Psicologia Da Imed: Revista de
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PSICOLOGIA DA IMED
Revista de Psicologia da IMED, Passo Fundo, vol. 9, n. 1 p. 69-86, Jan.-Jun. 2017 - ISSN 2175-5027
[Recebido: Nov. 06, 2016; Aceito: Set. 25, 2017]
DOI: https://doi.org/10.18256/2175-5027.2017.v9i1.1627
Endereço correspondente:
Daniela Centenaro Levandowski Sistema de Avaliação: Double Blind Review
Rua Sarmento Leite, 245 Sala 207, Bairro: Farroupilha. Editor: Jean Von Hohendorff
Porto Alegre, RS. CEP: 90050-170.
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Resumo
Este estudo investigou as representações sobre o bebê de 16 gestantes adolescentes (13 a
18 anos) de Porto Alegre e região. Todas eram primíparas, estavam no segundo trimestre
gestacional e responderam a uma entrevista semi-estruturada. Análise de conteúdo qualitativa
das entrevistas apontou diferentes representações, embora também certa dificuldade das
jovens em relatá-las. Foi referida preferência pelo sexo do bebê, justificada por motivos
diversos, como poder enfeitar (menina) ou maior facilidade para educar (menino). A escolha
do nome do bebê também foi pautada por diversos motivos, como ser o nome de algum
familiar, e se baseou em decisões individuais ou conjuntas com companheiro e/ou familiares.
Quanto às características físicas, emergiram relatos sobre a cor do cabelo, olhos e pele do
bebê, peso corporal e estatura, estando essas representações baseadas nas características das
gestantes, de seus companheiros ou da família de ambos. Também as representações sobre
características emocionais do bebê basearam-se em características dos membros do casal ou
familiares. Constatou-se que as representações de gestantes adolescentes sobre o bebê não
parecem diferir das representações de gestantes adultas. Esse aspecto deve ser considerado
por profissionais da saúde no acompanhamento das adolescentes, diante da sua importante
repercussão para a relação mãe-bebê.
Palavras-chave: gravidez na adolescência, relações materno-fetais, relações mãe-filho
Abstract
This study has investigated representations of the baby of 16 South Brazilian pregnant
adolescents (aged 13 to 18 years old). They were all primiparous, living in the city of Porto
Alegre and surroundings, and responded to a semi-structured interview during the second
trimester of their pregnancy. Qualitative content analysis of interviews showed a variety of
representations, but also some difficulty to provide descriptions of them. Preference regarding
the infant’s gender was also mentioned and justified by many reasons, such as the pleasure to
doll up (girl) and the greater facility for educating (boy). The choice of baby’s name was also
guided by many reasons, such as being the name of a relative, and was based on individual
or joint decision with the partner and/or family members. Regarding the infant’s physical
characteristics, representations of hair, eyes and skin color have emerged, as well as body
weight and height. These representations were based on characteristics of the participants
themselves, their partners or their family members. The representations of the baby’s
emotional traits were also based on couple or family members. Overall, infant representations
of pregnant adolescents do not seem to differ from those of expectant adults. Maternal
representations should to be considered by health professionals while monitoring pregnant
adolescents given their important repercussions for future mother-baby relationship.
Keywords: adolescent pregnancy, maternal-fetal relations, mother-child relations
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Introdução
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Método
Participantes
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de pesquisa maior do qual esse estudo deriva. A aplicação desses instrumentos ocorria
em sala reservada para esse fim nas UBS. Na sequencia, no mesmo local, a gestante era
convidada a responder uma entrevista semi-estruturada, cujo roteiro foi adaptado de
Piccinini et al. (2008), contendo questões sobre a vivência da gestação na adolescência e
as expectativas futuras. Em caso de impossibilidade, era agendado um novo horário, no
próprio local ou residência da gestante, para a realização da mesma. Não houve recusa
à realização da entrevista entre as adolescentes que já haviam respondido às escalas e
inventários. Entretanto, foram enfrentadas dificuldades, em alguns casos, para a sua
localização, seja por mudança de telefone ou local de moradia.
