Blocos Lógicos na Matemática: Anos 70
Blocos Lógicos na Matemática: Anos 70
INSTITUTO DE MATEMÁTICA
FRANCINE DAHM
PORTO ALEGRE
2012
2
FRANCINE DAHM
PORTO ALEGRE
2012
3
FRANCINE DAHM
Comissão examinadora:
________________________________________
_________________________________________
AGRADECIMENTOS
RESUMO
O trabalho consiste em uma pesquisa sobre a utilização dos blocos lógicos no ensino
de matemática. Tem como objetivos tratar sobre o uso, o desuso e as possíveis contribuições
dos blocos lógicos, questionando os motivos pelos quais vários professores escolheram
utilizar o material para explorar conceitos matemáticos, percebendo se o Movimento da
Matemática Moderna influenciou nessa escolha, procurando entender o que leva alguns
educadores a utilizarem os blocos lógicos atualmente e se é válido retomar o seu uso nas aulas
de matemática. O trabalho foi desenvolvido e construído com base em um conjunto de
entrevistas, aplicado a professoras que utilizaram os blocos lógicos nas aulas de matemática
durante a década de 1960 e 1970. As considerações finais foram baseadas nessas entrevistas.
De acordo com os entrevistados, o uso dos blocos lógicos pode contribuir para o aprendizado
dos alunos, sendo o educador responsável por fazer as explorações e as relações com esse
material. Os blocos lógicos caíram no desuso porque havia profissionais que não sabiam
manipulá-lo e explorá-lo, e por que foi, praticamente, divulgado só pelo GEEMPA no Rio
Grande do Sul, atingindo apenas os educadores que participavam das atividades do Grupo.
ABSTRACT
The work consists of a survey on the use of logical blocks in mathematics teaching. It
aims to treat about the use, disuse and the possible contributions of logic blocks, questioning
the reasons why many teachers have chosen to use the material to explore mathematical
concepts, whether the Modern Mathematics Movement influenced this choice, and trying to
understand why some educators use the logic blocks currently and whether it is valid to
resume its use in math classes. The work was designed and built based on one set of
interviews, applied to teachers who used the logic blocks in math classes during the 1960s and
1970s. The closing remarks were based on those interviews. According to the respondents, the
use of logic blocks can contribute to student learning, the teacher being responsible for
making holdings and dealings with this material. The logic blocks fell into disuse because
there were professionals who could not handle it and exploit it, and because the GEEMPA
only disseminated those ideas in Rio Grande do Sul, reaching only educators who participated
in the activities of the Group.
LISTA DE FIGURAS
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................1
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................76
5 APÊNDICES.........................................................................................................................81
6 REFERÊNCIAS.................................................................................................................127
1
1 INTRODUÇÃO
no ensino de matemática, sendo a maioria destes, guias de atividades com a descrição de que
se tratavam os blocos lógicos, acompanhados de atividades com aplicações simples, não
desenvolvendo todo o potencial nessas atividades que acredito que esse material didático
manipulável é capaz de proporcionar.
Com essas motivações, propus algumas questões que orientaram minha pesquisa
referente ao Trabalho de Conclusão de Curso, desenvolvido por meio de entrevistas com
pessoas que estavam e estão ainda envolvidas com a utilização dos blocos lógicas nas aulas de
matemática, para depois analisar seus comentários e tentar, assim, responder aos
questionamentos que propus inicialmente. As questões que guiaram a investigação foram:
Quais as possíveis contribuições da utilização dos blocos lógicos nas aulas de
matemática?
Quais os motivos que levaram alguns professores a escolherem e utilizarem esse
material nas suas aulas?
O Movimento da Matemática Moderna influenciou na escolha desse material para
as aulas de matemática?
Por que educadores que utilizavam os blocos lógicos nas aulas de matemática
deixaram de utilizá-lo?
Quais foram os possíveis motivos de desuso desse material?
Qual o incentivo e auxílio que os blocos lógicos proporcionam no ensino da
lógica, segundo os professores entrevistados?
O que atualmente leva alguns professores a utilizarem os blocos lógicos?
É válido retomar o uso dos blocos lógicos nas aulas de matemática?
O capítulo 2 deste trabalho relata o descontentamento dos educadores com o ensino de
matemática no Brasil a partir dos anos 1960 e o surgimento do Movimento da Matemática
Moderna, como resposta a essa insatisfação. Também é relatada a formação de grupos de
estudo na área de educação matemática preocupados em promover a formação dos
professores, como o GEEM e o GEEMPA, as ideias e as experiências de ensino defendidas
por esses grupos, que foram amplamente divulgadas na época. Nesse contexto, também são
expostas de modo resumido, as propostas de ensino envolvendo os blocos lógicos de Paul
Zoltan Dienes, tomando-se como base dois livros de Dienes que influenciaram o uso dos
blocos lógicos a partir dos anos 70: “A Lógica e os Jogos Lógicos”, de 1974, e “Seis Etapas
do Processo de Aprendizagem em Matemática”, de 1975. São descritos os blocos lógicos de
Dienes e suas características, e possíveis usos desse material no ensino de matemática.
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parecendo adequada para resolver os problemas do ensino brasileiro (BÚRIGO, 1989, p. 124-
125).
Havia uma preocupação com o rigor matemático, pois os professores tentavam abordar
diferentes assuntos segundo uma sequência de introdução de conceitos. Desejavam a
compreensão da natureza dos problemas, das operações e dos questionamentos das verdades
matemáticas, estando preocupados em propor ao aluno pensar antes de resolver, promovendo
a criatividade. Com a representação dos problemas e das soluções, o professor conseguiria
perceber onde estavam as dúvidas dos alunos. Não era necessário decorar, os alunos poderiam
criar e inventar o método para encontrar a solução da atividade.
Com a matemática moderna, os livros foram reescritos e figuras foram incorporadas.
Buscava-se que a matemática fosse mais cativante e intrigante, despertando o interesse dos
alunos.
Em 1964, foi criada no GEEM a área do ensino primário. Podem ser destacadas como
divulgadoras do Movimento no ensino primário as professoras Lucilia Bechara, Manhucia
Libermann e Anna Franchi. O GEEM proporcionava para professores do ensino primário
atividades semelhantes às aplicadas aos professores do ensino secundário: cursos, sessões de
estudo e conferências. As atividades do GEEM eram aplicadas no Grupo Escolar
Experimental da Lapa, como visto em Búrigo (1989, p. 152 e 160).
O GEEM também divulgou o avanço do Movimento para o ensino primário em todo
país. Os professores acreditavam que, para a inovação no ensino médio, os alunos deveriam
estar portados dessa ideia anteriormente.
Uma influência da matemática moderna na proposta de inovação do primário era a
unificação da linguagem, já utilizada em cursos superiores e no ensino secundário. As noções
de conjuntos, intersecção e inclusão eram mostradas em diagramas.
A divulgação da teoria de Dienes começou a ser promovida em 1970, em um curso de
férias do GEEM. As propostas de Dienes foram bastante apreciadas por uma parte do GEEM,
sendo consideradas como um preenchimento de algo que faltava na matemática moderna, pois
sua metodologia era baseada em experimentos inspirados na pedagogia piagetiana e percebida
como condizente com os programas desenvolvidos. Dienes veio ao Brasil novamente em
1971 e diversos dos seus livros foram lançados nessa época. O curso de férias do GEEM em
1973 incluía os blocos lógicos em sua programação, mostrando um espaço garantido para
Dienes no GEEM. Dienes voltou a São Paulo em 1974 e em 1975 para a participação em
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o professor Sangiorgi dava palestras em diversas regiões do Rio Grande do Sul, disseminando
a proposta da matemática moderna, ensinando noções de Teoria dos Conjuntos, Álgebra e
Álgebra Linear (BÚRIGO, 2010, p. 98).
A matemática moderna não ficou limitada a cursos de pequena duração, como visto
em Foi lançado na Escola de Engenharia um curso de um ano de duração de Introdução à
Teoria dos Conjuntos. Em 1965 foi proposto um curso sobre o mesmo tema no Instituto de
Física da Universidade durando três meses. Também nesse ano a Faculdade de Filosofia
promoveu uma conferência sobre a Matemática Moderna ministrada pela professora Lucienne
Félix (BÚRIGO, 2010, p. 99).
No Instituto de Educação General Flores da Cunha, em 1966, foi realizado o curso de
“matemática moderna” para a formação dos professores. Estavam presentes professores do
ensino primário e secundário. O curso combinava experiências de Papy, Dienes e Félix
(BÚRIGO, 1989, p. 189-190).
Como pode ser visto, antes da criação do GEEMPA, em 1970, os professores da
UFRGS já estavam envolvidos com as propostas da matemática moderna. As iniciativas em
introduzir elementos da Teoria dos Conjuntos, tanto no Instituto de Educação General Flores
da Cunha como no Colégio de Aplicação da UFRGS, pelas professoras Joana Bender e
Martha Menezes, respectivamente, mostra que elas estavam empenhadas em desenvolver no
primário, no secundário e no normal os elementos de conteúdo e linguagem de matemática
que foram apresentados e estudados no curso de Matemática da Faculdade de Filosofia
(BÚRIGO, 2010, p. 99-100).
O professor Antônio Ribeiro Junior, da Faculdade de Filosofia da UFRGS, foi um
grande promovedor da matemática moderna, dando cursos em diferentes regiões do Rio
Grande do Sul. Também eram feitas em Porto Alegre sessões de estudo sobre as novas
propostas no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, no CPOE e na Faculdade de Ciências da
Pontifícia Católica do Rio Grande do Sul (BÚRIGO; FISCHER; SANTOS, 2008, p. 36-37).
A matemática moderna também foi divulgada no interior do Rio Grande do Sul
através da circulação impressa da “Revista do Ensino”, que tinha o patrocínio da Secretaria de
Educação e Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Sul. Com a revista, principalmente
nos anos 1970, eram dadas orientações para as professoras primárias sobre como agir e
desenvolver suas aulas com essa nova proposta de ensino, a matemática moderna (PEREIRA,
2007, p. 206).
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Porto Alegre. Foram oito classes selecionadas, sete em Porto Alegre e uma em Novo
Hamburgo, sendo que os professores já haviam participado de ações do GEEMPA. Em 1974,
foi feita uma experimentação sistemática apoiada pelo INEP, com o objetivo de testar as seis
etapas do processo de aprendizagem de Dienes, no sistema de ensino local (BÚRIGO;
FISCHER; SANTOS, 2008, p. 40).
Os professores do GEEMPA comparavam os resultados da metodologia aplicada com
a matemática moderna com a “tradicional” do ensino de matemática, enfocando as atitudes
dos alunos referentes à aprendizagem de matemática, a reação a novos questionamentos, a
capacidade de aprender e entender conteúdos não vistos anteriormente e o desenvolvimento
da criatividade do estudante para a resolução da atividade proposta.
Nessa época, o GEEMPA fez uma aliança com o International Study Group for
Mathematics Learning (ISGML), que era dirigido por Dienes. Eram aplicadas as atividades e
uma vez por semana um dos colegas fazia uma análise do trabalho, para depois ser discutido e
avaliado o papel do professor, do aluno e do método utilizado. Uma vez por semana eram
promovidos encontros com as professoras da turma, para criar os materiais, fazer o
planejamento e realizar estudos teóricos sobre aquela aula que seria dada. Em um relatório do
GEEMPA sobre as classes experimentais as propostas de Dienes foram avaliadas como
favoráveis para aquele grupo experimental (BÚRIGO; FISCHER; SANTOS, 2008, p. 40).
O GEEMPA sempre valorizou os aspectos metodológicos na proposta de renovação
do ensino de matemática e isso motivou o esforço em trazer Dienes ao Brasil. Desde o início
do GEEMPA estavam propostas também atividades de renovação para o ensino primário,
considerando-se necessária a reformulação dos métodos utilizados (BÚRIGO, 1989, p. 72).
O GEEMPA não ficou apenas com a referência de Dienes para novas propostas
metodológicas, consideravam-se também os estudos de George Papy, Tamás Vargas e
Maurice Glaymann, sendo que Vargas e Glaymann deram cursos no GEEMPA sobre
Probabilidade e Estatística e Análise Matemática e as propostas de Papy estavam inseridas em
curso ministrado por Arago Backx, que havia estagiado com o Grupo Papy. Mas apenas
Dienes trabalhava com materiais didáticos manipuláveis no ensino de matemática (BÚRIGO;
FISCHER; SANTOS, 2008, p. 39).
A institucionalização do Movimento ocorreu através do envolvimento de órgãos
oficiais, por meio de palestras divulgadas na televisão, em apoio a cursos e com a promoção
de reuniões mensais de estudos sobre a inserção da matemática moderna na escola normal e
primária (BÚRIGO; FISCHER; SANTOS, 2008, p. 42-43).
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pública, sendo fechados, na época, os Ginásios Vocacionais, ficando apenas algumas escolas
privadas a experimentar essas propostas (BÚRIGO, 1989, p. 207-208).
Nesta seção do meu trabalho, destaco dois livros de Paul Zoltan Dienes que consultei
sobre a utilização dos blocos lógicos no ensino de matemática, que foram conhecidos e
divulgados com destaque durante o Movimento da Matemática Moderna. Exponho as ideias
principais do autor, destacando o pensamento matemático, e relato, dentre inúmeras, duas
atividades que Dienes sugeria fazer com o material dos blocos lógicos e que foram citadas no
segundo conjunto de entrevistas: “O jogo das respostas” e “O jogo do dominó”.
Nessa obra de Dienes (1974, p. IX), pode ser notada a preocupação em remodelar o
ensino do segundo grau, querendo preparar o estudante para a universidade. Também é
evidenciado que essa mudança, no pensamento do autor, deveria ocorrer também no ensino de
primeiro grau, devendo preparar muitos alunos para posterior trabalho. As mudanças que
Dienes propõe devem ser feitas no primeiro contato da criança com a escola, já abordando
questões matemáticas no ensino primário. Ainda expõe que na época moderna, é
indispensável o desenvolvimento do raciocínio matemático e de suas aplicações, podendo ser
explorado à medida que se altera a idade. Como relata Dienes (1974, p. IX): “É
imprescindível que o „cálculo‟ de outrora ceda lugar ao estudo da „matemática‟.”
Dienes (1974, p. IX-X) propõe o ensino da matemática moderna não apenas para
educandos que desejam o ensino superior, mas para qualquer aluno que deseja aprender
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matemática. Destaca também que em um futuro próximo, todos irão precisar de uma “cultura
matemática”, independente do nível de ensino que se encontram.
Nessa obra, Dienes (1974, p. X) menciona que as atividades ali apresentadas foram
desenvolvidas para crianças do jardim de infância e os dois anos seguintes de ensino primário,
destacando que não existem regras sobre o que um aluno pode ou não aprender nesse período
inicial de ensino. Conta que registra nesse livro resultados de anos de estudo em diferentes
locais de diferentes países, como Adelaide (Austrália), Papua (Nova Guiné), Leicestershire
(Inglaterra) e Massachusetts (Estados Unidos da América).
O autor defende que a lógica seja ensinada e desenvolvida ao mesmo tempo em que
estão sendo apresentados outros conceitos matemáticos (DIENES, 1974, p. X). A articulação
entre conceitos matemáticos e atividades cotidianas é capaz de provocar o desenvolvimento
de argumentos lógicos, mesmo sem que o aluno tenha total controle desses conceitos.
Dienes (1974, p. XI) menciona que os jogos são indicados no livro para motivar os
professores a utilizá-los em seus planejamentos, estando os educadores livres para elaborar
seus planos.
Deve ser destacado que estamos trabalhando com uma obra dos anos 1970 e é nesse
contexto que são mencionadas alterações no currículo vigente, pois o ensino de matemática
estava passando por uma reformulação em diversos países, sendo esse um momento propício
para a utilização de materiais didáticos manipuláveis no ensino de matemática. Sendo
destacados por Dienes os benefícios do uso desses materiais ao proporcionarem aos
estudantes um diferente ambiente de ensino.
Com as alterações que então ocorriam no ensino, como propõe Dienes (1974, p. XI), o
educador deve abrir espaço em sua aula, deixando o modo “tradicional” e propiciando um
ambiente de troca de conhecimento. Segundo o autor, um professor deve ter como um lema a
ser seguido que uma criança não deve “receber um ensino”, ela deve adquirir, conquistar,
construir com seu próprio mérito e esforço, e irá ter como consequência de seus atos um
aprendizado sobre aquilo que está se dedicando a entender. É indicada a formação de grupos
para as atividades, estando o professor livre para escolher os componentes ou deixar que a
turma mesmo se integre, podendo provocar conversas, mas que podem não atrapalhar e sim
auxiliar, o desenvolvimento do raciocínio lógico. Os estudantes estarão incentivados a
aprender a matemática porque gostam dela, a vivem e necessitam de mais argumentos para
poderem evoluir na atividade e no raciocínio lógico que estarão desenvolvendo para
compreender e tentar solucionar a atividade em que estão focados.
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Como Dienes (1974, p. XII) relata, algumas crianças aprenderão mais rápido que
outras e, nesses casos, é válido reavaliar os grupos que foram montados, pois experiências são
contadas e táticas são observadas, podendo ser mais fácil a obtenção de conhecimento por
estarem comparando suas ações com o que seus colegas estão fazendo para prosseguir na
atividade e, dessa maneira, dúvidas são esclarecidas sem a interferência do professor.
O aluno, para executar as atividades com os blocos lógicos, deverá pensar e estudar
suas jogadas, desenvolvendo seu raciocínio lógico, analisando o que ele e seus colegas
realizaram em rodadas anteriores e o que as jogadas provocaram, para assim conseguir
relacionar e desenvolver os conceitos matemáticos com possíveis jogadas bem sucedidas. O
trabalho em grupo promove discussões de ideias dos alunos. As versões são mencionadas,
cada um colocando o seu ponto de vista na discussão. Modelos matemáticos são debatidos e o
melhor argumento prevalece. As jogadas são analisadas, sendo que será eleita a melhor jogada
aquela que render maior sucesso na atividade. Obtém-se um debate de ideias e estratégias
sobre a atividade, sendo o professor responsável por administrar esse momento e provocar os
alunos ainda mais na construção do conhecimento (DIENES, 1974, p. XII-XIII).
Como pode ser visto em Dienes (1974, p. XIII), a concentração e a capacidade
cognitiva também estarão presentes na atividade, uma vez que quem tiver maior concentração
poderá perceber o erro que um colega cometeu, sendo mais válido o aluno perceber o erro do
outro do que o professor interferir na atividade e mostrar o erro cometido. Perceber o erro
cometido significa estar totalmente integrado na proposta de ensino e quem o fizer estará apto
a discutir sobre o que o colega fez de errado, mostrando argumentos capazes de contradizer o
fato que o aluno errante julgou ser a verdade.
Nessa discussão promovida pela atividade proposta pelo professor, alunos se
motivarão e o debate começará, como relata Dienes (1974, p. XIII). Cabe ao professor
respeitar esse ato, controlando os ânimos dos alunos para que não atrapalhem as outras turmas
da escola. Esse debate é muito válido uma vez que irá movimentar a turma e desafiá-los a
participar de uma exposição de ideias, estando o professor com o encargo de evidenciar os
erros cometidos e instigar os alunos a buscar soluções para essas situações. A aprendizagem
estará envolvida, uma vez que os alunos usarão argumentos matemáticos para comprovar
aquilo que estão defendendo. Como menciona:
com o aluno o método levado em questão, se for bom o aluno irá conseguir convencer o
professor, mas se houver problemas e faltarem explicações, o professor deve tomar o controle
e mostrar o que não é adequado com aquele método.
Como mencionado por Dienes (1974, p. 1), um segmento importante de estudo da
matemática é o estudo dos números. Os números não possuem existência concreta no
cotidiano, apenas conseguimos representá-los através de objetos. Como trata Dienes (1974, p.
1): “O número é uma propriedade que se refere às coleções, aos conjuntos de objetos.”
Não se tem um objeto que pode ter a propriedade de um número, mas pode-se ter um
conjunto de objetos que tenham a propriedade de um número. Por exemplo, não se pode
afirmar que uma cadeira é representada pelo número 1, mas o conjunto que contêm apenas
uma cadeira é representado pelo número 1 (DIENES, 1974, p. 1).
Para Dienes (1974, p. 1-2), é necessário ficar claro que foi aceito o pressuposto de que
os conjuntos se referem aos objetos levados em questão e os números se referem ao conjunto
que contém pelos objetos. Os objetos formam o material didático base para qualquer
experiência; assim que começamos a formar grupos com esses objetos, vamos obtendo
conjuntos e organizando esse material, pois é necessária a tal verificação do material para
poder se fazer futuras análises e experimentos. Os conjuntos poderão ser distinguidos através
de classes de equivalência, podendo-se separá-los de acordo com as quantidades que os
caracterizam. Todos os conjuntos pertencentes à mesma classe de equivalência respeitam as
mesmas regras e possuem as mesmas características.
Há vários modos de se determinar um conjunto, segundo Dienes (1974, p. 2). Quando
um conjunto for muito grande, devem ser analisadas as características desse conjunto e deve-
se tentar aplicar atributos marcantes na classificação dos componentes, sendo que essa
classificação deve ser bem precisa para que os atributos definam bem o conjunto. Desse
modo, ter-se-á um conjunto universo cujos elementos terão diferentes características, mas que
farão parte de um todo.
Entre conjuntos, existem relações a serem consideradas, conforme Dienes (1974, p. 2-
3). As relações podem ser de um conjunto estar incluído ou não no outro, ou um conjunto não
ter nenhum elemento em comum com o outro, ou os dois conjuntos podem ter os mesmos
elementos, sendo então conjuntos iguais. Além das relações, devem ser estudadas também as
operações. Quando se unem dois atributos pela palavra “e”, obtém-se uma intersecção dos
conjuntos pelos atributos distintos. Quando se reúnem dois atributos pela palavra “ou”,
obtém-se uma união de conjuntos determinados pelos atributos distintos. A construção de um
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Segundo Dienes (1974, p. 5), podem assim ser percebidas 4 variáveis: a forma, o
tamanho, a espessura e a cor. A variável forma é composta por quatro figuras: o quadrado, o
retângulo o triângulo e o círculo. A variável tamanho é composta por dois tamanhos, o grande
e o pequeno. A variável espessura é composta por dois tipos, o grosso e o fino. E a variável
cor é composta por três tipos, o vermelho, o azul e o amarelo. O professor deve primeiramente
ensinar o nome das peças para que as crianças se apropriem desse ensinamento brevemente,
uma vez que o trabalho será prejudicado caso desconheçam a nomenclatura, pois, portadas da
nomenclatura, estarão aptas a retirar do conjunto qualquer peça desnecessária e que restrinja o
problema ao qual estiverem se submetendo.
