Literatura Brasileira Pós
Literatura Brasileira Pós
Literatura Brasileira Pós
LITERATURA BRASILEIRA
André Gardel / Edgar Roberto Kirchof / Maria Márcia Matos Pinto / João Amálio Pinheiro Ribas
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André Gardel
Edgar Roberto Kirchof
Maria Márcia Matos Pinto
João Amálio Pinheiro Ribas
Por outro lado, por seu caráter conciso e abrangente, este livro não
apresenta discussões profundas a respeito das disputas que emergem
das posições ocupadas pelos vários agentes que atuaram – e continuam
atuando – na produção do campo da literatura brasileira. Antes, procura
apenas apresentar alguns de seus principais protagonistas, limitando-se,
em alguns casos, a mencionar algumas das problemáticas e sugerindo
bibliografia de apoio.
André Gardel
4 O Arcadismo brasileiro 51
4.1 Arcadismo no Brasil 51
4.2 Duas tendências 52
5 O Romantismo brasileiro 65
5.1 Primeira geração romântica (1836-1850) 66
5.2 Segunda geração romântica (1850-1860) 68
5.3 Terceira geração romântica (1860-1870) 70
5.4 A prosa romântica 72
5.5 O teatro romântico no Brasil 76
5.6 Contribuições do Romantismo 78
6 O Realismo 83
6.1 O que é Realismo 83
6.2 Realismo e realidade 85
6.3 Principais características 86
6.4 Realismo no Brasil 87
6 Literatura Brasileira
Sumário
7 Naturalismo 99
7.1 O que é Naturalismo 99
7.2 Principais influências ideológicas 101
7.3 Principais características 102
7.4 O Naturalismo no Brasil 103
7.5 Naturalismo de inspiração regional 105
7.6 Naturalismo estilizado 106
7.7 Naturalismos 107
8 Parnasianismo 113
8.1 O que é Parnasianismo 113
8.2 Principais características 114
8.3 Precursores do Parnasianismo no Brasil 116
8.4 O Parnasianismo no Brasil 116
9 Simbolismo 127
9.1 Origens e principais fundamentos do Simbolismo 127
9.2 Decadentismo e Simbolismo 128
9.3 Principais características 130
9.4 Simbolismo no Brasil 131
Literatura Brasileira 7
Sumário
8 Literatura Brasileira
1
Literatura no Brasil Colônia:
questões preliminares
Edgar Roberto Kirchof
Literatura Brasileira 9
1 Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares
10 Literatura Brasileira
Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares 1
1.2 Portugal permanece na Idade Média
Essa nova visão de mundo encontrou enorme resistência na Península Ibérica, de modo
geral, e em Portugal, especificamente – em grande parte por causa da fortíssima atuação
da ordem fundada por Inácio de Loyola, em 1534, a Companhia de Jesus (cujos membros
são denominados jesuítas até os dias de hoje) com o objetivo explícito de servir como um
obstáculo para as reformas protestantes. No intuito de barrar a eclosão de movimentos re-
formatórios que levavam invariavelmente a cismas e novos movimentos, acreditava-se ser
necessário realizar reformas no interior da própria Igreja Católica.
Em Portugal, desde que D. João III entregara aos jesuítas o Colégio das Artes, em 1555,
a influência dessa ordem religiosa sobre a cultura lusitana passou a ser tão forte que chegou
mesmo a, senão impedir, pelo menos frear de forma surpreendentemente eficaz a chegada
da maior parte dos valores e concepções renascentistas, que atingiam, a passos largos, os
demais países europeus. Dessa maneira, enquanto a Europa se modernizava a partir dos
novos ventos trazidos pelo Renascimento, os jesuítas se encarregavam de manter a cultura
portuguesa mais atrelada à visão de mundo e às tradições da Idade Média.
Talvez não seja demasiado exagero afirmar que, cultural e intelectualmente, Portugal
permaneceu sob o domínio do pensamento jesuítico desde 1555 até 1759, quando o Marquês
de Pombal, influenciado pelos ideais do Iluminismo, expulsou-os tanto de Portugal quanto
das colônias portuguesas.
Os jesuítas possuíam uma consciência muito forte da importância da educação, espe-
cialmente a educação das crianças, para a manutenção da fé cristã, razão pela qual se dedi-
cavam de forma intensa à fundação e ao cuidado de numerosos colégios, muitos dos quais
se transformariam posteriormente em universidades. Nos colégios jesuíticos eram aceitos
tanto alunos com intenções de se tornarem religiosos (padres jesuítas), quanto alunos inte-
ressados apenas em obter uma formação acadêmica consistente.
No entanto, a filosofia dos jesuítas era de fundamento medieval, notadamente teológica,
o que os tornava muito avessos aos novos conhecimentos científicos que se desenvolviam
principalmente na Itália e se espalhavam pelos demais países da Europa. Em vez de privile-
giar a observação, o cálculo e a descoberta do novo, os jesuítas prezavam a manutenção da fé
por meio do conhecimento da tradição, principalmente a tradição teológica cristã, o que os
levou a promoverem uma cultura (embora erudita) livresca, gramaticista e, na maior parte
das vezes, maniqueísta3 e moralizante.
No que diz respeito especificamente às artes e à literatura, os jesuítas se mantiveram
medievais e, posteriormente, barrocos. Na verdade, o Barroco pode ser visto como uma
tentativa de conciliação entre o pensamento religioso medieval, de um lado, e o apelo sen-
sualista renascentista, de outro, tendo sido promovido amplamente pela ordem de Inácio
de Loyola. Massaud Moisés acredita que os jesuítas, em decorrência do seu fundamento
3 O Maniqueísmo tem sua origem na filosofia do persa Mani, que pregava um dualismo intranspon-
ível entre o bem e o mal: para ele, tudo que está ligado à matéria é mal por essência, ao passo que o
espírito representa o bem.
Literatura Brasileira 11
1 Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares
4 A copla é uma forma poética muito popular, originada na Espanha, sendo utilizada na composição
de canções com temas geralmente cômicos, mas também eróticos e escatológicos.
5 Index librorum proibitorum: lista de livros proibidos criada em 1559 pela Igreja Católica.
6 Literariedade: conceito criado pelos teóricos do Formalismo Russo para dar conta de todos os ele-
mentos linguísticos e estruturais inerentes a um texto literário. Tais elementos permitiriam distinguir
a especificidade da literatura em relação a outros tipos de texto.
12 Literatura Brasileira
Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares 1
Os principais textos de origem portuguesa que merecem destaque, de acordo com o
historiador da literatura brasileira Alfredo Bosi (1994, p. 13), são:
• a Carta a el-rei D. Manuel, de Pero Vaz de Caminha, referindo o descobrimento de
uma nova terra e as primeiras impressões da natureza e do aborígene ou nativo;
• o Diário de Navegação, de Pero Lopes e Sousa, escrivão do primeiro grupo coloniza-
dor – o de Martim Afonso de Sousa (1530);
• o Tratado da Terra do Brasil e a História da Província de Santa Cruz a que Vulgarmente
Chamamos Brasil, de Pero Magalhães Gândavo (1576);
• a Narrativa Epistolar e os Tratados da Terra e da Gente do Brasil, do jesuíta Fernão
Cardim (a primeira certamente de 1583);
• o Tratado Descritivo do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa (1587);
• os Diálogos das Grandezas do Brasil, de Ambrósio Fernandes Brandão (1618);
• as cartas dos missionários jesuítas escritas nos dois primeiros séculos de catequese;
• o Diálogo sobre a Conversão dos Gentios, do padre Manuel da Nóbrega;
• a História do Brasil, de frei Vicente do Salvador (1627).
Embora menos influentes em relação à formação do cânone literário brasileiro, também
merecem destaque alguns textos de origem não portuguesa:
• Viagem à Terra do Brasil, do calvinista francês Jean de Léry (1578);
• As Singularidades da França Antártida, do frade André Thévet (1558);
• Viagem ao Brasil, do alemão Hans Staden (1557).
Literatura Brasileira 13
1 Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares
favor de se incluir tanto a literatura de informação quanto a literatura jesuítica dos séculos
XVI e XVII, notadamente europeia (pois incluem-se textos de espanhóis, franceses e mesmo
alemães), naquilo que se pode denominar de cânone da literatura brasileira.
Em primeiro lugar, não devemos esquecer que o Brasil iniciou sua existência para o
mundo ocidental e europeu enquanto colônia. Nesse sentido, por uma questão histórica,
não é aconselhável desconsiderar a visão de mundo do colonizador. A colonização deu iní-
cio a um processo irreversível de hibridação cultural, uma mescla da cultura do colonizador
tanto com as culturas aqui preexistentes quanto com aquelas para cá transportadas, princi-
palmente da África.
Essa confluência de culturas acarretou, no caso brasileiro, o surgimento de uma cul-
tura nacional complexa e heterogênea à medida que o Brasil deixou de ser colônia para se
transformar no sujeito de sua própria história – embora, de um ponto de vista crítico, tal
afirmação deva sempre ser vista com cautela. Como afirmou Alfredo Bosi (1994, p. 11), “essa
passagem fez-se no Brasil por um lento processo de aculturação do português e do negro à
terra e às raças nativas; e fez-se com naturais crises e desequilíbrios”.
Nesse contexto histórico da formação da cultura e da literatura brasileira não é possível,
portanto, desconsiderar os textos deixados pelos colonizadores, pois esses textos não consti-
tuem apenas meros testemunhos de uma época. Ao longo da história da literatura brasileira,
tais textos se transformaram em uma espécie de fundamento pré-literário, tanto em termos
temáticos quanto em termos formais. Como breve exemplo, pode-se citar o interesse pelo in-
dianismo no caso de José de Alencar, que retomou e reinterpretou a literatura de informação
do século XVI. Mas também os modernistas Oswald e Mário de Andrade que, entre outros,
recorreram à literatura quinhentista e seiscentista quando procuraram pelos fundamentos
da brasilidade literária, mesmo que seu intuito, muitas vezes, tenha sido descontruir os mi-
tos criados a partir dessa literatura.
Assim sendo, a despeito de sua relativa baixa qualidade literária, a literatura de infor-
mação, juntamente com a literatura jesuítica dos séculos XVI e XVII, devem ser considera-
das – em uma ousada e muito acertada formulação de Alfredo Bosi – como a pré-história das
nossas letras.
14 Literatura Brasileira
Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares 1
No que tange à literatura religiosa, seu caráter marcadamente catequético e doutrinário,
fundamentado na visão de mundo escolástica que dominava o universo jesuíta no século
XVI, constituiu um empecilho quase intransponível para que atingisse um grau verdadei-
ramente literário. Talvez uma possível, porém controvertida exceção, seja a poesia lírico-
-mística de José de Anchieta, à qual já foram atribuídos muitos elogios, desde comparações
com Ovídio e Virgílio até afirmações de que se trata de uma espécie de precursora do estilo
barroco, que despontaria, mais tarde, em padre Vieira e, principalmente, em Gregório de
Matos (COUTINHO, 2004a).
Entretanto, uma análise atenta da obra anchietana permite perceber que o padre je-
suíta utiliza a rima e esquemas rítmicos como mero ornamento formal, pois o conteúdo
de sua produção está por demais preso à sua visão doutrinária marcada pela catequese
(PIZZARRO, 1993, p. 197), no caso do teatro, e por um forte misticismo medieval, no caso
da lírica. Observe, por exemplo, como a atmosfera lírica é utilizada, nos primeiros versos do
“Poema da Virgem”, de Anchieta (2008c), com o fim de comover o leitor a partir dos sofri-
mentos da Virgem Maria ao enxergar Jesus crucificado:
Por que ao profundo sono, alma, tu te abandonas,
e em pesado dormir, tão fundo assim ressonas?
Não te move a aflição dessa mãe toda em pranto,
que a morte tão cruel do filho chora tanto?
O seio que de dor amargado esmorece,
ao ver, ali presente, as chagas que padece?
Onde a vista pousar, tudo o que é de Jesus,
ocorre ao teu olhar vertendo sangue a flux.
Olha como, prostrado ante a face do Pai,
todo o sangue em suor do corpo se lhe esvai.
A despeito de julgamentos críticos sobre a qualidade estética da poesia anchietana, o fato
é que textos marcadamente literários, no contexto jesuítico, constituem exceção, se é que exis-
tem. A maior parte dos textos produzidos pelos numerosos padres jesuítas para cá envia-
dos – Manuel da Nóbrega, João de Aspilcueta Navarro, Luis da Grã, Francisco Pires, Fernão
Cardim, para citar apenas alguns – entra no rol dos textos informativos ou caem na vala co-
mum dos textos catequéticos e maniqueístas, com evidente intenção de edificação espiritual
e conversão do indígena para a fé cristã, embora seja possível perceber intentos literários ou
estéticos em alguns textos, como o Diálogo sobre a Conversão do Gentio, de Manuel de Nóbrega,
alguns poemas de Anchieta ou alguns manuscritos de Fernão Cardim, entre outros.
Por outro lado, se os textos fundadores não primam pelo seu valor propriamente artís-
tico – no sentido restrito desse conceito –, é possível afirmar que os primeiros escritos sobre
o Brasil, produzidos tanto por autores não ibéricos quanto por autores ibéricos, adquirem
um grande valor historiográfico, mesmo para a história da literatura, pelo fato de nos terem
Literatura Brasileira 15
1 Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares
legado alguns dos mais fortes mitos sobre a nossa terra e seu povo nativo. Vários deles
ressurgirão constantemente, ao longo da história posterior da literatura brasileira, e isso de
forma consciente ou inconsciente por parte dos autores que deles lançam mão.
7 Marco Polo (1254-1324), viajante veneziano. Foi um dos primeiros ocidentais a percorrerem a Chi-
na e a Mongólia no final da Idade Média, tendo deixado um fantasioso livro de crônicas sobre essas
viagens.
8 Jean de Mandeville (1357-1371) – suposto cavalheiro inglês ou francês que também deixou um fanta-
sioso livro de crônicas sobre as viagens que realizou por países como Turquia, Armênia, Pérsia e Egito,
entre vários outros.
9 Preste João – lendário monarca cristão no Oriente, na verdade, Etiópia. Segundo a tradição mítica, ele
seria descendente de Baltasar, um dos três reis magos, e seu reino seria repleto de monstros, tesouros
e paisagens idílicas.
16 Literatura Brasileira
Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares 1
1.4.3 O índio sem fé, sem lei e sem rei
Entre os principais mitos criados e reforçados pelos primeiros documentos produzidos
na era colonial também merece destaque a ideia do nativo como o bom selvagem, destituído
de sentimento de cobiça, de propriedade, de hierarquia e, mesmo, de religião. Essa ideia
está muito presente na Carta de Pero Vaz de Caminha, mas também pode ser encontrada
nos escritos de Léry, entre vários outros. Observe, na passagem a seguir, como Pero Vaz de
Caminha se deixa imbuir desse mito:
Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua fala e eles a
nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm nem entendem crença alguma, se-
gundo as aparências. E portanto se os degredados que aqui hão de ficar aprende-
rem bem a sua fala e os entenderem, não duvido que eles, segundo a santa tenção
de Vossa Alteza, se farão cristãos e hão de crer na nossa santa fé, à qual praza a
Nosso Senhor que os traga, porque certamente esta gente é boa e de bela simpli-
cidade. E imprimir-se-á facilmente neles qualquer cunho que lhe quiserem dar,
uma vez que Nosso Senhor lhes deu bons corpos e bons rostos, como a homens
bons. E o Ele nos para aqui trazer creio que não foi sem causa. E portanto Vossa
Alteza, pois tanto deseja acrescentar a santa fé católica, deve cuidar da salvação
deles. E prazerá a Deus que com pouco trabalho seja assim! (CAMINHA, 2008)
Essa ideia de que os índios não teriam qualquer religião, lei ou autoridade, já presente
na Carta, também está presente nas descrições de Pero de Magalhães Gândavo, por exem-
plo, no sétimo capítulo de seu Tratado da Terra do Brasil (aproximadamente 1570), conforme
a citação a seguir:
Não há como digo entre eles nenhum Rei, nem Justiça, somente em cada aldeia
tem um principal que é como capitão, ao qual obedecem por vontade e não por
força; morrendo este principal fica seu filho no mesmo lugar; não serve de outra
coisa se não de ir com eles à guerra, e aconselha-os como se hão de haver na
peleja, mas não castiga seus erros nem manda sobre eles coisa alguma contra
sua vontade. Este principal tem três, quatro mulheres, a primeira tem em mais
conta, e faz dela mais caso que das outras. Isto tem por estado é por honra. Não
adoram coisa alguma nem têm para si que há na outra vida glória para os bons, e
pena para os maus, tudo cuidam que se acaba nesta e que as almas fenecem com
os corpos, e assim vivem bestialmente sem ter conta, nem peso, nem medida.
(GÂNDAVO, 2008)
Essas formulações de Gândavo e de Caminha forneceram o fundamento para a criação
do famoso mito “Sem F, sem L e sem R”, segundo o qual os nativos não possuiriam fé (F), lei
(L) e tampouco rei (R). Esse mito seria consagrado por Gabriel Soares de Souza, uma década
mais tarde.
Literatura Brasileira 17
1 Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares
10 François Rabelais (1493-1553): escritor francês da Renascença. Sua obra inspira-se no folclore popu-
lar e Pantagruel é um de seus livros cômicos. O título faz referência ao protagonista, monstro grotesco,
ao mesmo tempo cômico e assustador.
18 Literatura Brasileira
Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares 1
Ampliando seus conhecimentos
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1 Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares
Atividades
1. Marque (R) se a afirmativa se refere à Renascença e (IM) se ela se refere à Idade Média.
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Literatura no Brasil Colônia: questões preliminares 1
2. Assinale apenas as afirmativas corretas.
b. Segundo vários críticos, a poesia religiosa de Anchieta possui um alto valor li-
terário.
Resolução
1. Na ordem: R, IM, R, R.
3. Nos séculos XVI e XVII, a literatura produzida por autores europeus foi responsável
pela criação de vários mitos sobre a identidade nacional, especialmente no que diz
respeito terra e ao povo. Um dos mais recorrentes foi o mito segundo o qual o Brasil
(assim como as demais colônias) seria uma espécie de paraíso perdido, marcado
por uma natureza exótica e abundante, repleto de riquezas. Um segundo mito diz
respeito ao índio, retratado como se não possuísse governo, religião e tampouco
leis. Outro mito extremamente influente diz respeito à prática da antropofagia pelos
indígenas. O motivo por que tais mitos são tão importantes para a historiografia
literária está relacionado ao fato de que eles foram sendo apropriados por escolas
literárias nos séculos posteriores, mesmo que, por vezes, essa incorporação se desse
para contestá-los.
Literatura Brasileira 21
2
Literatura de informação e
literatura jesuítica
Edgar Roberto Kirchof
Para esses autores, os índios eram como que uma tabula rasa, destituídos de vários
vícios europeus e, por isso mesmo, aptos para receberem a fé cristã. Por outro lado, foi
Vespúcio o primeiro autor a mencionar o fato de que os nativos eram antropófagos, o
que, contudo, não chegou a abalar sua crença na inocência e na ingenuidade do nativo.
Observe como, apesar de descrever a prática antropofágica, Vespúcio não chega a rea-
lizar um julgamento negativo do índio, muito pelo contrário, conforme se pode perce-
ber a partir do excerto destacado em itálico a seguir:
Literatura Brasileira 23
2 Literatura de informação e literatura jesuítica
Não comem mulher alguma, salvo aquelas que têm como escravas, e disso ti-
vemos a certeza em muitos lugares onde encontramos tais pessoas, porque nos
ocorreu muitas vezes ver os ossos e as cabeças de alguns que foram comidos. E
eles não o negam; ademais, o afirmam os seus inimigos, que estão continuamen-
te atemorizados por eles. São gente de gentil disposição e de boa estatura: andam de
todo desnudos (VESPÚCIO, 2008, tradução nossa).
24 Literatura Brasileira
Literatura de informação e literatura jesuítica 2
Durante a ocupação francesa no Brasil por Villegaignon (1555), dois cronistas franceses
deixaram, por escrito, suas impressões sobre a terra e o povo nativo. Ao passo que o calvi-
nista Jean de Léry, em sua Viagem à terra do Brasil (Histoire d´un voyage facit en la terre du Brésil,
autremment dite Amérique, 1578), apresenta uma visão simpática ao índio brasileiro, chegan-
do mesmo, em algumas partes, a elevar elementos da cultura indígena acima da própria
cultura europeia, por sua vez o franciscano André Thévet, em suas Singularidades da França
Antártica (Les singularitez de la France Antartique, autremment nommée Amérique, et de plusieurs
terres et isles, 1558), retrata o índio de forma francamente preconceituosa e deformada, a
ponto de Léry tê-lo criticado severamente como “mentiroso e caluniador”.
Na ilustração anterior (uma réplica dos “monstros de Thévet”), você pôde observar
como o franciscano contribuiu para aumentar o mito do exotismo selvagem e quase sobre-
natural acerca do Novo Mundo, na medida em que descreve as criaturas monstruosas que
teria visto em terras brasileiras.
Já o calvinista Léry se mostra mais comedido em suas descrições, chegando mesmo a
relativizar a pretendida superioridade da cultura europeia em relação à cultura do índio
americano. Observe, na passagem a seguir, como a simpatia que Léry nutre pelo nativo faz
com que atenue o horror que a prática antropofágica suscitava na mente do europeu. Em
vez de criticar o ritual do nativo, Léry critica, em uma surpreendente analogia, uma prática
europeia que seria tão nociva quanto o canibalismo – a saber, a usura:
É útil, entretanto, que ao ler sobre semelhantes barbaridades os leitores não se es-
queçam do que se pratica entre nós. Em boa e sã consciência acho que excedem em
crueldade aos selvagens os nossos usurários [agiotas], que, sugando o sangue e o
tutano, comem vivos órfãos, viúvas e outras criaturas miseráveis, que prefeririam
sem dúvida morrer de uma vez a definhar assim, lentamente (LÉRY, s/d).
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2 Literatura de informação e literatura jesuítica
26 Literatura Brasileira
Literatura de informação e literatura jesuítica 2
são muitas; infinitas. Em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-
-se-á nela tudo; por causa das águas que tem! (CAMINHA, 2008).
A intenção de exploração de metais preciosos também permanece evidente, por exem-
plo, na seguinte passagem:
Até agora não pudemos saber se há ouro ou prata nela, ou outra coisa de metal,
ou ferro; nem lha vimos. Contudo a terra em si é de muito bons ares frescos e
temperados como os de Entre-Douro-e-Minho, porque neste tempo d’agora as-
sim os achávamos como os de lá (CAMINHA, 2008).
Na descrição do índio, prevalece, como já se afirmou, a ideia de um povo dócil e ao
mesmo tempo exótico. Caminha se demora nos detalhes visuais do exótico, aquilo que di-
ferencia o índio do europeu, principalmente a cor da tez, os adornos e adereços corporais, o
fato de andarem nus:
A feição deles é serem pardos, um tanto avermelhados, de bons rostos e bons
narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Nem fazem mais caso de
encobrir ou deixar de encobrir suas vergonhas do que de mostrar a cara. Acerca
disso são de grande inocência. Ambos traziam o beiço de baixo furado e metido
nele um osso verdadeiro, de comprimento de uma mão travessa, e da grossura
de um fuso de algodão, agudo na ponta como um furador. Metem-nos pela parte
de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feita a modo
de roque de xadrez. E trazem-no ali encaixado de sorte que não os magoa, nem
lhes põe estorvo no falar, nem no comer e beber.
Os cabelos deles são corredios. E andavam tosquiados, de tosquia alta antes
do que sobre-pente, de boa grandeza, rapados todavia por cima das orelhas
(CAMINHA, 2008).
O espírito da catequese é explicitado com todas as letras ao final da carta:
Contudo, o melhor fruto que dela se pode tirar parece-me que será salvar esta
gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar.
E que não houvesse mais do que ter Vossa Alteza aqui esta pousada para essa
navegação de Calicute bastava. Quanto mais, disposição para se nela cumprir
e fazer o que Vossa Alteza tanto deseja, a saber, acrescentamento da nossa fé!
(CAMINHA, 2008).
