Obrigatoriedade Guardas Souza
Obrigatoriedade Guardas Souza
Obrigatoriedade Guardas Souza
2000
OUTUBRO/2000
João Ricardo Carvalho de Souza 2
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João Ricardo Carvalho de Souza 3
1. APRESENTAÇÃO
A
presente Nota Técnica destina-se a avaliar
as medidas necessárias para determinar que
seja obrigatória a criação, em todos os
municípios brasileiros, de uma guarda municipal.
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como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme,
segundo se dispuser em lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem
prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
§ 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais.
§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais.
§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência
da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de
bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
§ 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército,
subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e
Territórios.
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens,
serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
§ 9º A remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste artigo será fixada
na forma do § 4º do art. 39.” .
O disposto no art. 144 constitui-se em um limite à capacidade organizatória dos Estados,
como nos revela José Afonso da Silva em sua obra “Curso de Direito Constitucional Positivo”:
“ 4. Limites do Poder Constituinte dos Estados 1 Dissemos antes que é a Constituição Federal que fixa
a zona de determinações e o conjunto de limitações à capacidade organizatória dos Estados, quando manda
que suas Constituições e leis observem os seus princípios.
...................................................................................................................................
6. Princípios constitucionais estabelecidos 2
São - como notara Raúl Horta Machado - os que limitam a autonomia organizatória dos Estados; são
aquelas regras que revelam, previamente, a matéria de sua organização e as normas constitucionais de
caráter vedatório, bem como princípios de organização política, social e econômica, que determinam o retraimento
da autonomia estadual, cuja identificação reclama pesquisa no texto da Constituição.
Limitações expressas ao Constituinte Estadual são consubstanciadas em dois tipos de regras: umas de
natureza vedatórias e outras, mandatórias.
...................................................................................................................................
As mandatórias consistem em disposições que, de maneira explícita e direta, determinam aos Estados a
observância de princípios, de sorte que, na sua organização constitucional e normativa, hão que adotá-los, o
que importa confranger sua liberdade organizatória aos limites positivamente determinados; assim o Constituinte
Estadual tem que dispor: a).......... ; j) sobre segurança pública a ser garantida por organizações policiais
civis (polícia civil) e militares (polícia militar) com as respectivas competências, conforme indicam o art. 144,
seus incs. IV e V e seus §§ 4º a 7º.” 3 .
Essa limitação constitucional reduz não apenas a capacidade de auto-organização dos
Estados como interfere na competência legislativa da União, isto é, uma lei – seja ela federal, estadual
ou distrital - não pode criar um órgão de segurança pública em desacordo com a estrutura definida no
art. 144, da Carta Magna.
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Igualmente, não pode atribuir, ainda que em caráter complementar, função de competência
de um dos órgãos de segurança pública federal, estadual ou municipal, a outro órgão, porque isso
ofenderia o disposto no texto constitucional.
Nesse sentido, para que fosse obrigatória a criação de guardas municipais em todos os
municípios brasileiros, a exemplo do que ocorre em relação às polícias civil e militar, nos Estados,
seria preciso que a Constituição Federal, explicitamente, determinasse que os municípios deveriam
constituir guardas municipais.
Dessa forma, a exemplo do que ocorre com os Estados, haveria uma limitação na
autonomia municipal, em especial na sua capacidade de auto-organização, uma vez que, por força de
disposição constitucional, na organização dos Executivos municipais, deveria estar prevista a existência
de uma guarda municipal.
Em conseqüência, a obrigatoriedade de criação, em todos os municípios de uma
guarda municipal, só pode ser estabelecida por meio de uma Emenda à Constituição.
2.2. Admissibilidade de uma Proposta de Emenda à Constituição que verse sobre a
obrigatoriedade de criação de guardas municipais em todos os municípios brasileiros
A Constituição Federal define, em seu art. 60, os elementos relativos à admissibilidade
de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), quais sejam:
“Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
...................................................................................................................................
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.”.
Uma PEC versando sobre a obrigatoriedade de criação, em todos os municípios brasileiros,
de uma guarda municipal poderia, eventualmente, ser contestada à luz do art. 60, § 4º, I, sob a
alegação de que a redução da autonomia municipal, por ato do poder constituinte derivado, tenderia
a abolir a forma federativa.
No entanto, é possível sustentar-se que a simples redução da capacidade de auto-
organização em um aspecto específico, a criação de guarda municipal, não “tenderia a abolir a forma
federativa”.
Portanto, ainda que tenha eventual oposição, há argumentos para sustentar a
constitucionalidade de uma emenda nesse sentido.
2.3. Da competência legislativa sobre guardas municipais
O segundo aspecto relevante para o estudo solicitado diz respeito à competência em
relação às guardas municipais.
O art. 22, da Constituição Federal de 1988, estabelece que matérias são de competência
legislativa privativa da União, passíveis de delegação pela União para os Estados, de questões
específicas, por meio de lei complementar.
