Dancin' Days: Disco Flashes No Brasil Dos Anos 1970: Ivan Paolo de Paris Fontanari

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Dancin' Days: Disco Flashes no Brasil dos anos 1970

Ivan Paolo de Paris Fontanari

Em 2019, mais de 100 mil brasileiros assistiram ao musical O Frenético Dancin' 1 Uma
grande produção internacional que leva o título do famoso Dias.
Discoteca carioca Dancin' Days, e em parte escrito por seu idealizador Nelson Motta, o
show relembrou com nostalgia, mas energia, os códigos musicais e visuais da era disco. A
encenação do musical coincidiu com uma forte virada conservadora na política do país
marcada pela eleição em 2018 do presidente Jair Bolsonaro que, apesar de ser um
presidente eleito democraticamente, chegou ao poder em um contexto não muito diferente
daquele da ditadura militar 40 anos antes . No final da década de 1970, quando o Brasil
estava em transição da fase mais difícil da ditadura militar, o surgimento da discoteca
parecia fazer parte de um novo e ingênuo movimento de libertação pessoal. Apesar das
décadas que se passaram desde então e do impacto que a discoteca e os gêneros musicais
subsequentes tiveram na psique nacional, uma visão de mundo patriarcal ainda persiste no
Brasil, e a discoteca continua a servir como uma metáfora crucial para as liberdades
individuais.

Embora a discoteca tenha tido um enorme impacto midiático nos canais pelos quais a
música e as culturas musicais eram consumidas no Brasil, ela apareceu pela primeira vez no

IP de Paris Fontanari (*)


UFFS – Universidade Federal da Fronteira Sul, Chapecó, Brasil

e-mail: [email protected]

© Springer Nature Switzerland AG 2022 51


F. Pitrolo, M. Zubak (eds.), Global Dance Cultures in the 1970 and
1980s, Palgrave Studies in the History of Subcultures and Popular
Music, https://doi.org/10.1007/978- 3-030-91995-5_3
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país numa época em que a música viajava exclusivamente através de discos físicos e
músicos. Proprietários de discotecas e DJs brasileiros viajaram para o exterior para vivenciar
a discoteca em primeira mão e depois retornaram para casa e moldaram o público local de
acordo com os repertórios musicais, tendências e técnicas de DJing norte-americanos e
europeus. A discoteca logo expressaria uma série de manifestações locais, mediadas por
gostos locais e adquirindo diferentes significados em diversas identidades de classe, gênero
e raça. Algumas dessas encarnações adquiriram fama além do público físico das discotecas
brasileiras e gravaram-se na memória coletiva brasileira mais ampla: o programa de TV
Carlos Imperial, o filme disco Sábado Alucinante

('Hallucinating Saturday'2), a novela Dancin' Days, discos disco como Disco Club de Tim
Maia, e a imagem e som de divas disco brasileiras como Gretchen são exemplos disso, e
foram coletivamente responsáveis por moldar o ideia dominante de disco baseada na
autolibertação corporal e sensorial face aos valores dominantes restritivos. O paradigma
resultante, que foi inspirado e adotado pela cena gay, acabaria por influenciar os clubes
gays undergrounds brasileiros, dos quais uma nova cena brasileira de música eletrônica de
dança emergiria uma década depois. Além de sua adoção como um ethos underground, a
proliferação de material relacionado à discoteca brasileira on-line ilustra como a discoteca
foi integrada à mídia brasileira e à indústria cultural em geral, e sua memória e visibilidade
foram valorizadas e preservadas nas décadas que se seguiram.

Desde o seu surgimento, a discoteca foi responsável por criar uma sensibilidade cultural
cosmopolita compartilhada entre um grande segmento da juventude brasileira, desde a
classe média branca e educada metropolitana até os trabalhadores pobres multiétnicos e
suburbanos. O governo autoritário instaurado pelo golpe de 1964 e patrocinado pelas elites
conservadoras trabalhou arduamente para anular as reformas sociais do governo Goulart
anterior. Suprimindo os direitos civis e exercendo controlo militar sobre as instituições,
impuseram a censura cultural e perseguiram os oposicionistas. No final da década de 1970,
contudo, o regime começou a afrouxar o seu controlo, preparando o país para um regresso
gradual à democracia em 1984. Embora muitos frequentadores de discotecas se tenham
posicionado contra a política conservadora, não há provas claras de intervenção militar
directa. intervenção na cena disco brasileira; no entanto, num clima ainda altamente
conservador, aqueles que não estavam alinhados com o regime poderiam facilmente ver-
se perseguidos pelas suas opiniões progressistas. Neste sentido, a discoteca era uma
espécie de válvula de escape: um lugar para cultivar identidades e estilos de vida não-
conformistas a partir dos quais
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novas formas de interação pessoal e visões de mundo poderiam eventualmente ser criadas.

Este capítulo explora como a discoteca circulou como música, sensibilidade e estilo de
vida no Brasil da década de 1970, prestando especial atenção à sua função simbólica na
promoção de novas identidades de classe, gênero e raça no país. Eu proponho a
emergência de um “corpo disco” – uma consciência recém-descoberta na qual, através da
dança, o corpo se torna um locus de pluralização do eu – para traçar a história da discoteca
brasileira desde sua adoção inicial pela classe média e pela elite, através da sua
popularização através da televisão, até à sua ascensão noutros meios sociais. Tal como
outros ambientes de música de dança com funções rituais análogas, as discotecas e as
discotecas permitiam que as pessoas se afastassem temporariamente do seu eu normal,
atraindo aqueles que – por qualquer razão – se sentiam “deslocados” nos seus respectivos
locais de pertença social. Como argumentei no meu estudo sobre DJs de periferia
(Fontanari 2013a), o corpo como local de “pluralização do eu” desempenha uma dupla
função: por um lado, inscreve no corpo dançante uma alteridade (por exemplo, social,
sexual, racial) vivenciada através do próprio corpo; por outro, permite que o corpo dançante
viaje para outro espaço, mundo ou meio. Esta ideia do corpo como local de inscrição e de
exploração ressoa com a leitura heterotópica da discoteca que sustenta esta coleção: no
espaço físico e cultural da discoteca, os dançarinos tornam-se “outros” devido às mudanças
radicais que experimentam entre o mundo exterior e o interior da discoteca, 'pluralizando-
se'. Embora esta pluralização esteja intrinsecamente ligada a uma noção émica de
autolibertação e ocorra a nível individual, os seus efeitos são, em última análise, políticos
– por esta razão, enfatizo a triangulação entre sensibilidade, estilo de vida e visão de
mundo ao longo deste capítulo. No corpo disco, um novo ethos é assim representado e as
identidades dominantes são contestadas, particularmente as noções patriarcais de género,
classe e raça.

