Livro Didatico Lingua Inglesa

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ANAIS ELETRÔNICOS DO IV SEMINÁRIO FORMAÇÃO DE PROFESSORES E ENSINO DE LÍNGUA INGLESA

VOL. 4, 2018 | ISSN: 2236-2061 – 28 A 30 DE MAIO DE 2018, SÃO CRISTÓVÃO/SE, UFS

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O LIVRO DIDÁTICO, A LÍNGUA INGLESA E A ELABORAÇÃO DE MATERIAIS

Julia Vasconcelos Gonçalves MATOS (UFRB)

Resumo: Material didático pode ser definido, de forma sucinta, como todo e qualquer objeto
que auxilia os alunos a aprenderem. Portanto, os materiais didáticos podem assumir a forma
de livros, dicionários, gramáticas, vídeos, CDs, revistas, dentre outros. Temos, assim, que o
livro didático é apenas mais um dos diversos materiais que podem ser utilizados em um
processo de ensino-aprendizagem. Entretanto, no que concerne o ensino de língua inglesa, os
livros didáticos se encontram, na atualidade, como o principal, e muitas vezes único, material
didático a ser utilizado em sala de aula. Desse modo, é necessário entender que o livro
didático não é apenas um meio para a propagação de conteúdo linguístico, mas também
cultural e social. Portanto, os elementos e concepções utilizados na sua elaboração terão
impacto direto em como os alunos visualizarão a língua estudada e o mundo ao seu redor. Ou
seja, as concepções de língua, ensino, aprendizagem e metodologia adotadas pelos criadores
de um livro didático influenciarão na forma como o aluno irá compreender e assimilar a
língua inglesa. Nesse sentido, este artigo aborda o surgimento, uso e importância dos livros
como ferramenta para o ensino de línguas, assim como discute sobre a elaboração desses
materiais.

Palavras-chave: livro didático, língua inglesa, elaboração de materiais

Introdução
Os livros, independentemente de seu conteúdo, são elementos intrinsecamente
conectados aos seres humanos, pois decorrem da necessidade da sociedade em documentar
acontecimentos, em retratar fatos, em registrar e criar histórias. De acordo com Mello Jr.
(2000 apud PAIVA, 2009, p. 18), “o livro como nós conhecemos hoje, surgiu no Ocidente por
volta do século II d.C., fruto de uma revolução que representou a substituição do Volumen
pelo Codex”.1 Até o século XV, com o advento da imprensa, “os livros eram escassos,
pesados e difíceis de produzir. Livreiros os tinham copiados por escravos, um leitor ditando
em uma sala cheia de escribas, mas o custo de se produzir livros dessa forma fazia com que
poucos pudessem ter acesso a estes” (KELLY, 1969, p. 258). Tem-se, assim, que a produção
de livros era muito precária, feita ainda manualmente, “não existindo dúvidas de que o único

1
Paiva (2009, p. 17) explicita que “o volumen consistia de várias folhas de papiro coladas que eram enroladas
em um cilindro de madeira, formando um rolo. […] Já o formato de codex se aproxima mais do livro atual com
várias folhas de papiro ou de pele de animais costuradas”.
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texto nas salas de aulas medievais estava nas mãos do professor, os pupilos tomavam notas
tanto dos textos quanto dos comentários através do ditado” (KELLY, 1969, p. 258).

O material didático e o ensino de línguas


No que concerne ao ensino das línguas, o uso dos livros foi incorporado, inicialmente,
tanto no período clássico como no medieval, como fonte exemplificativa do correto modo de
usar a língua. Os materiais utilizados, portanto, não eram específicos e próprios para o ensino,
pois eram livros comuns, em regra, de literatura, que serviam como exemplos para o ensino
da gramática e da escrita.
A inserção dos materiais próprios para serem utilizados no ensino de línguas surgiu
ainda no período medieval como um complemento para as obras comuns já utilizadas. Isso
porque, via de regra, esses materiais eram gramáticas e dicionários que serviam como suporte
para o ensino (PAIVA, 2009). A gramática e o dicionário passaram a ser a base
exemplificativa da estrutura da língua, tendo como função estabelecer os critérios de uso que
o aluno precisava para poder ler e compreender os textos apresentados em um livro comum.
Entretanto, mesmo com a inclusão das gramáticas e dos dicionários na prática de
ensino de línguas, em especial, estrangeiras, o livro ainda continuava, em sua maioria,
centralizado nas mãos do professor que o seguia como orientação para delimitar o que deveria
ser ensinado. Essa perspectiva, conforme afirma Paiva (2009), só foi alterada em meados do
século XVI, com o lançamento de uma gramática em hebraico, pelo Cardeal Roberto
Belarmino2, que tinha como objetivo fazer com que o aluno pudesse estudar sem o auxílio do
professor.
Ainda no século XVI, com a inserção das línguas complementares nos currículos das escolas
europeias e a invenção da imprensa no século anterior 3, o material didático ganhou ainda mais
notoriedade e tornou-se um recurso para o ensino de línguas quase que indispensável para a

