Cartas A Cicinato
Cartas A Cicinato
Cartas A Cicinato
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CARTAS A CIMNATO
ESTUDOS- CRÍTICOS
O b r a s de S e n i o (J. de A L E N C A R )
SECUNDA EDIÇÃO
COM EXTHACTOS DK (JAUTÁS DE CltiCINN^TO
ROTAS PO AUTOR
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PERNAMBUCO
J,-W, DF. MEDEIROS. LI V R R I R O - O I T m :
79, HO A DO 1 M 1 E K A H O B , 7 9
18 7 2
CARTAS
A GINCINNATO
MJIÀO UACON E COMI',, I t t A H EliKülilMI. 1
LITTERATURA BRAZILE1RA
CARTAS A CINCINNATO
ESTUDOS CRÍTICOS
DE SEMPRONIO
Sobre o GAÚCHO e a IRACEMA
SEGUNDA EDIÇÃO
COÍI EXTRACTOS DE CARTAS DE CINCINNATO
E fiOTAS DO AUTOR
PERNAMBUCO
J.-W. D li MEDEIROS, LI VREIRO-EDITOR
79, II V A 1)0 í 31 r E II A D O II , 7 O
PAR1Z.-T-V*» ,1.-1'. A I L L A U D , G Ü I L L A R D E C»
Livreiros de Su.is Magestades o Imperador do Brazil >• El-Rei de Portugal
i7, RUA s A j N T - A N nr. IÍ-I> E S - \ n T S . V7
187'2
MEU CARO CINCINNATO,
O GAÚCHO
CARTAS
A 'CINCINlNATO
CARTA I
Meu amigo
D
Meu amigo.
Meu amigo.
SEMPRONIO.
CARTA IV
Meu amigo.
Sempronio amigo.
Agradeço cordialmente as admiráveis cartas em que me
tens ido fazendo a analyse do famoso Gaúcho, com inlelli-
gencia e gudeza critica tal, que me parece a tua penna,
modelo para similhantes estudos, e digna de appreciação
de trabalhos de vulto. Sim, pennas, como a tua, devem tei-
mais alta missão, mas emfim, bem haja quem foi origem
de lucubrações tão valiosas, na essência e na fôrma, como
estas cartas são.
Mandas-me, com a tua 4a carta, um exemplar do Gaúcho,
para que eu, confrontando-a com o documento original, te
diga se és severo ou justo. Já que me permittes, dir-te-hei
que me não pareces justo nem severo : em vez de rigor, ha
ahi brandura; longe de justiça, ha favor nos teus julga-
mentos : affigura-se-me que ainda concedes ao escriptor
qualidades imaginárias, em desconto de seus peccados.
Agora que li o tal livreco, tenho para mim que no seu au-
tor venerarei de boa mente uma excellente pessoa; mas
como escriptor, isto não é mais que um operário da com-
muna litteraria, demolidor feroz, petrolisador intellectual,
digno membro do directorio da Escola Coimbra.
50 LITTERATURA BRAZILEIRA.
N'esta tua 4* carta, dissecas brilhantemente o 1* capitulo
do Gaúcho, e ainda assim saltas por sobre mil bellezas, pro-
vavelmente porque, para aquilateral-as todas, houveras pre-
cisado os CO volumes in-folio da Encyclopedia methodica.
Concordo comtigo : este escrevedor tem a mania da novi-
dade; il luifaut du nouveau quand il rtij en aplus; logo no
prôemio d'esta cousa, nos diz elle que na novidade é que
elle acha o sainete; é da rara dos taes que não hesitarão em
descrever o mar como encarnado, e o circulo como bicudo,
só para conquistarem a gloria de ceifar estranhezas, e dar
á luz novidades ; foi quem aconselhou Alcibiades a cortar
o rabo ao cão. Onde a imaginação lhe parece frouxa, ou de-
senfreada, pouco importa ; acceita-se tudo : ás maiores
loucuras, chama-se originalidade; o devaneador é chefe de
escola, e já que não pôde brilhar pelo senso commum,
contenta-se com o pechisbeque da casa :
Quand on n'a pas cc que l'on aime,
II faut aimer ce que l'ori a.
Meu amigo.
ov
Continua Senio :
« Em qualquer ponto onde estivesse, precisando de um ca-
vallo não carecia de o apanhar a laço; bastava-lhe um signal
e logo apparecia o magote alegre a festejal-o, offerecendo-se
para seu serviço. 0 trabalho era escolher e arrèdar os outros,
pois todos queriam prestar-se, como seus amigos que eram,
uns por gratidão, outros por sympalhia. »
SEMPROMO.
CARTA II
CINCINNATO A SEMPRONIO
ClNCIKNATC.