Embora o trabalho acadêmico sobre a discoteca brasileira ainda esteja em seus


estágios iniciais,3 estudos em contextos brasileiros paralelos, mas relacionados, confirmam
a leitura da discoteca que estou propondo aqui. Velho (1998) ofereceu uma descrição
densa de jovens adultos brancos de classe média que viviam no Rio no início dos anos
1970 e que equilibravam dramaticamente um estilo de vida “alternativo” baseado na
liberação sexual e no uso recreativo de drogas com as restrições sociais e financeiras da
família. vida. Da mesma forma, num estudo que explora o movimento da Nova Era
brasileiro, Soares (1994) destacou a importância da “libertação individual” das restrições
morais e familiares impostas a um meio específico socializado na tradição católica. É
razoável, então, sugerir que todo o “pacote” disco atraiu a população urbana brasileira
emergente.
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classe média: os seus valores e práticas pareciam libertadores em relação às antigas


restrições patriarcais e militares, ligando os entusiastas da discoteca a novos estilos de
vida cosmopolitas.
Este capítulo começa em 1976 na Discoteca de Nova York (NYCD), a primeira verdadeira experiência
discoteca a ocorrer no Rio de Janeiro; a partir deste ponto de partida, concentro-me no papel e nas conquistas
do citado Nelson Motta, peça fundamental na introdução e difusão da discoteca no Brasil. Seções específicas
abordarão a primeira e a segunda encarnações da boate de Motta, Dancin' Days, e outra seção investigará a
novela Dancin' Days, também idealizada por Motta, que foi exibida pela influente rede Globo entre 1978 e
1979. À medida que o capítulo traça as várias iterações da marca Dancin' Days, ele também se concentra
no papel da 'banda da casa' Dancin' Days - o grupo garçonete-diva Frenéticas - e sua faixa 'Dancin' Days',
que serviu como crédito musical da novela e continua sendo o hit disco brasileiro mais famoso até hoje, com

um olhar para a ressonância simbólica de suas letras. Na parte final do capítulo, apresento algumas
observações sobre a dimensão política do “corpo disco” como uma marca relevante de distinção de classe e
racial, na esperança de que pesquisas futuras possam basear-se nisso.

O COMEÇO: A DISCOTECA DE NOVA IORQUE


Ao fundar a New York City Discotheque (NYCD) no Rio de Janeiro em maio de 1976, o
proprietário Carlos Wattimo e o DJ Ricardo Lamounier introduziram o paradigma da
discoteca no Brasil. Um ano antes, Wattimo – um ex-major do exército dos EUA – dirigia
a Discoteca Ipanema, em Nova York, onde Ronnie Soares era o DJ. Os símbolos nova-
iorquinos podiam ser encontrados em todo o seu novo clube carioca, na música, na
arquitetura, na moda, na decoração e no cardápio, além do nome. A porta de entrada
tinha em sua moldura o Empire State Building e a Estátua da Liberdade esculpidas; a lista
telefônica de Nova York e as placas de trânsito de Nova York também estavam espalhadas
pelo clube.
'The New York', como era conhecido, oferecia diversos pratos quentes, todos com nomes
ingleses; whisky e vodka eram as suas bebidas de assinatura, servidas por 15 garçonetes
uniformizadas que correspondiam aos padrões de beleza atuais (Abbade e Junior 2016,
16–19).
O NYCD marcou a primeira aparição de um disc-jóquei que tocava discos em toca-
discos – o chamado discotecário – em uma boate brasileira de classe média, mas a
música de discos de gramofone já era comum há algum tempo nos bailes sociais da
classe trabalhadora pobre. Já em 1959, o rádio
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O técnico e vendedor de vinis Osvaldo Pereira atuou como proto-DJ em bailes sociais do centro de São Paulo,
onde tocou uma mistura de discos estrangeiros de Ray Charles e Frank Sinatra e nacionais de Bolão e
Eduardo Lincoln, entre outros. Estes eventos apresentaram à juventude negra pobre uma alternativa acessível
aos locais luxuosos com orquestras ao vivo tocando para as elites brancas (Assef 2003, 23). As classes
médias, porém, não tinham essas opções. Antes da chegada da discoteca, a MPB ao vivo, a bossa nova e o

jazz eram o entretenimento noturno padrão, que permanecia chique e caro, e que era principalmente um
passatempo boêmio de elite, atendendo a casais heterossexuais que desejavam dançar de rosto colado ao
som romântico. músicas.4 O NYCD mudou tudo isso: vestido com um extravagante macacão de lurex, o DJ
Ricardo Lamounier tocou discos de funk e soul de nomes como Diana Ross e KC e The Sunshine Band.5 Seu
mixer Bozak e dois toca-discos Technics, montados em um mezanino de onde ficava de frente para a multidão,
fez dele a principal atração do clube. O repertório disco que ecoava no poderoso sistema de som da boate –
que Wattimo trouxera dos Estados Unidos – convidava as pessoas a dançarem sozinhas através de
movimentos libertadores aleatórios, em contraste com a rotina anterior de dança em casal. O sistema de

iluminação incluía uma bola de discoteca e canhões coloridos que brilhavam em uma sala escura cheia de
espelhos, e a atmosfera geral criava uma experiência única de tempo e lugar, que reforçava ainda mais os
efeitos corporais recém-experimentados da música disco.

O NYCD logo se tornou um símbolo de prestígio social; famosos jogadores de futebol do Rio o visitavam
após suas partidas, e músicos, atores e modelos renomados estavam entre seus frequentadores,
compartilhando suas noites com multidões anônimas. Reportagens do clube apareciam regularmente nos
jornais locais, e as escolas secundárias mais prestigiadas da cidade organizavam ali seus bailes de formatura.
Porém, em 1978, o NYCD não era mais a única opção de discoteca, já que praticamente todas as casas
noturnas cariocas haviam se transformado em discoteca. À medida que surgiram discotecas maiores e mais
acessíveis, o NYCD deixou de ser o local a ser visto e o seu público começou a mudar lentamente a sua
lealdade (Abbade e Junior 2016, 17, 47, 114). A NYCD foi a primeira boate brasileira criada no modelo norte-
americano, mas a casa noturna que transformou a discoteca em fenômeno nacional teve uma história mais
complexa – uma história que envolveu uma interação de pessoas, músicas, ideias e estéticas que deram
forma ao que veio a ser. ser entendido como discoteca no Brasil.
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A DISCOTECA FRENÉTICA DANCIN' DAYS


As duas palavras em inglês 'Dancin' Days' continuam, sem dúvida, a expressão
mais evocativa da era disco brasileira. Referem-se simultaneamente a duas
discotecas locais, a uma novela de TV e sua trilha sonora, e a uma famosa
faixa disco gravada diversas vezes por diversos artistas. Essas diferentes
iterações de Dancin' Days alimentaram-se mutuamente em diversas mídias,
abordando diferentes públicos e estabelecendo formas distintas de vivenciar
a discoteca – mas uma pessoa, Nelson Motta, estava por trás de cada uma
delas. Criado em um círculo social intelectual de elite, Motta veio de uma
família artística de prestígio. Seu avô foi o intelectual Cândido Mota Filho, um
dos fundadores do movimento modernista brasileiro, e conheceremos seu
primo Ricardo Amaral mais adiante neste capítulo devido às suas próprias
contribuições para a vida noturna brasileira. No final da década de 1960, aos
23 anos, Motta tornou-se redator do influente jornal carioca Jornal do Brasil,
interagindo com jovens que mais tarde se tornariam figuras culturais
reconhecíveis nos campos da música, cinema, teatro, fotografia, literatura.
cultura e jornalismo. Dado que o Brasil atravessava o período mais difícil da
ditadura militar da época, Motta tinha o poder – como ele mesmo reconhece
– de tornar visíveis esses artistas, se quisesse. Em vez disso, ele escolheu
“lançar luz sobre novos talentos e dar voz aos marginalizados e transgressores
que difundem novas liberdades culturais e artísticas”, a maioria deles jovens
brancos, da elite ou da classe média do Rio de Janeiro e, em menor grau, de
São Paulo. Paulo (Motta 2014, 15–20).
Inserido na vanguarda da cultura pop nacional das décadas de 1960 e
1970, Motta e seus amigos serviram como guias locais para estrelas do rock
estrangeiras como Mick Jagger e Bob Marley em suas turnês pelo Brasil. Em
1976, Motta lançou seu primeiro grande empreendimento musical, o festival
de rock ao ar livre Saquarema, Sol, Som e Surf ('Saquarema, Sun, Sound and
Surf') em uma conhecida praia de surfe, apresentando tanto artistas
consagrados quanto novos. -vindos artistas do rock brasileiro. O mau tempo
impediu a gravação ao vivo do evento para um documentário planejado,
levando ao colapso financeiro de Motta (Motta 2014, 93–96). Apesar do
fracasso, de volta ao Rio de Janeiro, Motta foi convidado a desenvolver uma
estratégia de marketing para atrair clientes para o luxuoso e recém-inaugurado
e ainda pouco conhecido Shopping Gávea. Tendo o local por quatro meses,
ele primeiro se imaginou comandando um clube de rock hippie, após o
surgimento da moda psicodélica alternativa com a qual ele estava envolvido
na época. Motta já havia notado um forte apetite entre os jovens cariocas por novas tendência
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Assim que a onda psicodélica foi lançada em São Francisco, as pessoas no Rio
de Janeiro ficaram cientes dela e corajosamente afirmaram que eram
especialistas, embora não tivessem ideia do que realmente se tratava. Qualquer
coisa para evitar ser visto como um estranho: um sapato de madeira roxo é
psicodélico, asfalto quente é psicodélico, uma liquidação é psicodélico, esmalte
de unha é psicodélico [...]. Era preciso consumir e entrar na onda para mostrar
que não éramos subdesenvolvidos, ou assim pensávamos; na verdade, ao fazer
isso estávamos apenas provando exatamente o oposto. (Motta 2014, 21)

