Psicologia Forense Huss Matthew T

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MATTHEW T.

HUSS

Psicologia
Forense
PESQUISA,
PRÁTICA CLÍNICA
E APLICAÇÕES
Matthew T. Huss é professor de psicologia na Creighton
University (Nebraska, EUA). Atuou como consultor para
diversos importantes periódicos.
H972p Huss, Matthew T.
Psicologia forense [recurso eletrônico] : pesquisa, prática clínica e
aplicações / Matthew T. Huss ; tradução: Sandra Maria Mallmann da
Rosa ; revisão técnica: José Geraldo Vernet Taborda. – Dados eletrônicos. –
Porto Alegre : Artmed, 2011.

Editado também como livro impresso em 2011. ISBN


978-85-363-2554-5

1. Psicologia. 2. Psicologia forense. I. Título. CDU 159.9:343

Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB 10/2052


Tradução:
Sandra Maria Mallmann da Rosa

Consultoria, supervisão e revisão técnica desta edição:


José Geraldo Vernet Taborda, MD, PhD
Psiquiatra Forense. Professor Adjunto, Departamento de Clínica Médica,
Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
Presidente, Section of Forensic Psychiatry, World Psychiatric Association. Membro
Fundador e Ex-Coordenador, Departamento de Ética e Psiquiatria Legal,
Associação Brasileira de Psiquiatria.

Versão impressa
desta obra: 2011

2011
Obra originalmente publicada sob o título Forensic Psychology: Research, Clinical Practice, and Applications
ISBN 9781405151382

©2009. Authorised translation from the English language edition published by Blackwell Publishing
Limited. Responsibility for the accuracy of the translation rests solely wtih Artmed Editora S.A. and is not
the responsibility of Blackwell Publishing Limited. No part of this book may be reproduced in any form
without the written permission of the original copyright holder, Blackwell Publishing Limited. All Rights
Reserved.

Capa: Paola Manica

Preparação de original: Lara Frichenbruder Kengeriski

Leitura fi nal: Ingrid Frank de Ramos

Editora sênior - Ciências Humanas: Mônica Ballejo Canto

Editora responsável por esta obra: Amanda Munari

Projeto e editoração: Techbooks

Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, à


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90040-340 Porto Alegre RS
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É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer


formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na Web
e outros), sem permissão expressa da Editora.

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IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL

Agradecimentos
como caixa de ressonância para algumas
das minhas ideias, frequentemente sem
que eu me desse conta. Outros colegas es
tavam mais afastados da produção deste
livro, mas são igualmente importantes.
Jenny Langhinrichsen-Rohling e Alan

Inúmeras pessoas contribuíram para este


livro. No entanto, aqueles que mais
contribuíram foram as centenas de estu
dantes que sofreram por anos durante as
minhas aulas de psicologia forense sem
que houvesse nenhum livro que fosse
adequado. As suas perguntas e comen Tomkins forneceram de forma consisten
tários contribuíram imensamente para a te feedbacks sobre a minha produção e eu
organização deste livro, e as suas quei acredito que toda a sua frustração comigo
xas quanto à compilação dos artigos ou está refletida neste livro. Eu também gos
os livros fracos foram a força impulsio taria de agradecer a Steve Davis, que me
nadora por trás da produção do mesmo. carregou em seus ombros durante algum
Especificamente, gostaria de agradecer à tempo e ajudou a estabelecer o contato
Nicole Thurston por todo o seu trabalho entre mim e a Blackwell, que iniciou esse
árduo como minha assistente de pesqui projeto. Eu gostaria de agradecer às pes
sa nesse projeto e à Sarah Norris por aju soas da Blackwell. À editora executiva,
dar com os slides. Christine Cardone, e à editora do projeto
Gostaria de agradecer aos colegas original, Sarah Coleman, que demons
anônimos que revisaram este livro e de traram grande paciência e compreensão
ram ótimos feedbacks críticos que, com cer nas orientações a um novo autor durante
teza, melhoraram a qualidade do texto. todo o processo.
Gostaria de mencionar especificamente Por fim, gostaria de fazer um agra
John Edens por fornecer um feedback de decimento mais pessoal à minha família.
talhado ao primeiro rascunho do texto e Sem meus pais, Darrell e Cheryl, eu pro
a Eric Elbogen por seus comentários mais vavelmente seria uma das pessoas sobre
informais e por servir de um modo geral as quais falo neste livro em vez da pessoa
que as avalia e trata. E o mais importante, gia clínica forense. Por conseguinte, este
gostaria de dizer um enorme obrigado à livro possui vários objetivos específicos
minha esposa, Joanie, por editar alguns voltados à apresentação desse tema aos
dos rascunhos mais áridos deste texto, estudantes.
me dando um feedback útil, não fican do
muito zangada quando eu ignorava o 1. É enfatizada a necessidade de os psi
seu feedback, por me aguentar quando se cólogos clínicos atuarem dentro do seu
aproximavam os prazos e por ser em âmbito da prática como psicólogos
geral apoiadora enquanto criamos nos sas
filhas, Lexi e Samantha. Eu não teria
conseguido fazer isso sem qualquer um
de vocês.

Prefácio
forenses. O âmbito de sua atuação é
definido pela adesão à literatura
empírica, atuação dentro da própria
experiência e evitar a atuação como
A psicologia forense está se tornando um ator legal (p. ex., advogado, juiz e
cada vez mais popular, tanto em nível de júri) e, em vez disso, atuar como psi
espe cialização quanto de graduação. No cólogo dentro do contexto legal. Ao
en tanto, o próprio termo psicologia forense longo deste livro, são mencionadas
é interpretado de maneiras diferentes questões relativas ao âmbito da atua
pelos estudiosos e pelo público em geral. ção e, por vezes, explicadas em maior
profundidade. Além disso, são discu
Alguns especialistas na área o utilizam
tidas as ramificações éticas e legais da
para des crever o amplo campo da
atuação realizada fora do âmbito da
psicologia e do direito que inclui a
atuação do profissional.
prática clínica da psico logia, a psicologia
2. Desse modo, o livro enfoca a prática
penitenciária, psicologia policial e áreas
clínica apoiada empiricamente e colo
não clínicas da psicologia e do direito (p. ca pouca ênfase nos aspectos da psi
ex., comportamento do júri, identificação cologia forense que atualmente têm
de testemunhas oculares). Existem pouco apoio empírico ou são pura
diversos livros disponíveis que focalizam mente sensacionalistas. Não está den
o campo mais amplo. Contudo, faltam tro do escopo deste livro identificar a
livros de qualidade que focalizem melhor prática clínica, mas será dada
unicamente a prática da psicologia foren ênfase ao uso da pesquisa e à neces
se, que é principalmente exemplificada na sidade de que os psicólogos forenses
avaliação e tratamento de indivíduos que sejam conhecedores atuantes. Parte
interagem com o sistema legal, para estu dessa ênfase será avaliar criticamente
dantes de graduação e até para recém-for aspectos da prática clínica que preci
mados. Este livro foi concebido para focar sam de maior apoio empírico.
a definição mais restrita ou tradicional da 3. O texto também coloca os estudantes
psicologia forense – a prática da psicolo diante da jurisprudência e do direito
codificado necessários à prática da
psicologia forense. Os estudantes de- estilo da sua redação tem a intenção
viii Prefácio de ser especializado, mas acessível
aos estudantes. Este livro focaliza não
vem reconhecer que os psicólogos fo só a aplicação da psicologia forense
renses precisam estar familiarizados
com as leis de uma determinada juris
dição para que possam ser úteis aos como também a ajuda aos estudan tes
tribunais. A discussão significativa da para que obtenham uma com
jurisprudência e do direito codificado preensão adequada do treinamento/
também possibilita que os estudantes educação necessários e do emprego
entendam o papel da lei na formação das oportunidades disponíveis. Para
dos contornos da psicologia forense e o instrutor, existem alguns capítulos
na vida das pessoas que sofrem im iniciais para tornar o resto do texto
pacto da psicologia forense. flexível, de modo que ele possa esco
4. Este livro encoraja o conhecimen to da lher os capítulos de acordo com o seu
lei como uma entidade viva e que interesse/conhecimentos ou comple
mentar o texto como desejar.
respira na prática da psicologia
forense e também na sua capacidade O livro está organizado em cinco par tes
de ser terapêutica ou antiterapêutica diferentes. A primeira parte do texto
para as pessoas que são afetadas por abrange os Fundamentos da Psicologia
ela. O termo jurisprudência terapêu Forense e é composta por três capítulos.
tica é utilizado em um sentido amplo O Capítulo 1 serve como o principal ca
nesta obra, como um modo de alertar pítulo introdutório, “O que é psicologia
os alunos para a importância da lei, e forense?”, e começa a introduzir as ideias
pretende sugerir que a lei pode ter que os estudantes vão encontrar ao lon
go do livro. O Capítulo 1 se concentra
efeitos positivos ou negativos, depen
em definir o que a psicologia forense é e
dendo da sua determinação original e
o que ela não é. Os aspectos mais sen
do modo como é aplicada.
sacionalistas da psicologia forense são
5. O livro busca incorporar exemplos do mencionados juntamente com descrições
mundo real que prendam a aten ção frequentemente imprecisas na mídia. O
dos estudantes. Estudos de caso e campo mais amplo da psicologia e do
exemplos da vida real são direito será referido, mas deixamos cla ro
recorrentes, por meio de quadros que o foco principal deste livro será a
com textos espe ciais e da sua prática clínica da psicologia forense. O
integração ao próprio livro. Esse capítulo conclui discutindo o treinamen
objetivo é especificamente to e educação necessários para se tor nar
importante em um livro que enfoca a um psicólogo forense. O Capítulo 2,
prática da psicologia clínica no sen “Avaliação, tratamento e consultoria em
tido de dar ao estudante uma visão psicologia forense”, serve como mais um
introdutória da prática real da psico capítulo introdutório e descreve a ava
logia forense. liação clínica e tratamento de uma forma
ampla e dentro de um contexto forense.
6. Esta obra pretende ser útil tanto para
Especificamente, ele discute os desafios
estudantes quanto para instrutores. O
peculiares que os psicólogos forenses
com frequência enfrentam clínica, legal e sexual contra adultos e crianças, uma vez
eticamente. É apresentado o termo âmbito que vem recebendo atenção crescente por
da prática e explica-se como ele será inte parte por da mídia e da literatura especí
grado ao longo de todo o texto. O fica. Esse capítulo discute o tratamento,
capítulo avaliação e avaliação de risco dos agres
sores sexuais. Também é dada atenção
especial às diferentes leis que afetam os
final dessa parte, “Testemunho pericial e agressores sexuais, tais como a
o papel de um perito”, oferece uma intro notificação
dução sobre a importância do direito na Prefácio ix
prática da psicologia forense. Os leitores
são incentivados a pensar sobre os efeitos à comunidade, leis de registro e leis para
de longo alcance da lei não somente em o predador sexualmente violento (SVP).
termos de prática da psicologia forense, A terceira parte, “Leis de Saúde Men tal e
mas também sobre as pessoas que estão Psicologia Forense”, começa pelo Ca
diretamente envolvidas no sistema legal. pítulo 7, “Inimputabilidade e responsabili
A ideia de jurisprudência terapêutica é in dade criminal”. Esse capítulo é o primeiro
troduzida e será usada durante todo o de três que são focar o papel geral da apti
livro como um tema. Todo esse material dão mental e a ideia de que a lei muda
está organizado em torno do papel de com frequência quanto a como define
ampliação e do impacto potencial dos pe doença mental dependendo da questão
ritos forenses e o testemunho dos legal. Os padrões variáveis de
peritos. A segunda parte do livro está inimputabilidade são discutidos
organi zada sob a categoria de “Violência juntamente com outras mudan ças
e Psi relevantes para as questões legais rela
cologia Forense”. O Capítulo 4 é cionadas. As medidas clínicas relevantes e
dedicado inteiramente a uma discussão os vários mitos que rondam a inimputabi
da psicopa tia. É dada atenção especial à lidade são examinados em profundidade.
distinção entre psicopatia e transtorno da Várias outras defesas legais envolvendo
perso nalidade antissocial. Esse capítulo responsabilidade criminal também são
revisa a literatura geral que enfoca a discutidas brevemente. O Capítulo 8, “Ca
psicopatia e, especificamente, a sua pacidade civil e criminal”, enfoca
relevância para a violência. O Capítulo 5, questões em torno da capacidade civil e
“Avaliação do risco de violência”, revisa criminal e a distinção entre capacidade
a história da avaliação clínica e do risco criminal e inimputabilidade. Ele examina
atuarial, junta mente com as limitações de os diferen tes pontos ao longo do processo
ambos. Uma discussão específica sobre de julga mento em que a capacidade pode
diversas abor dagens atuariais ou ser ava liada e os casos legais relevantes e
estruturadas para avaliação de risco medidas usadas na prática clínica, com
serão feitas dentro do contexto da boa parte do foco na capacidade para se
realização da avaliação de ris co e manejo submeter a jul gamento. O Capítulo 9,
do risco em contextos e situa ções “Restrição civil”, define a internação
clínicas. O capítulo final dessa parte, civil, descreve sua base histórica e discute
“Agressores sexuais”, examina a agressão
a evolução mais recen te em capítulo, mas abrange diversos aspectos
procedimentos de internação civil. do direito civil relevantes para a prática
Especificamente, internação sem hospi forense. O Capítulo 13, “Danos pessoais
talização, diretivas psiquiátricas prévias e e discriminação no direito civil”, enfoca
coerção são examinadas com alguma diversas áreas da psicologia forense que
profundidade. Os alunos são expostos à são menos sensacionalistas e muito pouco
inter-relação entre internação civil, insani estudadas. No entanto, a área pode repre
sentar o campo maior da prática forense.
dade e capacidade.
O Capítulo 13 descreve áreas como danos
Na quarta parte do livro, “Crianças e
pessoais, avaliações médicas psicológicas
a Família na Psicologia Forense”, cada um
independentes, reivindicações de indeni
dos três capítulos aborda alguns aspectos
zação de trabalhadores e assédio sexual e
da família. O Capítulo 10, “Violência do
discriminação no emprego. Essas áreas
méstica e perseguição (stalking)”, começa da psicologia forense são frequentemente
x Prefácio ignoradas nas pesquisas, mas oferecem
uma oportunidade única para a prática
definindo violência doméstica e discute a da psicologia forense.

Sumário
importância do exame crítico da literatu
ra referente às taxas de prevalência. Esse
capítulo focaliza a etiologia, avaliação,
avaliação de risco e tratamento dos per
petradores de violência doméstica. O Ca
pítulo 11, “Delinquência juvenil e justiça
juvenil”, enfoca o papel de mudança das
cortes juvenis como reação à percepção
pública do crime juvenil e as realidades
PARTE I Fundamentos da
da violência juvenil. São examinadas as psicologia forense . . . . . . . . . . .
dife renças entre os infratores juvenis e os 19
in fratores adultos, sendo dada uma
atenção específica aos mitos e realidades
1 O que é psicologia forense?
em torno dos tiroteios em escolas. O
Uma introdução .............................. 21
Capítulo 12, “Guarda dos filhos“, expõe
os estudantes à literatura legal e O que é psicologia forense? ................
psicológica que envolve determinações
21 Isto é psicologia forense?
sobre a guarda dos filhos. É dada atenção
especial às diferenças en tre avaliações ............... 21 A origem da psicologia
para guarda dos filhos e avaliações forense
psicológicas junto com temas de objetivo .................................................. 23
da prática que estão envol
Nossa definição de psicologia
forense

vidos nessa área difícil da prática. Além .................................................. 23


disso, é discutido o abuso infantil de um História da psicologia forense ...... 24
modo geral e em termos da sua relevância Principais áreas da psicologia
para as situações de guarda dos filhos. forense
A parte final do livro consiste de um
........................................................ entrevista
26 Estrutura do sistema ............................................. 45
legal.............. 29 Carreiras na Métodos e procedimentos:
psicologia testagem psicológica.......................
forense 48 Informações de arquivo
.................................................. 31 As .................. 52 Utilização de
relações entre direito e relatórios escritos
psicologia em avaliações forenses e
.................................................. 32 diretrizes
O conflito entre o direito e ............................................... 53
a psicologia Tratamento em contextos
......................................... 33 forenses
Educação e treinamento em ......................................................
psicologia forense 55 Quem estamos tratando?
.................................. 34 Como me .............. 57 Tipos de
torno um psicólogo tratamento......................... 58
forense? ................................................ 34 Sucesso de programas para
criminosos ........................................... 59
12 Sumário

Programas de sucesso com


criminosos
........................................... 60
Consultoria forense
2 Avaliação, tratamento e
................................ 61
consultoria em psicologia
forense .............................................. 41
3 Testemunho pericial e o papel de
Avaliação forense
um perito .................................... 65
.................................... 41 Tarefas
importantes na avaliação História do testemunho
pericial
forense
..................................................... 66
.................................................. 42
Admissibilidade do testemunho
Conceitos básicos em avaliação:
pericial
confiabilidade e validade ...............
.....................................................
43 Distinguindo avaliação
68 Padrão Frye
terapêutica de avaliação
forense ....................................... 68
.................................................. 44 Daubert vs. Merrell Dow ...............
Métodos e procedimentos: 69 O restante da trilogia de
Daubert
.............................................. 71
Questionamentos ao testemunho
PARTE II Violência e psicologia
pericial
forense . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
..................................................... 72
. . 89
Exame cruzado
................................ 72 Perito opositor
4 Psicopatia .........................................
................................. 73 Instruções
91
judiciais......................... 73 Fatores
que influenciam a A natureza da psicopatia

credibilidade da testemunha ...................... 91 Uma


especialista operacionalização popular
............................................. 74 da psicopatia: o inventário da
Críticas ao testemunho pericial ....... psicopatia

74 Assumindo o controle da sala ............................................ 93


do tribunal Relação entre comportamento

........................................ 75 criminal e violência com psicopatia.....

Testemunho de opinião 97 Violência em geral e

final comportamento criminal ...............


..................................................... 75 97 Violência sexual
Corrupção da ciência ..................... 76 ................................. 100 Violência
Ética do perito em pacientes
....................................... 79 psiquiátricos civis
Competência .................................... .............................. 101 Violência
80 Consentimento esclarecido e entre perpetradores de
confidencialidade ........................... violência doméstica
81 Combinações financeiras .......................... 102 O que mais
............. 82 sabemos sobre a
psicopatia?
................................................ 102
Relações múltiplas ......................... Aspectos interpessoais/afetivos
83 Evidência de síndrome: área da psicopatia
controversa de testemunho ...................................... 102
pericial Déficits cognitivos e de
..................................................... aprendizagem associados
83 Perfil e evidência de à psicopatia
síndrome ........................................... 84 ......................................... 104 Base
biológica para a
psicopatia ............................................ 105 ........... 132 Fatores de risco estáticos
............... 132 Fatores de risco
dinâmicos ............ 133 Fatores de
Tratamento da psicopatia ..............
proteção ......................... 134
106 Grupos especiais e psicopatia
Exatidão da avaliação de risco ...........
............ 108 Mulheres
135
.............................................. 108
Sumário 13
Questões étnicas e
transculturais
Dificuldades na avaliação de
...................................... 110 Crianças risco
e adolescentes.................. 111 ........................................................
Questões éticas e legais envolvendo
136 Quando somos bons na
a psicopatia
avaliação
............................................... 112
de risco?
Sentença capital e o uso da
................................................. 137
psicopatia ............................................ 113
Comunicando o risco
............................ 138
5 Avaliação do risco de violência .... 117

Natureza da violência e avaliação 6 Agressores sexuais .........................


do risco de violência 141
.............................. 117 Definição de
O que é um agressor sexual? ..............
violência ..................... 117 Violência
141 Avaliação dos agressores sexuais
como uma escolha ........ 118
...... 144 Avaliação falométrica:
Realidades legais das avaliações
pletismógrafo peniano (PPG) .......
do risco de violência
144 Avaliação psicológica
.............................. 120 A evolução da
...................... 146 Avaliação de
avaliação de risco ...... 122 Começo da
risco e reincidência 148
história da avaliação
Instrumentos para avaliação de
de risco
risco em agressores sexuais ..........
.................................................. 123
150 Tratamento e manejo dos
Avaliações de risco clínicas, atuariais
agressores sexuais
e estruturadas
.............................................................
............................................ 125
153 Os programas de tratamento
Avaliações clínicas da violência ...
para o agressor sexual têm
125 Medidas atuariais da violência
sucesso?
..... 126 Julgamentos profissionais
................................................ 154
estruturados........................................
Componentes dos programas
129 Fatores de risco e de proteção
com potencial de sucesso .............. 178 Culpado porém mentalmente
156 Grupos especiais de agressores doente
sexuais ................................................... 179
........................................................ Desafios à defesa por
157 Agressores sexuais juvenis inimputabilidade ..............................
............ 157 Mulheres agressoras 180 Estudos que avaliam os padrões
sexuais ......... 159 Agressores de inimputabilidade em júris
sexuais pertencentes simulados
ao clero .................................................. 182
................................................. 160 Mitos sobre inimputabilidade ............
Legislação para o agressor sexual ..... 183 Avaliações de inimputabilidade .....
161 Leis de registro e notificação ........ 187 Procedimentos comuns para

162 Leis de residência avaliações de inimputabilidade ....

.............................. 163 Leis para 188 Confiabilidade e validade das


predadores sexualmente avaliações de inimputabilidade .... 188
violentos ................................................. 164 Instrumentos de avaliação forense ......
14 Sumário 190 Simulação e inimputabilidade ......
191
PARTE III Leis de saúde Outros aspectos da responsabilidade
mental e psicologia forense . . criminal
.169 ............................................................
192

7 Inimputabilidade e
responsabilidade criminal ............ 171
8 Capacidade civil e
Justificativa para defesa por criminal ............................................ 197
inimputabilidade
Levantando a questão da
.................................... 171 Padrões de
capacidade em procedimentos
inimputabilidade ............. 173 Padrão criminais
da besta selvagem ............. 173 ..................................................... 198
M’Naghten Capacidade para submeter-se a
........................................... 174 A regra julgamento (CST)
do produto e Durham ...... 176 A .................................... 199 Prevalência
regra do Instituto Americano da CST ............................ 200
de Direito (ALI) e Brawner Procedimentos em CST ...................
............... 177 Lei de reforma da 201 Avaliações de capacidade
defesa por .............. 202 Medidas de capacidade
inimputabilidade (1984) ................. .................. 203 Outras variáveis
relacionadas à 228 Processo de restrição civil
capacidade .................... 229 Restrição civil
................................................ 208 ambulatorial ........... 230 Exame
Âmbito da prática nas empírico da restrição
avaliações de capacidade .............. civil ambulatorial e outras
209 Recuperação da capacidade mudanças nas leis de
............... 209 Programas de restrição

recuperação da ................................................ 232

capacidade Coerção das restrições civis.................

.......................................... 211 Outras 233 O impacto da coerção na

capacidades criminais ............ 214 restrição civil

Capacidade para ser ........................................... 234

executado Fontes e frequência da

............................................ 214 coerção

Capacidade para renunciar aos ................................................. 235

direitos de Miranda .......................... Direito de tomar a decisão de

215 Capacidade para recusar tratamento e de recusar


tratamento
defesa
.................................................... 236
por inimputabilidade.......................
Capacidade para tomar decisões
215 Capacidades civis
de tratamento
.................................... 216
.................................... 237
Capacidade para tratamento ........ 217
Diretivas prévias para saúde
Capacidade para executar um
mental
testamento
................................................... 238
.......................................... 217
Prática da restrição civil
Capacidade relacionada à
........................ 239 Avaliação e
curatela ................................................. 218
tratamento de
pacientes psiquiátricos ...................
9 Restrição civil .................................. 239 Avaliação do perigo para si
221 mesmo
O que é restrição civil? .................................................. 240
.......................... 222 Critérios para Avaliação do perigo para os
restrição civil ................. 225 Doença outros ....................................................
240
mental................................... 225 Sumário 15
Periculosidade ....................................
227 Necessidade de tratamento .......... PARTE IV Crianças e a família
na psicologia forense . . . . . . . perpetração de violência doméstica
245 ............................ 266 Perseguição
(stalking) ........................... 267

10 Violência doméstica e 16 Sumário


perseguição (stalking) ................... 247
11 Delinquência juvenil e justiça
Definindo e identificando a juvenil ...............................................
prevalência da violência doméstica ..... 273
247 Fatores que influenciam os História da corte juvenil .......................
números da prevalência ................. 275 Processo nas cortes juvenis
248 Avaliação da violência doméstica ................. 277 Delinquência juvenil e
entre parceiros íntimos delitos
......................... 250 Avaliação das juvenis
consequências da .........................................................
violência doméstica ......................... 279 Fatores de risco para delinquência
250 Consequências psicológicas da juvenil
violência doméstica ......................... ........................................................
251 Fatores de risco e avaliação de 281 Violência juvenil
risco em violência doméstica ...................................... 283 Fatores
........................ 253 Fatores de risco de risco para violência
para violência não sexual
doméstica ............................................ 283
............................................ 253 Fatores de risco para violência
Avaliando o risco e sexual
reincidência .................................................... 284
......................................... 258 Papel do psicólogo forense nas

Tratamento da violência cortes juvenis

doméstica ........................................... 286


Avaliação da receptividade ao
.................................................. 261
tratamento
Tratamento educacional e
.......................................... 286 Oferta
psicológico
de tratamento....................... 287
.......................................... 261
Avaliações para transferência .......
Intervenções baseadas na
288 Avaliações de capacidade
comunidade
.............. 289 Avaliações de
........................................ 264
inimputabilidade .... 290 Avaliação de
Intervenções da justiça criminal .....
risco ............................. 291 Questões
264 Diferenças de gênero na
especiais em relação aos ........ 312 Impacto dos acordos de
jovens: violência na escola .................. guarda
292 Violência e tiroteios em ...................................................
escolas .................................................... 313 Resultados positivos
292 pós-divórcio
........................................ 314 Abuso
12 Guarda dos filhos ........................... infantil ........................................... 315
297

História legal e pressupostos sobre


guarda dos filhos PARTE V Aspectos civis da
.................................... 298 Padrões psicologia forense . . . . . . . . . .
legais e preferências na 319
guarda dos filhos
............................... 299 Outras
13 Danos pessoais e discriminação
preferências legais.............. 300 Leis
no direito civil .................................
de guarda de filhos e diretrizes
321
profissionais
.............................................. 301 Base legal para casos de danos
pessoais: atos ilícitos e o direito civil ....
322 Prática forense geral em casos de
Diretrizes profissionais para danos pessoais
avaliações de guarda dos filhos .....
......................................... 324
302 Prática forense nas avaliações de
Simulação em casos de danos
guarda dos filhos
pessoais
.................................... 304 Formato e
................................................ 325
métodos utilizados
Danos típicos envolvidos em
em avaliações de guarda dos
queixas de danos pessoais
filhos
.................. 327 Transtorno de
......................................................
estresse
304 Levantamentos da prática
pós-traumático (TEPT) .................... 328
clínica
e testagem psicológica ...................
306 Dificuldades nas avaliações de Danos por traumatismo
guarda dos filhos cranioencefálico (TCE) .....................
............................... 309 Efeitos da 331 Dor crônica
guarda e do divórcio .......................................... 333
nos filhos Avaliação clínica psicológica
.................................................... independente ..........................................
336 Indenização ao trabalhador
311 Efeitos do divórcio nos filhos
................ 337 Assédio sexual e forense? Uma introdução
discriminação no emprego

I
.................................................... 339
Sumário 17
PARTE
Glossário

.................................................. 343

Referências .............................................

