Fatores de Virulência Microbianos e Terapias Emergentes - Vol.02

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Organizadores

Sivoneide Maria da Silva


Francisco Henrique da Silva
Amanda Virgínia Barbosa
Matheus Alves Siqueira de Assunção
Fálba Bernadete Ramos dos Anjos

Fatores de virulência microbianos


e terapias emergentes
Vol. 02 - Fungos

Latin American Publicações


2021
2021 by Latin American Publicações Ltda.
Copyright © Latin American Publicações
Copyright do Texto © 2021 Os Autores
Copyright da Edição © 2021 Latin American Publicações
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Alagoas, Brasil.
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Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, Brasil.
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Brasil. Prof. Dr. Dilson Henrique Ramos Evangelista - Universidade
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Minas Gerais, Brasil.
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Brasil. Prof. Dr. Wagner Corsino Enedino - Universidade Federal de Mato
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Profª. Msc. Scheila Daiana Severo Hollveg - Universidade Franciscana, Brasil.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
S586f Silva, Sivoneide Maria
Fatores de virulência microbianos e terapias emergentes /
Sivoneide Maria da Silva. São José dos Pinhais: Latin
American Publicações, 2021.
262 p.

Formato: PDF
Requisitos de sistema: Adobe Acrobat Reader
Modo de acesso: World Wide Web
Inclui: Bibliografia
ISBN: 978-65-992783-3-4
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000058

1. Infecções. 2.Bactérias.
I. Silva, Sivoneide Maria. II. Silva, Francisco Henrique.
III. Barbosa, Amanda Virgínia. IV. Assunção, Matheus
Alves Siqueira. V. Anjos, Fálba Bernadete Ramos.
Título.

Latin American Publicações


São José dos Pinhais – Paraná – Brasil
www.latinamericanpublicacoes.com.br/
[email protected]
APRESENTAÇÃO

A coleção intitulada “Fatores de Virulência Microbianos e Terapias


Emergentes” surgiu a partir de ideias e indagações de singelos pesquisadores,
movidos pelo desejo sempre novo de desbravar o mundo fantástico dos
microrganismos. A proposta para o possível lançamento de um livro nos inspirou a
organizar uma série de livros que contasse como os seres microscópicos
sobrevivem às adversidades do meio.
O segundo volume desta coleção é destinado aos fungos de importância
médica. Este livro é constituído por diferentes capítulos, que convidam o leitor a um
passeio engrandecedor pelo Reino Fungi. As diferentes abordagens deste volume
ao mesmo tempo que apresentam variados fungos patogênicos ao homem,
estimulam a curiosidade sobre as inovações terapêuticas associadas ao controle de
infecções fúngicas.

Sivoneide Maria da Silva


Francisco Henrique da Silva
Amanda Virgínia Barbosa
Matheus Alves Siqueira de Assunção
Fálba Bernadete Ramos dos Anjos
PREFÁCIO

É com grande felicidade que celebramos as conquistas da ciência, em tempos


de tantos ataques e negacionismo científico. O livro Fatores de Virulência
Microbianos e Terapias Emergentes, é um presente em um momento histórico, de
pandemia, onde a microbiologia, infectologia, biotecnologia, imunologia,
farmacologia, epidemiologia e demais áreas ligadas a ciência translacional, estão no
dia a dia da população, na TV, nas redes sociais.
O livro é uma importante forma de divulgação do conhecimento cientifico,
onde a universidade pública e o Sistema Único de Saúde merecem grande atenção.
A pesquisa contribui para a geração de conhecimento e para o desenvolvimento da
humanidade.
A Micologia, neste contexto se apresenta como uma área em ascensão no
mundo todo, pois as infecções de origem fúngica são frequentes e afetam um
número crescente de pessoas no mundo e estão entre as principais causas de
doenças infecciosas. Em pacientes graves, principalmente atendidos em Unidades
de Terapia Intensiva, os fungos estão entre os quatro agentes mais frequentes e
essa frequência tem aumentado dramaticamente nas últimas décadas.
Aqui, desejo boa leitura, boas ideias, novas parcerias e novos projetos. O livro
trás uma leitura, resultado do trabalho de cientistas na área da micologia, fonte da
perseverança e curiosidade que devem sempre fazer parte da vida de quem veste
um jaleco e decide fazer do laboratório um local de contribuição para melhoria da
qualidade de vida da humanidade, fazendo da ciência uma ferramenta de
transformação.

Abraço fraterno!!

Bruno Severo Gomes


SUMÁRIO
CAPÍTULO 01 ................................................................................................... 1
PRODUÇÃO DE BIOFILME POR FUNGOS FILAMENTOSOS E LEVEDURAS
Franz de Assis Gradano dos Santos
Melyna Chaves Leite de Andrade
Ana Paula Sampaio Feitosa
Luiz Carlos Alves
Fábio André Brayner
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000059

CAPÍTULO 02 ................................................................................................. 21
FUNGOS LIQUENIZADOS
Mônica Cristina Barroso Martins
Maria de Lourdes Lacerda Buril
Beatriz Cristina da Rocha Silva
Nicácio Henrique da Silva
Eugênia Cristina Pereira
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000060
CAPÍTULO 03 ................................................................................................. 40
DERMATOFITOSES: GÊNEROS DE RELEVÂNCIA CLÍNICA
Aparecido Jonanthan Mandú de Araújo
Roberto Carlos da Silva Bandeira
Bárbara de Azevedo Ramos
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000061
CAPÍTULO 04 ................................................................................................. 55
EFEITO ANTIFÚNGICO DE PRODUTOS DE LIMPEZA USADOS EM AMBIENTES
HOSPITALARES SOBRE FUNGOS ANEMÓFILOS
Katiucha Silva Rodrigues
Phelipe Manoel Oller Costa
Bruno Severo Gomes
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000062
CAPÍTULO 05 ................................................................................................. 71
AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTIFÚNGICA DE ÓLEOS ESSENCIAIS FRENTE A
GÊNEROS DE Candida sp. DE IMPORTÂNCIA CLÍNICA
Maria Carolina de Albuquerque Wanderley
Roberta Luciana do Nascimento Godone
José Manoel Duarte Wanderley
Thiago Pajeú Nascimento
Ana Lúcia Figueiredo Porto
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000063
CAPÍTULO 06 ................................................................................................. 89
ATIVIDADE ANTIFÚNGICA DE LECTINAS SOBRE LEVEDURAS PATOGÊNICAS:
UMA REVISÃO
Leilane Marina Morais dos Santos
Thiago Henrique Napoleão
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000064
CAPÍTULO 07 ............................................................................................... 107
ATIVIDADE ANTIFÚNGICA in vitro DE EXTRATOS E INFUSÕES DE PLANTAS
MEDICINAIS
Marília Cleide Tenório Gomes
Bruno Severo Gomes
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000065
CAPÍTULO 08 ............................................................................................... 127
RELAÇÃO ESTRUTURA-ATIVIDADE DE ANTIFÚNGICOS UTILIZADOS NA PRÁTICA
CLÍNICA E INOVAÇÕES TERAPÊUTICAS
Mylena Félix de Lira
Bruna Maria Tavares de Melo
Lucas Lima de Oliveira
Cleriston de Oliveira Bezerra
Felipe Neves Coutinho
Marlene Saraiva de Araújo Neta
Antônio Rodolfo de Faria
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000066
CAPÍTULO 09 ............................................................................................... 148
ASPECTOS CLÍNICOS, DIAGNÓSTICOS, ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO E
TRATAMENTOS DA CRIPTOCOCOSE
Suéllen Pedrosa da Silva
Lidiane Pereira de Albuquerque
Gustavo Ramos Salles Ferreira
Pollyanna Michelle da Silva
Thamara Figueiredo Procópio
Emmanuel Viana Pontual
Patrícia Maria Guedes Paiva
Thiago Henrique Napoleão
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000067
CAPÍTULO 10 ............................................................................................... 169
LEVEDURAS DE IMPORTÂNCIA CLÍNICA NÃO-ALBICANS
Raudiney Frankilin Vasconcelos Mendes
Amanda Virgínia Barbosa
Henrique Nelson Pereira Costa Junior
Bárbara de Azevedo Ramos
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000068
CAPÍTULO 11 ............................................................................................... 182
Candida albicans: FATORES DE VIRULÊNCIA E IMPORTÂNCIA CLÍNICA
Henrique Nelson Pereira Costa Junior
Amanda Virgínia Barbosa
Raudiney Frankilin Vasconcelos Mendes
Bárbara de Azevedo Ramos
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000069
CAPÍTULO 12 ............................................................................................... 194
COMO A TECNOLOGIA FARMACÊUTICA PODE AUXILIAR NO DESENVOLVIMENTO
E INOVAÇÃO DE MEDICAMENTOS ANTIFÚNGICOS (PARTE 1)
Lucas Amadeu Gonzaga da Costa
Myla Lôbo de Souza
Aline Silva Ferreira
Asley Thalia Medeiros Souza
Pedro José Rolim Neto
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000070
CAPÍTULO 13 ............................................................................................... 213
COMO A TECNOLOGIA FARMACÊUTICA PODE AUXILIAR NO DESENVOLVIMENTO
E INOVAÇÃO DE MEDICAMENTOS ANTIFÚNGICOS (PARTE 2)
Lucas Amadeu Gonzaga da Costa
Myla Lôbo de Souza
Aline Silva Ferreira
Asley Thalia Medeiros Souza
Pedro José Rolim Neto
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000071
CAPÍTULO 14 ............................................................................................... 229
IMPORTÂNCIA DAS FERRAMENTAS COMPUTACIONAIS PARA O
DESENVOLVIMENTO DE NOVOS FÁRMACOS ANTIFÚNGICOS
João Alberto Lins de Lima
Izaulinda Marquez da Rocha Campelo
Salatiel Henrique Pereira de Lima
Otávio Campelo Ramos
Caio José Anselmo da Silva
Thalita Soares de Souza
Aline Claudia Almeida de Britto Silva
Arnon de Melo Andrade Júnior
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000072
CAPÍTULO 15 ............................................................................................... 250
COMPLEXO Sporothirx schenkii E ESPOROTRICOSE: UMA REVISÃO
Amanda Virgínia Barbosa
Bárbara de Azevedo Ramos
Ana Vitória Araújo Lima
Sivoneide Maria da Silva
Francisco Henrique da Silva
Márcia Vanusa da Silva
DOI: 10.47174/lap2020.ed.0000073
SOBRE OS ORGANIZADORES ................................................................... 261
CAPÍTULO 01

PRODUÇÃO DE BIOFILME POR FUNGOS FILAMENTOSOS


E LEVEDURAS

Franz de Assis Graciano dos Santos


Doutorando em Biologia de Fungos
Instituição: Universidade Federal Pernambuco/UFPE
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE
E-mail: [email protected]

Melyna Chaves Leite de Andrade


Doutora em Medicina Tropical – UFPE / Pós doutoranda em Medicina Tropical
Instituição: Universidade Federal Pernambuco/UFPE
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE
E-mail: [email protected]

Ana Paula Sampaio Feitosa


Doutora em Medicina Tropical – UFPE / Pós-doutoranda do Programa de Pós-
graduação em Biologia Aplicada à Saúde – LIKA/UFPE
Instituição: Universidade Federal Pernambuco/UFPE
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n- Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Luiz Carlos Alves


Pós-doutorado em Biologia Celular e Molecular - National Institute of Health-EUA
Pesquisador Docente do Instituto Aggeu Magalhães – FIOCRUZ/PE e LIKA-UFPE
Instituição: Universidade Federal Pernambuco/UFPE
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Fábio André Brayner


Pós-doutorado em Biologia Celular e Molecular - National Institute of Health-EUA
Pesquisador Docente do Instituto Aggeu Magalhães – FIOCRUZ/PE e LIKA-UFPE
Instituição: Universidade Federal Pernambuco/UFPE
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

RESUMO: Os biofilmes podem ser definidos como comunidades de microrganismos


que vivem aderidos a uma superfície e envoltos numa matriz extracelular complexa
formada por uma mistura de compostos tais como proteínas, polissacáridos e DNA
extracelular. A descoberta da formação de biofilme por bactérias e leveduras e mais
recentemente por fungos filamentosos, levaram a uma melhor compreensão da
ecologia microbiana e a novos conhecimentos sobre os mecanismos de virulência e
persistência de microrganismos patogênicos, além de compreender os impactos na
saúde, indústria e meio ambiente. Dentre os fungos, os biofilmes formados por
leveduras representam um problema clínico crescente estando associado a taxas
significativamente altas de mortalidade. O gênero Candida vem se destacando neste
cenário, onde estas leveduras são equipadas com uma gama de fatores de
1
virulência e características comensais que conferem a capacidade de colonizar e
invadir o tecido do hospedeiro. Neste grupo de fungos, a formação de biofilme pode
ser dividida em quatro fases principais: adesão, proliferação, maturação e dispersão.
Já para os fungos filamentosos estudos sobre a produção de biofilme são restritos e
pouco consolidados, em sua maioria o termo biofilme não é utilizado, mas
usualmente é utilizado termos alternativos, como "biomassa fúngica", ‘massas
multicelulares’, ‘esteiras miceliais’, ‘submerso/fermentação em estado sólido', ou
bola fúngica. Recentemente foi estabelecido que o processo de formação de biofilme
desse grupo de fungos compreende seis fases: Adsorção de propágulo, Fixação
ativa a uma superfície, formação de microcolônia I, formação de microcolônia II,
maturação ou desenvolvimento reprodutivo e fase de dispersão ou planctônica.
Neste sentido abordaremos os aspectos gerais para produção de biofilme por fungos
filamentosos e leveduras, importância clínica e econômica, além das alternativas
terapêuticas disponíveis.

PALAVRAS-CHAVE: Biofilme, leveduras, fungos filamentosos, comunidade


microbiana, fator de virulência

ABSTRACT: Biofilms can be defined as communities of microorganisms that live


attached to a surface and surrounded by a complex extracellular matrix formed by a
mixture of compounds such as proteins, polysaccharides and extracellular DNA. The
discovery of biofilm formation by bacteria and yeasts, and more recently by
filamentous fungi, has led to a better understanding of microbial ecology and new
insights into the mechanisms of virulence and persistence of pathogenic
microorganisms, in addition to understanding the impacts on health, industry and
environment. Among fungi, yeast biofilms represent a growing clinical problem and
are associated with significantly high mortality rates. The genus Candida has been
standing out in this scenario, where these yeasts are equipped with a range of
virulence factors and commensal characteristics that confer the ability to colonize
and invade host tissue. In this group of fungi, biofilm formation can be divided into
four main phases: adhesion, proliferation, maturation and dispersion. For filamentous
fungi, studies on biofilm production are restricted and little quantity consolidated,
mostly the term biofilm is not used, but alternative terms are usually used, such as
"fungal biomass", "multicellular masses", "mycelial mats", 'submerged / solid state
fermentation', or fungal ball. It has recently been established that the biofilm
formation process of this group of fungi comprises six phases: Propagule adsorption,
Active fixation to a surface, formation of microcolony I, formation of microcolony II,
maturation or reproductive development and dispersion or planktonic phase. In this
sense, we will approach the general aspects for the production of biofilm by
filamentous fungi and yeasts, clinical and economic importance, in addition to the
therapeutic alternatives available.

KEYWORDS: Biofilm, yeasts, filamentous fungi, microbial community, virulence


factor.

2
1. INTRODUÇÃO
Biofilmes microbianos são definidos como comunidades microbianas de
estrutura complexa, espacialmente orientada, que são envolvidas em uma matriz
extracelular (MEC) e fixadas a uma superfície ou substrato (BARROS et al., 2020).
Essas comunidades foram descritas pela primeira vez por Anthony van Leewenhoek
em 1684 ao observar um grande acúmulo de microorganismos em sua placa dental.
Já no final da década de 20, vários artigos descreveram filmes microbianos ou
camadas de lodo, no entanto pesquisadores alemães utilizavam o termo "manto de
sujidade". Como as propriedades observadas em células microbianas aderidas a
superfícies são únicas, quando comparadas a microrganismos em forma
planctônica, o emprego do termo “Biofilme” tornou-se útil para descrevê-lo. O uso
mais antigo de "biofilme" na publicação está na revista sueca Vatten: Harremoës, p.
1977. "Half-order reactions in biofilm and filter kinetics". Vatten, 33 122-143
(CHANDKI et al., 2011; MSU, 2014).
Esta estrutura confere proteção contra os mecanismos de defesa do
hospedeiro e entrada de antimicrobianos, dificultando assim a difusão dos fármacos
nos tecidos. Além disso, facilita o processo de adesão e colonização das cepas
constituintes sobre o hospedeiro ou sobre diferentes dispositivos médicos
implantáveis como próteses, sondas e cateteres (RAMAGE et al., 2012).

2. ASPECTOS GERAIS DA ADESÃO E FORMAÇÃO DE BIOFILMES


Uma ampla gama de bactérias e fungos são capazes de alternar entre o
crescimento planctônico e comunidades multicelulares sésseis, comumente
chamadas de biofilmes. As estimativas sugerem que até 80% de todos os
microrganismos no ambiente existem em um estilo de vida comunitário, formando
biofilme (LEITE-ANDRADE et al., 2017).
As vantagens de formar um biofilme para um organismo incluem a proteção
do meio ambiente, a resistência ao estresse físico e químico, a cooperação
metabólica e a regulação da expressão gênica baseada na comunidade. Nos últimos
anos, tem havido uma maior apreciação do papel que os biofilmes fúngicos
desempenham nas doenças humanas, visto que os microrganismos que se
desenvolvem no interior do biofilme exibem características fenotípicas únicas em
comparação com as células planctônicas, particularmente maior resistência a
agentes antimicrobianos (RAMAGE et al., 2012).

3
A adesão e colonização de populações de fungos complexos em superfícies
biológicas e inatas, como a mucosa oral ou substratos acrílicos de dentadura, por
exemplo, é comum para fungos clinicamente relevantes (WILLIAMS et al., 2011).
Uma ampla variedade de fatores ambientais contribui para a fixação superficial
inicial, incluindo o fluxo do meio circundante (urina, sangue, saliva e muco), pH,
temperatura, osmolaridade, bactérias, presença de agentes antimicrobianos e
fatores imunológicos do hospedeiro (BARROS et al., 2020).

3. IMPORTÂNCIA CLÍNICA E IMPACTO ECONÔMICO ASSOCIADOS A


BIOFILMES
Os biofilmes fornecem um nicho seguro, agindo como reservatórios para
fontes persistentes de infecção. Esta estrutura tem um impacto adverso na saúde
dos indivíduos acometidos com infecções causadas por fungos, visto que
representam um problema crescente nos cuidados de saúde (RAMAGE et al., 2009).
O avanço na medicina com a finalidade de prolongar a vida dos pacientes no
ambiente hospitalar, com uso de dispositivos médicos invasivos, nutrição parenteral,
cateteres de demora, antibióticos de amplo espectro, quimioterapia e radioterapia
propiciam uma predisposição para a adesão e produção de biofilme em superfícies
abióticas por microrganismos, uma vez que essas estruturas sésseis podem se
formar em uma ampla variedade de substratos (KOJIC; DAROUICHE, 2004).
Dessa forma, os biofilmes fúngicos se tornaram um problema clínico e
econômico cada vez mais significativo, apresentando taxas de mortalidade
inaceitavelmente altas. Estudos têm demonstrado que as células que se
desprendem do biofilme têm uma associação maior com a mortalidade do que as
células planctônicas equivalentes (UPPULURI et al., 2010). Além disso, estas
comunidades microbianas são importantes por serem refratários ao tratamento
antifúngico, o que representa um grande problema para os médicos, pois a dose
necessária para erradicar o biofilme pode exceder as maiores concentrações
terapeuticamente atingíveis de antifúngicos (RASMUSSEN et al., 2006).

4. ESTRATÉGIAS DE COMBATE AOS BIOFILMES


Biofilmes produzidos por espécies de Candida, como mencionado
anteriormente, são responsáveis por infecções recorrentes e crônicas e são
tolerantes e/ou resistentes a diferentes compostos antifúngicos, bem como ao

4
sistema imunológico inato do hospedeiro (MATHE; VAN DIJCK, 2013). Diferentes
estudos indicam que a complexa estrutura do biofilme é que determina a
susceptibilidade antifúngica desta comunidade. Esse fato pode ser explicado por
vários fatores, como o aumento da atividade metabólica que ocorre no
desenvolvimento inicial do biofilme, a presença de MEC e alterações na expressão
gênica, incluindo a regulação positiva de genes CDR e MDR que codificam
transportadores de resistência azólicos (MATHE; VAN DIJCK, 2013; TOBUDIC et al.,
2012).
Diferentes espécies de Candida demonstram um perfil de susceptibilidade do
biofilme bem distinto. Estudos realizados por Rodrigues et al. (2016), revelaram que
C. glabrata pode formar um biofilme mesmo na presença de concentrações
terapêuticas de anfotericina B. Além disso, o biofilme revela uma alta concentração
de carboidratos (β -1,3 glucanas), na parede celular, o que está implicado em sua
tolerância antifúngica. Por outro lado, biofilmes de C. glabrata são suscetíveis ao
voriconazol, que apresenta melhor potencial de penetração em comparação ao
fluconazol (RODRIGUES et al., 2017). Biofilme de Candida tropicalis é suscetível à
micafungina; no entanto, a anfotericina B lipossomal, amplamente utilizada para o
tratamento de infecções por Candida spp., não apresenta alta atividade antifúngica
(MARCOS-ZAMBRANO et al., 2016). Já C. auris, uma espécie emergente
multirresistente, e a estrutura do biofilme é relatada como resistente ao fluconazol,
ao voriconazol e às equinocandinas, micafungina e caspofungina, mas suscetível à
anfotericina B, anfotericina B lipossomal e clorexidina (SHERRY et al., 2017).
Devido às limitações no tratamento do biofilme produzido por Candida spp.
com drogas convencionais, opções terapêuticas alternativas têm sido relatadas. Os
óleos essenciais são uma importante fonte de compostos que podem ser aplicados
no tratamento de biofilmes. Manoharan et al. (2017) avaliaram 83 óleos essenciais
para um efeito anti-biofilme de C. albicans, e o óleo de Helichrysum foram
considerados os mais eficazes, inibindo a formação de biofilme e reduzindo in vivo a
virulência de C. albicans. O magnolol, encontrado principalmente em Magnolia
officinalis já foi relatado como ativo contra biofilmes de C. albicans, Candida glabrata
e Candida dubliniensis; além disso, essa molécula é capaz de se ligar ao ergosterol
e causar permeabilização da membrana, o que é uma característica importante
quando se considera o desenvolvimento de um novo antifúngico (MANOHARAN et
al., 2017).

5
Outra possibilidade para o tratamento de biofilmes é o reaproveitamento de
drogas, que envolve a investigação de novos usos para drogas já existentes para
tratar uma doença emergente (KATRAGKOU et al., 2016). Nesse contexto, os
inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRSs), fluoxetina e sertralina,
foram avaliados e foi verificado que esses compostos são ativos contra biofilmes de
Candida reduzindo a biomassa e o metabolismo (OLIVEIRA et al., 2018). Neste
estudo, a fluoxetina foi utilizada com sucesso para inibição de biofilmes de isolados
resistentes de C. albicans, Candida parapsilosis, C. glabrata e C. tropicalis.
Kathwate e colaboradores, em 2015, ao avaliarem os agonistas dos receptores do
ácido gama-aminobutírico (GABA) (diazepam, lorazepam, midazolam) também
demonstraram que esses fármacos são ativos contra o biofilme de C. albicans.
Ainda, a combinação de drogas foi recentemente relatada como uma possível
alternativa para o tratamento do biofilme. O tratamento pode envolver combinações
de agentes antifúngicos pertencentes a diferentes classes como opções terapêuticas
potenciais. A terapia combinada promove um espectro de ação mais amplo,
dosagens reduzidas e menor tolerância antifúngica (SANTOS et al., 2020; DE
CREMER et al., 2015). As combinações bem-sucedidas incluem: fitoquímicos e
drogas antifúngicas (PEMMARAJU et al., 2013); antimicrobianos e agentes
antifúngicos (LU et al., 2018) e substâncias da estratégia de reaproveitamento e
drogas antifúngicas (LIU et al., 2016).
A nanotecnologia também vem sendo explorada como estratégia antifúngica
no combate à biofilmes de Candida. Nanopartículas de prata foram consideradas
ativas na inibição da formação de biofilme e em biofilmes pré-formados (LARA et al.,
2015). Além disso, a nanoestruturação de óleos com baixa solubilidade potencializa
a atividade inibitória em biofilmes de C. albicans, C. glabrata, C. parapsilosis e C.
tropicalis (SOUZA et al., 2017). A terapia fotodinâmica também foi relatada como
uma estratégia promissora no tratamento de biofilmes de Candida; esta tecnologia
combina luz e um fotossensibilizador e promete reduzir a toxicidade e a tolerância
antifúngica (PINTO et al., 2018). A combinação de tecnologia fotodinâmica com
drogas antifúngicas para ruptura de biofilme também foi aplicada com sucesso
(HUANG et al., 2018).

6
5. PRODUÇÃO DE BIOFILME POR LEVEDURAS
Biofilmes formados por leveduras representam um problema clínico crescente
e está associado a taxas significativamente altas de mortalidade. C. albicans é o
agente mais relatado como formador de biofilme fúngico, no entanto, outros gêneros
como Cryptococcus sp. e Trichosporon sp. mostraram estar implicados em infecções
associadas ao biofilme. Ainda, a persistência deste fator de virulência à terapia
antifúngica continua sendo a maior ameaça aos pacientes com biofilmes (RAMAGE
et al., 2009).
O espectro de leveduras que colonizam superfícies e formam biofilmes é
vasto. Diferentes tipos de biomateriais frequentemente usados nas clínicas
propiciam a colonização e a formação de biofilme por leveduras e o aumento das
leveduroses invasivas nas últimas décadas é praticamente paralelo ao aumento no
uso de uma variedade de dispositivos de implante médico (LEITE-ANDRADE et al.,
2017).
Cryptococcus neoformans, uma levedura oportunista encapsulada que causa
meningoencefalite com risco de vida em indivíduos imunocomprometidos,
demonstrou colonizar e subsequentemente formar biofilmes em derivações
ventriculares, fístulas de diálise peritoneal e válvulas cardíacas (MARTINEZ;
CASADEVALL, 2006). Diferentes espécies de Trichosporon (também leveduras
oportunistas) podem causar infecções disseminadas com risco de vida e também
foram associadas a infecções relacionadas a implantes médicos, incluindo cateteres,
implantes mamários e enxertos cardíacos (KRZOSSOK et al., 2004).
As espécies de Candida estão entre os agentes etiológicos mais comuns de
infecções de biofilme relacionadas com leveduras. Dentro deste gênero, várias
espécies de Candida, além da C. albicans, como C. glabrata, C. parapsilosis, C.
krusei e C. tropicalis, têm sido relatadas como importantes patógenos em casos
graves de candidíase invasiva. Estas leveduras são equipadas com uma ampla
gama de fatores de virulência e características comensais que conferem a
capacidade de colonizar e invadir o tecido do hospedeiro. Esses fatores incluem a
expressão de adesinas e invasinas na superfície celular, capacidade de danificar
células hospedeiras, timotropismo (detecção de contato), troca fenotípica, secreção
de enzimas hidrolíticas e formação de biofilmes (HÖFS et al., 2016).
As espécies de Candida são conhecidas por construir biofilmes altamente
estruturados e dinâmicos compreendendo várias formas morfológicas (leveduras,

7
pseudo-hifas e hifas). Neste grupo de fungos, a formação de biofilme pode ser
dividida em quatro fases principais: adesão, proliferação, maturação e dispersão
(Figura 1) (LOHSE et al., 2018; WALL et al., 2019).

Figura 1: Etapas da formação de biofilme em Candida spp.

Fonte: Lohse et al., 2017, com adaptações

Na fase de adesão, as células de levedura aderem a uma superfície e formam


uma camada basal que irá ancorar o biofilme. Estudos de microarray de células que
participam da formação de biofilme identificaram uma série de “adesões gênicas”
com expressões alteradas de forma temporal. Estes estudos mostraram regulação
positiva em duas classes de moléculas de adesão em dois momentos: em um ponto
inicial (ALS1, ALS2, ALS3, ALS4, EAP1, MSB2, PGA6, SIM1, ORF19. 2449e
ORF19. 5126) e em um momento posterior (HYR1, FAV2, IFF4, IFF6, PGA32,
PGA55, ORF19.3988, ORF19.4906, ORF19.5813 e ORF19.7539.1) (FOX et al.,
2015, ALIM et al., 2018).
A adesão é seguida por uma fase de proliferação, que é caracterizada pelo
início da filamentação, levando ao surgimento de uma rede de hifas que contribui
para a robustez geral do biofilme. A capacidade de formar hifas, bem como a
aderência dessas hifas umas às outras e a outras células, é crítica para o
desenvolvimento e manutenção normais do biofilme (Nobile et al., 2015). Nesta fase,

8
as hifas expressam vários fatores de virulência específicos do tipo celular, como
adesinas (HWP1, HWP2, RBT1, ALS3, ALS10, FAV2 e PGA55), enzimas
degradantes de tecidos (SAP4, SAP5 e SAP6), proteínas de defesa antioxidante
(SOD5) e uma toxina de peptídeo citolítico (ECE1) (MOYES et al., 2016; NOBLE et
al., 2017).
Na fase de maturação; há a produção de substâncias exo-poliméricas (EPS)
que atuam essencialmente como um adesivo para segurar toda a arquitetura do
biofilme. Um biofilme maduro de C. albicans, por exemplo, é envolto em uma matriz
extracelular que é uma mistura de glicoproteínas (55%), carboidratos (25% em
grande parte α- manana e polissacarídeos β -1,6-glucana e, em menor extensão, β -
1, 3-glucano), lipídios (15%) e ácidos nucleicos (5%). Mais de 500 proteínas foram
identificadas por espectrometria de massa na matriz, muitas das quais são enzimas,
incluindo enzimas de hidrólise, sugerindo que a matriz pode desempenhar um papel
ativo na quebra de biopolímeros (Lohse et al., 2018), bem como o DNA que também
representa um componente funcional da matriz. Outro componente bem conhecido é
o β -1,3 glucano, responsável por fornecer resistência contra o fluconazol por
sequestro da droga (NETT et al., 2010).
A última fase é caracterizada pela dispersão de células de levedura e/ou
partes do biofilme em forma madura. Isso permite a circulação e o estabelecimento
dos biofilmes em novos locais, tornando a infecção sistêmica. Vários componentes,
como reguladores transcricionais, proteínas da parede celular e chaperonas, são
cruciais para esta etapa, sendo os reguladores envolvidos nessa dispersão UME6,
PES1 e NRG1 (ALIM et al., 2018; ROBBINS et al., 2011)
Ademais, os biofilmes apresentam variações, a depender da espécie, quanto
à estrutura e composição da matriz (Figura 2) (JAIN et al., 2007). Biofilmes de C.
tropicalis tem como principal componente da matriz extracelular a hexosamina
(27%), além de carboidratos, proteínas, fósforo e ácido urônico, em menor
quantidade (AL-FATTANI; DOUGLAS, 2006). Enquanto que a arquitetura constitui-
se de uma complexa matriz de polissacarídeos com multicamadas compostas de
blastoconídios e filamentos metabolicamente ativas (INÁCIO et al., 2019). Já
biofilmes de C. glabrata e C. krusei produzem biofilmes sem a presença de hifas
verdadeiras e ricos em matriz extracelular (SILVA et al., 2011).

9
Figura 2: Diferentes estruturas de biofilmes formados por Candida spp.

Fonte: Ramage et al., 2009.

6. PRODUÇÃO DE BIOFILME POR FUNGOS FILAMENTOSOS


Os estudos acerca da produção de biofilmes por fungos filamentosos, ainda
são escassos na literatura, provavelmente porque esses microrganismos
apresentaram um perfil de formação de biofilmes diferente dos baseados nos
modelos bacterianos. Desta forma, é necessário o entendimento acerca dos critérios
para a formação de biofilme de destes microrganismos, tais como crescimento
agregado complexo: feixes de hifas e/ou camadas (como em oposição a células
fracamente associadas ou hifas crescendo em monocamadas), crescimento de
células associado à superfície, células incorporadas em uma matriz polimérica
extracelular, expressão gênica alterada resultando em mudanças fenotípicas que
incluem: maior tolerância a compostos antimicrobianos ou biocidas, mudanças na
produção e/ou secreção de enzimas ou metabólitos e mudanças fisiológicas
(MOWAT et al., 2008; MICHAEL et al., 2009).

10
Além disso, muitos desses fungos produzem hifas invasivas e/ou estruturas
que se estendem além da interface líquido-ar, ou as estruturas especializadas
necessárias para a penetração do hospedeiro, esporulação e acúmulo de nutrientes
na interface do hospedeiro. Essas diferenças na morfologia e o crescimento dificulta
a compreensão dos biofilmes em fungos filamentosos. Desse modo, na maioria dos
casos, o termo "biofilme" não é usado para descrever essa associação em
superfície, mas usualmente é utilizado termos alternativos, como "biomassa fúngica",
‘massas multicelulares’, ‘esteiras miceliais’, ‘submerso/fermentação em estado
sólido', ou bola fúngica. No entanto, esporos, fragmentos de hifas e outros
propágulos fúngicos podem ser considerados como fase planctônica como visto em
leveduras e bactérias (GULIS et al., 2008; MOWAT et al., 2008; MICHAEL et al.,
2009).
A formação de biofilme por fungos filamentosos foi descrita inicialmente para
Aspergillus niger cultivado em malha de poliéster caracterizados por microscopia
eletrônica de varredura (MEV), para Aspergillus fumigatus foi estudado por
microscopia confocal de varredura a laser com (MCVL), transcriptômica,
susceptibilidade a antibióticos e MEV, já para Fusarium solani e Fusarium
oxysporum foram analisados por MCVL e sensibilidade a antibióticos. Três critérios
básicos são observados na formação de biofilme fúngico, todos tempo-dependentes,
(i) adesão, que é fortemente aumentada pela hidrofobicidade do esporo de A. niger,
(ii) uma fase inicial de crescimento e desenvolvimento, a partir da germinação de
esporos à colonização da superfície, que é afetada pelo densidade do inóculo, e (iii)
uma fase de maturação em que a densidade biomassa é altamente aumentada, uma
organização de canal interno foi criado garantido esse fluxo médio através a
biomassa, e presença de uma matriz extracelular associada a uma susceptibilidade
reduzida a drogas antifúngicas (AKAO et al., 2002; MOWAT et al., 2008; MICHAEL
et al. 2009; GONZÁLEZ-RAMÍREZ et al., 2016).
Neste sentido, um grupo de pesquisadores canadenses propuseram um modelo
de seis estágios para a formação de biofilme por fungos filamentosos (Figura 3)
(MICHAEL et al., 2009).
1. Adsorção de propágulo – Caracterizado pela deposição de esporos ou
outros propágulos, como fragmentos de hifas ou esporângios. Esta etapa envolve
essencialmente contato do organismo com uma superfície biótica ou abiótica.
2. Fixação ativa a uma superfície – Inclui a secreção de substâncias adesivas

11
por germinação de esporos e gametófitos ativos.
3. Formação de microcolônia I – Estágios iniciais de crescimento e
colonização da superfície que envolvem alongamento apical e ramificação das hifas.
Essas exploram o substrato, ramificam através das superfícies como uma
monocamada, e/ou se tornar invasivo. Esta etapa envolve a produção de uma matriz
polimérica extracelular que permite o crescimento de colônia fortemente aderidas ao
substrato.
4. Formação de microcolônia II, ou maturação inicial – Envolve a formação de
redes compactadas de hifas ou micélios e adesão entre hifa. Isso inclui camadas,
formação de feixes de hifas aderidas por uma matriz polimérica extracelular, e a
formação de canais de água através da repulsão hidrofóbica entre as hifas.
5. Maturação ou desenvolvimento reprodutivo – Caracterizada pela formação
de corpos de frutificação, células esporogênicas, escleródios e outras estruturas de
sobrevivência. O crescimento aéreo é muitas vezes uma característica fundamental
da frutificação e dispersão de fungos.
6. Fase de dispersão ou planctônica. Envolve a dispersão de esporos ou
liberação, de fragmentos de biofilme. As células liberadas podem atuar como novos
propágulos para reiniciar o ciclo.

Figura 3: Etapas da formação de biofilme em fungos filamentos.

Fonte: Harding et al., 2013.

Os fungos filamentosos comumente apresentam mais de uma forma


planctônica que pode se dispersar para reiniciar o ciclo (ou seja, esporos sexuais,
assexuados esporos, esporângios e fragmentos de hifas). Estas formas dispersivas

12
não são unicelulares e muitas vezes flutuam no ar em vez de água. Em particular, as
estruturas sexuais costumam se formar em resposta ao estresse externo e aumentar
a variabilidade genética dentro das populações (MICHAEL et al., 2009). A
Morfogênese aérea fúngica envolve a secreção de pequenas proteínas chamadas
hidrofobinas. Estas proteínas são exclusivas de filamentosos fungos e
desempenham um papel em vários processos no crescimento e desenvolvimento
desses organismos. Hidrofobinas são envolvidos na formação de estruturas aéreas
e na fixação de hifas a superfícies hidrofóbicas. Esta pode se organizar em
interfaces hidrofílica-hidrofóbica e alterar as propriedades da superfície das hifas em
resposta a sinais ambientais e de desenvolvimento. Também é possível que as
hidrofobinas formem camadas destinadas a selar agregações de hifas em estruturas
mais complexas em diversas espécies de fungos filamentosos (WOSTEN, 2001).
6.1 PRODUÇÃO DE BIOFILME POR ASPERGILLUS SP
Aspergillus fumigatus é o principal representante do gênero Aspergillus capaz de
formar biofilme, aderido a superfícies bióticas e abióticas, esta forma de crescimento
pode conferir ao patógeno a capacidade de colonizar diversos substratos, assim como
resistir às defesas fagocíticas e ataques antimicrobianos (BEAUVAIS et al., 2020;
KAUR; SINGH, 2014).
Os biofilmes de A. fumigatus são formados estaticamente em condições de
crescimento in vitro ou in vivo. Esta condição de crescimento já foi associada a forma
clínica invasiva da aspergilose, frequentemente fatal em pacientes
imunocomprometidos, bem como à forma de aspergiloma. Sendo considerada por
muitos autores como um dos mais importantes fatores de virulências (MANFIOLLI et al.,
2018; VEERDONK et al., 2017).
Estudos in vivo demonstram que a presença de biofilme em aspergiloma e
aspergilose pulmonar invasiva (API). No aspergiloma, A. fumigatus cresce como um
biofilme típico caracterizado por hifas fortemente envolvidas em uma matriz
extracelular (MEC) formada principalmente por polissacarídeos. Já na aspergilose
pulmonar invasiva, embora as hifas cresçam separadamente no pulmão, elas tendem
a ser cobertas por uma MEC (BEAUVAIS et al, 2020; MANFIOLLI et al., 2018; KAUR;
SINGH, 2014).
A MEC presente nos biofilmes de A. fumigatus, é composta por
galactomanano, 1,3- glucanos, monossacarídeos, melanina, proteínas, polióis e
melanina. Estudos apontam a presença de eDNA. Técnicas de imunomarcação em

13
proteínas evidenciam a presença de dois antígenos principais, o dipeptidilpeptidase
V, e catalase B, e um alérgeno, AspF1 além de hidrofobinas (KAUR; SINGH, 2014;
MANFIOLLI et al., 2018). MEC exerce funções estruturais para aumento da
densidade celular, controle da desagregação e alteração das necessidades
nutricionais, agindo como uma barreira de proteção física e química contra sistema
imunológico do hospedeiro e drogas antifúngicas (REICHHARDT et al., 2015).
A produção de MEC está associada com a maturidade do biofilme e forma de
infecção. Estudos demonstram que em biofilmes formados aspergiloma apresentam
uma MEC mais espessa, quando comparado com biofilmes das infecções
pulmonares invasivas, logo as hifas mostram células vacuolizadas após 48 horas de
infecção. Já estudos de imunocitoquímicas do aspergiloma indicam a presença dos
mesmos polissacarídeos encontrados na MEC produzida in vitro em culturas
estáticas e aéreas, α-1,3 glucano, galactomanano e galactosaminogalactano,
diferentemente da MEC dos biofilmes em API onde não são observados a presença
de α-1,3 glucanos (BEAUVAIS et al., 2020; KAUR; SINGH, 2014; MUSZKIETA et al.,
2013).
O processo de adesão e germinação dos conídios in vitro duram
aproximadamente 10 horas, em seguida, há uma fase de delongamento antes que
as hifas entrem em contato entre si e, formando uma monocamada em torno de 10 a
16 horas, seguida de maior complexidade estrutural nas próximas 4–8 horas de
desenvolvimento (MOWAT et al., 2007). Já a formação de biofilme in vitro de A.
fumigatus em células epiteliais ocorre nas fases inicial (12h), intermediária (48h) e
maturação (72h). Em co-culturas de células epiteliais foi demonstrado que os
biofilmes de A. fumigatus consistiam de hifas paralelas e cruzadas com uma
estrutura heterogênea de MEC, estabelecidas em células epiteliais brônquicas
humanas e apresentavam as mesmas fases de desenvolvimento (MUSZKIETA et
al., 2013).
6.2 PRODUÇÃO DE BIOFILME PELO COMPLEXO Sporothrix schenckii
Os estudos acerca da formação de biofilme pelo Complexo Sporothrix
schenckii continuam limitados. As espécies do Complexo S. schenckii são agentes
de micose subcutânea aguda ou crônica em humanos e outros mamíferos, e
infecções sistêmicas, particularmente em indivíduos imunocomprometidos
(CHAKRABARTI et al., 2015) sendo a esporotricose uma micose prevalente em todo
o mundo. Vários fatores foram associados à virulência das espécies do Complexo S.

14
schenckii, incluindo termotolerância, produção de melanina, peróxido de ergosterol,
proteases e adesão (ROJAS et al., 2018).
A formação de biofilme é potencialmente um fator chave para a patogênese
dessa micose. Em estudos recentes S. schenckii demonstrou a capacidade de
formar biofilmes in vitro, sendoobservados as fases de adesão, desenvolvimento e
maturação. Além da presença glicoproteínas e polissacarídeos de parede celular
que são importantes para a interação e adesão em superfícies abióticas e bióticas. A
adesão é um primeiro requisito para o desenvolvimento de biofilmes e para
estabelecer uma infecção; S. schenckii apresentam conídios que se aderem à
superfície e apresenta parede celular glicoproteica com manose e resíduo de glicose
os quais participam desse processo de adesão às células epiteliais. (SÁNCHEZ-
HERRERA et al., 2020; SANDOVAL-BERNAL et al., 2011).
Em biofilmes de S. schenckii, a matriz extracelular apresenta carboidratos e
proteínas semelhantemente as matrizes de biofilme de Candida e Aspergillus, que
são compostos por hexosamina e polissacarídeos. No entanto, a matriz extracelular
de S. schenckii possui uma maior quantidade de carboidratos e menos proteína
quando comparados aos biofilmes de espécies de Candida, sugerindo que a
composição da matriz pode ser específica para cada espécie de fungo (SHOPOVA
et al., 2013).
Ademais, na matriz de biofilme do S. schenckii temos a presença de quatro
classes macromoleculares: carboidratos, proteínas, lipídios e ácido nucleico. Nesse
aspecto, há um consenso geral de que a matriz de biofilme atua como uma barreira
para a difusão de agentes antimicrobianos, formando canais de água para
hidratação e distribuição de nutrientes, o que proporciona estabilidade mecânica aos
biofilmes, medeia a adesão de a superfícies e forma uma coesa rede de polímero
tridimensional que se interconecta e transitoriamente imobiliza células de biofilme.
(NOGUEIRA BRILHANTE et al., 2017; MITCHELL et al., 2016). Além disso, o eDNA
componente da matriz da maioria dos biofilmes, protege de tensões tais como
farmacologia, dessecação, nutrientes e outros. Sendo o papel do eDNA na formação
de biofilme um importante fator de integridade estrutural do biofilme. A presença de
eDNA na matriz extracelular de S. schenckii é uma chave para estabelecimento de
biofilme e resistência antifúngica, o que tem levado a dificuldade de tratamento da
esporotricose nos últimos anos. (NOGUEIRA BRILHANTE et al., 2017).
Os biofilmes de S. schenckii expressaram resistência quando comparado às

15
culturas planctônicas, sugerindo que a estrutura do biofilme confere essa
capacidade (NOGUEIRA BRILHANTE et al., 2017). A resistência à atividade
antifúngica ocorre por bombas de efluxo dependentes de CDR1, CDR2 e MDR as
quais são relatadas em outros fungos patogênicos, mas é desconhecido a presença
dessas moléculas expressas em S. schenckii, sendo necessários estudo
complementares acerca desse mecanismo (SÁNCHEZ-HERRERA et al., 2020).

7. CONCLUSÃO
O conhecimento acerca da produção de biofilmes por fungos é de grande
importância para saúde, indústria e meio ambiente. Neste sentido, a compreensão
do conceito de biofilmes, aspectos estruturais e composição, bem como o processo
de formação, são fundamentais para o desenvolvimento de estratégias de controle
efetivas e entendimento do risco que estes representam nesses setores. Sobretudo
em fungos que não apresentam o processo de produção de biofilme totalmente
definido, como os fungos filamentosos. O debate sobre o que qualifica um biofilme,
as estratégias de erradicação e impacto causado por essa associação certamente
devem continuar, e são necessários para desenvolvimento de modelos biológicos
que permitam a compreensão de crescimento, desenvolvimento e respostas aos
antimicrobianos, favorecendo o estudo de novos alvos e opções terapêuticas.

16
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20
CAPÍTULO 02

FUNGOS LIQUENIZADOS

Mônica Cristina Barroso Martins


Dra. Bioquímica e Fisiologia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Maria de Lourdes Lacerda Buril


Dra. Biologia Vegetal pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Geografia
Endereço: Avenida Acadêmico Hélio ramos, s/n – Cidade Universitária, Recife – PE,
Brasil.
E-mail: [email protected]

Beatriz Cristina da Rocha Silva


Acadêmico de Biomedicina pelo Centro Universitário São Miguel.
Instituição: Centro Universitário São Miguel- Unisãomiguel.
Endereço: R. João Fernandes Viêira, 110 - Boa Vista, Recife – PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Nicácio Henrique da Silva


Professor adjunto Bioquímica e Fisiologia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Eugênia Cristina Pereira


Profa. Titular Geografia
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Geografia
Endereço: Avenida Acadêmico Hélio ramos, s/n – Cidade Universitária, Recife – PE,
Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: O fungo liquenizado ou líquen pode ser considerado um holobionte, em


que o um fungo (geralmente um Ascomiceto) é o componente dominante e contém
um microbioma. Neste microbioma existe um parceiro fotossintético que pode ser
uma alga ou cianobactéria. Os liquens apresentam morfologia diversificada e são
capazes de habitar ambientes com extremos de temperatura, diferentes pH e
intensa radiação solar. As substâncias por eles produzidas, a partir do seu
metabolismo secundário, tem papel ecológico muito importante facilitando sua
permanência e desenvolvimento nos diversos ambientes. Eles funcionam como
protetores do talo contra a radiação ultravioleta (UVA e UVB), aos extremos de
temperatura (frio e calor) e a ataques de predadores como insetos, parasitas,
invertebrados e microrganismos. Seus metabólitos secundários, também chamados
de ácidos liquênicos, compreendem substâncias produzidas em três rotas

21
biogenéticas: acetato polimalonato, ácido mevalônico e do ácido chiquímico, que,
semelhante na natureza, apresentam atividade biológica sobre fungos patogênicos.
Entretanto, ainda há muito a ser explorado quanto a este potencial e muitas
substâncias liquênicas ainda não foram testadas.

ABSTRACT: The lichenized fungi or lichen can be considered a holobiont, where a


fungus (usually an Ascomycete) is the dominant component and contains a
microbiome. In this microbiome there is a photosynthetic partner that may be an
algae or a cyanobacteria. Lichens have diverse morphology and are able to inhabit
environments with temperature extremes, different pH and intense solar radiation.
The substances produced by them, from their secondary metabolism, have a very
important ecological role, facilitating their permanence and development in different
environments. They act as protectors of the thallus against ultraviolet radiation (UVA
and UVB), temperature extremes (cold and heat) and attacks by predators such as
insects, parasites, invertebrates and microorganisms. Its secondary metabolites, also
called lichen acids, comprise substances produced in three biogenetic pathways:
polymalonate acetate, mevalonic acid and shikimic acid, which, similar in nature,
have biological activity on pathogenic fungi. Furthermore, there is still much to be
explored regarding this potential, and many lichen substances have not yet been
tested.

22
1. INTRODUÇÃO
1.1 ASPECTOS GERAIS DO LIQUENS
Líquen é uma associação simbiótica estável e autossustentável entre um
fungo – o micobionte – e um parceiro fotossintetizante – o fotobionte (KIRK et al.,
2008). Mais precisamente o líquen é uma associação ecológica obrigatória estável
entre um ex-habitante fúngico e um in-habitante fotossintético composto de uma
população de algas unicelulares ou filamentosas ou cianobactérias localizadas
extracelularmente (HAWKSWORTH; HONNEGER, 1994). Liquens são um grupo
biológico não taxonômico e são únicos no sentido de que em muitos casos a forma
de vida e comportamento resultantes diferem significativamente daqueles dos
componentes isolados. Na maioria dos liquens o micobionte – que geralmente não
ocorre em vida livre - é responsável pela forma geral do talo (como é chamado o
corpo do líquen) e seus esporomas (antigamente denominados corpos de
frutificação), mas há uma interação entre ambos componentes (fungo e fotobionte)
na produção da forma final, e uma ampla variedade de relações biológicas estão
envolvidas (KIRK et al., 2008). Apesar da visão geral de que o líquen é constituído
por uma espécie fúngica e uma espécie de fotobionte, há também associações
liquênicas formadas por 3, 4, 5 ou mais parceiros na simbiose.
Estudos novos propõem uma revisão na definição de líquen, baseando-se em
descobertas recentes:
Spribille et al. (2016) visualizaram pela primeira vez a presença de
basidiomicetos leveduriformes (Cystobasidiomycetes, Pucciniomycotina) no córtex
de liquens pendentes, e detectaram a presença dessas linhagens de leveduras em
várias espécies, concluindo que as mesmas representam um componente integral
no córtex superior de liquens. Variedades de bactérias também vêm sendo isoladas
desde a primeira metade do século 20 (Cardinale et al., 2008), bem como, protistas
e até vírus (PETRZIK et al., 2019). Assim, os liquens parecem ter evoluído como
sistemas abertos e podem ser interpretados com ecossistemas em miniatura,
incluindo uma variedade de organismos operando em diferentes níveis tróficos.
Desse modo, o líquen pode ser tratado como um exemplo de “holobionte”, com um
fungo dominante contendo um microbioma (SIMON et al., 2019); o fungo liquenizado
define a morfologia geral do talo e o parceiro fotossintético imerso no talo provê a
necessidade energética, com pouca variação na diversidade e biomassa mais
controlada, enquanto as bactérias e leveduras das camadas mais externas do talo

23
são mais diversas e menos específicas.
Em consequência, Hawksworth e Grube (2020) redefinem a simbiose
liquênica como: “O líquen é um ecossistema autossustentável formado pela
interação de um ex-habitante fúngico e um arranjo extracelular de um ou mais
parceiros fotossintéticos e um número indeterminado de outros microrganismos
microscópicos”.
A liquenização é uma das principais estratégias nutricionais dentro de Fungi.
Os fungos liquenizados podem ser, mais frequentemente, um ascomiceto ou ainda
um basidiomiceto. Alguns fungos anamórficos também podem ser liquenizados, no
entanto, conforme os estudos filogenéticos e do ciclo de vida avançam, esses têm
sido alocados para os ascomicetos, ou, mais raramente, basidiomicetos (MARCELLI,
2006; NASH, 2008).
Somam cerca de 17% de todas espécies fúngicas (s.str.) e 27% de todos
Ascomycota. O número atual de espécies aceitas é 19.387 espécies, distribuídas em
995 gêneros, 115 famílias, 39 ordens e oito classes. Basidiomycotaliquenizados
somam 172 espécies (0,9% do total de fungos liquenizados) em 15 gêneros, cinco
famílias, cinco ordens e uma classe (sendo assim 19.215 spp., 980 gêneros, 110
famílias, 34 ordens e sete classes pertencem aos ascomicetos). Os basidioliquens
são geralmente considerados pobres em números de espécies, mas estudos
recentes têm mostrado que algumas linhagens são altamente diversas. (LUCKING
et al. 2016).
A liquenização se mostra, assim, um processo bastante vantajoso para o
fungo, e estudos filogenéticos apontam que esse fenômeno surgiu várias vezes
durante a história evolutiva, tanto de Ascomycota quanto Basidiomycota, tendo
ocorrido de 20 a 30 eventos de liquenização independentes durante a evolução do
grupo (LUCKING et al., 2016).
O número de parceiros fotossintetizantes que podem participar da associação
liquênica é relativamente pequeno: apenas 40 gêneros são representados, sendo 25
algas e 15 cianobactérias. A maioria pertence a gêneros de vida livre (e.g.
Coccomyxa, Myremecia, Trentepohlia para algas verdes e Gloeocapsa, Nostoc,
Scytonema, Stigonema para cianobactérias), e em alguns casos populações em vida
livre e em associação liquênica podem ser encontradas em um mesmo hábitat.
Apenas o complexo Trebouxia (incluindo Pseudotrebouxia), que ocorre em 20% de
todos os liquens, aparenta ser exclusivamente liquenizado, sendo rara e discutível

24
sua ocorrência em vida livre na natureza (AHMADJIAN, 1993, MUKHTAR et al.,
1994). Assim, uma mesma espécie de fotobionte pode ocorrer em uma grande
diversidade de associações liquênicas.
Inicialmente, liquens foram tratados como um grupo de organismos à parte
dentro das plantas, por sua cor esverdeada e sua capacidade fotossintetizante. Em
sua obra Species Plantarum Linnaeus descreveu cerca de 80 espécies de liquens
dentro do gênero Lichen. Foi seu aluno Erik Acharius que se dedicou mais ao estudo
dos liquens e escreveu a primeira classificação propriamente dita dos mesmos,
sendo considerado o ‘pai da liquenologia’ (NASH, 2008).
Com a descoberta de Schwendener (1867) de que os liquens eram na
verdade dois organismos em associação, e não apenas um organismo como se
pensava anteriormente, os liquens pararam de ser tratados como uma unidade
taxonômica, Lichenes. Um dos primeiros pesquisadores a incorporar esse
tratamento nos seus estudos taxonômicos foi Edvard August Vainio, que também
produziu uma importante obra sobre liquens brasileiros, tendo sido por isso
declarado ‘pai da liquenologia brasileira’ (MARCELLI, 2006).
Assim, liquens deixaram de ser tratados como grupos exclusivos, e possuírem
nomes científicos próprios, apresentando na verdade uma nomenclatura específica
quanto ao fungo, inserido no Reino Fungi, e uma nomenclatura específica para o
fotobionte, dentro dos seus próprios reinos. O nome comumente dado ao líquen
refere-se, na verdade, ao componente fúngico, visto que este é o parceiro dominante
na associação, e o fotobionte apresenta sua classificação própria (TURLAND et al.,
2018).
O líquen é formado por uma matriz de hifas fúngicas na qual está imerso o
fotobionte. Quando portador de algas verdes, o talo costuma apresentar coloração
entre o branco e cinza, com tom esverdeado devido à clorofila; quando portador de
cianobactérias, suas cores tendem ao marrom e cinza-chumbo. É comum que o
líquen se torne um verde claro ou escuro mais vivo quando umedecido, pois as hifas
fúngicas absorvem água e intumescem, se tornando transparentes. Em alguns
casos, os liquens podem apresentar cores mais vivas, como amarelo, vermelho ou
laranja; essas cores devem-se à presença de metabólitos secundários no talo
(MARCELLI, 2006).
O fotobionte está ou distribuído aleatoriamente em uma matriz gelatinosa ao
longo do talo liquênico (Figura 1), organização conhecida como talo homômero

25
(sem estratificação), ou em uma camada compacta abaixo do córtex superior ou
externo do líquen, em uma organização denominada de talo heterômero
(estratificado). No talo heterômero, as hifas fúngicas se adensam nas camadas mais
externas, formando o córtex, e formam uma camada menos adensada internamente,
que se divide em uma porção superior contendo o fotobionte, denominada camada
de algas, e uma porção inferior ausente de fotobionte, chamada medula (HALE,
1983).

