Amor Hóquei

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 289

Copyright © 2024 Lana Silva

Todos os direitos reservados

Capa: BK Designer
Revisão | Copydesk | Diagramação: Kreativ Editorial
Ilustração: Úrsula Gomes Vaz

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera
coincidência.
É proibida a reprodução total e parcial desta obra de qualquer
forma ou quaisquer meios eletrônicos, mecânico e processo xerográfico,
sem autorização por escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

TEXTO REVISADO DE ACORDO COM O NOVO ACORDO


ORTOGRÁFICO.

1ª Edição
Criado no Brasil
Playlist
Sinopse
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Epílogo
Bônus
Agradecimentos
Para ouvir a playlist, escaneie o código abaixo ou clique aqui.
Olivia Callahan é uma ótima patinadora, mas não é conhecida por
seu talento sobre os patins, e sim, por ser uma encrenqueira. E dessa vez,
ela foi presa e não está sozinha, pois Aaron Prince está com ela.
Aaron Prince, o garoto de ouro, com fama de ser um príncipe,
jogador de hóquei do time da faculdade de Dartmouth, só queria bancar o
herói, mas termina em uma prisão com Olivia, a garota problema.
Olivia precisa manter o pai longe e a única maneira é mentir que
Aaron, o cara que foi preso com ela, é seu namorado. Aaron não deveria
aceitar mentir, afinal, é um péssimo mentiroso, mas ele tem uma avó
doente e implorando para ele arranjar uma namorada.
Um acordo é feito, um namoro de mentira é firmado, eles só
precisam mentir, não deve ser tão difícil, não é?
Mas o que acontece quando sentimentos reais surgem? O que
acontece quando nada é tão simples quanto parece? O que pode dar
errado?
Nunca é o fim, apenas um recomeço...
Desejamos uma ótima recuperação a avó do nosso principezinho do
hóquei.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron
Paro o carro em frente à casa dos meus avós, olho para o lado e
encaro a fachada do lugar. Várias lembranças ecoam em minha mente e a
maioria são boas, com exceção do dia da morte dos meus pais e dos dias
seguintes.
Meus avós são responsáveis por quem eu sou; eles foram meus pais,
meus avós, meus guardiões e são tudo para mim. Respiro fundo e passo a
mão pelos fios do meu cabelo.
Eu preciso ser forte e não sei se conseguirei. Por um segundo,
pondero voltar para Hanover, continuar fugindo e fingindo que nada está
acontecendo, mas não posso mais fazer isso. Minha família precisa de mim,
eu preciso ser forte por uma das pessoas que eu mais amo na vida.
Suspiro, abro a porta ao meu lado e deixo o carro. Caminho na
direção da varanda e meus passos são curtos, pois não tenho pressa. Antes
mesmo de estar na metade do trajeto, a porta é aberta, meu avô apoia seu
ombro no batente, cruza seus braços, estreita seus olhos e sua testa está
franzida.
Ele não está muito feliz comigo. Eu também não estou! Se eu
pudesse, caminharia ainda mais devagar, mas, se fizer isso, meu avô é capaz
de atirar em mim. Ele abre a sua boca assim que me aproximo o suficiente
para o ouvir.
— Olha quem decidiu nos agraciar com sua ilustre presença.
Faço uma careta e piso na varanda.
— Eu estive ocupado.
Ele revira seus olhos, claramente não acreditando em minha
desculpa.
— Limpei sua bunda, garoto, não minta para mim.
— Realmente estive ocupado com minhas aulas e com os jogos.
Não é uma mentira, mas está longe de ser a verdade.
— Você estava fugindo e nós dois sabemos disso. — Engulo em
seco, meu avô apenas mantém seus olhos em meu rosto e abre seus braços.
— Nós sentimos a sua falta, garoto.
Dou dois passos em frente e abraço o meu avô. Seus braços são
familiares, foi onde encontrei conforto boa parte da minha vida e me sinto
em casa. Eu preciso me controlar para não permitir que as lágrimas deixem
meus olhos.
— Eu senti sua falta, vô.
Sussurro, meu avô se desvencilha de mim, assente e passa seu braço
pelos meus ombros.
— Eu sei que sim. — Nós dois entramos enquanto ele continua com
o braço ao meu redor. — Se você não viesse, eu mesmo iria te buscar.
E ele iria. Joseph Prince é um homem duro quando precisa; é
amoroso, gentil, mas firme e rude se for necessário. Não há limites para o
meu avô, nunca vi nada pará-lo.
Cruzamos o hall de entrada, as escadas que levam até o piso
superior e vamos até a sala. Deparo-me com as janelas imensas que
permitem uma olhada no jardim, a lareira, o sofá bege repleto de almofadas,
as poltronas preferidas dos meus avós e a decoração mais clássica que
minha avó ama.
O lugar aumenta minha nostalgia e a pressão em meu peito.
— Como ela está?
Faço a pergunta que preciso fazer e meu coração acelera, pois tenho
medo da sua resposta.
— Ela está reagindo bem ao tratamento, porém, ele a deixa fraca.
Meu avô se afasta e assinto. Continuo olhando em frente enquanto
sinto-o ao meu lado, me encarando.
— Ela irá ficar bem?
Minha voz embarga e preciso me controlar para não deixar que
lágrimas deixem meus olhos e desçam pelo meu rosto.
— Ela irá ficar bem.
Não sei se ele acredita nisso, se ele tem certeza ou se apenas está
tentando me consolar, porém, não importa, é nisso que eu preciso acreditar.
— Onde ela está?
Viro-me para o meu avô e ele faz um gesto com a cabeça na direção
do jardim.
— No jardim.
Faço uma careta.
— Ela está mexendo nas flores? Ela não deveria estar de repouso?
Ele suspira e assente.
— Sua avó é teimosa.
Ela realmente é e não existe nada que a pare. Não existia, pelo
menos até alguns meses atrás.
— Eu quero vê-la.
É lógico que quero vê-la, mas, por algum motivo, preciso dizer as
palavras em voz alta. Meu avô dá um passo em frente e faz um sinal para
que o acompanhe. Eu o sigo e, um ao lado do outro, vamos para o jardim;
durante o curto trajeto, pergunto se ele está bem e ele me responde que sim,
questiono-o sobre a empresa e um sorriso surge em seu rosto, já que mesmo
aposentado ele está por dentro dos assuntos e me coloca a par de tudo com
brilho em seus olhos e só fica em silêncio quando chegamos no jardim e
nos deparamos com minha avó.
Ela está abaixada e de costas para nós dois, com as mãos na terra e
mexendo em suas roseiras. Meu coração bate acelerado e os segundos
parecem durar uma eternidade. A última vez que a vi foi um dia antes do
início das aulas, eu fiquei aqui nas férias de verão e foi horrível, odiei vê-la
abatida e piorando a cada dia mesmo em tratamento. Eu precisava de um
tempo.
Ela fica em pé e minha respiração falha; Eileen Williams está mais
debilitada que há um mês. E quando se vira em nossa direção minha
angústia aumenta ao notar as linhas de expressão mais intensas em seu
rosto, seus lábios estão ressecados, há um lenço em sua cabeça e seus cílios
e sobrancelhas estão nus, sem pelo algum.
Ela é alguém que no momento grita fragilidade e nunca foi assim.
Eileen é uma rocha, e é a minha rocha. Eu me sinto sufocado e fecho as
minhas mãos em punhos na tentativa de não entrar em pânico.
— Finalmente o meu neto ingrato veio me visitar, achei que só
apareceria por aqui quando eu estivesse em um caixão.
A imagem que surge em minha mente é aterrorizante.
— Vó, não brinque com algo assim.
Ela faz um sinal com a mão, como se o que acabou de dizer não
significasse nada.
— Poderia acontecer.
Dá de ombros e balanço minha cabeça enquanto empurro as
imagens perturbadoras para longe da minha mente.
— Eu estive ocupado.
Desvia o olhar do meu rosto e encara meu avô.
— Ele também tentou mentir para você? — Meu avô assente. —
Como ele tem coragem?
— Isso ele herdou de você, querida.
Ela bufa e se aproxima de mim.
— Eu não sou uma mentirosa.
Minha avó entrelaça seu braço no meu, eu me inclino em sua
direção e beijo a lateral da sua cabeça.
— Eu senti sua falta, vovó.
Por um segundo, permito-me fechar meus olhos, sentir seu cheiro e
fingir que tudo está bem.
— Se realmente tivesse sentido a minha falta, teria vindo me ver.
Ela não está falando totalmente sério. Abro meus olhos e encaro o
jardim à minha frente.
— Eu deveria ter vindo, mas não vim.
Admito e ficamos em silêncio. Começamos a caminhar e deixo que
minha avó me guie, me levando na direção da casa.
— Está tudo bem, Aaron, sei que não está sendo fácil para você.
Ela me conforta e dá um tapinha em meu braço. Ela está me
confortando! Minha avó está com câncer e é ela quem está me confortando,
deveria ser o contrário.
— Não está sendo fácil para a senhora.
Olho para o lado e ela tem a testa franzida.
— Sempre soube que seria difícil para você, Aaron, senti sua falta,
mas entendo que precisava de um tempo para assimilar tudo.
Assinto, mesmo que ainda me sinta envergonhado pelo meu
comportamento. Não deveria ter sido tão fraco!
Entramos em casa pela porta da cozinha e minha avó se afasta de
mim.
— Sente-se e vamos comer algo.
Aponta para os bancos de frente para a enorme ilha que ocupa boa
parte da cozinha. Eu me sento e olho ao redor do cômodo, os armários são
brancos, equipados com os melhores eletrodomésticos, a iluminação é
natural devida a imensa janela e a porta de vidro.
Muitas lembranças ecoam em minha mente, já que minha avó ama
cozinhar e me recordo de me sentar exatamente onde estou enquanto ela
preparava bolos e tortas.
— Como está a faculdade?
Minha avó pergunta, as lembranças se dissipam e a encaro.
— As aulas de inverno começaram há um mês e as coisas estão
começando a ficar complicadas.
Assente.
— E o time de hóquei?
— Empatamos o jogo passado, mas estamos razoavelmente bem na
temporada, comparado aos anos anteriores, é o nosso melhor desempenho.
Assente novamente e fica de costas para mim. Mais uma vez a
analiso e meu coração aperta. Ela está tão diferente.
Minha avó pega um pano de prato e se abaixa, ela abre o forno e
apanha algo, e só consigo distinguir o que é quando se vira e me deparo
com uma forma repleta dos meus biscoitos favoritos.
— Eu fiz seus biscoitos preferidos. — Pisca em minha direção. —
Mesmo sem saber que iria vir, chame isso de sexto sentido de avó.
Se vangloria, eu balanço minha cabeça de um lado para o outro e
sorrio. Ela coloca a forma à minha frente e no mesmo instante estendo
minha mão e tento pegar um dos biscoitos, porém minha avó é mais rápida,
pega o pano que agora está em seu ombro e me acerta.
— Ainda está quente, garoto!
Repreende-me e faço uma careta. Ela conseguiu bater em minha
mão e está doendo.
— Vejo que seu reflexo continua tão bom quanto antes.
Sorri vitoriosa e há um brilho arrogante em seus olhos.
— Se você é bom no hóquei, é graças a mim. — Ergo minhas
sobrancelhas. — Herdou os melhores reflexos de mim.
Cruzo meus braços à frente do meu corpo e me controlo para não rir.
— E desde quando a senhora entende de hóquei?
Nunca entendeu nada do esporte, ela até tentou aprender quando
comecei a jogar, mas não deu muito certo e desistiu.
— Eu entendo muito sobre hóquei, afinal, sempre assisto seus jogos,
e assistia aos do seu pai.
É verdade, minha avó e meu avô assistiram a todos os meus jogos
presencialmente quando jogava pela escola e agora assistem pela televisão.
Eles são os meus maiores fãs, principalmente meu avô.
— A senhora assiste todos meus jogos. — Estreito meus olhos. —
Mas não entende nada do que está acontecendo na pista de gelo.
Ela ri e dá de ombros.
— Tudo que preciso saber é quando meu neto marca um ponto e
posso comemorar.
Sorri animada.
— Pena que nosso neto quase não marca pontos, porque ele faz
parte da defesa do time.
Meu avô comenta ao entrar na cozinha e minha avó revira os olhos
diante do seu comentário, eu apenas tento não rir.
— Detalhes, apenas detalhes.
Meu avô se senta ao meu lado e pisca em minha direção.
— Apenas detalhes, Aaron.
Meu avô soa debochado e não consigo mais evitar, meus lábios se
curvam em um sorriso.
— Quer saber? Foda-se. — Nós dois olhamos para minha avó, que
dá de ombros. — Não importa, o que importa é que você é o melhor no
hóquei e com certeza herdou isso de mim.
— Vamos ignorar que eu joguei hóquei na faculdade e que
Benjamin era um jogador profissional.
Meu avô cita meu pai e minha avó continua nos encarando com
soberba.
— Benjamin é meu filho.
Minha avó soa totalmente convencida, meu avô olha para mim e
suspira.
— Não adianta conversar com sua avó, ela sempre tem razão.
Por fim, nós três rimos e meu avô e eu conversamos sobre os jogos
de hóquei, ele, sim, entende sobre o esporte. Minha avó aproveita para fazer
um café e colocar as xícaras sobre o balcão, então se senta do outro lado da
ilha à nossa frente, eu paro de falar e a encaro como se fosse a detentora de
um tesouro.
— Posso finalmente comer meus biscoitos?
Ela bufa, mas há um brilho em seus olhos.
— Pode, mas lembre-se que é um atleta e não pode comer muito
doce.
Ela está me provocando, porém ignoro e estendo meu braço,
finalmente tendo em mãos um dos meus biscoitos preferidos. Trago-o até
minha boca e respiro fundo, sentindo o cheiro de canela. Deus, eu amo isso!
Não é só um doce, tem cheiro de infância, de boas lembranças. Eu
posso recordar dos meus primos e eu correndo pelo quintal, dos gritos, das
brincadeiras e das risadas. É tão nítido como se tudo tivesse acontecido
ontem.
Eu permaneço em silêncio, perdido em lembranças, meu avô está
comendo os biscoitos e tomando seu café, e ao olhar para minha avó, me
dou conta de que não está comendo, apenas nos observando com um sorriso
em seu rosto.
— Vó, a senhora não vai comer?
Segue sorrindo, mas uma sombra surge em seus olhos, denunciando
que seu sorriso não é assim tão sincero.
— Não estou com fome.
Ela está me escondendo algo, eu dou um tempo nos biscoitos e a
analiso.
— É por conta da doença?
Posso ver em seu olhar a batalha que está travando. Ela não quer me
contar, mas não quer mentir.
— O tratamento a deixa enjoada.
Meu avô me responde e ela o encara com a testa franzida.
— Obrigado, vovô.
Agradeço por ter me contado a verdade. Eu encaro a minha xícara,
porque não consigo olhar para a minha avó. Ela está doente e pensar em
perdê-la me deixa angustiado, um tipo de dor que não estou pronto para
enfrentar e me sufoca apenas cogitar essa ideia.
— E as garotas?
Minha avó muda de assunto, como se sua doença fosse algo simples
e banal. Eu faço uma careta, não quero que ela finja que está tudo bem, ao
mesmo tempo que não quero aborrecê-la. É uma situação de merda e
demoro alguns segundos para respondê-la.
— Sem garotas.
Digo e ela rebate:
— Você deveria arrumar uma namorada, Aaron, seu avô e eu
estamos ficando velhos, você precisa encontrar alguém, ou ficará sozinho.
— Eu tenho meus tios e meus primos.
Minha avó franze sua testa e não há vestígio de nenhum sorriso em
seu rosto.
— Não é a mesma coisa, querido. — Suspira. — Você precisa
encontrar alguém para amar e para ter ao seu lado ao longo da vida, sei que
você é novo, mas, talvez, eu não tenha mais muito tempo e gostaria de
conhecer a sua garota.
A expressão em seu rosto faz com que meu peito aperte, sua
preocupação é real e não quero deixá-la preocupada.
— Prometo que irei procurar por uma garota, vovó.
Nossa patinadora L. foi vista saindo chateada da pista de
patinação. O que será que aconteceu?
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia
Luke grita o movimento que devo fazer: Flip Jump quádruplo; o
maldito do meu treinador jura que estou preparada para fazer, mas faz uma
semana que estou tentando executá-lo e continuo falhando.
Eu me preparo, respiro fundo, repasso o salto em minha mente e me
impulsiono para frente, meus pés deixam o gelo, eu giro duas vezes
perfeitamente, mas no terceiro posso sentir algo errado. Droga! Sigo no
movimento e realizo apenas mais meio giro, meus patins atingem o chão de
uma maneira toda errada, não consigo me equilibrar e minha bunda acaba
no gelo.
Dói, mas não é por conta da dor que lágrimas surgem em meus
olhos, e sim, por conta do sentimento de frustração que domina meu peito.
Lembranças que odeio querem ecoar em minha mente e preciso me
concentrar para não deixar que tomem conta de mim.
— Você está bem? — Os patins de Luke surgem à minha frente, ele
me estende sua mão, mas a ignoro. Não quero sua ajuda! — Olívia, está
tudo bem?
Ele usa meu nome, o que me deixa ainda mais irritada.
— Foda-se, Luke!
Eu fico em pé sem a sua ajuda, seu olhar paira em meu rosto e me
encara preocupado.
— Você se machucou?
Encaro meu treinador e minha vontade é matá-lo.
— Eu não consigo fazer essa merda e você deveria aceitar isso.
Minha voz soa mais alta do que o normal. Luke dá um passo para
trás.
— Você tem potencial para mais, Olívia.
Balanço minha cabeça e sorrio, um sorriso sem humor, de quem
sabe do que é ou não capaz.
— Você está errado, Luke, e apenas está sendo um treinador horrível
comigo.
Ele passa a mão pelo seu cabelo e me encara com um olhar irritado.
— Não estou sendo horrível, eu sou seu treinador e estou fazendo o
melhor por você.
Sorrio debochada
— Não sou a sua melhor patinadora e você sabe disso.
Não espero para o ouvir, eu deslizo pelo gelo e me afasto dele.
Enquanto estou patinando para a saída, posso ouvir a voz de Meg.
— Não liga, ela fica insuportável quando não consegue acertar um
movimento.
Não é apenas não acertar um movimento, mas minha amiga não
sabe disso, ninguém em Dartmouth sabe. Alguns fantasmas residem apenas
em minha mente.
Eu coloco os protetores de lâmina em meus patins e saio da pista
patinação. As lágrimas seguem presas em meus olhos e sigo para o
vestiário, tentando manter as lembranças o mais longe possível da minha
mente.
É difícil e quero gritar de frustração. O campeonato seccional está
se aproximando e eu não estou pronta; tudo bem que nunca estive, mas ter
isso jogado na minha cara é horrível, desencadeia uma série de lembranças
que não gosto de visitar.
Entro no vestiário, troco meus patins pelos meus tênis, jogo a minha
mochila e bolsa sobre meus ombros e saio depressa do lugar. Eu preciso
sair daqui!
Cruzo com Meg quando estou saindo do vestiário, minha amiga
chama por mim, mas apenas balanço minha cabeça. Não quero conversar,
eu nem conseguiria e só descontaria minha raiva nela.
Odeio quando o que aconteceu no passado interfere no meu
presente, odeio quando sua voz volta a ecoar em minha mente, odeio
quando me transformo em alguém insuportável por conta das lembranças. O
passado deveria permanecer longe, mas às vezes, ele aparece como um
fantasma e me atormenta a ponto de esquecer quem eu sou.
Eu vou até meu carro, jogo minhas coisas no banco ao lado, aperto o
volante com força, aumento o volume do som e dirijo para longe. Mordo
meu lábio inferior, impedindo que as lágrimas deixem meus olhos e tento ao
máximo não deixar as péssimas recordações tomarem conta da minha
mente, mas é impossível.
“Desse jeito, Liv, você não vai conseguir. Eu não sei o porquê de
você insistir.”
Sua voz ecoa nitidamente em minha cabeça, é como se ele estivesse
ao meu lado. Balanço minha cabeça, mas ele continua aqui. A dor, a raiva, o
ódio e o desespero se misturam em meu peito, causando uma bagunça.
Soco o volante com força e respiro fundo. Eu não sei nem para onde
estou indo, não quero ir para casa, mas não há nenhum outro lugar para
mim, não tenho para onde ir.
Sigo apenas dirigindo e quando me dou conta, estou na rodovia, ela
está desativada e não há movimento algum. Imagine Dragons [1] continua
tocando, mas nem a minha banda preferida é capaz de me tirar do meu
tormento.
Estou um caos, fazia tempo que não ficava assim; uma parte minha
jurava que estava bem, bem o suficiente para deixar a terapia, bem o
suficiente para acreditar que finalmente eu tinha superado o que aconteceu.
Eu não superei.
É uma briga entre me deixar ser dominada por pensamentos que
tento evitar e mantê-los longe. É como se eu fosse uma bomba-relógio
prestes a explodir.
Estou longe, perdida em minha própria mente, o lugar onde estou
não importa, dirijo no automático, a música e o que acontece ao meu redor
passam como um borrão.
Demoro a perceber que há alguém atrás de mim e a me dar conta de
que um barulho de sirene ecoa sem parar. Olho pelo retrovisor e um carro
de polícia está fazendo sinal para que pare no acostamento.
Ótimo, era tudo que eu precisava!
Encaro o painel do carro e estou muito além do permitido na via,
além de ser uma rodovia desativada. Caralho! Desacelero e dirijo até o
acostamento, Paro e o carro da polícia para logo atrás, diminuo o volume do
som e abaixo o vidro enquanto o policial vem em minha direção.
— Bom dia.
Forço um sorriso, o policial é um cara alto, careca, musculoso, com
um ar de superior, dentes amarelos e com uma expressão de poucos amigos.
— Habilitação e desça do carro.
Ele é rude, desfaço meu sorriso, pego minha habilitação, entrego
para ele e saio do veículo. Ele vai até a viatura e eu me apoio contra a
minha porta. Tudo que faltava para minha manhã ser um desastre total era
receber uma multa por excesso de velocidade.
Cruzo meus braços sob meus peitos, encaro o céu nublado
característico do inverno de Hanover e espero pela volta do policial. Ele
demora e aposto que está apenas me castigando. Otário!
Raiva por estar aqui e por todos os acontecimentos anteriores
vibram em meu peito. Eu seria capaz de matar um nesse momento. É como
se estivesse demorando uma eternidade. Meu ódio aumenta a cada segundo
e não suporto mais, eu me afasto do carro e caminho na direção do policial,
que está de pé ao lado da viatura, mexendo em seu celular.
— O senhor irá demorar muito?
Ele olha em minha direção e tem a testa franzida.
— A senhorita tem algo de importante para fazer?
Ele claramente está debochando de mim. Sinto meu rosto
queimando de tanta raiva e minha visão está turva.
— Não tenho todo o tempo do mundo para esperar a sua boa
vontade.
O policial claramente não gosta do tom que usei com ele.
— Você não deveria falar assim comigo, mocinha.
Ele fala como se eu fosse uma criança, a raiva cresce em meu peito
e minha vontade é de avançar sobre ele.
— E o senhor não deveria me deixar esperando assim, pode ser um
policial, mas não é Deus.
Sua expressão se torna ainda mais séria e a ruga em sua testa quase
faz com que suas sobrancelhas se tornem uma só.
— Eu sou uma autoridade, então cuidado com o tom que está
usando comigo.
Soa como se estivesse me ameaçando e ergo minhas sobrancelhas.
— Preciso lembrá-lo mais uma vez de que não é Deus?
Dá um passo em frente e me fuzila com seus olhos. É um pouco
assustador, mas mantenho a minha postura.
— Você estava dirigindo muito além do permitido em uma via
interditada e tentou fugir, chame um responsável para ser liberada.
Encaro-o em choque.
— Você não pode fazer isso, eu sou responsável por mim mesma.
Dá de ombros.
— Eu posso.
Como ele pode estar falando sério? Respiro fundo, tentando
encontrar uma solução.
— Quanto você quer?
Ergue suas sobrancelhas.
— O que você está tentando fazer?
Não deveria continuar com a minha oferta, mas, merda, eu não sei o
que fazer e não vou chamar alguém para vir até mim.
— Quanto você quer para me liberar?
Faço uma careta assim que escuto as palavras, parece horrível.
— Você está tentando me comprar, mocinha? — Soa ofendido. —
Você não sabia que isso é um crime?
Talvez ele só esteja sendo um pouco resistente.
— Eu tenho dinheiro e tenho certeza de que conhece meu pai. —
Uso a melhor das minhas alternativas. — James Callahan.
Pelo seu olhar, sei que ele o reconhece, mas é algo breve, não
demora a me encarar com um olhar rude e sem sentimentos.
— Você deveria chamar seu pai para vir buscá-la.
Droga, ele não pode estar falando sério.
— Eu sou uma adulta, não chamo meu pai para resolver meus
problemas. — Ele sorri, inclina-se em minha direção e sorri. Um sorriso
que faz com que meu estômago embrulhe. Não gosto de como ele me olha,
respiro fundo e não deixo que me intimide. Ele não irá conseguir! — Se
afaste, por favor.
Como deboche, dá mais um passo em frente.
— O que a mocinha irá fazer?
Penso nas minhas opções: gritar, bater, sair correndo e nenhuma
delas parece aceitável. Um leve pânico começa a se instaurar em meu peito
e, mais uma vez, eu tenho que lutar contra recordações.
— Você é um policial, cuidado com as suas ações, não esqueça
quem é meu pai.
Ele segue sorrindo e o medo se liberta em meu peito. Droga!
— Você não deveria me ameaçar, mocinha, eu sou a autoridade. —
Ergue sua mão e toca meu braço. — Além do mais, estamos em um lugar
deserto, seu pai não pode vir te socorrer, não importa quem ele seja.
Eu quero vomitar! Dou um passo para trás, mas o homem segura
meu braço. Merda!
— Me solte.
Grito, porque é tudo que consigo fazer enquanto surto. Ele segue
sorrindo e os piores cenários possíveis ecoam em minha mente. Abuso,
morte, meu corpo jogado no mato ao lado, a sensação é horrível e, de
repente, é como se estivesse vivendo a vida de outra pessoa.
O medo está me dominando de tal forma, que demoro a perceber
que sua mão não está em meu braço; ele está olhando em frente. Hesito,
mas ao escutar o barulho de uma porta de carro sendo aberta, olho para trás.
Alguém parou e quero chorar quando reconheço quem está deixando
o carro. Um choro de alívio.
Aaron, um dos principais nomes do time de hóquei da faculdade de
Dartmouth caminha em nossa direção. Ele está usando um boné, moletom
do time, calça preta e um par de tênis esportivo. Não faço a mínima ideia do
que ele estava fazendo nessa estrada vazia, mas, no momento, ele é o meu
herói.
Encaro-o e ele percebe o meu desespero, porque assim que está
perto o suficiente, ergue suas sobrancelhas. É nítido que ele percebeu que
algo está errado, então desvia o olhar do meu e encara o policial.
— Algo está acontecendo?
Para alguns centímetros de nós dois. Aaron é o mais quieto do time,
só o conheço porque é um dos amigos do namorado da minha melhor
amiga, porém no momento, ele parece ameaçador.
— Nada que um garoto como você possa resolver.
Eu preciso fazer algo para nos livrar desse idiota, então penso em
algo e mesmo que seja uma ideia ridícula, é a única coisa que consigo
pensar. Viro-me para o policial e sorrio vitoriosa.
— Esse é o meu namorado.
O inverno chegou e chegou com tudo! Uma das nossas patinadoras
foi presa e levou junto nosso principezinho do hóquei (eu tenho certeza de
que ele é inocente).
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron
A voz de Liv ecoa em minha mente e demoro a processar o que
ela acabou de falar. Esse é o meu namorado. Que merda ela está falando? O
policial à minha frente olha em minha direção, seu olhar é arrogante e
debochado.
— Eu não perguntei nada a você, mocinha.
Repreende Liv e um alarme soa em minha mente. Ele não deveria
estar falando assim e não importa que seja um policial.
— Cuidado com a forma como você fala com ela.
Dou um passo em frente e paro logo atrás de Liv.
— Vai me ameaçar também?
Estreita seus olhos e me desafia a continuar. Não costumo me
envolver em brigas, aliás, detesto confrontos, mas não estou em meu
melhor momento. Droga, eu estou voltando de um fim de semana na casa
dos meus avós e minha avó está com câncer. Eu estou péssimo.
— Não estou te ameaçando, estou afirmando que não deveria
falar assim com a minha namorada.
As palavras voam da minha boca antes que tenha tempo de
realmente pensar sobre elas.
— Você não deveria deixar sua namorada andando sozinha por aí,
coisas ruins acontecem com garotas o tempo todo.
Há um olhar malicioso em seu rosto, como se ele fosse capaz de
machucar Liv. Eu não sou próximo da garota, só a conheço porque ela é
melhor amiga da namorada de um amigo, mas não vou permitir que ele fale
assim.
— Você está sugerindo que faria algum mal a ela?
Apoio minha mão nas costas de Liv e dou um passo em frente. O
policial sorri e deixa seus dentes amarelos à mostra.
— Não sei.
Ele desvia o olhar para Liv, seus olhos descem pelo corpo dela e
ele a encara como se estivesse a despindo em sua mente. É nojento,
grotesco e posso sentir através dos meus dedos Liv ficando tensa. Raiva
percorre meu corpo e me deixa cego. Não importa quem ele seja.
Dou mais um passo adiante, posiciono-me na frente de Liv e a
protejo do idiota.
— Eu deveria deixá-lo cego.
Mais uma vez, não penso sobre as palavras que deixam minha
boca.
— Posso prendê-lo por estar falando dessa maneira comigo, eu
sou uma autoridade. — Estreita seus olhos e tenta me intimidar. Para seu
azar, não tenho medo dele, não recuo e ele amplia seu sorriso. — Um
conselho, garoto, vadias não merecem a nossa proteção.
Não penso, apenas enxergo vermelho, fecho minha mão em
punho, ergo-a e acerto seu rosto.
— Aaron.
Liv grita, mas é tarde demais, meus dedos doem e o estrago está
feito. Dou um passo para trás e, merda, o lábio do idiota está aberto e
mesmo assim ele segue rindo. Idiota! Preciso me controlar para não o
acertar mais uma vez.
— Vocês dois estão presos por desacato à autoridade.
Sorri vitorioso, como se esse fosse seu objetivo desde sempre, e
talvez tenha sido, ele nos provocou até perdermos o controle. Ele pega as
algemas e no mesmo instante entrelaço a mão de Liv com a minha.
— Não precisamos de uma.
Ele me ignora e dá um passo em frente.
— Você é um idiota.
Liv grita e aperto sua mão com a minha. Recobro o meu controle,
respiro fundo e analiso a situação; se fugirmos será pior, se o atingir com
mais algum soco perderemos a razão.
— Cuidado, mocinha. — Faz um sinal para prender as algemas
em nossos pulsos e balanço minha cabeça. — O carro de vocês será
guinchado e levado até a delegacia. Vamos.
— Não precisamos de uma algema.
Repito.
— Eu não vou entrar em uma viatura com você.
Liv protesta, claramente irritada, viro-me para ela e a encontro
com um olhar furioso. Caralho!
— Liv, não piore nossa situação.
Eu tento a repreender, mas ela me encara com um olhar mortal e
puxa a sua mão da minha.
— Ele é um maluco e você quer entrar em um carro com ele? E se
ele nos sequestrar? Ele pode muito bem nos matar e sumir com nossos
corpos.
Ela está certa, ele é realmente um maluco, mas ela dizer algo
assim não será capaz de nos ajudar, além do mais, não acredito que ele
realmente seja capaz de fazer algo. Ele é um desses idiotas que gosta de
colocar medo e intimidar.
— Liv, você não está ajudando.
Sussurro e passo minha mão pelos fios do meu cabelo. Merda!
Quando vi o carro de Liv parado, ela discutindo com um policial e parei
para averiguar, jamais imaginei que acabaríamos nessa situação. Estou em
um pesadelo, só pode.
— Você só piora sua situação a cada momento. — Soa
debochado. — Mas sou alguém muito bonzinho, vou chamar mais pessoas
para acompanhá-los, inclusive uma das minhas colegas do sexo feminino
para tranquilizar a princesa.
Preciso me controlar para não o socar mais uma vez. Liv faz
menção de ir na direção do policial e preciso segurá-la. Toco sua cintura e a
puxo contra o meu corpo.
— Ela é um pouquinho nervosinha, não é?
Por alguns segundos, pondero deixá-la ir até ele e chutar suas
bolas, mas volto a mim e continuo a segurando.
— Você só irá piorar nossa situação, Liv.
Sussurro contra sua orelha.
— Ele é um maldito.
Diz entredentes enquanto encara o policial e ele ri. Realmente,
está nos testando. Abaixo minha cabeça e minha boca quase encosta em sua
orelha.
— Ele quer apenas acabar com seu controle porque é um maldito
sádico, não o deixe vencer.
Minha voz é baixa para que apenas ela escute. Eu estou perto o
suficiente para sentir o cheiro dos seus cabelos, é uma mistura de frutas
cítricas. É único e faz com que minha respiração se altere.
Meus sentidos de repente estão mais aguçados, minhas mãos estão
em sua cintura e meus dedos estão formigando. Aperto sua cintura e sinto
Liv ceder, ela não está mais tentando se desvencilhar e nem avançar no cara
à nossa frente.
Olho ao redor e me distancio alguns centímetros, afrouxo a
intensidade com que aperto seu corpo, mas minha mão continua em sua
cintura.
— Isso é uma idiotice completa.
Liv resmunga alto o suficiente, mas não avança no policial.
— Apenas aguardem e com o reforço dos meus colegas
poderemos levar os carros de vocês.
Nenhum de nós dois fala nada e nos apoiamos na viatura. O
policial vai até nossos carros e os analisa como se estivesse tentando
encontrar algo.
— Ele está tentando encontrar o quê? Drogas?
— Aparentemente, nós temos jeito de traficantes.
Liv, que está ao meu lado, responde no mesmo instante e acabo
rindo, apesar de não ser nem um pouco engraçado.
— O que aconteceu para você estar em uma estrada desativada
com um policial?
Pergunto quando consigo parar de rir.
— Eu vim parar aqui sem querer e estava acima do limite de
velocidade permitido.
Faço uma careta.
— E precisa respeitar o limite de velocidade em uma estrada
desativada?
Olho para ela e Liv dá de ombros.
— Esse cara é um babaca. — Suspira. — Ele queria que eu
chamasse algum responsável para me liberar, como se eu não fosse maior
de idade.
Cruzo meus braços à frente do corpo.
— E como você reagiu?
Ela olha para mim com uma expressão inocente, mas algo me diz
que ela não é tão inocente assim.
— Eu ofereci dinheiro para ele me deixar ir e perguntei se ele
conhecia meu pai.
Franzo minha testa.
— Isso dificulta a sua vida.
Morde seu lábio inferior por alguns segundos.
— Sim, e sei que ele poderia ter me levado para a delegacia por
tentar o subornar e o ameaçar. — Uma sombra que não consigo decifrar
toma conta dos seus olhos. — Ele estava tentando me intimidar quando
você chegou e, sinceramente, não sei qual era a intenção dele, se estava
apenas tentando me deixar com medo, ou se realmente faria algo.
Ela está tentando esconder, porém, é nítido que ficou com medo.
— Sinto muito pelo acontecido.
Ela assente e ergue seu rosto, Liv não quer que eu veja sua
fragilidade.
— Tudo bem e obrigada por ter parado.
— Reconheci seu carro e quando olhei mais atentamente, percebi
que não parecia confortável com o policial, minha consciência não teria me
deixado em paz se tivesse seguido em frente.
Ela me encara por alguns segundos e um sorriso surge em seu
rosto.
— E você, porque estava na estrada desativada, principezinho?
Liv usa o apelido ridículo que o jornal de Dartmouth usa para se
referir a mim e reviro meus olhos.
— Esse apelido é ridículo.
Ergue suas sobrancelhas e me encara curiosa.
— Por que o chamam assim?
Balanço minha cabeça, negando, mas sinto meu rosto ficando
vermelho. Droga!
— Eu não sei.
Estreita seus olhos e me analisa.
— Você está mentindo.
— Não estou.
Continuo negando, mas minha voz falha. Por que eu preciso ser
um péssimo mentiroso!?
— Por que você está mentindo, Aaron?
Liv se inclina em minha direção, como se estivesse disposta a
descobrir a verdade a qualquer custo e engulo em seco. Preciso sair dessa
sem mentir, porque ela irá perceber que estou mentindo.
— Apenas não gosto do motivo para o apelido.
Minha voz soa mais convicta, porque não é uma mentira, embora
não seja toda a verdade.
— E por que você não gosta? — Segue me pressionando e não a
respondo. — Se você não me responder, continuarei te chamando de
principezinho.
Ela me provoca e dou de ombros, prefiro que ela use o apelido
idiota do que contar o porquê não gosto dele.
— Ok, principezinho.
Soa debochada. Liv tem um olhar mais tranquilo, há um sorriso
em seu rosto e, por alguns segundos, esqueço o motivo de estarmos aqui
parados na margem de uma estrada desativada, mas o idiota faz questão de
me lembrar.
— Não encontrei nada de ilegal no carro de vocês. — Desviamos
o olhar um do outro e encaramos o policial. — Mas você está com um farol
queimado.
Aponta em minha direção e sorri. Ele realmente está muito feliz
por encontrar um problema em meu carro.
— Além de ser preso, irá levar uma multa.
Debocha e reviro meus olhos. Eu deveria utilizar meu sobrenome
para sair dessa, mas odeio ser o cara que usa o sobrenome da família para
escapar dos problemas. Apenas fico em silêncio, apoio meu corpo
completamente contra a viatura e olho para o céu. Há muitas nuvens e está
tudo nublado, o inverno realmente está em seu ápice.
Os minutos se arrastam e parecem durar uma eternidade. Eu olho
para o lado e Liv está encarando o chão e com a ponta do seu pé está
fazendo um rastro na terra e nas britas abaixo.
— Tentando cavar um buraco para sumirmos?
Sorrio, ela ergue o rosto e me encara.
— Será que eu consigo?
— Continue tentando.
Ela ri e balança sua cabeça. Liv volta a fitar o chão e ficamos em
silêncio até a chegada de mais três viaturas. Encaramos os carros em
choque.
— Somos malditos bandidos?
Liv enfrenta o policial, que apenas ri.
— Vamos lá, patricinha, conhecer a delegacia.
Liv dá um passo em frente e seguro seu pulso.
— Ele quer apenas te desestabilizar.
Ela se solta de mim e bufa irritada.
— Vamos logo acabar com essa palhaçada.
Eu me afasto da viatura e abro a porta, ocupamos os bancos
traseiros e o maldito do policial aparece para pegar as chaves dos nossos
carros, e mesmo contrariados, entregamos as chaves pela janela.
— Eu só posso estar em um pesadelo.
Liv resmunga. Eu encosto minha cabeça no estofado do banco,
encaro o teto da viatura e suspiro.
— Se for um pesadelo, acorde logo.
Ela não me responde e ficamos quietos até o policial se sentar
atrás do volante e uma colega ocupar o lugar ao lado.
— Ele tentou me assediar.
Liv o denuncia para a mulher, ela olha para ele, que dá de ombros.
— Nunca teria feito nada com ela.
Ela suspira, mas não o repreende.
— Ótimo.
Liv reclama, eu olho para o lado, procuro pela sua mão e
entrelaço nossos dedos. Nada mais é dito e o idiota dirige para a delegacia.
Somos escoltados até o prédio assim que chegamos. Nós dois
parecemos dois assassinos.
— Essa cidade deve ser mesmo muito segura e sem emoção para
eles estarem nos tratando assim.
Liv faz uma careta e concorda comigo. Nós dois somos levados a
uma cela e nos sentamos no chão de frente um para o outro. É um lugar
pequeno, com uma iluminação horrível e fechado por uma grade.
Deus, eu nunca pensei estar em um lugar assim.
— Desculpe por ter te colocado nessa situação.
Liv está envergonhada, eu suspiro e balanço minha cabeça.
— Não precisa me pedir desculpa.
Ela morde seu lábio inferior e nos encaramos.
— Você não me contou o porquê estava dirigindo em uma estrada
desativada.
Pergunta-me por fim.
— Eu estava querendo pensar e me distrair, achei que dirigir em
alta velocidade por aí era uma boa ideia.
Liv ergue suas sobrancelhas e é notável a sua expressão de
surpresa.
— Você fazendo algo ilegal?
Ela me provoca e sorrio.
— Acontece, às vezes até as pessoas mais corretas do mundo
precisam de uma pausa.
Pisco em sua direção. O fato é que precisava pensar depois de
passar o fim de semana com meus avós, apesar de terem sido dias
agradáveis, não consegui deixar de pensar que minha avó está doente, que
eles estão ficando velhos e que prometi que iria arranjar uma namorada.
— O delegado quer conversar com vocês dois.
Somos interrompidos, olhamos para o lado e nos deparamos com
um policial, ele abre a grade e ficamos em pé. Ele nos guia até a sala do
delegado e somos direcionados a nos sentar de frente para ele que, diferente
dos policiais, aparenta ser mais simpático.
— Então vocês estavam em uma estrada ilegal, acima do limite de
velocidade, desacataram uma autoridade e, além disso, o senhor bateu em
um policial?
Eu somente concordo, mas Liv, é claro, não se contenta em
apenas assentir.
— Sim, mas isso não dá o direito de um dos seus policiais me
assediar.
Ele ergue suas sobrancelhas.
— O que aconteceu exatamente?
Liv narra o que aconteceu, o delegado faz uma careta e passa a
mão pelos fios do seu cabelo.
— Sinto muito e prometo que tomarei providências sobre isso.
— Eu acho bom, ou vou processá-lo.
Liv aponta seu dedo para o delegado. Por que ela precisa ser tão
encrenqueira?
— Vou averiguar, mas isso não faz com que se tornem vítimas,
vocês precisam responder pelos seus atos. — Novamente apenas concordo e
dessa vez, Liv faz o mesmo. — Vocês podem fazer uma ligação para um
advogado ou algum familiar.
Aponta para o telefone sobre sua mesa e Liv se vira para mim.
— Como fui eu a nos colocar nessa situação, serei eu a ligar para
o meu pai e nos tirar daqui.
— Ok.
Ela olha para o lado, pega o telefone e disca um número. Seu pai
não demora a atender e a observo trocar algumas palavras com ele, até que
algumas delas me fazem paralisar.
— Eu e meu namorado estamos presos em uma delegacia.
Eu amo nossas patinadoras, mas confesso que tenho uma
preferida e nome dela inicia com O, apesar de muitos acharem que sua
letra inicial é L.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia
Disco o número do meu pai e respiro fundo. James Callahan, com
certeza, irá surtar e, mais do que isso, ficará extremamente preocupado. Sei
que, depois dessa ligação, terei que convencê-lo a não vir para Hanover.
— Hey, garotinha.
Ele usa o apelido pelo qual sempre me chamou ao atender a ligação
e sinto um aperto em meu peito.
— Hey, pai.
— Está tudo bem? Você nunca me liga a esse horário, aliás, você
quase nunca me liga, a não ser que esteja em problemas.
Ele está certo e, mais uma vez, estou ligando porque estou com
problemas.
— Está tudo bem, mas realmente algo aconteceu.
— O que está acontecendo, Olívia?
Não há mais apelido carinhoso e sua voz está diferente, preocupada,
responsável e séria. Não é o melhor dos humores do meu pai.
— Eu e meu namorado estamos presos em uma delegacia.
Minto mais uma vez que Aaron é meu namorado. Eu sei o quanto
meu pai é preocupado, sei que tem motivos para isso e, merda, não quero
que ele acredite que a situação é mais complexa do que realmente é.
— Desde quando você tem um namorado?
Posso ouvir seus passos e sei que ele está caminhando de um lado
para o outro, aposto que também está com a mão entre os fios do seu
cabelo.
— É recente.
— E quando você ia me contar sobre ele, Olívia?
É nítida a tensão em sua voz. Mordo meu lábio inferior e monto
uma mentira rapidamente em minha mente.
— Em breve, só estava esperando ter certeza sobre nós dois.
Droga! Não deveria estar mentindo para o meu pai depois de tudo,
mas qual a minha saída? Contar a verdade e ter James Callahan batendo em
minha porta nos próximos dias?
Ele sentirá que estou mais segura com um namorado, além de ser a
certeza que ele precisa para saber que estou bem.
— O que vocês fizeram, Olívia?
Essa parte não posso mentir, não totalmente, pelo menos.
— Nós estávamos em uma rodovia desativada e fomos pegos pela
polícia.
O problema da mentira? É que sempre se torna uma bola de neve
— O que vocês estavam fazendo em uma rodovia desativada?
— Pai, essa é uma pergunta que você não quer saber a resposta.
Dou a entender que estávamos fazendo sexo. Olho para Aaron e me
pergunto como seria fazer sexo com ele. Atraente ele é, porém, não tenho
certeza se sabe realmente o que fazer com uma garota. Nunca vi ele com
alguém e o garoto parece tão gentil, definitivamente não é o meu tipo.
Se bem que, em algum momento enquanto estávamos esperando a
chegada de mais policiais ele me fez desejar estar em outro lugar...
— Do que você precisa, Olívia?
Meu pai suspira e deixo meus pensamentos acerca de Aaron e seu
desempenho para lá.
— Que você nos tire daqui.
— E como eu posso fazer isso?
Eu olho para o delegado.
— O que meu pai tem que fazer para nos tirar daqui?
Faz um sinal para que entregue o telefone para ele.
— Eu falo com ele.
— Pai, você irá falar com o delegado.
Não espero por uma resposta, entrego o telefone para o homem à
minha frente e rezo para que meu pai consiga nos tirar daqui. Eles
conversam por alguns minutos sobre advogados, fiança e liberação
imediata.
Algumas vezes escutamos a palavra não sair da boca do delegado, e
isso é impossível, mas não sei exatamente o que está negando, porque não
consigo ouvir a voz do meu pai.
Por fim, ele se despede e me entrega o telefone, no mesmo instante
trago até minha orelha.
— Pai?
Pergunto ansiosa.
— Não consegui liberá-los sem um advogado.
Suspiro frustrada.
— E agora?
— Entrarei em contato com algum advogado, irá demorar alguns
minutos, mas serão liberados, ok?
— Ok.
Não há nada que eu possa fazer.
— Fique bem, garotinha, e qualquer coisa entre em contato.
Eu me despeço do meu pai e devolvo o telefone para o gancho.
— Vocês irão voltar para a cela e aguardar o advogado.
Encaro-o incrédula.
— Isso é mesmo necessário?
O delegado apenas assente e olha para baixo, encarando alguns
papéis que estão sobre sua mesa.
— Cade irá acompanhar vocês até a cela e...
Ele não completa sua fala, porque Aaron fica em pé de repente e sua
cadeira cai no chão. Ele suspira, apoia suas mãos na mesa e se inclina para a
frente. Olho para ele e Aaron parece furioso, sua postura calma e sua
gentileza desapareceram.
Esse Aaron é ainda mais atraente e preciso morder meu lábio
inferior para não rir dos meus pensamentos. Por favor, não é uma situação
cômica!
— Não precisamos ir para uma cela e podemos aguardar aqui.
Soa firme e determinado. Há uma ruga em sua testa ao encarar o
delegado, que volta a erguer seu rosto e faz uma careta para Aaron.
— Não é você quem dita as regras na minha delegacia.
Aaron sorri debochado.
— Você sabe quem é Joseph Prince?
— O empresário? Um dos mais influentes do país?
Aaron assente e o delegado engole em seco.
— Ele é meu avô.
O rosto do delegado fica branco, ele pega um papel sobre a mesa e o
encara, provavelmente conferindo o sobrenome de Aaron e fica em pé após
alguns segundos.
— Por que você não me disse antes?
Aaron afasta suas mãos da mesa e arruma sua postura. O delegado
olha para ele com uma expressão horrorizada. Eu não sei quem é o avô de
Aaron, mas, aparentemente, é alguém muito importante.
— Porque não sou um idiota que saí por aí usando o meu sobrenome
para resolver meus problemas.
O delegado fica ainda mais pálido. Talvez ele tenha um treco.
— Vou providenciar a liberação de vocês. — Ele se vira para mim.
— Senhorita Olívia, você pode ligar para o seu pai outra vez?
Agora eu sou senhorita? Idiota! Apenas assinto, porque se eu falar
algo sou capaz de nunca mais sair dessa delegacia. Ligo novamente para
meu pai e ele conversa com o delegado. Dessa vez, ele aceita a
transferência da fiança sem um advogado.
Aaron e eu seremos multados, mas não iremos responder
judicialmente a nenhum crime e seremos penalizados como se tivéssemos
cometido pequenas infrações. Tudo graças ao avô de Aaron. Por que ele
não mencionou isso antes?
O tal do Cade nos guia para fora da sala do delegado após
assinarmos um papel e nos leva até a recepção. O carinha atrás do balcão
alcança as chaves dos nossos carros e nos explica onde eles estão,
assentimos e deixamos o prédio um ao lado do outro.
Finalmente eu estou livre! Juro que vivi uma vida nas últimas horas,
eu sequer sei quanto tempo se passou.
Aaron e eu seguimos em silêncio até descermos o último degrau e
pisarmos no estacionamento.
— Aparentemente, é melhor um avô empresário do que um pai ex-
jogador de hóquei.
Ele olha para mim.
— Do que está tentando falar?
— Eu tentei usar essa tática com o policial do “você sabe com quem
está falando”? E citei o nome do meu pai, mas não funcionou, aliás, só
piorou.
Ele ri.
— Na próxima vida, peça para nascer neta de um dos empresários
mais influentes dos Estados Unidos.
Aaron fica muito bonito quando está rindo, principalmente por conta
das covinhas. Nós seguimos em frente, empurro a visão dele sorrindo para
longe da minha mente e continuo com o assunto.
— Por que você não mencionou o nome do seu avô antes?
Ele faz uma careta e continua encarando o espaço à nossa frente.
— Não gosto de mencionar o meu sobrenome para me livrar de
problemas.
Suspiro irritada.
— Você poderia ter nos tirado muito antes daqui, aliás, nem
teríamos sido presos.
Ele se vira para mim e ergue suas sobrancelhas.
— Preciso lembrar que fomos presos por sua causa?
Nós dois paramos, ficamos um de frente para outro e faço um gesto
de desdém com a mão.
— Já que quis bancar o herói, deveria ter feito o trabalho por
completo.
Ele ri e balança a cabeça.
— Estou começando a achar que deveria ter deixado você presa.
Encaro-o indignada e ele apenas ri, depois volta a olhar em frente e
se afasta. Eu sigo logo atrás.
— Isso foi bem pouco gentil da sua parte.
Escuto o som da sua risada e não consigo me controlar, acabo rindo
também. Aaron só volta a me encarar ao parar entre meu carro e o seu, que
estão estacionados lado a lado.
— Você precisa de mais alguma coisa, Liv?
Balanço minha cabeça. Eu me aproximo do meu carro, paro de
frente para a porta e o encaro.
— Obrigada, Aaron, por tudo.
Ele assente e um tom de vermelho tinge suas bochechas. Muito fofo,
eu quase tenho vontade de apertá-lo.
— De nada. — Ele dá um passo para trás, ergue sua mão e acena em
minha direção. — Até mais, Liv.
Aceno para ele.
— Até mais, Aaron.
Uma pergunta ecoa em minha mente enquanto ele se vira e toca a
porta para entrar em seu carro. Eu não posso ficar com essa dúvida.
— Aaron? — Ele olha para trás. — Você é virgem?
Ele arregala seus olhos e não me responde. Volta a ficar de costas
para mim, entra no veículo e não volta a me encarar. Eu continuo olhando
para ele e o observo dirigir para longe.
Ele me ignorou e fugiu. Mordo meu lábio inferior e a dúvida segue
em minha mente. Droga!
Entro em meu carro e dirijo para casa, eu estou tensa e uma parte
minha apenas quer parar em um lugar e descontar toda minha frustração
comendo. Não é uma boa ideia e me obrigo a ir para casa.
Dirijo pelas ruas de Hanover, há muitas casas, árvores e é um lugar
calmo, totalmente diferente do lugar onde cresci; uma cidade pequena que
não é um caos. Eu tinha outras opções, mas vim pra cá pelo sossego, porque
precisava fugir.
Estaciono na rua ao lado do nosso prédio, pego minha mochila e
deixo meu carro. Minha mente é uma mistura de vazio, exaustão e
frustração. De repente, estou cansada e é como se existisse um fardo pesado
em minhas costas. Subo as escadas devagar e lágrimas querem descer pelo
meu rosto.
Droga, eu sou uma bagunça!
Abro a porta do meu apartamento e me deparo com minhas amigas
na sala; Ava está sentada no sofá e Meg e Penny no tapete.
— Onde você estava?
Meg pergunta, eu fecho a porta e respiro fundo.
— Nós tentamos ligar para você.
Penny complementa a fala de Meg. Eu caminho na direção delas
enquanto mentalizo que tudo está bem. Eu não preciso surtar.
— Eu fui presa.
— O quê?
As três perguntam ao mesmo tempo, eu sorrio e tento ser a melhor
versão de mim, aquela que eu gosto e a maioria das pessoas conhece.
— E Aaron foi preso comigo.
— O amigo do Matteo?
Assinto diante da pergunta de Ava. Jogo minhas coisas sobre a
poltrona que fica na lateral da sala e me jogo no sofá ao lado da minha
amiga.
— O que você aprontou? E por que você estava com Aaron?
Penny pergunta enquanto se senta de frente para nós duas. Eu
suspiro de forma dramática.
— É uma longa história.
— Estamos prontas para ouvir.
É a vez de Meg se pronunciar e se posicionar de modo que consiga
enxergar o meu rosto. Eu faço um resumo das últimas horas para minhas
amigas e elas me escutam atentamente.
— Caramba.
Penny sussurra.
— Eu confesso que estou um pouco surpresa com Aaron, ele deu
um soco em um policial.
Ava realmente parece em choque com a atitude do amigo do
namorado.
— Ele parece tão da paz e calmo.
Meg complementa e assinto.
— Confesso que foi um pouco emocionante o ver tão diferente. —
Imagens dele me defendo ecoam em minha mente. — Com certeza parecia
um outro Aaron.
— Eu fico feliz que ele tenha te encontrado.
Não há mais diversão na voz de Ava, olho para o lado e minha
amiga me encara com um olhar preocupado. O clima entre nós não é mais
de deboche. O assunto é delicado.
— E como você está?
Penny pergunta.
— É para ser sincera?
— Sempre.
Minha amiga me responde, eu jogo meu corpo para trás, apoio
minha cabeça no estofado, deixo minhas mãos sobre meu peito e encaro o
teto.
— É como se eu tivesse vivido uns dez anos nas últimas horas, há
um turbilhão de sentimentos em meu peito. — Preciso fazer uma pausa para
não chorar. — Além de que existem alguns fantasmas do meu passado me
perturbando.
As lembranças estão aqui e estou as empurrando para longe. Estou
fazendo de tudo para não ceder, mas quão forte conseguirei ser?
— Nós ficamos preocupadas pela forma que deixou a pista de
patinação.
A voz de Penny ecoa pela sala, eu mudo de posição até conseguir a
encarar.
— Odeio falhar e sinto que estou apenas desperdiçando o tempo da
coordenação. — Sorrio, um sorriso sem graça. — Eu não sou tão boa e
nunca vou ser.
As palavras deixam minha boca e são repletas de ressentimento.
Nem eu suporto a Olivia ressentida. Realmente preciso voltar para a terapia.
— Você é ótima, Liv, e precisa acreditar em si mesma.
Ava me incentiva e, mais uma vez, uma risada sem humor surge em
meus lábios.
— Luke só está dificultando os movimentos pra você, porque sabe
da sua capacidade.
Penny defende nosso treinador e seu namorado.
— Ele deveria desistir de mim.
Bufo irritada assim que as palavras deixam minha boca. Como eu
posso soar tão insuportável?
— Eu queria que você fosse capaz de se ver como nós te vemos.
A frase dita por Meg ecoa em minha mente, e uma parte em mim se
pergunta como elas podem me ver assim. No mesmo instante me repreendo
pela forma de pensar e me sento, ficando com minhas costas totalmente
eretas.
— Podemos esquecer esse assunto por enquanto? — Olho para as
minhas amigas e faço uma careta. — Odeio me enfiar nesse poço de
autopiedade. Eu me torno uma Liv que odeio e tenho certeza que todos ao
meu redor também.
— Sabe do que nós precisamos? — Ava grita como se estivéssemos
longe uma da outra, eu a encaro com curiosidade e ela ri. — De um café.
— É a hora do almoço.
Penny salienta o único problema da sugestão de Ava.
— Então almoçamos e depois tomamos um café.
Ava dá de ombros, como se a solução fosse simples. E é simples.
— É uma ótima ideia — concordo. — Eu estou pronta.
Ava se manifesta, dizendo que também está pronta, Meg e Penny
precisam trocar de roupa, elas deixam a sala e ficamos apenas nós duas.
Ava me encara, aproxima-se e me abraça.
— Nós estamos aqui e sempre estaremos.
Eu deixo que seu abraço me conforte.
— Obrigada.
Agradeço e não só por agora, mas por tudo, por ela estarem ao meu
lado desde que cheguei na faculdade.
— Nós amamos você, Liv.
— E eu amo vocês.
Minha voz embarga e seguimos abraçadas. Eu amo as minhas
amigas e elas se tornaram parte da minha família. Nós nos encontramos no
primeiro ano de faculdade, na pista de patinação e nossa amizade foi fácil e
instantânea. Muitas vezes elas foram minha âncora e sequer sabem disso.
Ava e eu só nos desvencilhamos quando Meg e Penny retornam para
a sala. Nós duas ficamos em pé e nós quatro deixamos o apartamento.
Vamos para nosso estabelecimento preferido e minhas amigas me fazem
esquecer que alguns dos meus machucados ainda sangram.
Os jogadores de hóquei com certeza fazem as melhores festas!
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron
Saio da pista segurando meu capacete, taco e protetor bucal. Eu
estou exausto e suor escorre pela minha testa. O treino foi extremamente
pesado, o treinador foi ainda mais cruel por termos dois dias de folga.
— Eu achei que não sobreviveria.
Paul resmunga ao meu lado.
— Eu não sobrevivi, restou apenas meu espírito.
Alex soa dramático do meu outro lado.
— Vamos pensar pelo lado positivo, hoje é sexta.
Lembro-os e ao olhar para o lado, me deparo com Paul sorrindo
animado.
— Você tem razão, e o que faremos hoje?
Dou de ombros e é Alex a responder para Paul.
— Eu voto em uma festa.
Apesar de ser algo trabalhoso de organizar, não é uma péssima ideia.
— Não tenho nada contra.
O sorriso de Paul se amplia ainda mais.
— Eu vou divulgar nos grupos.
Paul escolhe sua função.
— Compro as bebidas.
Eu faço o mesmo e Alex é o último a se manifestar.
— Giulia e eu arrumamos a casa e vamos deixar a parte da comida
para Matteo.
Nós assentimos, seguimos até os bancos em frente à pista e nos
jogamos neles.
— Falar em festa até me fez ressuscitar.
Paul e eu rimos de Alex. Nós tiramos nossos patins e avisamos o
restante dos nossos colegas que iremos organizar uma festa em nossa casa.
Vamos para o vestiário com nosso time, eu tomo um banho e espero por
Alex e Paul, já que estamos juntos e hoje Paul é o responsável por dirigir.
Nós vamos para casa e o restante da tarde é apenas um borrão,
organizamos a festa, paramos apenas para comer e está anoitecendo quando
subo para o meu quarto, tomo um banho e escolho uma roupa adequada
para o evento.
Jeans, tênis e o moletom do time de hóquei.
Saio do meu quarto, desço as escadas e estou na metade dos degraus
quando escuto a música ecoando e os sons de vozes e risadas. As pessoas já
começaram a chegar.
Posso ver a movimentação assim que piso no chão da sala ainda são
poucas pessoas e estão espalhadas pelo cômodo. Ninguém está dançando,
mas todos têm copos nas mãos.
Eu sorrio e as cumprimento com um aceno de cabeça, a maioria são
apenas conhecidos, não tenho intimidade nenhuma para conversar e não sou
alguém que sai conversando com qualquer um, para mim, falar não é algo
que acontece facilmente.
Vou até a cozinha e pego meu próprio copo de cerveja. Eu me apoio
contra o balcão ao lado da pia e apenas fico observando o que está
acontecendo ao meu redor. Em alguns momentos recebo olhares e acenam
em minha direção, porém ninguém se aproxima e, de certa forma, me sinto
aliviado por isso.
Meu copo está praticamente vazio quando Paul entra na cozinha, ele
pega um copo de cerveja, faço um sinal para ele me trazer mais um, então
ele faz o que pedi e vêm até mim com um sorriso no rosto.
— Nós realmente somos os melhores organizando uma festa, não é?
Bebo o restante da cerveja e pego o copo que está me oferecendo.
— Nós somos.
Concordo, porque ele está certo, não há ninguém melhor do que nós,
organizamos as melhores festas.
— Eu vou largar a faculdade, o hóquei e me transformar em um
cerimonialista.
Paul parece tão empolgado que eu quase acredito nele. Nós
continuamos bebendo e estou no terceiro copo de cerveja quando Matteo,
Giulia e Alex entram na cozinha e se juntam a nós dois, então ficamos os
cinco conversando e como o lugar está ficando cheio, decidimos dar uma
volta e conferir se tudo está conforme o esperado.
Não há nada fora do comum acontecendo e algumas pessoas se
aproximam, formamos um círculo no meio da sala e Paul conta suas piadas
horríveis, algumas garotas riem para chamar sua atenção, Matteo e eu rimos
da situação, o que o faz nos encarar com uma expressão de poucos amigos.
Não nos importamos com sua reação, apenas rimos ainda mais.
Matteo está ansioso pela chegada de Ava e a todo instante olha na
direção da porta, Alex, Giulia e eu o provocamos e ele ergue seu dedo do
meio para nós três. Quando ele sorri, sabemos que sua garota finalmente
chegou.
Eu sigo seu olhar e me deparo com Ava e suas amigas entrando. Liv
está com ela. Faz quatro dias desde o incidente na delegacia e não a vi após
isso. Ela está sorrindo e desço meu olhar pelo seu corpo, notando que está
usando uma saia curta, um suéter verde, casaco e botas, seu cabelo está
preso e quase não há maquiagem em seu rosto, com exceção do batom
vermelho.
Ela está linda! Ela é linda!
As três caminham em nossa direção, eu trago meu copo até minha
boca e olho em frente. Escuto Paul, mas não estou prestando atenção em
suas palavras, todos riem ao nosso redor e faço o mesmo.
Ava, Meg e Liv se aproximam e abrimos o círculo para que possam
fazer parte dele. Ava fica ao lado do namorado, Liv caminha em minha
direção, eu a encaro e meu olhar encontra o seu.
— Hey, principezinho.
Posiciona-se ao meu lado e continuo com os olhos sobre ela. Seu
perfume cítrico me atinge e respiro fundo antes de respondê-la.
— Hey, Liv, você não deveria me chamar assim.
Ela dá de ombros e sorri animada.
— Eu gosto de chamá-lo de principezinho.
Faço uma careta.
— Vou encontrar um apelido irritante para você.
Liv segue com os lábios curvados em um sorriso.
— Você pode tentar. — Morde seu lábio inferior rapidamente e me
encara com malícia. — Mas eu aposto que não irei ficar irritada.
Balanço minha cabeça e sorrio. Eu com certeza irei arranjar um
apelido para essa garota.
— Liv, vamos pegar cervejas?
Meg a chama e Liv faz um sinal com a cabeça concordando com a
amiga.
— Até mais, principezinho.
Um arrepio percorre meu corpo e eu sei qual é o apelido perfeito.
— Até mais, diabinha. — Ela ergue suas sobrancelhas. — Esse é o
seu apelido.
Ela ri.
— Só para constar, eu amei.
Pisca em minha direção, vira-se ficando de costas e segue a amiga.
Eu a observo com um sorriso em meus lábios.
— Você está a fim dela?
Paul sussurra ao meu lado. Caralho, eu nem tinha notado sua
aproximação! Meu sorriso se desfaz e me viro para ele.
— Não. — Faço uma careta. — Ela é só uma amiga.
Ele me encara desconfiando, mas assente e desvia sua atenção de
mim quando uma das garotas o chama.
Eu continuo com meus amigos, conversando e bebendo, aos poucos
as pessoas se dispersam e ficamos apenas Paul, Alex, Giulia, Matteo e Ava.
Amo estar com eles, gosto, inclusive, das piadas ruins de Paul, as charadas
sem sentido de Alex e os deboches de Matteo, as garotas são as minhas
preferidas.
Percebo que há uma garota me encarando, não é a primeira vez que
a vejo e sei que ela é uma caloura. Ela não é discreta e não esconde suas
intenções. Quando sei que não há ninguém prestando atenção em mim,
sorrio de volta.
Pela forma como me encara, sei que ela entendeu meu sinal, então
uso como desculpa ir buscar mais bebida e me afasto dos meus amigos.
Espero que ela me siga.
Eu vou até o jardim e busco um lugar mais afastado e escuro. Para a
minha sorte, não há muitas pessoas por aqui. Pego uma espreguiçadeira e
me sento, bebo o restante da cerveja que tem em meu copo e o jogo no
chão. A garota enfim cruza a porta que liga o jardim ao restante da casa e
caminha até onde eu estou.
Ela está rindo e desço meu olhar pelo seu corpo, ela está usando
calça apertada e um suéter azul, ela é gostosa e me animo com a
possibilidade de ter minhas mãos pelo seu corpo.
A garota para à minha frente, subo meu olhar e encontro seus olhos.
Sorrio e me inclino em sua direção.
— Olá.
— Olá, você é o Aaron, não é? — Assinto. — Eu ouvi falar de você.
— Espero que apenas coisas boas.
Flerto.
— Apenas coisas boas.
Não preciso de muito mais para saber que ela está a fim das mesmas
coisas que eu. Ofereço minha mão, ela deixa seus dedos sobre os meus e a
trago para o meu colo. Ela se senta com as pernas ao redor da minha cintura
e levo minhas mãos até sua barriga.
— E qual é o seu nome?
Seus olhos brilham.
— Natalie.
Eu assinto e aproximo meu rosto do seu.
— Eu posso beijá-la, Natalie?
— Eu estou esperando por esse beijo a noite toda.
Não hesito e cubro sua boca com a minha. Eu a beijo e ela
corresponde, subo minha mão até seu cabelo e a mantenho na posição que
eu quero, ditando o ritmo e as regras.
Meus dedos passeiam pela sua barriga e pela forma como se
impulsiona para a frente, sei que está gostando. Mordo seu lábio inferior e
ela deixa escapar um gemido.
Os sons que deixam sua boca são incentivo suficiente para baixar
minha mão até sua bunda, aperto-a e ela ofega. Afasto meus lábios dos seus
e sorrio.
— O que você acha de subir para o meu quarto? — Ela assente. —
Terceira porta à direita, suba primeiro e subirei logo em seguida.
Concorda mais uma vez e deixa meu colo, eu seguro sua mão e ela
me encara.
— Eu preciso que saiba de dois fatos antes de subir para o meu
quarto. — Faz um sinal para que eu prossiga. — Não gosto de exibições e
não estou procurando um relacionamento.
A promessa que fiz para minha vó ecoa em minha mente, mas a
ignoro, eu posso curtir um pouco mais antes de enfim procurar alguém.
— Eu só quero diversão, Aaron.
— Ótimo.
Trocamos um ótimo olhar, solto sua mão, ela fica de costas e se
afasta. Ela cruza a porta e continuo a observando. Esperarei alguns minutos
para ir ao seu encontro. Ninguém precisa saber com quem e quando eu faço
sexo. Não quero ser o assunto e nem sei lidar com a situação quando sou o
centro das atenções.
— Depois dessa cena, eu tenho certeza de que não é virgem.
Sua voz surge às minhas costas e a reconheço no mesmo instante.
— Você não tem filtro nenhum?
Liv ri, sai das sombras e se senta de lado na espreguiçadeira. Eu me
viro até estar posicionado de forma que minha perna toque a sua.
— Nunca imaginei que você fosse desse tipo.
Encaro-a sem entender.
— Que tipo?
Estamos em uma parte totalmente escura, a luz da lua é a única
responsável por iluminar Liv.
— O tipo que come em silêncio. — Sinto minhas bochechas
vermelhas e ela ri. — Você também fica vermelho quando está com uma
garota?
Ela me desafia e me encara com malícia. Eu balanço minha cabeça e
sorrio.
— Esse é o tipo de coisa que você nunca ficará sabendo, diabinha.
O apelido sai fácil, meus olhos encontram os seus e ela continua me
encarando.
— Talvez eu pergunte à minha amiga amanhã.
Continua sorrindo com malícia e me pergunto o que ela faria se
levasse minha mão até sua nuca e a puxasse em minha direção.
— Ok e eu vou fazer questão de executar minha melhor
performance para que ela tenha só elogios a meu respeito.
— Faça o favor de fazê-la gozar.
Liv sussurra. Onde nossas pernas se tocam está queimando. Sinto
seu perfume e sua respiração contra o meu rosto. É como se existisse
apenas uma barreira entre nós dois. O álcool deixa as coisas ainda mais
intensas.
— Não posso deixá-la esperando por muito tempo.
— Você realmente não pode. — Ela ri, eu me controlo e fico em pé.
— Boa noite, principezinho.
— Boa noite, diabinha.
Seu olhar é puro fogo e me pergunto como seria se a fizesse entrar
em combustão. Olho uma última vez para Liv e vou ao encontro da garota
em meu quarto.
Um novo casal está surgindo... Vocês conseguem apostar quem
são!?
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia
Aaron entra na sua casa e eu observo enquanto mordo meu lábio
inferior. Nunca imaginei Aaron agindo assim, só de relembrar ele com a
garota um calor sobe pelo corpo e sinto uma leve invejinha dela.
Como seria se fosse eu? Imagens ecoam em minha mente e, mais
uma vez, sinto-me quente. Quem diria que o tímido Aaron seria assim!?
Eu, com certeza não imaginava.
Apoio minhas mãos na espreguiçadeira, curvo-me levemente para
trás e encaro o céu. Há muitas estrelas, a lua está cheia e está iluminando o
lugar. Estava apenas explorando a casa quando encontrei um casal na
sombra, minha curiosidade fez com que me aproximasse e fiquei surpresa
ao reconhecer Aaron.
Não sou uma voyeur, mas, caramba... E ele ainda estava no controle.
Por fim, sorrio. Realmente surpreendente. Como alguém em um momento
está com as mãos sobre uma garota e no outro está vermelho porque eu
disse que é do tipo que come em silêncio?
É impossível decifrar Aaron e isso o torna ainda mais interessante.
Ainda sorrindo, eu fico em pé, talvez esteja no momento de
encontrar alguém. Eu volto para a casa e encontro Meg, Ava está com
Matteo e Penny não veio, minha amiga está com seu namorado e sua
garotinha.
Meg e eu continuamos bebendo e analisamos ao nosso redor,
tentando encontrar alguém que valha a pena. O quarterback do time chama
sua atenção e eu fico sozinha, não demora para um garoto se aproximar de
mim, ele é bonito e sorrio. Trocamos nossos nomes, dançamos por alguns
segundos e ele me beija.
É decepcionante, muito molhado e sua língua é desgovernada. Ele
aprendeu a beijar ontem? Horrível. Não prossigo, interrompo o beijo e o
dispenso. Melhor ficar sozinha do que com alguém que não sabe o que faz.
Ele parece muito frustrado, mas não me importo, minha satisfação
vem em primeiro lugar e homem nunca é digno de compaixão. Beijo mais
um cara e ele também não atende às minhas expectativas; acho que hoje
elas estão muito altas.
Meg não passa de beijos com o jogador, aparentemente nenhuma de
nós está com sorte, nós desistimos dos garotos e nos divertimos juntas.
Dançamos, conversamos e rimos.
Estamos tontas e bêbadas quando deixamos a casa dos atletas. Ava
ficou com Matteo, nós decidimos ir a pé para casa, o Sol está nascendo e é
lindo.
Meu braço está preso ao de Meg e cambaleamos pela calçada.
Tropeçamos, quase caímos e nossas gargalhadas ecoam pela rua.
— Nossa noite foi péssima e ao mesmo tempo incrível.
Não entendo o que Meg está querendo dizer, talvez esteja bêbada
demais.
— Não entendi.
Olho para o lado e Meg revira os olhos.
— Foi incrível porque ficamos juntas e somos ótimas companhias,
terrível porque não encontramos ninguém.
Faz um biquinho para demonstrar sua frustração e sorrio.
— Garotos não são tudo, Meg.
Ela faz uma careta.
— Você tem razão, mas confesso que adoro me divertir com eles e
faz três semanas que não me divirto com nenhum.
— Com certeza um recorde.
Debocho e Meg ri.
— Vamos fazer uma aposta? — Ergo minhas sobrancelhas e o
sorriso de Meg se amplia. — Quem consegue ficar mais tempo sem sexo.
Um sorriso vitorioso surge em meu rosto.
— Essa será a aposta mais fácil de ganhar.
Ela balança a cabeça, negando.
— Eu posso ficar sem sexo.
Continuo sorrindo, porque de nós duas, Meg é a mais safada.
— Eu vou ganhar, Meg, e qual será meu prêmio?
Nós duas paramos, ficamos uma de frente para a outra na calçada e
refletimos sobre qual pode ser o prêmio ideal. Droga, o álcool em meu
sangue não me deixa pensar em nada!
— Podemos pensar mais pra frente. — Assinto concordando. — Na
verdade, quem vencer pode pedir o que quiser.
— O que quiser?
Pergunto animada.
— O que quiser.
Meg afirma e me estende sua mão, eu a aperto e selamos a nossa
aposta. Nós duas sorrimos, seguimos em frente e mais uma vez eu tropeço,
quase encontro o chão, mas Meg segura meu braço.
— Opa, foi quase.
Grito e continuamos caminhando na direção do nosso prédio. Não
há ninguém na rua, o Sol está nascendo e vamos dançando e pulando como
duas crianças.
Eu estou tonta e tudo ao meu redor é mais brilhante. Sorrio sem
motivo e Meg e eu conversamos sobre os assuntos mais aleatórios e sem
sentido, discutimos sobre o porquê as rosas são chamadas de rosa se a cor
predominante da flor é vermelha.
Ao chegarmos, precisamos nos apoiar uma na outra para subirmos a
escada e demoramos a achar a chave, que todo tempo estava em meu bolso,
e gastamos minutos tentando acertar a fechadura, e quando enfim entramos
em nosso apartamento, cada uma vai para o seu quarto.
Eu tiro meus tênis e me jogo na cama de qualquer jeito, tudo gira ao
meu redor e a sensação só piora quando fecho os olhos. Uma retrospectiva
da noite ecoa em minha mente e começo a rir ao me lembrar de Aaron com
a garota, o doce e meigo Aaron atacando.
Será que a noite dela foi boa? Com certeza ela terminou melhor que
eu... Eu apostei com a minha amiga que ficarei sem sexo por tempo
indeterminado. É patético e minha risada aumenta, abro meus olhos e
lágrimas escorrem pelo meu rosto, minha barriga dói e sei que minha reação
é totalmente exagerada.
Aos poucos, minha risada diminui e resta apenas uma curva em
meus lábios, encaro o ponto fixo á minha frente, o meu mural de fotos; elas
estão girando e se mexendo. Há fotos com meu pai, com minha mãe e com
minhas amigas.
O sono me cerca, meus olhos pesam, aos poucos meu quarto se
transforma em um borrão e a escuridão vence.