351 Índice Onomástico

................................ 407 Índice

Remissivo .................................... 411

Fundamentos
da
psicologia
forense

Capítulo 1 O que é psicologia

Capítulo 2 Avaliação, tratamento e consultoria em psicologia

forense Capítulo 3 Testemunho pericial e o papel de um perito


O que é psicologia forense?
1
Uma introdução
se eu lavasse o chão em vez de trabalhar
como professor universitário.
Entretanto, as imagens que vêm à mente
da pessoa mediana quando você declara
que é um psicólogo forense são muitas
O que é psicologia forense? vezes difíceis de serem corrigidas. Nes
se capítulo, vou inicialmente ocupar al
Você abriu este livro buscando aprender gum tempo esclarecendo a natureza e os
alguma coisa sobre psicologia forense, limites da psicologia forense, oferecen do
uma das áreas que mais cresce em toda a também uma definição específica da
psicologia. Mas você sabe realmente o psicologia forense que usaremos duran te
que é psicologia forense? Ela é como o restante do livro. E não se preocu pe:
aqueles programas da televisão, CSI – algumas dessas imagens que vêm à
Investigação criminal? A psicologia fo mente a partir do cinema e da televisão
rense envolve prender os serial killers?
são verdadeiras. A Figura 1.1 mostra o
Deve ser como no cinema! O Silêncio dos
Dr. Theodore Blau, ex-presidente da
inocentes? Beijos que matam? É esse o tipo
APA.
de coisa que os psicólogos forenses
fazem, não é? Sem dúvida, essas ima
gens retratam de forma limitada alguns Isto é psicologia forense?
dos aspectos da psicologia forense que
atraem o público. Embora esses exem Muitas pessoas equiparam a psicologia
plos possam dar uma impressão pouco forense à ciência forense ou à aplicação
precisa da psicologia forense, eles pro da lei. Elas acham que os psicólogos
porcionam algum entendimento desse forenses chegam até a cena do crime,
campo. Em última análise, essas ima examinam a área e, por fim, identificam
gens deixam as pessoas interessadas no várias pistas que vão ajudar a capturar o
assunto e nos estimulam a pensar sobre criminoso. Continuamente você vê es sas
as coisas terríveis de que os seres huma situações retratadas em programas de
nos são capazes. televisão, na mídia em notícias e no
Raramente digo às pessoas quando as cinema. Na verdade, pesquisas sugerem
conheço que sou um psicólogo foren se. que essas imagens na mídia podem con
Geralmente eu lhes digo que traba lho na
duzir a inúmeras percepções incorretas
universidade local. Meu orgu lhoso pai
sobre a psicologia forense em geral (Pa-
acha que essa minha resposta soa como
22 Matthew T. Huss
Figura 1.1 O Dr. Theodore Blau, ex-presidente da APA, começou a trabalhar com
psicologia fo rense testemunhando como perito psicológico e com frequência apresentava
palestras na Aca demia do FBI, em Quantico, VA. Arquivos de Psicologia – Universidade
de Akron © Skip Gandy, Gandy Photography, Inc., Tampa, FL.
“Como é que você faz terapia com pes
soas mortas, meu Deus?”. Bem, embora
try, Stinson e Smith, 2008). Entretanto, os pelo menos ele estivesse pensando em
psicólogos não são convocados rotinei psicólogos forenses em termos das tare
ramente para coletar amostras de DNA, fas que eles tipicamente desempenham
analisar uma amostra de sujeira deixada (ou seja, tratamento da doença mental),
para obter a localização geográfica de ele não acertou quando pensou no meu
onde ela se originou ou até para traçar trabalho como psicólogo forense. Eu não
os assim chamados perfis psicológicos. sou médium para falar com os mortos,
Os psicólogos forenses não são biólogos mas seria realmente muito fácil predizer
ou químicos e raramente são investiga a probabilidade de violência futura em
dores na cena do crime ou oficiais no alguém que já está morto. Muitos estu
cumprimento da lei. Parece estranho, dantes me procuram interessados em
mas eles são simplesmente psicólogos. usar sua especialização em psicologia ou
Eles estudam o comportamento huma justiça criminal e o conhecimento do
no e procuram aplicar esses princípios comportamento humano que adquiri
para auxiliar o sistema legal. ram para “pegar os caras maus”. Eu ge
Quando uma velha amiga minha volta à ralmente explico a esses estudantes que
nossa cidade, geralmente vou até a casa
dos pais dela para comer um chur rasco.
Certa vez, seu pai me perguntou, raramente os psicólogos forenses são
sabendo que eu era psicólogo forense: chamados para prender suspeitos; na
verdade, um estudo recente apurou que
apenas 10% dos psicólogos e psiquiatras cologia forense. O papel do psicólogo
forenses já realizaram um perfil criminal forense é na verdade muito simples e
e apenas cerca de 17% acreditam que direto: os psicólogos forenses auxiliam o
essa seja uma prática cientificamente sistema legal.
confiável (Torres, Boccaccini e Miller,
2006). A maioria dos estudantes que
estão interessados em pegar crimino
Nossa definição de
sos está direcionando o seu olhar para a psicologia forense
aplicação da lei e não para a psicolo gia Não somente existe confusão entre o
forense. Contudo, se você ainda está público em geral sobre a psicologia fo
interessado na psicologia forense como rense, como também ainda existe um
uma carreira possível, deve saber que debate entre os psicólogos a respeito da
pode até passar um tempo considerável natureza da psicologia forense (Bri gham,
bancando o detetive, mas vai precisar 1999). Esse debate ocorre não só nos
muito mais do que isso depois. Estados Unidos, onde as reformas nas
leis de saúde mental e a crescente
pressão das cortes pelo testemunho clí
A origem da psicologia forense nico levaram a um crescimento nesse
Parte da interpretação errônea do pú campo, mas também no Canadá, Eu ropa
blico em relação à psicologia forense e outras partes do mundo (Black burn,
1996; Ogloff, 2004). Falando de um modo
provém da falta de conhecimento sobre
mais abrangente, a psicologia forense se
a própria origem da palavra “foren se”.
refere à aplicação da psicolo gia ao
Embora algumas pessoas pensam na
sistema legal. Contudo, muitos se
ciência forense e na aplicação da lei
referem a esse campo mais amplo como
quando se trata de psicologia forense, psicologia e a lei ou estudos psicolegais,
outras podem pensar em palestras e de enquanto especificam que a psicologia
bates nas escolas. Colocar o foco na solu forense está focada na aplicação da psi
ção de discussões ou sendo adversários cologia clínica ao sistema legal (p. ex.,
verbais em uma competição de debates Huss, 2001a). Essa definição mais estrita
realmente nos aproxima um pouco mais da psicologia forense, que enfoca apenas
do verdadeiro significado de psicologia a psicologia clínica, exclui tópicos como
forense. A palavra forense é originada identificação de testemunhas oculares
da palavra latina forensis que significa do (psicologia cognitiva), polígrafos (psi
fórum e era usada para descrever um cologia fisiológica), comportamento do
local na Roma Antiga. O Fórum era o júri (psicologia social) e testemunho de
local onde os cidadãos resolviam dispu crianças no tribunal (psicologia do de
tas, algo parecido com o nosso tribunal senvolvimento). Os outros aspectos não
clínicos têm um impacto poderoso sobre
dos dias modernos (Blackburn, 1996;
o sistema legal e são extremamente im
Pollock e Webster, 1993). A partir desse
portantes no estudo psicológico da lei,
contexto, evoluiu o significado da psi
mas eles estão além do objetivo deste li
Psicologia Forense 23
vro. Os estudantes devem procurar em
24 Matthew T. Huss
quiatras são licenciados para prescrever
outras fontes se tiverem interesse nesses
aspectos da relação entre a psicologia e a
lei (p. ex., Brewer e Williams, 2005; medicação e enfatizar esse aspecto nos
Roesch, Hart e Ogloff, 1999; Schuller e cuidados ao paciente. Tradicionalmen te,
Ogloff, 2001; Weiner e Hess, 2006). os psicólogos não dirigem seu foco para
Neste livro, vamos nos concentrar em a administração de medicação, es
uma definição mais estrita de psi cologia pecificamente medicação psicotrópica, e,
forense, que se concentra unica mente na em vez disso, focalizam a avaliação e o
prática da psicologia clínica. Nossa tratamento dos que são mentalmente
definição de psicologia forense vai focar doentes (ver Capítulo 2). Os psicólogos
a interseção entre a psicologia clínica e o também têm geralmente um treinamen
direito. A prática clínica da psicologia to mais amplo na condução de pesqui sas
focaliza, em geral, a avalia ção e (Grisso, 1993) e, assim sendo, estão mais
tratamento dos indivíduos dentro de um aptos a examinar muitas das ideias que
contexto legal e inclui conceitos como vamos discutir neste livro. Haverá
psicopatia, inimputabilidade, ava liação alguns aspectos em que nos deteremos e
de risco, danos pessoais e respon que são relevantes tanto para a psico
sabilidade civil (Huss, 2001b). Além dis logia forense quando para a psiquiatria
so, evitaremos em geral os tópicos que forense. No entanto, discutiremos tais
são mais característicos da psicologia aspectos partir da perspectiva do psicó
policial (perfil criminal, adequação para logo forense.
avaliações de responsabilidade, nego
ciação de reféns) ou da psicologia peni História da psicologia forense
tenciária, que tem seu foco em questões
pertinentes a instituições correcionais A psicologia forense tem uma história
(prisões e cadeias), mas não servem di profunda e extensa que se desenvolveu
retamente como ajuda aos tribunais. muito antes da cultura popular começar
Ao utilizarmos essa definição de a focar nela. Veja a Tabela 1.1 para uma
psicologia forense, também devemos breve lista dos eventos importantes no
diferenciar a prática da psicologia foren desenvolvimento da psicologia forense.
se da psiquiatria forense. Os psicólogos Hugo Munsterberg é geralmente identifi
clínicos e de aconselhamento são geral cado como um dos primeiros psicólogos
mente confundidos com os psiquiatras. a aplicar os princípios psicológicos ao
Embora tanto os psicólogos quanto os direito em seu livro On the Witness Stand
psiquiatras sejam treinados para auxi liar [No banco das testemunhas] (1908). O
os indivíduos com doença mental e psicólogo alemão William Stern também
dificuldades emocionais em geral, direcionou o foco para a aplicação dos
existem diferenças significativas (Gris so, princípios psicológicos ao sistema legal
1993). Psiquiatras são doutores em por meio do estudo da identificação de
medicina e obtêm graus MDs ou DOs. testemunhas oculares no início dos anos
Os psicólogos tipicamente obtêm PhDs de 1900. Contudo, a prática clínica da
ou PsyDs. Por consequência, os psi psicologia em sua relação com o sistema
legal começou mais ou menos na mesma rense se originou com Lightner Witmer
época. A prática clínica da psicologia fo
Psicologia Forense 25

Tabela 1.1 Eventos importantes no desenvolvimento da psicologia


forense 1908 Publicação de On the witness stand, de Hugo
Munsterberg 1908 Lihtner Witmer ministra cursos sobre a psicologia do crime
1909 Fundação do Instituto Psicopático Juvenil de Chicago
1921 Psicólogo tem a permissão de testemunhar como perito em Estado vs.
Motorista
1962 Psicólogos puderam testemunhar em casos de insanidade em Jenkins vs.
Estados Unidos
1969 Criação da Sociedade Americana de Psicologia Jurídica
década de 1970 Fundação de periódicos especializados que publicam artigos exclusivos de
psicologia forense
da corte como Estado vs. Motorista ten
deram a legitimar a profissão, criaram
e William Healy. Witmer começou como um mercado para os psicólogos forenses
professor dos cursos de psicologia do cri e indicaram que o sistema legal recorria
me no início dos anos de 1900, e Healy à psicologia como outro instrumento
fundou o Instituto Psicopático Juvenil de para chegar a resultados justos e legais.
Chicago, em 1909, para tratar e avaliar Entretanto, foi uma decisão da Cor te de
delinquentes juvenis (Blackburn, 1996; Apelação no Distrito de Columbia,
Brigham, 1999), servindo, assim, como Jenkins vs. Estados Unidos (1962), que mar
os primeiros exemplos significativos de cou um momento decisivo ainda mais
psicólogos clínicos forenses. significativo para todo o campo da psico
Quando a psicologia, especificamen te a logia forense. Em Jenkins, a corte determi
prática da psicologia forense clínica, nou que fosse reconhecido o testemunho
começou a se desenvolver na América psicológico para determinar a responsa
do Norte, durante o século XX, os psicó bilidade criminal (isto é, inimputabili
logos foram chamados para aplicar seus dade). Agora os psicólogos forenses tes
conhecimentos rudimentares ao siste ma temunham rotineiramente em casos de
legal como testemunhas peritas (ver inimputabilidade após avaliarem os réus.
Capítulo 3). Por exemplo, foi permitido Essas avaliações são necessárias para de
que um psicólogo testemunhasse como terminar se os acusados exibiam aptidão
testemunha perita nos Estados Unidos mental suficiente no momento dos seus
em Estado vs. Motorista (1921) sobre crimes para serem responsabilizados por
delinquência juvenil (conforme citado eles. Antes da decisão de Jenkins, o teste
em Johnstone, Schopp e Shigaki, 2000). munho psicológico sobre inimputabilida
Embora a corte tenha rejeitado o teste de tinha sido excluído de um modo geral
munho posteriormente (Johnstone et al., em favor do testemunho de médicos e
2000), ainda assim esse acontecimento psiquiatras (Van Dorsten, 2002). Jenkins
foi um passo importante no desenvol foi um dos primeiros exemplos em que a
vimento da psicologia forense. Decisões lei e o sistema legal influenciaram tanto a
pesquisa quanto a prática da psicologia forense provavelmente ainda não está
forense. Especificamente, pode-se dizer
que a decisão em Jenkins levou a uma
explosão da psicologia forense nos Esta clara para você. Uma maneira de obter
26 Matthew T. Huss uma ideia melhor é examinarmos as
principais áreas da psicologia forense e
dos Unidos durante as décadas de 1960 e as próprias leis em si. Tipicamente, a
1970, porque os tribunais admitiram uma psicologia forense pode ser dividida em
variedade de testemunhos não médicos aspectos criminais e aspectos civis (ver
(Loh, 1981). Embora o sistema legal ca Tabela 1.2 para exemplos de psicologia
nadense possivelmente tenha sido menos forense em ambos). Essa divisão dos pa
predisposto a permitir que psicólogos péis e tarefas da psicologia forense está
testemunhassem no tribunal, tem havido baseada na separação legal entre o direi
mudanças em anos recentes para aumen to civil e criminal. O direito criminal tem
tar o seu envolvimento (Schuller e Ogloff, seu foco nos atos contra a sociedade, e é
o governo que assume a responsabilida
2001). Agora que os psicólogos estão sen
de de se encarregar dos assuntos crimi
do cada vez mais utilizados pelo sistema
nais por meio de oficiais da lei e promo
legal, vários outros sinais apontam para o
tores. O foco do direito criminal é punir
crescimento do campo. A maior e possi
os infratores para manter um senso de
velmente mais proeminente organização justiça na sociedade e prevenir o crime.
profissional em psicologia forense, a So O assassinato que ocorreu na noite pas
ciedade Americana de Psicologia Jurídi sada ou o assalto na rua são considera
ca, foi fundada em 1969 e já atinge mais dos violações das leis criminais porque
de 3.000 membros (Grisso, 1991; Otto e nós, como sociedade, não consideramos
Heilbrun, 2002). Além disso, vários esse comportamento adequado e consi
periódicos de psicologia relacionados ao deramos as violações das leis criminais
tema forense, como Law and Human como um delito contra qualquer um de
Behavior e Behavioral Sciences and the Law nós. O estado, ou o governo, age em
começaram a ser publicados na década nome da sociedade como autor de um
de 1970 (Melton, Huss e Tomkins, 1999). processo e apresenta uma acusação con
Todos esses avanços sugerem uma profis tra um réu quando considera que um in
são vibrante e em crescimento. divíduo violou a lei criminal.
Existem inúmeras questões legais
específicas do direito criminal que fre
Principais áreas da quentemente desempenham um papel
psicologia forense
No entanto, a natureza da psicologia

Tabela 1.2 Exemplo de áreas da prática forense no direito civil e


criminal Direito criminal Direito civil
Avaliação de risco no momento da sentença Guarda dos filhos
Inimputabilidade e responsabilidade criminal Responsabilidade civil
Capacidade para se submeter a julgamento Danos pessoais
Tratamento de agressores sexuais Indenização a trabalhadores Transferência do
jovem para tribunal adulto Capacidade para tomar decisões médicas
cessariamente o bem público. Se eu me
envolver em um acidente de carro por
importante na prática da psicologia fo que estou dirigindo em alta velocidade e
rense. Por exemplo, mens rea é um prin atropelo outra pessoa, posso ser con
cípio de responsabilidade criminal que siderado civilmente responsável porque
está relacionado ao estado mental de um prejudiquei aquela pessoa de alguma
indivíduo. Mens rea, ou mente culpada, Psicologia Forense 27
significa que um indivíduo cometeu um
ato ilegal intencionalmente ou proposi maneira. Os atos ilícitos se enquadram
talmente. Esse princípio sugere culpabi no direito civil e consistem de um ato
lidade. Embora os psicólogos não sejam injusto que causa prejuízo a um indiví
chamados para dar opinião em todos os duo. Além disso, fica a critério da pes soa
casos criminais quanto à questão de o que foi prejudicada tomar ou não
réu ser ou não uma mente culpada, eles alguma atitude, não da sociedade. Os
são chamados em situações específicas. atos ilícitos consistem de quatro elemen
Essas situações geralmente têm seu foco tos legais diferentes ou exigências legais
no tema da inimputabilidade. Em casos para que tenha ocorrido uma violação
de inimputabilidade, é responsabilida de do direito civil. Para que um ato ilícito
do psicólogo forense auxiliar a corte a tenha acontecido: (1) o indivíduo deve
identificar se o acusado sofria de uma ter responsabilidade; (2) essa responsa
doença mental e se esta o impedia de bilidade deve ter sido violada; (3) a vio
formar mens rea e, portanto, de cometer o lação daquela responsabilidade deve ser
crime intencionalmente. Outros exem a causa próxima de um dano sofrido e
plos relevantes no direito criminal in (4) deve ocorrer um dano e ele tem que
cluem quando um jovem ou uma pessoa envolver um direito legalmente protegi
com retardo mental está enfrentando a do (Douglas, Huss, Murdoch, Washing
pena de morte. Casos recentes na Corte ton e Koch, 1999).
Suprema decidiram que criminosos com Para que um ato ilícito tenha ocor rido
menos de 18 anos (Roper vs. Simmons, no acidente de carro que exempli fiquei
2005; Quadro 1.1) e acusados que so frem anteriormente, eu já deveria ter uma
de retardo mental (Atkins vs. Virgi nia, responsabilidade. É reconhecido em
2002) não têm capacidade suficiente para geral que operadores de veículos
formar mens rea e ser legalmente automotores têm o dever ou responsabi
responsáveis por um crime capital. Des lidade de não colidir com outros moto
sa maneira, não podem ser executados. ristas ou de obedecer mais apropriada
Em contraste, toda a violação da lei mente os regulamentos de tráfego. Por
civil é considerada ofensa contra um exemplo, eu tenho a responsabilidade
indivíduo. O direito civil se refere aos ou o dever de dobrar à esquerda somen
direitos e reparações privados, não ne te quando estiver acesa a luz verde do
semáforo ou desde que não haja tráfego tado de negligência. A negligência ocor
na outra direção. Se eu colidisse com ou re quando um indivíduo está abaixo de
tro motorista por ter dobrado enquanto um nível comum ou razoável de cuida
o semáforo estava vermelho, iria contra do. Então, mesmo que não pretendesse
aquela responsabilidade. Uma quebra dobrar quando o sinal estava vermelho,
do dever pode ser intencional ou resul isso pode ter sido negligente da minha
28 Matthew T. Huss

Quadro 1.1 Uma decisão da suprema corte em Roper vs.


Simmons (2005)
em que eu estiver dobrando à esquerda
O tema da mens rea fez parte da decisão his
no sinal vermelho, espatifar-se no carro
tórica em Roper vs. Simmons (2005). Em 1993,
do queixoso e depois eu colidir com ele,
Christopher Simmons planejou e executou o
assassinato de Shirley Crook, 7 meses antes a minha violação das regras de trânsito
de ele completar 18 anos. Além do mais, o cri não será a causa próxima do seu carro
me não foi repentino e impulsivo. Simmons danificado. O meteoro gigante que cai
explicou seu plano em grandes detalhes a do céu é a causa próxima do prejuízo,
dois dos seus amigos a quem tentou envolver muito embora eu possa ter cumprido os
no plano. Ele lhes disse que ia arrombar uma ponte e ela se afogou. Christopher Simmons
casa, roubá-la, amarrar uma vítima e atirá-la foi preso em seguida, logo após ter se van
de uma ponte. Ele inclusive se gabou de que gloriado para os amigos sobre ter matado a
eles se dariam bem com isso porque eram Sra. Crook, foi condenado por assassinato e
menores de idade. Em 9 de setembro de 1993, sentenciado à morte.
Simmons e seus amigos se encontraram para Na apelação, seus advogados argumen taram
executar o plano. No entanto, um deles deci que a imposição da pena de morte a um
diu não participar. Dessa forma, Simmons e menor de idade era cruel e uma punição
o seu único cúmplice, Charles Benjamin, fo incomum porque ele não possuía a capacida
ram até a casa de Shirley Crook. Eles arrom de mental ou mens rea para entender o crime
baram a casa, amarraram a Sra. Crook com e a sentença. A Associação Americana de Psi
uma fita adesiva, colocaram-na dentro da sua cologia apresentou uma síntese amicus curiae
própria camionete e dirigiram até um parque perante a corte de que o corpo de pesquisas
estadual próximo, onde a atiraram de uma científicas indicava claramente que os meno
res (indivíduos com menos de 18 anos) não
tinham a capacidade de assumir responsabi
lidade total pelos seus atos. A Suprema Corte
dos Estados Unidos concordou e declarou ofi
parte porque uma pessoa razoável não cialmente que a pena de morte representava
teria dobrado naquele momento. Para uma punição cruel e incomum para menores
que seja atingido o terceiro elemento de devido a sua capacidade mental insuficiente
um ato civil ilícito intencional, a viola para entender plenamente as suas ações.
ção do dever deve ser a causa próxima
do dano provocado pelo acusado. Cau sa
próxima é normalmente considerado
como algo que se segue naturalmente ou dois primeiros elementos do ato ilícito.
ocorre em uma sequência ininterrup ta Para que ocorra um prejuízo, o outro
dos acontecimentos. Se um meteoro motorista deve sofrer danos em seu car
gigante cair do céu no exato momento ro, ser ferido física ou psicologicamen te
ou sofrer algum outro tipo de dano. aspectos criminais da psicologia, e os
Nesse exemplo, se eu tivesse me enqua estudantes expressam maior interesse
drado nos três primeiros elementos de pelos aspectos criminais da psicologia
um ato ilícito, mas apenas tivesse bati do forense. Contudo, os aspectos civis da
no para-choque do outro motorista e psicologia, forense são amplamente es
não houvesse danos ao carro ou à sua tudados, especialmente porque o direi to
pessoa, não teria ocorrido um ato ilícito civil constitui uma porção maior da
porque ele não sofreu nenhum prejuízo.
Psicologia Forense 29
O direito civil geralmente reconhece que
deve haver danos porque um dos
propósitos da lei civil é compensar a ví ferentes são organizados de modo pa
tima pelo dano sofrido e ainda restau ralelo. As cortes estaduais tipicamente
rá-la ao seu estado anterior, seja física, têm algum tipo de nível de entrada ou
psicológica ou financeiramente (Dou glas tribunal de primeira instância, as varas
et al., 1999). distritais, que permitem um processo de
apelação e têm um tribunal que funcio na
como a corte mais superior naquele
No direito civil, uma das partes, o estado, normalmente a Suprema Corte.
querelante, deve impetrar uma ação O sistema federal dos Estados Unidos
contra alguém que violou seus direitos, está organizado de modo similar. Exis
o acusado. No exemplo acima, presuma tem os tribunais de primeira instância
que a minha companhia de seguros e eu em nível de entrada, as cortes distritais.
nos recusássemos a compensar a pessoa Também existe uma variedade de dife
pelos danos causados. O querelante, a rentes tipos de cortes de apelação.
pessoa que atingi com meu carro, deve Além disso, a Suprema Corte dos
entrar com um processo contra mim e Estados Unidos é a mais alta corte de
argumentar que causei o acidente de apelações nos Estados Unidos.
carro que resultou nos seus prejuízos. Frequentemente existe certa confu são
Nesse caso, um psicólogo forense deve sobre esses dois tipos de sistemas legais
avaliar o querelante para ver se sofreu e as suas jurisdições máximas. Em
algum dano psicológico. Por exemplo, o geral, uma violação do código criminal e
querelante pode sofrer de transtorno de civil estadual ou local será levada à cor te
estresse pós-traumático (TEPT) e ter estadual. Uma violação da lei federal
medo de dirigir ou sentir uma ansiedade levará à corte federal. Entretanto, nem
significativa quando dirige. Ele poderia sempre fica claro qual jurisdição deve
reivindicar ser indenizado pelo seu trau
ma emocional e pelo custo de alguma
assistência psicológica que procurasse. Sistema Judiciário
Boa parte deste livro vai enfocar os
12 e 13) e a dis cussão dos
prática forense. Assim, aspectos civis de diferentes
alguns capítulos Estrutura do
tópicos, como a
focalizarão quase que capacidade (Capítulo 8).
sistema legal
exclusivamente as
Uma noção sobre a
questões civis (Capítulos
estrutura do sistema legal Apelação
pode ser útil a esta altura.
Nos Es tados Unidos, Cortes Trial
existem dois tipos de sis Jurisdição
Geral/Especial
temas de julgamento, as
cortes estaduais Tribunais Federais

