Direitos Humanos - Livro-Texto - Unidade I
Direitos Humanos - Livro-Texto - Unidade I
Direitos Humanos - Livro-Texto - Unidade I
Angélica Carlini é natural de Araraquara, estado de São Paulo, graduada em Direito na Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo e advogada atuante nas áreas de Direito do Seguro, Responsabilidade Civil e Relações de Consumo.
É doutora em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2012); doutora em Educação
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2006); mestre em Direito Civil pela Universidade Paulista – UNIP
(2002); e tambem é mestre em História Contemporânea pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1995).
É pós‑doutora em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2015), sob
orientação do Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet. Professora do curso de Direito da UNIP desde 1998 e membro da Comissão
de Qualificação e Avaliação – CQA, desde 2009. Ministra as disciplinas de Direito Empresarial, Direito do Consumidor,
Filosofia do Direito, História do Direito, Direitos Humanos e Ciência Política. Escreve material didático para os cursos
de Educação a Distância da UNIP e ministra aulas no curso de Gestão de Serviços Jurídicos, Notariais e de Registro.
CDU 341.27
U519.33 – 24
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Profa. Sandra Miessa
Reitora
UNIP EaD
Profa. Elisabete Brihy
Profa. M. Isabel Cristina Satie Yoshida Tonetto
Prof. M. Ivan Daliberto Frugoli
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Material Didático
Comissão editorial:
Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
Profa. Dra. Ronilda Ribeiro
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista
Profa. M. Deise Alcantara Carreiro
Profa. Ana Paula Tôrres de Novaes Menezes
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................8
Unidade I
1 SISTEMA DE DIREITOS HUMANOS, TEORIAS SOBRE A CRIAÇÃO DE DIREITOS
HUMANOS, DEFINIÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA............9
2 CARACTERÍSTICAS E GERAÇÕES OU DIMENSÕES DE DIREITOS HUMANOS...............................9
2.1 Teorias sobre criação de direitos humanos....................................................................................9
2.2 Definição de direitos humanos e dignidade da pessoa humana....................................... 11
2.3 Características dos direitos humanos........................................................................................... 15
2.4 Gerações ou dimensões de direitos humanos........................................................................... 17
2.5 Dimensões ou gerações de direitos humanos?......................................................................... 20
2.6 A primeira geração ou dimensão de direitos humanos ....................................................... 20
2.7 A segunda geração ou dimensão de direitos humanos......................................................... 26
2.8 A terceira geração ou dimensão de direitos humanos.......................................................... 27
2.9 A quarta geração ou dimensão de direitos humanos............................................................ 29
2.10 A quinta geração ou dimensão de direitos humanos.......................................................... 33
2.10.1 Trajetória histórica da construção dos direitos humanos.................................................... 36
2.10.2 A Liga das Nações – precursora da ONU..................................................................................... 36
2.10.3 A Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a internacionalização
dos direitos humanos........................................................................................................................................ 37
2.10.4 O Tribunal de Nuremberg e a aplicação de punição contra crimes contra
a humanidade, crimes de guerra e crimes contra a paz..................................................................... 38
2.10.5 A criação da ONU.................................................................................................................................. 40
2.10.6 Estrutura da ONU.................................................................................................................................. 42
2.10.7 A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948....................................................... 58
2.10.8 O texto integral da Declaração Universal dos Direitos Humanos ou dos
Direitos do Homem da ONU .......................................................................................................................... 61
3 TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS.................................................................... 71
3.1 Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais............................................................................................. 71
3.2 Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados.................................................................... 73
3.3 Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial................................................................................................................................... 74
3.4 Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher............................................................................................................................................. 76
3.5 Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis,
Desumanas ou Degradantes..................................................................................................................... 76
3.6 Convenção sobre os Direitos da Criança .................................................................................... 77
4 SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS...................................................................... 79
Unidade II
5 A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988 E A PROTEÇÃO DE DIREITOS HUMANOS................. 90
5.1 Introdução histórica............................................................................................................................. 90
6 DIREITOS FUNDAMENTAIS............................................................................................................................ 93
6.1 Conceito e classificação de direitos fundamentais................................................................. 93
6.2 Direitos individuais e coletivos........................................................................................................ 95
6.3 Direitos dos acusados e condenados..........................................................................................104
7 A EMENDA CONSTITUCIONAL N. 45 E OS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL ........................110
7.1 Planos Nacionais de Direitos Humanos.....................................................................................113
8 DIREITOS SOCIAIS NO BRASIL...................................................................................................................117
8.1 Direito à saúde.....................................................................................................................................118
8.2 Direito à educação..............................................................................................................................124
8.3 Direito à moradia.................................................................................................................................130
8.4 Proteção às mulheres........................................................................................................................134
8.5 Proteção à criança e ao adolescente...........................................................................................137
8.6 Proteção às pessoas com deficiência..........................................................................................138
8.7 Proteção à pessoa idosa ..................................................................................................................146
8.8 Proteção à população LGBTQIA+..................................................................................................152
APRESENTAÇÃO
Esta disciplina tem um duplo objetivo: contribuir para a formação profissional e cidadã dos nossos
alunos e alunas. É ousado, mas muito necessário. A sociedade contemporânea, brasileira e mundial,
sofre um impacto bastante forte das mudanças ocorridas nos últimos cinquenta anos, em especial com
o avanço da tecnologia e dos recursos digitais disponibilizados para parte expressiva da humanidade.
Temos maior facilidade para nos comunicar do que tinham nossos antepassados, logramos enorme
facilidade para acessar dados e informações, porém tudo isso tem criado uma situação paradoxal: ao
mesmo tempo que simplifica nosso modo de viver, também cria novos conflitos e tensões sociais.
Estudar direitos humanos é uma forma eficiente de conseguirmos ter conhecimento para analisar
o percurso histórico da humanidade no campo das relações sociais; assim percebermos que nossas
diferenças devem nos aproximar e não nos afastar. Diferenças de nacionalidade, raciais, culturais, de
gênero, sexo e religiosas devem ser respeitadas por todos e devem servir para tornar nossa convivência
mais rica, dinâmica e feliz.
Direitos humanos são direitos de todos os seres humanos existentes na Terra, independentemente de
qualquer contrapartida que esse ser humano possa oferecer. Por isso, é importante conhecê-los, refletir
sobre eles, pensar calmamente em todas as situações de aplicabilidade e construirmos nossa identidade
profissional e cidadã com parâmetros claramente guiados pelos direitos humanos, direitos de todos e
para todos, para não cometermos erros.
Na atualidade, tanto no Brasil como em outros países do mundo, há grande preocupação com práticas
éticas e transparentes, seja nas atividades profissionais, seja nas atividades da vida de relações sociais. Isso
decorre dos muitos problemas que vivenciamos no passado recente, em especial com a corrupção nas
relações público-privadas, não apenas no Brasil como também em outros países do mundo.
Os prejuízos resultantes de práticas antiéticas e corruptas é tão extenso que é até difícil descrever,
mas é possível afirmar que a corrupção gera a degradação moral e ética de uma sociedade, tanto quanto
gera miséria e insegurança para todos. Em razão disso, deve ser combatida e substituída por práticas
transparentes, confiáveis, que possam ser checadas pelos cidadãos e aprimoradas sempre que necessário.
Quando tratamos de transparência e ética nas relações humanas, estamos tratando de direitos
humanos, porque é no respeito aos direitos das pessoas, independentemente de sua nacionalidade, origem,
raça, sexo ou qualquer outra referência que se materializam os princípios de moral. Em decorrência disso,
na atualidade, a sociedade questiona e crítica as práticas de assédio moral, assédio sexual, desrespeito aos
trabalhadores, agressões ao meio ambiente, violência contra os animais e tantos outros aspectos cuja raiz,
ou seja, os fundamentos, estão no direito que todo homem e toda mulher possuem de viver em ambiente
saudável, equilibrado, no qual possam exercer amplamente todos os seus direitos, cumprir seus deveres,
viver a vida com dignidade, segurança e com tudo o que for necessário para garantir bem-estar.
Assim, tanto nas atividades da vida profissional quanto na vida social, de relacionamento familiar,
com amigos e a comunidade, a UNIP Interativa espera que o aluno esteja preparado para respeitar e
7
fazer respeitar os direitos humanos, com a consciência de que todo o direito corretamente exercido no
plano individual contribui para melhorar a sociedade e propicia a concretização do bem comum.
INTRODUÇÃO
Os direitos humanos se constituem em estudo muito relevante para a formação cidadã de todos
os brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil. Independentemente da profissão escolhida, todos nós
temos que estar atentos para a defesa dos direitos do cidadão e para o cumprimento dos deveres
inerentes a essa mesma condição de cidadania.
Neste livro-texto vamos compreender a trajetória histórica internacional e nacional dos direitos
humanos e de que forma eles se materializam na legislação brasileira, muito em especial na
Constituição Federal, que é a lei mais importante do país.
Os direitos humanos são adotados em muitos países do mundo, em especial entre aqueles que
são membros da Organização das Nações Unidas (ONU), maior organismo internacional de atuação
conjunta de governos de diferentes países. A ONU foi criada após a Segunda Grande Guerra Mundial,
em 1948, e representa o esforço de muitas nações em todo o mundo para construir uma cultura de paz
e colaboração entre diferentes povos, evitando conflitos para evitar também mortes e destruição.
A experiência da Segunda Guerra Mundial foi muito traumática para a humanidade. Milhões de civis
foram mortos em bombardeios, ataques aéreos e, infelizmente, também em campos de concentração,
que ofendeu todos os princípios de proteção das pessoas e desrespeitou de todas as formas possíveis a
dignidade dos seres humanos que foram submetidos a essas condições degradantes.
Era preciso que uma resposta internacional fosse construída, em conjunto, por países e governos
determinados a impedir que essas barbaridades voltassem a acontecer. Essa é a linha de origem dos
direitos humanos que estudamos na atualidade, embora sua história tenha outros momentos importantes
e até anteriores à Segunda Guerra, que vamos analisar, estudar e refletir.
Direitos humanos são direitos de todos, de todas as pessoas em quaisquer condições em que se
encontrem. Garantir que sejam preservados e protegidos é a única forma de construirmos a sociedade
justa, fraterna e solidária que nossa Constituição Federal tem por objetivo.
Inicialmente serão tratados aspectos históricos que compõem a trajetória dos Direitos Humanos,
bem como questões que caracterizam e definem essa modalidade de direitos. Também vamos analisar as
diferentes variedades de direitos humanos, ou seja, gerações ou dimensões. E os tratados internacionais
que tratam desses direitos, juntamente com os órgãos internacionais que garantem sua efetividade.
Será analisada também a forma como a Constituição Federal do Brasil incorporou esses direitos em
seus direitos fundamentais e nos direitos sociais e de que forma os planos nacionais de direitos humanos
e a legislação federal têm tornado efetivos esses direitos na vida de todos nós.
8
DIREITOS HUMANOS
Unidade I
1 SISTEMA DE DIREITOS HUMANOS, TEORIAS SOBRE A CRIAÇÃO DE
DIREITOS HUMANOS, DEFINIÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E DIGNIDADE
DA PESSOA HUMANA
A proteção dos direitos humanos no Brasil e no mundo não ocorre de forma isolada, mas sim integrada em
um sistema nacional e internacional, com instrumentos eficientes para garantir que todos sejam protegidos
e, quando ocorrer alguma forma de agressão, seja possível identificar e punir os culpados. Sem um sistema de
proteção de direitos humanos seria muito mais fácil transgredi-los ou, simplesmente, ignorá-los.
É em razão da existência desse sistema interligado no âmbito nacional e internacional que muitas vezes
acontece uma violação de direitos humanos em um país e, imediatamente, organismos internacionais
como a Organização das Nações Unidas (ONU) se manifestam em repúdio ao ato praticado, ou para
exigir que cesse a violação, ou, ainda, para exigir que o governo daquele país garanta a integridade física
e psicológica da pessoa ou do grupo de pessoas que está sendo agredido em seus direitos.
A ONU é o órgão responsável pelo sistema de proteção de direitos humanos em todo o mundo.
Vamos conhecer seu funcionamento e os demais órgãos integrantes desse sistema, mas, primeiramente,
é necessário definir direitos humanos e conhecer suas características essenciais.
Para definirmos direitos humanos é necessário conhecer as teorias que fundamentam esses direitos.
Vamos analisar cada uma delas:
• Teoria jusnaturalista: está fundamentada na ideia de que todo ser humano possui um direito natural,
que decorre do simples fato de ter nascido humano. Esses direitos existiriam por si só, mesmo que não
sejam criadas leis para protegê-los, e são universais e imutáveis porque se referem à própria condição
da vida humana e à sua dignidade. É o caso do direito à vida, do direito à liberdade, entre outros.
• Teoria positivista: entende que são direitos humanos aqueles que forem escolhidos pelo povo e por
seus governantes para serem parte do corpo de leis de uma determinada sociedade, e serão positivados
em leis exatamente porque são direitos fundamentais para a vida humana e para toda a sociedade.
