2007 TatianaSanceveroBatistela
2007 TatianaSanceveroBatistela
2007 TatianaSanceveroBatistela
O Zoneamento Ambiental e o
desafio da construção da Gestão
Ambiental Urbana
Dissertação de Mestrado
Brasília, 2007
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO – FAU
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO - PPG
Brasília, 2007.
ii
TERMO DE APROVAÇÃO
Aprovado por:
Brasília, 2007.
iii
DEDICATÓRIA
A Marcelo Batistela,
companheiro da minha jornada.
iv
AGRADECIMENTOS
A minha avó Emília Pompilho Tamiozo, por todo o seu amor e carinho;
v
APRESENTAÇÃO
vi
No segundo semestre de 2004 ingressei como aluna especial no Programa de Mestrado
da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília – FAU/UNB e através
da disciplina “Avaliação de Impactos Ambientais de Assentamentos Urbanos” iniciei meu
aprendizado com a Profª. Maria do Carmo de Lima Bezerra e o Prof. Otto Toledo Ribas. Ao
longo da disciplina foi apresentada a necessidade de construção da gestão ambiental urbana e
principalmente os instrumentos de sua promoção. Apaixonei-me por este desafio e desde
então busco contribuir para esta questão.
Esta dissertação representa a efetivação de uma das etapas de minha vida pessoal e
profissional, o amadurecimento e o inicio de uma nova caminhada.
vii
RESUMO
A contribuição almejada tem como foco a interface entre os instrumentos das políticas
ambiental e urbana para uma efetiva construção da gestão ambiental urbana, e para tal,
apresentamos o instrumento Zoneamento Ambiental. Parte-se da premissa que este
instrumento seja utilizado como mediador dos conflitos de interesses entre o domínio público
e privado, internalizando os bens coletivos através de sua consideração (reconhecendo os
limites no uso dos recursos naturais) no processo de urbanização, dialogando com a estrutura
de referência da política urbana – o Plano Diretor Urbano.
viii
SUMMARY
For the construction of this current vertex discussion, first it must be understood the
thematics essence and specifications: environmental and urban. Evaluation of the tools,
competencies and the practice of the territorial management, have shown that environmental
and urban dimension work with different logics, on its tools, and has resulted, by the absence
of this understanding and adjusted interfaces on conflict stage. One of the polarities between
thematics is the logistics of pivate and public, internalized on the urban and environemental
dynamics, respectively. While the urban policies tools have origin since the concern on
organizing private space, the environmental policies tools concern as public good, natural
space.
Aimed contribution has as its focus, the interface between tools and environmental
urban policies for an effective urban environmental construction, and for such, we present the
Environmental Zoning agreement – “Zoneamento Ambiental”. It assumes that this tool be
used as arbiter for the conflict of interests between the public and private domain, giving the
collective goods through its consideration (recognizing limits in the use of natural resources)
at the urbanization process, dialoguing with the urban policy structure reference - Urban
Master Plan.
Through the study of the City of Extrema (Minas Gerais state), the lack of interface
between the several tools can be evidenced and proven, on the legal landmark of the urban
and environmental policies of municipality, which leads the urban growth without
consideration of environmental contraints of urbanization.
ix
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA......................................................................................................................................................iv
AGRADECIMENTOS..............................................................................................................................................v
APRESENTAÇÃO..................................................................................................................................................vi
RESUMO...............................................................................................................................................................viii
ABSTRACT.............................................................................................................................................................ix
SUMÁRIO................................................................................................................................................................x
LISTA DE FIGURAS.............................................................................................................................................xii
LISTA DE QUADROS..........................................................................................................................................xiii
LISTA DE DESENHOS........................................................................................................................................xiii
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................................1
x
3.2.1 Considerações acerca do Plano Diretor..........................................................................................................56
3.2.2 Considerações acerca do Zoneamento Urbano..............................................................................................59
3.3 A Política Nacional do Meio Ambiente e seus instrumentos: APA e ZEE.................................................64
3.3.1 Área de Proteção Ambiental..........................................................................................................................66
3.3.2 Zoneamento Ecológico-Econômico...............................................................................................................70
3.3.2.1 Zoneamento Ecológico-Econômico do Acre..............................................................................................72
3.4 Contextualização do Zoneamento Ambiental...............................................................................................75
3.4.1 APA do rio São Bartolomeu..........................................................................................................................78
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................................................................139
xi
LISTA DAS FIGURAS
xii
LISTA DE QUADROS
LISTA DE DESENHOS
xiii
INTRODUÇÃO
1
La tierra es um don glorioso. [...] En ella se encuentran más jóvenes
hermosas de las que podiéramos imaginar, más niños de los que podemos
amar, más risas de las que podemos soportar, más sabiduría de la que
podemos asimilar. Lienzos y colores esperan que alguien los utilice;
piedras, madera y metales se encontran listos para ser esculpidos; ruídos
indiscriminados vagan latentes a la espera de convertirse en sinfonías;
espacios dispuestos para convertirse en ciudades; [...].
Ian McHarg1
Conforme Ab’Sáber ressalta, a paisagem é uma herança “[...] patrimônio coletivo dos
povos que historicamente as herdaram como território de atuação de suas comunidades”
(2003, p.9). Como tal, a humanidade deve salvaguardar este bem para própria perpetuação de
sua espécie.
Infelizmente ainda existe uma alienação generalizada da sociedade acerca dos valores
ambientais e das conexões da cultura com o suporte biofísico (água, solo, vegetação, clima,
etc.) que a sustenta. Os valores tradicionais que moldaram a paisagem de nossas cidades têm
contribuído muito pouco para a saúde ambiental destas ou mesmo para seu sucesso
civilizatório.
1
MCHARG, Ian. Proyectar com la naturaleza. Editorial Gustavo Gili, AS, Barcelona, 2000. p.1.
2
[...] há que se conhecer melhor as limitações de uso específicas de cada tipo
de espaço e de paisagem. Há que procurar obter indicações mais racionais,
para preservação do equilíbrio fisiográfico2 e ecológico. E, acima de tudo, há
que permanecer eqüidistante de um ecologismo utópico e de um
economismo suicida3 (AB’SÁBER, 2003, p. 10).
Colocação do problema
Introduzida neste contexto, a gestão ambiental urbana4 surge como uma possível forma
de se estabelecer uma união entre os aspectos que permeiam tanto a dimensão ambiental
quanto a urbana. Porém, conforme Ribas (2003), como o conceito de gestão ambiental urbana
está ainda em consolidação, sua eficácia fica limitada diante da inadequabilidade dos
instrumentos disponíveis no marco legal das políticas públicas brasileira em lidar com a
temática ambiental urbana.
Ainda conforme Ribas (2003), as ferramentas existentes, por terem sido criadas com
finalidades distintas da temática ambiental urbana, não dão conta de lidar com suas
especificidades. Enquanto os instrumentos urbanísticos se originam a partir da preocupação
em organizar o espaço privado, os instrumentos da gestão ambiental emergem de uma
preocupação de proteção com a propriedade coletiva – o bem natural.
Necessitamos evoluir na difusão de uma base para o planejamento e gestão das cidades
preocupada tanto com as questões socioeconômicas - em evidência na política urbana - quanto
com questões de preservação e conservação dos recursos naturais – ainda a ser difundida no
âmbito das cidades brasileiras.
2
Fisiografia é o “estudo das formas físicas da Terra, de suas causas e das relações entre elas” (Diccionario de la
Naturaleza, 1987 apud www.ecolnews.com.br/dicionarioambiental. Acesso em 28 fev. 2007).
3
Conforme Góes (1973), o ecologismo manda conservar a natureza, reservando-a a função de paraíso ambiental;
já o economismo manda transformar o capital ecológico em consumo, acelerando o esgotamento dos recursos. O
ponto de equilíbrio será encontrado na planificação racional que compatibilize os objetivos de crescimento da
economia com a proteção e desenvolvimento de recursos naturais (apud AB’SÁBER, 2000, p.26).
4
Consideramos que a gestão ambiental urbana, de uma forma simplificada, pressupõe a compatibilização do
processo de desenvolvimento urbano com a conservação do meio ambiente nas cidades.
3
Em prol da implementação da gestão ambiental urbana, consideramos como um de seus
desafios à construção de interfaces entre os instrumentos da política ambiental e da política
urbana. Com tudo, há que se entender primeiramente a essência e as especificidades das
temáticas introduzidas nas respectivas políticas.
Segundo análises procedidas por Ribas (2003), uma das polaridades entre as temáticas é
a lógica do privado e do público internalizadas na dinâmica urbana e na ambiental
respectivamente. (Desenho 1)
A contribuição almejada por esta dissertação, para construção de uma gestão ambiental
urbana, tem como foco a questão dos instrumentos promotores desta gestão – ainda pouco
discutidos. Partindo da análise dos mecanismos de complementaridade entre as respectivas
políticas nacionais do meio ambiente e de desenvolvimento urbano, Política Nacional do
Meio Ambiente - PNMA (Lei nº. 6938/1981) e Estatuto da Cidade (Lei nº. 10257/2001), foi
identificado o instrumento Zoneamento Ambiental (ZA) como foco de estudo.
4
Parte-se da premissa que este instrumento seja utilizado como mediador do conflito de
interesses entre o domínio público e privado, internalizando os bens coletivos através de sua
consideração (reconhecendo os limites no uso dos recursos naturais) no processo de
urbanização, dialogando com a estrutura de referência da política urbana – o Plano Diretor
Urbano.
Objetivos da pesquisa
5
• (iv) Identificar as principais características e parâmetros a serem considerados
pelo Zoneamento Ambiental em complementaridade ao Plano Diretor, no
processo de interface entre as lógicas ambiental e urbana;
6
ambiental e urbano, apresentando um posicionamento de conceitos necessário para o
balizamento desta dissertação.
7
CAPÍTULO I
Marcos conceituais e legais da Gestão Ambiental Urbana
8
Para enfrentamento das questões referentes aos temas urbanos e ambientais nas cidades
brasileiras, são necessárias ferramentas adequadas a uma gestão que promova a inclusão da
dimensão ambiental no processo de urbanização, através de interfaces entre os instrumentos
das políticas ambiental e urbana brasileira. A eficaz gestão urbana fica limitada diante da
adoção estanque dos instrumentos disponíveis no marco legal destas políticas.
5
Chama-se de arquitetura do renascimento ou renascentista àquela que foi produzida durante o período do
Renascimento europeu, ou seja, basicamente, durante os séculos XIV, XV e XVI.
9
Fig. 1.1 – Pintura Paris de 1493, o muro cerca a cidade. Fig. 1.2 – Gênova em 1493, vê-se a cidade voltada
Fonte: www.wikipedia.org. Acesso em: 20 dez. 2006. para seu interior. Fonte: loco citato.
Segundo Argan (1992, p. 212 apud MARCONDES, 1999, p.40), ainda no final do
século XVIII e no princípio do XIX, a natureza era “vista como inimiga, inacessível,
inviolável, freqüentada somente pelas feras, pelas águias, e, naturalmente, por Deus [...] era o
sublime e representava o limite, a fronteira entre o habitado e o inabitável, entre a cidade e a
selva, entre o espaço geométrico ou mensurável do ser”.
Mas no final do século XVIII, a relação entre homem e a natureza, particularmente com
a natureza selvagem, se alterou. A reação à deterioração do ambiente urbano, que começa a
ser percebida neste momento, levou a uma admiração exacerbada pelo campo e pela natureza.
10
controle e utilização/exploração dos recursos ambientais. “Com a revolução industrial, os
papéis inverteram-se e agora é a Natureza que carece de proteção contra a ação humana”
(ARAGÃO, 1997, p. 19 apud FARIAS, 2005, p. 55). (Fig. 1.5)
Fig. 1.3 - Cidade Jardim de Howard Fig. 1.4 – Diagrama de Howard: o local deveria ser
Fonte: Ferrari apud Guimarães, 2004, p. 79. escolhido antes da execução do desenho. Fonte: Lucey;
Norman, 1973 apud Andrade, 2005, p.32.
11
No século XIX surgem os mais diversos pontos de vista acerca da relação do homem
com a natureza, indo do enfoque evolucionista de Darwin6 ao de Marx7 e Engels, segundo os
quais tal relação era pautada pelas relações sociais de produção.
Entretanto, conforme cita Marcondes (1999, p.42), é nos meados da década de 1960 que
na relação entre homem e natureza, pauta presente no pensamento do século XIX, emerge a
denominação meio ambiente tratada nos aspectos concernentes à problemática do
desenvolvimento. Este termo passou a designar uma pluralidade de questões abrangidas pela
terminologia questão ambiental, abrigando desde o desmatamento de florestas e riscos de
extinção de espécies da fauna e flora, até os problemas permeados pela questão urbana como
poluição de mananciais hídricos ou de resíduos sólidos.
O pensamento atual sobre meio ambiente foi desenvolvido a partir de três vertentes9, a
segunda e mais importante enseja que a questão ambiental passou a ser compreendida como
redefinidora das possibilidades de desenvolvimento humano. Este eixo de análise foi
fundamentado, sobretudo, nos documentos preparatórios às conferências organizadas pela
Organização das Nações Unidas (ONU), à frente descritas (ibidem, p. 44-45).
6
Charles Darwin (1809-182)desenvolveu a teoria da “evolução por seleção natural”; ele adotou a idéia da luta
competitiva e de taxas diferenciais de sobrevivência como base de suas idéias, dando-lhes o nome de “seleção
natural” ( PALMER, 2006, p. 108).
7
Karl Marx, economista e filósofo, é geralmente considerado o fundador do comunismo moderno, bem como
uma influência importante na teoria socialista (PALMER, 2006, p. 121).
8
Em sua filosofia, Descartes dividiu a criação em duas essências: a res cogitans (a que pensa) e a res extensa (a
que ocupa espaço), denominado os entes físicos não-humanos do mundo como objetos puramente mecânicos,
incapazes de qualquer tipo de pensamento (FARIAS, 2005, p. 24).
9
A primeira vertente em que os assuntos foram apropriados de forma fragmentada nos estudos sobre políticas
públicas, movimentos sociais, etc.; e uma terceira vertente na qual os paradigmas existentes seguiram o caminho
da chamada “ciência normal”, procurando entender os modelos, redefinir os conceitos e introduzir novos pontos
de vista a fim de dar conta da problemática iminente.
12
1.2 A CONFIGURAÇÃO DA PROBLEMÁTICA AMBIENTAL URBANA
10
Iniciada na Europa e expandida para diferentes partes do mundo.
11
Conceito de desenvolvimento sustentável (definido no Relatório Bruntland no processo preparatório da Rio-
92) é aquele que satisfaz as necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade das gerações
futuras de satisfazer suas próprias necessidades (CMMAD, 1988, p.46 apud BARBIERI, 1997, p.23). Porém
para este conceito ainda não há um conteúdo preciso cabendo as mais variadas definições; este traz a tona um
amplo debate em torno tanto da idéia de desenvolvimento quanto de sustentabilidade.
13
o documento intitulado Agenda 2112, e pela Conferência Habitat II, em Istambul 1996.
Entendido como cidades sustentáveis aquelas cujo desenvolvimento busca o equilíbrio entre
crescimento econômico, equidade social e preservação ambiental.
Conforme ressaltado na introdução, segundo Ribas (2003), uma das polaridades entre as
temáticas é a lógica do privado – internalizada da dinâmica urbana, e do público –
internalizada na dinâmica ambiental. A legislação urbana se baseia na garantia constitucional
à propriedade privada13, enquanto as normas ambientais tratam de assuntos de interesse
eminentemente coletivo.
A ausência de diálogo entre a questão ambiental e a urbana no Brasil talvez possa ser
explicada a partir da análise do embasamento conceitual que fundamentou a construção dos
12
O projeto de cidades sustentáveis passou a ser o tema recorrente a partir da Agenda 21, em que se estabeleceu
a questão dos assentamentos humanos, em especial dos assentamentos urbanos, como problema ambiental. Este
documento contém compromissos para mudança de padrão de desenvolvimento para o século XXI, onde se
buscou estabelecer um quadro de referências para as políticas públicas.
13
CF, art.5ª, XXII (BRASIL, 1988).
14
marcos legais referentes a estas duas temáticas, e também na inserção brasileira no contexto
econômico mundial, onde a ideologia do “crescimento” se contrapõe aos temas de
preservação e conservação ambiental.
