Ascensão Da Horda - Christie Golden
Ascensão Da Horda - Christie Golden
Ascensão Da Horda - Christie Golden
WORLD OF WARCRAFT®
A ASCENSÃO DA HORDA
CHRISTIE GOLDEN
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Capitulo 1
O que poderia ter acontecido se esses eventos não tivessem se desenrolado, nem
mesmo o sábio xamã Drek'Thar pode dizer. Os caminhos do Destino são muitos
e nenhum ser sensato deveria se aventurar no enganosamente agradável
caminho do "se". O que aconteceu, aconteceu; meu povo deve carregar tanto a
vergonha quanto as glórias de nossas escolhas.
Este conto não é o da Horda que existe hoje, uma organização desprendida de
orcs, taurens, trolls, renegados e elfos sangrentos, mas a ascensão da primeira
Horda. Seu nascimento, como o de qualquer infante, foi marcado por sangue e
dor e seus gritos inclementes pela vida significavam morte para seus inimigos.
Para um conto tão violento e sinistro, ele começa pacificamente entre os montes
e vales de uma terra verdejante chamada Draenor...
O ritmo dos tambores ninava os jovens orcs, mas Durotan do clã Frostwolf
estava acordado. Estava deitado com os outros no chão da barraca acumulado
de barro. Um enchimento de palha e uma grossa pele de fenoceronte o
protegiam do frio de doer os ossos. Mesmo assim, ele sentia as vibrações das
batidas viajarem através da terra e para dentro de seu corpo enquanto seus
ouvidos eram acariciados pelo som ancestral. Como ansiava sair e juntas-se a
eles!
Os orcs não lutavam entre si, mas também não eram particularmente sociáveis.
Cada clã ficava na sua, com suas próprias tradições, estilos, vestimentas,
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estórias e xamã. Havia variações de dialetos que eram tão diferentes que alguns
orcs não se entendiam a não ser que falassem a língua comum.
Sentiam-se tão distintos entre eles quanto à outra raça que dividia a
generosidade dos campos, florestas e correntezas; os misteriosos pele azulada,
chamados draenei. Apenas duas vezes ao ano, primavera e outono, todos os
clãs orcs se reuniam como faziam agora, para honrar a época em que dia e noite
tinham a mesma duração.
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Como qualquer criança - deitado em sua pele ele torceu o nariz para a palavra -
foi autorizado a ficar acordado até terminar a sua refeição e o xamã ter ido
embora. Uma vez que o banquete de entrada havia acabado, os xamãs de cada
clã partiam para escalar o Oshu'gun, entrar em suas cavernas e receber
conselhos de seus ancestrais.
Por mais interessante que Oshu'gun fosse, Durotan não achava justo que os
xamãs ficassem lá durante o festival todo. Para ele, os xamãs perdiam toda a
diversão. Porém, pensando bem, as crianças também.
Por mais divertido que fossem, e mesmo gostando delas, ele ansiava para saber
o que os adultos discutiam depois que as crianças caiam no sono em suas
barracas; depois de suas panças estarem cheias de boa comida, de terem
fumado e bebido muitas cervejas.
Ele não aguentava mais. Sorrateiramente sentou-se com os ouvidos atentos para
ver se havia indícios de alguém estar acordado. Não escutou nada e após um
longo minuto levantou-se e andou bem devagar até a entrada. Foi um progresso
longo e lento na barraca escura. Havia várias crianças de tamanhos e idades
diferentes dormindo e um passo em falso as acordaria. Coração acelerado pela
animação da sua ousadia, Durotan pisou cuidadosamente entre os espaços
visíveis, colocando seu largo pé com a delicadeza de uma ave.
Parecia uma eternidade até que chegasse à saída. Ele parou para diminuir o
fôlego, esticou...
E tocou um corpo largo e de pele lisa ao seu lado. Ele puxou bruscamente sua
mão com um silvo de surpresa.
"O que você está fazendo?" o outro orc retrucou. De repente Durotan riu do
quão tolos eles pareciam.
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"O mesmo que você" respondeu com sua voz ainda suave. Todos dormiam com
a exceção deles.
Durotan podia imaginar pelo tamanho da fraca forma à sua frente que o orc
eram um macho grande, provavelmente da mesma idade dele. Não conseguiu
reconhecer o cheiro ou a voz, então ele não era do clã Frostwolf. Era uma ideia
ousada - não apenas fazer algo proibido, como deixar a barraca sem permissão,
e ainda fazer tudo isso na companhia de um orc que não era de seu clã.
O outro orc hesitou, com certeza dividido pelo mesmo pensamento. "Muito
bem" finalmente disse "Vamos nessa"
Durotan virou-se para seu companheiro. O outro era mais marrom do que ele e
um pouco mais alto. Em relação a idade, ele era o mais alto do seu clã e não
estava acostumado a alguém mais alto do que ele. Era um tanto inquietante.
Seu aliado, em provocação, olhou para ele e ele sentiu estar sendo avaliado. O
outro acenou, aparentemente satisfeito com o que viu. Não arriscaram falar.
Durotan apontou para uma árvore enorme perto da barraca e silenciosamente
os dois foram em sua direção. Era provável que o trajeto não fosse tão longo
quanto pareceu, mas eles estavam expostos e qualquer adulto poderia vê-los se
por acaso virasse a cabeça na direção deles. Apesar disso, não foram
descobertos. Durotan sentiu como se estivesse à luz do dia, de tão brilhante que
a lua estava em contraste com a neve cristalina. E o barulho da neve quando
pisava era tão alta quanto um ogro enfurecido. Finalmente alcançaram a árvore
e afundaram-se atrás dela. A respiração de Durotam condensou quando
finalmente exalou. O outro orc virou-se e sorriu para ele.
"Sou Durotan, linhagem de Garad do clã Frostwolf" respondeu ele. Agora era a
vez de Orgrim reagir ao fato de estar sentado com o herdeiro de outro clã. Ele
acenou em aprovação.
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até chegar aos pés. Apontou para a multidão de novo e Orgrim assentiu.
Espiaram pela árvore com cuidado, esforçando-se para escutar. Certamente
agora eles escutariam os mistérios que tanto ansiavam saber. Entre os sons dos
estalos da grande fogueira e as batidas profundas dos tambores, vozes
flutuavam até eles.
"O xamã ficou atarefado nesse inverno com a febre" disse Garad, pai de
Durotan. Ele afagou o gigantesco lobo branco que adormecia perto da fogueira.
A besta, sua pelagem alva que o identificava como sendo dos Frostwolf, ganiu
em satisfação. "Tão logo uma criança é curada, outra adoece".
"Eu estou pronto para a primavera" disse outro orc ao levantar-se e jogar um
tronco na fogueira. "Tem sido duro para os animais também. Quando nos
preparávamos para o festival foi muito difícil achar fenocerontes."
"Klaga faz ensopados deliciosos com os ossos, mas recusa-se a falar quais ervas
usa" disse um terceiro fitando uma orquisha que estava amamentando um
infante. A fêmea em questão, provavelmente Klaga, riu.
"A única que terá a receita é esta pequena quando ela tiver idade." respondeu.
De queixo caído, Durotan virou-se para encarar Orgrim, que estava com uma
expressão similar. Isso era o que consideravam tão importante e secreto que as
crianças eram proibidas de sair da barraca? Discussões sobre febre e sopas?
Na luz brilhante da lua ele não teve problemas para ver claramente o rosto de
Orgrim. As sobrancelhas dele se juntaram ao franzir a testa.
"Você e eu podemos elaborar algo mais interessante do que isso, Durotan" disse
numa voz fraca e tola.
O festival durou mais dois dias. Quando saiam escondidos, fosse dia ou noite,
eles desafiavam um ao outro em diferentes testes de habilidades. Corridas,
escalada, força, equilíbrio, tudo o que pudessem pensar. E um derrotava o outro
como se tivessem planejado os turnos. Quando, no último dia, Orgrim gritou
por um quinto desafio para desempatar, algo dentro de Durotan o fez falar.
"Não vamos mais fazer desafios comuns e inferiores" disse ele, se perguntando
de onde surgiam as palavras a medida que as pronunciava. "Vamos fazer algo
nunca feito na história de nosso povo".
Os olhos cinzas de Orgrim brilharam ao que se aproximou "O que você sugere?"
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O queixo musculoso de Orgrim caiu. "Mas, nós não somos do mesmo clã." disse
com uma voz que parecia que ele tinha sugerido uma amizade entre um lobo
negro e um meigo talbuque.
"Não somos inimigos" disse com um gesto desdenhoso. "Olhe a sua volta. Os
clãs se reunem duas vezes ao ano e não há problemas nisso."
"Mas...meu pai diz que a paz é mantida justamente porque nos reunimos
pouco." continuou Orgrim. Preocupado, franziu a testa.
"Eu não sou covarde" rosnou ele. "Eu não fugi de nenhum desafio que propôs".
Então ele pulou em Durotan, derrubando o orc, que era menor do que ele e os
dois socaram-se até ser preciso chamar os xamãs para medicá-los e censurá-los
sobre a incoveniência de brigar em local sagrado.
Mesmo com o sangue escorrendo de seu nariz e enquanto via o xamã curar um
talho feio no torso de Orgrim, Durotan sorriu. Orgrim olhou para ele e sorriu de
volta.
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Capitulo 2
“Nós éramos assim, meu chefe”, disse com a voz entrecortada. Levantou seus
braços, jogou a cabeça para trás, chamando o vento para abraçá-lo e secar as
lágrimas de seu forte rosto verde.
“Próximos a terra, aos espíritos. Fortes nas caçadas, gentis com os jovens, certos
e justos, sabendo nosso lugar no mundo. Entendendo o equilíbrio de dar e
receber. A única mágica praticada pelos taurens é benéfica, pura mágica da
terra e ela reflete isso. Da maneira que uma vez Draenor refletiu a nossa
ligação.”
Eu pensei no pedido de ajuda dos tauren em lutar contra seus inimigos, os vis e
imundos centauros.
Drek’Thar riu, voltando-se para mim com seus olhos cegos e me enxergando
mais claramente do que qualquer um com visão poderia.
“Oh, jovem Thrall”, disse rindo levemente, “você não entende. Eles que nos
ajudarão.”
Durotan correu tão rápido quanto suas poderosas pernas jovens conseguiam
carregá-lo. Sua respiração ficou ofegante e suor umedecia sua pele castanho-
avermelhado, mas forçou-se a continuar. Era verão e ele estava com seu largo
pé descalço sobre a grama macia enquanto corria e ás vezes ele pisava na muda
da brilhante e roxa dassanflor. O perfume da planta esmagada, que era
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cultivada para cura, subiu como uma bênção, inspirando ele a correr mais
longe, mais rápido.
Durotan escutou um grito de guerra atrás dele e seu coração pesou. Como a
dele, a voz de Orgrim ainda estava pegando o tom grave que distinguia um
adulto, mas ele tinha que admitir que já impressionava. Ele tencionou suas
pernas a forçar mais, mas elas estavam tão pesadas e imóveis como se fossem
de pedra. Ele viu com pesar do canto de seu olho, quando Orgrim apareceu em
seu campo de visão e então, com um último impulso, ultrapassou ele.
Ao seu lado, ele escutou Orgrim fazer o mesmo e então, virou-se para rir.
Durotan riu também. Pássaros e pequenos animais que habitavam a floresta
Terokkar estavam em silêncio enquanto os orcs diziam palavras de alegria que
provavelmente soavam como um grito feroz que antecipava uma caçada.
“Você tem tanto músculo que seu cérebro está atrofiado”, replicou. “Habilidade
é tão importante quanto força. Mas o clã Blackrock não saberia sobre tais
coisas.”
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Não havia maldade no gracejo deles. No começo os clãs estavam preocupados
com a amizade dos jovens, Mas o argumento teimoso de Durotan – que só
porque algo nunca havia sido feito não significava que não poderia ser feito –
divertiu e impressionou os líderes de ambos os clãs. O fato de serem
tradicionalmente pacíficos ajudou muito. Se tivessem proposto tal amizade com
um membro do clã Warsong ou Bonechewer, por exemplo, que eram
conhecidos por seu orgulho e desconfiança nos outros, a pequena chama de
amizade apagaria rápido. Então, os anciãos observavam e esperavam que a
amizade desaparecesse e cada um voltasse para o seu lugar e manter a ordem
habitual já estabelecida por...tanto tempo quanto pudessem lembrar.
A última geada do inverno tinha aberto caminho para a primavera e esta agora
para o calor completo do verão, e a amizade continuava. Durotan sabia que
estavam sendo observados, mas contanto que ninguém interferisse, ele não se
opunha.
Durotan fechou os olhos e deixou o musgo espalhar pelos seus dedos. Os xamãs
disseram que tudo tinha uma vida, um poder, uma essência. Eles eram
envolvidos profundamente com os espíritos dos elementos – terra, ar, fogo e
água - E o Espírito da Natureza – e alegavam que podiam sentir a força vital na
terra e até mesmo numa aparente pedra inanimada. Tudo o que Durotan sentia
era uma sensação fria e um tanto úmida de musgo e solo nas palmas de suas
mãos.
Sentou rápido, automaticamente pegando sua clava com espinhos, que sempre
carregava junto a si. Orgrim preferiu um machado de metal pesado, arma
tradicional dos Blackrock, uma versão simplificada do machado legendário que
um dia seria dele. Os jovens trocaram olhares. Não precisavam falar para se
comunicarem. O que fez a terra tremer dessa maneira seria um enorme
fenoceronte, com sua pele desgrenhada que fazia cobertores magníficos e rica
carne vermelha que poderia alimentar quase um clã inteiro; ou seria algo mais
perigoso?
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Bum. A terra estremeceu de novo. O coração de Durotan começou a bater mais
depressa. Se fosse um fenoceronte pequeno, talvez eles conseguissem abatê-lo e
dividir os espólios com os dois clãs. Ele olhou para Orgrim e viu seus olhos
brilharem de agitação.
Bum.
Bum.
Crash.
Era enorme, carregava uma clava tão grande quanto eles e definitivamente não
era um fenoceronte.
Abriu a boca e gritou algo remotamente compreensível, mas Durotan não iria
perder tempo imaginando o que havia dito.
Agora ele desejava que não tivessem decidido mais cedo a desafiar um ao outro
para uma corrida, pois suas pernas não haviam se recuperado por completo.
Mesmo assim elas se moveram quando pediu, o instinto de sobrevivência
dando energia.
Como eles vagaram tão adentro do território dos ogros? E onde estava o gronn,
seu líder? Durotan imaginou o líder dos ogros abrindo caminho pelas árvores
como o ogro fazia – proeminente em relação aos ogros e estes em relação aos
orcs, mais hediondo do que um ogro, feito mais de terra do que de carne e
ainda tão terrivelmente errado, seu único olho avermelhado e fixo enquanto
apontava para o ogro ir em direção dele e Orgrim.
Agora, não estava tão certo. A terra continuou a tremer e os gritos do ogro
pareciam mais claros agora.
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“Esmagar pequenos orcs! Mim esmagar!” O rugido que soltou quase fez seus
ouvidos sangrarem.
A coisa estava alcançando eles. Apesar das ordens apavoradas do seu cérebro
para que seu corpo corresse mais rápido, mais rápido maldição, ele não
conseguia distanciar-se do ser monstruoso que tão perto se aproximava que sua
vasta sombra quase obscurecia a pouca luz que filtrava dos galhos das árvores.
As árvores rarearam e a luz ficou mais brilhante. Eles estavam perto do limite
da floresta. Durotan continuou correndo, irrompendo no espaço aberto do
prado, pisando em grama fofa de novo. Orgrim estava a sua frente, mas não por
muito. Desespero atravessou Durotan, seguido por uma onda negra de fúria.
Eles ainda não eram adultos! Não tinham ido a sua primeira caça de verdade,
não dançaram com as fêmeas em volta da fogueira, nem banharam seus rostos
no sangue quente da primeira vítima. Tanto que não haviam feito ainda. Uma
morte gloriosa numa batalha era uma coisa, mas estavam com tanta
desvantagem em relação à horrível criatura que suas mortes seriam engraçadas
e não honrosas.
Uma voz clara ecoou. Apesar de não entender a língua, ele reconheceu as
palavras de poder quando as escutava e sua pele formigou. De repente o céu
estava repleto de relâmpagos. Mas esses eram diferentes dos que havia visto os
xamãs evocarem. Energia azul, branca e prata estalavam em volta do ogro como
uma rede, rodopiando e cercando-o. O monstro urrou uma vez e caiu. A terra
tremeu.
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Capitulo 3
Drek’Thar não viu as cidades dos draenei quando estavam pacíficas. Apenas as
viu quando...bom, estou me adiantando. Mas ele disse que meu pai caminhou
pelas estradas brilhantes dos draenei, comeu sua comida, dormiu em seus
aposentos, conversou com eles em igualdade. Observou um mundo tão
diferente do nosso que até hoje é difícil de ter um vislumbre. Nem as terras dos
kaldorei me são tão estranhas quanto o que aprendi sobre os draenei. Drek’Thar
disse que Durotan não tinha palavras para descrever o que viu; talvez hoje,
vivendo nessa terra que leva o seu nome e vendo o que vi, ele teria.
“Vocês são bem vindos aqui, Durotan e Orgrim”, disse. As palavras pareceram
quebrar o feitiço e Durotan seguiu em frente desajeitadamente. As estradas de
pedra foram polidas ou pelo tempo ou pelos draenei, ele não sabia. Ao se
aproximarem, ele via que a cidade continuava montanha acima. O padrão
arquitetônico dos degraus era repetido aqui, com longas estradas feitas da
mesma pedra branca que parecia não manchar apesar de pelo menos dez
gerações de orcs terem vivido e perecido desde a chegada dos draenei. Ao
contrário de chifres e peles de animais abatidos na caça, os draenei usavam as
dádivas da terra. Havia gemas cintilantes por todo o lugar, e um estranho metal
leve marrom que ele nunca havia visto. Os orcs conheciam metais; eles lidavam
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com eles para benefício próprio. Inclusive já tinham caçado com machado e
espada, mas isso...
“Do que sua cidade é feita?” perguntou Orgrim. Foi a primeira palavra dele
desde o começo dessa estranha viagem feita na companhia dos draenei.
“Novos? Há mais de duzentos verões que seu povo veio para cá. Não somos os
mesmos.” ressaltou Durotan.
Durotan sabia que era um elogio, mas de alguma maneira incomodou. Como
se...achassem que os draenei fossem melhores do que os orcs. Esse pensamento
roçou como a asa de uma borboleta e sumiu tão rápido quanto chegou. Olhou a
sua volta e, para seu embaraço, pensou se não era verdade. Nenhuma habitação
orc era embelezada, ou complicada. Mas afinal...os orcs não eram draenei. Eles
não precisavam, ou escolheram viver como os draenei.
Então era esse metal espiralado, gigante e tênue que parecia ser feito de cobre e
couro. Durotan perdeu o fôlego.
Um orc teria rosnado e dado um soco na sua orelha – forte – por tal insolência.
O draenei apenas riu de leve.
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“Isso também é, de uma maneira” disse Restalaan. Acenou para um draenei e
disse algo em sua língua nativa. O outro draenei concordou e adiantou-se.
“Quero apresentar-lhes alguém, se ele não estiver muito ocupado.” disse e logo
calou-se. Durotan tinha mil perguntas, mas não se atreveu a fazê-las, temendo
parecer tolo. Orgrim pareceu ter aceitado a explicação sobre magia, mas ambos
esticavam o pescoço ao olhar o ambiente.
Cruzaram por muitos draenei ao caminhar pelas ruas, e viram uma fêmea que
parecia ter a idade deles. Era delicada, mas alta e quando ela e Durotan
trocaram olhares, ela vacilou. Então um tímido sorriso se formou e ela abaixou
a cabeça encabuladamente.
Sorriu de volta. Sem pensar ele perguntou “No nosso acampamento você
encontraria muitas crianças. Onde estão as crianças draenei?”
“Não há muitas, nosso povo tem longevidade e por isso raramente temos
crianças.” afirmou.
“Muito” foi tudo o que disse. “Suficiente para dizer que me lembro da nossa
chegada aqui.”
“Aquele que nos trouxe a esse mundo, nosso profeta, Velen, ficará aqui por
muitos dias. Achei que ele gostaria de vê-los. Não é sempre que recebemos
visitantes.” Deu um largo sorriso. “É com prazer que Velen não só concordou
em conhecê-los como os convidou para acompanhá-lo essa noite. Irão jantar
com ele e dormir na casa do magistrado. É com certeza uma grande honra.”
Durotan começou a pensar que teria sido melhor se tivesse sido esmagado pela
clava do ogro.
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montanha. Os degraus perfeitamente quadrados e sólidos pareciam não ter fim
e a respiração de Durotan acelerou enquanto escalavam. Chegaram ao ápice e
estavam observando uma estrutura em forma de caracol com interesse quando
o draenei disse “Olhe para trás.”
“Não quero parecer esnobe, mas tenho orgulho do meu povo e da minha
cidade.” disse. “Trabalhamos duro aqui e amamos Draenor. E nunca imaginei
que teria a chance de dividir isso com um orc. As armadilhas do destino são
definitivamente estranhas.”
Ao dizer isso, um profundo e quase distante pesar pareceu tomar conta de suas
feições. Afastou o sentimento e sorriu.
“Essa água está quente demais para beber e é muita para mergulhar ervas.”
ressaltou Durotan.
“Banho?”
“Nós nadamos nos rios no verão. Talvez isso seja parecido.” afirmou Durotan.
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“Não precisam fazer nada que não os agrade. O banho, a comida e as roupas
estão aqui para a sua necessidade. Profeta Velen espera vê-los em uma hora. Eu
virei buscá-los. Posso ajudar em algo mais?”
Eles negaram com a cabeça. Restalaan então fechou a porta. Durotan virou-se
para seu amigo.
Orgrim olhou o estranho material e a água quente. “Não, mas...sinto que estou
em uma caverna. Preferia estar em uma barraca.”
“Eu também.” Durotan tocou a parede que estava fria e suave; então percebeu
que esperava que ela estivesse quente e...de alguma maneira viva.
Ele já estava espantado pela aparência dos draenei. Contemplar Velen era algo
mais. O Profeta Draenei era meia cabeça mais alto do que os mais altos guardas
que tinha visto, mas não tão forte fisicamente. Seu corpo, vestido em suaves
túnicas cor de canela, era menos musculoso que os deles. E sua pele! Era de um
tom alvo fraco. Seus olhos, instigantes e sábios, cintilavam um azul brilhante e
eram envolvidos por rugas entalhadas profundamente que exprimiam não
apenas um Ancião, mas até mesmo um ancestral. Seus cabelos prateados não
estavam soltos como o da maioria, mas trançados num círculo e ornamentado,
expondo seu crânio pálido. Sua barba ondulava como uma onda prata até a
cintura.
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Nem Ancião nem ancestral. Pensou Durotan enquanto aqueles olhos azuis
intensos e faiscantes caíram sobre ele e pareciam ver sua alma.
Quase...atemporal.
Lembrou-se do que Restalaan disse, como ele tinha mais de duzentos verões.
“Bem vindos.” disse numa voz melosa ao levantar e inclinar a cabeça. Suas
tranças dançaram com o movimento. “Sou Velen. Estou contente que meu povo
os achou hoje, apesar de achar que em alguns anos você seriam mais do que
capazes de lidar com um ogro, ou mesmo com um ou dois gronns.”
Novamente, Durotan não sabia como, ele sabia que aquele não era um elogio
falso. Orgrim também pressentiu pois endireitou-se e olhou os olhos do draenei
em igualdade.
“Quando meu pai falecer, vou herdar a Doomhammer.” disse com orgulho. “É
uma arma antiga e honrada, passada de pai para o filho mais velho.”
“Irá empunhá-la bem, Orgrim.” concordou Velen. “Mas acredito que demorará
alguns anos até reclamá-la.”
Não pareceu ter passado pela cabeça dele naquela hora o fato do pai dele ter
que morrer para que pudesse virar Orgrim Doomhammer, e assim ficou com o
ar solene. Velen sorriu com uma pitada de tristeza, achou Durotan. Com o
sorriso, finas rachaduras apareceram em sua face como finas teias de aranha em
superfície branca.
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“Mas me fale mais sobre esse martelo. Parece-me uma arma poderosa.”
“Essa é uma poderosa profecia.” ressaltou Velen. Ele não disse mais nada, mas
Durotan sentiu um arrepio. Esse homem era chamado de Profeta pelo seu povo.
Ele saberia se essa profecia se tornaria verdade? Arriscaria perguntar?
Durotan era um jovem sensível e sabia disso. Ouviu por acaso uma conversa de
seus pais sobre essa característica e Mãe Kashur, que zombou deles e disse para
se preocuparem com coisas mais importantes e “deixar o garoto viver seu
destino”. Durotan reconhecia falso interesse quando via, inclusive em um
draenei. Mas os brilhantes olhos azuis de Velen eram concentrados, seu
receptivo rosto bondoso apesar de feio e seus questionamentos sinceros. Ele
queria saber sobre os orcs. E quanto mais descobria, mais triste parecia ficar.
Gostaria que Mãe Kashur estivesse aqui no meu lugar, pensou de repente. Ela
saberia aproveitar melhor essa oportunidade do que Orgrim e eu.
Velen virou seus olhos azuis para ele. Quis desviar do seu olhar fixo, não
porque o temia, mas porque nunca se sentiu tão...visto.
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Tudo quis dizer, ao invés disso concentrou-se na pergunta. “Os orcs não
encontraram os draenei há pelo menos duzentos verões. Restalaan disse que
vieram num grande navio que pode viajar pelos céus. Conte mais.”
Velen tomou um gole de sua bebida, que para Durotan tinha gosto de verão, e
sorriu. “Para começar ‘draenei’ não é nosso verdadeiro nome. É um termo que
significa...’exilados’.”
;Durotan acenou. Ele ouviu o termo antes. Gostava de como a palavra dobrava
em sua língua quando falava, e os orcs não tinham outro nome para esse lugar a
não ser “mundo”.
“É uma expressão nossa, não somos arrogantes para esperar que os orcs a
usariam também. Mas assim a apelidamos, e amamos Draenor profundamente.
É um belo mundo, e nós já vimos muitos.”
Velen sorriu com gentileza. “Não há outros como os orcs,” disse com respeito
ressoante em sua voz. “São peculiares.”
“Mas sim, tínhamos viajado por algum tempo antes de encontrarmos esse
mundo. Aqui estamos, e aqui permaneceremos.”
Durotan queria perguntar mais – por quanto tempo tinham viajado, como era
sua terra natal, porque tiveram que deixá-la. Mas havia algo no rosto eterno de
Velen que, apesar de ter sido encorajado a perguntar, o líder draenei não iria
contar essa história em particular.
Então, ao invés disso, ele perguntou sobre a natureza de suas armas e magia.
“Nossa magia vem da terra, dos xamãs e dos ancestrais.”
“Nossa magia vem de outra fonte, não acho que entenderiam se explicasse.”
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“Não somos estúpidos.” indignou-se Orgrim.
“Perdoe-me, não foi o que quis insinuar.” Era uma desculpa sincera e graciosa,
de novo impressionando Durotan. “Seu povo é sábio e vocês obviamente
inteligentes. Mas...não estou certo se tenho as palavras na sua língua. Não
duvido que se tivesse tempo e vocabulário, vocês entenderiam.”
Até para essa explicação ele parecia buscar as palavras. Durotan pensou no tipo
de mágica que pode esconder uma cidade, no metal macio e incomum mesclado
com as gemas da terra e pedra sólida e percebeu que Velen estava certo. Não
havia orc que pudesse compreender tudo isso em uma noite, apesar de
suspeitar que Mãe Kashur tivesse uma inerente compreensão, e se perguntou
por que as duas raças não interagiam mais.
Ele explicou que vivia num lindo lugar chamado Templo de Karabor. Havia
outras cidades draenei, mas a maior era ao norte e chamava Shattrath.
Então a refeição havia chegado ao fim. Velen suspirou e seus olhos repousaram
em seu prato, mas Durotan tinha certeza que ele não estava olhando.
“Peço sua licença.” disse levantando-se. “Foi um longo dia e preciso meditar
antes de dormir. Foi uma honra conhecê-los, Durotan do clã Frostwolf e Orgrim
do clã Blackrock. Acredito que dormirão bem e profundamente, a salvo nesses
muros, onde ninguém do seu povo já esteve.”
Os orcs saíram pouco depois. Foram escoltados para seus quartos e dormiram
bem, apesar de Durotan ter sonhado com um velho orc sentando
silenciosamente ao seu lado e perguntou-se o que significava.
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Mãe Kashur, a xamã mais velha do clã Frostwolf, dormia intensamente. Pela
sua posição honrosa, sua tenda era a segunda mais opulente, perdendo apenas
para a de Garad, líder do clã. Tapetes grossos de pele de fonecerontes
protegiam seus velhos ossos do frio da terra, e uma leal e amorosa neta atendia
suas necessidades, alimentação, limpeza e mantendo a fogueira atiçada nos dias
gelados para a “mãe” do clã. O trabalho da Mãe Kashur era escutar vento, água,
fogo, gramado e beber a amarga bebida de ervas toda noite para abrir sua
mente para as visitas dos ancestrais. Ela colhia informações para o clã do
mesmo jeito que outros colhiam frutas e lenha, e esse dom os nutria
significantemente.
O velho orc não estava presente, e ainda assim ela sabia que era real. Ele estava
em seu sonho e isso era o bastante para ela. Nesse estado onírico, ela era jovem
e vibrante, podia ver sua pele ruborizada e saudável, sua forma esbelta cheia de
músculos. O orc tinha a aparência de quando havia morrido, idade onde sua
sabedoria estava no ápice. Tal’kraa era seu nome quando era vivo, mas agora,
apesar de ser de muitas gerações anteriores à dela, ela apenas o chamava de
Avô.
“Recebeu a mensagem,” disse ele para a jovem Kashur do sonho. Ela acenou,
seu longo cabelo negro fluindo com o movimento.
“Ele e o garoto de Blackrock estão com os draenei. Estão a salvo, posso sentir.”
Avô Tal’kraa assentiu, suas bochechas agitavam. Suas presas amareladas pelo
tempo, uma quebrada numa batalha a muito esquecida.
Era a segunda vez que tinha dito isso e Kashur não tinha certeza o que
significava.
“Não, não.” resmungou. “Traga ele para nós. Traga ele para as cavernas de
Oshu’gun. Vou analisá-lo.”
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“Não foi o que eu acabei de dizer? Garota tola! O que aconteceu com os xamãs
de hoje em dia?”
Quando Kashur não respondeu, ele resmungou e bateu seu bastão no chão.
Kashur pulou.
Não conseguiu esconder o sorriso quando disse isso, e ela sorriu de volta
enquanto sua imagem no sonho fechava os olhos. Apesar do seu temperamento
intimidador e pavio curto, Tal’kraa era sábio, bondoso e a amava efetivamente.
Gostaria de tê-lo conhecido quando era vivo, mas ele havia morrido há quase
cem anos.
As pálpebras de Kashur abriram e ela suspirou assim que seu espírito retornou
para seu corpo...tão velho quanto Tal’kraa quando havia morrido, mãos e pés
curvados com dores nas articulações, corpo fraco, cabelo cruelmente branco.
Sabia que a hora de deixar essa concha e estar com os ancestrais estava perto.
Drek’Thar, seu aprendiz, seria então o conselheiro de Garad e do resto do clã
Frostwolf. Ela tinha muita confiança nele e ansiava pelo dia em que seria pura
energia espiritual.
Apesar que, ao meditar enquanto a luz do sol a envolvia e o canto dos pássaros
acariciava seus ouvidos, ela sentiria falta das coisas que são dadas quando se
está vivo. As coisas simples, como comida quente e o amável toque de sua neta.
E ela iria.