A visão de mundo medieval de Caminha se revela, da forma mais evidente, na maneira
como trata a cultura do outro. A crença maniqueísta na divisão do mundo entre o bem e o
mal, sendo que a cristandade europeia constituiria o único bem possível e aceitável, leva o
cronista não apenas a idealizar o índio como um “um ser facilmente passível de conversão
à fé cristã”, mas, o que é pior, a nem sequer procurar compreender o outro no que efeti-
vamente possui de diferente. Por essa razão, Caminha chega à conclusão, evidentemente
equivocada, de que o índio não possui qualquer religião:
Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua fala e eles a
nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm nem entendem crença alguma,
segundo as aparências. [...] E imprimir-se-á facilmente neles qualquer cunho que
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2 Literatura de informação e literatura jesuítica
lhe quiserem dar, uma vez que Nosso Senhor lhes deu bons corpos e bons rostos,
como a homens bons. E o Ele nos para aqui trazer creio que não foi sem causa
(CAMINHA, 2008).
Os jesuítas chegaram ao Brasil em 1549, juntamente com Tomé de Souza, primeiro go-
vernador geral das principais regiões do Brasil (Rio de Janeiro, Bahia e Pará). Aqui, assim
como em Portugal, fundaram colégios parecidos com o Colégio das Artes, em que ensina-
vam Filosofia, Teologia e Humanidades, a fim de preparar neófitos para a ordem inaciana.
Os jesuítas foram os responsáveis pela manutenção de uma certa vida intelectual na Colônia,
sendo que suas reflexões e produções escritas norteavam-se por objetivos muito pragmáti-
cos: catequizar os índios e promover ou fortalecer a fé e a moral cristã entre os colonos.
Os jesuítas acreditavam que era necessário manter os colonos sob o domínio da fé e da
moral cristã na medida em que a Colônia era vista como um local repleto de tentações, em
que rondava o que eles entendiam como o perigo da libertinagem moral. Quanto aos índios,
acreditavam os jesuítas, pelo menos em seus primeiros escritos, no mito do bom selvagem
que estaria à espera da doutrina cristã para se tornar um ser humano completo. Nesse senti-
do, os padres jesuítas aqui aportados produziram um material escrito relativamente amplo,
composto de epístolas, relatórios, cartas ânuas, crônicas de viagem, gramática, poesia (lírica
e épica) e teatro. Essa produção pode ser dividida em dois grandes blocos:
• literatura de edificação e educação; e
• literatura de informação.
Ao passo que a gramática, a poesia e o teatro eram utilizadas para catequizar o índio
e para educar o colono, constituindo, portanto, uma literatura de edificação, as epístolas,
os relatórios e as crônicas serviam como documentação informativa sobre a terra que
estava sendo explorada, cujo principal destino era informar os superiores, na metrópole,
a respeito das possibilidades de outros projetos missionários. Nesse sentido, formam a
literatura de informação.
Apesar de seus autores serem relativamente numerosos, pela importância política na
Colônia e também pela relativa superioridade do material produzido, podem ser destacados
Manuel da Nóbrega, Fernão Cardim e José de Anchieta, sendo que, desses três, Anchieta é
indubitavelmente o mais significativo. Por essa razão, ele será tratado com mais profundi-
dade na próxima seção.
Manuel de Nóbrega chegou ao Brasil em 1549, juntamente com Tomé de Sousa, sendo
nomeado como o primeiro provincial da ordem inaciana no Brasil. Suas atividades eram di-
rigidas à conversão dos índios e à educação moral dos colonos. Entre suas principais obras,
destacam-se as Cartas do Brasil, em que, além de fornecer numerosas informações sobre a
terra e a gente da Colônia, coloca uma grande ênfase naquilo que considerou uma degene-
rescência moral tanto da parte dos índios quanto dos colonos, o que, segundo ele, contribuía
para a propagação da promiscuidade sexual. Entre as muitas informações que deixou nas
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Literatura de informação e literatura jesuítica 2
Cartas, podem ser destacadas aquelas sobre rituais antropofágicos não apenas entre os ín-
dios, mas também entre alguns portugueses que teriam aderido a essa prática.
Outro padre jesuíta a deixar uma obra relevante sobre a colonização do Brasil foi o por-
tuguês Fernão Cardim. Em 1582, ele foi designado para acompanhar o primeiro governador
geral nomeado sob domínio espanhol, Manuel Teles Barreto. Seus principais manuscritos
lhe foram roubados por piratas em 1601, quando regressava a Lisboa, e acabaram caindo
nas mãos de Samuel Purchas, um colecionador. Por essa razão, tornou-se conhecido apenas
tardiamente para a historiografia do Brasil colonial. Em suas obras, o Brasil é descrito como
um Éden, igual e muitas vezes superior à Europa, sendo que essa idealização também se
estende ao próprio indígena. Contudo, sua empolgação pelo Brasil o levou a um excesso de
imaginação em alguns casos – por exemplo, quando fala de homens marinhos e monstros do
mar, ou quando descreve o uru como um pássaro que coloca tantos ovos e tão brancos que
os campos pareciam cobertos de neve.
Literatura Brasileira 29
2 Literatura de informação e literatura jesuítica
atenta dos gêneros que predominam em cada idioma nos ajuda a compreender o sistema
literário de José de Anchieta.
Em sua língua materna, predominam poemas líricos, sendo que alguns também foram
escritos em português e uns poucos em latim.
O tupi, por sua vez, predomina de forma absoluta no que diz respeito às obras de tea-
tro. Percebe-se, portanto, que o espanhol e o português lhe servem para expressão de uma
espiritualidade mais subjetiva, resultado de uma experiência mística pessoal, ao passo que o
tupi é a língua utilizada para produzir obras com o intuito explícito de catequese do índio.
Assim sendo, existe uma divisão clara, diria-se mesmo dualista, na obra de Anchieta:
ao passo que sua lírica possui aspectos literários dotados de intensa personalização, mani-
festando, em versos bem construídos, questões relativas tanto à intimidade quanto à tensão
entre o eu terreno e a divindade cristã, o teatro anchietano possui uma intenção explícita de
cristianizar o índio por meio de várias estratégias de aculturação, o que o torna didático,
rígido, estereotipado e autoritário.
No que tange à lírica, Alfredo Bosi (1994, p. 82) sugeriu existirem duas linhas de forma-
ção poética:
• uma voltada à criação de símbolos tomados da vida cotidiana; e
• outra mais afeita a uma linguagem místico-efusiva.
No primeiro caso, Anchieta (2008a) utiliza símbolos retirados principalmente do campo
semântico da alimentação e das relações de parentesco para exprimir o êxtase da ligação
com Deus; por exemplo, no poema “Ao Santíssimo Sacramento”:
[...]
enquanto a presença tarda
do vosso divino rosto
o saboroso e doce gosto
deste pão
seja minha refeição.
[...]
No segundo caso, Anchieta (apud MOISÉS, 2000) lança mão de vários recursos imagé-
ticos e sensórios, apelando para uma ligação mais direta e efusiva com a divindade, com a
extrapolação de pulsões afetivas, como nos versos de “O Menino Nascido ao Pecador”:
Yo nací porque tu mueras,
porque vivas moriré,
porque rías lloraré,
y espero porque esperes,
porque ganes perderé.
É no teatro anchietano, contudo, que se encontram as questões mais relevantes e con-
troversas para uma discussão sobre a influência da literatura jesuítica sobre a formação da
literatura e da identidade brasileira, pois se trata de um projeto claramente orientado por
30 Literatura Brasileira
Literatura de informação e literatura jesuítica 2
uma subjugação cultural. Se, nos primeiros relatos de viagem, havia a impressão de que o
índio não possuía religião, aos poucos os portugueses foram percebendo que existia sim
uma religiosidade indígena, marcadamente centrada no culto dos mortos. A partir desse nú-
cleo, organizavam-se vários rituais comandados pelos pajés, como cerimônias de canto e
dança em que se praticava o fumo (ou o ato de fumar) e as cauinagens (em que se consumia
bebida alcoólica), o que levava os participantes a uma espécie de transe. Ligado ao culto dos
mortos, também estava o ritual da antropofagia.
A estratégia de Anchieta foi utilizar as peças teatrais – de influência medieval, princi-
palmente os autos de Gil Vicente – como meio de cristianizar e suplantar a religiosidade
original. Suas principais estratégias foram:
• inserir a teologia cristã a partir do imaginário indígena;
• demonizar os heróis indígenas;
• demonizar e animalizar os costumes nativos.
O teatro de José de Anchieta ataca e demoniza não apenas os heróis, mas também os
rituais indígenas. Imbuído de uma visão de mundo absolutamente maniqueísta, em suas pe-
ças Anchieta divide o mundo entre o bem e o mal, sendo que o primeiro está figurativizado
por todas as personagens cristãs e europeias, ao passo que o segundo é construído a partir
do imaginário religioso do indígena. Por exemplo, no Auto de São Lourenço o mal é represen-
tado pela personagem principal, o herói tamoio Guaixará, que havia atacado os portugueses
duas vezes, e pelo chefe indígena Aimbiré. São Sebastião e São Lourenço, por outro lado,
são os representantes do bem. Note, na passagem a seguir, como o ritual da cauinagem, da
maneira como é exaltado por Guaixirá, acaba ridicularizado e representado como uma be-
beragem imoral, o que deprecia seu teor religioso original:
Boa medida é beber
cauim até vomitar.
Isto é jeito de gozar
a vida, e se recomenda
a quem queira aproveitar.
A moçada beberrona
trago bem conceituada.
Valente é quem se embriaga
e todo o cauim entorna,
e à luta então se consagra (ANCHIETA, 2008b).
Pode-se concluir que o teatro jesuítico dos séculos XVI e XVII, principalmente sob a
pena de Anchieta, serviu como o suporte de uma política colonizadora que reduz o outro
a si mesmo e, paralelamente, cria um dualismo de códigos. Como afirmou Alfredo Bosi, o
caso de Anchieta é exemplar porque revela a postura do colonizador de construir um código
válido para si mesmo e seus pares, de um lado, e outro código, válido para o povo, de outro:
“Lá o símbolo e a efusão da subjetividade; aqui, o didatismo alegórico rígido, autoritário. Lá
a mística da devotio moderna; aqui a moral do terror das missões” (BOSI, 1994, p. 93).
Literatura Brasileira 31
2 Literatura de informação e literatura jesuítica
Reatando os fios
(BOSI, 2005, p. 92-93)
Estamos tão resignados a pensar com “realismo” (se assim foi, é porque
não poderia deixar de ter sido), que não nos perguntamos se, na verdade,
o que aconteceu não terá significado uma franca regressão da consciência
culta europeia absorvida pela práxis da conquista e da colonização. Como
nas cruzadas e nas guerras santas, a religião e a moral coletiva degradam-
-se rápida e violentamente a pura ferramenta do poder; e o que se ganha
em eficiência tática perde-se em qualidade no processo de humanização.
32 Literatura Brasileira
Literatura de informação e literatura jesuítica 2
Iluminismo que se combinará com a ditadura recolonizadora; e o libera-
lismo que se casará com a escravidão...
A cisão, que este ensaio aponta, entre um teatro de catequese como exte-
rioridade e uma lírica do sentimento religioso, talvez sirva de estímulo
para repensar os contrastes internos do intelectual “que vive em colônias”.
Atividades
1. Entre as alternativas a seguir, assinale quais são verdadeiras (V) e quais são falsas (F).
Literatura Brasileira 33
3. Explique as principais estratégias discursivas que Anchieta utilizou em sua obra dra-
mática para convencer o nativo a abandonar sua cultura e aceitar a religião cristã.
Resolução
1. Na ordem: F, F, V, V.
3. Ao perceber que os nativos não compreendiam a noção de uma entidade divina abstrata,
como o deus judaico-cristão, José de Anchieta tratou de adaptar a teologia escolástica
da qual estava impregnado para o imaginário indígena, muitas vezes utilizando figuras
ligadas à natureza – como Tupã, o trovão, utilizado para designar Deus. Além disso, no
intuito de desacreditar a cultura religiosa dos índios, em suas peças Anchieta transfor-
mava os heróis indígenas em vilões e colocava as personagens ligadas aos rituais nativos
como vilões ou demônios.
3
O Barroco e a
literatura brasileira
Edgar Roberto Kirchof
Literatura Brasileira 35
3 O Barroco e a literatura brasileira
[...] praticamente não houve tipografia entre nós ao longo dos séculos coloniais,
ipso faco, não se publicaram livros no Brasil nesse lapso de tempo. Nem jornais:
o primeiro periódico, a Gazeta do Rio de Janeiro, apareceu a 10 de setembro de
1808, por consequência da Impressão Régia. E como os livros que pudessem vir
da Metrópole eram submetidos à censura e se destinavam precipuamente ao en-
sino religioso, segue-se que de um modo geral, afora uns quatro compêndios
escolares de Latim e de Lógica, catecismos e vidas de santos, uns raros romances
inocentes de cavalaria e um outro ripanço de leis, não havia o que ler na Colônia.
Mesmo a circulação manuscrita, supletiva do inexistente comércio livresco, tor-
nava-a inexequível a carestia do papel (MOISÉS, 2000, p. 75).
No Brasil colonial, portanto, os meios de comunicação eram escassos e precários, sendo
que os poucos existentes estavam concentrados nas mãos das ordens religiosas, o que fez
com que o obscurantismo que grassava já em Portugal pela resistência em absorver os ideais
da Renascença predominasse de modo ainda mais intenso entre nós. Por essa razão, não é
adequado pensar na literatura barroca brasileira como se efetivamente houvesse difundido
no Brasil um espírito barroco já nos séculos XVI e XVII. Talvez se possa falar de um embrião
desse estilo ou dessa ideologia, que lograria se impor – sobretudo na arquitetura e nas artes
plásticas – apenas no século XVIII, quando a literatura já havia abandonado os excessos da
estética barroca.
Por outro lado, devem ser destacadas três dimensões importantes sobre o Barroco
brasileiro.
Em primeiro lugar, se o espírito barroco não se impôs na colônia como uma visão de
mundo generalizada, na medida em que iam a Portugal para lá viverem um tempo ou ape-
nas para estudarem, alguns brasileiros ou mesmo portugueses aqui radicados, acabavam
se impregnando desse novo ideário. Foi o caso evidente de Gregório de Matos, cuja família
era abastada e, por isso mesmo, enviou-o, com 16 anos de idade, para estudar em Coimbra,
sendo que o poeta retornou ao Brasil apenas aos 46 anos de idade: sua formação barroca
certamente se deve à sua estadia em Portugal.
Outra dimensão do Barroco brasileiro está indissociavelmente ligada à influência jesuí-
tica entre nós, pois, apesar de não se tratar de um estilo religioso em primeira instância, o
fato é que a ordem de Inácio de Loyola acabou incorporando a estética barroca – em muitos
casos, contribuindo com seu estilo e mesmo ampliando suas temáticas – como uma estraté-
gia para combater os vários movimentos de reforma religiosa que se alastravam a passos lar-
gos pela Europa. No entanto, da forma como geralmente se manifesta no contexto jesuítico,
o Barroco adquire algumas singularidades que devem ser tratadas em específico.
Por fim, não se deve esquecer que, apesar de o Barroco não ter sido um sistema ideoló-
gico e estético generalizado no Brasil dos séculos XVI e XVII, sua influência para a formação
da identidade brasileira não deve ser subestimada, notadamente pela importância de autores
como o padre Antônio Vieira e, sobretudo, Gregório de Matos, que acabaram influenciando
movimentos literários posteriores, o que levou o crítico Afrânio Coutinho, por exemplo, a
afirmar que “a civilização desenvolvida no Brasil colônia é uma civilização barroca, e [...] o
Barroco ficou sempre congenial ao espírito brasileiro” (COUTINHO, 2004a, p. 34).
36 Literatura Brasileira
O Barroco e a literatura brasileira 3
3.2 Cultismo e conceitismo no Brasil?
Massaud Moisés (2000, p. 72) nos fornece uma relação dos principais autores do perío-
do Barroco no Brasil a partir de um critério cronológico, que pode ser útil, à guisa de intro-
dução, para chegar a uma visão panorâmica:
• nos 50 anos iniciais do século XVII, Pernambuco é o centro, sendo que o principal
autor, frequentemente considerado o primeiro autor barroco no Brasil, é Bento
Teixeira, com sua Prosopopeia;
• a segunda metade do século XVII caracteriza-se como o apogeu do Barroco na
Bahia, tendo como principais autores Gregório de Matos Guerra e o padre Vieira;
• o final do século XVII e o século XVIII caracterizam-se como o declínio e o final do
Barroco na literatura brasileira, cujo marco geralmente é reconhecido a partir das
Obras (1768), de Cláudio Manuel da Costa.
No conjunto das obras produzidas no Brasil durante esse período, destacam-se apenas
dois autores por uma certa qualidade literária e pela importância ideológica e estética que
angariaram ao longo da história de nossa literatura: o baiano Gregório de Matos e o portu-
guês Antônio Vieira, que aqui passou a maior parte sua vida. Muitos críticos e historiadores
da literatura brasileira costumam afirmar que esses dois autores representam duas faces di-
cotômicas do Barroco, especialmente do Barroco espanhol, e chegam a explicar tal fenômeno
pelo fato histórico de Portugal ter sido anexado à Espanha entre 1580 e 1640, permanecendo,
durante 60 anos, sob o domínio político de Felipe II e seus sucessores, o que teve consequên-
cias no âmbito cultural e literário de Portugal e de suas colônias.
Afrânio Coutinho (2004a, p. 34) acredita que justamente por causa desse fato político
o Barroco não se impôs em Portugal, pois teria angariado uma certa aura de “ideologia do
opressor”, ao passo que, no Brasil, teria se imposto pelo motivo inverso. A despeito desse
tipo de especulação, certos críticos afirmam que Gregório de Matos e o padre Vieira se-
riam os nossos representantes do Cultismo e do Conceitismo, respectivamente. Nessa visão,
Gregório de Matos estaria mais para o maneirismo acentuado de Gôngora (cuja escola ficou
conhecida como cultismo ou culteranismo), enquanto Antônio Vieira representaria o estilo de
Quevedo, que ficou conhecido como conceptismo.
É comum afirmar que o estilo de Gôngora é mais marcado pelo preciosismo exagera-
do advindo de um uso extensivo de figuras retóricas e poéticas, especialmente metáforas
sensoriais, figuras de oposição e de sintaxe, e o estilo de Quevedo, por sua vez estaria mais
marcado pela retórica escolástica, o que explicaria sua predileção por figuras de raciocínio
lógico, como silogismos.
Note como nos últimos versos do soneto “La dulce boca que a gustar convida”, Gôngora
(2008) utiliza as metáforas visuais – “manzanas” (maçãs) e “rosas” – para expressar o amor
como algo paradoxal: perfumado e venenoso ao mesmo tempo. Além do forte apelo senso-
rial (visual, olfativo e gustativo), o poema apresenta jogos de inversão sintática – por exem-
plo, no último verso, cuja ordem direta seria “Y solo el veneno queda del amor” (E só o veneno
do amor permanece).
Literatura Brasileira 37
3 O Barroco e a literatura brasileira
Por outro lado, já o primeiro verso do poema“¡Ah de la vida!” ... Nadie me responde?, de
Quevedo, em vez de privilegiar imagens visuais sensórias, apresenta um raciocínio lógico
destinado a criar uma espécie de paradoxo: “Represéntase la brevedad de lo que se vive y cuán
nada parece lo que se vivió” (Representa-se a brevidade do que se vive, quando nada parece
com aquilo que se viveu). Em vez de metáforas ou alegorias, há dois enunciados em oposição
lógica: no primeiro, uma asserção; no segundo, outra asserção, que se opõe à primeira. Assim,
o paradoxo não surge de imagens, mas da oposição entre o conteúdo lógico dos enunciados.
As aproximações entre Gregório e Gôngora, assim como entre Vieira e Quevedo, são justi-
ficáveis. No entanto, classificar o primeiro como cultista e o segundo como conceptista pode con-
duzir a simplificações exageradas. No caso de Gregório, já se demonstrou que seus poemas são
tributários de influências tanto de Gôngora quanto de Quevedo (COUTINHO, 2004a, p. 122).
No caso de Vieira, por sua vez, muito de sua tendência para um raciocínio mais lógico
e menos afetado se deve ao próprio gênero que predomina em sua produção: o sermão,
um discurso retórico por excelência. E, mesmo assim, também em seu discurso há um uso
extensivo de imagens sensórias, analogias (a maior parte delas provindas de textos bíblicos
e biografias de santos) e outras figuras de retórica, inclusive antíteses, embora seu uso ex-
cessivo tenha sido condenado pelo próprio autor em seu famoso “Sermão da Sexagésima”.
Em poucos termos, se é possível elencar elementos cultistas e conceptistas nas obras de
Gregório de Matos e do padre Antônio Vieira, classificá-los a partir desses dois movimentos
ibéricos pode conduzir ao risco da simplificação excessiva e da consequente negligência
quanto a aspectos específicos estilística e ideologicamente importantes nesses dois autores.
38 Literatura Brasileira
O Barroco e a literatura brasileira 3
Angola. Foi-lhe permitido voltar ao Brasil um ano depois, desde que fosse morar no Recife.
Lá faleceu, em 1695, vítima de uma malária contraída na África.
O primeiro e principal problema em relação à literatura de Gregório de Matos diz respei-
to à edição de seus poemas. Como inexistia imprensa no Brasil daquela época, a maior parte
de sua produção foi realizada em manuscritos, vários dos quais estão perdidos irremediavel-
mente. Além disso, por circularem de forma pouco organizada e visto não ter sido realizada
uma coletânea confiável na sua época, não é possível ter certeza de que todos os poemas que
hoje possuímos com a rubrica de Gregório de Matos realmente são de sua autoria.
Outra questão preliminar relevante é o fato de que alguns de seus poemas são pra-
ticamente idênticos a poemas de Gôngora, o que levou alguns críticos literários não só a
depreciarem a obra de Gregório como também a considerá-lo um poeta menor, incapaz de
produzir criativamente. Apesar de continuar gerando controvérsias, esse assunto foi tratado
com muito cuidado por Afrânio Coutinho, que foi capaz de demonstrar, de forma convin-
cente, que a imitação era a norma estética daquele período, sendo praticada por todos os
grandes autores – não apenas do Barroco, mas de todos os períodos literários anteriores
ao Romantismo. É apenas a partir do Romantismo que a criatividade individual do artista
passa a adquirir importância central como critério de avaliação estética: “Naquele tempo era
motivo de superioridade e não de inferioridade artística [...] um escritor mostrar que imitava
um modelo da Antiguidade” (COUTINHO, 2004a, p. 10).
A poesia de Gregório de Matos é de capital importância para compreender a formação
da identidade cultural e literária brasileira, pois certamente ele foi o primeiro escritor a
realizar uma “manifestação eloquente da mestiçagem cultural que se implantou no Brasil”
(COUTINHO, 2004a, p. 31). Nesse sentido, estudar a obra de Gregório é fundamental para
compreender vários mitos e práticas culturais ainda hoje perceptíveis em nossa sociedade –
como preconceitos de raça e de classe.
Além disso, Gregório pode ser considerado, sem dúvida, uma manifestação genuína e
de alta qualidade do espírito barroco, sendo que sua poesia manifesta, de forma exemplar,
um dos maiores paradoxos daquele período: uma religiosidade beata e piedosa junto com
uma sensualidade que, no caso de Gregório, chega às raias da obscenidade escancarada,
em uma vã e desesperada tentativa – sempre fadada ao fracasso – de conciliar o espírito e a
carne. Compare os quatro primeiros versos de um poema satírico de Gregório (o soneto “Ao
mesmo assunto do batizado”), em que o poeta conclama explicitamente ao gozo dos praze-
res terrenos, com os quatro primeiros versos de um de seus poemas religiosos (“Ao mesmo
assunto”), cujo tema principal é a culpa e o arrependimento:
Literatura Brasileira 39
3 O Barroco e a literatura brasileira
A poesia de Gregório pode ser dividida a partir de três temas ou subgêneros, que pre-
dominam em sua produção: poesia sacra, poesia satírica, poesia erótico-amorosa.
Na primeira, prevalece o tema tipicamente barroco da culpa pela consciência do peca-
do, advindo do apego incontornável à vida terrena, e a necessidade do perdão divino.
A poesia satírica de Gregório de Matos foi a principal responsável pelos seus problemas
com a Inquisição e pelo seu desterro. De fato, a linguagem feroz, ofensiva e frequentemente
obscena que o poeta utilizava para se referir aos seus desafetos fez com que ficasse conheci-
do como O Boca do Inferno.
