Pe FR Frutuoso Hockenmaier - O Cristão No Tribunal Da PenitênciaRED

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P. F r.

F ru tu o s o H o e ken m e i e r, o f ln

O Cristão no Tri b u na l da
Penitência

Tradução � P. 4n-o.c::iru:f" de Ne.scmento

3.• Edi-çio r.sfundida

194 9

Edição do clõletlm Menael, - Br•o•

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CARTA DO BANTO PADR.11; AO AUTOR DO LIVRO

Va.tlca.no, 8 de Abril de 1921. Secreta.ria. do ·Esta.do de Baa


Santidade. N .o B. 19356.

Revmo. Padl'e, o Augusto Pontifica recebeu, com verda :


clelra. satlsfa9ão, o te·ll livro admir,vel «Der belchtende Cbrlat,
pole nele soubeste tratar colaaa antfgae que poderiam parecer
menos o.comodadaa l&.1 mnltldõea, com acerto tal que suma­
mente agr&daram a muitísalmoa doa teus conclda.diLos e at'
de e1tranbos.
Pelo que aos parabéns pelo feliz bito do trabalho qae
empreendeste, e aos louvores 'pelo �elo que mo1tra1111te em ajudar
os fiéis em negócio de tanta monta, junta o Augusto Pontífice
oa melhores 1'0toa de que dia a dia cresça o númerc- doa que
manueeem o teu livro e dele tirem frutos salutares. E como
penhor da.a graça.a celeatea e testemunho da sua benevolência,
de todo o coraçlo te envia a Bênçio Apostólica.·
Aproveito & oportunidade desta grata comunlce.9ão para
manifestar os 1entlmento1 da estima que te consa.gro, e para
me cenfes1&r teu mto. obrlg. no Senhor

P. Cerd. Gesperri
Ao Rnmo. Padre Frntooao Hockenmaler, ofm. - Muhldorf.

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Ao tradutor deste fi. i��:�;l"j(' .,. do
Nascimento, já Deus para i· ··· ._.: á� apos-
tolado intenso que desenvo Clt'tJ sse Por-
tugal em fora, ainda hoje o contmuam os livros de
piedade e de instrução religiosa que deixou. E en­
tre estes. o de maior vulto é ·c om certeza O Cris­
tão no Tribunal da Penitência que se apresenta
agora ao público em terceira edição.
«Percorrendo em 1913 o catálogo duma livra­
ria·italiana-dizia o tradutor, nas edições passadas
- deparou-se-me o titulo do livro que apresento
agora ao leitor La Con/1ssione Fac;/itata, livro
que logo desejei adquirir.
<cLi-o em duas noites e fiquei encantado. Era
mais do que eu supunha, porque não era só um
livro bo�, e�a um _livro ?pt1mo e sem _precedentc:s
no nosso meio. Comecei logo a traduzi-lo; depois
abandonei-o por falta de tempo e de recursos para
o publicar. Estive até quase para rasgar o que já
tinha escrito, do que alguém me impediu, não sei
se feliz se infelizmente.
ccProvam a excelência da doutrina as onze edi­
ções que em poucos anos teve na Baviera onde .
foi .escrito, e a tradução em onze línguas e dia­
lectos feita até 1911, com edições de 60 e 90.000
exemplares, como a holandesa e polaca.
«A presente tradução, calcada sobre a edição
italiana âe Quaracchi, tem com certeza muitos de­
feitos, que os leitores perdoarão, atendendo ao
desejo que tive de lhes apresentar-. um livro útil,
··nãó" para aprenderem belezas de linguagem, mas
as misericórdias de Deus no Sacramento da Peni­
tência».•

Nesta terceira edição vai o texto da edição


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precedente. No intuito de o tornar m ais claro,
atrevi-me a retocar a fr a se. Não sei se o meu de­
sejo de clareza me iludiu ou ná' o . O leitor dirá.
Queira Deus abençoar o trabalho havido, para
que com a sua graça possa O Cristão no Tribunal
da. Pen itin cia continuar a ser útil e produzir algum
fruto de salvaç· ã o.

Lisboa, 14 de Agosto de 1949

P. F. Félix Lopes·

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PRÓLOGO DO AUTOR

O .Cristão no Tribunal da Penitência apa-:


reoeu, a primeira vez, em Outubro de 1903. .
A modo de compêndio popular de Moral
cristã, propunha· se esclarecer e instruir as muJti­
dões acerca dos deveres religiosos. Não apresen­
t ava doutrina nova ; expunha, sim, de m aneira
original, a nosso ver, a velha e santa doutrina
de Jesus.
E foi para nós consolador, verific"ar que se
até então alguns não viam com bons olhos se
vulgarisasse a Teologia Moral, esses tais, apenas
leram este livro humilde, logo mudaram de opi­
nião. Aparecer o livro publicado, espalhar-se entre
o povo cristão, e conquistar simpatias em todas as
classes sociais, foi tudo a mesma coisa. E muitos
que atentamente o leram, de. tal modo dele se
agradar am que não mais puderam dispensar sua
leitura e conselho.
Por mercê de Deus, em traduções correu na­
ções estranhas, e também lá, como nos paises . de
lingua alemã, com a ajuda das orações de muitos,
foi apreciada a doutrina nele exposta acerca da
grande necessidade da salvação, da paz interior e
dos meios que a ela conduzem.
Missionário oculto, O Cristão no Tribunal da
Penitência, fala hoje em treze linguas ao coração
de muitas gentes, no intuito santo de as ganhar
para Deus e lhes alcançar a graça e a paz celeste.
Graças sejam dadas a Deus por se ter servido
deste livro humilde para ajudar as . almas no ne­
gôeiõ grande da sua salvação. Que as bênçãos do
Cé.u o acompanhem no futuro, e lhe aplanem os
caminhos q'Ue levam ao coração dos homens.
E tu, pio leitor, que nesta obra procuras con-
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�elho e instrução, não esqueças nunca a verdade
antiga: as bênçãos e graças vêm do Alto. Pro­
cura, pois, na oração, merecer a bênção de Deus e
o bom fruto da sua doutrina para a tua alma e a
tua vida. E nas tuas orações, não e.s queças tam­
bém o autor deste livrinho.

Dia de Santa Inês, de 1922

O Auto,.

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Introdução

ccBem-aventurados os que la­


vam suas v'estiduras no sangue
do Cordeiro, a fim de terem di­
rei to à Árvore da vida e a en­
trarem na Cidade pelas portas».
Apoc. 22,1+

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. <? célebre poeta alem ão. ··,c1emeri'.t � /.� f �p'tánp,f ._
depois de se ter dado por muitos. anos ap_��;P!ª:Z'.�.e�
do mundo; catu em si e encontrmi.:..se_. c_�ffi.;'.'ã;�:�lIJl:á
vazia e bem maltratada de misér.i��;::e_; 'desgt.a�as.
Entrou-lhe o coração em· doloroso desassossego ;
e, a ver se h_ a via paz e conforto, deu de des�bafar
suas penas com pessoas experimentadas e prudentes.
· ora, certa tarde de Outubro de 181 6 c .a lhou ele
se encontrar num salão de recreio em B erl im · co,n
a piedosa jovem protestante Luisa Hensel, já então
afamada poetisa e mais tarde ilustre convertida,
e começou de lhe 'desfiar as misérias da sua vida e
os estragos do coração. As maneiras e graças tão
ao natural e espontâneas da jovem, haviam-no en­
cantado ; e dai o persuadir-se que saberia el,a
dizer- lhe pal avras de conforto e anim ação. Mas
Hensel ·depressa o atalhoU: :
- Que lhe aproveita ad senhor abrir-se em con­
fidências dessa natureza com uma donzela ? É ca.;.
t6lico1 . portanto é feli?= poi ' s tem a confissão para
teriléd10 de seus males. Vá e confesse-se, meu
senhor.
Tão inespe'ráda resposta como que acordou
Brentano. E com os olhos marej ados de lágrimas,.
prorrompeu em alta voz :
- E é verdáde ! . . . E a filha de um pastor
protestante foi quem me deu a lição !
E escondendo o rosto entre as mãos, desatou a
soluçar. Humilhação, mas humilhação salutar, foi,.
pa_r a ele, ouvir da boca de U:ma jovem e protestante
que a confissão dos pecados não é para se fazer a
um a donzela em salão de recreio, mas sim no re­
colhimento do confessionário ao sacerdote de Deus.
,-vá,e confesse-se, era a palavra ami ga com que
a donzela respondera aos seus queixumes. Tomou
o conselho tt decidiu-se a levá-lo à práti ca.
Foi ter.com o deão Tauben, sacerdote bondoso-
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O C R I STÃ O N O

e cheio de zelo, e pediu-lhe se dignasse ouvi-.lo


de confissão logo que estivesse preparado como
convinha. As palavras de consolação e esperança
com que o ministro de Deus o atendeu, foram bál­
samo viv.i ficante de graça derramado sobre sua
alm a dolorida.
Um m ês inteiro se preparou entre lutas terríveis
que se lhe desencadearam no coração ; m as, ao
fim, sempre venceu e fez confis�ão geral. No dia
seguinte recebeu a sagrada Comunhão.
No abraço que, depois da confissão, lhe dera o
venerando sacerdote, enchera-se-lhe a alma de feli­
cidade. Tinha encontrado sua Mãe a santa I g reja,
e. a paz com Deus e com a sua consciência. (1)
O senhor é católico, e portanto i /e/is pois t1m
.ao seu dispor a Confissão. Vá e con/1sse se.
Profunda verdade em tão singelos dizeres !
E é assim tal qual. Felizes de nós, os cató­
licos, pois temos na Confissão meio fácil e sim­
ples de nos reconciliarmos com Deus, e fonte pérene
<le paz p ara o nosso sempre atribulado coração.
A confissão bem feita cerra as - portas do inferno e
abre-nos n a . alma o paraíso.
Demos graças ao Divino Redentor que, para
nossa salvaç'ão, deixou ao sacerdote o poder de, em
nome de Deus, nos perdoar os pecados todas as
vezes que sinceramente arrependidos lhos confes­
.samos e prometemos fazer penitência !
Todavia, fixemos bem, a confissão não é para
nôs apenas um tesoiro precioso · ; é também uma
obrigação. «Em verdade em verdade vos digo,
-disse Jesus aos Apóstolos, tudo o que ligardes n a
terra, será ligado n o céu ; e tudo o que desligardes
na terra, será desligado no céu». (2) E depois da
:Ressurreição, melhor explicou o poder que assim
deixava aos Apóstolos : « Como meu Pai me enviou
a mim, t ambém eu vos envio a vós. Recebei o Es-

(1) P. Diel, Brentano,, \·oi. I I. (2) Mat� 18, 18.

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TR1BUN AL D A PE N1TÊ N C1 A r.l

pfrito S anto. Aos que vós perdoard es os pecados,.


ser-lhes-ão eles perâoados ; e aos que vós os reti­
verdes, ser-lhes-ão retidos>>. (1)
Destas palavras do Salvador havemos de con­
cluir que Deus concedeu ao cristão pecador um
meio para com Ele se reconciliar. E esse meio é a
confissão. Mais nenhum outro deixou Cristo na
sua Igreja.
E de Santo Agostinho esta observação judi ciosa:
«Fazei penitência como a Igreja ensina, para que a
Igreja ore por.svós. E ninguém diga : eu faço peni­
tência a ocultas, na presença de Deus ; e Aqui/,.
que sabe que faço penitência "º meu coração, pe,.­
doar-me-á. A ser assim, inutilmente Cristo teria
d to : Tudo o que desligardes na terra, será des­
ligado no céu. E debalde teri a dado à Igreja ais
chaves do· Parafso. Ousaremos fazer mentiroso O·
Evangelho e as palavras de Jesus ?»
Temos, pois, que, para alcançarmos remissão
dos pecados, nr1s manda Cristo aos Apóstolos e
seus suct-ssores, os bispos e os sacerdotes. Todo
o fiel que. depois do bapti smo, caiu em culpa
grave, só n.1 sacramento da P�nitência, recebido
de facto ou em desejo, encontrará o perdão.
E como conciliar esta verdade com aque]outra:­
a contrição p_erfeita, nascida do perfeito amor de
Deus, tem a virtude de perdoar peca 1os ?
De fact.o . quem ama a Deus de todo o coração .
e sobre todas as coisas, e se arrepende dos pe-.
cados p or serem ofc::n sa de Deus,· entra logo ria
sua amizade, e al cança o perdão de todas; as culpas.
por maiores que el as sejam.
Mas, a mar a Deus sobre todas. as coisas supó,e
pleno acatamento aos seus preceitos, pelo menos
aos .que obrigam sob pecado grave. Está escrito�
«Aquele que · tem os meus mandamentos e os.
guarda,��sse é que me ama» (2). Por isso, se Deus.

(r) Jodo 20, 21 e 25. (2) Jodo, 14, 21.

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r4 O C R I ST Ã O N O

envia o pecador aos sacerdotes aprovados pela


Igreja para dtles haver absolvi ção juc;l.icial e legal
dos seus pecr..dos, não amaria a Deus soQre todas
as coisas o pecador que não estivesse resolvido a
pedir ao sacerdote o perdão dos seus pecados.
Suponhamos que um rei depara em tlagrante
delito a 'um malfeitor, e que este, impressionado
com a �resença do soberano, se lhe roja aos pés a
pedir sinceramente o perdão. O monarca perdoou.
Ficariam satisfeitas assim as exigências da justiça ?
De modo nenhum. Apesar da clemência real� o
delinquente teria de submeter-se ao juizo dos tri­
bunais e esperar a sentença com o perdão.
O mesmo se passa no sacramento da Penitên­
cia. Quem faz um acto de amor e d� arrependi­
mento, alcança de Deus o perdão dos pecados ;
mas, por preceito divino, fica obrigado a apresen­
t ar-se no tribunal da Penitência, e a receber a sen­
tença e absolvição do s acerdote. Assim o exige e
preceitua a ordem estabelecida por Deus. Como j á
s e disse, quem ama a Deus sobre todas as coisas e
por amor dele se arrepe1,1de dos pecados, j á por
isso mesmo desej a receber o sacramento da Peni­
tência, embora nele não pense expressamente.
O seu arrependimento traz implicito em si o
desejo de fazer tudo o que Deus ordena, e portanto
o desejo de acusar todos os pecados graves na pri­
meira confissão. (1)
Somos felizes, nós os católicos, porque temos
a confissão que não só nos perdoa os pecadós e
defende dos perigos, mas é t ambém meio eficacfs­
simo para alcançar. a perfeição cristã.
Não há bem que não tenha quem ·s e lhe opo­
nha. Como não o h avia de ter a Confissão, fonte
perene de beneficias ? Não são, pois, para admirar
os.- especiosos argumentos forjados com o fim de
afastar os fiéis da prática deste sacramento. Infe-

(1) Cem mais desenvolvimento se tratará este assunto


quando se expuser a doutrina do arrependi m�nto.

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-�1
T RI B U N A L D A P E: N I T Ê N C 1 A 5

lizroente até alguns que se dizem católicos, os acei·­


. t am sem mais exame e por eles . regulam seu viver.

Efeitos do Sac ramento da Penitência

Ego te absolvo a peccatis tuis, z·n no­


mine Patris et Fi"lii et Spiritus Sancti :
«Eu te absolvo dos �eus pecados, em nome
do Pai, do Filho e do Espírito Santo» .
Assim fal a o sacerdote ao pecador peni­
tente, depois de o ouvir de confissão. E neste
seu falar não vai apenas a declaração de que
Deus perdoou o pecado ; vai, sim, o verda­
deiro perdão que ao penitente concede o sa­
cerdote em nome do mesmo Deus.
ccEu te perdoo os teus pecados » : palavra
omnipotente e de feliz conforto para o pe­
cador arrependido ! A fim de melhor a com­
preendermos, vejamos o que é o pecado e
quais seus tristes efeitos.
Pelo pecado, o homem abandona a Deus,
deixa-O, para . desordenadamente seguir as
criaturas . Antepõe seus próprios apetites e
desejos, à vontade s antíssima do Criador.
A desobediência à Lei de Deus em ma­
téria grave, feita com plena advertência e
consentimento deliberaáo, chama-se pecado
mortal.. Com abandonar assim a Deus,
transgredindo a sua Lei, a alma morre.
Quebram-se os laços que ao Criador a
prendiam, e lá se vai o amor e amizade de

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16 O C R 1 S.T Á O N O

Deus e a sua graça santificante. Estava .a


bem com Deus ; e com o pecado ficou ini­
miga do mesmo Deus. Era filha de Deus e
tornou-se filha do demónio, vaso de ira, in­
capaz de qualquer obra meritória p ara o
Céu, e indigna de entrar na bem-aventurança
eterna.
Suposto mesmo que, em estado de pe­
cado mortal, meses e anos se guidos pra­
ticasse todas as boas obras que imaginar se
possam, e todas as suas forças empregasse
a bem do próximo, tudo lhe seria sem valor
de vida eterna. Meses de fadiga, anos de
trabalho, e todos sem mérito de bem.- aven­
turança, pois as orações, mortificações e es­
molas por: nós feitas em estado de pecado
mortal� só este fruto podem ter : mover a
misericórdia infinita de Deus a conceder-nos
a graça da conversão. ·A plicadas pelo pró­
ximo, quer por vivos quer por defuntos, po­
dem para eles merecer o u alcançar as gra­
ças de Deus ; mas p ara o próprio, desde
que em pecado mortal, ficam irremediàvél­
mente perdidas.
Mais ainda : cc Se o justo se apartar da
sua justiça e vier a cometer a iniquidade,
nenhuma das obras de justiça que houver
feito, lhe será tomada em conta» , (1) diz o
Espírito Santo por boca do profeta Ezequiel.
Quer dizer : quem se aparta de Deus, seja

(1) Ezeq. 18, 24.

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T R I B U N A L D A P E N I T ÊNC I A

ele por um só pecado mortal, perde o mé­


rito das boas obras que antes praticou.
Anos, dezenas de anos passou alguém,
na oração e na prática de boas obras, acu­
mulando tesoiros para o céu. Se ao fim
cometeu um pecado mortal e nele morreu,
inúteis lhe fic:-iram esses tesoiros. A sua
sorte será uma eternidade sem consolação
nem alegria, eternidade de tormentos e pe­
nas, noite eterna de eternas dores. Tal a
maldição do pecado.
A satisfação pecaminosa que contra
a vontade_ de Deus se procurou, tra·z con­
sigo a desgraça na vida futura, e, mais
ainda, traz consigo a desgraça na vida pre­
sente.
« Onde mora -O pecado não pode haver
alegria nem felicidade verdadeira. Nem a
a grandeza de um principado, diz S. João
Crisóstomo, nem a estonteante formosura,
nem a glória- do poder, nem o prazer dos
bailes, nem o fausto no vestir, nem qualquer
outra coisa da terra pode d?t ao homem a
paz e a alegria verdadeira» . Alegria ver:..
<ladeira só a boa consciência a pode dar.
Quem traz limpa a' consciência, ande muito
embora vestido de farrapos e atormentado­
de fome, mesmo assim é bem mais feliz e
goza de mais paz do que quem vive rodeado·
de-·-todos os confortos imagináveis, tnas traz:
a alma roída de remorsos.
Poderás tentar adormecer a consciência
com pr�zeres e - divertitnentos, disfarçar as

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18 O C R ISTÃO N O

angústias da alma, negá-las mesmo, escon­


der os tormentos interiores que te martiri­
zam, polvilhar a vida de sorrisos, tudo isso
poderás fazer por algum tempo ; mas sem­
pre, isso, não alcançarás, por mais que faças,
pois ao remorso roedor nem as .a legrias da
terra nem as suas consol ações o poderão
nunca matar. ,

Deus é justo, e não se deixa enganar.


E se não tem pressa em aparecer, nem por
isso vem daí vantagem ao pecador. Ao fim,
sempre há de vir ; e então ·bramará alto a
consciência, vigorosa e terrível, lá dentro do
coração pecador, e obrigá-lo-á a confessar
que há um Deus que reprova o crime.
Suponhamos, pois, que muito temp0 pas­
sou alguém a ofender a Deus gravemente, e
ao cabo vem o mesmo Deus que lhe diz :
- Pecador, escolhe : ou fazer penitência
toda a vida ou cair rto inferno para sempre.
Diz-me l á : que prefrrias tu ? Não ·é
certo que, durasse muito embora a penitên­
da por todo o tempo de uma larga vida,
sempre seria de preferir. aos tormentos que
são eternos ? Mais vale sofrer por muito
tempo do que sofrer para se111pre.
Ora, o Senhor não te pede assim tão
larga penitência. lnfinitan1ente bom e _mise­
ricordioso como é, contenta-se com pequenos
sacrifícios. Pt:de-te apenas que confess�s ao
ouvido de um sacerdote obrigado a guardar
segredo, . com sinceri Jade e com arrependi-

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TRI BUN A L n· ,\ P E N I T Ê N C l A. _ _ _ . 19

menta, os pecados graves cometidos. Em


troca, dá-te o seu perdão.
Quando o filho pródigo voltou, arre­
p�ndido, à casa paterna a· pedir perdão, o
pai não se ficou a pensar que tinha diante
de si o filho ingrato. Abraçou-o e deu-lhe o
ósculo d a paz. «Tragam depressa o seu
melhor vestido, ordenou ele aos criados. e
vistam-lho já ; metam-lhe no deJo o anel ;
calcem-lhe os pés . . . depois comeren1os e
nos alegraremos » . (1)
Pois Deus faz assim, tal qual, com o pe­
cador que se aproxima, ,arrependido, do tri­
bunal da Penitência. Recebe-o outra vez
como a filho, veste-o com a sua graça, tor..;
na-lhe o direito de entrar no paraisa, é nem
mais recorda os seus pecados . Graves ou
leves, a todos perdoa, a todos risca do livro
das culpas e para sempre sepu!ta no es_que­
ci111ento. « Se o ímpio fizer penitência de to­
dos os pecados cometido�, assegura Deus
pelo profeta Ezequiel, não morrerá, e não
mais leTI?brarei as suas iniquidades » .� (2)
Com a culpa perdoa Deus ao mesmo
tempo a pena eterna e também parte das
penas temporais. 1

E para alcançar a vida eterna só Ill: a is


i_sto será bastante : perseverar no · bem até
morr-er. Se, depois de confessado e perdo�do,

(1) Luc. 15, 22-23. (2) Ezeq. 18, 21-22.

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20 O CR I S T Ã O N O

o homem tornasse a cair em culpa grave e


nela fosse até à morte e morte impenitente,
nesse caso não poderia salvar-se. Desgraça
enorme, desgraça de desgraças ! Ma,s, ainda
então, não sofreria pena tamanha como a
que haveria de sofrer se nunca se houvesse
confessado . Porque Deus é justo, para o
condenado tanto maior ·será o seu inferno,
quanto maior o número de pecados com c:i.ue
morreu.
Corria a missão na cidade de Aix, n a
Provença, e m França. Logo num dos pri­
meiros d ias, sentara-se o missionário à mesa,
eis que entra urn velho oficial visivelmente
agitado, aproxima-se e diz em tom impe­
rioso :
- Venha daí", por favor_, Padre. Preciso
de . lhe dizer duas palavras confidencialmente.
Entraram os dois na sal a vizinha. O ofi­
cial fechou a porta e começou :
- Padre, quero confessar-me e já ; de
outra sorte não sei o que será de mim.
- E porque assim tanta pressa ?
� .
- E que ouvi o sermão que pregou sobre
o inferno, respondeu o oficial, e desde então
fugiu-me a paz. Não posso mais. A cons­
ciência é verdugo que sem descanso me
atormenta. Não sairei daqui sem primeiro
tirar este peso de sobre o coração.
Que também a ti, ó .c ristão, te grite a
consciência, sem cessar, Já no fundo da alma,
para nem un1 só dia passares sem primeiro
te reconciliares com Deus, se alguma vez

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T R I B UN A L D A P E N I T Ê N C I A . 21

tiveste a desgraça de cair em pecado grave.


«Não tardes em converter-te ao Senhor, nem
te ponhas a diferir de dia para dia a conver­
são» . Poderia vir a morte e revar-te, antes
que te pudesse-s confessar.
·

No sacran1ento da Penitência, aléip. do


perdão, recebem-se ainda outras graças.
Como acima se notou, o pecado grave des­
poja . a alma de todos os méritos adquiridos
antes, quando em estado de graça. Com a
Confissão todos outra vez revivem e outra
vez ganham valor para q céu.
Depois, perdoados que fomos na Con­
fissão, podemos desde logo ir aumentando
os nossos méritos, porque todo o bem que
fizermos por amor de Deus . em estado d�
g � aça, será liberalmente retribuído no céu.
Um acto de amor de Deus que façamo�,
obra de misericórdia que pratiquemos, -tudo
nos será de mérito e nos será pago um dia
com novos graus de glória eterna.
Mais ainda : O bem-estar espiritual dá
consciência influí poderosa e beneficamente
no carácter. Quem está em paz com Deus,
em paz está _ consigo mesmo. E ao con:.:.
trário,, quem é escravo do pecado e por.:
tanto inimigo de Deus, vive sob a ameaça da
mqrte eterna, traz lá dentro alguma coisa
que �moi e lhe azeda a vida. A má cons­
ciência nunca poderá ter paz. Pelo contrá:­
_

rio, a boa consciência é paraíso antecipado.

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22 O C R IST Ã O N O

Quantas vezes os sacerdotes n a con. fissão


ouvem aos pecadores arrepend idos :
- Sinto-n1e outro, meu Padre. Agor a ,
si�, que sou"' fel iz e me crescem os desejos
de viver. Se me tivesse confessado há mais
tempo, qu;:tntos tormentos e martírios não
teria poupado ?
Quen1 sabe se também tu, ó cristão que
m� lês, terás algum dia experimentadp esta
consol adora eficácia do sacramento da Pe­
nitência ! O sacerdote, em nome de Deus,
sentenciou : (< Eu te absolvo dos te. us p�­
cados » ; e, no mesmo instante, todo te sen­
tiste inundado de a l egria indizível e cheio
de forças novas para a vida e trabal ho.
Depois que, pel a absolvição, te tornaste
fi lho de Deus e herdeiro do céu, o Espírito
Sant0 desceu sobre ti com suas divinas con­
sol ações, e deixou-te a alma cheia a mais não
de folicidade e alegria .
Se, depois, tiveste a desgraça de tornar
a ofender a Deus, não .tardes e1n conver­
ter-te, nem dzjiºras de dia pa14a dia a con­
persão ; mas corre de novo ao tribuna l da
Penitencia a lavar as manchas do pecado.
Ele é yerdade que apenas o homem, por
amor de Deus, se arrepende das culpas co­
metidas e se resolve a acusá-las n a primeira
confissão, graves ou leves que e l as sejam,
todas l he são logo perdoadas. E até nem
precisaria, ao depois, confessar as cul pas
yeniais de que já assim obtivera o perdão.
Mas, quando é que po�e h�ver certeza de

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T R 1 B U N A L D A P E N I TÊN C I A
·
23

que nosso arrependimento, a nossa. dor, foi


perfeita ?
E mesmo que fosse perfeita, ficari a sem­
pre o preceito divino que nos obriga a su:-
1eitar à confissão os pecados· graves, mesmo
os que já foram perdoados pel a contrição;
E, para mais, só a confissão dá à alma, per­
feita alegria espiritual e paz completa. Só
·

depois d a Confissão podes bem descansar e


dizer : - Agora, sim, poss6 ficar tranquilo e
-seguro de que estou reconciliado com Deus.
Em juizb regul ar fui absolvido de todos os
meus pecados ; dos lábios do sacerdote ouvi
a sentença do perdão. Pelo poder que Cristo
lhe deixou, ele me disse : «Eu te absolvo
dos teus pecados » .
Como acima incidentalmente se afirma,
o sincero e perfeito acto de arrependimento
apaga todos os pecados, até mesmo os mor­
tais ; mas fica sempre a obrig�ção de os
acusar na primeira confissão. E este, já o
dissemos, um rigoroso dever imposto por
Deus, e que não sofre excepção : Todo o
pecado grave cometido depois do baptismo,
deve ser confessado, tanto quanto possível .
Que esperas, então ?
A confissão é o meio mais simples e se­
guro de nos reconciliarmos com Deus, e é
também o meio mais eficaz de apagar da
a lm a os pecados tanto graves como leves�
Se quando te vais confessar, só pecados le•
ves te mancham a · consciência, nem por isso
te será inútil o Sacramento ; antes ao con•

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24 o· CR I S T Ã O NO

trário, pois te aumenta a graça santificante


e te dá direito a novas e mais abundantes
graças actuais. E quanto mais profundo for
o teu arrependimento e mais c� idado pu­
seres em te preparar, tanto maior sera a
torrente \de graças que sobre ti vão correr
da fonte Sempre bendita do Sacramento.

Utilid ade d a confissão frequente


Confessa-te com frequência, e será teu o
proveito. Se ainda te arrastas a custo nos
caminhos da virtude, a confissão frequente
dar-te há forças e coragem, e ajudar-te há
a evitar o pecado mortal . S e j á trazes certa
a tua vida pelo caminho do ben1, com a
confissão mais crescerás em graça e em
virtude.
V ais a confessar-te em es�ado de graça,
ou porque apenas cometeste pecados veniais
ou porque um acto de contrição perfeita já
te perdoou os pecados graves cometidos';
nesse caso o Sacramento aumenta em ti ou
mais te confirma a graça santificante.
Emprestamos uma quantia e deixamos os
juros a capitalizar. Amealhamos assim, com
o tempo, soma importante. Coisa parecida
sucede com a frequência dos sacramentos.
A graça que temos na alma é como se fora
capital a crescer de confissão em confissão,
de comunhão em comunhão, a render juros
que se capitalizam num tesoiro incalculável

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T R 1 B U NA L D A P EN 1 T Ê N C 1 A .25

de graças, de méritos e portanto de glória,


pois a grandeza da glória no céu mede· se
pelas graças e méritos que alcançámos em
vida.
Além disso sempre que dignamente
alguém se confessa, recebe a graça sacra­
mental, isto é, merece que Deus lhe assista
com a graça especial, necessária para de
futuro evitar o pecado e perseverar no bem.
Como o sacramento do matrimónio dá aos
esposos que dignamente o recebem, a graça
particular que ajudará a cumprir com fideli­
<lade os deve_res do estado matrimonial , assim
também a absolvição dá aos penitentes graça
particular, garantia de vida de virtude e
de piedade.
Para que tal graça dê o fruto esperado,
deve o cristão com ela cooperar. Recebê-la
e ir logo levianamente expor-se aos perigos
e ocasiões de pecado, seria torná-la fruste.
A melhor prova de que desejamos cooperar
com a graça particul ar da confissão, é fre­
quentar os sacramentos. Deus deixou na
sua Igreja meios abundantíssimos de graça e
santificação. Aproveitá-los depende de nós.
A graça não nos é concedida toda de uma
só vez ; recebemo-la aos poucos. E portanto
devemos merecê-la, ganhá-la, aproveitando
com frequência os meios que Deus deixou
na Jgrej a para nos dar a graça.
A� frequencia dos sacramentos, mais ne­
cessária e urgente se_ torna quando por longo
tempo nos deixámos vencer por qualquer in-
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O CRI� TÁO NO

clinação ruim ou dominar pelas paixões. Se


o pecado assim nos escravizou a alma, só
a confissão frequente nos poderá libertar.
A frequência dos sacramentos urgiria ainda
mais se, depois de termos recebido digna­
m ente o sacramento da Penitencia, sentís­
semos o aguilhão do pecado a induzir-nos
ao mal com graves e perigosas tentações.
Devemos, pois, envidar todos os esforços
para participar dos sacramentos, pois não
há outro meio que tanto ajude a conservar
a graça e a defender a alma contra o pe­
cado e seus perigos.
Mas, nem só pel a graça que dispensa, o
Sacramento da Penitência ajuda o homem
a progredir na vida rel igiosa e moral .
Na preparação que pa"ra ele fazemos,
entramos dentro de nós mesmos a examinar
o nosso interior, pesamos os nossos pensa­
m entos, palav ras e obras, cuidamos dos
meios de nos precavermos para não tornar
ao pecado no futuro . Esta preparação, por­
tanto, é de si meio eficaz para nos fortalecer
e firmar no caminho do bem.
Depois, a confissão dos pecados é freio
poderosíssimo para as más inclinações da na­
tureza corrompida . Até Voltaire, com ser
ímpio, assim pensava : <l Devemos reconhe­
cer que a confissão é o freio m ais poderoso
contra os pecados ocultos » . Sim , a lem­
brança de que em breve. nos teremos de con­
fessar, ajuda-nos em muito a vencer o pecado.

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TRIHUNAL D..\ PENITÊNCI \

Quem se confessa frequ_entemente, des­


cobre dia a dia razões mais poderosas e ín­
timas de fugir do pecado ; enquanto aquele
que se confessa apenas uma ou outra vez
ao ano, fàcilmente cai na ilusão de que pe­
cado mais pecado menos pouco Ímporta, e
de que tanto custa dizer na confissão «pe­
quei uma vez » como «pequei duas » . E é
deste modo que' se vai de pecado em pecado
até o abismo.
Mais ainda : O confessor pode exercer
sobre o penit�nte influxo benéfico : instrui-o,
adverte-o, sugere-lhe resoluções, com seus
conselhos estimula-o ao bem. Tudo o que
em geral se diz da pregação, com mais ra­
zão se pode dizer da paJavra do confessor
no sagrado Tribunal. O prega. dor só pode
falar em termos gerais, enquanto o confessor­
pode e deve descer aos casos concretos,. par­
ticulares ; vai até às feridas mais fundas do
coração do penitente, e medica-as conforme­
as circunstâncias.
Quantas vezes sucederá encontrar-se o
penitente em perigo de perder a inocência.
Não conhece as seduções do mundo, as ilu­
sões do demónio, e nelas se deixa embalar.
Se traz o confessor bem ao facto das suas.
tentações e más inclinações, logo ele lhe adi-:­
vinhará a iminência do perigo, e a tempo lhe·
e·risinará o modo - de fugir as ocasiões nas.
quais se .meteria sem o suspeitar.
E onde encontrará o homem coração ao.

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O CR I S T Ã O N O

·q ual tão confiad,amente possa comunicar os


seus pesares ! E sempre consolação desaba­
:far máguas e penas com coração amigo que
:Sabe compadecer-se e aconselhar. A dor
partilhada, é apenas meia dor.
Mas; per�untar-se-á, com quem poderei
abrir-me inteiramente e sem receios? Encon­
trarei porventura quem bei;n me entenda?
Não irá meu confidente revelar os íntimos
segredos que lhe confio? Saberá devida­
·mente aconselhar-me, alumiar-me nas dúvi­
das e perplexidades?
Uma só resposta para tantas perguntas :
No confessor encontrarás conforto e conso­
lação, conselho prudente e serena paz. Ele,
·O confessor, será o confidente seguro dos
.s egredos da tua ·alma.
Sílvio Pél lico quando esteve preso por
.supostos crimes políticos, todos os meses se
-confessava. E dizia ele que o confessor era
anjo de misericórdia, enviado pelo céu ao
meio das suas dores. A s suas exortações ·
·devia n ão ter caído em desespero. A con­
fissão reconduzja-o à virtude, ao perdão das
injúrias e dos ódios, ao desejo de a Deus
:sacrificar a sua vida por amor do próxim.o .
Iguais benefícios e salutares .efeitos pode­
remos todos nós encontrar na confissão, se,
·com as devidas disposições, a frequentarmos.
Overberg que morreu em 1826, 9uando
director espiritual e reitor do Seminario de
Münster, encontrou, certa tarde, junto às
portas da cidade, um homem que parecia
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T R I B U N A L DA. P E N I T Ê N C I A

louco : dava uma corrida, parava · de rep�nte,.


punha-se de novo a correr ao acaso, para
outra vez num repente estacar.
Compadecido, abeirou-se dele, saudou-o.
cómo a bom amigo e procurou entabular·
conversa. A princípio o homem respondeu­
-lhe com rispidez ; mas pouco a pouco foi:
amaciando e açabou por se abrir em confi­
dências·. Desde a juventude se entregara ao­
vício ; estava irremediàvelmente perdido, e·
portanto -resolvera pôr termo à vida.
·

- E que. remediavas tu, com tal ac.to de­


desespero?- perguntou o sacerdote.
O homem pareceu assustar-se com a in­
sinuação ; mas o falar cada vez mais amo­
roso e compassivo de Overb�rg desanuviou-·
-lhe a alma. E dali o pouco acompanhava-o­
ªº seminário, rajava-se-lhe aos pés, e ein.
confissão lhe contava todos os se.u s crimes.
E desde aquele momento parecia outro·
homem .
Quantos infel izes, esmagados sob o peso·
de suas angústias e penas, se têm deixado.
ir de pecado em pecado até ao desespero t
Não encontratam a quem abrir o coração,.
não procuraram o remédio salvador que·
Deus deixou na Igreja, o sacramento da.
Confissão.
Outros, mais felizes, souberam procurar·
aos... p�s do confessor, alívio, consol ação, força.
e coragem nos transes aflitivos da vida. Pois.
tudo aí superahundantemente encontraram!
E as&im não admira que até mu.itos que não·

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3o . O .CRISTÃO N O

foram católicos, tenham apregoado, alto, as


maravilhas da confis·s ão.
«Não há q ue nega.r, diz Leibnitz filósofo
protestante, a confissão é instituição digna
da sabedoria de Deus. Se há coisa bela na
Religião Cristã, é sem dúvida a confissão.
A obrigação de confessar os pecados, deles
salva a muitos que ainda não endureceram
no mal ; e aos que já neles caíram, dá con­
solações inefáveis. A meu ver, o confessor
piedoso, grave e prudente, é óptimo instru­
mento na salvaç·ão das almas . .-Seus conse­
lhos ajudam a refrear as más inclinaçües, a
reconhecer as faltas, a evitar as ocasiões de
pecado, a reabi . l itar o) degenerados pelo ví­
cio, a restituir e remediar os danos injusta­
mente causados, a resolver as dúvidas, a
animar os pusilânimes, a extirpar ou mitigar
todas as dores· da alma.
ccE se não há coisa mais para estimar do
que um bom amigo, quanto não vale o
amigo que tem obrigação de ser fiel e pres­
tar-nos auxílio, em virtude da inviolável san­
tidade do sacramento divino » ?
O teólogo protestante NaviIIe em tese
que defendeu em Genebra no ano de 1839,.
diz : « l Quem há aí que não tenha, mais de
uma vez, olhado com inveja para o tribunal
da Penitência ? Quem, na amargura do re­
morso, na incerkza do perdão divino, n ão
desejou ouvir uma ,·oz autorizada por Cristo,
a dizer-l he : «Vai, os teus pecados te são
perdoados?»

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T R 1 B U N .\ L D A P E N 1 T. Ê N C 1 A 1 )i

O j á citado Voltaire, filósofo increu, dei­


xou estas breves mas expressivas palavras :
«se a confissão não existisse, seria necessá-
rio ipventá-la» . , .

E, pois, indubitável : a confissão, e muito


mais a confissão frequente, proporciona-nos
incalculáveis benefícios e vantagens extraor­
dinárias para a vida moral e religiosa.
Portanto, ó cristão, procura Ífequentar os
Sacramentos para muitas vezes partilhares
dos seus benefícios. A lei eclesiástica, rigo­
rosamente falando, não te obriga a recebê­
-los mais de unla vez ao ano. Mas quem ·

não vê que a lei apenas quis fixar o limite


mínimo ? A Igreja não diz : recebe os Sa­
cramentos uma só i•e:;, por ano ; mas sim :
«Todo o fier, . de um e outro sexo, depois
que chegou ao uso da razão, está obrigado
a confessar-se
, . ao menos uma vez cada ano».
E assim que fala a Igreja.
Os mestres de espírito acrescentam :
muito aproveita a con 1 issão mensal, e por
isso é de aconselhar. E quem, por qualquer
motivo, não puder confessar-se mensalmente,
bom será o faça ao menos -umas quantas
vezes por ano.
Para satisfazer o preceito da Igreja, a ri­
gor basta a confissão pascal. Há, porém,
outras obri.gações que dificilmente se cum­
prem,sem a . confissão mais frequente. E to­
dos sabem que, além dos deveres para tom
a Igreja, outros �á para connosco,.com9 por.
exemplo o de evitar o pecado pelos meios

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O C R I S T Ã O NO

que Deus pôs ao nosso alcance. Ora, um


destes .r:neios, se1n dúvida o m ais eficaz, é a
frequência dos Sacramentos. Quem dera
que todos assim pen.s assem, sobretudo então
aqueles que gemem· sob o peso do. pecado!
Mas, dirás, de nada me aproveita a con­
fissão. Estou sempre na m'esma, recaio cons-
tantemente nos mesmos pecados !
A tua objecç.ão esconde um sofisma dos
mais subtis . Se vives escravizado a qual­
quer mau hábito, nem por isso hás de per­
der a coragem. Extingue;se- o incêndio e
fica o braseiro Jo rescaldo. Para o apagar,
é preciso ainda muita· água. As labaredas
do peca 1o, uma confissão as apagou ; mas
fica o braseiro do mau hábito, e esse só a
abundante chuva de graças que dá a con­
fissão frequente, o extinguirá.
Confessa-te, pois, com frequência. Aban­
donar-te ao desespero seria crime enorme,
pois levar-te-ia à perdição eterna.
Corag�m ! E quando os maus hábitos
apertarem contigo, diz : ccNão, agora não
hei de pecar » . E sempre que a tentação
volte; lhe hás de responder com o mesmo
falar. E se, apesar disso, te acontecer a
desgraça de recair, vai logo a confessar-te.
A primeira qu�da arrastar-te-ia a uma se­
gunda, terceira, e a muitas outras, se ime­
diatamente te não levantasses amparado à
graça do. Sacramento.
E se a força do mau hábito outra vez

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T R 1 B U N A L 1;> A P E N 1 T Ê N C 1 A 33

te fizer cair, não desanimes por isso. Ora,


torna a orar, e teima em ir buscar a força
e o vigor que te faltam, na frequência da
t:onfissão e na recepção da Sagrada Euca­
ristia. Ao fim, hás de ver, serás tu o ven­
cedor.
E como o sacramento da Penitência além
de nos perdoar os pecados, nos fortifica con­
tra o mal, devemos recebê-lo com frequência,
quer tenhamos cometido pecados graves, quer
não. Se Deus, com tanto amor e generosi­
dade, põe ao nosso alcance tantos meios de
obter a graça, justo é saibamos aproveitá-los
e corresponder assim às suas misericórdias.
«E podes ter a certeza de que serás salvo,
se resolveres confessar-te com frequência,
digna, ordenada e regularmente. Adopta
como regra de vida : cometeste um pecado ?
Não deixes pôr-se- o sol, sem te' reconciliares
com De.u s. Se assim fizeres, andarás preve­
nido contra a morte repentina, e nunca em
teu coração enraizará qualquer hábito peca­
minoso» (1).

Objecções c ontra a confissão f requente

Bem sabe o inferno que nenhum dos sa­


cramentos ajuda tanto as almas a vencer o
mal;· �om tanta segurança as dirige a Deus

(1) P. DOSZ, S. J:

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O CRISTÃO NO

e as preserva do pecado e suas seduções,­


como os sacramentos da Penitência e Eu­
caristia. Daí o esforçar-se o demónio e o
mundo perverso por deles desviar as almas.
E se tanto conseguem, fácil tarefa lhes será
perderem aos homens.
V amos responder a algumas das objec­
ções que comumente se apresentam contra
o dever da confissão (1).
r. Tantas confissões para quê ? A piedade
não consiste em 1nu1ºtas orações e confissões.
Muitos há que se confessam com frequência
e nem por i'sso se avantajam aos demais.
De facto a perfeição cristã não consiste
só em rezar e receber os sacramentos. Mui­
tos há que rezam dia e noite, frequentam
assiduamente o confessionário, e nem por
isso adiantam na virtude. -
A culpa não está nos sacramentos, mas
na fragilidade e imperfeição dos homens. Os
melhores remédios nada aproveitam, se não
são bem aplicados ; da mesma forma os re­
médios da graça : não curam, quando inde­
vidamente se recebem.
Há pessoas que se confessam não tanto
p�ara a gradar a Deus, quanto para captar as
simpatias do confessor -ou os louvores . da
gente piedosa ; acusam-se, por isso, de modo

t1) Outras objecçóes costumàm formular-se . N ão as men­


donamos aqui porque ou a estas se reduzem ou são resolvidas,
embora de modo indirecto, nos cap1tulos se guintes e no tratado
do exame de consciência.

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N C .1 A 35

que não chegue o confessor a descob�ir-lhe�


as mazelas da alma ou calam o que Julgam
desagradar-lhe.
Outros ·frequentam os Sacramentos de
oito em oito dias ou de quinze em quinze,
só no intuit.o de não pareceren1 menos que
os demais.
Outros ainda, embora não faç_am cál­
culos assim tão humanos, confessam-se por
hábito, sem desejos de progredir na vida es­
piritual. Podem ter boa vontade, mas falta­
-lhes p entusiasmo pela vida de perfeição.
Todos estes, por mais que frequentem
os Sacramentos, não adiantam na virtude'.
Vê lá bem como te preparas tu para re­
ceber os Sacramentos, e por que motivos
os frequentas . Se neles buscas glória para
ti mais que para Deus, muito te tens pre­
judicado. Pode ser que essa tua vaidade e
egoismo não tenham chegado a pecado grave
e invalidado as tuas confissões ; todavia hão
de ter deminuído . e m muito os efeitos saiu�
tares dos Sacramentos. Nunca de futuro :te
confesses por fins meramente humanos, mas
sempre só para amar a Deus e salvar a tua
alma. Mas se tens procurado confessar-te
bem, ainda que te encontres com muitos
defeitos e pecados, nem por isso fiques jul­
gando que nada aproveitaste. Não desa­
nimes. A luta· pela perfeição, e luta de toda
a. vida.
Com aqueles que frequentemente se.con­
fessam e te parecem cheios de imperfeições

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36 O CRISTAO NO

e defeitos, não sejas severo. Não te com­


pete a ti julgar os corações, mas sim a Deus.
Só Ele que bem conhece nossa fragilidade e
miséria, pode n1edir com acerto a nossa vir­
tude, e p,e sar as imperfeições e fraquezas em
que caímos, contra vontade, sobretudo no
princípio da nossa conversão.
A tantos foi dado um génio difícil ; pe­
sam-lhes na carne más inclinações, paixões
ardentes ; sua precária saúde não aguenta
combates duros. E daí o que por vezes su­
cede : apesar da boa vontade que têm, nem
sempre conseguem vencer. Para estes tais, já
é muito que a frequência dos Sacramentos
os ajude a evitar 'os pecados graves . Recri­
miná-los por não serem perfeitos e por su­
cumbirem aqui e além, seria injustiça. Não
são perfeitos, rrias desej am sê-lo ; e a boa
vontade é j á caminho de perfeição.
Também é verdade que a perfeição não
está em rezar muito, mas ninguém pode ne­
gar que Deus concede suas graças a quem.
l has pede na oração e aproveita os meios
de santificação que C risto instituiu e deixou
na sua Igreja. Só aquele que ora e apro­
veita esses meios de santificação, conseguirá
a plenitude das graças divinas .
2. Não _sei de que me hei de confessar. Se
náo faço mal a ninguém ...
Não tens de que te confessar ! . . . S e
assim falas, não dizes verdade. Entra l á
bem n o fundo do coração, e vê s e é s sin-

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TRIBUNA L D A P E NITÊNCIA 37

cero. « Se dissermos que somos sem pecado,


diz S . João, enganamo-nos a nós mesmos e
não há verdade em nós )) (1).
Mas demos mesmo que, ao presente, te
encontrasses sem pecado. Podias, nesse caso,
acusar na confissão as faltas da vida pas­
sada. A confissão não é só para lavar a
alma de pecados, é também para a forta­
lecer na virtude. E os sacrafl?,entos pro­
duzem tanta mais graça, quanta maior é a
pureza de consciência com que_ se recebem.
3. A confiºssão frequente será boa para
mulheres e crianças ; para um homem, não.
Não preciso de consf! lhos para saber o que
devo Jat_er.
Eis uma desculpa, pelo menos . . . irre­
flectida. Quem mais em perigo de pecar,
a criança ou o adulto que vive no meio do
mundo ? Quem mais necessita da graça, a
mulher que vive singelan1ent� em sua casa,
ou o homem assob�rbado com as responsa­
bilidades da sua vida e estado ?
« Não -preciso conselhos : sei muito bem
o que devo fazer ! . . . )) T alvez. Mas, diz-me
com franqueza, cumpres sempre o que jul­
gas teu dever ? Quantas coisas sabemos nós
que s ão boas, e todavia nem sempre as pra­
ticamos . David conheceu a sua culpa, mas
só a emendou e se converteu . quando Natan
o àdvertiu�

(1) Jo. 1 ,8.

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38 O CRIS'I;ÂO NO

4. 1\7áo tenho tempo para me confessar com


freq uência.
Não tens tempo L . . . Arranj as tempo
para tudo, só o não arranj as para frequen­
tar os Sacramentos ! Queiras tu assistir · a
uma representação, a uma partida de jogo:
não te falta o tempo. Só para a Confissão
ele te falta. E não te lembras que Deus
abençoa os trabalhos que deixas para te ires
a reconciliar com Ele ? ]S"ão prospera quem
muito madruga, mas quem Deus ajuda.
5. É tão dtficil fazer uma confissão bem:
feita!. . . Gostava de me confessar mais ve-
1es, mas custa-me tanto declarar os pecados!
De facto a confissão, a começar Jogo pelo
exame de consciência, exige muita abnegação
eºdomínio próprio ; mas também não é assim
coisa tão custosa e difícil como muitas vezes.
parece . Não há dúvida que devemos em­
pregar na confissão a dil igência prudente e
razoável con1 que tratamos outros negócios
sérios ; mas essa é quanto basta, não se
requer mais. E quanto mais frequentemente
nos confessamos, menos tempo será preciso
para o. exame de consciência .
Feito, pois, diligente e sin�ero exame,.
arre pende-te dos pecados cometidos, propõe
emendar-te e en1pregar os meios para isso·
necessários ; e· vai em p'az e sossego a con�
fessar tuas culpas tal como de momento na
consciência te pesàm, pois a confissão não·
é, não pode ser, instrumento de tortura.