Figura 1. Corte transversal de talo liquênico. A: talo homômero; B: Talo heterômero.

A B

Fonte: Buril, 2020

O talo liquênico pode apresentar diversas formas conforme sua organização e


estruturação anatômica, indo desde formas mais simples, como o talo pulverulento,
onde as hifas crescem por entre as colônias de algas de forma desorganizada, a
formas mais complexas, como os talos fruticosos, com uma estruturação em
camadas. Os principais tipos de talos são: crostoso, folioso, fruticoso (Figura 2);
sendo menos frequentes os talos filamentoso, esquamuloso e o dimórfico.
Adicionalmente ao talo, o mesmo pode apresentar diversas estruturas específicas, e
sua presença ou ausência, forma, disposição, ontogenia e até abundância variam
conforme o táxon. São algumas: máculas; pseudocifelas; cifelas; cílios; rizinas,
tomento, fibrilas, protalo, (HALE, 1983; MARCELLI, 2006).

26
Figura 2. Tipos mais comuns de talos liquênicos. A: talo crostoso; B: talo folioso; C: talo fruticoso.

A B C

Fonte: Buril, 2020.

O líquen pode produzir propágulos contendo o micobionte e fotobionte que


formarão novos talos liquênicos, ou o fungo pode produzir esporos sexuada ou
assexuadamente, que serão liberados no meio e precisam encontrar o fotobionte
compatível para formação de novo talo liquênico. Assim, a simbiose liquênica pode
reproduzir-se no meio pelo método direto, com formação de propágulos, ou indireto,
com formação de esporos pelo fungo liquenizado (MARCELLI, 2006).
A reprodução direta pode ocorrer por fragmentação e morte de partes velhas
do talo, formando talos liquênicos idênticos entre si, ou por sorédios ou por isídios,
que são pequenos propágulos contendo fungo e fotobionte. A reprodução indireta
pode ocorrer pela produção de conídios, esporos produzidos em conidiomas do
fungo, que tanto podem atuar como gametas, na reprodução sexuada, como
esporos, na reprodução assexuada, e pela produção de ascósporos, produzidos
em ascomas (apotécio, peritécio, lirela ou mazédio) por reprodução sexuada, no
caso de ascoliquens, ou basidiósporos, produzidos em basidiomas no caso de
basidioliquens. (MARCELLI, 2006).
Os propágulos, quando dispersos, podem gerar um novo talo ao cair em
substrato adequado. Quando a dispersão é por meio de ascósporos, é necessário
que o esporo, ao germinar, encontre o fotobionte compatível para realizar o
processo de liquenização e gerar um novo talo. Caso isso não ocorra, o micobionte
isolado possui baixas chances de sobrevivência devido à competição com outros
organismos e tende a morrer. As principais estratégias do esporo fúngico para
captura de células do fotobionte e subsequente liquenização são: o assentamento
em uma colônia algal ou de cianobactérias de vida livre, capturando células
conforme germina e cresce; a invasão de um líquen preestabelecido, matando o
parceiro fúngico e capturando o fotobionte daquele talo; a aterrisagem próxima ou
sobre um líquen, competindo com o mesmo e capturando células do fotobionte; ou

27
persistir em uma associação pouco estruturada com um parceiro fotossintético não
específico até a captura de um parceiro algal verdadeiramente compatível (KIRK et
al., 2008).
O tipo de contato célula-a-célula do micobionte com o fotobionte varia em
diferentes grupos; esse varia de justaposição parede-a-parede a uma variedade de
haustórios intraparietais até haustórios intracelulares (GALUN et al., 1970 a,b). É
possível observar, em algumas associações, a presença de células algais mortas
conectadas a haustórios, fortalecendo a teoria de que a associação liquênica pode
se comportar mais como um parasitismo controlado do que como um mutualismo,
como sugere Ahmadjian (1993): adicionalmente, o fotobionte tende a crescer mais
lentamente em simbiose do que quando em vida livre.
De qualquer forma, sabe-se que os haustórios facilitam o transporte de
carboidratos do fotobionte para o micobionte e questionamentos são feitos se os
haustórios podem também facilitar a passagem de nutrientes do micobionte para o
fotobionte (NASH, 2008). O fungo obtém do fotobionte substâncias de crescimento
como tiamina e biotina e produtos da fotossíntese, como polióis, no caso de algas
verdes, e glucose, bem como nitrogênio atmosférico, no caso de cianobactérias
(KIRK et al., 2008).
Sabe-se que o fungo liquenizado se beneficia enormemente ao obter sua
nutrição do fotobionte, mas o benefício ao fotobionte com a associação é menos
óbvio. O fotobionte principalmente ganha proteção contra a alta intensidade
luminosa, temperaturas extremas e à dessecação, permitindo que ambos vivam
juntos em áreas inóspitas, onde não poderiam fazê-lo independentemente (NASH,
2008).
1.2 VISÃO GERAL DO METABOLISMO PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO EM
FUNGOS LIQUENIZADOS OU LÍQUENS
Semelhantes as plantas, os liquens produzem substâncias essenciais e não
essenciais para o seu metabolismo a partir do que se convencionou denominar
metabolismo primário (intracelular) e secundário (extracelular). Os produtos
elaborados a partir do metabolismo primário (proteínas, polióis, polissacarídeos,
vitaminas, aminoácidos e carotenoides) são aqueles fundamentais para sua
sobrevivência. São encontrados nas paredes celulares e protoplastos e, por serem
frequentemente solúveis em água, podem ser extraídos com água quente
(FAHSELT, 1994b). Podem ser produzidos tanto pelo fungo, como também pela

28
alga.
Os aminoácidos são similares àqueles encontrados em plantas. A
micosporina, serinol e ácido L-glutâmico 5-[(2,4-dimetoxifenil) hidrazina], por
exemplo, foram descritos na literatura como sendo bons filtros solares (UVB) e
apresentaram atividade antioxidante podendo ser isolados do líquen
Lichinapygmanea (ROULLIER et al., 2010). Os carotenoides, produzidos por ambos
os simbiontes contribuem com 1,5-24 mg/g do peso seco do talo (RANKOVIĆ
KOSANIĆ, 2019) e; os polissacarídeos com 3-5% (CULBERSON, 1970). De acordo
com Hale (1983), foram identificados nos liquens os carotenoides: epóxido de β-
caroteno, α-criptoxantina, luteína e astaxantina. As vitaminas, que são sintetizadas
em sua maioria pelas algas, são: os ácidos ascórbico, nicotínico, pantatênico e
fólico; biotina, α-tocoferol; riboflavina e tiamina.
O aporte de carbono necessário para abastecer as rotas biogenéticas dos
metabólitos secundários é fornecido pelas algas através da fotossíntese, e envolve o
transporte de carboidrato para o fungo e subsequente biossíntese dos metabólitos
secundários. Estas rotas de transporte são conhecidas desde 1969, quando
Mosbach descreveu toda a rota do carbono metabólico para este fim. O tipo de
carboidrato fornecido para o fungo é determinado pela alga e geralmente liquens
que contêm algas verdes transferem ribitol, eritritol ou sorbitol. Por outro lado,
liquens que contêm cianobactérias produzem glicose (Figura 3).

Figura 3. Exemplos de metabólitos primários e secundários produzidos por liquens

Fonte: Podterob, 2008.

29
Mesmo estando incluídos no Reino Fungi, os liquens são organismos únicos,
pois apresentam características peculiares; entre elas a produção de substâncias
(algumas exclusivas da classe), que são derivados fenólicos, produzidos pelo
micobionte, através de um conjunto de genes na rota das policetídios sintases
(PKSs) do tipo I e II, que levam à formação de quatro estruturas distintas bem
diferenciadas quimicamente, conhecidas como depsídeos, depsidonas,
dibenzofuranos, ácidos úsnicos e depsona. Estes compostos são denominados
genericamente de substâncias liquênicas ou ácidos liquênicos (Tabela 1) (HOWELL
et al., 2003; EISENREICH et al., 2011).

Tabela 1. Principais classes de compostos originados das três principais vias de produção de
metabólitos secundários de liquens
• Ácidos alifáticos secundários,
ésteres e derivados
relacionados;
• Antraquinonas, xantonas,
cromonas, naftoquinonas;
• Compostos aromáticos
derivados dos policetídios: a)
Via do acetato-polimalonato compostos fenólicos
mononucleares; b) derivados
de unidades fenólicas,
depsídeos, tridepsídeos e
éteres benzílicos; depsidonas e
éteres difenílicos, depsonas,
dibenzofuranos, ácidos úsnicos
e seus derivados.
Via do ácido mevalônico Mono, di, sesqui e triterpenos,
esteróides.
Via do ácido chiquímico Terfenilquinonas e derivados do
ácido pulvínico.
Fonte: Ivanova; Ivanov (2009).

As substâncias liquênicas são insolúveis em água, com peso molecular


relativamente baixo que se acumulam no córtex (e.g. atranorina, parietina, ácido
úsnico e as melaninas do fungo), ou na camada medular (e.g. ácidos fisódico,
fisodálico e protocetrárico). Elas se depositam na porção extracelular em forma de
cristais e/ou sobre a superfície das hifas, sendo restritas a áreas específicas do talo,
estando relacionados a diferentes funções. O papel biológico das substâncias
liquênicas pode ser resumido da seguinte forma: 1- eles podem ter papel antibiótico
contra os microorganismos; 2- aumentam a permeabilidade da membrana do
fotobionte; 3- inibem o crescimento ou germinação de planta com sementes e

30
musgos; 4- são capazes de absorver luz ultravioleta, protegendo o fotobionte do
excesso de luminosidade; 5- são a base de defesa contra herbívoros e insetos; 6-
previnem contra o excesso de água no talo, permitindo a contínua troca de gases
(PÖYKKO et al., 2010).
Algumas espécies de fungos não liquenizados do gênero Aspergillus, como
por exemplo, A. flavus, A. parasitucuse A. ochraceus produzem os ácidos
fumarprotocetrárico, lobárico, protocetrárico, salazínico, esquamático e estístico
quando cultivados em meio de cultura contendo extrato de malte enriquecido com
azeite de oliva (ZAIN, 2009). O micobionte isolado de Parmelinella simplicor produz
a atranorina e o ácido salazínico cujo potencial antimicrobiano foi testado com
sucesso contra o Staphylococcus aureus (DHARMADHIKARI et al., 2010). Além da
parietina (antraquinona), extraída de Teloschistales, e das plantas superiores do
gênero Rumex, bem como, o ácido lecanórico obtido do fungo do gênero Pyricularia
(BEDNAR; SMITH, 1965; ARMSTRONG; SMITH, 2009). Estes dados indicam que o
micobionte sozinho é capaz de produzir estas substâncias acima citadas.
1. 3 ATIVIDADE BIOLÓGICA DE SUBSTÂNCIAS LIQUÊNICAS SOBRE
FUNGOS DE IMPORTÂNCIA ECONÔMICA E MÉDICA
Na natureza existem milhares de espécies de fungos, porém a grande maioria
é incapaz de causar infecções nos seres vivos, devido ao seu sistema de defesa,
seja como fagocitose, sistema complemento, imunidade celular ou humoral, entre
outros. No decorrer da evolução, algumas espécies foram capazes de se adaptarem
a ambientes inóspitos e consequentemente sobrepujaram os diferentes mecanismos
de defesa, podendo causar infecções de natureza cutânea ou respiratória em
animais e humanos. As infecções podem ser leves ou intensas dependendo da
susceptibilidade do indivíduo, envolvendo mucosas, órgãos e tecidos inteiros. São
causadas por fungos patogênicos primários, que apresentam dimorfismo térmico, ou
seja, na natureza se apresentam na forma de hifas, mas quando invadem o
organismo humano adquirem a forma de levedura. Na maioria das vezes, são
doenças pulmonares, com porta de entrada pelas vias aéreas (COELHO et al.,
2020).
É importante ressaltar que essas doenças apresentam distribuições
geográficas características, sendo causas de endemias. Adicionalmente, devido ao
uso irracional de antifúngicos, os fungos adquirem resistência aos medicamentos
utilizados, tornando-se uma problemática no contexto de Saúde Pública, uma vez

31
que dificulta o tratamento de micoses produzidas pelos diferentes fungos (COELHO
et al., 2020). Por esta razão, novas moléculas estão sendo apresentadas e
discutidas no meio científico quanto ao seu potencial antifúngico, no que concerne
as linhagens resistentes. Moléculas promissoras surgem a partir de organismos
naturais, sejam microrganismos, invertebrados, plantas e os liquens. Os metabólitos
secundários dos liquens apresentam diversificadas atividades biológicas,
importantes na área médica, entre elas a antifúngica, como descritas na Tabela 1.

32
Tabela 1. Atividade biológica de substâncias liquênicas sobre fungos de importância médica
Extrato Líquen Metabólito secundário Fungo Referência
Etanol Candida Plaza et al., 2017
Diclometano Cladonia aff. rappii Cryptococcus

Água Alectoriasarmentosa Absidiacorymbifera Ranković; Mišić, 2017


Álcool Usnea Alternaria alternata
Acetato de etila C. rangiferina Aspergillusflavus
A. fumigatus
A. niger
Botrytis cinerea
Cladosporiumcladosporoides
Fusariumoxysporum
F. solani
Mucormucedo
Paecilomycesvariotii
Penicilliumfuniculosum
P. raistrickii
Trichoderma harzianum
T. viride

Acetona C. amaurocraea Ácido úsnico Saprolegnia parasítica Guo et al., 2017


C. rangiferina Achlyabisexualis
U. longissima Pythiumsp
Ácido úsnico Alternaria sp.
Metanol Ramalina Ácido salazínico Fusarium sp. GN et al., 2017
Ácido sekikaico
Anaptychiaciliaris C. albicans Millot et al., 2017
Acetona Cetraria islandica
C. ramulosa
C. uncialis
Everniaprunastri
P. hymenina
P. rufescens
R. fastigiata
Xanthoparmeliaconsp
ersa
X. tinctina
Xanthoria parietina
Metanol Heterodermiadiadem
Diclometano ata C. albicans Nath Jha et al., 2017
Hexano Parmotremasp.
Heterodermia
Cladonia C. albicans

33
Lecanora Cryptococcus Studzińska-
Parmelia Antronorina A. flavus Sroka;Galanty; Bylka1,
Streocaula Penicilliumpurpurascens 2017
P. verrucosum
EpidermophytonfloccosumMicrosporumaudouinii
M. canis
Caloplaca M. gypseum
Acetona Everniastrum M. nanum,
Etanol HeterodermiaHypotra Ácido úsnico Trichophyton longifusus Furmanek; Czarnota1;
Metanol chyna T. mentagrophytes Seaward, 2018
Água Platismatia T. rubrum
Ramalina T. tonsurans
T.violaceum.
T. rubrum,
Xantonas M. canis Resende et al., 2018
E. floccosum
P. ravum C. parapsilosis Padhi et al., 2018
Metanol Botrytis cinérea González-Burgos;
Parmelia Fusarium oxysporum Fernández-Moriano;
C. albicans Gómez-Serranillos, 2019
Paecilomyces variotii
Metanol Dirinaria agealita Carotenoides R. solani Dawoud et al., 2020
F. oxysporum
S. rolfsi,
Hexano
Diclorometano Colletotrichum sp. Fusarium oxysporum
Acetato de etila Parmelia Ácido orselínico Pyricularia oryzae. Tuan et al., 2020
Acetona
Hexano,
Diclorometano, Colletotrichum sp.
Acetato de etila Parmelia F. oxysporum Tuan et al., 2020
Acetona Fusarium. sp.
Metanol Pyricularia oryzae
Leconara Aspergillus spp. Abdullah; Kolo; Sajadi,
2020
Fonte: Os autores.

34
2. CONCLUSÃO

Embora estejam sendo largamente estudados ao longo dos anos, ainda há


muito a ser explorado a respeito dos metabólitos secundários produzidos pelos
liquens. Muitas substâncias ainda não foram utilizadas em ensaios biológicos. Já se
sabe, entretanto, que quando apresentam atividade biológica são em baixíssimas
concentrações e suas moléculas podem servir de protótipos para a obtenção de
novos fármacos.

35
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39
CAPÍTULO 03

DERMATOFITOSES: GÊNEROS DE RELEVÂNCIA CLÍNICA

Aparecido Jonanthan Mandú de Araújo


Graduando em Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail:[email protected]

Roberto Carlos da Silva Bandeira


Graduando em Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Ciências
Farmacêuticas.
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail:[email protected]

Bárbara de Azevedo Ramos


Doutora em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco.
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Antibióticos.
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail:[email protected]

RESUMO: As dermatofitoses são infecções fúngicas ocasionadas por um grupo de


fungos dermatófitos. Elas são mais prevalentes em países subtropicais e tropicais,
embora se apresentem globalmente, e acometem tanto crianças quanto adultos.
Microsporum spp., Trichophyton spp. e Epidermophyton spp. são os três gêneros
mais frequentemente associados a infecções em humanos e embora apresentem
suas características individuais, eles não diferem na sua patogenia, uma vez que
atuam, principalmente, no estrato córneo da epiderme. Entretanto, espécies destes
gêneros podem variar quanto à capacidade de atuar nas unhas e cabelos. Essa
variação ocorre quanto a sua forma de adesão e invasão ao tecido, fatores de
virulência enzimáticos e não enzimáticos e resposta imune. O diagnóstico para
essas infecções pode envolver exame direto, histológico, de cultura ou através de
biologia molecular, além da análise do local afetado, pela extensão da lesão e pela
espécie causadora. Os tratamentos atuais ainda se restringem aos antibióticos
convencionais, uma vez que não há tanto investimento no tratamento de doenças
fúngicas, por se tratar de uma doença negligenciada.

ABSTRACT: Dermatophytoses are fungal infections caused by a group of


dermatophyte fungi. It is more prevalent in subtropical and tropical countries,
although it is present themselves globally, and affect both children and adults.
Microsporum spp., Trichophyton spp. and Epidermophyton spp. it is the three genera
most frequently associated with infections in humans and although it is present their
individual characteristics, it is do not differ in their pathogenesis, since they act,
mainly, in the stratum corneum of the epidermis. However, species of these genera
may vary in terms of their ability to act on nails and hair. This variation occurs in
terms of its form of adhesion and invasion to the tissue, enzymatic and non-

40
enzymatic virulence factors and immune response. The diagnosis for these infections
can involve direct examination, histological, culture or through molecular biology, in
addition to the analysis of the affected site, the extent of the lesion and the causative
species. Current treatments are still restricted to conventional antibiotics, since there
is not so much investment in the treatment of fungal diseases, as it is a neglected
disease.

ÂNCIA CLÍNICA

41
1. INTRODUÇÃO
Os fungos são seres eucarióticos, quimio-heterotróficos, sua reprodução se
dá através de esporos reprodutivos sexuais e assexuais, e se alimentam absorvendo
componentes orgânicos externos. São classificados estruturalmente em fungos
filamentosos, leveduras e dimórficos (TORTORA, 2012). Eles vivem por meio de
relações simbióticas, comensais ou patogênicas com plantas, humanos e animais
podendo causar infecções nesses hospedeiros (HUBE, 2009).
O impacto desses patógenos vão muito além das infecções em humanos,
uma vez que tem a capacidade de infectar animais e plantas e, nesse último,
destruir inúmeras safras de alimentos causando perdas econômicas severas, que
pode elevar o índice de pobreza em certas regiões. Porém, apesar da sua
importância, doenças fúngicas são muitas vezes esquecidas, embora cumpram os
requisitos para serem classificadas como doenças negligenciadas (ALMEIDA, 2019).
O grau da infecção fúngica pode divergir de acordo com uma variedade de fatores
que podem envolver o hospedeiro, os metabólitos do fungo, a virulência, as cepas,
os fatores ambientais e a localização anatômica da infecção (POLURI, 2015).
Ao longo dos tempos, a incidência de infecções fúngicas tem aumentado.
Essas infecções têm maior ocorrência em ambientes hospitalares e em pacientes
com o sistema imune comprometido, como pacientes receptores de transplantes,
com câncer, que fazem uso de imunomoduladores, neonatos e idosos. Quantificar
doenças fúngicas é um desafio pois há falta de vigilância de rotina e muitas vezes
são difíceis de diagnosticar uma vez que se manifestam com sintomas inespecíficos,
levando a uma dificuldade no levantamento de dados epidemiológicos (TORTORA,
2012; VALLABHANENI, 2015).
Micoses superficiais são o tipo de micose mais frequente e apresentam como
características gerais a transmissão por contato direto, inflamação local e ausência
de anticorpo séricos. Dentre esse grande grupo, as dermatofitoses constituem um
subgrupo de fungos que tem como característica a capacidade de invadir tecido
queratinizados causando infecções (SIDRIM, 2004; ZAITZ, 2010).
As Dermatofitoses são infecções fúngicas ocasionadas por um grupo de
fungos conhecidos como dermatófitos, e são conhecidos popularmente como
“epinge” ou “frieira”. Elas são prevalentes em países subtropicais e tropicais e são,
respectivamente, o terceiro e o segundo distúrbio dermatológico mais frequente em
crianças menores de 12 anos e adultos. Estes fungos se alimentam de queratina e

42
se localizam na pele, no pelo e nas unhas. Os principais gêneros incluem
Trichophyton, Epidermophytone e Microsporum, membros da família
Arthrodermataceae (ANVISA, 2004; CORTEZ, et al, 2012; CHIMMAPUN, 2015).
Embora sejam as infecções fúngicas mais comuns em países subtropicais, as
dermatofitoses se apresentam globalmente. Elas variam em sua distribuição,
frequência e seus agentes etiológicos, segundo sua região geográfica, as
características socioeconômicas da população e ao turismo, que proporciona uma
maior migração dos microrganismos de sua região de origem para regiões onde
antes essas espécies não eram relatadas como causadoras de dermatofitoses
(MATTÊDE, et al. 1986; LANA, 2016).

2. AGENTES ETIOLÓGICOS
2.1 Microsporum spp.
Segundo Lana e colaboradores (2015),Microsporum canis é um dos principais
agentes etiológicos de dermatofitoses, correspondendo a 15% de todas as infecções
dermatofíticas, sendo o agente infeccioso mais isolado nos casos de infecções do
couro cabeludo em casos de Tinia capitis. Sua transmissão inter-humano é rara
porém pode ocorrer, como demonstrado no estudo de Gurtler (2005).
Um estudo realizado por Gurtler e colaboradores (2005), demonstrou que a
micromorfologia de M. canis revelou a presença de filamentos hialinos, septados,
ramificados e macroconídeos fusiformes, de extremidades afiladas, paredes
grossas, espinescentes, com mais de seis células internas.
Coutiño e colaboradores (2009), evidenciaram em um estudo utilizando 45
cepas de M. canis que elas são caracterizadas por um crescimento rápido estimado
entre 7 e 14 dias, se apresentam como fungos brancos filamentosos em colônias
plana, com aspecto fofo e algodonoso. Tais aspectos podem estar relacionados com
seus micélios. Sugerem também que as diferenças entre as espécies podem variar
em cor da colônia, forma dos macroconídeos e presença ou ausência de
equinulações.
2.2 Trichophyton spp.
Trichophyton rubrum é a espécie responsável pela maior causa de infecções
por dermatófitos, sendo o a gente mais isolado, especialmente em onicomicoses, o
que corrobora com os dados da literatura de vastas pesquisas realizadas em outras
regiões e em diferentes épocas (LANA, 2016; SILVA, 2017). Já a espécie T.

43
mentagrophytes é a segunda espécie mais isolada nos casos de dermatofitoses.
Em relação as características fenotípicas, Gouling e seus colaboradores
(2006), afirmaram que o T. rubrum possui alto grau de diversidade morfológica,
incluindo a presença ou ausência de higifatura reflexiva, micro e macroconidia,
pigmentação de colônia vermelha e atividade urease. Como discute Ates (2008), já
foi demonstrado pela análise de microsatélites que não há nenhum grupo de
genótipos que se correlacionam a um tipo morfológico especial em T. rubrum.
2.3 Epidermophyton spp.
Silva e colaboradores (2018), discutem que Epidermophyton floccosum é a
espécie que tem índice de incidência próximo à espécie M. canis, e que as infecções
tiveram maior incidência na região ingual e em indivíduos do sexo masculino.
Porém, E. floccosum manteve uma relação parecida quando comparada com outros
trabalhos, como o de Damázio e seus colaboradores (2007).
A presença de micronídeos destingue o gênero Tricophyton do
Epidermophyton, e os conídeos de paredes lisa, em sua maioria sésseis, o separa
do Microsporum (CHEN et al., 2011). As colônias de E. floccosum geralmente
apresentam uma cor que pode variar de amarelo até algumas tonalidades de verde.
Observa-se hifas septadas e hialinas, macroconídios e células semelhantes a
clamidósporos, não se observando nunca a presença de microconídios (LIU; COLE,
2011).

3. PATOGENIA
De forma geral, a patogenia dos gêneros Epidermophyton spp., Microsporum
spp. e Trichophyton spp. não diferem entre si, uma vez que atuam, principalmente,
no estrato córneo da epiderme. Entretanto, espécies destes gêneros podem variar
quanto à capacidade de atuar nas unhas e cabelos (SIMPANYA, 2000). Assim,
pode-se dividir o processo patogênico dos dermatófitos, na epiderme, em três
etapas: adesão, invasão e resposta imune.
3.1 ADESÃO
Após a transmissão do microrganismo, que pode ser dada através do contato
direto com animais e humanos contaminados ou indireto através de fômites
contaminados; ele deve aderir à epiderme queratinizada, a partir da germinação do
artroconídio e rápida penetração da hifa no estrato córneo, para evitar que o fungo
seja eliminado juntamente a descamação da pele, que é um dos mecanismos de

44
defesa (PERES et al., 2010).
É relatado que o número de esporos aderentes é dependente do tempo. Em
um experimento utilizando secções da pele, foi demonstrada que a espécie
Trichophyton mentagrophytes leva 12 horas para aderir, 24 horas para germinar e
até 3 dias para invadir o estrato córneo (DUEK et al., 2004). Além disso, é
demonstrada a existência de um material polimérico entre as células do estrato
córneo e os artroconídios, que provavelmente desempenha um papel importante
para a fixação dos esporos (DUEK et al., 2004; KAUFMAN et al., 2007).
Os fatores que permitem a etapa de adesão ainda não são muito elucidados,
entretanto, sugere-se que os carboidratos manose e galactose, que estão presentes
na camada externa da pele, são adesinas reconhecidas por espécies T.
mentagrophytese e T. rubrum (ESQUENAZI et al., 2004; ESQUENAZI et al., 2003).
Além disso, é relatado que proteases secretadas pelos dermatófitos também
possuem influência na aderência dos micro-organismos (BALDO et al., 2008;
BALDO et al., 2010).
3.2 INVASÃO
Após o processo de adesão, as hifas passam a crescer e a se ancorarem no
hospedeiro a partir da projeção transversal e longitudinal por toda a camada externa
(URIBE; CARDONA-CASTRO, 2013). Durante esta etapa, vários fatores de
virulência, sendo eles enzimáticos ou não, são produzidos.
3.2.1 FATORES DE VIRULÊNCIA ENZIMÁTICOS
As macromoléculas presentes na epiderme do hospedeiro são utilizadas,
pelos dermatófitos, como fonte de nitrogênio, carbono, fósforo e enxofre. Então, para
isso, os micro-organismos produzem diversas enzimas, como lipases, proteases e
celulase. As enzimas proteolíticas são as mais estudadas, sendo as proteases
queratolíticas mais relacionadas com a patogenicidade dos dermatófitos (PERES et
al., 2010).
No entanto, primeiramente, é necessário que as ligações dissulfeto, presentes
na queratina dura garantindo sua estabilidade, sejam reduzidas, para permitir a ação
das proteases (KUNERT, 1992). Sugere-se que essa redução é feita por uma
bomba de efluxo de sulfito, pertencente à família de transportadores TDT (tellurite-
resistance/dicarboxylate), que são codificadas pelo gene Ssu1 (LECHENNE et al.,
2007).
O sulfito liberado por esse transportador permite a clivagem da cistina,

45
presente nas pontes dissulfeto, em S-sulfocisteína e cisteína, possibilitando a ação
de exo e endoproteases (LECHENNE et al., 2007); sendo as exoproteases as que
clivam ligações peptídicas no N- ou C- terminal do polipeptídeo, e as endoproteases
as que clivam ligações peptídicas ao longo do polipeptídeo (MONOD, 2008). Além
das proteases, outras enzimas também desempenham um papel importante na
virulência desses patógenos, como as fosfolipases e lipases (ELAVARASHI; KINDO;
RANGARAJAN, 2017), que são relacionadas também com a capacidade de
parasitar o hospedeiro.
3.2.2 FATORES DE VIRULÊNCIA NÃO ENZIMÁTICOS
Além das enzimas, foram estudados outros fatores que poderiam contribuir
para a patogenicidade dos dermatófitos e, para isso, utilizaram do conhecimento de
mecanismos de outros fungos para inferir fatores de virulência nos dermatófitos
(CHINNAPUN, 2015). Relata-se que a espécie T. rubrum produz xantomegnina, que
é uma micotoxina conhecida por ser produzida por Penicillium spp. e Aspergillus
spp. in vivo e in vitro causando nefropatia e morte em animais. Esta micotoxina é o
principal composto que causa a pigmentação avermelhada em culturas de T. rubrum
e foi observada em amostra de pele e unha infectadas (GUPTA et al., 2000). Outras
poucas espécies de dermatófitos produzem melanina ou compostos semelhantes à
melanina in vivo e in vitro que atuam de forma semelhante na patogênese de outras
doenças dermatofíticas (YOUNGCHIM et al., 2011).
3.3 RESPOSTA IMUNE
A partir da invasão do micro-organismo no tecido queratinizado, é
desencadeada a resposta imune inata dos hospedeiros, sendo induzidas por
antígenos, como peptídeos, glicopeptídeos e carboidratos, e metabólitos dos
dermatófitos; e cada tipo de antígeno pode induzir diferentes respostas imunes. A
principal resposta imune desencadeada é a adaptativa do tipo Th1 (linfócitos T
auxiliares tipo 1), com a produção de citocinas pró-inflamatórias como o interferon-γ
(IFN-γ) e interleucina-2 (IL-2) (WAGNER; SOHNLE, 1995).

4. DIAGNÓSTICO
Para o diagnóstico das dermatofitoses, assim como de outras micoses, a
qualidade da amostra é muito importante e define o desempenho eficiente para
análise micológica. A coleta deve ser adaptada ao local da lesão, podendo ser
amostra de pele, cabelo e unhas, bem como uma quantidade suficiente de amostra

46
deve ser coletada da borda da área da lesão, que é a zona ativa da infecção.
Também, é importante a ausência de tratamento farmacológico 15 dias antes da
coleta, nos casos de apenas aplicação de creme antifúngico, e de 3 meses, nos
casos de tratamento sistêmico (PIHET; GOVIC, 2017). Os exames realizados nas
amostras coletadas estão descritos a seguir.
4.1 EXAME DIRETO
Consiste no exame microscópico direto, sendo considerada uma técnica de
triagem eficiente, uma vez que permite uma resposta rápida para que seja possível
prescrever um tratamento antifúngico (CHAUVIN, 2005), no entanto, requer uma boa
qualidade do espécime coletado e experiência do examinador (PIHET; GOVIC,
2017). As amostras devem ser tratadas com hidróxido de potássio (KOH) para
dissociar as hifas dos queratinócitos. Para aumentar a sensibilidade, pode ser
adicionado o dimetilsulfóxido (DMSO) ou pode utilizar fluorocromos, que permitem
melhor visualização das hifas ou conídios; entretanto, para este último, é necessário
utilizar microscópio de fluorescência (CHAUVIN, 2005; PIHET et al.,2015).
O exame pode ser realizado em amostras de escamas da pele, fragmentos de
unha, cabelo e fluidos séricos das lesões inflamatórias e, por ser uma técnica
simples, pode ser realizado na maioria dos laboratórios de micologia. A presença de
hifas nas amostras confirma o diagnóstico de micose. Além disso, algumas
características morfológicas podem ajudar a identificar o tipo de fungo (PIHET;
GOVIC, 2017); distinguindo, por exemplo, hifas dermatófitas, hifas não dermatófitas
e pseudomicélios de leveduras, entretanto, não garante informações das espécies.
Sendo assim, o exame direto sempre deve ser acompanhado da cultura, para
determinar a espécie em questão (CHAUVIN, 2005).
4.2 HISTOLOGIA
Para onicomicoses e micoses profundas, o teste histológico da biópsia segue
sendo o “padrão ouro” para o diagnóstico (PIHET; GOVIC, 2017). Podem ser
utilizadas técnicas histoquímicas, como o ácido periódico de Schiff (PAS), para corar
e revelar elementos fúngicos (CHAUVIN, 2005). O resultado depende da quantidade
de material coletado e na apresentação clínica, podendo causar falso-negativos;
além de não permitir caracterizar a espécie do fungo. (PIHET; GOVIC, 2017).
No entanto, a biopsia é considerada um método relativamente invasivo; então,
outros métodos foram propostos (PIHET; GOVIC, 2017), como a técnica de
Hotchkiss-McManus, que utiliza recortes de unhas corados com PAS, apresentando

47
uma boa relação com exame direto e histologia clássica (LACHAUD et al., 2014).
4.3 CULTURA
Como dito anteriormente, a cultura fúngica acompanha o exame direto para
determinar definitivamente a espécie causadora da dermatofitose, sendo útil para
escolher a terapia adequada, que podem variar a depender da espécie (PIHET;
GOVIC, 2017). Além disso, as culturas muitas vezes carecem de sensibilidade, são
demorados e requerem uma equipe habilidosa para identificar as características
morfológicas; por isso, que alguns laboratórios passaram a utilizar espectrometria de
massa para facilitar a identificação dos dermatófitos (L’OLLIVER et al., 2013).
É necessário utilizar um meio de cultura seletivo para evitar contaminações
por leveduras, fungos saprofíticos e leveduras presentes na superfície do cabelo e
na epiderme (PIHET; GOVIC, 2017). É utilizado o meio ágar Sabouraud dextrose,
sendo uma amostra semeada na presença da ciclohexemida, para isolar
dermatófitos e Candida albicans; e outro, sem a ciclohexemida, para isolar outras
leveduras e bolores não dermatofíticos (CHAUVIN, 2005).
Após inoculação, as culturas são geralmente incubadas entre 20-25 ºC, mas
em alguns casos é utilizada uma temperatura mais elevada. O atraso para o
crescimento fúngico inicial varia de acordo com as espécies, sendo recomendado o
período de 4 semanas, porém, em alguns casos, pode necessitar de um tempo
maior para que a identificação seja mais precisa (PIHET; GOVIC, 2017).
4.4 BIOLOGIA MOLECULAR
Como relatado anteriormente, estes métodos apresentam algumas limitações,
acarretando problemas no diagnóstico, como dificuldade de identificar o fungo
corretamente, isolamento de outros fungos não dermatofíticos (VERRIER; MONOD,
2016), demandarem um longo tempo e causarem falsos negativos (PIHET; GOVIC,
2017). Assim, métodos moleculares, especialmente a PCR e RT-PCR, estão sendo
utilizados (HAY; JONES, 2010). Alguns estudos relatam que este método apresenta
taxas de positividade entre 74 a 100% (VERRIER et al., 2013).
Já estão disponíveis vários kits, que realizam a detecção de DNA fúngico em
menos de 48 horas (KONDORI et al., 2013). Alguns desses kits realizam a
identificação da maioria dos dermatófitos, leveduras ou bolores causadores de
micoses cutânea, outros kits são focados nas principais espécies de dermatófitos;
enquanto outros identificam apenas a espécie T. rubrum ou estão restritos a
detecção de DNA pan-dermatófitos (PIHET; GOVIC, 2017), que são primers

48
específicos para detectar qualquer espécie de dermatófitos (VERRIER; MONOD,
2016).
A técnica de PCR, embora muito eficaz, também apresenta alguns pontos que
precisam ser considerados, como heterogeneidade das amostras coletadas, quando
é coletado pouco material, risco de contaminação, podendo gerar falsos positivos, e
a interpretação de resultados, uma vez que é um método bastante sensível pode
identificar um contaminante transitório ao invés de um agente infeccioso (VERRIER;
MONOD, 2016).

5. TRATAMENTO
5.1 CONVENCIONAL
A escolha do tratamento mais apropriado é feita através da análise do local
afetado, pela extensão da lesão e pela espécie causadora. Pode ser de aplicação
tópica, geralmente servindo como terapia adjuvante à oral ou profilaxia, e de ação
sistêmica, sendo indicada para lesões generalizadas de caráter crônico ou quando
não há resposta à terapia tópica (PIRES et al., 2014). A Tabela 1 apresenta os
fármacos utilizados em cada uma das terapias.

Tabela 1. Fármacos utilizados nas terapias tópicas e sistêmicas


Terapia Fármacos
Cetoconazol, isoconazol, miconazol,
Tópica clotrimazol, bifonazol, terbinafina, butenafina e
ciclopirox olamina
Terbinafrina, griseofulvina, cetoconazol e
Sistêmica
fluconazol
Fonte: Pires et al., 2014.

A combinação de antifúngicos tem causado avanços no tratamento das


dermatofitoses, principalmente nos casos mais graves, como terbinafrina e
itraconazol oral administrados de forma consecutiva, terbinafrina e ciclopiroxolamina,
entre outras (SUBISSI et al., 2010). Algumas dessas combinações apresentam
evidências efetivas quanto à melhora do quadro clínico quando comparadas com a
monoterapia, mesmo que não possuam atividade total contra os dermatófitos
resistentes (HAVLICKOVA; CZAIKA; FRIEDRICH, 2008).
5.2 NOVOS COMPOSTOS
Um estudo avaliou as atividades antifúngicas de naftoquinonas sintéticas
contra dermatófitos, constatando que todas apresentaram atividade contra M. canis,
M. gypseum, T. rubrume T. tonsurans, sendo relacionado ao mecanismo de ação à
49
clivagem da membrana celular dermatofítica (FERREIRA et al., 2014).
5.3 PROBLEMAS RELACIONADOS À TERAPÊUTICA
As falhas na terapêutica das dermatofitoses são causadas, principalmente,
pela descontinuação da terapia, efeitos adversos dos medicamentos e resistência
aos fármacos (REZENDE et al., 2008). A descontinuação da terapia está
relacionada à prolongada terapia antifúngica necessária e aos efeitos adversos
inerentes aos fármacos (VENA et al., 2012). Já o processo de resistência está ligado
à utilização demasiada ou em doses inadequadas e abusivas, muitas vezes,
automedicadas, fazendo com que os fungos desenvolvam resistência por evoluções
epigenéticas e em resposta ao estresse, dificultando o tratamento (MARTINEZ-
ROSSI; PERES; ROSSI, 2008).

50
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Koogan, 2010.

54
CAPÍTULO 04

EFEITO ANTIFÚNGICO DE PRODUTOS DE LIMPEZA


USADOS EM AMBIENTES HOSPITALARES SOBRE
FUNGOS ANEMÓFILOS
Katiucha Silva Rodrigues
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Sistemas
Instituição: Escola Politécnica de Pernambuco- UPE
Endereço: R. Benfica, 455 - Madalena, Recife - PE, 50720-001
E-mail: [email protected]

Phelipe Manoel Oller Costa


Professor da Universidade Estadual do Vale do Acaraú
Instituição: Universidade Estadual do Vale do Acaraú
Endereço: Av. Guararapes - Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Bruno Severo Gomes


Professor associado da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Micologia
Endereço: Av. Ciências da Vida - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: Denomina-se infecção hospitalar ou nosocomial todo tipo de infecção


adquirida em ambiente hospitalar. Sua causa é atribuída a quase todos os micro-
organismos. A limpeza efetiva é uma das formas de preveni-la, todavia, nem sempre
os produtos de limpeza são fungicidas. Este estudo teve como objetivo testar os
produtos de limpeza utilizados em hospitais públicos de Pernambuco contra fungos
anemófilos. Para tal, os fungos foram coletados em ambiente hospitalar e
preservados na Micoteca URM da Universidade Federal de Pernambuco. Os
experimentos foram realizados utilizando-se três produtos de limpeza nas diluições
1/2 e 1/4: gelpinho, detergente neutro e cloro. Diluíram-se as colônias de leveduras
em água destilada, semeou em placa contendo meio Ágar Malte,e adicionando
discos de papel filtro contendo os produtos. Já com os filamentosos, acrescentou-se
os produtosao meio de cultura Ágar Malte fundido, adicionou-se um disco de 0,8 mm
de cultura fúngica no centro da placa. As placas foram encubadas a temperatura
ambiente por 72 horas. Os resultados constataram que o gel pinho e o detergente
apresentaram uma resposta significativa frente a Candida parapsilosis, o gel pinho
também apresentou resultado significativo na diluição 1/4 frente ao Tripospermum
myrti, o cloro obteve melhor resposta na diluição 1/4 contra o Penicillium waksmanii,
e o detergente nas diluições: 1/2 contra o Penicillium waksmanii e 1/4 contra o
Aspergillus terreus. Com isso concluiu-se que os produtos não possuem a mesma
eficácia para o tratamento com micro-organismos diferentes, enfatizando a
importância da utilização de vários produtos na limpeza hospitalar.

PALAVRAS-CHAVES: Infecção, Fungos, Anemófilos, Limpeza.

ABSTRACT: Every type of infection acquired in a hospital environment is called

55
hospital infection or nosocomial infection. Its cause is attributed to almost all
microorganisms. Effective cleaning is one of the ways to prevent it, however,
cleaning products are not always fungicidal. This study aimed to test the cleaning
products used in public hospitals in Pernambuco against anemophilic fungi. For this,
the fungi were collected in a hospital environment and preserved in the Micoteca
URM of the Federal University of Pernambuco. The experiments were performed
using three cleaning products in 1/2 and 1/4 dilutions: gelpine, neutral detergent and
chlorine. The yeast colonies were diluted in distilled water, sowed on a plate
containing Malte Agar medium, and added filter paper discs containing the
products. With the filaments, the products were added to the melted Ágar Malte
culture medium, and a 0.8 mm fungal culture disc was added to the center of the
plate. The plates were incubated at room temperature for 72 hours. The results
showed that the pine gel and detergent showed a significant response to Candida
parapsilosis, the pine gel also showed a significant result in the 1/4 dilution against
Tripospermummyrti, chlorine was better at dilution 1/4 against Penicillium waksmanii,
and detergent at dilutions: 1/2 against Penicillium waksmanii and 1/4 against
Aspergillus terréus.With this, it was concluded that the products do not have the
same efficacy for treatment with different microorganisms, emphasizing the
importance of the use of various products in hospital cleaning.

KEYWORDS: Infection, Fungi, Anemophiles, Cleansing.

56
1. INTRODUÇÃO
Infecção hospitalar é definida como todo tipo de infecção adquirida por um
paciente dentro do hospital. Estas podem ser provenientes de fontes exógenas
(adquiridas de outros paciente sou pelo ambiente) ou endógenas (auto-infecção)
(LIU et al., 2020). Segundo Mims et al. (2014), uma infecção que está incubada em
um paciente antes de ser admitido no hospital não é considerada uma infecção
hospitalar. Entretanto, infecções adquiridas na comunidade e levadas para o hospital
através do paciente poderão causar infecções hospitalares em outros pacientes e
funcionários do hospital.
Um fator importante para que um paciente adquira infecção hospitalar está
associado a deficiências do sistema imunológico (DENSTAEDT et al., 2018). Esse
sistema é responsável por eliminar moléculas e partículas estranhas com intuito de
manter a homeostasia do sistema, por isso sua resposta tem papel importante na
defesa contra agentes infecciosos (JONES et al., 2020). Pode-se atribuir as causas
de infecção hospitalar a quase todos os micro-organismos, porém, as mais comum
ente estudadas são as de origem bacteriana. No entanto, os fungos também podem
ocasionar infecções hospitalares. Desta forma, as infecções causadas por fungos
destacam-se nos últimos anos por seu aumento e pelas elevadas taxas de
morbidade e mortalidade (SABINO, 2020).
Os fungos são seres eucarióticos amplamente distribuídos na natureza,
apresentando-se sob forma de levedura ou filamentosa (KORNITZER; ROY, 2020).
Seus propágulos dispersam-se no ambiente por meio do ar atmosférico ou por
outras vias como água, insetos, homem e outros animais. Os fungos que são
dispersos através do ar atmosférico são denominados fungos anemófilos. Sendo
assim, a microbiota anemófila pode ser semelhante ou diferente em cada cidade ou
região. Os elementos fúngicos que são encontrados no ar atmosférico são os
esporos (estrutura esporulativa), e podem ser encontrados em altas concentrações
nos mais variados locais, especialmente em ambientes úmidos (LIMA et al., 2019).
Os fungos anemófilos são considerados um dos principais causadores de
infecções hospitalares, pois se encontram dispersos no ambiente e, de forma
oportunista, podem infectar pacientes imuno deprimidos, dificultando o seu
tratamento e aumentando a sua permanência no hospital ou até levando-os à morte,
principalmente quando essas infecções afetam pacientes encontrados em unidades
de terapia intensiva (UTI) (CALUMBY et al., 2019).

57
Infecções hospitalares são facilitadas por imunodeficiências e outros fatores
predisponentes do paciente hospitalizado, os métodos diagnósticos e terapêutico
invasivos utilizados e a falta de cuidados com padrões de assepsia e higiene do
ambiente hospitalar (LIU et al., 2020). Em ambientes climatizados o acúmulo de
umidade e material orgânico em bandejas de condicionadores de ar podem torná-las
ponderosas fontes dispersoras de propágulos fungicos. Por esse motivo a limpeza
em UTI deve ser minuciosamente realizada (SOUZA et al., 2019).
Nos hospitais existem basicamente dois tipos de limpeza o ambiente
hospitalar biologicamente seguro: a limpeza concorrente e a limpeza terminal. A
concorrente é feita diariamente em algumas partes da unidade de terapia intensiva e
em objetos pessoais dos pacientes após o seu uso. A terminal é realizada em todo o
ambiente da UTI e quando o paciente desocupa o leito (MEYER et al., 2020). Os
dois tipos de limpeza são importantes, pois buscam deixar o ambiente seguro para o
paciente em tratamento, porém, muitos dos materiais de limpeza utilizados não são
eficazes contra fungos, dificultando assim o seu controle e aumentando o risco de
infecções por esses patógenos (HAN et al., 2020).
Escolher adequadamente os produtos utilizados na limpeza hospitalar é
importante para evitar que os pacientes adquiram algum tipo de infecção ocasionada
por fungos. Assim, o objetivo desse estudo foi avaliar a eficácia de produtos de
limpeza utilizados por hospitais públicos de Pernambuco frente a fungos anemófilos
isolados de ambiente hospitalar.

2. SISTEMA IMUNOLÓGICO
O sistema imunológico tem como função a eliminação de moléculas estranhas
ao corpo, sendo elas patógenas ou não, para com isso manter a homeostasia do
sistema. As células que constituem esse sistema originam-se de células
hematopoéticas pluripotentes, que estão localizadas na medula óssea, e suas
diferenciações acontecem não só aí como também em outros locais específicos do
organismo. É constituído por granulócitos polimorfonucleares (neutrófilos, eosinófilos
e basófilos), os monócitos/macrófagos e os linfócitos (linfócitos T, B e células natural
killer [NK]) (VILLANI et al. 2018). Vale ressalta a existência do sistema de defesa
primário que apresenta a pele como o principal constituinte primaria de proteção
(NICKOLOFF, 2020).
A resposta do sistema imunológico é importante na defesa do corpo humano,

58
contra agentes infecciosos, constituindo-se como o principal impedimento para a
ocorrência de infecções muitas vezes relacionadas com um alto índice de
mortalidade. Todavia, quando ocorre uma deficiência imunológica esta é associada
a infecções. Isso vem sendo notado há muitos anos, pois mesmo sendo o sistema
imunológico fundamental para a defesa contra agentes infectantes evidenciou-se
que em muitas enfermidades infecciosas os principais aspectos patológicos não são
relacionados com a ação direta do agente agressor e sim com a resposta
imunológica anormal (VILLANI et al., 2018).

3. INFECÇÃO HOSPITALAR
Infecção hospitalar (IH), também denominada nosocomial, são infecções
adquiridas após a entrada do paciente na unidade hospitalar e manifestada durante
a internação ou após a alta. Podem ser relacionadas com a estadia do paciente no
hospital ou procedimentos hospitalares (MIMS et al., 2014). Dentre os fatores de
riscos existentes para que uma pessoa adquira infecção hospitalar (IH) destacam-se
a permanência do enfermo no hospital por mais de 24 horas, a realização de
procedimentos invasivos e a baixa taxa do número de profissionais de enfermagem
por paciente/dia, o que pode propiciar quebra na assepsia dos procedimentos para
assistência ao paciente ou diminuição da higiene manual (LIU et al., 2020).
Os hospitais são divididos em setores com características e funções
diferentes. Dentre os setores de alta complexidade, o centro de terapia intensiva
(CTI) apresenta maior gravidade em relação às IHs, uma vez que neste setor estão
internados pacientes em estado grave de saúde (AREA et al., 2020). As infecções
hospitalares em CTI estão relacionada, na maioria das vezes, com à gravidade
clínica dos pacientes, ou ao uso de procedimentos invasivos, ao uso de
imunossupressores, ao período de internação prolongado, à colonização por micro-
organismos resistentes, à prescrição de antimicrobianos e ao próprio ambiente do
CTI (SOUSA et al., 2016)
A Associação Nacional de Biossegurança (Anbio), informou que cerca de 80%
dos hospitais brasileiros não fazem a assepsia adequada do ambiente. Com isso, o
índice de infecção hospitalar no Brasil varia entre 14% e 19%, podendo chegar a
88,3% em algumas unidades, levando ao número de cem mil mortos por ano devido
às infecções. A Organização Mundial da Saúde (OMS) acredita que as infecções
hospitalares atinjam 14% dos pacientes internados no país (DOURADOS, 2020).

59
De acordo com Abegg et al. (2011), a infecção é uma entidade clínica de
múltiplos fatores envolvidos e a necessidade de reduzir e controlar sua incidência
determina a aplicação de medidas preventivas, educacionais e de controle
epidemiológico que visam, por meio de um processo de sensibilização coletiva, levar
as taxas de infecção para limites aceitáveis para o tipo de clientela e de
procedimentos realizados em cada hospital. As causas de IHs podem ser atribuídas
a quase todos os microrganismos, porém, as mais comumente estudadas são as
causadas por bactérias. Todavia, vale ressaltar, que as infecções hospitalares
causadas por fungos destacaram-se nos últimos anos, visto que, o número de casos
de IHs ocasionada por esses microrganismos vem apresentando um aumento
progressivo e com isso elevado a taxa de morbidade e mortalidade (DENSTAEDT et
al., 2018).

4. FUNGOS ANEMÓFILOS
Os fungos são seres eucarióticos que possuem ampla distribuição na
natureza, podendo ser encontrados em vários habitats (ar, água, terra, animais,
alimentos), sob a forma de leveduras ou micelial (QUEIROZ; SOUSA, 2020). Os
fungos encontrados no ar são chamados de anemófilos, sendo um dos principais
causadores de IHs, fato que preocupa bastante os profissionais da saúde, pois
esses microrganismos encontram-se dispersos no meio ambiente e, de forma
oportunista podem infectar pacientes imunodeprimidos, dificultando o seu tratamento
e aumentando a sua permanência no hospital ou até levando-os a morte (CALUMBY
et al., 2019).
Casos mais graves ocorrem quando essas infecções afetam pacientes
encontrados em unidades de terapia intensiva (UTI), visto que estes pacientes
apresentam o sistema imunológico debilitado ou fatores que pre dispõem á infecção
fungica, o que facilita a atuação de fungos oportunistas (DENSTAEDT et al., 2018).
Venceslau et al. (2012), por exemplo, realizou um trabalho em que coletou e
identificou fungos anemófilos encontrados nas áreas críticas do hospital de Urgência
e Emergência de Sergipe. Dentre os fungos anemófilos causadores de infecção
hospitalar destacam-se, Candida parapsilosis, Rhodotorula minuta, Aspergilus
terreus, Penicillium wasmanii, Tripospermum myrtie, Cladosporium
sphaerospermum.
4.1 Candida parapsilosis

60
Candida é um gênero de levedura normalmente encontrada na microbiota
normal humana, podendo ser localizada tanto nas mucosas da boca quanto na dos
tratos digestivo, genital e urinário de indivíduos sadios sem ocasionar infecções. No
entanto, em pessoas com fatores pré-disponentes como imunodeprimidos podem
tornar-se patogênicas, com a capacidade de ocasionar infecções chamadas de
candidíase (SANTOS et al., 2020). Os fungos desse gênero são os mais comumente
relacionados com manifestações clínicas sendo considerado como um dos principais
responsáveis por infecções hospitalares associados à fungemia, principalmente em
CTI. Tratando-se de em infecções fúngicas provocadas por Candida, é
extremamente importante identificar a espécie, pois a patogenicidade e o perfil de
sensibilidade a um antifúngico variam de acordo com a espécie (TÓTH et al., 2019).
Apesar de C.albicans ser a espécie mais comumente isolada nas infecções
superficiais ou invasivas, a incidência de infecções provocadas por C. parapsilosis é
crescente, principalmente em pacientes com cateter venoso central e nutrição
parental, e, em algunscasos, associada a altas taxas de mortalidade. Vale salientar,
que a C. parapsilosis é considerada uma das principais causas de candidíase
sistêmica (TÓTH et al., 2019). Como essa espécie pode ser encontrada na pele sua
transmissão torna-se predominantemente exógena. A mesma possui uma grande
capacidade de produzir biofilmes e se prolifera com maior facilidade em soluções
contendo glicose, além das crianças e recém-nascidos prematuros internados em
unidades de cuidados intensivos serem destacados por apresentar uma elevadas
taxas de ocorrência desse fungo (SANTOS et al., 2020).
4.2 Rhodotorula minuta
Leveduras do gênero Rhodotorula estão associadas a processos patológicos,
sendo encontradas como contaminantes da pele, unha, pulmão, urina, fezes,
sistema nervoso central e sangue. Essas infecções podem ocorrer de origem
endógena ou por origem exógena, bem como pelas mãos dos trabalhadores da área
de saúde, infusos contaminados e fontes inanimadas ambientais (SETIAWAN et al.,
2020)
Rhodotorula minuta apresenta distribuição mundial e desenvolve-se em
diversos tipos de substratos. Entre as doenças causadas por essa espécie incluem
sepses de articulação do quadril, endoftalmite e sepses relacionadas a cateter de
pacientes portadores do Vírus da Imunodeficiência Humana Adquirida
(SAMADLOUIE et al., 2020).

