenção da casa e
olhei para ele.
— Sair... Comer alguma coisa, ir para minha
casa depois.

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— Está querendo transar comigo? — Minha


sobrancelha se levantou em sinal de incredulidade.
— E por que, não? Você é mulherão...
— Obrigada pela parte que me toca, mas sou
namorada do seu amigo, esqueceu? — Voltei a fitar
a casa.
— Você ainda é namorada do Benjhamin? Ele
estava cuspindo fogo falando de você. Queria até te
jogar na cadeia.
Olhei novamente para Ulrich, agora sorrindo
e não mais surpresa. Convivendo três dias com ele,
já tinha percebido como era imprevisível.
— Eu sei. Quando eu conseguir provar tudo,
ele vai ficar pianinho, sei como acalmá-lo. —
Gesticulei com uma batata, antes de enfiá-la na
boca. Ele sorriu de um jeito muito sexy, o só que
fazia acentuar sua beleza. — Se aquiete aí senhor
turco. Apesar de você ser bonitão, o coração do
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mulherão aqui já tem dono.


— Poxa... Achei que por ter brigado, você
estava em uma espécie de solteirice provisória.
— Você é bem cínico, talvez por isso Stela
não goste de você. A propósito — O fitei
interessada. —, porque ela não gosta de você?
— Porque ela sabe que eu sou doido para
comer ela.
— Inacreditável. Olha lá, ela está saindo. —
Joguei para o lado o pacote de batatas, abri a porta
do carro e pulei para fora. — Te peguei, vaca!
— Kahrolasi! Diana! (Porra! Diana!) — Ouvi
o turco berrar, mas não parei. Eu estava cega de
ódio. E coloquei todo nosso plano a perder quando
gritei:
— Então você é a Dani? — Sabrina estava
prestes a entrar em um carro de luxo e virou-se

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horrorizada para mim. Nem dei tempo para ela


correr. Minha mão voou na cara dela e o chapéu
que usava caiu revelando os cabelos castanhos,
encaracolados, iguais aos da minha irmã. O ódio
me consumiu. Parti para cima dela.
— Vagabunda! — Mais uma bofetada, e ela
perdeu o equilíbrio e caiu no chão. Tentou se
rastejar, mas a chutei e pulei por cima dela. Eu
acabei chorando e gritando enquanto esbofeteava
minha prima. — Eu te dei tudo, sua desgraçada, e
você feriu a memória da minha irmã. Só parei
porque Ulrich me tirou de cima dela, e Sabrina se
arrastou no chão, se recostando na roda do carro.
Ofegante, assustada, me encarou.
— O que pensa que está fazendo? Que merda
é essa, Sabrina? Me larga, porra! — Me debati nos
braços de Ulrich. E ele me soltou.
— Diana... Eu... — ela choramingou.
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— Me fala, porra! Me explique que merda


você fez? Eu estava prestes a afundar a cara dela no
asfalto, quando ela começou a falar.
— Almir me obrigou, desculpe Diana. Ele me
ameaçou... Eu só tinha que me disfarçar da Dani,
para extorquir o velho Capello. Mas depois que ele
descobriu que você estava morando com o
Benjamin, não quis mais pagar nada. —
Aterrorizada, eu enfiei as mãos nos cabelos e dei
um passo para trás, mirando-a com cuidado. De
perto, ela não se parecia com Dani, mas de longe,
do outro lado da rua ou correndo no cemitério, não
tinha como não se confundir. As duas se pareciam
mesmo.
Sabrina ajeitou os cabelos e olhou em volta,
preocupada.
— Eu preciso ir. Almir está me caçando.
Porque eu me recusei a continuar. Ele me fez

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continuar a encenação. O objetivo era fazer você e


Benjamin se separarem.
— Por quê?
— Porque Maya ficaria desprotegida, sem
você diariamente na cola dela. Desculpa, prima...
— chorou.
— O que Maya tem a ver com isso? — eu
quase nem tive voz para questionar.
— Almir vai sequestrá-la. Talvez hoje na
exposição, se ela for. Porque ele quer a boate toda
para ele e vai usar a menina para fazer você
entregar sua parte.
— O quê...? Não... isso não pode... — Olhei
para Ulrich e de volta para Sabrina. Já era noite e
Benjamin e Maya já deviam estar na galeria.
Desesperada, corri em direção ao carro, esquecendo
completamente de Sabrina. Ouvi Ulrich me
chamar, mas só parei quando ele me segurou firme.
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— Pode ser uma cilada.


Do outro lado, Sabrina entrou no carro, que
arrancou, indo embora.
— Ou pode não ser. Eu não vou arriscar a
vida de Maya.
— Tudo bem, vamos para a exposição agora.
Eu dirijo.

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39
BENJAMIN

Enfim a minha noite. A noite pelo qual sonhei


por anos a fio. As minhas obras estavam expostas e
os convidados as apreciavam com encantamento.
Eu já tinha dado entrevista e feito um rápido
discurso para abrir o evento e estava agora apenas
recebendo minha glória prometida. Meus irmãos
vieram e ficaram boquiabertos admirando os
quadros assinados por mim. Enfim não era algo
para ter vergonha, era meu novo caminho,
independente da empresa Capello.

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Olhei para Maya junto a Stela e os filhos dela,


e a emoção foi ainda maior. Minha filha estava
presente, algo que jamais poderia imaginar. Não
iria negar que sentia a falta de Diana a meu lado,
ela me ajudou a planejar tudo, entretanto, eu
consegui superar e erguer a cabeça. Era o momento
de vencer sozinho.
— Benjamin, os quadros estão evaporando.
— A organizadora me disse em um tom animado
que beirava o surto. Aproveitou o momento para
abraçar meu braço.
— Isso é bom. — Avaliei.
— É ótimo. É maravilhoso. Tem gente já
querendo encomendar quadros.
— Uma coisa de cada vez, Monica. — Me
afastei dela e a encarei contido — Deixe-me viver
esse momento, absorver tudo isso, porque até agora
ainda não caiu a ficha.
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Ela se achou na intimidade de tocar em meu


colarinho e ajeitá-lo. Quase fui mal-educado
pedindo-a para parar, mas apenas relevei.
— A sua ficha vai cair quando ouvir o valor
que já arrecadamos. A peça principal ainda está
sendo duelada.
Eu sabia de qual quadro ela se referia, mas eu
só pensava em destruí-lo com muita fúria.
— Ele não está à venda.
— Não? — chocou-se — Já recebemos oferta
de um milhão e duzentos.
— Não importa. Ele não está à venda.
— Tudo bem. Olha, aquele senhor ali é o seu
pai, certo? — Acompanhei o gesto dela e vi meu
pai conversando com um homem de terno e
gravata. Miguel ao lado dele. Meu pai tinha vindo,
e nem se deu o trabalho de vir falar comigo.

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— É sim. Deixe-o confortável. — Tentei me


afastar, mas ela tocou em meu braço.
— Ele comprou um quadro.
— O que? — agora eu estava mesmo chocado
— qual?
— O das crianças sob as uvas.
O quadro em que retratava Stela e eu sob as
uvas da vinícola de mamãe. Eu fiquei sem fala
olhando para o senhor bem vestido, apoiado em
uma bengala, tentando passar um ar de imponente
que não existia mais, o tempo havia lhe roubado
todo o vigor. Cansaço era o que lhe tomava. Deixei
meu orgulho de lado e caminhei até ele.
— Pai. — Murmurei e ele levantou os olhos
meio surpreso. Nós dois estávamos em uma espécie
de queda de braço invisível, tentando descobrir
quem dos dois cederia primeiro. Ele engoliu seco
antes de falar, mas não desviou o olhar.
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— Fez um bom trabalho, garoto.


Eu devo ter ficado paralisado por uns bons
segundos, perplexo com as palavras dele. Jamais
tive um elogio do meu pai, e sempre peguei pesado
na empresa tendo a esperança de que ele me
elogiaria como fazia com Miguel. Agora foi como
receber uma descarga de euforia no estômago.
— Obrigado. — Falei. — Fique à vontade. —
Antes de eu me virar para sair, um dos seguranças
veio rápido em minha direção.
— Temos um problema, na portaria. —
Assenti e caminhei com ele para a saída. — Ela
disse que é sua namorada, mas está muito alterada e
sem convite. — Ao ouvir isso, ultrapassei ele e com
passos largos saí cheio de fúria me dirigindo ás
grades. Fechei as mãos em punho ao ver os
seguranças barrando Diana já no jardim. Passei por
eles e assim que me viu, ela deu um passo para trás.

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— O que você quer aqui? Saia antes que eu


precise chamar a polícia.
— Benjamin, precisa me escutar. — Dei uma
olhada nela. Estava com os cabelos bagunçados,
jeans e camiseta. Suava um pouco e muito exaltada.
— Onde está Maya? Onde está ela? — olhou em
volta de mim — Não está com você?
— Saia daqui, Diana! — Meu tom foi frio —
Não te interessa onde ela está.
— Benjhamin, o caso é sério. — Só então
percebi Ulrich ao lado de Diana. Assim como ela,
não estava arrumado para o evento.
— Até você, cara? — Me dirigi a ele sem
esconder minha decepção.
— Me escuta caralho! — Diana berrou e
tentou me segurar. Puxei meu braço e apontei o
dedo para a cara dela.

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— Saia daqui pelo seu bem. — Virei para os


seguranças. — Ela não entra aqui.
— Sim, senhor.
Passei por eles e estava atravessando o jardim
ouvindo-a berrar atrás de mim.
— Era tudo um plano do Almir. Não era
minha irmã, Benjamin, me escuta, era a Sabrina
minha prima.
Me detive no mesmo instante e virei para
olhá-la. Diana estava aterrorizada, na verdade
quase tendo um ataque. Dei alguns passos na
direção dela.
— Era a Sabrina. — Ofegou — Eu menti para
você afirmando sobre o golpe, apenas para te
preservar, para você não ir atrás deles. Eu fui
investigar para te mostrar a verdade. O Ulrich me
ajudou.