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TR IB U N A L. D A P E N l T Ê N C l A _ 39

6. É muito humilhante a confi:ssão ! . . . Que


vai pensar de mim o confessor, quando 1he
descobrir tal ou tal pecado ?
Tens razão. De facto é muito humilhante
mostrar ao confessor as chagas fundas do
coração, desfiar-lhe um a um os pecados
mais ocultos. Mas se pecamos, há que fa­
zer penitência. E a penitência começa por
este sacrifício que a Deus oferecemos em
troca do seu perdão. « Quando protestante,
contava-me certa vez uma ilustre dona con­
vertida ao catolicismo, a confissão metia-me
medo, era para mim um pavor, e não podia
comprE>ender que alguém tivesse coragem
para manifestar suas culpas a um homem.
Mas desde que sou católica, tudo me pa­
rece ao contrário. Se ousei pecar, justo é
humilhar-me, e portanto confessar-me, par.a
haver perdão» .
E tinha razão a ilustre convertida. A con­
fissã9 é humilhante, mas não tanto como às
vezes se pensa. O sacerdote que recebe as
tuas confidências, é pecador como tu, e tam­
bém ele se confessa. Quem sabe até se não
foi, como outro S. Paulo, por muitos anos
um grande pecador !
O sacerdote no tribunal da Penitência
representa a Deus que é bom e misericor­
dioso para com todos os que lhe imploram
perdão ; e por isso também ele tep:i de ser
bom� e mi s ericordioso para com os pecadores
arrependidos�
Em Í 8gi voltava ao seio da Igreja catá-

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O C RI STÃO N O

lica que na juventude abandonara, o ilustre


escritor, membro da Academia Francesa,
François Coppée. cc Fui educado çristãmente
(diz ele em La bonne souffrance, l ivro que
escreveu durante o período da sua conver­
são), com fervor infantil cun1pri meus de­
veres religiosos até bastante depois da pri­
meira comunhão. Veio a juventude com
todas as suas tentações e lutas . Sofri der­
rotas, e, com franqueza o digo, tive ver­
gonha de as confessar. Abandonei por isso
a Confissão e com ela os demais deveres re­
ligiosos. Toda a minha desgraça veio da­
quela falta de humildade, a virtude que me
parece agora a ·m ais necessária de todas .
O meu transvio foi, como se vê, um epi­
sódio bem frequente : a fuga cobarde do
soldado que se cansou da disciplina » . Assim
conta François Coppée a sua apostasia:
Enfermidade longa e dolorosa despertou­
-lhe a alma. Converteu-se e recebeu os Sa­
cramentos.
« Confessei-me com os olhos arrasados
de lágrimas de sincero arrependimento, es­
creve ele, e recebi a absolvição com indi­
zível alegri a » .
E no desejo d e que partilhassem também
d a sua felicidade os antigos companheiros
livre-pensado� es .q �1e, « atr � ídos pelos braços
abertos do Crucificado, nao se atrevem por
vergonha a transpor os umbrais da Igrej a » ,
dirigiu-lhes no j á citado livro estas tocantes
palavras : « Fazei como eu fiz. Vencei o or-

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TRIB UNAL D A PENITÊNCIA -. 41

gulho e apresentai-vos no tribunal de Cristo,


tribunal de misericórdia tão grande como
maior não pode ser. O ministro de Deus
que aí vos espera, só vos pede as lágrimas
precisas para vos l avar a alma .das manchas
que a ensujam ; porque, no mais, tein de si
o poder daquele Mestre divino que no Gól­
gota perdoou ao l adrão arrependido e lhe
abriu as portas do paraíso e de vida
eterna» .
Palavras de verdade e de encanto que
todos os homens deviam meditar, pois tra­
duzerri à maravilha os efeitos salutares da
Confissão e a bondade infinita que neste
sacramento usa Deus para connosco.
Depõe o medo infundado e inútil e irra­
zoável. Não te prendas com o que de ti
poderá pensar o confessor ao ouvir teus pe­
cados . Olha para as coisas como elas de
verdade são, e não como teus preconceitos
as figuram.
O confessor talvez nunca te visse, e pode
ser · que nunca m ais · te torne a ver. Mas,
demos que te conhece, e que se lembrará,
depois, dos teus pecados. Que ficará ele a
pensar de ti ? Julgas talvez que vai fazer
como o fariseu soberbo, e dirá a Deus :
« Graç3:s te dou, Senhor, porque não sou
como este miserável pecador ? » Se assim
pensas, acredita que estás em erro.
Ao v,er-te arrependido, humilhado e fir­
memente resolvido a empregar os meios ne-

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.1 2 O CR I S T Ã O NO

cessários para a emenda, compadecer-se-á


de ti e ganhar-lhes-ás o coração com tua
sinceridade e arrependimento. Agradecerá
a Deus tê-lo escolhido a ele para instru­
mento do seu perdão, e todo ele será ale­
gria ao . ver que voltaste, como o filho pró­
digo, à casa do Pai celeste.
Porque conhec� as fraquezas do homem,
a sua fragilidade perante a tentação, não se
qemora a pensar nos teus deslises passados ;
toda a sua atenção a fixa no arrependimento
que Jhe mostras e que é a coisa principal
em tão solenes circunstâncias.
Tivesses tu andado, durante anos e anos,
a amontoar pecados sobre pecados, crimes
sobre crimes, fosse a tua maldade tan1anha
que temessem as pessoas de bem sujar a
boca só com pronunciar .o· teu nome ; se,
arrependido, te rajasses aos pés do con­
fessor, toda a sua misericórdia e amor, po­
des crer, empregaria ele a esconder teus
crimes e pecados. Maior alegria e satis­
fação sente o sacerdote quando perdoa · ao
grande pecador arrependido, do que quando ·
perdoa a penitente menos miserável .
Se os pobres pecadores que pensam mor­
rer de vergonha quando no confessionário
desfian1 seus pecados, pudessem entrar no
coração do confessor e ver o que dentro dele
vai, com certeza sentiriam alívio grande, e a
confissão j á não seria para eles peso esma­
gador mas fonte de consolação e paz.
Certa vez, uma ilustre senhora fez coo-

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T R l B U N A L D A. P E N 1T Ê N C 1 A 43 ·

fissão geral com S. Francisco de Sales, e


acusou pecados muito vergonhosos. Ao fim
atreveu-se a perguntar :
- Padre, que conceito faz de mim agora ?
- Que sois uma grande santa, respon-
deu ele.
- Sim ? porquê ?
- Quando ouvi tantos e tamanhos peca··
cados, realmente doeu-me a alma ; mas,
purificada como estais agora pelo Sacra­
mento, .é grande a consideração com que
vos olho e alegro-me porque vos l ivrei de
tantos inimigos.
- M as, que pensa da minha vida passada?
- Vosso passado apenas o l embrarei para
como os anjos, me regozijar da vossa conver­
são ao Senhor Deus.
E com estas pal avras, o Santo começou
a chorar.
- Chorais as minhas enormidades, .não
é assim ? insistiu a dama.
- Choro de alegria pela vossa ressurrei­
ção à vida da graça.
Assim era, de verdade. E o facto re­
pete-se muitas vezes. Todos os sacerdotes
assíduos ao confessionário_ mais de uma vez
terão sentido aquelas inefáveis alegrias que
faziam derramar l ágrimas ao santo bispo de,
Genebra'.
Como médico, o confessor por vezes terá
de cortar e cauterizar ; mas· vigário de Deus
como é, não o pode fazer a seu arbítrio.
Tem ple nos poderes, e direitos quase divi-

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44 O C R IS T ;\ O NO

nos ; mas não menores os deveres a cum­


prir. Enganar-se-ia quem pensasse que
administrar o sacramento da Penitência é
-como se fosse operação mecânica na qual o
c<;> n fessor é simplesmente máquina de absol­
_
v1çoes.
Pois que no santo Tribunal representa o
mesmo Deus, cumpre-lhe cuidar no aperfei­
-çoamento espiritual do pen itente, e empre­
_ gar para isso todos os meios ao seu alcance.
Por mais que lhe doa o coração, terá de re­
preender com energia em certas circunstân­
· Cias. Vais tu, por exen1plo, e confessas uma
e muitas vezes as mesmas culpas . Nelas
-cais porque não foges, como devias, das
-ocasiões próximas do pecado, não obstante
as repetidas admoestações que te foi fazendo
· O confessor. Ou então com frequência te
· confessas, e todavia nada adiantas na vir­
tude.
Em casos assim, o confessor tem mais
que razão para duvidar da sinceridade . das
·tuas confissões, do tev arrependimento ou
do propósito de emenda ; e pode supor que
frequentas os Sacramentos rotineiramente.
E é bem de ver que em tais circunstâncias
·não te pode absolver sem m ais reparos.
Mas se estás de veras arrependido e com
propósito firme de pôr cobro a teus descui­
-dos e maus hápitos custe o que custar, se
assim preparaste a alma para com proveito
-receber o sacramento da Penitência, podes
:ir afoito ao confessionário, e logo de entrada

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T R I B U N A L D A P E N ITÊ N (, I A 45·

çonta a resolução em que vais, por estas ou


semelhantes palavras :
«Apesar das repetidas promessas, ainda.
não deixei as ocasiões de pecado nem tive·
emenda ; mas hoje venho firmemente resol- ·
vido, com a graça de Deus, a · evitar tudo .
quanto me possa levar· ao inferno» .
Perante tão decidido protesto de . guerra.
ao pecado e propósito de emenda - . os re-·
quisitos essenciais para a boa confissão - · o

confessor não porá dúvidas em te absolver.


O sacerdote, quando julgar preciso, tem
obrigação de te falar com palavras sérias,.
severas e justas. Como jui'{ tem de julgar
se sim ou não és digno do perdão ; como.
mestre tem de te instruir ; como médico·
deve receitar e aplic :ir os remédios que lhe·
parecerem convenientes ; como pai (é deveras
6 pai da tua alma) tem de zelar a tua salvação',.
e suas palavras, podes crer, vêm de um co-.
ração que só deseja a tua felicidade eterna . .
S e ainda assim a Confissão te parece pe­
nosa e difícil, lembra-te da obrigação
. .. ,
que·
tem o confessor de guardar mviolavel se-
gredo acerca de tudo quanto em confissão­
lhe . revelas . Podem-no condenar a penas.
graves e até à morte em vergonhoso e infa­
mante patíbulo ; derramará seu sangue, mas
nunca quebrará o sigilo a que está obrigado.
E é digno de se notar aqui : entre tantos.
sacerdotes que perdida a fé, se entregaram
a vida licenciosa, não consta de nenhum que
violasse o sigilo sacramental para quaisquer

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O CRISTÁO NO

depravados fins. A divina Providência como


que abertamente vela por tão santa e sobe­
rana instituição.
Nã� caberia aqui resolver, tfma a uma,
todas as possíveis objecções contra a Confis­
são. E por isso apenas acr�scentarei que
para se. conhecer a sem-razã9 de toàas elas
e dos pretextos que muitos aduzem em des­
.culpa de não frequentarem os Sacramento.s ,
não há como a mesma confissão.
Em 2 1 de Dezembro de 1 859 estava o
Santo Cura d'Ars, S . João B aptista Vianney,
a ouvir de confissões na sacristia da sua
igreja, quando dele se abeirou um cavalheiro,
trajando com distinção e ostentando as insí­
�gnias de oficial da Legião de Honra. Era
um veterano de guerra.
Saudou com respeito e acrescentou :
·

- Venho aqui, Rev. Snr., a tratar assunto


:sério.
- Está bem, respondeu o Santo com
-doçura e afabilidade. Ajoelhe-se aqui, se
faz favor. E indicava 'o genuflexório.
- Mas, Reverendo, eu não venho para
me con�es,c;ar. Venho apenas esclarecer uns
pontos. E que não tenho fé, não creio que . . .
e precisamente as minhas dúvidas versam
.sobre a Confissão. Seria farsa ir-me a con­
fessar sem. acreditar na Confissão.
- Está bem, meu caro amigo, tornou o
.santo. 1\.'las, por favor, faça o que lhe digo :
·Queira ajoelhar.

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TRI B U N A L D A PE NITÊNCI A 47

E o oficial, não encontrando melhor meio


de sair do embaraço, ajoelhou.
- Diga : «Em nome do Pai, do Filho e
do Espírito Santo » , continuou o sacerdote.
E em tom muito paternal, interrogou : - Sabe
fazer o sinal da Cruz ?
E de pergunta em pergunta, ajudado da
graça divina; levou o cavalheiro a abrir-lhe
por completo o coração. E um quarto de
hora depois, o oficial levantava-se banhado
em l ágrimas. Eram lágrimas de alegria.
E publicamente contava como tão inespera­
damente se encontrava feliz.
Aprendeu por si mesmo, confessando-se,
o que talvez as suculentas liçõ.e s dos doutos
nunca houvessem podido ensinar-lhe.
Com efeito, não há como a experiência
p ara bem ensinar a doçura, a fortaleza, a
consolação, que a alma encontra na prática
da Confissão frequente. Só quem se confessa
e comunga, compreende as · bênçãos que da
frequência dos sacramentos resultam para os
indivíduos e para a sociedade.
Sede também vós assíduos no tribunàl
da Penitência, e- vereis como se vos dissipam
todas as dúvidas e preconceitos.
E se quereis partilhar dos benefícios da
Confissão, achar fácil a sua prática, experi­
mentar suas doçuras e consolações, confes­
sai-vos bem.

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,

DIRECTOR IO PA,RA UMA ..


-

BOA CONFISSAO

«Este é seu mandamento :


que creamos em nome de seu
Filho Jesus Cristo e nos ame­
mos uns aos outros, como Ele
nos mandou. O que observa seus
mandamentos, está em Deus ei
Deus está nele ; e nisto sabemos
que Ele está em nós, pelo Espf­
rito Santo que nos deu». 1 ]o. 3,
23-44.

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Se pecaste gravemente e queres reconci­
l iar-te com Deus, volta-te para Ele, de co­
ração contrito, e promete ser-Lhe fiel no
futuro ; isto é, mostra-L4e que est�s repeso
das tuas culpas e que lhe prometes emenda.
Assim disposto, procura .sacerdote auto­
rizado pelo ·bispo, e confessa-lhe· todos os teus
pecados.
Depois cumpre a p.e nitência que te impôs,
porqu� n ão basta confessar o pecado, é pre­
ciso expiar a culpa, cumprindo a pena im­
posta pelo juiz �spiritual.
Como não poderás acusar todos os teus.
pecados sem os conhecer, entrarás dentro de
ti a recordá:·los, ou, como diz o catecismo,
farás, antes, o exame de consciência.
Eis traçado o caminho que vou seguir.
Tratarei primeiro do pecado em geral ; de­
pois dos pecados em particular, ou seja dos
pecados contra cada um dos mandamentos ;
e , por último, das condições requeridas para
que a confissão fique bem feita.

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PRIMEI RA PARTE

Co n h eci m en t o d os p ecad os

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Que é pecad o ?

Diz o catecismo : pecado é a transgres­


são voluntária da Lei de Deus.
Por Lei de Deus entendem-se, .a qui_, não
apenas os mandamentos dados imediata­
mente por Deus, mas todas as demais leis
promulgadas em seu nome pela autoridade
quer eclesiástica quer civil, com intenção de
obrigar. «Todo o homem está sujeito às po­
testades superiores·, porque não. há potestade
que n ão venha de Deus, e as que há, essas
foram por Deus ordenadas » . (1) «Quem vos
· ouve, a 1nim ouve ; quem vos despreza, a
mim despreza» . (2)
A transgressão da Lei de . Deus só é vo­
luntária quando com maior ou menor cla­
reza se adverte na malícia da acção que se
vai praticar, e, n ão obstante tal conheci­
mento, deliberadamente se pratica ; isto é,
quançlo há conhecimento ou advertência da

(1) Roin. 13, 1. (2) Luc. 10, 16.


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O. CRISTAo NO

malícia e cansentiºmento deliberado. O ho­


mem só dos actos conscientes e livres é res­
ponsável perante Deus. Se, por. qualquer
motivo, a transgressão da Lei de Deus não .
fosse livre, não haveria pecado.
Alguns exemplos :
1 . Numa sexta-feira, esquecido de que
é dia de abstinência, comes carne. Não pe­
caste, porque não advertiste na lei,. e por
isso não houve transgressão deliberada do
preceito da Igreja.
E seria tudo ao contrário se,. em qual­
quer dia, julgando por engano ser dia de
abstinência, comesses çarne. Pecavas, por­
que deliberadamente transgredias o preceito
da Igreja a que te julgavas obrigado na.,
quele dia.
·-

Em dia de festa de guarda, andas fora


de tua terra. Procuras n1issa, e não a en­
contras . Não p�caste, porque não transgre­
diste deliberadamente a Jei .
Uma criança pratica uma acção deso­
nesta que não sabe que é pecado. Não pe­
cou, porque não tem conhecimento do mal
ou da m alícia de tal acção. Neste apropósito
diz S.. Afonso M aria d e Ligório : cc Não há
obrigação de confessar certas leviandades ou
acções m enos decentes que porventura pra­
ticamos em criança, quando · ignorávamos a
sua malícia. E não se pode dizer sinal de
malícia, o facto de as termos feito às escon­
didas, pois também fazemos a ocultas certas

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TR 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N C 1 A 55
\

acções naturais que bem sabemos não serem


pecaminosas . » (1)
2. Pode suceder que peques com profe­
rir certas palavras ou praticar certas acções,
embora de momento não advirtas que são
pecado·. Tal te pode acontecer em cifcuns­
tâncias como estas : Tens o mau hábito de
proferir sem respeito os nomes santos. Em­
bora a experiência te ensine que, se não
andas advertido em combater tão mau há­
bito, às duas por três nele estás caído, nem
te ralas nem tqmas cuidado. Não tens inten- ·
ção de ofender a Deus, é certo ; mas não
trabalhas como devias por vencer o mau há­
bito, e por isso voluntàriamente o tens.
E assim és responsável, quando, sem . res­
peito, proferes os nomes santos, embora de
momento não advirtas na malícia · do que
estás dizendo. O pecado não está p11àpria- ·
mente nas palavras irteflectidas, pois não há
pecado sem conhecimento do mal ; está, sim,
no conservares voluntàrz"amente, hábito que
sabes te arrasta a essas faltas. Es, portanto,
delas indirectamente responsável .

(1) A oerdadelra esposa de Jesus Cristo, e. XV 18,21.

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CAPIT U LO 11

Pe�ado m o rtal· e pecado venial


O pecado é a trans gressão voluntária da
Lei de Deus . Tal trans'gressão pode ser
maior ou menor_, consoante as circunstâncias.
E daí o dizer-nos a Fé e a razão que os pe- ,
cados pode_m ser mortais e ve�iais, ou, como
de outra forma se costuma chamar-lhes, pe­
cados graves e pecados leves.
o pecado está no voltar-se o homem m.­
citamente · para as criaturas, deixando a Deus
seu Criador. Quando a J g:uém peca, antepõe
sua . vontade à vontade de �Deus ; afeiçoa-se
de modo ilícito às criaturas, quer e]as sej am
pessoas quer bens de fortuna ou pra zeres ;
e deixa, portanto, de pôr em Deus o seu fim
último. Peca quando faz figura parecida à
criança que prefere um torrão de açúcar · a
um punhado de oiro fino.
Se por completo se deixa a Deus, prefe­
rindo absolutamente a criatura ao Criador,
nesse caso perde-se o amor e amizade de
Deus, a graça santificante e o direito ao pa­
raíso. Havíarnos de dizer, então ·, que a alm a
recebe ferida mortal ; e , por isso, a pecado
assim enorme, chamamos pecado mortal.
Quando, porém, se deixa a Deus apenas
'parcialmente, estimando as . criaturas ::nais
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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T E N C 1 4. , 57

do que c�nvém, nesse ,caso a alma como que


fica doente : esfria-se nela o an1or de Deus,
debilita-se-lhe a graça santificante, não pra­
tica o bem com o entusiasmo com que antes
fazia. Porque não perdeu de todo o amor
de Deus, mais fàcilmente pode obt�r perdão
do seu pecado, que, por isso mesmo, se
chama pecado venial.
Perguntarás então : E ,quando .é que por
completo s·e deixa a Deus, e quando parcial-
1 mente ? Ou, por outras palavras : Quando
é que se comete um pecado mortal e quando
se comete pecado venial ?
1. Comete-se pecado 'ff! Ortal quando se
transgride a Lei de Deus em matéria grave
com plena adpertência e consentimento de­
libera"do.
Se falta a matéria grave, ou a plena
advertência, ou o consentimento deliberado,
não há pecado mortal .
A matéria pode ser grave em si ou nas
circunstâncias de que se acompanha. São em
si mesmo matéria grave, a blasfêmia, o per­
júrio, a impureza, prejuizos avultados nos
bens ou na fama do próximo. Circunstância
que tornaria grave a matéria de si mesmo
leve .. seria por exemplo o escândalo grave
resultante de uma acção leve. Daria tal es­
cândalo grave, quem, praticando - qualquer
acção -levemente pecaminosa, fosse causa de
que o;itro� caíssem em pecado grave.
So há pecado_ grave quando plenamente

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58 O CRISTÃO N O

se adverte na malícia da acção que se vai


praticar ; e, não obstante tal advertência, de­
liberadamente a praticamos ; isto é, quando ,
perfeitamente conhecemos que se trata de
falta grave, e todavia com p lena advertência
a praticarpos.
2. C01nete-se p ecado venial quando se
transgride a Lei de De,u s em matéria leve,
advertida e delibera jamente ; ou então em
matéria grave, mas sem plena advertência
ou consentimento deliberado.
A matéria é leve quando o que se manda
ou proíbe é em si de somenos importância,
ou, quando, com ser de importância, se
transgride apena� levemente. Certas curio­
sidades impertinentes, um pouco de luxo no
vestir, a ociosidade, a excessiva cubiça de
honras e dinheiro, um l eve excesso no comer
ou beber, são em si mesmo matéria leve ou
transgressão l eve de matéria grave.
Pode todavia suceder que acções de , si
veniais cheguem a pecado mortal por mo­
tivo de circunstâncias particulares. Tais se­
riam as acções leves de que resultasse e�­
cândalo grave ou grave prejuizo próprio ou
alheio, previsto quando se praticou a acção.
Em si m�smo é pecado leve olhar por cu­
riosidade e sem motivo razoável, figuras ou
imagens menos honestas. Mas se por expe­
riência sabes que tal curiosidade de ordinário
te arrasta a pecados desonestos, então esses
olhares serão gravemente pecaminosos pelas
graves consequências que deles vêm.

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TRI BUN A L D A PENITÊNCIA 59'

Pelo contrário a màtéria é grave, mas.


transgride-se· apenas l evemente em casos.
como estes :
A calúnia rouba ao próximo a honra e a
fama que são bens graves, e portanto em si é­
pecado grave . .Mas tratando-se de coisas de
somenos, ou se o dano causado foi insignifi­
cante ou nenhum, a calúriia ficou apenas.
pecado venial.
Em dia de abstinência comer, sem motivo,
um pequeno pedaço de carne ou um pouco
de caldo de carne, não passa de leve trans­
gressão do preceito eclesiástico. 0 mesmo.
se diga do exceder um tanto a quantid�de
de alimento permitida num dia de jejum.
A transgressão de Lei divina em matéria.
grave, também não passa de pecado venial
se não houve p l ena advertência ou consenti­
mento deliberado.
E ainda uma observação, para terminar ::
Se alguém julgasse pecado mortal , o que,
de facto, era apenas pecado venial, e assim.
persuadido praticasse ciente e voluntària­
mente tal acção, cometeria pecado mortaL
Pensas, por exemplo, que a · mentira é P!!-·
cado grave, e, apesar disso, mentes. Es.
réu de culpa grave, pois transgrediste a Lei.
divina em matéria que julgavas ser grave ..
E com estes princípios j á podemo :; de­
ordinário ajuizar da moral idade das nossas
acções . . Todavia nem sempre, em cada caso·
concreto, nos será fácil destrinçar se houve-

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O CRISTÃO NO

pecado grave qu leve. Muitas vezes nem a


- ciência aliada à madura reflexão saberá me­
dir bem o grau de �ulpabilidade deste ou
. daquele dos nossos actos.
E se assim sucede com as almas bem
·form adas, pior será com as almas escrupu­
losas que quase sempre desatinam no apli-
·Car desta doutrina. Falta-lhes a faculdade
de reflectir com calma ; o nervosismo turva­
-lhes o entendimento ; e daí não acertam na
. aplicação dos princípios que bem conhecem.
· Nas coisas mais singelas da vida, . emara­
·. nham-se com dúvidas e anciedades. Pes­
·so�s com a consciência assim deformada . ou
. doente, devem ater-se em tudo ao que lhes
-diz e n1anda o confessor.
Tod�via aí vão algumas observações que
·te poderão ajudar a resolver as dúvidas que
· te venham acerca da plena advertência e
-consentimento deliberado
Praticasté qualquer acção, grave em si
.mesma, durante a semi-vigília, ou em. tal
estado de excitação de paixão que não pu­
-d este reparar bem no que fazias. Acordaste
plenamente ou sobreveio a calma, e podes
. afirmar que não terias praticado tal acção
. se a soubesses pecaminosa ? Não pecaste
:.g ravemente, porque não houve advertência
suficiente.
Combates as · tentações que sobrevieram
.d urante o sono, apenas perfeitamente acor­
-dado. Ao advertires na tentação, logo te
;p esa e a combates . Sossega, que não co-

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TRI BUNAL D A PE NIT Ê N CIA 6t

meteste pecado mortal, pois não houve con­


sentimento deliberado.
De princípio não combateste a tentação..
com energia, vacilaste talvez até entre con­
sentir e não consentir ; mas, com a graça .
de Deus, ganhas força e atalhas ainda a _
ten�ação, começando a resistir seriamente.
Também ainda neste caso não pecaste mor- ·
talmente, porque nãó houve perfeito consen­
timento. M enos o houve ainda, se resististe ·
à tentação logo que nela advertis�e.
Demoras talvez algum tempo os maus .
pensamentos ou maus desejos. Mas apenas..
advertes na sua m alícia, logo os detestas e ·
combates. Sinal de que não consentiste ple­
namente, e portanto não pecaste gravemente.
Enfim, se em geral és consciencioso ·e ·
temente a Deus, sempr.e que te sobrevierem
dúvidas podes concluir que não houve pleno.­
consentimento.

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CAPÍTU LO Ili

�tenuantes d a culpabilidade
Causas q u e turvam o· conh ecimento e entravam a vontade

O homem é feito dé' corpo e alma. E a


alma, enquanto upida ao corpo, dele depende
em todas as suas operações, e portanto tam­
bém no conhecer e no querer. Até das en­
fermidades do corpo, até delas se ressente a
àlma. Unidos intimamente como estão, corpo
·e alma reagem constantemente um sobre o
outro. Como se opera esta recíproca reacção,
não s abemos explicar ; mas que é um facto,
isso é evidente e inegável.
Se o homem fosse só espírito, a alma
seria perfeitamente livre . Mas como está
presa ao corpo, este tolhe-a por vezes e n ão
lhe deixa completa liberdade no seu operar.
Desta· forma o livre alvedrio ou a liberdade
do homem é por vezes atenuada ou até to-
/
talmente destruída.
Já acima lembramos algumas causas aci­
dentais que turvam o conhecimento e peiam
a vontade, tais como a ignorância de qual­
quer obrigação particular, a semi- vigília, a
explosão súbita de paixão violenta. Diremos
agora alguma coisa sobre o enfraquecimento
geral das actividades psíquicas, resultante
da dependência erp que a alma está do corpo.
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T RI B U N A L D A P E N IT Ê N C 1 A - 63

De modo geral amortece ou atenua as


actividades da alma, e portanto a livre de­
terminação ou livre alvedrio, aquilo que po­
demos chamar a parte inferior do homem
ou a concupiscência ou o conjunto de pai­
xões e inclinações. Tudo isto é, dentro de
nós, como tempestade desfeita que nos traz
a alma revolta. A pobre natureza humana,
ferida:·-'.�.debilitada pelo pecado original, por
vezes 'quase nem se atreve a domar tempes­
tade assim medonha.
Já o divino Salvador no Jardim das Oli­
veiras punha de sobreaviso os apóstolos :
« Ü espírito n� verdade está pronto, mas a
carne é fraca» . (1) E S. Paulo abria-se aos
Romanos nesta confissão de humildade :
«Eu não aprovo o que faço ; porque não
faço o bem que quero, mas o mal que odeio.
Mas, nesse caso, não sou eu já o que faço
isso, mas sim o pecado que habita em mim.
Porque eu sei que em mim, isto é na mirtha
ca·rne, não habita o bem. Õ querer o bem
está em mim ; mas não encontro meio de o
levar à prática. Eu não faço o bem que
quero, mas o mal que não quero. Encontro,
pois, esta lei em mim : ao querer fazer o
bem, encontro o mal junto de mim. Todo
me deleito na Lei de Deus, segundo o ho­
mem interior ; mas sinto nos meus_ membros
outr3: lei que repugna à Lei do meu espírito

( 1) Mat. 26,41 .

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O CRISTÃ O NO

e que me prende à lei do pecado que está


nos meus membros. Infeliz homem eu sou !
Quem me livrará do corpo que me vai dando
esta morte ? » (1)
Também muitas circunstâncias exterio­
res há, que frequentemente influem no ho­
mem e lhe arrastam a vontade. A sedução
do mau exemplo, as ocasiões perigosas por
vezes inevitáveis, os n1últiplos atrae:tivo� do
pecado, a má educação recebida na mfância,
tudo · isto põe em dura prova a melhor boa
vontade.
O temperamento individual é outro fac­
tor que impertinentemente complica a v ida
moral · do homem ; assedia-o, quase joga
com ele. E o temperamento é, tantas vezes,
triste herança que no sangue vem. « Os pais
comeram as uvas em agraço, e os dentes
dos filhos é que se acham botos» (2), j á era
queixa do profeta Ezequiel. -Outras vezes
forma-se no correr dos anos. No corpo
vão-se desenvolvendo certas disposiçõe� vi­
ciosas que ao fim acabam por modificar no­
tàvelmente o feitio da alma.
Ora, o temperamento, ou estas disposi­
ções viciosas ou más inclinações habituais,
quer hereditárias quer adquiridas, exercem
sobre a vontade uma violência tirânica ;
como que a prendem com cadeias férreas e
arrastam-na a repetir os actos pecaminosos,

(1) Rom. 7, 1 5-24 . (2) Ezeq. 18,2.

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T R I B U N A L 'D A P E N IT Ê N C I A -, 65

a ponto de, por vezes a escravizar quase por


completo a um mau hábito. E o mau há­
bito pode chegar a enfraquecer de tal modo
a vontade que lhe roube as forças com que
!\avia de resistir às seduções do pecado .
E dever grave combater as más inclinações
e fortalecer a vontade com os meio� naturais
e sobrenaturais de que se possa dispor. Ha­
vemos de cultivar sempre a coragem e a
firmeza, para vencer os maus hábitos.
A tjrania que. todas estas coisas exer,cem
sobre a vontade, pode ser de tal violência
que vá até por completo destruir a liberdade
e portanto a responsabilidade. Difícil se
torna, por isso, em muitos casos medir ao
certo a cul pabilidade das nossas acções.
Quanta ela seja, por vezes só Deus o sabe
dizer.
Há ainda. o que ·se chamam as obsessões
ou pensaqienios e representações obsedian­
tes, que também elas influem na vontade ; e
são mesmo prova palpável, evidente, de
quanto um temperamento doentio pode per­
turbar a alma. Nevroses, taras hereditárias
ou adquiridas e outras disposições corporais
por vezes movem e activam de tal modo a
imaginação, que chegam a ernbaraçar a von-.
tade com representações obsediantes.
Tais imaginações ou pensamentos não
são actos livres e ·por i.sso pão são pe_cami­
nosos. Se quando em estado normal, habi­
tualmente lhes recusas consentimento, podes

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66, O C RISTÃO N O

estar sossegado. E quando cresçam até se


transformarem em obsessão demorada e vio­
lenta, quer sob a forma de tentações de
blasfêmia ou de impureza, quer de dúvidas
contra a fé, quer de tentações contra a cari­
dade ou contra qualquer outra virtude, com­
bate-as assim :
Aos pensamentos de blasfêmia contrapõe
actos frequentes e intensos de religião ; às
tentações contra a fé, a . comunhão fervorosa
e recolhida ; às tentações contra a pureza,
uma prudente vi� ilância sobre ti ; aos assal­
tos contra a caridade, a prática assídua das
obras de misericórdia. Deita ao des p rezo as
obsessões da iinaginação, do espírito e do
coração, pois não te podem causar dano
desde que lhes recuses assentimento.

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CAPÍTULO IV
.
.

Como formar a c onsciência n os c asos


duvidosos
o pecado é a transgressão v9luntária da
Lei de Deus . Supõe, portanto, que se adverte
ou conhece que determinada acção é proí­
bida pela Lei de Deus ; e que, apesar disso,
deliberadamente se pratica.
Se faltou o conhecimento de que tal 'acto
é proibido, j á não há pecado. E, pelo con­
trário, se houve tal conhecimento, - seja ele
errada persuasão em que estejamos, come­
teu-se pecado. Supúnhamos proibida uma
acção que de si é lícita ou ,até mesmo boa
e praticamo-la, caímos em pecado.

Esta advertênc.ia ou conhecimento é por­


tanto um dos elementos constitutivos da
moralidade dos nossos actos. Co m ele te�
mos de contar para saber se determinado
acto que. praticámos, foi pecaminoso ou n ão,
e sobretudo para a tempo fugir de tódó
o que é ofensa de Deus.
Qu�ndo a nossa consciência está na cer­
teza de· que determinada acção é proibida,
nenhuma dificuldade pode haver na resolu­
ção a tomar, pois temos obrigação de evitar
o pecado, custe o que custa�. A dificuldade
vem quando duvida1nos se o acto a prati-
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68 O CRISTÃO NO

car é proibido ou não. E tanto maior será


a dificuldade, quanto maior for a incerteza
em que nos encontramos.
E, neste particular, · de �rês modos se
pode encontrar incerta a consciência : pode
própriamente duvidar se sim ou não é lícita
determinada acção ; pode achar provável uma
das duas alternativas ; -pode duvidar, porque
emaranhada com escrupulos. Ou , como cos­
tuma dizer-se, a consciêencia f ode ser : pró­
priamente duvidosa, prováve e escrupulosa.
Como proceder com acerto em cada um
destes casos ?

1. Da oonsciênola duvidosa propriamente dita


A consciência é duvidosa quando não
sabe se o que se deseja praticar, é pecado
ou não ; e por isso oscila, titubiante e inde­
cisa, sem poder concluir se é boa ou má a
acção que se pretende real izar.
Como proceder em tais casos ?
S. Paulo, na E pístnla aos Romanos,
afirma : << Tudo o que não procede de uma
firme convicção, é pecado » . (1) Donde se
conclui que antes de praticarmos qualquer
acção, havemos de nos convencer de que é
lícita, pois pecaríamos se nos abalançásse­
mos a praticá-la duvidando se é boa ou má.
Por exemplo : Sabes que nas vigílias de

{I) Rom. 14, 25.

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T 'R I B U N A L D A: P E N I T Ê N C I A 6g

certas festas, há ob rigação de guardar abs­


tinência. Mas duvidas se no número de tais
vigílias cai também a do Nat�l . Sem te
importares com a dúvida, comes de c�rne
nesse dia. Pecaste, do mesmo modo que
pecarias se transgredisses um preceito certo.
E a razão do pecado está em que te expu­
seste a transgredir a lei da abstinência.
Tinhas consciência ou conhecimento . de·
que podia existir o preceito : isso queria- di­
zer a dúvida em que estavas. E não obstante,
ousaste comer carne, ou sej a, ousaste trans­
gredir um preceito que sabias podia existir.
O pecado está no teres-te exposto ,voluntà­
riamente a transgredii:- a lei, ou no pouco te
irn portares que a acção fosse proibida �u .n ão.
Devias, antes de· comer de carne, procu­
rar resolver a dúvida e obter urna certeza ;
o que podias fazer informando-te com pes­
soa competente ou consultando a lista dos
dias de abstinência. Não tens desculpa .de
não resolveres a dúvida, quando isso te seria
tão fácil . Não o fizeste ? Pois, nesse caso,
o caminho bom a , seguir era proceder con­
forme a parte mais segura, isto é, guardar
abstinência.
Perguntarás : E terei p·e cado até agora,
se.n1pre que não procedi em conformidade
com esta doutrina ?
Isso é questão diferente e j á implica com
outro principio acima exposto. Para haver
pecado . é preciso que no momento em que
se pratica a acção, . se conheça a sua malícia ..

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O CRI S T Ã O N O

Ora tu não sabias que não podias praticar


determinada acção duvi dan�o se era pec?do
ou n ão ; antes pelo contrá rio j u lgavas que,
no caso de d úvid a, pouco i m portava proceder
de um modo ou d e outro . Não te inqui etes,
pois � com o p assa:do, porque n e ste ponto,
d a d a a tu a ignorância , n ão houve cul pa grave.
O caso m uda de figura quando se trata
de uma con sciência t imorata e doentia. Diz­
-se e bem : a consciência é a voz de Deus.
Assim está certo, quanto à consciência nor­
m a l e bem for� ad a . A consciência que n ão
é normal , mas s i m doentia ou escrupu l osa,
essa nem sem pre é a voz de Deus. Adiante
diremos como devem proced er as pessoas
de con sciência escrupulosa .

2. Da oo nsoiê-n ola provável


Para que seja lícito praticar d eterminada
acção, é n ecessário a firm e con ,·icção de que
nos é perm itida. Ora, q uantas vezes �.u ced�
n ão . podermos chegar a convicção assim !
E certo que Deus gra vou n o coração do
homem a sua Lei , e que d epois, no a lto do
Sin a i , a escre veu e promul gou codificada
nos seus d ez m a"ndamen tos que C risto con­
firmou e esclareceu . E também conhece­
mos os preceitos que, no decorre r dos sécu­
los, a Igrej a t�m promulgado. Apesar de
bem conhecermos assim a Lei, n e m sem pre
tod avia acertamos na m an e ira de a apl icar
a cada caso concreto da vid a . cc Não matarás ;

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T R I B U N A L D A P E. N I T Ê N C I A 71

nãn levantarás falsos testemunhos ; jejuarás


quando �anda . a'·Santa Igreja » . Leis muito
claras, é verdade ; vamos porém a aplicá-las
na vida prática, e Jogo surgem dificuldades.
A vida humana é tão complexa e vária
que por melhor boa vontade que Jiaja, não é
possível muitas vezes concluir com segurança
se num determinado caso certa acção é per­
mitida ou imposta sob preceito grave. Acresce
ainda que a nossa inteligência é tão reduzida
e a'c anhada que nem sempre abarca todas as
circunstâncias de modo a chegar a firme
convicção.
Ora, seria jugo insuportável e fonte de
inquietações sem número, termos de optar
pelo mais seguro sempre que não houvésse­
mos certeza absoluta da liceidade de uma
acção. E, de facto a realidade não é assim
tão · d1:.1ra,. mas muito mais fl exível .
Quando não pudermos chegar a tal cer­
teza, basta a probabilidade de que uma
a}:ção é lícita,- para a podermos praticar.
E, desde séculos, opinião comum. dos teólo­
gos, consentida' pela Igreja, que, havendo
probabilidade de que uma acção é lícita, po­
demos descansar na certeza de que a pode­
mos praticar, firmados no princípio : <(a lei
incerta não obriga » .
Um exemplo a escl arecer melhor a doµ­
trina : a mãe de família, esquecida de que
era sexta-feira de · têmporas, preparou ·almoço
de carne. Está a comida na mesa e lem­
bra-se ela que é dia de abstinência. E fica

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O CRISTÃO NO

sen1 saber o que faça . A família precisa co­


mer, falta o tempo para preparar outro
almoço, e não há a quem consultar.
Pois é fácil fqrmar a consciência para
resolver o caso. E certo que a l ei da absti­
nência não obriga .com incómodo grave. No
caso, a mãe de família não vê bem se o · in­
cómodo é suficientemente grave para dispen­
sar a lei ; todavia julga provável que a Igreja
nãô tenha intenção de obrigar em circuns­
tâncias assim difíceis. Firmada nesta proba­
bilidade, conclui que de certeza pode servir
o j an tar de carne, e sem escrúpulo o serve.
Podemos, pois, estabelecer como certo.
que sem pecado praticamos determinada
acção desde que com fundamenta.da proba­
bilidade a julgamos lícita.
E se não obstante · todos os motivos_ para­
ª julgarmos lícita, nos vêm receios de que o
não sej a, nem com isso nos devemos per­
turbar. Para ser lícita basta haver razões
sólidas para se afirmar : tenho ·a pro�abili­
dade de que faço bem, procedendo ·assim ;
portanto de certe{a assim posso proceder-.
Daqui partimos para a seguinte conclusão
prática . : há fundada probabilidade de que
em tal caso cumpri bem a minha obrigação
ou que em tal outr.o uma obrigaçã.o n � o urge_?
De ordinário, em casos como o primeiro,
.p odemos dar por satisfeita a obrigação ; e,
em casos como o segundo, concluir que não
há obrigação.
De ordinário,- dissemos ; pois, de facto,

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T R 1 B U N A L D ..\ P E N 1 T E N C1 A - 73

há uma excepção, e é o caso de quando . seja


preciso conseguir um fim determiºnado e
certo, pois então há que empregar sempre
os meios máis seguros . Assim o sacerdote
quando administra os s�cramehtos, o mé­
dic� quando receita . ou faz uma à peraçao, o
farmacêutico quando manipula os remédios,
todos eles têm obrigação de proceder do
modo mais seguro para atingir o jiºm deter­
minado e certo, da validade dos sacramen­
tos; d& cura dos e.n fermos, da boa qualidade
dos remédios.
Quem ainda assim não for capaz de for­
mar uma consciência provável, ou porque
lhe falta saber ou porque são em demasia
intrincadas as dúvidas que l he surgem, deve
cqnsultar o confessor ou os l ivros que tra­
tam do assunto.
Quando poderemos jul gar bem fundada a proba-
, ?
b i l i dada
·

E evidente que nem em todos os casos


duvidosos, se pode chegar ao mesmo . grau
de probabilidade. Tal vez as seguintes regras
ajudem em muitos casos a atingir a proba­
bilidade suficiente para se proceder sem
temor :
a) Quem está na posse de uma coisa ou
direito, na dúvida pode consiºderar-se seu
legítiºmo dono.
Assim : litigam duas pessoas sobre o
qireitQ de propriedade de certo objecto.
E seu legítimo dono quem actüalmente o

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74 O CRISTÃO NO

possui, até que o outro prove à evidência o


seu direito. O facto da posse é suficiente
para se crer legítima a propriedade, ou seja,
para com probabi1idade se julgar legítima
ta] posse. E por isso e�quanto o opositor
não provar seus direitos, persiste a dúvida.
E, firmado na quela probabilidade, ô possui­
dor actual contmua a usar e ·disfrutar tran­
quilamente o que possui.
b) 1Va dúvida deve-se estar pelo que de
ordinário acontece.
Duvidas se foi pecaminosa a acção que
praticaste. Deves ju1gá-la pelo comum das
tuas acções. Assim, por exemplo� não sa .­
bes se consentiste plenamente num pensa­
mento gravemente pecaminoso. Se até ao
presente tens sido delicado de consciência
e por coisa nenhuma querias ofender a Deus,
provável se torna que também desta vez o
não quiseste ofender. Podes, pois, estar em
que nele não consentiste plenamente, e que,
portanto, não cometeste pecado mor.tal ; e a
rigór nem tens obrigação de confessar esse
mau pensamento.
Em dúvidas deste teor devemos olhar
para o nosso porte habitual . Quem do co­
ração ama a· Deus e a tudo está disposto
para lhe não desagradar, nos ca )OS duvido­
sos pode crer que não o of�ndeu. Esta re­
gra na prática é de · muita utilidade par-a as
..

pessoas apoquentadas por escrúpulos e per­


plexidades de consciência.

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T R 1 B U N A. L D A P E N I T Ê N Cl <\ 7�

O contrário se há de dizer de 9-_Uem te­


nha a consciência laxa a ponto de pouco
caso fazer dos pecados mortais. Nas dúvi­
das, dado o seu inodo habitual de · proceder,
é de presumir que consentiu no mal, e que
por isso ofendeu a Deus.
Duvidas se determinada companhia, lei-.
t': ra o� dí.ve �timento ( q9e �ot: sua nat� reza.
s � co1s .
? .s . md1ferentes) con·stttue � pata ti oca-·
s'.:�o prox 1 ma de pecado. Podes· estar pelo ·
tj ''! e até agora te tem acontecido. Se até ao
p�1esente não foram causa . próxima de pecado,
r �.Ováve} se torna que também de futuro O·
rl� o serão, e portanto não tens obrigação
�(.ave de as evitar. O contrário se dirá se
�{� agora com frequência te arrastaram ao
r�cado. .
:·.: Outro exemplo : puvidas se confessaste·
t\,fo pecado- mortal cometido há 'inuito tempo.
�;e ·tens con�ciência de sempre ter confes-·
s i1 do os pecados que te lembravam, há toda
a proba.b ilidade de que também a . esse o­
cbntessaste, e por 'isso não tens obrigação·
de o confessar outra vez.

. e) Na dúvida presume-se bem feito o·


qtie ,ç e f"e\. .
, Aplica-se esta regra quando, feita uma.
altção, duvidamos se a fizemos bem. Sl:lpo-·
� h amos que duvidas se foi válido o contrato
dtJe acabaste de firmar. Deves tê-lo como vá­
l i do e �om, até que se demonstre o contrário.
Reflectind0 sobre as confissões passadas

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O CRISTÃO NO

entras a duvidar se fizeste bem o exame de


-consciência, se te excitaste devidamente à
·Contrição e ao propósito firme de emenda�
Se a consciência te diz que não tens sido
·notàveln1ente descuidoso nestas coisas,. a in­
val idade dqs confissões não é absolutamente
·c erta e há probabilidade fundada de que
tudo está em orden1, , e não tens obri g,ação
. de renovar as confissões.

d) Na dúvida, a presunção está da


parte do superior ..
Um superior consciencioso dá-te as suas
ordens, e começas de duvidar se é lícito fa­
zer o que te manda . Anda para a frente
sem preocupações . o facto de ter sido um
superior consciencioso quem nlandou, basta
para h aver probabilidade de que se trata de
.coisa lícita . O mesmo se diga das ordens
que dão os p ais, mestres e patrões conscien­
ciosos. Como representantes de Deus que
s ão, deves presumir que têm razões graves
para m andar o que mandaram, embora com
clareza as não vejas ; e por isso deves supor
que náo mandan1 senão o que e lícito.
Submete-te, pois, à sua vontade s e m te me�
teres a discuti-l a .
R�solveu-te o confessor qualquer assunto
de consciência. Embora entres a duvidar se
haveria ou não desacerto, faz corr,io ele te
disse, pois n a dúvida deves presumir que é
b'em o que sentenciou. Pessoas de consciên­
cia timorata devem cumprir em absoluto o

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T R 1 B U N A'L D A P E N 1 T E N C l A 77

ciüe lhe diz o confessor. Quem propende ·


p._ara os escrúpulos, não· pode confiar no seu·
j{1izo em negócios de consciência.
::' Com estas regras, caro leitor, não terás .
d ificuldade em resolv·e r a maioria das dúvi­
d as que te possam apoquentar. Não darão .
elas para resol ver a todas , pois é tão corn­
rlex a a vida que impossível seria enquadrá­
- l a por completo nalgumas poucas regras.
(�tiando assim suceda, recorre a pessoas .
doutas e i lustradás que te possam socorrer·
e alumiar ; de outra fonna terás de escolher·
a parte mais segura, isto é, aquela em que ·
de certeza não há pecado.
3. o·a consciência escru p ulosa
Além destas dúvidas riais que viemos .
fratando, -outras há que, muito embura
f\ areçam i;-iascer da incerteza do nosso co­
Qhecimento, de . facto resultam apenas do·
e,xcesso da nossa fantasia ou do vão receio'·
de pecar.
Assemelham-se tais dúvidas aos ténues.
rievoeiros que empanam o brilho do sol e
roubam aos horizontes · a limpidez, mas nem
a pagam os contornos das colinas nem u' de- ·
senha da paisagem, embora os tornem menos .
claros.
Abalam ou diluem um tanto a nossa:
convic9ão a respeito da liceidade de qualquer·
á.cto ; mas nem a apagam nem destroem, e-

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o C RISTÃO NO

sempre nos fica aquel a firme persuasão que


S. Paulo exige n_as nossas acções.
Não devemos im portar-nos com seme­
lhantes dúvidas e temores infundados, filhos
· U .d a tim idez ou da pusilanim.i dade de espí­
O
rito', que se corrigem praticando tranquila e
razoàvelmente o que nos exige o nosso es­
tado. Assim se curam estes escrúpulos pas­
sageiros.
Mas se as dµvidas entram de perturbar
·e atormentar implacàvelmente, então já não
se trata de simples consciência delicada ou
timorata, mas de urn a consciência doente.
E a esta triste doenç� chama-se escrupu­
losidade.
A consciência escrupulosa é incapaz de
formular juizo seguro sobre determinado
.a ssunto da moral cristã, ou até, por vezes,
sobre tudo o que respeita à vida da alma.
À s vítimas desta doença bem se lhes podt:
aplicar a sentença da Escritura : « T �mem,
· Onde não há nada que temer» . Temem,
vêem pecados, onde nem sequer há sombra
-deles.
Causas dos escrúpulos
A maior parte das vezes os escr�pulos
procedem de causas meramente naturais
-como desarranjos fisiológicos, desiquilíbrios
nervosos, taras hereditárias e coisas pare­
·cidas.
Também, às vezes, a ignorância e com-

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TRIBUNAL DA PENITENCIA i9

preensão rigorista dos próprios deveres e


)ias normas da vida cristã, a .reflexão dema­
siada com que se pensam os assuntos da
consciência, podem atarantar as almas com
escrúpulos.
Em casos particulares os escrúpulos po­
deriam ser tentaçãó do demónio. Não des­
perdiça -ele meio algum para prejudicar ou
perder as almas, e portanto
. também poderá
deitar mão do desas sossego dos escrúpulos
para, com a paz, lhes roubar a alegria espi­
ritual e o gosto da virtude.
Seja, porém. qual for a causa imediata
dos escrúpulos, o facto é que são eles dura
prova a que Deus sujeita �s almas. Mas, se
Deus nos seus insondáveis desígnios os per­
mite, seni dúvida será para sua glória, e
para deles tirar o nosso bem.
Porque permite Deus tais provas ?
« Deus ministra a sua graça de modos
misteriosos. E a graça como que se aco­
moda ao féitio dos homens que é tão vário,
e toma os mais diferentes aspectos ou actua
das maneiras mais imprevistas. Todavia
pode dizer-se que Deus de ordinário manda
a graça das suas provas às almas que de­
-veras aspiram à perfeiçã0, sobretudo se as
quer preparar para qualquer missão especial
ou para bem receberem os dons extraordiná­
rios que lhes reserva.
«E portanto não se pense que só nos
começos da vida espiritual" a alma encontra

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80 O CRISTÃO N O

as provas de Deus . Encontra-as sempre, e


até com frequên�ia quando na puj ança da
vid a espiritual . Já alguém venceu vários
combates, sentiu firmeza na virtude, endu­
receu no supor�ar do sacrifício. Vieram os
aplausos dos homens, e as consolações inte­
riores " inundaram a alma de paz e alegr:ia.
O amor próprio espreita, e é então a altura
de com eçar no seu trabalho. E quando a
al ma menos se precata, corre perigo todo o
edifício da virtude canseirosamente levantado
durante tanto tempo. De improviso surgem
violentas tentações que há muito pareciam
mortas, e tão impetuosamente acometem que
a alma quase se julga vencida.
« Transida de medo, desata em queixas
contra si e contra tudo, e ao fim só vê escuro
à volta e dá de esmorecer. Antes, até dese­
j ava ocasiões de dar a fortun a e o sangue
para confessar a Fé ; agora, aquela fé que
parecia tão robusta, é ruina que se esboroa.
«A dúvida é cerração que aperta a. alma
a toda a volta. Estará realmente na ver­
dade ou andará no erro ? Parecia-lhe antes,
que com a muita penitênci� que fizera, tinha
assegurado o perdão dos / pecados antigos ;
e agora cisma e torna a cismar que a con­
versão foi apen as fingimento e que foram
mal feitas as passadas confissões. Antes,
descansava na misericórdia de Deus e na
graça de Cristo, com tamanha confiança
que nem a do filho no colo de seu pai ;
e agora afigura-se-lhe que tudo está perdido

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TR 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N (, 1 A 81

e que só tem a esperar a maldição eterna.


Na carne· · que maltratara com penitências a
ponto de toda parecer florida de pureza,
explodem agora as tentações ; e, apesar de
se rodear de c�utelas para não cair em
culpa, j á não distingue entre ser tentada e
consentir, entre culpa grave � culpa leve.
Acrescem ainda dificuldades sem conta no
exercício da oração» (1).
Assim prova Deus, por vezes, as almas
que querem servi-lo e amá-lo. Porquê ?
Porque pa economia de Deus, as provas
são meios de purificação e santificação.
Resi·gnadamente suportadas, desapegam a
alma de si mesma, matam o amor próprio
e a vanglória, conservam e robustecem a
humildade, ·o brigam a levantar . os olhos ao
Alto e a procurar amparo em Deus. A es­
cola da cruz é a melhor escola do amor de
Deus .
Como se hã de haver a alma nos escrúpulos ?
Primeiro que tudo há que tein1ar sempre
e perseverar no bem. Nunca voltes atrás no
caminho começado. Obedece, afervora-te,
e não omitas nenhum dos costumados exer­
cícios de piedade. O sol das consolações de
Deus eclipsou-se, mas de noYo há de bri­
lhar. Perdeste as consolações do Senhor ;
pois apega-te ao Senhor das consolações.

(1) ZAHN, lntrQ.dução à Mlstlca cristã, 316.

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O CRISTÃO NO

Neste apropósito repetia S. Francisco de


Sales as p alavras da «Imitação » : « Espera
com humildade e paciência as consolações
do céu, -porque Deus é poderoso para te
co�ceder maior graça e consolação» . Deus
que é Deus de p az, não deixará muito tempo
no tormento da inquietação aquele a quem
ama e adaptou por filho.
Dá-te à oração, conforme tuas forças pe�­
mitirem ; lança-te nos braços paternais de
Deus ; e resigna-te na sua santíssima von­
tade. Se também se te esvaiu a confiança
em Deus, teima todavia em nele confiar.
Deus te dará forças para venceres a prova
que para teu bem te enviou.
Se os escrúpulos procedem de males
naturais, cuida de lhes dar remédio. « Faz
de tua parte o que püderes, e Deus te aju­
dará » .
E aplica também estes remédios :
1. Obedece au confessor em tudo� Con­
grega todas as forças da vontade para sem
reserva te submeteres aos ditarpes do di­
rector espiritual . Ensinam os mestres de
espírito que a obediência. inteira ao confes­
sor é o melhor e por vezes o único remédio
p ara os escrupulosos. O escrupuloso pode
por completo sossegar nas decisões do con­
fessor.. Se a vontade te chegar para tanto,
em breve estarás curado.
2 . Não te demores a pensar no estado
da tua alma, quer no que _r:espeita ao pas-

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TRI B U NAL D A PE NITÊNCIA 83

.-,ado quer no que respeita ao presente.


cc Quem toca no pez, fica sujo» , diz o ditado.
Quanto mais vasculhares a · consciência, mais
o negrume te empanará os olhos. Bem sa­
bes que no negá.c io da salvação, nunca nos
será · dado haver certeza absoluta. Porque
te metes então a atormentar a alma . co1n
inquirições impossíveis ? Melhor emprega­
rás o tempo, abandonando-te à misericórdia
de Deus, que a todos, justos e pecadores,
acolhe com paternal bondade.
3. Evi"ta tudo o que possa assanhar os
escrúpulos. Não leias, por exemplo, livros
que sobrecarregam a.s obrigações e deveres
qos cristãos . Na dúvida, atém-te sempre ao
juízo do confessor .
. , 4·. Foge da ociosidade e procura quanto
possível andar sempre entretido. A sentença
também aqui se aplica : «Ü espírito mau é
na ociosidade que trabalha» . Entremeia o
trabalho sério com a conveniente distr,acção
e recreio, frequentando quer a natureza quer

as pessoas alegres ; e assim não te ficará


tempo para os teus escrúpulos.
5 . Se a· causa dos ·esc1�úpulos são doen­
ças do corpo, hão deixes de recorrer ao
médico, enquanto houver esperança de cura.
6. E tem presentes estes princípios :
a) Só dos pecados mortais tens obriga­
ção de confessar o número e a espécie,
E não precisas empregar cuidado extraordi­
nário em os descobrir ; basta, para tanto, a
diligência razoável e séria. O confessor 1te

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81 O CRISTÃO NO

poderá ensinar quando é séria e razoável a


diligência. E se. a confissão se te vai tor­
nando peso insuportável com exigir-te dema­
siado .e sforço corpora! ou espiritual, nesse caso
estás de certo modo dispensado da integri­
dade da confissão. B asta que faças um curto
exame de consciên�ia e confesses uns · poucos
ou dekrminados pecados, se o confessor
assim julgar conveniente. Se por este mo­
tivo ficasse por confessar algum pecado
mortal, perdoado seria com os outros que
con fessasses. Quem confessa seus pecados
com razoável diligência, isto é, com diligência
proporcional as suas . forças corporais ou
espirituais, recebe dignamente o Sacramento,
e portanto também a graça santificante com
o perdão de todos os pecados mesmo doj que
não con fessou por motivo assim justificádo.
b) Em rigor, n ingué_rn está obrigado a
confessar os pecados duvidosos. E os que
são atormentados de escrúpulos, se o con­
fessor assim julgar, nunca os devem con­
fessar. Se o peca jo duvidoso que se não
confessou, fosse de facto pecado mortal,
perdoado ficaria con1 os outros que se con­
fessaram.
e) Se o confessor te diz : · ccpódes ir à
comunhão, mesmo que duvides se pecaste
gravemente » , deves obedecer-lhe. Se tives­
ses cometido d,e facto qualquer pecado mor- .
tal, ser-te-ia e]e perdoado com o acto de
contrição feito antes de comungar. E se a
contrição não fosse perfeita, dizem os teólo-

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TRI BUNAL DA PE NITÊNCIA - 85

gos que, nesse caso, o pecado mortal ser�a


perdoado pela comunhão junta à dor im­
perfeita.
d) Se entras a duvidar das tuas confis­
sões passadas, consulta a segunda parte
deste livrinho onde se diz : « Quando pode
ser prejudicial a confissão geral» . /
e) Sempre que duvides se consentiste
em m atis pensamentos de blasfêmia, de
impureza, ou seja do que for, deves proce•
der na prática como se não houvesses consen­
tido · ao menos plenamente. E por isso não
tens obrigação de os confessar, a não ser
que pudesses jurar que neles consentiste
deliberadamente.
f) Quando vais a fazer qualquer coisa
e te assa-Item dúvidas se a podes faz�r ou
não,�escolhe sem receio o que te for mais
favorável. O mesmo se diga quando entre
duas acções não saibas qual delas deves
escolher. E procede assim, sem vacilar.
Não ter vontade de ofender a Deus, é
quanto basta para não o ofenderes, proce­
dendo assim .
Duvidas por exemplo se já rezaste as
orações a que estás obrigado. Não te fi­
ques a pensar e a repensar no caso ; não
rezas simplesmente, a não ser que no . mesmo
instante te certifiques de que as não rezaste.
Um só caso há em que não é lícito esco­
lher a parte mais favorável, e é· quando,
imediatamente e com toda a certeza,. possas
dizer : isto é de obrigação, aquilo é proibido.

