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RESUMO
O documento orientador da educação, Base Nacional Comum Curricular (2018), entende que um dos
objetivos das aulas de Língua Portuguesa é trabalhar com as diferentes práticas de linguagens.
Hodiernamente, os textos e gêneros que constituem essas práticas estão cada vez mais compostos por
vários modos, além de circundarem ambientes digitais. À vista disso, o eixo da oralidade deve ser
trabalhado na aula de língua materna e corresponde às práticas de linguagem que ocorrem em situações
orais. Uma das ferramentas que atua como estratégia para o desenvolvimento de habilidades e
competências orais é a playlist comentada. Este trabalho pretende apresentar uma prática pedagógica
em turmas do Ensino Médio em que utilizamos a playlist comentada como uma estratégia para o
desenvolvimento do eixo da oralidade, buscando, através dos usos sociais da escuta e da fala, valorizar
a cultura nordestina e denunciar problemas sociais típicos da comunidade. A intervenção foi realizada
numa escola estadual da zona rural de Caraúbas, em cinco turmas do Ensino Médio, sendo três turmas
da 1ª série e duas turmas da 2ª série. Os Resultados das experiências do Programa de Residência
Pedagógica demonstraram uma maior desinibição dos alunos nas práticas orais, conhecendo as
propriedades do texto falado, além de valorizar os ritmos das canções que permeiam sua cultura,
entendendo as denúncias relativas aos problemas sociais da seca presentes nos versos das músicas,
tornando o aluno um cidadão crítico e reflexivo que sabe agir através das práticas de linguagens,
incluindo a oralidade.
Palavras-chave: Ensino de oralidade, Língua Portuguesa, Playlist comentada, Intervenção Pedagógica.
INTRODUÇÃO
Percebemos que a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018) indica que o eixo
da oralidade deve ser trabalhado com o intuito de desenvolver nos alunos habilidades relativas
à fala e à escuta em contextos sociais e discursivos, sejam em situações formais ou informais,
nas palavras do documento:
O Eixo da Oralidade compreende as práticas de linguagem que ocorrem em
situação oral com ou sem contato face a face, como aula dialogada,
webconferência, mensagem gravada, spot de campanha, jingle, seminário,
1
Graduada pelo Curso de Letras–Português da Universidade Federal Rural do Semi-Árido - UFERSA,
[email protected];
2
Graduada pelo Curso de Letras-Português da Universidade Federal Rural do Semi-Árido - UFERSA,
[email protected];
3
Graduado pelo Curso de Letras-Português da Universidade Federal Rural do Semi-Árido - UFERSA,
[email protected].
debate, programa de rádio, entrevista, declamação de poemas (com ou sem
efeitos sonoros), peça teatral, apresentação de cantigas e canções, playlist
comentada de músicas, vlog de game, contação de histórias, diferentes tipos
de podcasts e vídeos, dentre outras. (BRASIL, 2018, p. 78-79)
METODOLOGIA
Nossa pesquisa é de classificação aplicada, possuindo uma abordagem qualitativa
através de uma pesquisa-intervenção, que em linha com Rocha (2003, p. 67), diz respeito a
“uma certa concepção de sujeito e de grupo, de autonomia e práticas de liberdade e a de ação
transformadora”. É ancorada nos pressupostos de (MARCUSCHI, 2007; ANTUNES, 2008;
FERRAREZI JÚNIOR, 2014), uma vez que desenvolvemos nas aulas de Língua Portuguesa,
um estudo sobre o gênero playlist comentada, através de uma perspectiva multimodal e
multissemiótica.
Com o objetivo de apresentar uma prática pedagógica em turmas do Ensino Médio,
utilizando a playlist comentada como uma estratégia para o desenvolvimento da oralidade, a
intervenção ocorreu nas turmas da 1ª e 2ª série do Ensino Médio, da Escola Técnica Integral
Almiro de França Silva, localizada na zona rural de Caraúbas-RN. Percebendo a necessidade
de se trabalhar a oralidade como um produto constituído por diversos modos e semioses, a
atividade desenvolveu-se mediante as seguintes oficinas: I- apresentação do projeto; II- a
importância da música e exemplo de playlist; III- playlist comentada; IV- escolha de música
para a playlist; V- produção do roteiro escrito; VI- produção da playlist comentada; VII-
culminância do projeto de letramento.
Sendo assim, iniciamos o trabalho por meio da apresentação do projeto, em que
pudemos observar as preferências/identificação dos gêneros musicais dos alunos. Nosso
objetivo nessa etapa era conhecer os nossos alunos, observando as canções que fazem parte da
sua coleção, pois, é necessário que o professor saiba as peculiaridades de sua turma para que
seu trabalho seja desenvolvido em sala de aula. Após isso, discutimos sobre a importância,
considerando o contexto cultural, social e histórico do aluno: o sertão nordestino.