9
Unidade I
• Teoria moralista: afirma que são direitos humanos aqueles todos que se coadunam com a
moral de cada sociedade, de cada povo, reconhecendo que os preceitos morais são diferentes
nas várias sociedades existentes na Terra. O principal defensor da teoria moralista foi Charles
Perelman, professor e estudioso de Filosofia do Direito, nascido em 1912 em Varsóvia, na Polônia,
e falecido em 1984.
Conhecer essas teorias é importante para que possamos acompanhar as diversas reflexões que o
surgimento dos direitos humanos provocou entre os pesquisadores ao longo do tempo, porém não há
necessidade de optarmos por uma teoria e desprezar as outras. Nesse sentido, o Ministro Alexandre
de Moraes, do Supremo Tribunal Federal brasileiro, que é pesquisador e escritor na área de Direito
Constitucional, ao se referir a essas três teorias, afirma:
De fato, as teorias são mesmo complementares, nenhum de nós duvida de que qualquer ser
humano tem direitos naturais, decorrentes do simples fato de ter nascido humano. É o caso do direito
à vida, que é amplamente protegido nas mais diversas sociedades, independentemente da cultura que
possuem. Mesmo que o direito à vida não esteja positivado em lei escrita, ou em uma lei maior como
a constituição federal de um país, nós todos vamos continuar a respeitar a vida das pessoas tanto
quanto vamos exigir que respeitem a nossa. Nenhuma sociedade que conhecemos no mundo adota a
liberdade de matar, indiscriminadamente, dependendo apenas da vontade das pessoas. Não aceitamos
isso como ato de civilização, ao contrário, definiremos como ato de barbárie uma sociedade que se
organize com a permissão de que uns matem os outros, dependendo exclusivamente de sua vontade.
Por outro lado, reconhecemos que é muito melhor que os direitos humanos estejam positivados em
leis, em especial na maior de nossa sociedade, que é a Constituição Federal. Estando claramente escrito
que temos direito à vida, à liberdade, à dignidade, é muito mais fácil exigir que esses direitos sejam
respeitados por todos. Então, a teoria positivista tem de fato seu valor.
E, finalmente, é preciso reconhecer que cada sociedade forma historicamente sua consciência de
direitos a serem respeitados como fundamentais para os seres humanos. A trajetória histórica de cada
sociedade permite a ela construir uma experiência única, da qual emanam valores que ela pretende
defender para todos, porque são elementos de união, são valores relevantes para todos os membros
daquela sociedade. É o caso dos Estados Unidos da América, país que tem na liberdade um de seus
10
DIREITOS HUMANOS
mais expressivos valores. Ser livre para se manifestar, para ir e vir, para adotar decisões para sua própria
vida, são valores realmente importantes para os norte-americanos, muito mais do que em outras
sociedades que conhecemos e, exatamente por isso, é preciso respeitar as opções que os diferentes
povos organizados constroem ao longo de sua história.
Portanto, podemos reconhecer que as três teorias são mesmo complementares e se interligam
profundamente, de tal modo que não é necessário que façamos uma escolha entre aquela que está
mais correta.
O professor Nestor Sampaio Penteado Filho, por sua vez, define direitos humanos da seguinte forma:
Figura 1 Figura 2
Disponível em: https://tinyurl.com/v7n36f25. Disponível em: https://tinyurl.com/33za9pm7.
Acesso em: 12 set. 2023. Acesso em: 12 set. 2023.
11
Unidade I
Figura 3
Essa pesquisa por fotos de miséria, pobreza e insegurança sociais nos fará compreender melhor do
que estamos falando quando definimos direitos humanos. Estamos nos referindo a um conjunto de
direitos que permite a cada ser humano, independentemente de seu gênero, masculino ou feminino,
desenvolver todas as suas potencialidades e buscar todos os recursos necessários para viver em uma
situação de bem-estar e segurança. Direitos humanos são, nessa perspectiva, todos aqueles que podem
nos permitir vida com dignidade, qualidade, e, principalmente, com perspectivas de que em cada
momento poderemos ter acesso a tudo o que for necessário para viver plenamente.
• Segurança contra qualquer tipo de violência, física, moral ou psicológica, praticada por pessoas
ou por agentes do Estado (polícia, fiscais ou qualquer outro agente público).
12
DIREITOS HUMANOS
• Acesso à saúde para prevenção de doenças e para a cura delas, lembrando que em muitos casos o
correto atendimento de saúde permite a prevenção de inúmeras doenças graves e que é sempre
muito melhor prevenir do que tratar.
• Acesso à educação básica que permita às pessoas desenvolverem suas potencialidades intelectuais
e cognitivas de forma a só interromperem os estudos se desejarem, e não por precisarem escolher
entre trabalhar e estudar.
• Condições de empregabilidade que permitam a cada pessoa um salário que lhe garanta vida digna.
Além desses direitos mencionados, que estão profundamente ligados com aspectos de vida material
(saúde, educação, emprego), também somos portadores de direitos essenciais da nossa condição humana,
como o direito de conviver com outras pessoas, sem nenhum obstáculo ou discriminação, o direito de
livre manifestação do pensamento, o direito de acesso a bens culturais como arte e cultura, o direito
de nos associarmos com outras pessoas para desenvolvermos atividades que nos motivem, entre outros
tantos aspectos essenciais para nossa vivência social, emocional, política e cultural.
Agora as definições começam a fazer mais sentido, porque é possível aplicá-las em nossas vidas
cotidianas. E também vão fazer sentido as definições de direitos humanos que apresentamos agora,
a primeira do jurista espanhol Antonio Enrique Péres Luño e a segunda do jurista brasileiro José
Afonso da Silva.
Como podemos perceber, a dignidade humana ou dignidade da pessoa humana é o principal fio
condutor das diferentes definições, ou seja, tudo o que diz respeito a direitos humanos está focado na
proteção dessa dignidade.
13
Unidade I
A pessoa tem dignidade por ser pessoa, de modo que o princípio da dignidade
é o primeiro de todos na escala axiológica – vale mais que qualquer outro
direito. [...] Por isso, o ordenamento jurídico interno de cada Estado soberano
não cria ou outorga os direitos de liberdades da pessoa, e sim os declara,
facilitando a sua proteção (2005, p. 54).
E a ONU, na Declaração Universal dos Direitos Humanos promulgada em 1948, logo no Preâmbulo,
determina: “Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família
humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da
paz no mundo”.
O Ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal brasileiro, afirma que: “A dignidade
humana, como atualmente compreendida, se assenta sobre o pressuposto de que cada ser humano
possui um valor intrínseco e desfruta de uma posição especial no universo” (2016, p. 14).
Mencionamos a posição do Tribunal Constitucional Alemão sobre o mesmo tema, que afirma:
Mesmo assim, não restam dúvidas de que a dignidade é algo real, algo
vivenciado concretamente por cada ser humano, já que não se verifica
maior dificuldade em identificar claramente muitas das situações em que é
espezinhada e agredida, ainda que não seja possível estabelecer uma pauta
exaustiva de violações da dignidade (2013, p. 18).
De fato, basta olhar as fotos anteriores para identificarmos, imediatamente, que vários direitos
estão sendo feridos em relação àquelas crianças e, também, a todas as demais pessoas que vivem na
mesma situação. Direito à saúde, à segurança, a um ambiente saudável, limpo e protegido, todas essas
14
DIREITOS HUMANOS
dimensões que compõem a dignidade da pessoa humana. Assim, em muitas situações, poderemos até
não conseguir consenso sobre um conceito de dignidade da pessoa humana, mas sempre vamos saber,
como afirma o professor Sarlet, quando a dignidade está sendo ferida ou agredida.
Na Constituição da República Federativa do Brasil temos um amplo rol de direitos fundamentais que
consagram entre nós brasileiros os direitos humanos como direitos positivados, incluídos na lei mais
importante do país e em outros vários textos de lei que dela derivam. Também respeitamos no Brasil os
tratados internacionais de direitos humanos dos quais o país é signatário (que assinou concordando em
cumprir), como é o caso de Declaração dos Direitos do Homem da ONU, por exemplo.
Assim, a distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais é meramente formal, porque os
primeiros estão em tratados internacionais ou ainda não alocados em textos de lei, embora já sejam
reconhecidos como direitos; e os direitos fundamentais estão positivados em lei, em especial, nas
constituições federais dos países que os adotam.
Os direitos humanos têm algumas características que precisam ser estudadas por nós. Vamos conhecê-las
e analisá-las uma a uma. Essas características são comuns em estudos de muitos pesquisadores da área de
direitos humanos, razão pela qual merecem análise cuidadosa.
• Universalidade: o que significa que todos os seres humanos da Terra têm direito a usufruir da
proteção que os direitos humanos expressam.
• Indivisibilidade: significa que o rol de direitos humanos compõe um todo que não pode ser
dividido. Assim, não é permitido a um Estado que escolha alguns direitos humanos para proteger
e deixe outros de lado.
15
Unidade I
• Imprescritibilidade: significa que nenhuma pessoa perde, por decurso de prazo, o direito de
exercício de qualquer um dos direitos humanos. Mesmo que sejam reivindicados depois de um
longo transcurso de tempo, a pessoa ainda terá direito ao exercício do direito.
• Inalienabilidade: significa que os direitos humanos não podem ser transferidos, negociados ou
cedidos, seja a título oneroso (por dinheiro ou outra contrapartida material), seja a título gratuito.
Todos têm direito e podem exercê-lo, mas não para aliená-los por qualquer motivo.
• Irrenunciabilidade: significa que ninguém pode renunciar aos direitos humanos, ou seja,
ninguém pode renunciar ao direito à vida, à liberdade ou a qualquer outro.
• Efetividade: significa que o Estado por meio de seus poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário,
deve atuar sempre para conseguir efetivar os direitos humanos, de forma a garantir que todas as
pessoas tenham como exercê-los livremente.
• Inviolabilidade: significa que ninguém, Estado ou pessoa (física ou jurídica), está legitimado para
desrespeitar direitos humanos. Todos devem respeitar, cumprir e fazer cumprir os direitos humanos.
• Vedação de retrocesso: significa que se um direito é reconhecido como direito humano, não
se pode retirá-lo ou diminuir sua aplicabilidade. Em outras palavras, uma vez que um direito é
integrado ao rol de direitos humanos, ele não pode ser retirado e também não pode ser minimizado.
Essas são as características mais relevantes dos direitos humanos e que aparecem em vários estudos
realizados sobre o tema. Existe variação entre os estudiosos, que elaboram uma lista de características mais
extensas ou um pouco menos extensas, mas no geral essas são as características que devemos conhecer
sobre direitos humanos e que de forma recorrente aparecem nos diferentes estudos de pesquisadores
dessa temática.
Por essas características, é possível compreender a importância desses direitos para a vida de todos os
seres humanos e o enorme prejuízo para toda a sociedade quando eles não são completamente efetivados.
Diferentemente de outros direitos que existem nas sociedades organizadas, os direitos humanos não podem
ser restringidos, não podem sequer ser objeto de renúncia por parte de seu titular. Os direitos patrimoniais,
por exemplo, podem ser objeto de renúncia. Não é usual, mas, se desejar, uma pessoa pode abrir mão de
seu direito de herança ou de seu direito de pensão alimentícia, por exemplo. Isso não acontece no campo
dos direitos humanos, porque ninguém pode abrir mão de seu direito à vida, à segurança ou à liberdade.
16
DIREITOS HUMANOS
Os direitos humanos foram construídos lentamente ao longo da história. Não surgiram todos de
uma vez nem foram reconhecidos como direito por todas as diferentes nações ao mesmo tempo.
É por essa razão que os estudiosos do assunto partilham a ideia de que os direitos humanos são uma
construção contínua, constante, nunca estarão completamente terminados, porque cada época da
história da humanidade exige a proteção de novos direitos, ou, se preferirem, cada época histórica
da humanidade faz surgir novas necessidades para a integral proteção dos seres humanos.
A análise das diferentes épocas da história da humanidade demonstra que já fomos muito mais
bárbaros do que na atualidade e, ao mesmo tempo, indica que ainda temos muito o que melhorar,
embora, sem dúvida, tenhamos caminhado bastante em termos de proteção de direitos do homem.
17
Unidade I
As duas fotos anteriores reportam ao período do nazismo na Alemanha, durante a Segunda Guerra
Mundial. Nessa época, como sabemos, judeus foram perseguidos, aprisionados, levados para campos
de concentração e mortos em câmaras de gás, depois de sofrerem todas as agruras do medo, da fome,
do frio e do trabalho excessivo a que foram submetidos. Estima-se que seis milhões de judeus tenham
sido mortos na Segunda Guerra Mundial, embora não tenham sido os únicos a serem perseguidos pelos
nazistas. Ciganos e homossexuais sofreram perseguições, torturas, entre outros.
