Barboza TENO, Neide Araújo C. COSTA
Barboza TENO, Neide Araújo C. COSTA
Barboza TENO, Neide Araújo C. COSTA
Linguística Aplicada e
investigação científica: considerações teóricas para o ensino dos multiletramentos. Revista Letra Capital, v. 1, n.
2, jul./dez. 2016, p. 118-139.
Abstract: Language studies goes by several areas of knowledge and are present in both the
Natural Sciences and Humanities and Social Sciences. We extend the interest of these studies
to the areas of Biology and Medicine, given the productivity of the area by the production of
knowledge and the importance to understand how the speech apparatus is processed and its
relationship with the language production. In this sense, Applied Linguistics has been shown
itself to be a multidisciplinary field of study to explain language and language. The purpose of
this study is to carry out a theoretical reflection about Applied Linguistics and its role in
language teaching, based on the assumption that Applied Linguistics is not a compendium of
methodological techniques to be used in the classroom, but theoretical reflections and
practices about the uses of language in specific contexts, necessary for language teaching.
The clipping that we propose for this study approaches the questions of linguistics, its
concepts and the concept of language as social and verbal and thematic interaction linked to
the research project in progress entitled "Multiletramentos in high school: the practice of the
teacher and the evaluation of learning ". To do so, we will use the following theoretical
contribution: Moita Lopes (1996), Bakhtin (2006), Aguiar (2007), Celani (2005), Triviños
(1987), Minayo (2007), Leffa (2001), Rojo (2012) and others.
Keywords: Applied linguistics. Language. Multiliteracies.
Revista Letra Capital, v. 1, n. 2, jul./dez. 2016, p. 118-139. | 119
Introdução
A linguagem teve e tem grande influência nessa interação com o meio físico e social e
a comunicação, pois é no processo das interações e na ânsia de descobrir os mistérios
naturais, físicos, sociais e mentais e resolver os problemas diários que o homem se lança em
busca de respostas para satisfazer seus desejos. Faz-se necessário planejamento para
realização do desejo, e a buscar caminhos para alcançar os objetivos propostos para o estudo
a ser realizado.
Essa necessidade de planejamento prima pela sistematização e pela organização. De
acordo com Aguiar (2007, p. 7), “precisamos providenciar os meios para resolver a situação
do modo mais satisfatório e menos dispendioso”. Quando se trata da dúvida diante de um
problema científico, a pesquisa não poderá somente firmar-se no desejado, deverá traçar,
esboçar um caminho organizado e sistemático na busca de conhecimentos, teorias, métodos
e técnicas para trilhar o árduo e curioso caminho do fazer científico:
Revista Letra Capital, v. 1, n. 2, jul./dez. 2016, p. 118-139. | 121
porque na modernidade, o conceito de culto e inculto vai muito além, incluindo as sociedades
de híbridos, mestiçagens.
A multiplicidade semiótica ou multiplicidade de linguagens presente nos diferentes
textos que circulam na sociedade, sejam eles, impressos, nas mídias, digitais ou não, é o que
tem sido chamado de multimodalidade/multissemiose – o multiletramento. Não basta mais, o
papel, a caneta, giz e a lousa. Novas ferramentas entram na leitura e escrita - áudio, vídeo,
imagem, cores, movimentos, diagramação, exigindo do professor um sujeito mais observador
e criativo.
Nessa diversidade cultural e semiótica de produção dos textos, os multiletramentos
trazem características próprias, que segundo Rojo (2012) são mais colaborativos, com a
presença de outras linguagens, mídias e culturas, são interativos a ponto de permitir que
leitor/produtor se comuniquem simultaneamente, em vários níveis e com vários
interlocutores. Características dessa natureza, cada vez mais estão expostas ao cenário das
escolas do ensino médio, professores e alunos, o que tem exigido desenvolvimento de
habilidades de leitura e escrita de acordo com as modalidades e as multissemioses.