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86 O C R I S T Á 11 N O

'Na aplicação destas normas poderá- acon­


tecer que erres e pratiques qualquer acção
que em si mesma s�ria má. Dado, por�m,
o teu estado de consciência, podes ter a cer­
teza que não te imputará Deus o mal que
assim possas fazer. E seguindo-as a rigor ­
e é isto o ponto capital - tornar-te-ás mais
sereno nas tuas decisões, entrarás a ver
mais claro nos assuntos da alma, e pouco a
pouco voltará tua consciência ao estado
normal .

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CAPÍT ULO V

Da co lisão de d everes ou c onflito


de leis
Sucede por vezes na vida prática encontrar-se
alguém perante dois ou mais preceitos aparente­
mente contraditórios, sem saber 'por qual deles se
deva decidir.
É claro que quando assim ocorrem dois · ou.
mais preceitos que uns aos outros se excluem, ape-:
nas a um deles .e stamos obrigados. Quem dá força
obrigat9ri a aos preceitos, é Deus ; seria absurdo
pensar que Ele nos impõe ao mesmo tempo vários
precei.t os incompaUveis uns com outros. E por isso
havemos de concluir que o conflito é apenas apa­
rente, e nasce só do facto de a nossa inteligência;
prir ser em dema�ia limitada, não atinar com o gue
Deus q'uer de -n ós em determinadas circunstâncias.
{)s seguintes principios ou regras nos ajudarão
a conhecer em casos assim de colisão e confli_t o,
qual a vontade de Deus ou qual a lei que em tais
casos devemos preferir.
1 . Em igualdade de circunstâncias, a lei natu­
ral, gravada no nosso coração, prefere a qual quer
outra lei moral positiva mesm<? promulgada expres­
samente por Deus.
É de lei natural acudir ao· próximo numa afli­
ção ou nece!'si dade grave. É também de lei natu­
ral honrar a Deus.. A mbas estas leis são de antepor
ao mandamento positivo da lei de Deus de não tra­
balhar ao domingo ; · e portanto se, para acudir a
necessi dade grave do próximo ou · para honrar a
Deus, for preciso trabalhar ao domingo, deves tra­
balhar.
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88

2. A lei divina prefere a toda a lei humana,


quer civil quer eclesi ástica.
A lei natural, que é divina, de conservar a
saúde ou de cumprir as obrigações do próprio es­
t ado, deve ·antepor-se à lei edesi ástica do jejum.
Não se deve, pois, jejuar quando o jejum põe em
perigo a saúde estorva ou muito difi culta · o cum­
primento dos d everes do próprio estado. !!: hora
da missa e tens de assistir a um doente. Pois dei­
xas a missa e ficas com o , doente, porqu� a lei di­
vina pretere à eclesiástica.
Com mais razão seria i lfcito observar a lei
humana que está em contradição aberta com a lei
divina. Era caso de repetir, então o dito dos
Apóstolos ao Sinédrio : ((Importa obedecer mais a
Deus do que aos homens». (1)
3 . Na colisão de dois preceitos, um n egativo
outro positivo, pre fere o negativo. .
Para praticar uma boa acção, haveria que
tran!igredir a lei que profbe qua lquer outra coisa.
Em tal caso não é licito praticar a boa acção. Eis
porque se não pode mentir para socorrer o próximo,
nem pronunciar com ira os nomes santos para dar
m ais intimativa às ordens que como superior se
queiram dar, nem exercer arte ou modo de vida
proibido (usura, prostituição) para com seus lu­
cros socorrer os pobres, nem prati car o m al .donde
res?lte um bem pois nunca os fins justi ficam os
me10s.
4. Os deveres sociais e obrigações inerentes a
cargo ou pro fissão . pública que st:: exerça, preferem
às obrigações particulares do indi vidio o u familia,
sempre que assim o exige o bem _público .
Quando a pátria recl ama, o soldado tem que ir
à guerra mesmo com detrimento dos seus interesses
ou deveres pessoais ou de familia. O sacerdote e

( 1 ) Act. 5, 29 .

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T R I B U N .<\ L l> A PENITENCIA 8g

o médico têm obriga-çáo de acudir aos doent�s., em


tempo de peste, apesar do perigo de contágio a que
se expõem.
5. As obrigações certas pre forem sempr� as
duvidosas.

6. Os inte r esses da alma preferem se mpre aos·


do corpo.
Assim não se pode negar a Fé para . salvar a
vida ou fugir a pers�guições e maus tratos. Não·
pode o pai mandar o filho à escola que lho per..:
verta, mesmo que do facto lhe resulte um futuro de
miséria. O criado tem de deixar o amo' que· lhe
sej a de ocasião próxi m a de pecado, muito embora·
dai lhe· possam advir prejuizos graves. É · palavra·
de Jesus : c< Que aproveitaria ao homem ganhar o
mundo inteiro, se ao fim viesse a perder a alma· �
Ou que comutação fará o homem para recobrar a
sua alma ? » .C1) Para o homem, o negócio de mais
importância é salvar a alma. Por coisa nenhuma=
poderá pôr- se no perigo de perder tes(.Jiro �amanho.
E não só a respeito de nós m�smos devemos
p referir os bens espiritua is aos temporai s ; de modo
igual h avemos de proceder a respeito do próximo,
interessando- nos mais pelo bem da sua alma do
que pelo seu corpo. Assim manda a caridade bem
ordenada.

7. A vida e a-saú Je geralmente preferem a


qual quer outro bem terreno, como honra, liberdade,
fortuna e educação.
Portanto não é licito expor a vida a perigos
por motivos fúteis e muito menos por vaidade, van­
glória, paixão amorosa ou coisa pareci da. Esta
norma tem as suas excepções : num a guerra justa,
por exemplo, o soldado pode encontrar oca:)iões

(1) Mat. 16, 26:

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O C RIST Ã O N O

em que deve antepor a honra à l iberdade e à pró­


pri a vida.
É licito e até- meritório sacrifi car a vida por
motivos m ai s altos, principalmente quando o exige
o bem comum. Podem, pois, exercer-se profissões
perigosas e arriscadas que são de utilidade pública ;
expor a vida em experi ências ou expedições arris­
cadas de que se esperam resultados úteis à socie­
dade. Sacrificar a vida a bem do próximo, é obra
de sublime caridade, cômo ensinou o Salvador :
«Ninguém tem m aior cari d.ade do que aquele que
dá a vida pelos seus amigos». (1)
Todavia n ão confundamos o que é lfcito ou
mesmo meritório, com o dever. Nos casos, po,r
exemplo, de mol éstia contagiosa não há obri gação
de expor a v ida a favor do próximo a não ·ser por
dever de oficio, do cargo ou de piedade familiai.
Com estes princípios não será difícil, ao menos
na m a iori a dos c asos, saber qual a vontade de Deus
quando s� nos afigura haver conflito de l eis ou
col isão de dev�res. Mas · se, em qual quer caso, não
poderes acertar no que tens a fazer, di fere a acção
se for possfvel, até havere s uma certeza. Se não
ch egares a h avê-Ia, faz o que te parecer mais pro­
vável. E se nem probabili dades vês no ca so, es­
colhe dos pre ceitos o que melhor quiseres. Na
dúviJ a, por exemplo_, se deves ficar a assis·t ir a um
doente ou ir a missa porque é domingo;- caso não
encontr� s r a zões que te tirem_ a dúvida, escolhe o
que mais te a gradar.

(1) Jo. 1 5 , 1 3 .

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CAPÍT ULO VI

O rigem e consequências d o pecado

Uma casa não se arruina de repente, diz


o P. Afonso Rodrigues. Infiltram-se umas
quantas gotas de água nas paredes, hume­
decem os rebocos·, disso! vem a argamassa,_
desunem as junturas ; e um belo di.a tudo se­
esboroa, e vem a terra .
Pois o demónio quando quer levar o·
homem ao pecado, faz trabalho de modo.
parecido ao das gotas de água . Não vai.
logo de entrada convidá-lo a qualquer pe­
cado volumoso, não. Começa pór : pouco :
infi ltra-lhe na alma um pensamento aprazí­
vel, deleitável, que l he cative e prenda a
atenção. E para . o bo.m sucesso da em-·
presa, conta com a ajuda da concupiscên- ·
eia da nossa natureza, e com a fascinação que­
sobre nós exercem as imagens que de fora
nos trazem os sentidos.
Ora, nem a nossa concupiscência ou má
inclinação, nem a imagem ou mau pensa-·
menta que nos s�duz e faz negaças, nem
um a nem outra cóisa juntas, são ainda o
oecado.
·

Enquanto as não consentimos, _ são; s.: ff)­


plesmente
tentações.
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O , . R I ST Á O NO

�uponhamos que repelimos e arredamos


a tentação l ogo que dela demos conta, ou

então, se com el a nos entretemos e nos com­


prazemos, foi só enquanto a não advertimos ;
:suponh amos rnesn10, que a tentação desper­
toú em nós qualquer má impressão que se.n­
timos mas a que não demos consentimento,
· OU que até no sobressalto nos chegou a pare­
cer que consentimos, mas o facto é que não
hou\'e da nossa parte complacência de·libe­
rada . Em todos estes casos houve, sim, ten­
tação, mas não chegou a haver pecado por­
que ou não houve advertência ou não houve
· consentimento l ivre da vontade. E sem um
e outro não há pecado. Podemos portanto
sossegar.
1. lmportância e utilidade das tentações na
:vida espiritual. Todo o homem, al guma vez na
vida sentiu a tentação a agui lhoar. Ser homem é
estar sujeito à tentação. Não estranhes, portanto,
que também a ti .te venha a tentação bater à porta.
A tentação não é de si um mal ; pode ser até
fo n t e de merecimentos e cami nho de p erfeição.
Ser bom q uando se não sente inclinação para o
1n a l � quem quer o pode ser, e portanto pouco vale.
.Mas ser bom, não se a fastar da lei de Deus, quando
os encantos do mal nos vêm seduzir, quando a
tentação nos soli cita, com impeto se deita a nós a
ver se nos arrasta, então, sim, que h á verdadeira
v irtude ou santo esforço. E aos olhos de Deus,
- o be m tem tanto maior valia quanto m aior esforço
custa, ou quanto m ais força (ou virtude) tenhamos
de pôr para o prati car.
Daqui se e::, tá a ver que a tentação que arredamos
e repel ii;nos sem nela consentir, é a cto de virtude,
-é bem que prati camos. Podemos, po is, tt r pvr

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T R 1 B U N A L D A i> E N 1 t· Ê N C I A o3

certo que não é para nosso mal nem sem motivo


que Deus permite a tentação. Resi stindo a ela he­
roicamente, provamos a Deus nossa fidel idade e
constância, praticamos o bem. entesoir"a mos mé­
ritos que Ele há de premiar. _cc�emaventurado o ho­
mem que suporta a tenta ção, porque. depois de­
pravada, receberá a coroa da vida qu·e Deus rem
prometi do aos que O amam » . .(1) , Quanto mais en­
carni çado for o combate, quanto mais esforç9 de-'
mandar, se vencemos, maior é a vitória e maior a.
recompensa.
Neste pensamento nos havemos de consolar
quando, :contra nossa vonta de, a tentação nos.
assaltar. Vem ela, não porque Deus nos abandonou
ou porque lhe tenhamos desagra dado ou .porque
andemos em culpa ; vem simplesmente porque Deus .
a perm ite, para que, vencendo- a nós, .t enha Ele de
que nos recompensar. A . tentação não é prova do
desagrado de Deus ; mas, sim, muitas vezes meio ·
de que Deus se serve para d'l<..:Je nos aproximar e
para mel hor nos assegurar a salvação.
A vida presente é tempo de prova. Nela nos.
havemos de decidir ou por Deus e pel as alegr'ias.
eternas ou pelo mundo e suas eférnt:ras alegrias
pecaminosas . "Bem corno a prata se prova no fogo­
e o oiro no crisol, assim o Senhor prova os cora­
ções>,. (2) Pois a alma é na tentação que se proya.
Se vence, está feita a prova de que ama a Deus e
Lhe é fiel. Quem nunca reve de haver-se com a
tentação, não sofreu ainda a prova de fogo do­
amor de Deus.
E quanto não contribuem as tentações para o­
nosso aproveitamento espiritual ! Quanto ajudam
a bem nos conhecermos ! " Que sabe, quem nunca
foi tentado ? (8)
A 'tentação arraiga-nos a humildade no cora­
ção, com mostrar nossas baixas inclinações e ten­
dências para o que é da terra ; leva-nos a recorrer

( 1) Tiago r, _12. (2) Proo. 17,3. (3) Bel/. 34,n.,

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O C R I S TÃ O N O

a Deus na oração fervorosa e ·frequente, com di­


zer-nos que só d'Ele podemos esperar a salvação ;
ensina-nos a sofrer e diss_imular as faltas do pró­
ximo, andar com mais cuidado e prevenç�o para
vencermos os futuros combates com patentear que
somos t ão somenos ,e tão fracos. A experiência da
tentação é como que tesoiro de sabedoria para a
. alma. «Aquele q�e não t em experiência� pouco
sabe ; mas aquele que se encontrou em muitas
-dificuldades, esse adquiriu mul tiplicada sagaci-
dade» (1) .
Eis alguns dos grandes benefícios que das ten­
tações resultam para a vida espiritua l. Não es­
· queças, porém, que' duas coisas se requerem para
delas colheres os frutos salutares : que não as pro­
voques livianamente e por querer ; e que conve­
nientemente lhes resistas .

2. Co mo n o s havemos de portar na tentação.


Não lhe havemos de dar ocasião sem motivo jus­
t i fi cado. As tentaçõe's d e si mesmo não são pe­
cado ; mas põem- nos . no perigo de pecar. E por
isso faltaríamos à caridade que a nós mesmos
- devemos, se temeràriamente a elas nos expusés·
sem os.
Andamos no meio do mundo e por toda a
parte encontramos per i gos ; mas sem motivo pro­
porcionado à sua gravidade, não nos podemos expor
a eles. Todavia quando há a certeza ou quase cer­
· teza moral de· que as não consentiremos, não de-
· vemos, regra geral, omitir uma acção de si licita
por temor de que com ela nos venha a tentação.
S. Afonso aponta. vários modos de combater
as tentações mais perigosas. Devemos combatê-las:
. a) com um acto positivo de resistência de vontade;
. b) com o recurso a Deus� à Virgem Mari à e aos
Santos, a pedir a sua ajuda ; e) com um acto de
amor de Delis junto ao propósito de antes morrer

(1) Ecll. 3<1, 10.

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TRIBUN A L D A PE N IT ENC1A 95

que pecar ; á) fiaalmente, com distrair o pensa­


mento para outros objectos.
Nem semp re será necessário empregar todos
estes meios. Quando as tentações nascem de acção
necessária ou útil (como exame médico, curativo
feito pelo enfermeiro, e semelhant�s) ,em rigor
basta que lhes não prestemos atenção, a não ser
que já nelas em tais circunstâncias tenhamos con­
sentido, pois nesse caso· temos de nos precaver
usando das cautelas precisas para não tornar a cair.
Há tentações que se vencem fàcilmente com o
desprezo ou com não lhes prestar atenção. «Se­
gundo a doutrina dos mestres de espfrito, com as
tentações o melhor <lue há a fazer, é desprezá- las e
não lhes dar atençao. Ensina a experiência que,
procedendo desta sorte, quase não nos fazem 1 m­
pr : ssão: e dão de rarear � e não é que de tod.o nos
deixam. Se, pelo contrário, · começamos de lhes re­
sistir com viol ência, e lhes damos impor·t ância e
com el as nos . enchemos de medo, afoitam- se, cres­
cem e não· mais nos largam ( 1).

Repetimos : Em si a tentação não é pe­


cado. Mas vem ela e começas de lhe pres­
�ar atenção, e co.m advertência vais até gostar
das representações pecaminosas que te sur­
gem na imaginação ? Começa aqui a culpa,.
pois começas de consentir nos
maus pensamentos ·propriamente ditos.

E o pecado será grave ou leve consoante


é grave ou leve a matéria em que pões
agrado e complacência. Será pecado venial
um pensamento de amor próprio, de vaidade,

(1) LEHEN, Caminho para a pas Interior.

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O CRISTÃO NO

de ambição ; será mortal ·a complacência


voluntária em pensamentos desonestos. To­
davia, não esqueçamos que, para haver
pecado mortal, é preciso que. haja conheci­
mepto perfeito e advertência plena. E por
isso se houve certa' negligência em resistir
aos pensamentos maus, mas sempre se resis­
tiu ; se ao advertir na tentação se titubiou
entre consentir e não consentir, mas seri1pre
se resistiu ; se não houve plena advertência
na gravidade da malícia das coisas que vie­
ram à imaginação, não houve pecado mortal,
porque não houve conhecimento perfeito ou
pleno consentimento.
Um exemplo dará melhor luz às coisas.
Dás com os olhos num inimigo, e sem que
tu o queiras nascem-te no coração pensa­
mentos de ódio e vingança. Até aqui não há
pecado, há tentação ; e por mais que tal
tentação se àemore, se procuras arredá-la e
lhe negas 9 consentimento, não pecaste. Co­
meça de te poisar a atenção com prazer nes­
ses pensamentos ? Começou o pecado. Mas
pode não ser ainda pecado grave. Só há pe­
cado grave quando, com perfeito conheci­
mento e pleno consentimento, te deleitas nos
pensamentos de ódio e de vingança, só então
ofendes
, . gravemente o an1or que deves ao
·

prox1mo.
Está de ver que se com demora te entre­
téns com pensamentos maus, começa de te
nascer no coração. o desejo de os praticar,

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TRIBUNAL D A PE NITÊNCIA 97

pois é natural desejarmos possuir e gozar o


que julgamos um bem embora o seja só na
aparência. E se prestamos o nosso consen­
t.imento chegamos assim ao
111 a u desejo.

O mau desejo tem malícia semelhante à do


acto que se deseja. O desejo de vingança, por
exemplo, tem malícia semelhante à do acto de
vingança, e portanto é pecado contra o -amor
do próximo. Por isso na confissão não basta
dizer « tive maus desej os» , mas deve decla­
rar-se qual foi a matéria do desejo. Também
nos maus desejos, como aliás em tudo, a
culpa varia segundo a maior ou menor deli­
beração da vontade.
Avivado o fogo do mau desejo, pode aca­
bar-se pela resolução de o praticar. Assim
se vai do mau desejo ao
mau pro p6sito.

E o pecado interno termina aqui. Se


, . ' . ,
pomos em pratica o mau propos1to caimos no
pecado •�terno.

. O pecado externo é mais grave 90 que...o


simples pensamento ·ou deseJo, pois supoe
maior vontade e portanto mais malícia. De­
pois, tem_ de ordinário .consequências mais
funestas : por vezes serve de ocasião de pe­
cado ao próximo, enfraquece no pecador a

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O CRISTÃ O NO

sensibilidade
. ....
moral, rouba a delicadeza de
.
consc1enc1 a.
« Meu filho, diz Deus, pecaste ? Não tor­
nes a pecar, mas ora ainda pelas tuas faltas
pa�sadas para que te sejam perdoadas» (1).
Segue este conselho se queres ser feliz. E ai
de ti se o não segues, porque então come­
çará desgraça maior.
Sobreveio uma indisposição corporal e
não se fez caso dela. Com o tempo parece
que p assou ; mas de ordinário lá fica qual­
quer coisa escondida, e ao menor descuido
logo volta a indisposição. Uma recaída, de­
pois outra, e assim se contrai doença cró­
nica be1n difícil de curar. Sucede coisa
p arecida com a alma. Cometeu-se um pe­
cado e não se fez caso ; dali a pouco vem
uma recaída ; a má inclinação cresce, co­
me y a de se r � petir o pecado, e chega-se
assim ao
mau hábito.

E se com deliberação se descam�a no


mau hábito, a inclinação para o pecado
mais cresce, mais se avoluma, e o mau
hábito converte-se em
vicio.

Quando a alma chega até aqui, anda por


caminhos de perdição. E cada pecado que

( r l Eclesl. 2 1 , 1 .

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TRI BUN AL D A PE NITÊNCIA .9Q

comete, é mais um passo para a completa


desgraça, pois começa de se endurecer o
cor.ação. · De princípio · a copsciência repro­
vava o mal, desassossegada e descontente, e
exigia emenda. Desprezada, foi-se calando
e emudeceu, e o senso moral do pecador
por completo se embotou. E se Deus não
acode com graça especial, continuará o des­
P. raçado a pecar até à morte, com riscó d_e
lhe suceder o que a Judas sucedeu. O trai­
dor bem conheceu a malícia do seu crime ;
mas, em vez de se arrepender, caiu em de­
sespero e morreu na desgraça.
Triste consequência e fruto maldito do
primeiro pecado que tão fácil seria ter evi­
tado. Acarretou atrás de si outros e mais
outros, até desgraça tamanha !

«Principiis obsta,
sero medicina p.a ratur,
cum mala per fongas
invaluere moras».
«Resiste ao mal logo de principio, não vá su­
ceder que ele cresça, e, quando vás a dar-lhe r�­
médio, j á seja tarde». Fácilmente conservarás a
alma com saúde ou lhe curarás as doenças, se logo
de principio resistires à tentação. Diz-nos o Sal-
- vador : c<vigilate et orate», «andai atentos e fazei
oração». (1) A penas te acometa a tentação, toma
cuidado e ora. Jaculatória breve, rápido suspiro de
amor de Deus, erguer dos olhos ao céu, tanfas ve­
zes é quanto basta para vencer a tentação. Enco-

( 1 ) Mat. 26, ,, f.

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100 O CRISTÃO N O

menda-te à Virgem e ao Anjo da guarda, faz o sinal


da cruz, e não entre contigo o desânimo ; se a ten­
taç ão persistir teimosa, redobra de oração. Se
assim te houveres, das tentações colherás vitória e
méritos abundantes para o céu. ''Bem-aventurado
o homem que suporta a tentação, porque. depois
de provado, receberá a coroa da vida que Deus
prometeu aos que o amam>>. (1)
·

«Resiste logo de principio !» Não dês o pri­


mei:� passo no caminho_,do mal. Foge dos pec�dos
vema1s, e procura que seJam sempre menos as faltas
quotidianas filhas . da fragilidade humana. O pe­
cado, por mais leve que seja, é para Deus ofensa ta­
manha como nem podes calcul ar, pois é feia ingra­
tidão para com sua bondade infinita.
Maria Teresa, esposa de Luís XIV, rei de
França, tinha uma consciência muito delicada.
Acontecendo-lhe certa vez cometer qualquer pe­
quena falta, foi tal sua tristeza e dor, que nada a
pod�a consolar. Not01;1 ·lhe alguém que n�o havia
motivo para tanto7 f. 01s quando multo _ teria come­
tido uma falta vema . Ao que ela respondeu :
- Ofendi a Deus, e com isso abri, em minha
alma, ferida imensa e grave.
Coragem, cristão ! Procura amar muito a Deus,
e embala a alma mais nesse amor do que no temor,
e ser-lhe-ás assim fiel em tudo. Diz S . Basilio: «quem
serve a Deus como filho amoroso e não como es­
cravo, �sse se !l tirá pejo de (!) ofender até nas mais
pequenmas c01sas».
Mais : Quem se acostuma a não fazer caso das
faltas leves, expõe- se a perder muitas graças que
Deus lhe concederia se outro fosse o seu porte.
Recordemos muitas vezes a sentença do Senhor :
«Oxalá tu foras frio ou quente ! Mas porque és
morno, e nem és frio nem és quente, começar-te-ei
a vomitar da minha boca». (t) Como quem diz :
um pecado . puxa outro, e os pecados veniais come-

(1) 1/ago, 1, 12. (2) Apocal. 3, 15-16.

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T R I B U N A L D A P E N I T Ê N C IA I_OI

tidos deliberadamente levam pouco a pouco ao pe­


cado mortal.
«Resiste ao pecado logo no principio». Sê fiel
no pouco. Todos os pecados, mesmo os . confes­
sados e perdoados, nos deixam sujeitos à pena
temporal que havemos de pagar aqui ou no Pur­
gatório cconde as dores são tão acerbas que não
sofrem comparação com as mais terriveis desta
vida». (I)
«Resiste logo de princípio !» Evita com cuidado
o primeiro pecado mortal. É muito mais fácil evi­
tar o primeiro, do que não cair no segundo. Mais
fàcilmente vive em castidade quem sempre foi
casto, do que quem já uma vez provou os prazeres
da carne. Resiste, pois, com energia e denodo à
primeira tentação, seja ela de gue espécie for.
Mas, se por desgraça, caiste nalgum pecado
mortal, não lfie acrescentes outro nem esperes que
a ferida seja antiga para lhe aplicares o remédio,
porque dela pode resultar grave doença para a tua
alma. Não te deixes atundar até ao mau hábito
que depois só muito a custo vencerias.
ccSero medicina paratur». É tarde para aplicar
o remédio, j á não produzirá efeito ? Pode ser que
te e!l contres em tal est 3;do que digas : ccreco!1heço
a mmha desgraça e queria ser' :melhor, mas nao se­
rei capaz. Desejari a deixar o pecado, sair d a misé­
ria em que ando, mas falta-me força, falta-me a
coragem para quebrar as cadeias que me prendem».
Nunca fales deste· modo. Não desesperes da
cura, por mais antiga e grave que seja a doença
que te mina a alma. · Os médicos do corpo por ve­
zes. vencidos, têm de desenganar o doente e con­
fes s ar : j á nada posso fazer. O Médico das almas,
esse é omnipotente e pode não só curar doentes
mas até ressuscitar mortos. Aproveita, pois, os re­
médios que Ele preparou e a Igreja põe ao teu dispor.

(1) s: AGOST�NHO, S. TOMÁS, S. FRANCISCO DE


SALES.

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102 O C R ISTÃO NO

Entrega-te à oração, prostra-te aos pés do con­


fessor abre-lhe com sinceridade a consciência e
pede- Íhe que te ajude. Confessa-te com frequência
e quanto possível com . o mesmo sacerdote. Assim
o confessor te conhecerá melhor, e melhor te po­
derá ajudar. Começa desde j á a combater os maus
hábitos ; quanto mais tarde o fizeres, mais di ficul­
dades irás encontrar.
«Devemos ter bem conta, diz S. Agostinho, em
que a misericórdia de Deus suporta-nos enquanto
não ultrapassamos um certo número de pecados.
Mas, completo o número2 deixa Deus cair a espada
da sua justi ça». Se desde j á não segues os conse­
lhos e ins p irações da graça, Deus ir-te á abando­
nando m ais e mais a ti mesmo. Não te negará, é
certo, as graças ordinárias, mas não te dará as
extraordinárias de que precisas para sair do pe­
p�cado. «Não tardes, pois, em converter-te ao Se­
nhor, e não defiras de dia para .dia a conversão ;
porque virá de improviso · a sua ira, e no tempo da
·v ingança te perderá». (I)

(1) Eclesl. ; , 8-9.

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DOS PECA DOS EM PARTICULAR

Tratamos até aqui do elemento psicológico do


pecado, ou seja daquilo que da parte do homem se
requer para haver pecado : conliecimento do mal e
livre consentimento . Passamos agora à exposição
do outro elemento do pecado, que é a transgressão
da lei de Deus.
Qual é a Lei de Deus ?
Quando se transgride ?
Vamos responder a estas duas perguntas, estu­
dando :
1 . Os Dez mandamentos da Lei de Deus, e
suas posstveis transgressões.
2. Algumas · espécies d� 1;ecado.s, particular­
mente os sete pecados _c aptta1s, assim chamados
por serem fontes e raiz de muitos outros.
3. Alguns preceitos da Igreja.
Nunca será por demais lembrar que o pecado
depende em primeiro lugar da consciência de cada
um. O homem será. julgado pela sua própria cons­
ciência, isto é, segundo o juízo que fez da morali­
dade dos seus actos quando os praticava. Se alguém
estava persuadido que com tal ou qual acção ape­
nas cometia um pecado venial, de facto só pecaria
venialmente se a praticasse, embora com ela trans­
gredisse um preceito grave ; e se a julgasse lfcita
não cometeria pecado algum, · fosse qual fosse o
preceito transgredido. E ao contrário, cometeria.
pecado grave se transgredisse um preceito leve,
1ulgando que era grave.
·

Todas as vezes que neste tratado se disser que


tal ou qual acção é pecado grave, deve entender-se·
simplesmente que com ela se transgride a Lei de
Deus em maténa grave.

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.,.�,,.
'-.:
'· o� gr�d e mandamento ?
Qual perguntou
o doutor da lei ao Divino Salvador. E Jesus
respondeu :
«Amarás ao Senhor teu Deus, de todo o·
teu coração, de toda a tua alma e de todo o
teu entendimento. Este é o maior e primeiro
mandamento. E o segundo é semelhante a
este : amarás ao teu próximo como a ti
mesmo. Destes dois mandamentos depende
toda a Lei e os Profetas» . (1)
t�Nestes dois mandamentos da carida�e se
compendia, pois, toda a Lei cristã, neles se
encerram os Dez M�ndamentos que Deus
promulgou para o seu povo, no cimo do
Sinai. Os três primeiros reforem-se à .honra
de Deus e ensinam os deveres que temos
para com Ele. Os outros sete referem-se a
nós mesmos e ao próximo, desta forma : o
quarto ensina-nos os deveres para com os
representantes de . Deus (pais, superiores e
-parentes), o quinto defende a vida do pró­
ximo e a nossa, o sexto e nono a inocência
nossa e do próximo, o. sétimo e décimo a

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TR1 BUN AL DA PE N1TÊN C1A 105 .

propriedade, e o oitavo a honra do próximo


e a confiança mútua entre os homens.

Primeiro mandamento
«Adorar a Deus.. e amá-lo sobre todas as
coisas» . Ou, na fórmula que Deus ditou a
Moisés : «Além de mim não terás outros
deuses, nem esculpirás qualquer imagem
para a adorar» .
Com este mandamento : a) Deus proibe
adorar outros �euses e prêstar-lhes o culto
só" a Ele devido ; b) e manda que O honre­
mos com as homenagens que lhe são devi­
das. São obrigações que nos impõe o pri­
meiro mandamento, a Fé, a Esperança, a
Caridade e a Oração.

1. Da Fé
Que é Fé sobrenatural ? Fé sobrenatural
é o firme assentimento que, com a ajuda da
graça, se presta a tudo o que Deús revelou
e a Igreja ensina.
A Fé supõe, portanto : a) Da parte de
Deus, a sua graça ; b) a da parte do homem,
firme assentimento às verdades por Deus re­
veladas e que a Igreja ensina.
A Fé não se funda em qualquer argu­
�ento 6u rac�ocínio . da razão human_a ...e que
a mesma razao se imponha com ev1 denc1a ;

funda-se na autoridade de Deus que' tudo

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IOÓ O CRISTÃO N O

sabe (é omnisciente) e não se engana (é infa­


lível). Por isso crer não é compreender ; é
aceitar, ter como certo e verdadeiro tudo o
que Deus ensina. Se a inteligência humana,
tão reduzida, tão acanhada, j á não atinge
nem compreende tantas das verdades n atu·
rais, como havia ela de compreender as ver·
dades sobrenaturais de si tão sublimes, tão
altas e tamanhas ? ccA fé, diz o Apóstolo,
é a substância das coisas que se devem
esperar, o argumento das coisas que não
aparecem » . (1)
Desta forma, a fé é um acto :::n o ral ou
uma livre determinação da vontade humana.
Não se alcança nem pelo estudo nem pelas
pesquisas do engenho humano, mas pelo
esforço da vontade auxiliada pela graça di­
vina, E nisto está · seu mérito. Se com·
preendêssemos as verdades sobrenaturais,
não nos ficaria a liberdade de as aceitar 0u
n ão ; impunham-se à nossa inteligência ne­
cessàriamente, e acreditar nelas deixaria de
ser um acto meritório . Quanto menos com·
preensíveis são as verdades reveladas por
Deus, tanta maior sujeição do entendimento
a Deus ehis exigem, maior. a virtude em
crer nelas, e portanto maior o prémio da
Fé. «Abraão creu a Deus, e isto lhe foi im·
p utado a 1ustiça>> . (2)
Daqui se vê que para ter Fé ou para a

(r) Hebr. 1 1 , 1 . (2) Rom. 4,3.

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TRIBUNAL DA PENITÊNCIA 1 07

ela chegar, não basta o estudo das verdades


reveladas por Deus, embora tal estudo, feito
com recta intenção e no desejo de conhecer
a verdade, possa ajudar a que chegue a ela
aquele que a nã� tem, ou a que · a escJareça
e firme aquel e que j á a possui-. Para se ter
Fé exige-se, sim :
1 0 da parte do homem um coração hu­

milde, um coração puro e desejoso de ver-:.


dade e de Deus. Não esqueçamos as pala­
vras . de Jesus : « Graças te dou, Pai e Senhor
do céu e da terra, pórque escondeste estas
coisas aos sábios e entendidos e as revelaste
aos pequeninos » ;. (1) ·
2 . 0 da parte de :Deus, a sua graça, pois
a Fé é obra divina : cc·Ninguém pode vir
a mi·m , se o Pai que me enviou, o não trou-
xer» . (2)
·

Que devemos crer, ou q uais são as verdadas por


Deus revaladas · a que a I greja ensina ?

1.º As verdades que Deus revelou e a


Igreja . ensina, como dogmas ou artigos da
Jte. Este ensino s'o lene da Igrej a é feito
pelos concílios gerais ou pessoalmente pelo
Papa. Fazem-no os concílios gerais, pre­
sididos pelo Papa ou seus · representantes,
quando ensinat!l ou definem que determi­
nada verdade é do depósito da Fé e por-

(1) Mat. r r, 23. (2) }o. 6, 44.

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108 O CRISTÃO NO

tanto deve ser acreditada por todos os fiéis.


Fá-lo o Papa quando com a assistência par­
ticular do Espírito Santo ensina ou define
doutrina de fé ou de costumes, como Su­
premo Pastor e Mestre d� Igreja, em vir­
tude da sua suprema autoridade apostólica,
e com intenção de obri g ar a toda a Igreja a
crer a verdade que ensma.
Quem deliberadamente nega qualquer
verdade assim definida ou ensinada pela
Igreja, ou dela duvida sabendo que é dogma
de fé, por esse mesmo facto naufragou na
Fé e cometeu pecado grave de heresia.
Quando a Igreja nos diz que esta ou aquela
verdade é dogma de fé, é Deus quem fala
pela sua boca, pois que lhe assiste o Espí­
rito Santo. Ora Deus que é verdade infalí­
vel, não se engana nem pode enganar. Por­
·tanto deve crer-se, sem a menor sombra de
dúvida voluntária, tudo o que a Igreja nos
propõe para crer como dogma.. Se a Igreja
pudesse enganar-se ou enganar UrJ?.a vez,
também outra vez poderia enganar. ; e então
como se duvidava de uma verdade por ela
ensinada, de todas :;is demais se poderia du­
vidar.
Todavia, não haja confusão, podem sur­
gir-nos no espírito dúvidas involuntárias
acerca das verdades da Fé apesar de nelas
crermos firmemente. Quando assim suceda,
a nossa obrigação é não consentir em tais
dúvidas e continuar a viver com a Igreja,
respeitando todas as suas decisões e nada

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T R I B U N A L D A P E N I T Ê N C:. I A

fazendo contra os seus ensinamentos. Se as


dúvidas aumentam, será bem opormos-lhes
maior frequência dos Sacramentos e actos
externos do culto, para assim como que mos­
trar à nossa consciência o desgosto que nos
causam semelhantes tentações.
2. Há outras v�rdades que podemos
chamar verdade!; católicas, que, se bem não
são de fé, pois nem constam claramente da
Sagrada . Escritura ou da tradição dogmática
nem a Igreja solenemente as definiu, todavia
pormo-las em dúvida seria verdadeira teme­
ridade, dado o apreço em que a Igreja as
tem. Rejeitá-las, sem fundamento sólido,
não é pecado de heresia ; mas seria culpável
temeridade e reprovável orgulho querer ante­
por assim o juizo próprio ao sentir da Igreja
universal.
3. O Papa, além do ensino solene que
dá a todos os fiéis q uando define as verda­
des da fé, outro ensmo lhes ministra quer
por meio das Congregações Romanas quer
directamente por suas cartas Encíclicas ou
pelos chamados Syllabus.
a) Os decretos promulgados pelas Con­
aregações Romanas com a aprovação do
flapa, ainda que versem matéria de fé ou de
costumes, n_ão são infalíveis, e portanto não
exigem de nós a Fé incondicionada que exi­
gem as. definições do�máticas.
Não exigem de nos a fé interna ; e visto

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1 10 O C R 1 S .T Á O N O
�������

estarem sujeitos a erro, podemos examinar


os seus fundamentos. Com tal estudo, os
teólogos irão profundando, escl arecendo .e
determinando melhor a doutrina neles ver­
sada, de modo a mostrarem ou que é erró­
neà e portanto se deve rejeitar, ou então que
é de. facto verdade que se pode ensinar como
verdade católica ou até chegar a ser definida
pela Igrej a como dogma.
Todavia este ensino, se não exige de nós
a fé interna, exige que a ele nos sujeitemos,
e uniformizemos o nosso juizo particular
com o da autoridade eclesiástica enquanto
não se demonstrar que tais decisões são
erróneas.
b) C hamam · se Syllabus duas listas ou
índices de erros que, em matéria de religião
ou lntimamente ligada com a Religião e a
Igreja, se propagaram desde os meaJos do
século XIX.
O primeiro Syllabus publicou-o Pio L'X
em 8 de Dezembro de 1 864 e consta de
oitenta proposições a reprovar e condenar
outros tantos erros. Foi dirigido a todos os
Bispos do orbe como rnonitória . da Santa Sé.
Quem sustentasse os erros nele reprova­
dos, tornar-se-ia réu de pecaminosa desobe­
diência contra o supremo magistério da Igreja.
E nos casos em que o erro condenado con­
tradiz o dogma, a desobediência seria tam­
bém pecado contra a Fé : ou de heresia pró­
priamente dita, ou pelo menos de pecaminosa
temeridade contra a mesma Fé ..

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TR1B U N A L DA P E N1TÊNC1A 111

O segundo Syllabus promulgou-o em 5


de Julho de 1 907 a Sagrada Congregação
do Santo Oficio com expressa aprovação de
Pio X. Nele se condenam ,s essenta e cinco
proposições quase todas elas opostas ao
dogma e subversivas do cristianismo e da
Igreja. Como decreto de uma Consre gação
Romana, não pertence ao ma s istério infalí­
vel da Igreja ; é, sim, lei dtsciplt"nar em
matéria de fé, e por isso todos os católicos
lhe devem obediência interna e externa. Mas
no que respeita aos erros j á outras vezes
condenados p�lo magistério infalível da Igreja, .
os católicos além de obediência, devem tam­
bém prestar-lhe fé ; e quem assim não fizesse,
tornava-se réu de verdadeira heresia. (1)
4 . Há ainda as opiniºões teológicas so­
bre as quais a Escritura e tradição nada di­
zem expllcitamente e a Igreja nada resolveu,
deixando aos teólogos liberdade ·de ensina­
rem o que melhor lhes parecer.
Quando sobre qualquer assunto da reli­
gião os teólogos se dividem em opiniões di­
versas ou escolas, podem os fiéis seguir a
opinião que lhes parecer melhor fundada,
contanto que estejam sempre prontos a crer
tudo o que a Igreja crê, e a abandonar a sua
opinião se a Igreja vier a ensinar o contrário.
Sobre a liberdade nas opiniões· teológi­
cas; é de ver o que sucedeu com a doutrina

(1) HENIER, Nooo Syllabus de Pio X.

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I I2 O C RI S T Ã O N O

da Imaculada Conceição. Os teólogos de


maior vulto durante séculos sustentaram
opiniões diferentes : defendiam uns que Maria
fora concebida sem pec ? � º original, suste3-
tavam outros o contrario. . Era questao
aberta� pois a Igreja nada definira, e ass_im
não eram réus de heresia nem os que es­
tavam por uma opinião , nem os que esta­
vam pe] a outra ; nem mesmo eram fautores
da heresia porque todos eles tinham vontade
firme de crer tudo o que Deus ensina pela
sua Igreja.
Em 1 854 a Imaculada Conceição de Ma­
ria foi solenemente definida como dogma de
Fé, e desde então terminaram as questões· e
toaos os católicos ficaram obrigados a acei­
tar a ·doutrina definida.
Quando não sabemos se determinada
proposição é dogma de Fé, simples doutrina
da Igreja ou opinião teológica, e nos vem ao
espírito qualquer dúvida, o melhor é dizer­
mos connosco : « Seja como fof, eu creio
tudo o que crê a santa Igreja » . E isto o 'que
de mais razoáve 1, em tais circunstâncias,
podemos fazer, pois a Igreja no que respeita
à Fé e aos costumes, nem se engana nem
·pode enganar· nos, assistida como é pelo
divino Espírito Santo : ccEis que eu estou
convosco todos os dias até à consumação
dos século� )) ; (1) o cc Consolador, que é o
Espírito Santo a quem o Pai enviará em

(1) Mat. 28,20

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 TÊ N C 1 A 11 3

meu nome, Ele vos ensinará todas as coisas


e vos fará lembrar tudo o que vos tenho

dito » . (1 ) Assim falou o Salvador.


Com razão, pois, se afirmou desde os
primeiros séculos cristãos . que as definições
da Igreja são palavra de Deus. Que nunca
o tentador te engane. Se te vier com dúvi­
das, responde-lhe com a sentença do Após­
tolo : «A Igreja de Deus vivo é -coluna e firma­
mento da verdade » ; (2) ensina-nos · não pala­
vras mentirosas de homens, mas as verdades
eternas, imutáveis e infalíveis do mesmo Deus.
S. Vicente de Paula, combatido por vio­
lentas e furiosas· tentações contra. a Fé, es­
creveu o C redo em folha de papel que meteu
ao seio, e com o Senhor fez este pacto :
uMeu Deus, sempre que contra o peito aper­
tar este pedaço de papel, intendo renovar
expressamente a minha Fé em todas as ver•
d ades da Igreja católica» . E quando as dú-·
vidas o vinham apoquentar' punha a mão no
peito e logo a tentação se esvaía.
Se fores tentado contra a Fé, faz de modo
parecido. Não que te seja preciso escrever
qualquer coisa num papel ; mas diz, ao me­
nos com o coração : « Creio tudo quanto crê
a santa Igreja Católica» .
Confissão pública da Fé.
Circunstâncias há em que temos obriga-

(1) Jo. 14,26. (2) Tim. 3,15.

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II4 O CRISTÃO NO

ção de publicamente confessar a nossa Fé.


Não poderia o Salvador reconhecer por seus
aqueles que, embora trouxessem no coração
sua doutrina, publicamente dissessem como
Pedro : «Não O conheço» . Sentença sua é :
«Todo'' aquele que me confessar diante dos
homens, também eu o confessarei diante de
meu Pai que está nos céus ; e o que me
negar diante dos homens, também eu o nega­
rei diante de meu Pai que está nos céus » . (1)
E quando urge a obrigação de publica­
mente confessar a Fé ? A propósito cumpre
notar :
1. Nunca é lícito negar, de palavra ou
por acções, a Fé católica, ou proceder como
se seguíssemos outra religião.
Por isso não podemos · pronunciar palavra
ou praticar acção que . leve a quem nos vê
ou ouve, a pensar que somos protestantes,
judeus ou sequazes de qualquer outra reli­
gião. Assim não pode o católico casar-se
com pessoa não-católica, assistir a -cerimó­
nias e pregações de outra religião desde que
de tal facto se pudesse concluir que seguia
essa tal religião. M_as com isto não se nos
proíbe assistir uma vez por outra a tais c�­
rimónias por curiosidade ou tomar parte nas
orações p articulares de não-católicos, con­
tanto que nessas orações se não usem fór­
mulas heréticas .

(1) Mat. 10, 32-33.

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TR1B U N AL D A PEN 1TÊNC1A 115

T arribérn por motivos razoáveis, como


amizade, parentesco, cortesia, é permitido
assistir a funções públicas e solenes de outras
confissões, acompanhar seus funerais, assis­
tir a seus baptizados e casamentos.
2. Nem sempre h á obri s ação de fazer
profissão pública da Fé católica.
Podemos dissimul ar ou ocultar a nossa
Fé quando de a manifestarmos resultariam
disputas inúteis, blasfêmias ou irreverências
às coisas santas. Em tais circunstâncias é
caso para se lembrar a pa] a vra de Jesus :
«Não deis aos cães as coisas santas, nem
aos animais imundos as vossas pérolas» . (1)
Por vezes é ocultando a nossa Fé que
maior glória daremos a Deus e maior bem
faremos às almas. Ao tempo das persegui­
ções, l á nos primeiros séculos da Igreja, µJUÍ­
tos cristãos contentavam-se com adorar Jesus·
Cristo a ocultas. De modo semelhante po-
<lerás fazer se homens sem crenças ou que
não tenham direito a interrogar-te, te vierem·
perguntar pe]a tua Fé. Podes em boa cons-·
ciência replicar-lhes : «A ·s i que lhe importa
isso ?» ; ou responder-lhe de outra qualquer
forma semelhante.
Se o facto de te mostrares católico, te
acarretasse incómodo grave ou prejuízo
grande, poderias até disfarçar as tuas cren­
ças comendo carne em dia de abstinência ou

(1) Mat. 71fü

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u6 O CRISTÁO NO

dispensando-te de qualquer outro preceito


meramente eclesiástico, pois os preceitos da
Igreja não obrigam com incómodo grave.
Mas cumpre fixar bem, nunca é permitido
dissimular a Fé quando a honra de Deus ou
o proveito do próximo exigem a sua confis­
são (can. 1 32 5 § 1 ).
E a honra qe b eus exige que confesses
a Fé sempre que sobre ela a autoridad€ le­
gítima te interrogar. Quando assim suceda,
a tua resposta tem de se. r : « Sim, sou cató­
lico » . Exige ainda a honra de Deus que com
tuas obras confesses a Fé todas as vezes que
ímpios ou sequazes de outra religião, por
ódio e desprezo ao catolicismo, procurem le­
var-te a transgredir os seus preceitos ; e que
também com tuas palavras, se tens ciência
para tanto, defendas as tuas crenças quando
ei.n tua presença contra elas se pronunciarem
frases depreciativas ou bl asfemas.
O proveito espiritual do próximo exige a
confissão pública da Fé quando a dissimµla­
ção ou o silêncio pudesse fazer vacilar na
Fé aos católicos ou encorajar nos seus erros
os que andam afastados da Igreja. Em ca­
sos assim a caridade obriga-nos a darmos
testemunho público da nossa crença .

Da i nstrução rel i g i osa.

Estão obrigados a assistir às pregações


todos os fiéis
a) que não têm os conheci1nentos reli-

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TRI B U N A L D A PE NIT ÊNCIA n7
...

giosos suficientes e indispensáveis a todos


os cristãos ;
b) ou que precisam de conhecimentos
mais profundos e completos porque vivem
entre pessoas de õutra religião ou entre pes­
soas que pelos seus �onselhos e maus exem­
plos arrastam ao mal.
Segundo os teólogos ensinam, todos os
cristãos devem saber :
a) o Credo, ou seja, os artigos da Fé
que nele estão compendiados ;
b) os Dez mandamentos �a Lei de Deus
e os Cinco mandamentos da Igreja. Viver
cristãmente é praticar a Lei de Deus e da
Igreja . . Pa� a a prat� car, é preciso conhecê-la.
Todavia nao se exige que se conheçam os
mandamentos em todas as suas particulari­
dades ; basta que se saibam as obrigações
que eles impõem ;
_e) o Padre-nosso ou a oração que Jesus
ensmou ;
d) o que são os sacramentos do baptismo,
eucaristia e confissão ou Penitência e as con­
dições necessárias para bem se receberem.
Todo o cristão está obrigado a con�ecer
estas verdades, ao menos de um modo ge­
nérico e substancial. E de um modo mais
completo e circunstanciado as devem · conhe­
cer. · aqueles que pelo seu cargo, posição so­
ci a l , etc., precisam de instrução religiosa
mais desenvolvida. Ao clérigo, por exemplo,
exige-se mais do que ao leigo, mais às pes­
soas de saber do ·que aos analfabetos.

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I I8 O CRISTÃO NO

Quem não possui a instrução religiosa


possível e conforme ao seu estado, tem ri­
gorosa obrigação de se instruir, o que pode
fazer assistindo à catequese, à pregação,
lendo livros e outros escritos religiosos.
Aos fiéis nestas circunstâncias o assistir à
pregação pode ser �m dever grave, se não
têm outros meios de se instruir ..
Também para os fiéis que vivem entre
ímpios ou acatólicos o assisti� às pregações
pode ser um estrito dever. E bem certo o
ditado ccdiz-me com quem andas, dir-te-ei
quem és » , pois o convívio assen1elha as
pessoas umas às outras e fàcilmente as uni­
formiza na maneira de pensar e proceder.
Por isso quem vive por necessidade
, . ,. em per-
- . '
manente conv1v10 com 1mp10s e nao-cato-
licos, se não procura na · - pregação estímulo
e vigor para a sua Fé, pouco a pouco se
lhe podem ir esmorecendo as crenças ou de
todo se lhe apagarem. Quantos se teriam
perdido na descrença e impiedad€, se a voz
do sacerdote, representante de Deus, a tempo
os não advertisse e chamasse ao cumprimento
do dever !
Pode ainda haver obrigação de assistir à
pregação, quando o não assistir fosse de es­
cândalo para os demais 'fiéis, o que fàcil­
mente aconteceria nas povoações pequenas.
S . Tomás de Aquino deixou esta sen­
tença que já quinze séculos · antes dele o
grande filósofo Aristóteles entrevira : « O sa­
ber das coisas do céu, por mais reduzido que

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TRIBUNAL D A PE NITÊNCIA n9

ele seja, vale mais e mais nos dignifica do


que a alta sabedoria das coisas da terra» .
Na pregação �prende o homem o que rnais
lhe importa saber. O conhecimento das
coisas da terra aproveita e muito para a
vida, m as não chega para nos assegurar a
felicidade eterna.
Procura, pois, ó cristão, estudar e saber
cada vez melhor as verdades divinas. ·Não
sejas descuidoso e negligente no que res­
peita à tua salvação, se queres viver contente
e morrer em paz. Se em ti houver o desejo
de bem conhecer a Deus, podes estar certo
de que anda por bons caminhos a tua alma.

Da p ro i bição eclesiástica dos l ivros.


Pois que se trata aqui da instrução religiosa
que os bons livros nos podem ministrar, não será
descabido alguma coisa dizer t ambém sobre o pe­
rigo das más leituras.
De Jesus recebeu a Igreja o sacerdócio, o apos­
tolado e a pastoreação. Para bem . desempenhar
este ministério tem ela de velar pela pureza da Fé
e da moral cristã e de ajudar os fiéis a vencer to­
dos os perigos nos caminhos da salvação.
Ora esta verdade palpa-se : os jornais e livros
maus põem em perigo a Fé e moral cristã. A ex­
periência ai está a clamar que a leitura de livros.
e periódicos perversos e imorais, quase sempre é
fatal para seus leitores. Desperta-lhes no coração
as dúvidas contra: a Fé ; enregela· lhes na alma o
amor da religiãoi da graça divina, da Igreja ; enti­
bia-os e desmaze a-os no cumprimento dos manda­
mentos de Deus, abre-lhes . o caminho da incredu­
lidade e da:· apogtasia. Assim se fecha t antas vezes
o coração dos fiéis à virtude e à moral católica.

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120 O CRISTÃO NO

Ouçamos Senestrey, bispo de Ratisbona, em


pastoral � ubli cada em 1 899 sobre a má imprensa e
os maus livros :
É do Apóstolo S. Paulo a recomendação : «Não
vos deixeis enganar : as ruins conversações cor­
ropem os bons costumes. ( 1)
«Se ao tempo de S. Paulo o mundo estivesse
inundado, à maneira de hoje, ,de maus livros e maus
jornais, como não trovejari a o Apóstolo contra
eles ? Não é de menos perigo o trato e conver­
sação com o s maus livros e j ornais do que com os
homens perversos a quem o Apóstol.o chamou cor­
rutores. A leitura é um convívio intimo entre leitor
e livro._ Se o livro é mau, o leitor sem dar por isso
vai-se imbuindo dos princípios subversivos que o
l ivro lhe propina, e com eles se lhe vai corrom­
pendo a alma e o coração.
«Com toda a razão se pode afirmar que as
má.s leituras são a ruína dos oons costumes.
«Donde nasce a incredulidade, e donde vêm as
dúvidas sobre as verdades mais fundamentais da
religião que de tantos se . vão .apoderando, inclusive
dos mesmos doutos ? Qual o motivo por que tantos
se entregam aos prazeres sensuais q_ue lhes arruinam
a alma e o corpo ? Porque se vai entibiando por
tantas partes a vida religiosa, e" até mesmo no povo
das aldeias j á se vai resfriando o amor à Igreja e
a confiança no clero ? Não cometeremos injustiça,
se atribuirmos a maioria destes tristes factos aos
maus livros e maus jornais.
«Não vos deixeis enganar. As m ás leituras cor­
rompem os costumes. E esta minha advertência
não vai só para os simples e ignorantes ; vai para
todos, seja gual for sua condição e estado. E notai
que não é simples conselho que vos dou, é rigoroso
dever de consciência que vos lembro.
«São réus de pecado não só os que compõem,
imprimem e propagam os maus escritos, mas todos

(1) I Cor. 1 5 .33.