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Olhei para ele e nada do costumeiro ar cínico


do meu amigo. O que eu vi deixou minhas mãos
dormentes. Tinha preocupação nos olhos dele.
— Cara, o assunto é sério. — Mais calmo que
Diana, ele reafirmou.
— Almir e minha prima disfarçada de Dani,
estavam extorquindo seu pai, Benjamin. E o
próximo passo é pegar a Maya para me obrigar a
doar minha parte na boate. Onde está ela está? Por
favor, diga que a trouxe com você.
Era muita informação para assimilar, e eu não
sabia se podia acreditar em Diana. Mas o que ela
dizia combinava corretamente com tudo que estava
acontecendo, sem falar no desespero em cada
palavra pronunciada.
Então não havia um complô contra mim.
Diana foi sincera e eu a coloquei para fora da
minha vida. Eu mesmo tinha escolhido trilhar o
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caminho do desolamento, da tristeza de não a ter ao


meu lado.
— A Maya veio... ela... está com a Stela.
— Por favor, fique com ela. — Implorou —
Segure na mão dela e não a deixe sozinha um
segundo. Por favor, eu te peço.
Automaticamente assenti diante do desespero
dela.
— O que está acontecendo? — Ouvi a voz de
Stela e me virei para olhá-la. Ela estava sozinha,
sem as crianças.
— Diana? — Minha irmã se surpreendeu —
enfim apareceu... o que está acontecendo?
— Onde está a Maya, mana? — Indaguei.
— Foi ao banheiro com a Rachel.
— Merda! — Ulrich enfiou as mãos nos
cabelos, completamente aflito, com um mau
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pressagio em seus gestos.


— Vai atrás dela. — Diana berrou e tentou
furar o bloqueio de segurança — Me deixe passar.
Ela não podia entrar lá nesse estado quase
psicótico. Antes de eu correr para dentro, avisei aos
seguranças: — ela não passa, ouviram?
— Benjamin! Me deixa passar, porra!
Entrei correndo atropelando as pessoas,
olhando em volta, sentindo o coração bombear
forte na garganta. Fui direto aos toaletes e entrei no
feminino sem aviso algum. Encontrei Rachel, filha
de Stela, sozinha lavando as mãos.
— Onde está Maya?
— Ora, tio Benjamin, a garçonete veio buscá-
la para tirar fotos com você.
Eu quase caí ali mesmo com o medo que me
atacou. Voltei correndo, trombando na porta. Olhei

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em volta, entre as pessoas circulando, tomando


champanhe e sorrindo, observando os quadros,
conversando entre si. Nem sinal de Maya.
— Monica — puxei a organizadora. Ela
sorriu de imediato ao me ver. — Viu minha filha
por aí?
— A doce Maya? Não a vi. Mas você tem que
vir falar com os...
Nem esperei ela terminar, saí pelas portas dos
fundos e não havia ninguém. Eu tinha apenas que
manter a racionalidade intacta, não surtar como
Diana já estava aos berros lá fora. Voltei para o
jardim e meu pai descia as escadas na companhia
de Andrey e Miguel, certamente atraídos pelo
escândalo de Diana.
— O que está acontecendo? — Andrey
perguntou.
— A Maya sumiu, me ajude, mano. Minha
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filha sumiu.
Voltei correndo até os seguranças que ainda
impediam que Diana atravessasse o jardim.
— Cadê ela? Cadê, Benjamin?
— Diana, você tem que se acalmar.
— Cadê minha filha, merda! — agarrada ao
segurança, começou a sacudi-lo. O pânico dela era
contagioso e tomou todos a nossa volta, eu mesmo
já estava quase berrando também. — Diga que isso
não aconteceu, por favor... onde ela está?
— Deixem-na passar e ajudem a procurar
minha filha. Evite que alguém deixe o local. —
Assim que os seguranças se afastaram, Diana veio
correndo, tentando chegar a porta principal, mas eu
a segurei. — Diana! você tem que manter a calma.
— Ela se debateu por mais alguns segundos até se
render ao meu abraço e afundar o rosto no meu
peito segurando forte as lapelas da minha jaqueta.
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— Vamos achá-la, eu prometo.


— Ela vai ficar muito amedrontada, ela vai
me chamar e eu não poderei ajudá-la.
— Isso não vai acontecer. Confia em mim. —
Acariciei os cabelos dela. — Porque você fez isso,
Diana? Por que mentiu e me fez te odiar?
Ela levantou os olhos, me encarando, estava
prestes a falar quando ouvimos um segurança
alertar sobre algo.
— Ei, senhor, não pode sair do ambiente. —
Do outro lado, um homem saia pela lateral com
algo nos braços. Nesse instante, Diana me
empurrou e andou depressa até o homem que não
parou diante da ordem do segurança. Ele carregava
algo enrolado em um lençol. Meu coração se
apertou ao ver que o embrulho estava imóvel.
— Não o deixem sair. — Ordenei para os
seguranças, mas não consegui segurar Diana. Em
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um segundo ela já estava correndo sozinha,


desesperada e pulou sem medo sobre o homem
impedindo-o de entrar em um carro preto encostado
na calçada. Eu corri também e sem aviso dei um
soco no cara que era enorme. E lá no chão,
enrolada no lençol, estava Maya, desacordada.
Diana a acolheu nos braços ajoelhada no chão, aos
gritos pedindo que alguém a ajudasse.
O cara todo vestido de preto - possivelmente
para se confundir com o escuro - se recuperou e
veio para cima de mim. Minha raiva por ele ter
tocado em minha filha foi tanta que não teve
chance de me atacar. Eu o agredi com brutalidade,
até que caísse tonto contra o carro. Mas não
desacordado.
— Leve-a para dentro, Diana. — Ordenei e
voltei-me para segurar o cara, mas ele já corria com
dois seguranças no encalço dele. Todavia nenhum

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conseguiu segurá-lo. Entrou em uma van do outro


lado da rua e arrancou, indo embora. E tudo foi
muito rápido, em questão de segundos. Sem dar
tempo de Diana entrar com Maya ou algum
segurança vir nos ajudar, a porta do carro preto,
perto de mim, se abriu e eu reconheci o homem que
saiu de dentro do carro. Almir.
— Para trás. — Ele tinha uma arma apontada
para minha cara. — Agora! — Olhou para Diana
com Maya nos braços e voltou a arma para a
cabeça dela.
— Levante-se Diana. — em seguida,
gesticulou a arma para mim. — Pegue a menina e
vá para dentro.
Eu fiz isso no mesmo momento. Peguei Maya
e a entreguei para alguém do lado de dentro. Acho
que Stela. Eu estava vidrado, os nervos saltados,
inflados de suspense. Atrás de mim no jardim, do

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lado de dentro das grades, os convidados se


aglomeravam espantados com a situação. E eu
torcia para que alguém já tivesse chamado a
polícia.
— O que vocês fizeram com ela? — de costa
para Almir e com as mãos levantadas, Diana
questionou. O lábio dela tremia e tive vontade de
segurá-la forte, para acalmá-la.
— Relaxa, é só um sonífero. Você vem
comigo. Entra no carro.
— Não Almir. — Ela implorou. — Eu passo
tudo para você. Eu juro. Eu te entrego minha parte
na boate.
— Está achando que eu sou tolo? Para eu sair
daqui e a polícia bater na minha casa no mesmo
momento? Você é meu escudo, Diana. Entra na
porra do carro. E ninguém dê um passo ou explodo
a cabeça dela.
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— O que vai fazer comigo, Almir? Eu te dou


minha parte, não é isso que quer? — Diana
continuou tentando barganhar. Eu com os nervos a
flor da pele, esperando qualquer oportunidade para
agir. Vi de soslaio, Stela entregar Maya para um
segurança que correu com ela para dentro da
galeria.
— Você nem imagina o que quero. — Almir
passou o revólver na bochecha dela e sussurrou no
ouvido: — sua vagabunda.
— Ah, vá para a porra seu filho de uma puta
— berrei e fiz menção de atacar, Almir virou a
arma com rapidez. Senti um empurrão forte no meu
corpo e ouvi o estampido alto do tiro. Todos
correram gritando e eu fiquei de pé, no mesmo
lugar, de olhos fechados. Esperei a dor, a morte,
qualquer coisa, mas ouvi apenas gritos. De Stela
principalmente. E quando me virei, nosso pai

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estava no chão com a mão no peito.


Agonizando, com olhar brilhante de medo,
meu pai me fitava do chão. Ele tinha entrado na
minha frente e recebido o tiro que era para mim.
Abaixei ao lado de Stela, que implorava para o
nosso pai falar com ela. Segurei a mão dele,
sentindo-a fria. Terror maciço me tomou. Parecia
um filme de horror todo em câmera lenta: Andrey
estava desesperado ligando para a emergência e de
lá de dentro Fernando vinha correndo.
— Pai! — Murmurei. E aproveitando esse
momento Almir fez Diana ir para o carro. Foi o
pior momento da minha vida. Entre meu pai
agonizando no chão e a minha mulher na mira de
uma arma.
— Benjamin... — a voz de Diana era um fio,
rouco e amedrontado. Almir a puxava e ela resistia
— Cuide da nossa menina...de a ela uma família.

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— Belas últimas palavras, vaca. — ela foi


empurrada para dentro do carro, no lado do
motorista. — Você dirige. — Almir entrou atrás e
o carro arrancou.

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40
DIANA

— Para de chorar. — Almir bateu a arma de


lado na minha cabeça. Ele estava sentado atrás do
banco do motorista, uma maneira fácil de me
controlar. — Quando brincou com minha cara não
chorou, não é?
— Eu não brinquei com você! Eu abandonei a
boate porque não queria mais confronto. Você sabe
que só quero proteger a Maya.
— Pura balela. Você foi morar com o filho da
puta e estragou meus planos com o velho. Ainda
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por cima foi atrás da Sabrina. Tinha que ser tão


enxerida, Diana?
— Seu desgraçado! — Berrava a medida em
que batia várias vezes no volante, com a fúria
queimando meu sangue e me desnorteando. —
Você tramou usando minha irmã morta. Seu
monstro.
— Calada. — Berrou no meu ouvido. —
Você fez pior, traindo-a. Entra na avenida dos
Holandeses. Rápido, porra.
— Para onde está me levando?
— Não te interessa. Vá direto até chegar no
Calhau.
E eu o obedeci, calada, tentando alcançar
racionalidade suficiente para pensar em uma saída.
Aquele lugar era lindo a noite. Fosse em outra
ocasião eu iria bem devagar para apreciar a
paisagem noturna. Por aqui podemos chegar à orla,
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onde Maya adorava ir para ver os cargueiros. As


vezes almoçávamos em restaurantes litorâneos e
andávamos contra o vento fresco vindo do mar.
Lembrar essas imagens era como morfina
para alma, tirava a minha dor. Me fazia fugir para
um mundo ilusório onde eu estava feliz, com minha
vida em ordem, criando a filha de Dani.
Eu fracassei com minha irmã e com Maya. Na
verdade, com Benjamin também. Eu fracassei em
dar a nós três um caminho feliz.
Almir me guiou, me fez desviar do Comando
geral da polícia e fomos rumo a Lagoa da Jansen.
Também um local onde me remetia a lembranças
da minha irmã. Nascemos nessa cidade, e em cada
cantinho tinha uma história feliz.
Pelo retrovisor vi ele atender o celular. Falava
baixo, mas pude ouvir perfeitamente: “Tivemos um
pequeno contratempo, mas já estou chegando com
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ela. Prepare tudo.”


