Baratas, de Scholastique Mukasonga: Um Olhar Crítico Dialético
Baratas, de Scholastique Mukasonga: Um Olhar Crítico Dialético
Baratas, de Scholastique Mukasonga: Um Olhar Crítico Dialético
GUARAPUAVA/PR
2021
CARLA FERNANDA DA COSTA SCHVEPER
GUARAPUAVA/PR
2021
Catalogação na Publicação
Rede de Bibliotecas da Unicentro
Bibliografia
CDD 896
A todos os autores cujas vozes me construíram.
AGRADECIMENTOS
À minha família, que sempre acreditou e apoiou os meus sonhos, principalmente aos
meus pais, Valdori Schveper e Maria Terezinha da Costa que, desde cedo,
incentivaram a leitura e defenderam a educação dentro do nosso lar. Em especial, a
minha mãe, que lia todas as noites, incansavelmente, histórias que embalaram meus
sonhos.
Ao meu padrasto e amigo, Heraldo Inácio Rosa, cujo incentivo foi de grande
importância nesta caminhada.
Aos meus amados irmãos: Luciano (em memória), que foi presença na ausência,
Bruna e Vitor Hugo, com quem sempre posso contar.
À Magnólia, Neve (em memória) e Clarice, que foram meus alicerces, oferecendo-me
carinho e ternura.
“...a literatura me salvou, pois se eu não pudesse escrever teria enlouquecido”
Scholastique Mukasonga
INTRODUÇÃO...........................................................................................................06
REFERÊNCIAS .........................................................................................................61
INTRODUÇÃO
1 Termo cunhado por Conceição Evaristo em sua tese de mestrado, 1996 – Conceição Evaristo
conceitua “escrevivência” como a escrita que nasce de nosso cotidiano, das lembranças, da experiência
de vida das mulheres negras, historicamente jogadas à margem da sociedade. (GÉLEDES, 2020).
6
para o desfecho da barbárie, e, consequentemente, na omissão da comunidade
internacional.
Na terceira camada, chegamos à ideologia, tema que levou a autora a
compartilhar suas memórias, ou seja, seu dever político.
Ao realizarmos as leituras de forma sucessiva, desvelamos as estratégias de
contenção utilizadas pela escritora para expressar o tema central de sua obra, o
genocídio de Ruanda, haja vista que, numa leitura mais profunda, a narrativa exerce
a função social de denúncia e resistência, apresentando-se não só como uma obra
memorialística, mas, segundo Fredric Jameson (1992), como um ato socialmente
simbólico, que faz emergir do texto uma realidade reprimida e oculta, fruto de um
inconsciente político.
Há que se ressaltar que a pesquisa apresentada também surgiu da falta de
estudos acerca da obra primogênita de Mukasonga. Baratas, segundo a Editora Nós,
responsável pela publicação dos livros da autora no Brasil, desponta como a menos
comercializada da trilogia do genocídio, sendo ofuscada por A Mulher de Pés
Descalços e Nossa Senhora do Nilo. O caráter inédito da obra aguçou o desejo de
nos debruçarmos em um relato tão rico e desafiador.
O desenvolvimento desta dissertação é norteado, inicialmente, pela fortuna
crítica de Baratas e sua recepção, perpassando pela importância da obra. Em seguida,
aprofundamo-nos no contexto histórico do genocídio de Ruanda, como o gatilho da
escrita de Mukasonga, sob o aporte teórico de Roberto Schwarz e Fredric Jameson,
que conduzem esta análise. Propomo-nos, portanto, pensar a literatura associada a
questões sociais, considerando Baratas mais do que uma obra intimista, mas fruto de
uma necessidade de verdade, uma obra de resistência.
7
1. SCHOLASTIQUE MUKASONGA: VOZ QUE EXISTE E RESISTE
“...sou mesmo aquela que é sempre chamada por seu nome ruandês, o
nome que me foi dado pelo meu pai, Mukasonga.”
Scholastique Mukasonga
Era uma região para onde o rei enviava as pessoas que caíam em desgraça,
uma região onde praticamente não chove, uma savana seca onde vivem
grandes animais como leões, elefantes e, ainda por cima, tinha aquela mosca
tsé-tsé, que dá a doença do sono, e os raros habitantes locais morriam dessa
doença. (MUKASONGA, 2017)2.
2Entrevista concedida por Scholastique Mukasonga à revista RFI, em 21 de julho de 2017, por ocasião
da FLIP.
8
A fome e a miséria vividas em Nyamata, capital de Bugesera, marcaram a
alma de Scholastique, porém, não foram suficientes para evitar que a autora
continuasse seus estudos. Cumprir com seus compromissos escolares não foi tarefa
fácil. A começar pelo processo de seleção, que limitava aos Tutsis um número mínimo
de cotas.
Havia ainda menos vagas para os tutsis porque, segundo as cotas étnicas
estabelecidas pelo regime hutu, eles só tinham direito a dez por cento das
vagas. Essa porcentagem lhes era concedida parcimoniosamente, e segundo
critérios que, com frequência, não tinham nada a ver com as notas obtidas.
Em Nyamata, estávamos longe da fatal cota étnica; na maior parte do tempo,
nenhum candidato de Nyamata figurava na lista dos admitidos.
(MUKASONGA, 2018, p.81).
9
presença de Scholastique colocava sua família em perigo: “No dia seguinte, pegamos
a estrada do Burundi. Revejo minha mãe na beira da pista, sua silhueta frágil envolvida
em sua canga. É a última imagem que guardei dela, uma pequena silhueta que se
apaga na curva da estrada.” (MUKASONGA, 2018, p. 130).
Em março de 1992, quando já morava na França, Scholastique recebe
notícias de seu pai; em uma carta, ele conta que “chovia demais” em Ruanda, um
código que significava que os atentados aos tutsis ganhavam grandes proporções. Na
primavera de 1994, eclode o genocídio, e Scholastique perde trinta e sete pessoas de
sua família. Nos dias que sucederam à barbárie ruandesa, a autora tenta localizar os
eventuais sobreviventes. Assediava a diáspora ruandesa, a Cruz Vermelha, os
Médicos sem Fronteiras e várias outras ONGs em ligações telefônicas angustiantes
(MUKASONGA, 2018, p. 135), porém, todos os seus esforços não lhe trouxeram
retorno, cabia-lhe aceitar a desgraça. Nunca mais os veria.
Em 2004, Scholastique volta a Ruanda com seu marido e filhos, e encontra
um cenário desolador. Sua antiga casa não mais existia, estava tomada pela
vegetação. Dos seus, apenas restavam suas memórias e cabia a ela, a escolhida para
sobreviver, manter vivos aqueles que tiveram suas vidas arrancadas da forma mais
brutal possível.
11
1.1 INIENZY: ASPECTOS DA FORTUNA CRÍTICA DA OBRA
12
genocídio ocorrido em Ruanda, na década de 90, no qual a autora perde grande parte
da sua família, mas também acerca do discurso de ódio e os processos de
desumanização provenientes deste, o que, de certa forma, é um problema que aflige
as minorias brasileiras.