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Capitulo 4
Noite passada um jovem orc foi iniciado no ritual da maturidade sob a luz da
lua e das estrelas, que pareciam cintilar em aprovação. Foi a primeira vez que
pude fazer parte desse ritual, o Om’riggor. Quando jovem, fui negligenciado
dos ritos e tradições do meu povo; e verdade seja dita, todos os orcs foram
usurpados destes ritos por muito tempo. E desde que encontrei meu destino, fui
envolvido em batalhas. A guerra me consumiu. Ironicamente, a necessidade de
proteger meu povo da Legião Ardente e achar um lugar para que nossas
tradições renasçam me distanciaram de tais coisas.
Noite passada, participei de um ritual atemporal que foi negado a uma geração
inteira.
E ele deveria abater um com apenas uma única arma e nenhuma armadura.
Outros sussurros: Você pode apenas carregar uma arma, Durotan, filho de
Garad, mas pode esconder uma armadura na floresta e ninguém saberia.
Ele ignorou todas as tentações. Talvez tenha havido outros orcs que tenham
sucumbido, mas ele não seria um deles. Durotan iria procurar uma fêmea, que
nessa época do ano carregariam chifres; pegaria a única arma permitida e seria
25
o sangue do animal que ele matou, fumegando no ar gelado, que untaria suas
bochechas.
E pareceu a ele que o rebanho também estava debochando dele. Conseguia com
facilidade encontrar pegadas e fezes, ver onde cavavam a neve a procura de
grama seca ou arrancavam cascos das árvores. Mas pareciam sempre escapar
dele. Foi no final da tarde do terceiro dia, quando pareceu que os ancestrais
decidiram recompensar sua determinação. Estava anoitecendo e Durotan
pensou, com dor no coração, que precisaria procurar abrigo e terminar mais um
dia infrutífero. Então, deu se conta de que as pequenas bolas de estrume
estavam frescas e não congeladas.
Estavam perto.
Imediatamente agachou-se atrás de uma pedra grande e espiou para poder ver
os animais. Estavam marrons escuros em contraste com a neve, pois esta não
havia coberto suas costas. Havia pelo menos duas dúzias, talvez mais, maioria
eram fêmeas. Foi bom ter achado o rebanho, mas agora ele tinha outro
problema. Como ele iria abater apenas um? Diferente da maioria dos animais
que caçavam, os talbuques protegem um ao outro quando atacados. Se atacasse
um, o resto viria defendê-lo.
Franziu a testa e tentou animar-se. Estava procurando esses animais por quase
três dias e agora estavam à sua frente. A noite testemunharia um jovem orc
faminto devorar um lombo, ou um corpo endurecido na neve?
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Observou por um tempo, ciente que as sombras estavam se alongando, mas
sem querer apressar-se e cometer um erro fatal. Talbuques eram criaturas
diurnas e estavam cavando buracos na neve para poderem se proteger. Ele
sabia disso e viu com tristeza eles se agruparem bem próximos uns aos outros.
Como separaria apenas um?
Sorriu; que oferenda dos espíritos! Era um bom presságio. A mais esperta e
saudável corça do rebanho, que não precisava seguir sem pensar, mas escolhia
seu próprio caminho. Embora essa escolha fosse a provável causa de sua morte,
também dava a Durotan a chance de conquistar honra e o direito de ser tratado
como um adulto. Os espíritos entendiam o equilíbrio dessas coisas. Pelo menos
foi o que disseram.
Durotan esperou. O sol mergulhou atrás das montanhas levando até mesmo o
fraco calor que havia fornecido. Esperou com a paciência de um predador.
Finalmente, até mesmo o mais afastado do grupo estava aconchegando suas
longas pernas e deitou-se com seus companheiros.
Lentamente, pisando com o maior cuidado que conseguia, foi em direção à sua
presa. Ele não sentiu frio, pois o calor da precipitação e concentração afastava
qualquer sensação de desconforto. Estava cada vez mais perto e o talbuque
continuava a sonhar.
Tentou ficar de pé, mas o golpe mortal já a tinha atingido. Durotan queria ter
dado o grito de guerra que havia escutado seu pai proferir tantas vezes, mas
engoliu-o. De nada adiantaria matar o talbuque apenas para ser dizimado em
retaliação pelo rebanho. Havia afiado bem sua lâmina, e cortou através do
pescoço grosso e vértebras como se fosse manteiga. Sangue jorrou, o fluído
quente e grudento respingou gentilmente nele, e sorriu com intensidade.
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Besuntar-se com o sangue da sua primeira caça fazia parte do ritual; e o
talbuque já havia feito isso por ele. Outro bom presságio.
Hesitaram. Tinham dito a ele que se fosse uma morte precisa fugiriam sem
atacar, percebendo, por alguma intuição primitiva, que não poderiam salvar a
irmã abatida. Ele desejou que fosse verdade; poderia abater mais uns dois, mas
seria pisoteado se eles atacassem.
“Porque não é feito assim.” Mãe Kashur disse brevemente. Irritada, ela amarrou
o garoto. Ele era jovem e estava em forma; a distância da escalada para a
montanha sagrada não era nada para ele. Ela, por outro lado, adoraria ter vindo
montada no Dreamwalker, seu grande lobo negro. Mas as tradições eram
antigas e precisas, e enquanto ela fosse capaz de andar, ela andaria. Durotan
inclinou a cabeça em reverência enquanto prosseguiam.
Apesar de cada viagem esgotá-la mais do que a anterior, Mãe Kashur sentiu um
entusiasmo que amenizava a dor e a fadiga. Ela havia levado tantos jovens –
machos e fêmeas, pois ambos são valiosos – nessa última parte do ritual da
maturidade. Mas nunca antes haviam solicitado que levassem um ante os
ancestrais. Não era velha demais para ser curiosa.
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triângulo perfeito. Reluzia como cristal, suas facetas captavam o sol e não era
parecido com nada a seu redor. Havia caído do céu, há muito tempo, e os
espíritos tinham sido atraídos a ela. E foi por isso que os orcs haviam se
instalado aqui, sob sua sombra sagrada. Dentro da montanha eles eram como
um, independente da discussão mesquinha ou diferenças que tinham. Logo ela
voltaria para lá, ela sabia, mas não como uma velha manca. Essa era sua última
visita com um corpo danificado. Na próxima vez, ela viria como espírito,
flutuando pelo ar como os pássaros, seu coração leve e limpo como novo.
“Algo errado, Mãe?” perguntou com preocupação em sua voz. Ela piscou,
saindo do devaneio e sorriu para ele.
“Não.” assegurou.
A escalada foi longa, cansativa, e mais difícil do que uma simples caminhada
até o topo da montanha, e estava agradecida pelo seu cajado firme e a mão forte
de Durotan. Mas hoje, seus pés pareciam mover-se com mais firmeza, seus
pulmões trabalhavam com eficiência enquanto ela e seu companheiro subiam.
Era como se os ancestrais estivessem a encorajando, ajudando seu corpo físico
com o poder dos espíritos.
Ela acendeu um amontoado de ervas secas que deram um aroma doce e acre ao
ambiente, e passou a fumaça sobre ele para purificá-lo. Então o marcou com o
sangue que seu pai derramou especialmente para esse momento, e mantido
cuidadosamente em uma pequena bolsa de couro. Kashur colocou sua mão
mirrada na fronte dele, murmurou uma bênção e fez um gesto em aprovação.
“Sabe bem que poucos são chamados ante os ancestrais e que não seguem o
caminho dos xamãs.” disse gravemente. Olhos castanhos arregalados, Durotan
concordou. “Eu não sei o que irá acontecer. Nada, talvez. Mas se acontecer,
comporte-se com honra e respeito aos que se foram.”
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Durotan engoliu e concordou de novo. Respirou fundo e endireitou-se, e no
corpo ainda não formado do garoto, Kashur teve uma ideia do chefe do clã que
estaria por vir.
Juntos, entraram; Mãe Kashur na frente para acender as tochas que ficavam nas
paredes. A iluminação laranja mostrou a eles a descida tortuosa, caminho liso
por anos de contato com os pés descalços ou calçados dos orcs. Aqui e lá,
pegadas foram marcadas, para fazer os pés dos peregrinos mais seguros. O
interior do túnel era sempre fresco, mais quente que o inverno lá fora. Kashur
deixava suas mãos tocarem as laterais da parede, lembrando a primeira vez que
veio aqui, há muito tempo, com o sangue úmido de sua mãe em seu rosto, olhos
arregalados, coração batendo rápido.
Finalmente, a longa e suave ladeira que desciam diminuiu. Não havia mais
tochas na parede, e Durotan a olhou, intrigado.
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fizesse o mesmo. Com cuidado retirou vários odres, abriu-os, e com uma suave
oração adicionou a água na poça brilhante.
Então, uma terceira pessoa juntou-se a eles, pois o Avô Tal’kraa estava acima de
seu ombro, seu reflexo tão nítido quando os deles. Kashur sorriu quando seus
olhos se encontraram.
Ela virou a cabeça para olhá-lo, mas Durotan continuava a olhar dentro da
poça, como se estivesse procurando lá as respostas. O coração de Kashur
apertou um pouco, mas reprimiu imediatamente. Se não era para Durotan
seguir o caminho xamanístico, então assim deveria ser. Com certeza seu destino
seria honrado de qualquer modo, nascido para liderar seu clã.
“Minha tataraneta,” falou Tal’kraa com mais gentileza que Kashur já havia
testemunhado. “Você o trouxe, como eu havia pedido.”
“Certamente está.” e virou sua atenção para o fantasma. “Eu trouxe ele aqui,
como pediu. O que acha dele?”
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“Eu pressinto...algo.” disseTal’kraa. “Achei que ele seria um xamã, mas se ele
não pode me ver agora, não verá nunca. Mas apesar de não ver os espíritos e ser
incapaz de evocar os elementos, ele nasceu com um grande destino. Ele será de
grande importância para o clã Frostwolf...e também para todo seu povo.”
“Não posso dizer, mas instrua-o bem, Kashur, pois uma coisa é certa: de sua
linhagem virá a salvação.”
E num gesto de ternura, nunca antes visto por Kashur, ele roçou seu dedo
intangível no rosto de Durotan. Ele arregalou os olhos e Kashur percebeu que
teve de lutar contra o instinto natural de recuar, mas não recuou diante da
carícia espectral.
Então, como uma névoa num dia quente, Tal’kraa se foi. Kashur vacilou um
pouco; quase se esqueceu de como a energia dos espíritos a supriam. Durotan
se apressou e segurou-a pelo braço, e ela ficou agradecida pelo seu tenro vigor.
“Mãe, você está bem?” perguntou. Ela agarrou o braço a acenou com a cabeça.
Sua preocupação era primeiro com ela, e não sobre o que o ancestral teria dito
ou não sobre ele. Ponderando as palavras, decidiu não contar a ele. Por mais
racional e bondoso que fosse tal profecia poderia corromper o mais nobre orc.
“Estou bem,” assegurou. “Mas esses ossos não são jovens e a energia dos
espíritos é poderosa.”
“Gostaria de tê-lo visto.” disse com uma ponta de melancolia. “Mas...mas sei
que pude senti-lo.”
Ele estava tentando agir com maturidade e calma, mas uma ponta de súplica
transpareceu. Ela não o culpava. Todos gostariam de manter-se numa gloriosa
lembrança, através de estórias de suas aventuras. Ele não seria um orc se não
compartilhasse desse desejo.
“Disse ser incerto.” afirmou bruscamente. Ele concordou e escondeu bem sua
decepção. Isso era tudo o que tinha planejado dizer, mas algo a fez acrescentar,
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“Você tem um destino a seguir, Durotan, filho de Garad. Não seja tolo na
batalha e não morra antes de cumpri-lo.”
Riu discretamente. “Eu desejo servir bem meu clã, e um tolo não faz isso.”
E ela gargalhou, pois pela primeira vez na viagem que fizeram juntos, Durotan
pareceu totalmente assustado.
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Capitulo 5
Em reflexão, assim conta Drek’Thar , essa época em nossa história era como um
dia perfeito do início do verão. Nós orcs tínhamos tudo o que realmente
precisávamos: um mundo hospitaleiro, os ancestrais para nos guiar e os
elementos para nos ajudar quando achavam oportuno. Comida era abundante,
nossos inimigos ferozes, mas não invencíveis, e éramos abençoados. Se os
draenei não eram nossos aliados, tão pouco eram nossos inimigos. Eles
dividiam sua sabedoria e generosidade quando pedíamos; fomos nós, os orcs,
que sempre nos contínhamos. E nós, os orcs, que fomos deturpados
involuntariamente para servir outro fim.
Ódio é poderoso. Ódio pode ser eterno. Ódio pode ser manipulado.
Ele estendeu sua longa e elegante mão vermelha com garras no nada que era
tudo e sentiu ondular ante sua indagação. Patrulheiros foram enviados no
momento em que o inimigo escapou, e reportaram apenas fracassos.
Archimonde os queria mortos por falhar, mas Kil’jaeden preferiu o contrário.
Aqueles que sentiam medo, ou fugiam, ele tinha boas razões para entender.
Aqueles que sentiam cheiro de recompensa ficavam e suplicavam a aprovação
de seu mestre. Então, enquanto ele mostrava sua desaprovação, aqueles que
falharam com ele normalmente ganhavam uma segunda chance. Ou uma
terceira, se ele acreditasse que estivessem fazendo tudo o que podiam e não só
se aproveitando de sua boa vontade.
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Archimonde não concordava com essa obsessão.
Fez um punho com sua mão gigante e as suas unhas afiadas furaram a palma
de sua mão. Fogo derretido jorrou, e o fluxo parou assim que entrou em contato
com o ar deixando uma grossa cordilheira de cicatriz. O corpo de Kil’jaeden
estava repleto desses vergões, e se orgulhava deles.
E então...
Não.
Não seria o bastante deixar Velen largado no fim do mundo, alimentando seu
orgulho ferido, sobrevivendo da terra em alguma caverna. Kil’jaeden uma vez
disse querer sangue. Mas sangue, com seu poder inerte, não o seria o bastante
agora. Ele queria a essência da vergonha, da total e completa humilhação. Isso
seria mais doce do que o gosto acobreado da vida fluindo de Velen e seus
seguidores estúpidos.
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Archimonde inclinou a cabeça, gesto que ele reconhecia. Um de seus servos
estava falando com ele. Archimonde tinha suas próprias maquinações e
esquemas a serviço de seu mestre sombrio para a conquista final. Sem dizer
uma palavra, Archimonde partiu ágil e delicadamente contradizendo seu
tamanho.
Dentro dele cresceu um grande contentamento. Como o ser que era caçado,
Talgath era o mais cauteloso de seus subordinados. Estava pouco abaixo dele e
provou sua lealdade através dos séculos. Ele não daria tal notícia sem
fundamento.
Assentiu, mesmo Talgath não estando presente para ver o gesto. Algumas
coisas de seu passado ainda persistiam, pensou, sorrindo um pouco do antigo
movimento que indicava concordância em todas as espécies que encontrava.
Você diz a verdade, reconheceu. Atraídos pela doce essência da magia dos
eredar, por muitas vezes as forças de Kil’jaeden chegavam a um ou outro
mundo, apenas para descobrir que, de algum jeito, Velen e seus seguidores
haviam percebido a aproximação e fugido. Mas ainda tenho esperanças. Irei
achá-los e dobra-los à minha vontade e tenho uma eternidade para fazer isso.
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Desta vez agiria diferente. Ele não mandaria Talgath e a Legião Ardente. Velen
era o mais forte, mais sábio e mais ligado à magia e ciência. Kil’jaeden não
podia imaginar seu velho amigo baixando a guarda, não depois de tão pouco
tempo. Ele estaria sempre alerta, pronto para fugir perante uma ameaça tão
obvia.
Já chegamos à força em outros mundos antes, sem utilidade. Talvez desta vez
apenas um seja enviado. Apenas um, mas que seja totalmente confiável.
Precisamente. Visite esse lugar por conta própria. Informe-se sobre ele.
Investigue. Reporte se os exilados estão mesmo lá, e se sim, qual é o atual
estado deles. Diga-me do que eles vivem, se estão corpulentos e relaxados como
bichos domesticados, ou se estão esguios e ágeis como animais de caça. Como o
mundo deles é, se há outros seres vivendo lá, quais são essas criaturas, quais
estações. Investigue Talgath. E não faça nada sem que eu ordene.
O rosto de Kil’jaden, apesar de ter pouca semelhança com o que era antes de
juntar-se com o grande Sargeras, ainda era capaz de simular um sorriso.
Durotan, como todos do seu povo, foi iniciado com o treinamento de armas
desde os seis anos de idade. Seu corpo já era alto e estava desenvolvendo e o
uso de armamento era natural para eles. Aos 12 anos ele já acompanhava os
grupos de caça. E agora, depois do rito que o marcava como um adulto, ele
pôde se juntar às caçadas aos ogros e seus mestres grosseiros, os gronns.
Esse ano, com a chegada do outono e do Kosh’harg, ele se juntou ao círculo dos
adultos depois que as crianças foram mandadas para a cama. Ele e Orgrim
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aprenderam no ano anterior que ser um adulto e fazer parte da roda em volta
da fogueira não era muito interessante.
Contudo, a única coisa que achava interessante, enquanto observava com seus
olhos castanhos, era interagir com pessoas que ele conhecia apenas por nome e
nunca conversavam com ele por ser muito jovem. Mãe Kashur era do clã e ele
sabia que ela tinha alta estima entre os xamãs de outros clãs e ele se orgulhava
disso. Na sua primeira noite, percebeu que ela se aninhava perto do fogo, um
cobertor de pele de lobo envolto num corpo que mais parecia pele e osso. Ele
sabia, sem saber como, que esse seria o último Kosh’harg que ela celebraria, e
isso o entristecia mais do que esperava.
Próximo a ela e mais jovem, mas ainda mais velho que os pais de Durotan,
estava o aprendiz de Kashur, Drek’Thar. Durotan não conversou muito com ele,
mas a língua ferina e olhos afiados impunham respeito. Os olhos de Durotan
continuavam a obervar a assembleia. No dia seguinte, os xamãs terão partido
para suas reuniões com os ancestrais na montanha sagrada. Sentiu um calafrio
ao lembrar-se de sua última visita e a brisa fresca que parecia uma corrente,
mas que era algo incomum.
E num canto estava Grom Hellscream, o chefe jovem e um tanto fanático do clã
Warsong. Apenas um pouco mais velho que Durotan e Orgrim, ele era novato
em sua posição. Havia rumores sobre as circunstâncias da morte misteriosa do
chefe anterior, mas o clã não desafiou a liderança de Grom. E ele entendia o
porquê. Apesar de jovem, era intimidador. A luz dançante da fogueira
tremeluzia, deixando-o mais ameaçador. Seu cabelo negro e grosso caia sobre as
costas. Ao ascender à chefia, teve seu queixo tatuado de preto. Usava um colar
com ossos em volta do pescoço. E ele sabia o que significava; entre os membros
do clã Warsong, era tradição que um guerreiro novato usasse os ossos de sua
primeira caça, com suas próprias runas inscritas.
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À esquerda de Drek’Thar sentava o famoso Ner’zhul, do clã Shadowmoon. Por
tanto tempo quanto lembrava, ele liderou os xamãs. Uma vez foi permitido a
ele ir numa caçada na qual Ner’zhul estava presente e a maestria de suas
habilidades era de assombrar. Enquanto outros grunhiam e se esforçavam para
evocar os elementos, direcionando-os potentemente, mas sem encanto, Ner’zhul
permanecia tranquilo. A terra tremia sob seus pés quando ele pedia;
relâmpagos descendiam dos céus para atingir onde direcionasse. Fogo, ar, água,
terra e o esquivo Espírito da Natureza, todos o consideravam como
companheiro e amigo. Não o viu interagir com os ancestrais, só os xamãs
poderiam testemunhar tais coisas. Mas era óbvio que se os ancestrais não o
favorecessem, não sustentaria o poder tão serenamente até hoje.
Já o aprendiz de Ner’zhul, ele não gostava. Orgrim estava sentado a seu lado e
percebendo onde o olhar dele estava fixado, inclinou-se e cochichou. “Eu acho
que Gul’dan serviria melhor seu povo se fosse usado como isca.”
Durotan desviou o olhar para que ninguém o visse sorrir. Não sabia quão
experiente xamã Gul’dan era; com certeza dispunha de alguma habilidade ou
não seria escolhido para sucessão. Mas ele não era um orc muito predisposto.
Mais baixo que alguns, mais fraco do que a maioria, com uma barba pequena e
espessa, não era o exemplo de um guerreiro orc. Mas Durotan supunha que não
precisava ser um herói para contribuir.
“Quem - quem é ela?” murmurou. Seu coração já estava apertado, pois com
certeza essa fêmea magnífica pertencia a outro clã. Ele notaria tal beldade –
forte, flexível, graciosa – se fosse do seu clã.
Orgrim gargalhou e bateu nas costas dele. O som do gesto fez com que vários
virassem a cabeça em sua direção, inclusive, como percebeu, da amável fêmea.
Orgrim inclinou-se para falar as palavras que fizeram seu espírito flutuar.
Uma Frostwolf? Como diabos ele falhou em notar um tesouro desses em seu
clã? Virou-se para observá-la de novo. E notou que ela o encarava e seus olhares
entrelaçaram.
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“Draka!”
Draka nasceu doente, sua pele era castanho claro como dos cervos ao invés do
castanho escuro e saudável dos cascos das árvores, marca dos orcs. Por quase
toda sua infância, Durotan escutava os adultos sussurrando sobre ela, como se
já fosse, tão jovem, para juntos dos ancestrais. Uma vez seus pais se referiram a
ela com tristeza, se perguntando o que fizeram de errado para que os espíritos
os amaldiçoassem com uma frágil criança.
Foi logo após isso, percebeu juntando as peças, que a família de Draka mudou-
se para os arredores do acampamento. Não a tinha visto muito, já que estava
ocupado com suas obrigações.
Draka cortou vários pedaços de carne e levou para sua família. Notou que havia
duas crianças junto aos orcs que pareciam ser os pais dela. Ambos estavam em
forma e com saúde. Sentindo o olhar dele, ela o encarou com firmeza. Suas
narinas dilataram e sentou-se altiva, como se desafiasse ele a olhá-la com dó ou
piedade ao invés de respeito e admiração.
Não, ela não precisava de compaixão. Pela graça dos espíritos, a cura dos xamãs
e a determinação evidente em seus olhos castanhos, ela teve de livrar-se de sua
fragilidade quando criança para amadurecer-se nessa...visão da orc fêmea
perfeita.
Orgrim o acotovelou e seu fôlego escapou com um ruído. Durotan olhou seu
amigo de infância.
“Fecha essa boca, ou vou colocar algo nela pra fechá-la.” grunhiu Orgrim.
Mas ele sonharia com ela. E quando acordou, soube que ela seria dele. Era
herdeiro da chefia e um dos mais orgulhosos do clã.
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Durotan estava pasmo. Ele abordou Draka pela manhã e a convidou para caçar
com ele no dia seguinte. A sós. Ambos sabiam o que isso significava; macho e
fêmea caçando juntos fazia parte do ritual de cortejo. E ela o repeliu.
Foi tão inesperado que não soube como reagir. Ela o olhou quase
desdenhosamente, lábios curvados num sorriso arrogante.
“Não tenho idade.” replicou mais parecendo uma desculpa do que uma razão.
Mas ele não seria desmotivado facilmente. “Minha intenção era que fosse uma
caçada de cortejo.” disse francamente. “Mas se ainda não está na idade, eu
respeito. Mesmo assim, gostaria da sua companhia e que esta seja uma caçada
compartilhada por dois guerreiros valiosos, nada mais.”
Ficou desconcertada. Durotan imaginou que ela esperava que forçasse o convite
ou fosse embora com raiva.
“Eu...”
Deteve-se com os olhos bem abertos. Então sorriu. “Irei nessa caçada, Durotan,
filho de Garad, líder do clã Frostwolf.”
Nunca achou que seria tão feliz. Isso era muito diferente do que uma caçada
normal. Estavam andando a passos largos e rápidos. Todos os desafios que teve
com Orgrim, deram a ele vigor e preocupou-se em estar indo rápido demais.
Mas Draka, nascida tão frágil e agora robusta, o acompanhou sem dificuldade.
Não trocaram muitas palavras, não havia o que dizer. Estavam caçando,
achariam uma presa, matariam, e levariam para o clã. O silêncio era fácil e
confortável.
41
Balançou a cabeça. “Sangue não, mas o padrão das pegadas me diz isso.”
Apontou para onde ele olhava. Ele não viu nada que indicasse um animal
machucado, e ficou intrigado.
Seguiram a trilha como lobos farejando. Durotan parou de liderar, pois essa
fêmea estava em pé de igualdade. Eles se complementavam bem. Ele tinha
olhos mais aguçados, mas ela enxergava os detalhes. Imaginou como seria lutar
ao lado dela. Seus olhos no solo perante eles deram a volta. Ele imaginou como
seria.
O grande lobo preto rodopiou, agachado e rosnando para o mesmo animal que
eles estavam rastreando. Por um instante interminável, os três predadores
trocaram olhares. Mas antes mesmo da poderosa besta juntar forças para saltar,
Durotan já havia atacado.
Não sentiu o machado pesar quando levantou e o atingiu. O golpe pegou fundo
no torso do animal, mas Durotan sentiu a mordida em retaliação esmagar seu
braço. Sentiu uma dor apavorante e chocante. Libertou seu braço. Foi mais
difícil levantar o machado com sangue se esvaindo, mas ele o fez. O lobo virou
sua atenção para Durotan, seus olhos amarelados fixados no dele, abriu sua
boca num rugido. Seu hálito cheirava a carne podre.
Naquele instante, antes que a mandíbula gigante pudesse fechar em sua cabeça,
Durotan ouviu um grito de guerra. Viu um borrão no canto do olho. Draka
avançou para cima do lobo com sua longa e adornada lança a sua frente. A
cabeça do lobo foi jogada para trás assim que foi atingida no tronco. Nesse
momento de desatenção, Durotan suspendeu seu machado de novo e trouxe-o
para baixo, o mais forte que conseguiu. Sentiu a lâmina cortar através do corpo
do animal, descendo até atingir fundo o solo, alojando tão firme que não pôde
tirá-la de imediato.
42
Recuou ofegante. Draka estava ao seu lado. Sentiu que o calor, a energia e a
paixão dela pela caça eram iguais à dele. Juntos encaravam a criatura poderosa
que tinham matado. Foram pegos desprevenidos por um animal que
normalmente requer vários guerreiros maduros para abater, e eles saíram vivos.
O inimigo jazia morto sobre a poça de sangue, partido em dois pelo machado
de Durotan e o coração varado pela lança de Draka. Ele percebeu que nunca
poderia dizer quem realmente matou o lobo e isso o deixou ridiculamente feliz.
Sentou-se pesadamente.
Draka foi logo ampará-lo, lavando o sangue de seu braço, apenas para
resmungar ao ver que mais sangue aparecia. Passou bálsamo e amarrou firme
com bandagens; juntou algumas ervas e água, obrigando-o a beber. Depois de
algum tempo a tontura passou.
“Obrigado.” murmurou.
Ela concordou sem olhá-lo. Então um pequeno sorriso apareceu no canto de sua
boca.
Foi mais bruto do que gostaria e ela olhou de imediato para ele, surpresa com o
tom.
“De maneira nenhuma. Lutou bem Durotan. Muitos teriam largado o machado
depois de uma mordida daquela.”
Olhou para ele sorrindo. “Eu sei de algo e você não sabe. Mas...depois
disso...acho que vou te contar.”
“Eu disse ontem que não tinha idade para a caça de cortejo.”
“Verdade.”
“Entendo.” disse apesar de não entender. “Bom...e quando será esse dia?”
43
Ele olhou-a por um longo tempo, então, sem falar nada, puxou ela para si e
beijou-a.
Talgath tem observado os orcs por um período. Agora, afastou-se, pois sua
natureza bestial o ofendeu. Ser um man’ari era bem melhor. Tirando as
criaturas fêmeas com asas de couro e rabo, os man’ari saciavam seu desejo com
violência, não copulando. E ele preferia assim. Na verdade, preferiria ter
matado os dois na hora, mas seu mestre foi bem claro sobre intervenções. Se
esses dois não voltassem para seu clã, levantaria suspeita e apesar de serem tão
importantes como moscas, estas ainda podiam tornar-se um incômodo.
Kil’jaeden queria que ele apenas observasse e reportasse, nada mais.
Vingança, meditava Kil’jaeden, era como um fruta no pé, mais doce quando
estava totalmente madura. Houve momentos através dos anos quando ele
alimentava dúvidas sobre ser capaz de localizar os renegados. Contanto, quanto
mais Talgath dividia com ele, mais confiante e animado ele ficava.
Kil’jaeden percebeu que Talgath estava perplexo quando viu que ele estava
mais interessado nos orcs do que em Velen. Como se organizavam? Quais eram
seus costumes? Quem eram seus líderes, e como eram escolhidos? O que era
mais importante para eles como uma sociedade? E como indivíduo?
Mas o trabalho de Talgath era reportar e não avaliar, e ele obedecia a seu
mestre. Quando finalmente Kil’jaeden absorveu tudo o que Talgath aprendeu,
até o nome das duas bestas acasalando depois de caçarem juntos, ele ficou
satisfeito – pelo menos até agora.
44
queria-os mortos. Mas ele queria arruiná-los. Humilhados. Esmagados tão
completamente quando um inseto sob uma bota.
45
Capitulo 6
Feliz, Ner’zhul olhou para o céu poente. O pôr do sol estava reluzente hoje. Os
ancestrais deveriam estar satisfeitos, refletiu, sentindo-se um tanto orgulhoso.
Mais um Kosh’harg tinha chegado e ido embora. Eles pareciam cada vez mais
difíceis do que nos outros anos, e toda a vez que a celebração ocorria, havia algo
para alegrar-se e algo para lamentar.
Sua velha amiga Kashur – sabia que dentre o clã Frostwolf era chamada de
“Mãe” – havia ido ao encontro dos ancestrais. Pelo o que ficou sabendo, havia
morrido bravamente. Ela havia insistido em juntar-se à caçada; algo que não
fizera há anos. Os Frostwolves haviam caçado fenocerontes e a Mãe ansiã
estava na dianteira junto com os guerreiros. Havia morrido pisoteada antes
mesmo que pudessem salvá-la e Ner’zhul sabia que o clã, mesmo em luto,
celebrava sua vida e como escolheu partir. Esses eram os jeitos dos orcs.
Perguntou-se se a veria e então repreendeu o pensamento. Ele a veria se achasse
que era apto para revelar-se. Morte não era esse deserto de tristezas para um
xamã como era para os outros orcs, pois tinha o privilégio de estar novamente
na presença dos amados falecidos, compartilhar de sua sabedoria, sentir sua
afeição.
O clã havia sofrido uma dupla tragédia, pois no meio tempo entre um
Kosh’harg e outro a morte tinha também levado o líder Garad. Os Frostwolves
tiveram o azar de, em um dia ensolarado, trombar com no mínimo três ogros e
seu mestre monstruoso. As horríveis criaturas eram estúpidas, mas ferozes, e o
gronn era um inimigo astuto. Os orcs saíram vitoriosos, mas a um alto custo.
Naquele dia negro, apesar de todo o esforço dos curandeiros, Garad e muitos
outros morreram em função dos ferimentos.
46
Mas nas angustias da perda de um líder, e um que Ner’zhul conhecera e
respeitara, havia a alegria do sangue novo para assumir. Kashur havia falado
bem de Durotan, e pelo o que havia visto, o jovem seria um ótimo líder.
Assistiu Durotan ser nomeado chefe e notou uma fêmea atraente e de olhar
impetuoso, observando a cerimônia com mais do que apenas simples interesse
pelo clã. Estava certo que até o próximo Kosh’harg a amável Draka seria a
parceira do novo chefe dos Frostwolves.
Voltou para sua pequena cabana, a qual uma vez dividiu com sua companheira,
que havia falecido há muitos anos. Rulkan o visitava de vez em quando sem
partilhar palavras de sabedoria, mas enchendo seu coração com ternura e
abrindo-lhe novamente para as necessidades de seu povo cada vez que seu
espírito tocava o dele. Sentia saudade de sua risada rouca e do calor ao lado
dele na cama, mas estava contente. Talvez, pensou ele, Rulkan apareceria essa
noite.