Eu estou em uma pista de patinação realizando os movimentos


perfeitamente e sendo aplaudida de pé, mas algo toca incessantemente, um
barulho chato. Grito para que desliguem o som, mas ninguém me escuta,
fica ainda mais alto e mais irritante.
A pista, as pessoas, o lugar ficam desfocados e é como se estivesse
sendo sugada para um outro espaço. Abro meus olhos de repente e me dou
conta de que estava apenas sonhando. Era apenas um sonho, eu estou em
meu quarto e meu celular está tocando.
Droga!
Aos poucos me situo sobre o que está acontecendo. Meu corpo está
dolorido e minha cabeça pulsa como se estivesse prestes a explodir, minha
boca está seca e o gosto é horrível.
O barulho segue me infernizando e minha bunda está vibrando.
Caralho, o celular está em meu bolso! Como a pessoa não parece a fim de
me deixar em paz, levo minha mão até meu bolso e pego o aparelho, trago-
o até meu rosto e confiro quem está desesperado para falar comigo.
É o meu pai. O que ele quer comigo em um sábado de manhã? Olho
para as horas no canto da tela e são nove horas da manhã. Merda, eu não
dormi nem três horas.
Ele segue me ligando, o que significa que deve ser urgente. Aceito a
ligação, trago o telefone até minha orelha e fecho meus olhos. Droga, tudo
continua girando!
— Pai?
— Hey, querida.
Meu pai soa tão animado que até fico assustada.
— Tudo bem?
Pergunto receosa.
— Ótimo, você pode abrir a porta?
Demoro a entender o que ele está querendo dizer, aliás, nem entendo
que tipo de pedido é esse.
— Abrir a porta?
— Abra a porta do seu apartamento, garotinha.
— Por que eu abriria a porta do meu apartamento às nove da manhã
de um sábado?
Será que ele me enviou algum presente? Mas nem é meu
aniversário...
— Eu estou aqui, querida.
Suas palavras ecoam em minha mente e não fazem nenhum sentido.
Como assim, ele está aqui?
— Pai, o que está acontecendo?
Abro meus olhos e me sento na cama. Será que ainda estou
sonhando?
— Eu estou em Hanover, Olivia.
Suas palavras ecoam em minha mente e a dor em minha cabeça se
intensifica.
— Pai, o que você está fazendo aqui?
Meu pai suspira, porque ele claramente percebeu que não estou feliz
com sua visita.
— Abra a porta e nós iremos conversar.
— Estou indo.
Encerro a ligação, abaixo minha mão com o celular e encaro a parede
à minha frente. Ok, agora, eu já posso acordar. Fecho meus olhos e me
belisco, nada muda a minha realidade.
Ai meu Deus!
Eu me levanto e é como se um caminhão tivesse passado por cima de
mim. Saio do meu quarto, caminho pelo corredor e vou na direção da porta
de entrada ainda sem acreditar. Só queria dormir o sábado todo, é pedir
demais?
Seguro a maçaneta e respiro fundo. Eu nem me olhei no espelho e não
sei qual é a minha aparência. Meu pai vai perceber que estou de ressaca?
Provavelmente sim.
Juro que se existisse um jeito, abriria um buraco no chão e me
esconderia lá para sempre, mas como isso não é possível e nem posso me
teletransportar para outro lugar, tento fingir que estou bem e fazer uma
expressão de plenitude. Terá que ser o bastante!
Abro a porta e me deparo com meu pai.
— Hey, pai.
Sorrio, um sorriso exagerado. Ele ergue as sobrancelhas e me analisa.
— Hey, querida.
Ele abre os braços e não tenho alternativa, me aproximo e deixo que
meu pai me abrace. Eu o abraço de volta e por alguns me permito me
aconchegar contra ele.
Apesar de tudo, é um abraço familiar, repleto de amor e nostalgia.
— Você está fedendo a álcool.
Desvencilho-me dele e faço uma careta.
— Eu estava em uma festa e faz pouco tempo que cheguei em casa,
não deu tempo de tomar um banho.
— Entendi.
Encara-me preocupado e faço um sinal para que ele entre.
— Isso é normal, pai.
Ele entra e eu fecho a porta.
— Eu estou preocupado, Liv.
É claro que ele está e por isso está aqui. Faço um gesto na direção
do sofá.
— Você não precisa se preocupar, pai, eu estou bem.
Forço um sorriso mais uma vez, embora ele nem esteja me
encarando. Meu pai se senta no sofá, eu me sento na poltrona ao lado.
— Na segunda foi presa, Liv.
— Apenas um deslize. — Faço um gesto de desdém com a mão. —
Não precisa se preocupar.
Tudo segue girando e preciso me concentrar para manter meu olhar
sobre meu pai. Às vezes eu enxergo dois dele.
— Meu advogado conversou com o delegado e me contou que
apenas foi liberada por conta da família influente do seu namorado.
As palavras “seu namorado” ecoam em minha mente. Meu Deus, eu
estou tão ferrada.
— Não foi tão ruim.
— Ele me contou sobre o policial que tentou te abordar de maneira
abusiva.
Isso me surpreende.
— O delegado realmente levou meu comentário a sério?
Meu pai assente.
— Liv, o que aconteceu, de alguma forma, acionou alguma
lembrança?
É possível perceber toda sua preocupação em seu olhar, e estou
bêbada.
— Pai, eu não surtei.
Tento o tranquilizar, mas pela sua expressão sei que ele não acredita
em mim.
— Eu soube que você gritou com Luke na segunda e não
compareceu aos treinos seguintes.
Faço uma careta.
— Quem fez a fofoca?
— Eu sou um dos patrocinadores da equipe de patinação, sempre sei
de tudo.
Balanço a cabeça, negando.
— Não há nada acontecendo, pai.
Realmente, nada está acontecendo. Eu não fui aos treinos, mas não
significa que não esteja bem.
— Eu preciso resolver alguns assuntos na cidade e ficarei aqui pelo
próximo mês.
— Você ficará um mês aqui?
— Isso é um problema?
É um problema? Não sei, meu pai tende a ser um tanto superprotetor
e não estou acostumada com ele por perto.
— Não, você ficará onde?
— Aluguei um apartamento.
— Pai, você não precisa fazer isso por mim, eu estou bem.
Ele dá de ombros.
— Eu tenho negócios na cidade e não tenho certeza se está bem.
— Sua falta de confiança em mim me deixa comovida.
Sorrio e dessa vez é um sorriso sem humor nenhum.
— Não vamos ter essa conversa com você bêbada.
Eu não estou fazendo nada de errado, mas me sinto péssima.
— Ok.
Meu pai fica em pé.
— Eu vou deixar você dormir e nos encontramos mais tarde. —
Assinto. — Tchau, querida.
Meu pai vem até mim, abaixa-se e beija minha testa.
— Tchau, pai.
Ele se afasta e o observo, ele para na porta com a mão na maçaneta
e olha para trás.
— E leve seu namorado com você.
Mordo meu lábio inferior. Droga, droga, droga! Pense em algo, Liv!
Mas eu não consigo pensar em nada.
— Ele estará lá, pai.
Há boatos de que nosso principezinho não é tão principezinho
assim...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron
Acordo com alguém se mexendo ao meu lado. Abro meus olhos e
me deparo com a garota de ontem à noite. Ela está me encarando com um
sorriso satisfeito em seu rosto.
— Bom dia, gato.
— Bom dia.
Ela tem um brilho em seu olhar que me deixa orgulhoso e com as
bochechas vermelhas.
— Eu não deveria ter ficado. — Faz um biquinho com seus lábios,
fico em silêncio, porque realmente não deveria ter ficado. — Mas você me
deixou tão cansada…
— Não vou dizer que sinto muito, porque estaria mentindo.
Pisco para ela, seu sorriso se amplia e ela se inclina em minha
direção.
— Vamos nos ver outra vez?
Espero que ela lembre da parte que não estou procurando por um
relacionamento.
— Talvez. — Essa é minha resposta padrão para todas as garotas.
Sento-me e apoio minhas costas na cabeceira da cama. — Qual seu
número?
Pego meu celular na mesa de cabeceira ao lado e anoto seu número,
salvando como garota 99. O número 99 ecoa em minha mente e me dou
conta de que estou perto da garota 100.
— Um banho de despedida?
Sua voz soa sexy. Um banho não é uma péssima ideia, mesmo sendo
algo que resulte em algo mais íntimo, mas não tem problema, porque não
irei ligar para ela. É só dessa vez.
Eu me levanto, estou nu assim como ela, estendo minha mão e ela
coloca seus dedos sobre os meus.
Nós dois vamos para o banheiro e enquanto a água do chuveiro cai
sobre nossos corpos, minha boca encontra a sua. Minhas mãos percorrem
sua pele e seus gemidos ecoam pelo espaço.
Toco-a nos lugares certos, faço-a delirar e implorar por mais e a
tenho com as costas contra os azulejos do banheiro. Mais uma vez, faço ela
gritar meu nome.
É uma ótima maneira de acordar.
Assim que deixamos o banheiro, colocamos nossas roupas e eu a
acompanho até a saída, despeço-me dela com um rápido beijo e fecho a
porta.
A promessa que fiz à minha avó ecoa em minha mente e sei que se
continuar com esse comportamento não irei encontrar uma namorada. Só
que eu não quero mudar meu comportamento e não quero uma namorada,
mas eu fiz uma promessa. Preciso encontrar uma solução para esse
problemão no qual eu me meti, pois com certeza minha avó irá me cobrar
sobre o assunto.
Em outro momento irei resolver, empurro o assunto para o fundo da
minha mente e sigo para a cozinha. Encontro Paul, ele está sentado de
frente para o balcão comendo algo e ergue a cabeça ao me ouvir entrar.
— Levando alguma garota até a porta? — Assinto e ele bufa. — Por
que eu tenho a fama de ser o jogador cafajeste se é você que sempre está
acompanhado?
Balanço minha cabeça e sorrio enquanto vou até a geladeira.
— Você é um cafajeste.
— Você também.
Ele me acusa, eu pego uma garrafinha de água, fecho a geladeira e
volto a ficar de frente para ele.
— Eu não sou um cafajeste.
Ele faz uma careta e um gesto de desdém com a mão.
— Você é, apenas é discreto.
Aponto a garrafa em sua direção.
— É só você ser discreto também.
Nós dois sabemos que é impossível Paul ser discreto.
— O mundo é realmente injusto.
Ignoro seu drama e me sento à sua frente. Há copos pelos balcões,
pelo chão e posso ver sujeira por tudo que é parte.
— Nós precisamos começar a limpeza.
Paul suspira.
— Por que insistimos em fazer festas?
— Porque somos uns idiotas.
Respondo e Paul volta a comer seu cereal com uma expressão de
tristeza que me faz rir. Eu fico na cozinha e preparo meu cereal, nós dois
conversamos sobre a festa, comentamos sobre os barracos e fofocas da
noite.
Não estamos nem um pouco animados para iniciar a limpeza e
adiamos para o horário em que todos estiverem acordados, pois seria
extremamente injusto nós começarmos a parte mais divertida sem nossos
companheiros.
Nós dois vamos para a sala assim que terminamos de comer,
ligamos o vídeo game, pegamos os controles e nos jogamos no sofá.
Paul e eu somos a melhor dupla e destruímos quem está jogando
com a gente, estamos finalizando a destruição do clã inimigo quando o som
da campainha ecoa pela casa.
— Porra.
Paul grita.
— Você está esperando alguém?
Pergunto enquanto continuo mirando em nossos rivais.
— Não.
Nenhum de nós dois para e o som continua ecoando pela sala.
— Merda, a pessoa não está dando sinais de que irá embora, Paul.
— Um de nós terá que atender a droga dessa porta.
Paul está certo e decidimos mirar no mesmo personagem, quem o
matar está livre de ir. Eu mato o cara e Paul resmungando deixa seu
controle de lado.
— Juro que se for aqueles pirralhos apertando a campainha e saindo
correndo, irei cortar a mão deles fora.
Eu apenas rio e sigo concentrado em meu jogo, posso ouvir Paul
abrindo a porta e a voz de uma garota, mas não consigo distinguir o assunto
e nem consigo dizer quem é ela.
Estou perseguindo mais um do clã rival quando escuto os passos de
Paul, miro na cabeça do cara.
— É com você, Aaron.
Paul soa animado e erro o tiro.
— Droga, Paul.
Ele ri, senta-se ao meu lado e pede o controle, sigo com o objeto em
minhas mãos.
— Não deixe a garota esperando.
Ele puxa o controle da minha mão, deixo que ele o pegue e olho
para o lado.
— Quem ela é?
— Liv, a amiga de Ava.
Faço uma careta.
— O que ela quer comigo?
Meu amigo apenas dá de ombros.
— Não sei.
Como só há uma maneira de descobrir o que Liv quer comigo, eu
me levanto e sigo até a entrada. A porta está totalmente aberta, ela está
parada e está com seus dedos na boca, mordendo-os como se estivesse
preocupada. Franzo minha testa e vou até ela. O que ela quer comigo?
— Hey, Liv.
Afasta seus dedos da sua boca e abaixa sua mão.
— Hey, Aaron.
Ela parece receosa, morde seu lábio inferior e me encara com um
olhar estranho.
— Algo está acontecendo?
Demora alguns segundos para me responder, o que aumenta a minha
ansiedade.
— Aaron, eu preciso conversar com você.
Ergo minhas sobrancelhas.
— Ok.
Espero que ela comece a falar, mas Liv só prolonga o meu
sofrimento.
— Em um lugar onde possamos ter privacidade.
Eu não gosto nem um pouco da maneira como Liv está soando.
— Tem algo a ver com nosso pequeno incidente na segunda? — Ela
assente. — Ah meu Deus, Liv.
Que merda pode ter acontecido? Milhões de possibilidades rondam
minha mente e não gosto de nenhuma delas. E se eu for preso outra vez? E
se minha vaga no time de hóquei estiver ameaçada?
— Podemos conversar no seu quarto?
Ela sugere e assinto.
— Vamos.
Faço um sinal para ela me seguir.
— Mais uma? — Paul grita quando pisamos no primeiro degrau. —
Você é realmente o fodão dessa casa.
Sinto meu rosto ficando vermelho, ergo minha mão e aponto o dedo
do meio em sua direção, o idiota apenas ri. Não olho para trás para ver a
reação de Liv, mas posso ouvir o som da sua risada.
Continuo em frente e só paro para abrir a porta do meu quarto, eu
fico de lado e faço um sinal para que Liv entre, e assim que ela passa por
mim, sigo-a e fecho a porta. Ela olha ao redor do meu quarto e me encara
com um sorriso em seu rosto.
— Seu quarto é exatamente como eu esperava que fosse.
— E como você esperava que fosse? — Ela não me responde e se
aproxima da minha estante onde estão meus mangás, funkos e legos. —
Cuidado.
Alerto-a, porque é mais forte do que eu.
— Um quarto com um estilo mais nerd.
Ela debocha e eu não digo nada. Meu quarto realmente é um quarto
de nerd, mas não me envergonho, pelo contrário, tenho o maior orgulho das
minhas coleções.
— Você quer uma água, um suco, um café, uma cerveja? — Ela olha
em minha direção e balança a cabeça, negando. — Ótimo, o que aconteceu?
Liv vai até minha escrivaninha, larga sua bolsa sobre ela e apoia seu
corpo contra a madeira.
— Eu preciso de um favor.
— Que tipo de favor?
Eu paro no meio do meu quarto e cruzo meus braços sobre meu
peito enquanto mantenho meu olhar sobre Liv.
— Sabe, você fica bem intimidante nessa posição. — Liv curva seus
lábios em um sorriso discreto, eu somente ergo minhas sobrancelhas. — É
sério, você é todo grande e suas covinhas somem.
Reviro meus olhos.
— Liv, eu estou curioso e preocupado, se você puder ir direto ao
assunto, ficarei grato.
Seu sorriso some e sua postura muda, é nítido que ela está tensa, o
que me deixa ainda mais preocupado.
— Ok. — Continua em silêncio, faço um sinal para que ela fale logo
e suspira. — Eu preciso que você finja ser meu namorado para o meu pai.
— O quê?
Ela não pode estar falando sério, ou tenho que ter escutado errado.
— Eu preciso que você finja ser meu namorado para o meu pai.
— Sem chance.
Liv afasta sua bunda da minha mesa e me encara com um olhar
determinado.
— Meu pai está na cidade porque está preocupado com o incidente
de segunda, se ele descobrir que menti sobre a existência de um namorado,
sua preocupação irá aumentar.
Dou de ombros, como se o problema não fosse meu, porque
realmente não é.
— Eu não posso ser o seu herói, você terá que procurar outro cara
para te ajudar.
— Meu pai está na cidade, Aaron.
Ela realmente parece estar diante de um problema, mas não existe
como eu ajudá-la.
— Sinto muito, Liv, mas eu sou um péssimo mentiroso, você
deveria procurar alguém do teatro.
A expressão em seu rosto se transforma e me encara com raiva.
— Quem foi preso comigo foi você.
Ergo minhas mãos para o alto em um sinal de inocência.
— E eu não tenho culpa do que aconteceu, eu fui preso por sua
causa. — Aponto em sua direção. — E você que mentiu para o policial e
para o seu pai que eu era seu namorado.
— Meu pai sabe que você foi preso comigo por causa do delegado,
logo não posso apresentar outro cara no seu lugar.
— Contrate alguém que finja ser eu, prometo que não irei processá-
lo por falsa identidade.
Pela forma como me encara, minha sugestão é péssima.
— Aaron, meu pai é dos patrocinadores do time de hóquei, ele sabe
quem é você.
Suspiro e dou um passo para trás.
— Sinto muito, Liv, mas acho que você terá que contar a verdade
para ele. — Olho para a porta, talvez deva simplesmente expulsá-la do meu
quarto. — Eu não posso ajudá-la.
Viro-me com a intenção de ir até a porta e a abrir para que Liv possa
sair, porém sua voz me detém.
— Eu vou contar para o seu treinador que foi preso e posso exigir
que meu pai, como patrocinador do time, solicite o seu afastamento por mal
comportamento.
Retorno à minha posição anterior e encaro Liv.
— Você está me ameaçando?
Ela assente e enrugo minha testa. Dartmouth é uma faculdade que
exige disciplina dos seus atletas, boas notas e devemos nos manter longe de
problemas e Liv sabe disso, porque também é um atleta.
— Se seu pai é um patrocinador, logo o treinador já deve estar
sabendo.
— Ele não prejudicaria o meu namorado.
Faz questão de frisar as últimas duas palavras e isso me deixa
nervoso. Minha avó está doente, se for expulso do time ou ganhar alguma
punição, meus avós saberão e serei questionado dos porquês, posso tentar
mentir, mas sou péssimo mentiroso e meu avô conhece alguns dos membros
da comissão técnica do time de hóquei, afinal, ele estudou aqui e muitos
foram seus colegas, além de que ele jogou pelo time, se desconfiar, irá
investigar e não demorará a descobrir que fui preso, isso com certeza
causará uma preocupação enorme a eles.
— Mas ele poderia prejudicar alguém que machucou o coração da
sua filha.
Liv continua.
— Eu não machuquei o seu coração.
Dá de ombros.
— Ele não sabe da verdade e será sua palavra contra a minha.
Passo a mão pelo meu cabelo. Que droga!
— Deus, como eu vim parar em um problema como esse?
— Aaron, você só precisa fingir ser meu namorado, só precisamos
convencer meu pai. — Ela suspira e me encara com um olhar cansado. —
Eu só quero acabar com a preocupação dele.
Eu encaro seus olhos e reconheço seu olhar. É a mesma forma que
olho para os meus avós. Eu compartilho do mesmo sentimento e saber disso
faz com que me recorde da minha promessa. Uma ideia horrível surge em
minha mente, é algo destinado ao fracasso e, mesmo assim, escuto as
palavras deixando minha boca.
— Ok, mas eu tenho uma condição.
— Qual?
Liv me encara com uma mistura de esperança e curiosidade.
— Eu preciso que você finja ser a minha namorada para meus avós.
Ela não hesita.
— Ok. — Sorri vitoriosa. — Você finge que é meu namorado para
meu pai e eu finjo que sou sua namorada para seus avós.
Uma patinadora, um jogador de hóquei e um jogador de hóquei
aposentado. Um encontro um tanto estranho, vocês não acham?
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron
Ouvir Liv dizer as palavras em voz alta faz com que a ideia pareça
ainda mais horrível.
— Isso é uma péssima ideia.
Liv segue rindo.
— É uma ótima ideia. — Seu sorriso some, inclina a cabeça para o
lado e me encara pensativa. — Por que você precisa fingir para sua avó que
tem uma namorada?
— Ela está com câncer e está preocupada comigo.
Liv endireita sua postura e me olha com pesar.
— Eu sinto muito. — Morde seu lábio inferior por alguns segundos.
— Você não quer que ela se preocupe com você, não é?
Eu assinto e vejo em seu olhar que ela conhece o sentimento.
— Nós iremos fazer isso funcionar, Aaron. — Soa convicta. — E
prometo que sua avó irá me adorar.
Eu levo minha mão até minha nuca e coço a minha pele.
— Liv, eu realmente sou péssimo mentindo.
Faz um gesto de desdém com a mão.
— Não se preocupe, daremos um jeito, eu sou uma ótima mentirosa.
— Espero que você seja mesmo.
Ela pega sua bolsa.
— Ótimo e no caminho inventamos nossas mentiras.
— Caminho?
— Sim, agora nós precisamos ir encontrar o meu pai.
— O quê?
Ela não pode estar falando sério...
— Meu pai está me esperando em um restaurante e quer que eu leve
o meu namorado comigo.
— Não posso ir.
Liv caminha em minha direção como se fosse a dona do lugar.
— Sim, você vai. — Deixa suas mãos apoiadas em sua cintura e me
encara impaciente. — Coloque um casaco e tênis e vamos.
— Isso é uma péssima ideia.
Resmungo enquanto vou buscar um moletom, carteira, celular e um
par de tênis. Liv fica analisando meu quarto.
— Você joga?
Ela tem os olhos sobre o meu computador.
— Sim.
Respondo enquanto me sento sobre a cama e calço meus tênis.
— Você é realmente surpreendente, principezinho, jogador de
hóquei e tem essa vibe de nerd.
Suspiro irritado.
— E você, Liv, é a pedra no meu sapato.
— Assim você me magoa.
Olho para ela, que tem um brilho nos olhos e está fazendo um
biquinho com os lábios. Ela não está magoada.
— Vamos enquanto eu tenho coragem.
Abro a porta do meu quarto e faço sinal para que Liv cruze por ela.
Ela passa por mim, então a sigo e nos deparamos com Ava e Matteo no
corredor, eles param de caminhar ao nos enxergar. Os dois nos encaram
com curiosidade, ótimo!
— Hey, Liv. — Liv acena e sorri para a amiga. — Você dormiu
aqui?
Ava parece confusa. Eu também estaria se fosse ela.
— Hey, Ava, eu não dormi aqui, Aaron apenas me fará um favor. —
Liv pega minha mão e me puxa na direção dos degraus da escada. — Nós
estamos atrasados, mas mais tarde explicamos o que está acontecendo.
Eu a sigo e Matteo e Ava continuam nos olhando confusos.
— Vamos no seu carro e na volta pego o meu. — Ela solta minha
mão. — Porque seria estranho se eu não chegasse junto com o meu
namorado.
Ela deixa o último degrau e se vira para mim.
— Você é sempre mandona?
Revira os olhos.
— Não sou mandona, eu sou prática.
Sorrio, um sorriso debochado.
— Claro, a rainha da praticidade.
Cruza seus braços abaixo dos seus seios.
— Onde está seu carro?
Pulo o último degrau e faço um sinal para que ela me siga. Eu nos
levo até a garagem e aponto para o veículo.
— Um típico carro de jogador de hóquei.
— Você sempre julga os outros? Ou eu sou um caso especial?
Olho para Liv e ela tem as bochechas coradas. Quem diria que
conseguiria deixá-la envergonhada!? Eu ocupo o lugar atrás do volante e
ela se senta ao meu lado.
— Só para constar, eu não julgo os outros.
Eu fico em silêncio, abro a garagem pelo controle e dirijo para fora.
— Onde estamos indo?
Pergunto e ela aponta para a tela fixada no painel do carro.
— Posso?
Assinto e enquanto ela digita o endereço no GPS, fecho a garagem.
Liv termina e reconheço o endereço, é um restaurante no centro da cidade,
eu já estive lá algumas vezes.
Coloco o carro em movimento e como sei que precisamos de tempo
para inventarmos nossa mentira, opto pelo caminho mais longo.
— Qual mentira você irá contar para o seu pai?
Apenas de pensar em mentir faz com que meu estômago embrulhe.
Meu Deus, no que eu fui me meter?
— Nós nos conhecemos quando nossos amigos começaram a
namorar, acabamos nos aproximando, conversando, encontrando coisas em
comum e nos apaixonamos.
Ela faz parecer tão fácil.
— Simples assim?
— Simples assim.
Ela parece tão convicta, mas eu não tenho essa mesma convicção.
— E se ele fizer perguntas?
— Eu inventarei algo na hora. — Droga, essa ideia é tão péssima.
— Não faça essa cara, é muito menos complicado do que está imaginando,
só precisamos saber o básico um do outro.
Sorrio, um sorriso sem humor.
— Nós não sabemos o básico um do outro, Liv.
— Isso é fácil de resolver, meu nome é Olivia Aubrey Callahan,
filha de James Callahan e Eve Murray, meus pais foram casados por dez
anos e quando eu tinha nove anos eles se separaram, eu tenho uma boa
relação com os dois. — Respira fundo e continua logo em seguida. — Eu
amo música clássica, minha banda preferida é Imagine Dragons, meu livro
preferido é Jogos Vorazes, minha cor preferida é verde, detesto atraso e
bagunça, eu faço fisioterapia e patinação é a minha paixão. Isso é tudo que
você precisa saber sobre mim.
Olho rapidamente para o lado e ela está encarando a rua pela janela.
— Com quantos anos você começou a patinar?
Volto a olhar para a estrada à minha frente.
— Aos nove, eu sempre soube patinar por causa do meu pai, mas
quando ele e minha mãe se separam eu comecei a patinar no lago congelado
que havia em frente a minha casa, era minha distração. — Algumas
perguntas ecoam em minha mente, mas não tenho chance de fazer
nenhuma. — É a sua vez.
— Meu nome é Aaron Prince, filho de Benjamin e Tegan Prince,
mas fui criado pelos meus avós Joseph e Eileen Prince, porque meus pais
morreram quando eu tinha sete anos.
— Sinto muito, Aaron, eu não sabia disso.
Ela me interrompe e assinto.
— Obrigado. — Agradeço e continuo. — Eu não sou muito ligado a
música, escuto o que me agradar, tenho uma leve obsessão por jogos de
computadores, videogame e Legos, além disso, o hóquei é uma parte muito
importante da minha vida e comecei a jogar na escola porque meu pai e
meu avô jogaram na faculdade, isso sempre foi algo que me ligou a eles.
Faço uma pausa para lembrar das informações sobre mim que Liv
precisa saber.
— Minha cor preferida é verde, assim como a sua.
— Essa com certeza foi uma das coisas em comum que fez com que
nos apaixonássemos um pelo outro.
Liv soa debochada.
— A probabilidade de um casal que gosta da mesma cor ficar junto
para sempre beira a noventa e nove por cento.
Sigo com o deboche e quando olho para ela, a encontro sorrindo. Liv
fica bonita quando está sorrindo.
— Claro, é o único fator que pode causar uma briga. — Sou
obrigado a voltar a olhar em frente. — E você faz administração, assim
como Matteo, não é?
— Sim.
— Ok, e você está parecendo um idoso dirigindo.
Ela muda totalmente de assunto e me ofende.
— Eu estou tentando matar o tempo, aliás, criar tempo para você
inventar sua mentira.
Defendo-me.
— Acredite, sou uma ótima mentirosa e não preciso de tempo.
— Ser capaz de mentir não é uma qualidade.
— Não é uma qualidade, mas é algo necessário. — Sua frase soa
enigmática, é como se ela sempre precisasse mentir. O que faria Liv mentir?
— Não se preocupe, Aaron, eu irei responder todas as perguntas que meu
pai fizer.
Ela menciona seu pai e seu nome ecoa em minha mente. Como eu
deixei isso passar?
— Qual nome do seu pai mesmo?
— Você finalmente se deu conta de quem ele é.
Diz entredentes e não parece nem um pouco contente.
— Seu pai é James Callahan?
— Sim, e é claro que você sabe quem é ele.
Resmunga nem um pouco contente.
— Ele foi o melhor jogador de hóquei por muito tempo. — O cara é
uma lenda e é o pai de Liv, o mundo é realmente pequeno. — Eu vou jantar
com James Callahan. Você acha que ele ficará chateado se pedir para tirar
uma foto com ele?
— Ele não irá se importar.
Liv continua mal-humorada.
— Eu devo estar cometendo algum pecado gravíssimo mentindo
para James Callaham.
— Meu pai não é nenhum um deus.
A forma como Liv pronuncia a frase faz com que eu pare com a
brincadeira.
— Ele é um mal pai?
Eu entro no estacionamento do estabelecimento.
— Não. — Suspira. — Meu pai é alguém incrível.
Eu não estou muito convencido da sua frase e assim que paro o
carro, me viro para ela. Liv está olhando em frente e suas mãos estão
fechadas em punhos. Com certeza há algo errado.
— Liv, ele faz algo contra você?
Talvez ele seja agressivo, ou autoritário. Ela olha em minha direção
rapidamente.
— Não, claro que não.
— Então, por que está com as mãos fechadas, como se estivesse
com raiva?
Faço um gesto com a cabeça na direção das suas mãos em seu colo e
ela balança sua cabeça.
— Não gostava de ter um pai jogador, ele passava muito tempo fora.
— Liv suspira e é possível ver a sinceridade em seus olhos. — James
Callahan é uma ótima pessoa, Aaron.
Ela é gentil e seus olhos brilham.
— Ok, eu acredito em você.
— Ótimo. — Ela sorri. — Vamos?
Assinto e deixamos o carro, eu a encontro e ela me oferece sua mão.
— Namorados sempre estão de mãos dadas.
Eu entrelaço meus dedos com os seus e não é estranho tocá-la,
porém, é como se existisse uma corrente elétrica correndo do seu corpo para
o meu, algo que faz com queira me aproximar ainda mais da garota ao meu
lado.
— Você já namorou alguma vez?
Ela me pergunta, eu demoro a responder, porque sua pergunta é
repentina.
— Sim, namorei uma garota no ensino médio e terminamos quando
escolhemos faculdades diferentes.
Sigo ao seu lado e caminhamos na direção da entrada.
— Eu namorei um garoto mais velho e não deu muito certo.
Ela está sorrindo, mas há algo errado, eu só não consigo dizer o quê.
Nós dois entramos e a recepcionista vem até em nossa direção, ela nos
indica a mesa em que James está nos esperando e a cada passo que damos
em sua direção, meu coração acelera.
Eu estou prestes a mentir para alguém e esse alguém é um ídolo do
hóquei, e patrocinador do time que eu jogo. É uma péssima situação, será
que consigo fugir?
A minha resposta é o olhar de James Callahan sobre nós dois. Ele
mantém o rosto sério e posso vê-lo me analisando. Aperto a mão de Liv.
— Finja naturalidade.
Ela sussurra para que apenas eu escute. Nós continuamos indo até a
mesa que ele está ocupando. É como se demorasse uma eternidade e apesar
de estar frio, eu estou suando.
James fica em pé, e ele é ainda maior do que na televisão, deve ser
uns oito centímetros mais alto que eu, não é muito, mas faz com que ele
pareça um gigante.
Assim que paramos à sua frente, Liv desvencilha sua mão da minha
e ele abraça a filha, falando algo que não consigo escutar, em seguida
afasta-se e se vira em minha direção. Engulo em seco e respiro fundo.
— Oi, James. — Minha voz falha e respiro fundo mais uma vez. —
É um prazer.
Estendo minha mão e ele apenas continua me encarando. Meu
pescoço está coçando, estou suando e juro que meu coração está prestes a
parar. Ele finalmente traz sua mão até a minha e aperta meus dedos.
— E você é?
Ergue suas sobrancelhas.
— Aaron.
Dessa vez minha voz não falha e respiro fundo.
— Ok.
Solta minha mão e demoro alguns segundos para processar o que
devo fazer, Liv dá uma leve cotovelada em minha barriga e faz um sinal
para a cadeira, no mesmo instante puxo-a para que sente e me sento ao seu
lado de modo que nós dois ficamos de frente para o seu pai.
— Pai, esse é meu namorado, Aaron. — Ela olha para mim. —
Aaron, esse é meu pai.
Eu a encaro mais tempo do que o necessário, porque existe algo em
Liv que me fascina, que me puxa em sua direção. Pisco e volto a encarar
James, ele está me observando e, droga, tenho impressão de que ele fará
isso a noite toda.
— Desde quando vocês estão namorando?
Minha garganta tranca, minhas mãos estão suando e tudo que eu
quero é desviar o olhar de James.
— Oficialmente? Dois meses.
A mentira sai fácil da boca de Liv.
— E como vocês se conheceram?
— Pai. — Ela o repreende e ri. — Isso é um interrogatório? Nós
nem fizemos os pedidos ainda.
Ela toca meu ombro, inclina-se em minha direção e apoia o queixo
em meu braço. Ela está tão perto que seu perfume me cerca, ela é cheirosa e
seu cheiro é refrescante como se ela tivesse acabado de sair do banho.
— Ok, então vamos fazer os pedidos.
Assentimos diante das palavras de James, ele chama um garçom e
fazemos os pedidos. E assim que estamos sozinhos, ele volta a refazer a
pergunta.
— E como vocês se conheceram?
Dessa vez, Liv o responde.
— Aaron é melhor amigo do namorado da Ava, nós acabamos nos
aproximando e nos apaixonando.
Liv beija meu queixo, prendo minha respiração e posso sentir
minhas bochechas vermelhas.
— E por que você demorou tanto para me contar?
Agora ele encara a filha e é perceptível a sua preocupação.
— Eu estava esperando o momento certo, não queria conversar
sobre nós dois sem a certeza de que nosso relacionamento daria certo.
As palavras de Liv soam tão fáceis que até mesmo eu quase acredito
nelas.
— E o incidente na segunda?
Liv suspira e se afasta de mim. Eu olho para o lado e a observo, não
há nada que indique em sua postura que está mentindo. Como ela pode
mentir tão bem?
— Aaron e eu estávamos apenas dando uma volta de carro pela
rodovia desativada e fomos parados por um policial, ele foi um idiota e
Aaron o socou.
James se vira no mesmo instante em minha direção.
— Você socou um policial?
Respiro fundo e procuro a melhor forma de contar parte da verdade,
sem chance de eu inventar uma mentira por completo.
— Ele foi desrespeitoso com Liv, normalmente, eu sou tranquilo e
ele conseguiu despertar o pior de mim.
Ergue suas sobrancelhas e olha para Liv.
— O advogado conversou com o delegado e ele comentou que está
investigando o policial, porém, não fui informado de que forma ele foi
desrespeitoso com você.
Eles trocam um olhar, e há uma tensão entre eles, como se existisse
um assunto mal resolvido.
— Não foi nada de mais, ele apenas tentou me intimidar. — James
não parece estar acreditando em Liv. — Pai, eu estou falando sério.
James ainda tem uma expressão de preocupação em seu rosto.
— Eu vou continuar na cidade, Liv.
Liv faz uma careta, mas assente, derrotada.
— Você sabia que Aaron joga no time de hóquei?
Ela declara mal-humorada, James olha em minha direção.
— Em qual posição?
— Eu defendo a ala direita.
— Nós temos apostado em vocês.
Assinto e finalmente, relaxo, hóquei é um assunto confortável, algo
que posso conversar sobre.
— Nós estamos nos esforçando para fazermos a melhor temporada
do time.
Para alívio de Liv, nós nos empolgamos falando de hóquei, eu quase
me esqueço que estou fingindo para James Callahan que eu sou namorado
da sua filha.
Nosso pedido chega e seguimos falando sobre hóquei, porém, para
meu desespero, James muda de assunto; ele faz perguntas sobre mim,
minhas mãos tremem e eu estou suando. Comer estando nervoso é horrível,
mas apenas sigo mastigando para que não perceba que estou mentindo.
Eu respondo com frases curtas e o assunto morre, a partir de então é
estranho e desconfortável, é horrível e assim que finalizamos a refeição,
solicitamos a conta, pagamos e nós três ficamos em pé.
Vamos para o estacionamento em silêncio, despedimo-nos com
palavras cordiais e Liv e eu entramos na minha picape. Eu estou gelado e
dirijo no automático.
— Você está bem?
Não a respondo e logo que estamos longe o suficiente para não
sermos vistos pelo seu pai, eu paro o carro no acostamento.
— Eu preciso vomitar.
Eu fiquei sabendo que certa patinadora e certo jogador de hóquei
estão namorando...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia
Assisto Aaron abrir a porta e se curvar para a frente, não é uma cena
agradável vê-lo vomitar. Devo fazer algo? Seu cabelo é um pouco grande,
mas não o suficiente para que precise segurar, talvez deva o abanar, mas
quando olho ao redor, não encontro nada que possa usar como um leque.
Sons esquisitos deixam sua garganta e ele volta a curvar seu corpo
para trás. Apoia suas costas no banco, fecha os olhos e suspira. Aaron está
pálido e com uma aparência péssima.
— Você está assim por conta de ontem à noite?
Ele faz um sinal de não com seu dedo.
— Estou assim porque foi extremamente horrível me sentar diante
do seu pai e mentir.
— Eu menti, você apenas concordou com a mentira.
Ele sorri, uma risada sem humor.
— Acredite, para mim não faz muita diferença.
Eu me sinto culpada.
— Sinto muito.
Mordo meu lábio inferior.
— Pelo que exatamente?
— Por enfiar você nessa situação. — Ele fica em silêncio e me sinto
estranha. — Você quer que eu dirija?
Ele balança a cabeça negando e abre os seus olhos.
— Eu estou bem.
— Você não parece bem.
Ele fecha a porta e me encara com deboche.
— Estou tão ruim assim?
Assinto, ele ri e olha em frente.
— Vou melhorar.
Ele volta a ligar o carro, a música ecoa novamente pelo carro e ele
dirige na direção da sua casa.
— Porque seu pai está tão preocupado?
É claro que ele está curioso!
— Apenas preocupação de pai.
Minto. Eu minto tanto que as mentiras saem de mim como se
fossem verdades. Talvez aquele filósofo esteja certo e eu esteja no estágio
que conto tantas mentiras que elas se tornam reais.
— Existe algum outro motivo?
Aaron segue desconfiado, eu continuo o encarando para que ele
acredite em minhas palavras.
— Não, ele sempre foi um pai preocupado. — Sorrio e faço um
gesto de desdém com a mão. — É do tipo protetor demais.
Ele assente e aproveito para mudar de assunto.
— Quando vamos precisar fingir para sua avó?
Aaron demora alguns segundos para me responder.
— No próximo fim de semana.
Não entendo exatamente de que dia ele está falando.
— De que dia você está falando exatamente? Sábado ou domingo?
Espero que seja domingo, porque talvez sábado esteja de ressaca.
— Os dois dias, nós iremos ficar o fim de semana inteiro com meus
avós.
Encaro-o incrédula.
— Você quer fingir por um fim de semana inteiro?
Assente.
— Vamos sexta à noite e voltamos domingo de tarde, um pouco
antes do anoitecer.
Analiso Aaron e tento encontrar algo que indique que ele está
brincando, talvez ele só esteja querendo me assustar, porém não existe
nenhum sinal, ele está falando sério.
— Meu Deus, é muito tempo!
Ele ri, como se existisse algo engraçado na situação.
— Não é você que é a rainha da mentira?
Faço uma careta.
— Isso não é um bom elogio.
Dá de ombros.
— Não estou fazendo um elogio.
Sei que sou boa mentindo, entretanto, ouvir dessa forma não é algo
agradável.
— Por que temos que fingir por um fim de semana inteiro?
— Porque é o aniversário da minha avó, em comemoração, toda a
família irá se reunir por um final de semana inteiro.
A cada segundo a situação parece ficar pior.
— Você está querendo dizer que toda sua família estará presente?
— Sim.
Mordo meu lábio inferior e milhões de problemas ecoam em minha
mente.
— Como vamos fingir se você é péssimo mentindo?
Ele suspira, encaro-o e ele está apertando a direção com força.
— Sei que será terrível, mas minha avó ficará feliz se eu levar
alguém.
Há carinho em sua voz.
— Por que é tão importante fazê-la feliz?
A resposta parece óbvia, mesmo assim quero ouvi-la.
— Meus avós são tudo para mim e faria qualquer coisa para vê-los
felizes.
— Até mesmo fingir um namoro.
— Até mesmo fingir um namoro.
Ele repete as minhas palavras com tanta convicção que eu o admiro.
Ele está fazendo isso por amor, totalmente diferente dos meus motivos.
— O que eu preciso fazer para conquistá-los?
Não posso voltar atrás, porém, mesmo se pudesse não faria.
— Meus avós não são pessoas difíceis, você só precisa ser... — Ele
faz uma pausa como se estivesse procurando a palavra certa. —
Espontânea, acho que essa é a palavra.
Faz uma careta e sorrio irônica.
— Ótimo, você me ajudou muito.
— Estou falando sério, eles são gentis, amorosos e simpáticos com
todos, apenas não os bajule.
— Ok, anotado e quantas pessoas estarão lá?
Ele demora alguns segundos para me responder, o que só pode
significar que não irei gostar da sua resposta.
— Meus tios, tias, primos e meus avós. — Faz uma pausa. — Cerca
de quinze pessoas.
Arregalo meus olhos.
— E vamos fingir para todos?
Um leve surto acontece em minha mente.
— Sim, não há como eu fingir apenas para meus avós.
Apoio minha cabeça contra o banco e encaro o teto.
— Aaron, vamos passar um fim de semana com sua família. —
Mordo meu lábio inferior. — Você se deu conta de que teremos que fingir
que nos conhecemos muito bem? Além disso, precisaremos nos tocar e nos
beijar.
— O quê?
Sorrio debochada.
— Casais se beijam e se tocam.
— Mas não na frente das pessoas.
Reviro os olhos.
— Beijos de língua talvez não, mas selinhos e trocas de carinho
sempre rolam em algum momento.
Imagens da boca de Aaron sobre a minha ecoam em minha mente, e
não é uma péssima ideia, inclusive, eu fico mais animada do que deveria.
Mentalizo que será apenas encenação.
— Daremos um jeito de evitar.
— E toda sua família ficará sabendo que somos uma farsa.
Volto a olhar para o lado, Aaron está concentrado na rua e há uma
ruga entre sua testa.
— Podemos não pensar nisso por agora? — Resmunga. — Nós
temos seis dias até sexta-feira.
Dou de ombros e sorrio.
— Evitar o problema não o faz desaparecer.
Ele faz uma careta.
— Mas a preocupação antecipada também não o resolve.
— Quanto antes resolvermos essa questão, melhor.
Aaron para em um sinal e me encara por alguns segundos, como se
eu fosse uma maluca. Claramente nós discordamos nesse assunto.
— Você pode resolver sozinha e na sua mente, eu vou esperar até
sexta-feira.
Ele frisa a última frase e volta a olhar em frente, eu cruzo meus
braços sobre meu peito e ergo minhas sobrancelhas.
— Nós podemos fazer um teste.
Provoco-o, embora a ideia seja tentadora.
— Um teste.
— Um teste?
Sorrio.
— Um beijo de teste para ter certeza de que pode fazer isso na
frente da sua família.
Meu coração acelera como se eu fosse uma adolescente ao pensar
em beijar Aaron. Seu rosto ganha um tom de vermelho, mas um sorriso
debochado surge em seu rosto.
— Você ficou curiosa, não é?
Ele com certeza está se referindo a noite passada. E eu lembro das
imagens dele com a garota.
— Você parecia saber o que estava fazendo.
Minha vontade é me inclinar em sua direção e tocá-lo, mas me
contenho.
— Eu sabia o que estava fazendo, eu sempre sei...
Ele soa tão convencido.
— Você está se gabando, como todos os malditos garotos fazem. —
Suspiro falsa e exageradamente. — Achei que você fosse diferente dos
outros.
— A diferença, diabinha, é que eu não faço isso diante de todos,
meu ego não é assim tão frágil.
Faço uma careta.
— Por que machos são assim?
Ele me encara confuso.
— Assim?
— Assim, egocêntricos, vocês agem como se fossem reis e donos do
mundo, os mais incríveis do planeta.
Reviro meus olhos e ele apenas ri. Aaron não está mais
envergonhado e nem mais tenso pela mentira.
— Falar sobre suas vantagens como garanhão até dissipou a sua
fobia por mentira.
Debocho e o sorriso some do seu rosto.
— Eu não tenho fobia por mentira, apenas não gosto de mentir.
Eu sorrio como se tivesse acabado de ganhar a partida de algum
jogo. Nenhum de nós fala mais nada e me viro para a janela ao meu lado,
encaro a rua e de repente uma pergunta de Aaron me surpreende.
— Por que você estava dirigindo em uma estrada desativada?
Ele já me fez essa pergunta e ele sabe que não contei toda a verdade,
ele está tentando descobrir a verdade, mas ao contrário de Aaron, eu não
tenho problema em mentir, só que dessa vez eu não quero, não totalmente.
— Eu precisava pensar.
Continuo encarando a rua pela janela.
— Em uma estrada desativada?
Dou de ombros.
— Eu não tinha outro lugar para ir.
Aaron não volta a fazer mais perguntas e ficamos em silêncio, não é
algo desagradável, nem estranho, é só.... silencioso, como se estivéssemos
compartilhando algo mesmo em meio ao silêncio.
Aaron para seu carro atrás do meu, eu olho para ele e sorrio.
— Obrigada. — Ele apenas assente. — E talvez precise de você
para outros encontros.
Ele ergue suas sobrancelhas.
— Meu pai pretende ficar um mês na cidade.
— Um mês?
Assinto e ele passa a mão pelo seu cabelo.
— Espero que eu não vomite da próxima vez.
Um sorriso surge em seu rosto e sorrio também.
— Eu vou torcer para que não aconteça de novo, não é uma cena
muito legal de presenciar.
— Você não achou sexy?
Ele brinca e balanço minha cabeça.
— Foi um pouquinho demais.
— Poxa, eu tinha acreditado quando me disseram que eu sou bonito
de qualquer forma.
Segue debochado e me dou conta de que deixar a situação mais leve
faz parte de quem é Aaron, nem sei se é proposital e se ele sabe disso, mas
Aaron sempre deixa o clima menos pesado.
— Essas garotas só estão te iludindo, principezinho.
Nós dois seguimos rindo, eu apoio minha cabeça no banco e aos
poucos nossas risadas cessam, enquanto isso seguimos com o olhar um no
outro.
— Eu vou indo.
Ele assente.
— Tchau, diabinha. — Pisca em minha direção e dessa vez, sou eu a
corar. — E se precisar de mim, ligue.
Franzo minha testa e levo minha mão até o bolso da minha calça.
— Eu não tenho seu número.
Pego meu celular.
— Isso não é um problema.
Aaron me passa seu número, eu o salvo com o apelido dele. Abro a
porta e sorrio.
— Tchau, principezinho, obrigada por ter sido meu namorado falso.
Ele apenas ri e deixo sua picape. Conforme caminho até o meu
veículo, sinto alguém me observando, o que faz com que o sorriso em meu
rosto se amplie. Chego em meu carro, abro a porta e assumo o lugar atrás
do volante, dirigindo para casa.
Os últimos acontecimentos ecoam em minha mente e, Deus, eu
nunca imaginei fingir estar namorando para o meu pai, porém, foi a única
solução que encontrei, porque ele pediu para levar meu namorado junto, se
contasse a verdade ele ficaria ainda mais preocupado.
