Vera Rosane Rodrigues de Oliveira
Vera Rosane Rodrigues de Oliveira
Vera Rosane Rodrigues de Oliveira
Porto Alegre
2006
VERA ROSANE RODRIGUES DE OLIVEIRA
Porto Alegre
2006
Agradeço às companheiras e companheiros, que com suas vivências,
lutas e experiências contribuíram para a construção dessa dissertação.
Aos meus filhos Juliana e Rafael, que com amor e afeto me incentivaram a
continuar quando queria desistir.
Com carinho agradeço à meu Nego, Edson Augusto, que com cuidado e paciência
me ensinou a lutar pela causa negra.
Aos amigos e parceiros do movimento negro, pois sem sua resistência cotidiana esta
dissertação não teria sentido.
quando eu tiver
então eu comprarei
larga
bonita
e ficarei mostrando
de gente engravatada...
Leon Trotsky
RESUMO
que reúne o Movimento Social Negro, Poder Público e uma Instituição de Ensino
Brasileira.
contradichos generados por las estructuras sociales para los sujetos sociales que
los caminos que una acción colectiva que reúne el Movimiento Social Negro, el
se pueda vislumbrar una sociedad que respete la diversidad sociocultural del pueblo
Brasileño.
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 8
necessita ser explicitada, neste caso, por estar estudando sobre algo que se
caracteriza por ser a parte mais complexa desta pesquisa. A minha história de vida e
9
individual e história coletiva. Foi de certa forma, o capítulo que mais me falou, pois
Ou mesmo, ter a nitidez que minha história pessoal e de minha família apesar
de única e semelhante à história não só dos alunos sujeitos sociais desta pesquisa,
mas de muitos negros e negras, e que necessita ser escrita e reescrita para darmos
não apenas cor a população Brasileira, mas diversidade à história de nosso país, a
experiência de vida.
Racista, também tem dois subtítulos, A luta negra pela escolarização e a política de
mesmo apresentando sentido nesta dissertação, são trazidas como elementos para
se perceber que o fato de ingressarem alunos com realidades diferentes fazem com
da defesa do projeto de dissertação ainda não o tinha de fato incorporado, não tinha
12
ciência do que significava para mim a concepção de etnia ou de raça. Uma das
sugestões trazidas por uma das examinadoras do projeto de qualificação foi que eu
utilizasse o termo raça, pelo peso social que representa para o movimento negro,
Não tinha muito nítida estas distinções. Sabia, no entanto, que não desejava a entrar
usar tanto a descrição de etnia ou de raça de forma isolada exigiria. Pois, uma das
racismo, pois o país é miscigenado, nem tão negros, nem tão brancos. Bem, com a
sugestão dada pela Professora Georgina de utilizar o termo raça, retomei a leitura de
1
O artigo do Professor ainda não foi publicado. Foi cedido ao Movimento Negro para discussão, por
isso tive acesso ao conteúdo.
13
realidade; no entanto, não encontrei até hoje nenhum negro que combatesse o
racismo e ao mesmo tempo não fosse buscar um asé2 em seu terreiro. Quero dizer
com isso, que existe uma realidade encoberta e que necessita ser desvelada para
Mas ,como disse inicialmente, procuro não entrar na polêmica entre o termo
os muitos trabalhos escolhi o livro Orfeu e Poder. Movimento Negro no Rio e São
Paulo, do Cientista Político african-american Michael Hanchard, (2001), onde ele diz
que o termo,
2
Esta palavra escrita com X expressa a forma de linguagem do Português do Brasil. Visto que, é uma
palavra de origem Iorubana e no Ioruba não existe a letra X (nos alfabetos africanos), a escrita correta
é com S, e acento agudo no E.
14
penso sobre o termo raça. Para isso trago Stuart Hall (2003) que afirma que
base estrutural. E, entendo, assim, como Hall que o racismo como prática discursiva,
possui uma lógica própria. Tenta justificar as diferenças sociais e culturais que
3
Korel Kosik no livro “Dialética do Conceito” propõe o termo pseudo-concreticidade. Aqui pseudo-
exclusão está sendo utilizada como forma de entender que a exclusão não se refere a retirada da
estrutura social vigente, pois os grupos ditos “excluídos”, só o são em relação ao mercado
15
de igual forma, pois ele cria as categorias de distinção do que é ou não aceito,
Lei 10.639/2003 que trata do Ensino da História da África, e as histórias dos negros
racial. Para isso, tinha como objeto a análise da implementação do Projeto de Cotas
na Rede Metodista de Ensino – IPA, tendo como público alvo os alunos que
consumidor, pois permanecem parte da estrutura como exercito de reserva, tanto para o trabalho
como para o possível consumo.
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série de entrevistas.
pública desta Universidade, ainda dar conta da vida familiar e cotidiana, sem
conseguiria concretizar o que havia me proposto fazer. É fato que o caminho que
deveria escolher tinha de levar todos estes elementos em consideração, mas saber
qualificação. Deslocamento esse que me fez compreender mais uma vez o que a
banca examinadora de forma muito carinhosa e enfática, quiz dizer ao falar que meu
projeto continha sonhos e aspirações de uma vida inteira. Num primeiro momento,
indagar, o que será de fato que as professoras da banca desejavam me dizer? Seria
que por mais familiaridade que se tenha com a problemática de pesquisa, ou por
que não nos permitem materializar o sonho de uma vida inteira em uma dissertação.
