Impressao

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 21

AULA 3

LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL

Profª Sarita Aparecida de Oliveira Fortunato


CONVERSA INICIAL

A LDB e sua aplicação na educação infantil, no ensino fundamental e no


ensino médio: introdução

Nesta aula, destacaremos a Lei de Diretrizes e Bases da Educação


Nacional (LDB), Lei n. 9.394/1996, com seus desdobramentos teórico-
metodológicos para a compreensão das relações que se estabelecem entre o
trabalho nas escolas brasileiras de educação infantil, de ensino fundamental, de
ensino médio e as políticas de gestão da educação básica. Cabe-nos interpretar
não apenas a normativa dos parâmetros legais que se instaura com validade
jurídica, mas a efetividade socioeducativa e cultural da lei. Sendo assim, os
diferentes subtemas desta aula, por exemplo: gestão democrática da educação,
segundo a LDB, numa visão de processo em construção, propiciam a
pluralidade de olhares sobre a legislação educacional brasileira (Brasil, 1996).

TEMA 1 – LDB: DESDOBRAMENTOS TEÓRICO-PRÁTICOS, NA ATUAL


CONJUNTURA

Ao longo de quase 25 anos da promulgação da Lei n. 9.394/1996, muitos


desdobramentos teórico-práticos se estabeleceram nos diversos debates,
discursos, estudos e mudanças ocorridos na educação, até o presente momento.
Muitos olhares também se entrecruzaram nas interpretações realizadas por
profissionais da educação e estudiosos da lei (Brasil, 1996).
De acordo com Saviani (2008), a expressão diretrizes e bases não fazia
parte do vocabulário comum dos educadores quando a LDB (Brasil, 1996) foi
sancionada. Portanto, houve necessidade de contextualizar a função
sistematizadora de uma lei de diretrizes e bases para a educação brasileira. Nem
na terminologia pedagógica e nem mesmo na terminologia jurídica usual os
termos diretrizes e bases estiveram presentes até aquele momento. Assim sendo,
na concepção de Saviani (2008, p. 93), aquela lei denotou um

[...] caráter vago, prestando-se a interpretações diversas. Por aí


começaram as dificuldades de tal modo que, mesmo hoje –, quando é
rara uma manifestação a respeito dos problemas da Educação Nacional
que não faça referência às “diretrizes e bases” –, o seu sentido continua
envolvido numa certa penumbra.

2
Para Saviani (2008), pesquisador da legislação brasileira, com base no
Parecer preliminar de Gustavo Capanema (2008, p. 94), o termo diretrizes pode
incluir todo o conjunto de preceitos normativos destinados a regular a estruturação
e a atividade de um serviço ou estabelecimento. A palavra bases veio como que
por acréscimo, para não vir a ter lugar uma interpretação que visasse restringir a
competência federal, em matéria de ensino, para fixação de princípios gerais
(Saviani, 2008). Assim interpretado, podemos afirmar que o caráter amplo da
expressão diretrizes e bases, nesse contexto, é entendido como universal,
referindo-se à totalidade do movimento da educação no Brasil, educação que
atende ou deveria atender a todos, impreterivelmente.
Em 1997, primeiro ano subsequente à homologação da LDB (Brasil, 1996),
ações constitutivas das políticas educacionais se fizeram presentes por meio da
participação ativa e intensa de educadores que estudaram, analisaram e
debateram as questões dúbias da lei. Ao ver da professora Iria Brzezinski (2005),
o movimento mais significativo daquele ano em relação à LDB foi a elaboração do
Plano Nacional de Educação para ser apresentado ao Congresso Nacional,
expresso pelas forças ambivalentes da sociedade política e da sociedade civil no
país.

A sociedade política propôs, sob a coordenação do Instituto Nacional de


Estudos e Pesquisas Educacionais do Ministério da Educação –
Inep/MEC, um Plano que deverá ser enviado ao Congresso Nacional
antes do encerramento da convocação extraordinária de janeiro/98. A
sociedade civil, por sua vez, mobilizou-se por meio dos legítimos
representantes do segmento educacional, elaborando um Plano
Nacional de Educação, também apresentado ao Congresso Nacional. O
Processo de elaboração deste Plano culminou com a realização, em
Belo Horizonte, do II Congresso Nacional de Educação II Coned (6 a
9/11/97). (Brzezinski, 2005)

Esse foi o processo com o qual a elaboração do Plano Nacional


verdadeiramente se iniciou, pela mobilização dos educadores participantes do II
Congresso Nacional de Educação (Coned) em 1997, com tudo documentado e
legalizado para apresentação ao Congresso Nacional (Brzezinski, 2005). Se
entendemos por diretrizes e bases os fins e meios do processo educacional,
entendemos que, ao serem definidos aqueles como termos nacionais, o seu
domínio está voltado especificamente à educação, intencionalmente (práxis
intencional), visto que (como já abordamos), é essa práxis intencional que levará
à construção do sistema de ensino respeitadas as devidas condições de
organização do trabalho pedagógico dentro e fora das escolas.

