P-036 - o Flagelo Do Esquecimento - Clark Darlton - Projeto Futurâmica Espacial
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P-036 - o Flagelo Do Esquecimento - Clark Darlton - Projeto Futurâmica Espacial
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O Flagelo Do Esquecimento
Clark Darlton
Tradução
S. Pereira Magalhães
Formatação
ÐØØM SCANS
2
Foi no ano de 1971 que Perry Rhodan,
antigo oficial da Força Espacial Americana,
atingiu a Lua com a nave Stardust e, com a
tecnologia que adquiriu da nave espacial dos
arcônidas encalhada, fundou sua Terceira
Potência.
Conflitos na Terra, invasões de fora, bata-
lhas no espaço, lutas em planetas longínquos
— por tudo isto passou gloriosamente a Ter-
ceira Potência no curto espaço de sua exis-
tência.
No momento, são ainda os saltadores —
aqueles comerciantes da galáxia que há milê-
nios conseguem defender seu monopólio co-
mercial com determinação contra qualquer
concorrente que apareça — que representam
o perigo mortal para toda a Terra.
Perry Rhodan, até hoje, tem feito tudo
que está a seu alcance para impedir que os
saltadores façam da Terra um mundo de es-
cravos. Levtan, o traidor, desempenhou um
papel importante no jogo de Rhodan, pois
somente através dele é que foi possível fazer
com que um grupo de agentes conseguisse
penetrar na Grande Conferência dos Patriar-
cas dos Saltadores.
Estes homens, lutadores experimentados
do Exército de Mutantes de Rhodan, cumpri-
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ram seu dever. E agora eles ainda vão mais
longe: Libertam um planeta inteiro do jugo
estrangeiro.
O FLAGELO DO ESQUECIMENTO serve-
lhes de instrumento para a libertação.
4
Personagens Principais:
5
1
***
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Sete planetas giram em volta do sol 221-Ta-
tlira, que percorre sua órbita em torno da Via
Láctea a uma distância da Terra de 1.012 anos-
luz. Só o segundo planeta tem vida inteligente,
a raça dos goszuls, semelhante à dos homens,
no momento dividida em duas metades pelos
saltadores. Um patriarca desta raça de comerci-
antes da galáxia, de nome Goszul, descobriu o
planeta e lhe deu seu nome. A partir deste tem-
po, o planeta de Goszul passou a pertencer ao
império dos saltadores.
Os saltadores, ou também chamados comer-
ciantes, não tinham propriamente pátria. Com
suas grandes naves, percorriam as galáxias e fa-
ziam comércio. Não davam muita importância à
solidariedade, a menos que seus interesses esti-
vessem em jogo. Aí então mostravam uma
grande união e esqueciam suas rixas, que fre-
qüentemente separavam as famílias.
Um caso assim estava se passando no mo-
mento. Os saltadores haviam descoberto a Ter-
ra e tentavam transformá-la num entreposto co-
mercial, quando foram repelidos energicamente
por Perry Rhodan. Aqui, no planeta de Goszul,
estavam pois reunidos os mais poderosos che-
fes dos clãs, a fim de estabelecerem um plano
de como se libertarem do incômodo e misterio-
so Rhodan, que tenazmente resistia às “bem in-
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tencionadas” invasões.
Os primeiros ataques dos mutantes tinha re-
duzido consideravelmente o número dos patri-
arcas presentes, mas ninguém cedia. Aliás, nin-
guém supunha, nem podia supor, que era exa-
tamente Perry Rhodan, o homem que estava a
1.012 anos-luz, o autor destes ataques.
A história de 1.012 anos-luz não era verda-
de. A frota de Rhodan estava realmente a oito
dias-luz distante do sistema de Tatlira, esperan-
do no espaço.
O coração da frota de Rhodan era a podero-
sa belonave Stardust-III, uma nave esférica com
diâmetro de 800 metros. Era comandada e diri-
gida pelo próprio Rhodan. Trazia no seu interi-
or armas dos tipos mais modernos e em grande
parte de origem arcônida. Dois transmissores
que transportavam a matéria a qualquer distân-
cia imaginável e no ponto de chegada desejado
a rematerializavam — inclusive bombas atômi-
cas — formavam uma arma irresistível.
Três cruzadores, igualmente esféricos, com
diâmetro de apenas 200 metros, acompanha-
vam a Stardust. Seus comandantes eram o capi-
tão McClears, o major Nyssen e o major De-
ringhouse.
Sem serem atingidos pelos rastreadores es-
truturais dos saltadores e por isso despercebi-
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dos, percorriam estes quatro gigantes do espa-
ço o longínquo sistema solar. Rhodan não tinha
intenção de intervir diretamente nos aconteci-
mentos, embora fosse indiretamente o respon-
sável. Não tinha pressa. Na Terra, tudo corria
normalmente. O Governo Mundial era entre-
mentes uma realidade. Rhodan fora nomeado
por seis anos para Administrador do planeta.