E, nem deve ser esse o nosso propósito. Cabe ao pesquisador ter esta
compreensão, pois os sonhos da vida toda são fundamentais para nos mantermos
vivos, mas até mesmo se queremos não apenas sonhar devemos saber como
ele enfatiza que “Não existe pesquisa sem um problema de pesquisa(...) Ás vezes, a
não puder contar com uma boa orientação,...”. E mais, a questão que subjetivamente
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me possibilitou encontrar o sul nesta dissertação, foi uma frase dita pela Professora
Malvina durante sua argüição, na banca de qualificação do projeto, qual seja: (...)A
esta realidade”. Bem, com todas estas contribuições consegui compreender onde se
indagações que me movem a pesquisar não são apenas de cunho acadêmico, mas
reúnem elementos de uma vida toda, o que me torna única neste espaço e tempo, e
racial.
de trabalho dos negros é duas horas superior a dos brancos e 44% dos negros
40% são negros. Com relação ao tempo médio de escolarização, temos os jovens
negros que encontram-se na faixa de 25 anos de idade, com um média de 6,1 anos
de estudos para 8,4 anos os jovens brancos. Vemos que 23 milhões de crianças não
têm acesso à escola. Destas, cerca de 20 milhões são negras. No ensino médio
observamos que 47% dos negros não concluem o curso e a evasão escolar atinge
entendo ter como constitutivo a dominação racial são estas que permeiam nosso
ainda existiam elementos que necessitavam de um certo ajuste para dar sentido ao
pelo problema e objetivo, ou a sugestão de ler o Stuart Hall, que com muito carinho
Bem, com tantos desafios escolhi iniciar lendo e relendo Stuart Hall, que é o
muitos outros que dialogarei nesta dissertação. Trago ainda, outros momentos
20
minha mãe de Santo, ou também chamada Yalorixá. E quando explicava para ela o
com a ciência e a escrita, pra nós o Orixá que trata destas questões, aqui no
Nosso povo trabalha muito com a oralidade, mas em nossa visão de mundo, a
que vive nosso povo tu tem de mostrar o que para nós negros é o principio de tudo,
nossa compreensão de circular ou de circularidade. Pra nós como não existe o bem
e o mal, também nada tem apenas fim, é sempre um novo início. As coisas estão em
constantes movimento e processo, por isso nossas religiões foram e são o nosso
4
Todos os depoimentos dos entrevistados durante o processo de pesquisa serão registrados
utilizando a letra itálica ao longo do texto, neste mesmo formato. Os registros das entrevistas e das
observações serão identificados quando autorizados e serão apresentados de forma genérica
segundo o critério que indica sua inclusão no grupo (professor, aluno, militante) e identificados com
um número seqüencial. Sempre que possível será preservada a íntegra da fala para permitir ao leitor
entender o que diz o sujeito da pesquisa enquanto tal e não apenas no recorte que possa ser
pensado por mim, enquanto pesquisadora.
21
Tenho que admitir que uma mulher negra de quase 60 anos de idade, e mais
de 20 anos de Feitura no Santo, aposentada como técnica em enfermagem
conseguiu sintetizar os elementos que são importantes tanto para apresentação do
que desejava mostrar, e mais, deu a tônica que me faltava para dizer: porque nossa
religiosidade têm sentido impar em nossa construção social. Com a lição dada por
minha Yalorixá abri a apresentação do projeto com a balança de Xangô, pondo nos
pratos da balança de um lado os elementos de exploração e dominação racial e de
outro os explorados e dominados.
5
Sempre que uso o pronome possessivo na primeira pessoa do plural estou me referindo ao que vejo
como condição coletiva dos negros e negras que vivem em nosso país.
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tradições que são preservados através de nossas crenças sejam vistos como um
legado de contribuição social.
Esses fatos possibilitaram entender esta pesquisa enquanto uma das formas
de contribuição do conhecimento e da tradição da população negra, que vem se
mantendo pela oralidade e necessita que seja escrita através dos elementos
valorizados pela sociedade, que é a ciência, sem abrir mão dos valores e das
tradições neles contido. Ao longo deste processo de pesquisa, que foi uma busca e
um conflito permanente entre a cientista, a mulher negra e a educadora, enfatizo que
só em ter o movimento de fazer e me re-fazer enquanto parte deste todo, dá valor a
esta dissertação. Durante muito tempo, tive um receio em escrever sobre as
questões raciais que aqui apresento, por no fundo ser algo que eu mesmo enquanto
cientista ou mesmo militante não tinha resolvido para comigo.
6
As idéias dos entrevistados mesmo que aparentemente longas são apresentadas como unidades de
expressões, a fim de que o leitor, possa conhecer o contexto das afirmações que problematizo.
23
uma Universidade Privada, mas que tinham elementos inspirados nesta Lei que
universidade. Este fato, pela importância que teve na articulação da gestão pública,
sociais, neste caso, negros e não negros permitiu assim, o diálogo que eu esperava
Rio Grande do Sul. Tanto o estágio docente que fiz, na disciplina de Sociologia da
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Educação (EDU 01) no primeiro semestre de 20057, como o convite feito por duas
espaço de sala de aula, de forma a vir refletir não apenas uma constituição numérica
pelo menos nas entrevistas que fiz com os alunos e através do relato do professor
que entrevistei, percebi que esta dimensão, até o momento, não foi a preocupação
espaço de sala de aula, e eles me disseram que não era trabalhado. Mas, ao mesmo
tempo, me informavam que havia conflitos em sala de aula devido a estas questões.
7
Trabalhei com duas turmas a “A” e a “B”, num total de 20h. Onde tive quase 60 alunos e apenas 5
deles eram negros.