61
4.3 Aspergillus terreus
Fungos do gênero Aspergillus são cosmopolitas, sendo a fonte de contágio
mais comum à via inalatória, considerando-o como causa de infecção grave com
risco de morte em pacientes imunodeprimidos. Dentre as diferentes espécies
relacionadas a infecções em seres humanos as ocasionadas por A. terreus são mais
raras e geralmente estão associadas à permanência de pacientes em UTI (POSCH
et al., 2018). Uma forma de tratamento para a aspergilose é a administração
endovenosa da Anfotericina-B, que apesar de desenvolver efeitos colaterais muitas
vezes frequentes apresenta uma eficácia significativa frente ao fungo, todavia,
apresenta ação limitada no tratamento de aspergilose causada por A. terreus que
apresenta uma resistência a esse antibiótico (KAUR; JAIN, 2017).
4.4 Penicillium waksmanii
Infecções hospitalares causadas por fungos do gênero Penicillium
(peniciloses) são raras. As espécies encontram-se distribuídas amplamente pela
natureza, sendo detectadas na matéria orgânica em decomposição e no solo,
podendo também apresentar-se como contaminantes em cultivos rotineiros no
laboratório (SCHOLTZ et al., 2017).
4.5 Tripospermum myrti
Fungos do gênero Tripospermum apresentam espécies aquáticas e
encontram-se dispersos na natureza. Dentre as diversas espécies pertencentes a
esse gênero, T. myrti é capaz de crescer e esporular na superfície de folhas de
árvores e em ambientes aquáticos (HONGSANAN et al., 2016).
4.6 Cladosporium sphaerospermum
Cladosporium é um gênero composto por fungos saprofíticos e cosmopolitas.
Seus esporos podem causa alergias respiratórias cujos sintomas incluem
pneumonite por hipersensibilidade, asma e rinite alérgica, além de provocar
infecções graves, quando em contato com pequenos cortes e arranhões na pele. A
exposição prolongada aos esporos de Cladosporium pode conduzir a uma
supressão do sistema imunológico, o que permite que vírus e bactérias oportunistas
aproveitem para infectar o hospedeiro (ADORISIO et al., 2019).
Esse gênero apresenta mais de 772 espécies, porém, apenas seis espécies
são associadas a doenças de pele, olhos, unhas e infecções respiratórias no
homem, sendo elas: C. cladosporioides, C. oxysporum, C. sphaerospermum, C.
elatum, C. herbarum e C. langeronii. Dentre essas espécies, C. sphaerospermum é

62
um patógeno humano raro e tem sido relatado como indutor de lesões intra-
brônquica e da córnea, além de ter sido isolado a partir de lesões cutâneas
(HALLEN-ADAMS; SUHR, 2016).

5. LIMPEZA HOSPITALAR
Uma forma de evitar infecção hospitalar tornando o hospital biologicamente
seguro é através da limpeza (LIU et al., 2020). A literatura tradicional de
enfermagem diferencia dois tipos de limpeza de unidade: (1) a concorrente, aquela
que é realizada todos os dias só em alguns locais e em objetos pessoais e (2) a
terminal, efetuada em todos os setores de uma unidade de saúde e também quando
ocorre a desocupação de um leito (FROTA et al., 2020).
Na escolha do produto mais adequado para que a limpeza seja eficaz deve-se
considerar o amplo espectro de ação antimicrobiana, inativação rápida dos
microrganismos, não ser corrosivo para metais, não danificar artigos ou acessórios
de borracha, plásticos ou equipamento ótico, sofrer pouca interferência de matéria
orgânica, não ser irritante para a pele e mucosas, possuir baixa toxicidade, tolerar
pequenas variações de temperatura e de pH, ter ação residual sobre superfícies
quando aplicado no ambiente, manter sua atividade mesmo sofrendo pequenas
diluições, ser um bom agente umectante, ser de fácil uso, ser inodoro ou ter odor
agradável, ter baixo custo, ser compatível com sabões e detergentes, ser estável
quando concentrado ou diluído. Porém, nenhum desinfetante químico apresenta
todas essas características, sendo necessário conhecer as características de cada
produto para que se possa escolher corretamente o melhor, evitando o consumo
excessivo e o uso inadequado (TEIXEIRA et al., 2012).

6. METODOLOGIA
6.1 LOCAL
Os experimentos foram realizados no Laboratório de Controle Biológico, do
Departamento de Micologia, do Centro de Biociências, Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE), no período de 26 de junho a 20 de dezembro de 2012.
6.2 FUNGOS UTILIZADOS
As amostras fúngicas utilizadas para o desenvolvimento do trabalho foram
cedidas pela Coleção de Culturas-Micoteca URM da UFPE.
As espécies de fungos utilizados foram: Aspergillus terreus URM6198;

63
Candida parapsilosis URM4869; Cladosporium sphaerospermum URM6120;
Penicillium waksmanii URM6117; Rhodotorula minuta URM4844; Tripospermum
myrti URM6121(Figura 1).

Figura 1. Espécies de fungos utilizados no experimento: (A) Aspergillus terreus URM6198; (B)
Candidaparapsilosis URM4869; (C) Cladosporium sphaerospermum URM6120; (D) Penicillium
waksmanii URM6117; (E) Rhodotorula minuta URM4844; (F) Tripospermum myrti URM6121.

Fonte: Os autores.

6.3 PRODUTOS DE LIMPEZA


Os produtos de limpeza utilizados para o desenvolvimento dos testes foram
cedidos pelo Hospital das Clínicas de Pernambuco. Os produtos empregados foram
cloro, detergente neutro (que é composto por espessante, agente formador de
espuma, neutralizante, conservante e água, além de possuir como principio ativo o
Ácido Dodecil Benzeno Sulfônico) e o gelpinho (que é composto por alcalinizante,
espessante, corante, fragrância, conservante, termoativo não ionizante e água, além
de possui como principio ativo o Ácido Dodecil Benzeno Sulfônico).
6.4 MEIO DE CULTURA
Para realização dos testes foi utilizado o meio de Cultura Extrato de Malte,
suga composição segue abaixo:
Ágar Extrato de Malte (MEA) (Food and drug administration, 1998; Pitt & Hocking,
1997 apud Gava, 2002).
Extrato de Malte em pó.................................................................................. 20,0 g
Glicose........................................................................................................... 20,0 g
Peptona.......................................................................................................... 1,0 g
Ágar............................................................................................................... 20,0 g
Água destilada............................................................................................... 1L

64
6.5 AVALIAÇÃO DO EFEITO ANTIFÚNGICO DOS PRODUTOS SOBRE
LEVEDURAS.
Para realização dos testes de efeito antifúngico do cloro, do detergente neutro
e do gelpinho frente às leveduras, foi utilizada a metodologia do teste de difusão em
disco sugerido por Rabanal et al. (2002) e por Karaman et al. (2003) que consiste na
aplicação de 10 μL da solução de agente antifúngico em discos de papel de filtro de
6 mm de diâmetro. Foram utilizadas duas diluições: uma solução de 1/4 (a cada três
litros de água adiciona-se um litro do cloro) e uma solução1/2 (a cada litro de água
adiciona-se um litro de cloro). Realizaram-se três repetições para cada diluição, o
grupo controle foi composto por uma placa contendo apenas fragmento da cultura
fúngica e uma placa contendo apenas o meio de cultura Ágar Extrato de Malte. As
culturas de leveduras foram diluidas em água destilada esterelizada até o líquido
atingir a turbidez 0,5 da escala de McFarland. Após esse processo com o auxílio de
um swab a solução foi semeada por toda a superfície de uma placa de Petri,
contendo o meio de cultura Ágar Extrato de Malte, logo após adicionou-se os dois
discos contendo as diluições. As placas foram incubados em 25 ± 2 ºC por 72
horas,. Após esse período observou-se o surgimento os halos de inibição foram
medidos com o auxílio de um paquímetro de precisão. Os valores foram submetidos
a análise de variância e os resultados submetidos ao teste de Tukey a 5%.
6.6 AVALIAÇÃO DO EFEITO ANTIFÚNGICO DOS PRODUTOS SOBRE
FUNGOS FILAMENTOSOS
Inicialmente os produtos de limpeza em concentração pré-estabelecida, foram
incorporados ao meio de cultura Ágar Extrato de Malte esterelizado ainda não
7solidificado, semelhante ao método descrito por Caldari Júnior (1998). Foram
utilizadas as diluiçãos 1/2 (A cada 1 litro de meio de cultura foi adicionado 1 litro do
produto de limpeza) e 1/4 (a cada 1 litro de meio de cultura foram adicionado 3 litros
do produto de limpeza). Após a solidificação do meio de cultura utilizando-se um
furador de 8 mm de diâmetro, retirou-se um disco de meio do centro da placa
substituindo o mesmo por um disco de mesmo tamanho retirado ca cultura do fungo
testado. As testemunhas consistiam nos fungos inoculados em meio de cultura sem
o produto de limpeza, em seguida as placas foram incubados em 25 ± 2 ºC por 72
horas, realizaram-se três repetições para cada diluição. Após o período de
incubação avaliou-se o percentual de inibição do crescimento medindo o diâmetro
do crescimento micelial (CALDARI JÚNIOR, 1998), os valores foram submetidos a

65
análise de variância e os resultados ao teste de Tukey a 5%.

7. RESULTADOS
7.1 EFEITO ANTIFÚNGICO DOS PRODUTOS DE LIMPEZA SOBRE
LEVEDURAS E FUNGOS FILAMENTOSOS.
7.1.1 Produto x diluição
Dentre os produtos utilizados para os testes com as leveduras, o cloro foi o
que apresentou melhor eficiência nas duas diluições, seguido pelo gelpinho que
demonstrou melhor resultado do que o detergente, pois o mesmo não apresentou
diferença estatística quando comparado as duas diluições (Tabela 1). Segundo
Conte (2002), detergentes são mais solúveis em água, o que pode vir a facilitar a
sua entrada na célula fúngica.

Tabela 1. Resultado da eficácia dos produtos, utilizados para o tratamento em leveduras, pelas suas
diluições.
Diluição
Produto
Diluição 1/2 Diluição1/4

Gelpinho 2.04 bA 1.30 bB


Cloro 3.71 aA 2.68 aB
Detergente 1.90 bA 1.64 bA
Fonte: Os autores.

As médias seguidas pela mesma letra, minúsculas na coluna e maiúsculas


nas linhas, não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey ao nível de 5% de
probabilidade.
Já em relação aos fungos filamentosos, os melhores resultados obtidos foram
para o cloro, o detergente não apresentou diferença estatística entre as diluições e o
gel pinho também não apresentou diferença estatística entre as diluições como
pode-se observar na Tabela 2.

Tabela 2.Eficácia dos produtos utilizados para o tratamento frente aos fungos filamentosos pelas
suas diluições

Produto Diluição
Diluição 1/2 Diluição 1/4
Gelpinho 73.65 aA 71.17 aA
Cloro 68.05 bA 43.57 bB
Detergente 69.43 abA 68.23 aA

Fonte: Os autores.

66
As médias seguidas pela mesma letra, minúsculas na coluna e maiúsculas
nas linhas, não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey ao nível de 5% de
probabilidade.
Os resultados demonstram o quanto é importante a utilização do produto na
diluição adequada para que a limpeza possa ser eficaz. Teixeira et al. (2012) afirma
que uma das características a ser considerada ao se escolher um produto de
limpeza é sua eficiência quando concentrado ou diluído.
7.1.2 PRODUTO X FUNGO X DILUIÇÃO
Com relação à eficácia dos produtos sobre as leveduras, após a realização
dos testes constata-se que o Gelpinho e o detergente apresentaram melhores
respostas nos tratamentos frente à levedura Candida parapsilosis, todavia com
cloro, com relação a sua eficácia, não apresentou diferença estatística frente as
duas leveduras (Tabela 3). No tratamento com os fungos filamentosos, pode-se
observar que o gelpinho na diluição 1/2 obteve o pior resultado frete ao Aspergillus
terreus não apresentando diferença estatística com relação aos outros fungos e na
diluição 1/4 apresentou melhores resultados frente ao Tripospermum myrti, não
obtendo diferença estatística com relação aos outros fungos, já o cloro na diluição
1/2 não apresentou diferença estatística, porém com relação a diluição 1/4 obteve
melhor resultado contra o Penicillium waksmanii, entretanto o detergente na diluição
1/2 teve melhor resposta quando empregado no tratamento contra o Penicillium
waksmanii e na diluição 1/4 a resposta foi significativa em relação ao Aspergillus
terreus como pode-se observar na Tabela 4.

Tabela 3. Resposta do efeito dos produtos de limpeza em diferentes diluições frente às leveduras.

Produtos
Fungos
Gelpinho Cloro Detergente
Diluição 1/2 Diluição 1/4 Diluição 1/2 Diluição1/4 Diluição 1/2 Diluição1/4
Candida
parapsilosis 1.08 bB 0.65 bB 3.83 aA 2.86 aA 1.20 bB 1.01 bB
Rhodotorula
minuta 3.00 aAB 1.96 aB 3.60 aA 2.50 aB 2.60 AB 2.26 aB
As médias seguidas pela mesma letra, minúsculas na coluna e maiúsculas nas linhas, não diferem
estatisticamente pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade.Fonte: Os autores.

67
Tabela 4. Resposta do efeito dos produtos de limpeza em diferentes diluições frente aos fungos

Produtos
Fungos
Gelpinho Cloro Detergente
Diluição 1/2 Diluição 1/4 Diluição 1/2 Diluição1/4 Diluição 1/2 Diluição1/4
Tripospermum
myrti 68.75 bA 64.58 bA 68.75 aA 68.75 aA 66.66 bc A 63.54 bA
Cladosporium
sphaerospermum 71.43 bA 71.43 abA 64.76 aAB 60 aB 71.43 abA 64.76 bAB
Penicillium
waksmanii 72.22 bA 70.37 abAB 64.81 aAB 16.68 cC 60.18 cB 65.74 bAB
Aspergillus terréus 82.22 aA 78.33 aA 73. 88 aA 28.90 bB 79.44 aA 78.89 aA
As médias seguidas pela mesma letra, minúsculas na coluna e maiúsculas nas linhas, não diferem
estatisticamente pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade.Fonte: Os autores.

Os resultados mostram que o cloro foi mais eficiente na inibição dos fungos.
Alves et al. (2010) afirma que, cloro por ser um agente oxidante atua sobre os
constituintes da membrana celular, levando osmicrorganismos à morte.
A escolha do produto adequado para realização da assepsia hospitalar é de
extrema importância, visto que a resposta de um produto a um microrganismo nem
sempre será a mesma com relação a outro. Teixeira et al. (2012) corrobora com
essa afirmação ao dizer que não existe um desinfetante químico que atenda a todas
as especificações e necessidades encontradas, sendo preciso conhecer as
características de cada um para se ter subsídios suficientes na escolha correta do
produto, evitando custos excessivos e uso inadequado.

8. CONCLUSÕES
• A ação inibitória dos produtos de limpeza varia de acordo com a espécie
fúngica;
• O cloro é mais eficiente na inibição dos fungos filamentos quando
comparado aos outros produtos;
• O ambiente hospitalar, por ser um local em que normalmente habitam uma
gama de microrganismos patógenos a saúde humana, requer uma maior atenção
com relação a sua limpeza;
• A concentração do produto influencia na ação inibitória contra os fungos
testados.

68
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70
CAPÍTULO 05

AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTIFÚNGICA DE ÓLEOS


ESSENCIAIS FRENTE A GÊNEROS DE Candida sp. DE
IMPORTÂNCIA CLÍNICA
Maria Carolina de Albuquerque Wanderley
Doutora em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Medicamentos
Instituição: Universidade Federal Rural de Pernambuco
Endereço: Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n - Dois Irmãos, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Roberta Luciana do Nascimento Godone


Doutora em Biologia Aplicada a Saúde – LIKA/UFPE
Instituição: Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco
Endereço: Av. Afonso Olindense, 1513 - Várzea, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

José Manoel Duarte Wanderley


Doutor em Biologia Aplicada a Saúde – LIKA/UFPE
Instituição: Universidade Federal Rural de Pernambuco
Endereço: Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n - Dois Irmãos, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Thiago Pajeú Nascimento


Doutor em Biologia Aplicada a Saúde – LIKA/UFPE
Instituição: Universidade Federal Rural de Pernambuco
Endereço: Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n - Dois Irmãos, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Ana Lúcia Figueiredo Porto


Doutora em Engenharia Química pela Universidade Estadual de
Campinas/UNICAMP Instituição: Universidade Federal Rural de Pernambuco
Endereço: Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n - Dois Irmãos, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

RESUMO: Denomina-se infecção hospitalar ou nosocomial todo tipo de infecção


adquirida em ambiente hospitalar. Sua causa é atribuída a quase todos os micro-
organismos. A limpeza efetiva é uma das formas de preveni-la, todavia, nem sempre
os produtos de limpeza são fungicidas. Este estudo teve como objetivo testar os
produtos de limpeza utilizados em hospitais públicos de Pernambuco contra fungos
anemófilos. Para tal, os fungos foram coletados em ambiente hospitalar e
preservados na Micoteca URM da Universidade Federal de Pernambuco. Os
experimentos foram realizados utilizando-se três produtos de limpeza nas diluições
1/2 e 1/4: gelpinho, detergente neutro e cloro. Diluíram-se as colônias de leveduras
em água destilada, semeou em placa contendo meio Ágar Malte, e adicionando
discos de papel filtro contendo os produtos. Já com os filamentosos, acrescentou-se
os produtosao meio de cultura Ágar Malte fundido, adicionou-se um disco de 0,8 mm
de cultura fúngica no centro da placa. As placas foram encubadas a temperatura
ambiente por 72 horas. Os resultados constataram que o gel pinho e o detergente

71
apresentaram uma resposta significativa frente a Candida parapsilosis,, o gel

PALAVRAS-CHAVES: Infecção, Fungos, Anemófilos, Limpeza.

ABSTRACT: Every type of infection acquired in a hospital environment is called


hospital infection or nosocomial infection. Its cause is attributed to almost all
microorganisms. Effective cleaning is one of the ways to prevent it, however,
cleaning products are not always fungicidal. This study aimed to test the cleaning
products used in public hospitals in Pernambuco against anemophilic fungi. For this,
the fungi were collected in a hospital environment and preserved in the Micoteca
URM of the Federal University of Pernambuco. The experiments were performed
using three cleaning products in 1/2 and 1/4 dilutions: gelpine, neutral detergent and
chlorine. The yeast colonies were diluted in distilled water, sowed on a plate
containing Malte Agar medium, and added filter paper discs containing the
products. With the filaments, the products were added to the melted Ágar Malte
culture medium, and a 0.8 mm fungal culture disc was added to the center of the
plate. The plates were incubated at room temperature for 72 hours. The results
showed that the pine gel and detergent showed a significant response to Candida
parapsilosis, the pine gel also showed a significant result in the 1/4 dilution against
Tripospermum, emphasizing the importance of the use of various products in hospital
cleaning.

KEYWORDS: Infection, Fungi, Anemophiles, Cleansing.

72
1 INTRODUÇÃO
O tratamento de doenças infecciosas causadas por microrganismos tornou-se
o mais desafiador problema de saúde da era moderna (GANJEWALA et al., 2014).
Em um cenário que a utilização de produtos químicos no combate a microrganismos
se restringe devido aos efeitos carcinogênicos, de toxicidade aguda e riscos
ambientais, (SWAMY; AKHTAR; SINNIAH, 2016). Fatores como o aumento da
resistência de fungos e bactérias patológicas conhecidas, em conjunto com o
aparecimento de novos patógenos emergentes, demonstram a importância e o
caráter de urgência do desenvolvimento de novos antimicrobianos (KHOSRAVI;
SHOKRI; FAHIMIRAD, 2016). É crescente o interesse pela descoberta de novas
fontes de antimicrobianos dando-se ênfase para as de origens vegetais, resultando
na inserção de vários processos de triagens desses vegetais na busca por novos
compostos com ação antimicrobiana (BADAWY; ABDELGALEIL, 2014). Durante o
processo de obtenção de novos compostos com atividades terapêuticas, buscam-se
atividades farmacológicas desejadas em humanos, animais e no controle de
patógenos presentes nos alimentos, em especial nos setores de armazenamento
(GEMEDA et al., 2014).
Há uma constante busca por estratégias de controle da disseminação
fúngicas e da formação dos seus metabolitos tóxicos, as micotoxinas fazendo-se uso
constante de tratamentos sintéticos (BOMFIM et al., 2015). Devido aos problemas
inerentes do uso dos fungicidas sintéticos, como custo de produção e efeitos
colaterais, alternativas terapêuticas vêm sido desejadas e os produtos de origem
vegetal para utilização no tratamento de patógenos (THOMIDIS; FILOTHEOU,
2016).
Dentre os microrganismos patológicos, os fungos se destacam por serem
patógenos oportunistas com alta capacidade de resistência a antimicrobianos, a qual
é agravada por fatores como a baixa oferta de antifúngicos, limitando-se a apenas
três classes (REVIE et al., 2018). Todavia, as infecções fúngicas que acometem
humanos são em sua grande maioria relativas às dermatofitoses, que, embora mais
comuns, não são associadas aos casos mais graves de micoses. Infecções
oportunistas, subcutâneas e sistêmicas estão entre as mais invasivas, que podem
ser letais (JAMALIAN et al., 2012).
Os fungos são organismos eucariontes, unicelulares ou multicelulares,
costumeiramente encontrados em materiais orgânicos em decomposição, se
73
fazendo presente em todos os ecossistemas nos mais diversos ambientes (CONTI et
al., 2018). O desenvolvimento desses microrganismos é muito mais grave entre
pacientes que recebem tratamento com antibióticos de amplo espectro e
quimioterápicos antineoplásicos, podendo ocasionar até o desenvolvimento de uma
septicemia, trazendo riscos à vida do paciente (SHARIFZADEH et al., 2018).
Os fungos também são responsáveis por ocasionar grande parte dos
prejuízos gerados na colheita e produção de alimentos. As infestações fúngicas
resultam em perdas exponenciais (XIE et al., 2017). Grande parte do acometimento
do setor agrícola por fungos se deve ao aumento da ineficácia dos fungicidas
sintéticos atuais, motivados em suma pela aquisição de resistência dos fungos,
devido ao uso prolongado dos antifúngicos (SOYLU; KURT; SOYLU, 2010). Apesar
dos notórios avanços tecnológicos, estima-se que em esfera global cerca de um
quarto dos alimentos tiveram que ser descartados nas commodities por
contaminação fúngicas e/ou metabólitos fúngicos (GEMEDA et al., 2014).
As patologias ocasionadas por fungos no setor alimentício em sua maioria
advêm de micotoxinas do metabolismo fúngico, que podem causar processos
infecciosos quando ingeridas (BOMFIM et al., 2015). Estima-se que 250.000 mortes
na África foram causadas por hepatocarcinoma associadi à ingestão de aflatoxinas,
expressando o potencial patogênico das micotoxinas (GEMEDA et al., 2014). Isso
resulta na necessidade de uma constante busca por estratégias de controle da
disseminação fúngicas e da formação dos seus metabolitos tóxicos, como alternativa
aos tratamentos químicos (BOMFIM et al., 2015).
As estruturas fúngicas que conferem resistência são, em sua maioria,
advindas de fatores determinantes como à formação de biofilmes e a presença de
dimorfismo, em alguns gêneros como a Candida sp. Estes traços são predominantes
no surgimento das suas formas resistentes (BANU et al., 2018). Atualmente, a
patogenicidade da Candida sp. vem tendo destaque. Nota-se em esfera global o
crescimento da sua incidência desde os anos 80, em especial em pacientes
hospitalizados imunocomprometidos, onde a ocorrência de espécies mais
resistentes é maior e mais grave (AGGARWAL; KASHYAP, 2018). Leveduras do
gênero Candida têm como fator agravante a expressiva quantidade de espécies
(existem cerca de 200 espécies conhecidas), sendo 10% dessas potencialmente
patogênicas para humanos (GAUCH et al., 2018). Espécies de Candida emergentes
e multirresistentes, como a C. auris e a C. haemulonii, já foram descritas como

74
responsáveis por graves surtos em ambientes hospitalares (THEILL et al., 2018).
A exposição prolongada das espécies de Candida às classes de
medicamentos como os azóis acarreta uma grande probabilidade de aquisição de
resistência a esses medicamentos, como já documentado pela literatura (SEGAL et
al., 2015; MORIO et al., 2017). Drogas como o Fluconazol já não apresentam ação
contra espécies resistentes como a C. krusei, C. glabata, C. lipolytica dentre outras
espécies de Candida não albicans e algumas espécies emergentes como a Candida
auris (MORIO et al., 2017). Realidade essa, observada em isolados de C. glabata
recuperados de infecções onde foram documentadas resistência a Fluconazol em
33% dos isolados (POZZATTI et al., 2008).
Os processos infecciosos causados por Candida tiveram uma extensão
significativa nos últimos anos tornando-se uma das infecções de maior incidência em
pacientes submetidos a tratamentos medicamentosos de amplo espectro e
imunologicamente comprometidos (SOARES et al., 2015). Tal fato se deve à
capacidade mutagênica do gênero Candida, alterando a taxonomia do gênero,
ocorrendo que onde outrora havia um predomínio da Candida albicans são
observadas uma progressiva substituição por Candida “não albicans”: espécies
resistentes (MUCCI et al., 2017). Com o surgimento de Candidas “não albicans”
como a Candida glabrata e C. krusei, o acometimento de graves infecções fúngicas
está cada vez mais frequente em pacientes imunocomprometidos (SHARIFZADEH
et al., 2017).
A Candida glabrata já é a segunda maior responsável por infecção na
América do Norte, e com esse parâmetro se equivalendo rapidamente em esfera
global, traz o caráter de urgência na elaboração de novas terapias medicamentosas
(CEN et al., 2017). Essa realidade corresponde em grande parte pela eficácia
decrescente dos fungicidas sintéticos, determinando desta maneira uma grande
necessidade de elaboração de novos fármacos (SOYLU; KURT; SOYLU, 2010). Tais
dados chamam atenção para as patologias causadas fungos, onde eles devem ser
inseridos em um dos principais problemas de saúde pública (GEMEDA et al., 2014).
Fatores que vão desde a baixa oferta de antifúngicos ao aumento da
ineficácia dos fármacos existentes provoca a busca por soluções terapêuticas
alternativas contra esses microrganismos patológicos, voltando-se os olhos para
fitoterapia (KHOSRAVI et al., 2013). A análise química de extratos vegetais fornece
informações que podem explicar as atividades farmacológicas e os componentes

75
bioativos das ervas, assim como sua eficácia. Componentes como ácidos fenólicos e
flavonoides encontrados em alguns extratos já são conhecidos por possuir
atividades antimicrobianas (MÉABED et al., 2018).
Tem-se uma tendência mundial de conscientização biomédica, ressaltando a
importância e a aplicabilidade de compostos antifúngicos advindos de plantas
(SHARIFZADEH et al., 2017). Órgãos como a OMS (Organização Mundial de
Saúde) vêm estimulando a busca pela cultura medicamentosa expressa por
conhecimentos populares, que em sua maioria é advindo de plantas locais, para
obtenção de dados, visando a elaboração de novos fármacos (RICARDO et al.,
2017). A disposição de plantas medicinais tradicionais representa um valiosíssimo
reservatório de substâncias farmacologicamente ativas e possíveis drogas
(KHOSRAVI; SHOKRI; FAHIMIRAD, 2016). As plantas têm despontado na última
década como alternativa promissora no desenvolvimento de antimicrobianos,
intensificando o interesse nos seus extratos (LEE et al., 2007).
A medicina tradicional já possui plantas em um patamar de referência quanto
a sua utilização com finalidades médicas (GUPTA; MUHURY; GANJEWALA, 2016).
A aplicação da medicina herbal se tornou o foco na busca por uma abordagem que
não tenha como consequência as atuais complicações advindas do uso dos atuais
fármacos (ABDEL-WAHAB; ABDEL-RAZIK; AZIZ, 2017). Sabe-se que as plantas
com potenciais farmacológicos comprovados se fazem presente em mais de 9000
exemplares, das quais aproximadamente 1500 espécies reconhecidas por sua
representatividade de sabor e aroma (SWAMY; AKHTAR; SINNIAH, 2016).
Plantas como a erva doce (Foeniculum vulgare), planta nativa do
mediterrâneo pertencente à familia dos umbiferos, está muito associada às práticas
medicamentosa na cultura popular, onde são ultilizados raízes, brotos jovens, folhas,
sementes e vapores (BARROS et al., 2009). A Erva doce é uma das plantas de
maior utilidade na prática medicamentosa alternativa, devido seu amplo espectro de
componentes bioativos, o que possibilita sua vasta aplicabilidade farmacológica
(SYED et al., 2018). A utilização medicamentosa da F. vulgare abrange problemas
do sistema digestivo, litíase renal, bronquite, tosse crônica, além de ser altamente
recomentada para diabetes, considerada também um excelente diurético (BARROS;
CARVALHO; FERREIRA, 2010). Fatores como análises químicas de extratos de
ervas expressam o potencial terapêutico de ervas como a Erva doce, tendo sido
observados ácidos fenólicos e flavonoides, que são compostos reconhecidos pelo

76
seu potencial medicamentoso (MÉABED et al., 2018).
O F. vulgare está entre as plantas mais utilizadas como fármaco alternativo no
mundo, isso muito se deve ao seu amplo leque de bioatividade. No Equador é
utilizada como tratamento alternativo de patologias como câncer (SYED et al., 2018).
A Erva-doce faz parte da medicina tradicional por suas propriedades antioxidantes e
anti-inflamatórias, suas características farmacológicas propiciaram estudos como
seu auxílio na diminuição da foto envelhecimento causado pelos raios UVB (SUN et
al., 2016). Com a utilização da medicina herbal cada vez mais recorrente, as plantas
aromáticas são uma alternativa as práticas medicamentosas, na busca de se evitar
os efeitos colaterais dos medicamentos e de diminuir os gastos com fármacos.
(ABDEL-WAHAB; ABDEL-RAZIK; AZIZ, 2017).
Outras plantas como a Canela (Cinnamomum cassia) têm suas atividades
biológicas relacionadas ao tratamento de enfermidades como: cólicas, dispepsia,
diarreia entre outros (SEO et al., 2014). A Canela é uma planta nativa do Sri Lanka,
que pode chegar a uma altura entre 10 e 20 metros, utilizada popularmente para
finalidades medicamentosas. Sua administração consiste na retirada da casca do
tronco das árvores, a qual é recolhida durante o ano todo (SEO et al., 2014). Comum
também no sul da China, onde seus galhos são usados no tratamento de processos
inflamatórios, dor, distúrbios menstruais, hipertensão, febre, entre outros, a C. cassia
já se faz presente há séculos em indústrias alimentícias e de cosméticos (SUN et al.,
2016).
Sendo também uma erva recorrente na dieta indiana, recentemente observou-
se nela um potencial antidiabético em resultados de testagens preliminares,
demonstrando mais uma vertente do seu potencial medicamentoso há dar-se
sequência (KAUR et al., 2018). Técnicas medicamentosas tradicionais como o
Ayurveda (técnica medicamentosa tradicional predominante na índia) também
relatam a eficácia da canela no tratamento da disfunção sexual (GOSWAMI et al.,
2013).
Apelidada de erva da recordação, o alecrim (Rosmarinus officinalis) é descrito
como um anti-aminésico, aplicação sugerida pela possível aplicação da nefelina
encontrada no alecrim, inserindo esse vegetal entre as plantas com potencial
farmacológico (KARIM et al., 2017). O alecrim é uma erva nativa do mediterrâneo e
da Ásia, notória por ser uma das ervas mais cultivadas no mundo, é muito utilizada
na extração de óleos, manteigas e vinagres (PEREIRA et al., 2017). Ela pertence à

77
família das Lamiaceae, com ampla utilização na medicina popular e na indústria
farmacêutica. Descrita na literatura com potenciais: anti-inflamatório, hepatoprotetor,
antibacteriano, antitrombótico, diurético, antidiabético, antinociceptivo, antineoplásica
(ZORAL et al., 2017). Além de possuir atividades antioxidantes, devido à presença
de compostos como o ácido carnósico e seus derivados, carnosol, cosmadial,
rosmanol, isômeros de rosmanol e carnosato de metilo (AMARAL et al., 2018).
As aplicações fitoterápicas das ervas aromáticas advindas de biomoléculas
secundárias a partir dos “óleos essenciais” é justificada pela variedade de atividades
bioativas dos seus compostos (WEI, 2013). O conhecimento das diversas atividades
terapêuticas das plantas aromáticas e seus óleos essenciais é sabido desde a
antiguidade, onde os processos de extração dos óleos eram aplicados em várias
partes das plantas incluindo caule, sementes entre outros (BADAWY;
ABDELGALEIL, 2014).
Os óleos essenciais (OEs) são sintetizados nas plantas em várias estruturas,
das quais posteriormente podem vir a ser extraídos. Podem ser citadas as folhas,
flores, sementes, frutos e raízes, dispondo-os como subprodutos de obtenção
variada (CASTRO et al., 2017 apud BAKKALI et al. 2008; TEXEIRA et al. 2013). Sua
composição contém substâncias como os terpenóides, resultantes da junção
complexa de monoterpenos cíclicos e acíclicos. Os OEs compõem uma mistura de
grande atividade biológica, a qual possibilita o desenvolvimento de atividades
terapêuticas, como antimicrobianas (WEI, 2013).
Sabendo-se que atividades como as antimicrobianas advindas dos óleos
essenciais se devem à diversidade de substâncias bioativas, os OEs podem ser
utilizados como fonte de estudos na busca por novas alternativas medicamentosas
(GANJEWALA et al., 2014). Os OEs detêm potenciais também para atuação no
combate às micotoxinas, além das outras tantas aplicações terapêuticas (SWAMY;
AKHTAR; SINNIAH, 2016).
Detendo um amplo leque de atuação antifúngica, os OEs de plantas
aromáticas mostram eficácia na sua utilização terapêutica frente a em gêneros como
a Candida sp. (BANU et al., 2018). Outros fatores inerentes aos OEs são seu alto
valor de comércio no mercado global, sabor único e fragrância, utilização na
aromaterapia, auxiliando no tratamento de patologias como doenças
cardiovasculares, diabetes, Alzheimer e câncer (SWAMY; AKHTAR; SINNIAH,
2016). Há também as aplicações terapêuticas dos óleos essenciais no controle e

78
inibição de patógenos em alimentos onde é amplamente aceito como terapia segura,
eficaz e sem efeitos colaterais (GANJEWALA et al., 2014). Os OEs também
possuem potencial antiparasitário, apresentando baixa citotoxicidade, o que contribui
de maneira enfática para sua utilização com fins medicamentosos (PEREIRA et al.,
2017).
Os OEs detêm uma série de características que os colocam como potenciais
terapêuticos contra diversas patologias. Em especial no tratamento de patologias
fúngicas, as quais já foram descritos bons resultados em espécies do gênero
Candida (BANU et al., 2018). Dessa maneira, o presente trabalho se propôs a
avaliar a atividade antimicrobiana de três extratos vegetais (erva doce, canela e
alecrim) frente a isolados do gênero Candida que apresentam interesse clínico.
Nesse sentido o objetivo deste capítulo foi avaliar a atividade antimicrobiana dos
óleos essenciais de erva doce (Foeniculum vulgare), canela (Cinnamomum cassia) e
alecrim (Rosmarinus officinalis), frente a espécies de Candida sp. de importância
clínica.

2 MATERIAIS E MÉTODOS
2.1 OBTENÇÃO DOS ÓLEOS ESSENCIAIS
Os óleos essenciais de erva doce (Foeniculum vulgare), canela
(Cinnamomum cassia) e alecrim (Rosmarinus officinalis) foram obtidos
comercialmente, a partir das folhas desses vegetais, na concentração de 100%, em
mercado público da cidade de Recife, Pernambuco, sendo estocados à temperatura
ambiente e ao abrigo da luz, até o momento do uso.
2.2 OBTENÇÃO DAS LINHAGENS DE CANDIDA
As linhagens de Candida utilizadas foram gentilmente cedidas pelo
Departamento de Antibióticos, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). As
espécies selecionadas foram as que apresentaram relevância clínica, como: C.
albicans, C. glabrata, C. parakrusei, C. krusei, C. lypolyticae C. lusitanea. Todas as
leveduras foram mantidas em Caldo Sabouraud-Dextrose (DIFICO®, Detroit,
Michigan, EUA), a 4 °C.
2.3 PREPARO DO INÓCULO
As cepas foram reativadas em Caldo Sabouraud-Dextrose (DIFICO®, Detroit,
Michigan, EUA), a 37°C por 24 horas. As suspensões fúngicas foram preparadas
diluindo os inóculos em solução salina estéril (salina a 0,85%) e a suspensão
79
resultante foi homogeneizada em agitador de vórtex durante 15 segundos, até que
fosse obtida turvação equivalente a uma solução padrão da escala de McFarland 0,5
onde a suspensão-padrão de leveduras continha aproximadamente 1,5 x 10 6
UFC/mL (NCCLS, 2002).
2.4 DETERMINAÇÃO DA CONCENTRAÇÃO INIBITÓRIA MÍNIMA (CIM) DOS
ÓLEOS ESSENCIAIS
A concentração inibitória mínima (CIM) foi determinada de acordo com as
diretrizes do Instituto de Padrões Clínicos e Laboratoriais (Clinical and Laboratory
Standards Institute - CLSI), utilizando o método de microdiluição em caldo (Cockerill
et al., 2012). Utilizando-se microplacas de 96 poços, foram adicionados 100 µL de
meio de cultura a 100 µL dos óleos essenciais de erva doce (Foeniculum vulgare),
canela (Cinnamomum cassia) e alecrim (Rosmarinus officinalis) na concentração
inicial de 100%. A concentração na primeira linha foi de 50%. Após a primeira
diluição, 100 µL da primeira linha A da microplaca foram retirados e adicionados à
linha seguinte B, e esse procedimento foi repetido até a última linha H, deixando as
diluições seriadas nas concentrações de 25%, 12,5%, 6,25%, 3,12%, 1,56%, 0,78%
e 0,39%, respectivamente. Após as diluições, 40 µL da suspensão com as espécies
de Candida (1 x 106 UFC/mL) foram adicionadas às placas. As placas foram
incubadas a 37 °C por 24 horas. Os controles de crescimento positivos foram
inoculados da mesma forma, com o caldo sabouraud no local dos óleos essenciais.
O meio estéril acrescido do antifúngico miconazol foi utilizado como controle de
inibição do crescimento microbiano. A CIM foi definida como a menor concentração
capaz de inibir o crescimento microbiano.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dentre os três óleos essenciais testados, erva-doce (Foeniculum vulgare),
canela (Cinnamomum cassia) e alecrim (Rosmarinus officinalis), foi possível
observar atividade antimicrobiana dentre algumas espécies de Candida testadas. A
Tabela 1 descreve todos os resultados obtidos.

80
Tabela 1. Resumo dos dados obtidos dos percentuais das concentrações inibitórias mínimas dos
óleos essenciais testados em espécies do gênero Candida de interesse clínico.

Microrganismo Concentração inibitória mínima de cada óleo essencial (%)


Erva doce (F. vulgare) Canela (C. cassia) Alecrim (R. officinalis)
C. albicans 3,12 – 1,57
C. glabrata – – –
C. parakrusei 3,12 – 1,57
C. krusei – – –
C. lipolytica 50 – 50
C. lusitanea 1,57 – 1,57
Fonte: Os autores.

O óleo essencial de Erva doce (F. vulgare) obteve os respectivos resultados:


C. albicans e C. paraklusei foram inibidas com uma concentração inibitória mínima
(CIM) de 3,12% do óleo. Já a C. lusitanea apresentou um percentual mais baixo de
inibição, igual a 1,57%. C. lipolytica apresentou o maior percentual de inibição
(50%), enquanto nas espécies C. glabrata e C. krusei não houve inibição. O óleo
essencial de Canela (C. cassia) não mostrou ação inibitória em nenhuma espécie de
Candida testada nas concentrações apresentadas. O óleo essencial de Alecrim (R.
officinalis) apresentou os melhores resultados, tendo inibido o crescimento das
espécies C. albicans, C. parakrusei e C. lusitanea na concentração de 1,57%. Para a
C. lipolytica, o resultado foi semelhante quando utilizado o óleo da erva doce,
apresentando um percentual de inibição de 50%. As espécies C. glabrata e C. krusei
também não conseguiram ser inibidas pelas concentrações do óleo de alecrim
testadas no presente trabalho. Os resultados obtidos expressam em primeira
instância a ação inibitória dos óleos essenciais em fungos do gênero Candida. Dos
três óleos testados dois tiveram ação inibitória em 4 das 6 espécies de Candida
testadas, embora o percentual de inibição da C. lipolytica tenha sido pouco
expressivo nos óleos de Alecrim e Erva doce, eles tiveram um percentual inibitório
significativo nas espécies: C albicans, C. parakrusei e C. lusitanea.
O presente trabalho traz dados pertinentes onde foram possíveis observa
uma concordância com outros estudos, quanto à ação antifúngica dos óleos
essenciais em espécies de Candida. Elas foram relatadas em Gavanji et al. (2015), o
qual relatou a ação inibitória dos óleos essenciais de Z. multiflora Boiss e S.
hortensis expressando uma CIM de 34 mg/mL para C. albicans. Em 2008,
Maksimovic et al. também relataram ação inibitória do óleo de Thymus pannonicus
na espécie C. albicans, obtendo uma CIM de 50 mg/mL. Nossas aplicações dos

81
óleos essenciais de Erva doce (Foeniculum vulgare) e Alecrim (Rosmarinus
officinalis) também tiveram ação inibitoria na espécie Candida albicans obtendo
percentuais inibitórios de 3,125% e 1,563% respectivamente. Os outros resultados
dos óleos essenciais de Erva doce e Alecrim fomentaram dados inéditos e muito
positivos quanto à inibição das espécies: Candida parakrusei e Candida lusitanea,
expressando sua eficácia perante espécies não albicans. Demonstrando assim
potenciais opções terapêuticas. Dentro da necessidade de elaboração de novas
alternativas que possam atual de maneira mais eficaz no combate aos
microrganismos que se disseminam por todo o mundo, realidade essa já exposta em
2014, por Ganjewala et al., que afirmava que as doenças infecciosas já são
responsáveis por metade de todas as mortes nos países tropicais.
O maior destaque e a ação inibitória dos óleos de Erva doce e Alecrim nas
espécies “não albicans” com pecentuais bem expressivos, obtendo, desta forma,
valores interessantes para as espécies C. lusitanea e C. parakrusei, nos óleos de
Erva doce e Alecrim. Dados esses que fomentam a ação e a relevância desses
óleos em espécies de Candida “não albicans”, as quais ainda não há citação na
literatura pesquisada. A Concentração Inibitória Mínima (CIM), o efeito inibitório
sobre biofilmes, a biocompatibilidade, e a interação com outros microrganismos são
aspectos que devem ser considerados quando da perspectiva de novos estudos e
validação do uso clínico desses produtos naturais. Estudos futuros são necessários
para melhor investigação da atividade antifúngica dos óleos de Erva doce e Alecrim,
e assim comprovar sua eficácia.

4 CONCLUSÃO
Na busca por alternativas medicamentosas evidencia-se o potencial
farmacológico das ervas aromáticas presentes nos seus metabólitos secundários, os
óleos essenciais, reavivando assim, os estudos do seu potencial antifúngico pouco
pesquisado e suas possíveis aplicações farmacológicas em diferentes gêneros e
espécies fúngicas. O presente trabalho mostrou o potencial antimicrobiano dos óleos
de Erva doce e Alecrim frente a espécies do gênero Candida de interesse clínico,
em especial para os gêneros C. albicans, C. parakrusei e C. lusitanea. O óleo de
Canela não demonstrou nenhuma atividade antifúngica nas concentrações testadas.
Outros testes são necessários para confirmar a atividade contra gêneros de

82
Candida. Entretanto, o trabalho contribui com o desenvolvimento de novas
alternativas medicamentosas em comparação às drogas sintéticas existentes.

83
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88
CAPÍTULO 06

ATIVIDADE ANTIFÚNGICA DE LECTINAS SOBRE


LEVEDURAS PATOGÊNICAS: UMA REVISÃO

Leilane Marina Morais dos Santos


Doutoranda em Bioquímica e Fisiologia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Thiago Henrique Napoleão


Professor Associado da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: Muitas espécies de leveduras são componentes normais da microbiota


humana. Porém, em determinadas circunstâncias como enfraquecimento do sistema
imunológico, algumas espécies de Candida, Cryptococcus, e Trichosporon podem
causar doenças. A candidíase é a causa mais importante de micose oportunista em
todo o mundo e a principal causa de infecção nosocomial na corrente sanguínea. A
criptococose afeta humanos e diversos animais e, apesar do pulmão ser o local mais
comum de entrada do patógeno no corpo, a meningoencefalite é a manifestação
clínica mais comum dessa infecção. A tricosporonose é uma outra infecção
oportunista, com taxas de mortalidade de 42% a 90%, sendo relatada como a
segunda infecção mais comum por fungemia em pacientes com doenças
hematológicas malignas. A resistência a antifúngicos comerciais tem sido uma das
causas para o aumento da mortalidade causada por infecções fúngicas invasivas.
Nesse cenário, é crescente a busca por novos agentes antimicrobianos que possam
servir como alternativas. Lectinas (proteínas que se ligam a carboidratos) têm sido
descritas como agentes antimicrobianos por inibirem crescimento e germinação e
induzirem a morte de células fúngicas. Essas proteínas têm se mostrado como
importante alternativas para o combate de infecções causadas por leveduras, sendo
o maior número de estudos realizados frente a espécies do gênero Candida.
Atualmente, constitui um desafio para os pesquisadores a realização de mais
estudos visando a avaliação das atividades em modelos in vivo. A disseminação da
resistência a antifúngicos torna urgente o desenvolvimento de alternativas para uso
nas terapias contra infecções causadas por esses microrganismos.

ABSTRACT: Many yeast species are normal components of the human microbiota.
However, in certain circumstances such as weakened immune systems, some
species of Candida, Cryptococcus, and Trichosporon can cause diseases.
Candidiasis is the most important cause of opportunistic ringworm worldwide and the
main cause of nosocomial infection in the bloodstream. Cryptococcosis affects
humans and several animals and, although the lung is the most common site of entry
of the pathogen into the body, meningoencephalitis is the most common clinical
manifestation of this infection. Trichosporonosis is another opportunistic infection,

89
with mortality rates from 42% to 90%, being reported as the second most common
fungal infection in patients with malignant hematological diseases. Resistance to
commercial antifungals has been one of the causes for the increase in mortality
caused by invasive fungal infections. In this scenario, the search for new
antimicrobial agents that can serve as alternatives is growing. Lectins (proteins that
bind to carbohydrates) have been described as antimicrobial agents because they
can inhibit growth and germination and induce the death of fungal cells. These
proteins have been shown to be important alternatives to fight infections caused by
yeasts, with the largest number of studies carried out against species of the genus
Candida. Currently, it is a challenge for researchers to carry out more studies aimed
at evaluating activities using in vivo models. The spread of antifungal resistance
makes it urgent to develop alternatives for use in therapies against infections caused
by these microorganisms.

90
1. INTRODUÇÃO
Os fungos constituem um grupo de organismos que se caracterizam por
serem eucarióticos, saprófitos ou parasitários. São produtores de esporos e podem
se reproduzir de forma sexuada ou assexuada. A reprodução assexuada ocorre por
brotamento, fragmentação ou produção de esporos, enquanto a reprodução sexuada
ocorre através da meiose e da fusão, originando núcleos diploides e promovendo a
variação genética na população dos fungos (TAN; HSU, 2018). Tanto a quitina
quanto a quitosana são dois polissacarídeos que estão frequentemente incorporados
na estrutura da parede celular, ancorando outros componentes na superfície da
célula fúngica (BROWN et al., 2020).
Há duas principais formas nas quais os fungos podem se apresentar:
leveduras e bolores. Podem também se apresentar de forma dimórfica, ou seja,
variarem sua morfologia de acordo com fatores ambientais(CARMONA; LIMPER,
2018). As leveduras são unicelulares e se reproduzem por brotamento, enquanto os
bolores formam hifas multicelulares e podem crescer por extensão apical (TAN;
HSU, 2018).
As leveduras podem pertencer aos grupos dos ascomicetos (Saccharomyces
e Candida, por exemplo) ou basidiomicetos (por exemplo, Cryptococcus, Malassezia
e Trichosporon). Dentre 150.000 espécies de fungos estimadas, aproximadamente
10% são leveduras (GUARRO, 2012). Muitas espécies de leveduras são
componentes normais da microbiota humana. Algumas leveduras, porém, são
consideradas patógenos oportunistas porque podem causar doenças em
determinadas circunstâncias, como enfraquecimento do sistema imunológico.
Segundo Kameswaran e Raghunandhan (2009), de acordo com o local de
infecção, as micoses podem ser superficiais, cutâneas, subcutâneas ou sistêmicas
(profundas). O ônus causado pelas infecções invasivas por fungos em pacientes nos
sistemas de saúde é difícil de mensurar; entretanto, é bem reconhecido que este tipo
de infecção está associado a altas taxas de morbimortalidade e custos elevados de
assistência médica. Nas últimas décadas, foi observada uma maior prevalência
destas infecções devido ao crescente tamanho da população de indivíduos
imunocomprometidos, que inclui pessoas vivendo com o vírus da imunodeficiência
adquirida (HIV), receptores de transplante e pacientes com câncer (CASTANHEIRA
et al., 2017).
A resistência aos antifúngicos comerciais também tem sido uma das causas

91
para o aumento da mortalidade causada por infecções fúngicas invasivas. Essa
resistência pode ser primária (intrínseca) ou secundária (adquirida). A resistência
primária ocorre sem exposição prévia ao medicamento. A resistência secundária é
gerada após a exposição a um antifúngico e pode estar associada a uma expressão
gênica alterada (MAYR; LASS-FLÖRL, 2011).
Os fármacos utilizados atualmente também podem ter seu uso limitado devido
a sua toxicidade, como é o caso por exemplo, dos polienos (as formulações de
anfotericina B). Os polienos existentes estão disponíveis apenas por via intravenosa
(GUBBINS; HELDENBRAND, 2009). Seus efeitos adversos estão relacionados à
nefrotoxicidade, limitadora de dose, o que leva à busca contínua de alternativas
igualmente eficazes, mas menos tóxicas que poderiam ser administrado tanto por
via intravenosa quanto oral (LEWIS, 2011). Nesse cenário, é crescente a busca por
novos agentes antimicrobianos que possam servir como alternativas aos
antifúngicos atualmente disponíveis.