Durante sua ausência, era o coronel Freyt, seu
substituto permanente, quem dirigia os negó-
cios.
Mas nem todo mundo tinha a mesma calma
que Rhodan.
Muito menos Reginald Bell, seu íntimo ami-
go e cooperador. Os cabelos vermelhos de Re-
ginald Bell, que era chamado simplesmente de
Bell, estavam penteados à escovinha e aquelas
cerdas verticais não contribuíam exatamente
para embelezar seus traços já rígidos. Nos olhos
de um azul-claro, cintilava uma ira contida.
Com exceção de alguns oficiais de serviço e téc-
nicos de radiotransmissão, a sala estava vazia,
mas Bell não era homem que se preocupava
com a ausência de alguns subordinados, quando
se tratava de dar expansão a sua ira.
— Quem sabe você pode ter a gentileza —
rosnou rispidamente — de me dizer para que
esta demora toda.
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Perry Rhodan olhava constantemente o fra-
co cintilar da tela, onde Tatlira parecia tão pe-
quena como uma estrela insignificante. A luz
fraca da central fazia desaparecer um pouco seu
corpo magro, mas com o reflexo da tela seus
traços fisionômicos eram realçados. Os lábios
contraídos formavam uma linha reta. Nos
olhos, o fogo tranqüilo da expectativa. Os cabe-
los escuros e lisos formavam um contraste be-
néfico com a cabeleira hirsuta de Bell.
— Você ouviu o que eu disse? — perguntou
Bell impaciente, quando não recebeu nenhuma
resposta. Rhodan virou-lhe rapidamente a cabe-
ça e continuou fixando a tela. — Há necessida-
de disso? — perguntou objetivamente.
O rosto de Bell ficou mais sombrio. As pon-
tas do cabelo tremiam, mas sua voz abrandou
um pouco. Isso, porém, não queria dizer que
seu nervosismo acabara. Pelo contrário.
— Para que falar, se ninguém me escuta? —
disse para si mesmo. — Perguntei por que esta-
mos aqui dependurados no infinito e esperando
o quê?
Rhodan continuou olhando para a tela.
— Tanto tempo, meu amigo, até que possa-
mos descer lá do outro lado, daqui a oito dias-
luz. Naturalmente ninguém pode prever quanto
ainda ficaremos aqui. Isto depende primeira-
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mente de John Marshall, seus mutantes e de
Gucky.
— Sempre este rato desgraçado — gritou
Bell, esfregando o queixo. — Quer dizer que
tudo depende deste camundongo.
— E depende mesmo — concordou Rho-
dan, esforçando-se para permanecer sério. —
Estou curioso para saber o que Gucky vai dizer
quando souber o que seu melhor amigo pensa
dele.
— Não, por todos os deuses do Universo —
gritou Bell, como se alguém lhe enfiasse uma
agulha através de toda a espinha dorsal. —
Tudo menos isso, não provoque desnecessaria-
mente o maldito rato. Eu não poderia revidar.
Acha que eu gostaria de ficar de novo três ho-
ras dependurado sob o teto, até que o espanta-
lho se dignasse me deixar descer? Afinal, não
sou nenhum mutante, sou um homem normal.
Rhodan tirou os olhos da tela e olhou pensa-
tivo para ele. Um esboço de sorriso apareceu
nos seus lábios. Parecia que, apesar de sua rela-
tiva imortalidade, tinha envelhecido nas últimas
semanas.
— Muito bem — respondeu ele, nada mais.
— Talvez não? — Bell fez uma contra-per-
gunta, mas não esperava resposta, pois logo
acrescentou: — Já teve confirmação se Gucky
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encontrou os mutantes?
— Conseguiu, mas não sem dificuldades. No
momento nossa tropa de ataque está num bar-
co a vela, ancorado no porto de terra dos deu-
ses. O nome me escapou. Desde ontem, po-
rém, Marshall não se manifesta.
— Quem sabe foram presos — disse Bell
triste.
— Esperamos que não, Bell. Isto escanga-
lharia todo meu plano.
— Que plano, Santo Deus.
— O de conquistar pacificamente o planeta
de Goszul.
— Conquistar pacificamente?... Você é mui-
to otimista, Perry. Conquista pacífica, e os co-
merciantes matam os nossos onde os encon-
tram.
