Texto para Discussão 4
Texto para Discussão 4
Texto para Discussão 4
Reynaldo Fernandes *
Amaury Patrick Gremaud **
Renata Del Tedesco Narita ***
_____________________
* Diretor-Geral da Esaf e professor licenciado do Departamento de Economia da
Fearp/USP
** Diretor-Geral-Adjunto da Esaf e professor licenciado do Departamento de Economia
da Fearp/USP
*** Técnica da Esaf e mestre pelo Departamento de Economia da PUC/RJ
1
GOVERNO FEDERAL
MINISTÉRIO DA FAZENDA
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO FAZENDÁRIA - ESAF
Diretor-Geral da Esaf
Reynaldo Fernandes
Diretor-Geral-Adjunto da Esaf
Amaury Patrick Gremaud
Diretor-Geral-Adjunto da Esaf
Manuel José Forero González
Diretora de Educação
Maria Cristina Mac Dowell Dourado de Azevedo
A série Texto para Discussão tem como objetivo divulgar resultados de trabalhos desenvolvidos
pela área de pesquisa da Diretoria de Educação da Escola de Administração Fazendária, bem
como outros trabalhos considerados de relevância tendo em vista as linhas de pesquisa da
Instituição.
As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e de inteira responsabilidade do(s)
autor(es), não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista da Esaf ou do Ministério da
Fazenda.
É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte.
Reproduções para fins comerciais são proibidas.
2
Estrutura Tributária e Formalização da Economia: Simulando Diferentes
Alternativas para o Brasil 1
Reynaldo Fernandes
Amaury Patrick Gremaud
Renata Del Tedesco Narita
Resumo
Neste artigo implementa-se um modelo de equilíbrio geral computável simplificado com
o objetivo de se avaliarem mudanças na estrutura tributária sobre o produto, o emprego
e os salários no setor formal da economia. A abordagem é de steady-state e as ofertas
de trabalho são especificadas em sua forma reduzida, considerando-se 18 tipos
diferentes de trabalhadores. As simulações realizadas avaliam a redução da carga
tributária total e diferentes mudanças na composição dos tributos. Estas últimas
mudanças visam à desoneração parcial da folha de salários dos trabalhadores menos
qualificados e do capital, repassando os encargos para o valor adicionado ou para o
consumo. Os resultados indicam que, para explicar informalidade, o tamanho da carga
tributária é mais importante do que sua composição. Um corte linear dos tributos, por
exemplo, gera um aumento de produto e emprego formal e, no longo prazo, retorna ao
mesmo nível inicial de arrecadação. Quanto às alternativas de mudança de base
tributária, o melhor impacto sobre produto é obtido a partir da redução de impostos
sobre capital e o melhor efeito distributivo é aquele observado a partir da redução dos
impostos sobre a folha salarial dos trabalhadores menos qualificados. Nesse sentido, o
estudo sugere que propostas de redução da carga tributária total deveriam levar em
conta estes efeitos sobre as diferentes bases tributárias.
Abstract
This paper uses a computable general equilibrium model with a steady-state approach
to evaluate the impact of different alternatives of tax reforms to the aggregate output,
employment and to the wages of the formal sector. The model incorporates 18 different
types of workers that differ by their years of schooling, sex and age. In the proposed tax
reforms, we examine the size of the tax burden and its composition. Basically, the last
simulations include reductions in the payroll tax for the low-wage workers and reductions
in the capital tax, shifting the tax base toward value added and consumption taxation.
Simulations results indicate that the size of the tax burden is more important than its
composition to explain the high number of informal jobs. As the best long-run effects to
the aggregate output come from a capital tax reduction and the best distributional
effects are obtained with a drop in the payroll tax for the low-wage workers, this article
suggests that a reduction in the size of the tax burden should consider these different
tax base aspects.
4
esse tipo de imposto não costuma isentar bens de capital, o que desincentivaria a
acumulação de capital no setor formal da economia.2
Essas questões, no entanto, possuem tratamento complexo. Uma
abordagem puramente econométrica ficaria restrita às mudanças passadas, que
podem não servir para analisar as propostas atuais. Além disso, mudanças
tributárias não são tão freqüentes e, quando ocorrem, tendem a afetar toda a
economia no mesmo instante do tempo, acarretando dificuldades de identificação
dos parâmetros relevantes do modelo. Modelos de série de tempo também
enfrentam dificuldades em encontrar séries suficientemente longas, importantes
quando o objetivo é avaliar impactos de longo prazo das medidas. Modelos de
cross-section também apresentam problemas de identificação: se a unidade de
análise são os estados, toda a informação dos tributos de âmbito nacional é
perdida, enquanto que a utilização de setores incorrer em problemas de
endogeneidade. Em virtude da dimensão dos problemas, análise de dados em
painel dificilmente teria melhor sorte.