3
Sobre o direito à educação e o dever de educar, no seu art. 4º a LDB define
que:

Art. 4º - O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado


mediante a garantia de:
I – Educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17
(dezessete) anos de idade, organizada da seguinte forma:
a) pré-escola;
b) ensino fundamental;
c) ensino médio;
II – Educação infantil gratuita às crianças de até 5 (cinco) anos de idade;
III – Atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades
ou superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e modalidades,
preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – Acesso público e gratuito aos ensinos fundamental e médio para
todos os que não os concluíram na idade própria;
V – Acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da
criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – Oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do
educando;
VII – Oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com
características e modalidades adequadas às suas necessidades e
disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as
condições de acesso e permanência na escola;
VIII – Atendimento ao educando, em todas as etapas da educação
básica, por meio de programas suplementares de material didático-
escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde;
IX – Padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a
variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis
ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem;
X – Vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino
fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do
dia em que completar 4 (quatro) anos de idade. (Brasil, 1996)

Ao analisarmos o art. 4º da LDB e seus respectivos incisos, verificamos que


ele traz no seu bojo elementos primordiais para a permanência da criança, do
adolescente e do jovem nos níveis de ensino (Brasil, 1996). É lei que deve ser
cumprida na sua íntegra, mas, pela realidade vivida por muitos brasileiros, isso
não acontece. Se não acontece para todos, os direitos à educação e o dever de
educar estão sendo violados para certa parcela da sociedade. Cabe aos órgãos
públicos competentes (gestão pública), de acordo com suas respectivas funções
e atribuições, fiscalizarem e atenderem a distribuição de renda para a educação,
seu destino e seu cumprimento perante à lei e preencherem as condições
necessárias à construção do sistema educacional.
Todavia, o art. 88 da LDB exige da União, dos estados, do Distrito Federal
e dos municípios uma rápida adaptação à lei:

Art. 88. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios


adaptarão sua legislação educacional e de ensino às disposições desta
Lei no prazo máximo de um ano, a partir da data de sua publicação.

4
§ 1º As instituições educacionais adaptarão seus estatutos e regimentos
aos dispositivos desta Lei e às normas dos respectivos sistemas de
ensino, nos prazos por estes estabelecidos.
§ 2º
O prazo para que as universidades cumpram o disposto nos incisos II e
III do art. 52 é de oito anos. (Brasil, 1996)

Do exposto, conclui-se que interpretar a LDB é questão sine qua non para
atribuir-lhe um sentido que ultrapasse a articulação do legislador para redigir as
leis, trilhando uma compreensão de propostas para o atendimento, de fato das
necessidades sociais nos diferentes momentos em que a LDB é aplicada (Brasil,
1996). Na perspectiva de Pino (2005, p. 20):

Mesmo tratando-se de uma lei maior da educação nacional, a


importância de uma LDB para a sociedade brasileira é sempre relativa
ao conteúdo que os atores conseguem nela inscrever. Tem que se ter
cautela para que as análises da LDB impliquem seu processo de
formulação com as condições históricas, contextualizado dentro de uma
formação igualmente histórica, uma vez que o tratamento a-histórico
desta lei encobria – mais do que iluminaria – ideologias, significados de
seus rasgos de avanço e de conservadorismo e interesses variados e
contraditórios que a permeiam, oriundos dos diferentes grupos sociais
(entre eles os interesses divergentes dos setores da educação
pública/privada).

Sabe-se que a existência de uma política nacional de educação dá a


direção da organização dos sistemas de ensino, afirma a autora Pino (2005). Isso
quer dizer que as questões mais polêmicas que polarizaram as negociações sobre
a LDB foram resolvidas antes da sua aprovação em 20 de dezembro de 1996, de
uma forma um tanto contraditória e arbitrária (Brasil, 1996). Seria ingenuidade
atribuir a essa lei, diz Pino (2005), força ou mesmo potencialidade para provocar
uma revolução da educação no país. “Entretanto, o reordenamento dos sistemas
educativos, inscritos em uma LDB, poderá criar contextos de relações estruturais
de transformação, de reforma e de inovação educacional como parte do processo
de ‘regulação social’” (Pino, 2005, p. 19).
Portanto, o desdobramento dos processos de regulação social na LDB
depende de diversos fatores (Brasil, 1996). Entre eles, podemos reiterar as
concepções de sociedade, Estado e educação que os participantes sociais
envolvidos, vindos do Estado, dos partidos políticos, da área educacional e de
outros grupos da sociedade civil organizada manifestam e pelas quais atuam para
o cumprimento das leis e políticas públicas exaradas para a educação brasileira.
Outro ponto importante a ser destacado são as estratégias e os mecanismos de
controle social desenvolvidos pelos diferentes protagonistas, os quais darão forma
aos diversos níveis de relações sociais como a organização das instituições

5
escolares, a gestão democrática, os encaminhamentos didático-metodológicos, a
avaliação educacional, a alfabetização, o registro da documentação escolar, entre
tantos outros.

TEMA 2 – APLICAÇÃO DA LDB NA EDUCAÇÃO BÁSICA: GESTÃO


DEMOCRÁTICA EM CONSTRUÇÃO

Em face das observações anteriores, questiona-se: a LDB (Brasil, 1996)


sistematiza a educação nacional brasileira? Na verdade, afirma Saviani (2008),
essa lei não sistematiza a educação nacional na sua íntegra porque, como a
anterior (Lei n. 5.692/1971 – Brasil, 1971) ela trata apenas do ensino.
“Inegavelmente, por se ter limitado deliberadamente à esfera do ensino e por
manter um critério mais uniforme no uso do termo “sistema”, a nova Lei demonstra
maior coerência interna do que a anterior. Quanto à coerência externa, no entanto,
exige maiores reparos” (Saviani, 2008, p. 117).
Pensar a educação no Brasil não tem sido tarefa fácil. Como educadores,
é preciso tomarmos consciência das necessidades atuais, analisarmos as
diversas situações e realidades, vislumbrarmos intervenções adequadas em
termos de políticas públicas educacionais voltadas para a transformação dessas
realidades no que se refere à promoção humana. Esse é um dos principais
objetivos da ação dos atuais educadores brasileiros em prol da educação do país.
Assim,