— No planeta de Goszul não vivem apenas
comerciantes — disse Rhodan com ar sério. —
Os aborígines primitivos são totalmente inofen-
sivos, os servos que se tornaram inteligentes na
Ilha da Terra dos Deuses não representam mai-
or perigo se compreenderem que se trata de
sua própria liberdade. A Terra dos Deuses é
uma colônia dos saltadores. Deste ponto aí é
que dominam o planeta. Normalmente, porém,
permanecem na Terra dos Deuses, quando
muito, duas dúzias de saltadores. A aglomera-
33
ção atual é uma exceção, com a qual temos que
contar. A tudo isso acrescente ainda os milha-
res de robôs de trabalho e de combate, que te-
mos que ter em conta de inimigos sérios. Não
obstante tudo isto, ainda aspiro a uma conquis-
ta pacífica.
— Muito prazer em sabê-lo — resmungou
Bell, que ainda não compreendia onde Rhodan
queria chegar. — E como você vai conseguir
isto? Ficando aqui, esperando até estarmos per-
didos?
Rhodan apontou para uma caixinha quadra-
da à sua frente, em cima da mesa de controle.
Ao lado dela havia alguns botões, enquanto que
a parte superior apresentava um conjunto de
lâmpadas de controle.
— Olhe lá. Com isso posso entrar em conta-
to com Marshall ou com Gucky. Aguardo notí-
cias e antes que cheguem não podemos tomar
nenhuma iniciativa.
— Com os transmissores fictícios podemos
mandar tantas bombas...
— Já recusei uma vez tal proposta, Bell —
lembrou-o Rhodan. — Não quero que nossa
posição seja descoberta. Se deixarmos o serviço
para Marshall e seu grupo, nenhum dos saltado-
res chegará a imaginar que nós é que estamos
atrás desta ação, se é que algum dia cheguem a
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perceber que isto foi uma ação. Pelo contrário,
atribuirão sua derrota muito mais a uma doença
normal.
A cara de Bell parecia um ponto de interro-
gação.
De repente seus olhos se iluminaram.
— Minha inteligência é a mesma que a sua,
mas eu nunca entendi bem de palavras cruzadas
e charadas. Por favor, tenha a gentileza de...
Rhodan teve realmente a gentileza.
— Gucky levou consigo uma multidão de
coisas utilíssimas, a mais útil delas são as bom-
bas do esquecimento.
— As bombas do quê?
— As bombas do esquecimento. Foram de-
senvolvidas na Terra e simultaneamente com
elas também o anti-soro. Resumindo: trata-se
de uma arma bacteriológica que após algum
tempo ataca o invólucro plástico das bombas e
se espalha rapidamente. Todo homem que en-
trar em contato com a bomba, manifesta logo
sintomas de uma doença desconhecida. Placas
vermelhas no rosto, dores na nuca, sensação de
cansaço, etc. Mas o pior vem ainda: o cérebro
da pessoa atingida não funciona mais direito.
Não poderá mais se lembrar de nada. Esquece
tudo. Numa palavra, os atingidos ficam doidos.
— E a isto você dá o nome de conquista pa-
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cífica? — protestou Bell espantado. — Quer,
pois, deixar os goszuls doidos? Que tem isso a
ver com humanidade?
— Não se esqueça do anti-soro. Atua no
sentido contrário. Os doentes se curam imedia-
tamente e a doença não deixa absolutamente
nenhuma conseqüência. É como se nunca tives-
sem ficado doentes.
Bell parecia indeciso.
— Não estou compreendendo nada. Para
que então toda esta palhaçada?
— Os saltadores provêm da mesma raça que
os goszuls, isto é, dos arcônidas. Portanto não
são imunes a nossa doença.
O rosto de Bell se iluminou como um sol
resplandecente.
— Ah... quer dizer então que têm de chegar
até nós, se quiserem obter o antídoto.
Rhodan abanou a cabeça.
— Não havia pensado diretamente nesta hi-
pótese. Para mim o essencial é que daí em di-
ante eles evitem o planeta dos goszuls, como a
própria peste. Se chegarem à conclusão de que
o planeta está perdidamente contaminado, nun-
ca mais voltarão. Você tem outra idéia melhor?
Bell tinha que conceder que não podia haver
uma idéia melhor. Seus cabelos já pareciam
mais deitados um pouco, pois sua incerteza não
36
existia mais. Sabia agora por que Rhodan esta-
va esperando.
***
***
44
RK-071 era um dos robôs de combate que
tinham a incumbência de controlar uma deter-
minada região. Geralmente estes robôs ficavam
em seus abrigos aguardando o sinal de entrar
em ação. Este sinal era transmitido, através do
rádio pelos robôs de vigilância, que existiam em
grande número e cuja missão era controlar per-
manentemente o território de sua jurisdição.
Em geral, era um serviço apenas de rotina, pois
ninguém contava com uma revolta dos inofensi-
vos goszuls, nem mesmo por parte dos descon-
fiados governadores da Terra dos Deuses. Con-
sideravam os nativos como súditos dóceis, que
ainda deveriam estar gratos pela tutela de uma
raça superior.