Por outro lado, uma análise puramente teórica, além de não dar uma
dimensão quantitativa ao problema, pode se ver obrigada a impor um conjunto
muito grande de restrições, de modo que o modelo seja tratável e os resultados
sejam não dependentes de um conjunto de parâmetros desconhecidos.
Uma alternativa, a ser utilizada neste estudo, é implementar um modelo de
equilíbrio geral computável. Assim, na impossibilidade de se avaliarem
quantitativamente mudanças tributárias que ainda não ocorreram, simulam-se tais
mudanças em uma economia artificial, garantindo que tal economia possua certas
características, consideradas desejáveis, da economia real. De modo geral,
especificam-se numericamente todos os parâmetros do modelo e, na medida do
possível, seus valores são extraídos da economia que se procura avaliar. Procura-
se também garantir que as dimensões de todas as variáveis endógenas relevantes
sejam, no equilíbrio inicial, as mais próximas possíveis da economia real. Por fim,
especifica-se uma estrutura tributária que seja similar à existente na economia sob
análise.3
O modelo a ser implementado é relativamente simples. Ele supõe que o
setor formal da economia opera de maneira competitiva, os agentes possuem
horizonte infinito e a produtividade no setor informal da economia é fixa. A
abordagem é de
6
nada pode ser analisado quanto aos efeitos de transição de uma mudança na
estrutura de taxação.
CES que depende da eficiência dos trabalhadores do tipo de trabalho i, o qual deve
variar no tempo e σ é a elasticidade de substituição que é fixa e igual entre pares
distintos de tipos de trabalho.
É razoável supor que em cada tipo de qualificação, subgrupos separados
conforme características demográficas tenham importâncias distintas na
determinação da quantidade total de trabalho Li (i=1,2,3). Essa separação é
particularmente interessante porque permite avaliar o efeito de cada esquema de
taxação sobre grupos mais desagregados (ou seja, mais distintos) de
trabalhadores. Assim, admitindo que eles possam ser classificados em 6 subgrupos
e que estes sejam substitutos perfeitos, Li seriam descritos por:
7
L j (2b)
j=1
L j (2c)
j=1
L j (2d)
j=1
onde Lij são subgrupos de trabalhadores formais definidos dentro de cada tipo de
trabalho Li e αij são os coeficientes de distribuição dos subgrupos Lij dentro de cada
tipo de trabalho Li (representam, em cada tipo de qualificação i, a razão entre a
remuneração do subgrupo j e a remuneração do subgrupo j de referência).
8
Definidos o preço dos serviços do capital e as alíquotas dos tributos que
incidem sobre esse fator, a remuneração bruta do capital4 deve ser igual a sua
remuneração líquida (igual a 1) acrescentados os encargos diretos ( φ) e deduzido o
crédito tributário referente à parcela dos encargos indiretos ( ρπ2), que funcionam
como um subsídio ou crédito direto aos bens de capital.
Assim, em steady-state, a produtividade marginal do capital (PMgK) após
impostos indiretos deve ser igual à remuneração bruta desse fator e, partindo da
equação de produção
(1), o estoque ótimo de capital é
6 Uma mesma equação reduzida pode ser uma aproximação para diferentes modelos estruturais.
10
Assim como em Lewis (1954), os trabalhadores fora do setor formal formam
um pool de mão-de-obra e estariam dispostos a migrar para o setor formal a
depender da remuneração paga nesse último setor. Entretanto, ao permitir que o
salário de reserva varie entre trabalhadores produtivamente homogêneos, damos
mais flexibilidade ao modelo ao considerar que a elasticidade de oferta de trabalho
não necessita ser perfeitamente elástica. Da forma que foi especificado, o modelo
apresenta ainda algumas características que poderiam ser consideradas não
apropriadas, sendo oportuno destacar duas delas. A primeira se refere à integração
entre os setores formais e informais. Mudanças na estrutura tributária afetam o
salário e produtividade apenas no setor formal da economia, deixando as condições
de trabalho inalteradas no setor informal: qualquer trabalhador que decidisse
permanecer no setor informal após uma redução da carga tributária, por exemplo,
não seria afetado pela política. Tal hipótese permitiu que o setor informal da
economia não fosse explicitamente modelado, mas pode ser considerada muito
restritiva. Em um mundo mais integrado, poderia se esperar que a redução de
tributos, ao elevar a demanda por trabalho no setor formal, elevasse também a
produtividade e salários no setor informal. Ou seja, caso os efeitos de mudanças
tributárias sobre as condições de trabalho na informalidade não sejam desprezíveis
podemos superestimar seus impactos sobre a formalidade e, possivelmente,
subestimar seus impactos sobre pobreza.
