STJ Nega Pronuncia Reu Denunciado

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Superior Tribunal de Justiça

AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.740.921 - GO (2018/0113754-7)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS


AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
AGRAVADO : ABEL LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302
EMENTA

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO


PROCESSUAL PENAL. ART. 155 DO CPP. PRONÚNCIA FUNDADA EM
ELEMENTOS EXCLUSIVAMENTE EXTRAJUDICIAIS.
IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Força argumentativa das convicções dos magistrados. Provas submetidas ao
contraditório e à ampla defesa. No Estado Democrático de Direito, o mínimo
flerte com decisões despóticas não é tolerado e a liberdade do cidadão só pode
ser restringida após a superação do princípio da presunção de inocência, medida
que se dá por meio de procedimento realizado sob o crivo do devido processo
legal.
2. Art. 155 do CPP. Prova produzida extrajudicialmente. Elemento cognitivo
destituído do devido processo legal, princípio garantidor das liberdades públicas e
limitador do arbítrio estatal.
3. Art. 483, III, do CPP. Sistema da íntima convicção dos jurados. Sob o pálio de
se dar máxima efetividade ao referido princípio, não se pode desprezar a prova
judicial colhida na fase processual do sumário do Tribunal do Júri.
3.1. O juízo discricionário do Conselho de Sentença, uma das últimas
etapas do referido procedimento, não apequena ou desmerece os
elementos probatórios produzidos em âmbito processual, muito menos os
equipara a prova inquisitorial.
3.2. Assentir com entendimento contrário implica considerar suficiente a
existência de prova inquisitorial para submeter o réu ao Tribunal do Júri
sem que se precisasse, em última análise, de nenhum elemento de prova
a ser produzido judicialmente. Ou seja, significa inverter a ordem de
relevância das fases da persecução penal, conferindo maior juridicidade
a um procedimento administrativo realizado sem as garantias do devido
processo legal em detrimento do processo penal, o qual é regido por
princípios democráticos e por garantias fundamentais.
3.3. Opção legislativa. Procedimento escalonado. Diante da possibilidade
da perda de um dos bens mais caros ao cidadão - a liberdade -, o Código
de Processo Penal submeteu o início dos trabalhos do Tribunal do Júri a
uma cognição judicial antecedente. Perfunctória, é verdade, mas munida
de estrutura mínima a proteger o cidadão do arbítrio e do uso do
aparelho repressor do Estado para satisfação da sanha popular por
vingança cega, desproporcional e injusta.
4. Impossibilidade de se admitir a pronúncia de acusado com base em indícios
derivados do inquérito policial. Precedentes.
5. Agravo regimental improvido.
ACÓRDÃO

Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 1 de 6
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Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar
provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Jorge
Mussi e Reynaldo Soares da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 06 de novembro de 2018 (data do julgamento)

MINISTRO RIBEIRO DANTAS


Relator

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Superior Tribunal de Justiça
AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.740.921 - GO (2018/0113754-7)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS


AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
AGRAVADO : ABEL LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RIBEIRO DANTAS:

Cuida-se de agravo regimental interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO


ESTADO DE GOIÁS contra a decisão de fls. 995-999 (e-STJ), que não conheceu do agravo
em recurso especial interposto por Raimundo Lopes Gonçalves; e, negou provimento ao recurso
especial interposto pelo Órgão Ministerial estadual.
Nas razões do inconformismo (e-STJ, fls. 1.005-1.012), o insurgente alega que a
decisão proferida dissentiu do entendimento majoritário do STJ a respeito do tema.
Sustenta que "a tese ministerial consistiu em apresentar a jurisprudência
majoritária desse colendo STJ no sentido de admitir o uso do inquérito policial como parâmetro de
aferição dos indícios de autoria imprescindíveis à pronúncia, sem que isto represente violação ou
negativa de vigência ao art. 155 do CPP" (e-STJ, fl. 1.008).
Defende que "se há o reconhecimento de que elementos colhidos na fase
extrajudicial que demonstram indícios de autoria do crime doloso contra a vida, ainda que de
maneira tênue, o juízo de pronúncia deve considerá-los, sob pena de contrariar as disposições do
art. 413 do CPP, bem como o princípio do in dubio pro societate" (e-STJ, fl. 1.009).
Requer a reconsideração da decisão agravada ou submissão do inconformismo ao
Órgão Colegiado.
É o relatório.