Ner’zhul fechou os olhos e logo os abriu de novo, mas sabia que estava
dormindo profundamente.
Ele e sua amada Rulkan estavam no topo da montanha. De começo achou que
olhavam o pôr do sol, mas percebeu que o sol estava nascendo e não descendo
para dormir. O céu estava magnífico, mas de uma maneira que estimulava e
incitava-o ao invés de acalmá-lo e confortá-lo. As cores eram escarlate, roxo e
laranja, quase violento, e seu coração elevou-se.
Rulkan virou-se, sorrindo, e pela primeira vez desde que exalou seu último
suspiro como ser vivo, falou com ele.
Arfou, tremendo, dominado pelo amor por ela, inundado com uma emoção
latente inflamada pelas cores vibrantes do sol nascente. Um novo começo?
47
“Você guiou bem o nosso povo.” disse. “Mas chegou a hora de aprofundarmos
os velhos costumes, levá-los adiante pelo bem de todos.”
Um pensamento cutucou sua consciência. Rulkan não tinha sido uma xamã,
nem uma chefe. Foi apenas uma maravilhosa orquisa, o que foi mais do que
suficiente para Ner’zhul, mas ela não havia tido nenhuma posição importante
durante a vida que a faria falar com tanta autoridade. Contrariado com sua falta
de fé, suprimiu o sentimento. Ele não era um espírito, era apenas carne e osso e
apesar de entender mais sobre o caminho dos espíritos, também sabia que havia
muito que jamais entenderia até juntar-se a eles. Por que Rulkan não falaria
pelos ancestrais?
“Estou escutando”
Ela sorriu. “Sabia que escutaria. Tempos negros e perigosos virão para os orcs.
Até agora, apenas nos reunimos durante o Kosh’harg. Esse isolamento deve
acabar se queremos que nossa raça sobreviva.”
Rulkan olhou para o sol, seu rosto pensativo e coberto pelas sombras. Ner’zhul
ansiou por abraçá-la, tomar dela o fardo que carregava como fazia em vida. Mas
agora, ele sabia que não podia tocá-la, nem forçá-la a falar. Então sentou em
silêncio, bebendo de sua beleza, ouvidos atentos à sua voz.
“Há uma praga nesse mundo.” disse com calma. “Deve ser eliminada.”
Voltou-se para ele, seus olhos procurando os dele enquanto a luz ficava mais
brilhante.
A maneira como ela disse isso fez o coração dele disparar. Ele já era poderoso,
honrado, talvez ainda reverenciado pelo seu próprio clã Shadowmoon. Já era o
líder dos orcs, apesar de não oficialmente. Mas agora o desejo por mais atiçou
seu coração. E o medo também o atiçou; sombrio e desagradável, mas que
precisava ser enfrentado.
“Qual é a ameaça que precisa ser dissipada antes que os orcs possam
reivindicar o que lhes é de direito?”
Ela disse.
48
Ele fez o desjejum com as duas pessoas do clã que mais confiava: Draka, sua
pretendida, com quem iria casar-se numa grandiosa cerimônia na próxima lua
cheia, e Drek’Thar, o novo chefe dos xamãs do clã.
Para Durotan, Chefe do clã Frostwolf, o xamã Ner’zhul manda saudações. Fui
agraciado com visões dos ancestrais que é de interesse de todos, como orcs, e
não como membros indivíduos de um clã. Falarei com os líderes de todos os
clãs no décimo segundo dia desta lua, assim como cada xamã de cada clã. Vocês
devem ir ao pé da montanha sagrada. Carne e bebidas serão concedidas. Se não
comparecer, vou considerar como um sinal de que não se importam com o
futuro de nosso povo e que irão agir de acordo. Perdoe-me pela maneira brusca,
mas essa questão é de extrema urgência. Favor responder pelo meu mensageiro.
“Eu não sei, a não ser que obviamente Ner’zhul sente que isso é de extrema
importância.” admitiu Drek’Thar. “Tal coisa nunca acontece fora das
cerimônias do Kosh’harg. E lá os xamãs sempre se reúnem na presença dos
ancestrais. Mas nada fora disso. E nunca ouvi falar de alguém convocar os
chefes. Mas o conheço desde sempre. É um grande e sábio xamã. Se os espíritos
fossem falar com qualquer um de nós sobre algo que nos ameaça, falariam
através dele.”
“Não discordo de você.” disse. Inicialmente o tom da carta fez seus pelos
eriçarem e estava propenso a recusar. Mas quando leu de novo, olhou através
das palavras soberbas para ver a intenção por trás da carta.
49
Certamente algo estava incomodando o orc que todos respeitavam, e isso valia
alguns dias de viagem.
Draka rosnou. “Sou Draka, filha de Kelkar, filho de Rhakish. Sou pretendida e
logo serei sua parceira para o resto da vida. Não irá me proibir de acompanhá-
lo!”
Durotan riu jogando sua cabeça para trás, tocado pela demonstração da sua
garra. Escolheu muito bem. Da orquisa nascida frágil, surgiu força e fogo. O clã
Frostwolf irá prosperar com ela a seu lado.
“Então, chame o mensageiro, se ele já terminou sua refeição.” falou com bom
humor ainda contaminado em sua rouca voz. “Diga que iremos a essa estranha
reunião, mas que ele assegure a necessidade dela quando chegarmos.”
Não era uma jogada arrogante por poder, mas um sentimento verdadeiro de
ameaça. Inclinou a cabeça e foi embora para acomodar seu clã.
50
Draka seguiu o olhar de seu futuro parceiro e grunhiu também satisfeita. Ela
havia se dado muito bem com Orgrim, pelo que Durotan era agradecido. Era
sortudo, pois as duas pessoas que mais lhe importava tornaram-se amigos.
Draka, que o conhecia bem, apertou sua mão. Não disse nada, pois não era
necessário. Sorriu para ela.
O mesmo esguio mensageiro avisou que Ner’zhul não iria realizar a reunião
antes da manhã seguinte, uma vez que vários clãs chegariam aos poucos
durante a noite. O acampamento do Frostwolf era menor do que a maioria, mas
mais harmonioso do que muitos. Trouxeram barracas de viagens e peles, e o
mensageiro foi acomodado e guarnecido com carne, peixe e frutas em
abundância. Um lombo de talbuque girava lentamente na fogueira, com seu
perfume irresistível, deixando os orcs com o apetite aberto mesmo enquanto
banqueteavam-se de peixe cru. Estavam em onze no total – Durotan, Draka,
Drek’Thar e oito de seus xamãs. Alguns pareciam bem jovens, mas xamãs
aumentavam suas habilidades com o tempo e uma vez que os ancestrais
apareciam para eles em visões, eram todos iguais em honra e respeito.
“Seja bem vindo velho amigo.” vociferou ao abraçar com força o outro orc.
Assim como na juventude, mesmo Durotan sendo alto, Orgrim era maior do
que ele. Enquanto observava o segundo em comando do clã Blackrock,
secretamente admirou-se como pôde ser capaz de superá-lo em algo.
51
“Vamos caminhar então.” replicou.
“Draka e eu tivemos a mesma reação, mas ainda bem que viemos. Você viu a
expressão no rosto do Ner’zhul. Apenas olhá-lo foi o bastante para perceber que
fizemos certo em vir.”
Orgrim bufou com escárnio. “Foi o que bastou para mim também, mas quando
deixei o acampamento, Blackhand ainda estava enfurecido com o xamã. Ele não
vê o que nós vemos.”
Não era da conta dele falar mal de outro líder de clã, mas também não era
segredo o que a maioria dos orcs pensa sobre Blackhand. Era certamente um orc
poderoso, em seu auge, maior e mais forte que qualquer orc que Durotan já viu.
E não era ignorante. Mas havia algo nele que o deixava desconfiado. Decidiu
segurar a língua.
“Até no escuro vejo o esforço que está fazendo, velho amigo.” murmurou. “Não
precisa falar as palavras para que eu saiba o que ia dizer. Ele é meu chefe, jurei
lealdade a ele e não irei quebrar o juramento. Mas até mesmo eu tenho minhas
dúvidas.”
52
Seus olhos recaíram sobre uma forma sombreada nas costas de Orgrim.
Orgulho e pesar o inundaram ao falar. “Você carrega a Doomhammer agora.
Não sabia que seu pai havia falecido.”
Desprendeu a arma de suas costas e ergueu-a. Era como assistir uma dançarina,
pensou Durotan – equilíbrio entre força e graça. A lua brilhava sobre o corpo
forte de Orgrim enquanto ele movia-se, agachava, saltava e girava. Finalmente,
ofegando e suando muito, Orgrim guardou a arma lendária.
53
Capitulo 7
Sei bem que nós orcs perdemos mais do que ganhamos. Até então nossa cultura
era preservada, inocente, pura. Éramos como crianças que sempre estiveram a
salvo, amadas e protegidas. Mas crianças precisam amadurecer e nós, como
povo, fomos facilmente manipulados.
Há lugar para a confiança, ninguém pode me acusar de não saber disso. Mas
também precisamos ser cuidadosos. Aqueles com rostos sinceros podem
enganar e até mesmo aqueles em quem acreditamos podem ser ludibriados.
Era uma longa fila de rostos solenes que olhavam para o grupo de líder dos clãs
orcs. Durotan estava ao lado de Draka, com a mão em volta de sua cintura num
gesto protetor, apesar de não saber o porquê sentia que ela precisaria de
proteção. Seus olhos arregalaram quando viu na expressão de seu amigo e
conselheiro Drek’Thar algo de arrepiar os cabelos.
“Ele está há muito tempo sem caçar.” murmurou Draka indicando Blackhand.
“Está procurando por uma briga.”
“Nunca vi Drek’Thar desse jeito, nem mesmo quando viu o corpo quebrado de
Mãe Kashur.” disse Draka.
Todos abriram caminho para Ner’zhul ao que ele avançou para centro da
multidão. Começou a andar em círculos, falando baixo. Então parou e levantou
as mãos. Fogo irrompeu a sua frente, saltando em direção ao céu numa
demonstração que arrancou sons de admiração até daqueles que já haviam visto
esse tipo de coisa antes.
O pilar ficou ali por um longo tempo e então abaixou para virar uma fogueira
tradicional, embora mágica.
54
“Ao cair da escuridão, de muitas maneiras além dessa, sentem em volta do
fogo.” comandou Ner’zhul.
“E que tal nós buscarmos uma presa também e ajoelharmos obedientes aos seus
pés durante a noite.” bradou uma voz furiosa.
Durotan conhecia aquela voz; escutara-a alterada por muitas vezes durante o
Kosh’harg quando era jovem e seu dono era conhecido por dar gritos que
arrepiavam durante as caçadas. Era peculiar e inconfundível. Virou para olhar
Grom Hellscream, o jovem líder do clã Warsong, e desejou que aquela explosão
não atrasasse o que Ner’zhul tinha para falar para eles.
Vermelho e preto eram as cores do clã Warsong e apesar de não usar armadura,
as vestimentas em couro naquelas cores já davam um toque majestoso. Grom
ficou a frente de seu clã e era mais esguio que a maioria dos orcs, mas ainda
imponente e alto. Cruzou os braços e encarou Ner’zhul.
O xamã não mordeu a isca, apenas suspirou profundamente. “Sei que muitos
estão com suas honras ofendidas. Deem-me chance para falar e ficarão
satisfeitos de estarem aqui, assim como os filhos de seus filhos.”
Grom resmungou, mas não disse mais nada. Ficou de pé por um tempo e
encolheu os ombros ao sentar-se, como se isso indicasse que o fez por vontade
própria. Seu clã fez o mesmo.
“Eu tive uma visão.” começou, “de um dos ancestrais que mais confio. Ela me
revelou uma ameaça, espreitando como um escorpião venenoso em um arbusto.
Todos os outros xamãs podem comprovar isso, e eles irão assim que tiverem
oportunidade de falar. Fico entristecido e furioso em ver como fomos tão
ingênuos.”
Ner’zhul suspirou, olhando para o chão, então balançou a cabeça. Sua voz era
grave e confiante, entrelaçada em tristeza.
E o caos explodiu.
55
em seu rosto. Os draenei? Certamente algo estava errado. Os gronns sim, quem
sabe se encontraram algum conhecimento secreto contra os odiados orcs...mas
não. Não os draenei.
Eles nem eram guerreiros do nível dos orcs. É verdade que caçavam, mas eles
precisavam de carne para sobreviver assim como eles. Eram páreo contra os
gronns e às vezes ajudavam alguns grupos de caça. Durotan se lembrou do dia
em que dois jovens orcs estavam fugindo de um ogro cujos passos faziam a
terra tremer, e as esbeltas figuras azuis que apareceram do nada para salvá-los.
Por que arriscariam sua segurança para salvar dois garotos se eram mesmo tão
maléficos quanto Ner’zhul acreditava? Não fazia sentido. Nada do que havia
dito fazia sentido.
Ner’zhul implorava por silêncio, mas sem sucesso. Blackhand estava de pé,
veias saltadas em seu pescoço enquanto Orgrim fazia de tudo para aplacar a
fúria de seu chefe. Então um ruído terrível perfurou o ar, ensurdecedor e quase
fazendo o coração parar. Grom Hellscream estava de pé, cabeça jogada para
trás, peito estufado e seu maxilar preto tão aberto quanto de uma cobra ao dar o
bote. Nada podia competir com o grito de guerra de Hellscream, sendo
sucedido por um silêncio total.
Abriu seus olhos e sorriu para Ner’zhul, que parecia completamente sem jeito
por ver um até então opositor, virar um aliado tão rápido.
“Deixe o xamã continuar.” disse. Tão grande era o silêncio depois da sua
explosão que as palavras foram ouvidas por todos apesar de terem sido ditas
num tom normal. “Quero saber mais sobre esse novo...velho inimigo.”
Ner’zhul sorriu em gratidão. “Sei que isso assustou vocês. Fiquei chocado
também. Mas os ancestrais não mentem. Esses seres aparentemente
benevolentes têm esperado por anos até o momento certo para nos atacar. Eles
se sentam em segurança atrás de suas estranhas edificações feitas com materiais
que não compreendemos e guardam segredos que podem nos beneficiar.”
“Mas por quê?” questionou Durotan antes mesmo de perceber que estava
falando. Todas as atenções estavam voltadas para ele, mas não recuou. “Por
que querem nos atacar? Se eles guardam tantos segredos, por que precisam de
nós? E como podemos derrotá-los se isso for mesmo verdade?”
O xamã ficou desconcertado. “Isso eu não sei, mas sei que os ancestrais estão
preocupados.”
56
“Não tanto assim.” devolveu Durotan. “Além do mais, são superiores em
conhecimento. Vieram para cá em um navio que navega pelos mundos,
Blackhand. Acha que cairão diante de flechas e machados?”
Abriu os braços implorando. “Somos clãs separados, sim, cada um com sua
tradição e legado. Não estou pedindo que desistam da sua honrosa história,
apenas que abram suas mentes para a unificação de clãs que são fortes sozinhos
e que juntos virariam uma força irreversível. Somos todos orcs! Blackrock,
Warsong, Thunderlord, Dragonmaw...não percebem quão pouco essas
distinções importam? Somos um povo só! No final, queremos lares seguros
para nossas crianças, sucesso nas caçadas, companheiras que nos amem, e
honra entre os ancestrais. Somos mais parecidos do que diferentes.”
Durotan sabia que o xamã falava a verdade e olhou seu amigo que estava atrás
de seu chefe, imponente e solene. Mas quando viu Durotan olhando para ele,
acenou em concordância.
Houve aqueles que protestaram contra a incomum amizade entre os dois jovens
aventureiros e inclinados a problemas, tinha que admitir. Mas Durotan não
seria a pessoa que é hoje se não tivesse se espelhado na firmeza de Orgrim; e
sabia do fundo de seu coração que seu amigo sentia o mesmo.
Mas os draenei...
“Posso falar?”
“Meu chefe,” e para o assombro de Durotan, a voz dele tremia, “meu chefe, o
que Ner’zhul diz é verdade. Mãe Kashur confirmou.”
57
enquanto Mãe Kashur falava com alguém que ele não podia ver, mas que sabia
estar lá.
“Mãe Kashur disse que os draenei são nossos inimigos?” perguntou não
acreditando no que ouvia.
Drek’Thar assentiu.
“Os draenei não são nossos amigos.” disse. “Meu chefe...sei que você e o
Doomhammer ficaram uma noite em sua cidade. Sei que você falou bem deles e
que deram a impressão de terem salvado suas vidas. Mas permita-me
perguntar...não estranhou nada?
“Vejo vincos em sua testa, meu chefe. Posso considerar então que sua fé neles
quando jovem começa a diminuir?”
Durotan não respondeu ou olhou para o líder dos seus xamãs. Olhou para o
chão, não querendo se sentir daquele jeito, mas incapaz de parar a dúvida que
aumentava em seu coração, como os dedos gélidos de uma manhã fria.
Em sua memória, ele reviveu o diálogo que teve com Restalaan, dizendo a ele,
“Não somos os mesmos.”
58
longas semelhantes a de répteis e brilhantes cascos azuis ao invés de pés
normais como dos orcs –
Durotan então disse numa voz rouca sobre a chegada afortunada dos draenei,
da quase arrogância de Restalaan. “E...Velen, seu profeta, fez muitas perguntas
sobre nós, e não era apenas conversa jogada fora. Ele realmente estava
interessado em saber mais sobre os orcs.
Os ancestrais não mentiriam para eles, especialmente sobre algo tão importante.
Durotan sabia disso. E agora que relembrou com uma nova luz de sabedoria os
eventos daquele dia e noite, era óbvio quão suspeita as ações de Velen tinham
sido. E ainda...era Velen tão incrivelmente dissimulado que toda aquela
confiança que ambos sentiram era mentira?
“Há uma parte de mim que ainda duvida, meus amigos.“ disse baixinho. “E
mesmo assim não posso colocar o futuro de nosso povo em risco em algo tão
superficial como minhas dúvidas pessoais. Ner’zhul não propôs um ataque
amanhã, mas para que começássemos a treinar, observar, preparar e nos
aproximar. Isso será o bastante pelo bem dos Frostwolves e pelo bem dos orcs.”
Olhou para cada rosto preocupado, alguns apenas amigos, outros, como
Drek’Thar e Draka, conhecidos e amados.
59
Capitulo 8
Com que facilidade uma mente amedrontada pode recorrer ao ódio – uma
reação protetora, natural e instintiva. Concentramos-nos naquilo que nos
dividia ao invés do que nos unia. Minha pele é verde; a sua é rosa. Eu tenho
presas; você longas orelhas. Minha pele é lisa; a sua coberta de pelos. Eu respiro
ar; você não. Se tivéssemos nos apegado a essas coisas, a Legião Ardente não
teria sido derrotada, pois eu nunca teria desejado me aliar à Jaina Proudmore,
ou lutar ao lado de elfos. Meu povo não teria sobrevivido e feito amizade com
os taurens, ou os renegados.
Assim foi com os draenei. Nossa pele então era castanho-avermelhada e a deles
azul. Tínhamos pés e eles cascos e cauda. Vivíamos geralmente ao ar livre, eles
viviam em espaços fechados. Nós tínhamos uma vida curta; ninguém sabia o
quanto eles viviam.
Não importa que eles tenham demonstrado apenas cortesia e franqueza; que
tenham comercializado conosco, nos ensinado e compartilhado tudo o que era
pedido a eles.
Todos os dias, minha prece é por sabedoria para guiar meu povo. E nessa prece
se oculta um apelo; nunca me deixar cegar por diferenças tão banais.
Não mais.
60
outros tipos de armas para serem usadas contra os draenei. Proteção seria vital,
e embora anteriormente os ferreiros e curtidores fizessem armaduras que
atenuassem ataques de garras e dentes, agora teriam que criar itens que
protegeriam o portador se fosse empalado ou cortado por uma espada. Aqueles
que entendiam do ofício da ferraria eram escassos e agora eles ensinavam
dúzias ao mesmo tempo. As forjas ressoavam noite e dia com o som dos
martelos e o silvo do metal quente sendo mergulhado em barris d’água. Muitos
passavam longos dias brandindo picaretas, forçando a terra a ceder minérios
necessários para produzir armas e armaduras metálicas. Antes as caçadas
aconteciam quando necessário, agora eram feitas diariamente, uma vez que a
comida era desidratada e preservada, e as peles eram usadas nas armaduras.
Para Durotan, que era um dos instrutores, os jovens que estavam enfileirados
para o treinamento pareciam muito novos. Lembrou-se de seu pai ensinando-o
sobre o manejo da lança e da espada. O que ele acharia desses pequenos
encurvados sob a brilhante armadura, segurando armas que nenhum orc havia
antes carregado?
Draka, que se juntou a ele num ritual rápido e discreto já que não queria gastar
tempo ou recursos do treinamento de guerra, tocou seu ombro com gentileza.
Como sempre, ela sabia o que ele estava pensando.
Sorriu com tristeza para ela. “Não, não irei. Somos guerreiros. Prosperamos na
caçada, no desafio, no derramamento de sangue e nos gritos de vitória. São
pequenos, mas não são fracos. Irão aprender. São Frostwolves.” Pausou, e então
acrescentou com ímpeto, “Eles são.
“Eu sei...mas você não quer que nosso povo entre em batalha despreparado,”
replicou Ner’zhul. “No atual momento os draenei são amplamente superiores.”
61
“Talvez possa nos ajudar,” disse. Tinha consciência de que estava balbuciando.
“Talvez haja algum conhecimento que tenha que...que...”
Franziu a testa e inclinou a cabeça. “Eu disse tudo o que sabia, mas há outros
poderes...outras entidades...que os vivos desconhecem.”
Ela sorriu. “Você ainda vive, meu companheiro, não está pronto para lidar com
eles. Essas entidades estão nos ajudando para que possamos ajudar os amados
que deixamos para trás.”
“Não!” Ner’zhul percebeu que estava implorando, mas não tinha como evitar.
“Por favor...precisamos de ajuda para que possamos proteger as gerações
futuras da trama traiçoeira dos draenei.”
Ele não disse que estava apreciando ser o centro das atenções de todos os orcs e
clãs. Nem disse que a promessa de poder que ela fizera antes, o fez pensar sobre
essas coisas e desejá-las. Mas mais do que isso, ela tinha insuflado tanto medo
dos monstruosos draenei que esse súbito atraso da parte dela o irritava
profundamente.
Rulkan olhou-o com apreço. “Talvez você esteja certo,” disse. “Vou ver se eles
falam com você. Há um em quem eu confio mais e sua preocupação com o
nosso povo é profunda e duradoura. Vou pedir a ele.”
Breve. Ele veria esse espírito misterioso, esse bem feitor, muito em breve.
Gul’dan sorriu enquanto trazia frutas e peixe para quebrar o jejum de seu
mestre. “Outra visão, meu mestre?” Curvou-se ao presentear a comida e uma
caneca de chá de ervas quente. Á conselho de Rulkan, Ner’zhul começou a
beber uma infusão de certas ervas fermentadas com uma acurada intensidade.
Ela assegurou que a mistura continuaria a garantir que sua mente ficasse aberta
para visões. Não demonstrou que desgostava, mas no começo achou a poção
desagradável. Agora percebeu que apreciava a bebida que tomava logo ao
acordar e mais três vezes ao dia. Ele aceitou a caneca e bebericou enquanto
acenava em resposta à pergunta de Gul’dan.
62
O xamã não conteve o sorriso se formando em volta de suas presas. “E isso
continua sendo verdade. Mas há muito que não sabemos. Muito que os
ancestrais veem, mas nós seres vivos não. Rulkan disse que está em contato com
essas entidades. A sabedoria eles excede a dos ancestrais e eles virão nos ajudar.
Disse ainda que há um em particular que tomou os orcs sob sua proteção. E em
breve... ele se revelará para mim!”
Os olhos de Gul’dan brilharam. “E...talvez para mim também, mestre?”
“Você é competente, Gul’dan. Não teria escolhido você como aprendiz se não
fosse merecedor, assim como ele me considera.”
Com seu líder Blackhand na dianteira, o clã Blackrock suplicou pela honra de
ser o primeiro a atacar. Houve queixas e ressentimentos, mas todos
concordaram que as habilidades de caça deles eram lendárias, além de viverem
mais perto de Telmor, uma das menores e mais isoladas cidades. Os primeiros
reforços de armaduras, espadas, flechas com ponta de metal e outras armas
para derrubar os draenei foi dado ao clã.
Ofegando, Orgrim resmungou. Parecia tão simples: ir para a guerra contra esse
novo e traiçoeiro inimigo. Mas quando todos, inclusive Orgrim, tinham
concordado e aplaudido a decisão, ninguém parou para pensar como seria
difícil se preparar. Precisariam criar os lobos para ficarem maiores, já que agora
eles carregariam armadura além de orcs que tinham ossos pesados e músculos.
As armas foram utilizadas. Várias vezes eles atacaram os ogros, e apesar destes
serem desajeitados e burros, e os draenei rápidos e inteligentes, lutar com eles
era mais parecido com o novo inimigo do que lutar com talbuques. Tiveram
algumas baixas no começo, estes foram queimados numa pira e honrados pelo
nobre sacrifício. As armas pareciam estranhas e a armadura os deixava mais
lentos, mas cada vez os ataques eram mais equilibrados. Da última vez eles
enfrentaram não apenas dois ogros, mas seu mestre também, que não apenas
tinha a ferocidade dominada pelos ogros como uma vil esperteza, tornando-o
um inimigo desafiador. Dois bravos soldados Blackrock caíram antes de Orgrim
63
conseguir dar o golpe final, brandindo o martelo da profecia e levando a
destruição ao barulhento gronn.
O rosto de uma órfã, pensou, mas não falou. Ao invés disso, disse bruscamente,
“Apenas imaginando qual a cor do sangue dos draenei.”
” Vou assegurar que seu rosto fique coberto com ele.” divertiu-se Blackhand.
64
Enquanto as feras grandes e desgrenhadas eram difíceis de serem abatidas, não
tinham a agressividade dos talbuques; e o grupo de caça draenei já tinha
isolado um deles. O animal urrou, pisoteando a terra e abaixando a cabeça para
mirar seu único chifre nos agressores, mas o fim já estava assegurado.
Blackhand levou seu grupo para uma pausa em uma serra. Orgrim podia sentir
a excitação de seus irmãos. O corpo deles tremia de antecipação em suas novas
armaduras, apertando as mãos e querendo usar as armas que estavam
começando a ficar acostumados. Blackhand estava com sua mão levantada e
seus pequenos olhos atentos à movimentação lá embaixo, esperando o melhor
momento para arremeter como um falcão a um rato do mato.
O chefe dos Blackrock virou-se para o seu xamã, que estava na retaguarda. Eles
também vestiam armaduras, mas não carregavam armas, pois não precisavam.
Curariam seus semelhantes assim que caíssem em batalha, e direcionariam o
imenso poder dos elementos contra o inimigo.
O mais velho entre eles confirmou. Seus olhos ganharam um tom feroz e seus
lábios curvaram-se num sorriso. Ele também queria ver sangue draenei ser
derramado hoje.
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investiu esmagando o inimigo. A armadura do draenei não aguentou o ataque e
amassou como um fino bracelete. Sangue e miolos espirraram no chão.
Orgrim olhou para frente, procurando seu próximo alvo. Alguns orcs estavam
presos na rede mágica criada pelo raio artificial e sujo dos draenei. Eram
guerreiros valorosos e fortes, mas as queimaduras sofridas pela rede os faziam
gritar em agonia. O cheiro acre de carne queimada misturada com o odor de
sangue tomou conta do cenário. Era intoxicante.
O único som perceptível na clareira era a vibração e altas risadas dos orcs
vitoriosos. Blackhand se dirigiu para seu segundo em comando e abraçou-o
com a força que suas armaduras permitiam.
“Eu vi a Doomhammer, mas ela era apenas um borrão de tão rápida.” disse
sorrindo. “Lutou bem hoje, Orgrim. Fiz bem em escolher você como meu
segundo.”
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isso nele no ritual de Om’riggor com o sangue de seu pai. E agora seu líder o
ungiu com o sangue do inimigo.
O sangue azul escuro escorreu para o canto da boca. Orgrim passou a língua
para provar o gosto e achou-o doce.
Tão fácil. Foi muito fácil. Nenhuma baixa, apenas alguns feridos. Os orcs foram
totalmente vitoriosos em sua primeira incursão. Blackhand desdenhou a
facilidade com a qual atacaram o grupo e esmagaram seus crânios. Tudo estava
se desdobrando como Rulkan havia prometido. Com certeza a entidade que
estava aliada a ela apareceria. Liderados por Ner’zhul, os orcs provaram seu
valor com esse triunfo decisivo.
E a entidade veio.
Era glorioso e radiante. Tão brilhante que até em sua visão Ner’zhul não
conseguia olhar diretamente. Ajoelhou-se, tremendo pela alegria e admiração
que tomou conta dele.
“Você veio.” sussurrou, sentindo as lágrimas descerem pelo rosto. “Sabia que se
o agradássemos você viria.”
“Certamente agradaram, Ner’zhul, xamã e acólito das almas dos orcs.” A voz
reverberou através de seus ossos e Ner’zhul fechou os olhos, quase zonzo com a
sensação. “Eu vi como habilmente lidou com seu povo e uniu os clãs com um
único propósito, um objetivo notável.”
“Um que foi inspirado por você, Grandioso,” murmurou. Pensou em Rulkan e o
motivo por ela não aparecer mais para ele, então esqueceu. Essa grande
entidade era muito superior comparada à alma de sua amada. Ner’zhul ansiava
pelas palavras desse ser magnífico.
67
“Você veio a nós e revelou a verdade e fizemos o que era necessário.”
continuou.
Ner’zhul piscou. Silêncio tomou conta depois de ter verbalizado seu pedido e
pensou ter sentido um arrepio. Então a voz falou novamente em sua mente e
ouvidos, e era suave e doce como mel.
A boca dele ficou seca de repente e as palavras não saiam. Com muito esforço,
pediu. “Grandioso...há um nome pelo qual podemos chamá-lo?”
Uma tímida risada resoou através do sangue de Ner’zhul. “Um favor simples e
facilmente concedido. Sim, eu tenho um nome. Você pode me chamar
de...Kil’jaeden.”
68
Capitulo 9
Era fácil entender porque tantos dos meus contemporâneos preferiram que essa
história morresse; deixasse cair no esquecimento silenciosamente, escorregando
para o fundo das águas do tempo até que a superfície do lago fique mais uma
vez tranquila e ninguém saiba da vergonha espreitando nas profundezas. Eu
também senti essa vergonha, apesar de não estar vivo quando isso aconteceu.
Vejo no rosto de Drek’thar quando conta, com uma voz trêmula, a sua parte da
história. Vi o peso que Orgrim Doomhammer carregava. Grom Hellscream,
amigo e traidor e amigo de novo, foi devastado por ela.
Mas fingir que não aconteceu é ignorar o impacto horrível que causou. Assumir
a participação em nossa destruição ao invés de nos fazermos de vítimas. Nós
escolhemos esse caminho. Escolhemos até ser tarde demais para voltar atrás. E
tendo feito essa escolha uma vez, com a sabedoria que acumulamos ao fim
dessa estrada escura e vergonhosa, podemos escolher não tomá-la.
Então desejo ouvir o testemunho daqueles que caminharam por essa que
significou a quase obliteração da nossa espécie. Quero entender porque deram
cada passo e o que teve que acontecer para que parecesse lógico e certo.
Quero entender para que quando aconteça de novo, eu possa reconhecer.
Os humanos têm dois ditados que são extremamente sábios.
O primeiro é. “Um povo que não conhece sua história está condenado a repeti-
la.”
E o segundo é...”Conheça teu inimigo.”
69
sombrio mestre Sargeras, Kil’jaeden não ignoraria possíveis recrutas.
Pesaroso como Velen, K’ure sofria junto com ele. Mas falava em sua mente
sobre a inalterável lógica de que Kil’jaeden, Archimonde e Sargeras teriam
destruído outro mundo. Todos os mundos, seres e raças eram horrivelmente
iguais aos olhos de Sargeras. Todos precisam ser destruídos num horrendo
festival de carnificina e fogo. A morte de Velen nas mãos de seres que antes
eram seus amigos queridos não salvaria nenhum dos inocentes desafortunados,
ao passo que sua vida um dia poderia.