Suprema Corte
dos EUA

Corte de Apelação
Tribunais Estaduais Cortes

Supremas Cortes Distritais

Cortes Intermediárias de
e as cortes federais (ver Figura 1.2). Em ou menos favoráveis a uma das partes
alguns aspectos, esses dois sistemas di envolvidas no processo. Também exis
Figura 1.2 O sistema judiciário nos
Estados Unidos.
30 Matthew T. Huss tem muitos exemplos específicos em que
as cortes federais têm jurisdição, como
assumir um determinado caso. A batalha quando uma questão constitucional é
legal entre a antiga pôster da Playboy e central para um caso ou existe uma dis
atriz Anna Nicole Smith e os filhos do puta entre dois estados. No entanto, as
seu falecido marido em relação à herança decisões da Suprema Corte dos Estados
dele é um exemplo sobre o qual se dis Unidos nem sempre estão vinculadas a
cute para qual jurisdição o caso deve ser todas as cortes estaduais. Por exemplo,
encaminhado (ver Quadro 1.2). Nesse em um caso que discutiremos no Capí
caso, uma das discussões era se o caso tulo 3, que focava a admissibilidade do
deveria ser julgado na Califórnia ou no testemunho de um especialista, Daubert
Texas. Essa questão é importante porque vs. Merrell Dow (1993), os estados não
cada estado tem leis diferentes que legis tiveram que seguir a decisão da Supre
lam sobre testamentos e podem ser mais ma Corte porque envolvia uma inter

Quadro 1.2 O caso Anna Nicole Smith


ganhou fama inicialmente como coelhinha da
Anna Nicole Smith é relevante para a nossa Playboy, mas depois apareceu em comerciais
discussão da psicologia forense devido ao seu nacionais, teve seu próprio programa de tele
caso nos tribunais, que envolveu duas cortes visão e fez vários filmes. Diz-se que o bilioná
estaduais diferentes e o sistema da Justiça Fe rio J. Howard Marshall prometeu se casar
deral. Antes da sua morte, em 2007, Anna Ni com a Srta. Smith em inúmeras ocasiões
cole Smith era modelo, atriz e celebridade que depois que ele a conheceu em um clube de
strip-tease, antes que ela ganhasse fama. assumir um determinado caso pode
Depois do seu divórcio, ela se casou com ainda ser ditado pelos oficiais da força
Marshall, de 89 anos, quando tinha 26 anos.
policial ou promotores. Em al guns
Muitos suspei tavam que aquele era um
casamento de con veniência devido à casos é deles o critério se um réu em
disparidade de idades e à saúde de Marshall. particular será acusado por um crime
As questões legais começaram 13 meses estadual ou federal, embora ele tenha
depois do casamento, quando Marshall mor co metido apenas um ato. A opção
reu. A Srta. Smith requeria metade dos bens
posterior do promotor vai ditar o
do falecido marido, muito embora tivesse
ficado fora do seu testamento. Essa ação le sistema de corte que atenderá o caso.
vou a uma disputa com um dos filhos do seu Um último ponto deve ser comenta
marido, E. Pierce Marshall, que continuou do. A maioria das pessoas acredita
por uma década em várias cortes estaduais que os legisladores nos EUA
e cortes federais. Em 2000, lhe foi concedido
elaboram leis ao proporem projetos e
meio bilhão de dólares por um tribunal da
Califórnia, mas foram negados todos os pro então as fazem passar com algum tipo
ventos dos bens de J. Howard Marshall por de voto da maio ria. No entanto, as
um tribunal do Texas, e ordenado que ela pa leis podem se origi nar tanto dos
gasse um milhão como honorários legais a E. legisladores quanto dos tribunais.
Pierce Marshall.
Quando um governo estadual ou
Como agora havia um conflito entre
duas cortes estaduais diferentes, a batalha foi federal põe em vigor uma lei legisla
transferida para a Justiça Federal. Em 2002, tivamente, ela é chamada de lei
uma corte federal reduziu o que ela recebe codifica da. A jurisprudência é uma
ria para 88 milhões, mas posteriormente isso lei derivada de interpretação judicial
foi completamente revertido pela 9ª Corte de
da lei codifica da existente ou de
Apelações, quando esta decidiu que a Srta.
Smith não era herdeira legítima e que não de situações em que não existe uma lei
veria receber nenhum bem. Entretanto, nessas formal. Tanto a lei codifi cada quanto a
disputas entre estados, a Suprema Corte dos jurisprudência possuem peso igual.
Estados Unidos dá a palavra final. Em 2006, a Às vezes, a jurisprudência é chamada
Suprema Corte decidiu por unanimidade a
de common law, mas a common law
favor da Srta. Smith, concluindo que ela tinha
direito a requerer uma parte dos bens do seu está baseada não somente em deci
marido e que a decisão não lhe concedera sões judiciais anteriores como também
uma parte dos bens. Embora as duas partes nos costumes e na tradição. A tradição
no caso já tenham falecido, E. Pierce Marshall da common law das leis feitas pelos juí
em 2006 e Anna Nicole Smith em 2007, seus
zes difere do processo em muitos
herdeiros continuam a batalha legal e o caso
permanece sem solução. outros países. O termo common law
sugere uma origem na Inglaterra e
países que ante riormente eram
pretação federal da lei, não uma colônias do império bri tânico. Irlanda,
questão constitucional. Entretanto, as Austrália, Canadá (exce to Quebec) e
cortes es taduais geralmente acatam a Estados Unidos são citados
Suprema Corte dos Estados Unidos Psicologia Forense 31
quando ela apresenta uma decisão,
mesmo que não esteja vinculada a como países de common law porque
elas. O sistema de cor te que pode mui tos dos seus sistemas legais
refletem a noção de que os juízes têm de polícia, agências do governo
autoridade para criar a lei. estadual e federal
32 Matthew T. Huss

Carreiras na psicologia
e até mesmo nas faculdades e universi
forense
dades. Em qualquer um desses
Quando o sistema legal começou a re cenários um psicólogo forense pode
conhecer o benefício da psicologia, as trabalhar como administrador,
oportunidades de carreira também se terapeuta, pesqui sador ou avaliador
ampliaram (Roberson, 2005). Como va de políticas. Uma boa fonte de
mos discutir no Capítulo 2, os psicólo informação sobre as carreiras em
gos forenses tipicamente se envolvem psicologia forense e o campo mais
em três atividades principais: amplo da psicologia e direito está
avaliação, tratamento e consultoria. dispo nível no APLS (Bottoms et al.,
Por exemplo, um psicólogo forense 2004).
pode avaliar um acusado para
estabelecer a imputabili dade As relações entre
(Capítulo 7) ou tentar determinar o
melhor interesse de uma criança em
direito e psicologia
uma situação de custódia (Capítulo Lembre-se, eu disse que a psicologia
12). Um psicólogo forense pode tentar forense era a interseção da psicologia
res taurar a capacidade de um clínica e o direito. Tem havido muitas
acusado para que ele possa se tentativas de explicar as relações entre
submeter a julgamento (Capítulo 8). a psicologia e o direito. Essas
Um psicólogo forense pode avaliar tentativas vão desde a descrição
psicopatia em um indivíduo tripartite de Ha
(Capítulo 4) que poderia ser libertado ney (1980) – psicologia em direito, psi
da prisão como parte de uma cologia e direito e psicologia da lei –
avaliação de risco para determinar o até a teoria de Monahan e Walker
seu poten cial para violência futura (1988), que aponta que a ciência social
(Capítulo 5). O psicólogo forense recai so bre a autoridade social, o fato
pode, então, ter que testemunhar em social e a estrutura social. Não vou
uma audiência ou jul gamento a me deter na abordagem dessas
respeito dos seus achados. Contudo, a teorias, mas é impor tante saber que,
maioria das questões legais é nos dois exemplos, es ses especialistas
resolvida sem que o psicólogo foren se defenderam a aplicação da pesquisa
testemunhe como perito (Capítulo 3). em ciências sociais para au xiliar o
Com a emergência da psicologia foren sistema legal. Uma conceituali zação
se, surgiu um leque ainda mais amplo teórica mais recente da relação entre a
de opções de carreira. Os psicólogos fo psicologia e o direito que vamos
renses trabalham em uma variedade utilizar neste livro é algo chamado
de contextos, tais como cadeias e juris prudência terapêutica. A
prisões, hospitais estaduais, agências jurisprudência terapêutica (JT) foi
definida como “o uso das ciências probabilidade de que aquele acusado
sociais para estudar até que ponto perpetre o crime no futuro. Se uma
uma regra ou prática legal promove o corte de apelação de cidir que existe
bem-estar psicológico e físi co das sigilo paciente-cliente para os
pessoas que ela afeta” (Slobogin, psicólogos, os clientes podem se
1996, p. 767). A jurisprudência terapêu dispor mais a compartilhar
tica inclui não só o impacto da lei informações com o seu terapeuta. As
leis de respon sabilidade civil de um
codifi
estado particu lar podem ser escritas
de modo que os sem-teto tenham
maior probabilidade de ser civilmente
cada ou da jurisprudência, mas responsabilizados por que eles são um
também o processo legal menos perigo para si mesmos sob condições
formal que pode focar as ações dos severas de incapacidade
juízes ou advogados. Como a JT se
espalhou, ela também tem sido
aplicada de modo mais geral para
de provisão. Todos esses são exemplos
sugerir algum outro modo pelo qual a
em que podemos examinar a lei a
lei possa ser terapêutica (útil de
alguma maneira) ou antiterapêutica partir da perspectiva da JT e, o que se
(detrimen tal de alguma maneira). espera, melhorar a administração e
Além disso, a aplicação da JT não aplicação da lei. Neste livro, a JT será
infere que uma ação particular deva importan
ter algo a ver com psi te porque vai enfatizar como a lei
coterapia ou mesmo a psicologia pode ter consequências reais sobre
clínica em geral. Isso significa que a algum as pecto da psicologia forense,
lei pode ter um impacto fora da rotina intencional mente ou sem intenção. A
da culpa ou inocência de um acusado lei pode ser uma entidade viva que
ou a negligên respira, e essa constatação é
cia de um acusado em uma causa civil. importante para o nosso estudo da
A JT sugere que a lei importa além das psicologia forense. Os psicó logos
leis de uma sala de audiências e pode forenses devem estar conscientes das
ter um impacto profundo na prática consequências da lei e do sistema
da psicologia forense e em nossas legal quando dão assistência aos tri
vidas que vai muito além do que nós
bunais. A JT será usada como modo de
rotinei
destacar o impacto da lei na prática da
ramente imaginamos.
psicologia forense. A JT não é
Há uma variedade de maneiras pe
certamen te a única maneira de tornar
las quais o sistema legal pode ter um
isso claro e, para ser honesto, não
im pacto benéfico ou detrimental nas
existe nada de tão profundo em
pes soas que ele afeta. Por exemplo, se
um relação à JT. A ideia da jurisprudência
juiz nunca obriga a tratamento os per terapêutica simplesmen te destaca
petradores de violência doméstica que algumas formas importantes pelas
se apresentam diante dele, isso pode quais a lei pode ter ramificações
ter um impacto negativo na positivas e negativas na prática da psi
cologia forense e formas pelas quais a direito usa o sistema adversarial, pelo
psicologia forense pode dar assistência menos em países da Comunidade
ao sistema legal. Britânica, como Estados Unidos,
Canadá, Reino Unido e Austrália, nos
quais se espera que os dois lados
O conflito entre o opostos esforcem-se ao máxi
direito e a psicologia mo para chegar à vitória. Espera-se
que a verdade seja revelada como
Algumas pessoas poderiam
resultado do esforço desses dois lados
argumentar que a interseção entre a
em darem o melhor de si. Essa
psicologia e o direito é na verdade abordagem frequen
uma colisão. A psi cologia e o direito temente entra em conflito com a
são duas disciplinas muito diferentes psicolo gia, que, ao contrário, usa a
que abordam a solu ção dos experimen tação, por meio da
problemas de maneiras também pesquisa objetiva. Embora haja vezes
muito diferentes. Haney (1980) e em que é introduzida a parcialidade
Ogloff e Finkelman (1999) no processo empírico, a intenção é
identificaram vários conflitos entre a revelar uma verdade objetiva. O
psicologia e o direito. direito e a psicologia também diferem
Psicologia Forense 33 pois, enquanto a psicologia é descriti
va, o direito é prescritivo. A psicologia
Em geral, o direito tende a ser dogmá descreve o comportamento humano, e
o direito dita ou prescreve como os hu-
tico, e a psicologia tende a ser baseada
34 Matthew T. Huss
empiricamente. Essa dicotomia sugere
que o direito está baseado nos
preceden tes. O princípio de stare manos devem se comportar. Outra dife
decisis, manter a decisão, está no rença fundamental entre os dois é que
cerne da lei. A lei se ba seia muito em a psicologia é nomotética e o direito é
decisões legais anteriores e é ideográfico. A psicologia focaliza o
resistente a mudar aquelas decisões agre gado ou as teorias amplas que
anteriores. O sistema legal está organi podem ser generalizadas para
zado hierarquicamente, com regras e inúmeros casos. O direito focaliza um
procedimentos específicos. A caso individual ou um padrão
psicologia, por outro lado, tem seu específico de fatos. Por fim, a
foco na reunião de inúmeras psicologia é probabilística e o direito é
informações, com conclu sões que definitivo. A psicologia fala da
podem ser alteradas ao longo do probabili dade de ocorrer um
tempo, pois a pesquisa examina uma determinado evento ou não se trata de
determinada questão segundo diferen um erro aleatório que a ocorrência de
tes perspectivas. A psicologia aceita um determinado evento. Em
que é provável haver mudanças contraste, o direito tenta ser certeiro,
durante a nossa busca da verdade. direto. Um réu é culpado ou inocente.
Esses dois sistemas também dife Cada uma das evidências é admissível
rem na maneira como chegam à ou não é admissível.
verdade quando a compreendem. O É claro que todas essas diferenças
são artificiais de certo modo, porque e vamos examiná-los ao longo de todo
são conceitualizadas como uma este livro.
dicotomia e não uma dimensão.
Nenhuma dessas diferenças é
verdadeira para cada disci Educação e treinamento
plina em todos os casos, mas elas são, em psicologia forense*
em geral, mais verdadeiras para uma
disci plina do que para outra. E o que é Como me torno um
mais importante, essas diferenças vão psicólogo forense?
até o cerne do conflito entre essas
duas disci plinas e com frequência A questão de como se tornar um
causam conflito para os psicólogos psicólo go forense é complexa. Além
que escolhem traba lhar dentro do disso, fazer essa pergunta pode
sistema legal. Por exem plo, uma colocar o proverbial carro diante dos
advogada de defesa local certa vez me bois. Por exemplo, quan tas pessoas
pediu para testemunhar em um caso crescem ouvindo a pergunta: “O que
em que uma mulher tinha agredido você quer ser quando crescer?”. Todos
seu marido. Fazendo isso, ela queria nós já ouvimos isso uma vez ou outra.
que eu testemunhasse sobre a Quantos de nós respondemos di
relevância da síndrome da mulher zendo: “Eu quero ser um estudante
espancada (ver Ca pítulo 3) para esse
uni versitário!”. É bastante improvável
caso. Entretanto, exis tem poucas
que algum de nós tenha dado essa
pesquisas científicas válidas que
resposta, mesmo se soubéssemos
garantam qual a constelação pecu liar
quando crianças o que era uma
de traços que foram descritos como a
síndrome da mulher espancada (SME) universidade. Entretanto, quem está
e as características que a separam do interessado em ser um psicó logo
TEPT. forense deve se dar conta de que
existe um meio (universidade) para
atin-
Contudo, ela estava convencida de que
a SME era a melhor estratégia para o
* N. de R.: Os programas de ensino aqui
jul gamento nesse caso, e não se descritos são disponibilizados nos EUA.
importava que houvesse pouco
embasamento cien tífico para isso. Seu
trabalho era defen der a sua cliente. O gir o objetivo (tornar-se um psicólogo
meu trabalho era apresentar a fo rense) e que a pós-graduação pode
pesquisa científica objetiva mente. Por não ser para todos.
fim, eu não testemunhei no caso Se você está interessado em se tornar
sobretudo porque a advogada não um psicólogo forense, precisará buscar
queria que eu testemunhasse de admissão em um programa de pós-gra
acordo com a minha interpretação da duação em psicologia. Contudo, a natu
literatura científica. A psicologia reza do programa será tão variada
forense está reple ta desses tipos de quan to os papéis e responsabilidades
conflitos entre a psico logia e o direito, dos psicólogos forenses. A primeira
pergunta que você deve se fazer: Um profundidade da prática e a
doutorado ou mestrado é a melhor capacidade de praticar com maior in
opção para mim? Existem várias dependência, dependendo de onde
publicações diferentes que falam das você mora e das leis que governam a
vantagens e desvantagens dos prática da psicologia. Essas vantagens
programas de mestrado e doutorado podem ser acentuadas na psicologia
em geral (p. ex., Actkinson, 2000). forense, es pecificamente devido à
Além dessas considerações gerais, necessidade de avaliação e
existem al gumas questões específicas habilidades para avaliação na prática
da psicologia forense que devem ser forense.
levadas em con sideração. A maioria
dos estudantes in teressados na Modelos de
psicologia forense tem seu foco na treinamento em
obtenção de um grau de doutora do
psicologia forense
(PhD ou PsyD). Embora os programas
de doutorado proporcionem maior Programas de graduação conjunta. A pró
flexi bilidade profissional e tenham xima pergunta a ser feita depois de es
vantagens em relação aos programas colher o tipo de grau que você gostaria
de mestrado, você também pode de buscar é o modelo ou tipo de treina
planejar uma carrei ra viável na mento que você gostaria de ter. Muitos
psicologia forense depois de obter um estudantes acham que para se tornar
grau de mestrado. Além disso, os um psicólogo forense você precisa
programas de mestrado apresentam obter um diploma tanto em psicologia
padrões de admissão menos competiti quanto em direito (Melton et al.,
vos, levam menos tempo para ser con 1999). Eles então ficam frustrados
cluídos, permitem que você receba quando não conse guem ser admitidos
mais cedo um salário profissional, em um dos poucos programas de
podem ser mais abundantes em uma graduação conjunta. En tretanto, a
determinada área geográfica e têm graduação conjunta é apenas uma das
mais probabilida de de permitir um formas de se tornar um psicó logo
estudo de meio-turno. Além disso, forense e pode até não ser o melhor
pesquisas sugerem que não existem caminho. Além do mais, a admissão
diferenças salientes na qualida de geral em um programa de graduação
do serviço prestado por clínicos em conjun ta é muito competitiva devido
nível de mestrado e doutorado (Cla às altas exigências de admissão à
velle e Turner, 1980), embora essa maioria dos programas e à sua
respos escassez. Um pro grama de
Psicologia Forense 35 graduação conjunta é um pro grama
em que você obtém o grau tanto em
psicologia quanto em direito. Esse
ta não seja clara em relação ao trabalho
processo significa obter o típico grau
forense especificamente. No entanto, 36 Matthew T. Huss
aqueles que alcançam o grau de douto
rado têm em geral muitas vantagens
dis tintas em relação ao clínico com de advogado, um JD ou Juris Doctorate
nível de mestrado. Essas vantagens e PhD em psicologia. Algumas
incluem um maior alcance e escolas, como a Universidade do
Nebraska, ofe recem uma variedade
de combinações de graduação
(PhD/MLS e MA/JD). Atualmente tar incorrendo em despesas adicionais,
não existem programas de graduação como o pagamento por sua educação
conjunta no Canadá, mas os ou empréstimos educativos. Além do
estudantes em programas de psicolo mais, a obtenção de uma graduação
gia forense naquele país obtiveram in conjun
formalmente Bacharelado em Direito, ta não significa necessariamente que
o equivalente a JDs fora dos Estados você terá mais opções de carreira.
Unidos, durante o seu treinamento. Como mencionam Melton e
Um programa de graduação conjunta colaboradores (1999), empregos
pode ser vantajoso porque permite relacionados à psicolo
treina mento nas duas disciplinas gia podem ponderar se você vai ser
simultanea mente, o que aumenta as um advogado algum dia e os
chances de um entendimento empregos rela cionados a direito
verdadeiro da integração da podem ponderar por que você tem
psicologia e o direito. A formação esse PhD e como ele será útil na
dentro das duas disciplinas também prática do direito. Embora seja
aumenta as opções de carreira. necessário um conhecimento das leis,
Embora possa parecer atraente certamente não é preciso obter um di
graduar-se em direito e psicologia, ploma de advogado para adquirir esse
existem alguns in conhecimento e atuar como psicólogo
convenientes (veja Melton et al., 1999). forense. Em consequência, os
As desvantagens de seguir o cami nho estudantes devem pensar seriamente
da graduação conjunta se referem ao se a gradua ção conjunta é a melhor
tempo, custos e esforço que envolve a opção para que eles se tornem
obtenção de duas formações psicólogos forenses.
avançadas. Existe uma razão para que
esses progra mas sejam raros e tenham Programas de especialização.
padrões de admissão competitivos. Outro modelo de treinamento para
Eles simples mente não são para psicologia forense é participar de um
todos. É difícil tran sitar entre duas programa de pós-graduação que
disciplinas diferentes, muito mais forneça especia
duas diferentes faculdades, maneiras lização em treinamento forense.
de pensar ou até mesmo a lo calização
Nesses programas de especialização,
do campus. Você também fica na
os alunos focarão na obtenção de um
faculdade por mais tempo e, confor
grau em psi cologia clínica, mas
me apontei anteriormente, as crianças
também receberão algum treinamento
não crescem ansiando pela glória de
especializado em psicologia forense.
uma vida como estudante
O treinamento espe cializado pode
universitário. Enquanto está
consistir de seminários em temas
estudando, você não está tendo uma
forenses, prática ou estágios clínicos
renda profissional, você está vivendo
em ambientes forenses ou mes mo
em nível de pobreza e pode es
fazendo alguns cursos na escola de
direito. Os alunos que participam des
ses programas de especialização fre
quentemente se envolvem em muitas participaram de um programa geral
das mesmas atividades que os alunos em psicologia clíni ca ou
da graduação conjunta. Entretanto, aconselhamento. Eles podem ter
eles não vão preencher os requisitos Psicologia Forense 37
para
participado de uma prática na prisão
local, obtido uma residência pré-douto
obter um diploma em direito e rado em instituições forenses depois
poderão ter maior dificuldade com a de terem concluído seu trabalho final
integração da psicologia e o direito. ou tiveram uma oportunidade de
Um programa como o oferecido pela treina mento pós-doutorado depois
Universidade Simon Fraser em British que obti verem seu PhD. Embora
Columbia, no Canadá, é um exemplo nenhuma des sas opções tenha a
de um progra mesma profundidade do treinamento
ma com ênfase especial em psicologia forense que você recebe nos
forense. Os programas que oferecem programas de graduação conjunta e
ên fase em psicologia forense também de especialização, elas são mais abun
são mais abundantes do que os dantes e permitem mais abrangência
programas de graduação conjunta e de treinamento. Por exemplo, você
oferecem um treinamento mais pode entrar na graduação achando
abrangente em psico logia clínica em que de seja ser um psicólogo forense e
geral (ver Tabela 1.3). então percebe, depois de obter
alguma expe riência, que essa não é a
Programas gerais. A maioria dos melhor opção para você. Esses
psi cólogos forenses na verdade não programas gerais têm maior
obteve os seus diplomas em um probabilidade de permitirem que
programa de graduação conjunta ou você obtenha experiência em diversas
de especializa ção. Em vez disso, eles áreas da psicologia clínica e não o for

Tabela 1.3 Lista de programas de doutorado em psicologia forense por modelo


de treinamento
Programas de graduação conjunta Programas especializados Universidade Estadual
do Arizona (JD/PhD) Universidade Carlos Albizu, em Miami (PsyD)
Universidade Drexel/Escola de Universidade Drexel (PhD)
Direito da Universidade Villanova
(JD/PhD) Universidade Fordham (PhD)
Escola de Direito da Universidade
Golden Gate (JD/PhD)
Universidade do Arizona (JD/PhD) Escola Illinois de Psicologia Profissional (PhD)
Universidade do Nebraska (JD/PhD, Escola de Justiça Criminal John Jay
MLS/PhD, JD/MA) (PhD)

