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Daniela Levy
Neste artigo, pretendo me concentrar nos mitos que foram construidos sobb
bre os judeus por um sentimento de intolerância e discriminação. Segundo
o título do texto, trata-se do drama vivido pelos judeus, que após a ocupaçb
ção holandesa no Brasil, sonharam com liberdade e tolerância, mostrarei
que a errância que começou em Portugal em 1497– continuou no Novo
Mundo.
O primeiro mito, o qual vou me referir, diz respeito à aversão de judeus
e cristãos novos ao trabalho agrícola; o segundo sobre a participação
judaica no tráfico de escravos e o terceiro, sobre a questão da “tolerância”
e convivência entre judeus, católicos e calvinistas em terras ocupadas pelos
holandeses.
O velho mito de que os judeus tinham aversão ao trabalho agrícola foi
desmentido no Brasil no século XVII como foi desmentido em Israel no
século XX. Os sefaradis portugueses no Brasil – século XVI – construíram
um território altamente produtivo . Como no século XX, em Israel, os
judeus plantaram e construíram um Nação desenvolvida .
A colonização brasileira foi uma colonização agrícola, os primeiros
cristãos novos que se estabeleceram no Brasil foram elementos fundamentais
para o desenvolvimento dessa economia agrária, sendo em grande parte
responsáveis pelo primeiro impulso econômico do Brasil e pela introdução
da cana de açúcar , fator primordial no enriquecimento português, trazendo
a tecnologia que haviam desenvolvido na Ilha da Madeira e São Tomé (ilha
Arnold Wizniter . Os judeus no Brasil colonial. Trad. Olívia Krahenbuhl, São Paulo,
Pioneira/EDUSP, 1966, p.4-9. Stuart Schwartz. Segredos Internos – engenhos e escc
cravos na sociedade colonial. Trad. Laura Teixeira Mota. São Paulo, Companhia das
Letras, 1988, p.3. Israel, Jonathan.”The Jews of Dutch Americas” in The Jews and the
Expansion of Europe to the West, 1450 to 1800. Paolo Bernardini and Norman Fiering,
editors. (European Expansion and Global Interaction, number 2.) New York: Berghahn
Books, New York, 2001. pp.335-349
Wiznitzer, op. cit. pp 7-9; Ernst Pijning, “New Christians as Sugar Cultivators and
Traders in the Portuguese Atlantic, 1450–1800” in The Jews and the Expansion of
Europe to the West, 1450 to 1800. Paolo Bernardini and Norman Fiering, editors.
(European Expansion and Global Interaction, number 2.) New York: Berghahn Books.
2001 pp. 485-500 James Boyaeian, “New Christians and the Jews in the Sugar trade,
1550-1750: Two Centuries of Development of the Atlantic Economy”, in The Jews
and the Expansion of Europe to the West, 1450 to 1800. Paolo Bernardini and Norman
Fiering, editors (European Expansion and Global Interaction, number 2.) New York:
Berghahn Books. 2001.p 480.
Processo da Inquisição de Lisboa- Ana Maria Correa- n. 1381; Ana de Paredes-n.
4944; Ana Rodrigues- n. 9101 in Gorenstein, Lina. A Inquisição contra as mulheres-
Rio de Janeiro, séculos XVII e XVIII. Ed. Humanitas: FAPESP, São Paulo, 2005.
pp. 460-461.
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Seymour Drescher, “Jews and New Christians in the Atlantic Slave in The Jews and
the Expansion of Europe to the West, 1450 to 1800. Paolo Bernardini and Norman
Fiering, editors (European Expansion and Global Interaction, number 2.) New York:
Berghahn Books. 2001, pp.440-470. Drescher, Seymour.From Slavery to Freedom:
Comparative Studies in the Rise and Fall of Atlantic Slavery. New York University
Press, 1999 pp 339- 354.
Jeffries, Leonard. Speech made on July 20at the Empire state Black Arts and Cultural
Festival in Albany. Publicado pelo New York Post ” An account of a vitriolic anti-
Semitism and Racist Speech”. Agosto, 1991
Salvador, José Gonçalves. Os Magnatas do Tráfico Negreiro. Ed. Pioneira/ EDUSP-
1981,SP p.4 “Com grande surpresa chegamos à conclusão de que os judeus ibéricos forb
ram os principais detentores do comércio negreiro, e mais: que um clã, ligado por interb
resses econômicos, quando não também por laços sangüíneos, o explorou largamente.”