2. LEVEDURAS PATOGÊNICAS
Nesse tópico, apresentaremos informações sobre três gêneros de leveduras
para os quais tem sido descrita atividade antifúngica de lectinas.
2.1. Candida
A candidíase é uma infecção causada por fungos do gênero Candida, a qual
continua sendo a causa mais importante de micose oportunista em todo o mundo e a
principal causa de infecção nosocomial na corrente sanguínea (NUCCI et al., 2010).
As candidemias são infecções sistêmicas causadas por diferentes espécies de
Candida, que são responsáveis por 80% dos casos de infecções nosocomiais
causadas por fungos. Entretanto, nem todas as espécies desse gênero são
responsáveis por causar infecção em humanos. Leveduras do gênero Candida são
comensais e naturalmente fazem parte da microbiota na mucosa oral, trato
gastrointestinal e trato gênito-urinário. O gênero Candida inclui cerca de 150
espécies, sendo mais de 17 espécies conhecidas por serem agentes etiológicos de
infecção humana; no entanto, mais de 90% das infecções invasivas são causadas
por Candida albicans, Candida glabrata, Candida parapsilosis, Candida tropicalis
e Candida krusei (MORIS et al., 2008; SARDI et al., 2013).
A parede celular de Candida é composta em sua região externa por
glicoproteínas altamente manosiladas (GOW et al., 2017). C. albicans é um

92
comensal e um patógeno que pode exibir morfologia de leveduras, hifas ou pseudo-
hifas. Estas transições morfológicas promovem colonização e invasão em diferentes
locais anatômicos e também ocorrem em outras espécies de Candida. A forma de
levedura está associada à disseminação e a forma hifal à adesão, invasão tecidual e
atividade proteolítica (ACHKA; FRIES, 2010). A capacidade de produzir hifas
verdadeiras é uma relevante característica em termos de epidemiologia e virulência,
encontrada em C. albicans, Candida dubliniensis e C. tropicalis (ZUZA-ALVES,
2017).
Candida pode crescer associada a superfícies, incorporadas em uma matriz
extracelular composta de carboidratos e proteínas, que se caracteriza como biofilme.
Os biofilmes se formam rapidamente em superfícies, como cateteres e dispositivos
intrauterinos, tornando-se resistentes a agentes antifúngicos, especialmente azóis.
Biofilmes também podem se formar nas superfícies mucosas e promover a
persistência de infecção por fungos (ACHKA; FRIES, 2010). C. albicans apresenta
uma capacidade de infectar variados nichos no hospedeiro, característica que se
deve a uma ampla gama de fatores de virulência. Dentre eles se inclui as transições
morfológicas já mencionadas, a formação de biofilmes, a expressão de adesinas e
invasinas, trigmotropismo, troca fenotípica e secreção de enzimas hidrolíticas
(MAYER et al., 2013).
Em uma pesquisa realizada em um hospital terciário brasileiro, foi avaliada a
incidência de espécies de Candida, sendo observado que a espécie de Candida
não-albicans mais incidente foi C. glabrata (37,62%), geralmente considerada uma
espécie de baixa virulência, mas com uma taxa de mortalidade mais alta que C.
albicans. C. parapsilosis (25,74%) e C. tropicalis (16,86%) foram a segunda e
terceira espécies mais comumente isoladas (SAVASTANO et al., 2016). C. tropicalis
é particularmente relevante nas infecções do trato urinário, enquanto C. parapsilosis
é frequentemente encontrada como agente causador de infecções relacionadas a
cateteres (CAVALHEIRO, 2018).
Azóis e equinocandinas são drogas antifúngicas usadas globalmente para
tratar infecções por Candida (PRISTOV; GHANNOUM, 2019). As equinocandinas
têm seu sítio de ação na enzima glucana sintase, responsável pela biossíntese de
polímeros da parede celular (PERLIN, 2015). Antifúngicos azólicos (como o
fluconazol) atuam inibindo a síntese de ergosterol e são mais frequentemente
utilizados para o tratamento, pois são baratos, exibem toxicidade limitada e

93
disponíveis para administração oral (WHALEY, 2017). A resistência de Candida a
esses antifúngicos tem aumentado (PRISTOV; GHANNOUM, 2019) e será abordada
em mais detalhes no tópico 3.
2.2 Cryptococcus
Cryptococcus é um gênero de fungos basidiomicetos com mais de 30
espécies amplamente distribuídas. São leveduras com cápsulas polissacarídicas,
sapróbias no ambiente, sendo isoladas principalmente de excreta de aves e vegetais
em decomposição (PESSOA et al., 2012; MAZIARZ; PERFECT, 2016). São
causadores da criptococose, uma importante infecção fúngica que afeta humanos e
diversos animais, tais como mamíferos, pássaros, répteis e invertebrados. A
meningite criptococócica causa 15% das mortes relacionadas à AIDS em todo
mundo (RAJASINGHAM et al., 2017).
Duas espécies são comumente conhecidas por causarem doenças em seres
humanos: Cryptococcus neoformans e Cryptococcus gattii. Historicamente, o gênero
foi classificado em 3 variedades, 5 sorotipos (baseados em diferenças estruturais na
cápsula de polissacarídeo) e 8 subtipos moleculares (MAZIARZ; PERFECT, 2016).
C. neoformans dos sorotipos A e D infectam principalmente hospedeiros
imunocomprometidos. Entretanto, C. gattii infecta tanto imunocomprometidos quanto
imunocompetentes. Os sorotipos A, D e AD são geralmente encontrados em todo o
mundo, enquanto o C. gatti é encontrado principalmente em regiões tropicais e
subtropicais. As infecções do sorotipo tipo D são mais encontradas na Europa
Ocidental (JONES et al., 2017). Entretanto, há relatos de prevalescência de
Cryptoccocus até mesmo em regiões subpolares (BUZZINI et al., 2017).
A parede celular de patógenos do gênero Cryptococcus é composta por uma
camada rica em quitina próxima à membrana, cercada por uma rede de
polissacarídeos compostas por β-1,3- e β-1,6-glucanas, xilomananas e
galactomananas (JONES et al., 2017). A cápsula polissacarídica de Cryptococcus é
um dos mais importantes fatores de virulência, sendo formada por repetições de dois
polissacarídeos, glucuronoxilomanano e glucuronoxilomanogalactano e pode incluir
manoproteínas, ácido hialurônico e ácido siálico (CASADEVALL et al., 2019). Outros
atributos de virulência bem caracterizados são a capacidade de crescer na
temperatura corporal dos mamíferos e a produção de melanina, urease e fosfolipase
B (ESHER et al., 2018). A melanina desempenha um importante papel protetor papel
contra o estresse ambiental (EISENMAN; CASADEVALL, 2011). Já a função da

94
urease, bem como da fosfolipase B, está associada à desestabilização de
membranas, lise celular, liberação de segundos mensageiros lipídicos (COX et al.,
2001) e disseminação de fungos do pulmão para o cérebro (SHI et al., 2010).
A infecção por Cryptococcus ocorre através da inalação da levedura, sendo o
pulmão o principal local da infecção. Apesar do pulmão ser o local comum de
entrada do patógeno no corpo, a meningoencefalite é a manifestação clínica mais
comum de infecção. As características clínicas da meningite criptococócica
geralmente se manifestam em 1 a 2 semanas e incluem febre, mal-estar, cefaleia,
rigidez da nuca, fotofobia, náuseas e vômitos (MADA et al., 2020). A anfotericina B
tem sido a base do tratamento da meningite criptococócica. O uso de um regime à
base de polieno foi associado à redução significativa da carga de levedura no
sistema nervoso central e está correlacionado a uma melhor sobrevida (MOURAD;
PERFECT, 2018). A flucitosina tem seu efeito apenas sobre as células fúngicas, não
havendo ação nas células de mamíferos. Porém, seu uso não é recomendado como
monoterapia sendo utilizado normalmente com outro antifúngico como a anfotericina
B. Ainda, este medicamento depende fortemente da função renal de um indivíduo,
pois não sofre metabolismo no corpo e, em 24 h, 85 a 95% da flucitosina é
excretada na urina sem alterar sua forma original (PADDA; PARMAR, 2020). A
resistência de Cryptococcus a antifúngicos será abordada no tópico 3.
2.3. Trichosporon
Trichosporon spp. são organismos anamórficos basidiomicetos semelhantes a
leveduras, com capacidade de crescimento filamentoso, sendo, portanto, dimórficos
(MARINÉ et al., 2015). Sua distribuição geográfica é bem variada sendo
encontrados tanto em áreas tropicais quanto em áreas temperadas. Podem
colonizar seres humanos em diferentes regiões do corpo, incluindo o trato
gastrointestinal, cavidade oral, trato respiratório, pele e vagina. Recentemente,
baseado em múltiplas análises sequenciais de genes, a taxonomia de Trichosporon
foi reavaliada e novos gêneros foram propostos para os clados monofiléticos, que
incluem Trichosporon, Cutaneotrichosporon e Apiotrichum (ALMEIDA-JUNIOR et al.,
2017).
Cinquenta espécies de Trichosporon foram descritas em diferentes regiões do
globo, incluindo 16 espécies com relevância clínica (COLOMBO et al., 2011).
Trichosporon é considerado uma importante causa de vários tipos de infecções
incluindo piedra branca e onicomicose, podendo também causar infecções

95
profundas, associadas à mucosa (BENTUBO et al., 2014). Tricosporonose é o nome
atribuído à forma invasiva das doenças causadas por Trichosporonspp., sendo uma
infecção oportunista e com taxas de mortalidade de 42% a 90%, apesar da terapia
antifúngica. Foi relatada como a segunda infecção mais comum por fungemia,
excetuando-se aquelas causadas por Candida, em pacientes com doenças
hematológicas malignas (MICELI et al., 2011). Micoses emergentes também podem
ser causadas por Trichosporon, documentadas em pacientes com neoplasias
hematológicas ou outras condições associadas à imunossupressão (TAVERNA et
al., 2014).
O perfil de susceptibilidade de Trichosporon spp. é capaz de variar de acordo
com a espécie sendo importante para fins epidemiológicos, a fim de definir melhor a
associação clínica de espécies melhorando o tratamento antifúngico (TAVERNA et
al., 2014). Trichosporon asahii possui uma capacidade de invadir a pele e outros
tecidos que requer diversas características de virulência, que inclui a transição de
levedura para hifa, formação de biofilme, atividade de lipases e proteases e a
composição dinâmica da parede celular (DUARTE-OLIVEIRA et al., 2017).

3. RESISTÊNCIA A ANTIFÚNGICOS
A terapia antifúngica é um componente central no tratamento de pacientes
com micoses agudas e crônicas. Entretanto, devido ao número escasso de classes
de medicamentos antifúngicos, as opções de tratamento são restritas (COWEN et
al., 2015). Além disso, a resistência antifúngica está se tornando uma grande
preocupação, reduzindo as possibilidades de tratamento, principalmente no contexto
da necessidade de assistência a pacientes de alto risco com micoses invasivas
(WIEDERHOLD, 2017).
A resistência a medicamentos pode ser classificada como microbiológica ou
clínica. A resistência microbiológica é identificada através da determinação de
concentrações inibitórias mínimas (CIM) in vitro para um determinado antifúngico e
interpretação desse valor de acordo com os pontos de corte clínicos (MORIO et al.,
2017). Já a resistência clínica refere-se à persistência de uma infecção fúngica,
mesmo com o tratamento. Embora a resistência microbiológica possa contribuir para
o desenvolvimento da resistência clínica, outros fatores também podem estar
envolvidos, como função imunológica comprometida, doença subjacente,
biodisponibilidade reduzida do medicamento e aumento do metabolismo do

96
medicamento (SANGUINETTI et al., 2015). O aumento da resistência antifúngica
pode ser devido ao uso de terapias seletivas com doses inadequadas ou ao uso
frequente do mesmo medicamento na profilaxia de infecções fúngicas em humanos
e animais (KONTOYIANNIS, 2017).
Vários são os mecanismos de resistência de Candida contra azóis e variam
desde a ativação de bombas de efluxo capazes de promover a exocitose do
fármaco, bem como alteração ou diminuição da expressão de proteínas-alvo. Em
relação às equinocandinas, os mecanismos de resistência baseiam-se na ocorrência
de mutações pontuais adquiridas nos genes que codificam as glucana sintases,
levando a uma diminuição da sensibilidade ao fármaco (VIEIRA; NASCIMENTO,
2017).
Numa avaliação realizada por Bongomin et al. (2018) acerca da resistência de
Cryptococcus spp. em estudos de 1988 a maio de 2017, foi observada uma
prevalência média de resistência ao fluconazol de 12,1%. Também observou-se que
cepas de C. neoformans e C. gattii que apresentaram resistência a antifúngicos
apresentaram uma superexpressão de genes responsáveis pela bomba de efluxo. O
mecanismo de resistência de Cryptococcus a fluconazol ainda não foi totalmente
elucidado (ZAFAR et al., 2019).
Estudos afirmam que o tratamento antifúngico das doenças de pele
associadas a Malassezia não é clinicamente eficaz em até um terço dos pacientes
(SAMAREI et al., 2017). Leong et al. (2017) testaram a susceptibilidade de 52 cepas
de 13 espécies de Malassezia a 11 antifúngicos comumente utilizados. Os menores
valores de CIM foram encontrados para os azóis itraconazol, posaconazol e
voriconazol e todas foram resistentes a equinocandinas e griseofulvina. Algumas
espécies também apresentaram altos valores de CIM para cetoconazol, que é um
antifúngico tópico amplamente recomendado para infecções cutâneas por
Malassezia. O manejo terapêutico de infecções causadas por Trichosporon também
é desafiador, uma vez que espécies desse gênero exibem uma resistência intrínseca
às equinocandinas e uma baixa suscetibilidade aos polienos (ALMEIDA-JUNIOR;
HENNEQUIN, 2016). Além disso, as espécies de Trichosporon podem mostrar
suscetibilidade limitada à anfotericina B e fluconazol (SANTOS et al., 2016).

4. ATIVIDADE DE LECTINAS CONTRA LEVEDURAS


As lectinas são proteínas amplamente distribuídas na natureza que

97
apresentam pelo menos um domínio capaz de reconhecer e se ligar a carboidratos
ou glicoconjugados com alta especificidade e de forma reversível (DIAS et al., 2015).
Desempenham na natureza papeis nos fenômenos de reconhecimento biológico e
podem proteger plantas e animais contra patógenos (BUUL; BROUNS, 2014). As
lectinas estão envolvidas no reconhecimento entre células, proliferação celular,
migração celular, adesão à matriz extracelular e interações parasita-hospedeiro.
Têm sido relatadas diversos atividades biológicas das lectinas, tais como inseticida
(NAPOLEÃO et al., 2019), antimicrobiana (EL-ARABY et al., 2020), antiviral
(SUBRAMANIAM et al., 2020) e antitumoral (RAMOS et al., 2019).
A ação antimicrobiana das lectinas inclui bloqueio de invasão e infecção,
inibição de crescimento e germinação, regulação de adesão e migração de células
microbianas, e indução da morte da célula microbiana. A morte de células
microbianas por lectinas pode envolver a formação de poros, seguida por alterações
na permeabilidade celular, e também interações com os componentes da parede
celular, tais como a quitina (COELHO et al., 2018). A Tabela 1 apresenta lectinas
que apresentaram atividade antifúngica contra leveduras.
Silva et al. (2018) relataram que a lectina da sarcotesta de Punica granatum
(PgTeL) apresentou efeito inibitório sobre o crescimento de C. albicans e C. krusei,
com CIM de 25 e 12,5 µg/mL, respectivamente, e causou morte das células com
concentração mínima fungicida (CMF) de 50 e 12,5 µg/mL, respectivamente. Além
disso, o tratamento dessas leveduras com essa lectina resultou em diminuição do
conteúdo intracelular de ATP e induziu a peroxidação lipídica. PgTeL também foi
capaz de danificar a integridade da parede celular fúngica de ambas as espécies.
Uma lectina oriunda de folíololos de Calliandra surinamensis, denominada CasuL, foi
avaliada contra C. albicans, C. glabrata, C. krusei e C. parapsilosis. Essa lectina foi
ativa apenas contra C. krusei, apresentando valores de CIM e CMF de 125 e 250
µg/mL, respectivamente. CasuL promoveu alterações drásticas na morfologia dessa
levedura, com retração do conteúdo citoplasmático e ruptura celular (PROCÓPIO et
al., 2017). Silva et al. (2019) isolaram uma lectina de raízes de Portulaca elatior
(PeRoL), que apresentou atividade antifúngica contra C. albicans, C. parapsilosis, C.
krusei e C. tropicalis com CIM de 16 μg/mL.Recentemente, Santos et al. (2021)
descreveram os efeitos da lectina solúvel em água de sementes de Moringa oleifera
(WSMoL) no crescimento e sobrevivência de espécies de Candida. WSMoL inibiu o
crescimento de C. albicans, C. glabrata, C. krusei e C. parapsilosis com CMI de 20

98
µg/mL. Menor valor de CMF (20 µg/mL) foi detectado para C. glabrata e o mais alto
(80 µg/mL) para C. albicans e C. parapsilosis. Essa lectina induziu apoptose e
necrose nas células fúngicas e causou hiperpolarização da membrana mitocondrial.
Também foram avaliadas as atividades das lectinas DvioL, DRL e ConBr,
obtidas das sementes das plantas leguminosas Dioclea violacea, Dioclea rostrata e
Canavalia brasiliensis, frente a leveduras dos gêneros Candida e Trichosporon
isoladas de secreções vaginais. A lectina DRL mostrou atividade antifúngica contra
Candida guilliermondii (CIM: 128 μg/mL), Candida shehatae (CIM: 4 μg/mL) e
Candida membranaefaciens (CIM: 64 μg/mL). DvioL mostrou atividade antifúngica
em onze cepas do gênero Candida, com CMI variando de 8 a 256 μg/mL. A ConBr
apresentou atividade antifúngica contra oito isolados do gênero Candida, e
Trichosporon cutaneum CIM entre 2 e 256 μg/mL (GOMES et al., 2012).

Tabela 1. Lectinas com ação antifúngica sobre espécies de três gêneros de leveduras.
Gênero Lectinas
Nome Fonte
Candida ApuL Inflorescência de Alpinia purpurata
BVL Semente de Bauhinia variegata
C-25 Semente de Cicer arietinum
CasuL Folíololo de Calliandra surinamensis
CFAL Semente de Clitoria fairchildiana
ConBr Semente de Canavalia brasiliensis
ConBr II Semente de Canavalia brasiliensis
DdeL Semente de Dypsis decaryi
DRL Semente de Dioclea rostrata
DvioL Semente de Dioclea violacea
DVL Semente de Dioclea virgata
Helja Semente de Helianthus annuus
PeRoL Raiz de Portulaca elatior
PgTeL Sarcotesta de Punica granatum
SteLL Folha de Schinus terebinthifolia
WSMoL Semente de Moringa oleifera
---- Semente de Archidendron jiringa
---- Hemolinfa de Portunus pelagicus
Cryptococcus Citovirina Cianobactérias
WGA Gérmen de trigo
Trichosporon ConBr Semente de Canavalia brasiliensis

99
Klafke et al. (2013) estudaram a ação de seis diferentes lectinas oriundas de
plantas sobre oito espécies de leveduras. Essas lectinas foram extraídas de folhas
de Abelmoschus esculentus, sementes de Canavalia brasiliensis, Mucuna pruriens,
Clitoria fairchildiana, Dioclea virgata e Bauhinia variegata. Atividade inibitória foi
observada apenas para C. parapsilosis com CIM entre 0,97 a 125 µg/mL e CMF de
3,9 a 500 µg/mL.
Charungchitrak et al. (2010) avaliaram a atividade antimicrobiana da lectina
de sementes de Archidendron jiringa contra C. albicans obtendo uma CIM de 0,0567
mg/mL. Del Rio et al. (2019) avaliaram a ação da lectina de Helianthus annuus,
denominada Helja, contra C. albicans, explorando também sua capacidade de inibir
a produção de biofilme. Foi detectada uma redução de 82% na viabilidade celular e
de 80% na formação de biofilme. As inflorescências de Alpinia purpurata contêm
uma lectina (ApuL) que foi avaliada contra C. albicans e C. parapsilosis,
apresentando CIM de 200 e 400 μg/mL, respectivamente (FERREIRA et al., 2018).
Gomes et al. (2013) avaliaram a ação da lectina de folha de Schinus terebinthifolia
(SteLL) contra C. albicans encontrando uma CIM de 6,5 μg/mL e uma CMF de 26
μg/mL. Lectinas de sementes de Cicer arietinum (C-25) foram avaliadas contra C.
krusei, C. tropicalis e C. parapsilosis, apresentando valores de CIM entre 1,56 e 12,5
𝜇g/mL. Após 30 min de incubação com C-25, foi observada a ruptura da parede
celular e o vazamento citoplasmático (KUMAR et al., 2014). Torres et al. (2019)
avaliaram a atividade antimicrobiana de sementes de Dypsis decaryi, denominada
DdeL, contra Candida albicans, detectando uma CIM de 2,06 μg/mL.
Fonseca et al. (2013) avaliaram os efeitos do bloqueio do principal
componente capsular do Cryptococcus neoformans, o quitooligômero
glucuronoxilomanano, pela lectina de gérmen de trigo (WGA). O estudo sugeriu que
as células de leveduras tratadas com WGA tiveram um atraso de 3 a 5 dias na
promoção dos sintomas da criptococose, quando comparado ao controle. Também
observou-se que o tratamento com WGA foi associado com uma deficiência severa
na capacidade das células de levedura colonizarem o cérebro dos animais,
sugerindo que as estruturas bloqueadas pela WGA possam estar envolvidas na
disseminação desses fungos. Além disso, as determinações visuais e quantitativas
demonstraram que WGA causou uma clara inibição na formação da cápsula.
Lectinas extraídas de outros organismos diferentes de plantas também
apresentaram atividade antifúngica. Jayanthi et al. (2017) demonstraram a atividade

100
antibiofilme contra C. albicans de uma lectina purificada a partir da hemolinfa do
caranguejo nadador (Portunus pelagicus) revestida com nanopartículas de prata
metálica. Jones et al. (2017) avaliaram uma lectina extraída de cianobactérias
denominada citovirina, a qual se mostrou eficaz contra C. neoformans sorotipos A e
D (com valores de CMF de 1 mM para o sorotipo D e entre 50 e 20 mM para o
sorotipo A) e C. gattii (CMF de 500 nM). Também observou-se que para o sorotipo
D, a citovirina inibiu a liberação de polissacarídeos capsulares.

6. CONCLUSÃO
Lectinas têm se mostrado como importante alternativas para o combate de
infecções causadas por leveduras, sendo o maior número de estudos realizados
frente a espécies do gênero Candida. Atualmente, constitui um desafio para os
pesquisadores a realização de mais estudos visando a avaliação das atividades em
modelos in vivo. A disseminação da resistência a antifúngicos tem aumentado nas
últimas décadas o que torna mais urgente o desenvolvimento de alternativas para
uso nas terapias contra infecções causadas por esses microrganismos.

AGRADECIMENTOS
Leilane Santos agradece à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES - Código de Financiamento 001) pela concessão de bolsa de
Doutorado. Thiago Napoleão agradece ao Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão de bolsa de produtividade em
pesquisa (309701/2019-8).

101
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106
CAPÍTULO 07
ATIVIDADE ANTIFÚNGICA in vitro DE EXTRATOS E
INFUSÕES DE PLANTAS MEDICINAIS FRENTE À
DERMATÓFITOS

Marília Cleide Tenório Gomes


Bióloga pela Universidade de Pernambuco
Cirurgiã-Dentista pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade de Pernambuco – Instituto de Ciências Biológicas (ICB)
Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Odontologia
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Bruno Severo Gomes


Professor associado da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Micologia
Endereço: Av. Ciências da Vida - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: Os fungos queratinofílicos denominados dermatófitos são responsáveis


por promover infecções superficiais cutâneas. Os dermatófitos são agrupados em
três gêneros, Trichophyton, Microsporum e Epidermophyton. As espécies
antropofílicas, costumam causar infecções brandas e crônicas. A maioria dos fungos
é resistente aos diversos agentes antibacterianos conhecidos e existem poucos
antifúngicos específicos. O emprego desses antimicrobianos ainda é restrita pela
toxicidade. Esse problema clínico estimulou intensas pesquisas voltadas para o
desenvolvimento de agentes antimicrobianos alternativos. Assim, o uso de extratos
vegetais de relevante resposta antimicrobiana pode adquirir significado nos
tratamentos. O emprego das plantas pela medicina tem chamado a atenção de
pesquisadores, no sentido de ser um campo promissor para o tratamento alternativo
para fungos. O presente trabalho teve por objetivo avaliar a atividade antimicrobiana
dos extratos e infusões das plantas medicinais, Camomila (Matricaria recutita L.),
Erva-Doce (Pimpinella anisum L.), Hortelã (Mentha piperita L.) e Boldo-do-Chile
(Peumusboldus molina) frente aos dermatófitos dos gêneros Epidermophyton,
Microsporum e Trichophyton. A pesquisa foi realizada através da infusão aquosa e
as extrações alcoólicas etílicas e alcoólicas cereais dessas plantas. Os fungos
utilizados foram repicados em meios testes contendo os extratos onde foram
avaliados os crescimentos durante dez dias. Ao fim das análises foi comprovado o
potencial antimicrobiano de todas as espécies sendo destacada a Mentha piperita L.
e o Peumusboldus molina como os mais eficientes para a função fungistática frente
a dermatófitos.

PALAVRAS-CHAVE: dermatófitos, antimicrobiano, plantas medicinais.

ABSTRACT: The keratinophilic fungi called dermatophytes are responsible for


promoting superficial skin infections. Dermatophytes are classified into three genera,
Trichophyton, Microsporum and Epidermophyton. Anthropophilic species usually
cause mild and chronic infections. Most fungi are resistant to several known

107
antibacterial agents and there are few specific antifungals. The use of these
antimicrobials is still restricted by toxicity. This clinical problem has stimulated intense
research aimed at the development of alternative antimicrobial agents. Thus, the use
of plant extracts with a relevant antimicrobial response can acquire significance in
treatments. The use of plants by medicine has attracted the attention of researchers,
in the sense of being a promising field for the alternative treatment for fungi. This
study aimed to evaluate the antimicrobial activity of extracts and infusions of
medicinal plants, Chamomile (Matricaria recutita L.), Fennel (Pimpinella anisum L.),
Mint (Mentha piperita L.) and Boldo-do-Chile (Peumusboldus molina) against
dermatophytes of the genera Epidermophyton, Microsporum and Trichophyton. The
research was carried out through the aqueous infusion and the alcoholic and
alcoholic cereals extractions of these plants. The fungi used were grown in test
media containing the extracts where growth was evaluated for ten days. At the end of
the analyzes, the antimicrobial potential of all species was proven, with Mentha
piperita L. and Peumusboldus molina being highlighted as the most efficient for
fungistatic function against dermatophytes.

KEYWORDS: dermatophytes, antimicrobial, medicinal plants.

108
1. INTRODUÇÃO
Os fungos são organismos que possuem grande capacidade de adaptação ao
meio ambiente, sendo encontrados em vários ambientes. Alguns fazem parte da
microbiota do homem e de outros animais, mantendo o equilíbrio da mesma, quando
este equilíbrio é alterado, podem desencadear o surgimento de sintomas (CONANT
et al., 1971; RIPPON, 1990; LACAZ et al., 2002; DEVI; KAUL, 2015; TAKAHASHI et
al., 2017).
As dermatofitoses são infecções fúngicas superficiais de tecidos
queratinizados, causados por um grupo de fungos que recebem a denominação de
dermatófitos. São representantes desse grupo os gêneros Epidermophyton,
Microsporum e Trichophyton. Os dermatófitos tem distribuição universal, entretanto a
incidência das diferentes espécies e locais anatômicos da infecção pode ser
influenciada por fatores geográficos, socioeconômicos e ambientais (PERREIRO et
al., 1996; GUPTA et al., 1998; RUBIO et al., 1999; SILVA et al., 2018).
As plantas têm sido utilizadas há muito tempo para a manutenção da saúde, a
qual constitui uma importante fonte de informação para a obtenção de uma
variedade de drogas. O potencial das plantas como fonte de novas drogas ainda
oferece grande campo de investigação, uma pequena porcentagem já foram
analisadas e uma pequena fração avaliada quanto a sua atividade farmacológica o
que ainda necessitam da comprovação de sua eficácia e segurança (RATES, 2001;
COLVARD, 2005; LIMA et al., 2006; JAMES et al., 2007; OLIVEIRA et al., 2007).
Os extratos vegetais representam uma nova oportunidade para o
desenvolvimento de novas medicações com espectro antimicrobiano, tendo em vista
o grande aumento da resistência destes às drogas comumente utilizadas, onde por
muitas vezes são administradas indiscriminadamente, o que reforça a necessidade
da procura de novas alternativas terapêuticas.
Poucas são as pesquisas relacionadas à atividade antimicrobiana de
capítulos florais de camomila (Matricari arecutita L.), frutos de erva-doce (Pimpinella
anisum), folhas e ramos de hortelã (Mentha piperita L.) e folhas de boldo do Chile
(Peumusboldus molina) frente aos dermatófitos. Tendo em vista a importância em
saúde pública que as infecções causadas por dermatófitos vem assumindo, torna-se
valioso o encontro de novas alternativas para seu tratamento.

109
2. CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS DERMATÓFITOS
Dermatófitos são agentes infecciosos que frequentemente acometem o ser
humano e alguns animais não humanos e são fungos capazes de determinar
infecções de pele, pelos e unhas conhecidas popularmente como tinhas. Esses
fungos, em vida parasitária, utilizam a queratina da pele, dos pelos e das unhas
como substrato (PEIXOTO et al., 2010; BRONDANI et al., 2016; SAHHO;
MAHAJAN, 2016). Segundo Dalla Lana (2016), As dermatofitoses se encontra em
terceiro lugar na lista doenças dermatológicas mais frequentes em crianças e o
segundo mais frequentes em adultos. Em 1934, Emmons, baseado nos padrões
morfológicos dos esporos e estruturas especiais, simplificou o trabalho iniciado por
Sabouraud e dividiu os dermatófitos em três gêneros: Trichophyton, Microsporume
Epidermophyton, como atualmente é aceito (WEITZMAN; SUMMERBELL, 1995;
TAKAHASHI et al., 2011; VIDAL et al., 2017)
Os dermatófitos são facilmente cultivados em meios artificiais contendo fontes
de carbono e nitrogênio. A identificação pode ser feitapor critérios morfológicos,
provas fisiológicas, bioquímicas, imunológicas e moleculares (SOUZA, 1998; LACAZ
et al., 2002; ZAITZ, 2004; SIQUEIRA; FERREIRA; MAFFEI, 2006). O gênero
Trichophyton é composto por diversas espécies, dentre as quais destaca-se pela
frequência de isolamentoTrichophyton rubrum, que pode produzir praticamente
todos os quadros clínicos de dermatofitose, tendo como características principais à
tendência para cronicidade e a resistência aos tratamentos convencionais (LACAZ et
al., 2002; SEEBACHER; BOUCHARA; MIGNON, 2008;).
Existem muitas espécies de Microsporum envolvidas em processos
infecciosos em seres humano e animais não humanos na dependência de
características geográficas e do hospedeiro. Assim, encontramos: Microsporum
canis, M. gypseum, M. audouinii, M. ferrugineume M. nanum, como as espécies
mais frequentemente isoladas (FERNÁNDEZ-TORRES et al., 2005; GUPTA et al.,
2005). Prevalecendo as espécies, M. canis e M. gypseum (CARVALHÃES,1999;
SIDRIN; ROCHA, 2004; GARCÍA - AGUDO; ESPINOSA - RUIZ, 2018).
Quanto ao gênero Epidermophyton, a única espécie patogênica para seres
humanos é o Epidermophyton floccosum (SIDRIN; MOREIRA, 2004; SIQUEIRA et
al., 2006). Nos últimos anos, a literatura vem divulgando amplamente o aumento das
infecções fúngicas, sendo as dermatofitoses uma das principais infecções

110
responsáveis por esse aumento (CARVALHAES, 1999; GUPTA et al., 2006;
MERCER; STEWART, 2019). Estudos de dermatófitos no Brasil têm apontado as
espécies T. rubrum, M. gypseume T. mentagrophytes, respectivamente como as
espécies mais prevalentes de dermatófitos isolados. O M. gypseum contribui com
uma percentagem que varia de aproximadamente com 1-2% nas Regiões Sudeste e
Nordeste (SIDRIN; ROCHA, 2004; MORAIS et al., 2006). Existem poucos agentes
antifúngicos específicos e o emprego de muitos deles ainda é restrito pela relativa
toxicidade. As drogas antifúngicas exercem ações fungistáticas ou fungicidas, direta
ou indiretamente (COLOMBO et al., 1995; LACAZ; NEGRO, 1991; SEEBACHER;
BOUCHARA; MIGNON, 2008).

3. PLANTAS MEDICINAIS
O uso das plantas e preparações feitas a partir delas para tratar infecções é
uma prática antiga, utilizada por uma boa parte da população mundial,
principalmente em países em desenvolvimento, onde o alto custo dos medicamentos
industrializados, dificuldade na assistência médica e farmacêutica e a preferência
popular cada vez maior de produtos naturais, tem levado ao acréscimo na utilização
das plantas medicinais na terapêutica e na cosmetologia (PARENTE et al., 2009;
SOARES; FREIRE; SOUZA, 2015).
O emprego de plantas medicinais para recuperação e tratamento da saúde
vem evoluindo ao longo dos tempos. As plantas também produzem moléculas
orgânicas que estão envolvidas na proteção contra bactérias, vírus, fungos, insetos
e animais. Muitos desses compostos químicos são biologicamente ativos quando
isolados. Portanto, as plantas são fontes muito ricas de agentes químicos com
atividades farmacológicas e podem ser considerados medicamentos em potencial
(PAGE et al., 2004).
Testes antimicrobianos in vitro permitem a seleção de extratos brutos de
plantas com propriedades potenciais de usoem estudos químicos e farmacológicos
(PINTO et al., 2000). O uso de extratos vegetais e fitoquímicos de conhecida
atividade antimicrobiana podem adquirir significado nos tratamentos terapêuticos
(LOGUERCIO et al., 2005; GONÇALVES, 2017). A fitoterapia tem ressurgido como
uma opção medicamentosa bem aceita e acessível aos povos do Mundo, e no caso
do Brasil é adequada para as necessidades locais de centenas de municípios

111
brasileiros no atendimento primário à saúde (ELDIN; DUNFORD 2001; Rosa et al.,
2011).
3.1 ATIVIDADE ANTIMICROBIANA DAS PLANTAS MEDICINAIS
Diversos autores demonstraram atividades antimicrobianas encontradas nas
folhas de hortelã de Mentha piperita L., família Lamiaceae, (JANSSEN et al., 1987;
HAMMER et al., 1999; DORMAN et al., 2000; BENITEZ; SILVA; ALVARES, 2016;
GONÇALVES, 2017).
A Matricaria recutita L. (Camomila), tem sido usada há séculos, internamente
e externamente, mais notavelmente em sintomas gastrointestinais, inflamações orais
e de pele, dermatites, propriedades sedativas, antibacterianas e antifúngicas
(ALBUQUERQUE et al., 2010; KOTOWY et al., 2020).
A Pimpinella anisum L. conhecida como erva-doce ou anis, é popularmente
utilizada no combate a diversas enfermidades gastrointestinais, embora careçam de
amplos estudos, foram relatados a forte atividade antioxidante e notável ação
antibacteriana para bactérias Gram-positivas e Gram-negativas (GULÇIN et al.,
2003).
O óleo essencial de Peumusboldus molina apresentou atividade
antibacteriana sobre Escherichia coli, Neiseria gonorrhea, Pseudomonas
aeruginosa, Staphylococcus aureus e atividade antifúngica sobre Candida albicans,
Bacillus cereus, Fusarium oxysporum, Rhizopus nigricans, Aspergillus niger e
Trichophyton mentagrophytes. Estas atividades podem estar relacionadasaos
ésteres boldino, ascaridol presentes na sua composição química (GUERIN; REVEIL-
LERE,1984; Lima et al., 2006).
Diante do aumento de micro-organismos resistentes a antimicrobianos, torna-
se limitado o uso de muitos medicamentos no combate às infecções provocadas.
Observado esses agravantes, torna-se útil comprovar o emprego das plantas
medicinais com base nas experimentações científicas para promover com segurança
a utilização da grande reserva de princípiosativos que possuímos em nossa flora,
bem como o sucesso dos usos de fitoterápicos nas indústrias farmacológicas.

4 OBJETIVOS
4.1 GERAL

112
Avaliar a atividade antifúngica de infusões e extratos alcoólicos de plantas
medicinais na inibição do crescimento das espécies de dermatófitos.
4.2 ESPECÍFICOS
• Reativar as culturas de dermatófitos a serem testadas;
• Autenticar taxonomicamente as espécies de dermatófitos a serem testadas;
• Produzir as infusões e extratos vegetais das espécies de Camomila
(Matricaria recutita L.), Erva-Doce (Pimpinella anisumL.), Hortelã (Mentha
piperita L.) e Boldo-do-Chile (Peumusboldus molina).
• Analisar a atividade antimicrobiana in vitro dos extratos vegetais utilizando
álcool de cereais e álcool etílico de Camomila (Matricariarecutita L.), Erva-
Doce (Pimpinellaanisum L.), Hortelã (Menthapiperita L.) e Boldo-do-Chile
(Peumusboldus molina) frente aos dermatófitos Epidermophyton floccosum
(URM3182, URM3345, URM6209); Microsporum amazonicum URM2732,
Microsporum gypseum URM4964, Microsporum fulvum URM2740,
Trichophytonton surans URM4743, Trichophyton mentagrophytes URM5540,
Trichophyton rubrum URM5908.

5 MATERIAIS E MÉTODOS
5.1 CARACTERIZAÇÕES DAS AMOSTRAS DE DERMATÓFITOS
Foram testadas nove culturas dos fungos, sendo um total de três culturas do
gênero Trichophyton, três culturas do gênero Mycrosporume três culturas do gênero
Epidermophyton preservadas sob o óleo mineral (SHERF, 1943) estocadas na
Coleção de Culturas URM do Departamento de Micologia do Centro de Biociências
da Universidade Federal de Pernambuco.
Destacam-se as espécies: Epidermophyton floccosum (URM3182; URM3345,
URM6209); Microsporum amazonicum (URM2732); Microsporum gypseum,
(URM4964); Microsporum fulvum, (URM2740); Trichophyton tonsurans, (URM4743);
Trichophyton mentagrophytes, (URM5540); Trichophyton rubrum (URM5908), como
os organismos testes do experimento in vitro como mostra a Tabela 1.

113
Tabela 1. Gêneros e espécies de dermatófitos utilizados no experimento

ORIGEM GÊNERO ESPÉCIE Nº DA ANO DE


AMOSTRA ESTOCAGEM
T. tonsurans URM-4743 2004
Trichophyton T. mentagrophytes URM-5540 2007
T. rubrun URM-5908 2009
Micoteca - M. amazonicum URM-2732 1983
URM da Mycrosporum M. gypseum URM-4964 2005
Universidade M. fulvum URM-2740 1983
Federal de T. floccosum URM-3182 1990
Pernambuco Epidermophyton T. floccosum URM-3345 1993
(UFPE) T. floccosum URM-6209 2010
Fonte: Os autores

5.2. REATIVAÇÃO DOS DERMATÓFITOS


Os fragmentos das culturas utilizadas foram reativados quando transferidos
para caldo glicosado e mantidos a 28°C ± 2°C por 72 horas. Após crescimento, os
fungos foram inoculados em tubos de ensaio contendo o meio de ágar Sabouraud
onde foram verificadas sua viabilidade e pureza bem como realizada sua
confirmação taxonômica. Depois de purificados, os dermatófitos foram repicados em
placas de Petri contendo o meio ágar Sabouraud para facilitar os cortes para os
testes.
5.3 COMPOSIÇÃO E MODO DE PREPARO DO CALDO GLICOSADO
Glicose...............................20,0 g
Peptona de carne .............10,0 g
Extrato de carne..................3,0 g
Água de destilada................1,0 L
Tendo todos os componentes dissolvidos em 1 litro de água destilada, foi
distribuído 8 ml em cada tubo de ensaio para ser esterilizado a 120 ºC por 15
minutos em pH de 6,8 – 7,0.
5.4 CONFIRMAÇÃO TAXONÔMICA DOS DERMATÓFITOS
Para a confirmação taxonômica, foram observadas características
macroscópicas como coloração do anverso e reverso, morfologia (plana, elevada,
crateriforme, cerebriforme) e textura, características microscópicas e características
fisiológicas das colônias, segundo; ELEWSKI et al. (1992); FERREIRA (1996);
FISHER; COOK (2001); LACAZ et al. (2002); MIDGLEY et al. (1998); RIPPON et al.
(1990); ZAITZ et al. (1998).

114
5.5 PREPARAÇÃO DE INFUSÕES E EXTRATOS ALCOÓLICOS DE
Peumusboldus molina (Boldo-do-chile), Matricaria recutita L. (Camomila), Pimpinella
anisum L. (Erva-doce) e Mentha piperita L. (Hortelã).
Quatro plantas de espécies diferentes foram testadas quanto a atividade
antifúngica. As plantas utilizadas foram adquiridas em embalagens comerciais e
processadas industrialmente. Foram utilizados os capítulos florais de camomila
(Matricaria recutita L.), frutos de erva-doce (Pimpinella anisum L.), folhas e ramos de
hortelã (Mentha piperita L.) e folhas de boldo-do-Chile (Peumusboldus molina) como
mostra a Tabela 2.
Tabela 2. Plantas medicinais utilizadas para testar as atividades antifúngica
ORIGEM NOME CIENTÍFICO NOME POPULAR PARTES
UTILIZADAS
Peumusboldus Molina Boldo-do-Chile Folhas
Matricaria recutita L. Camomila Capítulos florais
Comércio Pimpinella anisum L. Erva-doce Frutos
local Mentha piperita L. Hortelã Folhas e ramos

Fonte: Os autores

O extrato aquoso a quente (infuso) foi obtido com 180mL de água destilada
em 25g da planta sob controle de temperatura a 50°C, para que não perdesse
nenhum princípio ativo da planta (SILVA et al., 1988). O infuso foi preparado
vertendo-se água fervente sobre o material botânico e fechando o recipiente em
seguida. Este ficou em repouso por quinze minutos, com posterior filtração
(SCHUCK et al., 2001).
Os extratos alcoólicos foram preparados pelo método de maceração. Foram
utilizados álcool de cereal e etílico, como soluções extratoras. Os extratos foram
preparados, individualmente, utilizando-se 200 mL das soluções extratoras em 25g
do pó da planta. A maceração ocorreu durante oito dias, sob agitação esporádica, e
armazenados em frasco de vidro de cor âmbar para evitar uma possível interferência
da luz, os frascos foram mantidos em temperatura ambiente aproximada de 25°C
(SIMÕES et al., 2001). As ervas foram esterilizadas inicialmente por raios UV,
seguindo para o preparo das infusões e extratos. Após o preparo, os conteúdos
foram filtrados em papel filtro Whatman n°1 e posteriormente foram esterilizados por
filtração em membrana de acetato de 0,45 μm de porosidade. Os extratos etanólicos

115
foram utilizados imediatamente após a preparação (SANTOS et al., 2010). Os
extratos foram adicionados ao meio de ágar Sabouraud fundente (aproximadamente
45ºC), numa proporção de 1/5. Logo após foram distribuídas nas placas de Petri.
5.6 PREPARAÇÃO DO INÓCULO
Das culturas de dermatófitos purificadas, mantidas em tubos de ensaio
contendo meio ágar Sabouraud, adicionado de 50mg/L de cloranfenicol, foram
retirados fragmentos que foram inoculados no centro das placas de Petri contendo
meio agar Sabouraud, adicionado de 50mg/L de cloranfenicol. As mesmas foram
mantidas à temperatura ambiente (28ºC ± 2ºC), por 15 dias.
Na repicagem foram utilizados discos com tamanho de 0,8 mm das culturas
de Trichophyton, Mycrosporume epidermophyton, que foram transferidos para o
centro de cada uma das placas componentes de cada tratamento, onde foram
observados por 10 dias. Placas com meio ágar Sabouraud tradicional e contendo as
soluções extratoras com os discos de culturas de dermatófitosforam utilizadas como
testemunhas (SANTOS et al., 2010). Os extratos que apresentaram boa atividade
antimicrobiana foram re-testados em tetraplicata e os diâmetros dos halos foram
expressos pela média dos resultados obtidos nas três repetições.
5.7 AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTIFÚNGICA DE INFUSÕES E
EXTRATOS ALCOÓLICOS DE Peumusboldus molina (BOLDO-DO-CHILE),
Matricaria recutitaL. (CAMOMILA), Pimpinella anisum L. (ERVA DOCE) e Mentha
piperita L (HORTELÃ).
As infusões e os extratos alcoólicos foram testados individualmente. Cada
placa, contendo o meio de cultura, a infusão ou o extrato alcoólico recebeu um disco
de 0,8 cm de diâmetro de ágar colonizado pelo fungo, que foi colocado no centro da
placa. As placas foram mantidas em temperatura ambiente, por 15 dias. Cada teste
foi realizado em triplicata. A avaliação consistiu de medições do diâmetro da colônia,
com auxílio de um paquímetro após o 15° dia. O efeito das infusões e dos extratos
alcoólicos sobre o crescimento dos fungos foi expresso, calculando-se o percentual
de inibição do crescimento radial da colônia, comparando com o controle (placa
contendo apenas o meio de cultura e o disco com micélio).

116
6 RESULTADOS
6.1 EFEITO “IN VITRO” DAS INFUSÕES DE Peumusboldus molina (BOLDO-
DO-CHILE), Matricaria recutita L. (Camomila), Pimpinella anisum L. (Erva doce) e
Mentha piperita (Hortelã) SOBRE DERMATÓFITOS (TABELAS 3 E 4).
6.2 EFEITO in vitro DOS EXTRATOS ALCOÓLICOS DE Peumusboldus
molina (BOLDO-DO-CHILE), Matricaria recutita L. (CAMOMILA), Pimpinella anisum
L. (ERVA DOCE) e Mentha piperita L. (HORTELÃ) SOBRE DERMATÓFITOS
(TABELAS 3 E 4).

Tabela 3. Avaliação do crescimento in vitro de dermatófitos submetidos a infusões e extratos


alcoólicos de Peumusboldus molina (Boldo-do-Chile) e Matricaria recutita (Camomila)
PLANTA EXTRATO
MEDICINAL DERMATÓFITO C AQUOSO EXTRATO ALCOÓLICO
(Cm)
ÁLCOOL DE ÁLCOOL
CEREAL (95%) ETÍLICO (95%)

T. rubrum (URM-5908) 2,1 1,3 0,8 0,9


T. tonsurans (URM-4743) 2,2 1,4 0,9 0,9
BOLDO-DO-
T. mentagrophytes (URM- 1,7 1,0 0,9 0,8
CHILE
5540)
E. floccosum (URM-3182) 1,9 1,3 0,8 0,8
E. floccosum (URM-3335) 2,1 1,1 0,9 0,9
E. floccosum (URM-6209) 1,4 1,4 0,9 0,8
M. amazonicum (URM- 3,3 3,1 3,0 2,9
2732)
M. gypseum (URM-4964) 4,5 1,8 0,9 0,8
M. fulvum (URM-2740) 3,4 1,2 0,9 0,8
T. rubrum (URM-5908) 2,1 1,7 0,8 0,8

T. tonsurans (URM-4743) 2,2 1,5 0,8 0,8


T. mentagrophytes (URM- 1,7 1,7 1,2 0,9
CAMOMILA 5540)
E. floccosum (URM-3182) 1,9 1,1 0,8 0,8
E. floccosum (URM-3335) 2,1 1,6 0,9 0,9
E. floccosum (URM-6209) 1,4 1,2 0,8 0,8
M. amazonicum (URM- 3,3 3,0 2,7 2,5
2732)
M. gypseum (URM-4964) 4,5 2,4 0,9 0,8
M. fulvum (URM-2740) 3,4 1,6 0,8 0,8

Obs.: Tamanho dos discos de cultura = 0,8 cm; C = Controle; Crescimento= 0,8(tamanho do disco) +
x (valor do crescimento). Fonte: Os autores.

117
Tabela 4. Avaliação do crescimento in vitro de dermatófitos submetidos a infusões e extratos
alcoólicos de Pimpinella anisum L. (Erva doce) e Mentha piperita (Hortelã)
PLANTA
MEDICINAL DERMATÓFITO C EXTRATO EXTRATO ALCOÓLICO (Cm)
(Cm) AQUOSO
(Cm)
ÁLCOOL DE ÁLCOOL
CEREAL ETÍLICO (95%)
(95%)

T. rubrum (URM-5908) 2,1 1,5 0,8 0,8


ERVA-DOCE T. tonsurans (URM-4743) 2,2 1,0 0,8 0,9
T. mentagrophytes (URM- 1,7 1,7 1,0 0,9
5540)
E. floccosum (URM-3182) 1,9 1,2 0,8 0,8
E. floccosum (URM-3335) 2,1 1,3 0,9 0,9
E. floccosum (URM-6209) 1,4 1,2 0,9 0,8
M. amazonicum (URM- 3,3 2,9 0,8 0,9
2732)
M. gypseum (URM-4964) 4,5 1,4 0,9 0,9
M. fulvum (URM-2740) 3,4 1,3 0,9 0,8
T. rubrum (URM-5908) 2,1 1,1 0,8 0,8

T. tonsurans (URM-4743) 2,2 1,0 0,9 0,8


T. mentagrophytes (URM- 1,7 1,0 1,0 0,9
HORTELÃ 5540)
E. floccosum (URM-3182) 1,9 1,0 0,8 0,8
E. floccosum (URM-3335) 2,1 0,9 0,8 0,8
E. floccosum (URM-6209) 1,4 0,9 0,8 0,8
M. amazonicum (URM- 3,3 1,2 0,9 0,9
2732)
M. gypseum (URM-4964) 4,5 1,0 0,8 0,8
M. fulvum (URM-2740) 3,4 1,1 0,8 0,8
Obs.: Tamanho dos discos de cultura = 0,8 cm; C = Controle
Fonte: Os autores.

Os dermatófitos foram os organismos testes da pesquisa, sendo comprovada


a sua vitalidade através dos testes controles, visto que em alguns testes não ocorreu
crescimento no tempo estabelecido.

7 DISCUSSÃO
O aumento prevalente de microrganismos super-resistentes e os diversos
efeitos colaterais de algumas drogas fortalece a necessidade de recorrermos a
terapias alternativas para o tratamento de infecções fúngicas (PEREIRA et al., 2006;

118
PHONGPAICHIT et al., 2005). As plantas têm demonstrado possuir um efeito
antimicrobiano potencial contra esses microrganismos, justificando o aparecimento
de inúmeras pesquisas, voltadas para o desenvolvimento de agentes microbianos
alternativos. Assim, a ampliação do conhecimento desse efeito antimicrobiano como
tratamento alternativo sobre esses organismos, poderá demonstrar ou ter, num curto
espaço de tempo, um importante significado clínico, justificando as pesquisas nessa
área (ANIBAL, 2007)
O trabalho proposto teve por objetivo a pesquisa de atividade antimicrobiana
de plantas medicinais populares. Ao analisar os dados, percebe-se que as infusões
dos extratos vegetais utilizando álcool etílico apresentaram o maior espectro de ação
inibitória contra micro-organismos no geral, mostrando assim a sua eficácia como
solução extratora de compostos antibacterianos produzidos por estes vegetais,
Deve-se destacar a eficiência dos extratos de Hortelã (MenthapiperitaL.), que
apresentaram sobre todos os gêneros de dermatófitos, a inibição de crescimento
satisfatória, como comprovada em outras pesquisas relacionadas, feitas o óleo
essencial da Menta piperita
Os meios de cultura contendo o extrato alcoólico de hortelã inibiu com eficácia
o maior número de espécies testadas. Os extratos de Boldo-do-Chile apresentaram
resultados positivos na inibição, confirmando os testes realizados por SOUSA et al.
(1991) e SILVA (1997).
Os meios de crescimento contendo a infusão de Camomila apresentaram
resultados menos inibitórios frente aos dermatófitos, mas, ainda sim, com uma
margem inibitória pequena. Como um resultado inovador, observou-se a função
inibitória, porém, não tão satisfatória da Erva-doce, sendo necessária a realização
de estudos futuros com outros micro-organismos.
De um modo geral os dados obtidos nessa pesquisa demonstraram que todos
os extratos tiveram efeitos sobre as culturasdos gêneros de dermatófitos, inibindo o
desenvolvimento dos fungos, não apresentando propriedades fungicidas nessas
concentrações, mas sendo considerados com propriedades fungistáticas. Desta
forma, fica evidente o potencial do uso destas plantas na pesquisa de novos agentes
antimicrobianos, e a sua utilização em medidas de controle de dermatofitoses, como
a inclusão desses extratos em sabonetes e outros produtos de higiene pessoal, para
aspersão em outros animais, pura ou em associação a outros antifúngicos e

119
antibacterianos. As futuras investigações com a utilização da metodologia
aprimorada nessa pesquisa pioneira, possibilitará novas pesquisas de interesse para
indústria farmacêutica.
O isolamento dos compostos bioativos, sua ação antimicrobiana, o
conhecimento de seu mecanismo de ação e dados futuros sobre a regulação dos
genes de resistência desses micro-organismos com relação a esses extratos,
poderão ampliar consideravelmente as informações sobre o real potencial
microbicida dos extratos vegetais (ANIBAL, 2007; MORAIS et al, 2016; TAKAHASHI
et al. 2017).
Assim, em um futuro breve a utilização dos extratos de plantas com
propriedades antimicrobianas conhecidas, poderão ter grande significado nos
tratamentos terapêuticos, tendo em vista a adesão massiva pela população menos
favorecida economicamente, redução dos gastos na saúde pública relacionada aos
possíveis efeitos colaterais desenvolvidos pelos compostos fungicidas comumente
utilizados e redução dos coeficientes de morbidade relacionada às dermatofitoses.

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
● Os dados obtidos nessa pesquisa mostraram o potencial antimicrobiano
dos extratos vegetais, apresentando atividade fungistática dos extratos frente a
esses dermatófitos.
● Foram observadas, atividades fungistáticasin vitro dos extratos vegetais
utilizando água, álcool de cereais e álcool etílico de Camomila (Matricariarecutita L.),
Erva-Doce (Pimpinellaanisum L.), Hortelã (Menthapiperita L.) e Boldo-do-Chile
(PeumusboldusMolina) frente aos dermatófitosEpidermophytonfloccosumURM3182;
URM3345; URM6209, MicrosporumamazonicumURM2732, MicrosporumgypseumU
RM4964, MicrosporumfulvumURM2740, TrichophytontonsuransURM4743,
TrichophytonmentagrophytesURM5540, TrichophytonrubrumURM5908,
● Os extratos que apresentaram maior efeito fungistático foram a
Menthapiperita L. e PeumusboldusMolina.
● A infusão de água da Matricariarecutita L., apresentou o menor poder
inibitório frente às espécies do gênero Microsporum e Trichophyton.
● Quanto ao gênero Trichophytonasespécies utilizadas no testeapresentaram
resistência à infusão de água de Matricariarecutita L. e Pimpinellaanisum L. Quanto

120
aos extratos alcoólicos, os de PeumusboldusMolinae o deMenthapiperitaL.
produziram maior inibição frente a esse gênero.
● Quanto a espécie Epidermophytonfloccosum, os extratos alcoólicos
apresentaram efeitos fungistáticos. Quanto às infusões em água a mais eficiente foi
a da Menthapiperita.
● Quanto ao gênero Microsporum, os representantes tiveram menor inibição
pelos extratos, dentre todas as espécies do gênero, a espécieM.
amazonicumURM2732, respondeu a inibição do extrato alcoólico da
Matricariarecutita L. e diferente dos outros gêneros, apresentou resistência ao
extrato de PeumusboldusMolina.

