Geriatria Net
Geriatria Net
Geriatria Net
Organizadores
Leonardo da Costa Lopes
Maíra Tomayno de Melo Dias
Organizadores
Leonardo da Costa Lopes Colaboração
Maíra Tomayno de Melo Dias Ana Rosa Venâncio
Laís German
Autores Luciana Puddo
Aleksander Prokopowitsch Tatiana Kioki
André Felício
Ceres Eloah Revisão
Christyanne Maria Rodrigues Barreto de Assis Simone Santos - MG03194JP
Fábio César Gravina Olivieri
Juliana Lourenço Barbosa Pastorelli Braga Projeto gráfico e diagramação
Juliano Silveira de Araújo Rodrigo Cabido
Júlio César Menezes Vieira
Keite Priscila Paiá Foto capa
Leonardo da Costa Lopes Shutterstock
Luciana Avena
Maria Cecília Bernardes Pereira
Michele Bautista
Paula Cristina Eiras Poço
Rita Toledo
Vanessa Silva Suller Garcia
Vivian Romero
Ficha Catalográfica
Maria Fernanda Mayer de Camargo - Bibliotecária - CRB/6: 3103
Inclui bibliografia
ISBN: 978-85-93579-05-9
CDD: 618.97
CDU: 616-053.9
ÍNDICE
5. Cardiogeriatria – parte 1. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
O envelhecimento populacional é um fenômeno cada vez mais presente, com impactos evi-
dentes sobre a saúde. É natural que influencie a educação médica, à medida que se percebe
a necessidade do aprendizado especializado para que os cuidados com a saúde do idoso
sejam precisos, sem serem iatrogênicos; e eficazes; sem serem fúteis.
Um livro sobre Medicina Geriátrica para ser didático, e ao mesmo tempo fonte de consul-
tas ao estudante que se aproxima desta área do conhecimento médico, deve ser concebido
como um desafio. Trata-se de compreender a saúde do idoso sob o olhar do especialista
em uma faixa etária, sem deixar de manter a abrangência necessária para considerar as
peculiaridades de seus órgãos e sistemas. Além disso, é mister que esclareça a importância
de se obter do paciente não somente suas queixas físicas e resultados laboratoriais, mas
também suas características sociais, psicológicas, econômicas e espirituais, para citar ape-
nas algumas das peças fundamentais para a boa prática geriátrica. Isto porque a Medicina,
isoladamente, não reúne todo o conhecimento necessário para uma adequada assistência
ao idoso. É neste sentido que um livro sobre Geriatria, para ser útil, precisa ser também
gerontológico.
É neste contexto que elaboramos esta obra, produzida exclusivamente para os alunos do
Curso de pós-Graduação Lato sensu em Geriatria da Faculdade IPEMED. Ao longo de seus
22 capítulos, elaborados por uma equipe de 17 especialistas, abordamos os aspectos mais
importantes da saúde do idoso e incluímos diversos casos clínicos para maior fixação dos
conteúdos. A intenção é que nossos estudantes, já apaixonados pela Geriatria, aprendam
também a amá-la, com todo o seu saber e de todo o seu coração.
Epidemiologia e teorias
biológicas do envelhecimento
Prof. Me. Júlio César Menezes Vieira
Epidemiologia e teorias biológicas
do envelhecimento
Prof. Me. Júlio César Menezes Vieira
Epidemiologia do envelhecimento
A Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza que o adulto idoso é o habitante acima de 60
anos de idade nos países em desenvolvimento e, nos países desenvolvidos, acima de 65 anos. Um
país é considerado jovem quando sua população tem menos de 7% de idosos, enquanto um país
é considerado velho ao atingir a taxa populacional de idosos acima de 14%. A população mundial
de idosos está em torno de 8%, portanto, em envelhecimento.
Em 2050, a expectativa de vida nos países desenvolvidos será de 87,5 anos para os homens e 92,5
anos para as mulheres. Já nos países em desenvolvimento, será de 82 anos para os homens e 86
anos as para mulheres. Há uma previsão que a Coreia do Sul seja o primeiro país a atingir a ex-
pectativa de vida de 100 anos. Embora percebamos que nos países desenvolvidos haja tendência
de estabilização do crescimento populacional de idosos, nos em desenvolvimentos o aumento do
número de idosos continua desenfreado (Gráfico 1).
2.100.000
1.800.000
1.500.000
1.200.000
900.000
600.000
300.000
0
1950
1955
1960
1965
1970
1975
1980
1985
1990
1995
2000
2005
2010
2015
2020
2025
2030
2035
2040
2045
2050
35,0
29,0
30,0
Mulheres
Ambos os sexos
25,0
Homens
17,2
20,0
11,6
15,0
9,0
10,0 7,9 7,3 7,1
5,0
0
2000 2005 2010 2015 2020 2025 2030 2035 2040 2045 2050 2055 2060
Fonte: IBGE, Coordenação de População e Indicadores Sociais (COPIS) da Diretoria de Pesquisas (DPE), 2013
9,0
8,0
7,0
6,0
5,0
4,0
3,0
2,0
1,0
0,0
1940 1950 1960 1970 1980 199 0 20 0 0 2010 2020 2030
Fonte: IBGE, Coordenação de População e Indicadores Sociais (COPIS) da Diretoria de Pesquisas (DPE), 2013
Capítulo 1 15
A expectativa de vida tem aumentado dramaticamente nos Estados Unidos, de cerca de 47 anos
em 1900 para 77 anos de idade em 2002. Para os idosos de 65 anos, a esperança média de vida é
superior a 16 anos e para as idosas, é quase 20 anos; aos 85 anos, os homens podem esperar viver
mais 6 anos e as mulheres mais 7 anos. A população idosa é a única faixa etária que deverá cres-
cer substancialmente nas próximas décadas. A expectativa de vida média, em todo o mundo,
aumentou para 65 anos e espera-se para 2030, população de idosos em torno de um bilhão de
pessoas. Em 2050, o número de pessoas acima de 65 anos é projetado entre 2 a 2,5 bilhões em
todo o mundo, 20% da população total.
Os idosos muito idosos, ou seja, acima de 80 anos, constituem um dos subgrupos de maior cres-
cimento populacional. Em 1900, pouco mais de 100 mil pessoas atingiam os 85 anos de idade nos
Estados Unidos. A estimativa era de 4,2 milhões de octogenários em 2000 naquele país. Em 2050,
haverá de 19 milhões a 24 milhões de pessoas com 85 anos ou mais nos EUA, 5% da população
total do país.
Em quase 70 anos, desde 1950, o Brasil vive uma revolução demográfica. Os idosos brasileiros
correspondiam a 4,5% em 1950. Em 2010, eram aproximadamente 39 idosos para cada grupo de
100 jovens. As estimativas populacionais realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-
tística (IBGE) apontam para uma taxa de 23,8% de idosos em 2040. Teremos 63 milhões de idosos
brasileiros em 2050. Com o crescimento do número de idosos em relação à população jovem, esti-
ma-se a inversão da relação entre jovens e idosos, com 153 idosos para cada 100 pessoas menores
de 15 anos (Gráfico 4). Ao contrário do que ocorreu em muitos países desenvolvidos, no Brasil,
como observado, esse envelhecimento tem sido muito rápido. Em 40 anos, a população idosa vai
triplicar no Brasil, de 19,6 milhões, em 2010, para 66,5 milhões em 2050. A França era considera-
da um país jovem em 1865 e somente após 115 anos, em 1980, foi considerada envelhecida.
16
Gráfico 4 - Projeção da população por sexo e idade: Brasil 2000-2060
1950
80+ Homens
75 a 79 Mulheres
70 a 74
65 a 69
60 a 64
55 a 59
50 a 54
45 a 49
40 a 44
35 a 39
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
10.000.000 8.000.000 6.000.000 4.000.000 2.000.000 0 2.000.000 4.000.000 6.000.000 8.000.000 10.000.000
2000
80+
Homens
75 a 79
Mulheres
70 a 74
65 a 69
60 a 64
55 a 59
50 a 54
45 a 49
40 a 44
35 a 39
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
10.000.000 8.000.000 6.000.000 4.000.000 2.000.000 0 2.000.000 4.000.000 6.000.000 8.000.000 10.000.000
2010
80+
Homens
75 a 79
Mulheres
70 a 74
65 a 69
60 a 64
55 a 59
50 a 54
45 a 49
40 a 44
35 a 39
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
10.000.000 8.000.000 6.000.000 4.000.000 2.000.000 0 2.000.000 4.000.000 6.000.000 8.000.000 10.000.000
Capítulo 1 17
2020
80+
Homens
75 a 79
Mulheres
70 a 74
65 a 69
60 a 64
55 a 59
50 a 54
45 a 49
40 a 44
35 a 39
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
10.000.000 8.000.000 6.000.000 4.000.000 2.000.000 0 2.000.000 4.000.000 6.000.000 8.000.000 10.000.000
2030
80+
Homens
75 a 79
Mulheres
70 a 74
65 a 69
60 a 64
55 a 59
50 a 54
45 a 49
40 a 44
35 a 39
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
10.000.000 8.000.000 6.000.000 4.000.000 2.000.000 0 2.000.000 4.000.000 6.000.000 8.000.000 10.000.000
2050
80+ Homens
75 a 79 Mulheres
70 a 74
65 a 69
60 a 64
55 a 59
50 a 54
45 a 49
40 a 44
35 a 39
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
10.000.000 8.000.000 6.000.000 4.000.000 2.000.000 0 2.000.000 4.000.000 6.000.000 8.000.000 10.000.000
Fonte: IBGE, Coordenação de População e Indicadores Sociais (COPIS) da Diretoria de Pesquisas (DPE), 2013
18
1.3 As consequências do envelhecimento da população
A transição demográfica traz consigo a transição epidemiológica. A maioria dos idosos tem
pelo menos uma doença crônica, e muitos têm polipatologias (mais de 5 doenças clínicas) e em
uso de polifarmácia (mais de cinco fármacos). As doenças mais comuns nas pessoas idosas nos
Estados Unidos são a artrite, hipertensão e doenças cardiovasculares. As deficiências senso-
riais também são prevalentes: entre os habitantes de 65 a 74 anos, 30% relatam problemas de
visão; e 18% de audição. Estas taxas são aproximadamente duas vezes mais altas para pessoas
a partir de 85 anos.
A literatura mostra que quase 50% dos idosos apresentam comorbidades clínicas. Entre os oc-
togenários e mais velhos, 70% das mulheres e 53% dos homens tinham comorbidade. Nos EUA,
a taxa de idosos com sobrepeso subiu de 57% para 73% entre 1976 e 2002; e a de obesidade au-
mentou de 18% para 36%. As doenças cardíacas, neoplásicas e o acidente vascular encefálico cor-
respondem a duas de cada três mortes entre os idosos e são também responsáveis por inúmeras
consultas médicas e dias de internação. Apesar de altas, as taxas de mortalidade devido à doença
cardíaca e cerebrovascular diminuíram aproximadamente um terço de 1981 a 2001 por causa dos
programas de prevenção nos países desenvolvidos. O tabagismo também diminuiu, em 2002,
para 10% entre os homens mais velhos, e tem permanecido constante nos últimos anos em cerca
de 9% entre as mulheres mais velhas. Entretanto, as taxas de mortalidade devido a diabetes e
doenças respiratórias crônicas aumentaram 43% e 62%, respectivamente.
Além das doenças cardiovasculares e neoplásicas - que têm seu pico de incidência entre 50 a 69
anos -, as comorbidades neurodegenerativas ocupam papel importante no envelhecimento devi-
do ao aumento da incidência diretamente ligada ao acúmulo de anos, principalmente, após os 80
anos. A demência de Alzheimer é a sexta causa de morte entre os norte-americanos acima de 65
anos. A incidência da demência de Alzheimer duplica a cada cinco anos, sendo em torno de 5 %
aos 65 anos e pode chegar a 35 a 50% aos 80 anos. A Doença de Parkinson é a segunda causa mais
comum de doença neurodegenerativa, perdendo apenas para a demência de Alzheimer. A pre-
valência estimada é aproximadamente 3% no Brasil, sendo 90% em torno dos 60 anos de idade.
Capítulo 1 19
A pergunta que não se cala é: estamos preparados para o envelhecimento do povo brasileiro?
E, por isso, as atuais discussões acaloradas sobre a previdência social. O Brasil não pode mais
adiar a discussão sobre o envelhecimento da população, suas repercussões quanto a maior exi-
gência a pensões e cuidados de saúde. Essas tendências representam um desafio significativo
para a comunidade, profissionais da saúde e os próximos governantes.
2) Teoria do sistema endócrino: o relógio biológico agiria através de hormônios para controlar
o ritmo do envelhecimento. Estudos recentes especulam que o envelhecimento é regulado
pela via de sinalização hormonal de insulina/IGF-1(Insulin Growth Factor 1 ou Fator de
crescimento Insulina-1);
20
doenças cardiovasculares seria um dos principais mecanismos diretos ou indiretos na fi-
siopatologia da doença de Alzheimer e do câncer.
1) Teoria do uso e desgaste: as células e os tecidos têm partes vitais que desgastam resul-
tando em envelhecimento devido ao uso repetido. A teoria do desgaste para o envelhe-
cimento foi introduzida pela primeira vez pelo dr. August Weismann, biólogo alemão, em
1882. Porém, esta teoria é completamente discordante com as observações práticas e não
apresenta evidências robustas na literatura para sustentá-la;
3) Teoria dos Radicais Livres: foi introduzida pela primeira vez pelo dr. Gerschman, em 1954,
mas foi desenvolvida pelo dr. Denham Harman. Propõe que os radicais livres causam da-
nos aos componentes macromoleculares das células, dando origem a danos acumulativos,
fazendo com que as células e, eventualmente, órgãos, parem de funcionar. A formação
de espécies reativas de oxigênio (ROS) é provavelmente a mais importante via de radicais
livres responsável pelo desenvolvimento da senescência celular e pelo envelhecimento do
organismo. As macromoléculas como proteínas e os ácidos nucleicos são muito suscetí-
veis ao ataque de radicais livres. O corpo possui alguns antioxidantes naturais na forma
de enzimas (superóxido dismutase e catalase) que ajudam a reduzir o efeito deletério dos
radicais livres, sem as quais as taxas de morte celulares seriam consideravelmente aumen-
tadas e com expectativa de vida menor;
4) Teoria do dano ao DNA: de acordo com esta teoria, os danos no DNA ocorrem continua-
mente nas células. Enquanto a maioria destes danos é reparada, alguns se acumulam e os
mecanismos de reparação, como a DNA polimerase, não conseguem corrigir os defeitos tão
rápido quanto aparentemente são produzidos. As mutações genéticas ocorrem e se acumu-
lam com o aumento da idade, fazendo com que as células se deteriorem e não funcionem
adequadamente. Em particular, danos ao DNA mitocondrial podem levar à disfunção mi-
tocondrial;
Em geral, várias teorias de envelhecimento são propostas e agrupadas para melhor entendimen-
to da senescência (Figura 1), porém, atualmente não há nenhum consenso sobre esta questão.
Capítulo 1 21
Figura 1 – Principais teorias moleculares do envelhecimento
Fonte: Adaptado de OH, J.; LEE, Y.D.; WAGERS, A.J. Nature Medicine, 2014
Referências
AZEVEDO, J. et al. Educação Médica Continuada de Reumatologistas em São Paulo. Revista Bra-
sileira de Educação Médica. 2003;22(2/3)58-66.
GURALNIK, J.M.; FERRUCCI, L. Demography and Epidemiology. In: HALTER, J.B. et al. Haz-
zard’s Geriatric Medicine and Gerontology. Sixth Edition. McGraw-Hill Companies; 2009. p.45-67.
JIN, K. Modern Biological Theories of Aging. Aging and Disease. October 2010; Volume 1, Number
2; 72-74.
OH, J.; LEE, Y.D.; WAGERS, A.J. Stem cell aging: mechanisms, regulators and therapeutic oppor-
tunities. Nature Medicine, 2014; 20, 870–880.
SPAR, J.E.; RUE, A.L. Clinical Manual of Geriatric Psychiatry. In: An Aging World. Arlington.
American Psychiatric Publishing Inc.; 2006. 1st ed. p.1-19.
22
CAPÍTULO
Mudanças no Organismo
e no Metabolismo do Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Mudanças no Organismo
e no Metabolismo do Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
1.Introdução
O envelhecimento se caracteriza por uma redução progressiva das reservas funcionais de todos
os órgãos e sistemas. No envelhecimento saudável ou senescência, tais alterações não são sufi-
cientes para provocar doença, sintomas ou restrições às capacidades funcionais habituais do in-
divíduo. A senilidade acontece quando o envelhecimento é acompanhado por alterações funcio-
nais ou doenças que prejudicam a autonomia ou a independência do idoso. O comprometimento
mais significativo da reserva funcional está mais relacionado a hábitos desfavoráveis de vida do
que propriamente a alterações genéticas e hereditárias. O estilo de vida é, portanto, o determi-
nante mais importante do envelhecimento saudável.
A redução das reservas funcionais pode se estabelecer de forma heterogênea, sendo possível
identificar “órgãos de choque”, que irão manifestar mais precocemente sinais de insuficiência
frente a um estresse orgânico agudo.
Fonte: Adaptado de KALACHE & KICKBUSCH, “A global strategy for healthy ageing.” World health 50.4 (1997): 4-5
2. Anatomia e fisiologia do envelhecimento
As principais modificações fisiológicas do envelhecimento se devem a mudanças de ritmos fisio-
lógicos (como ritmo de secreção hormonal), à perda de complexidade (provocando reduções da
variabilidade da frequência cardíaca e da pressão arterial) e à homeoestenose. A homeoestenose
é o estreitamento da faixa de homeostase, provocada pela redução das reservas funcionais orgâ-
nicas, que conduz o idoso a uma maior vulnerabilidade a doenças.
Capítulo 2 25
Tabela 1 - Exemplos de algumas alterações morfológicas e fisiológicas no envelhecimento
No trato digestivo, observa-se redução da secreção salivar e mastigação menos eficaz. O esô-
fago revela movimentos peristálticos anormais após a deglutição e contrações repetitivas não
peristálticas (presbiesôfago). No estômago há redução da síntese de prostaglandinas, redução do
bicarbonato e o esvaziamento gástrico torna-se mais lento. A absorção de cálcio pelo intestino
delgado diminui e no cólon a motilidade também se alentece. O fígado se reduz em volume em
até 40%, bem como seu fluxo sanguíneo. A atividade do citocromo P450 se reduz e o clearence
hepático de muitas drogas torna-se até 40% mais lento.
Os rins sofrem redução de até 30% em volume, com perdas preferenciais no córtex e glomeru-
loesclerose, afetando a capacidade de concentração urinária. O clearence de creatinina diminui
26
em até 10ml/min por década, o que afeta o metabolismo da maioria dos fármacos e a regulação
do volume intravascular.
Nos pulmões, os dutos alveolares se alargam pela perda de tecido elástico, reduzindo a superfície
de trocas gasosas. A caixa torácica se torna mais rígida e a capacidade vital forçada se reduz em
até 300ml por década. A tosse é menos intensa e o clearence mucociliar torna-se mais lento e
menos efetivo.
No sistema nervoso central há perda neuronal, tanto no córtex cerebral quanto cerebelar. A me-
mória episódica e de trabalho se reduz com o envelhecimento, bem como a velocidade de proces-
samento cognitivo e a atenção.
A pele torna-se mais atrófica, fina e seca, menos elástica e com menor poder de cicatrização. Há
redução na vascularização da pele, com prejuízo à capacidade de preservar e dissipar calor. A
percepção sensorial da pele também diminui, bem como a capacidade de síntese da vitamina D.
Nos olhos, há redução da secreção lacrimal, atrofia da conjuntiva e aumento da distância neces-
sária para focalizar objetos próximos (presbiopia). No sistema auditivo, há redução na acuidade
auditiva para sons de alta frequência, bem como maior dificuldade para a discriminação e loca-
lização sonora.
4. Funcionalidade
Pelo fato de ser muito heterogênea, a população de idosos é representada por indivíduos que,
apesar de possuírem a mesma idade, manifestam diferentes graus de capacidade funcional. A
capacidade funcional ou independência, bem como a autonomia, são condições determinantes
da saúde no envelhecimento. A avaliação desta condição funcional fornece informações funda-
mentais, para além da idade e do diagnóstico de morbidades, do real estado clínico do idoso. O
Capítulo 2 27
registro das atividades básicas e instrumentais de vida diária (Escalas de Katz e Lawton) é um
instrumento simples, dentre os diversos disponíveis para esta avaliação (Tabelas 2 e 3).
Fonte: Katz, S., Down, T.D., Cash, H.R., & Grotz, R.C. 1970. Progress in the development of the index of ADL.
The Gerontologist, 10(1), 20-30
Fonte: Lawton, M.P., & Brody, E.M. (1969). Assessment of older people: Self-maintaining and instrumental activities of
daily living. The Gerontologist, 9(3), 179-186
5. Estudo de Caso
Você é procurado para atender em casa a sra. Filomena, 77 anos, viúva e costureira aposentada.
Ela mora na casa de sua filha, Aparecida, de 50 anos, que trabalha como nutricionista em um
hospital. Durante o dia, a paciente permanecia sozinha em casa, onde desenvolvia todas as tare-
fas de cuidados domésticos. Há 1 mês, após apresentar uma queda com fratura do rádio esquer-
do, foi internada para correção cirúrgica da fratura e permaneceu 8 dias hospitalizada. Na alta,
apresentava dificuldades para deambular, necessitando ser amparada pela filha para andar. Em
casa, tem receio de andar por “fraqueza nas pernas e tontura”. A filha da paciente está bastante
preocupada com a incapacidade da mãe para andar. Sua marcha revela bastante desequilíbrio.
Ela insiste em afirmar que, antes da queda, sua marcha era ágil e ela não apresentava quedas em
casa. Não saía sozinha à rua há cerca de 1 ano, quando se perdeu na vizinhança.
28
Há 4 dias, Aparecida tem notado a mãe mais confusa. Seus pensamentos são lentos e ela oscila
entre períodos de sonolência e outros em que fica levemente agitada. Ela informa já ter visto isto
ocorrer outras duas vezes: a primeira há 6 meses, durante uma gripe, e a segunda, no terceiro
dia da internação hospitalar pela fratura de rádio. No hospital foi submetida a uma tomografia
de crânio, que revelou atrofia cortical difusa. O clínico foi chamado para avaliar, considerando a
hipótese de Doença de Alzheimer. Ontem, a filha optou por levá-la de cadeira de rodas ao posto
de saúde, onde o médico constatou ressecamento da mucosa oral, alterações no turgor da pele e
prescreveu hidratação venosa com 1000mL de soro fisiológico. Não houve, entretanto, melhora
do estado clínico e ela evoluiu com edema facial e dos membros superiores.
2. Que parâmetros nos permitem reconhecer, neste caso, o declínio de reserva funcional?
5. Qual é o seu diagnóstico para a condição atual da paciente? Quais seriam suas condutas?
6. Conclusões
• O envelhecimento se caracteriza pela redução das reservas funcionais.
• Os idosos representam uma população muito heterogênea; dessa forma, a avaliação fun-
cional do idoso nos fornece mais informação que apenas a idade.
Capítulo 2 29
Referências
ARKING, R. Biologia do Envelhecimento. 2ª. edição. Ribeirão Preto. FUNPEC Editora, 2008.
BAUMGARTNER, R.N. et al. Predictors ok skeletal muscle mass in elderly men and women. Me-
chanisms of Ageing and Development 1999;107:123.
DUNN-WALTERS, D.K.; HOWARD, W.A.; BIBLE, J.M. The Aeging Gut. Mechanisms of Ageing and
Development 2004;125:851.
FREITAS, E.V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 3ª. edição. Rio de Janeiro. Guanabara
Koogan, 2011.
GATES, P.E. et al. Left ventricular structure and diastolic function with human ageing. Relation
to habitual exercise and arterial stiffness. European Heart Journal 2003;24:2213.
INBAR, O. et al. Comparison of thermoregulatory responses to exercise in dry heat among prepu-
bertal boys, Young adults and older males. Experimental Physiology 2004;89:691.
ISAIA, G. et al. D-dimer plasma concentrations in an older hospitalized population. Journal of the
American Geriatrics Society 2011;59:385.
JANSSENS, J.P. Aging of the respiratory system: impact on pulmonary function tests and adapta-
tion to exertion. Clinics In Chest Medicine 2005;26:469.
LIPSITZ, L.A.; GOLDBERGER, A.L. Loss of ´complexity´and aging. Potential applications of frac-
tals and chaos theory to senescence. Journal of the American Medical Association 1992;267:1806.
LOPES, L.C. et al. Desafios do Diagnóstico Diferencial em Geriatria. S. Paulo. Editora Atheneu,2012,
pág. 567-580.
MCLEAN, A.J. ; LE COUTEUR, D.G. Aging biology and geriatric clinical pharmacology. Pharma-
cological Reviews 2004;56:163.
PERRY, S.D. Evaluation of age-related plantar-surface insensitivity and onset age of advanced
insensitivity in older adults using vibratory and touch sensation tests. Neuroscience Letters
2006;392:62.
SANSONI, P. et al. Lymphocyte subsets and natural killer cell activity in healthy old people and
centenarians. Blood Journal 1993;82:2767.
SOTANIEMI, E.A. et al. Age and cytochrome P 450-linked drug metabolismo in humans: an
analysis of 226 subjects with equal histopathologic conditions. Clinical Pharmacology & Thera-
peutics 1997;61:331.
TAM, H.M. et al. Age-related difference in relationships between cognitive processing speed and
general cognitive status. Applied Neuropsychology. Adult - Journals 2005;22:94.
HJELMBORG J.vB. et al. Genetic influence on human lifespan and longevity. Human Genetics
2006;119:312.
30
CAPÍTULO
1. Introdução
O aumento da expectativa de vida e do número de pacientes com doenças crônico-degenerativas
tem impactado a realidade médica em todo o mundo. Idosos com doenças crônico-degenerativas
requerem acompanhamento constante, sendo necessária a adequação da avaliação médica, com
a adoção de rotinas bem estabelecidas para esta faixa etária. Com uma abordagem adequada, é
possível controlar a progressão de doenças crônicas, reduzir o risco de incapacidade, aumentar a
expectativa e a qualidade de vida.
Sabe-se que condições geriátricas comuns, como prejuízo funcional e demência são frequente-
mente não reconhecidas ou inadequadamente abordadas. Uma avaliação geriátrica eficiente e
completa, a custos razoáveis, torna-se cada vez mais necessária. Identificar tais condições com
uma avaliação estruturada pode ajudar clínicos no seu adequado manejo, além de prevenir ou
retardar complicações.
A AGA foi concebida pela médica inglesa Marjory Warren, conhecida como “mãe da Geriatria
moderna”. Em 1936, ela desenvolveu um trabalho de reabilitação em pacientes hospitalizados.
Muitos pacientes geriátricos recuperaram a mobilidade e receberam alta hospitalar, através da
aplicação do conceito interdisciplinar de avaliação ampla.
A história, o exame físico e os diagnósticos diferenciais tradicionais não são suficientes para um
levantamento adequado das diversas capacidades necessárias à vida diária do idoso. A prática
clínica geriátrica, uma vez preocupada com a qualidade de vida, deve conter também uma ampla
avaliação funcional em busca de perdas possíveis destas funções. A avaliação multidimensional
e interdisciplinar busca reconhecer os seguintes conceitos propostos pela Organização Mundial
da Saúde (OMS):
O termo “Síndrome Geriátrica” é usado para se referir a condições de saúde comuns nos ido-
sos e que não apresentam uma única causa ou um único órgão-alvo atingido. Como exemplo
de síndromes geriátricas temos: comprometimento cognitivo, delirium, incontinência urinária,
desnutrição, quedas, distúrbios de marcha, distúrbios de sono, úlceras por pressão, déficits sen-
soriais, fadiga e tontura. Tais condições citadas apresentam grande impacto na qualidade de vida
do idoso e podem ser mais bem identificadas através da AGA.
Outros termos utilizados na literatura para definir este perfil de assistência multidimensional,
assim como a AGA são: Avaliação Geriátrica Global (AGG), Avaliação Geriátrica Multidimensional
(AGM) e Avaliação Global do Idoso (AGI).
2. Público-alvo
A AGA deve fazer parte da consulta geriátrica habitual. Os idosos que se beneficiam deste modelo
de avaliação são aqueles com perda recente de funcionalidade, multimorbidades, utilização fre-
quente dos serviços de saúde, síndromes geriátricas já instaladas e mudança recente de ambien-
te. Em contrapartida, idosos muitos saudáveis e idosos em fase de terminalidade são pacientes
que não terão benefícios ou vantagens com a aplicação da AGA.
A AGA pode ser aplicada em diversos ambientes. Pode ser feita apenas pelo médico no consul-
tório, mas apresenta maior impacto quando realizada por equipe multidisciplinar. Outros locais
de atendimento como enfermaria, domicílio, centro de reabilitação e pronto-socorro também
podem ser utilizados, com adaptações de protocolo de acordo com o local e os componentes da
equipe.
Capítulo 3 33
é entender que a presença de duas ou mais condições crônicas de saúde tem um impacto maior
do que a ocorrência de somente uma delas isoladamente. Desse modo, a combinação de algu-
mas doenças pode ter um efeito sinérgico com consequências maiores do que o esperado, pelo
seu efeito aditivo. A presença de múltiplas condições crônicas num mesmo indivíduo leva a um
declínio mais rápido de sua saúde e, com ele, maiores chances de incapacidade e complicações,
decorrentes inclusive da terapêutica empregada.
Em um estudo populacional de São Paulo, 80% dos idosos apresentavam pelo menos uma doen-
ça crônica e 10% evidenciavam cinco ou mais (Ramos et al.,1998). Desta forma, a avaliação por-
menorizada das condições de saúde do paciente e sua lista de diagnósticos torna-se um elemento
chave na consulta.
Ao conduzir a anamnese, é importante deixar que o idoso se expresse livremente e seja acolhido
em suas preocupações e angústias. O geriatra deverá, concomitantemente, conduzir as informa-
ções coletadas de forma a estruturar uma lista de problemas, hipóteses diagnósticas e priorida-
des, buscando resolutividade e melhoria da qualidade de vida do paciente.
O interrogatório sobre diversos aparelhos é uma das etapas mais importantes da anamnese e
deve ser completo, pois muitas alterações importantes só serão identificadas após um questiona-
mento dirigido. Alguns exemplos são: déficits sensoriais, quedas, disfunções sexuais, distúrbios
do sono, alterações de cavidade oral como próteses mal ajustadas, constipação e perda de con-
tinência. Tais disfunções, quando presentes, podem ter forte impacto na qualidade de vida do
idoso, bem como favorecer seu isolamento social, ou mesmo comprometer sua autonomia.
A investigação ativa dos déficits sensoriais deve ser avaliada na consulta geriátrica, com o Teste
de Snellen, sistema universal de triagem da acuidade visual; e o Teste do Sussurro, na avaliação
auditiva, como triagem para a compreensão de sons de alta e baixa frequências.
4. Avaliação Funcional
Os métodos habituais de se realizar uma avaliação funcional estruturada consistem na observa-
ção direta (testes de desempenho) e por questionários, quer autoaplicados, quer concebidos para
entrevistas presenciais, sistematizados por meio de uma série de escalas que aferem os principais
componentes da dimensão. Tais escalas compõem o que se tem denominado de “instrumentos
de avaliação funcional”. Há algumas evidências importantes de previsibilidade de instituciona-
lização e mortalidade dos indivíduos com distúrbios nesta dimensão da AGA.
34
Tabela 1 - Atividades básicas de vida diária (AVD) – Índice de Katz
Escore: A pontuação é o somatório de respostas “sim”. 1-2 pontos: dependência importante; 3-5 pontos:
dependência parcial; 6 pontos: independência.
Para cada questão, a primeira resposta significa independência; a segunda, capacidade com ajuda; e a terceira,
dependência. A pontuação mínima é de 9 pontos e máxima 27 pontos, sendo que a pontuação tem um significado
apenas para o paciente individual, servindo como base para comparação evolutiva. As questões 4 e 7 podem ter
variações conforme o sexo e ser adaptadas para atividades como subir escadas e cuidar do jardim.
Capítulo 3 35
Outra escala muito utilizada é o índice de Barthel, que avalia dez funções: tomar banho, vestir-
se, promover higiene, usar o vaso sanitário, transferir-se da cama para a cadeira e vice-versa,
manter continências fecal e urinária, capacidade para se alimentar, deambular, subir e descer
escadas. Essa escala permite ainda uma gradação mais ampla na classificação de dependência,
indo desde a dependência total (0 ponto) à independência máxima (100 pontos).
Independente. 10
1. Como você realiza suas refeições? Necessita de ajuda para cortar carne ou passar manteiga. 5
Dependente – é alimentado por outra pessoa. 0
Independente. 5
2. Como você toma seu banho?
Dependente – necessita de alguma ajuda ou supervisão. 0
Independente. 10
3. Como você se veste? Necessita de ajuda. 5
Dependente. 0
Independente. 5
4. Como você realiza seus asseios?
Dependente – necessita de alguma ajuda. 0
Continente. 10
5. Como é a sua evacuação? Acidente ocasional. 5
Incontinente – mais de um episódio semanal. 0
Continente. 10
6. Como é a sua micção? Acidente ocasional. 5
Incontinente – mais de um episódio em 24 horas. 0
Independente. 10
7. Como você vai ao banheiro? Necessita de ajuda. 5
Dependente. 0
Independente. 15
8. Como você realiza suas
Mínima ajuda – supervisão ou pequena ajuda física. 10
transferências (cama, poltrona,
Grande ajuda – necessita de uma pessoa treinada e forte. 5
cadeira de rodas)?
Dependente. 0
Independente. 15
9. Como você realiza a
Necessita de ajuda ou supervisão. 10
deambulação (locomoção,
Independente em cadeira de rodas. 5
caminhar)?
Dependente. 0
Independente. 10
10. Como você realiza a subida e
Necessita de ajuda ou supervisão. 5
descida de escadas?
Dependente – incapaz de subir ou descer degraus. 0
Dependência Severa: abaixo de 45; Dependência Grave a Moderada: 45-79 pontos; Dependência Leve/ Independência:
60-100 pontos
Fonte: Adaptado de Minosso et al. Validação, no Brasil, do Índice de Barthel em idosos atendidos em ambulatórios.
Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, 2010
Dos instrumentos de Atividades de Vida Diária (AVD), a Escala de Barthel é a que possui resul-
tados de confiabilidade e validade mais consistentes. O instrumento de Katz possui estudos de
validade robustos e a qualidade dos resultados de validade também foi classificada como boa, em
uma revisão brasileira (Paixão Jr, et al., 2005).
36
A Escala de Lawton, reconhecida pelo Ministério da Saúde do Brasil e pela Sociedade Brasilei-
ra de Geriatria e Gerontologia (SBGG), é a forma publicada por Freitas e Miranda (2006). Nessa
escala, a pontuação mínima é de 9 pontos e a máxima de 27 pontos. Na publicação original de
Lawton, constam 8 itens em vez de 9, não estando presente o item sobre trabalhos manuais e
pequenos reparos. A pontuação pela escala de Lawton original varia de 0 a 8 pontos.
A dimensão de estado funcional é central para a avaliação geriátrica. Os instrumentos que a ava-
liam são variados e com objetivos diversos. Podem servir como medidas de saúde geral ou es-
pecífica; servir como instrumentos de pesquisa, triagem ou avaliação clínica; medir graus de
dependência mais graves e até capacidade para funções físicas e sociais. A escolha de um ou mais
instrumentos depende do ambiente operacional e dos objetivos do avaliador.
5. Equilíbrio e Mobilidade
No envelhecimento normal, o aparelho locomotor sofre importantes modificações, como a re-
dução da amplitude de movimentos e a alteração da marcha, com a ocorrência de passos mais
curtos e lentos. O centro de gravidade corporal adianta-se e a base de sustentação amplia-se,
buscando maior segurança e equilíbrio. Segundo Tinetti (1986), a mobilidade é a habilidade de se
locomover em um ambiente, o que é uma função complexa e composta de múltiplas manobras.
Tais manobras dependem da integração de características físicas, cognitivas e psicológicas.
Os principais testes utilizados para a avaliação de equilíbrio e marcha são a Escala de Equilíbrio
e Marcha de Tinetti, a Escala de Berg, o Teste de Guralnik e o Timed Up and Go Test.
O teste é capaz de avaliar as condições vestibulares e de marcha do paciente (Tabela 3). Em 2003,
foi adaptado para ser utilizado na população brasileira institucionalizada, recebendo o nome de
POMA-Brasil. Apresenta boa aplicabilidade nos indivíduos frágeis.
Destaca-se também, como um importante teste de mobilidade funcional nos idosos frágeis, o
Timed Up and Go Test. Este teste é utilizado para identificar alterações de equilíbrio dinâmico
e problemas de marcha. O teste mensura, em segundos, o tempo que o indivíduo leva para se
levantar de uma cadeira com apoio para os braços, caminhando por uma distância de 3 metros,
retornando e sentando-se novamente. A velocidade com que o paciente realiza o teste relaciona-
Capítulo 3 37
se fortemente com o risco de quedas. A nota de corte para predizer um maior risco de quedas
varia em diferentes estudos populacionais ao redor do mundo. Um importante estudo brasileiro
mostrou um melhor valor preditivo positivo para quedas nos idosos com desempenho superior a
12 segundos (Alexandre et al.,2012). Vários trabalhos mostram que indivíduos saudáveis desem-
penham o teste em até 10 segundos. Um valor acima de 20 segundos já demonstra um moderado
risco para quedas e acima de 30 segundos, altíssimo risco de quedas. Sabe-se ainda que uma
velocidade de marcha inferior a 0,8 metros por segundo também se correlaciona a maior risco
de quedas.
EQUILÍBRIO – O paciente deve estar sentado em uma cadeira sem braços, e as manobras a seguir
são testadas.
Escorrega. 0
1. Equilíbrio sentado.
Equilibrado. 1
Incapaz. 0
2. Levantando. Usa os braços. 1
Sem os braços. 2
Incapaz. 0
3. Tentando levantar. Mais de 1 tentativa. 1
Única tentativa. 2
Desequilibrado. 0
4. Assim que levanta
Estável, mas usa suporte. 1
(primeiros 5 segundos).
Estável, sem suporte. 2
Desequilibrado. 0
5. Equilíbrio em pé. Suporte ou base de sustentação >9 cm. 1
Sem suporte e base estreita. 2
6. Teste dos 3 tempos
(examinador empurra Começa a cair. 0
levemente o esterno do Agarra e balança. 1
paciente, que deve ficar de pés Equilibrado. 2
juntos).
7. Olhos fechados (igual à Desequilibrado, instável. 0
posição do item 6). Equilibrado. 1
Passos descontínuos. 0
Passos contínuos. 1
8. Girando 360º.
Instável (desequilibrado). 0
Estável (equilibrado). 1
Inseguro (erra a distância, cai na cadeira). 0
9. Sentando. Usa os braços ou movimentação abrupta. 1
Seguro, movimentação suave. 2
Pontuação do Equilíbrio ___ / 16
MARCHA - Paciente de pé caminha pelo corredor ou pela sala no passo normal, depois volta com
passos rápidos, mas com segurança (usando o suporte habitual, como bengala ou andador).
Hesitação ou várias tentativas para iniciar 0
10. Início da marcha.
Sem hesitação. 1
38
a) Pé direito:
Não ultrapassa pé esquerdo; 0
Ultrapassa pé esquerdo; 1
Não sai completamente do chão; 0
11. Comprimento e altura dos Sai completamente do chão. 1
passos. b) Pé esquerdo:
Não ultrapassa pé esquerdo; 0
Ultrapassa pé esquerdo; 1
Não sai completamente do chão; 0
Sai completamente do chão. 1
Passos diferentes. 0
12. Simetria dos passos.
Passos semelhantes. 1
Paradas ou passos descontínuos. 0
13. Continuidade dos passos.
Passos descontínuos. 1
Desvio nítido. 0
14. Direção. Desvio leve ou moderado ou uso de apoio. 1
Linha reta sem apoio (bengala ou andador). 2
Balanço grave ou uso de apoio. 0
Flexão dos joelhos ou dorso ou abertura dos braços 1
15. Tronco.
enquanto anda.
Sem flexão, balanço, não usa braços ou apoio. 2
Tornozelos separados. 0
16. Distância dos tornozelos.
Tornozelos se tocam enquanto anda. 1
Pontuação da marcha _____ / 12
Pontuação Total _____/ 28
Quanto menor a pontuação, maior o problema. Pontuação menor que 19 indica risco cinco vezes maior de quedas
6. Cognição e Humor
Através da uma adequada avaliação da saúde mental dos idosos, podem ser identificadas as prin-
cipais alterações pertinentes nesta faixa etária: as síndromes demenciais e os transtornos de hu-
mor. Ambos podem comprometer de forma significativa a qualidade de vida e a funcionalidade
do paciente. No caso do declínio cognitivo, quando acentuado, pode ser um importante fator de
institucionalização.
A escala mais utilizada no rastreio de déficit cognitivo, devido tanto à sua praticidade quanto
rapidez, é o Mini Exame do Estado Mental (MEEM), proposto por Foltstein, em 1975. Este teste
contempla diferentes áreas da cognição, portanto é uma importante ferramenta de triagem ao
se suspeitar de uma síndrome demencial. Outros testes complementares de rastreio que podem
compor uma investigação inicial são o Teste do Relógio, a Bateria Breve, a Fluência Verbal e o
Moca Test. É importante ressaltar que esses testes não são de caráter diagnóstico e sim de ras-
Capítulo 3 39
treio. Para o correto diagnóstico de uma demência, o paciente deve preencher os critérios do Ma-
nual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V). Quando há dúvida diagnóstica, é
possível lançar mão de uma investigação específica com testes neuropsicológicos, aplicados por
profissionais capacitados na área.
Dos transtornos de humor do idoso, a depressão tem a maior prevalência. Algumas caracterís-
ticas como maior recorrência de episódios e maior duração são observadas na população geriá-
trica. Além disso, muitas vezes as manifestações são expressas por sintomas físicos como fadiga
e exaustão, ou dores generalizadas, em vez de queixas propriamente psicológicas, como humor
deprimido e anedonia. Deve-se buscar o diagnóstico correto, pois o tratamento adequado pro-
porciona forte impacto positivo na vida do paciente. A Escala de Depressão Geriátrica é uma das
mais utilizadas, porém, o diagnóstico não dever depender apenas da pontuação obtida.
7. Avaliação Nutricional
O idoso apresenta maior predisposição à desnutrição, por fatores tanto da senescência quanto da
senilidade. São importantes fatores neste processo:
b) A presença de multimorbidades;
A Mini avaliação Nutricional (MAN), de Vellas e Guigoz (1996), é considerada atualmente o me-
lhor método de avaliação nutricional para idosos. Apresenta sensibilidade, especificidade e con-
fiabilidade altas. É de rápida e fácil aplicação e não requer equipamentos sofisticados. Sua forma
reduzida (MAN-SF) é uma triagem sensível para identificar o risco nutricional e a desnutrição
inicial, com validação para a população idosa brasileira.
40
Tabela 5 – Mini avaliação Nutricional Reduzida (MAN-SF)
Um escore de 12 pontos ou mais indica que o paciente não apresenta risco nutricional. Não é preciso completar o resto do
questionário. Um escore de 11 pontos ou menos indica que o paciente pode apresentar risco de desnutrição. Pode comple-
tar avaliação MAN respondendo às questões G-R, vide abaixo em Avaliação Nutricional Global.
Fonte: Adaptado de Guigoz, Y. Assessing the nutritional status of the elderly: The Mini Nutritional Assessment as part
of the geriatric evaluation, 1996
Capítulo 3 41
Tabela 5 - Avaliação Nutricional Global. (continuação)
42
Q – Perímetro braquial (PB) em cm
PB < 21 0
21 < PB < 22 0,5
PB > 22 1
R – Perímetro da panturrilha (PP) em cm
PP < 31 0
PP > 31 1
Total Avaliação Global =
ESCORE TOTAL = TRIAGEM + AVALIAÇÃO GLOBAL
AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRIONAL: pontos totais
Menos de 17 pontos = Desnutrido
De 17 a 23,5 pontos = Risco de Desnutrição.
De 24 a 30 pontos = Estado Nutricional Normal.
As medidas antropométricas fazem parte da avaliação nutricional. O peso e a altura devem ser
aferidos rotineiramente na avaliação geriátrica, pois um declínio ponderal não intencional fre-
quentemente passa despercebido em uma consulta ambulatorial não especializada.
Pela OMS, os idosos possuem uma classificação de Índice de Massa Corporal (IMC) específica:
inferior a 22 – baixo peso; entre 22 e 27 – peso adequado; entre 27 e 30 – risco de obesidade; e su-
perior a 30 – obesidade.
8. Fatores socioambientais
A avaliação dos aspectos sociais e do ambiente do idoso é complexa, tamanha a heterogeneidade
dos seus componentes. Entretanto, na AGA, torna-se fundamental identificar os recursos dispo-
níveis de suporte social, familiar e financeiro, pois influenciam diretamente o planejamento de
cuidados e o prognóstico do paciente. Deve-se buscar as expectativas e anseios do idoso, bem
como seus valores culturais e religiosos. Na tabela 5 encontra-se um teste que pode ser utilizado
para avaliar o suporte social do idoso, conhecido como Apgar da Família e dos Amigos.
A adaptação ambiental necessária a cada paciente também deve ser especialmente avaliada, com
o objetivo de manter a funcionalidade e a independência do idoso, bem como minimizar o risco
de quedas e todas as suas consequências deletérias à saúde global.
O estresse de quem cuida de um paciente idoso, termo conhecido na literatura como estresse do
cuidador, não deve ser esquecido. O idoso torna-se mais vulnerável a maus tratos e negligência,
Capítulo 3 43
quando assistido por um cuidador em estado de estresse importante. É preciso reforçar a ne-
cessidade de descanso, férias e do acompanhamento de saúde dos cuidadores. Ao identificar o
risco de estresse do cuidador, o geriatra deverá encaminhá-lo à ajuda médica e/ou psicológica
adequada.
ITENS OPÇÕES
0 – Raramente.
1 – Está satisfeito e pode contar com a ajuda de seus familiares
1 – Ocasionalmente.
e amigos para ajudá-lo a resolver seus problemas?
2 – Frequentemente.
0 – Raramente.
2 – Está satisfeito com a forma que seus familiares e amigos
1 – Ocasionalmente.
conversam e compartilham seus problemas com você?
2 – Frequentemente.
0 – Raramente.
3 – Está satisfeito com a forma que seus familiares e amigos
1 – Ocasionalmente.
acatam e apoiam suas vontades e decisões?
2 – Frequentemente.
4 – Está satisfeito com a forma que seus familiares e amigos 0 – Raramente.
expressam afeição e respondem às suas emoções como raiva, 1 – Ocasionalmente.
culpa e medo? 2 – Frequentemente.
0 – Raramente.
5 – Está satisfeito com a forma que você, seus familiares e ami-
1 – Ocasionalmente.
gos compartilham o tempo juntos?
2 – Frequentemente.
Escore: 7-10 família/amizade altamente funcional; 4-6 disfunção moderada; 0-3 disfunção acentuada
Fonte: Adaptado de Smilkstein G. The family APGAR: a proposal for a family function test and its use by physicians, 1978
9. Considerações Finais
Os componentes chave da AGA incluem a capacidade funcional, o risco de quedas, a cognição,
o humor, a polifarmácia, o suporte social, as finanças, os objetivos de cuidado do paciente, bem
como suas preferências no contexto de cuidados intensivos. Componentes adicionais também
podem estar presentes, tais como nutrição e variação de peso, continência urinária, função se-
xual, avaliação sensorial de visão e audição, avaliação da dentição, condição habitacional e espi-
ritualidade.
A família deve ser envolvida, sempre que possível, no processo de avaliação do paciente, e sua
contribuição é, muitas vezes, imprescindível.
Mesmo que com pequenas modificações entre os diversos grupos, a AGA precisa ser incorporada
como rotina na prática clínica, pela possibilidade de ações preventivas e de reabilitação, contri-
buindo para uma expectativa de vida mais saudável aos idosos a ela submetidos.
Caso clínico
Paciente do sexo feminino, 84 anos, viúva há 20 anos, 3 filhos, 4 anos de escolaridade, evangéli-
ca, aposentada (trabalhava como doméstica).
44
Procurou consulta com clínico geral, acompanhada de sua filha mais nova, com quem a paciente
mora. A filha estava preocupada com alguns relatos frequentes da paciente sobre fadiga e exaus-
tão para as atividades de vida diária, além de se recusar a sair de casa para as atividades sociais
habituais. A paciente apresenta queixa de dores na coluna e desânimo, além de insônia inicial
e perda de peso não intencional de 4kg em 3 meses. A filha notou que frequentemente a mãe
deixa de fazer as refeições principais, por referir que “já almoçou” ou então por não sentir fome.
Recentemente a paciente esqueceu o caminho de volta para a casa ao ir até a padaria do bairro e
precisou ser auxiliada por um vizinho. A paciente atribui os esquecimentos à insônia e à fadiga.
A paciente evoluiu após 2 meses com perda de mais 3kg (IMC atual de 21) e mantinha as queixas
iniciais, além de tontura não rotatória frequente ao se levantar. A filha procurou, então, atendi-
mento geriátrico para a paciente. Após a realização da AGA na primeira consulta, foram consta-
tadas as seguintes questões:
- Paciente descorada ++/4, emagrecida, com hipotensão postural (PA deitada = 160 x
100mmHg, em pé após 5 minutos = 140x80mmHg e sentada = 150x90mmHg sentada. Ci-
foescoliose acentuada. Apresentou 3 quedas nos últimos 6 meses. Teste de Snellen mos-
trando redução da acuidade visual (20/70);
- Avaliação funcional: ABVD’s: 6/6; AIVD’s: 15/27 (já com dificuldade para manejo de finan-
ças, preparar alimentos e tomar medicamentos no horário correto). Segundo a filha, a per-
da funcional ocorreu nos últimos dois anos;
- Avaliação cognitiva: mini exame do estado mental (MEEM): 14/30; fluência verbal: 5 ani-
mais/minutos;
- Avaliação de humor: GDS 2/15 e também não preencheu os critérios de depressão maior
pelo DSM-V;
Capítulo 3 45
Ao final da avaliação geriátrica foram feitas as seguintes alterações na prescrição da paciente:
suspensa a fluoxetina 20mg que poderia estar contribuindo para acelerar a perda ponderal, além
de não haver suspeita de transtorno de humor na avaliação geriátrica. Substituição de metildopa
por enalapril 5mg de 12/12h objetivando melhor controle da HAS e minimizar variação da hipo-
tensão ortostática. Além disso, os IECA apresentam efeito protetor renal nos pacientes com risco
de proteinúria pela HAS. Foi suspensa a sinvastatina devido à perda ponderal e de apetite. Foi
considerado que os valores de colesterol já estavam bastante adequados e como não havia histó-
rico de evento isquêmico coronariano ou cérebro-vascular, não se justificava o emprego de me-
tas rigorosas de controle lipídico. Foi contraindicado o uso de anti-inflamatórios não-esteroides
(AINE) por haver HAS e risco de lesão renal, e orientado analgesia simples de forma regular para
a osteoartrose. Foi solicitado densitometria óssea e radiografia de coluna dorsal e lombar para
avaliar a presença de fratura osteoporótica.
Foi iniciada suplementação calórico-proteica e orientado rigoroso controle de peso. Foram solici-
tados também exames complementares para a investigação da anemia.
A paciente foi encaminhada para avaliação oftalmológica, devido a rastreio visual comprome-
tido, sendo posteriormente identificada catarata em fase avançada com indicação cirúrgica. Foi
encaminhada também para fisioterapia motora, com treino de marcha e equilíbrio, objetivando
fortalecimento de membros inferiores, no intuito de minimizar o risco de quedas. Orientações
ambientais adicionais sobre o risco de quedas foram fornecidas à paciente e sua filha.
Por fim, devido à perda funcional recente para atividades instrumentais e rastreio cognitivo com
valores abaixo do esperado para a faixa etária, foram solicitados exames complementares para
investigação de síndrome demencial. Foram dadas orientações à filha quanto à necessidade de
supervisão das atividades instrumentais da paciente e aos horários corretos das medicações.
Após dois meses de acompanhamento, a paciente evoluiu com controle adequado dos níveis
pressóricos, apresentou melhor aceitação alimentar e obteve ganho ponderal de 2kg. Houve re-
dução da sensação de fadiga e exaustão com a fisioterapia três vezes por semana. Não apresentou
novas quedas. Está em aguardo de cirurgia de catarata. Está tratando deficiência de vitamina D
e de vitamina B12. Há ainda forte suspeita de síndrome demencial do tipo Doença de Alzheimer
provável, e a paciente mantém o acompanhamento regular para avaliar o melhor momento de
iniciar tratamento farmacológico específico.
Referências
ALEXANDRE, T.S. et al. Acurácia do Timed Up and Go Test para rastrear risco de quedas em ido-
sos na comunidade. Revista Brasileira de Fisioterapia, 2012; 16(5);381-8.
BOYD, C.M. et al. Principles for the Care of Older Adults with Multimorbity: An Aproach for Cli-
nicians. Journal of the American Geriatrics Society, 2012; 60(10):E1-E25.
FREITAS, E.V. Avaliação Geriátrica Ampla. In: Freitas EV, org. Tratado de Geriatria e Gerontolo-
gia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2016. p.970-7.
FREITAS, E.V. et al. Manual Prático de Geriatria. Rio de Janeiro: Gen, 2014.
46
FREITAS, E.V.; MIRANDA, R.D. Parâmetros clínicos do envelhecimento e Avaliação Geriátrica
Ampla. In: FREITAS, E.V. et.al. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 2ª. Ed. Rio de Janeiro: Gua-
nabara-Koogan, 2006. p.900-9.
GOMES, G.S. Tradução, adaptação transcultural e exame das propriedades de medida da escala
“Performance-Orientes Mobility Assessment” (POMA) para uma amostra de idosos brasileiros
institucionalizados [dissertação]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2003.
GUIGOZ, Y.; VELLAS, B.J.; GARRY, P.J. Assessing the nutritional status of the elderly: The Mini
Nutritional Assessment as part of the geriatric evaluation. Nutrition Reviews, 1996;54(1): S59-65.
JACOB FILHO, W. Envelhecimento: Uma Visão Interdisciplinar. Rio de Janeiro: Atheneu, 2015.
PAIXÃO JUNIOR, C.M.; REICHENHEIM, M.E. Uma revisão sobre instrumentos de avaliação do
estado funcional do idoso. Cadernos de Saúde Pública 2005; 21(1):7-19.
PODSIADLO, D.; RICHARDSON, S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for
frail elderly persons. Journal of the American Geriatrics Society, 1991; 39(2):142-8.
RAMOS, L.R. et al. Two-Year Follow-up Study of Elderly Residents. In: São Paulo, Brazil (EDIPO-
SO Project): Methodology and Preliminary Results. Revista de Saúde Pública, 1998; 32(5):397-407.
SMILKSTEIN, G. The family APGAR: a proposal for a family function test and its use by physi-
cians. The Journal of Family Practice, 1978; 6(6):1231-1239.
ZAPAROLLI, M.; KLEIN, F.; MOREIRA, H. Avaliação da acuidade visual Snellen. Arquivos Brasilei-
ros de Oftalmologia, 2009; 72(6):783-8.
WARD K.T.; REUBEN, D.B. Comprehensive geriatric assessment. Uptodate [on line] 2016. aces-
so em 19/06/2017; disponível em: www.uptodate.com/contents/comprehensive-geriatri-
c-assessment?source=search_result&search=avalia%C3%A7%C3%A3o%20geriatrica&selec-
tedTitle=1~150
Capítulo 3 47
CAPÍTULO
Fármacos no Idoso
e Iatrogenia Terapêutica
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Fármacos no Idoso
e Iatrogenia Terapêutica
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
1. Introdução
Os idosos apresentam um risco duas a três vezes maior, se comparados aos jovens, de apresentarem
reações adversas a fármacos. No Brasil, cerca de 3/4 da população idosa usa algum medicamento
regularmente. Os motivos para tal fenômeno são os seguintes:
Fonte: http://www.isagenixhealth.net/the-power-of-protein-for-staying-lean-battling-aging/
Tabela 1 - Exemplos de Interações Medicação-Doença
3. Farmacoterapia no idoso
Certos fármacos apresentam um risco maior de gerar complicações, como os antagonistas H2
(ex.: rantidina), que por serem anti-histamínicos podem provocar sonolência, anticoagulantes
(risco de sangramentos), anti-hipertensivos (risco de hipotensão postural), insulinas, antiagre-
gantes plaquetários e hipoglicemiantes orais. Diversas listas de medicações potencialmente ina-
propriadas aos idosos estão disponíveis para consulta, entre elas a dos Critérios de Beers (Tabela
2). Os efeitos anticolinérgicos são os mais indutores de complicações nos idosos. Drogas antico-
linérgicas aumentam o risco de demência.
Os critérios Screening Tool of Older Person’s Prescriptions - STOPP (Ferramenta para prescrição
em idosos, em português) também são úteis por identificarem as interações perigosas entre
fármacos e o uso duplicado de drogas dentro de uma mesma classe farmacológica.
Capítulo 4 51
Deve ser pesquisado também o uso de medicamentos derivados de ervas medicinais, que não
estão isentos de efeitos adversos e podem provocar interações medicamentosas significativas,
como o que ocorre entre o ginkgo biloba e a varfarina e entre o hipérico e os inibidores de
receptação de serotonina.
Drogas Motivo
Hidroxizina; prometazina Anti-histamínico com elevada ação anticolinérgica.
Escopolamina Antiespasmódico com elevada ação anticolinérgica.
Nitrofurantoína Antibiótico com elevado risco de toxicidade pulmonar.
Alfa-bloqueadores com elevado risco de hipotensão, depressão do
Doxasozina, clonidina e metildopa
sistema nervoso central.
Digoxina > 0,125mg Risco de toxicidade.
Espironolactona > 25mg Risco de hipercalemia.
Antidepressivos tricíclicos Elevada ação anticolinérgica.
Antipsicóticos Risco elevado de acidente vascular cerebral.
Risco de declínio cognitivo, sedação, delirium e quedas.
Benzodiazepínicos
Recomenda-se, de forma geral, que os fármacos sejam iniciados em doses menores e aumentados
lentamente de acordo com a necessidade. Medicamentos usados sem prescrição médica também
devem ser investigados com cautela.
Nesta fórmula, o peso aplicado deve ser o peso real (caso o paciente seja eutrófico ou desnutrido)
ou o peso ideal (caso seja obeso ou apresente edemas).
Na tabela 3 são descritos exemplos de antibióticos e outras drogas que necessitam de correção
pela função renal.
52
Tabela 3 - Exemplos de antibióticos e outras drogas com correção de dose para função renal alterada
Fonte: Adaptado de Gilbert D. Guia Sanford para terapia antimicrobiana. 47ª. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2017
4. Estudo de Caso
Você é chamado para avaliar no hospital o sra. Arlete, 92 anos, professora aposentada. Mora
com sua filha, Maria, e apresentava boa funcionalidade até 4 meses atrás, quando começou a
ficar doente. Saía sozinha à rua todos os dias para fazer pequenas compras e administrava suas
próprias finanças. Há 5 dias foi internada após ser trazida ao PS por quadro de síncope.
Maria informa que sua mãe é medicada há cerca de 20 anos com amitriptilina 25mg/noite para
tratar insônia. Há 2 meses e meio a paciente apresentou crise de vertigens, com queda em via
pública. Procurou atendimento na UBS que identificou PA 180X 100 mmHg. Recebeu a prescrição
de cinarizina 75mg pela manhã e metildopa 500mg/noite, em uso contínuo. Após 20 dias, o quadro
vertigionoso melhorou, mas surgiram tremores intensos e os movimentos corporais se tornaram
lentos. Procurou neurologista que diagnosticou Doença de Parkinson e adicionou ao tratamento
meio comprimido de levodopa a cada 6 horas. Após sete dias, a paciente evoluiu com confusão
mental e quedas no domicílio. Foi levada a nova avaliação na UBS. O médico diagnosticou tremor
essencial e indicou suspensão da levodopa e tratamento com propranolol 20mg, 8/8 horas. Houve
resolução da confusão mental, mas após 45 dias surgiram sinais de apatia e a paciente começou a
se desinteressar dos afazeres diários, comunicando-se pouco. Teve então novo episódio de queda,
desta vez associada a desmaio. O SAMU foi chamado e levou-a ao hospital, onde está internada.
No hospital, o médico plantonista solicitou ECG que revelou “arritmia” (abaixo). A tomografia de
crânio foi normal, bem como os exames de sangue. O ecocardiograma também estava normal, e
o U-S doppler de carótidas mostrou placas carotídeas com cerca de 30% de obstrução. O médico
informou à família que se tratava de um caso de AVC e indicou tratamento com Xarelto ® 20mg
(rivaroxabana) 1x ao dia.
Capítulo 4 53
Hoje pela manhã a paciente apresentou uma crise convulsiva, que durou 4 minutos. No momento
encontra-se sonolenta, não responde aos chamados verbais.
Ao exame:
Neuro: sonolenta. Glasgow: 10. Sem déficits motores focais. Pupilas sem alterações. Não há
rigidez nucal.
PA: 110 X 70 mmHg FC: 48 bpm FR: 16 irpm sat O2: 98%
2. Qual o diagnóstico do ECG? De que modo os achados deste exame se conectam com as
condutas e evolução da paciente descritas no caso?
3. Qual é o clearence de creatinina estimado para esta paciente? Ela apresenta insuficiência
renal?
5. Conclusões
• O risco de iatrogenias medicamentosas é maior com o envelhecimento.
• Deve ser observada a necessidade de correção de dose de fármacos, em especial por conta
das alterações de clearence de creatinina.
• As tabelas como as dos Critérios de Beers devem ser utilizadas como fonte de consulta para
drogas inapropriadas ao idoso.
54
Referências
AMERICAN GERIATRICS SOCIETY 2015 Beers Criteria Update Expert Panel. American Geriatrics
Society 2015 Updated Beers Criteria for Potentially Inappropriate Medication Use in Older Adults.
Journal of the American Geriatrics Society 2015; 63(11):2227-46.
APPEL, L.J. et al. Effects of reduced sodium intake on hypertension control in older individuals:
results from the Trial of Nonpharmacologic Interventions in the Elderly (TONE). Archives of
Internal Medicine 2001;161:685.
BUDNITZ, D.S. et al. Emergency hospitalizations for adverse drug events in older Americans. The
New England Journal of Medicine 2011;365:2002.
CARRIERE, I. et al. Drugs with anticholinergic properties, cognitive decline and dementia in an
elderly general population: the 3-city study. Archives of Internal Medicine 2009;169:1317.
GALLAGHER, P. et al. STOPP (Screening Tool of Order Person´s Prescriptions) and START
(Screening Tool to Alert doctors to Right Treatment). Consensus Validation. International journal
of clinical pharmacology and therapeutics 2008;46:72.
GRAY, S.L. et al. Cumulative use of strong anticholinergics and incident dementia. JAMA Internal
Medicine 2015;175:401-7.
LAI, S.W. et al. Polypharmacy correlates with increased risk for hip fracture in the elderly: a
population-based study. Medicine (Baltimore) 2010;89:295.
ROCHON, P.A.; GURWITZ, J.H. Optimising drug treatment for elderly people: the prescribing
cascade. British Medical Journal 1997;315:1096.
Capítulo 4 55
CAPÍTULO
Cardiogeriatria – parte 1
Profa. Dra. Luciana Avena
Cardiogeriatria – parte 1
Profa. Dra. Luciana Avena
1. Introdução
Motivo da consulta: a paciente está se matriculando em atividades para idosos e precisa de um
atestado médico para a prática de exercícios físicos.
Mulher 75 anos, procedente de SP, casada, branca, independente para atividades diárias. Ante-
cedentes: colecistectomia há 20 anos e 3 partos normais. Sem uso de medicações. Assintomática
para as atividades habituais, nega dispnéia, dor torácica, tontura, palpitações ou edemas. Não
pratica exercícios físicos regulares, a não ser tarefas domésticas e pequenas caminhadas para
fazer compras. Alimenta-se bem, incluindo verduras, legumes e carnes diariamente e evita fri-
turas e gordurosos desde a época em que operou a vesícula. Peso estável. Exame físico: BEG,
IMC 27, CA=87 cm, FC=88 bpm, PA=160x80, BRNF com sopro sistólico++/4 no foco aórtico, sem
irradiação. Restante do exame físico normal, incluindo pulsos periféricos. Exames Laboratoriais:
Colesterol total=230 mg/dL, LDL=170 mg/dL, HDL=47mg/dL, TG=120 mg/dL, glic=95 mg/dL, Hb-
glic=5,5%, U=40 mg/dL, C=0,9 mg/dL, eletrólitos normais, hemograma sem alterações. Traz me-
didas de pressão arterial que tem feito em casa nas últimas semanas: 150X 75 mmHg e 160 X 80
mmHg.
Problemas: Sedentarismo / Avaliação para atividade física / Sobrepeso e obesidade abdominal / Dis-
lipidemia / Hipertensão arterial sistólica / Sopro sistólico ejetivo no foco aórtico
A primeira intervenção feita foi a de encorajar a idosa a adotar um estilo de vida saudável, uma
vez que essa atitude resulta em redução do risco de desenvolvimento futuro de incapacidades.
Um estudo de coorte que seguiu por 12 anos indivíduos com 65 anos ou mais, inicialmente sem
qualquer incapacidade, mostrou que o risco de desenvolvimento de incapacidades, consideradas
moderadas e graves, foi maior nos indivíduos que tinham nível de atividade física apenas leve
ou moderado, que consumiam menos que uma porção de frutas ou vegetais por dia e que eram
fumantes e que esse risco foi tanto maior quanto maior fosse o número de comportamentos con-
siderados não saudáveis (Artaud et al, 2003).