2
Roberto Francesco Romolo Belarmino, nascido em 1542, foi um jesuíta italiano e um cardeal católico, sendo
uma das mais importantes figuras da Contra-Reforma.
3
A invenção da imprensa, como enfatiza Paiva (2009), foi de grande importância para a expansão dos livros de
forma geral, pois através desta foi estabelecida a cultura letrada. “Os livros deixam de ser copiados à mão e
passam a ser produzidos em série” (PAIVA, 2009, p. 18), fazendo, assim, com que a disposição de livros para a
sociedade aumentasse e, em relação ao ensino de línguas, fizesse com que se deixasse de ter um ensino no qual o
professor era, via de regra, o único detentor do material didático a ser utilizado.
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prática de ensino. Surgiu, então, o livro didático que foi, e ainda é, um dos diversos materiais
didáticos que podem ser utilizados no ensino de línguas, realizando como principal função, a
mediação no processo de ensino-aprendizagem.
O livro didático é o responsável por indicar e basear o estudo do aluno fora da sala de
aula, lhe cabendo também o papel de instigar o aprendiz à procura por novos conceitos, novos
vocabulários, novos conteúdos, novas formas de estudos e assimilação do conteúdo, entre
outros. Ademais, na maioria das escolas, o livro didático passou a ser concebido como
principal fonte de ensino nesse contexto, incorporando os procedimentos, direcionamentos,
atividades, conteúdos, entre outros, necessários para a aquisição do novo conhecimento.
Desse modo, as gramáticas e os dicionários passaram a ser vistos não mais como livros
didáticos, mas como material de suporte no processo de ensino-aprendizagem.
Os livros didáticos, portanto, podem ser concebidos como a representação das teorias
de aprendizagem e dos posicionamentos pedagógicos, uma vez que são utilizados como meio
de propagação de determinadas concepções educacionais. Isto é, se os teóricos, sejam
educacionais ou linguísticos, concebem que uma língua é adquirida ou aprendida através da
compreensão de estímulos e reações, o livro didático trabalharia dentro desse escopo,
apresentando o conteúdo de modo a gerar a memorização e o condicionamento do aluno. Caso
os teóricos se baseassem na concepção de que a aquisição ou a aprendizagem da língua
precisa ser feita de modo significativo, através do uso da língua e não apenas através da
memorização de regras e estruturas, o livro didático seria construído de forma a ser usado
como suporte para a interação e uso da língua em sala de aula.
Portanto, para cada teoria de aprendizagem e/ou posicionamento teórico tem-se uma
construção distinta do livro didático, inserindo os princípios, diretrizes e parâmetros típicos de
cada orientação. Ou seja, assim como o papel do aluno e do professor, o papel do livro
didático sofreu e sofre modificação de acordo com a teoria de aprendizagem ou o
posicionamento pedagógico adotado para o ensino de línguas. Outrossim, além do seu valor
pedagógico, livros didáticos são artefatos culturais, não menos enraizados em um tempo e
cultura específicos do que qualquer outra atividade humana e são moldados pelo contexto no
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qual são elaborados (LITTLEJOHN, 2012). Sendo, portanto, o reflexo de acontecimentos