Universidade Widener (JD/PsyD) Universidade Nova Southeastern (PhD/PsyD) Escola


Pacific de Graduação em Psicologia (PhD)
Universidade Estadual Sam Houston (PhD)
Universidade Simon Fraser (PhD)
Universidade do Arizona (PhD)
Universidade de Nebraska (PhD)
38 Matthew T. Huss clínico em hospitais forenses, prisões e
instituições de detenção juvenil; prepa ro
çam a se focar na psicologia forense tão de avaliações forenses e testemunho
no início do seu desenvolvimento pro
fissional. Não está claro se alguma des
sas opções é superior às outras em todos como testemunha perita (Bersoff et al.,
os aspectos. Isso na verdade depende do 1997). Esse nível de especialização per
estudante individualmente e dos seus mite que os psicólogos clínicos que não
objetivos pessoais e profissionais. se especializaram em psicologia forense
se envolvam em alguns trabalhos foren
Níveis de treinamento forense ses restritos. Por exemplo, quem é psicó
Independentemente do modelo geral em logo infantil poderá realizar um número
que um programa se enquadra, Ber soff e limitado de avaliações para custódia. Os
colaboradores (1997) propõem três clínicos especialistas são o nível mais alto
níveis diferentes de treinamento que um desse treinamento teórico que consiste
programa clínico pode oferecer ao de uma experiência de treinamento in
treinar psicólogos forenses. O nível in tegrado concebida especificamente para
ferior é chamado de o clínico legalmente treinar psicólogos forenses. Os clínicos
informado, e está baseado na ideia de que
especialistas recebem amplo treina mento
todo o psicólogo deve estar preparado
em casos judiciais e habilidades de
para ser uma testemunha perita poten
prática forense em uma variedade de
cial e que os temas forenses fazem parte
diferentes populações de pacien tes.
da prática clínica geral. Um clínico le
galmente informado é aquele que não se Parece haver uma ênfase crescente na
autodenomina psicólogo forense, mas é especialização em psicologia foren se
instruído em algumas ideias forenses (Packer e Borum, 2003). Essa ênfase
fundamentais, já que a lei se aplica até pode não só incentivar os programas de
mesmo à prática na psicologia clíni ca. graduação, oferecendo treinamento fo
Um clínico legalmente informado é rense, mas também requer treinamento
instruído em assuntos de confidencia forense pós-doutorado e certificação em
lidade, sigilo profissional e respostas a um nível avançado de habilidade con
intimações judiciais no que se refere aos cedida por organizações como a Ame
seus registros clínicos (Packer e Borum, rican Board of Professional Psychology
2003). Esses tópicos seriam incluídos nos (ABPP). Além disso, deve ficar bem cla
cursos rotineiros oferecidos em pro ro que uma determinada quantidade de
gramas clínicos como a ética necessária, treinamento não possibilita que alguém
avaliação clínica e psicoterapia (Bersoff
exerça a psicologia forense. Para exercer
et al., 1997). O clínico com proficiência re
a psicologia forense, você deve ser licen
cebe treinamento especializado em psi
ciado como psicólogo clínico ou atuante
cologia forense, tal como: treinamento
em um determinado estado. Os estu aprovar leis, a jurisprudência também é
dantes devem se certificar de que qual derivada das decisões do tribunal.
quer programa, não importa o modelo Os psicólogos forenses se defrontam
ou nível de treinamento que ele subscre continuamente com o conflito natural
ve, produza graduados que atendam às entre o direito e a psicologia. Cada disci
exigências gerais para licenciamento e Psicologia Forense 39
possam realmente praticar a psicologia
clínica. plina tende a responder às perguntas de
formas diferentes. O sistema legal tende
a basear as decisões na razão humana,
enquanto a psicologia procura fornecer
Resumo
respostas por meio da experimentação.
Existe muita confusão a respeito da na Em consequência, muitas vezes surgem
tureza e prática da psicologia forense. A conflitos entre as duas disciplinas, e eles
confusão do público em geral é fre devem ser reconhecidos pelos psicó
quentemente o resultado da abundância logos forenses. Uma teoria que tentou
em referências da mídia e cultura po fazer uma ponte entre a psicologia e o
pular aos aspectos sensacionalistas da direito é a jurisprudência terapêutica
psicologia forense. O debate dentro da (JT). A JT reconhece o impacto do siste
psicologia quanto às fronteiras precisas ma legal na prática da psicologia clínica
da psicologia também continua e con
e procura aplicar a pesquisa psicológica
tribui para a confusão. Nosso foco será
ao sistema legal para promover o bem-
na psicologia clínica forense, e psicolo gia
-estar psicológico e físico daqueles in
forense será definida como a prática
divíduos que entram em contato com o
clínica da psicologia que tem o foco na
avaliação e tratamento de indivíduos sistema legal. A JT será usada durante
dentro de um contexto legal. A psicolo todo este livro para chamar a atenção
gia forense tem uma história antiga, mas para o impacto do sistema legal tanto na
se expandiu exponencialmente nos últi prática da psicologia forense quanto nas
mos 40 anos. pessoas que são pacientes e clientes
Uma parte importante da psicologia dentro do sistema de saúde mental.
forense é o conhecimento do sistema le Embora as imagens na mídia com
gal. O sistema legal pode ser dividido frequência sejam sensacionalistas,
em direito civil e criminal. Cada uma atualmente existe muito interesse pela
dessas duas áreas amplas do direito ser psicologia forense, e os estudantes es tão
ve a diferentes propósitos, e os psicó continuamente buscando respostas de
logos forenses que trabalham em cada como se tornar um psicólogo foren se.
uma dessas áreas se defrontarão com Existem muitas maneiras de alguém ser
questões e responsabilidades diferen tes. treinado como psicólogo forense. Os
Dentro do direito civil e criminal, o
estudantes podem tentar entrar em
sistema legal apresenta uma estrutu ra
programas de graduação conjunta, pro
hierárquica com uma variedade de tipos
gramas de especialização em psicologia
de cortes que servem a diferentes
forense ou programas de treinamento
propósitos. Embora os órgãos legislati
vos recebam rotineiramente o poder de geral em psicologia clínica ou aconse
lhamento. Na graduação, esses estu
dantes têm muitas oportunidades à sua disposição.
40 Matthew T. Huss ideográfico

Termos-chave
amicus curiae programa de graduação
atos ilícitos lei civil conjunta
avaliador de lei codificada psicologia clínica
políticas common law jurisdição psicologia forense
corte de jurisprudência stare decisis
apelação corte jurisprudência transtorno de estresse
distrital terapêutica mens rea pós-traumático
direito criminal nomotética (TEPT) vara distrital
perfil criminal
psychology: Models from the Villanova
Conference. American Psychologist, 52, 1301–
1310.
Leitura complementar Packer, I. K., & Borum, R. (2003). Forensic
training in practice. In A. M. Goldstein (Ed.),
Bersoff, D. N., Goodman-Delahunty, J.,
Handbook of psychology: Vol. 11. Forensic
Grisso, J. T., Hans, V. P., Poythress, N. G., &
psychology (pp. 21–32). Hoboken, NJ: Wiley.
Roesch, R. (1997). Training in law and

2 Avaliação, tratamento e
consultoria em
psicologia forense
devem lhe ser familiares se você já fez o
curso de psicologia clínica. A avaliação
forense normalmente consiste da avalia
ção de um indivíduo na tentativa de au
xiliar os tribunais na abordagem de uma
Até aqui você recebeu uma introdução à questão legal. Por consequência, existem
psicologia forense, mas neste capítulo inúmeras considerações éticas que são
iremos examinar mais de perto as prin peculiares à avaliação forense (ver Capí
cipais áreas envolvidas na prática da psi tulo 3 para uma discussão completa). A
cologia forense. A prática forense pode avaliação forense baseia-se em métodos
ser dividida em três áreas específicas: e instrumentos similares à avaliação te
avaliação, tratamento e consultoria. As rapêutica geral, mas também utiliza al
duas primeiras áreas não são únicas da guns métodos forenses específicos. Ao
psicologia forense, mas são centrais para discutirmos o tratamento psicológico no
a prática da psicologia clínica e, portanto, contexto forense, nos deteremos em
grande parte nos infratores criminais e
nos aspectos do tratamento que preci
sam ser especialmente considerados. A informações que permitam chegar a uma
terceira área, consultoria, é mais prová conclusão sobre a saúde mental do exa
vel de ocorrer na prática forense do que
minando, mas é também fazer isso com o
na prática clínica rotineira e, portanto,
objetivo de informar a corte (Nicholson,
pode não ser familiar. A consultoria é
1999). Conforme mencionado anterior
frequentemente ignorada, mas tem um
mente, esses métodos estão baseados nos
papel extremamente importante para os
mesmos métodos que os psicólogos clí
psicólogos forenses. Os psicólogos foren
nicos usam para avaliar todo indivíduo
ses geralmente auxiliam os advogados
que apresenta uma preocupação quanto
ou os próprios tribunais na compreensão
à saúde mental e consistem de entrevis
de aspectos do comportamento humano
tas, testagem psicológica e coleta de in
e saúde mental que não envolvem direta
formações de arquivo e de terceiros. A
mente a avaliação ou o tratamento de in
diferença é que, em um contexto forense,
divíduos. No entanto, o psicólogo foren
esses métodos assumem uma importân
se que presta consultoria está engajado
cia adicional porque têm implicações de
em um aspecto crucial da prática forense
longo alcance que vão muito além de um
que vem crescendo em âmbito e frequên
diagnóstico acurado e podem definir até
cia (Andrews, 2005).

Avaliação forense a liberdade da pessoa ou o bem-estar da


sociedade (ver Figura 2.1).
Quando se discute a avaliação a partir da
perspectiva da psicologia clínica (isto é,
uma avaliação terapêutica), o foco se dá Tarefas importantes na
na coleta de informações sobre um exa avaliação forense
minando para realizar um diagnóstico
Uma avaliação terapêutica se propõe a
ou chegar a uma conclusão sobre o seu
diagnosticar um indivíduo de modo que
funcionamento psicológico atual. Esse
possa ser realizada uma intervenção e
processo significa que quando os clientes reduzido o sofrimento da pessoa. Entre
entram no consultório de um psicólogo, tanto, uma avaliação forense é diferente
em um pronto-socorro ou hospital psi de uma avaliação terapêutica tradicional
quiátrico, os psicólogos os entrevistam, porque existem duas tarefas adicionais
entrevistam outras pessoas próximas a envolvidas em uma avaliação forense.
eles, examinam os registros existentes ou As avaliações forenses devem esclarecer
administram testes psicológicos. Na ava e identificar a questão legal e avaliar se a
liação forense, o foco é não só na coleta de psicologia forense tem algo a ofere
42 Matthew T. Huss
Figura 2.1 No caso contra Jose Padilla, que foi acusado de tramar um ataque a bomba
nos Esta dos Unidos, um psicólogo forense avaliou Padilla e atestou que ele sofria de
TEPT. © PA Photos/AP.
uma “loucura completa”. Entretanto, de
pois de conversar um pouco mais com o
cer em uma situação específica. Grisso advogado, ficou claro que ele estava preo
(2003a) escreveu extensamente sobre a cupado em relação à capacidade do seu
importância de se realizarem avaliações cliente de ajudá-lo durante seu julgamen
forenses legalmente relevantes, e esse to e que se o seu cliente sofresse de uma
será um tópico que examinaremos em doença mental isso seria uma considera
vários momentos. ção importante na sentença, caso ele fosse
É surpreendente que, muitas vezes, o condenado pelo crime. Também há vezes
tribunal ou as partes não estejam com em que o tribunal requisita um psicólogo
pletamente esclarecidos quanto à sua ne forense e este pode não ter nada a ofere
cessidade de um psicólogo ou a questão cer ao tribunal. Por exemplo, há vezes em
legal estrita que deve ser abordada. Certa que a literatura psicológica não apoia um
vez, um advogado me abordou e disse pressuposto ou estratégia legal.
que o seu cliente era “completamente ma Se um advogado de acusação requisi tar
luco”. Teria sido difícil para mim avaliar um psicólogo forense para atestar que
esse examinando de modo a concluir se um determinado acusado definitivamen
ele realmente atendia aos requisitos para te vai assassinar alguém se for libertado,
o psicólogo terá dificuldade em fazer isso enquanto os seus sintomas permanecem
porque não existe um instrumento ou em sua maior parte sem al terações, isso
abordagem de avaliação que possa detec sugere pouca confiabilidade para aquela
tar com 100% de certeza que um determi medida. Os escores não são consistentes.
nado indivíduo vai cometer assassinato. Por outro lado, validade é a precisão da
No entanto, um psicólogo forense pode medida. Para que o BDI-II seja válido, ele
ria dar opinião sobre o nível global de ris precisa medir a depressão e não outra
coisa. Uma medida de depres são não
co de um indivíduo, compará-lo por meio
deve medir algo como a quanti dade de
de um instrumento de avaliação de risco
exercício físico que a pessoa faz ou algo
Psicologia Forense 43
que não esteja relacionado, como a
frequência com que assiste a um pro-
com outros indivíduos com o mesmo es 44 Matthew T. Huss
core e identificar os fatores que provavel
mente aumentam ou diminuem o risco de
grama de televisão como Grey’s anatomy.
violência futura. Todo esse processo faz
Níveis mais altos de confiabilidade e va
parte da definição do que a psicologia fo
lidade sugerem que um procedimento ou
rense pode trazer como contribuição para
teste é suficientemente sólido para ser
o processo de avaliação.
usado. Confiabilidade e validade são ex
pressas em geral por uma correlação que
Conceitos básicos em varia de −1 a 1, com uma correlação mais
avaliação: confiabilidade e alta indicando melhor confiabilidade e
melhor validade. Um aspecto da confia
validade
bilidade e validade que é frequentemente
Antes de discutirmos aspectos específi uma questão na avaliação forense é que
cos da avaliação terapêutica e forense, é os procedimentos clínicos gerais e os tes
importante revisarmos dois conceitos tes são muitas vezes adaptados para uso
importantes que são centrais para a ava em um contexto forense sem que sua con
liação e especificamente para a testagem fiabilidade e validade tenham sido de
psicológica. Confiabilidade e validade terminadas adequadamente por meio de
são termos que podem descrever a medi pesquisa científica (Butcher, 2002). Como
da e solidez psicométrica de um determi discutiremos no Capítulo 3, esse é um
nado teste ou procedimento. ponto em que encorajamos os psicólogos
Confiabilida de geralmente se refere à forenses a atuarem dentro da sua área de
consistência da medida. Por exemplo, especialidade ou âmbito da prática.
alguém que sofre de depressão deve
obter um escore simi lar em um teste
Distinguindo avaliação
psicológico designado para avaliar
depressão, como o Inventário de
terapêutica de avaliação
Depressão de Beck-II (BDI-II). Se uma forense
pessoa é testada semana após semana e
A avaliação terapêutica tradicional ou
os seus sintomas não se alteram, seus
clínica diferem das avaliações forenses
escores deverão ser similares em cada
em inúmeros aspectos importantes (Gol
semana. Se os escores de uma pessoa
dstein, 2003). Alguns desses aspectos in
deprimida va riam muito nas
cluem: (1) metas e objetivos; (2) relação
administrações repetidas da medida,
entre as partes; (3) identidade do cliente; O objetivo de uma avaliação foren se é
auxiliar a corte. O psicólogo forense
pode diagnosticar um indivíduo com
(4) consequências e (5) perspectiva do exa uma doença mental, mas em vez de tratar
minando (ver Tabela 2.1). Essas diferenças essa pessoa, ele pode simplesmente infor
focalizam as áreas centrais de sobreposi mar a corte sobre o impacto dessa doença
ção entre as avaliações terapêutica e foren mental nas tomadas de decisões sobre o
se e se somam à necessidade de identifi acusado ou sua capacidade de funcionar
cação da questão legal e avaliação de se o em um contexto legal. Essa diferença não
psicólogo forense pode auxiliar a corte. O quer dizer que a psicologia forense não
primeiro aspecto em que a ava liação tem compaixão ou que o examinando não
terapêutica difere da avaliação forense é deva ou não será ajudado, mas significa
nas metas e objetivos de cada abordagem. que o objetivo primário da avaliação em
O objetivo de uma avaliação terapêutica si não é fornecer informações para o tra
é ajudar o examinando a diag nosticar e tamento, mas é para um propósito legal.
tratar seus problemas emocio nais e A relação entre avaliador e examinan do é
psicológicos relevantes (Heilbrun, 2003). diferente em uma avaliação forense.

Tabela 2.1 Diferenças entre avaliação terapêutica e forense Avaliação


terapêutica Avaliação forense
Metas e objetivos Reunir informações Tratar de uma questão legal
para reduzir o sofrimento psicológico

Relação entre as partes Cuidar e apoiar Investigar e procurar a verdade


Identidade do cliente O cliente é o examinando Indivíduo que procura e paga pelos serviços
Consequências Planejar uma intervenção Financeiras ou perda da liberdade Perspectiva do
examinando Fonte mais importante Exame minucioso do examinando
ção na avaliação forense.
Pode até ser um desafio determinar
Em uma avaliação terapêutica, o papel quem é o cliente em uma avaliação fo
do psicólogo é demonstrar interesse e rense, desafio este que normalmente não
oferecer apoio. Uma parte importante da está presente na avaliação terapêutica
avaliação terapêutica é desenvolver o ra (Ogloff e Finkelman, 1999). Em uma ava
pport para ajudar o examinando em suas liação terapêutica, o cliente é muito clara
dificuldades emocionais. Em uma avalia mente a pessoa que procurou pelos seus
ção forense, o psicólogo adota um papel serviços. Ele é a pessoa a quem você está
mais investigativo em que ele está focado avaliando, a pessoa que você está entre
no exame objetivo das informações perti vistando, a pessoa que está respondendo
nentes a esse examinando (Craig, 2004). aos testes psicológicos. Entretanto, essa
Apoiar um indivíduo durante o processo questão pode ser mais complexa em uma
legal ou as dificuldades psicológicas rele avaliação forense. O cliente ou clientes
vantes não é tipicamente uma considera podem não ser necessariamente a pessoa
que está sentada à sua frente na avalia resultado da avaliação. Em consequência
ção, porque a pessoa que o contratou e a disso, a precisão das informações muito
quem você deve satisfações é diferente mais provavelmente estará em questão
da pessoa que você está avaliando. Na em uma avaliação forense do que em uma
avaliação forense, é mais provável que o avaliação terapêutica, e a importância da
cliente seja o tribunal ou o advogado que perspectiva do examinando varia.
o contratou. Essa diferença na identidade
do cliente está frequentemente refletida Métodos e
no nível de confidencialidade associado procedimentos:
às avaliações forenses e a obrigação que
entrevista
o psicólogo forense tem ao ir mais além
para esclarecer as limitações, ao mesmo Apesar das diferenças em alguns dos pro
tempo em que se certifica de que o exa cedimentos utilizados na avaliação foren
minando esteja dando o seu consenti se, também existem muitas semelhanças,
mento esclarecido para a avaliação. incluindo a parte fundamental da avalia
Psicologia Forense 45 ção, a entrevista clínica. A entrevista é o
46 Matthew T. Huss
As avaliações terapêutica e forense
também diferem nas consequências da método de avaliação utilizado com mais
avaliação (Craig, 2004). As consequências frequência na psicologia e consiste da reu
de uma avaliação terapêutica geralmente nião de informações sobre um examina
resultam na indicação de uma interven do, falando diretamente com ele. Uma en
ção ou abordagem de tratamento para o trevista clínica é tipicamente a
examinando. As consequências de uma abordagem inicial usada na tentativa de
avaliação forense podem ser uma inde coletar infor mações sobre uma pessoa
nização financeira, a perda da liberdade devido à faci lidade e profundidade das
ou até mesmo a perda da vida. Embora as informações que podem ser reunidas.
consequências de não receber tratamento Uma entrevista pode durar de meia hora
ou um tratamento ineficaz não devam ser até várias horas. As entrevistas clínicas
minimizadas, as consequências de uma normalmente con sistem em solicitar
avaliação forense podem ser mais graves. informações pessoais sobre diferentes
A precisão das informações que você áreas da vida do exami nando, tais como
obtém é geralmente mais questionável na família, trabalho, saúde mental, abuso de
avaliação forense do que na avaliação substância, educação ou envolvimento
terapêutica (Melton, Petrila, Poythress e legal. Um psicólogo fo rense pode
Slobogin, 1997). Durante uma avaliação perguntar a uma pessoa se ela teve
terapêutica, a perspectiva do examinando é alguma dificuldade na escola com os
altamente considerada porque ela é vo estudos, colegas ou problemas disciplina
luntária e existe um curso de ação compar res. Ele também pode perguntar à pessoa
tilhado entre o avaliador e o examinando.
sobre seus sentimentos e pensamentos
atuais. Ela está tendo alguma dificuldade
Durante uma avaliação forense, o exami
em desempenhar tarefas rotineiras como
nando usualmente não se apresenta vo
ir para o trabalho, sair com os amigos e fa
luntariamente, o avaliador questiona ou
mília ou realizar os afazeres domésticos?
aguarda a verificação das suas afirmações
Independentemente das perguntas espe
e o examinando tem algo a ganhar com o
cíficas que são feitas, existem três tipos de adicionais quando considerá-las
entrevista clínica, que estão dentro de um inapropriadas. Contudo, as entrevistas
contínuo; desde a não estruturada até es não estruturadas tendem a ser menos
truturada. Em cada um dos casos, confiáveis ou con sistentes nas
existem certas vantagens e desvantagens informações que obtêm. As perguntas
em usar a abordagem. que eu faço a um determinado
examinando podem ser muito diferentes
Entrevistas não estruturadas das que são feitas por outro psicólogo se
Em uma entrevista não estruturada, o não houver um roteiro comum. Além dis
so, o examinando pode dar repostas dife
psi cólogo forense não tem uma lista
rentes dependendo do tipo de rapport es
prescrita de perguntas a serem feitas,
tabelecido por cada psicólogo e também
mas tem uma ideia geral do propósito da
do próprio humor. Provavelmente haverá
avaliação ou das áreas a serem focadas e
muita variação em duas diferentes entre
procura reu nir informações preliminares.
vistas não estruturadas.
O psicólogo forense pode simplesmente
perguntar so bre o motivo para avaliação
e obter infor mações pregressas que Entrevista semiestruturada
proporcionem um Uma entrevista semiestruturada
normal mente consiste de perguntas
predetermi-
contexto ou explicação. Uma entrevista
não estruturada provavelmente é muito
parecida, faça ela parte de uma avaliação nadas que cada entrevistador segue, mas
terapêutica ou avaliação forense. que também permite alguma flexibilida
As entrevistas não estruturadas são de na resposta a essas perguntas ou em
boas para estabelecer rapport e reunir in perguntas adicionais de follow-up. Quan
formações em profundidade, mas devido do discutirmos a psicopatia no Capítulo
às diferenças individuais entre os psicó 4, trataremos do instrumento utilizado
logos elas podem ser mais inconsistentes com mais proeminência para avaliar psi
e menos confiáveis. Estabelecer o rapport copatia, o Psychopathy Checklist-Revised
significa que psicólogo e examinando co
(PCL-R). Um passo na administração do
nheçam um ao outro e que o psicólogo
PCL-R é uma entrevista semiestruturada.
seja capaz de construir uma situação em
A entrevista semiestruturada é dividida
que o examinando estará aberto e será
em áreas gerais, como a história educacio
honesto. Discutiremos posteriormente
por que essa prática é especialmente im nal, história familiar, história ocupacio
portante nas avaliações forenses e tam nal, etc., com perguntas específicas lista
bém especialmente difícil. No entanto, é das abaixo de cada uma dessas áreas para
importante estabelecer o rapport de modo focar a entrevista. Além disso, existem
que o examinando forneça livremente in perguntas sugeridas depois de cada uma
formações precisas, seja esta uma avalia dessas perguntas primárias que o entre
ção terapêutica ou avaliação forense. As vistador pode fazer se quiser, com base
entrevistas não estruturadas também per nas respostas iniciais do examinando. No
mitem que o entrevistador faça o entanto, não é exigido que o
follow-up das respostas e faça perguntas entrevistador faça cada uma das
perguntas ou alguma pergunta de avaliam se um indivíduo está fingindo ou
follow-up. exagerando os sintomas de uma doença
As entrevistas semiestruturadas po mental (Rogers, Kropp, Bagby e Dickens,
dem não ser tão úteis para estabelecer 1992). A administração é feita por meio
um rapport, mas serão mais confiáveis em de uma entrevista estruturada, é dito ao
comparação com as outras entrevistas e examinando que ele deve responder cada
os outros entrevistadores. As entrevistas uma das perguntas com uma resposta do
tipo sim ou não, o entrevistador não faz
semiestruturadas como as usadas com a
perguntas de follow-up e evita responder a
PCL-R não incluem perguntas que focam
qualquer comentário adicional feito pelo
em tópicos informais da conversação, tais
examinando durante a entrevista.
como o clima, se o examinando teve di
Obviamente, esse tipo de entrevista não é
ficuldade em encontrar o consultório ou o melhor se o seu objetivo for esta belecer
como ele está se sentindo em um determi um rapport. Na verdade, a entre vista
nado dia. Elas estão focadas na obtenção estruturada pode prejudicar as suas
de respostas a perguntas específicas. As chances de estabelecer rapport se for usa
entrevistas semiestruturadas permitem da como contato inicial com um exami
perguntas adicionais de follow-up, embo nando. Por exemplo, eu administrava ro
ra elas normalmente sejam específicas e tineiramente uma entrevista estruturada
mais limitantes do que em uma entrevista a veteranos de guerra em uma unidade
não estruturada. Além disso, as entrevis de tratamento do transtorno de estresse
tas semiestruturadas permitem alguma pós-traumático (TEPT) para avaliar seus
consistência nas perguntas formuladas sintomas de TEPT. A entrevista normal-
Psicologia Forense 47 48 Matthew T. Huss