Não gosto de ter ameaçado Aaron, mas ele era a minha única opção,
pois não conheço nenhuma outra pessoa que toparia ser um namorado de
mentirinha, além do mais, era ele que estava comigo na segunda-feira.
E agora terei uma semana para me preparar para fingir ser sua
namorada durante um fim de semana inteiro e para toda a sua família.
Eu vou para casa e assim que entro no apartamento, me deparo com
minhas amigas. Fecho a porta e as três me encaram com curiosidade.
— O que está acontecendo?
Deixo minhas mãos em minha cintura e fico parada.
— Por que você estava saindo com Aaron do quarto dele?
Ava me pergunta e é claro que ela já contou para nossas amigas que
me encontrou saindo do quarto do jogador.
— Você já perdeu nossa aposta?
Não sei definir se Meg está animada ou decepcionada.
— Vamos tomar um café e conto o que está acontecendo.
Suspiro e no mesmo instante elas ficam em pé. Deixamos nosso
apartamento, vamos até a nossa cafeteria preferida, Corner Park, que fica na
esquina.
Enquanto caminhamos pela rua, elas tentam descobrir o que está
acontecendo, mas apenas balanço a cabeça.
— Só falarei quando chegarmos.
Elas bufam irritadas e vamos conversando sobre as fofocas da festa.
Nós chegamos na cafeteria, entramos e o sininho toca. Esse é o lugar que
mais passamos tempo depois do nosso apartamento. Um café com um estilo
clássico que se mistura ao moderno, com fotos espalhadas pelo local.
Nós ocupamos nosso lugar habitual, dois sofás que ficam um de
frente para o outro com uma mesa entre nós. Cumprimentamos a
funcionária e fazemos os mesmos pedidos de sempre, então minhas amigas
me encaram, eu sorrio e sussurro para que apenas elas escutem.
— Aaron e eu estamos namorando.
— O quê?
Elas gritam e minha gargalhada ecoa pelo lugar. A expressão no
rosto das três é impagável. Meu Deus!
— Você está falando sério?
Meg pergunta, ela é a mais surpresa.
— Desde quando?
Penny soa incrédula.
— Pare de rir e nos explique que história de namoro é essa.
Ava está impaciente. Eu me controlo, mordo meu lábio inferior e
conto a verdade para minhas amigas.
— Eu menti para meu pai que estou namorando e Aaron irá fingir
ser meu namorado.
Um certo jogador de hóquei foi visto babando por uma das nossas
patinadoras, será um novo casal? (lembrando que os dois foram presos
recentemente e vistos juntos mais de uma vez)
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron
O treinador grita para Alex, eu o escuto e me posiciono na frente do
meu amigo, não vou deixá-lo chegar até a baliza e marcar o ponto. Nesse
momento, somos adversários.
Eu sorrio através do protetor bucal e o vejo erguer as sobrancelhas
atrás do seu capacete.
Ele tenta avançar, mas eu não permito, brigamos pelo puck e eu
venço, consigo avançar, olho para o lado e encontro Paul, passo para ele,
que ganha velocidade e empurra o puck para a baliza.
Nós marcamos, ele volta e comemoramos, olhamos para Alex que
ergue seu dedo do meio em nossa direção. Paul e eu rimos e fazemos gestos
de comemoração. O apito do treinador ecoa e olhamos para ele que está ao
lado da pista com o auxiliar técnico do time.
— Fim de treino. — Deslizamos em sua direção. — Boa, Aaron, e
Alex, mais atenção, trabalharemos mais nela na quarta-feira.
Meus amigos apenas assentem e seguimos para o vestiário com o
restante do time. Tomo um banho rápido, visto minha roupa e me despeço
dos meus colegas.
Minha mochila está em meu ombro e tenho o meu taco na mão,
guardado em sua capa de proteção. Estou passando pela pista de patinação
quando algo me chama atenção, na verdade, é alguém, eu a reconheço no
instante em que meus olhos recaem sobre ela.
Liv está sobre seus patins deslizando pelo gelo, eu paro e sigo a
acompanhando, seus movimentos são leves como se estivesse flutuando, sei
apenas o básico de patinação, nunca fui um grande fã do esporte, mas vê-la
é incrível. Ela gira, salta e seus pés executam passos que eu nunca
conseguiria executar.
Ela olha em minha direção e me reconhece, então ela desliza até
mim e me aproximo do vidro que separa a pista de patinação do restante da
arena.
— Hey, principezinho.
Sua voz soa divertida, porque claramente está usando o apelido
como deboche. Eu somente sorrio e balanço minha cabeça, não há mais um
constrangimento por ouvi-la me chamar assim.
— Hey, diabinha.
Um brilho surge em seus olhos e mantemos o olhar um no outro.
— Você estava treinando? — Assinto. — E marcou muitos gols?
— Não, porque meu objetivo é impedir que o time adversário
marque gols e não marcar.
Franze sua testa.
— Você é o goleiro?
Sorrio e balanço minha cabeça, negando.
— Eu sou um defensor, trabalho para que o goleiro não tenha que
trabalhar e para repassar a bola para o meu time. — Liv assente, mas não
parece estar conseguindo visualizar o movimento. — Você não entendeu?
Faz uma careta.
— Eu confesso que não sei muito sobre hóquei.
Trago minha mão até meu coração.
— Isso é um absurdo.
Nós dois rimos e ignoramos tudo que há ao nosso redor, é como se
estivéssemos apenas nós dois.
— Você sabe algo sobre patinação?
Ergue suas sobrancelhas e me desafia. Eu me inclino para a frente,
deixo meu taco apoiado ao lado e me apoio no guarda-corpo que me separa
da pista de patinação.
— Apenas o básico.
— Ótimo estamos quites.
Sorri vitoriosa.
— Você leva tudo como se fosse uma competição?
Dá de ombros e um passo para trás.
— Talvez. — Morde seu lábio inferior por alguns segundos. —
Acho que sempre fui competitiva.
Faz uma careta fofa e meu sorriso se amplia. Meu olhar desce pelo
seu corpo e meu sorriso se transforma em uma linha fina, Liv está vestindo
roupas coladas ao seu corpo, que deixam suas curvas em evidência.
— Você leu minhas últimas mensagens?
Volto a olhar para o seu rosto e agora ela me encara com um certo
receio.
— Não, na verdade, a última vez que peguei meu celular foi antes
do treino começar.
Ela hesita e a encaro apreensivo. Por que ela está hesitando? Algo
aconteceu? Ela está prestes a me dizer que não irá comigo para Concord?
Irá desfazer nosso trato?
— Meu pai quer você e eu no novo apartamento dele para o jantar.
Volta a morder seu lábio inferior.
— Eu jurei que você estava prestes a romper com nosso acordo.
Uma ruga surge entre suas sobrancelhas.
— Acabar com nosso namoro falso? — sussurra e faço um gesto
de afirmação com a cabeça. — Por que eu faria isso?
Dou de ombros.
— Não sei, mas você poderia ter simplesmente percebido que é
uma péssima ideia.
Ela aponta seu dedo em minha direção.
— Eu sempre soube que é uma péssima ideia, mas não há uma
outra alternativa. — Não sei se ela realmente não tinha uma outra opção,
mas não quero discutir sobre isso. Eu fico em silêncio e ela prossegue. — E
eu não vou desistir, não precisa se preocupar, eu vou passar o fim de
semana com a sua família.
— Ok. — Afasto-me do guarda-corpo. — Que horas vamos até o
apartamento do seu pai?
— Pode ser às sete e meia, e me busque em casa para chegarmos
juntos, vou enviar meu endereço por mensagem.
— Ok, mandona.
Ela revira seus olhos, pego meu taco e dou um passo para trás.
— Até à noite, diabinha.
Ela acena em minha direção, eu a encaro uma última vez e me viro.
Sigo para o estacionamento, guardo minhas coisas na parte traseira e
assumo meu lugar atrás da direção.
Não quero pensar sobre o jantar de mais tarde, então conecto o
celular no multimídia do carro e ligo para minha avó. Ela me atende no
segundo toque.
— Olá, querido.
Sua voz parece normal e isso me deixa aliviado.
— Olá, vó, como você está?
— Bem e você?
Ela nunca me falaria se estivesse mal, só descobri seu câncer porque
não poderia esconder.
— Bem. Nenhuma dor ou desconforto? A próxima sessão de
quimioterapia é amanhã?
Não escondo a minha preocupação e nem conseguiria. Por que eu
preciso ser um péssimo mentiroso?
— Nenhum desconforto, eu me sinto ótima, Aaron. — Droga, eu
não consigo dizer se está ou não falando a verdade. — Você virá para o meu
aniversário, não é?
Ela muda de assunto para que eu não faça mais nenhuma pergunta.
— Eu vou e, vó...
Faço uma pausa, meu coração acelera e penso em desistir.
— O que, Aaron?
Pergunta impaciente, eu respiro fundo e crio coragem. Não posso
desistir, não quando só estou mentindo para vê-la feliz.
— Eu irei levar alguém.
— O quê? Alguém tipo um amigo, ou alguém tipo uma garota?
Seu tom de voz denuncia que agora está empolgada e animada.
Droga! A partir de agora não posso mais voltar atrás.
— Tipo uma garota.
Resmungo entredentes e escuto o som da risada de Eileen.
— Ela é sua namorada?
Apenas pelo seu tom de voz sei que ela está feliz, tudo indica que
está radiante e a mentira até fica mais fácil, afinal, é isso que eu queria.
— Faz um tempo que estamos nos vendo e está ficando sério, talvez
eu peça para ela ser minha namorada.
Deixo que as palavras saiam da minha boca baseadas nos
pensamentos que ecoam em minha mente. É a primeira coisa em que
consigo pensar.
— Por que você não nos contou sobre ela antes?
Soa desconfiada, meu coração acelera e sinto minhas mãos suando.
— Eu queria ter certeza sobre meus sentimentos, porque não queria
falar sobre ela e correr o risco de vocês ficarem animados, repletos de
esperanças, e se não fosse para a frente, vocês acabariam arrasados.
Imito a resposta que Liv deu para o pai. Minha avó fica em silêncio
por alguns segundos, minha angústia aumenta e rezo para que acredite em
mim.
— Eu vou avisar seu avô que irá trazer alguém.
Ela segue animada e respiro aliviado.
— Vocês irão adorar Liv.
Essa é a parte fácil de ser dita, porque não é uma mentira.
— Liv? Esse é o nome dela?
— Olívia, Liv é o apelido.
O rosto de Liv ecoa em minha mente, e ela é linda até mesmo em
meus pensamentos.
— Quantos anos ela tem?
Meus pensamentos são substituídos por pânico, porque minha avó
irá começar um interrogatório que não saberei responder.
— Vó, sexta-feira a senhora terá chance de fazer todas as perguntas
que tem em mente para Liv, ela irá adorar respondê-las.
Não sei se ela irá adorar, mas eu vou adorar não ter que respondê-
las.
— Existe um problema em me responder a idade da sua namorada?
— Claro que não. — É um milagre minha voz não falhar diante de
tantas mentiras. — Apenas sei que a senhora não irá parar somente em uma
pergunta.
Essa parte pelo menos é verdade.
— Ok, ok, traga sua namorada preparada para responder todas as
minhas perguntas.
— Ela estará preparada.
Não posso esquecer de avisar Liv para estar preparada e nós dois
teremos que estar alinhados sobre as mentiras que iremos contar. Eu
pergunto do meu avô e mudamos de assunto, vou conversando com a minha
avó o restante do caminho, então me despeço dela assim que paro o carro na
garagem, encerro a ligação e adentro a minha casa.
Sigo na direção da escada, mas paro ao me deparar com Alex, Paul e
Matteo na sala, eles estão jogando e mudo de ideia. Largo minhas coisas no
chão e vou até eles.
Alex e Paul estão com os controles, sentados um ao lado do outro no
sofá maior, eu me jogo ao lado de Matteo no sofá menor.
— Quem está ganhando?
— Alex.
Nós dois os assistimos jogar e ficamos dando palpites. É muito mais
fácil quando não somos nós com o controle. Em certo momento, Paul
desvia o olhar em minha direção rapidamente e me encara com curiosidade.
— O que está acontecendo entre você e a garota da patinação?
— Você está falando isso por que eles estavam aqui ontem? Por eles
terem saído juntos? Ou hoje aconteceu algo?
Matteo questiona, Paul sorri e volta a olhar para a televisão. Eu
passo a mão pelos fios do meu cabelo.
— Ele saiu do vestiário depois do treino e ficou a encarando patinar
como se ela fosse a última mulher do mundo.
É Alex a responder Matteo e é claro que o idiota distorce o que
realmente aconteceu.
— Você está exagerando, eu apenas estava a assistindo patinar.
— Desde quando vocês são amigos? Desde que Ava e eu estamos
namorando nunca vi vocês dois conversando.
Matteo pergunta e estreita seus olhos em minha direção como se
estivesse em busca de algo.
— Eu estou fingindo que sou seu namorado para o seu pai e ela
fingirá para minha família que estamos namorando.
Soo tranquilo, mas pela expressão no rosto de Matteo, ele não
parece tão tranquilo assim.
— Merda, Aaron.
Repreende-me ao mesmo tempo em que Alex e Paul soltam alguns
palavrões. Os três acreditam ser uma péssima ideia, e quando Giulia se
junta a nós, a namorada de Alex reforça o quanto é algo destinado ao
fracasso. E eles estão certos.
— Eu sei que é uma ideia horrível, mas não podemos mais voltar
atrás. — Dou de ombros e suspiro. — Portanto, assunto encerrado.
Eles ficam em silêncio, mas é óbvio pela expressão deles que todos
têm muitos pensamentos sobre o assunto. Seguimos jogando, Alex e Paul
saem e Matteo e eu somos os próximos.
Matteo e eu ficamos um bom tempo jogando e voltamos a revezar
com nossos amigos, então eu vou para cozinha e preparo uma tigela com
cereal e leite, deve me ajudar a não morrer de fome até o jantar. Eu volto
para a sala e continuo conversando e jogando com meus amigos.
Perto do horário que marquei com Liv, subo para o quarto e troco de
roupa. Enquanto coloco meu relógio e encaro meu reflexo no espelho, eu
começo a tremer. Caralho! Eu vou ter que mentir. Esse era um ótimo
momento para o fim do mundo acontecer.
O mundo não acaba e preciso deixar meu quarto. Desço as escadas,
meus amigos me desejam boa sorte e eu vou para a garagem.
Dirijo até o endereço que Liv me enviou por mensagem e seguro o
volante com força. Há um frio em minha barriga, uma sensação estranha
percorrendo meu corpo e meu coração bate acelerado.
Assim que paro em frente ao prédio, envio uma mensagem avisando
que cheguei. Apoio meus braços na direção e encosto minha testa em minha
pele. Que merda eu acho que estou fazendo?
Respiro algumas vezes e só levanto minha cabeça quando Liv bate
no vidro. Eu destravo as portas, ela entra e se senta ao meu lado; Liv está
usando uma touca branca com pompom, seu rosto está rosado e seus lábios
brilhando.
— Você está branco.
Sorrio irônico.
— Você também está adorável.
Provoco-a, mas é a verdade. Ela está adorável. Liv cruza os braços
logo abaixo dos seus seios e olha para a frente.
— Tente não surtar.
Eu assinto e continuo sorrindo.
— Qual é o endereço?
Ela me passa o endereço e volto a colocar o carro em movimento.
— Eu avisei minha avó que estarei levando alguém no fim de
semana. — Liv segue em silêncio. — Ela fará muitas perguntas e temos que
estar preparados.
— Eu posso responder todas as perguntas. — Liv não parece nem
um pouco preocupada. — Inventarei mentiras convincentes, não se
preocupe.
— Ok, eu inventei que não falei sobre você da última vez porque
não queria dar falsas esperanças caso não fôssemos para frente e, na teoria,
nós ainda não estamos namorando, eu estou cogitando pedir você em
namoro.
Ela ri.
— Cogitando?
Pergunta com deboche.
— Sim, eu ainda não sei se você merece ser a minha namorada.
Respondo com o mesmo deboche, paro em um sinal, olho para o
lado e ela tem um sorriso torto em seu rosto.
— O que eu tenho que fazer para te convencer a me pedir em
namoro?
Mais uma vez, o jogador de hóquei, a patinadora e o ex-jogador de
hóquei (que também é pai da nossa patinadora) foram vistos juntos. O que
será que está acontecendo? Façam suas apostas...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Olho para Aaron com deboche, ele para em um sinal e se vira para
mim.
— Ainda não sei. — Ele está tentando não rir e surgem rugas na
lateral do seu rosto. — Me surpreenda.
Não consigo me conter e uma gargalhada deixa meus lábios. Aaron
volta a olhar em frente e eu continuo rindo. Aos poucos minha risada
diminui até restar apenas uma curva em meus lábios.
— Você tem até sexta.
Franzo minha testa sem entender.
— Para que, exatamente?
— Para descobrir como me convencer a te pedir em namoro.
Meu sorriso volta a aumentar.
— Você é tão gentil me concedendo um prazo para me esforçar.
Há um sorriso em seu rosto.
— Um sou um verdadeiro cavalheiro.
Mordo meu lábio inferior para parar de rir.
— Na verdade, você é conhecido por ser um príncipe. — Zombo
com o apelido e ele até tenta parar de rir. — Um dia, eu vou descobrir o
porquê de você detestar ser chamado de principezinho.
Ele apenas fica em silêncio tentando parecer que segue chateado por
conta do apelido, mas é nítido que não está. Ele superou eu chamá-lo de
principezinho e mesmo não o deixando irritado, vou continuar chamando-o
assim, combina com Aaron.
Eu sigo encarando seu perfil e há quase um sorriso em seus lábios.
Eu gosto desse Aaron descontraído. Na verdade, acho que eu gosto do
Aaron. Seu cabelo está caindo em sua testa e ele passa a mão pelos fios a
fim de ajeitá-los. Como seria se fosse eu a fazer isso? Engulo em seco
diante das imagens que surgem em minha mente. Olho em frente e tento me
concentrar na rua, porém, as imagens seguem em meus pensamentos. Eu
sentada sobre seu colo, sorrindo enquanto passo meus dedos pelos fios do
seu cabelo.
Meu Deus, eu estou com calor!
— Liv.
Escuto sua voz como se soasse distante, empurro meus pensamentos
para longe e me viro para o lado.
— O quê?
Droga, eu estou ofegante.
— Eu falei com você, Liv.
— Desculpe, eu não escutei.
Sinto meu rosto quente e sei que minhas bochechas estão vermelhas.
— Existe algo que precisamos acertar antes de estarmos com seu
pai?
Eu tento pensar em algo e nada vem à minha mente. Minha mente
está vazia, droga, Aaron!
— Não.
— Ok.
Aaron dobra a rua e estamos diante do prédio mais luxuoso da
cidade, o único com dez andares, ele é todo sustentável e as sacadas
ocupam quase todo o perímetro ao seu redor.
— Seu pai gosta de ostentar.
Suspiro.
— Sim, ele gosta.
Dinheiro nunca foi um problema e desde que se aposentou e
assumiu a empresa da família, seu patrimônio triplicou, às vezes acho que
ele simplesmente não sabe o que fazer com tanto dinheiro.
Aaron estaciona e descemos da F150 raptor[1], eu o espero e
quando para ao meu lado, faço um sinal para minha mão, ele ergue suas
sobrancelhas e reviro meus olhos.
— Pegue minha mão.
Ele se aproxima e entrelaça meus dedos com os seus. Sua mão é
bem maior que a minha e isso faz com que Aaron me passe uma sensação
de segurança e conforto.
— Namorados andam de mãos dadas.
Falo a primeira coisa em que consigo pensar, simplesmente não
posso continuar em silêncio.
— Eu esqueço que estamos fingindo.
Aaron se justifica enquanto andamos na direção da entrada do
prédio.
— Pois trate de não esquecer.
Somos recepcionados por um porteiro, eu digo meu nome, mostro
meu documento e somos liberados. Seguimos até o elevador, entramos e eu
aperto o botão que tem gravado o número 10.
— O último?
Assinto.
— É claro que ele está na cobertura.
Soo debochada, a porta se fecha e me viro para Aaron, ele não está
rindo, está apoiado na parede do fundo do elevador, seu peito sobe e desce,
ele está respirando mais rápido, fecha seus olhos e suas mãos em punhos.
— Você tem medo?
Assente, leva a mão até a gola da sua camisa, como se isso fosse o
libertar da agonia.
— Você deveria ter avisado, poderíamos ter subido pela escada.
— Vai ficar... tudo... bem.
Sua voz falha e é perceptível que está agoniado. Olho ao redor à
procura de algo, não há nada. Encaro o painel que mostra os andares e mal
chegamos ao terceiro. Os segundos se prolongam e parece que estamos aqui
há uma eternidade.
Droga, o que eu faço?
Agindo no automático, dou passos em frente e me aproximo de
Aaron, olho para seu rosto e espalmo minhas mãos em seu peito.
— Aaron, eu estou aqui. — Subo minhas mãos e abaixo seus braços.
— Olhe para mim.
Ele hesita, mas por fim abre seus olhos, existe pavor em seu olhar.
Volto a espalmar minhas mãos em seu peito e sinto as batidas do seu
coração.
— Irá ficar tudo bem. — Ele não parece nem um pouco convencido.
— Eu nunca quis aprender sobre hóquei, porque boa parte da vida culpei o
esporte pela ausência do meu pai.
Eu conto algo para chamar sua atenção, confesso algo que nunca
confessei para ninguém.
— Ele era ausente?
Assinto e mantenho meu olhar no seu.
— Sim, ele sempre estava treinando ou viajando para jogar. — As
lembranças são dolorosas. — Ele perdeu datas importantes e depois de um
tempo, minha mãe cansou.
Apesar do tempo ter passado, da terapia e do meu esforço, ainda há
um pouco de mágoa.
— Foi por isso que eles se separaram?
— Sim, e eu o culpei por muito tempo.
As batidas do seu coração não estão mais tão rápidas, seus ombros
não estão mais tão tensos e o pavor sumiu dos seus olhos.
— Você ainda o culpa?
A pergunta ecoa em minha mente, a mentira está na ponta da minha
língua, mas não quero mentir. Não quando estamos apenas nós dois, não
quando tenho a chance de ser sincera. Uma parte minha se sente segura
com Aaron, porque ele é tão tranquilo, algo nele passa uma sensação de
conforto, é como se ele não fosse capaz de me julgar.
— Algumas vezes, sim, e não somente pela separação dos meus
pais.
É tão difícil assumir que uma parte minha ainda culpa meu pai, eu
não queria culpá-lo, mas ainda assim o faço. Eu esqueço de onde estamos,
do que estou fazendo e meus sentimentos assumem o controle.
— Por isso é tão difícil estar perto do seu pai?
— Também, e é difícil porque ele ainda está tentando compensar
pelo tempo ausente, das coisas que não percebeu e eu só queria ser capaz de
amá-lo sem nenhum ressentimento.
Aaron me encara como se estivesse desvendando a minha alma. Ele
ergue sua mão e toca meu pulso. Ele não diz nada e quando me puxa para
um abraço, simplesmente deixo que passe seus braços pelo meu corpo e o
abraço de volta.
Ele me segura como se fosse capaz de tirar o fardo das minhas
costas. Eu respiro fundo e por alguns segundos deixo que toda mágoa e
ressentimento que ainda habitam meu coração prevaleçam, permito-me
sentir tudo aquilo que escondo lá no fundo da minha alma.
O barulho das portas sendo abertas me despertam e me desvencilho
de Aaron, eu olho para ele e um sorriso envergonhado surge em meu rosto
enquanto ele segura minha mão e deixamos o elevador.
— Desculpe, eu deveria distraí-lo do seu medo.
Ele para, eu paro, Aaron sobe sua mão e acaricia o meu pulso.
— Você fez isso.
— Quem me confortou foi você.
— Não importa como, o que importa é que você me fez esquecer —
Seus olhos brilham. — Obrigado, Liv.
Abro a boca para respondê-lo, mas a voz do meu pai nos
interrompe.
— Hey, vocês dois.
Olhamos para o lado e encontramos meu pai parado na porta.
— Hey, pai.
— Hey, James.
Falamos ao mesmo tempo, então Aaron olha para mim, trocamos
um sorriso cúmplice e voltamos a olhar em frente.
— Entrem.
Meu pai fica de lado para que possamos cruzar pela porta, de mãos
dadas avançamos, passamos por ele e adentramos o apartamento. Paramos
em um hall de entrada com um lustre pendurado no teto e um aparador
apoiado na parede.
Meu pai fecha a porta, passa por nós e faz um sinal para o
seguirmos. Aaron e eu vamos logo atrás dele ainda de mãos dadas. Saímos
em uma sala enorme, com sofás brancos, televisão, lareira, lustres e uma
parede de vidro.
— Muito luxuoso.
Sussurro alto o suficiente para meu pai ouvir.
— Não gostou?
Ele soa apreensivo.
— Gostei, mas segue sendo luxuoso. — Explico-me. — É bonito.
Apesar de ser algo que gita caro, não é brega, é na medida.
Seguimos meu pai que nos leva até a cozinha. É tão enorme quanto a sala,
os balcões são brancos, os eletrodomésticos são em inox, há uma ilha no
meio do espaço, com vinho e aperitivos sobre ela.
— Eu vou preparar algo para comermos enquanto conversamos.
Nós dois assentimos, eu solto minha mão da de Aaron, sento-me no
banco de frente para a ilha e ele se senta ao meu lado, meu pai continua em
pé, se movimentando pela cozinha.
— Você alugou esse lugar por quantos dias?
Tenho esperança de que ele diga que ficará apenas por alguns dias.
— Eu comprei esse apartamento.
Arregalo meus olhos e o encaro totalmente em choque.
— Pai, por que você comprou mais um apartamento em Hanover?
Por que ele precisa de dois apartamentos nessa cidade?
— Eu quero estar perto de você.
Suspiro.
— Pai, eu nem sei para onde eu vou após a faculdade.
Ele apoia as mãos na ilha e me encara.
— Eu sei, mas falta mais de dois anos e preciso de um lugar para
ficar quando vier visitar minha filha.
Eu quero dizer que não preciso dele aqui, mas mordo meu lábio
inferior, com certeza seria algo que iria magoá-lo.
— Dessa vez ficará um mês mesmo? — Ele assente. — E a
empresa?
Dá de ombros.
— Ela está em boas mãos, além disso, consigo trabalhar
perfeitamente daqui.
Uma parte minha fica feliz por ele estar largando tudo para estar
comigo, a outra fica em alerta, ele está aqui e está cuidando dos meus
passos. Ele irá controlar tudo que eu fizer.
Estou levemente em pânico, entretanto, finjo estar normal, meu pai
não nota nada de diferente, porque vira-se ficando de costas para mim, mas
não sou uma atriz muito boa, porque Aaron estende sua mão e entrelaça
meus dedos com os seus, ele os aperta e me conforta.
É um toque, um gesto simples, porém, realmente me tranquiliza.
Meu pai inicia o preparo do jantar, eu olho para o lado e sorrio para
Aaron, agradecida, ele dá de ombros, dizendo que não é nada de mais, mas
para mim é.
— Por que seu treinador não sabe que está namorando?
Nós dois demoramos alguns segundos para processar o que meu pai
está falando, então, quando entendemos, Aaron arregala seus olhos e eu
engulo em seco. Como esqueci que meu pai tem contato com o time de
hóquei por ser um dos patrocinadores? Aliás, ele tem contato com a
coordenação da equipe de patinação pelo mesmo motivo.
Não podemos nos desesperar. Respiro fundo, forço um sorriso e
aperto a mão de Aaron, ele tenta desfazer sua expressão de pânico e até que
consegue, pelo menos será o suficiente para meu pai acreditar em nós dois.
Eu me viro para meu pai e o encaro.
— Nós estávamos esperando um tempo, não queríamos ser
precipitados.
Uso a mesma desculpa que usei com ele e Aaron usou com seus
avós.
— Não se preocupe, James, ele ficará sabendo. — O que Aaron está
fazendo? Olho para ele e vejo que está se esforçando para mentir, chega a
ter uma veia saltada em seu pescoço. — Eu não estou brincando com a sua
filha.
Esse é o medo do meu pai? Como Aaron percebeu que é esse seu
medo?
— Eu espero que não, Aaron.
Meu pai soa ameaçador. Nós três ficamos em silêncio e nos
encaramos por alguns segundos. E, nesse momento, por algum motivo
inexplicável, a mentira me sufoca.
James Callahan volta a ficar de costas e se concentra em preparar o
jantar. Eu sorrio para Aaron, porque ele se saiu muito bem mentindo e ele
sorri de volta. Nós dois nos entendemos.
Desvencilhamos nossas mãos, eu pergunto se meu pai quer ajuda,
ele nega e apenas pede que sirva o vinho nas taças, então ficamos bebendo e
comendo os aperitivos, mantemos a conversa em assuntos leves e cordiais.
Meu pai fala sobre a empresa de cosméticos da minha família, Aaron fala
um pouco sobre a empresa da sua família, falamos sobre hóquei e sobre
patinação.
Preciso me controlar para não surtar quando meu pai avisa que irá
assistir a minha apresentação no campeonato, Aaron diz que também estará
lá, mais uma vez, eu preciso forçar um sorriso.
Fico tensa o restante do jantar, mas finjo estar bem. É um alívio
quando chega ao fim e nos despedimos do meu pai. Deixamos seu
apartamento e Aaron me guia com as mãos nas minhas costas, além de tudo
seu toque me desestabiliza, está frio e mesmo assim estou suando.
— Vamos pela escada.
Sussurro assim que cruzamos a porta. Eu vou na frente e Aaron
afasta a mão das minhas costas, é um alívio e ao mesmo tempo sinto como
se tivesse perdido algo. Que bagunça!
Respiro fundo, busco meu controle e desço o primeiro degrau. Posso
escutar seus passos e o sentir logo atrás de mim.
— Como vamos fazer para contar para o treinador que estamos
namorando?
Eu mordo meu lábio inferior, porque a resposta para a pergunta de
Aaron não é muito agradável. Ele com certeza irá odiar.
— Só há uma maneira, Aaron. — Paro, olho para trás e ele ergue
suas sobrancelhas. — Nós teremos que fingir para a faculdade inteira que
estamos namorando.

[1] Marca de carro


E eles se assumiram... Nosso principezinho do hóquei e nossa
encrenqueira da patinação estão juntos!!! Felicidades ao novo casal...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron

Sabe quando as pessoas dizem que uma mentira leva a outra e tudo
se torna uma bola de neve? Elas estão certas. Primeiro mentimos para um
policial, depois para um delegado, em seguida para James Callahan, o pai
de Liv, e agora vamos mentir para o time inteiro de hóquei.
Desde segunda, após o jantar com seu pai, Liv e eu estamos
planejando a melhor maneira de nos tornarmos públicos, de espalhar pelo
campus que estamos namorando, no entanto, só há um jeito: troca de afeto
na frente de todos.
É uma péssima ideia e ainda mais horrorosa, porque o primeiro alvo
é o time de hóquei.
É quarta-feira, dia do meu treino e estou nervoso, pois Liv virá
assistir da arquibancada e assim que acabar, irá descer até a pista de
patinação e iremos nos abraçar.
Meu corpo está coçando, eu estou suando frio e é como se existisse
uma população inteira de borboletas em minha barriga.
Eu chego no vestiário, encontro meus colegas e troco rápidas
palavras com eles. Não consigo manter uma conversa e a cada segundo eu
fico mais ansioso. Deus, como eu me meti em uma confusão assim?
Coloco meu uniforme, patins com os protetores de lâmina, pego
meu taco, capacete e deixo o vestiário. Meu coração está acelerado e a cada
passo que dou me sinto mais angustiado. E se eu desistir?
Não há como desistir e, lá no fundo, eu nem quero.
Eu me aproximo da pista de gelo, olho para trás, encaro a
arquibancada e procuro por ela. Liv ainda não chegou, não sei se me sinto
aliviado ou entro ainda mais em pânico.
Olho em frente, tiro o protetor dos patins, deixo sobre o guarda-
corpo e entro na pista. Deslizo pelo gelo e tento me concentrar no que mais
amo fazer; jogar sempre foi a distração perfeita, é como se o taco fosse uma
extensão de mim, sei jogar de olhos fechados, e espero que hoje jogar seja
minha salvação.
Meus colegas de time, o treinador e a equipe técnica se aproximam.
Os comandos são dados, o treino se inicia e foco em fazer o meu melhor, na
verdade, eu tento fazer meu melhor e falho. Eu falho! E eu nunca falho, não
no hóquei.
— Porra, Aaron!
Escuto o treinador gritar e meu peito aperta. Caralho! Eu só preciso
me concentrar, essa merda não deve ser tão difícil. Mas é difícil e tudo se
intensifica quando olho para o lado e me deparo com Liv na arquibancada.
Ela sorri e acena em minha direção, meu corpo inteiro treme e me obrigo a
erguer meu braço e acenar de volta.
Tenho certeza de que pareço um maldito idiota.
Respiro fundo e desvio o olhar de Liv. Continuo jogando como se
tivesse duas pernas esquerdas, o treinador segue gritando comigo, meus
companheiros de time me encaram como se um terceiro olho tivesse
surgido em minha testa.
Eu estou suando e tudo que ecoa em minha mente é o fato de que
Liv e eu vamos fingir para toda a faculdade que estamos namorando.
O apito do treinador soa e encerra o treino de hoje, para meu alívio.
Eu interrompo minha corrida, apoio o taco ao meu lado, tiro meu capacete e
o protetor bucal. Há suor escorrendo pela minha testa e suspiro. Nunca fui
tão horrível no gelo e nunca cansei tanto.
— Treino encerrado e espero, Aaron, que você esteja em um mau
dia, se esse seu desempenho se repetir, você estará no banco no próximo
jogo.
O treinador aponta o dedo em minha direção e me ameaça, sei que
ele é capaz de cumprir sua promessa, mas também sei que meu péssimo
desempenho não irá se repetir.
— Não irá se repetir.
— Eu estou contando com isso.
Ele sequer acena em minha direção, simplesmente vira-se, ficando
de costas e se afasta. Eu respiro fundo e olho para o lado, Liv não está mais
na arquibancada, olho ao redor com meu coração acelerado e me deparo
com ela na entrada da pista de patinação, ela está com seus patins e me
encara.
Seu olhar é determinado e prendo minha respiração. O momento da
nossa fraude se aproxima e meu coração acelera. É agora! Eu preciso me
movimentar e agir, mas é como se meus pés estivessem presos no gelo.
Eu não posso surtar, repito a mim mesmo.
Solto minha respiração, forço um sorriso e deslizo até o guarda-
corpo, deixo minhas coisas apoiados no vidro e patino na direção de Liv.
Ela me disse pelas mensagens que trocamos que deveria olhar para ela
como se estivesse apaixonado, mas, merda, eu nem sei como é esse maldito
olhar, e sou péssimo em atuação.
Os segundos se arrastam, é uma maldita eternidade e eu me sinto
sufocado, uma pressão em meu peito, talvez eu esteja prestes a infartar. Liv
pisa no gelo e vem em minha direção.
Ela continua sorrindo, seus olhos estão brilhando, mas, lá no fundo,
há uma sombra, um sinal que indica que também está nervosa. Ela não é tão
imune quanto aparenta.
Ela e eu nos encontramos no meio da pista, paramos um de frente
para o outro e por alguns segundos, não sabemos como agir, até que Liv se
aproxima o máximo possível e eu levo minhas mãos até sua cintura.
Apesar de estar tremendo, é fácil ter minhas mãos em seu corpo.
Nada em mim a repele e pela forma como me encara, meu toque não a
incomoda. Ela está usando um suéter e mesmo assim, sinto o calor
emanando do seu corpo.
— Boatos que você jogou muito mal hoje.
Ela sorri provocativa.
— Eu estava nervoso.
Morde seu lábio inferior e preciso me conter para não erguer minha
mão e o soltar.
— Nervoso com a minha presença, principezinho?
Não sei se é sua intenção, mas ela me encara com uma expressão tão
sexy que me faz esquecer que merda estamos fazendo aqui, minha vontade
é acabar com a maldita distância entre nós dois.
Nossas respirações se misturam, o barulho ao nosso redor se torna
um simples zumbido e me perco nos seus olhos.
— Nervoso com a nossa mentira, diabinha.
Minha voz é rouca e ela segue me encarando, nenhum de nós dois
desvia o olhar. E, caralho, é como se o ar estivesse mais escasso ao nosso
redor.
— Só precisamos fingir, Aaron.
Meu nome saindo dos seus lábios parece uma maldita canção. É
como se ela fosse uma sereia e eu estivesse caindo em seu encanto. Liv
espalma as mãos em meu peito, sigo parado, sem mexer nenhum músculo,
porque simplesmente não consigo.
TUDO. É. DEMAIS!
— Me beije, Aaron, e prove para todos que estamos namorando.
Suas palavras contêm muito mais informações que as fornecidas. É
beije-a e conclua a farsa, beije-a e continue a mentira, beije-a, porque
vocês têm um acordo.
Beijá-la faz parte de uma mentira.
Mas quando subo minha mão pelas suas costas e levo meus dedos
até sua nuca, quando curvo minha cabeça, quando meus lábios se
aproximam dos seus... eu não estou mentindo.
Ela ofega, seus olhos seguem presos aos meus e nesse momento a
farsa não importa. Tudo que importa é provar dos seus lábios, é sentir o seu
gosto.
Enrolo minha mão nos fios do seu cabelo, meu nariz toca o seu e
meu olhar perfura o seu.
— É isso que você quer, diabinha?
— Me beije, principezinho.
Puxo seu cabelo para trás, ela fecha seus olhos, eu fecho os meus e
minha boca cobre a sua.
O primeiro contato é um simples encostar, mas é o suficiente para
uma dose de energia se espalhar pelo meu corpo, percorrendo cada região
de mim, conquistando espaços e exigindo mais.
Sigo com meus dedos ao redor dos fios do seu cabelo, mantendo-a
da maneira que eu quero, ditando o ritmo e minha língua toca seus lábios
pedindo espaço, Liv não hesita e se abre para mim.
Não faz parte da mentira, não estou atuando, minha língua explora
sua boca, seu gosto explode em mim e possuo seus lábios como se eles
fossem meus, como se ela fosse minha.
A mão que está em sua cintura aperta sua pele, suas mãos seguram
com força a minha camiseta. Ondas de desejo flutuam pelo meu corpo,
fazendo-me esquecer de onde estamos, de quem somos, de nossos
objetivos.
Nada importa.
Sugo seus lábios, mordo-os e Liv suspira. Seus sons são como
álcool, como um combustível para o meu descontrole. Beijo o canto da sua
boca, ela sobe suas mãos até minha nuca e puxa os fios do meu cabelo, não
preciso de mais sinais e volto a cobrir seus lábios com os meus.
É como se estivéssemos famintos, como se fôssemos as peças de um
quebra-cabeça prestes a se unir.
A voz da razão soa lá no fundo da minha mente e me recordo de que
não estamos sozinhos. É extremamente doloroso quando me obrigo a
afastar minha boca da sua.
Eu estou ofegante, meus lábios dormentes e é como se um incêndio
estivesse acontecendo dentro de mim, e só Liv fosse capaz de apagá-lo.
Abro meus olhos e encontro os seus. Eles estão escuros e tomados por
luxúria, sua respiração está tão alterada quanto a minha.
Desço minha mão até sua cintura e ela se segura em meus ombros.
Simplesmente nos encaramos, sem reação, buscando o controle que
acabamos de perder, procurando a razão que nos abandonou no momento
em que nossos lábios se encontraram.
Os segundos passam, os barulhos voltam a nos perturbar, vozes
chegam até nós e o encanto vai se dissipando.
Nós tínhamos um motivo para esse beijo acontecer, ele tinha um
propósito. Dou um passo para trás e minhas mãos deixam seu corpo. É
como receber uma rajada de um vento frio.
— Acho que agora todos sabem sobre nós dois, principezinho.
Ela ri, mas é um sorriso que não chega até seus olhos.
— Com certeza.
Suas mãos descem, assim como as minhas e param ao lado do seu
corpo, nenhum de nós dois sabe como agir. Não depois do que
compartilhamos.
— Eu preciso trocar de roupa.
Faço um sinal para a saída.
— Eu vou ficar aqui e treinar um pouco.
Assinto e, por alguns segundos, encaro-a sem saber qual a melhor
forma de me despedir dela, porém, só há uma forma que dois namorados
agiriam.
Deslizo em sua direção, seguro seu pulso, ela me encara sem
entender, eu sorrio e pisco para ela.
— Depois de um beijo desses, um casal não se despediria com um
simples aceno, não é?
Aproximo meus lábios dos seus e deposito um selinho sobre eles.
— Até mais, diabinha.
Solto seu pulso e Liv abre e fecha sua boca, ela ainda está surpresa.
— Até mais, Aaron.
Sussurra e uma satisfação vibra em meu peito; eu a deixei sem
palavras.
Olho para Liv uma última vez e fico de costas para ela, sigo até
onde minhas coisas estão, pego-as e saio da pista de patinação. Eu posso
sentir os olhares sobre mim enquanto caminho na direção do vestiário.
Assim que paro diante do armário onde estão minhas coisas, o
goleiro do time se apoia no armário ao meu lado.
— Você e a garota da patinação estão namorando?
Engulo em seco e deixo que a mentira saia dos meus lábios.
— Sim, nós estamos.
— Parabéns. — Olho para o lado e ele está sorrindo. — Ela é muito
gostosa.
Estreito meus olhos e fecho minhas mãos em punho.
— Não fale assim da minha garota.
Liv pode não ser minha garota de verdade, mas nenhum idiota falará
assim dela.
— Desculpe.
O sorriso some dos seus lábios e ele ergue suas mãos para o alto.
Viro-me para o meu armário e pego minha mochila com as minhas coisas,
em seguida vou para o chuveiro, tomo um banho e enquanto estou embaixo
da água, me dou conta de algo.
O plano de Liv sempre foi o beijo.
Saio do chuveiro, coloco minha roupa, pego minhas coisas e deixo o
vestiário. Eu vou para o estacionamento, guardo minha mochila e bolsas no
meu carro e vou até o carro de Liv.
Espero-a apoiado em seu Mini Cooper enquanto a aguardo, confiro
minhas redes sociais. Já recebi algumas mensagens perguntando sobre meu
novo status de relacionamento.
— O que você está fazendo aqui?
Ergo meus olhos e ela está vindo até mim. Guardo o celular em meu
bolso e me afasto do seu carro. Não a respondo, porque espero ela se
aproximar. Meu olhar continua sobre Liv, dou um passo para o lado e ela
para à minha frente.
— Seu plano sempre foi esse beijo, não é?
Ela dá de ombros.
— É o único jeito de convencer a todos e espalhar a fofoca.
— E você não me contou.
Sorri debochada.
— Você ficaria nervoso e isso nos atrapalharia. — Abre a porta do
carro, joga as suas coisas sobre o banco, volta a fechá-lo e me encara com
um olhar divertido. — E fiz bem, porque o beijo até que não foi tão ruim.
— Não foi tão ruim? — Toco sua cintura, dou um passo em frente e
a forço a ficar contra a lataria do veículo. — Você sabe que foi incrível, e
que as coisas se tornaram difíceis, não é?
Sua respiração acelera, assim como a minha.
— Difíceis?
Finge que não entendeu, apoio minha mão ao seu lado e me inclino
em sua direção.
— Sim, porque toda vez que eu te ver, vou lembrar do maldito beijo.
— Abaixo minha cabeça e encosto meu nariz em seu pescoço, sentindo seu
cheiro. — E de como é ter meus lábios sobre os seus.
O relacionamento é mesmo sério, o jogador já conheceu o pai da
patinadora e a patinadora foi viajar com o jogador para conhecer a sua
família.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Eu juro que estou prestes a me transformar em uma gelatina, a


forma como sinto a respiração de Aaron, como sinto seu corpo, como seu
perfume me cerca é desumano.
Ele está certo, será difícil não lembrar do beijo. Quando ele saiu e eu
fiquei na pista de patinação, tudo que conseguia pensar era no beijo, na
sensação dos seus lábios sobre os meus, ele se afastou e mesmo assim meus
lábios ainda continuavam dormentes e minha respiração acelerada.
Mesmo deslizando no gelo e tentando me concentrar nos
movimentos que estava executando, Aaron não saía da minha mente, depois
do beijo ele roubou cada pensamento e cada batida do meu coração. Ele
roubou até mesmo minhas respirações.
E agora que ele está tão perto, só consigo torcer para que sua boca
cubra a minha outra vez.
— Tenho certeza de que nós dois podemos nos controlar, não é,
principezinho?
Finjo que estou no controle. Aaron ri, e não é o sorriso
envergonhado, nem gentil, é um sorriso totalmente sacana, um que faz
minhas pernas vacilarem e me faz perder o raciocínio.
— Não sei, nós conseguimos, diabinha?
Nós ficamos em silêncio com os olhares travados um no outro. Qual
o problema de perdermos o controle? Talvez nenhum, talvez todo. Nós
temos um acordo e estamos contando uma mentira.
Aaron dá um passo para trás, ele não está mais sorrindo e deve ter
chegado ao mesmo dilema que eu. Mordo meu lábio inferior e dou de
ombros.
— Acho que é algo que só o tempo dirá.
Ele assente e sorri, dessa vez é um sorriso contido.
— Você tem razão, diabinha.
Ele passa a mão pelo seu cabelo e perde a pose de eu estou no
controle de tudo. Ele volta a parecer apenas um cara tímido. Aaron tem
várias versões e eu gostei de todas que eu conheci até agora.
— Nos vemos na sexta? — Assinto. — Eu pego você no final da
tarde e vamos para a casa dos meus avós, leve tudo que precisa para
passarmos dois dias por lá, voltaremos apenas no domingo pela tarde.
Pensar em ficar perto de Aaron por tanto tempo me causa um leve
pânico, mas não há como desistir.
— Ok.
Ele dá um passo para trás e acena em minha direção, eu aceno de
volta, ele me encara por alguns segundos e se vira, então se afasta e eu
observo caminhar para longe.
O que acabou de acontecer? Como ficamos? Acho que nenhum de
nós tem a resposta.
Minha respiração continua irregular, meu coração segue batendo
acelerado em meu peito, como se estivesse prestes a sair pela minha boca.
O que foi isso? Por que é como se Aaron ainda estivesse por perto?
Eu nunca senti essa eletricidade, nunca a proximidade de alguém fez
isso comigo.
Respiro fundo e digo ao meu coração para se normalizar. Nada
demais aconteceu, foi apenas um beijo, e eu já beijei muitas pessoas, ele
não é o primeiro e nem o último. Tão insignificante!
Então, por que não parece realmente insignificante?
Suspiro, viro-me, abro a porta do carro e me sento atrás do volante.
Seguro a direção e demoro alguns segundos para conseguir reagir, para
enfim colocar o carro em movimento.
E enquanto dirijo para casa, uma parte de mim jura ainda estar
sentindo seus lábios sobre os meus.
C-A-R-A-L-H-O...
O multimídia está ligando e a música ecoa pelo carro, mas não
consigo me concentrar na letra, sequer sei qual é o cantor, não paro de
pensar no beijo, nas suas mãos em meu corpo, em como eu me senti.
Normalmente, eu estou no controle, mas Aaron me arrancou do
chão, e por alguns segundos foi como se estivesse flutuando.