O exercício físico beneficia pessoas de qualquer idade, pode reduzir todas as causas de morbi-
dade, reduzir mortalidade, aumentar a expectativa de vida e a independência funcional.Assim,
devemos fazer essa recomendação para todos os idosos, incluindo os muito idosos, aqueles com
comorbidades e também para os institucionalizados. Até mesmo a atividade física descomprome-
tida ou no lazer se associam com redução de incidência de doença cardiovascular e mortalidade
cardíaca e total nos idosos. Nunca é tarde para iniciar atividade física e até mesmo idosos com 85
anos ou mais, previamente sedentários, e que iniciaram atividade física evoluíram com benefício
significativo na sobrevida em 3 anos quando comparados com indivíduos sedentários (Stessman
et al, 2009).
Testes funcionais como o teste ergométrico não são indicados para pacientes idosos assintomá-
ticos que estão se preparando para iniciar uma atividade física. Os testes de esforço podem ser
considerados para idosos previamente sedentários que estão planejando iniciar um programa
intenso de exercícios, o que não é habitual. A falta, portanto, de um teste ergométrico não deve
ser uma barreira para orientarmos o início de um programa de exercícios e deve ser reservado
para pacientes com sintomas cardiovasculares, com doença arterial coronária (DAC) conhecida
ou com alto risco para DAC, baseado em múltiplos fatores de risco, como pacientes diabéticos e
que tem doença macrovascular como doença arterial carotídea e periférica. No entanto, deve-
mos avaliar um eletrocardiograma de repouso.
Assim, a boa anamnese, o exame físico e um eletrocardiograma de repouso são capazes de ava-
liar se há contraindicações ou risco para exercícios físicos. Pacientes sem sintomas cardiovascu-
lares, como a paciente do caso clínico, são capazes de iniciar atividade física de leve a moderada
intensidades, de modo gradual, sem riscos.
A definição de intensidade de exercício é diferente para o idoso. Para os adultos mais jovens, a
intensidade é medida em termos de equivalente metabólico (METS) ou estimativa do consumo
de oxigênio em repouso, de modo a avaliar o custo metabólico de uma dada atividade física.
Uma atividade física de 3 METS é aquela que utiliza 3 vezes mais oxigênio que o gasto energético
corpóreo em repouso. Atividades que dispendem entre 3-6 METS são consideradas de moderada
intensidade e acima de 6 METS são de elevada intensidade. Como os idosos podem ter uma capa-
cidade funcional reduzida e grande heterogeneidade em termos de performance física, gradua-
mos a intensidade do exercício em uma escala de 0 (repouso) a 10 (maior esforço físico possível).
A atividade física de intensidade moderada, recomendada em geral para o início dos exercícios
físicos, é definida entre aquela de nível 5-6 e provoca uma elevação evidente nas frequências
respiratória e cardíaca. As atividades de níveis de 7-8 são aquelas que provocam um grande au-
mento nesses parâmetros. Uma boa regra para diferenciarmos a intensidade do exercício é que
na atividade moderada o paciente deve ser capaz de conversar durante o exercício.
Capítulo 5 59
Tabela 1- Benefícios da atividade física no idoso
Fonte: Adaptado de LIFE Study Investigators. Effects of a physical activity intervention on measures of physical per-
formance: Results of the lifestyle interventions and independence for Elders Pilot (LIFE-P) study. J Gerontol A Biol Sci
Med Sci 2006; 61:1157
Para mais informações sobre recomendação de atividade física nos idosos consulte os sites:
www.exerciseismedicine.org/
www.research.va.gov/resources/pubs/LIFE-modules.cfm
www.move.va.gov/handouts.asp
Outras recomendações em termos de adoção de estilo de vida saudável devem ser enfatizadas.
Devemos perguntar ao idoso sobre tabagismo e aconselhá-lo a parar de fumar, já que essa in-
tervenção reduz de modo significativo o risco de doença arterial coronária, doença pulmonar
obstrutiva crônica e várias neoplasias. Um estudo avaliou por cinco anos idosos que pararam
e não pararam de fumar e observou redução do risco relativo de morte por todas as causas no
grupo que cessou o tabagismo (Russell et al, 1979). O benefício dessa recomendação se observa
em todas as idades, inclusive pacientes com 80 anos ou mais. Se necessário podemos utilizar a
bupropiona e a varenicliclina no tratamento do tabagismo no idoso e, apesar de não haver es-
tudos específicos para essa faixa etária, os medicamentos à base de nicotina também tem sido
prescritos e se mostrado efetivos.
60
Avaliação do risco de eventos cardiovasculares
A doença aterosclerótica vascular é comum e afeta a maioria dos adultos acima de 60 anos. O
risco de doenças cardíacas aumenta com a idade. Assim, idade é um fator importante na maioria
dos modelos de avaliação de risco cardiovascular e só esse fato justificaria monitorizar o risco
cardiovascular nos idosos.
Não se sabe a partir de qual idade essa avaliação periódica de risco não mais se justifica, mas
muitos dos modelos validados de avaliação de risco cardiovascular incluíram pacientes com 79
anos ou menos. Assim, a partir dessa faixa etária, a decisão de suspender essa avaliação perió-
dica de risco deve ser baseada no estado funcional do paciente, na sua expectativa de vida e em
valores e preferências do indivíduo com relação a modificações dos fatores de risco.
Atualmente podemos contar com vários modelos multivariados de avaliação de risco cardiovas-
cular, aplicáveis a indivíduos aparentemente saudáveis e assintomáticos, como é o caso da nossa
paciente. Lembremos que esses modelos tendem a superestimar os riscos mas podem nos au-
xiliar a tomar decisões, especialmente terapêuticas, quando se trata de prevenção primária. A I
Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia recomenda a utilização do Escore de Risco Global
(ERG) para avaliação do risco de eventos cardiovasculares (risco de infarto do miocárdio, aciden-
te vascular encefálico, insuficiência vascular periférica e insuficiência cardíaca) em 10 anos, para
pacientes entre 40 e 79 anos, de maneira periódica (a cada 3 a 5 anos).
O mais claro identificador de risco é a manifestação prévia da própria enfermidade. Desta forma,
o primeiro passo na estratificação do risco é a identificação de manifestações clínicas da doença
aterosclerótica ou de seus equivalentes (como a presença de diabetes ou de doença renal crônica
significativa, mesmo em prevenção primária). Indivíduos assim identificados possuem, em 10
anos, risco superior a 20% de apresentar novos eventos cardiovasculares. O paciente que se en-
quadrar em uma dessas categorias, não requer outras etapas para estratificação de risco, sendo
considerado automaticamente de ALTO RISCO.
Capítulo 5 61
Pacientes já com doença cardiovascular aterosclerótica manifesta são considerados de alto risco
de recorrência de eventos e devem ser tratados com medidas de prevenção secundária.
São considerados de BAIXO RISCO aqueles com probabilidade menor que 5% de apresentarem
os principais eventos cardiovasculares em 10 anos. Os pacientes classificados nessa categoria
e que apresentem histórico familiar de doença cardiovascular prematura serão reclassificados
para risco intermediário.
São considerados de risco INTERMEDIÁRIO homens com risco calculado ≥ 5% e ≤ 20% e mulhe-
res com risco calculado ≥ 5% e ≤ 10% de ocorrência de algum dos eventos citados.
São considerados de ALTO RISCO, aqueles com risco calculado > 20% para homens e >10% para
mulheres no período de 10 anos.
Nos indivíduos de risco intermediário devemos avaliar os fatores agravantes (Tabela 2), que
quando presentes (pelo menos um deles) reclassificam o indivíduo para a condição de alto risco.
História Familiar de doença arterial coronariana prematura (parente de primeiro grau mas-
culino < 55 anos ou feminino < 65 anos)
Critérios de síndrome metabólica de acordo com a International Diabetes Federation
Microalbuminúria (30-300 mg/min) ou macroalbuminúria (>300 mg/min)
Hipertrofia Ventricular Esquerda
• Evidência de doença aterosclerótica subclínica:
Escore de cálcio coronário > 100 ou > percentil 75 para idade ou sexo
Índice tornozelo braquial (ITB) < 0,9
Para todas as categorias de risco devemos salientar as questões relativas às mudanças do estilo
de vida:
a) redução do peso;
b) preferir o consumo de vegetais, frutas e grãos inteiros; além de fitoesteróis, fibras e peixe;
c) reduzir a ingesta de ácidos graxos saturados e de gordura trans e substituir ácidos graxos
saturados pelos mono e poli-insaturados;
62
d) reduzir ingesta de carboidratos, de açúcares simples, de carne vermelha, de sal (<2,3g/d);
g) cessar o tabagismo.
Devemos ainda tratar os fatores de risco encontrados. Muitos dos fatores de risco para doenças
cardiovasculares são modificáveis e susceptíveis a medidas preventivas. Os estudos Interheart e
Interstroke, que contaram com a colaboração de 52 países, demonstraram nove fatores potencial-
mente modificáveis que foram responsáveis por 90% dos eventos cardiovasculares ocorridos:
tabagismo, dislipidemia, hipertensão arterial, diabetes, obesidade abdominal, fatores psicosso-
ciais (depressão, estresse percebido, eventos da vida), consumo diário de frutas e vegetais, con-
sumo regular de álcool e atividade física regular. Atividade física e consumo de legumes e verdu-
ras foram fatores protetores. Consumo moderado de álcool (1 a 2 doses ao dia) pode proteger para
infarto mas aumenta o risco de acidente vascular cerebral hemorrágico.
Os idosos têm um risco anual global maior de doença coronária e podem beneficiar-se da redu-
ção de lipídios se a expectativa de vida for boa. A U.S. Preventive Services Task Force (USPSTF),
com base nas evidências de que medida de lípides pode identificar pacientes de risco aumentado
para eventos cardiovasculares e que a terapia redutora de lípides mostrou redução na ocorrência
desses eventos, com poucos efeitos colaterais, conclui que o benefício da dosagem de lípides e
tratamento da dislipidemia nos idosos é maior que o malefício.
Com o passar da idade, os níveis de colesterol tendem a estabilizar-se. Nos pacientes com mais de
um rastreio prévio, poderíamos considerar fazer um exame adicional aos 65 anos e a partir daí
interromper o rastreamento.A presença de diabetes é um indicador independente para avaliação
do perfil de lípides, independente de avaliação de risco do indivíduo. Ver Tabela 3.
A recomendação mais aceita hoje é baseada na avaliação prévia do risco cardiovascular do pa-
ciente idoso. O rastreamento de dislipidemia e a terapia redutora de lipides beneficia os idosos
de alto risco cardiovascular. Entretanto, a decisão de iniciar essa terapia nos idosos, particular-
mente acima de 80 anos deve ser individualizada com base nas comorbidades e nos riscos da
polifarmácia. Os pacientes de risco cardiovascular baixo e intermediário tem benefício incerto
com esse tratamento.
Capítulo 5 63
A terapia com estatina, quando usada na prevenção primária, irá reduzir o risco relativo de even-
tos cardiovasculares em 20-25% e é por isso que pacientes com mais alto risco são os que te-
rão maior impacto em termos de redução de risco absoluto de eventos com a medicação. Assim,
quanto mais alto o risco cardiovascular estimado, mais inclinados estaremos a iniciar estatina
nos idosos, pois o impacto na prevenção de eventos como infarto do miocárdio e acidente vascu-
lar cerebral será maior.
Quando decidimos por instituir a estatina para prevenção primária, a sugestão é usar uma
dose considerada moderada e que foi utilizada nos estudos disponíveis, como atorvastatina
10mg-20mg ou lovastatina 20-40mg, pravastatina 40mg ou sinvastatina 40mg ou rosuvastatina
5-10mg. Não há estudos comparando diretamente o efeito de doses baixas e moderadas com altas
doses de estatina na prevenção primária. Poucos idosos foram incluídos nos estudos de estati-
nas, de modo que essa terapia nessa faixa etária ainda não foi bem estudada.
Nova medida de LDL em 6 semanas pode ser feita para avaliar aderência a medicação e a dieta.
Não há necessidade de se associar uma segunda classe de droga para atingir meta de LDL na
prevenção primária, exceto para pacientes com LDL muito elevado e alto risco cardiovascular.
O tratamento não deve ser baseado na meta de LDL e por isso em geral não há necessidade de se
repetir as dosagens. Uma dosagem de CK e transaminases costuma ser recomendada antes do
início do tratamento com estatina para termos um valor controle de normalidade. Não é preciso
fazer dosagens seriadas de CK e transaminases se não houver sintomas.
O paciente idoso diabético deverá receber estatina, já que é considerado de alto risco, tendo be-
nefício absoluto maior na prevenção de eventos.
Os triglicérides não são considerados nos modelos de avaliação de risco e não há comprovação de
que reduzir triglicérides reduz eventos cardiovasculares. Por causa do risco de pancreatite, po-
rém, quando os níveis são muito elevados, devemos tratar, primeiramente com dieta e mudança
do estilo de vida e, se necessário, com fibratos.
A ação da aspirina (AAS) nas doses de 75-100mg é antiplaquetária pelo efeito de acetilação irre-
versível do sítio ativo da cicloxigenase1 (COX1), que é necessário para a produção de tromboxana
A2, um poderoso promotor da agregação plaquetária. O uso de AAS gera um aumento de 50% no
risco de sangramentos não fatais extracranianos em 10 anos. A maioria dos sangramentos ocor-
rem no trato gastrointestinal e raramente é fatal. O risco mais temido, o sangramento no sistema
nervoso central é de 4 por 10.000 (mas quando ocorre tem 50% de fatalidade). Para aqueles pa-
cientes que apresentam sangramento durante o tratamento com AAS para prevenção primária, a
decisão deve ser reavaliada, considerando o risco de sangramento recorrente versus o benefício
do uso preventivo. O risco de sangramento é tanto maior quanto maior a dose de AAS usada. As-
sim, para prevenção primária, uma boa estratégia é utilizarmos a dose de no máximo 100mg de
AAS por dia (entre 75-100mg). O benefício da aspirina na prevenção primária é a redução do risco
de infarto não fatal e uma pequena redução na mortalidade e possivelmente redução do risco de
câncer coloretal (quando o uso é acima de 10 anos). Em geral, devemos considerar o uso de AAS
para prevenção primária em pacientes com 50 anos ou mais, com risco estimado cardiovascular
acima de 10% e com baixo risco de sangramento, mas essa recomendação não é consenso entre
as várias orientações existentes, de modo que essa decisão deve ser individualizada.
Assim, para a nossa paciente, classificada como de alto risco cardiovascular, indicamos estatina
para prevenção primária de eventos e se considerarmos que ela não tem alto risco para sangramen-
64
to após anamnese cuidadosa, também podemos orientar AAS em dose baixa e com monitorização
periódica, especialmente para sangramento digestivo.
Tabela 3 - Recomendação para solicitação de exame lipídico nos pacientes idosos na prevenção primária
Fonte: I Diretriz Brasileira de Prevenção Cardiovascular. Arq. Bras. Cardiol. vol.101 no.6 supl.2; 2013
Vale ressaltar que a utilização de testes diagnósticos bioquímicos e/ou de exames de imagem
para detecção da aterosclerose subclínica não são preconizados como ferramentas de rotina na
estratificação de risco, mas podem ser usados nos pacientes que apresentem história familiar de
doença aterosclerótica precoce ou que sejam considerados como de risco intermediário. É o caso
da dosagem da proteína C reativa e do escore de cálcio determinado por tomografia de coronária .
Quanto ao Espessamento Médio-Intimal das (EMI) carótidas, sua utilização é muito controversa,
pois as evidências não são claras quanto à sua capacidade de prever doença.
O teste de esforço é útil na avaliação de pessoas com DAC conhecida e suspeitada, trazendo para
esses pacientes importantes informações diagnósticas e prognósticas. É, entretanto, muito con-
troverso o uso para rastreamento. Seu valor preditivo é muito dependente da probabilidade pré
teste da população em questão.
Em pacientes sem sinais e sintomas sugestivos de DAC, não é recomendado rastreamento para
DAC. Reservamos o teste de esforço para pacientes assintomáticos nas seguintes situações: a)
Capítulo 5 65
diabéticos que planejam iniciar um programa vigoroso de exercícios físicos; b) pacientes com
múltiplos fatores de risco para DAC ou homens acima de 45 anos e mulheres acima de 55 anos
sedentários e que estão planejando iniciar um programa vigoroso de exercícios; d) pacientes com
atividade ocupacional de risco; e) paciente que traz uma tomografia com escore de cálcio acima
do percentil 75.
Para a nossa paciente não há indicação de realização de exames adicionais para procurar doença
arterial coronária subclínica, porque a paciente já foi classificada como de alto risco e iniciamos
as medidas de prevenção primária. Com relação à atividade física pretendida, não há necessida-
de de exames complementares, além do eletrocardiograma de repouso, especialmente o teste
ergométrico para o início de exercícios de leve e moderada intensidades. O teste ergométrico
muitas vezes é solicitado para pacientes com 50 anos ou mais e com vários fatores de risco, antes
da prática de exercícios vigorosos. Podemos indicar esse exame para a paciente caso ela pretenda
aumentar a intensidade dos exercícios ou se surgirem sintomas sugestivos de DAC com o início
da prática esportiva.
Também nos idosos, a pressão maior ou igual a 140 x 90 não deve ser considerada fisiológica e
define HAS. Após os 60 anos, a pressão sistólica aumenta e a pressão diastólica cai, tanto nos
pacientes normotensos como nos hipertensos. A hipertensão sistólica responde por 60-80% das
hipertensões entre os idosos. A pressão sistólica e a pressão de pulso são preditores de DAC em
idosos, enquanto que a pressão diastólica é o principal preditor em indivíduos abaixo de 50 anos.
Os três parâmetros são preditores de DAC nos pacientes entre 50-59 anos.
66
Há benefício inequívoco no tratamento da HAS nos idosos, mesmo naqueles com mais de 80
anos, com redução dos eventos cardiovasculares, principalmente acidente vascular cerebral e
infarto do miocárdio, redução na mortalidade total, mortalidade cardiovascular, insuficiência
renal, insuficiência cardíaca e demência. A maioria dos estudos que demonstraram o benefício
do tratamento adotaram a pressão sistólica de 160 mmHg ou mais para o início do tratamento e
em geral não atingiram a meta inferior a 140 mmHg durante o tratamento. Por isso, a recomenda-
ção é que iniciemos tratamento se a pressão é maior ou igual a 150 x 90 mmHg nos idosos acima
de 60 anos e acima de 140 x 90 mmHg nos idosos com diabetes ou insuficiência renal crônica. A
eficácia do tratamento em níveis menores que esses de pressão sanguínea no idoso ainda precisa
ser estabelecida.
O tratamento deve ser iniciado nos idosos com expectativa de vida igual ou superior a 1 a 2 anos
e pressão arterial sistólica acima de 150-160 mmHg, com ou sem pressão arterial diastólica eleva-
da. Nos pacientes com risco cardiovascular alto e muito alto (com comorbidades como diabetes
mellitus, tabagismo, doença arterial coronariana, acidente vascular encefálico prévio, doença
arterial periférica, doença arterial carotídea, aneurisma de aorta, insuficiência cardíaca e ne-
fropatia crônica ou que apresentem proteinúria maior que 1 grama), o tratamento ativo deve ser
iniciado com níveis a partir de 140 mmHg de PAS.
Entre os idosos, a pressão sistólica e a pressão de pulso se correlacionam diretamente com DAC
e a pressão diastólica tem correlação inversa com DAC, ou seja, pressão diastólica mais baixa
correlaciona-se com maior risco de DAC. Isso gera preocupação com relação ao nível de queda
de pressão diastólica (com comprometimento da perfusão de órgãos vitais como o coração) que
podemos permitir quando estamos tratando um paciente com HA sistólica isolada. A sugestão é
que mantenhamos uma pressão diastólica mínima entre 60 e 65 mmHg nos pacientes com DAC
conhecida, a menos que sintomas possivelmente atribuídos à hipoperfusão ocorram com níveis
maiores de pressão diastólica.
O controle adequado do idoso hipertenso exige níveis de PA abaixo de 140/90 mmHg, porém
níveis ainda menores entre aqueles com risco cardiovascular mais elevado. Todavia, as recomen-
dações quanto à PA alvo nos pacientes portadores de nefropatia, notadamente os não diabéticos,
são derivados de estudos menores, em adultos e idosos jovens. A Diretriz Brasileira recomenda
como metas de tratamento o seguinte:
- Hipertensos e limítrofes com risco cardiovascular muito alto < 130/80 mmHg;
- Hipertensos nefropatas com proteinúria > 1,0 g/l < 125/75 mmHg.
O objetivo pressórico a ser atingido com o tratamento para a maioria dos hipertensos idosos, se-
gundo as diretrizes internacionais, será pressão sistólica de 125 a 135 mmHg para medida manual
e entre 120-125 mmHg para medida automática.
Capítulo 5 67
O tratamento recomendado será a mudança do estilo de vida, especialmente a perda de peso e a
restrição de sódio (menos que 2,3g dia). Idosos podem ingerir mais sal por causa da facilidade do
consumo dos alimentos processados (ricos em sódio) e para tentar compensar a redução do paladar
que pode ocorrer com a idade. É importante, porém, salientar a restrição de sódio, pois o efeito do
excesso de sódio e a eficácia anti-hipertensiva da restrição de sódio aumentam com a idade.
Os idosos podem ter resposta simpática e de baroreceptores lentificada, além de deficit na auto-
regulação cerebral. Por isso, na ausência de urgência/emergência hipertensiva, a pressão deve
ser reduzida gradualmente, por semanas a meses e não em horas a dias, para minimizar o risco
de hipotensão postural e sintomas isquêmicos. Mais cautela ainda deve ser tomada com os muito
idosos.
No tratamento, será importante avaliar se o paciente tem hipotensão postural e/ou hipotensão
pós prandial, achados encontrados em até 20% dos pacientes com hipertensão sistólica isola-
da. Esses pacientes tem um risco de queda muito maior e o tratamento anti-hipertensivo nesse
grupo de pacientes correlaciona-se com maior risco de fratura de quadril durante os primeiros
dois meses de tratamento. Por isso, teremos que medir a pressão arterial em posição deitada e
na vertical, de todo idoso, antes do início do tratamento. Diagnosticamos hipotensão postural se
após 2 a 5 minutos em pé, ocorre um ou mais dos seguintes: queda de pelo menos 20mmHg na
pressão sistólica, queda de pelo menos 10mmHg na pressão diastólica e ocorrência de sintomas
de hipoperfusão cerebral, como tontura. Fraqueza, fadiga ou tontura após alimentação podem
ser marcadores de hipotensão pós prandial, o que pode ser verificado medindo a pressão arterial
antes e após a refeição.
Outra complicação potencial com a terapia é o baixo fluxo cerebral, gerando confusão mental e
sonolência.
Os betabloqueadores não devem ser a primeira droga indicada para o tratamento de HAS nos ido-
sos, a não ser que outra indicação esteja presente, como insuficiência cardíaca e pós infarto. Essa
classe de drogas pode ser uma escolha pior que as outras para prevenção de acidente vascular
cerebral, especialmente entre fumantes e talvez com aumento do risco de morte com o atenolol.
68
a droga utilizada. Nessa situação, a primeira droga a ser escolhida (monoterapia) pode ser qual-
quer uma das três classes: diurético tiazídico em baixa dose (ex 12,5 a 25mg/ dia de clortalidona),
um bloqueador de canal de cálcio de longa ação diidropiridínico e um IECA ou BRA. As duas
primeiras classes em geral são preferidas no idoso por causa de maior eficácia em baixar a pres-
são. Deve-se levar em conta, entretanto, o risco de incontinência urinária e hipotensão postural
associado aos diuréticos.
É preciso ter cuidado com os possíveis efeitos colaterais do tratamento, especialmente a hipoten-
são postural e risco de quedas com qualquer classe de anti-hipertensivo, a piora da função renal
com IECA ou BRA e a hiponatremia e hipocalemia com os tiazídicos.
Definimos como hipertensão resistente quando o nível pressórico permanece maior ou igual a
140 x 90 mmHg nos pacientes tomando três ou mais anti-hipertensivos, situação em que investi-
garemos hipertensão secundária (doença renal, doença renovascular, hiperaldosteronismo, uso
de medicamentos como reposição hormonal e corticóides, feocromocitoma, Doença de Cushing,
hiperparatireoidismo e apnéia do sono). A doença renovascular deve ainda ser investigada nas
seguintes situações:
a) elevação de creatinina > 50% após uma semana após início de IECA ou BRA;
As causas mais comuns de estenose aórtica no idoso são a calcificação da valva bicúspide e a cal-
Capítulo 5 69
cificação degenerativa da valva tricúspide. Essa última etiologia é a mais comum nos pacientes
acima de 70 anos, enquanto que a valva bicúspide é afetada com maior frequência entre os 50
e 70 anos. Os fatores de risco associados com o desenvolvimento de estenose aórtica nos idosos
são os mesmos da aterosclerose: idade (a cada 10 anos o risco dobra), sexo masculino (risco 2x
maior), tabagismo (35% de aumento do risco), hipertensão arterial (20% de aumento do risco) e
dislipidemia (baixo LDL e elevação de lipoproteína A).
A esclerose (espessamento) da valva aórtica, sem estenose, é um achado comum nos idosos (pre-
valência acima de 25% nos idosos com 65 anos ou mais) e aumenta com a idade, sendo encontra-
do em 26-29% dos indivíduos com 65 anos ou mais, em 35% entre 75-84 anos e em 48% dos acima
de 85 anos. A esclerose de valva aórtica é definida como um espessamento irregular dos folhetos
da valva aórtica, com aumento focal da ecogenicidade, sem contudo prejudicar a movimentação
dos folhetos e com uma velocidade de pico no Doppler através da valva < 2m/s. Esses pacientes
devem ser acompanhados, pois a esclerose pode progredir para estenose, além de ser um marca-
dor de aumento do risco cardiovascular. Costuma-se repetir o ecocardiograma a cada 5 anos nos
pacientes com esclerose aórtica.
Na avaliação da gravidade da estenose aórtica devemos nos basear nas características anatômicas
e hemodinâmicas da valva, nos efeitos hemodinâmicos sobre o ventrículo esquerdo e nos sinto-
mas do paciente. Assim, classificamos a estenose aórtica com base nos seguintes parâmetros:
presença ou não de sintomas; calcificação e mobilidade da valva; velocidade de fluxo através da
valva; gradiente médio de pressão através da valva; área valvar e grau de disfunção ventricular
ou fração de ejeção reduzida. Veja a tabela 4.
A história natural da estenose aórtica costuma cursar com um longo período assintomático. Em
geral os sintomas começam quando a estenose é grave com área valvar menor do que 1cm2, ve-
locidade de jato transvalvar maior que 4m/seg e/ou gradiente de pressão média valvar acima de
40mmHg. A evolução hemodinâmica é variável e em geral a área valvar declina 0,1cm2 por ano.
A mortalidade dramaticamente aumenta após o surgimento dos sintomas e aqueles que não são
submetidos a procedimento cirúrgico tem prognóstico muito ruim e a sua mortalidade excede
90% em poucos anos. Essa observação juntamente com a evidência de melhora da sobrevida
após a troca da valva são responsáveis pela recomendação de troca valvar nos pacientes sinto-
máticos.
70
Tabela 4 - Graduação da Estenose aórtica - V=velocidade aórtica transvalvar máxima
Fonte: Nishimura, R.A. et al. 2014, AHA/ ACC guideline for the management of patients with valvular heart disease:
a report of the American College of Cardiology
Os sintomas clássicos de estenose aórtica são insuficiência cardíaca, angina e síncope. O pacien-
te, entretanto, pode apresentar sintomas inespecíficos como redução da tolerância aos esforços
e tontura, e até sintomas leves na estenose aórtica grave indicam mau prognóstico e necessidade
de cirurgia. Embora o exame físico se correlacione com a gravidade da estenose, não há um único
achado ou conjunto de dados no exame físico que tenha alta sensibilidade e especificidade para
exclusão de estenose aórtica grave. O ecocardiograma é o principal exame para o diagnóstico. O
cateterismo cardíaco é indicado para casos duvidosos, especialmente quando há discrepância
entre a avaliação clínica e o ecocardiograma.
Capítulo 5 71
O paciente com estenose aórtica grave sintomática é de risco aumentado para morte súbita. Nos
portadores de estenose aórtica grave e assintomáticos, a incidência anual de morte súbita é de
1%. Em adultos com sintomas devido à estenose aórtica, essa incidência é de 8-34%.
Uma vez sintomática, a proposta terapêutica é a cirurgia e o tratamento clínico tem pouca utili-
dade. Para os que se recusam a operar ou que não tem condições clínicas para tal, o tratamento
é paliativo, evitando fatores agravantes (prevenção e tratamento de condições concomitantes,
especialmente fibrilação atrial, doença coronária e hipertensão).
Para os assintomáticos, não há tratamento clínico capaz de retardar a evolução da doença e esta-
tina não é recomendado para esse fim. Para pacientes em estágio B com estenose leve, devemos
repetir o ecocardiograma a cada 3-5 anos. Para estágio B e estenose moderada, a cada 1-2 anos e
para pacientes em estágio C1, a cada 6-12 meses.
Se o paciente tem hipertensão concomitante à estenose aórtica assintomática, deve receber tra-
tamento para hipertensão mas de forma cuidadosa. Os inibidores de angiotensina podem ser
benéficos pelo efeito na fibrose ventricular e os betabloqueadores podem ser associados se há
doença coronária presente. Os diuréticos em geral devem ser evitados, especialmente se a câma-
ra ventricular é pequena devido à hipertrofia concêntrica pois nessa situação, qualquer redução
de volume ventricular (num ventrículo pequeno hipertrófico e pouco complacente) pode resultar
em queda do débito cardíaco.
Há alta prevalência de doença arterial coronária nos pacientes com estenose aórtica, de modo
que 40% dos pacientes que serão submetidos à cirurgia valvar também necessitarão de revascu-
larização.
A fibrilação atrial pode ocorrer nos pacientes com estenose aórtica e precipitar insuficiência
cardíaca nos previamente assintomáticos, por causa do ventrículo esquerdo não complacente e
maior dependência da contração atrial.
Uma vez que a cirurgia seja indicada é recomendado que o paciente evite a atividade física até
que o procedimento seja realizado. As indicações de cirurgia, conforme o grau de recomendação
e nível de evidência são as mesmas dos pacientes mais jovens:
b) estenose aórtica grave assintomática mas com uma fração de ejeção menor que 50% - IB;
c) estenose aórtica grave assintomática mas paciente com cirurgia de revascularização coro-
nária indicada - IB;
a) pacientes com estenose aórtica grave e assintomáticos, com baixo risco cirúrgico – IIa B;
b) pacientes com estenose aórtica grave assintomáticos mas com tolerância reduzida aos
exercícios ou ainda com queda de pressão sistólica nos exercícios – IIa B;
c) em pacientes sintomáticos com estenose aórtica grave com baixo fluxo/baixo gradiente
72
e fração de ejeção reduzida, cujo exame de estresse com dobutamina mostra aumento da
velocidade aórtica maior ou igual a 4m/s ou gradiente de pressão média maior ou igual a
40mmHg com área valvar menor ou igual a 1cm2, para qualquer dose de dobutamina – IIa B
d) pacientes sintomáticos que tem estenose aórtica grave com baixo fluxo/baixo gradiente
que são normotensos e tem fração de ejeção acima de 50% mas que a avaliação clínica, he-
modinâmica e anatômica evidenciam que a obstrução valvar é a causa mais provável para
os sintomas – IIa C;
e) pacientes com estenose aórtica moderada (velocidade aórtica de 3-3,9m/s) que irão ser sub-
metidos a outra cirurgia cardíaca – IIa C;
f) pacientes assintomáticos com estenose aórtica grave, rápida progressão da doença e baixo
risco cirúrgico – IIa C.
Grau de recomendação:
Classe III – o procedimento ou tratamento não deve ser realizado e pode ser danoso ao paciente
Nível de evidência:
Nível A – dados a partir de múltiplos estudos clínicos randomizados e metanálises ( múltiplas popu-
lações avaliadas)
Nível B – algumas populações avaliadas, dados derivados de um único estudo randomizado ou vá-
rios estudos não randomizados
Ao indicarmos cirurgia da valva aórtica, devemos lembrar que os idosos têm maior risco cirúrgi-
co do que os mais jovens, com mortalidade intra hospitalar entre 5-18%. O risco cirúrgico é ainda
maior se revascularização miocárdica ou outros procedimentos cirúrgicos concomitantes forem
realizados. Aqueles que sobrevivem à cirurgia, porém, em geral têm boa evolução e importante
melhora na qualidade de vida.
Capítulo 5 73
Com relação à escolha do tipo de prótese, será preciso pesar o risco de tromboembolismo e de
sangramento (pela necessidade de anticoagulação) das próteses mecânicas com a durabilidade
menor das biopróteses. Em avaliação de 15 anos de prótese, a taxa de disfunção da prótese bio-
lógica foi de 26% para pacientes com menos de 65 anos e de 9% para os maiores de 65 anos. A
sobrevida e mortalidade precoce é similar para os dois tipos de próteses. Assim, a expectativa de
vida de um octagenário será menor do que o esperado tempo de durabilidade da valva biológica
e é por isso que a bioprótese é em geral a valva de escolha para os idosos.
O sucesso crescente do implante transcateter de valva aórtica (TAVI), com 20% de redução de
mortalidade em um ano quando comparado ao tratamento clínico, trouxe uma nova alternativa
terapêutica para os pacientes considerados de alto risco cirúrgico. Se o risco cirúrgico é altíssimo
(maior ou igual a 50% de probabilidade de morte ou complicações graves irreversíveis) ou houver
uma contra indicação absoluta para a cirurgia, o TAVI é preferível à cirurgia (1B).
As indicações para cirurgia no idoso também não diferem dos adultos mais jovens:
b) insuficiência aórtica grave assintomática e fração de ejeção menor que 50% (IB);
f) insuficiência aórtica grave assintomática e com função ventricular normal, mas com pro-
gressiva dilatação ventricular esquerda (diâmetro diastólico de ventrículo esquerdo acima
de 65mm) – IIb C.
A melhor indicação cirúrgica para insuficiência aórtica grave no idoso é a presença de sintomas,
especialmente após os 80 anos.
A insuficiência mitral é comum no idoso (19% dos idosos a partir de 60 anos) e sua prevalência
aumenta com a idade (aumento de 1,3 vezes a cada 10 anos). Disfunção significativa (ao menos
moderada) ocorre em 1,9-4% dos idosos. As principais causas são: doença intrínseca dos folhetos
74
da valva ou do aparato subvalvar (prolapso mitral, degeneração e calcificação, rotura de corda
tendínea), insuficiência mitral isquêmica por isquemia reversível ou por infarto de músculo pa-
pilar e regurgitação mitral secundária à dilatação do anel mitral no contexto de insuficiência
cardíaca com dilatação de câmaras.
A insuficiência mitral crônica é a segunda razão mais comum para indicarmos cirurgia valvar
no idoso. A evolução pós operatória é melhor com a plastia do que com a troca da valva. A plas-
tia preserva todos os componentes funcionais da valva nativa, evitando o uso de prótese e suas
complicações e associa-se com menor taxa de morbidade, quando comparada à troca da valva
nos idosos. O reparo mitral percutâneo ainda se encontra em fase investigacional e poderá ser
útil nos pacientes sem condições cirúrgicas. Atualmente existe um estudo em curso sobre esse
assunto (COAPT Study).
A estenose mitral no idoso não é comum e pode ser produzida por calcificação intensa do ânulo
mitral. O tratamento cirúrgico preferido é a comissurotomia. No idoso este procedimento nem
sempre é possível, por causa da anatomia desfavorável (calcificação intensa, rigidez e retração dos
componentes da valva), sendo necessária a troca da valva. O procedimento de escolha quando a
anatomia é favorável deve ser a valvoplastia percutânea mas essa não pode ser feita na estenose
mitral por calcificação de ânulo mitral e pode cursar com recidiva da estenose no seguimento.
Encontra-se em experiência o implante transcateter de bioprótese mitral com balão expansível,
que poderá ser muito útil para os pacientes de risco muito alto para a cirurgia.
Para a paciente em questão, solicitamos um ecocardiograma que mostrou esclerose da valva aórtica
e função ventricular normal. A conduta é a manutenção do tratamento dos fatores de risco para
aterosclerose, acompanhamento clínico e, se não houver mudança no quadro clínico e/ou no exame
físico, repetiremos o ecocardiograma em 5 anos.
Capítulo 5 75
referências
ALEXANDER, K.P. et al. Outcomes of cardiac surgery in patients > or = 80 years: results from the
National Cardiovascular Network. Journal of the American College of Cardiology. 2000; 35:731.
AINSWORTH, B.E. et al. Compendium of physical activities: an update of activity codes and MET
intensities. Medicine and Science in Sports and Exercise. 2000; 32:S498.
ALI, R.; ALEXANDER, K.P. Statins for the primary prevention of cardiovascular events in older
adults: a review of the evidence. The American Journal of Geriatric Pharmacotherapy. 2007; 5:52.
AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE. ACSM’s Guidelines for Exercise Testing and Pre-
scription, 8th ed, Lippincott Williams and Willkins, Philadelphia 2010. p.380.
AMERICAN GERIATRICS SOCIETY, BRITISH GERIATRICS SOCIETY, AND AMERICAN ACADE-
MY OF ORTHOPAEDIC SURGEONS PANEL ON FALLS PREVENTION. Guideline for the prevention
of falls in older persons. Journal of the American Geriatrics Society. 2001; 49:664.
APPEL, L.J. et al. Effects of reduced sodium intake on hypertension control in older individuals:
results from the Trial of Nonpharmacologic Interventions in the Elderly (TONE). Archives of In-
ternal Medicine. 2001; 161:685
ARTAUD, F. et al. Unhealthy behaviours and disability in older adults: three-City Dijon cohort
study. British Medical Journal. 2013; 347:f4240.
ASIMAKOPOULOS, G.; EDWARDS, M.B.; TAYLOR, K.M. Aortic valve replacement in patients 80
years of age and older: survival and cause of death based on 1100 cases: collective results from
the UK Heart Valve Registry. Circulation. 1997; 96:3403.
BARENGO, N.C. et al. Leisure-Time Physical Activity Reduces Total and Cardiovascular Mortal-
ity and Cardiovascular Disease Incidence in Older Adults. Journal of the American Geriatrics So-
ciety. 2017; 65:504.
BRADLEY, H.A. et al. How strong is the evidence for use of beta-blockers as first line therapy for
hypertension? Systematic review and meta-analysis. Journal of Hypertension. 2006;24: 2131.
CAMPBELL, A.J. et al. Falls prevention over 2 years: a randomized controlled trial in women 80
years and older. Age and Ageing. 1999; 28:513.
CARROLL, M.D. et al. Trends in serum lipids and lipoproteins of adults, 1960-2002. Journal of the
American Medical Association. 2005; 294:1773.
COFFEY, S.; COX, B.; WILLIAMS, M.J. The prevalence, incidence, progression, and risks of aortic
valve sclerosis: a systematic review and meta-analysis. Journal of the American College of Cardi-
ology. 2014; 63:2852.
CRESS, M.E. et al. Exercise: effects on physical functional performance in independent old-
er adults. The journals of gerontology. Series A, Biological sciences and medical sciences.1999;
54:M242.
I DIRETRIZ BRASILEIRA DE PREVENÇÃO CARDIOVASCULAR. Arquivos Brasileiros de Cardiolo-
gia. vol.101 no.6 supl.2 São Paulo Dec. 2013
II DIRETRIZ EM CARDIOGERIATRIA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Arquivos
Brasileiros de Cardiologia. 2010; 95(3 supl.2): 1-112
76
ELAYDA, M.A. et al. Aortic valve replacement in patients 80 years and older. Operative risks and
long-term results. Circulation. 1993; 88:II11.
ELHASSAN, A.; CHOW, R.D. Smoking cessation in the elderly. Clinics in Geriatric Medicine. 2007;
15:38.
FORETTE, F. et al. Prevention of dementhia in randomised double-blind placebo-controlled Sys-
tolic Hypertension in Europe (Sys-Eur) trial. Lancet. 1998;352:1347.
FRANKLIN, S.S. et al. Does the relation of blood pressure to coronary heart disease risk change
with aging? The Framingham Heart Study. Circulation 2001;103:1245.
GELLERT, C.; SCHÖTTKER, B.; BRENNER, H. Smoking and all-cause mortality in older people:
systematic review and meta-analysis. Archives of Internal Medicine. 2012; 172:837.
GIANROSSI, R. et al. Exercise-induced ST depression in the diagnosis of coronary artery disease.
A meta-analysis. Circulation. 1989; 80:87.
GILL, T.M.; DIPIETRO, L.; KRUMHOLZ, H.M. Role of exercise stress testing and safety monitor-
ing for older persons starting an exercise program. Journal of the American Medical Association.
2000; 284:342.
GOFF JR, D.C. et al. 2013 ACC/AHA guideline on the assessment of cardiovascular risk: a report
of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guide-
lines. Circulation 2014; 129: S49.
GREENLAND, P. et al. 2010 ACCF/AHA guideline for assessment of cardiovascular risk in asymp-
tomatic adults: executive summary: a report of the American College of Cardiology Foundation/
American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. Circulation. 2010;122:2748.
GROSSI, E.A. et al. Late results of mitral valve reconstruction in the elderly. Annals Thoracic Sur-
gery. 2000; 70:1224.
HAMMERMEISTER, K. et al. Outcomes 15 years after valve replacement with a mechanical ver-
sus a bioprosthetic valve: final report of the Veterans Affairs randomized trial. Journal of the
American College of Cardiology. 2000; 36:1152.
HEART PROTECTION STUDY COLLABORATIVE GROUP. MRC/BHF Heart Protection Study
of cholesterol lowering with simvastatin in 20,536 high-risk individuals: a randomised place-
bo-controlled trial. Lancet 2002; 360:7.
IIVANAINEN, A.M. et al. Natural history of aortic valve stenosis of varying severity in the elderly.
American Journal of Cardiology. 1996; 78:97.
JAMERSON, K. et al. Benazepril plus amlodipine or hydrochlorothiazide for hypertension in
high-risk patients. The New England Journal of Medicine. 2008; 359: 2417.
JAMES, P.A. et al. 2014 evidence-based guideline for the management of high blood pressure in
adults: report from the panel members appointed to the Eight Joint National Commitee (JNC 8).
The Journal of the American Medical Association. 2014; 311:507.
Capítulo 5 77
JEBARA, V.A. et al. Mitral valve repair using Carpentier techniques in patients more than 70
years old. Early and late results. Circulation. 1992; 86:II53.
KEYSOR, J.J. Does late-life physical activity or exercise prevent or minimize disablement? A crit-
ical review of the scientific evidence. American Journal of Preventive Medicine. 2003; 25:129.
KHAN, N.; MCALISTER, F.A. Re-examining the efficacy of beta-blockers for the treatment of hy-
pertension: a meta-analysis. Canadian Medical Association Journal. 2006; 174:1737.
KING, A.C.; GURALNIK, J.M. Maximizing the potential of an aging population. Journal of the
American Medical Association. 2010; 304:1944.
KODALI, S.K. et al. Two-year outcomes after transcatheter or surgical aortic-valve replacement.
The New England Journal of Medicine. 2012; 366:1686.
KVIDAL, P. et al. Long-term follow-up of morbidity and mortality after aortic valve replacement
with a mechanical valve prosthesis. European Heart Journal. 2000; 21:1099.
LINDHOLM, L.H.; CARLBERG, B.; SAMUELSSON, O. Should beta blockers remain first choice in
the treatment of primary hypertension? A meta-amalysis. Lancet. 2005; 366:1545.
LINDROOS, M, et al. Prevalence of aortic valve abnormalities in the elderly: an echocardiographic
study of a random population sample. Journal of the American College of Cardiology. 1993; 21:1220.
LOBO, A.; CARVALHO, J.; SANTOS, P. Comparison of functional fitness in elderlies with reference
values by Rikli and Jones and after one-year of health intervention programs. The Journal of
Sports Medicine and Physical Fitness. 2011; 51:111.
MANCIA, G. et al. 2013 ESH/ESC Guidelines for the management of arterial hypoertension: The
Task Force for the management of arterial hypertension of the European Society of Hyperten-
sion (ESH). Journal of Hypertension. 2013; 31:1281.
MÄNTY, M. et al. Long-term effect of physical activity counseling on mobility limitation among
older people: a randomized controlled study. The journals of gerontology. Series A, Biological sci-
ences and medical sciences. 2009; 64:83.
MESSERLI, F.H. et al. Dogma disputed: can agressively lowering blood pressure in hypertensive
patients with coronary artery disease be dangerous? Annals of Internal Medicine. 2006; 144:884.
NALLAMOTHU, B.K. et al. Electron-beam computed tomography in the diagnosis of coronary
artery disease: a meta-analysis. Archives of Internal Medicine. 2001;161:833.
NATH, J.; FOSTER, E.; HEIDENREICH, P.A. Impact of tricuspid regurgitation on long-term sur-
vival. Journal of the American College of Cardiology. 2004; 43:405.
NELSON, M.E. et al. Physical activity and public health in older adults: recommendation from
the American College of Sports Medicine and the American Heart Association. Circulation 2007;
116:1094.
NISHIMURA, R.A. et al. 2014 AHA/ACC guideline for the management of patients with valvular
heart disease: a report of the American College of Cardiology/American. Circulation.
NKOMO, V.T. et al. Burden of valvular heart diseases: a population-based study. Lancet. 2006;
368:1005.
78
O’DONNELL, M.J. et al. Global and regional effects of potentially modifiable risk factors associ-
ated with acute stroke in 32 countries (INTERSTROKE): a case-control study. The Lancet Volume
388. No, 10046, p761-775, 20 August 2016.
OLSON, L.J. et al. Surgical pathology of the mitral valve: a study of 712 cases spanning 21 years.
Mayo Clinic Proceedings. 1987; 62:22.
OTTO, C.M. et al. Association of aortic-valve sclerosis with cardiovascular mortality and morbid-
ity in the elderly. The New England Journal of Medicine. 1999; 341:142.
PAHOR, M. et al. Effect of structured physical activity on prevention of major mobility disability
in older adults: the LIFE study randomized clinical trial. Journal of the American Medical Associ-
ation. 2014; 311:2387.
PAHOR, M. et al. Effects of a physical activity intervention on measures of physical performance:
Results of the lifestyle interventions and independence for Elders Pilot (LIFE-P) study. The jour-
nals of gerontology. Series A, Biological sciences and medical sciences. 2006; 61:1157.
PASSIK, C.S. et al. Temporal changes in the causes of aortic stenosis: a surgical pathologic study
of 646 cases. Mayo Clinic Proceedings. 1987; 62:119.
RANKIN, J.S. et al. The society of Thoracic Surgeons Risk Model for Opertaive Mortality after
multiple valve surgery. Annals Thoracic Surgery. 2013;95:1484 –90
RUSSELL, M.A. et al. Effect of general practitioners’ advice against smoking. British Medical
Journal. 1979; 2:231.
SALLIS, R.E. et al. The Call for a Physical Activity Vital Sign in Clinical Practice. American Journal
of Medicine. 2016; 129:903.
SACKS, F.M. et al. Coronary heart disease in patients with low LDL-cholesterol: benefit of pravas-
tatin in diabetics and enhanced role for HDL-cholesterol and triglycerides as risk factors. Circu-
lation 2002; 105:1424.
SATTELMAIR, J.R.; PERTMAN, J.H.; FORMAN, D.E. Effects of physical activity on cardiovascu-
lar and noncardiovascular outcomes in older adults. Clinics in Geriatric Medicine. 2009; 25:677.
SINGH, J.P. et al. Prevalence and clinical determinants of mitral, tricuspid, and aortic regurgita-
tion (the Framingham Heart Study). American Journal of Cardiology. 1999; 83:897.
SMITH, C.R. et al. Transcatheter versus surgical aortic-valve replacement in high-risk patients.
The New England Journal of Medicine. 2011; 364:2187.
SORGATO, A. et al. Ventricular arrhythmias in adult aortic stenosis: prevalence, mechanisms,
and clinical relevance. Chest 1998; 113:482.
SUEMOTO, C.K. et al. Development and Validation of a 10-Year Mortality Prediction Model: Me-
ta-Analysis of Individual Participant Data From Five Cohorts of Older Adults in Developed and
Developing Countries. The journals of gerontology. Series A, Biological sciences and medical sci-
ences. 2016 Aug 13. pii:glw 166
Capítulo 5 79
SPARLING, P.B. et al. Recommendations for physical activity in older adults. BMJ 2015; 350:h100.
STESSMAN, J. et al. Physical activity, function, and longevity among the very old. Archives of
Internal Medicine. 2009; 169:1476.
STEWART, B.F. et al. Clinical factors associated with calcific aortic valve disease. Cardiovascular
Health Study. Journal of the American College of Cardiology. 1997; 29:630.
STRANDBERG, T.E.; KOLEHMAINEN, L.; VUORIO, A. Evaluation and treatment of older patients
with hypercholesterolemia: a clinical review. Journal of the American Medical Association. 2014;
312:1136.
TOPILSKY, Y. et al. Clinical context and mechanism of functional tricuspid regurgitation in pa-
tients with and without pulmonary hypertension. Circulation: Cardiovascular Imaging. 2012;
5:314.
VASA-NICOTERA, M. et al. Impact of paravalvular leakage on outcome in patients after tran-
scatheter aortic valve implantation. Cardiovascular Interventions – Journals. 2012; 5:858.
VINCENTELLI, A. et al. Acquired von Willebrand syndrome in aortic stenosis. The New England
Journal of Medicine. 2003; 349:343.
YOU, J.J. et al. Antithrombotic therapy for atrial fibrilation: Antithrombotic Therapy and Preven-
tion of Thrombosis, 9th ed: American. College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Prac-
tice Guidelines. Chest 2012; 141: e531S.
YUSUF, S. et al. Effect of potentially modifiable risk factors associated with myocardial infarction
in 52 countries (the INTERHEART study): case-control study. The Lancet. 2004; 364:937.
Na web:
US DEPARTMENT OF HEALTH AND HUMAN SERVICES. Healthy People 2010, conference edition.
Washington DC: U.S. Department of Health and Human Services; 2000. Available at: www.healt-
hypeople.gov (Accessed on December 21, 2007).
80
CAPÍTULO
1. CASO CLÍNICO
Maria Inácia, 64 anos, solteira, aposentada. Veio para uma consulta de retorno. Diagnósticos
prévios: HAS, dislipidemia e esclerose de valva aórtica. Precisou procurar o PS há 1 semana por
dispneia e foi encaminhada para uma consultaambulatorial extrapara investigaçãodiagnóstica
. Fazia caminhada de 20 minutos 3 vezes por semana e dança de salão 1 vez por semana. Estava
em uso de: 100mg de aspirina, 10mg de atorvastatina e 12,5mg de hidroclortiazida. Há 2 meses,
começou a sentir cansaço durante as caminhadas e, por causa do calor, resolveu parar os exer-
cícios até o término do verão. Nega dor torácica. Refere ainda episódios de palpitações de curta
duração (10-15 minutos). Nos últimos quinze dias, a dispneia piorou para esforços menores, como
os de subir os degraus do seu sobrado (15 degraus). Iniciou edema de tornozelos e tosse seca. Há
1 semana esteve no PS, quando a hidroclorotiazida foi trocada por furosemida 40mg. O edema
regrediu e a dispneia melhorou parcialmente. Exame físico: BEG, IMC 25kg/m2, circunferência
abdominal = 85cm, FC = 100bpm, PA = 140x80mmHg. BRNF com sopro sistólico++/4 foco aórtico,
sem irradiação (sopro sem alteração em relação ao último exame físico). Restante do exame físico
normal, incluindo pulsos periféricos.
Problemas:
2. Insuficiência cardíaca
A insuficiência cardíaca (IC) pode ser definida como uma incapacidade do coração prover débito
suficiente para manter a perfusão e a oxigenação adequada para os tecidos, enquanto mantém
pressões de enchimento normais.
Uma revisão sistemática recente mostrou que a prevalência estimada de IC entre os idosos é de
11%, independentemente da função ventricular (VAN RIET et al., 2016). A prevalência de IC com
fração de ejeção normal tem aumentado e é o tipo de IC mais comum nos idosos.
Pacientes com doença cardíaca estrutural mas sem sintomas de IC são classificados em estágio
B. A detecção precoce de pacientes assintomáticos mas com fração de ejeção menor ou igual a
40% é importante, pois o tratamento com inibidor da enzima conversora de angiotensina (IECA)
retarda o início da doença clínica e prolonga a sobrevida.Essa condição é comum na população
idosa, por isso devemos solicitar o ecocardiograma para os pacientes com cardiomegalia no exa-
me físico ou na radiografia de tórax, onda Q patológica no eletrocardiograma ou BNP (peptídeo
natriurético cerebral) elevado. Não é recomendado rastreamento com ecocardiograma ou com
BNP nos pacientes sem fatores de risco ou sem suspeita clínica para IC, porque ainda não há evi-
dências de que exista benefício clínico com essa estratégia. O ecocardiograma deve ser solicitado
em todo paciente com IC de início recente, pois além de ter alta sensibilidade e especificidade
para o diagnóstico de disfunção miocárdica, ainda pode auxiliar na avaliação de sua etiologia.
Todos os pacientes com IC cuja causa permanece inexplicada devem ser pesquisados para pos-
sível doença coronariana. Um teste funcional não invasivo é uma boa estratégia como primeiro
passo da investigação, pois nos dará informação sobre a presençade isquemia
eprognóstico.
A IC com fração de ejeção reduzida (ICrFE) é caracterizada por alteração na função sistólica,
com progressiva dilatação de câmaras e remodelamento excêntrico, comfraçãodeejeçãome-
nor que 40%.
Na IC com fração de ejeção preservada (ICpFE), a fração de ejeção e o volume diastólico final do
ventrículo esquerdo são normais, mas a função diastólica é alterada, geralmentecom remodela-
mento concêntrico e hipertrofia.
Há ainda um terceiro grupo com leve disfunção sistólica e que compartilha características de
ambos os tipos anteriormente citados. Mas há ainda poucos estudos com esses pacientes e a
maioria acredita que seja um grupo similar ao da IC com fração de ejeção reduzida.
A ICpFe e
ICrFE são duas síndromes distintas e não espectros de uma mesma doença.
A apresentação clínica do idoso difere entre os pacientes abaixo e acima de 75 anos. A presença
de dispneia aos esforços, ortopneia, dispneia paroxística noturna, aumento do peso e edema pe-
Capítulo 6 83
riférico corroboram para o diagnóstico de IC, mas com o envelhecimento, apresentações atípicas
tornam-se mais comuns e podem retardar o diagnóstico correto. Muitos idosos podem não rela-
tar dispneia por causa da vida sedentária que levam e podem se queixar de fadiga ou alterações
no estado mental. As comorbidades e as múltiplas insuficiências orgânicas podem também in-
fluenciar na apresentaçãoclínica.
Tabela 1 - Diferenças entre IC nos idosos mais jovens e com mais de 75 anos
A IC-pFE é quase exclusivamente uma doença de idosos, particularmente mulheres idosas. Nes-
sas pacientes quase 90% dos novos casos de IC são do tipo com fraçãodeejeção normal.
84
A fisiopatologia da IC-pFE ainda não é bem compreendida e não há estudos demonstrando bene-
fício com tratamentos específicos. O envelhecimento normal é associado com muitas das mes-
mas alterações que ocorrem nos pacientes com IC-pFE, incluindo disfunção diastólica, redução
da reserva sistólica e diastólica, enrijecimento vascular e incompetência cronotrópica. Nas pes-
soas com IC-pFe pode ser que esse processo de senescência do coração seja acelerado, especial-
mente nas mulheres obesas.
Até 70-80% dos pacientes com IC-pFE têm hipertensão pulmonar (aumento da pressão hidrostá-
tica do leito vascular pulmonar), que está associada a pior prognóstico, aumento da mortalidade
e das reinternações hospitalares. A redução das pressões pulmonares com o uso de diuréticos
reduz as hospitalizações desses pacientes. A disfunção de ventrículo direito (VD) ocorre em 20-
35% dos casos e também é um marcador de morbimortalidade. A fibrilação atrial é mais comum
nos pacientes com IC-pFE (até 2/3 dos pacientes) e está associada à redução da capacidade de
exercício,disfunção de VD e pior prognóstico clínico.
Além da IC–pFE há outras causas de IC com fração de ejeção normal: doenças valvares, doença
pericárdica, amiloidose cardíaca, cardiomiopatia hipertrófica, cardiomiopatia restritiva e IC de
alto débito.
Pelo fato da disfunção diastólica geralmente ser acompanhada por uma cavidade ventricular es-
Capítulo 6 85
querda pequena e pouco complacente, é comum que uma redução da pré-carga provoque redu-
ção do enchimento do ventrículo esquerdo, com queda do débito cardíaco e hipotensão. Por isso,
diuréticos e venodilatadores como nitratos devem ser administrados com cautela. Os exercícios
físicos e a reabilitação cardiovascular constituem-se nas únicas intervenções que mostraram
uma consistente melhora nacapacidade funcional e na qualidade de v ida desses pacientes.
Já para pacientes com IC com FE reduzida, o objetivo do tratamento será reduzir a morbidade
(reduzir os sintomas, melhorar a qualidade de vida, o status funcional,reduzir as hospitalizações)
ereduziramortalidade. As intervenções se resumem a:
b) Mudar o estilo de vida: parar de fumar, restringir consumo de álcool, cessar o uso de
drogas ilícitas, restringir sal, tratar a obesidade e monitorizar o peso diariamente para de-
tectar acúmulo de fluidos. A restrição de sal é recomendada, embora não existam estudos
demonstrando qualquer nível específico de ingesta de sódio como meta. A opinião de es-
pecialistas recomenda restrição de sódio em 2-3g ao dia nos pacientes com IC sintomática.
Também é orientada a restrição hídrica de 1,5-2L ao dia, especialmente nos pacientes com
hiponatremia. Cessar as drogas e suplementos que possam piorar a IC: anti-inflamatórios
não hormonais, esteroides, antiarrítmicos, bloqueadores de canal de cálcio, tiazolidine-
dionas. Vacinar contra pneumococos e anualmente contra influenza;
e) Reabilitar o aparelho cardiovascular – para pacientes com classe funcional II a III que não
têm arritmias graves e que não têm outras limitações aos exercícios, os benefícios já são
aparentes após 3 semanas do treinamento. Ainda não há estudos que recomendem a rea-
bilitação para os pacientes com IC avançada.
86
Tabela 2 - Tratamento da IC-rFE
DROGA INDICAÇÕES
Diuréticos (1A) Se houver sobrecarga de volume.
Se não tolera IECA por razões outras do que insuficiência renal e
IECA (1A)
hipercalemia: trocar por BRA (1B).
Betabloqueadores (1A) Carvedilol, succinato de metoprolol ou bisoprolol.
Sacubitril-valsartan (2B) IC leve a moderada estável FE<40%, BNP elevado ou hospitalização
por IC nos últimos 12 meses, PAS maior ou igual a 100mmHg, ritmo de
(risco ainda alto e filtração glomerular maior ou igual a 30, que tem tolerado altas doses de
experiência limitada IECA ou BRA equivalente a 10mg 2x dia de enalapril por maior ou igual a
ao estudo clínico que o 4 semanas, usar o sacubitril-valsartan no lugar do IECA (suspender IECA
revelou) antes do início dessa droga).
IC crônica com FE menor ou igual a 35%, ritmo sinusal com FC de repouso
Ivabradina (2B) maior ou igual a 70, na dose máxima tolerada de betabloqueador ou com
contraindicação a betabloqueador.
Para paciente com boa função renal e que pode monitorizar função renal
e potássio:
Antagonista de receptor
a) IC classe funcional III ou mais e FE menor ou igual a 30%;
de mineralocorticoide
–espironolactona,
b) IC CF II ou mais e FE < 35%;
eplerenone (1A)
c) Pós-infarto, já em uso de iECA dose terapêutica e FE < 40% e IC
sintomática ou diabetes.
a) Pacientes negros com IC persistente com sintomas moderados a
graves, FE < 40% , apesar do uso de IECA ou BRA, antagonista de
aldosterona (se indicado) e diuréticos ( 1A);
Capítulo 6 87
a) Ritmo sinusal, FE ≤ 35%, bloqueio de ramo esquerdo (BRE) e QRS
≥ 150ms com CF III ou IV apesar do tratamento otimizado (1A) e
CF II apesar da terapia medicamentosa otimizada (1B);
f) FE≤50%, CF I ou mais e BAVT que implantarão marcapasso (2B).
Fonte: ACCF/AHA guideline for the management of heart failure: executive summary: a report of the American College of
Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force on practice guidelines. 2013
Fonte: ACCF/AHA guideline for the management of heart failure: executive summary: a report of the American Colle-
ge of Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force on practice, 2013
88
A cada visita médica é necessário avaliar a capacidade para as atividades cotidianas, o estado
volêmico, o peso, tabagismo, alcoolismo, uso de tratamentos alternativos, dieta e restrição de
sal. Se o paciente apresenta mudança do estado clínico ou recidiva dos sintomas, reavaliar o eco-
cardiograma para analisar o remodelamento e a fração de ejeção. O BNP também é útil como g uia
do tratamento crônico (tem valor prognóstico).
A presença de doença renovascular deve ser considerada nos pacientes com IC e hipertensão, es-
pecialmente com IC devido a doença cardíaca isquêmica. Descompensações recorrentes e inex-
plicadas de IC e/ou edema agudo flash (de início súbito) ocorrem nesses pacientes, em geral com
fração de ejeção normal ou quase normal. Eles necessitarão de tratamento anti-hipertensivo e
muitas vezes de revascularização da artéria renal.
A doença coronária é uma causa importante de IC (por infarto prévio ou isquemia atual). A re-
vascularização deve ser considerada, especialmente nos pacientes com flash edema agudo e re-
petidas descompensações.
A doença valvar pode também ser causa de IC. São frequentes as in-
suficiências mitral e tricúspide em pacientes com miocardiopatia dilatada de outras etiologias. A
doença valvar impõe sobrecarga hemodinâmica aos ventrículos, piorando a função ventricular.
A sobrevida da IC piora com a idade e geralmente é maior nas mulheres que nos homens. Tam-
bém é dependente da etiologia: é menor na amiloidose, hemocromatose, HIV e toxicidade por
doxorrubicina. As duas principais causas de óbito na IC são a morte súbita (arritmogência) e a
morte por progressão da insuficiência cardíaca.
Fonte:ACCF/AHA guideline for the management of heart failure: executive summary: a report of the American College
of Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force on practice, 2013
Capítulo 6 89
Devemos considerar ainda que os pacientes com mais de 75 anos são sub-representados nos es-
tudos clínicos e não dispomos ainda de evidências científicas demonstrando qual o tratamento
ideal para esse grupo de pacientes.
A nossa paciente repetiu o ecocardiograma e confirmou a suspeita clínica de IC-pFE. Como estava
em acompanhamento médico, mantendo a pressão arterial sob controle, era improvável que a causa
da IC fosse hipertensiva. Optou-se por investigar insuficiência coronária
crônicacomofator causal.
A prevalência da DAC aumenta com o envelhecimento, é maior nos homens do que nas mulheres
e, em média, tende a manifestar-se 10 anos mais tarde nas mulheres. Isto ocorre, pelo menos em
parte, devido aos efeitos protetores do estrogênio, conforme evidenciado pelo acentuado aumen-
to de DAC nas mulheres pós-menopausa.
Se a isquemia for transitória, a disfunção pode durar pouco tempo. Uma isquemia mais prolon-
gada pode produzir um atordoamento ou a uma hibernação do miocárdio, ou até um infarto do
miocárdio. O atordoamento miocárdico refere-se a um período prolongado (horas a dias) de dis-
função miocárdica reversível após um evento isquêmico. A hibernação ocorre no caso de uma is-
quemia crônica, presumivelmente quando a liberação de oxigênio é adequada para manutenção
da viabilidade miocárdica, mas inadequada para manter a função normal. A importância clínica
desse conceito é que o restabelecimento do fluxo sanguíneo para o miocárdio envolvido pode
resultar em melhora na função ventricular.
90
Tabela 5 - Fatores de risco para o desenvolvimento de aterosclerose
Capítulo 6 91
Doença renal crônica: alguns pacientes sem doença arterial coronária têm um risco de eventos car-
diovasculares subsequentes, que é equivalente ao risco dos pacientes com DAC estabelecida e esses
pacientes são: a) os portadores de doença arterial aterosclerótica não coronariana; b) os pacientes
diabéticos; c) os pacientes com doença renal crônica. Esses 3 grupos são considerados equivalentes
de risco e devem ser manejados de forma agressiva para a prevenção de eventos. Microalbuminúria
reflete dano vascular e parece ser um marcador de dano arterial inicial,
podendoser considerado
um marcador de risco cardiovascular.
Lipoproteína a é idêntica à LDL com uma molécula apo a igual, tem homologia estrutural com
o plasminogênio e parece interferir com a geração de plasmina, predispondo às complicações
trombóticas da aterosclerose; aumento da apolipoproteína CIII e LDL pequeno e denso e diferen-
tes genótipos de apolipoproteína E também influenciam o risco de aterogênese. Homocisteína em
níveis elevados tem associação com maior risco de DAC, doença arterial cerebral e doença vascular
periférica, provavelmente por lesão endotelial e por maior propensão à trombose. Tratamos com
suplementação de folato, porém ainda não se sabe qual o efeito do tratamento da hiper-ho-
mocisteinemia e da lipoproteína a sobre a incidência de eventos cardiovasculares; níveis elevados
de fibrinogênio e atividade fibrinolítica diminuída (inibidor doativador do plasminogênio elevado)
também parecem ter associação com a aterogênese.
O grau de c alcificação coronariana, determinado pela tomografia de coronáriasrelaciona-se com a
presença e com a gravidade da DAC. O nível de proteína C reativa (ultrassensível),um marcador de
inflamação sistêmica se correlaciona com a presença e extensão da DAC, podendo refletir o grau de
inflamação e instabilidade das placas. Interleucina 6 e IL6-R também têm direta relação com DCV.
Níveis elevados de m ieloperoxidase que é secretada pelos leucócitos na inflamação agudaepro-
move oxidação das lipoproteínas, se correlaciona com DAC. A utilidade potencial na prática clínica
atual desses marcadores é na identificação de indivíduos assintomáticos considerados de risco
intermediário pelos escores de avaliação de risco e que necessitarão de modificaçãomais agressiva
dos fatores de risco.
