MACHADO SUAIDEN - Biblioteca Pública, Entre Teoria e Prática - 2015 Art.
MACHADO SUAIDEN - Biblioteca Pública, Entre Teoria e Prática - 2015 Art.
MACHADO SUAIDEN - Biblioteca Pública, Entre Teoria e Prática - 2015 Art.
RESUMO
O presente trabalho discute sobre o distanciamento entre a teoria e
prática das bibliotecas públicas. Faz um panorama sobre o
desenvolvimento da biblioteca pública brasileira em comparação com
as diretrizes e orientações teóricas, confrontando com a realidade do
Distrito Federal. Trata-se de uma pesquisa exploratória realizada por
meio de revisão bibliográfica e de entrevistas com especialistas,
gestores de bibliotecas e bibliotecários do Distrito Federal. Conclui
que foi desenvolvido um modelo de bibliotecas públicas fundado em
expectativas sociais do senso comum e que por meio de políticas
públicas com ampla participação de especialistas e bibliotecários e
com a utilização de novos indicadores pode-se mudar o atual quadro
dessas bibliotecas.
Mestrando em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília.
[email protected]
Professor Titular da Faculdade de Ciência da Informação da Universidade de
Brasília; Doutor em Ciência da Informação pela Universidad Complutense de Madri.
[email protected]
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Biblos :Revista do Instituto de Ciências Humanas e da Informação, v. 29, n.2, 2015
ABSTRACT
This paper discusses the gap between the theory and practice of
public libraries. It is an overview of the development of Brazilian public
library in comparison with the guidelines and theoretical orientations,
confronted with the reality of Distrito Federal. This is an exploratory
research conducted through literature review and interviews with
specialists, managers of libraries and librarians from Distrito Federal.
Concludes that was developed a model of public library founded in
social expectations of common sense and also that through public
policies with wide participation of specialists and librarians and with
the use of new indicators it is possible to change the current situation
of these libraries.
1 INTRODUÇÃO
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2 ASPECTOS TEÓRICOS
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comunidade. Ela proporciona acesso ao
conhecimento, à informação, à educação
permanente e a obras da imaginação por meio
de uma variedade de recursos e serviços, e se
coloca à disposição, de modo igualitário, a
todos os membros da comunidade,
independente de raça, nacionalidade, idade,
gênero, religião, língua, dificuldade física,
condição econômica e social e nível de
escolaridade.
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3 ASPECTOS HISTÓRICOS
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poder e prestígio, porém muito distante do cotidiano da plebe
brasileira.
Enfim, sob os auspícios do Iluminismo, por meio do senhor de
engenho Pedro Gomes Ferrão Castelo Branco foi criada a
considerada primeira biblioteca pública brasileira (MORAES, 2006).
A primeira biblioteca criada para, em teoria, uso indistinto de
qualquer cidadão, não foi mantida pelo Estado, mas obteve
significativo apoio financeiro por meio do governador da província
baiana, o conde Arcos. Todavia essa biblioteca ainda contribuiu,
também, para formar uma imagem estereotipada da biblioteca como
“templo do saber”, uma vez que era destinada à elite letrada e
desprezava a tradição oral num país em que a população em sua
grande maioria era analfabeta.
Finalmente na Primeira República a biblioteca pública é
tutelada pelo Estado, estas passam, então, a adquirir características
de repartições públicas (GOMES, 1983), um traço marcante até os
dias de hoje. Atributo esse muito criticado por Milanesi (1983) que o
associa às condições precárias e ao desinteresse e mau humor de
seus funcionários.
Apenas na década de 20 do século XX, a partir da realização
da Semana da Arte Moderna, em 1922, a história das bibliotecas
públicas parece ter uma reviravolta e, então, pensa-se na
constituição de uma biblioteca mais voltada às necessidades da
sociedade, mais orgânica, baseada no modelo e na escola norte-
americana de biblioteconomia. Essa foi a biblioteca pública
municipal de São Paulo, denominada de Mário de Andrade a partir
fevereiro de 1960. Para Leitão (2011), por meio da Divisão de
Bibliotecas do Departamento de Cultura e da biblioteca municipal,
Rubens Borba de Moraes influenciou as bibliotecas públicas a essa
orientação norte-americana.