Não vejo Aaron nos próximos dias, mas mantemos contato por
mensagens, era para ser apenas uma conversa simples de como nos
comportaremos durante os dias com sua família, mas se transforma em
mais. Conversamos sobre nossos dias, sobre como é corrido ser atleta,
trocamos informações sobre nossos esportes, treinos e até mesmo dietas, de
repente estamos falando sobre aulas, cursos, filmes, livros, hobbies e rindo
das piadinhas infames um do outro.
É fácil conversar com Aaron, ele é tão engraçado, ao mesmo tempo
que é tímido, gentil e meigo. Eu durmo enquanto estamos trocando
mensagens e a imagem das suas covinhas atormenta minha mente.
Nós somos alvo do jornal ridículo da faculdade e nossos nomes
circulam pelo campus. Todos esperam nos ver juntos e especulam o porquê
não somos vistos um ao lado do outro. Alguns comentam que é algo
passageiro e apostam quanto tempo iremos durar. É engraçado!
Não ligo sobre o que estão falando sobre nós dois, tudo que preciso
é que meu pai acredite que realmente estou namorando, e ele acredita.
Almoçamos juntos durante a semana e ele confessa que gostou de Aaron, eu
aviso que irei com ele para a casa da sua família no final de semana e isso o
agrada, porque é um sinal de quão sério estamos. Lá no fundo, eu me sinto
culpada, mas empurro o sentimento para longe, só estou fazendo o
necessário.
Tudo está conforme o esperado, ou quase tudo. Eu ainda não
consigo esquecer o beijo de segunda.
Inicio minha sexta-feira com meu coração batendo mais rápido que
o normal, mais tarde encontrarei com Aaron e iremos para a casa da sua
família. Ele e eu, em um carro por quase duas horas; ele e eu juntos por um
fim de semana inteiro, fingindo que estamos apaixonados. É um pouco
preocupante.
As horas passam depressa, tudo parece um borrão; aula, treino pela
manhã, almoço com as meninas, academia e quando volto para casa, tomo
um banho, coloco uma roupa confortável e arrumo as coisas que irei levar
para o fim de semana.
Eu tento levar apenas o básico, mas o meu básico é muita coisa e
preciso de uma mala de rodinhas e uma mochila.
Com a mochila em minhas costas e arrastando a mala, deixo meu
quarto. Eu vou até a sala e encontro Ava, Penny e a sua garotinha, Maddy,
está com ela.
— Hey, bonequinha.
Ela olha em minha direção, sabendo que chamei por ela e ri
animada.
— Tia.
Ela é uma fofa e amo que me chame de tia. Largo minha mala e
mochila e me aproximo de Ava, Penny e Maddy, elas estão no tapete
brincando com peças imensas de Lego. Legos me lembram Aaron.
— Você parece nervosa.
Desvio meus olhos de Maddy e encaro Penélope.
— Não estou nervosa.
Minto, eu estou muito nervosa, apesar de saber que eu sou uma
ótima mentirosa, estou nervosa, além de mentir para sua família inteira, tem
a proximidade com Aaron.
— Nem um pouco?
Ava me pressiona e mordo meu lábio inferior.
— Eu estou é preocupada que perderei as festas do fim de semana.
Minhas amigas riem e mudamos de assunto, conversamos sobre o
quanto Luke está pegando pesado nos treinos enquanto brincamos com
Maddy.
Estou montando uma torre para Maddy quando o celular vibra em
meu bolso e um frio se espalha pela minha barriga. Pego o aparelho e como
o esperado, é uma mensagem de Aaron.
“Eu estou aqui na frente esperando por você”
Digito uma resposta rapidamente.
“Ok, eu estou descendo.”
Eu me despeço das minhas amigas, beijo a bochecha de Maddy, fico
em pé e pego minha mochila e mala. Aceno para Penny e Ava, elas me
desejam sorte, então respiro fundo e saio do nosso apartamento.
Sinto as batidas do meu coração acelerando a cada passo e repito a
mim mesma em minha mente que não há motivo para surtar. E realmente
não existe, eu sequer entendo o porquê do meu corpo estar reagindo assim.
Desço o último degrau, cruzo o hall de entrada, abro a porta e deixo
o prédio, no mesmo instante o encontro do outro lado da calçada, Aaron
está apoiado em seu carro com os braços cruzados em seu peito.
Ele está usando óculos escuros e não posso ver seus olhos, mesmo
assim sinto como se ele estivesse me analisando e um arrepio percorre o
meu corpo.
Atravesso a rua e caminho em sua direção. Conforme me aproximo,
ele sorri debochado, ergo minhas sobrancelhas e quando estou perto o
suficiente, ele ergue sua mão, retira os óculos do seu rosto e faz um sinal
para a mala que estou carregando.
— Você está levando uma mala para um fim de semana?
— Eu preciso estar prevenida para qualquer ocasião. — Dou de
ombros e sorrio. — Imagina se sua família é do tipo que está arrumada em
qualquer ocasião? Ou se eles decidem organizar um jantar chique?
Ele ri e balança a sua cabeça.
— É mais fácil eles organizarem uma noite do pijama. — Pisca em
minha direção. — Eles amam um pijama.
Aaron segue sorrindo e suas covinhas são visíveis. Deus, por que ele
tem que ser tão fofo? Bonito? E gostoso? E ainda beija bem... Droga, por
que preciso lembrar disso?
— Onde eu coloco minhas malas?
Pergunto de repente, antes que minha mente continue me traindo.
— Vamos colocar lá atrás.
Aponta para a caçamba da picape. Assinto e sigo até lá, Aaron me
segue e é como se ele estivesse praticamente colado a mim, é como se
existisse algo que nos puxa na direção um do outro.
Aaron abaixa a tampa, pega minha mala e coloca ao lado das suas
coisas. Uma bolsa chama minha atenção.
— Você sempre carrega seus patins e seu taco com você?
— Sim, há um lago perto da casa dos meus avós que congela no
inverno, eu amo treinar lá.
Faço uma careta.
— Não peguei meus patins.
Ele ri e fecha a tampa.
— Espero você subir para buscá-los.
Assim que a última palavra deixa sua boca, corro de volta para o
prédio e subo depressa até meu apartamento. Busco meus patins e quando
retorno, Aaron está me esperando dentro do carro, então eu ocupo o lugar
ao seu lado e jogo minha bolsa no banco traseiro.
— Pronta?
Meu coração dá um salto em meu peito.
— Pronta.
Aaron liga o carro e dirige para longe. Eu olho para o lado enquanto
meus dedos tocam uns nos outros.
— Você está nervoso?
Pergunto e ele mantém os olhos focados na rua.
— Eu estou prestes a surtar. — Ele ri nervoso. — Eu sou um
péssimo mentiroso e minha família me conhece desde sempre, como irei os
convencer?
— Conte a mentira de maneira que você mesmo duvide da verdade.
Franze sua testa.
— Essa é a sua tática?
Ele soa tão curioso, mas não de forma maldosa, é como se ele
estivesse interessado em minha resposta. Como se ele estivesse tentando me
desvendar.
— Algumas vezes.
Sou evasiva, por mais que Aaron me cause uma vontade estranha de
me abrir, talvez seja seu jeito leve, tranquilo e puro.
— Obrigado pela dica.
Assinto, embora ele não esteja me vendo.
— O que eu preciso saber sobre sua família?
Mudo de assunto e a expressão em seu rosto muda, volta a ser mais
descontraída. Eu acompanho cada mudança do seu rosto, a fim de
desvendá-lo, de descobrir quem Aaron é por completo.
— Nós estamos indo para casa dos meus avós, Eileen Williams e
Joseph Prince, eles tiveram quatro filhos Alisha, Benjamin, Camille e
Danny, Benjamin é meu pai que se casou com a minha mãe, Tegan.
Ele faz uma pausa e respira fundo, é nítido que mencionar os pais é
doloroso.
— Minha tia Alisha é casada com meu tio Gregory e eles têm três
filhos, Ace, Beckett e Caroline. — Segue me contando sobre sua família e
eu tento guardar os nomes em minha mente. — Minha tia Camille é casada
com meu tio Zaid e eles têm dois filhos, Asher e Bella, meu tio Danny é
casado com minha tia Lilian e eles são pais da Alice.
É muito nome e sei que não serei capaz de decorá-los. É muita
gente.
— Sua família é enorme.
— Ela é e precisa saber que eles são barulhentos e um caos.
Sua voz é repleta de carinho, eles são importantes para Aaron e eu
tento repassar os nomes e parentescos em minha mente. E é tentando
recordar que percebo algo...
— Sua família segue a ordem alfabética no nome dos filhos?
Aaron assente.
— É uma tradição.
Eu nem conheço sua família, mas a admiro.
— Acho que adoraria fazer parte de uma família assim.
— Sua família é centrada?
Ele está rindo e sorrio também.
— Minha família é pequena, meus pais são filhos únicos e eu sou
filha única.
— Eu sou filho único, mas tenho primos e crescemos como se
fôssemos irmãos, não sei como seria ser parte de uma família pequena.
— É entediante, principalmente quando seus pais são separados.
Apoio minha cabeça contra o banco e encaro Aaron, ele continua
sorrindo e suas covinhas seguem visíveis.
— Você vai perceber o caos que é e se arrepender do desejo de
família grande.
— Duvido.
— Não superestime minha família, eles podem ser terríveis.
Não consigo acreditar que eles são horríveis, não quando ele fala
deles com tanto carinho.
— Você está começando a me deixar empolgada em conhecer sua
família. — Aaron apenas ri. — Será que verei fotos suas de bebê?
Ele faz uma careta.
— Não e vou proibir minha avó de abrir o baú de fotos.
A possibilidade de ver as fotos da sua infância me deixa empolgada.
— Encontrarei fotos comprometedoras?
Provoco-o e Aaron olha em minha direção com luxúria.
— Se você quiser, posso enviar uma foto comprometedora para
você. — Ergo minhas sobrancelhas. — Um nude.
Ele volta a olhar em frente e o encaro, indignada.
— Eu não estava falando sobre isso.
Sua gargalhada ecoa pelo carro.
— Eu sei que não, diabinha.
Balanço minha cabeça, mas há um sorriso em meus lábios. O
restante do caminho vamos conversando e nos provocando. E quando
ficamos em silêncio, vasculho sua playlist, Aaron tem um ótimo gosto
musical e até nos arriscamos em um dueto.
Eu não me sinto entediada em nenhum momento, nem estranha, o
silêncio nunca predomina entre nós e quando me dou conta, estamos em
frente a uma mansão.
Olho pela janela e estou encantada, o local é repleto de árvores e
flores ao redor, como se estivesse em um conto de fadas. Eu estou distraída
e percebo tarde demais que Aaron tem o celular apontado em minha
direção.
O que ele está fazendo? Viro-me para ele, surpresa e curiosa. Ele
sorri e dá de ombros.
— Você estava muito bonita e precisava tirar uma foto.
Sua sinceridade me pega desprevenida e meu coração dispara em
meu peito quando ergue sua mão, coloca parte do meu cabelo para trás da
minha orelha e sorri.
— Eu até esqueci que estamos prestes a mentir, diabinha.
O que aconteceu no final de semana de vocês? Eu só posso dizer
que estou curioso para saber o que certo casal aprontou...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Suas palavras ecoam em minha mente. Eu até esqueci que estamos


prestes a mentir, diabinha. E eu me esqueci como se respira. Eu me inclino
na direção do seu toque e meu corpo desperta, cada parte de mim anseia por
mais, implora por mais de Aaron.
Caralho!
Uma força me puxa para ele e custa todo meu autocontrole não
ceder e me curvar em sua direção.
Aaron parece tão perdido quanto eu, seus olhos estão ainda mais
escuros e ele me fita intensamente. O ar está pesado e é difícil respirar.
O mundo ao nosso redor não importa, esqueço de tudo e de onde
estamos, é como se existisse apenas Aaron e eu.
De repente, um barulho penetra meus ouvidos e um grito assustado
deixa meus lábios. Aaron fica desnorteado por breves segundos, mas assim
que fita algo fora do carro, um sorriso surge em seus lábios.
— Meus primos.
Eu ainda estou um pouco desorientada quando olho para o lado e me
deparo com duas crianças, dois adolescentes e dois garotos mais velhos.
Eles estão com as mãos cheias de neve.
Eles acertam neve no carro.
— O que eles estão fazendo?
— Esse é o jeito deles de nos dar boas-vindas.
Escuto o barulho da porta sendo aberta, viro-me para Aaron e ele
está deixando o carro.
— Vocês deveriam ser mais educados.
Grita assim que tem a porta fechada e logo que a última palavra
deixa sua boca, ele é acertado por um punhado de neve. Eles o acertaram no
peito. Minha primeira reação é ofegar surpresa, a segunda é rir. Meus
próximos dois dias serão animados!
— Diabinha, fique no carro.
Aaron grita, e como não estou a fim de ser atingida, eu permaneço
onde estou. Aaron vêm até mim enquanto desvia de mais neve, seus primos
o acertam mais duas vezes até ele chegar e abrir a porta ao meu lado.
— Eles teriam coragem de me acertar?
— Com certeza.
Suas mãos encontram a minha cintura e ele me ajuda a descer da
picape, enquanto mantém seu corpo à frente do meu para me defender,
seguro-me em seus ombros e fico nas pontas dos pés para conseguir olhar
além das suas costas.
— Protegendo a namoradinha.
Um dos garotos mais velho soa debochado.
— Sim, porque meus primos são uns selvagens.
Aaron o provoca. Eles parecem crianças brigando.
— Não somos selvagens.
A garotinha que deve ter menos de dez anos se defende.
— Alice, vocês estão prestes a atingir minha namorada.
Não sei se Aaron se dá conta, mas ele me chama de namorada com
uma naturalidade, como se fosse verdade. Jamais duvidaria da veracidade
do namoro após vê-lo me chamar assim com tanta convicção.
Ele finalmente está entrando no personagem!
— Nós não a iríamos acertar.
É a vez do adolescente se defender.
— Não acredito em vocês.
Mordo meu lábio inferior para não rir. Eles realmente são um caos,
mas não me assustam.
— Chega, crianças.
Uma voz grossa interrompe a discussão e um casal de idosos cruza a
porta de entrada e para na varanda. O senhor é alto, seus cabelos são
brancos e sua postura causaria inveja em muitos garotos, a senhora ao seu
lado é alguns centímetros mais baixa, mas comparada a mim é alta, ela está
usando um lenço ao redor da cabeça, está um pouco pálida e apoiada em
uma bengala.
— Meus avós.
Assinto, mesmo que ele não esteja me vendo, Aaron dá um passo
em frente e me estende sua mão, deixo meus dedos sobre os seus e me
movimento até estar ao seu lado, ele entrelaça nossos dedos e caminhamos
na direção dos seus avos.
Conforme nos aproximamos, fica mais nítido que sua avó está
lutando contra a doença. Posso notar olheiras abaixo dos seus olhos e sua
postura está levemente inclinada, eu aposto que ela deveria ser alguém
muito ativa.
Há um sorriso em seus lábios e ela me analisa, meu olhar encontra o
seu e é como se fosse capaz de ver a minha alma. Eu tenho que lutar contra
a vontade de me encolher.
— Aaron, querido. — Sua voz é firme e gentil ao mesmo tempo. —
Essa é a Olívia?
Eu sou ótima mentindo, na verdade, sou ótima com pessoas em
geral, sou muito comunicativa e mesmo assim me vejo tremendo diante
dessa senhora.
— Essa é a Olívia.
Aaron confirma e deixa sua mão em minhas costas quando paramos
de frente para seus avós. Ela segue me analisando e eu tremendo. Caralho,
que coisa difícil!
— Seja muito bem-vinda.
Soa animada e me oferece um abraço, eu vou até ela e envolvo os
meus braços ao seu redor assim como ela faz comigo. Seu perfume é doce e
reconfortante, a tensão abandona meu corpo e uma paz vibra em meu peito.
— Obrigada e me chame de Liv.
Sussurro enquanto nos desvencilhamos. Ela olha em meus olhos,
segura minha mão e sorri.
— E você me chame de Eileen, ou vovó, esqueça o senhora.
Pisca em minha direção e eu sorrio. Solta minha mão e se vira para
o marido, eu faço o mesmo e ele curva seus lábios em um sorriso gentil.
— Bem-vinda, querida.
Ele também me abraça e emana a mesma energia que a esposa. Eles
me lembram muito o Aaron.
— Obrigada.
Agradeço e dou um passo para trás, a mão de Aaron encontra a
minha e mais uma vez entrelaçamos nossos dedos.
— Vamos que todos estão ansiosos para conhecer sua namorada. —
Ela hesita e encara Aaron. — É namorada, não é?
Eu encaro Aaron e torço para que ele consiga responder a avó sem
gaguejar.
— Sim, vó, ela é minha namorada.
Ele consegue e a avó sorri animada. Ela se vira, adentra a mansão e
seguimos logo atrás dela. O lugar é tão impressionante por dentro quanto é
por fora, janelas imensas, lustres, lareira, sofá branco, mesas enormes. Um
palácio!
— Mais tarde, Aaron, faça um tour pela nossa propriedade e mostre
tudo para Liv.
— Pode deixar, vovó.
Ele olha para mim e nós dois sorrimos. Continuamos caminhando
logo atrás dos seus avós e seguimos para um jardim. Há flores, árvores,
mesas espalhadas pelo local e muitas pessoas.
As conversas cessam e somos os alvos dos olhares, reconheço seus
tios e tias por conta da cor dos cabelos, eles todos têm cabelo castanho.
Aaron aperta minha mão e nos aproximamos.
Ele me apresenta ao restante da sua família, eles são gentis, mas é
óbvio que estão me analisando. É um pouco intimidante, nunca estive
diante de uma família tão grande e, merda, ainda é uma mentira.
Seus primos já estão por aqui também e devem ter dado a volta na
casa. Descubro que os garotos mais velhos são quase da idade de Aaron, um
é dois anos mais velho e o outro dois anos mais novo, os adolescentes têm
quinze anos e as garotinhas uma tem doze e a outra oito.
Após conhecer todos, Aaron me guia até a mesa com lanches e nos
serve dois copos com chocolate quente, ele me entrega um e faz um gesto
na direção de uma mesa vazia, assinto e vamos até ela. Eu me sento ao seu
lado e provo da bebida, está quente e quando a assopro, o vapor sobe e
causa uma pequena névoa ao nosso redor.
— Assustada?
— Por que eu estaria assustada?
Seguro o copo com as minhas duas mãos e as esquento.
— Com a minha família.
Olho ao redor e sorrio.
— Assustada não, embora seja um pouco intimidante, nunca tinha
feito isso, de conhecer a família de alguém.
— Eu nunca conheci o pai de uma garota.
Ele segue com a provocação, eu bebo um pouco do chocolate e faço
um beicinho de falsa indignação.
— Você não conheceu o pai da sua ex-namorada?
Aaron ri daquele jeito que só ele consegue, com as covinhas e ao
mesmo tempo com deboche.
— Nós namoramos no ensino médio, não era assim tão sério. E
você, não conheceu a família do seu ex?
O sorriso some do meu rosto ao pensar em Noah.
— Meu namoro não foi um namoro convencional.
Escondo meu incômodo e finjo que não é nada de mais, mas Aaron
franze sua testa, sorrio até que ele acredite e volte a relaxar.
— Irá sobreviver a esse fim de semana?
Não é um deboche por completo, porque há preocupação em seu
rosto.
— Eu sempre sobrevivo, meu amor. — Pisco em sua direção, seu
sorriso amplia e a preocupação some da sua expressão. — Seus primos
realmente iriam jogar neve em mim?
Ele assente.
— Nós somos terríveis um com o outro e no verão a namorada de
Ace esteve aqui e acabou sendo alvo de balões repletos de água.
— Então é uma vingança?
Ele se inclina em minha direção, como se fosse compartilhar algo
íntimo.
— Com certeza.
É claro que a nossa proximidade causa um rebuliço dentro de mim.
— Seu avô está chamando você, Aaron.
A voz da sua avó chama nossa atenção, trocamos um último olhar,
eu respiro fundo e desvio o olhar até a senhora que está à minha frente.
— Vamos, Liv?
Ele me chama, mas sua avó balança a cabeça, negando.
— Liv me fará companhia.
Ela quer conversar comigo! Digo a mim mesma que não tenho
motivos para surtar.
— Vó, não faça isso...
Antes que ele prossiga, viro-me para ele e o interrompo.
— Eu vou ficar bem. — Ele não parece muito a fim de me deixar a
sós com sua avó. — Estou falando sério.
— Vamos, Aaron.
Ele suspira e fica em pé.
— Eu não demoro.
Assinto, ele troca um olhar com avó, que sorri satisfeita e se afasta,
Eileen se senta na cadeira antes ocupada pelo neto.
— Você tem uma linda família.
Todos seguem espalhados pelo jardim conversando em grupos e as
risadas ecoam pelo espaço.
— Eu tenho mesmo. — Sinto-a me observando e quando me viro
para o lado, encontro seu olhar sobre mim. — E a sua família?
Ok, esse é o momento do interrogatório!
— Pequena e um pouco desestruturada, meus pais, ambos são filhos
únicos e se separaram muito cedo, eu tenho um padrasto, mas não tenho
irmãos por nenhuma parte, então as minhas reuniões familiares são, no
máximo, meu pai e meus avós, ou minha mãe, meu padrasto e a família
dele, que são um saco.
Ela ri e olha ao redor.
— Eu amo minha família e eles irão amar você.
A sua fala faz com que eu me sinta culpada. Eu estou mentindo para
uma família feliz e unida. Meu Deus, eu vou matar Aaron por estar me
metendo em uma roubada dessas.
— Obrigada.
Eu sequer sei pelo que estou agradecendo. Merda!
— Sabe, eu precisei retirar meus seios, estou em tratamento contra o
câncer, mas não é o que mais me dói. — Encara-me e engulo em seco. — O
meu maior medo é deixar Aaron, meu garoto já sofreu a perda dos pais e
não quero que ele passe por isso de novo sem ninguém ao seu lado, o
restante da sua família estará aqui, mas lidando com seu próprio sofrimento.
A culpa em meu peito triplica de tamanho.
— A senhora ficará bem. — Respiro fundo. — Mas se algo
acontecer um dia, eu vou estar aqui por ele.
Com essa mentira eu conquistei a minha vaga no inferno sem direito
à segunda chance.
— Ótimo, era tudo que eu precisava ouvir.
Sorri e fica em pé.
— Venha. — Sequer cogito contrariá-la e me levanto. — Aaron irá
mostrar a propriedade e o quarto que irão ficar.
Suas palavras ecoam em minha mente e só consigo pensar que
AARON E EU VAMOS DIVIDIR A PORRA DE UM QUARTO.
UM QUARTO E UMA CAMA.
Nós não recebemos nenhuma foto do nosso casal, será que eles
esqueceram das redes sociais, ou estavam ocupados com outras coisas?
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron

Eu converso com meu avô e meu tio Danny, mas tenho os olhos em
Liv e minha avó. Espero que vovó se comporte. Elas estão conversando e
espero que dona Eileen não esteja fazendo um interrogatório ou
pressionando Liv.
— Não se preocupe, sua avó não irá matar a garota. — Olho para o
meu tio e faço uma careta, ele apenas ri e toca meu ombro. — Ela está feliz
que você encontrou alguém e você sabe, sempre que encontramos alguém, é
para sempre.
Ele procura minha tia com seu olhar e a encara com amor.
— Você já contou a ela sobre a nossa tradição?
Minha tia Alisha surge absolutamente do nada e para ao lado do
meu avô.
— Não é uma tradição.
Faço uma careta.
— É uma tradição.
Minha tia defende a coincidência ridícula que aconteceu com todos
os casais da minha família.
— Coincidência.
Resmungo e meu tio sorri debochado.
— Você deveria deixar sua namorada decidir se é ou não uma
coincidência.
Meu tio me provoca e dou de ombros.
— Eu já tive uma namorada antes dela, ou seja, eu quebrei a
tradição.
Zombo.
— Foi apenas um namoro de escola, Aaron, você sequer a trouxe
para casa, nunca a conhecemos.
— Tudo que importa, tia, é que essa tradição não existe.
Ela revira seus olhos e sorri, assim como meu avô e meu tio, eles
realmente acreditam que existe uma tradição em nossa família, mas eles
estão errados, principalmente porque nosso namoro é uma mentira.
Uma mentira!
Por um momento, eu tinha esquecido que estávamos mentindo e
agora estou suando, mesmo que esteja frio. Se minha família descobrir que
estou fingindo, eles ficarão tão arrasados. Que merda eu fiz?!
— Aaron, você está bem?
Meu avô pergunta, assinto e bebo o restante do chocolate quente que
há em meu copo. Minha tia faz uma pergunta ao meu avô, ele responde e
eles entram em um outro assunto, não presto a atenção e assim que minha
avó levanta, eu dou um passo em frente. Liv também fica em pé e me
apresso quando vejo elas vindo em minha direção. Encontro-as no meio do
caminho e minha avó sorri.
— Mostre à sua namorada o restante da nossa propriedade e onde
irão ficar, será no seu quarto.
Pisca em minha direção e se afasta. Eu olho para Liv e ela me
encara com curiosidade.
— Vamos dividir um quarto?
Sussurra, eu entrelaço sua mão com a minha e a guio para longe.
— Sim, meus avôs não são conservadores, aqui os casais dormem
juntos.
Ela se inclina em minha direção e apoia seu rosto em meu ombro.
— Como iremos dormir?
É como se fôssemos um casal romântico e não duas pessoas
discutindo sobre o fato de dividir um quarto. Eu me curvo e aproximo
minha boca da sua orelha.
— Com medo de dormir comigo, diabinha?
Eu posso ver sua pele arrepiada e sorrio vitorioso. Meu sorriso não
dura por muito tempo, porque uma rajada de vento faz com que seu
perfume atinja meu nariz.
— Aaron, eu sou uma garota e você é um garoto, é uma péssima
ideia dividirmos uma cama.
Ignoro-a, porque é impossível me manter pensando, Liv acaba com
meu raciocínio.
— Você cheira como um dia de verão, diabinha.
— Aaron. — Ela suspira. — Não flerte comigo.
Ela lamenta e me afasto, endireitando a minha postura e ficando
com as costas retas.
— Por que não?
— Porque não.
Sorrio e passo meu braço pelo seu ombro.
— Ok, mas só para constar, o verão é minha estação preferida.
Ela dá um soquinho em minha barriga, eu a aperto contra o meu
corpo e nós dois acabamos rindo. Eu não me distancio de Liv e meu braço
segue ao redor dela enquanto caminhamos pela propriedade dos meus avós.
Eu mostro as quadras para praticar esportes, o jardim de rosas da
minha avó, os estábulos e por fim, eu a levo até o lago que está congelado e
permite a patinação.
— Seus avós são donos de uma preciosidade.
Liv sussurra encantada, ela ficou impressionada com cada canto que
eu mostrei.
— Eles construíram o lugar dos sonhos deles.
— É um sonho mesmo.
Afasto minha mão do seu ombro e Liv se desvencilha de mim. Ela
dá um passo em frente e se aproxima do lago.
— Você deve ter patinado muito aqui, não é?
Ela olha para trás, o Sol está se pondo e a luz que incide sobre ela
deixa seu cabelo iluminado, sua pele brilhando e ela sorri. Caralho! Ela é
tão bonita.
Minha vontade é pegar o celular e tirar uma foto sua, assim como eu
fiz hoje mais cedo no carro.
— O que foi?
— Posso tirar uma foto sua?
Ela ergue suas sobrancelhas, fica totalmente de frente para mim e
traz suas mãos até sua cintura.
— Você está maluco?
Faço um gesto com a mão.
— Você acabou com a minha foto ficando nessa pose de irritadinha.
Estreita seus olhos.
— Por que você queria tirar uma foto minha?
— Porque você estava linda.
Um vermelho toma conta das suas bochechas e, caralho, é a
perfeição. Desejo vibra pelo meu corpo e preciso me concentrar para que o
resultado não seja uma maldita ereção.
— É por isso que chamam você de principezinho? — Não entendo
seu raciocínio e fica explícito em meu rosto, porque ela me responde. —
Porque você sabe falar como um príncipe.
Balanço minha cabeça, caminho em frente e eu vou até a beira do
lago.
— Respondendo a sua pergunta, eu patinei muito aqui. — Toco o
gelo com a ponta do meu tênis. — Meu pai e meu avô me ensinaram a
patinar nesse lago e foi aqui que peguei em meu primeiro taco também.
Lembranças permeiam a minha mente, são recordações felizes, se
fechar meus olhos serei capaz de escutar a voz do meu pai e o som da sua
risada.
— Sabe, às vezes eu esqueço de como era o rosto dos meus pais,
mas o som da risada deles é algo que sempre ecoa em minha mente.
Ela para ao meu lado.
— Como eles eram?
Um sorriso surge em meu rosto, apesar de sentir falta dos meus pais
e de ser algo doloroso, falar deles me traz uma certa paz.
— Eu confesso que não tenho muitas lembranças deles, mas as que
permanecem são deles sorrindo, eles eram carinhosos, divertidos e o amor
era algo evidente em ambos. — É um pouco difícil tornar as recordações
em palavras. — Uma imagem que me marca muito é os dois dançando na
sala da nossa casa.
— Quantos anos você tinha quando eles morreram?
— Nove.
Liv se aproxima, toca meu braço e seus dedos descem pelo meu
braço até os entrelaçar com os meus.
— Sinto muito que você tenha os perdido tão cedo.
Ela apoia seu rosto em meu braço e encaramos o lago congelado à
nossa frente.
— Podemos patinar?
— Claro, mas somente amanhã, porque hoje está escurecendo e
pode ser perigoso.
— Ok.
Nós ficamos em silêncio e em nenhum momento esqueço que ela
está ao meu lado. Eu gosto de ter Liv por perto, ela faz com que as batidas
do meu coração se acelerem, mas também faz com que uma sensação de
plenitude ecoe em meu peito.
— Vamos? — Eu me viro e deixo um beijo no topo da sua cabeça.
— Pegamos nossas coisas no carro e levamos para o meu quarto.
Ela assente, então seguimos de mãos dadas até o carro que deixei na
entrada. Eu aproveito para levá-lo até a garagem, em seguida pegamos
nossas mochilas e malas e guio Liv até meu quarto.
Abro a porta e deixo que ela entre primeiro, ela larga sua mochila
sobre a cama, a mala fica em pé no meio do cômodo e olha ao redor. O
quarto ainda está da maneira que o deixei quando parti para a faculdade, os
pôsteres, fotos, prateleira com livros e minhas coleções são as mesmas, só
levei comigo os mais importantes.
Fecho a porta e me aproximo e, assim como ela, largo minhas coisas
sobre a cama. Eu fico logo atrás dela e espero pela sua reação. Liv vai até
minha prateleira com a minha coleção de Lego e a encara com curiosidade,
é claro que isso chamaria a sua atenção.
— Você é realmente viciado nisso, né?
Sorrio e caminho em sua direção.
— Um pouco.
Ela ri e dá um passo para trás, o gesto faz com que suas costas
encontrem meu peito, Liv se vira e ficamos um de frente para o outro com
pouquíssimo espaço entre nós.
Seu olhar encontra o meu e por alguns segundos apenas nos
encaramos, isso é o suficiente para o ar se tornar mais denso, é difícil de
respirar e anseio por tocá-la.
— Aquela é a cama que iremos dividir?
Apesar de mencionar a cama, sequer olha em sua direção.
— Por sorte é uma cama de casal, diabinha, tem bastante espaço
para nós dois.
Imaginá-la em minha cama é algo perturbador. Os fios do seu cabelo
espalhados pelo travesseiro, seu corpo a centímetros do meu, seu calor
chegando até mim, seu perfume me cercando... Será um verdadeiro
tormento.
— Espero que seja espaço o suficiente.
Ela está tentando me provocar, mas sua voz falha, ela está tão
perturbada quanto eu. Seu peito sobe e desce rapidamente e molha seus
lábios com sua língua, o que detém minha atenção e, caralho, é difícil
manter o controle.
— Sabe, Liv, eu achei que seria difícil tocar você em público, mas
será muito mais difícil não tocar em você aqui nesse quarto. — Inclino
minha cabeça para baixo e percorro a pele do seu pescoço com meu nariz.
— Vai ser difícil manter meus lábios longe dos seus.
Os sons ofegantes das nossas respirações se misturam, levo minha
mão até sua cintura, mas me detenho quando alguém bate na porta.
— Aaron?
Droga, é Bella. Eu preciso respirar fundo antes de respondê-la.
— Sim, Bella.
Afasto minha mão de Liv e ergo meu rosto, nós dois nos encaramos
e minha vontade é ignorar minha prima e diminuir a distância entre nós até
não conseguirmos decifrar onde um começa e outro termina.
— Vovó está chamando vocês para o jantar.
— Ok, estamos indo.
Eu dou um passo para trás, engulo em seco e ofereço minha mão
para Liv. Ela coloca seus dedos sobre os meus e deixamos o quarto em
silêncio.
Bella está nos encarando com um sorriso malicioso, reviro meus
olhos e minha prima de doze anos ergue o dedo do meio em minha direção.
Liv me dá uma leve cotovelada e seguimos a adolescente.
Vamos para a sala de jantar, a mesa de jantar está posta e a lareira
ligada. Liv e eu nos sentamos um ao lado do outro e esperamos minha avó
liberar para comermos, e é ela a ocupar a ponta da mesa, ela espera todos
estarem aqui e fica em pé.
— Eu quero agradecer a todos vocês por estarem aqui e quero dizer
que estar completando mais um ano de vida é muito importante pra mim,
ainda mais depois dos últimos acontecimentos, mas o mais importante é
estar com vocês, é ter vocês ao meu lado. — Seus olhos se enchem de
lágrimas, mas se recusa a deixá-las rolarem pelo seu rosto. — Eu amo vocês
e espero que sempre se lembrem disso.
Ela sorri e olha para o rosto de cada um de nós, como se estivesse os
memorizando. Recuso-me a pensar sobre essa sua ação e sobre suas
palavras. Isso não é uma despedida!
— Dito isso, vamos jantar.
Volta a se sentar antes que alguém tenha chance de falar algo,
demoramos alguns segundos, mas cedemos ao seu apelo silencioso para
ficarmos quietos em relação ao seu discurso e nos concentramos em servir
nossos pratos.
A comida está ótima e é claro que o jantar é uma bagunça,
conversas paralelas, risadas altas e vozes altas. Liv e eu conversamos com
Ace e Beckett que estão à nossa frente, os dois estão estudando em
faculdades fora do estado e trocamos experiências.
Assim que finalizamos o jantar, os funcionários retiram os restos de
comida e os pratos da mesa e a sobremesa é servida. Há vinho e o álcool
começa a fazer efeito e o caos é ainda maior. Meu tio fica em pé na cadeira
e aponta para o jardim.
— Vamos?
Ele não precisa falar mais nada, porque sabemos o que significa. O
barulho de cadeiras sendo arrastadas para trás ecoa pela sala de jantar. Liv
me encara curiosa.
— O que vocês irão fazer?
— Fogueira e marshmallow. — Ela me encara surpresa e sorrio. —
Minha família ama uma tradição e essa é uma delas.
Eu fico em pé e estendo a minha mão em sua direção, Liv deixa seus
dedos sobre os meus e a ajudo a se levantar.
— Isso é algo que acontece desde que meus tios e meu pai eram
pequenos, eles fizeram uma fogueira e assaram marshmallow logo após um
jantar, então sempre que estão todos na fazenda, saímos para o jardim e
acendemos uma fogueira.
— E a neve?
— Não está nevando no momento e o firepit[1] vai nos permitir
fazer fogo, além disso há uma cobertura móvel sobre o local, não será tão
incrível quanto no verão, mas terá fogo, que é o importante.
Ela assente, eu passo meu braço ao redor dos seus ombros e vamos
para o jardim. Somos os últimos a chegar e todos já estão ao redor da
fogueira. O espaço é um quadrado, assim como o buraco onde o fogo está
aceso, ao redor estão bancos de concreto estofados com almofadas
confortáveis.
— Não tem lugar para nós dois.
Olho ao redor e Liv está certa, existe apenas um espaço vazio e não
cabe nós dois.
— Acho que você terá que se sentar no meu colo, diabinha. — Eu
estou a provocando, mas o meu sorriso morre quando me dou conta de que
isso é exatamente o que terá que acontecer. — Merda, não temos outra
alternativa, não é?
Sussurro e Liv balança sua cabeça.
— Aaron, Liv, nós só estamos esperando por vocês.
Minha tia grita por nós dois, então trocamos um olhar e vamos até o
lugar. Eu me sento e seguro o pulso de Liv, ela me encara e engulo em seco.
É como se estivéssemos em câmera lenta, Liv se vira e se senta
sobre minhas pernas, eu mantenho minhas mãos em sua cintura e prendo
minha respiração. Sensações vibram em meu peito e são todas
desconhecidas. É um anseio por tocá-la, com um sentimento de
pertencimento, como se ela me pertencesse, uma necessidade e uma paz
estranha.
E tudo piora quando solto minha respiração e seu cheiro me cerca, o
cítrico e o doce se misturam e me inebriam. Ela me encara e morde seu
lábio inferior, ela está tão afetada quanto eu, suspiro e deixo minha mão
sobre sua coxa.
Minha tia me alcança o palito, ficamos com um só e os
marshmallows, eu levo ao fogo e Liv e eu dividimos o doce. Eu o levo até
sua boca, nós dois estamos tensos, há conversas ao nosso redor, mas temos
nossa atenção um no outro.
Não trocamos nenhuma palavra e não precisamos, tudo está
explícito em nossos olhos. O desejo, a tensão e a necessidade que nos cerca.
Alguém nos chama e somos obrigados a desviar nossos olhares, é
minha tia, o interrogatório a Liv se inicia e pelos próximos minutos ela
responde as perguntas e curiosidades da minha família, é um alvoroço
quando descobrem quem é o seu pai, inclusive são capazes de pedir que ela
consiga um autógrafo.
Mesmo quando o marshmellow acaba, continuamos aqui,
conversamos e compartilhamos histórias sobre nossa família, recordamos e
rimos. Liv se apoia contra meu corpo, deixa a lateral do rosto contra meu
peito e eu a seguro como se estivesse segurando meu bem mais precioso.
Ela relaxa e quando olho para o seu rosto, encontro seus olhos
fechados, ela parece tão calma e serena dormindo, tão diferente do furacão
que é quando está acordada.
— Eu vou levá-la para a cama. — Meus primos me encaram com
malícia e reviro meus olhos. — Idiotas.
Eu fico em pé com Liv em meus braços e a carrego para o quarto.
Deposito-a com cuidado sobre a cama, tiro seus tênis e casaco, e ela segue
dormindo.
Observo-a por alguns segundos e vou para o banheiro. Escovo meus
dentes, troco de roupa e ela ainda está dormindo quando retorno.
Eu me deito ao seu lado, cubro-nos e ela suspira sonolenta, mas não
abre seus olhos, fico parado esperando por sua ação e Liv se aproxima,
apoia sua cabeça em meu peito e deixa sua mão sobre meu coração, então
passo meus braços ao seu redor, fecho meus olhos e adormeço enquanto o
sorriso de Liv ecoa em minha mente.

[1] Um buraco no chão para se fazer uma fogueira com lugares para
se sentar ao redor.
Nunca um fim de semana pareceu tão longo...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

A primeira coisa que eu percebo ao despertar é que há um peso ao


redor de mim, a segunda é que estou deitada sobre algo mais consistente
que um travesseiro e a terceira é o cheiro de Aaron.
Deveria abrir meus olhos, mas não faço, aconchego-me ainda
mais contra ele e Aaron intensifica a maneira como me aperta contra si.
Quando foi que alguém me segurou assim?
Eu me sinto segura com ele, em paz e tranquila, como nunca me
senti com ninguém. É como se ele fosse a calmaria em meio a minha
tempestade.
Deus, de onde veio esse pensamento? Caralho!
Abro meus olhos, assustada, e ao olhar para cima, encontro Aaron
me observando.
— Bom dia, diabinha.
Ele sorri, suas covinhas aparecem e minha garganta fica seca.
— Bom dia, principezinho.
Tento soar normal e espero que ele acredite que minha voz falhou
por conta de ter acabado de acordar. Aaron continua me encarando e sinto
um frio em minha barriga.
Seus cabelos estão uma bagunça e me dou conta de que ele está
sem camisa, respiro fundo, o que é uma péssima ideia, porque estou cercada
pelo seu cheiro.
— Você dormiu bem?
— Eu tive uma noite incrível. — Eu falo mais do que falaria em
uma situação normal e sou bem mais exagerada. Merda, por que Aaron me
desestabiliza assim!? — E você?
— Minha noite também foi incrível.
A forma como ele me encara e a maneira como as palavras
deixam sua boca entregam que ele não está falando apenas de dormir. Ele
está falando de antes.
— Desculpe. — Ergue suas sobrancelhas, sem entender o porquê
estou pedindo desculpas. — Eu dormi enquanto sua família estava
conversando, e ainda por cima adormeci em seu colo, com certeza eu te
atrapalhei.
Ele me toca, o que me deixa totalmente alerta.
— Você não tem motivos para pedir desculpas, você nunca atrapalha
e foi bom que consegui me livrar da minha família mais cedo.