Repare que o cartaz da exposição sobre Auschwitz tem uma frase logo abaixo em que está escrito:
“No hace mucho. No muy lejos.” Essas duas frases, em português, significam: “Não faz muito. Não
muito longe.”
De fato, a Segunda Guerra Mundial ocorreu entre 1939 e 1945, aconteceu na Europa, continente
distante apenas algumas horas de voo do continente americano. Esses horrores praticados contra os
judeus aconteceram muito próximo e nem por isso foram evitados ou minimizados. Isso tudo deve nos
fazer refletir sobre a importância da preservação dos direitos humanos, tanto quanto os fatos ocorridos
no passado mais longínquo, como, por exemplo, a Revolução Russa, de 1917, a escravidão no Brasil, que
só terminou em 1888, e a Primeira Guerra Mundial, no período de 1914 a 1918.
E se nos aprofundarmos nos estudos da história da humanidade, retrocedendo além do século XIX,
mais para trás vamos encontrar também muita violência e muito desrespeito a direitos, como no período
da Idade Média, das Cruzadas, do Império Romano, da conquista da América por portugueses e espanhóis,
enfim, a história da humanidade se caracteriza por violência, guerra e desrespeito a direitos.
Claro que também existem aspectos muito positivos, como o desenvolvimento tecnológico e o
avanço da ciência. Isso é, sem dúvida, uma prova da incrível inteligência e capacidade de superação dos
seres humanos, que, quando resolvem empreender, não têm limites. Em pouco tempo, o homem deixou
de se locomover por meio de cavalos e carroças e criou naves interespaciais capazes de levá-lo à Lua.
O avanço tecnológico nem sempre vem acompanhado de evolução no campo dos direitos, por isso a
necessidade de conhecermos com profundidade as diferentes épocas dos direitos humanos e, se possível,
prospectarmos os direitos que precisarão ser criados na época que vivemos e para o futuro próximo.
Na atualidade, os avanços tecnológicos significam benefícios, mas também novos riscos, que podem
afetar os direitos de todos nós. É o caso dos riscos de ataques cibernéticos, com vazamento de dados
pessoais como senhas de bancos, por exemplo, ou os riscos à saúde que possam ser causados por
cosméticos concebidos a partir de nanotecnologia.
18
DIREITOS HUMANOS
Em outras palavras, cosméticos como cremes hidratantes e batons podem estar utilizando
substâncias em partícula nano e estas podem ser nocivas para a saúde das pessoas que neste momento
não sabem que os produtos são nocivos e que tipo de dano à saúde ele pode causar, porque os
estudos ainda estão sendo realizados pelos cientistas. Deve ser garantido às pessoas, no entanto, que
tenham direito à informação para que decidam utilizar ou não o produto com maior segurança para
sua vida e sua saúde.
Esse exemplo é bastante útil para nossas reflexões sobre direitos humanos e proteção da dignidade
da pessoa humana. Das guerras, torturas e destruições por bombas até a utilização de produtos de
consumo sem informações suficientes sobre os riscos para a saúde, existem inúmeras formas de agressão
aos direitos humanos. Por isso é que podemos afirmar que os direitos humanos são construídos pouco a
pouco, nas diferentes épocas históricas que a humanidade vivenciou, vivencia e ainda vivenciará.
Em razão disso, foi mais fácil para os estudiosos organizarem as diferentes fases dos direitos
humanos em gerações, ou dimensões, de forma a simbolizar o período histórico em que cada uma
surgiu e os tipos de direitos que foram reconhecidos naquele momento histórico. Vamos estudar, então,
as dimensões ou gerações de direitos humanos que temos até este momento, sem nos esquecermos
que outras muitas surgirão a medida que o leque de direitos humanos for sendo expandido, em razão
dos novos riscos que surgirão.
19
Unidade I
A lição é oportuna e esclarecedora, porque, de fato, uma geração de direitos humanos não substitui
a anterior, ao contrário, a ela se soma. Os direitos de primeira geração se somam aos de segunda, ambos
se somam aos de terceira geração e assim sucessivamente. Por essa razão é que a expressão dimensões
de direitos humanos é melhor, na medida em que ela deixa claro que existem dimensões temporais e
temáticas diferentes, porém todas elas se somam e, principalmente, se complementam.
Vamos analisar, então, cada uma das dimensões de direitos humanos que foram construídos ao
longo da história da humanidade.
A primeira geração ou dimensão de direitos humanos surgiu, simbolicamente, no século XIII, a partir
de 1215, quando João Sem-Terra, rei da Inglaterra, aprovou um texto de lei denominado Magna Carta.
Por esse texto ele se comprometeu a governar em conformidade com as leis, ou seja, não utilizaria mais seu
poder contra o povo e respeitaria a propriedade, a vida e a segurança de todos os seus súditos. Isso pode
parecer pouco, mas era uma grande novidade para aquela época, em que os reis tinham poder absoluto,
de vida e morte sobre seu povo. Pressionado por esse mesmo povo que estava inconformado com os
desmandos do rei, João Sem-Terra se comprometeu a seguir fielmente a lei elaborada pelo poder legislativo
e a governar apenas nos limites permitidos por ela.
Os direitos de primeira geração ou dimensão são, assim, os direitos do povo contra os abusos do
Estado e, por isso, são denominados direitos políticos e civis fundamentais, ou, liberdades públicas.
São os direitos que garantem ao povo o direito de escolher seus governantes pelo voto, o direito de não
ser condenado sem um processo justo e com amplo direito de defesa, o direito de não ser molestado
física ou psicologicamente por ninguém, em especial pelo Estado, e o direito de destituir do poder
governantes que não se comportem conforme a lei.
Além da Magna Carta, de 1215, outras leis são importantes para confirmar os direitos políticos e civis
ou direitos humanos de primeira dimensão ou geração. Entre eles, o Bill of Rights, de 1689, na Inglaterra,
que, segundo o professor Alexandre de Moraes, teve as seguintes características:
20
DIREITOS HUMANOS
Também contribuíram expressivamente para esse período histórico de afirmação de direitos políticos
e civis a Declaração de Direitos da Virgínia, de 16 de junho de 1776, e a Declaração de Independência
dos Estados Unidos da América do Norte, de 4 de julho de 1776. A esse respeito, ensina o professor
Alexandre de Moraes:
21
Unidade I
É bastante interessante observar que os norte-americanos parecem querer justificar para a Inglaterra
que a decisão pela independência decorre da intransigência inglesa em não respeitar os interesses
econômicos, sociais e políticos do povo americano.
Desse modo, os norte-americanos comunicaram aos ingleses que, a partir daquele momento, seriam
um Estado independente no qual viveriam homens que foram criados iguais e dotados pelo Criador dos
mesmos direitos inalienáveis à vida, à liberdade e a procura da felicidade. Estabeleceram que o governo
seria instituído sempre com o objetivo de preservar esses direitos inalienáveis e, nos casos em que o
governo se tornasse destrutivo desses fins, o povo poderia se insurgir e escolher um novo governo, que
se comprometesse com esses princípios.
A grande meta coletiva que os norte-americanos almejavam alcançar era a liberdade, que para eles
não era apenas um sentimento, mas muito mais que isso: um verdadeiro projeto de sociedade. Buscar
a felicidade e vivê-la com plenitude passava a ser direito natural de cada cidadão, que disporia de total
liberdade para concretizar esse projeto, devendo apenas respeitar a liberdade dos demais cidadãos.
A liberdade era outro valor supremo para os norte-americanos, que na introdução da Constituição
fixaram:
A Constituição dos Estados Unidos da América, nós, o povo dos Estados
Unidos, a fim de formar uma União mais perfeita, estabelecer a justiça,
assegurar a tranquilidade interna, prover a defesa comum, promover
o bem‑estar geral, e garantir para nós e para os nossos descendentes os
benefícios da Liberdade, promulgamos e estabelecemos esta Constituição
para os Estados Unidos da América (Constituição dos Estados Unidos
da América, 1987).
23
Unidade I
“Garantir para nós e para os nossos descendentes os benefícios da Liberdade, promulgamos...”. A frase
evidencia por todas as formas que a liberdade é o direito a ser garantido para a atual e as futuras
gerações e proclama que a liberdade tem benefícios que todos têm o direito de usufruir.
Essas posições e os objetivos traçados para atingir liberdade e felicidade afirmavam que os
norte‑americanos não aceitavam mais nenhuma forma de arbítrio ou de absolutismo da parte de
seus governantes. Ou, em outras palavras, o povo tinha o direito de escolher seus governantes e
de substituí-los sempre que não estivessem cumprindo rigorosamente seu papel. E qual o papel de um
governante? Para os norte-americanos do século XVIII, era, principalmente, respeitar o povo e garantir
que todos tivessem liberdade e meios para concretizar a felicidade.
Esses dois objetivos, exercer a liberdade e construir felicidade, estão na base dos direitos humanos
de Primeira Geração. Mas, ainda é preciso analisar a Revolução Francesa, que ficou conhecida como
a terceira revolução burguesa e teve início com o famoso episódio da Queda da Bastilha, ocorrido em
14 de julho de 1789.
Vamos recordar sobre esse episódio emblemático que a Bastilha era uma prisão onde os presos
eram tratados em condições desumanas, era um símbolo do absolutismo, ou seja, do poder absoluto
dos reis, que, na França daquele momento, era exercido pelo Rei Luiz XVI, que seria deposto pelos
revolucionários e morto na guilhotina em 1792. O prédio da Bastilha não existe mais em Paris, mas até
hoje é um lugar de muito simbolismo para os franceses e para todos aqueles que estudam as revoluções
que determinaram o fim do período absolutista e o nascimento dos direitos políticos e civis. A seguir
você pode ver a foto de uma maquete de como era a prisão da Bastilha, ela está no Museu Carnavalet,
localizado em Paris, capital da França.
Figura 6
24
DIREITOS HUMANOS
Figura 7
A foto anterior é de um monumento em Paris, próximo ao local em que antigamente estava localizada
a prisão da Bastilha. Esse monumento foi construído para homenagear a Revolução Francesa e a liberdade
que o povo francês adquiriu a partir daquele momento. Liberdade, igualdade e fraternidade são as três
palavras que simbolizam até hoje a Revolução Francesa; veja que a liberdade também representa para
os franceses revolucionários um ideal a ser concretizado. Dessa forma, nenhum governo que assumisse
o controle político depois da revolução poderia pretender usurpar a liberdade dos franceses, porque ela
estava no mais alto grau de direito que eles pretendiam proteger e exercer.
O homem, ao obedecer à lei, obedece à sua própria vontade, pois escolhe quem
fará a lei, de acordo com as suas convicções. De acordo com a Declaração
Francesa, embasada nas ideias de Rousseau, a finalidade da sociedade é
assegurar a liberdade natural do homem, e a lei, expressão da vontade geral,
não pode ser instrumento de opressão (2005, p. 74).
Os direitos humanos de primeira geração ou primeira dimensão são, portanto, os direitos de liberdade
e surgem para proteger o cidadão do arbítrio do Estado, que, naquela época, representado pelo poder
dos reis, era exercido de forma absoluta, como uma designação divina e, por isso, com poder de vida e
morte sobre os súditos. Com as revoluções do século XVIII o absolutismo dos reis termina e em seu lugar
surge a força do poder parlamentar cujos representantes são eleitos pelo povo, com objetivo de redigir
25
Unidade I
leis de cumprimento obrigatório para todos, governantes e governados, e leis que respeitem os direitos
do povo, em especial, os direitos de liberdade.
A segunda dimensão ou geração de direitos humanos surge como necessidade a partir das
modificações sociais, econômicas e políticas decorrentes do processo de industrialização, também
conhecido como Revolução Industrial, cujo início ocorreu no século XVIII.
Até o surgimento da máquina à vapor, que ocorreu em meados do século XVIII, por volta de 1760,
na Inglaterra, toda a produção econômica era de manufatura feita por artesãos e trabalhadores rurais.
Com o surgimento das máquinas movidas a vapor que podiam produzir centenas de peças em um único
dia, o modo de produção econômica foi totalmente modificado e a partir dele a vida social e política
daquele período histórico.
O surgimento das fábricas por toda a Inglaterra exigiu a procura por mão de obra e, com isso, houve
o êxodo rural, com milhares de pessoas se mudando para as cidades para poderem trabalhar nas indústrias
recém-criadas, com salários baixos e grande carga de trabalho, quase sempre em torno de 14 a 16 horas
por dia. Até a mão de obra infantil foi utilizada e muitas crianças trabalhavam de 10 a 12 horas por dia.
Desnecessário ressaltar que os homens também trabalhavam muitas horas por dia, e isso gerou muitos
acidentes de trabalho, causando lesões e mortes de operários.