— O que vai fazer, Almir? — Questionei
dividindo minha atenção entre ele e a rua a minha
frente. Na minha lateral estava a lagoa.
— Não. É. Da. Sua. Conta.
— O que vai fazer comigo, porra?
— Calma Dianinha, você só vai ser bondosa e
me doar sua parte da boate e depois... pensaremos
no depois.
O ódio me tomou. Eu vislumbrei
perfeitamente um destino em que eu era forçada a
assinar e depois seria executava sem chance de
escapar, jogada em alguma vala e perdida para
sempre. Sem família, quem iria se preocupar com
meu corpo desaparecido?
Olhei para Almir mais uma vez pelo
retrovisor. Ele estava sentado bem próximo de

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mim, bem encostado no banco do motorista.


Sutilmente passei os olhos pelo meu cinto de
segurança afivelado e não quis mais cogitar. Não
quis pagar para ver. Se eu tinha uma chance de
rever Maya, esse seria o momento.
Acelerei, e com brusquidão girei o volante
sem rumo algum. O carro saiu da via e entrou na
área de pedestre gerando pânico nas pessoas que
estavam por perto. Ouvi o barulho de um tiro e um
zumbido insuportável no meu ouvido. Mas
continuei com o pé no acelerador. Eu só queria
provocar uma batida, já que Almir estava sem
cinto. Funcionou. O carro rodopiou, bateu em um
poste, mas para meu azar, ele continuou girando. E
tudo a seguir foi o carro capotar indo em direção a
lagoa.

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41
BENJAMIN

Eu estava ao lado da cama de Maya, no


hospital, mas pensando em Diana ainda
desaparecida e no meu pai sendo operado. O tiro
por pouco não acertou o coração. Meus irmãos
estavam lá, esperando uma resposta dos médicos,
eu poderia também me juntar a eles, mas minha
filha tinha apenas eu para velar por ela, enquanto
permanecia inconsciente pelo sonífero.
Limpei uma lágrima e olhei mais uma vez
meu celular, esperando em desespero por uma
resposta da polícia que tinha ido atrás de Almir e

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Diana. Não conseguia decidir se ela tinha sido


altruísta ou burra. Não só agora, mas antes quando
me enganou dizendo que ela e Dani estavam
mesmo me dando um golpe. Segundo Ulrich, tudo
que Diana queria era descobrir a verdade sozinha,
porque se caso ferisse no processo, Maya ainda
teria a mim. Ela só não queria que eu corresse
perigo. E isso era tão estupido e adorável ao mesmo
tempo.
Eu passei a madrugada ao lado da cama de
Maya. Fernando veio ao quarto avisar que o nosso
pai tinha saído da cirurgia e estava na UTI apenas
para recuperação. Tinha corrido tudo bem, e eu não
cansava de agradecer.
Quando o dia amanheceu, eu tinha pegado no
sono e acordei sobressaltado com alguém me
cutucando. Stela estava lívida e preocupada, mas
não mais aterrorizada como presenciei na noite

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passada.
— Mano, como você está?
— Bem. — Direcionei meu olhar para Maya;
ela ainda dormia e era normal segundo o médico.
— Tem notícias da Diana? — Voltei a encarar
Stela.
— Ainda não. — Desviou o olhar.
— Você está mentido, Stela. O que houve?
— É apenas que...o papai acordou e quer falar
com você. Vá lá, depois iremos tomar um café.
Eu olhei para Maya e minha irmã entendeu
meu receio.
— Eu fico com ela.
— Eu preciso estar ao lado dela quando
acordar.
— Será rápido. Só ouça o que ele quer falar.

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— Tudo bem. — Saí do quarto, e um


enfermeiro me guiou até a ala de unidade intensiva.
Apenas Andrey permanecia na sala de espera
falando com alguém ao telefone, os outros já
deviam ter ido embora. Ele terminou a ligação e
veio até mim.
— Como está sua filha?
— Bem. Ainda dormindo, mas segundo o
médico, é normal devido a quantidade de sonífero.
O pai quer falar comigo...
— Sim. Já falei com ele. O velho está lucido.
O pessoal acabou de ir embora.
— Certo. Alguma notícia da polícia? — Ele
sabia que eu me referia a Diana.
— Ainda não, mano.
— Ok. — Assenti, não o deixando ver meu
desespero silencioso e voltei a seguir o enfermeiro.

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Coloquei máscara e touca descartável para entrar na


ala intensiva e aproximei devagar da cama em que
meu pai jazia. Cercado de aparelhos, e com uma
fonte de oxigênio no nariz.
— Pai. — Sussurrei temendo me aproximar.
Era como reviver o momento em que vi minha mãe
no leito de morte. Eu tinha quinze anos e aquela
cena me marcou para sempre. Meu pai virou-se
para me olhar. De repente, seus olhos lacrimejaram
e eu tive força de dar mais alguns passos em
direção a cama. Rapidamente busquei sua mão e a
apertei. Fiquei feliz ao constatar que estava quente
e não mais fria como na noite passada.
— Francisca Cristóvão. — Ele sussurrou e
coube a mim inclinar para ouvir melhor.
— Quem?
— Ela veio antes de sua mãe. Era o amor da
minha vida. — A voz dele era pausada e fraca.
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— De quem o senhor está falando?


— Escute...
Assenti, prestando atenção, para que ele
pudesse falar.
— Eu a amei loucamente, iriamos abrir uma
loja de roupas... — sua voz assumiu um tom
nostálgico e tristonho, de repente estava rouca de
emoção. — Mas ela fugiu com todo dinheiro que
empreguei. — Meu pai virou o rosto, creio que
envergonhado da lágrima que desceu
involuntariamente. Eu apenas fiquei em silêncio
dando tempo a ele.
— Ela fugiu com um homem mequetrefe, um
bêbado, um... quase delinquente... e juntos deram
vida à duas mulheres. Diana e Danielle.
Esfreguei a mão no rosto, completamente
pasmo com a revelação. Agora tudo fazia sentido.

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— Meu Deus! Pai...


— Eu devia ter dado valor a sua mãe, mas eu
só pensava em dinheiro, em ficar milionário para
ter Francisca de volta. Até que ela morreu e sua
mãe me deixou.
Dei um passo para trás, com as mãos cruzadas
atrás na nuca, encarando-o e pensando o quanto nós
poderíamos ter sido felizes se ele tivesse valorizado
minha mãe... se ele não tivesse sido mesquinho.
— Tudo que fez foi por causa de uma
mulher...
— Hoje, eu quase morri e tenho que te falar
isso. Eu só... não queria que você sofresse o que eu
sofri, meu filho. Eu odiei a Diana tanto... porque eu
vi nela a Francisca e ela poderia desgraçar sua
vida.
— Ela não é assim, pai. — Aproximei-me da
cama novamente. — A Dani também não. E hoje
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fomos vítimas de uma armação. Eu amo a Diana e


não tem nada que possa fazer para impedir isso.
— Eu sei. Agora eu sei. Depois do que eu vi
ontem... eu vi vocês juntos, vi a cumplicidade... Ela
deu a vida pela sua filha...
— Sim... ela fez isso. Assim como o senhor
ganhou um tiro por mim. Me sinto tão culpado.
— Não sinta. — Ele sorriu. — Pense na sua
menina. O que faria se visse uma arma apontada
para ela?
— Eu entraria na frente. Sem pensar.
— Agora você entende. E que o pai pode até
parecer malvado, mas vai fazer todo sacrifício para
defender sua prole.
— Você sempre pareceu malvado. — Não foi
uma acusação, eu estava concordando com ele.
— Um dia você vai... entender...

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— Senhor, precisa descansar. — O


enfermeiro chegou. — Não deve esforçar.
— Pai, descanse.
— Vá atrás dela... — ele sussurrou. Os olhos
quase fechando, entrando novamente na letargia
causada pelos medicamentos e a anestesia recente.
— Fique com ela.
— Eu farei isso. Sua benção, meu pai. —
Beijei a mão dele.
— Deus te... abençoe.

Eu saí depressa da ala, respirando rápido,


buscando ar. Apoiei na parede e fiquei lá por
alguns minutos remoendo o que acabei de escutar
do meu pai. Por causa da mãe de Diana, ele se
levantou contra as duas irmãs que não tinham nada
a ver com a mãe. Era muito ruim pensar que se meu

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pai tivesse aceitado conhecer Dani e ver que era


totalmente diferente da mãe, nada disso teria
acontecido.
Mas então eu me pergunto: meu destino era
com Dani? E se simplesmente não desse certo?
Voltei a caminhar rápido, para chegar logo ao
quarto de Maya. O passado não importava mais, o
meu destino agora era com outra mulher.
Antes de chegar ao quarto, me deparei com
policiais conversando com Andrey. Meu coração
saltou em câmera lenta, batidas altas que pulsavam
em meus tímpanos. Pelas expressões deles eu soube
que era algo muito grave. Um deles, inclusive,
abaixou o semblante sem poder me encarar.
Andrey apressou-se em vir ao meu encontro e
segurou meu braço.
— Mano, senta aqui.

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— O que houve? — Resisti para que ele não


me fizesse sentar.
— Vamos falar...
— O que houve, porra?
— Cara... você tem que manter a calma. —
Uma ordem em tom baixo, quase sussurrando.
Voltei-me para os policiais.
— O que aconteceu? — E me enfureceu o
fato de flagrar Andrey fazendo um gesto para eles
aguardarem.
— Senta aqui, porra. — Apesar do palavrão,
sua voz era pacífica e me convenci a sentar. Ele
ocupou o lugar ao meu lado.
— Ficamos sabendo desde às duas da manhã.
— Sabendo de que? — Com sobrancelhas
erguidas, eu encarava meu irmão. Percebi que era
desconfortável para ele falar, e por isso, Andrey
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engoliu ruidosamente e me fitou.