A segunda restrição diz respeito aos diferenciais de salários. Seria razoável
admitir que os benefícios líquidos não-salariais no setor formal sejam maiores do
que no setor informal e, assim, seria de esperar um diferencial de salários favorável
7
ao setor informal da economia. Entretanto, as evidências mostram o contrário:
mesmo controlado por uma série de características observáveis os salários líquidos
do setor formal mostram-se mais elevados.8 Isso pode ser fruto de características
produtivas não observáveis ou uma indicação de segmentação no mercado de
trabalho. Em que medida a presença desses elementos pode alterar os resultados
obtidos no presente trabalho é algo de difícil avaliação.
7 Além dos salários, os trabalhadores formais têm acesso a uma série de benefícios, especialmente os
relacionados à previdência social, o que implicaria um salário líquido mais elevado no setor informal. Por outro
lado, se, por exemplo, o risco de perda de emprego for maior no setor formal ou se os empregos no setor formal
forem menos flexíveis na disposição do tempo os trabalhadores exigiriam um prêmio para trabalhar nesse setor.
8 Ver, por exemplo, Fernandes (1996).
11
Entretanto, como não estamos propondo um modelo para explicar a taxa de
participação e os salários no setor formal da economia, mas apenas simular o
impacto de mudanças tributárias sobre essas variáveis, é plausível argumentar que
os resultados obtidos para uma economia competitiva, com trabalhadores
produtivamente homogêneos por grupo de características observáveis e salário de
reserva fixo providenciem uma boa indicação desses movimentos. De qualquer
modo, tratar o setor informal explicitamente no modelo é algo que se pretende
realizar em trabalhos futuros.
2.4. O equilíbrio no mercado de trabalho
Substituindo (3) em (1) e reescrevendo a condição (5), resultam as seguintes
equações:
onde θ=θ(1−θ)(1−θ)/θ
As alocações de trabalho formal de equilíbrio dependem dos parâmetros do
modelo e da participação relativa de cada tipo de trabalho no emprego total da
economia.
3. Calibragem
O sistema de 22 equações abaixo, formado a partir de (2a)-(2d) e (9) será
resolvido para as 22 incógnitas L,L1,L2 ,L3,Lij (i = 1, 2, 3, e j = 1, ..., 6). Quase toda
a parametrização do modelo foi feita com base em valores conhecidos para as
variáveis produto formal, número de ocupados formais e arrecadação com tributos.
Já os parâmetros da função CES (equação (2a)) e os parâmetros da função de
oferta de trabalho formal (equação (6)) foram estimados. O cálculo dos parâmetros
bem como a estratégia de identificação daqueles que foram estimados serão
mostrados nas próximas seções.
12
3.1. Parâmetros Calculados
9 Esta soma é ajustada pela quantidade de horas semanais trabalhadas, em relação à quantidade
padrão definido pela legislação que é de 44 horas. Por exemplo, o ocupado formal que trabalha
efetivamente apenas 22 horas semanais representa apenas “1/2 trabalhador” e aquele que exerce 44
horas semanais representa “1 trabalhador”.
10 Como a remuneração anual do trabalhador formal é acrescida do 13.º salário, então, computou-se
remuneração anual = remuneração mensal*13
13
salários11) e Tij é a média das transferências ocorridas no ano relativas ao Salário
Família12 e ao Abono Salarial13.
O produto formal da economia (Y) foi estimado com base no valor adicionado
fiscal, tido como base de arrecadação do ICMS (Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Prestação de Serviços). A Fundação SEADE disponibiliza esta
estimativa para o Estado de São Paulo para o ano de 2001 que, por sua vez, foi
coletada junto à Secretaria da Fazenda de São Paulo. Sob a hipótese de que a
relação entre o valor adicionado fiscal e o PIB para São Paulo (que é de 0,64) é a
mesma para o Brasil e usando a estimativa do IBGE para o PIB brasileiro, obteve-
se para o ano de 2001 o valor adicionado fiscal do Brasil (cerca de 769 bilhões de
reais correntes).14
A alíquota gij do imposto que incide sobre folha de salários, por definição, é
aquela alíquota que deve ser aplicada ao custo do trabalho para se obter a
remuneração líquida, ou seja, a que o trabalhador recebe após os encargos com
tributos sobre folha (INSS cota-parte do empregado e imposto de renda na fonte
(IRF) sobre trabalho)15. O gráfico 1 mostra os valores das alíquotas sobre salários
por tipos dAs alíquotas efetivas vigentes dos impostos sobre valor adicionado π1 e
π2, para o ano de 2001, foram calculadas a partir da arrecadação com tributos do
tipo 1 (ICMS e IPI) e do tipo 2 (PIS e COFINS), coletadas com base nas
publicações da Receita Federal. Assim, π1 é a razão entre a arrecadação dos
tributos tipo 1 (ICMS e IPI) e Y. Enquanto π2 é a razão entre a arrecadação dos
tributos 2 (PIS e COFINS) e Y16.
matrícula na escola. O benefício em termos anuais é dado pelo valor do benefício recebido
mensalmente vezes 12.