“Como?” disse uma vez enfurecido. “Como minha vida é mais importante,
mais valiosa do que a deles?”
70
serenamente. “Pelo menos, não tão bem quanto costumava. Temo que seu
tempo esteja acabando.”
Restalaan olhou para o chão, a dor evidente em seu rosto. Os Naaru
sacrificaram-se efetivamente por eles; todos os draenei sabiam e entendiam isso.
Por mais estranho e misterioso que o ser fosse, eles passaram a gostar dele.
Havia ficado preso e estava morrendo vagarosamente há duzentos anos. Por
algum motivo, Velen achou que demoraria mais para que o ser morresse....se é
que morria, até onde entendia dessas coisas.
Levantou determinado, sua túnica marrom clara flutuando atrás dele. “Ainda
tem sabedoria para partilhar comigo, mas não tenho mais a habilidade de
escutá-lo. Devo ir até ele. Talvez a proximidade ajude a se comunicar melhor.”
“Vo-você quer dizer ir até nave?” perguntou Restalaan.
“Eu devo.” Velen respondeu.
“Grande Profeta...não é minha intenção questionar sua sabedoria, mas-“
“Mas você questiona mesmo assim,” riu Velen e o canto de seus surpreendentes
olhos azuis enrugaram com bom humor. “Continue, velho amigo. Sempre
valorizo seus questionamentos.”
Restalaan suspirou. “Os orcs adotaram a nave como sua montanha sagrada.”
“Eu sei disso.” respondeu.
“Então porque ir contra eles se aventurando lá?” contestou. “Com certeza
entenderiam isso como uma agressão, particularmente agora. Vamos dar
motivo para que continuem nos atacando.”
“Pensei nisso. Pensei muito e seriamente sobre isso. Mas talvez seja hora de
revelarmos quem somos e o que é a sagrada montanha deles. Eles acreditam
que seus ancestrais vivem lá, e talvez estejam certos. Se K’ure tem pouco tempo,
não devemos aproveitar sua sabedoria e seus poderes enquanto podemos? Se
alguém ou algo pode selar a paz entre nós e os orcs, esse ser, maior que
qualquer um de nós, tem essa habilidade. Essa pode ser nossa única esperança.
K’ure mencionou sobre achar outras raças, outros seres para tomar parte da sua
jornada por equilíbrio e harmonia. Para se levantarem contra Sargeras e seu
vasto exército profano.”
Velen pousou sua mão alva no ombro de seu amigo. “Em minhas meditações
algo certo me foi revelado. As coisas não podem continuar como estão. Orcs e
draenei não podem viver mais distantes um do outro. Não há como voltar atrás,
meu amigo. Haverá paz ou guerra. Irão tornar-se nossos aliados ou inimigos. E
não poderei me perdoar se não explorar todos os caminhos para a paz. Entende
agora?”
Apesar do rosto triste, Restalaan concordou. “Sim, acredito que sim. Mas não
gostei. Deixe-me pelo menos mandar uma guarda blindada para acompanhá-lo,
pois sei que irão atacar antes de escutar.”
Velen balançou a cabeça. “Não. Sem armas. Nada que os provoque. São
criaturas honradas em seus corações. Pude vislumbrar as almas de dois jovens
orcs que ficaram conosco poucos anos atrás. Não há covardia ou maldade,
71
apenas precaução e agora por algum motivo, medo. Atacaram grupos de caça,
não civis.”
“Sim, grupos que estavam em menor número.” devolveu Restalaan.
“Encontramos sangue derramado que não era nosso naqueles lugares,”
relembrou a ele Velen. “Levaram de volta corpos para queimar nos rituais, mas
havia bastante sangue orc no solo. E com nosso conhecimento um punhado de
draenei pode facilmente suportar contra muitos orcs. Não. Arriscarei tudo
nisso. Não irão me matar se eu declarar minhas intenções com honra e não
demonstrar minha obvia capacidade de me defender.”
“Gostaria de ter sua confiança, meu Profeta.” disse Restalaan, resignado ao se
curvar. “Então irei reunir um pequeno grupo de escolta. E não estarão
armados.”
72
Ner’zhul estava em profunda meditação quando Gul’dan trouxe uma
mensagem para ele. O aprendiz curvou-se e entregou o pedaço de pergaminho
para seu mestre, rígido pelo líquido azul.
“O que é isso?” perguntou ao pegar o objeto.
“Era um grupo?”
“Apenas um mensageiro. Sem armas, nem mesmo tinha uma montaria. O tolo
veio andando." Os lábios de Gul’dan se retorceram num sorriso.
Para Ner’zhul, Xamã do clã Shadowmoon, o Profeta Velen dos draenei envia
saudações.
Recentemente muitos dos nossos sofreram ataques dos orcs. Não entendo o
motivo disto. Meu povo e o seu conviveram em paz e tolerância por gerações,
beneficiando um ao outro. Nunca levantamos uma arma contra um orc, e
inclusive, fomos uma vez essenciais ao salvar a vida de dois jovens orcs que
involuntariamente se colocaram em perigo.
Tão somente podemos presumir que houve um equívoco terrível, e desejo tratar
com você para que nenhuma vida - orc ou draenei – seja perdida dessa forma
trágica.
É de meu entendimento que a montanha que nomearam Oshu’gun é sagrada
para seu povo, pois é lá que os espíritos dos seus ancestrais permanecem.
73
Mesmo que esse lugar também tem profundo significado para nós draenei,
sempre respeitamos a decisão de tomá-lo como seu local sagrado. Contudo,
chegou a hora de reconhecermos que temos mais coisas em comum. Sou
chamado de Profeta pelo meu povo, porque por vezes sou agraciado com
sabedoria e discernimento. Procuro liderar bem e pacificamente, como de fato
você e os líderes de vários clãs devem fazer com seu povo.
Peço uma reunião pacífica em um lugar que tem significado tanto para nós
quanto para vocês. No terceiro dia do quinto mês, eu e um pequeno grupo
estaremos em peregrinação para entrar no coração da montanha. Ninguém
estará carregando armas. Convido você e qualquer um que se sinta comovido a
juntar-se a mim, ao entrarmos nesse lugar de magia e poder, e pedir pela
sabedoria de seres muito mais sábios e descobrir como podemos curar essa
fissura entre nós.
Com benção e Luz, desejo-lhe paz.
“E lamento por isso!” rebateu o xamã. “Devia ter sido detido e trazido a mim,
não morto!”
Kil’jaeden não disse nada. O resplendor escarlate banhava Ner’zhul enquanto
continuava, buscando às cegas um caminho para a solução.
“Não permitirei que suje nosso local sagrado,” continuou o xamã. “Não se
preocupe quanto a isso, Gul’dan. Mas não mandarei matá-lo sem antes ter uma
chance de falar com ele. Quem sabe não tiramos proveito disso.”
“Sim.” disse Kil’jaeden numa voz rica e afetuosa. “Quando alguém está
sofrendo, esse alguém revelará tudo o que sabe.”
As palavras soaram estranhas para Ner’zhul, mas não manifestou sua surpresa.
Essa entidade magnífica queria que ele torturasse Velen? Algo dentro dele
estava entusiasmado com a possibilidade. Mas algo também o fez recuar. Não
ainda. Não poderia fazer algo desse tipo ainda.
74
“Estaremos esperando por ele,” assegurou a seu grande mestre e seu aprendiz.
“Ele não escapará.”
“Mestre,” disse Gul’dan com cautela. “uma sugestão, se me permite?”
“O que é?”
“O clã Frostwolf é o que fica mais próximo da montanha,” sugeriu Gul’dan.
“Vamos pedir a eles que detenham Velen e seu grupo e os tragam até nós. Seu
líder usufruiu da hospitalidade dos draenei. E apesar de não ter impedido
nossos esforços, não recordo ter recebido notícias de um ataque liderado por ele
contra os draenei. Assim matamos dois coelhos com uma cajadada só: capturar
o líder dos draenei e o clã Frostwolf provar a sua lealdade à causa.”
Ner’zhul sentiu dois pares de olhos penetrando os seus – os pequenos e negros
de seu aprendiz, e a orbe brilhante de seu mestre Kil’jaeden. A sugestão de
Guldan parecia sensata. Então porque ele estava tão relutante a concordar?
Os batimentos foram passando e suor aparecia na testa de Ner’zhul. Finalmente
ele falou, e ficou aliviado de escutar sua voz sair segura e convincente.
“De acordo. É um bom plano. Arrume uma pena e pergaminho, e notificarei
Durotan do seu dever.”
75
Capitulo 10
Quando Drek’Thar contou-me do incidente com meu pai, nunca tive tanto
orgulho dele. Sei como é difícil tomar a decisão certa em determinados
momentos. Ele tinha tudo a perder com as escolhas que fez.
Ele manteve sua honra. E não há preço alto o bastante para sacrificá-la.
“É muita covardia Ner’zhul jogar essa responsabilidade para você.” disse baixo
para que o mensageiro, que esperava do lado de fora, não escutasse. “O pedido
foi para ele, não você.”
“Jurei obedecer,” respondeu com o mesmo tom de voz. “Ner’zhul fala pelos
ancestrais.”
O chefe do clã Frostwolf novamente olhou a carta. “Estou satisfeito por ele não
ter pedido que mate Velen. Uma vez em nosso poder, talvez possamos
convencê-lo a mudar de ideia e explicar por que querem nos prejudicar. Talvez
possamos negociar a paz.”
A possibilidade agarrou-se em seu peito, apertando forte. Por mais gloriosa que
sua vida fosse junto a Draka e pelo orgulho que sentia pelo clã, quão mais feliz
seria se vivesse como seu pai havia vivido – caçando os animais das florestas e
vales, dançando sob a luz da lua nos festivais Kosh’harg, escutando os velhos
contos e deleitando-se no zelo dos ancestrais. Não havia dito nada a Draka, mas
estava feliz por não terem concebido uma criança ainda. Não era uma época
76
fácil para os jovens orcs. Sua infância havia sido tirada e deveres tinham sido
colocados em ombros que não eram largos o bastante para carregá-los. Durotan
não hesitaria em treinar seu filho ou filha, caso Draka tivesse dado a luz. Não
pediria aos pais nada além do que ele mesmo faria, mas estava feliz por nãoter
que lidar com essas decisões ainda.
Draka o obervava com intensidade. Era como se ela pudesse ler seus
pensamentos.
“Você já encontrou Velen antes. Vejo que tenta reconciliar as memórias deste
encontro com as notícias de que estão tentando nos destruir. Não foi fácil para
você.”
“Nem está sendo agora.” respondeu. “Talvez seja melhor que essa tarefa tenha
sido dada a mim. Velen irá se lembrar daquela noite, tenho certeza disso. Acho
que estará mais disposto a tratar comigo do que com Ner’zhul. Gostaria de ter
lido a carta que mandou.”
Esforçou-se para escutar o sussurro baixo de K’ure, mas não conseguiu. Seu
coração apertou e ele abaixou a cabeça.
77
Restalaan levantou o braço, rejeitando a oferta. “Boas e más, meu Profeta.”
disse. “Lamento informar que o mensageiro que enviou para o líder xamã
Ner’zhul foi morto por um grupo de orcs.”
Velen fechou os olhos e o cristal violeta tornou-se mais quente por um segundo,
como se quisesse confortá-lo.
“Senti a sua morte.” revelou com pesar. “Mas esperava que fosse um acidente.
Está certo de que foi assassinado?”
“Acaba por aqui sua teoria de que não atacariam um draenei desarmado.”
continuou.
“Esperava pelo melhor” disse calmamente. “Mas disse que havia boas notícias
para amenizar essas tristes novas?”
Restalaan fez uma careta. “Se é que podemos chamar de boa notícia. Ner’zhul
disse que um contingente de orcs nos encontrará na base da montanha.”
Velen suspirou profundamente. Não era essa a resposta que sua alma ansiava.
O que aconteceu com os orcs? Por que de repente estão tão predispostos a fazer
mal aos draenei, que nunca se opuseram a eles?
Não garanto nada, escreveu Ner’zhul com uma letra firme.
78
“Muito bem,” decidiu Velen. “Então nada está garantido.” E sorriu para
Restalaan. “Assim como a vida.”
Com seus olhos afiados e habilidades para luta, Draka era útil como
patrulheira. Deixou-a como sentinela no primeiro grupo de guerreiros. No
minuto que Velen aparecesse, ela informaria seu companheiro pelos ventos
através de Drek’Thar.
O líder dos xamãs, porém, estava ao lado de Durotan. Como era o mais
poderoso entre os xamãs, seu trabalho era proteger o líder. Estavam parados em
uma rocha que emergia da entrada da montanha sagrada. Dúzias de guerreiros
esperavam com flechas, machados e dardos. Outros passaram o dia
manobrando pedras grandes, para que com uma palavra de Durotan, um
pequeno movimento faria as pedras rolarem e esmagar os draenei.
“Meu chefe, está fazendo como foi ordenado.” disse com sinceridade. “Esses
seres são nossos inimigos.”
79
Estão chegando. Cinco deles. Nenhum está usando armadura ou visivelmente
carregando armas. Caminham com tranquilidade.
O vento soprou para longe suas palavras, e sabia que iria para os ouvidos de
todos os orcs ali reunidos. Quando chegasse a hora, Drek’Thar aproveitaria o
vento para dar ordens para as tropas de Durotan. Endireitou-se, seu coração
batendo mais depressa. Agarrou com força seu machado.
A lembrança do que isso representava fez o sorriso sumir. Eles queriam ser
localizados imediatamente. Desejavam que os orcs tivessem certeza de que não
carregavam armas e que estavam no que Mãe Kashur chamava de
peregrinação.
Ou era uma fraude bem elaborada? Xamãs não necessitavam de lanças para
destruir. Nem os draenei. Durotan relembrou as redes mágicas que queimavam
e enegreciam a pele – redes de energia, estranhas para os orc e que surgiam do
nada.
Durotan assistiu os grupos que estavam mais longe, saírem de seu esconderijo e
fechar o cerco atrás dos draenei. Ele esperava que estivessem longe o bastante
para que os draenei não percebessem. Se sim, não transpareceram e
continuavam com uma velocidade constante, confiante e serena.
80
Durotan e Drek’Thar não tentaram se disfarçar. Depois de muitos minutos,
Velen levantou a cabeça e olhou diretamente nos olhos de Durotan, este não
desviou o olhar e esperou que os inimigos continuassem a se aproximar. Ao
alcançarem a base da montanha, vários orcs saíram propositalmente do
esconderijo para cercá-los.
Velen não pareceu nem um pouco surpreso. Sorrindo, olhou em volta e tornou
a encarar Durotan. O chefe desceu até ficar no mesmo nível que o draenei
profeta.
“Há quanto tempo não nos encontramos, Velen.” disse com calma.
Propositalmente não usou o título do draenei.
“Não estamos aqui para falarmos do passado.” retrucou Durotan, com mais
ênfase do que desejava. Não gostava de relembrar esse episódio. “Estamos aqui
porque nos informou que se atreverão a entrar no nosso local mais sagrado.”
“Não há motivos para que eu leia.” respondeu Durotan. “Foi pedido que eu
viesse em seu lugar e aqui estou.”
“Na verdade precisa, ou essa conversa de nada servirá.” Sua voz era clara e fria,
e não havia nada velho ou frágil apesar da idade avançada de Velen. Durotan
81
levantou a sobrancelha. Não havia dúvida de que era sábio. Mas agora, pela
primeira vez, ele vislumbrou a absoluta força de vontade que sustentou Velen
por incontáveis anos.
“Essa montanha é sagrada para seu povo. Sabemos e respeitamos isso. Mas é
também sagrada para nós.” Velen deu um passo à frente, olhar fixo em
Durotan. Os orcs em volta sussurraram entre si, mas não se moveram.
“Blasfêmia!”
“Oshu’gun pertence a nós! É o lar dos amados falecidos, abriga seus espíritos e
suas horríveis patas fendidas não darão um passo em seus arredores
abençoados!”
Velen também parecia surpreso com as palavras. Voltou sua atenção para o
xamã e esticou as mãos em súplica.
“Proteja eles!” exigiu Durotan. “Irão obedecer minhas ordens e devemos levá-
los com vida. Proteja eles, maldição!”
82
os orcs. Os guerreiros recuaram e para o desespero de Durotan, alguns
arqueiros começaram a colocar flechas em seus arcos.
“Velen, você e o seu grupo são agora prisioneiros do clã Frostwolf.” proclamou
numa voz calma, porém perigosa.
Com um olhar investigativo, Draka assentiu e retirou-se. Ele sabia que não
aprovava e ele também não estava feliz em presenciar isso. Mas estava andando
numa linha tênue, e sabia disso.
83
Durotan foi para junto de Rokkar e olhou o saco que abrira. Arregalou os olhos.
Aninhado no tecido suave estavam duas belas pedras. Uma era vermelha e a
outra amarela. Durotan ansiou por tocá-las, mas deteve-se. Olhou para Velen.
“Há muito tempo, Restalaan mostrou um cristal parecido com esse.” disse.
“Aquele protegia a cidade. O que esses fazem?”
“Cada um tem seu poder. Os cristais são parte do nosso legado. Foram
transmitidas a nós pelo ser que reside na montanha sagrada.”
Virou-se e saiu, não querendo olhar nos brilhantes e estranhos olhos azuis de
Velen, e nem o olhar de censura de Draka.
Durante a viagem de volta, Durotan lutou com seus sentimentos. Por um lado,
ele dividia a indignação de Drek’Thar. Oshu’gun era sagrada para os orcs. A
ideia de algo além dos ancestrais residir dentro dela – de fato, como Velen havia
afirmado, era tão poderoso que atraiu os ancestrais para ela, o atingiu em cheio.
Só podia imaginar como os xamãs se sentiram com essa declaração. Tudo se
encaixava no que Ner’zhul dizia; que os draenei eram uma praga e deveriam
ser eliminados.
Eles fizeram o caminho rápido, contando os cinco cativos. O sol estava apenas
começando a nascer quando chegaram. Durotan enviou alguns patrulheiros
antes para das às boas notícias e o clã os esperava ansiosamente. A sua direita
estavam Drek’Thar e Rokkar, que partilhava da ansiedade dos Frostwolves e a
sua esquerda estava Draka, que permaneceu estranhamente quieta durante o
ocorrido. Tinha certeza que não queria escutar o que ela tinha a dizer; já estava
sendo forçado em várias direções.
Depois que a agitação acabou Durotan respirou fundo. Ele não ansiava por
essa conversa, mas era seu dever. Acenou para os guardas e entrou na pequena
tenda que Velen encontrava-se.
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Esperava ver o ancião com as mãos amarradas, como havia ordenado. Viu que
independente de quem acatou a ordem, o fez com zelo excessivo.
A tenda havia sido levantada perto de uma árvore robusta e Velen estava
amarrado a ela. Seus braços foram puxados para trás num ângulo estranho, as
cordas tão apertadas em sua pele branca que, mesmo com a luz fraca, Durotan
percebeu a carne escurecendo. Felizmente, uma corda mais frouxa em volta do
pescoço que o obrigava a ficar com a cabeça ereta para não sufocar. Um pedaço
de pano sujo foi colocado em sua boca. Estava de joelhos e seus cascos também
estavam amarrados atrás dele.
Proferiu um insulto e puxou uma adaga. Velen o olhou, sem vestígio de medo
em seus profundos olhos azuis, mas Durotan percebeu que o draenei pareceu
surpreso quando o orc usou a arma para cortar as amarras ao invés da sua
garganta. Não reclamou, mas uma centelha de dor apareceu em seu rosto alvo
assim que o sangue voltou a correr em seus membros.
Durotan passou um odre com água para o ancião e observando enquanto bebia.
Velen não parecia ser uma ameaça, sentado a sua frente, em vestes sujas,
engolindo água morna, sua pele em carne viva por causa das amarras. Como se
sentiria, perguntou-se, se tivesse escutado o que Mãe Kashur disse? Tudo
parecia errado. Mesmo assim ela assegurou a Drek’Thar que o draenei era uma
ameaça tão fatal que mal podiam imaginar.
Havia uma tigela de mingau de sangue frio no chão. Com seu pé direito,
Durotan empurrou em direção ao prisioneiro. Velen olhou, mas não comeu.
85
Durotan levantou e chutou a tigela. Mingau endurecido derramou no chão.
“Espera que eu acredite nisso?”
Durotan ficou de joelhos e encostou seu rosto no de Velen. “Por que está
tentando nos destruir? O que fizemos a vocês?”
Velen parecia exasperado. “Você me entendeu mal. Não quero difamar seu
povo. Eu apenas-“
“Apenas o que? Dizer que a única razão de vermos nossos mortos é por causa
do seu...deus preso na montanha?”
“Velen, suas palavras são como lenha na fogueira da nossa ira.” disse
tranquilamente. “Sua alegação é arrogante e ofensiva. Irá apoiar aqueles que já
estão preparados para matar o seu povo baseado na palavra dos ancestrais. Não
entendo – mas você pede para que eu escolha entre as pessoas que confio e
tradições na qual fui criado, e a sua palavra.”
86
Virou e encarou o draenei. “Escolherei meu povo. Você precisa saber disso. Se
ficarmos frente a frente na batalha, não irei me segurar.”
Durotan balançou a cabeça. “Não. Se ele quisesse você, deveria ter vindo. Ele
designou que eu tratasse com você, e eu cumpri minha obrigação como achava
pertinente.”
“Era para encontrá-lo e escutar o que tinha a dizer.” concluiu. “Se tivesse te
capturado em batalha, tirado uma arma de suas mãos, e lutado no chão, aí sim,
você seria um prisioneiro. Mas não há honra em amarrar um inimigo que
estende suas mãos de bom grado. Estamos num impasse. Você insiste que não
tem más intenções com relação aos orcs. Meus líderes e espíritos dos meus
ancestrais dizem o contrário.”
Percebeu que estava implorando, mas isso não o angustiava. Amava sua
companheira, seu clã, seu povo. Odiava o que estava vendo: uma geração
inteira apressando-se para a idade adulta com apenas ódio cego em seus
corações. Se implorar para esse ser estranho pudesse mudar isso, assim ele
faria.
“O futuro não é como um livro que alguém lê.” articulou. “Está em constante
mudança, como água corrente, ou o rodopiar da areia. Tenho alguns
conhecimentos, nada mais. Sabia que deveria vir desarmado e olhe só, não fui
recebido pelo maior orc xamã, mas por aquele que dormiu a salvo sob meu teto.
Não acho que foi um acidente, Durotan. E se algo pode ser feito para evitar isso,
depende dos orcs não dos draenei. Tudo o que posso fazer é repetir o que já
disse. O curso do rio pode ser mudado, mas são vocês que devem mudá-lo. É
tudo o que sei e rezo para que seja o bastante para salvar meu povo.”
87
Durotan fechou os olhos por um instante, então se afastou. “Ficaremos com as
pedras.” disse. “Seja qual for o poder que tenha, os xamãs aprenderão a
aproveitá-la.”
Velen assentiu com tristeza. “Presumi. Mas tinha que trazê-las. Tinha que
confiar que podíamos achar uma forma de resolver tudo isso.”
Durotan perguntou-se por que nesse momento sentia-se mais próximo daquele
que disseram ser um inimigo do que do líder espiritual do seu povo? Draka
deveria saber. Ela sempre soube. Ela nada disse, pois entendia com uma
sabedoria que ele nunca compreenderia e como chegou até aqui por si próprio.
Mas conversaria com ela essa noite, sozinhos na tenda.
“Isso seria deveras conveniente para você;” concordou Velen. “Mas de algum
modo, acho que não é isso que deseja.”
Durotan não respondeu. Saiu da tenda e disse aos guardas, “Velen e seus
quatro acompanhantes devem ser escoltados em segurança até o limite de nosso
território. Então, devem ser soltos para que retornem a sua cidade. Nenhum
mal deve ser cometido a eles, fui claro?”
O guarda parecia que iria protestar, mas outro guerreiro mais sábio olhou-o
com ferocidade.
“Foi sim, meu chefe.” o primeiro guarda murmurou. Ao que foram buscar os
draenei, Drek’Thar correu para Durotan.
“Sim,” sibilou. “Escutou o que ele disse. Ele alega que os ancestrais são...são
como mariposas em uma tocha, perto desse deus deles! Arrogantes! Ner’zhul
está certo. Devem ser eliminados. Foi nos dito isso.”
“Se é para ser assim, assim será.” concluiu. “Mas não hoje Drek’Thar. Hoje
não.”
88
Velen sentia seu coração pesado, enquanto caminhava devagar com seus
companheiros pelo gramado do campo encharcado pelo orvalho, passando
pelas sombras das árvores da floresta Terokkar em direção a cidade mais
próxima.
Dois dos cristais ata’mal estavam agora em poder dos orcs. Ele sabia que as
palavras de Durotan eram corretas e que os xamãs iriam rapidamente
desvendar seus segredos. Mas deixaram escapar uma.
Isso porque o cristal não quis ser encontrado, e quando se tratava deles, a luz
obedecia a seus desejos e curvou-se para que o cristal violeta permanecesse
escondido dos orcs. Segurou-o junto ao peito, sentindo seu calor em sua pele
antiga.
Ele apostou e perdeu. Não totalmente, já que ele e seus amigos estavam vivos e
a salvo. Mas esperava que os orcs o escutassem, ou pelo menos o
acompanhassem até o coração da montanha sagrada e testemunhar algo que
não renegaria sua fé, nem um pouco, mas que na verdade foi o que a fez nascer.
O prognóstico era lúgubre. Quando caminhou pelo acampamento dos orcs, viu
o que estava acontecendo. Crianças estavam sendo treinadas tão duramente que
caiam de exaustão. Forjas a todo o vapor mesmo durante a madrugada. Apesar
de andar livremente agora, Velen sabia que os acontecimentos de hoje não
adiantaram de nada para evitar o que estaria por vir. Os orcs, inclusive os que
eram liderados pelo perspicaz e calmo Durotan, não estavam preparando-se
para uma possível guerra. Estavam convencidos da certeza dela. Quando o sol
nascesse amanhã de manhã, testemunharia o inevitável.
O cristal que segurava em seu peito pulsou, sentindo seus pensamentos. Virou
para seus companheiros e olhou-os com pesar.
“Os orcs não serão desviados desse caminho.” disse. “Portanto, se queremos
sobreviver...nós também devemos andar pelo caminho da guerra.”
“Os ancestrais estão com raiva de nós!” gritou um jovem xamã. “Raiva por
deixarmos Velen ir embora!”
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Durotan balançou a cabeça. Deveria repreender o jovem, e na manhã seguinte,
se essas palavras forem proferidas de novo, ele iria. Mas agora seu coração
estava repleto de dor. Não foi um grito de raiva que veio da montanha sagrada.
Era o som perturbador da mais completa tristeza, e ele tremeu por dentro ao
imaginar porque os ancestrais lamentavam tão, mas tão profundamente.
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Capitulo 11
“O que?”
O grito indignado de Ner’zhul fez seu aprendiz recuar. Durotan não piscou
sequer um olho.
“As ordens eram para que fizesse ele e os outros prisioneiros!” a voz de
Ner’zhul aumentava a cada palavra dita. Tinha sido tão simples, tão fácil. O que
Durotan pensou estar fazendo? Desperdiçar uma oportunidade como ossos
quando a carne já foi devorada! Quanta informação poderia ter tirado de Velen?
Qual tipo de poder de barganha poderia ter sobre os draenei?
Durotan continuou discursando com sua voz rouca e grave, mas Ner’zhul já
não escutava. Naquele instante, congelado no espaço e tempo, Ner’zhul teve a
repentina percepção de que talvez Kil’jaeden não fosse o espírito benevolente
no qual se apresentou. Durotan, perdido em suas palavras ao explicar sua
decisão, não percebeu a mudança de atenção do xamã. Mas sentiu que Gul’dan
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o olhava e um novo medo tomou conta dele, pois seu aprendiz estava
testemunhando os primeiros sinais de dúvida de seu mestre.
Como melhor lidar com isso? Durotan era muito estimado entre os clãs. Se o
punisse por sua decisão, haveria muitos que olhariam com compaixão para o
clã Frostwolf. E isso causaria um rasgo no tecido que tentava tecer, o tecido
firmemente costurado da nação dos orcs...uma Horda, se preferir. Por outro
lado, se aprovasse a ação de Durotan, isso seria um grande insulto para aqueles
que apoiavam com fervor o fato de que os draenei deveriam morrer.
Ele não conseguia decidir. Encarou Durotan que franziu levemente a testa.
“Meu mestre está tão furioso que não consegue falar,” disse a suave voz de
Gul’dan. Tanto Durotan quanto Ner’zhul olharam para o jovem xamã. “Você
desobedeceu a uma ordem direta de seu líder espiritual. Volte para seu
acampamento Durotan, filho de Garad. Meu mestre enviará uma mensagem em
breve comunicando sua decisão.”
Durotan olhou de volta para Ner’zhul e sua aversão por Gul’dan estampava
seu rosto. O xamã se recompôs e, dessa vez, quando procurou as palavras, ele
as encontrou.
“Vá embora, Durotan. Você me desagradou, e pior, desagradou o ser que nos
tem ajudado tanto. Terá notícias minhas muito em breve.”
Durotan curvou-se, mas não saiu de imediato. “Há algo que eu trouxe para
você.” comunicou. Estendeu-lhe uma pequena trouxa. O xamã aceitou e suas
mãos tremiam, e teve esperança de que Durotan e Gul’dan interpretassem isso
como fúria e não medo.
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Hesitou por mais um momento, como se esperasse algum comentário do xamã.
Quando o silencio aumentou a ponto de ficar desconfortável, ele curvou-se de
novo e saiu. Por um longo tempo, mestre e aprendiz ficaram calados.
“Perdoe-me pela interrupção, meu mestre. Vi que estava tão transtornado que
ficou sem palavras e temi que o inseto interpretasse isso como hesitação ao
invés de raiva.”
Houve uma época onde Ner’zhul teria compartilhado com seu aprendiz a sua
dúvida. Havia confiado nele. Treinou ele por anos. Mas agora, embora açoitado
por dúvidas como se caminhasse contra o vento, sabia com certeza de uma
coisa. Não queria que Gul’dan visse qualquer fraqueza nele.
“Realmente estava tomado pela raiva,” mentiu Ner’zhul. “De nada serva a
honra, se prejudica nosso povo.”
Deu-se conta que apertava a trouxa que Durotn havia dado a ele. Gul’dan a
encarava avidamente.
Raiva tomou o rosto de Gul’dan por um breve momento. Então o orc mais
jovem curvou-se com devoção e disse arrependido. “Claro, meu mestre. Foi
arrogante da minha parte esperar – estava apenas curioso, apenas isso, para ver
se o chefe Frostwolf contribuiu com algo de valor.”
“Claro,” disse gentilmente. “Irei informá-lo assim que souber de algo. Afinal de
contas, você é meu aprendiz, não?”
93
Jogou-se nas peles que serviam como cama. Aninhou a trouxa em seu colo e
disse uma prece para os ancestrais; já que Durotan falhou em trazer o líder
draenei, que pelo menos tivesse conseguido obter algo útil.
Energia, excitação e uma sensação de poder fluíram por ele. Suas mãos
ansiavam em pegar uma arma, apesar de não precisar de uma há anos. Sabia de
alguma maneira que se esse cristal estivesse com ele, seu objetivo seria
realizado. Um belo presente para os orcs! Ele teria que ver como transformar
essa paixão vermelha e quente pela luta que ocultava no centro da pedra para
servir seus propósitos.
Foi preciso muito esforço para que soltasse o cristal vermelho. Respirou fundo,
acalmou-se enquanto clareava a mente.
Ner’zhul agarrou-o. Desta vez ele já tinha uma noção do que esperar. De novo,
sentiu calor emanando e a sensação de poder. Mas desta vez não era de
agitação, ou urgência. Ao segurar o cristal amarelo, sua mente clareou e
percebeu que até agora tem visto as coisas apenas como em um vale nublado.