No entanto, depois de conversar com seu primo, um entusiasta da discoteca de Nova York,
Motta mudou de ideia e foi para Nova York para testemunhar em primeira mão sua
florescente cena disco, e concluiu que a discoteca seria um investimento melhor. Ele voltou
para casa com uma enorme bola de discoteca, efeitos de luz e muitos discos de discoteca,
determinado a montar uma discoteca local inspirada nas que acabara de ver. Seu instinto se
mostrou correto, já que a abertura do Frenetic Dancin' Days em agosto de 1976 foi um
enorme sucesso. Entre os 700 participantes estavam profissionais da mídia capazes de
transformar o clube em um local de prestígio e atrair novos visitantes, mas o público
diversificado também incluía militantes de esquerda, psicoterapeutas, observadores policiais
discretos, surfistas, jornalistas e uma grande variedade de celebridades como a atriz Sonia
Braga (que mais tarde estrelaria a novela homônima) e o produtor de cinema Glauber Rocha,
além dos músicos da MPB e tropicalistas Caetano Veloso e Gilberto Gil (Motta 2014, 99–
100, Motta 2000, 295, Assef 2003 , 56). O DJ Don Pepe tocou sucessos de funk e disco
durante toda a noite, interrompendo seu set apenas para dar lugar a uma apresentação ao
vivo de Rita Lee, ex-vocalista da banda de rock psicodélico Mutantes. Através do seu capital
social e da influência mediática, Motta dominou os códigos culturais tanto da elite artística
como do público urbano que visava. Atuando como mediador cultural, conseguiu introduzir
novidades musicais entrelaçadas com valores locais pré-existentes, tornando-os mais
facilmente aceitos. Uma semana após o seu lançamento, o local atingiu sua capacidade
total, feito que manteria semana após semana até o clube fechar, três meses depois.

Segundo Motta, “o ambiente era tão sexy e liberal que as escadas escuras do shopping
vazio estavam cheias de gemidos de casais heterossexuais e gays, enquanto outros
preferiam os cantos escuros sob as arquibancadas da discoteca, escondidos pelas cortinas”
(Motta 2000 , 297). Esta lascívia hedonista, aliada a uma mistura cuidadosa de códigos
culturais estabelecidos e “seguros” e de apetites cosmopolitas, não era domínio exclusivo de
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discotecas ou música disco, é claro - ela se enquadrava no movimento


mais amplo e complexo de liberação (sexual) evidente em outras
manifestações culturais da época, por exemplo, filmes pornochanchada6
- mas foi crucial para a lendária discoteca Frenetic Dancin' Days. estatuto
social e abrir a porta a inovações sociais e culturais mais profundas.

OS 'FRENÉTICOS'
Uma das principais atrações da discoteca Frenetic Dancin' Days foi o
grupo feminino multirracial Frenéticas ('The Frenetics') formado por seis
garçonetes de clube, todas atrizes, cantoras e dançarinas anteriormente
desempregadas. No meio da noite, eles paravam de servir as mesas e
subiam ao palco para cantar e dançar algumas músicas de rock de nomes
como Rita Lee ou Rolling Stones, após o que retornavam às suas funções
normais. Essa interação entre rock e disco foi recorrente no
empreendedorismo musical de Motta, que via os gêneros como
complementares; também permaneceu típico da forma como a disco
circulava no Brasil, pois dependendo do público a que se dirigia, os
gêneros musicais e os códigos culturais associados à disco mudavam.
Devido à sua popularidade, os interlúdios das Frenéticas ao longo da
noite foram se tornando cada vez mais longos, até que deixaram de servir
mesas e se tornaram a principal atração da noite (Motta 2000, 297). Logo
gravaram seu primeiro álbum, lançado simultaneamente pela Atlantic
Records no Brasil, Holanda, Alemanha e Portugal, e apareceram em
programas de TV com as mesmas roupas sensuais que usavam em suas
apresentações disco, tornando-se rapidamente estrelas nacionais. De
1977 a 1983 lançaram cinco álbuns e dezessete singles, todos repletos de
canções que falavam de felicidade, libertação individual e fascínio sexual.7
Em vez de apenas copiarem as divas originais da discoteca americana, as
Frenéticas eram consideradas um verdadeiro fenômeno local, inspirado
pela tradição do teatro de revista do gênero burlesco brasileiro e português
do século XIX , que eles atualizaram para uma atmosfera moderna de rock
e disco (Motta 2000, 302).
Vestidas com meias justas de lurex e ostentando salto alto e maquiagem
exagerada, os trajes das Frenéticas acentuavam seu apelo sexual e
reforçavam o papel do corpo disco como local de transformação e
autopluralização. Em suas apresentações, os corpos dos integrantes das
Frenéticas eram veículo dos valores disco. Os trajes que usavam
evocavam imagens extravagantes, quase carnavalescas, e derivavam de
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Dzi Croquettas, uma versão feminina suavizada da moderna trupe de dança gay Dzi
Croquettes, que interpretou comicamente a música brasileira durante a década de 1970.
Vestidos com trajes que cobriam apenas os órgãos genitais, os Dzi Croquettes originais
brincavam com as identidades de gênero, mostrando seus corpos masculinos e peludos em
trajes femininos extravagantes. As Frenéticas tomaram emprestado muito dessa estética,
mas o fizeram de uma forma mais e menos conservadora na forma como representavam
as mulheres e seu papel, realizando uma espécie de 'arrastar sem arrastar' que exagerava
o corpo feminino e mostrava isso sob uma nova luz. Misturando dança, canto, sensualidade
e ambiguidade, questionaram as identidades de gênero não ao apresentar o corpo feminino
como um local feminizado, mas ao libertar as mulheres da representação e dominação
patriarcal, um esforço urgente no contexto social do Brasil, dentro do qual apenas alguns
anos antes, as mulheres não saíam se não estivessem acompanhadas por um parceiro
masculino. Essa complexa camada de identidades de gênero, tanto subversivas quanto
conservadoras – de ida e volta, com a performance altamente sexualizada, mas irônica,
de mulheres interpretando homens representando mulheres – produziu performances
alegres, cômicas e, às vezes, cortantes e sarcásticas. mances. Embora se opusessem
claramente à supressão ditatorial das liberdades individuais, estabeleceram um jogo
representacional não-verbal e altamente codificado que poderia ter libertado os insiders,
mas que também era confuso para os olhos externos, o que os tornava mais difíceis de
compreender. censura (Dzi Croquettes, 2009).