Entretanto esse modelo proposto foi logo desconstruído com
instauração da Era Vargas. A partir da revolução 1930, começa uma
nova fase para essas bibliotecas, o Estado autoritário de Getúlio
Vargas as compreende como relevante entidade na expansão da
indústria livreira e de controle social. Como colocam Araújo (2002) e
Leitão (2011) o governo getulista possuía uma visão dos livros de
saúde social, perspectiva que ecoava nas bibliotecas. Foi nesse
contexto que surgiu uma das instituições mais relevantes para as
bibliotecas públicas, o Instituto Nacional do Livro (INL). Essa
conjuntura suscitou um modelo conservador de bibliotecas, com
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acervo que buscava obras de valor e enobrecimento intelectual e
moral, negligenciando as necessidades informacionais do cotidiano
do trabalhador. O resultado para essas bibliotecas foi a afastamento
dos trabalhadores e da população pelo reforço da imagem de um
local sem utilidade para a solução dos problemas cotidianos e
reservado para o uso de intelectuais. O legado positivo do período
foi a criação de inúmeras bibliotecas públicas pelos municípios
brasileiros por meio do incentivo do governo e da ação do INL.
Ainda mesmo que o modelo não fosse o ideal, foi nesse período que
o interior do Brasil pôde ter a oportunidade de conhecer essa
instituição pública.
Posteriormente, já no regime militar, o INL com sua gestão
sob a direção de Maria Alice Barroso é responsável pelo fenômeno
da escolarização da biblioteca pública (OLIVEIRA, 1994; PAIVA,
2008). Segundo Oliveira (1994) essa transformação se deu pela
mudança do paradigma da biblioteca pública a qual passa a ser
vista pelo INL como uma fonte paradidática de apoio ao estudante.
Dessa forma, ao final do século XX verificava-se um modelo
de bibliotecas distante da realidade dos trabalhadores e das
necessidades informacionais dos cidadãos. A biblioteca pública
brasileira ainda representa a imagem de “templo do saber”, de lugar
esotérico, ou de prestígio, a qual pertence somente aos intelectuais,
ou ainda após a escolarização desta, é vista como um local apenas
para os estudantes. E exatamente a parte da população brasileira
que mais precisa dessa instituição pública não consegue construir
uma identificação, então a rejeita e não cobram das autoridades e
agentes políticos investimento nelas. Assim, essas bibliotecas não
conseguem prover serviços de qualidade que atendam as
necessidades informacionais da comunidade, inclusive ela
desconhece essas necessidades, e não se consegue romper esse
modelo que leva à estagnação dessa instituição.
Com o advento da Sociedade da Informação, segundo
Castells (1999, p. 39) “uma revolução tecnológica concentrada nas
tecnologias da informação começou a remodelar a base material da
sociedade em ritmo acelerado”, com isso surgem novas
possibilidades de produção, troca e armazenamento de informação.
A informação nessa sociedade passa a ter posição estratégica, seja
para governos, empresas, ou pessoas, por isso, para Bernardino e
Suaiden (2011) apontam que a biblioteca pública passaria a ocupar
lugar de destaque na atual sociedade, pois essa instituição traz em
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sua essência o tratamento, uso e disseminação da informação, que
associada às tecnologias da informação e da comunicação garante
ao usuário a recuperação precisa da informação.
Todavia, essas bibliotecas ainda não atendem nem as
diretrizes propostas do século anterior, como valorização da tradição
oral, acesso à informação por meio de qualquer suporte, fomento ao
desenvolvimento da cultura local e regional, capacitação profissional
ao cidadão, combate às desigualdades e ao analfabetismo e
promoção de cidadania. Por isso, observa-se que na realidade essa
unidade de informação ainda não ocupa sua localização de
notoriedade. Ou seja, na atual conjuntura na qual a informação é
vital para o desenvolvimento individual e corporativo, as bibliotecas
públicas encontram-se despreparadas, negligenciadas pelo Estado
e sucateadas, atuando de acordo com um modelo socialmente
construído que remete ao século XX, enquanto os usuários
pertencem e estão conectados às transformações do século XXI.
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atitude correta porque, apesar de concordar com o discurso do
político, prefere que os recursos financeiros sejam utilizados para
1
tapar os buracos do asfalto de sua região (informação verbal) . Ou
seja, o discurso da importância da biblioteca pública é uma
manifestação abstrata, tanto o político, como o cidadão desconhece
a atuação prática no desenvolvimento econômico e social de sua
comunidade, como dele próprio.
A consequência desse modelo é a exclusão da população
dessa instituição pública. Principalmente dos mais necessitados.
Como exemplo, no Distrito Federal (DF), conforme a Companhia de
Planejamento do Distrito Federal (2013), no ano de 2013, a taxa de
não uso da biblioteca pública chega aos espantosos 90% da
população.
1
Entrevista com bibliotecários e gestores de Bibliotecas do DF. [out.
2014]. Entrevistador: Frederico Borges Machado. Brasília, 2014. 28
arquivos .mp3.