sociais que ocorrem muito além da sala de aula.
Esses reflexos podem ser exemplificados, no caso da língua inglesa, pelos
acontecimentos derivados da globalização e da expansão da língua inglesa pelo mundo, os
quais influenciaram, e ainda interferem no modo como os livros didáticos para o ensino desse
idioma são produzidos. Esses dois acontecimentos geraram como algumas de suas
consequências, a perda do centro hegemônico da língua inglesa (Estados Unidos e Reino
Unido) e o aumento gigantesco do número de falantes não nativos. Desse modo, surgiu a
concepção de que o material didático também precisava ser alterado para suprir as novas
demandas e necessidades de seus aprendizes, agora em escala global.
Com isso, os livros didáticos passaram a ser produzidos em duas acepções: a local e a
global. Na acepção local, os livros são produzidos por editoras e/ou autores locais, visando
uma maior aproximação com as necessidades e prioridades do espaço onde o livro será
utilizado. A perspectiva global, por sua vez, refere-se ao fato de que os livros começaram a
ser elaborados pelas grandes editoras em duas vertentes distintas: livros produzidos para
países específicos e a produção de um livro geral que pode ser utilizado em diversos países,
isto é, para blocos internacionais (GRAY, 2002).
Os livros de línguas produzidos por grandes editoras, para uso em países específicos,
são os denominados livros globais com alguma cor local (KUMARAVADIVELU, 2012).
Esses livros são, em regra, elaborados pelos ditos centros hegemônicos e visam atingir uma
comunidade específica, incluindo elementos correlatos a esta. Em muitos casos, esses
materiais se adaptam às decisões estipuladas e delimitadas pelas instituições dos países que
desejam adentrar, adequando a sua forma de apresentação e o seu conteúdo às convenções
locais. Diferentemente, os livros didáticos de línguas produzidos por grandes editoras para
uso irrestrito em diversos países são os denominados livros globais propriamente ditos. Esses
materiais são, ao menos em teoria, desterritorializados, pois visam a passar a ideia de que
podem ser utilizados em qualquer país, independentemente de seus aspectos sociais e
culturais.
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Entretanto, precisamos atentar para o fato de que o marcador ‘localidade’ não pode ser
utilizado como único parâmetro para se estabelecer se um livro se conecta ou não com as
necessidades desencadeadas pela globalização. Muito mais do que se fixar no local de
produção do livro didático, precisamos verificar se este livro propicia, de certa forma, através
do ensino da língua, que o aluno se visualize como ser autônomo e como um cidadão global.
Inicialmente, é necessário compreender que o uso do livro didático precisa ser analisado com
base em duas posturas que podem ser tomadas pela instituição e pelo professor perante este: a
de utilizar o livro como base e fonte única de estudo e a de usar o livro como uma das fontes
para o processo de ensino-aprendizagem.
No primeiro caso, o livro é visto como o guia supremo para o processo de ensino-
aprendizagem, sendo o responsável por estipular os objetivos, conteúdos e formas de trabalho.
Essa postura, de certa maneira, impossibilita a improvisação, isto é, a inserção de materiais e
atividades externos aos livros. Na segunda perspectiva, o livro didático não controla a sala de
aula, pois serve como suporte para as aulas, possibilitando que o professor improvise mais,
seja criativo e adapte o livro às necessidades de seus alunos.
Concebemos nesse trabalho que o livro didático precisa ser adotado como suporte para
as aulas, relacionando-se, desse modo, com o estímulo à reflexão, à autonomia e ao
pensamento crítico por permitir uma maior liberdade, tanto para o professor como para o
aluno. Ambos podem atuar de forma mais livre em sala de aula, expondo suas opiniões,
desejos e atitudes, já que a sala de aula se torna mais flexível e aberta a novas discussões e
conteúdos pertinentes e relacionados aos temas do livro. Nessa perspectiva, o livro didático
não, portanto, controla o processo de ensino, mas é utilizado como uma preciosa ferramenta
que complementa os conhecimentos do professor e do aluno e, ainda, funciona como
instrumento de atualização do educador.
O professor, assim sendo, tem um importante papel no uso do livro didático, visto que
será o responsável por apresentar ao aprendiz como ele pode e precisa utilizar o livro didático
de forma autônoma e benéfica ao seu aprendizado, instruindo-o a aproveitar todas as
vantagens e benefícios desse instrumento de aprendizagem, além de chamar a atenção para
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suas lacunas. Além disso, o professor será responsável por debater e introduzir temas
relacionados à expansão da língua pelo mundo, seu uso, impacto e variantes.