Além de intervir nas normas de gênero, as Frenéticas faziam comentários culturais


sofisticados sobre as aulas, já que a própria ideia de garçonetes subirem ao palco no meio
da noite para se apresentar representava uma grande mudança sob muitas perspectivas.
Ele subverteu a tradicional hierarquia palco/pista de dança que as discotecas haviam
introduzido na vida noturna da classe média brasileira, e da mesma forma confundiu as
fronteiras de classe e raça, representadas pela composição multiétnica da banda: a
mudança garçonete/diva ressoou fortemente em um país como o Brasil, onde as
desigualdades sociais estavam intimamente ligadas à cor da pele. A forma como as
Frenéticas mudaram de status em diferentes momentos da noite pode, portanto, ser
interpretada como uma espécie de dramatização das múltiplas transformações possibilitadas
na noite/clube heterotópico em direção a uma pluralização do eu – em termos sociais,
raciais e sexuais —dos atores sociais envolvidos.

Todas estas características ajudaram a criar um ambiente ambíguo na discoteca Dancin'


Days, que por vezes era normativo e hierárquico, e outras vezes liberal e igualitário.
Seguindo Turner (1974), poderíamos então postular a discoteca Frenetic Dancin' Days
como um liminar
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espaço por excelência: tal ambiguidade é um atributo de todas as situações liminares, como
se encontra em muitos ritos de passagem tribais, mas também em certos ambientes urbanos.
As festas do Dancin' Days poderiam ser vistas como um exemplo de local que permitiu a
reavaliação dos significados colocados em prática (Sahlins 1990), tanto quanto a redefinição
daqueles que ali estiveram. Ao mesmo tempo que sintetizavam a discoteca brasileira, as
Frenéticas também conseguiram subverter as antigas percepções de gênero, classe e raça
que marcaram o Brasil em geral e a era da ditadura em particular.

OS SEGUNDOS DIAS DE DANÇA

Após o encerramento do Dancin' Days original, toda a equipe do clube—


de músicos a seguranças, com quem Motta prontamente dividia seus lucros -
ficaram felizes com seu sucesso. Motta foi convidado a reanimar o clube, mas inicialmente
resistiu a fazê-lo, desejando preservar a sua memória em vez de explorar o seu sucesso. Ele
mudou de ideia dois meses depois, quando os diretores da empresa que administra os
teleféricos, lojas e restaurantes do Morro da Urca, no Rio de Janeiro, lhe apresentaram uma
oferta irrecusável: um local de 30 quilômetros quadrados com um bar, um restaurante , e um
anfiteatro com uma vista grandiosa do Rio de 200 metros de altura e - o mais importante -
sem vizinhos.
Motta, de quem a Televisão Globo já havia comprado os direitos da marca registrada Dancin'
Days para seu próximo programa, concordou em aceitá-lo, e os comerciais de TV deram à
nova discoteca a tão necessária promoção, transformando a antes exclusiva boate em um
grande negócio. A Globo também pediu a Motta que produzisse vinhetas musicais para sua
próxima novela, que, uma vez lançada, se tornaria o terceiro hit Frenética do ano (Motta
2000, 305–307).

O novo clube Dancin' Days tinha todos os elementos para repetir o sucesso do seu
antecessor e tornar-se um novo 'sonho de verão'; no entanto, segundo Motta, acabou sendo
um “desastre completo”, principalmente devido à má logística. A abertura, no verão de 1978,
contou com a participação das já famosas Frenéticas. Como milhares de pessoas queriam
ver o 'novo' Dancin' Days, a multidão excedeu a capacidade de 3.000 pessoas do clube.

Os teleféricos e o restaurante nunca tinham tido tanta procura: a comida e a água acabaram
pouco depois da meia-noite e os sanitários ruíram; formavam-se longas filas para os
teleféricos, já que não podiam levar mais de setenta passageiros por vez. Entre os que
estavam irritados com os organizadores estavam velhos amigos e clientes de Motta, e
embora as coisas tenham corrido melhor nas noites seguintes, Motta nunca sentiu que o
novo clube fosse
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DANCIN' DAYS: DISCO FLASHES NO BRASIL DOS ANOS 1970 61

um verdadeiro sucessor do original (Motta 2000). O time ganhou mais dinheiro,


mas se divertiu menos fazendo isso, e no final do verão, depois que a novela
parou de ser transmitida, eles decidiram fechar o clube para sempre.

Muita coisa mudou desde a abertura da discoteca original. A antiga clientela


da Zona Sul do Rio foi substituída por multidões “desconhecidas” da Zona
Norte e da periferia, que a confundiram com a própria novela, fingindo estar
“no set”, talvez na esperança de esbarrar com a estrela da novela, Sonia
Braga. na pista de dança. Esta segunda iteração do Dancin' Days representou,
portanto, o momento em que a discoteca no Brasil se tornou amplamente
acessível através da mídia, atingindo um amplo público nacional: o que antes
era reservado apenas às elites cosmopolitas poderia de repente ser
experimentado por todos. O espaço da discoteca não era mais o terreno de
uma vanguarda cultural distinta, onde uma existência heterotópica se tornava
possível, mas tornou-se um espaço no qual o público poderia pluralizar-se,
interpretando literalmente - e, portanto, "tornando-se" - o espaço ficcional.
personagens que eles assistiam na televisão (Motta 2000, 308). Essa lógica
de identificação hierárquica – pela qual as pessoas se identificam com uma
camada superior e não com sua própria classe – foi identificada por Roberto
DaMatta (1997) como uma característica estrutural da sociedade hierárquica
do Brasil, em oposição a uma sociedade igualitária. A forma como a discoteca
se tornou um fenômeno de massa no Brasil segue claramente essa lógica. Em
ambos os locais, a discoteca Dancin' Days tornou-se uma ferramenta de
autolibertação individual, um lugar que permitiu às pessoas distanciarem-se
da sua posição social diurna - algo que permaneceu uma característica da
maioria dos eventos de dança social urbanos e cosmopolitas desde que a
discoteca foi criada. introduzido pela primeira vez (Fontanari 2013a, b). Além
disso, ambas as iterações de Dancin' Days incorporaram arquitetonicamente
a mudança da boate – com uma separação entre o público e o palco – e a
discoteca apenas com pista de dança, na qual os papéis do público e dos
artistas coincidiam. Embora estivessem fortemente focadas na experiência
dos dançarinos, ambas as discotecas tinham palcos e recebiam bandas
regularmente, estabelecendo novamente Motta como uma figura líder na transição entre modo
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DA PISTA DE DANÇA À TELA PEQUENA : A DANÇA