Não achava palavras para descrevê-lo, mas havia pureza, limpidez e precisão.
Era de fato tão preciso, tão claro que Ner’zhul começou a sentir essa abertura da
mente como dor.
Ner’zhul arriscou olhar de relance seu benfeitor. Kil’jaeden estava mais uma
vez parecendo sereno, equilibrado, calmo e banhado em resplendor.
94
“Estou...desapontado.” murmurou. Jogou o peso do seu corpo de um enorme
casco fendido para o outro. “Mas digo duas coisas. O líder do clã Frostwolf é o
responsável. E você nunca mais confiará uma tarefa importante a ele.”
A sensação de alívio era tão forte, que Ner’zhul quase desmaiou. “Claro que
não, meu mestre. Nunca mais. E...nós trouxemos esses cristais para você.”
“Não são úteis para mim,” disse Kil’jaeden. O xamã recuou. “Mas acho que seu
povo pode acha-los vantajosos na sua batalha para destruir os draenei. Essa é
sua batalha, não é?”
Do canto de seu olho viu um vulto branco. Gul’dan havia visto tudo.
Havia mais duas mensagens, mas Ner’zhul não as leu. Não precisava. Apesar
dos detalhes serem diferentes, a essência das cartas era sempre a mesma. Um
ataque bem-sucedido, glória no massacre, o êxtase do derramamento de
sangue. Ner’zhul olhou a pilha de cartas que recebeu só esta manhã: sete.
Cada mês que passava, mesmo nos longos e inflexíveis meses de inverno, os
orcs desenvolviam suas habilidades em matar os draenei. Aprenderam muito
sobre o inimigo com cada vitória. As pedras que Durotan havia dado a
Ner’zhul provaram ser realmente valiosas. Trabalhou nelas, sozinho no começo
e depois em companhia de outros xamãs. A vermelha eles apelidaram de
Coração da Fúria, e descobriram que quando um líder de um ataque o
95
carregava, não somente lutava com mais energia e aptidão, mas todos sob seu
comando também eram beneficiados. As pedras passavam de clã para clã a
cada nova fase da lua e era muito cobiçada. Apesar disso, Ner’zhul sabia que
ninguém se atreveria a roubá-la.
Mas nada disso encorajava Ner’zhul. A súbita dúvida que apareceu quando
conversou com Durotan havia chegado até seus ossos. Lutava contra as
suspeitas, aterrorizado de pensar que de alguma maneira Kil’jaeden era capaz
de ler sua mente. Mas elas insistiam em vir, como vermes contorcendo-se num
cadáver, para assombrar seus pensamentos tanto acordado quanto adormecido.
Kil’jaeden era muito, mas muito parecido com os draenei. Era possível que, de
alguma maneira, eram os mesmos? E estava ele, Ner’zhul, sendo usado numa
espécie de guerra civil?
Então, em uma noite, ele decidiu que não poderia mais suportar. Vestiu-se em
silêncio e despertou seu lobo Skychaser, que se espreguiçou e piscou para ele,
sonolento.
“Venha, meu amigo,” disse o xamã com afeição ao montar nas costas da
criatura. Ele nunca antes foi até a montanha sagrada montado em seu lobo, ia
sempre andando, como era tradição. Mas ele precisava voltar antes de sentirem
sua falta, e tinha certeza que urgência da sua missão atenuaria sua ofensa para
com os ancestrais.
96
Sabendo que Skywalker teria dificuldades para escalar, mandou que ficasse
esperando e o lobo cavou um buraco na neve e aconchegou-se. Ner’zhul
calculou que não ficaria mais do que poucas horas e apressou-se para a
montanha com mais vivacidade do que há muito tempo havia sentido. Sua
bolsa cheia de odres com água e seu coração repleto de antecipação.
Deveria ter feito isso há muito tempo. Deveria ter ido direto para a fonte de
sabedoria, como um xamã faria. Não fazia ideia do porque não tinha pensado
nisso antes.
Finalmente chegou à entrada, um oval perfeito, e parou. Por mais ansioso que
estivesse em chegar aos ancestrais, sabia que o ritual deveria ser honrado.
Acendeu o maço de ervas secas que carregava e deixou seu perfume doce
acalmar e purificar seus pensamentos. Então deu um passo a frente,
sussurrando um feitiço para iluminar as tochas que estavam no caminho. Ele
andou por essa trilha mais vezes do que se lembrava, e seus pés moviam-se
sozinhos com firmeza. Logo embaixo o caminho entrelaçava e o coração
esperançoso de Ner’zhul acelerou ao entrar na escuridão.
Parecia demorar mais do que de costume para que a luz aumentasse. Entrou na
caverna e percebeu que de algum modo, a poça sagrada parecia mais opaca que
antes. Isso o deixou inquieto.
Respirou fundo e repreendeu a si mesmo. Estava trazendo seus medos para este
lugar sagrado, nada mais. Parou em frente à poça, retirou os odres da sua bolsa
e jogou seu conteúdo. O único barulho era o da água caindo e parecia ecoar.
Nada aconteceu.
Não entrou em pânico. Os ancestrais muitas vezes levavam algum tempo até
responder.
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aqueles que seguiram seus passos, venham até mim agora e aconselhem-me
para que os guie bem!”
Sua voz tremeu. Sabia que parecia perdido e patético, e por um momento um
orgulho teimoso fez com que corasse de vergonha. Mas esse sentimento foi
afastado quando percebeu que se importava de verdade com seu povo, que
queria fazer o que era certo por eles e nesse momento ele não tinha ideia do que
era certo.
Era ódio.
“Não!” disse encolhendo-se. “Não, diga-me o que fazer e eu farei. Não é tarde
demais, certamente não é tarde demais-“
“Você não é forte o bastante,” disse outra voz, dessa vez masculina. “Se fosse,
nunca caminharia tão longe nessa estrada. Não teria sido tão facilmente
enganado ao fazer a vontade daquele que não ama nosso povo.”
“Mas...não entendo,” murmurou. “Rulkan, você veio até mim! Escutei você!
Você, Grekshar-você aconselhou-me! Disse-me que queria que aceitasse
Kil’jaeden! O Grande Amigo de todos os orcs!”
98
Os ancestrais nunca haviam aparecido para ele. Foi tudo um embuste armado
por Kil’jaeden - seja lá o que ele fosse. Eles estavam certos em não confiar mais
nele. Qualquer xamã que fosse tão facilmente enganado nunca poderia ser
confiado a corrigir essa situação. Tudo foi uma rede elaborada de mentiras,
ilusão e manipulação. E ele, Ner’zhul, foi o primeiro inseto tolo a ficar
intricadamente preso a ela.
O número de draenei mortos beirava cem. Não havia como voltar atrás, ou
como pedir ajuda dos ancestrais. Não podia mais confiar no seu visitante, a não
ser entender que tudo o que dizia eram prováveis mentiras. O pior de tudo era
ter entregado seu povo nas mãos daquele que, apesar de sua aparência íntegra e
palavras doces, não tinha boas intenções em seja lá o que fosse seu coração.
Ner’zhul tremeu de horror ao perceber o que havia feito. Nada poderia ser feito
para corrigir. Nada, a não ser continuar nesse caminho que Kil’jaeden
cuidadosamente planejou para ele caminhar e rezar para os ancestrais, que já
não o escutavam, que de algum jeito pudesse fazer as coisas ficarem certas.
Enterrou seu rosto em suas mãos e chorou.
99
Capitulo 12
Ao voltar montado em seu lobo Skychaser, Ner’zhul queria apenas ser engolido
pela noite escura, suas mãos tão geladas e entrelaçadas na pelagem preta que se
perguntou se algum dia seria capaz de abri-las de novo. Como poderia retornar
para seu povo sabendo o que havia causado? Por outro lado, como poderia
fugir; haveria um lugar onde Kil’jaeden não fosse capaz de achá-lo? Ansiava
amargamente pela coragem de pegar a adaga ritual enfiá-la em seu coração,
mas sabia que não conseguiria. Suicídio era visto como um ato desonroso entre
seu povo; era uma resposta covarde para lidar com os infortúnios que o
afetaram. Não seria permitido que vivesse como espírito se tomasse esse
caminho sedutor para escapar dos problemas. Poderia continuar a fingir não
saber de nada e talvez miná-lo sutilmente. Apesar de seus poderes colossais,
não havia evidências de que Kil’jaeden tinha a habilidade de ler mentes. A
possibilidade o animou de alguma maneira. Sim...ele podia diminuir o dano
que esse intruso estava tentando fazer a seu povo. Era assim que poderia
continuar a servir.
“Informei a Kil’jaeden sobre um rato.” disse com calma. Aquele sorriso horrível
nunca deixou seu rosto. “E ele irá decidir o que fazer com o verme que se
voltaria contra ele.”
100
Ainda havia neve nos ombros de Gul’dan. Desanimado, Ner’zhul percebeu o
que tinha acontecido. Ávido por poder, seu aprendiz – como fechou seus olhos
por tanto tempo para algo tão obvio? – havia seguido-o. Escutou as palavras
dos ancestrais. Depois de ouvir as mesmas coisas que Ner’zhul, ainda se
apegava a Kil’jaeden? Por um breve instante, seu medo e egoísmo foram
embora, e Ner’zhul apenas sentia pena pelo orc que tinha ido longe demais.
“Unidos sob uma mentira.” disse Ner’zhul. Estava sendo leviano em sua
rebeldia. E a sensação era boa. Se continuasse, quem sabe Kil’jaeden perderia a
paciência e mataria ele, e seus problemas estariam resolvidos.
Mas o ser não respondeu com a fúria mortal que esperava. Ao invés disso, a
entidade suspirou profundamente e balançou a cabeça, igual um pai
decepcionado com um filho desobediente.
Os lábios do xamã moveram-se. Queria gritar sua rebeldia de novo, mas dessa
vez as palavras não vieram. Percebeu que o momento havia passado. Assim
como qualquer ser sensato, ele não queria morrer, então permaneceu em
silêncio.
“Não será suficiente que jurem lealdade.” prosseguiu. Pensativo, tocou o rosto
com seu dedo longo e vermelho. “Muitos parecem inclinados a mudar o
101
significado de ‘honra’ e ‘juramento’. Devemos...assegurar sua cooperação –
agora e sempre.”
Kil’jaeden sorriu para ele. Ner’zhul já podia perceber o vínculo entre eles –
como Kil’jaeden, Gul ‘dan estava de uma maneira que ele nunca esteve.
Kil’jaeden foi forçado a contar mentiras sedutoras e usar trapaças para trazê-lo
para seu lado; com Gul’dan ele podia falar abertamente.
“Há um jeito.” disse para ambos os xamãs. “Um jeito de fazê-los para sempre
ligados a nós. Para sempre leais.”
Ao escutá-lo falar, foi como se tivesse removido um feitiço. O que estava preso
em sua garganta veio à tona, e apesar de saber que isso significaria sua
perdição, o xamã não fez esforço para segurar.
Kil’jaeden escutou, e então balançou sua cabeça. “Esta é sua escolha. Escolheu
também as consequências. Saiba que isso não evitará que seu povo seja
escravizado, pois meus desejos prevalecerão. Mas ao invés de liderá-los e
continuar sendo favorecido por mim, você será apenas um observador incapaz.
Acho que isso seria mais agradável do que simplesmente matar você.”
Ner’zhul abriu a boca para falar, mas não conseguiu. Kil’jaeden apertou os
olhos e o xamã não conseguia mover-se. Até seu coração batendo selvagemente
em seu peito, apenas o fazia pela vontade de Kil’jaeden, e ele sabia.
102
Como tinha sido um tolo tão ingênuo? Como não viu através das mentiras?
Como pode confundir sua adorável amada com uma ilusão mandada por
esse...monstro ? Lágrimas enchiam seus olhos e desciam em suas bochechas e
ele sabia que era apenas porque Kil’jaeden permitia.
A entidade sorriu para ele, então devagar e propositalmente virou sua atenção
para Gul’dan. Apesar do seu estado, Ner’zhul teve um leve consolo em saber
que não tinha a expressão que Gul’dan usava agora, a de um cachorrinho
sedento por um elogio.
Kil’jaeden riu. “Se continuarei sem mentiras, você também deverá. Você vive
pelo poder. É ávido e tem sede pelo poder. E nos últimos meses, sua habilidade
aumentou a ponto de eu poder usá-lo. Não temos uma parceria de adoração ou
respeito, mas de conveniência e interesses egoístas. O que significa que seja
provável que dure.”
“Como deve ter percebido, desejo exterminar os draenei. O motivo não é de seu
interesse. Apenas precisa saber que eu assim desejo. Os orcs estão indo
moderadamente bem, mas podem melhorar. Eles devem melhorar. Um
guerreiro é tão bom quanto suas armas, Gul’dan, e pretendo dar a você e seu
povo armas que nunca imaginaram. Vai demorar um pouco; você deve
aprender antes de ensinar aos outros. Está pronto e disposto?”
Kil’jaeden gargalhou.
Durotan estava coberto de sangue, muito do dele mesmo. O que tinha dado
errado?
103
Tudo tinha ocorrido como deveria. Acharam um grupo de caça, foram até ele,
iniciaram o ataque e esperaram que os xamãs usassem sua magia para lutar
com os draenei.
Mas eles não o fizeram e ao invés disso, orc atrás de orc caíram sob as lâminas
brilhantes e magia branca azulada dos draenei. Num determinado momento,
brigando pela própria vida, Durotan viu Drek’Thar lutar desesperadamente,
usando apenas seu cajado.
O que havia acontecido? Por que os xamãs não vieram ajudá-los? O que
Drek’Thar estava pensando? Uma criança empunharia um bastão melhor do
que ele – por que não usou sua magia?
Esse era o momento então. Morreria em uma batalha gloriosa. Exceto que não
sentia que essa era uma batalha gloriosa. Por instinto, embora seu braço tivesse
sido profundamente cortado na junção da armadura, levantou seu machado
para bloquear o golpe que viria, e seu braço tremeu. Olhou dentro dos olhos
daquele que iria matá-lo.
E reconheceu Restalaan.
Ao que Durotan pôs-se em pé, deu-se conta de que apenas poucos de seus
guerreiros estavam vivos. Se a batalha durasse mais um pouco, os draenei
teriam eliminado todos os orcs, com apenas duas ou três vítimas deles.
104
que estavam fora de vista, ele podia parar de obrigar suas pernas a segurá-lo e
caiu de joelhos. Várias costelas haviam sido quebradas ou rachadas, e cada
respiração o fazia sentir uma dor aguda pelo corpo.
“Durotan!”
Era Draka. Ela também havia sido gravemente ferida, mas sua voz era forte.
Alívio tomou conta de dele. Graças aos ancestrais, ela ainda vivia.
“Pelo menos eles me deixam curar.” disse Drek’Thar tão baixo que Durotan não
teve certeza se escutou as palavras.
Quando fez tudo o que podia, ele levantou e olhou em volta. Nada menos do
que quinze corpos endureciam na grama verde, incluindo Rokkar, seu segundo.
Balançou a cabeça em descrédito.
Teria que voltar com carroças para levar os mortos de volta para sua terra.
Queimariam os corpos em uma pira e suas cinzas espalhariam pelo ar e seriam
consumidos pela água e pela terra. Seus espíritos iriam para Oshu’gun e os
xamãs conversariam com eles sobre assuntos de profunda importância.
Ou não iriam? Algo terrível havia acontecido e já era hora de descobrir o que.
105
silencioso ao que cada Frostwolf assistia o confronto. Então, com uma voz fraca,
Drek’Thar respondeu, “Os elementos – não vieram dessa vez.”
O choque de Durotan foi quebrado por um sibilo de raiva. Virou-se para ver o
rosto franzido de Draka. “Isso é mais do que um sinal! Isso é um brado, um
grito de guerra de que o que estamos fazendo é errado!”
106
Capitulo 13
Talvez.
Ou talvez, eu, como meu pai e outros, começaria a ver as falhas. Gostaria de
pensar que sim.
Blackhand olhava por debaixo de suas sobrancelhas grossas e testa franzida. Ele
sempre parecia estar franzindo a testa, provavelmente porque quase sempre o
fazia.
“Não sei Gul’dan.” resmungou. Colocou sua mão, maior do que o normal, no
punho da sua arma e a acariciou, inquieto. Ele concordou quando Gul’dan
pediu para encontrá-lo quinze dias atrás, e trazer seus xamãs mais promissores,
mas não contar a ninguém o que iriam fazer. Blackhand sempre gostou mais de
Gul’dan do que de Ner’zhul, apesar de não saber por quê. Quando o xamã
sentou com ele para uma generosa refeição e explicou a situação, Blackhand
ficou feliz em ter vindo. Agora sabia por que gostava tanto de Gul’dan; o antigo
aprendiz e agora mestre era como ele. Ideais não serviam de nada, apenas
praticidades. E ambos desejavam poder, boa comida, armadura extravagante e
derramamento de sangue.
Blackhand era chefe dos orcs Blackrock. Não podia mais subir. Pelo menos...não
até agora. Quando os clãs eram separados, a maior glória era liderar um. Mas
agora...agora trabalhavam juntos. Agora podia ver o brilho da cobiça nos olhos
pequenos de Gul’dan. Conseguia quase sentir o cheiro da ambição emanando
do xamã, uma ambição que compartilhava.
107
Blackhand sorriu ferozmente. Ner’zhul não estava em qualquer lugar que
pudesse ser visto.
“Você me pediu os xamãs. Suponho que saiba o que está acontecendo com
eles?”
Gul’dan suspirou e pegou uma coxa de talbuque. Mordeu-a com força, o suco
escorrendo em seu rosto. Limpou sua mandíbula saliente distraidamente,
mastigou, engoliu e respondeu.
Blackhand encolheu seus largos ombros. “Eu não sei o que pensar. É um
território totalmente novo. Os ancestrais dizem uma coisa, mas os elementos
não respondem.”
Estava começando a nutrir uma suspeita sobre os ancestrais também, mas não
disse nada. Blackhand sabia que muitos o achavam tolo; ele preferia deixá-los
pensar que ele não era nada além de um braço forte e uma poderosa espada.
Dava a ele vantagens claras.
“Temos orgulho da nossa raça,” disse Gul’dan. “É doloroso admitir que não
sabemos de tudo. Kil’jaeden e as entidades que comanda...ah, Blackhand, os
mistérios que guardam. O poder que eles controlam – este que pretendem
108
compartilhar conosco!”
“Somos crianças ignorantes perante eles. Mesmo você – mesmo eu. Mas eles
estão dispostos a nos ensinar. Compartilhar uma parte de seu poder. Um poder
que não depende dos caprichos dos espíritos do ar, terra, fogo e água.” Gul’dan
fez um gesto desdenhoso. “Esse tipo de poder é frágil, não é confiável. Pode
abandoná-lo no meio da batalha e deixá-lo desamparado.”
O chefe dos Blackrock levantou uma sobrancelha. “Posso imaginar sucesso sob
essas condições. Sucesso quase sempre.”
“Mas como saber se isso é verdade e não uma falsa promessa sussurrada ao seu
ouvido?”
"Impressionante.”
“Mas tenho mais a oferecer. Seus guerreiros – sei de um jeito que fará você e
qualquer um que lute ao seu lado mais poderoso, mais feroz, mais mortal. Tudo
isso poder ser nosso, se reivindicarmos.”
“Nosso?”
109
“Não posso continuar a perder meu tempo falando com cada líder de cada clã
toda a vez que têm uma reclamação.” disse levantando a mão imperiosamente.
“Há aqueles que estão de acordo com o que você e eu pensamos ser o melhor
jeito de proceder...e aqueles que não estão.”
Mas Gul’dan não continuou, pelo menos não de imediato. Estava quieto,
reunindo seus pensamentos. Blackhand pegou um graveto e cutucou a fogueira.
Sabia bem que a maioria dos orcs, inclusive alguns de seu próprio clã achavam
ele cabeça quente e impulsivo, mas sabia que a paciência é valiosa.
“Ambos, meu amigo.” respondeu com calma. “Você é um líder nato. Tem
carisma, força e até seus inimigos sabem que você é um mestre estrategista. Será
fácil eleger você como líder dos orcs."
"Claro que não.” assentiu Gul’dan. “Por isso disse que você pertencerá a ambos.
Você será líder dessa nova raça de orcs, essa...Horda se preferir. E estará no
Concílio das Sombras também. Não podemos trabalhar juntos a não ser que
confiemos um no outro, não é?”
110
ambicionava. Não estavam em uma competição, mas em uma liga; o que
beneficiasse um, beneficiaria o outro.
Blachand pensou em sua família – sua companheira, Urukal, seus dois filhos,
Rend e Maim, sua filha, Griselda. Não os adorava do mesmo jeito que o fraco
Durotan adorava sua Draka, claro, mas se importava com eles. Queria ver sua
companheira adornada com joias, e seus filhos reverenciados como convém à
prole de Blackhand.
Percebeu uma movimentação pelo canto de seu olho. Ao virar-se, viu Ner’zhul,
uma vez poderoso e agora desprezado, deslizando para fora da tenda.
“O que tem ele? Ele não importa mais. O Grandioso deseja que ele viva por
enquanto. Parece ter reservado algo...especial para Ner’zhul. Ele ainda será um
figurante; o amor por Ner’zhul está muito enraizado nos orcs para que seja
posto de lado agora. Mas não se preocupe, ele não será uma ameaça para nós.”
“Os xamãs Blackrock...você diz que irá treiná-los nessas novas magias? As
magias que você mesmo estudou? Eles serão invencíveis?”
Então esse era o nome desse novo tipo de magia. Tinha um som interessante.
Bruxo. E os bruxos de Blackrock seriam os primeiros escolhidos.
E agora eles vieram, os líderes dos clãs e seus xamãs, para se encontrarem com
Ner’zhul e exigirem uma explicação.
111
Ner’zhul apareceu e os cumprimentou balançando suas mãos e pedindo
silêncio.
“Sei o motivo pelo qual vieram hoje,” disse. Durotan franziu a testa. Ner’zhul
estava tão ausente que parecia uma mera mancha, mas podia-se escutá-lo
perfeitamente. Durotan sabia que, normalmente, ele conseguia isso pedindo aos
ventos que sustentassem sua voz para que todos os escutassem. Entretanto,
como isso era possível, se os elementos haviam de fato recusado os xamãs?
Trocou olhares com Draka, mas ambos ficaram em silêncio.
Em contraste, nunca havia visto Gul’dan tão bem. Havia uma nova energia no
orc, um forte sentimento de confiança na sua postura e na sua voz quando
falava.
“O que estava prestes a lhes dizer pode ser difícil de aceitar, mas tenho fé que
meu povo não tem uma mente fechada quando o assunto é melhorar a si
mesmos.” disse. Sua voz era clara e forte. “Assim como ficamos surpresos e
pasmos em saber que existiam seres poderosos além dos ancestrais e dos
elementos, descobrimos que há maneiras de canalizar magia além daquela que
temos cooperando com os elementos. Poder que não é baseado em pedir, ou
implorar, ou comprometer...poder que vem porque somos fortes o bastante
para exigir. Controlá-la. Forçá-la a nos obedecer, curvar-se a nossa vontade, e
não o contrário.
112
Gul’dan parou para deixar que eles assimilassem, olhando os orcs reunidos.
Durotan olhou Drek’Thar.
Sua voz ficou amarga ao que falava. Ele ainda estava em choque e com
vergonha. Durotan entendeu que o xamã se sentia como um guerreiro que
estava confiante em seu machado e o via virar fumaça em suas mãos – um
machado que um amigo de confiança havia dado, um que havia sido pedido
para ser usado em nome de uma boa causa.
“Sim! Vejo que vocês entendem o valor do que eu – do que o Grandioso que nos
tomou sob sua proteção está oferecendo.” concluiu. “Estudei com essa grande
entidade, assim como esses poucos nobres xamãs.”
“O que eles aprenderam,” continuou, “será ensinado a cada xamã que deseje
ser instruído. Isso eu juro a vocês. Acompanhem-me agora para as terras onde
os ritos Kosh’harg são feitos. Irei demonstrar suas formidáveis habilidades.”
Por alguma razão que não podia compreender Durotan de repente sentiu-se
mal. Draka apertou seu braço apoiando-o, percebendo sua súbita palidez.
Ele balançou a cabeça. “Eu não sei,” disse tão baixo quanto ela. “Eu
apenas...sinto que algo terrível está para acontecer.”
Durotan manteve sua expressão imparcial com esforço. Era responsável pelo
113
bem estar de seu povo, e sua relação com Ner’zhul e agora Gul’dan já era
precária. Estava bem ciente de que se ambos os xamãs quisessem desacreditar
ele ou seu clã, isso seria mais fácil do que antes. Com o foco na união, se o clã
Frostwolf fosse exilado ou de alguma maneira excluído, isso seria a extinção
deles. Durotan não estava gostando de como as coisas estavam se
desenrolando, mas não podia protestar muito. Não ligava para si mesmo, mas
não poderia permitir que seu clã sofresse.
E mesmo assim, seu sangue corria, seu coração disparava, seu corpo tremia com
o mau pressentimento. Fez uma rápida reza para os ancestrais para que
continuassem a guiar seu povo com sabedoria.
Chegaram ao rio do vale plano que por gerações foi palco do festival Kosh’harg.
Ao tocar o solo sagrado, relaxou um pouco. Memórias vieram à tona e sorriu ao
relembrá-las. Recordou da fatídica noite quando ele e Orgrim decidiram
desafiar as tradições e atreveram-se a espiar os adultos que conversavam – e
quão desapontados ficaram com a conversa comum que haviam tido. Mais
sábio agora, sabia que ele e Orgrim, por mais corajosos que pensavam ter sido
naquele momento, certamente não foram os primeiros a fazer isso, e não seriam
os últimos.
Recordou também a primeira vez que viu a fêmea que seria sua companheira
para a vida toda, caçando nesses campos exuberantes, dançando em volta da
fogueira ao som dos rufos dos tambores vibrando em suas veias, e cantarolar
para a lua. Pensou que enquanto seu povo ainda tivesse essas coisas, tudo
ficaria bem. Animado, olhou onde as danças normalmente aconteciam. Uma
pequena tenda foi erguida e perguntou-se para o que servia.
Draka e ele pararam alguns metros da tenda, presumindo que fosse parte da
demonstração. Os outros fizeram o mesmo. O sol brilhava intensamente ao que
cada vez mais orcs reuniam-se. Durotan viu que a maioria daqueles que vieram
hoje eram chefes de clã e seus xamãs, então o lugar não precisou comportar o
número de orcs que normalmente aparecia no festival.
114
Draenei...
Cochichos baixos em volta fizeram ele pensar que não foi o único que sentiu o
cheiro. Nesse momento, Gul’dan acenou para os guerreiros e eles
desapareceram dentro da tenda.
Seus rostos estavam inchados pelas surras. Trapos foram enfiados em suas
bocas. Sangue coagulado em sua pele azulada e no pouco que restava de suas
roupas. Durotan ficou paralisado.
Durotan ficou enojado com a atrocidade. Uma coisa era assassinar um inimigo
em um combate armado. Outra era massacrar prisioneiros incapazes de agir.
Ele abriu a boca, mas um aperto em seu braço o fez segurar as palavras. Olhou
com raiva dentro dos frios olhos cinza de Orgrim Doomhammer.
“Você sabia disso,“ sibilou Durotan, falando apenas para os ouvidos de seu
amigo.
“Controle sua voz,” respondeu Orgrim, olhando para ver se alguém estava
prestando atenção neles. A atenção de todos estava em Gul’dan e nos
prisioneiros draenei. “Sim, eu sabia. Estava lá quando os capturamos. É o jeito
que as coisas são, amigo.”
Durotan encarava seu amigo. Orgrim encarou de volta e depois corou e desviou
o olhar. A raiva dele de repente sumiu. Pelo menos seu amigo entendia a
violação que isso representava, mesmo apoiando. Mas o que mais Orgrim
poderia ter feito? Ele era segundo em comando de Blackhand. Era jurado a
apoiar seu chefe. Como Durotan, tinha responsabilidades para com outros que
simplesmente não podia fugir. Pela primeira vez em sua vida, desejou ser um
115
simples membro do clã.
Olhou nos olhos de sua companheira. Ela encarava, horrorizada, primeiro a ele
e depois a Orgrim. E então, viu a dor e resignação tomar conta de seus traços e
ela baixou a cabeça.
“Esses seres nos deram a honra nesse momento,“ dizia Gul’dan. Com o corpo
pesado, Durotan arrastou seu olhar para o xamã. “Iremos usá-los para
demonstrar esses novos poderes a vocês.”
Ele acenou para o primeiro xamã Blackrock, que fez uma reverência. Parecendo
um pouco nervosa, a fêmea fechou os olhos e concentrou-se. Um som como o
de um vento apressado passou pelos ouvidos de Durotan. Um estranho escrito
roxo estampado apareceu abaixo de seus pés, envolvendo-a. Acima da cabeça,
um cubo roxo rodando casualmente. Então, uma pequena e barulhenta criatura
apareceu a seus pés. Fez algumas cambalhotas, seus olhos vermelhos
flamejantes e seus dentes pequenos, porém afiados, que revelavam o que
parecia ser um sorriso. Durotan escutou alguns sussurros de medo.
Um dos draenei foi solto das amarras e empurrado adiante. Suas mãos, porém,
ainda estavam amarradas, tropeçou em seus cascos fendidos depois ficou de pé,
ereto. Seu rosto estava impassível. Apenas o movimento lento de sua causa
indicava algum estresse.
116
O primeiro xamã apresentou-se, movendo suas mãos e murmurando
levemente. A pequena criatura ao seu lado chiou e pulou, e então de repende
fogo surgiu de suas pequenas mãos com garra para atingir o infeliz draenei.
Logo depois, uma bola de...escuridão...formou-se nos dedos da xamã e voou em
direção ao prisioneiro. Grunhiu de dor ao que sua carne azulada foi escurecida
e queimada pelo ataque da pequena criatura, mas caiu de joelhos em total
agonia ao que a bola de sombras alvejou-o.
Por um momento, tudo era silêncio. Então, surgiu um som que Durotan nunca
achava que escutaria: gritos de aprovação e prazer à vista do tormento de um
inimigo impotente.
Mãe Kashur, certamente, certamente isso não é o que você desejava, pensou. A
animação tomou conta de seus ouvidos, o cheiro de sangue e carne carbonizada
incomodava seu nariz. Pior de tudo foi ver alguns de sua raça, inclusive de seu
clã, serem contaminados pelo frenesi de causar dor e tormento em outros seres
que estavam incapazes até de cuspir em seus oponentes.
Percebeu que sua mão estava doendo. Como em transe, ele olhou para baixo e
117
viu que Draka apertava sua mão tão forte que estava prestes a quebrá-la.
“Não!” a voz de Gul’dan foi levada abafando o barulho da multidão. “Não são
mais xamãs. Foram abandonados pelos elementos, e não irão mais chamá-los ou
implorar por sua ajuda. Contemplem aqueles que têm poder, mas não mais têm
medo de usá-lo. Contemplem...os bruxos!".
Durotan soltou sua mão dos dedos enroscados com o de sua companheira para
olhar a montanha sagrada. Sobressaía-se em direção ao céu tão serenamente
como sempre foi, seus lados refletindo a luz, e por um momento, Durotan
imaginou por que ela não rachou e quebrou, como o coração de um ser
consciente, dominado pelo horror pelo o que estava sendo feito sob sua antes
confortante sombra.
“Meu chefe,” disse pacientemente. “irá permitir que seus xamãs aprendam as
magias dos bruxos?”
“Farei uma pergunta a você antes.” disse. “Você aprova o que foi feito aos
prisioneiros hoje?”
“Provado que irão contra atacar quando atacados.” replicou. “Tudo isso foi
provado.” Drek’Thar estava prestes a protestar, mas Durotan o silenciou antes.
“Eu sei, é o desejo dos ancestrais, mas hoje eu presenciei algo que nunca achei
que iria. Vi os campos sagrados onde por incontáveis anos nosso povo reunia-se
em paz, manchado pelo sangue daqueles que não puderam levantar um dedo
para se defenderem.”