Em sua primeira vinda ao Brasil, em 2017, Scholastique Mukasonga participou
de vários eventos literários. Atração da 19ª Festa Literária Internacional de Paraty,
Flip, que objetivou defender a bandeira da diversidade com autores que
representassem a literatura contemporânea mundial. O evento abriu espaço para que
Scholatique Mukasonga pudesse divulgar seus trabalhos recém-traduzidos para o
idioma brasileiro. Joselia Aguiar, curadora do evento, justificou o convite à autora por
esta ser a primeira ruandesa a ganhar o Renaudot3, uma das maiores premiações
literária da França. Durante seus dias em solo verde-amarelo, a autora se mostrou
acessível e concedeu diversas entrevistas às principais revistas brasileiras. Sua visita
deu-se pelo lançamento de duas das suas obras: A Mulher de Pés Descalços e Nossa
Senhora do Nilo. Mukasonga, membro de destaque da mesa cujo tema era memória
da maternidade, comoveu todos os presentes com suas narrativas,
Ela narra de forma poética a rotina de sua mãe na missão de manter viva a
cultura familiar e ensinar aos filhos técnicas de fuga e sobrevivência, isso
décadas antes do genocídio de 1994 em Ruanda — uma tragédia iminente
que, como ressalta Scholastique, a comunidade internacional preferiu fechar
os olhos para não ver. (REVISTA VEJA, 2018).
3 O Prêmio Renaudot é uma das mais importantes premiações literárias da França. O prêmio é
nomeado em honra do jornalista francês Théophraste Renaudot que fundou o primeiro jornal (La
Gazette) na França em 1631 e foi criado em 1926 por dez críticos de arte e periodistas que esperavam
a deliberação do Prêmio Goncourt (concedido pela primeira vez em 1903). Scholastique Mukasonga
foi agraciada com o prêmio em 2012.
13
sobrevivente, há intenção de recuperar uma memória coletiva destroçada na
brutalidade do genocídio. (LE MONDE DIPLOMATIQUE BRASIL, 2021).
Baratas, o livro que ela escreveu, sem pretensão literária, justamente como
"dever de memória", e que a Gallimard publicou em 2006, chega agora ao
Brasil pela Editora Nós um ano depois de ela ter se tornado uma das
sensações da Flip, quando, desconhecida do leitor brasileiro, lançou aqui os
dois livros seguintes.[...] O livro é cronológico, perpassa a infância da autora
e retrata não só o terror que pairava sobre as pessoas de sua etnia, mas a
miséria, a humilhação, os deslocamentos intermináveis a pé ou como gado
em caminhões, a sede, a fome, o medo e a dor. (A CRÍTICA DE CAMPO
GRANDE, 2018).
14
respeito da guerra civil entre Tutsis e Hutus contribuiu para a relevância da obra de
Scholastique, para a história não só de Ruanda, mas também para denunciar o
tamanho descaso da comunidade internacional diante da barbárie que assolou o país
em 1994.
No Brasil, conforme citado anteriormente, Baratas chega em 2018, porém
ganha um pouco mais de destaque em 2020, sendo referenciado e comentado por
leitores brasileiros que enxergaram na obra de Mukasonga o reflexo da situação social
no país. O extremismo político brasileiro foi refletido na obra da autora, que narra a
força do discurso de ódio que transforma vizinhos em inimigos, no caso de Ruanda,
em assassinos. Além do extremismo, outras interpretações da obra análogas ao
contexto da recepção foram despertadas pelo cenário pandêmico, como a atitude do
governo brasileiro que, assim como fez a comunidade internacional com Ruanda, agiu
com descaso no combate ao Covid-19, vitimando aproximadamente 600.000 pessoas.
A obra literária não é um objeto que exista por si só, oferecendo a cada
observador em cada época um mesmo aspecto. Não se trata de um
monumento a revelar monologicamente seu Ser atemporal. Ela é, antes,
como uma partitura voltada para a ressonância sempre renovada da leitura,
libertando o texto da matéria das palavras e conferindo-lhe existência atual.
(JAUSS, 1994, p. 25).
[...] há um saber prévio, ele próprio ele mesmo um produto dessa experiência
com base no qual o novo que tomamos conhecimento faz-se experenciável,
ou seja, legível, por assim dizer, num contexto experencial. Ademais, a obra
que surge não se apresenta como novidade absoluta num espaço vazio, mas,
por intermédio de avisos, sinais visíveis invisíveis, traços familiares ou
indicações implícitas, predispõem seu público para recebê-la de uma maneira
bastante definida (JAUSS, 1994, p. 28).
16
importante, eu precisava que o maior número de pessoas tivesse acesso à
minha história e, ao mesmo tempo, isso faz parte dos valores profundos que
adquiri da minha família. Aliás, sou assistente social e no cotidiano tenho que
me fazer entender pela população mais simples, a mais carente. Devo estar
presente sendo eu mesma. Não posso fazer uma coisa que seja complicada,
por esses valores profundos, pela minha história, que devo compartilhar e
pela profissão que escolhi. É isso, é simplesmente isso. (MANUSCRITA,
2020 p. 227-228)
17
1.2 A CONSTRUÇÃO DE UM TÚMULO DE PAPEL: ASPECTOS TEÓRICOS
18
lugar de memória, pois mesmo cientes de que ela não tem a obrigatoriedade
documental com a veracidade dos fatos, ela oferece ao autor diversos caminhos para
dizer a verdade.
Há que se ressaltar que no que tange os estudos pós-coloniais, percebemos
que é por meio da memória que se recupera o que foi perdido. A narrativa dos
acontecimentos sob o olhar da sobrevivente permite que seja reconstruída não só a
identidade social, que denuncia e desconstrói o colonialismo e os discursos de poder,
mas também o resgate político e cultural de um povo que foi condenado a um
genocídio devido ao processo colonizador que segregou a sociedade ruandesa.
Para analisar o livro Baratas, de Scholastique Mukasonga, utilizamos o
modelo de análise proposto por Roberto Schwarz em A Poesia Envenenada de Dom
Casmurro, capítulo do livro Duas Meninas (2006). Schwarz aponta que a obra
machadiana possui “algo de armadilha, com lição crítica incisiva”. Tal armadilha é
melhor analisada quando colocada em camadas. Em Dom Casmurro, a análise é feita
a partir de três leituras sucessivas, as quais são intituladas respectivamente como:
romanesca, patriarcal/policial e leitura à contracorrente. Na primeira leitura,
romanesca, acompanha-se a formação e a decomposição de uma história de amor, o
que, diga-se de passagem, carrega a superficialidade da obra, escondendo as
denúncias sociais que Machado de Assis traz no decorrer da sua narrativa; no
segundo nível de leitura, ele analisa o retrato social que emerge da obra machadiana,
bem como as pistas e enigmas deixados pelo autor com o objetivo de dar credibilidade
à personagem Bentinho, na última, o enigma é decifrado, em uma leitura
contracorrente.
O deslocamento feito por Roberto Schwarz provoca nos leitores a inquietação
e corrobora a leitura social das obras literárias, bem como a recepção destas. O que
propomos aqui, também é um deslocamento de sentidos na leitura da obra Baratas,
de Scholastique Mukasonga, salvo as peculiaridades de cada obra, também
abordaremos a leitura em camadas. Na primeira camada de leitura, analisamos a
superfície da obra, concebendo a obra Baratas como uma narrativa testemunhal sobre
o genocídio ruandês e os anos que o antecederam; na segunda camada de leitura,
analisaremos os “não ditos” da autora, os quais nos fazem perceber como se deu a
influência do colonizador, que culminou na barbárie vitimando mais de 800.000
ruandeses e as estratégias discursivas utilizadas pelos Hutus, visando à manipulação
19
da sociedade contra os tutsis e, na terceira camada de leitura, desvendamos a
importância da escrita de Scholastique Mukasonga, pois acreditamos que mais do que
testemunhal, Scholastique narra suas memórias com o objetivo de denunciar a
omissão internacional e o descaso com o qual Ruanda foi tratada durante o genocídio.
