Seminário Projeto de Saneamento
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RESUMO
O sistema fluvial composto pelos rios Paraíba do Sul e Guandu é de extrema importância,
principalmente para a população do estado do Rio de Janeiro, uma vez que se trata da principal fonte
de água para aproximadamente 9 milhões de habitantes nesta região (CEDAE,2021). Apesar disso,
dados disponibilizados por instituições e sistemas nacionais de informação indicam grande
negligência quando se trata do tratamento dos efluentes que são despejados neste sistema fluvial. A
partir da análise de publicações acadêmicas, dados do SNIS - Sistema Nacional de Informações sobre
Saneamento e relatórios de potabilidade da água disponibilizados pela CEDAE - Companhia Estadual
de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro e pelo INEA – Instituto Estadual do Ambiente, buscou-se
compreender como o despejo de efluentes sem o tratamento adequado na Bacia do Guandu, somado
às questões de infraestrutura dos municípios da Baixada Fluminense, impacta na distribuição de água
potável para a população desta região. A compreensão desses fatores pode ser de grande ajuda para
reforçar a necessidade de implementação de medidas preventivas e de gestão adequada dos efluentes,
visando mitigar os riscos de proliferação de doenças relacionadas à água e oferecer dignidade à
população através do acesso à um dos itens mais básicos e essenciais para a vida humana.
Palavras-chave: ETA Guandu, Baixada Fluminense, Efluentes.
1. INTRODUÇÃO
No primeiro semestre de 2020, os moradores do município do Rio de Janeiro e da Região
Metropolitana viveram um cenário de crise hídrica que pode ser caracterizado como um dos piores já
ocorridos no estado. Moradores de diversas localidades destas regiões relataram alterações referentes
à coloração, odor e sabor da água que chegava em suas residências através da rede de abastecimento
da CEDAE (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro).
Segundo especialistas da CEDAE, as alterações foram provocadas pela presença de geosmina
e proliferação de algas na água, sendo esses dados corroborados pelos resultados apresentados nos
relatórios disponibilizados para consulta pública pela Companhia. Mesmo causando surpresa na
população geral, este cenário não é algo inesperado, uma vez que “a presença desses compostos
orgânicos deve-se principalmente à proliferação de cianobactérias em mananciais com altos e
desequilibrados níveis de nutrientes, fundamentalmente resultantes de eutrofização” (SOUZA et al.,
2012) e os mananciais que abastecem a região recebem um volume cada vez maior de esgoto
doméstico e industrial sem o devido tratamento.
O rio Guandu, responsável pela maior parte do abastecimento de água da Região
Metropolitana do Rio de Janeiro e cenário da crise acima descrita, tem como principal uso de suas
águas o tratamento para consumo de água potável. Este mesmo rio recebe esgoto dos municípios de
Nova Iguaçu, Japeri, Miguel Pereira, Seropédica (municípios da Baixada Fluminense) e Rio de
Janeiro, além dos efluentes recebidos da ETA do Complexo Guandu, responsável pelo lançamento
de grande quantidade de resíduos de origem metálica e inorgânica. Sendo cada vez maior a entrada
de carga orgânica, observa-se não apenas a degradação do ecossistema aquático, mas também a
evolução de uma crise sanitária que afetará milhões de pessoas.
Este trabalho de pesquisa tem como objetivo investigar o impacto do despejo de efluentes com
tratamento inadequado na Bacia do Guandu no abastecimento de água potável para a população, com
foco particular em seus efeitos na Baixada Fluminense.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Por anos, a humanidade acreditou que a água fosse um recurso inesgotável, uma vez que, na
crença comum, as fontes desse recurso eram infinitas e renováveis. Apesar de ser um recurso
abundante, hoje sabemos que não é ilimitado. A má gestão, combinada com o contínuo
desenvolvimento humano e a crescente demanda, tem gerado uma forte preocupação entre
especialistas. O ponto que causa maior preocupação é justamente um evidente declínio das reservas
de águas limpas em escala global. Segundo o relatório mundial das nações unidas sobre o
desenvolvimento dos recursos hídricos do ano de 2023, entre 2000 e 2018, o declínio dos recursos
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hídricos renováveis globais per capita foi de cerca de 20%. Em contrapartida, o mesmo relatório faz
a projeção de que a população urbana global que enfrenta escassez hídrica poderá aumentar de 933
milhões (dados de 2016) para até 2,4 bilhões de pessoas. A poluição dos corpos hídricos, mudanças
climáticas e o desperdício têm sido apontados como principais fatores que colocam em risco o
abastecimento da água, tanto nos meios urbanos quanto rurais (LIMA, 2011).