DIAS DE NOVELA

Como mencionado acima, ao visitar a discoteca, muitos freqüentadores de


clubes procuraram recriar a novela Dancin' Days, exibida entre julho de 1978
e janeiro de 1979 na influente rede de TV brasileira Globo, que havia
comprado os prestigiosos direitos do nome de Motta. A novela Dancin' Days
teve um tremendo impacto tanto na promoção nacional da discoteca quanto
na sua ligação com as classes médias e elites brasileiras, embora o enredo
principal na verdade seguisse dinâmicas de novelas independentes (e
familiares) de dramas pessoais, amor assuntos e tensões geracionais entre
jovens e famílias patriarcais. A censura federal, que se baseava e estava
comprometida com os valores cristãos ortodoxos do governo, impediu que
o programa fosse exibido antes das 22h e tratasse de temas como
'desagregação familiar devido à ruptura' e 'amor livre', todos ligados a o
personagem principal de uma mãe solteira. As restrições impostas afetaram
25 episódios, uma indicação de como as práticas liminares emuladas nas
discotecas eram consideradas como tendo potencial para se tornarem ampla
e perigosamente subversivas ('Globo 50 anos: censura na TV Globo', 2020).
Enquanto a MPB e a bossa nova acompanhavam as cenas do cotidiano,
uma vinheta em estilo disco serviu de pano de fundo para os interlúdios de
abertura e encerramento de cada um dos 174 episódios da série, ao mesmo
tempo que complementou as sequências de transição para os copiosos
intervalos comerciais. Essa posição única dentro do show não apenas
incorporou o tema na psique do público, mas reforçou o caráter extraordinário
da música disco como algo apropriado para fins de semana e para aqueles
momentos especiais e liminares em que as pessoas poderiam se reinventar.
A trama também foi esporadicamente interrompida por cenas filmadas em
discotecas locais que apresentavam alguns dos personagens principais. Na
pista de dança, as mulheres dançavam com sapatos plataforma, calças
boca de sino, tops estilo biquíni e vestidos soltos, enquanto os homens
usavam polos e camisetas meio abotoadas - em geral, o estilo era muito
mais baixo. mais terra do que os trajes extravagantes das Frenéticas, e
muito mais casual do que o código de fantasia que dominou as primeiras
casas noturnas da elite. Já os cartazes da novela traziam imagens de jovens
sem camisa entre outras pessoas vestidas de maneira descontraída. Não
aderindo nem à formalidade da boate inicial nem à atmosfera liberal e
orgíaca da verdadeira discoteca (Castro 2015; Abbade e Junior 2016), a
novela con-fatou os vários estados de espírito e contextos de classe da história da discotec
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DANCIN' DAYS: DISCO FLASHES NO BRASIL DOS ANOS 1970 63

até esse ponto, fundindo várias ondas num ambiente “acessível” e reconhecível.

Com o fim da série, o envolvimento próximo de Motta com a discoteca terminou, mas o
impacto e os efeitos do seu trabalho revelaram-se duradouros e de amplo alcance.8
Dancin' Days apresentou o cenário exótico do entretenimento nocturno a uma enorme
audiência televisiva nacional, e espalhar a febre discoteca global por todo o país. Em 1979,
novas discotecas estavam surgindo por toda parte, músicos brasileiros famosos como Tim
Maia e Ney Matogrosso gravaram seus próprios LPs discotecas e a moda discoteca
inspirada nas escolhas de vestimenta dos personagens tornou-se amplamente popular
entre os jovens. A fama do programa espalhou-se para além das fronteiras nacionais, já
que Dancin' Days foi transmitido em quarenta países, com maior sucesso em Itália no início
dos anos 1980, e foi refeito mais recentemente em Portugal em 2012.

popularizando assim a reformulação brasileira de uma linguagem e estilo musical importados


('Memória Globo' 2020). A trilha sonora original, lançada em 1978 pelo selo Som Livre,
vendeu mais de um milhão de cópias, incluindo onze faixas de diferentes gêneros, todas
menos uma de artistas brasileiros (Motta 2000, 309). Um LP com uma versão em espanhol
de Dancin' Days foi lançado no Peru e na Venezuela em 1982, e uma compilação homônima
foi lançada pela RCA na Itália em 1982, contendo onze faixas disco brasileiras e italianas.

'VENHA PARA ESTA FESTA': A DANÇA'


TRILHA SONORA DOS DIAS

A faixa tema dos créditos de abertura e encerramento da novela tornou-se o mais famoso
hit disco brasileiro (Motta 2014, 103–104). Não é novidade que Motta se envolveu mais uma
vez e teve influência decisiva no estilo da pista; ele também escreveu as letras, que refletem
o ethos que dominou as primeiras discotecas brasileiras. A instrumentação era tipicamente
'disco': uma batida contínua e regular marcada por um prato junto com baixo e caixa
paralelos alternados, apoiados por batidas de conga em semicolcheias.

As melodias eram tocadas por arranjos de metais ou cordas. Tanto o estilo de instrumentação
- já conhecido no funk e soul music -
e a letra foi pensada para convidar as pessoas a dançar e cantar junto:

Abra suas asas


Liberte suas feras
Solte-se
Entre nesta festa
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Leve-me com você para


Onde quer que você vá
Eu quero ver o seu corpo
Linda, leve e solta

Às vezes nos sentimos


Sofremos, dançamos
Sem querer dançar

Na nossa festa tudo é permitido


É permitido ser alguém como eu,
Como você

Dance bem
Dançar mal
Dançar sem parar

Dance bem
Dançar mal
Dance mesmo
se você não sabe dançar.9

A estrutura geral permite que o ritmo se ajuste estritamente às batidas e à


instrumentação, ajudando o dançarino a intensificar sua experiência de
libertação na pista de dança. A música e as letras, juntamente com a
sociabilidade geral que evoluiu em Dancin' Days, tanto em suas formas de
discoteca quanto de novela, revelam uma espécie de atmosfera libertina,
quase orgiástica, embora permaneça firmemente exclusiva e glamorosa -
lembrando assim o ambiente de discotecas famosas dos EUA como o Studio 54.
A letra, breve e direta, alude a um modo e significado particular da
experiência da dança disco, em que as Frenéticas assumem uma espécie de
papel de narrador-mediador, convidando as pessoas a se juntarem a elas
numa performance física hedonista e autotransformadora. . O primeiro verso
dirige-se diretamente aos dançarinos, sugerindo que eles se “libertem” das
suas inibições e se juntem à festa. Então, assumindo o papel de sedutoras e
evocando a liberdade pessoal, as Frenéticas se oferecem para serem levadas pelo
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DANCIN' DAYS: DISCO FLASHES NO BRASIL DOS ANOS 1970 65

dançarina onde quer que ela queira ir, reafirmando o papel do corpo -
'bonito, leve e solto' - como um local para potencial autotransformação. A estrofe seguinte
muda para um tom mais realista, referindo-se à diferenciação binária entre os dois universos
paralelos dentro e fora da discoteca: o interior é um lugar maravilhoso, comemorativo,
criativo e autêntico, enquanto o exterior é marcado pelo 'sofrimento' e 'bestas' a serem
'libertadas'. A quarta estrofe retorna ao otimismo da festa em curso na 'discoteca',
destacando o seu caráter inclusivo e a oferta da oportunidade de ser fiel a si mesmo ou
mesmo a si mesmo-como-outro, livre das máscaras sociais usadas na vida cotidiana e
inautêntica. interações. O refrão reforça o aspecto espontâneo, democrático e polifônico da
dança disco. O fato de não ser necessário nenhum conjunto de habilidades especiais
compara a experiência mais a um ritual transcendental do que a um evento formal de dança
social.

É importante ressaltar que a voz feminina tem uma atuação variada na canção como,
por sua vez, narradora e sedutora, que primeiro avalia as limitações da vida social cotidiana
e depois oferece permissão e libertação. Embora tenha sido escrita por um homem, a
execução da música foi percebida pelo público como feminina, sendo as Frenéticas vistas
como embaixadoras da libertação social e sexual. Ouvimos um grupo de vozes femininas
dirigindo-se a “você”, como se esse grupo de mulheres já tivesse se libertado das normas
patriarcais.
Um coletivo de garçonetes-divas de diferentes cores de pele assumindo a propriedade e
concedendo permissões sobre o espaço liminar e heterotópico da discoteca foi um gesto
importante no contexto da sufocada política de gênero do Brasil na época, e embora não
tenha acontecido. mudar a estrutura das relações de gênero, certamente apoiou o movimento
posterior em direção a uma percepção mais igualitária dos papéis de gênero no Brasil.