Os robôs não se deixavam levar por senti-
mentos nem por suposições. Estavam progra-
mados e cumpriam seu dever, que lhes era dita-
do pelo cérebro positrônico. Só se baseavam
em fatos e nada mais.
A operação no banco de areia era um fato.
O robô de vigilância RW-895 registrara esta
alteração e a transmitira ao cérebro central do
seu posto de comando. Ali, a mensagem foi ex-
plorada e tomadas as providências cabíveis. O
robô de combate responsável pela região era o
já mencionado RK-071. Recebeu a ordem de
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ativamento e se pôs em marcha na direção do
rio.
Mas a central de comando do posto de vigi-
lância devia se lembrar ainda dos acontecimen-
tos anteriores, pois não se baseavam apenas
nas informações de um só robô. Sabia-se que
se tratava de um adversário misterioso, que não
devia ser menosprezado, e com toda certeza
não era nenhum habitante deste planeta atrasa-
do.
Tais eram as conclusões lógicas do cérebro
positrônico que tudo dirigia, embora silenciasse
sempre que se perguntava sobre a identidade
do inimigo misterioso. Ninguém devia saber
quem era, ao menos no começo.
Vindos de diversas direções, seis robôs de
combate marchavam em direção ao banco de
areia, para se colocarem sob o comando do
RK-071. Na margem sul do rio, estava de pron-
tidão um pelotão de goszuls de quociente inte-
lectual mais elevado, equipado com armamento
leve, com a incumbência de não permitir a pas-
sagem de ninguém e de prender qualquer pes-
soa suspeita.
Tudo isto aconteceu exatamente enquanto
Gucky e Tako mergulhavam à procura das cai-
xas caídas no fundo do rio, para empilhá-las no
banco de areia. Das duas margens, não se po-
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dia ver bem o que se passava. De vez em quan-
do, os observadores notavam uma figura huma-
na, que podia ser tão bem um goszul como
também um saltador. De qualquer maneira,
aquele pequeno vulto estava causando muita
dor de cabeça ao cérebro positrônico do posto
de comando.
E, de repente, desapareceram as duas figu-
ras, como se tivessem sido dissolvidas, junta-
mente com duas caixas, em pleno ar.
Isto foi para eles, os robôs de combate, o
motivo de ocuparem o banco de areia. Cami-
nharam simplesmente para frente e desapare-
ceram dentro do rio. Assim não perdiam sua
possibilidade de locomoção no espaço, a água
também não lhes apresentava dificuldades.
Com a maior naturalidade, caminhavam no fun-
do do rio e, quando a água começou a ficar
rosa, subiram para o banco de areia. Aí, procu-
raram um esconderijo, para surpreenderem os
dois seres estranhos quando estivessem de vol-
ta. A ordem que haviam recebido era de não
matarem, mas sim de pegar vivos os dois des-
conhecidos.
E exatamente aí é que estava a sorte de
Gucky.
***
47
Mais ou menos a cinco metros da pilha de
caixas, Gucky e Tako se materializaram simulta-
neamente. Este estranho fenômeno não provo-
cou nenhuma reação nos robôs, pois estes
monstros mecânicos não se admiram de nada,
nem mesmo de acontecimentos quase impossí-
veis. Mas o fenômeno foi realmente tão rápido,
que Tako já havia pegado a caixa e iniciado a
volta, quando os quatro robôs se puseram a ca-
minho, abandonando seu esconderijo.
Gucky estava exatamente escolhendo uma
determinada caixa.
O barulho que ouviu às suas costas o obri-
gou a virar para trás. Os quatro monstros mar-
chavam resolutos e ameaçadores na areia solta,
contra ele. Dois deles se desviaram para os la-
dos, para lhe cortar a retirada — aliás, uma coi-
sa muito difícil, no caso de um teleportador,
como veriam logo a seguir.
Gucky deixou a caixa onde estava e se tele-
portou a uma altura de duzentos metros, onde
de novo se materializou. Suas propriedades te-
lecinéticas lhe permitiam pairar normalmente
no ar e, de lá de cima, contemplar calmamente
o desenrolar dos acontecimentos.
Não era difícil perceber o que estava aconte-
cendo.
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Lá no fundo, na margem norte estavam três
outros robôs de combate em posição de senti-
do, aguardando ordens para entrar em ação.
Os goszuls na margem sul do rio estavam um
pouco mais camuflados, mas Gucky os desco-
briu imediatamente. Devia, porém, admitir que
a automatização do sistema de vigilância dos
saltadores era perfeita e funcionava instantane-
amente. No espaço de meia hora, tinham eles
percebido sua atividade na ilha e tomado as
providências cabíveis.