Todas as entrevistadas consentiram com a gravação da entrevista, que foi transcrita
para posterior análise. Para este estudo foram consideradas apenas as respostas das
adolescentes às perguntas da entrevista que se referiam ao tema investigado: “O que tu
sabes sobre o bebê?”; “Tu tens alguma preferência por sexo?”; “Já pensou em um nome para
o bebê?”; “Quais características físicas tu imaginas que o bebê terá?”; “Tu achas que ele será
parecido com alguém?”; “Como tu imaginas que será o temperamento dele?”; “Tem alguém
com quem tu gostarias que o bebê não fosse parecido?”. Contudo, esses conteúdos também
foram considerados para análise quando apareceram em outros momentos da entrevista.
Destaca-se que todos os cuidados éticos preconizados para pesquisas com seres humanos
foram adotados no presente estudo, seguindo as Resoluções 196/1996 do Conselho
Nacional de Saúde e 026/2000 do Conselho Federal de Psicologia, vigentes à época da
aprovação do projeto pelos Comitê de Ética em Pesquisa já mencionados.
Após a transcrição das entrevistas, essas foram analisadas por dois juízes a
partir da proposta de análise de conteúdo qualitativa de Laville e Dionne (1999). Mais
especificamente, no presente estudo foi utilizado o modelo misto de análise. Nesse caso,
algumas categorias foram construídas a priori, com base nas questões da entrevista,
enquanto outras (e as próprias subcategorias) foram derivadas da leitura do material
transcrito. Foram feitas repetidas leituras dos depoimentos das participantes por dois
juízes de forma independente, a fim de alocar as falas na estrutura de categorias e
subcategorias previamente formulada. Após, sucessivas leituras foram feitas, a fim de
verificar a pertinência dos conteúdos alocados. Em caso de dúvidas nessa alocação,
buscou-se atingir um consenso sobre a categorização a partir de discussão entre os juízes.
Resultados e Discussão
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Categoria Subcategorias
- Características físicas imaginadas para o bebê
◆◆ Cor e quantidade dos cabelos
- Crenças populares
- Semelhança com a gestante quando criança
- Semelhança com o companheiro quando criança
- Semelhança com a gestante e o companheiro
◆◆ Cor dos olhos
- Desejo pela semelhança com a cor do olho do companheiro
- Desejo por determinado formato de olho
◆◆ Cor da pele
◆◆ Peso
◆◆ Estatura
Características físicas e - Crença quanto à estatura pautada em características familiares
emocionais do bebê ◆◆ Crença na semelhança do bebê com a família do companheiro
◆◆ Desejo de semelhança com o companheiro
◆◆ Desejo de semelhança com a gestante e o companheiro
◆◆ Desejo de semelhança com a gestante ou com o companheiro
◆◆ Desejo de semelhança com a gestante
◆◆ Crença na ausência de semelhanças do bebê consigo ou com outra
pessoa
◆◆ Sem manifestação de características físicas imaginadas para o
bebê
- Características emocionais imaginadas para o bebê
◆◆ Agitado e brabo
◆◆ Calmo e quieto
◆◆ Alegre e brincalhão
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característica não correspondeu a sua preferência: “Menina (. . .) ah, sei lá, mas era
melhor, preferia, mas veio um menino, tá bom” (G1). Ainda, três adolescentes relataram
não ter preferência por nenhum sexo: “Eu pra mim, vindo com saúde tá bom, né” (G9).
Entre as onze gestantes que conheciam o sexo do bebê predominou a preferência
pelo sexo feminino (N=7), justificada por diferentes motivos: possibilidade de ter uma
companhia do mesmo sexo: “É mais pelo companheirismo da gente, porque eu fico
em casa (. . .) quando eu fico em casa, a gente se sente só demais” (G5); poder arrumar
e enfeitar: “Ah, não sei... porque eu acho que a menina a gente pode arrumar mais,
botar ‘coisinha’ nos cabelos” (G7), “Ah, eu preferia uma guriazinha, porque eu gosto de
enfeitar” (G8); e desejo do companheiro: “Eu queria uma menina, que ele queria uma
menina” (G14). A única gestante que relatou preferência pelo sexo masculino pontuou a
convivência com outros bebês desse mesmo sexo: “Sempre quem era minha companhia,
meus amigos, era sempre masculina, né, tanto porque eu sempre convivi com meus
primos, com meus tios, sempre foi os amigos dele, sempre companhia assim. Então, eu
acho que eu me acertaria tanto pra vestir quanto pra conversar sendo um menino” (G4).