De fato, com a Revolução Industrial surgiu a classe operária, que passou a integrar o sistema
capitalista de produção. A partir da classe operária ou do proletariado, toda uma lista de direitos que
até então não existiam, como o direito a um salário justo, horas de trabalho que permitam segurança
ao trabalhador, horas de descanso para refazimento das condições físicas e psicológicas, serviços de
saúde para atender trabalhadores, locais para que os filhos dos trabalhadores pudessem ficar enquanto
eles trabalhavam, entre outros que compunham uma relação de direitos, que, para aquela época, eram
totalmente novos.
A mudança radical nas relações de trabalho, da propriedade rural e da manufatura de artesãos para
a produção industrial, que da Inglaterra se alastrou para a Europa e América, fez surgir a Organização
Internacional do Trabalho, a OIT, criada em 1919, com objetivo de contribuir para a construção de justiça
social. Surgem, então, os direitos humanos de segunda geração ou dimensão, que são direitos
econômicos, sociais e culturais inspirados pelo ideal de igualdade.
26
DIREITOS HUMANOS
Repare que estão contidos nesse rol de direitos não apenas o direito ao trabalho, a justa remuneração
e as condições dignas de trabalho, mas também o direito à saúde e moradia adequados; ao lazer com
acesso à cultura e ao esporte; à assistência e previdência social; à assistência para os casos de doença ou
desemprego que impeça a pessoa de prover o próprio sustento; e à previdência para que o trabalhador
possa se aposentar e receber um valor que lhe permita a vida com dignidade.
Figura 8 – Inauguração da primeira estrada de ferro a vapor (1825), construída por George
Stephenson para ligar as localidades de Stockton e Darlington, na Inglaterra
Alguns textos de lei foram muito importantes para a consolidação dos direitos humanos de segunda
geração ou dimensão, como a Constituição Mexicana de 1917, que foi a primeira a atribuir aos direitos
trabalhistas o caráter de direitos fundamentais do homem. E a Constituição de Weimar, Alemanha,
de 1919, que se notabilizou pela importância que deu aos direitos trabalhistas e à educação pública,
organizando as bases do que mais tarde ficaria conhecido como democracia social.
Esses importantes documentos e a Primeira Guerra Mundial, de 1914 a 1918, com todos os
transtornos, causando mortes, destruição e mutilação de sobreviventes, colocaram o mundo diante dos
desafios de tratar as pessoas com respeito e de forma digna, única maneira possível para que possam
desenvolver todas as suas potencialidades. Esses direitos, denominados direitos sociais, trazem um
caráter coletivo porque se destinam a toda a sociedade, independentemente do país de origem de cada
um, da raça, do gênero, da religião ou de qualquer outro fator.
O que teria ocorrido para que a humanidade despertasse para a necessidade de proteger esses
direitos coletivos e de fraternidade? O que são esses direitos difusos ou metaindividuais?
27
Unidade I
A Segunda Guerra Mundial, de 1939 a 1945, deixou marcas profundadas nos países da Europa
e nos Estados Unidos, embora também em outros países as experiências vividas durante o período
de guerra tenham sido marcantes, inclusive no Brasil, que cedeu soldados para lutarem na guerra e
sofreu com a escassez de bens e alimentos durante o período da guerra. A destruição e o alto número
de mortos e feridos de guerra despertou a humanidade para novas necessidades a fim de evitar que
aquilo ocorresse novamente. Era preciso construir a paz de forma duradoura, porque só é possível
desfrutar de qualidade de vida em um mundo em que haja equilíbrio, segurança, confiança, ou, em
uma única palavra, em que haja paz!
Além disso, a economia avançou e se tornou globalizada. Cada país e cada setor econômico se viu
diante da necessidade de produzir muito mais para poder exportar para outros países e, com isso, trazer
mais riquezas. A produção em massa e globalizada atingiu fortemente o meio ambiente, causou poluição
do ar, do solo, dos mares, dos rios e, com isso, os temas relacionados à proteção do meio ambiente e da
ecologia ganharam destaque na pauta da humanidade.
Se a fome ainda é a enorme preocupação no mundo em que vivemos, porque muitas pessoas ainda
não conseguem se alimentar com o mínimo necessário todos os dias para terem boa saúde, a obesidade
já é tratada em muitos países do mundo como epidemia e traz com ela sérios problemas para a saúde,
como as doenças coronarianas, por exemplo.
Proteção do consumidor é, portanto, uma modalidade de direitos humanos. Todo consumidor tem
direito a receber informações objetivas, precisas, úteis e exatas sobre os produtos ou serviços que consome
e, quando esses produtos ou serviços possam ser nocivos à saúde ou ao bem-estar dos consumidores, a
responsabilidade dos fornecedores aumenta significativamente.
O progresso técnico-científico é sempre bem-vindo, mas em nenhuma hipótese pode ser construído
sem práticas éticas e transparentes, ou com prejuízo para as pessoas, especialmente aquelas que estão
em condições de vulnerabilidade econômica ou cultural e, por isso, têm menores chances de lutar por
seus direitos e por sua proteção.
Saiba mais
É por isso que esse conjunto de direitos da terceira geração ou dimensão é chamado de direitos
metaindividuais ou difusos, porque pertencem a toda a humanidade, não há um destinatário específico
deles, todos devem ser beneficiados com esses direitos. Por isso também que são chamados de direitos
de fraternidade, porque no momento em que a Terra está fortemente interligada pela economia
(globalização) e pela comunicação (redes sociais e internet). Esses direitos, como o do meio ambiente
saudável e equilibrado, quando forem garantidos para todos os povos, farão o mundo muito melhor,
independentemente de onde cada um de nós estiver.
São os chamados direitos dos povos. Eles surgiram em decorrência da globalização como um
processo irreversível e também dos temores sobre o que a evolução tecnológica poderá significar
para a humanidade.
Pluralismo e democracia são os conceitos fundamentais que precisamos compreender para podermos
analisar os direitos de quarta geração. Democracia, já sabemos, é o direito de cada cidadão participar
das escolhas políticas do Estado em que vive, principalmente por meio de representantes que são eleitos
para participar do debate político e para adotar as leis e políticas públicas necessárias para a garantia do
interesse de todos, do bem comum. Ocorre que a democracia se tornou uma prática complexa porque
dificilmente pode ser direta, ao contrário, em um mundo com superpopulação a participação direta
é difícil e substituída por representantes escolhidos pelos diferentes grupos sociais.
29
Unidade I
Mulheres, negros, homossexuais, transgêneros, pessoas com deficiência, crianças e adolescentes são
chamados de minorias não porque sejam em menor número de pessoas, mas porque, quase sempre,
não contam com representação política que possa defender os direitos que eles possuem.
Pergunta: é mais fácil que os ruralistas tenham representantes no poder legislativo, ou é mais fácil
que pessoas com deficiência tenham representação? Quem tem maior facilidade de organização para
apoiar um candidato ou vários candidatos que os representem?
Essa representação não se confunde com práticas ilegais como a corrupção, por exemplo. Os ruralistas
não se organizam para comprar um deputado que vai fazer somente o que eles quiserem ou as pessoas
com deficiência não se organizam para essa mesma finalidade. Representação significa que o candidato
a deputado vai dialogar com esses grupos, conhecer suas necessidades, o que pode ser feito para que a
vida deles se desenvolva melhor. Esse diálogo tem que ser organizado com apresentação de propostas que
possam se tornar leis, políticas públicas e, com isso, trazer benefícios para aquele setor social.
Existem grupos sociais, no entanto, que se encontram em condição de enorme vulnerabilidade e, por
esse motivo, não conseguem se organizar de forma eficiente para poder ter representantes no campo
da política. Para esses grupos, a chance de participação democrática fica resumida ao voto, porque o
espaço do diálogo não se concretiza na medida em que não conseguem ter representação adequada.
Assim, os direitos humanos de quarta dimensão ou geração se voltam para essa preocupação:
pluralismo democrático, garantir que todas as pessoas tenham possibilidade de ter voz na vida política,
para poderem apresentar suas ideias, reivindicar seus direitos, discutir propostas e soluções de problemas.
Só assim teremos uma democracia verdadeiramente plural, em que todos os grupos sociais se sintam
representados e ativamente participantes do debate político.
Os estudiosos apontam uma outra face dos direitos humanos de quarta dimensão ou geração,
a proteção contra os abusos ou desvios que possam ser causados pelo progresso científico.
Em especial, há preocupação com o que pode ser prejudicial no campo dos estudos genéticos. Os estudos
genéticos avançaram muito e permitem, na atualidade, utilização no campo da engenharia genética e
da biotecnologia. Porém, esse avanço não pode ser tratado exclusivamente a partir da ótica do interesse
econômico, porque é preciso preservar a ética e o valor da vida humana.
Artigo 4º O genoma humano em seu estado natural não deve ser objeto de
transações financeiras (Unesco, 2000).
31
Unidade I
O maior risco do uso indevido do conhecimento científico é provocar a biologização da vida, ou seja,
utilizar os de mapeamento genético para explicar todos os comportamentos humanos, esquecendo
que o meio social que o indivíduo vive influencia diretamente em sua formação moral, ética, política
e econômica. Em outras palavras, a engenharia genética não tem o condão de explicar tudo nem
pode tentar fazê-lo, sob pena de reduzirmos o ser humano a resultados genéticos sem considerar sua
formação psicológica e social. Não pode haver determinismo genético para explicar todas as múltiplas
circunstâncias e vivências das quais a vida humana é constituída. O ser humano é complexo, não pode
ser explicado apenas pela genética.
Outra preocupação relevante protegida pela Declaração da Unesco foi a discriminação fundada em
características genéticas. Assim, o artigo 6º da Declaração determina que: “Nenhum indivíduo deve ser
submetido à discriminação com base em características genéticas, que vise violar ou que tenha como
efeito a violação de direitos humanos, de liberdades fundamentais e da dignidade humana.”
Como podemos perceber, duas são as preocupações mais relevantes da Unesco: que as pesquisas
genéticas continuem sendo feitas com o propósito de beneficiar a humanidade, em especial na busca
de cura para os grandes males que afligem os seres humanos, como as doenças autoimunes e os vários
tipos de câncer; e que nenhuma pesquisa e nenhum avanço no campo dos estudos genéticos seja
negativo ou prejudicial para a dignidade da pessoa humana.
32
DIREITOS HUMANOS
Figura 9
A foto anterior mostra os momentos iniciais de um dos piores atentados terroristas ocorridos em
todo o mundo, quando as Torres Gêmeas de Nova York foram atingidas por dois aviões e desmoronaram,
causando a morte de milhares de pessoas.
Aquele, infelizmente, foi apenas o primeiro de vários atentados terroristas que têm ocorrido nos últimos
15 anos, sempre com muitas vítimas covardemente feridas e mortas. São explosões de homens-bomba,
atropelamento com veículos de passeio e caminhões, bombas lançadas em ambientes com muitas pessoas,
ataques a tiros, entre outros.
Figura 10
33
Unidade I
A foto anterior mostra os protestos pacíficos contra o ataque terrorista realizado no jornal
Charlie Hebdo, em Paris, em 7 de janeiro de 2015. Milhares de pessoas foram às ruas em várias partes do
mundo para protestar, de forma silenciosa e muito sentida.
Existem conflitos espalhados por vários pontos do planeta e com as mais diversas origens.
São conflitos territoriais, religiosos, políticos, econômicos ou ideológicos. Quando não, vários fatores se
misturam para formar um conflito de grandes proporções. Os conflitos internos na Síria, a situação de
tensão permanente entre Israel e Palestina, as práticas criminosas do grupo Boko Haram, que praticou
o sequestro de 200 adolescentes mulheres em 2014, as práticas do grupo terrorista Estado Islâmico, os
atentados ocorridos na França, na Espanha e na Inglaterra, todos esses são momentos em que a paz
mundial é fortemente abalada e a insegurança toma conta de boa parte do mundo.
Em artigo escrito para o jornal Folha de São Paulo em 3 de dezembro de 2006 e ainda muito atual,
o professor Paulo Bonavides se refere ao direito à paz da seguinte forma:
O DIREITO à paz é o direito natural dos povos. Direito que esteve em estado
de natureza no contratualismo social de Rousseau e que ficou implícito
como um dogma na paz perpétua de Kant.
Direito à paz, sim. Mas paz em sua dimensão perene, à sombra do modelo
daquele filósofo. Paz em seu caráter global, em sua feição agregativa de
solidariedade, em seu plano harmonizador de todas as etnias, de todas as
culturas, de todos os sistemas, de todas as crenças e que a fé e a dignidade
do homem propugnam, reivindicam e sancionam.
A essa ideia de concórdia adere uma ética que tem a probabilidade de governar
o futuro, nortear o comportamento da classe dirigente, legitimar-lhe os atos
e as relações de poder.