CARTA VI
Meu amigo
D v
Outro disse :
« O perfil de Catita, o lyrio do matto, apparece no meio
d'aquellas contorsões, combates, perigos e lagrimas, como
o vulto de uma estrella límpida resplandecendo na tempes-
tade. »
SEMPROMO.
CARTA VII
Meu amigo
ov
Meu amigo.
SEMPROMO.
6.
CARTA III
DO ROCEIRO C I N C I N N A T O A S E M P R O N I O
Querido amigo.
CARTA IV
CINCINNATO A SEMPRONIO
CARTA V
DO R O C E I R O C I N C I N N A T O AO C I D A D Ã O FABRICIO
Caro amigo.
Passei hontem o dia em Andarahy, e por isso não pude
palestrar comtigo. Sai agora d'aqui o Tício, que me trouxe
a 2* e 5*. Palestra, publicadas hontem e hoje.
Lemos juntos aquellas duas peças de architectura, e discu-
timos largamente se era licito tomar em consideração escriplos
redigidos com iórmas tão baixas, que é duvidoso merecerem
resposta. Estas pugnas litterarias tem seu que do duello : ac-
ceitarias tu um repto para te bateres, não com armas licitas,
CINCINPiATO A SEMPROMO. 109
mas com punhados de lodo ? Eu já nem me presto a copiar as
palavras e expressões, que esta casta de adversários julga ad-
missíveis em taes polemicas; embora seja simples transcripção,
ha certo pudor que veda reproduzir com a nossa penna lingua-
gem que só se aprende nas tabemas e nos açougues. O sal
áttico d'estes senhores, é sal de cosinha, e do mais ordinário.
0 idioma é em todos os gêneros tão opulento que nada
houvera mais fácil do que a uma insolencia responder com dez
insolencias, a uma brutalidade com cem brutalidades ; mas
ainda quando o adversário nada mereça, merece muito o
publico, e a nossa própria dignidade.
Depois de lidos estes dous artigos, tinha um de três arbí-
trios a tomar:
Io. Responder na mesma afinação, ou meio tom acima.
Seria seguir um vergonhoso exemplo ; transformar contro-
vérsia em pugilato; desrespeitar o leitor e a mim mesmo.
2o. Em vista de tamanho descomedimento, guardar silencio,
por não julgar decente polemica de espécie alguma com taes
contendores. Seria deixar campear impune o desacerto boccal,
e autorisal-o a proclamar irrespondíveis os seus delírios.
3o. Fechar olhos a tudo quanto em taes artigos reveste a
fôrma brutal, extrahir d'elles lealmente o que aspire a foros
de argumentação, e aquilatal-a, como se fosse proferida com
decência e compostura, e por quem tivesse em mente, não a
injuria, mas a apuração de doutrinas controvertidas. Por ex-
clusão de partes, entendi que era esta' a marcha que eu tinha
de seguir.
Deixarei pois, de boamente, a Senio a gloria do seu voca-
bulário. Não reciprocarei os piegas, Mainante, salsinha litte-
rario, charlatão, casmurro, palhaço, critiqueiro, cacas-
seno, etc, etc. Acceito tudo, e pago-lhe, dizendo que nada
d'isso me demove da posição de justiça e plena rectidâo em
que me colloquei, nem me %autorisa a represálias, que em
laes termos seriam indignas do publico, de mim... e do pró-
prio Senio.
Não ha quem tenha esquecido a luta entre J. A. de Macedo
7
110 LITTERATURA BRAZILEIRA.
e Bocage, no fim do século passado. Aquelle começou a sua
excellente satyra por estes versos:
Sempre, ó Bocage, as satyras serviram
para dar nome eterno e fama a um tolo.
A satyra monumental em que Bocage analysou aquella,
principiou assim:
Satyras prestam, satyras se estimam,
quando n'ellas calumnia o fel não verte...
quando forçado epitheto affrontoso
[tal que nem cabe a ti) não cabe aquelles
que já na infância consultavam Phebo.
Eis-ahi, ao menosn'este ponto da satyra, um bello exemplo.
Bocage tinha um arsenal provido: quem lhe chamava tolo,
dava-lhe o direito de redarguir com egual energia: parvo,
néscio, asno, tolambana, basbaque, asneirâo, estólido, fátuo,
papalvo, parvoalho, inxovêdo, inepto, insensato, parvoeirão,
tolaz, patau, simplório, sandêo, tolão, simpleirão, estulto,
ignorante, lorpa, zote, bestial, pateta das luminárias, amenle,
mentecapto, lunático, tresvariado, demente, tonto, parvoínho,
alarve, alvar, animal, bobles abobles, bolonio, camelo, caturra,
orate, despropositado, estouvado, estúpido, patola, e mais
duas dúzias de variantes, que se aprendem na praça do Mer-
cado. Tal não fez: começou logo reconhecendo, não obstante
a ira que o inflammava, não ser aquelle epitheto applicavel
a quem lh'o applicava; como não faria outro tanto, eu, em
quem taes, violências não geraram agastamento, mas simples
compaixão ?