Preciso me controlar para não suspirar quando ele sobe e desce seus
dedos pelas minhas costas.
— E obrigada por ter me carregado até a cama, você poderia ter me
acordado.
— Não foi nada de mais.
A forma como ele me encara causa um alvoroço em meu interior,
desejo percorre cada célula do meu corpo e me pergunto se ele sente o
mesmo; se eu me mexesse mais um pouco para o lado encontraria uma
ereção? Engulo em seco e me desvencilho de Aaron.
Eu preciso de distância.
— Eu estou com mau hálito, preciso escovar meus dentes. — Pulo
da cama. — Onde fica o banheiro?
Ele me encara curioso e aponta para uma porta do outro lado do
quarto, eu assinto e corro até ela. Entro no banheiro, fecho a porta, apoio-
me contra ela e respiro fundo. Meu coração está totalmente descontrolado,
Preciso de alguns segundos para normalizar minha respiração e
quando enfim consigo, me dou conta de que minhas coisas estão no quarto.
Droga!
Abro a porta e me deparo com Aaron sentado na cama, ele está
mexendo em seu celular e seu abdômen está exposto, ele é um atleta e é
lógico que ele é definido. E para piorar, seus cabelos estão com aquela
aparência de quem acabou de acordar.
Gostoso!
— Esqueci minhas coisas.
Ele apenas olha em minha direção, eu corro, pego minha mala e
volto para o banheiro. Tomo um banho, escovo meus dentes, coloco uma
roupa e enquanto encaro o espelho e penteio meu cabelo, percebo que
minhas bochechas estão vermelhas.
Eu não fico vermelha e eu não coro por causa de garotos. Quem é
essa Liv?
— Caralho.
Resmungo irritada e termino de me arrumar, assim que estou pronta,
deixo o banheiro, Aaron ainda está sentado sobre o colchão, ele larga o
celular ao seu lado e seu olhar desce e sobe pelo meu corpo me causando
um formigamento.
Essa situação entre nós está ficando insustentável
— Eu vou tomar um banho. — Ele se levanta. — Você me espera
para irmos tomar café?
Assinto, ele caminha em minha direção e paramos um de frente para
o outro, o ar ao nosso redor é tão pesado que é como se pudéssemos cortá-
lo com uma faca.
Aaron segue para o banheiro e solto minha respiração, que eu nem
tinha notado que estava prendendo.
Ele fecha a porta, eu dou um passo em frente e enquanto ele está no
banheiro, caminho pelo seu quarto e encaro os detalhes. Há mangás, livros,
alguns jogos, Lego e paro diante do seu mural de fotos, existem muitas com
seus pais, Aaron era fofo quando criança, ele é extremamente parecido com
seu pai e sua mãe é linda.
Há uma foto com uma garota, aposto que é a formatura de ensino
médio, deve ser a garota que Aaron namorou, sua única ex-namorada e, lá
no fundo, essa constatação me incomoda.
Faço uma careta e me afasto, pego meu celular e me sento na
cadeira que fica de frente para a sua mesa de estudos. Eu respondo minhas
amigas e entro em minhas redes sociais. Assim que Aaron abre a porta e sai
do banheiro vestido, eu fico em pé.
Seus cabelos estão molhados, seu perfume se espalha pelo quarto e
me forço a ignorar esses detalhes. Isso não está me afetando, minto a mim
mesma.
— Vamos?
Convida e sorrio.
— Vamos.
Ele me estende a sua mão, eu me aproximo, coloco meus dedos
sobre os seus e deixamos seu quarto.
— Como foi o primeiro dia de caos?
Aaron me pergunta enquanto seguimos pelo corredor.
— Eu amei sua família.
Olho para o lado e seus olhos estão brilhando, por algum motivo
minha resposta o agrada. Trocamos um olhar e ficamos em silêncio. Volto a
olhar em frente e vamos até a sala de jantar, e como na noite passada, sua
família está sentada ao redor da mesa.
Aaron e eu nos sentamos nos mesmos lugares que ontem e da
mesma forma que foi o jantar, o café é animado. Eles são muito barulhentos
e isso me deixa fascinada.
Eu estava sendo sincera quando disse que amei sua família, eu amei
tanto que me sinto culpada por estar mentindo. É fácil estar envolvida com
eles, as conversas são leves e não me sinto deslocada em nenhum momento.
Termino de tomar meu café e estou rindo de algo que o primo mais
velho de Aaron falou quando ele se inclina em minha direção.
— Você quer ir patinar no lago?
Sussurra em meu ouvido e a menção de patinar no lago me deixa
animada, desde que fomos ao lago ontem estou sonhando em patinar lá.
— Claro.
Desvio minha atenção do seu primo e Aaron sorri. Ele fica em pé,
eu faço o mesmo e acenamos para sua família. Nós vamos até o quarto,
pegamos os patins e vamos para o lago.
Durante o caminho, Aaron vai me contando as histórias e memórias
que há em cada parte da propriedade e posso visualizá-las perfeitamente em
minha mente.
Assim que chegamos ao lago, trocamos os tênis pelos patins e
Aaron é o primeiro a pisar no gelo, ele me oferece sua mão e é só quando
tem meus dedos presos aos seus que piso no lago congelado.
Aaron mantém minha mão presa na sua e nós deslizamos pelo gelo
um ao lado do outro, Aaron é perfeito patinando, e assim como eu, ele é
natural, nenhum de nós dois faz esforço algum, não hesitamos e não
escorregamos.
Patinar em um lago congelado é diferente do que estar em uma pista
de patinação, e eu amo da mesma maneira, é algo que traz conforto.
Eu solto minha mão, Aaron me encara e sorrio animada.
Viro-me e corro, o vento atinge meu rosto e uma sensação de
liberdade me domina e traz um sentimento bom que ecoa em meu peito e
meu sorriso amplia.
Estar sobre patins é o que eu mais amo, mas, nos últimos anos, uma
pressão muito grande em ser boa o suficiente para ganhar e participar de
competições tem manchado essa satisfação.
E, nesse momento, eu só sou ocupada por essa satisfação.
Fodam-se as competições, foda-se se não sou a melhor, eu só sinto a
liberdade e o amor pela patinação. Giro, salto e deslizo pelo gelo me
sentindo livre.
Eu giro e assim que meus patins atingem o chão, sinto alguém me
observando e quando olho para trás, encontro Aaron parado e com os olhos
fixos em mim. Ele tem um olhar de admiração que faz meu coração
acelerar.
— Você é incrível patinando, diabinha.
A insegurança e as palavras que um dia Noah me disse ecoam em
minha mente.
— Você realmente acha isso?
Pergunto e lá no fundo tenho medo da sua resposta. Aaron faz uma
careta e patina em minha direção.
— Sim, eu nunca vi alguém como você.
Sorrio e balanço minha cabeça.
— Você já viu Penny e Ava patinando? — pergunto, incrédula. —
Eu posso ser boa, mas elas são perfeitas.
Ele ri e suas bochechas vermelhas entregam que ele está prestes a
dizer algo extremamente doce.
— Nunca prestei atenção nelas, você foi a única a chamar minha
atenção.
Meu coração acelera e sorrio como uma boba.
— Você não deveria me dizer coisas assim, Aaron.
Ele desliza em minha direção e eu vou para trás.
— Por quê?
— Porque... — Eu tento encontrar uma desculpa, mas simplesmente
não existe uma desculpa plausível. — Somos uma mentira, lembra?
Ele dá de ombros.
— E não podemos nos divertir?
Sua proposta é tentadora, mas, lá no fundo, minha razão fala mais
alto.
— Isso complicaria as coisas.
Aaron sabe que estou certa, porque ele para, suspira e passa a mão
pelo seu cabelo.
— Você está certa.
— Sempre costumo estar certa.
Eu o vejo sorrir e me viro, ficando de costas. Continuo patinando e
Aaron faz o mesmo. Então, olho para trás e sorrio.
— Duvido você me alcançar.
Aaron sorri debochado, eu olho em frente e corro. Ele corre atrás de
mim e ele é rápido, mas eu também sou. Nós estamos rindo e nossas
gargalhadas ecoam pelo lugar.
Eu canso e minha respiração está ofegante, sou obrigada a diminuir
minha velocidade e é nesse momento que Aaron toca minha cintura. Ele me
puxa e faz com que eu me vire, ficando de frente. Sorrio e espalmo minhas
mãos em seu peito.
— Você não vai conseguir fugir de mim, diabinha.
Provoca-me e dou um tapa leve em seu peito.
— Não estava tentando fugir.
Nós dois seguimos patinando enquanto suas mãos estão em minha
cintura, as minhas em seu peito e nos encaramos. Estar tão perto de Aaron
quase me faz repensar sobre nos envolvermos, mas empurro a ideia para o
fundo da minha mente.
Aaron ergue seu braço, toca a lateral do meu rosto e eu respiro
fundo. Nenhum de nós dois fala nada. Ele coloca uma mecha do meu cabelo
para trás da minha orelha e se afasta.
— Vamos voltar?
Eu assinto e saímos do gelo. Trocamos os patins pelos tênis e
seguimos de volta para casa, vamos em silêncio e dessa vez, suas mãos
estão longe de mim.
É melhor nos mantermos longe mesmo.
O restante do dia é um borrão, sua família segue animada,
almoçamos, jogamos jogos de tabuleiro, conversamos, rimos, histórias são
trocadas e novamente, após o jantar, vamos para jardim, dessa vez eu não
preciso ficar no colo de Aaron e uma parte de mim lamenta.
Essa noite só entramos quando todos também deixam o jardim,
acenamos para sua família, deixamos nossos casacos no cabideiro da sala e
seguimos para o corredor que leva ao quarto. Caminhamos um ao lado do
outro e ao olhar para o lado, encontro seu olhar sobre mim, há uma força
que me puxa em sua direção, que torna o ar ao nosso redor denso e tudo
insuportável.
Caralho!
Aaron apressa o passo, entra no quarto, segura meu pulso e me puxa
para dentro. Ofego, ele fecha a porta e me pressiona contra ela.
— Sabe, um beijo não faria mal a ninguém, diabinha.
Não tenho tempo de reagir, porque seus lábios cobrem os meus e ele
vira meu mundo de cabeça para baixo.
Eu sei de uma coisa, mas não vou me pronunciar sobre isso, porque
é um babado muito forte (até mesmo para mim)...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron

Caralho!
Eu simplesmente não consigo mais fingir que não estou alucinado
por ela, não dá mais para fingir que não passei o dia todo imaginando como
seria beijá-la, como seria ter minhas mãos em seu corpo.
Não deveríamos misturar as coisas? Talvez, mas, foda-se! No
momento, eu sou um animal e a única coisa que pode me parar é Liv, ela é a
única que tem esse poder.
E ela não me afasta, pelo contrário, assim que meus lábios
encontram os seus, ela ergue sua mão e segura meu moletom com força,
puxa-me ainda mais em sua direção. O espaço entre nós é mínimo, apoio
minha mão em sua cintura e a outra na porta ao lado da sua cabeça.
Reivindico sua boca, minha língua duela com a sua e nos perdemos
um no outro. É como se ela fosse meu ar e o que me mantém vivo. Desço
minha mão até sua perna, aperto sua coxa e a ergo até tê-la ao redor da
minha cintura.
Liv não me para!
Afasto minha boca da sua e encosto meus lábios em sua pele visível,
odeio que a blusa me impeça de ir mais para baixo. Eu vou até sua orelha e
mordo o seu lóbulo, Liv suspira e isso resulta em uma onda de desejo
percorrendo o meu corpo.
— Se você não me mandar parar, eu não vou parar.
Subo minha mão e pairo logo abaixo do seu seio. Olho para o seu
rosto e Liv inclina sua cabeça para trás até apoiá-la na porta, suas
bochechas estão vermelhas, seus olhos escuros de desejo.
— Eu não quero que você pare, principezinho.
— Caralho, Olívia.
Seu nome é uma música em meus ouvidos e eu dou um passo para
trás. Afasto minhas mãos e meu olhar percorre seu corpo de cima a baixo
como se assim fosse conseguir despi-la.
— Você está me encarando como se quisesse arrancar minhas
roupas com os dentes.
Sorrio malicioso.
— Eu quero arrancar suas roupas com os dentes. — Levo minhas
mãos até a barra do seu suéter, dessa vez segurando-o com mais força e
aguardando apenas um sinal para tirá-lo de uma vez. — Quero você nua e à
minha disposição.
— Então, me deixe nua, Aaron.
Eu não a espero pedir duas vezes, ergo o suéter, Liv levanta seus
braços e jogo a peça no chão. Ela está vestindo mais uma blusa.
— Droga, eu odeio essa porra de inverno!
Liv ri e eu não perco tempo, tiro a peça de roupa do seu corpo, ela
finalmente fica apenas de sutiã e sorrio satisfeito. Espalmo minhas mãos em
sua barriga, meus dedos encostam em sua pele quente e juro que sinto meu
corpo formigar.
Meu olhar está preso ao seu e me deparo com a mesma luxúria e
ansiedade que com certeza há em meus olhos. Nós dois parecemos prestes a
entrar em combustão.
Inclino-me em sua direção e distribuo beijos pela sua pele, sua
respiração se torna mais irregular, eu vou me abaixando e deixando um
rastro de beijos por onde eu passo.
Eu me ajoelho, nós nos encaramos e seus olhos estão ainda mais
escuros. Liv se apoia na porta outra vez, eu tiro seus tênis, sua calça e ela
fica apenas de calcinha e sutiã.
— Você é uma deusa, diabinha.
Ela ri.
— Deusa e diabinha na mesma frase é uma heresia, principezinho.
Subo minhas mãos pelas suas pernas e ela ofega. Eu sorrio e beijo a
lateral da sua coxa. Vou subindo até me deparar com sua calcinha, meu
nariz toca-a e sinto seu cheiro.
É nítido que está molhada e excitada, e isso intensifica meu desejo
por ela. É insuportável e doloroso.
Levo minhas mãos até a lateral da sua calcinha, puxo-a até que
rasgue, jogo o tecido no chão e a toco com minha língua. Gemidos saem de
sua boca, eu ergo sua perna até tê-la apoiada em meu ombro e a tomo em
meus lábios.
Meus dedos e minha língua brincam com ela. Liv tem a cabeça
inclinada e apoiada na porta, os lábios entreabertos, olhos fechados e sons
deixam sua garganta. Uma verdadeira deusa!
Suas mãos seguram meu cabelo, puxando com força meus fios e me
empurrando contra ela. Nós abandonamos o controle e a razão, nossos
corpos e nossas vontades estão no controle.
— Caralho, Aaron.
Essa é minha nova frase preferida. Continuo ajoelhado, com minha
boca sobre ela, tomando tudo que Liv tem a me oferecer, fazendo-a
suspirar, gemer e ofegar e só paro quando tenho tudo dela, quando obtenho
cada gota do seu prazer.
Liv tem o corpo relaxado após gozar, eu coloco seu pé no chão,
beijo sua coxa e a marco com meus dentes antes de ficar em pé, e posso
senti-la voltando a ficar tensa.
Ela abre seus olhos quando levo minhas mãos até as alças do sutiã,
puxo-as para baixo conforme a encaro. Seus olhos estão escuros, ao mesmo
tempo em que refletem tranquilidade.
Eu a fiz ficar assim, e isso faz uma satisfação vibrar em meu peito,
ao mesmo tempo em que sinto uma possessividade com Liv, uma vontade
de marcá-la e fazê-la minha que nunca senti com outra pessoa.
É como se meu mundo girasse em torno dela.
Seus seios ficam descobertos e olho para baixo. Eles são perfeitos e
quando levo minhas mãos até eles, constato que cabem perfeitamente em
meus dedos. Liv se impulsiona em minha direção, meus lábios anseiam por
tocá-los, mas resisto. Ainda não.
Volto a olhar para seu rosto, escorrego meus dedos até suas costas e
libero o sutiã, ele cai no chão e eu dou um passo em frente. Desço meus
dedos pela lateral do seu corpo até chegar em sua bunda e aperto sua pele
macia e quente. Meu corpo inteiro está tenso e preciso me controlar para
apenas não baixar minhas calças e a ter aqui contra a porta.
Eu a impulsiono para cima e Liv entende o que quero, passa suas
pernas pela minha cintura e os braços pelo meu pescoço. Beijo seu rosto,
seus lábios e enquanto minha língua duela com a sua, levo-a até a cama,
afasto minha boca da sua, nós dois suspiramos e a deposito sobre o colchão.
Os fios dos seus cabelos são uma bagunça em minha cama, ela tem
as pernas dobradas e seus pés apoiados no colchão. Tão convidativa.
Ela abaixa suas mãos e toca a barra do meu moletom, seus olhos
brilham e sorri, um sorriso sexy. Porra, essa garota será minha morte!
— Você está vestido demais.
Liv puxa meu moletom para cima e o joga para longe, em seguida
faz o mesmo com minha blusa térmica. Seus dedos traçam linhas em meu
abdômen, minha respiração se torna ainda mais irregular. Está cada vez
mais quente e sinto todo o meu corpo em chamas.
Minha boca encontra a sua, minhas mãos exploram seu corpo
enquanto ela continua me tocando, porém, quando Liv enfia a mão por
dentro da minha calça é demais, um arrepio sobe pelo meu corpo, estou
tenso e dolorido.
Eu me afasto, fico em pé, pego a camisinha em minha carteira, joga-
a sobre a cama e Liv abre a embalagem com os dentes enquanto me livro
dos tênis, calça e cueca.
Ela lambe seus lábios ao me ver nu e sorrio orgulhoso, ela ergue
suas sobrancelhas e apoio meus joelhos na cama.
— Você gostou do que viu.
Ajoelhado, eu vou em frente e me aproximo. Toco seu tornozelo, ela
se arrepia e sigo com meus dedos em sua pele.
— Eu gostei e espero que você saiba o que está fazendo.
Pisca para mim com um sorrisinho sacana em seus lábios. Curvo-me
em sua direção, beijo a lateral da sua perna enquanto aperto a outra com
força.
— Não se preocupe, Olívia, eu vou fazer você gritar. — Uso seu
nome propositalmente. — Só tome cuidado, porque não queremos
escandalizar minha família.
Sua gargalhada ecoa pelo quarto, mas ela morre assim que me
posiciono sobre ela. Seus olhos encontram os meus e ela leva suas mãos
para baixo, até minha ereção, então me toca e fecho meus olhos.
Ela tem os dedos em torno de mim, subindo e descendo, a pressão
em meu peito aumenta, sinto todo o meu sangue bombeando na parte de
baixo do meu corpo e não consigo mais me manter coerente. Gemidos e
palavrões deixam minha boca.
— Quem vai precisar se controlar é você, principezinho.
Liv me provoca e morde meu queixo, um grunhido escapa entre
meus lábios e antes que perca o raciocínio por completo, cubro minha boca
com a sua. O beijo nos leva a um outro mundo, um mundo só nosso.
Liv coloca a camisinha e me guia para dentro dela, sou recebido
pelo seu calor e suspiro.
— Caralho, diabinha.
Eu me controlo para simplesmente não a preencher de uma vez.
Sinto as veias do meu braço que estão ao seu lado saltarem com o esforço
que faço para ir com calma.
Liv me solta e traz suas mãos até meu ombro e seu olhar encontra o
meu.
— Não se controle, Aaron.
Suas palavras acionam uma parte insana do meu cérebro. Foda-se!
Não tenho cuidado, não sou gentil, preencho-a com força, saio e volto para
dentro dela no meu próprio ritmo, seguro sua perna ao meu redor e vou
ainda mais fundo, com suas unhas arranha minhas costas e clama por mais,
e eu dou o que ela quer.
Bato em sua bunda, mordo seu ombro e não me contenho.
Somos uma mistura de sons, suor, palavras desconexas e não
ligamos para mais nada. Liv avisa que irá gozar, desfiro mais um tapa na
lateral da sua perna e acelero o ritmo com com que entro e saio dela, seus
gemidos ecoam pelo quarto e meu nome deixa seus lábios quando ela é
dominada pelo seu orgasmo.
Eu continuo até que meu corpo inteiro tensione e se liberte. A
sensação vibra por todo meu ser e o prazer me preenche.
— Porra!
É bom pra caralho e me mantenho de olhos fechados. Meu corpo
está relaxado, saio de dentro dela, tiro a camisinha, deixo no chão e me jogo
ao seu lado. A sensação ecoa pelas minhas células e volto a mim quando
sinto Liv se mexer ao meu lado.
Ela se aproxima, apoia seu rosto em meu peito, eu passo meus
braços ao seu redor e beijo o topo da sua cabeça.
É assim que dormimos e a sensação é a melhor do mundo.
Desperto com os passarinhos cantando e a luz do sol se infiltrando
pelas cortinas. Abro meus olhos e não encontro Liv, eu me sento na cama e
escuto o barulho da água caindo no chuveiro, então me levanto, pego mais
uma camisinha em minha carteira, e sigo para o banheiro.
Eu encontro Liv sob o chuveiro, a água escorre pelo seu corpo e ela
tem os olhos fechados, porque está molhando os cabelos. Meu olhar
percorre seu corpo e é claro que é o suficiente para me despertar.
— Você não esperou por mim.
Caminho na sua direção e ela abre seus olhos. Liv me encara e um
sorriso surge em seu rosto. Linda pra caralho!
— Você estava dormindo tão profundamente e não quis te acordar,
mas eu estava toda grudenta.
Entro no box, paro à sua frente e ela traz as suas mãos até meu
pescoço.
— Ainda bem que eu acordei.
Minha boca encontra a sua, reivindico seus lábios e a giro até ter
suas costas contra o azulejo do banheiro. Dessa vez, a preencho contra a
parede, nossos gemidos ecoam pelo cômodo e nos perdemos chamando o
nome um do outro.
Após o sexo, tomamos banho e vestimos nossas roupas, nós dois
estamos com sorrisos nos rostos e nossos olhares se encontram a todo
instante.
Encontramos minha família assim que deixamos o quarto e
passamos o dia com eles, Liv parece tão à vontade com todos e é um alívio
saber que ela gostou das pessoas que eu mais amo na vida.
Depois do almoço, cantamos parabéns para minha avó, ela mais
uma vez agradece a todos com um tom de despedida que deixa meu coração
apertado e pelo olhar do restante da família, abala a todos, porém, uma
guerrinha de bolas de neve iniciada pelo meu avô alivia o clima, inclusive
Liv participa.
Liv e eu nos tocamos e nos beijamos como se fosse algo que
fizéssemos sempre. Fazer sexo com ela não suprimiu minha necessidade,
minha vontade de tocá-la, na verdade foi pior, aumentou todas as minhas
expectativas e tornou mais urgente a necessidade de tê-la outra vez.
Na hora de virmos embora, nos despedimos da minha avó com a
promessa de não demorarmos para uma outra visita.
Liv e eu guardamos as coisas no carro, ocupamos nossos lugares e
enquanto dirijo para longe da propriedade dos meus avós, me dou conta que
essa foi a mentira mais fácil que eu já tive que contar.
Eles finalmente estão de volta e nós estamos sedentos por detalhes...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Eu acordo e sorrio ao pegar meu celular e me deparar com uma


mensagem de Aaron.
“Bom dia, diabinha! Espero que você tenha uma ótima segunda-
feira e uma ótima semana.”
Sento-me com as costas apoiadas na cabeceira da cama e o
respondo.

“Bom dia, principezinho! Obrigada e desejo o mesmo a você.”


Eu vejo um digitando logo abaixo do seu nome e permaneço
encarando o aparelho até uma nova mensagem piscar na tela.
“Como foi a sua noite?
P.S confesso que a minha poderia ter sido melhor...”
Entendo o que ele está querendo dizer e meu coração acelera, eu
pareço uma adolescente boba, mas, caralho, Aaron é tão fofo e é incrível, e
mexe comigo. É inexplicável.
“Foi uma boa noite, mas concordo com você, poderia ter sido
melhor...”
Respondo o flerte, porque não estamos mais evitando flertar um
com o outro, depois da noite que dividimos na casa dos seus avós, mesmo
se tentássemos, não conseguiríamos, se bem que nunca conseguimos de
fato.
Pensar no que fizemos naquela noite faz com que um arrepio
percorra meu corpo, meus seios se destacam através do material fino do
meu pijama e sinto uma fisgada logo abaixo do meu ventre.
“O que faremos para nossas noites serem melhores, diabinha?”
Eu gosto das muitas versões de Aaron, mas essa de flerte é
irresistível e me deixa ainda mais bobinha.
“Não tenho nenhuma ideia...”
Na verdade, eu tenho muitas ideias e tenho certeza de que Aaron
sabe disso.
“Eu tenho algumas ideias e posso demonstrá-las hoje à noite.”
Leio a sua mensagem e sinto meu corpo mole. Caralho, como ele
me diz algo assim!?
“Isso é uma proposta?”
Eu conto os segundos até receber a sua resposta.
“É...”
“Eu vou pensar se vale a pena aceitá-la, principezinho.”
É claro que eu vou.
“Me avise dos seus planos, por favor, para eu não marcar com
nenhuma outra pessoa”
Ele está me provocando e eu caio na sua provocação, porque ciúme
ecoa em meu peito ao pensar nele com outra garota.
“Tentando me causar ciúmes?”
Mordo meu lábio inferior e espero ansiosa por sua resposta.
“Lógico que não.”
“Só para constar, eu não fiquei com ciúmes, principezinho.”
Há borboletas em minha barriga e suspiro. Quando foi que fiquei
assim? Quando foi que alguém me causou essas sensações? Nem com Noah
foi desse jeito, com ele nunca foi leve, com ele nunca me senti como se
estivesse flutuando.
“É uma lástima... e só para constar, diabinha, acho que você me
estragou para qualquer outra garota.”
Minha pulsação não é a mesma, nem minha respiração e nem meu
coração. Eu não consigo digitar e simplesmente fito o telefone, tentando me
recuperar da sua confissão.
Uma nova mensagem chega.
“Eu vou prestar atenção em minha aula, diabinha. Até mais, beijos e
me avise se quiser fazer algo à noite.”
Ainda atordoada, digito minha próxima mensagem. Deus, nem
conseguindo raciocinar direito eu estou.
“Beijos e boa aula, principezinho.”
É claro que mais tarde ele ficará sabendo que quero fazer algo à
noite. Eu não tenho nada marcado e mesmo se tivesse, talvez desmarcasse.
Não recebo mais nenhuma mensagem, apoio minha cabeça contra a
cabeceira e fito o teto. Cenas do fim de semana ecoam em minha mente e
um sorriso surge em meu rosto.
O fim de semana com sua família foi incrível, fez com que desejasse
o mesmo: uma família grande e divertida. Faz até com que surja uma
vontade de falar com minha mãe e com meu pai, inclusive, vou marcar um
almoço com meu pai para aproveitar que ele está pela cidade, e mais tarde
ligarei para minha mãe.
Meus pensamentos sobre minha família não perduram tanto, porque
Aaron volta a invadi-los. Eu não planejava e não queria que acontecesse
algo entre nós, mas foi inevitável, impossível resistir e ainda mais
impossível me manter longe dele.
E não me arrependo, não quando foi do jeito que foi, não quando
senti o que senti ao estar com ele. Eu faria tudo de novo, aliás, eu teria
perdido o controle antes.
Depois de Noah, nunca dormi com nenhum dos caras que transei, eu
achei que seria estranho, mas, de repente, Aaron estava invadindo o
banheiro, agindo tão naturalmente, além da tensão ao nosso redor me deixar
cega para qualquer possível surto.
Aaron deixou tudo tão fácil e leve. Nós não ficamos sozinhos
durante o dia, porque sua família estava por perto, mesmo assim, quando
meu olhar encontrava o seu, meu coração acelerava e um sentimento
invisível me puxava em sua direção.
A volta para Hanover foi tranquila e tudo que rolou foram
provocações. Aaron parou em frente ao meu prédio e nos despedimos com
um beijo, um beijo que girou meu mundo de ponta cabeça; Aaron tem esse
poder. Uma parte minha queria tê-lo convidado para descer, ou ter ido para
sua casa, mas resisti.
E minha sorte é que nenhuma das meninas estava em casa, Penny
estava com Luke, Ava com Matteo e Meg em algum lugar desconhecido por
mim, porque se tivesse encontrado uma das três, elas teriam percebido que
algo mudou. Algo realmente mudou e eu não quero explicar, não quando
nem eu tenho as respostas.
Suspiro, deixo minha cama e vou para o banheiro, como vou para o
treino, não tomo um banho, apenas escovo meus dentes, troco de roupa e
prendo meu cabelo.
Eu arrumo minha mochila com peças de roupa e o necessário para
tomar um banho, já que vou da arena para minhas aulas. Pego a bolsa com
meus patins, chave, celular, carteira, saio do quarto e vou até a cozinha.
Não encontro nenhuma das meninas; Ava e Penny sei que estão com
Matteo e Luke, mas, e Meg? Ela não costuma ficar tanto tempo com os
caras, talvez ela esteja com alguma outra amiga, mas seria bem incomum.
Enquanto como algo antes de sair, envio uma mensagem e pergunto
se está tudo bem, ela me responde que sim e ficamos de nos encontrar no
treino.
Termino de comer, lavo o que sujei e vou para a arena. Eu sou a
última a chegar, Meg e as outras garotas já estão aqui, Luke passa um
rápido aquecimento e inicia o treino de fato.
Luke pega pesado, ele faz suor escorrer pela minha testa, além de
insistir nos movimentos que temos mais dificuldade. Ele é um cretino e
cada vez que erro, me sinto péssima e incapaz de competir.
Mantenho meus medos e fantasmas do passado aprisionados, mas é
difícil, principalmente quando eles querem se libertar. Eu termino sem
conseguir executar o Flip Jump quádruplo.
— Luke, faz semanas que estou tentando e não consigo, nem
evoluo, talvez seja o momento de desistirmos.
Tento persuadir meu treinador mais uma vez, mas ele balança a
cabeça negando.
— Você irá conseguir.
Eu me controlo para não xingá-lo e assinto. Despeço-me dele,
espero por Meg e juntas vamos para o vestiário. Estou distraída e a voz de
Noah ecoa em minha mente.
“Você precisa ser mais leve, Olívia, ou nunca conseguirá executar
os movimentos corretamente.”
E se ele estiver certo? Minha mente alerta que esse não é o caminho,
mas, e se o problema realmente for meu peso?
— Liv, você está bem?
Minha amiga toca meu braço e me tira do limbo que é minha mente
no momento.
— Sim, eu só estou preocupada, a competição está se aproximando
e não sei se estarei preparada.
Meg sorri.
— É claro que estará, você é incrível.
Forço um sorriso.
— Mas ainda não consigo executar o Flip Jump quádruplo.
Meg dá de ombros como se não fosse nada de mais.
— Mesmo se tirar essa parte da sua apresentação, você terá chances,
Liv.
Eu queria acreditar em minha amiga, mas dessa vez a competição é
a mais acirrada, nós garantimos as vagas para a próxima fase no regional,
mas o campeonato seccional é o mais disputado, é ele que garante a
classificação para o nacional.
— Espero que você e Penny se classifiquem, se não passar, pelo
menos irei torcer por vocês.
Ela ri.
— Penny com certeza irá se classificar.
Nossa amiga realmente é a melhor.
— E você ficará chateada se não se classificar, Meg?
Meg parece pensativa e demora alguns segundos para me responder.
— Um pouco, mas não muito. — Uma ruga surge em sua testa. —
Eu amo a patinação, porém, não é o que eu quero fazer para sempre, é
apenas minha paixão passageira, não o amor da minha vida.
A última parte da sua frase ecoa em minha mente e me pergunto se a
patinação é realmente o amor da minha vida. Não preciso pensar muito,
realmente é.
Meg e eu vamos para o vestiário, eu tomo meu banho, coloco minha
roupa e me despeço da minha amiga. Eu dirijo para o campus, vou para o
prédio da saúde e para minha aula Métodos de Avaliação Clínica e
Funcional.
Como não tenho aula à tarde, vou para casa no horário do almoço.
Eu me recuso a pensar sobre patinação e Aaron ocupa minha mente, é só
dar um espaço que ele surge em minha cabeça. Preciso confirmar que
iremos nos encontrar, mas deixo para fazer isso depois, quando não estiver
mais dirigindo.
Abro a porta do apartamento que divido com minhas amigas e
escuto vozes, elas estão em casa. Largo minhas coisas na sala e sigo os
barulhos que vêm da cozinha, me deparo com Ava e Meg cozinhando e
Penny e Maddy as observando. Elas se viram em minha direção assim que
adentro o cômodo e sorriem ao me ver, eu sorrio de volta.
— Ainda bem que vim para casa.
Sorrio animada e Ava me entrega uma faca e um tomate.
— Não fique tão feliz, irá ajudar.
Eu faço um beicinho e pego a faca.
— Eu passo um final de semana longe e é assim que sou recebida?
Ava apenas revira seus olhos e eu me posiciono ao lado dela no
balcão, Meg está do outro lado da ilha à nossa frente e Penny está na lateral
com Maddy sentada sobre o mármore.
— Falando em final de semana… como foi?
Meg me questiona.
— Foi muito difícil mentir para a família de Aaron?
Penny complementa a pergunta de Meg.
— Matteo me contou que eles moram em uma propriedade enorme e
que são super ricos. São assim mesmo?
Ava colabora e como ela foi a última a se pronunciar, respondo-a
primeiro.
— A propriedade é imensa, linda e extremamente luxuosa, eles são
super ricos. — Olho para Meg, porque é a próxima que irei responder. — O
final de semana foi incrível.
Deixo Penny por último.
— E foi difícil mentir, porque a família de Aaron é incrível, eu me
senti extremamente culpada por estar fazendo algo assim com pessoas tão
legais.
Penny assente e a voz de Meg ecoa pela cozinha.
— E você e Aaron tiveram que se beijar?
Mordo meu lábio inferior, olho para baixo, pico o tomate e demoro
alguns segundos para respondê-la.
— Nós fizemos mais do que nos beijar — confesso, porque somos
melhores amigas. — Ele e eu transamos no sábado.
Ergo minha cabeça e minhas amigas me encaram totalmente
surpresas.
— Então a mentira se tornou verdade.
Faço uma careta para Ava.
— Não é bem assim, nós apenas transamos.
Minha amiga me analisa e sorri como se soubesse de algo.
— Você tem um brilho no olhar. — Aponta a faca em minha
direção. — Você não me engana, Olívia Callahan.
— Você está maluca.
Eu me defendo.
— Você está mesmo com um brilho diferente.
Penny concorda com Ava e olho para as duas, indignada. Elas estão
malucas, só pode ser efeito do amor.
— Vocês duas estão malucas. — Antes que continue criando
fantasias nas cabeças delas, viro-me para Meg e mudo de assunto. — E
você pode se vangloriar por ter vencido a aposta.
Meg não comemora como achei que faria.
— Que aposta?
Ava soa curiosa.
— Meg e eu apostamos quem ficava mais tempo sem sexo e eu
perdi.
— Você não perdeu.
Viro-me surpresa para Meg.
— Não perdi?
Minha amiga assente e me encara com um olhar culpado.
— Eu fiquei com alguém na sexta.
Eu sorrio vitoriosa.
— Eu venci!
Comemoro.
— Pera aí, você ficou o final de semana inteiro sumida.
Penny grita, e Ava e eu olhamos para Meg. O espanto de Penny é
compreensível, já que Meg nunca passou tanto tempo assim com um cara
desde que nos conhecemos.
— O conheci na sexta e ficamos o final de semana inteiro em seu
apartamento.
Há malícia em sua expressão, claramente ela se divertiu com ele.
— Você nunca ficou tanto tempo com um cara.
Soo surpresa.
— Ele foi uma exceção. — Dá de ombros, como se não fosse nada
de mais. — Talvez por ele ser mais velho e experiente, eu tinha coisas para
aprender.
Meg sorri e Ava se vira para ela com uma expressão debochada em
seu rosto.
— Temos mais uma maria-cupim entre nós. — Meg ergue suas
sobrancelhas sem entender o termo e eu mordo meu lábio inferior para não
gargalhar. — Gosta de madeira velha.
Ava explica enquanto faz um gesto sugestivo com as mãos e Penny
se defende.
— Hey, Luke é só nove anos mais velho que eu.
Ava e eu trocamos um olhar repleto de deboche.
— Só nove anos.
Sou sarcástica. Penny continua se defendendo, Meg fala mais sobre
seu velhote e seguimos nos provocando. É um almoço animado, rimos e
conversamos e é início da tarde quando nos separamos.
Penny precisa levar Maddy para casa, Ava tem treino e Meg aula,
então nos despedimos e enquanto minhas amigas seguem para seus
destinos, eu pego as minhas coisas que tinha deixado na sala e vou para o
meu quarto.
Eu me sento na cama, ligo para minha mãe e conversamos por
alguns minutos, assim que desligo o telefone, pego meus cadernos para
estudar e consigo fazer isso por um tempo, até que Aaron volta a invadir
meus pensamentos.
Paro com a caneta em mãos, encaro a parede e, mais uma vez, a
noite de sábado toma conta da minha mente. Caralho, eu quero tanto vê-lo.
Olho para o relógio e me dou conta de que ele deve estar treinando, então
fecho meu caderno, jogo-o sobre a cama, pego meu celular, meus patins e a
chave do carro, saio de casa e dirijo até a arena.
Nosso casal foi visto em clima de muito romance. Que química,
hein!? Melhor que isso, só fogo e gasolina.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron

— Aaron, interceda, não deixe que ele avance.


O treinador grita, ganho velocidade e avanço sobre meu colega do
time que, no momento, é meu adversário por conta do jogo que estamos
simulando. Nós trombamos em um movimento brusco, algo normal no
hóquei.
Brigamos pelo puck, não somos gentis um com o outro e fazemos
tudo que está ao nosso alcance para levarmos a melhor. E eu saio vitorioso,
fico com puck e o jogo na direção do meu companheiro de time, ele recebe,
acelera e parte na direção da baliza.
Continuo atento para o caso de alguém conseguir recuperar o disco e
eu precise agir. Alguém na arquibancada grita meu nome, a voz é familiar e
me contenho para não olhar para o lado. Agora não posso!
Mantenho-me concentrado até gritarem meu nome outra vez,
reconheço a voz. É Liv. O que ela está fazendo aqui? Tento ignorar, mas é
impossível. Ela está aqui e gritando por mim.
Rapidamente olho na direção da arquibancada e lá está Liv, em pé,
encarando-me e gritando meu nome. Meu coração bate acelerado e um
novo sentimento ecoa em meu peito, uma vontade de ser o melhor, porque
ela está aqui.
Aceno para ela e Liv acena de volta. Deus, ela está aqui e me vendo
treinar, eu estou um pouco nervoso, mas é diferente do nervosismo da
semana passada.
— Eu vim torcer por você, principezinho.
Ela grita e satisfação vibra dentro de mim, ocupando um espaço em
meu coração que nem sabia que poderia ser ocupado. Olho em frente com
uma nova motivação, ninguém passa por mim e sigo escutando sua voz.
O treinador está feliz, mas seus comandos ficam em segundo plano,
tudo no momento está em segundo plano. O hóquei apenas me ajuda a
conquistar meu objetivo, impressionar Liv.
Estamos simulando um jogo e os segundos finais se aproximam.
Olho ao redor, analiso a posição de cada um dos meus colegas de time, eu
planejo minha próxima jogada, algo arriscado e que com certeza terá a
reprovação do meu treinador, mas é apenas um treino, em um jogo não
assumiria esse risco.
Assim que tenho o domínio do puck, deixo a linha de defesa, ganho
velocidade e avanço pela pista de patinação. Eu passo pelos meus
companheiros de time, pelos meus adversários e deslizo na direção da
baliza, não paro até colocar o disco dentro da rede e marcar um ponto.
Sorrio empolgado, estou em êxtase, é como se tivesse acabado de
ganhar uma competição. Será que essa é a sensação?
Meus parceiros batem em minhas costas, meus adversários me
encaram sem entender e eu me viro para Liv e faço um sinal com o taco em
sua direção. Esse ponto foi pra ela.
Liv sorri, faz o gesto de um coração com as mãos e meu coração dá
um pulo em meu peito. Se eu pudesse, iria até ela nesse momento.
O som do apito do treinador ecoa pela pista de patinação.
— Treino encerrado. — Eu continuo parado, encarando Liv. — O
que foi isso, Aaron?
Escuto meu nome e sou obrigado a desviar meus olhos dela. Tiro
meu capacete, protetor bucal e encaro meu treinador, eu abro a boca para
respondê-lo, mas Paul para ao meu lado, bate em meu ombro e responde
por mim.
— Ele estava apenas se exibindo para a namorada.
Paul zomba, o treinador faz uma careta, ele claramente não apreciou
a minha jogada. Eu sorrio e dou de ombros.
— Pelo menos eu consegui acertar a baliza.
Ele revira seus olhos.
— Não tente fazer isso em um jogo.
— Jamais arriscaria assim.
Ele assente e se vira de costas, acho que ele não quer conversar
comigo.
— Eu espero.
Grita e se afasta. Alguns colegas falam comigo, eu os respondo, mas
sigo de olho em Liv, ela desce da arquibancada, vai até um banco perto da
pista e troca os tênis pelos patins.
Eu vejo quando ela pisa no gelo, então dispenso quem está falando
comigo e a espero. Liv se aproxima, para à minha frente e diminuo ainda
mais a distância entre nós dois, meu olhar encontra o seu e toco sua cintura
com a minha mão livre.
Não a vejo desde ontem e sinto sua falta, é um alívio tê-la tão perto
outra vez.
— Achei que você não marcasse pontos.
Ela me provoca.
— Eu não marco, mas por você abri uma exceção.
Seus olhos brilham e seu sorriso amplia.
— Você estava tentando me impressionar, não é?
— Consegui?
Ela morde seu lábio inferior, minha mão deixa sua cintura e a levo
até seu rosto, puxo seu lábio e o liberto dos seus dentes. Seus olhos
escurecem e não preciso pensar no que ela está pensando.
— Conseguiu.
Sussurra. Eu me inclino em sua direção, abaixo meu rosto e meus
lábios pairam sobre os seus. Nossas respirações se misturam e a tensão ao
nosso redor é palpável. É libertador cobrir sua boca com a minha.
É tão familiar tocar seus lábios, é como encontrar água no meio do
deserto. Caralho, é tão bom! Movo minha mão até sua nuca e a beijo com
urgência, ela me corresponde e segura o moletom branco que estou usando
com força.
É um toque, basta apenas um encostar para a combustão acontecer
dentro de mim. Nada mais importa e minha vontade é levá-la daqui. Liv se
transforma em meu mundo quando estou com ela.
Eu me recuso a contar há quantos dias a conheço, mas é como se ela
estivesse sempre aqui.
O ar nos falta, o beijo chega ao fim e apoio minha testa na sua. Abro
meus olhos e ela faz o mesmo, seu olhar está escuro e reflete o mesmo
desejo que vibra por todo meu corpo.
— Você não está surtando. — Encaro-a sem entender e Liv espalma
as mãos em meu peito. — Na semana passada, quando tivemos que nos
beijar aqui, você estava surtando.
Enfim entendo o que ela está querendo dizer e curvo os meus lábios
em um sorriso.
— É porque na semana passada eu precisava mentir. — Liv cora,
porque ela entende o que estou querendo dizer. Não é mais uma mentira,
não essa parte, pelo menos. — Eu adoro ver você corar.
Ela ri e me empurra, eu deslizo para trás e lhe ofereço minha mão.
Ela aceita e a puxo em minha direção enquanto sigo patinando para trás.
Liv me encara de cima a baixo como se estivesse me analisando.
— O quê?
Indago e ela volta a encarar meu rosto.
— Você seria péssimo na patinação.
— Por que essa constatação?
Eu nos levo na direção da saída da pista.
— Porque você é muito bruto.
Ela está certa, porém, é claro que irei a provocar de volta.
— Assim como você seria péssima no hóquei por ser muito amável.
Liv se controla para não rir, para de me acompanhar e me obriga a
parar.
— Vamos ver.
— O quê?
— Quem é melhor, você na patinação, ou eu no hóquei, e claro,
quem é melhor sobre os patins.
Ela me desafia.
— E como faremos isso?
— Uma breve competição, pegue seu taco e vamos ver quem é o
melhor, principezinho.
É claro que eu topo. Eu peço o taco de Alex emprestado e dois dos
pucks que usamos para treinar, então Liv e eu nos apoiamos no guarda-
corpo e esperamos todos deixarem a pista de patinação e enquanto
esperamos, combinamos os movimentos que iremos realizar.
Eu posso gostar de Liv, mas não vou deixá-la ganhar. E ela me
encara com um olhar desafiador, ela com certeza não irá facilitar para mim
também.
Assim que a pista está vazia, deixamos os tacos na lateral e vamos
até uma das extremidades. Primeiro iremos descobrir quem patina mais
rápido, nos colocamos em uma posição de corrida e iniciamos a contagem.
— Um, dois, três...
Contamos juntos e no três, disparamos. Eu vou a todo tempo
olhando para o lado e sorrindo debochado, porque estou na frente.
Comemoro ao chegar primeiro na outra extremidade, Liv se junta a mim
segundos depois e estreita seus olhos.
— Ser mais rápido não é o mais importante, Aaron, além do mais,
duvido que ganhasse se estivéssemos de costas.
— Você está me desafiando, diabinha?
Ela assente, então ficamos de costas e deslizamos para trás. É
horrível, faço o meu melhor e mesmo assim Liv chega primeiro.
— Caralho.
Resmungo mal-humorado enquanto giro e a encaro. Liv está
sorrindo satisfeita com seu desempenho. Ardilosa!
— Eu avisei que era a melhor.
Aponto para o taco.
— Vamos ver se consegue acertar o puck dentro da baliza.
Ela sorri como se isso fosse a coisa mais fácil do mundo de
acontecer e patina até o local onde deixamos os tacos e o disco. Eu a sigo,
pegamos os objetos e nos posicionamos no meio da pista e de frente para a
goleira anexada ao gelo.
Eu olho para ela e sorrio, nós dois contamos e no três olho em frente
e sigo na direção da baliza, é fácil, rápido e é claro que acerto a rede. Viro-
me para trás e Liv está tendo dificuldades para controlar o disco, eu sorrio e
minha gargalhada ecoa pela arena quando aplica força sobre o puck, acerta
o gelo e na segunda tentativa joga-o muito longe do seu alvo.
Ela me fuzila e aponta o taco em minha direção.
— Quero ver você continuar sorrindo quando for sua vez de
executar os movimentos da patinação.
Apenas dou de ombros.
— Lançamento à longa distância.
Dessa vez, o objetivo é acertar o disco na baliza de uma longa
distância, mais uma vez eu consigo e Liv joga o puck para a lateral, muito
longe do objetivo. Continuo sorrindo e ela com uma expressão de poucos
amigos.
— Quero só ver se continuará rindo.
Ela deixa o taco na lateral, eu faço o mesmo e voltamos para o
centro da pista. Liv está focada e determinada, o que deixa tudo ainda mais
divertido.
— Imite-me se for capaz. — Ela tem total certeza que irei perder. —
Primeiro, um giro simples.
Ela gira, um movimento simples, mas rápido e que ela executa com
uma elegância que nem se nascesse de novo seria capaz de ter.
— Vamos, Aaron.
Ela me encara com arrogância, eu me recuso a parecer perdido e
finjo estar confiante. Eu giro e é bem mais difícil do que aparenta, quase
caio no meio do giro, entretanto, consigo finalizá-lo.
Olho para Liv e sorrio, ela ergue suas sobrancelhas e me encara com
desdém.
— Esse é um movimento tão fácil, sua postura estava horrível e
você quase caiu. — Faz um barulho de estalo com a boca. — Péssima
execução.
Levo minha mão até meu coração.
— Assim você me magoa, diabinha.
Revira seus olhos.
— Próximo movimento, um giro com um salto e um dos pés fora do
gelo.
Arregalo meus olhos, indignado.
— Isso é muito difícil.
Dá de ombros.
— Isso é tão fácil na patinação, que uma criança seria capaz de
executar de olhos fechados.
Ela faz o movimento, eu tento decorar a execução, mas, caralho, é
difícil.
— Estou esperando, Aaron.
Cruza os braços sob seus seios. Respiro fundo e me preparo, giro,
salto e assim que tiro o pé do chão, perco o equilíbrio e, merda, minha
bunda acaba no chão. Dói e ao olhar para Liv, ela pisca para mim e sorri
debochada.
— Eu acho que venci, não é?
Ela desliza em minha direção e me oferece sua mão.
— Você venceu.
Seus olhos brilham, eu coloco meus dedos sobre os seus e ela me
ajuda a ficar em pé.
— Principezinho, eu sou a melhor no gelo.
Apesar da dor e de ter perdido, sorrio, simplesmente porque ela está
feliz. Quase não há espaço entre nós e descanso minhas mãos em sua
cintura.
— Para você, eu não me importo de perder.
Espalma suas mãos em meu peito e me encara com malícia.
— O que eu vou ganhar por ter vencido?
— Peça o que quiser e eu te darei, diabinha.
O romance está em todos os lugares desse campus... cuidado você
pode ser o próximo infectado.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Aaron me encara como se eu fosse o seu mundo e, nesse momento,


se fosse pedir algo, pediria para que fosse real, para que eu realmente fosse
o seu mundo.
Engulo em seco, forço um sorriso, deslizo para trás e o empurro.
— No momento certo, eu farei o meu pedido.
Ele assente e meus olhos continuam presos aos seus. Ele me encara
de um jeito que rouba meu fôlego, meus pensamentos e minhas ações. Tudo
se torna sobre ele e sobre nós dois. Eu não consigo nem lembrar sobre o
que estávamos falando.
Aaron parece tão perdido quanto eu, seu pomo de adão desce e sobe
em sua garganta.
— Vamos?
Sua voz é rouca e apenas assinto. Em silêncio, pegamos os tacos e
os discos que usamos, colocamos as proteções nas lâminas dos nossos
patins e deixamos a pista de patinação. A tensão segue mesmo sem nos
tocarmos e com uma certa distância entre nós.
— Eu preciso trocar meus patins.
Vou até o banco onde deixei minha bolsa e meus tênis, Aaron me
acompanha, eu me sento e ele se senta ao meu lado. A força que nos puxa
na direção um do outro continua aqui.
Há uma energia que emana do seu corpo e me atinge mesmo que ele
não esteja me tocando. Enquanto tiro meus patins e coloco meus tênis, sinto
seus olhos sobre mim.
— Você está de carro?
— Sim.
Eu olho para ele assim que amarro meus tênis.
— Eu quero levá-la a um lugar.
Soa enigmático e pela cor das suas bochechas, sei que suas
intenções não são castas.
— Isso faz parte de uma das suas ideias?
Apesar do rosto vermelho, um sorriso sexy surge em seus lábios.
— Sim. — Ele deixa sua mão sobre minha coxa e a aperta. — Eu
estou pronto para surpreendê-la, diabinha.
Um simples toque com o tecido entre nós faz com que minha
respiração acelere.
— Sabe, esse seu jeito de flertar descaradamente enquanto está
vermelho me excita.
Aperta outra vez minha perna.
— Eu quero você completamente excitada hoje. — Inclina-se,
morde meu lábio inferior e sustenta meu olhar no seu, ofego e ele ri. —
Saber que eu consigo mexer com você da mesma forma que você mexe
comigo faz com que eu me sinta a porra de um rei.
É tão difícil respirar, é como se o ar ao nosso redor fosse escasso,
como se meus pulmões não estivessem funcionando.
— Então, faça com que eu me torne a sua rainha.
Sussurro com a voz rouca.
— Você já é, Liv. — Morde meu lábio inferior mais uma vez. —
Você já é.
Sua boca cobre a minha e não me importo de estarmos em um lugar
público onde qualquer um pode nos ver, beijo-o como se estivéssemos
apenas nós dois, travo uma batalha com sua língua e me curvo ainda mais
em sua direção quando sua mão aperta minha perna, eu nem me importaria
se ele subisse seus dedos.
Eu preciso tanto do seu toque... eu preciso tanto dele.
Para a minha tristeza, Aaron interrompe o beijo e sua mão deixa
minha perna. Suspiro e ele ri, então abro meus olhos e encontro os seus.
— Aqui, não. — Seu olhar me promete tantas coisas. — Eu preciso
ir até o vestiário para tirar meus patins e tomar um banho, depois podemos
ir até a sua casa, você larga o seu carro e entra no meu.
— Ok, eu vou esperar por você.
Ele volta a aproximar o seu rosto do meu.
— Não vou demorar.
Beija meus lábios rapidamente e fica em pé. Eu o observo ir até o
vestiário, ele olha para trás antes de entrar no local e como pode existir
tanta troca entre nós dois?
Aaron sorri e suspiro quando ele adentra o lugar. Eu fico sozinha,
pego meu celular e rolo as minhas redes sociais, vejo fotos e vídeos, mas
sequer presto atenção. Aaron domina cada pensamento meu.
Nossa competição me faz rir. Eu tento encontrar algo para pedir por
ter vencido, mas não consigo pensar em nada. E ao lembrar do que pode
acontecer durante a noite, partes específicas do meu corpo despertam.
Eu não deveria estar tão envolvida, ele deveria ser só mais um cara,
só que simplesmente não consigo desligar as sensações e sentimentos que
dominam meu corpo, minha alma e meu coração.
Logo eu que jurei que ele não era meu tipo... Eu sou mesmo uma
piada.
Aaron não demora e sai do vestiário com outra roupa e o cabelo
molhado. Por que ele tem que ser tão bonito? E como eu não percebi antes
o quão bonito ele é?
Eu era uma idiota com certeza!
Ele caminha em minha direção, jogo minha mochila sobre meus
ombros e fico em pé. Sua mão procura pela minha assim que está perto o
suficiente e levo meus dedos até os seus.
— Você não demorou.
— Eu tinha um motivo para ser rápido.
Olho para o lado e ele tem os olhos fixos em mim. C-A-R-A-L-H-O!
Ele faz com que eu me sinta a porra de uma adolescente. Eu coro e é como
se borboletas de repente habitassem a minha barriga.
— Você precisa parar de ser assim.
— Assim como?
— Dizer essas coisas.
— Por quê?
Ele está se divertindo com a minha agonia.
— Porque... porque... — Faço uma careta. — Você entendeu.
Pisca em minha direção e faz com que eu fique vermelha.
— Eu entendi, diabinha.
Ele está tão convencido que dou uma leve cotovelada em sua
barriga, o que faz com que ele ria ainda mais.
— Cadê o jogador tímido e nerd, hein?
Ele apenas ri e saímos da arena. Está começando a escurecer e por
um momento paramos para admirar o Sol se pondo, Aaron está logo atrás
de mim e tem uma das suas mãos em minhas costas. O céu é uma mistura
de alaranjado, rosa e azul, é uma visão incrível.
— Só não é mais bonito que você, Olívia.
Ele beija meu pescoço, eu me arrepio e ele sorri.
— Vamos logo, Aaron.
Resmungo.
— Mostre-me onde está seu carro.
Eu mostro e ele me leva até lá, abro a porta, jogo minhas coisas no
banco de trás e sento-me atrás do volante com as pernas para fora, Aaron
fica entre elas e acaricia o meu rosto.
— Encontro você na frente do seu prédio.
Assinto e seus lábios encontram os meus. Perco o fôlego e as batidas
do meu coração. Assim que Aaron se afasta, seguro sua camisa e o puxo em
minha direção.
— A propósito, eu não confirmei, mas minha noite é toda sua.
Toca meu joelho e morde meu lábio inferior.
— Você não vai se arrepender, diabinha.
Ele me solta e dá um passo em frente, trocamos um último olhar e
Aaron fica de costas, ele segue para seu carro, eu fecho a porta e dirijo para
casa.
Aaron me acompanha e é excitante vê-lo me seguindo. Talvez seja
porque tudo que ele faz me deixe assim. Oh, merda, no que eu me
transformei!?
Eu canto as músicas que tocam no rádio, mas até elas me perseguem
quando Ed Sheran inicia Shivers. Presto atenção na letra e, porra, que
merda!
“Eu quero ser aquele cara
Eu quero beijar seus olhos
Eu quero beber aquele sorriso
Eu quero sentir como se
Como se minha alma estivesse pegando fogo”
Ela me faz pensar em Aaron e perguntas ecoam em minha mente,
como: onde ele irá me levar, o que faremos... Tudo o que eu sei é que estou
ansiosa, que tudo em mim anseia por ele.
Eu paro em frente ao prédio, no lugar em que sempre deixo meu
carro, desligo-o e o deixo. Meu coração está acelerado enquanto vou até
Aaron, ele abre a porta e ocupo o lugar ao seu lado. Encaro-o e ele está me
analisando, mais uma vez ele faz minha respiração falhar; Aaron tem esse
efeito sobre mim.
— Pronta?
Assinto e ele coloca o carro em movimento.
— Aonde estamos indo?
— É surpresa e antes tenho que passar em casa e pegar algumas
coisas. — Ele sorri. — Não estava esperando encontrar você no meu treino.
É claro que a minha aparição repentina está o deixando curioso.
— Desculpe estragar seus planos.
Soo debochada e torço para que ele esqueça o assunto.
— Por que você decidiu aparecer no meu treino de hóquei?
Droga, minha tática falha. Preciso inventar alguma boa mentira e
digo a primeira coisa que vem à minha mente.
— Eu precisei ir buscar algo que tinha esquecido na arena e quando
vi você treinando, decidi ficar e assisti-lo jogar.
Fico orgulhosa de mim mesma porque é uma mentira convincente.
— Você está mentindo.
Como ele sabe? Impossível, ele está apenas jogando comigo para
saber se realmente estou falando a verdade.
— Estou falando a verdade.
Insisto e ele balança a cabeça, negando.
— Você está mentindo.
Encaro-o indignada.
— Você não pode saber isso, eu sou uma ótima mentirosa.
Ele ri.
— Você pode ser uma ótima mentirosa, mas eu sei dizer quando está
mentindo. — Bufo irritada e ele ri ainda mais. — Aposto que estava com
saudade, lembrou que treino segunda à tarde e foi para a arena.
O idiota acertou, por isso fico em silêncio.
— Só para constar, eu também estava sentindo sua falta.
Mordo meu lábio para não rir, mas é em vão e acabo rindo. Nossos
risos cessam, então apoio a lateral do meu rosto no banco enquanto encaro
o perfil perfeito de Aaron.
— Explique-me como funciona o jogo de hóquei.
Aaron me explica as regras básicas e não é tão difícil quanto achei
que fosse, embora ainda não consiga visualizar muita coisa. Um dia eu
realmente aprendo sobre o esporte.
Assim que para em frente à sua casa, deixa o carro e eu fico o
esperando. Onde ele irá me levar? Algum lugar especial dele? Um hotel?
Uma cabana?
Milhões de possibilidades ecoam em minha mente e eu odeio e amo
não saber para onde estamos indo.
Olho ao redor, procurando algo para me distrair, o celular de Aaron
ainda está aqui e a música segue ecoando pelo carro. Eu vou vasculhar sua
playlist, nós já conversamos sobre nossas preferências musicais e ele não
vai se incomodar se der uma olhadinha. Pelo multimídia do carro, abro seu
Spotify, ele tem várias músicas boas, vai desde o pop ao rock; muito
eclético.
Uma notificação brilha na tela do carro, é uma mensagem, mas é o
nome salvo que chama minha atenção. Garota 50, porque garota 50?
Curiosidade me corrói e não me aguento, vou até sua agenda eletrônica e
um frio percorre a minha espinha ao me dar conta de que ele salva o
número das garotas por números.
E são 99 números, porra!
Eu procuro meu número e ele salvou com diabinha e um emoji de
patins ao lado. Pelo menos eu não sou a garota 100.
Caralho, Aaron!
Eu preciso deixar sua agenda de lado quando percebo que ele está se
aproximando de volta. Ele levou consigo seus equipamentos de jogar
hóquei e agora está carregando uma bolsa de viagem e cobertores. Por que
ele precisa disso?
Ele deixa a bolsa e os cobertores na caçamba da camionete, faz a
volta, abre a porta e se senta ao meu lado. Ele está sorrindo, mas eu não.
— Por que você salva os números das garotas com o número que
elas representam ao lado?
O descarado tem a decência de ficar vermelho.
— Você mexeu no meu celular?
Ele não parece chateado, mas sim, curioso. Balanço minha cabeça,
negando e estreito meus olhos.
— Eu estava mexendo na sua playlist pela tela do carro quando você
recebeu a mensagem da garota 50.
Seus lábios se curvam em um sorriso.
— Ciúmes, diabinha?
— Não seja ridículo, Aaron.
Ele ri e volta olhar em frente.
— Eu comecei a salvar o número das garotas assim porque sempre
esquecia seus nomes e ficava com vergonha de perguntar outra vez, depois
de um tempo parecia ser algo meu e um controle para saber com quantas
garotas já tinha transado.
Faço uma careta, e o cafajeste ao meu lado liga o carro e dirige
rumo a um lugar que eu ainda não sei qual é.
— Isso é tão ridículo.
Ele dá de ombros.
— Realmente, não é algo que deva me orgulhar, embora 99 seja um
ótimo número, não acha? — Desvia os olhos rapidamente da rua e pisca
para mim. — 100 agora...
Soco seu braço antes que ele tenha chance de continuar.
— Isso doeu, Liv.
— Era para doer. — Olho em frente e cruzo meus braços sob meus
seios. — E seu apelido ainda é principezinho.
Resmungo irônica e ele ri.
— Não se preocupe, você nunca foi e nunca será só um número,
Liv.
Apesar da sua declaração, sigo com raiva. Por que eu estou com
raiva? Eu também não sei.
— Eu pedi pizza, ok para você?
Meu primeiro pensamento são as calorias, mas empurro para o
fundo da minha mente. Hoje, não!
— Vamos em uma pizzaria?
Gostaria de continuar em silêncio, mas minha curiosidade é mais
forte.
— Vamos comer pizza, mas não em uma pizzaria, fiz o pedido e vou
apenas buscá-la.
Segue enigmático.
— E se eu não gostasse de pizza?
— Eu iria cancelar o pedido e buscar algo que você gostasse. —
Suspiro. — O que foi?
Questiona-me e volto a olhar para ele.
— É impossível ficar chateada com você.
Sorri satisfeito.
— É ótimo saber disso.
— Não se ache tanto, Aaron.
Ele comprime seus lábios um no outro para parar de rir e assente. É
óbvio que quer rir e agora eu quero também.
— Gostei das suas playlists.
Mudo de assunto antes que comece a rir e vamos conversando sobre
música até a pizzaria. Aaron para o carro no estacionamento, vai buscar a
pizza e assim que ele volta, dirige para nosso destino, que não demoro
muito a reconhecer.
— Você está me levando para a faculdade?
O que iremos fazer lá?
— Sim, e a uma parte específica.
Não era nenhuma das minhas possibilidades e não consigo
considerar onde ele possa estar me levando. Aaron dirige pelo campus, por
uma parte pouco movimentada no inverno, ele nos leva até o lago, invade o
gramado de ré e só para quando a camionete está quase tocando a água
congelada.
— Por um segundo achei que você nos jogaria no lago.
Ele ri e balança sua cabeça.
— Mais uma curiosidade sobre mim, diabinha: eu sou um ótimo
motorista.
Pisca e se vira, há um sorriso em meus lábios enquanto o observo
deixar o carro. Assim que está do lado de fora, ele faz um sinal para que
espere e eu espero, então Aaron faz a volta, abre a minha porta e me ajuda a
descer.
Eu paro à sua frente, quase não há espaço entre nós dois, nossas
respirações produzem vapor no ar, não há luzes por perto e a lua e as
estrelas são nossa única iluminação.
— Por que estamos aqui?
Sussurro.
— Porque amamos o gelo. — Ele me encara apreensivo e dá um
passo para trás. — Eu só queria impressionar você, diabinha.
Ele faz uma bagunça dentro de mim, deixando-me sem saber como
reagir e pareço uma bobona. Aaron dá um passo para trás, curva-se na
picape, pega a pizza e caminha para a caçamba da camionete.
Eu vou até ele e ofereço ajuda, ele me entrega a caixa com a pizza e
o observo se livrar da lona que cobre o veículo, abaixa a tampa e estende os
cobertores sobre o chão da caçamba, abre a sua bolsa de viagem, pega duas
lanternas e um vinho.
Entrego a pizza para ele, que coloca sobre a cama que ele acabou de
improvisar, junto com o vinho e joga as lanternas em lugares estratégicos,
então me oferece sua mão.
Coloco meus dedos sobre os seus e ele me puxa em sua direção, não
ofereço resistência, vou até ele, que me coloca sentada sobre a camionete e
se senta ao meu lado.
— Você não precisava fazer nada disso para me impressionar, eu já
sou a garota 100.
Estou brincando, mas minha voz soa rouca. Sua mão encontra a
minha nunca e aproxima sua boca da minha.
— Você nunca será só mais uma garota, Olívia.
Há boatos que afirmam que a noite de certo casal foi quentíssima,
embora eles estivessem ao ar livre...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Seus lábios cobrem os meus e Aaron me leva para uma outra