121
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126
CAPÍTULO 08
RELAÇÃO ESTRUTURA-ATIVIDADE DE ANTIFÚNGICOS
UTILIZADOS NA PRÁTICA CLÍNICA E INOVAÇÕES
TERAPÊUTICAS
Mylena Félix de Lira
Acadêmica de Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Artur de Sá, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Bruna Maria Tavares de Melo


Acadêmica de Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Artur de Sá, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Lucas Lima de Oliveira


Acadêmico de Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Artur de Sá, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Cleriston de Oliveira Bezerra


Acadêmico de Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Artur de Sá, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Felipe Neves Coutinho


Doutorando em Ciências Farmacêuticas pela Universidade Federal de Pernambuco -
UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Artur de Sá, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Marlene Saraiva de Araújo Neta


Doutora em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco -
UFPE
Doutora em Farmácia pela Université de Nantes (França)
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Artur de Sá, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil

127
E-mail: [email protected]

Antônio Rodolfo de Faria


Professor Associado
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Artur de Sá, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil
E-mail: [email protected]

RESUMO: Fungos são seres eucariontes que podem ser nocivos ou não para a
espécie humana. Milhares de espécies de fungos estão identificadas na pesquisa
científica. O conhecimento a respeito destes seres é de extrema importância para a
busca do tratamento ideal. A célula do fungo possui uma parede celular composta
principalmente de quitina e uma membrana celular que possui ergosterol, e são
responsáveis por infecções difíceis de serem tratadas. Os fármacos utilizados
atualmente para o tratamento das doenças causadas por fungos podem agir em
diferentes mecanismos na célula fúngica. Os antifúngicos são classificados em
grupos segundo sua estrutura química ou local de ação. A presença de cepas
resistentes às terapias correntes traz à tona a extrema importância ao uso racional
destes medicamentos bem como a descoberta de novas moléculas antifúngicas
otimizadas, ou seja, mais potentes e menos tóxicas às células humanas. A química
medicinal, fazendo uso do estudo da Relação Estrutura-Atividade (REA) de
fármacos existentes na terapêutica, possibilita a obtenção de novas moléculas
potencialmente antifúngicas. O objetivo deste capítulo é a discussão da Relação
Estrutura-Atividade (REA) das principais classes de antifúngicos utilizados na
terapêutica (análogos pirimidínicos, azóis, equinocandinas e polienos), enfatizando
suas estruturas químicas e modificações estruturais na atividade antifúngica.

PALAVRAS-CHAVE: Fungos, Antifúngicos, Relação estrutura / atividade

ABSTRACT: Fungi are eukaryotic beings that can be harmful or not to the human.
Thousands of species of fungi are identified in scientific research. Knowledge about
them is extremely important for the search for the ideal treatment. The fungal cell has
a cell wall composed mainly of kitine and a cell membrane that contains ergosterol,
and are responsible for infections that are difficult to treat. The drugs currently used
to treat diseases caused by fungi can act in different mechanisms in the fungal cell.
Antifungals are classified into groups according to their chemical structure or site of
action. The presence of resistant strains to current therapies brings up the extreme
importance of the rational use of these drugs as well as the discovery of new
optimized antifungal molecules, that is, more potent and less toxic to human cells.
Medicinal chemistry, through the Structure-Activity Relationship (SAR) of existing
drugs in therapy, makes it possible to obtain new antifungal molecules. The purpose
of this chapter is to discuss the Structure-Activity Relationship (SAR) of the main
classes of antifungals used in therapy (pyrimidine analogs, azoles, echinocandins
and polyenes), emphasizing their chemical structures and structural changes in
antifungal activity

KEYWORDS:Fungi, Antifungals, Structure / activity relationship

128
1. INTRODUÇÃO
Existem 1,5 a 5 milhões de espécies de fungos no planeta Terra, destas,
aproximadamente 400 espécies são capazes de causar doenças em animais e um
número ainda menor traz prejuízo à saúde humana (KOHLER et al., 2014;
BENNETT, 2012).Apesar de esses números em princípio trazerem um certo alívio,
uma vez que o número de patógenos não é tão grande quanto o número de
espécies, precisamos ter ciência da gravidade que as infecções fúngicas podem
acarretar, especialmente para pacientes cujo sistema imune está comprometido,
quer por alguma doença como a AIDS, quer pelo uso de medicamentos
imunossupressores (BENNETT, 2012).
Nos últimos cinco anos, as micoses representaram 23.842 internações
hospitalares e causaram 1.651 óbitos em território brasileiro até setembro de 2020
(DATASUS, 2020). Esses dados apontam a dificuldade de tratamento e, também, de
diagnóstico das micoses, evidenciando a alta morbidade e a mortalidade causada
por fungos, principalmente em pacientes enfermos e imunossuprimidos. Resistência
a medicamentos antifúngicos e diagnóstico tardio são fatores que dificultam o
tratamento de micoses (MATHEW; NATH, 2009).
Os fungos são organismos eucarióticos, diferente das bactérias, alvo de
estudo do primeiro volume do livro Fatores de virulência microbianos e terapias
emergentes, que são procarióticas. A parede celular dos fungos é composta
principalmente de quitina, um polissacarídeo, enquanto que nas bactérias é o
peptidoglicano, que compõe majoritariamente a parede celular. Outro polissacarídeo
importante de se destacar que também está presente na parede celular fúngica é o
β-glicano. Outra comparação importante de realizar, desta vez em relação às células
humanas, é a presença de ergosterol na membrana celular dos fungos, enquanto na
das células humanas está presente o colesterol (LEVINSON, 2014).
As características dos fungos apresentadas anteriormente são importantes
para compreensão da necessidade de antifúngicos: em geral, diante da diferença
entre os seres, os fungos são resistentes ao tratamento com antibacterianos, bem
como as bactérias são normalmente resistentes aos antifúngicos (KISGEN, 2016);
além disso, foi ressaltada a presença do ergosterol devido a seletividade dos
fármacos que atuam sobre os esteróides da membrana, de modo que as células
fúngicas são afetadas majoritariamente frente às humanas (LEVINSON, 2014).
As micoses, doenças infecciosas causadas por fungos, podem ser tratadas

129
com uma gama de medicamentos, umas vez que as características dos fungos são
úteis no direcionamento de fármacos quimioterápicos contra as micoses (KISGEN,
2016). Assim, os antifúngicos existentes estão distribuídos entre diversas classes,
de acordo com suas estruturas e mecanismos de ação. Na figura 1, podemos ver
alguns exemplos de antifúngicos e seus respectivos locais de ação.

Figura 1. Locais de ação de fármacos antifúngicos na célula fúngica

Fonte: Bennett, 2012

Assim, neste capítulo faremos a análise da relação estrutura-atividade de


alguns fármacos dentro das diversas classes de antifúngicos, trazendo ainda uma
explanação sobre o mecanismo de ação dos mesmos, e informações sobre algumas
inovações terapêuticas referentes ao tratamento de micoses.

2. ANÁLOGOS DA BASE NITROGENADA PIRIMIDINA – CITOSINA


2.1 FLUCITOSINA
Flucitosina, ou 5-fluorocitosina (5-FC), é um antifúngico análogo da base
pirimidínica citosina, de fácil absorção oral (figura 2). Foi primeiramente sintetizada
na década de 1950 na busca de novos fármacos antitumorais (DUSCHINSKY et al.,
1960). Posteriormente descobriu-se o potencial antifúngico da flucitosina, que hoje é
utilizada no tratamento de criptococose, em associação com a anfotericina B, e
devido ao seu amplo espectro de ação antifúngica, é utilizada também no tratamento
de candidíase disseminada grave (Candida sp), como por exemplo a endocardite e
outras infecções por leveduras e aspergilose grave invasiva (Aspergillus sp). Além
de combinada com anfotericina B, é utilizada também em associação com
antifúngicos azólicos no tratamento de meningite criptocócica (Cryptococcus sp) e
130
algumas outras micoses (VERMES, 2000; VANDEPUTTE et al., 2012).

Figura 2. Estruturas químicas da citosina, flucitosina e 5-fluorouracila

H H H
N O N O N O

N N N
F F H
NH2 NH2 O

Citosina Flucitosina (5-FC) 5-Fluorouracila (5-FU)

Fonte: Elaborado pelo autor.

O mecanismo de ação antifúngica da Flucitosina (5-FC) (figura 3) inicia com a


entrada do fármaco na célula fúngica através da ação da enzima citosina
permeasse. Em seguida, no citoplasma da célula fúngica, a Flucitosina é
metabolizada em 5-fluorouracila (5-FU), pela ação da enzima citosina desaminase. A
baixa toxicidade da Fluocitosina no organismo humano e mamíferos, se deve à
ausência ou baixa atividade desta enzima, quando comparada aos fungos. O 5-
fluorouracila (5-FU) é extensivamente incorporada em RNA fúngico e inibe a síntese
de DNA e RNA por dois caminhos:
(A) – A 5-fluorouracila (5-FU) é convertida, pela ação de fosforilases em
ácido 5-fluorouridílico mono, di e trifosfatos respectivamente (FUMP,
FUDP e FUTP) e são incorporados no RNA do fungo, resultando em um
RNA danificado que inibe o crescimento.
(B) – A 5-fluorouracila (5-FU) é convertida ao ácido 5-fluorodesoxiuridílico
monofosfato (FdUMP), um potente inibidor de timidilato sintetase e desta
forma evita a síntese de DNA, o que justifica o efeito fungicida.

131
Figura 3. Mecanismo de ação antifúngica da flucitosina
membrana

intra-celular incorporação em RNA


FUMP FUDP FUTP
inibição síntese proteica
A
citosina citosina
5-FC 5-FC 5-FU
permease desaminase

B
inibição da timidilato inibição de síntese
FdUMP
sintetase de DNA

Fonte: Adaptado de Vermes et al. (2000).

A fluocitosina (5-FC) apresenta alguma resistência preexistente ou emergente


a algumas cepas de espécies de candidas, por exemplo: C. albicans, C. tropicalis e
C. parapsilosis e está relacionada à má permeabilidade da fluocitosina na membrana
do fungo (citosina permeasse), metabolismo e à não incorporação de metabólitos do
fármaco no RNA do fungo (VANDEN BOSSCHE et al., 1994; VANDEN BOSSCHE,
1997; HOPE et al., 2004).

Figura 4. Estratégia de obtenção de híbridos potenciais antifúngicos fluconazol/flucitosina

Fonte: Adaptado de Fang et al. (2017).

Uma das estratégias em química medicinal (QM) no planejamento de


fármacos é a hibridização molecular, onde dois grupamentos ou estruturas, de
conhecida atividade biológica, são unidos em uma mesma estrutura química, para
averiguar o potencial biológico resultante, podendo ser sinérgicos, para diminuir

132
toxicidade ou mesmo para desenvolver atividade biológica distinta.Fang e
colaboradores sintetizaram híbridos contendo porção 5-flucitosina e fluconazol, dois
fármacos antifúngicos que apresentam mecanismos de ação antifúngica distintos
(FANG et al., 2017). A estratégia foi substituir o núcleo triazólico pela 5-fluorocitosina
(5-FC) na obtenção dos híbridos (figura 4)
De forma surpreendente, o derivado híbrido 7h (R = 3,4-diclorobenzila) inibiu
o crescimento de C. albicans ATCC 90023 e da cepa clínica resistente C. albicans
com valores de MIC de 0,008 e 0,02 mM (fluconazol e flucitosina utilizados como
referência), respectivamente. A molécula ativa 7h apresentou também
permeabilidade eficiente na membrana de C. albicans. O estudo de docking
molecular revelou que o híbrido 7h pode interagir com o sítio ativo do CACYP51
através da ligação de hidrogênio (mecanismo que apresenta o fluconazol).
Resultados preliminares sugerem que o derivado 7h poderia intercalar no DNA para
formar um complexo supramolecular estável, que poderia bloquear a replicação do
DNA para exercer a intensa atividade antifúngica.
Esses resultados demonstram que esses híbridos são bastante promissores
na terapêutica antifúngica, mostrando assim a versatilidade de estruturas
conhecidas na obtenção de híbridos potencialmente ativos.
2.2 AZÓIS
Duas grandes classes estão incluídas no grupo dos antifúngicos azólicos: os
imidazóis e os triazóis. Ambas as classes possuem o mesmo mecanismo de ação e
compartilham também do mesmo espectro antifúngico, sendo úteis por exemplo
contra Candida albicans, Coccidioides spp., fungos dermatófitos, entre outros. A
vantagem existente de uma classe para com a outra é que os triazóis sistêmicos
possuem uma metabolização mais lenta que os imidazóis, e, além disso, interferem
menos na síntese de esteróis humanos (BENNETT, 2012).
Ambas as classes de antifúngicos azólicos tem por mecanismo de ação a
inibição competitiva da esterol 14-α-desmetilase (CYP51), a enzima necessária para
catalisar o processo de remoção oxidativa da 14-α-metila, durante a biossíntese de
ergosterol (WU et al., 2018). O acúmulo de 14-α-metilesteroides promove
desestruturação da membrana, pois desfaz a organização compacta das cadeias
acilas dos fosfolipídeos; assim, o funcionamento de sistemas enzimáticos ligados à
membrana é comprometido, e o crescimento dos fungos é inibido (BENNETT, 2012).

133
2.2.1 CETOCONAZOL E ITRACONAZOL
Verificaremos neste tópico a relação estrutura-atividade de dois azóis: o
cetoconazol, um imidazol, e o itraconazol, um triazol.Os azóis exercem sua ação
interagindo com a enzima CYP51 através de quatro sítios existentes nesses
compostos, sendo os grupos presentes nos sítios S1, S2 e S3 os farmacóforos das
moléculas (SOUZA, 2018).
Em relação ao sítio S1, o átomo de nitrogênio, presente nos anéis imidazol e
triazol, atua complexando o ferro do grupo prostético heme, presente na enzima
alvo. No sítio S2, o oxigênio atua como aceptor de ligação de hidrogênio. Já os sítios
S3 e S4 apresentam estruturas que possibilitam a interação com a parte hidrofóbica
(figura 5) (JI et al., 2000; SOUZA, 2018).

Figura 5. Apresentação dos sítios presentes nos azóis (representados nesta imagem pelo miconazol)
e relação estrutura – atividade
Aceptor de ligação
de hidrogênio

S2 Cl
S1 N N O S4

Coordenação Cl
com o ferro do Cl
grupo heme

S3 Interações
Cl hidrofóbicas

Miconazol
Fonte: Elaborado pelo autor.

É comum encontrar diversos fármacos pertencentes a uma mesma classe.


Isso normalmente ocorre porque os primeiros fármacos vão sofrendo modificações,
visando assim o surgimento de congêneres que possuam melhor biodisponibilidade,
menor toxicidade, maior potência, entre outras otimizações. Veremos isso com um
exemplo comparativo entre o cetoconazol e o itraconazol (figura 6).

134
Figura 6. Comparativo entre as estruturas químicas do cetoconazol e do itraconazol

N
S2 S4
N
S1 O O

O O N N
CH3

Cl S3
Cl Cetoconazol

Aumento da
N cadeia lipofílica

Troca do N S2 H3C
anel imidazol O
N
para o triazol
S1 O
N
O N N N CH3
O N

Cl S3
Cl Itraconazol S4

Fonte: Elaborado pelo autor.

O cetoconazol é um imidazol que possui melhor biodisponibilidade, quando


comparado a um outro fármaco da mesma classe, o miconazol (SOUZA, 2018). Isso
ocorre devido à inserção do grupo fenilpiperazinetanona, no lugar do grupo
diclorofenila, em S4, aumentando assim a cadeia hidrofóbica da molécula. Este
fármaco foi o primeiro antifúngico a ser utilizado através da via oral, todavia, o anel
imidazólico presente, um dos farmacóforos da molécula, sofre degradação
metabólica, corroborando para um tempo de meia-vida curto (FRANÇA et al., 2014).
Diante disso, é importante fazer algumas considerações a respeito do itraconazol.
O uso do cetoconazol por via oral foi substituído pelo itraconazol devido às
vantagens desse último, exceto nos casos em que, por possuir menor preço, o uso
do cetoconazol se torna mais vantajoso (BENNETT, 2012). O itraconazol possui
melhor atividade, seletividade e biodisponibilidade quando comparado ao
cetoconazol. A mudança na estrutura química que possibilitou essas otimizações foi
a substituição do anel imidazólico pelo anel triazólico. Além disso, houve aumento na
lipofilia e melhora nas interações hidrofóbicas devido a inserção do grupo sec-
butilfeniltriazolona, no sítio S4, substituindo o grupo etanona (FRANÇA et al., 2014).
Tudo isso corroborou para o aumento do espectro antifúngico do itraconazol, em
comparação ao cetoconazol, e fez ainda com que o itraconazol não tivesse o efeito

135
de supressão de corticosteróide que o seu protótipo imidazólico possui (BENNETT,
2012).
2.2.2 Fluconazol

As modificações mais relevantes do Fluconazol incluem dois anéis triazólicos,


uma hidroxila e átomos de Flúor (figura 7). A inclusão de dois anéis triazólicos
idênticos foi feita para gerar um plano de simetria na estrutura, que elimina o centro
estereogênico e torna a síntese menos custosa, pois desta forma a molécula final
obtida é única e não há a formação de estereoisômeros, onde possivelmente
poderiam possuir grau de eficácia distinta, sendo necessário isolamento de apenas
um deles. A atividade farmacocinética e farmacodinâmica superior do fluconazol em
relação aos antifúngicos com anel imidazol, pode ser atribuída a três importantes
modificações em sua estrutura química: a substituição do anel imidazol por triazol, a
substituição no anel aromático de dois átomos de cloro por dois átomos de flúor, e a
substituição do grupo éter por álcool entre os triazóis e a fenila, minimizando um
possível impedimento estérico (FRANÇA et al., 2014).

Figura 7. Estrutura do fluconazol

Fonte: Elaborado pelo autor.

2.3 EQUINOCANDINAS
Equinocandinas correspondem a uma classe de lipopeptídeos modificados
sinteticamente derivados de produtos da fermentação de diversos fungos
(DENNING, 2002). São agentes usados como tratamento de primeira linha contra
infecções causadas por Candida e possuem, como mecanismo de ação, a inibição
não competitiva do complexo enzimático β-1,3-d-glucano sintase, presente na
parede estrutural fúngica. Como resultado, ocorre a inibição da síntese do β-1,3-d-

136
glucano, componente estrutural que compreende até 60% da parede celular de
Candida spp. A prevalência deste alvo em fungos, e não em mamíferos, é uma
característica que confere baixa toxicidade a essa classe (JAMES et al., 2016).
A estrutura química das equinocandinas compreende grandes lipopeptídeos
cíclicos, compostos de um núcleo hexapeptídeo anfifílico, com cadeia lateral de acil
lipídio ligada a um átomo de nitrogênio (KOFLA; RUHNKE, 2011), com sua estrutura
base representada na figura 8. A cadeia lateral das equinocandinas se intercalam
com a bicamada fosfolipídica da membrana celular dos fungos. A caspofungina
possui uma cadeia lateral de ácido graxo, a micafungina uma cadeia lateral
aromática complexa (isoxazol substituído por 3,5-difenilas) e a anidulafungina uma
cadeia lateral de alcoxitrifenila (terfenil) (DENNING, 2003).

Figura 8. Estrutura Base das Equinocandinas

Fonte: Elaborado pelo autor.

2.3.1 ANIDULAFUNGINA
Anidulafungina, representada na figura 9, é um derivado semissintético da
equinocandina B. Possui um núcleo lipopeptídeo composto por resíduos de
aminoácidos presentes na estrutura da equinocandina B com alcoxitrifenila (terfenil)
na sua cadeia lateral. Sua fórmula molecular é C₅₈H₇₃N₇O₁₇ e seu peso molecular é
1140,25 Da.
A lipofilicidade da anidulafungina é maior em comparação a caspofungina e
micafungina, devido a sua cadeia lateral com maior hidrofobicidade. No entanto, a
anidulafungina pode ser dissolvida em preparações manipuladas contendo água,
pois a presença de grupos hidroxila e amino conferem certa solubilidade da droga
em meio aquoso.

137
Sua atividade antifúngica é maior, quando comparada à equinocandina B. A
cadeia lateral de alcoxitrifenila é essencial para a intercalação do fármaco na parede
celular do fungo (PATIL et al., 2017; GHANNOUM et al., 2005).
A anidulafungina possui ampla atividade fungicida contra várias espécies de
Candida, inclusive contra cepas resistentes a outros antifúngicos (VASQUEZ, 2006).
Estudos in vitro com espécies de Candida obtiveram IC₅₀ que variaram de 0,03 a 1
mg/L (GIL-ALONSO et al., 2016). Da mesma maneira, anidulafungina apresentou
excelente atividade in vitro contra espécies de Aspergillus, com IC₅₀ para Aspergillus
fumigatus menor que 0,03 µg/mL (VASQUEZ, 2006).

Figura 9. Estrutura da Anidulafungina

Fonte: Elaborado pelo autor.

2.3.2 MICAFUNGINA
A Micafungina (Figura 10), de fórmula molecular C56H70N9NaO23S, trata-se
de um lipopeptídeo cíclico com coeficiente de partição (Log P) -1,5 e peso molecular
de 1292, 27 g/mol.

138
Figura 10. Estrutura da Micafungina

Fonte: Elaborado pelo autor.


Essa molécula carrega fortes semelhanças estruturais com a pneumocandina
A , só que com certas disparidades quanto aos grupamentos contidos em suas
0

cadeias laterais. Tais alterações consistem em uma sulfatação no anel aromático de


um resíduo de tirosina, a adição de uma amida primária e um anel de isoxazol 3,5-
difenil-substituído com um grupamento pentoxila como p-substituinte do aromático
mais distal da cadeia em relação ao resto da molécula. Essa última cadeia confere
significativa redução da atividade hemolítica associada à molécula da micafungina,
sem reduzir o poder de sua respectiva atividade antifúngica. Quanto à alta
solubilidade aquosa da micafungina, > 200 mg/mL, é possível atribuir boa parte
dessa propriedade ao resíduo de tirosina sulfatado (PATIL et al., 2017).
Esse fármaco possui atividade contra espécies de Candida e Aspergillus e,
assim como as demais equinocandinas, sua atividade fungicida resulta da ligação
não competitiva à subunidade Fks p da enzima β-(1,3)-D-glucano sintase, resultando
na defasagem da síntese do β-(1,3)-D-glucano e, respectivamente, no aparecimento
de uma parede celular relativamente mais frágil e permeável do fungo.
2.3.3 CASPOFUNGINA
A Caspofungina (Figura 11), de fórmula molecular C56H96N10O19 e peso
molecular de 1213.44 g/mol, é um semi-sintético análogo pertencente à família
equinocandina derivada da pneumocandina B 0 com excelente atividade para
espécies de fungos como Candida sp, por exemplo.

139
Figura 11. Estrutura da Caspofungina

Fonte: Elaborado pelo autor.

Essa molécula possui coeficiente de partição de -3,9 e é um composto


hidrossolúvel, sendo tal solubilidade em água um total de 28 g/mL, a qual é
aumentada pela presença do resíduo de 4-hidroxi-prolina e por sua substituição de
etilenodiamina. Sua cadeia lateral de dimetilmiristoila, reduz a suscetibilidade para
hemólise de hemácias e necessária para a intercalação da caspofungina na parede
celular do fungo. Já o núcleo da caspofungina, com sua constituição baseada na
pneumocandina B , supera a atividade hemolítica associada ao composto natural
0

que origina a caspofungina (PATIL et al., 2017). Quanto ao seu mecanismo de ação,
ocorre sua ligação não competitiva à subunidade Fks p da enzima β-(1,3)-D-glucano
sintase, bem como os demais compostos da mesma classe.
2.4 POLIENOS
Polienos são um grupo de antimicrobianos constituídos estruturalmente por
uma grande molécula ciclica. Possui em sua estrutura ligações simples e duplas
conjugadas, característica que nomeia o grupo, e um resíduo de carboidrato, a
micosamina. Os fármacos representantes são a nistatina, natamicina e anfotericina
B (AnB).
O mecanismo de ação deste grupo foi estudado baseado na AnB. Foi
verificado que a porção lipofílica da molécula de AnB interage com o ergosterol
contido na membrana fúngica criando canais (Figura 12). Essa modificação
estrutural altera a permeabilidade da membrana fazendo com que íons K+ passem
para o meio extracelular, levando à morte celular. A semelhança estrutural entre o
ergosterol e o colesterol pode explicar a presença dos efeitos colaterais deste grupo
(SOLOVIEVA; OLSUFYEVA; PREOBRAZHENSKAYA, 2011).

140
Figura 12. Estrutura do poro formado pelos polienos na membrana fúngica e estrutura química do
ergosterol e colesterol

Adaptado de (SOLOVIEVA; OLSUFYEVA; PREOBRAZHENSKAYA, 2011)

2.4.1 ANFOTERINCINA B (ANB)


A anfotericina B (AnB) (Figura 13) é um dos mais conhecidos e importantes
fármacos do grupo dos polienos, sendo descoberta em 1955 na Venezuela a partir
de culturas de Streptomyces nodosus. É um fármaco anfifílico e que possui baixa
solubilidade em água. Ela possui basicamente três formulações: Anfotericina B
Desoxicolato, que possui melhor solubilidade em água, a Anfotericina B Lipossomal
e a Anfotericina B complexo lipídico. Essas duas últimas formulações foram criadas
com o objetivo de melhorar a nefrotoxicidade e hematotoxicidade desse fármaco,
ocasionada pela alta interação com o HDL, que possui muitos receptores nos rins.
As novas formulações e modificações estruturais objetivam a diminuição dos efeitos
tóxicos e o aumento da potência antimicrobiana do fármaco (BANSHOYA et al.,
2020; FALCI; PASQUALOTTO, 2015).
A AnB possui um anel lactona de 38 membros, com um arranjo de hidroxilas e
uma porção micosamina. Várias modificações estruturais foram feitas em torno
dessa molécula e, foram percebidas mudanças na atividade e toxicidade. Por
exemplo, a protonação do átomo de nitrogênio do grupo micosamina é essencial
para a atividade biológica da AnB, por outro lado, quando o grupo carboxila (C16)
está carregado negativamente, não há efeito significativo. Derivados com
modificações estruturais nessas regiões apresentaram atividade semelhante a AnB
e menor toxicidade (OMELCHUK; TEVYASHOVA; SHCHEKOTIKHIN, 2018). A
presença de grupos neutros ou aminoderivados em C16 não interfere na atividade

141
da molécula. Alterações no grupo OH – (C3) levam a alterações na condutância do
canal transmembrana formado pela AnB.
Análises demonstraram que modificações do grupo OH de C2’ não tiveram
efeito sobre a atividade antimicrobiana da molécula e que a porção micosamina é de
extrema importância para a atividade do derivado de AnB. A funcionalização da
posição (C13), bem como da posição (C14), não levou a substancial melhora da
atividade antifúngica. A síntese de N-benzil derivados da AnB apresentaram
toxicidade três vezes menor que a do fármaco de origem (SOLOVIEVA;
OLSUFYEVA; PREOBRAZHENSKAYA, 2011).

Figura 13. Estrutura química da Anfotericina B

Fonte: Elaborado pelo autor.

2.4.2 NISTATINA
Nistatina (Nys) é um fungicida/fungistático de amplo espectro, mais utilizado
contra candidíases (NO-HEE et al., 2017). Foi o primeiro polienodescoberto, através
da observação do efeito fungicida da bactéria Streptomyces noursei por Elizabeth
Hazen, em 1994, tendo sua posterior extração e purificação realizada por Rachel
Brown em 1950. (AKAIKE; HARATA, 1994). Seu tratamento contra infecções
fúngicas é preferencialmente por via cutânea, mucocutânea e gastrointestinal, pois
sofre pouca absorção e alta toxicidade por via oral e tópica (VANDEPUTTE et al.,
2012). É um macrolídeopoliênico, caracterizado por uma região hidrofílica, com
grupos alinhados e externos ao anel, e o outro lado da molécula é hidrofóbico devido
ao sistema de ligações duplas conjugadas, além de conter uma porção micosamina,
ligada ao anel por ligação glicosídica. Sendo assim, a nistatina é uma molécula

142
anfipática capaz de atravessar poros aquosos e membranas lipídicas. (Figura 14)
(BOLARD, 1986). Ela difere da AnB pela mudança da hidroxila na porção hidrofílica
e a descontinuidade das ligações duplas conjugadas na porção hidrofóbica, devido a
uma saturação entre os carbonos (C28) e (C29), o que possibilita uma dobra na
estrutura, quebrando sua rigidez na região hidrofóbica (MȂNDRU et al., 2011). No
trabalho de Ostrosky-Zeichneret al. (2001), é verificado a presença de um isômero
estrutural da nistatina, gerado pela interconversão deste, quando aquela é inserida
em solvente orgânico ou numa matriz biológica com pH superior a 6 (Figura 14)
(OSTROSKY-ZEICHNER et al., 2001).

Figura 14. Estrutura química da nistatina (A) da nistatina isomérica (B).

Fonte: adaptado Ostrosky-zeichner et al. (2001).

Estudos quanto à uma melhor resposta farmacológica da nistatina vêm sendo


realizados, dentre eles a utilização de peptídeos sintéticos adjuvantes da nistatina
(LIMA et al, 2020), assim como a sua incorporação em nanopartículas de prata
(MONTEIRO et al, 2013) e óxido de bismuto (EL-BATAL et al, 2020), vem
apresentando uma melhor seletividade do fármaco, ou seja, maior atividade e menor
toxicidade. Outros estudos também apontam atividades antiparasitárias (JEHANGIR
I. et al., 2019) e promotora de regeneração neural (ROSELLÓ-BUSQUETS et al.,
2020), sendo um fármaco de grande interesse em novas pesquisas.

3 CONCLUSÃO
Os antifúngicos possuem estruturas químicas bastante variadas que são
responsáveis por diferentes mecanismos de atividade antifúngica: a) Interação
físico-química na membrana fúngica, tendo como exemplo a anfotericina B, onde

143
sua porção apolar interage com ergosterol da membrana, criando canais iônicos que
levam à morte da célula fúngica, b) Inibição enzimática na biossíntese de ergosterol,
desestruturando-se assim a membrana celular, como por exemplo os antifúngicos
azólicos, c) Inibição enzimática da síntese da parede celular fúngica, que impede o
crescimento do fungo, como por exemplo a caspofungina, d) Incorporação da
molécula do fármaco em ácidos nucleicos fúngicos, impedindo a síntese de DNA e
de proteínas fúngicas, tendo como por exemplo análogos de bases pirimidínicas,
como a 5-fluorocitosina. Muitas vezes, a seletividade para células fúngicas é devido
às atividades enzimáticas pronunciadas no fungo e especificidade estrutural, como a
presença de parede celular, quando comparada com as células humanas, o que é
benéfico, minimizando-se assim a toxicidade.
Modificações estruturais e obtenção de novos derivados híbridos, que contém
duas porções de classes diferentes, na mesma estrutura, podem ser novas
estratégias de obtenção de novas moléculas antifúngicas, visando o aumento da
potência e também a diminuição de efeitos tóxicos, para aumentar o espectro
antifúngico ou mesmo contornar a resistência que algumas cepas de fungos já
apresentam aos fármacos das classes tradicionais. Assim, novas moléculas são
desenvolvidas, visando aumentar o arsenal terapêutico antifúngico, incluindo a
cepas fúngicas resistentes.

144
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147
CAPÍTULO 09

ASPECTOS CLÍNICOS, DIAGNÓSTICOS, ESTRATÉGIAS DE


PREVENÇÃO E TRATAMENTOS DA CRIPTOCOCOSE
Suéllen Pedrosa da Silva
Doutoranda em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Lidiane Pereira de Albuquerque


Professora Adjunta da Universidade Federal do Piauí
Instituição: Universidade Federal do Piauí - Departamento de Bioquímica e
Farmacologia
Endereço: Avenida Universitária, Lado Ímpar - Ininga, Teresina - PI, Brasil.
E-mail: [email protected]

Gustavo Ramos Salles Ferreira


Doutorando em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Pollyanna Michelle da Silva


Doutora em Bioquímica e Fisiologia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Thamara Figueiredo Procópio


Doutora em Bioquímica e Fisiologia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Emmanuel Viana Pontual


Professor Adjunto da Universidade Federal Rural de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal Rural de Pernambuco - Departamento de
Morfologia e Fisiologia Animal. Endereço: Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n – Dois
Irmãos, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Patrícia Maria Guedes Paiva


Professora Titular da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

148
Thiago Henrique Napoleão
Professor Associado da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, s/n - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: Cryptococcus (Basidiomycota) é um gênero de leveduras de ocorrência


ubíqua e causadoras da criptococose, infecção iniciada pela inalação de esporos
disseminados por aves, que se alojam nos pulmões e se replicam e disseminam
pelo organismo hospedeiro, principalmente em indivíduos imunossuprimidos.
Cryptococcusneoformans e Cryptococcusgattii são as espécies oportunistas
causadoras de enfermidades em humanos. A patogênese e a virulência de
Cryptococcus são resultados de uma eficiente adaptação às condições do
organismo hospedeiro, de mecanismos de evasão da reposta imune e da produção
de fatores de virulência, incluindo a produção de células titãs, da cápsula
polissacarídica, de melanina, bem como a secreção de enzimas relacionadas à
invasão e/ou evasão do sistema imune do hospedeiro. As formas clínicas mais
comuns de infecção por Cryptococcus envolvem manifestações do sistema nervoso
central (SNC), pulmonares e cutâneas. No SNC podem ser identificados quadros de
meningite ou meningoencefalite aguda, subaguda ou crônica, com quadros de
hidrocefaleia, paralisia dos nervos cranianos e hipertensão intracraniana, cegueira e
morte. Na forma pulmonar podem ocorrer sérias lesões no trato respiratório,
enquanto lesões no rosto, pescoço e extremidades superiores, que podem sugerir
sepse, são observadas na forma cutânea. A elevada letalidade e morbidade das
infecções por Cryptococcus, sua alta virulência e a precária notificação e
acompanhamento de novos casos no Brasil são fatores preocupantes. Esta revisão
fornece uma discussão sobre a estrutura celular de Cryptococcus sp. com ênfase
nos seus fatores de virulência; aspectos clínicos da criptococose; técnicas de
diagnóstico; bem como estratégias de tratamento e prevenção da doença.

ABSTRACT: Cryptococcus (Basidiomycota) is a genus of yeasts that are ubiquitous


and cause cryptococcosis, an infection initiated by the inhalation of spores spread by
birds, which lodge in the lungs and replicate and spread through the host organism,
especially in immunosuppressed individuals. Cryptococcus neoformans and
Cryptococcus gattii are the opportunistic species that cause diseases in humans. The
pathogenesis and virulence of Cryptococcus are the result of an efficient adaptation
to the conditions of the host organism, mechanisms of evasion of the immune
response and the production of virulence factors, including the production of titan
cells, the polysaccharide capsule, melanin, as well as the secretion of enzymes
related to the invasion and/or evasion of the host's immune system. The most
common clinical forms of Cryptococcus infection involve manifestations of the central
nervous system (CNS), lung and skin. In the CNS, acute, subacute or chronic
meningitis or meningoencephalitis can be identified, with hydrocephalus, cranial
nerve palsy and intracranial hypertension, blindness and death. In the pulmonary
form, serious lesions in the respiratory tract may occur, while lesions on the face,
neck and upper extremities, which may suggest sepsis, are observed in the
cutaneous form. The high lethality and morbidity of Cryptococcus infections, its high
virulence and the precarious notification and monitoring of new cases in Brazil are
worrisome factors. This review provides a discussion of the cell structure of
Cryptococcus sp. with an emphasis on its virulence factors; clinical aspects of

149
cryptococcosis; diagnostic techniques; as well as disease treatment and prevention
strategies.

150
1 INTRODUÇÃO
Cryptococcus é um gênero de leveduras do Filo Basidiomycota, de
metabolismo predominantemente respiratório, amplamente encontradas no meio
ambiente e que possuem como característica fenotípica principal a presença de uma
cápsula polissacarídica, a qual envolve o corpo celular, que é um de seus principais
fatores de virulência (CASADEVALL; PERFECT, 1998; CASADEVALL et al., 2019).
Dentre as espécies desse gênero, as duas conhecidas como patógenos
humanos são Cryptococcus neoformans e Cryptococcus gattii, sendo C. neoformans
a maior causadora de enfermidades em humanos. Tanto C. Neoformans quanto C.
gattii são consideradas patógenos oportunistas, causando processos infecciosos
principalmente em pacientes imunossuprimidos, como pacientes transplantados e
portadores de doenças imunossupressoras, como a Síndrome da Imunodeficiência
Adquirida (AIDS) (RAJASINGHAM et al., 2017; ZARAGOZA, 2019).
A infecção causada por Cryptococcus é denominada criptococose e se dá
através da inalação de esporos da levedura (Figura 1) que podem ser carregados e
disseminados no ambiente através de algumas espécies de aves. Esses esporos se
alojam primeiramente no pulmão onde, em indivíduos com o sistema imune
suprimido, conseguem se replicar e, nos alvéolos, formam granulomas onde as
células de Cryptococcus podem permanecer latentes ou serem reativadas. Em
seguida, células fúngicas podem disseminar pela corrente sanguínea carreadas por
células fagocitárias, se espalhando por todo o organismo hospedeiro. Células
fúngicas que não tenham sido fagocitadas (Cryptococcus extracelulares) podem
permanecer nos pulmões ou atingir a corrente sanguínea por via transcelular, ou
seja através da membrana das células endoteliais. nos capilares cerebrais.
Cryptococcus atravessa a barreira hematoencefálica por mecanismo paracelular
(através do espaço intercelular), transcelular ou carreadas por células do sistema
imune infectadas. A principal manifestação clínica ocorre quando esses fungos
atingem o cérebro causando meningoencefalite, uma doença grave e de alto índice
de mortalidade, causando óbito de cerca de 20% até 50% dos pacientes acometidos
(LITTMAN; BOROK, 1968; CASADEVALL; PERFECT, 1998; HEITMAN et al., 2010).

151
Figura 1. Esquema mostrando como ocorre a criptococose, uma infecção por Cryptococcus. Após a
disseminação dos esporos por algumas espécies de aves (1), ocorre a inalação (2) por um indivíduo.
Os esporos se alojam inicialmente nos pulmões (3) e, em indivíduos com o sistema imune suprimido,
se replicam causando obstrução dos alvéolos (4) e em seguida disseminam por todo o organismo,
inclusive atingindo o sistema nervoso central (5 e 6) onde podem causar meningoencefalite e levar o
indivíduo ao óbito.

Outro fator relevante para o alto índice de mortalidade de infecções causadas


por Cryptococcus é o fato de a terapia antifúngica ser bastante limitada. Antifúngicos
como as equinocandinas não são ativos frente a C. Neoformans e o tratamento se
baseia praticamente no uso do fluconazol e da anfotericina B, porém, há diversos
relatos de cepas de Cryptococcus resistentes a estes medicamentos. Essa última,
apesar de ser bastante ativa para essas leveduras, tem seu uso bastante limitado
devido a sua toxicidade em uso prolongado. Combinações de Anfotericina B com
algumas formulações lipossomais, que reduzem seus efeitos tóxicos, apresentam
um alto custo. Sendo assim, é necessária a busca por tratamentos alternativos para
as doenças causadas por esse fungo, bem como pesquisas para aprofundar o
entendimento do processo de virulência desse patógeno (BONGOMIN et al., 2018;
ZARAGOZA, 2019).

2. EPIDEMIOLOGIA
Por ser mais prevalente em pacientes imunocomprometidos, a epidemiologia
da criptococose está muito relacionada a pacientes com AIDS, sendo os dados
descritos principalmente para meningite criptocócica. Estimativas globais de 2008,

152
anteriores à expansão da terapia antirretroviral, indicavam 957.900 casos por ano,
com aproximadamente 624.700 mortes (PARK et al., 2009). A África subsaariana é a
região que mais contribui com essa estatística, provavelmente devido ao fato de ser
a região que mais reporta estimativas sobre esse tema, além de apresentar a maior
incidência de AIDS (VIDAL et al., 2013). A América Latina é a terceira região com
maior número de casos, com mais de 54.400 casos anualmente e em torno de 55%
de mortalidade. Os casos de mortalidade no Brasil e na Argentina variam entre 30–
63% (VIDAL et al., 2013). Mesmo após a inserção da terapia antirretroviral no Brasil,
a criptococose continua sendo a principal infecção fúngica invasiva com alta
mortalidade, variando de 32% a 60% (OLIVEIRA et al., 2014; NUNES et al., 2018).
Contudo, as informações epidemiológicas no país são limitadas, uma vez que a
doença não é de notificação compulsória.
Globalmente, o número de mortes em decorrência da criptococose reduziu
em aproximadamente 45% em função da expansão da terapia antirretroviral. No
entanto, o acesso a essa terapia em países de baixa e média renda é mais escarço
e, consequentemente, altas taxas de mortalidade (50–100%) ainda estão presentes.
Já em países mais desenvolvidos essa taxa varia entre 10 e 30% (RAJASINGHAM
et al., 2017, WILLIAMSON, 2017, WILLIAMSON et al., 2017). Atualmente, o número
de casos está aumentando entre os pacientes não portadores de AIDS, porém
imunocomprometidos, como aqueles transplantados, afetados com doenças
autoimunes e com doenças hematológicas malignas, bem como pacientes sem
nenhum outro fator de risco, exceto serem expostos ao patógeno (BRATTON et al.,
2012; HENAO-MARTÍNEZ E BECKHAM, 2015).
Dessa forma, a implementação de estratégias tanto à nível de saúde pública
quanto à nível individual são necessários para reduzir morbidade e mortalidade.
Dentre essas estratégias, estão: 1) diagnóstico e tratamento precoce do HIV; (2)
triagem e tratamento preventivo para criptococose subclínica; (3) diagnóstico
otimizado de meningite criptocócica; e (4) tratamento otimizado da meningite
criptocócica (VIDAL et al., 2013).

3. MECANISMOS DE VIRULÊNCIA
A patogênese e os mecanismos de virulência de Cryptococcus são
resultados: (I) da eficiente adaptação às condições do organismo hospedeiro
incluindo disponibilidade de nutrientes, pH e radicais livres; (II) dos mecanismos de

153
evasão da reposta imune; e (III) da produção de fatores de virulência. Embora essas
características sejam compartilhadas entre outros patógenos fúngicos, Cryptococcus
spp. merecem uma atenção especial devido ao número de estratégias utilizadas
para sua adaptação (ZARAGOZA, 2019). Os principais fatores de virulência de
Cryptococcus são a produção de células Titãs, da cápsula polissacarídica, de
melanina e a secreção de várias proteínas, tais como: urease, oxidases e proteases
(ALSPAUGH et al., 2015). As células Titãs são um morfotipo de tamanho aumentado
que resulta da modificação da levedura no pulmão. Elas não são fagocitadas e são
capazes de gerar células filhas de tamanho normal, o que sugere o seu
envolvimento na disseminação da levedura (DAMBUZA et al., 2018).
A cápsula (Figura 2) é composta principalmente pelos polissacarídeos
glucuronoxilomanana (GXM) e galactoxilomanana (GXMgal), mas contém ácido
hialurônico (que facilita a entrada da célula fúngica no endotélio) e, em menor
quantidade, manoproteínas e estruturas semelhantes à quitina (RODRIGUES et al.,
2008). É organizada em fibras ramificadas que se ligam à parede celular e umas às
outras por meio de ligações não covalentes. A cápsula confere proteção contra a
ação de radicais livres, além de inibir a fagocitose, uma vez que dificulta a ligação
entre os receptores dos macrófagos e epítopos cognatos presentes na parede
celular de Cryptococcus. Adicionalmente, a GXM inibe a migração dos neutrófilos e
a proliferação e saída dos leucócitos dos vasos sanguíneos, reduzindo a expressão
de receptores de quimiocinas. Os polissacarídeos da cápsula também inibem a
aglutinação das células de Cryptococcus e são potentes indutores de apoptose, o
que aumenta a importância dessa estrutura como fator de virulência (ZARAGOZA,
2020).
A melanina (Figura 2) também confere resistência aos radicais livres, à
radiação ionizante e ao calor, além de reduzir a susceptibilidade de Cryptococcus a
drogas (NOSANCHUK, 2006). Foi demonstrado que a melanina criptocócica
aumenta a captura de calor, contribuindo para o crescimento a baixas temperaturas,
está envolvida na disseminação do pulmão para o cérebro, altera a produção de
citocinas no hospedeiro, protege contra macrófagos e induz respostas pró-
inflamatórias (MEDNICK et al., 2005).
A urease catalisa a degradação de ureia em CO 2 e amônia e é requerida para
a invasão do cérebro pelo fungo, pois acredita-se que a amônia promove a adesão
de C. neoformans por aumentar a expressão de adesinas no endotélio ou por

154
toxicidade direta à barreira hematoencefálica (OLSZEWSKI et al., 2004).
Adicionalmente, a urease favorece a aptidão do fungo em valores de pH levemente
alcalinos e representa uma ferramenta diagnóstica para criptococose (ZIMMER et
al., 1979).

Figura 2. Organização estrutural de Cryptococcusenfatizando a presença de fatores de virulência. A


cápsula polissacarídica é composta maioritariamente pelos polissacarídeos glucuronoxilomanana
(GXM) e galactoxilomanana (GXMgal), os quais desempenham funções importantes como modulação
da resposta imune do hospedeiro, inibição de fagocitose pelos macrófagos e supressão da
proliferação de linfócitos. A parede celular contendo quitina e melanina, um pigmento escuro que
confere resistência a radicais livres, radiação ionizante, ao calor e à ação de drogas. Componentes
celulares comuns para o Domínio Eukarya são também apresentados.

As proteases também são importantes para a capacidade invasiva de


Cryptococcus e as oxidases possuem um papel essencial na absorção do íon ferro,
em competição com o organismo hospedeiro, que é necessário como cofator de
muitas enzimas; em C. neoformans, outras proteínas são necessárias para a
absorção eficiente de ferro, incluindo ferro permeases e a glicoproteína quelante de
grupos heme Cig1 (BAIRWA et al., 2017).
Esses fungos também produzem fosfolipases e proteinases que estão
relacionadas à invasão e/ou evasão do sistema imunológico do hospedeiro,
favorecendo a disseminação hematogênica e o acometimento das meninges. No
Brasil, foram descritas uma intensa produção destas enzimas em amostras clínicas e
ambientais de C. neoformans e C. gattii (PESSOA et al., 2012). Além disso,
espécies dos gêneros Cryptococcus e Candida são os fungos formadores de
155
biofilme mais comuns em infeções nosocomiais. Todos estes fatores contribuem
para a persistência de infecções crônica devido à resistência adquirida aos
mecanismos imunológicos do hospedeiro e à terapia antifúngica (QIAN et al., 2020).

4. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DE INFECÇÕES CAUSADAS POR


Cryptococcus
A análise das manifestações clínicas atreladas a infecções humanas
causadas por Cryptococcus é de grande importância, podendo ser utilizada junto a
exames laboratoriais com a finalidade de se obter um diagnóstico preciso, bem
como determinar a gravidade da doença. Para essa patologia, os sintomas irão
variar, podendo estar relacionados principalmente a alterações do sistema nervoso
central (SNC), pulmonares e cutâneas (SILVEIRA et al., 2018).
Quanto às manifestações clínicas associadas ao SNC, podem ser
identificados quadros de meningite ou meningoencefalite aguda, subaguda ou
crônica, sendo estas caracterizadas principalmente pela ocorrência de cefaleia,
febre e alterações do nível de consciência. Diante disso, pesquisas têm
demonstrado uma alta incidência de criptococose neurológica, podendo chegar a
80% dos casos de infecções por Cryptococcus (COLOMBO et al., 2015).
Nascimento et al. (2020), em estudo realizado no Hospital Estadual de Doenças
Tropicais, relataram que 64,50% dos infectados por Cryptococcus spp.de 2006 a
2018 possuíam como principal manifestação a neurocriptococose.
As complicações frequentemente relacionadas a quadros neurológicos de
criptococose são a hidrocefaleia, paralisia dos pares cranianos e hipertensão
intracraniana, sendo essa última responsável por acometer aproximadamente 50%
dos pacientes que convivem com a meningite criptocócica. A hipertensão
intracraniana pode ainda evoluir causando cegueira e em casos mais graves
culminar no óbito do paciente, estando diretamente ligada ao aumento da
morbimortalidade dessa infecção (HURTADO et al., 2019).
A segunda forma mais frequente de criptococose é a pulmonar, sendo
assintomática ou sintomática. Nesse segundo caso, os sintomas pulmonares podem
ser equivocadamente confundidos com gripe, tuberculose e histoplasmose, visto que
os pulmões e alvéolos são as partes mais lesadas. Já a forma assintomática da
doença geralmente é decorrente de infecções pulmonares que se desenvolvem
principalmente na região subpleural onde os propágulos fúngicos se depositam nos

156
alvéolos periféricos (RÊGO et al., 2018). Vale ressaltar que a criptococose pulmonar
acomete principalmente homens e está bastante associada a casos de coinfecção
de pacientes imunodeprimidos, sendo acompanhada por sintomas como dor
torácica, febre e distúrbios respiratórios agudos (TELES, 2017).
A criptococose cutânea geralmente ocorre através de disseminação, sendo
foco secundário da doença podendo indicar sepse. No entanto, também pode ter
origem primária, se desenvolvendo após inoculação traumática. As manifestações
da forma cutânea podem ser observadas no rosto, pescoço e extremidades
superiores através de lesões nodulares e granulomatosas, pápulas umbilicadas,
vesículas herpetiformes, ulcerações, além de prurido e dor (MARANHÃO et al.,
2020). As pápulas umbilicadas seriam mais recorrentes na criptococose cutânea
disseminada enquanto outras manifestações clínicas como ulceração e celulite
estariam mais presentes na criptococose cutânea do tipo primária. As lesões
cutâneas são muito variadas podendo ser insuficientes para o diagnóstico devendo
se considerar o histórico clínico do paciente além de exames laboratoriais
(SANCHES et al., 2018).