Elaboração de um material didático


De acordo com Leffa (2008, p. 15), a produção de materiais de ensino deve envolver
ao menos quatro fases: a análise, o desenvolvimento, a implementação e a avaliação. Segundo
o autor, a fase da análise “parte de um exame das necessidades dos alunos incluindo seu nível
de adiantamento e o que eles precisam aprender” (LEFFA, 2008, p. 16). Em se tratando de
livros didáticos pré-produzidos, principalmente como ocorre na maioria das escolas, sabemos
que essa acepção não será adotada de forma completa, pois este é um material que, mesmo
quando produzido localmente, é impresso em larga escala e tem como foco escolas que
possuem a língua inglesa como disciplina. Além disso, precisamos aceitar o fato de que os
alunos não possuem participação na escolha do livro a ser utilizado, sendo estes, em sua
maioria, selecionados pelas instituições ou pelos professores (TOMLINSON, 2008, p. 7).
Ou seja, é preciso ter a consciência de que, na prática, nenhum livro didático irá
abarcar todas as necessidades e demandas da sala de aula e de seus alunos. O professor, sendo
assim, precisa assumir também o seu papel de criador de material didático, o qual o
impulsiona a estar em um constante processo de avaliar, adpatar e substituir os materiais
didáticos disponíveis (TOMLINSON, 2013).
Desse modo, os livros didáticos se adequam à fase da análise a partir do momento que
esta também engloba a necessidade de “que o material entregue ao aluno esteja adequado ao
nível de conhecimento do conteúdo a ser desenvolvido” (LEFFA, 2008, p. 16). Essa
adequação ocorre através da definição de níveis de aprendizagem. Assim, o conteúdo do livro
didático precisa estar relacionado com as necessidades que cada nível requer. Essa
delimitação pode ser feita através de medidas governamentais locais, como os Parâmetros
Curriculares Nacionais no Brasil, ou por definições de órgãos internacionais que abarquem
certas comunidades, como o Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas para
aplicação no ensino de línguas na Europa.
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Nesse sentido, para a construção do livro didático é necessário que se estipule o seu
público alvo, mesmo que de forma generalizada. Um livro voltado para alunos denominados,
por exemplo, de iniciantes, primários ou secundários, precisa ser elaborado utilizando
recursos (áudio, figuras, exercícios, entre outros) que permitam a evolução gradual dos
aprendizes no decorrer das unidades, bem como, o uso de uma linguagem clara e simples que
possibilite a sua fácil assimilação e compreensão. Para cada nível de aprendizagem será
utilizado, ou ao menos deveria ser, uma linguagem distinta, coerente com a competência
linguística do aluno.
A fase do desenvolvimento refere-se aos objetivos do ensino da língua estrangeira, ao
conteúdo a ser ensinado e aos recursos a serem utilizados, ou seja, a delimitação, organização
e adequação do conteúdo à estrutura do livro didático. De acordo com Leffa (2008, p. 17) “a
definição clara dos objetivos dá uma direção à atividade que está sendo desenvolvida com o
uso do material. Ajuda a quem aprende porque fica sabendo o que é esperado dele.”
Desse modo, visualiza-se que as fases da análise e do desenvolvimento são
complementares e precisam ser concebidas em conjunto, pois “a etapa do desenvolvimento
parte dos objetivos que são definidos depois da análise das necessidades” (LEFFA, 2008, p.
17). Ou seja, é a partir da delimitação das especificações linguísticas que os alunos devem
alcançar que são determinados os objetivos específicos para cada plano de aprendizagem.
Além disso, de acordo com Ferro e Bergmann (2008), a junção dessas duas fases,
isto é, a necessidade dos alunos e a delimitação dos objetivos e conteúdos a serem alcançados,
precisa de bastante atenção, pois é a partir da estipulação destas que o livro didático passa a
desempenhar as suas funções secundárias:4 a de livro como objeto inovador, motivador,
comunicativo, controlador, configurador e estruturador da realidade.
O papel de inovador do livro didático decorre do fato de que o uso de um material,
seja este qual for, expõe ao aluno novos conhecimentos e conteúdos ou, ao menos, uma nova
perspectiva sobre assuntos que este já conhece. Isto ocorre, pois mesmo voltados para um
mesmo nível e público, dois livros didáticos distintos mostram os conteúdos utilizando-se de