Pertencente a uma classe social que se encontrava em franca decadência – a aristocracia
portuguesa – em decorrência do avanço do Mercantilismo, Gregório viu uma série de no-
vos tipos sociais angariando prestígio econômico em detrimento da velha classe dirigente
do Brasil, de origem aristocrática. Sua pena se dirigiu sobretudo contra os comerciantes
ingleses (chamados, ironicamente, de brichotes), os cristãos-novos (judeus convertidos) e os
novos “burgueses” brasileiros, que o poeta denomina de “netos de caramuru”, em uma
franca demonstração de preconceito contra as etnias indígenas. Note os versos abaixo, em
que Gregório (MATOS, 2008b) procurou ridicularizar a linguagem indígena já presente no
vocabulário português da época:
Sua maior indignação, contudo, dirige-se contra mestiços forros que, agregados a fa-
mílias abonadas, recebiam deferências negadas a ele próprio, que se considerava de uma
classe social, econômica e racial superior. É exatamente nesse ponto que surgem algumas
das questões sociológicas mais relevantes no que diz respeito a uma discussão da poesia de
Gregório sob o pano de fundo da formação da cultura brasileira. Como observou o crítico
literário Alfredo Bosi (2005, p. 106), quando está em jogo o prestígio econômico é que sur-
gem, em nossa cultura, da forma mais cruel, os preconceitos de cor e de raça evidentes entre
inúmeros outros exemplos, nos versos a seguir:
A poesia amorosa de Gregório revela um dualismo inconciliável, que pode ser lido à luz
do pensamento barroco, mas que também revela aspectos sociológicos importantes quanto
aos mitos da fundação da cultura brasileira. Quando o poeta toma como objeto de seu desejo
mulheres brancas, preferencialmente pertencentes à classe social aristocrática, utiliza o que
a poesia barroca possui de mais exemplar para exprimir seu erotismo, como trocadilhos,
hipérbatos, antíteses, metáforas e alegorias, o que, a despeito de gerar um efeito estético de
40 Literatura Brasileira
O Barroco e a literatura brasileira 3
opulência sensória, acaba criando uma atmosfera sóbria e galanteadora. Já quando se dirige
à mulher negra ou mestiça, os preconceitos raciais já manifestos na poesia de cunho político
adquirem uma intensidade realçada pelo obsceno, que, muitas vezes, beira o pornográfico.
Observe os exemplos abaixo:
Parte de um poema dedicado a Parte de um poema dedicado a uma
Dona Ângela mulata
Se a boca vos fede a caca,
Anjo no nome, Angélica na cara! e tanto puta, fedeis,
Isso é ser flor, e anjo juntamente: eu creio que descendeis
Ser angélica flor, e anjo florente, de alguma Jaratacaca:
Em quem, senão em vós, se uniformara sobre seres tão velhaca,
que não há pobre despido
Quem veria uma flor, que a não cortara que vos não tenha dormido,
De verde pé, de rama florescente? Jaratacaca bufais,
E quem um Anjo vira tão luzente, e quando vós fornicais,
Que por seu Deus, o não idolatrara? deixais o membro aturdido.
(MATOS, 2008e) (MATOS, 2008g)
Alfredo Bosi explica que, na poesia erótica de Gregório, há uma desclassicação explícita
daquela mulher que não se pretende tomar por esposa, ao mesmo tempo em que há uma
idealização da mulher com quem se pretende casar. Nesse último caso, os impulsos eróticos
são sublimados (elevados, purificados) por meio do rico repertório de imagens e figuras
literárias do Barroco, ao passo que a mulher negra e mestiça transforma-se em objeto de de-
sejo luxurioso ao mesmo tempo em que é vista como digna de desprezo. Em poucos termos,
no tratamento concedido ao erotismo por parte de Gregório, “o preconceito [...] dobra-se e
complica-se porque desce ao subterrâneo de uma prática erótica onde se geram, íntima e
simultaneamente, a atração física, a repulsa e o sadismo” (BOSI, 2005, p. 107).
Literatura Brasileira 41
3 O Barroco e a literatura brasileira
Em 1652, após 11 anos em Portugal, Vieira retornou ao Brasil, onde se tornou uma
figura politicamente influente. A partir de então, engajou-se em vários projetos políticos e
ideológicos, entre os quais podemos destacar dois:
• sua luta contra o recrutamento de índios para trabalharem como escravos, no
Maranhão;
• seu intento de persuadir D. João IV a aderir ao espírito mercantil já incorporado
pelos mais importantes rivais econômicos de Portugal – Holanda e Inglaterra.
Novamente sem sucesso, no ano seguinte retornou ao Maranhão, onde residia desde sua
volta à colônia, e sua atuação acabou por levá-lo a ser expulso do Brasil, juntamente com outros
jesuítas, o que o conduz novamente a Portugal. Lá, Vieira foi preso por ordem da Inquisição
sob acusação de profetismo messiânico. De fato, em alguns textos escritos após esse retorno
a Portugal as imagens e analogias criadas pelo jesuíta exprimem a ideia do Brasil como uma
terra prometida, na qual Cristo reinaria soberano sobre todos os males e heresias.
Em 1669, ele se transferiu para Roma, na intenção de tentar anular o processo da
Inquisição, o que ocorreu em 1675. Nesse intervalo, Vieira tornou-se pregador nos espaços
literários criados pela rainha Cristina, da Suécia, que lá se encontrava. Em 1681, ele retornou
ao Brasil e na Bahia se dedicou à publicação de suas obras e ao ofício de pregador. Falece em
1697, no Colégio da Bahia.
A primeira questão a ser destacada quando se fala da obra de Antônio Vieira é o pró-
prio estatuto de sua produção, que praticamente não abrange a ficção e tampouco a lírica
tradicional: trata-se de textos literários ou não literários? Embora muito já se tenha discutido
a esse respeito – e a crítica literária tem oscilado quanto às respostas –, historicamente seus
textos têm sido valorizados, no âmbito da crítica, juntamente com os textos de Gregório de
Matos, apenas após a década de 1930 (MOISÉS, 2000, p. 197).
A segunda questão mais discutida no âmbito da crítica tradicional é a filiação de Vieira
a uma das duas principais correntes do Barroco ibérico. Se Gregório de Matos foi classifi-
cado, de modo apressado, como cultista, Vieira, de modo similarmente apressado e pouco
consistente, tem sido considerado nosso representante do conceptismo. A arbitrariedade
dessas classificações já tem sido devidamente discutida no âmbito da crítica contemporânea
e, assim como existem estudos demonstrando a influência de Quevedo sobre Gregório de
Matos, também há estudos que abalam a crença no conceptismo puro de Vieira.
De fato, o próprio Vieira, em um de seus mais famosos sermões, o “Sermão da
Sexagésima”, também chamado “Sermão do Evangelho”, condena diretamente a linguagem
cultista, muito apreciada e praticada amplamente pela ordem dos dominicanos, especial-
mente pelo Frei Domingos de São Tomás:
Este desaventurado estilo que hoje se usa, os que o querem honrar chamam-lhe
culto, os que o condenam chamam-lhe escuro, mas ainda lhe fazem muita honra.
O estilo culto não é escuro, é negro, e negro boçal e muito cerrado (VIEIRA, 2008).
Note como Vieira ataca ironicamente a hiper-retórica do estilo cultista, que considera
nada mais do que um jogo vazio de efeitos estéticos baseados em antíteses pobres, sem
qualquer conteúdo:
42 Literatura Brasileira
O Barroco e a literatura brasileira 3
Não fez Deus o céu em xadrez de estrelas, como os pregadores fazem o sermão
em xadrez de palavras. Se de uma parte está branco, da outra há de estar negro,
se de uma parte está dia, da outra há de estar noite, se de uma parte dizem luz,
da outra hão de dizer sombra; se de uma parte dizem desceu, da outra hão de
dizer subiu. Basta, que não havemos de ver num sermão duas palavras em paz?
(VIEIRA, 2008).
Apesar de seus ataques diretos ao cultismo, já se demonstrou de forma convincente
que, quando lhe convinha, Vieira sabia empregar com maestria as técnicas retóricas típicas
do gongorismo (COUTINHO, 2004a, p. 87).
No “Sermão da Sexagésima”, Vieira desenvolveu uma verdadeira teoria de retórica,
baseada em imagens e ações concretas: “O pregar há de ser como quem semeia, e não como
quem ladrilha ou azuleja.” Além disso, em franca oposição à ideia de que a forma é mais
importante do que o conteúdo, Vieira afirma que o bom discurso depende:
• da adequação do assunto;
• do domínio da técnica;
• da impostação da voz;
• do comprometimento com a verdade do discurso; e
• da coerência entre o discurso enunciado e a vida pessoal do orador.
Para sermos coerentes com a concepção de Vieira, portanto, é à luz de seus projetos
políticos e ideológicos que deve ser lida a sua obra e o modo como esse brilhante orador se
apropria da estética barroca. Ressalte-se novamente que Vieira não é um ficcionista, mas,
antes de tudo, um retórico e portanto, utiliza o estilo, em primeira instância, para persuadir
e não para criar efeitos de forma puramente estética. As analogias, os silogismos, as metáfo-
ras e as alegorias bíblicas, além de recursos de uso frequente por parte dos cultistas (como
hipérbatos, oxímoros e antíteses), são utilizados, pelo padre jesuíta para persuadir a classe
dirigente de Portugal em favor de suas concepções políticas e ideológicas.
Apesar de Vieira ter se pronunciado sobre numerosos assuntos e questões importantes
para a sua época, destacaremos aqui de modo muito panorâmico, apenas duas:
• sua visão política e econômica, favorável ao mercantilismo e à necessidade de bus-
car apoio pecuniário junto aos cristãos-novos;
• seu engajamento na questão da escravidão do índio e do negro.
Quanto ao primeiro ponto, diferente de Gregório de Matos, que defendia a classe aristo-
crática contra a máquina mercante, Vieira tinha consciência de que, para sobreviver economi-
camente, a classe dirigente de Portugal (os nobres, os teólogos, o Santo Ofício) deveria ven-
cer seus preconceitos contra os judeus (cristãos-novos), pois estes eram grandes banqueiros
e comerciantes. Enquanto conselheiro de D. João IV, Vieira o havia persuadido a fundar uma
Companhia das Índias Ocidentais, que dependia do capital de cristãos-novos. Na verdade,
Vieira pretendia imitar as estratégias mercantis já adotadas pela Holanda e pela Inglaterra,
mas para tanto precisava enfrentar e combater o pensamento dogmático de uma aristocracia
que não estava disposta a abdicar de seus privilégios, assentados em uma tradição religiosa
e ainda medieval em vários aspectos.
Literatura Brasileira 43
3 O Barroco e a literatura brasileira
44 Literatura Brasileira
O Barroco e a literatura brasileira 3
em suas plantações. Em 1654, Vieira chegou a retornar a Portugal na esperança de negociar
uma solução a partir de sua influência política. Entre os jesuítas e a Coroa havia um acordo
segundo o qual os padres da Companhia de Jesus ajudariam os portugueses a buscar os
índios no sertão, trazendo-os para São Luís, a fim de trabalharem como escravos apenas
durante a metade do ano – o restante do tempo deveria ser dedicado à catequese e à dou-
trinação cristã, realizada pelos padres. No entanto, na medida em que o trabalho nas roças
aumentava e se intensificava, os colonos exigiam que os índios trabalhassem o tempo todo
(BOSI, 2005, p. 136).
É contra esse abuso específico que Vieira se pronuncia, por exemplo, no “Sermão da
Primeira Dominga da Quaresma” ou no “Sermão da Epifania”. Assim como no caso dos
escravos negros, também na argumentação destinada a defender os índios, Vieira cai em
numerosas contradições – que podem ser lidas como contradições ou paradoxos do Barroco,
mas também servem como um ícone das contradições do próprio projeto de colonização do
Brasil. Nas palavras de Alfredo Bosi, “como poderia uma instituição, que vivia dentro do
Estado monárquico, e à custa dos excedentes deste, desenvolver um projeto social coeso à
revelia das forças que dominavam esse mesmo sistema?” (BOSI, 2005, 137).
Para concluir, ressalte-se que um dos aspectos mais curiosos quando se avalia a obra de
Antônio Vieira à luz do Barroco, e especialmente à luz do Barroco jesuítico, é o fato de que,
primeiro, Vieira não sobrepõe a forma ao conteúdo e, segundo, o fato de que tampouco se
revela um pessimista ou um desiludido, para quem a vida seria mero sonho ou aparência.
Comprova-o seu messianismo – alegórico ou não –, fundamento de uma esperança de re-
denção ainda neste mundo. Homem de ação e não de quimeras, Vieira desafia conclusões
simplórias sobre a maneira como a filosofia inaciana influenciou o pensamento barroco.
Prefácio
(CAMPOS, 1995, p. 9-14)
De longa data tenho insistido com meu amigo, o Prof. Segismundo Spina,
no sentido de que fizesse reeditar a sua antologia de Gregório de Matos,
publicada em 1946 pela Editora Assunção em São Paulo, e há muitos anos
esgotada.
Literatura Brasileira 45
3 O Barroco e a literatura brasileira
46 Literatura Brasileira
O Barroco e a literatura brasileira 3
• O levantamento e o estudo preliminar da “linguagem brasileira” de
Gregório (dos brasileirismos, tupismos e africanismos do léxico gre-
goriano), uma característica de seu “barroco tropical” (Spina).
Literatura Brasileira 47
3 O Barroco e a literatura brasileira
Atividades
1. Leia as afirmações a seguir.
48 Literatura Brasileira
O Barroco e a literatura brasileira 3
2. Assinale nas alternativas seguintes (V) quando estiver relacionada com a obra de
Vieira e (G) quando estiver relacionada com a obra de Gregório de Matos.
(( Sua obra pode ser dividida a partir de três gêneros principais: satírico, amoroso
e sacro.
3. Por que a obra de Gregório de Matos é tão importante no quadro da literatura bra-
sileira?
Resolução
1. d.
2. Na ordem: V, G, V, G.
3. Há pelo menos dois motivos principais para que a obra de Gregório de Matos seja con-
siderada de extrema importância para o cânone literário brasileiro:
Literatura Brasileira 49
4
O Arcadismo brasileiro
Edgar Roberto Kirchof
Como destacou Antônio Cândido (2000, p. 60), a poesia pastoril tem significado
próprio e importante no contexto brasileiro, pois, stricto sensu, é apenas a partir do
Arcadismo que se esboça uma poesia genuinamente brasileira. A despeito de um certo
artificialismo quanto às representações tanto da natureza quanto dos sentimentos,
consequência do próprio código estético seguido pelos árcades, fato é que, na pena de
Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga ou Basílio da Gama, entre outros,
pela primeira vez em nossa história literária temas genuinamente brasileiros e ligados
à formação de uma identidade nacional ganharam representação poética, ainda que de
forma tímida e incipiente.
Literatura Brasileira 51
4 O Arcadismo brasileiro
O crítico literário Afrânio Coutinho (2004a, p. 219) afirmou que, na poesia neoclássica
brasileira, podem ser encontradas duas principais tendências.
• Uma tendência a repetir os cânones estéticos e literários do século XVIII, que da-
vam fundamento à poesia neoclássica na Europa, especialmente as poéticas de
Horácio e de Boileau, além dos autores que lhes serviam como modelo e inspira-
ção: Anacreonte, Píndaro, Virgílio, Horácio, Ovídio, Sannazaro, Petrarca, Camões
e Garcilaso. Os principais efeitos buscados eram a clareza, a simplicidade, o equi-
líbrio e a harmonia.
• Uma tendência não tão tributária das normas neoclássicas, que alguns autores de-
nominam como uma tendência pré-romântica: apesar de estarem sujeitos aos códi-
gos e normas do neoclassicismo, alguns autores árcades conseguem imputar uma
marca pessoal em suas obras, dessa forma revelando uma subjetividade mais au-
têntica a partir de traços do contexto histórico e, mesmo, cultural em que estão
inseridos. Em algumas passagens de Marília de Dirceu, principalmente na segunda
parte dessa obra, por exemplo, percebe-se um tom mais pessoal, pouco típico do
arcadismo, como nos versos a seguir (a última estrofe da “Lira II”), em que o eu
lírico afirma um amor extravasado (coração maior que o mundo), mais típico do
Romantismo, e não contido, o que seria esperado de um poema árcade:
Também quando abordam o índio como personagem de seus épicos, de certa forma,
Basílio da Gama, Santa Rita Durão e mesmo Silva Alvarenga e o Cláudio Manuel da Costa
52 Literatura Brasileira
O Arcadismo brasileiro 4
da última fase acabam burlando o código neoclássico. Na poesia desses autores, “o índio ia
se tornando símbolo do Brasil”, como nota Antonio Candido (2000, p. 108).
Apesar de sua ideologia fortemente eurocêntrica e religiosa, Santa Rita Durão acabou
apresentando traços da flora e da fauna brasileira, além de certos costumes indígenas, em
seu Caramuru. Basílio da Gama, por sua vez, acentua o mito do índio como representante
da verdadeira naturalidade a que aspiravam os árcades, na medida em que os colocou como
heróis de seu O Uraguai.
Um caso especialmente interessante de poetas árcades que acabaram se desviando da
normatividade neoclássica são os mestiços Silva Avarenga e Domingos Caldas Barbosa, que,
em pleno Arcadismo, conseguem captar e traduzir poeticamente elementos de nossa nacio-
nalidade, embora menos na temática propriamente dita e mais na musicalidade e mesmo
na atmosfera emocional, mais terna e “dengosa”. Sobre Silva Alvarenga, Antônio Candido
afirma que:
[...] foi o primeiro em nossa literatura que sentiu e exprimiu certos tons da nossa
sensibilidade: o quebranto da volúpia à flor da pele e a surdina em que gostamos
de cantá-la. Menos por haver inserido plantas e bichos do Brasil, do que por ter
suscitado ritmos tão brasileiramente langorosos, merece a estima que lhe votam
os amantes da cor local. (CANDIDO, 2000, p. 138)
Observe como as características melódicas apontadas por Candido se fazem presentes
no estribilho do “Rondó X”, retirado de Glaura, sua principal obra:
Literatura Brasileira 53
4 O Arcadismo brasileiro
Deve ser ressaltado que o fundamento ideológico libertário e iluminista que perpassava
o arcadismo europeu se revestiu, na Colônia, de uma ideologia liberal, nacionalista e pró-in-
dependência do Brasil, sendo que os principais motivos se devem às políticas adotadas pelo
governo português quanto ao modo como deveria ser explorado o ouro recém-descoberto
nas Minas Gerais.
Apesar do rigoroso controle realizado nas Casas de Fundição, onde o ouro era obriga-
toriamente transformado em barras – garantindo-se, dessa forma, o pagamento dos tributos
–, em 1765, o governo português decretou a derrama, uma lei segundo a qual, caso a soma
destinada aos impostos não chegasse a cem arrobas de ouro por ano, a população mineira
deveria completar a quantia faltante.
Essa política, adotada pela Coroa para retirar Portugal da estagnação econômica em
que se encontrava, foi como que um fermento para grupos independentistas que já havia no
Brasil. Nesse contexto, destaca-se um movimento que ficaria conhecido como a Inconfidência
Mineira e cujos participantes eram, predominantemente, da elite mineira, destacavam-se en-
tre eles os principais poetas árcades: Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga.
Entre as principais reivindicações dos inconfidentes estava a criação de uma república
cuja capital seria a cidade mineira de São João Del Rei. O fundamento ilustrado do grupo se
manifesta sobretudo nas intenções de industrialização e de criação de uma universidade na
colônia. Contudo, é necessário lembrar que os inconfidentes representavam a elite financei-
ra e intelectual do Brasil Colônia e, enquanto tal, não chegaram a questionar a distribuição
interna das riquezas em nosso país. Como destaca Alfredo Bosi (1994, p. 60), os inconfiden-
tes não pretendiam acabar com a propriedade privada e tampouco se colocaram, de forma
declarada, contra a escravidão.
54 Literatura Brasileira
O Arcadismo brasileiro 4
neoclássico, grande parte de seus poemas está muito mais próxima do Barroco do que da esté-
tica neoclássica propriamente dita, como se pode perceber no seu Soneto XXIV.
Soneto XXIV
Sonha em torrentes d’água, o que abrasado
Na sede ardente está; sonha em riqueza
Aquele, que no horror de uma pobreza
Anda sempre infeliz, sempre vexado:
Literatura Brasileira 55
4 O Arcadismo brasileiro
e das ninfas, um dos mitos mais interessantes reinterpretados pelo poeta é o de Polifemo,
segundo o qual o gigante monstruoso se apaixona por uma bela ninfa.
Por essa razão, é possível falar em duas fases na poesia de Cláudio Manuel da Costa:
• uma primeira, em que o autor ainda está muito ligado ao cultismo, sendo que vá-
rios de seus versos são muito semelhantes aos de Gôngora;
• uma segunda, em que, pela influência mais do quinhentismo português (especial-
mente Camões) que de seus contemporâneos árcades, o poeta acaba se alinhando
com vários preceitos do Arcadismo.
Por essas razões, Cláudio Manuel da Costa tem sido considerado um poeta de transição
entre o Barroco e o Arcadismo no Brasil. Uma de suas principais contribuições para a litera-
tura brasileira pode ser a maneira como insere a temática da pátria em seus poemas. Antonio
Candido (2000, p. 85) chamou a atenção para o fato de que,
[...] enquanto a maioria dos poemas pastoris, desde a Antiguidade, tem por ce-
nário prados e ribeiras, nos de Cláudio, há vultosa proporção de montes e vales,
mostrando que a imaginação não se apartava da terra natal e, nele, a emoção
poética possuía raízes autênticas, ao contrário do que dizem frequentemente os
críticos, inclinados a considerá-lo um mero artífice.
56 Literatura Brasileira
O Arcadismo brasileiro 4
De amar, minha Marília, a formosura
Não se podem livrar humanos peitos:
Adoram os heróis, e os mesmos brutos
Aos grilhões de Cupido estão sujeitos.
Quem, Marília, despreza uma beleza,
A luz da razão precisa,
E se tem discurso, pisa
A lei, que lhe ditou a Natureza. (GONZAGA, 2008)
Na primeira parte de Marília de Dirceu, percebe-se, da forma mais evidente, a intimida-
de de Tomás Antônio Gonzaga com a estética árcade, pois foi capaz de conferir uma repre-
sentação lírica autêntica e convincente a um amor que de fato sentiu, fazendo uso da maior
parte dos recursos e dos temas neoclássicos:
• o locus amoenus, local prazeroso, marcado por prados e bosques, isto é, por toda
área temática do bucolismo;
• a aura mediocritas, meio-termo aspirado pelos árcades, em que os sentimentos são
expressos de forma equilibrada e harmoniosa, evitando-se grandes sobressaltos;
• o carpe diem, a ideia de aproveitar cada dia, presente no fato de o eu lírico não se
privar de viver o amor que sente.
Note nos versos a seguir (oitava estrofe da “Lira XVII”) como esses temas se fazem pre-
sentes, sobretudo no lirismo rococó (festa, dança) dedicado a Marília, bem como no espaço
físico bucólico (a floresta) em que o espaço é configurado:
Literatura Brasileira 57
4 O Arcadismo brasileiro
58 Literatura Brasileira
O Arcadismo brasileiro 4
E se servem de vós como de escravos.
Armados de orações vos põem no campo
Contra o fero trovão da artilharia,
Que os muros arrebata; e se contentam
De ver de longe a guerra: sacrificam,
Avarentos do seu, o vosso sangue. (GAMA, 2008)
Essa obra, com objetivos épicos, possui como tema a tomada das missões jesuíti-
cas do Rio Grande do Sul pela expedição liderada por Gomes Freire de Andrade, em
1756. Basicamente, após Gomes Freire explicar os objetivos da expedição no primei-
ro canto, inicia-se a batalha entre os portugueses e os índios no segundo canto. Embora
esse épico termine com a (evidente) vitória do exército luso-espanhol, os índios são re-
tratados com um certo respeito e até admiração. Dessa maneira, tanto a milícia luso-
-espanhola quanto os índios se caracterizam como protagonistas, vítimas dos jesuítas, os
verdadeiros antagonistas nessa obra.
Os principais méritos de O Uraguai são estéticos, pois ele é composto de versos muito
bem construídos do ponto de vista estilístico: cesuras bem realizadas, enjembements e efeitos
sonoros convincentes.
No que diz respeito à temática, a obra perde valor por causa de sua visão explicitamente
tendenciosa, em que os jesuítas são representados de modo quase caricato, ao mesmo tempo
em que há laudações muito explícitas ao Marquês de Pombal. Na temática da natureza, tão
cara ao Arcadismo, também existe uma tendência quase romântica, pois Basílio da Gama
apresenta uma relação mais direta entre o eu lírico e os sentidos do mundo.