Os estudos sobre os multiletramentos ganham sentido no âmbito internacional com
estudiosos liderados pela Austrália, Inglaterra, Estados Unidos, Canadá, África do Sul, e no
Brasil com as publicações recentes de Rojo (2012, 2013, 2015), entre outros para
compreender essa nova pedagogia de ensino e aprendizagem dos novos letramentos. Acerca
dos multiletramentos os estudos de Dias (2012) apontam a importância de o professor
subsidiar o aluno com textos multimodais em situação de interação, e aponta o estudo dos
gêneros textuais como uma porta de entrada para o ensino de leitura e escrita na
contemporaneidade. A estudiosa considera as esferas de comunicação como o trabalho, a
escola, a igreja, os bairros, como lugares que circulam gêneros específicos, que solicitam
conhecimentos, “não só da função social, como também de sua estrutura formal [...]” (DIAS,
2012, p.96).
O estudo da linguística aplicada está relacionado com os estudos do multiletramento
quando pensamos em uma prática de ensino, em que há o envolvimento de atividades com
gêneros multimodais, tão utilizados no Pisa, o Enem e o Saeb que abordam uma diversidade
de textos e gêneros textuais, englobando os textos multimodais utilizando questões que
envolvem mapas, gráficos, infográficos, imagens, propagandas. Barboza e Teno (2016), no
artigo “Multiletramento e a Avalição da Aprendizagem no Ensino Médio” chama atenção dos
124 | Linguística Aplicada e investigação científica...
professores para leitura dos elementos verbais e visuais, dos enunciados, seja ele, um texto
com charges, propagandas, tiras, até porque a multimodalidade é uma característica de todos
os gêneros textuais, agrupa mais de uma maneira de representação, e pode envolver, cores e
movimentos, imagens e palavras e ou palavras e tipografias. Por isso, podemos falar da
riqueza semiótico presente em cada gênero. Tudo isso, são consequências do uso das
tecnologias da comunicação e da informação, valorizando a cultura de referência, sendo ela
valorizada ou desvalorizada
Inicialmente discorremos acerca da linguagem, na sequência, discorreremos acerca do
desafio de trabalhar a pesquisa envolvendo a linguística aplicada, com o fito de desenvolver
nos alunos, o interesse pelos estudos linguísticos e a importância dos multiletramentos nesse
processo.
e privadas, nos mais diversos ambientes comunicativos. Nesse sentido, concordamos com
Leffa (2001) quando afirma que:
Leffa agrega a esse quadro da língua a inserção da importância dos gestos, das
imagens, da presença do corpo na comunicação como mais um meio para ser considerado ao
aspecto linguístico e ao estudo da comunicação. Quando LEFFA (2001, p. 3-4) discute a
questão da pesquisa e o desafio dos pesquisadores com o fenômeno estudado, recorre às
tecnologias para explicar as diretrizes que devemos considerar:
Ainda conforme Leffa (2001) e na esteira do que afirma Moita Lopes (1996), a
Linguística Aplica é definida como uma área da Ciência para estudar a linguagem em seus
usos, nos espaços de sua criação e circulação como um instrumento de interação social,
privilegiando a linguagem escrita e interdisciplinar. Nesse sentido, a Linguística Aplicada é
concebida como:
A partir das discussões acerca do fazer ciência como uma atividade social, histórica e
não neutra, da conceituação da Linguística Aplicada, passemos, a discorrer sobre alguns
conceitos relativos à pesquisa qualitativa necessários e para o desenvolvimento de pesquisas
na área do ensino de Língua Portuguesa. Recorremos a Moita Lopes (1996) Leffa (2001) e
Celani (2005), cujos autores indicam paradigmas qualitativos para a realização de pesquisas
científicas na Linguística Aplicada.
(1987), em forma de narrativas ilustradas, declarações das pessoas, fotografias entre outras
fontes de documentos.
[.
Nessa esteira, podemos dizer que os pesquisadores qualitativos estão preocupados
com o processo e não simplesmente com os resultados e o produto, e tendem a analisar os
seus resultados indutivamente. Dessa maneira, para a pesquisa qualitativa, o significado é sua
preocupação essencial. Isso denota que na pesquisa qualitativa, todo o processo faz parte do
todo e cada etapa é importante e contribui para o resultado, o objetivo esperado, o
significado.