Como Dienes (1974, p. 42) menciona, após serem construídas por parte dos estudantes
as propriedades das relações dos atributos levados em análise, ou seja, “e”, “ou”, “não”, é
necessário que o professor comece a introduzir as notações desses atributos. Para o atributo
“não”, será conveniente usar o símbolo . Para a conjunção de dois atributos, o “e”, será
conveniente usar o símbolo . Para a disjunção “ou”, será indicado usar .
Note os seguintes exemplos:
(A) v.
(B) q v.
(C) v q.
(D) v q.
(E) v q.
Na letra (A), tem-se escrito não vermelho. Na letra (B), tem-se escrito quadrado e
vermelho. Na letra (C), tem-se escrito vermelho ou quadrado. Na letra (D), tem-se não
vermelho e quadrado. Na letra (E), tem-se não vermelho ou não quadrado.
O sinal refere-se apenas ao atributo que o segue imediatamente, ou ao atributo entre
parênteses. Observe os seguintes exemplos:
(A) a v q.
(B) (v q).
Na letra (A), tem-se não azul ou vermelho ou quadrado, o sinal apenas modifica o
atributo azul. Na letra (B), tem-se não para o vermelho ou quadrado, o sinal modifica o
atributo composto por v q.
Dienes (1974, p. 43) afirma que os símbolos referidos deverão ser estabelecidos
solidamente para que os alunos consigam trabalhar sem dúvidas e com familiaridade com essa
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nova notação. Atividades envolvendo esses símbolos são importantes, sendo que, quanto mais
aplicações esses símbolos tiverem, mais os alunos estarão se apropriando deles. Os estudantes
devem ter um entendimento sobre o símbolo e o que está sendo simbolizado, devem saber
que, por exemplo, o símbolo deve ser utilizado para negar algum atributo ou alguma
propriedade, estando seguros para usá-lo. Dessa maneira, a atividade poderá ser avançada e
poderá ser proposto um jogo apenas com os símbolos.
Segundo Dienes (1974, p. 43-44), ao se escrever um atributo que representa certa
característica em um conjunto com uma notação simbólica, deve-se ter cuidado ao modificar a
ordem desses elementos, pois nem sempre resulta no mesmo significado inicial. Pode-se ter
três resultados com a troca da ordem desses elementos:
(1º) ou a nova notação não tem sentido, pois caso o símbolo apareça no final de um
atributo, não fará sentido, porque como regra, o símbolo não terá um atributo depois dele
para implicar alguma relação;
(2º) ou a nova notação tem sentido, mas altera o sentido inicial a que se referia,
descrevendo um diferente conjunto de peças;
(3º) ou a nova notação continua a representar o mesmo conjunto, por exemplo,
observando o caso q v, obtemos o mesmo conjunto se mudarmos a ordem e resultar no
atributo v q.
experiência com objetos concretos, relacionando formas, cores, tamanhos, espessuras, e deve
saber o nome de cada um dos objetos e das características com que estão tratando.
O JOGO DO DOMINÓ
Dienes (1974, p. 8) relata que o jogo do dominó é um modelo que consiste em jogar
simultaneamente em duas direções: da esquerda para a direita e de cima para baixo, ou seja,
um jogo em forma de cruz, sendo um problema desafiador preencher os cantos que sobraram.
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Na Figura 3 pode ser visto como se pode começar um jogo em cruz, conforme Dienes (1974,
p. 8):
Conforme Dienes (1974, p. 8-9), deve-se supor que, da esquerda para a direita, foram
ordenadas seis peças e que esta fila seja interceptada, num lugar qualquer, ortogonalmente,
por outra fila. Assim teremos quatro lugares, que podem ser completados, que têm um vértice
em comum com essa intersecção, como pode ser visto na Figura 3. Para preencher essas
lacunas, é necessário ter uma peça que seja diferente em um atributo de uma das peças já
colocadas na linha, e difira por dois da outra peça que está na coluna. Para resolver esse
problema, o aluno experimentará a natureza do jogo de atributos cruzados.
O espaço que está assinalado com linhas diagonais na Figura 4, segundo os critérios
do jogo, pode ser preenchido por um quadrado grande grosso vermelho.
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Figura 5 - Jogo do dominó com a peça quadrado grande grosso vermelho no espaço tracejado
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O espaço marcado com linhas diagonais também pode ser preenchido pela peça
círculo grande grosso vermelho. De fato, para a linha as peças devem diferir em um atributo,
que nesse caso é a forma. Para a coluna precisam diferir em dois atributos, sendo esses forma
e o tamanho, podendo ser escolhida a peça círculo grande grosso vermelho para preencher o
espaço com linhas diagonais. Como ilustra a Figura 6:
Figura 6 - Jogo do dominó com a peça círculo grande grosso vermelho no espaço com linhas diagonais
Figura 7 - Jogo do dominó com a peça triângulo grande grosso amarelo no espaço com linhas paralelas
O espaço marcado com linhas paralelas pode ser completado também com a peça
quadrado grande grosso amarelo. De fato, para a linha as peças devem diferir em um atributo,
sendo esse a forma. Para a coluna devem diferir em dois atributos, sendo esses a forma e o
tamanho, podendo ser escolhida a peça quadrado grande grosso amarelo para preencher o
espaço marcado com linhas paralelas. Como ilustra a Figura 8:
Figura 8 - Jogo do dominó com a peça quadrado grande grosso amarelo no espaço com linhas paralelas
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Conforme Dienes (1975, p. 1), não se tem uma resposta satisfatória para uma definição
do que é compreender e do que é aprender. É a partir de ambientes ricos de aprendizagem, de
debates, de saberes e de questionamentos a criança consegue construir seus conhecimentos,
pois suas ideias e suas dúvidas são debatidas, contrabalanceando versões e mostrando
verdades. Quanto mais o professor conseguir promover momentos de aprendizagem, maiores
poderão ser os ensinamentos conquistados. Conquistar um saber é mais importante do que
obtê-lo através de uma repetição de operações, uma vez que para adquirir um conhecimento é
necessário envolvimento e comprometimento com a atividade, fixando os conceitos que estão
envolvidos, pois deverão estar totalmente construídos e entendidos para poderem observá-los
em diferentes contextos matemáticos e, assim, tirar conclusões sobre o tema que estão
tratando.
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PRIMEIRA ETAPA
Como mencionado por Dienes (1975, p. 2) o meio em que a criança está inserida é
fundamental para a conquista do conhecimento. Para aprender, o aluno precisa modificar
aquilo que sabe, pois aprende o que desconhece e o que é necessário saber para poder adaptar-
se no meio no qual está inserido. E esse processo de adaptação a um meio é a aprendizagem.
O jogo infantil é muito importante, pois permite que as crianças se adaptem a diferentes
situações que poderão encontrar na sua futura vida, desenvolvendo as dúvidas que poderiam
obter quando vivenciassem aquela experiência, minimizando assim, futuros problemas de
envolvimento social.
Dienes (1975, p. 2-3) afirma que quando alguém se propõe a ensinar lógica para uma
criança, é importante pensar em situações que levem o estudante a construir conceitos lógicos,
desenvolvendo campos lógicos no seu aprendizado. O meio no qual o estudante vive não
contém muitos atributos que consideramos lógicos para formalizar diversas situações,
portanto é necessário criar um meio no qual a criança será levada, continuadamente, a formar
e conquistar conceitos lógicos, trabalhando de uma forma mais ou menos sistemática.
Um dos meios capazes de explorar esse campo lógico é o uso dos blocos lógicos,
como informado por Dienes (1975, p. 3), com os quais podem ser variadas as cores, as
formas, as espessuras e os tamanhos. Na verdade, o professor poderá variar os atributos com
base no sentido que quiser dar para aquele material, com base no assunto que quiser trabalhar,
estando livre para fazer o uso desejável dos blocos lógicos. Através da interação e da
simulação de atividades com esse material, a criança evoluirá em direção à aprendizagem,
sendo isso possível com um meio artificial, criado apenas para fortalecer a aprendizagem
matemática de um determinado conteúdo.
Simplificando, Dienes (1975, p.71) considera que a primeira etapa apresenta o
indivíduo ao meio em que ele está inserido, gerado de tal forma que certas estruturas
matemáticas podem ser dele extraídas. A primeira adaptação é chamada de “jogo livre”.
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SEGUNDA ETAPA
TERCEIRA ETAPA
Brincar apenas com jogos matemáticos não significa aprender a matemática que está
envolvida naquele determinado jogo, segundo Dienes (1975, p. 4). O professor deve levar o
aluno a brincar com diferentes jogos, possuindo a mesma estrutura, mas de maneiras distintas.
A criança deverá ser instigada a descobrir a semelhança entre os elementos envolvidos nesses
jogos, descobrindo suas estruturas idênticas, chamados de isomorfismos. O aluno, com os
jogos de estrutura isomorfa, consegue perceber a estrutura comum aos jogos e esclarece as
35
QUARTA ETAPA
Segundo Dienes (1975, p. 5) o aluno estará, nessa etapa, portado da abstração dos
conceitos que estavam envolvidos, mas ainda não estará apto a utilizá-los, pois não se fixaram
todas as ideias necessárias para a formalização dos conceitos. A criança tem a necessidade de
representar essa abstração, lhe permitindo olhar de fora, sair do jogo ou do conjunto de jogos,
para poder analisá-los e refletir a respeito deles. Essa representação poderá ser de qualquer
forma, visual ou auditiva, mas deve auxiliar o aluno a demonstrar aquilo que abstraiu.
Resumindo a quarta etapa, Dienes (1975, p. 71) afirma que a estrutura comum é
representada de alguma forma gráfica ou sonora. O aluno torna-se apto a completar a
representação vazia com os estados e os operadores particulares de um jogo particular da
estrutura analisada, conseguindo representar através de gráficos ou de explicações os
procedimentos que estão ocorrendo e suas relações.
36
QUINTA ETAPA
SEXTA ETAPA
Obtém-se um sistema formal, conforme relatado por Dienes (1975, p. 6), composto
por axiomas e regras do jogo. Para essa parte, poderão surgir inúmeras regras, até mesmo
contendo regras envolvendo a lógica, chamadas de regras lógico-matemáticas, devendo a
criança estar atenta a qualquer modificação no jogo para um sucesso na atividade envolvida.
A partir dessa descrição inicial, surgem os teoremas do sistema, ou seja, os problemas e os
questionamentos que serão alterados pelas regras do jogo para serem utilizados na atividade.
Resumindo a sexta etapa, Dienes (1975, p. 71-72) comenta, que dado que todas as
propriedades não podem ser caracterizadas em uma descrição, é tomado um número mínimo
de propriedades e é inventado um procedimento para que delas sejam deduzidos outras. As
propriedades iniciais constituem os axiomas, o procedimento de dedução chama-se
demonstração e as propriedades posteriores são os teoremas, obtendo um sistema formal. A
manipulação de um sistema como esse é o objetivo final da aprendizagem matemática de uma
estrutura.
Dienes, nessa obra, analisa em um grupo de alunos as seis etapas do processo de
aprendizagem em matemática tratadas anteriormente; o que foi observado por Dienes com os
alunos estará descrito abaixo.
37
PRIMEIRA ETAPA
Segundo Dienes (1975, p. 7-8), o professor mostra os blocos lógicos para as crianças e
pede para que elas se familiarizem com as variáveis envolvidas: forma, tamanho, espessura e
cor. Esclarece as dúvidas dos estudantes, para que na segunda etapa os alunos consigam obter
uma aprendizagem adiantada, podendo já trabalhar com relações entre os conjuntos.
SEGUNDA ETAPA
Como mencionado por Dienes (1975, p. 9), pode-se perguntar aos alunos onde estão
os blocos vermelhos e redondos ao mesmo tempo, onde estão os blocos que são não
vermelhos e redondos e assim por diante. A aprendizagem pode ser levada mais longe,
perguntando-se onde estão os blocos que são não vermelhos ou não redondos. Nesse caso,
está se negando a propriedade conjunta vermelho e redondo.
Na primeira linha e segunda coluna do diagrama estão representados os redondos
vermelhos, como informa Dienes (1975, p. 10-11) e como está exemplificado na Figura 10. O
aluno aqui aprende a fazer corresponder um conjunto a um atributo, e o conjunto
complementar ao atributo negado. Pode ser solicitado à criança que represente o diagrama de
Carroll por meio de dois aros no chão, obtendo o mesmo resultado de maneiras distintas. A
criança perceberá que os redondos vermelhos estarão na parte do aro destinada aos vermelhos
que fazem parte do aro destinado aos redondos. Assim, será representada a intersecção, ou
seja, a conjunção dos atributos vermelho e redondo e a intersecção do conjunto dos vermelhos
com o conjunto dos redondos. Se alguém perguntar onde estão os blocos que não são ao
mesmo tempo vermelhos e redondos, as crianças deverão mostrar o restante da Figura 10.
Também haverá a possibilidade de se fazer uma representação espacial, no modelo de
uma árvore, mas isso não é indicado para uma classificação lógica, segundo Dienes (1975, p.
11-12). Essa representação tem tanto valor como uma qualquer, mas exige da criança um
39
TERCEIRA ETAPA
Segundo Dienes (1975, p. 12), pode ser proposto aos estudantes que, feito um
diagrama, transfiram os blocos de uma repartição espacial para outra. Eles irão notar que
podem fazer essa transferência através dos conjuntos, pois os blocos agrupados em uma
repartição estarão agrupados na repartição correspondente em uma representação distinta.
Quando percebem que não se alteram as repartições, estarão deixando de considerar
propriedades que não interessam mais nessa parte do jogo, distinguindo as propriedades que
interessam das que não interessam.
Pode-se tomar um conjunto com poucos elementos do conjunto que está sendo
analisado, para esclarecer outras propriedades que podem ter provocado dúvidas, pois com
um número menor de elementos, fica mais claro o processo que está sendo analisado, como
mencionado por Dienes (1975, p. 12-14). Depois de terem feito uma abstração da repartição
de um conjunto particular, poderão associá-la a um universo, promovendo a correspondência
entre as propriedades dos conjuntos e as propriedades dos blocos.
Com a evolução das etapas, será preciso introduzir a implicação, como relatado por
Dienes (1975, p. 14-15). Uma das maneiras como isso pode ser realizado é através da retirada
de um dos conjuntos construídos para o jogo das conjunções. Por exemplo, se for retirado o
conjunto dos blocos redondos não vermelhos, e se na continuidade do jogo for escolhido um
redondo, então ele será vermelho. Essa é uma das propriedades condicionais do conjunto após
a retirada dos blocos redondos não vermelhos. Pode ser percebida também uma propriedade
disjuntiva, pois, com a retirada desses blocos, restarão somente blocos vermelhos ou não
redondos, evidenciando a propriedade conjuntiva com a conjunção “ou”.
Segundo Dienes (1975, p. 15), após o desenvolvimento e a evolução da atividade,
onde serão explorados os jogos de conjunção, disjunção, implicação e negação, e depois de se
ter repartido de diversas maneiras os conjuntos correspondentes, a criança terá atingido o
nível desejado de abstração.
40
QUARTA ETAPA
Dienes (1975, p. 16) afirma que, atingido o nível desejado de abstração, o aluno está
pronto para evoluir de etapa e prosseguir para a representação. A representação da ideia de
conjunção deve ser precisa e ele deve compreender os diferentes conceitos já construídos.
A Figura 11 representa uma rede lógica oferecendo uma possível representação da
conjunção, conforme Dienes (1975, p. 16).
Para a disjunção, pode ser feita uma representação semelhante, como descrito por
Dienes (1975, p. 17) na Figura 12:
Tem-se nessa representação da disjunção, como relatado por Dienes (1975, p. 17), que
a porta x fica no mesmo lugar, mas a bifurcação leva para baixo. Nessa representação, pode
ser notado que todos os elementos que possuem a propriedade x ou a propriedade y chegam à
saída (S). O complemento será composto pelos elementos que não possuem nem a
propriedade x nem a propriedade y. No caso que avaliamos, com x representando o atributo
“vermelho” e y representando o atributo “redondo”, todos os elementos vermelhos e todos os
elementos redondos chegarão à saída (S), mas apenas as peças que não são vermelhas e não
são redondas chegarão ao complemento (C). Dessa forma, representa-se a disjunção.
Para representar a negação, há vários casos, como relatado por Dienes (1975, p. 17-
18).
Na Figura 13, é descrito um modo em que os não-x chegam à saída (S) e, depois, todos
os y. Os y que são não-x já estão na saída (S), mas os y que são x vão passar pela porta x e
tomarão o caminho que passa pela porta dos y.
Na Figura 13, como visto em Dienes (1975, p. 18), os blocos que fazem parte do
conjunto saída são os não-x ou y. Pode ser visto facilmente como se constroem os conjuntos
dos não-x ou y.
Considerando-se outros casos da negação: se se quiser negar a propriedade y, o y deve
ser colocado embaixo, com a porta que dá diretamente para os complementares (C), como na
Figura 14:
Depois da negação de tudo isso se obtém um conjunto que contém todos os elementos
que não são “não-x ou não-y”.
Conforme Dienes (1975, p. 20-21), observando a Figura 11, pode-se perceber que os
mesmos elementos chegam à saída, tanto na Figura 11, como na Figura 15. Isso quer dizer
que a rede da Figura 15 reparte o conjunto universal entre o conjunto de saída e o conjunto
complementar, da mesma forma que na Figura 11. Desse modo, obtemos uma relação de
equivalência entre as duas redes analisadas, ou seja, a rede da Figura 11 é equivalente à rede
da Figura 15. Podemos dizer que duas redes são equivalentes quando elas fazem a mesma
repartição do conjunto universal no conjunto de saída e no conjunto complementar,
respectivamente.
Segundo Dienes (1975, p. 21), consegue-se assim introduzir no interior do sistema de
representação uma relação de equivalência, abordando-se desse modo um tema do próximo
nível da atividade, partindo então para a etapa cinco.
ETAPA CINCO
SEXTA ETAPA
Nessa etapa, como visto em Dienes (1975, p. 25), devem ser procurados métodos de
derivação, que vão permitir ir de um certo conjunto de propriedades a qualquer outra
propriedade da rede lógica, obtendo um sistema formal para a lógica envolvida na atividade.
Não há necessidade da compreensão de forma totalitária da lógica, podem ser estabelecidas
pequenas partes e assim, formar-se sistemas parciais formais, onde no interior das quais pode
se operar de maneira formal, tornando mais acessível à aprendizagem no sistema formal.
Na Figura 16, como mencionado por Dienes (1975, p. 28-29), vê-se o diagrama de
Cxy, seguido do diagrama Cyz e a rede de Cxz. O diagrama de Carroll vem depois, e o
conjunto das saídas de Cxy está hachurado horizontalmente e o Cyz hachurado verticalmente.
O conjunto correspondente a Cxz está hachurado obliquamente. Percebe-se que se um
elemento pertence ao conjunto de saída de Cxy, ao mesmo tempo em que o conjunto de saída
de Cyz, ele deve pertencer à parte do diagrama de Carroll que está hachurada no mesmo
tempo horizontal e vertical. Nota-se que cada elemento que pertence a esse conjunto
hachurado dessas duas formas pertence ao conjunto de saída Cxz.
Será necessário, para ser formal, acrescentar uma regra no jogo que permitirá
substituir cada x, cada y e cada z, em tal fórmula, por outra fórmula qualquer, sendo bem
escrita. Assim, uma fórmula bem escrita segue as leis da ortografia da escrita lógica
inventada. Existem dois aspectos que devem ser levados em conta para o formalismo: o
aspecto da escrita, onde existem métodos próprios para simbolizar os elementos do sistema,
caracterizando as leis da ortografia do sistema, e o aspecto das leis de transformações, que
correspondem às leis sintáticas de linguagem artificial.
Em Dienes (1975, p. 29-30) é esboçada a passagem, a partir de um jogo livre, isto é,
da adaptação inicial da criança a um meio construído para a aprendizagem das estruturas
matemáticas e lógicas, até a etapa em que a criança é capaz de manipular com sistemas
formais. É necessário observar que na elaboração das atividades não se pode pretender que
esta ou aquela etapa da aprendizagem o aluno adquira este ou aquele conceito, relativo aos
objetivos da atividade. As atividades devem ser elaboradas de uma forma que supõe critérios
capazes de dizer se a criança viu ou não aquela parte do conteúdo que estão se referindo.
46
O que ocorre em História Oral é que a opção por seguir este método implica
intencionalmente constituir fontes historiográficas – sejam essas fontes usadas ou
não, no presente ou no futuro, como tal. [...] Existem procedimentos relativamente
estáveis que temos seguido nas pesquisas com História Oral, quais sejam: (a) a
questão diretriz da pesquisa indica um grupo inicial de depoentes cuja memória é
julgada importante para compreender o tema levantado pela questão diretriz. Ao
serem convidados para participar da pesquisa, esses depoentes usualmente indicam
47
Quando cria fontes, o oralista pode, inclusive, dispor-se partir delas para a
constituição de uma narrativa historiográfica. [...] Mas a elaboração da fonte,
“apenas” ela, não é o todo de uma operação historiográfica: a fonte pode – se essa
48
Neste trabalho, através das entrevistas, foram registrados pensamentos, ações e desejos
dos entrevistados, e esses registros tornaram-se fontes de consulta para a elaboração e
desenvolvimento de meu Trabalho de Conclusão de Curso, como recomenda Garnica (2011,
p. 3):
(a) fazer surgirem questões de pesquisa, (b) buscar por informações e registrar
memórias – narrativas – que nos permitam tratar dessas questões; (c) cuidar desses
registros de forma ética e trabalhá-los segundo procedimentos específicos, tornando-
os públicos ao final desse processo; (d) analisar o arsenal de dados segundo
perspectivas teóricas em sintonia com alguns princípios previamente estabelecidos;
e (e) procurar criar formas narrativas alternativas às usualmente vigentes no meio
acadêmico, constituindo os trabalhos produzidos nessa vertente mais como campos
de experimentação que como arrazoados de certezas. (GARNICA, 2011, p. 5-6)
3.2 Considerações sobre as entrevistas com professoras que utilizaram os blocos lógicos
nas aulas de matemática durante o Movimento da Matemática Moderna
no Movimento para tentar responder aos questionamentos iniciais que lancei em minha
motivação para a realização deste trabalho.
A primeira entrevistada foi a Senhora H., a segunda entrevistada foi a professora
Monica Bertoni dos Santos e a terceira entrevistada foi a professora Maria Helena Camara
Bastos.