Impõe-se, pois, atuar de modo sistematizado nas estruturas, tanto ao


nível microeducacional, quanto da macroeducação. Essa atividade
sistematizada exige capacidade de reflexão e fundamentação teórica.
Desde que se faz necessário responder a problemas existenciais
concretos, torna-se inviável a adoção pura e simples de uma teoria já
existente tal como o pragmatismo, psicologismo, naturalismo,
sociologismo etc. (Saviani, 2008, p. 119)

O que o autor quer nos esclarecer é que, ao considerarmos o


educando/estudante apenas sob a perspectiva biológica, adotaremos o ponto de
vista do utilitarismo pedagógico que é representado pelo pragmatismo1,

1 Com base nos estudos de W. James (1931); Van Riet, N. Abbagnano, Y. A. Visalberghi (1964) e
Gustavo Cirigliano (1969), Saviani (2008) descreve que o pragmatismo parte do princípio de que
a verdade existe em termos de utilidade para a vida, bem como amplia os tipos de vida e se
constitui numa teoria educacional não totalmente errônea, mas um tanto ambígua, porque não
distingue os vários níveis de vida do ser humano, acabando por reduzir tudo ao útil. Das posições
pragmatistas em educação, o autor ressalta como maior repercussão e maior desenvolvimento a
teoria de Dewey. Relembrando que o método de ensino de Dewey se articula em cinco passos: 1)
situação problemática; 2) identificação do problema; 3) observação e levantamento de dados; 4)
formulação de uma hipótese de solução; e 5) verificação da hipótese.
6
observando que, ao educar, não podemos deixar de levar em conta, além da
realidade física, a realidade biológica do educando. Já na perspectiva psicológica,
é constado que a criança possui um mundo interior2 constituído de modo
complexo. Assim, ao educar, não podemos deixar de levar em conta, além da
realidade física e biológica, a realidade psicológica do educando, pois a
aprendizagem ocorre de acordo com o quadro psicológico de cada pessoa e se
dá com base em vivências internas. “Ela é, no fundo, a incorporação ao eu anterior
de elementos assimilados do ambiente. E a aprendizagem é também função das
ações anteriores, das emoções, dos sentimentos, temperamento” (Saviani, 2008,
p. 40).
Cabe reafirmar que a indissociação entre realidade física, biológica e
psicológica do educando, no contexto da educação, comporá o que é natural da
realidade humana, e a concepção educacional que se limita a esse quadro natural
denomina-se naturalismo pedagógico3, diz Saviani (2008, p. 43), tendo como
representante exponencial, dessa trajetória, Rousseau (1966).
E a estrutura do homem está completa, então? Não. Necessário se faz
incluir o homem como ser cultural.

E prosseguindo nas observações, constato que a estrutura do homem


não se esgota nas três facetas descobertas. A criança, além de ser um
corpo vivo dotado de uma interioridade própria, ela está situada num
contexto espacial e temporal que a determina. Além do meio físico
(natural) já referido, ela vive num meio humano (artificial), construído
pelo homem; ela vive numa época determinada (o século XXI) que tem
problemas específicos. (Saviani, 2008, p. 45, grifo do original)

Atualmente, a educação básica corresponde ao ensino provido às faixas


etárias dos 4 aos 17 anos, sendo obrigatória e gratuita nos estabelecimentos
públicos oficiais de ensino. E, nesse sentido, pode ser constatado, por exemplo,
que, para a criança e/ou o adolescente aprender, é preciso que sejam respeitados
o seu tempo de aprendizagem e a prática de se exercitar, por meio de diversas

2 Nas palavras de Saviani (2008, p. 40), “[...] este mundo interior, é, pois, bastante complicado,
mas muito importante para o problema da educação. Cada um tem sua maneira de encarar as
coisas. As divergências de pensamentos se explicam, muitas vezes, pelo a priori psicológico de
cada um.”
3 Rousseau (1966) desenvolve as suas ideias pedagógicas propondo a educação pela natureza.

Em 1753, no Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens,


reafirma e desenvolve a ideia de que o homem, de onde quer que seja, e/ou qualquer que sejam
suas opiniões tem sua base na natureza, pois esta nunca mente. “Tudo que dela vier será verdade,
e se nisso houver algo de falso deve-se ao que introduzi por minha conta, sem o desejar.” Já na
obra Emílio, Rousseau (1761, citado por Saviani, 2088, p. 44) afirma que o “[...] duro jugo que a
natureza impõe ao homem, o pesado jugo da necessidade, sob o qual é preciso que todo o ser
finito se curve; veja esta necessidade nas coisas, nunca no capricho dos homens, que o freio que
o retém esteja na força e não na autoridade.”
7
estratégias e atividades, os conteúdos trabalhados. Num exemplo prático,
podemos citar a vivência de uma criança ao aprender a andar de bicicleta. No
início, ela vai precisar de ajuda, em seguida vai praticar esse exercício, aprender
a dominar as suas frustrações, a construir técnicas próprias de direção e equilíbrio,
para mais tarde não precisar repetir constantemente as mesmas ações. Após sua
aprendizagem básica, somente vai aprimorar a forma e a sua segurança ao
manusear a bicicleta e outras dificuldades que aparecerão nesse contexto de
vivência/experiência.
Sendo assim, a LDB, nos seus art. 22 e 23, trata das finalidades da
educação básica, a saber:

Art. 22. A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando,


assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da
cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos
posteriores.
Art. 23. A educação básica poderá organizar-se em séries anuais,
períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos,
grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros
critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse
do processo de aprendizagem assim o recomendar.
§ 1o A escola poderá reclassificar os alunos, inclusive quando se tratar
de transferências entre estabelecimentos situados no País e no exterior,
tendo como base as normas curriculares gerais.
§ 2o O calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais,
inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de
ensino, sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta
Lei. (Brasil, 1996)