8
Disciplina EDU 02 Identidade Docente. Três turmas, onde trabalhei com quase 60 alunos, onde 5
deles se identificavam como negros.
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pela instituição para receber os alunos oriundos das cotas. E o professor salientou
que no início do processo, fizeram uma palestra, mas que existem problemas, não
apenas com relação a estas questões, mas mesmo com as disciplinas de caráter
mais humanista que são ministradas em um auditório para 300 pessoas, não
combinados permitem uma maior compreensão entre o dito e o feito, entre a vontade
consubstanciando na realidade.
tangencialmente é relevante para análise foi uma tarefa muito árdua. Mas como se
diz no Terreiro, a força dos Orixás sempre nos mostra o caminho. E somente o Orixá
Tempo pode me ajudar. Assim, consegui, não apenas com auxílio trazido pela
Referência Afro Brasileiro do Rio Grande do Sul, que tem finalidade a formação do
organizações do Movimento Negro de Porto Alegre, que são desde ONG’s, Terreiros
grupo, o qual faço parte como militante o MNU - Movimento Negro Unificado, que e
uma Organização com fim mais político e de Ação para o Combate ao Racismo,
processo da Política Pública de Cotas na UFRGS. Fez parte ainda, dos elementos
que contribuíram para feitura desta dissertação as aulas que ministrei em meu
racial.
alunos bolsistas não encontrei problemas para obter entrevistas, desde a época do
compreendida e transformada.
responsável pelo projeto. Após varias tentativas tanto por telefone, como por via
me foi indicado a ONG Centro Ecumênico de Cultura Negra como contato para
entrevista. Mais precisamente entre março e abril de 2006, busquei nova forma de
contato com o IPA, e recebi uma outra indicação de nome de contato da Rede
Metodista, deixei recados na secretaria eletrônica e não tive nenhum tipo de retorno.
Também, fiz várias incursões tanto, por telefone, quanto por e-mail para conseguir o
acesso junto ao Centro Ecumênico e não obtive retorno, sequer dos e-mails
fato do CECUNE não me conceder entrevista, mas, de fato, isso é só uma suposição
central desta dissertação não era o estudo de caso do IPA, e sim, a análise das
encontradas na coleta dos dados, mas, sobretudo pelo foco amplo em que estavam
análise das duas Leis a LP 73/1999 e a Lei 10.639/2003, por mais pertinente que
seja seu estudo, necessitaria um tempo superior ao que dispunha para execução da
dissertação.
Com base nesta trajetória tenho como problema desta pesquisa “Analisar a
partir da LP 73/1999, que institui cota nas Universidades quais as formas que estão
em sala de aula.
30
pesquisados;
trabalho?
públicas?
2.3.3 Como é visto pela comunidade escolar a LP 73/1999 de Cotas para negros na
UFRGS?
31
estruturada.
construção/produção de conhecimento.
E ter esta preocupação foi um dos elementos que me fez ter cuidado junto
concepções e o que os sujeitos sociais me dizem. E mais, saber que a ciência não é
neutra e o pesquisador, por mais bem intencionado que seja, de uma forma ou
que, exigiu da minha parte deixar as pré-noções de militante ao largo e procurar ser
a socióloga pesquisadora que tem aqui uma tarefa educacional junto aos sujeitos
32
sociais, mesmo tendo consciência de que não sou neutra, devo cuidar com minhas
indivíduos e não apenas falar sobre os indivíduos. Chesneaux (1965), trago esta
concepção do autor para expressar a preocupação que o pesquisador deve ter com
os indivíduos, ou seja, como o dito por ele: não apenas entender a historia sobre os
não assumam postura de classe frente a seus papeis sociais. Assumem sim, pois
objeto que escolho para analisar até a forma de inserção no diálogo e que constituo
de vida e dos processos subjetivos que ocorrem no cotidiano dos grupos, porque ele
observação não deve ser encarada como simples técnica de coleta de dados, mas
ação humana.
33
relação de confiança com os sujeitos, ter sensibilidade com as pessoas, ser bom
Anti-Racista da Universidade Federal. O primeiro contato que fiz foi com uma aluna
2003. Ao entrevistar a aluna “Luanda” me foram indicado por ela, mais 3 alunos
Evidencio que por ter participado de ações de manifestação públicas chamadas por
movimento negro da qual faço parte, já conhecia os sujeitos que compõe o GT. Mas,
entrevista da amostra.
Fórum Estadual das Religiões de Matriz Africana. Observei através das entrevistas
também, o Pró-Reitor de Graduação, que faz parte do Grupo Institucional criado pela
34
Os resultados obtidos não têm caráter generalizante. Eles são úteis para
fornecer “insight” sobre o lado subjetivo dos estudos e pode sugerir novas variáveis
que podem levar a uma reorganização da pesquisa. Deste modo esta pesquisa
estudar e compreender para além do conhecer e sim, ver o sentido que expresso.
bastava apenas coletar dados, realizar entrevista, pois, para dar sentido à pesquisa
massa, nos debates expressos por vários intelectuais nos principais jornais do país.
Esta foi a forma que encontrei para descrever o debate em curso sobre as
ZUMBI+10. Esta lista divulga o debate racial do movimento negro organizado pelas
organismos políticos.