A Senhora H. trabalhou com os blocos lógicos com suas alunas do Curso Normal na
Escola Normal Experimental Dom Diogo de Souza e sua última aposentadoria foi há dez
anos. A professora Monica Bertoni dos Santos ainda leciona, mas, inicialmente, tinha contato
com alunos desde anos iniciais até universitários e, desde 2001, trabalha apenas com
universitários, na PUCRS. No curso de Licenciatura em Matemática, trabalha em diferentes
níveis com os blocos lógicos. Desenvolveu seus conhecimentos sobre materiais didáticos
manipuláveis quando se iniciou o Movimento da Matemática Moderna e o Movimento da
Educação Matemática no Brasil. Foi uma das presidentes do GEEMPA e participa até hoje de
algumas ações do Grupo. A professora Maria Helena Camara Bastos é licenciada em História,
sendo professora e pesquisadora na área de Educação, com ênfase em História da Educação.
Atuou como professora polivalente em 1973 e 1974, no Colégio de Aplicação da UFRGS,
onde teve contato com os blocos lógicos. Atualmente é professora do Curso de Pós-
Graduação em História da PUCRS.
A Senhora H. lecionou durante 40 anos. Foi durante 12 anos professora em Porto
Alegre do ensino primário, que corresponde aos anos iniciais do ensino fundamental, uma
alfabetizadora. Posteriormente, foi para a cidade de Tapes, no Rio Grande do Sul, lecionar na
Escola Normal, recém inaugurada. Depois, retornou para trabalhar em Porto Alegre, indo
trabalhar na Escola Normal Experimental Dom Diogo de Souza 1, dedicando-se à formação de
professores. Participava ativamente das ações do GEEMPA durante o Movimento da
Matemática Moderna, ministrando cursos envolvendo os blocos lógicos, mas participava mais
como ouvinte do que como organizadora dos eventos. Fez parte do GEEMPA por alguns
anos, mas não conseguiu conciliar suas atividades pessoais e profissionais, abandonando a
direção do GEEMPA, continuando a participar como ouvinte.
A professora Monica trabalhou recentemente com os blocos lógicos com universitários
em uma disciplina que é focada na lógica, “Desenvolvimento do Raciocínio Lógico”, e é
oferecida aos licenciandos de matemática no primeiro semestre. Foi muito ativa no
1
A Escola Normal Experimental Dom Diogo de Souza não permanece com o mesmo nome, sendo agora o
Instituto Estadual Dom Diogo de Souza.
50
Sim, palestras, cursos, debates, reuniões com professores, reuniões, por exemplo,
com muitas professoras de matemática, isso foi muito intenso. [...]Participei também
de [cursos para] professores já formados, na PUC também, onde eu dei alguns
cursos, trabalhos, aulas, sobre especialmente os blocos lógicos. Professores de toda
região, não só de Porto Alegre. Demos cursos. (H., 2012)
Ativamente, eu fui, durante muitos anos, até hoje eu participo, durante muitos anos
eu participei muito ativamente e eu fui uma das presidentes do GEEMPA [...] Desde
a organização, depois a gente fazia os cursos, a gente servia de monitora para eles
[Tamás Vargas, Régine Douady e Michèle Artigue], porque a gente trabalhava
bastante no GEEMPA. (SANTOS, 2012)
Nessas entrevistas, merece ser destacado a busca de inovações, por parte dos
professores e de algumas escolas, para as aulas de matemática, desejando alterações no
currículo vigente, além de trabalhar com materiais manipuláveis no ensino de matemática,
como pode ser visto na entrevista da professora Monica, que foi o que a motivou a participar
do Movimento:
de que se aprende, não se utilizava esse termo “se aprende” na coletividade, mas o
trabalho em grupo foi uma coisa assim, que nós fizemos muito estudo para o
trabalho em grupo, com o professor Lauro de Oliveira Lima, porque aquela ideia de
uma criança atrás da outra, só olhando pro professor ou pra professora trabalhando
no quadro, isso era uma ideia que a gente queria abandonar. [...] Então, todas essas
coisas diferentes eram trabalhadas no Movimento da Matemática Moderna. Os
conteúdos mudaram, a forma de trabalho na sala de aula mudou, o aluno como
agente, trabalha com autonomia. (SANTOS, 2012)
Fui para a didática da matemática e daí mais eu precisava. E daí veio a onda de
Dienes. [...] E participando então eu vi os trabalhos de Dienes, nós fazíamos, então
nós éramos as alunas. Eu, por um tempo, fui uma entusiasta, deste trabalho, porque
eu percebi muito, há muitos anos de trabalho, foram 40 anos de magistério, e eu vi a
dificuldade do pensamento lógico, e eu trabalhava com as minhas alunas. (H., 2012)
Mas não é o brincar pelo brincar, nem o jogar pelo jogar. É tudo para que a criança
pense, elabore e construa o conhecimento. (BASTOS, 2012)
Havia iniciativas anteriores ao Movimento, mas eram isoladas e não tinham tanta
divulgação como as propostas que o Movimento defendia. Havia cursos para professores no
Instituto de Educação General Flores da Cunha, sendo que uma das entrevistadas, a professora
Monica, participava desses cursos. Segundo as professoras entrevistadas,o uso dos materiais
concretos e manipuláveis foi uma constante busca dos educadores que desejavam tornar a sala
de aula um ambiente rico de aprendizagens e diferente do que os alunos estavam acostumados
a compor, desmistificando a matemática, tornando-a mais simples que nos livros didáticos da
época e querendo propor que o discente pensasse sobre aquilo que estava conhecendo com os
blocos lógicos. Como relataram a Senhora H. e a professora Monica:
O que nós fazíamos era propor problemas para os alunos, deixar para os alunos
descobrirem sozinhos e construir seu conhecimento a partir desta descoberta. [...] E
isso também nós aprendemos com o professor Dienes. Trabalhar com materiais,
52
isomorfos aos blocos lógicos, pra não ater uma estrutura lógica apenas aos blocos
lógicos, trabalhar com uma coisa que a gente chama de princípio da variabilidade
perceptual, trabalhar com algum material manipulável que tem ou não a estrutura
dos blocos lógicos. É uma coisa superinteressante, mas isso precisa se saber
trabalhar. (SANTOS, 2012)
Para a criação dessas aulas, cada professora polivalente tinha várias assessoras
especializadas em cada área de ensino, que auxiliavam a elaborar as aulas e apresentavam
materiais didáticos pedagógicos para tornar o ambiente escolar um meio de construção de
conhecimento, mais atrativo para os aprendizes. Inúmeras professoras de escolas estaduais
vinham semanalmente tirar as dúvidas, como relatou a professora Maria Helena:
tenta fazer o que a humanidade tenta fazer através dos séculos, chegar lá no início,
partir do início e não do fim. (H., 2012)
Segundo a Senhora H., quem não concordava com esse novo método de ensino, com a
utilização de materiais didáticos manipuláveis e a liberdade de inovar nas aulas, eram alguns
pais e algumas escolas, acreditando que dessa forma os alunos não aprendiam, apenas
brincavam. Depois desses cursos dados por Dienes, as professoras queriam experimentar
essas atividades, mas os conteúdos e o ambiente escolar eram muito rigorosos. Como relatou
a Senhora H.:
Chegou o Dienes. Nós assistíamos então, uma colega minha e eu, todas as aulas,
sessões, tudo o que ele proporcionou, pelo GEEMPA, nós fazíamos parte também. E
tentamos aplicar, só que, por exemplo, eu não apliquei diretamente, as minhas
alunas faziam o trabalho em sala de aula. Houve, no início, uma ..., não bem uma
revolta, mas uma desconfiança muito grande dos pais, porque eles diziam que as
crianças iam para a escola para brincar. E daí nós observamos durante muito tempo.
As moças aplicavam e depois quando iam para o estágio também aplicavam,
dependendo da escola, algumas não permitiam, porque achavam que era brincadeira,
que não sei o quê. [...] Alguns grupos escolares permitiam, outros pensavam que era
bobagem e que não ajudava, embora a gente apresentasse os resultados, não se
convencia. (H., 2012)
Havia escolas antes do Movimento que eram baseadas totalmente em pesquisas, como
a Escola Normal Experimental Dom Diogo de Souza, como relatou a Senhora H. Nessa
escola, as professoras estavam livres para utilizar qualquer material pedagógico, mas com a
orientação de um setor da escola e da Secretaria de Educação, sendo que o setor da escola
responsável por aquela atividade tornava aquilo um meio de pesquisa, para poder se explorar
todos os benefícios que aquele material era capaz de produzir, e a Secretaria de Educação
fiscalizava as atividades que eram elaboradas e aplicadas.
54
Conforme mencionado pela Senhora H., quando essas ações começaram a ganhar
grandes proporções, e aceitação dos pais com aquele método de ensino, das escolas e dos
docentes, as pesquisas foram proibidas, e as escolas que utilizavam a pesquisa como
ferramenta de ensino ficaram fragilizadas. Nesse meio tempo, o Movimento da Matemática
Moderna começava a ser divulgado no Rio Grande do Sul pelo GEEMPA, sendo o professor
Dienes convidado a dar palestras, sessões de estudo, aulas e cursos em Porto Alegre,
mostrando os blocos lógicos como ferramenta de ensino, motivando as professoras para um
inovador ensino de matemática, pois com o Movimento, estava prevista também uma
reformulação do currículo, baseada na aprendizagem do estudante.
Antes de Dienes vir a Porto Alegre, a professora Esther Grossi deu cursos preparando
para sua vinda, as professoras Senhora H. e Monica participaram desses cursos.
A professora Monica disse que o primeiro contato dela com a matemática moderna foi
quando o professor Dienes veio pela primeira vez a Porto Alegre no Colégio Rosário, pois
antes ela estava trabalhando com outras áreas de ensino, que não a matemática, e nessa
ocasião conheceu os blocos lógicos e todos os recursos que o professor Dienes utilizava.
Neste momento, apaixonou-se por uma matemática diferente, em que todos poderiam
aprender e construir seus conhecimentos, estando motivada a fazer o curso de matemática,
como mencionado por ela:
Quando veio pela primeira vez o professor Dienes para Porto Alegre, foi a primeira
vez que eu entrei em contato efetivamente com a matemática moderna. [...] Pois foi
ele quem trouxe efetivamente o uso desses materiais. Eu me lembro na primeira vez
em que ele veio a Porto Alegre, ele deu um curso ali no Colégio do Rosário, e foi a
partir daí que eu tomei conhecimento dos blocos lógicos e todos os recursos que ele
[utilizava]. [...] Com o professor Dienes, eu comecei o curso de Matemática
efetivamente. E aí eu fui fazer o curso de Matemática, que terminei em 1975. [...]
Agora, eu nunca me esqueço, a primeira vez em que eu me deparei com uma
matemática diferente daquilo que eu tinha aprendido, eu fiquei assim, extasiada.
(SANTOS, 2012)
A professora Maria Helena participou de ações do GEEMPA nos anos em que atuou
como professora de matemática, pois a professora Léa Fagundes a convidava para participar
desses eventos envolvendo a matemática moderna. Comentou que várias professoras que
davam aula no Instituto de Educação atuavam também no GEEMPA.
No período em que Dienes vinha a Porto Alegre, a professora Monica foi monitora
dele, organizando todo o material de que ele necessitava e ajudando-o no que fosse preciso.
Também auxiliou também outros participantes dos eventos do GEEMPA, ressaltando os
professores Michèle Artigue, Régine Douady e Tamás Vargas. Como a mesma comentou:
55
Eu trabalhava com as minhas alunas. Elas riam, achavam graça, “Professora hoje
nós vamos brincar? É, nós vamos brincar, todo mundo vai brincar hoje!”. E depois,
anos, a gente se encontrava, elas diziam: “Professora o que a Senhora dizia na sala
de aula acontecia!”. [...] Quer dizer, houve um resultado muito positivo, só que foi
pouco abrangente. (H., 2012)
A professora Maria Helena trabalhou com os blocos lógicos em uma turma de sexta
série, passando entre os grupos para notar onde estavam as dificuldades sempre que utilizava
os blocos lógicos, questionando os alunos e perguntando sobre os processos que estavam
executando. Como a mesma relatou:
O dia em que o Dienes foi na minha sala, os alunos também estavam, porque eu
tenho essa imagem visual, distribuídos em grupos e eles estavam fazendo uma tarefa
que foi toda planejada, orientada, porque foi na minha sala e da Sílvia, eram duas
salas em que ele [Dienes] foi, e aí tinha toda uma atividade que nós ficamos até
56
quase até a meia noite fazendo, porque eu vou te dizer, devia ser uma segunda-feira
e ele iria na terça. Eu sei que eu morava ali na Tomáz Flores e era quase meia-noite
quando eu fui para casa. Preparando, organizando, e tudo para os alunos realizarem
durante a visita. Mas não me lembro qual foi a tarefa. (BASTOS, 2012)
A professora Maria Helena contou que trabalhava com os blocos lógicos com teoria de
conjuntos, frações, relações de cor, tamanho, espaço e com a intersecção, lembrando
vagamente das atividades que lançava com os blocos lógicos, como mencionou:
Tem toda uma lógica de utilização desse material para construir a abstração. Então é
óbvio que a criança, trabalhando com isso, vai abstrair, vai tirar conclusões, vai ver
características, vai construir o pensamento. (BASTOS, 2012)
Segundo a Senhora H., os estudantes não aprendiam na hora em que o assunto estava
sendo inserido, apenas com muito desenvolvimento e paciência. Como mencionou:
Eu tinha colegas, por exemplo, que tinham alunos em várias escolas de Porto Alegre
e elas chegavam pra mim e diziam: “Mas H., isso vai dar certo? Eles não estão
aprendendo, não sei o quê, multiplicação, divisão, não sei o quê”, eu disse: “Vai dar
certo, calma! Só que precisa paciência”. Tudo o que é de educação é um trabalho
demorado. A educação não pode ser trabalhada de um dia pro outro. É demorado,
contínuo, uma das características. (H., 2012)
Como naquela época a maioria das pessoas apenas frequentavam o ensino primário, a
Senhora H. defendia que os professores preparados para esse público deveriam ser muito bem
preparados, sendo um dos motivos para essa conquista a utilização de materiais pedagógicos,
pois isso tornava o ensino mais interessante e aceitável pelos discentes. Como na entrevista a
Senhora H. relatou:
Eu sempre dizia que os professores primários têm que ser os melhores. [...] Por uma
questão estatística, simplesmente. Porque na época já havia estatística, que na
maioria do povo brasileiro [a escolaridade] ia no máximo até a quarta série. [...] E
daí eu dizia: “Se eles vão só até a quarta série, eles têm que ter o melhor até a quarta
57
série, eles têm que ter professores que entendem de Psicologia, Sociologia, pra tirar
o máximo daquela professora”. Então, nós fazíamos na Escola Dom Diogo de
Souza, se fazia vestibular, como todas as outras, e depois meio ano de preparação e
três anos de magistério. Não entravam assim, mesmo fazendo a prova, elas faziam
meio ano de matemática, português principalmente, mais tudo, história, geografia,
e.... A gente tentou conservar isso por muito tempo, mas depois também não
pudemos mais. Mas eu partia desse princípio, professor primário, é para muitas
pessoas, e não é um montinho, o único professor que eles vão ter na vida. (H., 2012)
Como contou a Senhora H., muitos professores não estavam engajados nas propostas
que o Movimento divulgava, mas com o incentivo de outros colegas que utilizavam e
acreditavam nas mesmas, os educadores acabaram se convencendo e utilizando mais recursos
didáticos em suas aulas, ficando convencidos, depois de suas aplicações, que os alunos
estavam pensando e refletindo sobre aquilo que estavam trabalhando, construindo seu
conhecimento em lógica através dos blocos lógicos. Como foi marcante para a Senhora H.:
Também pude observar em duas entrevistas a relação entre Dienes e Piaget, pois os
educadores que desejavam utilizar as ferramentas de Dienes tinham que estudar Piaget e suas
estruturas para depois aplicar as atividades e entender o processo de conhecimento que
acontecia. A professora Maria Helena relatou que teve que estudar muito Piaget, Dienes e
outros autores matemáticos para aplicar os blocos lógicos e acompanhar o trabalho da
professora Ana Cristina Rangel, que utilizava os blocos em suas aulas. Como mencionado
pelas professoras:
E muito, claro, muito baseado no Piaget. Piaget estava sempre. Ele foi a base do
meu trabalho todo, ele já falava tudo dessa matemática, teve novos nomes, os nomes
mudam, matemática concreta, matemática significativa, não é nada disso, a
matemática é matemática. Enfim, mas usavam esses nomes. E o Piaget, as pessoas
tinham muito medo dele, quando eu dizia: “Não, eu me baseio em Piaget, eu leio
Piaget e não sei o quê”, “Mas Piaget é muito difícil, não dá pra entender”. Mas é que
podem sair dele princípios, e tudo. Aquelas etapas pra se chegar à aprendizagem,
que são do concreto até o abstrato, a espera dos 11 anos, mais ou menos, em que se
forma o pensamento abstrato, em que a pessoa realmente chaga ao conceito. Isso é
toda uma escadinha, daí isso aí tudo eu trabalhava bastante com as meninas e dava
58
bastante resultado, até pra elas, e pra mim também, também aprendi muito, com
isso, esses teóricos. (H., 2012)
A Senhora H. relatou que utilizou esse material porque acreditava no potencial que
estava envolvido com suas atividades e tinha a finalidade de aprimorar os conceitos de lógica.
Como mencionou:
Eu, como te disse não usei com crianças, [mas usei] porque eu acreditei. Porque
acreditei que poderia haver e ter um ensino melhor de matemática, mais
fundamentado, mais entendido, menos decorado. Eu acreditei, bastante. [...] Para
chegar a esses conceitos [de] que eu falei. Eles aprenderem a comparar, a selecionar,
..., a tornar significativa a matemática. Porque eles nada mais são do que um
material didático, só que um material didático bem estruturado e bem pensado. (H.,
2012)
Porque eu não uso só os blocos lógicos, eu uso vários materiais. Uso materiais
industrializados [pega uma caixa de madeira intitulada de Maquete dos Números e
me mostra], como este aqui, por exemplo, é um material maravilhoso, são as
Maquetes dos Números, uso o material de Cuisenaire, uso o Base 10, o Multibase,
eu uso os blocos lógicos. Então eu uso vários materiais, dependendo do conteúdo
que eu vou trabalhar. Entendes? Ou industrializados ou confeccionados por mim.
Agora, como eu me dediquei muito a trabalhar com alfabetização matemática e com
lógica, esse [toca na caixa de blocos lógicos que levei] é o material que mais se
apropria pra isso, então por isso é que eu trabalho muito com os blocos lógicos. Mas
trabalho com outros materiais também variados também. (SANTOS, 2012)
figuras geométricas, as cores, têm muitas coisas que eu trabalho. Mas o básico
mesmo é trabalhar as estruturas lógicas. (SANTOS, 2012)
A professora Maria Helena utilizava os blocos lógicos por ser uma orientação da
professora especialista Léa Fagundes, mas admite que os blocos lógicos contribuíram muito
para o desenvolvimento do raciocínio lógico dos envolvidos com suas propostas de ensino.
Com a utilização dos blocos lógicos, a professora Maria Helena sempre conseguia partir do
concreto para o abstrato, tornando mais simples para o estudante o aprendizado da lógica e de
todos os conceitos que estavam inseridos nas atividades propostas. Como afirmou:
A Léa, muito mais com as questões dos blocos lógicos, da topografia, topologia,
todos esses conhecimentos e de construção do conhecimento das crianças em
matemática. E a teoria dos conjuntos, todas essas coisas. [...] A questão do
pensamento, principalmente do raciocínio lógico, a partir do concreto para o
abstrato. (BASTOS, 2012)
As aulas todas eram programadas. Só que elas sempre foram programadas, mas às
vezes elas saíam daquele meu objetivo. Então essa liberdade tem que ter. As
crianças traziam, as crianças ou as alunas, elas me contavam, como eu te disse, eu
orientava, e muitas vezes o meu objetivo era um, o da minha aluna era um, e a
criança extrapolava aquilo, uma beleza. E a gente ficava feliz. (H., 2012)
Não se faz aula livre. Toda aula tem que ter objetivo muito bem traçado, os recursos,
os materiais, os procedimentos, porque eu trabalho com a teoria dos campos
conceituais, são coisas muito planejadas. E claro que, um professor que tem prática
de trabalhar com seu planejamento, ele cria, ele inova, mas não existe algo sem um
planejamento. (SANTOS, 2012)
As aulas, nós temos todas as aulas, em planos, todas, nós fizemos isso para as
escolas do Estado poderem adotar. [...] Então tudo foi transcrito em planos. Todos.
[...] Porque é muito importante. (BASTOS, 2012)
Com a inserção dos blocos lógicos nas aulas de matemática, como pode ser visto nas
entrevistas da Senhora H. e da professora Monica, os alunos ficavam mais envolvidos com as
atividades, queriam participar mais das aulas, estavam dispostos a debater sobre as decisões
que tomavam, entendiam a teoria que estava envolvida com os blocos lógicos e queriam fazer
as atividades que a professora lançava, estavam motivados e participativos.
A professora Monica confirmou que os blocos lógicos auxiliam o aprendizado da
lógica, persistindo os ensinamentos da lógica depois de muito tempo. Como relatou:
A minha experiência, com alunos, assim, que foram meus alunos no primeiro ano da
faculdade e que depois vão fazer uma disciplina de lógica mais pura, digamos,
lógica mais avançada, “Professora, eu me lembro dos blocos e consigo generalizar!”.
Então eu tenho a absoluta certeza, de que a partir de um trabalho bem feito, com
conhecimento de causa, com objetivos, entende? Tu podes fazer coisas maravilhosas
pelos alunos. (SANTOS, 2012)
ensino da lógica e também que muitos professores não estavam preparados para utilizar esse
material, compreendiam sua importância, mas não sabiam como poderiam explorá-lo em
ambiente escolar. Também relataram que foi um trabalho quase que exclusivo do GEEMPA:
Porque não conseguiram convencer todo mundo. O pessoal não se aprimora, não se
esforça, os próprios professores. Porque, claro, o professor está ganhando uma
miséria. [...] E é verdade. O magistério, assim, está abaixo de qualquer crítica para a
política, tudo, a culpa é do magistério. Eles não estão conseguindo se preparar e
justamente isso que eu te digo, chegam a um curso superior e não sabem escrever. E
aqueles poucos que tentam não estão tendo vez. O próprio GEEMPA tenta
[convencer professores] e também por alguns desvios durante o caminho [que não
conseguiram convencer muitos educadores]. Não sabem transformar aquela
brincadeira em conceitos, não sabem fazer as perguntas, e aí foi caindo. Eu quando
terminei o magistério já, praticamente, não se usava mais. [...] Precisaria de uma
orientação federal, estadual, municipal, mas gente que tivesse a mesma ideia, o
mesmo pensamento, que se dispusessem em conjunto a aplicar, a fazer pesquisa,
como se diz. Quer dizer, acompanhar crianças que vão desde o início, saber como
elas estão na quarta série, na quinta série, na oitava série, hoje em dia nessa seriação
que tem. Isso não pode ser uma coisa largada, tem que ter um acompanhamento. E
tem que chegar aos conceitos, se não, não adianta, se não é só brincadeira mesmo.
