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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

GUILHERME ANTONIO SIEMENTCOSKI

LIMBO TRABALHISTA-PREVIDENCIÁRIO: RELATO DE UM CASO E


REFLEXÕES

CURITIBA
2018/2019
GUILHERME ANTONIO SIEMENTCOSKI

LIMBO TRABALHISTA-PREVIDENCIÁRIO: RELATO DE UM CASO E


REFLEXÕES

Artigo apresentado como requisito parcial à


conclusão do Curso de Especialização em
Perícias Médicas, do Setor de Ciências da Saúde,
da Universidade Federal do Paraná.

Orientador: Prof. Geraldo Celso Rocha

CURITIBA
2018/2019
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LIMBO TRABALHISTA-PREVIDENCIÁRIO: RELATO DE UM CASO E


REFLEXÕES

Guilherme Antonio Siementcoski

RESUMO

O limbo trabalhista representa situação de vulnerabilidade do trabalhador devido


conflito de pareceres médicos entre o médico do trabalho do empregador e do perito
médico do INSS. O objetivo do trabalho é apresentar um caso envolvendo o limbo
trabalhista, suas repercussões para todos os envolvidos e mostrar algumas
ponderações sobre o tema. Conclui-se que é tema ainda delicado que o mais
prudente a se fazer é evitar deixar o trabalhador no limbo.

Palavras-chave: Limbo trabalhista. Perícia médica. INSS.


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ABSTRACT

The labor limbo represents a situation of vulnerability of the worker due to conflict of
medical opinions between the employer's work doctor and the INSS medical expert.
The objective of the paper is to present a case involving labor limbo, its
repercussions for all those involved and show some considerations about the
subject. It is concluded that it is a delicate matter that the most prudent to do is to
avoid leaving the worker in limbo.

Keywords: Limbo labor. Medical expertise. INSS.


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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 5
2 RELATO DE CASO ................................................................................................. 6
3 DISCUSSÃO ............................................................................................................ 7
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 9
REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 9
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1 INTRODUÇÃO

Situação recorrente na prática diária da Medicina do Trabalho, a


discordância dos pontos de vista do perito médico do INSS (Instituto Nacional do
Seguro Social) com relação ao médico trabalho ou médico examinador sobre
aptidão laboral pode deixar o trabalhador no limbo trabalhista-previdenciário, período
onde o trabalhador fica sem receber benefício da autarquia previdenciária nem
salário de seu empregador (MENDANHA, 2015; TREZUB, 2019).
Ao verificar uma condição clínica num trabalhador que seja vista como
incompatível com suas práticas laborais por dezesseis dias ou mais, o médico do
trabalho da empresa ou médico examinador da mesma deve fazer seu devido
encaminhamento ao serviço de perícias médicas do INSS para possível concessão
de benefício até a recuperação total do trabalhador, conforme a Lei 8213/1991 em
seu art. 59.
No entanto, muitas vezes o médico do trabalho encontra um impasse: a
volta do trabalhador por negativa da concessão do benefício ou concessão de
benefício por período inferior ao que julgava adequado para a melhora da doença
do trabalhador. Além disso, em boa parte desses casos o próprio trabalhador
considera-se sem condições para voltar ao seu trabalho (MENDANHA, 2015). Ao
emitir um atestado de saúde ocupacional como inapto ao trabalho após essa
situação, ocorre o que é chamado de limbo trabalhista-previdenciário: o INSS não
paga benefício ao trabalhador por julgá-lo como “capaz” ao trabalho e o empregador
não paga os respectivos salários por considerá-lo “inapto” ao trabalho (MENDANHA,
2015; TREZUB, 2019).
Caso todos os pareceres periciais do INSS sejam negativos ao trabalhador
assim como uma possível perícia judicial após esse impasse, o trabalhador pode
ficar um período bastante grande no limbo trabalhista-previdenciário e poderá
cobrar de seu empregador por todos os salários desse lapso temporal conforme o
art. 934 do Código Civil.
A NR-7 coloca no seu item 7.4.4.3 que o ASO (atestado de saúde
ocupacional) deverá conter, no mínimo, as definições de apto ou inapto para a
função específica que o trabalhador exerce, irá exercer ou exerceu, dando a
entender que é prerrogativa do médico do trabalho definir se o trabalhador está
em condições de exercer seu trabalho. No entanto, a Lei n 11.907/2009, em seu
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art. 30, coloca que compete privativamente aos ocupantes do cargo de Perito
Médico da Previdência Social emitir parecer conclusivo quanto à capacidade
laboral para fins previdenciários. Por haver normas conflitantes acerca de um
mesmo assunto, deverá prevalecer a que tiver uma posição hierárquica em nosso
ordenamento jurídico, que nesse caso é a Lei 11.907/2009 por ser uma lei federal
ordinária enquanto a NR-7 foi editada por uma portaria.
Além disso, a Lei 605/1949, que é uma lei federal, e a Súmula n. 15 do TST
elencam um ranking dos atestados médicos, onde a decisão do perito médico do
INSS está no topo, na posição mais privilegiada, devendo ser acatada pelos
demais, onde se inclui o médico do trabalho e /ou médico examinador do
empregador.
O objetivo deste trabalho é mostrar um caso envolvendo o limbo trabalhista
assim como suas repercussões.