Deixarei pois aquellas energias de linguagem para quem
precisar lançar poeira aos olhos; eu, que só preciso racioci-
nar sem vituperios, dispenso esses tristes recursos da impo-
tência.
Pelo que vejo, abandonaram ao braço secular o poder pes-
soal, o orador, o estadista, o escriptor. Só defendem o ro-
mancista. Vamos a isso. Sempronio consagrou 40 paginas á
analyse do Gaúcho; não se atreveram com elle: eu rabusquei
GmCINNATO A SEMPRONIO. 111
na vinha que o hábil vindimador deixara, consagrando apenas
duas cartinhas ao meu supplemento de analyse, e é sobre
mim que Senio cae desapiedadamente, por me saber mais fraco.
Faz lembrar César em Dyrráchio, investindo o campo de Tor-
quato, por suppôl-o mais fácil de derrotar do que se atacasse
as forças de Pompeo. Resigne-se cada um á sua sorte, e vamos
a isso.
É um tanto difficil conquistar attenção sobre assumptos já
cançados, e que naturalmente saciam. Sempronio fez uma
primorosa analyse do Gaúcho; eu comecei-lhe um insignifi-
cante additamento; agora o tal Senio disseca-me a mim; eu
vou dissecar a sua dissecçâo..., de modo que isto vem a ser
analyse da analyse do additamento á analyse da obra. Fora
mister muito mais alto mérito litterario em mim, e no meu
instigador, para ser isto supporlavei; todavia cumpra-se o
dever, inteiro e com lealdade.
Teu velho amigo,
ClNCIKNÀTO.
CARTA VI
DE C I N C I N N A T O A S E M P R O N I O
Respeitável Sempronio;
tehhb a estulta manha de multas vezes discursar de alhos
quando se trata de bugalhos; e se tae cae a talho de foice
uma leitura que me quadra, transcrevo logo, embora venha
112 LITTERATURA BRAZILEIRA.
despropositada; e como d'istojá agora me não emendo, por-
que quem torto nasce, tarde ou nunca se endireita, lá vae uma
das taes leituras, sem atilho nemvencílho.
Celebrava-se antigamente em algumas egrejas do Norte,
por fins de Dezembro, uma festa denominada Libertas decem-
brica, ou, mais commummente, do Papa fatuorum. No tempo
dos officios divinos, saíam da cathedral os clérigos emmasca-
rados, ou em trajos mulherís, ou vestidos de bobos e choear-
reiros, dançando e saltando e correndo, com grandes alari-
dos. Juntos no coro, cantavam cantigas deshonestas, faziam
dos altares mesas, com grandes comesanas e galhofas, deita-
vam solas de ehichellos nos thuribulos, e com fétido fumo
incensavam as paredes, e com outras sacrilegas extravagân-
cias, procediam á eleição do seu Pontífice, que tinha por titulo
0 Papa dos fátuos. Foi continuando este bárbaro escândalo,
até que, em 1444, os theologos da faculdade de Pariz, com
a circular que dirigiram aos prelados de França, e que depois
foi dada á luz por João Savaro, extinguiram a festa do Papa
fatuorum. Fizeram muito bem, e estou convencido de que
nunca mais se restabelecerá o ridículo protopapado.
Emfim, deixemos os assombrosos costumes da edade media,
lão outros dos actuaes, e continuemos a nossa pratica litte-
raria.
Uma folha d'esta capital, de aspirações adiantadissimas, dá
ao orbe intellectual a fausta noticia de que ás suas columnas
coube a gloria de serem escolhidas para uma nova brilhatura
romântica do Sr. José d'Alencar, o conservador. Ha de chamar-
se-lhe... 0 TU! e justificar a qualificação, já dada ao seu
autor, de chefe da litteratura brazileira. Podes imaginar
com que anciedade é esperado o novo parlo da fecunda musa,
para gloria nacional, orgulho e desvanecimento da pátria
(sic).