Embora a autora afirme que escreveu para reavivar os mortos, seu livro tem caráter
de resistência, de sobrevivência.
20
AOS RAROS SOBREVIVENTES QUE CARREGAM A DOR DE SOBREVIVER
Não quero chorar, sinto as lágrimas escorrerem pelas minhas faces. Fecho os olhos, esta
será mais uma noite sem sono. Tenho muitos mortos a velar.
Scholastique Mukasonga
21
maneiras com a sede de poder da comunidade europeia. Por isso, mesmo que a
escrita parta de uma ação individual, ela não é fruto de experiências isoladas, pois
Scholastique traz as vozes não só de sua família, mas de todos os que foram
silenciados.
22
Escrito em primeira pessoa, Baratas narra as experiências de sobrevivência
da família de Mukasonga ligadas ao grupo Tutsi, trazendo no decorrer da sua escrita
as tradições, religião e os esforços de toda uma comunidade para resistir à violência
dos hutus fomentada pelo processo colonial.
Mukasonga inicia sua obra deixando claro que suas memórias ocorrem em
diáspora, o que torna ainda mais angustiante a sua narrativa e perceptível a sua dor.
Todas as noites meu sono é abalado pelo mesmo pesadelo. Sou perseguida,
escuto uma espécie de zumbido que vem em minha direção, um barulho cada
vez mais ameaçador. Não me viro. Não vale a pena. Sei quem me persegue…
sei que eles têm facões. Não sei como, sem me virar, sei que eles têm
facões…às vezes, também, aparecem minhas colegas de classe. Escuto
seus gritos quando elas caem. Quando elas… agora, estou correndo sozinha,
sei que vou cair, que vão me pisotear, não quero sentir o frio da lâmina sobre
o meu pescoço, eu… Acordo. Estou na França. A casa está em silêncio. Meus
filhos dormem em seu quarto. Tranquilamente. Acendo o abajur de cabeceira.
Vou até a sala e me sento em frente a uma mesinha. Sobre ela, há uma caixa
de madeira e um caderno escolar de capa azul. Não preciso abrir a caixa, sei
o que ela contém: um pedaço de tijolo todo gasto, uma folha seca, uma pedra
chata e afilada, as bordas cortantes, letras escritas em folhas de caderno.
(MUKASONGA, 2018, p. 7).
Eu tinha três anos, e foi então que as primeiras imagens de terror ficaram
gravadas na minha memória. Eu me lembro. Meus irmãos e minha irmã
estavam na escola. Eu estava em casa com a minha mãe. De repente, vimos
fumaça subindo de todos os lados, sobre as encostas do monte Makwaza, do
vale do Rususa, onde morava Suzanne, mãe de Ruvebana que, para mim,
era como minha avó. Depois escutamos os barulhos, os gritos, um rumor
como um enxame de abelhas monstruosas, um bramido que invadia tudo.
Esse barulho, eu ainda o escuto hoje, como uma ameaça vinda em minha
direção, e às vezes, nas ruas da França, ouço-o ressoar; não ouso me virar,
aperto o passo. Não é esse mesmo ruído que me persegue com frequência?
(MUKASONGA, 2018, p. 13).
23
No início, eu estava, acima de tudo, contente: uma viagem de carro não
acontecia com muita frequência. Mas a viagem foi ficando cada vez mais
penosa, não terminava, estávamos amontoados, os solavancos da estrada
nos jogavam uns sobre os outros, lutávamos para não sufocar, tínhamos
sede, não havia água. As crianças choravam. Quando passávamos por um
rio ou um lago, os homens batiam no teto da cabine do chofer pedindo que
ele parasse, mas os caminhões seguiam em frente. A noite caiu. Ninguém
sabia onde estávamos indo. Percebi desespero no olhar da minha mãe. Tive
medo. (MUKASONGA, 2018, p. 17).
No trecho acima, ela narra a partida dos tutsis de Mugombwa, local onde se
refugiaram após o primeiro ataque hutu, para o exílio em Nyamata, mais precisamente
em Bugesera. Mesmo suas lembranças sendo infantis, é interessante analisarmos
pelas entrelinhas o registro que a autora faz dos costumes de seu povo.
Outro ponto que destaca a inocência da memória infantil, o que nos faz
repensar o lugar das crianças nas catástrofes, é a forma como situações vexatórias
podem marcar toda a vida:
As ações dos soldados, embora inocentes aos olhos de uma criança, denotam
a forma com a qual os tutsis foram tratados; afinal, “dar biscoitos” remete a
comportamentos que temos para com os animais. Essa animalização é perceptível
em outros momentos da narrativa:
Todas as manhãs, os refugiados faziam fila para receber seu pocho, sua
“ração”. [...] Os militares davam golpes com o cabo do fuzil para fazer a fila
avançar mais rápido. Havia confusão, gritos. Os tutsis tinham, acima de tudo,
sua dignidade. Não podiam suportar as humilhações e desordens.
(MUKASONGA, 2018, p. 21).
24
Nesse capítulo em especial, ela conta como os desterrados enfrentaram o
exílio. Assumir a condição de exilados em seu próprio país não foi tarefa fácil, o
deslocamento territorial afetou o sentimento de pertencimento dos ruandeses, fazendo
com que não se sentissem mais parte da sua nação, devido à condição de serem
tutsis.
Numa manhã cedo, os caminhões voltaram. Fomos reunidos no pátio da
escola. Todos pensaram: “Enfim eles vieram nos buscar; desta vez, o exílio
acabou. Vamos voltar pra casa”. Foi feita a chamada. Aquilo só dizia respeito
a algumas famílias hutus que tinham sido levadas por engano. Elas voltaram
a Ruanda, como dizíamos. Entre elas estava a de Yosefu, cuja mulher,
Nyirabasesa, era hutu. Nyirabasesa e minha mãe eram amigas; adoravam
trocar ideias para saber como usar a farinha amarela e outros produtos
desconhecidos que eram distribuídos. Eu brincava com seus filhos.
Comíamos juntos. Eles partiram em caminhões quase vazios. O desespero
tomou conta de todos que ficaram. Eles entenderam: jamais voltariam a suas
casas. Por serem tutsis, estavam condenados a viver como párias,
pestilentos, em uma reserva da qual não poderiam escapar. Contudo, esse
desespero foi o cimento de uma solidariedade bem mais forte do que jamais
fora estabelecida por uma suposta consciência étnica. (MUKASONGA, 2018,
p. 23).
É também nesse capítulo que a autora começa a trazer mais vozes à sua
narrativa. Em Baratas, pelo princípio de economia narrativa bem como devido à
memória fugidia de uma criança, as motivações sociológicas criam personagens
densos e profundos, carregados de representação social.
O quarto capítulo, 1961–1964: A exclusão “democrática”, é um soco no
estômago; Scholastique narra os acontecimentos de forma tocante ao leitor; narra o
desespero silencioso dos exilados que acreditam em um boato de que o rei tutsi Kigeri
voltaria para levar de volta os desterrados para suas casas. Diante de todas as
25
atrocidades às quais foram sujeitados, a notícia se espalhou como um fio de
esperança.