Literatura Brasileira 59
4 O Arcadismo brasileiro
Essa ideologia se torna explícita pelo próprio tema da obra: a narração da lenda segun-
do a qual o aventureiro Diogo Álvares Correia, ao naufragar na costa da Bahia, viu seus
homens sendo literalmente devorados pelos nativos. Após desferir um tiro de espingarda,
Diogo Álvares foi chamado de Caramuru pelos nativos, o que segundo Durão significaria
“filho do trovão”. Observe como o autor atribui a prática do canibalismo aos indígenas,
conforme os versos a seguir, encontrados no primeiro canto.
60 Literatura Brasileira
O Arcadismo brasileiro 4
A obra de Durão foi muito valorizada pelos românticos – na verdade, mais por sua vi-
são nacionalista e não tanto por causa de sua qualidade enquanto obra literária, pois nesse
ponto reside a principal debilidade do Caramuru. Além do defeito de uma ideologia tão
marcada ao ponto de comprometer a verossimilhança, Durão não tem o mesmo domínio da
linguagem literária demonstrado por Basílio da Gama. Na avaliação de Alfredo Bosi, Diogo,
o protagonista dessa obra, é um
[...] misto de colono português e missionário jesuíta, síntese que não convence os
conhecedores da história, mas que dá a medida justa dos valores de Santa Rita
Durão. Na medida em que o herói encarna, aliás ossifica tais valores, ele se enrijece
e acaba perdendo toda capacidade de ativar a trama épica [...]. (BOSI, 1994, p. 70)
Literatura Brasileira 61
4 O Arcadismo brasileiro
Atividades
1. Assinale verdadeiro (V) ou falso (F).
(( A ligação dos poetas árcades com a Inconfidência Mineira pode ser explicada,
entre outras razões, a partir da influência dos ideais iluministas sobre esses
poetas.
62 Literatura Brasileira
O Arcadismo brasileiro 4
(( Um dos principais temas da poesia épica árcade brasileira é o índio.
3. Quais as principais diferenças ideológicas entre Basílio da Gama e Santa Rita Durão?
Resolução
1. Na ordem: F, V, V, V.
2. Na ordem: e, c, a, b, d.
3. As principais diferenças ideológicas entre Basílio da Gama e Santa Rita Durão tor-
nam-se evidentes a partir da maneira como o índio é retratado em suas respectivas
obras – O Uraguai e Caramuru. Ao passo que na primeira, existe uma simpatia para
com o nativo (e o vilão é caracterizado na figura do jesuíta), na segunda existe um
combate entre o europeu cristão e o índio pagão. Apesar de ter iniciado seus estudos
junto aos jesuítas, Basílio da Gama acabou aderindo à visão iluminista do Marquês
de Pombal e por essa razão possui uma concepção mais humanista, que se revela na
maneira como retrata o índio. Santa Rita Durão, por sua vez, manteve-se um repre-
sentante da visão de mundo católica e proselitista segundo a qual o índio só adquire
um estatuto realmente humano quando se torna cristão.
Literatura Brasileira 63
5
O Romantismo brasileiro
Edgar Roberto Kirchof
Em nosso país, a crítica tradicional aceita que o Romantismo foi introduzido ofi-
cialmente por Gonçalves de Magalhães, com seus Suspiros Poéticos e Saudades, em 1836.
Como sugeriu Alfredo Bosi, de romântico esse livro tem mais a intenção do que a
realização, pois apesar de abordar temas comuns a Lamartine e Manzoni falta-lhe o
mais importante, “a liberdade expressiva, que é o toque da nova cultura” (BOSI, 1994,
p. 98). Embora também seja uma obra de transição, em que se percebem ainda nitida-
mente vários traços da tradição árcade, A Confederação dos Tamoios (1856), também de
Magalhães, já permitia vislumbrar a importância que a questão da identidade nacional
iria adquirir entre nós, pela influência dos ideais românticos.
Literatura Brasileira 65
5 O Romantismo brasileiro
66 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
ainda bastante influenciada pelo arcadismo. A primeira geração realmente romântica – re-
presentada principalmente por Gonçalves Dias – existiria apenas entre aproximadamente
1840 e 1850, principalmente a partir da obra do próprio Gonçalves Dias. Percebe-se, nessa
fase, um forte predomínio de temas nacionalistas, abordados principalmente por meio do
imaginário que vai sendo criado em torno do índio, mas também se fazem perceber outros
temas românticos, como o panteísmo e o culto à natureza, por exemplo.
Literatura Brasileira 67
5 O Romantismo brasileiro
renomadas (nas quais já se fazem perceber alguns dos principais temas românticos – natu-
reza, pátria e religião):
• Primeiros Cantos (1846);
• Segundos Cantos (1848);
• Sextilhas de Frei Antão (1848); e
• Últimos Cantos (1851).
Essas obras são marcadas por um forte tom pessoal, motivado por um fato da bio-
grafia do poeta: o pedido de casamento de Gonçalves Dias à jovem Ana Amélia foi re-
cusado pela família dela por conta de um preconceito de cor. Por essa razão, os temas
românticos da natureza, da pátria e da religião estão fortemente ligados, em sua obra,
ao tema do amor impossível.
Gonçalves Dias se dedicou também a estudos etnográficos e linguísticos, chegando
a realizar pesquisas na Amazônia. Desse seu interesse surgiram Brasil e Oceania (1852) e
um Dicionário da Língua Tupi (1858). Por fim, também deixou um poema épico inacabado,
Os Timbiras.
Gonçalves Dias morreu regressando de uma viagem à Europa: seu navio naufragou no
litoral do Maranhão.
68 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
Sua obra foi reunida em livro apenas postumamente, sendo que devem ser destacados
A Lira dos 20 Anos, a prosa narrativa A Noite na Taverna, e O Livro de Fra Gondicario além de
uma composição livre de tom satanista, Macário.
Literatura Brasileira 69
5 O Romantismo brasileiro
fazendeiros. Sua infância no campo é tema corrente de seus versos. Pelo fato de seu pai ter
sido magistrado da província, sua família era obrigada a mudar-se de domicílio muitas vezes.
Ainda muito jovem, Fagundes Varella começou a estudar Direito na faculdade de São
Paulo, onde entrou em contato com o byronismo e com a vida boêmia que lhe era caracterís-
tica. Por essa razão, entregou-se a grandes bebedeiras, que lhe renderam alguns escândalos
e problemas financeiros.
Casando-se com Ritinha Sorocabana, uma artista circense, o poeta teve um filho, que se
chamava Emiliano e morreu aos três meses de idade. Sua obra Cântico do Calvário é inspirada
nesse fato.
Após a morte da esposa, Fagundes Varella se entregou novamente ao álcool e a vários
problemas emocionais. Nesse contexto, ele retornou à fazenda de seus pais. Apesar de ter
se casado novamente, em 1869, jamais chegou a superar o problema do alcoolismo, sendo
que era visto frequentemente perambulando por fazendas próximas à sua, provavelmente
alcoolizado. Morre em 1875, vítima de um derrame.
Suas principais obras são
• Noturnas (1861);
• Vozes da América (1864);
• Cantos e Fantasias (1865);
• Cantos Meridionais (1869);
• Anchieta ou o Evangelho nas Selvas (1875).
Por fim, a terceira geração romântica, também chamada de Condoreirismo (uma alu-
são ao condor, que voa soberano sobre os céus), surge após 1860 e possui, como principal
representante, o poeta baiano Castro Alves. Com forte influência das concepções sociais que
Vitor Hugo já inseria em suas obras (como em Os miseráveis, por exemplo), apesar de ainda
cultivarem um certo intimismo amoroso, os poetas da terceira geração passaram a introdu-
zir temas de cunho político e social em suas poesias, o que já aponta, de certo modo, para a
superação do próprio Romantismo. O principal tema foi a abolição da escravidão no Brasil,
retratado principalmente por Castro Alves, sendo que o próprio poeta era afrodescendente.
70 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
na campanha liberal abolicionista, junto com Tobias Barreto. Lá se apaixonou pela atriz
portuguesa, Eugênia Câmara, de quem se tornou amante ainda aos 19 anos de idade. Sua
peça Gonzaga ou a Revolução de Minas é dedicada a Eugênia. Após casar-se com a atriz, Castro
Alves seguiu com a esposa para Salvador, onde a peça é apresentada no Teatro São João.
Mais tarde, Castro Alves foi para São Paulo, a fim de retornar ao curso de Direito.
Contudo, permaneceu dois meses no Rio de Janeiro, onde entrou em contato com José de
Alencar e Machado de Assis, conquistando-lhes a simpatia de imediato.
Após crises amorosas com Eugênia Câmara, que o abandonou, Castro Alves passou a se
dedicar à caça. Em uma de suas caçadas, sofreu um acidente no pé, que infeccionou, sendo
preciso amputar – então, o poeta retornou à Bahia, onde acaba vítima da tuberculose, mor-
rendo em 1871, com 24 anos incompletos.
Suas principais obras são:
• Espumas Flutuantes (1870);
• A Cachoeira de Paulo Afonso (1876);
• Os Escravos (1883); e
• Gonzaga (1875).
5.3.2 Sousândrade
Literatura Brasileira 71
5 O Romantismo brasileiro
72 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
[...] ao contrário do pai, que sempre se batera por teses liberais, o romancista
assumiu posições retrógradas (patentes em face do problema escravista) e foi,
no fundo, antes um individualista que um homem voltado para a coisa pública:
sabe-se que o motivo do seu afastamento da política, quando entrava na casa dos
40 anos, foi o ressentimento de ver--se preterido por Pedro II na indicação para o
Senado. (BOSI, 1994, p. 135)
Porém, parece que ter saído da política estimulou sua produção literária, pois, na déca-
da de 1860, escreveu muitas obras:
• As Minas de Prata (1862-66);
• Lucíola: Perfil de Mulher (1862);
• Diva: Perfil de Mulher (1864); e
• Iracema: Lenda do Ceará (1865).
Além disso, ainda na década de 1860, Alencar escreveu obras políticas:
• Ao Imperador: Cartas Políticas de Erasmo (1865);
• Ao Imperador: Novas Cartas Políticas de Erasmo (1865);
• Ao Povo: Cartas Políticas de Erasmo (1866);
• Juízo de Deus: Visão de Jó (1867); e
• Sistema Representativo (1868).
José de Alencar morreu em 1877, vítima da tuberculose. No entanto, os sete anos que
precederam sua morte foram extremamente produtivos, pois lhe renderam as muitas obras
de ficção:
• Gaúcho (1870);
• A Pata da Gazela (1870);
• Sonhos d’Ouro (1872);
• Til (1872);
• Alfarrábios (O Ermitão da Glória e O Garatuja, 1873);
• A Guerra dos Mascates (1873);
• Ubirajara (1874);
• Senhora (1875);
• Sertanejo (1875).
Postumamente, também foram publicados um romance (Encarnação, 1877) e uma auto-
biografia (Como e por que sou romancista, 1893).
Alencar foi, sem dúvida, o maior e o mais importante autor de obras literárias vincula-
do ao movimento romântico no Brasil. Figura contraditória e dotado de um grande talento,
contribuiu para a introdução de uma nova concepção quanto à nacionalidade brasileira (que
deveria, segundo os românticos, superar os preceitos árcades), porém, além de sua postura
Literatura Brasileira 73
5 O Romantismo brasileiro
74 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
• Culto do Dever (1865);
• Memórias do Sobrinho do Meu Tio (1868);
• Rio do Quarto (1869);
• A Luneta Mágica (1869);
• As Vítimas Algozes (1869);
• Nina (1869);
• A Namoradeira (1870);
• Mulheres de Mantilha (1871);
• Um Noivo e Duas Noivas (1871);
• Os Quatro Pontos Cardeais (1872);
• A Baronesa do Amor (1876).
Literatura Brasileira 75
5 O Romantismo brasileiro
Assim como José de Alencar, Taunay também nutria uma forte vocação política: militan-
te do Partido Conservador, foi deputado e senador por Santa Catarina. Após a Proclamação
da República, no entanto, abandonou a política. Deve-se notar que o Visconde de Taunay,
como ficou conhecido, era um artista talentoso, não apenas no que se refere à literatura, mas
também na pintura e na música. No entanto, entre suas várias obras literárias nem todas se
destacam pela qualidade estética, o que tem sido explicado, em parte, justamente por seu
talento, que fazia com que Taunay produzisse de modo um pouco apressado e, algumas ve-
zes, descuidado. A crítica tem considerado Inocência (1872) e A Retirada de Laguna (tradução
para o português realizada por Salvador de Mendonça em 1874) como suas melhores obras.
Além disso, o autor também produziu:
• Cenas de Viagem (1868);
• A Mocidade de Trajano (1872);
• Lágrimas do Coração (1873);
• Histórias Brasileiras (1874);
• Da Mão à Boca se Perde a Sopa (1874);
• Narrativas Militares: Cenas e Tipos (1878);
• Estudos Críticos (1881-1883).
No Brasil, o teatro romântico foi produzido em escala relativamente larga, pois a maior
parte dos principais romancistas românticos também escreveu obras dramáticas – é o caso
de José de Alencar, Franklin Távora e Joaquim Manoel de Macedo, entre outros. Além disso,
76 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
também havia autores que se dedicavam quase que exclusivamente ao teatro, como Quintino
Bocaiúva, Agrário de Meneses, Pinheiro Guimarães, Martins Pena, entre muitos outros.
Na época, nas mais importantes capitais de província havia várias casas de espetáculos
em que eram mantidas companhias compostas por atores brasileiros e europeus. Note-se
que a arte dramática gozava de uma grande popularidade na Corte, sobretudo pelo incen-
tivo de uma certa vida burguesa e aristocrática promovida pela própria família real e pela
aristocracia que a circundava.
Mas no caso do teatro romântico brasileiro vale o dito popular de que quantidade não
é qualidade: a forte tendência folhetinesca presente em romances de Éugene Sue e em nosso
Macedo, por exemplo, torna-se quase caricata nas obras dramáticas de nosso Romantismo.
A tendência para melhorar os vícios da elite e a incapacidade de representar questões real-
mente fundamentais da sociedade brasileira da época acabou comprometendo, enorme-
mente, a qualidade dessas obras.
Literatura Brasileira 77
5 O Romantismo brasileiro
Para concluir este capítulo, pode-se frisar que no Brasil o Romantismo foi um período
extremamente importante para a consolidação de uma literatura genuinamente nacional,
tanto no que diz respeito à poesia quanto à prosa e ao teatro. Algumas de suas principais
contribuições para a literatura e para a cultura brasileira foram:
• propor uma representação da cultura brasileira a partir de um substrato realmente
nacional, realizada por autores realmente brasileiros;
• introduzir nas obras literárias a língua portuguesa da maneira como é falada entre
nós, deixando de reproduzir o português na maneira como é falado e escrito em
Portugal;
• abrir espaço para uma maior liberdade quanto à criação, tanto em termos de gêne-
ros quanto em termos de temática.
Um menino gótico
(TEIXEIRA, 2001, p. 9-11)
78 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
Curiosamente, a literatura gótica surgiu no século XVIII – o chamado
Século da Luzes. Talvez fosse uma reação ao racionalismo que então
predominava na literatura e na filosofia. Otto Maria Carpeaux, em sua
História da Literatura Ocidental, explica que o gênero surgiu para atender
ao novo público leitor que então se formava na Europa. Não eram ainda
leitores sofisticados: precisavam de histórias que “excitassem os nervos”.
A tradição gótica vai longe. Já no século XX, temos autores como o arre-
piante norte-americano H. P. Lovecraft (1890-1937). O cinema aproveitou
os motivos do gótico e os transformou em clichês cada vez mais difíceis de
suportar. Autores de best-sellers, como Anne Rice e Stephan King, faturam
muito repetindo esses mesmo clichês. Isso para não falar na versão pop mais
barulhenta do gótico: os concertos de heavy-metal, com toda a sua paraferná-
lia cênica – morcegos, esqueletos etc. – e o seu satanismo de butique.
Literatura Brasileira 79
5 O Romantismo brasileiro
Atividades
1. Assinale:
2. Relacione as colunas.
80 Literatura Brasileira
O Romantismo brasileiro 5
b. José de Alencar ( ) Abordou a temática sertanista a partir de
um romance que pode ser caracteriza-
do como uma espécie de Romeu e Julieta
caboclo.
c. Visconde de ( ) Foi um dos primeiros romancistas a
Taunay adaptar o folhetim europeu ao contexto
brasileiro.
d. Franklin Távora ( ) Criou numerosas peças dramáticas satiri-
zando e ironizando costumes rurais e ur-
banos da sociedade brasileira.
e. Martins Pena ( ) Insere-se no projeto regionalista do
Romantismo, tendo abordado principal-
mente a temática do cangaço.
Resolução
1. Na ordem: b, c, a, b, a.
2. Na ordem: c, a, b, e, d.
José de Alencar, por sua vez, trata a temática do índio a partir de um gênero literário
genuinamente romântico: o romance, desprendendo-se da ideologia neoclássica da
qual em certa medida Magalhães ainda é tributário.
Literatura Brasileira 81
6
O Realismo
Edgar Roberto Kirchof
Figura 1 – COUBERT, Gustave. Mulheres peneirando trigo. 1854. Óleo sobre tela. 131 x 167 cm. Musée des Beaux-
Arts de Nantes, França.
Literatura Brasileira 83
6 O Realismo
No campo da literatura, o termo realismo foi utilizado pela primeira vez por Champfleury
(pseudônimo de Jules Husson) em um manifesto escrito em 1857, chamado O Realismo.
Outro autor importante nesse contexto foi E. Duranty, que lançou, também em 1857, a revis-
ta O Realismo, agregando-se, dessa maneira, ao grupo que já iniciava a se organizar em torno
de Courbet e Champfleury.
De forma simplificada, pode-se dizer que o Realismo é um movimento que pretende
se opor tanto à estética quanto à ideologia do Romantismo. Se a filosofia romântica pregava
a subjetividade, as emoções, os sonhos e a fantasia como canais privilegiados para obter o
conhecimento, os realistas passaram a apregoar a objetividade, a sobriedade, o apego aos
fatos – em um termo, a necessidade de “observar” o que acreditavam ser “o real”, evitando
fantasias ou concepções metafísicas.
No que diz respeito às suas concepções estéticas (válidas tanto para as artes, de forma
geral, quanto para a literatura, de forma específica), um dos principais fundamentos realis-
tas está baseado na noção positivista segundo a qual a arte e a literatura não deveriam se
guiar pelos sonhos e pela emoção – como pregavam os românticos –, mas pela própria realida-
de, pois os realistas acreditavam que o ideário romântico servia como fundamento filosófico
para manter o status quo de uma burguesia decadente e conservadora, cujo poder estava
alicerçado, principalmente, na família tradicional e na Igreja.
Os intelectuais identificados com o Realismo acreditavam que tanto a instituição fami-
liar burguesa quanto a instituição eclesiástica escondiam uma enorme gama de hipocrisia e
de relações doentias, acobertadas pela ideologia fantasiosa do Romantismo. Por isso, pas-
saram a postular que a melhor maneira de promover uma purgação social seria mostrar não
apenas as contradições das instituições burguesas, mas principalmente suas fragilidades e
mazelas. É por essa razão que os romances realistas geralmente abordam, entre vários ou-
tros, temas polêmicos, como a exploração do mais fraco pelo mais forte, a violência física e
psicológica, adultério, o abuso de poder, o rompimento do celibato por parte dos clérigos.
Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert, é tido pela maior parte da crítica tradicional
como o marco oficial do surgimento do Realismo literário. Nesse romance, Flaubert aborda
o adultério feminino, que era um tabu dos mais extremos para a sociedade de sua época
e passou a ser tema de numerosos outros livros realistas, como O Primo Basílio, de Eça de
Queirós, e mesmo Dom Casmurro, de Machado de Assis, por exemplo. Por causa de Madame
Bovary, Flaubert chegou a ser processado pelo governo francês, sob pena de ter atentado
contra a moral e a religião, mas acabou sendo absolvido. Nas palavras de Massaud Moisés,
[...] enquanto o romance romântico gira em torno do casamento, ou melhor, dos
antecedentes que conduzem ao enlace burguês, o romance realista focaliza a
situação criada pelo casamento, não a feliz, suposta pelas veleidades burgue-
sas, senão a degenerescente, encoberta pelo “manto diáfano” que a classe média
jogava sobre as suas instituições. E no panorama “real”, que a instrumentação
científica permitia, via-se, em lugar da bem-aventurança pacóvia, o câncer do
adultério. (MOISÉS, 1999, p. 25)
84 Literatura Brasileira
O Realismo 6
Além de Flaubert, alguns dos mais importantes representantes do Realismo europeu
são Balzac, Stendhal e Maupassant, entre outros. As principais influências ideológicas e
teóricas dos realistas provêm de uma tendência cientificista que, de forma cada vez mais
abrangente, vai se impondo na Europa da segunda metade do século XIX, derrubando – ou
pelo menos questionando – as bases metafísicas e platônicas em que se assentava grande
parte da doutrina romântica. Nesse contexto, devem ser destacadas várias teorias filosóficas
e sobretudo científicas que vão se pautando por uma concepção materialista da existência, em
oposição às concepções espiritualizadas, religiosas e metafísicas do Romantismo.
Algumas das mais influentes teorias, no que diz respeito ao movimento realista, são o
positivismo de Auguste Comte, o evolucionismo social de Herbert Spencer, a teoria evoluti-
va de Charles Darwin e, principalmente no caso da literatura, a crítica positivista-evolucio-
nista realizada pelo francês Hippolyte Taine.
Segundo os realistas, o projeto de reforma social só poderia ser realizado a partir de uma
arte radicalmente mimética, que, segundo essa concepção, deveria antes apresentar que repre-
sentar. Esse aspecto torna-se bastante evidente quando comparamos uma pintura romântica,
de Delacroix, por exemplo, com uma pintura de Courbet. Mas também pode ser facilmen-
te percebido se compararmos, por exemplo, um romance de Musset com um romance de
Flaubert – no caso europeu –, ou quando comparamos A Moreninha, de Joaquim Manuel de
Macedo, com Dom Casmurro, para citar apenas um entre vários exemplos possíveis a partir da
literatura brasileira. Ao passo que o romance de Macedo pinta uma sociedade idílica, em que
não há conflitos de outra ordem que não os amorosos – sendo que estes são resolvidos como se
a vida fosse um conto de fadas –, o romance de Machado nos apresenta o tema espinhoso do
adultério, para o qual não se vislumbra uma verdadeira solução ao longo da narrativa.
O projeto estético realista é marcado por uma série de contradições, sendo que uma
das mais importantes diz respeito à maneira simplista e ingênua como eles compreendiam
a relação da linguagem com a realidade. Mesmo uma tela que pretende simplesmente copiar
a imagem de um objeto da realidade já é uma representação na medida em que é realizada a
partir de certas técnicas que permitem criar um “efeito de realidade” em quem observa essa
tela. Da mesma forma, ao contrário do que acreditavam os realistas, um romance realista
não deixa de ser um recorte e jamais a própria realidade. Em termos estritamente semióticos,
o que mudou em relação à estética romântica foi apenas o modo como os realistas utilizam
a linguagem a fim de gerar, nos leitores, uma impressão de que estão diante da própria rea-
lidade e não diante de uma representação.
Se o Barroco e o Romantismo, por exemplo, exploravam imagens sensórias, enredos
ligados ao imaginário e a seres míticos, muitas vezes criando uma representação que trans-
cende a experiência, o Realismo preferiu adotar a descrição minuciosa dos detalhes, aprofun-
dando as características sociais e psicológicas das personagens. Em vez de figuras míticas ou
Literatura Brasileira 85
6 O Realismo
aristocráticas, os realistas priorizavam figuras que retratam tipos menos favorecidos, como
proletários, empregados subalternos, prostitutas, mulheres solitárias, entre outros.
Quando eram apresentados personagens que representavam a burguesia favorecida,
por outro lado, geralmente caracterizavam-se por suas mazelas, faltas e contradições. Em
suma, algumas das características formais mais prezadas pelos realistas foram, além da
construção de um enredo o mais verossímil possível, a descrição pormenorizada de ambien-
tes e de fatos, em detalhes, muitas vezes, banais, o que torna a narrativa realista geralmente
lenta do ponto de vista da leitura. A partir desses e de outros recursos, os realistas preten-
diam chegar ao que eles acreditavam ser um retrato fiel da própria realidade.