118
“E sob as sombras de Oshu’gun. Aqueles que mataram os draenei hoje não o
fizeram para proteger uma ameaça as nossas terras. Eles abateram prisioneiros
para mostrar seus novos...talentos.”
Orgrim agora tossia baixinho e Durotan pediu que se juntasse. Orgrim era
conhecido por todos e sentou-se a fogueira com a familiaridade de alguém
conhecido e querido.
"Orgrim,” disse Draka tocando o braço de seu amigo com gentileza. “Os
primeiros...bruxos...são de seu clã. O que eles pensam?”
Olhou para Durotan e sorriu. Apesar do peso em seu peito, ele sorriu de volta.
“Essas novas criaturas, esses poderes estranhos – parecem ser mais confiáveis. E
destrutivos.”
Draka ainda balançava a cabeça, seus lindos olhos tristes. Suas mãos moviam-se
como se procurasse fisicamente pelas palavras.
“Nós gostamos de caçar,” Durotan apontou. Não gostava de discutir com sua
companheira, mas como sempre, precisava ver todos os lados do assunto para
119
poder decidir o que era melhor para seu clã. “Os lobos gostam de banquetear-se
em carne crua”
“Os draenei sempre tiveram magia superior a nossa, mesmo com a ajuda dos
elementos,” disse Drek’Thar. “Sempre fui um xamã. Nasci assim. E agora falarei
que irei abraçar o caminho dos bruxos, se o líder do meu clã permitir. Porque eu
entendo o que aqueles poderes podem fazer por nós, tendo lidado com os
elementos pelo tempo que lidei. Eu diria Draka, desculpe, mas sim, isso é
necessário para a nossa existência. Se não tivermos os poderes dos elementos
para nos ajudar, os draenei irão nos obliterar da face da terra.”
Draka suspirou e enterrou seu rosto nas mãos. O pequeno grupo estava em
silêncio, o único som vinha da fogueira. Durotan achou que faltava algo, e
agora ele sabia. Não escutava o som das criaturas noturnas, pássaros, insetos e
outros seres que antes enchiam o ar com sons discretos. Foram afastados deste
lugar por causa do que aconteceu aqui mais cedo. Tentou não tomar isso como
um mau presságio.
120
Capitulo 14
Drek’Thar chora ao me contar essas histórias, lágrimas caindo de olhos que não
podem mais ver o presente mas que vêm perfeitamente o passado. Não posso
oferecer consolo a ele. Se os elementos voltaram a responder aos seus chamados
– aos meus – e certamente de qualquer orc xamã é uma prova da sua compaixão
e perdão e o desejo de ver o equilíbrio restaurado.
O Pico que ainda abriga a escuridão não está neste continente. Estamos bem
longe de sua perversidade, mas não ainda fora de sua sombra. A sombra que foi
lançada há muito tempo, no dia seguinte da corrupção do nosso local mais
sagrado.
O sono não chegou facilmente para Durotan. E nem para Draka, já que ela
revirava e suspirava. Finalmente desistiu e repassou os acontecimentos do dia.
Seus instintos gritavam que era errado adotar o caminho de uma magia que
descaradamente desenvolvia-se no sofrimento de outro ser. E, no entanto, o que
mais podia ser feito? Os elementos haviam abandonado os xamãs, apesar dos
ancestrais terem dado aos orcs essa missão. Sem a magia como uma arma
adicional, os orcs seriam dizimados pela sabedoria e tecnologia superior dos
draenei.
Haveria outra reunião em dois dias, e nela os chefes deveriam eleger um líder
que falasse em nome de todos. Decidir por eles. Iriam eleger um que seria
chamado Chefe Guerreiro.
Um toque suave afagou seus cabelos. Olhou para cima e viu Draka lendo a
carta por cima de seu ombro.
Ele sorriu com tristeza. “Você não costumava ser tão cínica, minha amada.”
121
“Não costumava viver em tempos como esse.” foi tudo o que ela disse. Em seu
coração sabia que ela estava certa. Havia apenas um orc que era bem conhecido
e carismático o bastante para ganhar votos suficientes para ser Chefe Guerreiro.
Grom Hellscream poderia ser algum desafio para Blackhand, mas Hellscream
era muito impulsivo para ser confiado a essa tarefa. Ele havia sido uma figura
visível desde o início, primeiro opondo-se e depois apoiando Ner’zhul. Eram
seus xamãs que haviam tornado-se os primeiros bruxos. Havia sido vitorioso
mais vezes contra os draenei do que qualquer um.
Draka, como na maioria das vezes, estava certa sobre isso. E dois dias mais
tarde assistiu com um olhar tedioso enquanto os votos dos chefes dos clãs eram
somados e como Blackhand do clã Blackrock foi escolhido. Viu que vários
olhavam em sua direção ao que o nome de Blackhand foi anunciado por
Gul’dan, e o grande orc aceitava o título com falsa modéstia. Durotan nem se
deu o trabalho de contestar. De que adiantaria? Já estava sob suspeita de
deslealdade. Nada do que dissesse poderia mudar o que estava decidido.
Orgrim estava atrás à direita de seu líder. Gul’dan olhava Blackhand com
respeito e Durotan sabia que o xamã estava manipulando as coisas, apesar de
não saber como.
122
Levantou seus braços e gritou. “Pela Horda!”
Indignados demais para ficar, Durotan e Draka retornaram ao lar logo depois
da eleição do líder. Os xamãs ficaram para poder treinar. Quando retornaram,
muitos dias depois, Durotan viu que estava confiantes e orgulhosos de novo.
Essa nova magia restaurou a confiança em si mesmos; algo que havia
evaporado como o orvalho da manhã, quando os elementos os deserdaram.
Durotan estava agradecido por isso. Amava seu clã e sabia que eram pessoas
boas, não gostava de vê-los abalados e desanimados.
“Chefe, uma palavra vinda do Chefe Guerreiro.” disse com uma voz
aparentemente agradável. Durotan aquiesceu e gesticulou para que o bruxo o
acompanhasse. Andaram até estarem certos de que não era possível ouvi-los.
“O que pode ser que Blackhand queira ao mandar um de seus mais importantes
bruxos?” perguntou.
Kur’kul sorriu em volta de suas presas. “Estou indo em todos os clãs.” disse
claramente com a intenção de colocar Durotan em seu lugar. Os Frostwolves
não eram particularmente honrados. Durotan grunhiu e cruzou os braços,
esperando.
123
“O fator mais importante em nossa eventual vitória gloriosa sobre os draenei
são números.” continuou. “Eles são poucos e somos muitos. Mas precisamos de
mais.”
Durotan o encarava pasmo. Seu comentário era apenas uma piada grosseira. O
que estava acontecendo.
“Crianças começam a treinar com seis anos.” prosseguiu Kur´kul. “São fortes o
bastante para batalhar com doze anos. Convoque todos os jovens.”
“Temo que não tenha escolha. É uma ordem. Qualquer clã que se recuse a
obedecer será marcado como traidor da Horda. O clã será exilado e seu líder e
companheira...executados.”
“Pelo futuro deles? Sim. Irei drenar um pouco de suas vidas...o equivalente a
seis anos. Não sofrerão danos. As crianças Blackrock com certeza não sofreram.
Blackhand inclusive insistiu que seus três filhos fossem os primeiros a serem
honrados. Em troca serão capazes de lutar pela glória da Horda agora, quando
podem fazer diferença.”
124
Durotan não estava surpreso por saber que havia deixado que fizesse isso com
seus filhos. Pela primeira vez sentiu-se agradecido por ter poucas crianças em
seu clã. Apenas cinco que se encaixavam no requisito. Releu a mensagem
sentindo fúria e náusea ao mesmo tempo. Essas crianças deveriam ter direito
de serem crianças.
Mas felizmente parou. Os jovens orcs – não mais crianças - permaneceram onde
eles haviam caído no instante em que a drenagem começou. Por um longo
tempo eles não podiam se levantar, e quando tentavam, choramingavam
baixinho, mas profundamente, como se não tivessem mais força para qualquer
outra coisa.
Durotan virou-se para o bruxo. “Você terminou o que veio fazer. Vá embora.”
Durotan o empurrou com força e Kur’kul tropeçou de costas, quase caindo. Ele
olhou furioso para Durotan.
125
“Blackhand não ficará satisfeito em ouvir isso”, Kur’kul rosnou. Durotan não
se atreveu a responder; se mais alguma palavra saísse de sua boca, ele sabia que
seria o fim do seu clã. Ao invés disso, ele se virou, tremendo de raiva, e foi até
as crianças, que não eram mais crianças.
Por algum tempo depois daquilo, nada foi pedido do clã Frostwolf, a não ser
mais treinamento intensivo e seus relatórios sobre o treinamento, e Durotan
estava aliviado e apreensivo. De alguma forma, quando Blackhand e Gul’dan
escolhessem notá-lo, a tarefa que lhe seria designada seria uma difícil.
Velho amigo,
Tenho certeza que não é surpresa para você que está sendo observado. Eles irão
definir uma tarefa para você, uma que sabem que pode completá-la. E assim
você deverá fazer. Não sei o que farão se recusar, mas temo pelo pior.
Não havia uma assinatura, não era necessário. Durotan conhecia a letra
expressiva de Orgrim. Amassou o pergaminho e jogou na fogueira, vendo-o
retorcer e enrolar em si mesmo como um ser vivo, ao que as chamas o
consumiam.
Mas a mensageira parecia inquieta. Não desmontou, mas não foi embora.
“Fui instruída a esperar por uma resposta.” disse após uma pausa
desconfortável.
Era pior que doe imaginava. Manteve sua expressão neutra, embora Draka
126
estivesse observando-o com cuidado.
Você teve tempo para veras habilidades dos bruxos recentemente treinados em
ação. É hora de atacar nossos inimigos. A cidade draenei de Telmor fica perto
de suas terras. Será instruído a formar um grupo de guerra e atacá-los. Orgrim
me disse que, quando jovens, vocês entraram na cidade. E que viu o segredo de
como os draenei a deixam invisível. Disse-me também que se lembra de como
expô-la para que nossos guerreiros ataquem.
Tenho certeza que não preciso dizer o que a destruição da cidade significaria
para a Horda. E para o clã Frostwolf. Responda essa mensagem imediatamente
e começaremos os preparativos para o ataque.
Durotan estava furioso. Como Orgrim podia ter revelado essa informação. Era
tão devoto a ponto de contar ao Chefe Guerreiro sobre este incidente
colocando-o em evidência? A raiva diminuiu quando percebeu que essa
informação poderia ter sido passada em alguma conversa tido ao longo desses
anos. Blackhand era inteligente o bastante para pegar qualquer resquício de
informação e guardar até a hora certa de usá-la.
Durotan pensou em mentir, e dizer que não se lembrava das palavras que
Restalaan tinha dito para tirar a ilusão que mantinha a cidade draenei segura e
longe dos olhos dos ogros...e agora os olhos dos orcs.Já fazia muito tempo e
havia escutado apenas uma vez. Qualquer um já teria esquecido. Mas a ameaça
na mensagem era tão mal velada que beirava o ridículo. Se Durotan
concordasse em ajudar no ataque, provaria sua lealdade a Horda, a Blackhand e
a Gul’dan pelo menos por enquanto. Caso recusasse alegando não lembrar as
palavras que o novo líder queira que falasse...bem, como Orgrim, temia pelo
pior.
127
feliz em ouvir isso. Fui instruída a entregar-lhe isto.” Pegou um pequeno saco
de sua bolsa e entregou. “Seus guerreiros e bruxos precisarão disso para
treinar.”
Durotan acenou. Sabia o que eram: Coração da Fúria e Estrela Brilhante que
tirou de Velen. Essas pedras foram o motivo pelo qual foi salvo da ira de
Ner’zhul. Agora, as usaria contra as pessoas das quais tirou.
Alguns minutos depois ela o acompanhou, colocando seus braços em volta dele
enquanto enterrava seu rosto nas mãos e lamentava os eventos ocorridos que o
levaram a tomar essa decisão forçada.
Um mensageiro havia sido mandado antes para que fossem arrumadas muitas
fogueiras e alimentação para os “convidados”.
Nenhum dos pesados gigantes perturbava a vasta onda de orcs enquanto eles
marchavam a caminho do seu destino naquela manhã. Durotan estava à frente
montado, ao lado de Orgrim e Nightstalker. Eles eram silentes, mas Durotan
não ignorou o fato dos olhos e Orgrimm demorar-se no local onde dois garotos
foram resgatados por guerreiros draenei.
“Longos anos se passaram desde que passamos por aqui”, Durotan disse.
Orgrim assentiu com a cabeça. “Eu não tenho nem certeza se estamos na
128
direção correta. A floresta e os campos mudaram e cresceram, e naquela época
as marcações já eram poucas e preciosas.”
Durotan disse pesaroso, “Eu lembro o caminho”. Ele desejou que não. Uma
pilha de pedras aqui, uma vegetação esquisita ali era o suficiente para guiá-lo.
Aquilo não parecia nada para os outros. Blackhand havia dito para as tropas
que os draenei eram capazes de camuflar sua cidade. Mesmo assim, os ouvidos
afiados de Durotan captaram pequenos murmúrios de preocupação. Ele franziu
as sobrancelhas.
“Nós estamos nos aproximando”, ele disse. “Devemos ser silenciosos. Há uma
grande chance de já termos sido vistos e reportados.”
O grupo de guerra então ficou quieto. Com alguns gestos, Orgrim enviou
alguns de seus batedores para reconhecer a área. A mente de Durotan voltou
àquele crepúsculo, quando ele também estava preocupado com onde estavam
indo e o que os draenei tinham planejado.
Não havia uma pedra falsa em baixo onde a gema verde ficava escondida. A
memória de Durotan não lhe servia de ajuda em descobrir isso. Ele se
concentrou, andando lentamente, ouvindo o tilintar da armadura e o suave
ressoar do metal, enquanto os outros observavam e esperavam. Ele fechou os
olhos para ajudar na concentração e viu de novo Restalaan ajoelhando no chão,
movendo as folhas e as espinhas do pinheiro para revelar-
Durotan abriu os olhos e deu alguns passos para a esquerda. Ele disse uma
breve oração aos ancestrais; se era buscando ajuda em encontrar a pedra ou não
encontrá-la, ele não estava certo. Mãos metálicas desceram e empurraram as
camadas de detrito e então tocaram algo gelado e duro.
Até neste conturbado estado mental ele podia sentir a pedra emanando uma
reconfortante energia. Ela estava alojada na palma de sua mão como se lá
pertencesse. Durotan passou seu dedo indicador esquerdo sobre a pedra,
129
prolongando o momento antes que tudo mudasse irrevogavelmente.
A pedra era tão tranquilizante de segurar, Durotan não queria nada além do
simplesmente ficar parado e olhar o seu interior, mas ele sabia que já tinha feito
sua escolha. Ele respirou fundo e disse as mesmas palavras que Restalaan havia
dito no mesmo lugar há tanto tempo.
Ele queria acreditar que seu grosseiro sotaque orc não ativaria a pedra. Que ele
seria capaz de cumprir suas obrigações com o seu povo sem precisar devastar
uma pequena cidade cheia de civils, mas aparentemente as palavras foram
entendidas por qualquer força que controlasse a gema verde. A ilusão já estava
desaparecendo, as árvores e pedras tremeluzindo até desaparecer, e diante do
grupo de guerra orc, uma larga e pavimentada estrada, como um convite.
Eles não precisavam de mais motivação. A gloriosa cidade dos draenei jazia à
sua frente, com gritos vindos de milhares de gargantas, os orcs caíram sobre
eles.
130
Capitulo 15
Posso apenas rezar para os ancestrais que eu nunca seja colocado na mesma
posição que meu pai. – dividido entre o que sei em meu coração estar certo e o
bem-estar do meu povo. E é por isso que continuo a lutar para sustentar a tênue
paz entre nós e a Aliança.
A atmosfera calma foi quebrada pelo som dos gritos de guerra e uivos dos lobos
enquanto aqueles que os montavam atacavam as ruas da cidade. Vários draenei
desarmados foram mortos nos primeiros segundos do ataque. A pavimentação
branca logo estava azul pelo sangue derramado, mas não demorou muito para
os guarda contra atacarem.
Durotan jogou a pedra dentro de sua bolsa no momento que terminou de usá-
la; seria adicionada a vermelha e a amarela que tirara de Velen. Montou
rapidamente e percorreu o caminho com uma determinação sombria e machado
pronto. Embora tivesse feito um juramento pessoal de que não atacaria um
inimigo desarmado ou uma criança, ele também fez uma escolha e estava
preparado para matar ou morrer por ela.
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Os guardas draenei estavam nas ruas agora, lançando suas próprias magias.
Durotan virou-se em sua sela a tempo de bloquear um golpe de espada que
flamejava com energia azulada. A espada ressoou contra a cabeça do machado e
estremecendo seus braços e ossos. Mas isso não era nada comparado com o
choque que sentiu ao reconhecer seu ofensor.
No entanto, Nightstalker foi treinado quase tão bem quanto o orc que
carregava. Ao sentir que este não estava mais em suas costas, ele virou-se para
Restalaan. Grandes dentes mastigaram o braço do draenei. Se não fosse pela
armadura, o braço teria sido arrancado naquele instante. Mas a pressão tinha
sido o bastante para que derrubasse sua espada. Com um grunhido, Durotan
brandiu seu machado o mais forte que conseguiu. Bateu violentamente contra o
torso do draenei, e seu gume afiado cortando a armadura e ferindo a carne.
Restalaan caiu de joelhos, seu braço inútil ainda preso aos dentes de
Nightstalker. O lobo branco mordeu fundo, rosnando, pressionando como se o
braço do draenei fosse um pequeno animal. Em instantes, o lobo iria arrancá-lo.
Sangue jorrou da ferida. Não fez nenhum som, apesar da agonia que deveria
estar passando.
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Odores assaltaram suas narinas, de sangue, fezes e urina, e do inconfundível e
único fedor de terror.
Sentiu-se bem com a cólera fervendo dentro dele. Seus sentidos nunca foram
tão aguçados e parecia mover-se sem pensar. Ali perto – outro dos guardas
lutando com Orgrim. Ficou apreensivo pensando em adiantar-se para ajudar
seu amigo, mas a Doomhammer brandiu no ar e esmagou o crânio do inimigo
apesar do elmo. Durotan sorriu ferozmente. Orgrim não precisava de ajuda.
Sentiu uma presença ao seu lado antes de poder escutar ou farejá-la, e virou-se,
urrando o grito de guerra de seu clã. Ergueu seu machado coberto de sangue e
preparou-se para brandi-lo.
Por um horrível segundo ela pareceu ser a mesma garota que Durotan e Orgrim
encontraram anos atrás. Não podia ser – certamente aquela garota era uma
adulta agora. Ou era ela? Mas não importava. Era uma criança que, brava e
estupidamente, estava tentando atacar um guerreiro orc montado com suas
próprias mãos.
E foi com enorme esforço que segurou seu ataque na metade do caminho. Não
iria machucar uma criança – não era esse o código, não era o jeito dos orcs-
Durotan jogou sua cabeça para trás e gritou sua agonia para os ancestrais.
133
um orc caído. Alguns orcs que ainda viviam, gritavam por ajuda, mas suas
súplicas não foram ouvidas. Xamãs podiam curá-los com seus feitiços, mas
aparentemente a magia dos bruxos não abrangiam as artes da cura. Então
jaziam onde haviam caído, alguns arfando seus últimos suspiros ao lado do
draenei que haviam matado enquanto a onda irreversível despejava-se adiante.
Seguiam pelas ruas através dos pés da colina, entrando em cada construção e
matando quem encontrassem. Certamente alguns draenei se esconderam,
pensou Durotan, e rezavam para que não fossem achados. Não achava que
essas preces seriam atendidas. Uma vez que a primeira rodada de massacre
fosse completada, haveria os saques e a procura por aqueles que escaparam do
ataque. Ele sabia. Foi planejado assim.
Alcançaram o maior edifício até então, aquele que ficava mais alto na
montanha, e Durotan reconheceu imediatamente. Era a casa do magistrado,
onde ele e Orgrim tinham jantado com o Profeta. Pensou com amargura que
Velen não era bem um profeta, se não previu esta situação negra. Nightstalker
apressou-se pelos degraus e Durotan não conseguiu evitar. Durotan virou a
cabeça e olhou sobre os ombros, em direção da cidade lá embaixo, exatamente
como fez a primeira vez que subiu esses degraus com seus próprios pés.
Tenho orgulho do meu povo e de nossa cidade, havia ditoe Restalaan, seu corpo
jazia morto e rijo na rua branca junto com incontáveis draenei. Trabalhamos
duro aqui. Amamos Draenor. E nunca pensei que teria chance de dividir isso
com um orc. As armadilhas do destino são definitivamente estranhas.
Mais estranha do que qualquer jovem orc ou guarda draenei poderia imaginar.
Os cômodos que fizeram os dois jovens orcs sentirem-se confinados anos atrás,
agora parecia totalmente claustrofóbico repleto de dúzias de guerreiros orcs.
Maioria estava vazio; houve tempo para evacuar todos os draenei, exceto
aqueles que juraram lutar a serviço da cidade. E esses guardas que os atacavam
agora, morreram. A bela mobília ornada foi usada como arma, lançada na
cabeça dos draenei, a quebradeira acrescentando à emoção da luta. Orcs
fazendo buracos nas paredes macias com socos pelo simples prazer de fazê-lo.
Camas rasgadas, e estátuas destruídas por machados ou martelos.
Durotan havia chegado ao seu limite. “Pare!”, gritou, mas ninguém o escutou.
134
As criaturas controladas pelos bruxos pareciam contentes com esse
comportamento. Mas a hora da destruição já havia passado e a implacável
selvageria dos orcs não serviria de nada agora que os habitantes de Telmor
estavam mortos ou haviam fugido.
Estavam escutando agora, sua respiração em fôlegos que enchiam o quarto com
um som rouco. Mas pelo menos eles pararam de usar suas armas em qualquer
coisa que se mexia... ou às vezes no que não se mexia.
Alguns pareciam sentir culpa por isso. Durotan percebeu que muitos haviam
esquecido completamente que alguns dos seus ainda permaneciam se
contorcendo de dor lá fora, enquanto praticavam a destruição gratuita da
estátua do magistrado. Afastou esses pensamentos e acenou para Drek’Thar. Os
bruxos podem não ter magias de cura, mas eles haviam sido xamãs, e sabiam
como cuidar das feridas da batalha de uma maneira mais mundana. Drek’Thar
gesticulou para vários bruxos e eles voltaram pelo caminho de onde tinham
vindo.
“Agora, essa cidade tem suprimentos dos quais nunca havíamos visto. Há
alimentos em abundancia, armas, armaduras e outras coisas que não
conhecemos. Coisas que servirão a Horda em sua busca para-“
Ele não pode terminar a frase como planejou: Em sua busca para varrer os
draenei. Ao invés disso, disse desajeitado, “Em sua busca. Somos um exército. E
um exército marcha junto com seu estômago. Precisamos estar bem
alimentados, bem hidratados, curados, descansados e protegidos. Orgrim –
você pega um grupo e comece pelo fim. Guthor, pegue outro e vá direto para os
portões. Avance até encontrar o grupo de Orgrim. Qualquer um que tenha
135
qualquer conhecimento de cura, apresente-se a Drek’Thar e faça exatamente
como ele mandar.”
Realmente, o que fazer? Não havia estrutura para cuidar dos prisioneiros, e no
final, o único propósito para prisioneiros, seria para negociar. Uma vez que
ficou bem claro que a única finalidade da Horda era o total extermínio da raça
draenei, não havia motivos para fazer prisioneiros.
“Mate-os.” disse roucamente. Esperou que essa falha em seu tom de voz fosse
interpretada como uma fúria crua do que a dor agonizante que era. “Mate todos
eles.”
Com alguma sorte, durante essa campanha horrível para apagar uma espécie
que nunca levantou a mão para eles, a morte acharia Durotan cedo ou tarde.
136
Capitulo 16
Mesmo assim, esses números não teriam importado se não fossem pelos
demônios que os tinham em suas mãos. Regozijo-me com sua dor; condeno com
cada fibra do meu ser o que fizeram àqueles que os obedeceram por confiança.
“Confesso ter ficado surpreso por Durotan ter sido capaz de executar nossas
ordens,” disse Gul’dan. “Achei que resistiria, ou ao menos restringiria
determinadas ações dos seus orcs. Mas a cidade está destruída e conquistada,
mestre. Todos os draenei que lá viviam não mais estão lá – a maioria morta.”
No entanto, o clã Blackrock não foi tão tolo. Blackhand e família agora deitavam
em camas onde antes o magistrado da cidade dormira. Os orcs não sabiam o
que fazer com os adereços dos draenei no começo, mas agora começaram a
incorporar o estilo de vida de suas vítimas. Sentavam-se em cadeiras,
alimentavam-se a mesa, treinavam com armas draenei, adaptaram as
137
armaduras ao porte mais corpulento do orc. Poucas orquisas e muitos orcs do
clã Blackrock adicionavam vestimentas draenei às tradicionais túnicas e culotes.
Gul’dan sabia que muitos se perguntavam por que ele, ou Ner’zhul não ficaram
com a cidade para eles. Apesar de tentador, ele foi muito bem aconselhado por
seu mestre. Confortos materiais eram agradáveis, mas poder era mais doce, e
quanto menos reivindicava para si publicamente, seu alcance ficaria em
segredo. Kil’jaeden não o decepcionaria contanto que fizesse bem o trabalho.
Alguns itens foram trazidos para esse novo lugar, que ele chamava de casa –
uma mesa circular enorme, esculpida em madeira incrustada com pedras e
conchas que brilhavam suavemente, junto com belas cadeiras.
Logo, bem antes do que esperava, o Concílio das Sombras seria formado.
Enquanto por fora, Gul’dan estava progredindo os orcs como raça, dando poder
e eliminando o “inimigo” draenei, um punhado de orcs tão corrompidos e
sedentos de poder quanto ele, os manipularia.
O bruxo olhou com desprezo o velho orc, que fora seu mestre, sentado
encolhido no canto. Seu olhar então encontrou os olhos ardentes de Kil’jaeden e
ele aquiesceu.
138
Aliados.
Alguns poderiam referir-se a eles como uma classe mais baixa de orc.
Secretamente, era assim que o bruxo pensava. Mas era sábio o bastante para
saber que seu ofício, apesar de não ser nobre ou dificilmente reconhecida, era
tão necessário quanto o desejo de matar de um guerreiro ou a maestria de
lançar feitiços de um bruxo. Aqueles que forneciam alimentos, abrigo,
armamento – os guerreiros e bruxos não iriam longe sem eles. Então Gul’dan
fez um espetáculo de louvor aos artesãos e o resultado agradável foi deixá-los
inspirados para trabalhar mais e melhorar.
Mas apesar de cada orc de cada clã estar trabalhando o máximo que podia – e
Gul’dan tinha espiões em cada clã para certificar-se disso – não iria ser o
bastante. A tomada de Telmor foi surpreendentemente fácil e o estímulo à
moral foi grande. Mas sabia que a vitória dos orcs foi em grande parte devido a
sorte. Nenhum draenei que lá vivia tinha razão para achar que seria descoberto
e invadido em questão de horas. Achavam que estavam totalmente a salvo,
protegidos pela magia da pedra verde, que Gul’dan chamou de Folha Sombria,
que os protegia das vistas dos ogros e depois dos orcs. Aquela vitória fácil não
seria repetida. Como –
139
“Venha, Blackhand.” convidou ele. “Acalme-se e escute o que tenho para falar.
Você é o que mais será beneficiado.”
“Eles são a escória.” grunhiu. “São inimigos de longa data. Muito mais do que
os draenei, e por melhores motivos. Como irei me beneficiar disso?”
Indo direto ao assunto, pensou com satisfação o bruxo. A escolha por ele foi
acertada.
“Há alguns que ainda dizem que não foi eleito de maneira justa. Se obtiver
sucesso, irá apenas aumentar sua glória.”
Mas Orgrim sabia que apesar de suas qualidades – e ele tinha muitas que o
desagradavam – ele era um bom estrategista. O plano era sólido, se pudessem
se desprender emocionalmente. Então concordou em apoiá-lo.
Trocar informações foi complicado. O clã Blackrock havia capturado três ogros
e passaram uma noite inteira falando com palavras simples para que pudessem
entender o que queriam e começassem a cooperar. Agora cada guerreiro, bruxo
e curandeiro do gigantesco clã estava preparado para batalha.
140
salvo, assim como os draenei em Telmor; e estariam certos há um ano. Mas
muito mudou desde então. Os orcs não eram mais clãs separados, mas uma
força de combate unificada, disposta a deixar de lado um antigo rancor por um
novo ódio.
Blackhand estava à frente, acompanhado pelos três ogros. Atrás dele estavam
seus filhos, Rend e Maim, que conversavam entre si em voz baixa e davam
risinhos roucos. Orgrim foi contra levá-los a batalha, mas estes provaram ser
mais fortes e hábeis do que parecia. Herdaram a sede de sangue do pai, mas
não a astúcia. Griselda também foi treinada para lutar, mas não era talentosa
como os garotos. Ficaram sérios quando Blackhand olhou-os com ferocidade.
Orgrim perguntou-se se ele faria um discurso. Eesperava que não fizesse, já que
o líder era melhor agindo e não falando e seu clã estava preparado para agir.
Blackhand olhou o mar de guerreiros e acenou, dando a ordem para atacar.
Orgrim virou a tempo de ver um dos guerreiros ser arremessado, morto com
um único golpe da clava maciça. Rugindo, Orgrim preparou-se para atacar a
criatura assassina quando um grito de “Parem! Parem!” o fez brecar de repente.
141
mesmo. E esse pensamente o irritou.
Levantou a cabeça para ver os ogros que eram amigos do clã conversando com
os da sua espécie. Ou melhor, gritando e de vez em quando os estapeando. Pelo
menos eles pararam de perseguir os orcs que saiam da batalha. Pareciam estar
escutando. Um deles, maior e usando algo que parecia ser um cinturão oficial,
tinha um cérebro. Orgrim não entendia as criaturas vis e usou a pausa para
recuperar-se e tomar água.
“Não vejo a hora de poder matá-los de novo,” disse Rend. Orgrim olhou o filho
mais velho de seu chefe.
“Se obtivermos sucesso, eles lutarão ao nosso lado.” retrucou. “Não será
permitido matá-los.”
Orgrim fez uma careta. Ele também gostaria, mas...”Vários orcs estão mortos
tentando fazer com que o plano de seu pai dê certo. Não iria gostar de ver você
sabotando seus esforços.”
“Eu irei. Se isso funcionar, e eles nos escutarem – e se algum deles aparecer
morto, seus nomes serão os primeiros que irei mencionar.”
Rend o encarou furioso. Agora, ele era tão jovem que parecia ser o ato de uma
criança petulante, mas por dentro, pressentiu um agouro. Nunca gostou de
Blackhand, nem de seus filhos, tirando Griselda. Não sabia ao certo se era a
criação ou o crescimento forçado o responsável pela obscuridade que havia
neles. Não confiava neles. Se sobrevivessem e começassem a usar o cérebro
além dos músculos, Rend e Maim seriam mais perigosos e mortais que seu pai.
“Eu disse que ele não iria concordar, Rend.” disse Maim, audacioso. “O velho aí
esqueceu o que é ter a sede de sangue correndo pelo corpo. Vamos.”
Rend seguiu seu irmão, sorrindo. Orgrim suspirou. Tinha problemas mais
importantes do que lidar com dois moleques. Voltou sua atenção para as
negociações, apesar de achar que os ogros não entenderiam essa palavra. Os
ataques haviam cessado. Blackhand, que havia fugido do campo de batalha e
pedido que seu clã fizesse o mesmo, agora conduzia seu lobo para onde os
ogros se reuniam. Orgrim o seguiu e chegou a tempo de escutar o líder dos
guardas anunciar, “Não gostar gronn. Gronn nos machucar.”
142
Acenou para um dos ogros virar e mostrar as costas para Orgrim e Blackhand.