E Tako, que não estava a par de nada, podia
voltar a qualquer momento. Gucky resolveu en-
tão tomar as contramedidas. Em vez de se des-
materializar, deixou-se simplesmente cair. Des-
pencou como uma pedra em cima dos robôs e
com um pequeno desvio caiu a quase cinqüenta
metros deles, na parte leste do banco de areia.
Agora ele poderia se concentrar bastante e pôr
em atividade suas forças telecinéticas.
Um dos robôs de combate se ergueu no ar,
sem maior esforço, antes que Gucky tivesse
tempo para se virar e tomar conhecimento da
situação. Subiu até uma altura de cem metros,
atirando loucamente em volta e foi de tal ma-
neira para o lado até que parou sobre a mar-
gem sul, no trecho cheio de florestas e de ro-
chedos, onde os goszuls tinham tomado posi-
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ção. Gucky não tinha propriamente tempo,
mas não conseguiu vencer a tentação.
E assim, o robô não caiu imediatamente,
mas executou no ar dois loopings completos,
descreveu uma curva maravilhosa em cima dos
goszuls, perplexos, e foi bater com extrema ve-
locidade de encontro a uma rocha na margem,
espatifando sua cabeça metálica. O resto rolou
como sucata nas águas tranqüilas do rio, desa-
parecendo para sempre.
Chegou a vez do segundo robô.
Depois de um passeio artístico no ar, termi-
nou também de encontro ao rochedo, apenas
com a grande diferença de que ele conseguiu
transformar um pedaço da rocha em lava incan-
descente. Isto, porém, apressou seu fim. Sibi-
lando se precipitou nas águas do rio juntamente
com um bloco de pedra em brasa.
Gucky ia se concentrar no terceiro robô exa-
tamente quando Tako voltou. E o japonês se
materializou diretamente entre os dois monstros
que estavam atacando Gucky. Estava tão per-
plexo que nem se mexeu. Felizmente os robôs
não deram muita atenção a Tako. Sua preocu-
pação era, com toda razão, o pequeno rato-cas-
tor, o adversário mais perigoso que era neces-
sário botar fora de combate.
A ordem recebida tinha que ser cumprida.
50
Ainda não tinha sido transmitido o comando de
matar. Os robôs em geral têm muito pouca
consideração consigo mesmo, embora os robôs
de combate formem uma certa exceção. Quan-
do eles estavam em perigo de serem aniquila-
dos pelo adversário, fundia-se automaticamente
o relê de travamento e passavam então a fazer
uso de suas armas mortíferas.
— De volta para o navio — guinchou
Gucky, que julgava ter ainda uns segundos li-
vres. — Eu volto também, quando tudo estiver
normalizado.
Tako obedeceu, desaparecendo no ar.
Gucky pensou na opinião de John a respeito
da humanidade e optou por um espetáculo mui-
to impressionante. Esperava também assim po-
der influenciar beneficamente os goszuls, que
futuramente seriam seus aliados.
Os dois robôs de combate que ainda resta-
vam foram transformados em dois aviões. Exa-
tamente em cima dos goszuls, que naturalmente
não compreendiam o que estava se passando e
acreditavam que os deuses metálicos estavam
loucos, exatamente em cima deles é que os tais
aviões começaram a executar loopings, folhas-
secas e os vôos rasantes assustadores. Final-
mente, como ponto alto da exibição, os dois se
distanciaram, fizeram uma curva de volta e se
51
precipitaram, com velocidade extrema, um con-
tra o outro, até se chocarem, sob enorme ex-
plosão. Enganchados um no outro, caíram os
dois “aviões”, semi-fundidos, nas águas do rio,
onde desapareceram.
Os goszuls acompanhavam o espetáculo
com toda atenção, embora não pudessem expli-
car a razão de tudo. Haveriam de imaginar que
os dois deuses estavam brigando e assim se des-
truíram. Ninguém deles chegaria à conclusão de
que o animalzinho peludo no banco de areia
era o responsável por tudo.
Somente o RK-071 é que chegou à conclu-
são tão absurda e deu a ordem de ataque e de
destruição a seus colegas de aço. A partir daí,
não haveria mais consideração. O mini-adversá-
rio era demasiadamente perigoso para poder
ser preso.
Os monstros marcharam na direção da mar-
gem norte e não hesitaram em mergulhar no
rio. Gucky percebeu o perigo. Sabia que a água
não podia prejudicar o mecanismo dos robôs.
Apanhou uma caixa e a teleportou para o na-
vio.
Tako estava exatamente descrevendo para
John a situação no banco de areia, quando sur-
giu na cabina o rato-castor. Estava bem aperta-
do, pois Kitai e Tama já estavam de volta.
52
— Olha ele aí — exclamou Tako com fisio-
nomia de aliviado. — Que se passou por lá?
Você fugiu?
Apesar da seriedade do momento, Gucky
teve tempo de se sentir ofendido.