— O carro que a Diana estava... caiu na lagoa.
— Ah, caralho. — Senti meu corpo todo
pulsar e minha nuca arrepiou-se. Era medo puro,
pânico nascendo das minhas entranhas. Fiquei de
pé. — Onde ela está?
— Senhor, é melhor manter a calma. — Um
policial estendeu a mão para mim.
— Pode trazer. — Andrey fez sinal para um
enfermeiro vir e apavorei ao ver ele trazendo uma
bandeja com algum medicamento.
— Eu não quero beber merda nenhuma. Onde
ela está, Andrey? Por favor, fala comigo!
— Sinto muito, cara...
— Não! — Com as mãos na cabeça
simplesmente saí fora de mim. Meus gritos podiam
reverberar pelas paredes, mas eu não conseguia

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parar. Vi Stela aproximando e em um instante


parou um pouco temerosa, já com lágrimas nos
olhos. Ela sabia. Desde o início, ela sabia.
Eu estava surtado, aos gritos e nem tinha
força para me controlar. Senti minha irmã me
abraçar e permaneci chorando enquanto ela me
consolava.

***

Fiquei sabendo depois que apenas o corpo de


Almir foi encontrado ainda dentro do carro. As
buscas ainda tentavam encontrar o corpo dela. O
local onde havia caído não era tão fundo e segundo
ouvi falarem, agora que amanheceu, era questão de
pouco tempo para resgatar o corpo.
Quando Maya acordou, eu estava ao lado

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dela. E confesso que fiquei aflito ao me deparar


com uma menina de cinco anos que seria agora
minha exclusiva responsabilidade. Eu tive medo de
levar adiante, sozinho, de não saber criar uma
menina que seria uma boa mulher. Eu me vi
despreparado, mas a emoção de tê-la comigo, de ter
algo para me sustentar, era maior que a
insegurança. E eu percebi como Diana tinha sido
forte em superar todos os sofrimentos pelo bem de
Maya. Porque ela também deve ter se sentido
insegura, mas foi em frente e criou a sobrinha.
Confusa, Maya se sentou na cama coçando os
olhos. Eu emoldurei um sorrido mesmo que por
dentro estivesse aos pedaços. Esperei ela olhar em
volta e sua atenção voltou-se para mim, intrigada.
— Onde estamos, papai?
— No hospital. Mas já, já, vamos embora.
— Eu estou dodói de novo?
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— Sim, minha princesa.


— E a mamãe vai vir me visitar?
Não pude responder. E eu não queria chorar
perto dela. Me sentei na cama e puxei-a para meus
braços acolhendo-a.
Éramos apenas eu e ela agora.

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42
DIANA

Quando abri os olhos estava na orla olhando


para o mar. O céu estava claro e havia sol. Pássaros
cantavam, a água estava bonita e ouvi risadas a
minha volta. E quando olhei para o lado meu
sorriso se expandiu deliciosamente ao ver minha
irmã olhando-me.
— Dani!
— É lindo, não é? — ela voltou a olhar para o
mar não compartilhando a mesma emoção que eu
sentia. — Esse lugar sempre marcado como nosso
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lugar para relaxar.


— Me perdoe, mana... fiz tudo que pude. —
Era estranho, minha voz era esganiçada, quase não
saia por mais que eu colocasse força.
— Di, você não fez nem o começo... mas vai
fazer tudo que estiver ao seu alcance. Você deu um
lar para a Maya e sarou Benjamin. E isso é só o
início.
— Onde você estava, Dani? Quando eu mais
precisei de você?
— Que pergunta é essa? — Riu — Eu sempre
estive com vocês. — Ela olhou para trás onde
crianças brincavam e eu acompanhei o olhar vendo
Maya e os filhos de Stela. — Vou rapidinho ali,
fica de olho nela. — Piscou para mim e saiu. Sem
que eu esperasse, olhei para o lado e vi um carro
preto vir em toda velocidade em minha direção. O
carro saiu da via, entrou na faixa de pedestre e
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capotou após bater em um poste. De repente era


noite e eu estava na beira da lagoa vendo o carro
despencar em minha direção.
— Aaah! — Berrei e me sentei na cama.
Olhei em volta, apavorada, demorando a me situar.
Só quando vi Amanda entrar correndo no quarto, as
lembranças da noite anterior me abraçaram. Eu
sofri um acidente, consegui sair e vir direto para
meu antigo apartamento.
— Di. Está tudo bem?
— Sim. Estou. — Olhei para ela me sentindo
pálida, mas, em contraparte, parecia que o dobro da
quantidade de meu sangue pulsava em meu rosto.
Estava suada.
— Sonhei com a Dani. — Murmurei e tentei
alcançar o copo de água ao lado da cama. Era tão
real. — Amanda me ajudou com água. — Eu gosto
de sonhar com ela...
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— Pelo amor de Deus, Diana, precisa ir ao


hospital. Está dormindo desde ontem. Você sofreu
um acidente sério.
— Não posso. Almir e seus comparsas
precisam pensar que estou morta.
— Acabou de sair no jornal. O corpo dele foi
encontrado. Almir está morto, Diana.
— Ah, meu Deus! — com dificuldade,
levantei as mãos para o alto — Obrigada! — Voltei
a deitar e de repente eu me vi radiante, mesmo
estando com o corpo dolorido. O braço
principalmente.
— Posso ligar para o Benjamin? — a
pergunta de Amanda me fez enrijecer. Havia muito
a resolver ainda.
— Não. Ainda não. Eu vou conversar com... o
Ulrich.

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— Quem?
— Meu advogado. Quero saber qual próximo
passo devo dar. Almir era chefe daquela gangue
que ele chamava de seguranças... eu não sei até
onde eles vão querer se vingar de mim.
— E a Maya? Vai deixá-la sofrer? Porque
mais cedo ou mais tarde vão contar a ela que você
foi morar com papai do céu.
Maya. Meu Deus, minha menina!
Tampei o rosto com as mãos e suspirei
exasperada. O sonho que acabei de ter com minha
irmã era tão vivido que podia jurar que era real. Eu
fiz uma promessa a Dani. Maya era sempre minha
prioridade.
— Não. Não vou deixá-la sofrer. — Me virei
de lado, lentamente, para levantar-me — Pode me
ajudar a tomar um banho?

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— Sim. Vamos.
Tomei um banho quente, depois de quase um
dia inteiro dormindo após o acidente, e pude sentir-
me revigorada. Eu não tinha ferimentos graves,
apenas alguns hematomas. Enquanto Amanda
penteava meus cabelos depois do banho, fechei os
olhos e solucei involuntariamente ao ter as imagens
claustrofóbicas do carro afundando nas águas
escuras.
O cinto e o airbag tinham sido primordiais
para que eu não machucasse tanto na batida. Mas
então o carro caiu no lago. A agonia de tentar soltar
do cinto e logo depois lutar com a porta que estava
emperrada. Por sorte o vidro da frente havia se
quebrado parcialmente no impacto, eu saí por lá,
sem nem pensar em conferir se Almir tinha mesmo
morrido. Eu só pensava em nadar e sair do lago.
Estava escuro naquela parte e vi as pessoas se

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aglomerando para ver o carro caído.


Eu confesso que quase gritei pedindo ajuda,
mas como ninguém estava me vendo, pensei
melhor e decidi sair um pouco mais a frente e andar
rápido, mancando, cheia de dores, até encontrar um
taxi. Naquele momento eu só queria fugir. Não
queria ir para hospitais ou outro lugar onde Almir
pudesse me pegar, ou mandar terminarem o
serviço. Pensei que eu no hospital ou ao lado de
Benjamin e Maya, estava apenas atraindo o perigo
para eles.
Por isso, agora, eu tinha que me encontrar
com Ulrich antes de qualquer coisa. Pelo celular de
Amanda liguei para ele.
— Espero que esse cara tenha um pingo de
bom senso e te faça ir ao hospital. — Amanda
expressou com irritação, parada na porta do quarto
enquanto eu esperava alguém atender a chamada.

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— Oi. — Ulrich atendeu.


— Ulrich, onde você está? Sou eu, Diana.
— Diana? kahrolasi...
— Por favor, não fale com ninguém. Se
outras pessoas estiverem por perto...
— Não tem ninguém por perto. Me explique
isso direito, Diana, onde está? Como sobreviveu?
Sabia que tem buscas pela sua corpo e o Benjamin
teve que tomar calmantes?
— Sério?
— Claro. Está em uma hospital?
— Não. Estou no meu apartamento. Vou te
passar o endereço e se puder venha me ver.
— Tudo bem. Pode falar.

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43
BENJAMIN

Eu estava exausto depois de uma noite no


hospital. As emoções pisoteadas na chegada da
tarde, e lutando para manter-me lucido e de pé,
porque Maya precisava de mim. Fomos para meu
apartamento e Stela me acompanhou. Fiquei grato
pela ajuda dela e nem pensei em negar. Sozinho eu
desmoronaria.
Enquanto ela estava na minha cozinha
preparando algo para comermos, eu fazia
companhia a Maya na sala. Ela amava televisão,
mas hoje nem isso conseguia tranquilizá-la. Nem

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mesmo os filhos de Stela brincando foi atrativo


para ela.
— Como está minha bebê? — Beijei os
cabelos dela. Maya estava aconchegada ao meu
corpo, de cabeça baixa, pensativa.
— Não sou bebê. — Sussurrou.
— É sim. — Fiz cocegas nela. — Minha
bebezinha princesa. — Não riu, desconfortável
empurrou minha mão.
— Papai... eu gostaria de dormir no seu
quarto hoje.
Levantei o queixo dela para que me olhasse.
— Está com medo?
— Um pouco. Por que a mamãe não chega?
Ela nem foi me visitar no hospital.
Ajeitei o cabelo dela, tirando mechas da testa
e pensando como um dia eu poderia contar a
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verdade. Esse grito interior louco para deixar meu


peito, era doloroso, era incontrolável, e não dava
para compartilhar com ela.
— A mamãe foi... fazer uma viagem... — não
tinha um pingo de credibilidade em minha voz.
— Liga para ela, papai. Só para eu contar que
fiquei no hospital.
— Tudo bem. Depois que almoçarmos eu vou
ligar, tudo bem?
— Tá bom.
— O que gosta de assistir? Vamos ver,
juntos?
— Hum rum. — Manteve a cabeça recostada
em meu peito, sem nenhuma vontade de fazer
qualquer coisa. Ainda poderia ser moleza do
sonífero, todavia, pelo pouco tempo que convivi
com ela, sabia que era tristeza.

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Eu tentava convencer Maya a comer um


pouco quando o interfone tocou e Ulrich se
identificou.

— Não o chame para almoçar. — De má


vontade, Stela cochichou para mim. Limitei-me a
revirar os olhos. Fui atendê-lo pensando em
dispensá-lo logo porque eu não queria conflito a
essa hora. Não tinha cabeça para isso.
— Estamos almoçando. — Falei quando abri
a porta desprezando o semblante meio afoito dele
— Podemos nos encontrar outro momento? Stela
está aqui...
— Você precisa vir comigo. — Nesse
instante, um gatilho acionou em minha cabeça, me
lembrando da situação trágica de Diana. Eu estava
esperando notícias...
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— O que houve? Encontraram...?