4
Apesar de não serem independentes, concebemos como função primária do livro didático o papel de mediador
do ensino de línguas propriamente dito, já enquanto função secundária nos referimos aos demais elementos que
são intrínsecos a este, tais como a metodologia utilizada, a visão de mundo apresentada etc.
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diferentes recursos e com base em concepções diversas, sendo estas guiadas pelo
posicionamento pedagógico e os objetivos de seus criadores. Portanto, cada livro didático
sempre apresentará ao aluno algo diferente ou trabalhado de uma nova maneira.
Ao introduzir os conteúdos, o livro didático assume também a sua função de
motivador, a qual condiz com o fato de que, ao apresentar um conteúdo, o material precisa
captar a atenção dos alunos para a importância do mesmo. O seu papel de motivador é feito
através da forma como o assunto é exposto, dos recursos que utiliza e das atividades que
propõe. Além disso, a sua atribuição de motivador terá grande relevância para cativar ou não
no aluno o seu interesse por determinado conteúdo, vocabulário, lugar, língua, etc.
A função comunicativa do livro didático refere-se ao fato de que “o material é um
agente de comunicação cultural e pedagógica, difundindo pontos de vista e servindo como
representante da metodologia da qual faz parte” (FERRO; BERGMANN, 2008, p. 20). O
livro didático, portanto, nada mais é do que uma representação de ideais e valores daqueles
que o elaboraram, os quais serão refletidos e perpassados aos alunos.
A influência do livro didático, por sua vez, condiz com a sua característica de
“controlador dos conteúdos a serem ensinados, determinando uma progressão de
aprendizagem” (FERRO; BERGMANN, 2008, p. 20). Os livros precisam seguir uma escala
de desenvolvimento do conteúdo, partindo do mais simples para o mais complexo,
possibilitando, assim, o desenvolvimento gradual do aluno.
Essa delimitação dos conteúdos, de forma controlada, precisa ser feita com muito
cuidado, pois o livro didático também é um configurador, uma vez que é um dos principais
responsáveis pelo tipo de relação que o aluno criará com os conteúdos introduzidos. Por ser,
na maioria dos casos, o elemento central de estudo, os livros didáticos carecem ser feitos de
modo a criar motivação pelos estudos, estimulando, ainda, a busca por novos meios e recursos
que podem e irão auxiliar o educando no aprendizado, em vez de manter a dependência com
uma única fonte de aprendizagem.
Ademais, na atualidade, os alunos estão inseridos em diversas realidades e precisam
estar aptos a saberem agir e se portar em contextos sociais variados. A contextualização do
livro didático com a realidade na qual o aluno se insere é realizada através de seu papel de
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estruturador da realidade “organizando os conceitos por ele apresentados e estabelecendo