Nas artérias que gradualmente desenvolvem estenose, colaterais suficientes podem se desen-
volver para prevenir lesões miocárdicas irreversíveis, mesmo com o desenvolvimentode uma
oclusão coronariana.
O espectro clínico da DAC varia desde a isquemia silenciosa (doença assintomática), passando
pela angina crônica estável, angina instável, infarto agudo do miocárdio,cardiomiopatiaisquê-
mica e morte súbita cardíaca.
A angina é uma síndrome clínica caracterizada por dor em quaisquer das seguintes regiões: tó-
rax, epigástrio, mandíbula, ombro, dorso ou membros superiores. Muitos não conseguem relatar
uma dor verdadeira e sim um desconforto. É tipicamente desencadeada ou agravada com a ati-
vidade física, estresse emocional, exposição ao ar frio ou após alimentação copiosa e é atenuada
com uso de nitroglicerina e repouso. Podeestar associada à dispneia, sudorese, náuseas ou pal-
pitações.
A maioria dos pacientes pode identificar um nível de esforço que reproduzirá o desconforto,
como subir um lance de escadas ou uma ladeira. Tal angina associada ao esforço em geral apare-
ce gradualmente, dura menos que 15 minutos e resolve-se rapidamente com o repouso ou com a
nitroglicerina (em cerca de 1min após o uso).
92
Chamamos de angina estável (AE) quando os sintomas, devido à isquemia, se apresentam de
forma inalterada há pelo menos dois meses. Pode ser a primeira manifestação de DAC, ou surgir
após IAM ou angina instável (AI). É uma das principais manifestações clínicas entre os idosos.
Apesar de sua alta prevalência, existe certa dificuldade em seu diagnóstico, possivelmente de-
vido à diferença nas manifestações clínicas da DAC nos idosos. A angina típica de esforço ocorre
em apenas metade dos pacientes idosos. Pode ser menos intensa, ou não ocorrer, devido à ativi-
dade física limitada. Pode ainda manifestar-se sob a forma de “equivalentes anginosos”, sendo
mais frequente a dispneia, o edema agudo pulmonar, as arritmias cardíacas (palpitação e sínco-
pe) ou forma silenciosa, manifesta como isquemia silenciosa, IAM ou morte súbita. Além disso
a manifestação atípica é comum, como dor nos ombros ou nas costas, dor na região epigástrica,
dor pós-prandial ou noturna (sugerindo hérnia de hiato ou refluxo esofagiano). A dor pode se
confundir com sintomas de espasmo do esôfago, úlcera péptica, colelitíase, distúrbios neuro-
músculo esqueléticos e ansiedade.
Embora a aterosclerose seja responsável pela maioria dos casos de angina, deve ser considerada
também a isquemia miocárdica na ausência de obstrução coronariana significante. Geralmente,
são doenças que causam isquemia miocárdica, por aumentarem o consumo ou por diminuírem a
ofertade oxigênio
para
omiocárdio. Os exemplos mais comuns são as drogas estimulantes como
anfetaminas, o hipertireoidismo, a hipertermia, as taquiarritmias e a HAS não controlada. Algu-
mas condições reduzem a oferta de oxigênio para o miocárdio e podem precipitar angina, como
a hipotensão arterial, a hipoxemia e a hiperviscosidade sanguínea, como ocorre nas leucemias
e no mieloma múltiplo. A cardiomiopatia hipertrófica, a hipertensão arterial não controlada e a
estenose aórtica podem causar angina por aumento da tensão na parede do miocárdio (aumento
do consumo e redução da oferta de oxigênio).
Todo paciente com suspeita de AE deve ser submetido a um eletrocardiograma (ECG) de repouso.
Em cerca de 50% dos casos, entretanto, o exame é normal e não exclui a existência de obstrução
coronariana.As ondas Q patológicas, por outro lado, sugerem um infarto prévio e são bastante
específicas de DAC. O ECG pode ser útil também quando realizado durante episódios de angina,
ao identificar depressão do segmento ST, inversão de T ou pseudonormalização de alterações
prévias do ST-T, achados que ocorrem em aproximadamente 50% dos casos.
Para pacientes cuja etiologia da dor torácica não é clara ou há suspeita clínica de equivalente
isquêmico, o teste ergométrico (TE) ou teste com estresse farmacológico (cintilografia ou eco-
cardiograma com estresse) é o melhor exame, podendo esclarecer o diagnóstico, seja pela re-
produção dos sintomas anginosos seja por demonstração de evidências objetivas de isquemia:
alterações típicas no eletrocardiograma, alterações de perfusão miocárdica ou da mobilidade da
parede ventricular.
O TE (Figura 1) não deve ser realizado nos pacientes com angina instável e outras síndromes
Capítulo 6 93
coronárias agudas. O nível de tolerância ao esforço, o comportamento da pressão arterial e a
resposta da frequência cardíaca são parâmetros importantes na avaliaçãohemodinâmica, assim
como a elevação ou depressão do segmento ST.
Para os pacientes capazes de deambular, o TE de rotina em esteira é o teste ideal e fornece muito
mais informações fisiológicas do que o teste com estresse farmacológico.
Nos pacientes que não deambulam, nos que têm capacidade muito limitada para o exercício e
naqueles com anormalidades basais no seu ECG (alterações inespecíficas de repolarização, hi-
pertrofia ventricular esquerda, bloqueio de ramo esquerdo, alterações no ECG por uso de digital
ou uso de marcapasso), utilizamos o teste com estresse farmacológico, com dobutamina, adeno-
sina ou dipiridamol. Estes são capazes de fornecer informações diagnósticas similares ao teste
ergométrico, porém não nos darão informações sobre a capacidade de exercício ou a resposta
hemodinâmica ao exercício.
Nos pacientes idosos, a indicação do estresse farmacológico pode ser a única opção, devido à in-
capacidade de realizar o exercício. A sensibilidade e especificidade do exame para a detecção de
lesões significativas encontra-se diretamente relacionada à probabilidade pré-teste do paciente.
Nos diversos estudos que avaliam a acurácia do ecocardiograma com estresse farmacológico, por
exemplo, foram encontrados valores médios de sensibilidade de 88% e especificidade de 83%
para estenose coronária acima de 50%. De qualquer forma, independentemente do método de
imagem utilizado ou do agente estressor, um exame negativo para detecção de isquemia confere
ao paciente um excelente prognóstico, com um risco de morte de 0,4%-0,9% ao ano.
A angiotomografia de coronárias também tem sido utilizada para a detecção de DAC e a ausência
de calcificação correlaciona-se fortemente com a ausência de aterosclerose coronária significati-
va. Apesar de não ser um teste funcional, mas anatômico, no caso de idosos, as dificuldades de
realização de esforço físico podem dificultar a execução de testes indutores de isquemia. Neste
sentido, a angiotomografia tem importância crescente nesta população. Por outro lado, a calci-
ficação coronária que acompanha o processo de envelhecimento dificulta a visualização da luz
vascular, diminuindo a sensibilidade e especificidade do método. O exame possui um elevado
poder preditivo negativo e fornece informações adicionais em caso de discordância entre outros
exames não invasivos. A principal limitação é a necessidade do uso de contraste iodado, que
pode acarretar agravamento de função renal.
94
Figura 1- O Teste Ergométrico (TE) positivo para isquemia: as variáveis mais preditivas relacionadas ao diagnóstico de
obstrução coronariana são depressão do segmento ST ≥ 1 mm (medido a 0,80 segundo do ponto J) ,com configuração
horizontal ou descendente e a presença da dor anginosa.
Figura 2 – Cineangiocoronariografia
Fonte: www.hemodinamica.com.br/artigo03.htm
Os dois mais importantes preditores de sobrevida na DAC crônica são a função ventriculare a
extensão do miocárdio sob risco de isquemia.
Capítulo 6 95
Nos pacientes com DAC capazes de ultrapassar o terceiro estágio do Protocolo de Bruce, no teste
ergométrico, a taxa de mortalidade anual é ao redor de 1%, em contraste com aqueles incapazes
de ultrapassar os 5 METs, cuja mortalidade anual gira emtorno de5%.
Os marcadores de pior prognóstico com o teste ergométrico são:
c) Alterações isquêmicas que persistem por mais que 5 minutos após o término do exercício;
A ecocardiografia também pode servir na avaliação da viabilidade miocárdica, já que, nos pa-
cientes com DAC, a função contrátil miocárdica pode estar deprimida, devido à necrose miocár-
dica ou como resultado do miocárdio hibernado. Assim, nos pacientes com doença multiarterial
e função ventricular esquerda deprimida, a melhora da contração miocárdica segmentar durante
baixas doses de dobutamina é considerada indicativa de reserva contrátil, sendo preditora de
melhora da função ventricular após cirurgia de revascularização miocárdica. A cintilografia e a
ressonância magnética também podem ser usadas na distinção entre o miocárdio hibernado e o
necrótico.
A angiografia coronária, nos pacientes com angina, deve ser realizada quando se deseja definir
a anatomia coronariana para programar a revascularização (por angioplastia ou cirúrgica). Os
pacientes que apresentam melhor prognóstico com a revascularização, em comparação com a
terapia medicamentosa isolada são os que:
96
• Têm sintomas
refratáriosàmedicação;
• Não toleram
a
medicação por
efeitoscolaterais;
• Têm marcadores de mau prognóstico pelas características clínicas ou pelo resultado dos
testes realizados;
• Têm sinais
esintomasde insuficiência
cardíaca;
Modificação dos fatores de risco: controle da HAS, DM, DLP, cessação do tabagismo, obtenção de
um peso ideal.
Mudança do estilo de vida: a atividade física regular a um nível que seja tolerável deve ser enco-
rajada. Não são recomendáveis os exercícios isométricos, como o levantamento de peso e ativida-
des de alta intensidade, especialmente no frio, como esquiar ou retirar neve com uma pá. Porém,
muitos pacientes com angina estável podem realizar atividades vigorosas, inclusive um exercício
moderado durante o trabalho. A terapia de reposição estrogênica não reduz risco de eventos CV
nas mulheres após a menopausa e não deve ser prescrita como terapia para prevenção primária ou
secundária de DAC.
Corrigir doenças que podem precipitar ou piorar a angina: como hipertireoidismo, anemia, DPOC.
Tratamento farmacológico: baseia-se ou na melhora do fluxo sanguíneo coronariano (aumento do
suprimento) ou na redução no consumo miocárdio de oxigênio (redução da demanda) e na terapia
antiplaquetária.
-Aspirina: 81 a 325mg (clopidogrel 75mg para os alérgicos à AAS) - reduz a taxa de IAM e a mortalida-
de nos pacientes com angina ou IAM prévio. Os únicos medicamentos que reduzem a mortalidade
nos pacientes com angina são os antiplaquetários e a estatina.
-Estatina: para atingir meta de LDL ≤100mg/dL no idoso de alto risco (identificado pela presença de
múltiplos fatores de risco) ; ou LDL ≤ 70mg/dL no idoso de risco muito alto (ex.: evento coronário
prévio).
Capítulo 6 97
-Nitratos: para controle de sintomas - promove dilatação das arteríolas, queda da resistência vascu-
lar sistêmica, queda da pós-carga e venodilatação. Efeitos colaterais: cefaleia e hipotensão postural.
O uso crônico resulta em tolerância, efeito que pode ser minimizado com um período diário livre de
nitratos. Não pode ser usado nos pacientes que fazem uso dos inibidores da fosfodiesterase.
-Betabloqueadores: para controle de sintomas - reduz mortalidade no pós-infarto e no paciente
com IC. Reduzem a demanda miocárdica de oxigênio por redução da frequência cardíaca, na pres-
são arterial e na contractibilidade. Efeitos colaterais: bradicardia/bloqueio atrioventricular, hipo-
tensão, disfunção sexual, broncoespasmo, fadiga, depressão e pesadelos.
-Bloqueadores de canais de cálcio: para controle de sintomas. Ação: redução da FC, da contractibi-
lidade e vasodilatação periférica. Diminui a demanda miocárdica de oxigênio.
-Trimetazidina: é uma substância com efeitos metabólicos e anti-isquêmicos, sem qualquer efei-
to na hemodinâmica cardiovascular. Seus benefícios têm sido atribuídos à preservação dos níveis
intracelulares de ATP e da fosfocreatina. A administração desse agente não modifica a frequência
cardíaca e a pressão arterial durante o repouso ou esforço físico.
-Ivabradina: é um inibidor específico da corrente I f no nó sinusal (X). Como resultado, trata-se de
uma droga exclusivamente redutora da frequência cardíaca, sem afetar os níveis pressóricos, a con-
tratilidade miocárdica, a condução intracardíaca e a repolarização ventricular.
-Ranolazina: bloqueador de canal de sódio. Atua reduzindo a sobrecarga de cálcio no miócito, redu-
zindo a tensão diastólica e o consumo de oxigênio. Pode ser adicionado aos antianginosos clássicos,
reduz sintomas anginosos e melhora a tolerância aos exercícios. Pode ser um substituto para os
betabloqueadores, se o paciente não tolera o betabloqueador ou tem contraindicações para o seu
uso. Não está disponível para uso no Brasil.
Fonte: Task Force Members, MONTALESCOT, G.; SECHTEM, U. et al. 2013 ESC guidelines on the management of stable
coronary artery disease: The Task Force on the management of stable coronary artery disease of theEuropeanSociety
of Cardiology. European Heart Journal. 2013;34:2949
Para o controle dos sintomas, em geral preferimos os betabloqueadores como terapia inicial na
ausência de contraindicações. Associamos nitrato oral de longa duração para pacientes cuja an-
gina não é controlada com betabloqueador. Utilizamos diltiazem ou verapamil para pacientes
com AE que não podem utilizar betabloqueador. Um bloqueador de cálcio diidropiridínico de
ação prolongada pode ser introduzido quando a monoterapia com betabloqueador não é suficien-
te para controlar a angina.
Os idosos podem apresentar mais efeitos colaterais com as medicações anti-isquêmicas, como
hipotensão com nitratos e bloqueadores de canais de cálcio e efeitos no sistema nervoso cen-
tral em decorrência dos betabloqueadores. Habitualmente são usadas doses menores que são
aumentadas de forma lenta de acordo com sua tolerabilidade.
O único ensaio clínico randomizado realizado em idosos com AE, o estudo TIME, demonstrou
os benefícios advindos da angioplastia percutânea, em comparação com tratamento clínico con-
servador otimizado. Em 6 meses de evolução, os pacientes da estratégia invasiva, 72% dos quais
tratados por meio de angioplastia, apresentaram reduções significativas de angina, número de
98
medicamentos antianginosos utilizados, re-hospitalizações e necessidade de procedimentos
adicionais de revascularização. Após 4 anos de evolução clínica tardia, verificou-se que a sobre-
vida foi similar para ambas as estratégias (70,6% versus 73%). Os pacientes da estratégia invasi-
va, porém, apresentaram sobrevida livre de eventos cardíacos maiores significativamente menor
(39% versus 20%).
No que se refere à anatomia coronária, a revascularização, seja cirúrgica ou por angioplastia, de-
verá ser solicitada preferencialmente para pacientes com lesão de tronco de coronária esquerda,
lesões triarteriais (particularmente quando a fração de ejeção for menor que 40%) e pacientes
biarteriais com estenose maior de 75% na descendente anterior proximal. Nesses pacientes, a
revascularização reduz o risco de morte e complicações. Também recomenda-se a revasculari-
zação nos pacientes com grande área de miocárdio sob isquemia (> 10%) e naqueles com lesão
proximal de descendente anterior (>50%).
Para a paciente em questão, que tinha um ECG de repouso com ritmo sinusal e não apresentava
alterações de repolarização que dificultassem a interpretação do segmento ST, o TE foi solicitado.
A paciente, entretanto, não conseguiu prosseguir no teste por cansaço e não atingiu o mínimo de
85% da frequência cardíaca máxima (220-idade). Solicitamos então uma cintilografia miocárdica
com estresse farmacológico com dipiridamol. O resultado foi a ausência de hipoperfusão miocárdi-
ca tanto no repouso quanto no estresse e boa função ventricular, sugerindo ser improvável a origem
isquêmica da IC-pFE. Um novo ecocardiograma mostrou aumento do átrio esquerdo, em relação ao
exame prévio. A paciente continuava apresentando episódios de palpitações. Solicitamos um Holter
de 24h à procura de arritmias.
Antes que fizesse o Holter, apresentou episódio de palpitações mais persistentes e necessitou procu-
rar o Pronto-Socorro novamente. Foi feito o EGG representado abaixo, com diagnóstico de fibrilação
atrial de alta resposta ventricular. As enzimas cardíacas foram negativas. A frequência cardíaca
foi controlada com betabloqueado. Recebeu alta e foi sugerido o início de anticoagulação oral com
rivaroxabana no seguimento ambulatorial.
Fonte: goo.gl/jxtfdN
Capítulo 6 99
4. Arritmias nos idosos
As alterações miocárdicas estruturais e funcionais que ocorrem com o envelhecimento contri-
buem para o aparecimento de arritmias nos idosos. Além disso, como as arritmias são mais pre-
valentes nos portadores de doença cardíaca estrutural e os idosos com mais frequência apresen-
tam condições como hipertensão arterial, diabetes, insuficiência cardíaca e coronariopatia, elas
são frequentemente encontradas na prática clínicaentre ospacientes idosos.
A fibrilação atrial (FA) é a arritmia cardíaca mais comum. Sua incidência e prevalência estão
aumentando no mundo todo e se associam a maior risco de morte, insuficiência cardíaca, hos-
pitalização e eventos tromboembólicos. A prevalência da FA chega a 9% dos idosos com mais
de 80 a nos.
A FA em geral é associada com alguma doença estrutural cardíaca: aumento do átrio esquer-
do, elevação da pressão atrial esquerda ou infiltração/inflamação dos átrios. As doenças cardía-
cas mais comumente associadas à FA são cardiopatia hipertensiva, doença cardíaca coronária e
doenças valvares. Frequentemente FA coexiste com IC, e uma condição pode agravar a outra. O
fator desencadeante no idoso pode ser ainda o hipertireoidismo, a embolia pulmonar, o pós-ope-
ratório (especialmente de cirurgia cardíaca) e as doenças pulmonares.
A perda da contração atrial organizada e regular, assim como o subsequente aumento da fre-
quência cardíaca pode resultar em comprometimento hemodinâmico, com progressiva disfun-
ção atrial e ventricularesquerdas.
Nem todos os pacientes com FA terão sintomas, mas os pacientes podem apresentar palpitações,
taquicardia, fadiga, redução da tolerância aos esforços, tontura, aumento da diurese e dispneia.
Pode ainda ocorrer descompensação da insuficiência cardíaca, síncope e exacerbação de episó-
dios anginosos. A primeira manifestação pode ser um fenômeno
embólico.
Os sintomas associados a FA de início recente são em geral relacionados à alta frequência ventri-
cular, como ocorreu com a paciente descrita no caso clínico.
100
Tabela 7 - Tipos de apresentação da fibrilação atrial
Fonte: JANUARY, C.T. et al. 2014 AHA/ACC/HRS guideline for the management of patients with atrial fibrillation exe-
cutive summary a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on practice
guidelines and the Heart Rhythm Society.Circulation. 2014;130:2071
Todos os pacientes cujo risco de embolização excede o risco de sangramento são candidatos à an-
ticoagulação por toda a vida. A anticoagulação com warfarin, dabigatran, rivaroxaban ou apixa-
ban reduz o risco de embolização sistêmica em 70%. O risco de sangramento e a quantificação do
benefício dessa intervenção deve ser avaliado pelo cálculo do escore CHA2DS2-VASc (Tabela 8)
e pelo escore de risco de sangramento HAS-BLED (Tabela 8). Para pacientes com CHA2DS2-VASc
maior ou igual a 2, a anticoagulação é recomendada. Para pacientes entre 65 e 74 anos, do sexo
masculino, muitos autores recomendam também a anticoagulação quando o CHA2DS2-VASc é de
1. Para pacientes com CHA2DS2-VASc de 0 e sexo feminino com escore de 1, não há necessidade
da anticoagulação.
Tabela 8 - CHAD2DS2VASC
ESCORE
CHA2DS2-VASC
(escore máxcimo = 9)
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA 1
HIPERTENSÃO 1
IDADE MAIOR OU IGUAL A 75 ANOS 2
DIABETES MELITUS 1
ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL PRÉVIO OU ACIDENTE
2
ISQUÊMICO TRANSITÓRIO
IDADE ENTRE 65-74 ANOS 1
SEXO FEMININO 1
DOENÇA VASCULAR ARTERIAL (INFARTO PRÉVIO, DOENÇA
1
ARTERIAL PERIFÉRICA OU DOENÇA/PLACA NA AORTA)
Capítulo 6 101
RISCO DE EVENTO
ESCORE CHA2DS2-VASC
EMBÓLICO (%/ANO)
0 0,2%
1 0,6%
2 2,2%
3 3,2%
4 4,8%
5 7,2%
6 9,7%
7 11,2%
8 10,8%
9 12,2%
Fonte: JANUARY, C.T. et al. 2014 AHA/ACC/HRS guideline for the management of patients with atrial fibrillation exe-
cutive summary a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on practice
guidelines and the Heart Rhythm Society.Circulation. 2014;130:2071
Tabela 9 - HAS-BLED
Pontos (máx. 9
Letra Característica clínica
pontos)
H HAS (>160 PAS) não controlada 1
ALTERAÇÃO NA FUNÇÃO RENAL E HEPÁTICA (1
A 1 ou 2
ponto para cada)
S ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL 1
B PREDISPOSIÇÃO OU TENDÊNCIA À SANGRAMENTO 1
L LÁBIL INR (para pacientes em uso de warfarin) 1
E IDADE > 65 ANOS 1
DROGA CONCOMITANTE
D (ASPIRINA OU AINH* OU ABUSO DE ÁLCOOL, 1 1 ou 2
PONTO PARA CADA)
Escore
HAS Sangramento por 100 pacientes por ano
BLED
0 1,13
1 1,02
2 1,88
3 3,74
4 8,70
5 A 9 Dados insuficientes
Fonte: JANUARY, C.T. et al. 2014 AHA/ACC/HRS guideline for the management of patients with atrial fibrillation exe-
cutive summary a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on practice
guidelines and the Heart Rhythm Society.Circulation. 2014;130:2071
102
Tanto o H AS-BLED como outros escores que estimam risco de sangramento nos fornecem uma
estimativa imprecisa do risco individual do paciente, já que eles foram derivados de estudos
que incluíram sangramentos de diferentes níveis de gravidade. Enquanto alguns sangramentos
podem provocar incapacidade e morte, como o sangramento no sistema nervoso central (SNC),
outros não geram repercussões importantes. Muitos estudos observacionais e randomizados re-
gistraram um risco de 0,2-0,4% ao ano para sangramento no SNC com o uso de warfarin. O risco
é significativamente maior quando há trombocitopenia ou outros distúrbios de coagulação com
sangramento prévio, sangramento ativo ou cirurgia recente com risco de sangramento, sangra-
mento prévio grave, incluindo no SNC quando em uso de anticoagulante, suspeita de dissecção
de aorta, hipertensão maligna e uso combinado de anticoagulante e antiplaquetários.
Para FA não valvar recomenda-se a escolha de um inibidor direto da trombina ou inibidor do fa-
tor Xa em detrimento do warfarin. Não há evidências de que um anticoagulante não antagonista
da vitamina K seja superior ao outro (não há estudos comparativos entre os novos anticoagulan-
tes). A warfarina deve ser reservada para:
a) Pacientes que já estão em uso e que estão adaptados ao controle periódico de TP (manten-
do INR entre 2 e 3 em pelo menos 65% das medidas em um ano);
e) Pacientes portadores de valvas protéticas, doença valvar mitral reumática, estenose mitral
de qualquer origem ou outras lesões valvares cursando com insuficiência cardíaca mode-
rada a grave e que podem necessitarde troca
valvarno futuro.
As estratégias de controle de ritmo (reversão para ritmo sinusal) e controle de frequência ventri-
cular são similares em termos de mortalidade, morbidade, taxa de eventos embólicos. O controle
de frequência pode ser feito utilizando-se drogas que bloqueiam o nó atrioventricular (betablo-
queador, bloqueador de canal de cálcio e digoxina). Nos casos refratários a essas drogas, existe a
opção de colocação de um marcapasso ventricular e ablaçãodo nó
atrioventricular.
Para pacientes acima de 65 anos portadores de FA e assintomáticos ou com sintomas leves, a re-
comendação prioritária é a do controle de frequência cardíaca (FC). Devemos manter a FC abaixo
de 85bpm para pacientes sintomáticos e abaixo de 110bpm para assintomáticos. O fundamental
é o alívio dos sintomas (com o controle da frequência cardíaca) e a prevenção de eventos embóli-
cos (pela anticoagulação), ao invés da tentativa da manutenção do ritmo sinusal, estratégia cujo
benefício clínico não está demonstrado até o momento.
Para a paciente em discussão, foi introduzido anticoagulação com um anticoagulante de ação di-
reta e controlada a frequência da FA com betabloqueador. Na consulta ambulatorial, solicitamos a
Capítulo 6 103
suspensão do AAS, uma vez que a associação com warfarin aumenta o risco de sangramento. Solici-
tamos ainda um Holter de 24h para avaliar a eficácia do controle do ritmo, além de monitoramento
da função renal e do hematócrito (por causa do anticoagulante).
Também podemos avaliar o controle da frequência cardíaca pelo do teste de caminhada de 6 mi-
nutos (exercício moderado) ou pelo teste ergométrico, para de forma mais completa determinar-
mos a frequência ventricular no repouso e nos esforços físicos. A frequência cardíaca persisten-
temente elevada tem sido associada com o desenvolvimentodeuma taquicardiomiocardiopatia.
É preciso orientar o paciente e sua família para o risco de sangramento aumentado quando em
uso de anticoagulação, como em quadros infecciosos e condiçõesquecursam comdesidratação
e/ou hipovolemia.
O BAV de primeiro grau é definido quando o intervalo PR é maior ou igual a 200ms (é um atraso
para o impulso atrial atingir os ventrículos) e em geral é benigno e não provoca sintomas. No
BAV de segundo grau, alguns impulsos atriais não atingem os ventrículos. No BAV de segundo
grau Mobitz tipo I, há um prolongamento progressivo no intervalo PR até que uma onda P não é
conduzida, enquanto no Mobitz tipo II, o intervalo PR não se modifica e subitamente uma onda
P não é conduzida.
Geralmente o Mobitz tipo II gera sintomas, incluindo fadiga, dispneia, dor torácica, pré-síncope
ou síncope. Esse tipo de arritmia tem natureza instável e tem risco de progressão para BAV com-
pleto, mesmo que o paciente esteja estável. Deve ser indicado o monitoramento cardíaco e, se
não houver fator causal reversível, é indicadooimplante de
marcapasso
definitivo.
104
7. Extrasístoles supraventriculares
São batimentos prematuros originados dos átrios ou da junção atrioventricular, cuja prevalência
aumenta com a idade, e é um achado frequente do exame de Holter de 24h. Na maioria das vezes
são assintomáticos, mas podem causar sensação de palpitação.
Uma vez identificadas, devemos avaliar se há ou não doença cardíaca estrutural. Não é necessá-
rio tratamento específico e devemos esclarecer o paciente que trata-se de uma arritmia benigna.
Orientamos que o paciente evite desencadeantes possíveis como cafeína, tabagismo, ingesta de
álcool e estresse emocional. Quando são sintomáticas, podemos utilizar betabloqueadores. Se as
extrassístoles desencadeiam fibrilação atrial, podemos encaminhar o paciente paraablação do
foco arritmogênico.
A maioria das EVs que ocorrem em corações normais se inicia na via de saída do ventrículo direi-
to e portanto possui a morfologia de bloqueio de ramo esquerdo. Deve ser feito, entretanto, diag-
nóstico diferencial com a displasia arritmogênica de ventrículo direito (DAVD). A DAVD é uma
doença rara, mas que deve ser suspeitada nos pacientes com história familiar de morte súbita e/
ou onda T negativa nas derivações precordiais direitas.
a) Holter de 24-48h para avaliar a frequência dessa arritmia e se são monomórficas ou po-
limórficas;
c) Teste de esforço para avaliar a resposta das extrassístoles ao esforço, sua morfologia e se
determinam o aparecimento de taquicardia ventricular sustentada (TVS) ou não sustenta-
da (TVNS). Além disso, identificar isquemias (que aumenta o risco de EV).
O tratamento das EV deve ser o da doença cardíaca subjacente encontrada (como isquemia e
hipertensão). Já o tratamento específico dependerá da presença de sintomas e doença cardíaca
Capítulo 6 105
estrutural. Não há evidências de que a supressão dessas extrassístoles com antiarrítmicos me-
lhore a sobrevida. Nos pacientes sintomáticos optamos por betabloqueadores ou bloqueador de
canal de cálcio, reservando os antiarrítmicos e a ablação por cateter para aqueles com sintomas
refratários. Dentre os antiarrítmicos, preferimos o sotalol (se não houver disfunção ventricular)
ou a amiodarona. Se houver disfunção ventricular e o paciente apresentar EV frequentes, a abla-
ção por radiofrequência é indicada.
A taquicardia ventricular sustentada é uma arritmia potencialmente fatal e deve ser tratada na
emergência. Para os pacientes que já apresentaram essa arritmia, é mandatória a investigação de
doença cardíaca estrutural e isquemia miocárdica, estando indicado o desfibrilador implantável.
O diagnóstico diferencial será o de taquicardia supraventricular com aberrância de condução,
taquicardia ventricular com pré-excitação e taquicardia supraventricular em um paciente com
marcapasso. Em casos duvidosos, o estudo eletrofisiológico poderá esclarecer o diagnóstico.
Referências
AGARWAL, V. et al. Relation Between Ventricular Premature Complexes and Incident
Heart
Failure. American Journal of Cardiology. 2017;119:1238.
BODEN, W.E. et al. Optimal medical therapy with or w ithout PCI for stable coronary disease. The
New England Journal of Medicine. 2007;356:1503-16.
BORLAUG, B.A. et al. Longitudinal changes in left ventricular stiffness:a community-based stu-
dy. Circulation. 2013; 6:944.
CHUGH, S.S. et al. Epidemiology and natural history of atrial fibrillation: clinicalimplications.
Journal of the American College of Cardiology.2001;37:371.
CONEN, D. et al. Premature atrial contractions in the general population:frequency and risk fac-
tors. Circulation. 2012;126:2302.
COODLEY, E.L. Coronary artery disease in the elderly. Postgrad Med.1990;87:223-8.
106
WEI, J.Y.; GERSH, B.J. Heart disease in the elderly. Current Problems in Cardiology.1987 12: 1.
DJOUSSÉ, L.; DRIVER, J.A.; GAZIANO, J.M. Relation between modifiable life style factors and
lifetime risk of heart failure. Journal of the American Medical Association2009;302:394.
EIKELBOOM, J.W. et al. Adverse impact of bleeding on prognosis in patients with acute coronary
syndromes. Circulation. 2006;114:774-8.
EPSTEIN, A.E. et al. ACC/AHA/HRS 2008 Guidelines for Device-Based Therapy of Cardiac Rhy-
thm Abnormalities: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association
Task Force on Practice Guidelines (Writing Committee to Revise the ACC/AHA/NASPE 2001 Gui-
deline UPdate for Implantation of Cardiac Pacemakers and Antiarrhythmia Devices): developed
in collaboration with the American Association for Thoracic SurgeryandSocietyofThoracic Sur-
geons. Circulation 2008;117:e350.
FRIBERG, L.; ROSENQVIST, M.; LIP, G.Y. Evaluation of risk stratification schemes for ischaemic
stroke and bleeding in 182678 patients with atrial fibrillation: the Swedish Atrial Fibrilation
cohort study. European Heart Journal. 2012;33:1500.
GO, A.S. et al. Prevalence of diagnosed atrial fibrillation in adults; national implications for rhy-
thm management and stroke prevention: the Anticoagulation and Risk Factors in AtrialFibrilla-
tion (ATRIA) Study. Journal of the American Medical Association. 2001;285:2370.
JANUARY, C.T. et al. 2014 AHA/ACC/HRS guideline for the management of patients with atrial
fibrillation executive summary a report of the American College of Cardiology/American Heart
Association Task Force on practice guidelines and the Heart Rhythm Society. Circulation. 2014;
130:2071.
JENSEN, P.N. et al. Incidence of and risk factors for sick sinus syndrome in the general
popula-
tion. Journal of the American College of Cardiology. 2014; 64:531.
KANNEL, W.B.; ABBOTT, R.D. Incidence and prognosis of unrecognized myocardial infarction:
an update on the Framingham study. The New England Journal of Medicine. 1984;311:1144-7.
KIRCHHOF, P. et al 2016 ESC Guidelines for the management of atrial fibrillationdeveloped in
collaboration with EACTS. European Journal of Heart Failure. 2016;37:2893.
LEVINE, H.J. Difficult problems in the diagnosis of chest pain. American Heart Journal. 1980;100:
108-18.
LIP, G.Y. Implication of the CHADS2DS2-VASC and HAS-BLED scores for thrombo prophylaxis in
atrial fibrillation. American Journal of Medicine. 2011;124:111.
MANOUKIAN, S.V. et al. Impact of major bleeding on 30-day mortality and clinical outcomes in
patients with acute coronary syndromes: an analysisfrom the ACUITYtrial. Journal of the Ame-
rican College of Cardiology. 2007; 49:1362-8.
Capítulo 6 107
MOCK, M.B. Prognosis of coronary heart disease in the elderly patient: the CASS experience. In:
VOODLEY, E.L. (ed). Geriatrich heart disease. Littleton: PSG;1983.p.358-63.
MONTALESCOT, G. et al. Task Force Members 2013. ESC guidelines on the management of stable
coronary artery disease: The Task Force on the management of stable coronary artery disease of
the European Society of Cardiology. European Heart Journal. 2013;34:2949.
NELSON, M.A. et al. Elderly patients with major bleeding or need for transfusion complicating
percutaneous coronary intervention have an increased risk of 30-day and 1-year mortality. Cir-
culation. 2006;114:II–687.
PATEL, N.J. et al. Contemporary trends of hospitalization for atrial fibrillation in the United Sta-
tes, 2000 through 2010: implications for healthcare planning. Circulation 2014; 129: 2371.
PELLIKKA, P.A. Stress echocardiography for the diagnosis of coronary artery disease: progress
towards quantification. Current Opinion in Cardiology. 2005;20:395-8.
PFISTERER, M. for the time investigators. Long-term outcome in elderly patients with chro-
nic angina managed invasively versus by optimized medical therapy. Four- year follow- up of
the randomized trial of invasive versus medical therapy in elderly patients (TIME). Circulation.
2004; 110: 1213-8.
PRIORI, S.G. et al. 2015 ESC Guidelines for the management of patients with ventricular arrhyt-
mias and the prevention of sudden cardiac death: The Task Force for the Management of Patients
with ventricular arrhythmias and the prevention of sudden cardiac death of the European So-
ciety of Cardiology (ESC). Endores by: Association for European Paediatric and CongenitalCar-
diology (AEPC). European Heart Journal. 2015; 36:2793.
SHINMURA, K. C ardiac Senescence, Heart Failure, and Frailty: A Triangle in Elderly People. The
Keio Journal of Medicine. 2016Jun25;65(2):25-32.
SOLVD Investigators, YUSUF, S. et al. Effect of enalapril on mortality and thedevelopment of
heart failure in a symptomatic patients w ith reduced left ventricular ejection fractions. The New
England Journal of Medicine. 1992;327:685.
STEINBERG, B.A. e t al. Trendsin Patients Hospitalized With Heart Failure and Preserved Left
Ventricular Ejection Fraction: Prevalence, Therapies, and Outcomes. Circulation, 126 (2012),pp.
65-75
TEIXEIRA, A. et al. Management of acute heart failure in elderly patients. Archives of Cardiovas-
cular Diseases. 2016 Jun-Jul;109(6-7):422-30.
108
AN RIET, E.E., et al. Epidemiology of heart failure: the prevalence of heart failure and ventricu-
V
lar dysfunction in older adults over time. A systematic review.European Journal of Heart Failure.
2016Mar;18(3):242-52.
VOELTZ, M.D. et al. Effect of anemia on hemorrhagic complications and mortality in patients
undergoing percutaneous coronary Intervention. American Journal of Cardiology. 2007;99:1513-7.
WINDECKER, S. et al. Revascularization versus medical treatment in patientsw ith stable coro-
nary artery disease: network meta-analysis. British Medical Journal.2014;348:g3859.
YANCY, C.W. et al. 2013 ACCF/AHA guideline for the management of heart failure: executive
summary: a report of the American College of Cardiology Foundation/American Heart Associa-
tion Task Force on practice guidelines. Circulation 2013;128:1810.
YOU, J.J. et al. Antithrombotic therapy for atrial fibrillation: Antithrombotic Therapy and Pre-
vention of Thrombosis, 9th ed: American College of Chest Physicians Evidence - Clinical Practice
Guidelines. Chest 2012;141:e531s.
Na web:
Capítulo 6 109
CAPÍTULO
Doenças do Aparelho
Digestivo do Idoso
Profa. Maria Cecília Bernardes Pereira
Doenças do Aparelho Digestivo do Idoso
Profa. Maria Cecília Bernardes Pereira
1. Caso Clínico
João, 80 anos, masculino, natural e procedente de Catanduva/SP, agricultor, católico, viúvo, re-
side sozinho, iniciou queixa de astenia há 3 meses com piora progressiva nas últimas 2 semanas.
Segundo relato do paciente, houve início de epigastralgia e hiporexia há 6 meses, pouco depois de
ter sido internado por síndrome coronariana aguda, quando foi tratado por angioplastia com colo-
cação de endoprótese em artéria coronária direita. Foi na consulta com cardiologista onde relatou
esta primeira queixa.
Medicações em uso: Metformina XR 500mg 3xdia, Losartana 50mg 12/12h, Carvedilol 3,125mg
12/12h (uso irregular por às vezes esquecer), Hidroclorotiazida 25mg 1xdia (uso irregular por
queixa de incontinência urinária), AAS 100mg 1xdia, Clopidogrel 75mg 1xdia, Sinvastatina 40mg
1xdia, Amitriptilina 25mg 1xdia, Alendronato 70 mg 1xsemana, Fórmula com Meloxican 20mg +
Ciclobenzaprina 5mg + Ginkgo Biloba 80mg + Ranitidina 150mg, além de uso por conta própria de
diclofenaco 50mg intermitente.
Devido à queixa dispéptica, o cardiologista solicitou Endoscopia Digestiva Alta que evidenciou
esofagite erosiva leve, gastrite enantemática no fundo gástrico (realizada biópsia), úlcera no duo-
deno com hematina (realizada biópsia), Teste da Urease negativo. Laudo histopatológico: gastrite
atrófica crônica (fragmento fundo gástrico) e gastrite aguda sem sinais de malignidade (fragmen-
to de úlcera). Paciente foi então encaminhado ao gastroenterologista, que prescreveu Omeprazol
40mg 1xdia por 8 semanas.
Passados 9 meses do quadro dispéptico, paciente procurou geriatra por astenia progressiva, além
de perda de peso. Durante o interrogatório sintomatológico, havia perda de peso (cerca de 5% em
3 meses), alternância do hábito intestinal com fezes escurecidas. Um episódio de queda da pró-
pria altura em casa há 3 semanas. Dieta predominante de carboidratos simples. O idoso relatava
melhora da epigastralgia com omeprazol, porém não conseguia interromper uso do IBP pois o
sintoma recrudescia.
Após avaliação geriátrica ampla e exame físico, foram formuladas as seguintes hipóteses diag-
nósticas: 1. Síndrome dispética com perda de peso; 2. Astenia com perda de peso a esclarecer; 3.
Insuficiência coronariana; 4. Diabetes; 5. HAS; 6. DRC estágio III; 7. Depressão; 8. Osteoporose
vertebral; 9. Dorsalgia miofascial crônica; 10. Constipação intestinal crônica; 11. Mau estado de
conservação dentária; 12. Alto risco de desnutrição 13. Quedas; 14. Polifarmácia; 15. Medicação
inapropriada para o idoso; 16. Má adesão medicamentosa; 17. Fragilidade social.
Foi realizada propedêutica complementar, sendo encontrada anemia ferropriva (Hb 7,3g/dl;
Ht25,6%; Ferro sérico 33 mg/dL; saturação da transferrina 9%). Além disso havia creatinina au-
mentada: 1,8mg/dl. Apesar do achado da doença ulcerosa péptica em EDA prévia e recente, foi
solicitada colonoscopia pelos sinais de alarme de perda de peso, alteração intestinal e anemia. O
exame foi normal.
O paciente foi tratado com manutenção do inibidor da bomba de prótons para doença ulcerosa
péptica e reposição de ferro endovenoso para anemia. Além disso, o geriatra corrigiu a polifar-
márcia, suspendendo o alendronato devido à esofagite erosiva e piora da função renal; reduziu a
dose de metformina para 2xdia devido à hiporexia e perda de peso; suspendeu a Fórmula anal-
gésica com meloxicam pela doença ulcerosa e disfunção renal, como também ciclobenzaprina
por aumentar o risco de quedas e Ginkgo biloba por aumentar risco de sangramentos; prescreveu
analgésico simples para dor.
Você pensaria em mais alguma hipótese diagnóstica e conduta para o sr. João? Que tal discutir
o caso com seu professor? Abaixo discutiremos as principais alterações do envelhecimento gas-
trintestinal e principais doenças do trato gastrintestinal do idoso.
2. Introdução
A melhor abordagem do idoso com queixa principal gastrintestinal acontece quando é aplicada
a avaliação geriátrica ampla. Nesta, além do diagnóstico da patologia principal, é possível presu-
mir riscos de perdas funcionais e mortalidade que tal comorbidade pode gerar.
Capítulo 7 113
ser atribuído apenas ao envelhecimento. É recomendável que a administração de medicamentos
via oral, mesmo nos idosos assintomáticos, seja feita na posição ortostática.
Com relação ao estômago, ocorre discreta a moderada elevação do tempo de esvaziamento gás-
trico, principalmente para líquidos, o que pode alterar a absorção de fármacos sensíveis ao meio
ácido (por ex.: cetoconazol, fluconazol e tetraciclinas). Uma importante alteração é a redução
da produção de ácido clorídrico (hipocloridria) pela redução do número de células parietais. Tal
fator leva à diminuição da absorção de ferro. Há também diminuição da produção de fator intrín-
seco, o qual é necessário para absorção de vitamina B12. Ocorre declínio na produção do muco
protetor gástrico, do bicarbonato, do sódio, da secreção não parietal e das prostaglandinas na
mucosa gástrica, como também redução da capacidade regenerativa, favorecendo, em conjunto,
o aumento da prevalência das doenças pépticas.
No envelhecimento do pâncreas há diminuição da massa pancreática (60g para 40g na nona dé-
cada); dilatação do ducto de Virchow e proliferação do epitélio ductal e formação de cistos. Há o
achado de fibrose e lipoatrofia focal e aumento da densidade do parênquima. Funcionalmente,
há redução da secreção de lipase e bicarbonato. Apesar disso, a reserva funcional do pâncreas
é muito grande, não havendo descrições de repercussões clínicas apenas pelo envelhecimento.
No cólon, observa-se redução dos neurônios do plexo mioentérico, tornando o idoso mais sus-
ceptível à constipação. As alterações morfológicas e biomecânicas do cólon observadas são a di-
minuição da resistência da parede e pressão intraluminais elevadas (criadas devido a alterações
do plexo), que favorecem o surgimento da doença diverticular. Em consequência, ocorre exposi-
ção prolongada a agentes carcinogênicos e aumento da incidência de neoplasias.
Por fim, relativo ao envelhecimento do reto e ânus, ocorrem alterações da musculatura do es-
fíncter externo, como espessamento e alterações do colágeno, redução da força muscular e
diminuição da capacidade de retenção fecal voluntária, que aumentam a incidência de incon-
tinência fecal.
114
3. Cavidade Oral
A avaliação da cavidade oral do idoso nos permite identificar tanto as alterações próprias do en-
velhecimento, quanto as doenças, que tem impacto sobre a qualidade de vida e influenciam a
manutenção do estado nutricional.
Há numerosas condições e doenças que afetam a cavidade oral nas pessoas idosas. Muitas são
facilmente passíveis de prevenção e de tratamento.
Uma das principais alterações em relação à saúde bucal é a perda dos dentes. A perda dentária é
evitável no processo do envelhecimento. As maiores causas de perda dentária são a doença pe-
riodontal, o tabagismo e a osteoporose.
A dispepsia pode ser classificada como orgânica ou funcional. A primeira ocorre quando existem
causas orgânicas diagnosticadas por métodos objetivos, enquanto a segunda ocorre quando nos
métodos diagnósticos, incluindo a endoscopia digestiva alta, não são identificados processos que
justifiquem os sintomas. Uma observação relevante é de que, no entanto, a maioria das gastrites
endoscópicas não tem correlação clínica, pois é observada nos indivíduos assintomáticos.
A classe mais comum, com base em investigação endoscópica para a população geral, é a dispep-
sia funcional (60%), seguida pela úlcera péptica (15 a 25%), esofagite por doença do refluxo (5 a
15%) e neoplasias de esôfago e estômago (< 2%).
Capítulo 7 115
Nos idosos, há aumento da prevalência de sintomas dispépticos, embora não se conheça dados
muitos específicos para faixas etárias avançadas. Sabe-se que a incidência de doenças do trato
gastrintestinal é maior após os 60 anos. Os sintomas dispépticos nos idosos muitas vezes são
subestimados; diante da multiplicidade de doenças concorrentes atribui-se frequente e inadver-
tidamente o aparecimento destes sintomas ao uso de múltiplas drogas ou à introdução de um
novo medicamento.
Fonte: FREITAS, E.V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4ed. Rio de Janeiro:
Editora Guanabara Koogan; 2016. p. 719
Na avaliação da síndrome dispéptica no idoso, uma história clínica detalhada deve fornecer
orientação diagnóstica para causa orgânica ou funcional. Questionamentos sobre transgressões
dietéticas, estilo de vida, uso de álcool, ingestão de AINE, história prévia de doença ulcerosa
péptica, cirurgia gástrica e história familiar de câncer gástrico são fundamentais. A criteriosa
identificação da idade e de sinais e sintomas de alarme é de extrema importância e são conside-
rados preditores de doença orgânica (Quadro 2).
Fonte: FREITAS, E.V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4ed. Rio de Janeiro:
Editora Guanabara Koogan; 2016. p. 720
116
de idosos que, apesar de dispepsia de início recente, tenham antecedentes familiares de câncer
gástrico, ou que sejam provenientes de países onde é alta a prevalência de neoplasias gastrintes-
tinais, a abordagem diagnóstica deve ser individualizada, prevalecendo, naturalmente, maior
liberalidade na indicação da EDA.
O quadro clínico típico é de pirose e regurgitação. Já os sintomas atípicos podem ser: dor torácica
sem doença coronariana, asma, tosse crônica, bronquite, pneumonias de repetição, rouquidão,
pigarro, laringite, sinusite crônica, otalgia, halitose e aftas. Os sinais de alarme são: disfagia,
odinofagia, perda de peso e anemia.
O diagnóstico é clínico, confirmando com teste terapêutico. Quando a idade é maior de 50 anos,
os sintomas existem há mais de 5 anos ou há sinais de alarme ou sintomas atípicos, deve-se rea-
lizar endoscopia digestiva alta (EDA). Pode ser considerada a realização de pHmetria de 24 horas
nos casos de EDA normal ou duvidosa.
Para o tratamento, iniciar orientando medidas comportamentais que são: elevação da cabeceira
em 15cm (colocar calço nos pés da cama e não somente elevação com travesseiros), evitar ingesta
de líquidos ao dormir, recomendar perda de peso se necessário, aguardar 2 horas para deitar após
as refeições, evitar alimentos gordurosos e álcool, evitar roupas apertadas, cessar tabagismo,
evitar ou substituir drogas que reduzam tônus do esfíncter esofágico inferior (anticolinérgicos,
beta agonistas, bloqueadores canais de cálcio, nitrato, diazepam, narcóticos e teofilina).
Para a terapia farmacológica, os inibidores da bomba de prótons (IBP) são as drogas de escolha
nos idosos devido à maior potência de controle da secreção ácida, maior capacidade de cicatri-
zação da esofagite, dose única e baixo risco de interação medicamentosa. A opção inicial é o
omeprazol 40mg por 4 a 12 semanas; se não houver resposta, pode-se dobrar a dose por 12 sema-
nas. Os inibidores receptores H2 têm menor efetividade, além de interferirem na metabolização
de medicações pelo citocromo P-450 (varfarina, teofilina, fenitoína). Os procinéticos devem ser
usados com cautela, devido aos potenciais efeitos adversos (por ex.: metoclopramida e parkinso-
nismo; domperidona e ginecomastia ou arritmias). Os antiácidos promovem alívio dos sintomas,
mas o efeito é de curta duração e há riscos de sobrecarga salina, constipação, diarreia. O sucral-
fato gera efeito protetor de mucosa, mas seu benefício é limitado.
Capítulo 7 117
6. Gastrites
A gastrite crônica está subdividida em duas categorias: tipo A (localizada no corpo gástrico) e
tipo B (localizada no antro).
No primeiro tipo, a produção de ácido gástrico está diminuída por destruição das células pa-
rietais com consequente redução da produção de fator intrínseco, podendo gerar deficiência na
absorção de vitamina B12 e subsequentes anormalidades neuro-hematológicas. O segundo tipo
de gastrite está associado à infecção pelo H. pylori, é o tipo de gastrite mais comum e altamente
prevalente acima de 70 anos, chegando a atingir até 100% dos idosos de baixo nível socioeconô-
mico. Inicialmente superficial, pode evoluir para gastrite atrófica por atingir camadas mais pro-
fundas e estender-se para o corpo e fundo. O estágio final é a atrofia gástrica com a mucosa fina
e destruição glandular, podendo haver alterações morfológicas tipo metaplasia intestinal, que é
um fator predisponente para o câncer gástrico.
A doença ulcerosa péptica (DUP) está associada a dois fatores principais: infecção por Helicobac-
ter pylori; e o uso de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs). Existem também outros mecanis-
mos definidos para a DUP que são muito menos comuns, mas são mais evidentes à medida que a
prevalência de H. pylori diminui nos países desenvolvidos.
A prevalência de H. pylori tanto na população em geral quanto nos pacientes com úlcera péptica
está diminuindo rapidamente nas regiões desenvolvidas, presumivelmente devido à melhora
da higiene e à diminuição da transmissão da bactéria na primeira infância. As baixas taxas de
reinfecção após a cura de H. pylori também refletem a queda na prevalência da infecção por esta
bactéria. Em contraste, as taxas de prevalência e reinfecção permanecem altas nas regiões onde
a higiene e as condições socioeconômicas não mudaram. Além disso, a população urbana empo-
brecida e as populações rurais geralmente têm uma prevalência muito maior de H. pylori, embo-
ra observe-se que esta situação também mudando.
A taxa de infecção por H. pylori nos idosos, entretanto, vem crescendo, com relatos de taxas
superiores a 70% nos portadores de doenças gastrintestinais e cerca de 60% nos idosos assinto-
máticos. Desses, entre 10 e 20% desenvolverão doença ulcerosa péptica e em torno de 1% apre-
sentará câncer gástrico ou linfoma MALT.
118
O aumento da prevalência desta bactéria nos idosos não parece resultar no aumento das taxas de
úlceras gastroduodenais, mas está associado a maior risco de anemia perniciosa e linfoma gás-
trico. Dois pontos são de importância crítica tanto na discussão de causas quanto na avaliação de
pacientes com úlceras pépticas:
1. H. pylori pode ser difícil de diagnosticar em alguns pacientes. Testes sorológicos falsos
negativos ocorrem em pelo menos 10% dos pacientes. Isso pode ocorrer após o uso de anti-
bióticos e IBP. Da mesma forma, o sangramento gastrointestinal agudo diminui a sensibi-
lidade do teste da urease.
Uma metanálise apontou que o risco de úlcera péptica em portadores de H. pylori em uso de
AINE é 61 vezes maior que em pacientes sem infecção por H. pylori e não usuários de AINE (Ciz-
giner et al., 2014).
A aspirina também aumenta o risco de úlcera péptica. A aspirina revestida entérica é projetada
para resistir à desintegração no estômago, dissolvendo-se no ambiente mais neutro a alcalino do
duodeno. Embora a aspirina com revestimento entérico diminua os sinais endoscópicos de lesão
gastroduodenal, o mesmo não se observa com a aspirina tamponada.
Para o tratamento da DUP, os inibidores da bomba de prótons (IBP) curam úlceras gastroduode-
nais mais rapidamente do que os antagonistas dos receptores H2. Uma metanálise comparando
a cicatrização de úlceras duodenais identificou que 20mg de omeprazol todas as manhãs durante
quatro semanas era superior a 300mg de ranitidina e 800mg de cimetidina, ambos administra-
dos na hora de dormir. Do mesmo modo, outra metanálise mostrou que 30mg de lansoprazol
todas as manhãs curaram significativamente melhor úlcera do que 300mg de ranitidina e 40mg
de famotidina. O pantoprazol e o rabeprazol se revelaram mais eficazes na cicatrização de úlcera
em comparação com antagonistas de H2. A duração ideal da terapia com IBP deve ser de quatro
semanas para úlcera duodenal aguda e oito semanas para úlcera gástrica. Os IBP também são
eficazes para a prevenção primária de úlceras associadas aos AINEs.
Capítulo 7 119
Uma metanálise que incluiu onze estudos de coorte e caso-controle examinou o risco de fraturas
associadas ao uso de IBP. O risco de fratura do quadril foi aumentado entre os usuários de IBP em
comparação com os não usuários (risco relativo 1,30, IC 95%: 1,19-1,43). Houve também um risco
aumentado de fratura da coluna vertebral (RR 1,56, IC 95% 1,31-1,85).
O risco de pneumonia em usuários de IBP pode estar aumentado devido a uma redução na se-
creção de ácido gástrico, permitindo que os agentes patogênicos colonizem mais facilmente o
trato gastrointestinal superior. O aumento do risco foi observado com a pneumonia adquirida na
comunidade (PAC) e também a hospitalar.
O uso prolongado dos IBP é cada vez mais visto na prática. Muitos pacientes com refluxo gastroe-
sofágico e dispepsia são mantidos continuamente em uso de IBP, mas algumas preocupações
foram expressas quanto à segurança a longo prazo desses medicamentos, bem como interações
medicamentosas potencialmente importantes. Assim, pacientes assintomáticos que não tenham
indicação precisa para uso prolongado de IBP devem ter a medicação descontinuada. Pacientes
tratados por um período de seis meses devem ser estimulados a suspender a medicação. As dire-
trizes seguintes podem ser empregadas para o desmame dos IBP:
• Pacientes tratados por úlceras duodenais e gástricas agudas durante quatro a oito semanas
não requerem um desmame;
• Pacientes que recebem um IBP como parte de um curso de tratamento para H. pylori não
requerem um desmame;
• Pacientes com IBP de dose moderada a alta (por exemplo, omeprazol 40mg ao dia ou duas
vezes ao dia), devem ter a dose reduzida em 50% a cada semana até a total suspensão da
medicação.
9. Hemorragia digestiva
A hemorragia digestiva (HD) é problema comum entre os idosos. A incidência acima dos 70 anos
é 10 vezes maior que nas pessoas abaixo dos 45 anos. A hemorragia digestiva aguda deve sempre
ser classificada quanto a seu provável sítio de origem. A forma de exteriorização do sangramento
guia a propedêutica inicial, possibilitando na maioria das vezes a localização da lesão hemorrá-
gica do trato gastrintestinal.
a) Hemorragia digestiva alta (HDA): os sangramentos são localizados entre o esôfago e o ân-
gulo de Treitz, manifestam-se como hematêmese ou melena e, quando volumosos, como
hematoquezia;
120
b) Hemorragia digestiva baixa (HDB): são de origem colônica (após íleo distal);
c) Hemorragia digestiva média (HDM): localizadas entre o ângulo de Treitz e o íleo distal,
podendo exteriorizar-se como melena ou hematoquezia. Apresentam o sítio dos sangra-
mentos de difícil definição em até 80% dos casos.
As HDA são responsáveis por 75% dos sangramentos (principalmente por úlceras e uso de AINE),
enquanto que 25% ocorrem no tubo digestivo baixo.
A principal causa de HDA em pacientes de qualquer faixa etária é a doença ulcerosa péptica. So-
mada às esofagites e gastrites, a doença ulcerosa péptica responde por mais de 70% das admis-
sões de idosos com HDA. A fonte da hemorragia pode não ser identificada em 10 a 15% dos casos,
porque a lesão pode ser de difícil identificação (como as ectasias vasculares de antro gástrico, a
hemobilia e a fístula aortoentérica). O risco de hemorragia por úlcera de estresse está aumentado
nos pacientes com insuficiência respiratória e naqueles com coagulopatia. O estresse psicológico
associado a eventos comuns de vida não tem claramente sido associado com úlcera, e terapia de
redução ácida não está rotineiramente indicada nesta situação.
Na maioria das séries, a diverticulose é a fonte mais comum de HDB, representando até 55% dos
casos. A seguir, as causas mais frequentes são: origem anorretal (hemorroidas, fissuras anais e
úlceras retais - 6 a 16%); neoplasias (pólipos e cânceres - 3 a 11%); angiodisplasias (até 3%); doen-
ça inflamatória intestinal (2 a 4%); colite actínica (1 a 3%). Outras colites (infecciosa, associada a
antibióticos, isquêmica) podem responder por até 29% dos casos.
A HDM corresponde a 5% dos casos de sangramento digestivo. As principais causas são lesões
vasculares: angiectasias, telangiectasia hemorrágica familiar e hemangiomas.
Idosos também apresentam diferenças na apresentação clínica em relação aos mais jovens em
razão das alterações na percepção de dor com o aumento da idade. As apresentações atípicas
também são comuns, podendo ir desde anemia crônica sem sintomas gastrintestinais específi-
cos até hemorragias maciças e óbito.
Embora não existam diretrizes específicas para a condução da hemorragia digestiva no idoso,
na maioria absoluta dos casos será necessário a internação hospitalar e a avaliação endoscópica
precoce. Na HDA recomenda-se o uso de altas doses de IBP por via intravenosa nos primeiros 3
dias de tratamento (p. ex., 80mg de omeprazol em bolus, seguido por infusão contínua de 8mg/h
por 72 h).
Está indicada a testagem para H. pylori nos pacientes com hemorragia digestiva por úlcera pép-
tica, pois a erradicação da bactéria se mostrou superior à terapia apenas com IBP na prevenção
da recidiva de sangramento na doença ulcerosa. Vale lembrar que no episódio de sangramento,
a identificação da bactéria revela maior taxa de falso-negativos, sendo pertinente nova testagem
nos pacientes com pesquisa inicial negativa para H. pylori.
Capítulo 7 121
Nos últimos anos, tem crescido o uso de novos anticoagulantes orais (nACO) (dabigatrana, riva-
roxabana, apixabana) por pacientes com necessidade de anticoagulação prolongada. Há maior
risco de sangramento intestinal com dabigatrana, mas menor risco de sangramento de sistema
nervoso central, se comparada à varfarina. Quanto aos outros nACO os dados obtidos são consi-
derados insuficientes para se precisar o risco de sangramento nos idosos.
Estudos epidemiológicos mostraram prevalência mais elevada de H. pylori em pacientes com CG.
Nos idosos, a positividade dos testes para H. pylori está associada ao aumento em até 8 vezes no
risco de desenvolver CG. Adicionalmente, estudos de seguimento após estratégia de erradicação
de H. pylori relatam queda significante na incidência de CG.
Indivíduos que têm anemia perniciosa secundária à gastrite autoimune apresentam maior risco
de tumores gástricos carcinoides e de adenocarcinoma gástrico. A anemia perniciosa, por ser
considerada condição pré-maligna, deve ser monitorada periodicamente por EDA.
O tratamento de escolha é a ressecção cirúrgica, apesar de apenas 15% dos pacientes terem o
tumor totalmente ressecável. A sobrevida média em 5 anos é de 20%. A ressecção e quimiote-
rapia paliativas podem dar qualidade de vida e podem aumentar a sobrevida. Não há diferença,
em comparação aos mais jovens, quanto à taxa de complicações pós-operatórias graves, como
sangramentos e infecções, tempo de cirurgia e quantidade de analgesia utilizada. A avaliação,
portanto, deve ser feita de forma individualizada, ponderando sobre o grau de funcionalidade e
comorbidades do paciente.
11. Colelitíase
Estudos epidemiológicos registram que a maioria dos cálculos biliares é assintomática, podendo
permanecer assim por várias décadas. As manifestações clínicas só ocorrem quando há maior
tensão na vesícula biliar e/ou nos ductos biliares. A colelitíase acomete mais as mulheres (relação
122
de 4:1). O estrogênio aumenta o risco de cálculos biliares de colesterol, por produzir mais secre-
ção hepática de colesterol, levando ao aumento na saturação de colesterol biliar.
Comumente não são necessários recursos adicionais à ultrassonografia para estabelecer o diag-
nóstico de cálculos biliares, e de um modo geral o paciente com idade avançada já tem esse diag-
nóstico confirmado desde a idade adulta. A tomografia não é muito adequada para a detecção
de cálculos, mas excelente para o diagnóstico das complicações, como abscesso, perfuração da
vesícula, do ducto biliar e pancreatite. A ultrassonografia endoscópica (USE) tem grande precisão
na detecção de cálculos do ducto biliar. Também a CPRE (colangiopancreatografia endoscópica
retrógrada) é o teste padrão para diagnóstico e extração de cálculos do ducto biliar, com eficiên-
cia nos casos de colangite aguda, por reduzir a necessidade de exploração do ducto biliar por
ocasião da colecistectomia.
A cólica biliar é a indicação mais comum de colecistectomia, visto que costuma apresentar re-
cidivas. Além disto, pessoas idosas têm risco maior de complicação de cálculos biliares e a mor-
talidade é mais elevada acima de 65 anos. A complicação mais comum da colelitíase consiste na
colecistite aguda, pela migração de cálculo biliar.
A etiologia é bem diversa, podendo ser sintoma de diversas síndromes clínicas, entre elas as gas-
trointestinais (doença diverticular dos cólons, fissuras anais, hemorroidas, vólvulo intestinal,
tumores e síndrome do cólon irritável); as doenças metabólicas (diabetes melito, hipotireoidis-
mo, hiperparatireoidismo, insuficiência renal crônica); os distúrbios eletrolíticos (hipocalemia,
hipercalemia, hipercalcemia, hipomagnesemia) e as doenças neurológicas (AVC, Parkinson, de-
mências, tumores). Existem também as causas psicogênicas (adiar ou ignorar a defecação volun-
tariamente, depressão) e a constipação provocada por imobilidade ou por medicamentos.
Além disso, a baixa ingesta hídrica, a falta de uma dieta equilibrada (rica em frutas, verduras,
legumes) e o sedentarismo interferem de forma negativa na manutenção de um bom funciona-
mento intestinal.
Com relação às medicações constipantes, as que têm com maior potencial de provocar constipa-
ção estão no Quadro 3.
Capítulo 7 123
Quadro 3: Medicações com efeito constipante
Carbonato de cálcio
Antidepressivos tricíclicos
Anti-histamínicos
Antipsicóticos
Antiparkinsonianos / dopaminérgicos
Anticonvulsivantes
Opioides
Bloqueadores do canal de cálcio
Diuréticos não poupadores de potássio
Anti-inflamatórios não hormonais
Hidróxido de alumínio
Sulfato ferroso
Fonte: FREITAS, E.V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4ed. Rio de Janeiro:
Editora Guanabara Koogan; 2016. p. 741
O quadro clínico é bastante heterogêneo. Queixas como redução do número de evacuações e alte-
rações da consistência fecal geralmente não são relatadas, pois os idosos as consideram próprias
do envelhecimento. Regularmente há relato de desconforto à evacuação, necessidade de ma-
nobras digitais para auxiliar a eliminação de fezes, além de sensação de evacuação incompleta.
Muitos pacientes apresentam queixas relacionadas à alteração da mobilidade gastrointestinal,
secundárias à constipação grave: sensação de esvaziamento gástrico lento, dispepsia, pirose,
náuseas e vômitos, flatulência excessiva, cólica ou distensão abdominal. Pode haver, ainda, per-
da involuntária de fezes, erroneamente confundida com incontinência fecal.
- Sensação de obstrução anorretal e/ou evacuação incompleta pelo menos em 25% das defe-
cações;
124
Há uma regra mnemônica (“regra dos 9D”) como orientação diagnóstica e terapêutica durante a
avaliação do paciente:
O exame clínico deve abranger a avaliação perianal e o toque retal. Exames complementares
básicos, embora úteis, normalmente têm baixa capacidade de auxílio no diagnóstico causal. A
colonoscopia é indicada nos quadros de constipação recente associada à hematoquezia, perda de
peso significativa ou quando há antecedente familiar de neoplasia. É importante ressaltar a re-
comendação de hospitalização para realização de preparo e exame de colonoscopia nos pacientes
com mais de 70 anos.
Para o tratamento, caso as medidas comportamentais não melhorem o quadro, deve-se orientar
o incremento de fibras e líquidos, sendo que esta medida já provoca remissão significativa dos
sintomas em número significativo de idosos.
Se não ocorrer resposta adequada, agregam-se laxantes osmóticos (lactulose, manitol, sorbitol,
polietilenoglicol). Dá-se preferência a esta classe pelo maior grau de resposta clínica e segurança,
se comparada a outros laxantes. Mesmo os laxativos osmóticos, todavia, apresentam potenciais
limitações, principalmente distensão e dor abdominais, flatulência e diarreia.
A constipação intestinal causa impacto significativo na qualidade de vida dos idosos e apresenta
potencial para provocar ou acelerar declínios funcionais. Medidas preventivas são importantes
para evitarmos o tratamento farmacológico destes pacientes. De forma geral, há uma boa respos-
ta com as medidas citadas anteriormente.
13. Diarreia
Define-se diarreia quando o peso e/ou o volume das fezes são superiores a 400g (mL) por dia,
ou quando há mais de 3 evacuações por dia. A queixa é corriqueira nos serviços de saúde, inde-
pendentemente da faixa etária. Classifica-se, quanto ao tempo de instalação da queixa, em três
subtipos: aguda, persistente e crônica.