Historicamente, o Brasil foi marcado por forte tradição de exploração dos recursos
naturais, o que explica o fato de as cidades terem surgido primeiramente ligadas às atividades
extrativistas e agro mercantis, tendo se desenvolvido basicamente a partir de pontos de
comercialização e exportação de recursos naturais (pau-brasil, cana-de-açúcar, ouro e pedras
preciosas, café, etc.). Posteriormente, a partir do processo de industrialização, já na década de
1930, e aliada à crescente imigração rural-urbana, verifica-se uma forte pressão no que tange
ao aumento das atividades relativas à urbanização no Brasil onde predominava o uso
indiscriminado do solo urbano, a falta de planejamento e oferta de serviços urbanos,
repercutindo impactos ambientais e deterioração do espaço urbano (BOTTINI, 2005, p. 21).
15
procuravam regular propriedade para fins de parcelamento. Segundo Ribas, até a Constituição
Federal de 1988, a legislação urbana se pautava ainda pelo privilégio da propriedade privada e
dos interesses econômicos e não apresentava qualquer menção aos aspectos ambientais e ao
planejamento territorial (2003, p.87 apud BOTTINI, 2005, p.22). No entanto, com a
Constituição de 1988, a política urbana foi tratada em um capítulo específico visando, acima
de tudo, garantir o direito de propriedade e a função social da cidade (CF, art. 5ª, XXIII).
Os movimentos sociais urbanos14, que tinham na década de 1980 um foco nas demandas
por habitação, propriedade, transportes e serviços urbanos, assistem, na década seguinte, ao
aparecimento de outros movimentos sociais de igual legitimidade e que levantam bandeiras de
apropriação e uso dos recursos comuns - o ambientalismo (RIBAS; BEZERRA, 2003, p.4). O
poder público entretanto não dispõe de instrumentos que conciliem os interesses de cada
segmento, do urbano e do ambiental, estes administram o espaço conforme suas lógicas.
O Estatuto da Cidade constitui a legislação mais recente sobre a questão urbana no País,
estabelecendo um marco legal para questões que se colocam como conflitantes nas áreas
urbanas brasileiras. Entretanto, como seu escopo foi estruturado na década de 1980, em pleno
14
Com especial destaque para o Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU).
15
Art. 182 – A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme
diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade
e garantir o bem-estar de seus habitantes.
Art. 183 – Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco
anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o
domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
16
período de redemocratização do País, possui forte conotação social com pequena visibilidade
da questão ambiental à época. Esta lei “estabelece normas de ordem pública e interesse social
que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-
estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (Parágrafo único do Art. 1º).
16
O licenciamento ambiental torna-se exigência corriqueira nos planos urbanos.
17
1.4 A POLÍTICA AMBIENTAL
A década de 1970 foi marcada pela tomada de consciência mundial para a questão
ambiental. A publicação em 1972 pelo Clube de Roma do relatório "Limites do Crescimento",
conhecido por “Relatório Meadows”, e no mesmo ano, a Conferência da ONU em Estocolmo
considerada um marco do ambientalismo global, foram iniciativas pioneiras na discussão de
problemas ambientais em contraponto ao desenvolvimento e tiveram papel preponderante na
projeção da crise ambiental em nível mundial despertando a preocupação com o meio
ambiente. Este período no Brasil, como no mundo, foi marcado por iniciativas
governamentais baseadas em instrumentos de comando e controle19 das atividades industriais.
• (i) um primeiro período, de 1930 a 1971, marcada pela construção de uma base
de regulação dos usos dos recursos naturais;
17
Decreto nº. 73.030, de 30 de outubro de 1973.
18
A definição federal, apresentada por esta lei e recepcionada pela Constituição Federal, conceitua meio
ambiente como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as formas”.
19
Instrumentos de comando e controle ou regulatórios são aqueles em que o poder público estabelece padrões e
pune com sanções legais e penalidades àqueles que desobedecerem as regras.
20
Análise procedida por Cunha e Coelho, sobre a Política e Gestão Ambiental in “A questão ambiental:
diferentes abordagens”, 2005, p.46.
18
• (iii) um terceiro período, de 1988 aos dias atuais, marcado pelos processos de
democratização e descentralização decisórias e pela rápida disseminação do
termo desenvolvimento sustentável.
A Constituição Federal aprova capítulo específico sobre meio ambiente (Capítulo VI),
onde estabelece em seu Art. 225 que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá - lo para as presentes e futuras
gerações”. Graças a esta nova percepção sobre a temática ambiental, os problemas
relacionados com a proteção do meio ambiente e com o desenvolvimento sustentável
emergiram no centro do debate político do País.
De acordo com Santos et al (2004 apud ANDRADE, 2005, p. 99), a PNMA funciona
como a espinha dorsal do art. 225 da CF, estabelecendo o que fazer, quem vai fazer e quais os
instrumentos utilizados para fazê-lo. A lei também fixa as diretrizes e as bases, e institui o
CONAMA e o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA). Por meio do SISNAMA
define a forma como os Poderes Executivos devem atuar e cooperar, uns com os outros, na
proteção do meio ambiente, estabelecendo as competências e hierarquias.
Esta lei nº. 6.938/81 define como seu objetivo (Art. 2º) “a preservação, melhoria e
recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições de
desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da
dignidade da vida humana”.
19
específica (floretas, água, recursos minerais,etc.), seja para lidar com a gestão integrada
(controle da qualidade ambiental), em especial nas áreas urbanas (RIBAS, 2003).
A PNMA, por meio de suas disposições, tem sido o elo entre as questões ambientais e o
desenvolvimento urbano brasileiro, em especial, no que se refere ao licenciamento de
atividades potencialmente poluidoras por meio dos estudos de impacto ambiental
(EIA/RIMA), que, na prática, não se adequam propriamente à análise dos impactos urbanos
(RIBAS; BEZERRA, 2003).
20
1.5 O DESAFIO DA CONSTRUÇÃO DE INTERFACES ENTRE OS
INSTRUMENTOS DA POLÍTICA AMBIENTAL E URBANA: A DIFERENÇA DE
LÓGICAS
Segundo análises procedidas por Ribas, parte-se de uma hipótese geral que os atuais
instrumentos, procedimentos e práticas de gestão do solo urbano são impróprios para lidar
com a problemática do meio ambiente urbano. Por sua vez, os instrumentos da gestão
ambiental, originários da lei da Política Nacional do Meio Ambiente, por se apoiarem na
idéia de proteção e preservação dos recursos naturais, não estabelecem, de forma aparente,
um diálogo com o processo de urbanização cujo princípio é o da ação e intervenção
(construção e uso) sobre a paisagem natural (RIBAS, 2003).
Ainda conforme Ribas, estabelece-se como pressuposto dessa assertiva que a possível
inadequação advém da finalidade para qual essas ferramentas foram criadas. Enquanto os
instrumentos urbanísticos se originaram a partir da preocupação de organizar o espaço
privado (o mercado em última instância), os instrumentos da gestão ambiental emergem de
uma preocupação com a propriedade coletiva, o espaço natural.
A alusão de que o desequilíbrio provocado pelo uso dos recursos naturais pode ser
equacionado exclusivamente pela modernidade tecnológica21, ignora o conceito de finitude e
de sensibilidade da natureza, o que reforça a lógica de uma administração do espaço urbano
21
Conceito mencionado por Bursztyn, M., e Bezerra M. (coord), no documento “Ciência e Tecnologia para o
Desenvolvimento Sustentável – subsídios à elaboração da Agenda 21 Brasileira”. Brasília, 2000.
21
centrada na regulação da propriedade privada. Esta lógica ainda predomina na formação dos
urbanistas e sanitaristas, em oposição à lógica do ambientalismo22, que se organiza a partir da
idéia do domínio coletivo (RIBAS; BEZERRA, 2003, p.5).
Segundo Santos (1987, p.2), através da história, alguns desses bens foram sendo
privatizados, tornando-se de uso exclusivo de indivíduos ou determinados grupos. O solo23,
principalmente, foi submetido a um processo que, partindo de formas coletivas24, chegou à
propriedade mais individualista.
Vivemos a grande maioria dos brasileiros em uma sociedade onde um dos valores
fundamentais é o da propriedade privada. A esfera privada constitui a base fundamental dos
22
O discurso ambientalista busca a base de suas propostas de recuperação/reestruturação em doses mais
solidárias e democráticas.
23
O solo, nas sociedades modernas, é usado para atender a duas finalidades: servir de suporte à produção ou
servir de suporte ao consumo.
24
No Brasil ainda são encontrados raros exemplos de propriedade em comum dos bens naturais, nas sociedades
indígenas.
22
instrumentos de gestão urbana calcados no conceito de propriedade, que deriva do direito
romano organizado nos princípios do usufruto e abuso da posse - “utendi, fruendi et abutendi”
(RIBAS, 2003, p. 236).
São as normas urbanísticas que regulam (regram, normatizam, impõe modo de agir)
juridicamente a ordenação e ocupação das cidades, e consequentemente o direito de
propriedade26 urbana. A Constituição Federal estabelece que a propriedade urbana fica
submetida ao processo urbanístico, nos termos de seu art. 182, § 2º., que subordinou o
cumprimento de sua função social às exigências da ordenação da cidade expressa no plano
diretor; é também o plano diretor que define os critérios da utilização do solo urbano (SILVA,
1997, p. 50).
25
A função social se manifesta na própria configuração estrutural do direito de propriedade, pondo-se
concretamente como elemento qualificante na predeterminação dos modos de aquisição, gozo e utilização dos
bens. Conclui-se então que o direito de propriedade não pode mais ser tido como um direito individual, a
inserção do princípio da função social, sem impedir a existência da instituição, modifica sua natureza (SILVA,
1997, p. 66).
26
O direito de propriedade é senão um direito atual (só existe enquanto é atribuído positivamente a uma pessoa),
cuja característica é a faculdade de usar, gozar e dispor de bens, fixada na lei. Decorre do nosso direito positivo,
ao estatuir que a lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens (Código Civil, art.
524)
23
Porém a doutrina segundo a qual a propriedade urbana é formada e condicionada (pelo
direito urbanístico) a fim de cumprir sua função social - esta focada em propiciar habitação
(moradias), condições adequadas de trabalho, recreação e circulação humana – não inclui a
proteção ambiental, dimensão pré-requisitante a manutenção e qualidade de vida humana.
Como observações elaboradas por Silva, ressaltamos que numa sociedade capitalista,
em que os “detentores do solo perseguem a máxima privatização da cidade, não só da
propriedade imobiliária, mas também das mais-valias que sua atividade gera”, o planejamento
urbano se converte frequentemente em um instrumento para consolidação de expectativas e de
reordenação das rendas do solo (1997, p.72).
27
A Grécia conheceu a única democracia direta, não representativa, os gregos discutiam seus problemas e
votavam diretamente suas leis. O cidadão livre grego exercia seus direitos políticos pela votação direta e livre
manifestação do pensamento (FERRARI, 1979, p. 216).
24
Segundo Farias, o termo “bem de uso comum” expressa o caráter difuso da proteção
ambiental, pois não sendo de ninguém, é de todos (2005, p.81). Como bem ambiental, é
objeto de interesses difusos28, ensejando o dever de intervenção pelo Poder Público e pela
coletividade para sua defesa e preservação.
O meio ambiente, salienta Benjamim (1993, p.66 apud FARIAS, 2005, p.81), é bem
público não porque pertençe ao Estado, mas porque se apresenta no ordenamento,
constitucional e infraconstitucional, como direito de todos. Por conseguinte, não está
vinculado somente ao Estado, mas à sociedade em geral, eis então a complexibilidade em
protegê-lo. Em sua grande maioria, a sociedade ainda pauta o meio ambiente por valores
referentes à sua exploração econômica e não por uma ética29 de responsabilidade e
solidariedade com as futuras gerações.
Historicamente, os bens ambientais nem sempre foram vistos como bem de interesse
público, que limitam o direito de propriedade. Em primeiro momento consideravam-se “bens
livres” em contraste aos “bens econômicos”, estes sim, úteis, escassos e acessíveis ao homem
(ARAGÃO, 1997, p.22 apud FARIAS, 2005, p.82). Supunha-se que os bens livres eram
infinitamente abundantes, tornando-os gratuitos, sendo considerados sem valor.
A ênfase dada ao papel do Estado na proteção ao meio ambiente e na regulação dos usos
dos recursos naturais depende, em grande parte, de como este se articula com a propriedade
privada.
O princípio da propriedade privada, assegurado como direito fundamental (art. 5º, inciso
XXIII da CF), deve ser interpretado em harmonia com o princípio de que a propriedade
atenderá sua função social no que tange à proteção do meio ambiente ecologicamente em
equilíbrio, pois, sendo bem de uso comum do povo, há cristalina restrição à iniciativa privada
por atos do Poder Público.
28
Difusos, como conceitua o Código de Defesa do Consumidor, são interesses ou direitos “transindividuais, de
natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato” (art. 81,
parágrafo único).
29
O termo provém do radical grego ethos, que significa “costume”. Numa visão simplificada, a filosofia moral
(ou ética) propõe os princípios para alcançar a conduta correta (FARIAS, 2005, p.87).
25
A Constituição de 1988 adotou, dentro da perspectiva de uma ética do
desenvolvimento, como conceito de desenvolvimento sustentável, aquele
que não permite a privatização do meio ambiente, prioriza a democratização
do controle sobre o meio ambiente ao definir meio ambiente como "bem de
uso comum do povo" e exige o controle do capital sobre o meio, por
intermédio de instrumentos como o Estudo de Impacto Ambiental, e muitos
outros, que chamam a comunidade a decidir. Para uma aplicação eficiente do
desenvolvimento sustentável, faz-se necessário um levantamento da medida
de suporte do ecossistema, ou seja, estuda-se a capacidade de regeneração e
de absorção do ecossistema e se estabelece limite para a atividade eco-
nômica. Este limite permite que as atividades econômicas não esgotem o
meio ambiente, mas que este seja protegido para o futuro (FARIAS, 2005, p.
213).
A metáfora da “tragédia dos comuns” tem sido utilizada nas últimas três décadas como
um dos principais argumentos da defesa da forte presença do Estado na regulação do acesso e
uso aos recursos naturais e da propriedade privada em detrimento da propriedade coletiva
como meio de se evitar a degradação ambiental. Popularizada por Garret Hardin30, a partir de
1968, com a publicação de um influente artigo, a noção de tragédia dos comuns é
normalmente associada à idéia de que recursos apropriados em comum estão sujeitos à
degradação massiva (HARDIN, 1980; FREENY et al., 1990 apud CUNHA; GUERRA,
2005).
30
Hardin construiu a metáfora da tragédia dos comuns como uma expressão da contradição entre racionalidade
individual e racionalidade coletiva. Para demonstrar essa contradição, toma como exemplo o processo que leva à
degradação de um pasto comum utilizado por um grupo de pastores. Com o objetivo de maximizar benefícios e
minimizar custos, cada pastor individual considerará racionalmente mais vantajoso ter um número crescente de
animais no pasto. Como o pasto é um recurso comum, os custos de manutenção de um número maior de animais
serão repartidos com os demais usuários, enquanto os benefícios serão apropriados individualmente, já que os
rebanhos não são coletivos. Cada pastor agindo racionalmente, então, acrescentará mais e mais animais ao pasto,
até que sua até que sua capacidade de suporte seja ultrapassada, levando, com o tempo, à perda total do recurso
para a inteira comunidade de pastores.
26
humanidade. O movimento ambientalista31 moderno, que destaca como uma preocupação
central a relação entre o desenvolvimento econômico e a afronta ao meio ambiente, também
motiva práticas onde agrupamentos sociais ensejam ações protetivas ao meio ambiente.
31
As décadas de 60 e 70 do século XX constituem marcos cronológicos importantes para o movimento
ambientalista; nos EUA houve uma intensa movimentação política de conscientização ambiental e o respectivo
agir para a preservação do meio ambiente; na Europa, o Clube de Roma, na década de 70, inaugurava a nova fase
do movimento ecológico, em que a questão central passa a ser a limitação da atividade econômica sob o risco do
comprometimento da própria sobrevivência da biosfera.
27
CAPÍTULO II
Referencial analítico sobre planejamento e gestão do território
28
A organização do espaço sempre foi uma premissa para grupos de pessoas que se
propõem viver conjuntamente, sob objetivos e normas comuns. Esta disposição vem desde a
Antiguidade, quando já existiam formas de planejamento, e se apresenta na atualidade como
um dos grandes paradigmas na busca da qualidade de vida32 futura.
32
A qualidade de vida significa algo mais que um bom nível de vida privada, exige uma máxima disponibilidade
pública para atuar em benefício do bem comum.