pontes entre o conhecimento e a vida do estudante” (FERRO; BERGMANN, 2008, p. 20).
Entretanto, um outro caráter do livro didático pode acabar por interferir nessa
contextualização: o de propagador de ideologias linguísticas. Por ideologia linguística
compreende-se o meio pelo qual “o significado serve para estabelecer e sustentar relações de
dominação” (THOMPSON, 1990 apud SCHEYERL, 2012, p. 40). Ou seja, a partir das
concepções de língua e de mundo adotadas para a elaboração de um material didático serão
propagadas diferentes formas de relações de poder. De acordo com Scheyerl (2012), as
relações de poder podem ser verificadas nos livros didáticos a partir de três posturas
ideológicas denominadas de: 1) mito do colonizador, 2) mito do melting pot e 3) mito do
consumismo.
O mito do colonizador refere-se à propagação do mundo ideal, proveniente das
culturas alvo, através dos livros didáticos (SCHEYERL, 2012, p. 41). No caso do inglês, esse
mundo ideal é, em regra, apresentado como um bloco homogêneo composto por pessoas
brancas, de origem britânica e protestantes, as quais, supostamente, detêm poder econômico e
social. Além disso, nesse mundo, a língua inglesa é inserida através de “padrões linguísticos
rígidos e normatizados e um rigor exagerado na pronúncia nativa” (SCHEYERL, 2012, p.
41).
Através dessa postura ideológica, o aluno é incentivado a rejeitar a própria identidade
e a tentar substituí-la ao máximo pela cultura e língua que lhe são apresentadas no material
didático, isto é, cria-se no aluno o desejo de ser o outro (MOTA, 2010 apud SCHEYERL,
2012, p. 41). Isto ocorre, pois, conforme afirma Dendrinos (1992 apud SIQUEIRA, 2012, p.
322), os materiais didáticos não visam apenas o ensino de um sistema linguístico, mas “a
aculturação linguística dos aprendizes e, consequentemente, sua subjugação a convenções
sociais e à ideologia dominante em que a língua está imersa”.
O mito do melting pot, por sua vez, se refere à inserção de aspectos culturais nos
materiais didáticos estimulada pelo movimento multiculturalista dos anos 1970. Através dessa
postura ideológica, os livros tentam passar uma ideia de diversidade cultural e tolerância às
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diferenças. Contudo, o que os materiais fazem é gerar uma falsa sensação de inclusão cultural,
pois,
mesmo que materiais didáticos nessa perspectiva apresentem uma certa
tolerância com a diversidade entre os povos, esta é tratada apenas como algo
interessante, sendo o componente cultural, por um lado, expresso, por
exemplo, através do folclore ou da culinária, visto como objeto de admiração
e contemplação por parte dos alunos. [...] Apesar de tudo, o objetivo
continua sendo a valorização da cultura euro-americana. (SCHEYERL,
2012, p. 43)

O mito do consumismo, por fim, condiz com a mercantilização de marcas e produtos


nos livros didáticos, assim como com a venda de um estereótipo padrão de estilo de vida,
beleza, família, profissão, etc., a ser seguido (SCHEYERL, 2012, p. 44-45). Nessa concepção
ideológica se fomenta a comercialização e aquisição de bens, sendo o livro didático utilizado
como meio de propaganda e incentivo da prática mercantilista. Nesse contexto, também, se
celebra o denominado “mundo plástico”, no qual se propaga um mundo neutro e perfeito,
distante do mundo real (SIQUEIRA, 2012, p. 323).
Verifica-se, assim, que a concepção ideológica linguística adotada para a elaboração
de um livro didático pode, em alguns casos, dificultar a associação da língua estudada com o
mundo real em que o aluno está inserido. Nesse sentido, o papel de estruturador da realidade
do material didático dependerá muito de uma postura crítica a ser adotada pelo professor ao
utilizar esse livro em sala de aula. Ou seja, mesmo na presença destas concepções ideológicas
“o livro didático não é um inimigo a ser combatido, mas um companheiro a ser avaliado
criticamente à luz das necessidades e características de cada contexto específico”
(SIQUEIRA, 2010 apud SIQUEIRA, 2012, p. 341).
E isto pode ser visualizado na fase da implementação do livro didático a qual refere-se
à forma como este será usado e inserido em sala de aula, tendo como perspectiva a
participação, ou não, de quem o preparou. De acordo com Leffa (2008, p. 34), a
implementação pode ocorrer de três modos distintos: “(1) o material vai ser usado pelo
próprio professor, (2) o material vai ser usado por outro professor, (3) o material vai ser usado
diretamente pelo aluno sem presença de um professor.”
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Quando o material é preparado pelo mesmo professor que o usa, a implementação se