Tenho de dizer também, existem hiatos que não são respondidos pela
racionalidade cientifica, mas que permeiam este trabalho que entendo que esteja
marxismo durante toda minha existência, e entendo o método marxista como forma
marxismo não explica tudo. E sei que Marx ao escrever o método dialético não tinha
apenas a aparência.
partida, ainda que seja o ponto de partida o resultado“o o concreto é concreto porque é a síntese de
muitas determinações. Por, não comoefetivo e, portanto, o ponto de partida também da intuição e da
porquê que o IPA, uma Instituição de Ensino Superior, voltada à educação dos filhos
da classe alta ou média alta, (como dito por um professor em sua entrevista) estaria
para negros, visto que, nem mesmo as universidades públicas conseguiram ainda,
são contrárias e permitem uma coerência interna ao fenômeno. Com isso, entendi
que deveria me debruçar sobre Lei de Diretrizes da Educação Brasileira, é ela que
públicas para setor específico da população. Assim, percebi que necessitava fazer
lógica do movimento negro e a lógica da Instituição privada que permite que seja
39
possível de ser visto na realidade como lógica interna presente nesta realidade e
que não necessariamente é oposta ou que ocorre no mesmo espaço como formas
combinadas e complementares.
Instituição privada e não pública? Pois em última análise uma Instituição privada
necessita do lucro, e uma política de ação afirmativa em tese, não gera lucro. Esse
público privado.
Entre vários autores que trabalham essa temática, selecionei estes dois
desta pesquisa, (Maria da Gloria Gohn – História dos Movimentos e Lutas Sociais –
público, destituição da fala e anulação da política) visto que esta perspectiva me fez
Lênin ainda, Hegel percebeu de forma brilhante a dialética das coisas (fenômenos, o
mundo a natureza) na dialética dos conceitos, mas salienta a dialética das coisas
produz a dialética das idéias, e não o inverso. Com base nestas definições retorno a
Esta talvez tenha sido a maior das descobertas de construção teórica que
qualificação do projeto,
específicas e não a todo e qualquer realidade. Por isso percebo que tenho de ter um
isso, não digo que não tenhamos conclusões a tirar dos fatos e fenômenos
toda uma série de gerações, cada uma das quais aos ombros da anterior e
Alemã (1984, p. 27) que: o “mundo sensível não é uma coisa dada diretamente da
eternidade, sempre igual a si mesma, mas antes do produto da industria e do estado em que se
de(Marx, 1982,pg.17/18)
com uma das mais tangenciais polêmicas tanto do movimento negro quanto da
sociedade de uma forma geral. Qual seja: No que tange ao movimento negro existe
pode-se dizer duas vertentes de ação e pensamento, uma que traduz as questões
fundador desta vertente teórica Stuart Hall. E como expressão na sociedade desta
Cotas.
43
Por outro lado se tem à perspectiva do racismo expressa por uma variação
pelas teorias marxistas, como por exemplo na obra Democracia Contra Capitalismo
de Ellen Wood (2003), e tem como centro de sua explicação a relação existente
com raras excessões se tem negros) que se utiliza das diferenciações entre os
indivíduos para dominá-los em nome do capital. E que nesta pesquisa trago como
do movimento social negro, que aqui no Estado do Rio Grande do Sul trabalha com
de classe é o intuito desta pesquisa, pois assim como o dito por Tatiana9 “...não há
como tu fazer luta de classes sem tu lutar lado a lado contra o racismo. Porque o
9
As entrevistas que consegui a autorização dos entrevistados identificarei os sujeitos da pesquisa
pelo primeiro nome.
44
para um segmento social específico. Ao se fazer este movimento vê-se que não há
como precursor social o Movimento Social Negro através das diversas organizações
e grupos que o constituiu, e próprio processo que vem sendo gestado na luta de
autores Africanos e marxistas Amílcar Cabral e Franz Fanon que por caminhos
73/1999, que institui cota nas Universidades, como Política pública de Ação
Alegre – RS, é que com base nas 7 entrevistas (com alunos, professores e
alunos e 1 professor do IPA, e por fim, dos vários diálogos e depoimentos que
46
selecionei da página Zumbi +10, uma página construída pelo movimento negro do
apresentam poucas variações de entrevistado para entrevistado, pois o tom foi dado
pelo próprio entrevistado. Contudo, construí 4 eixos centrais nos entrevistados, que
são:
10
Está página há mais de um ano vem socializado todas as informações da implementação da Lei de
Cotas em vários estados do país, e que fui dando forma e consolidando esta pesquisa.
47
pedagógico.
Como dizia Marx (1987, p. 4), “todo começo em qualquer ciência é sempre
difícil”. No entanto, não somente os inícios são difíceis, mas descrever o processo é
quando ela dizia: “várias vezes pensou em desistir de estudar pelas dificuldades
encontradas por causas das diferenças. Que eu só uma pessoa que moro na
mal estar que ela sentia no curso de letras, após ter começado a ministrar aulas em
Ao perceber através das falas das alunas que esta fala poderia ser minha ou
relações que oprime, discrimina, e invisibiliza a todos que não detêm capital.
De uma forma muito singular ter vivenciado enquanto teoria e prática esta
pesquisa fez com que ao final surgissem mais idéias e focos. No entanto, escolher e
manter-se fiel às escolhas para futuramente poder avançar foi o maior aprendizado.