dimensão, ele faz com que todas as partes de mim respondam a ele: corpo,
coração e alma.
É tão bom e tão perfeito. Eu poderia ser beijada por ela a vida toda e
não reclamaria. Poderíamos ficar aqui para sempre.
Rápido demais ele se afasta e protesto, abro meus olhos e ele está
rindo.
— Precisamos comer a pizza ou ela ficará fria.
Faço um beicinho.
— Eu não me importaria de não comer.
— Eu me importaria.
Aaron se distancia e se apoia na lateral da picape, eu faço o mesmo
e ficamos um de frente para o outro. Estamos perto, mas uma parte de mim
gostaria de estar ainda mais perto.
— Não trouxe meus patins. — Faço uma careta ao olhar para o lago.
— Nunca vim aqui durante o inverno e estou arrependida, deve ser ótimo
para patinar.
— A ideia não é patinar.
Sua voz soa repleta de malícia, volto a olhar para Aaron e ergo
minhas sobrancelhas.
— É comer?
Pergunto e ele sorri, um sorriso sexy pra caralho.
— É a ideia principal.
Nenhum de nós dois está falando sobre comida. Aaron se curva para
o lado, pega a caixa de pizza e a deixa sobre suas pernas.
— Espero que goste de Pepperoni.
— É o meu sabor favorito.
Ele suspira aliviado, abre a caixa e a estende em minha direção, eu
me inclino para frente e pego o menor pedaço. Aaron puxa de volta a
embalagem até ele e, ao contrário de mim, pega o maior pedaço.
Comemos em silêncio e ele pega o vinho, tomando o líquido direto
da garrafa, entrega-me e faço o mesmo.
— Conte-me algo engraçado sobre você.
Ele pede, abaixo a garrafa e fico pensando em algo engraçado sobre
mim.
— Eu nunca aprendi a andar de bicicleta. — Ele ri e entrego a
garrafa de vinho para ele. — Sua vez.
Seus olhos brilham divertidos.
— Quando era calouro, eu cumpri a tradição de correr pelado pelo
campo de futebol. — Jogo minha cabeça para trás e uma gargalhada escapa
entre meus lábios. — Matteo, Alex e Paul estavam comigo.
Eu preciso de alguns segundos para enfim conseguir parar de rir.
— Eu queria ter visto a cena.
Digo ainda rindo.
— Queria ter me visto nu antes, ou os meus amigos?
Ele bebe o vinho, paro de rir completamente e inclino minha cabeça
para o lado, como se estivesse pensando sobre o assunto.
— Vocês são um ótimo quarteto de se olhar. — Pisco para ele. —
Mas confesso que manteria meus olhos sobre você.
Desço meu olhar pelo seu corpo, como se estivesse analisando-o.
— Eu sou o mais bonito mesmo.
Nós dois rimos, ele me entrega o vinho outra vez e continuamos
bebendo, comendo e trocando histórias engraçadas. É tão fácil estar com
Aaron, ele me faz rir, eu esqueço todos meus medos, minhas preocupações
e tudo que passa a importar é estar com ele.
Acabamos com a pizza e com o vinho, ergo a garrafa vazia e faço
um beicinho triste.
— Acabou.
Ele ri e aponta para a sua bolsa de viagem.
— Eu trouxe mais duas garrafas.
Sorrio, eu estou feliz por estar aqui, mas o álcool ajuda.
— Você veio preparado.
— Sim, eu vim com munição pesada.
Malícia escorre das suas palavras e minha pulsação se torna
irregular. Mantenho meu olhar no seu e jogo a garrafa no chão, ele faz o
mesmo com a caixa.
— Você nem precisava de munição, bastava me chamar que eu viria.
— Não importa, você merece o mundo.
Suas palavras mexem profundamente comigo, mexem nos
machucados que ainda estão cicatrizando, mas não dói, pelo contrário, eu
sinto como se ele estivesse os tornando menores. Como se ele estivesse os
curando.
Aaron afasta suas costas da picape, senta-se ereto com as pernas
para fora e me estende seu braço, eu coloco minha mão sobre a sua e me
aproximo dele.
Eu tenho algumas opções: me sentar ao seu lado ou me sentar em
seu colo. Escolho a segunda opção, passando minha perna pelo seu quadril,
apoio meus joelhos no carro e fico sobre ele.
Aaron coloca suas mãos em minhas coxas, meu peito quase encosta
no seu e ele me fita. Seus dedos sobem pelo meu corpo e pairam no zíper do
meu casaco.
— Você está com frio, diabinha?
Frio? A temperatura não poderia ser mais irrelevante no momento.
— Não. — Ele tira a minha peça de roupa, sua mão puxa minha
blusa e toca minha barriga. Pele arde onde ele me toca, calor emana pelo
meu corpo. — Eu estou queimando, Aaron.
Ele sabe do que estou falando. Seus dedos seguem subindo pela
minha pele, eu não estou usando sutiã e paira sobre o meu seio. Ofego,
Aaron sorri e inclina sua cabeça até seus lábios estarem na altura da minha
orelha.
— Eu quero você enquanto olhamos para esse lago.
— Eu sou toda sua.
Sussurro enquanto sinto uma pontada no meio das minhas pernas e
meus seios cada vez mais pesados. Aaron beija meu pescoço logo abaixo da
minha orelha, um arrepio sobe pelo meu corpo e fecho meus olhos.
Ele aperta meu seio e suspiro. Seus lábios continuam em minha
pele, ele morde meu queixo e traz sua boca até a minha. Seus dentes puxam
meus lábios enquanto seus dedos brincam com meus mamilos.
As ondas de prazer ecoam em mim, rebolo contra ele e o sinto duro,
tão desesperado quanto eu. Sua boca toma a minha e o beijo é urgente, com
gosto de vinho, pecado e perversidade.
Enfio minhas mãos por dentro das suas peças de roupa e toco sua
pele, ele está quente mesmo com a temperatura baixa. Traço seu abdômen,
sentindo-o contra meus dedos.
Sigo rebolando contra ele, seu beijo me consome e a umidade em
minha calcinha aumenta. Caralho! Enrolo meus dedos ao redor dos tecidos
das suas roupas, puxo-as para cima e Aaron se afasta de mim, abro meus
olhos e jogo suas peças de roupa para longe.
Seus olhos estão sobre mim, escuros e transtornados pela luxúria e
necessidade. Eu não sou a única enlouquecendo.
É totalmente erótico olhar para ele e o encontrar ao ar livre, com as
estrelas e a lua acima de nós, sem camisa e com as minhas mãos sobre ele.
Não trocamos nenhuma palavra, mas sabemos o que fazer:
precisamos nos livrar do restante das nossas roupas. Aaron segura minha
cintura e me coloca sentada ao seu lado, ele joga uma embalagem de
camisinha entre nós dois e tiramos as peças que sobraram em nossos corpos
em um tempo recorde.
Eu volto para seu colo assim que estamos ambos nus e sua mão
encontra minha nuca, ao mesmo tempo em que sua boca cobre a minha. Sua
língua duela com a minha, seus dedos descem até o meio das minhas pernas
e beliscam meu clitóris.
Aaron silencia todos os sons que deixam minha boca e rebolo contra
sua mão. Mais um dedo se junta ao primeiro e a luxúria toma conta de mim.
Ofego quando desce seus lábios até meu pescoço e gozo chamando seu
nome.
Meu corpo treme e é como se minha alma estivesse saindo do meu
corpo. Ao abrir meus olhos, encontro o olhar de Aaron e, porra, ele me
encara como se eu fosse a sua presa.
E nem me importo de ser!
Levo minhas mãos até sua ereção e o toco, fazendo-o suspirar.
Aaron inclina a cabeça para trás, fecha seus olhos e eu observo fascinada as
suas reações e expressões. Eu paro quando me dou conta que ele está quase
gozando. Ele abre seus olhos e os estreita em minha direção.
— Quero você gozando dentro de mim.
Sorrio e leva a mão até a embalagem de camisinha. Aaron me
surpreende ao nos tirar de cima da picape, ele me coloca no chão, aperta
minha cintura e sorri.
— Enquanto eu estiver dentro de você, irá olhar para o lago. —
Guia-me até a lateral da picape, vira-me até estar com as costas em seu
peito. — Apoie suas mãos na lataria.
Eu faço o que ele pede, curvo-me e espalmo minhas mãos em sua
camionete. Fico à sua mercê e quando olho para trás, Aaron está colocando
a camisinha, assim que tudo está em seu devido lugar, volta a me tocar com
seus dedos.
— Caralho, diabinha. — Ele se guia para dentro de mim. — Olhe
para o lago, Liv.
Faço que ele manda e é possível ver nossa imagem refletida no gelo.
Porra! A visão me excita. Aaron está com o rosto virado para o lago, uma
mão segura os fios do meu cabelo e a outra aperta minha cintura.
Ele entra e sai de mim em um ritmo frenético, não há barulhos ao
nosso redor e o único som que escutamos é o dos nossos corpos se unindo.
Mantenho minhas mãos na picape e a cada estocada se torna mais
difícil não fechar meus olhos, mesmo assim continuo olhando para o lago,
sigo vendo-o me possuir, arrancar meus gemidos e me marcar como
nenhum outro cara fez.
Até que é demais e prazer me inunda, toma conta do meu corpo e
faz com que explosões aconteçam em meu interior. Fecho meus olhos e
suspiro satisfeita.
Aaron não demora a me acompanhar e o som das nossas respirações
é tudo que escutamos. A sensação é de como se estivesse flutuando, eu me
sinto completa, transbordando.
Aaron beija meu ombro e se afasta. Eu suspiro e abro meus olhos.
Ele descarta a camisinha e vem até mim, pega-me em seu colo e não hesito
em deixá-lo me carregar, porque minhas pernas estão bambas.
Ele nos leva até a camionete e nos deitamos, ele nos cobre e apoio a
lateral do meu rosto em seu peito. Aaron brinca com os fios do meu cabelo.
— Eu fui eleito o príncipe do baile da escola.
Ele me conta, apoio meu cotovelo na camionete e ergo meu corpo.
— No ensino médio?
Assente e fico vermelho.
— É por isso que você é conhecido por ser um príncipe?
— Sim. — É impossível não rir e seu rosto cora ainda mais. — Isso
é péssimo, eu sei.
— Eu achei adorável.
Não parece acreditar em mim, mas realmente quando imagino a
cena de Aaron sendo coroado um príncipe, ela é adorável.
— Agora você é o meu príncipe.
Ele ri e beija o topo da minha cabeça. Seguimos trocando histórias
engraçadas, inclusive conto do ursinho de pelúcia que tenho até hoje e
dorme na cama comigo.
Nossas risadas ecoam pelo lugar e quando começamos a sentir frio,
pegamos mais uma garrafa de vinho. O álcool modifica minha visão e meu
tato, minhas sensações e meus sentimentos se intensificam.
Cada toque de Aaron acende uma fogueira dentro de mim e não
demoramos a nos perder um no outro novamente, e dessa vez comigo
encarando as estrelas.
É tão incrível quanto a primeira vez, mas estamos exaustos e não
conseguimos ficar acordados, adormecemos e acordamos com o Sol
nascendo, então colocamos nossas roupas e nos sentamos na picape, os
braços de Aaron estão ao meu redor e observamos o Sol nascer por
completo.
Em certo momento, é como se o Sol estivesse saindo do lago.
— Obrigada, foi uma das melhores noites da minha vida.
Sussurro, Aaron me aperta e beija a lateral da minha cabeça.
— Foi uma das melhores noites da minha vida também, diabinha.
James Callahan está na cidade, o ex-jogador de hóquei tem
arrancado suspiros por onde passa, ele continua tão gostoso quanto era
aos 20 anos.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron

Saímos de Dartmouth logo após o Sol nascer, levo Liv até seu
prédio e nos despedimos com um beijo, então eu dirijo para casa. Há um
sorriso em meu rosto e não consigo parar de pensar em nossa noite, foi
muito melhor do que planejei, foi perfeito.
Como tenho aula e não vou demorar a sair, deixo meu carro na
frente de casa, pego a bolsa de viagem, os cobertores e a sacola com o lixo
e corro para dentro.
Eu tenho o azar de encontrar Paul e Alex, os dois estão no sofá da
sala comendo o cereal direto da caixa e olham em minha direção.
— Estava com a namorada que não é namorada?
Alex pergunta com deboche.
— Mas parece namorada.
Paul continua, ergo minha mão, a que está com a sacola de lixo, e
mostro meu dedo do meio para os dois babacas.
— Idiotas.
Sigo para a escada e eles riem, eu nem respondo e vou para o meu
quarto. Largo as coisas no chão e caminho direto para o banheiro, se não me
apressar, irei me atrasar.
Pelos próximos minutos, tomo meu banho, coloco minha roupa e
arrumo os materiais que irei levar para a faculdade, e sigo pensando em Liv.
Jogo minha mochila sobre meu ombro assim que tenho tudo organizado,
pego carteira, celular, chaves e saio do quarto.
Não há tempo para comer e corro para o carro. Minha manhã é um
tédio, adoro o curso de administração, mas algumas matérias me fazem
querer fugir para longe, e além de tudo estou cansado e dolorido. A falta de
sono me faz bocejar a cada dois minutos e meus olhos estão ardendo, apesar
do meu estado deplorável, não teria feito nada diferente.
É claro que Alex, Paul e Matteo ficam de zoação comigo por
mensagem. Por que eu tenho amigos mesmo? Eles continuam o deboche
quando saímos para almoçar e piora quando confesso que estávamos no
lago. Inimigos pra quê?
Deixo os idiotas de lado quando a notificação de mensagem brilha
na tela do meu celular; uma mensagem de Liv. Pego o aparelho que está ao
meu lado sobre a mesa e clico na notificação
“Hey, principezinho, como foi sua noite?”
Sorrio com a mensagem e a respondo no mesmo momento.
“Incrível, uma das melhores noites da minha vida e a sua?”
— Pelo sorriso e brilho no olhar, ele só pode estar falando com ela.
Alex me provoca e o ignoro, porque recebo outra mensagem dela.
“Olha que coincidência... também foi uma das melhores noites da
minha vida.”
Não me importo com a opinião e zoação dos meus amigos, sorrio e
digito a minha próxima mensagem.
“Muita coincidência, diabinha.”
— Quando você irá pedir a garota em namoro de verdade?
Ergo meus olhos do celular para responder Paul.
— Você deveria cuidar da própria vida, sabia? — Ele apenas ri e
reviro meus olhos. — Tomara que você encontre uma garota que ferre com
a sua mente.
Ele faz um gesto de desdém com a mão.
— Isso é impossível.
— Eu, se fosse você, não soaria assim tão convicto.
Matteo o repreende, eu deixo o idiota de lado, olho para baixo e me
deparo com uma nova mensagem de Liv.
“Meu pai nos chamou para jantar com ele outra vez, você está livre
hoje à noite?”
A ideia de jantar com James não me apavora mais, talvez porque
não precise mentir, não por completo, pelo menos.
“Sim, qual o horário? Pego você na sua casa.”
— O carnaval de inverno está se aproximando e vocês sabem o que
isso significa, não é? — Paul finalmente me esquece e muda de assunto. —
Muitas festas.
Ele mesmo responde sua pergunta e enquanto combino com Liv de
jantarmos com seu pai, meus amigos conversam sobre o carnaval de
inverno que acontecerá no próximo mês, com o tema “O melhor inverno
das nossas vidas”. Será um fim de semana com campeonatos de esqui,
apresentação do coral da faculdade, uma corrida de trenós, a construção de
bonecos de neve, guerras de bolas de neve e muitas festas organizadas pelas
fraternidades.
Depois do almoço, cada um de nós quatro segue seu caminho, eu
estou morrendo de sono e vou para casa, finalmente posso dormir. Eu vou
direto para o meu quarto ao chegar e me atiro na cama, troco mais algumas
mensagens com Liv e apago.
Acordo no fim da tarde, me levanto, desço até a cozinha para comer
algo e volto para o quarto, sento-me de frente para o meu computador e
pelos próximos minutos me divirto jogando.
Só paro porque preciso ir buscar Liv e estou atrasado, droga!
Apressado, troco de roupa, pego o que preciso, deixo o quarto e vou para o
carro. Dirijo até sua casa e não preciso avisar que cheguei, porque ela está
me esperando.
Liv ocupa o lugar ao meu lado, no mesmo instante curvo-me em sua
direção, ela se inclina também e nossos lábios se encontram. É um beijo
rápido, mas que mesmo assim faz algo dentro de mim bater de um jeito
diferente.
É Liv a interromper o beijo, ela toca os fios do meu cabelo que estão
saindo pelo boné e sorri, um sorriso sexy.
— Eu amo quando está de boné.
Pisco para ela.
— Anotado.
Ela segue sorrindo e volta ao seu lugar, eu faço o mesmo e dirijo
para o prédio luxuoso do seu pai.
— Você está atrasado.
Faço uma careta.
— Achei que você nem tinha reparado.
— Só estava esperando o momento certo, porque antes queria um
beijo. — Liv nem disfarça e nós dois rimos. — Mas é sério, você demorou
tanto que desci, porque se esperasse sua mensagem nos atrasaríamos ainda
mais e meu pai detesta atrasos.
— Desculpe.
Olho brevemente para o lado e ela está tentando não rir.
— O que estava fazendo?
— Jogando.
— Sério?
— Sim.
Ela bufa.
— Ótimo, perdi para um jogo.
Levo minha mão até sua perna e a aperto.
— Não se preocupe, você ainda é a número 1.
— A número 100, não é?
Ela soa ressentida.
— Você não vai esquecer isso?
— Não.
Ela pode estar me provocando, mas, lá no fundo, sei que a questão a
incomoda, e eu gosto de saber que ela está com ciúmes.
— Não se preocupe, eu vou me empenhar em fazer você esquecer.
Ela suspira e mais uma vez me repreende por dizer coisas fofas, essa
era exatamente a reação que eu queria.
— E se empenhe direitinho, porque soube que você é um
fofoqueiro.
— Eu?
Finjo inocência, mas sei que Matteo deve ter contado para Ava que
falei para os caras que fomos no lago da faculdade ontem à noite. Matteo
que é um fofoqueiro.
— Ava me contou que você falou que transamos ao ar livre na
faculdade.
— Eu não contei isso. — Soo indignado. — Apenas falei que
tínhamos ido no lago, não disse o que tínhamos feito.
— Filha da puta. — Sua voz sai mais alta que o normal. — Ela
mentiu para descobrir se era verdade, eu me entreguei e ainda contei os
detalhes.
Liv realmente parece chateada consigo mesma e me controlo para
não rir da sua reação.
— Quem é a fofoqueira agora? Estou esperando o pedido de
desculpas.
— Sem pedido de desculpas, principezinho.
O clima entre nós continua leve o restante do caminho, nunca canso
de estar com Liv.
Estaciono na frente do prédio de James e o pânico em mentir segue
distante, já que eu nem penso em mentir, talvez tenha mentido tanto que
esteja acreditando nas minhas mentiras.
Deixamos o carro e, de mãos dadas, seguimos para a recepção,
dessa vez, não vamos de elevador e subimos os lances da escada. Eu me
sinto culpado, mas Liv me tranquiliza.
Ela é realmente incrível.
Seu pai abre a porta segundos depois de apertarmos a campainha,
ele menciona o atraso, porém não parece chateado. Como da outra vez,
vamos para a cozinha e há vinho e aperitivos, contudo, quando Liv e eu
olhamos para o vinho, pensamos em outra coisa, compartilhamos outras
memórias.
James prepara o jantar e nós o ajudamos, o principal assunto é o
nosso fim de semana com minha família, James faz perguntas e as
respondemos.
O clima é agradável, no entanto, depois de jantarmos tudo muda
quando James puxa o assunto patinação. É nítido que o assunto deixa Liv
tensa, por mais que ela tente disfarçar.
Ela mente sobre como está se sentindo com a aproximação da
competição, James acredita, mas eu sei que algo a está incomodando.
Terminamos de limpar o que sujamos e vamos para a sala, nós nos
sentamos no sofá e Liv encontra um sutiã, segura com as pontas do dedo e
olha para o pai que está na poltrona ao nosso lado com uma ruga em sua
testa.
— Pai, o que é isso?
James fica vermelho e estende sua mão, Liv joga a peça de roupa
em sua direção. Ela não está feliz com a situação.
— Você sabe muito bem o que é isso.
Esconde o sutiã no meio das almofadas. Eu preciso me segurar para
não rir, é algo tão constrangedor, James tem razão em estar vermelho.
— Nenhuma filha quer saber que o pai anda transando no sofá da
sala.
Liv faz uma careta.
— Acontece.
Liv revira seus olhos e James dá de ombros.
— Não quero detalhes, pai.
— Ok. — James se inclina, apoia os cotovelos em sua perna e fita a
filha. — Você já contou para sua mãe sobre Aaron?
Faz um sinal na minha direção.
— Ainda não.
— É melhor você contar, porque ela não irá gostar de ser a última a
saber. — Liv assente e James se vira para mim. — Pronto para o jogo do
fim de semana?
Eu concordo e estabelecemos uma conversa sobre hóquei. É o
último assunto da noite e em seguida, Liv e eu nos despedimos e deixamos
seu apartamento. Novamente descemos pelas escadas, o que é um alívio,
odiaria entrar em um elevador a essa hora, com certeza iria pensar na
escuridão lá de fora e minha fobia se intensificaria.
Assim que entramos no carro e o ligo, faço uma pergunta que tem
ecoado em minha mente:
— Por que você ficou tensa quando seu pai falou da patinação
Liv só me responde depois de alguns segundos.
— Porque meu pai está preocupado.
— Por quê?
Parece existir tão mais nessa história.
— Porque a patinação é meu maior amor, mas também já foi meu
tormento.
A voz de Liv é carregada de dor, é a certeza que preciso para
entender que há mais nessa história.
— Ele tem medo de que seja outra vez?
A leveza que nos cerca quando estamos juntos cedeu lugar a uma
tensão.
— Sim.
— E você?
Ela não me responde imediatamente, o que significa que as feridas
de Liv ainda estão abertas.
— Eu também.
Existe dor em sua voz, minha vontade é parar e abraçá-la, mas não
faço isso. Seguimos em silêncio e a música é o único som preenchendo o
carro. Eu paro em frente ao seu prédio, solto meu cinto e olho em sua
direção.
As luzes dos postes nos iluminam e me possibilitam enxergar Liv.
Ela tem a cabeça apoiada no banco e sorri.
— Você deveria subir comigo.
Nós passamos a noite de ontem juntos e deveria recusar, mas não
consigo, é impossível.
— Eu vou subir com você.
Quanto mais tempo eu passo com Liv, mais tempo eu quero ter com
ela. Talvez em algum momento eu canse, ou ela canse de mim, mas, por
enquanto, tudo que precisamos é estar um com o outro e eu vou aproveitar
cada segundo ao seu lado.
Nossa mente pode ser nosso pior inimigo.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Luke grita os movimentos que devo executar, eu rapidamente


repasso o que devo fazer em minha mente e me preparo, tenho certeza de
tudo, sei de cor cada detalhe, meu corpo só precisa me obedecer.
Não é para ser difícil, eu estou na patinação há anos, sou uma das
principais patinadoras da faculdade, eu me classifiquei no campeonato
regional em segundo lugar.
Mesmo assim, eu falho. Mesmo assim, não faço o movimento
perfeitamente.
— Caralho!
Esbravejo assim que meus patins atingem o gelo. Raiva borbulha em
meu peito, fecho minhas mãos em punho e mais palavrões deixam minha
boca.
— Liv. — Ignoro Luke, ele está logo atrás de mim e não me viro em
sua direção. — Liv.
Ele insiste, mas não quero falar com ele, não estou em meu melhor
momento.
— Olívia, algo está acontecendo?
Luke usa o meu nome e isso me deixa com mais raiva ainda, eu
preciso de motivos para extravasar e ele está me dando.
— O que está acontecendo é que você está sendo um treinador
horrível.
Viro-me para ele, Luke suspira e mantém o olhar sobre o meu.
— Não estou sendo horrível, eu só estou cobrando mais de você,
porque sei da sua capacidade.
Balanço minha cabeça negando.
— Eu não tenho essa capacidade, Luke, e está na hora de você
aceitar isso. — Passo a mão pela minha testa, tirando os fios do meu cabelo
que estão presos em minha pele. — Concentre-se em Penny e em Meg, elas
são suas chances de brilhar.
Segue me encarando, mas algo em seu olhar faz com que me
encolha. Ele está me fitando com pena. Eu não quero pena de ninguém.
— Eu não posso fazer isso, Luke.
Fico de costas para o meu treinador e patino na direção da saída com
uma pressão em meu peito. Luke me chama, mas sequer olho para trás.
Dessa vez, não há lágrimas em meus olhos, só resta uma sensação de
fracasso e exaustão me dominando.
É uma manhã de sexta-feira, eu deveria estar radiante pela
aproximação do fim de semana, mas estou péssima.
Engulo em seco, coloco o protetor nas minhas lâminas e deixo a
pista de gelo. Não é assim que eu queria me sentir, só que há uma luta
dentro de mim e estou perdendo no momento.
Sigo para o vestiário, tiro minha roupa e entro embaixo de um dos
chuveiros. Lavo meu corpo e gostaria que a água fosse capaz de lavar
minha alma também.
Não choro, porque não há lágrimas. É como se de repente fosse oca,
nenhum sentimento, apenas um vazio. Sou um desastre nesse instante.
Eu termino o banho, enrolo uma toalha ao redor do meu corpo e ao
sair me deparo com Meg. Ela está sentada em um dos bancos que ficam
espalhados pelo vestiário e fica em pé ao me ver.
— Você deveria se cobrar menos, Liv, você é incrível. — Apenas
assinto. — E nós sempre estaremos ao seu lado.
Ela se aproxima e me puxa para um abraço, eu me deixo ser
abraçada pela minha amiga e respiro fundo, permitindo que um pouco da
minha frustração saia de dentro de mim.
— Obrigada — agradeço assim que ela dá um passo para trás. —
Acho que eu preciso de um tempo.
Ela ergue suas sobrancelhas.
— Da patinação?
Dou de ombros.
— Não sei, eu preciso pensar.
Eu sou uma bagunça e preciso me reencontrar, ou vou me perder
outra vez.
— Só lembre que sempre estaremos aqui.
Assinto mais uma vez, Meg sorri e me dá espaço para que possa me
trocar. Eu coloco minha roupa e me despeço da minha amiga, então vou
para o meu carro, guardo minhas coisas, sento-me atrás do volante e respiro
fundo.
Às vezes eu esqueço que alguns dos meus machucados ainda
sangram.
Eu opto por não almoçar e vou para a biblioteca, meus pensamentos
e meus sentimentos continuam um caos, mesmo tentando prestar a atenção
no que estou lendo, não consigo, preciso ler e reler o mesmo parágrafo
várias vezes.
A fome também não ajuda, porém, quando penso em comer, a voz
de Noah ecoa em minha mente.
“Se você fosse mais leve, Oli, seria mais fácil.”
Talvez ele esteja certo.
Os minutos se arrastam, eu sigo na luta de tentar estudar e estou
lendo o mesmo parágrafo pela quarta vez quando a tela do meu celular se
acende. Eu estou com meu computador à minha frente e o celular ao meu
lado. Olho para baixo e é uma mensagem de Aaron. Nós conversamos antes
do treino, mas depois não o respondi mais.
Há um misto de sentimentos, eu quero respondê-lo, mas ao mesmo
tempo não quero. Não sou a melhor pessoa no momento, porém, sinto a
necessidade de falar com Aaron. Ele me conforta e quero um pouco disso,
mesmo que seja por mensagem.
Olho ao redor, encaro as prateleiras com os livros e os outros alunos
estudando. Não deveria responder, porque estou de mau humor, entretanto,
eu preciso dele.
Mordo meu lábio inferior, volto a encarar o aparelho sobre a mesa e
depois de alguns segundos, tomo o celular em minhas mãos e clico na
notificação.
“Você decidiu não me responder mais? Já enjoou de mim?”
Ele não está aqui, é uma mensagem de texto, mas juro que é como
se estivesse ouvindo sua voz dramática.
“Seria impossível enjoar de você, principezinho. Apenas estou na
biblioteca estudando e deixei o celular de lado.”
Até consigo sorrir enquanto digito a mensagem.
“É um alívio saber disso.”
Como pode uma mensagem causar um frio na minha barriga?
“Não é hoje que destruo seu ego.”
Seguimos trocando mensagens e provocações, e apesar da bagunça
que eu estou, consigo me distrair um pouco com Aaron. Ele para de me
responder de repente, suspiro e sinto falta. Eu sinto a porra da falta das suas
mensagens.
Meu Deus!
Eu o vi na terça, quarta e ontem foi o único dia que ficamos
distantes e se for sincera comigo mesma, estou sentindo sua falta e pra
caralho. O quão emocionada, isso me faz?
Olho para o celular e não há nenhuma nova mensagem, suspiro e
volto a encarar o notebook à minha frente. Eu estou ainda mais distraída
que antes. Merda!
Por um segundo, penso em ir assistir Aaron treinar, mas lembro que
não haverá treino, porque o jogo deles é amanhã. Droga! Vou ter que
continuar em minha miséria.
Eu demoro praticamente vinte minutos, mas enfim consigo terminar
de ler uma página e no mesmo instante um arrepio percorre meu corpo, é
aquele formigamento que só acontece quando Aaron está por perto.
Olho para trás e meu coração dá um pulo em meu peito quando me
deparo com ele, Aaron está caminhando em minha direção; está a
centímetros de mim.
Vê-lo aqui causa uma sensação tão boa em mim, como se agora não
estivesse mais sozinha. Nem eu sabia que precisava tanto vê-lo!
— Hey, diabinha, eu vim resgatá-la desse seu árduo destino de
estudar.
Ele fala mais alto do que o permitido, recebemos olhares nada
amigáveis e a bibliotecária pede que façamos silêncio. Comprimo meus
lábios um no outro para não rir.
— Será que dessa vez vamos ser presos por estarmos perturbando o
silêncio em uma biblioteca?
Sussurro e Aaron ri, ele segue vindo em minha direção. Eu olho
para cima, ele traz sua mão até meu rabo de cavalo e seus dedos seguram os
fios do meu cabelo. Mantemos nossos olhos um no outro e ele inclina seu
corpo para frente até seus lábios estarem a centímetros dos meus.
— Por favor, vamos evitar sermos presos.
É engraçado, mas não rio, porque assim que encontra sua boca na
minha eu esqueço de tudo. É um simples beijo que faz todo o meu corpo
formigar.
Mais rápido do que gostaria, Aaron se afasta, puxa uma cadeira e se
senta ao meu lado. Passa seu braço pelos meus ombros e encara o meu
computador.
— Inovações na Fisioterapia. — Ele lê o título do tópico que estou
lendo e em seguida volta a encarar meus olhos. — Parece bem chato.
Dou um leve tapa em sua barriga.
— Não é chato.
Ele ri e em seguida, nós dois ficamos em silêncio e me dou conta de
que estou cansada de ser forte. Com Aaron, eu não preciso de armaduras,
ele pode ver as rachaduras em minha alma, mesmo que não mereça.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não foi um bom dia. — Minha garganta embarga. — Nós
podemos sair daqui.
Peço antes que desmorone. Ele assente e no mesmo instante fica em
pé. Aaron me oferece sua mão, ajuda-me a ficar em pé e a guardar meus
materiais.
Assim que tenho minha mochila sobre os ombros, deixamos a
biblioteca. Ele me leva até seu carro, jogo minhas coisas no banco de trás,
Aaron segura a porta e só a fecha depois que estou sentada, então dá a volta
e ocupa o lugar atrás da direção.
— Você quer ir para algum lugar?
Pergunta-me enquanto me encara com preocupação e só consigo
pensar em um lugar no momento.
— Podemos ir para o lago?
Ele assente e coloca o carro em movimento. Eu olho para o lado e
encaro as ruas pela janela, o tempo está nublado e deve nevar mais tarde.
— Você quer conversar?
Sua pergunta ecoa em minha mente e lágrimas se acumulam em
meus olhos.
— Eu tive um péssimo treino. — Olho para cima para não deixar as
lágrimas caírem. — Não estou conseguindo evoluir e a competição é em
três semanas.
— Você irá conseguir, Liv, é talentosa e talvez só esteja cobrando
demais de si mesma.
Sei que ele está tentando me consolar, mas a pressão em meu peito
aumenta.
— Eu tenho impressão de que só estou me enganando. — Sorrio
sem humor. — Não nasci para a patinação.
Aaron toca a minha perna e a aperta.
— Liv, sei que não entendo nada de patinação artística, mas quando
eu olho para você, só enxergo alguém talentosa, não vejo seus erros.
— Eu tenho medo de não ser o suficiente, Aaron — confesso. —
Medo de me decepcionar, medo de não ser boa no que eu mais amo fazer.
Não consigo olhar para ele, entretanto, é a primeira vez que digo
isso a alguém que não seja meu psicólogo.
— É compreensível, mas você não pode deixar seu medo vencer.
— Eu sei, mas o que vai sobrar de mim sem a patinação?
Respiro fundo e, mais uma vez, preciso me controlar para não deixar
uma lágrima descer pelo meu rosto.
— A patinação é algo que você ama, mas não é você, Liv, não é
tudo.
Suas palavras ecoam em minha mente e seguimos em silêncio. Não
demoramos a chegar, porque já estávamos no campus e assim que Aaron
para no mesmo lugar daquela noite, viro-me para ele.
Aaron tem os olhos sobre mim e ele está preocupado. Ótimo, agora
há mais uma pessoa preocupada comigo.
— Você tem patins?
Empurro a frustração para o fundo da minha mente, pelo menos por
enquanto.
— Sim, está na caçamba da camionete.
— Podemos patinar?
Ele sorri, ergue sua mão e coloca alguns fios do meu cabelo atrás da
minha orelha.
— Podemos fazer tudo que você quiser.
Inclino-me e beijo seus lábios rapidamente.
— Vamos, principezinho.
Afasto-me, pego meus patins e deixo o carro, Aaron faz o mesmo e
vai até a caçamba, ele pega seus patins e a abre para que possamos nos
sentar, então trocamos os tênis pelos patins e vamos para o gelo.
Patinamos em silêncio, os primeiros minutos de mãos dadas até que
eu me desvencilho dele e deslizo pelo lago congelado. Enquanto sinto o
vento frio em meu rosto, sou esmagada pelos meus medos e frustrações.
É uma pressão absurda em meu peito. É tão desesperador! E se
nunca for boa em nada? E se Noah estiver certo? E se for uma farsa? E se
só sou alguém por conta da influência do meu pai? E se não merecer ser
amada? E se estiver sonhando com muito?
Não preciso ser a melhor, mas não significa que não queira. Não
preciso ser amada, mas e se eu quiser?
Executo movimentos sem parar, lágrimas descem pelo meu rosto, as
vozes do passado seguem me atormentando. As lâminas dos meus patins
tocam o gelo, eu rodopio, giro, salto, sigo chorando e minhas feridas
continuam sangrando.
Sei que Aaron está aqui, mesmo assim desmorono.
Até que piso errado e caio de bunda no chão. Aaron se aproxima e
se abaixa.
— Liv.
Encaro-o com as lágrimas caindo dos meus olhos. Não há palavras,
não há o que ser dito. Ele me pega em seus braços e nos tira do gelo. Ele me
leva até a camionete, coloca-me sentada e tira meus patins, em seguida tira
os seus e se senta ao meu lado, Aaron me puxa para seus braços e o deixo
me abraçar.
Eu choro e deixo que alguém me segure. A dor se torna choro até
que não reste nenhuma lágrima. O Sol está se pondo e as cores se misturam
no céu.
— Desculpe.
Sussurro e Aaron beija o topo da minha cabeça enquanto me aperta
ainda mais contra seu corpo.
— Está tudo bem.
Ele sussurra de volta e, por um momento, eu acredito nele.
Vocês viram nossa patinadora torcendo para o nosso principezinho?
Ele até jogou melhor... O que o amor não faz, não é?!
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron

Acordo com meu celular tocando, levo minha mão até a mesa de
cabeceira e, ainda de olhos fechados, trago o aparelho até minha orelha.
— Bom dia.
Resmungo.
— Bom dia, garoto, você não deveria estar de pé?
Reconheço a quem a voz pertence no mesmo instante.
— Oi, Eileen.
Provoco minha vó.
— Vovó, nunca Eileen.
Ele me repreende no mesmo instante e sorrio.
— Oi, vovó.
— Bem melhor, como você está?
— Bem e a senhora?
Abro meus olhos e encaro a garota que está deitada em meu peito.
Liv dorme profundamente e seus cabelos estão espalhados pela cama e pelo
meu corpo.
— Ótima, eu finalmente fiz a última sessão de quimioterapia e estou
em remissão, querido.
As palavras ditas pela minha vó ecoam em minha mente, demoro a
compreendê-las.
— Remissão?
Eu preciso ter certeza para não ter falsas esperanças.
— Sim, eu estou bem, Aaron.
Preciso de alguns segundos em silêncio para assimilar a notícia e
quando enfim a ficha cai, uma lágrima desce pelo meu rosto, alívio ecoa em
meu peito e todo medo se dissipa, se transformando em esperança.
— Vó, isso é perfeito.
Digo com a voz embargada. Ela está bem, minha avó irá ficar bem.
Felicidade preenche os espaços antes ocupados pelo medo em meu coração.
— Eu queria ir ao seu jogo e fazer uma surpresa, mas ainda é cedo
demais.
Suspira e eu fico em silêncio, as palavras simplesmente fugiram de
mim, eu só consigo pensar no que ela acabou de me contar. “Eu finalmente
fiz a última sessão de quimioterapia e estou em remissão, querido.”
Um detalhe chama a minha atenção e pergunto sobre antes que
minha avó fale algo e esqueça o assunto:
— Por que eu não sabia que era a sua última sessão? Eu nem sabia
que o tratamento estava na reta final.
Minha avó demora alguns segundos para me responder, ela está me
escondendo algo.
— Eu queria ter certeza de que tinha funcionado e fazer uma
surpresa. — Ela não me passa confiança. — Seu avô quer falar com você.
Ela muda de assunto e antes que tenha chance de questioná-la, passa
o telefone para meu avô e pelos próximos minutos converso com ele,
trocamos expectativas pelo jogo e ele diz que tem certeza que venceremos o
time de Harvard. Eu também estou confiante.
Liv acorda, desvencilha-se de mim e a observo ir para o meu
banheiro enquanto ainda estou conversando com meu avô. Eu me despeço
dele, garantindo que vamos vencer e vou dedicar a vitória a eles.
Assim que encerramos a ligação, deixo a cama e sigo para o
banheiro. Liv está escovando os dentes de frente para a pia, eu paro logo
atrás dela e encaro nosso reflexo no espelho.
— Como você está?
Ela termina de escovar seus dentes e seu olhar encontra o meu pelo
espelho.
— Eu estou bem.
Apoio minhas mãos em sua cintura enquanto meu olhar percorre seu
rosto, tentando encontrar verdade no que ela está me dizendo. Ontem após o
lago, voltamos até a biblioteca, ela levou o seu carro para casa e viemos
para cá, eu preparei uma sopa e comemos em meu quarto enquanto
assistíamos Friends. Detesto o seriado, mas é o preferido de Liv. Tem algo
que eu não faça por essa garota!?
Não fizemos nada na noite passada, eu apenas a segurei em meus
braços como se fosse capaz de destruir seus medos e inseguranças.
A sombra que estava presente em seus olhos ontem não está mais
aqui, ela voltou a ser a minha Liv, mas sigo preocupado, foi desesperador
vê-la daquele jeito. Era como se ela estivesse perdida.
Liv se vira, seu olhar encontra o meu e espalma suas mãos em meu
peito.
— Hey, é sério. — Ela sorri, a porra do sorriso que é capaz de me
tirar de órbita. — Hoje não é sobre mim, é sobre você.
— Minha avó está em remissão.
Seus olhos brilham e seu sorriso amplia.
— Aaron, isso é incrível!
Lágrimas se acumulam em meus olhos e aperto sua cintura.
— Minha avó está em remissão.
Repito e ela assente.
— Isso é incrível, Aaron.
Ela faz o mesmo que eu e repete as suas palavras, elas ecoam em
minha mente e é realmente incrível. As lágrimas transbordam e descem
pelo meu rosto. É um choro de alívio, é saber que a pessoa que eu mais amo
no mundo irá ficar bem, que eu não vou perdê-la.
É o sentimento de medo me libertando, é o peso que existia em
minhas costas sendo retirado. Curvo-me e apoio minha testa no ombro de
Liv enquanto choro compulsivamente. Liv traz suas mãos até minhas costas
e seus dedos sobem e descem pela minha pele.
— Ela está bem, Aaron.
Sua voz é tão gentil. E ela está certa. Ela está bem, eu não preciso
mais temer, meus pesadelos não irão se concretizar. Eu não vou perder mais
ninguém.
Aos poucos o choro cessa e afasto minha testa do seu ombro, volto a
ficar ereto e ela traz suas mãos até meu rosto, afastando as lágrimas da
minha pele com as pontas dos seus dedos.
— Hoje foi sua vez de chorar.
Pisca para mim, eu sorrio e dou de ombros.
— Atingimos um novo nível de intimidade chorando na frente um
do outro.
Ela assente, desce suas mãos até a minha camisa que está usando e a
puxa para cima. Eu mantenho meu olhar sobre seu rosto, porque não é sobre
sexo, não agora.
Liv fica nua e vai para o box, eu faço o mesmo e a sigo.
Compartilhamos um banho, lavamos um ao outro e o máximo que rola é um
selinho. Não é porque não nos desejamos, é porque é mais que isso.
Saímos do chuveiro, colocamos as mesmas roupas que usamos para
dormir, ela a minha camiseta e eu uma calça de moletom e voltamos para o
meu quarto.
Nós dois subimos em minha cama, eu me sento com as costas
apoiadas na cabeceira e ela se senta entre minhas pernas com as costas
contra meu peito.
Não queremos descer e encontrar meus amigos, porque não
queremos socializar e temos a necessidade de estarmos um com o outro. Eu
tenho os braços ao redor de Liv, nossas mãos estão unidas e ela brinca com
meus dedos.
— Meu maior medo é perder mais alguém que eu amo.
Confesso.
— Por que você perdeu seus pais?
Ela é certeira.
— Sim, uma parte irracional minha tem medo de ser amaldiçoado,
medo de estar destinado a perder todos que amo.
Liv se ajeita até conseguir olhar em meus olhos.
— Você não é amaldiçoado, Aaron, eventualmente você poderá
perder alguém, mas nunca será por uma maldição. — Ela espalma as mãos
sobre meu coração. — Alguém que tem você em sua vida jamais o
abandonaria se tivesse escolha.
Ela fala com tanta convicção que não deixa margem para dúvida. Eu
beijo sua testa e a abraço.
— Obrigado por estar aqui. — Beija meu peito ao lado da sua mão.
— Eu precisava chorar e amo meus amigos, mas não conseguiria ter essa
troca com eles.
— Eu entendo o que está falando, ontem eu senti o mesmo. — Ela
faz uma pausa que faz meu coração acelerar e ela percebe, pois está o
sentindo contra sua mão. — Você é para mim o que ninguém nunca foi,
Aaron.
Eu sinto o mesmo. Curvo-me em sua direção e cubro sua boca com
a minha. É um beijo calmo, ele tem muito mais sentimento que qualquer
outro beijo que já compartilhamos, é como se todos os nossos sentimentos
estivessem expostos nele.
O beijo termina, eu a abraço novamente e Liv se aconchega ainda
mais contra mim. É assim que ficamos por um tempo, até a fome ser mais
forte que nós dois e descermos para a cozinha. Encontramos apenas Alex e
Giulia e ficamos os quatro conversando enquanto comemos, Liv mal
encosta nos seus ovos com bacon e encara a comida de uma forma estranha,
não a questiono por estarmos na frente dos meus amigos.
Nós ficamos um tempo na cozinha e voltamos para o quarto após
limparmos o que sujamos. Liv me encara com malícia ao entrarmos no
cômodo, eu fecho a porta e ergo minhas sobrancelhas.
— Me ensine a jogar.
Aponta para o meu computador, olho para a garota à minha frente e
sorrio.
— Você realmente sabe deixar um cara excitado.
Sua gargalhada ecoa pelo quarto, eu vou até ela, deixo minhas mãos
em sua cintura e a guio até meu computador, sento-me na cadeira gamer e
ela se senta em meu colo.
Pelos próximos minutos descobrimos que Liv é péssima, ela se
esforça, mas é horrível. Nós mais rimos do que jogamos, mesmo assim
insistimos e ficamos de frente para o computador até o início da tarde,
quando paramos para almoçar. Eu peço o almoço e almoçamos no quarto e
em cima da minha cama.
É como se estivéssemos vivendo uma realidade só nossa.
Perto do horário que tenho que estar na arena, limpamos o quarto e
começamos a nos arrumar. Ao ver Liv pronta, eu paro e a fito de cima a
baixo. Ela está de calça jeans, blusa térmica e uma das minhas camisetas do
time por cima, ela está com meu número e meu nome em seu corpo, além
disso, está usando um dos meus bonés.
— Mais tarde eu vou ter você usando só essa camiseta e esse boné.
Ela está encarando seu reflexo no espelho e se vira para mim com
um olhar malicioso.
— Promessas...Promessas.
Pisco para ela.
— Eu farei questão de cumprir cada uma delas.
Ela ri e balança sua cabeça. Eu pego minha mochila, meus
equipamentos e deixamos meu quarto. Liv vai comigo e lá vai encontrar seu
pai, ele vai assistir o jogo com ela.
É diferente ter alguém comigo, me acompanhando e me apoiando.
Eu me sinto como a porra de um ídolo. Ao chegar na arena, ela e eu nos
despedimos com um beijo, ela segue para arquibancada e eu para o
vestiário.
Meus colegas e o treinador estão aqui, a equipe técnica passa os
últimos comandos e estamos todos ansiosos, é um jogo importante e
precisamos vencer.
Trocamos de roupa, gritamos nosso grito de guerra e alguns minutos
antes do jogo saímos para a pista de patinação. A arena está lotada, o time
adversário está no gelo fazendo o reconhecimento, eu os encaro por alguns
segundos e em seguida procuro por Liv nas arquibancadas, não demoro a
encontrá-la. Ela acena e aceno de volta.
É a porra da visão da minha vida vê-la estar torcendo por mim com
a minha camiseta.
Seu pai está ao seu lado, James Callahan está me assistindo jogar e
mesmo assim, sua filha é a única que eu quero impressionar.
O treinador me chama e sou obrigado a desviar meu olhar de Liv.
Eu me aproximo dos meus colegas, formamos um círculo e o fechamos nos
abraçando, o capitão nos incentiva e, mais uma vez, entoamos nosso grito
de guerra.
Nós entramos na pista e nos posicionamos. Eu vou cuidar dessa
defesa como nunca cuidei antes.
O jogo inicia e me concentro em fazer a melhor partida da minha
vida. Eu deslizo pelo gelo com rapidez, esbarro em meus adversários e tiro
deles o disco mais vezes do que consigo contar.
Evito que entrem em nossa área, jogo o disco para meus colegas à
frente e brigo quando as jogadas não saem como o esperado.
É diferente jogar sabendo que sua garota está te assistindo.
Eu só relaxo quando o jogo termina e vencemos por dois pontos de
diferença. Comemoramos e eu vou até a lateral da pista, olho para Liv e
jogo um beijo em sua direção, ela sorri e finge pegá-lo no ar.
Meus colegas batem em minhas costas e preciso desviar meu olhar
do dela. Eles gritam e eu os acompanho, estamos em êxtase. Ainda
comemorando, vamos para o vestiário, pulamos nos bancos e Alex, Paul e
eu convidamos todos para nossa casa.
Eu tomo um banho rápido, visto minha roupa e pego o celular para
enviar mensagem para Liv, mas ela foi mais rápida.
“Estou te esperando na saída da arena.”
Com meus equipamentos em mãos e a mochila em meu ombro, saio
do vestiário e sigo na direção da saída. Não demoro a enxergar Liv, mas há
alguém com ela e isso faz com que sinta meu sangue borbulhar. É um cara e
ele está tocando seu braço.
Que porra é essa?!
Eu enxergo vermelho e apresso meu passo. Quem ele pensa que é?
Aproximo-me, paro logo atrás de Liv e empurro o braço do cara.
— Você não deveria tocá-la.
Ele não cria nenhuma resistência e afasta o braço.
— Foi mal, cara.
Não aceito suas desculpas, apenas continuo encarando como se ele
fosse meu pior inimigo.
— Até mais, Liv.
Ele acena e se afasta. Liv se vira para mim e seu olhar é divertido.
— Ele é meu colega e é gay.
Dou de ombros e enrolo minha mão livre ao redor dos fios do seu
cabelo.
— Não importa. — Diminuo a distância entre nossos rostos. —
Você é minha e ninguém deve tocá-la.
Mordo seu lábio inferior e ela suspira.
— Deveria achar essa sua cena ridícula, mas... — Faz um biquinho
nada inocente. — Me excita.
— Caralho, Liv.
Meu corpo todo tensiona e implora para que a tome aqui mesmo, é
uma pena que não posso, mas minha picape não está muito longe.
Eu a beijo com urgência e entrelaço nossos dedos. Afasto meus
lábios do seu e ela me encara com os olhos escuros de desejo. Não preciso
de mais nenhuma palavra para entender que ela está tão perdida quanto eu.
Guio-a até meu carro, jogo minhas coisas no banco de trás e
ocupamos os lugares da frente. Eu empurro o banco para trás enquanto Liv
tira suas calças e calcinha, em seguida tira sua blusa, mas volta a vestir a
minha camiseta. A tensão entre nós poderia ser cortada por uma faca, algo
nos puxa na direção um do outro e nos eleva a um outro patamar.
Eu jogo meu moletom e blusa para longe, abaixo minha calça e
cueca e Liv se senta sobre minhas pernas. Minha boca encontra seu
pescoço, subo sua blusa e aperto sua pele.
Temos pressa e fodam-se as preliminares. Mordo, chupo e marco
sua pele e quando me afasto é para pegar a camisinha no compartimento do
carro, rasgo a embalagem e Liv a toma das minhas mãos, é ela a colocar ao
meu redor e a me guiar para dentro dela.
Os vidros não permitem que sejamos vistos e a noite está escura, e
mesmo se alguém pudesse nos ver não ligaríamos. Ela me aperta e rebola
contra mim. Puxo seu cabelo e a faço me encarar.
— De quem você é, Liv?
— Eu sou sua. — Um gemido escapa entre seus lábios. — Eu sou
sua
.
Nós sentimos muito, L...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Encaro meu reflexo no espelho que vai do chão até o teto do