13
O abono salarial também é um benefício vinculado ao emprego formal que concede ao trabalhador
com uma remuneração inferior a 2 salários-mínimos mensais um benefício anual de 1 salário mínimo.
Como o recebimento do abono salarial depende se o trabalhador esteve empregado por pelo menos
30 dias no ano anterior e esta não é uma informação disponível na PNAD, atribuir simplesmente um
salário para cada indivíduo segundo somente o critério de renda iria superestimar as transferências
com o abono salarial. Por isso, usou-se o número de beneficiários do abono salarial em 2001
(segundo o Ministério do Trabalho, foram cerca de 4,9 milhões) e ajustou-se a transferência por
indivíduo amostrado na PNAD de modo que ao final chega-se a este número real de beneficiários.
11 Encargos referentes ao INSS cota-parte do empregador e ao Sistema “S”. Dado que não existe
uma relação direta entre as contribuições e os benefícios, decidiu-se tratar as contribuições ao INSS
como um imposto. Assim, os benefícios do INSS são vistos como um benefício não salarial,
capturado pelo parâmetro γij da equação de oferta de trabalho.
12 Para obter as transferências do Salário Família, aplicou-se as regras do Ministério da Previdência
Social para cada indivíduo na PNAD. Por estas regras, no ano de 2001, cada ocupado formal, com
uma remuneração inferior a R$ 420,61, recebeu um benefício mensal de R$ 10,12 por filho menor de
14 anos de idade com
14
14
Note que o cálculo do produto formal brasileiro pode estar superestimado por dois motivos. Primeiro,
a base de arrecadação do ICMS pode estar superestimada já que parte das compras feitas pelos
empresários podem ser feitas no setor informal, assim, estes sub-declaram compras e superestimam
o valor adicionado. Em segundo lugar, estima-se que São Paulo seja um estado que apresenta uma
das maiores taxas de formalização das empresas (já que é terceiro estado com maior taxa de
formalização do trabalho com base na PNAD 2002), nesse caso, o valor adicionado com base em
São Paulo poderia estar superestimando o valor adicionado brasileiro. Por outro lado alguns bens e
serviços produzidos formalmente podem estar fora da base que contabilização do valor agregado o
que sub-estimaria o produto formal.
15
O cálculo de gij é dado pela expressão, gij=1- (média das remunerações líquidas/wij).
16
O fato de a arrecadação com o PASEP vir sempre junta com a do PIS, implica que a estimativa de
π2 está superestimada. No entanto, como este fundo foi criado para servidores no setor público e
estes representam
15
(
real de rendimentos do trabalho e o produto formal Y, tal que θ= ∑w ij )
Lij /(1−π1
−π2 )Y .18
Por fim, os coeficientes αij presentes nas equações (2b)-(2d) definem a
importância relativa do subgrupo j em cada tipo de qualificação i, dada pela razão
entre o custo do
um percentual reduzido da população de ocupados, então, a arrecadação com o PASEP não deve
ser expressiva diante da arrecadação do PIS.
17
A tabela com a relação dos bens de capital e suas taxas de depreciação consta no Art. 310 do
Regulamento do Imposto de Renda.
18
Para maiores detalhes, ver parte 1 do Apêndice.
16
de empregos contra salários, não se sabe se o coeficiente de resposta se refere a
um comportamento de oferta ou de demanda. Uma alternativa de identificação da
oferta de trabalho foi proposta por Blundell, Duncan e Meghir (1997). Estes autores
utilizaram um painel de grupos (de coorte e educação) e tempo e estimaram uma
regressão do número de horas trabalhadas contra logsalário após imposto. Para
identificar a oferta de trabalho, a regressão foi feita contra dummies de grupo e de
tempo, deixando as interações entre os efeitos grupo e tempo como instrumento de
exclusão para a identificação de oferta. A razão pela qual os autores acreditam ser
este um bom instrumento é que durante o período amostral utilizado, reformas
tributárias, exógenas ao agrupamento de trabalhadores, alteraram diferentemente
entre os grupos as alíquotas dos impostos sobre trabalho.