entre os diversos examinandos ou entre mente consistia em lhes perguntar pelas


os diferentes entrevistadores. A entrevis suas três experiências mais estressantes
ta que eu realizo com meu examinando enquanto eles estavam em combate. Essa
como parte da PCL-R será similar, embo abordagem não aumentava as chances de
ra não idêntica, à que um colega realiza estabelecermos um vínculo terapêutico
com um examinando em outra parte do que fosse útil na terapia ou tratamento,
país. mas aquele não era o meu propósito. Meu
propósito era identificar e validar a gra
Entrevistas estruturadas vidade dos seus sintomas de TEPT com
No outro extremo do contínuo das entre objetivos clínicos e de pesquisa. Por con
vistas estão as entrevistas estruturadas. sequência, as entrevistas estruturadas são
Essas entrevistas são os tipos mais for normalmente as mais úteis em situações
mais e mais rígidos de entrevista clínica. em que o objetivo é claro e focado, mas
Elas consistem de perguntas específicas não serão úteis se a intenção for estabe
que devem ser feitas, e não é permitido lecer rapport. Tipicamente, uma entrevista
que o entrevistador se desvie das pergun estruturada designa pontos ou identifi ca
tas prescritas. As entrevistas estruturadas os itens que um examinando endossa
têm um propósito específico. Por exem para usar em um procedimento formal de
plo, a Entrevista para Sintomas Relata pontuação. Como resultado, a consistên
dos (SIRS) consiste de 172 perguntas que
cia e confiabilidade da administração são
de importância maior porque os escores procedimentos:
são comparados entre os diferentes exa testagem psicológica
minados como uma base de comparação.
Deve ficar claro que esses diferentes Além da entrevista clínica, o uso de testes
tipos de entrevista não são mutuamente psicológicos também é um método co
excludentes. Um entrevistador não está mum nas avaliações terapêutica e
confinado a conduzir apenas um tipo de forense. A testagem psicológica pode
entrevista com um determinado exami incluir uma variedade de testes e será
particularmen te útil dependendo da
nando, nem mesmo um único tipo em
questão legal e do examinando. Os tipos
uma determinada sessão. Cada uma des
mais proeminentes de testes usados nas
sas abordagens possui suas vantagens e
avaliações forenses tendem a ser os testes
desvantagens e deve ser utilizada quan
de personalidade, testes intelectuais,
do for apropriado. Se estou avaliando al testes neuropsicológi cos e testes forenses
guém para ver se ele trabalharia bem no especializados.
nosso grupo de reabilitação de infratores,
eu posso começar uma sessão inicial com Testes de personalidade:
uma entrevista não estruturada para ava
projetivo versus objetivo
liar seu nível atual de funcionamento inte
Provavelmente o tipo mais comum de
lectual e funcionamento psicológico geral.
teste psicológico é o teste de personalida
Eu posso sair daquela entrevista inicial
de (Archer, Buffington-Vollum, Stredny e
suspeitando de que ele sofre de TEPT e Handel, 2006). Os testes de personali
de que ele seria um bom candidato para dade são concebidos para medir alguns
um estudo de tratamento que estamos aspectos da personalidade normal do
examinando ou, no extremo, a sua psi
copatologia ou doença mental. Um psi
realizando com infratores. Como esses cólogo forense pode ter que administrar
são critérios rígidos sendo usados para um teste de personalidade para avaliar
inclu são nesse estudo de tratamento, eu
posso então realizar uma entrevista
estruturada para avaliar seu TEPT. Você doença mental em casos que têm uma
também po derá pensar em outras exigência legal para a presença de doença
combinações das três diferentes mental como inimputabilidade, responsa
entrevistas. Mais uma vez, nenhum bilidade civil ou casos de danos pessoais.
desses tipos de entrevista é ne
Testes psicológicos como o Inventário
cessariamente melhor do que o outro,
Multifásico de Personalidade de Minneso
mas cada um serve a um propósito
ta-II (MMPI-II) são utilizados para avaliar
diferente. Cada um desses três tipos de
a psicopatologia de um examinando em
entrevista vai diferir em termos da sua
habilidade para estabelecer rapport, o uma variedade de subescalas que medem
quanto permite perguntas de follow-up e aspectos como depressão, esquizofrenia,
a consistência ou confiabilidade da paranoia e características antissociais. Em
entrevista em si. geral, os testes de personalidade podem
ser divididos em projetivos e objetivos.
Os testes projetivos normalmente
Métodos e
consistem na apresentação de estímulos escala que varia de 1 (nada a ver comigo)
ambíguos aos indivíduos e o registro das até 7 (tem muito a ver comigo). Exemplos
suas respostas para avaliar uma questão de testes objetivos podem incluir testes
subjacente, tais como algo de sua perso como o MMPI-II ou o Inventário Clínico
nalidade ou psicopatologia. Testes como Mul tiaxial de Millon-III (MCMI-III). Os
o Teste de Rorschach e o Teste de Aper testes objetivos normalmente permitem
cepção Temática (TAT) são dois testes uma administração relativamente fácil
que produz resultados confiáveis e
projetivos comuns utilizados em situa
válidos. Por exemplo, um psicólogo
ções forenses (Craig, 2004). Nos dois ca
clínico pode administrar um MMPI-II
sos, apresentam-se estímulos ambíguos
sentando o exa minando em frente a um
ao examinando, seja por meio de um bor
computador e trabalhando em outras
rão de tinta ou de uma imagem de pes tarefas enquanto o examinando o
soas em uma situação particular, e lhes é preenche. As respostas do examinando
pedido uma interpretação dos mesmos. podem depois ser pontuadas em uma
As respostas do examinando são, então, questão de minutos, e é produzi do um
pontuadas para compará-las com as de resumo de informações para o psi cólogo
outros indivíduos. A maioria dos testes interpretar (Butcher, 2002). Além disso,
projetivos está baseada no pressuposto de os testes objetivos tendem a exibir maior
que as respostas abertas de um examinan confiabilidade e têm menos ques
do revelam disposições internas que não tionamentos referentes à sua validade do
são descobertas facilmente. Os testes pro que os testes projetivos (Lilienfeld et al.,
jetivos apresentam algumas vantagens e 2003). Contudo, os testes objetivos reque
desvantagens. As principais vantagens rem um nível maior de conhecimento e
são que eles avaliam as características psi cooperação do que os testes projetivos e
tendem a dar uma visão mais limitada do
cológicas mais profundas inobserváveis
comportamento humano.
de um examinando e são mais difíceis de
simular. Entretanto, muitos dos testes
projetivos foram criticados porque são
Outros tipos de testes
mais difíceis de padronizar, mais difíceis psicológicos Além da personalidade,
Psicologia Forense 49existem outras áreas em que os
psicólogos forenses fo-
de administrar e pontuar e apresentam 50 Matthew T. Huss
confiabilidade e validade questionáveis
(Lilienfeld, Lynn e Lohr, 2003). cam seus métodos de avaliação e testa
Os testes objetivos são diferentes gem. Testes psicológicos como a Escala
porque são mais estruturados e diretos. Wechsler de Inteligência para Adultos-IV
Apresentam ao examinando perguntas (WAIS-IV) têm seu foco nas capacidades
específicas e propõem alternativas especí intelectuais de um examinando. Nos Es
ficas de respostas. Um teste objetivo pode tados Unidos, os casos de pena de morte
incluir uma afirmação como: “Eu não me são uma área em que os psicólogos foren
socializo tanto com os amigos quanto cos ses administram um teste de inteligência
tumava fazer quando era mais jovem”. O como o WAIS-IV. A inteligência é uma
examinando é, então, solicitado a res das questões nesses casos porque a
ponder “verdadeiro” ou “falso” em uma Suprema Corte dos Estados Unidos
decidiu que as pessoas que sofrem de forenses especializados ou
retardo mental e, portanto, têm um instrumentos forensemente
Quociente de Inteligên cia (QI) abaixo de relevantes. Os instrumentos forenses
70, são inimputáveis para a pena de especializados de avaliação “são
morte (Atkins vs. Virginia, 2002). Veja o medidas diretamente rele
Quadro 2.1 para maiores ex plicações vantes para um padrão legal específico e
sobre Atkins vs. Virginia no con texto da refletem o foco nas capacidades, habilida
avaliação intelectual.
des ou conhecimento específicos que são
Os testes neuropsicológicos também
abrangidos pelo direito” (Otto e Heilbrun,
são um foco de rotina das avaliações fo
2002, p. 9). Eles incluem medidas designa
renses. Testes neuropsicológicos como o
das para avaliar questões legais específi
Teste de Trilhas A e B ou baterias neuro
cas como inimputabilidade ou
psicológicas como o Luria-Nebraska são
concebidos para avaliar déficits cerebrais capacidade para se submeter a
subjacentes que possam afetar habilida julgamento. Heilbrun, Rogers e Otto
des psicológicas como planejamento, me (2002) distinguiram ins trumentos de
mória e atenção. Um psicólogo forense avaliação forense dos ins trumentos
pode avaliar a capacidade de um acusado forensemente relevantes. Eles
de se submeter a julgamento, e essa ava argumentaram que os instrumentos de re
liação pode incluir uma avaliação da sua levância forense são instrumentos que fo
memória de longo prazo para se certificar cam nas questões clínicas, não em
de que não existe um prejuízo subjacen te padrões legais, os quais são mais comuns
à sua incapacidade de se lembrar de no siste ma legal. Os instrumentos que
eventos do crime. Se existir um compro avaliam o risco de violência futura e
metimento da memória de longo prazo, psicopatia são exemplos de instrumentos
ele não terá condição de auxiliar na sua forensemente
defesa de modo efetivo.
relevantes (Heilbrun et al., 2002). Os
instrumentos forenses especiali zados e
Instrumentos para avaliação os instrumentos forenses rela cionados
forense (IAF) têm vantagem sobre os testes
Além dos tipos tradicionais de testagem psicológicos descritos anteriormente por
psicológica, também existem testes con que estão menos afastados da questão
cebidos de modo a ter questões forenses legal imediata. Uma vez que estão me
nos afastados da questão legal imediata,
esses instrumentos reduzem a gravidade
em mente – instrumentos para das inferências que podem ser feitas pelo
avaliação forense (IAF). Cada vez mais avaliador e, portanto, aumentam poten
têm sido criados instrumentos e métodos cialmente a confiabilidade e validade das
especial mente para tratar de questões avaliações que utilizam instrumentos
forenses nas últimas décadas (Otto e forenses especializados confiáveis e vá
Heilbrun, 2002). Além disso, esses lidos. Essa ideia tem um apelo intuitivo.
instrumentos podem ser instrumentos
Psicologia Forense 51
Quadro 2.1 O impacto dos testes de inteligência depois de Atkins
vs. Virginia (2002)
Responsabilidade Cri
Atkins vs. Virginia (2002) é um dos casos ju
minal (R-CRAS), avaliaria mais direta
diciais de saúde mental mais interessantes da
problemáticas para conciliar com a realidade
última década e um excelente exemplo do
do diagnóstico de retardo mental. As Cortes e
impacto potencial do direito na psico logia
o poder legislativo identificaram um QI de 70
forense. Daryl Atkins e seu cúmplice, William
como a linha divisória para determinação de
Jones, sequestraram Eric Nesbitt em uma loja
retardo mental quando, na verdade, o diag
de conveniências em agosto de 1996. Nesbitt
nóstico é muito mais complicado do que um
tinha apenas $60 em sua carteira na quele
único número resultante de um único teste.
momento e então eles o forçaram a sa car mais
Um diagnóstico de retardo mental também
$200 em um caixa eletrônico. Depois disso,
inclui o reconhecimento de problemas adap
eles o levaram até um local afastado e
tativos ou funcionais. Por exemplo, além do
atiraram nele oito vezes com uma arma se
baixo QI, uma pessoa também deve ter limi
miautomática. Os dois homens disseram que
tações em áreas como a de manutenção do
o outro tinha sido o autor do disparo mortal,
emprego e cuidados básicos de higiene. Além
mas havia muitas inconsistências na versão
disso, os testes de QI não são 100% precisos.
de Atkins e, posteriormente, um
Existe ampla literatura sugerindo que o QI
companheiro de cela relatou que Atkins
pode se diferenciar entre as raças em aproxi
admitiu ter atirado em Nesbitt. Por
madamente 15 pontos, que os QIs em geral
consequência, Jones recebeu pri são perpétua
diferem em 5 pontos devido a erro aleatório,
para testemunhar contra Atkins e Atkins foi,
os escores de QI aumentam com a prática e
por fim, condenado por assassi nato. Na
que QI, em geral, está em ascensão na nossa
época da sua sentença original, um psicólogo
sociedade. Como resultado desses problemas,
clínico atestou que o QI de Atkins era 59 e,
a utilização de 70 como um número rígido
portanto, ele era mentalmente retar dado.
tem sido criticado rotineiramente pelos psicó
Apesar disso, Atkins foi sentenciado à morte.
logos forenses. Um fato interessante do caso
Atkins apelou do veredicto e, após inúmeras
de Atkins é que um segundo júri achou que
decisões, a Suprema Corte decidiu que era
ele não era retardado e o sentenciou à morte
cruel e incomum a punição de levar à morte
novamente. Sua execução foi marcada para
uma pessoa mentalmente retardada.
dezembro de 2005, mas ela foi adiada e, poste
Embora alguns tenham louvado a deci são da
riormente, a Corte Suprema da Virginia anu
Corte como terapêutica, a decisão e as
lou sua sentença de morte com outras bases
interpretações posteriores se tornaram muito
processuais.

Por exemplo, já identificamos o MMPI-II


mente o grau de prejuízo da capacidade
como uma medida da personalidade ou
do acusado em relação às acusações
doença mental comumente utilizada. En
legais que ele enfrenta. Ocuparemos
tretanto, um psicólogo forense teria que
algum tem po em cada capítulo específico
inferir o grau em que a doença mental de
examinan do os diferentes instrumentos
uma pessoa prejudicaria a sua
de avalia ção forense.
capacidade de distinguir o certo do
Utilização de testes entre os psicólogos
errado. Ao passo que um instrumento de
forenses. Em última análise, o uso de um
avaliação forense especializado, como as
teste particular em um determinado caso
Escalas de Rogers para Avaliação da
com um cliente particular está a critério informações coletadas dos registros
do psicólogo. No entanto, pesquisas institucionais ou entrevistas em situações
mostra em que a pessoa não estava sendo
52 Matthew T. Huss avaliada. Registros de saúde mental de
hospitais psiquiátricos, relatórios da
ram que muitos dos testes mencionados condicional, fichas oficiais do governo
neste capítulo estão entre os testes usados que listam todas as acusações
com maior frequência em avaliações fo
renses (Archer et al., 2006). O MMPI-2 é o
teste de personalidade mais utilizado e o e condenações e registros escolares são as
teste psicológico usado com mais frequên fontes comuns de informações de arqui
cia entre os psicólogos forenses. Essa sua vo. Além disso, fontes de terceiros, tais
utilização é provavelmente o resultado como testemunhas, amigos ou membros
do vasto apoio da pesquisa para seu uso da família também podem ser contatadas
e a relevância de se diagnosticar doença para corroborar informações específicas
mental em contextos forenses. As escalas em uma avaliação.
de inteligência de Wechsler são os testes Existe uma necessidade maior de in
intelectuais utilizados com maior frequên formações de arquivo em uma avaliação
cia e o segundo teste psicológico mais uti forense por duas razões. Primeiramente,
lizado em geral. O Rorschach é o teste per existe uma necessidade maior de precisão
ceptivo mais frequentemente utilizado, nessas avaliações. As conclusões de um
junto com o Teste de Trilhas A e B, como psicólogo forense serão avaliadas pelo
o teste neuropsicológico mais utilizado. O sistema legal e a mentira e simulação de
Psichopathy Checklist-Revised é o instru sintomas psicológicos são especialmente
mento de avaliação forense mais frequen relevantes (Melton et al., 1997). Isso não
temente utilizado (Archer et al., 2006). O quer dizer que as avaliações terapêuticas
uso de testes particulares é importante sejam imprecisas. Significa que não é só a
nas discussões do âmbito da prática e no saúde mental do indivíduo que está em
cum primento dos critérios de jogo em uma avaliação forense, mas tam
admissibilidade. Essas são questões que bém a sua liberdade pessoal, sua vida ou
explicaremos mais detalhadamente no até mesmo o bem-estar de outra pessoa.
Capítulo 3 e será um assunto constante Devido à natureza adversa do nosso siste
neste texto. ma legal (Capítulo 1) e do escrutínio que
sofre uma avaliação ou testemunho de
um perito (Capítulo 3), os procedimen tos
Informações de arquivo e o relatório final deverão ser detida
Além do uso de entrevistas clínicas e mente examinados e submetidos à análise
testes psicológicos, os psicólogos foren crítica por várias pessoas. Essas pessoas
ses devem se basear especialmente nas podem ser desde o defensor até o juiz e o
informações de arquivo na condução advogado de acusação. Por consequência,
das avaliações forenses (Goldstein, 2003). a consulta a informações de arquivo e de
As informações de arquivo ou de terceiros é especialmente importante.
terceiros normalmente consistem de Outra das razões principais por que as
informações de arquivo ou de tercei ros examinando tiver que fazer uma pausa
são especialmente importantes é a alta antes de cada resposta e parecer estar es
probabilidade de um ganho secun dário colhendo as palavras com muito cuidado,
nas avaliações forenses e o aumen to da isso pode ser uma indicação de comporta
probabilidade de simulação como mento deliberado com o objetivo de man
consequência (Craig, 2004; Melton et al., ter uma apresentação que ele acredita que
1997). O psicólogo forense pode esperar irá beneficiá-lo. É claro que esses sinais
que os examinandos não relatem todos clínicos não são suficientes para se con
os sintomas em uma variedade de situa- cluir que uma pessoa está minimizando
ou fingindo, mas eles devem servir como
ponto de partida.
ções como, por exemplo, custódia de fi Psicologia Forense 53
lhos ou que exagerem os sintomas como
no caso de inimputabilidade ou em casos Além dos indicadores menos formais em
de danos pessoais. Em todos esses casos, uma entrevista clínica, vários outros
o examinando tem alguma coisa a ga instrumentos são usados para identifi car
nhar, seja a sua liberdade, uma sentença a simulação de sintomas. Diversas
menor, uma indenização financeira ou a medidas clínicas rotineiramente usadas,
custódia de um filho. O ganho secundário como o MMPI-2, estabeleceram escalas de
é normalmente considerado um ganho validade para avaliar padrões de respos
ou vantagem além do objetivo primário ta distorcidos e pesquisas identificaram
padrões de perfil específicos que suge
de relatar ou deixar de relatar sintomas
rem simulação (Bagby, Nicholson Buis e
psicológicos que podem influenciar a pre
Bacchiochi, 2000). Conforme mencionado
cisão do autorrelato de um examinando.
anteriormente, a SIRS é uma entrevis ta
É importante que o psicólogo forense es
clínica estruturada que demonstrou
teja preparado para essas circunstâncias confiabilidade e validade significativas
e busque as informações de arquivo e de na identificação de indivíduos que estão
terceiros, além de conhecer as diferentes simulando psicopatologia (Rogers et al.,
abordagens para detectar a simulação por 1992). Além disso, existem medidas es
meio de uma avaliação formal. pecíficas que com frequência são usadas
Existem muitas estratégias tanto in para avaliar a simulação de prejuízos
formais quanto sistemáticas para detectar neuropsicológicos ou cognitivos, incluin
simulação. O método mais comum utili do o Teste de Simulação de Problemas de
zado é a entrevista clínica (Melton et al., Memória (TOMM). Veja a Tabela 2.2 para
1997). As várias indicações de simulação um resumo de todos os instrumentos de
potencial podem incluir uma apresen avaliação mencionados neste capítulo.
tação exagerada e dramática, intencio
nalidade e despreocupação chamativas, Utilização de relatórios
apresentação de sintomas inconsistentes escritos em avaliações
com um diagnóstico psiquiátrico, incon
forenses e
sistência nos relatos e a descrição apenas
de sintomas óbvios de uma determina da
diretrizes
doença mental (Rogers, 1988). Se um Um subproduto típico de uma avaliação
forense é um relatório formal contendo pendentemente do seu propósito (Melton
os procedimentos utilizados e a base para et al., 1997). Os relatórios forenses devem
a conclusão do especialista e achados separar os fatos das inferências,
gerais. Embora esses relatórios possam manter-se dentro da questão do
variar drasticamente em termos de exten encaminhamento, evitar informações
são e qualidade, um relatório deve seguir escassas/excessivas e minimizar o jargão
pelo menos quatro diretrizes gerais, inde clínico.
54 Matthew T. Huss

Tabela 2.2 Tabela das medidas psicológicas mencionadas no


Capítulo 2 Tipo de teste Medidas
Projetivo de personalidade Teste de Rorschach
Teste de Apercepção Temática (TAT)
Objetivo de personalidade Inventário Multifásico de Personalidade de Minnesota II
(MMPI-II)
Inventário Clínico Multiaxial de Millon III (MCMI-III)
Cognitivo/neuropsicológico Escala Wechsler de Inteligência para Adultos IV (WAIS-IV) Teste
de Trilhas A e B
Bateria Neuropsicológica Luria-Nebraska
Forense especializado Escalas Rogers para Avaliação da Responsabilidade Criminal
(R-CRAS)
Instrumento de Avaliação para Capacidade – Adjudicação
Criminal de MacArthur (MacCAT-CA)
Forense relevante Guia de Avaliação de Risco de Violência (VRAG) Psycopathy
Checklist-Revised (PCL-R)
Simulação Entrevista Estruturada de Sintomas Relatados (SIRS) Teste de Simulação de
Problemas de Memória (TOMM)
uma lição valiosa com a sua prisão. O exa
minando argumentar que aprendeu uma
lição valiosa e isso realmente ter ocorrido
Os relatórios forenses devem em ge pode configurar duas coisas bem diferen
ral procurar separar os fatos das inferên tes, e um psicólogo forense deve procurar
cias. Pode ser um fato comprovado que separar uma da outra.
um examinando foi condenado por roubo O examinador deve se ater ao âmbito
quando tinha 25 anos. No entanto, seria do motivo do encaminhamento. Ele deve
uma inferência dizer que ele pareceu ter abordar a questão que foi apresentada ao
aprendido com essa experiência e prisão tribunal e para a qual foi contratado. Ele
subsequente porque não cometeu ne deve evitar incluir comentários supérflu
nhum outro crime nos 10 anos seguintes. os que tenham pouca relevância para o
Seria mais apropriado dizer que o acu tema do encaminhamento. Por exemplo,
sado não cometeu nenhum outro crime evitar comentar sobre a periculosidade
nos anos seguintes ou, se for o caso, que do réu quando o seu motivo de encami
o examinando argumenta ter aprendido nhamento é avaliar se ele tem capacidade
para se submeter a julgamento. para definições de alguns desses ter
O examinador sempre deve tomar mos). Esses termos podem ser comuns
decisões quanto aos aspectos a serem in em contextos psicológicos, mas não con
cluídos no relatório e os aspetos a serem seguem comunicar adequadamente em
deixados de lado, mas em geral ele deve um contexto legal.
evitar informações escassas e/ou em ex Essas diretrizes tendem a ser muito
cesso. O relatório precisa ser prontamente gerais, mas devem ser aplicadas à maio
digerível pela corte e seus representan ria das circunstâncias. De um modo ge
tes, a maioria dos quais teve pouco ou
ral, elas são boas orientações a serem
nenhum treinamento psicológico. É im
seguidas porque vão aumentar a possibi
portante consultar o advogado que está
lidade de os psicólogos forenses auxilia
contratando o psicólogo forense para de
rem cortes na tomada de decisões legais,
terminar as informações que devem ser
o que é justamente o propósito da avalia
ção forense.
Psicologia Forense 55
incluídas no relatório, além de também
serem abrangentes.
Um aspecto relacionado é que o re Tratamento em
latório também deve minimizar o jar gão contextos forenses
clínico. As avaliações terapêuticas
rotineiramente incluem muitos termos Uma segunda tarefa importante em que
que são específicos das conceitualiza ções os psicólogos forenses rotineiramente se
psicológicas de temas particulares, mas, envolvem é o tratamento de indivíduos
como mencionado anteriormente, os em contextos forenses (Otto e Heilbrun,
psicólogos não são os únicos profis 2002). Como sugere a discussão anterior,
sionais que leem esses relatórios. Se um a avaliação forense foi a parte mais
psicólogo forense quer realmente au central da psicologia forense no passado
xiliar o tribunal, ele deve minimizar a (Borum e Otto, 2000). Esse foco foi
linguagem que será confusa ou obscura parcialmente baseado na ideia de que
para os profissionais do direito. Petrella muitos psicólo gos encaravam o
e Poythress (1983) realizaram um estudo tratamento como trata
que avaliou a utilização do jargão clínico mento de fato e que não havia nada de
e encontraram que os juízes e advogados muito específico para os contextos foren
em geral achavam os seguintes termos ses. Se um psicólogo usava uma determi
obscuros e confusos: ideação delirante; nada abordagem para tratar uma doença
afeto; neologismos; associações frágeis; mental fora de um contexto forense,
fuga de ideias; bloqueio, sua ideação então ele poderia usar essa mesma
paranoide é inespecífica, completamen te abordagem dentro de um contexto
assistemática; orientado no tempo, forense. Além dis so, o tratamento
espaço e pessoa; labilidade; associações forense tipicamente não está relacionado
frágeis e tangenciais; afeto embotado; diretamente a uma ques tão legal
grandiosidade; déficit de personalida de; específica. Existem situações, como a
amnésia histérica; amnésia por falta de recuperação da capacidade e res
registro e mente psicótica (ver Tabela 2.3 ponsabilidade civil, em que a melhora do
estado psicológico de um indivíduo cau se submeter a jul gamento. No entanto, a
sa impacto no sistema legal. Por exemplo, grande maioria dos tratamentos acontece
uma pessoa pode ser considerada depois que o indivíduo foi julgado e
incapaz para se submeter a julgamento preso ou institu cionalizado. Muitos
porque so fre de esquizofrenia e é incapaz tratamentos ocorrem quando a pessoa
de fazer diferença entre realidade e começa a apresentar problemas
fantasia, muito menos participar da sua psicológicos enquanto está na prisão ou
própria defesa. Se ela for tratada em sua cadeia. Um infrator criminal que já foi
esquizofrenia e os sintomas entrarem em sentenciado não está ativamente
remissão, então ela ficará apta e poderá
56 Matthew T. Huss

