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Artrodese talonavicular para


tratamento de pé plano valgo
em paralisia cerebral
Bruno de Oliveira Amin1, Monica Paschoal Nogueira2, Luiz Alberto Barbosa Tavares1, Alessandro Monterroso Felix3,
Paulo Rogério Kanaji3, Willian Martins Ferreira1, Nikita Tayana Penafort de Lima Ramos1

RESUMO SUMMARY
O pé plano valgo é uma deformidade comum em crianças com Pes planovalgus is a common deformity in children with
alterações neurológicas e pode trazer complicações como: dor durante neurologic diseases; complications can occur with this deformity as
atividades em ortostase, instabilidade durante o apoio, úlceras de pain in orthostatic position, instability during stance, pressure ulcers
pressão na região medial onde a cabeça do tálus fica proeminente e on the medial region where the talus head becomes prominent and
inadequação à adaptação de órteses. Inúmeras técnicas cirúrgicas maladaptation to orthoses. Several surgical techniques have been
foram descritas para a correção desta deformidade, porém nenhuma reported to correction of this deformity, however most of them do not
se mostrou totalmente satisfatória. Deste modo, Turriago afirma come out totally satisfactory. Turriago states that the shortening of
que o encurtamento da coluna medial associada a artrodese the medial column and the talonavicular arthrodesis correct both
talonavicular corrige a deformidade e a instabilidade presentes, deformity and instability and can be an effective alternative to the
podendo ser uma alternativa eficaz às técnicas vigentes. current technics.

Palavras-chave: Paralisia cerebral. Pé plano valgo. Artrodese


talonavicular. Keywords: Cerebral palsy. Pes planovalgus. Talonavicular arthrodesis.

INTRODUÇÃO tase3, instabilidade durante o apoio4, úlceras de pressão na região


medial onde a cabeça do tálus fica proeminente5,3 e inadequação à
O pé plano valgo é uma deformidade comum em crianças com adaptação de órteses3.
alterações neurológicas1, em cerca de 25% de todos os pacientes Existem várias técnicas descritas para a correção do pé plano
com paralisia cerebral. Em crianças diparéticas e tetraparéticas neurológico, como artrodese subtalar, alongamento da coluna la-
essa frequência pode chegar a 64%2. Esta deformidade pode levar teral e artrodese tríplice. No entanto, em pacientes com paralisia
a inúmeras complicações como: dor durante atividades em ortos- cerebral mais velhos ou na adolescência, e nos que possuem uma

1. Médico Residente (R4) em Ortopedia Infantil e Reconstrução do HSPE – IAMSPE – São Paulo
2. Chefe do Grupo de Ortopedia Infantil e Reconstrução do serviço de Ortopedia e Traumatologia do HSPE – IAMSPE – São Paulo
3. Médico Assistente do Grupo de Ortopedia Infantil e Reconstrução do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do HSPE – IAMSPE São Paulo
Autor Responsável: Bruno de Oliveira Amin / E-mail: [email protected]

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deformidade mais grave, estes procedimentos tem se mostrado ina- tabilidade do pé à ortostase, acarretando dor e piora do tempo de
dequados6-8, pela correção insuficiente conseguida (artrodese sub- ortostatismo (Figuras 1 e 2).
talar), pelas altas taxas de recidiva (alongamento de coluna lateral)
Indicado procedimento cirúrgico devido à inadequação à órtese
ou por resultarem em pés rígidos e deformados incapazes de gerar
e à instabilidade que já o estava impossibilitando de ficar em ortos-
estabilidade para a marcha (artrodeses tríplice).
tase. Foi indicada então a artrodese talonavicular devido à idade do
Turriago afirma que o arco longitudinal do pé plano espástico paciente e à gravidade da deformidade.
pode ser adequadamente restaurado com o encurtamento da co-
luna medial associada a artrodese da articulação talo navicular, RELATO DA TÉCNICA CIRÚRGICA
corrigindo também a instabilidade do médiopé e o valgismo do
retropé2. Além disso, é uma técnica que já se mostrou segura em Realizada incisão de aproximadamente 3cm abaixo do maléolo
pacientes adultos realizada em outras condições como a artrose medial, passando pela tuberosidade do navicular até a base do 1o
pós traumática3. metatarso, realizada dissecção por planos, identificado e isolado o
tendão do tibial posterior que se insere na tuberosidade do navi-
RELATO DE CASO cular. Podem estar presentes na via e devem ser identificadas e
isoladas durante a dissecção outras estruturas, como o tendão do
Paciente M.M.B, 15 anos, sexo masculino, com história de nasci- tibial anterior e a veia safena.
mento prematuro (30 semanas), necessitando de acompanhamento
por 01 mês na UTI neonatal e evoluindo com paralisia cerebral dipa- Visualizada a cápsula da articulação talo navicular e realizada
rética e com nível funcional IV (GMFCS) . capsulotomia em Y de modo a obter uma exposição ampla e que
permita a sutura posterior da mesma.
Inicialmente, o paciente apresentava marcha com flexão dos
joelhos, tendo sido realizadas há 2 anos (setembro de 2014) teno- Expostas as superfícies articulares do navicular e do tálus, toda
tomias do semitendíneo, grácil e alongamento intramural do semi- a cartilagem articular foi retirada com o uso de serra oscilante, for-
membranoso e bíceps femoral, com posterior ortetização, obtendo- mões e curetas. Neste passo, foi avaliado o comprimento da coluna
se a posição ortostática. medial, de modo que, se necessário fosse possível o encurtamento
da coluna.
Retorna em dezembro de 2015 em uso da órtese para exten-
são do joelho noturna, porém mal adaptado à órtese suropodálica Após a cruentização da articulação em conjunto com o encur-
devido ao pé plano valgo presente bilateralmente, bem como ins- tamento da coluna medial, foi realizada a redução da articulação,