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T RI B U N A L D A P E N IT Ê N C l A UI

os que sem justo motivo os lêem e conservam em


seu poder».
Ora sendo assim as coisas, a Igreja não pode
ficar indiferente perante elas e tem de lembrar aos
fiéis quais os livros e demais escritos que põem
em p erigo a sua Fé e a moral e portanto a sua sal­
vaçao, e de lhes proibir a· sua leitura. Desde sem­
pre a Igreja que é mestra da verdade, se insurgiu
contra o erro e a mentira que entravam o desen­
volver da religião ; e porque também lhe deixou
Deus o dever de pastorear os fiéis, empregou todos
os meios sobrenaturais e naturais ao seu dispor
para imunizar os fiéis contra o mesmo erro e
mentira.
E por isso desde os .velhos tempos condenou
os escritos contrários à Fé e à moral. Já ao tempo
de S. Paulo, quando o Apóstolo pregou o evangelho
em Éfeso na Ásia Menor, «muitos dos que tinham
seguido as artes vãs trouxeram juntos os seus livros
e os queimaram diante de todos». (1) E depois
sempre a Igreja considerou próprio da sua missão
de ensino e pastoreação, . levantar a voz contra li­
vros e escritos que tinham dentro o veneno do erro,
a acautelar os fiéis, não fossem .eles perverter-lhes
a alma e roubar-lhes a Fé . É do Código do Direito
Canônico, ultimamente promulgado, a actual legis­
lação sobre o assunto (can. 1 395-1405).
Há livros cuja leitura é proibida por lei geral
da Igreja e outros por decreto esp·e cial.
A - Por lei geral são proibidos no cânone 1 399
do Direito Canônico :
1 As edições do texto original e das antigas
-:-

traduções católicas da Sagrada Escritura, mesmo


da Igreja oriental, feitas por acatólicos ; e também
todas as traduções da mesma, em qualquer . lthgua,
feitas ou editadas por eles. '
A leitura destes livros, quando a versão for fiel

(t) Act. 19, 19.

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122 O CRISTÃO NO

e integra, e nas introduções ou notas se não im­


pugnem os dogmas católicos, é permitida aos que
se dão a estudos teológicos ou bfblicos (can. 1400) .
2 - São proibidos também, embora feitos e
editados por católicos, os comentários da S. Es­
critura que não têm aprovação eclesiástica ;
3 ....::.. Os livros de qualquer escritor que defendam
a heresia ou scisma7 ou procurem subverter, de qual­
quer modo, os functamentos da religião ;
4 - Os livros que propÓsitadamente atacam a
Fé e os bons costumes ;
5 - Os livros de qualquer acatólico que trate,
ex professo, de religião ; salvo se constar que nada
se contém neles contrário à religião católica ;
6 - Os livros e escritos sem aprovação ecle­
siástica que co�tam aparições, revelações, visões,
profecias, milagres, ou introduzem novas devoções
mesmo sob pretexto de que são particulares, se
forem publicados contra o prescrito nos cânoQes ;
7 � Os livros ou escritos que impugnam ou
escarnecem alguns . dos dogmas católicos, defen­
dem erros condenado.s pela Santa Sé, detraem do
culto divino, procuram subverter a disciplina ecle­
siástica, o estado clerical ou r�ligioso ;
·

8 .....,.. Os livros que ensinam ou recomendam


qualguer géner.o de superstição, adivinhação, ma­
gia, invocação dos espíritos e outras coisas seme­
lhantes ;
g - Os livros qua procl amam licito o duelo, o
suictdio ou o divórcio, os aue, tratando das seitas
maçónicas ou outras do mesmo género, afirmam
que são úteis e não perniciosas à Igreja e· socie­
dade civil ;
1 o - Os livros que tratam, narram ou ensinam
coisas lascivas e obscenas ex professo ;
11 - As edições dos livros litúrgicos, apro­
vados pela Santa Sé, em que haj a qualquer ,mu­
dança de modo que não concordem com as edições
autênticas, aprovadas pela Santa Sé ;

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TRI B UN AL D A PE N ITÊ NCI A 123

12 - Os livros. em. que se divulgam indulgen­


cias apócrifas, ou proscritas, ou revogadas pela
Sé Apostólica.
B Os livros proibidos por decreto especial
-

encontram-se, por ordem alfabética segundo o


nome do autor, no <clndice dos livros proibidos»,
que a Santa Sé periódicamente reedita.
·

Havendo causa razoável, o Santo Oficio ou a


Nunciatura concedem licença para ler livros proi­
bi dos, excel? tuando sempre os que tratam ex pro­
fesso de coisas obscenas.

II. Da Esperança

Esperança cristã é a firma confiança de


que Deus, em atenção aos méritos de Jesus
Cristo, nos dará tudo o que prometeu, ou
seja a felicidade eterna e os meios de a alcan­
çar, desde que da nossa parte façamos o
que pudermos para os merecer.
.
Três elementos entram na esperança cristã:
1 0
• A confiança de que Deus nos dará a
felicidade eterna e os meios de a alcançar :
a graça divina, o perdão dos pecados, e os
bens temporais enquanto necessários à vida
ou meios de conseguir o céu.
2 .º As promessas de Deus em atenção
aos méritos de Jesus Cristo. Neles se firma
a esperança. Sendo Deus como é, omnipo­
tente, bom e fiel , não falta ao que prometeu.
3.0 A nossa cooperação com a graça,
pois dela fez Deus depender suas promessas.

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O CR1STÁO N· o

Peca-se contra a esperança cristã :


1 .0 não esperando de Deus o que Ele
:p rometeu ou não o esperando firmell?-ente
(desesperação e desconfiança) ;
2 .Q não juntando à esperança a coope­
raçáo que Deus de nós exige (presunção e
temeridade).
D esesperação e desconfiança.

Não esperar a salvação e os meios ne­


cessários para a conseguir, mas ficar-se a
pensar com advertência e reflexão que «por
muitos e graves, os nossos pecados j á não
têm perdão » , é pecado grave de desesperação.
Não consentir plenamente nos pensamen­
tos de desesperação, mas deixar-se possuir
do desânimo e desalento" nas coisas tempo­
rais ou espirituais por excessivo temor de
9ue Deus � esgostado de nós. n �� nos_ ajudará,
e desconfiança que de ord1narro nao passa
de pecado venial. Tal se.r ia desejar a morte
por qual 9 uer futilidade ou contratempo.
Na duvida se pecaste mortal ou venial­
mente contra a esperança, examina se, por
desconfiar de_ Deus, deixaste de praticar o
bem, ou se, apesar · de todos os pensamentos
contra a esperança, continuaste a fazer o bem
que podias e a receber os sacramentos.
Neste último caso, podes estar certo que não
pecaste gravemente.
Não peca contra a esperança quem teme
perder-se por causa dos pecados cometidos

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TRI BUN AL D A PE N ITÊNC1 A 1 25

ou porque tem medo de neles recair e mor­


rer impenitente. A isto não se chama des­
confiar de Deus, mas sim , desconfiar de si
mesmo. Empreguemos os meios necessários
e conducentes à nossa santificação, e de Deus
esperemos o resto, . pois Ele não nos faltará.
Também não é pecado contra a espe­
rança desejar a morte para depressa &ozar­
mos de Deus, o sumo Bem, para fugirmos
a uma desgraça temporal ou espiritual, para
não cairmos· em faltas graves, . para nós ver­
mos livres de doença dolorosa. Todavia é
sempre melhor conformarmo-nos em tudo
com a vontade de Deus . .

Temeridade e presunçla.

Perseverar de propósito no pecado . mor­


tal até à morte e ao mesmo tempo esperar
da misericórdia de Deus a salvação, é pe­
cado grave de presunção e t.emeridade .
E também é pecado de presunção e temeri­
dade continuar a pecar porque . Deus é mise­
ricordioso e prometeu perdão.
Mas pecar por fra � ilidade ou paixão, e
pensar, logo, que se .ha de confessar e obter
perdão, não é pecar por temeridade. Mais
claro : a paixão ou mau hábito levam-te a
cometer um pe'cado ; enquanto o praticas,
lembras-te que depois o confessarás ou que
pouco importa confossar um pecado a mais
ou a menos. Pecas, mas não contra a espe­
rança, muito embora estas reflexões te te-

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1 26 O CRISTÁO NO

nham afoitado na culpa. Por presunção só


se peca quando a misericórdia de Deus é o
motivo decisivo e verdadeiro do pecado, o
que raras vezes sucede .
Expor-se alguém voluntàriamente a qual­
quer perigo para a alma ou para o corpo,
na esperança de que Deus o livrará, não é
ter esperança em Deus, ,é tentá-lo. h por­
tanto confiança pecaminosa.
«Põe a tua confiança em Deus, e Ele te sus­
tentará». (1) «Não andeis cuidadosos em dem asia
da vossa vida perguntando o que h aveis de comer,
nem do vosso corpo perguntando o que h aveis de
vestir. Não é m ais a vida do que a comida e o
corpo rião é mais que o vestido ? Não vos a fÍijais,
pois, dizendo : que comeremos ou que beberemos
ou com que nos cobriremos, porquanto o vosso
P ai sabe que tendes necessidade de todas estas
coisas». (:�)
Assim, fala a Verdade eterna. Confia em Deus,
nele espera ainda nas mais graves aflições. Espera
em Deus não só nas coisas temporais mas também
nas espirituais. Se por desgraça cometeste:: qual­
quer pecado grave) não desesperes nem desconfies
de Deus. A sua misericórdia é infinita.
«A malícia dos homens em comparação com a
bondade de Deus, diz S. João Crisóstomo, é gota
de água ao pé do mar o ceano». Judas, traindo e
entregando o Mestre à morte, cometeu pecado de
bradar ao céu ; todavia, observa S. Jerónimo, maior
pecado foi desesperar da misericórdia divina.
Mas que também não confies em demasia, nem
te deixes levar pela presunção de que te hás de
salvar sem merecimentos. Não acrescentes pecado

(1) Salmo 54, 2,s. (2) Mat. 6,25 e 31-32.

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TR1 BU N AL D A PE N1TÊNC IA 127

a pecado, nem digas «depois me confessarei,,, por­


que pode suceder que te venha a faltar o tempo.
Não aeixes a conversão para mais tarde. E se estás
em graça, lembra-te sempre que és fraco. « Quem
estâ em pé, veja não caia·», adverte S. Paulo. _(1)

m. Da Caridade

Caridade é amar a Deus e de tod o o co­


ração se lhe entregar por ser Ele o sumo
Bem, e procurar agradar-lhe cumprindo seus
mandamentos .
Por dois motivos podemos amar uma
pessoa : ou porque ela é boa e tem quali­
dades que a tornam amável (amor puro e
desinteressado, caridade perfeita), ou porque
dela esperamos algum benefício (amor inte­
resseiro, caridade imperfeita).
Podemos amar a Deus, entregando-nos
inteiramente a Ele, porque é a mesma bon­
dade, é toda a b�leza, reune ·e m si todas as
perfeições, é o sumo e melhor Bem, infini­
tamente amável . Nesse caso a nossa cari­
dade é perfeita (amor desinteressado).
Podemos amar a Deus sobre todas as
coisas porque é Ele a suma Bondade que
nos cumula de benefícios . Também neste
caso a nossa caridade é perfeita, porque
amamos a Deus por causa da sua excelsa
bonda�e, amamo-lo por si mesmo e não por

(1) 1 Cor. w, 1 3.

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O CRI S TÃ O N O

causa de nós. «Amai ao Senhor, diz S. João,


porque Deus vos amou primeiro» . (1)
Podemos finalmente amar a Deus porque
dele esperamos todos. os bens, inclusive o céu.
Amá-lo assim, é amá-lo por interesse ; não
por ser Ele quem é, mas pelos benefícios
que dele esperamos. Tal amor, embora so­
brenatural, não é perfeito nem desinteressado.

Pecados contra o amor de Deus.

Em geral peca-se contra o amor de Deus


sempre que falta a devida submissão ao
Criador ; e por isso todo e qualquer pecado,
seja qual for a sua natureza, é pecado contra
o amor de Deus.
De modo mais particul ar são pecados
contra o amor de Deus : o excessivo apego
às criaturas, como por exemplo à$ riquezas ;
a indiferença ou repugnância de Deus ou das
coisas santas ; a preguiça no cumprimento
dos deveres religiosos ; a aversão a Deus e
às suas ordens paternais ou o ódio e desprezo
de Deus.
O orgulho, a cubiça, a preguiça, a in­
temperança e a avareza também são pecados
contra o amor de Deus. A intemperança,
quando prejudica a saúde, é ainda. pecado
contra o quinto mandamento por se opor ao
amor que a nós mesmos devemos ; e ta.m-

(1) Jo. 4,r9.

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TRIBUNAL D A PENITÊNCIA 129

bém é pecado contra o quinto mandamento


e opõe-se ao amor devido ao próximo, a
avareza.

Não se exige a todos os cristãos o mesmo �rau


de amor de Deus ou perfeição. A maior perfc1çã_o
está obrigado o sacerdote e o religioso do que o
simples leigo secular. Maior perfeição na castidade
se exige no solteiro do que no casado. A quem
recebeu maiores graças, mais virtude se exip;e. To­
davia para todos é a máxima : evita o mal e pra­
tica o bem. Se fugires de todo o pecado voluntário,
ao menos do pecado mortal, e orares a Deus c·o m
frequência e fervori terás cumprido, no essencial, o
preceito do amor de Deus.
R eza com frequência os actos das três virtudes
teologais Fé, Esperança e Caridade - sobretudo
de Caridade. Não é que sej a obrigação estrita re­
-

zá-los todos ?S dia_s, porque n_a oraç�oi no sinal da


...

Cruz, n a ass1stenc1a aos ofic1os religiosos, na re­


cepção dos sacramentos, vão implfcitos os actos de
Fé, Esperança e Caridade, causa e motivo desses
exercícios religiosos. Mas os mestres de espírito
recomendam que não nos contentemos com os
actos implícitos destas virtudes e que explicita­
mente os façamos com frequência.
E não esqueças pedir a Deus te conceda a
graça de uma Fé vivíssima, de uma firme Esperança
e de uma Caridade ardente. Quanto mais radicadas
forem as tuas obras na Fé, mais vivificadas pela
Esperança e mais inflamadas de amor de Deus,
maior arrependimento sentirás pelos pecados co­
metidos, com m aior facilidade evitarás as recaídas
na culpa, e mais te unirás a Deus, teu último fim,
o Bem eterno.
«A fé, diz S. Agostinho, lança os alicerces à
casa de Deus, a esperança levanta as paredes, e a
caridade dá-lhe o último remate».

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130 O CRISTÃO NO

IV Da oração
Orar é levantar o pensamento a Deus,
para o louvar, p ara lhe agradecer os bene­
fícios recebidos, e para lhe pedir socorro
nas necessidades.
Um dia S . Francisco de Sales pôs-se a
explicar a umas crianças qual a essência da
oração e as alegrias que. nela podemos en­
contr � r ; e com muita g� aç � i a co?tando a
maneira como nossos primeiros pais no pa·
raíso se entretinham a conversar com Deus,
Pai amorosíssimo. E eis se não quando,
uma das crianças exclamou :
- Que pena agora não ser assim ! Que
gos to não havia de eu ter em falar com
Deus e andar na sua companhia !
Comoveu-se o santo bispo com tão cân­
dida e dolorosa exclamação, e respondeu :
- Consola-te, filho, o pecado tirou-nos o
paraíso, é certo ; mas n ão nos tirou a Deus .
Ele está connosco em toda a parte, .e sempre
podemos conversar com Ele na oração.
Podemos conversar com Deus na oração,
como um filho conversa com seu pai, e «tal
conversa, diz a Escritura, não tem nada de
amargo nem de fastidioso ; mas é toda de
alegria e consolação. Por aqui se vê como
é agradável e fácil a oração.
Temos obri gaçlo de o rar ?
Sim, a falar genericamente ternos obri­
gação rigorosa de orar, e por três motivos :

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N C 1 A. · 131

1 . 0 Orar é dever que temos para com


Deus. Somos criaturas suas, e portanto é
nosso dever louvá-lo e adorá-lo na terra
como os anjos O louvan1 e adoram no céu
e corno O louyou Jesus Cristo durante sua
vida mortal . E dever nosso agradecer-lhe os
contínuos benefícios que nos faz, conforme
lembra a Igreja no prefácio da missa : «Ver­
dadeiramente é digno, justo, e salutar que
Vos demos graças sempre e em toda a
parte, ó Senhor Santo, Pai Omnipotente>> .
2 .0 Orar é dever que temos para connosco.
Sem a graça de Deus não podemos nem co­
meçar nem prpsseguir nem acabar a mí­
nima coisa. « E Deus quem opera em vós,
a seu beneplácito, o querer e o operar» , diz

S . Paulo. · ( 1 ) Só com a ajuda de Deus po­


deremos conseguir o nosso último fim que
é a bem-aventurança eterna.
Ora, de ordinário, Deus dá a sua graça
e seus auxí Iios a quem lhos pede e com eles
coopera : «Pedi e dar�se-vos-á, diz o Sal­
vador ; . buscai e achareis ; batei e abrir-se­
-vos-á. Porque todo aquele que pede, re­
cebe ; aquele que busca, acha ; e ao que
bate, abrir-se-lhe-á. (2)
Portanto quem não quer perder-se, tem
de necessàriarnente orar.
S. João Crisóstomo, a gravar no espírito

( 1 ) F/l. 2,d. (2) Luc. 1 1, g-1 0 .

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O CRISTÃ O NO

dos seus ouvintes a necessidade da oração,


dizia-l hes :
« Retiras o peixe da água e dali a pouco
está morto. Retira-te ou afasta-te da ora­
ção, e a tua alma vai morrer para Deus e
para a graça. Para que o peixe viva, pre­
cisa de estar na água ; para que a tua alma
viva em .g raça, precisa de andar em oração.
Se o p e i x e tivesse Fé e razão, havia de com­
preender que tinha o dever rigoroso de não
sair da água para não perder a vida ; o cris­
tão tem o dever rigoroso de não deixar a
oração para não perder neste mundo a vida
da graça e depois a vida da eterna bem-aven­
turança )> . Sublimes palavras bem dignas de
serem meditadas por quem foi criado para
a eternidade .
Além de . ser ineio de alcançar graças es­
pirituais e temporais, a oração é de si uma
obra boa, e portanto obra meritória. A ora­
ção bem feita aumenta em nós a graça san­
tificante, e portanto acrescenta a glória fu­
tura. E é daquel as obras das quais dizia o
Apóstolo : « Cada qual receberá recompensa
particular, em proporção com o seu tra­
balho » . ( 1 ) Tem a oração, além disso, vir­
tude satisfatória. Podemos com ela satisfa­
zer à justiça divina pelos pecados cometidos
e expiar as penas temporais por eles ·mere­
cidas . E até com a oração alcançamos o

( 1) l Cor. 3,8.

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TR1 BUN A L D A PENITÊNC1A 133

perdão dos pecados veniais, se a fazemos


corn espírit9 de penitência.
3 .0 Orar é ainda um dever para com o
próximo. Filhos do Pai celeste, como todos
somos, e portanto irmãos, pertencemos to­
dos à grande família dos filhos de Deus.
E por isso justo é e natural, que dirij amos
nossas preces ao céu a pedir para nossos
irmãos graças e misericórdia. A caridade
cristã obriga-nos · a rezar por todos os vivos
e defuntos, sobretudo pelos mais necessita­
dos e pelos que são das nossas obrigações.
«Orai uns pelos outros, para serdes salvos »,
diz S . Tiago. (1)
Quando devemos orar ?
S. Afon �o ensina que temos obrigação
de orar :
1 . quando caímos em culpa grave ;
2 . quando nos encontramos em perigo
de morte ;
3 . quando a tentação nos assalta, vio­
lenta, a arrastar-_nos a pecado grave.
Os teólogos afirmam comumente que· pe­
caria gravemente quem não rezasse durante
um ou dois meses ; e que seria pecado ve­
nial deixar passar um dia inteiro sem rezar.
Daqui podemos concluir que não é pe­
(.Jdo omitir, um ou outro dia, as orações da

(1) Tiog 5 1 1 6.

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O CRISTÃO NO

manhã e da noite e as orações da refeição.


Portanto se alguma vez, por cansaço, por
falta de tempo ou por outro qualquer mo­
tivo, não fizeste as tuas orações, não fiques
inquieto, porque não cometeste com isso pe·
cado algum. Se as deixasses só por pre­
guiça, então sim que haveria pecado vep.ial.
Não há preceito algum que nos obrigue
a rezar precisamente pela manhã e à noite
e às horas da refeição, mas não te julgues
por isso desobrigado de rezar todos os dias
com fervor e deligência. Assim o exige a
salvação da tua alma. A omissão das tuas
rezas, -frequente e sem motivo, seria pelo
menos sinal de tibieza e preguiça espiritual.
As rezas da mesa e das Ave-Marias, ao
toque do sino, são exercícios de piedade que
todo o bom cristão pratica. As rezas da
mesa são tão antigas como o cristianismo,
pois as consagrou o Salv�dor e os Apó�­
tolos com o seu exemplo. Jesus não se
sentava à mesa sem prestar homenagens a
D.e us seu Pai como dador de tod9s os
bens. (1) Do mesmo modo fizeram os Após­
tolos. (2)
A reza das Ave-Marias remonta a tem­
pos muito an�igos. O toque dos sinos, três
vezes ao dia, recorda-nos a incarnação do
Verbo divino e lembra-nos que l he devemos
agradecer benefício de tão infinito amor.

( 1) Mat. 26,2í e jo. 6, r 1. (2) Act. :?j,35.

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T R 1 B u N AL ·n A pE N1TÊN e1 A 135

É certo que não há obrigação de obser­


var estas práticas piedosas, mas o desejo
ardente da Igreja deve bastar para sempre
praticares tão santo costume. Não as deixes
nunca sem motivo ; mas, se o houver e as
omitires, também não fiques por isso com
escrúpulos.
Há circunstâncias em que seria difícil
rezar às Ave-Marias sem reparo. Estás, por
exemplo, de conversa com pessoa de certa
po"sição social. Interromperes a conversa
para rezar, podia ser tomado à conta de
descortesia. Estás de conversa com ímpios
e ignorantes. Poderiam sublinhar a tua reza
com escárneos e sarcasmos. Em casos assim,
contentar-te-ás com levantar o espírito a Deus
numa rápida lembrança que é já uma oração.
As rezas que impõem certas confrarias e
Ordens Terceiras não obrigam sob pecado,
e portanto não há culpa quando se omitem.

Como se deve ... orar ?

Com fervor e devoção. Evita quanto


puderes as distracções voluntárias e as posi­
ções irreverentes, quer rezes em público quer
em particular. Evita-as sobretudo quando
assistes à missa ou às rezas que se fazem
na igreja e em .família. As distracções volun­
tárias deminuem o merecimento da oração.
As distracções involuntárias, essas so­
framo�las com humildade, pois em nada di­
minuem o fr úto e merecimentos da oração.

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136 O C R I S TÃ O N O

Diz S . Francisco de Sales : « Se na oração


não fizéssemos m ais que re. pelir as distrac­
ções e tentações, j á com isso teríamos feito
boa oração, pois Nosso Senhor compravse
com a nossa boa vontade » . E S . Agostinho
por seu lado assegura que « a dor sincera
de não podermos orar con1 atenção e de­
voção, é já de si devoção » .
Portanto nunca deixemos as nossas re­
zas por motivo das distracções involuntárias.
A oração que se faz enquanto se trabalha
ou durante qualquer jornada, é verdade que
não pode ser uma oração perfeita ; mas vale
m ais a oração imperfeita do que não orar.
Ajudar-te-á muito a evitar as distracções,
preparares-te para a oração invocando o di­
vino Espírito Santo. « Antes da oração pre­
para a tua a lma ; e não sejas como o homem
que tenta a Deus )) . (1) Podes, por exemplo,
começar a oração pelo «Deus in adjutorium»,
ou, 1nais simplesmente, com jaculatória como
esta : « Senhor meu e Deus meu, ensinai-me
a orar» .
Devemos orar com humildade . cc A ora­
ção do que se humilha, penetrará os céus )> . (2)
Devemos orar com con fiança . Vinha al­
guén1 ao Divino Salvador a pedir auxí lio, e
perguntava logo Ele : <� Crês que posso fazer
o que me pedes ? Tens confiança ? » E só
depois de haver a re's posta <l Sin1, Senhor,

(1) Eclesl. 18,23 (2) Eclesl. 35 121.

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T R-1 B U N A L D A P E N I T Ê N C 1 A 1 37

nós cremos e confiamos » , só então despa­


chava as suas preces .
Faça.mos nossas orações em nome · de
Jesus. cc Se ·vós pedirdes a meu Pai alguma
coisa em meu nome, Ele vo-Ia há de dar » . (1)
Rezemos em comum, quanto possível.
A oração feita em comum é mais agradável
a Deus. « Onde estiverem dois ou três reu­
nidos em meu nome, aí estou eu no meio
deles » . (2) Procura tomar parte nas · ora­
ções que se fazem em comum, sobretudo nas
que se fazem na igreja.
Devemos orar, quanto possível , em es­
tado de graça. Se estás e m graça, és mais
filhó de Deus, és membro de Jesus Cristo,
e desta forma tua oração terá maior valor.
.
«Se vós permanecerdes em mim e as minhas
palavras permanecerem em vós, pedireis
tudo o que quiserdes e ser-vos-á feito» . (5)
Portanto, para que tua oração plenamente
a.grade a Deus e seja mais meritória para · ti,
ora em estado de graça.
A oração feita em pecado n1ortal , embora
com ela possamos obter graças para nós e
para o próximo, sobretudo a graça da con­
versão, não vale para o céu porque n ão
aumenta a graça santificante à qual corres­
ponde a glória. Se cometeste qualquer falta
grave, antes de orar põe-te em estado de graça
por n1eio de um acto de contrição perfeita.

(1) Jo. 16,23. (2) Mat. 18120. (3) Jo. 1 5,7.

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1 38 O CRISTÃ O NO

Finalmente, devemos orar com perseve­


rança e resignados na vontade de Deus.
Devemos deixar a Deus a escolha do tempo
e do modo como nos há de ouvir. Não quei­
ramos investigar os segredos da sua Provi­
dência. Podemos ter a certeza de que Ele
não quer senão o nosso bem. Só no céu
chegaremos a compreenàer a admirável sa­
bedoria e amor com que nos conduz através
desta vida miserável, e os tesoiros de bon­
dade e de misericórdia ocultos em cada uma
das suas insondáveis disposições. Por agora
basta-te saber que todas as tuas orações por
Ele são ouvidas.
Propõe nunca omitir as reias da manhã e da
noite. Se as muitas ocupações e canseiras da vida
te não deixam tempo para longas rezas faz ao me­
nos uma breve oração. Por mais atare fada que seja
a tua vida, sempre encontrarás uns minutos para
levantar o espfnto a Deus em breve e rápida ora­
ção. Acostuma-te a fazer à noite actos de contri­
ção e verdadeiro arrependimento de teus pecados,
sobretudo se te pesa n a consciência qualquer pe­
cado mortal, porque nesse caso ser-te-ia mais útil
e necessário o acto de contrição perfeita do que as
rezas costumadas.
Faltar um dia às tuas orações pode ser o pri­
meiro passo para uma vida de tibieza e indiferença.
Deixar, uma só vez que seja, de as fazer com exacti­
dão e diligência, poderá bastar para .depois as deixa­
res muitas vezes. Lembra-te sempre de que quanto
mais orares com fervor e piedade com maior segu­
rança chegarás à santidade. c<To d os os condenados
se perderam, diz S. Afonso de Ligório, porque não
oraram. Se tivessem orado não se teriam conde­
nado. E, pelo contrário, to dos os santos consegui­
ram a santidade por meio da oração».

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T R l B U N A L D A P E N 1T Ê NC 1 A t 39-'

Da superstiç�o

Crer que certas criaturas ou ritos têm!


poderes superiores à sua n atureza, e pres-·
tar-lhes honras ou respeitos só a Deus de-­
vidos, é pecado de superstição.
Com a superstição atribuem-se, pois, às.
criaturas, perfeições ou poderes que só ª'
Deus competem, como a omnipotência, sa­
bedoria, omnisciência, e se lhes tributam1
homenagens de respeito, adoração e con­
fiança só a Deus devidas. Quanto tais.
crenças e práticas sejam contrárias à Fé e a.
• A
razao, quem quer o ve.
De três modos se pode pecar por su­
perstição : atribuindo perfeições como que·
divinas às coisas naturais (superstição na­
tural), aos espíritos maus (superstição pre­
ternatural ou demoníaca), e a certos objectos.
religiosos e determinadas circunstâncias por­
ocasião das nossas rezas e exercícios de pie­
dade (superstição· sobrenatural ou religiosa) ..

1. Da superstiçlo natural

Comete-se pecado de superstição natural'


quando se atribuem às criaturas visíveis, per­
feições que só a Deus convêm, supondo-as.
com um poder que não têm nem por sua
natureza nem pelas orações da Igreja.
A superstição natural toma vários no...
mes. Quando . pelas coisas naturais se pre­
tende adivinhar o futuro, chamá-se

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O CRISTÃO NO

Impossível seria enumerar


A d i v i n h ação .
todas as crenças e práticas eivadas de su·
perstiç�o divinatória. Algumas, para exem­
. Plo : E superstição acreditar que certos nú­
meros, certos encontros fortuitos, certos dias,
·trazem felecidade ou desgraça fatalmente ;
é superstição querer ler o futuro ou as coi­
sas ocultas na conjunção dos astros, nos
sonhos, nas l inhas das mãos, nas sortes das
.cartas e noutras coisas semelhantes.
É evidente que não há relação ou pro­
porção entre todas estas coisas e o futuro
que se pretende desvendar ; e se al guma
vez as predições saíram certas, foi por
mero acaso.
Todavia não confundamos as coisas. Há
fenómenos que se conjungam e relacionam ;
.. e a ciência pode descobrir as suas relaçõ�s,
e portanto prever certos acontecimentos.
Assim ., por exemplo : Não é superstição o
·uso da chamada « varinha mágica » para
. descobrir veios de água ou filões de metal,
porque parece haver, de facto, certa conexão
natural. entre o meio empregado e o conhe·
. cimento que se quer obter. Pelo mesmo
motivo não é superstição calcular as varia-
ções do tempo pelos fenómenos naturais qo
sol , vento, nuvens, porte de certos ani­
n1ais, etc. l\tlas desde que se ultrapassam
-os limites das relações naturais, há supers·
·t ição. .

Quando se procura produzir efeitos ex­


·.traordinários ou miraculosos por n1eios pu-

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TRIB U N AL D A PE N I T ÊNCI A 14 1

ramente naturais, comete-se o pecado de ·


superstição chamado

Magi à Também aqui não há proporção·


entre o poder dos opjectos e os efeitos que·
deles se esperam. E magia atribuir efeitos .
maravilhosos a objectos como amuletos,,
unguentos mágicos, talismãs, fisgas e seme­
lhantes ; atribuir curas a certas mezinhas .
ou remédios secretos, usar as chamadas .
«curas simpáticas » , etc.
Se os efeitos extraordinários que se pro-­
curam , são no intuito de prejudicar o pró-­
ximo, então a magia não só ofende o pri- ·
meiro mandamento como também ofende o·
quinto mandamento, e nesse caso chama-se ·
malificio. Também se ofende a caridade,.
e o pecado pode ir até pecado mortal de ·
má suspeita, quando pelo trato de certos­
objectos se procura saber qualquer coisa:
acerca do proceder do próximo.
Em todos estes casos é manifesta a des­
proporção entre os meios naturais que se·
usam e os efeitos prodigiosos que se pre­
teudem . Os objectos não têm o poder ma-·
ravilhoso que se lhes atribuem, pois não lho­
deu nem a natureza nem a Igreja nem Deus.
que se não pode prestar a tão néscias pre- ·
t_e nsões. E por isso as maravilhas que se ·
lhes atribuem, não passam de mera fantasia,.
a não ser ·que as quisésse1nos pôr à conta.
de intervenção diabolica.

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O CRISTÃO NO

Não se devem todavia confundir com a


· magia os jogos mais ou menos maravilhosos
de prestidigitação que têm sua explicaç�o
natural na agilidade, destreza e habilidade
- dos prestidigitadores . Nem é magia empre­
gar certos remédios que a experiência provou
-darem bom resultado, embora a ciência não
saiba explicar o porquê. A ciência ainda não
. desvendou todos os segredos da natureza, e
por isso podem existir remédios naturais de
. efeitos surpreendentes, mas até agora inex­
plicados. Tais remédios podem usar-se sem
. escrúpulo ; mas antes de os usar é preciso
. arredar toda a aparência de superstição.
O mesmo se diga, do uso da sugestão
. como meio de cura. E um facto confirmado
pela · experiência que na cura de certas en­
fermidades têm grande poder a imaginação
do doente e a sua confiança no médico, fe.
.· nómeno que assim apreendido em geral, fà.
cilmente se explica embora se não conheça
o seu desenvolver. O corpo enfermo · (já o
dissemos) pode exercer influência extraordi­
nária sobre o espírito até não lhe deix2!'
força para nada ; pois também um espírito
-cheio de energias pode exercer influxo ben­
fazejo e reconstituinte sobre um corpo �n­
fermo. Já nos provérbios se diz : « Ü animo
alegre faz a idade florida ; o espírito triste
-seca os ossos » . (1)

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N (.. 1 A 143

Quando o médico obtém a confiança do


doente e lhe dá esperança de cura, o espí­
rito reage e torna-se um prestimoso coope­
rador da medicina. Por isso também é lí­
cito usar este tratamento, desde que não
misturemos com ele crenças supersticiosas.
Também é lícito no tratar estas doenças
empregar a oração e os sacramentais, desde
que se não espere deles mais resultado do
que aquele que lhe co�responde. Seria su­
perstição acreditar que o fruto da oração
depende do _número de palavras e cruzes,
de determinada posição durante a prece ; e
superstição seria ainda considerar os sacra­
mentais como meios ocultos, misteriosos e
mágicos. O mesmo se diga de certas ora­
ções cc irresistíveis» ou de efeito infalível, por
vezes ridículas e ofensivas da religião.
Magnet ismo e hi pnotismo

. Os fenómenos ditos de magnetismo e


hipnotismo têm uma explicação natural .
Embora alguns escapem ainda à s investi­
gações d a ciência, para outros, em grande
parte, j á se encontrou explicação. Querer,
porém, obter do magnetismo efeitos que
transcedem as forças da natureza, seria su­
perstição . E por isso no caso deve haver
cautela, pois às vezes os que se entregam ao
exercício da hipnose, servem-se de expedien­
tes que são charlatanismo e superstição, com
os quais enganam os incautos e inexperientes.
Questão mais delicada é saber em que

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1 14 O CRISTÁO NO

condições serão lícitas as experiências hipnó­


ticas,.
E sabido que durante o sono hipnótico a
pessoa hipnotizada fica mais ou menos sem
liberdade e à mercê da vontade do hipnoti­
zador: Pôr alguém em semelhante estado
como que de roubo da vontade, é imoral
sempre q ue não haja ,ponderosos motivos
que justifiquem. Podem ser motivos justi­
ficativos as indagações científicas ou a cura
que fosse difícil de obter por outros pro­
cessos . E, mesmo nestes casos, a hipnoti­
zação não é lícita quando o doente a não
queira . E quando a consinta, preciso se
torna tornar as necessárias providências para
evitar abusos do hipnotizador e qualquer
dano físico ou moral da pessoa hipnotizada.
Seria um crime induzir un1a pessoa d_u­
rante o sono hipnótico a perpetrar qualquer
acção imoral ou criminosa. Quando se re­
corre ao hipnotismo como meio de cura, há
de se usat de toda a prudência e cautela
para que não venham danos donde se espe­
rava a cura.

2. Da superst i ção diab61 i ca.

Pior que a superstição natural é a su­


perstição diabólica ; e consiste el a na invo­
cação tácita ou expressa do demónio, quer
seja para dele saber coisas futuras e ocultas
quer para obter outros efeitos extraordiná­
rios e maravilhosos.

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TRI BUNAL D A PE NITÊN CIA 145

A superstição diabólica anda muitas ve­


zes conjunta com a superstição natural, prin­
cipalmente com a magia. A gente supersti­
ciosa, porque foram ineficazes os processos
da magia n atural, socorre-se dos espíritos
maus para deles . haver as maravilhas que
desejam a proveito seu (magia negra) ou
a detrimento alheio (malefício).
Trata-se evidentemente de uma pretensão
insensata, pois os espíritos maus só por si
nada podem fazer que ultrapasse os limites
da ordem natural das coisas. De mais, se
é certo, segundo a doutrina católica, que
tàcita ou expressamente invocados, os de"­
rnónios podem, se Deus o permite, exercer
qualquer influência nas coisas deste mundo,
seria pueriel e ridículo acreditar que Deus os
deixasse à disposição de quem se lembre
de os charnar. E suposto mesmo que assim
fosse de verdade, como não são nem omni­
potentes nem omniscientes, os demónios não
poderiam desvendar futuros nem operar mi­
lagre$. Este poder reservou-o Deus para si.
Os espíritos maus dependem inteiramente
de Deus, tanto no que sabem corno no que
fazem ; e nada podem sem sua permissão.
Ora Deus não lhes há de permitir que ul­
trapassem os limites que sua Providência
um dia lhes pôs . E portanto é irracional
!!lvocá-los com fins de adivinhação ou ma­
gia, ou seja para indagar futuros ou obter
maravilhas:

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O CRISTÃO NO

Do espiritismo

Sob o nome de espiritismo caem as tentativas


feitas pelos homens, para se relacionarem com os
es p íritos a fim de saberem deles coisas ocultas
prmcipalmente o que vai l á pelo outro mundo.
E ·neste ponto há que distinguir entre os factos
que se contam de aparições e revelações, e o sis­
tema e5pirita considerado em si mesmo.
Quanto aos factos espiritistas há que notar :
1 . Os medz"uns (as pessoas que lidam com os
espfritos e deles recebem as respostas) muitas ve­
zes têm sido apanhados em fraude. Donde se pode
concluir que por vezes as sessões de espiritismo
não passam de charlatanice armada para enganar
incautos.
2. Todavi a nem tudo é fraude nas sessões es­
piritistas, afirmam pessoas sabedoras e conscien­
ciosas que a elas têm assistido. Há. de facto ali
«aparições», «revelações» e coisas parecidas.
Como explicar tais fenómenos r
Se não · todos, pelo menos na sua maior parte
explicam-se nacuralmente : são efeito de forÇas
nervosas ainda m al estudadas e mal conhecidas,
manifestações do subconsciente, de sugestão hipnó­
.t ica, etc. E assim se compreende que os «mediuns u
por vezes acertem nas respostas que dão.
Com dizer que, na sua maioria pelo menos, os
fenómenos espiritistas têm causas naturais, não
se vai negar em absoluto que neles alguma vez pu­
dessem de facto intervir os espíritos. E no caso
de ser assim verdade, teríamos de afirmar que tais
espfritos que neles intervêm, são os espíritos maus,
pois seria fazer injúria grave a Deus acreditar que
tivesse Ele deixado os anjos ou as almas justas, su­
jeitas aos caprichos dos homens para fins nem sem­
pre morais. E tanto m a i s assim podemos pensar
quanto é certo que Deus por vezes tem permitido
aos espíritos maus intervirem nas coisas do mundo,
e que espíritos como são, têm conhecimentos mais
vastos que o homem.

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T RI B U N A L D A P E N I T Ê N C I A

Deste modo se explicaria o acerto de algumas


Jas respostas havidas nas sessões espiritistas em
que pudessem intervir. E se por vezes até anun­
ciam o bem, bem pode S atanás disfarçar-se em
anjo de luz.
Que pensar de quem toma parce em sessões
espiritistas ?
Embora os fenómenos espiritistas, em todo ou
em parte, sejam produzidos por forças meramente
naturais, é proibido neles tomar parte, porque :
1. não se exclui a possibi hdade de neles in­
tervirem os espíritos maus ;
2. nas práticas espiritistas há danos graves ou
perip;o de dano para a saúde de quem assiste ;
3. a Sagrada Congregação do Santo Oficio,
por decreto de 27 de Abn 1 de 1 907 declarou ser
ilfcito assistir a tais conversas ou manifestações
espiri tistas, quer nelas se empregasse o medium
ou o hipnotismo quer não, e fosse qual fosse o pre­
texto ou o fim para que �e provocassem tais con­
versas.
Das m esas de pé de galo ou mesas falantes

Também parecem simplesmente naturais os fe­


nó,menos, na aparência extraordinários, que se rea­
lizam com as mesas de pé-de- galo. Mas, pô- l as a
girar, a bater com os pés a responder a perguntas
que se lhes fazem, não é licito todas as vezes que
cais coisas se praticam para fins espiritistas ou com
intenção supersticiosa.

3. Da superst i ção rel i g i osa ou sobrenatural

Também con1 as práticas do culto cris­


tão se mistura às vezes a superstição. E de
duas maneiras isto acontece :
1. Atribuindo a certas cccircunstâncias

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148 O CRISTÃO NO

externas » o efeito da oração e demais home­


nagens prestadas a Deus e aos Santos, e a
eficácia do santo Sacrifício da M issa.
A graça que nos é dada nos Sacramen­
tos, na santa Missa, na oração, no uso dos
sacramentais, em nada depende de quais­
quer circunstâncias externas. h verdade que
ao sacerdote, como ministro oficial da graça,
manda Cristo e .a Igreja usar sinais sensí­
veis e externos ou observar determinados
ritos para transmitir a graça. Mas em mais
nada fez Deus depender a graça e a salva­
ção, de quaisquer circunstâncias ou práticas
meramente externas. E nem se compreen­
deria que, sendo o próprio Deus quem dis­
pensa a graça, se deixasse mover ou ficasse
n a d e p e n d ê n cia de circunst<1 ncias externas,
indiferentes, e , para mais, caprichosas tantas
delas e inventadas pel a fantasia do homem .
Desta forma é superstição acreditqr que
determinada oração é mais eficaz por conter
esta ou aquela palavra, por ter sido com­
posta por tal ou qual pessoa , em tàl tempo
ou lugar. Supersticiosas , são as oraçõe�
como a que se intitul a cc A corte celestiah
que absol veria de todos os seus pecados a
quem a rezasse, e livraria do inferno trinta
e quatro almas e outras tantas do purga­
tório.
Superstição é : crer na necessidade de
repetir tantas vezes, nem mais nem menos,
determinada oração, para que ela seja eficaz ;
julgar necessário para se alcançar o que se

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TR1BUN AL D A PE N 1TEN C1A 14Q

pede, orar em certa posição, com os braços


cm cruz, por exemplo. O mesmo 1'e diga
da crença de que o sinal da Cruz ou o uso
dos sacramentais, repetido um número certo
de v,e zes, tem maior efeito.
E absolutamente contrário à Fé cristã e
à razão pensar que certo número de cruzes
ou o uso dos sacramentais um certo n ú­
mero de vezes, nos hão de alcançar por si
mesmos uma bênção ou graça particular de
Deus. O que dá eficácia aos sacramentais
e à oração, é a disposição interna de quem
reza, a sua devoção, confiança, humildade
e perseverança,
b certo que a Igreja costuma repetir al­
gumas orações um certo número de vezes e
recomenda certos exercícios por uns tantos
dias ; mas, nestes casos como sempre, é às
disposições de quem reza, que ela atribui a
consecução da graça, e nunca ao número
cetto de vezes ou de dias .
2. A segunda maneira de superstição
religiosa consiste �m esperar efeito infalível
das orações ou sacramentais da Igreja, espe­
cialmente se feitos ou ditos em determinada
posição ou circunstâncias .
Ensina-nos a Fé que por nossas orações
nos concede Deus as suas bênçãos e nos
pr�serva de muitos males. E é desejo da
Igreja que çom frequência usemos dos sacra­
mentais : água benta, cruzes, medalhas e ou­
tros objectos piedosos bentos para esse fim.

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1 50 O CRISTÃO NO

Efectivamente a bênção da Igrej a dá aos


objectos piPdosos eficácia especial para nos
obter a graça de Deus, e defender das ten­
tações diaból icas. Os objectos consagrados
e benzidos pel a Igrej a para uso dos fiéis,
têm consigo a oração da Igreja, que é mais
eficaz do que a oração particular. Daí o
desejar a Igreja deles façamos uso frequente.
Não devemos, porém, esquecer que, se é
certo que Deus ouve infallvelmente as nossas
orações e as da Igreja, reserva para si o
modo e tempo mais oportuno de atender
às nossas necessidades temporais .
Deus conhece melhor do que nós o que
mais convém ao nosso aproveitamento espi­
ritual , e muitas vezes sere_mos nós mesmos,
com o nosso inau procedi mento e descon­
fiança, que poremos obstáculos aos efeitos
da oração e objectos santificados, li1nitando­
-lhes ou tirando- lhes a eficácia. Tratando-se,
pois, de conseguir certas graças temporais,
não é lícito esperar de rezas ou sacramen­
tais resultado infalível , como se se tratasse de
fórmulas mágicas ou amuletos que fizessem
violência à Divindade. Esperar desse modo,
é com certeza superstição.
A nossa oração é só e sempre infalível
(verificando-se nela as condições requeridas),
quando pedimos coisas úteis ou necessárias
para a salvação . (1)

( 1 ) )o. 1 6,23.

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TRIBUNAL DA PE NITÊNCIA 151

E prática santa e salutar, trazermos con-


'

nosco ou termos em casa rosários bentos,


cruzes, medalhas e · outros objectos piedosos,
e esperar por eles auxílio contra as tenta­
ções ; mas é superstição atribuir-lhes maior
eficácia de que a que têm pela bênção da
Igreja, como seria esperar deles resultados
infalíveis .
É muito louvável ter em casa palmas ou
ramos bentos no Domingo de Ramos, e es · ·
p�rar que Deus por eles protegerá a casa
contra o fogo ; mas é superstiç*o esperar
infallvelmente esta protecção. E também
muito cristão acender, durante a trovoada,
uma vela benta ; mas seria superstição pen­
sar que, feito isso, já nenhum raio ou faísca
nos poderia atingir.

Ou� pecado é a superst i ção ?

Não há dúvida que, em todas as suprà­


-enumeradas espécies de superstição, se en­
contra alguma coisa de pecaminoso, pois
algo nelas há contra a verdadeira fé e re­
verência devida a Deus.
O supersticioso com maior ou menor
consciência atribui às criatur.as perfeições
que só a Deus pertencem, como omnipotên­
cia, omnisciência e sabedoria ; e em vez de
·tributar só a Deus o culto que lhe é devido,
presta-o às coisas vãs deste mundo, aos es­
píritos m á us e a _certas exterioridades, espe­
rando daí o auxílio que só de Deus lhe pode

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O CRISTÃO NO

vir. Assim rouba a Deus a honra que lhe é


devida.
Geralmente fal ando a superstição é por
sua natureza pecado grave ; casos há, po­
rém , em que é sómente pecado venial.
Como regra geral , pode dizer-se que a
superstição é tanto mais grave quanto maior
é o conhecimento que dela se tem e a con­
fiança na eficácia das práticas supersticiosas.
Eis �lgumas regras mais particulares :
e) E pecado mortal to 30 o acto de su­
perstição em que se invoca expressamente
o demónio ; porque todo o contrato delibe­
rado e formal com o irreconciliável inimigo
de Deus é inj úria gravíssima feita ao mesmo
Deus. Com él invocação expressa do demónio
não raras ·v ezes andam juntos outros pecados,
como
, . blasfêmia, apostasia, ador_ação do de-
momo.
2) As práticas supersticiosas são só­
mente pecado venial nos seguintes casos :
a) quando se não acredita plenamente
em tais actos supersticiosos ; b) quando se
praticam só por curiosidade ; e) só por igno­
rância ou por costume irreflectido. Omitir
qualquer acção por ten10r supersticioso, é só­
mente pecado venial .
3) Nenhum pecado comete quem, por
mero passatempo e divertim·ento, executa cer­
tas práticas supersticiosas . Todavia, tanto
neste caso corno no anterior, pode haver ·pe­
cado, en1 virtude de circunstâncias, como
seria, por exemplo, o escândalo.

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TR1 B U N AL DA PE N 1TENC1A
.

r53

«Bem como faz o que se abraÇa com a sombra


e vai atrás do vento, assim também se porta o que
atende a enganosas visões. A adivinhação do erro,
os agouros mentirosos e os sonhos dos malfeitores,
tudo é vaidade». (1)
Assim fala o Espírito de verdade, chamando
estulta e néscia à superstição. Como poderá, por
exemplo, produzir os efeitos desejados, o bocado
de papel em que se escreveram quatro palavras
de uma oração, palavras que nada significam ?
Como é ridícula a crença de que o número 1 3 traz
desgraça, e o encontro duma ferradura ou dum pé
de trevo com quatro folhas traz ventura !
Parece ih.crível que, em tempos de tanto pro­
g resso e ciência, os homens, ainda os que se dizem.
intelectuais e se gloriam de não crer no sobrena­
tural e suprasensivel, se deixem vencer destes vãos
receios, e acreditem tão estultas superstições como
a sorte das cartas, a interpretação dos sonhos e a
leitura da sina !
Bem se pode dizer que onde morre a fé, nasce
a superstição.
A superstição além de néscia e ridícula é pe­
caminosa, coisa mui to de ponderar para cristãos.
«Nem se ache entre vós, diz o Senhor pela boca de
Moisés, quem pretenda purificar seu filho ou sua
tilha fazendo-os passar pelo fogo, nem quem con­
sulte adivinhos ou observe sonhos e agouros, nem
quem sej a feiticeiro ou encantador, nem quem con­
sulte os oráculos ou adivinhos, nem quem indague
a verdade dos mortos ; porque o Senhor abomina
todas estas coisas, e por semelhantes maldades ex­
terminará estes povos». (2)
Torna-se inâigno do auxilio do Senhor, quem
nas suas necessidades espirituais ou temporais re­
corre a estes meios para afastar males ou curar
?nfermidades. ccSe abandonas a Deus, diz S. João

( 1) Eclesl. 3.1 , 2 e 5. (2) Deut. 1 8, 1 0- 1 2 .

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O CRI S T Â O N O

Crisóstomo, e procuras auxilio no demónio, como


podes esperar que Deus te dê a sua graça ? ))
Não t e entregues de modo algum a práticas
supersticiosas, e se acaso tens qualquer livro ou
papel com escritos cabal isticos ou sinais supersti­
ciosos, dos q_ue por ai se propagam por simp licidade
ou por cobiça de dinheiro, destroi-os imediata­
mente ou então entrega-os ao teu pároco ou con­
fessor para que ele os destrl}a.
Se necessitas de auxilio, socorre - te dos meios
naturais, como Deus quer. Procura que haja lim­
peza em tua casa, nas tuas doenças recorre ao mé­
dico e não acredites que nas enfermidades da tua
familia ou animais haj a maus olhados ou outros
maleffcios de vizinhos. Não toleres qualquer acção
pecaminosa em tua casa ; esforça-te para que seja
santificado o nome do Senhor ; vive cristãmente, e
evitarás muitas desgraças. Usa com fé e devoção
os object9s bentos pela Igrej a ; nas tuas necessida­
des temporais e espirituais pede a Deus o seu au­
xilio, e aos santos a sua intervenção, e serás ou­
vido ; m as deixa à providência de Deus a maneira
e o tempo que m elhor julgue para te atender.

Segundo Mandam ento


Não invocar o santo nome de Deus ein vão.
O primeiro mandamento trata da honra
devida a Deus ; o segundo da honra devida
ao seu· santo nome. Proibe- nos profaná-lo e
manda-nos honrá-lo.
Profana-se o · nome de Deus :
1• pronunciando-o em vão,
1 . blasfemando-o e maldizendo-o,
3 . jurando falso,
4. violando os votos e promessas.
E como é honrar a Deus honrar os San-

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TRIB UNAL D A PENITÊ NCl 4 1 55

tos, seus particulares amigos, e é desrespei­


tar a Deus, desrespeitar os Santos e as coisas.
que lhes são consagradas, assim também é ·
honrar o nome de Deus, honrar o dos San-­
tos, e profanar o nome Deus, profanar o dos
Santos e as coisas santas como a cruz, o,.
céu, as palavrás da Escritura.
1. Invocação vã dos nomes santos

a) Invocam-se em vão os nomes santos


quando se proferem num momento de ira,.
de arrebatamento.
b) Mas, pelo contrário, é sinal de reve­
rência, proferir os nomes santos con1 respeito·
e devoção. A exclamação « l\'leu Deus ! » dita _
num momento de dor ou angústia, é belís­
sima oração 1aculatória.
c) Não é invocar em vão os nomes san- ·
tos, proferir certas palavras mutiladas que ·
não significam Deus nem outros objectos
santos. Se se pronunciam com ira, o pecado­
está na ira e não nas pal avras estropiadas.
Não é pecado dizer cc diabo » ou « demónio»
a não ser que h aja nisso escândalo ; mas .
lábios cristãos não devem suj ar-se pronun- ·
ciando tais palavras sem necessidade.
o u e p e cado 6 pronunciar em vlo os nomes santos ?

a) Proferir em vão os nomes santos não


passa de pecado venial . E se não há ad \'er-­
tência e' deliberação, como sucede muitas .
vezes, então nem pecado venial é. Deve-se,.

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1 56 O CRISTÁO NO

poré m , combater o mau costume de profe­


rir em vão esses nomes. E quem neste ponto
se desmazelar, peca, ainda quando os pro­
nuncie sem a precisa advertência.
b) Proferir em momentos de ira nomes
san.tos, é também pecado venial , e.m bora
in a 1 s grave.