Ele olhou por cima do meu ombro, conferindo
se havia alguém por perto e então me puxou para
fora.
— Diana está viva e escondida.
— O quê? — saiu um grito esganiçado.
— Shhhi. Não fale para ninguém.
— Como assim? Que merda é essa Ulrich?
— Venha comigo. — Ele estava cada vez
mais agitado — Ela acabou de me ligar pendido pra
eu encontra-la e pediu para eu não falar com
ninguém, principalmente com você... eu só não
achei justo você continuar pirando por causa dela.
— Por que ela faria isso? Caralho, cara...
— É isso que eu quero descobrir. Você vem
comigo?
— Claro. Vou calçar um tênis. — Entrei
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correndo, fui direto a sala de jantar e dei um beijo


em Maya.
— Meu bem, o papai vai resolver uma coisa e
daqui a pouco estarei de volta.
— Tá bom. — Nem levantou o rosto do prato,
empurrando a comida sem um pingo de interesse.
Para Stela fiz um sinal de que depois contaria a ela.
Mesmo assim minha irmã levantou da mesa e me
seguiu até o quarto. Eu estava sentado na cama
calçando um tênis quando ela entrou de supetão.
— Benjamin... o que houve? Encontraram a
Diana?
— Mana, te explico tudo quando voltar.
— Para onde está indo?
— Entender um bagulho que está
acontecendo pelas minhas costas. Cuide de Maya
para mim. — Pulei da cama, beijei o rosto dela e

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saí correndo do quarto.

Fomos no carro de Ulrich, enquanto ele


dirigia eu tentava encontrar uma justificativa para
ela estar escondida. Como conseguira fugir? Eu
tinha visto a foto do carro e me convenci naquele
momento de que ela tinha mesmo morrido.
Meu coração acelerava à medida em que se
aproximava da casa dela, do antigo apartamento
onde morava com Maya. Nem mesmo no hospital
ela tinha ido? Isso era bizarrice.
Quando chegamos, eu desci pronto para
derrubar o portão e invadir o edifício.
— Porra, cara. Segura a onda. — Ulrich
entrou na minha frente. — Siga o que combinamos.
— Tá. Vai logo nessa merda. Quero olhar
para a cara dessa desalmada que me fez chorar e o

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escambau.
Ele me ignorou e apertou o interfone e eu sem
um pingo de paciência ao seu lado. Quando
atenderam, quase coloquei o plano a perder, pronto
para berrar algo do tipo: “que merda ela estava
aprontando”. Ulrich empurrou minha boca e falou:
— Sou eu, Ulrich. — O portão destravou e eu
entrei na frente dele. Diana morava no segundo
andar e eu preferi as escadas.
— Benjhamin! — Ulrich vinha atrás me
chamando, mas só conseguiu mesmo me
acompanhar quando chegamos ao corredor dela.
Ele me empurrou contra a parede. — Sei que está
aflito, que precisa de respostas. Mas segue a porra
da nossa trato., vai deixar eu bater na porta, vai
deixar ela explicar e não vai fazer espetáculo. Eu
confiei em você caralho, por isso te contei.
Ele tinha razão. pressionei os olhos com os
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dedos e enfim o encarei, tentando ser mais


civilizado.
— Ok. Vá em frente.
Ele andou para o apartamento, bateu na porta
fazendo sinal para eu ficar no canto. E quando a
porta abriu, esperei ele entrar e só então apareci.
Antes de fechar, coloquei minha mão e Amanda
quase gritou ao me ver. Ela ficou muito pálida e até
soltou o ar dos pulmões em alívio quando eu a
deixei de lado.
Diana veio mancando do quarto, olhando para
Ulrich e então ela me viu e deteve-se com horror
explicito nos olhos.
— Desculpe, Diana. — Disse Ulrich — Eu
não pude mentir para ele.
Acho que ficamos um momento considerável
nos encarando. Eu estava sem reação e ela pronta
para correr, como se eu fosse fazer algum mal.
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Talvez porque minha cara de choque não era nem


um pouco tranquilizadora.
Caminhei até ela e Diana resolveu se afastar,
me encarando sem piscar, com medo. Eu continuei
andando até ela recosta na mesa.
— Eu ia... te contar. — Uma lágrima desceu
do olho dela. — Benjamin, eu ia te falar...
— Você tem ideia do que passei...? Achando
que você tinha...
— Eu só não podia aparecer ainda... fiquei
com medo.
Antes de ela termina de explicar atropelando
as palavras, puxei-a para meus braços apertando-a,
como se tivesse que me certificar que era real. E
então Diana desabou, segurando minha camiseta
chorou com o rosto no meu peito.
— Eu sofri tanto... — sussurrei, sem parar de

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beijar os cabelos dela. — Maya e eu precisamos de


você. Não faça isso de novo, cacete.
— Eu não queria levar perigo para vocês. —
Levantou os olhos para me olhar. — Você não está
bravo comigo?
— Estou muito puto. Estou tentado a algemar
você no meu braço... porque eu estava tão feliz com
minha nova vida e você com essa mania de querer
fazer tudo sozinha. Caralho, Diana! Eu já te incluí
nos meus planos, não me deixe fora dos seus. Eu te
amo, porra.
O semblante dela iluminou-se.
— E por que acha que eu quero manter o
perigo longe de você? Porque eu também te amo.
Não suportaria que algo lhe acontecesse por minha
causa. Você e Maya são meu mundo, cara.
Um sentimento poderoso, quase um
arrebatamento, tomou conta de mim ao ouvir ela
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falar isso. Era tudo que eu queria ouvir. Minha vida


estava um buraco negro vazio, de perversão, mas
agora eu tinha alguém que se importava comigo e
tinha trazido um presente para minha vida.
Puxei-a novamente para abraçar e só a liberei
quando me empurrou de leve.
— Adoro seu abraço, mas estou toda
arrebentada.
— Desculpa. — Beijei o nariz dela.
Sentada no sofá, ela narrou para mim e Ulrich
como aconteceu o acidente. Ela era corajosa e
arriscou tudo para ter mais uma chance de ver
Maya. Mesmo que poderia ter dado errado, graças
aos céus, tinha conseguido.
Ulrich convenceu Diana a falar com a polícia.
Tudo que ela passou era grave demais para a gente
resolver por baixo dos panos. O medo dela era
infundado, segundo Ulrich. Almir era sozinho e
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apesar de seus funcionários, ninguém mais iria


fazer nada contra ela, já que tinha sido um acidente
e ninguém precisava saber que ela havia
provocado.
Ela só se convenceu a ir embora, depois que
ele a explicou com cuidado que estaria mais segura
comigo. E mesmo que ela não aceitasse, eu teria
que levá-la a força.
Eu ajudei entrar no carro e fui com ela no
banco de passageiros enquanto Ulrich tagarelava ao
volante. Olhei para a mão dela presa à minha e
quando levantei os olhos Diana me fitava.
— Quem diria que eu poderia dar certo com o
cara que mais odiei no mundo?
— Eu digo a mesma coisa. — Beijei os lábios
dela e me lembrei do que meu pai revelou a mim.
— Há algo que precisa saber, sobre meu pai.
— Como ele está?
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— Bem. Fez uma cirurgia.


— Foi um gesto de bravura dele.
— Sim. Ele recebeu um tiro que era para
mim.
— Nem me lembre disso. — Voltou a
recostar o rosto no meu peito. — Só quero ver
minha menina e ter minha vida de volta.
Chegamos em casa, eu entrei primeiro,
chamei Stela e contei rapidamente para ela. Não
pude esperar que ela reagisse, deixei-a boquiaberta
no meio da sala assistindo Diana entrar com Ulrich,
e fui a procura de Maya. Ela estava deitada na
minha cama, de lado, com os olhos abertos olhando
para o nada.
— Ei filhinha... tudo bem?
Ela não respondeu.
— O papai trouxe alguém para te ver.

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Maya sentou-se me observando com atenção.


— É a mamãe?
— Por que você não vem ver? — Ajudei-a a
levantar, segurei em sua mão e saímos do quarto.
Maya descia a escada quando viu Diana abraçando
Stela.
— Mamãe! — Soltou da minha mão e
terminou de descer os degraus sozinha. Diana veio
rápido recebê-la.
— Meu bebê! — Ajoelhou e abraçou Maya
ali, aos pés da escada. Chorando baixinho por ver
nossa menina sã e salva. O que passamos naquela
noite, será para sempre meu maior pesadelo, mas
será tudo que eu preciso lembrar para dar valor ao
bem mais precioso: a minha família.
Me aproximei, ajudei Diana a se levantar e
abracei as duas sentindo cada pedaço de minha
alma colando novamente.
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Por cima do ombro de Diana vi Ulrich com


um sorriso cínico fazendo gesto de abraço para
Stela. Ela limitou-se a mostrar o dedo do meio para
ele, revirando os olhos.

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44
BENJAMIN

Meu pai ficou uma semana no hospital e


quando voltou para casa, tinha uma pequena
surpresa o esperado. Todos nós reunidos com
direito a uma faixa de boas-vindas. Meio cafona, eu
até alertei meus irmãos, mas Stela e Miguel
estavam com isso na cabeça e fizeram a faixa.
Nunca tinha visto meu pai tão surpreso e
emocionado. Pare ser sincero, nunca tinha visto
meu pai tão humano. Sorrindo como se nada mais
lhe importasse como estar ao lado da família. Ele
recebeu o abraço de cada um ali presente, beijou