O trecho acima traz ao leitor fruitivo um alívio, pois, tal qual os tutsis, ele
também se alegra com a possibilidade de um desfecho humanitário; porém, a
narrativa, mesmo sendo real, apresenta-se como uma distopia, tamanha a crueldade
que se seguiu.
26
dos agouros de má sorte prescritos em sua tradição, os homens tutsis quebraram os
arcos que construíram, e as mulheres rasgaram as coroas de casca de sorgo.
Fizeram isso com a morte na alma, sabendo o quanto esses gestos traziam
má sorte. E, de fato, os soldados voltaram, patrulharam por toda parte, nas
casas, na brousse. Não tinham mais medo. Estavam confiantes. Tinham o
capacete bem enfiado na cabeça. E nos olhos, parecia-nos ler uma raiva
implacável. Eles nos chamavam de inyenzis, as baratas. A partir de então,
em Nyamata, seríamos todos baratas. Eu era uma inyenzi. (MUKASONGA,
2018, p. 46).
27
Os militares exigiam que, em cada casa, fosse pendurado o retrato do
presidente Kayibanda. Os missionários cuidavam para que fosse colocada ao
seu lado a imagem de Maria. Vivíamos sob os retratos parelhos do presidente
que nos havia condenado ao extermínio e de Maria, que nos esperava no
céu. (MUKASONGA, 2018, p. 60).
28
Historicamente, uma das armas dos algozes é o estupro, devido à
impunidade advinda da suposta supremacia, motivado pelo sentimento de punição,
humilhação. Este tema também é abordado por Mukasonga, que, sendo mulher,
também está sujeita a esse tipo abominável de violência.
Cada aluno possuía uma ficha de dados, na qual estava indicada a pretensa
etnia, uma marca a ferro e fogo. Quando era preciso apresentá-la a uma irmã,
seu olhar e sua atitude mudavam de imediato: desconfiança, desprezo ou
raiva? Eu não queria saber. Também foi descoberto que eu vinha de
Nyamata. Eu não apenas era tutsi, mas uma inyenzi, uma dessas baratas
lançadas para fora da Ruanda habitável, talvez para fora do gênero humano.
Além disso, logo me senti diferente entre as minhas colegas. Ou melhor, eram
elas que, cruelmente, me faziam sentir assim. Faziam-me ter vergonha da cor
da minha pele, menos escura do que gostariam, do meu nariz, reto demais,
segundo elas, dos meus cabelos, muito volumosos. Eram sobretudo os meus
cabelos que me davam mais preocupação. Eram etíopes, ao que parece,
irende, característica que elas atribuíam às inyenzis. Eu levava um tempo
molhando esses cabelos de inyenzi, a fim de reduzi-los a uma pequena bola,
apertada como uma esponja. Em geral, me conformava em raspá-los. Ficava
29
com pena; apesar das gozações, eu gostava dos meus cabelos.
(MUKASONGA, 2018, p. 87).
30
Scholastique aborda, mesmo de forma superficial, o extremismo implantado
pelo discurso de ódio, quando conta que seu irmão, André, precisava partir, pois Fidèle
Rwambuka, grande amigo de sua infância, tornara-se burgomestre4 da comuna
Kanzenze, segundo a denominação oficial de Nyamata, o que tornaria André um alvo.
No capítulo onze, 1973: Refugiada no Burundi, Mukasonga narra os dias de
exílio no Burundi. Lugar onde ela e seu irmão tiveram como objetivo terminar seus
estudos.
Seguimos fielmente o nosso plano. Eu só pensava em estudar, em me sair
bem, para que André pudesse, por sua vez, retomar seus estudos. Éramos
cinco ruandesas na escola, certamente inseparáveis, mas minhas colegas
hutus, cujas famílias tinham sido atingidas pelos massacres de 1972, vinham
até mim voluntariamente. Nós nos considerávamos vítimas da mesma
loucura “étnica”. Aquilo nos aproximava. O mesmo acontecia com as
camponesas com quem eu praticava as atividades rurais. Fui bem acolhida
pelas viúvas; elas só viam em mim uma exilada infeliz, perseguida pela
mesma fatalidade implacável que, tanto em Ruanda, quanto no Burundi, tinha
se abatido sobre nossos dois povos e os levado, sem que nós mulheres
pudéssemos nos opor, às profundezas do horror. (MUKASONGA, 2018, p.
118).
Mas havia uma sombra em nossa alegria. Uma família desconhecida, que
minha mãe tinha mandado chamar, veio se juntar à festa. Minha mãe, um
pouco incomodada, explicou-me à meia voz que eram nossos novos vizinhos,
hutus, vindos do norte do país. Tinham sido instalados no final do nosso
campo. Não eram os únicos. As autoridades tinham destinado terras a
famílias vindas das províncias de Ruhengeri e Gisenyi. Era fato que essas
Jeanne, que estava grávida de oito meses, não conseguiu acompanhar a fuga
da multidão em pânico. Entregou seus três filhos mais velhos aos vizinhos
que voltaram com os outros para Nyamata. Recebeu um golpe de facão.
Escondeu-se em uma moita. Ficou com Nana, a menorzinha. Por quanto
tempo ela ficou escondida? Ninguém sabe me dizer. Não conseguindo ficar
sem notícia dos filhos, ela resolveu descer para Nyamata. Mataram-na em
frente da comuna. Como? Quem? A carta de Jocelyne tem as precisões e
incoerências de um pesadelo. Ferida, Jeanne foi abatida no chão. Foi
estripada. Arrancaram-lhe o feto. Espancaram-na com o feto. Nana estava ao
lado deles. Os assassinos foram embora. Deixaram Nana junto à mãe.
(MUKASONGA, 2018, p. 143).
No último capítulo, Scholastique narra sua visita a Ruanda dez anos depois
da chacina que dizimou quase um milhão de Tutsis; o caminho é feito de forma
dolorosa, e no seu decorrer a autora resgata as lembranças e aviva a memória dos
que sucumbiram ao genocídio.
Estão todos lá, na noite clara da minha lembrança. Sindabye, de quem uma
das filhas, Valérie, tinha frequentado a escola de assistência social de Burate,
na modalidade auxiliar. Rwahinyuza: um dos seus filhos, Claudiyani, virou
comerciante em Nyamata. Era o único que possuía um veículo. Prestava
vários serviços a todo mundo. Recorria-se a ele para o transporte dos
doentes. Felicita, viúva de Tito, que teve que cuidar das plantações sozinha
para criar os dois filhos restantes. Mas todos os habitantes de Gitwe e
Gitagata vinham ajudá-la. Ela era a viúva da aldeia. Donati, irmão de Mariya.
Trabalhava no Instituto Agronômico de Karama e só vinha a Gitagata para
animar os casamentos, porque era o melhor dançarino. Achávamos que era
tão bonito quanto a irmã, e ele mesmo estava convencido disso. E havia duas
meninas que viviam só com sua mãe deficiente, Bwanakeye e Runura, a
manca. Elas não podiam se defender dos jovens do partido, que as faziam
de brinquedo. E tantas outras que se aglomeram nas minhas lembranças:
Suzanne, a velha Nyiragasheshe, Athanase, Gashugi, Theresa, Godeliva, a
viúva de Nteri, Nyirarwenga, Siridiyo… (MUKASONGA, 2018, p. 166).