Viu cicatrizes cruzando as costas do ogro. Não sentiu pena da criatura, pois
fizeram pior com os orcs por décadas. Mesmo assim, era algo útil. Os ogros
capturados falaram também de agressões parecidas, e concordavam com a
cabeça, como se fossem muito sábios.
Blackhand sorriu para a coisa. “Bem, para começar não iremos bater em vocês.”
Orgrim pensou nos filhos de seu chefe, mas não disse nada. “Iremos dar
alimentos e armas apropriadas.” Blackhand ficou aliviado por não prometer
armaduras. Os materiais para fazer armadura para um ogro dariam para fazer
três para os orcs. E felizmente, o guarda – o mais inteligente dos ogros – ainda
não tinha sido esperto o bastante para lembrar-se disso.
“Terão comida, abrigo e o deleite de esmagar draenei até que virarem uma
mancha na grama.”
O ogro capitão concordou. “Não mais machucar ogros.” rosnou, e virou-se para
aqueles que liderava. Seus pequenos olhos brilhavam com lágrimas, e desta
vez, ao olhar para as costas cheias de cicatrizes do ogro, Orgrim sentiu um
pouco de pena deles. Bem pouquinho.
“Krol, então.” repetiu Blackhand antes que seu segundo em comando pudesse
acrescentar algo. “Quando acha que podemos liderar nosso primeiro ataque em
conjunto.”
“Agora.” disse o ogro antes que ambos orcs pudessem protestar, ele gritou algo
em sua língua estranha e horrenda. Os outros ogros pulavam, e a terra tremia
quando aterrissavam. Então todos se viraram e propositalmente entraram de
novo na caverna. Blackhand olhou Orgrim, que vacilou. Imaginou ser mais fácil
143
parar a maré do que essa enchente de gigantes estúpidos e determinados.
Não houve tempo de relembrar o clã do plano. Orgrim tinha esperanças de que
se lembrassem; principalmente os maníacos filhos de Blackhand. Uma matança
de ogros estava a espera deles, mas era melhor que matassem os ogros certos.
Porque se não o fizessem, se dessem aos ogros alguma razão para questionar
esta súbita e peculiar aliança, então os bebes e os velhos que esperavam no
acampamento, poderiam ser os únicos remanescentes do clã Blackrock.
Orgrim não estava muito otimista. O clã era sempre feroz nas batalhas.
Blackhand era mais do que um selvagem astuto, e Orgrim percebeu que,
recentemente, uma certa fúria maníaca começou a esgueirar-se entre os clãs. Ao
virar seu lobo em direção da caverna para atacar junto com os seus, perguntou-
se se sua imaginação não estava pregando-lhe uma peça.
144
Capitulo 17
Lar.
Por muitos anos, cada clã tinha seu próprio lar e terras sagradas. Espíritos da
terra, ar, água, fogo e da natureza. A erradicação começou e continuou cada vez
mais devastadora, até chegarmos a Kalimdor. Aqui, achamos um lar para um
povo errante. Um lugar para repouso, um santuário, onde possamos nos reunir
e reconstruir.
Lar, para mim, agora tem o nome de meu pai; a terra de Durotar.
Durotan levantou a cabeça para farejar o ar. O aroma que preencheu suas
narinas era de poeira e desidratação, um tipo acre de odor. Parecido a algo
queimando. Antes Drek’Thar poderia ter sentido esse cheiro melhor do que ele,
mas esses dias já haviam se passado. Não era mais um xamã, era um bruxo. O
vento não viria ao seu chamado quando solicitado, carregando informações tão
detalhadas como se tivessem sido escritas em um pedaço de pergaminho. E
pior, nem ele e nem os outros bruxos do clã pareciam se importar.
Havia algum tempo que não chovia e o verão parecia mais quente do que o
normal. Era o segundo verão no qual a chuva veio escassa, isso quando veio e
por um capricho Durotan ajoelhou e enfiou os dedos no solo. Antes era um
barro fértil, marrom escuro e cheirando a terra. Agora seus dedos mergulhavam
facilmente na poeira e a crosta ruiu entre eles, e dissolviam em areia que não
eram capazes de suportar pasto ou colheitas ou qualquer outra coisa.
Draka olhou-o com seus olhos negros e sábios. Seu coração doeu ao olhá-la. Ela
era melhor do que ele em tantas coisas. Mas era a companheira do chefe, e não o
chefe, e não tinha que fazer as escolhas que ele tinha.
145
As escolhas que tinha.
Ficou em silêncio quando um dos bruxos mais jovens chegou, com uma
pequena criatura saltitante no seu encalço. Ao passar, a criatura virou para
olhar Draka e sorriu, mostrando a boca repleta de dentes afiados. Draka sentiu
um arrepio.
“Como assim?”
“Ordem de Blackhand. Ele mudou-se para a sua nova cidadela, que foi feita
para ele, e quer seu exército lá. Não será mais suficiente nos juntarmos para
atacar. Devemos viver juntos e estarmos prontos para seguir Blackhand para
onde nos liderar.”
Draka o encarava, incrédula, então baixou seus olhos para a mensagem. Leu
rapidamente, enrolou e devolveu a ele.
Ao vê-la ir, perguntou-se o que exatamente aconteceu que fez seu coração
partir.
A Cidadela não estava terminada, mas no momento que Durotan a viu, ficou
totalmente pasmo. Foi rodeado de murmúrios de espanto.
“Tão imponente!”
“Tão grande!”
Se Durotan tivesse dito algo, teria sido: Blasfêmo. Uma praga sobre a terra.
Desarmonioso com tudo o que somos.
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A caravana do clã Frostwolf ainda estava a muitas milhas de distância, mas a
Cidadela elevava-se no horizonte como um abutre. O seu modelo em nada
parecia com o estilo orc. Essa estrutura, esse pesadelo arquitetônico, uma ofensa
aos olhos e alma era maior do que as construções draenei. Durotan sabia o
motivo; para abrigar uma elite de guerreiros orcs, a construção tinha que ser
enorme. Mesmo assim, esperava outra coisa.
Ao invés linhas suaves e elegantes que eram a marca das estruturas draenei,
essa fortaleza era afiada e pontiaguda. Dominava a paisagem ao invés de entrar
em harmonia com ela. Talhado com pedra negra, madeira áspera e metal,
praticamente eriçava contra o céu. Apesar de só poder ver a torre principal,
para Durotan isso já era o bastante. Estava parado como se tivesse criado raízes
ali, relutante a dar um passo em direção àquela monstruosidade.
O resto do clã seguia, passando pelo seu chefe. Hesitante, ajustou seu lobo e
continuou.
Ficar mais próximo da fortaleza não a deixou mais atrativa. Agora Durotan
podia ver outras construções – guarnições, silos de armazenamento, uma
extensão plana de áreas de treinamento que eram repletas com armas grandes
que nunca havia visto. Elas também pareciam negras, perigosas e mortais.
147
nossas fileiras pelo poderoso Blackhand, estão a caminho! Deem boas vindas!”
Havia algo familiar na maneira com que o chão estremecia. A única vez que
Durotan sentiu algo parecido foi quando lutava contra –
“Ogros!” alguém gritou. E de fato Durotan podia vê-los agora. Dúzias deles,
gigantes e determinados, indo em direção do grupo de orcs reunidos. Mais
patrulheiros Blackrock trotavam com seus lobos, berrando e assoprando os
chifres em júbilo. A multidão foi a loucura, encantada, gritando e dançando
desenfreadamente.
Esses eram os novos aliados? Durotan mal podia acreditar ao encarar, não
conseguindo achar as palavras, o maior ogro que já viu aparecer. O próprio
Blackhand andava ao seu lado, tão ágil e imponente como se a coisa do
tamanho de um mamute não o fizesse parecer um brinquedo de criança.
Velen estremeceu. Seu assistente foi ampará-lo, oferecendo uma bebida quente
e suave, mas o Profeta recusou. Nenhum conforto poderia vir de uma bebida
agora. Nenhum conforto poderia vir de novo.
Ficou em luto quando recebeu a notícia de que Telmor havia caído, e junto com
a cidade foi-se seu amigo Restalaan. Foi ainda pior saber como o ataque
aconteceu. Velen havia sentido algo especial no jovem Durotan, e o tratamento
que teve quando esteve sob sua custódia, apenas confirmou a fé no chefe do clã
Frostwolf. E agora isso. Durotan e Orgrim foram os únicos orcs que
presenciaram como a pedra verde havia protegido a cidade. Um deles inclusive
decorou o encantamento que desativaria a camuflagem protetora. Alguns
conseguiram escapar para o Templo de Karabor. Seus ferimentos foram
cuidados, mas não havia nada que ele ou qualquer um pudesse fazer para curar
seus espíritos destroçados.
148
Mas havia notícias piores. Os refugiados falaram que as armas dos orcs não
eram apenas arcos, flechas, machados ou lanças. Falaram também de setas
verdes escuras que causavam mais dor e tormento do que qualquer magia
lançada pelos xamãs. E também de criaturas que se agitavam e dançavam aos
pés daqueles que praticavam tais magias.
Os orcs nada mais eram do que peões nas mãos dos eredar. Velen sabia que ele
e os exilados eram os alvos reais. A Horda orc, agora expandida com a adição
de criaturas imensamente poderosas, era a maneira com a qual Kil’jaeden
desejava destruí-lo. Por um breve instante, o Profeta pensou que talvez pudesse
racionalizar com o líder da Horda; se eles se voltassem e lutassem junto com os
draenei para derrubar Kil’jaeden, depois de saber que estão sendo usados. Mas
desistiu da ideia na mesma hora. Era provável que aqueles sendo usados por
Kil’jaeden sabiam dos propósitos e da natureza dos eredar, e a oferta por poder
parecia real e sedutora. E Archimonde e Kil’jaeden sucumbiram, sendo que
eram infinitamente mais sábios velhos e fortes que qualquer orc.
E agora para piorar a situação, essa visão, da aliança dos orcs com os
desajeitados ogros – algo que acharia ser um sonho trazido por uma bebida
forte. Agora sabia ser verdade. Algo mudou de maneira drástica a natureza dos
orcs, e tão irrevogável, que se aliaram a seres que odiaram por gerações, ao
contrário dos draenei, que tentaram apenas serem amigáveis pelo mesmo
período.
Ah, K’ure, velho amigo. Como sinto falta da sua sabedoria agora, e quão
doloroso é saber que jaz junto ao inimigo, que não faz ideia da sua existência.
149
Segurou junto ao peito a pedra que era conhecida como Canto do Espírito e
sentiu uma fraca centelha do Naaru moribundo. Velen fechou os olhos e baixou
a cabeça.
Gul’dan olhou a sala com grande satisfação. Tudo estava indo como planejado.
O Concílio das Sombras se reunia há algum tempo e sentia-se confiante. Havia
escolhido bem. Estavam preparados – nem, ávidos – para trair seu povo e
buscar suas aspirações pelo poder. Já realizaram tantas coisas, agindo através
de seus fantoches que pensavam fazer parte do Concílio. Foi fácil eleger um
Chefe Guerreiro, e contanto que o Concílio sorrisse e concordassem com ele nas
poucas vezes que era chamado para uma reunião, ele não fazia perguntas. Mas
Blackhand sempre ia embora antes das verdadeiras reuniões acontecerem,
enviado para uma missão especial que enchia seu peito de orgulho.
“Ouvi alguns protestos vindo do clã Whiteclaw.” relatou um. “E Durotan do clã
Frostwolf ainda precisa ser vigiado, pois tudo o que fez foi liderar o ataque a
Telmor.”
Gul’dan o silenciou com um gesto. “Não tema. Tenho pensado em algo especial
para ele há algum tempo.”
“Por que não foi eliminado?” rosnou com raiva Kargath. “Seria mais fácil
colocar outro que se adequasse aos nossos planos. Durotan está se tornando
conhecido por discordar das ideias de Blackhand – e por consequência, suas.”
150
“E é exatamente por isso que o quero vivo.” concluiu, observando aqueles que
entenderam sem precisar das explicações. Foram poucos, sendo que a maioria
parecia intrigada e furiosa.
“Porque ele é conhecido por ter uma postura moderada,” continuou, pesaroso
por ter que soletrar para cada um no Concílio, “quando ele finalmente
concordar, todos aqueles que têm dúvidas virão com ele. Ele representa aqueles
que não tem coragem de falar por si próprios. Se Durotan concordar, pela sua
lógica, então deve ser o certo. Como Kargath mencionou, o clã Frostwolf não é o
único que parece ainda ter alguma reserva.”
“Mas...e se ele não concordar? E se tiver algum limite do qual não queira
ultrapassar?”
Gul’dan sorriu friamente. “Então iremos lidar com ele de um jeito que aumente
nosso poder sem colocarmos em risco. Como sempre fazemos.” disse,
decidindo ser melhor mudar o assunto. Inclinou-se, colocando as mãos na
mesa. “Falando em pessoas com reservas. Fiquei sabendo que ainda há aqueles
que tentam contatar os elementos e os ancestrais. ”
Olhou de novo Ner’zhul. Foi apenas quando o antigo mestre dos orcs viajou
para a montanha sagrada que conseguiu falar com os ancestrais e então
descobriu a verdade. Até então, mesmo sendo o poderoso xamã que era, havia
sido iludido. A resposta, no entanto, parecia simples.
151
Tinham memórias do que havia sido e relances do que estava por vir. Residiam
aqui por muito tempo, alimentados pelo Outro, que era como eles, mas não
parecidos com eles, e aqueles que sentiam estavam perto da passagem. Até
então, eles jaziam num estado de 'ser' 'não-ser' de paz e tranquilidade. Mas
agora, corrupção e ódio havia chegado. Eles não podiam mais alcançar os
amados vivos, e esses não os procuravam como antes, nem para reabastecer a
poça sagrada e involuntariamente manter o Outro vivo. Apenas o Grande
Ludibriado veio, chorando e implorando, mas muito perdido em seu engano
para ser ajudado.
E agora, também o Outro, gritou de pesar quando o círculo foi fechado. Sem a
água que os xamãs traziam, não podia mais nem tentar curar a si. E sem o
Outro, também não haveria ancestrais.
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Capitulo 18
Faço parte do segundo grupo de xamãs, assim como sou líder da segunda, e
rezo melhor e mais sábia, encarnação da Horda. Comuniquei-me com os
elementos e espíritos, e os senti trabalhando comigo em harmonia muitas vezes
e recusando sua ajuda tantas outras.
Mas eu nunca vi os espíritos dos ancestrais, nem em sonhos; minha alma anseia
por essa ligação. Até muito recentemente, aqueles que andam pelo caminho dos
xamãs não sonhavam poder fazê-lo, e mesmo assim foi possível.
Quem sabe um dia, as barreiras entre nós e os amados finados, também seja
derrubada.
Quem sabe.
“Não entendo,” disse Ghun. Era o bruxo mais novo do clã e ainda assim
idealista, pensou com amargura Durotan. Viu o jovem torcer o nariz para as
criaturas que era obrigado a usar na batalha contra os draenei e seu rosto
repleto de remorso ao ver o inimigo se contorcer de dor. Durotan tomou
conhecimento do bruxo através de Drek’Thar depois do documento emitido por
Gul’dan. “Qual o problema em desejar que os elementos cooperem conosco de
novo? E por que não posso ir a Oshu’gun?”
O chefe não tinha respostas; a ordem que nenhum orc deveria praticar o
xamanismo ou sofreria punições severas – exílio ou morte por violações
recorrentes – parecia não ter motivo. Era verdade que os elementos
abandonaram aqueles que seguiam por esse caminho, mas e os ancestrais? Por
que diabos Gul’dan proibiria os orcs de irem ao seu local mais sagrado nessa
hora de necessidade e apuro?
E por não ter respostas para o jovem que as merecia, Durotan ficou furioso. Seu
tom de voz era rouco e áspero.
“Nosso Chefe Guerreiro fez alguns aliados para poder vencer os draenei. Esses
aliados nos deram os poderes bruxos que agora controlamos. Sei que está feliz
com os resultados, não minta para mim.”
153
Os dedos longos de Ghun estavam cavando a terra seca e removeram uma
pedra. Jogava-a para cima com a palma da mão. Durotan franziu a testa ao
olhar a pele do bruxo. A aridez e as duras condições sob as quais estavam
trabalhando há quase dois anos estavam os afetando. Normalmente os orcs
tinham uma pele castanha e suave, estendida sobre músculos tonificados, mas
agora estava ressecada e descascando. Distraído, Ghun coçou onde havia pele
áspera. Durotan olhou a nova pele embaixo.
Se o bruxo fosse mais velho, perceberia o aviso no tom de voz usado pelo seu
chefe, mas era jovem e estava envolto em suas próprias preocupações e não deu
atenção a advertência.
“Não interessa!” gritou. “Farei o que for melhor para meu clã, e isso significa
seguir as ordens de Gul’dan e Blackhand. Obedeça a essa nova ordem!”
Ghun o encarava. A fúria foi embora tão rápido quanto chegou, deixando dor
em seu rastro. Durotan acrescentou com um tom ríspido, sussurrando apenas
para que o jovem bruxo escutasse. “Não serei capaz de protegê-lo, se não
obedecer.”
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Durotan o soltou. Ghun endireitou-se, arrumou suas vestes, fez uma reverência
e partiu. Ele também sentia algo de errado em como as coisas estavam se
desenrolando. Mas um único jovem tentando entrar em contato com os
elementos não seria o bastante.
“As cidades que tomamos até agora foram apenas um treino.” declarou
Blackhand. “Logo, sua capital será derrubada. Mas antes de destruir a cidade
mais importante, vamos destruí-los como um povo. Vamos invadir o local!
Despedaçar suas estátuas. Aniquilar tudo o que é importante para eles.
Assassinar seus líderes espirituais. Eles vão perder o ânimo e então...tomar a
cidade deles será tão fácil quanto matar um filhote de lobo.”
Durotan, que estava junto com os outros guerreiros armados, olhou para
Orgrim. E como sempre, seu velho amigo estava ao lado de Blackhand e estava
ficando mestre em manter-se impassível, mas não conseguia esconder suas
emoções de Durotan. Sabia o que isso significava. O templo era o lar de Velen.
Quando ele e Orgrim estavam em Telmor, o Profeta estava apenas visitando a
cidade; seu lugar era no templo, onde rezava e meditava, servindo como guia
de seu povo. Se estivesse lá, provavelmente seria morto. Já havia sido difícil
matar Restalaan. Havia rezado para que não acabasse matando Velen
também...se é que havia alguém para quem rezar.
Seis horas depois, parado no topo das escadarias do grande trono do templo
dos draenei, Durotan quase engasgou com os odores que atacaram suas
narinas. O agora conhecido cheiro de sangue draenei. O fedor de urina e fezes e
o odor denso do medo. E o doce e enjoativo aroma do incenso. Sangue cobria a
sola das botas ao que pisavam em juncos espalhados, que liberavam uma
fragrância limpa, deixando todos os outros aromas piores.
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Escutou alguém rindo e congelou. Virou para ver os dois filhos de Blackhand
rindo.
“É isso aí,” disse Rend, ainda rindo. “É tudo o que eles merecem, nosso vômito
e cuspe.”
“Eles tomaram o templo,” disse Kil’jaeden. “mas não acharam o meu prêmio.”
A voz de Kil’jaeden nunca esteve tão doce, mas sua cauda balançava
repetidamente. O estômago de Gul’dan revirou-se de medo.
“Velen o Traidor deve ter previsto,” responder o bruxo. “Não é a toa que é
chamado de ‘profeta’”.
“Você está certo.” disse finalmente. “Se fosse um inimigo fácil e burro, já o teria
achado antes.”
O bruxo conseguiu voltar a respirar. Uma parte dele ansiava perguntar o que
Velen havia feito para aquele que era da sua mesma espécie, Gul’dan já tinha
essa certeza, para merecer um ódio tão direcionado. Mas Gul’dan era sábio o
bastante para ficar quieto. Ele podia ficar com a curiosidade insatisfeita nesse
ponto.
156
cidade. Vão achar que estão a salvo, quando na verdade estarão sem saída.”
Kil’jaeden estalou os dedos e sorriu. “Sim.” disse. “O templo deve ser dos orcs.
Blackhand está bem confortável abrigado na Cidadela. Mas antes de você
mandar seus cachorrinhos atacarem a fortaleza dos draenei, eu tenho
um...presentinho para eles.”
Ner’zhul esperou que Gul’dan terminasse. Ele viu com olhos semi-abertos o
bruxo escrever carta após carta, manchando seus dedos de tinta e comendo
frutas e carne com esses mesmos dedos sujos. Então eram cartas importantes;
geralmente Gul’dan pediria a um escriba bajulador para enviar as mensagens.
Ner’zhul inclinou a cabeça. Ainda não conseguia fazer uma reverência para seu
antigo aprendiz, e Gul’dan não o pressionava, pois sabia quão destruído estava.
Sentou-se na cadeira que o bruxo havia usado e assim que seu andar pesado
não pôde ser mais escutado, começou a ler as mensagens.
Gul’dan sabia que leria, e não havia nada que já não sabia. Era convidado para
todas as reuniões no Templo Negro, mas era obrigado a ficar no chão frio e não
na grande mesa de pedra, onde os influentes sentavam. Não sabia o porquê,
apenas que Kil’jaeden o queria lá. Caso contrário, Gul’dan já teria se livrado
dele.
157
morrendo. Afastou o pensamento e começou a enrolar as mensagens. Seus
olhos pousaram no pedaço de pergaminho não utilizado e na pena com tinta.
Seria tão audacioso, que só de pensar seu coração parou por um instante.
Olhou em volta rapidamente. Estava sozinho, e não havia motivo para que
Gul’dan voltasse. Gul’dan, Kil’jaeden, o Concílio – achavam que estava
destruído, tão inofensivo quanto um lobo velho e banguela que aquecia os
ossos junto à fogueira esperando o sono da morte. E talvez estivessem certos.
Talvez.
Ner’zhul já havia aceitado que seu poder havia sido tirado. Seu poder, não sua
vontade, pois sem isso não teria conseguido resistir a Kil’jaeden. Não podia agir
diretamente, mas poderia entrar em contato com quem poderia.
O lobo era banguela. Mas o lobo não havia esquecido como lutar.
Mais ordens para marchar. Durotan já estava cansado. Não havia mais trégua,
apenas batalha, consertar armadura, comer carne dura e fibrosa, dormir no chão
e outra batalha. Os tempos de tocar tambores, fazer rituais e banquetear-se
acabaram. O triângulo perfeito que era a Montanha dos Espíritos foi substituído
por um pico negro que às vezes emitia uma fumaça preta. Alguns diziam que
uma criatura morava dentro da montanha e que um dia acordaria. Durotan não
sabia no que acreditar.
Correu para encontrar Draka, a única pessoa no mundo com a qual poderia
dividir essa informação. A reação dela foi a mesma ao ler.
“Quem mais sabe disso?” disse calmamente, deixando sua expressão firme.
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“Vai contar para Orgrim?”
Durotan balançou a cabeça. “Não me atrevo. Ele está jurado a contar tudo para
Blackhand.”
Durotan encolheu os ombros. “Não faço ideia de nada. Apenas sei que devo
proteger meu povo. E farei isso.”
Draka o olhou fixamente. “Se o clã não fizer o que está escrito...iremos atrair
atenção. Poderá ser punido. Quem sabe exilado ou morto.”
Durotan furou a carta com o dedo. “Qualquer coisa é melhor do que irá
acontecer se obedecermos. Não. Jurei proteger meu clã. Não os entregarei
por...”
Percebeu tarde demais que sua voz estava alterada e alguns orcs prestavam
atenção. ”Não os entregarei por isso.”
Os olhos de Draka encheram-se de lagrimas e agarrou seu braço tão forte que
suas unhas furaram a carne. “E é por isso.” disse destemidamente. “que eu me
tornei sua companheira. Estou tão orgulhosa de você.”
159
Capitulo 19
Tenho orgulho da minha herança. Tenho orgulho de ter tido Durotan e Draka
como pais. E de Orgrim Doomhammer ter me chamado de amigo e me confiado
a liderança do povo que amava.
Julgo apenas alguns indivíduos que sabiam bem o que estavam fazendo, que
estavam trocando a vida e o destino de seu povo por uma recompensa
momentânea. E o fizeram de bom grado.
Quanto aos outros...posso apenas balançar a cabeça e agradecer por não ter sido
forçado a fazer as escolhas que fizeram.
Gul’dan estava tão ansioso que mal conseguia se conter. Estava esperando por
esse momento desde a primeira vez que Kil’jaeden mencionou. Tentou apressar
seu mestre, mas este apenas sorriu e pediu paciência.
“Ainda não estão prontos. Aprenda a esperar, Gul’dan. Um golpe dado cedo ou
tarde demais não mata, apenas machuca.”
Gul’dan achou estranha a metáfora, mas entendeu o que seu mestre quis dizer.
Mas finalmente os orcs estavam prontos para a última etapa.
Havia um pátio central no Templo Negro que era descoberto. Quando pertencia
aos draenei, essa área tinha um jardim exuberante, com uma piscina no meio.
Nas últimas semanas os orcs beberam a água doce e pura, não se importando
em reabastecê-la e agora deixando um espaço vazio com pedras e ladrilhos. As
árvores e flores que rodeavam a piscina haviam murchado e morrido com uma
velocidade espantosa. Ner’zhul e Gul’dan esperavam ao lado da piscina vazia a
pedido de Kil’jaeden. Nenhum deles fazia ideia do que esperar.
160
Perdeu-se em devaneios, fantasiando vários tormentos que poderiam ser
aplicados a Ner’zhul quando um súbito estalo de um trovão os fez arfar.
Gul’dan olhou para o céu; onde antes abrigava inúmeras estrelas agora havia
apenas escuridão. Engoliu seco, olhando fixo as trevas.
O céu se abriu.
Ficou de pé, seu corpo tremia sem controle e perdeu o ar de novo quando viu a
coisa.
Era muito maior do que ele. Quando mexia suas quatro patas, pedaços de terra
voavam e batia as asas, irritado. O cabelo parecia uma juba que fluía em cachos
verdes sobre seu pescoço e torso. Os olhos verdes brilhavam como estrelas e ao
abrir a boca suas presas podiam ser vistas na luz fraca. Parecia ter uma fileira de
dentes afiados e Gul’dan quis cair de joelhos e chorar de medo ao ver a parte
inferior do ser. Este, cerrou os punhos, baixou a cabeça e olhou para os orcs
amedrontados.
Gul’dan engoliu e não se atreveu a olhar para Ner’zhul, mesmo sabendo que o
antigo mestre o observava pelas costas.
161
Sabia o que ele estava oferecendo. Poder além do imaginável...e escravidão
eterna. Kil’jaeden ofereceu o primeiro a Ner’zhul pelo segundo, mas o covarde
recusou. Não quis condenar o seu povo.
Gul’dan não tinha esse tipo de escrúpulo. Só pensava na recompensa que havia
sido prometida.
“Sei sim, Grandioso.” disse surpreso com a firmeza da sua voz. “Sei e aceito a
oferta generosa.”
Confiante e alegre virou-se para encarar seu antigo mestre. O xamã olhava-o
implorando. Não se atrevia a falar, mas não era necessário, mesmo a luz fraca
das estrelas, sua expressão dizia tudo.
“Apenas uma lâmina especial pode fazer o que lhe peço, Gul’dan.” retumbou
Kil’jaeden. Estendeu as mãos e a adaga era pequena em comparação com a
palma gigante na qual repousava. Quando Gul’dan a pegou percebeu que era
grande.
162
A criatura rosnou de leve e seus olhos verdes brilharam. “Estou ansioso para
ver o que acontecerá. A todo o seu povo...Faça!”
Gul’dan engoliu seco, levantou a lâmina, mirou sua ponta cintilante na carne
exposta de Mannoroth e fincou a adaga o mais forte que conseguiu. Mannoroth
urrou de dor e golpeou Gul’dan, jogando-o longe. Levantou a cabeça um pouco
zonzo tentando enxergar algo.
Gul’dan tirou os olhos do líquido verde brilhante para olhar seu mestre.
“Gul’dan...em breve você será o líder da Horda. Estão prontos. Estão sedentos
pelo o que dará a eles.”
163
Lembrou-se de ter visto o mesmo no jovem Ghun há pouco tempo.
“É apenas a luz,” disse tentando convencer a si mesmo. Não seria fácil acalmá-
la. Levantou seu braço e coçou e a pele também estava verde. Voltou seus olhos
para o companheiro. Não era um truque da luz, ambos viram.
Durotan já não conseguia nem ficar curioso sobre a próxima missão. Seria o
mesmo que antes – matança, fúria, violação de corpos. Recentemente até corpos
de orcs foram deixados onde haviam caído, as armas e armaduras tomadas para
ser usado em quem sobreviveu. Ás vezes algum amigo ou familiar abaixava em
reverência em frente ao corpo, mas estava acontecendo com cada vez menos
frequência. A época em que os corpos dos mortos honrados eram trazidos e
colocados na pira e seus espíritos enviados cerimonialmente para os ancestrais
havia acabado. Agora não havia tempo para rituais, ou piras, ou ancestrais. Não
havia tempo para os mortos. Não havia tempo para nada além de massacrar
draenei e consertar armas a armaduras para que a Horda continuasse sua
tarefa.
164
Levantou a mão e apontou a sombria montanha distante, que se projetava no
céu e soprava fumaça negra.
Parou para que pudessem processar o que foi dito e ficou feliz com o murmúrio
causado.
Conhecido por não falar mais do que era necessário, Blackhand terminou o
discurso com, “Vamos!”
A meio caminho da montanha havia uma trilha íngreme e estreita que levava a
um grande platô. Para Durotan, era como se esse pedaço tivesse sido cortado
com uma espada, de tão anormal. Arrepiou só de pensar. Nos últimos dias,
nada de natural aconteceu na vida dele. Três grandes placas de pedra negra e
polida estavam parcialmente encaixadas no chão, dispostas em sequência.
Eram, ao mesmo tempo, belas e sinistras. Os orcs estavam cansados depois da
subida sob o sol forte, vestidos com armadura e carregando suprimentos e
tentou encontrar alguma lógica nisso. Não parecia racional deixar os guerreiros
exaustos pouco antes da batalha. Talvez ela fosse acontecer na manhã seguinte,
depois de descansar.
Para sua surpresa, logo após todos estarem acomodados e quietos, quem
começou a falar foi Gul’dan, e não Blackhand.
“Não faz muito tempo que éramos um povo disperso.” começou o bruxo.
“Reuníamo-nos só duas vezes ao ano apenas para cantar, dançar, tocar tambor e
caçar.”
Disse essas palavras com desdém. Durotan baixou a cabeça. Os clãs se reuniam
durante festival Kosh’harg fazia séculos. Não era algo tolo, como estava
implícito pelo tom de voz de Gul’dan, mas sagrado e poderoso. Prevenia ataque
entre os clãs, mas, pela reação dos orcs a sua volta , parecia que havia
acontecido há décadas. Eles também grunhiam em reprovação e balançavam a
cabeça, envergonhados. Inclusive aqueles que haviam sido xamãs.
165
“Olhe para nós agora! Estamos lado a lado. O clã Laughing Skull junto ao
Dragonmaw; Thunderlord junto ao Warsong. Todos sob uma liderança forte e
perspicaz de Blackhand – escolhido por vocês para unifica-los. Por Blackhand!”
“Ante sua orientação sagaz, e benfeitoria dos seres que escolheram aliarem-se a
nós, estamos fortalecidos. Tornamo-nos mais gloriosos. Nos últimos dois anos,
progredimos mais em habilidade e tecnologia do que em dois séculos. A
ameaça que se aproximava dos orcs foi quebrada e precisará apenas de um
impulso final para que seja totalmente destruída. Mas antes...primeiro iremos
nos comprometer à causa e receber uma benção em retorno.”
Inclinou-se e pegou um cálice estranho. Parecia ter sido feita do chifre de algum
animal, mas Dutoran não se lembrava de um fenoceronte ter um chifre tão
grande. Era curvado e amarelo, com alguns adornos e inscrições que brilhavam
timidamente. O conteúdo do cálice, seja o que fosse, também brilhava. Assim
que Gul’dan segurou perante a si, uma luz amarela esverdeada horripilante
iluminou seu rosto, criando sombras grotescas.