De classificação, de correspondência, isso tudo o aluno ter que chegar. E daí a
maioria dos professores, não sabem mais, hoje em dia nem sabem mais, então é por
isso que eu acho que não deu certo. Não houve uma unidade dos professores e
também das pessoas responsáveis pela educação, maior do que os professores, de
incrementar isso. Foi um esforço, praticamente que individual do GEEMPA e de
alguns professores. E para tu sejas professor, tu tens que estar permanentemente ou
se atualizando, ou frequentando cursos, que tu podes até contestar, mas tu tens que
ter um elemento firme para contestar. (H., 2012)
Em primeiro lugar, eu acho que as pessoas não sabem usar os blocos lógicos como
eles devem ser usados. [...] Eu acredito que o uso dos blocos lógicos não seja
adequadamente utilizado porque as pessoas não sabem como trabalhar com eles. E
como não sabem como trabalhar, como nunca trabalharam como alunos com os
blocos lógicos, não entendem o valor que eles têm. [...] As pessoas não sabem usar e
não sabem o valor que tem. Então não usam. (SANTOS, 2012)
Vamos supor, usar os blocos lógicos como um brinquedo, não deixa de ter o seu
valor, porque uma criança que usa os blocos lógicos como um brinquedo,
automaticamente ela vai separar pelas cores, ela vai separar pelas formas, pelo
tamanho, ela vai falar os nomes das figuras, que são as faces dos blocos e tal, mas
usar como um recurso pedagógico, por exemplo, para que os alunos classifiquem,
para que os alunos ordenem, para que os alunos trabalhem os conectivos lógicos,
associados aos diagramas de Venn, aos diagramas de Carroll, aos diagramas de
árvore, trabalhar com o princípio multiplicativo, trabalhar com codificadores
lógicos. Para fazer isso tu precisas saber trabalhar, então eu acredito que as pessoas
não usem pedagogicamente, didaticamente, como recurso para ensinar lógica,
porque não sabem. Porque no momento que as pessoas sabem utilizar, elas utilizam.
62
Então os blocos lógicos existem, eles estão nas escolas, as pessoas sabem que eles
são importantes, mas as pessoas não sabem usar adequadamente como um recurso.
Certo? Se tu perguntares para a maior parte das pessoas, as pessoas ligadas à
matemática, elas sabem que existem os blocos lógicos, mas não sabem o valor dos
blocos lógicos para o ensino da lógica. [...] Tu tens uma série muito rica e muito
interessante de trabalhos de lógica, de frações, de número, que tu podes trabalhar
com os blocos lógicos. Mas tu tens que saber. [...] Têm muito poucas pessoas que
efetivamente sabem trabalhar com os blocos e entendem o valor do trabalho com os
blocos. (SANTOS, 2012)
A professora Monica relatou que trabalha com os blocos lógicos e outros materiais que
têm uma estrutura parecida com os blocos, e que são confeccionados por ela e por seus
alunos, o que também era uma das ideias divulgada por Dienes no Movimento da Matemática
Moderna, como comentou:
Eu trabalho com os blocos lógicos e uma coisa que se chama materiais estruturados,
que são materiais confeccionados pela gente, que são estruturas isomorfas aos
blocos lógicos. Então o trabalho se torna mais rico ainda. E isso também nós
aprendemos com o professor Dienes. Trabalhar com materiais, isomorfos aos blocos
lógicos, pra não ater uma estrutura lógica apenas aos blocos lógicos, trabalhar com
uma coisa que a gente chama de princípio da variabilidade perceptual, trabalhar com
algum material manipulável que tem ou não a estrutura dos blocos lógicos. É uma
coisa superinteressante, mas isso precisa se saber trabalhar. (SANTOS, 2012)
Outra recordação significativa da Senhora H. foi com as alunas do curso normal, que
depois de alguns anos conseguiram compreender a teoria de aprendizagem que estava sendo
desenvolvida com a utilização dos blocos lógicos no ensino de matemática, como relatou:
E também a reação dos alunos, das alunas do curso normal. Quando elas chegavam
assim e diziam: “Professora, agora eu entendi aquilo que estudei no tempo em que
eu fiz!”, que bom. Porque isso aqui nada mais é do que desvendar, a matemática
chegou a um conceito, mas ela deve chegar a cada pessoa, e não [o professor] pegar
o conceito já pronto e dar para o aluno, por isso que ela não aprende matemática.
Não entende o que está fazendo. Então a matemática significativa, seja qual for o
nome, matemática moderna, ela tenta fazer o que a humanidade tenta fazer através
dos séculos, chegar lá no início, partir do início e não do fim. A matemática estava
sendo ensinada a partir do conceito, na multiplicação, na divisão, nessas operações
fundamentais. Nós muitas vezes não sabíamos porquê eles não resolviam o que se
chamava de problema, porque ele não conseguia encaixar aquilo. (H., 2012)
Para a professora Monica, o que mais a marcou naquela época foram as presenças de
Dienes e do professor Vargas em cursos e ações promovidas pelo GEEMPA, além de uma
matemática diferente da qual havia aprendido e da utilização de materiais concretos
manipuláveis no ensino de matemática, como contou:
E acho que, embora as pessoas achem que o Movimento seja fracassado, eu não
tenho essa opinião. Minha opinião é que como tudo, tudo não, mas como muitas
coisas que são implantadas no mundo, as pessoas não estão bem preparadas para
isso, é o que aconteceu. Mas muitas coisas, os livros didáticos, por exemplo, uns
antes e depois do Movimento, pelo meu entender. (SANTOS, 2012)
A professora Maria Helena também acredita que trabalhar com o ensino da lógica é
fundamental, principalmente com materiais manipuláveis, e que o conhecimento é obtido
através de muito desenvolvimento e de muita manipulação. Relatou que percebe a dificuldade
dos alunos em suas aulas de história quando precisa, com alguma atividade, o
desenvolvimento do raciocínio lógico. Como relatou em sua entrevista:
A professora Monica acredita que o uso dos blocos lógicos não é algo simples, que
deve ser muito estudado, deve ter embasamento teórico, deve ser composto de vários módulos
de ensino para contribuir para o aprendizado da lógica. Como relatou:
Mas se tu queres que ele produza, como é que eu vou dizer, tenha uma finalidade,
para a qual realmente eles foram criados, então tu tens que compreender muito, tu
tens que estudar muito, tu tens que fazer os jogos primeiro, e depois aplicar para as
crianças. E a primeira vez que tu vais aplicar tu não vais explorar tudo que tu podes.
A gente vai saber explorar depois de usar umas quatro, cinco ou seis vezes. Então ai
tu vais estar apta a fazer render o que eles podem render. (SANTOS, 2012)
Eu acho indispensável. Mas também nunca, Francine, é usar por usar. O material
concreto, ele tem que ser usado muito criteriosamente, tá? Com objetivos claros,
sem enjoar as crianças, tem uma etapa primeiro, uma etapa de jogo livre, isso
também é do professor Dienes, depois tu tens uma etapa de jogos com regras,
depois, quando as crianças abstraem as regras, tu podes tirar o material e trabalhar,
representar, fazer várias representações e depois eles vão abstrair e generalizar. É
isso aí a etapa, são as etapas da construção do conceito de verdade. (SANTOS,
2012)
A professora Maria Helena também acredita ser muito importante o uso de materiais
concretos em sala de aula, pois recentemente nas suas aulas percebeu a dificuldade dos
estudantes em entender questões históricas sem o uso de materiais ilustrativos, precisando na
maioria das vezes de uma ferramenta diferente e demonstrativa sobre o conceito que estava
ensinando, como relatou:
Eu acho que com criança é fundamental, inclusive com os adultos. Porque eu vejo
que as professoras aqui da prática, que dão metodologia do ensino de matemática,
para as professoras que vão ser professoras de educação infantil, de séries iniciais,
elas trabalham com isso. Para elas poderem saber explorar, então, é fundamental. E
tudo aquilo que tu podes observar, o lúdico, o olhar com os olhos, hoje, por
exemplo, se eu der uma aula expositiva e não usar datashow, os alunos, parecem que
não entendem nada. Porque eles precisam estar vendo. Então história, tem que
mostrar mapa, tem que mostrar linha de tempo, porque os séculos parecem que é
uma coisa muito abstrata, por exemplo, eu dou história da educação, mas eu mostro
pra elas que elas vão ter que trabalhar com conceitos fundamentais com as crianças,
tempo e espaço. Então o espaço, é geográfico, é temporal, é matemático, é tudo. Pra
elas entenderem. Porque senão elas acham que o espaço é só geografia, espaço é só
[a geografia que trabalha], e tempo é só a história que trabalha. Então são conceitos-
chave que têm que ter concretude e abstração, porque senão o clique não faz.
(BASTOS, 2012)
Pode ser visto nas entrevistas, que algumas escolas e alguns educadores estavam
dispostos a mudar a metodologia de ensino, buscando inúmeras alternativas para essa
inovação. O Movimento da Matemática Moderna divulgou propostas de desenvolvimento do
ensino de matemática de um modo em que o professor deixava de ser o foco, que passava a
ser o aprendizado do educando, baseado no uso de materiais pedagógicos manipuláveis para
tentar construir, aplicar e trabalhar de um modo mais receptivo com os conceitos que eram
ensinados em sala de aula.
divulgação dos blocos lógicos, querendo saber como é que estavam sendo utilizado esse
material didático manipulável em ambiente escolar e quais suas contribuições para a
aprendizagem dos conceitos abordados e explorados pelos blocos lógicos.
No XI Encontro Gaúcho de Educação Matemática (EGEM), que ocorreu entre os dias
22 a 25 de agosto de 2012, no Centro Universitário Univates, em Lajeado, Rio Grande do Sul,
foi oferecida uma oficina intitulada “Blocos Lógicos, Peças Retangulares e o Início do Pensar
Matemático” pelo ministrante Valdir Pinheiro Filho, da qual participei, pensando em
entrevistar os envolvidos e aprender sobre como trabalhar e explorar o material, desejando
perceber como os blocos lógicos são utilizados atualmente em ambiente escolar.
A oficina foi realizada de uma maneira bem informal, estando todos os participantes
envolvidos na construção de atividades para os dois materiais evidenciados na oficina, os
blocos lógicos e as peças retangulares, sendo que as peças retangulares é um material baseado
nas estruturas dos blocos lógicos, composto por peças em formato de retângulos, variando no
tamanho (pequeno, médio e grande), na largura (estreito e largo) e na cor (vermelho, azul,
verde e amarelo). Inicialmente, foram apresentadas as peças dos blocos lógicos e as peças
retangulares. Em um primeiro momento, trabalhamos apenas com os blocos lógicos. Foram
criados dois grupos, pois participavam apenas 6 pessoas, todas em formação acadêmica de
graduação, apenas uma com o conhecimento dos blocos lógicos. Inicialmente, foi solicitado
que os participantes manuseassem o material e verificassem as diferenças entre forma,
tamanho, cor e espessura das peças, ressaltando a estrutura do material. Após esse momento,
foi solicitado por Valdir que classificássemos as peças da maneira como julgávamos que os
nossos alunos iriam separá-las.
Depois de explorar essa atividade e comparar como os grupos separaram os blocos,
Valdir pegou uma peça dos blocos lógicos e tirou-o de nossa visão, dando atributos dessa
peça e pediu para que nós adivinhássemos que bloco era, por exemplo, digamos que Valdir
tenha escondido o bloco quadrado pequeno fino vermelho, ele prosseguiria a atividade
questionando: “Não é círculo, não é retângulo e não é triângulo. Que formato essa peça tem?”,
responderíamos que só poderia ser quadrado. Valdir continuava: “Não é grande, então é?,
falaríamos que só poderia ser pequeno. Ele prosseguia: “Não é azul e não é amarelo. Que cor
é?”, comentaríamos que apenas poderia ser vermelho. Ele afirmava: “Não é grosso!”,
concluiríamos que deveria ser fino. Para finalizar, Valdir perguntava: “Então, qual é a peça?”
e assim finalizávamos dizendo que era um quadrado pequeno fino vermelho. Assim fez várias
vezes.
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Bom, a oficina de blocos lógicos ela trata muito é de traçar ideias sobre formas
geométricas, traçar ideias sobre raciocínio lógico, entre outras ideias, no caso, de
ensino fundamental, das séries iniciais. [...] Público alvo dessa oficina, desse mini
curso é justamente para os graduandos em matemática ou pedagogia ou professores
já formados, que estão no caso, nas séries iniciais. (PINHEIRO FILHO, 2012)
Porque assim, eu [esse material] mesmo não conhecia. Em relação a esses blocos,
para estar conhecendo, estar manipulando, e ver qual a melhor, as melhores
atividades para estar depois aplicando em sala de aula. Para estar passando para os
alunos questões de conhecimento, enfim, para poder estar utilizando nas aulas de
matemática em si. (SILVA, 2012)
Adriana contou que a oficina a motivou a usar os blocos lógicos em sala de aula, pois
acreditava no potencial de aprendizagem da lógica desse material e pensava que a utilização
de materiais concretos no ensino auxiliava o estudante a desenvolver o conhecimento na área
em estudo, como mencionou:
Sempre que possível, se tu puderes relacionar algum conteúdo em que você for
passar para os alunos, se tu puderes relacionar com os blocos, é muito mais
interessante, porque além de despertar o interesse do aluno, ele se envolve mais na
aula, quando tem um material diferente. Então, com certeza eu vou utilizar. [...]
Porque de certa forma o aluno visualizando e podendo manipular, ele absorve o
conteúdo mais facilmente. Eu acredito que manipulando e visualizando é mais fácil
ele compreender. (SILVA, 2012)
Valdir citou que não aplicou os blocos lógicos com alunos, apenas trabalhou com eles
na disciplina de “Laboratório de Matemática I”, em que os alunos da disciplina simulavam
atividades envolvendo os blocos lógicos e agiam da maneira como julgavam que seus alunos
iriam executar a atividade proposta, analisando as ações dos educandos e melhores
intervenções que os professores poderiam fazer naquela aula em que estariam utilizando os
blocos, como contou:
Bom, na sala de aula, por exemplo, nós usávamos os blocos lógicos, aprendemos a
usar, como tratar com eles em sala de aula, com as crianças e tal, no ensino
fundamental, e foi isso. (PINHEIRO FILHO, 2012)
Valdir pensa que o curso de Pedagogia da UEPB o incentivou muito a planejar suas
aulas com materiais didáticos manipuláveis, não sendo tão motivado a utilizar esses materiais
na PUCRS, no curso de Licenciatura em Matemática que frequenta atualmente.
O ministrante Valdir desconhecia o Movimento da Matemática Moderna e o
GEEMPA, não tendo participado de nenhuma ação nesse período, não sendo nascido nos anos
1970, bem como a participante Adriana.
A participante Adriana contou que a faculdade que cursa incentiva o uso de materiais
didáticos manipuláveis em sala de aula, dando oportunidade de confeccionar e testar o método
de ensino:
Adriana acredita que sempre que conseguir relacionar os blocos lógicos com algum
conteúdo que estará ensinando em sala de aula, ela irá explorar e desenvolver seus conceitos
com os blocos.
O ministrante Valdir acredita que os blocos lógicos proporcionam uma contribuição
no aprendizado da lógica:
Bom, na forma do pensar. Na forma, no caso, do aluno perceber, não só por acaso,
mas ao ele associar algo, aquelas, “ah, aquilo ali é um quadrado, não, aquilo ali é
uma forma quadrática, aquilo ali é um círculo, não, é uma forma circular” e assim
por diante. (PINHEIRO FILHO, 2012)
O que está inserido nas atividades que Valdir propõe com os blocos lógicos é a
classificação de figuras geométricas, trabalhando com a lógica básica, não aprofundando
conhecimentos lógicos, explorando muito a parte de geometria. Nota-se, em sua fala, a
preocupação em não mencionar conceitos geométricos errados, enfatizando que não está
trabalhando com um quadrado, mas com uma peça de forma “quadrática”.
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Valdir relatou que pensa ser interessante a utilização dos blocos lógicos na maior parte
das aulas, onde seja possível encaixar o material. Explora o material nas aulas de Laboratório
de diversas maneiras e simula atividades como:
Nós colocamos os blocos lógicos nas mesas, no caso para os alunos já interagirem,
conhecerem as peças, e ai começarem a perguntar sobre a questão, sobre a parte de
estrutura da peça, o que é a peça na verdade, ou o que não é a peça. (PINHEIRO
FILHO, 2012)
A participante Adriana relatou acreditar que os blocos lógicos deveriam ser bem
explorados para que os estudantes compreendessem suas estruturas e assim desenvolvessem o
potencial da lógica. Ela pensa na ideia de criar um material de blocos lógicos para cada
educando, para que ele possa explorá-lo em casa e no ambiente escolar:
Assim, primeiramente estar mostrando pra eles o que é. As atividades que podem ser
feitas e construir com eles, para eles terem em casa e para eles poderem manipular,
porque como eu comentei antes, é mais, eles absorvem mais conhecimento
manipulando e observando. Então, se eles puderem ter em casa e puderem ter acesso
na escola, se torna mais fácil pra eles também. (SILVA, 2012)
Adriana pensa ser válido o trabalho desenvolvido nas aulas de matemática através de
materiais concretos e manipuláveis, como mencionou:
Tornam-se muito mais interessantes as aulas do que aquela rotina de você passar o
conteúdo no quadro exercício e prova. (SILVA, 2012)
Pode ser observado, nessas entrevistas, mesmo sem uma aplicação direta com
estudantes por parte do ministrante da oficina Valdir, ou com o desconhecimento da
participante da oficina Adriana dos blocos lógicos, o interesse pela utilização desse material
nas aulas de matemática, para desenvolver noções lógicas e de classificação e ordenação dos
blocos, dentre o ensinamento de diversos assuntos citados.
É verificada também uma busca por inovação no ensino de matemática, trabalhando
com mais materiais didáticos manipuláveis no ambiente escolar, tentando despertar o
interesse do estudante e motivando-o a participar das aulas, expondo seus pensamentos,
dúvidas e conclusões. É incentivado o trabalho em equipe e a construção de conhecimento.
A função que a faculdade desenvolveu em propor a utilização de materiais
pedagógicos manipuláveis no ensino, tanto no ensino infantil como no de matemática, para o
ministrante Valdir e para a participante Adriana, simultaneamente, foi fundamental para
incentivar o uso de materiais concretos em ambiente escolar. A faculdade que cursaram, tanto
72
blocos lógicos contribui muito para o ensino da lógica, podendo-se observar as etapas de
aprendizagem, consideradas por Dienes, necessárias para a formação do raciocínio lógico.
Com o uso desse material didático pedagógico, também conseguiam explorar diversos
conceitos de maneira prazerosa, ficando o aluno motivado a participar das aulas de
matemática. Estavam conseguindo, com a utilização de diversos materiais didáticos,
desmistificar a matemática, possibilitando que todos os alunos aprendessem. Depois de
explorarem o que o material poderia proporcionar para a atividade realizada, havia a
necessidade de formalizar e registrar com os educandos os assuntos trabalhados naquela aula,
para conseguirem ligar a prática com a teoria. Conseguiam partir do concreto para o abstrato,
facilitando o aprendizado da lógica e dos conceitos que estavam sendo abordados.
Foi observado, pelos professores, que o ensino da lógica, através dos blocos lógicos,
se for bem estruturado, planejado e desenvolvido, pode ter seus ensinamentos perdurados por
muito tempo. Para isso, o professor deve estar seguro das relações e explorações que pode
fazer com a utilização do material. É notado também que o uso dos blocos lógicos não é algo
simples, deve-se ter um embasamento teórico para assim serem feitas as relações necessárias
e se conseguir desenvolver o raciocínio lógico do aluno.
Os conceitos que foram destacados e abordados pelos entrevistados com o uso dos
blocos lógicos foram: formas geométricas, frações, conjuntos, operações com conjuntos,
relações de equivalência, relações de ordem, correspondência, igualdade, conectivos lógicos,
princípio multiplicativo, codificadores lógicos.
Segundo os professores entrevistados, os blocos lógicos podem contribuir para a
aprendizagem dos alunos em qualquer nível de ensino, devendo o professor avaliar as
atividades que podem ser trabalhadas em diferentes contextos. Por se tratar de um material
didático manipulável, auxilia os estudantes a construírem aprendizagens sobre os conceitos
envolvidos no desenvolvimento das atividades, sendo proposto pelo educador analisar e
pensar sobre as ações que vai executar para avanços no assunto que está explorando,
verificando assim seus erros e as jogadas incorretas.
Com o uso dos blocos lógicos, podem ser abordadas as relações de equivalência e de
ordem, servindo como uma base para serem explorados outros conceitos posteriormente. O
professor deve instigar os alunos a avançarem nas atividades, nunca dando as soluções dos
problemas, mas intrigando e motivando os educandos a pensarem sobre os assuntos
envolvidos.
74
aprendizagem dos alunos, ou seja, conheciam o material, mas não sabiam como trabalhar com
os blocos.
Outro motivo aventado para o desuso foi que não se conseguiu convencer diversos
educadores sobre a importância de sua utilização para o ensino da lógica, sendo que essas
pessoas não trabalharam com os blocos e não propiciaram aos seus estudantes conhecer esse
material didático manipulável. As entrevistadas também comentaram que não houve um
grupo de professores, ou algum setor da educação que motivava e apresentava diferentes
atividades e abordagens que poderiam ser feitas com os blocos lógicos, sendo o esforço de
divulgação no Rio Grande do Sul praticamente só do GEEMPA, não atingindo a maioria dos
professores, apenas o grupo de educadores que participava das ações do Grupo.
O incentivo que os blocos lógicos proporcionam para o ensino de matemática, como
foi visto nas entrevistas, é referente à motivação provocada nos estudantes em quererem
desbravar e descobrir as soluções para os problemas lançados em ambiente escolar. Nos anos
1960 e 1970, o professor era visto como a pessoa central e mais importante na sala de aula, e
com as inovações curriculares, o aluno começou a ser percebido e observado no ambiente
escolar, deixando o educador de ser o centro. Segundo as entrevistadas, os professores
passaram a trabalhar com mais atividades concretas, mais próximas da realidade do educando,
ele começava a entender a matemática e conseguia perceber onde e de que forma poderia ser
aplicada. Os blocos incentivavam o aluno a pensar, a simular as situações que estavam
trabalhando e analisando, ocorrendo no ambiente escolar uma troca de conhecimento e de
experiência entre os estudantes que estavam envolvidos com as atividades.