33
Fecho os olhos e, sobre o cenário das lembranças, reposicionam-se as coisas
desaparecidas. E eis que, novamente, acolhem-me à entrada os grandes pés
de café carregados de frutos vermelhos. A seus pés, a manta de ervas secas
é um tapete sobre o qual adoro caminhar descalça. A trilha está ladeada de
flores amarelas, que Jeanne cuida com amor. Bem perto da casa, as
bananeiras desfrutam o caldo do cozimento do feijão; são elas que produzem
as variedades mais suculentas – as kamaramasenge, as ikingurube. Minha
mãe reservou-nos os cachos mais bonitos para as férias, para a nossa volta.
Diante da porta, um grande pé de mandioca funciona como toldo. Minha mãe
espera-me na soleira. Amarrou sua canga mais bonita, a que usa para ir à
missa. Abraçamo-nos longamente, como pede o costume, como que para nos
impregnar do calor dos nossos corpos. Ela entra em casa primeiro, e escuto
o marulho familiar da cerveja de sorgo que fermenta nas grandes jarras.
Penetramos no cômodo escuro. Minha mãe estende-me um canudo. Enfio-o
no líquido fremente. Estou em casa. (MUKASONGA, 2018, p. 177).
34
RUANDA, UM PAÍS PROIBIDO
“Foi assim”, dizia meu pai, “que nós votamos em Kayibanda, eu e todos os
refugiados tutsis de Nyamata, votamos no homem que tinha jurado nos aniquilar”.
Scholastique Mukasonga
37
2.1 PERÍODO COLONIAL
Según las autoridades belgas: El tutsi de buena raza no tiene, a parte del
color, nada de negro. Su estatura es muy elevada, 1,80 m como mínimo;
1,90m es una buena estatura que muchos sobrepasan. La delgadez de un
tutsi es muy característica y a veces se acentúa con la edad. En su juventud,
sus rasgos son de una gran pureza: frente recta, nariz aguileña, labios finos
y dientes blancos. Las mujeres tutsi tienen, en general, una tez mucho más
clara que sus maridos. Esbeltas y bonitas en su juventud, se fortalecen
rápidamente. De una viva inteligencia, a menudo con una delicadeza de
sentimientos inusual entre los primitivos, las tutsi son muy respetuosas con el
sentido del mandamiento, con una extraordinaria capacidad de autocontrol,
38
sabiendo em todo momento cómo ser benévolas sin esforzarse. (GALÁN;
DIAZ-MADROÑERO, 2020, p.9).
39
Tais mudanças ficaram ainda mais sensíveis a partir do momento em que o
governo ruandês atrelado ao poder colonial realizou uma institucionalização
das identidades raciais a partir de documentos de identidades que separavam
tutsis e hutus enquanto grupos raciais distintos que possuíam diferentes
locais na sociedade Banyarwanda. Desta forma, o ruandês ficou legalmente
marcado como um tutsi ou um hutu a partir da década de 1930 (FONSECA,
2015, p. 118 apud FONSECA, 2019).
40
2.2 O INÍCIO DO (QUASE) FIM
Assim, a grande maioria dos ruandeses não seguiu seus líderes tradicionais,
buscando o apoio dos colonialistas belgas para realizar uma forma de
“transição transada” e conseguindo inclusive suporte militar por parte dos
belgas, corroborando assim com a revolução e a expulsão dos monarquistas
tutsis, dando fim, assim, ao colonialismo belga em Ruanda. No entanto, os
belgas continuaram com uma ampla influência e inserção na política e
também na economia ruandesa mesmo durante o período independente.
(FONSECA, 2019, p.12).
41
Em 1958, os Tutsis fundaram seu próprio partido, a União Nacional Ruandesa,
e, em resposta, os colonizadores belgas incentivaram os hutus a fundar o Partido do
Movimento de Emancipação dos Hutus (Parmehutu). Em outubro de 1959 explode a
primeira revolução social de Ruanda.
42
pública. Os meios de comunicação se encarregaram do restante. A Rádio e Televisão
Livre das Mil Colinas (apelido do país) sistematicamente difundem o ódio, bem como
uma dezena de jornais subsidiados pelo governo. No começo, diziam que os hutus
deveriam se preparar para se proteger contra os tutsis. Começou assim um processo
de “desumanização” dos tutsis, referidos como “baratas” a serem exterminadas.
Muitas pessoas de bem, sem perceber, foram enraizando um ódio irracional,
incorporando em seus cotidianos piadinhas discriminatórias e expressões
depreciadoras a respeito dos tutsis. (RAMOS FILHO, 2018).
O conflito instaurado entre os dois grupos de Ruanda foi avivado pelos
programas étnicos criados pelo estado; o objetivo era exilar os tutsis do seu próprio
país, o que foi chamado pelas forças militares de "limpeza étnica dentro do país." “Os
caminhões arrancaram. À beira da estrada havia uma multidão para assistir à
passagem do comboio. As pessoas gritavam: “Olhe os tutsis indo embora”, e cuspiam
em nossa direção, brandindo seus facões.” (MUKASONGA, 2018, p. 17). O exílio dos
tutsis, vivenciado pela família de Mukasonga, foi narrado por ela no capítulo II da obra
1960: Exilada do Interior.
Não sei quanto tempo durou a viagem. Bem mais tarde, soube que o comboio
passou pelo Burundi: Ngozi, Kirundo. Por fim, os caminhões pararam no pátio
de uma escola. O calor surpreendeu-nos. Vínhamos de Butare, das
montanhas, onde é sempre fresco. Todos morriam de sede. As mulheres
amamentavam as crianças desmamadas, para lhes dar algo de beber. Os
homens saíram à procura de água. Estávamos, realmente, em um país
desconhecido que não parecia Ruanda. Não sei quando meus pais se deram
conta de que tinham sido deportados para Nyamata, em Bugesera. Bugesera!
O nome tinha algo de sinistro para todos os ruandeses. Era uma savana
quase desabitada, moradia de grandes animais selvagens, infestada pela
mosca tsé-tsé. Dizia-se que o rei exilava para lá os chefes caídos em
desgraça. (MUKASONGA, 2018, p. 19).
Voltando de férias em 1972, logo constatei que o clima tinha mudado [...]uma
tarde, durante a aula de matemática, ao que me parece, ouvimos um grande
estrondo. Era o portão da entrada principal que caía e, quase ao mesmo
tempo, duas colegas tutsis do último ano abriram a porta da classe, gritando:
“Mukasonga! Mukasonga! Corra!”. Sem pensar, precipitamo-nos pelo
corredor. Atrás de nós, havia esse rumor de multidão vindo em nossa
perseguição, como treze anos antes, em Magi, esse rumor que avança até
mim, que escuto até hoje, que me persegue em meus pesadelos.
Atravessamos o terreno vazio. Não sei como, passamos pelo arame farpado
da cerca e nos escondemos no bosque de eucaliptos que separava a escola
da estrada de Gikongoro. Do nosso esconderijo, vimos passar nossas
colegas que lideravam os meninos do grupo escolar, gritando: “As inyenzis,
é o fim delas, desta vez elas vão se ver com a gente!”. (MUKASONGA, 2018,
p. 105).
45
da FPR e permitiu que o governo ruandês se armasse e iniciasse o massacre dos
tutsis.