33
Objetivo, ideal ou meta é um estado limite ou fim a que tende um desejo ou propósito (FERRARI, 1979, p.6).
34
Definição da Carta dos Andes, elaborada em outubro de 1958, na Colômbia pelo “Seminário de Técnicos e
funcionários em Planejamento Urbano”, promovido pelo CINVA – Centro Interamericano de Vivenda e
Planejamento.
29
Implicitamente contido no conceito amplo de planejamento, fica subentendido que é
preciso conhecer os dados do problema – através de pesquisa, e compreendê-lo – através de
análise, para equacioná-lo e resolvê-lo – consequentemente uma síntese (FERRARI, 1979,
p.4, grifo nosso). O planejamento é, portanto, um processo racional de tomada de decisões
(HALL, 1974 apud BEZERRA, 1996, p. 15).
O planejamento é um processo contínuo, o que exige que seus objetivos sejam alterados
com o decorrer do tempo, assim como as políticas necessárias para sua prática. Portanto,
inclui também a ação política, já que se propõe a intervir no jogo de interesses de uma
realidade (MORAIS, 2002, p.35).
30
A gestão é aqui entendida como um processo de complementaridade ao planejamento.
Enquanto o planejamento se configura como uma base de objetivos e metas a serem
executadas mediante planos e projetos, a gestão assegura o bom funcionamento, o melhor
rendimento e o desenvolvimento dos planos e projetos; de uma forma ampla executa os
objetivos do planejamento, o implementa.
31
As abordagens de planejamento urbano evoluíram do desenho e do embelezamento das
cidades - que teve na França, a partir do século XVIII, com Haussman, a sua principal
aplicação - até mais recentemente, com a adoção de abordagens voltadas para a
sustentabilidade ambiental e para a adaptação de processos e instrumentos de planejamento e
gestão que considerem a dimensão econômica e social da cidade. (Fig. 2.1)
Fig. 2.1 – Plano Haussman. Fonte: Ferrari apud Guimarães, 2004, p. 79.
32
Procurando entender o processo de constituição do planejamento urbano no Brasil, o
ponto de partida do que hoje denominamos como tal deu-se na década de 193035.
Estabelecendo uma análise cronológica, o período que vai de 1930 a 1950 destacou-se pela
elaboração de planos que tinham por objetivo o conjunto da área urbana e propunham a
articulação entre os bairros, o centro e a extensão das cidades através de sistemas de vias e de
transportes. Neste mesmo período são formuladas as primeiras propostas de zoneamento,
devido a conflitos de uso, e organizam-se órgãos para o planejamento urbano como parte da
estrutura administrativa das prefeituras das principais cidades (LEME, 1999).
35
Na década de 1930 e 1940 o planejamento urbano recebeu outra denominação, se chamava urbanismo
(VILLAÇA, 1999, p.173).
36
Ao longo do período que se iniciou a discussão sobre o conceito de planejamento urbano no Brasil este sempre
esteve intimamente relacionado ao conceito do Plano Diretor.
37
Segundo a concepção ideológica do Planejamento Integrado, os problemas urbanos não poderiam limitar-se ao
âmbito da engenharia e da arquitetura, a cidade é também um organismo econômico e social, gerido por um
aparato político-institucional (VILLAÇA, 1999, p. 210).
38
Tecnocrático se refere à ideologia da supremacia do conhecimento técnico e científico como guia da ação, ou
seja, a ideologia da tecnocracia. Porém, se por um lado, o tecnocratismo é condenável não somente por seu
autoritarismo, mas igualmente por pretender negar o fato de que planejar e gerir intervenções no espaço urbano
são atividades eminentemente políticas, uma vez que o sentido e as finalidades da vida coletiva estão em jogo,
por outro lado isso não deve desembocar na conclusão que planejar e gerir prescinde de téchne, de
conhecimentos apropriados, notadamente no que se refere à escolha dos meios mais adequados para a satisfação
de determinadas necessidades.
33
Conforme Morais (2002, p.38), a partir da década de 1980 o Brasil sofre o
desmantelamento de sua estrutura pública de planejamento - ocorrendo em paralelo com a
pressão neoliberal externa -, onde o interesse dos políticos no poder era de eliminar
procedimentos do planejamento que dificultavam o uso a seu exclusivo critério dos recursos
públicos.
34
A discussão sobre a “sustentabilidade das cidades”, foi em um primeiro nicho,
constituída entre os ambientalistas e a sua crítica radical às cidades biocidas39 ou doentes.
Outra vertente importante desta discussão se deu no âmbito das clientelas que lidam
diretamente com a gestão das cidades (GIRARDET, 1989 apud ROMERO, 2001, p.3).
O processo de crise do planejamento urbano fez emergir novos princípios como base de
apoio ao planejamento e gestão do solo urbano, para formulação de políticas públicas
sustentáveis, como: equidade40, eficiência e eficácia41, flexibilidade42 e participação43. A
partir desses princípios é que ganham força as idéias de uma gestão urbana comprometida
com a sustentabilidade.
39
O biólogo Girardet (1989) em seu livro “Cidades” caracteriza as principais cidades do mundo, em especial as
megalópoles como Cidade do México e São Paulo, Calcutá e Nova Iorque como usinas de consumo de energia e
de produção intensiva de rejeitos de toda ordem. Ele contrasta as noções de cidades biocidas e cidades
ecológicas, comparando formas de organização onde na primeira (biocida) os ciclos não são sequer pensados ou
planejados, e na segunda (ecológica) onde há uma consciência ambiental por parte dos gestores e cidadãos. As
cidades biocidas, segundo o autor, em sua maioria são verdadeiras máquinas de destruição da natureza e
produtoras de stress humano, onde todos os fluxos buscam fora o que precisam. Como alternativa, nas cidades
ecológicas, a sustentabilidade vai estar diretamente relacionada à capacidade de cada cidade, pensada como um
ecossistema construído prover-se com um mínimo de importação de recursos que necessita.
40
Equidade refere-se à necessidade de reformar instituições e revisar instrumentos para que seu funcionamento e
aplicação não contribuam para segregação da população urbana pobre.
41
Eficiência e eficácia envolvem a capacidade de administração e aplicação dos instrumentos de gestão urbana e
das ações públicas para atingir os objetivos definidos nas políticas públicas; envolve ainda, uma relação de
custos e benefícios.
42
Flexibilidade se refere à capacidade das instituições e instrumentos acomodar as mudanças e o crescimento,
duas características principais do processo de urbanização.
43
Participação é compreendida como o envolvimento da sociedade civil e organizada, terceiro setor e setor
produtivo no sistema de planejamento e gestão urbana.
35
urbana, em especial na elaboração dos planos diretores prevista constitucionalmente no Brasil,
ainda não se introduziu de forma efetiva uma gestão que se diga “sustentável” – leia-se uma
gestão preocupada e responsável não só com as questões sociais, mas com a introdução de
condicionantes ambientais no processo de urbanização.
36
2.2.2 A Gestão Urbana e sua abordagem
44
A crise do planejamento urbano e regional, iniciada no Brasil desde os anos 80 , foi
preponderante ao fortalecimento da palavra “gestão”; o planejamento estava largamente
desacreditado e associado a práticas tecnocráticas. Contra este pano de fundo, o termo gestão
traz para alguns observadores a conotação de um controle mais democrático, operando com
base em acordos e consenso, em contradição ao planejamento, fundamentado apenas nos
critérios técnicos (MACHADO, 1995 apud SOUZA, 2002, p.46).
44
Sob influência das críticas de corte marxista, iniciadas na Europa e nos EUA nos anos 70.
37
A adequabilidade das bases normativas e legais que fundamentam a gestão urbana
constitui um desafio importante para atingir o objetivo de uma cidade sustentável, aí
entendida, a repartição de benefícios e custos diretos e indiretos gerados pelos agentes
imobiliários, instituições públicas, privadas e indivíduos, originados do processo de
urbanização.
Uma nova fase ocorre no final da década de 1960, quando da releitura dos fundamentos
conceituais de desenvolvimento gerado por diversas causas histórico-políticas, surgem
modelos alternativos de desenvolvimento considerando benefícios desvinculados do aspecto
45
De acordo com Latour (1998 apud SANTOS, 2004, p. 17), “os impactos ambientais da sociedade moderna
ajudaram a [...] torna-la, pouco a pouco, uma parte de nossa existência legal, política e moral [...] Ela passou do
exterior ao interior do mundo social”.
38
puramente econômico, bem como características negativas do chamado “mundo
desenvolvido” como poluição e degradação ambiental (loco citato).
Segundo Santos (2004), o marco das preocupações do homem moderno com o meio
ambiente, incorporando questões sociais, políticas, ecológicas e econômicas com uso racional
dos recursos, deu-se em 1968, com o Clube de Roma46. O relatório final elaborado nesta
reunião, chamado “Limites de Crescimento”, abalou as convicções da época sobre o valor do
desenvolvimento econômico e a sociedade passou a fazer maior pressão sobre os governos
acerca da questão ambiental (estas considerações tomam proporção na Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em 1972).
Nos anos de 1970 e início dos anos 1980, os conceitos sobre planejamento,
influenciados pelos estudos de impacto, sofrem uma reformulação e surge a tendência de
elaborar planejamentos regionais integrados – se resumiam na formalização do sistema de
planejamento já existente, com elementos provenientes do meio natural ou antropizado
analisados de forma interativa.
46
O Clube de Roma foi uma reunião com representantes de diversos países e de diversas áreas de conhecimento:
biológica, econômica, social, política e industrial; reuniram-se para discutir o uso dos recursos naturais e o futuro
da humanidade.
39
No Brasil, prenúncios mais concretos de propostas de planejamento ambiental ocorrem
na virada do século, nos anos de 193047, quando foram modelados os planejamentos de
recursos hídricos e gestão de bacias hidrográficas.
47
Constituição do Código de águas, do Código Florestal e da Lei de Proteção à Fauna.
48
Segundo o vocabulário básico de meio ambiente, FEEMA (1990), a conceituação de conservação seria
”Utilização racional de um recurso qualquer, de modo a se obter um rendimento considerado bom, garantindo-
se, entretanto, sua renovação ou sua auto-sustentação. Uso apropriado do meio ambiente dentro dos limites
capazes de manter sua qualidade e seu equilíbrio, em níveis aceitáveis” (apud BEZERRA, 1996, p. 24).
49
Segundo o vocabulário básico de meio ambiente, FEEMA (1990), a conceituação de preservação seria “Ação
de proteger, contra a destruição e qualquer forma de dano ou degradação, um ecossistema, uma área geográfica
definida ou espécies animais e vegetais ameaçadas de extinção, adotando-se as medidas preventivas legalmente
necessárias e as medidas de vigilância (apud BEZERRA, 1996, p.140).
40
[...] a ação de sistematizar o conhecimento científico sobre uma determinada
região, apontando as inter-relações entre os recursos naturais e os usos
possíveis frente a necessidade de manutenção do equilibro dos ecossistemas,
de forma que viabilize a tomada de decisão sobre o uso do território com
vistas ao atendimento das demandas sócio-econômicas e a preservação dos
recursos naturais (BEZERRA, 1996, p.26).
De acordo com o MMA (1994 apud CABRAL, 2005, p. 11), o problema básico do
planejamento ambiental consiste em avaliar tanto a sensibilidade dos fatores naturais que
compõem a paisagem de determinado espaço aos danos causados por usos antrópicos (ou seja,
o potencial de uso dos recursos naturais e a capacidade de os fatores naturais diluírem os
efeitos negativos), quanto à intensidade dos danos potencialmente causados por usos
antrópicos a cada um desses fatores naturais, de modo a embasar cientificamente a análise das
relações de causa e efeito entre fatores naturais e usos antrópicos.
41
2.3.2 A Gestão Ambiental e sua abordagem
Ainda, segundo Bolea (1984 apud BEZERRA, 1996, p.27), entende-se por gestão
ambiental um conjunto de ações que objetivem dar racionalidade máxima ao processo de
tomada de decisão relativa à conservação, defesa, proteção e melhoria do meio ambiente,
baseando-se em informações coordenadas e multidisciplinares com participação dos cidadãos.
42
Souza (2000 apud CABRAL, 2005, p. 49) afirma que a abordagem sistêmica do meio
ambiente, por meio da gestão ambiental, propicia uma aplicação mais próxima da realidade,
pois cria canais de comunicação nos quais os fatores ambientais são identificados, analisados,
ponderados e administrados, observando inúmeras áreas do conhecimento, permitindo, assim,
a compreensão global dos problemas e também a aplicação de soluções ambientalmente mais
adequadas.
Assim, a gestão ambiental não é pacífica, ou seja, incita discussões e conflitos a partir
do momento em que ela se defronta com o desafio crucial de integrar os diversos interesses e
inserir a dimensão ambiental em processos decisórios privados e em políticas governamentais.
Do ponto de vista dos instrumentos legais e normativos, existe um amplo aparato legal
de controle e punição aos potenciais danos causados pela utilização inadequada dos recursos
naturais. Porém, a gestão ambiental praticada no país ainda hoje tem caráter "curativo"
(CERQUEIRA,1989 apud BEZERRA, 1996, p. 34). O meio ambiente é pensado a partir de
degradação e poluição.
Ainda conforme Bezerra, a gestão ambiental corretiva e pontual50 não tem fornecido as
respostas esperadas pelas crescentes demandas ambientais fomentadas pelo paradigma do
desenvolvimento sustentado. As novas demandas obrigam uma ampliação de abrangência nas
ações de proteção ambiental, envolvendo, além do controle das emissões, a economia dos
recursos naturais de acordo com suas potencialidades e limitações dentro de uma proposta de
ordenamento territorial.
50
De qualquer forma, não se podem negar os êxitos alcançados através de ações normativas e corretivas,
principalmente no combate à poluição industrial.
43
2.4 ASPECTOS CONCEITUAIS SOBRE GESTÃO AMBIENTAL URBANA
A definição de gestão ambiental urbana parece indispensável para que possamos evoluir
sobre uma terminologia que, na prática profissional, tem sido utilizada muitas vezes sem
maior preocupação conceitual, e que ainda está em fase de consolidação. Para tal, pretende-se
buscar uma melhor compreensão deste conceito sem, no entanto, apontá-lo como verdade
absoluta.
O tema meio ambiente, no Brasil, entra no espaço municipal via ação dos estados e da
União, manifestou-se principalmente em problemas relativos a resíduos sólidos, saneamento
básico, poluição do ar e da deficiência de áreas verdes, mas praticamente até a atualidade não
têm uma inclusão nos processos de planejamento como elemento básico (MORAIS, 2002, p.
45 - 46).
Já no plano federal, cada vez mais as ações governamentais procuram intervir com
programas voltados para controle do ambiente urbano partindo da definição de áreas
ambientais críticas - resultantes do uso inadequado de recursos ambientais e da própria
ineficiência do processo de gestão ambiental. A definição destes programas no âmbito federal,
onde tem recebido o nome de “Agenda Marrom”, é orientada por duas premissas: (i) a
magnitude dos danos gerados - principalmente sociais (impactos sobre o ser humano),
econômicos (perda de produtividade) e ambientais (degradação de recursos); e, (ii) a
necessidade de cumprimento de acordos internacionais que definem normas específicas e
comuns para problemas ambientais globais (MMA, 2002 apud RIBAS, 2003, p. 116).
O que tem se entendido hoje como “gestão ambiental urbana” são as questões referentes
principalmente a saneamento ambiental, focados na resolução dos problemas quanto à
poluição das cidades – retoma-se a pauta da infra-estrutura. É uma tentativa de resolução dos
problemas que o planejamento urbano não foi capaz de resolver mediante enfoque ambiental.
44
A questão que se coloca é mais ampla, envolve tanto ações de mitigação de impactos e
implantação de infra-estruturas, mas principalmente a consideração das potencialidades e
fragilidades do meio físico biótico na definição das áreas a serem urbanizadas.
Por outro lado, a gestão ambiental urbana necessita de instrumentos. Porém, pouco tem
se falado sobre a questão dos instrumentos promotores da gestão ambiental urbana, foco desta
dissertação. Reafirmamos que é necessário entender a gestão ambiental urbana para além do
tratamento de carência de infra-estrutura e de poluição (mesmo sendo estas de suma
importância), trabalhar no sentido da construção da gestão propriamente dita – seus
instrumentos, políticas.