Novinsky, Anita. Inquisição – Inventários de bens confiscados a cristãos novos. Impb
prensa Nacional, Casa da Moeda, Livraria Camões, 1976 pp.154-158
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autoridades para praticar sua religião não era visto com bons olhos pelos
predicantes calvinistas que consideravam as práticas judaicas , escândalo
público. Esses relatórios pediam que os judeus fossem proibidos de
ocuparem cargos públicos e de serem arrecadadores de impostos.20
Diversas tentativas foram feitas para impedir que os judeus exercessem
sua religião livremente. Em uma dessas tentativas, o Conselho Eclesiástico
dos calvinistas, decidiu que as duas sinagogas deveriam ser fechadas .
A comunidade judaica do Recife reagiu, exigindo o mesmo tratamento
dos calvinistas dado aos católicos e conseguiram desafiar os inimigos
mantendo suas sinagogas em funcionamento.21
A religião praticada pelos judeus serviu de excelente pretexto, pois estava
por trás a capacidade de um grupo de judeus que se destacava devido ao seu
nível superior de conhecimento, possibilitando vantagens na concorrência
econômica e em todos os cargos que ocupavam.
As reclamações dos judeus eram recorrentes. Chegaram ao ponto de
pedirem que os judeus passassem a usar um distintivo de identificação,
ou um chapéu vermelho, ou insígnias amarelas no peito, como ocorria em
outros países da Europa, para que todos soubessem sua procedência e não
deixassem enganar ou roubar. 22
Em outro relatório os judeus são chamados de filhos de Judas, mentirosos,
larápios e malditos que querem se apoderar das terras brasileiras. São
comparados a pestes que graçavam o Brasil.23
Essa conduta demonstra que católicos e calvinistas não aceitavam as
imposições dos diretores da Companhia e desejavam eliminar os judeus de sua
convivência, o que se concretizará na expulsão após a retomada portuguesa.
Mas, a Companhia das Índias Ocidentais tinham nos judeus importantes
aliados políticos, o que não acontecia com os cristãos portugueses, e por
maior que fosse a pressão, havia o interesse em consolidar o comércio de
importação e exportação de mercadorias.24
20 Wiznitzer op. cit. pp 63-71; Mello, José Antônio Gonsalves de. Gente da Nação: Crist-
tãos Novos e Judeus em Pernambuco, 1542-1654. Fundação Joaquim Nabuco, Ed.
Massangana . Recife, 1996. 257-271.
21 Wiznitzer, op. cit. p. 64.
22 Wiznitzer, op. cit p.69.
23 “Dezessete Cartas de Vicente Joaquim Soler 1636-1643” in Brasil Holandês. Editora
Index. Rio de Janeiro,1999 pp.73-74.
24 Wiznitzer, op. cit p.54-55.
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25 ver: Mello, José Antônio Gonsalves de. Gente da Nação: Cristãos Novos e Judeus em
Pernambuco, 1542-1654. Fundação Joaquim Nabuco, Ed. Massangana . Recife, 1996.
p 274.
26 Wiznitzer,op.cit p.71.
27 Wiznitzer, op. cit.75.
28 Calado, Frei Manoel. O Valeroso Lucideno e o triunfo da liberdade- 1584-1654. Recib
ife, Fundarte. Diretoria de assuntos culturais, 1985.v.2 pp. 15-33.
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Conclusão
29 Willians, James Homer. ”An Atlantic Perpective on the Jewish struggle for rights and
opportunities in Brazil , New Netherland and New York” in The Jews and the Expans-
sion of Europe to the West 1450-1800. Paolo Bernardini and Norman Fiering (eds.)Ed.
Bergham Books, New York,2001, pp.369-393.
Marcos, Jacob Rader. The Colonial American Jew. Hebrew Union College Jewish Insb
stitute of Religion. Wayne State. University Press, Detroit,1970 pp.215-243.
30 POOL, David de Sola and Tamar de Sola. An Old Faith in the New World: Portrait of
Shearith Israel 1654-1954. New York: Columbia University Press,1955 p. 157; Marcb
cus, op. cit. vol. II p.1019.