Seguindo a estratégia de identificação de Blundell, Duncan e Meghir (1997),
estimou-se o logaritmo da equação (6) incluindo como variáveis independentes as
dummies indicando os tipos de trabalho e tempo e o logaritmo da média salarial do
tipo de trabalho caso os trabalhadores estivessem no setor informal. Para captar as
prováveis diferenças existentes entre as elasticidades de oferta dos tipos ij de
trabalhadores, incluímos também interações entre as dummies de tipo de trabalho e
o logaritmo da remuneração líquida. Por fim incluiu-se a proporção das pessoas
com características ij na população total para controlar mudanças nos tamanhos
relativos dos grupos.
A estimação da oferta de trabalho foi feita separadamente para homens e
mulheres e usando a amostra de 1981 a 1990 da PNAD. A escolha desse período
se deve ao fato de que durante os anos 90 houve mudanças institucionais, por
conta da regulamentação de reformas no sistema de previdência e do mercado de
trabalho que acarretariam impactos não exógenos dos salários relativos dos
agrupamentos de trabalhadores. Assim, como os parâmetros devem representar
bem a economia vigente no longo prazo, que é o horizonte para o qual estimaremos
os efeitos da mudança no sistema tributário, optou-se por utilizar a amostra dos
anos 80 para calcular as elasticidades de oferta de trabalho.
O modelo empírico, descrito na parte 3 do Apêndice, mostra como foram
calculadas estas elasticidades. Para cada tipo de trabalho ij, soma-se o coeficiente
do logaritmo da remuneração líquida do tipo ij e o coeficiente da interação entre a
dummy indicando o tipo ij e o logaritmo da remuneração líquida deste tipo. Por fim,
substituindo cada um dos valores de εij na equação (6), encontram-se os valores
para
17
γij. O gráfico 2 mostra os valores das elasticidades de oferta de trabalho por tipo de
trabalho.
4. Simulações
18
que a reforma proposta não é neutra do ponto de vista da arrecadação, enquanto
nas demais tal hipótese é feita. Já que as simulações aqui realizadas mudam
apenas os tributos da esfera federal, nestes últimos experimentos é mantida apenas
a arrecadação federal.13
4.1. Redução da carga tributária
Nossa primeira simulação consiste na redução da carga tributária total em
10%. Esta redução é feita de forma proporcional, ou seja, todos os tipos de
trabalho, o capital e o valor adicionado terão uma redução igualitária de 10% nos
seus encargos.
A simulação (1) da tabela 5 mostra os resultados obtidos para o produto
formal, estoque de capital e arrecadação tributária. Apesar dessa redução inicial de
carga tributária em 10%, no longo prazo, o aumento do produto formal (9,5%), do
estoque de capital (13,9%) e do emprego agregado (5,3%) em relação a 2001
revertem em um aumento de arrecadação sobre folha de salários e sobre capital de
forma que isso mais que compensa a perda inicial. Como esta tabela mostra, a
arrecadação federal obtém no longo prazo um aumento de 0,4% e a arrecadação
total apresenta uma queda de apenas 0,37%.
A tabela 6 mostra o impacto sobre o emprego formal por tipo de trabalho. Os
resultados da simulação (1) apontam que a redução da carga tributária aumenta a
quantidade de ocupados formais para todos os tipos de trabalho. Porém, a
magnitude desse aumento varia. Por exemplo, homens com idade entre 16 e 25 e
escolaridade baixa têm um acréscimo de 6,9%, enquanto homens da mesma faixa
etária com escolaridade alta têm um acréscimo de 0,9%. A tabela 7 mostra um
crescimento da remuneração líquida proporcional ao crescimento do emprego para
cada um dos tipos de trabalho.
4.2. Redução dos encargos sobre folha de salários neutra do ponto de vista da
arrecadação
20
comparamos com a simulação anterior, estas evidências sugerem que o aumento
compensatório do IVA piora o efeito desejado sobre emprego dessa redução de
carga tributária.
Podemos atribuir esse efeito negativo ao fato de que, em 2001, as
legislações dos impostos sobre valor adicionado do tipo 2 (PIS e COFINS) não
previam a desoneração dos bens de capital ( ρ igual a zero). Assim, quando
reduzimos tributação sobre folha salarial passando para valor adicionado estamos
onerando consumo e também o investimento. Como, no longo prazo, a taxação do
capital implica redução da poupança agregada, o efeito sobre o produto é negativo.
Assim, se poderia argumentar que a compensação ideal deveria ser feita por meio
da taxação do consumo e não sobre o valor adicionado.