Não é possível reduzir a obra de todos os autores considerados realistas a algumas pou-
cas características, até porque alguns oscilam entre traços românticos e realistas, ao passo
que outros – como Machado de Assis, por exemplo – foram capazes de desenvolver uma
linguagem tão própria que, muitas vezes, denominá-los de realistas parece um reducio-
nismo. No entanto, a crítica tradicional tem elencado alguns traços gerais, passíveis de ser
encontrados (senão em todos) pelo menos em grande parte dos autores considerados realis-
tas, muitas vezes de modo diluído. Isso vai nos permitir formar uma espécie de sistema da
estética realista, que pode nos servir como um aporte didático.
A seguir, apresenta-se um pequeno conjunto de algumas das principais características
do romance realista, baseadas, entre outros, em autores como Alfredo Bosi (1994), Afrânio
Coutinho (1994c), Massaud Moisés (1999) e Antonio Candido (1987).
• Busca de objetividade – ao contrário dos românticos, que viam no sujeito, com
suas fantasias e emoções, a fonte de toda criatividade, os realistas acreditavam no
esforço técnico do escritor. No que diz respeito ao conteúdo de suas obras, se os
românticos buscavam retratar a alma agitada por suas emoções, os realistas pre-
feriam representar as ações humanas com uma certa distância, de forma muitas
vezes descritiva, evitando excesso de recursos estéticos e estilísticos.
• Fé na razão e na ciência – na base filosófica do Romantismo se encontram ideias
platônicas e metafísicas, sendo que os românticos possuíam um profundo apreço
pela religião. Os realistas, por sua vez, atacavam a religião e a metafísica, defen-
dendo a posição segundo a qual apenas a ciência, com seus métodos baseados na
observação e na experimentação, é capaz de nos levar à verdade.
• Engajamento político-social – paradoxalmente, ao mesmo tempo em que critica-
vam os ideais metafísicos dos românticos, os realistas eram ”idealistas” na medida
em que acreditavam na possibilidade de uma transformação social, que seria reali-
zada justamente com o auxílio da arte e principalmente da literatura. Assim sendo,
suas obras estão repletas de denúncias das mazelas da sociedade burguesa, tanto
na vida pública quanto na vida íntima.
86 Literatura Brasileira
O Realismo 6
• Recorrência ao tipo e às situações típicas – como estratégia para atingir o objetivo
de denúncia social, o romance realista procurava abordar tipos sociais e psicológi-
cos em vez de explorar idiossincrasias. Desse modo, pode-se facilmente identificar
heróis injustiçados (“o proletário”, “o pobre”, “o mendigo”, “a prostituta”) e vi-
lões (geralmente “o rico”, “o burguês”, “o fazendeiro”).
• Preferência pelo ambiente urbano – o romance realista, principalmente na Europa,
priorizava problemas sociais ligados à industrialização e aos efeitos nefastos que o
incipiente capitalismo desencadeava na sociedade. Por essa razão, predominavam
ambientes urbanos, onde se podiam perceber, de forma mais nítida, as injustiças
sociais geradas pela nova ordem econômica.
• Ênfase na descrição e apresentação de detalhes – como decorrência de seu cienti-
ficismo e de seu idealismo desejoso de transformar a sociedade, os realistas acre-
ditavam que era necessário “descrever” ou simplesmente “apresentar” as mazelas
sociais, em vez de “embelezá-las” a partir de inúmeros recursos estilísticos.
• Ênfase no aprofundamento das personagens em detrimento do enredo – como
consequência de sua visão cientificista, o romancista realista se entende como uma
espécie de psicólogo social ou sociólogo, interessado não apenas em “contar uma
história” (ênfase no enredo), mas principalmente em “analisar” razões, causas e
consequências dos problemas apontados a partir das personagens.
• Promoção de uma linguagem simples e regional – os realistas levavam adiante o
projeto já iniciado no Romantismo de abolir a linguagem excessivamente formal e
artificial que predominava nas obras neoclássicas, permitindo, dessa forma, o uso
de regionalismos e variações linguísticas de diferentes ordens.
Tem-se aceito, de forma didática, que o Realismo foi introduzido no Brasil com o ro-
mance Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), de Machado de Assis. Essa nova estética
serviu para marcar grandes mudanças sociais e econômicas pelas quais passava o país no
final do século XIX, quando já se anunciava o caminho de transição de uma sociedade rural
para o capitalismo. Se até então o Brasil tinha sido um país eminentemente escravocrata,
agrário e aristocrático, tornava-se, pouco a pouco, mais urbanizado e aberto para (ainda que
incipientes) formas de modernização capitalista. Assim sendo, ao passo que o Romantismo
continuava servindo de base ideológica para uma burguesia avessa às transformações que
se vislumbravam, o Realismo passou a ser visto como um movimento revolucionário, ver-
dadeiro arauto dos novos tempos que se anunciavam entre nós.
Apesar da enorme importância que esse movimento angariou no contexto intelectual
brasileiro do final do século XIX, em termos de quantidade de escritores, não encontrou gran-
des representantes capazes de produzir uma literatura com qualidade estética reconhecida.
A maior exceção, sem sombra de dúvida, foi Machado de Assis, que captou e retratou, de
modo brilhante e ao mesmo tempo pessoal, as contradições dessa nova sociedade que emergia.
Literatura Brasileira 87
6 O Realismo
Machado conhecia e foi influenciado pelo Realismo europeu, mas jamais chegou a se
tornar caudatário dessa escola, além de não ter se entregado, de modo ingênuo, ao ufanismo
e à empolgação sem limites com relação ao progresso que as novas teorias científicas supos-
tamente estariam trazendo – atitude muito comum entre vários intelectuais brasileiros da
época, como Sílvio Romero, por exemplo. Machado sempre se manteve como um crítico,
além de ter criado um estilo literário próprio, desse modo nos legando uma original e insti-
gante representação das relações sociais do Brasil em sua época.
Além de Machado de Assis, no contexto do Realismo brasileiro também desponta o nome
de Raul Pompéia, autor que morreu ainda muito jovem, o que o impediu de produzir um con-
junto de obras consistente. E O Ateneu, seu principal romance, é marcado por fortes traços não
realistas (que oscilam entre expressionistas e impressionistas), fugindo dos preceitos da escola
realista e também apontando na direção de um novo movimento literário – o Simbolismo.
88 Literatura Brasileira
O Realismo 6
6.4.1.1 Machado romântico
Na década de 1860, Machado já havia escrito quase todas as suas comédias e seus poe-
mas românticos, reunidos em Crisálidas. Na década de 1870, ele produziu ainda várias obras
de fundo marcadamente romântico, nas quais não explora as crises morais e sociais da tra-
ma: trata de abrandá-las, muitas vezes as dissimulando, o que revela a forte influência do
Romantismo, que mais tarde iria superar.
Algumas das principais obras dessa fase:
• Contos Fluminenses (1870);
• Ressurreição (1872);
• Histórias da Meia Noite (1873);
• A Mão e a Luva (1874);
• Helena (1876); e
• Iaiá Garcia (1878).
Literatura Brasileira 89
6 O Realismo
certo estoicismo ou resignação frente à solidão na terceira idade, em Memorial de Aires. Esse
romance foi sua última obra, escrita logo após a morte de sua esposa e no ano de seu próprio
falecimento, e alguns críticos têm encontrado nele rasgos autobiográficos.
Não é exagero algum afirmar que Machado de Assis está entre os melhores escritores
de nossa literatura, além de ter exercido em outras áreas de nossa cultura uma grande in-
fluência que perdura até os dias de hoje. Ainda em vida, foi considerado o maior romancista
brasileiro, sendo que também foi um dos fundadores e o primeiro presidente da Academia
Brasileira de Letras. Como afirma Alfredo Bosi,
Machado de Assis também animou a excelente Revista Brasileira, promoveu os
poetas parnasianos e estreitou relações com os melhores intelectuais do tempo,
de Veríssimo a Nabuco, de Taunay a Graça Aranha. Não obstante essa ativa so-
ciabilidade no mundo literário, ficaram proverbiais a fria compostura pessoal e o
absenteísmo político que manteve nos anos derradeiros: atitude paralela à análi-
se corrosiva a que vinha submetendo o homem em sociedade desde as Memórias
Póstumas. (BOSI, 1994, p. 174)
Bosi também sugere, didaticamente, uma lista dos temas predominantes na obra
machadiana:
• mesquinhez e sorte precária – heranças inalienáveis;
• a história humana é marcada pelo cinismo e pela indiferença;
• forte visão de destino;
• humor baseado nos signos do cotidiano;
• não importam tanto os fatos, mas as intenções e as ressonâncias que o envolvem.
Ainda segundo Bosi, as principais características estéticas da obra machadiana, são:
• humor;
• microrrealismo;
• ambivalências;
• oculta sensualidade;
• reiterações;
• narrador onisciente (que serve para veicular o desprezo pelas idealizações
românticas);
• narrador em primeira pessoa (que serve para mostrar o indivíduo fraco e
incoerente);
• estrutura informal e aberta das personagens.
90 Literatura Brasileira
O Realismo 6
Raul Pompéia estudou no Colégio Pedro II e terminou a faculdade de Direito em Recife.
Destaca-se sua militância política quando ainda estudava em São Paulo, onde participou
dos movimentos abolicionista e pró-República. Além disso, Raul Pompéia também foi dire-
tor do Diário Oficial, professor de mitologia na Escola Nacional de Belas Artes e diretor da
Biblioteca Nacional.
Sua vida foi marcada por algumas polêmicas e um temperamento angustiado, que o
levaria ao suicídio aos 32 anos de idade. Entre os conflitos em que se envolveu, podem ser
destacados dois principais:
• no velório do presidente Floriano Peixoto, Pompéia realizou uma oração fúnebre
de exaltação, o que fez com que Prudente de Morais (sucessor de Peixoto) o exone-
rasse do cargo que ocupava na Biblioteca Nacional;
• o duelo ao qual desafiou o poeta parnasiano Olavo Bilac.
Como afirma Massaud Moisés “em 1892, por questões de honra, entrou em duelo com
Olavo Bilac, sintoma da perturbação mental que, recrudescendo, o induziria ao suicídio,
cometido a 25 de dezembro de 1895.” (MOISÉS, 1984, p. 117).
Embora tenha escrito já em 1880 a novela Uma Tragédia no Amazonas, além de outras
poucas obras editadas apenas postumamente (Microscópicos, 1881; As Joias da Coroa, 1882;
Canções sem Metro, 1900), o fato é que sua única obra de valor reconhecido pela crítica é
O Ateneu (1888), na qual se percebe um fundo autobiográfico, feito de reminiscências, e um
intenso trabalho literário e intelectual sobre tais reminiscências. Como afirmou Alfredo Bosi,
na verdade, em sentido restrito, esse romance mal pode ser definido como realista por sua
fortíssima carga de passionalidade:
[...] se já houve quem o dissesse impressionista, afetado pela plasticidade ner-
vosa de alguns retratos e ambientações, por outras razões se poderiam nele ver
traços expressionistas, como o gosto do mórbido e do grotesco com que deforma
sem piedade o mundo do adolescente [...]. (BOSI, 1994, p.183)
Algumas das principais virtudes desse romance são, além do excelente domínio em
termos de linguagem literária, suas investigações psicanalíticas – a partir das quais emerge
o complexo de Édipo da personagem principal, o adolescente Sérgio. Na trama, o jovem
se apaixona, ao final da obra, justamente pela mulher de seu algoz, Aristarco (diretor do
Colégio Ateneu), caracterizado como um pai tirano, com quem é necessário entrar em dis-
puta pela mãe que se apresenta como uma mulher doce e sensual. Além disso, Pompéia tam-
bém foi capaz de abordar, de maneira bastante honesta e ousada, alguns conflitos relativos
à maturação sexual, ligados à fase da adolescência notadamente, na medida em que surgem
alguns jogos de sensualidade entre os alunos do Colégio.
Infelizmente, contudo, Pompéia não foi capaz de produzir outras obras com o mesmo
nível de profundidade e domínio literário, o que levou alguns críticos a julgamentos, talvez
excessivamente duros, como se percebe, por exemplo, nas palavras de Massaud Moisés,
abaixo transcritas:
Raul Pompéia pertence à classe dos escritores de um livro só: O Ateneu. Tudo
o mais que criou, apesar do muito engenho que ali se manifesta, não passa de
Literatura Brasileira 91
6 O Realismo
Características do período
(CANDIDO; CASTELLO, 1987, p. 281-284)
92 Literatura Brasileira
O Realismo 6
modestamente durante o romantismo, como intermediário entre a produ-
ção intelectual e o poder público.
Literatura Brasileira 93
6 O Realismo
94 Literatura Brasileira
O Realismo 6
Rio de Janeiro, um pouco por toda parte, formaram-se grupos que fize-
ram da divulgação científica a base para uma renovação do pensamento,
em sentido acentuadamente crítico. Deles, sobressai Sílvio Romero, que,
tendo cultivado a literatura, o folclore, a sociologia, a política, o direito,
foi sobretudo um grande crítico da nossa civilização, lançando alguns
dos temas que formaram a base do pensamento sociológico dos nossos
dias. A sua esclarecedora teoria da mestiçagem racial e espiritual é uma
concepção ampla, que interpreta a constituição da sociedade brasileira à
luz da mistura étnica, da vida da família, da troca de experiência civili-
zadora entre europeus e americanos, entre senhores e escravos, segundo
o princípio de interdependência das sociedades, formulado por Auguste
Comte sob o nome de consenso.
Atividades
1. Leia com atenção o vigésimo capítulo de Dom Casmurro, de Machado de Assis.
Mil padre-nossos e mil ave-marias
Levantei os olhos ao céu, que começava a embruscar-se, mas não foi para vê-lo
coberto ou descoberto. Era ao outro céu que eu erguia a minha alma; era ao meu
refúgio, ao meu amigo. E então disse de mim para mim: “Prometo rezar mil pa-
dre-nossos e mil ave-marias, se José Dias arranjar que eu não vá para o seminário”.
A soma era enorme. A razão é que eu andava carregado de promessas não cum-
pridas. A última foi de 200 padre-nossos e 200 ave-marias, se não chovesse em
Literatura Brasileira 95
6 O Realismo
certa tarde de passeio a Santa Teresa. Não choveu, mas eu não rezei as orações.
Desde pequenino acostumara-me a pedir ao céu os seus favores, mediante ora-
ções que diria, se eles viessem. Disse as primeiras, as outras foram adiadas, e à
medida que se amontoavam iam sendo esquecidas. Assim cheguei aos números
20, 30, 50. Entrei nas centenas e agora no milhar. Era um modo de peitar a von-
tade divina pela quantia das orações; além disso, cada promessa nova era feita e
jurada no sentido de pagar a dívida antiga. Mas vão lá matar a preguiça de uma
alma que a trazia do berço e não a sentia atenuada pela vida! O céu fazia-me o
favor, eu adiava a paga. Afinal perdi-me nas contas. “Mil, mil”, repeti comigo.
Realmente, a matéria do benefício era agora imensa, não menos que a salvação
ou o naufrágio da minha existência inteira. Mil, mil, mil. Era preciso uma soma
que pagasse os atrasados todos. Deus podia muito bem, irritado com os esqueci-
mentos, negar-se a ouvir-me sem muito dinheiro...
Homem grave, é possível que estas agitações de menino te enfadem, se é que
não as achas ridículas. Sublimes não eram. Cogitei muito no modo de resgatar a
dívida espiritual. Não achava outra espécie em que, mediante a intenção, tudo
se cumprisse, fechando a escrituração da minha consciência moral sem déficit.
Mandar dizer cem missas, ou subir de joelhos a ladeira da Glória para ouvir
uma, ir à Terra Santa, tudo o que as velhas escravas me contavam de promes-
sas célebres, tudo me acudia sem se fixar de vez no espírito. Era muito duro
subir uma ladeira de joelhos; devia feri-los por força. A Terra Santa ficava mui-
to longe. As missas eram numerosas, podiam empenhar-me outra vez a alma...
(MACHADO DE ASSIS, 2008).
b. Determinismo social.
I. Pode-se perceber a fina ironia de Machado de Assis com relação à religião, pois,
com sua atitude religiosa, a personagem principal procura apenas obter benefí-
cios pessoais.
96 Literatura Brasileira
O Realismo 6
II. É possível perceber o pessimismo de Machado de Assis com relação ao espíri-
to humano na medida em que a personagem principal não age de acordo com
valores nobres e abstratos, mas unicamente de acordo com seus interesses mais
imediatos.
III. Percebe-se nitidamente a influência que Machado de Assis recebeu do
darwinismo, pois a personagem principal é apresentada em seus aspectos natu-
rais ou biológicos.
Resolução
1. e.
2. b.
Literatura Brasileira 97
7
Naturalismo
Edgar Roberto Kirchof
Por outro lado, embora não tão evidentes à primeira vista, há entre esses movi-
mentos diferenças de cunho histórico, político-ideológico e mesmo estético que permi-
tem delinear dois estilos distintos. Nas palavras de Afrânio Coutinho, o Naturalismo
Literatura Brasileira 99
7 Naturalismo
Assim como no caso do Realismo, também no que diz respeito ao Naturalismo não hou-
ve muitos escritores brasileiros capazes de produzir obras dotadas de grande valor literário
a partir dessa estética. Como notou Afrânio Coutinho, no Brasil,
[...] o Naturalismo, como escola, não durou mais que a década de 1880. O que
se encontra mais comumente na ficção da época são as suas impregnações aqui
e ali.
Para a maior parte dos críticos, o Naturalismo foi introduzido em solo brasileiro pelo
romance O Mulato, de Aluísio Azevedo, em 1881, mesmo ano em que Machado de Assis
publicou Memórias Póstumas de Brás Cubas. As obras mais identificadas com essa estética
fizeram uso especial de um elemento característico da literatura brasileira: o regionalismo,
em suas várias facetas, sendo que um dos aspectos mais explorados foi a influência que as
duras condições climáticas e ambientais, principalmente no Norte e no Nordeste, exercem
sobre os indivíduos. Essa temática tipicamente naturalista estará presente mesmo após o
término desse movimento – por exemplo, em Os Sertões, de Euclides da Cunha, e mesmo em
romances modernistas que exploram a temática da seca.
Juntamente com obras mais influenciadas pelo Naturalismo europeu também se pro-
duziu no final do século XIX um estilo a que Alfredo Bosi denominou naturalismo estilizado,
representado principalmente por Coelho Neto e Afrânio Peixoto, que estavam mais interes-
sados em retratar a vida galante da burguesia brasileira por meio de uma literatura forte-
mente guiada por efeitos estéticos do que realmente denunciar mazelas sociais ou defender
teses científicas.
Apesar de Aluísio Azevedo ter sido o maior expoente do Naturalismo brasileiro, também
devem ser mencionados alguns autores que, ligados ao Naturalismo, destacaram-se pela utili-
zação de traços do regionalismo geográfico e social para dar corpo às necessidades de ambien-
tação inerentes à estética naturalista. Autores como Inglês de Souza, Adolfo Caminha, Manoel
de Oliveira Paiva, Domingos Olímpio, Rodolfo Teófilo, Antônio Sales e outros utilizaram te-
mas como o cangaço, a seca nordestina e peculiaridades da região amazônica para ilustrar as
teses deterministas de Taine acerca da influência do meio sobre o indivíduo.
apesar da pouca qualidade estética de várias obras naturalistas, não deve ser subestimado
o impacto que o seu regionalismo conseguiria exercer sobre o Modernismo, principalmen-
te na década de 1930, manifesto em autores como José Américo de Almeida e Rachel de
Queiroz, por exemplo.
Ao mesmo tempo em que no final do século XIX uma linha dos autores brasileiros
procurava seguir de modo bastante fidedigno as teses naturalistas de Taine, juntamente
com as sugestões de composição ditadas por Émile Zola, Eça de Queiroz e outros natura-
listas europeus, também se desenvolveu em solo brasileiro um tipo de literatura que não
pretendia ser tão vinculado a teses científicas ou assuntos considerados por demais sérios.
Nas palavras de Alfredo Bosi, “desenvolve-se um estilo mundano, meio jornalístico, meio
sofisticado, aquele ‘sorriso da sociedade’ como entendia a literatura Afrânio Peixoto” (BOSI,
1994, p. 197). Principalmente a partir do final do século XIX até a Primeira Guerra Mundial
(1914-1918), autores como Coelho Neto e Afrânio Peixoto inspiraram-se no estilo art
nouveau, típico da Belle Époque, oriundo principalmente da arquitetura decorativa em voga
na Europa naquela época. Ainda segundo Bosi, as principais características dessa literatura,
por ele denominada de naturalismo estilizado, são o “estetismo, evasionismo, ‘pureza’ verbal
precariamente definida, sertanismo de fachada, lugares-comuns herdados à divulgação de
Darwin e Spencer, resíduos da dicção naturalista de cambulhada com clichês do romance
psicológico à Bourget”(BOSI, 1994, p. 196).
Nesse contexto, adquiriram especial relevância Henrique Maximiniano Coelho Neto,
nascido em Caxias, no Maranhão, em 1864, e Júlio Afrânio Peixoto, nascido em Lençóis, na
Bahia, em 1876. Tanto Coelho Neto quanto Afrânio Peixoto possuem uma produção literária
bastante volumosa, o que torna tarefa difícil listar todas as suas obras em uma introdução
à literatura.
Na obra de Coelho Neto prevalece um senso de virtuosismo exercido a partir da ex-
ploração de temas muitas vezes triviais. Predomina, ainda, uma certa ambivalência entre
o folhetinesco e o mundano. Em um termo, a literatura de Coelho Neto é sincrética, “na
medida em que tende a amalgamar a intenção documental com o brilho da palavra plástica
e sonora” (BOSI, 1994, p. 205).
Afrânio Peixoto, por sua vez, ambientou boa parte de seus romances no sertão baiano,
sendo que seu realismo acaba revelando fortes traços de um romantismo tolerante e epicu-
rista1. Algumas de suas principais obras são A Esfinge (1908), Maria Bonita (1914), Fruta do
Mato (1920), Bugrinha (1922) e Sinhazinha (1929).
Para finalizar este capítulo, é importante ressaltar que, enquanto uma tendência estética
e ideológica que enxerga o ser humano principalmente sob o viés de suas determinações na-
turais e biológicas, o Naturalismo não se restringe à escola naturalista que se impôs na França
a partir do final do século XIX, sob a influência de Émile Zola e seu grupo. No estudo crítico
da literatura, é necessário distinguir movimentos literários, como o Barroco, o Romantismo, o
Realismo, o Naturalismo, por exemplo, de tendências baseadas em traços estéticos.
No primeiro caso, temos as escolas literárias, que sempre são situadas historicamente a
partir de um grupo ou movimento específico, bem como a partir de uma série de documen-
tos ou manifestos que contêm as poéticas e as intenções político-ideológicas desse grupo.
No segundo caso, por sua vez, temos tendências estéticas, que devem ser compreendidas
como um conjunto de estratégias semióticas que, utilizadas na composição literária ou ar-
tística, são destinadas a causar um tipo de efeito sobre o receptor: um efeito barroco, um efeito
realista ou naturalista, entre outros. Nesse sentido, é possível perceber traços naturalistas em
obras anteriores ao século XIX (por exemplo, na pintura de Rembrandt ou na literatura de
Chaucer, entre outros), mas também é possível perceber traços naturalistas em inúmeros
escritores e artistas posteriores, mesmo na atualidade.
No que se refere à crítica artística e literária, em pleno século XXI um grupo de biólogos
e críticos literários – ligados à sociobiologia e à psicologia evolutiva – tem reafirmado valores
e critérios comuns ao Naturalismo do século XIX como programa ideológico e estético a ser
seguido por artistas e escritores. Um dos mais importantes representantes dessa tendência
é o biólogo Richard Dawkins, que, em seu livro Desvendando o arco-íris, argumenta em favor
de uma literatura orientada pela ciência e não pela pura fantasia. Segundo sua concepção, a
arte deve buscar inspiração nos mistérios das leis do universo (ou seja, o universo da ciência)
e não na pura imaginação, pois, segundo o autor, uma arte puramente imaginativa pode
estimular a credulidade e inibir o senso crítico, tão necessário na vida adulta (KIRCHOF,
2008, p. 94). Como se percebe, as disputas travadas entre os românticos e os naturalistas, já
no século XIX, continuam repercutindo até os dias de hoje.