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Maya e a abraçou um pouco mais demorado. Eu


tinha ido pessoalmente ao hospital mostrar a ele o
exame de DNA que ficara pronto três dias atrás
confirmando que ela era uma Capello e os papeis
da paternidade já estavam em andamento. Diana foi
a última a cumprimentar meu pai. Ela ficou de
longe sem coragem e ele a chamou.
— Você me lembra minha juventude. — Ela
assentiu sem mostrar-se confusa.
Eu contei para ela a revelação que meu pai
tinha feito sobre o passado dele e a mãe dela. Diana
ficou comovida ao saber que Dani foi apenas um
bode expiatório para a raiva que meu pai tinha.
— Eu te peço desculpas, em nome de sua
irmã. — Meu pai falou — Mesmo que não seja
capaz de dá-las a mim.
— Fique feliz e apoie as escolhas do seu filho
e então já será meio caminho andado para o senhor.
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E por incrível que pareça, meu pai concordou


com ela.
Depois, Diana conversava muito entrosada
com Maria Clara, Stela e Mariana, me dando uma
sensação agradável por vê-la à vontade na minha
família. Meu pai fez sinal para mim e eu aproximei.
— Me acompanhe até meu escritório. —
Pediu e eu o ajudei a levantar do sofá, entreguei sua
bengala e fomos para o escritório. Ajudei meu pai a
se sentar em sua cadeira e me acomodei a frente
dele.
— O que deseja, meu pai?
— O que resolveu da sua exposição que deu
errado?
— Não deu errado. Deu muito certo. Eu vendi
todos os quadros e já tenho encomendas que vão
me deixar ocupado até o fim do ano. — Isso tinha
sido incrível. A exposição foi um sucesso de crítica
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mesmo com a tragédia que desencadeou naquele


mesmo dia. Os jornais não paravam de noticiar,
assim como o telefone da galeria e novas visitas de
pessoas interessadas em meus quadros.
— Que bom. Você... vai se casar com a
Diana?
— Não pensamos nisso ainda, pai.
— Certo. Eu sempre me esqueço que os
relacionamentos de hoje em dia vão em contramão
dos de antigamente.
— Estamos felizes. Ela vai reabrir a boate
porque o juiz deu a ela uma liminar. Queremos
aproveitar, nos conhecer melhor...
— Tudo está dando certo para vocês. Isso me
deixa tranquilo. Eu quero que saiba que sua filha
está segura. Eu incluí ela no meu testamento. —
Falou com tranquilidade me fazendo remexer
inquieto na cadeira.
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— Incluiu? Quando?
— Há algum tempo. O tal socio de Diana
contou para mim, muito antes, em uma tentativa de
me extorquir. Ele disse que Diana criava minha
neta, filha da irmã dela com você. E eu observei-a
um dia e vi Diana com a menina.
— Pai! Pelo amor de Deus — bati as mãos
nos braços da poltrona sem esconder minha
perplexidade com a revelação — por que não me
contou?
— Você já sabe o motivo. Eu odiava pensar
em você metido com as irmãs Cristóvão. Mas a
menina podia ser minha neta. Então a cláusula do
testamento diz que ela está automaticamente
inclusa caso se comprove ser sua filha.
— Então não tinha nenhuma amante... que
achamos...
— Eu sei que você e seus irmãos andaram
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investigando, achando que eu tinha incluindo uma


mulher... uma amante. — Recostei na cadeira
observando a risada irônica dele — Eu não seria tão
idiota. Dividir o dinheiro dos meus filhos com uma
estranha. A nova herdeira, era sua filha esse tempo
todo.
— Eu fico feliz e tenho certeza que Andrey
ficará aliviado.
— Como eu disse lá no hospital, posso
parecer maldoso, mas só quero o bem dos meus
filhos.
— É, não deixa de ser frio tomando as
decisões.
— Aquele dia na UTI eu não pude explicar,
mas vou te falar agora. Veja o seu irmão, Thadeo,
por exemplo, eu queria tomar metade das terras
dele para poder administrá-las e depois devolver, já
que ele não quer meu dinheiro.
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Meneei o pescoço considerando que fazia


sentido. Thadeo não queria ajuda do meu pai para
reerguer a vinícola e isso gerava mal-estar entre os
dois. Meu pai continuou:
— Acha que eu não sei o que Andrey
esconde? Você ficaria horrorizado se soubesse. Eu
só queria protegê-lo de uma encrenca maior,
casando-o logo.
— E o que ele esconde?
— Não cabe a mim dizer. — Ele pigarreou e
fez uma pausa descansando para prosseguir. —
Veja o Fernando, sempre teve tudo tão fácil e tinha
que duelar pela vice-presidência para dar valor
àquela cadeira. Quanto a sua irmã, você sabe o que
ela passou na adolescência e como Miguel foi
importante para ela. Como eu poderia jogar os pés
no homem que a reergueu? Ah rá — ele riu com
vontade, de modo sarcástico — eu não sou bobo e

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sei que o meu genro é um puxa saco, como vocês


dizem. Mas é o puxa saco que ela ama. — Deu de
ombros com desdém.
Eu estava mirando-o com atenção, surpreso
em conhecer uma nova versão para todas as ações
questionáveis dele. E me flagrei esperando falar
sobre mim.
— E você... eu tinha medo de vê-lo
humilhado, fracassado... medo de ver você
investindo muito em algo que poderia não ter
retorno. Você tem tendência a ser como sua mãe, a
se afundar no abismo, em lutas clandestinas, mundo
da perversão, bebidas, cassinos clandestinos. —
Mais uma vez me deixou inquieto. Ele sabia de
todos os meus passos. — Por isso a pressão de estar
na empresa comigo. Para te dar condição o
suficiente de tentar seu sonho, e se não der certo,
ainda poderia ter uma vida digna. Você tem uma

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casa, carro, dinheiro no banco, conseguiu com o


suor do seu rosto e agora, pode enfim, seguir o que
sempre sonhou sem se perder no caminho.
Em silêncio, permaneci olhando-o entendendo
seu lado. Meu pai não precisava mostrar que estava
querendo o bem. Ele simplesmente fazia tudo,
mexia os pauzinhos sem se importar que parecesse
maldoso. No fim, cada um dos filhos se daria bem e
era o que importava para ele.

***

Diana e eu tínhamos algumas pendencias a


resolver, principalmente na boate que agora estava
sob o comando dela. Tínhamos um horário
marcado às seis da tarde com um empresário -
especializado em casas noturnas - que visitaria a
boate e se tudo desse certo, faria parceria com
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Diana. Era o que precisávamos.


Deixamos Maya com Stela e saímos da casa
do meu pai, mas antes, passamos em um lugar.
Tinha chegado o momento de uma visita ao
cemitério. Nossos fantasmas do passado estavam
ali e era uma maneira de seguirmos em frente a
partir daquele momento.
Diante da lápide de Dani, eu me vi abalado
olhando a foto da mulher que um dia eu fui
apaixonado e constatei que agora em meu coração
residia apenas uma boa saudade e lembranças
nostálgicas agradáveis.
— Estamos dando a Maya uma família, mana.
— Diana sussurrou. — Obrigada por deixar um
tesouro com a gente. — Beijou uma flor e
depositou na lápide. — Olhou para mim e pediu
emocionada: — Nunca esqueça dela, Benjamin.
— Eu jamais esquecerei. — Beijei a testa de
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Diana e ficamos ali, abraçados observando o


túmulo. Depois caminhamos para o local onde eu
vim muito na adolescência. Já sabia o caminho
decorado. Era onde minha mãe estava enterrada.
— Ela era linda. — Diana falou. — Parecia a
Stela. — Na foto escolhida, minha mãe sorria com
seus cabelos claros, soltos. Essa foto foi tirada
assim que mudamos para a vinícola e ela estava
radiante pronta para começar uma nova vida.
— Sim. Era uma mulher forte, confiante, até...
que... — engoli as palavras. — Minha mãe sofreu
bastante por homens que não a valorizaram.
— O que de verdade aconteceu? — Diana
virou-se para mim, interessada.
— Minha mãe quis o divórcio. Partiu dela o
pedido. E agora sabemos que a causa foi...
— Minha mãe. — Diana emendou.

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— Não. Claro que não. Sua mãe já estava


com seu pai, vivendo a vida deles. Meu pai que
cismou que a reconquistaria e depois disso fomos
morar na vinícola que era do meu avô. Na época
era um dos melhores vinhos do Brasil, conhecido
internacionalmente. E então minha mãe conheceu
um cara.
— Ah, meu Deus. — Diana murmurou,
abraçada a meu braço, me olhando com
cumplicidade.
— Ele nos destruiu. Minou a sanidade dela...a
afundou em vicio e aos poucos fomos perdendo
tudo. O vinho deixou de ser o melhor...
— E o seu pai não fez nada?
— Quando ele descobriu, entrou na justiça e
conseguiu levar Fernando e Andrey com ele,
porque eram mais velhos. A justiça permitiu que os
mais novos continuassem com minha mãe. E
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então... as agressões começaram. — Diana


acompanhava meu relato chocada, e eu não
desviava o olhar da lápide de minha mãe. — Ele
batia muito nela, me trancava em um baú...
— Meu Deus, Benjamin! Que horror!
— Pois é. O ápice de tudo aconteceu uma
manhã em que ele queria dinheiro para drogas.
Minha mãe não tinha mais nada para vender. Então
ele estava espancando-a e depois que acabou com
ela... minha irmã foi seu alvo. — Parei de falar com
um bolo na garganta, a dor das lembranças quase
me cegavam e me faltava o ar.
— Não precisa falar... se não puder. — Ela
pediu, sentindo meu dilema doloroso em reviver os
fatos. Apertei a mão dela e continuei, com a voz
amarga e baixa:
— Ele pegou Stela e... rasgou a roupa dela.
Ele estava fora de si e me trancou no baú... aquele
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dia eu quebrei o pulso de tanto bater na tampa para


escapar porque eu ouvia os gritos dela. E então
Thadeo chegou da escola. Minha irmã estava em
choque, ferida... mas ele chegou a tempo e feriu o
desgraçado.
— Feriu?
— Ele bateu com algo na cabeça do sujeito e
depois que ele caiu, o Thadeo continuou batendo. O
cara teve traumatismo craniano... eu liguei para a
polícia e quando eles chegaram meu irmão estava
mudo, banhado de sangue, sentado no canto da
sala. E desde então ele distanciou de todos. Mora
na vinícola hoje em dia, e se sente culpado pelo que
aconteceu com nossa mãe.
— E o que aconteceu com ela?
— Meu pai a culpa até hoje. E naquela época
ele a jogou em uma clínica de reabilitação e em
seguida em uma clínica particular para doentes
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mentais. Eu a vi poucas vezes... ela não teve culpa,


Diana. Minha mãe nunca teve uma chance de se
reerguer e dar a volta por cima.
— Eu compreendo. Eu sei que ela não teve
culpa. Ela era a vítima. O seu padrasto morreu?
— Não naquele momento. Morreu dois anos
atrás de enfarte.
— Foi tarde.
Olhei mais uma vez para a lápide, beijei a
mão de Diana que estava entrelaçada à minha e
caminhamos rumo a saída.
— Foi bom compartilhar com alguém. —
Falei.
— Estarei sempre aqui para te ouvir. — Ela
me confortou. Abraçados saímos do cemitério rumo
a uma nova vida que trilharemos juntos. Nossos
mortos ficariam em paz, enfim descansando.