4.3. Desoneração do capital e Taxação do Consumo
21
As mesmas simulações na tabela 6 mostram o impacto sobre o emprego
formal agregado e para os diferentes tipos de trabalho. No longo prazo, o emprego
agregado cresce 0,6; 0,8 e 1,2% para as desonerações de 0,5; 0,7 e 1,
respectivamente. Pela tabela 7, essas simulações mostram um crescimento
proporcional dos salários. Por exemplo, entre os homens com escolaridade baixa e
idade entre 26 e 45, os salários crescem 1,2; 1,7 e 2,6%, respectivamente.
Assim, mesmo diante de um aumento considerável no produto formal da
economia, os efeitos sobre o emprego e salários do setor formal são pequenos
perto do elevado grau de informalidade existente na economia brasileira.
É importante lembrar que a desoneração feita ao capital tem por objetivo
criar um tributo sobre o consumo. A decisão de consumo em uma economia
intertemporal depende da quantidade de trabalho. Portanto, quando repassamos a
carga do IVA do tipo 2 sobre capital para consumo nessa economia, estamos
onerando o trabalho formal. Por este motivo, os efeitos sobre emprego ainda que
positivos são reduzidos.
4.4. Redução dos encargos sobre folha de salários e taxação do consumo
22
qualificados, mulheres e os de menor idade obtêm aumentos relativamente maiores
tanto de emprego quanto de salários. Por exemplo, mulheres com idade entre 16 e
25 e menos qualificadas obtém um ganho de 10% na quantidade de empregos
formais e de 9,4% no salário líquido médio. Por outro lado, a quantidade de
empregos formais cai em 0,1% entre as mulheres, com idade acima dos 46 anos e
mais qualificadas e o salário líquido médio reduz 0,3%.
Em suma, dentre as simulações que mudam apenas a base tributária, deixando o
montante arrecadado inalterado, o deslocamento de parte dos encargos sobre
trabalho para consumo é a que apresenta o mais elevado impacto sobre a
quantidade de empregos formais.
Como argumentamos na seção anterior, apesar de estarmos reduzindo a
carga sobre trabalho, a compensação via um imposto sobre consumo acaba por
recair sobre trabalho novamente. Isto gera um efeito pequeno sobre emprego
comparado ao que seria necessário para reduzir substancialmente o grau de
informalidade existente.
4.5. Transferências dos encargos sobre folha dos que recebem menos para os que
recebem mais
23
perda de arrecadação é feita por meio do repasse aos que recebem mais, ao final,
haverá uma redistribuição do encargos dos tributos sobre trabalho. A tabela 8
resume os efeitos distributivos dessa política sobre as alíquotas efetivas sobre
trabalho. Em geral, os mais qualificados obtêm uma alíquota maior após a política,
enquanto os tipos de qualificação baixa e intermediária são beneficiados com
alíquotas menores do que as vigentes em 2001.
Os resultados dessa simulação sobre produto formal, estoque de capital e
arrecadação são apresentados pela última coluna da tabela 5. O produto formal
cresce 0,9% em relação ao produto vigente em 2001. Em relação à simulação 2,
que compensa a perda de arrecadação sobre folha por meio de um tributo sobre
valor adicionado do tipo 2 e supõe desoneração zero dos insumos de capital, o
produto formal é 4,8% superior. Já em relação à simulação 6, o produto formal
gerado pela simulação 7 é 5,3% inferior.
A tabela 6 também aponta um melhor resultado sobre emprego formal
apresentado pela simulação 6, que compensa a perda de arrecadação por meio de
um tributo sobre consumo, em relação à simulação 7, que compensa por meio do
aumento dos encargos sobre os que recebem mais. Como esta tabela mostra, esta
última simulação leva a um acréscimo de cerca de 368 mil empregos formais em
relação à quantidade presente em 2001 (ganho de 1,4% no longo prazo).
Comparando com as outras alternativas de desoneração da folha de salários
apresentadas, a quantidade de empregos formais desta simulação 7 é 1,4%
superior em relação ao obtido pela simulação 2, mas 0,5% inferior àquele obtido
pela pela simulação 6.
Quanto aos impactos para os diferentes tipos de trabalho, as tabelas 6 e 7
mostram esse efeitos sobre emprego e salários do setor formal por tipo de trabalho.
Trabalhadores do sexo feminino, com idade entre 16 e 25 e menos qualificados, por
exemplo, obtém um ganho de 9,2% na quantidade de empregos formais e de 8,7%
no salário líquido médio. Por outro lado, a quantidade de empregos formais cai em
0,9% entre as mulheres, com idade acima dos 46 anos e mais qualificadas e o
salário líquido médio reduz 1,6%.
O efeito distributivo, portanto, parece similar ao apresentado pela simulação
6. Por este motivo, a simulação 6, que compensa a perda de arrecadação com
tributos sobre trabalho a partir da taxação do consumo, é a que apresenta os
melhores resultados sobre produto, estoque de capital e emprego formal.