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AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.740.921 - GO (2018/0113754-7)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS


AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
AGRAVADO : ABEL LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302
EMENTA

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO


PROCESSUAL PENAL. ART. 155 DO CPP. PRONÚNCIA FUNDADA EM
ELEMENTOS EXCLUSIVAMENTE EXTRAJUDICIAIS.
IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Força argumentativa das convicções dos magistrados. Provas submetidas ao
contraditório e à ampla defesa. No Estado Democrático de Direito, o mínimo
flerte com decisões despóticas não é tolerado e a liberdade do cidadão só pode
ser restringida após a superação do princípio da presunção de inocência, medida
que se dá por meio de procedimento realizado sob o crivo do devido processo
legal.
2. Art. 155 do CPP. Prova produzida extrajudicialmente. Elemento cognitivo
destituído do devido processo legal, princípio garantidor das liberdades públicas e
limitador do arbítrio estatal.
3. Art. 483, III, do CPP. Sistema da íntima convicção dos jurados. Sob o pálio de
se dar máxima efetividade ao referido princípio, não se pode desprezar a prova
judicial colhida na fase processual do sumário do Tribunal do Júri.
3.1. O juízo discricionário do Conselho de Sentença, uma das últimas
etapas do referido procedimento, não apequena ou desmerece os
elementos probatórios produzidos em âmbito processual, muito menos os
equipara a prova inquisitorial.
3.2. Assentir com entendimento contrário implica considerar suficiente a
existência de prova inquisitorial para submeter o réu ao Tribunal do Júri
sem que se precisasse, em última análise, de nenhum elemento de prova
a ser produzido judicialmente. Ou seja, significa inverter a ordem de
relevância das fases da persecução penal, conferindo maior juridicidade
a um procedimento administrativo realizado sem as garantias do devido
processo legal em detrimento do processo penal, o qual é regido por
princípios democráticos e por garantias fundamentais.
3.3. Opção legislativa. Procedimento escalonado. Diante da possibilidade
da perda de um dos bens mais caros ao cidadão - a liberdade -, o Código
de Processo Penal submeteu o início dos trabalhos do Tribunal do Júri a
uma cognição judicial antecedente. Perfunctória, é verdade, mas munida
de estrutura mínima a proteger o cidadão do arbítrio e do uso do
aparelho repressor do Estado para satisfação da sanha popular por
vingança cega, desproporcional e injusta.
4. Impossibilidade de se admitir a pronúncia de acusado com base em indícios
derivados do inquérito policial. Precedentes.
5. Agravo regimental improvido.

VOTO
Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 4 de 6
Superior Tribunal de Justiça

O EXMO. SR. MINISTRO RIBEIRO DANTAS (RELATOR):

A pretensão recursal não merece êxito, pois a parte agravante não apresentou
fundamentos capazes de modificar o entendimento anteriormente adotado.
Na origem, Abel Lopes Gonçalves e Raimundo Lopes Gonçalves foram
pronunciados pela prática do delito previsto no art. 121, § 2°, II, III e IV, do CP.
Instado a se manifestar, o Tribunal de origem deu parcial provimento ao recurso
defensivo para: i) despronunciar Abel Lopes Gonçalves; e ii) manter a pronúncia de Raimundo
Lopes Gonçalves, mas excluir as qualificadoras referentes ao motivo fútil e ao recurso que
impossibilitou a defesa da vítima.
Inconformado, o Órgão Ministerial estadual interpôs recurso especial (e-STJ, fls.
884-881), apontando violação aos arts. 155, 413 e 414 do CPP.
Em síntese, alegou ser possível que a decisão de pronúncia seja fundamentada em
prova inquisitorial.
Sustentou que a pronúncia requer apenas indícios de autoria e materialidade
delitiva, elementos que estão presentes nos autos.
Às fls. 995-999 (e-STJ), esta relatoria negou provimento ao apelo nobre.
Daí o presente agravo regimental do Parquet do Estado de Goiás.
Inicialmente, convém assinalar que não se descura que há no âmbito do STJ
julgados no sentido de admitir a pronúncia do acusado com base em indícios derivados do
inquérito policial, sem que isso represente afronta ao art. 155 do CPP: AgRg no AREsp
978.285/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 13/06/2017,
DJe 21/06/2017; e HC 435.977/RS, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em
15/5/2018, DJe 24/5/2018.
Contudo, essa não é a melhor posição para o deslinde da controvérsia dos autos.
O Tribunal local manteve a decisão que despronunciou o réu - Abel Lopes
Gonçalves -, tendo em vista ser a prova dos autos um único depoimento extrajudicial, o qual não
foi confirmado na fase processual, e a confissão qualificada em juízo do corréu - Raimundo
Lopes Gonçalves (e-STJ, fls. 829-833):

No caso em exame, não se confirmam as bases em que o órgão ministerial


construiu a acusação de ABEL LOPES GONÇALVES pelo crime de
homicídio, amparada tão somente no depoimento de David Campelo do
Nascimento, ouvido apenas em sede inquisitorial (fls. 10/11), mesmo
porque tal testemunho não restou corroborado pela única prova
jurisdicionalizada coletada, qual seja, confissão qualificada de RAIMUNDO
LOPES GONÇALVES, não podendo assim lastrear o encaminhamento
daquele recorrente ao julgamento pelo Júri.