A diarreia aguda é aquela que tem menos de 2 semanas de duração. Na maioria das vezes tem
etiologia infecciosa e também não definida. Os idosos, pelo próprio processo normal do enve-
lhecimento tem sua microbiota intestinal alterada. Devemos atentar aos fatores adicionais que
possam modificar esta microbiota, como a origem do paciente: domicílio, ILPI ou hospital. Ou-
tros fatores importantes de serem considerados são: fragilidade, desnutrição, imobilidade, po-
lifarmácia e padrão dietético (especialmente dietas enterais – por mecanismos relacionados a
Capítulo 7 125
osmolaridade e velocidade de infusão). Quanto ao prognóstico, a maioria é autolimitada com
resolução espontânea. Na população idosa, contudo, a diarreia aguda provoca grande número de
internações e apresenta grande potencial para óbito.
A diarréia persistente é aquela que tem mais de 14 dias e menos de 4 semanas de duração. Em
geral, é de origem infecciosa, mas que se perpetuou em decorrência de complicações múltiplas.
Os principais fatores de risco para esta condição são hábito alimentar inadequado, condições de
higiene e de habitação precárias, convívio com animais domésticos, presença de familiares/cui-
dadores com os mesmos sintomas e episódios prévios. Para o diagnóstico, alguns exames labora-
toriais são úteis: coprocultura e parasitológico de fezes, pH fecal e substâncias redutoras nas fezes
(sugerem componente osmótico se apresentarem valores menores que 6,0 e maiores que 0,5%
respectivamente), leucócitos fecais (indicam invasão da mucosa intestinal) e sangue oculto nas
fezes (indica invasão da mucosa). A pesquisa da osmolaridade fecal, pela obtenção dos eletrólitos
fecais, nos ajuda a diferenciar a diarreia osmótica de secretora. A osmolaridade fecal normal é de
290 mEq/L e é calculada pela fórmula:
Para o tratamento, a hidratação e controle dietético adequado evitam a persistência da fase agu-
da da diarreia. Mesmo sendo habitualmente de origem infectoparasitária, sugere-se limitar o uso
de agentes antimicrobianos/antiparasitários quando tais agentes são identificados nas fezes ou
se houver comprometimento do estado geral do paciente. Indica-se terapia nos casos de infecção
prolongada causada por Salmonella, Giardia, Cyclospora, Strongyloides e E. coli enteroagregativa
(este principalmente em desnutridos e imunodeprimidos). Em caso de sangue positivo nas fezes,
prescreve-se antimicrobiano para Shigella quando o agente for isolado.
A diarreia crônica é aquela que se estende por mais de 4 semanas. Este tipo é classificado pela
aparência das fezes em 3 subtipos, embora seja importante ressaltar que pode haver sobreposi-
ção dos subtipos:
c) Diarreia aquosa (fezes sem sangue ou gordura). Esta subdivide-se em: secretória (normal-
mente com alguns sinais de alarme, como ocorrência em período noturno e não há relação
com a ingesta alimentar, observada na doença de Chron, hipertireoidismo, estados pós
-operatórios); osmótica (nas intolerâncias alimentares); e por fim, funcional (nos estados
de hipermotilidade intestinal).
Para o diagnóstico diferencial da diarreia crônica deve-se solicitar exames de acordo com estes
subtipos acima e o conjunto da anamnese e suspeita clínica. História e exame físico são funda-
mentais para a diferenciação entre os subtipos. Diarreia há pelo menos 3 meses, principalmente
durante a noite, associada a perda significativa de peso, sugere origem secretória e secundária a
doença orgânica, como hipertireoidismo ou doença de Crohn. Exame físico normal indica Sín-
drome do Cólon Irritável, assim como esteatorreia, fezes claras e volumosas sugerem má absor-
ção intestinal.
126
Quando a diarreia é de padrão secretório, é recomendável solicitar coprocultura e parasitológico
de fezes para isolar agentes infecciosos. No padrão osmótico, o exame de pH fecal é valido (se
ácido, sugere má absorção a carboidratos). Já quando o padrão é gorduroso, para confirmar solici-
ta-se pesquisa de gordura nas fezes (pesquisa qualitativa e não quantitativa) e pode ser solicitada
função pancreática sérica quando há suspeita de pancreatite crônica. Já nas diarreias de caracte-
rísticas inflamatórias, os principais exames são: pesquisa de sangue/pus nas fezes, colonoscopia
ou retossigmoidoscopia, pesquisa de toxina A e B de Clostridium difficile (quando houver históri-
co de uso de antibióticos). A diarreia com sinais de alarme, como perda de peso e anemia, pode
ser também provocada por neoplasias, estando indicada a investigação por colonoscopia.
Referências
ABDULLAH, M.; FIRMANSYAH, M.A. Clinical approach and management of chronic diarrhea.
Acta Medica Indonesiana. 2013; 45(2):157-65.
AL DHAHAB, H. et al. State-of-the-art management of acute bleeding peptic ulcer disease. Saudi
Journal of Gastroenterology. 2013 Sep-Oct; 19(5):195-204.
BOURAS, E.P.; TANGALOS, E.G. Chronic constipation in the elderly. Gastroenterology Clinics of
North America. 2009; 38(3):463-80.
CIZGINER, S. et al. Approach to Helicobacter pylori infection in geriatric population. World Jour-
nal of Gastrointestinal Pharmacology and Therapeutics. August 6, 2014; 5(3): 139-47
COELHO, L.G. et al. 3rd Brazilian Consensus on Helicobacter pylori. Arquivos de Gastroenterolo-
gia. 2013; 50(2).
FESTI, D.1. et al. Clinical manifestations of gallstones disease: evidence from the multicenter
italian study on cholelithiasis (MICOL). Journal of Hepatology. 1999; 30-9.
FREITAS, E. V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara
Koogan; 2016. p. 707-11
GIL-MONTOYA, J.A. et al. Oral health in the elderly patient and its impact on general well-being:
a nonsystematic review. Clinical Interventions in Aging. 2015; 10:461-7.
Capítulo 7 127
GULMEZ, S.E. et al.Use of proton pump inhibitors and the risk of community-acquired pneumo-
nia: a population-based case-control study. Archives of Internal Medicine. 2007;167(9):950.
HESS, M.W. et al. Systematic review: hypomagnesaemia induced by proton pump inhibition. Ali-
mentary Pharmacology & Therapeutics. 2012 Sep;36(5):405-13. Epub 2012 Jul 4.
KIM, B.S. et al. Diagnosis of gastrointestinal bleeding. A practical guide for clinicians. World
Journal of Gastrointestinal Pathophysiology. 2015; 5(4):467-78.
KIM, M.G. et al. The impact of old age on surgical outcomes of totally laparoscopic gastrectomy
for gastric cancer. Surgical Endoscopy. 2013 Nov; 27(11):3990-7.
KWOK, C.S. et al. Risk of Clostridium difficile infection with acid suppressing drugs and antibio-
tics: meta-analysis. The American Journal of Gastroenterology. 2012;107(7):1011. Epub 2012 Apr 24.
LEONARD, J.; MARSHALL, J.K.; MOAYYEDI, P. Systematic review of the risk of enteric infection
in patients taking acid suppression. The American Journal of Gastroenterology. 2007;102(9):2047.
Epub 2007 May 17.
McCOLL, K.E. Effect of proton pump inhibitors on vitamins and iron. The American Journal of
Gastroenterology. 2009;104 Suppl 2:S5.
MURPHY, G. et al. Cancer risk after pernicious anemia in the US elderly population. Clinical Gas-
troenterology and Hepatology. 2015 Jun 14
PILOTTO, A.; FRANCESCHI, M. Helicobacter pylori infection in older people. World Journal of
Gastroenterology. 2014 June 7; 20(21):6364-73.
SARKAR, M.; HENNESSY, S.; YANG, Y.X. Proton-pump inhibitor use and the risk for community
-acquired pneumonia. The American Journal of Gastroenterology. 2008;149(6):391.
SHARMA, M. et al. Efficacy and harms of direct oral anticoagulants in the elderly for stroke pre-
vention in atrial fibrillation and secondary prevention of venous thromboembolism: systematic
review and meta-analysis. Circulation 2015 Jul 21; 132(3):194-204.
SILVA, V.L. et al. Associação entre carência social e causas de morte entre idosos residentes no
município de Recife, Pernambuco, Brasil. Caderno de Saúde Pública. 2008; 24(5):1013-23.
TARIQ, S.H.; MEKHJIAN, G. Gastrointestinal bleeding in older adults. Clinics in Geriatric Medici-
ne. 2007; 23(4):769-84
TRINH, C.; PRABHAKAR, K. Diarrheal diseases in the elderly. Clinics in Geriatric Medicine. 2007;
23(4):833-56.
128
VAZQUES ROQUE, M.; BOURAS, E.P. Epidemiology and management of chronic constipation in
elderly patients. Clinical Interventions in Aging. 2015; 10:919-30.
VENERITO, M.; SELGRAD, M.; MALFERTHEINAR, P. Helicobacter pylori: gastric cancer and ex-
tragastric malignancies – clinical aspects. Helicobacter pylori and Gastrointestinal Malignancies.
2013 Sep; 18(Suppl 1):39-43.
YU, E.W. et al. Proton pump inhibitors and risk of fractures: a meta-analysis of 11 international
studies. The American Journal of Gastroenterology. 2011; 124:519.
Na web:
http://www.fda.gov/Safety/MedWatch/SafetyInformation/SafetyAlertsforHumanMedicalPro-
ducts/ucm245275.htm (Acessado em 29 de julho de 2017)
Capítulo 7 129
CAPÍTULO
Epilepsia no idoso
1. Introdução
A epilepsia é a doença neurológica crônica mais prevalente. Por sua característica de dispersão
em qualquer faixa etária, este é um problema relevante na prática médica como um todo. A senes-
cência é talvez o momento mais comum em que se desenvolve epilepsia. Existem diversas causas
nesta faixa etária, epilepsias ditas primárias e secundárias. Vamos rever o conceito mais atual da
classificação das crises e epilepsias.
• Início focal;
• Início generalizado;
• Desconhecido;
• Não-classificado.
Já as crises de início generalizado são divididas em motoras (tipo tônico-clônicas ou outras mo-
toras) e não motoras (ausências).
Aquelas de início desconhecido são separadas em motoras (tipo tônico-clônicas ou outras moto-
ras) e não motoras (parada comportamental).
Em relação às mudanças na classificação dos tipos de crises epiléticas de 1981 para a de 2017 po-
demos notar que:
3. Crises de início desconhecido podem ter características que ainda podem ser classificadas;
7. Novos tipos de crises generalizadas são: ausências com mioclonias palpebrais, ausências
mioclônicas, mioclono-atônicas, mioclono-tônico-clônicas, espasmos epiléticos.
A importância prática de classificar uma crise está em facilitar a determinação de sua etiologia e
tratamento.
Vejamos abaixo:
Um idoso de 72 anos, previamente hígido, tem 3 episódios de crises convulsivas de início focal
em um intervalo de 3 meses. As crises não foram precedidas de alteração de consciência. Todos
os 3 episódios se caracterizaram por clonias na face à E e braço ipsilateral, com duração máxima
de 40 segundos. Este idoso está perdendo peso e tem queixas de prostatismo. Exame físico geral
e neurológico são normais.
Em uma situação como a descrita acima, após classificar estas crises como “de início focal” e
avaliar a questão do emagrecimento e sintomas prostáticos, é necessário pensar que uma das
prováveis etiologias para crises de início focal neste contexto poderia ser metástase de um cân-
cer prostático, como na figura abaixo:
Fonte: http://www.mdpi.com/1422-0067/15/6/10508/htm
Capítulo 8 133
Por outro lado, do ponto de vista terapêutico, sabemos que antiepiléticos como carbamazepina
são excelentes drogas para crises de início focal, em detrimento de ácido valproico, cuja indica-
ção maior são nas crises de início generalizado.
Assim, um idoso que tem hipoglicemia, hipo ou hipernatremia, quadros agudos de desidratação,
infecções sistêmicas e que desenvolve uma crise neste contexto não terá, por definição, epilep-
sia, mas sim o que se chama de “crise provocada”. Crise provocada é tratada primariamente a
partir da correção da causa de base. Os antiepiléticos podem ser utilizados, mas em geral por
volta de seis meses.
Muitos eventos não epiléticos paroxísticos podem fazer diagnóstico diferencial com crise epilép-
tica nos idosos, por exemplo:
C. Síncope vasovagal;
D. Arritmias cardíacas;
E. Hipoglicemia/hiponatremia/hipocalemia.
Assim, a tarefa de coletar uma boa história e fazer um bom exame físico geral e neurológico são
determinantes. Não podemos deixar de observar:
134
C. Pupilas;
D. Força;
E. Marcha;
F. Sensibilidade;
Veja na Tabela 1, as principais características das drogas antiepiléticas e suas implicações nos
idosos.
Capítulo 8 135
Tabela 1: Drogas antiepiléticas e suas vantagens e desvantagens em relação a pacientes idosos
Dose mínima
Droga/Mecanismo ação Prós Contras
terapêutica
Fenobarbital Baixo custo Sedação
Amplo espectro Indutor enzimático
Bloqueador sódio/ 100mg
GABAérgico Comprometimento
Dose única
cognitivo
Fenitoína Tontura
Baixo custo Indutor enzimático 100mg 3 x dia
Bloqueador de sódio
Reação alérgica cutânea
Carbamazepina Hiponatremia
Padrão-ouro crise
Indutor enzimático 200mg 3 x dia
Bloqueador de sódio focal
Reação alérgica cutânea
Ácido Valproico Hepatotóxico
Padrão-ouro crise Inibidor enzimático
500mg 3 x dia
Agonista GABAérgico generalizada
Tremor
Topiramato
Perda de peso
Bloqueador sódio/
Nefrolitíase
GABAérgico Amplo espectro 100mg
Comprometimento
Bloqueador cálcio
cognitivo
Antagonista glutamato
Lamotrigina
Amplo espectro 50mg 2 x dia
Bloqueador sódio Titulação
Boa tolerabilidade
Bloqueador cálcio Reação alérgica cutânea
Pouca interação
Antagonista glutamato
Alterações comportamentais
Levetiracetam Amplo espectro
Elevado custo 500mg 2 x dia
Bloqueador cálcio Pouca interação
Sedação
Lembrar que drogas como carbamazepina, fenitoína e fenobarbital são indutoras enzimáticas e
diminuem o nível sérico de outras medicações. São também drogas que levam à perda mineral
óssea. Logo, é necessário monitorar os níveis de cálcio e de vitamina D. Por outro lado, o ácido
valproico é um grande inibidor enzimático e pode aumentar o nível sérico de outras medicações,
como anticoagulantes, sendo necessário ajustes.
136
5. Conclusões
A epilepsia é comum nos idosos e particularidades nesta população como efeitos adversos das dro-
gas antiepilépticas, mecanismos de ação, questões de natureza farmacocinética e farmacodinâmi-
ca devem ser levadas em consideração. Finalmente, lembrar de procurar diagnósticos diferenciais
de crises epiléticas e procurar o melhor manejo possível para um completo controle das crises.
Parkinsonismo no Idoso
1. Introdução
O parkinsonismo no idoso é um problema bastante comum, seja no contexto da doença de Par-
kinson, seja no contexto de outras doenças neurodegenerativas como os parkinsonismos atípi-
cos e o parkinsonismo medicamentoso. Os sinais cardinais que compõem uma síndrome parkin-
soniana são a bradicinesia, a rigidez, o tremor de repouso e a instabilidade postural.
A marcha parkinsoniana é o cartão de visitas deste paciente. Demonstra os passos curtos, pode
ocorrer festinação e congelamentos, a postura pode estar fletida, existe diminuição do balanço
dos braços e o equilíbrio pode estar claramente prejudicado, inclusive com quedas espontâneas.
Finalmente, durante a marcha também é possível avaliar o tremor de repouso.
3. Estudo de Caso
Trata-se de uma senhora que veio com o filho advogado para uma “segunda opinião sobre sua
doença de Parkinson”.
Capítulo 8 137
Identificação e História Patológica da Moléstia atual: N.C.T., sexo feminino, 73 anos, branca,
aposentada, trabalhava como bibliotecária, procedente de Goiânia/GO e atendida em São Paulo/
SP em 30 de novembro 2015. Há 3 anos diagnosticada com doença de Parkinson (final de 2012).
Na ocasião tinha dificuldade para movimentar-se e não se observava um lado do corpo pior que o
outro. Os sintomas evoluíram rapidamente e há 1 ano está em cadeira de rodas dependente para
andar, fazer higiene pessoal e alimentar-se. A fala ficou mais baixa e as frases mais curtas. Tem
dificuldade grave de deglutir e sialorreia. Não responde a 1g de levodopa.
Interrogatório sobre os diversos aparelhos: cognição preservada; olfato preservado (sic); humor
deprimido; tem dificuldade para alimentação ingerindo apenas comida pastosa; sialorreia; in-
continência urinária (usa fraldas); constipação intestinal; fica “tonta” e “mole” toda vez que é
levantada da cama (hipotensão postural).
Ao exame: PA 200x110 mmHg deitada / PA 80x60 mmHg de pé / FC89 / Ritmo regular em 2 tem-
pos, bulhas normofonéticas, sem sopros. Presença de disartria e disfonia grave / disfagia gra-
ve. Rigidez e bradicinesia graves bilateralmente e simétricos. Distonia em membros inferiores
(MMII) e membro superior direito. Provas cerebelares sem alterações em membros superiores.
Não testada em MMII. Equilíbrio não testado. Paciente não fica de pé. Reflexos presentes e nor-
moativos. Cutâneo plantar em flexão.
Figura 2: RM de crânio revelando sinal hipointenso em SE-T2 simetricamente disposto nos aspectos laterais dos
putamina, indicativo de deposição de minerais, desproporcionalmente maior do que nos globos pálidos e mais
acentuado em relação ao padrão habitualmente observado no grupo etário. No contexto clínico, pode ser compatível
com a possibilidade de afecção de natureza degenerativa (atrofia de múltiplos sistemas, forma parkinsoniana)
138
O caso acima exemplifica um quadro clássico de parkinsonismo atípico, identificado pela his-
tória e exame físico. Dentre os sinais de alarme na história acima, os que fazem o médico não
pensar na doença de Parkinson são:
1. Parkinsonismo simétrico desde o início: a doença de Parkinson típica tem um quadro clí-
nico assimétrico, com sintomas predominando em um lado em relação ao outro;
2. Progressão rápida dos sintomas: a paciente do caso teve uma evolução muito rápida, ne-
cessitando de cadeira de rodas e totalmente dependente para atividades de vida diária
(AVD) em menos de 5 anos. A doença de Parkinson típica evolui lentamente e, usualmente,
dificuldades graves com a locomoção ocorrem somente após 1 década.
3. Sintomas axiais: fala e deglutição são sintomas que podem estar comprometidos na doen-
ça de Parkinson típica, mas normalmente não inauguram a doença e são afetados de ma-
neira mais leve nos primeiros 5 anos.
6. Distonia: distonia fixa, que não ocorre no contexto do período off da levodopa indica a ne-
cessidade de investigar outra causa de parkinosnismo.
Existem, portanto, sintomas conhecidos como não motores e que podem anteceder ou coexistir
com a doença de Parkinson. Em algumas vezes, estes sintomas podem ser até mais incapacitan-
tes do que os sintomas motores. Abaixo, vamos discutir alguns destes sintomas.
Capítulo 8 139
Alterações do trato gastrointestinal
A constipação intestinal, embora seja um sintoma muito comum na população geral, é uma das
manifestações não motoras que antecedem o diagnóstico clínico da doença de Parkinson e pode
estar presente em até 80% dos casos. O tratamento destes sintomas segue, em geral, as recomen-
dações usuais a portadores de constipação intestinal crônica que inclui: ingestão de mais líqui-
dos, atividade física, dieta rica em fibras e laxativos com fibras solúveis ou osmóticos.
Alterações do olfato
Acredita-se que um dos primeiros sintomas da doença de Parkinson, décadas antes dos sinto-
mas motores, seja justamente a alteração de olfato, normalmente caracterizada por hiposmia ou
anosmia. Ocorre, entretanto, que este órgão do sentido não é tão apurado no ser humano como a
visão, por exemplo, e muitos outros problemas alteram por si só o olfato (tabagismo, trauma cra-
nioencefálico, doenças das vias aéreas superiores), tornando muitas vezes difícil sua avaliação.
Uma particularidade interessante da alteração de olfato no Parkinson é que ela pode servir como
auxílio no diagnóstico diferencial entre esta e outras doenças. Tanto no tremor essencial quanto
no parkinsonismo medicamentoso, diagnósticos diferenciais comuns com Parkinson no idoso, o
olfato está preservado. Não há tratamento específico para esta alteração no Parkinson.
Alterações do sono
Alterações do humor
A depressão pode ser um evento pré-clínico associado a uma maior predisposição para desenvol-
ver Parkinson. A depressão de início na terceira idade é um fator de risco conhecido para o desen-
volvimento de doenças neurodegenerativas. A depressão pode anteceder a doença de Parkinson
ou coexistir com ela, tornando-se um forte modulador negativo para a qualidade de vida destes
pacientes. Em geral, esta depressão no idoso é confundida com aspectos da própria senescência.
Deve ser, portanto, ativamente procurada.
140
O manejo da depressão na doença de Parkinson envolve o uso de drogas antidepressivas. De uma
forma prática, os duais e os inibidores seletivos da receptação da serotonina são os antidepressi-
vos mais utilizados, como duloxetina, desvenlafaxina, citalopram ou escitalopram, pelo perfil de
efeitos colaterais mais favorável.
Um segundo grupo de medicações, bem mais eficaz que o primeiro, são os agonistas dopaminér-
gicos. Neste grupo estão o pramipexol e a rotigotina. Esta classe melhora os sintomas motores
de portadores de Parkinson. Estas medicações podem provocar sonolência, além de edema de
membros inferiores e patologias de controle do impulso, como jogo patológico, hipersexualidade
e compulsão por compras.
O terceiro grupo é a classe mais eficaz no tratamento dos sintomas motores. Trata-se da levo-
dopa, sempre em associação com inibidores da dopa-descarboxilase (carbidopa na formulação
SinemetR ou ParkidopaR ou benserazida nas diferentes formulações de ProlopaR).
A Tabela 2 mostra características de cada uma das drogas mais utilizadas em Parkinson.
Capítulo 8 141
Tabela 2: Drogas antiparkinsonianas e suas vantagens e desvantagens em relação a pacientes idosos
142
A segunda etapa da evolução do Parkinson, quando ocorre o diagnóstico, dura em geral de 3 a 5
anos e também é conhecida como período de Lua de Mel. Nesta fase, onde ainda existe relativa
reserva dopaminérgica, predominam os sintomas motores como a bradicinesia, tremor de re-
pouso e rigidez e o paciente não tem complicações do uso de medicações como levodopa.
1. Móveis, do tipo coreia ou balismo e ocorrem no pico de efeito da levodopa (período On);
2. Imóveis, do tipo distonia, dolorosas, em geral quando a levodopa não está funcionando
(período Off).
Tanto na segunda quanto na terceira etapas, a maioria dos sintomas que impactam a qualidade
de vida do paciente com Parkinson ainda responde satisfatoriamente à levodopa.
Finalmente, há o quarto período da doença, chamado de período dos sintomas axiais e cogniti-
vos, em que surgem sintomas refratários à terapia de estimulação dopaminérgica, entre eles ins-
tabilidade postural, freezing de marcha e prejuízo cognitivo (demência). A demência associada
à doença de Parkinson pode afetar até 40% dos pacientes, mas é um evento tardio, que ocorre
mais de 10 anos depois do início dos sintomas motores.
Capítulo 8 143
Tabela 3: Demência associada à doença de Parkinson, demência com corpos de Lewy
e doença de Alzheimer: principais características
8. Parkinsonismo medicamentoso
Os transtornos de movimento, de uma forma geral, aumentam significativamente com a idade.
Além disto, uma situação bastante comum em nosso meio é o parkinsonismo medicamentoso ou
induzido por drogas. Dentre estas medicações destacam-se:
• Reserpina;
• Alfametildopa;
• Flunarizina;
• Cinarizina;
• Verapamil;
144
• Ácido valproico;
• Lítio.
Pela lista acima de medicações acima é fácil perceber que grande parte destes medicamentos
é comprada em nosso país sem prescrição médica. O exemplo mais típico é o de um idoso com
queixa de “tontura”, para o qual é prescrito flunarizina ou cinarizina em uso crônico, desenvol-
vendo-se o parkinsonismo.
O tratamento do parkinsonismo induzido por drogas é muito simples. Basta retirar a medica-
ção desencadeante dos sintomas. A grande questão é: por quanto tempo devemos esperar para
que os sintomas desapareçam? Em geral, este tempo deve ser de, pelo menos, 6 meses. A partir
deste período, se os sintomas persistirem, é provável que o idoso tenha, coincidentemente, um
parkinsonismo degenerativo como doença de Parkinson. Nesses casos há um quadro incipiente
agravado pelo contato com uma droga bloqueadora dopaminérgica.
Cabe ressaltar que o parkinsonismo induzido por drogas, em geral, não responde ao tratamento
convencional com levodopa. Isto tem uma razão farmacodinâmica. Como o mecanismo de ação
da levodopa é pré-sináptico e depende de um terminal pós-sináptico íntegro, a levodopa não tra-
rá benefícios a pacientes que estão com os receptores dopaminérgicos bloqueados (por exemplo,
por neurolépticos).
9. Conclusões
A doença de Parkinson é a segunda doença neurodegenerativa mais comum nos idosos e o en-
velhecimento de nossa população gera um desafio aos médicos que atendem idosos, no sentido
de realizar diagnóstico e tratamento adequados. Para tanto, é fundamental conhecer os diagnós-
ticos diferenciais, como parkinsonismos induzidos por droga ou parkinsonismos atípicos, até
porque isto confere diferentes prognósticos para cada paciente.
Referências
BERG, A.T. et al. Revised terminology and concepts for organization of seizures and epilepsies:
report of the ILAE Commission on Classification and Terminology, 2005–2009. Epilepsia
2010;51:676–685.
ENGEL, J.J.R. Report of the ILAE classification core group. Epilepsia 2006; 47:1558–1568.
Capítulo 8 145
STAMELOU, M.; BHATIA, K.P. Atypical parkinsonism: diagnosis and treatment. Neurologic
Clinics. 2015; 33:39-56.
146
CAPÍTULO
Demências no Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Profa. Dra. Ceres Eloah
Demências no Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Profa. Dra. Ceres Eloah
1. Definição
O conceito de demência passou por uma extensa e recente revisão. Pela terminologia do DSM-V,
os termos “demência” e “comprometimento cognitivo leve” foram reformulados em “transtorno
neurocognitivo (TNC) maior” e “transtorno neurocognitivo menor”, respectivamente. Cada tipo
de transtorno pode ser provocado pelas mesmas etiologias (Doença de Alzheimer, vascular, cor-
púsculos de Lewy, frontotemporal, etc), havendo uma diferenciação especial para a nomenclatu-
ra do TNC provocado por Doença de Alzheimer (DA), como descrito ao longo do capítulo. Outro
ponto é que o TNC passa a ser descrito “com ou sem alterações comportamentais”.
O TNC maior pode ser subdivido em fases leve, moderada e grave. Caracteriza-se pelo comprome-
timento de ao menos um domínio cognitivo (atenção, função executiva, memória, aprendizado
e linguagem), confirmado pela entrevista com o paciente e um informante (cuidador ou familiar)
confiável, em que se observe declínio da performance se comparado ao estado prévio do paciente.
Ocorre comprometimento da independência, e o quadro não pode ser provocado por delirium ou
outra doença mental. A principal diferença entre esta conceituação e a terminologia antiga é que
a memória não corresponde mais a um domínio cognitivo obrigatoriamente comprometido (exce-
tuando-se na DA, como será visto adiante) e que não há mais a necessidade do acometimento de
dois domínios cognitivos para se caracterizar o quadro demencial.
Como o termo “demência” não foi abandonado por outras sociedades médicas - como a Alzhei-
mer´s Association, que manteve a terminologia “Demência por Doença de Alzheimer” -, será uti-
lizado neste capítulo o termo demência indistintamente de TNC maior.
O fator de risco mais importante para demência é a idade, mas também são significativos a histó-
ria familiar, histórico de trauma craniano, baixa escolaridade e gênero feminino. O determinante
genético mais significativo é a presença do alelo épsilon 4 da apolipoproteína E. O diagnóstico é
eminentemente clínico, sendo utilizados exames complementares apenas para identificar etiolo-
gias específicas e testes ou baterias neuropsicológicas para quantificar os déficits. As informações
obtidas na história clínica devem ser sempre confirmadas por um familiar ou cuidador confiável.
Os cuidadores devem ser questionados quanto à existência de dificuldades de julgamento, redu-
ção do interesse em atividades usuais, comportamento repetitivo, como fazer perguntas e contar
histórias, dificuldades de aprendizado de algo novo, esquecimentos de datas, problemas com as-
suntos financeiros e pagamento de contas.
Figura 1 - Transtorno neurocognitivo pelo DSM-V
Fonte: Adaptado DE HOWARD, F. et al. Brocklehurst’s Textbook of Geriatric Medicine and Gerontology,
8th Edition. Elsevier, 2017
Capítulo 9 149
2. Epidemiologia
A prevalência de demência no Brasil é de cerca de 7% dos idosos. Nos indivíduos com mais de 80
anos ultrapassa os 30%. Até 80% dos casos, entretanto, não é diagnosticada e a maior parte dos
diagnósticos é feita nas fases mais avançadas da doença. Há uma negligência, tanto de familiares
quanto de profissionais de saúde no reconhecimento de sintomas precoces de déficit cognitivo,
que muitas vezes são identificados como típicos do envelhecimento. O envelhecimento normal
caracteriza-se por uma redução na velocidade do processamento cognitivo e maior dificuldade
para lidar com estímulos cognitivos competitivos e sustentar a atenção. Estas modificações, en-
tretanto, não são progressivas e não comprometem as funções diárias do idoso.
O diagnóstico precoce permite detectar causas reversíveis, planejar adaptações, reduzir o impac-
to psicossocial da doença para o paciente e a família e reduzir a chance de institucionalização.
A fase leve da doença se caracteriza por comprometimento apenas das atividades instrumentais
e preservação das atividades básicas de vida diária. Nesta fase, além das alterações de memória,
existem dificuldades de orientação e nomeação. Na fase moderada já há comprometimento de ao
menos uma atividade básica. Começam a surgir dificuldades maiores de compreensão e apren-
dizado. Na fase avançada estão comprometidas pelo menos 3 atividades básicas e há grave pre-
juízo à linguagem, que se torna quase incompreensível, além de surgirem incontinências fecal e
urinária. Desta forma, a avaliação da capacidade funcional é um instrumento importante para o
seguimento clínico do paciente. Uma escala útil para identificar pacientes por grau de acometi-
mento é a FAST (Tabela 2).
150
6 d - Demência moderada grave Incontinência urinária
6 e - Demência moderada grave Incontinência fecal
7 a - Demência grave Incapaz de dizer mais que 5 palavras
7b - Demência grave Capaz de dizer apenas 1 palavra
7c - Demência grave Incapaz de andar sem ajuda
7d - Demência grave Incapaz de se manter sentado sem ajuda
7e - Demência grave Perda da capacidade de sorrir
7f - Demência grave Perda da capacidade de sustentar a cabeça
4. Testes Cognitivos
O diagnóstico de demência, embora seja clínico, deve ser ratificado pela execução de alguns tes-
tes cognitivos. O Mini Exame do Estado Mental, muito embora seja apenas um teste de triagem,
é frequentemente utilizado por sua praticidade. É um teste que em poucos minutos avalia diver-
sos domínios cognitivos, como orientação, atenção, nomeação, cálculo, linguagem e praxia. O
desempenho neste teste é fortemente influenciado pela escolaridade. Estão descritos pontos de
corte para a população brasileira de acordo com os anos de escolaridade. Do total de 30 pontos
do teste, para analfabetos temos ponto de corte em 18; para 1-3 anos de escolaridade, corte em 21;
para 4-6 anos, corte em 24 e para 7 anos ou mais, corte em 26.
O teste de fluência verbal avalia o domínio da linguagem e pode ser aplicado nos indivíduos
analfabetos. Pode-se utilizar o teste de fluência semântica (animais) ou fonêmica. Em 1 minuto,
espera-se que o indivíduo analfabeto mencione 11 palavras e o escolarizado, 14 palavras.
O teste do desenho do relógio, apesar de exigir escolaridade para ser realizado adequadamen-
te, avalia não somente os domínios de memória, mas também a capacidade de planejamento
executivo. O paciente deve ser capaz de desenhar uma circunferência, dispor os números com
espaçamento adequado e incluir os ponteiros mediante a solicitação de marcação de um horário
específico. É aceitável apenas erros ligeiros de colocação dos ponteiros para que haja um bom
desempenho neste teste.
Estes testes isoladamente possuem baixa sensibilidade para ratificar o diagnóstico de demência,
mas quando todos se apresentam alterados há elevada sensibilidade e especificidade para o diag-
nóstico (superior a 90%).
Capítulo 9 151
Figura 2 - Teste do Desenho do Relógio em pacientes com síndrome demencial
5. Etiologias
Didaticamente, as demências são divididas em causas ditas reversíveis e irreversíveis. As princi-
pais causas irreversíveis estão descritas na Tabela 3.
A principal causa de demência é a Doença de Alzheimer (DA), que responde por até 70% dos casos.
Segundo a definição do DSM-V, o TNC maior por DA se caracteriza pelo início insidioso e progressão
gradual, sendo necessário o acometimento de pelo menos 2 domínios cognitivos, sendo um deles a
memória. No TNC menor por DA o acometimento se dá apenas no domínio da memória.
A Alzheimer´s Association também reformulou seus critérios diagnósticos para a DA, que passou
a ser definida como um continuum que se inicia na fase pré-clínica (em que só é possível obter
o diagnóstico por alterações em biomarcadores liquóricos ou exames de imagem, de interesse
apenas para pesquisa clínica), passa pelo comprometimento cognitivo leve (em que há perda
objetiva de memória, mas sem impacto funcional significativo) até chegar à fase demencial pro-
priamente dita. Esta mudança de abordagem do diagnóstico de Doença de Alzheimer tem por
objetivo identificar casos mais precoces dos distúrbios, tendo em vista, no âmbito da pesquisa
clínica, a possibilidade de intervenções que alterem o curso natural da doença, haja vista que os
tratamentos até hoje disponíveis se mostraram pouco eficazes.
152
O National Institute on Aging também ressalta que, a exemplo das demências vascular, fron-
totemporal e por corpúsculos de Lewy, a Doença de Alzheimer pode apresentar espectros não
amnésticos, incluindo-se aí as manifestações comportamentais e alterações de personalidade,
que assumiram o status de domínio cognitivo, assim como a memória, a função executiva, a
linguagem e a habilidade visuoespacial. Desse modo, os critérios diagnósticos para DA (e para
todas a demências) envolveriam o acometimento de pelo menos 2 de qualquer um dos 5 domí-
nios mencionados.
Fonte: Adaptado de FROTA et al. Critérios para o diagnóstico de doença de Alzheimer, 2011
Capítulo 9 153
Tabela 5 - Biomarcadores na Doença de Alzheimer
Fonte: Adaptado de FROTA et al. Critérios para o diagnóstico de doença de Alzheimer, 2011
Fonte: http://www.diffen.com/difference/CT_Scan_vs_PET_Scan
A demência vascular (DV) responde por cerca de 10% das causas de demência e ocorre mais fre-
quentemente nos homens portadores de fatores de risco cardiovascular, tais como hipertensão
arterial sistêmica, diabetes, dislipidemia, tabagismo, fibrilação atrial e aterosclerose manifesta.
Pode haver início abrupto, associado a evento isquêmico, sintomático ou não. A evolução é clas-
sicamente descrita em degraus, mas é comum observar-se também a evolução insidiosa, carac-
terizada por acometimento subcortical, com redução da capacidade em sustentar a atenção e
diminuição da velocidade do pensamento, quadro que às vezes se assemelha a sintomas depres-
sivos. Esta evolução lenta é resultado da ocorrência de múltiplos surtos silenciosos de infartos
lacunares. A evolução costuma ser mais rápida que a da DA. O Escore Isquêmico de Hachinsky é
um instrumento válido para apoiar o diagnóstico diferencial entre DA e DV (Tabela 6).
Cerca de um terço dos pacientes com DA apresentam também achados vasculares no SNC, carac-
terizando uma demência mista, que pode responder por até 15% dos casos de demência. A dete-
rioração clínica destes pacientes costuma ser mais rápida. As alterações de memória são menos
pronunciadas e mais evidente o comprometimento da função executiva (lobo frontal).
154
Tabela 6 - Escore Isquêmico de Hachinski
A demência frontotemporal acomete indivíduos mais jovens, que apresentam alterações preco-
ces de comportamento e do planejamento executivo com relativa preservação da memória. Há
desinibição, impulsividade e oralidade (hábito de levar objetos à boca).
A demência por trauma craniano caracteriza-se pelo declínio cognitivo de instalação súbita, após
um traumatismo craniano, em que houve perda de consciência, amnésia pós-traumática, de-
sorientação e confusão. Há alterações nos exames de imagem cerebral ou sinais neurológicos,
como convulsões, perda de campo visual, anosmia ou hemiparesia.
A demência pelo HIV caracteriza-se por uma destruição difusa da substância branca e do subcór-
tex. O paciente manifesta-se com pensamento lento, apático e retraído socialmente. Pode haver
associação com outros tumores do SNC, como linfomas e infecções oportunísticas, tais como
toxoplasmose, citomegalovírus, criptococose, tuberculose e sífilis.
A demência associada à Doença de Parkinson (DPP) apresenta quadro clínico semelhante à de-
mência por corpúsculos de Lewy. Na DPP, entretanto, os sintomas motores precedem o quadro
demencial em ao menos um ano. Pode afetar até 80% dos portadores de Doença de Parkinson
após 8 anos de duração.
Capítulo 9 155
A Tabela 7 lista as causas reversíveis de demência.
Fonte: Adaptado de HOWARD, F. et al. Brocklehurst’s Textbook of Geriatric Medicine and Gerontology, 8th Edition.
Elsevier, 2017
A depressão ocorre em cerca de 40% dos pacientes dementados e, se não for tratada, pode pro-
vocar rápido agravamento do quadro demencial. A hidrocefalia de pressão normal caracteriza-se
por uma tríade: declínio cognitivo, instabilidade de marcha ou quedas e incontinência urinária.
O exame de imagem (TC ou RM de crânio) costuma revelar dilatação ventricular desproporcional
ao grau de atrofia cortical. Nestes casos, indica-se um teste terapêutico (tap test): o paciente é
submetido a uma punção liquórica para drenagem de 20mL de líquor. Quando o teste é positivo
observa-se melhora espontânea do distúrbio de marcha horas após a punção. Quando a resposta
ao tap test é positiva, há melhor prognóstico clínico na drenagem ventricular definitiva, realiza-
da por meio do implante de uma derivação ventrículo-peritoneal.
6. Exames Complementares
Indica-se a coleta de exames laboratoriais principalmente para afastar as causas reversíveis. De-
vem ser solicitados: hemograma, glicemia, função renal, hepática e tireoidiana, cálcio, vitamina
B12 e sorologia para sífilis. Outros exames, como coleta de líquor, sorologia para HIV, eletroence-
falograma e PET-scan poderão ser indicados em casos isolados.
156
Figura 4 - Imagens de ressonância magnética de crânio revelando diferentes graus de microangiopatia
(Escala de Fazekas 1,2,e 3)
7. Tratamento
O tratamento dos quadros demenciais se dará em função do diagnóstico etiológico. No trata-
mento dos quadros potencialmente reversíveis, o objetivo é a resolução da causa metabólica,
infecciosa ou estrutural que afeta o SNC, como a derivação ventrículo-peritoneal nos casos de
hidrocefalia de pressão normal.
Capítulo 9 157
9. O que são os SCPD
Desde que foi cunhado por Finkel e cols (1999), em reunião de Consenso da International Psycho-
geriatric Association (IPA), o termo Behavioral Psychological Symptoms of Dementia (BPSD) é
usado para descrever um grupo de condições heterogêneas que abrange reações psicológicas,
sintomas psiquiátricos e comportamentos decorrentes das síndromes demenciais. Pode-se dizer
que os BPSD são um grupo de sintomas caracterizados por distúrbio de percepção, alterações
de conteúdo mental, alterações de humor e de comportamento, que frequentemente acometem
pacientes com demência. O termo correspondente em português é SCPD – sintomas comporta-
mentais e psicológicos da demência.
Comportamento motor
Delírios Depressão Distúrbio do Sono
aberrante
Alucinações Ansiedade Desinibição Apatia
Agitação Euforia Alteração do apetite Irritabilidade
158
• Identificar quais sintomas causam maior desconforto/ perturbação;
Agitação/agressividade
1. Distrair o paciente e redirecionar atividades para tirar o foco de atenção sobre situações
problemáticas.
Capítulo 9 159
Delírios
2. Considerar o uso de medicação antipsicótica e, para tal, discutir com o médico responsável
esta possibilidade.
Comportamento repetitivo
1. Responder com firmeza e sempre que necessário. Distrair o paciente. Usar calendários,
agenda e relógio.
Ansiedade
3. Não comunicar ao paciente, por exemplo, uma atividade que será realizada no final de se-
mana, antecipadamente.
Apatia
1. Convidar a pessoa para fazer atividades que tenham sido, e, principalmente, ainda sejam,
agradáveis a ela.
2. Faça com que a pessoa sinta-se importante na participação de qualquer conversa ou ativi-
dade proposta.
Perambulação
1. Avise amigos, vizinhos, parentes e comerciantes que a pessoa poderá se perder e, portan-
to, caso o paciente seja visto perambulando, peça que a família seja avisada imediatamen-
te.
2. Utilize pulseiras com identificação com o telefone do cuidador e, se possível, a doença que
a pessoa apresenta.
3. Garanta a segurança ambiental com luzes, corrimões, retirada de tapetes soltos, manuten-
ção de portas trancadas e das chaves em local seguro, uso de telas ou grades de proteção
em andares altos.
160
Alucinações
2. Considere o uso de medicações antipsicóticas quando necessário, mas só utilize essas me-
dicações com prescrição médica.
3. Informe inteiramente à família e aos cuidadores dos riscos / benefícios desses medicamentos.
Risco de acidentes
As orientações são extensas e devem ser explicadas de forma individualizada. Deve-se lembrar
que tanto a falta de orientações quanto o excesso de recomendações podem aumentar a sobre-
carga do cuidador. Reforçar junto aos cuidadores que os SCPD:
2. Todos os pacientes apresentam algum tipo de SCPD em algum momento do curso evoluti-
vo da demência.
Capítulo 9 161
4. As alterações de comportamento como agitação e agressividade são mais comuns nas fases
moderadas da doença.
5. Os SCPD tendem a atingir um pico de frequência antes da fase avançada, quando tendem a
declinar.
7. É preciso estar atento à presença de delirium, associado a causas orgânicas tratáveis como
infecções, desidratação, pneumonias, fecaloma, dentre outras causas clínicas.
• Inclui um programa estruturado que provê informações sobre a doença, recursos e servi-
ços sobre como expandir a habilidade de resposta eficaz aos sintomas da doença.
• Inclui atividades que envolvem palestras, discussões e entrega de materiais impressos pro-
duzidos por profissionais treinados.
Suporte
• Intervenções que dão a oportunidade de mudar estratégias que podem ser mais efetivas.
162
Psicoterapêutico
• A atividade física também reduz a progressão do declínio funcional. Cuidados com relação
aos déficits de deglutição e consequente desnutrição são fundamentais, bem como a pre-
venção do imobilismo e do surgimento de úlceras por decúbito.
Uma outra questão no tópico farmacológico é o tratamento dos sintomas comportamentais, que
se tornam mais frequentes a partir da fase moderada da doença. São sintomas de agitação, de-
sinibição, inquietude, agressividade, irritabilidade, alucinações, ansiedade e insônia com pe-
rambulação noturna. Quando as abordagens comportamental e ambiental não forem suficientes
para o controle dos sintomas, está indicado o uso de fármacos. Os de uso mais habitual são os
antipsicóticos. O Food and Drug Administration (FDA) - agência federal do Departamento de
Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos - não autoriza o uso destas medicações para o
controle de sintomas comportamentais nas demências, dado o risco aumentado de morte asso-
ciado a acidente vascular cerebral isquêmico (RR=2). Desta forma, deve-se preferir o uso pontual
e sintomático, das menores doses possíveis, dando-se preferência a antipsicóticos atípicos (tais
Capítulo 9 163
como risperidona, quetiapina e olanzapina), que produzem menos efeitos extrapiramidais. Po-
de-se recorrer também a anticonvulsivantes (como divalproato de sódio e carbamazepina) e a
antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina, principalmente nos sintomas
ansiosos. Deve-se evitar o uso de benzodiazepínicos.
O tratamento dos fatores de risco cardiovascular mesmo nos pacientes com DA sem quaisquer
sinais de doença cerebrovascular instalada está associado à redução da progressão do declínio
cognitivo.
Teste do Relógio:
164
Em função destes resultados, o neurologista solicitou exames de sangue, de líquor, um ECG e
uma ressonância magnética do crânio. Prescreveu memantina 5mg à noite e pediu que retornas-
sem o quanto antes com os resultados.
Após 10 dias, o paciente retorna com os resultados. A esposa refere que o quadro de memória
encontra-se inalterado, mas que há dois dias Osvaldo teve dificuldade para abotoar sua camisa e
afivelar o cinto, precisando de ajuda da esposa para se vestir.
Hb 13,2 g/dL Glicose: 78 mg/dL Uréia: 35 mg/dL Creatinina: 0,8 mg/dL Na: 142 mEq/L K: 3,8
mEq/L Cálcio ionizado: 1,21 (normal de 1,10-1,30 mEq/L) TSH: 25 UI/mL T4 livre: 0,4 UI/mL vi-
tamina B12: 110 (normal de 150-800 mg/dL)
Fonte: https://emedicine.medscape.com/article/344482-overview#a3
Capítulo 9 165
O eletrocardiograma está abaixo:
Fonte: Chinitz, J.S., et al. , Atrial Fibrillation Through the Years - Contemporary Evaluation and Management.
Circulation. 2013; 127:408-416
Questionamentos:
2. Qual seria sua conduta, nesse momento, no que se refere ao tratamento do quadro cognitivo?
4. Qual a justificativa clínica para a solicitação de exame liquórico neste caso? Como interpre-
tar os resultados deste paciente?
13. Conclusões
• O termo demência designa a ocorrência de déficits cognitivos associados a alguma incapa-
cidade funcional.
166
• A causa degenerativa mais comum é a Doença de Alzheimer. Causas potencialmente rever-
síveis também devem ser investigadas.
Referências
AALTEN, P. et al. (2005a). The course of neuropsychiatric symptoms in dementia. Part I: findings
from the two-year longitudinal Maasbed study. International Journal of Geriatric Psychiatry.
ALBERT, M.S. et al. The diagnosis of mild cognitive impairment due to Alzheimer´s disease: re-
commendations from the National Institute on Aging – Alzheimer´s Association diagnostic gui-
delines for Alzheimer´s disease. Alzheimer´s & Dementia: The Journal of the Alzheimer´s Associa-
tion 2011;7(3):270-9.
BRODATY, H.; DRAPER, B.M.; LOW, L. Behavioral and Psychological symptoms of dementia: a
seven-tiered model of service delivery. The Medical Journal of Australia. 2003; 178: 231–234.
CAMPBELL, N.L. et al. Use of anticholinergics and the risk of cognitive impairment in an African
American population. American Academy of Neurology 2010;75:152.
DESCHAINTRE, Y. et al. Treatment of vascular risk factors is associated with slower decline in
Alzheimer disease. American Academy of Neurology 2009;73:674.
FERRETTI, C.E.L.; MINETT, T.S.C.; BERTOLUCCI, P.H.F. Behavior disorders and subjective bur-
den among caregivers of demented patients. Dementia & Neuropsychologia. 2007; 2:190-195.
FERRETTI, C.E.L. Abordagem Psicossocial. In BRUCKI, S.M.D. et al. (Org) Demência Avançada. 1ª
ed. São Paulo: Omnifarma, 2015.
______________ O que a Enfermagem pode fazer pelo portador de demência e sua família. In: CAO-
VILLA, V.P.; CANINEU, P.R. Você não está sozinho, vol 1 cap 15 ABRAz- Associação Brasleira de
Alzheimer. 2015. São Paulo.
FINKEL, S.I. Behavioral and Psychological Signs and Symptons of Dementia: A Consensus State-
ment on Current Knowledge and Implications for Research and Treatment. International Journal
of Geriatric Psychiatry. Vol. 12:1060-1061 (1997).
Capítulo 9 167
FORBES, D. et al. Exercise programs for people with dementia. The Cochrane Database of Syste-
matic Reviews 2015;4:CD006489.
FROTA, N.A. et al. Critérios para o diagnóstico de Doença de Alzheimer. Dementia Neuropsycho-
logia 2011 June;5(Suppl1):5-10.
GALVIN, J.E. et al. validity and reliability of the AD8 informant interview in dementia. American
Academy of Neurology 2006;67:1942.
KAUFER, D.I. et al. VAliation of the NPI-Q, a Brief Clinical Form of the Neuropsychiatric Inven-
tory. The Journal of Neuropsychiatry & Clinical Neurosciences. 12:2, Spring 2000
KNOPMAN, D.S. et al. Practice parameter: diagnosis of dementia (an evidence-based review). Re-
port of the Quality Standards Subcommittee of the American Academy of neurology. American
Academy of Neurology 2001;56:1143.
PETERSEN, R.C. et al. Memory function in normal aging. American Academy of Neurology
1992;42:396.
SADOWSKY, C.H.; GALVIN, J.E. Guidelines for the Management of Cognitive and Behavioral Pro-
blems in Dementia. The Journal of the American Board of Family Medicine. 2012;25:350-366
SCARMEAS, N. Delusions and hallucinations are associated with worse outcome in Alzheimer
disease. Archives of neurology. 2005. 62, 1601–1608.
SÖRENSEN, S.; PINQUART, M.; DUBERSTEIN, P. How effective are interventions with caregivers?
An updated meta-analysis. Gerontologist. 2002 Jun; 42(3):356-72
SOUZA, C.S.S.M. et al. Factors associated with the resilience of family caregivers of persons with
dementia: a systematic review. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Rio de Janeiro,
2016; 19(4):703-714
SPERLING, R.A. et al. Toward defining the preclinical stages of Alzheimer’s disease: recommen-
dations from the National Institute on Aging-Alzheimer’s Association workgroups on diagnostic
guidelines for Alzheimer’s disease. The Journal of the Alzheimer’s Association 2011 May;7(3):280-92.
WHO. World Health Organization World report on ageing and health. WHO Library Cataloguing
-in-Publication Data, 2015.
WOODS, B. et al. Cognitive stimulation to improve cognitive functioning in people with demen-
tia. The Cochrane Database of Systematic Reviews 2012;2:CD005562.
Na web:
1. Alzheimer’s Disease International / Bupa. Relatório ADI/Bupa - Demência nas Américas: custo
atual e futuro e prevalência da doença de Alzheimer e outras demências. ADI/Bupa; outubro
de 2013. Available on: https://www.alz.co.uk/sites/default/files/pdfs/dementia-in-the-americas
-BRAZILIAN-PORTUGUESE.pdf [Access Jan 15, 2017].
168
CAPÍTULO
Delirium no Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Delirium no Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
1. Introdução
Delirium é uma síndrome mental orgânica, caracterizada por confusão mental, redução da aten-
ção, de início abrupto e curso flutuante. Ocorre por perda da homeostase cerebral e desorganiza-
ção da atividade neural. A maior parte dos pacientes se recupera após dias ou semanas do início
do quadro, especialmente quando a causa é identificada e tratada prontamente (Tabela 1). Apesar
de seu caráter agudo, o início dos sintomas pode ser insidioso, precedido em alguns dias de redu-
ção da concentração, irritabilidade, distúrbios do sono e alucinações fugazes.
2. Epidemiologia
O delirium pode responder por mais de 20% das admissões hospitalares de idosos. Em unida-
des de terapia intensiva, a prevalência de delirium pode ultrapassar 70% entre idosos. Apesar
de sua elevada frequência, é subdiagnosticado em mais da metade dos casos, o que compromete
seu prognóstico, em virtude do atraso na identificação de suas causas subjacentes. O diagnóstico
tardio de delirium aumenta a chance de agravamento do quadro clínico, tornando-o até irreversí-
vel, pelo consumo das reservas funcionais orgânicas. O delirium está relacionado à mortalidade
hospitalar em 25-60% dos casos e a maiores taxas de institucionalização após a alta. Além disso,
os idosos afetados por delirium apresentam um risco maior de declínio cognitivo permanente,
mesmo após seis meses de recuperação, sugerindo que idosos que desenvolvem delirium já apre-
sentam maior fragilidade cognitiva.
3. Manifestações Clínicas
O delirium habitualmente se manifesta com desorientação temporal e espacial, podendo surgir
distúrbios da percepção como alucinações visuais. É frequente haver uma fase prodrômica, em
que há sintomas de fadiga, distúrbios do sono, ansiedade e irritabilidade. Apresenta piora no pe-
ríodo vespertino e o ciclo sono-vigília normalmente está comprometido. Pode se manifestar de
três formas:
a) Hipoativa, que é a forma mais comum e de mais difícil detecção, manifesta por apatia
ou rebaixamento do nível de consciência;
4. Diagnóstico
Existem algumas estratégias para o reconhecimento do delirium, entre elas, a aplicação do Con-
fusion Assessment Method – CAM. É um instrumento padronizado e validado para o português,
com sensibilidade e especificidade em torno de 94% (Tabela 3). Logo após o reconhecimento do
delirium, a tarefa mais importante é a identificação das causas potenciais, o adequado tratamen-
to e a prevenção de iatrogenias. Muitas vezes, a única apresentação clínica de uma doença física
potencialmente grave é o estado confusional agudo, especialmente nos idosos que já apresentam
declínio cognitivo. O delirium frequentemente é multifatorial; em cerca de 50% dos casos é pos-
sível identificar ao menos dois fatores causais. A reação adversa a drogas responde por cerca de
30% das causas de delirium. A Tabela 2 descreve os seus principais fatores de risco.
Fonte: Adaptado de Jeffrey Halter et al. Hazzard’s Geriatric Medicine and Gerontology, 7th Edition.
McGraw-Hill Education, 2017
Capítulo 10 171
Tabela 2 - Fatores de Risco para Delirium
Fonte: Adaptado de Jeffrey Halter et al. Hazzard’s Geriatric Medicine and Gerontology,
7th Edition. McGraw-Hill Education, 2017
Fonte: Delirium in the Older Person: A Medical Emergency. Island Health, 2006
172
O principal diagnóstico diferencial a ser estabelecido no delirium é com demência. Como a aplicação
de testes cognitivos é inapropriada no quadro confusional agudo, o diagnóstico diferencial depende-
rá fundamentalmente das informações colhidas junto a familiares ou cuidadores. Deve ser investi-
gada de forma objetiva as condições cognitivas e funcionais prévias do paciente, considerando que o
principal fator de risco para o desenvolvimento de delirium é a própria síndrome demencial.
5. Tratamento
O tratamento será definido a partir da identificação das causas do delirium. Cerca de 30% dos
quadros de delirium são provocados por efeito adversos a drogas, especialmente as que possuem
efeitos sedativos O tratamento do delirium se dá eminentemente no ambiente hospitalar, dada
à gravidade da doença e ao elevado risco de mortalidade. Alguns exames laboratoriais são obri-
gatórios, como hemograma, determinação dos eletrólitos, dos níveis de glicose, da função renal
e hepática, dos marcadores de necrose miocárdica, além de análise de um exame de urina, RX
de tórax e ECG. Outros exames poderão ser necessários, como função tireoidiana, gasometria
arterial, culturas de sangue e urina, análise de líquor e exames de imagem do sistema nervoso
central e eletroencefalograma.
Drogas implicadas com o surgimento de delirium devem ser descontinuadas, bem como devem
ser corrigidos fatores que possam agravar a confusão mental, tais como desidratação, imobilida-
de, déficits visuais e auditivos, além dos distúrbios do sono. Deve ser investigado o histórico de
introdução recente de fármacos.
Os pacientes que apresentam agitação psicomotora devem ser medicados com neurolépticos. A
droga de eleição na fase aguda é o haloperidol 0,5-1mg, a cada 30 minutos, até se obter a tranqui-
lização. Devem ser evitadas doses superiores a 4,5mg/dia. Alternativas são o uso dos antipsicóti-
cos atípicos, como risperidona (dose inicial: 0,5mg) e quetiapina (dose inicial: 25mg). Na Tabela
4 estão dispostas as equivalências de dose para alguns antipsicóticos.
Fonte: Adaptado de Drug Information Handbook for Psychiatry, Lexi - Comp, 2009
Capítulo 10 173
O uso de benzodiazepínicos deve ser evitado, excetuando-se no delirium por abstinência a esta
substância ou nos casos de abstinência alcoólica. Os aspectos sensoriais e ambientais também
são de importância para a recuperação clínica. Deve-se dar preferência a manter o paciente em
ambientes silenciosos, bem iluminados durante do dia, garantindo-se a manutenção de órteses
como óculos, aparelhos auditivos e próteses dentárias, que favorecem a orientação e comunica-
ção. Relógios, calendários e orientações verbais podem evitar a confusão mental. A estimulação
cognitiva também é útil, como as visitas de familiares e amigos. Bebidas quentes ao deitar, mú-
sica relaxante, iluminação suave e massagem também são recursos úteis. Deve-se evitar a con-
tenção física, que agrava o quadro confusional e propicia o surgimento de úlceras por decúbito.
Além disso, garantir a adequada hidratação e nutrição, mantendo-se a cabeceira do leito elevada
por conta do risco de broncoaspiração. O sono noturno poderá ser facilitado evitando-se a admi-
nistração de medicamentos nesse período e reduzindo ruídos. O uso de tampões auditivos reduz
o risco de delirium nas unidades de terapia intensiva. Parte significativa das medidas terapêu-
ticas atuarão também como medidas preventivas, evitando o agravamento e prolongamento do
quadro confusional.
6. Estudo de Caso
Você está no pronto-socorro e terá de atender o sr. Marcílio, 70 anos, atendente de bar. Ele traba-
lhava até há 3 anos, quando teve AVCi e ficou com sequela de hemiparesia leve à direita. É trazido
ao PS pela esposa Vilma porque há dois dias está “diferente” do seu habitual. A esposa relata
que começou a se tornar mais irritado e, às vezes, muito quieto e apático. Há 1 dia começou a
apresentar confusão mental, falar sobre coisas sem sentido e ficar mais agitado. Nessas horas, o
paciente esfrega a mão no abdome mas nega sentir dor. Trata HAS e DM com enalapril 10mg/dia e
metformina 850mg 8/8 horas. Usa também loperamida 2mg 1 x ao dia, porque apresenta diarreia
crônica que já foi investigada no posto de saúde sem conclusão diagnóstica. À noite usa clonaze-
pam 2mg para tratar insônia, que adquiriu depois do AVCi. Toma também sertralina 50mg/dia.
Usa aparelho auditivo à esquerda há cerca de 5 anos. Ontem, por achar que estivesse com dor, a
esposa administrou 40 gotas de Escopolamina (Buscopam ® ), o que ajudou bastante na agitação.
Quando perguntado sobre suas condições cognitivas prévias, Vilma informa que o esposo era
normal (sic). A única coisa que também lhe chama a atenção, além da confusão mental, é que há
2 dias não está evacuando, nem urinando, nem ingerindo líquidos e alimentos, o que a deixou
preocupada e a fez trazê-lo ao PS.
Hidratado.
Pulmões limpos.
174
Enquanto o paciente aguarda a coleta de material para exames laboratoriais que você solicitou,
a esposa lhe informa que ele está ficando agitado. Na sala de medicação, começou a discutir com
o auxiliar de enfermagem, chamando-o de “ladrão” e dizendo que “ninguém vai roubar assim o
meu bar”. A enfermeira-chefe solicitou que ele se deitasse em uma maca para colher o material
para exames e orientou a contenção física do paciente, o que deixou a esposa aborrecida e cho-
rosa.
Questionamentos:
1. Qual o diagnóstico sindrômico deste paciente? Qual sua etiologia mais provável?
3. Qual é sua conduta terapêutica neste momento? O que fazer com as prescrições de clonaze-
pam e sertralina?
4. Pelo relato da esposa o paciente parecia ser cognitivamente normal. Esta informação parece
confiável? Que método(s) você escolheria para se avaliar o estado cognitivo deste paciente?
7. Conclusões
• O delirium é um quadro confusional agudo que costuma ter uma causa clínica subjacente.
Referências
CARNES, M. et al. Physicians vary in approaches to the clinical management of delirium. Journal
of the American Geriatrics Society 2003;51:234.
COLE, M.G.; PRIMEAU, F.J. Prognosis of delirium in elderly hospital patients. Canadian Medical
Association Journal 1993;149:41.
Capítulo 10 175
FARBER, J.I. et al. Operational and quality outcomes of a mobile acute care for the elderly servi-
ce. Journal of Hospital Medicine 2011;6:358.
LANDEFELD, C.S. et al. A randomized trial of care in a hospital medical unit especially designed
to improve the functional outcomes of acutely ill older patients. The New England Journal of Me-
dicine 1995;332:1338.
LONERGAN, E. et al. Antipsychotics for delirium. The Cochrane Database of Systematic Reviews
2007;CD005594.
MARCANTONIO, E. et al. Delirium severity and psychomotor types: their relationship with out-
comes after hip fracture repair. Journal of the American Geriatrics Society 2002;50:850.
SACZYNSKI, J.S. et al. Cognitive trajectories after postoperative delirium. The New England Jour-
nal of Medicine 2012;367:30.
SCHWEICKERT, W.D. et al. Early physical and occupational therapy in mechanically ventilated,
critically ill patients: a randomized trial. Lancet 2009;373:1874.
VAN ROMPAEY, B. et al. The effect of earplugs during the night on the onset of delirium and
sleep perception: a randomized controlled trial in intensive care patients. Journal of Critical Care
2012;16:R73.
176
CAPÍTULO
Depressão no Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Depressão no Idoso
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
1. Introdução
A depressão é um distúrbio do humor caracterizado por sintomas psicológicos, comportamentais
e físicos. Afeta até 10% da população idosa da comunidade e até 30% dos idosos hospitalizados.
Nos pacientes afetados por AVC, infarto do miocárdio ou câncer a prevalência de depressão pode
chegar a 40%. A depressão está associada ao aumento da mortalidade, do risco de suicídio e do
desenvolvimento de demência.
2. Critérios diagnósticos
Os principais critérios diagnósticos, de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Trans-
tornos Mentais/2013 (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – DSM), da Associa-
ção Americana de Psiquiatria, estão descritos na Tabela 1.
Humor deprimido na maior parte do dia, na maior parte dos dias da semana,
confirmado pelo paciente ou familiares.
Perda do interesse ou do prazer.
Agitação ou retardo psicomotor.
Perda ou ganho de peso ou apetite (5% em 1 mês).
Insônia ou hipersônia.
Fadiga ou diminuição de energia.
Sentimentos de inutilidade ou culpa excessivos ou inadequados.
Redução da capacidade de pensar ou concentrar-se.
Pensamentos de morte ou suicidas.
A depressão maior se caracteriza pela presença obrigatória de ao menos 5 desses sintomas, sendo
obrigatórios o primeiro e o segundo deles. Os sintomas devem estar presentes ao menos por duas
semanas.
O clínico deve estar atento à existência de depressões reativas, relacionadas a eventos vitais como
luto ou estressores psíquicos. A tendência é que haja recuperação espontânea, em período variá-
vel de meses a um ano. Estes pacientes não deverão ser tratados farmacologicamente, a menos
que apresentem sintomas graves ou tendência à piora, com significativo impacto funcional.
Capítulo 11 179
A Tabela 3 indica os principais fatores de risco para depressão nos idosos:
b) A condição social, ou seja, o modo como o paciente se relaciona com a família e a socieda-
de, os vínculos afetivos com amigos e a rede de suporte social. Dessa forma, a viuvez e a
perda de familiares e amigos, o isolamento social, a privação sensorial, a aposentadoria e a
mudança de papéis sociais na família são fatores predisponentes para depressão;
A depressão nos pacientes muito idosos pode ser a manifestação prodrômica de um quadro demen-
cial. Dessa forma, a cognição deve ser sempre monitorada. A abordagem diagnóstica deve excluir
causas orgânicas para o distúrbio de humor, como diabetes descompensado, anemia, doenças da
tireoide, do metabolismo do cálcio, apneia do sono, cardiopatias, uremia, demência e medicamen-
tos (como anti-hipertensivos de ação central e benzodiazepínicos). Em alguns idosos a depressão
pode ser a única manifestação de neoplasias, especialmente malignidades abdominais.
4. Tratamento
Quando não tratada, a depressão aumenta a mortalidade, reduz a adesão a tratamentos de outras
doenças clínicas e aumenta o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares.
Apenas um terço dos pacientes é tratado adequadamente, com fármaco e psicoterapia. A psi-
coterapia, em especial a psicoterapia breve no modelo cognitivo-comportamental, é útil para o
tratamento da depressão nos idosos. Para quadros de depressão leve, a atividade física pode ser
um bom recurso, principalmente se existirem sintomas ansiosos associados.
Com relação ao tratamento farmacológico, deve ser indicado nos casos moderados e graves de
depressão. Deve ser iniciado sempre em monoterapia. Podem ser utilizados, basicamente, anti-
180
depressivos e estabilizadores de humor, evitando-se o uso de benzodiazepínicos. Nos casos de
insônia, preferir hipnóticos não benzodiazepínicos, como o zolpidem ou antidepressivos modu-
ladores de serotonina, como a trazodona.
As drogas antidepressivas apresentam perfil de eficácia semelhante entre si. Dessa forma, serão
selecionadas tendo em vista seu perfil de efeitos colaterais. Com relação à terapêutica farmacoló-
gica deve-se cuidar para evitar a ocorrência tanto de subtratamento quanto de supertratamento.