5. DIAGNÓSTICO, SENSIBILIDADE ANTIFÚNGICA E TRATAMENTO


O diagnóstico da criptococose pode ser realizado por vários métodos,
incluindo: isolamento em meio de cultura, a partir de amostras do trato respiratório
(como escarro, fluido de lavagem broncoalveolar ou tecido pulmonar); e detecção do
antígeno do polissacarídeo capsular criptocócico (CrAg) no sangue, líquido
cefalorraquidiano (LCR) ou urina. Pacientes imunocomprometidos com criptococose
pulmonar devem ser investigados para a doença no SNC (MAZIARZ; PERFECT,
2016). A eficiência dessas técnicas varia de acordo com o indivíduo e o sistema
orgânico envolvido. Paralelamente, existem avanços nas abordagens proteômicas
em diagnóstico microbiológico e métodos como a espectrometria de massa por
ionização e dessorção a laser assistida por matriz e analisador de tempo-de-voo
(MALDI-TOF) têm sido avaliados na identificação de Cryptococcus spp.
(FIRACATIVE et al., 2012).
Para meningoencefalite criptocócica, o exame do LCR geralmente revela uma
pleocitose linfocítica, embora o número real de células possa ser baixo ou normal
em pacientes com disfunção imunológica grave. Os níveis de proteína no LCR
tendem a ser elevados, enquanto os níveis de glicose diminuem (VILCHEZ et al.,

157
2002). A neuroimagem é necessária para descartar o comprometimento do cérebro,
que pode se manifestar como criptococoma, hidrocefalia ou focos de atenuação
anormalmente reduzida, realce pelo contraste e edema. Lesões de massa
semelhantes a abscessos têm sido relatadas, mais comumente nos gânglios da
base, tálamo e cerebelo, em tomografias computadorizadas cranianas em até 58%
dos casos de criptococose causada por C. gattii (CHEN et al., 2012).
A ressonância magnética (RM) é mais sensível que a tomografia
computadorizada, especialmente para a detecção de pequenas lesões (SMITH et
al., 2008). A espectroscopia por ressonância magnética nuclear pode ser associada
à RM para localizar criptococomas de 2 cm ou mais de diâmetro e sua impressão
digital metabólica em um único exame. Essa abordagem é estabelecida para o
diagnóstico não invasivo de tumores cerebrais e abscessos piogênicos (SORRELL;
HIMMELREICH, 2008).
A pneumonia criptocócica pode ser diagnosticada por cultura de escarro e
fluido de lavagem broncoalveolar. Os resultados das hemoculturas e dos testes de
CrAg em soro são normalmente negativos, especialmente para doença pulmonar
isolada (SINGH et al., 2008). O teste de aglutinação em látex do lavado
broncoalveolar foi descrito, embora o ensaio ainda não tenha sido formalmente
estudado nem esteja licenciado para este propósito (SENGHOR et al., 2018). A
avaliação de meningoencefalite criptocócica, incluindo punção lombar, deve ser feita
em todos os pacientes imunocomprometidos com pneumonia criptocócica. Um
exame físico completo juntamente com antígeno CrAg e hemoculturas fúngicas
devem ser realizados para avaliar a disseminação da doença (LEE; GOLDMAN,
2021).
O exame de imagem do tórax pode fornecer o primeiro indício da
criptococose, que mais comumente se manifesta como um ou mais criptococomas
circunscritos (CHEN et al., 2012). Criptococomas podem aparecer em qualquer
região do pulmão e variarem de 1 a 8 cm de diâmetro, embora lesões maiores (até
10 cm de diâmetro) tenham sido relatadas (GARRETT et al., 2011). Raramente,
derrame pleural, abscesso, cavitação e linfadenopatia são observados nos exames.
Para nódulos e massas pulmonares, uma biópsia é necessária para confirmar o
diagnóstico. A coloração de Mucicarmim destaca a cápsula mucopolissacarídica do
fungo e ajuda a distinguir este organismo de outras leveduras (HARRIS et al., 2013).
Para o diagnóstico da criptococose cutânea, geralmente são necessárias

158
biópsia e cultura da área atingida. As lesões cutâneas são geralmente uma
manifestação da disseminação da doença e os pacientes frequentemente
apresentam níveis elevados do antígeno CrAg. Todos os pacientes
imunocomprometidos com este tipo de criptococose devem passar por uma
avaliação completa para excluir a disseminação, incluindo uma punção lombar para
descartar envolvimento do SNC (LEE e GOLDMAN, 2021).
Vários métodos baseados em anticorpos estão disponíveis para detecção do
antígeno CrAg, incluindo aglutinação em látex, ensaio de imunoabsorção enzimática
(ELISA) e ensaio de fluxo lateral. Foi relatado que a sensibilidade desses testes em
LCR varia entre 93% e 100% (HOANG et al., 2004). As reações falso-negativas a
esses ensaios são bastante incomuns, no entanto podem ser observadas na fase
inicial da doença e em casos níveis de CrAg extremamente altos quando o ensaio
de antígeno em látex é utilizado. Reações falso-positivas também são muito
incomuns, contudo, pode ocorrer reatividade cruzada com polissacarídeos
capsulares de outros microrganismos, tais como Trichosporon (levedura) e
Capnocytophaga (bactéria Gram-negativa). Os testes de detecção de CrAg
fornecem medições semiquantitativas do antígeno no LCR e no soro. Altos níveis
iniciais de CrAg no LCR estão geralmente associados a cargas fúngicas mais
elevadas e a um pior prognóstico (DATTA et al., 2009). Infelizmente, os ensaios de
detecção de antígeno têm utilidade limitada na medição da resposta à terapia.
Na prática clínica, os métodos moleculares raramente são necessários para
confirmar o diagnóstico de criptococose. Na situação incomum em que os métodos
fenotípicos fornecem um resultado ambíguo, o sequenciamento de DNA de isolados
fúngicos, a PCR multiplex e outros testes moleculares também podem ser
empregados. Inclusão de primers específicos para Cryptococcus em ensaios
multiplex baseados em diagnósticos sindrômicos (por exemplo, septicemia e
infecção de LCR) ou para análise de hemoculturas ou amostras de biópsia, onde o
diagnóstico diferencial inclui a doença fúngica, tem sido válido em alguns
laboratórios (CHEN et al., 2014).
Segundo as diretrizes da Infectious Diseases Society of America, o tratamento
para a meningoencefalite criptocócica consiste em três fases sucessivas: indução,
consolidação e manutenção. Na indução, os pacientes são tratados com uma
combinação de anfotericina B e flucitosina. Estudos têm mostrado que formulações
lipídicas de anfotericina são terapeuticamente equivalentes e podem ser mais bem

159
toleradas em indivíduos com ou em risco de doença renal (PERFECT et al., 2010).
Portanto, deve-se considerar o uso de preparações lipídicas ou lipossomais em
pacientes com risco de disfunção renal, incluindo os receptores de transplantes que
recebem inibidores de calcineurina e para aqueles que não toleram a anfotericina
convencional. A duração da fase de indução é normalmente de duas semanas.
Durações mais longas (de quatro a seis semanas) devem ser consideradas nas
seguintes circunstâncias: em pacientes que não receberam flucitosina como parte
inicial da terapia; e naqueles com doença neurológica complexa (incluindo aqueles
com criptococomas) (SUN et al., 2010).
Recentemente a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou novas
diretrizes ampliando a terapêutica, no caso de indisponibilidade do anfotericina B, o
fluconazol em alta dose pode ser usado combinado com flucitosina oral. Na África,
80% das infecções por Cryptococcus são tratadas com monoterapia de fluconazol
(ASSOGBA et al., 2015; BERTOUT et al., 2020).
Após a fase de indução, inicia-se a etapa de consolidação (com duração de 8
semanas) com fluconazol e, em seguida, finaliza-se o tratamento com a fase de
manutenção utilizando também o fluconazol. Esta abordagem está associada a uma
taxa de mortalidade inferior a 10% e uma resposta específica do paciente ao fungo
maior que 70%. Em indivíduos infectados pelo HIV, a duração total da terapia
antifúngica é de no mínimo 12 meses. Para os receptores de transplante de órgão
sólido, a fase de manutenção do fluconazol deve ser de 6 meses a 1 ano (SUN et
al., 2010). Pacientes com criptococose pulmonar grave ou com evidência de
disseminação da doença devem ser tratados da mesma forma que aqueles com
meningoencefalite criptocócica. Para os pacientes com criptococose pulmonar
aguda, recomenda-se a terapia com fluconazol durante 6 a 12 meses (PERFECT et
al., 2010).
A infecção refratária pode ocorrer e geralmente está relacionada ao estado de
imunocomprometimento grave do paciente mais do que à resistência antifúngica
(PFALLER et al., 2005). Clinicamente, a melhor opção é confirmar o diagnóstico e
estabelecer a adesão ao medicamento e a ausência de interações que limitem a
exposição ao medicamento. Terapias alternativas estão disponíveis, incluindo
voriconazol e posaconazol, embora as respostas não sejam muito favoráveis
(SABBATANI et al., 2004 ; PITISUTTITHUM et al., 2005).
A resistência fúngica pode ser classificada como hereditária ou transitória. A

160
resistência hereditária está ligada a mutações pontuais em alvos de medicamento ou
transportadores de medicamentos (RHODES et al., 2017; BOYCE et al., 2017). A
resistência transitória ou heterorresistência é uma resistência adquirida frente a altas
concentração dos agentes antifúngicos, onde subpopulações de células são
capazes de proliferar em altas concentrações, mas perdem sua resistência quando o
estresse medicamentoso é removido. Este tipo de resistência é mediado por
aneuploidia de cromossomos (GERSTEIN et al., 2015; STONE et al., 2019).
Infecções progressivas e a redução da sobrevida de pacientes com
criptococose estão relacionadas com a suscetibilidade reduzida ao fluconazol
(BONGOMIN et al., 2018; PONZIO et al., 2019), que pode estar relacionada à
superexpressão do gene ERG11 que codifica a enzima lanosterol 14-α-desmetilase
ou mutações no citocromo P450 lanosterol 14-alfadesmetilase. Esta enzima é o
principal alvo das drogas azólicas e é fundamental na biossíntese do ergosterol, um
importante componente da parede celular do fungo (RODERO et al., 2003; SIONOV
et al., 2012; SELB et al., 2019). Outro mecanismo de resistência aos antifúngicos
azólicos é a superexpressão de proteínas da membrana plasmática que bombeiam
azóis para fora da célula (GAGO et al., 2017). Vários estudos têm relatado a
heterorresistência ao fluconazol em C. neoformans, C. gattii e Cryptococcus
deuterogattii (SIONOV et al., 2013; GAST et al., 2013; BERTOUT et al., 2020). A
resistência aos azóis pode surgir durante terapia antifúngica ou pode estar
associada ao uso de azóis agrícolas (STONE et al., 2019).
O arsenal limitado de agentes terapêuticos, juntamente com a toxicidade e o
desenvolvimento de resistência fúngica aos fármacos, instiga a investigação de
novos medicamentos. A atividade neste ramo destaca as potenciais rotas para a
descoberta de novos antifúngicos ou para o reaproveitamento de moléculas já
existentes e que mostram atividade anticriptocócica. Um antifúngico ideal deve ter
como alvo um fator de virulência ou um componente fúngico que seja essencial para
a viabilidade do microrganismo. Esse medicamento deve ser fungicida quando
utilizado sozinho ou quando combinado com o fluconazol; deve ter boa
biodisponibilidade por via oral; e deve ser capaz de entrar em nichos criptocócicos
dentro do hospedeiro (como fagócitos e o SNC) (MAY et al., 2016).
Um alvo conhecido para uma droga antifúngica é a parede celular
criptocócica. Infelizmente, a última classe de antifúngicos que são ativos contra a
parede celular, como os inibidores da β-1,3-D-glicano sintase (conhecidos como

161
equinocandinas) não possuem atividade anticriptocócica satisfatória. No entanto, a
síntese de um outro componente da parede celular, as manoproteínas ancoradas ao
glicosilfosfatidilinositol, é inibida pela molécula ativa denominada E1210 que possui
atividade in vitro contra Cryptococcus spp. e outros fungos clinicamente relevantes
(como Candida e Scedosporium spp.) (MIYAZAKI et al., 2011).
Existem alguns estudos que abordam indicações de cirurgia para o
tratamento da criptococose. Lesões extensas que invadem estruturas locais no
pulmão ou que mostrem um efeito de massa ou de edema circundante na
neuroimagem requerem ressecção caso sejam cirurgicamente acessíveis. A
inserção de um dreno lombar ou de um shunt do LCR pode ser útil, em caso de
pressão intracraniana elevada não controlada (McMULLAN et al., 2013).

6. ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO PARA A CRIPTOCOCOSE


Por se tratar de uma doença ligada à saúde pública, as medidas preventivas
para criptococose devem ser aplicadas em conjunto entre a população e os
Ministérios da Saúde e Meio Ambiente, que podem agir na instauração de políticas
públicas. Sendo a infecção natural de criptococose causada pela inalação de
propágulos presentes no meio ambiente na sua forma latente (MAY et al., 2016),
diversos microfocos da infecção podem ser encontrados em habitats de aves e
morcegos, madeira em decomposição e até na poeira domiciliar.
Dessa forma, entre as providências cabíveis à população estão: a retirada de
possíveis fontes de alimento e abrigo para pombos e morcegos dos arredores da
residência, bem como não entrar em cavernas que não possuam liberação para
visitação. Além disso, no caso de haver fezes de animais como pombos e morcegos
no interior da residência se indica que essas fezes sejam umedecidas antes de
serem removidas do local para evitar a formação de poeira contaminada por esses
microrganismos que podem vir a ser inalada. Durante a limpeza, é recomendado o
uso de EPI’s (Equipamentos de Proteção Individual) como máscara e luvas. Por fim,
é de extrema importância realizar a assepsia dos ambientes com solução de
hipoclorito de sódio ou água sanitária se certificando da desinfecção efetiva
(BRASIL, 2006). Além das estratégias citadas acima é proposto sobretudo que o
controle ambiental da população de pombos seja realizado através da parceria entre
a Vigilância Ambiental e Epidemiológica (BRASIL, 2012).
No Brasil, o Ministério da Saúde em 2012 criou a cartilha nomeada como

162
Vigilância Epidemiológica da Criptococose, preconizando diversas medidas a serem
implementadas pelo governo como forma de compreender e prevenir as diferentes
formas dessa infecção. Entre as medidas a serem executadas estão: estimar a
prevalência e caracterizar as formas clínicas e distribuição geográfica da
criptococose, bem como o índice de mortalidade atrelado a essa doença, além de
promover o desenvolvimento de material técnico-científico disponibilizado sobre o
tema para a rede de serviço de saúde, e investir na compra de novos instrumentos
diagnósticos e estudos de novas terapias de controle da criptococose (BRASIL,
2012).

7. CONCLUSÃO
A criptococose é uma micose oportunista que tem recebido cada vez mais
atenção devido à gravidade das infecções, que podem acometer o sistema nervoso,
pulmões e outros órgãos, podem resultar em graves sequelas e óbito. Os fungos
causadores dessa doença se destacam pela elevada patogênese e pelos diversos
fatores de virulência que lhes conferem eficiente adaptação às condições do
organismo hospedeiro. Ainda, o número de casos tem aumentando entre diversas
condições de imunossupressão bem em pacientes sem nenhum fator de risco,
sendo necessária a implementação de estratégias tanto à nível de saúde pública
quanto à nível individual para reduzir morbidade e mortalidade.

AGRADECIMENTOS
Suéllen P. Silva agradece à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES - Código de Financiamento 001) e Gustavo R.S. Ferreira
agradece à Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco
(FACEPE; IBPG-0386-2.08/17) pela concessão de bolsa de Doutorado. Pollyanna
M. Silva e Thamara F. Procópio agradecem à FACEPE pela concessão de bolsa de
Fixação de Pesquisador (BFP-0139-2.08/20 e BFP-0141-2.08/18). Patrícia Paiva e
Thiago Napoleão agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) pela concessão de bolsa de produtividade em pesquisa.

163
REFERÊNCIAS
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168
CAPÍTULO 10

LEVEDURAS DE IMPORTÂNCIA CLÍNICA NÃO-ALBICANS


Raudiney Frankilin Vasconcelos Mendes
Discente de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas
da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Antibióticos
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Amanda Virgínia Barbosa


Estudante de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas da
Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Henrique Nelson Pereira Costa Junior


Discente de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas
da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Antibióticos
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Bárbara de Azevedo Ramos


Pesquisadora em estágio Pós-doutoral (RENORBIO) da Universidade Federal de
Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Antibióticos
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: O aumento de casos de infecções fúngicas levou o aumento das


pesquisas médicas, muitas vezes essas pesquisas se concentraram apenas em
leveduras no gênero Candida, que são reconhecidas como as mais prevalentes. No
entanto, outras leveduras não-albicans também são que são muito prevalentes em
infecções nosocomiais e tem recebido menos atenção. Fungos podem se apresentar
em forma de micélio ou leveduras. Na natureza muitos desses fungos são
dimórficos, mas na maioria das vezes ao infectarem o organismo humano, adquirem
a forma de leveduras. Espécies do gênero Cryptococcus, Malassezia, Trichosporon,
Sporothrix, Paracoccidioides e Histoplasma são exemplos desse mecanismo e estão
relacionadas a infecções locais ou sistêmicas de importância médica. Nesse capítulo
resumimos algumas dessas leveduras infectantes brevemente.

PALAVRAS-CHAVE: Cryptococcus. Malassezia. Trichosporon. Sporothrix.


Paracoccidioides.Histoplasma.

ABSTRACT: The increase in fungal infection cases has led to an increase in medical

169
research. Many times, these studies have focused only on yeasts in the genus
Candida, which are recognized as the most prevalent. However, other non-albicans
yeasts are also very prevalent in nosocomial infections and have been received less
attention. Fungi can be in the form of mycelium or yeast. In nature many of these
fungi are dimorphic, but the most time when they infect the human organism, they
take the form of yeasts. Species of the genus Cryptococcus, Malassezia,
Trichosporon, Sporothrix, Paracoccidioides and Histoplasma are examples of this
mechanism and are related to local or systemic infections of medical importance. In
this chapter we briefly summarize some of these infective yeasts.

KEY-WORDS: Cryptococcus. Malassezia. Trichosporon. Sporothrix.


Paracoccidioides.Histoplasma.

170
1. INTRODUÇÃO
Infecções fúngicas têm aumentado consideravelmente nos recentes anos
principalmente em pacientes imunocomprometidos, causando um impacto negativo
nas taxas de morbimortalidade (TABORGA et al., 2017). Esse aumento de casos
levou o aumento das pesquisas médicas em busca de novas medidas profiláticas e
do tratamento dessas infecções. Muitas vezes essas pesquisas se concentraram
apenas em leveduras no gênero Candida, que são reconhecidas como as mais
prevalentes.
No entanto, outras leveduras não-albicans também são que são muito
prevalentes em infecções nosocomiais e tem recebido menos atenção (BORGES-
WALMSLEY et al., 2002). Como já se sabe, terapia com antimicrobianos de amplo
espectro e de corticoides, procedimentos médicos invasivos estão associados a um
aumento na incidência de doenças fúngicas invasivas. Além disso desses fatores, a
formação de biofilme dessas cepas aumenta patogênese e cronicidade das
infecções (MARTINEZ; FRIES, 2010).
Leveduras como do Cryptococcus, também estão entre os patógenos mais
comuns em infecções fúngicas em pacientes imunocomprometidos com uma alta
taxa de mortalidade. Leveduras do gênero Malassezia vem sendo isolados
principalmente em amostras de pacientes com infecções de pele, porém a micose
sistêmica causada por espécies de gênero também relacionada ao uso cateter,
sepse e procedimentos invasivos (PROHIC, 2016; THEELEN, et al., 2018).
Além dessas leveduras altamente relacionada com infecções em humanos,
existem algumas espécies de fungos dimórficos que ao ultrapassar as barreiras
imunes do hospedeiro se transformam em uma forma leveduriforme. Algumas
espécies do gênero Trichosporon, Sporothrix, Paracoccidioides e Histoplasma
podemser incluídas (BORGES-WALMSLEY et al., 2002; CHAGAS-NETO; CHAVES;
COLOMBO, 2008; BARROS; PAES; SCHUBACH, 2011; GARFOOT; RAPPLEYE,
2016).
Nesse capítulo descrevemos as infecções causadas pelos gêneros
Cryptococcus eMalassezia e resumimosalgumas leveduras infectantes brevemente,
a fim de mostrar a importância do conhecimento desses patógenos tão relacionados
com sérias infecções no mundo inteiro.

171
1.1 Cryptococcus spp.

Esses fungos são leveduras cosmopolitas encapsuladas (Figura 1), que


infectam o homem causando a criptococose, uma doença sistêmica subaguda ou
crônica, e muitas vezes fatal (AGUIAR et al., 2017). Os principais fatores que
contribuem para a virulência desses microrganismos são a cápsula, a produção de
melanina e a capacidade de crescimento na temperatura do hospedeiro (37º C)
(MAY et al., 2015).

Figura 1. Leveduras encapsuladas do gênero Cryptococcus presentes no Líquido Cefalorraquidiano,


(coloração tinta Nanquim).

Fonte: RACHADI et al., 2016.

No passado, a infecção criptocócica era atribuída a uma única espécie de


fungo, o C. neoformans. Com o aprimoramento das técnicas moleculares foi possível
observar uma variedade desse patógeno, C. neoformans var. gattii, que
posteriormente foi reclassificado como sendo uma espécie distinta, o C. gattii (MAY
et al., 2015). Acredita-se que estes dois microrganismos tenham se separado e
divergido dos filos criptocócicos saprobios há 40 milhões de anos, provavelmente na
África. E desde então, vem se espalhando pelo mundo em eventos de cruzamento
(KÖHLER et al., 2017).
A criptococose é uma infecção fúngica oportunista com alta incidência entre
pacientes imunocomprometidos, principalmente aqueles com HIV (vírus da
imunodeficiência humana) (OSUNA et al., 2008; ALVAREZ; CHIPANA; SUAREZ,
2019), embora também sejam capazes de acometer pessoas saudáveis. C.

172
neoformans costuma infectar o pulmão e geralmente, migra para o sistema nervoso
central (SNC), causando a meningite criptocócica (ANDREOLA et al., 2006), ou
ainda, em casos mais raros, pode se espalhar e afetar a pele, ossos e outros órgãos
(Figura 2) ( RUAN et al., 2017).

Figura 2. Ciclo de infecção de Cryptococcus (ambiente e hospedeiro). O fungo sobrevive no meio


contaminado com fezes de aves e nas árvores. Aves, especialmente pombos, podem ter sido
responsáveis pela dispersão mundial. O fungo também infecta vários hospedeiros animais, como
gatos, cabras e coalas, sobreviver a predadores ambientais, como insetos, vermes e amebas, além
disso, pode interagir com outros micro-organismos, como bactérias ou outros fungos. O fungo
estabelece uma infecção pulmonar humana por meio da inalação de seus esporos ou células de
levedura desidratadas de fontes ambientais. Quando o hospedeiro se torna imunocomprometido, o
fungo pode ser reativado de formas latentes e entrar no SNC. A infecção do SNC representa a forma
mais grave de criptococose humana.

Fonte: Adaptado de LIN; HEITMAN, 2006.

Estima-se que por ano cerca de 1 milhão de pessoas com HIV desenvolvam
meningite criptocócica com 625.000 óbitos (HAGEN et al., 2016). A taxa de
mortalidade pode chegar até 43% em países em desenvolvimento (GUIDELINES in
Cryptococcosis – 2008). A maioria dos casos de criptococose é causada por C.
neoformans que por estar presente em uma infinidade de ambientes, a exposição ao
patógeno é quase universal (DENHAM; WAMBAUGH; BROWN, 2019). No entanto,
em muitas localidades o C. gattii costuma ser o patógeno primário mais comum
(KÖHLER et al., 2017).

1.2 TRATAMENTO
Quanto ao tratamento da criptococose, apenas três classes de antifúngicos
são usadas: os polienos (anfotericina B), os azóis (cetoconazol, itraconazol,

173
fluconazol e voriconazol) e um derivado da pirimidina (5-flucitosina) (GUIDELINES in
Cryptococcosis – 2008). A terapia para meningite criptocócica geralmente consiste
em duas semanas de tratamento com anfotericina B seguida por oito semanas de
fluconazol (BERENGUERet al., 1998).
Muitas leveduras já são resistentes aos antifúngicos frequentemente
utilizados para tratamento das respectivas infecções. Os próprios medicamentos
podem falhar e o aumento da resistência intrínseca em fungos é um problema
crescente. Quando isso acontece, a terapia é drasticamente comprometida por
restar pouca ou nenhuma opção de tratamento (PERLIN; RAUTEMAA-
RICHARDSON; ALASTRUEY-IZQUIERDO, 2017).

Estudos epidemiológicos revelam que entre os antifúngicos azóis a


resistência é alta para as espécies de Candida, no entanto, permanece baixa entre
os Cryptococcus (HOWARD; ARENDRUP, 2011; PFALLER, 2012; HAGEN et
al.,2016). Falhas terapêuticas de anfotericina B para C. neoformans também já são
relatadas na literatura (PERFECT; COX, 1999).
1.3 Malassezia spp.
O gênero Malassezia é composto por fungos leveduriformes encontrados de
forma natural na microbiota cutânea de diversos animais como comensais e
patógenos oportunistas. Em sua maioria são lipofilifilicos e lipodependente
compreendendo 90% dos fungos encontrados na pele humana. No microscópio são
observados como massas de leveduras agrupadas, hifas curtas e tortuosas
(SCHLOTTFELDT et al., 2002).
O gênero teve sua primeira descrição com a nomenclatura de Pityrosporum,
quando no início do século XIX Pityrosporum malassez foi identificado como micro-
organismo causador da caspa (SCHLOTTFELDT et al., 2002). As espécies de
Malassezia possuem hábitos e características semelhantes, podendo ser
diferenciadas por meio de critérios morfofisiológicos, observando as particularidades
da micromorfologia de cada espécie, a atividade enzimática e suas necessidades
nutricionais (GUILLOT et al., 1996; WU et al., 2015).
Contudo, a dificuldade de cultivo de algumas espécies tornou confusa sua a
classificação e nomenclatura, sendo inicialmente descritas apenas três espécies,
vindo a ser precisamente descritas com a auxílio de técnicas moleculares
identificando cerca dezoito espécies de Mallasezia (Tabela 1), do qual dez estão

174
presentes em humanos (GUILLOT; BOND, 2020).

Tabela 2.Principais espécies de Malassezia presentes na microbiota humana.


Espécies de
Sinônimos Presença em lesões
Malassezia
M. furfur Pityrosporum ovale pitiríase versicolor, fungemia
M. pachydermatis P. pachydermatis e P. Fungemia
canis
M. sympodialis M. furfur sorovar A dermatite atópica,dermatite seborreica
M. globosa P. orbiculare e pitiríase versicolor, dermatite seborreica,
M. furfur sorovar B dermatite atópica.
M. slooffiae M. furfur sorovar C
M. restrita dermatite seborreica
M. dermatis dermatite atópica
M. japônica dermatite seborreica, dermatite atópica.
M. yamatoensis dermatite seborreica
M. arunalokei
M. obtusa

As patologias causadas por espécies de Mallassezia no geral são infecções


superficiais benignas de pele pouco invasivas ocorrendo principalmente em regiões
do corpo ricas em glândulas sebáceas. Essas patologias são associadas a disbiose
da microbiota da pele do hospedeiro. Podendo atribuir-se outros fatores que
predispõem a ocorrência destas infecções como: deficiências vitamínicas,
desnutrição, doenças crônicas infecciosas como tuberculose, diabete melito,
corticoterapia sistêmica, gravidez, pacientes imunodeprimidos e taxas elevadas de
cortisol plasmático (CHOUDHURY; MARTE, 2014).
Dentre as principaispatologias que são causadas por infecções de espécies
do gênero Malassezia estão pitiríase versicolor, foliculite pitirospórica e raras
infecções sistêmicas. Entretanto, em quadros de dermatite seborréica e dermatite
atópica o papel patogênico da Malassezia spp.careça de definição mais precisa,
seus quadros clínicos podem ser agravados ou desencadeados por esta levedura
modulada pela presença de micovírus (CLANCEY; RUCHTI, 2019).
1.4 TIPOS DE INFECÇÕES CAUSADAS PELO GÊNERO Malassezia
A pitiríase versicolor é uma infecção superficial, benigna, com frequentes
recidivas, caracterizada por lesões maculosas, discrômicas e descamativas,
podendo acometer a face, o tronco e os membros superiores. Com o início dos
casos desencadeados no período da puberdade, quando há significativas alterações
nos lipídios na superfície da pele decorrentes de modificações hormonais. Os dados

175
epidemiológicos indicam que esta dermatose apresenta maior prevalência em
regiões tropicais e subtropicais, onde o clima quente e úmido favorece a colonização
da pele pelo fungo (GUPTA et al., 2000).
O diagnóstico pode ser realizado a partir de raspados obtidos da lesão são
clarificados com potássio e examinados ao microscópio para observação das
características morfológicas, podendo ser observadas várias espécies envolvidas
nesta patologia sendo identificada M. globosa na maioria dos casos
(NAKABAYASHI, 2019).
A foliculite pitirospóricaé um quadro patológico infecciosa de ampla
distribuição, com maior frequência em climas quentes e úmidos, atingindo
principalmente mulheres de meia idade, com altas taxas de recidivas (FINDLEY et
al., 2017). Esta infecção caracteriza-se pela formação de pápulas e pústulas
foliculares acometendo os membros superiores, no tronco e no pescoço. A formação
das pústulas é causada pela obstrução dos folículos pilosos por massas de
leveduras, o que é agravado pela multiplicação das leveduras. O processo
inflamatório ocorre devido à quebra de ácidos graxos livres em triglicérides e a
produção de fosfolipases.
É possível diagnosticar a infecção a partir da análise da cultura de pele o a
titulação de anticorpos da classe IgG diferindo de pacientes que apresentam
quadros de pitiríase versicolor e pacientes saudáveis (GLATZ et al., 2015;
GAITANIS et al., 2012).
A dermatite seborreica é a infecção causada por leveduras do gênero
Malassezia relatada com maior frequência global, sendo o primeiro quadro
infeccioso associado ao gênero amplamente estudado e suas principais
características são a inflamação e a descamação da pele em áreas ricas em
glândulas sebáceas, como face, couro cabeludo e tronco. Tem em sua
epidemiologia a predominância de casos em humanos do sexo masculino com idade
superior a 40 anos. Contudo, casos de dermatite seborreica podem ser observados
em ambos os sexos e em diversas faixas etárias (SANDSTROM et al., 2005).
Essa infecção é caracterizada pela formação de lesões eritematosas e
descamativas no couro cabeludo, região retroauricular, mediofacial e mediotorácica,
podendo ser acompanhada de prurido e hiper sensibilização da área afetada, sendo
associada frequentemente à colonização por Malassezia. Em pacientes com fatores
de predisposição como HIV-positivos a dermatite seborreica é desencadeada de

176
forma súbita e com quadro clínico mais intenso ou grave com frequentes recidivas.
Nesta dermatose, as espécies M. globosa, M. furfur, M. sympodialis e M.
pachydermatis são isoladas com maior frequência (SPARBER; LEIBUNDGUT-
LANDMANN, 2017)
Embora o gênero Malassezia esteja geralmente associado a infecções
superficiais, o quadro clínico pode ser agravado e evoluir para fungemia, em
pacientes imunocomprometidos e acometendo neonatos que recebem alimentação
parenteral com suplementação lipídica. Sendo também apontado que o uso de
suplementação lipídica facilite a colonização, pela levedura, através do cateter
utilizado para infundir os nutrientes, requerendo a remoção do dispositivo
contaminado para limitar a infecção (FINDLEY et al., 2017).
1.5 TRATAMENTO
Para o tratamento de patologias causadas por infecções de espécies de
Malassezia são utilizadas como opções terapêuticas derivados azoicos como
cetoconazol e itraconazol, além de antifúngicos como fluconazol, terbinafina.
Contudo, os quadros apresentam frequentes recidivas sendo observado a
necessidade de mudanças de hábitos como dieta e higiene associados a
medicamentos (DE HOOG et al., 2017).

2. FUNGOS DIMÓRFICOS (LEVEDURAS INFECTANTES)


Trichosporon é um gênero medicamente importante capaz de colonizar e
proliferar em diferentes partes do corpo humano como o sistema gastrointestinal,
respiratório, pele e vagina. Este patógeno semelhante à levedura pode causar
infecções profundas, associadas à mucosa ou superficiais. Já são reportadas 38
espécies diferentes desse gênero que causa a Tricosporonose. Enquanto as
infecções superficiais e a pneumonia alérgica são encontradas predominantemente
em hospedeiros imunocompetentes, sua forma invasiva é documentada
principalmente em pacientes imunocomprometidos (CHAGAS-NETO et al., 2008;
COLOMBO; PADOVAN; CHAVES, 2011).
A Esporotricose é uma micose associada a arranhões ou mordidas de
animais como ratos, tatus, esquilos, cães e gatos, causada pelo complexo Sporotrix
schenckii. É distribuída mundialmente, especialmente em regiões tropicais e
subtropicais. Por muitos anos se acreditou que a esporotricose era causada apenas

177
por uma espécie, a S. schenckii. No entanto, estudos baseados em análises
genotípicas e fenotípicas descobriram mais espécies nesse gênero distribuídas
mundialmente (BARROS; PAES; SCHUBACH, 2011). No Brasil as espécies S.
brasiliensis, S. schenckii e S. mexicana são as mais comuns (RODRIGO; HOOG;
CAMARGO, 2013).
Paracoccidioides brasiliensis, é um fungo dimórfico no qual os seus conídios,
no meio ambiente atuam como propágulos infecciosos que são inalados. Ao invadir
os pulmões, ocorre a transformação para a forma de levedura patogênica que causa
a micose chamada de paracoccidioidomicose. Ao invadir o organismo, P. brasiliensis
possui a capacidade de se replicar em macrófagos e células epiteliais. A
paracoccidioidomicose é normalmente uma infecção latente que se desenvolve após
anos, principalmente por causa dos granulomas formados através da resposta
imune do hospedeiro (BORGES-WALMSLEY et al., 2002).
Por último e não menos importante o fungo Histoplasma capsulatum é
reconhecido por causar doenças respiratórias e disseminadas, mesmo em
hospedeiros imunocompetentes. O sucesso desse micro-organismo depende de
vários mecanismos para entrar na célula hospedeira, entretanto, eles são capazes
de infectar macrófagos, sobreviver às defesas antimicrobianas e proliferar
(GARFOOT; RAPPLEYE, 2016).

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A preocupação com as leveduras capazes de infectar o organismo humano
vão além das espécies do gênero Candida, e assim como elas, muitas vezes outras
leveduras patogênicas descritas nesse capítulo são difíceis de tratar. Geralmente
essas infecções não respondem aos tratamentos convencionais utilizados por causa
dos mecanismos de virulência das espécies, da resistência aos antifúngicos e da
falta de resposta do hospedeiro, que muitas vezes se encontram
imunocomprometidos. Sendo assim, se faz necessário uma compreensão e
abordagem maior dessas micoses que são muitas vezes negligenciadas.

178
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181
CAPÍTULO 11

Candida albicans: FATORES DE VIRULÊNCIA E


IMPORTÂNCIA CLÍNICA
Henrique Nelson Pereira Costa Junior
Discente de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas
da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Antibióticos
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Amanda Virgínia Barbosa


Estudante de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas da
Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Raudiney Frankilin Vasconcelos Mendes


Discente de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas
da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Antibióticos
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Bárbara de Azevedo Ramos


Pesquisadora em estágio Pós-doutoral (RENORBIO) da Universidade Federal de
Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Antibióticos
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: As infecções de origem fúngica acometem aproximadamente dois bilhões


de pessoas no mundo, com maior incidência em pacientes imunocomprometidos,
além das altas taxas de novos casos em idosos. Dentre os patógenos humanos,
destaca-se o gênero Candida spp. associado a cinco espécies: Candida albicans, C.
parapsilosis, C. glabrata, C. tropicalis e C. krusei, que são responsáveis por 90% das
infecções. Entre as espécies que compõem esse gênero, a C. albicans apresenta
maior importância, presente na microflora humana.Essas infecções, frequentemente,
são adquiridas durante o período de estadia em Unidades de Terapia Intensiva (UTI)
e/ou centros de saúde (hospitais e enfermarias), tem acarretado altos índices de
morbidade e mortalidade. Apesar de fazer parte da microflora humana, as leveduras
da espécie C. albicans podem causar uma grande variedade de infecções sob certas
condições (alterações nos mecanismos de defesa) e, assim ultrapassar as barreiras
do hospedeiro. Outros fatores predisponentes participam na instalação da infecção,
tais como fatores de virulência, uma vez que promovem a colonização, aderência e
invasão. O diagnóstico é realizado através de exame direto e cultura. Recentemente,

182
a utilização de métodos de biologia molecular tem sido cada vez mais empregada
para o diagnóstico e elucidação das espécies de patógenos. O tratamento vem
sendo realizado com antifúngicos sintéticos. Entretanto, o uso inadequado e sem
novas formulações vem selecionando cepas resistentes. Neste contexto, entender
os mecanismos de virulência, infecção, diagnóstico e tratamento, é de grande
relevância para combater e contornar a resistência desses patógenos, além de
fornecer ferramentas para novas formulações.

PALAVRAS-CHAVE: Leveduras. Candidíase. Infecções nosocomiais.

ABSTRACT: Infections of fungal origin affect approximately two billion people


worldwide, with a higher incidence in immunocompromised patients, in addition to the
high rates of new cases in the elderly. Among the human pathogens, the genus
Candida spp. stands out, associated with five species: Candida albicans, C.
parapsilosis, C. glabrata, C. tropicalis, and C. krusei, which are responsible for 90%
of infections. Among the species that make up this genus, C. albicans has greater
importance, present in the human microflora. These infections, frequently, are
acquired during the period of stay in Intensive Care Units (ICU) and / or health
centers (hospitals and wards), have resulted in high rates of morbidity and mortality.
Despite being part of the human microflora, yeasts of the species C. albicans can
cause a wide variety of infections under certain conditions (changes in defense
mechanisms) and thus overcome the barriers of the host. Other predisposing factors
participate in the onset of the infection, such as virulence factors, since they promote
colonization, adherence, and invasion. The diagnosis is made through direct
examination and culture. Recently, the use of molecular biology methods has been
increasingly used for the diagnosis and elucidation of pathogen species. The
treatment has been carried out with synthetic antifungals. However, improper use
and without new formulations has been selecting resistant strains. In this context,
understanding the mechanisms of virulence, infection, diagnosis, and treatment is of
great relevance to combat and circumvent the resistance of these pathogens, in
addition to providing tools for new formulations.

KEYWORDS: Yeasts. Candidiasis. Nosocomial infections.

183
1. INTRODUÇÃO
Os fungos são organismos eucariontes saprófitos, encontrados sob dois tipos
morfológicos; na forma unicelular, como as leveduras, ou então formando um
conjunto de hifas, septadas ou não, denominados micélios (multicelulares). As
leveduras apresentam parede celular relativamente rígidas e permeáveis para
algumas substâncias, possuem a função de equilíbrio hipotônico, proteção e está
relacionada a eventos de sinalização celular, adesão e reprodução. Os principais
constituintes da parede dos fungos são polissacarídeos, como quitinas e glucanos,
que compõem o arcabouço da célula (TSAI et al., 2013).
É importante salientar, que as principais classes de antifúngicos tem como
mecanismos de ação a inibição da biossíntese do ergosterol ou β-glucanos presente
na membrana e na parede celular, respectivamente (CAMBOY; ADRIO, 2017).
Entretanto, as infecções fúngicas invasivas têm emergindo em todo o mundo, as
quais são consideradas um problema de saúde pública (SANGUINETTI et al., 2015;
ARENDRUB; PATTERSON, 2017; SARDI et al., 2018; QUINDÓS et al., 2018;
DADAR et al., 2018).
Por muito tempo, as infecções nosocomiais causadas pelas leveduras do
gênero Candida foram subestimadas. A partir da década de 90, estudos
epidemiológicos revelaram que essas leveduras eram um dos maiores responsáveis
pelos casos de septicemia e mortalidade (POULAIN, 2013). Alguns fatores são
predisponentes às infecções fúngicas como pacientes imunocomprometidos, com
maior incidência dentro dos grupos: pacientes transplantados, com câncer, pós-
cirúrgico, com infecções por HIV, além das altas taxas de novos casos em idosos
(VON LILIENFELD-TOAL et al., 2019).
As infecções causadas pelas espécies de Candida vão desde superficiais a
sistêmicas (VON LILIENFELD-TOAL et al., 2019; DADAR et al., 2018). Já são
conhecidas para o gênero mais de 100 espécies, no entanto, aproximadamente 97%
das infecções causadas por todas as formas invasivas deste gênero está associada
a cinco espécies (Candida albicans, Candida parapsilosis, Candida glabrata,
Candida tropicalis e Candida krusei) (CAMPS; JARQUE, 2016).
Entre as espécies que compõem esse gênero, a C. albicans apresenta maior
importância, sendo um patógeno fúngico multirresistente e a terceira principal
infecção adquirida em UTIs (Unidades de Terapia Intensiva), responsável por uma
alta taxa de mortalidade, gerando assim altos custos da saúde pelo mundo

184
(BASSETTI et al., 2019).

2. CARACTERÍSTICAS GERAIS DA C. albicans


C. albicans é classificada no Reino Fungi, filo Ascomycota, Classe
Saccharomycetes, Ordem Saccharomycetales, Família Saccharomycetaceae
(GUARRO et al., 1999). É um fungo dimórfico comumente encontrada na forma de
leveduras, com reprodução assexuada. Alguns fatores denominados fatores de
virulência, contribuem para patogenicidade desses microrganismos, além das
alterações das barreiras imunológicas e físicas (MORAN et al., 2011). Os fatores de
virulência das leveduras contribuem para colonização, aderência e invasão.
Candida é uma levedura que faz parte da microflora de indivíduos saudáveis.
Geralmente são encontradas no tubo gastrointestinal, pele e superfícies mucosas da
cavidade oral, tubos urogenitais ou vagina. Apesar de fazer parte da microflora
humana, as leveduras da espécie C. albicans podem causar uma grande variedade
de infecções sob certas condições (alterações nos mecanismos de defesa). Os
exemplos mais comuns incluem: candidíase orofaríngea, candidíase vulvovaginal
(CVV) e em condições propícias, podem disseminar para corrente sanguínea
levando a infecções sistêmicas, conhecida como infeções fúngicas nosocomiais,
com maior incidência em UTIs que são distribuídas no mundo todo (Figura 1) (TSAI
et al., 2013; BASSETTI et al., 2019; FELIX et al., 2019).

Figura 1. Distribuição geopolítica das espécies de Candida spp. Globalmente, Candida albicans é a
espécie mais prevalente associada à infecções invasivas. É notório o aumento de casos de
candidíase no Brasil.

Fonte: adaptado de Pappas et al. (2018).

185
3. FATORES DE RISCO PARA INFECÇÕES
Alguns fatores são de suma importância para que o microorganism seja capaz
de ultrapassar as barreiras do hospedeiro e assim provocar a infecção. Os fatores
de risco que predispõem o hospedeiro somados aos fatores de virulência das
leveduras podem provocar infecções letais. Alguns desses fatores estão resumidos
abaixo.
3.1 FATORES DE RISCO RELACIONADOS AO HOSPEDEIRO
O uso de antibióticos de amplo espectro, tornam pacientes mais propensos à
infecção por leveduras, nestes casos, a supressão da microbiota bacteriana
responsável pela inibição do crescimento dos fungos é comprometida pelo
tratamento e assim ocorre um desequilíbrio da competição natural (TSAI et al.,
2013).
Além do uso de antibióticos, outros fatores importantes contribuem para o
processo infeccioso, tais como: pacientes que são submetidos a constantes
procedimentos médicos invasivos, transplante de órgãos, uso de cateter e sondas
urinárias. Nesses casos ocorre o comprometimento das barreiras físicas,
possibilitando a proliferação e instalação de Candida no tecido profundo do
hospedeiro (figura 2) (TSAI et al., 2013; DADAR et al., 2018; PAPPAS et al., 2018).

Figura 2. Patogênese da candidíase invasiva. a) Quando as barreiras intestinais são rompidas por
algum trauma, por exemplo, após cirurgia gastrointestinal, Candida pode disseminar diretamente para
a cavidade abdominal e invadir a corrente sanguínea. b) Em condições normais, o fungo é um
organismo comensal. c) O comprometimento da resposta imune, entre outros fatores, pode provocar
o desequilíbrio, isto é, o crescimento excessivo dos fungos no intestino, o que pode levar a infecções
invasivas em vários órgãos (candidíase invasiva) e coinfeção de patógenos oportunistas.

Fonte: Traduzido de Pappas et al., 2018.

186
Algumas doenças influenciam no rompimento do equilíbrio entre parasita-
hospedeiro, por exemplo, doenças neurologias, doença gastrointestinal, doença
pulmonar, doença vascular, acometidos pelo vírus HIV, doença
genética/malformação congênita, doença renal, diabetes, doença hepática e doença
pancreática (CANELA et al., 2018).
No recém-nascido, candidíase pode ser adquirida no momento de dar à luz,
ou seja, pelo canal vaginal, na amamentação ou em centros cirúrgicos. As Candidas
ficam localizadas na região da cavidade bucal, com aspecto pseudomembranoso.
Esse tipo de candidíase é facilmente controlada pela atividade da imunoglobulina A
adquirida no leite materno (ARAÚJO et al., 2013).
As respostas da imunidade inata e adquirida constituem uma eficiente
proteção para o hospedeiro contra infecções de leveduras de Candida. A resposta
da imunidade inata inclui atividade de diversas células de defesa: células epiteliais e
fagocíticas, como neutrófilos polimorfonucleares (PMNs), monócitos/ macrófagos e
células dendríticas (CDs) na defesa do hospedeiro contra candidemia (TSAI et al.,
2013).
A imunidade adquirida predomina a secreção de citosinas das células T CD4+
e quimiocinas pró-inflamatórias. Por esse motivo, pacientes portadores de doenças
graves como síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA), uso de
imunossupressores ou terapias antineoplásicas são mais suscetíveis a candidíase
invasiva, dessa forma, afetando o sistema circulatório e órgãos do hospedeiro (TSAI
et al., 2013; FIDEL; NOVERR, 2012).
Por fim, alguns estudos indicam que fatores nutricionais do hospedeiro podem
contribuir para morfogênese e patogênese da infecção por C. albicans, como
alteração de fatores de expressão gênica no sentido de usar a fonte de carbono do
hospedeiro, consiste na regulação positiva de vias metabólicas, incluindo
gliconeogênese, ciclo do glioxilato e β-oxidação de ácidos graxos (TSAI et al., 2013;
DADAR et al., 2018).
Além, dos diversos fatores para desenvolver infecção nos seres humanos por
C. albicans, os fatores de virulências dos microrganismos medeiam a instalação,
patogenicidade, proliferação, danos teciduais, evasão de macrófagos, permitindo
assim, sua sobrevivência no organismo do hospedeiro (FORSBERG et al., 2019).
3.2 FATORES DE INFECÇÃO RELACIONADO AO MICRO-ORGANISMO
A espécie C. albicans expressam importantes fatores de virulência

187
relacionados principalmente a adesão, formação do biofilme, produção de enzimas
hidrolíticas, hemolisinas e dimorfismo, ou seja, a transição morfológica entre
levedura para hifas ou pseudo-hifas (DADAR et al., 2018).
A habilidade de C. albicans em formar hifas está diretamente relacionado com
sua patogenicidade, dessa forma, promovem a invasão e adesão no tecido do
hospedeiro, enquanto as células de leveduras facilitam a disseminação da infecção
(TONG; TANG, 2013). Além disso, as hifas impedem que os macrófagos e
neutrófilos fagocitem as células de Candida (MAYER et al., 2013).
A morfogênese de C. albicans é controlada por ampla rede de sinalizações,
essa rede é ativada por condições ambientais, incluindo variação de pH,
temperatura, CO2, fonte de nutrientes e de N-acetil-β-D-glicosaminidase (NAG) que
está envolvida na formação, modelação de hifas e do tubo germinativo de leveduras
(TONG; TANG, 2013). As principais vias de sinalização que regulam a expressão de
genes de leveduras para hifas são: a proteína quinase A dependente de
monofosfato cíclico de adenosina (PKA-AMPc) e a proteína quinase ativada por
mitógeno via Cph1 (TSAI et al., 2013; DADAR et al., 2018).
A PKA ativada controla fatores de transcrição da via Efg1, e assim, o
aumento da expressão de genes envolvidos na formação de hifas, como os genes
hwp1, hgc1e als3 (TSAI et al., 2013; DADAR et al., 2018). O gene asl3 e hwp1
promovem a síntese de proteínas da parede celular, relevantes na adesão da célula
fúngica. O gene hgc1 tem como função, a síntese de proteínas do citoesqueleto,
crescimento, proliferação e formação de hifas (TSAI et al., 2013).
Além disso, proteínas de superfícies, relacionadas a NADH-Ubiquinona,
participam da proteção e dificultam a identificação do sistema de defesa (inata e
adquirida) do hospedeiro, proteção oxidativa, osmótica e participam do processo de
transição de leveduras para hifas (DADAR et al., 2018).
As proteínas, ß-glucanas, que formam a parede de celular de C. albicans são
capazes de reprogramação de células de defesa, como os monócitos/macrófagos,
elas medeiam a expressão de algumas citocinas inflamatórias, e assim,
comprometem ainda mais a detecção do sistema imunológico (DADAR et al., 2018).
Dentre o vasto arsenal de proteínas produzidos por Candida, destacam-se as
adesinas (STANISZEWSKA, 2020). As adesinas também são proteínas presentes
na parede celular dos fungos e proporcionam uma forte ligação à superfície epitelial.
Isso permite a colonização das células dos hospedeiros e, consecutivamente, a

188
formação do biofilme (DADAR et al., 2018; STANISZEWSKA, 2020).
Os biofilmes são comunidades de microrganismos aderidos na superfície de
células, órgãos, tecidos e substratos abióticos, como dispositivos médicos (catéter
urinário ou venoso central, válvulas cardíacas artificiais ou próteses odontológicas)
(TSUI et al., 2016).
A capacidade de formação de biofilme está relacionada com o aumento da
patogenicidade, contribuindo para a resistência de C. albicans frente aos
antifúngicos, acarretando sérios problemas de saúde. Os mecanismos envolvidos na
proteção das células fúngicas por meio dos biofilmes são: (1) evitando a penetração
(barreira física/química) dos medicamentos, mediados por bombas de efluxo.
Existem até o momento dois tipos de bombas que participam desse mecanismo de
resistência do biofilme de C. albicans, tipo ABC (ATP-binding cassete) e do tipo MFS
(major facilitators superfamily); (2) regulando as rotas energéticas, glicose, ácido
graxo e o aumento da síntese ergosterol (BASSETTI et al., 2019; MAYER et al.,
2013)
Ainda dentro dos atributos da virulência, as enzimas hidrolíticas (proteinase,
lipase e fosfolipase), estão diretamente relacionadas com a aquisição de nutrientes
para células de C. albicans, pois induz degradação celular e consecutivamente dano
tecidual, promovem também crescimento celular, adesão e a filtração das células
fúngicas, proporcionando a disseminação de C. albicans no organismo do
hospedeiro (TSAI et al., 2013).
Das inúmeras enzimas secretadas pela espécie C. albicans, destaca-se, as
proteases aspárticas secretadas (PAS), uma família com 10 genes (sap proteins)
(TSAI et al., 2013). Os genes saps são expressos durantes as várias fases das
células C. albicans, por exemplo, sap1 e sap3 são expressos em leveduras,
enquanto sap4 e sap6 em hifas. As Saps possuem características especializadas
durante o processo infeccioso, tais como: degradação do grande número de
moléculas, incluído albumina e colágeno tipo IV. Essas proteínas são importantes na
estrutura das células do tecido, a degradação delas permite que a C. albicans
destrua as barreiras do hospedeiro, e dessa maneira, penetre profundamente nos
tecidos ou na corrente sanguínea (TSAI et al., 2013; DADAR et al., 2018).

189
4. INFECÇÕES CAUSADAS POR C. albicans

As infecções por C. albicans, clinicamente podem se classificam de duas


formas: candidíase superficial ou sistêmica (JAYATILAKE; SAMARANAYAKE,
2010). A candidíase superficial é a mais comum da espécie C. albicans, pois é
encontrada com maior frequência na microflora humana (TSAI et al., 2013).
A candidíase orofaríngea, ocorre devido colapso da imunidade local e está
associada a doenças subjacentes, como diabetes. Além disso, orofaríngea foi uma
das primeiras manifestações de imunodeficiência induzida por HIV, é a mais comum,
um indicador para a progressão da doença AIDS (TSAI et al., 2013).
A candidíase vulvovaginal (CVV), ocorre no trato genital feminino devido a
alteração do pH ou desequilíbrio da microflora da região, consequência o aumento
da proliferação de leveduras, com diversas manifestações clinicas: prurido, ardor,
dor, lesões trato genital, favorecendo o estabelecimento de coinfecções por
patógenos oportunistas (TSAI et al., 2013).
Por outro lado, a infecção sistêmica ocorre por deficiência do sistema
imunológico, podendo as leveduras disseminarem para corrente sanguínea, e assim,
infectar vários tecidos e órgãos. No Brasil, candidíase profunda é responsável por
uma média de 2,23 episódios / 1000 internações e uma taxa de mortalidade em 30
dias de 55,9% (MEDEIROS et al., 2019). Outra revisão sobre a candidíase foi
realizada por Mello et al (2017), segundo os autores a candidíase profunda
corresponde a 2,49 casos por 1.000 admissões hospitalares. O que significa uma
similaridade com os dados, além de uma significativa taxa de infeção.

5. TRATAMENTO
O arsenal disponível para o tratamento de fungos é bastante limitado, devido
a diversos fatores, que incluem: (1) Similaridade bioquímica e fisiológica existente
entre as células fúngicas e células humanas, (2) Falta de descoberta de novos
fármacos, (3) Terapia de longo prazo (4) Uso inadequado. Além, da maioria dos
fármacos disponíveis no mercado possuem efeitos colaterais (MELLO et al., 2017).
Na tabela 1 estão descritas as principais classes de antifúngicos.

190
Tabela 1.Mecanismos de ação dos antifúngicos

Classe de fármaco Sitio de ação na célula Atividade


fúngica
Promovem alteração da
permeabilidade da membrana
celular por ligação ao ergosterol,
que acarreta desequilíbrio
Polienos Membrana
osmótico pela perda de íons
intracelulares e
consequentemente lise e morte
das células.
Inibidores da síntese de
Azóis Membrana
ergosterol
Inibidor da síntese timidilato
Flucitosina Núcleo sintetase, comprometendo
assim a síntese de DNA.
Inibindo a ß(1,3)-glucana
Equinocandinas Parede célula sintase, impedindo a síntese de
glucanas.
Fonte: Adaptado de Campoy; Adrio, (2017).

O aumento de novos casos de infeções fúngicas invasivas, aliado com o


desenvolvimento de resistências aos antifúngicos, serve como alerta. Sendo assim,
a necessidade de síntese de novos antifúngicos mais eficazes e seguros (CAMBOY;
ADRIO, 2017). Atualmente tem se empregado a utilização de métodos de biologia
molecular para detecção do genoma de fungos, que são promissores por apresentar
diversas vantagens: (1) detecção da instalação precoce do patógeno, (2) tratamento
com antifúngicos adequados, e assim, diminuindo a taxa de mortalidade (3) redução
do tempo de internação de paciência em UTIs, (DADAR et al., 2018).

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Infecções causadas por C. albicans são um problema no mundo inteiro. Com
a preocupação quase totalmente voltada para as bactérias que causam infecções
hospitalares, a infecções por fungos são muitas vezes negligenciadas. Dessa forma,
entender o patógeno, os mecanismos de infecção e o tratamento adequado, é de
suma importância para combater infecções mais graves que podem demandar altos
custos ao paciente e ao sistema de saúde.

191
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193
CAPÍTULO 12

COMO A TECNOLOGIA FARMACÊUTICA PODE AUXILIAR


NO DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO DE
MEDICAMENTOS ANTIFÚNGICOS (PARTE 1)
Lucas Amadeu Gonzaga da Costa
Mestrando em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Myla Lôbo de Souza


Doutoranda em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Aline Silva Ferreira


Doutoranda em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Asley Thalia Medeiros Souza


Graduanda em Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Pedro José Rolim Neto


Professor titular da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: Medicamentos antifúngicos apresentam alguns problemas relacionados a


solubilidade, a distribuição em sítios específicos de ação e a toxicidade. Além disso,
o surgimento de cepas resistentes aos antifúngicos mais comuns empregados na
clínica tem exigido, além da busca por novos compostos e entidades químicas, o
emprego de tecnologias que permitam uma maior eficácia e segurança dos
antifúngicos já presentes no arsenal clínico. Um dos meios pelos quais tais
problemas podem ser contornados é através do emprego de carreadores e drug
delivery systems, especialmente aqueles em escala micrométrica e nanométrica. No

194
presente capítulo foram reunidos alguns estudos que falam sobre as possibilidades
de emprego desses carreadores para doenças fúngicas, bem como seus conceitos.
Estão elencados os drug delivery systems mais encontrados nas buscas, bem como
os mais relevantes em termos de estudos atuais, como é o caso das nanopartículas
poliméricas, nanofibras, nanopartículas lipídicas, nanoemulsões, sistemas auto-
emulsificantes, entre outros encontrados nas buscas.

ABSTRACT: Antifungal drugs have some problems related to the solubility,


distribution at specific sites of action and toxicity. Furthermore, the emergence of
resistant strains to the most common anti-fungalsprescribed in routine clinical
carehas required, in addition to the search for new compounds and chemical entities,
the use of technologies that allow greater efficacy and safety of the alreadyexisting
anti-fungal therapeutic armamentarium. One of the ways in which such problems can
be solved is through the use of carriers and drug delivery systems, especially those
in micrometric and nanometric scales. In this chapter, some studies that discuss the
possibilities of using these carriers for fungal diseases, as well as their concepts,
have been gathered. The drug delivery systems most commonly found in searches
are listed, as well as the most relevant in terms of current studies, such as polymeric
nanoparticles, nanofibers, lipid nanoparticles, nanoemulsions, self-emulsifying
systems, among others found in searches.

195
1. INTRODUÇÃO
As doenças causadas por fungos, diferentemente de outras doenças
infecciosas, como é o caso das causadas por bactérias, vírus e alguns parasitas
ainda não são plenamente encaradas como problemas de saúde pública mundial
(RODRIGUES; NOSANCHUK, 2020). Dados de 2017 revelam que mais de 1 bilhão
de pessoas tem alguma doença fúngica superficial (como na pele, cabelos e unhas)
e que mais de 1,5 milhões de pessoas morrem todos os anos em decorrência de
doenças causadas por fungos, de acordo com dados do Global Action Fund for
Fungal Infections(BONGOMIN et al., 2017; RODRIGUES; NOSANCHUK, 2020). No
Brasil, um estudo realizado por Giacomazzi e colaboradores (2016) demonstrou que
cerca de 3,8 milhões de pessoas sofrem de alguma doença fúngica mais grave.
Além dos altos números de pessoas que sofrem por tais patologias, há
alguns problemas associados com os tratamentos mais clássicos e empregados na
clínica para doenças fúngicas. Primeiro pode ser citado o fato de que as classes de
antifúngicos empregados de modo recorrente na clínica são poucos; o segundo é
que alguns deles apresentam toxicidade relevante que nem sempre compensam o
seu uso; e o terceiro é que os alvos moleculares para tais fármacos são muito
similares (PIANALTO; ALSPAUGH, 2016).
A baixa variedade de alvos terapêuticos faz com que seja mais provável o
desenvolvimento de resistência aos poucos medicamentos disponíveis e já há o
aumento crescente de relatos de cepas resistentes aos antifúngicos mais utilizados
na clínica (LEE et al., 2020; ROBBINS; WRIGHT; COWEN, 2017). O
desenvolvimento e pesquisa de novos fármacos e entidades químicas que sejam
efetivos contra cepas resistentes também se demonstra um desafio por conta da
natureza eucariótica dos fungos, em que moléculas promissoras demonstram
toxicidade também para células humanas (ROEMER; KRYSAN, 2014), além de
problemas físico-químicos das moléculas, farmacocinéticos e farmacodinâmicos
(FUENTEFRIA et al., 2018).
Como alternativa, pode-se empregar o melhoramento tecnológico de
fármacos e medicamentos já disponíveis de modo a se contornarem problemas
físico-químicos (como solubilidade, taxa de dissolução, estabilidade), de
farmacocinética, de toxicidade, de seletividade e de eficácia (BHATIA, 2016). Novos
sistemas são desenvolvidos todos os anos de modo a solucionar problemas em
específico, seja na área da saúde, alimentação ou agricultura.