Desta forma fazendo que se tenha muito mais dificuldades em escolher uma entre
familiares não são reconhecidos como constitutivos de um saber social, logo, não se
percebem enquanto sujeitos de um fazer social. Assim como ainda nos diz Fanon:
Essa dimensão psicológica que faz com que os negros tenham dificuldades
exigência frente a tudo que fazem, precisam ser melhor analisado. Mas abrir este
prisma exigiria maior aporte teórico que no momento não tenho como dar conta.
fato com a vida e o vivido pelos sujeitos. Ao começar a detectar que minha intuição
não era vazia e todos os entrevistados de uma ou outra forma foram salientando os
50
aspectos que buscava, isso foi me dando animo a ponto de poder abrir mão das
dos “viventes”, dos sujeitos que fazem a ação foi e é uma ótima perspectiva de
análise.
militância. Bem, existe uma série de elementos que podem contribuir em algum tipo
existência moral.
deste país. E essa pesquisa mostra que por menor que seja a ação ela pode
dizia o celebre personagem da literatura mundial Dom Quixote, Sonho que sonha
Luanda, o Ezequiel, o Alexandre que teve de deixar o curso para trabalhar, a Flavia
ou mesmo eu, somos todos alunos negros, oriundos das classes populares e que
juntamente com professores como Maria Aparecida, o Carlos, a Paré e outros, vem
Para que num futuro próximo as crianças como Juliana, Rafael, Camila,
Mauro, Aline, Rafai e tantas outros não comecem a trabalhar aos 9 anos de idade,
como se fossem adultos, e tenham sonho de um dia poder cursar uma universidade
que ensine que Zumbi dos Palmares foi um líder, assim como Bento Gonçalves o
herói Farroupilha que lutou pela dignidade de seu povo. E que a história dos negros
neste país é dor e sofrimento, mas eles com garra e luta resistiram e contribuíram
realidade vivida de discriminação e racismo, na busca por uma nova realidade, com
que não são apenas a divisão social do trabalho, mas também, a divisão sexual, a
raciais não dizem respeito apenas aos negros e sim ao conjunto dos trabalhadores.
Com esta colocação percebo que existem dois limites que necessitam ser
econômica que tem conseqüências no fazer político, tem como base constitutiva
olhar com esse ótica, quando nos reportamos aos dados estatísticos que mostram
sociais construídas pelo movimento negro como forma de construção de uma contra-
reivindicações, são por um lado, instituídas e incorporadas pelo Estado, e por outro,
Qual seja, utilizo o referencial de ideologia trazida em Marx para explicar o racismo,.
existem ideologias.
hegemônicas dos grupos antagônicos, ou seja, não como a IDEOLOGIA, mas como
capitalista que abrange todos os trabalhadores. E vemos isso, pelas mais diversas
mas também, cria uma exploração racial, que é consubstanciada nos mecanismos
55
negros que não tem compreensão deste processo, sendo assim, uma falsificação da
realidade. Contudo a luta negra pelo prisma da mudança adquire sentido na busca
social. Desta forma a luta anti-discriminação contribui para a luta de classes, pois
dou sentido a linha que conduz minha práxis. E concebo como práxis de forma geral,
universal, criativa e autocriativa, por meio da qual o homem cria (faz, produz), e
Ao conceber como práxis a coerência entre como vivo (meus atos) e teorizo
Diferentes do preconceito que deriva de uma opinião ou idéia que se forma sobre
longo da história se reporta a condição da hierarquia social, onde se tem como eixo
a economia de mercado.
igualdade foi tida como consolidada. No entanto na prática o que se percebia era a
grande disparidade entre aqueles poucos que muito tem e os muitos que muito
outras.
que por vários fatores o que se tem na prática são as grandes desigualdades.
discriminação racial.
posição que lhe permite tirar vantagem de outros. Segundo a tradição marxista a
desigualdades, que faz com que entre os sujeitos da mesma classe social, se tenha
(2006, p. 1-2), ele afirma que: As discussões sobre pobreza urbana ou sobre
afrodescendentes. Ele salienta quatro razões para estas dificuldades quais sejam:
análise a contribuição desta corrente teórica algo que visa negar aos membros de
serviços, são criadas condições sob as quais esses grupos não podem fazer mais do
discriminação, opera com base em um grupo de fatores: ela funciona em relação aos
da UFRG, tem pelo menos três dissertações que explicam tais formas de
essa questão que é uma das mais importantes - as diferenças salariais entre
determina a vida, é a vida que determina a consciência”. A vida objetiva com toda as
suas contradições faz com que minha história tenha similitude às histórias de
diversidade.
ele salienta que trazer “a questão da diversidade para o debate hoje é colocá-la no
2004, p. 51).
para a transformação desta estatística e das estruturas que permitem que ela exista,
11
Saliento a importância deste seminário, por ser o 1º Institucional da Universidade, e que foi
construído por mim, enquanto gestora pública, pelo Movimento Negro Organizado, pela SEPPIR e
pela Prefeitura de Porto Alegre.
12
Silva, Cidinha da - Ações Afirmativas em Educação. Ed. Selo Negro, 2003, p. 25.
62
deste projeto.
humilhações relacionadas a minha raça, nem tampouco o motivo pelo qual tudo que
fosse expresso sobre minha cultura era pejorativo. Parafraseando o grupo musical O
23), que são os homens que desenvolvem a sua produção material e o seu
63
intercâmbio material que, ao mudarem esta sua realidade, mudam também o seu
pensamentos.