— Fugiu...? — repetiu perplexo e encoleri-
zado ao mesmo tempo. — Como poderia ima-
ginar isto? Só tive um pensamento. Kitai, uma
companhia inteira de goszuls está lá no rio es-
perando por um tratamento seu. Quem sabe
você vai transformá-los em nossos bons aliados.
— Uma companhia inteira? — disse Kitai ar-
regalando os olhos. — Que podemos fazer com
eles?
— Muita coisa. Você vai sugerir na mente
deles que devem esquecer todas as outras or-
dens e se dirigirem para o porto. Aqui, eles se-
rão recebidos por nós. Tenho uma missão vital
para estes irmãos.
Kitai queria perguntar ainda alguma coisa,
mas um gesto de John o deixou calado. O tele-
pata já tinha compreendido o plano de Gucky.
— Kitai fará o que você disse — falou diri-
gindo-se a Gucky. — E os armamentos, estão
garantidos?
Gucky se preparou para saltar. Fixou os
olhos em Kitai que ele tinha que levar consigo e
o pegou pela mão, dizendo:
53
— Ainda não. Três robôs de combate estão
lá tentando se apoderar deles. Mas eu vou botar
muita pimenta nesta sopa.
— Robôs de combate? — disse John horro-
rizado. — Como vai se desvencilhar deles?
— Não se preocupe, amigo. Quatro deles eu
já destruí, servindo-me de seus poucos conheci-
mentos de pilotagem. Mais três ou menos três,
não tem maior importância.
Com esta explicação sumária e mais ou me-
nos misteriosa, ele desapareceu; Kitai também
não estava mais na cabina. Tako, julgando-se
preterido, perguntou a John:
— E eu? Posso também...?
— Espera um pouco — resolveu Marshall.
— Gucky vem buscá-lo quando precisar. A úni-
ca coisa que podemos fazer é esperar.
Gucky se materializou. Não se via ainda
nada dos robôs. Deviam estar ainda debaixo
d’água, podendo aparecer a qualquer momento
na praia do banco de areia.
— Do lado de lá, na margem sul, Kitai. Os
goszuls ainda estão em posição de sentido e
não sabem o que pensar das maravilhas que es-
tão presenciando. Tome conta deles e não se
preocupe com o que vai acontecer aqui. É me-
lhor você se esconder para que os robôs não o
vejam.
54
— Que robôs?
— Estão brincando de submarino, mas de-
vem emergir logo — explicou Gucky, continu-
ando a olhar para a praia do banco de areia. —
Mas, vamos embora, não temos muito tempo.
Notou a uns metros de distância da praia um
redemoinho na superfície da água. O primeiro
dos robôs, com sua cabeça metálica apontou
fora d’água.
Gucky gostava de variar. Nada lhe era tão
desagradável como a monotonia. E se ele des-
truísse estes três robôs do mesmo modo como
os quatro primeiros, seria terrivelmente monó-
tono.
De um momento para o outro arquitetou um
plano e o pôs em execução. Lá na margem sul,
havia muitas rochas separadas, que poderia fa-
cilmente comandar telecineticamente. Até que
enfim o rato-castor podia brincar à vontade,
como sua raça lá no Planeta Vagabundo chama
a movimentação da matéria por telecinésia.
Os goszuls, que ainda não se tinham recupe-
rado da primeira surpresa, presenciavam uma
outra. Ao invés de robôs voando, havia agora
rochedos flutuando no ar, em grande fila. Er-
guiam-se da água, na parte rasa da margem,
velejavam num vôo tranqüilo ao longo do rio e
se chocavam de repente contra o espelho das
55
águas, para afundar borbulhantemente. Natural-
mente, os goszuls não podiam saber que sob es-
tes rochedos voadores havia três robôs, cujas
armas poderosíssimas de nada valiam sob a
água.
Finalmente surgiu uma ilha nova de pedra,
bem rente ao banco de areia, completando as-
sim o plano de Gucky. Debaixo desta ilha, sabia
ele, os robôs estariam bem guardados, embora
mais tarde eles conseguissem se libertar, ou tal-
vez não. De qualquer maneira, não era preciso
se preocupar com eles no momento. O fato de
que os robôs soterrados pudessem transmitir à
central o que acontecera com eles, também não
preocupava Gucky. Foi de encontro a Kitai no
esconderijo do banco de areia e perguntou:
— Está tudo pronto?
— Sim, penso que está. Ainda vai levar uns
minutos. Tenho que percorrer toda a margem,
para não escapar ninguém.
— Ótimo, então continue. Vou recomeçar o
transporte das caixas e apanhar Tako. Em meia
hora estará tudo terminado.
Voltou às pilhas de caixas e desapareceu
com uma delas. Depois que Tako voltou, in-
cumbiu-o de transportar o resto do armamento
para o navio, enquanto ele próprio tiraria do
fundo do rio as últimas caixas.