34
DIREITOS HUMANOS
No entendimento do professor Paulo Bonavides (2006), a paz é um direito que precisa estar em
todas as constituições de todos os países do planeta, para que os governantes tenham sempre em mente
que não se pode romper com a paz e que são necessários todos os esforços possíveis para mantê-la,
para concretizá-la de forma satisfatória. Considera Paulo Bonavides que a paz é um direito para todos
os povos e um dever para todos os governantes. Sem dúvida, é uma ideia interessante porque coloca a
paz em um campo concreto, como um dever de governo e um princípio do Estado, o que, sem dúvida,
fortalece o empenho para que os melhores propósitos sejam atingidos.
Existem alguns estudiosos, ainda, que inserem no rol dos direitos humanos de quinta geração ou
dimensão a proteção para os seres humanos no âmbito dos riscos decorrentes da revolução tecnológica
que a internet, a rede mundial de computadores, propiciou em grande parte da Terra.
Na atualidade, aqueles que têm acesso constante à rede mundial de computadores e às redes sociais
sabem que estão sujeitos a muitos riscos decorrentes de crimes praticados no espaço virtual. São crimes
cibernéticos para captura de senhas de acesso ao sistema bancário eletrônico, para disseminação de
fotografias de práticas de pedofilia, para divulgação de imagens de crimes de estupro coletivo, uso indevido
de imagens, práticas de estelionato virtual, entre outras inúmeras possibilidades de práticas ilícitas.
No campo dos direitos humanos, as práticas ilícitas também ocorrem com discriminação de raça,
de gênero, de orientação sexual, religiosa, sempre com consequências muito graves. Já são comuns,
infelizmente, práticas de bulling pelas redes sociais que levam jovens e adolescentes a se suicidarem ou
a desenvolverem doenças psíquicas muito graves, muitas vezes sem contar a seus pais ou professores
porque temem ficar ainda mais expostos a serem ridicularizados. São casos em que jovens, adolescentes
e até crianças enfrentam problemas sem apoio e sem orientação, o que, sem dúvida, pode provocar atos
extremos contra a própria vida.
A importância que as práticas ilícitas na rede mundial de computadores adquiriram permite que elas
integrem o rol dos direitos humanos de quinta geração ou dimensão, porque combater as práticas e
atuar na proteção das vítimas é um tema que envolve todos os países, todas as pessoas e organizações
de direitos humanos, até porque se trata de tarefa complexa.
Novas dimensões e gerações de direitos humanos surgirão no futuro. O que é importante destacar
para finalizar é que os diferentes direitos humanos alocados em cada uma das gerações ou dimensões
não se sobrepõe aos demais. Todos são importantes e ainda precisam ser praticados mais intensamente
35
Unidade I
nos dias atuais. Todos se complementam, não se excluem e, quando inteiramente garantidos a todas as
pessoas, propiciarão um mundo de paz e de felicidade.
Como já sabemos, a trajetória histórica da construção dos direitos humanos está profundamente
atrelada à trajetória histórica da própria humanidade. Na medida que os homens avançam historicamente
surgem novas dimensões ou gerações de direito a serem protegidos e, dessa forma, o rol de direitos
humanos cresce em quantidade e, consequentemente, em importância.
A história dos direitos humanos no mundo se confunde com a história dos organismos que foram
criados para defendê-los, entre eles, o mais importante, a ONU. Em 1899, em Haia, na Holanda, foi
realizada a Conferência Internacional de Paz, com objetivo de elaborar formas de solução de conflitos
de maneira pacífica, para prevenir guerras e organizar regras a serem respeitadas durante os períodos
em que existissem conflitos armados.
Parece um absurdo para nós, nos dias de hoje, mas no fim do século XIX e início do século XX
houve uma preocupação em criar um direito humanitário, ou seja, um direito para proteger aqueles que
participavam da guerra. Em outras palavras, uma lei de guerra! O objetivo era fixar limites à atuação dos
combatentes de cada país em conflito, para assegurar o respeito aos direitos humanos mesmo nessas
situações. A proteção humanitária era destinada, principalmente, para os soldados fora de combate,
como feridos, doentes, náufragos e prisioneiros; e para a população civil moradora nas zonas de conflito.
Era o Direito Internacional da Guerra, também chamado de Direito Humanitário, que regulamentou
a violência no âmbito internacional durante os períodos de guerra. Uma importante contribuição desse
conjunto de regras foi exigir, por exemplo, que após um ataque de um inimigo contra outro, fosse
liberado um período de tempo sem novos ataques para que as patrulhas pudessem socorrer os feridos.
Esses primeiros esforços de proteção humana parecem muito distantes da nossa realidade
contemporânea, mas é preciso lembrar que a história da humanidade é repleta de conflitos entre
países, o que torna mais fácil compreender a necessidade de organização de um direito internacional de
guerra ou direito humanitário, que antecedeu os esforços que seriam feitos depois para a criação dos
direitos humanos.
A entidade considerada como precursora da ONU é a Liga das Nações, instituição criada durante
a Primeira Guerra Mundial, em 1919, a partir do Tratado de Versailles. A Liga das Nações tinha como
objetivo promover a cooperação, a paz e a segurança no plano internacional e, para isso, condenava
agressões externas contra a integridade territorial e contra a independência política de seus membros.
A Convenção da Liga das Nações, escrita em 1920, tinha previsões relativas aos direitos humanos,
em especial para proteção ao direito do trabalho. Os países que se tornaram signatários da Convenção
da Liga das Nações se comprometeram a assegurar condições justas e dignas de trabalho para homens,
mulheres e crianças.
36
DIREITOS HUMANOS
De certa forma, o texto da Convenção da Liga das Nações era uma novidade para aquele período
histórico no sentido de que representava uma limitação à soberania dos estados que se tornaram membros
daquela entidade. A liberdade de atuação, ou seja, a soberania de cada estado deixava de ser um conceito
absoluto para se relativizar, até porque a Convenção da Liga das Nações estabelecia sanções econômicas
e militares a serem impostas pela comunidade internacional, pelos demais países participantes, contra os
estados que violassem as obrigações assumidas a partir do momento em que assinassem a Convenção.
É bastante interessante observar que a partir da assinatura da Convenção da Liga das Nações, cada
estado se comprometia a garantir o respeito aos direitos humanos em seu território, mediante a adoção
de leis que efetivassem esses direitos. O Estado deveria respeitar os direitos humanos para prosseguir
com sua soberania porque, do contrário, seria punido pelos demais.
A criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1919, com objetivo de promover justiça
social contribuiu decisivamente para que o debate sobre direitos humanos e sua aplicabilidade em todas
as áreas da vida humana fosse ampliado e efetivado. A missão da OIT desde sua criação foi “promover
oportunidades para que homens e mulheres possam ter acesso a um trabalho decente e produtivo, em
condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade”.
A OIT foi criada pela Conferência de Paz, realizada após a Primeira Guerra Mundial, e se encontra
mencionada na parte XIII do Tratado de Versalhes.
Tratado de Versalhes foi o nome dado ao acordo internacional firmado entre várias nações e que
colocou fim aos conflitos da Primeira Guerra Mundial, fixando responsabilidades para a Alemanha, em
especial, suportar todos os prejuízos causados pela guerra. Em linhas gerais, o tratado apontava a Alemanha
como única responsável pelo conflito e por suas consequências materiais, em especial no tocante aos
aspectos econômicos. Evidentemente, isso fragilizou a economia alemã, que já havia sofrido muito com a
Primeira Guerra Mundial e criou as condições sociais, políticas e econômicas suficientes para que Hitler
ascendesse ao poder e levasse a Alemanha para os caminhos que resultaram na Segunda Guerra Mundial.
Saiba mais
O filme a seguir retrata o período histórico que antecedeu à subida de
Adolf Hitler ao poder na Alemanha:
37
Unidade I
A criação da OIT contribuiu muito para a divulgação dos direitos humanos em todo o mundo, porém
a maior consolidação desses direitos em caráter internacional ocorreu com a Segunda Guerra Mundial
e seus efeitos devastadores em termos de destruição e mortes. Foi preciso que essa grande tragédia
abalasse profundamente a humanidade, destruísse lares, famílias e nações para que os direitos humanos
pudessem ser tratados institucionalmente, com status de prioridade mundial, como é tratado até hoje.
Somente após a morte de 60 milhões de pessoas, algumas em condições de absoluta e total
desumanidade, como as vítimas dos campos de concentração, a humanidade despertou para a necessidade
de priorizar a efetividade dos direitos humanos como ponto de partida para todas as atividades do
século XX e seguintes. No trabalho, na família, na cultura, no lazer, no esporte e em qualquer área da
vida do ser humano ele precisa ser respeitado em seus direitos e em sua dignidade.
38
DIREITOS HUMANOS
O chamado Acordo de Londres, firmado em 1945, criou as bases legais para a responsabilização que o
mundo desejava fazer sobre as práticas dos alemães durante a Segunda Guerra. Esse acordo determinou
a convocação de um tribunal militar internacional para julgar os chamados crimes de guerra, expressão
que em princípio parece contraditória por ser a guerra um crime violento. Porém, o que pretendiam
os países que assinaram o Acordo de Londres é que ficasse claro para o mundo que mesmo durante
uma guerra é preciso respeitar os direitos humanos de prisioneiros, combatentes e população civil, em
especial para que não sejam praticados atos de tortura, privação de alimentos e de condições mínimas
que garantam o respeito à dignidade humana.
Criaram o Acordo de Londres os seguintes países: Estados Unidos da América do Norte, Reino Unido,
Governo Provisório da República da França e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Aderiram ao
Acordo: Grécia, Dinamarca, Iugoslávia, Países Baixos, Checoslováquia, Polônia, Bélgica, Etiópia, Austrália,
Honduras, Noruega, Panamá, Luxemburgo, Haiti, Nova Zelândia, Índia, Venezuela, Uruguai e Paraguai.
Pelo Acordo de Londres, o Tribunal de Nuremberg estava capacitado para processar e punir as pessoas
que fossem apontadas como responsáveis pela prática de crimes contra a paz, crimes de guerra e crimes
contra a humanidade, categorias que o acordo cuidou de definir adequadamente.
• Crimes contra a paz: planejar, preparar, incitar ou contribuir para a guerra de agressão ou para
a guerra, em violação aos tratados e acordos internacionais, ou participar de plano comum ou
conspiração para a realização das referidas ações.
• Crimes de guerra: violar o direito e o direito costumeiro da guerra; tais violações devem incluir,
mas não serem limitadas a assassinato, tratamento cruel, deportação de populações civis que
estejam ou não em territórios ocupados, para trabalho escravo ou para qualquer outro propósito.
Também foram incluídos como crimes de guerra: assassinatos ou tratamento cruel de prisioneiros
de guerra ou de pessoas em alto-mar, assassinato de reféns, saques à propriedade pública ou
privada, destruição de vilas ou cidades e devastação injustificada por ordem militar.
• Crimes contra a humanidade: assassinar, exterminar, escravizar, deportar ou outro ato desumano
cometido contra a população civil, antes ou durante a guerra, ou perseguições baseadas em critérios
raciais, políticos e religiosos, para execução de crime ou em conexão com crime de jurisdição do
Tribunal, independentemente se em violação ou não de direito doméstico de determinado país em
que foi perpetrado.
dos vencedores contra os vencidos, o que, sem dúvida, é uma crítica bastante séria e pejorativa para
aqueles que tiveram a iniciativa de organizar esse julgamento.
Observação
É importante lembrar, porém, que a discussão em torno do Tribunal de Nuremberg nos leva à reflexão
sobre a necessidade de práticas éticas até mesmo quando duas partes estão em confronto. Mesmo
em estado de guerra, os inimigos (países, aldeias, grupos religiosos ou raciais etc.) devem respeitar a
integridade física, moral e psicológica de seus prisioneiros, de forma a não praticarem atos de tortura ou
de barbárie que possam agredir a dignidade humana dos soldados ou da população civil.
Evidentemente que o maior desejo coletivo da humanidade é que os conflitos armados deixem de
existir tanto no plano interno de cada território, nação ou estado, como no plano internacional entre
diferentes grupos políticos ou países. Contudo, enquanto a guerra for uma possibilidade é preciso
que exista regramento ético para ela, de forma que não sejam praticados atos de violência além daqueles
estritamente necessários para as partes atingirem seus objetivos. Atos de violência contra a população
civil não podem ser tolerados, em especial ataques, estupros, invasão de casas, remoção dos lugares de
habitação para campos de prisioneiros, privação de alimentos, de água ou de abrigo, ou qualquer outra
forma de violência que possa ser praticada contra pessoas.
Por essas razões é que, apesar da estranha denominação de crimes de guerra, porque a guerra já
é um ato de violência comparável a um crime, é preciso compreender que tal ação foi um esforço para
tentar impedir que a violência seja ainda maior, ainda mais negativa para todos.
40
DIREITOS HUMANOS
A ONU foi criada para contribuir para a construção de uma nova ordem internacional que tivesse
como modelo de conduta a prioridade para a paz e a segurança, para o desenvolvimento de relações
amistosas entre países e para a cooperação internacional nas áreas econômica, social e cultural. A ONU
foi criada para garantir a proteção internacional dos direitos humanos em todos os setores da vida no
planeta, inclusive na saúde, educação, proteção ambiental, o desenvolvimento científico e outros.