Por fim, três gestantes mencionaram não ter preferência por nenhum dos sexos, sem
identificar motivos explícitos para isso.
Já dentre as cinco gestantes que não conheciam o sexo do bebê, também houve
menção à preferência por um determinado sexo. As duas gestantes que preferiam
meninas não mencionaram os motivos para tal, enquanto que as duas que preferiam
meninos pautaram sua escolha na presença de um número maior de meninas na
família: “Eu queria um gurizinho, por causa das minhas sobrinhas pequenas. Quando
elas eram bem nenezinha, eu cuidava bastante e eram duas menininhas. E o meu pai
também não tem neto guri, só a minha mãe tem neto guri” (G12); bem como na crença
na facilidade do cuidado: “É mais fácil de cuidar” (G13).
Segundo Soifer (1980), a gestante apresenta, inconscientemente, um conhecimento
seguro, traduzido muitas vezes como sensações conscientes, que se referem a um
possível sexo do bebê. Apresentando diversas justificativas, observou-se entre as
adolescentes uma maior preferência pelo sexo feminino. Piccinini et al. (2003), em
estudo realizado com gestantes primíparas, adolescentes e adultas, residentes na
Região Metropolitana de Porto Alegre, também encontraram essa predominância.
Segundo esses autores, essa preferência poderia ser compreendida como uma maneira
direta de a mãe identificar-se com seu bebê; assim, ter um bebê do sexo masculino
poderia dificultar esse processo identificatório.
Entretanto, essas expectativas e preferências em relação ao sexo do bebê não
foram correspondidas para a maioria das participantes, o que pode ter gerado
frustração. Talvez, em uma tentativa de se defenderem contra essa decepção, as
gestantes podem ter feito uso da resignação. Pode-se pensar que, por estarem
no segundo trimestre, elas ainda teriam tempo para se adaptar a essa realidade
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imaginar que o bebê seria mais parecido consigo: “Eu acho que ela vai puxar mais a
mim, pela ecografia que eu vi” (G4); “Eu acho que vai ser mais parecido comigo” (G11) e
duas delas, que o bebê não seria parecido consigo ou com alguém em especial: “Acho que
não [vai ser parecido com alguém], não tem assim...” (G1); “Nada parecido comigo” (G6).
Apesar de terem imaginado algumas características físicas de seus bebês, duas
gestantes relataram não ter imaginado com quem eles serão parecidos: “Por enquanto
ainda não imaginei se vai ser parecido com alguém” (G9). Ainda, ressalta-se que apenas
três das 16 gestantes entrevistadas relataram não ter imaginado características físicas
de seus bebês até o momento do estudo: “Não pensei nisso” (G7); “Eu nem imagino (. . .) ah,
eu não prefiro dizer ‘ele vai nascer isso, assim, assim” (G8); “É, eu não consigo imaginar”
(G16). Contudo, mesmo não relatando imaginar alguma característica, uma dessas
gestantes citou crenças populares que, de alguma forma, indicam características e
semelhanças: “Tem aquelas superstições: o guri parece mais com a mãe, a menina parece
mais com o pai. Que nem o sangue do negro é mais forte...” (G8).
Em relação às características emocionais, treze gestantes referiram imaginar o
bebê nesse sentido. Dentre elas, nove mencionaram uma representação do bebê como
agitado e brabo: “Eu acho que ele vai ser bastante agitado e nervoso também” (G7); “Ah,
brabo, brabo, brabo. Eu acho que vai ser muito brabo” (G12); “Acho que vai ser bastante
agitado” (G15); “Pode ser que vai ser agitado... se é agitado agora, imagina depois!” (G16).
Contudo, características como calmo/quieto, alegre e brincalhão também emergiram:
“Acho que vai ser calma, ah, sei lá, meio nervosa, mas calma (risadas)” (G5); “Bem
quietão” (G6); “Acho que ele vai ser mais alegre” (G1); “Acho que vai ser mais espoleta
assim, mais brincalhona” (G9).