24
Ainda assim, as alternativas de desoneração da folha salarial por meio de
uma mudança de base tributária (valor adicionado, consumo ou maiores salários)
possuem efeitos de longo prazo sobre a quantidade de empregos que variam entre
0,04% e 2%. Isto é, este aumento está muito abaixo do que seria necessário para
reduzir substancialmente a informalidade no Brasil, que atinge cerca de 55% dos
trabalhadores. Por outro lado, uma redução da carga tributária, em vez da mudança
de base, permitiria um melhor impacto sobre produto e emprego do setor formal,
sem praticamente afetar a arrecadação total da economia no longo prazo.
5. Considerações Finais
Neste artigo implementa-se um modelo de equilíbrio geral computável
simplificado com o objetivo de se avaliar mudanças na estrutura tributária sobre o
produto, o emprego e os salários no setor formal da economia. Admitiu-se que o
setor formal da economia opera de maneira competitiva, os agentes possuem
horizonte infinito e a produtividade no setor informal da economia é fixa. A
abordagem é de steady-state e as ofertas de trabalho são especificadas em sua
forma reduzida. Foram considerados 18 tipos diferentes de trabalhadores e o
modelo possui uma estrutura tributária relativamente complexa, com um imposto
sobre o trabalho, um imposto sobre capital, transferências relacionadas ao emprego
formal e dois tipos de impostos sobre o valor adicionado: um que estorna o tributo
pago referente a bens de capital e um que não o estorna.
Cinco mudanças na estrutura tributária foram consideradas. A primeira delas
consiste na redução da carga tributária total, ou seja, pressupõe-se uma queda
percentual igual para todos os tributos considerados. Nas demais simulações o
nível de arrecadação é mantido constante. A segunda mudança analisada é a
redução dos encargos sobre folha de salários repassando o ônus para o valor
adicionado do tipo que não estorna o investimento feito em bens de capital. A
terceira consiste em diferentes níveis de desoneração feita aos bens de capital,
incluindo o caso extremo em que se estorna completamente este fator, ou seja, o
tributo sobre valor adicionado recai apenas sobre consumo. A quarta alteração
consiste em desonerar a folha salarial tal com a compensação feita por meio da
tributação do consumo. Por fim, a última é a transferência de parte dos encargos da
folha salarial dos que recebem menores salários para os que recebem mais.
Os resultados da redução da carga tributária foram os mais expressivos, uma
redução de 10% de todos os tributos federais provocou um aumento de 9,5% no
produto formal de equilíbrio, enquanto a arrecadação de impostos foi, praticamente,
mantida. O impacto sobre emprego e salários foi relativamente menor. Já a
25
transferência de parte contribuição previdenciária da folha de salários para o valor
adicionado apresentou um resultado negativo: o produto, o emprego e os salários no
setor formal se reduziram. O motivo dessa redução é que o IVA incide sobre bens de
capital.
A desoneração do capital, compensando as alíquotas para que a
arrecadação seja mantida, também se mostrou efetiva, embora o impacto foi menor
que a simples redução de alíquotas de todos os impostos. Quando a desoneração é
completa, transformando o IVA em um imposto sobre consumo, o produto formal
cresce cerca de 7,8%. Nesse caso, no entanto, o impacto sobre o emprego é bem
mais reduzido, em torno de 1,2%. Isso ocorre em virtude da medida incentivar o uso
mais intensivo de capital.
Analisou-se também uma transferência de parte dos encargos sobre folha
para o imposto sobre consumo. Trata-se, na realidade, de duas mudanças
conjuntas. Em primeiro lugar, transforma o IVA em um imposto sobre consumo, ao
se desonerar completamente o capital. Feito isso, transfere-se parte dos encargos
sobre folha para esse novo IVA, ajustando-se as alíquotas de modo a não perder
arrecadação. A redução dos encargos sobre folha se deu com a isenção das
contribuições ao INSS (parcela patronal) para o primeiro salário mínimo de todos os
trabalhadores. Quando comparado à situação inicial, a medida mostrou-se positiva,
crescendo o produto formal em cerca de 6,5%. Entretanto, esse crescimento é
decorrente da desoneração do capital e não da redução dos encargos sobre folha,
visto que, quando comparado com a simples transformação do IVA em um imposto
sobre consumo, o produto formal é menor. Entretanto, o impacto sobre o emprego é
ligeiramente superior nesse caso: um crescimento de 1,9% em relação a situação
inicial. Esse impacto, entretanto, é muito diferenciado entre os grupos de
trabalhadores, favorecendo os menos qualificados cujo crescimento de emprego
pode chegar a 10%. Por outro lado, a desigualdade salarial é também reduzida: a
razão entre os salários do grupo mais bem remunerado e do grupo com pior
remuneração cai de 10,57, no equilíbrio inicial, para 9,58.