Legado do Naturalismo
(MONTELLO, 2004b, p. 88-90)
Não se pode afirmar que foi com o Naturalismo, através de seu pro-
cesso de captação da realidade objetiva, que se fixaram pela primeira
vez no romance brasileiro os nossos tipos e os nossos costumes. Antes
de Aluísio Azevedo, Júlio Ribeiro, Inglês de Souza e Adolfo Caminha,
Atividades
1. Leia o início do terceiro capítulo de O Cortiço, de Aluísio Azevedo.
Eram cinco horas
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a
sua infinidade de portas e janelas alinhadas.
Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de
chumbo. Como que se sentiam ainda na indolência de neblina as derradeiras
notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à luz loura e tenra
da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia.
A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros, umedecia o ar e punha-
-lhe um farto acre de sabão ordinário. As pedras do chão, esbranquiçadas no lu-
gar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil, mostravam uma palidez
grisalha e triste, feita de acumulações de espumas secas.
Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se am-
plos bocejos, fortes como o marulhar das ondas; pigarreava-se grosso por toda a
parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplan-
tando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras,
os bons-dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora
traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de crianças que ain-
da não andam. No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de
vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos,
cacarejar de galinhas. De alguns quartos saiam mulheres que vinham pendurar
Resolução
1. d.
2. Na ordem: b, e, d, c, a.
Por fim, de Taine, os naturalistas incorporam a tese segundo a qual o ser humano é
produto da hereditariedade (raça), do condicionamento histórico e do meio.
Já no prefácio de sua obra Primeiras Poesias (1832), Gautier investe contra a estética ro-
mântica. No entanto, o movimento parnasiano propriamente dito se configuraria apenas
quando – juntamente com Théodore de Banville e Leconte de Lisle, entre outros – Gautier
organiza Le Parnasse Contemporain (O Parnaso Contemporâneo), uma antologia de poemas
em três volumes (1866, 1871 e 1876). É interessante notar que alguns dos poetas como
Stephane Mallarmé, Paul Verlaine e Charles Baudelaire, que originalmente fizeram parte
desse grupo, romperam com ele mais tarde e criaram um movimento diametralmente
antiparnasiano, o Simbolismo.
O nome Parnasianismo se refere ao monte Parnaso, na Grécia, que, segundo a lenda,
era moradia de musas e poetas. Os parnasianos afirmavam, alegoricamente, que era ne-
cessário levar a poesia novamente ao Parnaso, de onde Lamartine a teria retirado, fazendo
uma alusão ao fato de que os românticos haveriam corrompido os valores neoclássicos que
vigoravam até então na literatura europeia. Essa adesão implícita no nome por si só já revela
a tendência do Parnasianismo na direção de uma estética voltada para os valores clássicos e
neoclássicos, em oposição a movimentos fundamentados na imaginação e nos sentimentos,
como o Barroco e o Romantismo, por exemplo.
Assim sendo, a ênfase da poesia parnasiana recai sobre a forma perfeita, exata, precio-
sista, a partir da qual se busca um efeito de impessoalidade e distância em relação às emo-
ções. Justamente pelo apego excessivo à técnica em detrimento da criatividade, em muitos
casos a poesia parnasiana se torna artificial e pouco convincente.
Uma das fórmulas mais populares utilizadas pelos próprios parnasianos para defini-
rem seu projeto poético é a “arte pela arte”, que se traduz como apelo a um formalismo
extremado de acordo com o qual o único objetivo da obra de arte – e, portanto, também da
poesia – é gerar efeitos estéticos, não lhe cabendo, assim, a tarefa de se engajar em projetos
que não sejam artísticos. Não deveria ser objetivo da arte, portanto, abordar questões sociais
ou filosóficas, e muito menos se engajar politicamente.
Visto que se trata de um movimento literário cuja ênfase recai mais na forma do que no
conteúdo, as características estéticas predominantes da poesia parnasiana dizem respeito
à maneira como esses poetas faziam uso de vários recursos estilísticos, principalmente do
verso. Ao contrário de movimentos que priorizam a inspiração, a criatividade e a imagina-
ção, na medida em que a estética parnasiana promove a técnica, torna-se relativamente fácil
fornecer uma lista de características desse movimento. Algumas delas encontram-se a seguir
(MOISÉS, 1984; RAMOS, 2004; BOSI, 2004).
• Antirromantismo – assim como os poetas, filósofos e cientistas realistas e socia-
listas do século XIX, precursores do Parnasianismo propriamente dito, os parna-
sianos também pretendem realizar uma poesia diametralmente oposta aos ideais
românticos, sobretudo no que diz respeito ao sentimentalismo e ao subjetivismo.
Não é tarefa muito simples afirmar quando o Parnasianismo propriamente dito foi inau-
gurado no Brasil, pois alguns dos autores acima mencionados (Gonçalves Crespo, Artur de
Oliveira e, de modo especial, Luís Guimarães) produziram poemas que já se enquadram na
maior parte das características formais e ideológicas geralmente atribuídas aos parnasianos
De fato, Bilac se tornou uma espécie de mentor intelectual desse período, sendo que
sua obra serviu também ideologicamente como um aporte político para a visão de mundo
ufanista e nacionalista propagada pelo governo militar que se instalava juntamente com a
recém inaugurada República brasileira. Alguns autores chegam a afirmar que a relação do
Parnasianismo com a ideologia positivista que reinava também nos círculos políticos gover-
nantes de nosso país, no final do século XIX, explicaria por que esse movimento conseguiu
se tornar tão influente entre nós, a ponto de frear o desenvolvimento do Simbolismo e, mes-
mo no século XX, ter gerado tantos epígonos.
Porém, é Alberto de Oliveira o parnasiano em que mais se percebe a técnica sendo uti-
lizada de forma um tanto mecânica e escolar – e isso apesar de ele ter iniciado sua trajetória
poética como um romântico. Seu famoso “Vaso Grego”, por exemplo, não passa de um exer-
cício formal totalmente descompromissado com qualquer conteúdo realmente lírico.
Raimundo Correia, por sua vez, apesar de ter sido duramente criticado porque vários
de seus poemas são quase idênticos a poemas de Metastásio e Gautier, confere um grande
lirismo a vários de seus versos, a ponto de ser considerado, por alguns críticos, como um dos
únicos parnasianos capazes de produzir uma obra original a partir dessa estética.
8.4.1 Prestígio
Com o forte prestígio que, no final do século XIX e início do século XX, o Parnasianismo
adquiriu no contexto intelectual brasileiro – em grande parte promovido pelo governo militar
–, não é de estranhar que, além dos já citados Raimundo Correia, Olavo Bilac e Alberto de
Oliveira, vários outros poetas tenham buscado apresentar uma produção alinhada com essa
estética. Surgem, dessa maneira, vários epígonos dos parnasianos, os assim chamados neo-
parnasianos, tais como Raul de Leoni e, antes dele, Francisca Júlia, Luís Delfino, Bernardino
da Costa Lopes, José Albano, entre inúmeros outros.
Nas palavras de Coutinho, “o Parnasianismo no Brasil penetrou muito além dos seus
limites cronológicos, paralelamente ao Simbolismo e mesmo ao Modernismo, sobretu-
do constituindo uma subescola de poesia, muito generalizada nas províncias das letras”
(COUTINHO, 2004c, p. 13).
Vaso Grego
Esta de áureos relevos, trabalhada
De divas mãos, brilhante copa, um dia,
Já de os deuses servir como cansada,
Vinda do Olimpo, a um novo deus servia
Entre as várias obras deixadas por Alberto de Oliveira, podem ser mencionadas algu-
mas das mais importantes: Canções Românticas (1878), Meridionais (1884), Sonetos e Poemas
(1885), Versos e Rimas (1895).
As Pombas
Vai-se a primeira pomba despertada...
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada...
Autores como Manuel Bandeira e Mário de Andrade não escondiam sua grande ad-
miração por vários sonetos de Raimundo Correia. Em poucos termos, Raimundo Correia
conseguiu se valer da estética parnasiana para criar uma obra pessoal, sendo que, em muitos
de seus versos, existem tendências que extravasam o formalismo abstrato, apontando, in-
clusive, para temas e construções pré-simbolistas. Principalmente em Aleluias, por exemplo,
predominam temas mais ligados ao Simbolismo do que ao Parnasianismo ortodoxo, tais
como a desilusão, o desengano, o pessimismo, a dor e mesmo a necessidade de superação
espiritual expressa pelo nirvana.
Olavo Bilac também foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Tendo fa-
lecido em 1918, com 53 anos de idade, o poeta deixou uma vasta produção, cujo valor estético
e literário tem sido objeto de algumas das mais sérias contendas entre os críticos. Se, em sua
época, Bilac foi considerado o maior dos poetas brasileiros, durante o Modernismo – prin-
cipalmente pelo fato de ter sido visto como o maior representante do Parnasianismo – foi
considerado também um poeta de brilho falso, responsável por versos prolixos, artificiais e
ufanistas, cujos efeitos derivariam de uma utilização mecânica da técnica. Hoje, na opinião de
Alfredo Bosi, “parece consenso da melhor crítica reconhecer em Bilac não um grande poeta,
mas um poeta eloquente, capaz de dizer com fluência as coisas mais díspares, que o tocam de
leve, mas o bastante para se fazerem, em suas mãos, literatura” (BOSI, 1994, p. 227).
No que diz respeito à forma, Olavo Bilac demonstra verdadeira obsessão pelo efeito,
utilizando – de modo quase sempre perfeito – a maior parte dos recursos preconizados pe-
los parnasianos europeus, tais como o brilho da frase isolada e a chave de ouro nos sonetos,
em que a mensagem principal do poema é resumida a partir do último verso.
No que diz respeito aos temas, despontam, entre outros, uma exaltação da beleza física
da mulher, embora em um sensualismo pouco convincente; os cenários geográficos de nos-
so país e grandes momentos históricos do Brasil. No entanto, seu intenso apego à técnica
cria um forte efeito de distanciamento que torna sua poesia pouco pessoal e, com frequência,
pouco convincente.
Além disso, no plano ideológico, certamente Olavo Bilac foi o parnasiano que mais ab-
sorveu as tendências conservadoras em voga após a Proclamação da República. Nesse senti-
do, sua adesão acrítica ao positivismo levou-o a promover um ufanismo cívico exacerbado,
no qual a tradição é considerada bela pelo simples fato de ser tradição. É por tais influências
que Olavo Bilac se torna uma espécie de cantor cívico da bandeira e das armas nacionais.
Note-se que esse civismo foi utilizado como uma espécie de bandeira pelo governo militar,
sendo que Olavo Bilac produziu, destinadas à infância, obras com esse teor ideológico.
De sua vasta produção podemos mencionar, como das mais relevantes, as obras:
• Poesias (1888);
• Poesias Infantis (1904);
• Crítica e Fantasia (1906);
• Conferências Literárias (1906);
• Ironia e Piedade (1916);
• A defesa nacional (1917); e
• Tarde (1919).
Machado de Assis
(RAMOS, 2004, p. 135-143)
[...]
Atividades
1. Leia os versos a seguir.
(BILAC, 2008b)
(( Os versos fazem parte do poema chamado Profissão de Fé, no qual Olavo Bilac
apresenta uma série de preceitos estéticos do Parnasianismo.
(( Ao longo do poema de que esses versos fazem parte, existe uma tendência à
desilusão e ao pessimismo, contrariando a estética parnasiana.
2. Entre as características a seguir, assinale apenas aquelas que são típicas da poesia
parnasiana.
Resolução
1. Na ordem: V, V, F, F.
2. b, e.
Olavo Bilac, por sua vez, pode ser considerado o representante mais significativo
da estética parnasiana no Brasil. Em seus poemas, há um predomínio de temáticas
nacionalistas, sensualismo e ufanismo. No que se refere à forma, o poeta é extrema-
mente cuidadoso no exercício de criar efeitos elegantes a partir de vários recursos
estilísticos, tais como a métrica e as rimas.
Essa forte ênfase na subjetividade levou alguns críticos (até mesmo críticos atuais)
a afirmarem que se trata de um retorno ao Romantismo. No entanto, em alguns auto-
res o subjetivismo romântico abria espaço para idealismos e mesmo para reformas
sociais e políticas, enquanto o subjetivismo simbolista é desenganado e altamente
cético quanto a qualquer possibilidade de transformação deste mundo, o que lhe ren-
deu o título de “movimento decadente”.
século XIX, atingindo alguns autores do século XX, como Valéry, Rilke, George, Blok, Yeats,
entre vários outros.
Um dos temas mais recorrentes na poesia de Cruz e Sousa, contudo, é a obsessão pelo
branco, que o poeta reverencia a partir de numerosas imagens, como lírio, neblina, espuma,
lua, entre várias outras. Um importante intérprete de Cruz e Sousa, o sociólogo Roger Bastide
(apud BOSI, 1994, p. 275), viu nessa obsessão, uma “busca de cristalização” das ideias eternas
e espirituais, exatamente o oposto do que propunha Mallarmé com sua estética do silêncio.
De fato, na poesia de Cruz e Sousa, o branco é uma espécie de materialização simbólica do
mundo platônico formado por ideias puras e imateriais. O escuro, por sua vez, caracteriza
o mundo sensório e decadente, marcado pelo sofrimento. Observe como o poeta faz uma
verdadeira reverência mística à brancura já no primeiro poema de Broquéis, denominado
“Antífona” (uma forma litúrgica). A seguir, encontram-se as duas primeiras estrofes:
O ano de 1896 é marcado por duas grandes tragédias na vida de Cruz e Sousa, que aca-
baram se refletindo em sua obra produzida após essa data: a morte de seu filho e a loucura
de Gavita, sua mulher. Assim, foram escritas duas obras: Evocações (poemas em prosa, 1898)
e Faróis (versos, 1900), publicadas mais tarde, postumamente. Somando-se àquelas duas tra-
gédias, Cruz e Sousa foi acometido pela tuberculose, e então procurou abrandar seus sin-
tomas mudando-se para Minas Gerais, onde acabou falecendo no dia 19 de março de 1898.
Nessa época, surgiram ainda os Últimos Sonetos, que foram publicados postumamente, em
1905, além de outras composições em prosa e verso que podem ser lidas em alguma edição
organizada da obra do poeta.
Desse período, tomemos os Faróis, em que se percebe um tom ainda mais sofrido e
doloroso se comparado com as obras anteriores. O sofrimento é abordado de forma direta,
sendo que não é utilizado como denúncia ou como apelo social: antes, trata-se de uma vi-
vência aristocratizante, típica do decadentismo francês, segundo a qual a arte é o único ou
último refúgio do espírito agonizante. Nesse contexto, o poeta agrega temas nitidamente
autobiográficos, como a angústia do negro escravo, retratada no poema “Pandemonium”;
XIX
Hão de chorar por ela os cinamomos
Murchando as flores ao tombar do dia
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia
Para concluir, pode-se ressaltar que se o Simbolismo brasileiro não obteve o devido
valor da crítica literária em sua época, por outro lado ele foi um movimento extremamente
importante para o posterior desenvolvimento de nossa literatura, tendo influenciado, de
forma mais ou menos direta, uma série de escritores no século XX. Assim como existem o
Barroco, o Romantismo, o Realismo e o Naturalismo enquanto movimentos literários, ao
mesmo tempo em que existem enquanto ideais ou estilos que transcendem grupos situados
historicamente, também o Simbolismo consegue ser, ao mesmo tempo, um movimento lite-
rário e uma atitude estética.
Atividades
1. Leia os versos a seguir, de Cruz e Sousa.
Satã
Capro e revel, com os fabulosos cornos
Na fronte real de rei dos reis vetustos,
Com bizarros e lúbricos contornos,
Ei-lo Satã dentre os Satãs augustos.
e. Arte engajada.
Resolução
1. d.
2. b, c.
Ainda não houvera a Primeira Guerra Mundial. Estamos no Brasil do início do século
XX. No Rio de Janeiro – a capital do país – transitam, pela Rua do Ouvidor, os escritores re-
presentativos do momento pré-moderno e a maioria dos 730 mil habitantes da cidade. Eles
vivem a esperança esplendorosa da Belle Époque2. O progresso e a ciência apresentam suas
armas sedutoras que traduzem a nova percepção urbana: bares, cafés, bondes elétricos, con-
feitarias, revistas, iluminação pública. O Rio consome livros e modelos europeus, cervejas
alemãs e conhaque francês.
Nesses cenários de ritmos e estéticas variados destaca-se a visão urbana e moderna
do administrador Pereira Passos e a abertura da Avenida Central, hoje Av. Rio Branco. Na
cena pré-modernista, os cafés e as livrarias são os espaços das relações intelectuais. Na im-
prensa, A Quinzena Alegre, O Diabo, a Revista da Época (da qual Lima Barreto foi secretário) e
O Correio da Manhã, entre outros, anunciam a ebulição sociopolítica e cultural que toma con-
ta da capital da República.
Nas primeiras décadas do século XX, o cenário literário carioca ostenta figuras de peso
nacional como Machado de Assis, Euclides da Cunha, Lima Barreto, Coelho Neto, José
Veríssimo, Gonzaga Duque e, entre outros, João do Rio – um dos personagens satirizados
por Lima Barreto no seu romance Recordações do Escrivão Isaías Caminha, de 1909.
No início do século XX, a cidade ostentava amplos salões festivos e culturais. Os salões
são o signo reluzente da época de ouro vivida pelo Rio de Janeiro no pórtico do novo século.
2 A Belle Époque traduz a nova sensibilidade urbana que surge no final do século XIX, em sintonia com
os avanços tecnológicos. No Brasil, corresponde ao período que vai da Proclamação da República, em
1889, até a Semana de Arte Moderna, em 1922.
Lima Barreto e Euclides da Cunha são os autores mais representativos da prosa produ-
zida no Pré-Modernismo. Embora os seus textos possuam temáticas e características estéti-
cas diferentes, ambos os autores apresentam-se comprometidos com as ideias de representa-
ção daquele Brasil do início do século XX. A seguir, estudaremos a narrativa social na obra
de Lima Barreto, e a Guerra de Canudos na ótica de Euclides da Cunha.
O autor estetiza sua conturbada vida social, suas memórias familiares e existenciais,
como no romance Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá. Sua narrativa constrói conexões entre a
vida no início da modernidade no Brasil e as dificuldades de inscrição social para um jovem
negro, numa sociedade cujas desigualdades latentes oscilavam entre o centro e a periferia, a
maioria pobre e negra e uns poucos brancos instruídos a gozarem privilégios infindos.
A narrativa de Lima Barreto consiste num tipo de texto que se fundamenta muito mais
no plano das ideias e reflexões, em sintonia com as questões sociais do seu tempo, do que no
trabalho com a sintaxe e o significante linguístico. O crítico Sérgio Milliet destaca, no texto
de Lima, exatamente o seu caráter “antiliterário” (MILLIET apud BARBOSA, 2002, p. 176) e
a busca pela exatidão na construção das frases.
A primeira publicação jornalística de Lima foi em A Lanterna. Nesse jornal, o escritor de
cor azeitonada que sorri para as certezas das ciências começa a exibir sua produtiva porção
irônica e sarcástica: “O sarcasmo já brilha nas suas crônicas. É a reação contra o meio que
começa a se processar de modo inevitável” (BARBOSA, 2002, p. 108).
Sarcástico, irônico, ferino. Esses adjetivos nortearão a carreira profissional e a vida de
Lima Barreto, em suas relações sociais e nos ambientes profissionais pelos quais transitou.
Sua vida e obra estão repletas de imagens que refletem as margens nas quais o autor se
situou durante quase toda a sua vida. A negritude roubava-lhe a força; acentuava seu aze-
dume frente aos costumes e às regras de uma sociedade racista e socialmente muito injusta.
Junte-se às injustiças sociais, as perdas econômicas, a loucura e os delírios paternos, os seus
temas recorrentes.
Na revista Floreal, o autor inicia a publicação do romance Recordações do Escrivão Isaías
Caminha, cuja 1.ª edição – portuguesa – começa a circular no Rio de Janeiro em dezembro
de 1909. Isaías Caminha é o alter ego de Lima Barreto. Servia, às vezes, como pseudônimo
do autor. O narrador desse romance assume a predileção pelos seus autores literários mais
amados: Dostoiévski, de Crime e Castigo, Voltaire, de Contos, Tolstói, de Guerra e Paz, Flaubert,
de Educação Sentimental e, dentre outros, Eça de Queirós e Stendhal.
Entre 1920 e 1922, Lima Barreto conclui nada menos que cinco volumes: Histórias e
Sonhos, Marginália, Feiras e Mafuás, Bagatela e Clara dos Anjos. Destes, viu publicado apenas
Histórias e Sonhos.
Em 1920, após deixar o hospício pela segunda vez, começa a escrever um importante
romance que deixou inacabado: O Cemitério dos Vivos. A obra, cujo trecho foi publicado na
Revista Sousa Cruz, aponta para uma temática mais fortemente metafísica e existencial. Trata-
se de um denso registro, como atesta a voz de Vicente Mascarenhas – o narrador (BARRETO
apud BARBOSA, 2002, p. 350): “eu sentia que interiormente eu resplandecia de bondade,
de sonho de atingir a verdade, do amor pelos outros, de arrependimento dos meus erros e
um desejo imenso de contribuir para que os outros fossem mais felizes... ...uma vontade de
descobrir nos nossos defeitos o seu núcleo primitivo de amor e de bondade”.
Texto híbrido que rompe com a noção de gênero literário, Os Sertões pode ser lido como
um ensaio histórico de tonalidades e sintaxes romanescas, com desfecho de tragédia e alto
teor de poesia. Sua volumosa fortuna crítica registra uma gama de títulos anunciando os
múltiplos procedimentos poéticos de que Euclides lança mão, chegando a ser relacionado
por Gilberto Freyre com o seu contemporâneo Augusto dos Anjos.
Testemunha como jornalista de O Estado de São Paulo, Euclides escreve sob o impacto de
ter entrado em contato com o universo verbal e a realidade histórica do sertanejo. Seu texto
traduz as duras trilhas de um espaço cuja geografia apresenta – nos seus signos naturais e
imaginários – elementos ásperos e violentos, como o clima quente e o solo seco.
Para abarcar esse universo, onde a morte parece ser mais cultuada que a vida, Euclides
lança mão de uma série de procedimentos estéticos. Produz jogos intertextuais com autores
de diversas procedências, mune-se de sofisticados recortes vocabulares, oriundos tanto do
universo das ciências quanto da oralidade sertaneja. Tais recursos orais podem ser aferidos
nas muitas falas e expressões sertanejas que o autor ouviu da “boca jagunça do povo/ lin-
guagem/ poesia viva/ explodindo em seus tímpanos civilizados”, como diz o poeta Paulo
Leminski (LEMINSKI, 2001, p. 78).
Pré-Modernismo
(BOSI, 1994, p. 306)
Creio que se pode chamar pré-modernista (no sentido forte de premonição dos
temas vivos em 22) tudo o que, nas primeiras décadas do século, problematiza a
nossa realidade social e cultural
[...]
Atividades
1. Por quais motivos podemos afirmar que o momento pré-moderno, no Brasil, foi um
período de sincretismo estilístico na literatura brasileira?
Resolução
1. Trata-se de um momento histórico em que vários estilos de época ocorrem de modo
mais simultâneo do que sucessivo, sem terem a mesma força demarcatória de épocas
sociais e estéticas específicas, como aconteceu, por exemplo, com os estilos anteriores
da tradição ocidental – Classicismo e Romantismo. Com isso, não era incomum que in-
fluências de mais de uma escola do período – as principais são: Realismo, Naturalismo,
Parnasianismo, Simbolismo-Decadentismo, Impressionismo – se dessem num único
autor que, assim, frequentemente, misturava, sincretizava tendências e estilos diversos.
2. Movido por sentimentos de injustiça social e racial, tendo vivido preconceitos de di-
versas ordens durante sua vida de cidadão comum e homem de Letras, Lima Barreto
opta, em seus escritos, por utilizar um estilo mais direto, jornalístico, de denúncia
dos absurdos e desigualdades que estavam por detrás das elites políticas e literárias
oficiais de sua época. Hoje, a crítica literária vê nessa atitude de construção formal de
suas obras, mais objetiva e menos elaborada expressivamente, uma postura irônica
do autor diante do artificialismo que dominava a literatura “sorriso da sociedade”
de nossa Belle Époque.
Embora não tenha escrito exatamente um texto com o título de manifesto, Mário de
Andrade publicou vários ensaios e escritos – em livros, jornais, revistas – nos quais manifes-
tava aquelas que seriam consideradas, mais tarde, as linhas mestras da nossa modernidade.