56
Kitai, entrementes, conseguira tudo. Isto se
podia ver agora, como os goszuls abandonavam
sossegados seus abrigos e se punham em forma
para marchar. Um deles assumiu o comando.
Sem se incomodarem mais com os dois ho-
mens e com o rato-castor na ilha, tomaram a
direção do litoral e começaram a caminhar. An-
tes da desembocadura do rio, havia uma ponte,
sabia Kitai. De lá não era muito longe para o
porto.
Gucky chegou.
— Chegarão ao porto amanhã, ao meio-dia,
e se apresentarão aos nossos — sorriu o suges-
tor. — Estão agindo de livre vontade e ainda le-
vam alguns amigos, de maneira que amanhã
nós temos que contar com uma bela multidão
de auxiliares voluntários.
— Poderemos nos utilizar deles — sorriu
Gucky, pegando Kitai pela mão. — Feche os
olhos, irmão, eu o levo para o navio.
Duas horas depois, todo o equipamento es-
tava bem estocado numa das grandes cabinas
da proa, para onde John e seus mutantes ti-
nham mudado, para não deixarem largadas as
preciosas caixas. Com toda calma, podiam ago-
ra examinar o conteúdo das caixas impermeá-
veis.
Gucky os ajudou. Apontou para a pilha de
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pacotes compridos e relativamente chatos, en-
voltos em chapas metálicas e disse:
— O conteúdo é o mesmo, basta abrir uma
delas.
E assim o fizeram. Quando a tampa pulou
fora, os quatro olharam estupefatos para a fila
dupla de bombas pequenas, do tamanho talvez
de uma granada de mão. O invólucro não era
de metal, mas de um material plástico de várias
cores. Gucky apontando para as vermelhas:
— Estas atuam muito depressa. O período
de incubação da infecção é de apenas alguns
dias. Dentro de uma semana, a doença irrom-
pe. Nas outras demora um pouco mais. Aí den-
tro há uma lista exata.
— Guerra bacteriológica — disse John, bai-
xo, sem muito entusiasmo.
— Não se preocupem — disse Gucky, de-
monstrando muita alegria. — Nas caixas ver-
des, lá do outro lado, está o anti-soro. Aliás, es-
tamos diante da deflagração de uma guerra que
vai ser muito interessante.
— Uma guerra interessante? — continuou
Kitai, num tom de reprovação.
Gucky sorriu feliz:
— Esta será de fato interessante.
3
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O bloqueio hipnótico feito por Kitai na men-
te de Geragk não durou muito tempo. Ele havia
voltado para seu alojamento depois de termina-
da a descarga do navio, após haver comunicado
ao robô de vigilância competente a execução
do serviço. Este providenciou imediatamente a
remoção da carga do barco para a rampa do
espaçoporto.
Sentou-se na cama de seu alojamento, apoi-
ou a cabeça com as mãos. Os nervos tremiam-
lhe debaixo da pele bronzeada. Nos olhos mon-
golóides havia um piscar nervoso. Não teria es-
quecido alguma coisa, que lhe parecia muito
importante? Alguma coisa que poderia melho-
rar sua situação perante os deuses?
Por mais que refletisse, não conseguia se li-
vrar do trauma que envolvia sua cabeça como
um cinturão de aço. Quando alguém bateu à
porta, tremeu todo como um criminoso sur-
preendido em flagrante. Exatamente hoje, Ralv
queria conversar alguma coisa com ele — quase
se esquecera disso. Mandou o tardio visitante
entrar e fechou de novo a porta. Ralv era o ca-
beça da organização que pretendia pôr fim no
fantasma dos deuses, e aliás, com violência.
Sua estatura ultrapassava a de Geragk por uns
vinte centímetros. A pele, de um vermelho-
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escuro, exibia pêlos pretos e fortes tendões.
Ralv devia dispor de uma força física descomu-
nal.
— Não se sente bem? — perguntou depois
de ter sentado.
Geragk alçou os ombros.
— Não sei direito como me sinto. Quem
sabe é apenas o trabalho e o calor de hoje. É
como se tivesse um peso amarrado na cabeça.
Ralv olhou para ele com atenção, depois
acrescentou:
— Acontece o mesmo com Rendex, hoje.
Estive em sua casa agora, aliás ele pertencia ao
seu pelotão de estivadores. Será uma casualida-
de?
— Como?
— O fato de ele estar em condições idênti-
cas a você.
Geragk fitou Ralv.
— Alguma coisa aconteceu no navio, mas
eu não me lembro o que foi. Como é que a
gente pode esquecer uma coisa assim? Certa-
mente me lembrarei depois, mas por enquanto,
não me lembro de nada. Que coisa esquisita.