O uso dos blocos lógicos atualmente, segundo os professores entrevistados no XI
EGEM, é motivado pela busca de ferramentas de ensino para tentar aprimorar seu trabalho
docente, pensando sempre na aprendizagem dos alunos, querendo provocar um ambiente de
ensino com trocas de experiências e exploração de conceitos matemáticos através de uma
maneira distinta da aula expositiva, podendo ser complementado ou abordado os temas
desejados pelo educador. Também pode ser destacado, no caso dos dois entrevistados, que o
uso dos blocos nas aulas de matemática foi incentivado nos cursos de graduação, e que as
aulas em que foram aplicados métodos de ensino motivaram esses alunos a usar materiais
didáticos manipuláveis no ensino de matemática, sendo um deles os blocos lógicos.
76
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os blocos lógicos, durante os anos 1960 e 1970, foram divulgados por Dienes e pelo
GEEMPA para tentar tornar a matemática mais criativa e divertida, oportunizando aos
estudantes um ambiente de ensino diferente daquele com o qual estavam acostumados,
estando mais preocupados com a aprendizagem do educando. Pude notar que os educadores
dessa época, mesmo desmotivados com o resultado do ensino de matemática, buscavam
ferramentas que julgavam ser benéficas e motivadoras para que os estudantes frequentassem a
escola e desejassem prosseguir na carreira acadêmica, mostrando sempre a importância do
estudo, sendo os blocos lógicos um método de ensino capaz de proporcionar alguma
curiosidade e motivação em descobrir os conceitos matemáticos que estavam sendo
aprendidos com as atividades propostas.
Pode ser notado que durante a década de 1960 e 1970 era comum os alunos
abandonarem o ambiente escolar, tendo que muitas vezes trabalhar para auxiliar no sustento
da família e pode ser observado, pelos relatos, que não era necessário muito estudo para
executar a maioria das atividades realizadas nessa época, não estando os alunos motivados a
seguirem na carreira acadêmica. Dessa maneira, pode ser observado que a evasão escolar e a
desmotivação dos estudantes sempre existiu, dependendo de cada contexto histórico que o
aluno estava inserido, mas o professor deve usar argumentos capaz de estimular seus
estudantes a comparecerem ao ambiente escolar, sempre destacando as oportunidades que
podem surgir para quem se dedica mais à carreira estudantil e os benefícios de seus
ensinamentos para posteriores aplicações.
Como pode ser observado nas entrevistas, a utilização de materiais didáticos
manipuláveis tem muito a contribuir para o processo de aprendizagem dos sujeitos
participantes. Penso que o uso desses materiais em ambiente escolar pode ser uma alternativa
de ensino para o professor, sendo que se o aluno não entendeu do modo e da maneira como
foi explicado, estará o educador portado de mais uma ferramenta de ensino que poderá ajudar
o estudante a entender, na prática, aquilo que estava tratando anteriormente.
Com tudo que aprendi e descobri nesse trabalho, penso que o uso de materiais
didáticos manipuláveis deve ser bem estruturado, pensado e planejado, estando o professor
seguro em usar esse recurso didático em ambiente escolar, apto a instigar e questionar seus
alunos para os mesmos prosseguirem nas atividades com sucesso e sem dúvidas. Cabe ao
professor que está portado de um material didático manipulável, explorar, estudar e avaliar
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suas estruturas, para assim, conseguir conectar conceitos matemáticos e propor atividades que
podem ser experimentadas e desenvolvidas nas ações dos educandos, de um modo que possa
auxiliar na aprendizagem do assunto visto em sala de aula.
O uso dos blocos lógicos pode auxiliar o aprendizado da lógica e dos outros conceitos
matemáticos envolvidos e explorados pelo educador. O professor, ao trabalhar com os blocos,
deve estar familiarizado com seus atributos e com as características do material, propondo
objetivos para sua aula de acordo com aquilo que deseja que seus estudantes desenvolvam e
alcancem com a atividade proposta. Os conceitos que podem ser explorados com os blocos
lógicos são inúmeros, como visto no capítulo 3 e na seção 2.2, estando o professor a escolher
a maneira e a atividade mais adequadas para a turma que está lecionando, tentando contribuir
para uma melhor e mais significativa aprendizagem dos estudantes.
Pode ser observado também que com o material dos blocos lógicos o professor pode
trabalhar e explorar diversos conceitos matemáticos, encontrando em um material didático
manipulável a ligação entre diversos assuntos. O professor poderá obter mais experiência e
saber ao apresentar aos alunos, com o mesmo material, diversos conceitos matemáticos, tendo
que estudar as estruturas dos blocos lógicos para assim, pensar em posteriores aplicações e
alterações de conteúdos para ser inseridos em atividades que tenham os objetivos
determinados pelo educador.
Penso que convém ao professor explorar e usufruir dos blocos lógicos, pois é um
material fácil de ser adquirido, podendo ser construído com materiais acessíveis
economicamente, e através dos blocos, pode ser possível obter um excelente aprendizado na
área da lógica, como pode ser observado pelos relatos dos entrevistados. Acredito que a lógica
é um tema difícil de ser trabalhado, pois caso não se fizer uma abordagem correta, poderá
confundir os alunos pela complexidade do tema abordado e das relações envolvidas, não
apresentando o raciocínio lógico necessário para a evolução dos níveis abordados e assim, os
blocos lógicos podem proporcionar um ensino com mais clareza e entendimento referente a
lógica.
Também pude notar com essa pesquisa que utilizar os blocos lógicos em ambiente
escolar não é válido se o professor não respeitar o tempo que cada estudante leva para
manipular e conhecer o material que será explorado posteriormente. Cada aluno deve
conhecer e dominar os atributos envolvidos no material para que as atividades que o professor
desejar apresentar não sejam prejudicadas pelas nomenclaturas não dominadas, podendo
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Como esta pesquisa foi voltada para o uso dos blocos lógicos no ensino de
matemática, pude conhecer mais um material didático manipulável cuja utilização acredito ser
viável no ensino de matemática, para uma melhor aprendizagem dos estudantes, estando
motivada a utilizá-lo em ambiente escolar assim que tiver alguma oportunidade. Nunca havia
pesquisado e explorado um material didático em detalhes, desde sua criação até sua utilização,
o que me despertou um interesse em conhecer mais detalhadamente outros materiais didáticos
manipuláveis com que estou acostumada a trabalhar, estando assim mais crítica no momento
de pesquisar outros recursos metodológicos, sempre pensando em uma possível melhor
aprendizagem do sujeito participante.
Consegui observar, através desse trabalho, que ao apresentar um material didático
manipulável para a turma, o professor deve estar bem seguro com a atividade que deseja
propor, para não gerar momentos de frustrações nos estudantes por não conseguir ajudar a
desenvolver o pensamento do educando para resolver um dilema ou uma indagação que
obteve ao manipular o material. Também aprendi que com os blocos lógicos ou com qualquer
outro material didático o professor deve ter sua aula bem planejada, simulando anteriormente
79
jogadas que os sujeitos participantes podem cometer no andamento da aula, para assim poder
propor para os estudantes melhores questionamentos para avançarem no nível de saber que
estiverem explorando e desenvolvendo.
Aprendi também que os objetivos no planejamento são bem importantes para as
atividades que envolvem os blocos lógicos, pois fazem com que o educador se proponha a
desenvolver os conceitos e atribuições neles apontados, podendo assim perceber se aquilo que
pensou sobre a atividade antes de aplicá-la foi realmente feito, sendo proporcionado observar
erros cometidos e pensar em melhores explorações da atividade e dos conceitos envolvidos,
orientando futuras aplicações. Como os blocos lógicos possibilitam muitas abordagens de
muitos assuntos, como visto nos depoimentos e em atividades que foram guiadas e planejadas
por Dienes, cabe ao educador focar nos conceitos que deseja desenvolver com os alunos com
a atividade que propôs, estando os objetivos a orientar o trabalho do docente para uma melhor
ampliação do conhecimento.
Também devo ressaltar que pude compreender com os relatos dos entrevistados que,
depois de utilizarem os blocos lógicos em ambiente escolar, é necessária e importante a
sistematização e a formalização dos conceitos que foram construídos e explorados pelas
atividades que o professor criou. Pude verificar que não basta apenas trabalhar e manipular os
blocos lógicos, deve ser feita uma análise dos assuntos que foram trabalhados para que os
alunos que ainda estão com dificuldades de entender o que foi discutido, tenham mais uma
oportunidade de esclarecer suas dúvidas, ou deve ser realizado esse momento de formalização
porque alguns estudantes preferem aulas expositivas, estando o professor a oportunizar várias
modos de ensino para a turma que está envolvido.
Com o meu Trabalho de Conclusão de Curso, pude notar o difícil e árduo trabalho de
um pesquisador que, antes dessa experiência, não acreditava ser tão importante e trabalhoso.
Foram diversas as tentativas para entrevistar as pessoas, sendo que muitos educadores que me
dispus a encontrar não quiseram participar da entrevista ou não viabilizaram horários
disponíveis para encontrá-los.
Aprendi também que é sempre válido o professor tentar encontrar ferramentas de
ensino capazes de ajudar o estudante a pensar em melhores soluções para resolver as
indagações do educador, provocando interações com os colegas, proporcionando um debate
rico em conhecimento obtido através de experiências anteriores e que foram descobertas
através da manipulação do material. O ambiente de ensino pode tornar-se acolhedor, de modo
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que os estudantes se sintam bem nesse meio, querendo participar de suas ações e desenvolver
argumentos cada vez mais importantes para a formalização do saber.
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APÊNDICES
TERMO DE CONSENTIMENTO
Estou realizando uma pesquisa para meu o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)
intitulado Uso dos blocos lógicos no ensino de matemática, com a orientação da Professora
Elisabete Zardo Búrigo. O (a) Sr (a). está plenamente esclarecido de que participando desta
pesquisa, estará participando de um estudo de cunho acadêmico, que tem como objetivos:
Tratar sobre o uso, o desuso e as contribuições dos blocos lógicos no ensino de
matemática.
Questionar os motivos pelos quais vários professores utilizavam esse material para
explorar o campo lógico nas aulas de matemática.
Estudar o motivo do desaparecimento do ensino da lógica no ensino fundamental.
Verificar as possibilidades de uso dos blocos lógicos nas aulas de matemática.
Embora o (a) Sr (a) venha a aceitar a participar desta pesquisa, estará garantido que o (a)
Sr (a) poderá desistir a qualquer momento bastando para isso informar sua decisão. É
esclarecido ainda que, por ser uma participação voluntária e sem interesse financeiro o (a) Sr
(a) não terá direito a nenhuma remuneração. É desconhecido qualquer risco ou prejuízos por
participar dela. Os dados referentes ao Sr (a) serão sigilosos e privados, e assim, será
preservado o anonimato do respondente e não haverá nenhum prejuízo ao mesmo. Autoriza
ainda a gravação da voz na oportunidade da entrevista.
A coleta de dados será realizada pela Orientanda FRANCINE DAHM, cujo telefone é (51)
93582747 e email é [email protected] , cursanda do oitavo semestre do Curso de
Licenciatura em Matemática da UFRGS e orientada pela Professora ELISABETE ZARDO
BÚRIGO, cujo email é [email protected] .
Porto Alegre (RS), de de 2012.
______________________________ ______________________________
Assinatura do Participante Assinatura da Orientanda
82
17. O que o Senhor (a) pensa sobre o ensino da lógica no ensino fundamental? Julga ser
importante? Por quê?
18. Que tipos de atividades o(a) Senhor(a) costuma(va) fazer utilizando esse tipo de
material?
19. O(a) Senhor(a) acredita que a utilização dos blocos lógicos contribuiu para a
construção do conhecimento da criança ou o utiliza apenas por estar com um material
didático manipulável em sala de aula?
20. O que pensa sobre atividades concretas e manipuláveis nas aulas de matemática?
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Entrevista concedida pelo ministrante da Oficina, Valdir Pinheiro Filho, sobre os blocos
lógicos no XI EGEM
Francine Dahm: Bom, porque tu escolheste fazer uma oficina envolvendo os blocos lógicos?
Valdir Pinheiro Filho: Bom, a oficina de blocos lógicos ela trata muito é de traçar ideias sobre
formas geométricas, traçar ideias sobre raciocínio lógico, entre outras ideias, no caso, de
ensino fundamental, das séries iniciais.
Valdir: Bom, a existência dos blocos lógicos eu fiquei sabendo logo no primeiro semestre de
matemática, assim que eu entrei na Universidade Estadual de Paraíba, e o professor, logo, eu
acho, que na segunda semana de aula de laboratório já mostrou pra gente os blocos lógicos.
Valdir: Bom, na sala de aula, por exemplo, nós usávamos os blocos lógicos, aprendemos a
usar, como tratar com eles em sala de aula, com as crianças e tal, no ensino fundamental, e foi
isso.
Francine: O senhor utiliza os blocos lógicos nas suas aulas de matemática? Por quê?
Valdir: Bom, no momento agora eu não to usando, era porque eu não estou estagiando e eu
não estou em sala de aula, mas assim que possível eu estarei usando.
Valdir: Bom, o público alvo dessa oficina, desse mini curso é justamente para os graduandos
em matemática ou pedagogia ou professores já formados, que estão no caso, nas séries
iniciais.
Valdir: Os conteúdos abordados com os blocos lógicos, como eu tinha dito antes, é mais a
parte lógica, a parte lúdica da criança, no caso de aprender as formas geométricas das peças, o
que é peça circular, o que é peça triangular, o que é a peça quadrada e tal e assim por diante.
Francine: E o senhor acredita que a faculdade que cursou o incentivou a usar esses materiais
didáticos manipuláveis?
Valdir: Bom, a Universidade Estadual da Paraíba, onde eu iniciei, sim. Hoje, atualmente, na
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, eu não vejo tanto incentivo assim.
Valdir: Não, porque no caso, no momento, eu estou entrando agora na área de matemática, e
eu não conheço muito não.
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Francine: O senhor acredita que os blocos lógicos proporcionam uma contribuição para o
aprendizado da lógica e dos assuntos que estão envolvidos nas atividades?
Valdir: Bom, na forma do pensar. Na forma, no caso, do aluno perceber, não só por acaso,
mas ao ele associar algo, aquelas, “ah, aquilo ali é um quadrado, não, aquilo ali é uma forma
quadrática, aquilo ali é um círculo, não, é uma forma circular” e assim por diante.
Valdir: Bom, a gente tenta utilizar em todos os momentos. Mas muitas vezes a gente não
consegue ter a ideia, “Ah vamos usar naquela área ali!”, mas normalmente é na forma mais
centrada mesmo.
Francine: E de um a cinco, assim, qual a frequência com que tu os utilizas? Sendo um menos
e cinco mais.
Valdir: Três.
Francine: E que tipo de atividade costumas fazer usando esse tipo de material?
Valdir: Bom, as atividades usadas são mais as atividades de..., tu podes repetir novamente a
pergunta?
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Francine: Que tipo de atividade o senhor costuma fazer usando esse tipo de material? Tu pões
os blocos lógicos assim na mesa pra eles...
Valdir: É, justamente, é. Nós colocamos os blocos lógicos nas mesas, no caso para os alunos
já interagirem, conhecerem as peças, e ai começarem a perguntar sobre a questão, sobre a
parte de estrutura da peça, o que é a peça na verdade, ou o que não é a peça.
Francine: As peças ficam ao alcance dos estudantes para usá-las em qualquer atividade em
sua aula ou o senhor apenas as expõe quando tem alguma atividade pra esses blocos?
Valdir: As peças são entregues ao aluno logo no momento em que a aula se inicia, para que
eles possam ter o contato com as peças logo de imediato.
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Francine Dahm: Porque tu escolheste participar de uma oficina que envolvia os blocos
lógicos?
Adriana da Silva: Porque assim, eu [esse material] mesmo não conhecia. Em relação a esses
blocos, para estar conhecendo, estar manipulando, e ver qual a melhor, as melhores atividades
para estar depois aplicando em sala de aula. Para estar passando para os alunos questões de
conhecimento, enfim, para poder estar utilizando nas aulas de matemática em si.
Adriana: Estou cursando, estou na terceira fase, no Instituto Federal Catarinense, Campus de
Concórdia.
Francine: Bom, tu pretendes usar os blocos lógicos em tuas aulas? Porque tu queres usá-los?
Adriana: Assim, ó, sempre que possível, se tu puderes relacionar algum conteúdo em que
você for passar para os alunos, se tu puderes relacionar com os blocos, é muito mais
interessante, porque além de despertar o interesse do aluno, ele se envolve mais na aula,
quando tem um material diferente. Então, com certeza eu vou utilizar.
Francine: E para que série, para que tipo de aluno tu achas que vai usar isso?
Adriana: Séries iniciais até o ensino médio, porque eu acredito que além de atividades assim,
com séries iniciais, tu podes aplicar com outras turmas também.
Francine: E que conteúdos tu achas que podes abordar com os blocos lógicos?
Adriana: Questão de figuras de iniciação, com as séries iniciais, questões de figuras, depois
ensino fundamental, questão de área, perímetro, volume. Acredito que esse tipo de conteúdo.
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Francine: E tu acreditas que a tua faculdade que tu cursaste incentivou a utilizar esses
materiais didáticos manipuláveis?
Adriana: Não.
Adriana: Sim, porque de certa forma o aluno visualizando e podendo manipular, ele absorve o
conteúdo mais facilmente. Eu acredito que manipulando e visualizando é mais fácil ele
compreender.
Francine: E tu achas que vai usar os blocos lógicos bastante nas tuas aulas?
Adriana: Sempre que possível, se puder relacionar alguma atividade diferenciada, se puder
estar utilizando eles, com certeza.
Francine: E tu achas que vai deixar as peças ao alcance dos alunos para usar em qualquer
atividade ou tu vais colocar elas quando tu vais propor uma única atividade?
Adriana: Assim, primeiramente estar mostrando pra eles o que é. As atividades que podem ser
feitas e construir com eles, para eles terem em casa e para eles poderem manipular, porque
como eu comentei antes, é mais, eles absorvem mais conhecimento manipulando e
observando. Então, se eles puderem ter em casa e puderem ter acesso na escola, se torna mais
fácil pra eles também.
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Francine: E tu acreditas que o uso dos blocos lógicos contribui para a construção do
conhecimento da criança ou apenas o utilizas porque é um material concreto em sua aula?
Francine: O que tu pensa sobre atividades concretas e manipuláveis nas aulas de matemática?
Adriana: Tornam-se muito mais interessantes as aulas do que aquela rotina de você passar o
conteúdo no quadro exercício e prova.
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Senhora H.: Foi uma vida de 40 anos, cravados, como professora. Iniciei como professora
primária, 12 anos no ensino de primeiro grau, na época era o primário, mudou muito isso
tudo, e alfabetizadora. Só que na época, não havia ainda aqui em Porto Alegre, nós não
tínhamos ainda esse conhecimento dos blocos lógicos, mas havia anterior a isso o trabalho
com materiais concretos, que nós chamávamos de matemática significativa, que já preparou
muito para esse material [blocos lógicos], porque mesmo na primeira série do primário, em
que os alunos eram assim bem diferentes dos de hoje, porque eles não vinham com toda essa
gama de experiências. Nossos aluninhos, a gente ensinava, pegava a mãozinha e tudo, mas o
material concreto ajudou muito, pra tornar a matemática significativa, porque era uma coisa
que partia do conceito, na direção do conceito, já que começava, inclusive eu, com o conceito
de matemática. Parecia, assim, que era natural, e aos poucos a gente foi despertando para isso,
de que não é. E aquelas dificuldades enormes na matemática. Ninguém gostava de
matemática. Na primeira série ainda gostavam porque ainda eram conceitos muito primários,
mas à medida que ia se desenvolvendo, a gente ia acompanhando os alunos. Eu trabalhava em
uma escola pequeninha particular no início, e via que em segunda e terceira série a
dificuldade se tornava cada vez maior maior, porque se ensinava, digamos, multiplicação,
divisão, todas essas operações, sem alguma coisa concreta, sem que as crianças vissem e isso,
nós professores sentíamos muito. Então começou assim, com matemática significativa.
Depois eu fui para o ensino normal, trabalhei um tempo em Tapes, para inaugurar a
escola normal lá, na época chamava-se de Escola Normal, escola de formação de professores,
ela mudou muito, tudo mudou de nome, eu vou com os meus nomes antigos. Daí eu fui
inaugurar a Escola Normal em Tapes, saía às quatro [horas] da manhã daqui e voltava às dez
da noite, foi bem difícil. Era uma estrada de terra, e em uma certa ocasião até o ônibus
tombou, daí veio a polícia me pegar para atender os alunos, porque era casualmente o dia de,
a gente chamava de admissão, até assim, entre aspas, vestibular do curso normal, e eu que ia
aplicar. Então aquilo era muito rigoroso, muito, muito, muito.
Depois vim pra Porto Alegre, eu morava aqui, vim para Porto Alegre para a Escola
Normal Experimental Dom Diogo de Souza, que foi uma escola excelente, porque ela toda foi
baseada em pesquisa, do antigo CPOE, [Centro de Pesquisas e Orientações Educacional] e lá
93
tudo era feito através de pesquisa. Todo o trabalho que se fazia, havia um setor que
transformava aquilo em uma pesquisa, porque que acontece, que não acontece. Nós
trabalhamos daí com conceitos já, já trabalhamos com notas semestrais, e tudo, por exemplo,
digamos que uma turma não foi bem, ninguém foi bem em história, geografia, ou seja, o que
fosse, nós precisávamos fazer, e isso era orientado pela Secretaria de Educação e fiscalizado
por eles também, um trabalho muito sério. Esse trabalho que hoje em dia se faz de aprovação
por objetivo, nós já fazíamos naquela época. Nós dividíamos em primeira, segunda série, das
crianças, com as nossas alunas nós fazíamos pesquisa, elas participavam, eu tinha toda a
documentação, mas depois uma diretora queimou tudo.