45
CAPÍTULO III
O Zoneamento Ambiental e as diferentes abordagens do ordenamento
territorial nas políticas urbana e ambiental
46
Em que pese o processo de complementaridade entre os instrumentos das políticas
ambiental e urbana, também existe uma dicotomia acentuada por lacunas quanto à
caracterização de instrumentos e controvérsias quanto à aplicação dos mesmos. O
Zoneamento ambiental se encaixa neste perfil, seu escopo e finalidade não foram demandados
por normas legais após seu estabelecimento na PNMA - abrindo margem à dúvida quanto a
sua implantação e dificultando assim sua aplicação.
Do ponto de vista da prática, não existe nem consenso quanto à aplicação deste
instrumento e também nenhuma abordagem teórico-conceitual consagrada capaz de nortear a
elaboração do ZA como subsidio a elaboração de planos de ordenamento do território. Sua
prática no Brasil se limita a poucas experiências marcadas por interpretações circunstanciais
das equipes técnicas envolvidas.
O Plano Diretor51, como a figura central da política urbana, deveria ser subsidiado por
uma análise ambiental do território. O Estatuto da Cidade não se refere à obrigatoriedade de
realização do Zoneamento ambiental para que lhe sirva de subsídio, fornecendo conhecimento
das fragilidades e potencialidades do território. Esta seria uma grande oportunidade de
integrar a dimensão ambiental na tomada de decisão sobre política urbana.
51
Os Planos Diretores têm inserido capítulos sobre aspectos ambientais do município, fato que não se percebia
há algumas décadas. Esta postura não tem significado por outro lado uma proposição de instrumentos de gestão
ambiental urbana, ou de consideração de condicionantes ambientais aos processos de planejamento do território
ficando esta aparente evolução conceitual restrita a fase de diagnóstico.
47
- que resulta em palco de conflitos, uma vez que terá que deliberar sobre situações de fato,
restando apenas o estabelecimento de medidas mitigadoras.
Reforçando esta hipótese, de acordo com Ribas (2003)52, um dos instrumentos previstos
pelo Estatuto da Cidade que apresenta potencial de incorporar a temática ambiental no
contexto da gestão municipal é o ZA. Assim, o imperativo de se implementar uma gestão
ambiental nas cidades, faz com que esse instrumento adquira destaque na gestão de áreas
urbanas. Também, segundo Maglio (1995, p. 91), o zoneamento ambiental junto ao
EIA/Rima, passam a ser mecanismos fundamentais para o gerenciamento ambiental das
políticas setoriais e para o desenvolvimento com sustentabilidade.
Existem vários tipos de zoneamento, variando de acordo com sua finalidade, cada um
deles constituindo um instrumento específico. Possui conceitos jurídicos e técnicos diferentes,
mas um fim específico: delimitar geograficamente áreas territoriais com o objetivo de
estabelecer regimes especiais de uso, gozo e fruição da propriedade. O proprietário só poderá
utilizar sua terra, da maneira que lhe convier, desde que respeite os interesses coletivos como
a função social e a conservação do meio ambiente. Trata-se de controle estatal capaz de
ordenar o interesse privado e a evolução econômica com os interesses e direitos ambientais e
sociais.
52
Em sua tese de doutorado Ribas (2003) faz uma análise das diretrizes e dos instrumentos pertinentes ao
Estatuto da Cidade.
48
O zoneamento é considerado, de forma geral, como um instrumento de planejamento
urbano (por excelência) e teve suas primeiras propostas disseminadas na Europa, e em
especial nos Estados Unidos onde se apontou, historicamente, como sendo o “carro-chefe”53
do movimento de planejamento naquele país.
Em países de ocupação densa e antiga, tais como a Holanda ou o Japão, que possui
cerca de 300 habitantes por Km², o zoneamento é um instrumento de planejamento do uso do
solo indispensável e amplamente utilizado. No Brasil, com um território de grande extensão e
de baixa densidade - cerca de 15 hab/Km² -, apenas recentemente é visto como necessário fora
das áreas urbanas e metropolitanas adensadas (RIBEIRO, 1998, p. 328).
53
A expressão original workhorse é ainda mais forte (SOUZA, 2002, p.250).
54
As zonas costumam expressar as potencialidades, vocações, fragilidades e suscetibilidades, expondo os
conflitos existentes no território. Para cada zona é atribuído um conjunto de normas específicas, dirigidas para o
desenvolvimento de atividades e para a conservação do meio. Isso significa que o zoneamento deve definir as
atividades que podem ser desenvolvidas em cada compartimento e, assim, orientar a forma de uso, eliminando
conflitos entre tipos incompatíveis de atividades (SANTOS, 2004, p. 133).
49
Tipos de zoneamento
Urbano Geoambiental55
Industrial Ecológico56
Ruído57 Agrícola58
Agroecológico61 Climático
Ambiental
Quadro 1 – Alguns tipos de zoneamento existentes no Brasil. Fonte: SILVA, J. S. V.; SANTOS, R. F.
Zoneamento para Planejamento Ambiental: vantagens e restrições de métodos e técnicas. Cadernos de Ciência &
Tecnologia, Brasília, v.21, n.2, p. 221-263, maio/ago. 2004.
55
Zoneamento geoambiental baseia-se na teoria de sistemas (BRASIL, 1984 apud SILVA; SANTOS, 2004).
56
Zoneamento ecológico trabalha com o conceito de unidades homogêneas da paisagem (PIVELLO et al., 1998;
BECERRA, 1999 apud SILVA; SANTOS, 2004).
57
Zoneamento de ruído baseiam-se em relação aos prováveis danos a saúde (SILVA; SANTOS, 2004).
58
Zoneamento agrícola define zonas a partir da determinação das limitações das culturas, exigências
bioclimáticas e riscos de perdas de produção agrícola (ROSSETI, 2001 apud SILVA; SANTOS, 2004).
59
Estatuto da terra sob a perspectiva socioeconômica e das características da estrutura agrária(SILVA;
SANTOS, 2004).
60
Zoneamento agropedoclimático faz a abordagem integrada entre as variáveis climáticas, pedológicas e de
manutenção da biodiversidade (CHAGAS et al., 2001 apud SILVA; SANTOS, 2004).
61
Zoneamento agroecológico interessa-se pela aptidão agrícola e pela limitação ambiental para ordenamento dos
meios rural e florestal (SÁNCHEZ, 1991 apud SILVA; SANTOS, 2004)
62
Zoneamento voltado às locações de empreendimentos define zonas de acordo com a viabilidade técnica, a
econômica e a ambiental de obras civis (GRIFFITH, 1989; SOUZA, 1990; RANIERI, 2000 apud SILVA;
SANTOS, 2004).
50
problemática central enfocada, sendo cada um importante para seus devidos fins. No decorrer
deste capítulo as diferenças serão explicitadas.
A Lei 10.257/2001, estabelece que a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante 16
diretrizes gerais. Estas diretrizes como normas gerais de direito urbanístico, em especial para
os Municípios, se propõem a balizar e induzir a aplicação dos instrumentos (inovadores ou já
existentes) desta política regulamentados na lei. A primeira garante o direito a cidades
sustentáveis:
63
A lei destaca o interesse de regular o uso da propriedade urbana, não explicitando de modo direto a regulação
sobre os espaços comuns – o espaço público (RIBAS; BEZERRA, 2003, p. 21).
51
Pertencente à categoria dos direitos difusos, como o direito ao meio-ambiente, o direito
a cidades sustentáveis preconiza a meta fundamental do Estatuto para o desenvolvimento
urbano: “tornar as cidades brasileiras mais justas, humanas, democráticas e sustentáveis”.
Porém, uma análise mais acurada das diretrizes leva a crer que a noção de sustentabilidade
possui um foco limitador do conceito que acaba por torná-lo sinônimo de saneamento
ambiental.
Na diretriz IV, a prática do planejamento urbano mais do que estabelecer modelos ideais
de funcionamento das cidades, deve contemplar os conflitos e possuir uma função de correção
dos desequilíbrios de todas as ordens que são causados pela urbanização.
Segundo análises procedidas por Ribas64, o Estatuto “abre espaço para uma
compreensão de que o crescimento e desenvolvimento urbano como um processo pressiona o
equilíbrio social e ambiental. A idéia de crescimento urbano em conflito com o meio ambiente
é assumida” (RIBAS, 2003, p. 101-102).
64
Ribas (2003), em sua tese de doutorado, analisa as 16 diretrizes gerais do Estatuto da Cidade apontando com
que dispositivos conta o objetivo de construção de cidades sustentáveis para ser viabilizado na prática da gestão
urbana brasileira.
52
d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar
como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura
correspondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização
ou não utilização;
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental.
Por fim, na diretriz XII, o Estatuto reconhece a proteção ao patrimônio público, o meio
ambiente natural, como parte do direito às cidades sustentáveis a ser garantido pelos
instrumentos urbanísticos.
O Estatuto foi concebido sobre três linhas principais inovadoras: (i) instrumentos de
natureza urbanística, voltados a induzir formas de uso e ocupação do solo65; (ii) instrumentos
que ampliam as possibilidades de regularização fundiária de posses urbanas proporcionando o
direito de propriedade e a função social da propriedade, na tentativa de promover justiça
social66; e, (iii) instrumentos que permitem a participação da população nos processos de
decisão e implementação de políticas públicas67.
65
No primeiro conjunto, a interação entre regulação urbana e a lógica de formação de preços no mercado
imobiliário é enfrentada por meio de dispositivos que procuram coibir a retenção especulativa de terrenos e de
instrumentos que consagram a separação entre o direito de propriedade e potencial construtivo dos terrenos
atribuído pela legislação urbana.
66
O segundo conjunto de instrumentos trata da regularização fundiária de áreas ocupadas e não tituladas da
cidade.
67
No terceiro, são instrumentos como: audiências públicas, plebiscitos, referendos, estudos de impacto de
vizinhança, além da obrigatoriedade de implementação de orçamentos participativos; são assim, mencionados
como instrumentos que os municípios devem utilizar para ouvir, diretamente, os cidadãos em momentos de
tomada de decisão sobre sua intervenção no território.
53
Art. 4º Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos:
I – planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de
desenvolvimento econômico e social;
II – planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e
microrregiões;
III – planejamento municipal, em especial:
a) plano diretor;
b) disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo;
c) zoneamento ambiental;
d) plano plurianual;
e) diretrizes orçamentárias e orçamento anual;
f) gestão orçamentária participativa;
g) planos, programas e projetos setoriais;
h) planos de desenvolvimento econômico e social;
IV - institutos tributários e financeiros:
a) imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU;
b) contribuição de melhoria;
c) incentivos e benefícios fiscais e financeiros;
V - institutos jurídicos e políticos:
a) desapropriação;
b) servidão administrativa;
c) limitações administrativas;
d) tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano;
e) instituição de unidades de conservação;
f) instituição de Zonas Especiais de Interesse Social;
g) Concessão de Direito Real de Uso;
h) concessão de uso especial para fins de moradia;
i) parcelamento, edificação ou utilização compulsório;
j) usucapião especial de imóvel urbano;
l) direito de superfície;
m) direito de preempção;
n) outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso;
o) transferência do direito de construir;
p) operações urbanas consorciadas;
q) regularização fundiária;
r) assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais
menos favorecidos;
s) referendo popular e plebiscito;
VI - estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e estudo prévio de impacto
de vizinhança (EIV). (grifo nosso).
54
Um fator importante inserido na lei é a obrigatoriedade de englobar todo o território do
município, uma perspectiva do desenvolvimento integrado. Ao ser obrigatório a inclusão de
todo o território municipal, o Estatuto da Cidade faz uma avanço quanto ao gerenciamento da
área rural, porém sem a previsão de instrumentos adequados à esta gestão.
68
Segundo Moreira (apud MAGLIO, 2005), o conceito de ambiente urbano pode ser entendido como “a relação
dos homens com o espaço construído e a natureza nas aglomerações de população e de atividades humanas”; ou
conforme Mota (2003) “formado por dois sistemas intimamente inter-relacionados: o “sistema natural”,
composto do meio físico e biológico (solo, vegetação, animais, água, etc.) e o “sistema antrópico”, consistindo
do homem e de suas atividades”.
55
3.2.1 Considerações acerca do Plano Diretor
Segundo Silva (1997, p. 87), a concepção do plano diretor evoluiu, passando por quatro
etapas, sendo estas:
Portanto, uma nova fase de estímulo aos planos diretores municipais se origina pela
Constituição de 1988. Estimulada pelo processo de abertura democrática do país a partir do
56
final dos anos 80, esta nova fase resultou da mobilização de movimentos populares que
lutavam pela regularização fundiária e pelo direito a moradia e da mobilização de urbanistas
engajados com a necessidade de promover a reforma urbana. Consolidava-se no Brasil o
movimento pela reforma urbana, que aglutinou, em escala nacional, os vários movimentos e
propostas populares em torno dos chamados problemas urbanos. (MARICATO, 1994 apud
MAGLIO, 2004).
Como figura central do Estatuto da Cidade, o Plano Diretor é obrigatório para cidades
com mais vinte mil habitantes69, e passa a ser exigido também para cidades: (i) integrantes de
regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, independentemente do tamanho populacional;
(ii) integrantes de áreas de especial interesse turístico; (iii) inseridas na área de influência de
empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou
nacional; e (iv) para casos onde o poder público municipal pretenda utilizar os instrumentos
previstos no § 4º do art. 183 da Constituição Federal, ou seja, aqueles voltados para combater
a especulação imobiliária.
No que se refere ao processo de elaboração, o Estatuto determina que este deva ser
revisto pelo menos a cada dez anos, e a participação da sociedade na elaboração e
implementação do Plano Diretor deverá ser garantida através de audiências públicas, debates,
publicidade e acesso aos documentos produzidos.
De acordo com Bottini (2005, p. 26), como instrumento precípuo para o ordenamento e
gestão das cidades, através do Plano Diretor que são estabelecidas regras para o município,
seja no âmbito urbano - definindo a política de desenvolvimento e expansão urbana -, seja no
âmbito rural. Conforme argumenta Araújo “o fato de o plano englobar o território do
Município como um todo, e não apenas as áreas urbanas, conferem a esse instrumento uma
função ampla de ordenamento territorial e, por conseqüência, poderes e deveres para a esfera
local de governo no que se referem à gestão do meio ambiente natural" (2003, p.10 apud
BOTTINI, 2005, p. 26).
57
Fig. 3.1 – Mapa da Política Ambiental do município de Londrina.
Fonte: www.londrina.pr.gov.br/ippul. Acesso em: 20 jan. 2007.
Porém, uma abordagem dos planos diretores que oriente a atuação do poder público
levando em consideração a capacidade de suporte dos condicionantes ambientais ainda é
praticamente inexistente. Este deveria visar o aprimoramento das relações entre os cidadãos e
a natureza, ter objetivos e metas claras e bem consolidadas por meio das diretrizes e ações
propostas preocupadas com os seres humanos e a conservação dos recursos naturais.
O que vem ocorrendo na prática em algumas cidades brasileiras é que o Plano Diretor
ainda se apresenta como um documento para atender a uma exigência legal; em outras, trata-
58
se de um documento estático, não integrado aos outros segmentos da administração
municipal, elaborado sem a participação da sociedade, não avaliado periodicamente. O
processo ainda esta longe do ideal e como agravante dessa situação são muitos os problemas
ambientais existentes nas cidades brasileiras, os quais tendem a se intensificar devido ao
processo de crescimento urbano.
59
Historicamente, o zoneamento em uma cidade se dá nas primeiras décadas do século
XX, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. O primeiro código a instituir um
zoneamento abrangente nos EUA (país ao qual se disseminou esta prática), a legislação de
zoneamento de Nova Iorque em 1916, estava dentro dos princípios que dominaram o
instrumento no século XX – a exclusão de certos usos70.
Conforme Souza (2002, p. 255), a idéia que os diferentes usos da terra, sobretudo as
diversas funções básicas do viver urbano – produzir, circular, morar e recrear -, deveriam ser
objeto de uma separação rígida, encontra o seu ponto culminante com a quarta edição do
“Congresso Internacional de Arquitetura Moderna” (CIAM IV), em 1933, do qual derivou a
“Carta de Atenas”, legando o “zoneamento funcionalista”71 – o Urbanismo modernista
perseguiu a separação funcional de forma obsessiva. A divisão entre os usos é rígida, no
máximo havendo alguma pequena concessão sob a forma de uma permissão de “uso misto”
(comercial e residencial, principalmente) para certas áreas.