Tabela 2.3 Definição de alguns jargões clínicos


Jargão Definição
Afeto Outro nome para emoção
Ideação delirante Falsas crenças
Afeto embotado Ausência de expressão emocional
Fuga de ideias Progressão de uma série de ideias, usualmente em alta velocidade
Grandiosidade Uma visão exagerada das próprias capacidades, amor próprio ou importância
Labilidade Refere-se à mudança constante, geralmente inadequada, das emoções
Associações frágeis Ausência de conexão de um pensamento para outro Neologismos
Palavras recém criadas que são geralmente sintoma de esquizofrenia
Orientado no tempo, espaço e pessoa psicologia clínica a uma prisão ou
Ser capaz de identificar o tempo atual, sua ambiente correcional isento de
localização atual e quem você é qualquer aplicação legal. Por exemplo,
um psicólogo penitenciário pode tratar
Fonte: Baseado em Petrella e Poythress a doença mental de um infrator encarce
(1983).
rado para aliviar seu sofrimento,
deixá-lo mais manejável no ambiente
da prisão e reabilitá-lo para o seu
envolvido no sistema dos tribunais, por
retorno à socie dade. Tal tarefa pode
que já foi condenado. Se ele for tratado
não ter nenhuma aplicação legal direta.
ou reabilitado com sucesso, terá menor
Entretanto, se esse mesmo infrator foi
pro babilidade de entrar em contato
considerado incapaz de se submeter a
com a lei quando for libertado. Além
julgamento e precisa que sejam
disso, muitos psicólogos forenses que
tratados os seus sintomas de saúde
realizam avalia ções forenses também
mental para ser restaurada a
estão trabalhando em prisões e
capacidade
hospitais forenses tratando infratores.
Uma distinção importante para a dis
cussão do nosso tratamento é a
diferença entre psicologia forense e e se submeter a julgamento, agora
psicologia peni tenciária. Psicologia existe uma aplicação legal direta. É esta
penitenciária se refe re à aplicação da
última tarefa que tende a ser vista diferentes entre si e podem incluir in
como foren se, e a tarefa anterior, como divíduos que perpetram violência
correcional. Porém, essas linhas são domés tica ou violência sexual. Um
frequentemente borradas na prática grande nú mero de infratores sofre de
corrente da psico logia, e muitas dessas problemas de abuso de substância que
distinções entre a psicologia podem não ser a base da sua
penitenciária e forense não são condenação criminal, mas que no
importantes. Além disso, a psicolo gia
entanto servem como um fator im
penitenciária está crescendo a passos
portante no seu comportamento antisso
largos (Boothby e Clements, 2000). Por
cial. Embora a maioria dos infratores
consequência, nossa discussão sobre tra
seja homens, as pesquisas também
tamento vai focar, em grande parte, no
tratamento de infratores, o que pode ser revelaram que as mulheres infratoras
considerado mais correcional, embora apresentam uma variedade de
deixemos boa parte da discussão do tra necessidades em saú de mental (Ogloff,
tamento forense puro para quando for 2002). Além disso, as intervenções em
relevante para capítulos específicos. En delinquência juvenil não foram
tretanto, o leitor deve ter em mente que mencionadas, embora as pesquisas
frequentemente faz-se uma distinção tenham revelado cada vez mais resulta
entre tratamento das dificuldades emo dos positivos (Kurtz, 2002). Os
cionais que se relacionam a uma infratores com transtornos mentais se
questão legal específica e o tratamento sobrepõem parcialmente a alguns dos
que preten de reabilitar infratores grupos anterio res, mas mesmo esse
criminais para que eles tenham uma grupo inclui infrato res com uma
probabilidade menor de cometer variedade de necessidades. Os
infrações futuras quando forem
infratores com transtornos mentais in
libertados da cadeia ou prisão.
cluem indivíduos considerados “não
cul pados por motivo de
inimputabilidade”, “incapaz para se
Quem estamos tratando? submeter a julgamento”, “agressores
A maioria das pessoas pensa nos sexuais com transtorno men tal” e
infrato res como um grande grupo “infratores mentalmente doentes”
homogêneo. Entretanto, os infratores (Heilbrun e Griffin, 1999). Mesmo
compõem um grupo muito dentro desse grupo de infratores com
heterogêneo (Harris e Rice, 1997). Os transtorno
grupos de infratores podem in cluir Psicologia Forense 57
aqueles não violentos, que estão pre sos
por crimes como furto, destruição de mental existe uma variedade de atos cri
propriedade ou até mesmo por crimes minais e uma variedade de transtornos
de colarinho branco como peculato. psiquiátricos (Harris e Rice, 1997).
Também incluem infratores violentos As estimativas de prevalência de
que têm uma história de doença mental variam muito – desde
comportamento impulsivo e agressivo. me nos de 5% até mais de 50%,
Mesmo os infratores violentos são dependendo da definição de doença
mental e da na tureza do contexto Além disso, os mentalmente doentes
correcional (Corrado, Cohen, Hart e têm uma chance significativamente
Roesch, 2000). Entretanto, as pesquisas maior de serem presos do que os que
sugerem claramente que os infratores não são men
encarcerados sofrem de uma variedade talmente doentes por infrações
de doenças mentais. Atual mente, em similares (Teplin, McCleallad, Abram e
torno de 10 a 19% dos prisio neiros do Weiner, 2005). Imagine que a polícia é
sexo masculino e 18 a 30% do sexo chamada até um parque tarde da noite.
feminino sofrem de doença mental Os policiais encontram um homem
séria (Pinta, 2001). Os diagnósticos de dormindo em um banco do parque,
abuso de substância podem envolver mas ele parece respon
quase 50% dos infratores encarcerados sivo e sóbrio. Eles podem simplesmente
(Arboleda-Florez et al., 1995). Mais uma pedir que aquele indivíduo vá embora
vez, embora as estimativas variem e se certificarem de que ele não retorne.
ampla mente, a revisão de Fazel e Entretanto, se aquele mesmo homem fa
Danesh (2002) de mais de 60 estudos lar sobre ouvir vozes que o conduziram
encontrou que 47% dos homens foram até o parque para dormir, a polícia
diagnosticados com transtorno de pode rá levá-lo até a cadeia para sua
personalidade antissocial. Um estudo própria proteção e também para
apontou que mais da metade das proteger a socie dade. Nos dois
mulheres encarceradas tomavam me exemplos, os indivíduos podem ter
dicação psicotrópica (O’Brien, transgredido, embora apenas o
Mortimer, Singelton, Meltzer e indivíduo que exibir doença mental
Goodman, 2003). Independentemente será encarcerado.
de estimativas preci sas, está claro que a Além de a possível criminalização dos
doença mental é uma questão mentalmente doentes justificar o au
significativa entre os infratores mento nas taxas de prevalência, a
encarcerados. própria natureza da experiência de
Além do mais, a razão para a pre prisão pode ser um fator (Mobley,
valência de doença mental entre os in 2006). Dvoskin e Spiers (2004) indicam
fratores é provavelmente muitifacetada que há cinco es tressores importantes
(Mobley, 2006). Há muito tempo houve que provavelmente causarão impacto
uma discussão sobre a criminalização no bem-estar psicológi co do indivíduo
dos mentalmente doentes (Teplin, (a saber, ruído extremo, temperatura
2001). Por exemplo, durante a década elevada, níveis elevados de medo,
de 1970, quando decresciam em mais sujeira e superpopulação) e a prisão é
de 60% os cuidados à população de um ambiente em que todos es ses cinco
saúde mental, a população prisional fatores estão presentes. É claro que
correspondentemen te aumentava em muitos podem argumentar que essas
uma proporção similar condições ruins são apropriadas dado
58 Matthew T. Huss que essas pessoas infringiram a lei. No
entanto, essa questão apenas chama a
(veja Mobley, 1999; Teplin, 1983; 1984). atenção para o fato de que o sistema
legal e o sistema de cuidados à saúde tratamento sejam apresen tados como
mental possuem diferentes propósitos distintos para propósitos con ceituais,
(Howells, Day e Thomas-Peter, 2004). eles também se sobrepõem e são
O objetivo do interdependentes entre si.
O tratamento focado no manejo bus ca
reduzir e eliminar crises agudas. As
sistema legal é punir e o objetivo da crises agudas são de curta duração, mas
saúde mental é reabilitar o infrator. É potencialmente graves e podem incluir
nesse am biente que os indivíduos automutilação, gestos suicidas,
potencialmente vulneráveis são violência geral ou demonstrações
encarcerados. agudas de psico-
A vulnerabilidade dessa população
fornece um motivo adicional para as ta
xas de prevalência de doença mental patologia psicótica ou impulsiva.
potencialmente elevadas. Já foi bem es Existem rotineiramente estressores
tabelecido que os indivíduos de áreas ambientais precipitantes que se
socioeconômicas mais baixas estão em originam de dentro ou de fora do
maior risco em relação a muitas ambiente da prisão e que conduzem a
doenças mentais (Glover, Leese e essas crises. As estratégias de
McCrone, 1999). Esse risco maior não intervenção tipicamente incluem a re
deriva apenas dos problemas solução da crise imediata, provendo as
ambientais adicionais e de re cursos necessidades imediatas de segurança
econômicos que eles vivenciam, mas do infrator ou dos outros à sua volta e
também da falta de educação sobre esta belecendo um plano para reduzir
saúde mental e da falta de recursos de recor rências futuras (Mobley, 2006).
saúde mental disponíveis. Também fica A manutenção, por outro lado, tem o
claro que os indivíduos com foco nas questões de saúde mental
antecedentes socioeconômicos mais crôni cas que não são prováveis de
baixos têm maior probabilidade de serem resol vidas completamente no
serem encarcerados. Esses dois ambiente da pri são ou cadeia. A
achados inevitavelmente de manutenção geralmente ocorre em
sempenham um papel na prevalência situações em que o infrator está
da doença mental entre os infratores. sofrendo de uma doença mental sé ria,
transtorno do desenvolvimento ou
transtorno cognitivo grave. O tratamen
Tipos de tratamento
to normalmente focaliza a estabilização
O tratamento forense pode assumir mui por meio da medicação e um esforço
tas formas. Mobley (2006) identificou para manter um ambiente consistente
um modelo extenso de tratamento de em um contexto que tende a resistir a
infrato res que inclui quatro tipos de interven ções individualizadas. Além
tratamento: manejo, manutenção, disso, pes quisas apontaram que esses
programas ambu latoriais e programas programas podem ser efetivos no
especiais. Embora esses tipos de manejo da conduta imprópria (French
e Gendreau, 2006).
Embora a terapia de pacientes não
Sucesso de programas
hospitalizados não seja um aspecto de
rotina dos cuidados ao infrator, existem
para criminosos
esforços crescentes para reconhecer que Embora esteja claro que existem trata
é importante a supervisão continuada mentos forenses que são reconhecidos,
daqueles em risco (Roskes, Feldman e ainda restam algumas perguntas.
Baerga, 2003). De acordo com Mobley Primei ro, é possível tratar criminosos
(2006), o tratamento de pacientes ambu com suces so? Segundo, se for possível
latoriais normalmente focaliza os pro tratar crimi nosos, existem abordagens
blemas de ajustamento e de manejo das de tratamento que têm mais sucesso do
dificuldades, ansiedade e depressão que outras? Por fim, essas abordagens
que são resultado da vida diária. O têm o mesmo su cesso com todos os
foco nes sas situações está na criminosos ou existem alguns que são
identificação de es tratégias efetivas intratáveis? Além do mais, ao
examinar a eficiência ou sucesso des ses
para lidar com as difi culdades,
programas, os pesquisadores focaram
eliminar distorções cognitivas
inúmeras variáveis de resultado. Os
Psicologia Forense 59
estu dos focaram o comportamento
criminoso geral, a reincidência em
e manejo dos sintomas gerais. comportamento violento, conduta
Pesquisas também demonstram que o institucional imprópria,
tratamento de infratores com base na re-hospitalização, gravidade dos sinto-
comunidade é mais efetivo do que as 60 Matthew T. Huss
intervenções de prisão (ver Harris e
Rice, 1997 para uma revisão).
mas, nível de contato social,
O tipo final de tratamento cada vez
estabilidade ocupacional ou adaptação
mais disponível para as populações fo
autorrelatada (Harris e Rice, 1997).
renses é o uso de programas especiali
Embora boa parte das pesquisas tenha
zados (Mobley, 2006). Esses programas
a tendência de focar a recidiva, até
usualmente focam um tema ou área
espe cífica como abuso de substância, certo ponto devido à natu
controle da raiva, transtornos da reza objetiva da variável e sua importân
personalidade, agressão sexual ou cia óbvia segundo um ponto de vista po
erros do pensamento criminoso. Esses lítico, ainda é importante prestar
programas oferecem a oportunidade atenção à maneira como sucesso ou
de intervenção intensiva e focada, eficácia são
sendo que as pesquisas apoiaram seu definidos na avaliação dessa pesquisa.
uso (ver Walters, 2003a, para um pro A história do tratamento de crimino sos
grama focado no pensamento é marcada por muitas reviravoltas.
criminoso). Entretanto, esses Durante a década de 1960, os cuidados
programas também po dem ser caros e à saúde mental começaram a fazer
desgastantes para a equi pe (Mobley, algumas incursões às cadeias e prisões,
2006). apesar da ausência de evidências sobre
a eficácia da reabilitação de criminosos
(Gendreau, 1996). Contudo, em 1974 com criminosos
Robert Martin son concluiu, após uma
revisão das pes quisas sobre Uma vez que é possível tratar
reabilitação de criminosos, que ela era criminosos, existem abordagens de
em grande parte ineficaz (Mar tinson, tratamento que têm mais sucesso? Na
verdade, as pes quisas revelaram
1974). A expressão nada funciona foi
inúmeras característi cas que são
atribuída a ele e se tornou popular
relevantes para o sucesso dos
entre os legisladores nos Estados
programas de tratamento. Os
Unidos, de modo que os esforços para
programas de sucesso devem
reabilitação foram se reduzindo apresentar uma base conceitual sólida
(Cullen e Gendreau, 1989). Foi somente que inclua componen tes
no final da década de 1980 e início dos comportamentais e cognitivos (Lan
anos de 1990 que o otimismo foi denberger e Lipsey, 2005). Uma base con
recuperado por inúmeras outras ceitual sólida significa que os
revisões e estudos metanalíticos da programas devem ter uma base teórica
literatura (Gendreau, 1996), com as particular que conduza à realização de
metanálises mais recentes apoiando a um tratamento mais estruturado e
rea bilitação de criminosos, focado. Isso fornece aos profissionais
considerando-a efetiva (p. ex., de saúde mental um guia a ser seguido
Andrews, Zinger, Hoge e Bonta, 1996; e uma indicação das técnicas que
Dowden, Antonowicz e An drews, devem ser aplicadas. Especificamente, a
2003). Antonowicz e Ross (1994, p. 97) maioria das revisões da literatura reco
menda uma abordagem cognitivo-com
afirmaram em sua revisão que “um
portamental com foco no comportamen
crescente corpo de literatura de
to e aquisição de habilidades para a
pesquisa atesta o fato de que alguns
vida juntamente com a correção das
programas de reabilitação são
atitudes e crenças que levam ao
bem-sucedidos com al guns criminosos comportamento antissocial
quando aplicados por uma equipe” e, (Landenberger e Lipsey, 2005).
assim, destacaram as di ficuldades nos Antonowicz e Ross (1994) encontraram
esforços atuais. Embora a que 75% dos programas de sucesso
eram cognitivo-comportamentais,
enquanto que apenas 38% dos
reabilitação de criminosos possa ser efe programas sem sucesso
tiva quando concebida e administrada eram cognitivo-comportamentais. Os
adequadamente, o conflito programas devem focar as neces
anteriormente descrito entre os sidades criminogênicas ou aqueles
sistemas da justiça crimi nal e saúde fatores
mental pode impedir o pro gresso. No
entanto, as evidências dispo níveis
parecem sugerir que os criminosos que sabidamente levam a futura recidi
podem ser tratados efetivamente. va. As necessidades criminogênicas são
os objetivos que os criminosos têm ou
Programas de sucesso as necessidades que eles satisfazem
quando cometem crimes. Essas
necessidades ti picamente incluem que reinci dam no crime. Por exemplo,
atitudes antissociais, abuso e Gendreau
dependência de substância e pro moção Psicologia Forense 61
de comportamentos pró-sociais
(Dowden e Andrews, 2000). O (1996) mencionou quatro características
tratamento dessas necessidades de programas mal-sucedidos. Ele des
diminui as chances de os criminosos se creveu programas que usam
voltarem para o cri me e aumenta as abordagens terapêuticas psicanalíticas
chances de os que pro curem tradicionais e centradas no cliente,
alternativas não criminais para esses estratégias socioló gicas que focam em
comportamentos antissociais. Por subculturas particu lares, programas
exemplo, 90% dos programas efetivos punitivos que focam na punição do
são voltados para as necessidades criminoso (p. ex., campos de
criminogê treinamento) e programas que direcio
nam os esforços para necessidades não
nicas (Antonowicz e Ross, 1994). Os
criminogênicas e não abordam as
programas devem adequar os cri
causas
minosos ao tipo apropriado de
múltiplas de agressão como ineficazes.
tratamen to com a equipe apropriada
Uma revisão da literatura traz respos
(Gendereau, 1996). Essa abordagem é
tas claras às duas primeiras questões le
frequentemente chamada de princípio vantadas. A literatura sobre o
da responsividade, pois a expectativa tratamento forense apoia cada vez mais
é de que intervenções específicas a noção de que uma variedade de tipos
devem ser responsivas às ca de crimino sos, tenham eles transtornos
racterísticas das pessoas que estão mentais, se jam criminosos em geral ou
sendo tratadas e que essas delinquentes juvenis, podem ser
características podem ser usadas para tratados com sucesso ou reabilitados,
chegar aos melhores re sultados apesar de alguns con flitos inerentes
possíveis. Um estudo examinou o entre a saúde mental e o sistema de
impacto das características do progra justiça criminal. Embora nem todos os
ma que sugeria implementações do tratamentos e equipes sejam criados
prin cípio da responsividade e igualmente, temos evidências re
encontrou que 80% dos programas de ferentes aos componentes necessários
de uma abordagem de tratamento de
sucesso exibiam essas características
suces so. Contudo, a pergunta final
(Antonowicz e Ross, 1994). Pode ser
referente à eficácia desses programas
argumentado que existem outros
com todos os criminosos ainda não foi
componentes para um programa de
respondida. Infelizmente, essa questão
sucesso, mas esses três componentes somente será abordada no Capítulo 5.
parecem ter mais apoio e são os mais Por enquanto, o foco se voltará para a
dire tos na reabilitação de criminosos. área final da prática na psicologia
Também conhecemos as caracterís ticas forense, a consultoria.
de programas que não conseguem
reabilitar criminosos e podem até
mesmo aumentar a probabilidade de Consultoria forense
testemunha perita permane ça objetiva,
A consultoria forense é uma área da prá imparcial e evite a natureza adversarial
tica forense que é menos conhecida e do sistema legal. No entanto, os
me nos examinada do que a avaliação
consultores trabalham como advoga
forense e tratamento forense. Essa
dos. Eles estão trabalhando ativamente
tendência é in teressante apesar do fato
para benefício de um lado em relação
de que o campo mais amplo da
ao lado opositor. Um psicólogo forense
consultoria em julgamen-
62 Matthew T. Huss que é chamado para advogar por certa
posi ção, identificando os aspectos da
literatu ra que apoiam uma posição,
tos é um negócio de milhões de dólares
sabendo que um advogado tentará
(Strier, 1999). O termo consultoria em
apenas explorar esse aspectos, pode
jul gamentos geralmente se refere a
experimentar uma
aspectos da psicologia que são
desempenhados com maior frequência
por psicólogos so ciais, não por
psicólogos clínicos. A con sultoria em falta de familiaridade profissional com
julgamentos se aplica mais esse papel e considerar as implicações
tradicionalmente a tarefas como realizar éticas da utilização inadequada dos
pesquisas para moções de mudança de seus conhecimentos (Shapiro, 2002).
jurisdição, assistência na seleção do júri Em con
e preparação de pessoas para sequência, os especialistas
testemunhar (Boccaccini, 2002; Myers e argumentaram fortemente contra
Arena, 2001). Mantendo o foco nos servir como consultor ou como perito
aspectos clínicos da psicologia forense, testemunha no mesmo caso (Drogin e
esta seção não vai fo car esses aspectos, Barett, 2007). No entanto, realizar
mas apenas a consulto ria forense e sua consultoria forense não é antiéti
relação com a psicologia clínica. co inerentemente, e essas questões
podem ser evitadas. Você deve manter
Como afirmam Drogin e Barrett
(2007, p. 446): “os psicólogos forenses isso em mente quando discutirmos
geralmente encaram a consultoria como consultoria e testemunho de
pouco mais do que uma abordagem especialista no Capítulo 3, e que o
aper papel de um psicólogo forense como
consultor é muito diferente do seu
feiçoada ou segmentada às suas ativida
des familiares e costumeiras: por exem papel como testemunha especialista.
plo, realizar uma avaliação sem ter que Boa parte do trabalho do perito fo rense
testemunhar, revisar um relatório sem reside em auxiliar os advogados em
ter que compor um, localizar um perito uma variedade de questões
sem ter que ser um”. Entretanto, a relacionadas ao julgamento. Uma
distinção não é tão simples. No tarefa pode envolver a identificação de
Capítulo 3, analisa remos amplamente peritos relevantes para testemunharem
as diferentes questões éticas envolvidas no caso. Nessas situa ções, o consultor
em ser um perito ou uma testemunha forense deve se familia rizar com todos
perita. Em geral, espera- -se que uma os aspectos do caso para poder dar os
conselhos mais abrangentes e úteis. identificar algum erro ou aspectos
Um advogado pode pedir a um questionáveis no rela tório (Drogin e
psicólogo forense informações sobre Barrett, 2007). Essa tarefa também pode
onde encontrar um psicólogo que envolver a revisão de algu ma
possa teste munhar sobre o impacto do documentação produzida pelo perito
abuso sexual em uma criança. Além para o caso e alguma outra coisa que
disso, o advogado pode nem mesmo ele escreveu ou declarou publicamente
saber que um perito em psicologia sobre o tema. Essas buscas podem
poderia ser útil em uma deter minada fornecer de clarações contraditórias em
situação ou o tipo de especialista em casos relevan tes que podem ser usadas
saúde mental que seria o mais útil em para desacredi tar o perito que está
uma situação particular (Drogin e testemunhando.
Barrett, 2007). Por vezes, a consultoria Uma última área em que os psicólo gos
consiste em informar o advogado sobre forenses estão sendo cada vez mais
as pesqui sas em uma determinada área usados como consultores se relaciona
(Gottlieb, 2000). O consultor pode ter com as ações políticas. Muitas agências
conhecimen to das diferentes gover namentais ou independentes
organizações confiáveis e também estão usan do os psicólogos forenses
poder revisar com mais com petência o para ajudá-las a formar iniciativas
passado profissional de espe cialistas políticas ou avaliar po líticas já
potenciais para recomendar o existentes. Por exemplo, Norris (2003)
explicou o papel que os consultores
forenses desempenharam na reformula
melhor deles. Um advogado não dispõe ção das políticas da igreja católica para
do tempo para desenvolver esse nível a proteção das crianças após a crise de
de conhecimento e, assim sendo, o abu sos sexuais. A igreja católica
consultor forense poderá ser muito formou uma comissão que teve a
útil. incumbência de che gar a um conjunto
Outro caminho comum para os con de políticas que prote
sultores é avaliar o testemunho ou o Psicologia Forense 63
pro duto do trabalho de um perito
oponente (Singer e Nievod, 1987). Um geria as crianças de futuro abuso
psicólogo fo rense pode examinar o sexual. Os consultores forenses foram
relatório do perito oponente para envolvidos na formulação de novas
avaliar se parece que esse especialista políticas e pro gramas e no treinamento
administrou adequadamente os testes de autoridades da igreja para
psicológicos, se os dados apoiam as implementar e responder de acordo
conclusões do relatório e se o relatório com as políticas. Esse exemplo é
aborda todas as exigências estatutárias apenas um em que os consultores foren
ses podem usar o seu conhecimento
para aquela ação civil ou criminal parti
fora dos papéis mais tradicionais de
cular. O advogado pode usar essas infor
avaliação e tratamento.
mações para fazer um exame
Além desses três papéis, os psicólo
transversal do perito opositor e
gos forenses são usados para consulta
em inúmeras outras situações além de instrumentos forenses especializados, e
testemunhar como especialistas. Deve também se basear significativamente
ser reiterado que trabalhar como em
consultor forense é um trabalho que informações de arquivo ou de terceiros.
vai além do treinamento normal que os O tratamento forense se interessa por
psicólogos forenses normalmente tratar e reabilitar uma variedade de
recebem e envolve questões éticas tipos de criminosos, desde os
potenciais que podem en criminosos vio lentos até aqueles com
trar em conflito com a abordagem cientí transtorno mental. O tratamento
fica objetiva tradicional assumida psicológico em contextos forenses
quando trabalham como especialistas. consiste rotineiramente de ma nejo,
No entan to, é provável que os manutenção, terapia com pacientes
psicólogos forenses cada vez mais externos ou programas concebidos para
trabalhem como consulto res nesses questões específicas relevantes para os
papéis tradicionais e também em criminosos. O tratamento de criminosos
muitos outros papéis ainda não reco já foi controverso devido aos propósitos
nhecidos.

Termos-chave
Resumo
A avaliação forense é parte fundamen
tal da prática forense e a atividade mais conflitantes do sistema de justiça
comum que os psicólogos forenses de criminal e do sistema de saúde mental
sempenham. As avaliações forenses são e as evi dências do sucesso dessas
realizadas para auxiliar o tribunal em abordagens de tratamento.
res posta a uma questão legal Atualmente, a literatura psi cológica
particular. Por consequência, as deixa relativamente claro que o
avaliações forenses ten dem a diferir tratamento pode ser bem-sucedido e
das avaliações terapêuticas tradicionais que existem componentes específicos
em vários aspectos: (1) metas e carac terísticos dos programas de
objetivos; (2) relação entre as partes; (3) tratamento bem-sucedidos.
identidade do examinando; (4) conse A área final da prática forense é a
quências e (5) precisão das informações. consultoria forense. A consultoria fo
A avaliação forense normalmente con- rense inclui uma variedade de tarefas
64 Matthew T. Huss informais que podem ser distintas da
avaliação e tratamento e também se so
brepõem a eles. Como o papel do
siste de uma entrevista clínica que pode
consul tor forense tende a encorajar o
ser não estruturada, semiestruturada
psicólogo forense a trabalhar como
ou estruturada; a testagem psicológica,
advogado, po dem surgir certas
que pode incluir uma variedade de
questões profissionais e éticas que
testes psi
devem ser cuidadosamente
cológicos para avaliar personalidade, in consideradas.
teligência, déficits neuropsicológicos ou
entrevista não estruturada instrumentos para avaliação
entrevista forense
semiestruturada necessidades
ganho secundário criminogênicas princípio da
âmbito da prática
informações de arquivo responsividade psicologia
avaliação
instrumento penitenciária testes
terapêutica
forensemente relevante objetivos
confiabilidade
instrumentos forenses espe testes projetivos
distorções cognitivas
cializados validade
entrevista estruturada
psychology: Emerging topics and expanding roles
(pp. 465–488). Hoboken, NJ: John Wiley & Sons.
Gendreau, P. (1996). Offender rehabilitation:
What we know and what needs to be done.
Leitura complementar Criminal Justice and Behavior, 23, 144–161.
Grisso, T. (2003a). Evaluating competencies:
Drogin, E. Y., & Barrett, C. L. (2007). Off the Forensic assessments and instruments. New
witness stand: The forensic psychologist as York: Kluwer Academic/Plenum Publishers.
consultant. In A. M. Goldstein (Ed.), Forensic

Testemunho pericial e o
3 papel
de um perito
auxiliá-la. Também é importante perceber
que os psicólogos forenses geralmente
atuam como peritos sem que testemu
nhem no tribunal, e boa parte da nossa
discussão neste capítulo se propõe a dis
tinguir o perito que testemunha do perito
A prática da psicologia forense com fre
que não testemunha.
quência acaba tendo o psicólogo forense
Ao concordar em entrar na sala do
no papel de testemunha perita. Como
tribunal, o psicólogo defronta-se com
testemunha perita, os psicólogos podem
vários desafios importantes aos quais ele
auxiliar a corte diretamente, informan do
não está exposto na rotina de sua prática
sobre os achados psicológicos e sua
clínica (Brodsky, Caputo e Do
aplicação a uma questão legal particular.
No entanto, é importante lembrar que os mino, 2002). A natureza antagonista do
psicólogos forenses estão meramen te próprio sistema legal é um desafio para
prestando assessoria ao sistema legal. O os psicólogos forenses. Os psicólogos ti
sistema legal e os juízes em particular picamente atuam em ambientes em que
são resistentes a que sua autoridade seja existe cordialidade e discussão aberta de
usurpada ou substituída por evidências ideias. No entanto, a natureza anta
psicológicas (Ogloff e Cronshaw, 2001). gonista da sala do tribunal pode deixar
O propósito do psicólogo forense como claro que as ideias e conclusões não se
testemunha perita não é substituir a auto rão discutidas, mas criticadas dentro de
ridade da corte para tomar decisões, mas uma atmosfera competitiva. Além disso,
essa crítica é realizada em um local mui síndrome de trauma por estupro, hipno
to público e existe pouco apoio ao perito se ou evidências por meio de polígrafos.
que testemunha. Um perito não pode se Uma metanálise é uma análise estatística
dar ao luxo de solicitar um intervalo ou em que os estudos disponíveis são com
telefonar para um amigo para pedir um binados estatisticamente para fazer e res
conselho enquanto está no papel de ponder perguntas que não são possíveis
testemunha. Ele está realmente sozinho. com apenas um único estudo. Essa abor
Toda essa experiência acontece em um
dagem estatística ajuda a complementar
contexto com o qual o perito na maior
a abordagem tradicional de resumir uma
parte das vezes não está familiarizado, e
área de pesquisa que consistiu de leitu ra
essa é outra razão pela qual o testemu
das pesquisas disponíveis e chegar a
nho do perito foi chamado de a expe
riência profissional potencialmente mais uma conclusão com base na consideração
assustadora em psicologia (Brodsky et racional dos diferentes estudos. Nietzel e
al., 2002). colaboradores (1999) encontraram um
O uso crescente de profissionais da impacto modesto entre esses tipos dife
saúde mental como peritos testemunhas rentes de casos de testemunho de peritos.
nos Estados Unidos, Canadá e em mui No entanto, não há indicação de que os
tos lugares por todo o mundo (Colbach, tribunais já estejam fartos do testemunho
1997; Knapp e VandeCreek, 2001; Saun dos psicólogos forenses ou que o estejam
ders, 2001) sugere que eles produzem um descartando.
impacto significativo no sistema legal. A. Além disso, a maior parte do traba lho
Hess (2006) sugere que, à medida que forense não culmina no testemunho do
nossa sociedade se torna mais compli especialista. O trabalho de consultoria
cada e o conhecimento se expande em por sua própria natureza não resulta no
66 Matthew T. Huss testemunho objetivo de um especialista.
As avaliações e o tratamento forense tam
um ritmo exponencial, existe uma ne
cessidade ainda maior de especialistas.
Na verdade, ele sugere que não utilizar bém não tendem a acabar com o testemu
um perito em um caso constitui uma fa nho da sala do tribunal, provavelmente
lha profissional por parte do advogado porque a grande maioria dos casos é re
(Hess, 2006). Contudo, a verdade é que o solvida antes do julgamento. Entretanto,
impacto do testemunho de um perito na ainda é importante focar atenção especial
tomada de decisão do júri não está nos peritos que testemunham, porque
completamente claro (Nietzel, McCarthy boa parte da visão do público sobre a
e Kern, 1999). Nietzel e colaboradores psicolo gia forense está baseada nessas
realizaram uma metanálise de 22 exibições públicas do trabalho forense.
estudos publicados examinando o Além disso, muitos dos temas que
impacto do testemunho de especialistas discutirei em rela ção ao testemunho de
dentre uma variedade de casos, peritos, como ques tões éticas e
incluindo tópicos di parcialidade, são a realidade de todo o
trabalho forense em que o psi cólogo está
versos como abuso infantil, identificação
atuando como um especialista objetivo,
de testemunhas oculares, inimputabilida
resulte isso em testemunho no tribunal
de, mulheres espancadas ou evidência de
ou não. o uso de uma variedade de achados e mé
todos psicológicos para auxiliar a corte,
incluindo algumas áreas clinicamente re
História do lacionadas com o comportamento crimi
testemunho pericial nal. Embora as suas primeiras alegações
referentes à capacidade da psicologia de
Os psicólogos nem sempre testemunha
fazer a diferença na sala da corte tenham
ram amplamente como peritos. As opi
sido excessivamente otimistas (Benjamin,
niões variam, mas Gravitz (1995) sugere
que um dos primeiros exemplos de tes 2006), Munsterberg estimulou a conside
temunho de perito nos Estados Unidos ração da possibilidade, apesar das críticas
que poderia ser considerado sob a ideia feitas pelos estudiosos legais como John
geral da psicologia ou psiquiatria forense Wigmore (ver Quadro 3.1 para discussão
ocorreu em um julgamento por assassina da critica de Wigmore a Munsterberg).
to em 1846. John Johnson foi julgado pelo Psicologia Forense 67
assassinato de Betsey Bolt, como parte de
um plano para encobrir uma anterior O status profissional dos psicólogos
agressão sexual da Sra. Bolt por Johnson. clínicos na parte inicial do século XX tor
Uma especialista, Amariah Brigman, tes nou improvável que os psicólogos inva
temunhou exaustivamente sobre o estado dissem as salas dos tribunais. Durante a
de saúde mental de uma das testemunhas
infância da psicologia clínica, os psicó
que havia sido paciente em um hospital
logos clínicos eram em sua maior parte
psiquiátrico. Entretanto, a maioria das
vistos como administradores de testes
tentativas iniciais de encorajar o uso de
psicológicos e certamente secundários
princípios psicológicos no sistema legal
ocorreu antes que o campo da psicologia aos psiquiatras no campo da saúde
clínica estivesse formalmente estabele mental. Em consequência, os psiquiatras
cido e, assim, ocorreram em áreas como foram os únicos consistentemente
percepção e cognição (p. ex., identifica- capazes de teste munhar em questões
legais (Ewing, 2003). Essa prática mudou
com Jenkins vs. Esta dos Unidos (1962). A
ção de testemunhas oculares). Essas pri opinião da maioria na Corte de
meiras tentativas foram auxiliadas por Apelações no Distrito de Co lumbia,
figuras significativas como Hugo Muns conforme o Juiz David Bazelon, a quem
terberg (Capítulo 1) e seu livro On the wi também mencionarei no Capítulo 7
tness stand (1908), em que ele incentivava (inimputabilidade), decidiu que, devido