2 RELATO DE CASO

Masculino, 30 anos, motorista de caminhão em transportadora, vem para


avaliação médica de retorno ao trabalho em clínica de medicina do trabalho após
afastamento de sessenta dias pelo INSS em março de 2017. Relata que ficou
afastado devido episódio depressivo e que não houve melhora do quadro clínico
nesse período, tendo sido avaliado por sua psiquiatra cinco dias antes do exame de
retorno ao trabalho trazendo carta da mesma dizendo que houve alteração de todo o
tratamento farmacológico e que o trabalhador não poderia pilotar qualquer tipo de
veículo automotor por pelo menos trinta dias.
A perícia médica do INSS de pedido de prorrogação do auxílio-doença
ocorrera no dia anterior e diz que mostrou essa carta ao perito médico
previdenciário, mas não houve alteração do período de afastamento proposto de
sessenta dias contados a partir da primeira perícia.
O trabalhador mostrava-se ansioso e dizendo que não tinha condições para
dirigir. Dessa forma, entrei em contato com a médica do trabalho coordenadora do
PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional) da transportadora
para verificar quais possíveis condutas frente ao caso.
A médica coordenadora do PCMSO disse que não havia como alterar a
função do trabalhador porque só havia as funções de motorista e de cargos
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administrativos que não tinham vaga naquela ocasião. Sendo assim, para não emitir
um atestado de saúde ocupacional como inapto ao trabalho e reencaminhar o
trabalhador ao INSS sob o risco de ter o novo pedido de auxílio-doença negado e
assim criar um limbo trabalhista, optamos por emitir um ASO (atestado de saúde
ocipacional) com o resultado de “apto com contraindicação à função de motorista”
para que ficasse claro que não estávamos afrontando uma decisão do INSS e
também para que o trabalhador não voltasse a dirigir evitando que causasse dano a
si mesmo e a terceiros num eventual acidente de trânsito. Essa conduta foi discutida
também pelo setor jurídico da clínica de medicina do trabalho e corroborada por
esse setor.
Passados dois dias da avaliação desse colaborador, a transportadora entrou
em contato com a clínica de medicina do trabalho e exigiu que fosse emitido um
ASO como inapto à função e que não iria pagar nada ao trabalhador até estar cem
por cento apto ao trabalho. Com a recusa de tomar essa conduta por parte da
clínica, a transportadora quebrou o contrato com a clínica para buscar outra que
seguisse seus interesses. Após essa situação, a clínica passou a exigir que todos os
médicos assinassem um termo dizendo que só poderia ser emitido atestado de apto
ao trabalho se não houvesse nenhum tipo de restrição ou recomendação para os
trabalhadores e que qualquer coisa diferente de totalmente apto seria equivalente a
inapto ao trabalho. Não concordei com essas condições e não trabalhei mais nessa
clínica.
Cerca de dois anos após isso, fui informado por outro colega médico que o
trabalhador teve melhora clínica e remissão do quadro depressivo, mas que não
conseguiu mais afastamento pelo INSS e que estava processando a transportadora
na Justiça Trabalhista devido ao período em que ficou sem benefício previdenciário
nem salário, o limbo trabalhista.

3 DISCUSSÃO

Uma saída para resolver o impasse entre o INSS e médico do trabalho do


empregador seria readaptar o trabalhador em outra função compatível com suas
limitações. Dessa forma, a empresa acata a decisão do INSS sem prejudicar a
integridade física do trabalhador e este voltaria a receber seus salários.
Todavia, nem toda empresa tem o porte ou a possibilidade de colocar o
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trabalhador em outra atividade, tal qual verificado no caso relatado anteriormente.