vestiário e respiro fundo. Não posso surtar, não agora. Meu figurino é lindo,
preto com algumas franjas na barra, bordados prateados e muita pele
exposta pelo tule transparente que cobre meus braços. Meu cabelo está
preso em um penteado bonito, minha maquiagem é leve, porque não pode
chamar atenção.
Eu deveria me achar incrível, mas não consigo nem me achar
bonita.
Tudo que vejo é alguém que deveria emagrecer; fecho meus olhos e
respiro fundo. O espelho não define quem eu sou e eu tenho uma imagem
distorcida de mim mesma. Já faz três anos e mesmo assim não superei.
Há vozes ao meu redor, estou dividindo o espaço com mais de vinte
garotas e nem isso me distrai, continuo perdida em minha mente.
Abro meus olhos e toco minha clavícula, meus ossos estão mais
salientes comprovando que estou mais magra, reduzir a comida deu certo,
um alarme soa em minha mente que não deveria fazer isso, não posso me
permitir ou estarei no fundo do poço outra vez, mas foi só essa semana, só
dessa vez. Para me tornar mais leve e melhorar a execução dos
movimentos, melhorar minha chance de ser classificada.
— Liv, você está bem?
A voz de Meg chama minha atenção, empurro meus pensamentos
para longe, forço um sorriso e olho para o lado.
— Claro. — Meg me analisa e eu faço o mesmo com ela. — Você
está linda.
Não há ressentimento ou inveja, minha amiga está radiante no seu
figurino azul e merece ser aclamada por isso.
— Você também está. — Sorri animada. — Deslumbrante, o pobre
do Aaron irá ter um ataque do coração.
Eu balanço a cabeça e nós duas sorrimos. Estamos rindo ainda
quando Penny se aproxima de nós duas.
— Nós precisamos ir, Luke está nos esperando.
Ela soa afobada, Meg e eu paramos de rir e encaramos nossa amiga
com deboche.
— Ela é a assistente do treinador agora.
Meg a provoca e Penny revira seus olhos.
— Vamos logo.
Ela soa impaciente, então nós vestimos nossos casacos e deixamos o
vestiário. Seguimos até o lugar de concentração da nossa equipe, Luke e a
coordenação estão lá esperando por nós e com as pranchetas em mãos
fazendo anotações e observando as equipes de outros estados.
Estamos em uma arena em Boston, onde o campeonato seccional irá
acontecer, apenas oito de nós irão se classificar e estamos divididas entre
regiões Nova Inglaterra, Atlântico Norte e Atlântico Sul. Somos muitas e
será muito difícil se classificar.
Meu coração bate acelerado e não é de uma maneira boa. Fecho
minhas mãos em punho e finco as unhas em minha pele na tentativa de
recobrar o meu controle.
Nós nos juntamos com nossa equipe e somos os únicos com mais de
duas atletas, pois garantimos esse direito na temporada passada.
— Vocês estão ótimas, meninas.
— Obrigada, Luke.
Agradeço seu elogio e vou até o banco, eu me sento e meu olhar
percorre as arquibancadas procurando por eles. Não demoro a encontrar
meu pai e Aaron, eles estão aqui e são a minha âncora, eles serão o meu
Norte, principalmente Aaron.
Agora eu vou sentir o que ele sentiu no sábado passado quando
estive na arquibancada torcendo por ele em seu jogo de hóquei. Acho que
eu prefiro ser telespectadora, é muito mais divertido.
Ele acena em minha direção e aceno de volta. Ele está usando o
moletom verde de Dartmouth e um boné segura os fios do seu cabelo para
trás. Gostoso e meu!
Se eu me classificar, talvez possamos repetir a comemoração da
semana passada, Aaron e eu em sua camionete como dois animais no cio,
ele me deixando com o pescoço marcado e me fazendo gritar que sou sua.
Imagens do que fizemos naquela noite ecoam em minha mente e um
arrepio percorre meu corpo. Isso é o que Aaron faz comigo, ele sempre
consegue uma reação minha. Eu achei que eventualmente iria enjoar dele,
mas não, pelo contrário, cada vez eu sinto mais necessidade de estar com
ele.
Depois do seu jogo no sábado e da nossa pequena comemoração na
camionete, fomos para sua casa e comemoramos com seus amigos, eu
fiquei na sua casa durante o fim de semana e na segunda iniciou a última
semana de treinos antes da competição. Luke pegou pesado, mudamos os
movimentos que não conseguia executar e os treinos ocorreram todos os
dias, foi difícil e ao fim do dia procurei abrigo em Aaron, ele me segurou
durante meus surtos, mesmo que não soubesse a extensão deles.
Mesmo que ele não soubesse que estava limitando minha
alimentação, mesmo que ele não soubesse o caos que minha mente se
tornou.
— Quem é aquele com Aaron?
Meg sussurra ao se sentar ao meu lado e encaro meu pai.
— É meu pai.
— Seu pai?
Meg soa chocada.
— Sim, por quê?
Viro-me para ela, que está olhando para meu pai com a testa
franzida, além disso, ela está branca.
— Ele só parece muito novo para ser seu pai.
Dou de ombros.
— Chame isso de boa genética. — Sorrio, mas Meg segue com uma
expressão estranha em seu rosto. — Algum problema?
Ela abre e fecha a boca, mas, por fim, balança a cabeça negando.
— Apenas estou nervosa.
— É só isso?
Assente, não parece ser só isso, mas Ava e Matteo chegam e nos
interrompem, eles são a única dupla da nossa equipe a disputar e
provavelmente irão vencer, eles são incríveis juntos.
Os minutos passam, seguimos conversando, mas eu fico mais tensa
a cada segundo. Eu queria ter meu celular para conversar com Aaron.
E se eu errar? E se eu não for bem? As dúvidas permeiam minha
mente e meu passado volta à tona. Meu erro em uma competição, minha
lesão, Noah sendo meu fisioterapeuta, ele e eu nos envolvendo, ele me
dizendo que o problema estava em mim, em meu peso, na forma que eu
patinava.
“Eu te amo, Liv, e você é linda, mas não é o suficiente para a
patinação,
Engulo em seco e me obrigo a empurrar as lembranças para o fundo
da minha mente. Agora não é o momento. Procuro por Aaron e mantenho
meu olhar no seu.
Somos chamadas, os juízes são apresentados e a competição tem
início. Eu sou uma das últimas e sou obrigada a ver a maioria das
apresentações, nessa competição temos apenas o programa livre, apenas
uma chance.
Não podemos errar.
A cada nota alta é como levar um tapa; eu não vou conseguir! Penny
e Meg são incríveis e isso me consola, se eu não estiver no nacional, elas
estarão.
Minha vez chega, eu respiro fundo e vou até a pista. É como estar
no automático, eu faço o que eu tenho que fazer. É como estar vivendo a
vida de outra pessoa.
Há um frio em minha barriga quando me posiciono no centro da
pista. Não posso falhar, não mais!
A versão instrumental de Fix You, de Coldplay inicia e me
movimento primeiro uma sequência de passos, meus patins simplesmente
deslizando pelo gelo, marcando da forma mais leve possível enquanto meus
braços e mãos acompanham o ritmo da música.
É tão fácil, tão tranquilo, a parte que me lembra o quanto eu amo
patinar e o quanto faz parte de mim.
Deslizo pela pista fazendo dela minha, salto, primeiro um flip,
simples e perfeito. Giro em pé e vou me abaixando até estar quase sentada
no gelo e sigo girando. Escuto os aplausos ao meu redor e sei que fui bem.
Respiro aliviada e continuo.
Acelero pelo gelo, volto até o centro, avanço pela borda externa do
meu pé e executo um Axel duplo, é perfeito e mais uma vez escuto os
aplausos.
Giro, salto, faço mais uma sequência de passos, eu domino o gelo e
a música está chegando ao fim, estou em meus últimos segundos. Eu
preciso executar o Flip Jump triplo, nós tiramos o quádruplo, mas o triplo
permaneceu.
Eu suo frio, sei fazer, executei a semana toda, porém, sou tomada
pelo medo. Eu me preparo, avanço e salto. Está tudo certo, até que sou
tomada por uma tontura e meu maior pesadelo acontece, meu patins direito
atinge o chão, eu dobro-o levemente e meu tornozelo dói.
É o mesmo da lesão de quando disputava pelo júnior, a dor sobe
pela minha perna e tento continuar, mas é impossível. Eu caio no gelo e a
dor irradia pelo meu corpo.
Olho para o meu pé e não foi uma simples torção, é visível. Um
grito deixa meus lábios, porque dói demais.
Lágrimas nublam a minha visão, escuto os sons de surpresa ao meu
redor, mas tudo que ecoa em minha mente é a voz de Noah:
“Um dia você terá certeza de que eu tenho razão, Liv”
Meu peito é pressionado por uma dor absurda, dói tanto quanto meu
pé. Meu choro é alto e compulsivo. É vergonhoso quando os enfermeiros
entram na pista e me tiram em uma maca. Sou levada para o atendimento
médico e sinto como se fosse apenas uma telespectadora da minha vida.
Eles precisam de apenas alguns minutos para chegar à conclusão
que preciso de um hospital. Eu fico chorando de dor, gemendo enquanto
aplicam gelo e esperam a ambulância.
Meu pai e Aaron adentram o espaço, ambos preocupados, eles me
amparam, seguram a minha mão, e mesmo assim, tudo que consigo sentir é
dor e um vazio em meu peito. Uma sensação sufocante de frustração. É
como se eu estivesse me afogando.
A ambulância chega, eles me levam até ela e enquanto Aaron me
segura, uma enfermeira aplica um sedativo em meu braço. A escuridão não
demora a me cercar e eu apago. Talvez eu tenha me afogado por completo.

Acordo em um lugar diferente, as luzes são mais fortes, há uns


barulhos estranhos, o cheiro é horrível e algo está preso ao meu braço. Não
demoro a me dar conta de que estou em um hospital.
Estou aqui porque falhei e torci meu tornozelo enquanto me
apresentava.
Engulo em seco, forço as minhas emoções a se manterem no lugar e
olho ao redor. Há aparelhos acompanhando meus batimentos cardíacos, um
acesso em meu braço, não estou mais vestindo meu figurino e meu pai e
Aaron estão no quarto.
Meu pai está sentado na poltrona e Aaron de costas encarando o
vidro da janela.
Meu pé está enfaixado e para cima, meu tornozelo ainda dói e é
claro que não é algo simples.
— O que aconteceu com meu tornozelo?
Minha voz é arrastada, rouca e minha garganta está seca. Meu pai
olha em minha direção e Aaron se vira para mim, eu odeio o olhar deles, é
um olhar repleto de pena.
— Você precisou passar por uma cirurgia.
Meu pai me responde e fica em pé. Ele para aos pés da cama e ergo
minhas sobrancelhas. Não é só isso!
— E? — Meu pai não me responde. Olho para Aaron, que mantém
as mãos em seu bolso e uma expressão digna de um velório. — Por que
vocês estão me encarando assim?
Aaron balança a cabeça, volto a encarar meu pai.
— É melhor chamarmos o médico, ele irá explicar melhor.
Lágrimas descem pelo meu rosto e balanço minha cabeça, negando.
Lá no fundo eu sei o que ele quer me esconder, eu fui avisada da outra vez.
Eu faço fisioterapia, sei o que uma lesão pode ocasionar.
— Pai, eu quero que você me fale o que aconteceu.
Eu não quero ouvir de um estranho, quero que meu pai me diga. Ele
passa a mão pelo seu cabelo, encara-me com pesar e deixa que as palavras
saiam da sua boca.
— Você não pode mais patinar, garotinha.
Vocês estão com saudade da nossa patinadora? Porque nós
estamos. #boarecuperação #voltalogoliv
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

A voz do meu pai ecoa em minha mente, tornando real o meu maior
medo. Era isso que imaginava quando vi o rosto dele e Aaron, mas
intensifica a dor e abre um buraco em meu coração que eu não sei se um dia
voltarei a preencher.
É como se de repente eu fosse oca, e talvez seja. Patinação era parte
de mim, era um pouco de quem eu era, e o que eu sou agora? Quem eu
serei?
As perguntas ecoam em minha mente e aquelas feridas em minha
alma voltam a sangrar, elas foram atingidas e os machucados estão maiores.
Eu fui capaz de me reerguer uma vez, mas como vou fazer isso de novo e
sem a patinação?
Queria ser capaz de ignorar a dor e deixar para sofrer mais tarde,
porém, não consigo. Não consigo empurrar meus pensamentos para o fundo
da minha mente e é como se estivesse aberto a parte obscura de mim,
aquela em que aprisiono meus fantasmas.
Eles estão soltos e me aterrorizando.
— Sinto muito, garotinha.
Meu pai deixa seu lugar e vem até mim, para ao meu lado e segura
minha mão. Aaron dá um passo em frente, inclina-se e beija minha testa.
— Irá ficar tudo bem, diabinha.
Eu queria acreditar nele, mas não consigo. Queria ser capaz de
respirar fundo, sorrir e fingir que conseguirei sair desse lugar escuro em que
me encontro no momento, no entanto, não tenho forças.
As lágrimas seguem deixando meus olhos, o choro segue
embargando minha garganta e sons estranhos escapam dos meus lábios.
Meu pai me puxa para seus braços e me agarro à sua camiseta.
É dilacerante, é como se tivessem arrancado uma parte de mim.
O médico chega, entra no quarto e me explica sobre o rompimento
de ligamento. Usa termos médicos para explicar como eles fizeram de tudo,
mas não foi possível restaurá-lo, não o suficiente para que eu possa voltar a
competir. No máximo vou conseguir pôr os patins para deslizar sobre o
gelo, depois de muita fisioterapia, nada de movimentos elaborados, nunca
mais farei uma execução perfeita.
Patinação foi minha válvula de escape quando tinha nove anos e
mesmo após o acontecido com Noah, mesmo com as lembranças dolorosas,
foi a minha vida, meu objetivo e meu sonho.
Algumas vezes eu cheguei a me perguntar o que seria de mim sem a
patinação, mas nunca foi algo que acreditasse realmente, era apenas um
surto, um medo... Porém, agora é real. E eu não faço a mínima ideia de
como seguir em frente.
O médico descarta qualquer chance de reverter o quadro. As
lágrimas seguem aqui e quando ficamos apenas Aaron, meu pai e eu no
quarto, outra vez encaro o teto do hospital.
Eu repasso o momento da queda em minha mente e sei o que a
ocasionou. Eu fiquei tonta, perdi meu equilíbrio e sei o que causou a
tontura, não sou idiota, eu estava há muito tempo sem comer, levei meu
corpo ao limite, não caí porque sou ruim, eu mesma fui a responsável por
tirar tudo de mim. Eu me sabotei no nível mais profundo que poderia.
Culpa me corrói, acaba com o restante de mim. Eu me sinto inútil,
não há mais nenhuma utilidade para mim, estou sem esperança; é como se a
vida tivesse perdido o sentido.

Aaron e meu pai ficam em silêncio ao meu lado, eu durmo e acordo


e eles estão aqui. Eles perguntam se sinto dor, apenas assinto ou nego com a
cabeça. Quando não estou de olhos fechados, estou dormindo, presa em um
loop infinito de dor e sofrimento. Sonho com a competição, com a minha
queda e me pergunto se teria me classificado.
Não tenho muita noção de tempo, mas em algum momento acordo e
me deparo com minha mãe e meu padrasto no quarto. Minha mãe se
aproxima e ela está chorando.
— Eu sinto muito. — Aperta minha mão com a sua. — Eu deveria
ter estado aqui.
Sua presença não teria mudado nada, mas não digo nada, continuo
em silêncio. Minhas amigas vêm me ver e eu não tenho forças nem para
perguntar se elas se classificaram.
Eu me recuso a comer e só uso a minha voz para pedir para que meu
pai e Aaron deixem o hospital por algum tempo, eles estão acabados e
precisam de um banho. Eles me escutam e fico com a minha mãe.
— Patinação era só uma parte da sua vida, filha.
Fecho meus olhos e finjo adormecer, não quero palavras de
incentivo. Eu acabo dormindo de verdade e quando acordo, meu pai e
Aaron estão aqui outra vez.
Passo quatro dias no hospital e são horríveis, eu pareço uma morta-
viva. Voltamos para Hanover de avião, não suportaria uma viagem de carro.
Meu pai me leva para o seu apartamento e ocupo seu quarto enquanto
minha mãe se instala no de hóspedes. Não preciso de ajuda, porque consigo
me locomover com o auxílio de uma muleta, mas ela permanece ao meu
lado.
Eu não preciso ficar deitada, mas é o que mais eu faço. Não choro
com tanta frequência, mas me sinto tão vazia quanto me sentia naquele
hospital. Uma parte em mim diz que preciso reagir, que não é o fim do
mundo, mas uma outra parte grita em minha mente que não sei ser ninguém
além da Liv patinadora e é ela que vence no momento.
Eu perco a noção dos dias e só sei se é dia ou noite porque meus
pais abrem a cortina e porque Aaron vem dormir todas as noites comigo, os
fim de semana ele passa o tempo inteiro aqui, ele narra o seu dia e apenas o
escuto. Minhas amigas são visitas constantes e nunca estou sozinha, mesmo
assim é silencioso, porque não respondo as perguntas, não converso e me
mantenho presa em minha mente.
À noite, quando Aaron me abraça, depois de ouvi-lo, eu me permito
chorar. Ele fica lá me segurando e repetindo que tudo irá ficar bem.
Os professores me permitem estudar em casa, o fisioterapeuta está
sempre por aqui e até a visita de um psicólogo eu recebo, eu até tento abrir
a boca e falar, mas não consigo formular nenhuma frase, não consigo tornar
o caos que está dentro de mim em palavras.
Os dias, as horas se arrastam e só sigo sobrevivendo. O vazio é um
eco que se torna maior a cada dia. Olho para meus pais e vejo olhares
tristes, eles parecem estar tão miseráveis e é ainda pior quando encaro
Aaron.
Ele inclusive criou barba, Aaron de barba parece uns dez anos mais
velho e há olheiras abaixo dos seus olhos. Eu estou acabando com ele
também. Estou consumindo com uma das melhores pessoas que já conheci.
Dessa vez, ele me abraça e eu o abraço de volta. Ele tem o queixo
apoiado em minha cabeça e meu rosto está pressionado contra seu peito. Eu
sinto seu cheiro e me odeio ainda mais por estar o mantendo aqui.
— Quanto tempo se passou desde o acidente?
Minha voz é rouca da falta de uso e falar a palavra acidente tem um
gosto amargo.
— Três semanas.
Três malditas semanas. Eu volto a ficar em silêncio, adormeço
sabendo que não posso continuar mantendo Aaron preso à minha escuridão.
Acordo com a claridade, abro meus olhos e estou sozinha na cama,
Aaron já foi e meu pai está abrindo as cortinas. Eu me sento com as costas
apoiadas na cabeceira e o encaro.
— Pai.
Ele se surpreende ao me ouvir e me encara com esperança. Odeio
decepcioná-lo.
— Hey, garotinha.
Ele sorri, aproxima-se e se senta ao lado da minha cama.
— Aaron nunca foi meu namorado — digo de uma vez, porque não
quero conversar, só quero libertar Aaron. — Eu menti para você não ficar
preocupado.
Ele arregala seus olhos e me encara com uma mistura de decepção e
preocupação.
— Aquele dia foi a primeira vez que surtei, eu saí do treino
desnorteada, dirigi sem rumo e fui parar naquela estrada.
Eu conto a verdade, não escondo nenhum detalhe e posso ver meu
pai tentando se controlar, as suas veias são visíveis e há uma ruga em sua
testa.
—Liv, você não deveria ter mentido.
Dou de ombros e sorrio, um sorriso irônico.
— Mas eu menti, eu não queria te deixar preocupado, porque sabia
que iria ficar por conta de todo meu histórico. — Ele tenta esconder, mas
está magoado. — Não adiantou muito, não é? Já que estamos aqui.
Sarcasmo escorre dos meus lábios.
— Você está me dizendo que aquele garoto vem todas as noites por
causa de uma mentira?
— Nós nos envolvemos de verdade e Aaron é incrível, mas estar ao
meu lado está o destruindo. — Lágrimas nublam minha visão. — Eu não
posso destruir a vida dele.
Às lágrimas rompem e descem pelo meu rosto.
— Eu já destruí a minha e não posso destruir a dele também.
Minha voz quebra e meu pai balança a cabeça, negando.
— Garotinha, você tem uma vida inteira pela frente, você irá se
reerguer e descobrir novos sonhos, não acabou aqui.
Aperta minha mão e as lágrimas seguem caindo e caindo.
— Eu deveria ter procurado ajuda, deveria saber que estava perto de
uma recaída, mas não, fingi que estava tudo bem e parei de comer
corretamente porque precisava emagrecer, precisava ser mais leve para não
cair, eu fiquei tonta antes de cair, pai — falo enquanto as lágrimas salgadas
molham meus lábios. — A queda aconteceu porque eu estava sem comer.
Confesso, meu pai entende e me puxa para o seu colo. Ele me
embala como uma criança enquanto eu choro. As lembranças atuais se
misturam com o meu passado e meu coração quebra em milhões de
pedacinhos.
Desde os doze anos eu luto com a balança. No início era algo
necessário por conta da patinação, mas se tornou uma obsessão a ponto de
contar as calorias presentes nos alimentos que evoluí para dietas absurdas,
até resultar em restrições completas, eu não me alimentava por dias, nem
água bebia.
Eu tinha treze anos quando desmaiei pela primeira vez, foi a
primeira, mas não a última, e foi quando meus pais perceberam que tinha
algo errado. Exames alertaram que eu estava com anemia e foi terrível
comer, eu preferia continuar doente do que engordar. Estava extremamente
magra e as investigações começaram, eu tentei mentir que estava comendo
e por um tempo até funcionou, porém eu fui diagnosticada com transtorno
alimentar, Anorexia.
Eu não aceitava, lutei contra, segui mentindo, enganando meus pais
e parei no hospital mais de uma vez. Só com quatorze anos admiti estar
doente e me deixei ser ajudada. Muita terapia, muita ajuda e muitas
lágrimas me levaram a uma melhora.
Mas quanto ao transtorno, você luta todos os dias.
Eu lutei e venci por dois anos, mas, aos dezesseis, torci o pé em um
treino antes das competições nacionais dos juniores e precisei de
fisioterapia. Foi quando conheci Noah, no início parecia alguém bacana, tão
bacana que me vi apaixonada, eu me envolvi com meu fisioterapeuta dez
anos mais velho, menti para meus pais escondendo o nosso relacionamento
e continuei mentindo quando ele se tornou um idiota, quando ele culpou
meu peso pela queda, quando ele dizia coisas horríveis sobre mim, e eu
aceitava, porque uma parte minha acreditava que realmente era aquela
garota sem valor. E quando tentei me livrar dele, fui ameaçada, chantageada
e obrigada a transar com ele.
Noah me causou uma recaída e meus pais só descobriram quando
novamente fui parar em um hospital. Eu estava em uma cama de hospital
com lágrimas deixando meus olhos quando contei sobre as ameaças, sobre
os abusos psicológicos e o sexual. Foi horrível e meu pai precisou usar a
sua influência para que o caso nunca viesse a público.
Noah perdeu o direito de ser fisioterapeuta, respondeu judicialmente
e nunca mais o vi, mas os machucados em minha alma causados por ele
ainda estão aqui.
Meu pai me segura e quando me desvencilho, limpa as lágrimas do
meu rosto com a ponta dos seus dedos. Ele abre a boca, mas balanço a
cabeça negando.
— Agora não, pai.
Ele assente e fica apenas ao meu lado. Minha mãe traz nosso café e
se senta do meu outro lado, eles ficam aqui comigo e me forço a comer. Nós
três ficamos na cama ao longo do dia, assistimos televisão e eles pedem o
almoço por delivery.
Ambos só deixam o quarto quando Aaron chega, ficamos apenas ele
e eu. Olho em seus olhos antes que se aproxime e ele para no meio do
cômodo.
— Meu pai sabe que é uma mentira, Aaron.
Ele dá de ombros.
— Isso não muda nada, diabinha.
Ele sabe o que vou dizer, ele entende que esse é o nosso fim.
— Sua avó está bem e vai ficar bem sabendo que terminou com a
namorada. — Ele balança a cabeça e dá um passo em frente, eu ergo minha
mão e faço com que pare. — Aaron, você precisa me deixar, eu nem sei
quem eu sou no momento.
— Não me importo, não vou deixar você.
Sorri, um sorriso tão triste que rasga o que sobrou de mim.
— Aaron, eu tenho um pedido, lembra? — Recordo da nossa
competição no gelo. — Eu ganhei e você me deve um pedido.
Aaron não vai quebrar uma promessa.
— Não me peça isso, diabinha.
Por mais que doa, sigo o encarando.
— Eu preciso de um tempo. — Uma lágrima desce pelo meu rosto.
— Eu preciso que você me deixe.
Eu recebi uma foto de certos jogadores de hóquei e de certo
patinador com máscaras coloridas de skin care no rosto. Vocês gostariam
de ver? Talvez faça um leilão.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Ele me encara como se eu estivesse quebrando o seu coração, e


provavelmente estou, e mesmo sabendo que é o melhor para ele, dói. No
momento, gostaria de ser mais egoísta e deixá-lo ficar, permitir que ele se
destrua junto comigo.
— Ok, eu vou fazer o que está pedindo. — Sua voz acaba comigo,
eu tenho vontade de voltar atrás, mas não posso. Aaron me olha uma última
vez e simplesmente assinto. É isso que eu quero. — Isso não é um adeus,
diabinha.
Ele sorri, um sorriso completamente triste e que me arruína. Aaron
se vira e leva consigo um pedaço do meu coração, o restante dele. Eu fico
olhando fixamente para a porta enquanto as lágrimas descem pelo meu
rosto.
Por que é tão difícil? Por que eu não posso correr atrás dele e mudar
de ideia? É a primeira vez desde o acidente que de fato consigo pensar em
fazer algo, e eu sequer posso correr.
A porta do quarto é aberta e meu pai cruza por ela, ele encara meu
rosto e minhas lágrimas e uma careta surge em seu rosto.
— Você tem certeza de que tomou a decisão certa? — Assinto. —
Ele parecia transtornado.
— Aaron não merece ficar ao meu lado.
Meu pai se apoia contra a porta.
— Você deveria deixá-lo decidir isso.
Sorrio e balanço minha cabeça.
— Aaron é um protetor nato, ele jamais me abandonaria. — Pensar
no tanto que eu o conheço em pouco tempo faz com que a dor em meu peito
aumente. — Eu precisava fazer isso por ele.
Meu pai apenas assente e eu encaro o teto; eu vou sentir sua falta
todos os dias. E eu sinto, é uma saudade dolorida, muito mais do que
imaginei ser capaz de sentir.

Aaron

Eu deixo meu coração no quarto de Liv. Então é assim que alguém


de coração quebrado se sente?
Passo pelos seus pais na sala e James me chama, ele está sentado no
sofá, olho em sua direção e ele me encara com pesar.
— Ela só precisa de um tempo.
Assinto.
— Eu vou esperar o tempo que ela precisar.
Ele passa a mão pelo seu cabelo.
— Ela gosta de você, sei que ela me falou que é uma mentira, mas
não é.
Sorrio, um sorriso que transborda toda a tristeza que ocupa meu
coração no momento.
— Não é uma mentira, nem sei quando deixou de ser.
Nós dois nos encaramos por alguns segundos, então aceno para ele e
para a mãe de Liv e saio do apartamento. Desço as escadas olhando para o
chão, uma sensação sufocante de perda me domina, nunca senti nada assim
antes e me pergunto que merda eu faço agora, tudo que eu sei é que não vou
desistir de Liv
Entro em meu carro, mas fico parado, encarando a rua à minha
frente. Ela está tão perdida e gostaria de fazê-la se reencontrar, eu gostaria
que ela se enxergasse da mesma forma que eu, gostaria que ela soubesse
que é bem mais do que a patinação.
Ela é a minha garota. Ela é debochada, ela tem um coração enorme,
ela é gentil, ela é educada, ela é capaz de brigar por uma injustiça, ela é
capaz de convencer um juiz que está certa, ela é mandona, ela é carinhosa,
ela é forte, ela é incrível.
Sei que deve estar sendo difícil, sequer consigo imaginar o quanto
está doendo, mas queria estar ao seu lado enquanto ela descobre como
seguir em frente. Queria continuar a segurando todas as noites e ser a sua
âncora.
Passo a mão pelo meu rosto e enfim dirijo para casa. Sei que apenas
fiz o que ela pediu e não estou desistindo, não é o nosso fim, porém, mesmo
assim dói.
Porra, como dói.
E piora, porque minha playlist está no aleatório e Photograph, do Ed
Sheran ecoa pelo carro. Caralho! Eu não consigo me segurar e lágrimas
descem pelo meu rosto.

“E se você me machucar
Tudo bem, querida
Somente palavras sangram
Dentro destas páginas, você apenas me abraça
E eu nunca vou te deixar ir
Espere por mim para voltar para casa”

É como se uma faca estivesse me perfurando e cavando um buraco


ainda maior em meu peito.
Choro como uma criança, meu nariz está entupido, sons estranhos
escapam da minha garganta e assim que estaciono em minha garagem, me
debruço sobre o volante e as lágrimas continuam deixando meus olhos.
Eu estou um caos!
Nunca pensei que uma garota me deixaria assim. Uma voz sussurra
em minha mente que Liv não é qualquer garota, ela é a minha garota.
A minha garota que está quebrada, que de repente sua vida não é
mais a mesma, seu maior sonho não é mais possível de realizar e ela precisa
aprender a seguir em frente.
Recordar do seu acidente é horrível, vê-la caindo naquela pista de
patinação foi uma das coisas mais aterrorizantes da minha vida, por um
curto período, eu me perguntei se iria perdê-la. E o pior era que estava
longe, sem ter como agir, eu não pude ajudá-la.
James e eu simplesmente tivemos que ficar ali assistindo os
paramédicos entrarem na pista enquanto ela chorava. Foi assustador e os
dias seguintes também. É como se Liv tivesse perdido o seu brilho, ela
quase não falava e seu olhar se tornou o mais triste que já vi.
Eu faria de tudo para fazê-la sorrir, mas sempre soube que não seria
um processo rápido. Só não esperava que ela me expulsasse da sua vida, ou
tentasse, porque ela não vai conseguir, não assim tão fácil.
Eu me recuso perdê-la, não com ela tão perto. Pode ser
extremamente doloroso vê-la triste, chorando, porém, eu poderia segurá-la
em meus braços pelo tempo que precisasse, pela eternidade se fosse
necessário.
Eu respiro fundo e paro de chorar, não posso chorar para sempre,
então saio do carro com meu coração em frangalhos e não limpo nem meu
rosto, foda-se, as lágrimas podem continuar aqui.
Entro em casa pela porta que liga a garagem ao interior e sigo na
direção da escada, entretanto, meus amigos estão na sala, sentados no sofá e
percebem o estado deplorável que me encontro.
— O que aconteceu?
Matteo pergunta preocupado.
— É com a sua avó?
Paul se adianta antes que eu possa responder. Eu mudo de ideia, vou
até eles e me sento na poltrona ao lado do sofá.
— Liv pediu um tempo.
As palavras são dolorosas de dizer e quase volto a chorar outra vez.
— Ava me falou que ela está deprimida.
Matteo me encara com pesar enquanto as palavras deixam a sua
boca.
— Ela está e não me quer por perto.
Deus, como pode doer tanto?
— Ela deve estar confusa, é um momento difícil. — Olho para Alex
ao ouvi-lo e o encaro esperançoso, porque sua garota já passou por algo
parecido. — Você deveria conversar com Giulia.
Olho ao redor como se a namorada do meu amigo que divide a casa
com a gente estivesse escondida em algum lugar. Alex ri, volto a encará-lo
e ele balança sua cabeça
— Ela está em uma noite das garotas com suas amigas.
Suspiro frustrado.
— Você está apaixonado
Matteo não está me perguntando, mesmo assim o respondo.
— Eu estou apaixonado.
É a primeira vez que falo em voz alta, porém tenho essa certeza há
algum tempo. Um pouco emocionado? Totalmente, mas não ligo. Jogo-me
contra a poltrona, pego uma almofada e cubro meu rosto com ela. Solto um
grito como se isso fosse capaz de me trazer paz, ou uma solução para os
meus problemas.
Meus amigos ficam em silêncio, mas não por muito tempo, Matteo
se inclina e tira a almofada do meu rosto. Olho para ele e me deparo com
meu amigo me encarando com curiosidade.
— O que você irá fazer?
— Eu vou lutar pela minha garota. — Curvo meus lábios em um
falso sorriso. — Mas hoje, eu vou subir para meu quarto e lamber minhas
feridas como um cachorro abandonado.
Matteo faz uma careta, Alex joga minha almofada e Paul cruza seus
braços sobre seu peito.
— Hoje é sexta-feira, você não pode simplesmente ir lamber suas
feridas.
Encaro Paul, indignado.
— E o que você acha que eu devo fazer?
Soo sarcástico e ele me encara com deboche.
— Vamos ter uma noite dos meninos. — Ergo minhas sobrancelhas.
— Cerveja, pizza e skin care.
A gargalhada de Matteo ecoa pela sala.
— Você está falando sério?
Pergunto sem acreditar.
— Nós não vamos fazer isso.
Alex discorda e balança a cabeça, negando.
— É o que as meninas fazem, deve servir para algo.
Paul argumenta, nós o encaramos e a ideia martela em minha mente.
Porra, não posso estar considerando fazer algo assim! Mas beber não é
uma péssima ideia, amo pizza e o skin care vai fazer com que ria dos meus
amigos.
— Ok. — Matteo e Alex se viram em minha direção como se eu
estivesse maluco, mas só dou de ombros. — Eu estou com meu coração
quebrado e vocês precisam me ajudar.
Eles suspiram, balançam a cabeça, negando, mas por fim cedem.
Vamos os quatro até a conveniência mais perto, pegamos as cervejas e umas
máscaras de colocar no rosto, passamos na pizzaria e voltamos para casa.
Na sala da nossa casa bebemos, comemos a pizza e ficamos
conversando, além disso conectamos a televisão no spotify e músicas
animadas ecoam pelo cômodo.
Conforme as horas passam, o álcool começa a fazer efeito e mesmo
assim não paramos de beber. Rimos das piadas idiotas de Paul, provocamos
Matteo por estar trocando mensagem com Ava.
Já estamos mais alegres que o normal quando pegamos as máscaras,
lemos as instruções e as passamos em nossos rostos. A minha é verde, a de
Matteo dourada, a de Alex banca e de Paul preta. É gelada e pegajosa.
Apoio minha cabeça contra o sofá e apoio meus pés na mesinha à frente,
meus amigos fazem o mesmo e encaramos o teto.
— Até que isso é legal.
Paul soa animado.
— Eu só sinto a gosma em meu rosto, é nojento.
Alex reclama como um velho, nós o provocamos e ele pega seu
celular, tira uma foto nossa e Matteo pega seu celular para se vingar do
melhor amigo. Passamos minutos tirando fotos e quando nos damos conta,
passamos do tempo de retirar as máscaras, corremos para o banheiro e nos
esprememos para tentarmos olhar para o espelho e arrancar o produto.
Meu rosto está vermelho e coçando. Que péssima ideia! Curvo-me
sobre a pia e jogo água em meu rosto, o que é ainda pior. Sigo jogando água
e me molho todo, molho o chão e meus amigos.
— Caralho, Aaron.
Paul reclama.
— Foda-se, minha pele está ardendo.
Grito de volta e sigo sem me importar se estou os molhando. Assim
que a ardência diminui, desligo a torneira e me endireito.
— Você está lindo todo vermelhinho, principezinho.
Paul debocha e rosno para ele.
— Ele sabe rosnar.
Matteo segue me provocando, eu reviro meus olhos e pego a toalha
que há ao lado do espelho para secar meu rosto. E estou afastando o tecido
do meu rosto quando Alex dá um passo para trás e escorrega na água que há
no chão.
No mesmo instante a minha gargalhada ecoa pelo banheiro, Matteo
e Paul também riem e Alex nos amaldiçoa com todos os xingamentos que
conhece.
Deixamos o banheiro, rindo, e preciso tirar meu moletom por conta
da água; lá fora está frio, mas aqui dentro, não, além disso, estamos
bebendo. Voltamos para a sala, nos sentamos no tapete e seguimos bebendo,
eu não sei quantas garrafas de cerveja eu bebi, mas foram muitas.
O mundo ao redor gira, as cores estão diferentes, não sei nem mais
sobre o que estamos falando. O que eu sei é que Liv invade meus
pensamentos e meu coração sangra.
— Eu nem sei quando a mentira se tornou verdade para mim —
confesso. — Queria estar ao seu lado.
Lágrimas nublam minha visão e trago a cerveja até meus lábios,
bebo o restante da bebida.
— Eu sinto falta dela. — Abaixo a garrafa e a jogo no tapete. — O
que eu farei para convencê-la a me deixar ficar ao seu lado?
— Um bêbado deprimido é o pior tipo de bêbado.
Alex reclama e o ignoro.
— Minha família está certa, é ela, nunca será outra garota, sempre
será Liv.
— Vou até trocar a playlist, colocar uma mais dramática para ser a
trilha sonora de Aaron.
Matteo declara e realmente troca para uma playlist romântica. Eu
me jogo no chão, encaro o teto e choro enquanto uma música da Taylor
Swift ecoa pela minha sala. Eu estou deplorável.

“Eu não quero olhar para mais nada agora que te vi


Eu não quero pensar em mais nada agora que pensei em você
Eu tenho dormido há tanto tempo numa noite escura de vinte anos
E agora, vejo a luz do dia
Vejo apenas a luz do dia”[1]

A dor rasga meu peito, a saudade é imensa, mesmo que não faça
nem um dia que estou longe dela. Eu estou transtornado quando pego meu
celular e envio uma mensagem para Liv, as letras dançam à minha frente e
abrevio a maioria das palavras, até um emoji acabo colocando no lugar de
diabinha.
Eu espero que ela entenda.
“Eu so qria q vc soubesse q n vou desistir de vc, �� , pq estoiu
muiityo apaixonado.”

[1] Trecho da música Daylight, da cantora Taylor Swift


Faz um tempinho que não vemos nossa patinadora e nosso
principezinho juntos. Será que algo aconteceu?
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Meus pais são compreensivos e não me fazem perguntas, eles não


forçam conversas e nem tentam me entender, e quando peço para ficar
sozinha depois de me forçar a comer algo no jantar, eles saem do quarto.
Eu fico deitada encarando o teto e repassando os últimos dias em
minha mente: o acidente, o pós-acidente e a forma como mandei Aaron
embora. O que vou fazer sem ele agora?
Ele era a minha única força, ele era meu último fio de esperança,
mas não poderia continuar o mantendo aqui, não quando não tenho certeza
de quando ficarei bem.
Talvez esteja no momento de me reerguer, de me levantar e seguir
em frente. É isso que eu quero, mas algo me impede, uma pressão em meu
peito, um sentimento de impotência.
Viro-me e fico de lado, encolhida enquanto abraço meu ursinho de
pelúcia, o Brad, um coelho que eu tenho há mais de vinte anos. Um filme
qualquer está passando na televisão e por mais que tente, não consigo me
concentrar.
Esse horário Aaron estaria aqui me abraçando e me dizendo que
tudo ficaria bem. Eu o perdi e também é minha culpa. Quantas escolhas
erradas eu consigo fazer durante a vida?
Lágrimas rolam dos meus olhos e me afundo em lembranças, medo,
angústia e sofrimento.
O celular vibra embaixo do meu travesseiro e o ignoro, mas uma
parte minha sabe que pode ser Aaron e eu quero qualquer migalha sua,
aceitaria qualquer coisa no momento, então levo minha mão até o aparelho
e o aproximo do meu rosto.
É uma mensagem dele, meu coração bate acelerado e ansiosa clico
na notificação. As palavras são confusas e abreviadas. Aaron nunca me
enviou nada assim. Que merda aconteceu? E o que ele está querendo me
dizer?
Ele só pode estar bêbado e não demoro a entender o que ele quis
escrever.
“Eu só queria que você soubesse que não vou desistir de você,
diabinha, porque eu estou muito apaixonado.”
Ele está apaixonado por mim, o fato ecoa em minha mente e em
meu coração. Mesmo depois de tê-lo mandado embora, mesmo depois do
que eu me tornei, ele ainda está dizendo que está apaixonado por mim.
Por que eu não posso ser a garota que ele merece? Porque,
definitivamente, aquele cara merece uma pessoa completa, uma pessoa sem
uma bagagem como a minha.
Ele merece a porra de um mundo inteiro.
Meu choro se torna mais intenso, mas agora é diferente. Aaron pode
não saber, mas eu também me apaixonei por ele. Pela pessoa incrível que
ele é, pelas vezes que me fez rir, pelas vezes que ficou vermelho, pelas
vezes que foi engraçado, fofo, ingênuo, pelas vezes que me protegeu, ou
protegeu alguém ao seu redor.
Eu só não sei se é o suficiente e queria que fosse.
Adormeço encarando o celular e sonho com Aaron, um sonho em
que estamos bem e quando acordo, desejo que ele se torne realidade.
Como nos outros dias, minha mãe vem abrir as cortinas e me trazer
o café. Ela coloca a bandeja ao meu lado e se senta na beirada do colchão.
— Você quer conversar?
Balanço minha cabeça, negando.
— Ainda não.
Ela suspira, encara-me como se fosse falar algo, mas desiste e
assente.
— Ok.
Ela fica aqui até terminar meu café e assim que finalizo, pega a
bandeja e deixa meu quarto. Eu fico assistindo televisão, maratono Friends
e a minha série preferida até que consegue me arrancar alguns sorrisos.
É meu pai a me trazer o almoço e minha mãe deve ter alertado que
não quero conversar, porque ele não puxa nenhum assunto sério, só fala
amenidades. Ele e eu almoçamos e no meio da tarde coloco em um jogo de
hóquei.
— Você pode me explicar como funciona um jogo de hóquei?
Ele me encara surpreso. Aaron já me explicou um pouco, mas quero
ter esse momento com meu pai.
— Claro.
Meu pai se senta ao meu lado e me explica os passes, as estratégias
e até comenta os erros cometidos pelos times.
— Eu passei a vida toda jogando hóquei e você só decidiu aprender
sobre o esporte por causa de um garoto.
Ele resmunga no final do jogo e dou de ombros.
— Não fique com ciúmes, pai.
Ele me puxa para um abraço e nós dois rimos. É um bom momento,
é leve e espontâneo, algo que nunca tivemos antes.
O Sol está se pondo quando surpreendo meu pai avisando que vou
sair do quarto. Ele me ajuda a levantar, alcança-me a muleta e saímos do
cômodo. Vamos para a sala e surpreendo minha mãe e meu padrasto. É
possível ver nos olhos deles que estão emocionados.
Eles acreditam que isso é um bom sinal e realmente espero que seja.
Minha mãe prepara o jantar, jantamos na sala e eu participo das
conversas com frases curtas, mas é o melhor que consigo no momento.
Ao fim da noite, eu vou para o meu quarto, tomo um banho e visto
uma camiseta que roubei de Aaron, me deito na cama, pego meu celular e
me deparo com uma mensagem dele.
“Ontem eu bebi com os caras, nós fizemos skin care e eu chorei
deitado no chão encarando o teto enquanto Taylor Swift ecoava pela sala.
Totalmente deplorável e tudo por sua causa, diabinha, espero que um dia
você me recompense por isso.
Hoje, eu passei a maior parte do dia de ressaca e quando melhorei,
fiquei jogando. Não vou sair, porque odiaria estar em um lugar sem você.
Seu A.
Ele está me contando do seu dia, como ele fazia todas as noites
enquanto me abraçava. Leio a mensagem mais de uma vez e meus lábios se
curvam em um meio sorriso ao imaginar a cena dele chorando e ouvindo
Taylor, ao mesmo tempo em que meus olhos se enchem de lágrimas, porque
ele não merece sofrer.
Merda, não posso continuar vendo Aaron sofrer. Eu preciso
descobrir como seguir em frente.
Mais uma vez, adormeço encarando o celular e Aaron é o
protagonista dos meus sonhos.
Desperto com a claridade me incomodando. Minha mãe está aqui e
me trouxe o café. Como nos outros dias, tomo o café da manhã na cama e
assim que termino de comer, minha mãe se aproxima para retirar a bandeja
e eu a surpreendo.
— Eu vou com você.
Ela assente emocionada e me ajuda a me levantar. Eu vou para a
sala e fico por lá na companhia dos meus pais e do meu padrasto. Participo
mais ativamente das conversas e mantemos os assuntos complexos longe.
Meu pai pede comida em meu restaurante favorito, almoçamos
sentados ao redor da mesa de jantar e em seguida, voltamos para a sala.
Colocamos um filme para assistirmos, mas não o finalizamos, porque
estamos na metade quando minhas amigas chegam.
Meus pais nos deixam a sós, porém, noto que há algo de errado com
meu pai. Qual o problema? Por que minhas amigas o incomodam?
Esqueço o assunto quando elas se sentam ao meu redor e me contam
as fofocas que estão rolando pelo campus espalhadas pelo jornal de
Dartmouth, ou melhor, jornal de fofoca.
Eu converso com elas como há muito tempo não conversava, eu me
sinto um pouco mais como a antiga Olívia. E eu percebo que existe algo de
errado com Meg, ela está mais quieta e mais contida, como se algo estivesse
a incomodando.
— Está acontecendo algo?
Pergunto, ela olha ao redor como se estivesse procurando alguém e
por fim, balança a cabeça negando.
— Não, eu só estou preocupada com minhas provas.
Estranho, muito estranho, mas não tenho chance de fazer mais
perguntas, porque Ava muda de assunto.
Meu pai passa por nós na sala e apenas acena em nossa direção, sem
mesmo olhar para minhas amigas. O que ele tem? Ele deixa o apartamento
sem eu ter a chance de perguntar o que diabos foi isso.
Não deixo que o acontecido estrague meu humor e sigo conversando
com minhas amigas, minha mãe prepara algo para comermos e jantamos ao
redor da mesa.
Noto que Meg sequer tocou na comida, realmente algo está
acontecendo, faço perguntas e ela novamente culpa a semana de provas. Ela
deve estar falando a verdade.
É finalzinho da noite quando me despeço delas e assim estou
sozinha, vou até a cozinha, agradeço minha mãe e Malcolm pelo jantar,
deixo um beijo de boa noite no rosto de cada um e sigo para meu quarto.
Ao entrar no cômodo, pego meu celular e me sento na beirada da
cama. Meu coração está acelerado e bate ainda mais forte quando me
deparo com uma nova mensagem de Aaron.
Mais uma vez, eu recebo o relato do seu dia. E eu o respondo
contando sobre o meu dia, na verdade é um rascunho, porque não envio a
mensagem.
Suspiro, largo meu celular sobre a cama e vou para o banheiro.
Depois de um banho, eu me deito na cama e encaro o teto. Minha mente e
meu coração ainda são uma bagunça.
Eu tento fechar meus olhos e dormir, mas meu tornozelo dói porque
me movimentei demais durante o dia. Demoro a adormecer e quando
consigo, tenho pesadelos, sonho com uma pista de patinação tomada por
sangue. É horrível.
Minha noite é péssima e volto a acordar desanimada, não consigo
me levantar, ou sair do quarto, simplesmente não consigo e choro. Eu
queria estar bem, mas ainda não estou.
Não converso com meus pais e posso ver a decepção no olhar deles,
eles acreditaram que eu estava melhor. Decepcioná-los me machuca.