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46
DIANA

Não havia ninguém na boate além de mim e


Benjamin. Eu dei folga para as meninas e iria
mudar toda a equipe de segurança. Leandro tinha
desaparecido assim como Sabrina, e boatos que
escutei diziam que tinham fugido juntos. Eu não ia
gastar meu tempo perseguindo-os, mesmo que
merecessem mofar atrás das grades.
Ajeitei o que pude para receber o empresário
que tinha aceitado o convite feito por Benjamin. Se
desse certo, poderíamos fazer parceria com uma

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das casas noturnas mais conhecidas do momento: a


Dama de copas.
— Você usou o nome de sua família para
chamar atenção dele, não é? — Indaguei.
— Claro que sim. Para alguma coisa o
sobrenome tinha que servir. — Ouvimos o
interfone e ele animou-se. — Chegaram, vamos lá.
— Entrem, por favor. — Benjamin os recebeu
e os trouxe até a antessala onde eu esperava. Era
um homem muito bonito acompanhado de uma
mulher estonteante que eu sabia se tratar de uma
famosa violinista. Tinha pesquisado sobre a vida do
casal antes de recebê-los.
— Essa é a minha namorada e dona da boate,
Diana Cristóvão. — Benjamin apresentou-me.
— Oi Diana. — O homem apertou minha
mão. — Sou Magno Lafaiette e essa é minha
esposa Lavínia.
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— Olá. — A cumprimentei com dois


beijinhos no rosto. — Por favor, venham. Vamos
mostrar a boate a vocês.

A conversa e a visita a boate tinha sido


positiva. Mostramos cada ambiente e ele ouviu com
atenção os planos que eu tinha em mente.
Contamos a eles toda a história, e mostramos como
queríamos algo novo para atrair novamente a
clientela. Magno mostrou-se interessado na
parceria e marcamos um jantar para falarmos mais
a respeito.
Quando foram embora, eu gritei e pulei nos
braços de Benjamin.
— Já está comemorando, titia?
— Muito, garotão. — Beijei a boca dele,
sendo carregada para o salão principal.

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— Adoro te ver feliz. Tenho certeza que vai


dar certo. — Ele me colocou sobre o balcão do bar
e beijou meu ventre. Acariciei seus cabelos e
quando ele me olhou sorrimos juntos.
— Obrigada por me apoiar.
— Somos um time, agora.
— Claro. Falando em time, vamos a
comemoração. — Empurrei Benjamin, e caminhei
para o palco, o lugar onde as meninas se
apresentavam nas noites. Liguei as caixas acústicas
de som e quando a música começou subi no palco.
— Você fica aí. — Apontei para ele.
— Ah caralho. — Exclamou incrédulo —
Não acredito. É sério?
— Sim. Uma dança especial para meu amor.
Você é o único que vai ver a dona da boate nesse
palco.

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— Eu sou sortudo pra caralho. — Benjamin


acompanhou com os olhos cada um dos meus
movimentos enquanto eu me balançava no ritmo da
música, imitando o que via as meninas fazerem.
Sensualmente despindo peça por peça da minha
roupa. Usei a barra de pole-dance, rebolei
eroticamente bem perto dele, escutando seus gritos
de euforia e morrendo de rir no processo.
Quando estava só de lingerie e saltos,
Benjamin pulou sobre o palco e me agarrou.
— Não é legal o cliente agarrar a dançarina.
— Não é legal a dançarina provocar tanto.
Ele me segurou com impressionante força,
passando as mãos grandes em minhas coxas, sem
desgrudar a boca da minha. De repente estávamos
deitados sobre o palco, ele sobre mim, se despindo
com rapidez, ofegante e desesperado para sentir
nosso calor se misturar.
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— Caralho... você ainda me mata com seu


fogo. — Ondulei meu corpo, receptiva, querendo-o
intensamente.
— Não aguenta mais o baque, titia?
— Agora eu te mostro quem é a titia. —
Empurrei ele, Benjamin virou-se deitado de costas
e eu o montei. — Está precisando de um bom
corretivo.
— Nossasenhora. — Sussurrou e me puxou
para beijá-lo.
Viajei em um sexo formidável, tão quente e
gostoso como todos os outros. Benjamin sempre
me levava ao paraíso, era uma união perfeita ali
suados, embolados nos movimentando corpo contra
corpo. Tendo-o em toda sua intensidade me
atacando sem reservas, me embalando com força o
mais fundo que podia ir, e o seu piercing fazendo
um trabalho absurdamente delicioso.
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— Te amo... — sussurrei contra os lábios


dele, um pouco antes do orgasmo.
— Você é uma das melhores coisas que
aconteceu na minha vida. — Ele respondeu e
gemeu rouco e alto me agarrando com força no
momento em que gozamos.
— Um brinde a uma nova vida. — Benjamin
falou, segurando meu rosto em suas mãos. Eu ainda
sentia seu pênis dentro de mim, montada sobre ele,
com meus seios tocando seu peito forte. Eu estava
completamente de joelhos por esse homem.
— Um brinde. — Respondi e voltamos a nos
beijar, ali sozinhos pelados na boate sobre o palco
com as luzes piscando e a música dançante ao
fundo.

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EPÍLOGO
— Mamãe, que torre enorme! Vamos poder
subir nela? — Maya estava impressionada com a
torre Eiffel, assim como eu. Era minha primeira vez
na França e não conseguia parar de suspirar e me
encantar com tudo a minha volta.
Seis meses tinham se passado desde que tudo
acontecera e estávamos em outro país para a
primeira exposição internacional de Benjamin. Ele
já tinha feito outra no Rio de Janeiro, depois
daquela desastrosa e incrivelmente foi convidado a
participar de uma exposição de arte em Paris onde
seriam expostas obras de apenas alguns poucos
artistas de renome.
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— Claro que vamos poder subir. Você não


tem medo, princesa? — Benjamin perguntou.
— Um pouco. Mas com meu pai e minha mãe
perto de mim eu não tenho medo. Rimos da
sinceridade dela. Benjamin a pegou no colo e
andamos em direção a torre.

A noite nós três nos arrumamos e fomos a um


jantar em um elegante restaurante que Benjamin
conseguira fazer reservas. Eu estava vivendo um
conto de fadas e não tem idade certa para começar
a ser feliz e a amar. Um romance que jamais sonhei
ter com direito a Paris e um buquê de flores. Maya
saltitava a nossa frente e eu sentia orgulho de estar
de braços dados com Benjamin.
Durante o jantar a surpresa veio me deixando
em choque. Um garçom trouxer em uma bandeja
uma caixa muito bem embrulhada e ao lado dele
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um violinista, bem a estilo Paris. Boquiaberta, tão


surpresa como eu, Maya implorava para eu abrir
logo.
— Abre mamãe.
Puxei as fitas e peguei a caixinha de veludo
dentro da caixa maior.
— É um anel mamãe. — Maya gritou antes
de eu abrir para conferir se era mesmo um anel.
Benjamin levantou-se, pegou a caixinha e a abriu
diante de mim.
Coloquei a mão na boca, maravilhada com os
dois anéis ali dentro. Um era pequenino, de criança.
— Vocês duas sãos as mulheres da minha
vida. Diana quer se casar comigo?
— Diz que sim mamãe, diz que sim. — Para
Maya, era o mundo perfeito que ela sempre sonhou
nas suas fantasias infantis, regadas a histórias de

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princesas.
— Sério? — Sussurrei voltando a mirar os
olhos apaixonados de Benjamin.
— Muito sério. — Seu sorriso era um refúgio
lindo onde eu não cansava de me abrigar.
— Ah meu Deus... é claro. É logico que eu
quero me casar com você. — Nem pensei duas
vezes. — Ele pegou o anel maior, colocou no meu
dedo e beijamos ali sobre os gritinhos e aplausos de
Maya contagiando as pessoas que aplaudiram
também. Benjamin pegou o outro anel e segurou a
mão de Maya.
— E você, minha princesa, aceita ser a
daminha do casamento do seu pai e sua mãe?
— Sim! — Ela esperou ele colocar o anel em
seu dedinho e festejou: — eu estou tão feliz. Eu
ganhei um anel também.

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Parecia que a vida de Benjamin começava a


partir daquele momento. Estávamos desenhando
nossa própria casa com piscina para Maya,
planejando o casamento que seria logo após o de
Andrey, planejando crescer a família. Eu queria
tudo com ele, experimentar cada momento dos anos
que teríamos juntos.

***

Essa noite estávamos todos na fazenda de


Fernando para um jantar dado por Maria Clara. Ela
ganharia neném em breve e era como um chá de
bebê para a família. Era maravilhoso fazer parte
daquela família que me recebeu de braços abertos,
com alguma relutância no início. Eu ainda tinha
dificuldade em me aproximar de Andrey ou Thadeo
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por exemplo, mas isso com o tempo seria resolvido.


Naquele momento na mesa rodeada de
pessoas sorridentes eu flagrei o velho Capello me
observando e quando nossos olhares se
encontraram ele sorriu de leve, com nostalgia nos
olhos.
E eu enfim tinha cumprido o sonho da minha
irmã. Maya tinha agora uma família que a amaria e
cuidaria dela.
FIM

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O TERCEIRO LIVRO DA SÉRIE, TEM


DATA PREVISTA PARA OUTUBRO. LEIA
AQUI O PRÓLOGO E O PRIMEIRO CAPÍTULO
DO LIVRO 03, E CONHEÇA O GRANDE
SEGREDO DE ANDREY CAPELLO.