Ralv mudou de assunto.
— Nossos elementos de ligação consegui-
ram capturar um robô de vigilância e estran-
gulá-lo...
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— Vocês assassinaram um deus de metal?
— Não diga besteira. Você sabe tão bem
como eu que toda esta história de deuses e de
deuses de metal é bobagem. Os tais deuses são
seres humanos como nós, possuem naves espa-
ciais com as quais podem voar de estrela para
estrela. É apenas isso. São aventureiros que ex-
ploram a nossa ignorância. Com sua superiori-
dade tecnológica conseguiram escravizar nosso
mundo. Haveremos de expulsá-los do planeta
de Goszul, como chamam nosso mundo.
— Mas capturar um deus de metal, um
robô... O prejuízo não vai provocar a ira dos
deuses? Haverão de nos perseguir com estas
máquinas de combate.
Ralv dava a impressão de ser dono de um
grande segredo.
— Talvez você não saiba ainda, mas nós
conseguimos aliados inesperados. Há algum
tempo, estão aqui no nosso mundo estranhos
que também combatem os deuses e lhes infli-
gem pesados danos.
— Estranhos? — perguntou Geragk, ficando
de um momento para o outro muito pensativo.
— Como pode acontecer que esta palavra me
faz sentir algo diferente? Não estive ocupado
hoje com estranhos?
Meneou a cabeça e cerrou os punhos.
61
— Então? — perguntou Ralv. — Não se
lembra de nada ainda?
— Preciso dormir, Ralv. Quem sabe amanhã
minha cabeça ficará mais clara. Tenho pressen-
timento de que é coisa muito importante mes-
mo. Fora disso, que é que aconteceu mesmo
com o robô que vocês pegaram?
— Que aconteceu com ele? Examinamos
seu interior e constatamos que se trata de uma
simples máquina. Em caso de necessidade po-
deremos também construir tais artefatos, se ti-
vermos as máquinas para isso, o que não levará
muito tempo. Se quisermos expulsar os deuses,
temos que tomar suas fábricas e fazer nossas
espaçonaves, com as quais atingiremos as estre-
las.
— Temos as bases indispensáveis para tais
empreendimentos?
— Está tudo preparado. Já podíamos ter co-
meçado esta noite, se Enzally não nos tivesse
chamado a atenção.
— Enzally? Que quer o vidente?
— Devíamos chamá-lo propriamente de o
receptor, pois ele pode ler o pensamento de
outros homens, mas não apenas o pensamento
dos homens, mas o dos chamados deuses, tam-
bém. E o dos estranhos.
— Dos estranhos? Terá ele ligação com os
62
estranhos?
— Pequena e por poucos momentos. Ele in-
terceptou uma conversa telepática. Os estra-
nhos devem ser também leitores do pensamen-
to. Mas quando ele interveio, as correntes de
pensamento se dissolveram e não ouviu mais
nada. Uma coisa, no entanto, ele ficou saben-
do: Os deuses são também os adversários dos
estranhos. Ocuparam seu planeta natal, mas fo-
ram expulsos. Vieram para cá para destruírem
uma assembléia geral dos deuses, que chamam,
aliás, de saltadores. Nós mesmos já presencia-
mos como eles foram em parte bem sucedidos.
— Aliados — raciocinou Geragk. — Nunca
poderíamos ter contado com amigos e agora de
repente os temos. Mas por que não se apresen-
tam? Por que se escondem e não nos procu-
ram?
— Terão seus motivos. Enzally tenta entrar
em contato com eles, até agora sem resultado.
Ele me avisará quando souber de alguma coisa.
Você compreende, nossa situação não é deses-
peradora, mas é mais prudente que aguarde-
mos um pouco.
— Se os deuses já não estiverem cientes de
tudo, em virtude do desaparecimento de um de
seus robôs.
— Temos que contar com isto — disse Ralv
63
levantando-se. — E procure se lembrar do que
aconteceu hoje no barco. É muito singular que
todos que estiveram sob seu comando hoje, es-
tão sofrendo de perda da memória. Há alguma
lebre escondida por aí.
Geragk abriu-lhe a porta.
— Mas que será? — disse ele, sem esperar
nem receber resposta.
***
***
***
***
***
***
***
159
Os saltadores têm pavor do FLAGELO
DO ESQUECIMENTO. Mais pavor do que da
própria morte. Por este motivo, abandonam
furtivamente o planeta e libertam os goszuls,
que até então serviam de escravos para eles.
Que acontecerá, porém, se os saltadores
anteciparem sua volta?
Perry Rhodan já tem resposta para esta
eventualidade. Chama-se: O PLANETA LOU-
CO, o título do novo volume de Perry Rho-
dan.
*
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ÐØØM SCANS
PROJETO FUTURÂMICA ESPACIAL
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