Dessa forma, uma sugestão seria emitir um atestado de saúde ocupacional como
“apto com contraindicação à função” onde o trabalhador pode voltar a receber os
salários enquanto faz seu tratamento e não presta serviço ao empregador ou volta a
trabalhar com restrições ou recomendações que não permitiriam o agravo de sua
condição clínica. Enquanto vigorar essa situação, pode ser feita a solicitação de
nova perícia ao INSS ou até mesmo iniciar um processo judicial contra a autarquia
previdenciária unindo médico do trabalho, empregador e trabalhador buscando um
novo parecer da Justiça envolvendo a avaliação pericial feita por perito médico
oficial nomeado por magistrado.
Outro caminho seria o empregador emitir através de seu serviço médico o
ASO como “inapto”, não permitindo ao trabalhador voltar às suas atividades, recorrer
contra a decisão do INSS e não lhe pagar salários. No entanto, conforme exposto
anteriormente, não é uma atitude recomendada porque a decisão jurídica pode ser
favorável ao INSS e o empregador pode ser cobrado judicialmente por seu
empregado por todos os salários correspondentes ao tempo que ficou no limbo
trabalhista-previdenciário.
Acerca das possibilidades elencadas, todos os médicos envolvidos
apresentam condições técnicas e éticas para minimizar a possibilidade de ser
estabelecido um longo período de limbo trabalhista. O médico do empregador, após
a avaliação de retorno ao trabalho, que também não deixa de ser uma avaliação
médica pericial, deve fornecer parecer detalhado sobre a condição clínica do
trabalhador e elencar os motivos pelos quais considera que o trabalhador necessite
de mais afastamento, o que envolve dados do PPRA, PCMSO e justificativa de não
haver possibilidade de mudança de função. O perito médico do INSS, caso
considere não ter informações suficientes para aceitar ou negar um pedido de
auxílio-doença, pode recorrer ao SIMA e solicitar essas informações ao médico
assistente do trabalhador assim como do médico coordenador do PCMSO da
empresa onde o obreiro trabalha. Por fim, o perito médico da Justiça, seja de vara
trabalhista ou federal, deve solicitar todas as informações possíveis aos médicos
assistentes do trabalhador, médico do trabalho e ao INSS antes de realizar seu
exame médico pericial para que seu laudo seja o mais completo e assertivo
possível.
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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O limbo trabalhista é situação complexa e deixa o trabalhador numa situação


bastante delicada onde pode ficar com dificuldades financeiras por não
receber benefício do INSS nem salário do empregador. Além disso, ainda há grande
insegurança jurídica aos empregadores por não haver consenso sobre o assunto.
Em virtude disso, fica a forte recomendação de evitar ao máximo deixar o
trabalhador nessa situação e readaptá-lo ao trabalho sempre que possível ou, pelo
menos, lhe dar algum suporte durante a vigência da discordância entre INSS e
médico do trabalho.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 605 de 5 de jan. de 1949. Dispõe sobre o repouso semanal remunerado
e o pagamento de salário nos dias feriados civis e religiosos.

BRASIL. Lei 8213 de 24 de jul. de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da


Previdência Social e dá outras providências.

BRASIL. Lei n 11.907 de 2 de fev. de 2009. Dispõe das carreiras e dos cargos da
administração pública federal.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 15. A justificação da ausência do


empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da
remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos
atestados médicos estabelecida em lei. Brasília, DF: Tribunal Superior do Trabalho,
[28 out. 2003].

BRASIL. Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 1a edição. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2002.

BRASIL. Norma Regulamentadora nº 7, de 08 de junho de 1978. Programa de


Controle Médico de Saúde Ocupacional.

MENDANHA, Marcos Henrique. Medicina do Trabalho e Perícias Médicas: aspectos


práticos (e polêmicos) – 4 ed – p. 25-39. São Paulo: LTr, 2015.

TARTUCE, F. Breve estudo das antinomias ou lacunas de conflito. Genjuridico, São


Paulo, 25 de fev. de 2015. Disponível em
<http://genjuridico.com.br/2015/02/25/breve-estudo-das-antinomias-ou-lacunas-de-
conflito/>. Acesso em 10 de jun. de 2019.

TREZUB, C.J. Limbo previdenciário e o papel do médico do trabalho. CW3 perícias,


Curitiba, 11 abr 2019. Disponível em <http://cw3pericias.com.br/limbo-previdenciario-
e-o-papel-do-medico-do-trabalho/>. Acesso em 10 de jun. de 2019.

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