dá de modo intuitivo (LEFFA, 2008), uma vez que, ao elaborar o seu próprio material, o
educador é o responsável pela estipulação dos critérios pedagógicos e metodológicos que
fundamentam o material produzido, pela seleção e elaboração das atividades, pela delimitação
dos objetivos a serem alcançados com o material, entre outros. Nessa perspectiva, o professor
já sabe como e por que precisa atuar de determinada maneira, sem que sejam necessárias
maiores explicações sobre o material adotado.
Diferentemente, quando o material vai ser usado por outro professor “há necessidade
de instruções de como o material deve ser apresentado e trabalhado pelos alunos” (LEFFA,
2008, p. 35). Nessa situação, o professor que usa o material didático não tem o conhecimento
quanto aos procedimentos adotados em sua elaboração, precisando, portanto, que o autor o
direcione e explique, por exemplo, “o objetivo da atividade, o tipo de conhecimento que está
sendo construído, como a atividade deve ser conduzida junto com os alunos, as possíveis
respostas para as questões que estão sendo colocadas, como certas respostas dadas pelos
alunos deveriam ser trabalhadas, etc.” (LEFFA, 2008, p. 35).
Ressaltando-se, nesse caso, que, antes da mera implementação do livro em sala de
aula, o professor deveria analisá-lo criticamente. Essa análise baseia-se na verificação de se
este material se encaixa no seu contexto de ensino e se reflete as concepções de língua e
cultura que esse educador acredita ser as mais adequadas para a sua realidade. A partir disto, e
caso fosse pertinente, o professor faz as adequações e adapatações necessárias.
A terceira possibilidade de implementação ocorre através do uso do material
diretamente pelo aluno, sem a influência do professor. Nesse caso, o material didático precisa
ser elaborado de forma a apresentar instruções claras, diretas e de fácil assimilação para o
educando. Na elaboração desse tipo de material, Leffa (2008) alerta ser necessário atentar
para dois critérios: estabelecer contato com o aluno e tentar prever o que pode acontecer.
O material didático elaborado precisa criar uma conexão com o aluno, oferecendo ao
educando nem menos nem mais do que ele precisa, adequando o conteúdo ao seu nível de
conhecimento, mas sem distorcer a complexidade do saber que precisa ser apreendido
(LEFFA, 2008). Sendo assim, o material didático precisa ser produzido observando o
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conhecimento que o aluno já tem, ou, ao menos, deveria ter de acordo com o nível ao qual
está e aquele que precisa alcançar, apresentando, ao mesmo tempo, um papel de revisor do
conteúdo e de estimulador pela busca de novos saberes.
Além disso, conforme dito antes, o elaborador do material didático precisa prever o
que pode acontecer, pois, como o professor não estará presente no momento de seu uso, é
preciso “ter uma ideia das possíveis dúvidas do aluno” (LEFFA, 2008, p. 35). Nesse sentido,
ao produzir um material didático, o autor precisa ser criterioso com as informações que
apresenta e atencioso com as atividades que insere como forma de tentar evitar possíveis
brechas e dúvidas em torno de como as atividades devem ser realizadas e, ainda, mal
entendidos em relação ao conteúdo ensinado.
A última fase a ser analisada é a da avaliação, a qual aborda o fato de que o material
didático deve ser avaliado pela escola, pelo professor e pelo aluno, de modo a demonstrar se o
seu uso é/foi efetivo para o objetivo esperado. Essa fase pode ocorrer de duas formas:
informal e formal. A informal ocorre, em regra, quando envolve o trabalho de um único
professor, sendo este o responsável pela elaboração e implementação do material didático
(LEFFA, 2008, p. 38). Nessa avaliação, o próprio professor averigua os pontos positivos e
negativos do material em sua aplicação com os alunos e analisa se o material alcançou o
objetivo delimitado, para então, sendo necessário, reformulá-lo para ser usado novamente e
com diferentes grupos de alunos.
Na formal, por sua vez, o material é preparado por um grupo de professores para uso
próprio e/ou de outros colegas, assim como por editoras de materiais didáticos. Nessa
situação, a avaliação do material “pode ser feita por consultoria de um especialista ou por
questionários e entrevistas com os alunos” (LEFFA, 2008, p. 38).

Conclusão
Através desse trabalho, foi feita uma exposição sobre os materiais didáticos, as suas
conexões com o ensino de línguas e o seu processo de elabora. Desse modo, foi constatamos
que estudar o material didático, em especial o livro didático, possibilita que este seja
compreendido através de novas perspectivas e facetas. Ou seja, ao ampliar o nosso escopo de
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VOL. 4, 2018 | ISSN: 2236-2061 – 28 A 30 DE MAIO DE 2018, SÃO CRISTÓVÃO/SE, UFS

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compreensão sobre o livro didático, passamos a visualizar novas formas de estudá-lo e


elaborá-lo.
Diante do exposto, verificamos que o livro didático passou por diferentes
transformações, tendo o seu uso e função alterados a depender do contexto em que estava
inserido. Ademais, esmiuçamos, ao menos na teoria, o processo de elaboração de um livro
didático, especificando os procedimentos e fases necessários para a produção do mesmo.

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