Para evitar o subtratamento é necessário rever periodicamente as drogas, suspender ou trocar se
necessário, e organizar um planejamento terapêutico, que reconheça a resposta clínica ao medi-
camento, a remissão, a recaída e a recorrência. Para evitar o supertratamento, buscar orientar a
terapêutica não exclusivamente pela intervenção medicamentosa, julgar de forma crítica quais
os limites e os benefícios do uso de medicações para cada paciente, levando em conta os efeitos
adversos e, principalmente, não confundir depressão com tristeza. A tristeza é um sentimento e,
como tal, não deve ser interpretado como doença ou medicado.
As medicações devem ser iniciadas em doses baixas e reavaliadas após 4 a 6 semanas de uso,
quanto à manutenção, ajuste de dose ou substituição. Deve-se lembrar que, após a primeira ten-
tativa de tratamento, ainda 50% dos pacientes não terão se recuperado, exigindo mudança do
esquema terapêutico. A resposta completa a um antidepressivo é mais lenta nos idosos e cos-
tuma ser menos robusta que aquela observada nos pacientes mais jovens. Após 8 semanas de
tratamento na fase aguda, se houver adequada resposta, segue-se uma etapa de 4 a 9 meses, de
prevenção de recaídas e recuperação de funcionamento psicossocial. Os medicamentos antide-
pressivos poderão, nesta fase, ter suas doses reduzidas. Evita-se a suspensão completa do trata-
mento antes de seis meses, haja vista que a taxa de recorrência de sintomas nos idosos é elevada.
Como regra, o tratamento é mantido por pelo menos um ano. A Tabela 3 lista as principais classes
de antidepressivos, princípios ativos e doses usuais.
Dentre as drogas adjuvantes ao tratamento vale a citação do metilfenidato, que em estudos re-
centes com idosos demonstrou benefício ao ser associada ao citalopram. O tratamento também
pode ser potencializado com anticonvulsivantes, estabilizadores de humor e levotiroxina. Pa-
cientes que necessitam de tratamentos combinados, entretanto, devem ser referenciados a psi-
quiatras para seguimento.
Capítulo 11 181
Tabela 3 – Antidepressivos
Um outro tratamento disponível para a depressão em fase leve e moderada é a estimulação elétri-
ca transcraniana, técnica não invasiva que atua pela modulação da excitabilidade cerebral, com
melhora dos sintomas depressivos.
182
A depressão quando não tratada adequadamente se torna crônica e de mais difícil manejo, con-
dicionando perdas funcionais e comportamento desadaptado. Há ainda o aumento do risco em
até três vezes para o surgimento de infarto agudo do miocárdio e duas vezes para demência por
Doença de Alzheimer, diabetes e acidente vascular cerebral isquêmico. Há um risco de até 30%
da depressão se tornar uma doença crônica, necessitando de suporte farmacológico contínuo.
5. Estudo de Caso
Um clínico está atendendo no consultório a sra. Alzira, 69 anos, viúva e auxiliar de serviços ge-
rais. Ela trabalha em uma repartição pública e é acompanhada na consulta pela amiga do serviço,
Vera, já que não tem filhos e mora sozinha há 4 anos, desde que o marido faleceu. Ela procura
atendimento porque tem se sentido muito cansada nos últimos 3 meses. No último mês chegou
a faltar ao trabalho por dois dias, com muita sonolência e sem vontade de sair da cama. Quei-
xa-se de dores nos braços e na região cervical posterior que não a deixam dormir à noite. Conta
também declínio do apetite, tendo perdido 7kg nesse período. A amiga informa que está muito
preocupada com Alzira porque ela abandonou o tratamento que fazia com hidroclorotiazida e
amitriptilina, prescrito no posto de saúde. Acha que Alzira está muito cansada, com falta de ar
e esquecimentos, inclusive se confundindo nas atividades do trabalho. Acha também que ela
está fumando e bebendo cerveja demais. Alzira informa que interrompeu o tratamento porque
apresentava muita tontura e não suportava tomar a medicação, tendo havido melhora quando
as suspendeu. Reconhece que está bebendo muita cerveja e que deseja parar porque começou a
ouvir vozes estranhas e incompreensíveis dentro de casa, principalmente à noite. É tabagista de
48 maços/ano (1 maço de cigarros ao dia desde os 21 anos) e etilista de 4 garrafas de cerveja/dia
há cerca de 30 anos.
RCR sem sopros. Pulmões com MV difusamente reduzido, sem sibilos. Abdome flácido, indolor.
Após examinar a paciente, o clínico solicitou alguns exames e iniciou tratamento com sertralina
50mg/manhã e solicitou retorno em 2 semanas.
Após 2 semanas, a paciente retorna informando piora do apetite e insônia. Está mais cansada e
faltou no serviço por 4 dias seguidos na última semana.
Exames: Hb 10,5 g/dL Ht 32,9% HCM 22 VCM 109 Uréia 45 mg/dL Creatinina 0,9mg/dL Glicose
92mg/dL Na 143mEq/L K 3,9mEq/L urina tipo I: 9.000 leucócitos por campo; urocultura negativa.
Capítulo 11 183
Em função deste cenário, o médico optou por suspender sertralina e introduzir outro antidepressivo.
Questionamentos:
6. Conclusões
• A depressão é condição frequente nos idosos e está associada a aumento de mortalidade,
risco de suicídio e declínio cognitivo.
• Os sintomas depressivos nos idosos podem ser atípicos, com mais sintomas físicos e menos
sintomas psicológicos.
• Os antidepressivos costumam ter eficácia semelhante entre si, sendo escolhidos de acordo
com o perfil de efeitos colaterais de maior tolerabilidade ao paciente.
7. Referências
BURKE, W.J.; WENGEL, S.P. Late-life mood disorders. Clinics in Geriatric Medicine 2003;19:777.
HUANG, A.X. et al. A systematic review and meta-analysis of psychotherapy for late-life depres-
sion. The American Journal of Geriatric Psychiatry 2015;23:261.
HUSAIN, M.M. et al. Speed of response and remission in major depressive disorder with acute
electroconvulsive therapy (ECT): a Consortium for Research in ECT (CORE) report. Journal of
Clinical Psychiatry 2004;65:485.
LYNESS, J.M. et al. Outcomes of minor and subsyndromal depression among elderly patients in
primary care settings. Annals of Internal Medicine 2006;144:496.
184
SINYOR, M.; SCHAFFER, A.; LEVITT, A. The sequenced treatment alternatives to relieve depres-
sion (STAR D) trial: a review. The Canadian Journal of Psychiatry 2010;55(3):126-35.
SJÖSTEN, N.; KIVELÄ, S.L. The effects of physical exercise on depressive symptoms among the
aged: a systematic review. International Journal of Geriatric Psychiatry 2006:21:410.
SOLAI, L.K.; MULSANT, B.H.; POLLOCK, B.G. Selective serotonin reuptake inhibitors for late-life
depression: a comparative review. Drugs Aging 2001;18:355.
SPINA, E; SCORDO, M.G. Clinically significant drug interactions with antidepressants in the el-
derly. Drugs Aging 2002;19:299.
YESAVAGE, J.A. et al. Development and validation of a geriatric depression screening scale: a
preliminary report. Journal of Psychiatric Research. 1983;17:37-4
Capítulo 11 185
CAPÍTULO
Transtornos de ansiedade
e sono no idoso
Profa. Paula Cristina Eiras Poço
Profa. Vanessa Silva Suller Garcia
Transtornos de ansiedade e sono no idoso
Profa. Paula Cristina Eiras Poço
Profa. Vanessa Silva Suller Garcia
1. Caso Clínico
Senhora Ivone, de 82 anos, comparece à consulta médica acompanhada de seu filho. É desqui-
tada, vive sozinha, porém passa o dia em companhia de seus netos. Aposentou-se do trabalho
de costureira, mas ainda aceita pequenas encomendas para complementar a renda. Realizava
tratamento irregular de hipertensão e dislipidemia até 6 meses atrás, quando apresentou infarto
agudo do miocárdio e passou a se preocupar com sua saúde. Procurou atendimento por dificulda-
de em iniciar e manter o sono há 6 meses, desde a internação pelo infarto. Lembra com angústia
dos dias no hospital, com receio de pegar no sono e morrer dormindo, mas acha que esse medo é
exagerado. Conta que sempre teve um sono agitado e seu falecido esposo reclamava de roncos.
Chegou a usar CPAP por apneia obstrutiva do sono, porém abandonou o uso pelo desconforto do
dispositivo. Voltou a usá-lo há 2 meses, quando passou a despertar no meio da noite com mal-es-
tar e falta de ar, o que proporcionou pequena melhora desses sintomas. Acorda de manhã indis-
posta e com dor cervical, mas logo inicia suas tarefas e tem a impressão que a cabeça está “a mil
por hora”. Confessa que os netos a deixam sobrecarregada e irritada, mas o filho está precisando
dessa ajuda neste momento. Refere ainda dispneia aos grandes esforços, o que não limita suas
atividades. Nega ortopneia, palpitação, dor torácica e edema periférico. Não faz atividade física.
Tem dificuldade recente de lembrar onde guardou objetos e não dá conta de realizar mais de uma
tarefa ao mesmo tempo, como costurar e vigiar os netos. Tem que ir e voltar de um cômodo para
o outro para lembrar-se do que estava fazendo ou o que estava procurando. Apresenta queixas
de memória iniciadas junto ao quadro de insônia. A avaliação cognitiva foi normal para o grau de
escolaridade e o exame físico sem particularidades.
2. Transtornos de ansiedade
Os transtornos de ansiedade englobam comportamentos de medo e ansiedade que, quando ex-
cessivos e persistentes, causam sofrimento e esquiva. O medo é a resposta emocional fisiológica
à ameaça iminente, real ou percebida, enquanto que a ansiedade representa a antecipação de
ameaça futura. A evolução recorrente e crônica desses comportamentos, em geral maior que 6
meses, é o que distingue os transtornos de respostas adaptativas e transitórias, desencadeadas
principalmente por estresse.
Os quadros ansiosos diferem entre si pelas situações temidas ou evitadas e pelo conteúdo dos
pensamentos ou crenças associadas, embora tendam a ser altamente comórbidos entre si. As
principais características dos transtornos de ansiedade estão ilustradas na Tabela 1. Uma avaliação
clínica detalhada é, portanto, essencial para um diagnóstico mais preciso. Apesar de afetarem ini-
cialmente adultos jovens, os quadros de ansiedade podem surgir tardiamente, em particular entre
a quinta e a sexta décadas de vida. Diversos fatores predisponentes para o desenvolvimento de
transtorno de ansiedade generalizada (TAG) no idoso foram identificados, dos quais se destacam:
- Sexo feminino;
- Personalidade neurótica;
Capítulo 12 189
O impacto da ansiedade patológica é considerável e semelhante ao da depressão. No entanto,
acredita-se que seja subdiagnosticada e pouco tratada nos idosos. Os pacientes, familiares e pro-
fissionais de saúde podem atribuir o medo e a preocupação a fatores de personalidade, ou consi-
derar a ansiedade como uma resposta realista ao ambiente social, aos desafios e eventos da vida
recentes, em vez de abordá-la como uma síndrome tratável.
A ansiedade no idoso pode estar presente como transtorno isolado, mas com frequência ocorre
em associação a outras doenças clínicas e psiquiátricas, ou ainda com uso ou abstinência de me-
dicamentos e outras substâncias. A ocorrência conjunta de depressão e ansiedade é frequente e
tem pior prognóstico, por retardar a resposta terapêutica e aumentar a probabilidade de ideação
suicida.
Outro desafio é o diagnóstico e manejo da ansiedade nos pacientes com demência, que podem
apresentar sintomas ansiosos manifestos sob a forma de agitação psicomotora, descontrole ver-
bal e prejuízo nas funções executivas.
É importante frisar que a ansiedade no idoso, assim como a depressão, tem uma apresentação
clínica com mais elementos somáticos que no jovem. São frequentes as queixas de perda de me-
mória, sono não restaurador, fadiga, dificuldade de relaxar, dores de cabeça e osteomusculares.
Isto é particularmente difícil para o médico, pois trata-se de uma população também sob risco do
desenvolvimento de doenças orgânicas que poderiam explicar os sintomas. Nos portadores de
Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica ou de Insuficiência Cardíaca, por exemplo, a dispneia pode
ser superestimada pela ansiedade, o que também provoca impacto funcional negativo.
Os pacientes ansiosos também estão mais sujeitos à instabilidade de marcha e quedas. É de ex-
trema importância o reconhecimento de pacientes com medo excessivo de cair, condição que
pode determinar inatividade física e isolamento social.
A escala GAD-7 é amplamente validada para rastreamento de casos suspeitos de TAG (Tabela 2).
São atribuídos pontos de acordo com a frequência em que ocorrem os sintomas ansiosos, sendo
a somatória dos pontos proporcional à gravidade do quadro. O diagnóstico definitivo de TAG é
clínico e se baseia nos critérios estabelecidos pelo DSM-5 (Tabela 3).
190
Tabela 2: Escala GAD-7 de rastreamento de Transtorno de Ansiedade Generalizada
Nas últimas 2 semanas, com que frequência você se Nenhum Alguns Mais da meta- Quase todos
sentiu: dia dias de dos dias os dias
1. Nervoso, ansioso ou no limite; 0 1 2 3
2. Incapaz de controlar medos e preocupações; 0 1 2 3
3. Preocupado excessivamente com diferentes as-
0 1 2 3
suntos;
4. Com dificuldade para relaxar; 0 1 2 3
5. Cansado a ponto de interferir nas suas atividades; 0 1 2 3
6. Facilmente chateado ou irritado; 0 1 2 3
7. Preocupado como se algo ruim fosse acontecer. 0 1 2 3
TOTAL DE PONTOS*:
* Escore 5 a 9 = ansiedade leve; 10 a 14 = ansiedade moderada; 15 a 21 = ansiedade grave
Fonte: SPITZER, R.L. et al. A brief measure for assessing generalized anxiety disorder:
the GAD-7. Archives of Internal Medicine. 2006 May 22;166(10):1092-7
A. Ansiedade e preocupação excessivas (expectativa apreensiva), ocorrendo na maioria dos dias por
pelo menos seis meses, com impacto em diversos eventos ou atividades (tais como desempenho es-
colar ou profissional).
B. O indivíduo considera difícil controlar a preocupação.
C. A ansiedade e a preocupação estão associadas a três (ou mais) dos seguintes seis sintomas (com pelo
menos alguns deles presentes na maioria dos dias nos últimos seis meses):
1. Inquietação ou sensação de estar com os nervos à flor da pele.
2. Fatigabilidade.
3. Dificuldade em concentrar-se ou sensações de “branco” na mente.
4. Irritabilidade.
5. Tensão muscular.
6. Perturbação do sono (dificuldade em conciliar ou manter o sono, ou sono insatisfatório e
inquieto).
D. A ansiedade, a preocupação ou os sintomas físicos causam sofrimento clinicamente significativo ou
prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
E. A perturbação não se deve aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medi-
camento) ou a outra condição médica (p. ex., hipertireoidismo).
F. A perturbação não é mais bem explicada por outro transtorno mental.
Capítulo 12 191
4. Diagnóstico diferencial
O TAG primário com sintomas depressivos associados pode ser difícil de distinguir do distúrbio
depressivo persistente (distimia), pois as condições compartilham muitas características, como
um início insidioso, curso prolongado, disforia proeminente e sintomas de ansiedade. Indiví-
duos com depressão tendem a se preocupar com eventos e circunstâncias anteriores, enquanto
os pacientes com TAG tendem a se preocupar com possíveis eventos futuros. A ocorrência de
despertares no início da manhã, de variações diurnas do humor e de pensamentos suicidas são
incomuns no TAG, ao contrário do que se constata nos quadros depressivos.
Da mesma forma que acontece com a depressão, a relação entre cognição e ansiedade é comple-
xa. Por um lado, o paciente com declínio cognitivo tem dificuldade de expressão da experiência
emocional; mas, por outro, pode acontecer sobreposição de sintomas possivelmente explicados
pela demência, como agitação e dificuldade em fazer escolhas. A ansiedade está relacionada ao
declínio cognitivo, porém não é certo ainda se ela é a manifestação de uma resposta do indivíduo
frente à percepção do declínio cognitivo, ou se ela é o próprio fator de risco para a piora cognitiva.
Um possível viés de confusão dessa associação é o uso de benzodiazepínicos por longos períodos
de tempo. A avaliação neuropsicológica de pacientes ansiosos evidencia prejuízo na atenção, na
habilidade de resolução de problemas, na memória de curto prazo e na memória de trabalho.
Há diversas substâncias com potencial de gerar sintomas ansiosos por seu uso ou abstinência. As
mais vistas na prática clínica são o álcool, a cafeína, a fenciclidina, os alucinógenos, os inalantes,
os opioides, os benzodiazepínicos, os anfetaminérgicos, a cocaína e o fenoterol.
As doenças clínicas que podem ter sintomas semelhantes aos da ansiedade estão descritas no
Quadro 1. Em casos de dor torácica ou dispneia, sempre realizar avaliação cardiológica minucio-
sa, já que ansiosos têm maior risco de desfechos cardiovasculares negativos.
192
5. Tratamento
O tratamento deve sempre incluir medidas de auxílio no manejo do estresse. Atualmente pre-
coniza-se o estímulo à pratica de atividade física aeróbica e terapias de relaxamento. Evidências
recentes apontam para o benefício da realização de meditação mindfulness. A psicoterapia tem
benefício bem estabelecido, não havendo superioridade entre as técnicas, embora atualmente a
linha cognitivo-comportamental seja bastante estudada.
Os benzodiazepínicos devem ser evitados por seu grande potencial de desencadear efeitos ad-
versos. Se indicados, devem ter seu uso restrito ao início do tratamento, durante o período de
latência dos antidepressivos. Deve-se dar preferência aos de meia-vida mais curta, como o lora-
zepam e o alprazolam. Os riscos potenciais do uso crônico incluem quedas, prejuízo cognitivo,
tolerância e dependência.
Nos casos de ansiedade que afetam pacientes com demência, deve-se tratar possíveis fatores
desencadeantes, como alterações ambientais, dor e distúrbio do sono. O tratamento farmacoló-
gico, quando necessário, pode ser realizado com inibidores de receptação de serotonina ou com
antipsicóticos atípicos, que além de serem usados para controle comportamental, também tem
ação contra a ansiedade.
Capítulo 12 193
Tabela 4: Principais medicamentos utilizados para tratamento do TAG
ISRS
Tontura, insônia, tremor, diarreia, disfunção ejaculatória,
Citalopram 20-40mg
aumento do intervalo QT
i: 5mg
Cefaleia, insônia, tontura, disfunção ejaculatória, náusea,
Escitalopram
diarreia
10-20mg
i: 10mg
Sonolência, tontura, diminuição da libido, boca seca, cons-
Paroxetina
tipação ou diarreia
20-40mg
IRSN
i: 37,5mg
Sonolência ou insônia, tontura, náusea, boca seca, hiper-
Venlafaxina 75-225mg
tensão, taquicardia
Desvenlafaxina i: 50mg
Insônia, cefaleia, tontura, náuseas, boca seca, hiper-hidrose
50-200mg
i: 30mg
Duloxetina Cefaleia, sonolência, náusea, insônia, constipação
60-120mg
i: 15mg
Mirtazapina Sonolência, ganho de peso, boca seca, constipação
15-45mg
Antidepressivos tricí-
i: 10mg Arritmia, glaucoma de ângulo fechado, confusão mental,
clicos
constipação, retenção urinária, hipotensão postural, déficit
30-50mg cognitivo
Nortriptilina
Anticonvulsivantes
i: 75mg
Edema periférico, tontura, sonolência, tremor, xerostomia,
Pregabalina
ganho de peso e confusão mental
150-300mg
i: dose inicial; ISRS: inibidores seletivos da recaptação de serotonina; IRSN: inibidores da recaptação de serotonina e nora-
drenalina
Fontes: Adaptado de FORLENZA, O.V. et al. Neuropsiquiatria Geriátrica. 2. Ed. Atheneu 2014; FREITAS, E.V.; PY, L.
Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016; ANDREESCU, C. et al. New resear-
ch on anxiety disorders in the elderly and an update on evidence-based treatments. Current Psychiatry Reports, 2015
Jul;17(7):53
194
Distúrbios do sono no idoso
1. Introdução
As alterações do sono apresentam-se como uma das queixas mais comuns do indivíduo adulto,
com crescente prevalência ao longo da sua vida. O processo de envelhecimento implica no sur-
gimento de inúmeros fatores de risco para o desenvolvimento de distúrbios do sono e estima-se
que metade dos indivíduos acima de 60 anos vivendo na comunidade e mais de dois terços dos
institucionalizados já experimentaram alguma dificuldade para dormir. Queixas de sono devem
ser valorizadas, pois além de altamente prevalentes, estão envolvidas na gênese de diversas
doenças físicas e psiquiátricas, além de contribuir para a descompensação de doenças crônicas.
A arquitetura do sono muda com o avançar da idade, relacionada a alterações no ciclo circadiano,
na temperatura e no perfil hormonal. Observa-se marcada redução da secreção de melatonina e
do hormônio de crescimento. O sono do idoso tem maior latência (tempo necessário para passar
da vigília ao sono) e menor eficiência (razão entre tempo total de sono e tempo total na cama)
em relação ao adulto jovem, passando a ser mais superficial e mais fragmentado. Outros fatores,
como privação de sono, uso de fármacos, doenças crônicas, redução à exposição solar e redução
da atividade física, contribuem para um agravamento da qualidade do sono.
O diagnóstico dos distúrbios do sono geralmente é feito através de uma anamnese cuidadosa,
da qual extraem-se informações sobre os hábitos de sono, rotinas de vida diária e sintomas diur-
Capítulo 12 195
nos. Deve-se sempre investigar o uso de medicamentos que possam prejudicar o sono. Hábitos
alimentares como a ingestão de álcool, café e outros alimentos estimulantes também devem ser
investigados, assim como os cochilos diurnos. A utilização de um “diário do sono” ao longo de 2
semanas, no qual é registrada a rotina (horários de deitar, pegar no sono, acordar, tomar medica-
mentos e café, realizar atividade física) pode ser útil para uma avaliação mais completa na abor-
dagem da insônia. Em casos selecionados, como na suspeita de síndrome da apneia e hipopneia
do sono, pode ser necessária a realização de uma polissonografia.
Existe atualmente o registro de mais de 100 tipos de distúrbios do sono. Neste capítulo abordare-
mos as alterações mais frequentes no idoso: insônia, síndrome da apneia e hipopneia obstrutiva
do sono, síndrome das pernas inquietas e transtorno comportamental do sono REM.
2. Insônia
A insônia é o transtorno do sono mais comum no idoso. Trata-se da percepção de sono insufi-
ciente ou não reparador, motivada pela incapacidade em iniciar e/ou manter o sono durante a
noite, com prejuízo na capacidade de ficar alerta, no desempenho físico e mental e na qualidade
de vida.
Pode ter origem primária ou secundária. A insônia primária corresponde a 15% dos casos e é
caracterizada pela atividade mental exagerada ao deitar, trazendo dificuldade de relaxar e pen-
samentos que geram angústia. A incapacidade de dormir provoca ansiedade e agrava o quadro, o
que constitui o componente cognitivo de perpetuação da insônia. Muitas vezes a insônia primá-
ria tem início após um precipitante, como um evento de vida estressor ou uma condição médica
de curso agudo. Pode, entretanto, se manter a longo prazo pela existência dessas alterações cog-
nitivas e psicológicas, o que ocorre principalmente nos indivíduos que já apresentam fatores pre-
disponentes, como maus hábitos relacionados ao sono, uso de substâncias, sedentarismo, iso-
lamento social, baixa renda e baixa escolaridade. Por outro lado, a insônia pode ser secundária
a diversas condições médicas, como DPOC, asma, insuficiência cardíaca congestiva, demência,
doenças urológicas (noctúria), doença do refluxo gastresofágico, dor e prurido crônicos. Pode
também ser secundária a doenças psiquiátricas como transtornos de ansiedade ou do humor.
196
Tabela 5: Critérios diagnósticos de insônia
Substância Efeito
Etanol Induz a um sono fragmentado
Xantinas (café) e fenilefedrinas Efeito estimulante
Nicotina Insônia
Anticolicolinesterásico Insônia e pesadelos
ISRS e IRSN Insônia inicial ou terminal
Levodopa Insônia e pesadelos
Corticoides sistêmicos Efeito dose-dependente de estimulação e agitação psicomotora
Diuréticos Nictúria
Fenitoína Insônia
Teofilina Efeito estimulante
Betabloqueadores Alteração da fisiologia do sono, pesadelos
Fonte: Adaptado de ZDANYS, K. et al. Sleep Disturbances in the Elderly. Psychiatric Clinics of North America. 2015
38(4):723-741; e ROEPKE, S.K. et al. Sleep disorders in the elderly. Indian Journal of Medical Research. 2010;131:302–310
Capítulo 12 197
O manejo da insônia sempre deve ser iniciado com orientações comportamentais concernentes à
higiene do sono. Além disso, a terapia cognitivo-comportamental é bem estudada para a insônia
e tem alguns componentes de aplicação simples na prática ambulatorial (Quadro 2). A associação
de terapias não farmacológicas, como técnicas de relaxamento muscular progressivos, terapia
de biofeedback, terapia de restrição do sono e fototerapia, deve ser estimulada. As terapias não
farmacológicas são altamente eficazes e não têm efeitos colaterais importantes, então devem ser
prioritárias no manejo de pacientes idosos.
O tratamento farmacológico deveria ser utilizado na minoria dos pacientes, porém o que se ob-
serva na prática é que os idosos com queixas de insônia tèm chance maior de receber tratamento
farmacológico do que os pacientes jovens, a despeito do perfil de eventos adversos dos fármacos
serem piores no primeiro grupo. A abordagem farmacológica, quando necessária, deve levar em
consideração as expectativas do paciente, o perfil de segurança do fármaco, efeitos colaterais,
interações medicamentosas, possibilidade de titulação da dose, custo, comorbidades e contrain-
dicações. Deve-se atentar para o uso a curto prazo, com dose inicial mais baixa possível, e para a
reavaliação regular da eficácia do tratamento.
Higiene do Sono
Criar um padrão de sono:
1. Manter uma rotina de sono/vigília. É de maior importância o acordar sempre no mesmo horário,
a despeito de quantas horas teve de sono. Não tentar compensar noites mal dormidas durante a
semana, em dias de feriado ou fim de semana.
2. Não cochilar ao longo do dia.
Manter um ambiente adequado ao sono:
1. Garantir quarto escuro e temperatura ambiente confortável.
2. Garantir bloqueio de sons que podem atrapalhar o sono, com uso de protetores auriculares ou
ruídos brancos (como o de ventilador ou ar condicionado).
Reduzir a ansiedade antes de dormir:
1. Não olhar o alarme e se preocupar em quantas horas de sono vai ter.
2. Desenvolver um ritual antes de deitar, fazendo sempre as mesmas atividades, o que auxilia a ge-
rar uma espécie de memória inconsciente acerca do momento de descansar.
3. Planejar atividades noturnas que promovam relaxamento. As tarefas que são de preocupação
para o dia seguinte podem ser escritas em um papel para auxiliar a não pensar sobre elas ao estar
na cama.
Alterações de hábitos de vida:
1. Não deitar com fome ou após refeições copiosas. Jantar diariamente no mesmo horário.
2. Minimizar ou evitar o uso de cafeína após o almoço.
3. Evitar o uso de álcool. Temporariamente o álcool pode gerar sonolência, porém aumenta os des-
pertares noturnos e piora a qualidade do padrão do sono. Além do mais, álcool pode piorar a
apneia do sono.
4. Manter o hábito de se exercitar. O melhor momento do dia para o exercício é o período da manhã,
pois em algumas pessoas o exercício pode ser estimulante e atrapalhar o sono.
198
Terapia comportamental (TCC) cognitivo
1. Psicoeducação: abordar o entendimento que o paciente tem sobre o problema da insônia. Fre-
quentemente os pacientes têm uma percepção aumentada do impacto da insônia no seu cotidia-
no, ou crenças fantasiosas sobre o problema, que devem ser abordadas. Sempre dar um panorama
realista para o tratamento, para que eventuais insucessos não piorem a ansiedade.
2. Higiene do sono (ver acima).
3. Terapia de controle de estímulo: o foco deste componente é criar associação entre “cama” e
“sono”, e diminuir a ansiedade que ocorre pela dificuldade de cair no sono ao deitar-se. A orien-
tação a ser dada é não fazer atividades incompatíveis com o sono na cama, ou seja, deitar somente
com sono e sair da cama se não conseguir dormir ou se sentir-se ansioso.
4. Técnicas de relaxamento.
5. Restrição de sono: restringir o sono é um método já estudado nos idosos insones, e que auxilia a
reestabelecer o ciclo sono/vigília.
Fonte: Adaptado de GOONERATNE, N.S. et al. Sleep in older adults: normative changes, sleep disorders, and treat-
ment options. Clinics in Geriatric Medicine. 2014 Aug;30(3):591-627; e RODRIGUEZ, J.C. et al. Sleep problems in the
elderly. Medical Clinics of North America. 2015 Mar;99(2):431-9
Os antidepressivos sedativos são bem tolerados e têm sido as medicações de primeira escolha em
grande parte dos casos atualmente (Tabela 7). O agonista da melatonina ramelteona ainda não
está disponível no mercado brasileiro, mas seu uso tem sido associado à diminuição da latência
de sono e de despertares noturnos. Anti-histamínicos, anticonvulsivantes e antipsicóticos não
são recomendados para tratamento crônico da insônia.
O uso de benzodiazepínicos deve ser evitado no idoso pela ocorrência frequente de diversos
efeitos colaterais, a saber: sedação residual durante o dia, déficit cognitivo, quedas, depressão
respiratória, insônia rebote com a descontinuação do remédio e chance de desenvolvimento de
tolerância, dependência e abuso da medicação. Quando necessário, preferir benzodiazepínicos
de meia-vida curta, pela menor chance de sedação residual e confusão pela manhã. No tocante
às medicações hipnóticas, por algum tempo acreditou-se que o uso dos hipnóticos não benzodia-
zepínicos era muito mais seguro em idosos. Entretanto, estudos demonstram que estas medica-
ções também acarretam em efeitos motores (como risco de quedas) e cognitivos.
Capítulo 12 199
Tabela 7: Medicações para tratamento de insônia
Fonte: Adaptado de ZDANYS, K. et al. Sleep Disturbances in the Elderly. Psychiatric Clinics of North America. 2015
38(4):723-741; e ROEPKE, S.K. et al. Sleep disorders in the elderly. Indian Journal of Medical Research. 2010;131:302–310
200
Quadro 3: Manifestações clinicas da SAHOS
Fonte: Adaptado de GOONERATNE, N.S.; VITIELLO, M.V. Sleep in older adults: normative changes, sleep disorders, and
treatment options. Clinics in Geriatric Medicine. 2014. Aug;30(3):591-627
• Sexo masculino;
• Hipotireoidismo;
Capítulo 12 201
O tratamento usual consiste na perda de peso e na administração de pressão positiva nas vias
aéreas (PAP, positive airway pressure) durante o sono. Nos idosos o efeito da obesidade no de-
senvolvimento da SAHOS é atenuado e é possível que existam idosos de massa corpórea normal
portadores da SAHOS. Nos casos leves, a simples mudança de posicionamento no leito (deitando
em decúbito lateral com a cabeceira inclinada de 30º a 60º), a mudança de hábitos como ces-
sar o consumo de tabaco, de álcool e de medicações sedativas, ou ainda o uso de dispositivos
orais, pode ser suficiente. Em casos de edêntulos é importante avaliar se o uso da prótese den-
tária durante a noite pode ser uma alternativa. A intervenção mais eficaz, entretanto, é o uso de
PAP, sendo o dispositivo mais comum o continuous-PAP (CPAP) acoplado a uma máscara nasal.
O problema deste tratamento, entretanto, reside na adesão, para a qual há diversos obstáculos:
o custo, o não discernimento da importância da terapia por parte do paciente e o ressecamento
de vias aéreas com o uso do dispositivo. O Quadro 4 apresenta considerações acerca da adesão à
PAP na SAHOS.
• O paciente adere ao uso de PAP? A boa adesão é definida pelo uso mínimo de 4
horas por noite em 70% das noites.
Fonte: : Adaptado de RODRIGUEZ, J.C. et al. Sleep problems in the elderly. Medical Clinics of North America. 2015
Mar;99(2):431-9
A abordagem cirúrgica é reservada aos casos de falha ou intolerância à terapia com CPAP. Inclui
uma ampla gama de procedimentos e abordagens que aumentam e/ou estabilizam a via aérea su-
perior. São categorizados em procedimentos nasais, faríngeos superiores, faríngeos inferiores e
global de vias aéreas superiores. Uma seleção cuidadosa de pacientes e procedimentos, especial-
mente relacionada à gravidade da SAHOS, à anatomia, fisiologia e função do trato aerodigestivo
superior, e ao gerenciamento do risco perioperatório são considerações importantes na avaliação
cirúrgica dos pacientes.
A cirurgia nasal não trata a SAHOS de forma isolada. O principal objetivo dos procedimentos na-
sais é aumentar a eficácia do CPAP e o conforto dos pacientes com obstrução nasal. Exemplos de
procedimentos nasais utilizados para este propósito incluem redução de cornetos, septoplastia
e cirurgia valvar nasal.
202
Os procedimentos na região faríngea inferior e laríngea, como glossectomia da linha média, epi-
glotidectomia e avanço genioglosso, visam melhorar a via aérea retrolingual laríngea ao reduzir,
avançar ou estabilizar a base da língua.
Abordagens cirúrgicas mais extensas, como o avanço maxilomandibular, melhoram vários ní-
veis de obstrução das vias aéreas e com melhora significativa dos parâmetros polissonográficos.
No entanto, é reservado para pacientes com SAHOS persistente e significativa após outros tra-
tamentos cirúrgicos. A traqueotomia é geralmente reservada para pacientes com múltiplas co-
morbidades e SAHOS grave refratária ao CPAP. A estimulação das vias aéreas superiores através
de um neuroestimulador implantável é um novo tratamento emergente da via aérea da faringe
superior e inferior em pacientes selecionados.
O diagnóstico é clínico e requer apenas avaliação laboratorial para exclusão de fatores de risco
potencialmente reversíveis (ferritina, creatinina, hemograma, TSH e vitamina B12). A seguir, as
características clínicas da SPI:
d. Se manifestam de forma frequente e crônica: três vezes por semana por ao menos três meses.
2. Os sintomas não podem ser explicados por outra condição médica (como alterações cutâ-
neas, edemas, isquemia periférica) ou psiquiátrica e nem pelo uso de droga ou medica-
mentos (que cursem com acatisia, por exemplo).
Geralmente os sintomas se restringem às pernas, mas em casos mais graves os braços também
podem ser acometidos.
Existem várias alternativas terapêuticas para a SPI. A primeira opção são os agonistas dopaminér-
gicos, como o pramipexol, na dose de 0,125 a 0,5mg/dia. Outras opções incluem levodopa na dose
de 50 a 200mg/dia antes de dormir, pregabalina e gabapentina. Tratamentos adjuvantes podem ser
usados para melhora do quadro, como exercícios de relaxamento e atividade física regular.
Capítulo 12 203
5. Transtorno comportamental do sono REM
O Transtorno Comportamental do Sono REM (TCSR) é uma parassonia caracterizada pela perda
da atonia muscular durante o sono REM. A apresentação clínica é variável, desde gestos de mãos
até golpes, socos e chutes violentos. Os pacientes geralmente procuram atenção médica com
queixas relacionadas a ações potencialmente prejudiciais para si mesmos ou para seu parceiro
de cama.
Com as hipóteses de TAG e SAHOS, foi tratada com escitalopram até a dose de 20mg, iniciou ati-
vidade física (caminhadas diárias) e psicoterapia (uma vez por semana). Foi ainda adaptada no
modo “Ramp” do CPAP. Foi discutido com a paciente a importância do uso do CPAP para a sua
saúde, inclusive para o controle do risco cardiovascular. Após 3 meses, houve melhora significa-
tiva do quadro de ansiedade e do padrão de sono.
Referências
ALEXOPOULOS, G.S. Depression in the elderly. Lancet. 2005 Jun 4-10. 365(9475):1961-70.
GULPERS, B. et al. Anxiety as a Predictor for Cognitive Decline and Dementia: A Systematic Re-
view and Meta-Analysis. The American Journal of Geriatric Psychiatry. 2016;24(10):823-42.
ALLGULANDER, C. Morbid anxiety as a risk factor in patients with somatic diseases: A review of
recent findings. Mind & Brain, 2010; 1 (1):1-9.
ALMONDES, K.M. et al. Insomnia and risk of dementia in older adults: Systematic review and
meta-analysis. Journal of Psychiatric Research. 2016 Jun;77:109-15.
ANDREESCU, C.; VARON, D. New research on anxiety disorders in the elderly and an update on
evidence-based treatments. Current Psychiatry Reports. 2015 Jul;17(7):53.
204
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento et al. Revi-
são técnica: Aristides Volpato Cordioli et al. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos men-
tais: DSM-5. Porto Alegre; 5. ed. Artmed, 2014.
BERRY, R.B. et al. The AASM Manual for the Scoring of Sleep and Associated Events: Rules, Ter-
minology and Technical Specifications, version 2.4, American Academy of Sleep Medicine, Darien
IL 2017.
CAMACHO, M. et al. The effect of nasal surgery on continuous positive airway pressure device
use and therapeutic treatment pressures: a systematic review and meta-analysis. Sleep Medicine.
2015;38(2):279-86.
FONSECA, M.I.; PEREIRA, T.; CASEIRO, P. Death and disability in patients with sleep apnea--a
meta-analysis. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. 015 Jan;104(1):58-66.
FREITAS, E.V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koo-
gan, 2016.
GOONERATNE, N.S.; VITIELLO, M.V. Sleep in older adults: normative changes, sleep disorders,
and treatment options. Clinics in Geriatric Medicine. 2014 Aug;30(3):591-627.
HAIMOV, I.; SHATIL, E. Cognitive Training Improves Sleep Quality and Cognitive Function
among Older Adults with Insomnia. PLoS One. 2013;8(4):1–17.
KEZIRIAN, E.J. et al. Obstructive sleep apnea surgery practice patterns in the United States: 2000
to 2006. Otolaryngology Head Neck Surgery. 2010.143(3):441-7.
LENZE, E.J.; WETHERELL, J.L. A lifespan view of anxiety disorders. Dialogues in Clinical Neuros-
cience. 2011;13(4):381-99.
MONTEIRO, N.T.; NERI, A.L.; COELIM, M.F. Insomnia Symptoms, Daytime Naps And Physical
Leisure Activities In The Elderly: FIBRA Study Campinas. Revista da Escola de Enfermagem da
USP. 2014;48(2):239–246.
RODRIGUEZ, J.C. et al. Sleep problems in the elderly. Medical Clinics of North America. 2015
Mar;99(2):431-9.
ROEPKE, S.K.; ANCOLI-ISRAEL, S. Sleep disorders in the elderly. Indian Journal of Medical Re-
search. 2010;131:302–310.
Capítulo 12 205
SCHUURMANS, J.I.; BALKOM, A.V. Late-life anxiety disorders: a review. Current Psychiatry Re-
ports. 2011 Aug;13(4):267-73.
SILVA, A.A.; DE MELLO, R.G.; SCHAAN, C.W. Sleep duration and mortality in the elderly: a syste-
matic review with meta-analysis. British Medical Journal Open. 2016 Feb 17;6(2):e008119.
STEIN, M.B. et al. Treating anxiety in 2017: optimizing care to improve outcomes. Journal of the
American Medical Association, 2017;318(3):235-236.
STEWART, R. et al. Insomnia comorbidity and impact and hypnotic use by age group in a natio-
nal survey population aged 16 to 74 years. Sleep and Breathing. 2006;29:1391–7.
TOGEIRO, S.M. et al. Obstructive sleep apnea: a cardiometabolic risk in obesity and the metabolic
syndrome. Journal of the American College of Cardiology. 2013 Aug 13;62(7):569-76.
TOM, S.E. et al. Nonbenzodiazepine Sedative Hypnotics and Risk of Fall-Related Injury. Sleep
and Breathing. 2016 May 1;39(5):1009-14.
WITTCHEN, H.U. et al. The size and burden of mental disorders and other disorders of the brain
in Europe 2010. European Neuropsychopharmacology. 2011 Sep;21(9):655-79.
WOLITZKY-TAYLOR, K.B. et al. Anxiety disorders in older adults: a comprehensive review. De-
pression and Anxiety. 2010 Feb;27(2):190-211.
YAFFE, K.; FALVEY, C.M.; HOANG, T. Connections between sleep and cognition in older adults.
The Lancet Neurology. 2014 Oct;13(10):1017-28.
ZDANYS, K.F.; STEFFENS, D.C. Sleep Disturbances in the Elderly. Psychiatric Clinics of North
America. 2015 38(4):723-741.
ZHANG, X. et al. Risk factors for late-onset generalized anxiety disorder: results from a 12-year
prospective cohort (the ESPRIT study). Translational Psychiatry. 2015; 5:e536.
206
CAPÍTULO
1. Caso Clínico
Sr. ACRS, viúvo, de 68 anos de idade, diagnóstico prévio de transtorno de humor bipolar há 40
anos. Ele estava evoluindo com pródromos de sintomas depressivos o que estava preocupando a
família, principalmente após o falecimento da esposa que ocorreu há um ano. Ele permaneceu
estável com divalproato de sódio 1g por dia desde o ano de 2000, quando foi a última crise mani-
forme. Ao longo dos últimos meses, a família tinha observado crescente apatia, falta de motivação
e um declínio em sua capacidade funcional, embora ele negasse. Sem relato de outras comorbida-
des clínicas. No exame, sr. ACRS tinha um tremor de ação e de repouso simétrico nas mãos. Um
Mini Exame do Estado Mental (MEEM) de 28 de 30. Dosagem sérica do ácido valproico de 110µg/
mL (VR: 50,0 a 100,0µg/mL) e aumento de 3 vezes nos valores de referência das transaminases.
Devido ao tremor e provável risco de toxicidade do divalproato, a dosagem do divalproato foi re-
duzida para 500mg/dia. Após duas semanas, a dosagem sérica do ácido valproico estava em 35µg/
mL e as transaminases normais. Dentro de 4 semanas, a filha do sr. ACRS ligou para informar que
seu pai “já não está mais deprimido” e tinha melhorado a motivação, a energia e a concentração,
bem como apresentado retorno à funcionalidade prévia. No mês seguinte, a filha do sr. ACRS liga
novamente, extremamente preocupada, pois seu pai estava com grave ansiedade, dormindo duas
horas por noite, tendo pensamentos acelerados, humor irritável e loquaz. Sr. ACRS foi internado e
recebeu alta com o uso de quetiapina 200mg/dia na hora de dormir. Em acompanhamento ambu-
latorial, nos últimos 12 meses, ele continua estável e sem alterações de humor.
2. Introdução
O transtorno de humor bipolar (THB) é uma doença crônica caracterizada por episódios de sín-
drome depressiva intercalados com humor maniforme (elevado, expansivo, irritado) e muitas
vezes com apresentação mista. Para satisfazer um diagnóstico clínico de transtorno bipolar, os
episódios de humor anormal devem causar prejuízo sobre a funcionalidade social e ocupacional
do indivíduo. Embora os critérios de diagnóstico da doença sejam bem demarcados na população
adulta, o mesmo não acontece no THB nos idosos. Pesquisas sugerem que o transtorno em idosos
seja diferente em termos de sua apresentação, epidemiologia e etiopatogenia.
3. Epidemiologia
O transtorno bipolar afeta mais de 1% da população do mundo, independentemente da naciona-
lidade, etnia ou condição socioeconômica. A prevalência de THB é estimada aproximadamente
em 0,6% para transtorno bipolar I, 0,4% para o transtorno bipolar II, de 1 a 4% para transtorno
bipolar subsindrômico, ou seja, para o espectro bipolar. O THB geralmente afeta as pessoas com a
idade de 30 anos; estima-se que 90% estão com idade inferior a 50 anos, quando surge o primeiro
episódio maniforme ou misto. Isto indica que 10% dos pacientes bipolares vão desenvolver sua
doença depois dos 50 anos. Um estudo mostrou que 9% dos pacientes bipolares tinham mais de
60 anos quando tiveram o primeiro episódio.
O bipolar de início tardio (BIT) é classificado quando o primeiro episódio ocorre após 50 anos, por
consenso na maioria dos estudos. E temos os bipolares de início precoce (BIP), que são adultos
bipolares envelhecendo. Enquanto o BIP tem alta taxa familiar de bipolaridade, o BIT tem maior
associação como comorbidade médica e neurológica. Alguns destes incluem demências, condi-
ções neurológicas e condições cerebrovasculares. Os idosos bipolares de início tardio também
demonstraram sintomas maníacos mais brandos e humor mais irritável em comparação com o
BIP. Os bipolares de início tardio parecem ter um maior intervalo entre um episódio depressivo
e um maníaco.
Esses achados indicam que idosos com THB têm um padrão clínico diferente, envolvendo mais
depressão e possivelmente sintomatologia maníaca mais suave.
4. Etiopatogenia
4.1 Hipótese de mania vascular
Semelhante à hipótese de depressão vascular no início tardio, a hipótese vascular para sintomas
maniformes está ficando cada vez mais evidente nos últimos estudos. Em pacientes idosos bi-
polares, fatores de risco vasculares estavam associados com desempenho cognitivo mais pobre.
Além disso, em um estudo com bipolares, o maior escore de risco de acidente vascular cerebral
de Framingham foi encontrado no BIT contra BIP.
Há uma correlação cada vez mais estudada de áreas maiores de hiperintensidade de substância
branca cerebral em pacientes com transtorno bipolar de início tardio em relação a população em
geral (Figura 1). Lesões microangiopáticas cerebral foram mais encontradas em pacientes BIT
na região frontal, parietal e putâmen quando comparados a idosos BIP. Porém, faltam estudos
atuais de acompanhamento longitudinais para explorar melhor estes achados.
Capítulo 13 209
Figura 1 – Microangiopatia cerebral
5. Lesão cerebral
Embora seja relativamente bem conhecido que o traumatismo cranioencefálico na população
adulta possa causar mania secundária como uma sequela neuropsiquiátrica, a evidência para
esta associação nos idosos é muito mais fraca. Existem alguns relatos de casos de mania secun-
dária nesta população causada por danos talâmicos ou encefalopatia anóxica. De fato, parece
razoável que uma lesão cerebral tenha efeitos semelhantes ou piores nas pessoas idosas.
Os estudos sobre a etiopatogenia do BIT são limitados, porém, as melhores evidências apoiam o
papel da doença cerebrovascular nas manifestações clínicas do THB no idoso.
A mania secundária pode estar associada às condições neurológicas ou clínicas como acidente
vascular encefálico, trauma, epilepsia do lobo temporal, demências, alterações do cortisol, hi-
pertireoidismo, lúpus eritematoso sistêmico, infecções sistêmicas e uremia; ou condições medi-
camentosas como no uso de corticosteroides, levotiroxina, agonistas dopaminérgicos.
210
cias psicoativas (álcool, cocaína, metanfetamina e opioides) como causas secundárias de trans-
torno de humor. Todos os idosos BIT devem ser investigados por avaliação clínica e laboratorial/
imagem rigorosa.
A relação entre bipolaridade e comprometimento cognitivo está no foco dos estudos atualmente.
Embora o risco de desenvolver demência, particularmente a doença de Alzheimer, aumenta com
a idade. Este risco parece aumentar ainda mais em pacientes com transtornos afetivos. Apesar da
associação entre depressão unipolar e demência seja relativamente bem estabelecida atualmen-
te, há bem menos estudos sobre associação entre bipolaridade e demência.
Existem poucos estudos que evidenciam que os BITs possam apresentar um comprometimento
cognitivo mais tardio em relação à população em geral. Há, entretanto, maior risco de disfunção
executiva e declínio cognitivo global mais rápido do que o esperado para sua idade e escolaridade.
A Tabela 1 mostra um resumo das principais características no diagnóstico diferencial no THB do idoso.
Fonte: Adaptado de Trinh N, Forester BP. Bipolar Disorder in the Elderly: Differential Diagnosis and Treatment.
Psychiatric Times, 2007
Capítulo 13 211
6. Considerações sobre o tratamento
farmacológico no THB no idoso
O tratamento farmacológico exige mais atenção e conhecimento do clínico, pois existem altera-
ções farmacocinéticas e farmacodinâmicas que aumentam o risco de interações medicamento-
sas e efeitos colaterais. Além da maior chance do idoso ter polipatologias e polifarmácia. Em um
estudo com idosos em instituições psiquiátricas, verificou-se que 96% das prescrições tinham
potencial para interações medicamentosas com uma média de oito medicamentos prescritos
para cada paciente.
Como ocorre no tratamento para transtorno psicótico no idoso, não existem estudos controlados
aleatorizados de tratamento farmacológico no idoso bipolar. O tratamento farmacológico se ba-
seia em extrapolação de estudos clínicos realizados nos adultos jovens. Há evidências limitadas
em estudos abertos, naturalísticos, relatos de casos e experiência clínica sobre o manejo do THB
em idosos.
Primeira Linha
Monoterapia: Lítio, Divalproato, Divalproato ER, Olanzapina, Risperidona, Quetiapina, Quetiapina
XR, Aripiprazol, Ziprasidona, Asenapina, Paliperidona.
212
Tabela 3 – Recomendações para tratamento farmacológico da Depressão Bipolar I
Primeira Linha
Monoterapia: Lítio, Lamotrigina, Quetiapina, Quetiapina XR.
Terapia Combinada: Lítio ou Divalproato + ISRS, Olanzapina + ISRS (Fluoxetina), Lítio + Divalproa-
to, Lítio ou Divalproato + Bupropiona.
Segunda Linha
Monoterapia: Divalproato, Lurasidona.
Alguns trabalhos apontam que os antipsicóticos foram significativamente mais eficazes para
o tratamento da mania do que os estabilizadores do humor convencionais (lítio e valproato e
carbamazepina), sendo os mais potentes: haloperidol, risperidona e olanzapina. Alguns antip-
sicóticos mostraram eficácia no BIT, especialmente como agente antimaníaco. Em uma análise
post-hoc de dados não controlados, a quetiapina em monoterapia foi eficaz para o tratamento
agudo da mania nos bipolares idosos. Os mesmos autores encontraram eficácia no aripiprazol.
Em estudos retrospectivos sobre os padrões de resposta, observaram que os estabilizadores de
humor foram os mais utilizados (68%), seguido por antipsicóticos (54%) e antidepressivos (34%).
A terapia combinada com as medicações acima era mais comum do que a monoterapia (57% vs.
38%). Remissão foi alcançada em apenas 35% dos indivíduos, enquanto 32% não mostraram ne-
nhuma melhoria significativa.
No conhecido estudo de coorte EMBLEM, com 2761 pacientes bipolares, verificou-se que os pa-
cientes BIT utilizavam mais antipsicóticos típicos, lítio e anticolinérgicos do que os pacientes
BIP. No entanto, após um episódio de recaída nas de mania ou misto, houve aumento na pres-
crição de antipsicóticos atípicos e uma consequente diminuição no uso de antipsicótico típico.
Houve aumento constante na prescrição de antidepressivos em todos os grupos durante o trata-
mento ativo.
Capítulo 13 213
Para os casos de THB refratário em idosos, o uso da clozapina também é reservada como opção
farmacológica. E apesar da clozapina demonstrar benefício e eficácia para os idosos com THB
refratários, ela deve ficar reservada somente a eles devido ao risco de agranulocitose, sedação,
hipotensão postural, efeitos anticolinérgicos e aumento da possibilidade de convulsões dose-
dependente.
As terapias não analíticas com a terapia cognitiva comportamental são as mais estudadas e pa-
recem eficazes na prevenção de recorrências e recaídas quando iniciadas após recuperação dos
episódios de alteração do humor melhorando adesão ao tratamento através da psicoeducação do
paciente e familiares.
Referências
DEPPA, C.A.; JESTEA, D.V. Bipolar disorder in older adults: a critical review. International Journal
of Bipolar Disorders 2004: 6: 343–367.
FRANK, M.H.; RODRIGUES, N.L. Depressão, Ansiedade, Outros Transtornos Afetivos e Suícidio.
In: Freitas EV, Py L. Tratado de Geriatria e Gerontologia. Quarta edição. Editora Guanabara Koo-
gan, 2016. p. 391-403.
GARERI, P. et al. Use of atypical antipsychotics in the elderly: a clinical review. Clinical Interven-
tions in Aging 2014:9 1363–1373.
LADEIRA, R.B.; NUNES, P.V. Transtorno afetivo bipolar. Aspectos clínicos do transtorno bipolar
em idosos. In: FORLENZA, O.V.; RADANOVIC, M.; APRAHAMIAN, I. Neuropsiquiatria geriátrica.
2. ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2014. p. 151-156.
LAFER, B. et al. Bipolar. In: MIGUEL, E.C.; GENTIL, V.; GATTAZ, W.F. Clínica Psiquiatrica: A visão
do Departamento e do Instituto de Psiquiatria do HCFMUSP. Baueri, SP: Manole, 2011. p.711-31.
LI, X.B. et al. Clozapine for treatment-resistant bipolar disorder: a systematic review. Internatio-
nal Journal of Bipolar Disorders. 2014;17(3):235-47.
NEBHINANI, N.; PAREEK, V.; GROVER, S. Late-life psychosis: An overview. Journal of Geriatric
Mental Health, Jul-Dec-2014; Vol 1, Issue 2.
PHILLIPS, M.L.; KUPFER, D.J. Bipolar disorder diagnosis: challenges and future directions. Lan-
cet. 2013; Vol 381: 1663-71.
VASUDEV, A.; THOMAS, A. ‘Bipolar disorder’ in the elderly: What’s in a name? Maturitas Vol. 66,
Issue 3, July 2010, Pages 231-235.
YATHAM, L.N. et al. Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT) and In-
214
ternational Society for Bipolar Disorders (ISBD) collaborative update of CANMAT guidelines for
the management of patients with bipolar disorder: update 2013. International Journal of Bipolar
Disorders. 2013; 15:1-44.
Capítulo 13 215
CAPÍTULO
Psicose no idoso
Prof. Me. Júlio César Menezes Vieira
Psicose no idoso
Prof. Me. Júlio César Menezes Vieira
1. Caso Clínico
Sra. FCMV, solteira de 72 anos de idade, ensino superior – médica –, foi levada pelo seu sobrinho
ao pronto atendimento devido à história recente de mudança de comportamento, desconfiança
e comprometimento social. Ela reclamava insistentemente das intenções “maliciosas” dos vizi-
nhos; estava cada vez mais inquieta e observando compulsivamente se as portas estavam tran-
cadas; não dormia à noite e já tinha trocado inúmeras vezes as fechaduras. FCMV colocava as
orelhas na parede afirmando que os vizinhos estavam dizendo obscenidades sobre ela, acrescen-
tando que ouve “vozes” de homens desconhecidos, que comentam do outro lado da parede sobre
todas as suas atividades diárias. Sem história pregressa de comorbidades clínicas ou psiquiátrica.
Ao chegar ao hospital, sra. FCMV insistia que estava sendo perseguida. O Mini Exame do Estado
Mental foi 30/30. Exames laboratoriais e RNM do encéfalo sem alterações. O tratamento foi ini-
ciado com 0,5mg/dia de risperidona e posteriormente ajustado para 1,5mg/dia. Atualmente, junto
com a intervenção psicossocial, observou-se melhora significativa do quadro.
2. Introdução
Os sintomas psicóticos podem ocorrer frequentemente na idade avançada e podem fazer parte de
várias doenças como esquizofrenia, demência, delirium, transtorno delirante, depressão, psicose
orgânica, etc. A esquizofrenia é o transtorno psicótico mais emblemático no sofrimento mental
e se caracteriza além das vivências delirantes (delírios e alucinações) por sintomas negativos,
desorganização da linguagem e do comportamento com importante comprometimento da afeti-
vidade e da cognição ao longo da evolução da doença. A prevalência global está em torno de 1%.
É uma das dez principais doenças que causam incapacidade segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS) devido aos prejuízos ocupacionais, nas relações interpessoais e familiares. A esqui-
zofrenia de início precoce (EIP) apresenta sua maior incidência no início da vida adulta, sendo nos
homens em torno de 18 anos e nas mulheres mais tardio, por volta de 25 anos. No entanto, a lite-
ratura sugere que aproximadamente 23% dos pacientes com esquizofrenia têm início da doença
após os 40 anos de idade, sendo que 3% apresentam os sintomas iniciais após os 60 anos de idade.
Kraepelin (2006ª) definia “Parafrenia” como um grupo de sintomas correspondentes a esquizo-
frenia de início mais tardio, caracterizada por um alucinações e delírios, sem sintomas negativos.
Além disso, nesses pacientes, não havia nenhuma deterioração a longo prazo da personalidade.
Este capitulo fornece uma visão geral do conhecimento atual sobre sintomas psicóticos no enve-
lhecimento e como identificá-los a fim de proporcionar um acompanhamento clínico adequado.
3. Envelhecimento dos pacientes com
Esquizofrenia de Início Precoce
Apesar da maior taxa de mortalidade em geral e de suicídio nos EIP, os pacientes esquizofrênicos
de início precoce estão envelhecendo.
Fatores associados com mau prognóstico para EIP são cronicidade, início insidioso, déficits fun-
cionais ou psicossociais pré-mórbidos e sintomas negativos proeminentes. Em uma amostra de
pacientes cronicamente institucionalizados com esquizofrenia, a idade mais avançada foi asso-
ciada com níveis mais baixos de sintomas positivos e níveis mais elevados de sintomas negativos.
A literatura disponível também sugere a presença de mais déficits cognitivos em pacientes com
EIP em comparação com indivíduos saudáveis, especialmente nas áreas de aprendizagem e fun-
ção executiva. A funcionalidade varia consideravelmente entre os pacientes mais idosos com
esquizofrenia. Em um estudo de um grupo de pacientes com esquizofrenia de meia-idade e mais
velhos, apenas 30% tinham emprego na maior parte do tempo após o início do quadro.
Em geral, o pior desempenho dos EIP nos testes neuropsicológicos está relacionado a baixo nível
de escolaridade e aos sintomas negativos, mas não aos sintomas positivos. A baixa qualidade de
vida nos esquizofrênicos está associada com depressão, sintomas positivos e negativos, déficits
cognitivos, dificuldades financeiras, pobre apoio social e falta de traquejo social.
Estudos epidemiológicos estimam uma prevalência de esquizofrenia entre pessoas com idades
entre 45-64 de 1,0%; e entre os idosos acima de 65 anos de idade, em 0,3%. Os encargos financei-
ros para a EIT são tão altos quanto a EIP.
Fatores de risco e apresentação clínica associada a EIT são semelhantes aos associados com o
EIP. A proporção de indivíduos com EIP e com EIT é a mesma em relação ao histórico familiar,
em torno de 10-15%. Nenhuma ligação consistente foi encontrada entre a idade de início e o risco
genético para a esquizofrenia. Negligência na infância como fator de risco foi similar na EIT e
na EIP, mas superior em ambos os grupos se comparados com indivíduos saudáveis. Estudos de
Capítulo 14 219
neuroimagem mostram que os pacientes EIT e os EIP têm anormalidades estruturais mais ines-
pecíficas como ventrículos alargados e aumento de lesões na substância branca, leucoaraiose, e
um maior volume no tálamo.
Acompanhamento neuropsicológico a longo prazo de pacientes com EIT não revelou evidência de
declínio cognitivo acentuado, reafirmando que a esquizofrenia é um transtorno do neurodesen-
volvimento e não de um processo de neurodegenerativo. Em testes neuropsicológicos, pacientes
com EIT tendem a ter menos prejuízo na aprendizagem, abstração e flexibilidade no pensamento
do que pacientes com EIP. Em comparação com pacientes com EIP, uma maior proporção de EIT
tem histórico ocupacional e conjugal mais bem-sucedidos e geralmente tem melhor funciona-
mento pré-mórbido.
A prevalência de EIT e transtorno delirante persistente é maior nas mulheres. Entre os pacientes
que tiveram esquizofrenia após os 40 anos de idade, 62,5% eram mulheres. Em outro estudo, so-
bre as características clínicas da EIT, a idade de aparecimento da doença foi 47 anos para homens
e 51 anos para mulheres, indicando que nelas o início se dá mais tardiamente do que nos homens.
Por isso, é especulado que o estrogênio tenha uma ação protetora contra a psicose, mascarando
os sintomas da esquizofrenia em mulheres vulneráveis até a perimenopausa. No entanto, in-
vestigações sobre a eficácia da terapia de reposição hormonal como tratamento adjuvante para
mulheres na pós-menopausa com psicose não têm tido resultados promissores.
A prevalência da característica paranoica em pacientes com EIT é 75%; e naqueles com com a EIP
fica em torno de 50%. Pacientes com EIT tendem a ter delírios mais organizados e sistematizados
associados, com ou sem alucinações auditivas. Pacientes com EIT também têm menos sintomas
negativos do que pacientes com EIP.
As características que distinguem os pacientes com EIMT incluem menor carga genética, menor
evidência de fatores de risco na primeira infância, pensamentos mais organizados e menos sin-
tomas negativos. Um maior risco de discinesia tardia nos pacientes com EIMT pode evidenciar
um componente mais neurodegenerativo, ao invés de um processo do neurodesenvolvimento
visto na EIT e na EIP.
Os pacientes com EIMT podem ter um perfil cognitivo mais estável de funcionamento do que os
idosos cronicamente institucionalizados com esquizofrenia.
220
Na EIMT, também, há predomínio do gênero feminino e elevada prevalência de delírio persecu-
tório.
6. Transtorno Delirante
Há poucos estudos sobre transtorno delirante em idosos. Pelo menos 6% dos idosos têm sinto-
mas paranoicos como delírios persecutórios, mas na maioria destes indivíduos, há uma demên-
cia comórbida. O transtorno delirante é responsável por 1 a 4% das admissões nos hospitais
psiquiátricos e é mais visto em populações de imigrante e situação socioeconômica desfavorável.
A prevalência relatada para o transtorno delirante entre idosos vivendo na comunidade varia de
0,1 a 4% e sua incidência é estimada em 10-26 por 100.000 habitantes por ano.
Os delírios persecutórios estão presentes em 90% dos casos, podendo no restante ser de refe-
rência, de controle, grandiosidade, hipocondríaco, religioso. As alucinações são bem mais raras,
mas podem ocorrer, sendo as mais comuns de origem auditiva e visual. E há preservação do
afeto, cognição e personalidade.
Entre os vários subtipos de transtornos delirantes, a vivência delirante de infestação por pa-
rasitose é comum na população idosa, especialmente nas mulheres. É conhecida também com
delírio de Ekbom, uma condição persistente em que o paciente falsamente acredita que peque-
nos insetos (pulgas, vermes ou larvas) têm infestado a sua pele. Os idosos com delírio de Ekbom
apresentam traços obsessivos de personalidade em mais de um terço. Em estudo com 45 idosos,
quase metade (46%) relatou delírios somático/infestação seguido por delírios de ciúme e per-
Capítulo 14 221
seguição. Para diagnosticar transtorno delirante, o médico deve sempre descartar o delirium,
demência, transtornos psicóticos devido a condições médicas gerais ou uso de substância (ben-
zodiazepínicos ou anticolinérgicos), esquizofrenia, transtornos do humor com características
psicóticas. Fatores de risco para transtorno delirante incluem uma história familiar de esquizo-
frenia ou transtorno de personalidade esquizoide, esquizotípica ou paranoica.
Estudos evidenciaram maior frequência de delírios nos pacientes idosos deprimidos em relação
a depressão de início precoce. Os indivíduos com depressão com sintomas psicóticos eram mais
velhos e respondiam melhor a ECT.
8. Psicose na demência
Os sintomas comportamentais e psicológicos na demência (BPSD) podem ocorrer em torno de
50 a 70 % ao longo do processo neurodegenerativo da demência de Alzheimer (DA). A frequência
de delírio varia entre 10% e 73%. Os delírios persecutórios são os mais comuns. Ao contrário dos
sintomas psicóticos na esquizofrenia, os delírios na DA tendem a ser mais simples e menos estru-
turados (Tabela 2). De modo geral, o conteúdo delirante é: “pessoas roubando coisas”; “...não tem
ninguém em casa”; cônjuge (ou outro cuidador) é um impostor – delírio de Capgras; abandono;
e de infidelidade. As alucinações visuais podem ser mais frequentes do que auditivas, princi-
palmente, na Demência por Corpos de Lewy (DCL). A frequência das alucinações na demência é
relatada na faixa de 12 a 49%, que pode ser de até 80% em pacientes na DCL.
Os BPSD foram classificados como preocupantes para a maioria dos cuidadores e têm efeitos ad-
versos sobre a saúde mental dos cuidadores, sendo uma das principais causas de institucionali-
zação de idosos.
222
Tabela 2 – Características dos sintomas psicóticos na Demência de Alzheimer (DA) e na esquizofrenia
9. Psicose e delirium
Os sintomas psicóticos são muito comuns no delirium, devido ao rebaixamento do nível de
consciência. O delirium é o diagnóstico mais comum entre os transtornos psiquiátricos em geral
(30-39%), sendo mais encontrado na população idosa (49%). Apesar da prevalência de sintomas
comportamentais e cognitivos serem significativamente maiores em comparação com sintomas
psicóticos, os delírios e as alucinações são mais frequentes no subtipo hiperativo e misto do
delirium.
Pacientes psicóticos prévios com delirium têm um prognóstico pior do que aqueles que não apre-
sentam psicose de base. Idosos com delirium têm maior risco de desenvolver declínio cognitivo
e funcional a longo prazo.
O haloperidol continua sendo o antipsicótico mais utilizado e com eficácia comprovada em en-
saios clínicos randomizados e controlados. Embora, atualmente, os antipsicóticos atípicos (ris-
peridona, olanzapina e quetiapina) também estejam sendo usados para tratar a agitação em pa-
cientes com delirium hiperativo e misto, com eficácia comparável ao haloperidol.