O que antes poderia ser apenas uma frase de impacto, ou seja, não é a
consciência, adquire uma expressão concreta em minha vida. Pois, trabalhava 20h
semanais, fazendo as mesmas tarefas que os colegas que tinham carteira assinada
inferior.
pois nunca podia acompanhá-las em suas festas ou apenas ir para casa de alguma
para fazer os trabalhos de aula, ou mesmo ir fazer um programa que elas muito
gostavam, tomar chá comendo guloseimas e jogando conversa fora. Nesta época eu
já era ativista no grupo de jovens da Igreja, e sempre preferia, quando não estava
vejo que de minha juventude a juventude das jovens que entrevistei, existe uma
língua inglesa, condição importante exigida pelo mercado de trabalho. Não consegui
terminar o primeiro ano do curso, pois o mesmo funcionava por trimestre, onde a
exigência para prosseguir era apenas a aprovação no trimestre. Tinha todo o curso
curso pago por uma bolsa integral. No entanto, não consegui dar conta de estudar a
Alexandre (aluno do IPA), e posteriormente soube que ele teve de largar o curso no
Ao rever esta fase de minha vida, mesmo que não esteja usando a teoria da
violência simbólica propostas por Bourdieu, compreendo o que ele (Bourdieu 2001,
processo de construção de novas aspirações, pois se não fosse o fato de meu pai
construção civil.
pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, no quadro dos Estatutários. Também
mesmo ano inicio, paralelamente, um outro patamar em minha militância, agora nos
movimentos negro onde eu conjuntamente com meus irmãos fundamos uma ONG,
13
Não trago aqui a questão da educação como o centro para garantia de emprego, mas saliento a
preponderância da mesma em uma realidade que tem como exigência para o emprego um
determinado grau de escolarização.
66
vida objetiva me leva a entender o sentimento trazido por Luanda, quando fala que:
população negra não tinha emprego, e em especial, ser motorista que era uma
profissão que nesta época exigia qualificação. Por outro lado, exercia um papel de
aglutinava não apenas os homens em torno das partidas, mas também suas
pluvial. Essa realidade vivida por mim, somasse a mesma realidade descrita por
decorrência deste fato, no entanto sua família teve papel singular em sua
permanência.
Damata, Saviani, Furtado, Oliven e tantos outros autores, bem como a influência dos
67
história de vida de meus país como lutadores, em especial a história de meu pai ou
encontrar tempo para ter paixão por literatura e me ensinar o gosto pela leitura. Ou
mesmo, a história de vida de minha avó paterna, que pertence a terceira geração de
negros livres após a lei do ventre livre e, aos 13 anos de idade casa-se com um
homem 20 anos mais velho, e tem 21 filhos, mas ao mesmo tempo é uma mulher
lutadora. Em Alegrete, sua cidade natal, constrói o primeiro Clube para negros na
seus avós, que foram doadas por um senhor de escravos), que possuía na cidade,
A minha história somente compreendida, por mim, muito mais tarde, conduz-
leva que milhares de negros como eu, com trajetória muito semelhante às minhas, a
Em 1989 contrai matrimônio, mais tarde me tornei mãe, o que deu um novo
sentido à minha existência. A partir desse momento, todas as perguntas que eu fazia
sobre a forma diferente como eu era tratada, até mesmo por aqueles que pertencem
temer que eles passassem por todas a angústias, discriminações e opressões que
passei, tanto na escola como na vida, pois como diz Bourdieu (2001, p. 46)
68
essas condições objetivas que definem as atitudes dos país e dominam as escolhas
importantes da carreira escolar regem, também, a atitude das crianças diante dessas
Entendo isso, por minha vivência enquanto mãe, pois vejo o quão é difícil para as
crianças e jovens trabalharem com situações que não entendem em sua plenitude.
com situações pessoais conflitantes, e que cabem ser explicitadas, pois apesar de
singulares fazem parte da vivencia das crianças negras. Um dos conflitos vividos, foi
o fato de minha filha passar por uma fase de stress, e em decorrência disto estava
perdendo literalmente os cabelos e não queria ir a aula porque todos iam rir dela. Eu
dizia para ela: - filha você esta doente e teus colegas vão entender. Então ela aos
prantos me dizia. – Mãe eles vão rir de mim como faziam quando era criança, e
ninguém queria trabalhar comigo porque eu era negra e tinha o cabelo ruim.
Ter ciência deste fato, só me move a cada vez mais, buscar elementos para
sindicais. Vejo que, mesmo entre meus pares, a discriminação era algo presente,
tanto de raça, quanto de gênero. Desnuda-se aos meus olhos a teoria que a única
estive na direção do sindicato sofri todas as formas de opressão por ser mulher e
negra. Esta dimensão vivida me auxilia, a perceber todo a exploração de classe, sob
seu próprio fazer. Percebi isto tanto na inter-relação dos acadêmicos que se
conhecer mais a fundo autores que trabalham com estas questões e, me deparei
Meu primeiro trabalho rumo a esta ação foi um Projeto intitulado Resgate
cidade do Estado do Rio Grande do Sul. A principal descoberta que fiz ao longo da
maioria a população era da raça negra e composta por mulheres, que historicamente
para aguçar a mente curiosa de uma cientista social, descobri ainda, que Alvorada é
Como cientista social, mulher e negra que sempre procurei ler além da
superficialidade das coisas, já tinha uma grande intuição do porque a cidade era tida
14
Como é denominado os moradores da Cidade de Alvorada.
71
Pela primeira vez, tinha diante de mim, não só a intuição de que para além
através do exposto por IANNI (1988, p. 87), fica evidente a relação do capitalismo
objetiva, que uma cidade ao caracterizar-se nitidamente como negra e com ênfase
15
Os registros eram superior tanto em número de ocorrências registradas, quanto o tipo de delito
eram mais graves em Novo Hamburgo, que em Alvorada.