Pesquisador que empreendeu várias viagens de pesquisa folclórica e etnográfica ao
Norte e Nordeste do Brasil, Mário é um intelectual consciente da importância do nosso
passado nacional e soube louvar, de modo crítico e seletivo, a tradição literária brasileira.
Apesar de ser considerado conciliatório no universo estético, o poeta, nos momentos de
maior radicalidade e desejo de mudança, rompe com essa tradição, por estar inserido no
contexto das reverberações da fase heroica de nosso Modernismo. Isso fica claro na autoa-
valiação feita pelo autor em 1942, três anos antes de sua morte: “O Modernismo, no Brasil,
foi uma ruptura, foi um abandono de princípios e de técnicas consequentes, foi uma revolta
contra o que era a inteligência nacional” (ANDRADE, 1972c, p. 235).
Leitor:
Está fundado o Desvairismo.
Este prefácio, apesar de interessante, inútil.
[...]
Quando sinto a impulsão lírica escrevo sem pensar tudo o que meu inconsciente
me grita. Penso depois: não só para corrigir, como para justificar o que escrevi.
Daí a razão deste Prefácio Interessantíssimo. [...]
Nessa introdução, o autor justifica o livro. Depois ele apresenta uma teoria na qual se
destacam elementos da poética, da música e da gramática, dentre outros. Com este “Prefácio
interessantíssimo”, o autor “antecipa-se ao Primeiro Manifesto do Surrealismo de André
Breton de 1924, quando pregava o primado do inconsciente, que os surrealistas chamariam
de ‘“escrita automática”’ (ABEL, 1985, p. 8). A diferença é que Mário se dispõe a corrigir e
justificar o que escreve sem pensar, os surrealistas, ao contrário, têm como proposta trazer à
tona, para a realidade, as forças da palavra que vem do subconsciente profundo, sem esta
arrumação do intelecto.
Apesar do mesmo sobrenome de Mário, o escritor Oswald de Andrade não era seu pa-
rente e assumiu posturas mais radicais na vida e no texto. Rico, irreverente e irônico, casou-
-se várias vezes e colecionou alguns desafetos. Sua obra foi banida das antologias escolares
durante anos, sendo reconhecida nos Anos 60 pelos poetas concretos de São Paulo, Haroldo
e Augusto de Campos.
Sua biógrafa, Maria Augusta Fonseca, e parte da crítica sugerem explicações para o
silêncio ao qual o poeta foi relegado: “Oswald arreganhou os dentes de antropófago à men-
talidade colonizada que atrofiou e ainda atrofia o país” (FONSECA, 2007, p. 22). “Oswald
nunca pôde subordinar seu espírito a cânones métricos e aos parâmetros semânticos que
lhes são correlatos” (CAMPOS, 1978, p. 19).
Poeta que viajou à Europa e manteve contato com autores representativos das van-
guardas europeias, Oswald estreia na imprensa paulista em 1909, como repórter e reda-
tor do Diário Popular. Atua depois em várias frentes. Publica poesia, romance, teatro e
ensaio. As memórias, os diários e os manifestos ocupam grande parte da sua produção
estética e literária.
A seguir, conheceremos dois dos principais manifestos do nosso Modernismo, publi-
cados por Oswald de Andrade: Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1924) e Manifesto Antropófago
(1928), os quais, segundo a perspectiva de alguns críticos, “formam uma peça única, o se-
gundo estando contido fundamentalmente no primeiro” (CAMPOS, 1978, p. 48).
2 A máxima é “to be or not to be, that is the question”, cujo significado literal em português é “ser ou não
ser, eis a questão”, e está inserida em um dos vários solilóquios que ocorrem na arquifamosa tragédia
Hamlet, do autor inglês William Shakespeare, considerado por muitos críticos como o centro do Câ-
none Literário Ocidental. A máxima, hoje em dia, já se transformou em bordão popular. Os solilóquios
foram importantes para que, no palco elizabetano, pudesse ser expressa a psicologia profunda do
personagem teatral, que, usando esta técnica, apresenta diretamente para a plateia o que ocorre em
sua alma. Nesse aspecto, Shakespeare introduz procedimentos modernos de concepção literária do
homem, que perde muito de seu traço caricatural e ganha em densidade existencial. Oswald de An-
drade, ao parodiar a expressão, está ampliando, de modo genial, a questão existencial para o âmbito
do cultural e do nacional, além de exercitar seu conceito de antropofagia.
incorporá-la, filtrando apenas o que nos possa ser útil para enriquecermos nossa sociedade
e cultura. A antropofagia é o desejo do outro, do “que não é meu”.
Os manifestos modernistas dos anos 1920 representam duas tendências estéticas e ideo-
lógicas. De um lado, estão os artistas como Mário e Oswald de Andrade, influenciados pelas
vanguardas europeias e pelas ideias de ruptura com a tradição literária; do outro, encon-
tram-se os artistas de direita, representados por movimentos como, por exemplo, o Verde-
-Amarelismo e o Grupo Anta, liderados por Plínio Salgado.
Publicado em 1929, o Nhenaçu Verde Amarelo (Manifesto do Verde-Amarelismo ou da
Escola da Anta) valoriza as nossas raízes. Contra a noção de intelectualidade e a favor de
uma filosofia tupi, os verdes modernos destacam a figura do índio que nos ensinou a rir dos
sistemas, e concluem o manifesto assumindo sua porção conservadora: “Aceitamos todas as
instituições conservadoras, pois é dentro delas mesmo que faremos a inevitável renovação
do Brasil... Nosso nacionalismo é ‘verdamarelo’ e tupi”.
Referindo-se a esses grupos de cunho conservador e de direita, Haroldo de Campos
critica a sua “grandiloquência vazia”, e ressalta a supremacia das propostas artísticas e cul-
turais de Oswald de Andrade. Segundo o crítico e poeta concreto paulista,
[...] em relação à poesia “pau-brasil”, a diluição veio por volta de 1926, com
o nome de “Verdamarelismo”, depois “Escola da Anta”, sob a responsabi-
lidade principal de Menotti del Picchia, Cassiano Ricardo e Plínio Salgado.
O “Verdamarelismo” propunha-se combater os resquícios parisienses no “Pau-
Brasil”, mas, na verdade, através deste expediente diversionista, capeado de na-
tivismo, procurava escamotear o pesado tributo temático e estilístico que pagava
às inovações oswaldianas, das quais era um sucedâneo edulcorado, em pauta
decorativa e superficial. (CAMPOS, 1978, p. 47-48)
“Triste xenofobia que acabou numa macumba para turista”, é a frase de Oswald de
Andrade para definir o “verdamarelo” (CAMPOS, 1978, p. 49).
A emoção geradora da arte ou a que esta nos transmite é tanto mais funda,
mais universal quanto mais artista for o homem, seu criador, seu intér-
prete ou espectador. Cada arte nos deve comover pelos seus meios diretos
de expressão e por eles nos arrebatar ao Infinito.
A pintura nos exaltará, não pela anedota, que por acaso ela procure repre-
sentar, mas principalmente pelos sentimentos vagos e inefáveis que nos
vêm da forma e da cor.
Atividades
1. Qual a importância histórica e estética, para as letras nacionais, da fase heroica de
nosso Modernismo?
2. Faça um comentário crítico acerca das duas tendências estéticas e ideológicas dos
anos 1920 que nortearam a publicação dos manifestos modernistas.
Resolução
1. A fase heroica da nossa modernidade corresponde aos anos que antecederam a Se-
mana de Arte Moderna, e culmina com a realização deste evento, em 1922. Segundo
o poeta Mário de Andrade, trata-se de um período no qual alguns participantes do
grupo modernista viviam numa união iluminada pelas ideias de liberdade e pureza.
Nessa fase de heroísmo, a exposição de Anita Malfatti, em 1917, destaca-se como o
evento que demarca o espaço estético dos modernos, já que os seus quadros foram a
revelação para o poeta entender aquele contexto artístico e cultural.
Nesta aula vamos conhecer a produção literária de um período que ficou conhecido na historio-
grafia da literatura brasileira como o Romance Moderno de 1930. Para isso, objetivamos refletir acerca
das duas vertentes básicas que fundamentam a prosa de ficção da segunda fase modernista: o romance
social nordestino e o romance intimista.
Com esse intuito, analisaremos as obras de alguns dos mais importantes ficcionistas e cronistas do
período: Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Erico Verissimo, Jorge Amado, Lúcio
Cardoso e Marques Rabelo.
As duas faces da prosa moderna produzida nos anos 30 são: de um lado, o romance nordestino;
de outro, o chamado romance intimista. Também chamada de introspectiva, a produção romanesca do
período explora o fluxo da consciência e as características psicológicas dos seus personagens. E, não por
acaso, teve como expoentes autores católicos, como Lúcio Cardoso e Otávio de Faria.
O romance social nordestino dos anos 30 pode ser compreendido como uma segunda floração da
estética realista/naturalista em nossas letras. Diferente da forma como acontecera no século XIX, ainda
retórica e determinista, a prosa romanesca de cunho social surge agora sob um viés mais politizado, de
busca direta de apreensão da fala e da cultura do povo esquecido e abandonado do mundo rural bra-
sileiro, numa denúncia típica do maior amadurecimento estético e social da segunda fase modernista
(BOSI, 1994, p. 385):
A prosa de ficção encaminhada para o realismo bruto de Jorge Amado, de José Lins do Rego,
de Erico Verissimo e, em parte, de Graciliano Ramos, beneficiou-se amplamente da “des-
cida” à linguagem oral, aos brasileirismos e regionalismos léxicos e sintáticos, que a prosa
Rachel de Queiroz (1910 - 2003) estreou como escritora, nos anos 1920, colaborando
para jornais. Publicou depois romances, peças teatrais, literatura infanto-juvenil e crônicas.
Diga-se de passagem, muitas crônicas. Sua bibliografia ostenta mais de dez volumes de crô-
nicas reunidas, que vieram à lume na imprensa brasileira durante mais de 50 anos. Segundo
a ensaísta que organizou as crônicas desta parenta do escritor romântico José de Alencar,
“quando Rachel era perguntada sobre a sua atividade nas letras, ela não hesitava e respon-
dia: “Antes de mais nada, sou jornalista” (HOLLANDA, 2004, p. 7).
Figura 1 – Rachel de Queiroz, autora de O Quinze (1930), um de seus romances mais famosos, foi a
primeira escritora a entrar para a ABL, em 1977.
Afirmando, com uma frase de efeito paradoxal, que era mais jornalista do que escrito-
ra, Rachel de Queiroz, em suas memórias, nos fala de suas primeiras leituras e nos auxilia
a trilhar os caminhos que levam à sua criação. Ao relembrar o universo intelectual de sua
infância, no qual havia muita ideologia política, apresenta o ambiente literário em que foi
criada. “A biblioteca materna formada por Eça, Balzac, Machado, Alencar e Flaubert, dentre
Figura 2 – Menino do engenho, publicado em 1926, é o primeiro romance de José Lins do Rego.
Fonte: Divulgação/Reprodução
Assim como Rachel de Queiroz, o escritor José Lins do Rego (1901-1957) é um dos no-
mes mais representativos da prosa moderna dos anos 1930, e possui os sertanejos da região
Nordeste como base contextual e temática da sua escritura.
Descendente de senhores de engenho, o romancista soube fundir numa lingua-
gem de forte e poética oralidade as recordações da infância e da adolescência
com o registro intenso da vida nordestina colhida por dentro, através dos pro-
cessos mentais de homens e mulheres que representam a gama étnica e social da
região. (BOSI, 1994, p. 398)
Composta por mais de vinte títulos, repletos de figurações dos engenhos da cana-de-
-açúcar e da fé nordestina, a obra de José Lins do Rego se deixa atravessar, também, por
Figura 3 – O escritor Graciliano Ramos foi Prefeito Municipal de Palmeira dos Índios (AL).
1 Albert Camus (1913-1960) nasceu na Argélia, mas é reconhecido como um escritor francês. É autor de
um clássico da literatura existencialista do século XX: o romance O Estrangeiro.
Dono de uma bibliografia que ostenta cerca de 50 títulos, e tendo sua obra traduzida
para mais de cinquenta países, Jorge Amado (1912 - 2001) é o escritor moderno mais conhe-
cido no Brasil e no mundo. Sua obra ganhou várias adaptações para o cinema e para a televi-
são. Devido ao contexto festivo dos lançamentos de seus livros, entre outras coisas, repletos
de alusões políticas e partidárias, e devido ao excesso de alegria e de sexo em suas páginas,
que acabam por configurar um perfil de literatura popular e de massa, a obra literária de
Jorge Amado é recebida por parte da crítica especializada com uma certa dose de descon-
fiança. Acerca da recepção dessa obra e dos seus personagens, podemos ler (CASTELLO,
2008b, p. 3):
eles são seres míticos, representativos e simples – como a forte Gabriela, para
quem coragem e sensualidade são uma coisa só, e o inconstante Vadinho que,
em “Dona Flor” nos leva à fronteira do impossível. Estes personagens sedutores
e fortes despertam, sempre, a suspeita de simplicidade.
Respondendo a essa crítica, que considera simplificadora e populista a obra do au-
tor baiano, a seguir apresentaremos uma defesa positiva dos traços específicos dos perso-
nagens de Jorge Amado, que permeiam as páginas de suas narrativas da seguinte forma
(CASTELLO, 2008b, p. 3):
como os grandes personagens da mitologia clássica, divididos entre impulsos
selvagens e ideias nobres, os personagens de Amado também se debatem entre
os apelos da carne e os limites da vida social. Muitas vezes se diz que eles não
passam de seres mundanos e preguiçosos. Amado distinguia, porém, a preguiça
da vadiagem. A vadiagem, ele pensava, inclui a inquietação e se sustenta em
O escritor gaúcho Erico Verissimo (1905-1975) dividiu com Jorge Amado o sucesso jun-
to ao grande público e, também, uma certa reserva por parte da crítica culta. Teve ainda,
assim como o romancista baiano, algumas de suas obras transpostas para o cinema e para a
TV, o que muito contribuiu para a popularidade do autor e de sua produção literária.
Além de grande escritor, Erico Verissimo foi também professor de literatura brasileira
na Universidade da Califórnia, na década de 1950, tendo publicado depois, com base nesta
experiência pedagógica, uma Breve História da Literatura Brasileira.
Figura 5 – Casa da família de Erico Verissimo, em Cruz Alta (Rio Grande do Sul), hoje transforma-
da em museu.
Persistindo no jogo de duplos com Jorge Amado, podemos afirmar que, da mesma for-
ma que o autor baiano é reconhecido como aquele que melhor transpôs para as páginas lite-
rárias a vida social e os costumes culturais do povo de sua região, o autor de Olhai os Lírios
do Campo foi quem retratou de modo mais contundente os costumes sociais da burguesia
componente da sociedade gaúcha da primeira metade do século XX (BOSI, 1994, p. 408):
para compor a saga pequeno burguesa gaúcha depois de 1930, o romancista bus-
cou realizar um meio-termo entre a crônica de costumes e a notação intimista. A
linguagem com que resolveu esse compromisso é discretamente impressionista,
caminhando por períodos breves, justaposições de sintaxes, palavras comuns e,
forçosamente, lugares-comuns da psicologia do cotidiano. A aparente frouxidão
que adveio da fórmula encontrada pareceu a certos leitores sinal de superficia-
lidade. Mas era, na verdade, o meio ideal de não perder nenhum dos polos de
interesses que atraiam a personalidade de Erico Verissimo: o tempo histórico do
ambiente e o fluxo de consciência das personagens. [...] (grifos do autor)
A busca desses dois “polos” – o tempo histórico e o fluxo de consciência das personagens –
não livra o autor de situar-se numa mediania de concepção de obra e estilo, assim justificada
(BOSI, 1994, p. 408):
[...] não se trata aqui de fechar os olhos aos evidentes defeitos da fatura que
mancham a prosa do romancista: repetições abusivas, incerteza na concepção
de protagonistas, uso convencional da linguagem...; trata-se de compreender o
nexo de intenção e forma que os seus romances lograram estabelecer quando
atingiram o social médio pelo psicológico médio. E era necessário que a nossa
literatura conhecesse também a planície ou, valha a metáfora, as modestas ele-
vações da coxilha.
Figura 6 – Crônica da casa assassinada, de Lúcio Cardoso, expõe a ruína de uma família da aristo-
cracia mineira.
Fonte: Divulgação/Reprodução
Sob esta perspectiva, o autor de A Estrela Sobe (1939) produz, “na sua simplicidade, uma
arte clássica”, que apresenta o seguinte pressuposto (BOSI, 1994, p. 410):
a sábia dosagem de proximidade e distância do narrador em face dos seres da
ficção é o pressuposto do neorrealismo de Marques Rebelo e a chave de uma
obra que testemunha o povo, sem populismo, e fixa as angústias do homem da
rua sem a mais leve retórica.
Noite2
(VERISSIMO, 2005)
2 Este texto foi escrito por Luís Fernando Verissimo, filho do escritor Erico Verissimo, e publica-
do na seção “Artigos” do site criado pelo Governo Estadual do RS, em 2005, em comemoração ao
centenário de nascimento do escritor Erico Verissimo. O título do texto refere-se à novela Noite,
por ele publicada em 1954.
Ou será que tinha? Escrevi acima que Noite era um anti-O Tempo e o
Vento para dar uma ideia do seu tamanho, em contraste com os três volu-
mes alentados da trilogia. Mas também foi um anti-O Tempo e o Vento
no sentido de ser uma manobra diversionista do autor, para protelar o
começo da obra que precisava escrever, “O Arquipélago”, a parte final
da trilogia. Que só foi terminar anos depois. E na qual, aí sim, na cena da
reconciliação de Floriano Cambará com o pai, ele exorcizou um fantasma.
Atividades
1. Estabeleça um comentário a respeito dos principais traços que distinguem os textos
literários de José Lins do Rego e de Lúcio Cardoso.
Resolução
1. A literatura de José Lins do Rego inscreve-se naquela face da nossa prosa moderna
escrita nos anos 1930 e que produz o romance nordestino; enquanto a prosa literária
de Lúcio Cardoso possui a sua inscrição, naquele mesmo contexto, como romance
intimista. Segundo o ensaísta Alfredo Bosi, de forma sutil e meio indireta, os autores
mais representativos do romance intimista ou introspectivo – Lúcio Cardoso, Cor-
nélio Pena e Otávio Faria – resgataram o traço freudiano-surrealista do nosso Moder-
nismo dos anos 1920. Já os autores do romance nordestino encaminharam-se para o
realismo bruto.
13.2.1 As vanguardas
São chamadas de vanguardas as propostas estéticas que, surgidas no início do século
XX, romperam com os padrões estéticos tradicionais, formulando princípios de produção
artística ligados às transformações do mundo moderno.
As mais famosas e as principais ideias de cada vanguarda
• Futurismo: exaltação dos elementos da modernidade (vida urbana, velocidade,
produção industrial); ruptura com as formas tradicionais de expressão; culto da
máquina.
• Expressionismo: representação da vida interior e dos aspectos mais obscuros da
natureza humana; desequilíbrio na elaboração das formas; primitivismo.
• Cubismo: fragmentação; justaposição de imagens; simultaneísmo (sobreposição
de planos).
• Surrealismo: desprezo pela lógica e pela razão; valorização do mundo inconscien-
te; representação de imagens de sonho.
• Dadaísmo: negação da ordem, da lógica e do equilíbrio; desprezo pela ordem so-
cial estabelecida, com propostas alinhadas com o anarquismo1; ausência de cren-
ças – seja no passado, no futuro, nas organizações ou instituições sociais.
1 Anarquismo: sistema que propõe uma estrutura social que abole todos os tipos de hierarquia (go-
vernamental, econômica e social). Em uma sociedade organizada em bases anarquistas, a prioridade
seria a liberdade individual e a igualdade social. Entre os principais teóricos desse sistema estão Pierre
Joseph Proudhon (1809-1865), Mikhail A. Bakunin (1814 - 1876) e P. A. Kropoktin (1842-1921).
A partir dos anos 1950, a busca pelo novo foi ganhando outros contornos. Naquilo que
trazia como proposta de inovação, a arte moderna começou a entrar em uma fase de esgota-
mento, pois as vanguardas e todas as vertentes que vieram na sua esteira faziam crer que as
rupturas possíveis já haviam sido realizadas. Além disso, deixou de haver o choque inicial
que as construções estéticas vanguardistas causaram no começo do século XX, já que, pouco
a pouco, elas foram assimiladas ao modo de vida burguês, passando a fazer parte de seus
espaços cotidianos.
A partir de então, os princípios estéticos das vanguardas – particularmente os dadaístas
– foram repensados no contexto das condições sociais que passaram a orientar a vida dos ci-
dadãos. Assim, arte e literatura trazem para o seu âmbito a cultura de massa, o consumismo,
a luta das minorias pela observância de seus direitos (movimento feminista, lutas antirracis-
tas, movimento gay), a liberação sexual, a contestação aos valores tradicionais da sociedade
(casamento, estrutura familiar convencional, métodos de educação etc.).
Tendo em vista, os rumos que a sociedade tomou desde os anos 1950, as propostas da-
daístas apareceram a muitos artistas como plenamente adequadas para representar o contexto
que se configurou. Após as duas guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945) e diante dos confli-
tos que se estabeleceram logo depois, consequência principalmente da polarização ideológica
que se deu com a Guerra Fria, havia uma atmosfera de desencanto, em particular entre os
Figura 2 – Andy Warhol transformou as latas de sopa Campbell´s em ícones da pop art.
Na segunda metade do século XX, a arte e a literatura brasileiras não ficaram indiferentes
ao que estava sendo produzido na Europa e nos Estados Unidos. Porém, nos anos 1920, uma
das vertentes do Modernismo brasileiro – a antropofagia – já havia revelado a necessidade de
pensar a arte vinculada aos valores culturais próprios do nosso povo. As novidades vindas do
exterior deveriam ser “deglutidas” e assimiladas à nossa realidade cultural para que uma arte
genuinamente brasileira fosse oferecida ao público. Desse modo, a produção artística come-
çou a ser vista como inseparável dos demais aspectos que envolvem a cultura nacional.
2 Instalação: obra de arte constituída por uma construção ou pelo empilhamento de materiais. Pode ser
permanente ou temporária e o espectador pode participar, alterando a disposição dos seus elementos.
A instalação também pode ter dimensões suficientes para que o espectador circule em seu interior.
O alegre desbundar
(SANTOS, 2006, p. 36-39)
Isto só foi possível por duas razões. Primeiro porque o cotidiano se acha
estetizado pelo design e [...] os objetos em série são signos digitalizados e
estilizados para a escolha do consumidor. Depois, porque nosso ambiente
é todo ele constituído pelos mass media. Vivemos imersos num rio de
signos estetizados. O artista pop pode diluir a arte na vida porque a vida
já está saturada de signos estéticos massificados. A antiarte trabalha sobre
a arte dos ilustradores de revistas, publicitários e designers, e acaba sendo
uma ponte entre a arte culta e a arte de massa; pela singularização do
banal (quando Andy Warhol empilha caixas de sabão dentro de uma gale-
ria e diz que é escultura) ou pela banalização do singular (quando Roy
Alegria, alegria
(VELOSO, 2008)
Em caras de presidentes
Em grandes beijos de amor
Atividades
1. São verdadeiras (V) ou falsas (F) as afirmações abaixo?
2. São acontecimentos de âmbito nacional que contribuíram para que a cultura brasilei-
ra se tornasse conhecida no exterior:
Resolução
1. V, F, F
2. C
A poesia produzida a partir dos anos 1950 é, na verdade, uma continuação das
estratégias que, rompendo com os padrões tradicionais, imprimiram-se ao fazer poé-
tico desde a segunda metade do século XIX. A partir dessas rupturas, certas práticas
poéticas se firmaram, configurando o que passou a ser conhecido como poesia moderna.
Entre essas práticas, a do verso livre ficou marcada como técnica própria dos poemas
de cunho modernista. Mesmo tendo sido introduzido na poesia já no século XIX – o
autor norte-americano Walt Whitman (1819-1892) foi o responsável por difundi-lo –,
o verso livre se integrou ao projeto vanguardista no sentido de romper com a tradição
da poesia metrificada, dando mais vigor à superação de quaisquer restrições à liber-
dade no processo de criação poética.
Com João Cabral, a elaboração poética revelou uma nova faceta. A poesia lírica, que
sempre esteve ligada à expressão dos sentimentos de um eu, tornou-se construção objetiva.