Na primeira Assembleia Geral das Nações Unidas, ocorrida em Londres no ano de 1946, ficou
acordado entre os países membros que a sede permanente da organização seria nos Estados Unidos,
mais precisamente na cidade de Nova York. Com a ajuda do governo federal norte-americano e do
município de Nova York, a sede da ONU foi instalada na ilha de Manhattan, local em que se encontra
até hoje. Nações Unidas, entretanto, começaram a existir oficialmente em 24 de outubro de 1945.
41
Unidade I
O Brasil foi um dos países que assinou a Carta das Nações Unidas e introduziu suas diretrizes no
ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto-Lei n. 7.935. Ele aprovou a Carta das Nações Unidas
em 4 de setembro de 1945 pelo Decreto-Lei n. 7.935. Por meio dele, as determinações constantes da
Carta das Nações Unidas passaram a fazer parte do ordenamento jurídico brasileiro e, em consequência,
devem ser respeitadas como se fossem uma lei brasileira.
Saiba mais
A ONU é um organismo internacional formada por 193 Estados membros. Ela é constituída por seis
órgãos principais, que são:
• Assembleia Geral.
• Conselho de Segurança.
• Conselho de Tutela.
• Secretariado Geral.
Saiba mais
42
DIREITOS HUMANOS
Principais funções
Discutir formas e meios para melhorar as condições de vida das crianças, dos
jovens e das mulheres;
Este é o único órgão da ONU que tem poder decisório, isto é, todos os membros
das Nações Unidas devem aceitar e cumprir as decisões do Conselho.
43
Unidade I
Principais funções
Principais funções
44
DIREITOS HUMANOS
Principais funções
Discutir formas e meios para melhorar as condições de vida das crianças, dos
jovens e das mulheres;
A ONU possui ainda órgãos específicos para tratar de assuntos como saúde, educação, infância entre
outros. Vamos conhecer alguns desses órgãos:
Criada em 16 de outubro de 1945, a FAO atua como um fórum neutro, onde todos
os países, desenvolvidos e em desenvolvimento, se reúnem em pé de igualdade
para negociar acordos, debater políticas e impulsionar iniciativas estratégicas.
46
DIREITOS HUMANOS
Um compromisso
Todo esse esforço é direcionado para alcançar metas comuns, como iniciativas
sanitárias multilaterais, traçadas pelos governos que fazem parte da Opas/OMS,
sempre com uma atenção especial aos grupos mais vulneráveis: mães e
crianças, trabalhadores, idosos, pobres, refugiados e desabrigados. [...]
Trabalho
48
DIREITOS HUMANOS
É a agência das Nações Unidas que atua nas seguintes áreas de mandato:
Educação, Ciências Naturais, Ciências Humanas e Sociais, Cultura e
Comunicação e Informação.
49
Unidade I
Áreas de atuação
EDUCAÇÃO
CIÊNCIAS NATURAIS
50
DIREITOS HUMANOS
CULTURA
COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
51
Unidade I
O Fundo das Nações Unidas para a infância tem por objetivo e funções:
Assegurar que cada criança e cada adolescente tenha seus direitos humanos
integralmente cumpridos, respeitados e protegidos é a principal missão do
Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
No decorrer dessas décadas, o Unicef tem atuado junto com o País nas
conquistas alcançadas no campo dos direitos da infância. Esteve lado
a lado do Brasil na luta contra a poliomielite, que teve o último registro
de ocorrência em 1989; lutou junto com as mulheres para que lhes fosse
garantido o direito a amamentar seus filhos; ajudou o governo brasileiro a
criar o seu primeiro programa de merenda escolar; colaborou com a redução
das mortes por diarreia, com a promoção do uso do soro caseiro; e, nos
últimos anos, está apoiando o País a reduzir as disparidades regionais no
Semiárido, Amazônia e comunidades populares dos centros urbanos.
O Unicef uniu sua voz à dos brasileiros para a redação e aprovação do artigo 227
da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente – que
mudaram o marco legal dos direitos da infância no Brasil.
Por meio de ações conjuntas com sociedade e governos, o Unicef atua com
compromisso e determinação para garantir uma vida melhor para cada
criança e cada adolescente no Brasil (ONUBR, [s.d.]l).
Existem, ainda, muitos outros órgãos da ONU. Entre eles, o Fundo Monetário Internacional (FMI);
o Banco Mundial; a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal); o Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD); o Fundo Internacional para o Desenvolvimento
da Agricultura (Fida); o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR); o Ato
Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos (ACNUDH) e o Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento (PNUD).
Lembrete
Além disso, a ONU criou agências para cuidados com políticas nas áreas de Meio Ambiente,
Mulheres e Habitat.
53
Unidade I
Estabelecida em 1972, a ONU Meio Ambiente tem entre seus principais objetivos
manter o estado do meio ambiente global sob contínuo monitoramento;
alertar povos e nações sobre problemas e ameaças ao meio ambiente e
recomendar medidas para melhorar a qualidade de vida da população sem
comprometer os recursos e serviços ambientais das gerações futuras.
No Brasil, a ONU Meio Ambiente trabalha para disseminar, entre seus parceiros
e a sociedade em geral, informações sobre acordos ambientais, programas,
metodologias e conhecimentos em temas ambientais relevantes da agenda
global e regional e, por outro lado, para promover uma participação e
contribuição mais intensa de especialistas e instituições brasileiras em
fóruns, iniciativas e ações internacionais. A ONU Meio Ambiente opera
ainda em estreita coordenação com organismos regionais e sub-regionais
e cooperantes bilaterais, bem como com outras agências do Sistema ONU
instaladas no país.
A ONU Mulheres ou Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento
das Mulheres tem por objetivos e funções:
55
Unidade I
Por fim, temos a ONU-Habitat ou Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos:
56
DIREITOS HUMANOS
— Participação cidadã
— Boas práticas
Saiba mais
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada em 10 de dezembro de 1948, por aprovação
unânime de 48 Estados, com oito abstenções. É reconhecida como um código ou uma plataforma
comum de ação, para a qual não houve nenhum voto contrário e, portanto, deve ser cumprida por
todos os países signatários.
De acordo com o texto da Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações
Unidas, a única condição para ser titular dos direitos que ela especifica é ser pessoa, ou seja, ser um
ser humano. Esse requisito está expresso no artigo VI da Declaração Universal dos Direitos Humanos da
ONU, que textualmente afirma:
Artigo VI
Essa determinação não é aleatória, ao contrário, é resultado porque o Direito, em vários países do
mundo, determina que somente podem ser sujeitos de direito aqueles que forem pessoas. Animais,
plantas e minerais não são sujeitos de direito, embora devam ser protegidos pela legislação como forma
de preservação da natureza. Somente as pessoas é que são titulares de direito e podem exigir que eles
sejam cumpridos em seu benefício.
58
DIREITOS HUMANOS
Ocorre que em vários momentos da história da humanidade a condição de pessoa foi subtraída de
alguns grupos sociais e, com isso, eles deixaram de ser titulares de direitos. Foi o que ocorreu com os
negros em vários países do mundo durante o período de escravidão. Eles não eram reconhecidos como
titulares de direitos, ou seja, não eram reconhecidos como pessoas e, por isso, foram tratados de maneira
degradante, como se fossem animais de carga.
Em razão desses exemplos históricos, entre outros, a Organização das Nações Unidas deliberou
colocar expressamente no texto da Declaração Universal dos Direitos do Homem que todo ser humano
tem direito de ser reconhecido como pessoa, ou seja, como titular de direitos e, consequentemente,
de proteção do Estado. Esse direito se aplica a todas as pessoas em qualquer lugar do mundo em
que estejam e, se, por acaso, ocorrer novamente de um país pretender realizar uma perseguição contra
determinado grupo social, subtraindo dele o direito de ter direitos, caberá à ONU e a todos os países
que dela fazem parte exigir que o Estado que estiver agindo de forma contrária à Declaração Universal
dos Direitos Humanos volte atrás em sua decisão e reconheça os direitos daquele determinado grupo
social. Se o Estado não recuar em sua decisão, caberá à ONU e aos países membros efetivar sanções,
inclusive bloqueio comercial, ou seja, deixar de ter relações comerciais de compra e venda de produtos
com aquele país específico.
Desse conceito de que todo ser humano tem direito de ser reconhecido como pessoa, ou seja,
como titular de direitos, surgiu a expressão dignidade da pessoa humana, que nem sempre é bem
compreendida por aqueles que não estudam direitos humanos.
De fato, como compreender a expressão pessoa humana? Sem a devida explicação histórica e
jurídica, pode parecer que existem pessoas que não são humanas! Entretanto, na verdade, a expressão
pessoa humana é correta porque sabemos que a palavra pessoa está sendo utilizada no sentido jurídico,
ou seja, pessoa é todo sujeito de direitos que pode exigir a proteção do Estado para que esses
direitos sejam protegidos e efetivados.
Portanto, quando você encontrar a expressão pessoa humana saberá que está diante de um conceito
jurídico, construído historicamente em razão dos vários momentos da história da humanidade, em
que grupos de pessoas tiveram seus direitos usurpados e, consequentemente, foram vítimas de
inúmeras agressões.
59
Unidade I
I – a soberania;
II – a cidadania;
V – o pluralismo político.
Observe que, no Brasil, a dignidade da pessoa humana é um fundamento republicano, ou seja, toda
a ordem republicana formada pela independência e harmonia dos três poderes, legislativo, executivo e
judiciário, deve respeitar a dignidade da pessoa humana, porque ela se constitui em um dos alicerces da
República Federativa do Brasil. Nenhum poder da república poderá agir de forma a desconsiderar esse
fundamento, seja na elaboração de leis, decretos ou atos administrativos, seja na execução de projetos
ou políticas públicas, seja, por fim, no julgamento de ações judiciais em qualquer um dos tribunais
brasileiros. Todos os poderes republicanos e todos os agentes públicos têm obrigação de respeitar a
dignidade da pessoa humana, não podem agir de forma a desrespeitá-la, porque a lei mais importante
do país, a Constituição Federal, determina que esse respeito é um fundamento da existência da própria
República Federativa do Brasil.
Além de constar em constituições federais de vários países do mundo, a dignidade da pessoa humana
é um conceito presente em vários tratados e declarações de direitos humanos que foram aprovados ao
60
DIREITOS HUMANOS
longo da história da ONU e de outras instituições humanitárias internacionais e, por isso, esse conceito
é considerado parte integrante do Direito Internacional dos Direitos Humanos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas divide os direitos
em duas categorias: os direitos civis e políticos e os direitos econômicos, sociais e culturais.
O objetivo foi conjugar o valor da liberdade (direitos civis e políticos) com o valor da igualdade
(direitos econômicos, sociais e culturais). O tratamento mais detalhado dos direitos civis e políticos e
dos direitos econômicos, sociais e culturais foram tratados posteriormente, em tratados específicos que
vão ser analisados por nós neste livro.
Antes de conhecermos o texto integral da Declaração Universal dos Direitos Humanos, é importante
lembrar que todos os países que fazem parte integrante da ONU e que são chamados de Estados
membros têm a obrigação de respeitar os direitos proclamados na Declaração.
De fato, os países não se tornaram signatários da Declaração Universal dos Direitos Humanos por
mera liberalidade. Ao contrário, ao assinarem a sua participação na Declaração Universal dos Direitos
Humanos da Organização das Nações Unidas, os países se comprometeram a cumprir e fazer cumprir
aqueles direitos para todos os povos, por meio de mecanismos que garantam que todas as pessoas
devam ser respeitadas em seus direitos e, quando eles forem usurpados, possam ter onde reclamar e
exigir o devido respeito aos direitos.
Desse modo, a proibição à tortura, à escravidão, às prisões infundadas e sem provas de culpabilidade,
entre outras práticas de violência contra os direitos humanos, devem obrigatoriamente ser proibidas pelos
governos dos países signatários da Declaração Universal dos Direitos Humanos, como é o caso do Brasil.
2.10.8 O texto integral da Declaração Universal dos Direitos Humanos ou dos Direitos
do Homem da ONU
Reproduzimos aqui o texto integral da Declaração Universal dos Direitos do Homem, também chamada
comumente de Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esse texto, elaborado pela Organização das
Nações Unidas (ONU) e aprovado pelos países que pertencem ao grupo de Estados membros da ONU, é
de cumprimento obrigatório para eles. Trata-se, por isso, de um documento de grande importância, que
deve ser minuciosamente conhecido por todos os cidadãos brasileiros.
Leia atentamente:
Artigo I.
Breve comentário: o artigo destaca que nenhuma condição de nascimento, de raça, ou de qualquer
outra categoria, nos priva do direito à liberdade e à igualdade e do respeito que todos merecemos por
nossas ideias e crenças (razão e consciência).