O costume de proferir em vão, nos mo­


mentos de ira, os nomes santos, expõe ao
perigo de se ofender a Deus gravemente,
pois pode levar a e1n pregá-los em impreca­
ções, ou a m isturá-los com palavras ultra­
jantes para Deus ou para os Santos, o que
seria verdadeira blasfémia.
Há ainda risco de se escandalizar a quem
· ouve . Se os pais, por exemplo, na presença
dos filhos continuamente invocam em vão os
nomes de Deus e dos Santos, não se poderá
estranhar que comecem os filhos de os imi­
tar e contraiam também o mesmo mau hábito.

2. Da b l asfém i a e imprecação

a) Blasfémia pràpriamente dita é toda


a expressão de desprezo ou palavra injuriosa
dirigida cont.ra Deus, os Santos, ou cousas
santas. Este pecado poder-se-ia chamar es­
cárneo ou mofa de Deus.
b) Quando não se exprime por palavra
·O desprezo ou a injúria, mas com delibera­
ção neles se consente por pensamentos, e
quando advertidamente se pratica qualquer
.acção que signifique injúria a Deus e aos

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TR1 Bu N AL D A pE N 1T ÊNe1 A 1 sr

Santos, como por exemplo, levantar irado o­


punho contra o céu ou contq1. q ua lquer ima- ·
gem, comete-se pecado de blasfémia em sen­
tido lato.
e) É verdadeira blasfémia proferir no- .
mes santos com rancor e ira contra Deus,
ou com intenção de menosprezar e injuriar
as coisas santas.
d) Também é blasfémia maldizer a Deus, ..
as coisas santas ou as disposições da divina
Providência.
e) B lasfémia é maldizer (rogar pragas) ·
a outros ou a si próprio, invocando o nome
de Deus ou das coisas santas como instru­
mentos de vingança, dizendo por exemplo
«oxalá o céu te mate » ou ex.pressões serne- ·
lhantes. Querer que o nome de Deus e das .
coisas santas que a Providência destina para
bem , se convertam em meios de ruína, é in-­
juriar a mesma Providência.
Estas imprecações, quer expressas quer ·
não, ofendem o segundo e quinto manda­
mento (imprecações blasfematórias).
Proferir o nome de Deus ou de coisas .
santas para confirmar uma promessa ou a .
v erdade d o que se diz, por exemplo ccassim
Deus me condene, se não falo verdade» ou.
«se não cumprir a minha promessa» , é jura- ·
mento imprecatório, mas não é blasfémia . .
f) Imprecar ou rogar pragas sem a inclu- ·
são do nome de Deus ou de coisas santas-,..
comG « ainda tu morras» , não é blasfémia ;.
mas é pecado contra a caridade devida ao·

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1 58 O CRISTÃO NO

próximo ou a si mesmo, e ofende o quinto


mandamento. . As p alavras «diabo, raio» e
· semelhantes, usadas frequ€ntemente nas im­
-. precações, não são blasfémias .
A imprecação, em sentido próprio, é
rogar mal a si ou aos outros. A simples
-invocação dos nomes santos não se considera
imprecação injuriosa .
M a l l c i a d a blasfém i a o i m p recação (pragas)

A blasfémia advertida e plenamente con­


. sentida é sempre pecado gravíssimo.
Quanto à imprecação (pragas) s�parada
. de blasfémia, que, como se disse, é pecado
. contra o amor do próximo e de nós mes­
mos, note-se o seguinte : Desej ar no pró­
ximo um mal grave, séria e del iberadamente
e sem motivo justo, é ofensa grave e por-
· tanto pecado mortal .
O mesmo se deve diz.e r das imprecações
. contra o próximo proferidas na sua mesma
. presença, prevendo- se que as levará a mal .
As imprecações ou pragas proferidas
num acesso de . ira sem plena deliberação,
quando nelas não entra o nome de Deus ou
de coisas santas nem as quiséramos ver rea­
lizadas, como « demónios te levem » , ou
quando nelas não rogamos um mal grave,
não são gravem ente ofensivas da caridade,
e por isso ordinàriamente são ape.n as pecado
· venial . Desta mesma natureza são também
as pragas que os pais rogam aos filhos em
.:momentos de excitação.

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TR1B UN A L D A PEN1TÊNClA 159

Advirtam contudo os pais que, a não se


corrigirem de semelhante costume, fàcilmente
induzirão seus filhos a contraí-lo. Por esse
motivo pecam gravemente em muitos casos,
já pelo escândalo que dão, j á pela perma­
nência. voluntária
. em estado tão perigoso de
consc 1 enc 1 a.
....

« Ü nome d e Deus não sej a frequente n a tua


boca, e não te mistures com os nomes dos santos,
porque nisto não serás isento de falta». (1) Tal o
preceito do Senhor .
Todavia_, infelizmente, quantos, à mais pequena
contrariedade, se arrebatam de cólera, e com os
nomes m ais santos misturam palavras obscenas !
E por vezes, o que é mais tri ste ainda, até de
lábios de cr ianças que mal falam, saltam monstruo­
sidades de arrepiar ! Qual a causa ? Não erramos,
com certeza, atribuindo tal desgraça ao mau exem­
plo. Não se nasce ensinado . Dos pais e superiores,
que a todo o momento desatam em pragas e blas­
fémias, herdam 'a s cri anças tão mau costume.
Grande responsabilidade a tua se também tens
dado tão ruinoso exemplo. A ter sido assim, re­
flecte e emenda perversidade tarr. anha.
Porque hás de escolher precisamente os nomes
mais santos e respeitáveis para desafogar tuas iras ?
Se alguém andasse sempre com teu nome na boca
para expandir seu mau-humor, para alvo de seus
escárneos, para vingar seus despeitos, com certeza
levarias o caso muito a mal e com razão. E . pare­
ce-te coisa de somenos, profanares tu de modo se­
melhante o nome do Senhor !
Desej as as bênçãos de Deus para a tua vida, e
pedes que tas conceda ; temes a doença e a misé­
ria, e rogas-lhe que de ti as afaste ou as remede_i e.

(r) Eclesl. 23, ro.

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16o O CRISTÃO NO

E mal acabas de pedir, desatas em imprecações e


blasfémias ! R ezas um quarto de hora a pedir gra­
ças, e blafesmas depoi s a pedir maldições ! Quando
queres que Deus te ouça ? Quando pedes ou quando
praguejas e blasfemas ? •

Todo o uso irreverente dos nomes santos, toda


a .imprecação ou mal dição proferida deliberada­
mente, é acto pecaminoso. Se tantas vezes ao dia
se te destrava assim a lingua, calcula quantos pe­
cados ao fi m de um ano, quantos ao fim da vida ?
E q u e penas não terás depois a sofrer ?
E ntra em ri, e se tens alguma estima à tua
alma e à salvação, arrepende-te do passado, e, aos
pés do Senhor, promete com sinceridade que, de
hoje em diante, não proferirás em vão qualquer
palavra santa del iberadamente, nem advertidamente
rogarás pragas ou imprecações.
Se depois, por inadvertência, por força do há­
bito, fal tares à promessa, arrepende-te ; como pe­
nitência reza a Ave-Maria ou dá qualquer esmola
ou repete com devoção a palavra santa que profa­
naste.
Trabalha por dar vasão a teus arrebatamentos,
com palavras inocentes. Cui da a sério de assim
fazer, e em breve te verás livre do teu m au cos­
tume. Se uma vez ou outra ainda te escapar pala­
vra ofensiva de Deus, nem por isso desanimes. Re­
nova o bom propósito, acautela· te mais e mais, e
chegarás à completa emenda.

3. Do Juramento

.Jurar é invocar a Deus por testemunha


da verdade do que se diz ou da sinceridade
da promessa que se faz.
·

Jurar é como que dizer implicitamente,


embora se não manifeste por palavras : « Deus
omnisciente me é testemunha ; sabe que é
verdade o que digo e que não minto. Con-

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TR1 BUN AL D A PE N 1TÊN C1A 161

firme Ele mil)has palavras ; e se minto, me


castigue. Se me n ão castiga, saiba o mundo
que falei verdade» .
O juramento chama-se assertório ou in­
vocatório, quando com ele se invoca a Deus
por testemunha da afirmação que se faz
acerca de factos presentes ou passados. Tais
seriam os . juramentos como estes : «Juro em
presença de Deus omnipotente que direi a
verdade . segundo a minha consciência, sem
calar nem . acrescentar coisa �lguma : assim
Deus me aiude» , ou <duro por D eus que não
tenho tal coisa nem sei onde ela esteja : assim
Deus me ajude ».
O juramento com que alguém se obriga
a fazer ou omitir no futuro uma coisa, .diz-se
promissório. Tal seria o juramento feito
assim : « Declaro, com ' juramento, na pre­
sença de Deus, que cumprirei, segundo a
minha consciência,· os deveres do cargo que
aceito agora» .
Invocar a Deus como testemunha e ainda
como vingador da falsidade, por palavras,
como estas « Deus me castigue se não cum­
prir exactamente os meus deveres» , é jura­
mento i1nprecatório.

Condi çles requeridas para a val idade do juramen.t o

�) Para haver juramento é preciso que


haja vontade e intenção de invocar a Deus
por t�stemunha. Dizer, sem nisso pensar,
qualquer fórmula de juramento, como «Juro»

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O CRISTÃO NO

ou mesmo « Juro por Deus » , não foi jurar


pois não houve a precisa intenção .
bj Também p ara haver juramento de­
vem as palavras clararnente dizer que se in­
voca Deus por testemunha. Afirmação que
se fizesse com palavras como estas «verda­
deira mente » , «pela minha honra» , «sob a
minha palavra » , « à fé de soldado» , « à fé de
cristão» , não chegariam a juramento, pois
com elas não se invocou a Deus por teste­
temunha.
e) Ensinou Cristo certa vez : «Todo o
que jurar pelo templo, jura por ele e pelo
que habita nel e ; e o que j ura pelo céu,
jura pelo trono de Deus e por aquele que
está sentado nele » . (1) . Donde se conclui
que o mesmo é invocar a Deus por teste­
munha como invocar as coisas santas com
Ele intimamente relacionadas : o Evangelho,
a Cruz, etc.
·

d) Há modos de falar que são juramento


ou não, segundo a intenção de quem os diz.
Não são juramento expressões como esta,
intercaladas na conversa a modo de excla­
mação : « Pela minha salvação » , « Deus sabe
que não minto» , cc Tão certo como Deus ser
Deus » . l\fas se houve intenção de, com tais
palavras, invocar a Deus por testemunha,
não há dúvida de que com elas se fez um
juramento.

(1) Mal. :i3, 2I-22 .

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TR1B U N AL DA P E N 1TÊ N C1A 1 63

e) A declaração, mesmo solene, feita em


vez de juramento, nunca passa de si1nples
declaração, pois não se invoca nela a Deus
por testemunha. Portanto, faltar a ela não
é perjúrio, embora seja. mais do que simples
mentira. Se declarasses ter cumprido à risca
os teus deveres e tal não fosse verdade, não
serias perj uro mas qualificadamente menti­
roso.
Também a promessa feita de modo mais
solene do que o costumado, como prometer
(( pela honra» ou ápertando a mão, não obriga
corno se fosse juramento promissório, em­
bora seja de mais valor do que qualquer
simples promessa.

Quando é pecado jurar ?

Responde o catecismo : É pecado


a) jurar sem necessidade ou sem neces­
sidade induzir outros a jurar ;
b) jurar falso ou' jurar como certo o que
é duvidoso ;
e) não cumprir a promessa que se jurou,
podendo cumpri-la ;
d) j urar fazer o mal ou jurar não fazer
o bem.

a) O juramento é um acto de religião,


e portanto, de si, é agradável a Deus. Mas
não podemos supor agradável a Deus o jurar
por qualquer ninharia. O juramento é acto
de culto, grato a Deus quando há motivos

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O CRISTÃO N O

justos para se fazer e se faz com madura


reflexão. Também não é lícito exigir a al­
guém um juramento sem necessidade.
Jurar por motivos frívolos é de ordinário
pecado venial. Todavia não jures leviana­
mente e sem motivo, não vá suceder que
caias no mau hábito de jurar sem reparar
se é verdade ou mentira· quanto juras. Quem
tivesse o mau hábito de jurar por tudo e
por nada, devia esforçar-se por se emendar,
pois não só faltaria ao respeito a Deus ju­
rando sem motivo, mas andaria em perigo
de jurar falso (juramento em que falta o
;ui'z_o, no dizer do Evangelho).
b) Jurar con10 verdade o que é mentira
ou como certo o que é duvidoso, é pecado
grave . Pecado grave é também prometer
com juramento uma coisa q ue se não pode
ou não quer fazer (perjtírzo ou juramento
falso). ,
e) E grave falta de respeito · para com
Deus não cumprir a promessa jurada quando
se pode e subsistem as mesmas circunstân­
cias que existiam ao tempo do juramento.
Mas faltar numa pequenina parte à p romessa
j urada, não seria pecado grave. O empre­
gado que não chegasse bem à hora do re­
gulamento que tivesse jurado cumprir, não
se poderia dizer incurso em falta grave. (in­
fracção. do juramento).
d) E pecado contra a honra de Deus afir­
mar, m anifestar, descobrir, prometer com ju­
ramento aquilo que �em pecado não se pode

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T R 1 B U N A L D ..\ P E N I T Ê N C 1 A r65

afirmar, descobrir ou prometer. Seria, pois,


pecado, por exemplo, descobrir com jura­
mento segredos ou as faltas de outrem ou
pron1eter odiar alguém Uuramento t'njusto).
Antes d e jurar, vê o que fazes. Averigua bem
se é verdade o que vais . afirmar ou se estás resol­
vido a cumprir o que vais prometer.
Olha que jurar falso é fazer a Deus, santfssimo
e justíssimo, corroboradôr de mentiras e falsifi­
cador de- verdades. Injúria gravfssima feita a Deus,
escárneo atirado a Sua sabedoria, justiça e san­
tidade.
O perjúrio é crime que todos os tribunais hu­
manos castigam com penas gravissimas. Como não
o havia de punir Deus também, nos seus justos jui­
zos ? A maldição «irá à casa do ladrão e à casa do
que jura falsamente em meu nome, e ficará no meiO
dessa casa e a consumirá a ela e a sua madeira e
a suas pedras», (1) diz o Senhor.
E não é só a Fé mas também a razão a dizer
que o perjúrio é exacrâvel. Que terríveis conse­
quências para o individuo, a familia e a sociedade)
se o juramento deixasse de ser santo e respeitado t
Nada ficaria _p ara firmar a mútua fidelidade e leal­
dade, se se nao pudesse confiar no juramento.
Lembra sempre o que diz o Eclesiástico : «<Ü ho­
m e m que jura muito, será cheio de iniquidade e
n ão se apartará de sua casa o flagelo». (2)

4. Do voto
Voto é. a promessa deliberada e livre que
faz a Deus, de um bem possível e me­
!:>e

lhor (cân. 1 307 § 1 ) .

(1) Zacar. 5,4. (2) Eclesl. 231 12.

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1b6 O CRISTÃO NO

O voto é m ais que sin1ples propósito,


pois é a promessa formal feita a Deus. Por
ele COII!O se contrai para com Deus uma dí­
vida. E promessa a que se fica obrigado
por motivo da virtude da religião.
Se, por exemplo, ao renovares teus bons
propósitos depois da confissão, dissesses :
« Meu Deus, prometo emendar-me de tal
ou qual pecado, quero fugir das ocasiões
perigosas, e rezarei todos os dias três Ave·
-Marias em honra da Virgem a pedir.:Jhe
que me ajude a guardar castidade » , nem
por isso terias feito un1 voto, pois de tais
palavras não consta que te quiseste obrigar
por motivo da virtude de religião, mas que
somente a Deus quiseste expdr teus bons
propósitos.
Mas já seria voto se, conhecendo tu por
experiência a fragilidade em esquecer os
bons propósitos, resolvesses expressamente
ligar-te por voto, com promessa como esta :
« Ô meu Deus, para o futuro serei melhor,
eu vo-lo prometo, etc. » .
Para que a promessa seja voto, é preciso
que seja livre e deliberada e de uma coisa
boa ou melhor, pois só o que é bem, agrada
a Deus.
A boa obra a que j á estamos obrigados
por lei divina ou eclesiástica, pode ser objecto
de voto ; e então a ela ficamos obrigados por
motivo da Lei q ue a impõe e por motivo da
virtude da religião. Podemos, por exemplo.
fazer voto de guardar castidade segundo o

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T R 1 B U N A L D A. P E N 1 T Ê N C 1 A 167

estado em que vivemos, para que a graça


de Deus melhor nos ajude a praticar a vir­
tude. E, neste caso, guardando castidade
merecemos por 1notivo do voto feito e pela
virtude praticada ; e, faltando à castidade,
pecaríamos contra a virtude e contra o votO.
Podemos fazer voto de ouvir missa aos
domingos e dias santificados, e também
então mereccremqs duplamente, assistindo
à missa.
A promessa a qualquer · Santo só seria
voto se fosse feita a Deus para honrar o
Santo, aliás ficaria simples promessa que
todavia se deve religiosamente cumprir.

Ouand o há que cumpri r o voto ?

O voto é para se cumprir logo que se1 a


possível . Todavia há que distinguir :
a) Se por voto te obrigasses a praticar
qualquer boa obra cada dia ou cada mês ou
toda a vida, bem está que desde j á comeces
a cumpri-la . A demora considerável tiraria
a Deus parte da honra que lhe quiseste dar.
b) Se o voto foi temporário, isto é, se
te obrigaste a praticar qualquer boa obr�
uma vez ou um número d eterminado de ve­
zes, não urge que imediatamente o cumpras,
a não ser que também disso fizesses voto.
Fora deste último caso, a demora, mesmo de
anos que fosse, não chegaria a pecado grave ,
se não- houvesse perigo de mais tarde n ão
poderes cumprir o voto ou de por comp leto o

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168 O C RISTÃO NO

esquecer. E nunca seria pecado grave, se


o voto te não obriga gravemente.
e) Se não é possível cumprir o voto no
tempo determinado, ou justos motivos, como
doença, dificuldades financeiras, falta de
tempo, não deixam que imediatamente o
cumpras ? nenhum pecado há na demora em
o cumprir.

Que pecado se comete faltando ao voto ?

a) Se a matéria do voto é grave e im­


portante, faltando a ele cometes pecado grave
se ao fazê-lo tiveste intenção de te· obrigar
sob grave ; e cometes pecado leve se só sob
leve te obrigaste com voto.
Se a matéria do voto é leve, faltando a ele
cometes pecado leve apenas, pois ninguém
se pode obrigar a cumprir sob pecado grave
aquilo que de sua natureza é leve.
b) Duvidando se ao fazer o voto tiveste
inte n ção de te obrigar sob grave, podes
ater-te a esta norma : o pecado sera, grave
ou leve segundo a importância do objecto
do votó. Assim : fizeste a promessa coin
voto, de fazer cinco vezes a Via-Sacra . Fa­
zer apenas duas, por n egligência, seria pe­
cado· grave. Prometeste rezar cada dia cinco
Padre nossos e Ave-Marias . A obrigação de
cada dia, considerada em si mesma, não é
importante, pois nem prometestes rezá-los
todos seguidos ; e por isso faltar à promessa.
seria sàmente pecado leve.

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TRI B UN AL D A PE N IT E N C1 A 169

cj Se a matéria do voto já é de si gra­


vemente preceituada na Lei de Deus ou da
Igreja, então violar o voto é sempre malícia
nova que se junta ao pecado grave come­
tido pela transgressão da Lei .

Quando cessa a obrigaçlo do voto ?


.:r

a) O vo�o deixa de obrigar quando não


se pode cumprir, quanào o seu objecto se
torna inútil ou ilícito por circunstâncias su­
pervenientes, e quando se não realizaram as
condições determinantes do voto.
Por exemplo : Prometeste com voto fa­
zer uma romaria. Se adoeces, só estás obri­
gado a cumprir o voto depois de curar. Pro-·
meteste com voto uma romaria a determinado
santuário . Se o santuário foi destruído, não
estás obrigado a fazer a romaria, mesmo que
comodamente a pudesses fazer a qualquer
outro santuário. Prometeste com voto dar
uma esmola para o ccPão de S. António » se
sarasses duma enfermidade dentro de tantos
dias . Não saraste, não estás obrigado a dar
esmola a l gnm a . Prometeste dar 2o::Poo aos
pobres, e apenas podes dar 2·/P OO. Só estás
obrigado a dar a quantia que podes .
b) Se há motivo suficiente para obteres
dispensa ou comutação do voto, recorre ao
confessor para que ele te dispense dele ou
o comute . Muitos confessores, os religiosos
por exempfo, têm faculdade de dispensar e
comutar quase todos os votos.

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O C RISTÃO NO

e) Se fizeste o propósito de praticar de­


terrninada boa obra, e mais tarde começas
de duvidar se foi simples resolução que to·
mas te ou voto que fizeste, podes contigo con·
cluir que não houve voto.
O voto é um acto de culto graUssimo a Deus.
Q_uem por voto se obriga a qualquer boa obra:
mesmo j á obrigatória, praticando- a, mais mereci­
mentos têm diante de Deus.
Ana esposa de Elcana, fez a Deus o seguinte.
voto : « � enhor dos exércitos, se te digo.ares olhar
para a aflição de tua serva e te lembrares de mim,
se te não esqueceres da tua serva e deres à tua es­
crav a um fillio varão, eu to o ferecerei por todos os
dias da sua vida». (1) Deus agradou-se da homena­
gem deste voto e concedeu o filho desej ado.
Mas para que o voto sej a assim grato a Deus,
preciso é que fielmente o cumpras. Por isso antes
de o fazer, vê bem se o podes cumprir. Consulta o
confessor ou o teu director espiritual, sobretudo
quando se tratar de voto diffcil como o de virgin­
dade ou de castidade, porque doutra sorte poderias
mais . tarde arrepender-te.
nSe fizeste algum voto a Deus, trata de o cum­
prir logo, porque lhe desagrada a promessa infiel e
imprudente. Muito melhor é n ão fazer voto algumi
do que� depois de o fazer, n ão cumprir o pr.ome­
tido » . (!)

Tercei ro Mandamento
« Santificar os domingos e festas de
guarda » .
Como o segundo mandamento, também
o terceiro vem a declarar melhor a honra
( 1 ) 1 Reis, 1 , t r. (2) Bcleae. 5, 3·-r·

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T R I B U N A L D A P E N I T f: N C I A

que a Deus se deve, conforme ensina o pri­


meiro mandamento. Nele se manda o culto·
externo e se determinam os dias em que
com ele se deve honrar a Deus .
Na Lei antiga os dias de guarda eram os
sábados. Na Lei Nova são os domingos e
outros dias de festa determinados pela Igreja.
Actualmente são dias de festa de guarda os
dias de Natal, da Circuncisão, Epifania ou
Reis, . Ascenção, Corpo de Deus, Assunção·
de Nossa Senhora, Imaculada Conceição,
S. José, S. Pedro e S. Paulo e Todos os
Santos. Todos estes dias s ao dias de festa.
de guarda em toda a Igreja, a não ser que
para alguma região a mesma Igreja os tenha
.dispensado ou transferido para o doming0:·
seguinte.
Por lei geral não há obrigação de guar­
dar nenhum outro dia de festa,
. nem mesmo·
P
o dia do adroeiro, cuja so lenidade externa
pode o bispo transferir para o domingo se­
guinte mais próximo. E se nalguma região­
ª estas festas de toda a Igreja outras hou­

vesse a juntar, os bispos as fariam anunciar.


Como se santificam os domingos e .fes-·
tas de guarda ?
Responde o catecismo :
1 . Praticando obras de piedade ; .
2 . Abstendo-se de trabalhos servis.
As obras de piedade a praticar são :-
1• ,Ouvir missa inteira e assistir, quanto-
possí vel, a outros exercícios religiosos ;

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O CRISTÃO NO

2. Ouvir a palavra de Deus e receber os


sacramentos ;
3 . Ler livros de piedade e praticar as
obras de misericórdia.
Ouvir m issa inteira
Para regular o cumprimento do terceiro
mandamento da Lei de Deus, a Igreja obriga
todos os fiéis cristãos logo · que che �em ao
uso da razão (7 anos), a ouvir missa com
devoção nos domingos e dias de festa de
_guarda ou dias santos. Em tais dias urge,
portanto, a obrigação de
1 . ouvir missa inteira, isto é, do princí­
pio até o fim .
Não cumpre o preceito quem, sem mo­
tivo justificado, falta à parte essencial da
missa, isto é, à p arte que vai do ofertório à
comunhão ou a parte notável . Satisfaz ao
preceito, m as não perfeitamente e por isso
se a falta foi por negligência peca venial­
mente, quem assiste à parte essencial e não
falta a parte notável .
Um ou outro. exemplo prático :
Peca venialmente quem, sem motivo, sai
da igreja logo depois da comunhão. A parte
da missa que vai da comunhão até ao fim
não é parte notável nen1 essencial da missa.
Não assistir a ela, havendo motivo razoável,
nem é pecado nenhum.
Tal seria o caso de uma criada de servir
-que para evitar os ralhos dos patrões por se

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TR1BUNAL DA PENlTE NCI A 173

ter demorado mais que de costume, ou de


pessoa que tivesse de começar viagem a
hora certa, ao chegar à comunhão fosse para
a sua vida.
Quem por desleixo chegar ao Evangelho
e ficar até ao fim da missa, cumpre o pre­
ceito mas peca venialmente .
Que fazer em casos como este ? Julgando
de boa fé que ias a tempo, entras na igreja
quando a missa já vai na elevação. Não há
outra mis�a a que possas assistir. Terás
obrigação de ficar até ao fim ? Os teólogos
ensinam comumente que, visto ter passado
a parte principal da missa e portanto j á se·
não ouvir missa, não há obrigação de assis­
tir até final . Acons�lham, porém, que não
havendo reparos ou escândalo, se assista até
ao fim.
2 . Manda a Igreja ouvir missa devota­
mente. Portanto para cumprimento do pre-·
ceito exige-se a devoção externa pelo menos�
E assim n ão cumpriria o preceito quem assis- ·
tisse à missa completamente distraído e sem·
atender ao que se faz, ou quem fosse à igreja
ünicamente para admirar as pinturas, ouvir·
o canto. As distracções p assageiras, embora
voluntárias, não impedem a satisfação do·
preceito ; o mesmo se diga das distracções
demoradas, desde que não tirem a atenção ·
geral às partes principais da missa ou a de-·
voção externa a ponto de se dar escândalo ..
Mas aqui, como em tudo, o que importa não é�

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O CR I S T Ã O N O

tanto saber o que obriga sob pecado grave, quanto


esmerar-se cada um por cumprir o preceito com a
possfvel devoção e .por chegar sempre a tempo.
A falta de pontualidade habitual pode ser mau
exemplo que a outros arraste à mesma falta.
Assiste, pois à missa com a maior devoção e
respeito de que fores capaz, seguindo com atenção
o desenrolar das cerimónias ; e não te distraias
voluntàriamente. As almas piedosas que têm boa e
sincera vontade de ouvir missa ·com devoção, não
têm a recear as distracções, porque nenhuma as (ará
pecar gravemente.

Causas que dispensam de assist i r à m i ssa

l Tn1 motivo razoável dispensa-nos de


assistir ú missa 9-0S domingos e dias de
festa de auarda. E motivo razoável, e por­
tanto su flciente para a dispensa, aquele de
que resultaria prejuizo grave para nós ou
para o próximo. Estão, pois, dispenc;ados
de assistir à missa :
1 . Os que tem em , com fundamento, que
a demora na igreja lhes faça mal à saúde.
Tal pode acontecer com certas pessoas ner­
vosas, com os convalescentes, mal-enroupa­
dos, etc. 1\ilas j á não estão dispensados
aqueles que receiam de que por entrar na
igre j a lhes venha qualquer malestar indifinido
ou simplesmente possível e problemático.
2. Estão dispensados aqueles que, para
ouvir missa, tivessem de passar por uma
grande vergonha. Estão neste caso os que
não têm roupa decente, calçado em condi­
ções, etc. . Mas esses tais, se podem evitar
. a vergonha, assistindo a missa que se ceie-

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T RI B U N A L D A P E N 1 T Ê N C 1 A 175

bre mais cedo ou em igreja onde não são


conhecidos ou de outra qualquer forma, já
não estão dispensados. .
3 . As pessoas que têm crianças ou doen­
tes que não podem ficar sós. Nesses casos,
porém, bom· é que se alternem nos vários
domingos as pessoas de casa ; e se no lugar
há mais de uma missa, devem quanto pos­
sível dispor a vida de modo a que umas
assistam a uma e as restantes à outra.
4. Os que estãó de viagem que sem
grave danq ou incómodo não podem inter­
romper. E de advertir, porém, que não é
lícito, sem motivo grave, guardar uma via­
gem para domingo ou dia festivo quando se
prevê que por causa dela se vai faltar à missa.
5; Os criad?s e empr�gados a quem :>s
p atroes e superiores por 1ustos motivos nao
deixam ir à missa. Se os motivos são fúteis
apenas, podem uma ou outra vez deixar a
missa, se temem excitar as iras dos patrões
e vir-lhes daí grave dano. Mas, neste caso,
se frequentemente têm de faltar, estão abri.­
gados, mesmo com grave incómodo, a pro­
curar patrões m ais cristãos e menos intran­
sigentes, pois é quase impossível viver cris­
tãmente, tanto pública como particularmente,
faltando com frequência à missa. São ra­
ríssimas as excepções.
6. Os que vi vem longe da igreja, sobre­
tudo em ocasiões de mau tempo, pelo grave
incómodo . que daí resultaria. Ensinam os
teólogos que ninguém está obrigado a ir à

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O CRISTÂO NO

n11ssa a uma l égua de distância com mau


tempo.
7 . Também dispensa de ir à missa, uma
vez por outra, a necessidade de re�reio e

distracção. Quem vive todo o ano amarrado


ao trabalho em fábricas e escritórios, a res­
pirar constantemente ar corrompido e infecto,
sobretudo nas grandes cidades, sem ter pelo
ano fora uma distracção ou recreio no campo,
pode ir passar o domingo ao ca1npo uma vez
por outra, embora por · esse motivo tenha de
ficar sem missa. Mas se antes de ir para o
passeio, durante ele ou depois, pudesse assis­
tir à missa, tinha obrigação de o fazer.
8 . Havendo verdadeira causa mas insu­
ficiente p ara dispensar da missa, se a ela se
n ão assiste, em geral comete-se pecado venial .

O assistir à missa traz sempre alguns sacrifl­


cios. Sendo graves e consideráveis, a Igreja não
obriga a eles os fiéis. E nesse caso outras obras de
piedade podem suprir a missa, corno a oração, a lei­
tura espiritual, a missa durante a semana.
Quando haja motivo, mas não suficiente, para
dispensar da missa, pede-se dispensa do preceito.
Não cumprir o preceito sem pedir d.i spensa dele1
seria sempre pecado embora menos ' grave do que
se não houvesse motivo.
Sendo o motivo razoável embora insuticiente,
os párocos e bispos podem dispensar de ·assistir à
missa e do descanso a todos os indivíduos ou até
familias inteiras que vivam ao presente no territó­
rio da sua diocese ou da sua paróquia. Esta dis­
pensa dura er.. quanto duram as causas que a moti·
varam ; e cessando elas, urge o cumprimento do
preceito.
A dispensa nestes casos supre a insuficiência

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TRIBUN A L D A PENITÊNCIA 1 77

dos motivos que se julga ter· para não obs.etvar �


lei. Por exemplo : resolves tu, sozinho ou . com a
famtlia, fazer uma viagem ao domingo, . e prevês
lJUe por causa dela não podes assistir à missa. Tens
razões para fazer a. viagem, inás não são assi·m de
tanto peso que te · deixem a consciência tranquila.­
Vais ter com o pároco ou com o bispo, e se ele
julga suficientes as razões para usar do seu poder
de dispensar, podes fazer a. viagem em boa cons­
ciência. Com o poder que têm disy ensar a lei, su­
priram · o que faltava às tuas razoes para poderes
deixar a missa.

Quais os trabalhos proibidos nos domingos


e dias santos ?

1 . São proibidas todas as obras servis.


Por obras servis entendem-se os traba­
l hos corporais próprios de operários e jor­
naleiros, tais como os trabalhos agrícolas,
mecânicos ou de fábricas, os trabalhos· ·de
carpinteiro, pedreiro, ferreiro, alfaiate·, cos­
tureira e semelhantes.
- São ainda proibidas as obras demasiado
ruidosas e profanas, que, embora não sejam
propriamente servis, impedem· notàvelmente
o recolhimento religioso e a tranquilidade
dos dias festivos. Tais seriam as áudiências
públicas nos tribunais, os mercados e feiras,
salvo ·se autorizadas pelo costume.
2 . Não são proibidas as obras chamadas
livrPs ou artes liberais, que tendem a aper­
feiçoar . o espírito : ler, escrever, desenhar,
pintar artisticamente, tocar instrumentos, fo-

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O CRISTÃO NO

tografar, bordar. Mas já não é permitido


preparar as tintas, a tela, etc.
Também não são proibidas as obras c�­
muns, que, embora servis, são necessárias na
vida doméstica de cada dia : varrer a casa,
cozinhar, tratar de animais, em suma, todos
os trabalhos · que não podem ser antecipados
nem adiados .
3 . Trabalhar ao domingo ou dia s�nto,
sem verdadeira necessidade, em obra servil,
é pecado grave, se o trabalho durar mais
de duas .horas ; durando menos, é pecado
ve nial . E este o sentir con1um dos mora­
l istas .
Ensinam eles também que, havendo grave
escândalo, se pode incorrer em . pecado mor­
tal ainda que se trabalhe pouco tempo.
Quem obriga qualquer pessoa a traba­
lhar, sem necessidade, incorre no mesmo
pecado que incorreria se fosse ele mesmo a
trabalhar.

Ouando é permitido trabalhar ao domingo ?

Quando o ·exigir a honra de Deus, o bem


do próximo, ou uma urgente necessidade.
Assim é lícito :
1
• Todo o trabalho que serve para dar
n1aior esplendor ao culto, como enflorar os
altares, varrer as ruas por onde passa a pro­
cissão, tocar os sinos, fazer paramentos para
igrejas pobres.
2 . Todo o trabalho que tem por fim ali-

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TRIBUNAL DA PENITÊNCIA 17 9

viar os enfermos, socorrer qual 9 uer neces­


sidade grave e urgente do próximo, como
acudir a um incêndio, a uma inundação, ou
a qualquer desgraça ; e· bem assim tratar da
roupa dos pobres .
3 . Todo o trabal ho que se n·ão pode adi�r
para outro _ dia, ou seja o trabalho feito por
necessidade· urgente. Podem, por exemplo,
as mães de família pobres e as criadas de
servir, lavar e remendar, não o podendo fa­
zer noutros dias, desde que evitem o escân­
dalo que daí poderia resultar.
É também licito fazer os vestidos de
lüto precisos para um entêrro, abrir sepul­
turas, e continuar obras que se não podem
interromper sem grave prejuizo, como acon­
tece em muitas fábricas .
Os criados a quem . os patrões obrigam,
podem trabalhar uma ou outra vez, ha­
vendo necessidade, principalmente se, deso.­
bedeceildo, se arriscam a grave dano, como
serem despedidos ou ficarem mal vistos dos
amos . Se, porém, tiverem de trabalhar quase
habitualmente, deyem mudar de casa, embora
com algum prejuizo. No caso em que obri­
gassem a trabalhar só no intuito de os fazer
transgredir a lei como católicos, então não
poderiam obedecer tnuito embora daí lhes
viesse grave dano.

Na. dúvida, se há ou não motivo sufi­


ciente que dispense, peça-se dispensa ao

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180 O C RI S T Ã O N O

bispo ; e nos casos urgentes, recorra-se aó


pároco ou mesmo ao confessor. ( 1 )
O trabalho do domingo e dias santos é
amaldiçoado por Deus, ensina a experiência.
Podia perguntar-se aqui se será l ícito
nos domingos, para evitar a ociosidade, fazer
meia, cozer, remendar; arrancar ervas no
jardim, e fazer certos trabalhos delicados. de.
talha, etc.. mas como nestes casos a reso­
lução depende, em grande parte para não
dizer absolutamente, do costume dominante
em cada terra, deve-se recorrer ao confessor
em cada c a s o p a rt i cu l a r, ou seguir na prá­
tica o exemplo dos que são considerados
b on s cris tãos .

Para trabalhar em seus negócios temporais


Deus concedeu ao homem seis dias, e um apenas
reservou para o homem descansar e a Ele o con­
sagrar. Esta a Lei ou a vontade de Deus .
Agradeçamos-lhe tão acertado preceito. Não o.
tivera Ele imposto e teríamos nós de o inventar .. .

O trabalho sem tréguas nem descanso exgotar­


-nos· ia em pouco tempo . Ensina a experiência
que, após uma semana de trabalho, precisamos de
um dia de descanso para acumular forças novas
que permitam as fadigas da semana seguinte.
O domingo não é pois, dia perdido na nossa
vida, é sim necessida de da nossa natureza. Vejam
a Inglaterra onde o domingo é rigorosamente guar-

( 1 ) Pode aqui aplicar-se tudo o que se disse acerca das


causas· que nos escusam da obrigação de ouvir missa. Havendo
motivo real, ainda que não seja grave, a transgressão deste pre-

ceito será sómente peca do ,·enial.

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TRIB UN AL D A PE N IT ENC1 A 18c

dado, e digam os que se _não conformam com o


mandamento de Deus, se há para ai muitas nações
mais prósperas do que ela. Deus recompensa com
bênçãos especiais a obediência às suas Leis.
nNem só do pão vive o homem, mas de toda a
palavra que sai da boca de Deus,,, (1) O homem
precisa de tempo para se instruir e para mais di­
r�ctamente ho!lrar a Deu � ; e para neBócio t �manho
. nao se . pode dizer que seia por demais um dia cada
semana.
E diz Deus que sobre a c·a beça dos que profa­
narem o seu dia porá. o peso da sua mao : nVio­
laram por completo os meus sá.bados, pelo que eu
disse que no deserto derramaria sobre eles o meu
tµror e os consumiria». (2) .
Costumava dizer o San to Cura d' Ars : <<Dois
caminhos sei eu, que fatalmente levam à pobreza :
trabalhar ao dommgo e apropriar-se do alheio».
Guarda religiosamente os dias do Senhor ; e se
por qualquer motivo houveres de neles trabalhar,
cuida de não escandalizar a nin s uém. Se até agora
trabalhaste nos domingos e aJUntaste algum di­
nheiro, não confies nele, que é dinheiro de mal­
dição. Emprega-o em obras santas, e talvez possas
evitar assim os castigos de Deus.
Santifica os domingos e festas de preceito ou­
vindo missa atenta e devotamente e ocupando-te
em obras de misericórdia e piedade.
Os preceitos da Igrej a não obrigam com grave
incómodo ; mas nem por isso julgues que te dis­
pensa da missa o incómodo ou sacrifício q_ue ale­
gre farias se se .t ratasse de qualquer negócio tem­
poral .
Olha que precisas muito das graças que. o
santo Sacriftcio da Missa te dá ; e portanto cuida
em aproveitá-las. Faltar frequentemente à missa
nos domingos e dias santos, mesmo com motivo, é
sinal de pouca fé e traz à alma perigos graves.

(1) Ma t. 1·-1· ( :?) Eeeq. 20, 1 :�.

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O CRISTÃO NO

E não te contentes com o estritamente neces­


sário. Sempre que em tais dias haj a pregação, não
faltes a ouvi-la, frequenta os exercícios piedosos
ou rezas da tarde, lê livros de devoção que te ins­
truam e edifi quem a alma.
R.e creia-te, alegra-te, sim, mas cristãmente.
Não assistas nunca a divertimentos escandaloso�
onde se perde ou periga a virtude. O domingo seja
para ti, de verda d e, o dia .do Senhor : dia de bên­
çãos e alegria. Diz-se às vezes que e1 as festas são
os grandes dias do demónio». Que nunca se possa
apli car a ti este ditado.

Qu arto Mand am ento

«Honrar pai e n1 á e )> .


No quarto mandamento ordena Deus aos filhos
e aos s �1bditos q � e respeitem, o � edeçam � amem a
seus pais e superiores, e aos pais e superiores que
cumpram seus deveres para com os filhos e súbditos.
Por ordem vamos tratar de todos estes deveres.
a começar pelos
·

Deveres dos filhos

Os fil hos devem aos pais : respeito,


amor e obediência. O respeito e amor obri­
gam toda a vida ; o dever da obediência
a c a b a quando os fi l hos s e emancipam da
autoridade paterna.
1 . Pe c am contra o respeito devido .aos
pais, os filhos que os desprezam, censurar:n,
ameaçam, os contradizem com ira ou as p e­
reza ou arrogélncias, prevendo que os vão
magoar e entristecer.

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TR1 BUN AL D A PE N1TÊ N C1 A 183

2 . Pecam . contra o amor devido aos pais,


os filhos que· os odeiam, aborrecem, contris­
tam e afligem, bem como os que não sofrem
com paciência suas fraquezas e não rezam
por eles�
3 . Pecam contra a obediência os filhos
que não cumprem ou que desprezam as ordens
de seus pais, e mais pecam se desobedecem
em coisas importantes como seriam as or;..
dens que lhes dessem de evitar más com­
panhias, espectáculos ou diversões perigosas.
Desobedecer em coisas de pouca monta, a
um conselho ou desejo, não seria pecado
grave .
Os filhos que, por sua habitual desobe­
diência no que respeita ao governo da casa,
perturbam notàvelmente a ordem e paz do�
m éstica ou causam graves desgostos aos
pais, pecam mortalmente se negligenciam
combater o mau hábito, fonte de desgostos
para a família.
O filho que duvida se é lícito o que lhe
mandam seus pais, estará obrigado a obe­
decer ? Com certeza. A responsabilidade não
é dele, mas de quem o manda. Em todo
o caso, podendo, consulte o confessor.

Em dois casos apenas os filhos não de­


vem obedecer a seus pais :
1 . Quando lhes mandarem coisas certa­
mente 'contra a Lei de Deus, como roubar,
matar, blasfemar, pois então importaria obe-

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O CRISTÂO NO

decer mais a Deus do que aos homens. (1)


A ordem que lhes .dessem contrária à lei
humana, civil ou eclesiástica, só deveriam
obedecer em certos casos e deteqninadas
circunstâncias. (2)
2. Na eleição do próprio estado. A vo­
cação vem de Deus ; de lhe corresponder
ou não, depende a fe 1 icidade na vi�a ·pre·­
sen te e a salvação na vida futura .
Todavia muito são para louvar os filhos
que neste particular pedem conselho aos pai 5,
e estão dispostos a segui-lo sempre que re­
conheçam não se opor à vontade . divina.
E m tudo o mais os filhos devem lembrar
a palavra de S . Paulo : « Filhos, obedecei em
tudo a vossos pais, porque isto é agradável
ao Senhor » . (5)
Quando, por justos motivos, houverem
de fazer qualquer coisa , que pre\'ejam que
vai o fendê-los, procedarn com tanta cordura
e moderação, que bem mostrem a vontade
que têm de não l hes faltar ao respeito .
« Honra a teu pai em acções e e m pala­
vras e obras e em toda a sorte de paciên­
cia » , diz a Escritura. (4)
Os pupilos, discípulos, aprendizes e cria­
dos têm quase iguais deveres para com seus
tutores, professores, mestres, amos e quais-

( 1 ). Act. 5,z5.
(2) Veja-se o que ficou dito a p ropósito do 3.0 manda­
mento. e o que se dirá sobre o jeium.
( 3) Coloss. 3,20. ( 1) Ecles. 3,9.

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TR1BUNAL DA P E N 1 1' E N G I A 185

quer qutros superiores. Devem-lhes também


respeito, amor e obediência.
Nada há mais repreensfvel e abominável� mesmo
sob � ponto de vista . natura� do q':1 e a i r:igratidão
dos filhos. Os próprios pagaos assim o iulgaram,
apesar de privados âas luzés da Fé.
Solon; o sábio legislador ateniense, decretou
pe'n as contra todos os criminosos ; só as não decre­
tou contra o filho que maltrata os ·p ais. E a alguém
que lhe perguntou o motivo, respondeu : <<Não
posso acreditar que haj a filhos que · se atrevam a
maltratar seus pais ; . inútil seria, pois, legisl ar con­
tra crime que se não pode conceoer,,. ·
E lembra-te, cristão, que maior tristeza causa­
rás a teus pais com uma vida desregrada, com uma
desobediência habitual e continua embora leve, do
que: com qualquer desobediência passageira embora
mais grave.
Cheias estão as Escrituras sagradas de conse­
lhos a este respeito :
«Honra a teu pai, e não te esqueças dos gemi­
dos de tua mãe. Lembra-te que não terias nascido
se não fora por sua intervenção, e faze por eles, em
recompensa, aquilo mesmo que eles fizeram por
t i n . (1) «Honra teu pai e tua mãe, que é o primeiro
mandamento com promessa, para que te vá bem e
sejas de l arga vida sobre a terra». (2) «A bênção
do pai ampara as casas dos filhos e a maldição da
mãe as destroi pelos alicerces». (ª) 11Maldito quem
não honra a seu pai e sua mãe». (4).
Poderia Deus falar com mais energia e clareza ?
O filho ingrato poucas vezes fica sem castigo
neste mundo. Ensina a experiência que os filhos
desnaturados costumam re .:eber, depois, de seus
filhos a paga das amarguras que causaram a seus
j.JiJ.15.

(1) Ecles. 7, 2g-3o. (2) Efes. 6, 2-3.


(�1) Ecles . 3, 1 1 .
.

(4) Deut. 27, 16.

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186
-·----- ------
O CRISTÃO N O

Olha o que conta o grande filósofo pa s ão Aris­


tóteles : Cm filho, no arrebatamento da ira, agar­
rou o pai pelos cabelos e arrastou-o pelas �sca_das
abaixo até à porta .da rua. Ao chegar aqui, o velho
bradou : 11Detém-te, desgraçado, não vás mais
além ! Foi só até aqui que eu arrastei meu pai».
Ho'nra teu pai e tua mãe. Reza por eles todo s
os dias, pois se é verdade que só estás obrigado a
encomendá los a Deus de vez em quando, todavia
tudo eles o merecem e nunca lhes pagarás o que
eles por ti fizeram e por ti sofreram. Quanto mai.s
lhes agradares, maior será a tua recompensa no céu�
Se por desgraça alguma vez os agravares ou
desgostares, não te demores em pedir- lhes perdão�
e mostra- te m ais carinhoso com eles e mais pronto
em obedecer-lhes. Se assim o não fizeres, teme os
casti q os de Deus.
E quando o Senhor os chamar, ora por eles,
sufraga-os quanto puderes, trata de os sepultar e
não esqueças nunca os bons conselhos que te deram.

Deveres dos criados


Os criados devem a seus amos, como a
representantes de Deus, - respeito, fidelidade
e obediência em tudo o que se refere ao seu
ofício e profissão. Pecam contra estes de­
veres :
1 • Se não são prontos em obedecer, se
lhes respondem com insolência, os escarne­
cem ou deles murmuram ;
2. Se passam o tempo na ociosidade;
não trabalham ou trabalham pouco, faltando
assim à justiça ; se não zelam as coisas que
estão ao seu cuidado e as deixam . estragar ;
3 . Se espalhan1 ou .çlescobrem os segre­
dos da família com prejuizo dos amos, fal-

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T IU B U N A L D A P E N I T Ê N C I A 187·

tando assim ao contrato do silêncio, cele-­


bra:do implkitamente quando entraram para
o serviço da casa ;
-

4. Se deixam o serviço antes de findar·


o contrato, sem motivo justificado ;
5 . Se desencaminham os filhos da casa.
com maus conselhos ou maus exemplos.
Se .Deus te chamou à humilde profissão de
criado, lembra-te muitas vezes das palavras de
S. Agostinho : <1Não te envergonhes, cristão, da
humi lde profissão de criado, porque servir a um
homem por ordem de Jesus Cristo, é servir e obe­
decer não a um homem mas a Jesus Cristo mesmo,.
que veio a servir e não a ser servido>>.
Serve agora os homens por algum tempo, para
um dia reinares com Cristo. No céu não haverá.
diferença entre ricos e pobres, grandes e pequenos,.
amos e criados.
Obedece a teus patrões em tudo que te m anda­
rem e for 11cito. Exigem que faças algum pecado,
como mentira < impureza ·? E ntão lembra-te da sen­
tença da Esct-1tura : Importa obedecer m ais a Deus .
do que · aos homens. Não se tratando, porém, da
transgressão dum mandamento da lei de Deus, mas .
dum preceito da Igrej a, podes, segundo as circuns­
tâncias, julgar-te dispensado dele.
Sê cauteloso e prudente em tudo o que di z
respeito aos segredos da familia de teus amos.
Nenhuma falta lhes seri a tão senstvel como qu .:11-
quer inconfidência neste particul ar.
Só em casos muito excepcionais, em que ne­
cessitasses de conselho ou conforto que eles te não­
poderiam dar, te seria licito, para resolver quai s­
quer_ dúvidas, confi ar t ais segredos a pessoa pru­
dente ê temente a Deus, que te ajudasse a livrar de
embaraços Não fales demasiado, para não semea­
.•

res discórdias.
Cumpre fiel e conscienciosamente todos os teus.

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t88 O 'C R I S T Á O NO

deveres. � obrigação de . justiça, pois recebes. a


soldada para cuidares dà.s coisas de teus amos
como se foram tuas. No · · cumprimento dos teus
deveres, toma por lema : « tudo para a m aior gló­
ria de Deus)) !
- O nosso amo está ausente. dizia um escravo
pagão ao companheiro cristão . 'Larguemos o tra­
balho e divirtamo-nos à vontade.
- O meu ainda está aqui, respondeu o cristão.
Cont empl a-me lá do alto, para me premi ar ou cas­
c i g o r seg u n d o as m inhas obras ; por isso não aban­
·dono o trabalho.
Qual deves imitar ? O cristão, certamente.
Consult a a tua consciência em cada caso 2 e traba­
lha sempre com Deus e por Deus. Escolhe, para
teu protector.' Santo que tenha exercido a tua pro­
fissão, segue seus exemplos, imita suas virtudes e
chegarás à perfeição cristã.

Dos deveres para com os superiores eclesiás­


ticos e civis

1 Devemos aos superiores eclesiásticos


(Papa, bispos, pároco e s acerdotes) respeito,


obediência e veneração. l\.iinistros e dispen­
seiros dos mistérios de Deus, investidos de
uma dignidade superior à dos reis e magis­
trados, devemos-lhe obediência em tudo o
que ordenam para bem do povo cristão em
geral, e de cada . um de nós em particul ar.
Devemos também concorrer para o seu sus­
tento. segundo os costumes da região, e as
necessidades deles .
Pecam contra este dever :
a) Os que, por ódio ou desprezo, calu­
niam, murmuram, ridicularizam e escarne-

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T R I B u N A r: · D 11..·· pÉN IT r:: NeI A 18g.

cem, por p·a lavtas, escritos, ·c aricaturas gro­


tesca_s , os ministros do . Senhor ;
.
b) Os que desobedecem às suas · ordens
e preceitos, relativos à vida espiritua] , cultó
divino, e . disciplina eclesiástica.
A estas culpas anda junto, não poucas.
vezes, o pecado de escândalo e a ruína da
religião, que tanto mais prospera quanto·
maior estima e respeito se tributa ao clero�
Pode, pois, suceder que pequena falta de
respeito, de obediência ou caridade para
com os superiores eclesiásticos chegue a pe•
cado grave, por causa das consequências
funestas que, neste caso, o escândalo pode
trazer à religião �
e) Finalmente pecam os que se recusam
a contribuir para o sustento do clero e ma­
n utenção do culto di_v ino.

Notemos b�m que tais contribuições não sãe>


de devoção, mas de obrigação. É vontade de Deus
que os fiéis contribuam� segundo as suas posses,.
p ara as despesas do culto, da conservação das . igre­
jas e sustento dos sacerdotes. Aqueles g_ue dispen­
sam aos fi�is os bens espirituais, têm direito a re-.
ceber deles o sust�nto material . e corporal. " Quem
jam ais vai à guerra à sua cust a ? Quem planta uma
vinha e não come do seu fruto ? Quem apascenta,
um rebanho e não ·se alimenta do seu leite ? . Se • .

nós semeamos as c.oisas espiritu ais, ? .p orventura


muito se recolhermos as temporalidades que vos
pertencem a vós ? Não sabeis que os que trab alham
no santuário, comem do que é do santuário, e que
os que servem ao altar.; participam justamente do
altar ? Do Jll e smo ·· modo ordenou também o Se-

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190 O CRISTÃ O NO

n hor aos que pregam o Evangelho, que vivam do


.
1·.vangelho». (l)
E sta obrigação pode ser grave até certo ponto,
principalmente quando as igrejas não têm rendi­
mentos e o estado não sustenta os mini s tros · do
culto. Em tais casos aos cristãos co m pete prover
.às neces.sidades mais urgentes dos sacerdotes.

2. Semel hantes a estes, , guardadas as


devidas proporções, são os deveres que te­
mos para com os superiores civis. S. Paulo,
-escrevendo aos - cristãos de Roma sujeitos à
autoridade pagã, declarou expressamente
-que « todo o homem esteja sujeito aos pode­
res superiores, porque não há poder que não
venha de Deus, e os que há, ordenados por
Deus foram » . (2)
A autoridade civil · vem também de Deus, pois.
Nosso Senhor reconheceu tanto os seus superiores
temporais como os espirituais. ccNáo terias sobre
mim poder al�um: se não te fora dado lá de cima»,
· dizia Jesus a Pi lacos. (<1)
E ainda noutra ocasião, em termos ·s imples
:mas enérgi " cos� deu relevo às obrigações que temos
para com a autoridade civil : «Dai a César o que é
de César e a Deus o que é de Deus». (4)
A exemplo do Divino Mestre, os Apóstolos
lembraram. claramente e em diferentes ocasiões, os
- d everes par a com os superiores temporais.
S. Paulo resume assim as nossas obrigações
par � � om � autorid �de ci vil : «É necessário que lhe
estejais su1euos ; nao sómente pelo temor do cas­
tigo, m as também por obrigaç·ão de consciência.

(r) I Cor. 9, j·I4. t2) Rom. 1 3, r.