Sete gestantes referiram preferir que seus bebês apresentassem características
emocionais semelhantes às suas: “Eu prefiro que seja do meu jeito” (G1); “Tomara que
não seja estressado, tomara que puxe por mim, calmo” (G3). Entretanto, relatos de
preferência de características emocionais semelhantes ao companheiro também foram
evidenciados por duas gestantes: “Eu to querendo que puxe o jeito dele, né, que é melhor
que o meu pelo menos” (G5). Uma gestante relatou dúvidas quanto a isso: “Se puxar o
pai, vai ser mais calmo, se puxar a mãe, vai ser mais agitado” (G10). De forma contrária,
duas gestantes relataram preferir que seus bebês não apresentassem características
emocionais semelhantes ao companheiro: “porque não sei, eu acho que é muito
estranho” (G10); “Ele é muito nervoso” (G11).
Ainda, uma gestante imaginou que o bebê teria características emocionais
semelhantes às de outro familiar: “Só cheguei a pensar que ele vai ser parecido com o
meu irmão” (G6). Contudo, duas adolescentes manifestaram também não querer que
seus bebês se parecessem emocionalmente com outros familiares, como irmã: “Ela é
um capeta, traz bilhete do colégio, faz besteira, daquelas bem rebelde” (G3); ou sogra:
“Eu já não gosto muito dela, sabe...” (G5). Chamou a atenção o fato de duas gestantes
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relatarem não pensar no assunto devido a crenças populares: “Ah, isso eu prefiro não
procurar muito, que nem dizem, né, que tanto que não gosta da pessoa, puxa igualzinha”
(G4); “Daí diz que, quando uma pessoa pega implicância com uma criança ou com
alguém, o nenê nasceu igualzinho” (G8).
Em relação às características físicas imaginadas para o bebê, observou-se a
predominância de relatos de semelhanças com o companheiro ou com a família dele.
Nesse sentido, de acordo com Stern (1997), um filho seria visto como algo bastante
precioso a ser ofertado. Assim, esse achado poderia ser decorrente do fato de as
gestantes estarem se relacionando com seus companheiros e, por isso, desejando
prestigiá-los. De maneira geral, isso parece mostrar que essas mães não estariam
excluindo o pai da realidade da gravidez e que parecem não ter representações
negativas dele, pelo menos em sua maioria.
Embora não seja foco do presente estudo analisar de que forma ocorreu a gestação,
pode-se pensar que esse achado decorra da segurança que a semelhança poderia dar
às gestantes e seus parceiros, sendo confirmatória da paternidade, como relatado por
uma delas. Por outro lado, embora não se tenha dados sobre a autoestima das gestantes,
tem-se a impressão de que, na sua perspectiva, os parceiros adultos pareceriam ser mais
dotados de valor do que elas mesmas. Nesse sentido, interessante destacar que esses
achados diferem daqueles encontrados quanto à escolha do nome do bebê, no qual
predominou uma escolha feita pela própria adolescente, conforme suas preferências.
Esses aspectos imaginados também podem estar baseados no narcisismo dessas
gestantes adolescentes (Brazelton & Cramer, 1992). Conforme evidenciado no estudo de
Piccinini et al. (2004), a mãe espera que o bebê atenda a um desejo seu de ser daquela
maneira, e não apenas a uma expectativa sua.
De qualquer forma, no presente estudo observou-se que as características
imaginadas para o futuro bebê encontram-se relacionadas com o que é familiar às
gestantes, isto é, com o jeito de ser do casal ou de algum familiar próximo. Esse aspecto
também foi encontrado na literatura (Piccinini et al., 2003; Piccinini et al., 2004;
Souza & Pedroso, 2011). Para Szejer e Stewart (1997), as gestantes caracterizam o bebê
conforme semelhanças com um dos pais ou com o casal, demonstrando, com isso,
necessidade de inseri-lo em uma linhagem da qual fazem parte, o que também explica
os achados do presente estudo. Isso se constitui em um fator de proteção para o bebê,
pois é um sinal de que a criança é aceita, desejada e, por isso, inserida na filiação.
No presente estudo, também foi possível identificar um fenômeno apontado
por Raphael-Leff (1997). Para o autor, muitas gestantes, embora conscientemente não
tenham preferências em relação a sexo, nome, aparência e personalidade, sabem o
que não querem. De fato, isso foi observado quando as adolescentes relataram não ter
preferência por características físicas e emocionais, mas evidenciaram aquelas que não
gostariam que o bebê apresentasse.
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Considerações Finais
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Agradecimento
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Referências
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