Capítulo 14 223
O padrão temporal do aparecimento de sintomas delirantes continuam sendo o fator mais impor-
tante do diagnóstico diferencial. Se o curso dos sintomas psicóticos se iguala ao da doença mé-
dica, o diagnóstico de psicose secundária é a mais provável. Algumas condições médicas estão
mais relacionadas a quadro psicótico: distúrbios metabólicos (deficiência de vitamina B12, ence-
falopatia hepática, uremia, distúrbios da tireoide e das adrenais, etc.), acidente vascular cerebral,
doença de Wilson, tumor, epilepsia, etc.
Portanto, um diagnóstico diferencial minucioso das possíveis causas médicas e tóxicas da psi-
cose é necessário para se evitar um diagnóstico apressado de um transtorno psiquiátrico primá-
rio. Excluir causas secundárias de psicose é fundamental para a conduta terapêutica adequada e
pode mudar dramaticamente o prognóstico.
224
Tabela 3 - Comparação do perfil farmacológico dos neurolépticos
Neuro-
Risperi- Olanzapi- Quetiapi- Ziprasi- Aripipra- Amis-
léptico Clozapina
dona na na dona zol sulprida
Típico
+ (se < 0 a + (se
SEP + a +++ 0 0 0a+ 0a+ +
4mg) <10mg)
Discine-
++ a +++ 0 a raro raro raro raro raro raro raro
sia Tardia
Convul- 0.1% a
2 a 6% ~0.3% ~0.9% ~0.8% ~0.4% ~0.1% raro
são 0.3%
Sedação + a +++ +++ + ++ ++ 0-++ 0-+ +
Hipoten-
são Ortos- + a +++ +++ ++ + ++ + a ++ + a ++ +
tática
Aumento
do Inter- + a +++ + a ++ + 0a+ + a ++ ++ 0a+ 0a+
valo QT
Ação An-
ticolinér- + a +++ +++ 0 + 0a+ 0 0 0
gica
Agranulo- ~1 em 6 em < 1 em < 1 em < 1 em < 1 em < 1 em < 1 em
citose 50.000 1.000 50.000 50.000 50.000 50.000 50.000 50.000
Aumento
Transitó- + se
de Prolac- ++ a +++ +++ 0 0a+ 0 +++
rio >20mg
tina
Ganho de
+ a ++ +++ + +++ ++ 0 + a ++ +
Peso
Catarata Algum
0? 0? 0? 0? 0? 0? 0?
Focal risco
Metabo-
lização
1A2, 2D6,
pelo Ci- vários 2D6 1A2, 2D6 3A4 3A4 2D6, 3A4 nenhum
3A4
tocromo
CYP P450
Piora da
+ a ++ +++ + +++ ++ 0 +? 0
Diabetes
Hipertri-
gliceride- + a ++ +++ + +++ ++ 0 0 0
mia
Outro efeito adverso grave dos antipsicóticos é discinesia tardia. A discinesia tardia é um distúr-
bio de movimento de início retardado que continua mesmo depois que a droga foi descontinuada
e é caracterizada por movimentos repetitivos, sem propósito, involuntários, principalmente na
Capítulo 14 225
região orofacial. A prevalência média geral de discinesia tardia em pacientes cronicamente trata-
dos com neuroléptico típico é de aproximadamente 24%. A incidência anual em jovens adultos é
de 4%. Os idosos tratados com antipsicóticos convencionais apresentam de quatro a cinco vezes
o risco de desenvolver discinesia tardia do que os pacientes mais jovens. Uma revisão sugere que
há significativamente maior incidência acumulativa de discinesia tardia em populações idosas
recebendo antipsicóticos típicos em relação à população adulta (após 3 anos de incidência de te-
rapia 63% entre idosos contra 15% entre a população adulta).
O ganho de peso é um importante efeito colateral com o uso de antipsicótico atípico que não pode
ser ignorado. Em 2003, o Food and Drug Administration (FDA) exigiu de todos os fabricantes de
antipsicóticos atípicos a inclusão de um aviso sobre os riscos do uso deles por pessoas com hiper-
glicemia e diabetes.
A maioria dos estudos sobre o tratamento farmacológico para a esquizofrenia de início tardio é
especulação sobre os tratamentos na EIP. Os estudos aprovam a eficácia de vários antipsicóticos
atípicos, incluindo clozapina, risperidona, olanzapina e aripiprazol no tratamento da psicose de
início tardio. Assim, a primeira linha de tratamento para a psicose em idosos é antipsicóticos
atípicos.
Em geral, os antipsicóticos atípicos são preferidos em idosos devido a menos efeitos colaterais ex-
trapiramidais, mas à custa de efeitos colaterais metabólicos em comparação com antipsicóticos
típicos. O uso de baixa dose de risperidona apresenta boa resposta aos ensaios clínicos controla-
dos. Resultados semelhantes de eficácia para o tratamento de idosos com EIP foram encontrados
para 2mg de risperidona e 10mg olanzapina em um estudo randomizado controlado, apesar da
olanzapina apresentar mais efeitos colaterais metabólicos.
Uma revisão da Cochrane não identificou evidência para o uso de antipsicóticos em pacientes
com EIT ou EIMT. Estudos abertos com antipsicóticos típicos, usados para o tratamento de EIT e
EIMT indicaram que 48-61% dos pacientes demonstraram remissão completa dos sintomas psi-
cóticos. Os antipsicóticos de alta potência (haloperidol) e os típicos de baixa potência (clorpro-
mazina) são associados a vários efeitos anticolinérgicos e extrapiramidais.
De um modo geral, há ampla evidência da eficácia do uso de neurolépticos para todos os tipos de
psicose em idosos, embora haja um alerta “black box” do FDA desde 2005, de aumento de 1.5 a 1.7
vezes do risco de mortalidade em pacientes idosos com demência de Alzheimer, principalmente
cerebrovascular, com o uso de qualquer antipsicótico. Apesar de as drogas antipsicóticas serem
comumente usadas para diferentes tipos de psicoses em idosos, nota-se que nenhum destes fár-
macos (nem outras drogas psicotrópicas) foi aprovado pelo FDA para uso em qualquer psicose di-
ferente de esquizofrenia. Por isso, na demência, é orientado utilizar dose baixa no menor período
de tempo, com o objetivo de eventual interrupção sempre que possível.
Uma ressalva importante: a quetiapina e a clozapina têm muito baixa incidência de SEPs, a ponto
de serem os de escolha para casos de psicose em síndromes parkinsonianas. Além disso, a cloza-
pina é primeira linha para esquizofrenia refratária.
226
Em estudos randomizados controlados, os resultados indicam que baixa dose clozapina e quetia-
pina são eficazes no controle dos sintomas comportamentais sem agravamento do parkinsonis-
mo, embora a clozapina seja um desafio para uso em adultos mais velhos por causa de seu risco
para agranulocitose (necessitando de acompanhamento hematológico semanal e mensal) e suas
propriedades de anticolinérgicos potentes.
Referências
BROADWAYA, J.; MINTZERB, J. The many faces of psychosis in the elderly. Current Opinion in
Psychiatry, 2007; 20:551–558.
ELKIS, H.; MELTZER, H.Y. Esquizofrenia Refratária. Revista Brasileira de Psiquiatria 2007;29
(Supl II): p.41-7.
GARERI, P. et al. Use of atypical antipsychotics in the elderly: a clinical review. Clinical Interven-
tions in Aging 2014:9 1363–1373.
KAYO, M.; NETO, M.R.L; ELKIS, H. O idoso com esquizofrenia. In: FORLENZA, O.V.; RADANO-
VIC, M.; APRAHAMIAN, I. Neuropsiquiatria geriátrica. 2. ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2014p.
172-178.
NEBHINANI, N.; PAREEK, V.; GROVER, S. Late-life psychosis: An overview. Journal of Geriatric
Mental Health, Jul-Dec-2014; Vol 1, Issue 2.
SANTANA, C.M.; GORDILHO, A. Transtornos Psicóticos de Início Tardio. In: FREITAS, E.V.; PY, L.
Tratado de Geriatria e Gerontologia. Quarta edição. Editora Guanabara Koogan, 2016. p. 404-413.
Capítulo 14 227
CAPÍTULO
Principais doenças
reumatológicas em geriatria
Prof. Dr. Aleksander Prokopowitsch
Principais doenças
reumatológicas em geriatria
Prof. Dr. Aleksander Prokopowitsch
1. Introdução
O objetivo deste capítulo é abordar, de forma sucinta, as doenças da área de Reumatologia com
maior importância no universo dos pacientes geriátricos. Devido à sua prevalência e relevância
na população geral e, especialmente, nos idosos, foram selecionadas quatro doenças, que a se-
guir serão detalhadas: osteoartrite, polimialgia reumática, arterite de células gigantes e artrite
reumatoide.
2. Osteoartrite
A osteoartrite (OA) é uma condição crônica degenerativa da cartilagem articular, de grande preva-
lência na população geral, especialmente acima dos 60 anos de idade e com predomínio no sexo
feminino. Estima-se que por volta de 15% da população tenha sintomas de OA na sexta década de
vida. A prevalência, porém, de alterações radiográficas compatíveis com a doença em ao menos
uma articulação nessa faixa etária é bem maior, podendo atingir 85% dos indivíduos. É a mais co-
mum das afecções reumatológicas, representando cerca de um terço das consultas ao reumatolo-
gista, e tem grande impacto social pois é causa frequente de afastamentos do trabalho e solicita-
ções de auxílio-doença. Mais frequentemente, a OA é de origem primária, oriunda de um proces-
so de desequilíbrio entre a síntese e a degradação da matriz extracelular da cartilagem articular,
com alterações das moléculas constituintes dessa matriz (glicosaminoglicanas e proteoglicanos)
e desidratação da cartilagem. Quando primária, afeta principalmente articulações das mãos (in-
terfalangianas distais e 1ª articulação carpometacarpiana), joelhos, quadris, coluna vertebral, 1ª
articulação metatarsofalangiana e articulações acromioclaviculares. Um dos principais fatores de
risco para a doença é a obesidade, especialmente para OA de joelhos, mas outros fatores de risco
podem incluir lesões articulares crônicas estruturais ou ligamentares, presença de deformidades
articulares, fatores ocupacionais e esportivos, além de fatores genéticos (principalmente para OA
de mãos). Entretanto, a OA pode também ter causas secundárias, tais como doenças inflamató-
rias articulares por cristais ou autoimunes, pioartrites, hemartroses, osteonecroses, neuropatias
crônicas, doença de Paget, síndrome de hipermobilidade e doenças endócrinas ou metabólicas
(hemocromatose, doença de Wilson, acromegalia, amiloidose e hiperparatireoidismo).
Do ponto de vista clínico, a OA manifesta-se essencialmente por dor articular mecânica, ou seja,
que piora à movimentação e melhora ao repouso. Vale ressaltar que a origem da dor articular na
OA é multifatorial, envolvendo inflamação e distensão da membrana e da cápsula sinovial, sensi-
bilização periosteal e central de dor, remodelação do osso subcondral, proliferação neural na jun-
ção osteocondral e fatores psicossociais. Além do quadro doloroso, na OA frequentemente ocorre
rigidez articular matinal de curta duração (menor que 30 minutos), com achado de crepitações
articulares ao exame físico e, eventualmente, sinais flogísticos, caso a doença esteja em fase
inflamatória. Nas mãos, o desenvolvimento de osteófitos pode levar ao surgimento dos nódulos
de Heberden e Bouchard nas articulações interfalangianas distais e proximais, respectivamente.
Nos quadros mais avançados, pode ser evidente a limitação de amplitude de movimento articu-
lar com o consequente prejuízo funcional.
Capítulo 15 231
Figura 2: Aspecto radiológico da osteoartrite de joelho
Fonte: http://images.md/osteoarthritis-degenerative-joint-disease-djd/
O tratamento da OA tem por objetivo a melhora da dor e da função articular, uma vez que, até
o momento, não há nenhuma medida capaz de mudar a evolução natural da doença. Há duas
frentes complementares e igualmente importantes no tratamento da doença: as medidas farma-
cológicas e as não farmacológicas.
232
tranquilidade anti-inflamatórios ou analgésicos tópicos como a capsaicina, especialmente na OA
de mãos e joelhos. A colchicina oral também pode ser empregada, especialmente nos casos com
exacerbações inflamatórias frequentes, que geralmente estão associadas à deposição articular
de cristais de pirofosfato de cálcio. Já os medicamentos de ação lenta incluem o sulfato de glico-
samina, o sulfato de condroitina, a diacereína e os óleos insaponificáveis de soja e abacate, cujo
efeito geralmente inicia-se após 4 a 8 semanas de uso e pode perdurar por até 6 meses após a sua
interrupção. Entretanto, não há evidência de que o uso dessas medicações seja capaz de alterar a
progressão da doença. Uma alternativa possível de tratamento são as infiltrações articulares com
corticoide (usualmente a triancinolona), especialmente nos joelhos, durante exacerbações in-
flamatórias, ou com derivados do ácido hialurônico (viscossuplementação), que podem garantir
melhora sintomática durante meses. Vale lembrar que o uso do antidepressivo duloxetina tam-
bém pode ser considerado um tratamento adjuvante no controle da dor crônica relacionada à OA.
Há várias outras modalidades de tratamento ainda em estudo, como, por exemplo, o uso de co-
lágeno hidrolisado, ranelato de estrôncio, bisfosfonatos e plasma rico em plaquetas, porém no
momento não há ainda evidências suficientes para recomendar a utilização de tais tratamentos
na prática clínica.
3. Polimialgia reumática
A polimialgia reumática (PMR) é uma condição inflamatória sistêmica relativamente comum na
faixa etária mais idosa. Afeta quase que exclusivamente indivíduos acima dos 50 anos de idade,
com a maior incidência ocorrendo entre os 70 e 80 anos. Trata-se de doença importante devido à
sua frequência relativamente elevada. Em algumas populações, especialmente de origem escan-
dinava, a PMR ocupa o segundo lugar entre as doenças reumáticas inflamatórias sistêmicas mais
comuns, com uma prevalência de até 0,7% da população com mais de 50 anos de idade, perdendo
apenas para a artrite reumatoide.
A PMR pode ocorrer isoladamente ou em associação à arterite de células gigantes (ACG), tam-
bém conhecida como arterite temporal, mas é doença duas a três vezes mais comum que a ACG.
Estima-se que aproximadamente metade dos pacientes com ACG apresente associadamente sin-
tomas de PMR. Ao inverso, por volta de 10-20% dos pacientes com PMR poderão, em algum mo-
mento da evolução, desenvolver ACG.
Do ponto de vista clínico, a PMR caracteriza-se essencialmente pela ocorrência de dor e rigi-
dez matinal importantes, por vezes de início abrupto, envolvendo a região cervical e as cinturas
escapular e pélvica, geralmente de maneira simétrica. Tais sintomas podem também acometer
porções mais distais, na maioria das vezes punhos e mãos, porém de forma mais branda que nas
porções proximais dos membros. A rigidez matinal pode durar horas e recorrer após períodos de
inatividade física, resultando muitas vezes em limitação funcional para atividades de vida diá-
ria. Podem ocorrer também sintomas constitucionais inespecíficos, tais como fraqueza, fadiga,
perda de peso e episódios de febre baixa. Os achados de exame físico são relativamente pobres,
Capítulo 15 233
mas podem incluir limitação de amplitude de movimento cervical, dos ombros e dos quadris,
bem como sinovite leve de articulações periféricas (principalmente mãos e punhos).
O diagnóstico de PMR baseia-se em grande parte nos achados clínicos e laboratoriais, uma vez
que não há teste específico para o seu diagnóstico. Em caso de dúvida, porém, pode-se lançar
mão de algum método de imagem, como ultrassonografia ou ressonância nuclear magnética de
ombros ou quadris, para melhor caracterização do quadro. Na PMR, tais métodos costumam de-
monstrar a sinovite glenoumeral e/ou coxofemoral, além de frequente acometimento inflamató-
rio de estruturas periarticulares, como tendões e bursas (principalmente subacromial/subdeltoi-
dea e trocantérica).
234
ao longo da vida é de 0,5% para os homens e 1% para as mulheres. Sua ocorrência predomina no
sexo feminino, na qual a doença é duas a três vezes mais comum que nos homens.
Clinicamente, a ACG tem em geral início subagudo, com sintomas constitucionais usualmente
marcantes, tais como febre, fadiga, anorexia e perda de peso. Em um número considerável de pa-
cientes, tais sintomas são os únicos na apresentação inicial da doença, de modo que a ACG deve
ser incluída no diagnóstico diferencial de febres de origem indeterminada na população idosa.
Vale lembrar também que aproximadamente metade dos pacientes com ACG apresenta sintomas
compatíveis com polimialgia reumática, já descritos no tópico anterior.
Um dos mais importantes sintomas da ACG é a cefaleia, que ocorre em mais de dois terços dos
pacientes. Ela, muitas vezes, é mais pronunciada na região temporal, porém pode ocorrer em
outras áreas ou mesmo ser generalizada. Não há um padrão típico para a cefaleia associada à
ACG, mas comumente é possível caracterizá-la como sendo nova, e frequentemente os pacientes
queixam-se de aumento de sensibilidade ao toque no couro cabeludo. Outro sintoma marcante, e
que apresenta boa especificidade para o diagnóstico, é a claudicação de mandíbula, que aparece
em cerca de metade dos casos e geralmente é referida como sensação de fadiga mastigatória.
Os sintomas potencialmente mais perigosos e mais temidos da ACG são aqueles relacionados a
perdas visuais. Tais perdas podem ter caráter transitório, na forma de amaurose fugaz. Podem,
todavia, ser permanentes e ocorrer de forma súbita, tanto unilateral quanto bilateralmente. Esti-
ma-se que até um quinto dos pacientes com ACG possa evoluir com perdas visuais permanentes
parciais ou completas, de um ou ambos os olhos. Os quadros de perda visual na ACG são, mais
frequentemente, derivados do acometimento inflamatório da artéria ciliar posterior (produzin-
do a chamada neuropatia óptica isquêmica anterior aguda) ou da artéria central da retina, com
o consequente comprometimento do fluxo sanguíneo para porções da retina e do nervo óptico.
Além de perdas visuais, podem ocorrer eventualmente também sintomas de diplopia, secunda-
riamente a lesões isquêmicas de qualquer porção do sistema oculomotor.
Apesar de a ACG tipicamente afetar vasos arteriais do segmento cefálico, acometimento de ou-
tras grandes artérias também pode ocorrer. São descritas na doença, por exemplo, alterações
inflamatórias na parede da aorta, levando a quadros como aneurismas e dissecções, ou mesmo
aortites idiopáticas. Ramos da aorta também podem ser acometidos, especialmente os mais cra-
niais, tais como as artérias subclávias e o tronco braquiocefálico, apesar de também haver des-
crições de acometimento das artérias femorais.
Do ponto de vista do exame físico, podem eventualmente ser notadas anormalidades em artérias
do segmento cefálico, especialmente nas artérias temporais superficiais, que podem se apresen-
tar dolorosas à palpação, endurecidas e aumentadas de volume, com redução ou mesmo ausência
do seu pulso. Vale ressaltar que este não é um achado universal na ACG, de modo que a ausên-
cia de anormalidades ao exame das artérias temporais superficiais não afasta o diagnóstico da
doença. Além disso, o exame oftalmológico fundoscópico deve ser realizado em todos os pacien-
tes com suspeita de ACG, especialmente naqueles com queixas de perdas visuais transitórias ou
permanentes, no sentido de se pesquisar alterações compatíveis com neuropatias ópticas isquê-
Capítulo 15 235
micas. Eventualmente, a depender do envolvimento de outras grandes artérias, podem ser iden-
tificados sopros arteriais, assimetrias de pulsos ou diferenças de pressão arterial entre membros.
Em relação ao diagnóstico laboratorial da ACG, não há nenhum ensaio bioquímico que demons-
tre alterações típicas ou específicas da doença. São frequentes as elevações de provas de fase
ativa (VHS e proteína C-reativa), com valores de VHS que muitas vezes atingem 100mm/hora
ou mais. Estima-se, contudo, que 5% dos pacientes com ACG possam apresentar valores de VHS
abaixo de 40mm/hora no momento do diagnóstico. Assim, valores pouco elevados ou mesmo
normais de VHS não excluem a possibilidade de ACG. Outros achados laboratoriais inespecíficos
podem incluir anemia de doença crônica, elevação discreta de transaminases e redução dos ní-
veis de albumina sérica.
Alguns métodos de imagem podem contribuir para o diagnóstico de ACG, mas, até o momento,
não tornam dispensável a biópsia vascular. O principal método de imagem atualmente utilizado
é a ultrassonografia com Doppler das artérias temporais superficiais. Nos casos de ACG, pode ser
eventualmente visualizado o denominado “sinal do halo”: uma área hipoecogênica circunferen-
cial à parede vascular, medindo até 2mm de largura e representando edema inflamatório. Pode
também ser percebida a persistência da visualização da parede arterial inflamada durante a sua
compressão pelo transdutor. No entanto, a utilização desse método como apoio diagnóstico de-
pende em grande parte da experiência do ultrassonografista, o que pode limitar a sua acurácia.
Outros métodos, tais como angiotomografias, angiorressonâncias e PET-CT, podem ser utiliza-
dos na avaliação de quadros suspeitos de ACG, especialmente para a avaliação de acometimento
de grandes artérias extracranianas.
Fonte: http://medicinembbs.blogspot.com.br/2011/01/giant-cell-arteritis-temporal-arteritis.html
236
O tratamento da ACG é baseado fundamentalmente na corticoterapia, que deve ser iniciada tão
logo seja firmada a suspeita clínica, mesmo antes da confirmação histológica, no sentido de se
reduzir substancialmente o risco de complicações visuais. Vale ressaltar que o início precoce
do tratamento não prejudica a avaliação histopatológica da biópsia vascular, uma vez que os
achados característicos da ACG podem persistir por semanas ou mesmo meses após iniciada a
corticoterapia. Usualmente, o corticoide de escolha é a prednisona, na dose inicial de 1mg/kg/
dia. Essa dose pode ser precedida de pulsoterapia com metilprednisolona (1000mg/dia por via
endovenosa durante 3 dias consecutivos) nos casos em que haja complicações visuais já instala-
das. Uma vez iniciada a corticoterapia, o desmame deve ser lento, de modo que muitos pacien-
tes acabam permanecendo em uso de doses decrescentes de prednisona durante um período de
tempo total de um ano ou mais. Eventuais exacerbações da doença ao longo do desmame podem
requerer elevações temporárias da dose de corticoide. Nos casos resistentes ao desmame, que ne-
cessitem de doses maiores que 10mg/dia de prednisona para o adequado controle de atividade de
doença, pode ser considerada a associação de algum agente poupador de corticoide, tais como o
metotrexate, a ciclofosfamida e, mais recentemente, o tocilizumabe (anticorpo monoclonal anti-
receptor de interleucina-6). Em grande parte dos pacientes, porém, a doença apresenta um curso
autolimitado, permitindo a descontinuação completa do corticoide ou, eventualmente, sua ma-
nutenção em doses baixas a longo prazo.
Como terapia adjuvante, pode ser considerada a associação de AAS em baixas doses (geralmente
100mg/dia) no sentido de se diminuir o risco de complicações isquêmicas visuais ou no sistema
nervoso central. Nesses casos, especialmente na população idosa, é importante considerar pro-
teção gástrica com o uso de inibidores de bomba de prótons. Além disso, a prolongada corticote-
rapia requer vigilância em relação à massa óssea, podendo ser adequado o uso de suplementação
de cálcio e vitamina D, ou mesmo de bisfosfonatos.
Do ponto de vista clínico, a AR pode afetar qualquer articulação sinovial, porém classicamente
acomete os punhos, os carpos e as pequenas articulações das mãos, caracteristicamente pou-
pando as articulações interfalangianas distais. O acometimento tende a guardar relativa sime-
tria, e a rigidez articular matinal costuma ser prolongada, geralmente com duração maior que
uma hora. As articulações afetadas apresentam-se edemaciadas e doloridas, muitas vezes com
prejuízo funcional importante. Caso não seja adequadamente tratada, a AR pode, ao longo do
Capítulo 15 237
tempo, causar erosões ósseas e deformidades articulares, tais como subluxações metacarpofa-
langianas, desvio ulnar dos dedos das mãos e as clássicas deformidades em “pescoço de cisne”,
“botoeira” e “martelo”.
Variados acometimentos extra-articulares podem ocorrer nos pacientes com AR. Os mais co-
muns são nódulos reumatoides, vasculites reumatoides, síndrome sicca secundária e alterações
pulmonares, especialmente fibrose pulmonar intersticial e derrame pleural. Tais quadros são
mais comuns nos pacientes com doença articular mais agressiva, geralmente portadores de fator
reumatoide em títulos elevados.
Fonte: http://www.stemcelltherapyinindia.com/treatable-diseases/rheumatoid-arthritis.php
Estima-se que por volta de um quarto dos pacientes com AR são diagnosticados a partir dos 60
anos de idade. Nesses casos, a proporção de acometimento entre os gêneros tende a ser igual,
diferentemente da proporção de três mulheres para um homem vista na AR de início em indiví-
duos mais jovens. Além disso, o acometimento é mais agudo, oligoarticular e assimétrico, com
predomínio maior nas grandes articulações e sintomas constitucionais mais marcantes.
Fonte: OZERKIS-ANTIN, D. et al. Recognizing Lung Disease in patients with Rheumatoid Arthritis.
European Journal of Respiratory Diseases, 2008, vol. 29
238
Do ponto de vista laboratorial, a AR associa-se à positividade do fator reumatoide em 70-80% dos
casos. Vale recordar que o fator reumatoide é inespecífico para a doença, porém sua positividade
em altos títulos relaciona-se a uma doença mais agressiva, com maior potencial erosivo e mani-
festações articulares mais graves. Nos casos onde o fator reumatoide é negativo, principalmente
nas fases iniciais da doença, pode ter importância a pesquisa de anticorpos contra peptídeos
citrulinados, dos quais o anti-CCP (anticorpo antipeptídeo cíclico citrulinado) é o mais relevante.
Tais anticorpos apresentam especificidade muito maior para a AR que o fator reumatoide, esti-
mada em cerca de 95%, com sensibilidade entre 70% e 80%. É importante considerar que, na po-
pulação idosa, a positividade inespecífica do fator reumatoide é mais comum que na população
jovem, o que pode limitar o seu valor diagnóstico para a AR e tornar a pesquisa dos anticorpos
contra peptídeos citrulinados mais importante, dada a sua maior especificidade para a doença.
Nos idosos, diante de um caso suspeito de AR, deve-se sempre avaliar a possibilidade de alguns
diagnósticos diferenciais comuns a essa faixa etária. Assim, é necessário considerar a presença de
alguma neoplasia associada à idade e ao sexo do paciente, já que manifestações articulares compa-
tíveis com a AR podem ter caráter paraneoplásico. Outros diagnósticos diferenciais a serem con-
siderados são osteoartrose em fase inflamatória, artropatia por cristais e polimialgia reumática,
lembrando que, nesta última, os níveis de VHS tendem a ser ainda mais elevados que na AR, com
fator reumatoide usualmente negativo e anticorpos antipeptídeos citrulinados ausentes.
O tratamento da AR na população idosa deve seguir os mesmos princípios que na população mais
jovem. Idealmente, a instituição do tratamento deve ser precoce, visando à remissão de doença
(o chamado treat to target), com o uso de drogas antirreumáticas modificadoras de doença (ou
DMARDs – disease-modifying anti-rheumatic drugs). O uso associado de prednisona em baixas
doses pode ser considerado (geralmente até 10mg/dia), porém a utilização de anti-inflamatórios
não hormonais nos idosos deve ser feita com grande cautela ou mesmo evitada, devido ao seu
grande potencial de efeitos adversos nessa população. Dentre as DMARDs atualmente disponí-
veis, a mais importante no tratamento inicial da doença é o metotrexate oral, geralmente utiliza-
do nas doses de 15 a 25mg/semana. Outras DMARDs orais incluem o leflunomide, a sulfassalazina
e a cloroquina, que podem ser usadas isoladamente ou em combinação com o metotrexate. No
caso de falha aos DMARDs orais, pode estar indicado o uso de terapia imunobiológica. Dentre
as medicações dessa categoria atualmente disponíveis, encontram-se os agentes anti-TNF (in-
fliximabe, etanercepte, adalimumabe, certolizumabe, golimumabe), o tocilizumabe (anticorpo
monoclonal antireceptor de IL-6), o abatacepte (inibidor da coestimulação de linfócitos T) e o
rituximabe (anticorpo monoclonal anti-CD20 de linfócitos B). Há também disponível atualmente
o tofacitinibe, pequena molécula de uso oral inibidora das janus-quinases 1, 2 e 3. Recomenda-se
que a indicação e a utilização dessas medicações sejam avaliadas e acompanhadas por reumato-
logista.
Capítulo 15 239
6. Caso clínico
Paciente do sexo feminino, de 74 anos de idade, compareceu ao consultório médico com queixas
de dores articulares acompanhadas de edema havia 2 meses. Tais queixas foram aditivas e passa-
ram a predominar nas pequenas articulações das mãos e nos punhos, também afetando um dos
tornozelos e o joelho contralateral. A paciente também referia sentir rigidez articular nas mãos
ao acordar, que melhorava gradativamente até desaparecer por completo após aproximadamen-
te duas horas. Relatava discreta perda ponderal de 2kg no período, porém sem febre ou outras
queixas constitucionais. Negava surgimento de lesões mucosas ou cutâneas, dores lombares, al-
terações intestinais ou urinárias, sintomas respiratórios ou queixas oculares. Tinha anteceden-
tes pessoais de tabagismo, suspenso havia oito anos, com carga tabágica total de 40 maços-ano.
Também apresentava hipertensão arterial e hipotireoidismo, em uso de valsartana 160mg/dia,
amlodipina 5mg/dia e levotiroxina 75mcg/dia, sem outras comorbidades conhecidas.
Ao exame físico articular, constatava-se aumento de volume e presença de dor à palpação em al-
gumas articulações interfalangeanas proximais das mãos e metacarpofalangianas, com relativa
simetria. Notava-se também edema articular no punho esquerdo, com alguma dor à sua flexo
-extensão, além de discreto aumento de temperatura no joelho direito e no tornozelo esquerdo.
Não havia deformidades articulares ou outras alterações evidentes ao exame clínico.
Considerou-se inicialmente a principal hipótese diagnóstica como sendo artrite reumatoide, para
cuja investigação foram solicitados alguns exames, dentre eles hemograma completo, provas de
atividade inflamatória, pesquisa de fator reumatoide e de anticorpos anti-CCP, além de radiogra-
fia das mãos. Os resultados mostraram hemograma normal, VHS de 52mm/hora, proteína C-rea-
tiva de 2.84mg/dl (normal até 1 mg/dl), fator reumatoide e anti-CCP negativos. A radiografia de
mãos evidenciou porose óssea difusa, porém sem erosões articulares evidentes. Sorologias para
quadros virais crônicos (infecção por HIV, hepatite B e hepatite C), como possíveis diagnósticos
diferenciais para a poliartrite crônica, também foram solicitadas e resultaram todas negativas.
Assim sendo, em vista do quadro clínico altamente sugestivo e das alterações inflamatórias aos
exames laboratoriais, admitiu-se de fato o diagnóstico de artrite reumatoide soronegativa do
idoso. Instituiu-se tratamento com metotrexate 15mg/semana, hidroxicloroquina 400mg/dia e
prednisona 5mg/dia, com boa resposta clínica após dois meses de tratamento, embora a VHS e a
proteína C-reativa permanecessem ainda elevadas, com melhora apenas parcial (38mm/hora e
1.42mg/dl, respectivamente).
Durante o terceiro mês de tratamento, a paciente passou a evoluir com episódios de epistaxe de
repetição à esquerda, além de leve sensação de obstrução nasal do mesmo lado, sem dor local
ou outras queixas. Hemograma demonstrou nível normal de plaquetas, não havendo alterações
também ao coagulograma. Foi encaminhada a serviço otorrinolaringológico, onde foi realizada
nasofibroscopia, sendo evidenciada massa em fossa nasal esquerda. Biópsia da lesão foi com-
patível com melanoma maligno. No prosseguimento da investigação, a paciente foi submetida
a tomografia computadorizada das fossas nasais, que mostrou grande invasão tumoral local e
de base de crânio, não havendo possibilidade de ressecção cirúrgica. Foi instituída radioterapia
paliativa do tumor, com a paciente evoluindo a óbito depois de dois meses.
Esse caso ilustra a necessidade de atenção para etiologias paraneoplásicas em casos de artrite
reumatoide do idoso, especialmente quando da negatividade do fator reumatoide e de outros au-
240
toanticorpos associados à doença, bem como quando há persistência da elevação das provas de
atividade inflamatória. As neoplasias mais comuns são aquelas mais frequentes segundo a idade
e o sexo do paciente, mas também podem ocorrer em sítios pouco usuais e serem virtualmente
assintomáticas e de difícil suspeita diagnóstica, como no caso aqui apresentado.
BORCHERS, A.T.; GERSHWIN, M.E. Giant cell arteritis: a review of classification, pathophysiolo-
gy, geoepidemiology and treatment. Autoimmunity Reviews. 2012; 11: A544-54.
BUTTGEREIT, F. et al. Polymyalgia rheumatica and giant cell arteritis: a systematic review. Jour-
nal of the American Medical Association. 2016; 315: 2442-58.
DE SOUZA, A.W.S. Vasculite no idoso. Revista Paulista de Reumatologia. 2016; 15(4): 28-35.
LOESER, R.F.; COLLINS, J.A.; DIEKMAN, B.O. Ageing and the pathogenesis of osteoarthritis. Na-
ture Reviews Rheumatology. 2016; 12(7): 412-20.
SALVARANI, C. et al. Clinical features of polymyalgia rheumatica and giant cell arteritis. Nature
Reviews Rheumatology. 2012; 8: 509-21.
SENNA, E.R. et al. Prevalence of rheumatic diseases in Brazil: a study using the COPCORD approa-
ch. The Journal of Rheumatology. 2004; 31(3): 594-7.
TORIGOE, D.Y.; GENNARI, J.D. Artrite reumatoide do idoso. Revista Paulista de Reumatologia.
2016; 15(4): 6-10.
WENHAM, C.Y.; CONAGHAN, P.G. New horizons in osteoarthritis. Age Ageing 2013; 42(3): 272-8.
Capítulo 15 241
CAPÍTULO
Doenças endócrinas
do envelhecimento
Profa. Michele Bautista
Profa. Christyanne Maria Rodrigues Barreto de Assis
Prof. Juliano Silveira de Araújo
Doenças endócrinas do envelhecimento
Profa. Michele Bautista
Profa. Christyanne Maria Rodrigues Barreto de Assis
Prof. Juliano Silveira de Araújo
Introdução
As alterações hormonais associadas ao envelhecimento habitualmente não apresentam impacto
na perda de funcionalidade do idoso. Apesar de alguns níveis hormonais não se reduzirem ou até
aumentarem no envelhecimento, a resistência dos receptores hormonais conferem um menor
funcionamento do sistema endócrino no idoso.
A confirmação diagnóstica é feita através de exames laboratoriais. Uma avaliação inicial do eixo
somatotrófico pode ser feita pelas dosagens séricas de IGF-1 e de IGFBP-3, já que seus níveis refle-
tem os efeitos biológicos do GH e também se correlacionam com o pico de GH estimulado. Valores
de IGF-1 e IGFBP-3 abaixo de -2 desvios-padrão do valor de referência aumentam a probabilidade
de deficiência e demandam a realização de um primeiro teste provocativo para avaliar a reserva
secretória de GH.
1.3 Tratamento
Os idosos com deficiência de GH apresentam perfil de risco de efeitos colaterais com a reposi-
ção de GH maior que os jovens. Recomenda-se doses menores que as habituais do adulto, 100 a
200 mcg/dia, com aumentos a cada 1 a 2 meses. O objetivo terapêutico é atingir metade superior
do limite da normalidade do valor de referência para GH. Após alcançar a meta, recomenda-se
observar o paciente a cada 6 meses.
2. Hipogonadismo Masculino
Tem sido reconhecido por vários anos que o processo de envelhecimento do homem é associado
ao declínio progressivo na produção androgênica. As principais manifestações da Deficiência
Androgênica no Envelhecimento Masculino (DAEM) são:
• Diminuição da libido;
• Disfunção erétil;
• Depressão e irritabilidade;
• Osteoporose.
Capítulo 16 245
2.1 Investigação
Recomenda-se a investigação de indivíduos com queixa de redução da libido, número de ereções,
ginecomastia, redução dos pelos corporais, redução testicular e baixa massa óssea. O escore
Androgen Deficiency in the Aging Male (ADAM), que consiste em 10 questões (Tabela 1), é uma
ferramenta de grande utilidade no rastreio do hipogonadismo.
Fonte: TANCREDI, A. et al. Interest of the Androgen Deficiency in Aging Males (ADAM)
questionnaire for the identification of hypogonadism in elderly community-dwelling male volunteers.
European Journal of Endocrinology, 2004, 151, 355–360
2.2 Tratamento
A principal forma de administração é através de testosterona injetável. Estão disponíveis no Bra-
sil: propionato, fenilpropionato, cipionato, decanoato, isocaproato e undecanoato. A medicação
deve ser repetida a cada 2 ou 3 semanas para medicamentos de curta duração e a cada 6 ou 12
semanas para aqueles de longa duração. Nos pacientes com DAEM, os adesivos transdérmicos
são bem aceitos na dose de 5 a 7,5 mg/dia e trocados a cada 48 horas.
246
Quadro 1 - Opções terapêuticas para reposição de testosterona
Fonte: SARRIS, A.B. et al. Fisiopatologia, avaliação e tratamento da disfunção erétil: artigo de revisão.
Revista de Medicina 95.1, 2016: 18-29
Idosos sob corticoterapia podem necessitar de dose suplementar de glicocorticoide quando ex-
postos a situações de estresse, como anestesia geral, procedimento cirúrgico, trauma e na vigên-
cia de processos infecciosos. Uma das formas de suplementação é a administração de 100mg de
hidrocortisona a cada 8 horas por 72 horas nos pacientes submetidos a cirurgia de grande porte e
50 a 100mg de hidrocortisona a cada 8 horas por 12 a 24 horas nos procedimentos de menor porte.
Após uso deste esquema o paciente retorna ao uso da dose habitual.
Capítulo 16 247
4. Climatério
4.1 Introdução
A menopausa natural é a permanente cessação dos ciclos menstruais definida retrospectivamente
após 12 meses de amenorreia sem outra causa secundária. A perimenopausa (PM) é definida pelo
início dos sintomas climatéricos até 1 ano após a menopausa. Esta fase pode durar anos.
Na fase tardia a variedade cíclica aumenta, com flutuação no FSH e estradiol. Alto FSH com baixo
estradiol sugere menopausa, mas, logo em seguida o FSH e o estradiol podem voltar aos níveis
da pré-menopausa.
4.2 Epidemiologia
A média de idade da menopausa é de 51 anos, com 95% entre 45 e 55 anos. Antes dos 40 anos não
é normal, devendo ser aventada a falência ovariana.
A histerectomia parece alterar a função ovariana a longo prazo, mesmo com preservação dos
ovários. Tal efeito não é completamente entendido. Estudos mostram que mulheres pós-histe-
rectomia desenvolvem mais precocemente perfil hormonal e clínico da menopausa, possivel-
mente pelo dano vascular.
Na senescência o FSH e o LH mudam estruturalmente e têm maior meia-vida, o que leva a maio-
res níveis hormonais, mesmo que menos biologicamente ativos.
O período PM, em média, se inicia 4 anos antes da menstruação e incluem alterações fisiológicas
que afetam a qualidade de vida. Irregularidade dos ciclos, flutuação hormonal, fogachos, distúr-
bios do sono, do humor e ressecamento vaginal. Em paralelo, alterações no lipidograma e perda
de massa óssea começam a ocorrer. Na fase inicial da PM tende a existir uma irregularidade dos
ciclos; tipicamente primeiro um aumento no intervalo intermenstrual, mais tardiamente as mu-
danças se acentuam até mesmo com ciclos amenorreicos e anovulatórios. Algumas mulheres
podem ter ciclos com sangramentos mais intensos e/ou prolongados, que são mais anovulató-
rios e mais frequentes nas mulheres com obesidade e/ou fibromas uterinos. Dados sugerem que
mulheres que apresentaram 3 meses de amenorreia deverão atingir o último ciclo menstrual nos
próximos 4 anos.
Os sintomas mais comuns no período PM e menopausa são os sintomas vasomotores (SV) - (refe-
rido como fogachos ou “ondas de calor”), que ocorrem em torno de 80% das mulheres, mas ape-
nas 20 a 30% procuram o médico. Tais sintomas são mais frequentes na fase tardia (80% versus
40% na precoce).
248
Os SV comumente se iniciam com uma súbita sensação de calor em face e tronco que se generaliza,
dura de 2 a 4 minutos e se associa a transpiração, suor frio, palpitações, ansiedade, várias vezes
ao dia e mais à noite. Mais de 80 % dura mais de um ano, tende a cessar em 4 a 5 anos, porém,
alguns persistem por anos, com 9% além dos 70 anos.
Distúrbios do sono também podem ocorrer na PM com uma prevalência que aumenta na fase
tardia. O manejo dos SV pode auxiliar na insônia, mas, às vezes, há outras causas associadas
como depressão e ansiedade.
A queda hormonal gera atrofia e ressecamento vaginal com sintomas como comichão, dispareu-
nia e alterações urinárias na forma mais tardia, que aumentam após a PM. No que tange ao ciclo
sexual existe diminuição no fluxo sanguíneo e da lubrificação vaginal, além de diminuição do
turgor e da elasticidade da vagina. Podem haver alterações de memória e capacidade de concen-
tração, mas são achados controversos na literatura médica.
4.6 Tratamento
O estrógeno é a terapia mais eficaz para os sintomas da menopausa, principalmente os SV. Outros
sintomas como o humor, os distúrbios de sono e as dores articulares também podem ser aliviadas,
assim como a atrofia vulvovaginal. Os transtornos de humor também podem ser manejados com
inibidores de recaptação de serotonina e a atrofia vulvovaginal com estrógeno local. Para a pre-
venção cardiovascular, da osteoporose e dos distúrbios cognitivos, não há indicação de reposição
hormonal.
A terapia de reposição hormonal com estrógeno combinado ou não com progesterona não é
Capítulo 16 249
indicação de rotina, diante dos resultados de estudos com aumento do risco de câncer e eventos
trombóticos. Considera-se candidata a paciente que está há menos de 10 anos na menopausa,
que apresenta menos de 60 anos, na ausência de contraindicações, como histórico de câncer de
mama, doença coronariana, trombose, acidente vascular encefálico ou doença hepática.
A reposição pode ser de diversas formas, como oral, transdérmica, vaginal em creme, anel
ou implante subcutâneo. A transdérmica está associada a menores riscos de trombose e
hipertrigliceridemia. O tempo de reposição hormonal deve ser limitado a não mais do que 5 anos
ou para além dos 60 anos de idade.
Fonte: SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2015–2016). Sao Paulo:
AC Farmacêutica, 2013
As complicações microvasculares são caracterizadas por lesões visuais (retinopatia), renais (ne-
fropatia) e neuronais (neuropatias). A investigação destas afecções deve ser realizada anualmente.
A retinopatia diabética é a responsável pelo risco 25 vezes maior de diabéticos apresentarem ce-
gueira em relação à população geral. A retinopatia pode ser classificada em: I. Não proliferativa;
250
II. Pré-proliferativa; III. Proliferativa. A estratégia de avaliação consiste na realização de oftal-
moscopia e identificação dos microaneurismas (preditores de progressão de doença).
Das intervenções possíveis na nefropatia diabética, o controle da pressão arterial é uma das mais
importantes na prevenção e progressão de doença. A relevância do controle da pressão arterial
nas complicações do DM é demonstrado pelo estudo UKPDS. Neste estudo, ficou demonstrado
que cada redução de 10mmHg na pressão arterial sistólica está associada a uma queda de 12% no
risco de complicações. Das classes de anti-hipertensivos, os IECAs (inibidores de enzima conver-
sora de angiotensina) e os BRAs (bloqueadores de receptores de angiotensina) apresentam efeito
nefroprotetor pela redução da perda proteica renal.
Durante vários anos o nível tensional de 130x80mmhg foi a meta pressórica para indivíduos com
diabetes mellitus. O consenso americano (Eighth Joint) estabeleceu um alvo de pressão inferior a
140x90mmHg, acima do qual os indivíduos devem ser tratados farmacologicamente.
A neuropatia é uma das piores complicações crônicas do DM, sendo um distúrbio do nervo peri-
férico caracterizado por atrofia e degeneração axonal e/ou por alterações nas células de Schwann,
provocando desmielinização em segmentos do axônio, tendo como consequência diminuição da
velocidade de condução ou interrupção da transmissão do impulso nervoso.
A neuropatia diabética gera transtornos tróficos da pele e osteoarticulares do pé, como atrofia
muscular e diminuição da amplitude de movimento, o que resulta no risco de ulceração plantar.
Úlceras superficiais ou lesões pré-ulcerativas nos pés de indivíduos diabéticos com diminuição
de sensibilidade causada por neuropatia diabética constituem 85% dos casos graves de interna-
ções hospitalares.
Capítulo 16 251
Quadro 2 - Metas laboratoriais para o tratametdo do DM tipo 2
Aconselhamento nutricional (atentar para o maior risco de hipoglicemia e perda ponderal pelo idoso).
Recomendação Grau
O tratamento do idoso com diabetes deve obedecer aos mesmos princípios dos não idosos. A
Não há evidências de que o controle glicêmico rigoroso em idosos evita eventos cardiovasculares. B
A terapia intensificada em idosos com diabetes está associada a maior risco de hipoglicemia. A
Não se conseguiu comprovar que a maior mortalidade observada com tratamento intensivo dos idosos com diabetes
B
se deveria à maior incidência de hipoglicemia.
Metformina não é contraindicada em idosos, mas, quando recomendada, deve-se dar maior atenção às funções re-
A
nal, hepática, cardiopulmonar e a quaisquer situações que predisponham à acidose.
Insulinoterapia não está contraindicada aos idosos com diabetes, mas este tipo de tratamento necessita cuidados
B
maiores e implica em maior risco de hipoglicemia.
Acarbose pode ser utilizada em idosos com diabetes com mínimo ou nenhum risco de hipoglicemia, mas a tolerância
C
aos efeitos colaterais é menor.
As glitazonas podem ser utilizadas nos pacientes idosos com diabetes, mas o risco de insuficiência cardíaca e os-
A
teoporose (principalmente nas mulheres) limitam o seu uso nesta população.
Análogos de GLP-1 e inibidores da DPP-IV podem ser usados em idosos com diabetes com especial atenção à função
B
renal, já que são contraindicados na insuficiência renal grave (Clearance igual ou menor do que 30 ml/minuto).
(A) Estudos experimentais e observacionais de melhor consistência; (B) Estudos experimentais e observacionais de menor
consistência; (C) Relatos de casos - estudos não controlados; (D) Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consenso,
estudos siológicos ou modelos animais.
252
5.5 Classes farmacológicas no tratamento do DM tipo II
Nos idosos, o tratamento deve ser iniciado com doses menores que as administradas em pacien-
tes jovens, considerando-se a possibilidade de interações medicamentosas, dado o uso frequente
de diversos medicamentos.
IV. Acarbose: apresenta ação modesta nos idosos, reduzindo a glicemia de jejum em 20-30mg/
dl. Atua retardando a degradação dos carboidratos, assim como a absorção pós-prandial
dos glicídios no intestino delgado. Os efeitos que limitam seu uso são: flatulência, intole-
rância gástrica, diarreia e dor abdominal.
VI. Insulinoterapia: apesar de ser uma modalidade efetiva nos idosos, é subutilizada. A in-
sulinoterapia deve ser introduzida quando o controle da glicemia se mostrar refratário às
modificações do estilo de vida e ao uso dos hipoglicemiantes orais. Deve-se iniciar com
dose de 0,1 a 0,2 UI/kg de insulinas de ação intermediária (NPH) ou prolongada (deglude-
ca, glargina e detemir) com ajustes de 2 a 4 unidades após 1 a 2 semanas.
Capítulo 16 253
(lispro, asparte e glulisina). Em 2014, foi aprovado no Brasil o uso da insulina degludeca (tresiba
- insulina de ação ultralonga) que apresenta um comportamento mais homogêneo durante o dia
evitando os picos glicêmicos.
Fonte: Adaptado de MCMAHON, G.T. et al. Intention to Treat — Initiating Insulin and the 4-T Study. The New England
Journal of Medicine.2007;357(17):1759-61
Fonte: WEINERT, L.S.; CAMARGO, E.G.; SILVEIRO, S.P.. Tratamento Medicamentoso da Hiperglicemia no Diabetes
Melito Tipo 2. Clinical & Biomedical Research. 2015. 30.4
254
Figura 2 - Etapa inicial no manejo da diabetes mellitus 2
Fonte: http://www.diabetes.org.br/profissionais/images/2017/POSICIONAMENTO-OFICIAL-SBD-02-2017-ALGORITMO
-SBD-2017.pdf
Fonte: http://www.diabetes.org.br/profissionais/images/2017/POSICIONAMENTO-OFICIAL-SBD-02-2017-ALGORITMO
-SBD-2017.pdf
Capítulo 16 255
Figura 4: Manejo farmacológico do DM tipo 2
Fonte: http://www.diabetes.org.br/profissionais/images/2017/POSICIONAMENTO-OFICIAL-SBD-02-2017-
ALGORITMO-SBD-2017.pdf
6. Alterações da tireoide
A elucidação dos sintomas e a inter-relação com afecções da tireoide são desafiadoras nos
idosos, pois, as manifestações clínicas podem ser ausentes, oligossintomáticas ou sem sintomas
clássicos. Por conseguinte, a dificuldade clínica do diagnóstico justifica o rastreio periódico da
função tireoidiana (FT).
A senescência traz impactos sobre o eixo hipófise-tireoide, com menor elevação do TSH em
resposta à queda do T4 livre e redução na produção do hormônio tireoidiano (HT), devido á
redução do clearance hormonal e uma maior meia vida.
256
Tabela 3 - Drogas que são causas secundárias de alterações do perfil hormonal
Fonte: NASRI, F.; FREITAS, E.V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4ed. Rio de Janeiro:
Editora Guanabara. Koogan; 2016. p. 860-66
6.3 Hipotireoidismo
Estado de menor disponibilidade do HT para os tecidos periféricos, incorrendo no alentecimento
da velocidade do metabolismo dos órgãos e sistemas.
No que concerne aos sintomas tendem a ser menos sinalizados nos idosos e infrequentes no HS.
Na esfera osteomuscular existe maior desequilíbrio, menor força muscular, alterações de pro-
priocepção com maior risco de queda e até mesmo a possibilidade de síndrome do túnel do carpo.
No campo neuropsiquiátrico, o individuo pode ser classificado erroneamente com um transtorno
de humor ou declínio cognitivo.
Capítulo 16 257
Quanto às alterações laboratoriais associadas pode haver elevação do colesterol total, fração LDL
e triglicerídeos. No exame físico podemos encontrar bradicardia, derrame pericárdico, edema
muscular com dor proximal e certa fraqueza associada, que tende a melhorar após 2 meses de
tratamento.
6.5 Tratamento
O tratamento usual no idoso terá início com baixas doses de levotiroxina (LT4): 25mcg e pro-
gressão mensal, conforme necessidade, tendo-se cuidado se houver doença coronariana ou ar-
ritmias. O alvo do TSH entre 60-70 anos deverá ser entre 3-4 mU/L e nos pacientes acima de 70
anos, 4-6 mU/L. A dosagens de TSH e T4 livre devem ser feitas a cada 6 a 8 semanas para ajustes
de dose.
Se houver necessidade de doses altas de LT4 (> 2 mcg/kg/dia) devemos considerar a possibilidade
de interação medicamentosa ou má absorção, como o que ocorre na insuficiência cardíaca ou no
uso de hidróxido de alumínio, ferro, cálcio e inibidores de bomba de prótons.
Para muitos autores o tratamento do HS estará indicado se TSH > 10 mU/ml, se houver evidên-
cia de anticorpos antitireoideanos (AAT) e depressão concomitante. Tal indicação, entretanto,
tem sido questionada diante de alguns estudos que não evidenciaram benefícios sintomáticos
consistentes com este tratamento.
6.6 Hipertireoidismo
O hipertireoidismo tem uma prevalência variável nos idosos. A doença com variante subclínica
(TSH baixo com T4 livre normal) tem prevalência estimada em 2,5% e a forma clínica de 0,5 a
2,3% dos idosos.
Na DG o quadro clínico pode sugerir o diagnóstico, com oftalmopatia e bócio difuso. Em cerca
de 30% dos casos, entretanto, não evidenciamos a tireoide palpável. Para auxílio no diagnóstico,
a presença do AAT anti-Trab é especifico e a cintilografia revela um bócio com captação difusa,
diferente da captação em nódulo (s) “quente (s) ” na doença uninodular ou multinodular tóxica.
A tireoidite aguda ocorre em decorrência de uma liberação hormonal da glândula por efeito in-
flamatório agudo. Há um quadro clínico de dor e calor na região cervical associado aos sinais e
sintomas de tireotoxicose que, usualmente, sucedem um quadro infeccioso de vias aéreas ou
viral. Na cintilografia de tireoide há uma baixa captação.
A amiodarona pode ser causa de hipertireoidismo secundário e também pode ser causa de
alteração de dosagem hormonal mesmo nos eutireoideos.
258
Nos idosos os sintomas cardiopulmonares como taquiarritmias, dispneia ao esforço e ede-
ma podem predominar, além da tendência à perda ponderal e menor aumento do apetite. O
hipertireoidismo subclínico aumenta em três vezes o risco de FA no idoso.
6.8 Tratamento
O hipertireoidismo pode ser controlado por meio de inibição da síntese hormonal, utilizando as
DAT. Como exemplos, temos o metimazol (MTZ) e o propiltiouracil (PTU). Os únicos tratamentos
definitivos, contudo, são a destruição com iodo radioativo 131 I ou a tireoidectomia total.
A adesão ao tratamento costuma ser melhor com o MTZ por exigir apenas uma tomada diária. O
monitoramento da FT com o T4 livre e o T3 total (TSH pode permanecer suprimido após longo
prazo) deve ser feito após 4 a 6 semanas do início e depois em intervalos de 4 a 8 semanas até se
obter o eutireoidismo. O risco de agranulocitose deverá ser vigiado, podendo ocorrer em 0,5%
dos casos em uso de DAT.
A taxa de remissão da doença após 1 a 2 anos de tratamento com DAT varia de 30 a 50%, o que pode
ser subestimado nos idosos, cuja doença tende a ser mais leve. O tratamento deverá ser utilizado
por até 1 a 2 anos e a maioria das recidivas ocorre entre 3 a 6 meses após o fim do tratamento.
Diante do risco, a FT deverá ser realizada mensalmente nos primeiros 6 meses, depois a cada 3
meses por 1 ano e depois anualmente. Se recidiva, tratamento definitivo deverá ser ponderado.
Os betabloqueadores (BB) podem atuar no controle dos sinais e sintomas da tireotoxicose, como
taquicardia, hipertensão arterial, tremores e labilidade emocional. O propranolol é o mais uti-
lizado, mas também podem administrados atenolol e metoprolol. Os bloqueadores de canal de
cálcio como verapamil e diltiazem são uma opção se houver contraindicação aos BB.
A terapia definitiva com 131 I é escolha muitas vezes por ausência de remissão plena e efeitos ad-
versos do tratamento com DAT; seu uso é contraindicado no caso de câncer de tireoide. O pré-
tratamento com DAT e BB deve ser considerado nos pacientes com alto risco de complicação. Se
utilizados, deverão ser suspensos 4 a 7 dias antes do tratamento com 131I. A reintrodução da DAT
após 7 dias parece evitar a exacerbação da tireotoxicose, não interferindo na eficácia.
Após o 131I a avaliação clínica e laboratorial seguirá a cada 4 a 6 semanas. Cerca de 20% dos trata-
dos com 131I apresentam falha terapêutica e o tratamento pode ser repetido se persistência após
6 meses.
Os fatores associados à falência de tratamento são: sexo masculino, tabagismo, bócios volumo-
sos, captação de iodo elevada, uso de dose baixa de 131I e níveis de T3 muito elevados.
Capítulo 16 259
6.9 Nódulos e neoplasias de tireoide
A prevalência de nódulos da tireoide (NT) aumenta com a idade e com o maior uso dos métodos
de imagem o diagnóstico de nódulos acidentais aumentou. Estima-se uma prevalência de NT
evidentes por ultrassonografia em torno de 50% aos 65 anos.
Fonte: HAUGEN, B.R. et al. American Thyroid Association Management Guidelines for Adult Patients with Thyroid No-
dules and Differentiated Thyroid Cancer: The American Thyroid Association Guidelines Task Force on Thyroid Nodules
and Differentiated Thyroid Cancer. American Thyroid Association. 2016 Jan;26(1):1-133
A incidência de neoplasias de tireoide vem aumentando nos últimos anos. Estatisticamente, 70%
das neoplasias de tireoide são bem diferenciadas (68% papilares, 30% foliculares e 2% neopla-
sia de Hurthle). Cerca de 29% das lesões são pouco diferenciadas, como carcinoma anaplásico,
260
metástases e linfomas. O anaplásico deve ser aventado se houver uma massa sólida de rápido
crescimento.
O fator etário é importante no prognóstico da doença, além do risco de recidiva. Como outros
fatores temos sexo masculino, crescimento rápido dos nódulos, antecedente de irradiação no
pescoço, linfonodo cervical e clínica de disfagia.
Usualmente a FT é normal na vigência de neoplasia de tireoide; entretanto, nos casos com hiperti-
reoidismo o prognóstico tende a ser pior, pois os AAT podem estimular o crescimento neoplásico.
O tratamento do idoso deverá seguir a mesma linha do jovem, baseado na análise histopatológica
e sua classificação, com atenção ao prognóstico geral do idoso. A terapêutica mais usualmente
indicada é a tireoidectomia total por ablação com iodo radioativo. A terapia com tiroxina até o
momento da cirurgia para manutenção de valores subnormais do TSH costuma ser indicada, pois
reduz a recidiva da neoplasia. Lembrar, porém, do risco de taquiarritimias nos idosos.
Capítulo 16 261
Tabela 5 – Causas de Osteoporose secundária
Fonte: Adaptado de FITZPATRICK, L.A. Secondary causes of osteoporosis. Mayo Clinic Proceedings. 2002; 77:453
A ocorrência de fraturas, quando não há recuperação completa, está relacionada a dores crôni-
cas, alterações do humor, debilidade funcional e até aumento da mortalidade. Além disso, histó-
ria prévia de fratura é um dos principais fatores de risco para novas fraturas.
7.3 Diagnóstico
Visto que a osteoporose pode estar relacionada a outros fatores de risco que não apenas o aumen-
to da idade, é importante a realização de anamnese completa, com história clínica e exame físico
detalhados, além da abordagem das medicações em uso, a fim de identificar possíveis causas
secundárias ou contribuintes para o quadro e poder guiar melhor a investigação e necessidade
de exames adicionais.
De modo geral, todo paciente em investigação para osteoporose deve realizar um hemograma
completo, dosagem de ureia, creatinina, cálcio, fósforo, magnésio, proteína total e fração, tran-
saminases, fosfatase alcalina, TSH e T4 livre, PTH e 25-OH-vitamina D, e, de acordo com os dados
obtidos na consulta, complementar com exames para suspeição clínica de causas associadas (ex.:
dosagem de testosterona, eletroforese de proteínas, anticorpo transglutaminase, cálcio urinário
de 24h e cortisol sérico).
262
Além disso, com objetivo de se firmar o diagnóstico e monitorizar o tratamento, a densitometria
óssea (DO) da coluna lombar ou do quadril é essencial, uma vez que o critério da Organização
Mundial de Saúde (OMS) se baseia nos dados deste instrumento. Dessa forma, pacientes com T-s-
core acima de -1.0 desvio-padrão (DP), possuem exame considerado normal; aqueles com T-score
entre -1.0 e -2.5 DP são classificados como portadores de osteopenia e os que apresentam exame
com T-score abaixo de -2.5 DP são diagnosticados com osteoporose. O exame está indicado prin-
cipalmente para mulheres após os 65 anos, ou antes dos 65 anos que estejam na pós-menopausa
e adultos que tenham fatores de risco para osteoporose secundária e fraturas. Algumas diretrizes
sugerem realizar DO nos homens acima de 70 anos ou naqueles entre 50 e 69 anos que tenham
fatores de risco associados.
Este diagnóstico também pode ser estabelecido quando há fratura sem trauma maior na coluna
vertebral, quadril, úmero, rádio distal e costelas. Uma situação habitual é a identificação, pela
radiografia de coluna torácica e lombar, de uma fratura vertebral assintomática em um idoso com
diminuição da altura.
A perda de massa óssea pode ser provocada por fatores secundários, tais como uso de corticoide,
tabagismo, etilismo, artrite reumatoide, história pessoal ou parental de fratura prévia, hiperti-
reoidismo não tratado e desnutrição.
Para auxiliar na identificação do alto risco de fraturas nas mulheres pós-menopausa e homens
acima de 50 anos, recomenda-se o uso do FRAX (Fracture Risk Assessment Tool), algoritmo que
estima a probabilidade de fratura de quadril e de fratura osteoporótica maior (vertebral, de qua-
dril, úmero proximal e radial) em 10 anos. Este algoritmo se baseia em fatores clínicos, podendo
ou não utilizar a densidade mineral óssea do fêmur proximal ou do quadril.
7.4 Tratamento
O tratamento precoce reduz o risco de fraturas. Está indicado para pacientes com fratura os-
teoporótica de coluna vertebral, de quadril ou outros sítios (úmero, rádio distal ou costelas), para
aqueles com DO evidenciando T-score abaixo de -2.5 e para os que tenham osteopenia e uma
probabilidade em 10 anos de fratura de quadril maior que 3% e de qualquer fratura osteoporótica
maior que 20% pelo FRAX.
O tratamento deve ser decidido em conjunto com o paciente, considerando suas preferências,
comorbidades e risco de fraturas. Dentre as medidas gerais indicadas no tratamento da osteopo-
rose, estão inclusos:
Capítulo 16 263
b) Prática de exercícios físicos regulares de treinamento aeróbico, de melhora do equilíbrio e
de fortalecimento muscular. Os exercícios reduzem o risco de queda e poder gerar discreto
aumento na DMO;
O bifosfonato é a única classe terapêutica com efeito prolongado. Devem ser utilizados por um
período máximo de 5 anos. Após este tempo o risco de fratura deve ser reavaliado, tomando-se
por base exames laboratoriais, história clínica, risco de queda, comorbidades e uso de medicações.
Medi-
Dose Ação Indicação Observações
cação
Tomar em jejum.
Osteoporose na pós-menopausa, em
homens e induzida por corticoides.
Reduz risco de fratura vertebral, de
264
Tomar em jejum.
Osteoporose na pós-menopausa
Considerar uso intravenoso em pacientes com
Reduz risco de fratura vertebral
Osteoporose na pós-menopausa, em
homens e induzida por corticoides.
Reduz risco de fratura vertebral, de
Comp.: 150mg/mês
Capítulo 16 265
Considerar em pacientes com contraindicação ou
Aplicação em 15 min.
por corticoides.
(artralgia, febre, dor de cabeça e mialgia – maior risco na
Zolendrônico
1a aplicação).
Ác.
aumento de DMO.
266
Considerar em pacientes com contraindicação, com efeitos
Subcutâneo: 60mcg a cada 6 meses
prostática.
manter DMO.
menopausa.
neoplasia de mama.
Reduz risco
Raloxifeno
de fratura
vertebral.
60mg/dia
na pós-
Comp.:
É necessário o monitoramento periódico dos pacientes que estão em tratamento ou nos que hou-
ve suspensão das medicações. Em geral, indica-se reavaliação da DO a cada 2 anos para pacientes
em tratamento e com periodicidade regular a critério clínico para aqueles em que houve inter-
rupção do tratamento. Outro dado importante é o acompanhamento da altura, uma vez que a
perda de estatura superior a 2 cm pode sugerir fraturas vertebrais assintomáticas. A dosagem
de marcadores bioquímicos de reabsorção óssea, quando disponíveis, também podem ser uti-
lizados na avaliação de resposta ou nos casos em que se optou por suspensão temporária dos
medicamentos.
Capítulo 16 267
É discretamente mais comum em homens e sua prevalência é rara entre pacientes jovens, sendo
maior com o aumento da idade, podendo chegar a cerca de 10% na população idosa após 80 anos.
É mais comum em países como Inglaterra, Estados Unidos e Austrália, tendo menor prevalência
nos países orientais e da América do Sul. Existem poucos dados epidemiológicos brasileiros, mas
a doença é mais frequente em cidades cuja colonização e descendência europeias foram mais
presentes, uma vez que há maior taxa de prevalência entre indivíduos brancos.
Sua etiologia não é bem determinada, com algumas evidências sugerindo o envolvimento de
fatores genéticos e ambientais. Pode ser encontrada história familiar em até 40% dos casos.
Entre os pacientes sintomáticos, são mais comuns os sintomas relacionados ao sistema músculo
esquelético, como o aparecimento de deformidades, devido a alteração no tamanho ou forma
óssea; dor óssea; osteoartrite de articulações adjacentes; protrusão acetabular; fraturas e esteno-
se espinhal. A dor óssea é um dos sintomas mais presentes, mas, geralmente, se desenvolve em
fases mais tardias, sendo descrita como uma dor profunda com piora ao longo do dia, podendo
estar relacionada ao aumento ósseo e deformidades, lesões líticas, fraturas ou osteoartrite de
articulações adjacentes.
8.2 Diagnóstico
Por tratar-se de uma doença assintomática na maioria dos casos, o diagnóstico é suspeitado nos
indivíduos com alterações típicas nos exames de imagem, realizados por outra indicação clínica,
ou naqueles com alteração exclusiva de fosfatase alcalina sérica. Nestes casos, deve ser indicada
a complementação com exame de imagem, a fim de fazer um rastreio ósseo e identificar possí-
veis lesões suspeitas.