Frise-se que, ao confessar o crime em juízo, o corréu Raimundo Lopes


Gonçalves assumiu inteiramente a autoria delitiva e afirmou que Abel Lopes Gonçalves
não participou do fato, pois se encontrava em casa dormindo (e-STJ, fls. 830-831 - sem
grifo no original):
Interrogados, RAIMUNDO LOPES GONÇALVES afirmou ter matado a
vítima em legítima defesa, ao passo que ABEL LOPES GONÇALVES
negou veementemente a imputação, nesta sequência:
[...] que o dono do bar estava fechando e então saíram para fora (sic) e o
interrogando sempre pedia para Claudiomar (sic) sair do local e ir embora;
que ainda desceu a rua conversando com Claudiomar (sic), mas a uma
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certa altura do caminho, Claudiomar (sic) passou a agredir o interrogando,
com chutes e lhe mostrou uma faca; que então o interrogando caiu no
chão junto com Claudiomar (sic) e pegou uma pedra que estava no chão e
agrediu Claudiomar (sic) duas vezes na nuca; que não desferiu qualquer
outro golpe contra Claudiomar (sic); que depois o interrogando percebeu
que tinha matado Claudiomar (sic) e então o pegou pelo pescoço e o
puxou para perto de uma árvore, ao lado da estrada e então foi para sua
casa; que Abel não participou desses fatos, uma vez que estava dormindo
na sua própria residência; que não sabe por qual motivo Abel foi
implicado nos fatos como sendo um dos agressores da vítima Claudiomar
(sic);

Registre-se que a transcrição acima é do acórdão objeto do recurso especial. Não


se está aqui examinando prova. Basta ler o decisum do Tribunal de Justiça a quo.
Desse modo, nota-se a ausência de indícios de autoria delitiva (art. 413 do CPP)
submetidos ao devido processo legal. Portanto, carece de judicialização a prova a apontar os
indícios de autoria delitiva.
No Estado Democrático de Direito, a força argumentativa das convicções dos
magistrados deve ser extraída de provas submetidas ao contraditório e à ampla defesa. Isso
porque o mínimo flerte com decisões despóticas não é tolerado e a liberdade do cidadão só pode
ser restringida após a superação do princípio da presunção de inocência, medida que se dá por
meio de procedimento realizado sob o crivo do devido processo legal.
Importa registrar que a prova produzida extrajudicialmente é elemento cognitivo
destituído do devido processo legal, princípio garantidor das liberdades públicas e limitador do
arbítrio estatal.
Com efeito, sob o pálio de se dar máxima efetividade ao sistema de íntima
convicção dos jurados, consagrado na norma insculpida no inciso III do art. 483 do CPP, não se
pode desprezar a prova judicial colhida na fase processual do sumário do Tribunal do Júri. Em
análise sistemática do procedimento de apuração dos crimes contra a vida, observa-se que o juízo
discricionário do Conselho de Sentença, uma das últimas etapas do referido procedimento, não
apequena ou desmerece os elementos probatórios produzidos em âmbito processual, muito menos
os equipara a prova inquisitorial.
Na hipótese em foco, optar por solução diversa implica inverter a ordem de
relevância das fases da persecução penal, conferindo maior juridicidade a um procedimento
administrativo realizado sem as garantias do devido processo legal em detrimento do processo
penal, o qual é regido por princípios democráticos e por garantias fundamentais. Em outras
palavras, assentir com a tese defendida pelo Ministério Público seria considerar suficiente a
existência de prova inquisitorial para submeter o réu ao Tribunal do Júri sem que se precisasse,
em última análise, de nenhum elemento de prova a ser produzido judicialmente.
Contudo, essa não foi a opção legislativa. Diante da possibilidade da perda de um
dos bens mais caros ao cidadão – a liberdade, o Código de Processo Penal submeteu o início dos
trabalhos do Tribunal do Júri a uma cognição judicial antecedente. Perfunctória, é verdade, mas
munida de estrutura mínima a proteger o cidadão do arbítrio e do uso do aparelho repressor do
Estado para satisfação da sanha popular por vingança cega, desproporcional e injusta.
Nesse sentido, convém mencionar o escólio de Walfredo Cunha Campos:

Pode o juiz pronunciar com base em prova exclusivamente haurida na fase


do inquérito policial, sem confirmação em juízo?
O art. 155 do CPP veda, expressamente, que o juiz fundamente sua
decisão, de maneira exclusiva, nos elementos informativos colhidos na
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investigação. Até porque, se assim o fizesse, estaria tornando possível
eventual decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos
(dos autos de processo propriamente dito, e não do inquérito). Caso os
jurados condenassem o acusado estribados tão somente em prova
extrajudicial, tal veredicto desrespeitaria os princípios constitucionais do
contraditório e da ampla defesa e deveria ser anulado. Isso porque, como
se sabe, para que alguém seja condenado, é necessário terem-lhe sido
garantidos a ampla defesa e o contraditório, só efetivos no transcurso de
um processo judicial, e nunca num inquérito policial, mera peça informativa
destinada a formar a opinio delictii do promotor para oferecimento da peça
acusatória.
[...]
Se houver, todavia, uma fonte de prova colhida no inquérito policial que
seja corroborada por elementos de convicção suficientes produzidos em
juízo, não há qualquer empecilho à prolação de pronúncia. Isto porque, de
acordo com o art. 155, caput, do CPP, é vedado ao juiz formar sua
convicção tendo por base, exclusivamente, os elementos informativos
colhidos na investigação; se apenas é vedado ao juiz decidir estribado,
exclusivamente, nas fontes de prova colhidas no inquérito, lhe é permitido,
então, formar seu convencimento, utilizando-se, parcialmente, das provas
do inquérito, desde que sejam corroboradas por elementos de convicção
coligidos em juízo, não havendo se falar em nulidade da pronúncia nessa
situação. E para arrematar: se a reunião das fontes de provas do inquérito e
das provas em juízo, se harmônicas e coerentes, legitimam até uma
condenação, o que se dirá então de uma mera decisão interlocutória mista
não terminativa como a pronúncia. (CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal
do Júri: teoria e prática. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2018, n.p., Arquivo Kobo,
ISBN: 978-85-970-1771-7).

A propósito, cito os seguintes precedentes a respeito do tema:

PROCESSUAL PENAL. INDÍCIOS DE AUTORIA. PROVA COLHIDA


NO INQUÉRITO. INSUFICIÊNCIA, NO CASO CONCRETO, PARA
ARRIMAR PRONÚNCIA. FALTA DE CONFIRMAÇÃO EM JUÍZO.
1 - No caso concreto, não havendo qualquer confirmação em juízo, sob o
crivo do contraditório, dos elementos colhidos no inquérito, não há como
admitir arrimar-se a pronúncia apenas e tão-somente naquela prova apurada
na fase inquisitorial. Precedente da Sexta Turma.
2 - Equivoca-se o Tribunal de origem ao afirmar que, indiscutivelmente, a
prova colhida no inquérito é isolada e, mesmo assim, concluir pela
pronúncia do paciente.
3 - Impetração não conhecida, mas concedida a ordem, ex officio, para
restabelecer a decisão de impronúncia. (HC 341.072/RS, Rel. Ministra
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em
19/4/2016, DJe 29/4/2016)

RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO TENTADO QUALIFICADO.


PRONÚNCIA FUNDAMENTADA EXCLUSIVAMENTE EM ELEMENTO
INFORMATIVO COLHIDO NA FASE PRÉ-PROCESSUAL. NÃO
CONFIRMAÇÃO EM JUÍZO. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.

Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 7 de 6
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1. A decisão de pronúncia é um mero juízo de admissibilidade da acusação,
não sendo exigido, neste momento processual, prova incontroversa da
autoria do delito - bastam a existência de indícios suficientes de que o réu
seja seu autor e a certeza quanto à materialidade do crime.
2. Muito embora a análise aprofundada dos elementos probatórios seja feita
somente pelo Tribunal Popular, não se pode admitir, em um Estado
Democrático de Direito, a pronúncia sem qualquer lastro probatório colhido
sob o contraditório judicial, fundada exclusivamente em elementos
informativos obtidos na fase inquisitorial, mormente quando essa prova está
isolada nos autos, como na hipótese, em que há apenas os depoimentos da
vítima e de sua mãe, colhidos no inquérito e não confirmados em juízo.
3. O Tribunal de origem, ao despronunciar o ora recorrido, asseverou que
"não há prova judicializada suficiente para fins de pronúncia" (fl. 212),
razão pela qual, consoante o enunciado na Súmula n. 7 do STJ, torna-se
inviável, em recurso especial, a revisão deste entendimento, para
reconhecer a existência de prova colhida sob o contraditório judicial apta a
autorizar a submissão do recorrido a julgamento perante o Tribunal do Júri.
4. Recurso especial não provido. (REsp 1254296/RS, Rel. Ministro
ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 17/12/2015,
DJe 2/2/2016)

Desta feita, não merece ser acolhida a pretensão ministerial.


Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.

Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 8 de 6
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA

AgRg no
Número Registro: 2018/0113754-7 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.740.921 / GO
MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 02036502220068090168 200602036504 200692036504 20365022 2036502220068090168

EM MESA JULGADO: 04/09/2018

Relator
Exmo. Sr. Ministro RIBEIRO DANTAS
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO DE ASSIS VIEIRA SANSEVERINO
Secretário
Bel. FRANCISCO PEREIRA DA SILVA

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
RECORRIDO : ABEL LOPES GONCALVES
AGRAVANTE : RAIMUNDO LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra a vida - Homicídio Qualificado

AGRAVO REGIMENTAL
AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
AGRAVADO : ABEL LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"Após o voto do Sr. Ministro Relator negando provimento ao agravo regimental, pediu
vista, antecipadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer."
Aguardam os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Jorge Mussi e Reynaldo Soares da
Fonseca.

Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 9 de 6
Superior Tribunal de Justiça
AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.740.921 - GO (2018/0113754-7)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS


AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
AGRAVADO : ABEL LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER: Trata-se de agravo


regimental interposto pelo Ministério Público estadual contra decisão que negou provimento
ao seu recurso especial, no qual pretendia a modificação do julgamento proferido pelo eg.
Tribunal de origem, nos autos de recurso em sentido estrito, que despronunciou o recorrido
ABEL LOPES GONÇALVES.

Nas razões, o Ministério Público argumenta que a decisão vergastada diverge


da orientação jurisprudencial desta Corte Superior de Justiça, no sentido de que a pronúncia
poderá ter por fundamento provas coligidas no inquérito policial, sem que isso configure ofensa
ao art. 155 do Código de Processo Penal.

O Senhor Ministro Relator proferiu decisão na qual desproveu o agravo


regimental. Asseverou que no caso concreto, os elementos do inquérito não seriam suficientes
para fundamentar a decisão de pronúncia, porquanto não teriam sido confirmados por
qualquer prova judicializada.

Pedi vista dos autos para melhor examinar a questão.

Eis, em síntese, o que basta relatar. Passo ao exame da insurgência.

Com efeito, esta Corte de Justiça, historicamente, sedimentou o entendimento


de que é possível admitir a pronúncia do acusado com base em indícios derivados do inquérito
policial, sem que isso represente afronta ao art. 155 do Código de Processo Penal.

Neste sentido, os seguintes precedentes das duas Turmas que compõem a


Terceira Seção desta Corte:

"PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO. TRIBUNAL DO JÚRI.
Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 10 de 6
Superior Tribunal de Justiça
MATERIALIDADE COMPROVADA. INDÍCIOS DE AUTORIA.
PRONÚNCIA. ELEMENTOS COLHIDOS NA FASE INQUISITORIAL.
POSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. É entendimento pacífico neste Superior Tribunal de
Justiça que a prova realizada em sede policial é apta a autorizar a
pronúncia, desde que, a partir da sua análise, seja possível se colher
indícios suficientes de autoria. Cumpre registrar, que a pronúncia não
exige plena prova da autoria, sendo suficiente os indícios de que nessa
fase podem ser fundados em provas produzidas tão somente no inquérito
policial.
2. De acordo com o entendimento desta Corte, "para o
oferecimento da denúncia, exige-se apenas a descrição da conduta delitiva
e a existência de elementos probatórios mínimos que corroborem a
acusação. Mister se faz consignar que provas conclusivas acerca da
materialidade e da autoria do crime são necessárias tão somente para a
formação de um eventual juízo condenatório. Embora não se admita a
instauração de processos temerários e levianos ou despidos de qualquer
sustentáculo probatório, nessa fase processual, deve ser privilegiado o
princípio do in dubio pro societate" (RHC 51.751/SP, de minha Relatoria,
QUINTA TURMA, julgado em 25/10/2016, DJe 09/11/2016).
3. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no
AREsp 1256930/RS, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe
23/05/2018, grifei)

"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS.


SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO.
TRIBUNAL DO JÚRI. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. INDÍCIOS DE
AUTORIA BASEADOS EM PROVAS OBTIDAS DURANTE INQUÉRITO
POLICIAL. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CPP.
INOCORRÊNCIA. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE
ANIMUS NECANDI. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI.
QUALIFICADORA. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA. HABEAS CORPUS NÃO
CONHECIDO.
I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento
firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação
no sentido de não admitir habeas corpus em substituição ao recurso
adequado, situação que implica o não conhecimento da impetração,
ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade
apta a gerar constrangimento ilegal, seja possível a concessão da ordem
de ofício.
II - Sabidamente, a decisão de pronúncia comporta juízo de
admissibilidade da acusação, para o qual devem concorrer a prova da
Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 11 de 6
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existência do fato (materialidade) e os indícios acerca da autoria ou
participação do agente, consoante dispõe o art. 413 do CPP. Constitui a
pronúncia, portanto, juízo fundado de suspeita, que apenas e tão somente
admite a acusação. Não profere juízo de certeza, necessário para a
condenação, motivo pelo qual o óbice do art. 155 do CPP não se aplica à
referida decisão.
III - Esta Corte de Justiça possui entendimento firmado no
sentido de que é possível admitir a pronúncia do acusado com base em
indícios derivados do inquérito policial, sem que isso represente afronta ao
art. 155 do CPP. In casu, o eg. Tribunal citou depoimentos prestados na
fase judicial, de forma que a pronúncia não foi baseada exclusivamente
em elementos produzidos na fase pré-processual.
IV - Diante das circunstâncias do delito em tese cometido e
das provas produzidas, não é possível concluir, de forma categórica, pela
ausência de animus necandi na conduta, de modo que, em casos como o
presente, compete ao Júri a pretendida desclassificação para outro delito.
V - É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que as
qualificadoras somente podem ser excluídas na fase da pronúncia quando
se revelarem manifestamente improcedentes, sob pena de usurpação da
competência constitucional do Conselho de Sentença. Na hipótese, o eg.
Tribunal apontou indícios de que o paciente teria agido de modo a
dificultar a defesa das vítimas, o que justifica a manutenção da
qualificadora respectiva.
Habeas corpus não conhecido." (HC 435.977/RS, Quinta
Turma, de minha relatoria, DJe 24/05/2018)