72
urbanização, pois demandaria grande dedicação e não é este o foco deste estudo,
mas, saliento apenas que, no processo de compreensão mais global dos elementos,
saliento a importância da pesquisa ter sido feita pela Universidade Federal do Rio
realizado, encaminhamos todas as fitas das gravações feitas mas, todo este
enquanto esfera pública de poder a serviço das comunidades. Assim, esta distinção
que dialoga com a implementação das Cotas na UFRGS e não em uma Instituição
privada.
O livro construído com base na pesquisa realizada, não deu crédito algum
parece mais um romance onde não existem sujeitos sociais concretos, que conta a
Trazer minha história é também falar dos sujeitos sociais desta pesquisa,
na universidade, por serem negras, entendo o que querem dizer, por já ter passado
por isso. Ou mesmo quando dizem que começam a vislumbrar outros horizontes
dos Saberes, seja dando aulas nos Cursinhos Pré-Vestibulares, organizados por
dos professores como a Maria Aparecida e o José Carlos, onde a história da Cida
enquanto branca que incorpora a luta por Cotas para negros e índios, por entender o
utilizando o escrito pelo Poeta Negro Solano Trindade Nem todo Negro é meu irmão,
novo, nesta busca, é analisar as formas, que ao longo das lutas, foram construindo
sociedade.
* Professor José Carlos dos Anjos é professor titular do Inst. Filosofia e Ciências Humanas
Movimento de combate a discriminação racial que tem privilegia como eixo central
que dão origem as mais variadas formas de exploração social, que se apresentam
nova ordem contra-hegemônica permite as bases para uma sociedade em que tenha
Pois como salienta Lia Faria em seu artigo intitulado O papel da Escola no
Giroux (1988, p. 32), “a escola é uma das esferas públicas, juntamente com as
ainda neste período a Lei Eusébio de Queirós, que aboli o trafico negreiro no Brasil,
país”. A história oficial nos induz a crer que as lutas negras nunca se deram de
forma organizada, no entanto se pode citar apenas um dos vários exemplos que
Este fato é significante, uma vez que, a maioria dos acadêmicos, bem como
(2000, p. 03):
o Estado tem papel emblemático, através das políticas publicas e ações afirmativas
educativo que esta luta traz em seu cerne, como o de conscientização da condição
transformador.
a todos de uma forma indistinta, criando a divisão dos próprios trabalhadores, seja,
trabalhador para divisão, e essa gerada que permite que o conhecimento cientifico e
o saber prático sejam distribuídos desigualmente, também não nos permite ver que o
ciência são sempre difíceis”, tendo como base essa dificuldade, trago a educação
não apenas em seu aspecto formal, mas dialogo com os processos educacionais do
Analisar este processo e sua interação com o fazer educativo próprio desta
nova cultura, é um dos aspectos que necessita ser abordado, pois não é o
lutas especificas para a inserção nesta nova realidade, também, refletem através da
intrínseco aos programas de luta das organizações negras, é o fio condutor desta
pesquisa, porque “cada atividade intelectual tende a criar círculos próprios de cultura
social vigente. Então, como diz Santos (1997, p. 15) “Somente a Historia nos instrui
sobre o significado das coisas. Mas é preciso sempre reconstruí-la, para incorporar
cultura negra, em especial para mim, visto que faz muito pouco tempo que a ciência
boa parte da população negra, tem como elementos balizadores de suas vidas. E
movimento na década dos anos de 1930, que deu origem, no ano de 1937 a Frente
racial, tornando-se uma forte arma política e organizativa dos negros brasileiros na
Negras - CONEN, no ano de 1982, que reúne ONG de vários Estados; o Movimento
Mulheres Negras; e, o Fórum das Religiões de Matriz Africana, assim como muitas
ações, que o movimento negro adotou, para garantir visibilidade de sua luta, ao
concepção de mundo.
de 1944, que segundo o próprio Abdias em seu livro O Quilombismo, (2002, p. 78),
É esta conjuntura que temos no marco nacional e que reflete uma tendência
necessitam.
marco das leis, conferencias e ações políticas que as constituem. Desta forma, se vê
uma série de conformações políticas públicas, tais como, Malvina (2005, p. 3):
foge a esta regra. Ou seja, o movimento negro a luz da trajetória histórica em 2001
Universidades16.
sociedade de uma forma mais ampla se depara, onde o dialogo foi inexistente,
16
É importante frisar que participei ativamente desta discussão.
86
estagio docência, no primeiro semestre de 2005. Bem, como as palestras que proferi
parâmetro da discussão de cotas, visto que, tive contato com 5 turmas ao longo do
oficiais sobre a situação dos estudantes negros no ensino superior, tive apenas 10
alunos negros. Por vezes, quando vejo o mapa da cor no ensino superior, do Censo
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) , de 2000, que diz que: dos
são brancos, 559.906 são negros, 37.403 são amarelos e 4.397 são índios, não
como forma de dirimir as desigualdade, por mais singela que seja a experiência é
sobre a realidade, buscando para o seu fazer cotidiano, também a incursão de curso
87
desta dissertação.
sem nos reportarmos ao papel preponderante que a educação tem neste sistema de
é importante para sua constituição social, hoje, ela adquire um papel mais relevante,
branca e cristã.