I - O Macrozoneamento municipal
70
Segundo Cullingworth (apud SOUZA, 2002, p. 252), este zoneamento disseminado nos EUA, excluía certos
usos e, não raro, também certos grupos sociais. Mais marcado que a Europa por desigualdades sociais, em larga
medida associadas à problemática da discriminação étnica, os EUA viram prosperar a utilização do zoneamento
como um meio de exclusão social de maneira particularmente intensa. Um exemplo trata-se do caso de Modesto,
uma cidadezinha situada a 150 quilômetros de São Francisco, que em fins do século XIX decidiu, a pretexto de
minimizar os riscos de incêndio, restringir a localização de lavanderias, a certa parte da cidade. Uma vez que os
imigrantes chineses de Modesto haviam se especializado no negócio de lavanderia, segregar espacialmente estas
últimas significava, automaticamente e essencialmente, segregar também os primeiros (SOUZA, 2002, p. 253).
71
O preceito da separação funcional foi entusiasticamente abraçado pelo Urbanismo modernista em geral,
especialmente dominado pela figura gigantesca e polêmica de Le Corbusier.
60
indústrias, comércio e serviços, equipamentos públicos). Dessa maneira, circunscreve-se o
perímetro urbano, ou seja, a área em cujo interior valem as regras da política urbana.
Carvalho e Braga (2001, p. 100) colocam que, um parâmetro básico a ser observado
para delimitação da zona de expansão urbana, em que pese os critérios ambientais, é a Lei
Federal 6766/79, modificada pela Lei 9.785/99, que proíbe o parcelamento do solo para fins
urbanos nos seguintes casos: (i) em terrenos alagadiços e sujeitos a inundação; (ii) em
terrenos que tenham sido aterrados com materiais nocivos à saúde; (iii) em terrenos com
declividade superior a 30%; (iv) em terrenos com condições geológicas impróprias; e, (v) em
áreas de preservação ecológica.
Este certamente foi um avanço na legislação brasileira no final dos anos 70, mas tem-se
mostrado insuficiente para abordar a todos os aspectos concernentes a preservação ambiental.
61
Fig. 3.2 – Mapa da Área Urbana – Macrozonas e Perímetro de Campo Grande.
Fonte: www.campogrande.ms.gov.br. Acesso em: 20 jan. 2007.
62
Fig. 3.3 – Mapa do Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo do município de Londrina.
Fonte: www.londrina.pr.gov.br/ippul/plano_diretor/imagens. Acesso em: 20 jan. 2007.
63
agregados, sociais e ambientais). O zoneamento torna-se assim um instrumento ambíguo, ora
defendendo o interesse da coletividade, ora defendendo interesses da propriedade privada
(SILVA, 1997, p. 217).
O zoneamento de uso e ocupação do solo urbano não tem como lidar com as
especificidades ambientais, pois não faz parte de sua gênese – prima pela ordenação da
propriedade privada -, se ele o fizer se sobrecarregara ao tentar lidar com a tarefa de
operacionalizar um manejo ambiental adequado, e ainda incorre a possibilidade da submissão
dos interesses coletivos aos privados. Isso quer dizer, por conseguinte, que um tipo de
zoneamento comprometido com a dimensão ambiental, consequentemente com a proteção dos
bens coletivos, poderá ser muito útil como subsídio ao planejamento urbano, contribuindo
para a implementação da gestão ambiental urbana.
• (i) o primeiro era que a sociedade brasileira começava a pesar os resultados dos
impactos ambientais resultantes das obras de grande porte, realizadas na década
64
anterior (grandes hidrelétricas, rodovias, poluição industrial, derrames de
mineração, intoxicação por agrotóxicos etc.);
• (iii) o terceiro, e talvez de ação mais contundente, era pressão exercida pelos
órgãos financiadores internacionais que começavam a exigir dos países em
desenvolvimento a consideração da variável ambiental na solicitação de recursos
para seus programas e projetos de desenvolvimento72.
Os instrumentos apresentados pela PNMA, que devem ser utilizados pelo Poder Público
e pela sociedade para a realização prática desta política são:
72
Cabe lembrar que, naquele tempo, os bancos internacionais estavam, por sua vez, sendo pressionados pela
comunidade cientifica mundial e por entidades ambientalistas, fortalecidas pela repercussão dos eventos do
Clube de Roma e Conferência de Estocolmo.
65
IX - as penalidades disciplinares ou compensatórias não cumprimento das
medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental.
Posterior a lei 6.938/81, foram apresentados, através de leis73, decretos e normas, outros
instrumentos em complemento ao Art. 9º, ao qual salientamos o Decreto nº. 4.297/200274 que
estabelece critérios para o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil.
• Zoneamento Ecológico-Econômico;
• Zoneamento Ambiental.
73
P. ex. incisos acrescentados ao art. 9º pela Lei nº. 7.804 de 18/07/89: X – a instituição do Relatório de
Qualidade do Meio Ambiente, a ser divulgado anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA; XI – a garantia da prestação de informações relativas ao Meio
Ambiente, obrigando-se o Poder Público a produzi-las, quando inexistentes; XII – o Cadastro Técnico Federal de
atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadoras dos recursos ambientais.
74
Regulamenta o art. 9º, inciso II, da Lei 6.938/1981.
66
Criou-se assim, a categoria de manejo Área de Proteção Ambiental (APA), que foi
considerada um desafio para seu tempo e contexto. Esta teve por base de inspiração o Parque
Natural, um tipo de área protegida compatível com a propriedade privada já existente em
Portugal, Espanha, França e Alemanha (loco citato).
Inserida no grupo de Uso Sustentável75, a APA tem por objetivo proteger valores
ambientais significativos, assegurando o bem estar das populações humanas e melhorar as
condições ecológicas locais.
“[...] uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana,
dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente
importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas,
e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o
processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos
naturais”.
Esta unidade de conservação pode ser criada em níveis federal, estadual ou municipal;
não impede o desenvolvimento econômico da região que é abrangida pela APA, mas
disciplina o uso racional dos recursos naturais.
No Brasil, Cabral (2005, p. 47) aponta que a categoria Área de Proteção Ambiental é
singular, não existindo no mundo qualquer tipo ou categoria que se iguale aos objetivos de
sua criação. Levando-se em consideração que esta é uma unidade de uso sustentável
(conservação), pode ser instituída em terras públicas ou privadas (geralmente há coexistência
de ambas), criada pelo poder público (considerada a comunidade local, ou seja, com
participação da sociedade civil), manejada pelos proprietários desde que obedeçam a medidas
restritivas impostas pelo poder público, no sentido de garantir a conservação dos atributos que
75
Dentro do conjunto brasileiro de áreas protegidas, as Unidades de Conservação (UCs), existem diferentes
categorias, uma delas a de “Uso Sustentável”. Esta visa a exploração do ambiente de maneira a garantir a
perenidade dos recursos ambientais renováveis e dos processos ecológicos, mantendo a biodiversidade e os
demais atributos ecológicos de forma socialmente justa e economicamente viável (CABRAL, 2005, p. 13).
67
motivam sua criação e, ainda, gerenciada por meio de Conselho Gestor76 que pode (e deve)
funcionar como um fórum de debates nos quais os conflitos sejam equacionados.
A gestão das APAs é de certo modo complexa por se constituírem tanto por terras
públicas quanto por privadas, sendo que as privadas devem se submeter às restrições legais e
às do Plano de Manejo77, ressalvados os limites constitucionais (ANDRADE, 2005, p.104).
Por sua vez, o ZEE é também referido como instrumento obrigatório para as APAs. O
CONAMA, por sua Resolução nº. 10 de 14 de dezembro de 1988, dispõe sobre as APAs e
declara que “visando atender aos seus objetivos, as APAs terão sempre um zoneamento
ecológico-econômico”.
76
A APA será administrada por um Conselho Gestor composto pelos órgãos ambientais competentes (IBAMA
ou SEMARH), outros órgãos e instituições oficiais de pesquisa responsáveis ou com projetos nas áreas, por
membros representantes da comunidade que viva na APA, e por representantes de organizações da sociedade
civil com objeto estatutário e experiência na gestão ou pesquisas ambientais (ANDRADE, 2005, p.104). O
Conselho estabelece normas específicas regulamentando o uso dos recursos naturais e a ocupação das Unidades
de Conservação.
77
Os planos de manejo para Unidades de Conservação são instrumentos voltados à preservação e conservação
dos recursos naturais, bem como, ao uso desses recursos para pesquisa científica e para visitação pública na
forma de ecoturismo e educação ambiental, dentro de espaços pré-estabelecidos por um documento legal.
Procura-se assegurar a manutenção do potencial dos elementos naturais em detrimento de demandas, a
conservação em detrimento do uso ou manejo abusivo e a participação da comunidade, além de garantir
obediência a padrões legais ambientais (SANTOS, 2004, p. 38). É entendido como um documento técnico
mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de cada UC, se estabeleça um zoneamento e as normas
que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais.
78
Esta Lei dispõe sobre a criação de Estações Ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental.
79
O Plano de Gestão é o instrumento através do qual se apresentam as diretrizes e atividades básicas para
consolidação da APA.
68
A metodologia de elaboração do Plano de Gestão parte da identificação, análise e
priorização dos problemas socioambientais e oportunidades específicas da APA. O
ordenamento territorial e as normas ambientais são as partes desse Plano que constituirão as
diretrizes espaciais de ocupação e uso do solo e da utilização dos recursos naturais (MMA,
1999, p. 39).
1. Quadro socioambiental/Diagnóstico80;
3. Zoneamento Ambiental;
4. Programas de Ação82;
5. Sistema de Gestão83;
80
O Quadro socioambiental contém o aporte de dados, análises e interpretações da dinâmica socioambiental.
Abrange análises do meio biótico, abiótico, socioeconômico e dos aspectos políticos e institucionais, no âmbito
do território interno e macro-regional da APA (MMA, 1999).
81
A Matriz Lógica de Planejamento é uma forma de estruturar e apresentar os principais elementos do Plano
(ibidem).
82
Os Programas de Ação organizam o conjunto de atividades a realizar para alcançar os objetivos específicos da
APA, dentro das estratégias estabelecidas (ibidem).
83
O Sistema de Gestão constitui o componente gerencial da APA. Apresenta a composição do Comitê Gestor,
instância de direção colegiada e dos instrumentos legais que o estabelecem (ibidem).
84
A Monitoria e a Avaliação são instrumentos básicos para o gerenciamento da implementação do Plano de
Gestão (ibidem).
69
Verifica-se que três instrumentos de disciplinamento do uso dos recursos naturais nas
APAs são defendidos, ou pela legislação ou pelos documentos legais que procuram disciplinar
o tema: (i) o Plano de gestão; (ii) o ZA; e (iii) o ZEE. Esse é o exemplo da condição de
omissão da legislação no trato do tema zoneamento que incentivou a iniciar nosso trabalho.
85
No desenrolar dos fatos e no âmbito das reformas do Estado, se extinguiu a SAE/PR, passando a coordenação
e a responsabilidade pela execução do ZEE para o Ministério do Meio Ambiente – MMA, em especial através da
Secretaria de Desenvolvimento Sustentável –SDS que assume a coordenação do Programa ZEEBRASIL
(ARAÚJO NETO, 200?).
70
6.938/1981, estabeleceu-se critérios para o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil
através do Decreto nº. 4.297 de 10 de julho de 2002.
O ZEE tem como prerrogativa contribuir para que o sistema de planejamento oriente os
esforços de investimentos do governo e da sociedade civil segundo as peculiaridades das áreas
definidas como zonas e tratadas como unidades de planejamento.
A busca pôr uma ação harmoniosa entre as diretrizes emanadas da área econômica e da
área ambiental, freqüentemente conflituosa, diz respeito ao ZEE. Este último parte de um
diagnóstico que conduz a elaboração de produtos sínteses, englobando aspectos físicos,
bióticos, socioeconômicos e jurídico-institucionais, permitindo a construção de cenários e a
posterior indicação das diferentes zonas em um território. O resultado é a elaboração de
normas de uso e ocupação do território e de manejo dos recursos naturais sob uma perspectiva
conservacionista e de desenvolvimento econômico e social.
• (ii) política - propicia interação entre governo e sociedade civil para estabelecer
áreas prioritárias no planejamento;
71
Entende-se que o ZEE seja aplicável a qualquer escala geográfica e na prática é usado
para grandes áreas sob qualquer intensidade de uso, tais como bacias hidrográficas ou regiões
geopolíticas. Conforme Ab’Saber (1989), estabelecer as bases de um zoneamento ecológico-
econômico em uma determinada conjuntura geográfica equivale a realizar um estudo para
determinar a vocação de todos os subespaços que compõem um certo território, e efetuar o
levantamento de suas potencialidades econômicas, sob um critério basicamente
“ecodesenvolvimentista”.
A partir da segunda metade dos anos 80, o debate sobre o planejamento territorial na
Amazônia passou a incorporar elementos do discurso ambiental, fazendo com que ganhasse
força a remissão a uma racionalidade ecológica, apresentada como necessária ao ordenamento
territorial da região (ACSELRAD, 2006). A urgência de uma política de ordenamento
territorial, dado o processo rápido de desmatamento e degradação da Floresta Amazônica,
justamente declarada “Patrimônio Nacional“ na Constituição de 1988, desencadeou o
processo de elaboração de um ZEE para os Estados da Amazônia Legal. (Fig. 3.4)
72
Fig. 3.4 – Localização do Acre na América do Sul e Brasil
Fonte: Arquivo ZEE/AC, 1999 apud www.seiam.ac.gov;index.php
Pelo Decreto nº. 503, de 06 de abril de 1999, foi instituído o Programa Estadual de
Zoneamento Ecológico-Econômico do Acre. Respalda-se a justificativa pela instituição deste
instrumento na realidade de que, a partir dos anos 70, a expansão da fronteira agropecuária e
madeireira no Acre foi acompanhada por uma série de problemas graves: conflitos sociais
sobre o acesso a terra e outros recursos naturais, exploração insustentável de recursos naturais,
altas taxas de desistência nos projetos de assentamento, crescimento desordenado de cidades
como Rio Branco, entre outros (ZEE, 2005).
O ZEE foi dividido em duas fases, a primeira (realizada durante o ano de 1999)
compreendeu a elaboração de diagnóstico abrangendo a extensão total do Estado do Acre com
73
a elaboração de produtos cartográficos; e, a segunda fase tem como objetivo geral construir o
mapa de gestão do Estado do Acre, em desenvolvimento (ibidem).
De um modo geral, os resultados gerais esperados para fase II são: (i) articulação, numa
base espacial, das políticas públicas relacionadas à gestão territorial, tendo como eixo
norteador os princípios de desenvolvimento sustentável; (ii) contribuições para a redução
substancial de conflitos sociais relacionados aos direitos de uso de recursos naturais numa
mesma área geográfica; e, (iii) disponibilização de um valioso instrumento de monitoramento
e controle do uso dos recursos naturais e do território.
• III - Prognóstico: com base nos resultados dos estudos de diagnóstico, foi
realizado prognóstico sobre cenários tendênciais para o desenvolvimento futuro
do Estado e/ou região especifica sob análise, tendo como enfoque as dinâmicas
de ocupação territorial e gestão dos recursos naturais;
74
Podemos constatar que, neste exemplo, devido à apropriação indiscriminada do
território e de seus recursos naturais, o objetivo esteve intimamente relacionado ao
ordenamento territorial das atividades sócio-econômicas em bases conservacionistas.
O zoneamento ambiental surgiu no Brasil a partir dos anos 1970, com um enfoque
normativo, restritivo, voltado para a proteção do meio ambiente contra impactos negativos do
crescimento econômico, onde se dividia o território em parcelas nas quais se autorizavam ou
não as atividades (MILLIKAN,1998).
Definido no âmbito da lei que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente as
práticas do ZA limitam-se ainda a poucas experiências em andamento no país. Os esforços
para promoção do zoneamento ambiental no país se deram por meio da regulamentação do
uso do solo em Áreas de Proteção Ambiental.
75
Usualmente empregado em Planos de Gestão de Áreas de Proteção Ambiental, o
ordenamento territorial e as normas ambientais que constituem o ZA são formulados a partir
do grau de conhecimento da biodiversidade da APA e da identificação e avaliação dos
problemas e conflitos, das oportunidades e potencialidades decorrentes das formas de
conservação da biodiversidade, uso e ocupação do solo e da utilização dos recursos naturais
da área (MMA, 1999, p.132).
SEQUÊNCIA
↓ ↓ ↓ ↓
Desenho 2 – Representação simplificada das fases para elaboração de um Zoneamento Ambiental. Fonte: Cabral
2005, p.27 (modificado).