(3) João 19, u . (4) Mat. 22, 2 1

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T R 1 13 U N AL D A· P E N I T Ê N C 1 A 191

Pagai, pois, a todos o que lhes é deYido : a quem


imposto, imposto ; a quem tributo, tributo ; a quem
temor, temor ; e a quem honra, honrai). (1).
Que «todo o homem estej a sujeito aos poderes
superiores)). A obediênci a à legitima autoridade
civil é1 portanto, para o cristão, um negócio de
consciencia, e, praticada com as dev.idas disposi­
S'. õe�, é virtude. A insubordina � ão e a revol! a são
il.f citas. Quando, porém, as leis e ordenaçoes do
poder civil -. são a b ertamente contrárias à lei - -de
D eus, é preciso recordar estoutra palavra dos Após­
t.Q los : «Importa obedecer mais a Deus do que aos
homens,,. (2)
«Pag ai, pois, a todos o que lhes é devido ;
a quem imposto, imposto ; a quem tributo, tributo)).
O Estado faz-nos grandes beneffcios, especialmente
no que respeita à instrução1 forma ção, segurança e
comunicações. Estes bene Ucios e semelhantes im­
põem-nos obrigações, entre as quais está a de pagar
os imp ostos. Eximir-se o cristão ao pagamento d. as
contribuições e impostos, é faltar aos seús devere s
para com a pátria, e tratando-se de somas avul tadas,
é ser causa de que os encargos pesem mais sobre
os outros, e portanto é lesar a .lustiç� social
« D ai a César o que é de César»> . E imposto bem
pesado, m as mais sagrado ainda do que os outros,
� imposto de sangue, o serviço militar para defesa
da pátria. Pois que é meritório o cumprimento
deste dever, bem compreendi do, podemos . chamar
ao sentimento que o inspirá, ao amor da pátria1 uma
verdadeira virtude em toda a extens·áo da palavra.
Chamamos · mártires aos que morrem em defesa
da fé ou duma virtude crist ã ; mártires são t ambém,
e m certo modo, os "que oferecem a sua vida pela
pátria com recta intenção e em estado de graça.
«Dai a Deus o que é de Deus». Nos· tempos
actuais o poder não está só nos soberanos ; o povo
toma nele a sua parte por meio dos seus represen-

(IJ Rom. 12, S-7 . (2) Act. S ,29 ..

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192 O CRISTAO NO

t antes, os membros das câmaras legislativas; É ele


que elege os· seus procuradores e deputados tor.:...
nando- se assim responsável pelos actos do governo.
O direito de votar torna-se assim uma obrigação.
E é dever votar sempre em candidatos que previa-:
mente se sabe estarem dispostos a dar tanto a Deus,
como a Cc:sar: o que a cada um deles é devido. ,.

Quanto a c r ença está mais viva e arrei � ada no


coração do povo, m ais profundo é o respeito para
com os sacerdotes. Encontramos a prova eloqu�n­
t1ssima des t a verdade nos primeiros tempos do:
cristianismo. Não era raro, então, ver os reis e
imperadores descerem do seu trono; para ir ao en­
contro do sacerdote, beijar-lhe a mao e pedir-lhe a
bênção. (1)
Quando o cruel Hunerico desterrou os bispos
e os padres católicos, diz um historiador, o povo
seguiu-os com toch as acesas, e as mães depunham
aos pés dos confessores da fé os filhos qu � l evava� '
nos braços e exclamavam com as lágrimas nos
olhos :- A quem nos confiais, se partis para o des­
t erro para nunca mais voltar ? Quem baptizará nos­
sos filhos ·t Quem nos ouvirá de confissão e absol­
verá dos pecados ? Quem nos acompanhará à
se pultura e oferecerá por nós o santo S acrifício da
missa . ? Prouvera a Deus que vos pudéssemos acom­
panhar para o desterro».
Casos. semelhantes se deram em 1 8 7 0 na perse­
guiçã ? chamada o Kulturkampf contra os católicos
prussi anos.
Basílio, imperador bisantino, procurou por to­
dos os modos despertar em seu filho Leão senti­
mentos de respeito e veneração pelos saçerdotes :
"A honra que se dá aos sacerdotes, dizia ele, recai
sobre Deus. Assim como desejamos que p povo
honre a nossos ministros por nosso respei to, assim

(1) SCHUSTER. Manual católico.

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T R 1 B U N A L D A. P E. N 1 T Ê N C 1 A 1g3

Deus desej a que honremos os sacerdotes seus mi­


nistros, pelo respeito que a Ele lhe devemos».
Isto mesmo declarou Jesus Cristo quando disse
ao s seus Apóstolos e neles aos bispos e sacerdotes :
((O que a vós ouve, a mim ouve ; o que a vós des­
preza a mim despreza ; e quem me despreza a mim,
despreza Aquele que me enviou». (1)
Não olhes tanto à pessoa do sacerdote, como
à sua dignidade e carácter sagrado. Se não vive
como deve e dá mau exemplo, recorda-te da pal a­
vra do Divino Mestre : ccSobre a cadeira de Moisés
sentaram -se os escribas e fariseus ; observai, pois,
e fazei tudo quanto eles vos disserem, porém não
obreis segundo a prática das suas acções». (;.i) Lem­
bra- te que o sacerdote, não obstante a sublime di 9-
nidade a que foi elevado, é miserável filho de Adao
como tu. Não lhe exijas, pois, a santidade perfeita.
Quando julgares que tens direito e necessidade
Je falar ou proceder contra algum sacerdote, usa
de toda a prudênci a para não faltares ao respeito
que sempre é devido ao carácter sacerdotal, e evi­
tares todo o escândalo e mau exemplo. Teme o
castigo de Deus. ccO Senhor, diz S. Pedro, sabe li­
vrar aos justos da tentação, e reservar aos maus
para o dia do juizo, a fim de serem atormentados ;
e principalmente aqueles que, seguindo a carne,
andam em desejos impuros, e desprezam a domi-.
nação, atrevidos, pagos de si mesmos, não temem
introduzir novas seitas blasfemando». (ª)
Não resi stas às ordens dos teus superiores, lei­
gos ou sacerdotes ; porque ((aquele que resiste à
potestade, resiste à ordem de Deus ; e os que lhe
resistem, a si mesmo trazem a condenação». (4)
«Teme ao Senhor com toda a tua alma e venera
os seus sacerdotes)>. (5) Observa fielmente este pre­
ceito do Senhor, e observa também aqueloutro que
reza assim : «Temei a Deus, respeitai ao rei». (6)

( 1 ) Luc. 1ô, i6. C2) Mat 23, 2.3. (1) 2 Ped. 2, g-ro.
(4) Rom. 1 3, 2. (Sr Ecles. 7, 3r. (6) J Ped. 2, 1 7 .

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194 O CRISTÃO N O

O apóstolo recorda neste texto o temor de


Deus e o respeito do rei. Ambas estas obrigações
têm, no seu parecer, o mesmo valor. A honra, a
obediência, o amor e a fiel adesão ao m agistrado
superior são uma obrigação sagrada e um caso de
consciência. Quando prestas ao supremo po ler do
estado, honra e obediência, é como se a prestasses
a Deus. É a Deus a quem honramos, quando hon­
ramos o poder civil ou eclesiástico. Porque «res­
peito, a quem respeito ; honra, a quem honra,,.

Dos deveres dos pais

cc Amarás ao teu próximo como a ti


mesmo » . Esta lei do amor tem maior força,
e significado todo �special , quando se aplica
a fi lhos e pais, unidos entre si pelos laços
mais íntimos da natureza.
O amor dos pais para com os filhos
deve ser :
1 . puro ou fundado em motivos nobilís·
simos de amor de Deus, e nunca de amor
sensual e carnal.
2 . e.fica\, isto é, deve mostrar-se em
obras de verdadeiro amor, tanto no tem·
poral como no espiritual.
3. racional, e ordenado a promover a
verdadeira felicidade temporal e espiritual
dos filhos ; de contrário não seria verdadeiro
amor, e serviria apenas para desgraçar os
filhos.
O amor dos pais deve manifestar-se num
cuidado grande pelo bem corporal dos filhos.
Pecam contra esta obrigação os pais que ex·

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N (, 1 A 195

põem os filhos a perigo de vida ou lhes da­


nificam a saúde, dando-lhes por exemplo
bebidas alcoólicas nos primeiros anos ; os
que dissipam a f0rtuna com os prazeres,
jogo ou luxos extravagantes ; os que não
provêm seus filhos de alimentos e vestidos
convenientes, ou os impedem de seguir a
sua vocação.
Acerca do costume, já muito espalhado,
de se dar às crianças cerveja, vinho, água-ar­
dente e outras bebidas alcoólicas, escreve
o bispo Dr. Paulo von Reppler em pas­
toral sua do ano 1 902 : ccEu devo chamar
ao ·costume de dar às criancinhas bebidas
alcoólicas em vez de leite, um pecado que
bró.da ao céu ; e devo levantar a minha
voz contra este crime de envenenamento,
porque, é sentença · comum de todos os mé­
dicos, o alcool é, para as crianças, um
veneno. Que tomem tentf) os pais, e repa­
rem no que se lhes diz, enquanto é tempo ;
s�não, vão ver ó que sucede : fazem dos
filhos uns doentes e achacados, idiotas e
maus, e preparam-nos para bêbados e de­
vassos, desgraçados nesta e na outra vida,
castigos estes que caem sobre os próprios
pais e que serão um remorso a roer-lhes o
coração até à morte» .
Tais pal avras são sempre verdadeiras.
Nunca �erá em demasia o cuidado dos pais
em livrar os filhos das bebidas alcoólicas
para bem d-a sua saúde do corpo e da alma.
Assentem bem os pais neste princí pio : Nos

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O CRISTÃO N O

primeiros anos nunca dar aos filhos qual­


quer bebida alcoólica ; e, depois, só raras
vezes e sempre pouco.
Maior cu idado deve merecer aos pais o
bem · espiritual dos fiJhos, a sua educação e
a formação da sua inteligência e vontade.
E, por isso, pecam os pa is
1 . Se por negligência ou descuido não
procuram instruir seus fil hos na religião ca­
tólica ; não os ensinam a rezar, nem se im­
portam de saber se cumprem os manda­
mentos da Lei de Deus e da Igreja, ou se
assistem à missa e satisfazen1 o preceito
pascal .
2. Se l hes dão maus exem plos, pois nesse
caso todos os consel hos seriam frustes, . e sem
fruto a educação se os não afastam das más
companhias e ocasiões de pecado ; se se con­
tentam com dar-lhes educação meramente
profana, que nada aproveita à alma.
3. Se não corrigem seus fil hos, sempre
que sej a necessário, para os afastar do mal,
aplicando-lhes o correctivo conveniente à sua
idade e à graveza das fahas cometidas. A Es­
critura Sagrada inculca este dever em quase
todas as suas páginas.
P a i s e m ães, cuidai com todo o carinho do bem
corporal dos vossos fi lho�, desde o primeiro ins­
t ante d a sua existência ; m as n ão ponh a i s menos
cuidados em l hes dar de t am anhi nhos um a edu­
cação só l id amente cristã.
Apenas com ecem a fal ar, ens i n a i-lhes os santos

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TRIBU N A L D A PENIT Ê NCI A 1 97

nomes de Jesus e Maria, e alguma reza pequenina.


Não importa que não saibam o que dizem;· basta
que o entenda Deus e Jes·us Cristo, que disse : «Dei­
xai vir a mim os pequeninos, porque deles é o reino
dos céus ». (I) Mais tarde, quando puder�m com­
preender as palavras que dizem agora, encontrarão
maior gosto e facilidade em as r epetir, por serem
as santas devoções da sua infân .:ia .
· ·

Dai sempre bom exemplo aos vossos filhos.


Se sois indiferentes e ttbios no cumprimento dos
deveres para com Deus, não tereis de que vos quei­
xar se vossos filhos forem para convosco indiferen­
tes e irreverentes. Os vossos tftulos ao seu respeito
não são melhores nem mais bem fundados do que
os de Deus para convosco .
Pai incrédulo dissuadia o filho de assistir à
missa aos domingos.
- A missa, dizia ele, é boa para tua mãe e
irmã ; tu, vem comigo para o trab�lho.
- Mas então o preceito de ouvir missa é só
para minha mãe e irmã ? - perguntou o filho.
- Tolices, tolices ! disse o pai sem saber que
mais dizer.
- Ah ! mas então também deve ser tolice o
preceito que diz : «honrarás teu pai e tua mãe».
Grande verdade, a resposta daquela criança !
Não digas nem faças, diante de teus filhos, coi­
sas que possam induzi-los ao peca do. Acautela-te
até dos mais pequenos. Se ainda não entendem o
que dizes ou fazes.' têm contudo olhos e ouvidos e
u m a memória que lhes guardará recordações, que
mais tarde podem ser causa de graves danos para
a sua alma.
Finalmente, vigia· os e livra- os, quanto J?OS­
slvel, das más c o m p a n h i as . Por m a i s educado, ino­
cente e be m que teu fi l h o seja, St! anda em más
companhi as, correrá grandes riscos, por melhores
cui dados que em tudo o mais tu ponhas.

( 1 ) Ma t. 19, 14.

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198 O C l� l S T Á O N O

Nunca as apreensões sobre o fu t uro da farnllÍa


e de t eus fi lhos sejam causa de te pore s a má vida.
Confi a na Providência, e o l h a que a v i d a de matri­
môni o, levada no m e i o de pec ados, é um 'riste pre­
nún � i o de muitas a m arguras e de pouca ou n e­
nhu m a fel i ci da d e .

Mútuos deveres dos cônj uges


Os cônjuges, unidos entre si por laços
íntimos, sagrados e indissolúveis, devem
amar-se mutuamente, e praticar a mesma
religião.
« Levai a carga um do outro » . ( 1 ) Estas
palavras de S . Paulo devem ser a suprema
regra da vida conjugal, do mútuo entendi­
mento e sofrimento.
Portanto, devem os esposos servir ao
Senhor em comum, pedir e solicitar os bens
comuns, orar um pelo outro, receber os Sa­
cramentos e assim procurar a Deus. Se um
se torn a negligente e descuidoso rio serviço
de Deus, o outro deve redobrar de esforços
para o reconduzir ao bom caminho.
A mulher deve obedecer ao marido, que
é o chefe da família, em tudo o que for
razoável e honesto. <<As mulheres, diz
S . Paulo, sejam sujeitas aos seus maridos
como ao Senhor » (2), isto é, em tudo o que
não é contra o mesmo Senhor.
Aos maridos impõe também o Apóstolo

( 1 ) Gal. (2) Efes.

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T R I B U N A L D A P E N I T Ê N C I A. 199

este preceito : «Maridos, amai a vossas mu­


lheres, como também Cristo amou a Igreja
e por ela se entregou a si mesmo». (1) O ma­
rido cristão considera obrigação sagrada amar
sua mulher como a companheira da sua vida,
honrá-la, protegê-la e procurar-lhe o neces­
sário, segundo as suas forças.
Os esposos devem guardar um ao outro
a mais inviolável fideli�ade conjugal e cum­
prir mutuamente as obrigações matrimoniais,
conforme as santas leis estabe] eciqas por
Deus. A viol ação da fidelidade conjugal
(adultério) é pecado mortal . Até nos pen­
samentos devem os esposos guardar fideli­
dade, porque, não só por acções mas tam­
bém. por pensamentos e desejos desonestos
voluntários, se ofende a castidade do próprio
estado e se falta à fidelidade prometida.
A respeito das obrigações próprias do
estado matrimonial e mútuas rel ações dos
esposos, pode estabelecer-se o seguinte :
Como os actos matrimoniais são orde­
nados por Deus e claramente impostos pela
Providência divina, por toda a vida se podem
praticar desde que não haja perigo grave para
a saúde e vida de algum dos cônjuges ou para
os filhos que se esperam. Feitos com recta
intenção são até acções boas, honestas e
santas, como o ensina S. Paulo : C< Ü marido

(1) Efes. 5, 25.

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200 O CRISTÃO N O

pague a sua mulher o que lhe deve, e da


mesma maneira também a mulher ao ma­
rido. Não vos defraudeis um ao outro, se­
não talvez de comum acordo, por algum
tempo, para vos aplicardes à oração» . (1)
Tudo, porém, que é contra a fé dó
matrimónio, é pecado, e atrai os castigos de
Deus . « Seja por todos tratado com honra o
matrimónio» (2), diz S . Paulo. Quando por
qualquer motivo se n ão poden1 cumprir os
actos matrimoniais, seja porque com eles
corre perigo grave a saúde ou vida da es­
posa, seja pelo que for, os cônjuges ficam
estritamente obrigados à lei da continência.
Se a não podem observar só pelas próprias
forças, Deus não l hes há de faltar com a
ajuda da sua graça . Quem sabe que só por
si não pode ser casto, pede com fervor esta
graça, e procura, na comunhão frequente e
noutros exercícios religiosos e sobrenaturais,
as forças precisas para mortificar os senti­
dos e vencer a fraqueza humana.
As vistas e toques úte is para o mais fácil
cumprimento dos deveres conjugais, não são
pecado. Feitos sem motivo razoável , são con­
tra a virtude fundamental da temperança, e
porisso não são isentos de pecado leve para
a parte culposa. Se, porém, são tais que
naturalmente arrastam a pecado grave, nesse
caso vão contra o fim do matrimónio e são
gravemente pecaminosos .

( 1 ) I Cor. 7, 3 e 5 . ( 2) Heb. 1 3, .J.

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TRIBU N AL DA PE N 1 T l� N C 1 A 201

Os pensamentos, os desejos, os pedidos


do que lhes é permitido, não são proibidos,
desde que não tragam consigo qualquer pe­
rigo ; mas quem quer ser casto e pudico,
não se entretém com pensamentos inúteis,
não só pela estima que lhe deve merecer a
castidade do próprio estado, como pelo bem
dos filhos. . ..

« As pessoas bem formadas, diz S. Fran­


cisco de Sales, só pensam n a comida quando
se sentam à mesa, e lavam as mãos para
comer e não para chamar a atenção dos
comensais. Do mesmo modo devem proce­
der os casados, guardando a liberdade e
susceptibilidade para coisas nobres - e ele­
vadas » .
« Ü cumprimento dos deveres conjt,Igais,
diz o mesmo Santo noutra parte, asseme­
lha-se ao comer. A comida é necessária
para sustento do homem e porisso tem de
ser boa e proporcionad a às necessidades de
cada um ; mas quando alguém come com
avidez e em demasia ou a deshoras, torna-se
cul pado de intem perança D .
Os cônjuges cristãos podem segui r esta regra :
Quanto mais castos, segundo o seu estado, tanto
mais perfeitos. Quanto m ais perfeitamente guar­
darem e cultivarem a cast i dade conjugal, tanto me­
l hor para eles e para os filhos que esperam. Quando
procuram observar a castidade conjugal tão perfei­
taniente quanto posstvel e a oferecem a Deqs por
uma consagração sublime, transmitem com ela aos
seus filhos, como herança, um apreciabilfssimo te­
souro de castidade·e pureza. Pelo contrári o, os· pais

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202 o CRISTÃO NO

levianos gravam a alm a dos filhos com o germe


morttfero das m ais funestas paixões. ·

Deveres dos Superiores


Deverfamos tratar aqui dos deveres das auto­
ridades para com os súbditos, dos mestres e edu­
cadores para com os seus alunos e educandos, dos
patrões para com os criados e empregados ; mas
apenas �tocaremos ao de leve os deveres dos mes­
tres e educadores para com seus di scfpulos e dos
patrões para com seus criados.

Deveres dos mestres a educadores

Os primeiros mestres e educadores, se­


gundo . a lei natural e divina, são os pais.
� deles o direito e o dever de educ ar e for­
mar a alma dos seus filhos no que respeita
à moral e à religião, e de lhes ministrar os
conhecimentos necessários e úteis à vida.
Os pais, porém, nem sempre podem de­
sempenhar por si estes múltiplos deveres, e
porisso confiam tal missão a mestres e edu­
cadores da sua escolha. E estes ficam obri­
gados a.o rigoroso cumprimento do contrato
implícito ou explícito, feito com os pais.
Quando é o Estado que se incumbe de mi­
nistrar a instrução por n1eio das suas esco­
las, os professores têm os deveres que têm .
os pais, cuj a autoridade representam.
Pecam os mestres que :
1 . ocupam o tem pó de escola em traba­
lhos alheios a ela, ou se não preparam como
convém ;

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T R I B U N A L D A. P E N I T Ê N C I A 203

2. descuidam a formação moral e reli­


giosa dos alunos; não lhes corrigindo os de­
feitos, não os repreendendo quando preciso,
permitindo-lhes más acções, e, pior ainda,
escarnecendo da religião, ridicularizando os
dogmas, destruindo-lhes assim a fé e os
bons costumes ;
3 . são injustos nos prémios ou casti­
gos, etc.
Procuravam algumas mães aproximar-se de Je­
sus para que lhes abençoasse os filhos, e os Após­
tolos julgaram seu dever afastá-las para não mo­
lestarem o Salvador.
Jesus repreendeu-os, dizendo-lhes : ccdeixai vir
a mim as criancinhas, porque del a s é o reino dos
céus». Impôs-lhes as m ãos e abençoou-as.
Eis, mestres cristãos, o vosso modêlo ! Aprendei
aqui o amor, o carinho, a ternura com que deveis
tratar as cri anças, e a sublimidade do ministério
que vos está confiado� Não vos esqueçais de que a
vossa primeira obrigação é formar, para Cristo e
para o reino dos céus, seus corações J á preparados
pelo bapt ismo e graça divina para receberem as
âoutrinas sublimes do cristianismo e para tudo o
que as ajudará a serem pessoas de bem e cumpri­
doras dos seus deveres.
O mestre cri stão deve empregar todos os meios
para ministrar aos seus discfpulos os conhecimentos
que preci .;am para serem felizes neste e no outro
mundo. Deve educá-los e instrui-los convencido
de que a instrução intelectual. sem a educação do
coração, nunca poderá fazer o homem feliz.
Nun.:a deixará de unir a severidade à bondade,
a justiça ao amor. Será imparcial para com todos,
carinhoso para cada um. Repreenda e castigue
quando for necessário ; nunca por cólera, e sempre
com amor e por amor.
O mestre cristão não deve sómente ensinar

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20.., O C RI STÃ O N O

com pala vras, mas deve actuar sobre os seus discí­


pulos com o suave influxo dos seus exemplos. Lem­
brado do antigo prolóquio « as palavras movem e os
·exemplos arrastam)), empregará todos os me·i os para
cultivar em si mesmo o espírito de verdadeira pie­
dade e mostrar no exterior os sentimentos reli­
giosos que interiormente o animam. Que se po­
Cleri a esperar, se os mestres destruissem com o
.exemplo o que ensinam com as palavras ?
Muito pode fazer a bem da salvação das almas
· e da socied ade, o m estre bom e cristão que cumpre
o seu dev er . . Que consol ações não deve . experi-
· mentar ! E� ainda que um ou outro aluno iluda as
suas esperanças e resista, talvez desde o principio,
à sua influência salutar, quantos em compensação
não seguirão o caminho que lhes ensina !
Como t ambém será feliz a criança que crescer
sob a influência de um mestre bom e cristão ; e quão
infeliz aquela cujos professores não têm elipfrito re­
ligioso.
«Felizes, excl ama um grande mestre de espfrito,
fel izes das crianças que deram com mestre que as
am a com amor sobrenatural, l- incero e paternal !
Infelizes del as se cairam na s mãos de mestres ou
mestras cuj o coração está l onge de Deus !»

Deveres dos amos

Os amos devem tratar a seus criados


com amor, instruí-] os com a palavra e o
exemplo, � onfirmá-los no bem, corrigi-Jos
sendo preciso, e pagar-lhes o trabal ho con­
forme a justiça e equidade.
Pecam contra este dever os amos que :
1 . t ra t a m os criados com a s p e reza e des­
prezo ; não l hes dão o alimento n ecessário �
os sobrecarregam com trabalhos excessivos,
·OU os despedem sem caridade e justiça ;

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T R1 8 U N AL D A PE N 1T ENC I A 205

2 . não lhes pagam a soldada ou demo­


ram o pagamento ; os despedem antes do­
tem po, sem motivo justificado ;
3 . os impedem de cumprir os deveres
rel igiosos, não ·lhes dando para isso o tempo
necessário sem justo motivo ; encobrem os
seus crimes, e, o que seria pior, os induzem.
ao pecado.
Não consideres a teus criados como sim p les
máq uinas de trabalho, nem limites os teus cmda­
dos a examinar se trabalham-. Vai mais além :
pensa na salvação da sua alma. Confirma-os no
bem e afasta-os do mal, vigiando-os conveniente­
mente.
Trata-os como desejarias ser tratado por el es
se estivessem no teu lugar, recordando as palavras
da Escritura : ctSe tens um servo que te é fiel, es­
tima-o como à tua alma ; trata-o como a irmão» (1)
porque «se alguém n ão tem cuidado dos seus, e
principalmente do5 de sua casa, esse negou a fé e é ·
pior que um infiel». (2)

Quinto M andamento
ccNão matar» .
Por estas palavras proíbe Deus tudo o-·
que prejudica, de qualquer modo, a vida
corporal e espiritual nossa Ol.J do nosso pró­
xi1no ; e manda :
1 . que nos amemos a nós mesmos, isto
é, que cuidemos do nosso bem corporal e
espirit_ual .

( 1 ) Eclesl. 33, 3 1 . (2) J Tim. 5 , 8.

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200 O CRl�TÃO N O

2 . que amemos ao nosso próximo, como


a nós mesmos.
«Não matarás» . Com estas palavras não
se proíbem só as obras que prejudicam, mas
também os pensamentos e d�sejos contrários
ao amor de nós mesmos ou do nosso pró­
ximo, e tudo o que a tal desamor pode levar,
como a excessiva tristeza, a ira, ódio, os
desejos de vingança e palavras de escárnio,
de desprezo e maldição. cc O que tem ódio
.a seu irmão, diz o Evangelho, é homicida » . (1)
« Eu, porém, vos digo, que todo o que se
ira contra seu irmão, será réu no juizo » . (2)
Trataremos aqui especialmente do pre­
ceito de amar os inim igos e do pecado de
escândalo e sedução.

Do amor dos inimigos


«Eu vos digo : amai a vossos m1m1gos,
fazei bem aos que vos têm ódio, e orai pelos
que vos perseguem e caluniam, para serdes
fi lhos do vosso Pai que está nos céus, o qual
faz nascer o seu sol sobre bons e maus, e
vir as chuvas sobre justos e injustos » . (5)
Não há aqui apenas um conselho, mas
verdadeiro preceito que o Salvador impõe,
como de todo o contexto se conclui.
A mar é : «não fazer mal a ninguém, e
fazer bem a todos » . Portanto não te é lícito

( 1 ) Jo. 3 , 1 5 . (2) Mat. 3, 22. (3) Mat. 5, 44-45.

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TR1B UNAL D A- P E N l T E N C 1 A 20']

odiar nem lá no íntimo desejar mal ao pró­


ximo, e muito menos vingar-te ou pagar o
m al com mal. Podes, sim, exigir, por vias
justas e legais, a restituição e reparação dos
prejuizos que te causaram, mas sem pensa­
mentos de vingança ou de qualquer outra
m á paixão.
Não é permitido recusar ao ofensor as
mostras comuns de benevolência e as obras
ordinárias de caridade e de misericórdia.
Pode, pois, ser pecado recusar-lhe esmola
quando necessitado, não . o saudar, não cor­
responder às suas saudações, evitar s -:m
justo motivo o seu encontro, principalmente
quan·do o caso pode ser notado e 1 evado a
mal .
E são estes o s deveres de obrigação para
com os inimigos . Manteres com eles rela­
ções especiais de amizade, recebê-los em tua
casa e outras provas semelhantes de bene­
volência, a tanto não estás obrigado.

Há obrigação de saudar os inimi gos ?

A saudação, segundo o uso corrente, é sinal da


veneração e respeito que se presta a certas pessoas
pela sua dignidade e posição social ; e assim se diz :
«honra, a quem a mere..:e>i, É, além disso, prova
de amor e amizade. Como tal, não é de obrigação
para com os in;migos.
Mas onde é costume saudarem- se todas as pes­
soas -·que se encontram, não é licito negar a sauda­
ção aos inimigos, pois negâ la, tàcilmente e com
razão, seri a 'levado à conta Ja desconsideração, vin­
gança e mâ vontade:

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208 O CRISTÃO NO

Todavi a se, uma vez por outra, negas a sauda­


ção a quem te o fendeu para lhe mostrares quanto
sentes sua má conduta, não o fendes gravemente a
caridade.
Não faltas à caridade para com os inimigos que
por acaso tenhas, desde que h abitualmente lhes dês
as mostras ordinárias e comuns de benevolência.
Estas, só as poderias negar se previsses que as tuas
tentativas de reconciliação havi am de ser mal in­
terpretadas por teu mimigo, provocando-lhe pala­
vras ou acções que iriam servir para mais e m ais
te incompatibil izares com ele.
Se teu inimigo despreza as tentativas de recon­
ciliação, não respondendo às saudações, negando-te
a palavra, não tens para com ele outra obrigação
mais que perdoar de todo o coração e n ão guardar
contra ele qual quer ressentimento.
Também nao pecas, se perdoando do coração
a quem te agravou e não guardando ressentimento
con tra ele, l he negas todavia qualquer serviço com
·o fi m d e lhe dares a entender o teu justo senti­
mento, e de o obrigares a reconhecer o mal que
praticou e a voltar ao bom caminho.
Vej amos num exemplo : o pai justamente indi­
gnado com o procedimento do filho, proi be-lhe a
entrada em casa, não lhe fala nem o abenço a du­
rante algum tempo, para o ch amar ao bom cami­
nho. N ão pecaria desde que não se deixasse domi­
nar pel a cólera ou estendesse o castigo mais do
que é necessário à emenda do filho. A prudência
dos pais deixamos o cuidado de ver o que melhor
poderá servir de emenda aos filhos : se o castigo
severo, se a terna e amorosa exortação.
Am ar os inimigos · é preceito característica­
mente cristão, e, por isso mesmo um dos que mais
directamente se opõem ao espfrito do mundo.
O mundo diz : «Não nos devemos deixar esmagar :
quem não se vinga, é cobarde ; temos de defender
os nossos direitos ; quem de mel se faz, moscas o
comem». S ão - estas as m áximas do mundo. Pois

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TR IBUN AL DA P E N ITÊNCIA

não será por- . elas que Deus nos julgará, mas pelas
leis do seu · EvangeJho, que diz expressamente .:
. c<Am ai <;>s vossos inin:i1�os».. «Todo o que ter:n
ódio �
a seu irmao, é hom1c1da. E vós bem sabei�
que_ nenhum homicida tem a vida eterna permanen­
temente em si mesmo». (1) «Far- se-á juizo sem mise­
ricórdia àque' e que não usou de misericórdia». (2)
Assim fala o Senhor ; ao homem só fica o.b edecer.
Se não é nada fácil cumprir este preceito, tam.;.
bém não é impossivel. Repara no exempJo do Sal"."
vador. Pregado na cruz, orava pelos seus inimigos
e algozes : «Meu Pai, perdoai-lhes, pois não sabem
o .que fazem». No seu exemplo encontrarás a cora­
gem que te há de fazer fácil pela graça o que pa­
recia 1.m posstvel à fragilidade humana.
Sentirás, sem dúvida, as ofensas e injúrias que
te fizerem ; e, quando as recordares, surgirão dtntro
de t1 movimentos de indignação e antipatia contra
os teus inimigos. Não é pecado sentir rancor ; é,
sim, pecado, consenti-lo voluntária e deliberada­
mente.
Podes estar tranquilo e sossegado, se, não obs­
tante as tentações de ódio e antipatia que contra
teu inimigo te sacodem o coração, fazes violência
a ti mesmo, e do melhor modo possfvel lhe dás as
mostras ordinárias de benevolência, exercitando
qualquer obra de misericórdia a seu favor ou ao
menos orando por ele.
Sê misericordioso com o próximo, como que­
res que ·Deus o seja contigo. Quantas vezes não
terás tu posto à prov11: a · bt:nigntssima . bonda�e de
Deus. E sempre Ele generosamente te perdoou.
Não será justo que também tu perdoes as ofensas
recebidas ? c<Servo mau, perdoei-te a divida toda
porque me vieste rogar para isso. Não devias tu
logo igualm�nte compadecer-te do teu c<;>mpa�heiro,
assim como também eu me compadeci de u .? » (8)

(1) 1 Jo. 3, 15. t2) Tlag. 2, 13. (3) Mat. 18, 32-35.

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2W O C R I S TÃ O N O

Todos os dias repetes no «Padre nosso» : «Per­


doai-nos as nossas ofensas, assim como nós per­
doamos a quem nos tem o fendido)). Já pensaste
bem nestas palavras ?
Não sejas demasia damente sensfvel às injúrias
e o fensas mais ou menos graves com que te ferem,
nem zeles intran.;igentemer.te os teus supostos di­
reitos. É licito de fenJer nossos direitos pel as vias
legais e honestas ; mas é muito mais cristão regú­
lar amigá\l'elmente as desavenças e contendas.
Q uantos d anos temporais e espirituais não vêm
de proce s sos desnecessários e sem pre prejudiciais
para as partes cont.:ndoras ! E se houvesse verda­
âc-ira cari dade cristã, ter-se iam talvez evitado 1
Estende generosamente a mão a teu inim igo, e não
deixes que se ponha o sol sem te reconciliares com
ele, como diz o Divino S a lvador.
It preciso que perdoes, para não seres um dia
condenado etérnamente. Porque não fazes agora o
que terás de fazer mais tarde t
S ! foste t ll que ofenJ.e ste a teu próximo, tens
obrigação de pro�urar reconcili ar-te com ele, ofe­
recendo- lhe de novo a tua amizade, e mos lrando­
-lhe a tua benevolência. Se ele não aceitar a re­
conci liação que lhe o fereces, sossega. Já cumpriste
o teu dever e asseguraste a tua salvação eterna.
Se houve ofensa m útua e si multânea, não te
percas a pesar quem teve mais razão ; mas estende
l ogo a m ão ao inimigo e faz com ele as pazes por
amor de O éus : «perdoai, para que também o vosso
Pai que está nos céus, vos perdoe os vossos peca­
dos». (1)

Do escândal o ou sedu�ão
A palavra escândalo, em sentido próprio,
significa obstáculo. Em linguagem teológica

(1) M.irc. u, 25.

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T R I B U N A L L> A l' E N I T Ê N C I A 21 1

significa a palavra, acção ou omissão, que é


para o próximo ocasião de pecado.
O escândalo diz-se directo, quando pre­
meditada e' deliberadamente se intenta o
pecado do próximo ; indirecto, quando,
embora não se intente o pecado do próximo,
suficientemente se prevê que as nossas pala­
vras, acções ou omissões o induzirão a pecar.
Do escândal o d i reclo

Há escândalo directo quando se induz o


próximo ao mal , aconselhando, ajudando,
mandando, aprovando ou apl audindo.
Quem deliberadamente induz o próximo
a pecado grave, peca gravemente contra a
caridade e contra o preceito ou virtude a
cuj a violação o induz. Quem aconselhar
outro a cometer um furto, deve na confissão
decl arar « induzi o meu próx imo a furtar» ,
e acrescentar logo a qualidade e quantidade
do furto.
O amo que sem justo motivo induz os
criados ou operários a trabalhar ao domingo
e dias de festa, pe.:a, e deve dizer n a con­
fissão que obrigou seus súbditos a traba.J har
em çiia de festa de preceito.
E evidente que uma coisa é induzir o
próximo a roubar e outra a jurar falso ;
uma . coisa é levá-lo a trabalhar ao domingo,
outra a violar a castidade ; e por isso n a
confissão s'e deve decl arar qual � espécie de
pecado a que se induziu alguém .

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212 O CRISTÃO NO

Do esclndal o indirecto

Há escândalo indirecto, quando, não ha­


vendo intenção de induzir o próximo a pecar,
se faz , ou omite, sem justo motivo e causa
suficiente, qualquer coisa que se prevê irá
servir de ocasião de pecado ao nosso semi­
lhante.
h escândalo indirect.o falar mal dos su­
periores eclesiásticos e civis ; porque de tais
palavras se se gue nos que as ouvem� o des­
prezo da autondade, e com o desprez.o vem
a perda de influência da mesma autoridade
e o desprestígio da Religião.
Dá ocasião ao pecado, e por isso escan­
daliza, quem distribui l ivros maus, imagens
indecentes. Este escândalo · será directo ou
indirecto, segundo houve ou não intenção de
induzir os outros a pecar ou apostatar da fé.
Se houve tal intenção, além do pecado de
escândalo, também se pecou contra a cari­
dade num caso, e no outro contra a fé.
O escândalo indirecto também pode nas­
cer do mau exemplo. De facto, não poucàs
vezes o nosso mau exemplo arrasta os outros
ao mal e enfraquece, se não é que de todo
apaga nas almas débeis e frouxas, todo o
temor do pecado.
Essas almas fàcilmente raciocinam desta
forma : « Se os outros não fazem caso deste
ou daquele pecado, para que hei-de eu ser
escrupuloso onde os outros não vêem moti­
tivo de reparo ? Não serei eu o primeiro

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T R J B U N A L D A P E. N 1 T Ê N C 1 A .213

nem o último a fazer isto» . É, pois, inegá­


.

vel a sedução e · perniciosa influência do mau


exemplo. Essas almas tenras e débeis nunca
cometeriam tais pecados, se não fossem os
maus exemplos que lhes deram.
Trabalhar nos dias de festa sem necessi­
dade e em lagar onde todos podem ver, trans;.
gredir publicamente o preceito da abstin.ên­
cia, é dar ocasião de que outros comet,am as
mesmas faltas e por isso é escândalo. · E tam­
bém escândalo pronunciar más palavras, ro­
gar pragas diante de crianças, porque tomam
daí ocasião de as aprender e de contrair o
mau costume de as repetir.
Outra cousa será transgredir os citados
preceitos ou pronunciar essas más palavras
diante de cristãos fervorosos, que com cer­
teza se não deixarão arrastar ·do mau exem­
plo ; ou de maus cristãos, que, sem o mau
exemplo, j á transgridem esses preceitos e já
tê n o mau costume de profanar os nomes
santos. Nestes casos o mau exemplo não
seria ocasião de pecado, e porisso não se jun­
taria o pecado de escândalo aos pecados que
foram cometidos.

Mal icia do esclndalo i ndi recto

A vida da alma é muito mais nobre e


preciosa do que a do corpo. Se temos obri­
gação d'e não danificar a esta, muito mais a
temos de não prejudicar aquela .

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O C R I S T Ã. O N O

Portanto falta se ao amor do próximo,


se, sem motivo, se lhe dá oc·asião de pecar.
Dar ocasião a faltas leves dos outros, é
pecado venial . Se não se advertiu n a malí­
cia de acto gravemente escandaloso, o pe­
cado será ainda leve. E quem não conhece
nem sabe que dá escândalo, não comete
peca.do algum.
E necessário evitar o escândalo a todo o
custo, e pão dar ao próximo ocasião de pe­
cado nem mesmo venial . Se, para tanto,
fosse preciso omitir uma acção de si indife­
rente, ou n1esmo boa, ou até às vezes pres­
crita pel a Igreja, teríamos obrigação de a
omitir para evitar o escândalo .

Vej amos al guns exem pl os : U m a pessoa s abe


por experiência que sua presença num pas� e i o pú­
bl i co, em deter m i na das ci rcunstânci as, é o c asião de
pecado grave p ar a outra A cari dade cri � t ã exi ge..:.
- lhe que durante algum tempo não apareça e m t al
p asseio, se o puder fazer sem grave i n cómodo.
D i sse c1 por algu m tempo>>, e n sem grave i ncó­
m odow, porque ni nguém está obri gado a privar-se
dum passeio h onesto por m u i t o t e m po, o que de
p er si ser i a i ncómodo grave e um sacri ff cio extraor­
cl.inário que Deus não exige de nós para e v i t armos
os pecados dos outros.
Anim ado de sincero e ardente desejo de perfei­
ç ão, desej ari as receber frequentemente os Sacra­
m entos, m a s prevês que teu proced i m ento dará a so
a escárneos contra a rel igião e a calúnias contra ti
ou outras pesso as. Que fazer ?
Procura, se podes, com prudentes e ajuizadas
observações preven i r o escân d a l o. Se nada conse­
guires, podes d e i x a r os Sacram entos, s e prevês, que
será este o m e i o e fi caz de e v i t ar o escândalo. Mas

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TRIBUNA L D A PENITÊNCIA 21 5

isto uma ou duas vezes, e não por muito tempo,


porque a caridade bem ordenada começa por nós ;
e seria l oucura, a pretexto de não prejudicar a alma
do próximo, causar_ grave dano espiritual a ti mesmo.
Do mesmo modo, para evitar o escândal o e a
ocasi ão certa de alguém cometer pecado grave, por
exemplo contra a casti dade, poderás uma vez por
outra deixar de assistir à missa de obrigação. b. se
para evitar o escândalo se vai até omitir obriga_;
ções, com m aior razão se deverá ir até omitir cer­
tas acçõe!' de si indi ferentes ou mesmo boas.
No caso de havtr motivos justos e particulares
para fazl' r qual quer coisa de que o próximo se vaí
escandalizar, devemos expl icar o motivo do nosso
procedimento, ou, se fôr possível, esperar melhor
ocasião para fazermos o que desej ávamos. . ..

f: dia de a bstinência e vais comer carne publ i­


camente porque estás dispensado do preceito.' Tens
de expl i car aos que estão presentes, os niótivos do
teu proceder.

Impossível seria, mesmo com a melhor


boa vontade, evitar ao próximo toda a oc.a sião
de pecado. Nunca faltarão olhos perversos
que vejam ou finjam ver ocasião de pecado
nas mais santas das nossas acções.
O Divino Salvador foi acusado de escandaloso
pelos judeus ; e os fariseus até dos seus mila­
gres a favor dos que so friam, tomavam motivo de
escânda lo. Pa·r a evitar · escândalos as�im, stria pre­
ciso, como disse S. Paul o aos Coríntios, andar fora
deste mundo. De nenhum modo, por exemplo, es.­
tarás obrigado a sujeit ar-te às exorbitantes exigên­
cias dum, art ista ou operário, embora preveja� que
vai r.ornper em pra gas e i m precaçóe!-. Ao prejuizo
. que sofrias, acresci a ainda dares-lhes ansas para
na vez seguinte mais exorbitar.
Os pais podem _ e devem corrigir seus filhos,
mesmo quando prevêem que se v ão zangar ou amuar.

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216 O CRISTÃO NO

Antes esses seus arrebatamentos ou amuos, do que


ficarem com o caminho aberto para falt.as mais
graves.

E para terminar, advertimos que nem


sempre o autor do escândalo indirecto está
obrigado na" confissão a declarar expressa­
mente que escandalizou.
A cusa-se alguém, por exemplo, de ter
dito palavras obscenas diante de crianças.
Não precisa de dizer mais nada ; já assim
vai tudo confessado, pois sempre as crianças
se escandalizam quando ouvem conversas
desone�tas.
Também pel a mesma razão não é obri­
gado a declarar o pecado de escândalo quem
se acusa de ter trabalhado publicamente no
domingo.
«Ü que escandalizar a um destes pequeninos que
crêem e m m im, melhor lhe fora que se lhe depen­
durasse ao pescoço uma mó de atafona e o lan­
çassem no fundo do mar. Ai ! do mundo por causa
dos escândalos ! Ai daquele homem por quem vem
o escândalo !» (1) Duras e terriveis, estas palavras
do Sal vador, sempre todo . mansidão e doçura !
Pensa, porém, no que é o escândalo e nas suas ter­
riveis consequências, e compreenderás a dureza do
seu falar.
O escandaloso é verdadeiro assassino, no dizer
de Santo Agostinho : «quem dá escândalo, é um
assassino», porque m ata a vida da alma. Por isso
a Escritura chama ao demónio «homi cida desde o
principio». O demónio foi o primeiro sedutor e é

(1) Mat. 18, 6-7.

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TR1BUNA L D A P E N 1T ÊNC1 A 217

-o pai de todos os sedutores e escandalosos, seus


instrumentos e auxiliares e em tudo seus semelhan­
tes, quando procuram arrastar à perdição as almas
puras e inocentes. .
Mas o crime do escand a loso va i mais longe.
Um só pecado de escândalo po ie ser causa da rutna
espir itual de centenares de pesso as. Escandalizaste
a uma pessoa, esta a outra, e assim por ai fora ;
e foi o teu pecado a causa remota de todos estes
pecados. Sucederá até, que, morto o escandaloso,
sepultado de há ·muito, esquecido pelos homens o
seu nome, continue ainda a ser causa da rufna de
muitas almas. A semente por ele l ançada à terra
germinou, cresceu e produziu frutos Je morte eterna,
entre os homens !
Não te iludas, parecendo-te que o escândalo e:
<:oisa de pouca monta ; nem o consideres ao de leve.
Examina com cuidado se tens dado esc.â ndalo,
o nde e de que modo. Suposto mesmo que' ·n ão te­
nhas sido absolutamente responsável diante de
Deus porque não advertiste no pecado o.u nas suas
consequências, procura reparar do melhor modo
posstvel, e evitar completa,nente para o futuro, todo
o escândalo . «Não percas aquele por quem Cristo
morreu)> . (1)
Se conheceres que alguém arma ciladas. à tua
virtude1 ou que sua a � izade é perigosa para a tua
.
alma, to � e com o maior cuidado, porque também
Jesus Cnsto morreu por ti sobre a Cruz . . .

Como se há· d• reparar • escândalo

Aquele que, sem justo motivo, deu ao


próximo ocasião de pecar, está obrigado a
reparar, quanto puder, o dano espiritual que
lhe· causou. Se, por tua culpa, alguém se

(1) Rom. q, I S .

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218 O CRISTÃ O NO

apartou do caminho do bem, cuida por to­


das as n1aneiras de o trazer de novo à vir­
tude, exortando-o, instruindo-o, orando por
ele e dando-lhe bom exemplo. Que ele veja
nas tuas palavras e obras, que repudias todo
o ma] que fizeste e dele estás arrependido
de todo o teu coração.
O melhor meio de reparar o mal , será
converteres-te de pedra de escândalo que
eras pelo teu mau exemplo, em pregador
mudo mas eloquente da virtude pel a tua
vida exemplar e verdadeiramente cristã .
Nas dúvidas que te ocorrerem sobre
qualquer ponto particular, aconselha-te com
o teu con fessor.

S exto e n o n o Mandam ento


« Guardar castidade n as palavras e obras,
e nos pensamentos e desejos » .
No sexto mandamento proíbe Deus os pecados
externos contra a castidade : as más pal avras e­
m ás obras, e tudo o que a el as possa induzir.
Pdo nono protbe os pecados mternos contra a
mesma virtude : os pensamentos e desejos impuros.
Este livro não é de m olde a poder-se nele dis­
sertar largamente sobre os pecados impuros ; limi­
tar-me hei por isso a apontar as causas que nos
podem conduzir à impun:: z a.

Pensamentos e desejos
Os pensamentos ou representações de
coisas chamadas impuras ou sexuais, de si

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T R I B U N A L D A P E N I T Ê N C I A. 2 1 g.

não são desonestas nem pecaminosas. Só o


são quando nelas se consente, ou, o que vale
o mesmo, quando nélas há complacência.
Quem por dever do ofício (um médico,
por exemplo) estuda esses assuntos sexuais,
naturalmente neles tem de poisar o pensa-
1nento. E não vai nisso pecado. O que é
preciso é haver cautela, para que, se por
ventura daí surgirem tentações, não haja o
perigo de nelas consentir,
Mas se alguém, sem motivo razoável , se
entretém com essas representações, e só pot
curiosidade ou leviandade, voluntàriamente
discorre por esses assuntos perigosos, resol­
vido muito embora a não ter ne1es deleite
ou c�mpl acência, nem por isso fica isento
de culpa, pois voluntàriamente e sem causa
razoável se expôs ao perigo de pecar.
Qual a gravidade deste pecado ? Nem
sempre é fácil medi-l a. Derende sobretudo
dá consciência de quem assim procede, e do
perigo que tais pensamentos podem traz�r.
Se o perigo de consentir na complacência e
deJeite é pequeno, podemos supor que não
houve pecado grave ; mas se o perigo é
grande, é . para temer que tenha havido
ofensa grave da virtude da pureza.
Quando alguém tem o coração puro e
limpo e pouco inclinado ao pecado da impu­
rt:za, pa maior parte das vezes os pensa­
mentos curiosos sobre coisas impuras, em­
bora voluntários, d �sde que demorados por
pouco tempo, n ão oferecem grande perigo

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220 o CRISTÃO NO

.d e consentimento e por isso não são grave­


mente pecaminosos. Mas para quem não é
firme na guarda d a pureza, semelhantes
pensamentos são em gera 1 muito perigosos.
Na maior parte das vezes não se fica nos pen­
samentos ou representações curiosas, mas fà­
cilmente neles há - deleite e c01nplacência, e
temos então
maus pensamentos

propriamente ditos.
Quando à compl acência e deleite no pen­
sar coisas impuras se junta o desejo delas,
.então os pensamentos convertem-se em
maus desejos.

Peca-se por maus desejos quando hà


vontade formal de praticar acções impuras,
ver ou ouvir coisas más para nelas se delei­
tar, len1brar pecados antigos com desejo de
-os tornar a cometer.
Quem deseja simplesmente conhecer coi­
·s as indecentes, ver objectos e coisas peri go­
sas, não peca por m aus desejos, mas peca
·m ais. ou menos segundo a gravidade do
perigo a que se expoe.
-

Os pensamentos e desejos de coisas inde­


·Centes, mas não desonestas, n ão são de todo
isentos de cul pa, por desordenados e peri­
gosos.
Quanto aos pensamentos e representa­
ções desonestas que vêm nos sonhos, nes-

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TRIBUNAL DA PENITÊNCIA 221

sas n aturalmente não há _pecado. Quando


tiveres sonhos maus, logo que acordes pro­
cura afastar a lembrança do mau sonho, não
vá suceder que, acordado, cometas o pecado
que em sonho se te representou.
De resto lembra-te do que atrás se disse
do pecado, principalmente dos maus pensa­
mentos.
Cristão, sê casto e puro em teus pensamentos !
Foje de todo o pensamento, que, embora não seja
própria.mente impuro, pode ser causa de impureza �
e nunca te demores, sem motivos justi ficados, �m
tais pensamentos ou repre�entações ! Lembra- te
que também ·o s pecados veniais repugnam à :-anti­
dade e jus t i ç a de Deus, e também os pecados pe­
quenos ofende m a Magestade divina !

Vistas
Alguém olha para objectos menos decen­
tes ou perigosos, sem má intenção, mas só
por curiosidade ou leviandade. Pecou ?
A cul pa de semelhantes olhares está em
proporção com o. perigo de pecar a que esse
alguém se expõe.
Se os obj�ctos ou imagens que se o�ham
provocam pouco à impureza ou se olham
apenas de passagem, não haverá grande pe­
rigo para pessoas moralmente firmes e pouco
inclinadas à im pureza ; e assim não se pude
dizer _que pecaram gravemente. . .
J.Vl ais graves se devem cons1de�ar as vis­
tas quando os objectos ou imagens que se
olham , muito provocan1 à impureza, ou

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2 2,2 O CRISTÁ O NO ������

quando alguém com tais vistas se expõe a


grandf' perigo de consentir e m coisas más,
em virtude da sua já conhecida fragilidade.
Pode 5uceder que teus olhos, sem má
intenção, mas só por leviandade, te caiam
sobre objectos perigosos, por exem plo sobre
imagens l ascivas. Se os reti ras logo que
notas o mal, nã0 te inquietes porque não
houve pecado.
Toma, porém, este conselho : guarda os
teus olhos, não busques perigos inutilmente.
Pensa nos santos de Deus, pensa em S. Luís
Gonzaga . Que sacri fícios não fez ele para
não manchar sua imaginação com qualquer
representação menos pura !

Al gum as advertênci as p ara os que se o cupam


de pintura ou artes p l ásticas, como artist as, este tas
ou am adores.
1 . Com a intenção de se a perfei çoar ou exe­
cutar u m a obra cas t H n a sua con cepção, os artistas
podem traba lhar sobre modelos nus. Se a i en con­
tra rem ocasi ão próx i m a de pecado, resistir-lhe-hão
em p reg a n .to oi; m e i o s apropriados ; m as s � nem
ass i m consegu irem remover a ocasi ão, devem re­
nunciar à obra em preendida. Nas mesmas condi­
ções e perm itido servir de modelo nestes trabalhos
art t s t i cos.
2. Não é pro i b i do o l h ar para as obras de arte,
desde o momtnto �ue respe i t am as l e i s da m oral e
os f i ns d i arte : enobrecer o homem e e l evar- lhe a
al m a . M a � nem a todas as pessoas é permi tido ver
as obra s de arte que representam o «nu)) e mbora
não ul trapassam os l i m i te s da h on est i d ade.
P ara uma pesso a se poder demorar na contem­
pl ação de t a i s obras, é n ecessário que estej a em
condi ções de as poder apreci ar, a o m enos um pouco,

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TR1B UN AL D A P E N IT E NC1 ftl. 223

sob o ponto de vista estético. Quem não està nas


condições de compreender, ao menos de um modo
vago, o pensamento artfscico dum a obra e se fic a
na contempl ação das formas sensívei s e � ensuais,
não deve olhar com ins i s cên( i a est�s produtos da
arte : A religião e a consciência a i sso � e opõem
a bsoluta nente. Nesta suposição, o exame de tais
o bras poderia ser causa de grandes perigos.
A l ém disso quem se põe a ver tais obras de
arte, deve levar de tal modo disposto o espírito .e o
coração, que a vista destas coi sas nenhum dano
lhe possa causar à alma. Quem não tem a forta­
leza precisa para a fastar as tenta ções, qu ! talvez
vão surgir, deve evidentemente renunciar à visi t a
de museus, colecções e exposições em que tais
obras se mostram. Que, ao m enos.' não olhe
de· perto obras que lhe possam trazer verdadei ros
peri gos à alma.
Quem não reune estas du as condições, gosto
estético e i nte 9 ridad� moral, Aáo pode demorar-se
na contempla çao de obras des ta nat ureza, pois nisso
encontraria verdadeiro per igo p róximo de p ecado.
E como na juventude em geral faltam estas duas
condi ções, não se devem permitir à g�nte moça
estas visitas e espectácul os.
Pelos mesmos motivos proi be a moral que se
exponham publ i ca mente estátuas e quadros peri­
gosos ou escandalosos, embora i mpecáveis como
obras de arte. A c i m a da arte mais subl i me está a
l e i moral e a salva ç ão das almas i mortais.