PRÓLOGO - ANDREY

Era a festa do meu noivado, ou melhor, o


espetáculo que meu pai fez questão de criar para
exibir a futura união do filho mais velho. União
essa que era totalmente armada, era a única
condição imposta para eu chegar à presidência: ser
casado. Eu pensei bastante em não ceder e
desmarcar esse vexame, mas meus irmãos me
aconselharam a não magoar o velho, já que eu

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queria o comando do grupo Capello. E por isso eu


estava aqui: apenas para não o contrariar e no fim,
eu ser recompensado.
No meu dedo o anel de noivado pesava uma
tonelada e eu pensei na minha garota que não sabia
de nada disso. Não sabia que nesse momento eu
selava união com uma segunda mulher. Observei
minha noiva ao longe conversando alegremente
com Stela e Miguel, os convidados já começavam a
ir embora.
Corpo escultural, cabelos muito bem tratados
em ondas douradas perfeitas, rosto angelical,
Mariana era filha de um parceiro comercial da
Capello, fomos apresentados há uns meses e eu me
recorri a ela para propor o casamento de
conveniência. Sedenta para crescer no mundo das
pseudo celebridades, e por gostar de ter transado
comigo, ela aceitou imediatamente. Quem não

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aceitaria? Ela só tinha a ganhar ficando um ano


casada com um herdeiro Capello.
Benjamin aproximou-se com uma garrafinha
de corote e serviu a mim e a nossos outros irmãos
Fernando e Thadeo. Nós quatro reunidos para um
brinde de irmãos, no fim de festa.
— Um brinde ao cara que vai se casar em
breve sendo que tem uma mulher fixa malocada em
algum lugar por aí.
— Cara, é verdade. — Fernando concordou
— Por que não propôs casamento a mulher que
você já come e gosta dela? Não seria mais fácil do
que um casamento de conveniência?
— Não. Não seria. Dinah é meu tesouro, ela
não quer essa vida. Ela odeia tornar-se um alvo de
olhares, conversas e até notícias.
— E onde está essa mulher misteriosa que
nunca mais apareceu? — Benjamin questionou.
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Lembro de ter saído com ela, o Fernando também a


pegou. Mas só você apaixonou.
Ah, meu jovem irmão... Você não sabe da
missa um terço.
— Onde mais estaria? — Respondi — Em um
apartamento de luxo custeado por mim. A Dinah
ama luxo e tenho prazer de dar tudo a ela.
— É um safado mesmo. Vai ter que rebolar
para esconder isso da Mariana.
— Está tudo bem. Será apenas um ano
casado. — Levantei o copo e esperei meus irmãos
levantarem o deles também. — Á minha noite que
tem prazo de validade.
— À sua noite. — Batemos os copinhos e
viramos a bebida na boca bem a tempo de Stela vir
caminhando desconfiada.

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CAPÍTULO 01
ANDREY

Rolei na cama antiga e um pouco velha e o


colchão de mola rangeu com meu peso. Podia ouvir
o coaxar dos sapos misturando com o som da água
correndo no riacho e grilos chiando denunciando a
noite de verão, e apesar da estação quente, a janela
aberta deixava entrar um gostoso ar fresco natural
do campo; dava, inclusive, para perceber toques de
aroma da terra molhada da plantação por perto.
Vagarosamente, arrastei para o corpo nu ao
meu lado e beijei as costas até a curva da bunda
roliça. Aos poucos me acomodei sobre o corpo
feminino, tendo cuidado para não colocar muito

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peso. Só queria que ela sentisse meu corpo quente e


meu pau ainda duro mesmo depois do tórrido sexo.
— André, você já quer mais?
— Querer eu quero, mas sei me controlar,
meu bem. — Ah, uma puta mentira. Perto dela eu
não conseguia mesmo me controlar. — Eu sei que
está dolorida. Mas você é tão gostosa que me tira
do sério. — Aspirei o cheiro gostoso de lavanda
que ela exalava e sorri de olhos fechados. Queria
tanto deslizar para dentro da boceta apertada, onde
apenas eu tinha estado em toda sua vida.
Ela começou a virar-se e eu dei espaço para
ela fazer isso. Quando enfim ficou de frente para
mim, enroscando as pernas nas minhas e me
abraçou, pude ver vestígios de seu rosto no escuro,
iluminado apenas pelo brilho da lua.
Era tão linda, muito jovem, carregada de
pureza angelical. Seus cabelos castanhos cacheados
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e volumosos jogados pelo travesseiro.


— Eu te amo, meu homem. — Ela soprou,
beijando minha boca. — Te deixo fazer qualquer
coisa.
— Eu sei minha doçura. — Retribui o beijo
suportando meu pau feito aço reclamando por
conchego nas carnes macias. Mas eu não poderia
forçá-la. Observei contente, a insinuação de
sedução que ela aplicava, ao acariciar meu corpo e
morder os lábios ao mesmo tempo, na esperança de
que pudesse ficar mais tempo aqui comigo. —
Agora, você precisa ir para a casa pois seu tio não
pode ver você aqui.
— Eu queria tanto dormir com você, André.
— A decepção em sua voz quase me fez ceder. Mas
eu tinha que pensar a longo prazo. Era melhor
comer pouco agora, do quer não comer nada no
futuro se o tio dela descobrisse.

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— Eu sei minha linda, eu também queria, mas


se ele te pega aqui fora, no celeiro, ele vai proibir
de eu vir te visitar. — Era um saco ter que aguentar
o tio dela que queria entregar a sobrinha pura ao
homem que ela casaria. Ana já tinha vinte anos e
ainda bem que eu cheguei antes de ela ser entregue
a outro e a reivindiquei como minha garota. Nunca
tinha estado com um homem além de mim, e os tios
me adoravam por ser, aparentemente, um homem
respeitoso e trabalhador.
Se ele soubesse que na roda da alta sociedade
maranhense eu era conhecido como o grande
canalha imoral...
— Tem razão. — ela concordou acariciando
minha barba — promete que um dia me leva pra
São Paulo? Quero conhecer seu trabalho.
Ok. Minha consciência pesava toda vez que
ela tocava nesse assunto. Ana Rosa nunca

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imaginaria que eu era na verdade um empresário


herdeiro de uma potência bilionária. Menti sobre o
meu nome e inventei essa de cortador de cana, que
a proposito nem existe mais, apenas para engabelar
o tio dela. Ele ficou mais aliviado – e
estranhamente maravilhado - quando me apresentei
como um homem humilde e trabalhador braçal.
— Prometo sim, meu bem. — Beijei a testa
dela. — É um canavial a perder de vista. — Menti.
— Mal posso esperar. — Ela me beijou e eu
lutei para me controlar e não começar tudo
novamente. Ana ainda não estava acostumada com
meu vigor. Para ela, uma vez na noite era
suficiente, mas um dia eu iria treiná-la para me
aguentar em toda intensidade.
Quando ela saiu, eu fiquei lá no colchão no
chão do celeiro sorrindo pelado olhando para o céu
pela janela. Isso que era vida. Transar com quem a

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gente queria, mas mantê-la guardada, sem


questionários, sem dilemas, apenas empurrando
com a barriga.
Conheci Ana Rosa no ano passado quando
estava na fazenda Capello dirigida por Fernando. O
tio dela trabalhava lá e ela foi um dia acompanhá-lo
para conhecer a fazenda. Foi paixão à primeira
vista. Aquelas pernas lisas, os seios empinados, o
olhar dócil, quase me matou. Eu tive certeza que
teria aquela mulher gemendo embaixo de mim,
minha boca salivava ao pensar nela, em seus seios
intocados e na pureza intacta de sua feminilidade. E
eu lutei muito, sozinho e discretamente, para
conseguir meu prêmio, minha garota escondida.
Não deixei que ela me visse naquele dia na
fazenda de Fernando, mas investiguei e descobri
que a jovem moça morava em uma casa à beira de
um lago em uma vilazinha ali perto. Um lugar

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rural, pobre, sem telefone, ou até mesmo energia


elétrica. Eles usavam energia solar. Eu fiquei
pasmo com a vida precária, mas feliz que ela
levava.
O tio já estava velho e se aposentara
recentemente como lavrador e eu consegui me
infiltrar naquela casa e roubar para mim a inocência
daquela jovem que tinha sonhos pequenos e
simples, de uma vida feliz. Era fácil convencer uma
pessoa sem muito acesso à informação. Ana havia
se formado apenas no ensino médio e passava seus
dias alfabetizando jovens e adultos da pequena vila.
Ela era minha garota, e minha família não precisava
saber disso.
Meus irmãos sabiam que eu tinha uma
amante, mas eu os enganei dizendo que era uma
mulher de nome Dinah, que nós conhecemos e
compartilhamos.

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Na manhã seguinte, tomei café com ela e com


os tios. Dei um dinheiro para eles mentindo que era
do corte de cana e fui embora. Claro, parei em um
posto de gasolina e troquei de roupa, para não
levantar quaisquer indagações a quem me visse.
Cheguei relaxado em casa depois de uma deliciosa
noite. sempre que eu ia ver minha garota secreta,
minha semana tornava-se mais feliz. Abri a porta
do meu apartamento e revirei os olhos ao ver quem
estava sentada no sofá me esperando.
— Oi Mariana. — Minha voz beirou o
desprezo ao ver nos olhos da minha noiva a
desaprovação. Estava se mostrado bastante
grudenta nos últimos dias e nem tínhamos nos
casado ainda. Eu odiava mulher grudenta.
— Passou todo o fim de semana fora. —
Observou, sem apelar para questionários. —
Incomunicável. — Ela me seguiu enquanto eu ia

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para meu quarto dando como resposta apenas


silêncio. Me despi e entrei no banheiro para uma
ducha.
— Você estava com ela?
— Não. — Liguei o chuveiro e controlei a
temperatura da água.
— Você prometeu que iria terminar tudo com
ela. — Mariana tentou não gritar, mas sua
abordagem acusatória dava tom de briga. — Você
estava com Dinah, a meretriz?
Eu não dei a ela a chance de me ver rindo
ironicamente. Mariana tinha descoberto semana
passada, um bilhete simples que Ana havia
depositado em minha bolsa sem eu ver. Mariana foi
até a empresa me confrontar e como saída, contei a
ela o que eu sempre contei para meus irmãos: uma
amante de luxo com o nome de Dinah. E prometi a
Mariana que terminaria tudo com a outra, antes do
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casamento. Uma ova que eu terminaria tudo com


Ana Rosa, meu tesouro secreto.
— Dinah já voltou para São Paulo, Mariana.
— Você não queria atender...
— Que bom que percebeu.
— É essa sua resposta? Não atendeu ao
telefone uma vez se quer...
Debaixo do chuveiro, recusei a responder e
quando saí, ela ainda esperava a resposta que ela
mesma já tinha: eu não queria atender ao telefone.
— Eu te disse que estaria viajando a trabalho
e que provavelmente estaria fora de área. Por que
essa loucura? Eu estou aqui, não estou?
— Andrey, eu não serei chacota nessa cidade.
— o leve desdém que esbocei a irritou mais —
aceitei casar com você, porque você implorou,
porque você quer essa merda de presidência. Mas

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iremos manter todas as aparências incluindo


fidelidade. — Berrou revoltada e saiu do banheiro.
Dei uma risada, terminei de enxugar, joguei a
toalha e fui para a frente do espelho. Hoje Mariana
não iria me estressar, tudo que eu queria era manter
as lembranças da noite gostosa. E quando esse
casamento acabasse eu iria contar a Ana quem eu
sou, e ela será a senhora Capello.

Continua...
(Lançamento em outubro)

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A SÉRIE DINASTIA CAPELLO É


COMPOSTA POR 5 LIVROS E SEGUEM A
ORDEM ABAIXO:
DOCE DOMINIO - Fernando
SEGREDOS INDISCRETOS – Benjamin
IMPIEDOSA PAIXÃO - Andrey
O BEIJO DA FERA – Thadeo
SUBLIME AMOR – Stela

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