196
O capítulo agrupou, dentro de classificações mais convencionais, diferentes
tipos de tecnologias farmacêuticas que vêm sendo empregadas nos últimos anos na
área de desenvolvimento de novos medicamentos antifúngicos. Na primeira parte
serão abordados os carreadores e drug delivery systems, como é o caso de
nanopartículas, nanoemulsões, lipossomas, sistemas auto-emulsificantes, entre
outros, com base em sua composição principal. Num segundo capítulo serão
abordados os sistemas que utilizam excipientes inteligentes em sua composição,
como ciclodextrinas, dispersões sólidas, polímeros inovadores etc. É importante
ressaltar que mais de uma tecnologia pode sem empregada numa mesma
formulação, não se excluindo entre si, como é o caso de misturas de lipídeos e
polímeros nas mesmas nanopartículas, de microemulsões em géis, dentre outras
possibilidades.

2. CARREADORES E DRUG DELIVERY SYSTEMS


Os ditos drug delivery systems (ou sistemas de entrega de fármacos, em
tradução livre), como o próprio nome sugere, são sistemas que possuem a
capacidade diferencial de entregar ou modular a entrega de substâncias de
interesse a um ou mais locais desejados. De acordo com Kakkar e colaboradores
(2017), tais sistemas precisam preencher alguns requisitos, como ter capacidade de
carrear tais substâncias, mantê-las em concentração ideais nos seus locais de ação,
facilitar a interação celular para captação do fármaco e apresentar segurança em
termos de imunogenicidade, além de ser passível de produção industrial.
O grupo mais proeminente dentro desses sistemas são aqueles que possuem
como diferencial suas dimensões. Com o impulsionamento da nanotecnologia
iniciado pelo físico Richard Feynman em 1959, várias áreas do conhecimento
começaram a explorar as propriedades de materiais em escalas do micrômetro e do
nanômetro, inclusive o setor farmacêutico e cosmético (SAFARI; ZARNEGAR,
2014). A partir de tais estudos surgiram os lipossomas, as nanopartículas
poliméricas, as nanopartículas metálicas, os dendrímeros, os nanocristais e uma
vasta gama de drug delivery systems (PATRA et al., 2018) em escala nanométrica,
bem como um crescente número de patentes (DA COSTA et al., 2020).
2.1 CARREADORES E DRUG DELIVERY SYSTEMS POLIMÉRICOS
Polímeros são longas cadeias compostas a partir da repetição de uma
molécula ou de mais de uma molécula (copolímero). Podem apresentar vantagens

197
ao compor drug delivery systems por possuírem diversas formas de produção,
serem escalonáveis industrialmente, permitirem a encapsulação de drogas
hidrofóbicas e hidrofílicas, entre outras (BHATIA, 2016).
2.1.1 NANOPARTÍCULAS E MICROPARTÍCULAS POLIMÉRICAS
As nanopartículas são sistemas carreadores de fármacos que, quando
compostas por polímeros, podem ser classificadas como nanocápsulas ou
nanoesferas. As nanocápsulas se assemelham em estrutura com as cápsulas,
sendo um sistema em que o polímero se apresenta na superfície da estrutura, ao
redor de um centro que pode carrear fármacos e misturas, como é o caso de óleos.
Já as nanoesferas são sistemas em que o polímero encontra-se distribuído em todo
o volume da nanopartícula, sendo o fármaco disperso na matriz (BHATIA, 2016).
Os polímeros que podem ser empregados são tanto de origem natural, como
é o caso da quitosana e alginato (naturais), quanto sintética como é o caso do ácido
poli(láctico-co-glicólico), o PLGA e poli(ácido láctico), o PLA (sintéticos). As
nanopartículas poliméricas apresentam algumas vantagens como drug delivery
systems porque modificam a taxa de liberação do fármaco, podem ser
funcionalizadas na superfície, apresentam boa estabilidade, permitem altas taxas de
encapsulação e protegem os fármacos e misturas dentro de sistemas biológicos
(ZIELIŃSKA et al., 2020). Diversos são os campos em que nanopartículas
poliméricas podem ser aplicadas, inclusive no tratamento de doenças antifúngicas.
Em um estudo realizado por Alvarez-Berrios e colaboradores (2020)
desenvolveu micropartículas de alginato, um polímero natural, com anfotericina B
(AmB), fármaco disponível em nanoformulações lipídicas, mas que apresentam
maior custo, causam toxicidade pulmonar e demandam repetidas administrações.
Os resultados de ensaios in vitro demonstraram que o carreador apresentou
atividade contra cepas de Candida albicans de igual valor ao fármaco livre, bem
como menor toxicidade a células pulmonares e perfil de liberação aprimorado para
diminuir a quantidade de administrações. Outro estudo avaliou o potencial de
nanopartículas de alginato, mas com miltefosina, um fármaco com atividade
antifúngica comprovada sobre diversas espécies. Os resultados desse estudo
demonstraram que o sistema apresentou menor toxicidade que o fármaco livre tanto
em modelos hemolíticos quanto com o uso de larvas de Galleria mellonella, além de
aumentarem o tempo de vida das larvas quando infectadas com Candida spp.e
Cryptococcus spp., apesar de não apresentarem a mesma atividade do fármaco livre

198
em testes de susceptibilidade antifúngica.
O alginato também foi empregado no desenvolvimento de nanopartículas
contendo ebselen, um organoselênio, para o tratamento de infecções de pele
causadas por Candida spp. no trabalho feito por Jaromin e colaboradores (2018). Os
resultados dos testes de susceptibilidade antifúngica demonstraram que a
nanopartícula apresentou melhores resultados que o fármaco livre contra três
espécies de fungos testadas, exceto para a Candida glabrata, ao mesmo tempo em
que apresentou bons resultados de citotoxicidade em fibroblastos.
A quitosana também é um polímero natural que vem sendo estudada nos
últimos anos para o desenvolvimento de sistemas carreadores. Park e
colaboradores (2017) desenvolveram uma nanopartícula polimérica de quitosana
conjugada com um peptídeo antifúngico, a histatina 5 e com a AmB, de modo que a
liberação era pH dependente e direcionada para as células fúngicas. Os resultados
dos testes in vitro foram promissores, tanto no teste de susceptibilidade antifúngica
contra cepas de Candida albicans por apresentarem melhores resultados que a AmB
livre e a nanopartícula apenas com a AmB, quanto no teste de citotoxicidade. Testes
em murinos também foram realizados, de modo que a taxa de sobrevivência dos
animais infectados com Candida albicans foi de 100% para o regime de
administração de 1mg/kg 3 vezes ao dia.
O PLA foi o polímero de escolha no estudo realizado por Endo e
colaboradores (2020) para o desenvolvimento de nanopartículas contendo
cetoconazol para o tratamento de infecções causadas por leveduras de Candia spp.
e por fungos dermatófitos, bem como de seus biofilmes. Os testes de
susceptibilidade antifúngica demonstraram que as nanopartículas foram eficazes
contra diversas espécies de fungos avaliadas cerca de 2 a 8 vezes mais que o
fármaco livre, apesar de terem sido menos eficazes que o mesmo nos ensaios
realizados em biofilmes.
2.1.2 NANOFIBRAS E MICROFIBRAS POLIMÉRICAS
Outro tipo de sistema compostos por polímeros são as nanofibras e
microfibras, que, como o próprio nome sugere, apresentam-se sob a forma de fios
poliméricos de diâmetros nanométrico e micrométrico e que apresentam alta área
superficial. Elas são capazes de alterar a liberação de fármacos, de carrear diversas
substâncias, como antibióticos, proteínas e DNA, bem como vêm sendo estudadas
como plataformas de desenvolvimento de tecidos. Assim como os sistemas

199
nanoparticulados poliméricos, as nanofibras também podem ser fabricadas com
polímeros sintéticos (como PLA e PLGA) ou naturais (como celulose e quitosana)
(HU et al., 2014).
O polivinil álcool (PVA) foi alvo de estudo em trabalho feito por Semnani e
colaboradores (2017) para desenvolvimento de nano e microfibras contendo
fluconazol. Eles obtiveram as fibras em coletores compostos por algodão e poliéster,
avaliando essa plataforma frente à espécie Candida albicans por meio de teste de
susceptibilidade a antimicrobianos. Foi observado que o aumento da proporção de
fluconazol aumentou o diâmetro das fibras, indo de nanofibras a microfibras e que as
plataformas desenvolvidas apresentaram atividade contra a cepa estudada em
diferentes níveis.
Um estudo realizado por Nematpour e colaboradores (2020) desenvolveu
uma formulação de nanofibras de alginato, dextrano e PVA mucoadesivas contendo
clotrimazol para o tratamento de candidíase vaginal. Os resultados obtidos
demonstraram que as nanofibras desenvolvidas apresentaram maior
mucoadesividade que filmes desenvolvidos em paralelo devido à maior área
superficial das primeiras, bem como maior atividade contra Candida albicans e
Candida dubliniensis, provavelmente por conta de um estado de maior amorfização
das nanofibras que permitem uma maior solubilidade do clotrimazol, fármaco
majoritariamente hidrofóbico. Ensaios de citotoxicidade também demonstraram que
as nanofibras são seguras.
2.2 CARREADORES E DRUG DELIVERY SYSTEMS LIPÍDICOS
Entre as variedades de matrizes disponíveis para uso em nanocarreadores
sendo atualmente investigadas, os lipídeos possuem destaque devido às vantagens
de maior grau de biocompatibilidade e versatilidade. São viáveis para formular
produtos farmacêuticos e cosméticos que podem ser adaptados para diversas vias
de administração e condições patológicas. Comparados à nanocarreadores de
outras matrizes, possuem as vantagens de maior capacidade de encapsulamento de
ativos, biocompatibilidade, maior estabilidade, permeação cutânea superior, baixo
risco, menor custo, além de poderem ser formulados sem uso de solventes
orgânicos (ATTAMA; MOMOH; BUILDERS, 2012; MISHRA; SHANDILYA; MISHRA,
2018).
Geralmente, nanocarreadores lipídicos são utilizados para melhorar a
biodisponibilidade de fármacos com baixa solubilidade e permeabilidade (Sistema de

200
Classificação Biofarmacêutica Classes II e IV), mas também atende à várias outras
aplicações conforme as necessidades dos fármacos e doenças investigados. Além
disso, dentre suas outras funções estão: proteção dos compostos ativos contra
degradação, conferindo estabilidade; liberação controlada e/ou prolongada de ativos;
direcionamento sítio-específico; redução de toxicidade (LI et al., 2017). Baseado na
eficácia do uso de nanocarreadores lipídicos em diversas funções, já existem
diversos medicamentos sendo comercializados para o tratamento de diversas
doenças, tais como Doxil®, AmBisome®, Depocyt®, Amphocil® e DepoDur®(MISHRA;
SHANDILYA; MISHRA, 2018).
A depender da estrutura e tamanho da partícula, os tipos de nanocarreadores
lipídicos são variados, sendo os mais comuns as nanopartículas, lipossomas,
nanoemulsões e microemulsões (ATTAMA; MOMOH; BUILDERS, 2012). Entre as
nanopartículas estão as Nanopartículas Lipídicas Sólidas (NLS) e os Carreadores
Lipídicos Nanoestruturados (CLN), os quais são sistemas matriciais que variam entre
50 e 1000 nm (PURI et al., 2009). NLS são nanopartículas compostas por lipídeos
sólidos à temperatura ambiente como matriz, o que lhe confere desvantagens como
crescimento da partícula, baixa taxa de incorporação e expulsão de ativos devido a
característica cristalina e transições polimórficas dos lipídeos. Tal fato levou ao
desenvolvimento dos CLN, os quais são caracterizados pela matriz composta por
uma mistura de lipídios sólidos e líquidos, que permitiu aumentar o encapsulamento
e retenção do ativo (GORDILLO-GALEANO; MORA-HUERTAS, 2018; SHIRODKAR
et al., 2019). Já os Lipossomas são estruturas vesiculares formadas por bicamadas
de fosfolipídios separadas por domínios aquosos e que compreendem um núcleo
aquoso, com tamanhos variando de nanômetros à micrômetros, inclusive com
variações nas quantidades de lamelas, podendo ser vesículas multilamelares
(MLVs), pequenas vesículas unilamelares (SUVs) e grandes vesículas unilamelares
(LUVs). Possui extensa versatilidade sua estrutura hidrofílica e hidrofóbica, passível
de incorporação de ativos de diferentes solubilidades (BOZZUTO; MOLINARI, 2015).
Quanto aos sistemas emulsionados, as Nanoemulsões (NE) e Microemulsões (ME)
são as mais utilizadas. MEs e NEs podem ser definidos como a dispersões
nanométrica de uma fase líquida em outra na qual não é solúvel, geralmente
compostos por uma fase aquosa, uma fase oleosa e tensoativos (ANTON;
VANDAMME, 2011). NE são sistemas cineticamente estáveis, com tamanhos
variando entre 50-500nm, enquanto ME são termodinamicamente estáveis,

201
opticamente isotrópicas, com tamanho que varia de 10-200 nm, porém requer o uso
de altos níveis de tensoativos, os quais podem ser tóxicos e irritantes
(MCCLEMENTS, 2012).
Independente do tipo de estrutura, os carreadores lipídicos possuem
vantagens para administração cutânea devido sua maior compatibilidade com a
composição da pele, o que permite melhor penetração e permeação, além de
possuir efeito emoliente e atividade reparadora da pele. Assim, a escolha do
carreador vai depender do ativo usado, a doença a ser tratada e o tipo de
administração pretendida, podendo ser dérmica ou transdérmica (HUA, 2015;
WAGHULE et al., 2020). No caso das doenças fúngicas, tanto as infecções fúngicas
superficiais que requerem administração tópica, como as infecções invasivas, as
quais necessitam de tratamento sistêmico, podem se beneficiar de carreadores
inovadores que corrijam os problemas dos agentes antifúngicos utilizados na prática
clínica, como o espectro de atividade, propriedades físico-químicas e
biofarmacêuticas (SAINI; ARORA; GUPTA, 2020; SOLIMAN, 2017). Assim, tais
doenças podem se beneficiar das vantagens dos nanocarreadores lipídicos. Os
principais estudos são relatados a seguir, subdivididos por tipo de nanocarreador
lipídico.
2.2.1 Lipossomas
Muitos estudos têm se debruçado para avaliar a eficiência de lipossomas
como estratégia para aprimorar a eficácia dos fármacos e tratar tais infecções. O
voriconazaol apresenta falhas inerentes em terapias e sua incorporação em
lipossomas mostrou algumas vantagens. No estudo de Veloso e colaboradores
(2018), o encapsulamento resultou em atividade antifúngica melhorada em modelo
animal de candidíase sistêmica causada por Candida albicans e Aspergillus sp.,
devido ao aumento da especificidade e penetração nos tecidos, proteção do fármaco
contra degradação biológica com redução de 30% da taxa de metabólito inativo.
Outro estudo comparou a ação do voriconazol contra Trichophyton rubrum em
diferentes nanocarreadores, mostrando redução da MIC50 e MIC90 e melhor
deposição na pele quando incorporado em CLN e lipossomas, inclusive
proporcionando concentrações de drogas nas camadas mais internas da pele acima
dos valores de MIC (SANTOS et al., 2018).
Outro estudo que desenvolveu lipossomas, com propriedades mucoadesivas
e contendo sertaconazol para tratamento local de candidíase vaginal, mostrou

202
aumento da atividade antifúngica, além da retenção do fármaco no tecido e redução
da permeabilidade do fármaco quando usado um gel contendo fármaco em
lipossoma mucoadesivo, em comparação com o gel contendo o fármaco em sua
forma convencional. A retenção do fármaco no tecido e a absorção sistêmica
reduzida servem para desenvolver a forma de aplicação local, minimizando a
absorção sistêmica do fármaco (ABDELLATIF et al., 2020). A eficácia de lipossomas
carregados com óleo essencial de Artemisia annua foi testada contra diversas cepas
de Candida spp., cujos resultados mostraram aumentam de sua eficácia,
apresentando concentrações fungicidas mínimas (MFC) para o óleo encapsulado em
média 1/3 da MFC do óleo livre, sendo as espécies mais suscetíveis a Candida
norvegensis e Candida krusei (RISALITI et al., 2020).
A fim de verificar a eficácia de lipossomas contendo fluconazol associado à
C12AHL (N -3-oxo-dodecanoil-L-homoserina lactona - molécula sinalizadora
secretada por P. aeruginosa), Bandara e colaboradores (2020) mostraram que o
carreador conseguiu reduzir a concentrações inibitórias mínimas de biofilme (MBIC)
do fluconazol para Candida albicans de 512 μg/mL para 5,5 µg/mL. Em outro estudo,
diferentes lipossomas desenvolvidos contendo anidulafungina conseguiram
aumentar a solubilidade do fármaco e auxiliar a liberação nos fungos, reduziram a
carga fúngica em até 99% e também interromperam biofilmes pré-formados de
Candida albicans de forma superior em comparação com o fármaco não
encapsulado (VERA‐GONZÁLEZ et al., 2020). Como os fracassos das terapias
atuais anti-biofilme estão principalmente ligados à fraca penetração do fármaco no
biofilme e à ligação inespecífica na matriz do biofilme, os nanocarreadores surgem
como uma abordagem para facilitar a penetração do fármaco.
2.2.2 Carreadores Lipídicos Nanoestruturados (CLN)
O sistema nervoso central é um dos locais de ação mais difíceis de se
alcançar devido a fraca penetração de ativos através da barreira hematoencefálica,
podendo ser aprimorada com uso de nanocarreadores. Um estudo buscou avaliar o
tratamento da meningoencefalite causada por Cryptococcus neoformans utilizando
cetoconazol em CLN, cujos resultados mostraram atividade superior do cetoconazol
encapsulado em comparação com o cetoconazol livre quando administrados por via
intranasal, devido atividade antifúngica significativamente aumentada, propriedades
de penetração no tecido aprimoradas e residência prolongada (DU et al., 2019).
Para tentar diminuir efeitos adversos sistêmicos e interações medicamentosas

203
relacionados aos antifúngicos, pesquisas têm sido desenvolvidas usando CLN
visando aplicação tópica. Passos e colaboradores (2020) buscavam tratamento
tópico cutâneo para esporotricose e mostraram que itraconazol encapsulado em
CLN possibilitou a retenção dérmica do fármaco em até duas vezes mais, mantendo
a eficácia antifúngica conta Sporothrix brasiliensis e Candida albicans. Em outra
pesquisa, CLN contendo AmB foi testado como tratamento tópico de candidíase
vulvovaginal, e demonstrou acúmulo significativo do fármaco na pele, potência
aprimorada contra cepas de Candida albicans em comparação com o fármaco livre,
com eficácia superior do gel contendo AmB encapsulado em CLN no modelo in
vivo em comparação com o gel AmB sem CLN (RIAZ et al., 2020).
Já para via ocular, um estudo desenvolveu CLN contendo AmB e avaliaram
sua biodistribuição após instilação tópica, como tratamento de ceratomicoses
causadas por Candida albicans e Aspergillus fumigatus (LAKHANI et al., 2019). O
CLN peguilado carregado com AmB mostrou atividade antifúngica comparável ou
melhor do que Fungizone e AmBisome, e produziu distribuição de AmB, com
concentrações estatisticamente semelhantes em todos os tecidos oculares testados.
Portanto, tanto para uso tópico como sistêmico, os CLNs têm mostrado eficácia
como sistemas de boa distribuição tecidual e aumento de eficácia.
2.2.3 Nanopartículas Lipídicas Sólidas (NLS)
Visando comparer os carreadores, uma pesquisa investigou como NLS e CLN
podem melhorar a biodisponibilidade oral e melhorar a atividade antifúngica do
cetoconazol contra Candida albicans (DUDHIPALA; AY, 2020). Ambas as
formulações aumentaram a atividade antifúngica do fármaco em comparação com a
suspensão aquosa, bemc omo as aumentaram em mais de duas vezes a
concentração máxima (Cmax) in vivo após a administração oral em comparação ao
cetoconazol livre, sendo a biodisponibilidade levemente melhor com o CLN.
Para a administração oftálmica de medicamentos, o desafio é vencer
diferentes barreiras oculares que diminuem a absorção, necessitando de sistemas
de aplicação ocular eficientes com melhor penetração. Nesse sentido, um estudo
avaliou NLS contend natamicina para aumentar permeação corneana e aprimorar
atividade antifúngica em Ceratite causada por Aspergillus fumigatus e Candida
albicans (KHAMES et al., 2019). Os resultados mostraram atividade antifúngica
aprimorada com o fármaco incorporadona NLS, levando ao aumento da zona de

204
inibição e diminuição da MIC em mais de duas vezes, além de aumento da absorção
ocular da natamicinanas camadas profundas da córnea.
Diferentes formulações de NLS contendo fitol foram testadas quanto à sua
eficácia antifúngica em diferentes cepas de Candida spp., cujos resultados
mostraram que as nano partículas foram capazes de melhorar a atividade
antifúngica do fitol diminuindo as MICs em aproximadamente 300 vezes em relação
ao fitol não encapsulado, inclusive em Candida krusei que é uma espécie resistente
ao fluconazole (LIMA et al., 2020).
Clotrimazol e ácido alfalipólico incorporados em NLS foram testadas como um
sistema de entrega duplotópico contra Candida albicans, mostrando que a atividade
foi igual entre o fármaco livre e incorporadoem NLS, porém a MIC foireduzida à
metade quando o fármaco foi incorporado em NLS catiônicas, mostrando que o
revestimento de nano partículas pode ser uma estratégia eficaz para melhorar
eficácia (CARBONE et al., 2020). O miconazolen capsulado em NLS também foi
avaliado como tratamento tópico contra Candida albicans, onde a nano partícula
melhorou a retenção e distribuição cutânea e a atividades antifúngica do fármaco em
comparação ao mesmo em solução, além de apresentar menor irritação (AL-
MAGHRABI et al., 2020).
NLS contend fluconazole foram testadas contra diferentes cepas de Candida
spp. in vitro, cujo resultado mostrou que as nano partículas conseguiram reduzir o
MIC em diversas cepas resistentes ao fluconazol, mostrando atividade antifúngica
eficaz (MOAZENI et al., 2016). Em um ensaio clínico controlador andomizado, NLS
com fluconazole foram incorporadas em um gel e testado como tratamento tópico da
pitiríase versicolor causado por Malassezia sp., em comparação com um creme
comercial de clotrimazol 1% (EL-HOUSINY et al., 2018). Os resultados mostraram
eficácia clínica superior do gel contendo as nanopartículas de fluconazol, com
melhora na resposta terapêutica 1,4 vezes maior, porcentagem de cura 4 vezes
maior e erradicação complete em comparação ao creme comercializado, que pode
ser atribuído à penetração aprimorada na pele do fármaco quando
encapsulado. Assim, vários fármacos tradicionais foram testadosem NLS para
diversas vias de administração com algum sucesso, inclusive em ensaio clínico.
2.2.4 Microemulsões
Embora mais timidamente, micro emulsões também foram avaliadas quanto
ao seu potencial carreador em tratamentos antifúngicos, onde os estudos mais

205
recentes avaliaram sua aplicação tópica. Uma micro emulsão contendo na tifina foi
avaliada quanto à sua atividade antifúngica contra Candida albicans
e Candida parapsilosis, onde foi demonstrado que a microemulsão apresentou
melhor atividade in vitro que o creme tópico comercial com o mesmo ativo, além de
coeficiente de permeabilidade cinco vezes maior, sugerindo que o carreador permitiu
maior penetração do fármaco nas membranas celulares dos fungos (ERDAL et al.,
2020). Já o fármaco nistatina, quando incorporado em micro emulsões, apresentou
alta taxa de difusão e melhor atividade antifúngica in vitro contra Candida albican
sem comparação com o fármaco em suspensão, devido melhor solubilidade da
nistatina nos components oleosos da formulação (MAQSOOD et al., 2019). Entre os
produtos naturais, o óleo da folha de Citrus hystrix DC foi incorporado em
microemulsões e testados contra o fungo Trichophyton
mentagrophytes var. interdigitale, o qual exibiu atividade antifúngica melhor que
cetoconazol e fluconazol no teste (PUMIVAL et al., 2020).
2.2.5 Nanoemulsões
Nanoemulsões recentemente foram testadas tanto para uso tópico como uso
sistêmico de AmB. Uma nanoemulsão de líquido iônico em água contend AmB
visando uso sistêmico foi utilizada para demonstrar a robustez das nanoemulsões
em melhorar a solubilidade e diminuir a toxicidade de fármacos, mantendo atividade
antifúngica contra Candida albicans (ESSON; MECOZZI; MECOZZI, 2020). Em outro
estudo, nanoemulsões contend AmB incorporadas em gel para avaliação de
atividadetópica, foi demonstrada uma taxa de fluxo de permeação percutânea mais
de três vezes melhor do gel contendo a nanoemulsão e da nanoemulsão em
comparação com a solução, além de melhor atividade antifúngica contra Candida
albicans e Aspergillus fumigatus (HUSSAIN et al., 2016).
2.2.5.1 Sistemas de entrega de fármacos auto nanoemulsificantes
Os sistemas auto emulsificantes são misturas da fase oleosa, tenso ativos e
co-tensoativos, que formam espontaneamente nanoemulsão óleo em água de
aproximadamente 200 nm ou menos em tamanho após diluição com água sob
agitação suave (DATE et al., 2010). O uso desses sistemas como formas
farmacêuticas tópicas ou orais sólidas e/ou líquidas já tem sido avaliado por
pesquisadores. Uma pesquisa avaliou a eficácia de Sistema auto nanoemulsificantes
na melhoria da permeabilidade transcorneal do voriconazol para o tratamento da
ceratitefúngica (RASOANIRINA et al., 2020). Os resultados revelaram que a

206
MIC90 da formulação desenvolvida foi semelhante à formulação comercial do
voriconazol contra as espécies de cândida testada se superior contra Aspergillus
fumigatus, além de ter apresentado maior penetração no olho e liberação sustentada
do fármaconos testes in vivo.
Para otimizar a biodisponibilidade oral da nistatina sistemas auto
nanoemulsificantes foram desenvolvidos, os quais melhoraram taxa de liberação e a
solubilização do fármaco em comparação com a formulação comercial, bem como
apresentou uma MIC contra C. albicans similar in vitro, e foram significativamente
mais eficazes na redução da carga oral do fungo em camundongos após sete dias
de tratamento (KASSEM et al., 2016). Em outro estudo, um Sistema auto
nanoemulsificante contend itraconazole foi incorporado em gel para usotópico, onde
foi demonstrado que o gel tinha uma atividade antifúngica significativamente maior
que a solução do fármaco contra as espécies testadas, que estava relacionada ao
fato de que o fármaco no sistema está em gotículas muito pequenas que melhoram
sua difusão (BOTROS; HUSSEIN; MANSOUR, 2020). Portanto, os sistemas
nanoemulsivos, tradicionais e auto emulsificantes, tem apresentado grandes
propriedades de aprimorar a permeação de fármaco sem vários tecidos,
possibilitando tratamentos de doenças fúngicas por diferentes vias de administração.

3. CONLUSÃO
O desenvolvimento de formasfarmacêuticascapazes de carrearsubstâncias,
alterandosuascaracterísticasfísico-químicas, farmacocinéticas, tóxicas e até modular
a respostadiretamente no local do sítio de açãosãopossíveisgraçasaosnovosdrug
delivery systems, especialmenteos que se apresentamnaescalananométrica e
micrométrica, comofoipossível ser visto nessecapítulo. Alémdisso, comoem outros
campos de aplicação, taiscarreadores se mostrampromissores no tratamento de
doençascausadas por fungosdesdemicosessuperficiais a sistêmicas. Dentre as
principaisplataformasdesenvolvidasestão as nanopartículaspoliméricas e lipídicas,
as nano e microfibras, as nanoemulsões, ossistemasautoemulsificantes, entre
outros. É importantetambémressaltar que ossistemasaquiapresentadospodem se
apresentar de forma híbrida, como é o caso de nanopartículashíbridas de polímeros
e lipídeos. O mercado envolvendoessessistemastendeaaumentaraolongo dos anos e
se tornarlíder no tratamento de doençasdesafiadoras.

207
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em: <https://www.mdpi.com/1420-3049/25/16/3731>.

212
CAPÍTULO 13
COMO A TECNOLOGIA FARMACÊUTICA PODE AUXILIAR
NO DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO DE
MEDICAMENTOS ANTIFÚNGICOS (PARTE 2)

Lucas Amadeu Gonzaga da Costa


Mestrando em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Myla Lôbo de Souza


Doutoranda em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Aline Silva Ferreira


Doutoranda em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Asley Thalia Medeiros Souza


Graduanda em Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Pedro José Rolim Neto


Professor titular da Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Ciências
Farmacêuticas – Laboratório de Tecnologia dos Medicamentos
Endereço: Av. Prof. Arthur de Sá, S/N- Cidade Universitária, Recife - PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

RESUMO: Muitos fármacos antifúngicos apresentam problemas de solubilidade, ou


seja, são fracamente solúveis em água e nos fluidos aquosos, o que leva a uma
absorção limitada devido à baixa velocidade de dissolução. Dessa forma o objetivo
desse capítulo foi evidenciar a aplicação de excipientes inteligentes e técnicas para
obtenção de sistemas carreadores de fármacos e formulações, atrativos para o
carreamento e veiculação de fármacos antifúngicos. Diversos estudos foram
realizados utilizando fármacos e candidatos a fármacos antifúngicos veiculados em
complexos de inclusão com ciclodextrinas, polímeros, dispersões sólidas, esmaltes

213
para as unhas (sistemas transungueal) e géis (hidrogéis, organogéis, microgel), com
muitos resultados promissores e formulações potencias, que demonstraram
principalmente incremento de solubilidade e melhora de estabilidade, além de
melhora de permeação, liberação prolongada, aumento da taxa de dissolução e
ação intensificada, aspectos interessantes para administração eficaz de
medicamentos antifúngicos.

ABSTRACT: Many antifungal drugs have solubility problems. They are poorly
soluble in water and aqueous fluids, which leads to limited absorption due to the low
rate of dissolution. Thus the aimoft his chapter is to high light the application of
inteligent excipiente sand techniques for obtaining carrier systems of drugs and
formulations which are suitable for carrying and delivering antifungal drugs. Several
studies have been carried out using drugs and antifungal drug candidates carried in
inclusion complexes with cyclodextrins, polymers, solid dispersions, nailpolishes
(transungual systems) andgels (hydrogels, organogels, microgels), with many
promising results and potential formulations, which showed mainly in creased
solubility and improved stability, in addition to improved permeation, prolonged
release, increased dissolution rate and intensified action. That are interesting
aspects for effective administration of antifungal drugs.

214
1 INTRODUÇÃO
Boa parte dos fármacos antifúngicos apresentam como entrave farmacológico
problemas de solubilidade, são fracamente solúveis em água e nos fluidos aquosos,
o que leva a uma absorção limitada devido à baixa velocidade de dissolução. Dessa
forma a utilização de excipientes inteligentes e técnicas para obtenção de sistemas
carreadores de fármacos vêm crescendo na área farmacêutica, dentre os quais se
destacam as ciclodextrinas, polímeros, dispersões sólidas, dentre outros, visando
principalmente incremento da solubilidade e modulação da liberação de fármacos
(ARRUNÁTEGUI et al., 2015; URBAN et al., 2016).
Além disso, as formas farmacêuticas são importantes aliadas, uma vez que
são formuladas para atingir objetivos específicos e a cada ano diversas inovações
surgem, oferecendo vantagens como veiculação de fármacos hidrofílicos e
hidrofóbicos para diferentes vias de administração, liberação controlada,
estabilidade, dentre outras. Nesse contexto, o objetivo desse capítulo consistiu em
evidenciar a aplicação de excipientes inteligentes e técnicas para obtenção de
sistemas carreadores de fármacos e formulações atrativos para carreamento e
veiculação de fármacos antifúngicos.

2 EXCIPIENTES INTELIGENTES
2.1CICLODEXTRINAS
As ciclodextrinas (CD), constituem uma classe de excipientes farmacêuticos,
que destacam-se devido a sua capacidade de formar complexos de inclusão
(receptor-substrato) com uma variedade de substâncias que têm suas propriedades
alteradas pela complexação, permitindo alterações de propriedades físico-químicas,
estabilidade, redução de toxicidade, incremento de solubilidade em água e
consequentemente melhora de biodisponibilidade. Esses complexos de inclusão
podem ser obtidos por diversas técnicas como: solução com água, mistura física,
liofilização, atomização, dentre outras. Elas têm formato cônico, com parte interna
apolar (hidrofóbica) e parte externa polar (hidrofílica), podendo ser naturais ou semi-
sintéticas. (CUNHA-FILHO & SÁ-BARRETO., 2007; VENTURINI et al., 2008).
As CD naturais são sacarídeos cíclicos formados por unidades de glicose,
dentre as principais estão a α-CD (6 unidades de glicose), β-CD (7 unidades de
glicose) e γ-CD (8 unidades de glicose), que diferem pelo tamanho de sua cavidade
conforme se pode observar na figura 1. E as ciclodextrinas semissintéticas,

215
modificadas através da adição de substituintes a uma ciclodextrina natural buscando
melhorar ainda mais a solubilidade desses compostos, como ahidróxi-propil-α-
ciclodextrina (HP-α-CD), a hidróxi-propil-β-ciclodextrina (HP-β-CD), a sulfo-butil-éter-
β-ciclodextrina (SB-β-CD) e a metil-β-ciclodextrina randomizada (RM-β-CD)
(GUEDES et al., 2008).

Figura 1. Estrutura e propriedades da α-CD, β -CD e γ -CD.

Fonte: VENTURINI et al., 2008.

Características que tornam as CD atrativas para complexação com fármacos


antifúngicos. Nesse sentido estudos foram realizados com a anfotericina B (AnB),
um antifúngico de amplo espectro de ação, que apresenta baixa taxa de resistência,
mas ainda não disponível comercialmente como formulações tópicas, apenas
parenterais. Por isso Serrano e colaboradores (2012) obtiveram uma solução
complexando γ-CD com AnB para aplicação tópica como colírio para tratamento da
ceratite fúngica, doença que pode levar a cegueira e após as caracterizações
evidenciaram que a complexação foi capaz de solubilizar a AnB, manter atividade
antifúngica in vitro de 35% contra C. albicans maior que a encontrada na suspensão
extemporânea de Fungizone® utilizada como base, conferir estabilidade físico-
química, conseguir tamanho de partícula adequado e esterilidade por mais de 30
dias, aspectos importantes pois suspensões aquosas e AnB são difíceis de
esterilizar por filtração, além da doença ter um período de tratamento em torno de 4
semanas (ou seja em torno de 30 dias) e são associadas a irritação devido ao
tamanho de partículas, o que faz a formulação desenvolvida ser promissora.
Ainda seguindo a mesma linha Ruiz e colaboradores (2014) também
desenvolveram formulações tópicas de AnB complexada com γ-CD, mas para tratar
infecções cutâneas na forma de cremes e géis e dentre elas o complexo de AnB
216
com γ-CD em gel de metilcelulose foi o que apresentou maior atividade antifúngica
contra as cepas de Candida spp., Trichosporon spp. e Saccharomyces spp. e
quando comparado com a AnB dissolvida em DMSO, comprimidos de
AnBSensitabs® padrão e com o creme (clotrimazol® creme) e comprimidos de
clotrimazol (clotrimazol Neo-sensitabs®) o gel também demonstrou melhores
resultados, in vitro. O gel de AnB ainda mostrou maior inibição na formação de
biofilmes e maior penetração nesses biofilmes que o AnB dissolvida em DMSO. Uma
formulação interessante, físico-quimicamente estável, mas que ainda precisa de
mais testes para o uso em humanos.
O incremento de solubilidade e a melhora de estabilidade de candidatos a
fármacos e fármacos antifúngicos com baixa solubilidade a partir da complexação
com ciclodextrinas é um dos principais objetivos de alguns estudos. Sanjuan e
colaboradores (2020) avaliaram complexos de inclusão (CI) liofilizados de um
candidato a fármaco antifúngico, o 2-(2-nitrovinil)furano (G-0), com HP-β-CD e SB-β-
CD, através de um estudo de estabilidade acelerada onde evidenciaram boa
estabilidade físico química dos CI com nenhum produto de degradação detectado
em 6 meses, e ainda a partir de ensaio de dissolução em fluido vaginal simulado
puderam observar uma liberação rápida e na avaliação da atividade antifúngica in
vitro tanto o G-0 isolado, como seus CI apresentaram igual atividade contra cepas
de C. albicansporémmaior que a AnB utilizada como comparativo.
O tratamento preferido de lesões antifúngicas cutâneas e sistêmicas utiliza
composto azólicos antifúngicos, porém a maioria deles apresenta baixa solubilidade
e consequentemente baixa biodisponibilidade, acarretando problemas de eficácia e
efeitos colaterais desagradáveis (BUNCHANAN et al., 2007). Dessa forma, Silva e
colaboradores (2021) investigaram experimentalmente a complexação do candidato
a fármaco, 2-[2-(ciclohexilmetileno) hidrazinil)]-4-feniltiazol (RN104), com a α-CD, β-
CD e HP-β-CD e teoricamente por docking molecular, identificando que com a HP-β-
CD a solubilidade desse composto aumentava em torno de 18x sendo a ligação
mais favorável.
Assim como, Valkova e Perlovich (2020) que obtiveram complexos de um
composto potencial antifúngico da classe dos tiazóis, o L-173, com diferentes
ciclodextrina (β-CD, HP-β-CD e heptaquis (2,6-di-O-metil)-β-ciclodextrina (DM-β-
CD)) com melhora significativa de solubilidade em soluções aquosas (pH 2 e 7,4)
indicando possível melhora de biodisponibilidade, sendo o complexo obtido com a

217
DM-β-CD o de melhor capacidade solubilizante nos meios utilizados. E Jansook e
colaboradores (2020) complexaram econazol com α-CD e γ-CD em soluções de
diferentes pHs, observaram que os complexos obtidos com α-CD em pH ácido
melhoravam a solubilidade do econazol, a estabilidade térmica e ainda sua atividade
contra os fungos filamentosos testados (A. flavus e F. solani).
Buchanan e colaboradores (2007) por sua vez fizeram uma avaliação e uma
comparação da eficácia de complexos de itraconazol (antifúngico triazólico de amplo
espectro) com hidroxibutenil‐β‐ciclodextrina (HBenBCD) e com HP-β-CD para
administração oral e intravenosa (IV), para verificar a potencialização da solubilidade
do visando a maior biodisponibilidade desse fármaco, obtendo melhora de
solubilidade de 17x com a HBenBCD e 3,8x com a HP-β-CD. Esses complexos e
formas comerciais do itraconazol com e sem HP-β-CD (Sporanox®) foram avaliados
in vivo em ratos por via oral e IV, apresentando resultados animadores o complexo
com HBenBCD em solução por via IV apresentou área sob a curva maior que a
observada no Sporanox® com HP-β-CD e por via oral resultou em maior
biodisponibilidade oral que o Sporanox® com HP-β-CD. Enquanto que na forma
sólida o complexo com HBenBCD exibiu biodisponibilidade oral 2x maior que o
Sporanox® sem HP-β-CD. Esses resultados demonstram o potencial desse
complexo, mas ainda são necessários mais estudos.
O voriconazol também faz parte dos composto azólicos antifúngicos, com
amplo espectro de ação contra Candida, Apergillus, Fusarium e Espécies
de Histoplasma mas possui baixa solubilidade aquosa. Baseado nisso Deshkar e
Pelve (2019) obtiveram CI de voriconazol com HP-β-CD por atomização e a partir
dele formularam géis vaginais termossensíveis, para tratamento vaginite um
problema que acomete grande parte mulheres durante a vida, que foram
caracterizados e avaliados quanto sua liberação in vitro e in vivo utilizando ratas. A
melhor formulação obtida de acordo com as caracterizações foi a que utilizou
poloxâmero e HPMC (como polímero mucoadesivo), proporcionando liberação
sustentada com aproximadamente 56% de fármaco liberado em 8h e uma maior
absorção vaginal in vivo, que o gel in situ convencional (sem HP-β-CD) e a
dispersão do fármaco utilizados com finalidade comparativa.
Como as CD conseguem agir como emulsionantes, por sua capacidade de
solubilização de compostos pouco solúveis, além de serem biocompatibilidade, elas
vêm sendo muito usadas para compor emulsões pois podem melhorar a distribuição

218
e/ou permeação na pele. Leclercq e Nardello-Rataj (2016) desenvolveram 6
emulsões pickering (E1, 2, 3, 4, 5 e 6), ou seja, uma mistura de água, óleo (miristato
de isopropila e parafina líquida) e CD naturais (α-CD,β-CD e γ-CD) variados, para
administração tópica de derivados azólicos antifúngicos, nesse estudo foi utilizado o
econazol. As formulações foram estáveis contra coalescência e comportamento
reológico adequado para aplicação tópica, quando comparadas a formulação
comercial (Pevaryl®). Porém na avaliação da atividade antifúngica in vitro contra C.
albicans apenas E1, E2, E4 e E5 apresentaram atividade e está foi semelhante a
formulação comercial (Pevaryl®).
Já Noomen e colaboradores (2008) produziram uma emulsão aquosa
combinando β-CD, polímero de silicone e água para encapsulamento de fármacos
antifúngicos. As β-CD foram enxertadas com o polímero poli(metilhidrossiloxano) ou
copolímero poli(metilhidro-siloxano-co-dimetilsiloxano) por hidrossililação, que foram
emulsificados por emulsificação espontânea obtendo emulsões estáveis com
tamanhos de partículas entre 200 e 500 nm, onde incorporaram a griseofulvina
(antifúngico de baixa solubilidade) dentro da cavidade da β-CD formando um CI.
Além desses estudos Santana (2016) analisaram a encapsulação de um
composto natural que apresentou atividade antifúngica frente a dermatófitos e
leveduras (Candida e Cryptococcus) em CD. O óleo essencial de Eugenia brejoensis
(OEEb) embora apresente atividade antifúngica possui alguns problemas como
baixa solubilidade em água, facilidade de oxidação e alta volatilidade que dificultam
sua utilização como medicamento, dessa maneira uma solução de água e β-CD foi
formada e o OEEb foi adicionado e mantido em agitação seguindo para liofilização e
após caracterizado por calorimetria exploratória diferencial (DSC), análises de
termogravimetria (ATG) e difração de raios X (DRX) confirmou-se a formação de um
CI e um percentual de retenção do OEEb pela β-CD de cerca de 87% foi
evidenciado por headspace estático acoplado a cromatografia de fase gasosa.
Porém mais estudos ainda são necessários para avaliar a estabilidade desses CI e
atividade antifúngica.
Com base em todo o exposto os estudos conseguiram resultados
interessantes, em sua grande maioria aumento de solubilidade e melhora de
estabilidade e em alguns casos formulações com grande potencial de ação
antifúngica foram obtidas. Nota-se que vários tipos de CD foram utilizados, uma vez
que, o tipo vai proporcionar tamanhos de cavidade e substituintes diferentes que

219
podem influenciar na afinidade e interação com os fármacos produzido alterações
que podem ser vantajosas ou não.
2.2 ESMALTES
As onicomicoses são infecções fúngicas crônicas que acometem as unhas
causando desconforto e que são de difícil tratamento uma vez que, a lâmina ungueal
é muito queratinizada. Nesse sentido Yang e colaboradores (2020) assim como Pael
e Vora (2016) desenvolveram sistemas transungueal (esmalte para unhas) para
entrega de cloridrato de terbinafina (TB) para tratamento de onicomicoses. O
primeiro obteve um sistema de formação de filme in situ à base de Eudragit ® RLPO
para co-entrega de TB e ureia, a uréia carregada no filme exibiu efeitos de aumento
significativos na retenção de TB nas membranas do casco bovino e na penetração
através das membranas demonstrado superar a barreira ungueal para tratar a
onicomicose, a formulação teve sua atividade antifúngica in vitro testada
contra Trichophyton rubrum , Microsporum canis , Fusarium e Aspergillus fumigatus
os resultados indicaram que a formulação desenvovida aumentou a atividade
antifúngica de TB .
E o segundo formulou uma preparação a base de Eudragit ® RL 100, HPMC
E15, etanol, água e 2-mercaptoetanol como intensificador de permeação, para
entrega de TB e a partir dos estudos de permeação in vitro e ex vivo observou-se
que o esmalte permaneceu mais tempo em contato com a lâmina ungueal e liberou
o fármaco acima da concentração inibitória mínima. Ambos os resultados
demonstram que as formulações são promissoras para o tratamento eficaz de
onicomicoses.
2.3 GÉIS
Os géis são formas farmacêuticas semissólidas estáveis, com boa
propriedade de aplicação sendo conveniente para administração de fármacos por via
tópica, como antifúngicos, atualmente novos géis vem sendo estudados como os
hidrogéis, organogéis e microgéis visando a entrega de fármacos. Kenechukwu e
colaboradores (2018) produziram um microgel mucoadesivo de nitrato de miconazol
(NM) (antifúngico) a base de micropartículas de fitolipídios sólidos com ou
sem polietilenoglicol (PEG)-4000, utilizando policarbófilo como polímero bioadesivo,
que teve eficaz da candidíase vulvovaginal (CV). Onde os microgéis peguilados
exibiram resultados promissores, como liberação prolongada, estabilidade por cerca
de 6 meses, com atividade anti-Candida (86%) in vivo (ratas infectadas com C.

220
albicans) maior que a formulação comercial Daktarin® (75%) e que um hidrogel
carregado de NM. Sendo uma formulação potencial para tratamento da CV com NM.
Gopalan e José (2020) prepararam organogéis de AnB, a base de
monoestearato de sorbitana e lecitina plurônica, uma vez que os organogéis tem alto
poder de penetração através na pele sem utilizar intensificador químico, são de fácil
preparação e podem acomodar composto hidrofílicos e lipofílicos. Nesse estudo o
organogel preparado com monoestearato de sorbitana desempenhou maior
liberação em 8 horas, maior permeação ex vivo em orelha de porco e melhor
atividade antifúngica C. albicans in vitro, além disso, todas as formulações foram
consideradas estáveis e seguras durante os 3 meses de estudo.
E Sultan e colaboradores (2019) apresentaram um hidrogel bioadesivo para
aplicação tópica à base do peptídeo modificado de histatina-5, um peptídeo
produzido naturalmente pelas glândulas salivares, que por ter demonstrado potente
atividade contra C. albicans está sendo utilizado como tratamento alternativo para
candidíase oral. O hidrogel foi obtido a partir do peptídeo modificado liofilizado, PBS
e HPMC, e demonstrou ser eficaz contra cepas de C. albicans resistentes aos
antifúngicos tradicionais in vitro e ainda o peptídeo foi capaz de induzir a proliferação
celular e a rápida migração celular de queratinócitos orais humanos, o que pode
indicar ação na cicatrização de feridas.
2.4 DISPERSÕES SÓLIDAS
Muitos fármacos apresentam fraca solubilidade em água, o que limita a
dissolução aquosa dos mesmos, dificultando sua absorção através do trato
gastrointestinal e interferindo diretamente na biodisponibilidade e eficácia desses
fármacos (PARIKH et al., 2016). Visando o aumento da solubilidade dos fármacos e
o melhoramento das propriedades de dissolução várias técnicas foram
desenvolvidas, como o uso de surfactantes, polimorfos, conjugados poliméricos,
transportadores e dispersões sólidas (YOO et al., 2000).
As dispersões sólidas, também chamadas de soluções sólidas, constituem um
sistema de fármaco-polímero molecularmente dispersos, onde o fármaco é
incorporado de forma homogênea a uma matriz polimérica produzindo um sólido
(Figura 2) (RAMBALI et al., 2003). Esse tipo de sistema vem sendo utilizado como
estratégia de formulação para o aumento da taxa de solubilidade e extensão da
dissolução de fármacos pouco solúveis em água. Uma série de polímeros pode ser
utilizada na constituição de uma dispersão sólida, como polietilenoglicóis, derivados

221
de celulose (celulose microcristalina e hidroxipropilmetilcelulose), copovidona, ácido
cítrico e ácido metacrílico, dentre outros (CHOWDARY; RAO, 2000).

Figura 2.Representação esquemática da estabilização de dispersão sólida amorfa incorporando a


droga na matriz polimérica.
Insumos farmacêuticos
ativos amorfos

Dispersão sólida amorfa


Polímero transportador

Fonte: Adaptado de VAKA et al., 2014.

Além dos diferentes tipos de materiais que podem ser utilizados o sistema de
dispersões sólidas pode ser preparado por diferentes métodos, dentre eles tem-se:
método de extrusão a quente, método de secagem por pulverização ou método do
solvente, revestimento de leito fluido, técnica de liofilização, comoagem e
coprecipitação, sendo os dois primeiros os mais aplicados na indústria farmacêutica.
No método de extrusão de fusão a quente o calor é utilizado para dispersar ou
dissolver o fármaco no polímero de escolha (FULE; AMIN, 2014). Já o método de
secagem por pulverização um solvente orgânico é utilizado para dissolver o fármaco
e o polímero que posteriormente passam por uma secagem por pulverização
(RAMBALI et al., 2003).
Em uma busca por artigos relacionados a formulações antifúngicas contendo
dispersões sólidas encontrou-se 12 estudos que utilizaram o fármaco Itraconazol,
sendo um deles associado ao Posaconazol. O Itraconazol é um agente antifúngico
triazólico de amplo espectro, atualmente apresenta amplo uso clínico para o
tratamento de dermatomicoses, micose visceral, aspergilose, candidíase e infecções
por Tinea unguium (OSHIMA et al., 2003).
Os estudos realizados por Oshima e colaboradores (2007), Keen e
colaboradores (2017), Bhardwaje colaboradores (2018), Rambali e colaboradores
(2003), Tsinmane colaboradores (2018), Parke colaboradores (2007) e Parikh e
Serajuddin (2018), produziram dispersões solidas pelo método de extrusão a quente,

222
que utiliza o calor para formação da dispersão fármaco-polímero. Diversos
excipientes podem ser empregados no sistema de dispersões sólidas, os
encontrados nos estudos foram: copovidona e hidroxipropilmetilcelulose,estando
sozinha ou associada a polivinilpirrolidona, ciclodextrinas, polietilenoglicol e ácido
fosfórico.
Já os estudos realizados por Yoo e colaboradores (2000), Chowdary e Rao
(2000), Jung e colaboradores (1999) e Parikh e colaboradores (2016) utilizaram a
técnica de secagem por pulverização para formação das dispersões sólidas, método
que utiliza um solvente orgânico para formação da dispersão, seguido de posterior
secagem por pulverização. Os excipientes inteligentes utilizados nesses artigos
foram hidroxipropilmetilcelulose, polivinilacetal, polivinilpirrolidona, Poloxamer®,
polietilenoglicol, lactose e Eudragit®.
Um único estudo, realizado por Mugheirbie colaboradores (2017) utilizou o
método de formação das dispersões solidas por leito fluido, onde ocorre a formação
do sistema disperso por meio do movimento ascendente do liquido através de
partículas solidas. Para esse estudo a formação da dispersão utilizou como
excipiente o polímero entérico Eudragit®.
O estudo realizado por Fule e Amin (2014) utilizou o fármaco Posaconazol,
indicado para o tratamento de infecções invasivas por espécies de Cândida e
espécies de Aspergillus em pacientes gravemente imunogênicos. Esse fármaco
possui uma solubilidade aquosa muito baixa, o que prejudica sua dissolução no
fluido gástrico. Tendo em vista a baixa solubilidade do fármaco o estufo utilizou o
polímero anfifílico caprolactampolivinil acetato-polietilenoglicol copolímero de
enxerto, Soluplus©, para formação das dispersões solidas com o Posaconazol
através do método de extrusão de fusão a quente.
No estudo realizado por Muehlenfeld e colaboradores (2013) utilizando
Griseofluvina, antifúngico pertencente a classe II do Sistema de Classificação
Biofarmacêutica, apresentando baixa solubilidade, foi aplicada a técnica de
comoagem no preparo das dispersões sólidas, essa técnica consiste na moagem
continua utilizando jato de ar para micronização. Para o preparo das dispersões
sólidas desse estudo foi utilizado o polímero hidrofílico manitol.
Em suma, os estudos encontrados na busca apresentaram resultados
significantes no quesito de incremento de solubilidade e aumento da taxa de
dissolução dos fármacos após formulação contendo o sistema de dispersões

223
sólidas.
2.5. POLÍMEROS
Os polímeros são excipientes farmacotécnicos extremamente versáteis,
podendo ser aplicados em diferentes formas farmacêuticas. Desde suas aplicações
como diluente ou aglutinantes em pós, compridos e cápsulas, solubilizantes e
estabilizantes em medicamentos líquidos, emulsionantes e geleificantes em formas
farmacêuticas tópicas, co-solventes em formas farmacêuticas parenterais e como
formadores de filmes para aplicação bucal, vaginal, oftálmica, por exemplo.
Polímeros naturais e sintéticos com propriedades bioadesivas tem despertado
grande interesse para produção de produtos farmacêuticos. Para elaboração de um
sistema bioadesivo o fármaco é incorporado a polímeros com afinidade de adesão a
superfícies mucosas. Alguns dos polímeros com propriedades bioadesivas são o
carbopol, hidroxipropilmetilcelulose, carboximetilcelulose, polivinilpirrolidona e
quitosana (FITAIHI et al., 2018).
O uso de formas bioadesivas é particularmente recomendável para o
tratamento de infecções fúngicas, especialmente para aplicação em mucosas, como
a mucosa vaginal e bucal, por exemplo (ROJEWSKA et al., 2019). O contato da
forma farmacêutica com a superfície mucosa permite que formulação permaneça
mais tempo no local de administração, o que aumenta a biodisponibilidade fármaco,
melhorando assim a eficácia clínica da terapia e promove administração menos
frequente do medicamento, podendo contribuir para redução dos efeitos colaterais
(DOBARIA et al., 2019).
Estudos realizados por Rojewska e colaboradores (2019) e Fitaihi e
colaboradores (2018), com o fármaco Fluconazol, antifúngico utilizado no tratamento
contra infecções por C. albicans, desenvolveram formulações muco adesivas para
entrega local do antifúngico. O primeiro estudo citado desenvolveu comprimidos
mucoadesivos com o excipiente interligente Kollidon®, já o segundo estudo
desenvolveu um gel mucoadesivo contendo quitosana, um derivado hidrolisado da
quitina amplamente distribuído em natureza.
O estudo realizado por Dobaria e colaboradores (2009), utilizou o fármaco
Itraconazol, antifúngico triazólico com um amplo espectro de atividade aplicado para
o tratamento de candidíase vaginal. Foi desenvolvido nesse estudo um filme vaginal
mucoadesivo contendo dispersão sólida, sendo constituído dos polímeros
hidroxipropilmetilcelulose e hidroxietilcelulose.