DISCO E CORRIDA

A discoteca surgiu no Brasil em um contexto dominado pela música MPB, Jovem Guarda e
Tropicália, cada uma com sua identidade e muito diferente dos modos pelos quais a disco
era vivenciada. Estes géneros estavam relacionados com tradições musicais nacionais pré-
existentes, com a inovação estética e a adopção ou recusa de influências internacionais,
com graus variados de oposição ao regime militar e, finalmente, com as formas como o
corpo era usado pelos fãs e músicos (Dunn 2009).

Além do envolvimento com o funk e o soul por parte de uma linhagem menor de artistas
negros da Jovem Guarda, como Tim Maia e Jorge Ben, o disco não tinha conexões estéticas
explícitas com nenhuma dessas tendências musicais dominantes - embora,
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como vimos, não era incomum que artistas da Jovem Guarda e da Tropicália frequentassem
regularmente as discotecas (Motta 2000, 2014.). É, portanto, claro que a juventude branca
da classe média via a discoteca como uma experiência musical totalmente diferente devido
à importância que conferia à dança e, por extensão, à libertação do eu através do movimento
físico e da expressão. Esta era uma novidade nos círculos com os quais Motta se misturava
e que ele representava – graduados universitários que tinham conhecimento sobre a cultura
popular global, que se sentiam ligados, física ou simbolicamente, à arte e à moda norte-
americana e europeia, e que eram na sua maioria provenientes de círculos brancos de
classe média e elite.

Uma breve consideração da dimensão étnico-racial da discoteca, no entanto, lança uma


luz ligeiramente diferente sobre as práticas do gênero e revela que a discoteca foi menos
inovadora do que poderia ter parecido originalmente aos seus fãs de classe média. Isto
porque, para a juventude multiétnica da classe trabalhadora dos subúrbios metropolitanos,
a introdução da discoteca seguiu um caminho já percorrido por dois outros géneros
importados dos EUA, o funk e o soul, conhecidos em conjunto como “música negra” no
Brasil. Na verdade, a discoteca estava enraizada - e talvez fosse apenas outro nome - na
música funk e soul tocada ao longo da década de 1970 em bailes sociais frequentados
principalmente por jovens negros pobres dos subúrbios.

Esta noção de 'música negra' tinha um significado diferente, pois para esses pobres
jovens negros brasileiros, a discoteca tornou-se um símbolo não - ou não apenas - de
liberdade pessoal e sexual, mas de sua própria negritude e de uma identidade negra
internacional emergente. , assim como o funk e o soul já haviam sido antes. Enquanto para
a classe média branca a discoteca desafiava os costumes conservadores dominantes e os
papéis de género, para a juventude multiétnica da classe trabalhadora era tanto uma fonte
como uma extensão da sua identidade racial. Esta é precisamente a razão dada para o
fracasso do investimento da indústria musical brasileira em artistas locais de soul-funk: 'se
há um bom público para o funk no Brasil, ele não [tem] renda suficiente para comprar LPs'
(Vianna 1988 , 31). As estratégias de negócio da indústria musical, da qual a discoteca era
um produto, foram definidas em termos económicos, segregando uma grande população
de consumidores incapazes de comprar produtos musicais. Vianna (1988) também descreve
como esses mesmos jovens suburbanos que não tinham condições de comprar LPs
frequentavam salões de baile negros nas periferias do Rio e de São Paulo nos finais de
semana. Esses locais mais tarde dariam origem às cenas do funk carioca e do hip hop
brasileiro, produzindo algumas das maiores exportações musicais do Brasil precisamente a
partir de um gênero negligenciado pela indústria musical.
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DANCIN' DAYS: DISCO FLASHES NO BRASIL DOS ANOS 1970 67

Na verdade, na década de 1970, o radialista e mestre de cerimônias Big Boy e Ademir


Lemos começaram a organizar uma série de bailes sociais no Rio de Janeiro chamados
Bailes da Pesada ('Danças Sociais Pesadas'), onde os DJs misturavam soul, rock, e faixas
pop dentro do mesmo conjunto; da mesma forma, as estações de rádio FM foram
extremamente importantes na difusão da música disco para além das discotecas (Assef
2003, 112). Na época, Lemos era considerado o melhor DJ do Rio, e se destacava por
tocar discos originais importados da Europa que tornavam seus sets únicos. Foi também
o primeiro DJ brasileiro a empregar técnicas de mixagem em toca-discos. A capa de uma
compilação de 1970 de seus sucessos favoritos de clubes, sem intervalos entre as faixas,
trazia o rosto de Lemos, com um penteado black power e usando um colar de contas afro-
brasileiras.10 Logo, outras equipes organizaram bailes negros semelhantes. danças') em
comunidades periféricas, e o movimento Black Rio, como essas danças passaram a ser
conhecidas, cresceu exponencialmente.11 Seu repertório musical, por sua vez, foi
diminuindo gradativamente. Antes favorecendo o samba e o rock da Jovem Guarda, os
jovens da classe trabalhadora suburbana da periferia mais tarde se voltaram para gêneros
“negros”, como o soul americano e o funk, juntamente com suas versões brasileiras de
artistas como Sandra de Sá e Tim Maia, que gravaram seu Disco Club . LP em 1978,
embora grande parte de suas outras composições também possam ser consideradas
música 'disco'.12

Tendo em vista a presença dominante de cantores e músicos negros, a negritude ficou


evidente na música e na dança disco a ponto de ser vista como um rótulo criado para
descrever o funk e a soul music para um público branco.
Segundo Motta (2007), Tim Maia nunca considerou a discoteca como “música branca”, mas sim como
complementar à música soul negra (Fontanari 2013a; Vianna 1988; Motta 2007). À medida que as discotecas
e discotecas estabeleceram raízes cada vez mais fortes no Brasil durante o final da década de 1970, a música
nos bailes negros tornou-se estritamente 'disco'. Os dançarinos dos bailes suburbanos e das discotecas do
centro dançavam o mesmo repertório (discoteca) (Vianna 1988, 31; Motta 2007, 160). Os significados que
atribuíam a ele variavam, no entanto.

Embora o apelo da música disco tenha alcançado com sucesso todas as classes
sociais, as discotecas permaneceram reservadas às classes médias. Os jovens pobres da
classe trabalhadora não podiam pagar o transporte para chegar até eles nem a taxa de entrada.
Na verdade, considerando o seu menor tamanho e capacidade, as discotecas do centro
da cidade não poderiam ter sobrevivido nos subúrbios, mesmo que fossem acessíveis aos
clientes de baixos rendimentos. É por isso que os locais de baixo custo do Rio destinados
à juventude pobre sempre tiveram uma capacidade muito maior e estavam localizados
longe das discotecas do centro, seguindo a orientação sócio-geográfica dominante.
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padrões do Brasil, onde quanto mais longe o local estiver do centro da cidade, menor
será sua renda e menos branca será a população (com a notável exceção das favelas
segregadas racial e socialmente , que estão fisicamente próximas das áreas médias e
ricas do Rio). bairros) (Telles 2004, 199).

CONCLUSÃO
Ricardo Amaral, primo de Motta e um influente empresário de clubes cariocas que teve
profunda influência na indústria musical brasileira, destacou como a Discoteca de Nova
York introduziu mudanças duradouras na paisagem noturna brasileira . Ao selecionar
quem poderia entrar, o NYCD mudou radicalmente a vida noturna comercial metropolitana
brasileira, de uma que antes era cara e exclusiva para uma cena mais igualitária (Abbade
e Junior 2016, 6, 16–17). Várias discotecas proporcionaram à classe média uma opção
confortável e intermediária entre restaurantes-clubes formais, conformistas e caros e
danças sociais negras lotadas e periféricas nos subúrbios (Assef 2003, 58). O surgimento
das discotecas refletiu, assim, a consolidação de um estilo de vida urbano e de classe
média no Brasil que alimentou valores individualistas, liberais, cosmopolitas e hedonistas.