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FIGURA 1 - População segundo a frequência em bibliotecas no DF
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instituição. No pequeno estacionamento das bibliotecas são
observados bons carros que revelam o poder aquisitivo dos usuários
reais, também há algumas características da própria biblioteca,
como a revista na entrada e saída dos usuários, o local fechado, as
regras de silêncio, que intimidam uma parcela da população, assim,
o trabalhador e a população no geral não se identificam e não
2
utilizam a biblioteca (informação verbal) .
3
5 ANÁLISE DO DISCURSO DOS ESPECIALISTAS
2
Ibid.
3
Entrevista com especialistas em bibliotecas públicas. [nov. 2014].
Entrevistador: Frederico Borges Machado. Brasília, 2014. 3 arquivos .mp3.
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que devido à quantidade de concursos com bons salários e as
novas dinâmicas da Sociedade da Informação não despertam
interesse pelas organizações de representação coletiva da classe
profissional.
Esse diagnóstico do movimento associativo se torna um
obstáculo à transformação das bibliotecas públicas, uma vez que,
conforme exposto, a participação dos bibliotecários seria crucial na
elaboração das políticas públicas. Além disso, é função dos
conselhos profissionais a fiscalização da área para que se proteja e
valorize a profissão, porém por conta dessa fragilidade da
organização profissional da área, presencia-se a existência de
inúmeras bibliotecas públicas sem a presença do bibliotecário. Essa
situação foi indicada como uma das mais graves existentes, mas
que por meio de uma política do Estado séria e sistemática poderia
ser sanada.
Também foi apontada a contradição de a biblioteca pública vir
perdendo usuários na atual Sociedade da Informação, na qual a
informação se torna elemento tão fundamental e na qual se observa
o aumento dos níveis de alfabetização e escolaridade. Uma das
principais causas dessa perda, indicada nas entrevistas, é a
desatualização dos acervos dessas bibliotecas, pois o que as
pessoas querem são livros novos, populares, ler os best-sellers.
Para os pesquisadores também é importante a compreensão
de que as bibliotecas públicas tem a responsabilidade de criar
leitores críticos, isso significa que essas bibliotecas teriam de criar
metodologias que proporcionassem o desenvolvimento dessa
habilidade em seus usuários. A formação de leitores críticos é parte
do desenvolvimento da cidadania. Mas, para isso é preciso um novo
olhar sobre os serviços dessas bibliotecas.
Ao voltar o olhar para o modelo de bibliotecas públicas
desenvolvidos em outros países vizinhos, como a Colômbia, verifica-
se a viabilidade da construção de um novo modelo de bibliotecas
que atenda as necessidades informacionais dos cidadãos e que
promova desenvolvimento social e econômico das comunidades.
Porquanto, para um dos entrevistados, a dificuldade em transformar
o modelo de bibliotecas não é financeira, já que tecnologicamente
existem diversos exemplos brasileiros de bibliotecas mais
desenvolvidas. O verdadeiro obstáculo é o modelo socialmente
construído e constituído de que a biblioteca tem a função de
oferecer apenas os mesmos serviços, ditos tradicionais. Por isso,
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seria preciso refletir sobre esse modelo de biblioteca pública que se
cristalizou na sociedade brasileira, entender que essa biblioteca é
um serviço público, com referência em se transformar em centros
culturais.
Ainda, foi consensualmente colocado a necessidade de novos
indicadores para a gestão dessas bibliotecas. Precisa-se parar de se
trabalhar com indicadores de acesso às bibliotecas e passar a
utilizar indicadores relacionados à leitura e ao uso da informação. O
acesso por si só não traz impactos consideráveis á realidade social,
tem de se buscar indicadores que possam identificar, quantificar e
analisar o impacto do uso dos serviços da biblioteca na comunidade
à qual serve, para, enfim, poder ter indicadores que quantifiquem e
qualifiquem os serviços dessas bibliotecas.
Assim, a biblioteca pública brasileira fica descompassada de
seu tempo histórico. Enquanto ainda produz um debate em alcançar
as diretrizes propostas para modelos do século XX, ainda atuando
como uma biblioteca de apoio ao sistema de ensino público formal,
essa retarda-se na discussão do século XXI, sobre os desafios com
o advento das novas tecnologias de comunicação e informação.
Por fim, foi alvitrada a necessidade de se reformular o
currículo do bacharel em Biblioteconomia para que o profissional
egresso possa ter habilidades e capacidades reais de enfrentar e
contribuir para a transformação do atual quadro dessas bibliotecas.
Dessa forma, conclui-se que tem de haver atualização do
acervo, novos serviços à comunidade, informações úteis que
possam gerar renda e emprego à comunidade. A biblioteca pública
está estática no tempo, ela sabe trabalhar com o livro, mas não sabe
trabalhar com a informação. Então, ela está e ainda continua
distante do cotidiano do cidadão.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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