Entre essas matérias, enunciadas em vinte e nove incisos, somente três – inciso III
(requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra), inciso XXI (normas
gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias
militares e corpos de bombeiros militares), e inciso XXII (competência da polícia federal e das polícias
rodoviária e ferroviária federais) – relacionam-se com segurança pública.
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Como é possível observar-se, matéria relativa a guardas municipais não está incluída
entre as matérias de competência legislativa da União.
Por outro lado, no art. 30, I, da CF/88, está previsto que compete ao Município legislar
sobre assuntos de interesse local.
Entre esses assuntos, inclui-se, obrigatoriamente, a questão das guardas municipais, uma
vez que as guardas municipais destinam-se à proteção dos bens, serviços e instalações dos Municípios.
Em sendo a guarda municipal órgão de atuação voltado, exclusivamente, para a proteção
do patrimônio municipal, a lei a que se refere o art. 144, 8º, da CF/88, é, sem nenhuma dúvida, uma
lei municipal, nos termos do indigitado art. 30, I.
Nesse sentido inclina-se o entendimento da maior, e melhor, parte dos doutrinadores
pátrios, que, de forma pacífica, definem as guardas municipais como assunto de interesse do município
e, portanto, em relação às quais a competência legislativa é municipal.
É o que se constata pelos textos a seguir transcritos.
Discorrendo sobre o dispositivo, em sua obra “Comentários à Constituição de 1988”,
Wolgran Junqueira Ferreira 4 , ensina que:
“ No ordenamento jurídico da Constituição este parágrafo seria dispensável, pois os Municípios não
teriam necessidade de autorização constitucional para constituir guardas municipais
destinadas à proteção das instalações e dos serviços municipais. Existem guardas armados
nos estabelecimentos bancários que não fazem parte da polícia estadual.” (grifamos)
Verifica-se, da leitura do texto transcrito, que o autor entende ser a proteção de bens,
serviços e instalações dos municípios matéria típica de interesse local.
Na mesma linha, Hely Lopes Meirelles, em seu consagrado livro “Direito municipal
brasileiro” 5 , esclarece que:
“ A guarda municipal destina-se ao policiamento administrativo da cidade,
especialmente dos parques e jardins, dos edifícios públicos e museus, onde a ação dos depredadores do patrimônio
público se mostra mais danosa. Tal serviço se enquadra perfeitamente na competência
municipal, mas nem sempre vinha sendo aceito pelo Estado-membro como atribuição local, sob o especioso
argumento de que constitucionalmente só as unidades federadas podem ter ‘polícias militares’.”. (grifamos)
Também Hely Lopes Meirelles é claro em reconhecer que a guarda municipal se constitui
em um assunto de competência, exclusiva, do município, uma vez que suas missões são de interesse
estritamente local.
Mais claro, em relação à definição sobre a quem pertence a competência legislativa para
a elaboração da lei a que se refere o art. 144, § 8º, da CF/88, é Ives Gandra Martins, que, sobre o
tema, se manifesta nos seguintes termos:
“ Os municípios podem ter suas guardas municipais, cujo destino é a proteção de seus bens, serviços e
instalações.
O constituinte acrescenta que tal proteção dar-se-á nos termos da lei que, à evidencia,
cuidará da sua organização.
A lei de criação da guarda há de ser, necessariamente, municipal. Não pode extrapolar
os limites da Constituição, devendo, apenas, cuidar da área de atuação referida no Texto Supremo.” 6 .
(grifamos)
Do conjunto de textos reproduzidos, de autoria de renomados juristas brasileiros, podemos
afirmar, fundamentadamente, que são os Municípios que podem, em razão da natureza da matéria e
da competência legislativa municipal, elaborar a lei que disponha sobre as normas relativas às guardas
municipais que vierem a criar.
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j) PEC nº 266/2000: Cria uma polícia municipal e destina um por cento da receita
tributária da União para os municípios com mais de cem mil habitantes para a manutenção de suas
polícias (apensada à PEC nº 218/19995);
l) PEC nº 276/2000: Possibilita que, em municípios com mais de um milhão de habitantes,
a guarda municipal possa executar ações de segurança pública (apensada à PEC nº 218/1995);
m) PEC nº 284/2000: Atribui às guardas municipais competência para executar ações
de polícia ostensiva (apensada à PEC nº 218/1995);
n) PEC nº 087/1999 – Senado Federal: Permite às guardas municipais realizar ações
de segurança pública.
4. CONCLUSÃO
NOTAS DE REFERÊNCIA
1
Curso de Direito Constitucional Positivo, José Afonso da Silva, 8ª edição, p. 520
2
Idem, p. 521
3
Curso de Direito Constitucional Positivo, José Afonso Da Silva, 8ª edição, p.522
4
FERREIRA, Wolgran Junqueira. Comentários à Constituição de 1988. Julex Livros
Ltda., v. 2, 1ª Edição, São Paulo, 1989, p. 842
5
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. Malheiros Editores Ltda., 7ª
Edição, São Paulo, 1995, p. 331
6
BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do
Brasil. Editora Saraiva, 5º volume, São Paulo, 1997, pp. 271 e 272.
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