Trato do corpo
O trato do próprio corpo, para o asseio
e limpeza ou por qualquer outro motivo ra­
zoável e honesto, não é pecado mortal . Se ·
nele .hçmver algum perigo, santifique-se com
a boa intenção e procura-se, além disso, tor­
ná-lo inofensivo com o emprego de meios
apropriados .

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224 O CRISTÁO NO

Aos toques imodestos consigo mesmo,


feitos ·por curiosidade, leviandade e de fu­
gida, aplique-se o que acima se disse acerca
das vistas curiosas e sem má intenção.
Toques imodestos noutra pessoa,. são
pecado ; e à culpa contra a pureza junta-se
de ordinário o pecado de escândalo causado
à pessoa que se tocou, expondo-a ao perigo
de consentir em pecados desonestos.
É principalmente aqui que se deve apl icar o
adágio tão conhecido : «guarda-te do primeiro
passo». Nesta m atéri a fàcilmente se passa do pe­
cado venial ao mortal. O perigo arrasta quase
irremedi àvelmente ao pecado, e nenhum outro pe­
cado ganha ralzes t ão fundas e tão depre�sa se
converte em mau costume. Daqui a necessidade
d� evitar até mesmo aqueles pensamentos, vistas e
toques que não parecem perigosos ou s ão apenas
pecados veniais.
Ai de quem por l eviandade, isto é, sem motivo
razoável, se mete na tentação !
As tentações que nos repugnam em absoluto e
contra a nossa vontade nos assaltam, e também os
maus pensamentos que não queremos, n ão são pf'.­
cado, ainda que J? Or mui co tempo nos apoquentem.
Os movimentos impuros e as sensações que não
consentimos e que repugnam à nossa vontade, não
nos devem perturbar. porque também n ão são pe-
cado. ·

Se, a-pesar de todas as tentações e da guerra


encarniçada que te movem, conservares sempre
puro o esplrito e o corpo, alcançarás dupl a coroa
de pureza.
Conversas
Ainda que tudo o que é desonesto é in'!'
decente, nem tudo o que é indecente se pode

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TRIBUN AL D A PE NITÊ N C1 A 225

chamar desonesto. Não se confunda pois a


indecência com a desonestidade. Conversas
e expressões referentes a coisas baixas e in­
convenientes são falsamente julgadas deso­
nestas. O mesmo se deve pensar de certas
conversas sobre namoros, modas e diversões
profanas, em que não se diz qualquer coisa
menos conveniente.
Nas mesmas expressões impuras deve­
mos distinguir aquelas que são aberta e di­
rectamente más e que ordinàriamente arras­
tam à impureza; e aquelas que só remota e
encobertamente se referem a coisas impuras
e apenas levemente induzem ao pecado. Es­
tas expressões, principalmente quando ditas
por gracejo o'u leviandade e sem compla­
cência e impureza, não são tão pecaminosas
como as outras ; todavia: o seu perigo cresce
à medida que os interlocutores são falhas de
virtude e inclinados à luxúria. O pecado
Ser � tanto mais grave, quanto maior for: o
pengo.
Não se esqueça que os pensamentos m aus a
ninguém escandalizam, ao passo que as conversas
livres e mâs, por levi,andade, brincadeira, ou «para
divertir a companhia» como se costuma dizer, dão
quase sempre ocasião a maus pensamentos e de­
sejos de pecados talvez gravíssimos, tanto internos
como externos. Que tristes efeitos resultam d as
conversas levianas e impuras !
Uma criada de servir tinha o costume de entre­
mear- sempre nas suas conversas palavras levianas
e frases inconvenientes, a-pesar das admoestações
constantes àuma companheira que não cessava de
lhe dizer :

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O CRISTÃO NO

- À hora da morte chorarás amargamente esse


mau costume, mas talvez sem proveito.
Uma tar de foram as duas visitar a criada dum
vizinho � ravemente enferma a qual, depois de lhes
ter suplicado que orassem por ela para que Deus
lhe concedesse uma boa morte, acrescentou :
- Uma coisa sobretudo me aflige : ter mistu­
rado nas minhas conversas, pal avras e frases obsce­
nas. O meu confessor bem me dizia : quantos maus
pensamentos e talvez más acções cometidas pelo teu
próximo, que te serão imputadas à hora da morte !
Agora vejo eu quanta ratão ele tinh a ! Peço-vos que
esqueçais as minhas más palavras, não sigais os
meus exemplos, e dizei o mesmo às minhas compa­
nheiras. Todas as vezes que entrardes no cemi­
tério e deitardes água benta sobre a minha campa,
pensai que me ouvis dizer l á debaixo da terra :
Guardai-vos de conversas desonestas, que pesam
terrivelmente sobre o coração n<;> leito da morte.
Todas as p essoas presentes ficaram profunda­
mente impressionadas, e mais que todas a leviana
criada, que na volta disse à companheira :
- Parecia-me que estava sobre brasas ; mas
prometo a Deus que nunca mais hei de suj ar meus
l ábios com palavras desonestas.
Como é verdadeira a pal avra do Salvador : f( A i
daquele homem por quem vem o escândalo !»
Havendo justo motivo para falar de coisas im­
puras ou perigosas, empregue-se o maior recato e
sobriedade, evite-se toda a má intenção e haja todo
o cuidado em não escandalizar as pessoas com
quem se fala.

Quanto a assistir a conversas desonestas


ou ind e centes, nota o se guinte : Não gos­
tando das coisas que se dizem mas sómente
do modo como se dizem, não é pecado grave
ouvi-l as.
Mas se mostras agrado, por exemplo

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TRJBUNAL DA PE N1TÊNC1A 227

rindo-te, e dás assim calor a quem fala para


continuar, e aos outros ocasião de escândalo,
então há perigo de pecares mortalmente.
Não haverá pecado se, quando a con­
versa descamba para coisas torpes, te retiras
ou, não o podendo fazer, procuras levá-Ia
para outro assunto.
Há, porém, ocasiões em que nenhum
destes meios é exequível. Então necessário
se torna não consentires ; e, para não haver
escândalo, d eves mostrar-te desgostoso e
desapro\"ar externamente tais conversas, bai­
xando os olhos, ponde-te sério, ou de qual­
quer outra 1naneira.
Os pais e superiores estão obrigados a
cortar energicamente todas as conversas
impuras ou indecentes entre as pessoas que
lhes estão subordinadas.

Más leituras
I. Ler livros mais ou menos obscenos,
com intenção de entreter a fantasia com
imagens e repre.sentações impuras, é sempre
pecado grave.
2. Embora não haja má intenção, é
sempre perigosíssima a leitura de livros e
escritos manifestamente obscenos e lascivos,
como são aqueles que, apr.e sentando o mal
de _ �odo a parecer permitido e amável, in­
duzem o leitor a deseiá-lo.,

A leitura de tais livros só é permitida por- mo-

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228 O C RISTÁ O N O

tivos imperiosos, e quando não h á a temer perigo


grave para a salvação.
Os professores de literatura, por exemplo,
podem ler os clássicos antigos e modernos, não
obstante serem imorais, pois que a tanto os obriga
o dever de oficio. Mas cumpre frisar bem.: os que,
em 1virtude da sua profissão, precisam fazer tais
leituras, estão obrigaaos a empregar todos os meíos
para vencer o perigo moral que daf lhes pode advir.
D emais exige-se-lhes sempre uma grande seriedade
e perfeita formação moral.

.3. Não é pecado ler histórias de amores


honestos, desde que nisso não haja perigo
p ara a salvação.
4. Que dizer da leitura de romances e
livros clássicos que não são por completo
desonestos, mas também não são de todo
inofensivos ?
Se tais livros falam de coisas obscenas
apenas incidentalmente, e não as aprovam
de modo algum antes as censuram e ver­
beram, é lícita a sua leitura se há motivo
razoável e certeza moral de não consentir
no mal.
É motivo razoável o desejo de conhecer
as belezas da língua ou aperfeiçoar os co­
nhecimentos adquiridos .
Se durante a leitura sobrevier qualquer
tentação, é preciso resi.s tir-lhe corn energia
e negar-lhe consentimento.
Ler tais obras só por passatempo, ex­
pondo-se não a perigo grave mas a algum
perigo, é, pelo menos, imprudência venial .
Seria mortal se tua fragilidade ern resistir

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TRIBUNAL D A PENITÊNCIA 229

às tentações te levasse a consentir em pen­


s amentos maus e aceder a maus desejos.
Nesse caso terias de pôr de parte essa lei­
tura. Donde se há-de concluir : quanto maior
for o perigo, tanto maior deve ser a causa
para te poderes expor a ele.
Deve-se ainda notar que a leitura habitual
de romances amorosos traz sempre consigo
algum perigo : afasta de Deus o nosso cora­
ç ão, distrai-o das coisas sérias, enfraquece a
vontade, enche a alma de imagens vãs e
• / • A •
inute1s, e traz qutras pess1mas consequenc1as.
, .

ccA quantos jovens e donzelas a leitura habitual


de romances corrompeu o coração e encheu a ca­
beça de ilusões ! Quase não passa dia em que os
j ornais não contem factos lamentáveis que denun­
ciam bem a triste influência dos romances.
Conheço uma jovem que, com a leitura de um
livro, perdeu a inocência e a virgindade, e caiu no
abismo da degradação moral, a que uma mulher
pode chegar». (1)
Se a leitura de livros um tanto livres é peri­
gosa e assanha a sensualidade, que dizer então de
livros e romances abertamente impuros e lascivos ?
Um médico célebre e nada rel igioso fez o se­
guinte juizo de um romance de Zola : «Eu creio
que perderá irremediàvelmente a inocência toda a
donzel a que ler este l ivro». Rousseau, o famosís­
simo livre-pensador francês, no prefácio de um seu
romance escreveu : «A donzela que ler este ro­
mance, está perdida». Todas as pessoas, mas so­
bretudo os jovens e dor.zelas, devem evitar os livros 1

que não sej am francamente morais.


Os pais e superiores têm obrigação de não dei-

(1) P. LERCH.

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O CRIST ÃO NO

xar cair nas mãos dos seus subordinados l ivros


i mora i s, e de só lhes permi tir lei turas que possam
exercer i nfluênci� s alutar s obre eles.
Para evi tar toda a surpresa e equivoco na es­
colha de leituras amenas e l ivros recreati vos, não
se comprem l ivros nem revistas senão a livreiros
reconhecidos como fi éis católicos.
No uso de l ivros emprestados, toda a cautela é
pouca. Procura os l i vros recreativos nas bibl i o­
tecas cató l i cas, tais como as dos Centros d a boa
im p rensa, d as Ord�ns Terceiras e das Obras Paro­
GJUi ais. Em casos de dúvi da, con!'.ulta o pároco� o
confessor, ou outras pessoas idóneas.

Ainda de outros perigos o catecismo nos acau­


tela, tais como : comédi as, b a i l e s l i cenciosos: con­
versas dem asi ado l ivres com pessoas de outro sexo,
encontros de noi te, vestido!' pouco decentes, intem­
p erança, ociosidade e mol eza de vi da. Direi apen as
algo sobre os bailes, dan ç a s e conversas demasiaJo
livres com pessoas de outro sexo.

Assistência a danças e saraus


Ouve o que sobre o assunto diz S . Fran­
cisco de Sa1es, cujo zelo pela salvação das
almas, doçura e bondade, sabedoria e pru­
dência, o põem fora de toda a suspeita,
quando fala com severidade : ccAs danças e
saraus são, por sua natureza, coisas indife­
rentes ; atentas, porém, várias circunstâncias
que neles concor rem, incl inam muito para o
mal e são causa de inúmeros perigos e tro­
peços. Fazem-se de noite, no meio de trevas,
e muito fàcilmente se rodeiam de circuns­
tâncias que tornam nefastas, acções já por
si mesmo sumamente perigosas.

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TR1BUN A L DA PEN1TÊN C1A 231

« Os cogumelos, ainda os mais bonitos,


dizem os médicos, não prestam para nada ;
e o mesmo eu digo das danças : as melhores
não prestam para nada. Acompanham-nas
ordinària_mente grandes perigos, e obrigam
a muitas cautelas quando forçosamepte haja
que tomar parte nelas . Para o baile ser
lícito, deve tomar-se como um recreio, não
entrar nele a paixão, durar pouco tempo,
nunca até cansar, e mesmo assim raras
vezes.
«Tendo de i r ao baile, por motivo ra­
zoável, por exemplo para comprazer com
pessoas amigas cujo convite seria descortesia
e imprudência recusar, cuida por todos os
módos que a tua dança seja digna sob todos
os respeitos, não desdiga da boa opinião
que de ti se forma e que deves conservar,
nem da moralidade, dignidade e mais con­
dições que a devem acompanhar » .
Desnecessário é dizer que o santo fala
das danças realmente honestas e sob todos
os respeitos decorosas, isto é, daquelas em
que os vestidos, os contactos e todo o porte
em nada ofendem a moral cristã. Tomar
parte e m danças e saraus indecentes, é sem­
pre ilícito.
Convém ainda notar : quem por expe�
riência sabe que também os bailes chamados
honestos são para si. um perigo de pecado
grave; está obrigado a evitá-los, se não há
motivo muito grave e proporcionado ao pe­
rigo a que se ex-põe. Há obrigação estrita

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O CRISTÃO NO

de fugir das ocasiões de pecado grave, todas


as vezes que uma necessidade urgente nos
não escuse.
Refl.ecte bem nas ::.eguintes regras e conselhos,
que dava à juventude um escritor católico, experi­
mentado director de almas :
1 ) Não deixes que o prazer que sentes na dança,
se converta em paixão. 2 ) Não frequentes nunca
bailes públicos, como kermesses, feiras, e os bailes
do carnaval. onde sabe Deus que classe de gente
encontras. 3) Dança só em lugares e reuniões par­
ticulares, debaixo da vigilância de teu pai ou mãe
ou de parente recomendável por sua idade e vir­
tude. Essa vigilância deve acompanhar-te na ida
e na volta, e nunca te deixar só. (1)

Das relações demasiado l ivres com pessoas


de diferente sexo
Um dos maiores perigos para a virtude da pu­
reza é, sem dúvida, a demasiada liberdade no falar
e tratar com pessoas de diferente · sexo Por este
motivo to rnam-se perigosas as cham adas « conver­
sas,, ou «namoros>" mesmo os que se entretêm com
o fim de em breve se contrair matrimónio.
As «conversas,, ou «namoros,, só serão licitas
quando os dois querem e podem contrair matrimó­
nio, num praso relativamente curto e determim;1.do.
As relações amorosas, cultivadas sem vontade
ou possibili dade de futuro m atrimónio, embora ne­
las não haj a nada de imoral, são indecorosas, por­
que se opõem à seriedade da vida cristã : são peri­
gosas para a .salvação, e uma ofensa ao preceito do
amor q ue cada um se deve a si mesmo, segundo o
qual nmguém se pode expor sem necessidade ao
perigo de pecar.

(1) P. l\lU F F .

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TRIB UN A L D A P E N IT Ê N CI A 233

A ·experiênci a ensina que nas relações .amoro­


sas cultivadas muito embora· sem m á intenção m as
sem m otivo honesto, facilmente se acaba por des­
graça grande contra a pureza. «Quem ama o pe­
rigo, nele perecerá».
Mesm o quando se trata de namoro sério entre
duas pessoas que querem e podem casar dentro de
pouco tempo, não deixa de h aver perigo para a sal­
vação ; e por isso necessário se torna empregar cer-·
t as cautelas que defendam a virtude da pureza.
Vejam-se mais pormenores no tratado da «Elei­
ção do Estado» sob o titulo ccPreparação para o
m atrimónio»,
Poucos pecados o homem expia sobre a terra
com m ais amargor do que os pecados impuros.
Inferm idades incuráveis e as querosas são, tantas
vezes, tristes vesttgios que a culpa deixou no corpo,
principalmente quando passou a ser um hábito.
Perguntando um menino a seu pai que era m é­
dico, o que fosse à impureza, levou-o este a um
hospital, e, mostrando-lhe as tristes vitimas deste
vicio, lhe disse :
- Olha, filho, estes doentes, e vê bem a sua
m iséri a. Pois a impureza é isto.
«Vê que má e amarga coisa é o h averes aban­
donado ao Senhor teu Deus !» (1)
O libertino sente a verdade desta sentença não
só no corpo, mas t ambém na alma, na vida do espí­
rito e dos sentimentos. A má consciência não lhe
deixa um momento de paz, e não poucas vezes o
desasso_ssego de alm a . m anifesta:se cá fora e m . todo
o seu viver.
Uma jovem de vinte anos, que tinha perdido a
inocência, sentou-se certo dia à porta dumr.. igreja,
e · com os olhos vermelhos de chorar, comó· fora de
si gritava :
-=- Perdi a inocência, perdi o céu, perdi a Deus,
tudo perdi !

( 1 ) Jer. 2, 19.

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O CRISTÃO NO

E arrepelando os cabelos e ferindo- se no· rosto,


correu frenética para l onge dali.
Os que p resenciaram a cena, chqravam compa­
decidos de infelicidade tão grande ; e dentre eles
al guém exclamou :
- Eis a recompensa do pecado !
Sim, a recompensa do pecado : castigos nesta
vida, castigos na outra ; triste e desesperado viver
na terra, e, se o pecador se não converte, mais
triste, infinitamente mais triste, o viver na eterni­
dade. c<Sabei que nenhum impudico tem herança
no reino de Cristo e de Deus». (1) .
Mas arredemos os olhos deste vtcio asqueroso,
porque mais do que a consideração dos danos e
terrtveis consequências da impureza, nos deve mo­
ver a beleza da castidade. «Oh ! quão formosa é a
geração casta e gl oriosa, pois imortal é sua memó­
ria, porquanto ela é conhecida assim diante de
Deus como diante dos homens ! Coroada para
sempre triunfa, levando o prémio dos certames
castos. (2)
Eis o louvor com que o Esptrito Santo exalta
a pureza ! Deus encontra-se bem dentro dos cora­
ções puros, e os próprios l ibertinos olham com res­
peito e reverência, como se olhassem maravilha, as
pessoas puras, as almas a quem não manchou o
sopro pestilencial do vicio.
Quanta al egri a não sentirá, lá no ocaso da vida,
a, alma que, apesar da guerra que lhe moveu a
carne e das lisonj as com que o mundo tentou em­
bat-la, soube conservar intacto o tesoiro da purezat
E pelo contrário, de.sgraçado aquele que numa hora
de fraqueza, numa ocasião infeliz, perdeu tão pre­
cioso tesoiro ! A recordação das culpas passadas
será punh al a cravar-se-lhe no coração, a torturar­
-lhe todos os momentos da vida, a fazer-lhe sofrer
um ver <lade iro inferno.
«Vigiai, pois, e orai para que não entreis em
tentação.» (ª)

(1) Efes. 5, 5, (2) Sab. 4, 1-2. (3) Mat. 26, 4 1 .

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TRlB U NA L D A PE NlT ÊN ClA 23;

«Vigiai !» Não te entregues à ociosidade que é


a mãe de todos os vicios ! «Vigiai J ,, Guarda os
teus sentido�, principalmente os olhos, porque pelos
o·l hos entra ·•o pécado no coração. «Não âetenhas
teus olhos, diz o Sábi o, em ver donzela, não vá su­
ceder que a sua beleza te sej a ocasião de queda . . .
Por causa da formosura da mulher pereceram
muitos ; porque dai é que se acende a concupis­
cência como fogo». (I)
Diz o S ábio e<não detenhas os olhos,,, porque,
observa S. Francisco de Sales, uma coisa é ver de
fugida, outra deter o olhar com atenção.
Guarda os teus olhos e não os deixes fixar
objectos provocadores, como são estátuas e ima­
gens licenciosas, guardadas nos museus ou expostas
em vitrines. Se contra tua vontade teus olhos em­
barram em objectos perigosos, não percas a sere­
nidade ; . a o advertir no perigo, vol ta-os logo para
outro obJecto.
<e Vigiai ! » Foge d as ocasiões ; evita aquela casa
onde o perigo espreita a tua virtude, as conversas
com pessoas já tocadas do vicio e que por isso se
podem tornar perigosas para ti. Se podes, foge da
companhia dos que falam obscenidaâes ; e, se não
podes, leva a conv.e rsa para assuntos inofensivos,
ou ao menos_. mo.stra o teu desgosto e reprovação e
entretém o esptnco com qual quer bom pensamento
para não caires na tentação.
Como. aoesar
· da tua boa vontade, não poderás
evitar toda s as tentações, «vigia e ora para nelas
não caires». Apenas pressentires a tentação, retira
do m al o pensamento e volta-o para o bem, porque
n:is tentações contra a fé e pureza, observa S. Fran­
cisco de Sales, vencem os cobardes que fogem.
Não te demores em combate com os maus pensa
mentos ; despreza- os, desdenha-os, fixando- te em
qualquer outra coisa, por exemplo no trabalho que
tens entre mãos. Se a tentação teima em fi car, im-

(1) Ecles. 9, ; e 9.

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O CRISTÃO NO

portuna, in voca os santíssimos Nomes de Jesus e


M a r i él .
Depo i s da tentação não t e quedes a pensar se
consentiste nela ou não ; porque nesse exame ex­
punhas- te ao perigo de lhe dar o consentimento
que até então lhe negaste.
Finalmente é muito útil a frequênci a dos S a- 1
cramentos da Penitênci a e da Eucaristia. A Sa­
grada Comunhão, diz S. Felipe Néri, unida à de­
voção à Santíssima Virgem, é o melhor meio de
um j ovem conservar viva a fé, e s.em mancha a flor
da pureza ; de o levantar, se cair, e de lhe dar
força nas suas fraquezas.

Séti mo Mandamento
« Não furtar» .
Por este mandamento proíbe Deus todo
o prejuizo injusto na propriedade alheia. De
dois modos se pode causar prejuizo na pro­
priedade :
1 por furto, e

2 . por injusta danificação.


1 . Furto é a apropriação das coisas
al heias contra a vontade razoável do dono.
É turto reter as coisas alheias que se tiraram
a alguém contra sua vontade. Se para rou­
bar se emprega violência, o furto toma o
nome de rapina. St: nos contratos se usa de
meios ilícitos para não pagar ou reter o que
se deve, há fraude e engano.
2 . A injusta danificação dá-se quando se
prejudica o próximo nos ,s eus bens ou direi­
tps, sem benefício para quem causou o dano.
E injusta danificação lançar fogo a uma pro-

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TRl B UN AL' D A PE N lT Ê N C l A 237

priedade alheia, ter negligência culposa no


trabalho contratado, causar estragos nos
bens, de modo a reduzir a família à mi­
séria, etc.
Culpabilidade ou malfoia de furto e injusta
danificação
1. É pecado grave todo o pre1mzo in­
justo causado ao próximo contra sua vontade,
desde que tal prejuízo, por si mesmo ou
pelas circunstâncias que o acompanham, se
pode dizer importante ou de bastante valor.
Admite-se comumente que se deve ter
como pecado grave, roubar ou prejudicar o
próximo em tanto quanto seria suficiente
para ele se sustentar um dia, porque tal
prejuízo é ordinà.riamente considerado grave.
Mas as circunstâncias em que se encontra
o lesado, podem fazer que seja pecado grave
um pequeno furto ou prejuízo. Roubar a
um pobre mendigo alguns poucos escudos
que eram toda a sua riqueza, seria pecado
grave, pois se lhe tinha causado dano grave.
2 . Não se pode julgar se o roubo ou
prejuízo foi pecado mort�l ou venial só pelo
que acabamos de dizer. E necessário atender
ta1nbém à consciência com que se praticou
o furto ou prejuizo, isto é, ao conhecimento
e advertência que houve no momento em
que se roubou ou prejudicou.
Roubaste ou prejudicaste pensando que
era leve o róubo ou prejuízo ? Pecaste ve-

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238 O. CR1S TÁO N O

nialmente. Pelo contrário, em tua consciên­


cia jul g avas que a tua acção era gravemente
prejudicial ao próximo e injuriosa a Deus,
e todavia livremente a praticaste ? Pecaste
mortal mente. Esta regra é de grande im­
portância, sobretudo para o efeito da resti­
tuição ou compensação de danos .
3 . A gravidade da injustiça depende
essencialmente do dano causado · ao próximo
com a acção injusta. Os danos causados a
parentes e amigos, em gera l são de se julgar
com mais benignidade, pois é de supor que
as pessoas lesadas os n ão sentem tanto como
se fossem causados por estranhos . Daqui
se segue que, para se considerarem graves
os furtos dos filhos aos pais, requer-se muito
maior quantidade. O mesmo se pode dizer
dos furtos de comida e bebida, feitos aos
patrões pelos criados, para uso próprio. Nes­
tes casos, o furto, quanto à sua matéria,
deve ser julgado c01n mais benignidade.
Do que fi ca dito se depreende que nem sempre
é pecado grave o prejuízo causa do ao próximo nos
seus bens ; mas quem não tem remorsos dos pe­
quenos furtos e infidel 1 dades, corre perigo de ir até
ofender gravemente a justiça. Não é fácil, e muitas
vezes é até impossí vel, determina; os limites que
separam o pecado grave do venial. Acautela-te,
pois, até das mfnimas infidelidades, porque é este
o meio de evitar as grandes.
Um menino foi severamente castigado por seu
pai, por ter roubado umas bugigangas a sua irmã­
zinha. A criança lamentou-se, dizendo :
-- Por coisas tão pequenas não merecia cas­
tigo tão grande !

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T R I B U N A L D A P E N I T Ê N C l l\ 2 39

- É para que de ladrãozinho, te não tornes


ladrãozão, respondeu o pai.
·

Os bens mal adquiridos, por pequenos que se­


j am? não trazem consigo bênçãos nem felicidade.
«Ü bem injusto não medra em bem».

Compensação e restituição
«Não roubarás » , diz Deus no sétimo man­
damento. A transgressão desta lei obriga a
restituir o que se roubou e a reparar os pre­
juízos causados. Quem pode e não quer res­
tituir ou reparar os danos graves, peca gra­
vemente e vive em estado de pecado grave.
Restituição das co isas roubadas

1 . Quem está obrigado a restttmr e


quanto deve restituir ? Todo aquele que
toma ou retém, ciente e injustamente, qual­
quer coisa de outrem, deve, quanto lhe seja
possível , restituí-Ja à pessoa a quem pertence.
Se não é possível restituir o próprio objecto
por causa das despesas excessivas do trans­
porte ou por outro qualquer motivo, deve
entregar o seu valor.
2. A que m se deve restituir ? A resti­
tuição deve, quanto possível, ser feita ao
dono, se é conhecido, ou aos seus herdeiros,
se ele já faleceu. No caso de estes também
terem morrido ou não se encontrarem, a
quantia a restituir deve ser empregada em
obras expiatórias pela alma do dono legítimo,
por exem p lo, em_ missas, em .e smolas aos

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O CRISTÃO NO

pobres, ou noutras obras pias pela mesma


intenção.
Se o dono é vivo, mas não é possível
restituir-lhe, consulte-se o confessor.
3 . Como se deve restituir ? . Convém
proceder com prudência para não prejudi­
carmos a nossa fama e bom nome. Se é
dinheiro, pode-se, por exemplo, enviar pelo
correio ; m as como também nisto há seus
inconvenientes, melhor é fazer a restituição
por meio do confessor.
4 . Quando cessa a obrigação de resti­
tuir ? Quem não pode restituir o que injus­
tamente roubou, porque é pobre por exemplo,
deve ao menos ter firme vontade de restituir
logo que possa, e empregar os meios neces­
sários para isso, evitando despesas supérfluas
e inúteis. Quem não pode restituir tudo, ·deve
restituir a parte que pode ; quem nada pode
restituir, é obri g ado ao menos a orar e fazer
boas obras a tavor da pessoa prejudicada.
Tratando-se de coisas de somenos cujo
desaparecimento o dono nem notou, basta
que se empregue o seu valor em obras pias,
como esmolas aos pobres, principalmente .se
a restituição é difícil. Pode até dar-se o
caso que não haja obrigação de restituir
essas miudezas, por se supor com funda­
mento que o dono não as aceitaria ; mas
quando as coisas roubadas são de algum
valor, não é bem julgar-se sem obrigação
de restituir. Tenha-se sempre presente que
« as coisas clamam pelo seu dono» .

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TRIBUNAL DA PENITÊNCIA

Compensação por injusta dan ificação

Quem injusta e voluntàriamente prejudi­


cou o próximo nos seus bens, está obrigado
a compensá-lo segundo as suas forças, mesmo
que desse prejuizo lhe não tenha resultado
proveito algum.
Os princípios acima apresentados quanto
ao modo e à escusa eventual da restituição,
valem também para a compensação por in­
justo dano.
No caso de se terem causado prejuízos
ao próximo por ignorância ou descuido in­
culpável, n áo há obrigação de compensar os
prejuízos a não ser que a causa tenha ido a
tribunal e o juiz por sentença mande fazer
a compensação. Nesse caso é obrigação
cumprir a sentença dada, porque assim o
exige o bem com:um . Antes da sentença a
compensação não é obrigação de justiça, mas
talvez a caridade e o amor do próximo exi­
j am que, de qualquer modo, se compensem
os prejuízos causados.
Nesta matéria há muitas questões que
não podem ser aqui tratadas porque não
cabem num livro popular como este. Nas
tuas dúvidas recorre ao confessor. Corno
representante de Deus ele te aconselhará,
ficando responsável diante do mesmo Deus
pelas decisões que proferir. Podes por isso
seguir em boa consciência o que ele te disser.
Os bens retidos injustamente clam am sempre
por seu dono e não trazem bênção a quem os

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O CRISTÃO NO

detém. Diz a voz do povo : «OS bens mal adqui­


ridos nunca aproveitam a terceiro herdeiro», e «a
fortuna como vem, assim vai». E do mesmo modo
que a fruta podre estraga a sã, assim costuma Deus
permitir que os bens mal adquiridos sej am causa
de que se percam até os que justamente se pos­
suem.
Não é, porém, dos castigos temporais que de­
vemos fazer mais caso.
«Não sabeis, diz o Apóstolo S. Paulo, que nem
os ladrões nem os roubadores hão-de possuir o
reino de Deus ?» (1)
Que incompreenstvel loucura trocar a eterna
bem-aventurança e dar a alma ao demónio por uns
bens passageiros que, dentro de pouco, h avemos de
deixar ! Que loucura precipitarmo-nos no fogo do
inferno por uns centos de escudos que vamos dei­
xar, talvez, a herdeiros ingratos !
A um rico, cujos bens em grande parte eram
fruto de injustiças, entrou-lhe num braço a gan­
grena, e a morte j á lhe batia à porta. Instado pelo
sacerdote a restituir os bens mal adquiridos, res­
pondia sempre :
- E os meus três filhos hão-de ficar na miséria ?
O sa'c erdote socorreu-se então do seguinte
expediente. Disse conhecer . um meio para atalhar
a gangrena e até curar o braço j á por ela atacado ;
mas era coisa muito cara.
- Custe o que custar ; estou pronto a dar
cinco contos ou mais, para conseguir a cura.
- Pois bem, tornou o sacerdote, para ficares
curado é preciso que um homem são e robusto
deixe rechinar a sua carne, até catrem algumas go­
tas de gordura sobre a tua ferida.
Mandou o doente chamar os três filhos, mas
nenhum deles se quis sujeitar à tortura do fogo
para sal var o pai. E então o sacerdote disse ao
en fermo :

(1) 1 Cor. ó, g-10.

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TR1B UN AL DA P E N1TÊNC1 A 243

- Vês ? Nenhum dos teus filhos se quer su­


jeitar por teu amor a ser atormentado durante um
quarto de hora ; e cu, por amor deles, vais ser ator­
mentado por uma eternidade no fogo do inferno.
- Tendes razão, respondeu o enfermo. Abri­
ram-se-me 0$ olhos, quero confessar-me j á, e res­
tituir os bens m al adquiridos.
Se cu, cristão, por um amor insensato fores
tentado a deixar a teus filhos bens mal adqui­
ridos, tira deste exemplo a l ição. Vê se na tua mão
se encontra algo que te não pertence, e restitui-o o
mais depressa possfvel, não venha a morte encon­
trar-te na posse de bens que não são teus e levar-te ·
assim ante o tribunal divino. Lembra-te p ara o
futuro que ((a honra vale mais que tudo».

Oitavo Mandam ento


«Não levantar falsos testemunhos ».
Neste mandamento proíbe Deus toda e
qualquer ofensa à verdade, principa1mente a
mentira, a hipocrisia, a adulação e todos os
pecados contra a honra do próximo.

Mentira e hipocrisia
Mentir ·é dizer o contrário do que se
pensa, com intenção de enganar.
Segundo o fim que se tem em vista, a
mentira é : oficiosa, perniciosa e jocosa.
Não é mentira dizer uma coisa falsa que
se julga ser verdade ; nem prometer o que
se não pode cumprir, quando se pensa que
sim. Sera mentira dizer qualquer verdade
quando se ju1ga que não é.

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O CRISTÃ O N O

Não é mentira empregar expressões exa­


geradas e ironias cujo sentido todos com­
preendem ; inventar, para instrução dos ou­
tros, qualquer história, como fábulas ou
parábolas. Não há vontade nem intenção
de enganar ; e quem ouve, facil mente en­
tende o justo sentido de tais modos de falar.
O mesmo se diga das fórmulas de cortesia,
que, a atender às palavras, não passariam
de mentiras : todos sabem perfeitamente o
que com e l as se quer significar. Encon­
tras-te com uma pessoa, com ela travas
conhecimento, e dizes : << Quanto estimo co­
nhecê-l a ; muito estimo tê-la encontrado ;
todo o prazer é mem> , e outras expressões
semilhantes que não enganam ninguém,. pois
todos sabem que não passam de formalidades
e delicadezas.
Todavia é conveniente, nestas expressões,
não ultrapassar os limites estabelecidos pelo
uso, para não diminuir ou, melhor, destruir
a confiança mútua que deve existir entre os ·
homens.
Nunca é lícito usar n1odos de fal ar que
ofendam qualquer dever, corno por exe mplo
o amor do próxin10.
Não é mentira dizer coisas não verda­
deiras, se por qualquer expressão os ouvin­
tes percebem logo que se trata duma brin­
cadeira. Porém, não está certo abusar de
expressões assim, pelo perigo que há de se
cair em qualquer imperfeição. e muitas vezes
até em verdadeiras mentiras jocosas.

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TR1BUNAL DA P E N 1 T Ê N C. I A 24 5

Como responder quando alguém, sem


ter direito, nos interroga sobre coisa a que
não podemos responder ? Em nenhum caso
e por nenhum motivo, mesmo grave, se pode
mentir, porque a mentira opõe-se à veraci­
dade de Deus. Que fazer então ? Recorrer
a uma evasz'va, e havendo justa causa, a
uma resposta equívoca.
Alguém, por exemplo, interroga outro
sobre negócios de família que não lhe dizem
respeito e que não é conveniente revelar.
Poderia responder : «Acerca disso, não posso
dizer coisa alguma» . Era uma resposta equí­
voca, pois de dois modos se podia entender :
ou não sei nada ou não devo dizer nada.
Outro caso : Tudo me corre mal, e vem
alguém e pergunta-me como vão os meus
negócios. Posso responder, sem mentir, por
um equívoco : «Bem » ou « menos mal» , con­
forme as circunstâncias, porque tudo o qu� su­
cede, é bom, segundo as disposições de Deus.
E preciso, porém, usar com prudência
destes modos de falar, para não destruir a
confiança e tornar impossíveis todas as re­
lações humanas.
Enganar o pr6ximo por meio de acções,
ou de um procedimento bifronte, é uma nova
espécie de mentira que. se chama falsidade
e sim'l!-lação ou mentira por acção.
A hi'pocrisia é simulação em que nos
fazemos passar por melhores do que somos,
para conseguir bens ou captar louvores.

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O C ln S T Á O N O

A mentira simples e a hipocrisia, são


apenas pecados veniais. Havendo circuns­
tâncias agravantes, como seriam o depor
falsamente perante o juiz, ou causar com a
mentira grave d ano ao próximo premedi­
tadamente, então por tais circuntâncias há
que medir a gravidade da mentira ou hi­
pocrisia. Todavia atente-se bem nisto : de
todo� os pecados leves, a mentira e hipo­
crisia são os mais perigosos . «A mentira é
no homem um opróbrio » (1) diz o Espírito
de verdade. cc Os lábios mentirosos são abo­
minação para o Senhor» . (2)
A mentira destrói a confiança e torna
mais difíceis as relações mútuas entre os
homens, é odiosa a todos os que estimam a
honra e têm consciência da sua dignidade ;
pelo contrário, a franqueza e a sinceridade
conquistam-nos a estim a e consideração dos
outros.
O cél ebre presidente dos Estados Uni­
dos, Washington, quando criança foi-se a
uma cerejeira em que seu pai tinha grande
estimação e escavacou-a à machadada. O pai,
zangado, perguntou quem tinha feito aquele
estrago.
- Papá, respondeu a criança, não quero
mentir ; fui eu.
O pai serenou com a resposta, e não
castigou o filho, antes o louvou, dizendo :

(1) Ecles. 20, 26. (2) Prov. 12, 22.

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TRI B U N AL D A PE NITÊNCIA 247

- A tua sinceridade vale para mim mais


do que mil cerejeiras.
Evita toda a mentira, e detesta em ti
tudo o que nos outros aborreces. Foge até
das mentiras jocosas, porque toda a mentira,
por insignificante que seja, sobretudo quando
dita por hábito, ofende a Deus, atrai o seu
castigo, e abre o caminho a mentiras mais'
graves. Quantos sofrerão hoje as penas
atrozes do inferno, porque por pequenas
mentiras entraram em caminhos de perdiçã9.
Portanto, « principiis obsta» , resiste ao pe­
cado logo desde o princípio, se não queres
cair em infelicidade tamanha.

Falsas suspeitas e juizos temerários


Assim como temos direito aos bens tem­
porais necessários à conservação da vida,
assim o temos também à honra e bom nome,
ao menos enquanto os não perdemos por
causa do nosso mau ,P rocedimento. A honra
e bom nome são ate de maior valia do que
as riquezas, como diz o Espírito Santo :
«Mais vale o bom nome do que muitas ri­
quezas » . (1 )
1
• Peca contra o direito que todos têm
à honra e ao bom nome, quem, levado das
suspeitas, pensa mal do próximo sem mo­
ti_vo_ s�ficiente, ou julga dele temeràriamente,

(1) Proa 22, 1 .


•.

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O CRISTÃO NO

tendo, sem provas suficientes, por verda­


deiro e certo o mal que se lhe atribui.
2 . Sómente são pecado os juizos e sus­
peitas sem motivo suficiente. O pai de fa­
mília ou o superior que proíbe aos filhos e
súbditos cpnversas com pessoas de má nota;
quem esconde objectos de valor a hóspedes
desconhecidos, não peca, pois não há aqui
suspeita mas precaução.
A suspeita ordinàriamente não passa de
pecado venial, até quando atribui ao pró­
ximo cu] pas graves . Em certas circunstân­
cias, porém, pode nela haver culpa grave.
Tal sucederia, por exemplo, se a suspeita
nascesse do ódio ou levasse alguém a des­
prezar conscientemente o seu próximo.
Expõe-se ao pe:igo de cair em pecado
mortal quem descobre, sem motivo razoável ,
m á s suspeitas que atingem gravemente a
honra do próximo.
3 . O juizo temerário é muito maior
ofensa à honra do próximo do que a sus­
peita infundada. Sem . Provas suficientes,
atribuir a alguém qualquer má acção e con�
sentir neste mau juizo, é pior do que sus­
peitar ou duvidar apenas. O 1uizo temerário
não passa de pecado venial, tratando-se de
coisas de pouca importância ou havendo mo­
tivos para assim julgar embora não suficien­
tes nem certos. Algumas vezes, porém, es­
tes juizos, devido às circunstâncias de que se
acompanham, tornam-se gravemente· pecami­
nosos passando a constituir pecado mortal.

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TRIBUNAL D A P E NITÊNCIA 249

«Não julgueis, para não serdes ju i gados». (1)


Estas palavras do Salvador bem merecem séria
reflexão. Não julgueis, diz a Verdade eterna ; e o
homem, levado só por aparências, de tudo julga
com uma facilidade incrfvel ! E quantas vezes se
engana, e falta ao ·respeito ao seu semilhante, e
o casiona. grav1ssimos males com seus jufzos teme­
rários !
Quando te sentires tentado a julgar mal do
próximo, combate imediatamente o mau jufzo. Nas
relações com teu semilhante, não te deixes gui ar
por . suspeit�s7 porque fàcilmente podes faltar à
JUSUÇa e cand.ade.
Mesmo que te pareça haver motivo fundado
para suspeitar, mesmo então combate a suspeita
dizendo contigo : «Que me importa a mim a vida
dos outros ? . . . Cada um dará contas do que fizen.
Tratando-se de coisas que te dizem respeito e
sendo necessário impedir danos materiais ou pe­
cados, faze o que a consciência te sugerir como
justo, e lembra-te que, em todas as coisas, o teu
guia deve ser a lei da caridade.
Pensa muitas vezes nestas palavras da «Imi­
tação» : «Grande sabedoria e perfeição é sentir
sempre bem e favoràvelmente âos outros, e a si
ter-se em nenhuma conta. Se vires alguém pecar
publicamente ou cometer culpa grave, não te âeves
ter por melhor, porque não sabes até quando po­
derás perseverar no bem. Todos somos fracos ; no
entanto a ninguém deves julgar mais fraco do que
a ti,>. (1)

Maledicência
As falsas suspeitas e Jlll ZOS temerários
lesam l á no teu íntimo o direito que o pró-

(1) Mat 7, 1 .
• . -(2) lmit. Livr. 1 , Cap. 2.

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O C RI S T Ã O N O

ximo tem à sua honra e reputação ; a ma­


ledicência Jesa esse direito externamente por
m eio da difamação, da calúnia, dos mexe­
ricos e injúrias.
1. D i famação

A difamação, chamada impràpriamente


murmuração, é injustificada e injusta mani­
festação ou divulgação das faltas ocultas do
próximo. Havendo motivo razoável para
descobrir essas faltas, não há murmuração.
A gravidade da difamação não ·se avalia
pela dos pecados ou faltas que se divulgam,
mas pelo dano que deliberadamente se causa.
Se a d ifamação lesou notàvelmente o pró­
ximo na sua honra, diminuiu o respeito que
se devia à sua posição ou lhe causou graves
prejuízos nos bens, o dano é grave e a difa­
mação é pecado mortal . Falar mal do pró­
ximo, nestas circunstâncias, é expor-se a
cometer pecado grave.
Neste caso, porém, como sempre, tudo
depende da consciência que cada um forma
no mon1ento em que pratica a acção e do
consentimento que lhe presta. A difamação
irreflectida, quando se não advertiu no dano
que se pode causar, isto é, a murmuração
sem n1a]ícia, n ão é pecado grave. Não
o serão também certas expressões lesivas
da honra do próximo, que irreflectidamente
irromperam num momento de p aixão e exci-

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TR1B U N AL D A PE N 1TÊN C1A 251

tação, ou se ·proferiram numa acalorada dis­


puta, porque então é impossível a reflexão que
se requer para que haja pleno consentimento.
A manifestação de cuJpas ocultas do
próximo, quando nãd causa grave dano, é
só pecado venial .
Como podemos julgar se o dano é grave
ou l eve ? Atendendo
1 . 0 À pessoa que murmura : Se é séria
e de autoridade, causa maior dano do que
se é leviana, de reputação duvidosa e que
todos sabem inclinada a suspeitar mal de
todos e de tudo. Naquela todos acreditam ;
nesta niqguém ou quase ninguém.
2 . 0 A pessoa de quem se murmura :
Uma pessoa de reputação, a rapariga hon­
rada, & mãe de família respeitável, o ern­
pregtldo honesto, o sacerdote, o médico, o
professor, numa palavra, a pessoa de repu­
tação sente m ais qualquer injúria do que
outra cujo procedimento não é correcto, ou
é de categoria inferior, principalmente se pe­
las suas acções perdeu o direito à boa fama.
Falar de faltas de pessoa publicamente
conhecida como má, de ordinário não é pe­
cado grave. Divulgar faltas graves e secre­
tas dos mortos, é da mesma forma difama­
ção, porque também os mortos têm direi to
à �ua reputação e bom nf)me. Como, po­
rém, · o dano que se lhes causa é menor do
que se fosse a vivos, menor é também a
culpa que se comete falando mal deles.

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O C RISTÃ O N O

Não é pecado lembrar as histórias do


que foran1 pecados públicos, mesmo j á es­
quecid0s, porque são factos que pertencem
« à história )> . Seria, porém, pecado manifes­
tar as velhas culpas da vida particular, a
menos que se presumisse, com fundamento,
que en1 breve tempo seriam descobertas e
publicadas por qualquer estudioso amante
de vel harias. ( 1 )
Dizer mal de pessoas desconhecidas ou
até conhecidas, porém de modo que os ou­
vintes não podem saber de quem se fal a, é
somente pecado venial . Mas já seria pecado
mortal, se a murmuração desacreditasse a
determinada famíli a ou sociedade, muito em­
bora se não pronunciasse o nome de ninguém.
3 . 0 Ao que se manifesta : Revelar de­
feitos e pecados graves, é de sua natureza
maior pecado que descobrir coisas de fiouca
monta. Raras vezes será pecado mortal
falar do mau feitio do próximo, como dizer
que é soberbo, de mau génio, invejoso, por­
que quase se não faz caso destas faltas, tão
ordinárias elas são ; pelo que com isso o
crédito e honra pouco ou nada sofrem .
Não é pecado, salvo s e h á m á intenção,
falar dos defeitos naturais do próximo : que
é falho de intel igência, filho natural . Sê-lo-ia,
porém, se houvesse má intenção, como se
se pretendesse o desprestígio, a perda dum

(1) LEHMKUHL.

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T�Ê N C I .\ 253

lugar, o descrédito duma pessoa ou família


estimada.
4 . 0 Ao modo como se murmura : É maior
pecado afirmar de alguém que cometeu uma
falta, do que man ifestar suspeit,as ou dúvidas
acerca do seu procedimento. E m enor culpa A.
narrar c0 1 sas que ouvimos e que J ª tem uma
• • • ,

certa publicidade, do que revel.ar o que só


de nós é sabido. Dizer mal dos outros em
livros, jornais, cartas e outros escritos, causa
maior dano do que deles murmurar por pa­
l avra, e por isso é maior pecado.
São verdadeiros atentados contra a honra
do próximo, e por vezes bem mais danosas
do que as acusações explícitas, insinuações
como estas : «se eu quisesse, tinha muito·
que dizer. . . Se eu pudesse falar . » . O ve­
. .

neno que tais insinuações encerram, é bem


mais perigoso do que a verdade , que se po­
deria dizer.
5 .0 Dtve-se atender ao número e quali­
dade de pessoas em cuja presença se mur­
murou, porque o dano é tanto maior, quanto
maior o número de pessoas a, cujo conheci­
mento se levou a difamação. E pecado, mas
não mortal, descobrir as faltas ocultas do·
próximo a pessoa discreta e de bem, · que
guardará segredo.
Qu_ando é lícito manifestar as faltas ocul­
tas çlo p r óximo ?
E lícito quando o exige o bem do cul-­
pado ou a necessidade de evitar um mal

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O CRISTÃO NO

maior. Assim, é lícito manifestar as faltas


dos outros a pessoas que, melhor do que
nós, podem prorpover, favorecer, obter a
sua correcção. E lícito e até obrigatório,
advertir os patrões para s� acautel arem de
certas faltas dos criados . E lícito e obra de
caridade manifestar os defeitos e faltas dos
culp�dos para guardar e salvar os inocentes.
E lícito e meritório combater por pal avra
e· por escrito qualquer pessoa cuja influência
é perigosa, diminuindo-lhe assim o ascen­
dente de que goza e de que se aproveita para
fazer mal . E lícito também manifestar . as
culpa" de outrern (m as só tanto quanto ne­
cessário) para salvar um inocente.
Do mesmo modo é lícito desmascarar
urna pessoa que fraudulentamente usa nome
que lhe não pertence. Não é pecado mani­
festar as sem-razões dos pais ou superiores,
com o fim de hav�rmos alguma pal avra de
conforto ou bom conselho.
Para que seja lícito manifestar as faltas
ocultas do próximo, há, pois, que atender :
1 ) a que se faça por bom fim e sàmente a

pessoas que nos possam ajudar a conse­


gui-lo ; 2 ) que se manifestem só às pessoas
que sej a preciso ; 3) que n ão se exagerem
as faltas nem se apresente como certo o que
é duvidoso .
Que dizer das conversas sobre defeitos e
faltas públicas do próximo ?
Não é difamação falar de faltas apre-

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T R 1 B U N A L D A. P E N 1 T Ê N C 1 A 255

sentadas em tribunal ou pelas quais alguém


foi condenado ; mas pode-se com isso faltar
à caridade e incorrer nas penas estatuídas
nos códigos, em virtude das circunstâncias
ou do modo a gressivo que se emprega. T am-·
bém não é difamação contar qualquer falta
conhecida j á de tantas pessoas que impos­
sível seria impedir a sua divulgação, falar
de crijnes cometidos publicamente, ou da
impiedade pública de certa gente que não
esconde os seus maus sentimentos.
Em nenhum destes casos há de per si
pecado ; mas havê-lo-ia contra a caridade,
se fosse a aversão, má vontade, inveja, ciúme
ou complacência no mal .d o próximo, que
nos pusesse a falar. ' Ofende-se também a
caridade quando, sem motivos, se fala de
faltas, mesmo públicas e _ notórias, se com
isso se causa ao próximo ou aos seus pa­
rent�s grande vergonha .
E ordinàriamente pecado falar, por cos­
tum_e , das faltas notórias de quem quer que
seja ; e para um cristão que tem como norma
as leis da caridade, e muito mais para quem
faz profissão de « pessoa piedosa » , é um
péssimo costume digno de todas as censuras.
2. Cal únia
Calúnia é atribuir ao próximo um mal que
realme�te não fez, ou exagerar o mal por ele
praticado. Será pecado leve ou grave, con­
soante o prejuízo maior ou menor que o ca­
luniado sofrer na sua honra ou reputação.

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O C RI S TÃ O N O

3. Mexerico

Mexerico é contar a uns o que deles se


ouviu a outros, de maneira a criar inimiza­
des. O mexerico é abominável e odioso,
principalmente se se previu ou, pior ainda,
se houve i·ntenção de criar ódios e inimizades.
É pecado ouvir maledicências : 1 ) se com
perguntas, louvores ou aprovação concorre­
mos para as sustentar e promover ; 2) se as
ouvimos com prazer ; · 3) se podendo, as não
impedimos.
Peca contra a caridade quem, por indi­
ferença ou respeito humano, não impede a
murmuração. Se for consentida e dela re­
sultar dano ou prejuízo notável, será pecado
grave n ao a impedir.
Para não incorrer em culpa é preciso mos­
trar externamente que não se gosta de tais
conversas, já carregando o semblante, j á
de�viando a conversa para outro assunto, j á
contradizendo o murmurador se h á a esperar
bom resultado, o que raras vezes sucede.
Os superiores e pais devem em absoluto
proibir na sua presença toda a espécie de
maledicência.
Não é pecado rir-se da maneira como se
conta qualquer coisa que ofende o próximo ;
mas é falta sentir gosto pela ofensa que se
lhe faz.
Como se há de reparar o mal causado
pela maledicência ? Quem, em conversas,

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TR1 B UN A L D A PE N 1T Ê NC1 A 257

ofendeu o próximo na sua honra ou fama,


está obrigado a restituir-lhe a honra injusta­
mente lesada, e a reparar os danos que pre­
viu lhe ia causar. Se, por exemplo, revelou
falta verdadeira mas ignorada, não se pode
desdizer porque seria mentir ; mas tem obri­
gação de desculpar o pecador, falar das suas
virtudes e boas qualidades, p ara assim o
compensar do dano recebido.
As acusações injustas devem retratar-se,
o mais depressa possível. Se, porém, a re­
tratação é impossível, não há obrigação de
a fazer. Se é possível, m as com dificul­
dades extraordinárias, pode ce·s sar a obri­
gação ; mas é conveniente consultar o con�
fessor, porque ninguém é bom juiz em causa
própria. ·

Não há obrigação de se retratar : 1 ) se


ninguém j á se lembra da ofensa ; 2 ) se não
se pode, ou se de a retratar resultassem
maiores males ; 3) se a honra já foi reco­
brada doutra maneira, por exemplo, por
sentença do juiz.
4. Injúri as
A difamação e a calúnia têm por alvo
pessoas ausentes ; as injúrias essas deri­
gem-se a alguém que está presente. Con­
siste_ a injúria em lançar em rosto a outrem
faltas ou culpas cometidas, mostrando clara­
mente a má vontade que se lhe tem. Une-se
a injúria à calúnia e detracção, se em pre-

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258 O C R I ::; T Ã O NO

sença de outras pessoas se acusa o próximo


presente de faltas que não cometeu ou que
não eram notórias.
Há obrigação de reparar a honra ou bom
nome ofendido pela injúria, e restituir todos
os danos, se os houve. Para isso basta que
o ofensor mostre· ao ofendido, por palavras
ou sinais, o seu arrependimento, prestando­
-1 he qualquer serviço ou manifestando-lhe a
sua estima. Quando as injúrias e desprezos
foram mútuos, basta darem-se reciproca­
mente as provas ordinárias de caridade.
Muitas vezes se ouve : «O que digo é verdade,
e a verdade pode dizer-seu. Este principio é falso.
Pelo facto de urna coisa ser verdadeira nem ROr
isso se pode sem pre dizer. Pois quê ? S erá licito
divulgar as faltas ocultas, porque são verdadeiras ?
Não, certamente. Pelo pecado oculto não se perde
a estima pública, e conserva-se ainda o direi to à
honra e boa reputação. É, pois, uma injustiça
roubá-la, como o seria roubar quaisquer outros bens.
Graves são os danos que consigo traz a male­
dicência. A detracção, murmuração ou calúnia,
trazem consigo muitas vezes consequências funestís­
s imas. Quantos perderam o seu bom nome e até a
posição que ocupavam, devido a urna calúnia !
Toma a resolução de j amais descobrir os de­
feitos do próximo, embora te pareça que tens mo­
t ivo suficiente para o fazer. Não o faças a não ser
que to imponha o dever. Atende mais aos teus
defeitos do que aos do teu semelhante. «Porque
vês tu, pois, a aresta no olho de teu irmão, e não
vês a trave no teu olho ? » (1)

( 1 ) Mat. 7 , 3.