No escopo dessas reflexões, Triviños (1987) aponta que na pesquisa qualitativa a
coleta e a análise dos dados não são ações estanques. Os dados são analisados durante todo
o processo e o pesquisador precisa estar preparado para mudar de rota caso os dados não
sejam suficientes ou não atendam suas expectativas e objetivos. Nesse caso, o relatório final
só pode ser realmente chamado de final, quando o processo de coleta realmente chegar ao
fim. Nessa abordagem qualitativa, a necessidade de revisão de teoria surge no decorrer do
processo de pesquisas e estudos.
Na pesquisa qualitativa, ainda, de acordo com Triviños (1987), “o pesquisador será
eficiente e altamente positivo para os propósitos da investigação, se tiver amplo domínio não
só do estudo que está realizando, como também do embasamento teórico geral que lhe serve
de apoio” (TRIVIÑOS, 1987, p. 132). O autor ressalta que o pesquisador possui ampla
liberdade teórico-metodológica para realizar seus estudos, levando em consideração as
exigências de um trabalho científico e observando os critérios das estruturas de coerência,
consistência e originalidade.
Nesse sentido, compromisso, ética, respeito ao outro e ao conhecimento são fatores
essenciais para que o pesquisador desenvolva um trabalho sério, ético, verdadeiro, que
retrate a essência do fato e/ou objeto pesquisado.
Importante evidenciar que na abordagem qualitativa existem vários tipos e pesquisas:
a etnográfica, os estudos de casos, as pesquisas qualitativas participativas, as qualitativas
interpretativistas ou interpretativas e o método de análise de conteúdo, o qual pode ser
utilizado tanto nas pesquisas quantitativas quanto qualitativas.
O processo de coleta de dados das pesquisas qualitativas se desenvolve num
movimento de interação dinâmica com reformulações constantes, alimentando e
130 | Linguística Aplicada e investigação científica...
práticas sociais de uso da leitura e da escrita. Dessa forma, concordamos com a autora
(2009), quando explica que:
Pode-se dizer que trabalhar com leitura e escrita na Educação Básica, especificamente
no Ensino Médio, é um grande desafio e que a Linguística Aplicada desempenha um
importante papel, porque implica trabalhar com as práticas letradas, valorizadas ou não,
envolvendo os letramentos do mundo e os letramentos da escola, ou seja, implica na “leitura
na vida e leitura na escola” (ROJO, 2009, p.118), focando as linguagens verbal, corporal,
plástica, musical e gráfica em uso, ou seja, os estudantes devem ser capazes de se expressar
linguística e socialmente, nas várias esferas de comunicação valorizadas ou não da sociedade
em que vivem, nas situações e nos eventos de seu cotidiano.
Outro desafio posto para a Linguística Aplicada é o de desenvolver competências para
trabalhar a língua e a linguagem, utilizar as mídias e as múltiplas práticas letradas de maneira
ética, crítica, democrática e responsável, levando os estudantes e os professores a serem
protagonistas de seus discursos e, conforme Souza (2014), a enfrentar as mudanças ocorridas
nas sociedades nos campos social, econômico, cultural e linguístico.
As necessidades que a sociedade contemporânea exige, bem como a urgência de
novas formas de comunicação e de interação postas pelos meios de comunicação e os
avanços das tecnologias digitais de comunicação, faz-se necessário que o ensino seja
diferenciado, enfocando os multiletramentos e os letramentos críticos. Elementos estes
necessários e fundamentais para o desenvolvimento de práticas de comunicação e interação
verbal na atualidade.
134 | Linguística Aplicada e investigação científica...