Na literatura em geral, o conceito de efluentes são os resíduos líquidos provenientes de ações
antrópicas, abrangendo uma ampla gama de fontes, incluindo residências, setores industriais e
estabelecimentos comerciais. Esses efluentes podem conter uma variedade de contaminantes, como
detritos industriais, agentes químicos e pesticidas. O tratamento inadequado desses efluentes
apresenta um impacto significativo no abastecimento de água, levando à degradação dos corpos
hídricos receptores (Momba, 2006; Muchie, 2011). Essa degradação pode ser percebida no processo
de eutrofização dos corpos hídricos, de proliferação de agentes patogénicos transmitidos pela água e
na presença de compostos desreguladores endócrinos, que representam riscos para a saúde pública e
o ambiente (Momba, 2006; Muchie, 2011).
No Brasil, o tratamento de efluentes ainda é um desafio. De acordo com o Sistema Nacional
de Informações sobre Saneamento (SNIS), em 2021, apenas 51,2% do esgoto coletado no país foi
tratado. A Baixada Fluminense, por sua vez, não apresenta dados divergentes deste cenário. Composta
por 8 municípios, e com uma população estimada em 3,3 milhões de habitantes (SNIS, 2021) em
2021, o volume de esgoto produzido na Região Metropolitana do Rio de Janeiro foi de 2.200 milhões
de metros cúbicos (m³), o que representa uma média de 175 litros por habitante por dia. Uma parte
considerável deste esgoto não passa por tratamento, indo diretamente para os mananciais da região,
gerando problemas recorrentes de abastecimento, uma vez que o sistema de abastecimento de água
caracteriza-se pela retirada da água de um manancial, adequação da qualidade desta água a fim de
torná-la potável para consumo humano e o transporte da água tratada para população.” (FUNASA,
2015, p.32.).
Com a qualidade da água captada nos mananciais da Região Metropolitana do Rio de Janeiro
(RMRJ) comprometida pela poluição, principalmente por esgotos não tratados, as estações de
tratamento de água precisam atuar em níveis de tratamento mais eficientes, o que aumenta o custo do
tratamento e a necessidade de investimentos em infraestrutura.
Este artigo começará examinando o estado atual da poluição das águas na Bacia do Guandu e
seus efeitos na Baixada Fluminense. Em seguida, analisará as causas do lançamento de efluentes e os
fatores que contribuem para os seus impactos negativos na qualidade e disponibilidade da água.
Finalmente, o artigo explorará potenciais estratégias de mitigação que podem ser implementadas para
reduzir os efeitos do despejo de efluentes no meio ambiente e na saúde pública.
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3. MATERIAIS E MÉTODOS
O presente estudo bibliográfico foi realizado sobre o a poluição do Rio Guandu e de oito
municípios inseridos dentro da região conhecida como Baixada Fluminense, localizada na Região
Metropolitana do Rio de Janeiro. Para delimitação da Baixada Fluminense foi utilizada a classificação
utilizada pelo ISP (Instituto de Segurança Pública) que compreende treze municípios: Belford Roxo,
Duque de Caxias, Guapimirim, Itaguaí, Japeri, Magé, Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu, Paracambi,
Queimados, São João de Meriti e Seropédica.
Figura 3: Esquema da água bruta que chega à captação de água da ETA Guandu
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Figura 4: rios e seus afluentes que fazem contribuição hídrica à captação de água
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O INEA – Instituto Estadual do Ambiente, realiza o monitoramento da água dos corpos
hídricos do estado do Rio de Janeiro. Ao observar o Índice de Qualidade de Água (IQA) dos os rios
afluentes ao Sistema Lagoa do Guandu, identifica-se que de 2012 a 2021, a classificação da qualidade
da água de todos aparece como “Qualidade Ruim” e “Qualidade Muito Ruim” .