Minha semana é um caos, repleta de altos e baixos, alguns dias


estou bem, outros nem tanto. Aaron segue me enviando relatos dos seus
dias e eu continuo o respondendo sem enviar as mensagens.
Eu estou respondendo a psicóloga, não estou mais escondendo a
minha dor, e nem a mantendo só para mim. E sei que preciso ter calma,
além disso, não posso mais adiar a conversa com meus pais.
Aos poucos a esperança está voltando a habitar meu coração.
O fim de semana é tão bom quanto o anterior, temo que a segunda se
repita e seja horrível, tenho medo de acordar mal e descobrir que não estou
progredindo, mas, para meu alívio isso não acontece. Eu estou bem, ou bem
na medida do possível.
Eu não tomo café no quarto, aliás, acordo antes dos meus pais,
escovo meus dentes, tomo um banho, coloco uma roupa confortável e vou
para a cozinha. É meu pai quem está preparando o café e está de costas para
a porta de entrada.
— Hey, pai, bom dia.
Ele se vira para mim e me encara surpreso.
— Hey, garotinha, bom dia.
Sorrio, adentro o espaço e vou até a bancada.
— Decidi vir tomar café aqui com vocês hoje.
Deixo a muleta ao lado e me sento no banco de frente para o balcão.
— Sua mãe e Malcolm não estão.
Assinto e não digo nada mais, é até melhor, eu quero conversar com
meu pai primeiro. Ele volta a encarar o fogão e termina nosso café, então
arruma as coisas sobre a bancada e se senta à minha frente.
Eu como um pouco do bacon e dos ovos, tomo metade do meu café
e encaro meu pai.
— Pai. — Ele ergue suas sobrancelhas e respiro fundo, porque sei
que não será uma conversa fácil. — Uma parte minha o culpa por tudo que
aconteceu comigo.
Ele me encara surpreso, ao mesmo tempo em que uma sombra toma
conta do seu olhar, posso ver o quanto dói ouvir isso de mim e dói em mim
também, mas precisamos conversar. É isso que tenho conversado na terapia,
para seguir em frente, eu preciso que o passado fique no passado.
— Garotinha, eu sinto muito. — Sua voz quebra. — Deveria ter sido
mais presente, você sempre deveria ter sido a minha prioridade.
— Eu acreditei que se não tivesse se separado da mamãe, se não
tivesse tanto tempo fora de casa, tudo seria diferente. — Minha voz
embarga. — Eu o culpava, porque queria que você tivesse sido meu herói.
As palavras soam amargas e uma lágrima desce pelo seu rosto. Eu
queria não ter que dizer isso para ele, não queria magoá-lo, porque o amo
tanto. Eu preferia continuar mantendo isso só para mim, mas não posso, não
mais.
— Eu deveria ter percebido que você estava doente quando parou de
comer, deveria ter percebido que tinha algo errado com seu fisioterapeuta,
deveria ter percebido que estava mentindo sobre seu namoro... — As
lágrimas descem com mais intensidade dos seus olhos. — Mas falhei todas
as vezes, eu nunca consegui ser o pai que você merece, garotinha.
Ele me olha com tanto ressentimento e com tanta dor... Isso o
machuca tanto quanto me machuca. O corrói de uma maneira que talvez
nem eu entenda.
E enquanto olho em seus olhos, eu entendo que nunca foi proposital,
nunca foi porque ele não me ama.
— Mas não é sua culpa, pai, ninguém poderia ter impedido o que
aconteceu comigo. — Lágrimas nublam minha visão. — Nem eu mesma...
nem eu mesma.
Ele fica em pé, aproxima-se e me abraça. Eu choro como uma
criança, deixando toda a mágoa sair de dentro de mim, perdoando meu pai e
me perdoando.
Deixando o passado exatamente onde ele pertence, no passado.
— Eu amo você, pai.
Sussurro e pela primeira vez em anos, não é algo dito por dizer, é
puro, genuíno. Eu finalmente posso amar meu pai sem me culpar por culpá-
lo.
— E eu amo você, garotinha. — Beija o topo da minha cabeça. —
Você sempre será a minha garotinha, a minha menininha.
Esse abraço é tudo que eu precisava, ele tira das minhas costas um
peso enorme. E quando minha mãe entra na cozinha, desvencilho-me do
meu pai, vou até ela e a abraço. Ela chora, eu choro e tenho a certeza de que
tudo ficará bem.
Ainda irá doer, ainda não será fácil, mas finalmente posso seguir em
frente.
Ouvi boatos de que o romance do nosso jogador e da nossa
patinadora chegou ao fim... Estão comentando até que o relacionamento
nunca foi real.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Conseguir me entender com meu pai faz com que eu finalmente


possa estar com ele sem ressentimentos, nós podemos rir e quando nos
sentamos os três na cozinha, conversamos como uma família de verdade,
olhamos de verdade um para o outro.
Não tocamos no assunto mágoa, porque não há mais o que ser
discutido, nós nos perdoamos e isso é tudo. Terminamos o café conversando
sobre as viagens de mamãe e Malcom, ele ficou caminhando pelo centro da
cidade, porque sentiu que precisávamos de um tempo a sós.
Minha mãe está ao meu lado enquanto meu pai está à minha frente,
ela se vira e me encara com curiosidade.
— E você e o garoto?
Mordo meu lábio inferior e o solto assim que estou pronta para ser
sincera sobre Aaron.
— Nós nos apaixonamos, ele e eu tornamos a nossa mentira uma
verdade.
— E o que você irá fazer? Vai continuar o mantendo distante?
Balanço minha cabeça negando.
— Eu não posso, eu estou morrendo de saudades dele.
Faço um beicinho infantil.
— E quando você irá falar com ele?
Meu pai questiona e olho em sua direção.
— Não sei, em breve, eu só preciso de um pouquinho mais de
tempo.
Ele franze sua testa.
— Você tem medo do que exatamente, Olívia?
Meu pai sabe que existe algo a mais em meu receio de conversar
com Aaron.
— Dele ter percebido que não faço falta. — Suspiro. — Ou dele não
gostar dessa versão de mim.
Falo meus medos em voz alta e eles parecem tolos, talvez eu só
esteja sendo uma medrosa
— Aquele garoto te encarava como se você fosse responsável por
mantê-lo vivo, ele com certeza está esperando por você.
Meu rosto fica vermelho ao ouvir as palavras da minha mãe, mas é
uma dose de coragem.
Apesar dos meus pais me encorajarem, apesar de ficar encarando o
número de Aaron, eu não envio mensagem, lá no fundo não quero o
procurar antes de descobrir exatamente quem eu vou ser. Eu quero encarar
Aaron sem nenhuma dúvida em minha mente.
Minha mãe e eu preparamos o almoço, Malcom retorna e nos ajuda,
meu pai diz que precisa resolver um problema e ficamos os três. Pela tarde,
eu vou para o quarto e abro meu notebook, eu preciso traçar as minhas
possibilidades.
O que eu vou fazer sem a patinação? Procuro pós-graduações,
cursos de especialização e meus olhos brilham com a possibilidade de ter
uma clínica com foco em recuperação de atletas. Eu escolhi a fisioterapia
porque precisei tanto dela e para evitar que o que aconteceu comigo se
repetisse. Talvez nas horas vagas possa ensinar o básico sobre patinação,
isso é tudo que meu tornozelo irá permitir, mas já é algo.
Faço as pesquisas necessárias e traço um futuro em minha mente,
um futuro em que eu visualizo Aaron ao meu lado. Eu só espero que ele
ainda queira fazer parte dos meus planos, e espero ainda fazer parte dos
seus planos.
À noite, eu recebo mais uma das suas mensagens.
“Hey, diabinha... uma semana e dois dias sem você e continuo
sentindo sua falta como um maluco, acho que você é o meu oásis em meio
ao deserto...
E sobre meu dia... foi um pouco entediante, aula e fui para a
academia. Amanhã temos um jogo e vou sentir sua falta na arquibancada.
Talvez você tenha me acostumado mal e saiba que se nós perdermos, ou
meu desempenho for horrível, vou culpar você.
E se estiver se perguntando, eu ainda estou apaixonado por você.
Seu A.”
Eu digito a mensagem e encaro o enviar, mas não tenho coragem.
Suspiro, jogo o celular ao lado, deito-me completamente na cama e encaro
o teto. Aaron apenas com uma mensagem faz um arrepio percorrer meu
corpo, faz com que deseje sair correndo ao seu encontro.
Novamente sonho com Aaron, ele é tão constante em meus sonhos
que me assusta.
Eu começo minha terça-feira indo para o campus, é meu pai a me
levar e é um pouco difícil por conta da maldita da bota imobilizadora, mas
consigo suportar e é legal estar de volta, o único ponto negativo são alguns
olhares de pena, eu tenho vontade de mandá-los enfiarem o olhar de pena
no rabo deles, mas não é isso que eu faço, apenas sorrio, aceno e digo que
eu estou bem.
E eu realmente acredito nas palavras que saem da minha boca, eu
estou bem!
Converso com a coordenadora do curso e alguns professores, eu
estarei impossibilitada de fazer as aulas práticas por um tempo e vou
adiantar algumas matérias teóricas para que não atrase tanto.
Sei que é impossível encontrar Aaron, ele faz administração e eu
fisioterapia, os prédios são em direções opostas, mesmo assim olho para os
lados e procuro por ele.
Para meu azar, nenhum milagre acontece, ele não surge de repente e
eu não o vejo. A saudade segue em meu peito.
Eu encontro Ava no campus e juntas vamos para Corner Park e nos
encontramos com Meg e Penny para almoçarmos. É tão libertador estar de
volta, rindo e fofocando com minhas amigas enquanto estamos em um dos
nossos estabelecimentos preferidos.
Maddy está com Penny e a garotinha torna nosso almoço ainda mais
divertido, Meg inclusive chora quando ela a abraça, além de encarar a
criança com um olhar emocionado.
Mesmo depois de almoçarmos, continuamos sentadas em nossos
lugares favoritos, Maddy dorme nos braços de Meg e pedimos os cafés de
sempre e Ava, que está à minha frente, me olha com uma certa
preocupação.
— Você está bem?
Meg está ao seu lado e me encara da mesma forma e sei que se olhar
para o lado, Penny estará me olhando da mesma maneira. É uma pergunta
que elas evitaram fazer, porém é inevitável.
— Estou ficando bem. — Suspiro. — E dessa vez de verdade. Eu
menti pra todos e pra mim mesma por muito tempo que estava bem.
Minhas amigas me encaram sem entender, elas nunca souberam
sobre o transtorno e nem sobre Noah. Eu estou pronta para contar, então
abro minha boca e deixo que as palavras simplesmente saiam.
Agora elas sabem da minha história, aquela que tinha vergonha, que
escondia e fingia que nunca tinha acontecido. É o meu passado e ficará lá,
não define quem eu sou e nem quem eu serei, entretanto, aconteceu e faz
parte de mim.
— Eu nunca suspeitei que você lutasse contra a anorexia.
Meg soa culpada e dou de ombros.
— É difícil alguém suspeitar, mesmo quando se está no estágio mais
grave da doença, porque é algo que ninguém gosta de admitir, não é algo
fácil para quem sofre e nem para quem está ao lado.
Minhas amigas me acolhem e me apoiam. Elas não me julgam, elas
não me encaram com pena, elas são exatamente o que eu preciso.
O assunto se encerra de forma natural e ficamos alguns segundos em
silêncio, é Penny a quebrá-lo.
— E quando você irá voltar para casa?
— Em breve, eu só estou aproveitando um tempinho com meus pais,
depois de tudo, nós precisamos disso.
Elas assentem e eu mudo de assunto, pergunto sobre o nacional,
Meg e Penny estão classificadas, além de Matteo e Ava. Penny está
empolgada, mas Meg parece desanimada.
O que está acontecendo com a minha amiga? Faço perguntas, mas
ela me responde com palavras curtas e frases inconclusivas.
Saímos do café no meio da tarde, elas me levam até em casa e fico
um tempo conversando com meus pais, mas estou cansada e vou para o
meu quarto.
Eu me jogo na minha cama e adormeço. Mais uma vez, sonho com
Aaron e quando acordo, estou com tanta saudade dele que dói. Suspiro,
pego meu celular e vou até a rede social de Aaron, preciso aplacar a
saudade de alguma forma.
Ele postou uma foto do taco de hóquei e da arena. Hoje é seu jogo e
as palavras que me enviou ontem ecoam em minha mente. Amanhã temos
um jogo e vou sentir sua falta na arquibancada.
Droga, eu não posso ficar em casa quando ele precisa de mim!
Eu vou até o perfil do time de hóquei e vejo o banner com o horário
do jogo. Ainda não começou.
O mais depressa que consigo, vou para o banheiro, tomo um banho
rápido e quando volto para o quarto, coloco uma calça, uma blusa de manga
longa e por cima a camiseta de Aaron. Calço o meu tênis na perna boa, a
bota imobilizadora na outra, prendo meu cabelo, pego um casaco e meu
celular.
Saio para o corredor e grito pelo meu pai, ele surge correndo e me
encara assustado.
— Aconteceu algo?
— Eu preciso que você me leve até a arena de Dartmouth.

Aaron

Faz mais de uma semana que eu não vejo Olívia e isso dói, sigo
contando sobre o meu dia e sei que ela visualiza minhas mensagens, mas
não me responde.
Eu estou enlouquecendo. Como ela tomou um espaço tão grande em
minha vida? Eu não sei, mas ela tomou e agora tudo que consigo é pensar
nela, é vê-la em cada pequeno detalhe, até quando estou jogando ela está
me atormentando.
Juro que ainda consigo sentir o seu cheiro em meus lençóis.
Meus amigos e meus colegas de time reclamam que estou mal-
humorado e realmente estou. Desconto toda minha frustração neles. Porra,
nem eu mesmo me suporto!
Eu até briguei durante os treinos, coisa que nunca fiz antes, no jogo
fora de casa eu joguei muito mal, até fui substituído e o treinador ameaçou
me deixar no banco no próximo jogo se não domasse meu comportamento.
Tudo apenas não está pior, porque minha avó está com a doença em
remissão e só não veio assistir ao jogo porque é dia de semana e de noite,
eles não poderiam voltar no mesmo dia e não queriam dormir em Hanover.
Talvez se eles estivessem aqui hoje, eu estaria mais animado. Troco
minha roupa pelo uniforme no vestiário e enquanto meus colegas falam
empolgados das expectativas do jogo, eu penso que Liv não estará aqui.
Acho que estou meio obsessivo pela garota!
O jogo de hoje nos ajuda a entrar na disputa por nos classificarmos
para os playoffs e eu não paro de pensar na minha ex-namorada que, na
verdade, nunca foi namorada.
Meus colegas e amigos entoam o grito de guerra, eu os acompanho,
mas minha voz é apenas um sussurro. Em seguida, deixamos o vestiário e
seguimos para a pista de patinação, eu caminho mais afastado de todos,
então Alex se aproxima e bate em meu ombro.
— Foco, Aaron, nós precisamos de você aqui.
Assinto e empurro os pensamentos acerca de Liv para o fundo da
minha mente, mantendo-a o mais distante possível.
O time da Yale já está aqui ocupando os bancos da parte esquerda,
os cumprimentamos com um aceno de cabeça e ocupamos os bancos da
direita. O treinador nos passa as últimas recomendações e me encara.
— Aaron, você precisa dar o seu melhor, eles são os melhores na
área defensiva e são o time que mais marcou na temporada.
Assinto e engulo em seco. A responsabilidade é minha e não posso
falhar. O auxiliar técnico finaliza suas observações e fazemos nossa
rodinha, bradamos mais uma vez o grito de guerra, colocamos nossos
equipamentos, pegamos os tacos e vamos para o gelo.
Antes de entrar na pista, eu olho para a arquibancada, procuro por
ela e é claro que não a encontro. Lá no fundo, eu tinha uma esperança.
Suspiro e sigo em frente.
Eu assumo minha posição, inclino-me levemente para a frente e dou
uma olhada em cada jogador, analiso a postura e me preparo para o que eles
possam estar planejando fazer.
O apito soa, o jogo se inicia e dou o meu melhor. Intercedo, eu
marco, recupero o disco do time adversário, faço passe para o meu time,
corro pelo gelo mesmo não sendo minha maior função.
O time é bom, é difícil barrá-los e difícil invadir sua defesa. Parto
pra cima dos outros jogadores, esbarro neles, marco falta, trocamos palavras
agressivas e terminamos o primeiro tempo empatados.
No primeiro intervalo, o treinador aponta o que estamos fazendo de
errado, mas estamos nervosos. Vamos para os segundo, continuamos
jogando e nos defendendo, mesmo assim eles são os primeiros a marcar.
Desgraça!
O treinador grita comandos, nós tentamos nos alinhar, o que é pior,
o puck entra mais uma vez e eles marcam o segundo ponto.
Caralho, é frustrante!
Gritamos um para o outro palavras de motivação. Eu respiro fundo e
mentalizo que não posso perder o controle. Escutamos o treinador, nos
acalmamos e voltamos a ter domínio do jogo.
Eu consigo atacar o time adversário, o atacante estava em alta
velocidade e mesmo assim o barrei, a arena grita meu nome e comemora,
mas é uma voz que chama minha atenção.
Merda, eu estou tendo alucinações?
Escuto-a me chamar mais uma vez, então olho rapidamente para o
lado e meu coração bate acelerado quando me deparo com Liv e seu pai,
eles estão com a equipe técnica, Liv sentada junto aos meus colegas.
Ela está aqui!
— Aaron, se concentre, porra!
O treinador grita e eu preciso me concentrar, eu preciso vencer,
porque ela está aqui! Eu olho em frente, mais focado do que nunca.
Não importa se é o melhor jogador dele ou se é a melhor jogada, eu
os detenho. Faço minha parte e marcamos um ponto. Comemoramos e
mantemos o foco.
Os vinte minutos chegam ao fim e temos o intervalo, eu saio o mais
depressa possível do gelo, tiro o capacete e protetor bucal, jogo-os no chão
ao lado da pista, coloco o protetor nas lâminas dos meus patins e vou na
direção do banco de reserva e da equipe técnica, mas nenhum deles é o meu
alvo.
Liv fica em pé com a ajuda da muleta, meu olhar encontra o seu e
tudo ao meu redor some, torna-se insignificante. Ela importa, apenas ela.
Eu paro à sua frente e a saudade ecoa por todo meu corpo. Preciso
me controlar para não tocá-la.
— Você veio.
Sussurro e ela sorri.
— Não poderia deixar você sozinho, principezinho. — Pisca em
minha direção. — E nem ser a responsável pela derrota do time.
Essa é a minha diabinha! Eu dou um passo em frente, toco sua
cintura e apoio minha testa na sua.
— Eu senti tanto a sua falta, diabinha.
Ela espalma sua mão em meu peito.
— Foi difícil para mim, Aaron, extremamente difícil.
Meu olhar se mantém no seu e compartilhamos um mundo.
— Por que você está aqui, Liv?
Faço a pergunta que martela em minha mente, mesmo com medo da
sua resposta. Eu preciso saber o porquê.
— Não é óbvio? — Seus olhos têm um brilho divertido, eu sigo com
os lábios em uma linha fina, uma parte de mim está até com medo de estar
sonhando. — Por você, Aaron.
Sua mão sobe até meu pescoço.
— Porque eu sou sua.
É tudo que preciso ouvir, minha boca cobre a sua e a beijo. Um
beijo repleto de saudade. Caralho! Liv se tornou meu vício e estar longe
dela foi um inferno, depois de dias, finalmente estou no paraíso.
Meus lábios reconhecem os seus, meu coração e minha alma a
reconhecem. Não importa o que aconteça a partir de agora, porque ela está
aqui.
— Aaron, não faça eu me arrepender de ter deixado sua namorada
invadir nosso espaço.
Sorrio ao ouvir a voz do meu treinador e me afasto de Liv.
— Eu preciso ir.
Ela assente.
— Eu vou esperar por você.
Beijo seus lábios rapidamente mais uma vez e dou um passo para
trás.
— E, Aaron? — Ergo minhas sobrancelhas. — Vença por mim.
— Eu farei de tudo.
Pisco em sua direção e vou até meu treinador que está reunido com
o restante do time, ele nos passa mais orientações e quando voltamos para a
pista, estamos com sangue nos olhos.
Vamos vencer, porra!
Jogamos com a maior garra que conseguimos e empatamos. Apenas
mais um ponto e vencemos. Os segundos finais se aproximam e não há
muito o que ser feito, então quando consigo recuperar o disco, eu arrisco, é
tudo ou nada.
Eu saio da minha área, corro pelo gelo e invado a área do
adversário. Eles tentam me parar, mas não conseguem. Continuo e de
repente estou de frente para o goleiro. Não hesito, acerto o puck com o taco
e ele invade a baliza.
Marco a porra do ponto final. Gritos ecoam ao meu redor e tudo
que faço é olhar para ela. Liv ri e faz tudo valer a pena.
O jogo termina, meus colegas e eu comemoramos, mas não fico por
muito tempo com eles, saio depressa da pista, atiro meus equipamentos pelo
chão, inclusive os patins e vou até Liv.
Ela está em pé, coloco minhas mãos em sua cintura e ela deixa que a
muleta caia. Eu a sustento e ela traz suas mãos até estarem ao redor do meu
pescoço.
— Eu ganhei por você, diabinha.
— O que você deseja de recompensa?
Ela sorri e beijo seu queixo.
— Você, você é a minha maior recompensa.
Um casal realmente apaixonado e há quem disse que eles eram
apenas uma mentira...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Olívia

Aaron faz meu coração bater mais forte, faz com que sinta um frio
em minha barriga, faz com que meu sangue percorra mais rápido, ele faz
com que meu mundo gire de ponta cabeça e que tudo ao meu redor suma.
Tudo que importa é ele.
É como se o mundo paralisasse, como se todos sumissem e restasse
apenas nós dois.
Suas palavras ecoam em minha mente: “você, você é a minha maior
recompensa” enquanto sua boca cobre a minha. É um beijo que me arrebata
para um outro lugar, que faz meu corpo formigar e me sentir a pessoa mais
importante do universo.
Deus, eu senti tanta falta de Aaron!
Nossas línguas duelam, sua mão aperta minha cintura e eu o puxo
ainda mais na minha direção; ainda não é o bastante. Aaron afasta seus
lábios do meus e beija o canto da minha boca.
Então, apoia a testa na minha e nossos olhares se encontram.
Estamos tão perdidos um no outro, tão apaixonados...
Um beijo não é o suficiente, eu preciso de mais e ele sabe disso.
— Você irá me esperar?
— Eu vou.
Aaron acaricia o meu rosto e beija minha testa.
— Eu já volto, diabinha.
Ele pega a minha muleta no chão e me alcança, ele hesita alguns
segundos, beija meus lábios rapidamente e segura meu rosto, é óbvio que
ele não quer ir. Sorrio e empurro seu peito.
— Vá.
Ele ri, balança a cabeça e por fim, vira-se de costas. Eu o observo
caminhar na direção do vestiário e respiro fundo, há um turbilhão de
sentimentos ecoando em meu peito, e são bons, nenhuma dúvida, medo ou
insegurança.
— Você irá com ele?
Olho para o lado e encaro meu pai.
— Eu vou.
Ele assente e espera Aaron comigo, os caras do time e até os garotos
do time adversário vêm conversar com meu pai, pedir foto e autógrafo. Para
não cansar, eu me sento, coloco meu casaco, já que o tirei para Aaron saber
que estava com sua camiseta, e só volto a ficar em pé quando Aaron deixa o
vestiário e caminha em minha direção.
Encaro-o e ele me encara de volta, nenhum de nós desvia o olhar um
do outro, nem mesmo quando meu pai se aproxima.
— Aaron, cuide da minha garotinha.
Continuamos nos olhando.
— Com minha própria vida se for necessário.
Sorrio e ele sorri.
— Ok, eu estou indo. — Meu pai resmunga, então nos forçamos a
olhar para ele. — Se comportem, crianças.
Nós assentimos e nos despedimos dele. Assim que ele se afasta,
Aaron volta a me encarar.
— Vamos para a minha casa? — Encaro-o com malícia e ele fica
vermelho. — Nós precisamos conversar.
Ele está certo, mas conversar não é a primeira coisa que eu quero
fazer.
— Vamos para a sua casa. — Eu me inclino em sua direção e mordo
seu lábio inferior. — E nós iremos conversar em algum momento.
Seus olhos ficam escuros e sei que as imagens em sua mente não são
as mais inocentes do mundo.
— Você tem até a sua casa para descobrir como irá me foder com
essa maldita bota.
Seus olhos ficam ainda mais escuros e apoia sua mão em minhas
costas.
— Vamos logo, diabinha, antes que você acabe com meu controle.
— Eu amo acabar com seu controle.
Provoco-o, ele fica ainda mais vermelho e eu sorrio. Aaron me ajuda
a ir até o estacionamento, coloca-me em seu carro e assume o lugar ao meu
lado.
Eu mexo na playlist, coloco Imagine Dragons e ele ri, porque sabe
que é a minha banda preferida.
— Eu respondia suas mensagens contando sobre os meus dias, mas
nunca as enviava.
Confesso enquanto ele dirige.
— Você irá me deixar lê-las?
Assinto.
— Sim, você irá saber de tudo, Aaron.
Ele precisa saber, não haverá nada entre nós.
— Sabe, há uma tradição em minha família.
— Dos nomes?
Ele ri, aquele sorriso que mostra suas covinhas e eu amo.
— Não, eles dizem que a primeira pessoa que levamos para
conhecer a família é a pessoa que iremos nos casar e ser felizes para
sempre.
Aaron está vermelho e sorrio.
— Mas não sou a primeira pessoa.
Ele morde seu lábio inferior.
— É, eu namorei no ensino médio, mas ela nunca conheceu a minha
família.
Finjo o encarar, indignada, porque lá no fundo a informação me
deixa esperançosa e não apavorada.
— E você me levou para conhecer sua família mesmo assim?
— Primeiro que eu não acreditava na tradição... — O uso da palavra
no passado não me passa despercebido. — Segundo, que era uma mentira.
Sorrio enquanto meu coração bate acelerado em meu peito.
— Você está dizendo que iremos ser para sempre, principezinho?
— Isso te assusta?
Responde minha pergunta com outra pergunta, mordo meu lábio
inferior e demoro alguns segundos para respondê-lo.
— Deveria, mas não me assusta, Aaron.
O restante do caminho vamos em silêncio, porque a tensão entre nós
é demais. Porque aquela força que nos puxa na direção um do outro é quase
insuportável.
Minha respiração está ofegante, meu corpo todo está em alerta e
meus seios estão pesados contra meu sutiã. Como ele pode fazer isso sem
sequer me tocar?
Assim que Aaron para na garagem, tiro o cinto e sua voz ecoa pelo
carro.
— Espere, eu vou pegar você.
Assinto e espero por ele. Aaron deixa o carro e vem em minha
direção, ele abre a porta e me toma em seus braços. Ele me segura como se
fosse um presente valioso.
Espalmo minhas mãos sobre seu coração, ele me encara e nós dois
sorrimos como se estivéssemos compartilhando algo, e estamos. Meu corpo
vibra diferente, porque ele está me segurando, porque tenho suas mãos em
mim.
— Você pensou em nossas opções?
Sussurro enquanto ele abre a porta e adentra sua casa.
— Eu, definitivamente, pensei nas nossas opções. — Olho para
minha perna. — Você pode tirar a bota?
Assinto.
— Faz mais de um mês do acidente, não posso fazer movimentos
bruscos, mas todo o resto está permitido.
Ele sorri vitorioso, apressa o passo e nos leva para seu quarto.
Entramos no cômodo e ele me carrega até sua cama. Deixa-me sentada
sobre a beira do colchão, inclina-se em minha direção, apoia a mão ao lado
e solta meu cabelo do rabo-de-cavalo.
Aaron está me encarando e o que vejo em seus olhos faz com que
minha respiração falhe.
— Eu senti sua falta pra caralho, diabinha. — Beija meu pescoço.
— Cada maldito minuto longe de você foi insuportável.
Seguro o tecido do moletom que está usando.
— Meus minutos também foram insuportáveis longe de você, mais
do que posso explicar, mais do que você pode imaginar.
Aaron beija meu pescoço mais uma vez e fica de joelhos. Ele tira a
minha bota imobilizadora com cuidado, depois meu tênis e em nenhum
momento deixamos de nos encarar.
Os próximos itens a deixar meu corpo são o meu casaco, a camisa
de Aaron, a blusa térmica e meu sutiã. Ele beija o vale entre meus seios e
suspiro. Ele ri e me ajuda a ficar em pé, encosto meu pé levemente no chão
e termina de me despir.
Amo o jeito que ele me encara, amo o jeito que ele venera o meu
corpo apenas pela forma como olha para mim.
Sento-me novamente e assisto Aaron fica nu diante de mim, e é uma
visão do caralho, então ele sorri convencido, porque sabe que estou o
admirando. Ergo minhas sobrancelhas. o desafiando a fazer alguma
piadinha, mas ele apenas dá um passo em frente, coloca o joelho ao meu
lado, inclina-se em minha direção e me obrigada a me deitar.
Ele está sobre mim, uma perna no chão, uma ao meu lado, mão
apoiada ao lado da minha cabeça e seus olhos estão conectados ao meu. Um
arrepio atinge e o meio das minhas pernas vibra em antecipação.
Sua mão livre passeia pela lateral do meu corpo. Não é apenas tesão
que nos consome, não é apenas o sexo que nos liga, é muito mais do que
isso.
Aaron cobre minha boca, reivindica meus lábios e me marca como
sua. Não ofereço nenhuma resistência quando se afasta, coloca um
travesseiro abaixo do meu corpo, inclina-se um pouco e apoia minha perna
machucada em seu ombro, enquanto a outra continua para fora da cama.
— Se sentir dor, me avise.
Foda-se a dor! Tudo que consigo pensar é no quanto preciso dele
dentro de mim.
Nós dois trememos em antecipação e gememos quando ele se guia
para dentro de mim. Foi tanto tempo longe um do outro!
Seguimos nos encaramos o tempo inteiro, em nenhum momento
fechamos os olhos, nem quando tudo se torna uma confusão de sentimentos
e estamos ambos desorientados.
Somos a bússola um do outro.
Alcançamos juntos nosso orgasmo, então ele se joga ao meu lado e
me puxa para seu peito. Estar com Aaron é tão libertador, estar com ele é
como se tivesse reencontrado uma parte minha.
Recobramos nossos sentidos e Aaron me leva para seu banheiro.
Ficamos um tempo na banheira conversando sobre nossos sentimentos, não
mentimos e nem negamos. Estamos apaixonados.

Após o banho, nós dois nos vestimos e vamos até a cozinha preparar
algo. Aaron irá preparar algo e eu vou assisti-lo. Porém, Aaron só tem
tempo de cortar os temperos, porque Giulia invade a cozinha e pede sua
ajuda.
— Alex furou o pneu na rua de trás, eu não posso ajudá-lo.
Aaron revira os olhos.
— Eu vou ajudar o idiota.
Ele deixa um beijo no topo da minha cabeça e ficamos apenas
Giulia e eu. Ela se senta à minha frente e conversamos sobre assuntos
referentes à faculdade até que a expressão em seu rosto muda.
— Eu soube o que aconteceu com você.
Ela me encara com pesar, mas é algo além disso em seus olhos,
reconhecimento. Giulia, a namorada de Alex e irmã de Matteo era uma
patinadora, até que um acidente na pista de patinação, assim como o meu, a
impediu de continuar competindo.
— E sinto muito, sei o quando é doloroso, passei pelo mesmo, eu
não posso mais competir e também perdi um bebê.
Encaro-a surpresa.
— Eu não sabia do bebê, sinto muito, não consigo nem imaginar o
quanto deve ter sido difícil para você.
Ela assente.
— Foi difícil, mas a vida continua, Liv, Aaron conversou comigo,
eu falei o quanto é complicado, é um sonho que é perdido, mas queria que
soubesse que a vida segue, nós aprendemos a recomeçar, a ter outros
sonhos. — Sorri. — É possível voltar a ser feliz.
Suas palavras ecoam em minha mente e sorrio agradecida.
— Muito obrigada.
Ela assente e me conta que está trabalhando com crianças no gelo,
elas estão no básico e não precisa se esforçar muito, ou seja, isso ela pode
fazer. É a esperança que preciso e trocamos algumas experiências.
Os meninos voltam, Aaron faz a comida e jantamos os quatro.
Como Aaron cozinhou, Giulia e Alex limpam a cozinha, então nós dois
voltamos para o seu quarto.
Nós nos sentamos na sua cama, Aaron com as costas apoiadas na
cabeceira e eu apoiada em seu peito. Pego meu celular, ele pega o seu e
envio todas as mensagens que escrevi e não enviei.
Não escondi nenhum sentimento, e agora ele sabe que desde o
momento em que deixou meu quarto, eu senti sua falta.
“Eu sigo sentindo sua falta, Aaron, e a sua falta faz com que eu
queira melhorar. Você me motiva a continuar vivendo, não quero mais
apenas sobreviver, quero viver e viver ao seu lado.”
Ele lê em voz alta e me encara.
— Você me ajudou mesmo distante, principezinho.
Sorrio e ele desvia os olhos de volta para o celular.
“Eu sinto sua falta e não quero mais continuar assim, finalmente
estou conversando com a psicóloga.”
Ele lê mais uma mensagem em voz alta e dessa vez, não faço
nenhum comentário.
“Hoje eu conversei com meu pai sobre o meu passado, sobre tudo o
que aconteceu. Estou pronta para recomeçar e espero que você esteja ao
meu lado. “
— Eu estarei.
Ele beija minha testa e termina de ler as mensagens. Aaron joga o
celular e se ajusta em uma posição para que possa ver o meu rosto.
— O que aconteceu no seu passado?
Respiro fundo, afasto minhas costas do seu peito e o encaro. Eu
conto sobre meu passado, sobre a anorexia, sobre minha luta contra minha
mente e sobre Noah.
— Sinto muito. — Ele entrelaça nossas mãos. — Eu sempre soube o
quão forte você é.
Traz nossas mãos até seus lábios e beija os nódulos dos meus dedos.
— Eu precisei do acidente para superar o meu passado, e precisei de
você para seguir em frente.
— Sempre estarei aqui, Olívia.
Suspiro, ele abaixa nossas mãos e encaro nossos dedos entrelaçados.
— Estou bem, Aaron, mas não significa que esteja curada. — Sou
sincera e volto a olhar em seu rosto. — Eu posso ter uma recaída, um surto,
lutar contra a anorexia é algo que continuarei fazendo.
Ele não parece assustado.
— Nada vai me fazer desistir de você, Liv.
Enquanto olho em seus olhos, me dou conta de que sou exatamente
o que eu fingia ser, nunca menti, nunca fingi, essa sempre fui eu e
finalmente posso admitir isso para mim mesma.
— Eu vou anotar isso para quando estivermos brigando.
Brinco e ele ri.
— Não importa o que aconteça, não importa a briga que possamos
ter, continuará sendo minha namorada e é para sempre, segundo minha
família.
Tranquilidade e plenitude ocupam meu peito enquanto sorrio para
Aaron.
— Namorada? Não lembro de nenhum um pedido.
— Você é minha namorada.
Ele não abre margens para negar e eu não negaria.
— É bom você apagar os 99 números.
— Ciúmes?
Ele gosta de me ver com ciúmes e reviro meus olhos.
— Apenas cuidando do que é meu.
Pisco em sua direção, seguimos nos provocando e nossas risadas
ecoam pelo quarto. Em um momento, paramos, espalmo minhas mãos em
seu peito e o encaro.
— Segundo a tradição da sua família, somos para sempre, você não
tem medo?
Ele ri, fica vermelho e nega balançando sua cabeça.
— Eu não tenho medo, Liv, e você?
Finjo que estou pensando no assunto e demoro alguns segundos para
responder. Eu não preciso pensar!
— Não, eu estou pronta para você ser o meu principezinho para
sempre, Aaron.
Tudo começou com uma prisão, se transformou em uma mentira e
resultou em um casal apaixonado... Realmente, o melhor inverno de todos.
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Aaron

Eu desvio o olhar rapidamente para o lado e Liv está mexendo suas


mãos. Sorrio e ganho um olhar de advertência.
— Não ria.
Volto a encarar a estrada à minha frente.
— Não sei o porquê está nervosa.
Ela claramente está nervosa, e desde que saímos de Hanover.
— Nós estamos indo ver sua família.
— E daí? — Ela não me responde e não preciso olhar para ela para
saber que está revirando seus olhos. — Você já os conhece, Liv.
— Mas agora é de verdade.
Seu raciocínio não faz sentido ao mesmo tempo que faz.
— Eles continuam as mesmas pessoas.
— Mas nós dois não.
— Eu sigo sendo a mesma pessoa, o que aconteceu com você? Foi
transformada em uma vampira? Ou um zumbi?
Provoca-a e Liv bufa irritada.
— Vá se foder, Aaron.
Sorrio e sigo com o deboche.
— Eu até pararia o carro, mas acho que sua bota nos impediria.
Ela soca meu braço e continuo rindo.
— Você está tão irritante hoje, Aaron.
Olho para ela outra vez e tem os braços cruzados sobre o peito.
— Você não tem motivo para estar nervosa, não iremos encontrar
com toda minha família, apenas com meus avós e eles adoraram você.
O medo de Liv é irracional, eu não contei para meus avós sobre a
mentira e nem que ficamos alguns dias separados, ou seja, para eles tudo
continua exatamente da mesma forma. Eles apenas sabem sobre o acidente.
— Agora é diferente e eu sei sobre a tradição.
Como faz dias que estou tentando tranquilizá-la e não obtive êxito,
não será agora no caminho para a casa da minha família que conseguirei,
desisto e mudamos de assunto.
Estar com Liv é fácil, hoje é sábado e desde terça nos entendemos,
nós nos vimos todos os dias, ou no campus, ou em minha casa, ou no
apartamento do seu pai. Sua mãe e padrasto foram embora, mas seu pai,
não, James não parece com pressa de ir embora.
Eu amo estar com Liv, amo ser seu namorado. Nós somos como
éramos antes do acidente, na verdade, Liv mudou, não há mais uma sombra
no seu olhar, não constantemente, alguns dias ou alguns momentos não são
tão bons, mas eles não definem seus sentimentos e nem quem ela é.
Estaciono em frente a casa dos meus avós e Liv suspira. Eu sorrio e
quando ela me encara com uma expressão nada amigável, comprimo meus
lábios um no outro.
— Acho bom.
Ela resmunga, eu deixo o carro e vou até o seu lado ajudá-la a
descer. Enquanto saímos da picape, meus avós abrem a porta e nos esperam
na varanda.
— Você pode fingir que é uma mentira, já que fica mais tranquila
quando a situação não é real — sussurro e ela bate em meu peito. — Hey,
eu estou apenas tentando ajudar.
Defendo-me enquanto ficamos de frente para meus avós e
caminhamos na direção deles, Liv com o apoio da muleta.
— Não está ajudando.
Diz entredentes, porque está forçando um sorriso.
— Só não precisa vomitar.
Refiro-me ao dia que vomitei depois de encontrar com seu pai e
precisar mentir para ele.
— Eu deveria, para me vingar daquele dia.
— Pelo menos dessa vez não temos guerra de bola de neve.
Tento ser positivo.
— Eu acho que preferia ser recebida por uma grande bola de neve,
olha como seus avós estão nos encarando.
Eles realmente estão nos analisando e por esse motivo ficamos em
silêncio enquanto nos aproximamos.
Eu olho para minha avó e ela está visivelmente melhor, ainda tem
um aspecto de doente, mas não é tanto quanto da outra vez.
Ela está bem, ela ficará bem! Saber disso faz com que um
sentimento de gratidão ocupe meu peito. Eu não suportaria perdê-la, não
consigo nem pensar em como faria para seguir em frente.
Eu vivi tanto nos últimos dias, altos e baixos, e finalmente tudo está
se encaminhando para a calmaria.
Minha avó sorri quando paramos à sua frente, eu a abraço e ela beija
a lateral do meu rosto.
— Eu soube que você marcou um ponto.
Assim que me afasto, ela olha com deboche para o meu avô, ela está
nos provocando pela vez que dissemos que eu não marco pontos.
— Ela não entendeu que foi uma exceção.
Meu avô resmunga enquanto o abraço, eu apenas sorrio e me
posiciono ao lado dele. Liv está abraçando minha avó e é nítido em sua
expressão o quanto algo está a incomodando.
— Hey, Eileen.
— Hey, querida.
Minha vó se desvencilha de Liv, segura suas mãos e encara minha
namorada, ela está a analisando, Liv apenas força um sorriso.
— O que aconteceu? — Surge uma ruga em sua testa. — Você está
tensa.
Liv balança a cabeça e segue forçando um sorriso.
— Eu estou bem, só um pouco cansada por causa do meu tornozelo.
— Suspira dramaticamente. — Além disso, Aaron e eu saímos muito cedo
de Hanover, estou com muito sono.
Ela inclusive finge um bocejo e preciso me segurar para não rir.
Minha avó assente, solta suas mãos e se vira para meu avô, eles trocam um
olhar e os dois sorriem como se estivessem compartilhando um segredo. E
talvez realmente estejam, muito suspeito!
— Vamos entrar, eu preparei biscoitos. — Ela olha para Liv. — Os
biscoitos preferidos de Aaron.
Conta como se fosse um segredo. Liv ri, minha avó faz a frente e a
seguimos, vamos todos para a sala de jantar, uma mesa está posta com o
café da manhã e há muita comida, ovo, bacon, panquecas, bolo, biscoito,
suco, café, leite e pães.
— Uau, uma mesa digna de filme, vovó.
Ela se vira para mim e sorri.
— Meu neto querido e sua namorada merecem.
Ela pisca em minha direção e volta a olhar em frente. Não entendo
exatamente o que ela quis dizer, ignoro o enigma e nos sentamos ao redor
da mesa.
A comida está excelente, conversamos sobre o jogo, sobre a
faculdade e meus avós perguntam para Liv como ela está, ela é sincera e diz
que está se recuperando, que todos os dias ela melhora um pouco, meu avô
nos atualiza sobre a empresa, minha avó comenta sobre a sua remissão e
todos nós precisamos nos segurar para não chorar.
— Nada de choro, porque chorar causa rugas. — Ela pressiona
abaixo dos olhos com os dedos para evitar lágrimas. — E não temos mais
motivos para chorar, não mais.
— Não mais.
Repito baixinho, encaro minha avó e ela sorri, um sorriso de uma
vencedora. E eu sorrio de volta, esse é um sorriso aliviado e quando olho
para o meu avô, ele tem a mesma expressão em seu rosto.
— Gostou dos biscoitos, Liv?
Minha avó muda de assunto e o clima tenso se dissipa.
— Eles são maravilhosos.
Ela pega mais um biscoito e o leva à boca, comprovando que amou
os biscoitos. É impossível não gostar deles.
— Eu vou passar a receita para você fazer para o meu neto.
Liv assente, mas tenho certeza de que ela tem pensamentos
diferentes rondando sua mente.
Nós terminamos o café, eu levo Liv para o meu quarto, em seguida
busco nossas mochilas no carro e volto para o cômodo, então me jogo na
cama ao seu lado. Liv me encara, tem um brilho travesso em seus olhos e
ergo minhas sobrancelhas.
— Eu deveria ter dito para sua avó que o neto dela sabe cozinhar.
Eu sabia que ela tinha uma opinião contrária sobre o assunto.
— Não seja uma mala, diabinha. — Beijo seu pescoço. — Foi aqui
que você perdeu o controle.
Ela vira o rosto e seu nariz encosta no meu.
— Que você perdeu o controle.
Desafia-me a contrariá-la, eu fico alguns segundos em silêncio,
pensando na melhor resposta.
— Que nós perdemos o controle.
É tudo que consigo dizer e ela sorri vitoriosa. Liv se apoia em mim e
uma ruga surge em sua testa assim que para de rir.
— Sua avó está estranha, não é um estranha doente, ou algo ruim, é
um estranha só estranha mesmo.
Ela explica e meus lábios seguem curvados em um sorriso, eu
entendi o que ela está querendo dizer.
— Eu também achei.
Nós levantamos motivos para ela estar estranha, mas não
encontramos nenhuma explicação plausível, então nos levantamos,
deixamos o quarto e vamos para o jardim, onde meus avós estão, ficamos
conversando e minha avó fala sobre suas plantas, eu também aproveito para
contar quem é o pai de Liv e entrego uma das minhas camisetas de hóquei
com o autógrafo de James.
— Presente do meu sogrão para o senhor.
Liv zomba da minha escolha de palavras e simplesmente dou de
ombros. Meu avô tem um brilho nos olhos e sorri como uma criança que
acabou de ganhar um doce, ele só não veste a camiseta porque está frio.
Assim que a funcionária dos meus avós avisa que o almoço está
pronto, vamos para a sala de jantar e enquanto almoçamos, minha avó inicia
um interrogatório.
— Como está o namoro de vocês?
— Bem.
Respondo-a e a encaro, tentando descobrir o porquê da sua pergunta.
— E como vocês se conheceram?
Eu olho para Liv e faço um sinal para ela responder, porque não vou
mentir. Liv me encara com uma expressão de poucos amigos, mas responde
à minha avó. Dona Eileen segue fazendo perguntas e são perguntas
específicas.
— O que vocês fizeram essa semana?
Nego-me a responder isso, ela já foi longe demais.
— Vovó, o que você está querendo com essas perguntas ridículas?
Ela sorri debochada, olha para Liv e segundos depois olha para
mim. O que está acontecendo? Realmente, estou perdido.
— Eu só quero saber se a mentira já se transformou em verdade.
O quê? Sigo olhando para ela, sem entender do que está falando.
— Do que a senhora está falando, vovó?
— Eu sei de tudo, querido, sempre soube, desde o instante que eu
olhei em seus olhos. — Soa tão convencida. — Eu te conheço desde bebê,
além de ser um péssimo mentiroso.
Sigo sem entender, nenhuma das suas palavras faz sentido.
— Acho que ela sabe, Aaron — Liv sussurra e me viro para ela. —
Que estávamos mentindo sobre nosso relacionamento.
Finalmente tudo se liga em minha mente e volto a encarar minha
avó, totalmente surpreso.
— A senhora sabia? — Minha avó sorri vitoriosa e assente.
— Lógico, Aaron, você é tão horrível mentindo, com cara de
apavorado, vermelho e gaguejando.
Ela revira seus olhos e a encaro boquiaberto.
— Não acredito.
Dá de ombros.
— Pois acredite.
Meu cérebro ainda está processando a informação e quando olho
para Liv, a encontro com o rosto vermelho. Volto a encarar a minha avó,
que não parece nem um pouco abalada.
— E por que não nos desmentiu?
— Porque eu sabia que em algum momento a mentira se tornaria
verdade.
Ela responde como se fosse simples assim; sorrio ironicamente.
— A senhora sabia que se tornaria verdade? — Assente. — A
senhora é uma bruxa? Uma fada? Uma vidente?
Minha avó aponta seu dedo em minha direção.
— Eu tenho anos de experiência, vivi mais do que a idade de vocês
dois juntos, sei quando duas pessoas estão destinadas a ficarem juntas.
Ela soa tão convicta que não tenho nem coragem de discordar.
Minha avó abaixa seu rosto e nos encara com uma expressão convencida.
— Vocês dois não são mais uma mentira, não é?
Ela olha de mim para Liv com um olhar repleto de expectativa.
— Nós não somos, nós somos reais. — Viro-me para Liv e sorrio.
— O mais real possível.
— Ok, Joseph, eu quero meus duzentos dólares.
Liv e eu não entendemos, olhamos para meus avós e eles estão se
encarando.
— O quê?
Pergunto, já que nenhum dos dois faz questão de explicar o que está
acontecendo.
— Eu apostei com seu avô que demoraria menos de dois meses, seu
avô apostou em mais de dois meses.
— Para namorarmos de verdade?
Liv sussurra incrédula.
— Sim, querida.
Minha avó responde, meu avô bufa e entrega o dinheiro para ela.
Assim que tem o dinheiro em mãos, volta a nos interrogar, dessa vez, ela
quer a verdade e a contamos, inclusive que eu fui preso.
É um longo almoço e apesar das revelações, é divertido.
Meus avós deixam a mesa após o almoço e vão para o quarto, já que
é o horário do cochilo da tarde. Eu levo Liv para um passeio misterioso,
pego uma manta e vamos para minha camionete, já que ela não pode
caminhar longas distâncias.
— Para onde você está me levando?
Questiona assim que estamos na picape.
— Surpresa.
Ela passa o restante do caminho tentando descobrir, a sorte é que é
rápido, e só paro quando avista o lago.
— O seu lago.
— O meu lago.
Paro e saio do carro, dou a volta, abro a sua porta e ajudo a descer,
então pego a manta e sua muleta. Estendo o tecido no chão e nós nos
sentamos, Liv entre minhas pernas e com as costas apoiadas em meu peito.
— Eu ainda estou em choque que seus avós apostaram quanto
tempo demoraríamos para nos apaixonar de verdade.
Eu sorrio e beijo o topo da sua cabeça.
— Estou surpreso, mas quando paro pra pensar, é exatamente algo
que eles fariam.
Ela ri.
— Sua família é incrível e os adoro.
— Eu os amo demais.
Confesso e nós dois ficamos em silêncio encarando o lago à nossa
frente. É prazeroso ter Liv aqui em meus braços, é como estar segurando o
meu mundo. E talvez eu esteja!
— Se a tradição estiver certa, eles serão a sua família também.
Ela ri e seu corpo treme. A tradição não é uma pressão para
nenhum de nós.
— E teremos quatro filhos, principezinho.
— E os seus nomes iniciarão com A, B, C e D.
Pelos próximos minutos discutimos os nomes enquanto rimos,
minha barriga dói de tanto rir.
— Você jogará hóquei e eu terei uma clínica de fisioterapia, além de
ensinar patinação para as crianças, talvez na escola dos nossos filhos.
Estamos apenas brincando, mas se esse for nosso futuro, nenhum de
nós irá reclamar, lá no fundo, torcemos para que seja exatamente assim. Liv
e eu seguimos rindo e criando um futuro perfeito.
O Sol brilha sobre o gelo, a paisagem reflete sobre a água ao redor e
Liv suspira.
— Eu só sinto muito não poder patinar nesse lago.
Eu me afasto e fico em pé. Vou até a picape, pego os patins que
estão na caçamba, coloco-os e me aproximo de Liv de volta.
— Vamos.
Estendo minha mão, ela me encara sem entender, mesmo assim
coloca os dedos sobre os meus, ajudo-a ficar em pé e viro-me ficando de
costas.
— Suba, diabinha.
Liv faz o que eu peço, abraça-me e passa as pernas ao redor do meu
quadril.
— Você é louco, sabia?
Sorrio enquanto caminho na direção do lago. Meus patins encostam
no gelo e deslizo sobre ele com Liv presa a mim. Ela ri contra meu pescoço
e corro. O vento atinge nossos rostos e Liv se inclina até ter a boca próxima
da minha orelha.
— Eu amo você, Aaron.
Eu toco sua mão e grito para que ela possa me escutar.
— E eu amo você, Liv.
Qual o nome do próximo baby? Damien? Destiny? Daphne?
Daniel? Declan? Esse autor aposta em Daphne...
Escândalos e fofocas de Dartmouth

Dez anos depois

Olívia

Eu entro no local, avisto a pista de patinação e dois garotinhos, eles


estão segurando os tacos infantis com força, estão um de frente para o outro
e tem uma ruga na testa, o disco de hóquei está entre eles e não preciso ser
um gênio para saber que eles irão disputar o puck.
Um ótimo jeito deles se machucarem e não seria a primeira vez!
Encaro o pai das crianças e ele finge que não me vê, péssimo,
porque a garotinha ao seu lado faz sinais em minha direção e chama por
mim.
Suspiro irritada, sento-me em um dos bancos que ficam ao redor da
pista e troco meu par de tênis pelos meus patins, então sigo para o gelo. Não
há quase ninguém e quem está por aqui nos conhece, aceno e sorrio.
— Vamos logo, Benjamin, ela está chegando.
Escuto ao me aproximar e reviro meus olhos. Ela está chegando!
Pestinhas.
Eles iniciam a disputa, Austin toca o disco e Benjamin tenta o
resgatar, os dois apenas deslizam em uma linha reta na direção na baliza ao
fim da pista. Eles não são cordiais um com o outro e são agressivos.
Eu vou matar meu marido! A garotinha solta a mãe do pai e patina
pelo gelo em minha direção.
— Mamãe.
Ela grita, eu me abaixo e a recebo em meus braços.
— Querida.
Beijo a lateral do seu rosto e ela deixa um beijo molhado em minha
bochecha.
— Austin e Benjamin jogando.
Ela me conta e aponta para os irmãos.
— Eu estou vendo.
Ela se desvencilha dos meus braços e me encara com um beicinho
em seus lábios.
— Mamãe braba?
Até ela sabe que eu fico braba com os meninos jogando dessa
forma, eles não estão usando nenhuma proteção!
— Não com você.
— Com papai?
Toco a ponta do seu nariz.
— Você é tão esperta.
Ela ri, eu sorrio de volta, entrelaço minha mão com a sua e fico em
pé, então nós duas nos aproximamos de Aaron, ele tem um sorriso
orgulhoso no rosto, é claro que ele está orgulhoso, ele que os ensinou.
— Se eles se machucarem, eu vou fazer uma greve de sexo.
Sussurro a última parte para que nossa filha não escute. Aaron
desvia os olhos dos garotos e finalmente me encara. Suas covinhas estão
estampadas em seu rosto, merda, por que ele tem que ser fofo?
Preciso me esforçar para continuar o encarando com uma expressão
nada amigável.
— Você não conseguiria resistir, diabinha.
Ele desliza em minha direção e toca a minha cintura,
automaticamente um formigamento percorre meu corpo. Olha em meus
olhos e ele faz com que meu coração bata mais forte. Dez anos e ele ainda
tem a mesma capacidade de bagunçar meu mundo, e de o pôr em ordem.
— Não me teste, Aaron.
Ele ri e olha para baixo.
— Aaron, não principezinho, garotinha, acho que ela está braba com
o papai.
Nossa filha ri e bota a mão sobre a boca como se estivesse tentando
se controlar. Ela é tão a filhinha do papai!
— Você sabe que é perigoso eles treinarem apenas os dois, além de
incentivar uma rivalidade entre eles. — Encaro meus filhos que continuam
brigando pelo disco. — E eles estão sem proteção nenhuma.
— Diabinha, eles não são rivais, eles se amam e na escola jogam no
mesmo time, eu só estou os ensinado a serem os melhores, como o pai
deles.
Ele tem um ponto, mesmo assim combinamos que não os traríamos
na pista para treinar hóquei fora dos horários de treinos e durante a semana.
— Esse não era nosso combinado.
Volto a encarar Aaron, que está me olhando com seu olhar de gato
de botas.
— Eles imploraram para virem até aqui assim que os busquei na
escola.
Suspiro, é claro que eles fizeram, porque sabiam que Aaron os traria
até aqui, assim como eu sabia assim que recebi a mensagem de Aaron
avisando que estava aqui com as crianças e que ele os deixaria fazer o que
quisessem.
— E você poderia não os ter deixado pegar os tacos de hóquei.
Encara-me com seu olhar culpado.
— Eu passei dois dias fora.
Reviro meus olhos.
— E nós sabemos que você estava trabalhando. — Aproveito que
Cassie se distanciou para girar pelo gelo e espalmo minhas mãos em seu
peito. — Nós sentimos sua falta, Aaron, mas sabemos que estava ocupado.
Ele gira até estar completamente à minha frente, traz suas mãos até
minha cintura e faz um beicinho, muito parecido com o de Cassie, por sinal.
— Quando estou longe de vocês, eu desejo me aposentar e ir
trabalhar na empresa da minha família.
Sorrio e balanço minha cabeça.
— Não seja, um bebê chorão, Aaron.
A expressão em seu rosto se transforma em uma careta, ele se
inclina e apoia sua testa na minha.
— Você irá me perdoar, diabinha?
É claro que eu irei o perdoar!
— Não sei, eu vou pensar.
Ele ri e está prestes a dizer algo que tenho certeza de que tem
conotação sexual, mas escutamos os gritos dos nossos filhos. Olhamos para
eles e Benjamin está comemorando enquanto Austin tem os braços
cruzados em seu peito.
— Vamos de novo, você ganhou por sorte.
É óbvio que Benjamin irá aceitar, mas Aaron é mais rápido.
— Chega de hóquei por hoje.
Os dois contestam, eles até se abraçam para nos convencerem do
contrário, mas não cedemos, então os dois vêm até nós e param à nossa
frente com os olhares mais cínicos do mundo.
— Podemos pelo menos patinar?
Aaron me encara, eu assinto e liberamos os garotos, eles nos
entregam os tacos e ficam brincando com Cassie.
— Nós temos muita sorte, não é?
Olho para nossos três filhos, tudo que conquistamos nos últimos
anos ecoam em minha mente. Aaron foi escolhido no Draft após a
faculdade para o Bruins, viemos para Boston, Aaron me pediu em
casamento em nosso segundo dia na cidade e ele e eu nos casamos na
propriedade dos seus avós com o pôr do Sol e o lago à nossa frente. Eu abri
minha clínica, trabalho com a fisioterapia com foco em atletas e dou aula de
patinação para crianças até seis anos, Aaron é um dos melhores jogadores
da atualidade, temos três filhos lindos que amam o gelo tanto quanto nós
dois e nós temos uma imensa família, inclusive eu tenho irmãos.
Volto a encarar Aaron e sorrio.
— E o futuro que planejamos, não é?
Ele ri e me puxa para seus braços.
— Sim, é, diabinha.
— Mas falta algo.
Ele ergue as sobrancelhas e eu preciso me controlar para me manter
séria.
— Falta? Você não está feliz?
É possível ver o medo em seus olhos. Desvencilho-me dele e dou
um passo para trás, então pego o exame que tenho dobrado no bolso das
minhas calças, entrego-o e pela sua reação sei exatamente quando ele se dá
conta do que estou falando.
Seus olhos estão brilhando, abaixa o exame e sorri.
— Falta o quarto filho, principezinho.
Ele me abraça, sua boca encontra a minha, segura-me, tira meus pés
do chão e ele nos gira pelo gelo, nossas risadas ecoam pela arena.
Aaron e eu encontramos no outro tudo que precisávamos, tudo que
nos faltava, somos completamente um do outro
Vocês estão mais surpresas por nossa patinadora estar se
relacionando com o pai da melhor amiga (24 anos mais velho), ou com o
fato de ela estar grávida?
Escândalos e fofocas de Dartmouth
Hey, eu queria agradecer você por ter chegado até aqui. Espero que
tenha amado Aaron e Liv tanto quanto eu amei. Eles foram incríveis e há
muito tempo não me sentia tão livre e tão bem escrevendo um livro.
Terminei eles com a sensação de dever cumprido e satisfação.
Quero agradecer às minhas betas lindas e maravilhosas que me
ajudaram na construção do livro, vocês foram incríveis. As minhas leitoras
que comentam posts, respondem storys, enviam mensagens, às vezes vocês
salvam o meu dia de ser péssimo.
Um agradecimento especial a todos que contribuíram de alguma
forma com o livro, capista, revisora, design dos posts do insta, ilustradora,
assessora, vocês são demais e muito obrigada.
Lembre-se de que se gostou do livro, avalie, comente, compartilhe,
mande mensagem lá no insta (lanasilva.sm) e me ajude a espalhar Liv e
Aaron para o mundo.
Mais uma vez, muito obrigada e até o livro da Meg ❤ -
ONDE ME ENCONTRAR
Instagram: lanasilva.sm
Facebook: Lana Silva
TikTok: lannaa_silva
Twitter: lanasilva_sm
[1]
Imagine Dragons é uma banda de pop rock formada em Las Vegas, nos Estados
Unidos,

Você também pode gostar