Quadro 3.1 Discussão da controvérsia entre Munsterberg e Wigmore


Psicologia em 1898. É reconhecido em geral
Hugo Munsterberg foi um dos psicólogos não somente como o pai da psicologia
mais eminentes do começo de 1900. Ele se forense,
tornou diretor do primeiro laboratório psi mas de todo o campo da psicologia aplicada.
cológico dos Estados Unidos, originalmente Uma figura que era igual, se não supe rior, a
estabelecido em Harvard, e um dos primei ros Munsterberg no seu campo do direito era
presidentes da Associação Americana de John Henry Wigmore. O Decano Wigmo re foi
diretor em Harvard da Northwestern Law tivéssemos o crescimento prolífico da
School e potencialmente o estudioso ju rista psicologia forense que ocorreu durante
mais importante da sua época. Wigmore
os últimos 40 anos.
concordou com boa parte do sentimento que
Munsterberg expressou em No banco das tes
temunhas e também proferiu palestras sobre
Admissibilidade do
temas como a falibilidade das afirmações de
testemunho pericial
testemunhas oculares antes de ter sido pu
blicado No banco das testemunhas. No entanto,
Wingmore achava que muitas das alegações Para que um psicólogo testemunhe em
de Munsterberg eram excessivas e sem funda um julgamento, o seu testemunho
mentação na pesquisa psicológica. Wigmore deve rá ser legalmente permissível ou
deu sua resposta a Munstererg em um artigo
admi tido por um juiz. A
na edição de 1909 do Illinois Law Review de
admissibilidade do testemunho
uma forma criativa. Wigmore estruturou a
sua res posta como um julgamento fictício em científico do perito foi de in teresse
que um personagem, “Muensterberg”, era crescente durante a última déca da,
colocado em conforme indicado por alguns casos
julgamento por difamar a profissão legal. A significativos decididos
maioria dos relatos do julgamento si mulado respectivamente pela Suprema Corte
aludiam a que ele era parecido com outros dos Estados Unidos e Canadá (veja
acontecimentos históricos como o da última
Daubert vs. Merrell Dow
posição de Custer, estando Munster berg no
papel de Custer (Doyle, 2005). Wig more
Pharmaceuticals, 1993; Regina vs.
conseguiu refutar os argumentos de Mohan, 1994). Contudo, a
Munsterberg sobre a aplicação da psicologia admissibilidade do testemunho
ao direito. Embora o seu relato ficcional te nha científico e do testemunho psicológico
feito Munsterberg recuar e alguns estu diosos remonta a antigos casos e princípios
da psicologia tenham argumentado que isso que continuam a ser relevan tes hoje,
deixou a psicologia completamente
apesar dessas decisões mais re centes.
desconsiderada aos olhos da lei (Brigham,
Também é extremamente impor tante
1999), também possibilitou uma das primeiras
oportunidades de a psicologia aprender com que os psicólogos forenses tenham
a comunidade legal. Além do mais, Wigmore conhecimento dos padrões legais para
é frequentemente descrito como um dos maio a admissibilidade do seu testemunho,
res, se não o maior, proponentes da psicologia porque isso tem relação direta com os
como informante do sistema legal. métodos e técnicas que eles utilizam
68 Matthew T. Huss na sua prática. Embora seja
improvável que os psicólogos
ao seu treinamento e conhecimentos forenses testemunhem na maioria dos
sig nificativos, os psicólogos clínicos seus casos, eles devem es tar
não de veriam ser impedidos de preparados para a possibilidade em
testemunhar em questões de saúde cada caso.
mental como uma ques tão legal
(Ewing, 2003). Conforme escreve
Ewing (2003, p. 58) em relação a Padrão Frye
Jenkins, “a sua importância para a
história da psico logia forense não Nos Estados Unidos, o padrão
pode ser subestimada”. Sem a decisão relevante na maioria dos estados e no
em Jenkins, é improvável que governo fe deral antes de Daubert era o
padrão Frye. Em Frye vs. Estados
Unidos (1923), a Cor te de Apelações
do Distrito de Columbia declarou que probatório significa que uma
“embora as cortes tenham um longo determina da informação ajuda a
caminho para admitir o teste munho provar um ponto particular ou é útil
de um especialista deduzido de um na decisão de uma questão diante da
princípio ou descoberta reconhecidos, corte. Prejudicial se refere aos danos
a coisa a partir da qual é feita a potenciais ou à parciali dade que uma
dedução deve ser suficientemente evidência ou testemunho podem
consagrada para ter conseguido causar. Todas as evidências apre
aceitação geral no campo particular a sentadas na corte são tanto probatórias
que ela pertence” (p. 1014). Portanto, a quanto prejudiciais. Por consequência,
base para permitir que os es pecialistas esse teste de equilíbrio significa que as
científicos testemunhem sob o teste de informações que um perito fornece
Frye era de aceitação geral. Se um têm de ser mais benéficas (ou seja,
procedimento científico ou teoria fosse mais pro batórias) do que qualquer
aceito em geral por um campo prejuízo ou in fluências que elas
científico particular, era permitido que possam introduzir na mente do juiz
o especialis ta testemunhasse. Se o ou do júri, os julgadores do fato, ou
campo específico não aceitasse a teoria não serão admitidas na corte. Por
ou procedimento como preciso, o exemplo, maus atos realizados no pas
especialista não tinha permissão para sado, como o fato de o acusado já ter
testemunhar. Por exem plo, em Frye a as sassinado alguém anteriormente,
questão era a admissibili dade da não são em geral admissíveis em um
testemunha especialista em fun ção de julgamento criminal. A razão é que os
um polígrafo (isto é, detector de tribunais de terminaram que esse tipo
mentiras). A corte concluiu que o de informação influenciaria os jurados
campo científico de um modo geral contra um réu de modo irracional e
não aceitava o polígrafo como traria pouco, se algum, valor
confiável ou válido, de modo que o probatório na decisão sobre o réu ser
testemunho não foi admitido na corte culpado do crime atual. O testemunho
e os especialistas em polígrafos ainda do perito deve atender ao critério de
hoje continuam a ser excluídos para ser mais benéfico do que tendencioso.
testemunhar. O teste de Frye era admi
nistrado com facilidade pelos
tribunais, uma vez que requeria
Daubert vs. Merrell Dow
mínima sofistica ção científica dos Muitos criticaram o teste de Frye por
juízes (Faigman, Porter e Saks, 1994). so mente se aplicar a testemunhos
Os tribunais também equilibram o va científicos recentes ou novos, o que
lor probatório da evidência em significava que os tribunais tinham
compara ção com as consequências dificuldade em definir a comunidade
prejudiciais de admitir a evidência científica apropriada para decidir se
(Taslitz, 1995). Valor ele era aceito em geral. Ele tam bém foi
criticado como conservador de mais, uma alegação de dois querelantes em
porque excluía evidências confiáveis nome dos seus filhos que nasceram
que tinham a infelicidade de ser com graves defei tos de nascença. A
recentes. Por fim, as atenções ao corte excluiu o testemu nho dos
testemunho cientí fico de especialistas especialistas dos querelantes que
começaram a se focar na admissão da tentavam provar a ligação entre o uso
junk science. Junk science do medicamento Bendictin e os
Psicologia Forense 69 defeitos das crianças. A Suprema
Corte, por fim, rever teu a decisão do
era considerado o testemunho de tribunal inferior de excluir as
peritos que era admitido sobre temas evidências do especialista dos querelan
que não es tavam consagrados na tes e decidiu que o teste de Frye de
comunidade cien tífica, mas que eram aceita ção geral não era a regra
úteis para o sistema legal de alguma apropriada para decidir a
maneira. Por exemplo, o testemunho admissibilidade de evidências
de representantes das com panhias de científicas (Daubert vs. Merrell Dow
tabaco sugerindo que fumar cigarros Phar maceuticals, Inc., 1993). A Corte
não causa câncer foi usado como um identificou o papel do juiz como o de
exemplo de junk science fora do campo um guardião em relação a todo o
da psicologia (Givelber e Strickler, testemunho científico e especificou um
2006). Em Daubert, a Corte concluiu processo de duas partes para
que o teste de Frye era obsoleto e que avaliação da admissibilidade que se
a admissibili dade do testemunho focava na relevância e confiabilidade. A
científico do perito agora seria Corte indicou que, para que as
governada pelos requisitos de Daubert evidências cientí ficas sejam relevantes,
(Daubert vs. Merrell Dow Pharma devem estar relacio nadas ao assunto
ceuticals, Inc., 1993). Veja a Figura 3.1 em questão. Em relação ao teste de
para relevância, a Corte indicou que o juiz
um exemplo do padrão Daubert em tinha o discernimento para excluir um
ação. Daubert originalmente envolvia testemunho relevante quando o valor
70 Matthew T. Huss
Figura 3.1 Em 2005, Lewis “Scooter” Libby Jr. foi indiciado com inúmeras acusações
relacionadas à revelação do agente secreto da CIA Valerie Plame. Libby contratou vários
psicólogos renomados para apresentarem pesquisas psicológicas aos jurados, mas a corte
considerou o testemunho inadmissível segundo o padrão Daubert porque achou que
os estudos subjacentes eram de validade questionável; o testemunho não auxiliaria o júri;
o efeito prejudicial do testemunho era maior do que o seu valor probatório; e o testemunho
substituiria o júri como o julgador do fato. © Alex Wong/Getty Images.
interessados na exatidão do seu testemu
nho (validade). No entanto, para estabe
probatório tivesse menos peso do que o
lecer a confiabilidade, a Corte identificou
impacto prejudicial do testemunho. Ao
uma lista de diretrizes:
definir o seu segundo critério,
confiabilidade, a Corte se baseou nas Re 1. A teoria ou técnica em questão é testá
gras Federais de Evidência (FRE) 702, que vel e já foi testada?
comparam o conhecimento científico com 2. A teoria ou técnica foi submetida à re
evidências confiáveis do perito. A Corte visão dos pares ou à publicação? 3. Qual
estava incorreta quando sugeriu que os é o índice de erro conhecido ou potencial
juízes estavam interessados na consistên para as técnicas científicas?
cia da evidência dos peritos (confiabili
dade) quando eles estavam na realidade
Em essência, o caso identificou até onde
um juiz da corte comum precisa errar nas
4. A teoria é aceita de modo geral na co suas decisões de admissibilidade para
munidade científica? que
Psicologia Forense 71
Fica claro com essa lista que Daubert
também incorporou, como um compo
uma corte de apelação a reverta. A Corte
nente do novo teste, muito do que foi
decidiu que um único padrão, o abuso de
utilizado no teste de Frye, o qual reque
ria aceitação geral. critério, era apropriado. O importante não
A decisão de Daubert foi com certeza um era o padrão legal particular, mas que
marco, conforme indicado pelo volu me esse padrão legal fosse alto. O padrão do
de comentários que se seguiram (p. ex., abu
Black e Singer, 1993; Imwinkelried, 1993). so de critério sugere que um juiz da corte
Apesar do volume de debates, houve pou comum precisa tomar uma decisão clara
ca concordância sobre como esse padrão mente irracional ao admitir o testemunho
afetaria a admissibilidade da evidência de um perito e, assim, o tribunal estava
científica (Faigman et al., 1994; Fenner, acatando os juízes de corte comum como
1996). Apesar de a Corte acreditar que o os responsáveis em última análise pela
novo padrão estaria mais de acordo com a aplicação de Daubert. O termo guardião foi
tendência das Regras Federais de utilizado para significar esse papel do juiz
Evidência e que os tribunais teriam como o árbitro final do mérito científico
condições de exer cer maior flexibilidade do testemunho de um perito.
(Daubert vs. Merrell Dow Pharmaceutics,
Em Kumho Tire Co. vs. Carmichael
Inc., 1993), as verdadei ras consequências
(1999), a questão era se o testemunho não
ainda não estavam cla ras. Também não
científico ou técnico deveria ser avaliado
estava claro como juízes sem treinamento
pelos critérios Daubert. Os tribunais esta
científico avaliariam o mérito científico
do testemunho científico. vam colocando os peritos científicos em
um padrão mais alto do que os peritos téc
nicos? A Corte decidiu que Daubert deve
O restante da trilogia de ria se estender ao conhecimento técnico e
Daubert que deveria ser aplicado com alguma fle
xibilidade pelo juiz da corte comum. Essa
Dois outros casos tentaram esclarecer a
decisão aplicou claramente Daubert a as
abrangência de Daubert, os
procedimentos referentes à pectos controversos da psicologia clínica
admissibilidade do testemu nho do sobre os quais os tribunais estão discutin
especialista e completaram a trilo gia dos do quanto à sua cientificidade. Ao esten
casos que formam os fundamentos para a der o Daubert até o conhecimento técnico
admissibilidade do testemunho do perito e especializado, os tribunais não tiveram
moderno nos Estados Unidos. A questão que criar um padrão diferente para a psi
diante da Suprema Corte em Ge neral cologia clínica em comparação com aspec
Electric Company vs. Joiner (1997) foi o tos da psicologia que eram menos aplica
padrão de revisão para a reversão das dos e consagrados mais empiricamente.
decisões de cortes inferiores referentes à Então, embora a Suprema Corte conti
admissibilidade de evidências científicas. nuasse a esclarecer a sua decisão original
em Daubert por meio de Joiner e Kumho, o desses achados, Daubert, Joiner e Kumho
verdadeiro impacto do testemunho do sugerem que os psicólogos forenses de
perito ainda não estava completamente
claro. Esses padrões adicionais, na ver
dade, dificultavam que as evidências vem esperar um escrutínio legal maior e,
científicas fossem admitidas? Daubert por consequência, haverá uma melhora
72 Matthew T. Huss na base científica do testemunho psicoló
gico admitido nas cortes (Faigman e Mo
excluiu a junk science? Groscup, Penrod, nahan, 2005). Os casos da Suprema Corte
que são relevantes para a admissibilidade
Studebaker, Huss e O’Neil (2002) exami
do testemunho científico estão resumidos
naram quase 700 casos de apelação à
na Tabela 3.1.
corte que ocorreram antes e depois de
Daubert e encontraram vários resultados
interes santes que poderiam sugerir o Questionamentos ao
verdadeiro impacto de Daubert. De um
modo geral, não houve um impacto testemunho pericial
perceptível na ad missibilidade do
Exame cruzado
testemunho do perito. A pesquisa
indicou que os tribunais passam mais Além de excluir a possibilidade de o pe
tempo examinando as qualificações do rito testemunhar como uma questão le
especialista do que os seus métodos, e gal, existem muitas outras maneiras pelas
que auxiliar o juiz de fato era o critério quais o testemunho de um perito pode
mais importante para admissão compa ser questionado na corte. O método mais
rada a qualquer um dos quatro critérios comum de questionar um perito é o exa
de Daubert. Esses resultados sugerem que me cruzado. Na verdade, os tribunais até
em vez de avaliar a qualidade do teste mesmo se baseiam no uso do exame cru
munho científico, os tribunais continuam zado como uma forma de questionar o
a se basear nos mesmos padrões que usa tes temunho do especialista que eles
vam antes de Daubert. Daubert pode ter acham suspeito, muito embora ele seja
aumentado a avaliação referente à prática admitido. O direito não somente
da psicologia forense, mas provavelmen considera que juí zes que não foram
te não aumentou de fato o limiar para o treinados em um cam po científico
mérito científico dela. Como os juízes não podem avaliar o seu método científico,
são treinados para serem peritos científi mas também que um júri pode fazer o
cos, eles podem, em vez disso, se basear mesmo devido ao poder do exame
na utilidade do testemunho do perito ou
decidir se ele irá auxiliar a corte. Apesar