76
• III - Identificação de alterações provocadas no meio ambiente pelos projetos de
grande porte, indicando ações que minimizem os efeitos do impacto ambiental
provocado pelos mesmos;
O zoneamento ambiental, apesar de não ter sido colocado na legislação dessa forma,
acabou se tornando quase que um instrumento de gestão de APAs e não à base do
planejamento territorial, seja urbano ou macro-regional, como é o caso do ZEE.
86
Os mapeamentos são representações, em superfície plana, das porções heterogêneas de um terreno,
identificadas e delimitadas. Um mapa permite observar as localizações, as extensões, os padrões de distribuição
e as relações entre os componentes distribuídos no espaço, além de representar generalizações e extrapolações.
Principalmente, deve favorecer a síntese, a objetividade, a clareza da informação e a sistematização dos
elementos a serem representados (SANTOS, 2004, p. 129).
77
3.4.1 APA do rio São Bartolomeu
A primeira APA a possuir seu zoneamento foi a APA do rio São Bartolomeu, no
Distrito Federal, em 1988. Esta APA foi criada pelo Decreto n° 88.940, de 07 de novembro de
1983, com objetivo principal de preservação do manancial para abastecimento futuro do
Distrito Federal. Hoje, abrangendo uma área de cerca 84.1 00ha, a APA da bacia do rio São
Bartolomeu é a maior do Distrito Federal e desempenha um importante papel de corredor de
ligação entre a Estação Ecológica de Águas Emendadas, APA de Cafuringa, APA do Lago
Paranoá e APA das bacias do Gama e Cabeça-de-Veado.
87
Hoje Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA.
88
De acordo com o documento técnico que fundamentou o zoneamento (SEMA,1988), a metodologia adotada de
unidades “sistemas de terra” estrutura-se em variáveis físico-bióticas e é capaz de permitir uma análise agregada
de diversos fatores ambientais. Possibilita uma visão ao mesmo tempo abrangente e compartimentada de uma
região, na medida em que identifica áreas (zonas) homogêneas em relação aos fatores analisados, definido assim
um zoneamento em relação a eles (BEZERRA, 1996, p. 153).
78
Fig. 3.5 Rezoneamento APA do rio São Bartolomeu, 1996.
Fonte: www.semarh.df.gov.br. Acesso em 22 jan. 2007.
79
Sistema de Descrição Limitações ou Potencialidades Recomendações
Terra
I Vale do Rio São Proibidas novas ocupações; Manejo da paisagem natural (nível de
Bartolomeu - Reestudar usos existentes e compatibilizá- artificialização 2);
altamente dissecado los com o Decreto 88940; Silvicultura ou recuperação (nível de
- Proibidas captações de água sem permissão do artificialização 3);
órgão ambiental da APA; - Criação de Reserva Ecológica e formação
de corredor ecológico a oeste do sistema;
II Vale do alto curso Proibidas novas ocupações urbanas; - Agricultura com fração mínima de 5 há
do São Bartolomeu - Reestudar usos existentes e compatibilizá- com 2 habitações/módulo (nível de
moderadamente los com o Decreto 88940; artificialização 4, 5 e 6);
dissecado Proibido suinocultura e avicultura;
Proibidas captações de água sem permissão
do órgão ambiental da APA;
- Proibido uso e erradicação de cerradão e matas
decidas;
Quadro 2 – Diretrizes gerais de uso do zoneamento da APA do rio São Bartolomeu. Fonte: Bezerra, 1996, p.
157 (modificado).
89
Análise feita por Bezerra (1996), em seu estudo de caso sobre a APA do rio São Bartolomeu, Capítulo 6.
80
As conseqüências práticas desta postura foram a inoperância do instrumento que não
encontrou condições socioeconômicas e políticas para sua implantação e a APA foi ocupada
de forma indiscriminada.
81
CAPÍTULO IV
O planejamento ambiental e os condicionantes ambientais da urbanização
82
“A Natureza pode ser considerada como um processo de interação, que
responde a leis, constituindo um sistema de valores, oferecendo intrínsecas
oportunidades e limitações aos usos humanos.” (Ian L. McHarg)
A inclusão dos aspectos ambientais na dimensão urbana vem sendo defendida a algum
tempo90. Neste sentido, os instrumentos do planejamento ambiental são importantes aliados ao
processo de urbanização, pois contemplam um raio de ação no sentido de ordenar o
crescimento regional considerando os aspectos ambientais, em seu sentido mais amplo,
minimizando as conseqüências adversas que costumam surgir ao longo do binômio
crescimento/desenvolvimento.
90
Sobretudo, a partir das conferências organizadas pela ONU (Capítulo I).
83
O conhecimento das características do meio ambiente91 é imprescindível, partindo da
premissa de que o planejamento ambiental decorre de uma abordagem que encara a sociedade
como um conjunto de subsistemas interligados e tendo por parâmetro a visão sistêmica do
meio e a estrutura sociopolítica existente.
Segundo Cabral (2005, p.60), sob visão sistêmica, os atributos ambientais devem ser
estabelecidos e seus papéis avaliados dentro dos ecossistemas92. Isso reforça o planejamento
do uso do solo e sua capacidade de relacionar o nexo causal (causa-efeito) por meio da
ligação entre planejamento e proteção ambiental.
Para Santos (2004, p. 97), uso e ocupação das terras é um tema básico para
planejamento ambiental, porque retrata as atividades humanas que podem significar pressão e
impacto sobre os elementos naturais. É uma ponte essencial para análise de fontes de poluição
e um elo importante de ligação entre as informações do meio biofísico e socioeconômico.
Desta forma, considera-se essencial que o instrumento ZA, para que se converta em
subsidio ao ordenamento territorial dentro do escopo do Estatuto da Cidade, esteja apurado no
conceito do planejamento ambiental.
As condições naturais de uma região como o clima, o relevo, tipos e formações de solos,
os recursos hídricos, a cobertura vegetal (entre outras), são características de um ambiente que
91
O meio ambiente é visto como o resultado das interações entre os sistemas socioeconômicos - culturais e os
sistemas ecológicos.
92
O conceito de ecossistema (sistema ecológico) foi introduzido na ciência por Arthur Tansley em 1935 e
ganhou, com retardos diferenciais, todos os países e grupos científicos do mundo. O famoso botânico inglês
definia o termo como sendo o “sistema ecológico de um lugar, envolvendo fatores abióticos e fatos bióticos do
local” (AB’SÁBER, 2003, p. 137-138). Ecossistema é um nível de organização que envolve populações e
comunidades com sues meios físicos e fluxos energéticos.
84
estão relacionadas com a ocupação urbana influindo no processo ou sendo modificadas por
ela.
O estado do meio natural costuma ser avaliado por temas relacionados aos aspectos
físicos (climatologia, geologia, geomorfologia, pedologia, hidrologia) e biológicos (vegetação
e fauna). As pressões exercidas são verificadas pela avaliação das atividades humanas sociais
e econômicas.
Os elementos que compõem o ambiente natural se relacionam entre si, influindo uns
sobre os outros, mas as atividades antrópicas provocam mudanças nessas características do
meio natural, causando, muitas vezes, alterações prejudiciais e irreversíveis ao ambiente e ao
próprio homem. Portanto, algumas características do meio podem ser usadas como elementos
que orientarão o planejamento de uma área urbana, contribuindo para sua proteção e
conservação, levando sempre em consideração as características antrópicas93.
93
Mota (2003, p. 48) coloca como “características do meio antrópico” aquelas relacionadas com os componentes
dos meios físico e biótico, que devem ser abordadas em conjunto: aspectos demográficos; usos do solo;
atividades e meios produtivos; níveis de educação, saneamento e saúde; infra-estrutura existente; comunicação e
transporte; habitação; aspectos culturais; áreas de valor histórico-cultural.
85
A seguir, são dissertadas as características do meio que influem ou são afetadas pelo
processo de urbanização, utilizando como referência a análise apresentada por Mota (2003)94.
Especialmente nas áreas urbanas, o meio físico é o componente ambiental que mesmo
alterado em suas características e processos originais persiste interagindo e condicionando
grande parte dos problemas do ambiente construído (PRANDINI et al., 1995 apud MOTA,
2003, p. 36). O clima, o substrato rochoso e o relevo são os temas de maior hierarquia para
caracterizar e ordenar as paisagens. O meio físico corresponde a: Climatologia,
Geomorfologia (relevo, topografia), Geologia (geotecnia), Solos, Hidrografia e Hidrogeologia
(superficiais e subterrâneas).
94
Suetônio Mota, Engenheiro Civil e Sanitarista, em seu livro “Urbanização e Meio Ambiente”, no Capítulo 3,
discorre sobre as características ambientais e a urbanização.
86
Fig. 4.1 O domo de poluição urbana. Fonte: Cavalheiro in Tauk, 1995, p. 117.
95
O Ciclo Hidrológico corresponde aos processos de: Precipitação, Infiltração, Escoamento Superficial (runoff),
Escoamento Subterrâneo, Evaporação e Evapotranspiração (MOTA, 2003 p. 41).
87
FATORES CLIMÁTICOS E SUA RELAÇÃO COM A URBANIZAÇÃO
Radiação Solar Dependo das características da região, a distribuição da cidade e os tipos de construção, devem ser equacionados mediante a
incidência do sol; p.ex.: em regiões onde a radiação solar é intensa, a incidência do sol deve ser diminuída.
Temperatura A elevação da temperatura, nas cidades, resulta na formação da “ilha de calor”, que corresponde a uma área na qual a temperatura
da superfície é mais elevada que as áreas circunvizinhas, o que propicia o surgimento de circulação local. O efeito deste fenômeno
sobre as cidades ocorre devido à redução da evaporação, ao aumento da rugosidade e às propriedades térmicas dos edifícios e dos
materiais pavimentados. Comparativamente, nos centros das áreas urbanas, em lugares pobres em vegetação, as temperaturas
alcançam valores máximos; por outro lado, os valores mínimos são registrados em áreas verdes e reservatórios de água.
Umidade Com o aumento da temperatura nas cidades, ocorre uma diminuição da umidade relativa. Em dias extremamente quentes, o
desconforto térmico, associado à umidade relativa baixa, provoca um “clima de deserto artificial” (LOMBARDO, 1985 apud
MOTA, 2003, p. 33).
Velocidade e A velocidade dos ventos também é modificada nas cidades, esta é menor em conseqüência de barreiras (edificações) que são
Direção dos ventos criadas à sua circulação.
Camadas atmosféricas Juntamente com a direção e a velocidade dos ventos, as camadas atmosféricas, com suas possíveis inversões, estão diretamente
relacionadas com a dispersão dos poluentes atmosféricos resultantes de atividades urbanas.
Precipitação Nas cidades observa-se maior precipitação pluvial do que nos campos, pois as atividades humanas nesse meio produzem maior
número de núcleos de condensação. Porém a umidade relativa é menor nas áreas urbanas do que nos campos.
Quadro 3 – 0s fatores climáticos que estão relacionas a urbanização. Elaborado a partir do Cap. 3, Mota, 2003.
88
CARACTERÍSTICAS GEOMORFOLÓGICAS, GEOLÓGICAS E DOS SOLOS E SUAS RELAÇÕES COM A URBANIZAÇÃO.
Geomorfologia A análise do relevo permite sintetizar a história das interações dinâmicas que ocorreram entre o substrato litólico, a tectônica e as
variações climáticas. O estudo da conformação atual do terreno permite deduzir a tipologia e intensidade dos processos erosivos e
deposicionais, a distribuição, textura e composição dos solos, bem como a capacidade potencial de uso. As formas de relevo de
uma determinada área têm grande influência no seu processo de ocupação, e são, geralmente, bastante alteradas pelo mesmo. (Fig.
4.2)
As características geológicas podem ser favoráveis ou apresentar limitações à ocupação urbana. O conhecimento das
Geologia características geotécnicas de uma área urbana é necessário para orientar o uso do solo da mesma. Assim, podem ser identificadas
áreas de riscos (sujeitas a deslizamentos), terrenos suscetíveis à erosão e locais com lençol freático elevado, onde a ocupação deve
ser feita com muito controle ou mesmo evitada. (Fig. 4.3)
As formações geológicas relacionam-se com as águas subterrâneas. O conhecimento dessas características, em áreas urbanas, é de
grande importância em função das necessidades de abastecimento de água.
Como as mudanças geológicas ocorrem em uma grande escala temporal, os dados geológicos são mais estáveis, ou seja, seus
processos dinâmicos são mais contínuos no tempo e espaço, sendo uma informação confiável como unidade espacial. Por outro
lado, a transformação do dado geológico em informação ou indicador não é tão simples assim. É necessário um ótimo geólogo que
consiga traduzir ou transcodificar o dado acadêmico para uma linguagem que permita entender o substrato geológico quanto à sua
dinâmica fisico-química, relações com outros elementos do meio, potencialidades e limitações no espaço superficial e no subsolo.
Solos Os solos são produtos da interação rocha/relevo/clima e, portanto, sintetizam as principais características destes elementos. Assim,
conhecendo-se o solo pode-se inferir sobre: o material de origem (rocha-mãe), a forma de relevo, a declividade, o sistema de
drenagem, o comportamento hídrico e a suscetibilidade aos processos do meio físico (erosão, escorregamento, assoreamento,
contaminação, colapsos e subsidências, recalques, etc.) (KERTZMAN; DINIZ, 1995 apud MOTA, 2003, p. 38-39).
Uma vez que o solo é o suporte dos ecossistemas e das atividades humanas sobre a terra, seu estudo é imprescindível para o
planejamento e fundamental para diversas atividades do meio urbano. Quando se analisa o solo, pode-se deduzir sua
potencialidade e fragilidade como elemento natural, como recurso produtivo, como substrato de atividades construtivas ou como
concentrador de impactos. (Fig. 4.4)
Quadro 4 – Características geomorfológicas, geológicas e dos solos relacionadas à urbanização. Elaborado a partir do Cap. 3, Mota, 2003.
89
Fig. 4.2-Ilustração de mapa de tipos de relevo idealizado para o plano de manejo do Parque
Nacional Serra da Bocaina. Fonte: MMA, 2001 apud Santos, 2004, p. 79 (modificado).
Fig. 4.3-Trecho de mapa geológico, região de Angra Fig. 4.4 Trecho de mapa de tipos de solo, região
dos Reis. Fonte: MMA, 2001 apud Santos, 2004. p.75 Centro-Oeste. Fonte: Lepsch, 2002 apud Santos
(modificado). 2004, p.82.
90
Fig. 4.5 – Conseqüências da urbanização sobre o Ciclo Hidrológico. Fonte: Mota, 2003, p.42.
Pelo seu inerente potencial como indicador, a vegetação é um tema muito valorizado
pelos planejadores. É um elemento do meio natural muito sensível às condições e tendências
da paisagem, reagindo distinta e rapidamente às variações. Seu estado permite conhecer, por
um lado, as condições naturais do território e, por outro, as influências antrópicas recebidas,
podendo-se inferir, globalmente, a qualidade do meio. (Fig. 4.6)
91
Fig. 4.6 – Ilustração de mapa de vegetação, região de Paraty. Fonte: MMA, 2001 apud Santos, 2004, p.90.
Quadro 5 – A cobertura vegetal e seu reflexo nos aspectos urbanos. Elaborado a partir do Cap. 3, Mota, 2003.
92
A Fauna, em planejamento ambiental, tem basicamente a função de indicar a qualidade
ambiental do meio, escolher e definir áreas a serem protegidas e especificar manejo. (Fig. 4.7)
93
4.2 BASES HISTÓRICAS E CONCEITUAIS DO PLANEJAMENTO AMBIENTAL
96
Olmsted (1822-1903) é considerado o criador da Arquitetura da Paisagem (Landscape Architecture), bem
como o fundador da “American Society of Landscape Architecture” – ASLA (SILVA, 2005, p. 55).
97
Segundo McHarg (2000, p. 12), durante os primeiros anos da década de 60, eram poucos os defensores do
meio ambiente, assim como o público interessado neste tema. Este autor relata que o movimento de defesa não
surgiu nem das instituições estatais, tão pouco da sociedade científica, mas foram os “hippies” que se
comprometeram com a ecologia até o ponto de entender a sua defesa como um compromisso moral.
98
Destaca-se por trabalhos ambientais de participação comunitária (FRANCO, 1997).