Bom, quando começaram esses movimentos, coisas políticas, foi proibida a pesquisa,
então a escola perdeu um pouco o significado. Mas, nesse meio tempo, e eu trabalhava mais
com didática da matemática, e chegou o Dienes. Nós assistíamos então, uma colega minha e
eu, todas as aulas, sessões, tudo o que ele proporcionou, pelo GEEMPA, nós fazíamos parte
também. E tentamos aplicar, só que, por exemplo, eu não apliquei diretamente, as minhas
alunas faziam o trabalho em sala de aula. Houve, no início, uma..., não bem uma revolta, mas
uma desconfiança muito grande dos pais, porque eles diziam que as crianças iam para a escola
para brincar. E daí nós observamos durante muito tempo. As moças aplicavam e depois
quando iam para o estágio também aplicavam, dependendo da escola, algumas não permitiam,
porque achavam que era brincadeira, que não sei o quê. Daí a gente percebeu, e daí nós não
tínhamos, infelizmente, a pesquisa, mas a gente tinha aquele espírito ainda. Percebemos
assim, que na formação de conceitos foi uma beleza, sabe. As crianças tinham muito mais
facilidade, de comparar, de fazer equivalência, de entender o que era a matemática. Porque os
blocos lógicos se destinavam a isso, as primeiras percepções. Hoje em dia, não sei como é que
está, me desliguei completamente, mas parece que estão trabalhando [com os blocos lógicos]
alguns, se ainda estão, no pré, no que nós chamávamos de pré primário. Mas na nossa época,
nós iniciamos com a quinta série, os pequeninhos ainda não foram atingidos. E anos depois,
os pais vinham muito saber, nós tínhamos que explicar a eles, assim, o que significava, o que
a gente queria com o desenvolvimento do pensamento lógico, no entendimento mesmo da
matemática e não só da matemática, também da língua portuguesa, de todas as coisas, de
todos os fenômenos que existem ao redor, porque esse compartimento em disciplinas é uma
coisa pra estudo, porque a pessoa é uma só. Se ela entende, se ela tem capacidade de
raciocinar sobre matemática, ela tem [...] sobre as coisas que ela vê, que observa. Então isso
que nós fizemos. Por vários anos.
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Senhora H.: Se eu te disser tu vais achar graça. Era um namorado que eu tinha, e ele queria
que eu trabalhasse com ele, mas só que, foi um namoro assim, nem um ano, terminou, nunca
mais vi, mas daí eu entrei e gostei. Principalmente quando eu estava fazendo magistério,
normal, curso normal, que eu me apaixonei pelas aulas de didática, vendo como tu podes
ensinar de uma outra forma, não daquele formato antigo, chegar no quadro. E daí eu disse:
“Eu quero repartir isso com outras pessoas!”. E foi assim então que entrei [no magistério].
Não fui, nunca, assim me considerei como uma professora extremamente vocacionada, mas
uma pessoa com muita vontade, sabe. Então eu estudei muito, saí de lá e fiz Pedagogia em
seguida, me formei no Normal e fiz [Pedagogia] na UFRGS e com excelentes professores
também, e gostei, gostei desse aspecto assim de ver, porque eu via muito numa classe, e
talvez mais carente, uma dificuldade grande demais em aprender, sabe, muito grande, era tudo
tão difícil, e eu trabalhei com essas crianças, tudo tão difícil, eles não tinham jornalzinho em
casa, uma revistinha, nada, nada, nada, nada, nada. Então eu disse: “Não, essas pessoas têm
que aprender”.
95
E sempre fui muito, por exemplo, como professora, até eu era chamada de elitista, só
que as pessoas não me compreendiam, eu sempre dizia que os professores primários têm que
ser os melhores, isso que dizem agora, eu digo: “Olha aqui, parece eu!”, têm que ser os
melhores professores. Por uma questão estatística, simplesmente. Porque na época já havia
estatística, que na maioria do povo brasileiro [a escolaridade] ia no máximo até a quarta série.
Agora eu não sei como está isso, mas não deve estar muito diferente. E daí eu dizia: “Se eles
vão só até a quarta série, eles têm que ter o melhor até a quarta série, eles têm que ter
professores que entendem de Psicologia, Sociologia, pra tirar o máximo daquela professora”.
Então, nós fazíamos na Escola Dom Diogo de Souza, se fazia vestibular, como todas as
outras, e depois meio ano de preparação e três anos de magistério. Não entravam assim,
mesmo fazendo a prova, elas faziam meio ano de matemática, português principalmente, mais
tudo, história, geografia, e... A gente tentou conservar isso por muito tempo, mas depois
também não pudemos mais. Mas eu partia desse princípio, professor primário, é para muitas
pessoas, e não é um montinho, o único professor que eles vão ter na vida. Então esse
professor tem que ser excelente, tem que ser excelente em todos os aspectos. Então brigavam
muito comigo, “Porque tu és elitista, só queres os melhores no curso” “Sim, realmente, mas
eu não sou elitista, eu estou querendo que aquelas pessoas que não podem, tenham um bom
estudo, uma boa direção na vida”.
E foi por isso que me tornei professora, batalhei muito, como eu te disse, eu não me
considero uma professora vocacionada, é engraçado isso, mas lutei bastante e estudei. E
batalhei por essa turminha. Eu tinha uma que era sobrinha do Presidente da República da
época, e eu a reprovei. “Mas eu vou falar com o tio, porque a Senhora vai sair!” “Está certo,
se eu estiver errada. Mas tu tens que aprender, não vais sair desse jeito”. E foi assim que eu
me tornei professora e estando dentro, eu não quis mais sair, então foi por isso, eu tinha 16
anos, comecei com 16 anos e fiz muito sucesso com meus alunos, muito.
Houve uma época com uma teoria econômica que, como é que diziam ainda, que
ninguém modifica ninguém, que não sei o quê, não sei o quê, não sei o quê. Claro, não
modifica, mas pode ajudar. Tu podes ajudar como professor a dar caminhos, principalmente a
ensinar a pensar, a ajudar a pensar, levar a pensar. E isso eu acho que nós conseguimos fazer,
porque a gente fazia muito, o nosso trabalho era muito em equipe, eu e uma grande amiga
minha, eu na Didática da Matemática e na Matemática também, convertemos professoras de
matemática, e elas diziam: “Eu não sei porquê” e depois, anos depois, “Tu tinhas razão, mudei
e deu certo!”. E isso tem grande influência dos blocos lógicos, que até eu, claro, aprendi a
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pensar e pensar em outras coisas trabalhando com eles. E era imenso, sabe? Todas as
professoras de matemática e aulas, às vezes não tinha nem espaço direito no Dienes [nas
sessões que Dienes promovia]. E muito, claro, muito baseado no Piaget. Piaget estava sempre.
Ele foi a base do meu trabalho todo, ele já falava tudo dessa matemática, teve novos nomes,
os nomes mudam, matemática concreta, matemática significativa, não é nada disso, a
matemática é matemática. Enfim, mas usavam esses nomes. E o Piaget, as pessoas tinham
muito medo dele, quando eu dizia: “Não, eu me baseio em Piaget, eu leio Piaget e não sei o
quê”, “Mas Piaget é muito difícil, não dá pra entender”. Mas é que podem sair dele princípios,
e tudo. Aquelas etapas pra se chegar à aprendizagem, que são do concreto até o abstrato, a
espera dos 11 anos, mais ou menos, em que se forma o pensamento abstrato, em que a pessoa
realmente chaga ao conceito. Isso é toda uma escadinha, daí isso aí tudo eu trabalhava
bastante com as meninas e dava bastante resultado, até pra elas, e pra mim também, também
aprendi muito, com isso, esses teóricos.
Francine: E a matemática te influenciou bastante por trabalhar com os blocos lógicos então?
Senhora H.: Sim, sim. Eu sempre fui muito, eu sempre gostei muito de matemática. Eu
sempre gostei, então isso daqui juntou a fome com a vontade de comer. E ainda trabalhar com
as alunas com isso foi melhor ainda, foi muito bom. Não, não sou [licenciada em
Matemática]. Formado em matemática é o meu filho, um dos meus filhos seguiu e se formou
também. Tu estás também na Licenciatura na UFRGS?
Senhora H.: Meu filho também fez na UFRGS, também gosta muito. Ele vem discutir as
coisas comigo, e eu não sei mais nada. Estou muito esquecida.
Senhora H.: A gente vai esquecendo, e eu trabalhei muito tempo, eu cansei muito, porque eu
nunca levei na brincadeira. Brincava com as crianças e com as minhas alunas, mas sempre em
assunto sério. Então fiquei realmente muito cansada, cinco filhos, a batalha foi bem violenta.
E bem boa. Ah, bem boa.
Francine: Que bom, melhor assim do que não ter valido a pena.
Francine: A senhora já era professora quando conheceu os blocos lógicos? O que a senhora
fazia nessa época?
Senhora H.: Sim, sim. Como eu te disse, eu trabalhei 12 anos sem saber de nada. Fui me
encaminhando para a matemática significativa, e dali também tirei muita coisa boa, que os
blocos lógicos também têm muito a ver, porque a coisa acontece. E depois, então, fui para a
didática da matemática e daí mais eu precisava. E daí veio à onda de Dienes. Primeiro Piaget.
Eu antes me baseava muito em Piaget e o Dienes também. E daí eu... Quando vieram esses
estudos, houve outros professores também, mas não lembro o nome, mas ele foi o principal,
nós nos atiramos para assistir suas aulas.
Francine: E quando tu conheceste os blocos lógicos tu já davas aula então? E o que tu fazias
nessa época, dava aula só para o normal?
Senhora H.: Só, daí só com o normal. Mas daí quando tu trabalhas com o normal tu trabalhas
com o primário também, porque é uma extensão da escola normal inclusive. E daí nós
fazíamos pesquisas, coordenei várias, aquela... promoção por níveis, níveis, objetivos, tudo,
tentamos. Só que a gente, depois, numa época política diferente, a gente ficou muito cortado.
A gente não podia fazer o que queria. E a pesquisa, não sei porquê, não era bem vista. E a
gente foi tirando. Mas tivemos vários grupos, fazia, preparava as professoras para trabalhar,
quatro anos numa série só, numa turma só, e as turmas se modificando à medida que iam
avançando. Como é que era o nome da professora,..., não lembro, mas era uma fase por
níveis, e agora tentam fazer, mas não estão sabendo, às vezes me dá vontade de, qualquer dia
vou lá, vou me oferecer, porque a gente fez, níveis de pesquisa. Porque não está dando muito
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certo, as crianças estão chegando e entendem mal, estão chegando à quarta ou quinta série e
não sabem ler. Aliás, estão chegando ao terceiro grau, uma das minhas filhas, agora, ela era,
fez Engenharia, mas agora ela fez Direito, ela chegou apavorada dos primeiros dias de aula,
ela disse: “Mãe, as pessoas lêem e não sabem o que estão lendo!”, eles sabem ler Porto
Alegre, mas não sabem o que é. Ela passou muito trabalho para fazer o curso de Direito, e
foram caindo [o nível dos estudantes], porque ela disse que eles não sabem ler e tu podes ver
em entrevistas com outros professores que realmente pouquíssimos, a minha filha já tem 50
anos, foi há 40 e tantos que ela começou, e é isso que estão fazendo.
Francine: E com essa lei que não pode reprovar até a quinta série agora...
Senhora H.: Pois é, é um absurdo. Não podem, é um absurdo o que estão fazendo, um
absurdo, que não é assim, não é assim. Se tu queres fazer tu podes, tu podes, às vezes uma
criança de primeira série já poderia estar em uma terceira, mas ela tem que ser avaliada, ela
tem que ser acompanhada. O professor tem que estar preparado, não é assim. Pode, vai e não
roda nunca, está muito sério, muito, muito sério. E a gente está vendo na sociedade a
dificuldade disso. Têm pessoas assim, com curso superior, que não sabem nem escrever. Na
televisão então, eu falo: “Cacoete de professor eu queria perder!”, porque eu fico corrigindo o
tempo todo, não que eu saiba, mas a gente, ao menos, sabia um pouco mais. E eu fico
corrigindo, corrigindo e corrigindo, eu digo: “Eu não quero mais fazer, eu não sou mais!”
[professora]. Mas é o que acontece. O que mais tu gostarias de saber?
Francine: Por que a senhora acredita que os blocos lógicos não são utilizados hoje nas aulas
de matemática como foram utilizados naquela época?
Senhora H.: Por que não? Porque não conseguiram convencer todo mundo. O pessoal não se
aprimora, não se esforça, os próprios professores. Porque, claro, o professor está ganhando
uma miséria, como diz um filho meu, “Mãe, tu vais buscar tua gorjeta lá no... [risos]?”. E é
verdade. O magistério, assim, está abaixo de qualquer crítica para a política, tudo, a culpa é do
magistério. Eles não estão conseguindo se preparar e justamente isso que eu te digo, chegam a
um curso superior e não sabem escrever. E aqueles poucos que tentam não estão tendo vez. O
próprio GEEMPA tenta [convencer professores] e também por alguns desvios durante o
caminho [que não conseguiram convencer muitos educadores]. Não sabem transformar aquela
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brincadeira em conceitos, não sabem fazer as perguntas, e aí foi caindo. Eu quando terminei o
magistério já, praticamente, não se usava mais.
Precisaria de uma orientação federal, estadual, municipal, mas gente que tivesse a
mesma ideia, o mesmo pensamento, que se dispusessem em conjunto a aplicar, a fazer
pesquisa, como se diz. Quer dizer, acompanhar crianças que vão desde o início, saber como
elas estão na quarta série, na quinta série, na oitava série, hoje em dia nessa seriação que tem.
Isso não pode ser uma coisa largada, tem que ter um acompanhamento. E tem que chegar aos
conceitos, se não, não adianta, se não é só brincadeira mesmo. De classificação, de
correspondência, isso tudo o aluno ter que chegar. E daí a maioria dos professores, não sabem
mais, hoje em dia nem sabem mais, então é por isso que eu acho que não deu certo. Não
houve uma unidade dos professores e também das pessoas responsáveis pela educação, maior
do que os professores, de incrementar isso. Foi um esforço, praticamente que individual do
GEEMPA e de alguns professores. E para tu sejas professor, tu tens que estar
permanentemente ou se atualizando, ou frequentando cursos, que tu podes até contestar, mas
tu tens que ter um elemento firme para contestar.
Francine: Como ficou sabendo da existência dos blocos lógicos? Pelo Dienes?
Francine: Porque escolheu utilizar os blocos lógicos em suas aulas de matemática? Por
influência de quem?
Senhora H.: Eu, como te disse não usei com crianças, [mas usei] porque eu acreditei. Porque
acreditei que poderia haver e ter um ensino melhor de matemática, mais fundamentado, mais
entendido, menos decorado. Eu acreditei, bastante.
Francine: Com que finalidade usava os blocos lógicos? Para mostrar a elas quais atividades
que poderia fazer...
Senhora H.: Sim, sim, para chegar a esses conceitos [de] que eu falei. Eles aprenderem a
comparar, a selecionar, ..., a tornar significativa a matemática. Porque eles nada mais são do
que um material didático, só que um material didático bem estruturado e bem pensado.
100
Francine: E a senhora traçava alguns objetivos para sua aula? Eles eram cumpridos?
Senhora H.: Sim, sim, sim. As aulas todas eram programadas. Só que elas sempre foram
programadas, mas às vezes elas saíam daquele meu objetivo. Então essa liberdade tem que ter.
As crianças traziam, as crianças ou as alunas, elas me contavam, como eu te disse, eu
orientava, e muitas vezes o meu objetivo era um, o da minha aluna era um, e a criança
extrapolava aquilo, uma beleza. E a gente ficava feliz.
Francine: E o que tu pensavas que ia ser bom para as suas aulas usando os blocos lógicos?
Senhora H.: Que ia ser bom? As crianças se interessavam muito, participavam, ficavam
curiosas, perguntavam, queriam fazer as coisas e como eu te disse, traziam coisas que nem eu
tinha pensado. Desenvolviam o pensamento, que é um dos objetivos dos blocos lógicos.
Muito além, às vezes, do que eu imaginava. Era uma surpresa muito agradável dos
pequeninhos, porque eu assistia às aulas das gurias.
Senhora H.: Não, não, não, não, não. Ficava quietinha, a mais invisível possível, nem me
mexia, eu só anotava, claro, pra depois comentar com elas. E as minhas alunas também
ficavam muito contentes, quando a criança mesma chegava a um passo além do que elas
tinham planejado.
Senhora H.: No princípio as ideias de, bem quando eram pequeninhos, de cor, tamanho,
forma, que isso aqui muito é geometria também, ela prepara para a geometria, espessura, e
depois de relações, relações de equivalência, que se usava bastante, chamando de grupos de
equivalência, correspondência, igualdade, diferença...
Senhora H.: Sim, palestras, cursos, debates, reuniões com professores, reuniões, por exemplo,
com muitas professoras de matemática, isso foi muito intenso. Como eu já te falei, muitas
professoras de matemática se converteram para esse tipo de trabalho. Primeiro achavam que
era impossível, que assim não ia dar. Colegas também, outros professores do ensino normal.
Participei também de [cursos para] professores já formados, na PUC também, onde eu dei
alguns cursos, trabalhos, aulas, sobre especialmente os blocos lógicos. Professores de toda
região, não só de Porto Alegre. Demos cursos.
Senhora H.: Sim, eu fui sócia do GEEMPA por um tempo, mas depois, é muita coisa, eu não
consegui acompanhar. Sim. Nós trabalhamos até noções, assim, superiores de matemática, lá
no Instituto de Matemática. Eu não pude concluir também.
Francine: Possui alguma recordação significativa desse momento? O que mais te marcou?
Senhora H.: O que mais me marcou? Tanta coisa... O que mais me marcou foi justamente o
que eu já te falei, quando os professores de matemática começaram a vir pra nós sim e dizer
que estava dando certo. Não professores de didática, de Matemática. “Tu tinhas razão, isso
realmente funciona”. Tinha uma professora que me contestava muito, e depois de um ou dois
anos ela veio e disse: “Olha, tu tinhas razão, eu estou experimentando”, isso foi muito
gratificante, porque nesses trabalhos assim novos, nós não temos certeza se as coisas vão dar
certo, e quando tu vês, morreu. Infelizmente. Morreu. Mas alguns professores aplicaram. E
também a reação dos alunos, das alunas do curso normal. Quando elas chegavam assim e
diziam: “Professora, agora eu entendi aquilo que estudei no tempo em que eu fiz!”, que bom.
102
Porque isso aqui nada mais é do que desvendar, a matemática chegou a um conceito, mas ela
deve chegar a cada pessoa, e não [o professor] pegar o conceito já pronto e dar para o aluno,
por isso que ela não aprende matemática. Não entende o que está fazendo. Então a matemática
significativa, seja qual for o nome, matemática moderna, ela tenta fazer o que a humanidade
tenta fazer através dos séculos, chegar lá no início, partir do início e não do fim. A
matemática estava sendo ensinada a partir do conceito, na multiplicação, na divisão, nessas
operações fundamentais. Nós muitas vezes não sabíamos porquê eles não resolviam o que se
chamava de problema, porque ele não conseguia encaixar aquilo.
Senhora H.: Sim, sim. Porque a criança pensa em cima disso, sim.
PARTE 2
Senhora H.: [Comentando uma fala de um aluno] “Agora que eu entendi, agora que eu entendi
que é multiplicação!”, conceito simples, mas que foi aprendido através de um conceito já
formado e o aprendes agora. E que depois tu podes ver, tu chegas à parte de decorar, claro, é
bom saber a tabuada, mas saber o que tu estás falando.
Senhora H.: Colegas minhas professoras diziam assim: “Mas como, como é que vão aprender
a tabuada?”, “Vai chegar lá, vai chegar lá, mas ela vai com entendimento, ela vai saber
resolver uma coisa através da tabuada”. Claro, a mesma coisa a simplificação, mas pra tu
chegares à simplificação tu tens que passar por etapas.
Francine: Bem como a senhora falou, não é do dia pra noite que tu vais mudar.
Francine: É questão até de anos, é questão de um trabalho bom, que vai evoluindo.
Senhora H.: Justo, justo. Uma boa coordenação, pois é, uma das coisas que eu acho, que
atrapalha muito o ensino, é que quando muda um partido político, parece mentira, entram
outras pessoas e derrubam tudo o que foi feito, então eu penso que, por exemplo, um bom
planejamento pedagógico, seria de, digamos, cinco anos, seis anos, sete anos, que as pessoas
que entram teriam que completar aquilo. Porque chega outro e corta, como nós fomos
cortados em várias coisas. E daí as coisas se perdem no Brasil. No Brasil se perde em tudo,
não é só no ensino. Se perde em Engenharia, se perde em Direito. Se estão construindo uma
ponte, como a gente vê, entra outro governo, a ponte fica sem fim, fica aquela coisa ali, nosso
dinheiro.
Senhora H.: Então isso falta a meu ver, um projeto tem que ter início, meio e fim. Um
[projeto] educacional, também. Digamos que peguem um projeto desses, trabalhem cinco
anos, “ah não, não está”, mas daí termina aquele [governo] e começa outro.
104
Francine Dahm: Eu queria que a senhora me contasse um pouco da sua vida profissional.
Monica Bertoni dos Santos: Bom, eu tenho 74 anos, tu podes imaginar que eu tenho, mais ou
menos, uns 58 de magistério. Então, como o meu primeiro curso foi magistério, eu comecei
dando aula de alfabetizadora. Depois eu casei, fui para São Paulo, comecei um curso de
História e de Geografia. Daí voltei pra cá sem terminar o curso, e quando eu voltei para o Rio
Grande do Sul já tinha dois filhos, e quando eu fui tentar terminar o curso para Geografia eu
já tinha que fazer tudo de novo, tinha mudado. Daí eu fiz Pedagogia. Por volta de 68, 67, eu
entrei em contato, por 65, 66 eu comecei a ter contato com o GEEMPA e a seguir, quando
veio pela primeira vez o professor Dienes para Porto Alegre, foi a primeira vez que eu entrei
em contato efetivamente com a matemática moderna. Claro que a gente já tinha feito alguns
cursos adicionais no Instituto de Educação, as datas ficam meio confusas, porque foi um
tempo de muita agitação intelectual pra nós, pra mim muito especialmente, mas o contato com
os materiais, com o professor Dienes, pois foi ele quem trouxe efetivamente o uso desses
materiais. Eu me lembro na primeira vez em que ele veio a Porto Alegre, ele deu um curso ali
no Colégio do Rosário, e foi a partir daí que eu tomei conhecimento dos blocos lógicos e
todos os recursos que ele [utilizava].
Vamos supor que, sabendo usar os blocos lógicos, tu trabalhas com várias finalidades.