A garganta de Durotan travou. Não conseguia falar. Então decidiu: Não. Antes
considerava o líder magro, mas imponente, como um amigo. Mas não poderia
arriscar revelar tudo o que sabia.
166
“Sempre soube aproveitar as oportunidades, estimado Grom.” sorriu Gul’dan,
entregando o cálice repleto de líquido verde. Ondas de calor e luz subiram e
fizeram da face do chefe – lapidada para inspirar medo nos inimigos e respeito
nos aliados – parecer mais terrível.
Grom não hesitou. Pegou o cálice e bebeu com intensidade. Durotan observou,
esforçando-se para ver a reação. No final das contas, talvez alguém sem boas
intenções tenha enviado a carta; quem sabe não fosse uma armadilha...
Gul’dan mal teve tempo de tirar o cálice antes de Grom começar a tremer e
endurecer. Dobrou o corpo para frente e já se podiam ouvir sussurros de
preocupação. Durotan fitava, horrorizado, o corpo do orc sacudir e arquejar.
Seus ombros, esguios para um orc, alargaram-se diante dos olhos de Durotan. A
armadura rachou com o novo corpo desenvolvido. Grom endireitou-se. Já alto,
agora estava remodelado pelo líquido verde para ficar mais forte e musculoso.
Olhou para a multidão.
O que pôde ver foi um semblante saudável, suave e, tirando a tatuagem preta
no maxilar...completamente verde.
Grom jogou a cabeça para trás e berrou. Foi o grito mais alto que Durotan havia
ouvido. Tapou os ouvidos, assim como a maioria havia feito, mas ainda olhava
a expressão de Hellscrem.
A fisionomia de euforia era tão aguçada que parecia dor, e tentava achar as
palavras. “Sinto-me...magnífico! Sinto...”. Parou de falar e gritou pela terceira
vez, como se apenas isso respondesse a pergunta. “Quero carne draenei para
rasgar e despedaçar! Sangue draenei no meu rosto...beberei até não aguentar
mais!
Seu peito arfava de paixão pelas emoções e estava com os punhos cerrados.
Parecia estar preparado para atacar uma cidade inteira com as mãos vazias...e
Durotan achou que ele seria vencedor dessa batalha. Voltou-se para seu clã.
167
Os guerreiros apressaram-se, sedentos para sentir o que seu chefe estava
sentindo. A taça foi passada a todos e cada um bebeu. Tremeram de dor aguda
por um momento; e passavam para o deleite total e aumento da força física. E
os olhos de todos aqueles que beberam, tornaram-se vermelho flamejante.
“Você não,” rosnou. A jovem recuou, assustada. Durotan, que sempre gostou
da garota, suspirou aliviado. Apesar de a intenção ter sido humilhá-la,
involuntariamente, deu a ela um precioso presente. Virou-se para Orgrim.
Durotan não conseguiu falar, mesmo vendo seu melhor e mais antigo amigo ser
chamado. Felizmente, não foi preciso. Orgrim inclinou a cabeça.
“Não tirarei sua glória, meu chefe. Sou segundo em comando, e não chefe. Não
tenho pretensões para tomar seu lugar.”
Durotan curvou aliviado. Orgrim sentiu algo errado, mesmo não tendo sido
avisado como Durotan foi. Não era tolo. Não iria vender sua alma para ter esse
tipo de poder que atormenta o corpo e faz os olhos arderem com um brilho
sinistro.
Agora os outros líderes enfileiravam-se, ansiosos pela benção que foi concedida
aos dois chefes mais respeitados por todos. Durotan não se mexeu. Drek’Thar
sussurrou, “Meu chefe, não deseja receber essa benção?”
“Não. E não permitirei que ninguém do meu clã beba desse líquido.”
168
em voz baixa, e quando o ex-xamã fez menção de protestar, foi silenciado com
um olhar de seu chefe.
“Recusa-se? Acha ser melhor do que os outros? Não acha necessária essa
benção?”
169
“Sei o suficiente. E nunca saberá como descobri.” sussurrou em resposta.
Eram palavras em duplo sentido, mas não importava. Iria se preocupar com o
que o bruxo poderia fazer com ele outro dia.
Gul’dan voltou para onde estava e gritou para a multidão. “Todos aqueles que
desejaram a benção do poderoso Kil’jaeden, nosso bem feitor, a receberam.
Considerem esse local como solo sagrado, pois aqui os orcs tornaram-se algo
muito maior do que quando nasceram. Pensem nessa montanha como o trono
de Kil’jaeden, onde fica enquanto cuida e abençoa os orcs.”
Durotan estava perplexo. Esta noite? Não haviam discutido estratégias. Não
estavam falando de uma vila ou aldeia, mas da capital draenei. Era o último
refúgio dos draenei e certamente lutariam com mais garra do que nunca, como
animais encurralados. Lembrou que Blackhand mandou remover as máquinas
de guerra – mas para onde, ninguém sabia.
170
xamãs e os líderes de clã.
“Almas distorcidas” era grafada como uma única palavra na língua arcaica.
O fluido que passara pelos lábios daqueles que eram amigos e inimigos de
Durotan era sangue desse ser. E Durotan assistiu as almas distorcidas que os
orcs haviam se transformados, começarem a dançar como insanos à luz das
tochas antes de correrem montanha abaixo, dominados por uma fúria e energia
anormal, atacar a cidade mais fortificada que o mundo havia visto.
Almas distorcidas.
Dae’mons.
Demons.
Demônios.
171
Capitulo 20
Então esse relato é vago e lamento por isso. Por mais obscuro que fosse não
deveria ser esquecido ou encoberto. Mas este é o desafio do cronista.
Durante a longa corrida, Durotan teve mais medo de seus companheiros orcs
do que qualquer ogro, ou um bando de talbuques, ou até mesmo um guerreiro
draenei raivoso. Suava frio, mas não temia por si. Tinha medo do que
aconteceria depois – não com os draenei, pois seu destino certamente já estava
decidido, mas com os orcs. Não conseguia concentrar enquanto corriam para
Shattrath como a Horda.
Parecia que a montanha havia explodido. Fogo líquido jorrava no céu noturno,
subindo e então descendo e espirrando do pico. Brilhava e irradiava como o
sangue demoníaco que os orcs tinham acabado de beber, só que ao invés de
verde, sua cor era alaranjada. Mais e mais rochas derretidas eram expelidas da
montanha. Era uma cena magnífica, hipnotizante e pavorosa.
172
Diminuíram a velocidade há uma milha da cidade. Uma área havia sido
desobstruída recentemente e os orcs que lá chegaram primeiro, observavam,
confusos. Foi dito que se reunissem nesse local; e onde as máquinas de guerra
deveriam estar.
E sem aviso prévio, algo se materializou a sua frente. Os orcs recuaram com um
silvo, então, em vista de tudo isso, começaram a rosnar para o ser gigantesco.
Era três vezes maior do que o maior ogro; era vermelho desde as patas fendidas
até os chifres salientes. Nunca haviam visto nada naquele tamanho, mas a
forma...Durotan encarava. Era nada mais nada menos do que um draenei
colossal e com a pele escarlate. A súbita compreensão de que os orcs foram
mergulhados em um conflito pessoal e que não era de sua conta, atingiu-o como
uma onda gigante.
“àqueles que juraram fidelidade a mim, não há nada que devam temer, apenas
celebrar.” gritou e sua voz penetrava em seus ossos. “Sou Kil’jaeden, o Belo,
que esteve com vocês desde o começo. E estarei durante a batalha mais gloriosa
já vista. Os perversos draenei conspiraram contra os orcs, escondendo uma
cidade inteira. Mas essa cidade foi destruída, junto com outras e seu templo foi
conquistado. Esta batalha é tudo o que resta para que a ameaça seja eliminada.”
173
Os ogros impulsionavam as máquinas de guerra com os orcs no encalço. Mas os
muros da cidade já estavam sob ataque antes mesmo das maquinas serem
manobradas. Rochas verdes enormes e brilhantes caiam do céu e atingiam a
cidade. Torres e cidadelas que ultrapassavam o nível dos muros rachavam e
estilhaçavam, e o próprio muro começava a desmoronar em alguns pontos. Mas
não eram apenas os pedregulhos que caiam que abrangiam o ataque – mas que
aparecia uma vez que aterravam.
A cidade não iria durar com tamanha investida. E com uma vasta colisão, uma
parte do muro de pedras ruiu. Uma maré de orcs enlouquecidos e ogros
barulhentos sacudiam suas armas e vertiam pela fissura criada. Durotan não
saiu do lugar, parecia estar pregado ao chão olhando orcs a lutarem, matarem e
morrerem.
A fúria e raiva que havia visto antes não eram nada comparadas com o que via
agora. Não havia estratégia, defesa, ou pedidos para recuar quando necessário.
Era apenas matança e massacre, infligindo e recebendo a morte. Caindo
estupidamente em armadilhas, atitude esperada dos ogros, que quando caiam
em batalha seus corpos jorravam sangue, Durotan não os lamentava. Mas os
orcs...importavam-se apenas com a sensação do sangue ressonando em suas
veias e os gritos de guerra que ecoavam de suas gargantas.
174
muito contente.”
Virou-se surpreso para seu tenente. “Próximo? Não tem próximo, pelo menos
não aqui. Os orcs cumpriram meu propósito. Ardem com seu sangue, amigo.
Por fim irá consumi-los a não ser que arrumem uma válvula de escape, e essa
válvula só pode ser achada no massacre de todos os draenei.”
“Bom saber que já terminou por aqui,” disse o tenente. “Archimonde resmunga
que isso é perda de tempo e que nosso mestre precisa de nós em outro lugar.”
“Como assim ele não está aqui?” chiou Gul’dan. Não era possível.
“Possível. Muito provável.” disse o Chefe Guerreiro. “Mas pelo o que me havia
dito, mesmo se o corpo estivesse em pedaços, não seria confundido por draenei
comum.”
“Vasculhou a cidade?”
175
Gul’dan concordou. Apesar de enfeitiçados pela sede de sangue, não iriam
falhar em procurar o corpo mais cobiçado pelo seu líder. A recompensa era
muito boa e o castigo caso fosse ignorado e descoberto depois seria implacável.
Velen escapou de alguma maneira. Isso significava que havia outros draenei
vivos. Em pânico, imaginou como os deixou escapar por entre os dedos...e para
onde tinham ido nesse vasto mundo.
Nem mesmo os orcs poderiam ser salvos. A única centelha de esperança para
uma possível redenção da Horda jazia no único clã que não bebeu o sangue e
não fez parte do pacto e, portanto ainda eram donos de suas almas e corações.
Cerca de oitenta orcs. Oitenta para irem contra dúzias de clãs; sendo que um clã
já superava esse número, e seu Chefe Guerreiro era o pior de todos. Orcs seriam
tratados pelos draenei como bestas enfurecidas, e se esbarrassem com algum no
caminho, seriam executados rápida e piedosamente, pois apesar de não
compreenderem o que faziam, deviam ser mortos mesmo assim.
“Se não houver draenei suficientes para matar, a sede não poderá ser saciada
nem temporariamente. Ficarão ávidos e irão farejar nosso cheiro e nos
encontrar. Aqueles que fugirem vão acabar mortos. Devem acreditar que
mataram a maioria de nós. E para acreditarem...precisa ser verdade.” disse com
compaixão e delicadeza, mas com firmeza.
176
Velen o encarava horrorizado. “Acha que mandarei meu povo consciente para
ser massacrado?”
Velen baixou a cabeça com o peito doendo. “Se acreditarem que mataram a
todos, menos alguns draenei banais, Kil’jaeden ficará satisfeito e partirá.”
“Os orcs irão sofrer imensamente.” disse parecendo contente. Velen não o
culpava, depois do que os orcs haviam feito contra sua raça.
“Mas o método que podem usar para achar alguns draenei será diferente do
que das centenas que sobreviverão. Pensar que estamos destruídos e dispersos
será nossa vantagem.”
Olhou o tenente, assombrado. “É fácil falar. Não será você que decidirá. Serei
eu. Escolherei e direi ‘Você e sua família virão comigo e viverão. Mas você, você
e você devem ficar para trás e deixar os demoníacos orcs parti-los em pedaços e
embeber de seu sangue.’”
Velen conversou com cada um que havia escolhido para morrer. Abraçou e
abençoou-os; ficou com objetos que significavam algo para eles e prometeu que
estes perdurariam. Viu esses guerreiros polirem suas armaduras, sem uma
lágrima no rosto, como se houvesse a possibilidade de outro resultado senão a
perdição. E os viu marcharem, entoando canções antigas, envolvendo-se nos
muros da cidade esperando uma lança, maça ou machado para terminar com
suas vidas.
Os orcs não sabiam nada sobre Zangarmarsh. Não haviam detectado esse
esconderijo, e se dependesse de Velen, nunca iriam. Aqui, as melhores cabeças
draenei continuariam a planejar meios para conseguir energias e direcioná-las
para manter a salvo os sobreviventes. Reagrupariam e iriam se recuperar.
177
Curariam suas feridas e rezariam para terem finalmente ludibriado Kil’jaeden,
o Enganador e escapado de seu vislumbre.
Os orcs haviam capturado três cristais, mas Velen ainda estava com quatro;
Sorriso da Fortuna, Olho da Tormenta, Escudo de Naaru e claro, Canção do
Espírito. E apesar da ligação com os Naaru ser tênue, K’ure ainda vivia.
178
Capitulo 21
“O que devo fazer?” Gul’dan não parecia acreditar nas palavras que saiam de
sua boca, mas estava tão aterrorizado que um conselho, seja qual fosse, era
melhor do que esse medo que sentia.
“Claro que não. As minhas escolhas foram egoístas, para meu próprio proveito.
Mas nunca joguei fora o futuro do meu povo – meu mundo – por elas. Cadê o
poder que lhe foi prometido, Gul’dan? Aquele que você trocou pelo nosso
povo?”
Tremendo, afastou-se. Sabia que não havia poder e isso fez com que as palavras
penetrassem fundo.
179
Sim. Ainda havia o Concílio das Sombras.
“A terra está morta.” sentenciou Durotan enquanto inspecionava junto com seu
amigo um local que antes havia sido um campo verdejante. Cutucou o solo com
a bota. Chutou a grama amarela ressecada revelando rocha e areia debaixo dela.
Sem árvores para bloquear, o vento assobiava.
Orgrim ficou quieto por um bom tempo. Viu que o amigo tinha razão. Olhou o
leito do rio que havia nadado um dos muitos desafios junto a Durotan, mas que
agora não apresentava vestígios de que água alguma vez passou por ali. A que
havia restado estava suja, repleta de corpos de animais e sedimentos. Beber
arriscaria ficar doente; não beber, seria morte certa.
Sem água ou gramado. Havia alguns lugares aqui ou ali que sobreviviam, como
a Floresta Terokkar. Sem pasto para alimentar o rebanho, os orcs estavam
definhando. Nos últimos três anos houve mais mortes por inanição e
enfermidade do que baixas na batalha contra os draenei.
“Está mais do que morta.” disse finalmente Orgrim. Sua voz era rouca e grave e
virou-se para Durotan. “Como está o suprimento de grãos do clã?”
Durotan fez uma careta. “Vários tonéis foram roubados durante o ataque.”
“Qual clã?”
“Shattered Hand.”
180
varrê-los de Draenor, foi alcançado e que provavelmente haviam sido caçados
até a extinção.
“Se meu clã estivesse na mesma condição, você me daria uma surra até me
deixar inconsciente e depois enfiaria comida goela abaixo antes de eu ter a
chance de recusar.” disse Orgrim.
Durotan ficou surpreso ao rir. Orgrim apenas sorriu. Ignorando o solo infértil a
sua volta e a coloração anormal da pele, era como se, por um momento, os
horrores dos últimos anos não tivessem acontecido.
“O aniquilamento dos draenei irá induzir aos dos orcs caso algo não seja feito.”
expos Durotan. “Estamos nos voltando uns contra os outros. Rebaixando-nos ao
tirar comida da boca de crianças, já que a terra está tão ferida que não nos nutre
mais. Os demônios que saltitam aos pés dos bruxos podem atormentar ou
dizimar, mas não curam ou alimentam os famintos.”
181
preparado especialmente para ele. E lá havia colocado um altar com todos os
berloques e instrumentos necessários para comandar os demônios que
convocava: fragmentos das almas dos draenei, certas pedras para criaturas
maiores, poções para manter a energia quando preciso. Havia também crânios,
ossos e outros símbolos de domínio. Ervas queimavam em recipientes para que
os aromas causassem visões.
Viu um ente na forma de um orc vestindo um longo manto que escondia seu
rosto. Era mais esbelto do que uma orquisa, mas de alguma maneira pressentiu
que era um orc. Apesar de ter um porte delicado, o poder que irradiava quase o
açoitava. Tremeu, e quando o estranho falou em sua mente a voz era masculina,
singularmente agradável e persuasiva.
182
“Sargeras!”
Com cautela, ainda receoso com as palavras doces proferidas pela figura
encapuzada, o bruxo perguntou. “E o que será exigido de mim?”
“Seu povo está morrendo.” afirmou bruscamente. “Nada resta para que possam
arruinar, ou mesmo sobreviver. Devem ir para outro lugar, onde há alimentos
em abundância e presas dignas de se matar. Os orcs estão famintos por algo
além de comida. Dê-os o sangue que tanto anseiam.”
Estreitou os olhos. “Isso está mais para uma recompensa do que uma missão.”
disse.
Gul’dan estremeceu. Já haviam oferecido isso antes, mas percebeu que Sargeras
era mais capacitado para cumprir juramentos tão extravagantes. Fantasiou
estender a mão e fazer a terra sacudir, ou apertar a mão com força e parar um
coração. Viu os olhos de milhares de seguidores e as vozes clamando seu nome.
Pensou em paladares e sensações fora de seu entendimento, ficando com água
na boca.
A figura suspirou. “Sargeras dará tudo isso e muito mais. Só que...ele está
aprisionado. Precisa de ajuda para escapar. Seu corpo está confinado num
183
túmulo antigo sob um oceano turvo e obscuro. Aspira pela liberdade e pela
soberania que possuía, assim como os orcs por derramamento de sangue e você
por poder. Leve seus orcs para esse mundo novo e intacto. Dê-os carne macia
para que possam fincar seus machados. Derrote os habitantes deste lugar,
fortaleça seu povo e junte-se a mim para, junto com esse mar verde de orcs,
possamos libertar nosso mestre. A gratidão – “
Perfeito.
A cena mudou. De repente estava debaixo d´água, nadando, mas seus pulmões
não pediam por ar, independente da profundidade. Algas oscilavam na
correnteza, escondendo parte das colunas caídas e uma laje com uma escrita
singular, deteriorada pelo tempo e incessantes carícias da água. Um arrepio
percorreu seu corpo ao perceber que esse era o local onde Sargeras jazia.
Libertá-lo de sua prisão...e então...
Seria uma boa parceria. Era melhor que ficar em Draenor, e morrer lentamente.
Um mundo bonito e pronto para ser saqueado, já era uma boa troca, mas havia
mais por vir.
Medivh.
184
Capitulo 22
Pode algo ser, ao mesmo tempo, uma benção e uma maldição? Salvação e
perdição? Assim limito o que aconteceu depois à história do meu povo. Por
tudo, as energias demoníacas, usadas livremente e sem se importarem com as
consequências, extraindo tudo de sadio e vital de Draenor. Kil’jaeden quis
aumentar o número de orcs, para que virássemos um exército imenso, e assim
fizemos, forçando o crescimento de nossos jovens, roubando assim sua infância.
Agora a população de orcs nunca foi tão alta e não havia como alimentar a
todos. Ficou claro para mim, assim como para aqueles que viveram em tempos
tão terríveis, que se permanecêssemos em Draenor, nossa raça seria extinta.
Mas como...e por que partimos...esse mundo ainda sangra por isso. Faço o que
posso para curar essa ferida enquanto protejo os interessas da nova Horda que
criei, mas será que ela um dia cicatrizará?
Vida para meu povo: uma benção. Como conseguimos: uma maldição.
O trabalho começou.
185
seria possível se os orcs se matassem antes da invasão.
E, como sempre acontecia, alguns escutavam. Assim como o clã Frostwolf foi o
único a não beber o sangue de Mannoroth, outros orcs de posições mais baixas,
também se recusaram. O que mais o preocupava era Orgrim Doomhammer.
Esse poderia virar um problema. Orgrim nunca gostou de Blackhand; um dia
ele poderia fazer algo. Por agora, não se pronunciava junto aos Frostwolves e
era um vitorioso constante das batalhas.
Não poderiam fazê-lo em sigilo; o portal deveria ser grande para o exército que
Medivh queria passar. Além disso, a Horda sentia-se derrotada. A animação e
desafio das batalhas e a construção do portal com ampla cerimônia daria aos
orcs algo para se concentrar.
“Maravilhoso,” disse.
“Não entendo seu desagrado,” disse Orgrim em um dia que sentava junto a
Durotan para observar a construção do que chamavam de Portal. Orcs
trabalhavam por todos os lados. A pele esverdeava cintilava com o suor
debaixo do sol que queimava a terra. Alguns cantavam gritos cadenciados de
guerra enquanto trabalhavam, outros estavam concentrados e em silêncio. A
estrada que levava ao platô, que percorria quase em linha reta do que era
conhecido como Cidadela Fogo do Inferno, estava pavimentada para que os
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equipamentos pudessem transitar livremente.
Porém, o mais ameaçador era o quarto, situado um pouco atrás dos outros três.
Essa era a real estrutura do Portal que Gul’dan havia prometido que se
manifestaria. Duas grandes lajes de pedra se erguiam no ar, e a terceira estava
deitada entre elas para formar o mais primitivo dos portais. Moldes começavam
a aparecer da rocha, figuras encapuzadas em ambos lados e uma espécie de
serpente ondulada no topo.
“Não é melhor do que ter seu clã dizimado por eles?” continuou Orgrim.
Durotan aquiesceu. “De certa maneira. Mas ainda não sabemos onde esse portal
nos levará.”
A Península Fogo do Inferno era a área mais prejudicada de Draenor, mas não
era a única. Apontou para a paisagem seca. “E isso importa? Sabemos de onde o
portal virá.”
Durotan grunhiu com uma pitada de alegria. “Acho que tem razão nisso
também.”
Olhou seu amigo, e respondeu a pergunta com outra pergunta. “E por que você
não bebeu?”
“Havia algo...errado,” disse finalmente. “Não gostei do que fez nos outros.”
Não havia razão para revelar o que sabia. Conseguiu proteger seu clã dos
horrores que aconteceriam se tomassem sangue demoníaco. Impôs-se para
Gul’dan e, até agora, não havia sofrido nenhuma retaliação. E Orgrim, graças
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aos ancestrais, havia sido sábio o bastante para perceber que algo equivocado e
assim recusou a oferta. Por enquanto isso já bastava para Durotan, filho de
Garad, chefe do clã Frostwolf.
“Sei que faz isso pelo seu clã e não por glória,” expos Durotan. “Luta para
ganhar água e alimento para eles. Mas não colocarei um pé nessas...exibições.
Orcs não deviam lutar entre si. Nem em batalhas rituais.”
Orgrim suspirou. “Não mudou nada. Sempre teve medo que eu o derrotasse.”
O dia chegou.
Foi solicitado que alguns clãs ficassem em Draenor. Gul’dan fez o possível para
convencer os chefes dos clãs Shattered Hand, Shadowmoon, Thunderlord,
Bleeding Hollow e Laughing Skull, que eram necessários aqui. Foi
particularmente difícil e fazer o mesmo com Grom e seu clã. No começo, o chefe
do Warsong enfureceu-se e Gul’dan pensou se foi acertado deixa-lo beber o
sangue do demônio. Parecia ter pouco controle sobre suas emoções;
Independente de falar o quão valioso Grom era e o quanto era importante que
ficasse, quis que o chefe permanecesse justamente por seu comportamento
selvagem e imprevisível. Caso Grom colocasse alguma ideia maluca na cabeça,
acabaria desobedecendo a ordens. Gul’dan não poderia arriscar. Medivh não
iria gostar nada disso.
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Os clãs reuniram-se. Cada um com suas cores tradicionais adornadas em uma
faixa ou cinto sobre a armadura, e neste dia quente o vento balançava
orgulhosamente os estandartes.
Gul’dan não se apressou. Seria teleportado para o Portal por outro bruxo. Podia
aproveitar o desfile do exército descer a estrada pavimentada até o Portal.
Onde a encontraram? Durotan não havia visto nem sombra dos seres azulados
fazia meses. Foi muita sorte achar qualquer draenei, muito menos uma criança.
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Mal pode terminar de apreciar a habilidade aplicada a esta criação. Sua atenção
foi desviada para o jovem draenei. Era tão pequeno em comparação com o
enorme arco – minúsculo, fraco e machucado. Olhava inexpressivelmente para
o mar de orcs que gritavam em sua direção, tão aterrorizado que já nada sentia.
“Espero que esteja certa.” disse Durotan, mas não via outra razão para que o
pequeno ser estivesse presente. Se esse fosse o caso, não poderia apoiar. Não
queria arriscar mais o clã, então rezou para que estivesse enganado.
“Hoje é um dia glorioso para a Horda!” gritou. “Viram o Portal ser construído,
admiraram o artefato e como agora virou um monumento à glória da Horda.
Revelarei as visões que tive.”
Gritos de alegria entre os orcs. Draka parecia não acreditar. “Como ainda
podem estar assim? Não percebem que acontecerá nessa nova terra o mesmo
que aconteceu em Draenor se continuarmos nesse caminho?”
“Nesse momento nosso aliado está abrindo o Portal do outro lado. E agora,
começaremos.” Gesticulou para o pequeno cativo draenei. “Sangue é uma
oferenda pura para aqueles que não concedem esse vasto poder. E o sangue de
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uma criança é ainda mais puro. Com o fluído vital de nossos inimigos,
abriremos o Portal e entraremos em um glorioso mundo novo – uma nova
página na história da Horda!”
“Não!”
A palavra foi arrancada dos lábios de Durotan. Todos viraram para encara-lo.
Avançou. Não poderia se esperar nada de bom, se essa nova iniciativa seria
aberta com o sangue de uma criança inocente. Não conseguiu dar três passos
até ser derrubado. Ao cair no chão banhado pelo sol, ouviu Draka urrar um
grito de guerra e o barulho e metal contra metal. Irrompeu o caos. Lutou para
levantar-se e viu a forma contorcida da criança. Sangue azul escorria da
garganta cortada.
“Gul’dan, o que fez conosco!” Durotan bradou, mas seu protesto perdeu-se no
rugido dos orcs enfurecidos. Os Frostwolves tomaram ação para defender seu
líder, e os gritos eram ensurdecedores. Durotan perdeu o fôlego ao ser atacado
– não sabia de qual clã. Levantou seu machado para se defender. O agressor
desviou, movimentando-se mais rápido que Durotan esperava, aproximou-se e
–
A terra começou a tremer, mudando o teor dos gritos proferidos. A luta cessou
assim que os orcs viraram-se para o Portal. Antes se via a paisagem da
Península através do portal. Agora havia escuridão cintilada por estrelas como
se olhassem um céu noturno. Até os olhos de Durotan ficaram fixos no
espetáculo. Observou a escuridão ondular e transformar-se numa cena que
surpreendeu e intrigou.
Gul’dan havia falado de uma terra fértil e rica, com animais para caçar e céu
azul. Certamente estava olhando para uma terra que nunca havia visto antes,
mas em que nada parecia ao reino idílico que o bruxo havia descrito. Era tão
úmido quanto Draenor era árida. Uma neblina espessa flutuava sobre a água
salobra e oscilava em um terreno úmido. Um zumbido encheu o ar. Pelo menos,
pensou Durotan, havia vida nesse lugar estranho.
Sussurros descontentes correram pela multidão. Este era o local aonde queriam
enviá-los? A primeira vista não era muito melhor do que Draenor. Mas de
qualquer jeito, água significava vida.
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disfarçar o próprio choque. Levantou os braços pedindo silêncio.
Gul’dan apontou para um grupo de orcs com armadura que esperavam ao lado
do Portal. Pareciam ter acordado. “Foram escolhidos para serem os primeiros a
investigar a nova terra. Avancem em nome da Horda!”
O cenário desapareceu.
Durotan olhou Gul’dan. O bruxo esforçava-se para ficar impassível, mas estava
intrigado.
Tanto ele quanto seu clã eram necessários e sabia disso. Sabia também que a
tentativa em defender a criança – e a reação desencadeada entre os outros clãs,
muitos que vieram em defesa dos Frostwolves – não seria esquecida. Chegou a
suspeitar que Gul’dan o executasse, ou banisse, mas pelo jeito ainda tinham
alguma utilidade para Blackhand e Gul’dan.
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Que seja. Por enquanto, lutaria ao lado da sua raça. Amanhã cuidaria de si
mesmo. Qualquer coisa que acontecesse, morreria com a honra intacta.
“Esse é o nosso destino,” disse. “Do outro lado, um novo começo nos espera.
Um novo inimigo para exterminar. Conseguem sentir, não é? A sede de sangue
crescendo? Sigam Blackhand! Obedeçam suas ordens e governem esse novo
mundo, como lhes é de direto! O mundo do outro lado do Portal é de vocês.
Ocupe-o!”
“Pela Horda!”
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Epílogo
A suspeita de que meu pai e seu clã seriam exilados provou-se correta. Gul’dan
os baniu logo após o clã Frostwolf entrar em Azeroth. Foram forçados a se
estabelecerem nas severas montanhas de Alterac. Os lobos brancos que ainda
caçam por lá, cuja lealdade não pôde ser abalada por palavras daquele que
ainda guardava um rancor, descendem dos que seguiram meu clã através do
Portal...
Quando nasci, meu pai compreendeu que teria que dividir com os outros orcs
tudo o que sabia. Procurou seu velho amigo, Orgrim Doomhammer, que
acreditou em suas palavras e teriam se aliado se meu pai não tivesse sido morto
de forma traiçoeira. Quando me tornei adulto, fiquei amigo de Orgrim assim
como meu pai; e a profecia da Doomhammer foi cumprida por mim.
Thrall parou no meio da frase, movendo a pena para que não manchasse o
pergaminho. “Pois não?” perguntou ao orc ancião, um dos seus conselheiros
mais confiáveis.
Thrall não gostava do termo “espião”, mas os tinha mesmo assim. Certamente
Jaina Proudmoore os tinha os dela. Era de se esperar e muitas vezes provava-se
útil. Um querer vê-lo já era algo difícil de acontecer. Com certeza algo
importante ocorreu.
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Thrall levantou-se mostrando toda sua majestade sem pensar que isso poderia
intimidar o humano. “Aceita água ou comida?” perguntou com um tom gentil.
“As notícias.”
O humano ficou pálido. Thrall suspirou baixo. Nunca seria tão cruel – ou tão
tolo – para matar um mensageiro com más notícias. Tal comportamento só
afastaria possíveis recrutas. Para reforçar esse pensamento, sorriu.
“Não tema. As notícias, sejam boas ou ruins, são bem vindas se ajudam a
proteger meu povo.” concluiu.
Thrall ficou confuso. Trocou olhares com Eitrigg, que encolheu os ombros.
“Você não entendeu,” a urgência aumentando em sua voz. “Não essas criaturas
patéticas – draenei! Uma nave foi vista vindo do céu. E caiu como um infernal
há duas noites.”
Thrall inspirou com calma. Todos viram o objeto estranho que caiu do céu como
uma estrela cadente. Então...não era uma estrela ou um infernal. Era um navio...
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importância da notícia.
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Atenção!
O texto que você acabou de ler, só teve sua tradução possível em uma parceria
dos sites Coja no WoW e Acervo de Azeroth sem fins lucrativos, foi feito por
um simples motivo, possibilitar um alcance maior ao Lore (História) do Jogo de
Computador: World of Warcraft para aqueles que não possuem condições ou
não compreendem bem o idioma Ingles para ler o material original.
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