Para a formação comum a que se refere o art. 22 da lei, necessário se faz


reiterar que a base curricular é composta de: base nacional comum (para todos
e garantida pela Constituição Federal) e parte diversificada (ligada às
especificidades locais e/ou regionais) (Brasil, 1988, 1996). As duas partes são
indissociáveis. Portanto, devem se complementar na prática do ensino e da
aprendizagem ofertados. Quanto à organização da educação básica, podemos
crer que a autonomia pedagógica se faz presente se as instituições escolares
tiverem um bom entendimento de gestão democrática, transparência nas decisões
e compromisso com a oferta da melhor aprendizagem para todos os estudantes,
respeitando sempre as diferenças das formas de aprender. Para retificar isso veja
o art. 26 da lei, bem como seus respectivos parágrafos, do 1º ao 10º, sobre o
estudo das disciplinas obrigatórias, a saber:

Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do


ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada,
em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma

8
parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da
sociedade, da cultura, da economia e dos educandos.
§ 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger,
obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o
conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,
especialmente do Brasil.
§ 2o O ensino da arte, especialmente em suas expressões regionais,
constituirá componente curricular obrigatório da educação básica.
§ 3º A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é
componente curricular obrigatório da educação básica, sendo sua
prática facultativa ao aluno:
I – que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a seis horas;
II – maior de trinta anos de idade;
III – que estiver prestando serviço militar inicial ou que, em situação
similar, estiver obrigado à prática da educação física;
IV – amparado pelo Decreto-Lei no 1.044, de 21 de outubro de 1969;
V – (VETADO)
VI – que tenha prole.
§ 4º O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das
diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro,
especialmente das matrizes indígena, africana e europeia.
§ 5º No currículo do ensino fundamental, a partir do sexto ano, será
ofertada a língua inglesa.
§ 6º As artes visuais, a dança, a música e o teatro são as linguagens
que constituirão o componente curricular de que trata o § 2o deste artigo.
§ 7º A integralização curricular poderá incluir, a critério dos sistemas de
ensino, projetos e pesquisas envolvendo os temas transversais de que
trata o caput.
§ 8º A exibição de filmes de produção nacional constituirá componente
curricular complementar integrado à proposta pedagógica da escola,
sendo a sua exibição obrigatória por, no mínimo, 2 (duas) horas mensais.
§ 9º Conteúdos relativos aos direitos humanos e à prevenção de todas
as formas de violência contra a criança e o adolescente serão incluídos,
como temas transversais, nos currículos escolares de que trata o caput
deste artigo, tendo como diretriz a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990
(Estatuto da Criança e do Adolescente), observada a produção e
distribuição de material didático adequado.
§ 9º-A. A educação alimentar e nutricional será incluída entre os temas
transversais de que trata o caput.
§ 10. A inclusão de novos componentes curriculares de caráter
obrigatório na Base Nacional Comum Curricular dependerá de
aprovação do Conselho Nacional de Educação e de homologação pelo
Ministro de Estado da Educação. (Brasil, 1996)

Saviani (2008), nos seus estudos sobre legislação educacional, chama a


atenção para se tomar cuidado com a formação do chamado homem comum,
aquele que é imerso no cotidiano e incapaz de ultrapassar o domínio do prático-
utilitário para perceber as implicações e consequências de sua própria atividade
prática. Ele não pode desprezar a teoria e considerar que a prática se basta por
si mesma. Há que se superar essa concepção fragmentária de educação para que
as prerrogativas da LDB (Brasil, 1996) possam ser concretizadas de acordo com
as necessidades dos estudantes e do povo brasileiro em geral.
Evidentemente, o sistema educacional deverá preencher três requisitos
apontados por Vázquez (2011), na sua obra clássica Filosofia da práxis, tais como:
a intencionalidade (sujeito-objeto); o conjunto (unidade-variedade); e a coerência
9
(interna-externa), acrescentando também as condições impostas por uma
educação sistematizada. Para clarearmos um pouco mais os conceitos,
passaremos a esmiuçar a LDB (Brasil, 1996) nas três esferas da educação básica:
educação infantil, ensino fundamental e ensino médio.
Nessa ótica, a discussão sobre a democratização da gestão escolar remete
à necessidade de se questionar o papel e a função social da educação e da
escolarização, bem como de se repensar os vínculos e compromissos que
norteiam a natureza política e social da gestão democrática no país. É preciso,
portanto, ir desde as posturas de participação restrita e funcional ligada às novas
formas de controle social, por exemplo a qualidade total, até a busca pela
participação efetivamente cidadã.
A gestão democrática do planejamento educacional, nessa acepção, é
entendida como processo de aprendizado e de luta política no âmbito social e
educacional, o qual não deve se ater somente aos limites da prática educativa,
mas vislumbrar, nas especificidades dessa prática social, a possibilidade de criar
formas de exercer a autonomia pedagógica para o aprendizado do jogo
democrático em construção, transpondo, assim, por meio da prática da gestão
escolar, as estruturas de poder autoritário que permeiam as relações sociais no
seio das práticas educativas (Fortunato; Bruno, 2015).