Por fim, quando se realizou uma transferência dos encargos sobre folha dos
que recebem menos para os que recebem mais, o resultado sobre produto e
emprego foi ligeiramente positivo. Novamente, o impacto foi muito diferenciado
entre os grupos de trabalhadores, favorecendo os menos qualificados. A razão
entre os salários do grupo mais bem remunerado e do grupo com pior remuneração
cai para 9,49.
26
Os resultados indicam que, para explicar a informalidade, o tamanho da
carga é mais importante do que sua composição. Entretanto, uma vez decidido
reduzir o tamanho da carga, o estudo sugere que um corte linear não seja, talvez, a
melhor forma de fazê-lo. Caso estivéssemos interessados em maximizar o produto
formal, corte dos impostos sobre capital seria a melhor escolha. Por outro lado, se
nossa preocupação reside na desigualdade, deveríamos priorizar a redução dos
encargos sobre folha dos menos qualificados.
27
Referências Bibliográficas
Altig, D., Auerbach, A.J., Kotlikoff, L.J., Smetters, K.A. e Walliser, J. Simulating
fundamental tax reform in the United States, American Economic Review, 2001, vol.
91, n. 3, pp. 574-595.
Blundell, R., Duncan, A. e Meghir, C. Estimating labour supply responses using tax
reforms, Econometrica, 1997, vol. 66, pp.827-862.
28
Tabela 1: Parâmetros Calculados e Estimados
29
Tabela 2: Variáveis de Interesse no Equilíbrio Inicial e Dados Brasileiros em 2001
30
Tabela 4: Remunerações Líquidas e Transferências Vinculadas ao Emprego
Formal – Equilíbrio Inicial
31
Tabela 5: Impacto das Diferentes Simulações (Produto Formal, Estoque de Capital, Arrecadação) – R$
bilhões de 2001
32
Tabela 6: Impacto das Diferentes Simulações (Quantidade de Empregos Formais)
33
Tabela 7: Impacto das Diferentes Simulações (Remuneração Líquida do Setor Formal) – Médias – R$ de
2001
34
Tabela 8: Alíquota Efetiva do Tributo sobre Trabalho – gij – Simulações 2 e
7
35
Gráfico 1: Alíquotas do Tributo sobre Trabalho (gij)
36
Apêndice
(1) Obtendo a participação do trabalho no produto (θ) da função de produção
Cobb-Douglas.
Pela equação (2a):
37
onde é a participação relativa da massa salarial do grupo de
qualificação i. ∑wi1Li
Extraindo o logaritmo da expressão acima, obtém-se:
onde:
i é o tipo de qualificação (1- baixa, 2-intermediária, 3-alta); t é o tempo em anos
(PNAD 1981-2001); α é o termo constante; β é o coeficiente estimado da variável
ln(Li/L), suposto igual para todos os grupos e períodos; ηi é o coeficiente da dummy
do tipo de qualificação i; Di é a dummy indicando o tipo de qualificação i;
T é uma tendência linear;
C é um componente cíclico (taxa de
desemprego); µit é o termo aleatório.
Usando as estimativas β:
σ=1/(1-β)
Por fim, substituindo σ na expressão para todo i, encontram-se os
parâmetros de eficiência ai.
(3) Obtendo a elasticidade de oferta segundo grupos de trabalhadores (εij) e
os parâmetros (γij) da função de oferta
Pela equação de oferta (6), log-linearizada temos:
Na equação acima, wij, Lij, Tij e gij são conhecidos. Para estimar εij empiricamente,
partimos do seguinte modelo com dados em painel, estimado por MQO:
onde:
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ij é o tipo de trabalho com escolaridade i (baixa - 0-4; intermediária - 5-11; ou alta -
12 ou mais anos de escolaridade) e característica j definida pela combinação entre
as variáveis sexo (homens ou mulheres) e idade (3 faixas: 16-25, 26-45, 46 ou mais
anos de idade); t é o tempo em anos (PNAD 1981-1990);
α é o termo constante;
ηij é o coeficiente da dummy do tipo de trabalho ij;
νt é o coeficiente da dummy do tempo t;
Dij é a dummy indicando o tipo de trabalho ij;
Dt é a dummy indicando o tempo t;
β0 é o coeficiente estimado da variável ln(wijt (1− gijt ) +Tijt ) , igual para todos os tipos
de trabalho e períodos;
βij é o coeficiente estimado da variável Dij ln(wijt ))1(− gijt +Tijt , que deve ser diferente
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