O facto de a essa altura a juventude brasileira já ter vivido doze anos de ditadura
militar que censurava tudo o que desafiasse os costumes conservadores – incluindo
reuniões de jovens – apenas intensificou o efeito heterotópico da discoteca. Sem outras
danças sexualizadas comparáveis destinadas à população urbana branca, o contraste
entre a vida quotidiana e as discotecas não poderia ter sido maior. Para eles, a discoteca
desafiou os valores familiares patriarcais impostos pela igreja e pelo estado ditatorial,
promovendo a ascensão do individualismo nos centros urbanos e permitindo-lhes ter
experiências diretas e indiretas de autopluralização. Numa sociedade moderna, embora
ainda altamente hierárquica, as discotecas funcionavam como locais seguros para a
libertação do corpo. Foi relatado que a experiência nas pistas de dança nas discotecas
do centro do Rio no final da década de 1970 tinha a mesma atmosfera das norte-
americanas, onde “tudo era permitido” – desde encontros sexuais até consumo excessivo
de álcool e cocaína – ampliando uma experiência liminar e heterotópica. de lugar e
tempo.14

O impacto da discoteca nas práticas de género foi duplo: promoveu um ambiente


favorável aos homossexuais e também proporcionou às mulheres da classe média novas
oportunidades de vida nocturna, livres do anteriormente necessário acompanhamento
masculino.15 Ao mesmo tempo, em ambientes menos individualistas e mais comunitários,
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DANCIN' DAYS: DISCO FLASHES NO BRASIL DOS ANOS 1970 69

Em cenários suburbanos, a história era um pouco diferente, revelando nuances nas


experiências disco relacionadas à classe e à etnia. Lá, o disco desempenhou o mesmo
papel anteriormente atribuído ao funk e ao soul, sendo posteriormente substituído pelo funk
carioca. Experimentada através de coreografias colectivas, a discoteca entre os jovens
multiétnicos pobres reforçou a sua identidade negra/racial, destacando a sua segregação
espacial social e racial das multidões das discotecas de classe média do centro da cidade.

Como um todo, a discoteca introduziu novas formas de tocar e experimentar música.


Antes de sua chegada, a música ao vivo nos clubes brasileiros era apreciada intelectualmente,
e não destinada à dança. Com a discoteca, surgiu uma nova relação entre o intérprete e o
público, como foi destacado décadas mais tarde pela investigação em cenas de música de
dança eletrónica (Tagg 1994).
Os DJs de discoteca foram o expoente máximo dessa mudança na performance musical,
pois embora ainda não tivessem 'saído da cabine' para subir ao palco, mudança que só
ocorreu na década de 1990, foram considerados os responsáveis pelo sucesso da festa.
DJs como Ademir Lemos eram ícones dos clubes em que tocavam, e nas casas noturnas
cariocas os DJs conquistaram um público fiel que os admirava como personalidades únicas
e criativas, com identidades musicais próprias, e que até os 'seguiam' quando se mudavam
para outra discoteca ( Abbade e Júnior 2016).

As duas versões de Dancin' Days de Motta fizeram a transição com sucesso da classe
média branca brasileira da contracultura do rock dos anos 1960 para o disco. Ele administrou
essa mudança a partir de vários ângulos: música e códigos visuais, dança, autoexpressão,
sexualidade, papéis de gênero, a ânsia da juventude local por novidades internacionais e a
grande mídia, ao mesmo tempo em que incorporou ao disco o anterior apetite generalizado
no Brasil pelo rock. música. Ainda assim, o público da discoteca era eclético por design –
como foi refletido no próprio nome do clube de Motta, que foi supostamente inspirado na
faixa de hard rock do Led Zeppelin de 1973 – uma referência com a qual a rede social de
Motta estava familiarizada (Motta 2000, 294) . Muitos músicos e fãs de rock também faziam
parte do público da discoteca, o que sugere que, apesar das diferenças estéticas e musicais
entre os dois gêneros, o rock e o disco eram semelhantes na medida em que desafiavam
as percepções sociais dominantes sobre raça, classe, corpos, sexualidade. liberdade,
consumo de drogas ou relações de género – tudo isto tradicionalmente implicava um
elevado grau de segregação e desigualdade.

Agora uma mudança na mitologia urbana do Brasil, para o público da época a discoteca
constituía uma espécie de rebelião espontânea e privada contra visões autoritárias de
gênero, raça e classe. O foco no corpo e a música não apenas disponibilizaram, mas
celebraram e posicionaram o corpo
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si mesmo como um local liminar: um espaço limiar através do qual uma pluralização
do eu poderia ser realizada durante a noite, com a esperança de que eventualmente
se tornasse uma realidade diurna. Embora a discoteca possa não ter contribuído
diretamente para o retorno da democracia no Brasil, foi certamente um sinal na forma
de um pequeno lampejo de liberdade pessoal que trouxe uma ilusão de liberdade
individual aos frequentadores de discotecas da classe média. Quarenta anos depois,
embora de uma forma e contexto bastante diferentes, a sua estética ainda soa
apelativa e a sua variedade de significados potenciais parece apenas aumentar,
evocando memórias de diferentes gerações e apontando para possíveis novas
formulações de uma cultura de dança e de um sistema de dança. de valores.

NOTAS

1. O Frenético Dancin' Days (2019), musical de Nelson Motta e Patrícia Andrade, teve direção
de Deborah Colker. O musical foi anunciado como “o lugar ideal para reviver os anos
gloriosos da música disco e celebrar a década de 1970”.

2. Todas as traduções são doravante do autor, salvo indicação em contrário.


3. O único relato existente sobre a discoteca brasileira foi escrito recentemente pelos jornalistas
Celso Junior e Mario Abbade, cujo irmão era frequentador de discoteca, e aqui me baseio
no trabalho deles; outras informações relevantes utilizadas na presente investigação foram
encontradas em livros de não-ficção sobre a história dos DJs brasileiros (Assef 2003) e do
funk brasileiro (Vianna 1988), bem como nas biografias de alguns dos principais músicos de
discoteca do Brasil, desde apresentadores de TV aos músicos (ver Amaral 2010; Castro
2015, 2016; Couto e Fabretti 2015; Motta 2000, 2007, 2014; Imperial 1973 e Monteiro 2008).

4. MPB significa Música popular brasileira , um movimento iniciado em meados da década de


1960 por jovens músicos urbanos de classe média, recorrendo ao samba e às tradições da
música rural brasileira para desenvolver canções sociopolíticamente engajadas com poesia
elaborada, melodias e harmonias (Dunn 2009).