A partir daí, tendo contato com a matemática reformulada, com o professor Dienes, eu
comecei o curso de Matemática efetivamente. E aí eu fui fazer o curso de Matemática, que
terminei em 1975. A partir daí, eu trabalhei só com matemática, trabalhei vários anos no
Colégio João XXIII, depois eu fundei um colégio, neste período eu fui convidada a trabalhar
aqui na PUC e em 2001 eu fiquei só com a PUC. Daí muito tardiamente eu fui fazer mestrado
e tudo. Desde então eu trabalho aqui [na PUCRS] e as minhas disciplinas mais
especificamente são lógica, quer dizer, nem é bem lógica, é o “Desenvolvimento do
Raciocínio Lógico”, é uma cadeira do primeiro semestre de matemática, depois eu trabalho
com “Iniciação à Pesquisa”, “Metodologias do Ensino de Matemática” e estágios. Digamos,
essas são as minhas cadeiras mais fortes. Já participei, junto com a Bete [Elisabete Búrigo], de
um Grupo de Pesquisas sobre o Movimento da Matemática Moderna, que é uma pesquisa que
faço até hoje, há dois anos eu tenho uma bolsista de iniciação científica em torno da
matemática moderna mesmo, a divulgação do Movimento da Matemática Moderna no Rio
105
Grande do Sul. Depois eu já fui diretora de escola, depois do João XXIII, durante seis anos eu
fui diretora geral do João XXII, depois eu fundei a escola, que se chama Conhecer, eu fui
nove anos diretora pedagógica da escola, nós dividimos a direção, uma fazia a missão mais
administrativa e, a outra, a missão mais pedagógica. Então, mais ou menos, a minha carreira é
essa. Nunca saí da sala de aula todos esses anos. E a minha experiência com o uso de jogos,
uso de materiais concretos, resolução de problemas, quando se iniciou o Movimento da
Matemática Moderna e o Movimento da Educação Matemática no Brasil, eu fui muito
presente nessa construção, eu estava presente na sessão em que mais ou menos a gente
resolveu fundar a Sociedade Brasileira de Educação Matemática, eu estava representando o
GEEMPA nesse evento, a minha carreira é isso aí.
Monica: Ativamente, eu fui, durante muitos anos, até hoje eu participo, durante muitos anos
eu participei muito ativamente e eu fui uma das presidentes do GEEMPA, além da professora
Esther Grossi, ela é presidente há muitos anos, ela renova, duas vezes eu fui presidente do
GEEMPA, em gestões intermediárias.
Monica: Olha, minha filha, eu vou te dizer uma coisa muito tranquilamente, eu não escolhi ser
professora. Tu podes imaginar que com 74 anos eu sou de uma época completamente
diferente da tua. A minha mãe era viúva, e eu sou a quarta filha de uma família, um irmão
meu era médico psiquiatra, outro era advogado, a outra fez faculdade de Letras, eu acho que
como eu era a última, a minha mãe do ginásio me passou para o normal e eu não questionei, e
eu fui e ela considerou uma missão comprida. Minha opção mesmo por ser professora foi
quando eu fiz Pedagogia, ai eu fiz a minha opção. Mas aí eu já tinha uma experiência em ser
professora, então eu gostei, eu sempre era tida como uma pessoa que ensinava a matemática
muito bem, digamos assim. Aí quando eu fui para a Pedagogia, e depois, quando eu fui para o
curso de Matemática, foi aí que eu fiz a minha opção. Mas a primeira vez em que eu fui
professora na minha vida eu não fiz a opção de ser professora, me botaram na escola normal e
eu não questionei, eu sempre digo isso, mas se eu hoje tivesse que escolher, eu escolheria ser
professora. E por incrível que possa parecer, a minha primeira experiência de professora foi
106
ser professora de balé, eu estudei balé dos seis aos dezenove anos, e então, vamos dizer assim,
essa foi a minha experiência de ser professora. Mas essa experiência era outra coisa, eu dava
balé para os pequenininhos, mas eu escolhi mesmo ser professora depois que eu fui para a
Pedagogia e principalmente quando eu fui para a Faculdade de Matemática.
Monica: Exatamente.
Monica: Não, não. Quando eu fiz o meu primeiro estágio, foi numa primeira série e eu não
conhecia os blocos lógicos. Eu fui conhecer os blocos lógicos quando, agora eu não estou me
lembrando da data em que o professor Dienes veio pela primeira vez, acho que foi em 68, foi
aí que eu fui conhecer os blocos lógicos, um pouco antes, 66 ou 65.
Monica: Aqui em Porto Alegre, não, aqui em Porto Alegre. Lá em São Paulo eu trabalhava
com história, não tinha nada a ver com matemática.
Francine: E porque que a senhora acredita que os blocos lógicos não são mais utilizados hoje
nas aulas de matemática?
Monica: Eu não penso assim. Eu vejo, assim, em primeiro lugar, eu acho que as pessoas não
sabem usar os blocos lógicos como eles devem ser usados. Vamos supor, usar os blocos
lógicos como um brinquedo, não deixa de ter o seu valor, porque uma criança que usa os
blocos lógicos como um brinquedo, automaticamente ela vai separar pelas cores, ela vai
separar pelas formas, pelo tamanho, ela vai falar os nomes das figuras, que são as faces dos
blocos e tal, mas usar como um recurso pedagógico, por exemplo, para que os alunos
classifiquem, para que os alunos ordenem, para que os alunos trabalhem os conectivos
lógicos, associados aos diagramas de Venn, aos diagramas de Carroll, aos diagramas de
árvore, trabalhar com o princípio multiplicativo, trabalhar com codificadores lógicos. Para
107
fazer isso tu precisas saber trabalhar, então eu acredito que as pessoas não usem
pedagogicamente, didaticamente, como recurso para ensinar lógica, porque não sabem.
Porque no momento que as pessoas sabem utilizar, elas utilizam. Então os blocos lógicos
existem, eles estão nas escolas, as pessoas sabem que eles são importantes, mas as pessoas
não sabem usar adequadamente como um recurso. Certo? Se tu perguntares para a maior parte
das pessoas, as pessoas ligadas à matemática, elas sabem que existem os blocos lógicos, mas
não sabem o valor dos blocos lógicos para o ensino da lógica. Certo? E de outras coisas. Se tu
quiseres, por exemplo, começar a trabalhar com frações, tu podes começar a trabalhar com os
blocos lógicos. Entendes? Tu tens uma série muito rica e muito interessante de trabalhos de
lógica, de frações, de número, que tu podes trabalhar com os blocos lógicos. Mas tu tens que
saber. Eu acredito que o uso dos blocos lógicos não seja adequadamente utilizado porque as
pessoas não sabem como trabalhar com eles. E como não sabem como trabalhar, como nunca
trabalharam como aluno com os blocos lógicos, não entendem o valor que eles têm. Eu não
sei das tuas entrevistas, mas se tu trabalhares, por exemplo, com professores das séries
iniciais, “Ah, os blocos lógicos são interessantes!”, “Mas porque tu não os utilizas?”, não
utiliza porque não sabe utilizar. Essa é a minha opinião. Eu, por exemplo, utilizo os blocos
lógicos na pré-escola, na escola infantil, eu ensino, trabalho com os blocos lógicos
intensamente no primeiro ano, quando os alunos estão desenvolvendo as habilidades para
construir o número natural. Eu trabalho os blocos lógicos na universidade quando eu dou a
introdução ao raciocínio lógico, então toda a parte dos conectivos lógicos, da negação, da
teoria dos conjuntos, tudo isso eu trabalho com os blocos lógicos associado ao uso de
diagramas. Entendes? Pra mim não, se tu fosses matriculadas em uma disciplina de raciocínio
lógico, eu começo, todo o primeiro mês, eu trabalho com os blocos lógicos.
Francine: Bom, eu não conhecia os blocos lógicos, fui conhecer no último semestre de
matemática, foi numa menção da Bete [Elisabete Búrigo] em uma aula de pesquisa [disciplina
de Pesquisa em Educação Matemática] e ela mencionou o Dienes e os blocos lógicos achando
que todo mundo conhecia e nós não conhecíamos. E o que a senhora acha, porque o nosso
curso não tem os blocos lógicos?
Monica: Eu vou dizer a mesma coisa, porque as pessoas não sabem usar e não sabem o valor
que tem. Então não usam. Eu te diria assim, eu trabalhei muito com os blocos lógicos, muito,
muito. Em cursos de formação de professores, com alunos, alunos de séries iniciais, alunos de
108
quinto ano, quando eu fui fazer toda uma introdução aos conjuntos, às operações dos
conjuntos, porque como tu vais trabalhar as operações com conjuntos sem definir os
conectivos lógicos? Mas como é que o aluno vai entender o que é p e q? Isso ai já é um nível
de abstração. Então tu começas pelo concreto e tu generalizas. Eu trabalho com os blocos
lógicos e uma coisa que se chama materiais estruturados, que são materiais confeccionados
pela gente, que são estruturas isomorfas aos blocos lógicos. Então o trabalho se torna mais
rico ainda. E isso também nós aprendemos com o professor Dienes. Trabalhar com materiais,
isomorfos aos blocos lógicos, pra não ater uma estrutura lógica apenas aos blocos lógicos,
trabalhar com uma coisa que a gente chama de princípio da variabilidade perceptual, trabalhar
com algum material manipulável que tem ou não a estrutura dos blocos lógicos. É uma coisa
superinteressante, mas isso precisa se saber trabalhar. É um conhecimento tão, tão aprendível,
não sei se é esta a palavra, como equação diferencial. Tu tens que saber trabalhar, porque que
tu trabalhas com aquilo. Têm muito poucas pessoas que efetivamente sabem trabalhar com os
blocos e entendem o valor do trabalho com os blocos.
Francine: Então a senhora sempre trabalhou com vários públicos com os blocos lógicos?
Monica: Vários.
Monica: Não, eu trabalho com os blocos lógicos com os alunos do primeiro ano, certamente,
na escola infantil, no primeiro ano e segundo, quando temos a etapa de alfabetização
matemática, para fazer as classificações, as ordenações, a negação, o complementar, tudo isso
eu trabalho com os blocos lógicos. As sequências repetitivas ou não, tudo isso eu trabalho
com os blocos lógicos. Depois lá pelo quinto ano, quarto ano, em que a gente está começando
mais formalmente, sexto ano, as operações com conjuntos, eu apelo de novo para os blocos
lógicos. Quando eu trabalho a iniciação à lógica, por exemplo, construir as tabelas-verdade,
seja isso no primeiro ano do ensino médio ou no primeiro ano da universidade, fazendo toda a
base para a lógica e para a álgebra, eu trabalho com os blocos lógicos de novo. Trabalho em
formação de professores com os blocos lógicos. Então eu trabalho com vários públicos.
Monica: Através do GEEMPA e do professor Dienes, foi através dele que a gente conheceu.
Por exemplo, eu não sei se tu conheces o material de Cuisenaire. Esse eu já conhecia quando
eu fiz o magistério e eu trabalhei muito tempo com o Laboratório de Matemática no Instituto
de Educação General Flores da Cunha, que era um laboratório de matemática maravilhoso. E
que tinha professores que estudavam muito, até pode ser que eles conhecessem os blocos
antes do professor Dienes vir. Mas aí eu já havia me formado, entende? Mas o material de
Cuisenaire, por exemplo, que é um outro material maravilhoso, para outras coisas, mas
também para a construção do número, para as operações básicas e para composições aditivas
de um número, isso eu conheci no Instituto de Educação. Agora os blocos, eu comecei a
trabalhar, foi com a vinda do professor Dienes.
Monica: Olha minha filha, porque que eu comecei a usar? Porque eu não uso só os blocos
lógicos, eu uso vários materiais. Uso materiais industrializados [pega uma caixa de madeira
intitulada de Maquete dos Números e me mostra], como este aqui, por exemplo, é um material
maravilhoso, são as Maquetes dos Números, uso o material de Cuisenaire, uso o Base 10, o
Multibase, eu uso os blocos lógicos. Então eu uso vários materiais, dependendo do conteúdo
que eu vou trabalhar. Entendes? Ou industrializados ou confeccionados por mim. Agora,
como eu me dediquei muito a trabalhar com alfabetização matemática e com lógica, esse [toca
na caixa de blocos lógicos que levei] é o material que mais se apropria pra isso, então por isso
é que eu trabalho muito com os blocos lógicos. Mas trabalho com outros materiais também
variados também. Meu armário é um laboratório de matemática.
Francine: E com que finalidades a senhora usava eles e usa ainda nas aulas?
Francine: E a senhora assim, traçava objetivos para as aulas ou deixava as aulas livres?
Monica: Não, meu amor, não se faz aula livre. Toda aula tem que ter objetivo muito bem
traçado, os recursos, os materiais, os procedimentos, porque eu trabalho com a teoria dos
campos conceituais, são coisas muito planejadas. E claro que, um professor que tem prática de
trabalhar com seu planejamento, ele cria, ele inova, mas não existe algo sem um
planejamento.
Francine: Também concordo. E o que a senhora queria utilizando os blocos lógicos nas aulas?
Monica: Olha, eu compreendo que um aluno, para construir seu conhecimento matemático,
ele tem que, como se chama, fazer matemática. E fazer matemática é quase que recriar a
matemática. Então, a sistematização do conhecimento pra mim é a última etapa da construção
do conhecimento. Então, quando eu proponho jogos ou atividades com algum material
concreto, seja qual for, subjacente a esse material está toda uma estrutura numérica, algébrica,
lógica, que eu queira que os alunos aprendam. Então, quando eu trabalho com os blocos
lógicos [isso] não é um brinquedo, eu trabalho com os procedimentos que eu proponho a
partir de um jogo que eu proponho com os blocos, subjacente a esse procedimento está o
pensamento que eu quero que o meu aluno construa. A partir de um momento em que eu sinto
que o aluno construiu esse conhecimento, nós vamos sistematizar o conhecimento. Então, por
exemplo, tu vais definir a conjunção, define a partir de uma tabela-verdade, não é isso?
Quando tu vais generalizar pro aluno e construir a tabela-verdade, o aluno já sabe, que para
um “e” ser verdadeiro, é preciso que as duas condições sejam verdades. Isso aí, são etapas de
construção de um conceito, a etapa de comprimir [reduzir a um conjunto menor], a etapa de
construção, é um material, um problema, tu podes partir da resolução de um problema para
construir um conceito. Agora, este problema pode ser proposto a partir de um jogo, que os
blocos lógicos sejam o material. E como eu me identifiquei muito com o ensino da lógica, é
um material dos que eu uso, podes olhar nas aulas de metodologia, eu uso outros tantos
materiais.
Monica: Vivenciei muito intensamente, muito, muito. Porque assim, em primeiro lugar,
quando eu conheci o GEEMPA, eu não sou uma das fundadoras propriamente, poderia dizer
que sim, mas na assembleia de fundação eu não estava. Mas eu fui me apaixonando por uma
matemática diferente, que todo mundo poderia aprender, que todo mundo poderia construir e
eu fui vivendo. Então, nos primeiros cursos que a professora Esther Grossi deu, preparando,
por exemplo, a vinda do professor Dienes, eu estava presente. Depois eu vivi, vivi muito
intensamente esse momento. E acho que, embora as pessoas achem que o Movimento seja
fracassado, eu não tenho essa opinião. Minha opinião é que como tudo, tudo não, mas como
muitas coisas que são implantadas no mundo, as pessoas não estão bem preparadas para isso,
é o que aconteceu. Mas muitas coisas, os livros didáticos, por exemplo, uns antes e depois do
Movimento, pelo meu entender.
Francine: Eu também concordo, assim, a gente estava observando isso e eu não achei que
assim, nunca eu tinha visto antes um livro dos anos 70, por ali, e quando eu peguei [o livro]
eu me espantei, assim, do tipo de livro que era, tratando em séries iniciais, um conteúdo muito
abstrato para os alunos, muito fixado, sabe? Sem nenhuma liberdade para o aluno testar nas
aulas.
Francine: Então a senhora participava das palestras, dos cursos, das conferências?
Monica: Todas elas. Participava, organizava, as cinco vindas, por exemplo, do professor
Dienes, eu fui monitora dele, a gente organizava o material que ele preparava, depois veio o
professor Vargas, um professor muito amigo do professor Dienes, mas ele trabalhava com
estatística e com probabilidade, tudo para crianças pequenas. Depois veio a professora Régine
Douady, Michèle Artigue, todas essas professoras e a gente participou, eu participei de tudo.
Monica: Desde a organização, depois a gente fazia os cursos, a gente servia de monitora para
eles [Tamás Vargas, Régine Douady e Michèle Artigue], porque a gente trabalhava bastante
no GEEMPA.
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Francine: E qual assim, a lembrança mais marcante que a senhora teve nesse período?
Francine: Então nessa época inicial do GEEMPA a senhora estava fazendo pedagogia?
Monica: Não, não. Já não estava mais fazendo pedagogia. Eu comecei Pedagogia, fiquei um
tempo lá e também eu não podia fazer muitas cadeiras porque eu tinha quatro filhos nessa
época, daí eu fui para a Matemática.
Francine: E quais as propostas que o Movimento divulgava assim, de que a senhora lembra?
Monica: Bom, em primeiro lugar, um novo currículo. Onde, por exemplo, entravam as
estruturas lógicas, entrava a teoria de conjuntos, as estruturas algébricas, entrava a
probabilidade e estatística, a teoria dos conjuntos principalmente, onde tu trabalhavas com
muito material, a ideia de que se aprende, não se utilizava esse termo “se aprende” na
coletividade, mas o trabalho em grupo foi uma coisa assim, que nós fizemos muito estudo
para o trabalho em grupo, com o professor Lauro de Oliveira Lima, porque aquela ideia de
uma criança atrás da outra, só olhando pro professor ou pra professora trabalhando no quadro,
isso era uma ideia que a gente queria abandonar. Então, a gente não dizia: “Ah, nós vamos
trabalhar com resolução de problemas!”, só que aquilo foi vindo depois, quando veio o
Movimento da Educação Matemática. O que nós fazíamos era propor problemas para os
alunos, deixar para os alunos descobrirem sozinhos e construir seu conhecimento a partir
113
desta descoberta. Isso tudo, hoje em dia, a gente está verbalizando, mas nessa época era feito
assim. Entende? Então, todas essas coisas diferentes eram trabalhadas no Movimento da
Matemática Moderna. Os conteúdos mudaram, a forma de trabalho na sala de aula mudou, o
aluno como agente, trabalha com autonomia, isso tudo pra mim, pode ser Francine, que eu
misture um pouco, porque as coisas que são vivenciadas, que tu vais tendo, porque tu não vais
delimitando que até aqui foi isso, a vida, a gente vai crescendo, então pode ser que algumas
coisas que não fossem do Movimento da Matemática Moderna, eu atribuo a ele. Mas pra
mim, tudo isso veio com esse Movimento.
Francine: E a senhora acredita que os blocos lógicos proporcionam uma contribuição para o
aprendizado da lógica e dos assuntos que estão envolvidos na atividade?
Monica: Acho que é indispensável. Para começar, tu não constróis um número se tu não
construíres determinadas estruturas de classificação. Por exemplo, as relações, o que é pra
construir um número, tu vais ter que trabalhar com relações, e tu vais ter que trabalhar com
equivalências e com ordens. Então, uma coisa que se fazia era trabalhar com propriedades
reflexiva, simétrica e transitiva, como conhecimento. Isso não se precisa no primeiro ano, mas
o aluno tem que sentir que quando ele classifica, ele trabalha com um tipo de coisa, não
precisa nem chamar de estrutura. Quando ele ordena, ele está com outra forma. Daí o número
vai estar no meio dessas classificações, dessas equivalências, dessas ordens. Mais tarde, tu já
vais trabalhar com algumas propriedades e quando tu chegares em outro nível, tu vais definir.
Mas eu não tenho dúvida nenhuma de que, como as funções, tu não vais definir as funções no
primeiro ano de ensino médio, tu vais trabalhar com regularidades e padrões desde muito
pequeno, tu já estás construindo as funções. A mesma coisa é a lógica. Tu já vais trabalhando
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com a lógica, com a negação, com a conjunção, com a disjunção, desde muito pequeno.
Depois tu vais definir, fazer tabelas-verdade, isso é outra etapa dessa construção.
Francine: Que tipos de atividades que a senhora fazia utilizando os blocos lógicos?
Monica: Ai, muitas atividades. Por exemplo, tu fazes, tu brincas com os blocos lógicos, as
atividades de adivinhação. Você pega um triângulo amarelo grosso e pequeno [está com a
peça na mão mostrando], aí eu pergunto, depois de as crianças fazerem jogo livre de
descobrirem “Bah, professora tem grossos e finos!”, “Ah, professora tem grandes e
pequenos!”. Aí tu pegas assim, esse triângulo, eu fecho os olhos, pego o triângulo, pergunto
pra ti, “ele é azul”?, tu dizes “não”, “ele é vermelho?”, tu dizes “não”, uma criança que já
descobriu uma série de coisas não faz a pergunta se ele é amarelo, ela já conclui que se ele
não é vermelho, não é azul, então ele é amarelo. Daí eu vou perguntar, “ele é grande?”, tu vais
dizer “não”, o que eu vou concluir?, que ele é pequeno. Então, entendes, esse é o jogo que eu
faço. [...] Uma brincadeira como essa, a pessoa se dá conta de que já está usando a lógica.
Porque se ele não é grande, é pequeno. Se ele não é fino, é grosso. Se ele não é quadrado, não
é retângulo, não é círculo, só pode ser triângulo. Quando uma criança ainda não conhece, ou
ainda não está usando a lógica, ela tem: “É grande?”, “Não!”, “É pequeno, [risos], não é?”
Então essas coisas tu vais... Dominó! Eu pego uma peça e digo, agora tu vais escolher uma
peça, [aponta para a tal peça que vai descrever], esse quadrado grande, pequeno e grosso e
amarelo, eu quero uma peça que tenha apenas uma diferença dessa, ela vai pegar essa aqui
[pega a peça quadrada pequena grossa e azul] e vai me dizer, a diferença é na cor. Uma outra,
por exemplo, essa aqui, boto, não, esse círculo não é aqui [sobrepõe as peças em análise],
porque ele tem duas diferenças, ele é círculo, esse é quadrado, diferem na forma, diferem na
espessura. Ah, daí a criança tira e bota este aqui. Isso jogos, mas são jogos preparados
cientificamente. Depois, a gente faz representações, a gente trabalha com máquinas de trocar
cor, trocar forma, isso está preparando para funções. Então, tudo o que tu tiveres de lógica, de
álgebra, tudo não, mas a base, as noções básicas de todos esses raciocínios ligados a
classificações, as estruturas lógicas, as ordens, as funções, estão ali na base.
Francine: E a senhora acredita que os blocos lógicos contribuem para uma melhor
aprendizagem do aluno?
115
Monica: Eu não tenho dúvida disso. Eu não acredito, é mais do que acredito. Eu tenho certeza
disso. Mas como eu te digo, Francine, desde o primeiro momento, não é brincar por brincar,
também brincar por brincar é bom, que é melhor fazer isso do que não fazer nada. Entendes?
Mas se tu queres que ele produza, como é que eu vou dizer, tenha uma finalidade, para a qual
realmente eles foram criados, então tu tens que compreender muito, tu tens que estudar muito,
tu tens que fazer os jogos primeiro, e depois aplicar para as crianças. E a primeira vez que tu
vais aplicar tu não vais explorar tudo que tu podes. A gente vai saber explorar depois de usar
umas quatro, cinco ou seis vezes. Então ai tu vais estar apta a fazer render o que eles podem
render. Certo?