Em 6 de abril de 1994, o avião presidencial do General Juvenal Habyarimana
foi abatido; assim, encorajada por uma propaganda massiva pelos meios de
comunicação, inicia-se uma onda de perseguição da maioria da população Hutu pelos
Tutsis, como sinal de represália pelo atentado ao presidente. E a partir de sua morte,
tem início o genocídio de Ruanda, em que o exército ruandês e as milícias armadas
começam a realizar bloqueios em estradas e nas principais cidades do país, além de
fazer incursões em residências, com o intuito de localizar e assassinar tutsis e hutus
considerados traidores. O conflito dura pouco mais de cem dias, vitimando em torno
de 800 mil e um milhão de ruandeses, e só tem seu fim oficial com a ocupação da
capital Kigali pelas forças da Frente Patriótica Ruandesa, em 18 de julho de 1994.
(SANTOS JÚNIOR, 2012).
Os Hutus foram convocados a assassinar os cidadãos ruandeses de etnia
tutsi sem critério algum; para isso recebiam incentivos como dinheiro ou comida, além
de ser permitida pelos mandantes a apropriação das terras e bens das vítimas. O
resultado foi chocante. As narrativas do genocídio chegam a níveis distópicos e
alcançam requintes de crueldade. Os tutsis foram assassinados com facões, martelos,
porretes, lanças ou qualquer ferramenta que pudesse ser usada como arma.
Gradualmente a Frente Patriótica Ruandesa, fundada pelos tutsis, avançou e
derrubou o “governo” em Kigali, em meados de julho de 1994. Milhares de hutus
fugiram, temendo represálias, a maioria dos envolvidos no holocausto, foram para os
países vizinhos, inclusive para o Congo, onde estes últimos formaram uma milícia que
existe até hoje. (AGUIAR, 2014).
Voltemos nosso olhar para as estruturas internas submetidas às relações de
poder, haja vista que tais relações foram, de certa forma, responsáveis pela morte de
mais de 800.000 ruandeses. Comecemos pela atitude da Bélgica, detentora do poder
colonial, que abriu espaço para a propaganda racista e para a separação de raças em
Ruanda, acirrando as diferenças, já existentes, entre Hutus e Tutsis, amparada pela
posse de cabeças de gado, estigmatizando a maioria da população ruandesa e
limitando-a uma categorização, ignorando os sujeitos e seus laços parentais.
46
2.4 RUANDA APÓS O GENOCÍDIO
Embora vinte e sete anos já tenham se passado, ainda são encontrados restos
mortais de 1994, algo não mais tido como fora do comum, infelizmente. Embora seja
lembrado com dor, o genocídio ruandês não é algo que as novas gerações querem
apagar, pelo contrário, as visitas frequentes ao Memorial do Genocídio, em Kigali, tem
a finalidade de manter vivas as memórias dos antepassados.
Para manter viva a reflexão acerca desse episódio da história de Ruanda,
todos os anos, em 7 de abril, dia que marcou o início do genocídio, é acendida a
chama da lembrança no Memorial do Genocídio, em Kigali, onde mais de 250 mil
pessoas estão sepultadas. O ato marca o início de cem dias de luto nacional no país
do leste africano. Os eventos buscam a reconciliação entre os ruandeses, sendo que
esta é a chave em um país marcado por um legado sangrento. Além disso, Ruanda
proibiu referências à questão étnica na vida pública, e priorizou o encaminhamento
dos culpados à justiça; todavia, sabe-se que muitos agressores continuam livres.
"O renascimento de Ruanda após a tragédia do genocídio espanta o mundo",
afirma a escritora Scholastique Mukasonga, "Ruanda se tornou modelo para os países
africanos. O visitante constata o desenvolvimento econômico, a luta implacável contra
a corrupção, o lugar que as mulheres têm. A segurança que reina em Kigali (capital)
leva as grandes empresas a estabelecerem lá suas sedes. Ruanda sonha ser a
pequena Cingapura africana." Porém, fazer justiça às vítimas não foi tarefa fácil. Em
2002, o governo reabilitou as cortes "gacaca", instrumento de resolução de conflitos
anterior ao colonialismo. De acordo com Jean Damascene Bizimana, secretário
executivo da Comissão Nacional de Luta contra o Genocídio, 1,9 milhão de casos
foram analisados dessa forma em dez anos, resultando em 500 mil presos - 10% ainda
cumprem pena. "Os tribunais lançaram as bases para a paz, a reconciliação e a
unidade de Ruanda", diz. Os mandantes dos crimes ficaram com o Tribunal Penal
Internacional para Ruanda (ICTR, na sigla em inglês), criado pela ONU em novembro
de 1994. Em 2015, quando encerrou os trabalhos, foram julgadas noventa e três
pessoas e condenadas sessenta e quatro. Foi a primeira Corte internacional, desde
Nuremberg, a condenar um chefe de Estado por genocídio (o primeiro-ministro Jean
Kambanda, sentenciado à prisão perpétua em 1998), o primeiro tribunal a considerar
47
estupro e violência sexual como formas de perpetração de genocídio e o primeiro a
julgar o papel da mídia na incitação das matanças.
Atualmente, em Ruanda, é vetada a diferenciação entre hutus e tutsis -
carimbada nas cédulas de identidade a partir de 1926 pelos colonizadores belgas -, e
a Constituição de 2003 proíbe a apologia e a negação do genocídio. Grupos de apoio
aos envolvidos promoviam, até há pouco tempo, sessões públicas de perdão.
Ademais, nas escolas, cursos acerca do genocídio foram incorporados ao currículo
nacional.
Com uma taxa média de crescimento de mais de 7% por ano desde 2000,
Ruanda é agora um dos principais países africanos em crescimento econômico.
Segundo dados oficiais, investimentos em agricultura, energia, infraestrutura,
mineração e turismo tiraram mais de 1 milhão de pessoas da pobreza. Este
desenvolvimento é acompanhado pela maior integração do país em estruturas
econômicas regionais, mas também sua maior participação na comunidade
internacional. Com 6.550 funcionários, Ruanda é agora o quarto maior contribuinte
para as operações de manutenção da paz das Nações Unidas. (UNESCO, 2019).
Alphonse Nkusi (2019), analista sênior de mídia no Conselho de Governança
de Ruanda, editor da New Vision, um dos dois jornais diários mais importantes de
Uganda, e professor de Comunicação Social na Universidade Makerere, em Uganda,
aponta que na atual Ruanda há um grande investimento em desenvolvimento
inclusivo, colocando as mulheres em primeiro plano na vida pública do país. "Elas
pagaram um preço alto durante a primavera negra em Ruanda: entre 100 mil e 250
mil mulheres foram vítimas de estupro e agressão sexual, essas terríveis armas de
guerra, reconhecidas pelo ICTR como atos de genocídio. Desde então, muitas delas
morreram de Aids, contraída durante os ataques." Objetivando à segurança das
mulheres, foi adotada a Lei de Prevenção e Punição à Violência com base em Gênero;
além disso, outras leis garantem a participação feminina na vida política e social: ao
menos 30% dos cargos são reservados para mulheres em todos os órgãos estatais
de todos os níveis. Essa estratégia reduziu a disparidade entre homens e mulheres
em um ritmo mais rápido. Atualmente, 62% dos parlamentares, 50% dos ministros e
40% dos funcionários do judiciário são mulheres.