TEMA 3 – EDUCAÇÃO INFANTIL NA LDB: PERSPECTIVAS DE


DESENVOLVIMENTO DA INFÂNCIA

Sob a influência das circunstâncias concretas de vida da criança e do lugar


que ela objetivamente ocupa no sistema das relações humanas é que se
preconizam mudanças e alterações no desenvolvimento infantil. De acordo com
os estudos de Leontiev (1998, p. 59), a infância é o período da vida em que o
mundo da realidade humana que cerca a criança abre-se cada vez mais para ela.
Abre-se no sentido da possibilidade de a criança assimilar o mundo objetivo como
um mundo de objetos humanos, no qual ela reproduz ações humanas com eles.
Durante a infância, o mundo ao redor da criança se decompõe como se fosse em
dois grupos distintos, reitera Leontiev (1998).
O primeiro círculo relacional se caracteriza pelas pessoas diretamente
ligadas à criança a partir de seu nascimento (mãe, pai, irmãos ou aquelas que
ocupam lugar junto à criança), cujas relações são de extrema importância, pois
são elas que determinarão as relações futuras do indivíduo com o resto do mundo.
10
Do primeiro círculo relacional surgirá o segundo círculo, que é mais amplo e
complexo, formado por todas as demais pessoas com as quais a criança vai se
relacionar ao longo de sua vida. As relações da criança no segundo grupo
dependem da mediação que ela estabeleceu com o primeiro, ou seja, com seu
núcleo familiar.
É nessa perspectiva que a criança, em toda sua atividade e
desenvolvimento mediados e incentivados pelo adulto, necessita ultrapassar os
estreitos limites da manipulação dos objetos que a cercam, para penetrar em um
mundo mais amplo de ações humanas. Teoricamente, no processo de
desenvolvimento infantil, independentemente da produtividade concreta que a
criança realize por meio de seus atos, as suas necessidades vitais são satisfeitas
pelos adultos. Sobre isso, Leontiev (1998, p. 60) afirma que:

Uma criança reconhece sua dependência das pessoas que a cercam


diretamente. Ela tem de levar em conta as exigências, em relação a seu
comportamento, das pessoas que a cercam, porque isto realmente
determina suas relações pessoais, íntimas, com essas pessoas. Não
apenas seus êxitos e seus malogros dependem dessas relações, como
suas alegrias e tristezas também estão envolvidas com tais relações e
têm a força de motivação [...]. As relações de uma criança dentro de um
grupo de crianças são também peculiares. Os vínculos que as crianças
de três a cinco anos estabelecem entre si constituem ainda, em grande
parte, o elemento pessoal – “privado”, por assim dizer – em seu
desenvolvimento, que conduz a um verdadeiro espírito de grupo.

Nesse aspecto, ao estudar o desenvolvimento infantil, o referido autor


sugere se começar pela análise do desenvolvimento da atividade da criança
nas relações sociais, ou melhor, de como uma determinada atividade é construída
consideradas as condições concretas de vida dessa criança (Leontiev, 1998).
Assim, com esse modo de estudo, pode-se elucidar o papel tanto das condições
externas de sua vida, como das potencialidades que a criança possui. Esse
método de estudo, baseado na análise do conteúdo da própria atividade infantil
em desenvolvimento, leva à compreensão do papel condutor da educação e da
criação, pois, nas palavras de Leontiev (1998), opera precisamente na atividade
e na atitude tomada pela criança diante da realidade.
Na concepção de Wallon (1998), o ser humano é organicamente social e
seu ato mental desenvolve-se do ato motor. O grande eixo do desenvolvimento
mental infantil está na motricidade como parte do conjunto do funcionamento do
indivíduo na sua totalidade. Para Wallon (1998), o termo motor é sinônimo de
psicomotor, pois seus estudos estão centrados nos órgãos do movimento

11
caracterizados pela musculatura e pelas estruturas cerebrais, as quais são
responsáveis pela organização do movimento pela criança.
Entretanto, para Vigotsky (1994), a percepção de uma criança, como ser
humano que é, não se desenvolve como uma continuidade direta e aperfeiçoada
das formas de percepção animal, nem mesmo daqueles animais que estão mais
próximos da espécie humana. Experimentos realizados por aquele autor
conduziram à descoberta de algumas leis básicas que caracterizam as formas
humanas superiores de percepção. Por meio de um conjunto de observações,
Vigotsky (1994) reiterou que a rotulação4 é a função primária da fala nas crianças
pequenas. Vigotsky (1994) afirma que a rotulação capacita a criança a escolher
um objeto específico e isolá-lo de uma situação global por ela percebida. Portanto,

Pelas palavras, as crianças isolam elementos individuais, superando,


assim, a estrutura natural do campo sensorial e formando novos
(introduzidos artificialmente e dinâmicos) centros estruturais. A criança
começa a perceber o mundo não somente através dos olhos, mas
também através da fala. Como resultado, o imediatismo da percepção
“natural” é suplantado por um processo complexo de mediação; a fala
como tal torna-se parte essencial do desenvolvimento cognitivo da
criança. (Vigotsky, 1994, p. 43)

Os mecanismos intelectuais relacionados à fala da criança, no seu


processo de desenvolvimento, adquirem então uma nova função, a saber: a
percepção verbalizada (estágio superior), não mais se limitando ao ato de rotular,
mas ao ato de verbalizar com significado, de acordo com um contexto vivenciado.
Essa mudança, por sua vez, atinge formas mais complexas da percepção
cognitiva. Faz-se necessário saber que a percepção na criança é parte de um
sistema dinâmico de comportamento.
O resultado mais notável disso, na concepção de Vigotsky (1994), reside
na compreensão de que todo o processo de seleção é externo e concentrado na
esfera motora, o qual permite observar, nos movimentos da criança, a verdadeira
natureza do próprio processo de escolha. “Passar os olhos por um gráfico dos
movimentos de uma criança é suficiente para qualquer um se convencer da
natureza motora básica do processo” (Vigotsky, 1994, p. 45). Em resumo, os