Tabela 3.1 Casos da Suprema Corte relevantes para a admissibilidade do


testemunho científico
Caso da suprema corte Resumo das decisões
Pharmaceuticals (1993)
Frye vs. Estados Unidos
(1923) General Electric Co. vs.
Joiner (1997)
Daubert vs. Merrell Dow
Kumho Tire Co. vs. outros especialistas no campo
Carmichael (1999) discordam, se o especialista presente se
Testemunho científico admitido se for aceito baseou nesses ma teriais ou métodos.
de um modo geral na comunidade científica Evidências empíricas indicam que a
Testemunho científico admitido se for tática pode ter sucesso, um exame
relevante e confiável de acordo com os
cruzado efetivo de uma testemu nha
quatro critérios potenciais
especialista já alterou escolhas de ve
Juiz da corte comum é nitidamente o guardião
redicto em estudos simulados de
para admissão de evidências científicas
jurados (p. ex., Spanos, Dubreuil e
Decisões anteriores sobre admissibilidade do
Gwynn, 1991).
testemunho científico se aplica ao
conhecimento técnico e especializado
Perito opositor
cruzado. O exame cruzado ocorre Outra forma pela qual um perito pode
depois que uma testemunha ser questionado é por meio do uso de
testemunhou, e o advogado oponente um perito opositor. Embora esse
pode questionar o pe rito diretamente. método re sulte em muito menos do que
Brodsky e colaboradores (2002, p. 30) uma carga
resumiram o exame cruzado de uma Psicologia Forense 73
testemunha especialista dizendo: “Mais
do que qualquer outro aspecto do emocional para o perito, o resultado
processo legal, as testemunhas temem o pode ser similar. Entretanto, os peritos
exame cruzado. Passamos a pensar no oposi tores podem aumentar o custo de
exame cruzado como uma batalha pelo um jul gamento, deixar o juiz e o júri
poder e controle entre a testemunha e o confusos e conduzir à crítica frequente
advogado”. Desacreditar ou impedir do duelo de especialistas e, assim,
uma testemunha especialista desviar o foco das verdadeiras questões
normalmente ocorre por meio do uso e colocar mais ênfa se no testemunho do
de inconsistências anteriores que foram perito (Hess, 2006). Entretanto, a nossa
registradas em ca sos passados ou discussão anterior da metanálise de
publicadas em materiais profissionais. Nietzel e colaboradores (1999) sugere
Um especialista pode ter expressado que as testemunhas especia listas
uma opinião em testemunho anterior podem causar um impacto modes to.
ou até ter publicado um livro com a Especificamente, Devenport e Cutler
opinião dada e depois contradizer es sas (2004) apontaram que o testemunho
afirmações no testemunho atual. Um opo sitor da acusação poderia diminuir
advogado bem preparado vai pesquisar o im pacto da testemunha especialista
as declarações anteriores na procura des da de fesa. Portanto, parece haver
ses exemplos para desacreditar um peri algum apoio empírico também para
to (Ewing, 2003). Advogados opositores essa abordagem.
também se baseiam em outros materiais
especializados que possam contradizer
Instruções judiciais
a opinião do perito ao apontar que
influência a sua credibilidade ou acre
Um desafio final ao testemunho do pe ditação. Existem muitos fatores que os
rito é o uso das instruções judiciais. Um comentaristas sugeriram que
juiz tipicamente lê uma lista de aumentam a credibilidade de uma
instruções para o júri antes da testemunha es pecialista. Esses fatores
discussão do caso, as quais o júri deve incluem se vestir profissionalmente,
seguir durante o pro cesso de familiaridade com a sala do tribunal,
deliberação. Os juízes podem instruir manter um bom con tato visual e
os jurados quanto ao escrutínio para projetar sua voz e demons trar
dar certo testemunho ou mesmo es compostura no contexto adversarial
quematizar o testemunho de um modo (Brodsky et al., 2002; Melton, Petrila,
particular para o júri. A pesquisa empíri Poythress e Slobogin, 1997). Azevedo
ca deixa claro que os jurados têm muita (1996) e Blau (1998) argumentaram inde
dificuldade para entender e aplicar as pendentemente que existem fatores que
ins truções judiciais (Penrod e Cluter, reduzem a credibilidade de um perito,
tais como passar uma parte excessiva
1987; Ogloff e Rose, 2005). Entretanto,
do tempo do seu testemunho se
existem muitas variáveis, como o
referindo à sua profissão principal, a
timing, o pro pósito das instruções e a
falta de conhe cimento do caso atual,
natureza das instruções, que
inconsistências entre os diferentes
desempenham um papel na casos em que o perito testemunhou e o
compreensão dos jurados e impacto no uso de métodos científi cos
veredicto final (Penrod e Cutler, 1987; inadequados.
Ogloff e Rose, 2005). Pelo menos um No entanto, os fatores sugeridos pe los
estu do encontrou que o testemunho do autores são em grande parte teóricos.
perito é mais provável de produzir Existem achados empíricos que também
impacto nos identificaram fatores que influenciam a
74 Matthew T. Huss credibilidade de uma testemunha
especia lista. Por exemplo, estudos de
jurados do que as instruções de um juiz júri simula
(Cutler, Dexter e Penrod, 1990). Entretan
to, o sistema legal continua a encarar as
instruções judiciais como uma maneira do focaram no efeito mercenário. O
de influenciar os jurados no que se efeito mercenário foi descrito como
refere à avaliação que eles fazem da fazendo com que os peritos pareçam
testemunha especialista. menos acreditá veis porque foram
pagos por um dos la dos para
testemunhar. Cooper e Neuhaus (2000)
Fatores que influenciam a
examinaram o nível do pagamento
credibilidade da (alto ou baixo), o nível das credenciais
testemunha especialista (alto ou modesto) e a frequência do
testemunho (frequente ou novato) em
Além das realidades legais que têm im três estudos de júri simulado. Eles
pacto no trabalho da testemunha espe indicavam com con sistência que os
cialista forense, também existem vários peritos muito bem pagos que
fatores que foram identificados como testemunhavam geralmente eram me
nos acreditáveis e menos apreciados psicó logos estão não só testemunhando
pelos jurados potenciais. Boccaccini e como também “assumindo o controle
Brodsky (2002) foram mais um passo da sala do tribunal” (Coles e Veiel,
além e rea lizaram uma pesquisa por 2001, p. 607). A preocupação com o uso
telefone com 488 moradores de uma crescente de peritos é de que isso possa
comunidade. Os resultados revelaram significar que eles estão não somente
que os participantes tinham maior informando o juiz ou o júri além do
probabilidade de acreditar nos peritos
conhecimento que têm, como também
da sua comunidade local com parados
substituindo a sua prerro
aos peritos nacionais, peritos que
gativa de tomar decisões. Essa
praticavam ativamente, peritos que
preocupa ção aumenta em especial
teste munharam para a acusação e
defesa em julgamentos anteriores e quando é pres tado um testemunho que
peritos que não receberam nenhum não atende aos padrões do testemunho
pagamento. Embora possa ser difícil científico. Coles e Veiel (2001) trazem
para um psicólogo forense acompanhar uma preocupação sig nificativa de que o
todos esses achados e ainda ganhar a testemunho em saúde mental está
vida, eles devem ser considera dos por sendo mal empregado devido à falta de
advogados e peritos preocupados em rigor científico, e encorajaram os
parecerem mercenários. tribunais a limitar o testemunho de
psicó logos forenses. Essa crítica assume
impor tância ainda maior no caso de
Críticas ao testemunho final sobre a questão.
testemunho pericial
Surgiram muitas críticas provenientes Testemunho de opinião final
da psicologia e direito com respeito aos
psicólogos forenses que testemunham Opinião final ou testemunho final
como testemunhas especialistas. Algu sobre a questão é o testemunho do
mas dessas críticas são o resultado do perito em que ele não só apresenta uma
conflito inerente entre as duas conclusão, mas essa conclusão
disciplinas e a natureza adversarial do responde à pergunta legal final,
sistema legal, enquanto outras devem pergunta que no momento está pe
ocorrer por dis rante a corte. Por exemplo, a pergunta le
tintas razões. gal final em um julgamento criminal é
se o acusado é culpado ou inocente. Se
um psicólogo forense fosse chamado
Assumindo o controle da para tes temunhar em um caso criminal
sala do tribunal ou escre veu um relatório que afirmava,
com base
Vários estudiosos sugeriram que os psi Psicologia Forense 75
cólogos estão sendo cada vez mais soli
citados para auxiliar os tribunais (Col na sua avaliação do acusado, que ele era
bach, 1997; Knapp e VandeCreek, 2001; culpado, isso constituiria um
Saunders, 2001). No entanto, também testemunho de opinião final. É claro
foi expressa a preocupação de que os
que soa um pouco tolo que um conforme indicado no FRE 704b (Finkel,
psicólogo ateste diretamen 1990; Wilkinson, 1997). Falaremos mais
te que uma pessoa é culpada ou so bre essa questão no Capítulo 7.
inocente porque determinar isso é 76 Matthew T. Huss
papel do juiz ou do júri.
Tradicionalmente, o testemunho final Existem muitos problemas em
sobre a questão que ocorre em situa evitar o testemunho final sobre a
ções que envolvem inimputabilidade, ca questão. Juízes e advogados
pacidade e risco de periculosidade frequentemente esperam, ou mesmo
futura foi encarado como inapropriado demandam, que os psicólogos
porque ele trata de uma questão legal, apresentem uma conclusão final quan
não de uma questão psicológica, e isso do testemunham (Gutheil e Sutherland,
está além do papel de um especialista 1999; Milton et al., 1997). Uma pesquisa
em saúde mental (Ewing, 2003; com juízes e advogados confirmou essa
Wilkinson, 1997). impressão (Redding, Floyd e Hauk,
Os psicólogos não são 2001). Redding e colaboradores (2001)
rotineiramente treinados sobre pediram que juízes, promotores e
questões legais ou para serem advogados de defesa respondessem a
advogados. Os psicólogos são treinados um questionário com oito perguntas
em psicologia e, portanto, são referentes ao teste munho de um perito
competentes em psicologia (Ogloff, em um caso de inim
1999). Testemunhar ou trabalhar fora putabilidade. Os resultados
da área da psicologia ou da sua confirmaram que os participantes
especialidade na psi cologia seria referiam o testemu nho de opinião final
trabalhar fora do seu âmbito da prática apesar de o FRE e leis estaduais
ou papel como especialista. Mel barrarem especificamente o testemunho
ton e colaboradores (1997) argumentam de opinião final nesses ca sos. Outros
que os psicólogos devem evitar testemu psicólogos argumentam que proibir o
nhar ou escrever quanto à questão final testemunho de opinião final é enganoso
por essa razão. Não somente psicólogos (Rogers e Ewing, 2003; Sales e Shuman,
como Melton e colaboradores estão preo 2005). Além do mais, existem si tuações
cupados com a prática fora da própria em que os psicólogos forenses são
área de competência, mas o sistema legalmente obrigados a dar uma
legal pode se preocupar se achados opinião final como, por exemplo,
psicológicos este jam tendo um impacto quando uma pessoa é avaliada quanto
tão grande na deci são final do juiz à capacidade de executar um
(Fulero e Finkel, 1991). Em testamento. Como um apoio adicional
consequência, os psicólogos foram ao uso da opinião final, vários estudos
especi ficamente impedidos de examinaram o impacto do teste munho
testemunhar em questões finais em de opinião final (Fulero e Finkel, 1991;
casos de inimputabili dade após a Rogers, Bagby, Couch e Cutler, 1990).
aprovação do Ato de Reforma da Rogers e colaboradores (1990) apre
Defesa de Inimputabilidade em 1984 e sentaram a 274 adultos transcrições abre
viadas de julgamentos e não o potencial para uma resultante falta de
encontraram diferenças significativas objetividade científica. Gutheil e Simon
entre a escolha do veredicto dos (2004) identifi caram especificamente
sujeitos que receberam o testemunho várias fontes dessa parcialidade
de opinião final de peritos e dos potencial no trabalho forense.
sujeitos que não o receberam. Em
consequência, a psicologia ainda está di Incentivos financeiros
vidida quanto ao testemunho final Talvez a maior fonte de parcialidade
sobre a questão. potencial que leva à aparência de um
processo científico corrupto seja a re
compensa financeira de trabalhar como
Corrupção da ciência perito. Uma pesquisa de precedentes
procurando menções a prostitutas di-
Outra crítica dos especialistas forenses
ao testemunho do perito é que a nature
za do processo adversarial corrompe a
recionada aos profissionais de saúde
natureza objetiva da ciência e, portanto,
mental, inspirada pelo livro de Hagen,
a parcialidade é introduzida no seu tes
concluiu que “a percepção entre os pro
temunho (Shuman e Greenberg, 2003).
fissionais legais é que muitos peritos
Na verdade, Margaret Hagen chegou ao em saúde mental são inescrupulosos”
ponto de escrever um livro sobre isso in (Mossman, 1999, p. 414). Alguns deles
titulado Whores of the Court (Hagen, ganham mais de U$10.000 por seu tra
1997). Conforme observamos balho em um único caso, e existe uma
anteriormente, o sistema legal e a crescente sensibilidade à aparência e
psicologia apresentam abordagens problemas associados a ser um mercená
diferentes para tratar de uma questão rio (Boccaccini e Brodsky, 2002; Cooper
potencial. Uma abordagem não é e Neuhaus, 2000). Alguns até mesmo
necessariamente superior à outra, mas sugerem que não existe mais essa coi sa
essas diferenças podem causar dificul de perito objetivo, e peritos forenses
dades quando os atores do sistema legal proeminentes recusaram-se a testemu
não têm conhecimento das diferenças e nhar na corte devido ao efeito potencial
os psicólogos não conseguem manter a da parcialidade (Colbach, 1997). No en
tanto, uma pesquisa com advogados en
sua integridade científica (Sales e
controu que a maioria deles não
Shuman, 1993). Os psicólogos precisam
escolhia psicólogos forenses devido à
estar cons cientes de que os advogados,
sua dispo sição de dar uma opinião
como parte da sua estratégia legal,
desonesta, mas baseavam a seleção dos
podem fazer coisas que lhes parecem peritos psicoló gicos no seu
estranhas. Por exemplo, alguns conhecimento, habilidades de
advogados contratam um perito comunicação e reputação (Mossman e
simplesmente para que o outro lado não Kapp, 1998). Os psicólogos forenses
possa chamar aquele mesmo perito devem manter-se muito atentos à
como testemunha. Em consequência, os parcia lidade percebida e deixar claro
peritos forenses precisam estar cientes que eles estão sendo pagos pelo seu
dos valores diferentes de cada sistema e tempo como peritos e não pelo seu
testemunho. assumida, fornecendo apenas da dos
selecionados para exame do perito ou
Relações extraforenses alegando ter outro perito que vai
Outra questão mencionada por realizar a tarefa sem qualquer
problema, alegando dificuldade
inúmeros comentaristas é a ocorrência
financeira ou então exibindo uma
de relações extraforenses. Essas
resposta desfavorável a uma opinião
relações podem existir de vários
inicial (Gutheil e Simon, 1999). O perito
modos. As relações mais pronta
deve ser capaz de identificar esses pon
mente identificáveis ocorrem quando
tos e resistir à pressão de se comportar
uma das partes envolvidas em um caso
de uma maneira particular. Em
é um amigo ou membro da família de
determinada situação, um advogado
um pe rito. Contudo, a relação
me pediu que eu apagasse uma
extraforense tam bém pode ocorrer
referência do meu relatório a respeito
quando a parte envolvi da e o psicólogo
de um teste psicológico particu lar
forense são membros da mesma
porque ele não estava consistente com o
organização profissional ou insti tuição
resto dos meus achados e era desfavo
(Gutheil e Simon, 2004). Por exem
rável para o caso. Recusei-me a fazer
Psicologia Forense 77
isso e, por fim, o advogado entendeu a
minha justificativa e aquilo nunca foi
plo, o psicólogo forense e uma das trazido à tona pelo lado oposto.
partes envolvidas podem pertencer à 78 Matthew T. Huss
mesma or ganização cívica ou igreja. A
crítica é que a relação pode turvar a
objetividade do especialista e ser usada
Crenças políticas e morais
para sugerir que o produto do trabalho Outra fonte de parcialidade potencial
de um determinado perito ou o seu pode ser proveniente das crenças políti
testemunho é tendencioso. cas e morais (Gutheil e Simon, 2004).
Par cialidades morais podem surgir em
casos que envolvem questões como
Pressão do advogado
aborto ou custódia dos filhos. Questões
É muito provável que um perito sinta a políticas que se chocam com cada um
pressão dos advogados. Os advogados dos lados do espectro, conservador e
são comprometidos com a sua ética pro liberal, de crenças políticas como os
fissional para lutar pelos seus clientes casos de pena de morte também são
dando o máximo de si, sendo que não problemáticas para o perito forense.
precisam ser objetivos no seu trabalho. Por exemplo, um perito pode optar por
Entretanto, o perito forense deve ser ho apenas testemunhar nes ses casos de
nesto e objetivo (Gutheil e Simon, 1999). acusação ou defesa devido a suas
Consequentemente, é natural que ocorra crenças a favor ou contra a pena de
conflito nessas situações e que o perito morte. Nesses casos, a opinião final do
sofra pressão para se comportar de uma perito pode ser determinada antes que a
determinada maneira ou para que avaliação aconteça e a objetividade será
preste um determinado tipo de destruída completamente. Os peritos
testemunho. Es sas pressões podem devem considerar a parcialidade que as
surgir de várias for mas, com o suas crenças pessoais, morais e políticas
advogado expressando uma opinião
podem introduzir e recusar casos em Por exemplo, um perito pode ficar mais
que essas parcialidades não possam ser inclinado a assumir um caso, especial
mane mente um caso de grande destaque, e
jadas adequadamente. que pode testar a sua objetividade por
que outro colega vai dar assistência ao
Notoriedade advogado caso ele se recuse. Um perito
também pode ter melhor desempenho
Outra área de parcialidade potencial se
do que um perito oponente e procurar
deve ao centro das atenções ou
apresentar uma conclusão não porque
notorieda de que pode acompanhar o
ela é correta, mas porque será um
trabalho como testemunha especialista
trunfo contra a opinião de um perito
(Gutheil e Simon, 2004). Fazer parte das
oponen te. O próprio processo legal
atenções da mídia de um determinado
também pode encorajar as tendências à
caso e receber acla mação pública pode
vitoria que muitas pessoas,
ser muito atraente. Um colega e eu
especialmente as de sucesso,
costumávamos discutir sobre a sedução
naturalmente desenvolveram durante
que representa esse tipo de atenção, e
a sua vida. Essas tendências podem
ele admitia gostar de de terminados
ficar ainda mais fortes quando o perito
aspectos do processo. Como
tem mais sucesso testemunhando, se
consequência, passei a me referir a ele
sente mais confortável e é procurado
pelo nome de Ícaro; do mito grego em
com mais frequência pelos advogados.
que Ícaro voou perto demais do sol
porque se perdeu na excitação de voar.
Ícaro tinha um par de asas feitas de Falta de reconhecimento da
penas e cera, e elas derreteram quando parcialidade
ele voou muito Entretanto, o verdadeiro perigo de qual
quer uma dessas fontes potenciais não
é a existência da parcialidade, mas o
perto do sol e logo caiu ao solo. Nessas fato
situações, o psicólogo forense corre o ris
co de chegar muito perto do sol ou da
fama por testemunhar em casos de de ela não ser reconhecida e afetar o
muito destaque, e pode se queimar pela pro cesso, a escrita do relatório, a
perda da objetividade. Embora a conclusão ou mesmo o testemunho do
consequência não seja tão grave para o perito (Gu theil e Simon, 2004). Pelo
psicólogo foren se como foi para Ícaro, menos um es tudo examinou
ela ainda pode ser uma fonte de parcialidades potenciais entre os
parcialidade. peritos (Commons, Miller e Gu theil,
2004). Commons e colaboradores (2004,
Competição p. 73) solicitaram a 46 participan tes de
Uma fonte final de parcialidade poten um workshop que respondessem a um
cial é a competição (Gutheil e Simon, questionário e concluíram que os
2004). A parcialidade por competição peritos “subestimam demais os efeitos
pode ocorrer por várias razões que se re da parcialidade dos seus próprios con
lacionam ao contexto legal, ao profissio flitos de interesse e outros fatores”. Por
nalismo ou à personalidade do perito.
exemplo, os participantes não achavam éticos. É especialmente importante que
que a quantidade de dinheiro envolvi os psicó logos no seu papel como
da em um caso, a natureza de destaque peritos forenses se comportem de uma
de um caso, a filosofia pessoal do perito maneira ética por muitas razões que já
ou sua agenda social ou a relação com abordamos neste li vro. Fatores como a
o advogado que os contratava criassem natureza adversarial do sistema legal,
parcialidade. Esses resultados sugerem as consequências signi ficativas das
que os peritos forenses devem ficar es decisões legais e a natureza pública do
pecialmente atentos para identificar trabalho forense convergem todos para
fontes potenciais de parcialidade e não que a prática ética como tes temunha
minimizar o grau em que elas podem especialista seja especialmente
afetar seu julgamento profissional. A importante. O sistema legal por vezes
Tabela 3.2 resume as críticas ao testemu en tra em conflito com a prática da
nho de peritos e as fontes de corrupção psicolo gia e até mesmo com os
científica. princípios éticos do psicólogo como
Psicologia Forense 79 praticante objetivo da ciência. O ideal
ético do sistema adver sarial legal é
Ética do perito lutar ao máximo pelo seu cliente; em
essência, você não tem que ser objetivo,
Um aspecto importante da realização você tem que ser um advogado.
de um trabalho como o do psicólogo Consequentemente é ainda mais impor
forense e especificamente como o de tante que o psicólogo forense mantenha
testemunha especialista é aderir a um uma base ética firme diante da pressão
conjunto de di do
retrizes profissionais ou princípios

Tabela 3.2 Críticas ao testemunho de peritos e fontes


de corrupção científica
1. Assumir o controle do tribunal
2. Testemunhar na questão final
3. O uso de especialistas corrompe a ciência por várias
razões: ■ Incentivos financeiros
■ Relações extraforenses
■ Pressão do advogado
■ Crenças políticas e morais
■ Notoriedade

■ Competição

■ Falta de reconhecimento das fontes de parcialidade


80 Matthew T. Huss têm implicações de longo alcance. É im
portante não somente ser correto ao tes
sistema legal. Os psicólogos forenses au temunhar sobre o potencial de violência
xiliam o sistema legal com decisões que de alguém que enfrenta o risco de sofrer
pena de morte, mas também fazer isso de sanções contra os profissionais que não
uma maneira ética. Além disso, conforme forem éticos, bem como um mecanismo
discutido no Capítulo 1, o público geral para proteger os profissionais de simula
mente forma sua opinião a respeito da ções indesejadas dos clientes.
psicologia a partir da mídia (Stanovich,
2004). As imagens mais sensacionais da
Competência
mídia provavelmente provêm da psicolo
gia forense (Huss e Skovran, 2008). Como A área mais óbvia de interesse no teste
resultado, os psicólogos forenses têm o munho do perito forense é a necessida de
dever especial de agirem de maneira éti de ser competente (Sales e Shuman,
ca porque o público forma muito da sua 1993). O Código da APA (APA 2002, p.
visão da psicologia a partir dessas ima 1063) afirma explicitamente que os psi
gens da mídia. cólogos apenas devem atuar “com popu
Muitas profissões apresentam um lações e em áreas que estejam dentro das
conjunto de princípios éticos ou diretri fronteiras da sua competência, baseados
zes éticas que os indivíduos que perten na sua formação, treinamento, experiên
cem àquela profissão seguem, e a psicolo cia supervisionada, consultoria, estudo e
gia não é diferente. Na verdade, existem experiência profissional”. Em outras pa
muitas fontes de diretrizes profissionais lavras, os psicólogos devem permanecer
e éticas para os psicólogos forenses. A dentro do âmbito da sua prática. O
fonte primária de princípios éticos para âmbito da prática é normalmente
os psicólogos são os Princípios Éticos dos definido com o psicólogo atuando
Psicólogos da Associação Americana de apenas em áreas em que seja competente.
Psicologia e o Código de Conduta (APA, A sua compe tência provém de ter
2002). Mas por que ter esses princípios formação suficiente em uma
éticos? Hess (1999) sugere que como a determinada área para chegar a
sociedade concede um monopólio a uma conclusões confiáveis e válidas (Ogloff,
determinada profissão, essa profissão 1999). Por exemplo, um psicólogo forense
deve assumir a responsabilidade de ser é competente para praticar psicologia fo
vir ao melhor interesse do público e não rense, mas não é competente para
simplesmente servir à profissão. Os có praticar o direito a menos que ele
digos de ética servem a esses interesses. realmente tenha uma graduação em
Frankel (1989) identifica várias funções direito e tenha obtido experiência
dos códigos de ética que, em grande par profissional adicional para exercer o
te, se concentram na necessidade de edu direito. Isso não significa que um
car o público, incentivar a confiança em psicólogo forense não precise estar
uma profissão, identificar um conjunto familiarizado com as leis que governam
a prática da psicologia forense (Shapiro,
2002), mas que o especialista deve sim
de valores e habilidades compartilhados plesmente evitar praticar como advogado
pelos membros de uma profissão que em vez de como psicólogo.
podem servir como uma bússola pro
fissional e fornecer um mecanismo para
Capítulo 12 não apenas as considerações
legais relevantes e as técnicas psicológi
Além do mais, alguém pode ser trei Psicologia Forense 81
nado com psicólogo forense, mas isso
não lhe dá o requisito de experiência cas envolvidas nas decisões de custódia
para praticar todos os aspectos da psi de crianças, mas também se essas técni
cologia forense. Alguém que é somente cas correspondem a um limiar adequado
treinado para diagnosticar patologia de confiabilidade e são suficientes para
adulta não seria competente para reali realmente informar o tribunal. Nós de
zar avaliações para custódia de crianças. monstramos confiabilidade e validade
O profissional precisa estar familiariza adequada para realizar avaliações de
do com a doença mental, mas também custódia de crianças? Em caso negativo,
com a psicologia do desenvolvimento e a psicologia como um todo está atuando
fora do seu âmbito de prática. Essa no
a literatura sobre paternidade para ava
ção pode parecer um tanto simplista a
liar adequadamente alguém em uma si
essas alturas, mas vamos discutir conti
tuação de custódia infantil. O psicólogo
nuamente as situações em que poderia
pode, ainda, ser competente para atuar
ser questionado se os psicólogos foren
em uma determinada área, mas não ser ses estão atuando dentro do seu âmbito
competente para usar um teste psicoló de prática.
gico particular (Rotgers e Barrett, 1996).
Um psicólogo forense pode tentar ava
liar alguém por depressão em um caso Consentimento
de danos pessoais, mas não ser compe esclarecido e
tente para usar o MCMI-III porque ele confidencialidade
nunca foi treinado para isso na gradua
Duas outras questões éticas relacionadas
ção, nunca teve prática supervisionada e
são a obtenção do consentimento escla
nunca participou de workshops sobre esse
recido e a confidencialidade. É rotina na
teste psicológico (Knapp e Vande Creek,
prática da psicologia clínica obtermos o
2001). Além disso, os psicólogos têm consentimento de um cliente para
obrigação ética de ser não somente realizar uma avaliação ou participar do
competentes, mas de zelar por sua com tratamen to (Stanley e Galietta, 2006). O
petência e conhecimentos participando consenti mento esclarecido consiste em
de oportunidades de educação conti descrever os procedimentos e o processo
nuada. Eles precisam estar atualizados como pro vavelmente acontecerão e obter
com os desenvolvimentos dos métodos o consen timento legal do cliente para
ou testes que procuram usar (Shapiro, prosseguir. A obtenção do consentimento
2002). esclarecido também é necessária dentro
O âmbito da prática é relevante não de um con texto forense, e o código de
somente para os indivíduos que prati ética da APA ainda faz menção especial à
cam a psicologia forense ou áreas par obtenção do consentimento esclarecido
ticulares da psicologia forense. Ele tam quando os serviços são ordenados pela
corte em 3.10c do Código de Ética (APA,
bém é relevante para a profissão como
2002). Em contexto forense, uma pessoa
um todo. Por exemplo, discutiremos no
pode estar passando por uma coerção
adicional de vido ao seu ganho conflito com a obtenção de informações
secundário ou porque uma autoridade de uma manei ra aberta e honesta. Se um
legal está determinando a avaliação. cliente entende mal ou acredita que tudo
82 Matthew T. Huss o que ele discu tir será confidencial, a
probabilidade será maior de ele revelar
Relacionada com a obtenção do con informações que lhe sejam prejudiciais
sentimento esclarecido está a ideia de con legalmente e potencial
fidencialidade. Como pressupõe a mente relevantes para a avaliação. Existe
maioria das pessoas, existe a lei
codificada e a ju risprudência apoiando a
confidencialida de da relação um conflito para o psicólogo forense. Por
terapeuta-cliente (Glosoff, Herlihy e um lado, ele tem uma obrigação ética de
Spence, 2000). Embora esse pri vilégio obter verdadeiramente o consentimento
tenha algumas limitações depen dendo esclarecido, mas, por outro lado, a avalia
da jurisdição (p. ex., relato de abu so ção será mais acurada se houver a crença
infantil), os clientes podem presumir que de que as informações que ele obtiver das
esse privilégio existe universalmente. partes envolvidas serão confidenciais. No
Surgirá um problema se os pacientes pre entanto, a responsabilidade ética do con
sumirem que esse mesmo privilégio sentimento esclarecido é mais importante.
existe em uma avaliação forense porque
os pri vilégios de confidencialidade estão
mais reduzidos (Knapp e VandeCreek,
Combinações financeiras
2001). Se o tribunal determina um Outra questão ética potencial com que os
relatório, ou um advogado requer uma peritos se defrontam são as questões fi
avaliação de um acusado em um caso nanceiras relativas a ser um perito
criminal, o rela tório será lido pelo juiz, forense. Essas questões são cada vez
pelos advogados oponentes e poderá ser mais impor tantes, pois a psicologia
apresentado como evidência na corte forense é encarada como uma área de
aberta onde os psicólo gos forenses vão prática financeiramente gratificante
testemunhar sobre ele. Essa prática não (Haas, 1993). Essa área pare ceria um
permite o mesmo nível de tanto mundana para ocorrer um conflito
confidencialidade que normalmente se ético potencial, mas isso é, de fato, de
vivencia quando se procura terapia. grande interesse. Na verdade, o Código
Surgirá um problema se o psicólogo de Ética da APA (APA, 2002) encoraja o
forense não explicar essa limitação a um es tabelecimento de combinações
indivíduo ou se o indivíduo não entender financeiras o mais imediatamente
essa limitação (Hess, 1999). É importante possível na relação, e o perito pode ainda
que o examinando reconheça os limites requerer pagamento antecipado e ser
da confidencialidade em um determinado muito específico quanto aos serviços a
caso e que isso seja claramente entendido serem cobrados e aos hono rários
antes do começo do processo. Isso se específicos (Knapp e VandeCreek, 2001).
torna ainda mais complicado, porque Talvez a razão mais saliente para lidar
explicar essas limitações entra em com as questões desse modo é o impacto
potencial de uma compensação na con tratamen to (Knapp e VandeCreek, 2006).
clusão da situação forense. Os psicólogos Entretan to, o psicólogo forense precisa
não devem realizar serviços forenses com estar cons ciente do dano potencial que
base nos honorários de contingência, pode resultar nessas situações.
em que o psicólogo é pago pelos seus Existem muitos problemas éticos
servi ços na conclusão (Knapp e potenciais que podem surgir de circuns
VandeCreek, 2006). Tal prática traz sérias tâncias em que existe uma relação múlti
complicações para a objetividade do pla. Por exemplo, ser solicitado a avaliar
processo forense. Exemplos óbvios de alguém em uma disputa pela custódia
uma combinação de honorários de do filho com quem você anteriormente
contingência são normal mente realizou psicoterapia (Shapiro, 2002). A
identificáveis com facilidade, mas dificuldade surge porque o foco em um
contexto forense não é mais o bem-estar
do seu cliente, mas os seus deveres para
situações mais sutis, tais como um advo com o advogado ou a corte que o contra
gado se recusar a pagar a menos que o Psicologia Forense 83
relatório seja “ligeiramente” alterado, são
potencialmente mais perigosas. taram como psicólogo forense. O foco
está em lhes prestar informações (Knapp
e VanderCreek, 2006). Suponha que um
Relações múltiplas
psicólogo esteja tratando uma mulher
O Código de Ética da APA (APA, 2002, p. que está sofrendo de ansiedade e, depois,
1065) declara que os psicólogos devem seja solicitado a realizar uma avaliação
evi tar relações múltiplas “se houver a de cus
expec tativa razoável de que a relação tódia para ajudar a corte a decidir sobre a
múltipla prejudique a objetividade, custódia dos seus dois filhos. O psicólogo
competência ou eficiência do psicólogo é colocado em uma situação
no desempe nho das suas funções como potencialmente comprometedora,
psicólogo ou, então, arrisque a independentemente de qual seja a
exploração ou danos à pessoa com quem conclusão. Se a opinião for des
a relação profissional existe”. favorável, é muito provável que o achado
Tipicamente, o foco das relações cause impacto na relação terapêutica no
múltiplas como perito está nos conflitos futuro e diminua as chances de um pro
entre ser um terapeuta que trata e atu ar cesso bem-sucedido, porque a relação te
como um avaliador forense (Shuman, rapêutica foi prejudicada. Se a conclusão
Greenberg, Heilbrun e Foote, 1998). Pode for neutra, o psicólogo poderá ser pressio
rá haver situações em que essas relações nado a dar uma conclusão mais favorável
não possam ser razoavelmente evitadas, para um cliente. Se a conclusão for positi
tais como, por exemplo, se o psicólogo for va, haverá uma aparência de favoritismo.
o único profissional de saúde mental em Além disso, um psicólogo nunca pode ter
uma área rural ou se um psicólogo reque certeza se o seu relatório simplesmente ve
rer informações sobre um paciente para rificou suas hipóteses terapêuticas anterio
quem o tribunal determinou seu res ou é realmente objetivo e responde
ver dadeiramente à pergunta da corte.
Como observa Shapiro (2002, p. 46), “não
se pode ser um terapeuta eficiente em
termos de auxiliar um cliente ou paciente
a lidar com suas dificuldades se já esteve
evolvido em realizar uma avaliação
forense abrangente daquele indivíduo”.

Evidência de síndrome:
área controversa de
testemunho pericial
Ao concluir o capítulo sobre o
testemunho do perito, vamos nos focar
em uma área de testemunho que é
frequentemente contro versa. Ao
examinar a evidência de síndro me e a
controvérsia que a rodeia, o objeti vo não
é acusar os psicólogos forenses que

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