A partir de então, direcionamo-nos para o momento do trabalho com o gênero playlist
comentada, através de uma aula síncrona, enfatizando sempre que as playlists são produções
encontradas frequentemente em diversos ambientes digitais, possuindo contextos de produção,
estrutura composicionais e propósitos específicos, apresentando-a como um gênero
multimodal. No quarto momento foi feita uma roda de conversa virtual para selecionarmos as
canções que iriam compor a playlist. Em seguida, os alunos produziram o roteiro escrito para
guiar os comentários, com as orientações dos educadores. Na sexta oficina, os discentes
realizaram a produção da playlist comentada. E no último momento, ocorreu a culminância do
projeto de letramento, no qual foi apresentada a playlist comentada.
Sendo assim, desenvolvemos as atividades em um período de sete encontros/oficinas
(síncronas e assíncronos). Como exposto, em virtude da pandemia da COVID-19, as atividades
aconteceram com o auxílio das tecnologias digitais, como os aplicativos Google Meet e
WhatsApp.
REFERENCIAL TEÓRICO
O ensino de Língua Portuguesa possui como finalidade, em linha com Bezerra (2019,
p. 308), o “desenvolvimento de habilidades relativas à leitura e à escuta, à escrita e à fala,
mobilizando os gêneros como estratégias para alcançar esse fim”. Nesse sentido, o gênero
playlist comentada atua como estratégia para o desenvolvimento da fala e da escuta. Pensando
no ensino da oralidade, que diz respeito aos usos sociais da fala e da escuta, muitas vezes, nas
aulas de língua materna as práticas de leitura e escrita são privilegiadas, já a fala passa a ser
vista como informal, não planejada ou até como uma espécie de dom, ocupando pouco espaço
para o trabalho com os gêneros orais. O papel da escola é trabalhar com o letramento (leitura e
escrita) e com a oralidade (fala e escuta), não devendo haver predileção de uma em detrimento
da outra.
Ferreira Junior e Forte-Ferreira (2020) entendem que a unilateralidade no ensino é uma
problemática, pois, nas palavras dos autores “Pensar a língua neste sentido é desprezar a sua
complexidade e ignorar a sua função dentro dos mais variados processos interativos em diversas
situações de comunicação que podem ser formais ou informais” (p. 14).
Nas aulas de Língua Materna, o ensino da oralidade deve, segundo Ferreira Junior e
Forte-Ferreira (2020) “criar possibilidades de uso da língua em diversos contextos para que o
aluno compreenda quando e onde usar os diferentes níveis de linguagem necessários à sua
prática comunicativa”. Nesse sentido, percebemos que nossa intervenção pedagógica buscou
trabalhar com a oralidade através de ferramentas digitais que fazem parte da vivência de nossos
alunos, ou seja, através de uma atividade significativa, em que os educandos percebam a
importância do planejamento e monitoramento da fala em situações comunicativas.
O trabalho com a playlist comentada além do desenvolvimento da oralidade também
segue o viés dos multiletramentos, para Gomes-Sousa e Lima-Neto “ Temos nós, professores,
a responsabilidade de também multiletrar”. Desse modo, os multiletramentos devem estar
presentes em nossas práticas pedagógicas, pois:
Multiletrar é, portanto, buscar desenvolver cognitivamente nossos alunos,
uma vez que a nossa competência genérica se constrói e se atualiza através das
linguagens que permeiam nossas formas de produzir textos. Assim, as práticas
de multiletramentos devem ser entendidas como processos sociais que se
interpõem em nossas rotinas diárias (DIONÍSIO, 2014, p. 41 apud GOMES-
SOUSA E LIMA-NETO, 2020, p. 114).
Nesse contexto, os textos produzidos no nosso mundo contemporâneo cada vez mais
estão sendo mediados pelas Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDICs),
Vergna (2010) expõe que:
As pessoas estão a todo instante estabelecendo comunicação, e os textos fazem
parte da vida delas, pois são frutos das demandas sociais. Atualmente, tem-se
visto que as práticas de linguagem estão sendo mediadas pela utilização das
tecnologias de informação e comunicação, envolvendo, com isso, práticas que
se utilizam de novos gêneros e textos cada vez mais multissemióticos e
multimidiáticos. A BNCC considera que esses gêneros são próprios da cultura
digital e da cultura juvenil (p. 48).
A playlist comentada é um desses gêneros próprios da cultura digital, e por isso, ainda
é um desafio seu trabalho em sala de aula, em linha com Cordeiro (2016 apud RIBEIRO, 2016,
p. 95) temos a seguinte indagação: “por que os professores se tornaram socialmente usuários
das TDICs, mas não as empregam na escola, em suas aulas ou em seus programas de curso? ”
Nossa ação pedagógica também objetivou mostrar que os gêneros que circulam em ambientes
digitais contribuem em um ensino e aprendizagem significativos aos nossos alunos.