4 Em relação ao estudo da linguagem infantil, Vigotsky (1994) reitera que a fala requer um
processamento sequencial, bem como o papel da linguagem na percepção infantil é surpreendente
devido às tendências opostas implícitas na natureza dos processos de percepção visual e da
linguagem. Elementos independentes num campo visual são percebidos simultaneamente; nesse
sentido, a percepção visual é integral. Ao passo que, na fala, os elementos são rotulados
separadamente, para após isso serem conectados numa estrutura de sentença, de frase, tornando
a fala essencialmente analítica.
12
processos coincidem quase que exatamente: movimento e percepção não se
separam.
Em seu raciocínio, Vigotsky (1994) crê que, além de reorganizar o seu
campo visual-espacial, a criança, com o auxílio da fala, cria um campo temporal
que lhe é tão perceptivo e real quanto o visual, pois, ao desenvolver sua
linguagem, por intermédio da fala, ela adquire a capacidade de dirigir sua atenção
de uma forma dinâmica, percebendo mudanças na sua situação imediata e em
situações futuras.
Nessa mesma via, Luria (1998) exemplifica o assunto dizendo que, para
uma criança ser capaz de ler, escrever ou anotar alguma coisa, são necessárias
duas condições:

1. as coisas ao seu redor devem ser diferenciadas de forma interessante, por


coisas que gostaria de possuir ou com as quais brinca, ou seja, por aquilo
que possui um significado funcional para ela;
2. a criança, por meio desses subsídios, deve conseguir controlar seu próprio
comportamento, e isso acontece porque, quando a criança desenvolve sua
relação funcional com as coisas do mundo, é aí que se concretizam as
complexas formas intelectuais do comportamento infantil e seu respectivo
desenvolvimento (Fortunato, 2016).

Nesse sentido, os programas, a organização do trabalho pedagógico, os


estudos e pesquisas sobre o desenvolvimento infantil, as leis que direcionam a
educação pré-escolar de qualidade, a escola e seu espaço físico ajudam a criança
a perceber o contexto formal em que o aprendizado acontece. Todos esses
importantes elementos influenciam o aprendizado da criança e seu
comportamento posterior. Observe o que regem os art. 29, 30 e 31 da LDB sobre
a finalidade da formação da criança de 0 a 5 anos:

Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem


como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco)
anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade.
Art. 30. A educação infantil será oferecida em:
I – creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos
de idade;
II – pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade.
Art. 31. A educação infantil será organizada de acordo com as seguintes
regras comuns:
I – avaliação mediante acompanhamento e registro do desenvolvimento
das crianças, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao
ensino fundamental;
II – carga horária mínima anual de 800 (oitocentas) horas, distribuída por
um mínimo de 200 (duzentos) dias de trabalho educacional;

13
III – atendimento à criança de, no mínimo, 4 (quatro) horas diárias para
o turno parcial e de 7 (sete) horas para a jornada integral;
IV – controle de frequência pela instituição de educação pré-escolar,
exigida a frequência mínima de 60% (sessenta por cento) do total de
horas;
V – expedição de documentação que permita atestar os processos de
desenvolvimento e aprendizagem da criança. (Brasil, 1996)

Malaguzzi (1999), numa entrevista sobre a escola para crianças pequenas,


nos chama a atenção para o fato de tomarmos o cuidado para que esse espaço
institucional não seja preparatório e tenha a tendência de continuidade com a
escola elementar, pois, como educadores, podemos ficar prisioneiros de um
modelo de educação e formação que pode terminar como um funil.

Basta dizer que a escola para crianças pequenas precisa responder a


elas um rodeio gigantesco, onde aprendem como cavalgar 100 cavalos,
reais ou imaginários. Como se aproximar de um cavalo, como o acariciar
e como permanecer próximo a ele são aspectos de uma arte que pode
ser aprendida. Se existem regras, as crianças podem aprendê-las. Se
elas caírem, poderão montar novamente [...]. O que sabemos realmente
é que estar com crianças é trabalhar menos com certezas e mais com
incertezas e inovações. (Malaguzzi, 1999, p. 101)

As características da abordagem de Reggio Emilia (citado por Malaguzzi,


1999)5 desafiam crenças e práticas tradicionais de trabalho com a educação
infantil e, contemplam, nesse contexto, a formação integral da criança como
estabelecido no art. 29 da LDB (Brasil, 1996). Cumulativamente, em se tratando
da legislação educacional, essas concepções de educação para a fase infantil
contribuem para um melhor entendimento dos processos de desenvolvimento da
criança nessa faixa etária, bem como oferecem uma base poderosa para um
exame mais atento dos princípios teóricos que orientam as interpretações
educacionais da prática apropriada às necessidades infantis.

TEMA 4 – ENSINO FUNDAMENTAL

Como foi discutido anteriormente, o termo educação básica, na LDB, está


acompanhado de um amplo conjunto de artigos, por exemplo, da formação básica
comum dos conteúdos mínimos das três etapas do ensino (inciso IV do art. 9º),

5O sistema de Reggio Emilia, criado, no norte da Itália, por Lóris Malaguzzi (1999) – um intelectual
e jovem professor italiano –, em 1963 e vigente até os dias atuais, começou a ganhar destaque
mundial por volta de 1991. O diferencial do sistema é pensar nas crianças como indivíduos cheios
de potencial e possibilidades para o presente e para o futuro. “Descrito sucintamente, ele é uma
coleção de escolas para crianças pequenas, nas quais o potencial intelectual, emocional, social e
moral de cada criança é cuidadosamente cultivado e orientado. O principal veículo didático envolve
a presença dos pequenos em projetos envolventes, de longa duração, realizados em um contexto
belo, saudável e pleno de amor” (Gardner, 1999).
14
da formação comum no art. 22, da base nacional comum dos art. 26, 39 e 64
(Brasil, 1996). Para o ensino fundamental, na LDB, o art. 32 traz no seu bojo o
objetivo principal para a formação básica do estudante e discorre da seguinte
forma:

Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove)


anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade,
terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante:
I – o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios
básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;
II – a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da
tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;
III – o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista
a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e
valores;
IV – o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade
humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social.
(Brasil, 1996)

Segundo o art. 208, parágrafo 1º da Constituição Federal, “o acesso ao


ensino fundamental obrigatório e gratuito é direito público e subjetivo” (Brasil,
1988). Assim, esse nível de ensino tem sido priorizado nos últimos anos, segundo
afirma Dourado (2006), chegando à sua quase universalização no que se refere à
garantia do acesso. O que podemos evidenciar como um grande desafio no
contexto do cumprimento das metas é a garantia de condições de permanência
com qualidade a uma pequena parcela das crianças em idade escolar que ainda
estão fora da escola. “Tais avanços só se efetivarão se forem otimizados os
processos formativos de estudantes e professores, os processos de gestão e de
financiamento, visando superar questões como distorção idade-série, evasão,
entre outras” (Dourado, 2006, p. 38).
Faz-se propício reiterar que o art. 32 da LDB, parágrafo 5º, trata de uma
questão muito importante em relação ao currículo do ensino fundamental, que,
obrigatoriamente, terá que seguir os conteúdos postos no Estatuto da Criança e
do Adolescente – ECA (Lei n. 8.069/1990), em relação aos direitos das crianças
e dos adolescentes do país, bem como proporcionar a produção e distribuição de
materiais didáticos adequados a essa temática de cunho social (Brasil, 1990,
1996). Defender os direitos da infância e da adolescência é, portanto, conteúdo
curricular.

15
TEMA 5 – LEI N. 13.415/2017: O “NOVO” ENSINO MÉDIO

Considerando o importante papel do ensino médio nos processos


formativos dos estudantes e a baixa cobertura garantida a ele na trajetória das
mudanças educacionais, ainda que esse nível de ensino tenha vivenciado
significativas taxas de crescimento nos últimos anos, no setor público, Dourado
(2006) nos chama a atenção para o cumprimento (de fato) das metas previstas no
Plano Nacional da Educação (PNE), Lei n. 13.005/2014, para o decênio
2014/2024, que definiu 10 diretrizes que devem guiar a educação brasileira nesse
período e estabeleceu 20 metas a serem cumpridas na vigência da lei (Brasil,
2014).
Essa mesma lei reitera o princípio de cooperação federativa da política
educacional, já presente na Constituição Federal de 1988 e na LDB (Brasil, 1988,
1996, 2014), ao estabelecer que “A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios atuarão em regime de colaboração, visando ao alcance das metas e à
implementação das estratégias objeto deste Plano” e que “[...] Caberá aos
gestores federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal a adoção das
medidas governamentais necessárias ao alcance das metas previstas neste PNE”
(Brasil, 2014).
Nesse sentido, a meta 3 do PNE, referente ao ensino médio, prevê
universalizar até 2016 (meta não atingida ainda) o atendimento a toda a população
de 15 a 17 anos e elevar, até o final do período de vigência do PNE, em 2024, a
taxa líquida de matrículas nessa última etapa da educação básica para 85% (meta
a ser atingida). Quanto ao indicador 3A, que se refere ao percentual da
população de 15 a 17 anos que frequenta a escola ou já concluiu a educação
básica, conforme informações atuais do Ministério da Educação (MEC), a meta
prevista é 100%, mas a situação atual aponta para 84,3% atingida até o momento.
Já o indicador 3B, sobre o percentual da população de 15 a 17 que frequenta o
ensino médio ou possui educação básica completa, a meta prevista é de 85% para
55,3% apresentada na situação atual (Brasil, 2014). Observe o que rege o art. 35
da LDB:

Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração
mínima de três anos, terá como finalidades:
I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos
no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;
II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para
continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com

16
flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores;
III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a
formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do
pensamento crítico;
IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos
processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de
cada disciplina. (Brasil, 1996)

Portanto, cabe perceber que, no tocante à otimização dos processos de


gestão e de financiamento, o ensino médio ainda necessita de adequada
articulação entre esses dois processos para atingirmos a melhoria das condições
de oferta desse nível de ensino. Nesse sentido, a Lei n. 13.415/2017, que propõe
a reforma do ensino médio, oferece muitos desafios à educação nessa última fase
da educação básica, os quais precisam ser sanados (Brasil, 2017). De acordo
com os estudos de Ramos e Heinsfeld (2019), em consonância com os
Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (Brasil, 2000, p. 9) e a LDB
(Brasil, 1996), essa etapa da educação escolar passou a ter uma nova identidade,
“[...] determinando que Ensino Médio é Educação Básica”. Dessa forma, reiteram
as autoras, “[...] esse nível de ensino torna-se direito de todo cidadão brasileiro”
(Ramos; Heinsfeld, 2019).
Com o objetivo de atingir as finalidades mencionadas, as Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (as quais trabalharemos com mais
detalhes posteriormente) possuem fundamentos importantes como: a pesquisa
direcionada ao princípio pedagógico; o trabalho como princípio educativo; a
formação integral do estudante; a sustentabilidade ambiental como meta
universal; a educação em face dos direitos humanos; a indissociabilidade entre
educação e prática social, bem como a consideração da historicidade dos
conhecimentos e dos sujeitos do processo educativo no que se refere ao ensino
e à aprendizagem (Brasil, 2013). Outra finalidade a ser considerada é a
perspectiva de interdisciplinaridade e a diversidade no que tange as culturas
subjacentes aos estudantes. Nesse sentido, a integração entre educação e
dimensões de trabalho se faz presente na ciência, na tecnologia e na cultura como
bases da proposta e do desenvolvimento curricular, afirma Silva (2011).
Temos, cada vez mais, que possuir uma visão histórica e crítica da trajetória
do ensino médio no Brasil, no sentido de salientarmos que a sua reforma abrange
o sistema educacional como um todo (escolas públicas e privadas). Para Campos
(2018, p. 92), “ambas as redes escolares terão que se adaptar e construir arranjos