— Fiquei com o espirito tão desenxabido, pela insipidez da
materia,que para o consolar peguei n'um livro ao acaso, e caiu-
me debaixo das mãos a Euphrosina. Findo esta carta com uma
transcripçào dVlla, como com outra transcripção principiou,
CINCINNATO A SEMPRONIO. 113
apezar de nem uma nem outra ter a mínima ligação com o
assumpto, porque emfim eu não creio que isto sejam umas
galés, ou que fossemos condemnados a não nos occuparmos
senão de um. Diz o bom do clássico:
« Guarde-vos Deus de ira do senhor e de alvoroço do povo
— de doidos em lugar estreito — de moça adivinha e de mu-
lher latina — de pessoa signalada, e de mulher três vezes
casada — de homem porfioso — de Iodos em caminho e de
longa enfermidade — de official novo e de barbeiro velho —
de amigo reconciliado, e de vento que entra por buraco —
de hora minguada e de gente que não tem nada — de phy-
sico experimentador, de mathematico doutor, e de asno or-
nejador. »
Recebe as expressões da respeitosa admiração do teu reve-
rente amigo,
CIKCINHATO.
CARTA VII
DE C I N C I N N A T O A S E M P R O N I O
Illuslrado amigo.
Recebo a tua preciosa carta, de 10 do corrente, na qual me
dizes que talvez te divirtas com o testa de ferro de Senio, pa-
recendo-te porém mais methodico esperar que elle despeje o
seu vasto arsenal de conhecimentos, expressos em linguagem
apropriada. Accrescentas : «Far-se-ha então uma aprecia-
ção synthetica, epôr-sè-ha a nu a intelligencia do critico. Crê
114 LITTERATURA BRAZILEIRA.
tu que o Gaúcho me offerece matéria para outra longa série
de cartas, e não estou longe de escrevêl-a. Entretanto, para
mudar de assumpto por agora, vou entreter-me com a Ira-
ctma. »
Escuta cá, meu amigo. 0 anonymo das Palestras declarou
depois que depunha a mascara, com o que ficou mais ano-
nymo que d'antes!
ClNCINNATO.
NOTAS
DE J. DE ALENCAR
A IRACEMA
S1SR. REDÀCTOR DAS « QUESTÕES DO DIA
SEMPRONIO A CINCINNATO
fnclito amigo.
SEMPKOMO,
CARTA I
SEMPRONIO.
CARTA III
SEMPRONIO.
CARTA VII
CINCINNATO A SEMPRONIO
Talentoso amigo1
e
Onde estávamos nós ? Ah, já me lembro: no Til. Admirá-
mos os mil modos interessantes empregados para activar a
venda do livro monumental, tão superior a qualquer outra
producção como o til o é ás palavras a que se superpõe.
ClNCIMNATe.
CARTA IV
Meu amigo.
oK
SEMPRONIO.
CARTA Y
'>»->)(
Meu caro amigo.
D^
Teu, do coração,
SEMPRONIO.
CARTA YIÍI
CINCINNATO A SEMPRONIO
Lê-se no Caramurú:
« Já se avistava bárbaro tumulto
« das inimigas tropas em redondo ;
'Í e antes que empr'endam o primeiro insulto
SEMPRONIO.
CARTA IX
Meu amigo.
b v
Comprimento-te, e continuo.
Lê-se na pag. 84 da Iracema : « — .... Se o
guerreiro Cauby tem de morrer, morra elle por esta
mão, e não pela tua.
« Martim pôz no rosto da selvagem olhos de
horror :
«Iracema matará seu irmão ? — Iracema antes quer
que o sangue de Cauby tinja sua mão que a tua;
porque os olhos de Iracema vêem e a ti, a ella
não. »
Explica-me esta filigrana, que o Sr. Alencar
não achou planta exótica n'uma sociedade, onde o
sangue, longe de infamar, exaltava, porque era
prova de gentileza e bravura.
Entretanto, ao passo que tinha tal fineza para o
248 LITTERATURA BRAZILEIRA.
Meu amigo :
1
Armadilha selvagem de pegar camarão.
286 LITTERATURA BRAZILEIRA.
Meu amigo :
DE C I N C I N N A T O A C U J A C C I O
Illustrado Cujaccio.
ClHCINNATO.
1*1
NOTA
FIM
ÍNDICE
Carta-prulogo «
DE SEMPIIONIO A ClNflINNATO SOBRE O « G A Ú C H O . II
Carla 1 3
Carta II ' 9
Carta III 25
Carta IV . . . 57
Carta V 5r,
Carta VI 71
Carta VII 81
Carta VIII. . . . . . . . . 9 1
DE CINCINNATO A SEMPRONIO. — (EXTIIACTOS).
Carta I. . . . ._ 49
Carta II. . . . .' 65
Carta III 10o
Carta IV 106
Carta V (de Cincinnato ao cidadão Fabricio) 108
Carta VI 111
Carta VII 113
NOTAS
Sobre as cartas de Cincinnato. . . . . . 117
Sobre as cartas de Sempronio 117
330 ÍNDICE.
Carto. 12.*»
DE CINCINNATO A CDJACCIO.
Carta I. . 321
NOTA
Sobre as cartas de Sempronio 327
FIM no ÍNDICE.
-d E
•
So