Os poemas do autor pernambucano são geometricamente planejados e destituídos de todo
caráter sentimental. Segundo Alfredo Bosi,
[...] o poeta recifense estreou com a preocupação de desbastar suas imagens de
toda ganga de resíduos sentimentais ou pitorescos, ficando-lhes nas mãos, ape-
nas a nua intuição das formas (de onde o geometrismo de alguns poemas seus)
Assim, Cabral apresenta uma definição do ato de escrever poesia comparando-o ao ato
de catar feijão. É realmente um tipo de comparação inusitado, pois jamais se espera que a
elaboração poética seja associada a uma atividade tão comezinha e sem glamour. Nesse poe-
ma, o fazer poético – que sempre esteve ligado a uma espécie de dom divino recebido pelo
poeta – acaba sendo igualado a uma atividade doméstica menor. Além disso, esse fazer vai
sendo pouco a pouco detalhado no próprio ato de catar feijão, de modo que o vocabulário
que cabe a este ato – alguidar, água, grão, pedra, catar – torna-se, de fato, a concretização dos
elementos próprios à escrita – papel, palavra, seleção, escrita, leitura e interpretação.
Há apenas uma coisa que diferencia os dois atos: a pedra. Misturada ao feijão, ela é
algo extremamente desagradável, podendo causar acidentes indesejáveis, como a quebra de
um dente. Já na escrita, a pedra tem um significado especial: ela é desejável, pois “obstrui a
leitura fluviante, flutual”, a leitura monótona, sem surpresas, levando o leitor a parar para
refletir, a buscar os sentidos ocultos das palavras.
Este verso é particularmente revelador do processo de construção poética de João
Cabral. A sonoridade é trabalhada de modo bastante expressivo, pois os sons fl, que iniciam
as duas últimas palavras, apontam para a leitura fluente, sem necessidade de quebras. Já
o tr de “obstrui” e o r intervocálico de “leitura”, rompem a fluidez, pois são de pronúncia
mais difícil. Assim, há no poema uma perfeita integração entre forma e conteúdo, já que a
sonoridade está perfeitamente harmonizada à ideia expressa.
Veja-se que toda essa elaboração é produto de imagens concretas tiradas da vida co-
tidiana e não de uma expressão sentimental. Anteriormente, os recursos poéticos estavam
confinados àquilo que despertava os sentimentos mais nobres do ser humano, ou seja, a mu-
lher amada, a natureza, os deuses – fontes inesgotáveis de inspiração. Assim, o poeta surgia
como ser iluminado, com um dom que o aproximava das divindades. João Cabral anula a
inspiração e fica apenas com a construção.
Essa preocupação com a arquitetura do poema não afastou o autor das convicções ideo-
lógicas: sua poética também está voltada para os problemas sociais que afligiam e ainda
afligem o povo nordestino. No entanto, ao abordar as questões locais, seus poemas se proje-
tam para o plano universal, tratando de temas como vida e morte. A obra mais significativa
dentro dessa temática é Morte e Vida Severina: auto de Natal pernambucano, em que o autor
retoma um gênero medieval – o auto – para adaptá-lo às tragédias que marcam o viver no
Nordeste. No ano de 1965, ela foi encenada no Teatro da Universidade Católica (Tuca), em
São Paulo, com música de Chico Buarque, tendo se tornado um marco para a representação
teatral da época, já que, no ano seguinte, obteve o primeiro lugar no Festival Internacional
Mundial de Teatro Universitário de Nancy, na França.
No ano de 1984, o autor pernambucano publicou o Auto do Frade. Nesse poema dramá-
tico, ele adota um procedimento bastante em voga na literatura contemporânea: o revisio-
nismo histórico. O texto é uma representação do cortejo que leva Frei Caneca (1779-1825)
à morte por execução. De convicções liberais e republicanas, esse frade carmelita recifense
esteve envolvido em vários dos conflitos políticos do Nordeste no início do século XIX.
Apresentando pontos de vista variados – do carcereiro, do clero, do povo, dos soldados,
dos representantes da justiça, do próprio frade –, João Cabral vai dando conta dos últimos
Na segunda metade do século XX, outros nomes se consagraram na escrita poética, nem
sempre aderindo ao experimentalismo que predominou em certos movimentos. De fato,
muitos poetas se moveram entre a tradição e a inovação, utilizando procedimentos vanguar-
distas, mas, muitas vezes, retornando a formas poéticas mais tradicionais, como o soneto.
Com relação ao conteúdo, alguns seguiram a linha inovadora de João Cabral, enquanto
outros preferiram reatar a poesia com a subjetividade. Nesse sentido, muitos trilharam o
caminho de uma poesia filosófica, trabalhando temas ligados à existência e à religiosidade.
Vamos conhecer alguns deles.
OFICIAL
– Que se recomponha o cortejo
Só depois se dissiparão.
O MEIRINHO
– Vai ser executada a sentença de morte
[...]
e em Acauã, lá no Ceará
– E separatista ademais;
O MEIRINHO
– Vai ser executada a sentença de morte
Atividades
1. Considerando as produções poéticas contemporâneas, é correto dizer que
c. elas promoveram um retorno aos modelos da poesia tradicional e, por isso, ado-
taram o soneto como forma poética privilegiada.
d. elas seguem múltiplas tendências, de maneira que ora aderem a formas experi-
mentais e ora adotam modelos mais tradicionais.
3. Por que a poesia de João Cabral de Melo Neto é considerada inovadora no que se
refere à produção poética moderna e contemporânea?
Resolução
1. D
2. C
Conforme o conhecemos nos dias de hoje – ou seja, uma narrativa em prosa que
privilegia as experiências vivenciadas pelos indivíduos –, o romance teve seu surgi-
mento no século XVIII como gênero adequado às transformações sociais que se evi-
denciaram naquela época. A ascensão da burguesia como classe poderosa econômica e
politicamente gerou um novo contexto de interação dos indivíduos e a isso a literatura
não podia ficar indiferente.
Esse novo âmbito de relações sociais pedia uma construção literária mais prosaica,
que trouxesse à tona os elementos do cotidiano da classe em ascensão. Desse modo,
o romance tornou-se o gênero ideal para representar os problemas que cercavam os
novos ideais de comportamento que a burguesia disseminava pela sociedade.
Assim, na segunda metade do século XVIII e por todo o XIX, o romance definiu
as suas características fundamentais, voltando-se primordialmente para uma repre-
sentação realista do mundo, como o fizeram os grandes romancistas da época, entre
eles Stendhal (Henri-Marie Beyle, 1783-1842), Honoré de Balzac (1799-1850), Charles
Dickens (1812-1870), Gustave Flaubert (1821-1880), Machado de Assis (1839-1908) e
Eça de Queirós (1845-1900).
Porém, com o advento do Modernismo, o romance vai sofrendo alterações que se fa-
zem sentir tanto no âmbito da forma como no conteúdo. Segundo Anatol Rosenfeld, na arte
moderna há
a tentativa de redefinir a situação do homem e do indivíduo, tentativa que se
revela no próprio esforço de assimilar, na estrutura da obra de arte (e não ape-
nas na temática), a precariedade da posição do indivíduo no mundo moderno”
(ROSENFELD, 1976, p. 97).
Portanto, para retratar uma realidade em que o indivíduo passou por um intenso pro-
cesso de fragmentação para adaptar-se às numerosas exigências que o mundo moderno lhe
apresentava, o romance passou por algumas transformações.
Um elemento marcante dessas transformações foi a tentativa de aproximar o leitor da
mente das personagens. No romance tradicional, aquele que foi produzido entre os séculos
XVIII e XIX, ocorria em geral uma narrativa distanciada, com um narrador que se colocava
à distância do que era narrado, mas dominando completamente o curso dos acontecimentos
com a sua onisciência, ou seja, seu conhecimento absoluto sobre tudo que se passava dentro
e fora das personagens. Era ele que organizava o discurso das personagens e ordenava os
fatos, de modo que o leitor não precisava de grande esforço para acompanhar a sequência da
ação, mesmo diante de flashbacks (interrupção da narrativa para apresentar acontecimentos
passados) e flashforwards (antecipação dos acontecimentos). Até quando havia um narrador
em primeira pessoa o procedimento era também o do distanciamento e da ordenação linear
do discurso.
No romance moderno, o processo narrativo torna-se mais complexo. Por meio do uso
do discurso indireto livre (recurso em que a fala do narrador e das personagens se confun-
de), o narrador praticamente desaparece para que o leitor tenha um contato mais direto com
o que se passa no interior das personagens. Surge então a técnica do fluxo de consciência,
pela qual os pensamentos das personagens aparecem sem uma organização lógica: os pen-
samentos se revelam de forma fragmentada, com lacunas e quebras abruptas, exigindo do
leitor maior esforço de leitura. Conforme define Anatol Rosenfeld,
A tentativa de reproduzir este fluxo de consciência – com sua fusão dos níveis
temporais – leva à radicalização extrema do monólogo interior. Desaparece ou
se omite o intermediário, isto é, o narrador, que nos apresenta a personagem no
distanciamento gramatical do pronome ele e da voz do pretérito. A consciência
da personagem passa a manifestar-se na sua atualidade imediata, em pleno ato
presente como um Eu que ocupa totalmente a tela imaginária do romance. Ao
desaparecer o intermediário, substituído pela presença direta do fluxo psíquico,
desaparece também a ordem lógica da oração e a coerência da estrutura que o
narrador clássico imprimia à sequência dos acontecimentos. Com isso esgarça-
-se, além das formas de tempo e espaço, mais uma categoria fundamental da
realidade empírica e do senso comum: a da causalidade (lei de causa e efeito),
base do enredo tradicional, com seu encadeamento lógico de motivos e atuações,
com seu início, meio e fim. (ROSENFELD, 1976, p. 83-84)
A partir dos anos 1950, alguns autores levaram o romance a um processo de renovação
que passou principalmente pelas concepções de arte pós-modernistas e pelas ideias veicu-
ladas pelo movimento de contracultura (quebra com os valores estabelecidos pela tradição).
Conforme aponta Jair Ferreira dos Santos,
Enquanto o Modernismo lutava pelo máximo de forma e originalidade, os pós-
-modernistas querem a destruição da forma romance, como no nouveau roman
[novo romance] francês, ou então querem o pastiche, a paródia, o uso de formas
gastas (romance histórico) e de massa (romance policial, ficção científica), como
na metaficção americana. Num e noutro caso, entretanto, está fora de cogitação
a representação realista da realidade, o ilusionismo. Na literatura pós-moderna
não é para se acreditar no que está sendo dito, não é um retrato da realidade, mas
um jogo com a própria literatura, suas formas a serem destruídas, sua história a
ser retomada de maneira irônica e alegre.
Há portanto uma desdefinição do romance. Existem meios para isso. O nouveau
roman, que começa nos anos 1950, destrói a forma romance banindo o enredo, o
assunto e o personagem. Nathalie Sarraute escreve romances sobre nada – ape-
nas um buraco na porta, por exemplo. Certo conto de Nove Novena, do brasileiro
Osman Lins, reduz os personagens a sinais gráficos. A fragmentação da narrati-
va é total, podendo-se misturar os narradores: em geral não sabemos quem está
1 Romance de não ficção (non-fiction novel) é uma tendência literária que se configurou nos Estados Uni-
dos da América. No Brasil, esse tipo de obra, praticado principalmente durante a ditadura militar
(1964-1985), ficou conhecido como romance reportagem.
uma narrativa de caráter autorreflexivo, isto é, sua elaboração reflete sobre a própria escrita
literária. A obra é marcada por episódios que parecem não ter qualquer ligação a não ser
pela figura do protagonista, o escritor João da Fonseca Ribeiro. Os sete capítulos do livro
são, de fato, as memórias do escritor, que vai refazendo o seu percurso de vida por imagens
fragmentadas das suas experiências. O romance torna-se, nesse sentido, uma espécie de
jogo. Ao leitor são dadas as peças de um quebra-cabeça que ele deverá montar.
Outro romancista que segue os rumos da introspecção é o pernambucano Osman Lins
(1924-1978), autor de obras cuja densidade já se revelava logo nas primeiras produções. Em
O Fiel e a Pedra (1961), apesar da temática regionalista, há uma profunda sondagem interior.
Assim, não há no romance um tratamento simplista das relações de trabalho e nem das
relações individuais, visto que a exploração do universo interior das personagens revela a
complexidade de suas atitudes.
A configuração que Osman Lins imprime a suas narrativas lembra os processos experimen-
tais que os adeptos do Novo Romance aplicaram a suas obras. Porém, segundo Sandra Nitrini,
O valor da obra de Osman Lins, sobretudo a partir de Nove, Novena, pois foi com
esta que nosso autor logrou uma forma própria que desse conta de sua visão de
mundo, independe de qualquer relação que a crítica tenha feito ou venha a fazer
com realizações literárias artísticas de países hegemônicos ou não. Que Osman
Lins foi um leitor atento e meticuloso da tradição literária ocidental e de autores
contemporâneos é fato notório e por ele assumido. Incluindo-se suas leituras do
nouveau roman e seu contato pessoal com os escritores franceses. Mas em nenhum
momento, ele se valeu da teoria do Novo Romance, enquanto instrumento de
suas elaborações literárias. (NITRINI, 2003, p. 104)
A verdade é que, a partir do livro de contos Nove, Novena (1966), a construção literá-
ria de Osman Lins foi tomando caráter cada vez mais experimental, sendo precursora de
uma linguagem que prenuncia os recursos da tecnologia do computador na literatura. É o
que ocorre no romance Avalovara (1973), que, além dos elementos gráficos de que se utili-
za, cria uma estrutura que remete ao universo da computação. Segundo Ermelinda Maria
Araújo Ferreira, que realizou pesquisas sobre a relação entre esse romance e a linguagem
do computador,
Avalovara funciona como uma alegoria do romance justamente porque se elabora
como um simulacro do romance. Não é um romance convencional: é uma série
de sequências narrativas que podem ser lidas em ordens diversas, compondo
histórias diversas. O espaço desta obra não é físico: é virtual. Para representar
essa ideia, Osman Lins recorre frequentemente à imagem: a começar pelo sím-
bolo que representa graficamente o romance, uma espiral sobreposta a um qua-
drado, chave do funcionamento segmentado e interativo da leitura proposta, até
o nome da protagonista, uma mulher identificada por um signo inventado que,
curiosamente, lembra o formato de um disco flexível.
formais, adotando os recursos típicos da narrativa tradicional. Entretanto, é uma obra de di-
fícil classificação pela mistura de gêneros que ali se configura, ficando entre a autobiografia,
pois há acontecimentos da vida real do autor; o romance memorialista, já que são recupera-
das situações que permaneceram na memória do narrador; e o relato jornalístico, pelo estilo
de narração que é adotado, lembrando, em alguns momentos, uma reportagem.
Os autores e obras aqui mencionados confirmam as múltiplas tendências em que se
dispersou o romance brasileiro contemporâneo. Vale lembrar, contudo, que estamos falando
de um período que ainda está em configuração. Por isso, ainda é difícil definir as linhas de
construção literária que serão realmente definidoras desta fase da literatura brasileira.
impulso para estar junto das pessoas de quem gosta, ou mesmo telefonar
para saber se estão bem.
Atividades
1. A técnica do fluxo de consciência
2. C
3. O romance histórico procurava recontar as origens das nações de uma forma heroica,
enfatizando valores que teriam cercado essas origens, tais como coragem, lealdade e
honra. Já a metaficção historiográfica reapresenta a história sob o ponto de vista das
minorias e dos oprimidos, revelando fatos e enfocando personagens que a história
oficial acabou deixando de lado. Desse modo, ela desmistifica a história.
A identidade nacional e cultural do país sempre foi algo premente em nossa pro-
dução artística, e, obviamente, a nossa literatura não é exceção dentro dessa busca e
construção, já a literatura que contribui de forma decisiva para formar “uma consciên-
cia nacional e pesquisar a vida e os problemas brasileiros” (CANDIDO, 2006, p.140).
Dentre os aspectos basilares de nossa constituição identitária certamente o fator étnico
é dos mais importantes. Nesse sentido, ainda que, do ponto de vista da igualdade
social, os povos de origem afro e indígena tenham sofrido e ainda sofram com a explo-
ração, a exclusão e o preconceito, seu contributo para a edificação da nação e sua parti-
cipação no patrimônio artístico-cultural do Brasil são de basilares riqueza e relevância.
Tal importância e presença dentro da literatura brasileira é o que, de forma panorâ-
mica e em uma perspectiva histórica, apresentaremos neste capítulo.
16.1.5 O Realismo/Naturalismo
Falando em escritores de origem afro, é no período do Realismo, seguinte ao
Romantismo, que surge o maior nome de nossas letras e emblematicamente alguém fruto
da mestiçagem tão característica de nossa nação. Tecer considerações sobre os aspectos étni-
cos na obra e biografia de Machado de Assis é assunto espinhoso e que certamente necessita
de uma análise mais atenta. Há os que vejam no fato de um descendente afro-brasileiro se
tornar o maior escritor brasileiro uma forma de afirmação da etnia. Por outro lado, há os que
critiquem a ausência em sua obra dos problemas sociais diretamente ligados aos negros. Há
ainda os que enxergam na crítica mordaz à sociedade brasileira de seu tempo uma forma
de engajamento, ainda que indireto. O que nos parece é que a obra machadiana, mesmo nos
16.3.1 O indígena
O que se percebe na literatura brasileira a partir dos anos 40 e nas décadas seguintes é
um esmaecimento da figura do indígena em nossas obras. Para Luzia Aparecida Oliva dos
Santos, “a descaracterização da figura do indígena tende, gradativamente, a alcançar o limi-
te” (SANTOS, 2009, p.34). É o que se percebe, por exemplo, no conto “Meu tio o Iauaretê”,
de Guimarães Rosa, pertencente à chamada geração de 45, em que o “nativo, representado
no sangue mestiço, chega ao ápice de sua desintegração tribal, impelido a regressar à flo-
resta como matador de onças, dada a incompatibilidade com o trabalho servil ao não índio”
(idem). O sentido de regresso ao universo totêmico, no conto, para a pesquisadora, está liga-
do à busca de uma identidade perdida, assumindo a personagem espectro de representação
coletiva do que a autora chama de “morte agônica da cultura ameríndia” (idem).
Já na década de 60 do século XX, surge o romance Quarup (1967), de Antônio Calado,
no qual
recria-se o ritual dos povos do Xingu, enquanto manifestação ritualística de re-
verência à memória de uma figura célebre, ao mesmo tempo em que questiona,
pelas linhas biográficas das personagens, o contexto histórico da era Vargas. No
entrelaçamento dos fios histórico, político e ficcional dá-se a vertente crítica do
desnudamento das circunstâncias de aculturação a que foram submetidos os po-
vos xinguanos (SANTOS, 2009, p.32).
Nos anos 70, o sociólogo Darcy Ribeiro lança seu romance Maíra (1976), resultado da
manipulação dos dados que coletou durante a experiência de dez anos de vivência entre
os indígenas. No entanto, o que o torna significativo “é sua constituição artística, pela qual
teceu as linhas frágeis da aculturação, resultantes da tragicidade do encontro do nativo com
a civilização” (SANTOS, 2009, p.33).
Nos anos 80 podemos citar A expedição Montaigne (1982), também de Antonio Calado,
apresentando novos caminhos para a construção do índio na literatura. Mais contempora-
neamente, ainda ligadas de uma forma ou outra à temática indígena, podem ser mencio-
nadas as obras Nove noites (2002), de Bernardo Carvalho; e Yuxin (2009), de Ana Miranda.
Deve-se mencionar também a antologia de poesia guarani Kosmofonia mbya guarani (2006),
16.3.2 O afro-brasileiro
O que pode se dizer do afro-brasileiro em nossas letras é que, ao contrário do índio que
passou por um longo momento de esquecimento para retornar nas últimas décadas, a temá-
tica e produção ligadas ao elemento afro foram se intensificando até os nossos dias.
A partir da geração de 45 do século passado, podemos citar primeiramente a obra-pri-
ma A menina morta (1955), de Cornélio Pena, logo em seguida, o fenômeno editorial Quarto
de despejo (1960), de Carolina Maria de Jesus.
A partir da década de 1970, com o aparecimento de movimentos de valorização da
consciência negra, surgem inúmeras obras protagonizadas por personagens afro. Podem ser
citadas as coletâneas de contos Contos crioulos da Bahia (1961), de Dioscóredes M. dos Santos;
O carro do êxito (1972), de Oswaldo de Camargo; Um negro vai à forra (1977), de Edilberto
Coutinho; Contos afro-brasileiros (1980), organizada por Júlio Santana Braga e Cauterizai o meu
umbigo (1986), de Eustáquio José Rodrigues.
Há que se mencionar os romances Corpo vivo (1962) e Luanda, Beira, Bahia (1971), de
Adonias Filho, Os tambores de São Luís (1975), de Josué Montello, Crônica dos indomáveis delí-
rios (1991), de Joel Rufino dos Santos; e a trilogia A casa da água (1969), O rei de Keto (1980) e
Trono de vidro (1987), de Antonio Olinto. Além dos livros de poesia de Abdias Nascimento,
Axés do sangue da esperança (1983); Incursões sobre a pele (1996), de Nei Lopes; e Dionísio esfa-
celado (Quilombo dos Palmares) (1984), de Domício Proença Filho.
Mais recentemente, já no século XXI, apareceram, entre outras obras, Elegbara (2005), de
Alberto Mussa. Contos negreiros (2005), de Marcelino Freire; 20 contos e uns trocados (2006), de
Nei Lopes; além dos romances A noite dos cristais (2001), de Luís Fulano de Tal; e Um defeito
de cor (2006), de Ana Maria Gonçalves.
Por último, mas não menos importante, deve-se mencionar o trabalho do movimento
Quilombhoje, fundado em 1980 por Oswaldo de Camargo, Paulo Colina, Cuti e Abelardo
Rodrigues, responsável pela publicação dos Cadernos Negros, que reúne contos e poemas de es-
critores afrodescendentes, incentivando a produção de autores e obras ligados à cultura negra.
Uma das escritoras lançada pelos Cadernos Negros e que se tornou das mais destacadas
autoras de nossa contemporaneidade é Conceição Evaristo. Afro-brasileira, nascida numa
favela em Belo Horizonte, trabalhou como empregada doméstica até graduar-se em Letras
pela UFRJ e tornar-se professora. Hoje é doutora em Literatura Comparada e autora de
obras como o romance Ponciá Vicêncio (2003); o livro de poesias Poemas da recordação e outros
movimentos (2008) e o de contos Olhos d’Água (2014).
Sobre a cena literária afro-brasileira contemporânea, a mesma Conceição diz que
principalmente nas três últimas décadas, ao lado de obras que revelam um olhar
mais lúcido e coerente com a gama de experiências dos afro-brasileiros, depa-
ramo-nos cada vez mais com criações literárias em que a voz textual se impõe
como sujeito que se descreve, a partir de uma subjetividade experimentada como
cidadão negro na sociedade brasileira. Vem se consolidando um discurso como
contra voz à autoridade/autoria da letra hegemônica da literatura brasileira, que,
como a história, tende a obliterar a saga dos africanos e seus descendentes no
Brasil (EVARISTO, p.23-24).
Sendo assim, esta literatura brasileira que, atualmente, passa a dar mais voz a povos
e culturas de nossa nação que tanto foram silenciados ao longo dos tempos; esta literatura
mais plural e inclusiva pode se dizer cada vez mais legitimamente brasileira.
[...]
Regina Dalcastagnè é professora de literatura na Universidade de Brasília,
autora do livro Literatura brasileira contemporânea: um território contestado,
entre outros.
Resolução
1. O primeiro estereótipo que podemos observar é da figura indígena como um ser
bárbaro, sem cultura alguma; o segundo é em relação à representação do índio como
seres belos, ignorantes e puros; e por último podemos notar que Caminha tinha a
visão de que o povo indígena não possuía uma religião e um sistema de crenças, o
que sabemos ser algo equivocado.
nar a maneira com que a figura do negro é exposta, por exemplo, no poema “O Na-
vio Negreiro”, pelo fato de essa representação não dar voz ao próprio negro, sendo
o elemento branco o advogado, a voz que defende um oprimido supostamente sem
capacidade para reagir.
3. Na obra de José Lins do Rego notamos muitos personagens negros que evidenciam
sua pobreza e exploração. As obras desse autor retratam a decadência dos engenhos
e o fim do trabalho escravo, mas ao mesmo tempo mostram que a libertação pouco
alterou a situação social dos negros, já que os personagens brancos, mesmo os mais
pobres, reafirmam constantemente sua suposta condição de superioridade, maltra-
tando e menosprezando os afro-brasileiros daquela região.
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