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. INDÍCIOS DE
AUTORIA. FASE INQUISITORIAL. POSSIBILIDADE. INSURGÊNCIA
IMPROVIDA.
1. A jurisprudência desta Corte Superior consolidou-se no
sentido de que a decisão de pronúncia pode ser baseada em elementos
colhidos na fase policial.
2. Tratando-se a pronúncia de simples juízo de
admissibilidade da acusação, afigura-se como a solução mais adequada
reservar ao Tribunal do Júri o exame dos elementos probatórios para, se
for o caso, proferir um juízo seguro acerca da prática do indicado crime
doloso contra a vida, uma vez que as dúvidas, nessa fase processual,
resolvem-se contra o réu e a favor da sociedade, conforme o mandamento
contido no art. 413 do Código Processual Penal.
3. Agravo regimental improvido." (AgRg no AREsp
734.302/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 01/08/2018, grifei)

Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 12 de 6
Superior Tribunal de Justiça
"HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO
PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. TRIBUNAL DO JÚRI.
TENTATIVA DE HOMICÍDIO. MATERIALIDADE PROVADA. INDÍCIOS
DE AUTORIA AFERÍVEIS COM BASE EM ELEMENTOS DE
INFORMAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL E PROVAS COLHIDAS
DURANTE O SUMÁRIO DE CULPA. PRONÚNCIA. POSSIBILIDADE.
HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento
firmado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, não tem
admitido a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso
próprio, prestigiando o sistema recursal ao tempo que preserva a
importância e a utilidade do writ, visto permitir a concessão da ordem, de
ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, é
admissível o uso do inquérito policial como parâmetro de aferição dos
indícios de autoria imprescindíveis à pronúncia, sem que isto represente
violação ou negativa de vigência ao art. 155 do CPP. Precedentes.
3. Se há o reconhecimento de que elementos colhidos na fase
extrajudicial demonstram indícios de autoria do crime doloso contra a
vida, ainda que de maneira tênue, o juízo de pronúncia deve considerá-los,
sob pena de contrariar as disposições do art. 413 do CPP, bem como o
princípio do in dubio pro societate.
4. Considerando o fato de que as instâncias ordinárias
admitiram a existência de indícios de autoria decorrentes das informações
que defluem do inquérito policial, bem como da instrução judicial do
sumário de culpa, a pronúncia do réu é medida que se impõe.
5. Habeas corpus não conhecido" (HC 362.113/RS, Quinta
Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 23/09/2016, grifei).

"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS


SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. PARTICIPAÇÃO EM
TENTATIVA DE HOMICÍDIO. PRONÚNCIA FUNDAMENTADA EM
INDÍCIO COLHIDO JUDICIALMENTE E EM DECLARAÇÕES DE
CORRÉUS COLHIDAS NA FASE PRÉ-PROCESSUAL E NÃO
RECHAÇADAS EM JUÍZO. VALORAÇÃO DA PROVA. POSSIBILIDADE.
ORDEM NÃO CONHECIDA.
1. Não há constrangimento ilegal na pronúncia de acusado
de participação em homicídio tentado, quando a decisão, ao valorar os
elementos de prova juntadas aos autos, conclui pela existência de indícios
suficientes de autoria com arrimo em depoimentos de corréus que, embora
colhidos na fase inquisitorial, encontram lastro em declarações de outrem
em juízo, que confirmou ter vendido arma de fogo ao paciente, que
poderia ter sido a mesma utilizada no crime.
2. Embora a vedação imposta no art. 155 do Código de
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Superior Tribunal de Justiça
Processo Penal - decisão fundada exclusivamente em elementos
informativos colhidos na investigação - se aplique a qualquer
procedimento penal, inclusive ao relativo aos da competência do
Tribunal do Júri, não se pode perder de vista o desiderato da decisão de
pronúncia, qual seja, o de encerrar juízo de admissibilidade da acusação
(iudicium accusationis).
3. Na hipótese em apreço, a pronúncia indica suficientes
indícios de participação delitiva do paciente em homicídio tentado,
configurando o fumus commissi delicti que basta para inaugurar a
segunda fase do procedimento do Júri (iudicium causae).
4. Ordem não conhecida" (HC 320.535/DF, Sexta Turma,
Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 26/09/2016, grifei).

Isso porque, sabidamente, a decisão de pronúncia comporta juízo de


admissibilidade da acusação, para o qual devem concorrer a prova da existência do fato -
materialidade - e os indícios acerca da autoria ou participação do agente, consoante dispõem
os arts. 413 e 414 do Código de Processo Penal.