99
Ian MacHarg, um arquiteto da paisagem, foi professor do Departamento de Arquitetura da Paisagem da
Universidade de Pensilvânia entre 1954 a 1987. É autor do conceituado livro “Design with Nature”, redefiniu o
campo do paisagismo, do desenho ecológico e do planejamento urbano e regional, e exerce uma influência
permanente nos debates sobre o lugar que ocupa a humanidade e a natureza, e vice-versa, dentro do marco das
ciências físicas e humanas. (MACHARG, 2000).
100
WMRT: Wallace, McHarg, Robert e Todd.
101
Em 1969 foi aprovado o “National Environmental Policy Act” – NEPA, pelo Congresso dos Estados Unidos,
que estabeleceu os ditames da política ambiental americana.
102
O trabalho de McHarg foi influenciado pelas idéias e obras de filósofos, planejadores, cientistas,
especialmente pelos pioneiros da ciência da Ecologia e do conservacionismo ambiental, tais como: Lewis
Munford, Henry D. Thoreau, George P. Marsh, Patrick Guedes, Raquel Carson, Eugene Odum, Tom Odum, Paul
Sears, Stanley Can, Pierre Dauserau, Paul Ehrlich, Edward Dewey, Frank Fraser, Aldo Leopold, Roderick
McKencie, Benton MacKaye, Carl Sauer, entre outros (SILVA, 2005, p. 73).
103
Intitulação de McHarg (PALMER, 2006, p. 230).
94
seu ambiente natural, procurando soluções para os problemas de desenvolvimento urbano (em
especial nos EUA), elaborando uma nova metodologia de planejamento e projeto em bases
ecológicas. Nos trabalhos desenvolvidos por McHarg identificamos potencial aparato
conceitual e prático (dadas às devidas correções, proporções e aparato metodológico atual)
que podem auxiliar no processo de caracterização do ZA enquanto instrumento de apoio ao
Plano Diretor.
A visão ecológica do mundo, defendida por ele, integra os sistemas humanos e naturais.
Conforme McHarg afirma, “[...] nós vivemos em um mundo físico, um mundo biológico e um
mundo social, devendo nossas ações sempre considerar todos elas” (MOTA, 2003, p. 24). A
terra e seu conjunto se apresentam como um ecossistema dinâmico, onde se integram os
processos e os fatores biofísicos com os humanos de forma a fundamentar as decisões de
planejamento e projeto.
Este singular planejador ficou conhecido por seus planos ambientais de nível regional,
baseados de forma precursora no conceito de desenvolvimento sustentável e na minimização
de impactos sobre os recursos naturais e culturais. Como um dos pioneiros do movimento
ambiental, ele modificou a teoria e as práticas de planejamento urbano e influenciou campos
como a arquitetura, estudos de meio ambiente, ecologia, engenharia florestal e geografia. Nos
anos sessenta e setenta, suas idéias sobre planejamento ambiental foram aplicadas a trabalhos
em grandes cidades e áreas metropolitanas (ibidem).
95
4.2.1 A metodologia de Planejamento Ecológico de McHarg
El método define las mejores áreas para um uso del suelo potencial y la
convergencia de todos o casi todos los factores considerados propicios para
esse uso en ausencia de otras condiciones negativas. Las áreas que reúnen
este estándar se estiman intrínsecamente idóneas para el uso del suelo
considerado (MCHARG, 2000, p. 10).
96
para, em continuação, decidir até que ponto facilitam ou impossibilitam determinadas
utilizações do solo.
Em relação ao método de análise integrada de recursos, que tem por base operacional a
sobreposição de informações, McHarg (1992 apud CABRAL, 2005, p.60) afirma que, talvez,
uma das mais valiosas inovações seja a concepção de complementaridade de usos do solo e a
procura por áreas que suportem mais de um uso. O reconhecimento de que determinadas áreas
são favoráveis a muitos tipos de usos pode ser tanto um conflito quanto uma oportunidade
para combinar usos de forma que reflitam os anseios da comunidade.
104
Referência desta dissertação, McHarg, 2000.
105
Publicada na Via 1, da Pennsylvania University (PALMER, 2006, p. 232-3).
97
MÉTODO DE PLANEJAMENTO ECOLÓGICO
1. Inventário Uma análise por tipo ambiental de todos os sistemas naturais e condições físicas de uma região e sub-região (a análise
ecológico invariavelmente incluía clima, fisiografia, geologias, solos, hidrogeologia, associação de animais e plantas, usos da terra existentes
e desenvolvimentos culturais; era predominantemente realizada por mapeamento, onde se fazia superposições na mesma escala106,
o que facilitava as interpretações comparativas)
2. Descrição de Uma análise de todos os processos físicos e biológicos dirigidos para a definição das interações de uma ciência natural com as
processos naturais outras e também de todos os sistemas naturais com as necessidades e os desenvolvimentos humanos.
3. Inventário Uma análise da adaptação humana ao sistema ambiental, enfatizando o ajuste entre desenvolvimento e mudanças tecnológicas ao
histórico longo do tempo.
4. Expressão da Uma análise conclusiva que delineia a identidade natural da região e suas sub-partes.
forma “dada”
5. Expressão da Uma análise conclusiva que delineia a resposta do homem nos seus estabelecimentos à forma “dada”107.
forma “feita”
106
A metodologia de superposições comparativas influenciou a linguagem e metodologias computacionais desenvolvidas como parte de todos os atuais programas de GIS
(Sistemas de Informações Geográficas) (PALMER, 2006, p. 233).
107
Geralmente McHarg dava a essa análise o nome de Genus Loci, expressão do grego que significa a relação adequada e competente entre a civilização e seu local
(PALMER, 2006, p. 233).
98
MÉTODO DE PLANEJAMENTO ECOLÓGICO
6. Atribuição de Uma análise matemática ou matricial comparativa que determina o grau relativo de adequação ou conflito de um uso de terra com a
valor relativo forma “dada” de uma sub-área.
7. Interpretação do Uma análise por mapas que utiliza os valores relativos de uso da terra para cada sub-área regional para determinar a “adequação”
uso intrínseco da terra relativa de um tipo de terreno em relação a outro para cada uso diferente da terra (mapas de adequação são determinados, no
mínimo, para desenvolvimento urbano, agricultura e conservação; num formato mais expandido, a análise incluía usos residencial,
industrial, em recreação e parques, bem como outros usos estudados da terra)
8. Conclusões quanto Pelo uso de uma matriz contendo todos os usos possíveis da terra, faz-se uma seleção do número máximo de usos de terra
ao uso compatível da compativelmente concorrentes.
terra
9. Formulação de Um plano alternativo é formulado para focalizar a predominância e otimização de cada um dos usos de terra estudados. Em cada
planos alternativos de uma das áreas, mostra-se o desenvolvimento adequado e integrado com áreas de conservação como determinadas pela análise do
uso da terra sistema natural. Acompanha o plano um conjunto de orientações para assegurar a boa administração do desenvolvimento em
relação às condições e interesses ambientais.
10. Implicações para Desenvolve-se um plano ótimo proposto em que os sistemas ecológicos críticos são conservados e os desenvolvimentos urbanos ou
nova forma “feita” humanos são compatíveis. Onde mais de um tipo de uso de terra é apropriado, em vez de permitir usos conflitantes, escolhe-se e se
incorpora ao plano o conceito de “uso melhor ou mais nobre” para salvaguardar o ambiente natural. A nova forma “feita” é descrita
na nova ética e estética de base ecológica. As linhas mestras tornam-se então recomendações políticas.
Quadro 6 – Continuação.
99
4.2.1.1 Os estudos de “The Valleys” e “Staten Island”
The Valleys
Este plano ambiental objetivou mediar à conservação de um corredor formado pelo vale
fluvial “Maryland”, em Batimore (EUA), com o melhor desenvolvimento possível. O plano
para “The Valleys” se valeu do determinismo fisiográfico para esclarecer o melhor modelo de
urbanização. Os princípios fisiográficos indicam os tipos de desenvolvimento urbano e as
densidades adequadas segundo as diversas características fisiográficas. O terreno foi avaliado
para averiguar as oportunidades e as limitações existentes frente o desenvolvimento urbano.
(Fig. 4.8 e 4.9)
108
A dedicação ao meio ambiente foi inspirada em sua infância, na cidade industrial de Glasgow (Escócia), que
foi grandemente afetada, em seu ambiente natural, pela industrialização (MCHARG, 2000).
109
Plan for the Valleys, Wallace-McHarg Associates, Filadélfia, 1963 (MCHARG, 2000).
100
conservar a beleza natural de “The Valleys” para o bem comum. Representou uma
oportunidade única para demonstrar a possível convergência entre os interesses e a atuação
dos proprietários privados com o processo cívico e governamental (MCHARG, 2000, p. 80).
Fig. 4.8 – Parte do mapa “Características Fisiograficas”. Fonte: McHarg, 2000, p. 88.
Fig. 4.9 – Parte do mapa “Uso ótimo do solo”. Fonte: McHarg, 2000, p.89.
101
Richmond en Staten Island
Este outro estudo de caso diz respeito ao distrito de “Richmond” em “Staten Island”,
considerado de “hiterland” da cidade de Nova York (EUA). A “hiterland” de Manhatan
oferecia grande diversidade de ambientes naturais para desfrute de seus habitantes, e que a
evolução dos mesmos teria a posto em evidência. Por conseqüência, um grande crescimento
estendeu uma mancha de tecido urbano sem qualidade para esta região, eliminando sua
riqueza e valor. (Fig. 4.10)
O estudo desta ilha, desenvolvido por Ian McHarg, foi solicitado pelo Departamento de
Parques para conhecer as áreas com “idoneidades intrínsecas” e extrair conclusões sobre o uso
e a disposição do solo. Segundo McHarg (2000, p. 104), se tratou de um problema de
avaliação, onde foi necessário saber que zonas são apropriadas (idóneas) para a proteção do
meio ambiente, para recreação, comércio e indústria e zonas residenciais.
Fig. 4.10 Adaptação da Imagem de Staten Island. Fonte: McHarg 2000, p. 102.
102
Este estudo objetivava por em evidência as alternativas existentes para o futuro desta
ilha. O argumento de partida que se utilizou foi que esta zona é a soma de uma série de
processos históricos, físicos e biológicos, todos estes dinâmicos, que constituem valores de
interesse social. Parte-se do pressuposto que cada zona tenha uma “idoneidad intrínseca”
para certos usos de solo e certas zonas servem para múltiplos usos coexistentes.
Segundo McHarg, uma vez aceito que um lugar é a soma de processos naturais e que
estes processos constituem valores sociais (p. ex. os recursos hídricos são indispensáveis para
a vida e por tanto são valores sociais - as águas superficiais representam um recurso natural
para abastecimento), se podem extrair conclusões sobre o uso que se vai dar a um
determinado lugar, de maneira que se assegure uma ótima utilização e melhora dos valores
sociais. Para ele isto é sua “idoneidad intrínseca” (2000, p. 104).
Etapas do método:
• III - No terceiro momento, para cada uso futuro do solo também são
selecionados certos valores fundamentais. Os usos futuros: conservação,
recreação, desenvolvimento residencial, desenvolvimento comercial e
industrial. Para zona intrinsecamente idônea para conservação, os fatores
selecionados foram: características de valor histórico, bosques de grande
qualidade, várzeas de grande qualidade, praias de baías, correntes de água,
103
habitat de animais aquáticos, características geológicas e fisiográficas únicas,
características valiosas do ponto de vista paisagístico e associações ecológicas
escassas; o mesmo foi feito para os demais usos futuros.
Conforme McHarg (2000, p. 115), o mais valioso deste método consiste na noção dos
usos complementares do solo, a busca de zonas que admitam mais de um uso. Esta idéia tende
a entrar em conflito com o princípio de zoneamento, que impõe a segregação dos usos do
solo. Para ele, reconhecer que certas zonas são aptas para diversos usos pode ser considerado
um problema, mas também pode ser visto como uma oportunidade de combinar os usos de
uma maneira atrativa para a sociedade.
Porém, para McHarg (loco citato), existem certos problemas técnicos inerentes ao
método, um deles é a garantia da escolha de fatores, os resultados formarão uma matiz de
cores e tons se os fatores tiverem muita importância. Ocorre também a dificuldade de
transformar os dados em valores de cor e tom, e mesmo sua combinação, devido seu grau de
subjetividade.
De um modo geral, este estudo que foi desenvolvido para “Staten Island” oferece
condições para que se desencadeie um processo de planejamento que utilize em sua
elaboração os valores da sociedade.
104
Fig. 4.11 - Mapa Zonas Protegidas de Staten Island. Fig. 4.12 - Mapa Áreas Recreativas de Staten Island.
Fonte: McHarg, 2000, p. 110. Fonte: McHarg, 2000, p. 112.
105
Fig. 4.14 - Adaptação do Mapa Síntese: Conservação-Recreação-Urbanização. Fonte: McHarg, 2000, p.114
106
CAPÍTULO V
Avaliação dos instrumentos ambientais e urbanos na gestão territorial em
Extrema - MG
107
O presente capítulo visa, por meio de um estudo empírico da cidade mineira de
Extrema, exemplificar, através de análise dos diferentes instrumentos ambientais e urbanos, as
interfaces existentes e que possibilitam a construção da gestão ambiental urbana.
Extrema se desenvolveu numa área limítrofe e de ligação entre as capitais dos Estados
de Minas Gerais e de São Paulo110, margeada pela Rodovia Fernão Dias (BR-381) e
implantada em plena Serra da Mantiqueira – Mata Atlântica111. (Fig. 5.1, 5.2 e 5.3)
110
Extrema esta a 479 Km de Belo Horizonte e 107 Km de São Paulo.
111
Considerado um bioma prioritário para a conservação, um dos mais ricos do mundo em biodiversidade, a
Mata Atlântica – originalmente com 1.300.000 de quilômetros quadrados – está reduzida a menos de 8% de sua
cobertura e em sua área de abrangência vivem 120 milhões de brasileiros, gerando 70% do Produto Interno
Bruto do País. (www.mma.org.br. Acesso em: 16 dezembro 2006).
108
Fig. 5.1 Extrema e a Serra da Mantiqueira. Fonte: Oficina Ambiental de Extrema, 2000.
BRASIL
MINAS GERAIS
EXTREMA
109
Fig. 5.3 Imagem do núcleo urbano de Extrema. Fonte: Google Earth, 2007.
Por sua vez, as atividades rurais apesar de não representarem fonte importante de receita
do município, são necessárias para fixar o homem no campo. A zona rural conta com
pequenas propriedades, muitas chácaras e vários loteamentos onde o setor agropecuário é
pouco desenvolvido.
110
Estrategicamente para seu desenvolvimento conta-se com o Rio Jaguari (Fig. 5.5), uma
vez que é um dos principais mananciais de abastecimento público do país. O manancial é de
qualidade, supri parcialmente a grande São Paulo, sendo o principal contribuinte do Sistema
Cantareira, efluente importante da bacia do Rio Piracicaba.
111
5.1.1 O diagnóstico do município apresentado pela Agenda 21 de Extrema
O maior desafio apresentado pela Agenda 21 de Extrema foi internalizar nas políticas
públicas os valores e princípios do desenvolvimento sustentável. A importância deste
documento se da à medida que serve de base para a revisão do Plano Diretor municipal e
demais instrumentos destinados ao planejamento e gestão territorial.
112
Entre as várias propostas emanadas por esta Agenda, destacamos algumas que, no
âmbito de nossa pesquisa, fornecem informações que auxiliariam em muito o processo de
revisão do Plano Diretor de Extrema:(Quadro 7)
Quadro 7 – Propostas emanadas pela Agenda 21 de Extrema em subsídio a revisão do Plano Diretor
113
5.1.2 Os instrumentos de ordenamento territorial abordados
Política Ambiental
Política Urbana
114
de 1997, a APA compõe o conjunto de medidas compensatórias adotadas para a minimização
das perdas ambientais decorrentes da duplicação da rodovia112.
Localizada na porção sul do estado de Minas Gerais, esta abrange seis municípios
integralmente - Camanducaia, Extrema, Gonçalves, Itapeva, Sapucaí-Mirim e Toledo - e dois
parcialmente – Brasópolis e Paraisópolis -, se estendendo por uma área de 180.373 ha. (Fig.
5.6)
Fig. 5.6 – Mapa da APA Fernão Dias (modificado). Fonte: UGP/BID, 1999 apud Horn, 2001, p. 7.
112
O requerente da licença ambiental foi o Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais – DER/MG,
onde a empresa contratada para elaboração do Plano de Gestão Ambiental da APA Fernão Dias foi a IBITU
Consultoria Ambiental.