IQA
Rio Município
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 Média
Queimados Queimados 28,21 26,46 20,04 19,60 20,24 21,29 20,69 24,1 20,24 17,07 21,79
Poços Queimados 36,20 37,04 33,09 30,33 28,44 30,62 35,55 30,72 32,70 28,83 32,35
Ipiranga Nova Iguaçu 22,25 29,30 29,16 30,63 26,62 SD SD SD SD 18,06 26,00
Cabuçu Nova Iguaçu 22,76 28,75 30,08 27,73 26,20 SD SD SD SD 19,6 25,85
Nota: As células classificadas como "SD" se devem a falta de dados no relatório do INEA
Categoria de Resultados Excelente Boa Média Ruim Muito Ruim
100 ≥ IQA ≥ 90 90 > IQA ≥ 70 70 > IQA ≥ 50 50 > IQA ≥ 25 25 > IQA ≥ 0
Águas impróprias para tratamento
Águas apropriadas para tratamento convencional convencional visando abastecimento
Significado
visando o abastecimento público público, sendo necessários tratamentos
mais avançados
Tabela 1: : Monitoramento Sistemático de Qualidade da Água do INEA. Adaptado pelos autores do artigo
É importante levantar como ponto de atenção a contribuição hídrica do Rio Queimados, por
este receber esgotos brutos do município de Queimados e efluentes do Polo Industrial (Figura 4) e
possuir um dos piores históricos do IQA de 2014 a 2021 (Tabela 1). O Rio Ipiranga, que desagua
diretamente na Lagoa Pequena, também apresenta um dos piores indicadores, principalmente se
observarmos o ano de 2021. Em paralelo, se observarmos os IQA médio da Lagoa Pequena do período
de outubro de 2021 a fevereiro de 2022 (Tabela 1), é possível ver a consequência desses afluentes no
Sistema de Lagoas do Guandu.
O IQA é uma medida que avalia diversos parâmetros físicos, químicos e biológicos da água
para determinar sua qualidade. A presença de poluentes, como matéria orgânica, coliformes fecais e
outros contaminantes associados ao esgoto, pode resultar em um baixo IQA, logo, um Índice de
Qualidade da Água (IQA) ruim pode indicar a presença de esgoto na água.
Esses dados podem ser relacionados ao sistema ineficiente de tratamento de esgoto dos
municípios da região conhecida como Baixada Fluminense, especialmente pelos municípios de Nova
Iguaçu, São João de Meriti e Queimados, que possuem corpos hídricos que integram diretamente o
Sistema Guandu. Os dados da coluna “Atendimento Total de Esgoto” (Tabela 2) apresenta uma
realidade onde, com exceção do município de Nova Iguaçu, menos da metade da população tem seu
esgoto coletado. E, apesar de a Resolução CONAMA nº 357, de 17 de Março de 2005, estabelecer
que “Os efluentes de qualquer fonte poluidora somente poderão ser lançados, direta ou indiretamente,
nos corpos de água, após o devido tratamento e desde que obedeçam as condições, padrões e
exigências dispostos nesta Resolução e em outras normas aplicáveis”, seis dos oito municípios
estudados trataram apenas uma porcentagem do esgoto coletado e dois deles não realizaram qualquer
tipo de tratamento, despejando-os in natura nos corpos hídricos.
5. CONCLUSÃO
O impacto desses rios na qualidade da água do Sistema Lagoas do Guandu pode ser
apresentado através dos resultados de monitoramento disponibilizados nos boletins do INEA de 2022,
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onde o valor médio de IQA das amostras coletadas no período de outubro de 2021 a fevereiro de 2022
e localizadas em pontos mais ao centro das lagoas, apresentaram classificação “Ruim”.
Dados públicos informam que o governo federal possui programas de investimentos em
saneamento básico direcionados para o tratamento de esgoto. Além disso, as empresas de saneamento
básico da RMRJ também estão investindo em projetos de expansão do tratamento de esgoto
(CEDAE,2023). Neste sentido é importante avaliar quais os tipos de mecanismos que estão sendo
criados em paralelo para um monitoramento dos resultados empregados por estas frentes de atuação.
Em caso de ausência, torna-se crucial o incentivo de novas frentes de pesquisas, com o objetivo de
trazer essa visibilidade de resultados para a população atendida.
A participação da sociedade civil também é fundamental para a melhoria do tratamento de
esgoto. A população pode se fazer presente junto aos governos e as empresas de saneamento básico
para que invistam mais no tratamento de esgoto, participando através de consultas públicas no que
tange os investimentos de governos locais. Ao investir no tratamento de esgoto, estamos investindo
na qualidade de vida da população e na preservação dos recursos naturais.
Por fim, nota-se que a utilização desses materiais de pesquisa permitiu um embasamento mais
consistente para investigar e compreender a conexão entre o despejo de efluentes nos corpos hídricos
que fazem parte do sistema de abastecimento do Guandu e qualidade e disponibilidade de água
potável na região da Baixada Fluminense.
6. REFERÊNCIAS
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