Esse trabalho com a playlist comentada possibilita uma valorização da cultura dos
alunos, principalmente, em sociedades tão globalizadas, em que a mistura de ritmos e músicas
cada vez mais se confundem. Como indica Rojo (2012, p. 14) “Vivemos, já pelo menos desde
o início do século XX (senão desde de sempre), em sociedades de híbridos impuros,
fronteiriços”. A escola, como instituição dos letramentos, deve proporcionar ao aluno vivências
como essas, com produções que despertam o protagonismo e valorizam a coleção de cada
educando. Rojo (2012), ainda, indica que:
No caso brasileiro, em nossas salas de aula, essa mistura de culturas, raças e
cores não constitui constatação tão nova, embora passe o tempo todo quase
totalmente despercebida ou propositadamente ignorada (p. 15).
A música também é uma forma de mostrar esse misto de ritmos que circundam em nossa
cultura e nos constituem como partes de uma comunidade, abrindo fronteiras para pertencermos
a outras sociedades. Antunes (2008) aponta que na aula de português, a oralidade deve ser
considerada de forma a englobar os diversos “gêneros de discursos orais” (p. 102). A playlist
comentada proporcionou o conhecimento de um gênero oral, mostrando também que a fala não
é homogênea, e que como a escrita, também se adapta ao contexto comunicativo e ao público-
alvo.
Desse modo, a criação da playlist comentada é vista como uma importante ferramenta
para o desenvolvimento de competências orais, além de proporcionar um trabalho com as
TDICs, viabilizando, assim, práticas da pedagogia dos multiletramentos. À vista disso, como
indica Ferrarezi Jr (2014, p. 69) devemos “integrar o ouvir como falar”, justamente a proposta
da experiência aqui retratada.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Explanaremos, nesta seção, os resultados obtidos através da nossa intervenção, ou seja,
das oficinas, bem como a atuação dos alunos em relação a produção de um gênero oral,
desenvolvendo as habilidades de fala e escuta.
Oficina 1: apresentação do projeto e divisão dos grupos
Nesse dia, de forma síncrona, através do Google Meet, montamos uma roda de conversa
virtual sobre a música, os alunos puderam expor seus estilos musicais preferidos, além de
mostrar a importância e a subjetividade da música para cada um. Em seguida, disponibilizamos
um exemplo de playlist vinculada na plataforma Youtube com músicas nordestinas, os alunos
tiveram um tempo para ouvir e, em seguida, opinar sobre cada uma delas. Nesse momento,
perguntamos se eles conheciam o conceito de playlist e se as ouviam em ferramentas digitais,
todos os alunos mostraram conhecer e ouvi-las em seu dia a dia.
A partir dessa atividade, pudemos desenvolver a escuta, um dos elementos integrantes
da oralidade. Em Linha com Ferrarezi Jr. (2014) ouvir é “adotar uma postura social e conhecer
o tema que se ouve” ações necessárias para a construção e seleção das músicas da playlist.
Figura 2: Material sobre a importância da música e playlist com músicas nordestinas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A proposta pedagógica apresentada neste artigo, muito contribuiu em nossa formação
docente, sendo possível, ainda na graduação, termos a experiência de levarmos para a educação
básica um ensino crítico de língua, baseado na construção cidadã. A partir da playlist comentada
foi possível entender as tecnologias digitais como aliadas da educação, além de promover um
trabalho com a oralidade, modalidade que, ainda hoje, é pouco explorada nas aulas de Língua
Portuguesa.
O momento pandêmico em decorrência da COVID-19, afetou diretamente o ambiente
educacional, realizar um projeto de letramento nesse contexto, foi um desafio, mas com
atividades significativas que levam em conta as práticas discursivas da língua e com a medição
das Tecnologias Digitais da Informação e comunicação (TDIC), conseguimos cumprir com os
objetivos propostos no trabalho, tornando o ensino e a aprendizagem um momento de
construção do aluno em um ser político, social e histórico. Ademais, pudemos ir nos
construindo no processo contínuo de tornar-se professor, tendo em vista que, são essas
experiências que nos compõem para nos reconhecermos como educadores.
O programa de Residência Pedagógica, proporciona a construção da práxis educacional.
Essa aplicação e inserção dos saberes teóricos na prática em sala de aula, a partir de experiências
como a que foi relatada aqui, contribui para que tenhamos uma relação de diálogo entre
universidade e educação básica. Segundo Fontoura (2017, p. 125):
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro & interação. São Paulo: Parábola
Editorial, 2008. 186 p.
BEZERRA, G. B. Algumas teses sobre gênero na relação com texto e discurso. Anais do
1º ERELIP. Arco Verde, 2019, p. 300-311.
BRAHIM, Adriana Cristina S. de Mattos. Pedagogia crítica, letramento crítico e leitura
crítica. Revista X, Paraná, v. 0, n. 1, p. 11-31, jan. 2007.
FONTOURA, Helena Amaral da. Formação de professores para a justiça social: uma
reflexão sobre a docência na residência pedagógica. Revista Ibero-Americana de Estudos
em Educação, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 120-133, fev. 2017.