113
A bacia hidrográfica do rio Jaguari, em Minas Gerais, é responsável pelo fornecimento de aproximadamente
60% da água consumida na região metropolitana de São Paulo e abastecimento das comunidades locais. Faz
parte do Sistema Cantareira (PRODEC, 1998 apud HORN, 2001).
115
O ZA da APA Fernão Dias possui como objetivo considerar as características
ecológicas e econômicas de tal forma a estabelecer um ordenamento de uso e ocupação do
solo em sinergia à política de gestão de recursos hídricos das bacias hidrográficas dos rios
Jaguari e Sapucaí-Mirim.
O ZA foi orientado em função das questões demandadas pelas normas legais vigentes, o
uso da terra já estabelecido e consolidado e questões quanto à infra-estrutura existente.
Questões primordiais como a capacidade de suporte da área não são utilizadas para tomada de
decisão sobre a regulamentação dos usos, somente citadas.
O diagnóstico ambiental foi elaborado com base nos componentes dos meios físico,
biológico e sócio-econômico, reconhecendo as potencialidades e restrições impostas pelo
ambiente - em termos de aptidão e limitação/restrição aos diferentes tipos de ocupação e uso -
revelando o cenário ao qual o ZA deveria pautar-se para conduzir o ordenamento territorial.
(Quadro 9, 9.1, 9.2 e 9.3)
• Solos
116
Meio Físico
• Classificação dos ambientes: foi feita a classificação dos espaços compartimentando-os segundo
níveis de qualidade ambiental definidos principalmente pela análise das paisagens envolvidas pelo
limite da unidade de conservação.As regiões foram classificadas em quatro, sobre níveis de qualidade
superior e inferior: (i) nível I - considerado de qualidade superior114; (ii) nível II – considerado de
qualidade média superior115; (iii) nível III – considerado de qualidade média inferior116; e (iv) nível IV –
considerado de qualidade inferior117 (O território de Extrema possui classificação nos três últimos
níveis).
Cada componente do meio físico foi dissertado, levando em consideração os critérios de análise da paisagem e a
classificação dos ambientes, gerando dados em forma de tabelas, gráficos e mapas temáticos (Mapa de Níveis de
Qualidade da Paisagem, Geológico, Hidrográfico, Geomorfológico e de Solos).
114
Correspondem às áreas de preservação permanente, as áreas onde a vegetação apresentou ótimas
características de conservação, áreas onde não se constatou indícios de erosão e onde os cursos d’água
apresentam-se com ótimas condições aparentes (IBITU, 1998, p. 19-20).
115
Aquelas áreas que se mostraram quase tão bem conservadas quanto as primeiras, mas a vegetação não se
mostrou tão exuberante (ibidem, p. 20).
116
Corresponde às áreas onde o aproveitamento das encostas não está sendo feito da melhor maneira, podendo
no futuro provocar deslizamentos e assoreamentos dos cursos d’água, áreas onde a vegetação mostrou-se mais
escassa e áreas onde os cursos d’água aparentemente apresentaram-se como sujeitos a receber algum tipo de
contaminação (loco citato).
117
Corresponde àquelas áreas que se mostraram degradadas, com pouquíssimas formações florestais, onde o uso
do solo e demais recursos naturais aproximaram-se de estágios de esgotamento e escassez, decorrente do mal uso
da terra(loco citato).
117
Meio Biótico
Para o diagnóstico do meio biótico estabeleceu-se uma metodologia baseada nos aspectos gerais da cobertura
vegetal, tais como a tipologia existente em cada área, seus principais elementos florísticos e estruturais, seu
estado de conservação e a extensão ocupada pelas formações nativas.
Conforme Ibitu (1998, p. 90), foram escolhidas as formações florestais mais representativas, estas foram
amostradas através de dez pontos quadrantes, de forma a indicar as principais espécies vegetais e algumas das
demais constituintes da comunidade. O conjunto florístico foi acrescido pela observação de espécies no restante
da mata, bem como alguns aspectos populacionais daquelas de maior importância no suporte à fauna.
Na área abrangida pela APA Fernão Dias, sete áreas florestais foram estudadas com a utilização de pontos
quadrantes, a saber uma das áreas a Mata Serra do Lopo, no município de Extrema. Os dados gerados pelos dois
componentes (vegetação e fauna) reverteram-se em tabelas, gráficos e mapas temáticos (Mapa de Uso da Terra e
de Vegetação).
Meio Sócio-Econômico
O objetivo do estudo do meio sócio-econômico foi reunir subsídios para uma compreensão mais aproximada das
estruturas regionais e de suas relações com o ambiente das localidades. Os dados foram em sua grande maioria
interpretados através de índices, demandando uma grande quantidade de tabelas.
Foram propostas 6 (seis) zonas de manejo para APA Fernão Dias, adaptando a
nomenclatura expressa na Resolução Conama n° 10 de 14/12/1988, e criando outras zonas em
118
função de especificidades locais (IBITU, 1998) (Fig. 5.7). Ao que diz respeito o território do
município de Extrema (Fig. 5.8), 5 (cinco) zonas são prescritas pelo zoneamento ambiental:
Para regulamentação de usos, os parâmetros utilizados foram: (i) usos incentivados; (ii)
usos recomendados; (iii) usos tolerados; (iv) usos restringidos; e (v) usos proibidos.
118
De acordo com o Decreto Federal nº. 89.336 de 31/01/1984.
119
De acordo com Decreto Federal nº. 750 de 10/02/1993.
120
Art. 10 - Não é permitida a derrubada de florestas situadas em áreas de inclinação entre 25 a 45 graus, só
sendo nelas toleradas a extração de toras quando em regime de utilização racional, que vise a rendimentos
permanentes (IBITU, 1998, p.11).
119
Extrema
Fig. 5.7 – Zoneamento Ambiental APA Fernão Dias. Fonte: PEREIRA, Paulo H. Zoneamento Ambiental
[mensagem pessoal] Mensagem recebida por [email protected] em 17 nov. 2005. (modificado)
120
ZONA DE OCUPAÇÃO URBANA
Usos Tolerados • Lançamentos de esgotos sanitários coletados pelas redes públicas, no cursos
d’água, até que, a curto prazo, sejam implantados sistemas de tratamento adequado;
• Lançamentos de resíduos sólidos em lixões, até que, a curto prazo, sejam
implantados aterros sanitários ou qualquer outro sistema de disposição de lixo.
Quadro 10 – Regulamentação de Uso da Zona de Ocupação Urbana. Elaborado a partir do texto de Ibitu, 1998,
p. 20-22.
121
A análise do ZA da APA Fernão Dias nos permite afirmar que os aspectos
preservacionistas prevalecem e, portanto, segue o modelo introduzido no Brasil desde o ZA
da APA do Rio São Bartolomeu no Distrito Federal. Os parâmetros estabelecidos pelo Código
Florestal e demais normas vigentes, referente à Mata Atlântica, se sobrepõem as demais
questões pertinentes à dinâmica territorial da área do município, em especial a dinâmica
urbana.
O Plano de Gestão Ambiental da APA Fernão Dias ainda não foi aprovado pela
SEMAD e, portanto não implementado seu zoneamento ambiental. Nas discussões ocorridas
nos municípios envolvidos na APA, foram destacados vários conflitos com os interesses das
outras dimensões que envolvem a gestão do território. Concomitantemente o Governo de
Minas Gerais esta desenvolvendo um ZEE, dividindo o Estado em quatro regiões de análise,
onde a primeira a ser disponibilizada será a região sul, onde Extrema esta inserida.
121
Extrema possui uma declividade acentuada, possuindo pouquíssimas áreas com inclinação de até 15º, mas o
ZA prescreve que acima desta é proibida a ocupação urbana.
122
processo de expansão urbana. Não oferece subsídio técnico científico para que o Plano
Diretor Municipal introduza os condicionantes do meio físico e biótico e estabeleça a melhor
forma de uso e ocupação do solo, simplesmente busca conter o parcelamento do solo e as
atividades antrópicas. Contrária a realidade do município de Extrema que apresenta atrativos
econômicos e conseqüente aumento da população, esta posição restritiva pode se apresentar
no futuro como prejudicial inclusive para os objetivos de preservação, pois tendem a ser
desobedecidos.
O Plano Diretor de Extrema foi elaborado com apoio da Fundação João Pinheiro, que já
havia elaborado diretrizes para os planos diretores dos municípios pertencentes à APA Fernão
Dias.
Atualmente o Plano Diretor se encontra em revisão, o município por não possuir 20.000
(vinte mil) habitantes não faz parte do grupo de municípios obrigados a elaborar no prazo
123
estabelecido pela Lei nº. 10.257/2001 que era outubro de 2006. Portanto, nosso objeto de
análise se constitui na lei supra citada.
O macrozoneamento estabelecido pelo Plano Diretor (Fig. 5.9) possui como diretrizes
para elaboração das 7 (sete) zonas por ele definidas aspectos diretamente relacionadas quanto
à acessibilidade e articulação com as áreas já ocupadas, infra-estrutura básica e características
de relevo. Um fator determinante do ordenamento do território foi à localização geográfica da
Rodovia Fernão Dias e em menor escala do Rio Jaguari.
122
Informações fornecidas pelo Diretor do Dep. De Serviços Urbanos e Meio Ambiente da Prefeitura Municipal
de Extrema, Paulo Henrique Pereira, em 17 abril 2005.
124
• V - Zona Industrial: áreas confrontantes à faixa de domínio da BR-381, 1.000
(um mil) metros a partir do eixo da rodovia para cada lado;
125
Fig. 5.9 – Macrozoneamento do município de Extrema. Fonte: Extrema, 2001, p. 58.
126
Fig. 5.10 – Zoneamento Urbano do município de Extrema. Fonte: Extrema, 2001, p. 60.
127
Os demais componentes naturais, principalmente as características Hidrológicos e
Hidrogeológicos, devido à importância do Rio Jaguari, não são considerados na proposta,
observa-se uma preocupação voltada no máximo para questões de saneamento básico.
128
5.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS INTERFACES ENTRE OS INSTRUMENTOS
ANALISADOS EM EXTREMA
Uma real troca de informações entre os diferentes planos deve ser perseguida, por mais
que todas as leis e diretrizes ressaltem esta importância à análise procedida não identificou
nenhum caso de contribuição mutua.
129
CAPÍTULO VI
Conclusões e Recomendações
130
Neste capítulo conclusivo, buscamos responder a questão colocada no objetivo desta
dissertação: Como o Zoneamento Ambiental poderá apoiar o Plano Diretor Municipal,
tendo em conta a construção da gestão ambiental urbana?
123
Bastante familiar entre ambientalistas, o conceito de suporte ambiental foi delineado pelo norte-americano
Eugene Odum, que ampliou os horizontes da biologia ao partir do princípio de fluxo de energia para explicar que
a Terra é, na verdade, um grande ecossistema. Segundo sua teoria, se existir uma sobrecarga anormal de
qualquer elemento, haverá um desequilíbrio danoso e, em alguns casos, irreversível ao meio ambiente. Ou seja,
há um limite de suporte na natureza que deve ser respeitado (BEZERRA, 1996). Em relação aos bens
renováveis, a taxa de uso não pode ser superior à taxa de regeneração (FARIAS, 2005).
131
A proposta aqui defendida, para o ZA, se baseia na possibilidade de um diálogo entre
este instrumento de planejamento ambiental e o instrumento de referência da política urbana,
o Plano Diretor, fornecendo, a este último, subsídios técnico-científicos para definição dos
usos e ocupações do solo.
Como já dissertamos, um dos fatores do não diálogo entre os instrumentos das políticas
ambiental e urbana advém das diferentes lógicas internalizadas em cada política. Como
resultado, em sua grande maioria, quando existem planos de ordenamento territorial
provindos tanto do âmbito ambiental quanto do urbano, que legislam sobre um mesmo
ambiente geograficamente definido, estes não “conversam” entre si. São comuns os Planos
Diretores não levarem em consideração, quando de sua elaboração ou revisão, os
zoneamentos dos planos ambientais - quando existentes. Mesmo porque os planos ambientais
não são direcionados para dinâmica urbana, dificultando assim sua incorporação (questão
abordada no estudo de caso de Extrema-MG, Cap. V).
Acreditamos que para o ZA contribuir com a Política Urbana, o que de importante deve
ser acrescentado no Plano Diretor são os aspectos do meio físico e biótico. À luz dos avanços
emanados no Estatuto da Cidade e da própria tradição urbana, os aspectos da participação e
principalmente da dinâmica socioeconômica, são amplamente considerada na própria
metodologia do Plano Diretor. As fragilidades ainda residem quanto à consideração dos
aspectos do meio natural de forma estruturante, e não apenas na forma de diagnósticos.
Vale justificar que não estamos propondo ou advogando uma nova configuração, ou
mesmo desconfiguração, do ZA enquanto instrumento de ordenamento territorial da Política
Ambiental (aquele que considera os aspectos socioeconômicos e do meio físico biótico);
ressaltamos até a necessidade de mais pesquisas no âmbito de sua caracterização. Estamos
sim propondo um direcionando do ZA, enquanto instrumento de apoio à tomada de decisão
do Plano Diretor, para os aspectos físicos e bióticos – o Plano Diretor fornecerá o perfil
socioeconômico.
132
Lançamos mão da base conceitual apresentada por McHarg que reconhecidamente
privilegiou em sua metodologia os aspectos biofísicos e se percebe uma maior interação entre
o urbano e ambiental - homem e natureza.
124
Segundo Macedo (1995, p.31), uma vulnerabilidade ambiental consiste em qualquer conjunto de fatores
ambientais de mesma natureza que, diante de atividades ocorrentes ou que venham a se manifestar, poderá sofrer
adversidade e afetar, de forma vital ou total ou parcial, a estabilidade ecológica da região em que ocorre. Ainda
segundo o autor, é importante ressaltar que uma vulnerabilidade ambiental não se constitui, obrigatoriamente, em
fragilidade ambiental, embora todas as fragilidades sejam também vulnerabilidades. Uma estrutura sólida pode
ser vulnerável em determinado ponto ou sob determinadas circunstâncias sem ser, no entanto, frágil. Um corpo
d’água não é, a priori, frágil, mas é vulnerável a uma vazão de efluentes não tratados acima de sua capacidade de
autodepuração, neste caso, é provável que a vulnerabilidade ambiental seja de caráter antrópico e se constitua na
proximidade de áreas ocupadas, sem sistema de tratamento de efluentes, como o corpo d’água.
133
I – O Zoneamento Ambiental não determinará as formas de uso e ocupação do
solo, mas sim as possibilidades; propomos a assertiva de que o ZA não deva
determinar ou restringir usos de forma taxativa, buscamos um caráter mais informativo,
que estabeleça uma orientação de possíveis usos e ocupações; propositalmente para que
este possa dialogar com o zoneamento de uso e ocupação do solo – um instrumento de
planejamento já consagrado - e não concorrer com o mesmo. O ZA, dentro de uma
perspectiva de elaboração (ou revisão) do Plano Diretor, antecederia a execução do
Zoneamento Urbano (em especial o Macrozoneamento); o primeiro serviria de base
estruturante ao segundo.
125
Os estudos de caso elaborados por McHarg (2000) confirmam esta possibilidade.
134
O ordenamento territorial, apoiado por um ZA, também pode (e deve) ser efetuado em
áreas ocupadas. Neste sentido, o programa de ocupação a ser proposto deverá conter medidas
orientadas para a reabilitação em um território já ocupado, as ações dependerão da conjuntura
ambiental encontrada.
135
• Impossibilidade de assegurar proteção a longo prazo.
126
Para análise da paisagem os métodos empregados podem, a grosso modo, dividir-se em objetivos (estudos
paramétricos) e subjetivos, estes últimos contando com um ou mais fatores básicos de integração, ou apenas
conceituando emocionalmente a paisagem, não considerando parâmetro integrador definido (SEMA, 1988 apud
BEZERRA, 1996, p. 154).
136
reverte na falta de interdisciplinaridade e respectivo consenso e equilíbrio na
tomada de decisão sobre as questões que envolvem desenvolvimento e
conservação ambiental. Acreditamos que através da reestruturação da forma de
ensino a formação dos profissionais estará mais apta a conciliar a questão
ambiental e a urbana.
137
Acreditamos que seja viável compatibilizar o desenvolvimento e a preservação
ambiental, desde que considerem os problemas ambientais dentro de processo contínuo
de planejamento, atendendo-se adequadamente às necessidades de ambas as esferas: a
pública e a privada.
138
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