62
DIREITOS HUMANOS
Artigo II.
Artigo III.
Breve comentário: vida, liberdade e segurança pessoal são direitos de todo ser humano, em qualquer
condição ou local de nascimento.
Artigo IV.
Artigo V.
Artigo VI.
Breve comentário: toda pessoa é titular de direitos e nenhuma situação pode justificar que isso não
seja respeitado.
63
Unidade I
Artigo VII.
Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a
igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer
discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento
a tal discriminação.
Artigo VIII.
Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes
remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe
sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.
Breve comentário: os direitos fundamentais, como o próprio nome esclarece, são aqueles sem os
quais os homens não serão respeitados em sua dignidade. São o direito à vida, à liberdade, à segurança, à
liberdade de opinião e de expressão, direito de ser julgado por um tribunal imparcial e com possibilidade
de ampla defesa, entre outros. Todas as vezes que esses direitos forem usurpados, o ser humano terá
direito a utilizar os tribunais de seus país para exigir que a agressão contra os direitos fundamentais
deixe de ser praticada imediatamente.
Artigo IX.
Breve comentário: nenhum ser humano pode ser preso ou colocado para fora de seu país de forma
arbitrária, ou seja, sem direito a julgamento por um tribunal imparcial e sem direito de apresentar defesa.
Artigo X.
Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública
audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir
sobre seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação
criminal contra ele.
Breve comentário: tribunal imparcial é aquele que garante a oportunidade do acusado apresentar
sua defesa e suas provas, com total liberdade para isso.
Artigo XI.
64
DIREITOS HUMANOS
Breve comentário: referente ao item 1, ninguém pode ser considerado culpado antes de ser
julgado, ou seja, antes de apresentar sua defesa e as provas que referendam suas alegações. Referente
ao item 2, aquele que pratica um ato que não é considerado crime não pode ser julgado posteriormente
quando o ato passar a ser considerado criminoso. Retroagir é sempre um desrespeito às leis vigentes
na época em que os fatos ocorreram.
Artigo XII.
Breve comentário: a privacidade é um direito atribuído a todas as pessoas e deve ser protegida
e preservada.
Artigo XIII.
2. Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio,
e a este regressar.
Breve comentário: referente ao item 1, toda pessoa tem direito de escolher para onde quer ir e onde
quer residir. Referente ao item 2, toda pessoa tem direito de sair de seu país ou de qualquer outro, no
momento que quiser, e regressar quando quiser, sempre que cumpridas as leis existentes para isso.
Artigo XIV.
Breve comentário: toda pessoa que estiver sendo perseguida, por exemplo, por ser contrária a um
governo, pode pedir asilo (proteção) em outro país. Essa hipótese não se aplica quando a pessoa tiver
praticado um crime comum (homicídio ou estupro, por exemplo), ou quando tiver praticado um ato
contrário aos objetivos da ONU (tortura contra outras pessoas, por exemplo).
65
Unidade I
Artigo XV.
Breve comentário: referente ao item 1, todas as pessoas que nascem em um país têm direito de
ter a nacionalidade daquele país ou a nacionalidade de seus pais. Referente ao item 2, todos as pessoas
têm direito de manter sua nacionalidade enquanto desejarem ou, de adotarem outra nacionalidade, se
assim desejarem. Nesse caso, deverão cumprir as regras do país cuja nacionalidade pretendem adotar.
Artigo XVI.
Breve comentário: todas as pessoas podem se casar, mas ninguém pode ser obrigado a isso. A família
é essencial para a vida em sociedade e deve ser protegida pelo Estado.
Artigo XVII.
Artigo XVIII.
66
DIREITOS HUMANOS
Artigo XIX.
Breve comentário: ninguém poderá ser impedido de manifestar livremente sua opinião sobre
qualquer assunto que desejar e tão pouco poderá ser impedido de receber as informações que desejar.
Artigo XX.
1. Todo ser humano tem o direito de fazer parte no governo de seu país
diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.
Breve comentário: referente ao item 1, participar democraticamente do governo do país, por meio
de eleições, é um direito de todas as pessoas. Referente ao item 2, utilizar os serviços públicos, em
especial de saúde e educação, é um direito de todas as pessoas. Referente ao item 3, a vontade do povo
é soberana e todos os governos democráticos têm obrigação de respeitá-la.
Artigo XXII.
Breve comentário: os direitos econômicos, sociais e culturais são reconhecidos como indispensáveis
para a concretização da dignidade da pessoa humana.
67
Unidade I
Artigo XXIII.
2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração
por igual trabalho.
3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e
satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência
compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário,
outros meios de proteção social.
Breve comentário: referente ao item 1, o trabalho é o principal instrumento para uma vida digna,
por isso precisa ser protegido. Referente ao item 2, trabalho igual, salário igual, essa é a regra mais
justa. Referente ao item 3, a remuneração pelo trabalho deve ser justa, de forma que as pessoas possam
garantir sua subsistência e a de seus dependentes a partir do seu trabalho e de sua remuneração.
Referente ao item 4, a proteção dos direitos do trabalhador pode ser feita de forma individual ou
coletiva e, nesse caso, a atuação dos sindicatos são a melhor forma de proteção para os trabalhadores.
Artigo XXIV.
Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável
das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas.
Breve comentário: toda pessoa tem direito ao repouso necessário para seu bem-estar físico e mental.
Artigo XXV.
Breve comentário: referente ao item 1, padrão de vida é um conceito real e não abstrato. E nesse
conceito estão todos os elementos indispensáveis para que as pessoas tenham vida digna e segura.
Referente ao item 2, nas fases de maternidade e durante a infância, a vulnerabilidade é maior e, por isso,
os cuidados e proteção também precisam ser maiores.
68
DIREITOS HUMANOS
Artigo XXVI.
1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo
menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será
obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem
como a instrução superior está baseada no mérito.
Breve comentário: referente ao item 1, a educação nos graus elementares, ensino fundamental e
médio, deverá ser acessível a todos. Referente ao item 2, o ensino deverá garantir que todos tenham
formação humanista, ou seja, sejam preparados para interagir em sociedade com tolerância, amizade
e compreensão em relação uns aos outros, de forma a garantir a efetividade do respeito. Referente ao
item 3, os pais são os maiores responsáveis pela educação dos filhos e, por isso, devem ter liberdade para
escolher que tipo de instrução vão propiciar a eles.
Artigo XXVII.
2. Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais
decorrentes de qualquer produção científica, literária ou artística da
qual seja autor.
Breve comentário: referente ao item 1, as pessoas devem ter acesso à cultura, a arte e ao progresso
científico. Referente ao item 2, todas as obras científicas, literárias ou artísticas devem identificar seu
autor, que terá direito aos frutos econômicos de sua criação se assim desejar, ou poderá abrir mão desses
frutos se lhe parecer melhor.
Artigo XXVIII.
Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que
os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser
plenamente realizados.
Breve comentário: os direitos previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU
devem ser concretizados.
69
Unidade I
Artigo XXIX.
1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e
pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível.
Breve comentário: referente ao item 1, todas as pessoas devem cumprir seus deveres sociais.
Referente ao item 2, nenhum direito é absoluto, porque os direitos das demais pessoas que vivem em
sociedade também deverão ser respeitadas. Referente ao item 3, nenhum direito poderá ser exercido
com objetivos que não sejam aqueles contemplados nos princípios da ONU, ou seja, direitos somente
poderão ser exercidos para o bem, de forma positiva para toda a sociedade.
Artigo XXX.
Breve comentário: os direitos e liberdades garantidos pela Declaração devem ser praticados de
forma mais ampla possível e protegidos pelos Estados.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem ou dos Direitos Humanos da Organização das Nações
Unidas é um dos mais importantes documentos de direitos da história da humanidade. Infelizmente,
em muitos países do mundo esses direitos ainda não são integralmente respeitados, como acontece no
Brasil, por exemplo, em que muitos desses direitos ainda não são concretizados em sua plenitude.
Lembrete
70
DIREITOS HUMANOS
Além da Declaração Universal de Direitos Humanos da ONU, que estudamos no item anterior,
existem vários tratados internacionais que têm por objetivo proteger os direitos humanos de forma
mais específica.
Os dois primeiros textos são chamados de pactos e têm por objetivo complementar a Declaração
Universal de Direitos Humanos da ONU, ambos criados em 1966.
A proposta inicial da Organização das Nações Unidas era a construção de uma Carta Internacional
de Direitos Humanos, composta de uma Declaração Universal e um Pacto Internacional, porém naquele
momento histórico pós-Segunda Guerra Mundial havia uma disputa entre Estados Unidos e União
Soviética, periodo chamado de Guerra Fria, que impediu que eles chegassem à mesma conclusão
sobre o que deveria constar da Declaração e do Pacto, em especial no tocante a direitos econômicos,
porque a União Soviética era contrária à defesa do direito à propriedade privada, porque no regime
comunista adotado por ela a propriedade deve pertencer ao Estado, e não aos particulares.
Assim, foram criados pactos específicos para Direitos Civis e Políticos e para Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais.
O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos cuida dos direitos humanos relacionados
à liberdade individual, à proteção da pessoa contra a ingerência estatal em sua órbita privada
e à participação popular na gestão da sociedade. São os chamados direitos humanos liberais ou
liberdades públicas.
• aos mecanismos de supervisão e controle, especialmente com a criação do Comitê de Direitos Humanos;
71
Unidade I
Dos artigos 6º a 27º o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos reitera e pormenoriza os direitos
encontrados nos artigos III a XXI da Declaração Universal dos Direitos do Homem, tais como: direito à
vida; direito a não ser submetido à tortura ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes; de não
ser escravizado ou ser submetido à servidão; à liberdade e segurança pessoal, incluindo não ser preso
arbitrariamente; à igualdade perante a lei, entre outros.
O artigo 20 do Pacto merece especial destaque: proíbe a propaganda em favor da guerra, da apologia
ao ódio nacional, racial ou religioso, que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade ou à
violência, não só por conteúdo específico, mas por prever não um direito da pessoa, mas uma limitação
a esses direitos, especialmente à liberdade de expressão. O artigo pode ser aplicado contra pessoas ou
grupo e contra o Estado.
O Pacto pode ser considerado um avanço em relação à Declaração de 1948 por prever o direito de a
criança ser protegida pela família, pela sociedade e pelo Estado; o direito das minorias étnicas, religiosas
ou linguísticas de terem sua própria vida cultural, de professar e praticar sua própria religião e utilizar
sua própria língua.
O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais está dividido em quatro partes:
Esse pacto tem por objetivo estabelecer sob a forma de direitos as condições sociais, econômicas
e culturais para a garantia de uma vida digna para cada pessoa, no âmbito do trabalho, das relações
sociais e culturais.
É garantido o direito de fundar ou se associar a sindicato e fazer greve, segurança social, proteção da
família, das mães e das gestantes, vedação da mão de obra infantil e restrição do trabalho de crianças
e adolescentes.
O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos foi adotado pela Resolução n. 2.200-A da Assembleia
Geral das Nações Unidas em 16 de dezembro de 1966. No Brasil ele foi aprovado pelo Decreto Legislativo
n. 226, de 12 de dezembro de 1991, e ratificado em 24 de janeiro de 1992. Entrou em vigor em 24 de
abril de 1992, promulgado pelo Decreto n. 592, de 6 de julho de 1992.
O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais foi aprovado pelo Decreto
Legislativo n. 226, de 12 de dezembro de 1991, e assinado pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992. Entrou
em vigor em 24 de fevereiro de 1992, promulgado pelo Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992.
É importante lembrar que no período de 1964 a 1985 o Brasil viveu sob regime de ditadura militar
e, por isso, os pactos criados pela ONU em 1966 só foram reconhecidos pelo Brasil e colocados em vigor
em nosso território em 1992, quando já havíamos retornado à democracia.
Em 1951 foi aprovada a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, também conhecida como
Convenção de Genebra.
Esse documento define o que é um refugiado e estabelece os direitos que os indivíduos nessas
condições possuem, em especial o direito de asilo e a responsabilidade das nações que concedem asilo
em relação àqueles aos quais foi concedido o direito.
O documento também estabelece as situações em que uma pessoa não pode pedir asilo, como, por
exemplo, no caso de fuga motivada pela prática de crime de guerra ou de crime comum, como contrabando,
por exemplo.
73
Unidade I
Dados da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) informam que 68 milhões de pessoas tiveram
deslocamento forçado em 2017, em razão de guerras e outras formas de violência e perseguições.
O escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) foi criado em 1950,
com objetivo de ajudar milhões de europeus que após a Segunda Guerra não tinham mais casa, porque
haviam sido obrigados a fugir em razão da guerra ou haviam sido desapossados de suas propriedades
pelos governos totalitaristas.
74
DIREITOS HUMANOS
Figura 14
A ONU instituiu o dia 21 de março como Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial.