Como se pode observar, na esteira dos conhecimentos atuais que envolvem o ensino
de linguagem, o conceito de multiletramentos, de acordo com (ROJO, 2012, p.13),
compreende a “multiplicidade cultural das populações e a multiplicidade semiótica de
constituição de sentidos dos textos por meio dos quais ela se informa e se comunica”. Ainda
conforme Rojo (2012), implementar os multiletramentos na Educação Básica, em especial no
Ensino Médio, leva ao letramento crítico, o que contribui para desenvolvimento dos alunos,
como sujeito de suas ações, suas histórias, seus discursos, sendo, desta forma, protagonistas
de suas vidas, tornando-se capazes de opinar nas mais diversas formas e nos mais variados
eventos discursivos:
1
Gêneros impuros: de acordo com Canclini, gêneros impuros estão relacionados aos artistas e escritores que
abrem o território da pintura ou do texto para que sua linguagem migre e se cruze com outras. Há gêneros
constitucionalmente híbridos, práticas que desde seu nascimento abandonaram o conceito de coleção
patrimonial. Lugares de intersecção entre o visual e o literário, o culto e o popular, aproximam o artesanal da
produção industrial e da circulação massiva (1997, p. 22-28).
Revista Letra Capital, v. 1, n. 2, jul./dez. 2016, p. 118-139. | 135
Ao dar conta de que a Linguística Aplicada trabalha com a linguagem em uso, que o
espaço das salas de aula e os processos de ensino/aprendizagem são seus objetos frequentes
de investigação e estudos e que esses são desenvolvidos na perspectiva da pesquisa
qualitativa interpretativista, depreende-se que as muitas pesquisas desenvolvidas na área
buscam, cada vez mais, compreender, valorizar, interpretar e reconhecer a centralidade da
linguagem como interação verbal, social, viva, dinâmica nos processos de ensino de língua
portuguesa na Educação Básica, especificamente no Ensino Médio.
Cabe ponderar que na perspectiva interpretativista os conceitos e teorias passam a
ser considerados fenômenos sociais, concebidos e legitimados socialmente. Nesse caso, os
conhecimentos são produzidos coletivamente, pesquisador e pesquisados contribuem
interativamente para a construção do saber sistematicamente produzido, organizado e
transmitido social, cultural e historicamente.
Podemos dizer que a pesquisa científica, concebida na vertente aqui brevemente
exposta, envolvendo seus métodos, tipos, técnicas, formas de análises contribuem
sobremaneira para o desenvolvimento da própria Linguística Aplicada, bem como para
alcançar dos objetivos dos projetos implementados nas escolas e nas universidades para o
desenvolvimento da linguagem e do ensino de línguas nas escolas brasileiras.
A possibilidade que ora se desponta na Linguística Aplicada para o trabalho com a
linguagem em sala de aula, na perspectiva de pesquisas qualitativas interpretativistas,
garantem iniciativas exitosas que envolvem uma visão diferenciada da própria língua,
ressignificando seus conceitos, os de linguagem, de ensino, de aprendizagem, assim como dos
principais sujeitos de todo ato educativo, os professores e os estudantes, percebendo-os
como seres humanos que são, com suas diferenças, perfeições e imperfeições, capazes de,
por si próprios, serem também os agentes da pesquisa e contribuírem com as mudanças tão
necessárias para o desenvolvimento do processo de aprendizagem.
138 | Linguística Aplicada e investigação científica...
Referências
AGUIAR, V. T. As Letras em foco de pesquisa. In: Pesquisa em letras [recurso eletrônico] / Vera
Teixeira Aguiar, Vera Wannmacher Pereira (org.) – Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007.
BAKHTIN, M. O Problema do Texto. In Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes,
1992.
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 2006.
BARBOZA, S.N.R.O, TENO, N.A.C. Multiletramentos e a avaliação da aprendizagem no ensino
médio. VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos
Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da
integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária
de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3.
CANCLINI, Néstor García. Culturas Híbridas - estratégias para entrar e sair da modernidade.
Tradução de Ana Regina Lessa e Heloísa Pezza Cintrão. São Paulo: EDUSP, 1997. p. 22-28
Revista Letra Capital, v. 1, n. 2, jul./dez. 2016, p. 118-139. | 139