Tanto a saúde quanto a educação têm absorvido 30% do orçamento nacional,
acarretando com que no âmbito educacional houvesse o investimento em tecnologias
48
de informação e comunicação. Como exemplo, o projeto "Um laptop por criança",
iniciado em junho de 2008, já em abril de 2021, 2.500 professores já receberam
laptops com o projeto “Um Laptop por Professor”, que também faz parte da Estratégia
Nacional de Transformação (NST1) até 2024. O Ministério da Educação do Ruanda
tem o objetivo de equipar mais de 88.000 professores nas escolas secundárias,
primárias e creches com laptops para facilitar a aprendizagem inteligente no país. O
país que almeja fazer da tecnologia digital um pilar do seu crescimento
socioeconômico anunciou, agora no mês de novembro de 2021, por meio de seu
Ministério de TIC e Inovação, a sua colaboração com a empresa americana Google
para acelerar a sua transformação digital. De acordo com Paula Ingabire, Ministra de
TIC e Inovação de Ruanda, o crescimento da economia digital que será apoiado pelo
Google “é essencial e continuará a estimular a transformação económica nacional de
acordo com a visão do país de se tornar uma economia impulsionada no
conhecimento “. A experiência que o Google trará para Ruanda faz parte do vasto
programa de apoio à transformação digital da África, revelado pela empresa
americana em outubro passado. De acordo com Nkusi, a grande maioria da população
já tem acesso a telefones celulares, e, dos aproximadamente 13 milhões de
habitantes, mais de 4 milhões já podem comprar e pagar suas contas, impostos, e até
multas de polícia por meio de aplicativos móveis. O mesmo se aplica aos
procedimentos administrativos. Basta visitar o portal Irembo (a palavra significa
acesso na língua quiniaruanda) para encontrar a maioria dos serviços governamentais
on-line.
No que concerne à saúde, os avanços tecnológicos também fizeram a
diferença; os serviços melhoraram consideravelmente em áreas remotas desde a
chegada da Zipline Drones que, segundo o chefe executivo da startup norte-
americana, fez mais de 4 mil entregas de sangue e medicamentos entre outubro de
2016 e abril de 2018.
A Cidade da Inovação, que será construída no marco da África50, a
plataforma de desenvolvimento de infraestruturas do Banco Africano de
Desenvolvimento (AfDB, sigla em inglês), também promete um futuro tecnológico
brilhante para Ruanda, que está agora bem-posicionada para se tornar uma
plataforma regional de TIC. Especialmente desde setembro de 2018, a inteligência
artificial (IA) entrou oficialmente no currículo universitário, graças a um mestrado
49
lançado pelo especialista senegalês Moustapha Cissé, chefe do centro de pesquisa
em IA do Google em Gana, e pelo Instituto Africano de Ciências Matemáticas (AIMS,
sigla em inglês), em Kigali. Um quarto de século após o genocídio contra os tutsis em
Ruanda, a nação dividida, devastada, em ruínas, necessitada de reconstrução e
reabilitação, está hoje resolutamente olhando para o futuro e preparando o terreno
para o que um dia poderá ser chamado de o milagre de Ruanda, afirma Alphonse
Nkusi.
Em 1978 ocorre uma nova eleição e Juvénal é eleito o novo chefe de estado
ruandês. Após sua eleição, ocorre uma série de problemas internos no país,
encorajando os tutsis refugiados em outros países a criarem a Frente Patriótica
Ruandesa, lançando ataques militares contra o governo hutu a partir de Uganda. O
clima já acirrado entre os grupos tem seu ápice quando o avião no qual estava o
presidente hutu de Ruanda, Juvénal Habyarimana, foi abatido próximo à capital,
Kigali. Os hutus culparam os tutsis, mesmo sem prova alguma, pela morte do então
chefe do estado; a fatalidade foi o estopim para o início de um dos maiores morticínios
presenciados pela humanidade.
50
VÍTIMAS VERSUS VÍTIMAS
Márcio Seligmann-Silva
51
É por meio da obra Baratas que a escritora transforma seu luto em escrita.
Baratas surgiu para a escritora como uma forma de lidar com o trauma.
Os estudos de Maurice Halbwachs, originalmente publicados em 1968, acerca
da memória coletiva, corroboram o que inferimos, de que a memória transcende o
individual; afinal, estas não pertencem exclusivamente ao autor, mas é necessário que
se leve em consideração o contexto e aqueles que vivenciam a mesma época
temporal.
52
sempre uma busca de compromisso entre o trabalho de memória individual e
outro construído pela sociedade. Aqui a já em si extremamente complexa
tarefa de narrar o trauma adquire mais uma série de determinantes que não
podem ser desprezados mesmo quando nos interessamos em primeiro plano
pelas vítimas individuais. (SELIGMANN-SILVA, 2008, p. 67).
53
Eu me lembro que íamos com muita frequência trabalhar para uma família
que se mostrava particularmente hospitaleira. A mãe chamava-se Kabihogo.
Esqueci o nome do pai. Eles tinham apenas uma filha, mais ou menos da
minha idade, por isso não recusaram a ajuda que viemos lhes propor.
Enquanto minha mãe trabalhava nas plantações, eu varria o quintal. A
menininha queria brincar comigo. Aquilo me dava certo descanso. Às vezes
eu chegava a ter o direito de comer com ela. (MUKASONGA, 2018, p. 29).
Para essa batalha bem nos servem os propósitos das artes. A cura, um tipo
de serviço que a arte presta por meio da voz de expressão ou do fator
expositivo de vários eventos cumulativos que precisam ser visibilizados. Suas
diversas possibilidades, quando bem aplicadas, podem nos dar a chance de
galgar postos antes impossíveis, visto que os caminhos para ir aos grandes
palcos onde se modulam as referências de pensamento influente ainda são
um desafio grande. Não conseguiremos sem a força da arte, pois uma
autonarrativa ainda é privilégio para poucos e não fazemos parte desse
universo por não atendermos aos critérios da meritocracia. (MAKUXI, 2020,
p. 37).
55
principalmente a ONU, que nada fez para evitar ou diminuir a barbárie que assolou o
país africano.
O genocídio foi consequência de uma divisão étnica já existente, porém,
estimulada pelo país colonizador, a Bélgica, que, visando à formação de uma elite,
criou uma classificação entre os ruandeses. Os que possuíam mais de dez cabeças
de gado, haja vista que a pecuária era vista como sinal de prosperidade econômica,
poder e educação, eram registrados como tutsis e os demais, 85% da população como
hutus. Os registros foram feitos nos documentos pessoais de identidade. Tal ação
ressaltou ainda mais o conflito entre os grupos, criando na maioria da população, no
caso os hutus, ressentimentos que foram alimentados por vinte anos, período no qual
Ruanda foi dominada pela Bélgica.
A todas essas atrocidades, a comunidade internacional fechou os olhos,
principalmente a França e seus aliados, Estados Unidos e Reino Unido, haja vista que
estava envolvida na sustentação do governo ditatorial de Habyarimana. Assim, ela
simplesmente estendeu a “proteção” a seus sucessores, considerados, como o
presidente morto, “conservadores e anticomunistas”.
O genocídio que ocorreu em Ruanda é um exemplo de omissão de potências
internacionais. Diante da análise dos relatos, quando se deu o início do genocídio
efetivamente, as lideranças políticas foram avisadas, e mesmo assim a ONU não só
não aprovou uma intervenção militar como também diminuiu o número das forças de
paz no território ruandês. Ressalta-se o trabalho de Cíntia Araujo (2012), apontando
a omissão dos EUA, que embora pudesse ter evitado a carnificina, não o fez, por
Ruanda ser um país de poucos recursos. A decisão do então presidente da maior
potência mundial, Bill Clinton, foi de não colocar seus soldados americanos em risco
devido a um conflito que não lhes traria nenhum benefício.