5. Testemunhando o tipo de música tocada no NYCD, sete compilações de LPs sob o nome
NYCD foram lançadas de 1976 a 1979, contendo sucessos favoritos de artistas norte-
americanos de funk e soul, como Stevie Wonder, Eddie Kendricks, The Jackson 5, Diana
Ross, A Família Richie, Grace Jones, Gibson Brothers, Rare Earth, Sylvester e assim por
diante.
6. O popular gênero cinematográfico brasileiro pornochanchada oferece uma comparação
adequada e, sem surpresa, ao mesmo tempo que a disco.
Refere-se a uma série de comédias eróticas que exploravam temas como casos
extraconjugais, namoro, sexualidade gay, psicanálise (que estava na moda na época entre
pessoas brancas de classe média urbana),
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DANCIN' DAYS: DISCO FLASHES NO BRASIL DOS ANOS 1970 71

e as tensões intrínsecas entre a libertação sexual e as restrições conservadoras da família


de classe média.
7. Os discos foram Frenéticas (Atlantic 1977); Caia na Gandaia (Atlântico
1978); Soltas na vida (WEA 1979); Babando Lamartine (Warner Bros
1980); e Diabo a quatro (Top Tape, 1983). Esses títulos simbolizam a
identidade pública das Frenéticas como mulheres desempenhando o
papel de ‘libertadoras do corpo’. Caia na Gandaia é uma expressão
coloquial do português brasileiro, que também aparece em suas letras (ver
Seção “The seConD DanCin' Days”). Soltas na Vida pode referir-se à
identidade que defendem publicamente para si mesmas. Babando Lamartine
('Babar Lamartine') tem múltiplos significados: pode significar que as
Frenéticas babavam poeticamente pelo compositor brasileiro de sambas
satíricos, Lamartine Babo, cujo sobrenome também é análogo ao verbo
português 'babar'. 'Babar' –– o infnitivo de 'babando' em português coloquial
–– também significa 'reverenciar', mas para quem não conhece o
compositor, também pode se referir ao famoso drink martini como um
'Martini Babado'. Ambos os significados evocam um senso de humor
sexualizado que é notável na obra das Frenéticas. Diabo a quatro ('Devil
by four') é uma antiga expressão popular em português que se refere a
criar caos ou fazer bagunça; aqui 'quatro' refere-se claramente aos quatro
membros (diabólicos) das Frenéticas, enfatizando assim a sua posição
culturalmente crítica contra uma imagem patriarcal e conformista da mulher.
8. Motta afirma que após fechar a segunda discoteca Dancin' Days, ele se
cansou da discoteca e quis voltar-se para a música brasileira. Na conhecida
boate carioca Canecão, mais tarde montou a discoteca Tropicana, de
estilo latino, totalmente decorada com temas tropicais, com música latina
ao vivo (salsa, merengue) interpretada por uma big band vestida em estilo
tropical. A apresentação, porém, foi recebida com frieza, e o clube só
atingiu sua capacidade total quando o ex-DJ do NYCD Ricardo Lamounier
assumiu o toca-discos e as Frenéticas se apresentaram no palco.
9. Para referência, a letra original é: 'Abra suas asas/ Solte suas feras/ Caia
na gandaia/ Entre nesta festa./ Me leve com você/ Pra onde você for/ Eu
quero ver seu corpo/ Lindo, leve e souto. / A gente às vezes/ Sente, sofre,
dança/ Sem querer dançar./ Na nossa festa vale tudo/ Vale ser alguém
como eu/ Como você./ Dance bem/ Dance mal/ Dance sem parar./ Dance
bem/ Dance mal/ Dance até Sem saber dançar.'
10. Assef 2003, 39; Le Bateau Ao Vivo, Top Tape, Brasil, 1970. As faixas da
compilação traziam artistas norte-americanos de rhythm 'n' blues, soul,
funk, country music e rock 'n' roll. As batidas fortes são enfatizadas com
palmas e pandeiro em muitas faixas, bem como frases de instrumentos de
sopro e coros vocais nos refrões. O ritmo também é enfatizado pelas
batidas do violão.
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72 IP DE PARIS FONTANARI

11. Funk Santos, citado em Assef 2003, 47. Funk Santos era um autoproclamado
admirador de Ademir Lemos.
12. Tim Maia, Disco Club, Atlântico, Brasil/Portugal, 1978. Maia faleceu em 1998, aos 55
anos, tendo gravado 32 discos em 42 anos de carreira. Inspirado no funk, no soul e
no rhythm 'n' blues norte-americanos, teve profunda influência na música brasileira,
principalmente em músicos e produtores identificados com a 'música negra'. Suas
composições foram continuamente regravadas e sampleadas por vários outros
músicos. A Disco Club de Tim Maia foi relançada no Brasil em 2001 (WEA) e 2011
(Abril Coleções), e no Reino Unido em 2018 (Mr. Bongo/Atlantic). O filme biográfico,
Tim Maia, baseado no livro de Nelson Motta (2007), foi lançado em 2014.

13. No final da década de 1960, Amaral dirigia a boate Sucata, no Rio de Janeiro, que abrigava
jovens músicos que mais tarde se tornariam ícones da MPB, como Elis Regina e Wilson
Simonal (Motta 2014, 17). Anos depois fundou as discotecas Club A em Nova York e Le
78 em Paris, e a Discoteca Papagaios em São Paulo em 1977.

14. Outra droga muito usada nas discotecas cariocas era o Mandrix, uma espécie de
sonífero tomado com álcool para produzir estado de euforia e tontura. Assef 2003,
56; Motta 2014, 102. Mandrix também é conhecido como 'drake', mandrax ou
quaaludes.
15. Abbade e Junior (2016, 6, 19) citam artigo de O Globo de 1976, onde a segurança feminina do
banheiro do NYCD se declarava “assustada” com a moda em que “mulher beija mulher”.

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Brasil. In O rigor da Indisciplina, 189–212. Rio de Janeiro: Relume-Dumará.

TAGG, Felipe. 1994. Do refrão à rave: o declínio da figura e a ascensão da


Chão. Música Popular 13 (2): 209–222.
Telles, Eduardo. 2004. Raça em outra América: o significado da cor da pele no Brasil.
Princeton, NJ: Princeton University Press.
Turner, Victor. 1974. O processo ritual. Petrópolis: Vozes.
Velho, Gilberto. 1998. Nobres e anjos: um estudo de tóxicos e toxicidade. Rio de Janeiro:
Fundação Getúlio Vargas.
VIANA, Hermano. 1988. O Mundo Funk Carioca. Rio de Janeiro: Zahar.

DISCOGRAFIA

Frenéticas. Frenéticas. Atlântico, 1977, LP.


———. Caia na gandaia. Atlântico, 1978, LP.
———. Soltas na vida. WEA, 1979, LP.
———. Babando Lamartine. Warner Bros., 1980, LP.
———. Diabo a quatro. Fita Superior, 1983, LP.
Tim Maia. Discoteca. Atlântico, Brasil/Portugal, 1978, LP.
Vários. Le Bateau Ao Vivo. Top Tape, Brasil, 1970, LP.
———. Discoteca de Nova York. Fita Superior, 1976, LP.
———. Discoteca 2 de Nova York . Top Tape, 1977a, LP.
———. Discoteca 3 de Nova York. Top Tape, 1977b, LP.
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74 IP DE PARIS FONTANARI

———. Discoteca 4 da cidade de Nova York . Top Tape, 1978a, LP.


———. Discoteca 5 de Nova York . Top Tape, 1978b, LP.
———. Discoteca 6 de Nova York . Top Tape, 1979a, LP.
———. Discoteca 7 de Nova York . Top Tape, 1979b, LP.

FILMES, TV E TEATRO
Alvarez, Raphael e Issa, Tatianna (Dirs.). 2009. Dzi Croquetes. Canal Brasil e Tria.
(Documentário).
Braga, Gilberto (Dir.). 1978–1979. Dias dançantes. Rede Globo. (Programa de TV).
Cunha, Cláudio (Dir.). 1979. Sábado Alucinante. Atlântida
Cinematográfca. (Filme).
Imperial, Carlos. 1978–1979. Programa Carlos Imperial. TV Tupi/TVS/TV
Registro. (Programa de TV).
Lima, Mauro (Dir.). 2014. Tim Maia. Globo Filmes. (Documentário).
MOTA, Nelson e Andrade, Patrícia. 2019. O Frenético Dancin' Days. (Musical).

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