Além de anamnese e exame físico completos, é importante realizar exames laboratoriais como
hemograma, função renal, bioquímica hepática, eletrólitos e, em alguns casos, dosagem de
25-OH-vitamina D e PTH, para realizar diagnóstico diferencial com outras doenças, como a os-
teomalácia, a elevação de fosfatase alcalina por acometimento hepático, o hiperparatireoidismo
e a hipercalcemia secundária ao imobilismo.
A fosfatase alcalina sérica (FAs), por se tratar de exame de fácil acesso, menor custo e por estar
relacionada à atividade de doença é o marcador bioquímica mais utilizado. Nos casos em que
268
há disponibilidade pode-se dosar a fração de fosfatase alcalina óssea e outros marcadores de re-
modelação óssea, como o propeptídeo amino-terminal do procolágeno tipo 1, N-telopeptídeo na
urina e o C-telopeptídeo sérico.
A biópsia óssea, em geral, não está indicada, podendo ser realizada nos casos em que a apresen-
tação radiológica não for típica de Doença de Paget ou quando houver suspeita de malignidade.
8.3 Tratamento
Os objetivos do tratamento são a diminuição da dor, do remodelamento ósseo, da vascularização
óssea e da progressão da doença. Indica-se tratamento quando:
Entre os bisfosfonatos, o ácido zolendrônico é o que tem maior potência e produz maior resposta
sustentada, obtendo remissão bioquímica de até 2 anos após uma única infusão. Além disso, em
casos de necessidade de retratamento, o zolendronato é a medicação de escolha na maioria dos
casos, visto as características descritas.
O pamidronato é uma alternativa de medicação injetável, mas tem uma potência menor e neces-
sita de um maior tempo de infusão. Alguns pacientes desenvolvem resistência à medicação, o
que dificulta o retratamento com esta droga. O alendronato e o risendronato representam alter-
nativas orais de tratamento.
Capítulo 16 269
Tabela 7 – Dose de bisfosfonatos mais utilizados no tratamento de doença de Paget
Medicação Dose
Ácido zolendrônico 5mg, intravenoso, em infusão única
Pamidronato 30-60mg, intravenoso, em infusão única
Risendronato 30mg, 1x/dia, por 2 meses
Alendronato 40mg, 1x/dia, por 6 meses
Fonte: Adaptado de SINGER, F.R. et al. Paget’s disease of bone: an endocrine society clinical practice guideline.
The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism. 2014; 99:4408
Um procedimento cirúrgico pode ser necessário para pacientes com complicações da doença,
como fixações para fraturas, osteotomias em caso de deformidades e colocação de próteses ar-
ticulares. Quando há paraplegia, o tratamento com bifosfonatos parece ter melhor resposta em
comparação com cirurgia.
O acompanhamento do tratamento deve ser feito com dosagem de fosfatase alcalina sérica a
cada 3 a 6 meses até a estabilização de seus níveis séricos. Considera-se como remissão total a
normalização dos níveis de fosfatase alcalina, e como remissão parcial, a queda de mais de 50-
75% nos seus níveis após 6 meses do tratamento. Naqueles indivíduos com doença monostótica,
sem aumento dos níveis de fosfatase alcalina, a cintilografia óssea a cada 6 a 12 meses pode ser
uma opção para o controle de atividade metabólica. O retorno de sintomas ou uma nova elevação
da fosfatase alcalina pode ser indicativa da necessidade de retratamento, sendo o ácido zolen-
drônico o mais indicado nesses casos.
Referências
ANTI, S.M.A.; GIORGI, R.N.; CHAHADE, W.H. Glicocorticoides (GC) e as doenças reumáticas do
idoso: considerações gerais. Temas de Reumatologia Clínica, v. 9, n. 3, p. 87-95, 2008.
ATTIE, K.M. et al. The clinical utility of Growth Hormone Binding Protein, Insulin-like growth
factor-I and Insulin-like growth factor binding protein 3 measurements. Journal of Pediatrics.
1997; 131:S56-S60.
BRENTA, G. et al. Diretrizes clínicas práticas para o manejo de hipotireoidismo. Arquivos Brasi-
leiros de Endocrinologia & Metabologia. 2013 Apr; 57 (4) 264-99.
CAMARGO, M.B. et al. Bone mineral density and osteoporosis among a predominantly Caucasian
elderly population in the city of Sao Paulo, Brazil. Osteoporosis International. 2005; 16(11):1451-60.
270
CUNDY, T.; REID, I.R. Paget’s disease of bone. Clinical Biochemistry. 2012; 45:43.
EBERT, T. et al. The current status of therapy for symptomatic late-onset hypogonadism with
transdermal testosterone gel. European Urology. 2005;47(2):137- 46.
FELDMAN, H. et al. Age trends in the level of serum testosterone and other hormones in mid-
dle-aged men: longitudinal results from the Massachusetts male aging study. The Journal of Cli-
nical Endocrinology & Metabolism. 87(2):589-598,2002.
FITZPATRICK, L.A. Secondary causes of osteoporosis. Mayo Clinic Proceedings. 2002; 77:453.
FREITAS, E. V. PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia, 4ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara.
Koogan; 2016. p. 832-43.
GABER, J.R. et al. Clinical practice guidelines for hypothyroidism in adults: cosponsored by the
american association of clinical endocrinologists and the american thyroid association. Practice
Guidelines for Hypothyroidism in Adults. 2012 Nov; 18 (6) 1200-35.
GLINA, S. Esquema Geral para investigação da DE. In:Glina S et al (eds). Disfunção Sexual Mas-
culina. São Paulo: Instituto H. Ellis, 2002.
HANS, D.B. et al. Joint Official Positions of the International Society for Clinical Densitometry
and International Osteoporosis Foundation on FRAX(®). Executive Summary of the 2010 Position
Development Conference on Interpretation and use of FRAX® in clinical practice. Journal of Clin-
ical Densitometry. 2011; 14(3):171-80.
HAUGEN, B.R. et al. American Thyroid Association Management Guidelines for Adults Patients
with Thyroid Nodules and Differentianted Thyroid Cancer. The American Thyroid Association
Guidelines Task Force on Thyroid Nodules and Differentiated Thyroid Cancer. American Thyroid
Association. 2016 Jan; 26(1):1-133.
JOSSE, R.G. et al. Diagnosis and treatment of Paget’s disease of bone. Clinical & Investigative Med-
icine. 2007; 30:E210.
LANZILLOTTI, H.S. et al. Osteoporosis in postmenopausal women, dietary calcium and other
risk factors. Revista de Nutrição. 2003; 16(2):181-93.
LIMA, P.M. et al. Disfunção erétil no homem idoso. Revista de Medicina e Saúde de Brasília. 2016.
5(1).
MAIA, A.L. et al. Consenso brasileiro para o diagnóstico e tratamento do hipertireoidismo: reco-
mendações do Departamento de Tireoide da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolo-
gia. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia. 2013 Apr; 57 (3) 205-32.
Capítulo 16 271
MARTINI, L.A. et al. Prevalência de diagnóstico auto-referido de osteoporose, Brasil, 2006. Re-
vista de Saúde Pública. 2009; 43(Supl 2):107-16.
MARTINELLI, JR.C.E.; CUSTÓDIO, R.J.; AGUIAR-OLIVEIRA, M.G. (2008). Fisiologia do eixo GH-
sistema IGF. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia, 52(5), 717-725.
MARTITS, A.M.; COSTA, E.M.F. Hipogonadismo masculino tardio ou andropausa. Revista da As-
sociação Médica Brasileira. 50.4 (2004): 358-359.
PAPAIOANNOU, A. et al. 2010 Clinical practice guidelines for the diagnosis and management of
osteoporosis In Canada: summary. Canadian Medical Association Journal. 2010; 182:1864.
ROSEN, C.J. Clinical practice. Postmenopausal osteoporosis. The New England Journal of Medi-
cine. 2005; 353:595.
SARRIS, A.B. et al. Fisiopatologia, avaliação e tratamento da disfunção erétil: artigo de revisão.
Revista de Medicina. 95.1 (2016): 18-29.
SGARBI, J.A. et al. Consenso brasileiro para a abordagem clínica e tratamento do hipotireoidismo
subclínico em adultos: recomendações do Departamento de Tireoide da Sociedade Brasileira de
Endocrinologia e Metabologia. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia. 2013 Abr;
57(3):166-83.
SINGER, F.R. et al. Paget’s disease of bone: an endocrine society clinical practice guideline. The
Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism. 2014; 99:4408.
SIRIS, E.S. et al. Medical management of Paget’s disease of bone: indications for treatment and
review of current therapies. Journal of Bone and Mineral Research. 2006; 21 Suppl 2:P94.
SNYDER, P.J.; DAVID, S.C.; MARTIN, K.A. Growth hormone deficiency in adults. UpToDate [data-
base on the internet]. Waltham (MA): UpToDate (2013).
SOUZA, A.H.O. Densidade mineral óssea e calcificação da aorta abdominal em idosos com
deficiência do hormônio do crescimento. Tese de Doutorado em Ciências da Saúde. 2011 - 2014
STOTT, D.J. et al. Thyroid Hormone Therapy for Older Adults with Subclinical Hypothyroidism.
The New England Journal of Medicine. 2017; 376:2534-2544.
TAFFET, G.E. Normal aging. In: Basow eDS, editor. UpToDate. Waltham: UpToDate; 2013. (2013).
TANAKA, T. et al. Risk Factors for Proximal Femur Osteoporosis in Men Aged 50 Years or Older.
Osteoporosis International. 2001; 12:942-949.
TANCREDI, A. et al. Interest of the Androgen Deficiency in Aging Males (ADAM) questionnaire
for the identification of hypogonadism in elderly community-dwelling male volunteers. Euro-
pean Journal of Endocrinology. 2004, 151, 355–360.
272
WARD, L.; MACIEL, L.M.Z. Consensos em tireoide – Guias para a prática clínica. Arquivos Brasi-
leiros de Endocrinologia & Metabologia. 2013 Abril; 57 (3) 161-62.
WHYTE, M.P. Clinical practice. Paget’s disease of bone. The New England Journal of Medicine.
2006; 355:593.
Na web:
CASPER, R.F. Clinical manifestation and diagnosis of menopausa. Uptodate [database on the in-
ternet]. Last updated: Aug 15, 2017. Available at: http://www.uptodate.com. Access in: Set, 30,
2017.
GRIZ, L. et al. Doença de Paget. Projeto Diretrizes, 2004. Disponível em: https://diretrizes.amb.
org.br/_BibliotecaAntiga/doenca-de-paget.pdf
GRIZ, L. et al. Doença de Paget óssea: diagnóstico e tratamento. Associação Médica Brasileira,
2013. Disponível em: http://amb.org.br/diretrizes/_DIRETRIZES/doenca_de_paget_ossea_diag-
nostico_e_tratamento/files/assets/common/downloads/publication.pdf.
MARTIN, K.A.; BARBIERI, R.L. Treatment of menopausal symptoms with hormone therapy. Up-
todate [database on the internet]. Last updated: Apr 19, 2017. Available at: http://www.uptodate.
com. View at: Set, 30, 2017.
NATIONAL OSTEOPOROSIS GUIDELINE GROUP (NOGG). Clinical guideline for prevention and
treatment of osteoporosis – Executive summary, 2017. Disponível em: https://www.sheffield.
ac.uk/NOGG/NOGG%20Guideline%202017.pdf
SANTEN, R.J. et al. Menopausal hot flashes. Uptodate [database on the internet]. Last up-
dated: Oct 16, 2017. Available at: http://www.uptodate.com. Access in: Sep, 01, 2017.
Capítulo 16 273
CAPÍTULO
1.Introdução
Tontura, vertigem e desequilíbrio são queixas importantes em atendimentos médicos da popula-
ção adulta e idosa. São frequentemente causadas por alterações labirínticas, porém outras causas
incluem alterações cardíacas, neurológicas, endocrinológicas e psicológicas. Dados mostram que
a prevalência de tontura significativa ao longo da vida varia entre 17 e 30%, enquanto para verti-
gem essa variação se dá entre 3 e 10%.
Idosos com queixa de tontura têm maior probabilidade de cair. Lesões relacionadas a quedas le-
vam a restrições de mobilidade e perda de funcionalidade, além de aumentar o medo de cair, o
que também aumenta o risco de futuras quedas.
Embora seja uma queixa comum entre idosos, a tontura não deve ser interpretada como parte
do processo normal do envelhecimento. Cabe ao médico generalista estar familiarizado com a
investigação do sintoma, seus diagnósticos diferenciais e manejo terapêutico. Como a etiologia é
geralmente multifatorial, o encaminhamento a um ou mais especialistas (otorrinolaringologista,
oftalmologista, neurologista, cardiologista, psiquiatra ou neurocirurgião) pode ser necessário.
Apesar da enorme gama de distúrbios que podem contribuir para a queixa, aproximadamente
90% das causas identificáveis de tontura situam-se em uma de sete grandes categorias causais
(Tabela 1).
Fonte: Adaptado de EATON, D.A. et al. Dizziness in the older adult, part 1:
Evaluation and general treatment strategies. Geriatrics 2003;58(4):28-36)
2. Fisiologia do equilíbrio e envelhecimento
A manutenção do equilíbrio depende da correta percepção e integração de cinco modalidades
sensoriais: vestibulares, visuais, proprioceptivas, somatossensórias (toque e pressão) e auditi-
vas. Crianças tendem a utilizar mais informações proprioceptivas (como a posição dos pés) e
vestibulares (como a posição da cabeça), ao passo que na idade adulta tornam-se preponderantes
para o equilíbrio as informações visuais (como a posição dos objetos ao redor). Em uma situação
normal, os receptores vestibulares de ambos os labirintos geram uma informação de repouso;
movimentos da cabeça produzem alterações opostas e de mesma intensidade nas informações
de cada ouvido. Isso leva a alterações compensatórias dos olhos e músculos, que permitem a
manutenção do equilíbrio postural. Qualquer discrepância das informações sensoriais, altera-
ções na integração sensorial central ou na função motora (causada por doenças neurológicas ou
ortopédicas como Parkinson ou artrite) pode levar à tontura e ao desequilíbrio.
Capítulo 17 277
a) Vertigem
A vertigem é a sensação descrita pelo paciente como movimento do ambiente ao redor. Apesar
de geralmente ser rotacional, pacientes também podem descrevê-lo como sensação de queda.
Geralmente é episódico, inicia-se abruptamente e quando intenso está associado a náuseas e
vômitos. É tipicamente causada por um distúrbio do sistema vestibular periférico (ouvido in-
terno ou VIII nervo craniano) ou suas conexões no sistema nervoso central. As causas comuns
de vertigem periférica são vertigem de posicionamento paroxística benigna (VPPB), labirintite
aguda e doença de Menière. As causas centrais incluem lesões vasculares, bem como processos
expansivos e doenças inflamatórios do Sistema Nervoso Central.
b) Desequilíbrio
O desequilíbrio é uma sensação iminente de queda, que ocorre em posição ereta, referida prin-
cipalmente ao tronco e membros inferiores (e não à cabeça). A sensação desaparece em posição
sentada ou deitada. A queixa de desequilíbrio geralmente é contínua; raramente aparece de ma-
neira intermitente. Causado geralmente por disfunção de distintas modalidades sensoriais, o de-
sequilíbrio costuma denotar deterioração do sistema nervoso. Causas comuns de desequilíbrio
incluem doenças vestibulares graves, acidentes vasculares encefálicos, neuropatias periféricas
e doenças cerebelares.
c) Pré-síncope
d) Tontura inespecífica
A tontura inespecífica é descrita como sensação vaga (como “cabeça vazia”), que não pode ser
claramente identificada como vertigem, pré-síncope ou desequilíbrio. Este tipo de tontura pode
ser devido a formas mais leves das desordens previamente descritas, mas frequentemente é de-
corrente de transtornos fóbicos e ansiosos, além de hiperventilação.
278
Caso 1
Faz uso de levodopa + bensarazida 125mg ½ cp 3 vezes ao dia, vitamina D3 7000 UI por semana
e alendronato sódico 70mg por semana.
Questões propostas:
2. Existem outras alterações descritas no caso que podem ser relatadas como tontura ou ins-
tabilidade?
Respostas
2. Apesar da queixa “nova” ser característica de quadro vestibular periférico, o paciente apre-
senta outras alterações que afetam o equilíbrio e podem explicar o histórico de quedas. A
degeneração neurossensorial da doença do Parkinson associada ao provável quadro de sarco-
penia e fragilidade do paciente podem manifestar-se através de queixa de desequilíbrio, uma
das categorias de tontura.
Capítulo 17 279
3. Deve-se pesquisar as principais doenças que causam desequilíbrio: lesões vestibulares bila-
terais ou de instalação lenta, mielopatias, neuropatias periféricas, hidrocefalia de pressão
normal, tremor ortostático e tumores do sistema nervoso central na fossa posterior. O tra-
tamento inclui identificar e, quando possível, tratar as patologias que provocam o quadro.
Deve ser feita reabilitação com treinamento de marcha, bem como prescrição de dispositivos
de auxílio de marcha (bengala, andador).
VPPB
A VPPB é a causa mais comum de vertigem em todas as faixas etárias. Estudos apontam para
uma prevalência do distúrbio entre idosos até sete vezes maior que entre adultos jovens. É carac-
terizada pela queixa de vertigem intermitente e de curta duração, provocada pela mudança de
posição da cabeça. O diagnóstico é feito com uma história sugestiva e pela observação de nistag-
mo durante as manobras de posicionamento (Dix-Hallpike).
Fonte: POST, R.E. et al. Dizziness: A Diagnostic Approach. American Academy of Family Physicians. 2010;82(4):361-68)
Utilizada no diagnóstico da VPPB, a manobra tem início com o paciente sentado, de olhos abertos
e olhando para frente. O examinador vira a cabeça do paciente em 45 graus para o lado que irá
testar e, segurando a cabeça lateralizada, pede para o paciente rapidamente deitar-se, deixando
a cabeça pendente em 20 graus para fora da cama. O paciente é mantido nesta posição por 30
segundos, em seguida retorna para a posição inicial e aguarda por mais 30 segundos antes de ini-
ciar a manobra para o lado contrário. O teste é considerado positivo quando a manobra de algum
dos lados reproduz vertigem, com ou sem nistagmo.
280
É causada pela formação e deposição de pequenas partículas de cristais (otólitos) nos canais se-
micirculares, sendo o canal posterior o mais afetado. Esses cristais, formados pela degeneração
do utrículo, provocam estímulo irritativo no labirinto lesado quando a cabeça é movimentada.
A duração do sintoma costuma ser de algumas semanas e a intensidade mais leve. A vertigem
costuma remitir espontaneamente e recidivar ao longo do tempo.
O tratamento de primeira linha na VPPB do canal posterior é feito com manobras de reposicio-
namento, sendo a de melhor evidência a de Epley modificada. A manobra de Semont também é
uma alternativa terapêutica, com eficácia superior à intervenção farmacológica pura. A recomen-
dação de restrição de movimentos da cabeça após executada uma manobra de reposicionamento
não encontra embasamento em literatura.
Fonte: POST, R.E. et al. Dizziness: A Diagnostic Approach. American Academy of Family Physicians. 2010;82(4):361-68)
Capítulo 17 281
O paciente senta-se na maca com os olhos abertos e a cabeça virada em 45 graus para o lado
acometido. O examinador segura a cabeça do paciente lateralizada enquanto ele se deita rapida-
mente, deixando a cabeça pendente para fora da maca em 20 graus. O examinador vira então a
cabeça em 90 graus para o lado oposto, mantendo a posição por 30 segundos. O examinador vira
a cabeça do paciente em mais 90 graus, enquanto o paciente vira-se em decúbito lateral na mes-
ma direção. Após 30 segundos, o paciente senta-se, reassumindo a posição inicial. A manobra
pode ser repetida até que o paciente apresente melhora sintomática.
Fig 4. Movimentação dos olhos Fig 5. Fixar o olhar no dedo, Fig 6. Jogar a bola de uma mão Fig 7. Sentar, levantar
para cima e para baixo. afastando-o e aproximando-o. para outra fixando o olhar. e sentar.
Fig 8. Pegar objetos no chão Fig 9. Levantar e abaixar a Fig 10. Andar em linha Fig 11. Andar em linha
com fixação ocular. bola com fixação ocular. reta olhando para reta olhando para os la-
frente, andar em linha dos, andar em linha reta
reta olhando para cima jogando uma bola de
e para baixo. uma mão para a outra.
Fonte: MANTELLO, E.B. et al. Efeito da reabilitação vestibular sobre a qualidade de vida de idosos labirintopatas.
Revista Brasileira de Otorrinolaringologia. 2008;74(2):172-80)
282
Embora a taxa de recorrência dos sintomas seja menor nos pacientes submetidos a manobras de
reposicionamento, ela é bastante elevada ao longo do tempo, chegando a ser observada em até
80% dos casos.
Capítulo 17 283
O principal diagnóstico diferencial da doença de Menière, principalmente em suas apresenta-
ções iniciais em que as queixas auditivas são menos presentes, é a enxaqueca vestibular. Nesses
casos, a vertigem pode apresentar-se associada a náuseas e vômitos como manifestação isolada
ou como fenômeno de aura, antecedendo a cefaleia hemicrania típica da enxaqueca. A duração
típica das crises de enxaqueca vestibular costuma ser inferior a uma hora. Queixas de hipoacu-
sia, zumbido e plenitude auditiva não estão presentes no quadro. O mecanismo que faz com que a
enxaqueca leve a crises de vertigem não é claro. Entretanto, os sintomas vertiginosos geralmente
respondem às medicações usadas no tratamento das crises de enxaqueca, como ergotamínicos
e triptanos. A profilaxia medicamentosa das crises é análoga a das demais enxaquecas e inclui o
uso de beta-bloqueadores, bloqueadores de canal de cálcio, tricíclicos, valproato, acetazolamida
e metisergida.
Nos pacientes com neurite vestibular superior e inferior combinadas, os sinais clínicos são se-
melhantes aos observados logo após cirurgias de labirintectomia ou neurotomia vestibular: há
presença de nistagmo horizontal e rotatório (torsional) espontâneo, cuja fase lenta “bate” em
direção ao ouvido afetado. O nistagmo é necessariamente unidirecional e cessa com a fixação do
olhar, o que pode dificultar sua identificação em uma avaliação clínica padrão.
O teste de impulso cefálico é geralmente positivo: o paciente não consegue manter o olhar fixo ao ter
a cabeça girada para o lado lesado, necessitando executar um movimento ocular compensatório vo-
luntariamente, o que evidencia a ausência de função do canal semicircular lateral do lado afetado. O
paciente, embora instável, é capaz de manter o equilíbrio quando em pé e com os olhos abertos, mas
apresenta rotação do eixo de marcha com os olhos fechados (teste de Fukuda positivo).
Fonte: HUH, Y.E. et al. Bedside Evaluation of Dizzy Patients, Journal of Clinical Neurology. 2013; 9(4):203-13)
284
A: Nos pacientes sadios, o impulso cefálico (seta) normalmente induz rapidamente um movi-
mento ocular compensatório no sentido oposto, permitindo a fixação da visão.
• Nistagmo bilateral, vertical ou que não é suprimido com a fixação do olhar sugere infarto
cerebelar;
• O paciente com infarto cerebelar, ao contrário dos quadros de neurite vestibular, geral-
mente não consegue manter o equilíbrio estático sem apoio;
Capítulo 17 285
Os pacientes com acidente vascular encefálico (AVE) podem queixar-se de vertigem, desequilí-
brio ou sensação mais vaga de tontura. Náuseas e vômitos são comuns – assim como na neurite
vestibular. Embora todos os pacientes com neurite vestibular apresentem instabilidade de mar-
cha, a incapacidade de andar deve ser interpretada como sinal de alarme para lesão isquêmica
central.
Um paciente com nistagmo unidirecional, teste de impulso cefálico positivo (para o lado oposto à
da fase rápida do nistagmo) e ausência de outros sinais neurológicos focais pode ser diagnostica-
do como neurite vestibular com alto grau de certeza, sem que outros exames sejam necessários.
4. Desequilíbrio
Geralmente é consequência de deterioração do sistema nervoso (central ou periférico), envol-
vendo uma ou mais disfunções sensoriais. Abaixo, discorreremos sobre algumas das principais
causas de desequilíbrio.
a) Lesões vestibulares
Lesões vestibulares bilaterais não causam vertigem, mas ataxia e visão oscilante. Em quadros
que não estejam acompanhados de perda auditiva, são de difícil suspeição diagnóstica. O teste
de impulso cefálico é positivo bilateralmente. A principal causa de lesão vestibular bilateral não
286
acompanhada de perda auditiva é a toxicidade à gentamicina, devendo ser suspeitada nos pa-
cientes que passam a se queixar de desequilíbrio adquirido após internação hospitalar.
Geralmente causadas por neuropatias periféricas, comuns nos pacientes diabéticos ou com insu-
ficiência renal. A osteoartrose da coluna cervical pode causar mielopatia compressiva, levando
a queixa de desequilíbrio; esses pacientes também demonstram fraqueza muscular do território
das raízes nervosas acometidas, bem como disfunções esfincterianas.
Lesões dos lobos frontal e gânglios basais causam desequilíbrio associado à fraqueza, rigidez ou
tremor. Lesões cerebelares causam grave desequilíbrio que não melhora com a compensação vi-
sual, estando geralmente associadas a visão oscilante, marcha de base alargada e ataxia de tron-
co. Lesões dos centros motores corticais e subcorticais levam a distúrbio do equilíbrio, podendo
ser causadas por doença de Parkinson, múltiplos infartos subcorticais, tumores e hidrocefalia
comunicante.
d) Doença de Parkinson
Este raro quadro degenerativo extrapiramidal pode manifestar-se com desequilíbrio e tendência
a quedas. Outros sintomas incluem rigidez axial sem tremor, demência e oftalmoplegia (dificul-
dade de olhar para cima).
Capítulo 17 287
h) Ataxia cerebelar
Distúrbio de equilíbrio não acompanhado de ataxia apendicular, nistagmo ou outros sinais ocu-
lares. Pode ser decorrente de degeneração cerebelar. Síndromes paraneoplásicas e atrofia de múl-
tiplos sistemas (um quadro de parkinsonismo atípico) são hipóteses que devem ser consideradas
nos idosos.
i) Tremor ortostático
Tipicamente, não causa distúrbios de marcha, mas uma queixa de desequilíbrio quando na posi-
ção ortostática. O paciente nem sempre percebe o tremor fino e de alta frequência nos quadríceps
e músculos tibiais anteriores, alteração facilmente identificável em exame de eletromiografia de
superfície.
Caso 2
Sra. Helena, 76 anos, encaminhada para primeira consulta geriátrica (já faz acompanhamento
com cardiologista e reumatologista). Relata internação hospitalar recente após episódio de sínco-
pe associada a queda e traumatismo cranioencefálico. De acordo com o resumo de alta hospita-
lar, a investigação realizada descartou causas cardíacas ou complicações cerebrais relacionadas
ao evento.
Perguntada sobre o episódio de síncope, a paciente relata que ocorreu ao levantar-se do vaso sa-
nitário após evacuar. Relata sintomas prodrômicos (turvação visual, sensação de perda de tônus
muscular) e que tentou voltar correndo ao seu quarto, mas bateu a cabeça na beira da cama quan-
do perdeu a consciência. Seu esposo estava em casa e foi acudi-la ao ouvir o barulho da queda,
encontrando-a desperta no chão do quarto, porém pálida e com extremidades frias.
A sra. Helena nega outros episódios de síncope. Relata, entretanto, que frequentemente tem sen-
sação de tontura, “como se fosse desmaiar”. Conta que sua tontura é recorrente, constante em
alguns períodos do dia, e não sabe relatar situações que favoreçam o surgimento do sintoma.
Tem antecedentes de hipertensão, hipotireoidismo e artrose de joelho. Faz uso de prazosina 1mg
1 comprimido ao dia, levotiroxina 88mcg 1 comprimido ao dia; além de 1 cápsula diária de fór-
mula manipulada composta de paracetamol 300mg + ciclobenzaprina 5mg + nortriptilina 10mg.
288
Holter-ECG (24 horas): ritmo sinusal, com raras extrassístoles ventriculares e supraventriculares,
baixa variabilidade da frequência cardíaca, ausência de alterações sugestivas de isquemia. Sin-
tomas relatados durante o exame não se correlacionaram com as alterações eletrocardiográficas
encontradas.
Questões propostas
2. Quais medicações em uso pela paciente podem contribuir para a queixa relatada?
Respostas
5. Pré-síncope
Geralmente descrita como uma sensação de desmaio iminente, pode iniciar-se com uma sensa-
ção de turvação visual ou rugido no ouvido. As causas mais frequentes são a hipotensão ortostá-
tica, a tontura vasovagal e as doenças que rebaixam o débito cardíaco.
a) Hipotensão ortostática
Essa forma de tontura ocorre com o paciente em pé. A tontura ortostática pode ocorrer mes-
mo nos pacientes que não apresentam critérios de hipotensão postural - queda pressórica de
ao menos 20mmHg na pressão sistólica ou 10mmHg na pressão diastólica, medidas 2 minutos
após levantar o paciente da posição deitada. Nos pacientes idosos, está geralmente associada à
disfunção autonômica, desidratação ou medicações. Alterações fisiológicas do envelhecimento
contribuem para que a hipotensão postural seja a principal etiologia de síncope nos maiores de
70 anos. Estas alterações incluem diminuição e retardo no reflexo baroceptor, diminuição da
complacência miocárdica e do volume circulatório sanguíneo, além do aumento da pós-carga.
Capítulo 17 289
O tratamento do quadro inclui:
• Evitar grandes refeições, ingestão alcoólica, exposição ao calor e força excessiva na hora
de evacuar;
Medicação Classe
Dexclorfeniramina
Dimenidrinato
Hidroxizina Anti-histamínicos de 1ª geração
Meclizina
Prometazina
Escopolamina
Antiespasmódicos
Hiosciamina
Carisoprodol
Relaxantes musculares
Ciclobenzaprina
Doxazosina
Bloqueadores alfa-1 periféricos
Prazosina
Clorpromazina
Clozapina
Antipsicóticos
Olanzapina
Tioridazina
Oxibutinina
Antimuscarínicos (usados na incontinência urinária)
Tolterodina
Clonidina
Metildopa Alfa-bloqueador central
Reserpina (>0,1mg/d)
Amitriptilina
Clomipramina
Imipramina Antidepressivos
Nortriptilina
Paroxetina
Fonte: Adaptado de KENNY, R.A. et al. Syncope. In: HALTER, J.B. et al. Hazzard’s Geriatric Medicine and Gerontology,
6th ed. New York: McGraw-Hill; 2009, p. 698
290
b) Tontura vasovagal
Tontura e síncope vasovagal são espectros diferentes do mesmo distúrbio. O quadro, principal
desencadeante de síncopes nos jovens, é menos comum na população idosa. Os sintomas podem
surgir vários minutos após a pessoa assumir postura sentada ou em pé. Os pacientes tipicamente
apresentam pré-síncope associada a náuseas, sudorese fria e palidez cutânea – em alguns casos,
ocorre perda de consciência.
Diversos problemas podem levar à diminuição do débito cardíaco. Arritmias, insuficiência car-
díaca congestiva, infarto do miocárdio, doença cardíaca valvar (particularmente a estenose aór-
tica) são possíveis causas de pré-síncope. O tratamento deve ser direcionado à causa identificada.
Exames complementares devem ser realizados nos casos suspeitos, incluindo ECG de repouso ou
Holter-ECG, Ecocardiograma e ultrassonografia com doppler de carótidas.
• Hematócrito <30%;
• Eletrocardiograma alterado;
• Dispneia;
• PA sistólica <90mmHg.
Capítulo 17 291
Voltando ao Caso 2 ...
Optou-se pela troca do anti-hipertensivo por losartana 25mg ao dia e suspensão da fórmula ma-
nipulada em uso contínuo, com prescrição de fisioterapia e analgesia de demanda com paraceta-
mol pela artrose de joelho. A sra. Helena retorna após 30 dias, sem novos episódios de síncope,
porém mantendo queixa de tontura constante. Perguntada sobre sintomas previamente relata-
dos de turvação visual e perda de tônus muscular, afirma que a “sensação de desmaio” não foi
mais percebida. Relata, no entanto, tontura mal caracterizada (“sensação de cabeça vazia”) que
chega a durar várias horas seguidas, e que relaciona a momentos de maior ansiedade ou aborre-
cimento.
Ao exame físico:
Questões propostas
2. Tendo em vista a piora dos sintomas depressivos e ansiosos, qual a estratégia adequada
com relação aos psicofármacos?
Respostas
2. Seria interessante trocar o antidepressivo em uso por outro sem efeito anticolinérgico, seja
da classe dos inibidores seletivos da receptação de serotonina (p.ex.: sertralina) ou dos an-
tidepressivos atípicos (trazodona, mirtazapina).
6. Tontura inespecífica
Descrições vagas do quadro de tontura geralmente não podem ser classificadas em nenhuma das
categorias de tontura já descritas (vertigem, desequilíbrio ou pré-síncope). Queixas de “cabeça
cheia”, “cabeça vazia”, ou de leve tontura ou atordoamento podem estar associadas à síndrome
de hiperventilação ou a quadros ansiosos.
292
Queixas de tontura relacionada a sintomas fóbicos e ansiosos são descritos há tempos na literatu-
ra médica. São mais comuns entre mulheres, de todas as faixas etárias. O paciente pode queixar-
se de insegurança quando em pé ou caminhando. Geralmente o curso é crônico e flutuante - ra-
ramente há história de piora progressiva. No exame físico, não se encontram sinais objetivos de
vertigem ou desequilíbrio. As opções terapêuticas são bastante eficazes e incluem psicoterapia,
terapia cognitivo-comportamental e medicações antidepressivas.
Referências
BELTRAN-MATEOS, L.D. et al. Phobic Orthostatic Insecurity. Acta Otorrinolaringológica Españo-
la. 2007;58(9):393-400.
BRESSI, F. et al. Vestibular rehabilitation in benign paroxysmal positional vertigo: Reality or fic-
tion. International Journal of Immunopathology and Pharmacology .2017; 30(2)113-22.
EATON, D.A.; ROLAND, P.S. Dizziness in the older adult, part 1: Evaluation and general treatment
strategies. Geriatrics. 2003;58(4):28-36.
____________ Dizziness in the older adult, part 2: Treatments for causes of the four most common
symptoms. Geriatrics 2003;58(4)46-52.
FERNÁNDEZ, L. et al. Vertigo and dizziness in the elderly. Frontiers in Neurology 2015;6(144).
FICK, D.M. et al. American Geriatrics Society 2015 Updated Beers Criteria for Potentially Inappro-
priate Medication Use in Older Adults. Journal of the American Geriatrics Society. 2015;63(11):2227-
46.
GANANÇA, F.F. et al. Como Diagnosticar e Tratar Labirintopatias Vestibular disorders. Revista
Brasileira de Medicina. 2014;71(12)78-85.
HUH, Y.E.; KIM, J.S. Bedside Evaluation of Dizzy Patients, Journal of Clinical Neurology. 2013;
9(4):203-13.
IWASAKI, S.; YAMASOBA, T. Dizziness and Imbalance in the Elderly: Age-related Decline in the
Vestibular System. Aging and Disease. 2015;6(1)38-47.
KENNY, R.A. Syncope. In: HALTER, J.B. et al. Hazzard’s Geriatric Medicine and Gerontology, 6th
ed. New York: McGraw-Hill; 2009, p. 698.
Capítulo 17 293
KERBER, K.A. Vertigo and Dizziness in the Emergency Department. Emergency Medicine Clinics
of North America. 2009;27(1).
MANTELLO, E.B. et al. Efeito da reabilitação vestibular sobre a qualidade de vida de idosos labi-
rintopatas. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia. 2008;74(2):172-80.
MURDIN, L.; SCHILDER, A.G.M. Epidemiology of Balance Symptoms and Disorders in the
Community: A Systematic Review. Otology & Neurotology. 2015;36(3)387-92.
POST, R.E.; DICKERSON, L.M. Dizziness: A Diagnostic Approach. American Academy of Family
Physicians. 2010;82(4):361-68.
QUINN, J. et al. Prospective Validation of the San Francisco Syncope Rule to Predict Patients
With Serious Outcomes. Annals of Emergency Medicine. 2006;47(5):448-54.
RIBEIRO, K.F. et al. Effectiveness of Otolith Repositioning Maneuvers and Vestibular Rehabilita-
tion exercises in elderly people with Benign Paroxysmal Positional Vertigo: a systematic review.
Brazilian Journal of Otorhinolaryngology.
SUSANTO, M. Dizziness: if not vertigo could it be cardiac disease? Australian Family Physician.
2014;43(5)264-69.
YEO, S.C. et al. Idiopathic benign paroxysmal positional vertigo in the elderly: a long-term follo-
w-up study. Aging Clinical and Experimental Research.
294
CAPÍTULO
1. Introdução
A queda é um fenômeno multifatorial, frequente e de significativo impacto na morbimortalidade
dos idosos. Além disso, produz prejuízo à qualidade de vida, não somente pelas lesões que provoca,
como pelo receio de cair novamente. O medo de novas quedas afeta 1/3 dos idosos que caem e
está associado ao isolamento social, deterioração cognitiva, depressão e dependência funcional,
com piora do equilíbrio e imobilismo. Idosos que já sofreram ao menos uma queda apresentam
declínio nas atividades da vida diária e os ditos “caidores crônicos” têm mais chance de serem
institucionalizados e maior mortalidade. Até 35% dos idosos com mais de 65 anos sofrem quedas
no período de 1 ano e cerca de 15% das quedas provocam traumatismos graves, como fratura de
fêmur, pelve, coluna e membros superiores, além do trauma craniano. A fratura de fêmur é muito
ilustrativa da gravidade das quedas. Cerca de 50% dos idosos que apresentam fratura de fêmur
morrem no primeiro ano após a fratura e 50% dos sobreviventes ficam dependentes de cuidadores.
2. Etiologia
Na pesquisa de síncope deve-se considerar a possibilidade de hipotensão ortostática, reflexos
vasovagais exacerbados e arritmias cardíacas. A avaliação de deformidades e de alterações de
sensibilidade nos pés pode identificar pacientes com maior risco para quedas.
Os fatores causais para quedas estão listados na Tabela 1. As causas mais significativas são os
distúrbios de marcha e equilíbrio, o uso de fármacos, a hipotensão postural, os déficits visuais,
a incapacidade funcional prévia e os distúrbios cognitivos. A perda de equilíbrio é uma causa
frequentemente apontada pelos idosos e está relacionada ao comprometimento dos mecanismos
efetores do equilíbrio: sistema visual, vestibular, proprioceptivo, aparato muscular e segurança
psicológica.
Tabela 1- Fatores Causais para Quedas
3. Avaliação da marcha
Os distúrbios de marcha podem ser avaliados preventivamente. É comum que com o
envelhecimento se reduza a amplitude dos passos, provocando um andar mais arrastado,
hesitante e suscetível à queda por tropeços. A dificuldade de mobilidade pode ser avaliada pela
dificuldade em subir lances de escada, por exemplo. O uso de dispositivos auxiliares à marcha,
como bengalas ou andadores também é um fator propiciador de quedas, principalmente se não
forem utilizados de forma adequada. Um dos testes de fácil aplicação é o “Get Up and Go”, em
que se solicita que o idoso se levante de uma cadeira sem braços, ande uma distância de 3 metros,
dê meia-volta e retorne à cadeira até se sentar novamente. O tempo esperado para executar
esta tarefa é de até 10 segundos. Os pacientes que levam de 10 a 20 segundos ainda apresentam
mobilidade que permite a marcha sem acompanhantes ou uso de apoios. Um tempo superior a
20 segundos sugere um comprometimento maior da mobilidade, recomendando-se, neste caso,
a supervisão de um acompanhante e o uso de dispositivos auxiliares à marcha. A velocidade de
marcha também é um parâmetro que está associado ao risco de quedas e à maior mortalidade.
Pode ser testada pedindo-se ao paciente para caminhar o mais rápido possível por uma distância
de 6 metros e cronometrando-se o tempo dispendido para a tarefa. A velocidade menor que
0.8m/s (bradipedia) é sugestiva de maior risco de quedas.
4. Tratamento e prevenção
O tratamento está fortemente associado à prevenção das quedas. A queda, entretanto, frequen-
temente se manifesta como um epifenômeno, consequência do agravamento de instabilidade
Capítulo 18 297
postural por conta de uma doença aguda, como infecções ou distúrbios hidroeletrolíticos. Dessa
forma, a avaliação de um episódio inicial de queda não deve estar restrita à identificação de pos-
síveis lesões ou traumatismos, mas considerar a existência de um fator desencadeante subjacen-
te, muitas vezes assintomático.
Dessa forma, o tratamento passa pela identificação de um possível fator causal para quedas, como
a revisão de medicamentos inapropriados, que provoquem hipotensão postural ou sedação e a
avaliação da acuidade visual. As quedas costumam ser multifatoriais e o descondicionamento
físico, especialmente a fraqueza de quadríceps, associado a alterações de equilíbrio é causa muito
frequente. Recomenda-se, portanto, a reabilitação como ferramenta não só para o tratamento
das lesões, mas para a prevenção de novas quedas e do medo de cair novamente. Os exercícios
resistidos (musculação) promovem ganho de força e resistência e podem ser associados a recursos
fisioterapêuticos como treino de marcha, além de medidas para melhora do equilíbrio postural,
como Tai Chi. O uso de dispositivos de segurança como barras de apoio, elevação do assento
sanitário, corrimãos, piso antiderrapante, iluminação de vigília e sinalização de degraus são
outras medidas que podem reduzir o receio de quedas e favorecer a mobilidade e a independência
do paciente. A detecção e o tratamento da osteoporose podem contribuir para a prevenção de
fraturas, habitualmente provocadas por quedas. O uso da vitamina D, na dose mínima de 800 UI/
dia, mostrou-se eficaz na redução de quedas. Pacientes com níveis muito baixos de vitamina D (<
10 ng/mL) devem receber reposição de 50.000 UI por semana por até 8 semanas.
5. Imobilidade
Nos pacientes em que não é obtida a reabilitação adequada é comum a ocorrência da síndrome de
imobilidade, que também pode ser desencadeada por outros fatores, como sequelas neurológicas
de acidente vascular cerebral, Doença de Parkinson e quadros demenciais. O paciente imóvel em
geral torna-se frágil e apresenta emagrecimento em decorrência da perda de massa muscular. O
imobilismo por cerca de dois meses pode provocar a perda de até 50% de toda massa muscular.
Outras complicações são o surgimento de incontinência urinária e fecal, úlceras por decúbito,
pneumonias, fenômenos tromboembólicos e contraturas musculares generalizadas. É frequente
também que surjam hipotensão postural, infecções urinárias, constipação intestinal, hiporexia,
sintomas ansiosos e depressivos.
298
Cerca de 40% dos idosos com mais de 70 anos apresentam alguma dificuldade para locomoção.
O fenômeno é multifatorial, mas tem como causa subjacente o baixo de grau de atividade física
(sedentarismo). Indivíduos sedentários estão mais sujeitos, em especial após algum evento agudo,
como infecções ou internação hospitalar, a apresentarem perda de funcionalidade, tornando-se
mais dependentes e imóveis. A Tabela 2 lista as causas comuns de imobilismo nos idosos.
6. Estudo de caso
Uma fisioterapeuta lhe reencaminhou a sra. Doralice, 72 anos, a quem você havia indicado
fisioterapia há cerca de 2 anos por queixas de lombalgia mecânica. Ela apresentou tanta melhora
com os exercícios que abandonou o tratamento médico que fazia com você. O motivo do
Capítulo 18 299
reencaminhamento é que a fisioterapeuta está observando que a paciente sofreu grande número
de quedas nos últimos 6 meses. Na sua ficha está registrado que além de hipertensa, a paciente
tem osteoporose, cefaleia tensional e insuficiência cardíaca (IC) diastólica.
Doralice mantém o uso contínuo das seguintes medicações: Alendronato de sódio 70mg/semana,
Vitamina D 7000 U/semana, Ciclobenzaprina 5mg/noite, Enalapril 20mg 12/12 horas e Carvedilol
12,5mg 12/12 horas.
Sua queixa principal voltou a ser a dor lombar. Relata que caiu mais de 10 vezes nos últimos 6
meses, mas que não entende o motivo de cair. Como mora sozinha, já precisou gritar por socorro
em seu apartamento para obter a ajuda de vizinhos para se levantar. Atualmente tem muito
receio de cair, e só sai de casa para ir à fisioterapia e ao mercado, sempre com ajuda de um taxista.
Passa o dia todo sentada ou deitada.
Ao exame físico: lúcida e orientada. Bom estado geral. Diversos hematomas na fronte, nos braços
e nas pernas.
RCR sem sopros. Pulmões limpos. Dor à flexão do tronco, na região lombar. A região sacral
apresenta área de intensa hiperemia local (foto). Abdome flácido, sem massas ou visceromegalias.
Membros sem edemas, pulsos arteriais presentes.
Fonte: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. Manual de
Condutas para Úlcera Neurotróficas e Traumáticas. Brasília: Ministério da Saúde, 2002
300
7. Questionamentos
1. Que fatores você acredita estarem implicados nas quedas desta paciente? Que intervenções
proporia?
4. Qual sua impressão sobre a evolução da osteoporose desta paciente? O que proporia?
8. Conclusões
• As quedas ameaçam a independência dos idosos e aumentam o risco de fraturas e morte.
Referências
BROWN, C.J.; FLOOD, K.L. Mobility limitation in the older patient: a clinical review. Journal of
the American Medical Association 2013;310:1168.
GANZ, D.A. et al. Will my patient fall? Journal of the American Medical Association 2007;297:77.
LUUKINEN, H. et al. Predictors for recurrent falls among the home-dwelling elderly. Scandinavian
Journal of Primary Health Care 1995;13:294.
Capítulo 18 301
MUIR, S.W.; GOPAUL, K.; MONTERO ODASSO, M.M. The role of cognitive impairment in fall risk
among older adults: a systematic review and meta-analysis. Age Ageing 2012;41:299.
NACHREINER, N.M. et al. Circunstances and consequences of falls in community older women.
Journal of Women’s Health (Larchmt) 2007;16:1437.
PODSIADLO, D.; RICHARDSON, S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for
frail elderly persons. Journal of the American Geriatrics Society 1991;39:142.
RICHARDSON, J.K.; HURVITZ, E.A. Peripheral neuropathy: a true risk factor for falls. The journals
of gerontology. Series A, Biological sciences and medical sciences 1995; 50:M211.
STUDENSKI, S. et al. Gait speed and survival in older adults. Journal of the American Medical
Association 2011;305:50.
TINETTI, M.E.; WILLIAMS, C.S. The effect of falls and fall injuries on functioning in community-
dwelling older persons The journals of gerontology. Series A, Biological sciences and medical
sciences 1998;53:M112.
TINETTI, M.E. Clinical practice. Preventing falls in elderly persons. The New England Journal of
Medicine 2003;348:42.
VISSCHEDIJK, J. et al. Fear of falling after hip fracture: a systematic review of measurement
instruments, prevalence, interventions and related factors. Journal of the American Geriatrics
Society 2010;58:1739.
VISSER, M.; DEEG, D.J.; LIPS, P. Low vitamin D and high parathyroid hormone determinants of
loss of muscle strength and muscle mass (sarcopenia): the Longitudinal Aging Study Amsterdam.
The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism 2003;88:5766.
302
CAPÍTULO
Envelhecimento do
aparelho geniturinário
Profa. Keite Priscila Paiá
Envelhecimento do
aparelho geniturinário
Profa. Keite Priscila Paiá
1. Caso clínico
Paciente A., 85 anos, portador de hipertensão arterial, dislipidemia, doença pulmonar obstrutiva
crônica (DPOC), vem para iniciar seguimento geriátrico por indicação de familiares. Independen-
te, autônomo, frequentador de Posto de Saúde – PS - (onde vai sempre sozinho), conta diversos
tratamentos de infecções do trato urinário nos últimos anos. Lembra nunca ter ido ao PS por esta
queixa, mas lá eles sempre “descobriam a infecção” (sic). Trouxe medicações de uso contínuo:
cerca de 10 medicamentos, vários deles prescritos por médicos do PS. Sua única demanda é que
deseja realizar “prevenção da próstata”.
2. Discussão
Objetivamos neste caso, diminuir as idas a PS e a múltiplos especialistas, além de minimizar ia-
trogenias. Lembrando de acompanhar suas comorbidades e avaliar a polifarmácia.
ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS
700 mL/min (vida adulta)
FLUXO SANGÚINEO RENAL
Redução para cerca de 300 mL/min (90anos)
ENDOTÉLIO Vasoconstrição
O RFG diminui 1% para cada ano de vida a partir dos 40 anos. Como a medida do RFG emprega a
depuração da creatinina endógena, que é um metabólito muscular, deve-se atentar quando ava-
liamos o nível plasmático do idoso. Neste grupo, pela diminuição na massa muscular, os níveis
só se elevarão quando em adiantado comprometimento da função renal. A avaliação da função
renal, portanto, será superestimada se tomar por base apenas a aferição dos níveis de creatinina.
Contrariamente aos níveis de creatinina, observa-se desproporcional aumento da ureia plasmática
nos idosos.
Capítulo 19 305
Pela dificuldade de coleta de urina de 24 horas nesta população, procuramos lançar mão de fór-
mulas de cálculo, como Cockroft e Gault, para estimar o RFG.
72 X CREATININA
BALANÇO
CARACTERÌSTICAS NO ENVELHECIMENTO
Na / K
Sódio plasmático no limite da normalidade
A sensibilidade à sede nesta idade está diminuída. Assim, os idosos encontram-se num estado
homeostático que os deixa mais vulneráveis a progressivos estados de desidratação.
306
3.7 Alterações de ureteres, bexiga e uretra
A Tabela 4 resume as alterações observadas nos ureteres, na bexiga e na uretra, decorrentes do
envelhecimento normal.
Tabelas 4 (A, B, C): Alterações provenientes do envelhecimento dos ureteres, bexiga e uretra
A – Ureteres
Maior contratilidade
Expansão da camada muscular
Diminuição da elasticidade
Alteração da motilidade
B – Bexiga
Depósito de colágeno
Contrações não inibidas do músculo detrusor
Progressiva esclerose da vasa vasorum
Aumento do trabeculado, fibrose
Formação de divertículos
Denervação da musculatura lisa, axônios terminais e diminuição na permeabilidade ao cálcio,
com alteração da contração muscular
Desequilíbrio entre músculos estriados (voluntários) e lisos involuntários
Danos nos receptores terminais
Queda de 50% na capacidade de armazenamento
C - Uretra
Diminuição da celularidade
Maior depósito de colágeno
Atrofia, enfraquecimento da musculatura pélvica e perda elasticidade do colo vesical, com au-
mento na frequência e urgência urinárias
Mulheres: redução do comprimento funcional e da pressão máxima, com maior vulnerabilidade a ITU
Homens: hipertrofia da próstata e maior sensibilidade à infecção
Capítulo 19 307
3.8 Retomando caso clínico
Calculando o clearance estimado do paciente pela fórmula de Cockroft e Gault, temos:
72 X CREATININA (1,5)
A redução no clearence de creatinina nos deve deixar atentos a potenciais riscos de suas medica-
ções, do uso de suplementos, de sobrecargas dietéticas e do uso de contrastes.
A prevalência de ITU aumenta substancialmente com a idade avançada em ambos os sexos, pela
diminuição nos mecanismos de defesa, além das alterações funcionais e orgânicas do trato ge-
niturinário (Tabela 6), imobilidade, desidratação e doenças sistêmicas. Representa a primeira
causa de infecção hospitalar, podendo chegar a 40% dos casos. É a principal responsável pelo
desenvolvimento de sepse nesses indivíduos.
Homem Mulher
Aumento prostático Enfraquecimento do assoalho pélvico
Dificuldade esvaziamento vesical Redução da capacidade vesical
Alterações tróficas do epitélio pela queda hormonal
308
Os sintomas podem variar substancialmente e o diagnóstico pode ser dificultado por sintomas
atípicos nos idosos. Nas infecções baixas, sintomas clássicos como disúria, polaciúria e urgência
miccional predominam, porém, podem estar relacionadas a outras causas, não infecciosas. Sin-
tomas atípicos como adinamia, prostração, anorexia e delirium podem estar presentes e serem
predominantes. Na infecção alta, sintomas clássicos como febre e dor lombar podem ocorrer,
mas outros sintomas como náuseas, vômitos e dor abdominal podem mascarar o quadro.
A investigação deve ser baseada na anamnese e na coleta de urina tipo 1, associada a urocultura
com antibiograma ou avaliação microscópica com coloração de Gram (bacterioscopia), quando a
urocultura não estiver disponível.
A bacteriúria assintomática tem curso benigno, não leva a dano renal progressivo ou a forma-
ção de cicatrizes renais e seu tratamento não reduz a mortalidade nem episódios sintomáticos
de ITU. Seu tratamento aumenta o risco de efeitos adversos dos fármacos, bem como promove
aumento da resistência bacteriana, superando quaisquer benefícios. Existem condições em que
deve ser tratada, como antes de procedimentos invasivos do trato geniturinário para fins diag-
nósticos ou terapêuticos, antes de procedimentos cirúrgicos e em quadros de DM descompensa-
do. Sua investigação deve ser feita antes de procedimentos urológicos invasivos e pré-operató-
rios de cirurgia com implante de material.
O tratamento deve ser baseado em testes de sensibilidade bacterianas aos antibióticos, concen-
tração local do fármaco, via de administração, tolerabilidade e custos. Deve-se iniciar a antibioti-
coterapia imediatamente após a coleta da urina com urocultura e antibiograma. Após resultados,
a medicação pode ser alterada, se necessário.
Os idosos são infectados geralmente por bactérias mais resistentes do que a população mais jo-
vem, devido à maior frequência de ITU e ao uso de repetidos ciclos de antibiótico, muitas vezes
sem indicação.
As cistites não complicadas na mulher podem ser tratadas por três a sete dias. Já os homens,
devem receber tratamento por sete a quatorze dias. As fluoroquinolonas, a sulfametoxazol-tri-
Capítulo 19 309
metropima, a nitrofurantoína, os amioglicosídeos e as cefalosporinas de terceira geração consti-
tuem os antibióticos mais empregados.
A pielonefrite aguda requer tratamento mais prolongado, de quatorze dias em média, podendo
chegar a vinte e um dias, inicialmente por via endovenosa, havendo boa eficácia com o uso de
fluoroquinolonas, cefalosporinas de terceira geração ou da associação de piperacilina com tazo-
bactana.
A antibioticoterapia baseada em baixas doses de antibióticos por longo período (três a seis meses)
pode ser eficaz na profilaxia de infecções recorrentes.
No caso clínico que seguimos, o paciente conta diversos ciclos de antibióticos, mesmo sem apre-
sentar queixa, o que nos sugere tratar-se de bacteriúria assintomática, sem qualquer indicação de
tratamento. Some-se a esta iatrogenia o fato de que a maioria dos antibióticos prescritos não devem
ter sido corrigidos para a atual função renal do paciente, o que aumenta o risco de intoxicações.
4.6 Hematúria
Hematúria ou existência de células sanguíneas na urina é sinal comum em mais de uma centena
de doenças ou de condições sistêmicas, sendo muito frequente na população geral. As principais
etiologias variam com a idade e as mais comuns são litíases, infecções e inflamações da bexiga
ou da próstata. A prevalência de hematúria microscópica assintomática aumenta com a idade,
podendo atingir até 21% após os 60 anos.
4.7 Investigação
Sempre avaliar a proporcionalidade da investigação deste achado nos idosos, pensando em sua fun-
cionalidade, riscos e benefícios tanto dos procedimentos diagnósticos, quanto dos tratamentos.
Anamnese e exame físico devem ser bem detalhados, procurando por infecções recentes (bac-
310
terianas ou virais), ingestão de alimentos (p.ex. beterraba, páprica, etc.) e medicamentos que
podem alterar a coloração da urina (ex. fenitoína e nitrofurantoína) e os que podem causar he-
matúria (ex. anticoagulantes), tabagismo, sangramentos frequentes, antecedentes pessoais e
familiares de doenças urológicas, renais e sistêmicas, avaliação da pressão arterial, exame das
genitálias e da uretra, bem como atenção a hematomas e a equimoses.
Os exames que fazem parte da investigação são urina tipo I, urocultura com antibiograma, pes-
quisa de dismorfismo eritrocitário, estudos de coagulação, hemograma completo e avaliação da
função renal (ureia e creatinina).
Nas patologias extrarrenais, a avaliação completa das vias urinárias deve ser indicada se houver
risco para diagnóstico de câncer, como mostra a Tabela 7. Causas extrarrenais respondem por
60% dos casos de hematúria, sendo que as patologias malignas do trato urinário, como câncer de
próstata e de bexiga, representam a primeira e a segunda neoplasias mais frequentes, respecti-
vamente, nos homens com mais de 55 anos.
Tabela 7: Fatores indicativos de avaliação urológica completa por risco mais elevado de patologias de vias urinárias
Para avaliação radiográfica inicial, recomenda-se tomografia computadorizada (TC), que apresen-
ta especificidade de 97% e acurácia de 98% para diagnosticar e caracterizar lesões renais (como
tumores e cistos) e extrarrenais/ureterais, principalmente cálculos urinários e lesões infecciosas.
A acurácia da TC é superior que a da urografia excretora (UGE). Embora apresente sensibilidade
inferior à uretrocistoscopia na detecção de tumores vesicais, permite identificação de lesões que
invadem os tecidos perivesicais. A ressonância magnética (RM) tem precisão semelhante à TC
na identificação de tumores e pode ser indicada para pacientes com alergia a contraste iodado.
Uma possível crítica à RM como primeiro exame seria seu alto custo e sua menor sensibilidade
Capítulo 19 311
para detecção de litíase. Vários centros utilizam ultrassonografia (US) renal como exame inicial
por ser um método de menor custo, não invasivo e não radioativo, embora apresente limitações
na avaliação do sistema coletor e de pequenas lesões renais. No diagnóstico de tumores vesicais,
sua sensibilidade também é inferior à da uretrocistoscopia. A US pode ser utilizada como método
auxiliar na avaliação de lesões císticas renais.
Rotineiramente, não se utiliza biópsia renal em casos de hematúria para esclarecimento diag-
nóstico. Ela tem indicação precisa para glomerulopatias e para pacientes com piora progressiva
da função renal.
Nos casos de micro-hematúria assintomática transitória, sem fatores de risco para ocorrência
de tumores, indica-se reavaliação e novo exame de urina após um ano. Quando há hematúria
associada à infecção urinária, realiza-se novo exame de urina seis semanas após o tratamento da
infecção, principalmente se estiverem no grupo de risco para tumor. Na permanência de hema-
túria, indica-se avaliação urológica completa.
FILTRAÇÃO
ESTÁGIO GRAU DE DISFUNÇÃO RENAL
GLOMERULAR (mL/min)
0 >90 Grupos de risco para DRC, ausência de lesão renal
1 >90 Lesão renal com função renal normal
2 60-89 Leve ou funcional
3 30-59 Moderada ou laboratorial
4 15-29 Grave ou clínica
5 <15 Terminal ou dialítica
312
Com a devida estimativa da TFG do paciente, deve-se sempre avaliar medicamentos em uso,
adequando suas doses, evitando polifarmácia e ajustando a dieta. Como os pacientes idosos são
sensíveis a mudanças de sódio e equilíbrio hídrico, desencadeando desidratação ou edema pul-
monar, atenção redobrada ao balanço hídrico é necessária. O controle do peso é um guia rápido
para se detectar o nível de desidratação, particularmente para se estabelecer o diagnóstico. A
super-hidratação pode normalmente ser controlada pelo uso de altas doses de diuréticos (80 a
120mg de furosemida), embora em alguns pacientes a complementação com um outro diurético
seja necessária para aumentar a diurese. A constipação intestinal crônica pode exacerbar a hiper-
potassemia em pacientes renais crônicos. O emprego da eritropoetina recombinante humana na
pré-diálise é bem estabelecido na prática. A anemia associada à lesão renal crônica exige maior
rapidez no tratamento do paciente, pelo risco de ser desencadeada a insuficiência cardíaca por
alto débito. A deficiência de ferro deve ser excluída pela avaliação da ferritina, do ferro sérico e
da saturação de transferrina.
A abordagem precoce conjunta com o nefrologista permite que pacientes geriátricos renais crô-
nicos tenham tempo para compreender seu estado de saúde, preparando-se para a decisão a re-
peito da diálise. O encaminhamento tardio, maiores comorbidades e a piora na situação funcio-
nal influenciam na sobrevida. A Tabela 9 mostra condições que impactam no tratamento destes
pacientes.
A diálise nos pacientes idosos, que há três décadas era considerada proscrita, hoje em dia é ro-
tineira para o nefrologista, sendo o grupo que mais cresce em incidência nas clínicas de diálise.
A diálise peritoneal, a hemodiálise e o tratamento conservador têm seu lugar nesta população.
Na prática clínica diária, quando a diálise está indicada para pacientes com DRC estágio 5, a per-
gunta que deve ser feita é se aquele determinado paciente realmente se beneficiará da terapia.
Aspectos como expectativa de vida, impacto da diálise na qualidade de vida, determinantes de
sobrevida, impacto das comorbidades e ônus da doença devem ser levados em consideração. As-
sim, para pacientes portadores de DRC estágio 5 que preferem não serem submetidos à diálise,
tem sido oferecido outro modelo de assistência descrito como tratamento conservador, trata-
Capítulo 19 313
mento conservador máximo (TCM), tratamento não dialítico e tratamento renal paliativo. Nesta
abordagem, o foco é o controle rígido da anemia, da acidose, da hipervolemia, da pressão arte-
rial, da insônia, da fadiga, da anorexia, da dor, da depressão e de outros sintomas associados à
DRC avançada.
Mesmo que o paciente aceite o tratamento dialítico, o foco da atenção deve ser de priorização de
alívio de sintomas e cuidados paliativos, ao invés de prolongamento da vida pela diálise.
Devido à íntima relação entre próstata, uretra e colo vesical, qualquer aumento da próstata, per-
manente ou não, trará graus variáveis de obstrução ao fluxo urinário. Dependendo do grau de
aumento e adaptação do idoso, a HPB pode ser assintomática, até apresentar-se com sintomas do
trato urinário baixo, hematúria, incontinência urinária, infecções e insuficiência renal pós-re-
nal, conforme detalhado na Tabela 10.
SINTOMAS IRRITATIVOS
SINTOMAS OBSTRUTIVOS (esvaziamento vesical)
(enchimento vesical)
Diminuição do jato urinário Noctúria
Hesitação Frequência
Constrição abdominal Urgência
Gotejamento terminal Disúria
Esvaziamento incompleto Incontinência
Intermitência
A avaliação inicial de um paciente com sintomas do trato urinário baixo (STUI) inclui: história
clínica, questionário de sintomas I-PSS (vide abaixo), exame físico com toque retal, exame de
urina, dosagem de creatinina plasmática e dosagem do antígeno prostático específico (PSA).
Deve-se abordar a condição global de saúde, a duração e natureza dos STUI, antecedentes de
cirurgias, doenças neurológicas (como AVC e Parkinson) e metabólicas (como diabetes), que pos-
sam afetar o trato urinário. Também deve ser avaliado o uso de medicamentos, como diuréticos,
drogas de ação anticolinérgica e de ação alfa simpaticomiméticas.
314
O I-PSS (Tabela 11) é um instrumento validado e utilizado mundialmente para quantificar os
STUI. A graduação dos sintomas e do incômodo que acarretam impacto na qualidade de vida
pode auxiliar na decisão terapêutica. A Organização Mundial de Saúde (OMS) elaborou uma
questão complementar ao I-PSS, enfatizando a percepção do indivíduo sobre seus sintomas e
quanto esses sintomas pioram sua qualidade de vida. A confiabilidade do escore é afetada pelo
estado cognitivo, grau de escolaridade e outras condições que interfiram com a compreensão das
perguntas.
Menos
Menos que Cerca de Mais que a
Escore Internacional de Sintomas Nenhuma de 1 vez Quase
a metade metade metade das
Prostáticos (IPSS) Vez a cada 5 sempre
das vezes das vezes vezes
vezes
No último mês, quantas vezes
você teve a sensação de não es-
0 1 2 3 4 5
vaziar completamente a bexiga
após terminar de urinar?
No último mês, quantas vezes
você teve urinar novamente 0 1 2 3 4 5
menos de 2h após ter urinado?
No último mês, quantas vezes
você observou que, ao urinar,
0 1 2 3 4 5
parou e recomeçou várias ve-
zes?
No último mês, quantas vezes
você observou que foi difícil 0 1 2 3 4 5
conter a urina?
No último mês, quantas vezes
você observou que o jato esta- 0 1 2 3 4 5
va fraco?
No último mês, quantas vezes
você teve de fazer força para 0 1 2 3 4 5
começar a urinar?
No último mês, quantas vezes,
em média, você teve de se le- 0 1 2 3 4 5
vantar para urinar?
1 6
Qualidade de vida 2 3 4 5
excelente péssima
Pontuação final: sintomas leves - até 7; sintomas moderados - 8-19; sintomas severos - 20-35
Exame físico: os requisitos mínimos são o exame neurológico sumário e o toque retal. Deve-
se pesquisar a função sensitiva e motora do períneo e membros inferiores. O exame digital da
Capítulo 19 315
próstata deve avaliar o volume, consistência, formato e presença de nódulos, além do tônus do
esfíncter anal. Importante salientar que o tamanho da glândula tem pouca relação com a presen-
ça ou ausência dos sintomas.
Laboratório: a análise dos elementos do sedimento (urina tipo 1) pode demonstrar hematúria,
piúria, glicosúria, proteinúria e outras anormalidades que implicarão em necessidade de inves-
tigações complementares. O nível do PSA guarda correlação estreita com o volume prostático e
pode ser utilizado como instrumento de estimativa do volume da glândula. A ultrassonografia
do trato urinário inferior e próstata via abdominal permite a avaliação do volume e formato da
próstata, protrusão para o interior da bexiga, medida da espessura da parede vesical, identifica-
ção de divertículos, cálculos ou tumores vesicais, além do volume urinário residual. A Tabela 12
resume os demais exames disponíveis para investigação.