Além dos EUA, a França também marcou sua presença no genocídio em
Ruanda, não por omissão. Richard Mugenzi, recrutado em 1990, pelo regime ruandês
como agente secreto para espionar a Frente Patriótica Ruandesa, em entrevista ao
Libé, afirma que a França "também entrou em guerra em Ruanda", apoiando, segundo
ele, os militares que tomaram o poder. Para ele, é absurda a tese da guerra étnica
entre tutsis e hutus para explicar o massacre. "O Estado se organizou para o
genocídio", diz o ex-agente (RFI, 2019).
56
Para muitos sobreviventes do massacre, o país foi abandonado à própria
sorte, e era perceptível mesmo para os hutus que cometeram os assassinatos: o
mundo não se importava com Ruanda. “Todos os grandes personagens viraram as
costas para nossos massacres. Os belgas, os diretores brancos, os presidentes
negros, as pessoas humanitárias e os cinegrafistas internacionais, os bispos e os
padres, e finalmente até Deus”, declarou Élie Mizingue, ex-militar hutu preso que
confessou o assassinato de uma assistente social. (HATZFELD, 2005, p. 164-165
apud ARAUJO, 2012, p.49).
Quanto a ONU, mesmo depois de ignorar diversos chamados, um fato peculiar
denota seu descaso acerca do genocídio. Philip Gourevitch, em uma visita a Ruanda,
dois anos após o massacre, percebeu que não havia cachorros na maior parte das
regiões. A resposta a seu questionamento foi que, assim que as mortes cessaram, os
capacetes-azuis, nome pelo qual são conhecidas as tropas multinacionais que servem
nas Forças de Paz da ONU para a resolução de conflitos internacionais em países
envolvidos em conturbação social, começaram a matar os cachorros, pois estes
estavam se alimentando com os cadáveres, o que foi considerado pela Organização
das Nações Unidas como um problema de saúde pública. Ou seja, a ação instintiva
dos cães de se alimentarem dos cadáveres expostos nas ruas foi imediatamente
tomada como uma situação de perigo à saúde da população, a qual requeria ação
imediata dos soldados que usaram suas armas para exterminar os cachorros. A ironia
da situação está exatamente na postura de não evitar o massacre, mas,
posteriormente, proteger seus cadáveres. (ARAUJO, 2012, p. 53).
É no terceiro nível de leitura que encontramos a história maior, que a narrativa
de Scholastique Mukasonga não se restringe a um relato de memórias, mas uma
denúncia do tratamento da comunidade internacional, que foi telespectadora passiva
dos horrores sofridos pelo continente africano: tanto Tutsis quanto Hutus foram vítimas
de um sistema colonial. Ao narrar suas lembranças permeadas pelo afastamento dos
seus, Scholastique ocupa seu mais legítimo lugar de fala, sendo altamente autorizada
a proferir o seu discurso de resistência.
57
CONSIDERAÇÕES FINAIS: HISTORICIZAR SEMPRE!
59
engajamento solicita também uma atitude reflexiva do leitor. Quanto ao engajamento
do autor, segundo Cecília Almeida Salles, “lembrar não é reviver, mas refazer,
reconstruir, repensar com imagens de hoje as experiências do passado. A memória é
ação. A imaginação não opera, portanto, sobre o vazio, mas com a sustentação da
memória.” (ALMEIDA SALLES, 2009, p. 104). Em Baratas, bem como as demais
escritas de si e do trauma, a memória funciona como elemento simbólico, pois articula
historicamente algo do passado, não como ele efetivamente foi, mas como uma
lembrança; é justamente essa lembrança que funciona como força motriz para a
escrita de Scholastique Mukasonga. Segundo os estudos de Frederic Jameson,
podemos inferir que, embora Baratas seja considerada literatura autobiográfica, no
decorrer das leituras percebemos que ela transpõe a individualidade, fazendo emergir
a narrativa ininterrupta da relação de opressor e oprimido, “e traz à tona a realidade
reprimida e oculta dessa história fundamental na qual a doutrina de um inconsciente
político encontra sua função e sua necessidade”. (JAMESON, 1992, p. 18).
Esperamos, com este trabalho, contribuir para a fortuna crítica da escritora
Scholastique Mukasonga, de modo a alargar os horizontes de investigação acerca de
sua obra que segue ativa, bem como somar com as discussões acerca da visibilidade
da literatura africana dentro das academias, e as lutas travadas nas mais diversas
esferas sociais visando à quebra de preconceitos impostos ao continente africano em
busca da liberdade e igualdade social.
60
REFERÊNCIAS
BASTOS, Hermenegildo. Dialética: Por quê? Para quê? In: Teoria e Prática da Crítica
Literária Dialética. 1.ed. Brasília: Editora UnB, 2011.
CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade. 9. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre azul,
2006.
61
Literaturas Francófonas III: debates interdisciplinares e comparatistas. Rio de
Janeiro: Dialogarts, 2019.
SILVA, Marisa Corrêa. Crítica Sociológica.. 3. ed. rev. e ampl. Maringá: Eduem,
2009.
63
PENACHIONI, Júlia B. O massacre na República de Ruanda de 1994: um genocídio
relatado por Philip Gourevitch. Universidade Federal do Espírito Santo - Revista
Sinais ISSN 1981 – 3988, 2015.
RAMOS FILHO, Wilson. A temporada dos facões: uma reflexão sobre a crueldade
humana. Revista Cult. 18 abr. 2018. Disponível em:
https://revistacult.uol.com.br/home/temporada-dosfacoes/ Acesso em: 29 ago. 2020.
SANTOS, Bruna Tais dos. Sobre a Relação entre Tutsis e Hutus: A Questão
Identitária nos Conflitos de Ruanda (1994) ANPUH-BRASIL - 30º Simpósio Nacional
de História. Recife, 2019.
SANTOS, Valci Vieira dos. Ruanda, genocídio de 1994: palco de traumas e feridas e
de esperanças, no presente e no futuro. Revista Mosaicum - Ano 15, v. 29, n. 1 -
Jan./Jun. 2019 – 131
SCHWARZ, Roberto. Duas meninas. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
64
SELIGMANN-SILVA, Márcio. Narrar o trauma: a questão dos testemunhos de
catástrofes históricas. Rio de Janeiro: 2003.
SILVA, Larissa Esperança da; TEIXEIRA, Lucília Souza Lima; FIRMINO, Mariana
Cunha, SANTOS; Sandra Coeli Barbosa. Escrever para não esquecer: entrevista com
Scholastique Mukasonga. Manuscrita - Revista de crítica genética, São Paulo, 2019.
SILVA, Thaíse Alves da. Guerra étnica, civil ou genocídio? Por uma história de
Ruanda. VII Encontro Estadual de História. ANPUH. Feira de Santana: Bahia, 2016.
SIQUEIRA, Joao Ricardo Pessoa Xavier de. Imagens Da dor e do trauma em Una sola
muerte numerosa, de Nora Strejilevich: notas a partir de algumas contribuições da
crítica genética e da escrita de si. Revista Porto das Letras, V. 04, Nº 02. 2018.
65