A data foi escolhida para homenagear as vítimas da tragédia ocorrida em 1960, na cidade de Johanesburgo,
na África do Sul, no episódio que ficou conhecido como Massacre de Shaperville. Naquela data, cerca de vinte
mil negros protestavam pacificamente contra a Lei do Passe, que os obrigava a portar cartões de identificação
especificando os locais por onde eles poderiam transitar na cidade, quando foram agredidos por tropas do
exército que dispararam contra a multidão, matando 69 pessoas e ferindo outras 186.
A ONU incentiva com essa data que todas as pessoas em todo o mundo protestem nesse dia contra
o racismo e a discriminação racial.
Saiba mais
Para saber mais sobre o Dia Internacional pela Eliminação da
Discriminação Racial, acesse o site:
75
Unidade I
Em 1979, a ONU aprovou a convenção que tem por objetivo eliminar a discriminação e assegurar a
igualdade entre homens e mulheres. No Brasil, essa Convenção foi promulgada pelo Decreto n. 4.377,
de 13 de setembro de 2002.
A Convenção prevê a adoção de ações afirmativas pelos Estados signatários, para que seja obtida a
igualdade de tratamento, bem como para compensação das desigualdades historicamente ocorridas ao
longo dos tempos.
De acordo com dados do governo brasileiro, no primeiro semestre de 2018, ocorreram 258 homicídios
de mulheres, 13.643 casos de violência física e 13.202 casos de violência psicológica, em sua maioria
violência praticada por maridos, namorados e ex-companheiros (ONU, 1979).
É a convenção da ONU que determina a proteção contra atos de tortura e outras formas de tratamento
cruel, desumano ou degradante. Além disso, trata do direito de uma pessoa não ser extraditada ou
expulsa para um Estado em que haja risco significativo de que ela venha a sofrer tortura ou tratamento
desumano ou degradante.
76
DIREITOS HUMANOS
Essa Convecção foi promulgada no Brasil pelo Decreto n. 40, de 15 de fevereiro de 1991.
Foi criada pela ONU em 1989 e se constitui em um tratado internacional que torna a criança, definida
como todo menor de 18 anos, como sujeito de direitos, com especial proteção e absoluta prioridade.
77
Unidade I
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) está presente no Brasil desde 1950 e, além do
Brasil ser signatário da Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU, adotou em 1990 a Lei n. 8.069,
conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente.
O Estatuto da Criança e do Adolescente define criança como a pessoa até 12 anos e adolescente,
aquela entre 12 e 18 anos. Determina, ainda, que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata a lei,
78
DIREITOS HUMANOS
Para garantia da efetividade da proteção dos direitos humanos foram criados, além da Organização
das Nações Unidas, sistemas regionais de proteção nos diferentes continentes da Terra. Assim, além do
sistema global de proteção dos direitos humanos realizado pela ONU, existem outros organismos oficiais
que cumprem essa mesma tarefa no âmbito de suas regiões.
Para as três Américas, do Norte, do Sul e Central, foi criado o Sistema Interamericano de Direitos
Humanos, em 30 de abril de 1948, durante a realização da IX Conferência Internacional Americana,
realizada em Bogotá e da qual resultou a assinatura da chamada Carta da OEA, que entrou em vigor em
dezembro de 1951.
A Organização foi criada para alcançar nos Estados membros, como estipula
o Artigo 1º da Carta, “uma ordem de paz e de justiça, para promover sua
solidariedade, intensificar sua colaboração e defender sua soberania,
sua integridade territorial e sua independência”.
A Organização dos Estados Americanos (OEA) é composta de sua Assembleia Geral, órgão mais
importante e deliberativo que se reúne uma vez por ano, ou extraordinariamente, quando necessário.
Além disso, também existe a Reunião de Consulta aos Ministros das Relações Exteriores, para resolver
problemas de caráter urgente e de interesse comum dos Estados Membros; os Conselhos Permanente e o
79
Unidade I
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) foi criada na quinta Reunião de Consulta dos
Ministros das Relações Exteriores, realizada em Santiago, no Chile, em 1959. Foi instalada oficialmente
em 1960, quando seu estatuto foi aprovado pelo Conselho da Organização. A Comissão Interamericana
de Direitos humanos é um órgão do Sistema Interamericano e sua finalidade específica é a promoção
e proteção dos direitos humanos. Ela é constituída por sete membros que exercem suas funções por
um período de quatro anos, podendo ser reeleitos uma única vez; a eleição é feita pelos membros da
Assembleia Geral.
O Brasil foi um dos estados que mais tardiamente aderiram à Convenção, em 25 de setembro de
1992, após o fim do regime militar, que havia se encerrado em 1985.
Observação
Esse protocolo foi elaborado a partir da constatação de que existe estreita relação entre a vigência
dos direitos econômicos, sociais e culturais e os direitos civis e políticos. Na verdade, as diferentes
categorias de direitos constituem um todo indissolúvel, que se fundamenta na dignidade da pessoa
humana que, para ser concretizada integralmente, exige tutela e promoção permanentes sem que se
possa justificar a violação de uns, sob pretexto de realizar outros.
80
DIREITOS HUMANOS
• Obrigação de adotar medidas (para garantir a plena efetividade do protocolo); adotar disposições
de direito interno (para tornar efetivos os direitos, caso não sejam garantidos no plano nacional –
constituição de cada estado membro); obrigação de não discriminação; não admissão de restrições;
alcance das restrições e limitações (preservar o bem-estar geral); direito ao trabalho; condições
justas, equitativas e satisfatórias de trabalho; direitos sindicais; direito à previdência social; direito
à saúde; direito a um meio ambiente sadio.
• Reservas (os Estados poderão adotar reservas sobre uma ou mais disposições específicas, desde
que não sejam incompatíveis com os fins e objetivos do Protocolo); incorporação de outros direitos
e ampliação dos reconhecidos (os Estados membro poderão sugerir outros direitos e liberdades a
serem incorporados ao Protocolo) (CIDH, 1988).
• Observância e proteção dos direitos humanos na América, podendo recomendar aos governantes
dos Estados membros a adoção de medidas adequadas à proteção destes direitos.
• Requisitar aos governos informações relativas às medidas por eles adotadas concernentes à
efetiva aplicação da Convenção.
• Examinar as petições encaminhadas por indivíduos ou grupos de indivíduos, ou ainda por entidades
não governamentais que contenham denúncias de violação a direito protegido pela Convenção
por Estado que dela seja parte.
A petição individual apresentada por pessoa que tenha tido seus direitos humanos violados deverá
atender alguns requisitos prévios, como o comprovado esgotamento dos recursos disponíveis no país
em que ocorreu a violação. Somente em caso de injustificada demora processual, ou, no caso em que a
legislação do país não prevê a existência de processo judicial para aquele tipo de agressão aos direitos
81
Unidade I
humanos, é que se aceitará a petição individual antes de esgotadas todas as possibilidades de reclamação
no próprio país.
Além disso, a pessoa que apresenta uma petição inicial sobre direito violado deverá comprovar que
não existe outra pendência internacional sobre o mesmo fato.
Após o exame dos fatos, a Comissão deverá obter solução amistosa entre as partes. Se conseguir,
será elaborado um informe que será transmitido ao peticionário e aos Estados partes da Convenção para
depois ser comunicado para a Secretaria da OEA.
Esse informe deverá conter breve exposição dos fatos e a solução concretizada. Se não for alcançada
solução amistosa a Comissão redigirá um Relatório, no qual apresentará os fatos e as conclusões e,
eventualmente, recomendações para o Estado membro. Esse relatório tem caráter mandatório e indica
se o Estado referido violou ou não a Convenção Americana.
O Estado membro terá o prazo de três meses para cumprir as recomendações. Durante esse
período, o caso pode ser solucionado pelas partes ou encaminhado para a Corte Interamericana de
Direitos Humanos. Então, se o caso não for solucionado nem encaminhado à Corte, a Comissão fará as
recomendações pertinentes e fixará um prazo dentro do qual o Estado deve tomar as medidas que lhe
competem para solucionar a situação. Vencido o prazo, a Comissão decidirá por maioria absoluta de
votos de seus membros se as medidas recomendadas foram adotadas pelo Estado e publicará o informe
no relatório anual de atividades.
Apenas a Comissão e os Estados membros podem submeter um caso à Corte Interamericana, que é
órgão jurisdicional do sistema regional; o indivíduo não tem legitimidade para ir diretamente com seu
caso à Corte. A questão só pode ser submetida à Corte Interamericana se o Estado parte reconhecer,
mediante declaração expressa e específica, a competência da Corte no tocante à interpretação e aplicação
da Convenção, embora qualquer Estado parte possa aceitar a jurisdição da Corte para um determinado
caso. O Brasil reconheceu a competência jurisdicional da Corte Interamericana em dezembro de 1998,
por meio do Decreto Legislativo 89, de 03 de dezembro de 1998.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos é composta de sete juízes nacionais de Estados membros,
eleitos por estes, e tem competência consultiva e contenciosa. No plano consultivo qualquer membro
da OEA pode solicitar o parecer da Corte relativamente à interpretação da Convenção ou de qualquer
outro tratado relativo à proteção dos direitos humanos nos estados americanos. No plano contencioso a
Corte tem jurisdição para examinar casos que envolvam a denúncia de que um Estado parte violou direito
protegido pela Convenção. Se reconhecer que efetivamente ocorreu a violação à Convenção, determinará
que sejam adotadas medidas necessárias para restauração do direito então violado.
82
DIREITOS HUMANOS
A Corte poderá, ainda, condenar o Estado a pagar uma justa compensação à vítima. A decisão da
Corte tem força jurídica vinculante e obrigatória e cabe ao Estado seu imediato cumprimento. Nos casos
em que a Corte fixar uma compensação à vítima, a decisão valerá como título executivo.
Observação
83
Unidade I
Resumo
84
DIREITOS HUMANOS
85
Unidade I
Exercícios
Figura 15
O holocausto pode ser tratado como um momento da história recente da humanidade em que os
direitos humanos foram integralmente desrespeitados, em especial o direito à vida e a dignidade humana.
O que justificava a barbárie era a existência de uma suposta superioridade ariana, muito utilizada
pelo Partido Nacional Socialista alemão para unir o povo alemão e lançar as bases da perseguição contra
os judeus considerados inferiores.
86
DIREITOS HUMANOS
I – A Declaração Universal dos Direitos Humanos determina que todos os seres humanos nascem
livres e iguais em dignidade e direitos e devem agir uns aos outros com espírito de fraternidade
porque
I – Afirmativa correta
Justificativa: a afirmativa I está correta porque o artigo I da Declaração Universal dos Direitos
Humanos tem essa previsão, ou seja, de que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade
e direitos e, que são dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito
de fraternidade. A afirmativa I está correta e não é uma justificativa para a afirmativa II.
II – Afirmativa incorreta
Justificativa: a afirmativa II está incorreta porque não é possível afirmar que o holocausto tenha
sido a maior manifestação de ausência de fraternidade porque outros acontecimentos mundiais
foram igualmente violentos, como a escravidão dos negros e o massacre dos curdos pelos turcos na
década de 1930.
87
Unidade I
C) Aos refugiados que estão sendo acolhidos pelos países europeus para conseguirem melhorar suas
condições econômicas e sociais.
D) Aos refugiados que estão sendo perseguidos em seus países por motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas.
E) Aos turistas que são surpreendidos por guerras e conflitos em países nos quais estavam em
razão de visitas.
A) Alternativa incorreta.
Justificativa: o desenho não faz referência às crianças que são afetadas pela fome em países da
África, mas sim à morte do menino Alan cuja família tentou fugir de Kobane para a Grécia para escapar
dos conflitos entre militantes extremistas muçulmanos e forças curdas, ocorrido em 2015.
88
DIREITOS HUMANOS
B) Alternativa incorreta.
Justificativa: migrantes são pessoas que optam por se deslocar para outros países na busca de
melhores condições de trabalho, de educação ou para reunir a família. Refugiados são pessoas que se
deslocam para outros países para fugir de situação de conflito, de perigo, decorrentes de perseguição
política, racial ou social.
C) Alternativa incorreta.
Justificativa: os refugiados não estão sendo acolhidos pelos países europeus para melhorarem suas
condições econômicas e sociais, mas sim porque estão fugindo de conflitos e guerras que podem lhes
custar a vida.
D) Alternativa correta
Justificativa: segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), também
conhecido como a Agência da ONU para Refugiados, refugiados são pessoas que escaparam de conflitos
armados ou perseguições. Quase sempre buscam refúgio em outros países para garantir segurança de
vida, e a negação do asilo com o consequente retorno a seus países de origem pode ter consequências
trágicas como a perseguição e a morte.
E) Alternativa incorreta.
Justificativa: a situação de turistas surpreendidos por conflitos ou guerras quando visitam países
estrangeiros não é a mesma que a dos refugiados.
89