88
anteriormente. É, neste prisma que se insere a questão das cotas não apenas como
número de negros que ingressam nas universidades, mas como sujeitos sociais uma
vez imersos nesta nova realidade, questionando não apenas o que é ensinado, mas
literatura ia trabalhar com a gente literatura brasileira. Então perguntei pra ele se
íamos trabalhar com a literatura negra. E ele me disse para que Luanda se só eu tu
conhecemos. Bem, estamos em uma universidade não porque sabemos, mas sim
aula não garantiria que este professor por livre e espontânea vontade, fosse
entrevista da Professora Maria Aparecida, por exemplo, que relata sua experiência
em buscar trabalhar com essa perspectiva em suas disciplinas, mesmo ainda, não
racial é preciso adotar nova postura frente ao processo educacional. Analisar qual
concepção está presente e se impõe ao sujeito social histórico, como o descrito por
Cultural (1986), “De um lugar Generalizante (com uma posição social abstrata) como
formação para diversidade racial dos futuros profissionais que a UFRGS forma; 3ª
abrindo assim o que Bourdieu (2001), denomina sua perspectiva de Capital Cultural;
as diversidades.
diversidade racial, entendo que, mesmo assim ainda se terá muito a caminhar para
entender como isto acontece, e que pequenas ações como as que estão surgindo,
seja através do Projeto como o Conexão dos Saberes, seja pelas manifestações e
atos intra e extra muros da universidade, mudam não apenas sua vida imediata, mas
universidade. Esta é levada a pensar de forma diferente para dar conta deste novo
Como dizia Leon Trotsky, Todas as revoluções são impossíveis, até que se
Negro Brasileiro, mas não passava disto. Hoje o sonho impossível começa a se
Legislações anti-racistas.
Tese sobre Desigualdades Raciais e Ensino Superior, onde traz os dados do MEC
população, ou mesmo a representação dos amarelos (origem asiática) que são 2,4%
dos formandos e apenas 0,4% da população, evidencia que a realidade para negros
e negras como se diz no movimento negro, continua cada vez mais “branca”.
do Rio Grande do Sul e significativamente pelo processo paulatino que vem sendo
sociedade.
desta dissertação. Dos 4 capítulos que trago aqui não tenho e não tive a pretensão
mulheres negras, firmes na busca de seus futuros acadêmicos, mas com o sonho da
com a Professora Maria Aparecida que é uma mulher branca e por seu
ser intolerante com negros, índios, pobres e tantos outros. É uma questão cultural,
educacional, logo, se pode aprender a deixar esta perspectiva de lado. Ela me dizia
na entrevista “Não sei de onde vem minha identificação com estas questões sociais,
vem com muito esforço criando ambientes na Administração Pública para fomentar o
debate sobre a discriminação racial, ele foi parceiro do movimento negro desde o
parceiro dos estudantes, não apenas para se ter Políticas Públicas e Ações
Esses fatos contribuíram para a conclusão deste texto onde fui respondendo
ao problema de pesquisa, que era, Analisar a partir da LP 73/1999, que institui cota
demonstrei, ao longo deste trabalho, quais eram os sujeitos sociais dentro e fora da
LP 73/1999, que institui cota nas Universidades, como Políticas Públicas de Ações
parceria especial com Movimentos Sociais, no caso o Movimento Negro. Pois, todos
talvez nunca venham a fazer parte desta comunidade como estudantes, no entanto,
descobriram que uma universidade pública também é seu espaço de muitas outras
formas.
Bem, essa sim é uma preocupação que apesar de demonstrar acolhida ou pelo
foram:
a lei foi decretada, mas a aplicabilidade não pode apenas ser instituída. é necessário
não mais uma imposição, mas uma aceitação, por parte daqueles que muitas vezes
pesquisados;
97
materialização, foi uma das coisas mais interessantes de perceber. Pois tanto os
Públicos, cada um tem muita nitidez do lugar e papel de cada instância no processo.
O movimento sabe que o protagonismo da ação é dos alunos, pois eles são os
sujeitos sociais que estão dentro da universidade. Os alunos sabem que a política
pública e ações afirmativas implementada têm a ação social deles como relevante
no momento, mas que eles só estão a frente do processo porque muitos outros em
Como disse anteriormente essa é uma constatação que carece mais estudo,
pois pelas questões apresentadas pelos alunos existem uma série de perspectivas
cotas reflete em sala de aula, ou seja pela participação nos debates ou pelo assunto
estar na ordem do dia, tanto dos que são a favor como dos que são contrário. Um
passando por uma mudança curricular ter inserido a disciplina Identidade Docente,
observação desta conotação tendo sido parte da preocupação desta pesquisa, seria
Bará o senhor de tempo irá mostrar os caminhos que o movimento refletiu nos
negros na UFRGS?
relato dos militantes acerca da importância que tem a educação para a comunidade
negra ou, no seu aspecto formal de escolarização dos diversos níveis de ensino até
vislumbrar uma outra perspectiva ao começarem a dar aulas nos cursos pré-
processo em curso, não tenho conclusões definitivas. Sei que até no próximo
implementação, como foi salientado pelo Onir na entrevista, entendo que o processo
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plural com respeito a diversidade. Não que se tenha da noite para o dia mudança na
Assim, entendo que este trabalho tenho por concluído, no entanto trago
investigação, como será que se dará o processo de formação dos alunos que
uma disciplina que trabalha com a identidade docente, essa identidade levará a
esta sendo gestado pelos alunos contrários as cotas, chegará a algo igual ao
que atearam fogo em um mendigo que dormia no banco de uma praça em São
Paulo?
outro. Então sei que minhas indagações como pesquisadora, são fundamentais para
balança de Xangô tem pautado minha vida e as ações coerentes que observei
durante a pesquisa.
100
um povo, pauta a minha vida, e a vida coletiva da grande maioria dos negros neste
quando levar em conta esta realidade. E para isso, se deve ter incluído no currículo
classe, gênero e raça. Quando de fato a Lei 10.639 seja implementada em todos os
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