Na pronúncia opera o princípio in dubio pro societate, porque é a favor da


sociedade que se resolvem as dúvidas quanto à prova, pelo Juízo natural da causa. Constitui a
pronúncia, portanto, juízo fundado de suspeita, que apenas e tão somente admite a acusação.
Não profere juízo de certeza, necessário para a condenação, motivo pelo qual a vedação
expressa do art. 155 do Código de Processo Penal não se aplica à referida decisão.

Feitas tais considerações, no caso sob exame, é possível se aferir que o eg.
Tribunal de origem deu provimento ao recurso em sentido estrito interposto por Abel Lopes
Gonçalves, sob o fundamento de que não haveria embasamento probatório mínimo para a
pronúncia. Confira-se.

"No caso, não se confirmam as bases em que o órgão ministerial construiu


a acusação de ABEL LOPES GONÇALVES pelo crime de homicídio, amparada tão
somente no depoimento de David Campeio do Nascimento, ouvido apertassem sede
inquisitorial (fls. 10/11), mesmo porque tal testemunho não restou corroborado pela
única prova jurisdicionalizada coletada, qual seja, confissão qualificada de RAIMUNDO
LOPES GONÇALVES, não podendo assim lastrear o encaminhamento daquele
recorrente ao julgamento pelo Júri.
[...]
Ressalte-se que as testemunhas Manoel Edmilson de Mello e Maria do
Socorro Campeio do Nascimento, inquiridas sob o crivo do contraditório e da ampla
defesa depois de transcorridos mais de dez anos da data do fato, não se recordaram da
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Superior Tribunal de Justiça
conduta apurada (mídias - fls. 436 e 525).
Interrogados, RAIMUNDO LOPES GONÇALVES afirmou ter matado a
vítima em legítima defesa, ao passo que ABEL LOPES GONÇALVES negou
veementemente a imputação, nesta sequência:
[...]
Não obstante deva a decisão de pronúncia se traduzir em juízo de indícios
suficientes da autoria criminosa, é necessário que esses indícios sejam minimamente
seguros, jurisdicionalizados, para que a causa penal seja apreciada pelo colegiado leigo,
sendo que, ausente esta suficiência, calha a despronúncia de ABEL LOPES
GONÇALVES, nos termos do artigo 414, do Código de Processo Penal."

Nesta ordem de idéias, tendo o eg. Tribunal de origem concluído pela


insuficiência de prova apta a determinar a pronúncia do recorrido, verifica-se que a
modificação desse entendimento demandaria incursão no acervo fático-probatório da ação
penal, providência inviável em sede de recurso especial, nos termos do enunciado n. 7 da
Súmula desta Corte Superior de Justiça.

Exemplificativamente:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO


REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO
QUALIFICADO. PRONÚNCIA. TESE DE AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE
AUTORIA. REEXAME DE PROVAS. SÚMULAS 7/STJ.
I - Para examinar a tese de violação ao art. 414 do CPP de
que inexiste indícios suficientes a respaldar a pronúncia do ora
agravante, seria imperioso reexaminar o conjunto fático-probatório,
providência vedada nos termos da Súmula 7/STJ.
II - "É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância
ordinária, fazer um cotejo fático e probatório a fim de analisar a
existência de provas suficientes para absolver sumariamente, pronunciar,
desclassificar, ou ainda, impronunciar o réu, porquanto é vedado na via
eleita o reexame de fatos e provas. Súmula 7/STJ" (AgRg no AREsp n.
683.092/MT, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe
10/6/2015). Agravo regimental improvido" (AgRg no REsp n.
1.388.381/MT, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe de
3/8/2015).
Agravo regimental não provido." (AgRg no AREsp
1071699/PA, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe 18/08/2017, grifei)

"PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL


NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JÚRI. HOMICÍDIO.
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Superior Tribunal de Justiça
QUALIFICADORA DECOTADA NA PRONÚNCIA. POSSIBILIDADE.
ALTERAÇÃO. NECESSÁRIO REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM ENTRE
MEIO CRUEL E RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA.
INOVAÇÃO RECURSAL. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Quanto ao decote da qualificadora, esta Corte firmou o
entendimento de que esta situação só pode ocorrer quando
manifestamente improcedente e descabida, sob pena de usurpação da
competência do Tribunal do Júri, juiz natural para julgar os crimes
dolosos contra a vida, como se verifica na hipótese dos autos.
2. As instâncias ordinárias, mantiveram o decote da
qualificadora considerando não ter sido comprovado nos autos a
conduta consciente do recorrido em causar sofrimento exacerbado à
vítima ou mesmo intenção de causar dor maior que os da própria
conduta. Assim, alterar esse entendimento demandaria necessário
reexame de fatos e provas o que é vedado pela súmula 7/STJ. No mesmo
sentido os julgados colacionados, apesar de tratarem de incisos diferentes
previstos no §2º, art. 121 do CP, trazem em suas teses de julgamento a
impossibilidade de revolvimento do arcabouço probatório para
restabelecer qualificadoras devidamente decotadas na pronúncia.
3. "É vedado, em sede de agravo regimental ou embargos de
declaração, ampliar a quaestio veiculada no recurso especial, inovando
questões não suscitadas anteriormente" (AgRg no REsp 1378508/SP, Rel.
Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 1/12/2016, DJe
7/12/2016).
4. Agravo regimental não provido." (AgRg no AREsp
1163422/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe 24/08/2018,
grifei)

"PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO


AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.
IMPRONÚNCIA. AUSÊNCIA DE LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. PREQUESTIONAMENTO DE
DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. NÃO CABIMENTO. DECISÃO
MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. A desconstituição das premissas fáticas assentadas no
acórdão, relativamente à inexistência de lastro probatório mínimo para a
pronúncia, exigiria revolvimento fático-probatório, o que encontra óbice
na Súmula 7 do STJ.
2. Inviável a apreciação de ofensa a dispositivos
constitucionais, ainda que para fins de prequestionamento, uma vez que
não cabe a esta Corte, em sede de recurso especial, o exame de matéria
constitucional, cuja competência é reservada ao Supremo Tribunal
Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 16 de 6
Superior Tribunal de Justiça
Federal, nos termos do art. 102, III, da Carta Magna.
3. Agravo regimental improvido." (AgRg no AREsp
1126131/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe 11/05/2018)

"RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.


PRONÚNCIA FUNDAMENTADA EXCLUSIVAMENTE EM ELEMENTO
INFORMATIVO COLHIDO NA FASE PRÉ-PROCESSUAL. NÃO
CONFIRMAÇÃO EM JUÍZO. REVERSÃO DO ENTENDIMENTO.
INVIABILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO
CONHECIDO.
1. A teor do enunciado sumular n. 284 do Supremo Tribunal
Federal, deve o recorrente desenvolver, de forma lógica e com um mínimo
de profundidade, as razões jurídicas pelas quais entende haver a Corte de
origem ofendido o dispositivo de lei federal a que faz menção em seu apelo
extremo, sob pena de, caso descumprido esse requisito imprescindível, não
ver conhecido o seu recurso especial.
2. A decisão de pronúncia é um mero juízo de
admissibilidade da acusação, não sendo exigido, neste momento
processual, prova incontroversa da autoria do delito - bastam a existência
de indícios suficientes de que o réu seja seu autor e a certeza quanto à
materialidade do crime.
3. Muito embora a análise aprofundada dos elementos
probatórios seja feita somente pelo Tribunal Popular, não se pode admitir,
em um Estado Democrático de Direito, a pronúncia sem qualquer lastro
probatório colhido sob o contraditório judicial, fundada exclusivamente
em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial, mormente quando
essa prova está isolada nos autos, como na hipótese, em que há apenas os
depoimentos da vítima e de sua mãe, colhidos no inquérito e não
confirmados em juízo.
4. O Tribunal de origem, ao despronunciar o ora recorrido,
asseverou que não há prova judicializada suficiente para fins de
pronúncia, razão pela qual, consoante o enunciado na Súmula n. 7 do
STJ, torna-se inviável, em recurso especial, a revisão desse
entendimento, para reconhecer a existência de elementos de prova
bastante aptos a autorizar a submissão do recorrido a julgamento
perante o Tribunal do Júri.
5. Recurso especial não conhecido." (REsp 1591768/RS,
Sexta Turma, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 18/06/2018, grifei)

Desta forma, considerando o óbice Sumular, não merece ser acolhida a


pretensão ministerial.

Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 17 de 6
Superior Tribunal de Justiça
Ante o exposto, embora sob fundamento diverso, nego provimento ao agravo
regimental interposto pelo Ministério Público, acompanhando a conclusão do voto do insigne
Ministro Relator.

É o voto.

Documento: 1747783 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/11/2018 Página 18 de 6
Superior Tribunal de Justiça

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA

AgRg no
Número Registro: 2018/0113754-7 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.740.921 / GO
MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 02036502220068090168 200602036504 200692036504 20365022 2036502220068090168

EM MESA JULGADO: 06/11/2018

Relator
Exmo. Sr. Ministro RIBEIRO DANTAS
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO DE ASSIS VIEIRA SANSEVERINO
Secretário
Me. MARCELO PEREIRA CRUVINEL

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
RECORRIDO : ABEL LOPES GONCALVES
AGRAVANTE : RAIMUNDO LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra a vida - Homicídio Qualificado

AGRAVO REGIMENTAL
AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
AGRAVADO : ABEL LOPES GONCALVES
ADVOGADO : DEGIR HENRIQUE DE PAULA MIRANDA - DF021302

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"Prosseguindo no julgamento, a Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo
regimental."
Os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Jorge Mussi e Reynaldo Soares da
Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.

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