Vigilância ativa: uma proporção significativa de homens com HPB não necessitam de tratamen-
to. A observação não implica necessariamente ausência de tratamento. Podemos obter melhora
316
nos STUI adotando algumas medidas não farmacológicas, como a redução da ingestão hídrica
noturna, a redução do consumo de cafeína e seus derivados e de bebida alcoólica, evitando o uso
descongestionantes e anti-histamínicos, além de poderem desenvolver treinamento pessoal em
controle de sintomas, por exemplo, mediante esvaziamentos vesicais com micções programa-
das. São candidatos a vigilância ativa homens com sintomas leves ou moderados com impacto
mínimo na qualidade de vida.
Astenia
Alfa- *Tratamento STUI Tontura
bloqueador *Relaxa musculatura associado a HPB. Hipotensão
Doxazosina Antagonista lisa da próstata e colo *STUI moderados ortostática
Tansulosina receptor alfa vesical. a severos com
Alfuzosina adrenérgico *Primeira linha. impacto na #Recomenda-
Terasozina *Efeito rápido. qualidade de se seu emprego
Silodosina vida. ao deitar e com
titulações lentas.
*Diidrotestosterona,
Inibidores da atua no trofismo *Sintomas do
Redução da libido
5-alfa redutase glandular e participa trato urinário
Converte Disfunção
(5AR) do componente inferior, próstata
testosterona a ejaculatória
Finasterida mecânico ou estático aumentada e/ou
diidrotestosterona Impotência
Dutasterida da HPB. PSA elevado.
Ginecomastia
*Efeito alguns meses
(4 a 6 meses)
Sintomas do trato
urinário inferior
Terapia
moderados
combinada Não é recomendada
a intensos,
(inibidores para tratamento com
próstatas
da 5-alfa duração inferior a um
aumentadas e/
redutase e alfa ano
ou PSA elevado
bloqueador)
e fluxo urinário
máximo reduzido
Capítulo 19 317
Boca seca
Constipação
Sintomas do trato Dificuldades
Antagonistas urinário baixo de micção
Inibe a ação da
de receptor e sintomas de Nasofaringite
acetilcolina e
muscarínico armazenamento Tontura
consequentemente
Oxibutinina vesical Confusão mental
reduz a
Tolterodina (principalmente Agitação
contratilidade do
Darifenacina com resíduo Risco de
músculo detrusor.
Solifenacina pós-miccional esvaziamento
elevado) incompleto e
retenção urinária
aguda
Efeitos sobre o
relaxamento do
músculo liso,
Inibidores da proliferação de células
Disfunção erétil
PDE5 endoteliais, melhora
com STUI e HPB
Tadalafila do fluxo sanguíneo
e atividade sobre
os nervos eferentes
prostáticos.
Falta de evidência Não
Fitoterápico
científica. recomendados
A cirurgia da próstata é geralmente necessária para pacientes com sintomas urinários modera-
dos ou intensos, que apresentam indicações absolutas de cirurgia: retenção urinária recorrente
ou refratária, incontinência por transbordamento, infecções recorrentes do trato urinário, cál-
culos ou divertículos na bexiga, hematúria macroscópica ou hidronefrose devido a HPB, com
ou sem insuficiência renal. Além disso, a cirurgia é geralmente necessária quando os pacientes
obtiveram alívio insuficiente dos STUI ou do resíduo pós miccional (RPM) após a instituição dos
tratamentos conservadores ou medicamentosos (indicações relativas de cirurgia).
O tratamento cirúrgico (Tabela 14) em pacientes geriátricos hígidos tem suas indicações bem es-
tabelecidas e deve ser oferecido ao paciente para que o mesmo participe do processo de decisão,
uma vez ciente dos riscos e benefícios do mesmo. Nos tratamentos dos muito idosos ou com alto
risco cirúrgico, deve-se individualizar a decisão, discutindo-se a proposta entre o geriatra e o
especialista.
318
Tabela 14: Modalidades de cirurgias
Os carcinomas uroteliais (células transicionais) estão presentes em 90% dos casos, seguidos de
outros tipos menos comuns, como carcinoma epidermoide, adenocarcinoma, carcinoma de pe-
quenas células e sarcoma.
O espectro do câncer de bexiga inclui tumores superficiais (sem invasão muscular), tumores com
invasão muscular e a doença metastática.
Capítulo 19 319
Os sintomas podem variar e serem intermitentes. A hematúria (visível ou microscópica) e sinto-
mas irritativos do trato urinário, como aumento de frequência, urgência e disúria, podem ser as
manifestações iniciais. O diagnóstico pode tardar pela semelhança com outras doenças benig-
nas, como infecção do trato urinário, cistite intersticial, prostatite ou calculose. Este atraso pode
levar à piora no prognóstico.
Na avaliação do câncer de bexiga, deve constar toque retal nos homens e toque bimanual nas
mulheres, sempre que possível. Deve-se considerar a realização de cistoscopia com biópsia, ci-
tologia urinária quando possível e imagem do trato urinário superior, preferencialmente tomo-
grafia, já que algumas lesões podem ser multifocais, com uma ou mais lesões presentes desde a
pelve renal até a uretra proximal.
O tratamento varia de acordo com o grau do tumor. Os tumores sem invasão muscular podem ser
manejados com ressecção transuretral (RTU), sendo que pacientes de alto risco de recorrência ou
progressão podem necessitar de terapia intravesical associada (quimioterapia ou imunoterapia
com BCG).
A cistectomia radical com derivação urinária é o tratamento de escolha para pacientes com inva-
são muscular. A neoadjuvância com quimioterapia (cisplatina) pode ser considerada, entretanto
os benefícios da adjuvância são controversos. Uma opção para não candidatos a cistectomia radi-
cal seria RTU completa associada a radioterapia.
Doença com invasão muscular e acometimento de linfonodos regionais limitados à pelve, sem
linfonodos a distância ou metástases viscerais, podem ser tratados com quimioterapia, seguido
de cistectomia ou terapia combinada.
Muitos pacientes portadores de câncer de bexiga não morrem da doença, mas experimentam
múltiplas recorrências.
Estudos têm identificado diversos fatores de risco para esta neoplasia, sendo o tabagismo o mais
importante deles. Outros fatores como exposição a cistite crônica, HPV, radioterapia prévia, uso
de ciclofosfamida, exposição prolongada a tintas e corantes, entre outros (indústrias têxteis,
de borracha, de combustão de gás e carvão), podem estar relacionados ao desenvolvimento da
doença.
320
O câncer de rim mais comum é o carcinoma de células claras, originário do córtex renal, corres-
pondendo a 80 a 85% dos tumores primários renais. Outros tipos mais raros são o carcinoma de
células de transição da pelve renal, seguidos do oncocitoma, tumor ductal e sarcoma.
Infelizmente, a maioria dos pacientes são assintomáticos até o avançar da doença. Sintomas
como hematúria, massa abdominal palpável, dor abdominal e perda de peso podem ocorrer,
mas há um aumento na frequência de diagnósticos incidentais durante algum exame de imagem
por outra indicação. Sintomas menos comuns incluem varicocele, principalmente à esquerda
e síndrome de Budd-Chiari, quando há envolvimento da veia cava inferior, produzindo ascite,
hepatomegalia, dor abdominal, edema dos membros inferiores, disfunção hepática e embolia
pulmonar.
Após o diagnóstico presuntivo ter sido feito pelas imagens, deve ser avaliada a extensão da doen-
ça e a presença de metástases para proceder-se a cirurgia, sempre que possível. A biópsia per-
cutânea é mais limitada, porém pode ser usada nas massas renais menores, com suspeita de
metástase renal, linfoma ou infecção renal, além dos casos de pacientes não candidatos à cirur-
gia, para iniciar tratamento apropriado. Para pacientes com massa renal isolada, a nefrectomia
parcial ou completa é preferível à biópsia porque já permite o diagnóstico e o tratamento defini-
tivo. Quando há suspeita de metástase a distância, a biópsia da lesão metastática pode ser mais
acessível que a biópsia renal.
Apesar de massas sólidas menores de 3cm poderem ser adenomas benignos, a distinção baseada
no tamanho não deve ser usada. A maioria das massas renais sólidas devem ter diagnóstico e,
apenas nos pacientes com comorbidades significativas, a conduta expectante é adotada.
Testes de triagem para diagnóstico precoce de câncer renal não são recomendados pela baixa
prevalência do carcinoma de células renais na população geral. A busca pelo tumor é recomenda-
da, entretanto, nos portadores de síndrome de Von Hippel-Lindau e esclerose tuberosa, nos pa-
cientes em estágio final da insuficiência renal com programação de diálise por 3 a 5 anos ou mais,
quando houver história famíliar forte de câncer renal ou antecedente de irradiação renal prévia.
Capítulo 19 321
Os pacientes com massas menores de 1cm podem ser seguidos com vigilância ativa, com ima-
gens seriadas com 6 e 12 meses e então anuais, pelo período de 5 anos. Pacientes com massas
renais entre 1 e 4 cm com expectativa de vida maior que 5 anos, devem ser submetidos a cirur-
gia poupadora ou nefrectomia parcial, sempre que possível, para preservação da função renal.
Entretanto, em alguns casos, a nefrectomia total faz-se necessária. Os não candidatos à cirurgia
ou com expectativa de vida menor que 5 anos, podem ser submetidos a biópsia, com posterior
ablação termal. Este tratamento também pode ser realizado em recidiva pós nefrectomia parcial,
pacientes com rim único ou transplantados, ou de risco para múltiplos cânceres renais. Após res-
secção completa do tumor localizado não há indicação de terapia adjuvante com imunoterapia
ou outras drogas.
Nos pacientes com doença localmente avançada (e irressecável), metastática ou recorrente pode-
se usar terapia sistêmica com imunoterapia ou com terapia alvo molecular, além de radioterapia,
dependendo da extensão da doença e condições clínicas do doente. Há uma gama de drogas que
podem ser tentadas pelos oncologistas, como interleucina 2 ou terapia alvo molecular com dro-
gas como pazopanibe, sunitinibe, axitinibe, sorafenibe ou bevacizumabe.
Os cuidados paliativos devem ser oferecidos quando, ao diagnóstico, a doença já não apresentar
possibilidade de cura.
Em homens americanos, o risco de desenvolver câncer de próstata é de 16%, mas sua letalidade
é de menos de 3%. Muitos casos sem evidência clínica são achados em levantamentos de autóp-
sias, com 30% deles em homens de 55 anos e aproximadamente 60% de casos aos 80 anos. Isso
sugere que, com frequência, há crescimento lento do tumor, com a maioria das mortes ocorrendo
antes deste diagnóstico.
O PSA é uma glicoproteína produzida nas células epiteliais da próstata e tem sua produção au-
mentada no câncer, com ruptura das barreiras tissulares entre a glândula e os capilares, e con-
sequente aumento de seus níveis séricos. Esta elevação pode preceder a doença clínica em 5 a 10
anos ou mais. O PSA, entretanto, também pode estar elevado em condições benignas como HPB
e prostatite. Também sofre alteração após a ejaculação, após o ato de pedalar bicicleta e após
episódios de retenção urinária aguda. A biópsia prostática e a RTU, igualmente, podem levar a
elevações do PSA. As drogas inibidoras da 5-alfa redutase, como finasterida e dutasterida, por
sua vez, diminuem os níveis de PSA.
O rastreamento do câncer de próstata tem sido uma questão controversa porque não há evidên-
cias claras de benefícios populacionais no que se refere ao diagnóstico precoce. Os estudos não
322
demonstram redução significativa da mortalidade e indicam piora da qualidade de vida e das
morbidades decorrentes da detecção do PSA elevado, notadamente a necessidade de biópsias
prostáticas e os efeitos adversos da prostatectomia, como disfunção erétil e incontinência uriná-
ria. A radioterapia complementar também está associada a complicações intestinais, como retite
actínica.
• A American Cancer Society (ACS) recomenda o PSA como rastreamento, com ou sem to-
que retal, começando aos 50 anos. O rastreamento não deve ser oferecido para pacientes
com expectativa de vida menor que 10 anos. Homens que tem PSA inicial maior ou igual a
2,5ng/mL devem fazer exames anuais. Menores que 2,5ng/mL, a cada 2 anos. Também re-
comendam começar discussão entre 40 e 45 anos em pacientes de alto risco de desenvolver
câncer de próstata (ex. negros, pacientes com familiares de primeiro grau com a doença
diagnosticada antes dos 65 anos). Há recomendação de realização de biópsia quando o PSA
for superior a 4,0ng/mL.
• A American Urological Association (AUA) não recomenda a realização de triagem nos me-
nores de 40 anos, nos pacientes de risco intermediário entre 40 e 54 anos, nos homens
maiores de 70 anos e nos pacientes com expectativa de vida menor que 10 a 15 anos. A
decisão deve ser individualizada entre 40 e 54 anos e nos pacientes com mais de 70 anos
e excelente saúde. A recomendação mais forte da AUA é de realizar PSA nos homens en-
tre 55 e 69 anos. A recomendação não encontra evidências para manter toque retal como
primeira linha de triagem. A AUA afirma que um intervalo de dois anos para os homens
que escolhem o rastreio pode ser preferido a triagem anual e que os intervalos podem ser
individualizados com base no nível de PSA basal. A diretriz observa a falta de evidência
para o uso de qualquer teste além do PSA, como os derivados de PSA, a cinética de PSA, os
marcadores moleculares de PSA, os marcadores urinários, as imagens ou as calculadoras
de risco. A AUA sugere usar o limiar de PSA em 10,0ng/mL para indicar biópsia prostática
para homens com 70 anos ou mais.
• O Canadian Task Force on Preventive Health Care faz fortes recomendações contra o ras-
treio nos menores que 55 anos e maiores que 69 anos. Faz uma recomendação fraca contra
PSA entre 55 e 69 anos.
• O United Kingdom National Screening Committee não recomenda rastreio para câncer de
próstata.
Capítulo 19 323
• O Australian Cancer Council não encontra evidências para triagem populacional e orienta
que a abordagem seja individualizada.
• A European Society for Medical Oncology (ESMO) não recomenda rastreio populacional e
é a favor de uma abordagem individualizada usando a tomada de decisão compartilhada.
A ESMO acredita que há evidências inconsistentes para rastreio nos menores que 50 anos e
entre 70 e 75 anos, com evidências de maior risco que benefício nos maiores de 75 anos.
Em resumo: quando a decisão for de realizar o rastreamento, sugere-se rastreamento com PSA
em intervalos entre 2 e 4 anos. O toque retal não deve fazer parte do rastreio. A idade limítrofe
para pausa no rastreamento é de 69 anos, ou antes se comorbidades limitarem a expectativa de
vida em menos de 10 anos, ou se o paciente não desejar mais realizá-lo. A suspensão do rastreio
também seria apropriada aos 65 anos com PSA menor que 1,0ng/mL.
Os homens com PSA maior que 7,0ng/mL ou com toque retal alterado (caso tenha sido realizado)
devem ser encaminhados ao urologista, sem mais testes, para avaliação sobre biópsia.
Sugere-se que pacientes com PSA entre 4 e 7ng/mL devem ter o exame repetido algumas sema-
nas após, com preparo adequado. Homens com prostatite sintomática devem ser tratados com
antibióticos antes de novo PSA. Os homens com um nível repetido de PSA acima de 4ng/mL de-
vem ser encaminhados para biópsia de próstata.
Não se deve utilizar a velocidade de crescimento de PSA, o PSA livre, a idade ou a raça na decisão
sobre quais pacientes encaminhar para biópsia.
Os homens com biópsia negativa, realizada conforme protocolos, devem ser manejados como os
que não realizaram a mesma. Seu próximo rastreamento deve ser novamente orientado e discu-
tido, com os mesmos critérios utilizados antes da biópsia.
324
grau III, nosso papel é informá-lo sobre riscos e benefícios do rastreamento de câncer de prósta-
ta, sobre as evidências até o momento e sobre tratamentos disponíveis e efeitos colaterais possí-
veis, caso rastreio venha positivo.
Referências
BEIRITH, A.; LARGURA, S.W.R. Alterações Fisiológicas Decorrentes do Envelhecimento. In Ge-
riatria para Clínicos – Medicina Aplicada a Terceira Idade. Liga Interdisciplinar da Terceira Idade
– LITI. Rio de Janeiro: Editora Revinter. 2012. p. 13-19.
COHEN, R.A.; BROWN, R.S. Clinical practice. Microscopic hematuria. The New England Journal of
Medicine. 2003; 348 (23): p. 2330-8.
DAMBROS, M.; ORTIZ, V.; TONIOLO, NETO J. Urologia Geriátrica, São Paulo: Editora Roca, 2009.
FABBRI, R.M.A.; PIRES, S.L. Infecção do Trato Urinário, in: Tratado de Geriatria e Gerontologia.
Rio de Janeiro. Editora Guanabara Koogan, 2016. p. 1256-1266.
FRANCO, M.R.G.; FERNANDES, N.M.S. Diálise no paciente idoso: um desafio do século XXI – re-
visão narrativa. Jornal Brasileiro de Nefrologia. 2013; 35 (2). p. 132-141.
GOMES, M.A. Doenças da Próstata, in: Tratado de Geriatria e Gerontologia. Rio de Janeiro. Edito-
ra Guanabara Koogan, 2016. P. 1224-1255.
MARQUES, L.P.J.; MOREIRA, R.M.P.; SANTOS, O.R. Infecção do Trato Urinário nos Idosos. In:
Atualidades em Nefrologia. São Paulo: Ed Sarvier, 2010. p. 150-154.
PIRES, A.J. Doença Renal. In: Tratado de Geriatria e Gerontologia. Rio de Janeiro. Editora Guana-
bara Koogan, 2016. p. 1290-1305.
Capítulo 19 325
para Clínicos – Medicina Aplicada a Terceira Idade. Liga Interdisciplinar da Terceira Idade – LITI.
Rio de Janeiro: Editora Revinter. 2012. p. 1-12.
ROMÃO JUNIOR, J.E. Doença Renal Crônica: Definição, Epidemiologia e Classificação. Jornal
Brasileiro de Nefrologia. 2004; 26, (3/1).
TRINDADE FILHO, J.C.S.; JESUS, C.M.N. Avaliação de Hematúrias. In: Urologia Fundamental,
São Paulo, Planmark Editora e SBU seção São Paulo, 2010. p. 47-54.
Na web:
ATKINS, M.B. Clinical manifestations, evaluation, and staging of renal cell carcinoma. Disponível
em www.uptodate.com. Capturado em agosto 2017.
____________ Diagnostic approach, differential diagnosis, and treatment of a small renal mass. Dispo-
nível em www.uptodate.com. Capturado agosto 2017.
KANTOFF, P.W.; TAPLIN, M.E.; SMITH, J.A. Clinical presentation and diagnosis of prostate can-
cer. Disponível em www.uptodate.com. Capturado agosto 2017.
LEE, S.I.; DUIGENAN, S. Diagnostic approach, differential diagnosis, and treatment of a small
renal mass. Disponível em www.uptodate.com. Capturado agosto 2017.
LERNER, S.P.; RAGHAVAN, D. Overview of the initial approach and management of urothelial
bladder cancer. Disponível em www.uptodate.com. Capturado agosto 2017.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE UROLOGIA. Recomendações SBU 2012. POMPEO, A.C.L. et al. Dis-
ponível em www. sbu.org.br. Capturado julho e agosto 2017.
YAIR, L.; CHOUEIRI, T.K. Clinical presentation, diagnosis, and staging of bladder cancer. Disponí-
vel em www.uptodate.com. Capturado em agosto 2017.
326
CAPÍTULO
Incontinência Urinária
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Incontinência Urinária
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
1. Introdução
A incontinência urinária é condição patológica comum de ser observada nos idosos, apesar de
subdiagnosticada, seja por inibição do paciente em queixar-se da perda urinária, seja por falta
de questionamento por parte do médico da sua ocorrência. A incontinência urinária é, muitas
vezes, considerada normal ou esperada com o envelhecimento. Até 30% dos idosos apresentam
perdas urinárias e a prevalência é 2 a 3 vezes maior nas mulheres que nos homens, ao menos até
os 80 anos de idade. A incontinência urinária provoca significativo impacto sobre as finanças e a
qualidade de vida do idoso, restringindo sua mobilidade e contatos sociais, elevando o risco de
depressão e aumentando o risco de quedas, infecções urinárias e institucionalização.
2. Mecanismos de Incontinência
Os mecanismos provocadores de incontinência urinária estão relacionados ao comprometimento
de um ou mais fatores reguladores da micção normal:
Uma série de comorbidades podem promover a perda da continência urinária no idoso, na forma
de causas transitórias: delirium, depressão, poliúria, déficit de estrógeno, infecção urinária,
imobilidade, iatrogenia medicamentosa e impactação fecal. Dentre os fármacos implicados na
incontinência estão os diuréticos, as xantinas, os anticolinérgicos, os bloqueadores do canal de
cálcio, os estimulantes alfa-adrenérgicos e os sedativos.
A incontinência urinária permanente pode ser dividida em 5 causas: por urgência, por esforço,
mista, total ou paradoxal.
A incontinência por urgência é a principal causa, e caracteriza-se por uma sensação de urgência
miccional com desejo súbito de urinar. Ocorre por hiperatividade detrusora não inibida. A
incontinência por esforço é mais frequente nas mulheres e caracteriza-se por perda urinária
associada ao aumento da pressão intravesical (por tosse, espirros e ao carregar pesos), que supera
a pressão determinada pelo esfíncter, que se encontra deficiente.
A incontinência mista engloba características tanto dos mecanismos de esforço quanto de
urgência urinária.
A incontinência total é fruto de lesão do esfíncter uretral externo ou das fibras que o inervam,
como ocorre nas sequelas de prostatectomia. Ocorrem perdas urinárias contínuas.
A história clínica costuma ser suficiente para se estimar o mecanismo gerador de incontinência.
Recomenda-se que, na primeira avaliação, seja solicitado exame de urina com urocultura
e antibiograma. A análise da função renal e da glicemia pode adicionar informações úteis. A
avaliação mais minuciosa dos mecanismos de incontinência pode ser obtida pelo estudo
urodinâmico. A estimativa do resíduo pós-miccional, pelo ultrassom, nos auxilia a identificar o
impacto de bexigas hipocontráteis ou o grau de compressão uretral.
Capítulo 20 329
Figura 2 - Estudo urodinâmico com curvas relativas à pressão intravesical (preto), intra-abdominal (azul) e do
músculo detrusor (vermelho)
3. Tratamento
O tratamento consistirá em medidas comportamentais, fisioterapêuticas, farmacológicas ou
cirúrgicas. Dependerá do mecanismo específico de incontinência, da gravidade dos sintomas e
de seu impacto sobre a funcionalidade e independência do paciente. O tratamento conservador
produz melhora clínica em cerca de 70% dos pacientes.
330
Figura 3 - Cones vaginais de diversos pesos (4 a 55 gramas)
Fonte: http://chadeintimidade.blogspot.com.br/2014/08/fisioterapia-uroginecologica-e.html
Na incontinência total, onde há lesão de esfíncter ou das fibras que o inervam, pode-se recorrer
ao uso de plugs penianos, à tentativa de reconstrução cirúrgica do esfíncter ou ao implante de
slings perineais.
Capítulo 20 331
4. Estudo de Caso
Você está atendendo pela primeira vez a sra. Amélia, 79 anos, que vem trazida ao consultório por
sua filha Lúcia. Já no início do atendimento, a filha manifesta muita preocupação por conta de
um assunto constrangedor: há cerca de 4 meses sua mãe apresenta perda urinária pela casa, com
piora progressiva: já urinou na cama diversas vezes, no estofado da sala de estar e até durante um
almoço de família. Segundo a filha, isto está provocando diversos problemas no domicílio, onde
moram seus dois filhos adolescentes. O odor de urina na casa está muito intenso e a paciente se
recusa a usar fraldas. A filha Lúcia resolveu procurar assistência médica porque está decidida a
internar a mãe em um asilo se o problema não se resolver. Ela tentou procurar o médico do posto
que atendeu sua mãe há cerca de 6 meses, mas como ele estava em férias, decidiu buscar outra
orientação.
A filha informa também que sua mãe trata hipertensão arterial, diabetes, que adquiriu depois
da sétima gestação, quando tinha 36 anos. Desde então faz tratamento irregular. É tabagista de
1 maço de cigarros/dia desde os 27 anos de idade. Há 4 anos tem tosse crônica com expectoração
de secreção clara e eventuais crises de sibilos. O médico disse se tratar de bronquite e prescreveu
teofilina, que usa diariamente desde então. Na última consulta, como estava muito hipertensa,
foi prescrito Furosemida 40mg/dia e Anlodipina 10mg/dia. Para o diabetes usa Glibenclamida
5mg 2x ao dia.
Trouxe os últimos exames colhidos que ainda não conseguiu mostrar ao médico:
A paciente, que está em silêncio desde o início da consulta, diz que o que mais a incomoda é a
constipação intestinal. Está tomando três colheres de sopa de lactulose, duas de óleo mineral,
1 cp de Bisacodil 5mg ao dia e 1 copo de chá de sene por dia, sem sucesso. Concorda que a
incontinência é muito desagradável e que já não a deixa mais sair à rua, para ir à feira ou à igreja.
Então começa a chorar. Pede para não ir ao asilo nem usar fraldas.
RCR sem sopros. Pulmões com MV reduzidos, sibilos esparsos e roncos. Ao inspirar apresenta
muita tosse até expectorar pequena quantidade de secreção clara. Abdome flácido. À palpação
abdominal, apresentou perda urinária na mesa de exame. Membros com edema 2+/4+, mole e
depressível.
5. Questionamentos
1. Que fatores estão envolvidos na incontinência urinária desta paciente?
2. Quais as consequências que uma incontinência urinária desta intensidade podem
provocar?
3. Que condutas você proporia para investigar e tratar esta paciente?
332
6. Conclusões
• A incontinência urinária é um distúrbio prevalente nos idosos, especialmente nas
mulheres e frequentemente subdiagnosticada.
• O tratamento não farmacológico deve ser sempre considerado, com recursos como
a fisioterapia urogenital e técnicas de biofeedback.
7. Referência
FREITAS, E.V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 3ª. edição. Rio de Janeiro. Guanabara
Koogan, 2011.
Capítulo 20 333
CAPÍTULO
DISFAGIA
1. Introdução
Disfagia é considerada toda alteração encontrada em qualquer uma das fases da deglutição, que
leve a risco de desnutrição, desidratação e broncoaspiração. Chamamos de disfagia orofaríngea
as alterações ocorridas desde a preparação do bolo alimentar até sua passagem pela faringe e de
disfagia esofágica as alterações ocorridas no trajeto do bolo alimentar do esôfago ao estômago.
Diversas doenças associadas à disfunção orofaríngea ou esofágica podem causar disfagia nos
idosos. A disfagia orofaríngea em idosos é mais comumente causada por acidente vascular en-
cefálico (AVE), ocorrendo em um terço desses pacientes. A disfagia esofágica pode resultar de
várias causas motoras ou mecânicas. E, em alguns pacientes, muitas vezes nenhuma causa pode
ser reconhecida. Identificar a diferença entre a disfagia orofaríngea e a disfagia esofágica não é
apenas importante em relação à etiologia, mas é fundamental no gerenciamento da deglutição do
paciente.
2. Prevalência
A prevalência da disfagia é maior na população idosa do que na população em geral: 23% dos ido-
sos com idade igual ou superior a 70 anos. A prevalência de disfagia é ainda maior naqueles que
residem em instituições de longa permanência (ILPI), onde 40% a 60% dos residentes apresentam
dificuldades de deglutição. Também encontramos disfagia em 30% dos idosos com AVE, em 60%
- 80% dos idosos com distúrbios neurodegenerativos e em 55% a 86% dos idosos hospitalizados
por pneumonia.
Na segunda fase, a fase preparatória oral, o bolo alimentar necessita de preparação para ser deglu-
tido. A preservação da dentição ou a adaptação correta de próteses dentárias são fundamentais
para um bom desempenho de mastigação. Quando ocorrem ausências dentárias ou quando as
próteses estão mal ajustadas, podem ocorrer algumas adaptações espontâneas na função, como
por exemplo, evitar ingerir vegetais crus e carnes. Outra questão importante é que, com próteses
dentárias mal ajustadas, os músculos da mastigação não atuam corretamente, gerando um pro-
longamento do processo de mastigação e número maior de movimentos mastigatórios.
4. Fase Oral
Esta fase envolve a manipulação e o transporte dos alimentos na boca. A língua propulsiona o
alimento para a faringe. Próximo aos pilares faríngeos ocorre o disparo da deglutição e é inicia-
da a fase reflexa faríngea. As movimentações labial, bucal e lingual, em conjunto com a saliva,
atuam para manipular o alimento e para formularem o bolo alimentar. O bolo alimentar é levado
à porção posterior da boca para a porção inicial da faringe. No envelhecimento, a força da língua
diminui e, consequentemente, a duração da fase oral aumenta. Este fato permite o acúmulo de
resíduos na boca e pode levar ao crescimento excessivo de bactérias, assim como pode levar à
aspiração desses conteúdos.
5. Fase Faríngea
A cavidade bucal e a faringe contêm uma enorme quantidade de receptores sensoriais. O mo-
mento exato do início da fase faríngea é desencadeado por reflexos através da atuaçao desses
receptores sensoriais. Qualquer atraso nesse início pode resultar na entrada de alimento na via
aérea e/ou na aspiração. Na população idosa ocorre o atraso do reflexo de deglutição e também há
uma distância aumentada entre o osso hioide e a laringe.
O movimento do osso hioide desempenha um papel crucial, pois ele é importante não só por
gerar segurança ao mover a entrada da via aérea para longe do bolo alimentar, como também
por razões de eficiência, pois este movimento é responsável pela abertura do esfíncter esofágico
superior. Este movimento declina com o envelhecimento, mesmo nos idosos saudáveis quando
comparados a indivíduos mais jovens.
A segurança da deglutição é reforçada pelo movimento da epiglote e pela aproximação das pregas
vocais, mas sua eficiência não implica apenas em uma função motora adequada, mas também
dependem da preservação da sensibilidade. O aumento da idade é frequentemente associado a
uma percepção reduzida do lábio, da língua e da cavidade oral como um todo.
Nos idosos, o bolo alimentar tende a se acumular nos seios piriformes e nas valéculas, e essa alte-
ração pode estar associada a um maior risco de penetração ou aspiração nas vias aéreas. Estudos
Capítulo 21 337
mostraram que resíduos são frequentemente encontrados na valécula e nos seios piriformes em
idosos assintomáticos saudáveis. Chamamos de penetração quando o alimento chega ao nível
das pregas vocais, e de aspiração quando o material atinge as estruturas traqueais. Nos idosos
saudáveis, ocorre maior incidência de penetração do que de aspiração.
6. Fase Esofágica
Inicia com a abertura da transição entre a faringe e o esôfago. Em seguida surgem ondas peris-
tálticas que transportam o alimento até o estômago. No envelhecimento, estas ondas se tornam
mais lentas e ineficazes, aumentando a incidência de refluxo gastroesofágico. Estes problemas
na movimentação se agravam na presença de doenças que afetam o sistema nervoso ou o siste-
ma muscular e também com a utilização de alguns medicamentos.
8. Causas
Primárias - Doenças neurológicas como os AVEs, doenças neuromusculares como esclerose la-
teral amiotrófica e esclerose múltipla, doença de Parkinson, distúrbios reumatoides, distúrbios
metabólicos como doenças da tireoide, miosites e miopatias, quadros demenciais como a Doença
de Alzheimer e neoplasias em estruturas periféricas da deglutição.
Secundárias - São causas iatrogênicas, sendo a mais comum a medicamentosa. Os efeitos colate-
rais da medicação costumam descompensar o mecanismo de deglutição.
338
9. Avaliação
A avaliação clínica fonoaudiológica desempenha um papel importante na avaliação do pacien-
te disfágico. Esta avaliação detecta a presença de disfagia, avalia sua gravidade, determina as
alterações que a causam, permite o planejamento da reabilitação e a testagem do resultado da
reabilitação fonoaudiológica. Após uma anamnese direcionada à história pregressa do distúrbio
de deglutição e a investigação dos hábitos alimentares atuais e remotos do paciente, deve ser
realizada a avaliação da anatomia, da sensibilidade e dos reflexos do aparelho de deglutição e por
fim a avaliação funcional, que avalia as fases oral e faríngea da deglutição durante a alimentação
e/ou hidratação.
10. Tratamento
Após a avaliação fonoaudiológica da deglutição, devemos determinar o tipo de terapia: de esti-
mulação ou de deglutição.
As terapias de estimulação de forma isolada são indicadas para pacientes com quadro de disfa-
gia grave, usuários de via alternativa de alimentação que aspiram todas as consistências e volu-
mes de alimentos. Esta deve ser realizada até que a terapia de deglutição para reintrodução de
via oral segura possa ser realizada. Seu objetivo é melhorar as condições de força, mobilidade e
sensibiliddae geral do paciente sem a oferta de alimento. Para isso, são realizados exercícios de
mobilidade das estruturas envolvidas: laringe, faringe, língua, bochechas lábios, palato mole e
pregas vocais. Vale ressaltar que, em casos muito graves não se tem a intenção de restabelecer a
alimentação por via oral. Contudo, a terapia é indicada em caráter de manutenção visando mini-
mizar o risco de broncoaspiração salivar.
Capítulo 21 339
11. Conclusão
Lidar com o envelhecimento e suas nuances é um dos grandes desafios deste século. A demanda
é crescente e complexa, exigindo dos profissionais, além de conhecimentos específicos em ge-
riatria e gerontologia, atenção interdisciplinar que contemple as necessidades de saúde do idoso.
1. Introdução
Através de um caso clínico, abordaremos os principais aspectos no tratamento das lesões por
pressão - LP (do inglês, pressure injury), termo que passou a ser utilizado a partir do Consenso
da NPUAP (National Pressure Ulcer Advisory Panel), em maio de 2016, para substituir a denomi-
nação úlcera por pressão (pressure ulcer). A substituição se deu porque a expressão descreve de
forma mais precisa esse tipo de lesão, tanto na pele intacta quanto na pele ulcerada.
Essas lesões são decorrentes de um dano localizado na pele e/ou tecidos moles subjacentes, ge-
ralmente sobre uma proeminência óssea ou relacionadas ao uso de dispositivo médico ou outro
artefato. Podem se apresentar em pele íntegra ou como úlcera aberta e ser dolorosas. Ocorrem
como resultado da pressão intensa e/ou prolongada em combinação com o cisalhamento. A to-
lerância do tecido mole à pressão e ao cisalhamento, pode também ser afetada pelo microclima,
nutrição, perfusão, comorbidades e pelo estado geral do paciente.
As lesões por pressão relacionadas ao dispositivo médico resultam do uso de dispositivos pro-
jetados e aplicados para fins diagnósticos ou terapêuticos (uma órtese, um cateter de oxigênio,
sonda nasogástrica, entre outras). Geralmente a lesão está em conformidade com o padrão ou
forma do dispositivo.
Quanto à fisiopatologia das LPs, sabe-se que a superfície de contato, a cama ou a poltrona, exerce
pressão sobre os tecidos moles do paciente e este, por sua vez, contra o osso. Os vasos sanguíneos,
o músculo, a gordura subcutânea e a pele são comprimidos entre estas contrapressões. Quando
a pressão externa (intersticial) excede a pressão intracapilar, ou seja, excede a 32mmhg, ocorre
uma oclusão dos vasos (hipóxia), má nutrição e oxigenação dos tecidos, causando o acúmulo de
subprodutos tóxicos resultantes do metabolismo celular, anoxia tecidual e morte celular.
340
2. Caso clínico
Sr. WGS, de 79 anos, foi admitido numa enfermaria geriátrica, proveniente do domicilio, para
tratamento de pneumonia aspirativa. Com história de IAM e AVCi prévios, é portador de De-
mência Vascular Avançada, HAS e tabagismo. É totalmente depende para as atividades básicas
de vida diária (ABVD) há 2 anos . Com anemia e desnutriçao leve, recebia dieta oral pastosa e
líquidos com auxílio. Fazia uso de anticoagulantes, hipoglicemiantes orais, diuréticos, betablo-
queadores e analgésicos.
Situação social: Reside com sua esposa e cuidadora principal, de 77 anos, portadora de diabetes
mellitus. Seu filho viúvo auxilia nos cuidados por uma hora ao dia. Sua neta, que trabalha e es-
tuda, auxilia esporadicamente, bem como uma inquilina que mora no mesmo terreno .
Exame físico da pele: detectou-se a lesão por pressão no trocânter E e D, na região sacra, nos joe-
lhos D e E e nos calcâneos D e E.
Avaliamos o risco que o sr. W. teria de desenvolver lesão por pressão (LP), utilizando como ins-
trumento de avaliação a escala de Braden (Tabela 1) e encontramos o escore 9. Isto significa que
nosso paciente tem altíssimo risco de desenvolver LP. Essa escala estratifica o risco em muito
elevado (escores de 9 ou menos); risco elevado (escores entre 10 e 12); risco moderado (escores
entre 13 e 14); risco baixo (escores entre 15 e 16). Na vigência de outros fatores como idade maior
que 65 anos, escores de 17 e 18 são considerados como pacientes de risco.
Capítulo 21 341
Os fatores de risco que predispõem o indivíduo a períodos prolongados de isquemia induzida por
pressão se dividem em intrínsecos (situações locais e sistêmicas) e os extrínsecos (que derivam
do ambiente): fricção e as forças de cisalhamento.
Por ser uma pessoa acamada e com perda da sensibilidade local, há comprometimento do me-
canismo de mobilização para alívio da pressão. Isso também se aplica a pacientes com o nível
de consciência alterado. A hipertensão arterial e o diabetes favorecem alterações da circulação
cutânea, potencializando a isquemia local e reduzindo o transporte de nutrientes e células de
defesa ao local acometido. Além disso, o diabetes também reduz a inervação sensitiva local, pre-
dispondo ao aparecimento de lesões por imobilização prolongada sobre o mesmo local.
A pele envelhecida está predisposta a lesões por pressão por alterações próprias da senescência,
tais como:
a) Maior fragilidade;
Quanto aos fatores extrínsecos levantados na avaliação clinica do sr. W., podemos citar a fricção,
que acontece quando a pele se move contra uma superfície de apoio. Pode causar danos ao teci-
do quando o paciente é arrastado na cama, em vez de ser levantado. Isso faz com que a camada
superficial de células epiteliais seja retirada. Ocorre também o cisalhamento, definido como a
tração exercida sobre a pele, fazendo-a deslizar sobre o plano muscular, com oclusão ou rutura
dos capilares.
Para minimizar a ação dessas forças mecânicas associadas à pressão, instituímos o reposiciona-
mento e a mobilização, a mais importante e eficaz técnica de prevenção. Mudamos o paciente
de decúbito a cada duas horas, pois há évidencias que mostram que o alívio da pressão sobre
uma proeminência óssea por 5 minutos a cada 2 horas permite a recuperação do tecido à agressão
isquêmica.
A cada mobilização foi colocado um travesseiro entres as mesmas proeminências, sejam joe-
lhos, maléolos e assim por diante (para proteger as proeminências umas das outras). Quando
colocado em decúbito lateral, sempre devemos manter o quadril a 30 Graus (Figura 1) para o
peso do corpo ficar sobre os glúteos e não sobre os trocânteres que suportam menos pressão.
Além disso, temos que evitar ficar sobre áreas que já têm LP.
342
Figura1: Posicionamento adequado no decúbito lateral
Os calcâneos, para serem protegidos , não devem estar em contato com a superfície da cama.
O ideal seria não estarem sujeitos a qualquer pressão (“calcâneos flutuantes”). Neste caso, pode-
mos utilizar dispositivos de suspensão de calcâneos que os elevem completamente (Figura 2).
Os dispositivos de suspensão dos calcâneos são preferíveis para utilização a longo prazo ou para
indivíduos que geralmente não mantêm as pernas em cima das almofadas (Figura 3).
Fonte: http://www.oaplbendigo.com.au/product/heel-lift-suspension-boo
Capítulo 21 343
Figura 3: Redução de pressão calcânea com almofada
Fonte: www2.eerp.usp.br/site/grupos/feridascronicas/index.php?option=com_content&view=article&id=4&Itemi-
d=11´PrªDraMaria Helena Larcher Caliri
Utilizamos também como estratégia para reduzir a pressão as superfícies de suporte (SS) como
colchões, poltronas e almofadas, que podem ser divididas em Estáticas, as quais reduzem a
pressão pela redistribuição da carga sobre uma maior área do equipamento e estão indicadas
para a pessoa com baixo risco de desenvolver LP; e Dinâmicas, que caracterizam-se pela varia-
ção de pressão através de meios mecânicos, reduzindo a duração da pressão aplicada em pontos
diferentes do corpo, ao acessar o link www.prevencaoupp.com.br/1-sistema-tegumentar/7prin-
cipais-superficies-de-suporte.html encontrarão mais detalhes e fotos dessas superfícies de su-
porte.
Sempre que possível, devemos evitar posicionar o indivíduo numa superfície corporal que esteja
ruborizada. O eritema indica que o corpo ainda não recuperou da pressão anterior e exige um
intervalo de tempo maior entre pressões repetidas. Não massagear e nem esfregar vigorosamen-
te a pele que esteja em risco de lesões por pressão. Além de ser doloroso, esfregar a pele pode
também provocar uma ligeira destruição tecidual ou uma reação inflamatória, especialmente na
pele mais frágil dos idosos.
Para proteger a pele da exposição à umidade excessiva, utilizamos dispositivos urinários (fral-
das descartáveis ou dispositivo urinário masculino). Após as eliminações, fazemos a higiene
com agua e sabão, usamos cremes barreira para proteger a pele de novos efluentes e utilizamos
emolientes para hidratar a pele seca, a fim de reduzir o risco de dano.
344
Para o tratarmento tópico das feridas devemos classificá-las, fazer limpeza do conteúdo infla-
matório e corpos estranhos e desbridamento, usar cobertura e correlatos para curativo. Para
isso, utilizamos o sistema da NPUAP, que classifica as feridas conforme a profundidade de teci-
dos acometidos: quanto menor o estágio, menor profundidade de acometimento. Ou seja, se não
forem afastadas as causas, elas podem se aprofundar e evoluir do estágio 1 para o 2 , para 3, e
assim por diante. Lesões por pressão jamais cicatrizam pelo estadiamento reverso, ou seja, não
podem passar de 3 para 2 , de 2 para 1.
- “Lesão por Pressão Estágio 1: pele íntegra com área localizada de eritema que não embran-
quece e que pode parecer diferente em pele de cor escura. Presença de eritema que em-
branquece ou mudanças na sensibilidade, temperatura ou consistência (endurecimento)
podem preceder as mudanças visuais.
- Lesão por Pressão Estágio 2: perda da pele em sua espessura parcial com exposição da
derme. O leito da ferida é viável, de coloração rosa ou vermelha, úmido e pode também
apresentar-se como uma bolha intacta (preenchida com exsudato seroso) ou rompida. O
tecido adiposo e tecidos profundos não são visíveis. Tecido de granulação, esfacelo e es-
cara não estão presentes. Essas lesões geralmente resultam de microclima inadequado e
cisalhamento da pele na região da pélvis e no calcâneo. Esse estágio não deve ser usado
para descrever as lesões de pele associadas à umidade, incluindo a dermatite associada à
incontinência (DAI), à dermatite intertriginosa, à lesão de pele associada a adesivos médi-
cos ou às feridas traumáticas (lesões por fricção, queimaduras, abrasões).
- Lesão por Pressão Estágio 3: perda da pele em sua espessura total na qual a gordura é visí-
vel e, frequentemente, tecido de granulação e epíbole (lesão com bordas enroladas) estão
presentes. Esfacelo e/ou escara pode estar visível. A profundidade do dano tissular varia
conforme a localização anatômica; áreas com adiposidade significativa podem desenvol-
ver lesões profundas. Podem ocorrer descolamento e túneis. Não há exposição de fáscia,
músculo, tendão, ligamento, cartilagem e/ou osso. Quando o esfacelo ou escara prejudica
a identificação da extensão da perda tissular, deve-se classificá-la como Lesão por Pressão
Não Classificável.
- Lesão por pressão Estágio 4: perda da pele em sua espessura total e perda tissular com ex-
posição ou palpação direta da fáscia, músculo, tendão, ligamento, cartilagem ou osso. Es-
facelo e/ou escara pode estar visível. Epíbole (lesão com bordas enroladas), descolamento
e/ou túneis ocorrem frequentemente. A profundidade varia conforme a localização anatô-
mica. Quando o esfacelo ou escara prejudica a identificação da extensão da perda tissular,
deve-se classificá-la como Lesão por Pressão Não Classificável.
- Lesão por Pressão Não Classificável: perda da pele em sua espessura total e perda tissular
na qual a extensão do dano não pode ser confirmada porque está encoberta pelo esfacelo
ou escara. Ao ser removida (esfacelo ou escara), Lesão por Pressão em Estágio 3 ou Estágio
Capítulo 21 345
4 ficará aparente. Escara estável (isto é, seca, aderente, sem eritema ou flutuação) em mem-
bro isquêmico ou no calcâneo não deve ser removida.
- Lesão por Pressão Tissular Profunda: pele intacta ou não, com área localizada e persisten-
te de descoloração vermelha escura, marrom ou púrpura, que não embranquece, ou sepa-
ração epidérmica que mostra lesão com leito escurecido ou bolha com exsudato sanguino-
lento. Dor e mudança na temperatura frequentemente precedem as alterações de coloração
da pele. A descoloração pode apresentar-se diferente em pessoas com pele de tonalidade
mais escura. Essa lesão resulta de pressão intensa e/ou prolongada e de cisalhamento na
interface osso-músculo. A ferida pode evoluir rapidamente e revelar a extensão atual da
lesão tissular ou resolver sem perda tissular. Quando tecido necrótico, tecido subcutâneo,
tecido de granulação, fáscia, músculo ou outras estruturas subjacentes estão visíveis, in-
dica lesão por pressão com perda total de tecido (Lesão por Pressão Não Classificável ou
Estágio 3 ou Estágio 4). Não se deve utiliar a categoria Lesão por Pressão Tissular Profunda
(LPTP) para descrever condições vasculares, traumáticas, neuropáticas ou dermatológicas.
A seguir, vamos explicar como foi feito o tratamento tópico das lesões do sr.W:
Lesão por pressão no trocânter E, estágio não classificável, foi tratada com Papaína gel a 10%,
que é uma enzima proteolítica retirada do látex do mamão papaia (Carica Papaya), comercializa-
da na forma de pó, pasta, creme e gel, em concentrações que irão variar conforme as caracterís-
ticas da ferida (quantidade de tecido necrótico, presença de infecção, presença de tecido de gra-
nulação. O mecanismo de ação da papaína é como desbridante químico, facilitando o processo
cicatricial. Tem ação desbridante não traumática, anti-inflamatória, estimulante e facilitadora
da síntese de colágeno aumentando a força tensil da cicatriz.
Ao contrário do que muitos acreditam, a Papaina não agride o tecido sadio, pois as células sa-
dias inativam as proteases pela ação da alpha 1-antitripsina (globulina humana), ou seja, quando
existe a maceração é porque a pele perilesão sofreu a invasão do exsudato infeccioso. Após os
40 dias de internação recebeu alta e a ferida evoluiu com tecido de granulação e com curativo de
espuma de silicone.
Lesão por pressão no trocânter D, estágio 4, foi tratada inicialmente com papaína gel a 10%,
associada a curativos de prata para absorver o exsudato purulento e diminuir a colonização. No
momento da alta, a ferida já estava com tecido de granulação e com pouco exsudato serososo.
Saiu de alta com curativo de espuma de silicone.
Lesão por pressão em região sacral: estágio 3, tratada inicialmente com papaína gel a 0,8%, me-
nos concentrada, pois a necrose está mais úmida, associada a curativo de prata para absorver o
exsudato purulento e diminuir a colonização.
Lesão por pressão em regiao de joelho D e E, estágio 2, realizado curativo com AGE com óleos ve-
getais poli-insaturados (ácido linoleico, caproico, caprílico, láurico), que provocam uma resposta
inflamatória local aumentando a granulação e angiogênese. Cicatrizou em 30 dias.
Lesões por pressão em calcâneos D e E, estágio tissular profundo, realizado curativo com co-
berturas não aderentes, que mantêm o meio úmido, como acetato de celulose impregnado de
petrolatum ou rede de poliamida com silicone ou poliéster impregnado com AGE. Após 30 dias
cicatrizou.
346
3. Conclusão
Recebeu alta após 40 dias, com melhora da anemia, desnutrição e da infecção pulmonar. Para
continuar o tratamento das feridas e evitar futuras lesões, pois o mesmo continuou com os fato-
res de riscos levantados na internação, encaminhou-se o paciente para um programa de assis-
tência domiciliar, com visitas periódicas, que darão um suporte para a cuidadora e permitirá
detectar complicações precoces. Para viabilizar a prevenção, os curativos e os demais cuidados
com o paciente, a equipe multidisciplinar gerontológica desenvolveu um trabalho de orientação
aos familiares através de atendimentos e reuniões onde conseguiu-se que a inquilina pudesse
ajudar mais vezes a esposa do sr. W nos cuidados, em troca do abatimento do valor do aluguel,
pois a economia em evitar futuras feridas, internações e a melhora da qualidade de vida do pa-
ciente e seus familiares propiciará também melhor custo/benefício.
Referências
ALY, Y.A.; ABDEL-ATY, H. Normal oesophageal transit time on digital radiography. Clinical radiol-
ogy. 1999;54(8):545-9.
BARKER, A.R.; ROSSON, G.D.; DELLON, A.L. Wound healing in denervated tissue. Annals of Plastic
Surgery. 2006;57:339-42.
BILTON, T.L.; COUTO, E.A.B. Fonoaudiologia em gerontologia. In: FREITAS, E.V.; PY, L. org. Trata-
do de geriatria e gerontologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. p.118-79.
BUTCHER, M.; THOMPSON, G. Pressure ulcer prevention: can dressings protect from pressure ul-
cer damage? An advertorial - Wounds International, Vol 1, Issue 1, Practice development, 2009.
CABRE, M. et al. Prevalence and prognostic implications of dysphagia in elderly patients with
pneumonia. Age Ageing. 2010;39(1):39-45.
CANNON, J.P.; CANNON, B.C. Management of pressure ulcers. American Journal of Health-System
Pharmacy. 2004;61:1895-905.
CASTELL, D.O. Eating and swallowing disorders in the elderly. Practical Gastroenterology.
1988;12:32-37.
CHICHERO, J.M.B. Dysphagia Foundation, theory and practice. Chichester: John Wiley &Sons Ltd
2006.
Capítulo 21 347
DEJAEGER, E. et al. Manofluorographic analysis of swallowing in the elderly. Dysphagia.
1994;9(3):156-61.
DUARTE, Y.A.O.; DIOGO, M.J.D. Atendimento domiciliar: um enfoque gerontológico. São Paulo: Ath-
eneu; 2000
ELLINGER, S.; STEHLE, P. Efficacy of vitamin supplementation in situations with wound healing
disorders: results from clinical intervention studies. Current Opinion in Clinical Nutrition & Meta-
bolic Care. 2009;12:588-95.
FERREIRA, V.M.; RUIZ, T. Atitudes e conhecimentos de agentes comunitários de saúde e suas rela-
ções com idosos. Revista de Saúde Pública; 46(5): 84.
GORDON, C.; HEWER, R.L.; WADE, D.T. Dysphagia in acute stroke. Archive of British Medical Jour-
nal (Clinical Research Ed.) 1987;295(6595):411–414.
GRANDE, L. et al. Deterioration of esophageal motility with age: a manometric study of 79 healthy
subjects. The American journal of gastroenterology. 1999;94(7):1795-801.
GROHER, M.E. Distúrbios de deglutição em idosos. In: FURKIM, A.M.; SATINI, C.S. org. Disfagias
orofaríngeas. 2 ed. Barueri: Pró-Fono; 2004. P.97-108.
GUSENOFF, J.A.; REDETT, R.J.; NAHABEDIAN, M.Y. Outcomes for surgical coverage of pressure
sores in nonambulatory, nonparaplegic, elderly patients. Annals of Plastic Surgery. 2002;48:633-40.
JAUL, E. Assessment and management of pressure ulcers in the elderly. Drugs Aging.
2010;27(4):311- 25.
LEONARD, R.; KENDALL, K.; MCKENZIE, S. UES opening and cricopharyngeal bar in non dys-
phagic elderly and nonelderly adults. Dysphagia. 2004;19(3):182-91.
LIN, L.C. et al. Prevalence of Impaired Swallowing in Institutionalized Older People in Taiwan.
Journal of the American Geriatrics Society. 2002; 50: 1118–1123.
LOGEMANN, J.A. et al. Oropharyngeal swallow in younger and older women: videofluoroscopic
analysis. Journal of speech, language and hearing research : JSLHR. 2002;45(3):434-45.
MILLER, N. et al. Swallowing problems in Parkinson disease: frequency and clinical correlates.
Journal of Neurology, Neurosurgery, and Psychiatry. 2009;80(9):1047–1049.
MIOCHE, L. et al. Changes in jaw muscles activity with age: effects on food bolus properties. Phys-
iology & behavior. 2004; 30;82(4):621-7.
MUSTOE, T.A.; O´SHAUGHNESSY, K.; KLOETERS, O. Chronic wound pathogenesis and current
treatment strategies: a unifying hypothesis. Plastic and Reconstructive Surgery. 2006;117(Su-
ppl):35S-41S.
NETTINA, S.M. Prática de enfermagem. 7a. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2003.
348
NISHIMURA, N. et al. Effect of aging on the esophageal motor functions. Journal of smooth muscle
research = Nihon Heikatsukin Gakkai kikanshi. 1996;32(2):43-50.
OMARI, T.I. et al. Swallowing dysfunction in healthy older people using pharyngeal pressure-flow
analysis. Neurogastroenterology and motility : The Official journal of the European Gastrointestinal
Motility Society. 2014;26(1):59-68.
REN, J. et al. Effect of aging on the secondary esophageal peristalsis: presbyesophagus revisited.
The American journal of physiology. 1995;268(5 Pt 1):G772-9.
ROBSON, K.M.; GLICK, M.E. Dysphagia and advancing age: are manometric abnormalities more
common in older patients? Digestive diseases and sciences. 2003;48(9): 1709-12.
SELLARS, C. et al. Factors for Chest Infection in Acute Stroke A Prospective Cohort Study. Stroke.
2007;38 (8), 2284-2291.
SERRA-PRAT, M. et al. Prevalence of oropharyngeal dysphagia and impaired safety and effica-
cy of swallow in independently living older persons. Journal of the American Geriatrics Society.
2011;59:186–187.
SHETH, N.; DINER, W.C. Swallowing problems in the elderly. Dysphagia. 1988;4:209-215.
SHIP, J.A.; PILLEMER, S.R.; BAUM, B.J. Xerostomia and the geriatric patient. Journal of the Ameri-
can Geriatrics Society. 2002;50(3):535-43.
TODD, J.T.; LINTZENICH, C.R.; BUTLER, S.G. Isometric and swallowing tongue strength in healthy
adults. The Laryngoscope. 2013;123(10):2469-73.
WOHLERT, A.B. Tactile perception of spatial stimuli on the lip surface by young and older adults.
Journal of speech and hearing research. 1996;39(6):1191-8.
Na web:
CALIRI, M.H.L.; SANTOS, V.L.C.G.; MANDEELBAUM, M.H.S. Classificação das lesões por pressão
- Consenso NPUAP 2016 - adaptada culturalmente para o Brasil. Publicação oficial da Associação
Brasileira de Estomaterapia e da Associação Brasileira de Enfermagem em Dermatologia. Disponí-
vel em http://sobest.org.br/noticias/nacional/10/4/texto d/35
Capítulo 21 349
NPUAP. Etapas de lesão por pressão. Disponível em www.npuap.org/resources/educational-and-
clinical-resources/npuap-pressure-injury-stages/
Revista do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Extensão | ISSN: 1806-6399. Patos de Minas: UNI-
PAM, n. 8, vol. 1, jul. 2011, pp. 12-31; Medicina (Ribeirão Preto) 2015;48(2): 168-74. Disponivel em
http://revista.fmrp.usp.br
http://www.prevencaoupp.com.br/1-sistema-tegumentar/7principais-superficies-de-suporte.html
350
CAPÍTULO
Cuidados Paliativos
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
Cuidados Paliativos
Prof. Dr. Leonardo da Costa Lopes
1. Definição
Os cuidados paliativos são o conjunto de propostas terapêuticas direcionadas a pacientes com
doenças incuráveis, progressivas e com curta expectativa de sobrevida. Caracterizam-se pela ên-
fase no controle de sintomas e não na cura da doença provocadora destes sintomas, tendo por
objetivo obter a melhor qualidade de vida possível ao paciente e para a sua família. São cuidados
multiprofissionais que se dirigem a diferentes esferas de atenção, tais como a biológica, psicoló-
gica, social e espiritual. Procuram integrar valores e preferências da equipe de saúde com os do
próprio paciente e de sua família. Os cuidados paliativos consideram a morte como um fenômeno
natural e, portanto, não a postergam nem a aceleram, buscando manter uma vida o mais ativa
possível até a morte. Procuram evitar a distanásia, condição em que o indivíduo recebe terapêu-
ticas fúteis que não mudam o curso da doença, muitas vezes submetendo o paciente a sofrimento
e mantendo-o longe de seus familiares, como nas unidades de terapia intensiva. É importante
que os médicos estejam treinados para identificar pacientes que apresentam doença ou condição
clínica que possam se beneficiar de um plano de cuidados paliativos, procurando entender os
mecanismos que levam ao sofrimento e buscando meios de aliviá-lo. Os cuidados paliativos, nes-
se sentido, podem ser perfeitamente incorporados também aos tratamentos ditos “curativos” e a
qualquer abordagem terapêutica também dirigida aos pacientes jovens.
No âmbito da paliação, não existem condutas obrigatoriamente proscritas, mas estas deverão ser
avaliadas criticamente, à luz de seus benefícios e potenciais malefícios. Como exemplo, deverão
ser avaliadas na perspectiva do alívio do sofrimento o real benefício do uso de sondas alimenta-
res e urinárias, da obtenção de acessos vasculares, da coleta frequente de exames laboratoriais,
da troca obstinada de antibióticos, da realização de biópsias, cirurgias ou outros exames comple-
xos e dolorosos, da prescrição de dietas e de hidratação venosa. A Tabela 1 aponta as principais
condições clínicas em que se indicam cuidados paliativos:
Fragilidade Extrema, com comprometimento avançados das Insuficiência Cardíaca classe funcional IV, com fra-
capacidades funcionais. ção de ejeção < 20%, refratária ao tratamento clínico.
Demência avançada e outras doenças neurológicas
Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica ou outra pneumopatia em degenerativas, especialmente com complicações
dependência de oxigênio e com dispneia incapacitante. recorrentes pela imobilidade: tais como úlceras,
infecções e desnutrição.
Insuficiência Hepática Child C sem indicação de transplante e Neoplasias Malignas Avançadas em que não há pers-
Insuficiência Renal com Clearence < 15mL/min sem indicação de pectiva curativa; geralmente doença metastática e
transplante. extremamente consumptiva.
2. Controle de Sintomas
De todos os sintomas a serem paliados, a dor é o que recebe maior enfoque, por ser considerado
um importante marcador de qualidade de vida e pela existência de protocolos bem estruturados
para a identificação de sintomas dolorosos e seu tratamento. A Escala Visuo - Análoga e a de Des-
crição Facial (Figura1) são instrumentos para quantificação da dor e a Escala Analgésica proposta
pela Organização Mundial de Saúde (OMS) uma orientação para adequada analgesia (Figura 2).
Fonte: http://enfermagemnossavida.blogspot.com.br
Capítulo 22 353
A dor chega a ser negligenciada em até 50% dos idosos e é considerada o quinto sinal vital. Em
pacientes com declínio cognitivo pode se manifestar como queda do estado funcional, altera-
ções de humor, agitação ou perda de apetite. O mecanismo de dor, se nociceptiva, neuropática
ou psicogênica e, ainda, se aguda ou crônica, auxiliará na escolha da analgesia. As medicações
são divididas em analgésicos não opiodes, opioides e drogas adjuvantes (Tabela 3). Deve ser dada
preferência a drogas com maior facilidade de administração, como as de uso oral, retal e subcutâ-
neo, especialmente nos pacientes tratados no domicílio e que apresentam dificuldade de acesso
vascular. No caso do uso da escala visual analógica, recomenda-se que a dor classificada como
moderada (4-6 pontos) já seja tratada com opioides fracos e que a dor intensa (pontuação de 7
ou mais) receba opioides fortes. Quando forem prescritos opioides, deve-se atentar para efeitos
colaterais comuns, como náuseas, constipação intestinal, sonolência excessiva, depressão respi-
ratória e prurido. Como o sintoma de constipação intestinal é extremamente comum, recomen-
da-se o uso contínuo de laxativos nos pacientes submetidos a terapia contínua com opioides. Os
opioides devem ser prescritos sempre numa dose fixa, respeitando a meia-vida da droga. Deve-se
evitar o uso “apenas se necessário” e sempre deve ser prescrita uma dose de resgaste (1/6 da dose
total) caso o controle ideal do sintoma ainda não tenha sido obtido. No dia seguinte à administra-
ção de resgastes, deve-se considerar um aumento de cerca de 30% da dose total diária prescrita,
com o objetivo de controle contínuo da dor. Medicamentos opioides não devem ser associados
entre si, a fim de se evitar a competição por receptores, prejudicando o controle analgésico.
Dor refratária a
farmacoterapia
DEGRAU 4
Dor Intensa
DEGRAU 3
Procedimentos
Dor Moderada Intervencionistas
+
DEGRAU 2 Opioides Opioides
Dor leve Fortes Fortes
Opioides + +
DEGRAU 1 Fracos Analgésicos Analgésicos
+ AINE
Analgésico AINE
Analgésicos
AINE AINE
Drogas adjuvantes
354
Tabela 3 - Descrição de Analgésicos
A taxa de conversão de opioides usados por via subcutânea/venosa para oral encontra-se na
Tabela 4. Os medicamentos adjuvantes no controle da dor estão descritos na Tabela 5.
Capítulo 22 355
Tabela 5 - Adjuvantes no Controle da Dor
Dentre os demais sintomas a serem paliados, pode-se citar a anorexia, as náuseas, os soluços, a
sialorreia, a xerostomia, a constipação, a diarreia, a dispneia, a tosse e o prurido. A Tabela 5 resu-
me algumas recomendações para cada uma destas condições.
Figura 3 - Hipodermóclise
Fonte: www.cursoananery.com.br
356
Tabela 6 - Paliação de Sintomas nos Cuidados Paliativos
A sedação paliativa está indicada nos casos em que, apesar da tentativa de controle de sintomas,
o paciente apresenta considerável sofrimento físico e psicológico. Neste caso, é obtido o rebaixa-
mento do nível de consciência pela administração de fármacos, sem a intenção de acelerar o pro-
cesso de morte. A administração de analgésicos deve ser mantida. Em geral, são prescritos ben-
zodiazepínicos, como midazolam, em dose de ataque e depois manutenção em infusão contínua
e podem ser associados neurolépticos, como haloperidol ou levomepromazina, principalmente
se houver delirium. Os barbitúricos, como fenobarbital também podem ser utilizados.
3. Estudo de Caso
DIA 1 - Você é chamado para avaliar o sr. José Carlos, 77 anos, internado há 9 dias na enferma-
ria para tratamento de adenocarcinoma do pulmão direito. O tumor foi diagnosticado há cerca
de 4 meses e, na última semana, o paciente vem evoluindo com dispneia intensa. Logo após o
diagnóstico, foi contraindicada cirurgia pela existência de linfonodos mediastinais muito au-
mentados. Recebeu dois ciclos de quimioterapia, mas foi necessário interromper o procedimen-
to por ter apresentado anemia grave e pneumonia, tratadas há 2 meses. Desde o tratamento da
pneumonia, o paciente, que era muito ativo, passou a manifestar astenia crônica, evitando sair
do domicílio e permanecendo boa parte do dia sentado ou deitado. Na última semana, a astenia
tornou-se mais intensa e surgiram náuseas e lombalgia, quando procurou o hospital e foi inter-
nado. Queixa-se também de hiporexia e perda ponderal de 15kg nos últimos 4 meses (pesava
65kg e agora 50kg).
Capítulo 22 357
Ao exame: emagrecido. Lúcido e orientado. Regular estado geral, levemente cianótico, dispneico.
FR: 26 irpm
Foi submetido à realização de radiografia do tórax e da coluna lombar, que estão abaixo.
Fonte: TAVARES, N.T. et al. Anais do XXI Congresso Fonte: SOUZA, F.F. et al.
Nacional de Medicina Interna, Portugal, 2015 Revistas Brasileiras de
Radiologia. vol.38 no.5
São Paulo Sept./Oct. 2005
DIA 2 - Após a avaliação inicial, foi prescrito tramadol 50mg VO 6/6 horas, mas o paciente persis-
tia com muita dor no dia seguinte. Apresentou vômitos, constipação intestinal, distensão abdo-
minal e leve confusão mental.
DIA3 - Apresentou na madrugada uma crise convulsiva. Foi solicitada uma tomografia de crânio.
358
Para discutir em grupo e com seu professor:
1. Qual seu diagnóstico após analisar as radiografias de tórax e coluna lombar deste paciente?
4. Conclusões
• Os cuidados paliativos se constituem em um programa multiprofissional que tem por objetivo
o controle de sintomas no contexto de doenças sem perspectiva curativa.
• A dor, no âmbito dos cuidados paliativos, deve preferencialmente ser aferida por escalas ob-
jetivas. Considerar sempre a necessidade de analgésicos potentes, como opioides em doses
suficientes para o adequado controle da dor.
Referências
American Geriatrics Society Panel on Pharmacological Management of Persistent Pain in Older
Persons. Journal of the American Geriatrics Society. 2009;57:1331.
CREMESP. Cuidado Paliativo. Coordenação Institucional de Reinaldo Ayer de Oliveira. São Paulo:
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, 2008. 689 p.
Capítulo 22 359
ISBN 978-85-93579-05-9
9 788593 579059