Francine: E o que a senhora pensa sobre usar materiais concretos e atividades concretas e
manipuláveis assim, nas aulas?
Monica: Eu acho indispensável. Mas também nunca, Francine, é usar por usar. O material
concreto, ele tem que ser usado muito criteriosamente, tá? Com objetivos claros, sem enjoar
as crianças, tem uma etapa primeiro, uma etapa de jogo livre, isso também é do professor
Dienes, depois tu tens uma etapa de jogos com regras, depois, quando as crianças abstraem as
regras, tu podes tirar o material e trabalhar, representar, fazer várias representações e depois
eles vão abstrair e generalizar. É isso aí a etapa, são as etapas da construção do conceito de
verdade.
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Francine Dahm: E eu queria que a senhora me contasse um pouco de sua vida profissional.
Maria Helena Camara Bastos: Bom eu não vou te contar, eu vou te mandar, tu leres ela, e aí
fica mais fácil, que tem as minhas memórias, inclusive as memórias de professora do Colégio
de Aplicação algumas coisas. Está no livro do Alonso. E aí eu acho que eu te dou a referência
depois, me lembra tá? Por que senão a entrevista não vai terminar. Disso, deixo a história
profissional. Eu sou formada em História, que tu vais ver lá no memorial, e depois tu vais ver
também nesse memorial que eu, quando me formei, fui trabalhar no Colégio de Aplicação
como professora de sexta série. E esta era uma experiência diferenciada porque era o antigo
ginásio, quer dizer, já não era mais ginásio, mas a sexta série correspondia ao primeiro ano do
ginásio e os alunos entravam no Colégio de Aplicação por concurso no final da quinta série.
Então o colégio só começava na sexta. Então, como até a quinta era um professor único nas
antigas escolas primárias, a Dona Graciema [Graciema Pacheco, diretora do Colégio de
Aplicação] me instituiu nesse projeto como professora polivalente. O que era? Ela era uma
professora única, dando todas as disciplinas, só as de teatro, música, educação física, e nem
sei mais o quê, que eram [ministradas por] professoras especializadas. Então eu tive que
estudar, mas isso foi muito fácil, tem até um projeto muito interessante, porque eu tinha uma
tutoria das professoras das áreas especializadas, e como também funcionava a antiga
professora, que era a coordenadora do primeiro grau, dessa parte do primeiro grau, ela
também orientava. Então eu tinha mais orientação era na matemática e na área de ciências.
Porquê de português, e de história e de geografia, isso eu tinha toda a [formação]... Então, da
matemática era a Léa Fagundes, e a Maria Luisa Macedo, então eram as duas que me
assessoraram. A Léa, muito mais com as questões dos blocos lógicos, da topografia,
topologia, todos esses conhecimentos e de construção do conhecimento das crianças em
matemática. E a teoria dos conjuntos, todas essas coisas. Isso era um atendimento semanal.
No segundo ano em que eu fui polivalente, eu tinha duas turmas, então era uma que eu dava e
a outra era a professora Silvia Stifelman, que hoje é Kats, que era formada em Letras, então
era muito interessante essa diferenciação. Depois, inclusive, isso se transformou em projeto e
todos esses planos, de todas as disciplinas, foram ampliadas para outras escolas do Estado,
estaduais, porque a Dona Graciema dizia: “O Colégio já era conhecido como elite”, mas ela
acreditava que esse trabalho que era feito no Colégio de Aplicação podia ser estendido. Se tu
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quiseres saber mais sobre isso, não é tão teu objeto, a professora Ana Maria Colla
acompanhou todo esse projeto e eu tenho o telefone, se tu quiseres depois entrevistá-la. Bom,
ela deu até entrevista já sobre a educação matemática no Colégio de Aplicação. Bom, então
funcionava assim pra tu teres uma ideia, o que eu me lembro, foi que eu passei a participar de
vários eventos do GEEMPA, porque a Léa fazia parte, não é o GEEMPA como é hoje, o
GEEMPA dos anos 70, que era só matemática, então a Esther, com a Esther Grossi, a Celeste
[Maria Celeste Koch], eu acho que a Malamuti também, um monte de professoras que eram
do Instituto e que havia esse transe [participavam também do GEEMPA]. Eu agora teria que
olhar os planos e procurar lá em casa aqueles benditos planos em caixas, o que eu fazia com
os blocos lógicos. Eu me lembro que os alunos se reuniam em grupos de quatro, e havia toda
uma orientação, e tinha uma caixa de blocos lógicos para cada grupo de alunos. Nós
tínhamos, em média, em sala de aula, de 30 a 35 alunos. Eu me lembro disso aí, havia toda
uma atividade orientando. O dia em que o Dienes foi na minha sala, os alunos também
estavam, porque eu tenho essa imagem visual, distribuídos em grupos e eles estavam fazendo
uma tarefa que foi toda planejada, orientada, porque foi na minha sala e da Sílvia, eram duas
salas em que ele [Dienes] foi, e aí tinha toda uma atividade que nós ficamos até quase até a
meia noite fazendo, porque eu vou te dizer, devia ser uma segunda-feira e ele iria na terça. Eu
sei que eu morava ali na Tomáz Flores e era quase meia-noite quando eu fui para casa.
Preparando, organizando, e tudo para os alunos realizarem durante a visita. Mas não me
lembro qual foi a tarefa. E outra coisa que eu me lembro de fazer nas aulas de matemática, era
muito ligado com a Geografia e com os passeios que a gente fazia na cidade, então a questão
do corpo dentro do círculo, fora do círculo, noções de espaço, de topologia, então isso tenho
muito claro, as atividades com topologia. Dos blocos lógicos, eu só tenho memória visual
deles [brinca e mexe em algumas peças dos blocos lógicos que eu trouxe para a entrevista],
não estou lembrada assim de que, eu me lembro que eu fazia os conjuntos, a questão de
intersecção, de relação, cor, tamanho, espaço, tinha também fichas coloridas que nós
fazíamos, não eram fichas eram..., esses também redondos, quadrados [pega as peças],
retângulos, triângulos, e que a gente fazia uma série de atividades com eles.
Francine: Comprei o material novo [as peças estavam grudadas e alguma que ela quis pegar
não saíram da caixa]. Então o professor Dienes, vocês trabalhavam com palestras e depois ele
ia às escolas visitar vocês para ver essas aplicações, essas atividades que eram discutidas?
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Francine: O Dienes.
Maria Helena: O Dienes veio para um evento, e fez uma série de palestras. E visitou salas de
aula, que eu me lembre, no Aplicação essas duas, e no Instituto de Educação. Agora ele foi
para ver uma atividade, aquilo que tu vais observar, né? Também nós usávamos aqueles
pauzinhos, como é que era, aqueles compridinhos, que tinham o nome... [Cuisenaire], toda
normalista também tinha aquilo, muito mais que os blocos lógicos, tinha pauzinho pequeno,
médio, grande, de gorduras diferentes, de espessuras, que eram antes dos blocos lógicos
utilizados, também para ver espessura, tamanho, e etc.
Maria Helena: Ah, como me tornei professora? Bom, eu não fiz escola normal. Esse é um
dado bem relevante. Eu fiz clássico, porque eu queria entrar no direito e etc. Aí no clássico eu
já não pensava tanto no direito e adorava história e matemática. E eu fui fazer vestibular, tu
vais ver no memorial, me preparei pra matemática, com professor de cursinho chamado Gato,
que era também professor da universidade. E com isso, na hora H, eu mudei para história.
Porque eu achei aqueles seis meses de preparação de cursinho com alta matemática, porque
não era aquela matemática cotidiana de que eu gostava e tal, eu achei tudo muito árido, e ai
fui para a história, que era uma área que eu amava de paixão, e continuo amando, porque eu
sou da história da educação, então foi este, o caminho. E quem faz licenciatura normalmente
segue a profissão docente. Mas eu caí na sexta série também por uma casualidade. Porque
quando eu me formei, nós fomos convidadas pra sermos monitoras, ou auxiliares, das
professoras de práticas de ensino, da professora de Prática de Ensino de História e Geografia,
e também no último semestre da faculdade, não sei por quê, eu fui acompanhar a professora
Ana Maria Colla, que era a professora, observar a aula dela, de sexta série. E com isso, ela me
convidou para no ano seguinte assumir essa sexta série, tá? Porque ela estava se desligando
como professora polivalente. Então foi essa a casualidade. Mas ao mesmo tempo em que eu
acompanhei, em que eu fui ser professora de sexta série, eu também acompanhava a
professora de prática de ensino de história e geografia, com isso, eu fui galgando, eu fui
professora de sexta série dois anos, depois da nona série, depois fui trabalhar no laboratório de
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metodologia do ensino superior, fui ser professora do ensino básico, com Introdução aos
Estudos do Homem, aí já mais vinculada com a minha área, o meu trabalho na matemática foi
muito transitório durante dois anos.
Maria Helena: Já, já, porque eu já estava formada. Na minha aprendizagem matemática não
teve os blocos lógicos [risos]. Sou mais antiga que eles. Nem sei quando eles, o Dienes, foi o
Dienes que criou eles?
Francine: Sim.
Maria Helena: Não, ele começou a vir. Mas ele assistiu, eu comecei como professora no
Aplicação em 73 e ele assistiu, foi na minha sala em 74.
Francine: E o que a senhora fazia nessa época quando conheceu os blocos lógicos?
Francine: E porque que a senhora acredita que os blocos lógicos não são mais utilizados hoje
nas aulas de matemática?
120
Maria Helena: Olha, eu não sei, porque aqui na faculdade a professora que dá Prática de
Ensino de Matemática ela trabalha com as alunas. Porque eu vejo ela carregar as caixas, mas
são mais chatinhas [achatadas]. Eles não estão sendo usados nas escolas, mais?
Francine: Não, infelizmente não. Eu fui conhecer também os blocos lógicos agora, eu faço daí
na UFRGS, no meu sétimo semestre, e numa menção da professora Bete [Elisabete Búrigo]
em uma aula minha de pesquisa [Pesquisa em Educação Matemática], ela contou desse
trabalho que teve do GEEM, do GEEMPA em Porto Alegre, e daí ela mencionou os blocos
lógicos, achando que todo mundo conhecia e ninguém conhecia. E daí foi uma motivação
para eu fazer o trabalho, eu me formando como uma professora de matemática não
conhecendo esse recurso para a lógica.
Maria Helena: Exatamente, bem interessante. E marcou a matemática, porque toda a teoria de
Piaget, a questão, a Léa [Fagundes] trabalhava muito nisso, dos processos de pensamento, do
concreto para levar ao pensamento lógico, abstração e tal, então toda a orientação do trabalho
era manusear, que eu me lembre, estes blocos, os blocos lógicos, e depois havia questões que
eles tinham que responder a partir da concretude, daquilo que eles estavam visualizando,
fazendo.
Francine: E como que a senhora soube da existência deles? Através da professora Léa?
Maria Helena: Sim, através dela que me orientava, foi através. Mas a Ana [Maria Colla], se eu
não me engano, já usava anteriormente também na sala dela. A Ana trabalhou na sexta série,
em 71 e 72. Eu acho que, daí teria que perguntar para a Ana, mas a Ana já utilizava, se eu não
me engano.
Maria Helena: Bom, eu te disse, em grupos de quatro, porque nem todos tinham os blocos
lógicos, alguns até compraram, eu tenho uma vaga memória, isso a Bete [Elisabete Búrigo]
pode responder porque ela foi aluna, e se a Bete foi da turma de 74, não, a Bete não foi minha
aluna em sala de aula, eu fui coordenadora dela, mas ainda se usavam os blocos lógicos, a
Bete deve saber responder essa questão, que eu não me lembro. Eu me lembro que
distribuíamos em grupos de quatro e eles manuseavam, e havia uma orientação de tarefa, e eu
ia de grupo em grupo, perguntando, questionando, vendo as dificuldades, era um trabalho bem
prático.
Maria Helena: Para a teoria dos conjuntos, que eram as coisas que nós trabalhávamos. Agora
não me pergunta muito sobre isso porque eu não lembro [risos]. Mas eu sei que era para a
questão de espaço, a teoria dos conjuntos, o que está incluído em que, etc, até hoje eu uso
isso, para explicar coisas. Ah, que mais que eu me lembro? [pensa um pouco] Eu tinha que
pegar o material, essa parte foi esquecida.
Maria Helena: Sim, as aulas, nós temos todas as aulas, em planos, todas, nós fizemos isso
para as escolas do Estado poderem adotar. E nós dávamos orientações para as professoras do
Estado que vinham semanalmente ao Colégio de Aplicação para receber orientação que era
dada então pela Léa, pelas professoras especialistas e por nós, professoras de sexta série.
Então tudo foi transcrito em planos. Todos. Agora eu teria que achar onde estão, eu sei que
estão numas caixas, nuns arquivos grandes, porque eu guardei tudo isso. Porque é muito
importante. Eu não sei se o Colégio de Aplicação guardou, isso é uma boa questão. Lá estão
todos os planos.
Francine: Eu até poderia entrar em contato com a senhora daqui a umas semanas, pra ver se a
senhora encontrou alguma coisa, e daí eu entrego para a Bete.
Maria Helena: Muita coisa da matemática dos meus filhos, que também usaram, eu passei
para a Cecília Fischer [Maria Cecília Fischer], que é colega da Bete, elas estão com o material
dos meus filhos, mas ai já é anos 80.
Francine: E o que a senhora queria com suas aulas utilizando os blocos lógicos?
Maria Helena: Ah, minha filha, tu perguntas para as matemáticas. A questão do pensamento,
principalmente do raciocínio lógico, a partir do concreto para o abstrato. Então, desde o
século XIX é a meta. Só que como era a Léa que orientava, tinha todos aqueles passos do
Piaget, da construção do conhecimento, eu tive que estudar Piaget, tive que estudar Patto
[Maria Helena Souza Patto], e tinha outros autores da matemática, porque depois eu
acompanhei o trabalho da Ana Cristina [Rangel], a Ana Cristina usava muito os blocos
lógicos, Ana Cristina Rangel , que foi professora da UFRGS de prática de ensino.
Maria Helena: Ela está na UniRitter eu acho, Ana Cristina Rangel, essa mesma.
Maria Helena: E ela, ela vai te dizer qual é o outro autor, que é uma mulher famosa, Kamii
[Constance Kamii].
Francine: E a senhora lembra de alguns conteúdos que abordava com os blocos lógicos?
Maria Helena: Não, vazio existencial, total. Eu me lembro que, questões de topologia, o que
eu já te falei, alguma coisa de geometria e teoria dos conjuntos, só isso que eu me lembro.
Maria Helena: Não, eu só fui professora dois anos. Ia aos eventos do GEEMPA, naquela
época, depois eu não acompanhei mais.
Francine: Então a senhora participou dos eventos do GEEMPA durante os dois anos que era
professora?
Francine: Mas a senhora foi professora durante dois anos no Colégio de Aplicação?
Maria Helena: É, que dava matemática. Depois nunca mais dei matemática na minha vida.
Maria Helena: Ah, sim. Eu já contei aí pro Diogo que fez a tese lá na Bahia. Ah, eu achei essa
experiência muito gratificante, porque era completamente diferente da matemática que eu tive
na escola. E eu sempre fui boa em matemática, em cálculo, hoje eu faço cálculo tudo mental e
no papel, não uso calculadora, acho que tem que... Mas nós fazíamos um exagero de
exercícios, decorar a tabuada, até hoje eu sei tudo de cor, e hoje eu fico impressionada que
ninguém sabe tabuada, porque se põe na...
Francine: Na calculadora.
Maria Helena: Na calculadora, ninguém pensa. Apesar de que eu estou escrevendo uns textos
e vi que o cálculo mental voltou, com uma outra abordagem, porque nos anos em que eu
trabalho [pesquisando], anos 40, 50, era decorar, né? Mas eu era boa nas contas, e por isso eu
tinha essa afinidade. Só eu digo sempre, eu nunca entendi a tal de trigonometria, eu tive que
aprender pro vestibular, aquilo pra mim era alta estratosfera. Até hoje. Agora regra de três,
frações, mais ou menos. Ah, nós usávamos o [pega as peças dos blocos lógicos] para estudar
frações. Agora que me lembrei. E um meio, é, tudo de frações e tal. Regra de três eu adorava,
até hoje, proporções e etc, é o que mais eu uso na vida. Agora me lembrei, frações também.
Tá? O que mais tu precisas?
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Francine: E a senhora acredita que os blocos lógicos proporcionam uma contribuição para o
conhecimento da lógica?
Francine: É, eu até acho que eles trabalham com alguma coisa, mas com o material dos blocos
lógicos, são raras as escolas, com que eu tive contato, pelo menos aqui em porto alegre
nenhuma. E o que a senhora pensa sobre o ensino da lógica no ensino fundamental?
Maria Helena: Bom, nunca pensei sobre isso atualmente, porque eu não estou vinculada a
trabalhos em escolas hoje, porque eu trabalho só com as coisas velhas. Mas a lógica é
fundamental. E o método intuitivo, fundamental. Porque em toda educação se trabalha muito
com o dedutivo, aquilo é de fora pra dentro, e não mexe, não fixa, e tudo aquilo que a criança
elabora é o que fica, né? Então essa questão de trabalhar com material concreto, para ela tirar
conclusões a partir do manuseio, com uma certa orientação, não é só brincar. Porque agora
traduziram que a criança tem que jogar, isso é mais velho que minha avó, desde o século,
desde Platão, e Friederich Froebel no século XIX, inventou, destacou isso. Mas não é o
brincar pelo brincar, nem o jogar pelo jogar. É tudo para que a criança pense, elabore e
construa o conhecimento. Então, o grande problema hoje, é que tu entras na universidade, o
aluno da universidade não tem ainda o processo de abstração. Porque eles não têm o
pensamento lógico. Então isso é fundamental.
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Francine: E a senhora acredita que a utilização dos blocos lógicos promove um pensamento
lógico na criança ou a senhora apenas utilizava os blocos lógicos por ser um material, por
trabalhar com algum material concreto na sala de aula?
Maria Helena: Não, tem toda uma lógica de utilização desse material para construir a
abstração. Então é óbvio que a criança, trabalhando com isso, vai abstrair, vai tirar
conclusões, vai ver características, vai construir o pensamento. Então isso é o processo.
Ninguém sai imune, mesmo pegando essa tua caixa, alguém não conheça isso aqui, ela não
vai ser imune a este, depois que mexer aqui com esse. Porque ela vai tirar conclusões, porque
isso daí é grande, é mais alto, essa tem a mesma espessura [pega um círculo grande grosso
azul e um círculo pequeno grosso vermelho para a comparação], mas tamanho diferente, cor
diferente, esse é da mesma cor, mas fino [pega um triângulo pequeno fino vermelho], esse é
mais fino de outra cor [pega um círculo pequeno fino amarelo], nessa caixa têm três cores,
têm quantos formatos? Triângulo, quadrado, redondo e retângulo, é retângulo, não é quadrado
[está com uma peça quadrada que achava ser um retângulo], esse não é quadrado?
Francine: É quadrado.
Maria Helena: É quadrado, então, têm quantas formas? Cinco formas, triângulo, redondo, não,
quatro, então, três cores, espessura, tamanho, então, mesmo um adulto que nunca viu isso vai
começar a tirar conclusões. [fica brincando e mexendo com as peças]. Vou procurar a minha
caixinha de blocos lógicos.
Francine: Sim. Levei tempo para achar e eu não sou de porto alegre, aqui eu não encontrei. Eu
sou do interior, e lá tinha uma lojinha que trabalha com materiais de madeira...
Maria Helena: Claro, porque isso daqui, que eu me lembre, a minha caixa foi algo que foi
mandado fazer para uns grupos, para terem o material. Então, vamos dizer, hipoteticamente,
foi um marceneiro que fez. Porque isso aí também, deve ser alguém habilidoso que trabalha
com isso e fez.
Maria Helena: Eu acho que com criança é fundamental, inclusive com os adultos. Porque eu
vejo que as professoras aqui da prática, que dão metodologia do ensino de matemática, para as
professoras que vão ser professoras de educação infantil, de séries iniciais, elas trabalham
com isso. Para elas poderem saber explorar, então, é fundamental. E tudo aquilo que tu podes
observar, o lúdico, o olhar com os olhos, hoje, por exemplo, se eu der uma aula expositiva e
não usar datashow, os alunos, parecem que não entendem nada. Porque eles precisam estar
vendo. Então história, tem que mostrar mapa, tem que mostrar linha de tempo, porque os
séculos parecem que é uma coisa muito abstrata, por exemplo, eu dou história da educação,
mas eu mostro pra elas que elas vão ter que trabalhar com conceitos fundamentais com as
crianças, tempo e espaço. Então o espaço, é geográfico, é temporal, é matemático, é tudo. Pra
elas entenderem. Porque senão elas acham que o espaço é só geografia, espaço é só [a
geografia que trabalha], e tempo é só a história que trabalha. Então são conceitos-chave que
têm que ter concretude e abstração, porque senão o clique não faz.
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6 REFERÊNCIAS
BASTOS, Maria Helena Camara. Entrevista concedida a Francine Dahm. Porto Alegre:
outubro de 2012.
BONAFÉ, Marytta Rennó Vilela Perez Masseli. Zoltan Dienes e a Matemática Moderna. In:
MATOS, José Manuel. VALENTE, Wagner Rodrigues. A matemática moderna nas escolas
do Brasil e de Portugal: primeiros estudos. São Paulo: Zapt Editora, 2007. p. 215-221.
BÚRIGO, Elisabete Zardo. FISCHER, Maria Cecilia Bueno. SANTOS, Monica Bertoni dos.
Considerações acerca da matemática moderna no Rio Grande do Sul. In:______. A
matemática moderna nas escolas do Brasil e de Portugal: novos estudos. Porto Alegre:
Redes Editora, 2008. p. 35-44.
DIENES, Zoltan Paul. Lógica e jogos lógicos. Tradução de Euclides José Dotto. 2. ed. rev.
São Paulo: EPU, 1974; Brasília: INL, 1974.
H., Senhora. Entrevista concedida a Francine Dahm. Porto Alegre: setembro de 2012.
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PIAGET, Jean. Les structures mathématiques et les structures opératoires de l‟intelligence. In:
COMISSION INTERNATIONALE POUR L‟ETUDE ET L‟AMELIORATION DE
L‟ENSEIGNEMENT DES MATHEMATIQUES. L’enseignement des mathématiques.
Neuchâtel: Delachaux et Niestlé, 1955. p. 11-34.
SANTOS, Monica Bertoni dos. Entrevista concedida a Francine Dahm. Porto Alegre:
setembro de 2012.
SILVA, Adriana Bruckmann da. Entrevista concedida a Francine Dahm. Lajeado: agosto
de 2012.