224
Além das aplicações mucoadesivas os polímeros podem ser aplicados como
excipientes inteligentes em matrizes para aumento de solubilidade de fármacos por
via oral. O estudo realizado por Al-Obaidi e colaboradores (2019), utilizou celulose
microcristalina, polivinilpirrolidona e hidroxipropilmetilcelulose como excipientes para
aumentar a solubilidade aquosa da griseofluvina, comumente usada para tratar
dermatofitose causada por T. rubrum.
O polímero quitosana vem sendo bastante utilizado, a quitosana não é tóxica,
é biocompatível e biodegradável e possui atividade antimicrobiana contra fungos,
leveduras e bactérias, sendo capaz de ser um agente ativo anti-Candida (FITAIHI et
al., 2018).
Kurniasih e colaboradores (2018) desenvolveram uma gaze, contendo a
carboximetilquitosana, forma solúvel da quitosana, para ser aplicada sobre a pele no
tratamento de infecções por C. albicans. Akakuru e colaboradores (2019), utilizou a
quitosana como excipiente inteligente associadas ao polietilenoglicol na formulação
de esferas de liberação solida, para veiculação do fármaco clotrimazol, um derivado
do imidazol que previne infecções micóticas do trato gastrourinário e é eficaz contra
dermatófitos, Candida, Trichophyton, Microsporum, Epidermophyton e Malassezia.

3 CONCLUSÃO
Os estudos utilizaram fármacos e candidatos a fármacos antifúngicos
veiculados em complexos de inclusão com ciclodextrinas, polímeros, dispersões
sólidas. Além de formulações antifúngicas como esmaltes para as unhas e novos
géis, hidrogéis, organogéis, microgel. Os resultados encontrados foram promissores
e as formulações são potencias, demonstrando principalmente incremento de
solubilidade e melhora de estabilidade, como também melhora de permeação,
liberação prolongada, aumento da taxa de dissolução e ação intensificada. Aspectos
interessantes para administração eficaz de medicamentos antifúngicos.

225
REFERÊNCIAS

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228
CAPÍTULO 14
IMPORTÂNCIA DAS FERRAMENTAS COMPUTACIONAIS
PARA O DESENVOLVIMENTO DE NOVOS FÁRMACOS
ANTIFÚNGICOS

João Alberto Lins de Lima


Bacharel em Farmácia pelo Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA
Instituição: Centro Universitário Brasileiro, Departamento de Farmácia
Endereço: Rua Padre Inglês – Boa vista, Recife – PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Izaulinda Marquez da Rocha Campelo


Bacharel em Farmácia pelo Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA
Instituição: Centro Universitário Brasileiro, Departamento de Farmácia
Endereço: Rua Padre Inglês – Boa vista, Recife – PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Salatiel Henrique Pereira de Lima


Bacharel em Farmácia pelo Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA
Instituição: Centro Universitário Brasileiro, Departamento de Farmácia
Endereço: Rua Padre Inglês – Boa vista, Recife – PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Otávio Campelo Ramos


Graduando em Psicologia pelo Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA
Instituição: Centro Universitário Brasileiro, Departamento de Farmácia
Endereço: Rua Padre Inglês – Boa vista, Recife – PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Caio José Anselmo da Silva


Bacharel em Farmácia pelo Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA
Instituição: Centro Universitário Brasileiro, Departamento de Farmácia
Endereço: Rua Padre Inglês – Boa vista, Recife – PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Thalita Soares de Souza


Bacharel em Farmácia pelo Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA
Instituição: Centro Universitário Brasileiro, Departamento de Farmácia
Endereço: Rua Padre Inglês – Boa vista, Recife – PE, Brasil.
E-mail: [email protected]

Aline Claudia Almeida de Britto Silva


Graduanda em Farmácia pela Universidade Salgado de Oliveira
Instituição: Universidade Salgado de Oliveira, Departamento de Farmácia
Endereço: Rua Lambari, 10, Trindade – São Gonçalo – RJ, Brasil
E-mail: [email protected]

Arnon de Melo Andrade Júnior

229
Mestre em Ciências Farmacêuticas da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco- UFPE
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil.

RESUMO: As infecções fúngicas (IFs) são uma das doenças de maior agravo no
âmbito clínico, causando a morte de mais de um milhão de pessoas por ano,
havendo recentemente, mais 150 milhões de novos casos de alta gravidade em todo
o mundo. De acordo com os dados epidemiológicos, a grande maioria das infecções
fúngicas são ocasionadas por cepas do gênero Cândida e Aspergillus, que somadas
ocasionam mais de 1 milhão de IFs por ano em todo o mundo. Dessa forma,
diversas terapias macro e micromoleculares vêm sendo investigadas, tendo como
principal objetivo, atuar sobre os mecanismos de resistência produzida por estas
cepas ou afetar alvos que comprometam diretamente essa resposta adaptativa dos
patógenos. Dentre as diversas alternativas existentes, a abordagem computacional
vem se mostrando bastante promissora, devido à realização de um conjunto de
estratégias previamente estabelecidas realizadas através da abordagem fisiológica,
um planejamento racional de fármacos com base nas estruturas do alvo
farmacológico, permitindo o desenvolvimento de substância com maior seletividade
e menores efeitos colaterais. Sendo assim, este capítulo aborda algumas
ferramentas computacionais de fácil acesso, que podem ser utilizadas para o
desenvolvimento de novos fármacos antifúngicos com base nessa abordagem.

ABSTRACT: Fungal infections (IFs) are one of the most serious diseases in the
clinical scope, causing the death of more than one million people per year, with
recently, more than 150 million new cases of high severity worldwide. According to
epidemiological data, the vast majority of fungal infections are caused by strains of
the genus Candida and Aspergillus, which together cause more than 1 million FIs per
year worldwide. Thus, several macro and micromolecular therapies have been
investigated, with the main objective of acting on the resistance mechanisms
produced by these strains or affecting targets that directly compromise this adaptive
response of pathogens. Among the various existing alternatives, the computational
approach has shown itself to be very promising, due to the realization of a set of
previously established strategies carried out through the physiological approach, a
rational planning of drugs based on the structures of the pharmacological target,
allowing the development of a substance with greater selectivity and fewer side
effects. Therefore, this chapter addresses some computational tools that are easily
accessible, which can be used for the development of new antifungal drugs based on
this approach.

230
1. INTRODUÇÃO
As infecções fúngicas (IFs) são umas das doenças de maior agravo no âmbito
clínico, causando a morte de mais de um milhão de pessoas por ano, havendo
recentemente, mais 150 milhões de novos casos de alta gravidade em todo o
mundo. Dentre os diversos fatores associados a esse aumento no número de casos,
destaca-se o uso inadequado dos medicamentos antifúngicos que acabam
promovendo o desenvolvimento de mecanismos de resistência capazes de
inviabilizarem a ação de medicamentos eficientes no tratamento (KAINZ et al.,
2020).
Além do aumento no número de casos, temos também uma elevação das
taxas de mortalidade da doença, sendo esse fato justificado pelo aumento no
número de pessoas acometidas que já apresentam alguma comorbidade como por
exemplo a síndrome da imunodeficiência humana adquirida (AIDS), doença que
compromete de forma contundente o sistema imunológico dos pacientes,
promovendo uma resposta mais agressiva por parte dos microrganismos (LIMPER et
al., 2017).
Outro fator cada vez mais recorrente que está relacionado com o aumento da
virulência fúngica, consiste na deposição destes microrganismos em alguns
acessórios utilizados na administração parenteral como os catéteres e também em
válvulas cirúrgicas, que são objetos propícios para a fixação dos fungos através da
formação de biofilmes, sendo esse um dos principais mecanismos responsáveis pelo
aumento da gravidade da infecção (RUBIN; HARI; NITHYANAND, 2020; WALKER et
al., 2020).
Todos esses fatores tem como consequência uma grande perda de eficácia
terapêutica dos diversos medicamentos utilizados, havendo inclusive algumas cepas
principalmente do gênero Cândida que já são resistentes a praticamente todos os
medicamentos utilizados na clínica. Esse é o caso da Cândida auris, descrita
recentemente como a primeira cepa multi-resistente no território nacional
(CHAABANE et al., 2019; PASQUALOTTO; SUKIENNIK; MEIS, 2019; SPETTEL et
al., 2019).
De acordo com os dados epidemiológicos, a grande maioria das infecções
fúngicas são ocasionadas por cepas do gênero Cândida e Aspergillus, que somadas
ocasionam mais de 1 milhão de IFs por ano em todo o mundo. Outro ponto a ser
levado em consideração, consiste na quimioterapia utilizada no tratamento, no qual

231
grande parte das classes medicamentosas tratam-se de fármacos presentes há
bastante tempo no mercado, não havendo, portanto, o surgimento de novas
entidades químicas que permitiram uma maior versatilidade de mecanismos ação
(BAJPAI et al., 2019; KAINZ et al., 2020).
Todos esses fatores demonstram a necessidade de que novas substâncias
sejam desenvolvidas para o tratamento das IFs, visto que grande parte da terapia
utilizada na clínica já não apresenta a eficiência necessária. Dessa forma, diversas
terapias macro e micromoleculares vêm sendo investigadas, tendo como principal
objetivo, atuar sobre os mecanismos de resistência produzida por estas cepas ou
afetar alvos que comprometam diretamente essa resposta adaptativa dos patógenos
(DE ALMEIDA et al., 2019).
Dentre as diversas alternativas existentes, a abordagem computacional vem
se mostrando bastante promissora, devido à realização de um conjunto de
estratégias previamente estabelecidas, que permitem o desenvolvimento de novas
moléculas com base nos fragmentos moleculares presentes nos microrganismos
patogênicos. Esta atividade realizada através da abordagem fisiológica, consiste em
um planejamento racional de fármacos com base nas estruturas do alvo
farmacológico, permitindo o desenvolvimento de substância com maior seletividade
e menores efeitos colaterais (HOWARD et al., 2020).
Além disso, essa estratégia permite uma determinação preliminar de
propriedades fisico-químicas (FQ), farmacocinéticas (FC) e farmacodinâmicas (FD),
antes mesmo da realização de qualquer síntese de compostos e sua avaliação em
testes experimentais. Esse fator é uma das principais vantagens atreladas as
ferramentas de modelagem molecular, evitando que uma variedade de moléculas
com baixa atividade e/ou alta toxicidade venham ser sintetizadas, reduzindo o tempo
e custo associado ao desenvolvimento de novos candidatos (SHAZAN; GIRIJA;
PRIYADHARSINI, 2019).
Esse fato justifica, o emprego da química computacional em laboratórios de
pesquisa acadêmicos bem como por parte da indústria farmacêutica, que investem
grande parte de seus recursos no planejamento de fármacos auxiliados por
computador. Com os avanços obtidos no isolamento de estruturas cristalográficas e
também pela engenharia genética, é possível obter informações cada vez mais
fidedignas sobre as macromoléculas diretamente relacionadas com a doença (ROY
et al., 2019).

232
Entretanto, os testes teóricos realizados através das ferramentas in sílico não
são exatos o suficiente para que os testes experimentais sejam abolidos, haja vista a
complexidade existente em um sistema biológico que apresenta uma enorme
quantidade de variáveis que estão fora do escopo da modelagem molecular, que se
baseia diretamente nas características da própria molécula ou em sua interação
apenas com o alvo investigado (KAR; LESZCZYNSKI, 2020).
Além disso, existe uma variedade de metodologias que podem ser aplicadas,
no qual nem todas as ferramentas disponibilizadas apresentam resultados
estatisticamente significativos capazes de prever as propriedades farmacocinéticas e
farmacodinâmicas de novos compostos (IWANIAK et al., 2019; DASTI et al., 2020;
SHARMA et al., 2020).
Sendo assim, a escolha do método a ser utilizado depende de uma variedade
de fatores que devem ser levados em consideração, como por exemplo, os custos
associados ao uso desses softwares. Embora a maioria dos programas mais
eficazes de previsão possuam um elevado custo para sua utilização, existem
programas disponíveis gratuitamente que possuem um robusto banco de dados,
contendo uma variedade de parâmetros FQs, FCs e FDs que permitem realizar
previsões destas importantes propriedades, servindo como uma ferramenta
indispensável para pesquisadores interessados na realização de um planejamento
racional de fármacos (JIA et al., 2020).
Estes resultados podem fornecer informações importantes para a realização
de ensaios posteriores que podem ser aplicados a estes compostos para o
desenvolvimento de novos derivados ou análogos, permitindo a obtenção de novas
substâncias para o tratamento das IFs em menor tempo e com as propriedades
desejadas. Sendo assim, este capítulo aborda algumas ferramentas computacionais
de fácil acesso, que podem ser utilizadas para o desenvolvimento de novos
fármacos antifúngicos.

2. AVALIAÇÃO IN SÍLICO DAS PROPRIEDADES FISICO-QUÍMICAS (FQ)


Antes que qualquer substância possa ser ter suas propriedades
farmacocinéticas e farmacodinâmicas investigadas, se faz necessário avaliar
parâmetros relacionados inerentemente as moléculas investigadas, sendo estas
características determinadas a partir do estudo FQ dos compostos (HASHIDA,
2020).

233
Estas propriedades permitem avaliar se as moléculas em estudo podem ser
direcionadas para os testes pré-clínicos e clínicos, visto que as características de
cada molécula têm um papel fundamental na própria solubilidade dos compostos,
que precisam apresentar uma afinidade adequada para os solventes ou veículos
utilizados nos testes posteriores, ter uma afinidade ou biodisponibilidade adequada,
bem como apresentar elementos químicos que contribuam de maneira significativa
na interação com seu alvo farmacológico (LIMA et al., 2020).
Dessa forma, para o estudo e desenvolvimento de fármacos existem uma
variedade de parâmetros que podem ser utilizados, no qual grande parte dos
trabalhos realizados através da abordagem computacional utilizam principalmente os
seguintes parâmetros: peso molecular (PM), área de superfície polar (PSA),
coeficiente de partição (P), coeficiente de difusão (D), fração de carbonos do tipo
sp3, coeficiente de solubilidade (S), número de doadores (DH) e aceptores (AH) de
ligação de hidrogênio e refratividade molar (RM) (MIGNANI et al., 2018).
Mesmo que os parâmetros sejam restritos as características gerais de cada
molécula, seu papel acaba sendo preponderante para as propriedades FC e FD,
pois cada parâmetro interfere diretamente nas ações que o organismo realiza sobre
o fármaco durante seu período de transporte até o local de ação bem como nas
ações que o fármaco realiza sobre o organismo através da sua potência e atividade
intrínseca (ALQAHTANI, 2017).
O PM tem uma influência importante na fase de absorção pela barreira
intestinal, que é caracterizada por apresentar junções firmes que regulam a
passagem de substâncias de acordo com o seu peso. Dessa forma, moléculas de
baixo PM são capazes de atravessar mais facilmente essa barreira pela via
paracelular, enquanto substância com PM mais elevado só conseguem atravessar
essa barreira através do transporte transcelular, exigindo um maior custo energético
do organismo, que deve promover essa passagem com o auxílio de estruturas
carreadoras presentes na membrana dos enterócitos (KARASOV, 2017).
A PSA descreve a capacidade de solvatação de moléculas pequenas, sendo
esse parâmetro determinante para solubilidade dos compostos bem como sua
posterior biodisponibilidade, sendo estes ambos parâmetros farmacocinéticos
também determinados através dos coeficientes de partição (P) e difusão (D), que
descrevem a afinidade das moléculas por solventes orgânicos em relação a sua
afinidade pela água, seja para as moléculas nos estados neutros (P) ou ionizados

234
(D). Já o coeficiente de solubilidade (S) descreve apenas as características de
solubilidade dos compostos em relação aos solventes utilizados, baseando-se no
ponto de fusão das moléculas (DAINA; MICHELIN; ZOETE, 2017).
Em relação interações intermoleculares, temos as ligações de hidrogênio,
uma das propriedades FQ de maior utilidade para o desenvolvimento de fármacos,
pois essa interação contribui tanto para solubilidade, biodisponibilidade, permeação,
e principalmente na fase FD através da interação entre o fármaco e o receptor. A
RM embora menos relevante, também é bastante utilizada pois descreve a
polaridade da molécula, uma propriedade que se correlaciona com a grande maioria
dos parâmetros descritos anteriormente (SHAFIEI; ESMAEILI, 2019).
Todos estes parâmetros podem ser facilmente detectados instantaneamente
através da abordagem in sílico, sendo esse fator algo bastante vantajoso quando
comparado aos métodos experimentais, que precisam realizar diversas etapas de
preparo e isolamento dos compostos para que o estudo das propriedades FQ
possam ser realizados (ZHANG; PEI; LAI, 2017; BIAN; XIE, 2018).
A abordagem computacional conta com um robusto banco de dados
depositados sobre as propriedades FQ dos compostos que foram determinadas
previamente em ensaios experimentais, sendo esses dados utilizados para
construção de modelos de previsão que fazem parte das ferramentas utilizadas
pelos químicos medicinais para determinar forma preliminar as propriedades teóricas
dos compostos investigados.
Existem diversas ferramentas utilizadas para determinação preliminar das
propriedades FQ, sendo algumas ferramentas disponíveis gratuitamente e que
apresentam bons resultados teóricos. Esse é o caso das ferramentas SwissADME e
pkCSM, que realizam a previsão de várias moléculas ao serem desenhadas no
próprio Front end da plataforma utilizando apenas as estruturas no formato SMILES.
As figuras abaixo demonstram exemplos de alguns fármacos antifúngicos já
conhecidos que foram utilizados como moléculas testes para comparação em ambas
as plataformas (PIRES; BLUNDELL; ASCHER, 2015; DAINA; MICHELIN; ZOETE,
2017).

235
Figura 1. Previsão das propriedades FQ do cetoconazol através das ferramentas pkCSM e
SwissADME
pkCSM

SwissADME

Fonte: Imagens diretas das plataformas pkCSM e SwissADME.

Como é possível visualizar a plataforma SwissADME fornece uma maior


variedade de informações além das propriedades FQ básicas, realizando inclusive a
construção de um gráfico de propriedades classificados através das propriedades de
lipossolubilidade, tamanho, polaridade, flexibilidade, insaturações e insolubilidade.
Sendo assim, fármacos com as características FQ apropriadas devem estar
presente na região em rosa claro, que descreve o score de biodisponibilidade oral,
uma metodologia utilizada por esta ferramenta que permite predizer se as moléculas
apresentam características FQ apropriadas para serem administrados pela via oral.

3. AVALIAÇÃO EM IN SÍLICO DAS PROPRIEDADES FARMACOCINÉTICAS (FC)


As propriedades farmacocinéticas abordam todos os fatores relacionados ao
transporte do fármaco no meio biológico, desde fase de administração até a
excreção, tendo como principal objetivo descrever as ações que organismo realiza

236
sobre o fármaco durante seu movimento no meio biológico (JABLONKA et al., 2019).
Os fenômenos FCs são sistematicamente divididos nas fases de absorção,
distribuição, metabolismo e excreção (ADME) devendo estas etapas serem
investigadas antes mesmo das propriedades FDs, visto que as substâncias
administradas principalmente pela via oral durante estas fases, podem promover
respostas fora da janela terapêutica, seja devido a uma redução da sua
concentração desejada por conta de uma baixa biodisponibilidade pré ou pró-
sistêmica, ou devido ao excesso de concentração plasmática do fármaco, que pode
desencadear respostas tóxicas para o organismo (YANG et al., 2019).
Esse último fator está relacionado diretamente com a etapa de metabolismo
ou biotransformação, que é um conjunto de reações químicas realizadas por
biomacromoléculas capazes de modificar as estruturas dos compostos
administrados, gerando metabólitos ativos, inativos ou tóxicos, havendo também a
possibilidade de interação sinérgica ou antagônica com os sítios de
biotransformação pelos fenômenos de inibição ou indução enzimática que são um
dos principais responsáveis pela ocorrência de interações medicamentosas
(FERREIRA; ANDRICOPULO, 2019).
Dessa forma, fica bastante clara a importância de se determinar previamente
as propriedades FC dos compostos, principalmente em relação as moléculas
antifúngicas, que são bastante descritas na literatura pela sua capacidade de
atuarem como inibidores enzimáticos. Este fenômeno foi correlacionado com as
interações intermoleculares existentes entre os elementos eletrofílicos presentes no
sítio ativo das estruturas de biotransformação com os grupos nucleofílicos presentes
em fármacos antifúngicos (ANDRADE et al., 2019).
Os azóis, uma das principais classes utilizadas no tratamento de IFs são um
grande exemplo de moléculas que atuam como inibidores enzimáticos irreversíveis,
devido a presença de átomos de nitrogênio básicos em sua estrutura, a exemplo do
cetoconazol, que é um dos principais compostos que interagem com o complexo do
citocromo P450 (CYP450), inibido a capacidade de biotransformação destas
enzimas microssomais hepáticas (DE ALMEIDA et al., 2019; VERMA et al., 2020).
Desta forma, grande parte das ferramentas computacionais de previsão,
utilizam esse complexo CYP450 como um dos parâmetros de maior importância
para as propriedades FC, visto que grande parte dos fármacos administrados pela
via oral são metabolizados pelas enzimas desse complexo presentes na membrana

237
do retículo endoplasmático dos hepatócitos (LI) (GUENGERICH, 2020).Para
avaliação desta e outras propriedades FC também temos diversas ferramentas de
fácil acesso, como o SwissADME, já descrito anteriormente, bem como outras
ferramentas gratuitas como SMARTCyp e MetaPrint e MetaPred, todos capazes de
prever a interação de qualquer composto desenhado com o CYP450, detectando
principalmente quais os grupamentos estão suscetíveis a primeira fase do
metabolismo denominada de oxidação. As figuras abaixo mostram os resultados
obtidos em relação a predição das propriedades FC do cetoconazol utilizando as
ferramentas descritas (OLSEN et al., 2019).
Além da interação com o citocromo, algumas ferramentas como o
SwissADME e pKCSM também são capazes de avaliar outras propriedades FC
como permeabilidade em barreiras intestinais, hematoencefálicas e pele a partir da
capacidade das substâncias em serem absorvidas in vitro em células de
adenocarcinoma de cólon humano tipo 2 (Caco-2), ou in vivo utilizando dados
obtidos de absorção em modelo de roedores (ratos), e também a partir de dados de
permeabilidade cutânea (PIRES; BLUNDELL; ASCHER, 2015; DAINA; MICHELIN;
ZOETE, 2017).
Ambas as plataformas também avaliam a capacidade das substâncias em
interagirem com a glicoproteína P (gp-P), uma proteína responsável por expulsar
ativamente as moléculas do fármaco que chegam da corrente sanguínea durante o
processo de distribuição tecidual (OTSUKA et al., 2020).
A figura abaixo demonstra os resultados teóricos obtidos das propriedades FC
do cetoconazol feitos com todas as ferramentas descritas aqui

238
Figura 2. Avaliação in sílico das propriedades FC do cetoconazol utilizando as ferramentas pkCSM,
SwissADME, SMARTCyp, MetaPrint e MetaPred respectivamente.
SwissADME

pkCSM

SMARTCyp

Fonte: Retirado diretamente das plataformas SwissADME, pkCSM e SMARTCyp.

Fazendo uma comparação entre as três ferramentas em relação a todas as


fases relacionadas a FC, percebe-se que nem todas descrevem os mesmos tipos de
parâmetros, no qual as duas primeiras plataformas (SwissADME e pkCSM)
englobam muitas fases do processo de transporte, enquanto que a última ferramenta
(SMARTCyp), tem como foco apenas a fase de metabolização pelas enzimas
microssomais. Entretanto, esta última, consegue inclusive predizer quais são os
sítios lábeis metabolicamente que estão presentes nas moléculas, sendo esse
parâmetro bastante norteador para otimização dos compostos estudados que
apresentem propriedades indesejadas (MONTEFIORI et al., 2019).

239
Ainda assim, existem alguns parâmetros semelhantes calculados pelas
ferramentas, podendo ser feita uma comparação entre os próprios softwares e
também uma comparação destes resultados com os experimentais. Em relação as
fases de biodisponibilidade, permeabilidade e distribuição podem ser feitas
comparações entre as ferramentas SwissADME e pkCSM, no qual descreveram uma
alta absorção para o cetoconazol pelo trato intestinal e uma baixa permeabilidade no
tecido cutâneo (SCHNECKERNER et al., 2019).
Além disso, outro ponto semelhante entre as plataformas foi demonstrado
pela interação do cetoconazol com a gp-P, no qual tanto a ferramenta SwissADME
(não mostrado) quanto a ferramenta pkCSM descrevem o cetoconazol como um
ligante inibitório para esta proteína, de modo que sua entrada em barreiras
especializadas acaba sendo facilitada, podendo ocasionar por exemplo toxicidade a
nível do sistema nervoso central (LEOPOLDO et al., 2019).
Outro resultando semelhante foi obtido na comparação feita entre a
ferramenta SwissADME e SMARTCyp com relação a fase metabolização pelas
isoformas do CYP450, no qual ambas as ferramentas descreveram que o
cetoconazol apresenta a isoforma 3A4 como a principal subfamília responsável pela
interação com esse fármaco que é capaz de promover a inibição enzimática desse
complexo, o que pode ocasionar em interações medicamentosas caso essa
substância seja administrada em conjunto com outras substâncias que sejam
metabolizadas por esta mesma isoforma (LI et al., 2020).
Independentemente de qual plataforma seja utilizada, vale destacar que os
resultados teóricos encontrados estão de acordo com os resultados experimentais,
podendo então serem utilizados na previsão de novas moléculas, norteando a
escolha dos melhores compostos que devem ser ensaiados. Estes resultados
também fornecem dados suficientes para que novas modificações das estruturas já
sintetizadas possam ser realizadas, no qual os resultados obtidos a partir destas
ferramentas podem ser considerados como um fator decisivo para otimização de
compostos hits ou leads (KRITSI et al., 2019).

4. AVALIAÇÃO IN SÍLICO DAS PROPRIEDADES FARMACODINÂMICAS (FD)


A farmacodinâmica, embora seja uma fase muitas vezes dependente das
propriedades farmacocinéticas, apresenta da mesma forma, grande relevância para
o estudo de qualquer molécula bioativa. Nesta fase tem-se como principal objetivo

240
descrever as ações que o fármaco desempenha sobre o organismo. Para isso, se
faz necessário entender qual ou quais são os alvos farmacológicos envolvidos com a
resposta biológica das moléculas, sendo este fator fundamental para determinar qual
deve ser o mecanismo de ação do fármaco em estudo (RODRIGUES et al., 2020).
É nesta fase que podemos ver claramente a grande contribuição feita pela
abordagem computacional, pois grande parte dos mecanismos de ação que são
descobertos bem como o desenvolvimento de novos compostos são feitos
principalmente a partir da análise interação entre o ligante e o alvo farmacológico
diretamente. Essa abordagem é possível graças aos avanços obtidos nas técnicas
de isolamento de estruturas por meio da engenharia genética e biologia molecular
bem como na eficiência das elucidações estruturais proteicas que são promovidas
pelos estudos cristalográficos que permitem identificar os principais sítios e domínios
de importância para promoção da atividade farmacológica (KAIRYS et al., 2019).
A partir de bancos de dados mundiais de estruturas cristalográficas que estão
disponíveis gratuitamente como o Protein Data Bank (PDB) é possível a realizar
ensaios computacionais que simulam a interação direta entre os fármacos (ligantes)
com seus possíveis alvos farmacológicos, sendo os valores destas interações
descritos em termos de energia livre, um parâmetro termodinâmico bastante
empregado pelo químicos medicinais para avaliar afinidade das moléculas
investigadas (CARRARA et al., 2017).
Essa estratégia chamada de ancoramento ou docking molecular, é sem
dúvida a principal ferramenta utilizada pela abordagem computacional para
determinar as propriedades dos compostos em estudo, tendo como principal
finalidade determinar qual deve ser o principal alvo relacionado com as atividades de
compostos já estudados em ensaios experimentais, sendo, portanto, uma técnica
implementa com o objetivo de justificar ou corroborar com alvos previstos no ensaio
experimental (TORRES et al., 2019).
Dessa forma, essa metodologia acaba não sendo tão favorável quando
utilizamos moléculas novas que se quer passaram por ensaios pré-clínicos, sendo
necessário realizar um grande levantamento bibliográfico para estimar qual alvo
farmacológico deve ser utilizado nos estudos de interação com moléculas
completamente inovadoras. Além disso, no caso de novos fármacos antifúngicos,
esse fator pode se tornar um grande obstáculo, devido à grande variabilidade de
alvos presentes nas cepas que podem interagir com o mesmo ligante (CELY-

241
VELOZA; COY-BARREIRA, 2019).
Entretanto, já existem ferramentas capazes de prever quais são possíveis
alvos que as novas moléculas desenhadas podem alcançar, baseando-se nas
técnicas de homologia, estes softwares são capazes de estimar a probabilidade de
uma nova estrutura interagir com certos alvos já descritos experimentalmente. Uma
das ferramentas de grande utilidade é o SwissTargetPrediction que é capaz de
estimar previamente quais são os possíveis alvos sobre os quais as moléculas em
investigação podem atuar. A figura abaixo também realizada com o cetoconazol
demonstra a previsão dos principais alvos nos quais esta molécula pode interagir,
sendo os alvos de maior probabilidade relacionados possivelmente com seu
mecanismo de ação.

Figura 3. Uso da ferramenta SwissTargetPrediction para previsão dos alvos do cetoconazol

Fonte: Imagens tiradas diretamente da ferramenta SwissTargetPrediction.


Fonte: Retirado diretamente da ferramenta SwissTargetPrediction.

Os resultados teóricos dos alvos preditos corroboram bem com os resultados


experimentais acerca de quais são os principais alvos proteicos do fármaco utilizado
como exemplo. No caso do cetoconazol, seu principal alvo farmacológico que é
descrito pela FD acaba sendo justamente um alvo que faz parte da fase FC
(citocromo P450), no qual este fármaco apresenta uma grande afinidade pelas
isoformas de CYP presentes nas cepas fúngicas, inibindo um dos processos
metabólicos como a desmetilação, uma etapa essencial para transformação do
lanosterol no metabólito ergosterol. Esse tipo de lipídeo é o principal componente da
membrana fúngica, onde a inibição da atividade metabólica causa uma
desestabilização da membrana plasmática das células dos fungos, causando uma

242
variedade de alterações que resultam em sua apoptose (VUPPALA et al., 2019).
Esses resultados podem então ser utilizados para investigação de como
ocorre de fato a interação do fármaco com seu alvo farmacológico, sendo esta
atividade avaliada através da técnica de docking molecular. Esta metodologia pode
ser aplicada com o auxílio de diversas ferramentas que também estão disponíveis
gratuitamente e são de fácil acesso. Uma revisão recente feita por Kumar e Kumar
em 2019 descreve uma lista contendo cerca de 40 ferramentas de docking
molecular, sendo grande parte desses softwares disponível para uso seja por
pesquisadores ou estudantes interessados em realizar este tipo de abordagem.
Entre as ferramentas descritas, destacamos o uso das ferramentas DockThor
e Swissdock, ferramentas on-lines, gratuitas e de fácil utilização, no qual o usuário
não precisa de nenhum treinamento específico para realização de cada etapa,
bastando apenas selecionar as variáveis (ligantes, cofatores e o alvo desejado) de
maneira bastante intuitiva. Diversos trabalhos publicados recentemente em estudos
de modelagem molecular para o desenvolvimento de novos fármacos antifúngicos
vêm utilizando estas ferramentas mostrando a praticidade e eficiência dos seus
resultados de previsão (SAHNOUN et al., 2018; FERRAZ et al., 2019; MELO et al.,
2019; TIGHADOUNINI et al., 2019; TOUBI et al., 2019; TILAKVIJAY; BABU; UMA,
2019; SIQUEIRA; MARTINEZ, 2019;). A figura abaixo mostra dois trabalhos
publicados recentemente que realizaram um docking molecular nas ferramentas
DockThor e Swissdock utilizando o fármaco fluconazol e derivados imidazólicos
respectivamente.

243
Figura 4. Docking molecular feito com o uso das ferramentas DockThor e Swissdock.

DockThor Swissdock
(vizualizado pelo Pymol) (visualizado pelo UCSF Chimera)

Fonte: SIQUEIRA; MARTINEZ, 2019; BOUCHAL et al., 2019.

Os resultados são avaliados em termos de energia livre de ligação (ΔG), um


parâmetro termodinâmico que descreve a energia relacionada a interação entre o
fármaco com seu sítio ativo. Quanto menor o valor da energia (mais negativo) maior
será a estabilidade e consequentemente maior será a interação entre o alvo e o
ligante, sendo assim os valores calculados pelas ferramentas são utilizados
comparando-se as energias do mesmo ligante com as isoformas presentes no
microrganismo e no hospedeiro humano. No primeiro trabalho, os autores
demonstraram um baixíssimo valor de ΔG (-11,898 kcal/mol) para interação do
fluconazol com a isoforma fúngica quando comparada a isoforma presente no Homo
sapiens (-0,432 kcal/mol), sendo esses valores suficientes para comprovar uma
afinidade do fluconazol pela enzima fúngica (SIQUEIRA; MARTINEZ, 2019).
Já o segundo estudo teve como objetivo o desenvolvimento de novos
derivados a partir do fluconazol, sendo feita agora uma comparação da interação do
derivado com o fluconazol frente as cepas de Sacharomyces cerevisae. O derivado
apresentou um ΔG de -6,791 kcal/mol enquanto que o fluconazol (não mostrado)
apresentou um ΔG de -7,337 kcal/mol, tendo o derivado, portanto, uma menor
afinidade. Ainda assim esses valores são próximos o suficiente para considerar esse
candidato promissor.

244
5. CONCLUSÃO
De acordo com o que foi visto nesse capítulo, as IFs são consideradas um
dos grandes problemas de saúde no Brasil e no mundo, havendo constantes relatos
de surgimento de cepas resistentes a uma grande quantidade de medicamentos
considerados bem eficientes no tratamento. Dessa forma a busca por novos
compostos antifúngicos é imperativa para que possa haver uma mudança de
panorama em relação a farmacoterapia, que é composta em sua grande maioria por
medicamentos com baixa seletividade e efeitos colaterais diversos.
Sendo assim, o desenvolvimento de fármacos baseados diretamente nas
estrutras relacionadas com a doença a partir da abordagem fisiológica permite que a
produção de novos medicamentos possa ser feita com bases nas caraterísticas de
cada cepa, evitando que estes microrganismos consigam se desvencilhar dos
mecanismos de ação de novas drogas.
Isto só é possível devido a uma meticulosa análise preliminar de um grande
conjunto de variáveis que devem ser analisadas em todas as fases de
desenvolvimento de um novo candidato, algo que só pode ser feito com o auxílio da
abordagem computacional, que permite a realização de ensaios prévios in sílico
cada vez mais acurados, capazes de descrever quais são os principais fatores que
podem melhorar ou atrapalhar as ações farmacológicas de novos compostos. Desta
forma, fica bastante evidente que o emprego da química computacional, mostra-se
cada vez mais como uma das abordagens de maior valia para a inovação
terapêutica.

245
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249
CAPÍTULO 15

COMPLEXO Sporothirx schenkii E ESPOROTRICOSE: UMA


REVISÃO

Amanda Virgínia Barbosa


Mestre em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235- Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Bárbara de Azevedo Ramos


Doutora em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235- Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Ana Vitória Araújo Lima


Mestre em Bioquímica e Fisiologia pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235- Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Sivoneide Maria da Silva


Mestre em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235- Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Francisco Henrique da Silva


Acadêmico de Farmácia pela Universidade Federal de Pernambuco
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Bioquímica
Endereço:: Av. Prof. Moraes Rego, 1235- Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

Márcia Vanusa da Silva


Professora Associada do Departamento de Bioquímica Universidade Federal de
Pernambuco-UFPE
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco
Endereço: Av. Prof. Moraes Rego, 1235- Cidade Universitária, Recife-PE, Brasil
E-mail: [email protected]

RESUMO: Sporothrix corresponde a um gênero de fungos cosmopolitas


pertencentes ao filo Ascomycota, que incluem indivíduos sapróbios e parasitas de
vertebrados e plantas. O complexo de espécies Sporothrix schenckii são fungos
dimórficos que possuem parede celular e produzem melanina. Algumas espécies
pertencentes ao complexo S. schenckii são causadores da criptococose, uma
micose subcutânea aguda ou crônica causada pelo contato traumático com material
contaminado com esporos ou por animais doentes. O diagnóstico para a doença é

250
realizado através de cultura e o tratamento envolve a terapia com itraconazol,
anfotericina B, terbinafina e uma solução saturada de iodeto de potássio. No
entanto, devido a toxicidade e ao aumento da resistência, as terapias usuais podem
ser drasticamente comprometidas. Desse modo, terapias alternativas utilizando
compostos naturais de plantas e o desenvolvimento de uma vacina são
possibilidades interessantes. Assim, pesquisas que visem o desenvolvimento de
novas drogas, sintéticas ou naturais, são significativamente importantes.

ABASTRACT: Sporothrix corresponds to a genus of cosmopolitan fungi belonging to


the Ascomycota phylum, which include saprobic individuals and parasites of
vertebrates and plants. The complex os Sporothrix schenckii species are dimorphic
fungi that have a cell wall and produce melanin. Some species belonging to the S.
schenckii complex cause cryptococcosis, an acute or chronic subcutaneous mycosis
caused by contact with material contaminated with spores or by sick animals. The
diagnosis for the disease is made by culture and treatment involves therapy with
intraconazole, amphotericin B, terbinafine and a saturated solution of potassium
iodide. However, due to toxicity and increased resistance, the usual therapies can be
dramatically compromised. Thus, alternative therapies using natural plants
compounds and the development of a vaccine are interesting possibilities. Thus,
research aimed at the development of new drugs, synthetic or natural, is significantly
important.

251
1. COMPLEXO Sporothrix schenkii
Sporothrix corresponde a um gênero de fungos cosmopolitas pertencentes ao
filo Ascomycota, que incluem indivíduos sapróbios e parasitas de vertebrados e
plantas (LÓPEZ-ROMERO et al., 2011). Das 51 espécies descritas para o gênero, a
maior parte delas corresponde a indivíduos não patogênicos de hábitos ambientais
que se desenvolvem em madeira em decomposição, plantas e no solo (GREMIÃO et
al., 2017).
Sporothrix schenckii lato sensu é um complexo de espécies formado por
Sporothrix brasiliensis, Sporothrix luriei, Sporothrix schenckii stricto sensu e
Sporothrix globosa eambascompõem o denominado clado clínico, espécies de
importância médica, por serem mais virulentas em mamíferos. Do outro lado, tem-se
a Sporothrix mexicana e a Sporothrix pallida, espécies moderadamente patogênicas
que integram o clado ambiental (HAN; KANO, 2020).
O complexo de espécies S. schenckii são fungos dimórficos, ou seja,
possuem duas formas sendo uma filamentosa e outra leveduriforme. Inicialmente, S.
schenckii formam colônias brancas que se tornam marrons ou pretas ao passo que
os conídios são produzidos. Já na fase parasitária, apresentam-se como leveduras
ovais (Figura 1) (OLIVEIRA et al., 2011). A capacidade de mudar sua morfologia de
acordo com a temperatura, passando de um estilo de vida saprofítico micelial a 25
ºC para um estado de levedura quando em contato com o hospedeiro de sangue
quente (35-37 ºC), corresponde a um dos principais fatores para o sucesso da
infecção em mamíferos (RODRIGUES, HOOG; CAMARGO, 2016).
Esses fungos possuem parede celular e produzem melanina, que é um dos
fatores de virulência desses microrganismos. As espécies que produzem mais
melanina são mais infectantes do que as menos produtoras (TEXEIRA et al., 2010).
Ainda não foi totalmente elucidado o processo de biossíntese de melanina entre as
espécies de Sporothrix spp. No entanto, a produção desse pigmento ocorre de
maneira mais rápida e mais abundante em S. brasiliensis do que em S. schenckii
(WALLER et al., 2020).

252
Figura 1. Fotomicrografia do fungo (400x). (A) É possível observar os conidióforos contendo conídios
como um buquê na ponta (seta). (B) Forma leveduriforme de S.schenckii (Exame direto. 10x.
Coloração Romanowsky). (C) Imagem de S. schenckii. (D) Colônia melanizada de S. schenckii
(25ºC).

Fonte: Barraza et al. (2018); Silva et al. (2018); Jiao et al. (2019) e Barros; Paes; Schubach ( 2011).

Infecções invasivas causadas por fungos têm contribuído para aumento das
taxas de morbimortalidade, principalmente de pacientes imuncomprometidos,
chegando a representar até 60% das causas de óbitos (HAMILL, 2013).
Nos últimos anos, os casos de esporotricose têm aumentado
consideravelmente em zonas tropicais e subtropicais (LYON et al., 2003; KOVARIK;
NEYRA; BUSTAMANTE, 2008), inclusive no Brasil (SCHUBACH;BARROS;
WANKE, 2008; BARROS et al., 2010; MADRID et al., 2012).

2. ESPOROTRICOSE
A esporotricose é uma infecção causada por fungos do complexo Sporothrix,
que acomete principalmente gatos e humanos. Esta infecção apresenta-se com altas
incidências no Brasil e na China, tornando-se um alerta global (RODRIGUES,
HOOG; CAMARGO, 2015).
Trata-se de uma micose subcutânea aguda ou crônica causada pelo contato
traumático com material contaminado com esporos ou por animais doentes (LÓPEZ-
ROMERO et al., 2011). A esporotricose em humanos manifesta uma grande
variação clínica e pode ser classificada como esporotricose cutânea (lesão restrita),
linfocutânea (mais comum), cutânea disseminada (várias lesões no corpo),
extracutânea (atinge vários órgãos e tecidos) e esporotricose pulmonar primária,
neste último caso quando ocorre a inalação de conídios (OLIVEIRA et al., 2014).

253
Infecções sistêmicas podem ocorrer em indivíduos imunodeprimidos,
comprometendo inúmeros órgãos (ZHOU et al., 2013). Uma vez dentro do
hospedeiro, a fase de conídios se transforma em levedura em resposta a
temperatura corporal, sendo esta a fase dominante nas infeções (BONIFAZ;
VAZQUEZ-GONZALEZ, 2010).
Sabe-se que fungos se adaptam bem a áreas quentes e úmidas e esses
fatores favoreceu a disseminação desses microrganismos em lugares que
apresentam tais características como a Austrália, China, Índia, Estados Unidos,
México e Panamá (BRILHANTE et al., 2017). No Brasil, a espécie mais prevalente
nos casos de esporotricose felina é a S. brasiliensis e é considerada a mais virulenta
(WALLER et al., 2017), com capacidade de infectar cachorros e humanos
(THOMSON et al., 2019). Além disso, S. brasiliensis éepidêmico eencontra-se
geograficamente restrito ao país (RODRIGUES; HOOG; CAMARGO, 2012). S.
schenckii stricto sensu, S. globosa e S.mexicana também estão associadas aos
casos de esporotricose (BRILHANTE et al., 2017).
O estado do Rio de Janeiro vem sofrendo, nos últimos anos, surtos de
esporotricose transmitidas diretamente de gatos para humanos. Esse surto
epizoótico continua crescente no estado e em expansão para as demais regiões do
Brasil (QUEIROZ-TELLES; BUCCHERI; BENARD, 2019). Um estudo realizado por
Silva et al. (2018), relatou o primeiro surto de esporotricose em felinos na região
metropolitana do Recife.
2.1 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
O padrão-ouro utilizado para diagnóstico da esporotricose é a cultura, no
entanto, outras ferramentas como análises sorológicas, histopatológicas e
moleculares podem ser utilizadas para auxiliar na detecção dessas infecções
(BARROS; PAES; SCHUBACH, 2011). O sucesso do tratamento depende
diretamente de um diagnóstico rápido e seguro, pois os padrões de sensibilidade
aos antifúngicos são diferentes entre as espécies do complexo Sporothrix
(GREMIÃO et al., 2017). Independentemente da espécie causadora da infecção, a
esporotricose pode ser tratada com itraconazol, anfotericina B, terbinafina e uma
solução saturada de iodeto de potássio por até 6 meses (Figura 2) (KAUFFMAN;
HAJJEH; CHAPMAN, 2000).

254
Figura 2.Estrutura química dos antifúngicos Anfotericina B e Itraconazol.

Fonte: Nett; Andes (2016).

O Itraconazol é um antifúngico triazólico com amplo espectro de atividade. Ele


age inibindo a 14α-desmetilase, enzima dependente do citocromo P450, resultando
na diminuição do ergosterol e acúmulo de 14α-metilesteróis causando defeitos na
membrana e afetando sua permeabilidade. Comporta-se como uma droga
fungistática, ou seja, inibe o crescimento fúngico, no entanto, doses altas podem
causar a morte desses patógenos (JAIN; SEHGAL, 2003). A terbinafina é um
fármaco sintético derivado da alilamina sendo utilizado desde 1996, no tratamento
de micoses. Atua especificamente na biosíntese de ergosterol (AJIT, et al., 2003).
Já a anfotericina B é um antifúngico macrolídeo da classe dos polienos,
utilizado na clínica desde 1959, e produzido através da fermentação pelo
Streptomyces nodosus (HAMILL, 2013). Seu uso é indicado em casos de infecções
mais severas com altas taxas de sucesso, no entanto, há casos em que os
pacientes respondem lentamente ao tratamento ou a terapia é ineficaz e os mesmos
desenvolvem uma infecção crônica (ALMEIDA-PAES, et al., 2016), comprometendo
drasticamente o quadro clínico desses indivíduos. Seu mecanismo de ação ocorre
por interação com o ergosterol, um dos principais componentes da membrana
fúngica, comprometendo a permeabilidade da mesma (HAMILL, 2013).
A anfotericina B apesar de ser um potente antifúngico, seu uso é restrito em
decorrência de alguns efeitos colaterais, incluindo toxicidade renal e hepática
(NETT; ANDES, 2016).
Vale ressaltar que devido o alto risco das terapias antifúngicas sistêmicas, é
importante isolar e identificar corretamente o patógeno, tal prática auxilia na escolha
do tratamento terapêutico mais adequado (JAIN; SEHGAL, 2003).

255
3. RESISTÊNCIA FÚNGICA
De acordo com as Concentrações Inibitórias Mínimas (CIM) padronizadas
pelo Instituto de Padrões Clínicos e Laboratoriais (CLSI, em inglês) e pelo Comitê
Europeu de Testes de Susceptibilidade Antimicrobiana (EUCAST, em inglês), cepas
fúngicas com valores da CIM ≥ 8µg / mL são consideradas resistentes (WALLER et
al., 2020).
A escolha adequada da terapia antifúngica tem relação direta com o agente
causador da infecção e seu perfil de susceptibilidade, desse modo, é crucial o
conhecimento sobre o mecanismo de ação e perfil de resistência às drogas
antifúngicas. Muitas cepas já são resistentes às drogas da classe dos triazólicos,
como o itraconazol, em consequência do seu imenso uso clínico (CUENCA-
ESTRELLA, 2010).
Um estudo realizado por Gutierrez-Galhardo e colaboradores (2010), verificou
a susceptibilidade antifúngica de 91 linhagens de S. schenckii e os resultados
mostraram resistência para fluconazol, itraconazol, voriconazol, posaconazol e
terbinafina. Cepas de S.brasiliensis já são descritas como resistentes aos
antifúngicos comumente utilizados no tratamento da esporotricose (WALLER et al.,
2017). Almeida-Paes et al., (2016), investigaram se a produção de melanina
interfere na ação do antifúngico terbinafina e concluíram que a melanina produzida
por S. brasiliensis e S. schenckii protegem esses patógenos da ação da droga.
O aumento de casos de infecções fúngicas é preocupante devido ao número
limitado de drogas antifúngicas, pois tanto a toxicidade quanto a resistência
comprometem significativamente seu uso e eficácia. Todas as espécies do complexo
S. schenckii de importância clínica já foram relatadas em infecções persistentes, o
que pode indicar resistência antifúngica (SÁNCHEZ-HERRERA, et al., 2020).
Um fator relevante que contribuiu para a resistência antimicrobiana e colabora
com a redução da eficácia terapêutica é a capacidade que muitos microrganismos
possuem inclusive os fungos, em formar biofilmes (BRILHANTE, et al., 2017). A
adesão a uma superfície é um fator fundamental para a formação do biofilme, e
espécies do complexo S. schenckii na forma de leveduras possuem alta capacidade
de aderência às células do epitélio. Assim, esses fungos conseguem aderir aos
tecidos do hospedeiro e até em dispositivos médicos implantados e formar o biofilme
(BRILHANTE, et al., 2018).

256
4. AVANÇOS TERAPÊUTICOS
O aumento de cepas resistentes é um alerta para a saúde pública, pois, reduz
drasticamente as opções terapêuticas. Assim, são importantes pesquisas que visem
à descoberta de novos agentes antifúngicos inclusive, de origem natural. Extratos
vegetais são ricos em compostos com ação medicinal. Essas substâncias já são
bem descritas na literatura com caracterização e atividades biológicas bem
definidas. Os flavonoides como a quercetina e rutina, e alguns ácidos fenólicos,
apresentam atividade antifúngica contra Aspergillus spp., Fusarium spp., Penicillium
spp., Candida albicans e também para S. schenckii (WALLER et al., 2017). Desse
modo, é importante que outros compostos produzidos pelas plantas também possam
ser explorados quanto à atividade antifúngica.
O desenvolvimento de uma vacina eficaz contra a esporotricose é uma
alternativa interessante. A produção de uma vacina é um caminho possível uma vez
que uma resposta humoral específica contra Sporothrix já foi relatada. Sporothrix 3-
carboximuconato ciclase (Gp70 e Gp60) emerge como um alvo promissor para
estudos de vacinação uma vez que essas glicoproteínas já foram reconhecidas por
anticorpos no soro de felinos infectados (GREMIÃO et al., 2017).

5. CONCLUSÃO
Fungos do complexoS. schenckii são patógenos causadores da espororicose,
uma infecção fúngica invasiva que pode ser fatal. Esses microrganismos
apresentam diversas características associadas aos seus fatores de virulência
inclusive, resistência aos antifúngicos. Assim, devido à limitada disponibilidade de
agentes antifúngicos, pesquisas que visem o desenvolvimento de novas drogas,
sintéticas ou naturais, são significativamente importantes.

AGRADECIMENTOS
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
pelo apoio financeiro.

257
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260
SOBRE OS ORGANIZADORES

Sivoneide Maria da Silva


Possui Graduação em Ciências Biológicas/Licenciatura pela Universidade Federal
de Pernambuco - UFPE (2014) e Mestrado em Ciências Biológicas, área de
concentração Biotecnologia, pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências
Biológicas - PPGCB - UFPE (2017). Atualmente é aluna de Doutorado pelo
Programa de Pós-Graduação em Bioquímica e Fisiologia - PPGBqF - UFPE. Tem
experiência em Microbiologia clínica e ambiental, atuando com Biologia Molecular
de Microrganismos e Biofilmes Bactrianos.

Francisco Henrique da Silva


Acadêmico em Farmácia no Departamento de Ciências Farmacêuticas da
Universidade Federalde Pernambuco(UFPE). Atualmente participa de projetos de
extensão na área de bioprospecção de compostos bioativos do Bioma Caatinga,
desenvolve pesquisas relacionadas a perfil de resistência microbiana de
organismosmultri-droga resistentes no laboratório de Biologia Molecular do
Departamento de Bioquímica da Universidade Federal de Pernambuco.
desenvolvendo pesquisa na área de produtos naturais e sintéticos frente a
patógenos microbianos de interesse clínico. É Membro do Grupo de pesquisa dos
compostos bioativos das florestas sazonalmente secas da América do Sul, onde
associa os conhecimentos populares aos saberescientíficos.

Amanda Virginia Barbosa


Possui graduação em Ciências Biológicas - Licenciatura pela Universidade
Federal de Pernambuco - UFPE (2014) e Mestrado pelo Programa de Pós-
Graduação em Ciências Biológicas - PPGCB - UFPE (2017). Atualmente, aluna de
Doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas - PPGCB –
UFPE.

Matheus Alves Siqueira de Assunção


Acadêmico em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco -
UFPE. Atualmente participa de projeto de extensão na área de saúde do Hospital
da Mulher de Recife - HMR, desenvolve pesquisas relacionadas ao
desenvolvimento embrionário e toxicidade no Laboratório de Toxicidade e
Comunicação Celular do Departamento de Histologia e Embriologia do Centro de
Biociências. Desenvolve trabalhos relacionados ao estudo de algas e seu
potencial de cicatrização e antimicrobiano pelo Departamento de Química
Fundamental, Centro de Ciências Exatas e da Natureza, Universidade Federal de
Pernambuco-UFPE.Desenvolveumprojetodepesquisaintitulado"Variação espacial
e sazonalidade de artrópodes associados a Ipomoea carnea subs.fistulosa
(Convolvulaceae) na área de Caatinga", vinculado ao Laboratório de Interações
Multitróficas - LIM do Departamento de Botânica da Universidade Federal de
Pernambuco-UFPE.

Fálba Bernadete Ramos dos Anjos


Mestrado em Fisiologia pela Universidade Federal de Pernambuco e Doutorado
em Farmacologia pela Universidade Federal do Ceará. Professor da Universidade

261
Federal de Pernambuco. Atuando na área de Saúde Pública em Projetos de
Extensão, nas maternidades e Projetos de Pesquisa com meio ambiente e em
estudos com Etnofarmacologia; Ecotoxicidade e Embriotoxicidade. Realiza
monitoramento da Costa do Estado de Pernambuco, evidenciando os efeitos da
ação antrópica nos Ecossistemas Costeiros, evidenciando os impactos ambientais
através de ouriços-do-mar, macroalgase suas relações com os organismos
marinhos presentes no habitat estudado, considerando sua distribuição
geomorfológica. Avaliação da atividade de exsudatos naturais e outros
biocompostos e a o seu comportamento na comunicaçãocelular.

262
Agência Brasileira ISBN
ISBN: 978-65-992783-3-4

263

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