17
curriculares próprios que, sistematicamente, deverão possuir unidade com suas
identidades e seus projetos político-pedagógicos.”
Muito temos a trilhar ainda no âmbito dessa última etapa da educação
básica diante da complexa realidade por que passa o mundo na atual conjuntura.
Os resultados em termos de avaliação para o ensino médio brasileiro não são dos
melhores, é o que apontam as pesquisas atuais, demonstrando um significativo
aumento das taxas de reprovação, abandono e evasão a cada ano. Não podemos
deixar esgotar nossa análise somente nos documentos propositivos ou mesmo no
processo de elaboração das leis e reformas, mas, como tão bem define Silva
(2011, p. 66), avançarmos para a investigação dos processos por meio dos quais
tais proposições tensionam e são tensionadas nos momentos em que a escola e
seus sujeitos tomam contato e dialogam com os dispositivos normativos oficiais,
com suas referências explícitas e implícitas.

18
REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial


da União, Brasília, 5 out. 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em:
27 fev. 2021.

_____. Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Diário Oficial da União, Brasília,


12 ago. 1971. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5692.htm>. Acesso em: 28 fev. 2021.

_____. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Diário Oficial da União, Brasília, 16


jul. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>.
Acesso em: 28 fev. 2021.

_____. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União,


Brasília, 23 dez. 1996. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 27 fev. 2021.

_____. Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014. Diário Oficial da União, Brasília,


26 jun. 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2014/lei/l13005.htm>. Acesso em: 28 fev. 2021.

_____. Lei n. 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Diário Oficial da União,


Brasília, 17 fev. 2017. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13415.htm>.
Acesso em: 28 fev. 2021.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Secretaria de


Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Secretaria de
Educação Profissional e Tecnológica. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais
da Educação Básica. Brasília, 2013. 562 p.

BRZEZINSKI, I. LDB interpretada: diversos olhares se entrecruzam. 9. ed. São


Paulo: Cortez, 2005.

CAMPOS, C. de M. Base Nacional Comum Curricular BNCC: uma reflexão para


além da definição normativa. Fortaleza: Editora Caminhar, 2018.

DOURADO, L. F. Plano Nacional de Educação: avaliações e retomada do


protagonismo da sociedade civil organizada na luta pela educação. In:

19
FERREIRA, N. S. C. (Org.). Políticas públicas e gestão da educação:
polêmicas, fundamentos e análises. Brasília: Líber Livro Editora, 2006. p. 21-50.

GARDNER, H. Perspectivas complementares sobre Reggio Emilia. In:


EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. (Org.). As cem linguagens da
criança: a abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância.
Tradução: Dayse Batista. Porto Alegre: Artmed, 1999.

FORTUNATO, S. A. de O. O trabalho infantil e as políticas públicas para sua


erradicação no Brasil: o pensar sobre a infância e a educação. 260 f. Tese
(Doutorado em Educação) – Universidade Tuiuti do Paraná, Curitiba, 2016.

FORTUNATO, S. A. de O.; BRUNO, C. R. Infância e educação: a gestão do


planejamento de ensino sob o “olhar” de Walter Benjamin. In: EDUCERE, 13.,
2015, Curitiba. Anais... Curitiba: PUCPR, 2015.

LEONTIEV, A. N. Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da psique infantil.


In: VIGOTSKI, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem,
desenvolvimento e aprendizagem. Tradução: Maria da Penha Villalobos. 6. ed.
São Paulo: Ícone, 1998. p. 59-83.

LURIA, A. R. Diferenças culturais de pensamento. In: VIGOTSKI, L. S.; LURIA, A.


R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. Tradução:
Maria da Penha Villalobos. 6. ed. São Paulo: Ícone, 1998. p. 39-58.

MALAGUZZI, L. Se os currículos são encontrados nas crianças. In: EDWARDS,


C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. (Org.). As cem linguagens da criança: a
abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Tradução: Dayse
Batista. Porto Alegre: Artmed, 1999. p. 100-101.

PINO, I. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação: a ruptura do espaço social e a


organização da educação nacional. In: BRZEZINSKI, I. LDB interpretada:
diversos olhares se entrecruzam. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2005. p. 19-42.

RAMOS, F. R. O.; HEINSFELD, B. D. de S. S. Reforma do ensino médio de 2017


(Lei nº 13.415/2017): um estímulo à visão utilitarista do conhecimento. In:
EDUCERE, 15., 2019, Curitiba. Anais... Curitiba: PUCPR, 2019.

SAVIANI, D. Educação brasileira: estrutura e sistema. 10. ed. Campinas: Autores


Associados, 2008.

20
SILVA, M. R. da. Perspectivas curriculares contemporâneas. 1. ed. Curitiba:
Ibpex, 2011.

VÁZQUEZ, A. S. Filosofia da práxis. Tradução: Maria Encarnación Moya. 2. ed.


Buenos Aires: Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales; São Paulo:
Expressão Popular, 2011.

VIGOTSKY, L. S. Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar.


In: VIGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem,
desenvolvimento e aprendizagem. Tradução: Maria da Penha Villalobos. 6. ed.
São Paulo: Ícone, 1994. p. 103-117.

WALLON, H. P. H. A evolução psicológica da criança. Lisboa: Edições 70,


1998.

21

Você também pode gostar