A B

C D

Figura 1. Fotos pré-operatórias exame clínico do pé


Fonte: Arquivo pessoal do autor

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pronando o antepé de modo a corrigir a supinação característica do Realizada sutura da cápsula de modo à tensioná-la e sutura por
pé plano valgo. A redução foi mantida com FK de modo provisório e planos, suturada pele com pontos simples (Figuras 3 e 4).
conferida com o uso de radioscopia.
Confeccionado gesso suropodálico mantido por 8 semanas.
Checada a redução, foi realizada a fixação definitiva com 02 pa-
rafusos canulados de 4,0mm passados retrogradamente do navicular Após 6 meses de pós – operatório o paciente retorna mantendo
para o tálus. melhora da posição do pé obtida na cirurgia, com boa adaptação á

Figura 2. Radiografias com carga pré operatórias AP e Perfil dos pés direito e esquerdo
Fonte: Arquivo pessoal do autor

A C

Figura 3. Fotos do pós-operatório imediato


Fonte: Arquivo pessoal do autor

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órtese e melhora da instabilidade e da dor que apresentava à ortos- DISCUSSÃO


tase (Figura 5). Traz exame radiografico apresentando consolidação
da artrodese e correção parcial com melhora do padrão da linha de A correção cirúrgica do pé plano valgo está indicada quando co-
Meary e do ângulo de Kite (Figura 6). meça a influenciar na função do mesmo. Diversas técnicas foram

B C D

Figura 4. Radiografias do pós operatório imediato AP e perfil sem carga


Fonte: Arquivo pessoal do autor

Figura 5. Fotos exame clínico do pé pós operatório tardio


Fonte: Arquivo pessoal do autor

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Figura 6. Radiografias pós-operatório tardio AP e Perfil com carga


Fonte: Arquivo pessoal do autor

descritas, porém não se mostraram adequadas a correção do pé children and adolescents withcerebral palsy. J Child Orthop.
plano valgo a longo prazo2. 2009 Dec;3(6):501-2.
Pode se notar no caso apresentado acima nas radiografias em 3. de Coulon G, Turcot K, Canavese F, Dayer R, Kaelin A, Ceroni D.
perfil a melhora da linha de Meary, bem como nas radiografias em Talonavicular arthrodesis for the treatment of neurological flat
AP a redução da articulação talo navicular, a correção do ângulo de foot deformity in pediatric patients: clinical and radiographic
Kite e da abdução do antepé. Deste modo, a artrodese talonavicular evaluation of 29 feet.3. J Pediatr Orthop. 2011 Jul-Aug;31(5):
parece ser uma ferramenta útil e eficiente para a correção dos pés 557-63.
plano valgo nos pacientes portadores de paralisia cerebral, conse- 4. Gage JR. Gait analysis in cerebral palsy. London: Mac Keith
guindo estabilizar o médio pé, alinhar o retropé e o antepé. Press; 1991.
Ainda não há estudos para avaliação dos resultados a longo 5. Herring JA. Disorders of the Brain - cerebral palsy. In: Herring JA
prazo, sendo necessário um maior follow-up para consolidação do (editor). Tachdjian’s pediatric orthopaedics. 3ed. Philadelphia: W.B.
método, mas os resultados preliminares encontrados no estudo de Saunders; 2002; p.1150.
Turriago et al.2 com um seguimento de 40 meses mostrou que a
6. Monson R, Gibson DA. Long-term follow-up of triple arthrodesis.
artrodese talonavicular foi capaz de manter a correção obtida.
Can J Surg. 1978 May;21(3):249-51.
7. Tenuta J, Shelton YA, Miller F. Long-term follow-up of triple
REFERÊNCIAS arthrodesis in patients with cerebral palsy. J Pediatr Orthop. 1993
1. Zeifang F, Breusch SJ, Doderlein L. Evans calcaneal lengthening Nov-Dec;13(6):713-6.
procedure for spastic flexible flatfoot in 32 patients (46 feet) with 8. Andreacchio A, Orellana CA, Miller F, Bowen TR. Lateral column
a follow-up of 3 to 9 years. Foot Ankle Int. 2006 Jul;27(7):500-7. lengthening as treatment for planovalgus foot deformity in
2. Turriago CA, Arbeláez MF, Becerra LC. Talonavicular joint ambulatory children with spastic cerebral palsy. J Pediatr Orthop.
arthrodesis for the treatment of pes planus valgus in older 2000 Jul-Aug;20(4):501-5.

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