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê '1 C 1 A. 2 59

Não te fies nas aparências, que muitas vezes


enganam. Não vês os corações, e por isso não po­
derás julgar com inteira justiça. E quem te diz a
ti que a pessoa que julgas, não apagou j á, com o
arrependimento e a confissão, os defeitos contra
os quais . te insurges, e voltou por isso a ter direito
à herança dos filhos de Deus que tinha perdido
pelos seus sraves pecados ?
Os fanseus queriam que Jesus condenasse a
adúlter a ; mas Jesus absolveu-a, porque lhe viu o
coração e conheceu o seu arreJ?endimento e bons
propósitos. Fora adúltera, mas Já o não era.
Não andemos a lembrar o que foram os outros
e o que fomos nós, mas atentemos no que somos
agora eles e nós. E injustiça flagrante ajuizar do
nosso irmão por culpas eventuais e já antigas.
Para que desenterrar histórias esquecidas ? (,lue
importam elas agora ? Que motivos te levam a re­
cordar essas coisas ? Na maioria dos casos, a mania
de falar ou uma disposição pouco conforme, para
não dizer contrária, à caridade, talvez uma vilania
que não te atrevas a confessar claramente. Porque
não hás de gravar no teu espfrito a sentença do
Redentor : ccNão queirais julgar para, não serdes
julgados ?» (1)
Sejam quais forem as culpas de teu irmão, tu
não és o seu juiz. E quem sabe se no momento
em que pensas mal, j á ele se tornou mais amigo de
Deus do que tu és ? Não venera a Igreja tantos
santos que, durante muitos anos, foram grandes
pecadores ? E tu que és pecador, atreves-te a jul­
gar a quem o Senhor há muito perdoou ? Não sejas
fariseu !
Não havendo motivo razoável, as conversas em
que periga a caridade, nem são dignas nem conve­
nientes. Se nas conversas não trouxéssemos à baila
as faltas dos outros, depressa elas esqueceriam, e,
em breve, teriam eles recuperado o bom nome per-

(1) Mat. 7, l.

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26o O CRISTÃO NO

dido. Mas, não ! .Sofra o bom nome do próximo,


sofra a caridade, com tanto que possamos soltar
as rédeas à vibora da nossa lingua !
Quem tem o costume de murmurar, ordinària­
mente não se limita a falar de faltas notórias, des­
cobre também as ocultas, que, ainda por cima
col ore, exagera e transfigura. E que graves perigos
não há aqui para a salvação !
Havendo motivo razoável para falar dos de­
feitos notórios do próximo, tenhamos todo o cui­
dado em não nos deixarmos influenciar por motivos
m enos justos ; mas pratiquemos o principio : «Não
digas dos outros o que não desej as digam de ti».
A observância deste mandamento é de grande im­
portância para a felicidade, tanto espiritual como
temporal. « Quem quer amar a vida e ver os dias
bons, refreie a sua lingua do mal e néio deixe que
seus lábios profiram enganos».

Décim o Mandam ento

« Não cobiçar as coisas alheias»


1 . No sétimo rnandamento diz Deus :
«Não roubarás, nem caU's arás prejuízo à
propriedade do próximo » . No décimo vai
m ais além e diz : <mão cobiçarás as coisas
alheias » .
Em virtude deste m andamento é pecado
desejar seriamente ·qualquer coisa com pre­
juizo do próximo. Desejar possuir por meios
lícitos os bens de outrem , ser rico como os
outros, não é pecado ; mas não deixa de ser
desejo muito perigoso. Seria pecado se
fosse acompanhado de ódio, invej a, ou de
qualquer outra má inclinação.
2. Na proibição de desejar mal, inclui-se

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T R1 B U N A L D A PE N 1T ÊN C1 A -26I

o preceito de nos alegrarmos com o bem


dos outros e de nos contentarmos com o que
temos . Não devemos, pois, nem queixar-nos
nem l amentar-nos por outros possuirem mais
e melhores bens temporais, nem desejar de­

sordenadamente o que não temos.


Podemos e devemos pedir a Deus o pão
de cada dia e os bens temporais, sempre
com a condição tácita ou expressa : «se for
da sua santíssima vontade» .
Deus concedeu-nos o s bens temporais como
meio para alcançarmos os eternos. Não são os
bens temporais o nosso fim : são meios para o con­
seguirmos. Quem, portanto, pensando apenas na
aquisição dos bens terrenos, se esquece dos ce-
1est�s, é louco que se engana a si mesmo7 porque
cedo ou tarde a morte lhos roubará, reduzindo-o à
m iséria por toda a eternidade.
Em • meio de todos os teus negócios, pensa nas
coisas eterna� e tem sempre presente a palavra do
S alvador ·: «'-lUe aproveita ao homem ganhar o
mundo inteiro, se vier a perder a - sua alm a ?» (l)

(1) Mat. 16, 26.

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CAPÍT U LO l i

Dos Pecados Cap itais


Soberba, avareza, luxúria, ira, gula, in­
veja e preguiça chamam-se cc pecados capitais»
porque todos os outros neles têm princípio.
ou raiz, deles provêm como regato da nas­
cente. Também se chamam cc pecados mor­
tais » , não porque sejam sempre pecado grave
mas porque a ele fàcilmente condu,zem se
logo de princípio se não atalham.
Vamos e x aminá-los um a um.
1. Soberba

A soberba é o desejo desordenado de


honras e distinções. De ordinário é apenas
pecado venial. As consequências é que
muitas vezes são graves.
Dar-se ares de irpportância alardeando
boas qualidades ou bens fingidos (vaidade),.
ter-se por mais que os outros procurando
estar em tudo e por tudo acima deles (am­
bição), de s i não é pecado mortal. Mas
quem se embriaga assim de importânci as,
depressa vai a desprezar gravemente o pró­
ximo, a Deus e seus mandamentos, ou a re­
cusar submissão aos superiores, represen­
tantes de Deus (orgulho, no sentido próprio).
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TR1 BU NAL D A PE N1T Ê NC1 A 263

Desejam-se honras, e para havê-las não


custa nada a ir roubá-las aos outros socor­
rendo-se até da calúnia. Começou o pecado
leve da soberba a minar o coração, e logo
arrastou atrás de si o pecado grave da
calúnia .
A doná de casa quer ser o ídolo de toda
a gente, e não tarda nada que dê de gastar
no luxo o que bem preciso era para a família.
A soberba, e logo atrás dela o pecado grave.
Lembra-te, cristão, que todos os teus bens,
sejam as tuas boas qualidades sej am eles quais
forem, são esmola que Deus te deu e que Deus te
pode tirar quando bem lhe aprouver. Não te enso­
berbeças com eles, nem te vanglories de coisas que
te não pertencem. cc Quem se exalta, será humi­
lhado». (1)
<cA vanglória, diz o rifão popular, leva à rufn a ;
a vergonha e a desonra seguem-na por toda a parte».
Quantas vezes aos presumidos e soberbos permite
Deus que caiam em pecados vergonhosos para os
obrigar a ver a sua insignificância e miséria ! En­
sina a experiência de cada dia que bem sabe Deus
como fazer para que as árvores não cresçam até
ao céu.
D a mesm a acção com que o soberbo pensa
distinguir-se, elevar-se, conquistar os olhos do
mundo inteiro, dessa mesma às vezes se serve Deus
para o humilhar e abater.
Regra geral, a soberba e a vaidade não deixam
fazer o bem. Se com sinceridade fores a indagar a
origem de teus pecados, talvez encontres que quase
sempre as · ratzes deles mergulham na soberba e
va! dade. Demais, quem por soberba e vaidade pra-

(1) Mat. 23, 12.

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O CRISTÃ O NO

tica o bem, j á na terra recebeu o prémio do seu


trabalho e nada lhe resta a esperar do céu.
Cultiva a humildade, nela te exercita constante­
mente, pois, para . a alcançar, nada ajuda tanto como
praticar pequeninos actos de humildade. E muitas
vezes ao dia repete a jaculatória tão bela : cdesus,
manso e humilde de coração, fazei o meu coração
semelhante · ao vosso».

2 . Avareza e cobiça
Cobiça é o desejo das riquezas e a de­
sordenada tendência para elas. Também a
cobiça é por sua natureza pecado leve, mas
mil consequências dela podem ir a pecado
grave.
Cobiças uma coisa ; daqui até te ser­
vires de fraude ou embuste para a alcançar,
não vai um salto grande. Prendes o coração
aos bens da terra ; preso ficas, e quando a
Lei de Deus te chama a cumprir preceito
grave, não podes correr a Gumpri-lo.
Se ao desordenado desejo das riquezas
se junta a insensibilidade e dureza de cora­
ção p ara com o próximo, temos a avareza.
O avaro comete pecado grave todas as ve­
zes que notàvelmente ofende a caridade de­
vida ao próximo, por exemplo com a usura
ou com abusar das necessidades e aflições
dos outros para enriquecer.
A avareza e cobiça são dos vtcios mais peri­
gosos, porque cegam a quem neles caiu a ponto
de nem lhes deixar ver sua avareza e cobiça. Ao
avarento enchem-se-lhe os olhos de pretextos para

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TR1 B uN AL n A PE N1T E Ne1 A 265

justifi car suas fomes de riqueza ; - e vai até à morte,


ensanado, a pensar que são virtudes os afanosos
cmdados com que anda 3: perder a alma.
«Todos os vícios envelhecem com o homem e
amainam, só a avareza cada dia mais lhe cresce e
se avigora», diz S. Jerónimo. Chega o fim : tudo o
avarento vai abandonar, e nem então se lhe desa­
pega a alma do� seus bens e tesoiros, que eterna­
mente o vão desgraçar. «Não há coisa mais injusta,
diz o Espírito Santo, do que amar o dinheiro ; por­
que o homem que ama o dinheiro, por ele vende a
própria alma». (1)
A avareza é miséria abominável. Ande alguém­
atascado no lodaçal do vi cio desonesto, que m esmo
assim ainda por vezes lhe atloram à tona da alma
sentimentos nobres. Ao avarento, nunca. A mi­
séria mais de comover� deixa-o insensível e frio ;
nada há capaz de lhe despertar na ·a lma a com­
paixão e misericórdia.
O avarento pensa como se fora louco. Bem
pudera ele ver que suas riquezas e tesoiros, adqui­
ridos e amealhados com tantas fadigas e trabalhos,
com tanto cuidado e aflição, à custa de tantas p ri­
vações, à sua morte vão parar à mão de herdeiros
que ainda se vão rir da vida sórdida que levou e
t alvez em pouco tempo dissiparão herança que não
lhes custou a ganhar. Mas nada disto ele vê.
«Néscio, esta. noite te virão demandar a tua
alma ; e as coisas que ajuntaste, para quem irão ?» (li)
Pensa nestas palavras do Senhor e sê liberal para
com teu próximo. Junta tesoiros_, sim, mas lá. para
o céu. Contempla a pobreza de Jesus, e não te
deixarás prender nos laços d� avareza.

3 . Luxúria
Sobre luxúria; vej a-se o que atrás ficou dito a
propósito do sexto mandamento da Lei de Deus.

(1) Ecleai. 10, 10 •. (2) Luc. 12, 20.

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266 O CRISTÁO NO

4. Ira
Ira é o movimento desordenac;{o do génio
contra tudo o que desagrada. A ira habi­
tual, por tudo e por nada, chama-se irasci-
bilidade. '

Indignar-se quando há razão para isso,


não ultrapassando as regras da modera­
ção, não é ira pecaminosa. Assim, não co­
metem pecado de ira os pais e superiores
que se mostram zangados com as faltas dos
filhos e súbditos, nem os mestres quando
verberam a preguiça dos alunos e até com
prudência os castigam. Em casos como estes
a ira é justa e um movimento razoável e na­
tural .
Pode, pois, dizer-se que não é pecami­
nosa a ira quando
a) é fundâda e procedente de motivo
justo e razoável,
b) e se contém dentro dos limites da
moderação e prudência.
O mesmo se diga do que chamamos
« indisposições contra o próximo» . Não é
pecado mostrar descontentamento quando
para isso há motivo razoável, e não se
ultrapassa(Il os justos limites.
A ira desde que não haja consequências,
de ordinário é pecado leve. Mas cuidado com
ela, pois fàcilmente arrasta a pecado grave.
Se com a ira andam desejos de vingança,
então o pecado será t�nto maior quanto mais
grave for a falta contra a caridade.

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TRIBUN A L D A P E NITÊNCIA 26T

Os homens diferem uns dos outros pelo seu .


carácter, feitio e modos de pensar : «cada cabeça,.
cada sentença», diz o provérbio. Querendo, pois,
viver em paz, havemos de nos s9frer e perdoar uns.
aos outros. Se · vives com outras pessoas, cuida.
mais das tuas fraquezas e imp erfeições do que das .
fraquezas e imperfeições alheias. «Levai as cargas .
uns dos outros)). (1)
Toma a resolução de não falar enquanto estás .
irado. A principio custar-te h á ; mas o que não te ·
será fácil da primeira vez, conse sui-lo-âs de outra.
vez se teimares no bom propósito. Se antes do ·
combate perd�s a esperança de vencer2 nunca che-·
garás à vitória. Apenas conheças em tl algum mo-·
vimento de ira, recorre à oração ; se não consegues.
vencer-te logo, ao m�nos proc�ra . distrair . o pensa­
mento para outra coisa. O primeiro movimento, o
primeiro despertar do sentimento, não é pecado,.
mas aliciação ao pecado.
S. Francisco de Sales era de temperamento
fogoso. Soube, porém, combater sua paixão de tal
modo que veio a ser exemplo luminoso de man­
sidão e doçura. Perguntado certa vez como podia
conservar-se manso falando com pessoas irritadas,.
respondeu : c(Fiz pacto com a minha lingua de não
pronunciar palavra enquanto o coração ' não est iver
calmo».
Imita o exemplo deste santo, e ev_itarás grandes
inquietações, desarmonias, mágoas e dissabores.
Logo pela manhã, pensa onde e quando te
poderás irritar, e resolve fugir das ocasiõe� e
arma-te de fortes resoluções para não caires. .t.. m ­
prega todos os meios para seres moderado, mesmo
quando a ira é justa, porque se não te acostumas a
vencer-te, yodes ir mais longe do que desejas.
A correcçao e o castigo aplicados durante uma
forte excitação, originam mais males do que bens.

(1) Gal. 6, 2.

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268 O C RI S T Ã O N O

Mais fácil é não se irar, do que, irado, conservar


justa r:noderação.
«E melhor evitar a ira po·r compl eto, do que
-servir-se dela com sabedo ria e moderação ». (I)

5 . Gula
A Gul a é o gozo desorden ado da comida
e da bebida.
Segundo a ordem de Deus, o homem
tem de comer e beber para conservar a
vida. Por isso em si nem o comer nem o
beber é pecado. Podemos até, convertê-los
·e m obras meritórias. cc Ou comais ou be­
bais, ou façais qualquer outra coisa, fazei
tudo para glória de Deus » . (2)
O que não está bem, é o excesso na co­
mida e bebida. E portanto há pecado ou
gul a sempre que se come e bebe de mais.
];: pecado também comer ou beber com ní­
mia avidez ou nímia lentidão, e bem assim
.d esejar desordenadamente a comida ou a
bebida.
Beber cientemente até por completo per­
.der a razão, é pecado grave. Enquanto se
pode distinguir entre o bem e o mal e re­
.cordar-se de todas as acções, não há embria­
_g uez completa, nem portanto pecado grave.
A gul a é de sua natureza pecado venial .
As circunstâncias que a acompanham é que
podem torná-la pecado grave. Sabe alguém

(1) S. Frarzc. de Sales. (2) I Cor. 10, 31.

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TR1BUN AL DA PEN1T ÊN C1 A. 269

que apenas semi-embriagado, logo dá escân­


dalo, tratando mal a família, cometendo im­
purezas, insultando os vizinhos ; se bebe
até chegar a tal estado, peca mortalmente.
A gula é ainda pecado mortal quando causa
grave dano à saúde, sobretudo se é habitual.

A embriaguês é degradante para o homem.


Já os pa s ãos reconheceram a vergonha de tal vicio.
Na Grécia, quando passava um homem embriagado,
era costume chamar as crianças para lhe atirarem
lama ; porque, ajuizava aquela gente, a vist"a dum
bêbedo seria o bastante para afastar seus filhos
desse hediondo vfcio.
O que a razão ensina, é confirmado pela fé.
No quinto mandamento diz Deus : ((não matarás».
E que é a embriaguês, senão um suicfdio lento ?
Mais homens tem levado ao túmulo o uso imo­
derado das bebidas, do que as guerras mais san­
grentas.
((Não matarás», diz a lei divina. O bêbedo
malbarata setis bens, arruina a saúde, perde a honra
e a reputação, destrói a felicidade da familia, e
chega muitas vezes a ser assassino moral e até
corporal da mulher e dos filhos.
Que triste não é ver um homem que diante do
altar jurou amor e fidelidade à sua mulher, fazer­
-lhe derramar tantas lágrimas, cobri-la de vergonha,
inocular no corpo e na alma dos filhos inocentes o
germe da ruína do corpo e da alma 1 E quanto
mais triste não é ver mãe escravizada a este vicio,
destruir a felicidade e a saúde dos seus tilhos !
Calcula-se gue mais de 5 o por cento dos idiotas
e imbecis, principalmente nas grandes cidades, são
filhos de pais notóriamente alcoólicos. Que res­
ponsabilidade a destes pais sem consciência !
((Não �atarás». A embriaguês tira a vida à
alma e . pode atirar o homem às penas eternas.
((Não vos enganeis, clama o Apóstolo, os que

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º2j0 O CRISTÃO NO

· se dão a bebedices, não hão de possuir o reino de


:Deus» (1)
Em 190 1 foi executado em B autzen um assas­
:sino, chamado Hoche. Na véspera da execução,
noticiaram os jornais, fez seu testamento, onde,
- entre outras coisas, dizia o seguinte :
ccSe me pergunto a causa que me levou a assas­
sinar, apenas encontro esta : a aguardente. Co...
:mecei por pouco ; quase desde criança fazia dela
as minhas delícias. Meu pai era bêbedo, e morreu
embriagado, enterrado na neve.
ccReflecti, ô pais, amigos da embriaguês ; o vosso
mau exemplo envenena a vida de vossos filhos.
« Quando deixei a escola, fiz-me pedreiro, e
bebia a minha aguardente como todos os pedreiros.
No princípio trabalhava com ardor e ganhei muito ;
·mas depois, fui perdendo a força e a vontade de
trabalh ar. E pouco a pouco me meti a caminhos
·de perdição. Tomei conhecimento com as cadeias
. e casas de correcção ; m as, apenas de lá safa, vol­
tav a a beber e a embriagar-me. Não contarei as
infâmi as que cometi. A aguardente tirava-me a
força de vontade para tudo, menos para seguir
meus instintos bestiais ; até que afinal matei minha
. mulher. Foi este o último elo da cadeia de crimes
a que me arrastou a aguardente.
((Amanhã terão eles o seu epílogo, porque ama­
nhã vou ser justiçado. Mereci a morte. Estou tran­
quilo, por g ue espero que Deus usará comigo de
misericórdia. Não poderia, porém, morrer em paz
se não soltasse este grito de alarme, que será o
meu testamento».
Este assassino a quem a embriaguês arrastou
a tantos crimes, ao menos converteu-se antes da
morte, que foi para ele graça especial. Mas a
-q uantos a concede o Senhor ? ! Quase todos mor­
rem como vivera� ; morrem na embria �uês, mor­
rem no pecado. E a experiênci a que assim afirma.

(1) I Cor. 6, 10.

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TRI B U N A L D A PENITÊ N CIA 271

Oh ! que morte horrorosa 1 morrer e mbriagado,


para logo comparecer na presença do divino Juiz !
Eis porque o divino Redentor nos admoésta :
t:Velai sobre vós, para que n�o suceda que vossos
corações se façam pesados com as demasias do
comer e do beber e com os cuidados desta vida, e
para que aquele dia vos não apanhe de repente». (1)
Se caiste nos laços deste vicio, foge, foge d o
perigo. Evita quanto puderes a taberna ! Não és
obrigado a não beber, mas tens estrita obrigação
de evitar, quanto possível, todas as ocasiões que
até agora te arrastaram ao pecado. Consulta o
confessor, manifesta-lhe as tuas dificuldades, e ele
te ajudará.
«E como eu sabia que de outra maneira não
podia ter continência, se Deus ma não desse . . .
encaminhei-me ao Senhor e fiz-lhe a minha sú­
plica». (1)

6. I nveja
A inveja é a tristeza pelo bem do pró­
ximo. Há pecado de inveja quando se sente
desgosto pelo bem sucedido a outrem, por­
que assim nos iguala ou nos excede. A in­
vej a está na tristeza que se sente quando
sucede bem ao próximo, ou na alegria que
por má vontade se experimenta na sua des­
graça.
Não é pecado, antes coisa muito natural,
desejarmos partilhar de felicidade igual à
dos outros. O mesmo se diz da tristeza
que sentimos por não possuir õ que outros
possue-m, sem todavia desejarmos para nós

(1) Luc. 21, 34. (2) Sab. 8, 2 1 .

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O C RISTÃ O NO

o que e les têm. Deve, porém , haver todo o


cuidado em combater estes senti·m entos, que
fàcilmente p odem acabar n a inveja.
Sentir que ao próximo a fortuna terrena
seja de perigo para a alma ou lhe dê facili­
dades de pecar, não é inveja, mas sim puro
sentimento de santa caridade de quem sabe
valerem bem mais as coisas da alma do que
as coisas d a terra.
Também não é pecado regosijar-se al­
guém de que a desgraça tem por a] · tenha tra­
zido o próximo a melhores sentimentos ou o
tenha impedido do causar dano à Igreja e à
religião.
A invej a e o regozijo do mal do pró­
ximo são ofensas contra a caridade. Quanto
m aior e mais notável for a ofensa, tanto
mais grave será o pecado. Sendo pequeno
o bem de que se tem inveja, por exemplo,
se um estudante tivesse inveja do louvor
dado a u m condiscípulo, o pecado seria só­
mente venial, porque é l eve a ofensa contra
a caridade.
O pecado não está na inclinação à inveja,
ao rancor, ao ciume. Sentir os assaltos da
inveja, é tentação ; em segui-los é que há
pecado. Do mesmo modo não passa de
tentação um tal ou qual sentimento de a]e­
gria involuntário pelo m al sucedido ao pró­
ximo, desde que deveras se lhe desej e todo
o bem.
«Por inveja do diabo éntrou no mundo a morte;

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TR1 BUN AL DA PE N1TÊN C1A 273

e a ele imitam os que são do seu partido». (1) O de­


mónio, inimigo da felicidade de nossos primeiros
pais no paraiso, procurou seduzi-los e lançá-los na
desgraça. Conseguiu o seu intento. Nem por isso
as chamas do inferno deixaram de o atormentar, é
verdade ; mas uma satisfação lhe ficou : de futuro
houve mais infelizes no mundo, e no inferno teve
ele mais companheiros na desgraça.
O que sucedeu no parafso com a sedução de
Lúcifer, repete-se ainda agora todos os dias. Mui­
tos, não podendo levar a bem que corram os negó­
cios do próximo melhor do que correm os seus,
deixam-se arrastar pela paixão e vão · até às maio­
res injustiças. Porque procedem assim ? Pode a
paixão fazê-los felizes ?! Não. A inveja atormen­
t a-os e martiriza-os no mais intimo do coração, e
até lhes rói e devora as fibras da mesma carne.
«Olhou o Senhor para Abel e para as suas ofertas,
mas não olhou para Caim nem para as que ele tinha
oferecido. E Cafm se irou grandemente e o seu
rosto cobriu-se de tristeza». (2)
Se sentes nascer em ti este vf cio, arranca-o
bem pelas raizes. E se a tua soberba sente que os
outros te igualem, dirige logo contra ela as tuas
forças.
Considera a malicia e a baixeza da inveja.
Inveja e ciúme são sinais de espfrito vil. Exercita-te
em obras de caridade. Faze bem, principalmente
àqueles contra quem sentes qualquer inveja ; apro­
xima-te deles com amor e particular benevolência.
Fal a deles com estima, defende-os, e pede a Deus
J'ela sua felicidade. Mostra com tais actos de cari­
dade que não estás de acordo com as tuas más
inclinações, e desta forma andarás livre de pecado.
«Assim ganhareis duas coroas duma ·vez, diz S. João
Crisóstomo : uma pela vitória sobre a inveja, outra
pelo exercício da caridade».

(1) Sabed. 2 , 24-25. (2) GtJn. 4, 4-S.

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2 74 O CRISTÃO NO

7. Da pr�gu iça

Preguiça é a aversão ao trabalho e ao


esforço, levada até ao pon!o de se descura­
rem os próprios deveres. E preguiça :
1 . 0 A ociosidad� ou o não cumprir os
deveres profissionais, e também abandonar
todo o trabalho, só porque fatiga e cansa.
Para o homem, o trabalho é um dever, pois é
lei da vida. c<Ü homem, diz o Espírito Santo, nasce
para trabalhar, tal como a ave nasce para voar» (1).
Nem para outro fim o Criador nos deu forças, nos
dotou o corpo e a alma de faculdades e potências,
como ao servo da parábola evangélica nos empres­
tou talentos para com eles agenciarmos, e se reser­
vou o direito de nos pedir contas do bom ou mau
uso que deles fizemos.
Havemos de nos dar ao trabalho, a imitar o
Criador que, é para se dizer, nunca descansa, pois
está sempre alerta a sua activa Providência. À. sua
imagem e semelhança fomos criados, para em tudo
nos parecermos com Ele. As faculdades que nos
deu, não podem ficar como veio de oiro escondido
nas profundezas da t�rra. Como a boa planta que
dá fruto em tempo própr�o, assim nós devemos, com
as faculdades que nos foram dadas, trabalhar para
a honra de Deus e felicidade eterna e temporal,
nossa e do nosso próximo. Doutra sorte seriamos
como a figueira estéril que não realizou o fim para
que Deus a criou, ou como o servo que enterrou o
t alento. '
E não se d � a que l á no principio não foi assim.
Pensar que Adao no paraíso vivia ocioso sem nada
fazer, é erro. Lá diz a Escritura : «Deus colocou a
Adão num parafso de delicias, para ele o hortar e

(I) job. 5, 7•

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T R1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N C I A 275

guardar». (1) Só que então o trabalho não era peso


e castigo ; a alma naturalmente, sem esforço, pro­
pendia para o trabalho, no desejo de se conformar
com a vontade de Deus.
Não pode, p ois, o homem subtrair-se à lei divina
do trabalho, sei a qual for seu estado ou condição.
Incumbe-lhe a obrigação de se entregar a trabalho
corporal ou ·e spiritual, pois como diz S. Paulo :
«se alguém não quer trabalhar, pois que também
não coma». (2)
Mas daqui não se vá. ao extremo de julgar o
trabalho a única e exclusiva ocupação do homem.
O homem precisa tamb�m de orar, pois é a oração
que alimenta, fortalece e revigora o espírito, e mais
aproxima de Deus. Fomos criados para o céu,
não o podemos perder de vista. Se, como diz
S . Paulo. em Deus «vivemos. nos movemos e exis­
timos» (ª), preciso é que de vez em · quando nos
recolhamos a conversar com Ele para lhe agradecer
os benefícios recebidos, pedir as graças necessá.rias,
mostrar gratidão a quem tanto amor nos tem.
São. exigências iguais da natureza do homem :
a oração e o trabalho. Descurar qualquer delas, é
desequilibrar a vida. O trabalho não deve estorvar­
-nos de cuidar da alma e da salvação eterna. Por
mais urgentes e importantes que pareçam as neces­
sidades do corpo para cuja satisfação trabalhamos,
nunca seria justo, por causa delas, esquecer os inte­
resses da alma, bem mais importantes eles são.
Muito bem caem a este propósito as palavras
com que o Seráfico Patriarca S. Francisco a seus
frades impõe a lei do trabalho, na Regra que lhes
deixou : «ÜS frades a quem o Senhor deu a graça
d e trabalhar, trabalhem fiel e deyotamente, de ma..
neira que afugentem a ociosidade, inimiga da àlma,
mas não matem o espírito da santa oração e de­
voção ao q ual todas as demais coisas temporais
deve-m- servir».

(1) Gen. 2, 5. (2) e Tes. 3, 10. (3) Act. 17, 28.


_

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O CRISTÃO NO

c1Que aproveit aria ao homem ganhar o mundo


inteiro, se ao fim de contas viesse a perder a
alma ? » (1)
Pat'a o hom1m p1eado,-, o lt'abalho é p1nitê.ncia.
Se no paraíso o trabalho era praze � outro tanto
não sucede depois de Adão pecar. «Comerás o teu
pão no suor do teu rosto, até que tornes à terra de
que foste formado» sentenciou a misericórdia de
Deus contra o pecado de Adão. Não fosse o ho­
mem outra vez iludir-se e deixar-se levar pela ma­
nia de grandezas divinas, sobre ele deixou Deus
cair sua mão pesada : os abrolhos de que cobriu a
terra, haviam de ajudá-lo a erguer olhos supli­
cantes para o Alto. E o trabalho tornou-se assim
misericordiosa expiação da desobediência come­
tida. E Cristo, trabalhando, deu ao trabalho hu­
·mano poder santifi cante.

E no cristianismo o trabalho transformou-se


em fonte de graças. O que nele há de pena e dor,
com a graça da Redenção tornou-se em beneficio
para o homem.
E o trabalho é hoje uma honra. Deus feito
homem, para pai adoptivo escolheu o humilde ope­
r ário S. José. Aos olhos humanos, olhos pagãos, o
trabalho era desonra, era vergonha. E o Salvador,
para o nobilitar, com suas mãos divinas trabalhou.
E desta forma o trabalho tornou-se para o homem
honra e glória. Trabalhando, assemelhamo-nos a
Deus ; andamos trabalhando com Jesus. Por isso
S. Paulo, apesar de tão atarefado com os cuidados
do ministério e pregação, quis, a cumprir o sublime
dever do trabalhq, ganhar o pão com . o trabalho
de suas mãos.
A alguém que lhe aconselhava a tomar criado,
respondeu S. Francisco Xavier, o apóstolo das Indias
e Japão : «Enquanto tiver mãos e pés, chego para

(1) Mat. 1 6, 26.

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TRIBUNAL DA PENITÊNCIA

os meus trabalhos, não quero que ninguém me


sirva. Uma só coisa o homem deve evitar : o pe­
c:a do».
O trabalho além de ser uma honra, ajuda o
homem na virtude. «A ociosidade é a mãe de todos
os vícios», diz o provérbio. É o mau terreno onde
as plantas mimosas da virtude definham e morrem ;
e cr:escem e prosperam as plantas ruins do pecado.
() trabalho alimenta a força do corpo e da alma, e
reprime as perversões do coração.
Em vão pretende ser perfeito_, quein não traba­
lha segundo as suas posses. Por isso os fundadores
-das Ordens Religiosas, não se esqueceram nunca
de mandar aos seus frades o trabalho com a oração.
Já vimos o que S. Francisco de Assis ordena no
capitulo V da sua Regra : «OS frades a quem o
Senhor deu a graça de trabalhar, trabalhem fiel e
devotamente». E ao fazer seu Testamento, mais
acrescentou : «Eu trabalhava com as minhas mãos
e quero ainda trabalhar ; e firmemente quero que
todos os frades trabalhem em mister honesto.
E os que não sabem, aprendam ; não pela cobiça
de receber o preço do trabalho, mas para dar bom
exemplo e para repelir a ociosidade».
O trabalho feito com recta intenção é obra
boa, que vale para a vida eterna. Feito por amor
de Deus, tem a recompensa do mesmo Deus. E1não
aprecia Ele ªRenas o trabalho 11ue tem o louvor
dos homens. Todo o trabalho por mais humilde
que ele sej a, por mais vil, por mais escondido às
vistas do mundo, desde que feito para agradar a
Deus, é de Deus apreciado.

Qual o merecimento do trabalho ?


O trabalho se é feito em graça de Deus, tem
merecimento semelhante ao da oração, do jejum ou
da esmola : sa � isfaz pe �a pena temp <? ral devida aos
peéados comeudos e amda nao _ expiados, alcança­
-nos favores para a vida presente e merecimentos
para o cêu, aumenta agora a graça santificante
nesta vida e depois a glória eterna.

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O CRISTÃ O NO

Suportado ..e or amor de Deus, é tesoiro ' de


valia grande. �uantas penas nos ajuda a pagar,
quantas graças nos alcança, quantos méritos com
ele entesoiramos ?
>Jão tiremos dele muito embora os resultados
temporais 9.Ue esperávamos, OU sej a porque DOS
faltou habihdade, oµ seja por desgraça nossa ou
por qualquer outro motivo ; nem por isso julgue­
mos que foi perdido o nosso tempo : amealhámos
riquezas lá no céu <(onde as não consome nem a
ferrugem nem a traça, e onde os ladrões não a s
desenterram nem roubam,, (1). E portanto não de­
vemos afligir- nos por demais quando nossos tra­
balhos parece que vão mal� se não lucramos para
este mundo, é grande o lucro para a eternidade.
O trabalho é sem dúvida uma graça, dizia
S. Francisco de Assis. Não são felizes os que nada
fazem, mas os que se entregam ao trabalho com
assiduidade e paciência. Aqueles a quem o Senhor
não deu a graça de. trabalhar, os que são doentes e
faltos de forças, resignem-se com a vontade de Deus;
e na paciência em levar as dore'S e doenças, alcan­
çarão os méritos que não podem haver com , o
trabalho.
M � s há p c:_ssoas que nã � preci � am trabalhar
para viver, d1rao alguns ? Nao precisam trabalhar
para si, trabalhem para os outros, pois não falta
que fazer. É largo muito largo o campo da santa
caridade. São as o bras de assistência que podemos
ajudar, são dores que podemos aliviar ou consolar,
necessidades que podemos socorrer. Quanto bem
podemos fazer, trabalhando pelo próximo 1 Porque
a misericórdia cristã não é apenas dar esmola ;
é também misericórdia e caridade, e às vezes cari­
dade bem maior, ajudar os outros ·com nossos tra­
balhos e sacriffcios.
E quanto não pod�rás fazer, . trabalhando nas

( 1 ) Mat. 6, 20.

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TRI B U N A L DA PE NITÊ N C I A 279

obras de apostolado ? E se é caridade prover às


necessidades corporais do próximo, maior caridade
é ainda cuidar-lhe da alma, a1umiando:lhe o ca­
minho da verdade a fim de que todos o sigam, e
os desvios do . erro para que todos deles fujam.
É devef' de caridade p ara com o . próximo aju-:­
dar, por exemplo, a boa imprensa, propagando-a, e
com bater de todas as formas a imprensa ímpia e
imoral. Nos tempos de hoje em que os inimigos
da Igreja e religião não se poupam a canseiras e
em toda a parte aparecem a semear a má doutrir.. a,
preciso se torna que todos os homens de bem, se­
gundo lhes for possível, saiam a campo em defes�
da Fé e da moral cristã. Não o fazer quando se
pode, é mais que preguiça, é cobr..r dia e traição â
Igreja santa de Deus.
Não faltemos nunca a ajudar com nossos tra­
balhos as empresas e sociedades católicas organi­
zadas para a di fusão da sã doutrina, e o nosso tra­
balho será ajuda preciosa no apostolado de salvar
as almas. Se trabalharmos no apostolado do bem,
receberemos o prémio decretado para os apóstolos�
«Ü que recebe um profeta como profeta, terá a
recompensa de . profeta». (1)

2 . 0 A tibieza nas coisas de Deus é tam­


bém preguiça. É tibieza deixar as obrigações
de piedade ou cumpri-Ias com aborrecimento
e enfado, desmazelar a oração ou fazê-Ia
negligentemente, distraidamente, de qualquer
forma, só para não se ralar ou mortificar,
não frequentar os sacramentos para fugir a
presumidos incómodos.
}... preguiça espiritual é pecado grave ou

(1) Mat. 10, 41:

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O C RI S T Ã O N O

leve conforme são graves ou leves os de­


veres que . por causa dela se não cumprem.
Quem, por exemplá, só para não se inco­
modar descura notàvelmente os deveres do
próprio estado, peca gravemente.
Também se não livrará de culpa grave
quem não utilizar os meios que Deus põe
ao seu dispor, sabendo que desta forma fàcil­
mente cai em pecado grave. Assim, se é
verdade que por preceito da Igrej a ninguém
está obrigado a confessar-se e comungar
m ais de uma vez ao ano, todavia quem sou­
besse que só, sem a frequência dos Sacra­
mentos, não poderia livrar-se de pecados
graves e por preguiça os não frequentasse,
com�teria pecado grave de preguiça.
E certo que há outros meios de evita� o
pecado, tais como a oração fervorosa, os.
frequentes actos de contrição perfeita ; mas
quem por preguiça deixa os Sacramentos,
também nas outras coisas de Deus não porá
a diligência alegre que é preciso. Nuriça
esqueçamos esta norma de bom viver : quem
quer os ·fins, tem de querer os meios que a
eles levam ; quem se quer ver livre de pe­
cados graves, tem de empregar para isso os
meios oportunos.
Adverte o divino Salvador : «Nem · todo
o que diz « Senhor, Senhor» entrará no reino
dos céus» . (1) E n1ais adverte ainda :

(1) Mat. 7, 2 1 .

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TR1 BUN A L D A PE N 1TÊ NC1 A 281

«O reino dos céus padece força ; e os que


fazem violência, são os que o arrebatam» . (1 )
Quem quisesse servir a Deus, mas cobarde­
mente fugisse ao sofrimento e ao combate,
seria como aquele a quem na Escritura se
dizem estas palavras severas : cc Oxalá foras
frio ou quente ! Mas porque és morno, e
não és frio nem quente; vou começar a vo­
mitar-te da minha boca» . (2)
Contra o servo preguiçoso do Evangelho
porque escondeu o seu talento e com ele
nada agenciou, o Senhor proferiu a sentença :
«Ao servo inútil lançai-o nas trevas exterio­
res ; ali haverá choro e ranger de dentes» . (3)
Se ao menos trabalhasses por Deus e pela
salvação da alma, tanto quanto os homens
do mundo trabalham para satisfazer suas
paixões ? O célebre chanceler de Inglaterra
S. Tomás Moro exclamou certa vez : Quanto
se afadigam e suam os homens do mundo
para entrarem no inferno ! E bastava-lhes
tão pouco para salvar a alma e alcanç ar no
céu glória grande e altíssima !
t< Üra et labora)) : reza e trabalha ! Reza
pela manhã ; e se por acaso te esqueceste,
pelo dia adiante levanta a Deus o teu cora­
ção. Trabalha, primeiro no exacto cumpri­
mento dos deveres do teu estado e Yocação,
e nos tempos livres entretém-te em qualquer
tra�alho útil para ti ou para o próximo .
,

(1) Mat. n, 12. (2) Apoc. 3, 15-16. (3) Mat. :zS, 3o.

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O CRISTÃO N O

Faz violência a ti mesmo. De princípio


pode custar a cumprir um ou outro dever,
esta ou aquela mortificação, esta ou aqüe­
loutra obra de piedade e caridade ; mas
teimando nelas, cedo chegarás a encontrar
aí mais prazer do que nos divertimentos, e
mais alegria e conforto no serviço de Deus
do que nas coisas do mundo.
Tito, imperador pagão, punha todo o seu
cuidado em não deixar passar sequer um
dia sem ter feito qualquer beneficio a alguém.
Certa, vez, entrara anoite quando se recordou
que nenhum bem fizera aquele dia, e loBo
cheio de desgosto desabafou para o oficial
que com ele estava : « Olha, amigo, perdi o
meu dia » .
Oxalá também tu julgasses perdido q
dia em que não trabalhasses de qualquer
forma a favor do teu-próximo, em que nada
fizesses por Deus e pela tua salvação !

Da e l eiçlo do estado

Toda a vocação vem de Deus. É pecado de


preguiça e ociosidade não escolher, a tem po, estado
âe vida, desde que não haja motivos multo graves
em contrário.
A sociedade não poderia atingir os fins para
qtie Deus a constituiu, terrenos ou eternos que eles
sejam, se os indivíduos que a formam, não abra­
çassem estados de vida diferentes . .
No corpo cada órgão tem sua· função es p ecial.
E é da boa conjugação das diferentes acti v1dades
dos órgãos, que sai o e q_uilibrio que permite ao
corpo viver. Coisa parecida se dá na sociedade :

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T R 1 B,U N A L D A P E N 1 T Ê N C 1 A 283

da actividade diferenciada dos indivf duos resulta a


harmonia que permite à sociedade ·atingir os fins
que Deus teve em vista ao constituf-:la.
Por isso todo o estado ou modo de vida que é
necessário ou útil à humanidade, é conforme com
a vontade de Deus. Lê-se no Eclesiástico : «Ü Se­
nhor7 pela grande compreensão da sua sabedoria,
os distinguiu, e deversificou os seus caminhos». (1)
E noutra parte : «Honra o médico por causa da ne­
cessidade que tem dele o homem, pois· o Senhor
foi quem o criou».
Da<Jui havemos de concluir que todos os ho­
mens tem obrigação de escolher estado de vi'cla,
pois têm obri g ação de contribuir para o bem comum
e p ara a realização dos desfgnios que teve Deus ao
cnar a humanidade.
E este dever urge t anto mais, quanto é certo
que, no plano divino, cada um há de encontrar a
felicidade quer terrena quer eterna no estado ou
modo de vida a que Deus o destinou.
«Ü j ardim onde o homem há de desabrolhar,
florescer e dar frutos de vida eterna», é o estado
ou modo de vida que escolheu e abraçou conforme
os desfgnios da Providência.
Mas, perguntareis, como hei de eu saber qual
o estado de vida a que me destina Deus ?
Estudàndo a vocação a que te chama, o fim
que Ele teve em vista ao criar-te. Todos os es­
tados de vida, necessários ou úteis à sociedade,
foram por Deus determinados, são a sua vonta_de.
Para um deles te destinou a ti. Como o pai dis­
tribui os vários trabalhos da casa pelos membros
da familia segundo suas habilidades e forças, como
o general determina a cada soldado o lugar que
deve ocupar no exército ou no campo da óatalha,
assim Deus,. o nosso i:>ai, a cada um de nós dis­
tribui o seu · trabalho, a cada um determina qual

(1) Eclesl. 331 1 1 . (2) Eclesl. 381 1 .

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O C RI S T Ã O N O

o lugar onde há-de cumprir o dever para chegar à


bem aventurança.
Do Pontffice afirma S. Paulo : «Nenhum usurpa
para si esta honra, senão o que é chamado por
Deus, como Aarão». (1) Em certo modo, de todos
os estados se pode dizer o mesmo. A vocação vem
de Deus, , é Deus quem nos chama a um estado
de vida.
É certo que não vem ele pessoalmente ter
connosco a chamar-nos, como' fez outrora com os
Profetas e Sumos Sacerdotes da Antiga Lei, e com
os Apóstolos. Mas se tem sobre cada um de nós
os seus designios e não vem mostrar-no-los aber­
tamente, a nós cabe o dever de os indagar. E de
dois modos o podemos fazer : pela oração e pela
reflexão.

1 . Primeiro há que pedir a D eus a graça da


sua luz. Seria atrevimento imperdoável decidirmo­
-nos em negócio de tanta monta como o de escolher
estado, sem o auxilio da luz de Deus. Digamos-Llte
com quanto fervor pudermos : «Vinde, 6 Espirito
Santo, alumiai o coração dos vossos fiéis e enchei
da luz celeste as almas daqueles a quem Vós . crias­
tes». · E à oração h á que juntar a frequêncià dos sa­
cramentos d a Penitência e Eucaristia. Quando em
graça, somos o templo do Deus vivo. Purificados
pelos. sacramentos, mora Deus vivo em nosso cora­
ção ; e então é que é tempo de com Ele tratar os
negócios graves, pois estamos em condições de
melhor ouvir a voz interior da sua graça.
E podemos estar certos de que nossas orações
serão ouvidas, e que a luz de Deus virá alumiar os
caminhos que havemos de tomar na vida. (1)
.

2. À oração cumpre-nos juntar a reflexão. Há


circunstâncias na vida do homem que são outros

( 1 ) Ecles. 39, 10.

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TR1BUN AL DA PE N1TÊ N G1 A .285

tantos indfcios naturais a apo iTt ar o estado a que


Deus chama. Basta atentar neles, para descobrir
os desfgnios da Providência.
São indfcios dos quais nos podemos socorrer :
a) Certas circunstâncias externas. Vejamos se
não haverá na nossa vida circunstâncias que bem
possamos interpretar como revelações do estado
em que Deus nos quer.
Punham os alguns exemplos : Uma donzela anda
em desejos de se meter a freira · mas, em dada al­
tura, cai g ravemente doente e fi ca impossibilitada
de cumpnr os deveres que impõe a vida religiosa.
Esta circunstância é indicio certo que Deus a não
quer freira, ma.s sim a chama a outro estado de vida.
Também outro deseja abraçar a vida religiosa,
mas sucede que seus pais envelheceram e os irmãos
cairam doentes e não dispensam seus cuidados. Esta
circunstância mostra com certeza que mais a gra­
dará a Deus, e portanto maior perfeição ser � ficar
em casa a cuidar dos seus do que entrar em urdem
religiosa.
Não é que pais e irmãos tenham direito a im­
pedir que alguém abrace a vida religiosa ; é, sim, o
preceito da caridosa piedade que cada um deve aos
seus, a obrigar a que fique com eles em casa.
Se as circunstâncias externas nada alumiam
sobre os desígnios de Deus a nosso respeito, então
socorramo-nos de outros meios. .
b) O nosso feitio e qualidades podem ser in­
dícios ·seguros da vontade de Deus, pois Deus a
cada um de nós distribui seus dons conforme deles
precisamos para o bom desempenho da missão a
que nos destina no mundo.
Examina pois, qual o estado de vida que me­
lhor se con forma com teu feitio e qualidades, e
pode ser que assim acertes com a vocação a que
Deus te chama.
c) A inclinação 1 f>ropensão que sentimos para
determinado modo de vida, à falta de melhor luz,
não são pâra desprezar. Certas aves não aguentam
com o f rio do inverno ; e dai, outono dentro,

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286 O CRISTÃO NO

põem-se de abalad a para regi Õ es mais quentes·.


O instinto ou a inclinação livra as assim da morte.
Pois também aos homens deu o Senhor certo ins­
tinto e um a tal ou qual. inclinação para o estado
de vida em que serão felizes. Se sentes tal incli­
nação, pede a Deus te ajude a ver, com Ele pensa
-0 caso, e talvez chegues à certeza moral de qual
seja o estado de vida que mais te convém.
d) Se não chegares a certeza alguma, então ·
um único meio te resta : pedir ,conselho ao con­
fessor ou a outras pessoas experimentadas que bem
te conheçam o carácter e as condições de vida.
Em caso de dúvida, sózinho, é que te não deves
aventurar a dar passo decisivo em negócio de
tanto risco. «Filho, diz o Eclesiástico, nada faças
sem conselho, e nunca te arrependerás)) (1)
Em primeiro lugar, consulta teus pai s. Ninguém
melhor do que el es para te dar um conselho. Por­
que te estimam como mais ninguém, têm o direito
de ser ouvidos e co m certez.a. s..ó te dirão o q_ue
julgam ser teu bem. _Mas se sempre tens obrigação
de lhes pedir conselho, nem sempre terás obrigação
de o seguir. A vocação é a voz de Deus ; e quando
Deus claramente chama, muito empora os pais não
concordassem, mesmo assim haveria que seguir o
chamamento de Deus.
Aos pais não assiste o direito de obrigar os
filhos a abraçar o estado de . vida qtíe lhes parece
melhor. Este negócio transcende a alçada do seu
poder. E pecariam gravemente se obrigassem os
filhos a casar cont_ra vontade, contra vontade entrar
no convento ou meter à carreira eclesiástica. E pe­
rante Deus ficariam responsáveis pelas consequên­
cias que da sua coacção pudessem resultar.
Do mesmo modo pecariam os pais que, levados
da ambição, cubiça ou qualquer outro motivo assi_m
ignóbil, estorvassem os filhos de casar com deter­
minada pessoa ou os constrangessem a casar com

(1) Eclesl. 32,24.

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T R l B U N A L D A P E N 1 'f. Ê N C 1 A 287

outra que lhes não convém. Não lhes cabe o di..:.


reito de se oporem à legitima inclinação dos filhos)
pelo facto · de se terem eles agradado de pessoa qtie
não é rica ou de familia distinta. Todavia pode
acontecer alguma vez que a intervenção . e oposição
dos pais sej a tudo o que há de mais legi.timo e
certo. Há cegueiras nos . filhos para as quais . �êm
os pai� obrigação de procurar remédio.
Do acerto no eleger estado depende em muito
a felicidade quer no ·. mundo quer na eternidade;
«Assim como são diferentes as pessoas, diz o
célebre místico alemão Tauler, assim são diferentes
os caminhos do Senhor. O que para uns é vida,
para outros pode ser a morte. A graça actua mui­
tas vezes segundo as disposições e natureza das
pessoas.
«Mais gue tudo, procura conhec�r a tua vo­
cação, e vai para onde Deus te chama. Sim, pro­
cura conhecer a tua vocação, porque as outras não
te fariam feliz». ccNem a toda a alma agrada o exer.­
Cicio das mesmas coisas». ( 1)

Vocação para .o matrim6nio


O matrimónio é um dos sacramentos . da Igreja :
o sacramento que Deus instituiu para santificar a�
justas pretensões ·e a vida dos esposos. Estado de
vida tão sànto, exige que convenientem·ente para
ele se prepare quem o deseja abraçaT.
«Antes que cases, vê o que- fazes». Entra den­
tro em ti, e com sinceridade responde : - Vou para
o casamento ; e será recta a minha intenção ? Vou
resolvido a cumprir tudo como Deus ordena ? A res­
peitar de veras a castidade conjugal ?
Vê lá se vais para o casamento resolvido a ser­
vir e �mar a Deus, ou só para te servir a ti. Vê se
-. .

(1) Eclesl. 37, 3 1 .

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288 O CRISTÃO NO

vais disposto a ajudar teu cônju $e a salvar a alma,


ou pelo contrário a ti e a ele te irás perder. Levas
sérios propósitos de educar cristãmente os filhos
que Deus te quiser dar ?
Depois, vê bem com quem desej as casar. Se
seu temperamento e feitio, suas aspirações e cul­
tura, são parecidos aos teus, se «O coração se
amo] da ao coração». Se tem virtudes e carácter,
se · te irá servir de arrimo nos trabalhos dá vida,
nos exercícios de piedade. Que te não deixes fas­
cinar pela beleza ou qualquer outra prenda cor­
poral; tão efémera, tão sem-preço. Encham-te, sim,
os olhos e o coração, a beleza de alma, o feitio
santo que seja capaz de te fazer feliz.
Numa palavra : Andas em cata do escolhido
do teu coração. Procuras nele o chefe digno para
a familia que vais fundar, o casto e sólido arrimo
para ti e para os filhos que Deus te pode dar, ou
que procuras tu ? Andas em cata da eleita da tua
alma. É a companheira amável para a vida toda,
que desejas encontrar, a séri a dona da tua casa, a
mãe boa e piedosa para os filhos ,que te vão nascer ·?

Preparação para o casamento


Tudo bem ponderado perante Deus e a tua
consciência, bem aconselhado por quem podia
aconselhar-te, resolves dar o coração ao eleito
ou eleita da tua alma, e em breve vais casar. E st ás
noivo ou noiva, e com o teu par começas de entrar
em maior intimidade. Lembra-te, porém, que ainda
agora estás obrigado a ser casto ; e ROrtanto ro­
deia- te de precauções, não vá tua fragilidade per­
der-te.
Em primeiro lugar atende ao que nunca é por
demais rep etir : Quanto mais se difere o casamento,
tanto maior cuidado h ão de ter os noivos em seus
entreténs e conversas.
Os mestres de espírito insistentemente reco­
mendam aos noivos que não se entretenham um
com outro sem motivo razoável, e nunca a sós, e

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TRI B U N A L D A PENIT Ê N CI A 28g

muito menos na escuridão da noite.. Não é que a


conversa . seja sempre e para todos um perigo ; mas
a. muita familiaridade pode acarretar desgraças sem
remédio. Quanto desvairio moral, quantos remo·r­
sos a roer o coração, quantas liberdades a crescer
assustadoramente, não resultam por vezes das inti­
midades e conversas em demasia frequentes !
Conversem) sim, os noivos para cultivar o mú­
tuo amor e ateição, mas à vista dos pais ou de
pessoas de consciência. Um ao outro dêem aquelas
provas de estima que na região passam por ho­
nestas e decentes ; mas nunca entre eles haj a seja
o que for, nem sequer um pensamento, menos casto
ou menos puro.
E se qualquer vez nalguma coisa transpuseram
os limites da honestidade e a Deus ofenderam gra•
vemente, cortem sem piedade pelas ocasiões e pe­
rigos de desgraça, acautelem mais suas convers as
e apressem o casamento quanto possfvel.
E se de tais precauções não resultasse a emenda,
teriam de solenemente prometer a Deus e à �ua
consciência que de-veras iam pôr cobro a todos os
perigos de pecar, e que de futuro só na presença
dos pais ou de pessoas assim de respeito se encon-.
trariam para conversar. Quem não quisesse assim
acautelar a alma, não andaria a · bem com Deus,
pois voluntàriamente se quedava em ocasião pró­
xima de pecado.��
Cristão, no intuito sério de casar em breve,
conversas com alguém ? Vê lá, não transponhas
nunca os limites da modéstia e da moral cristã.
Mesmo que te julgues . de uma segurança a toda -a
prova, sê prudente e acautel ado com o eleito ou
eleit a do teu coração. De faúlha pequena sai · às.
vezes incêndio grande. Que teu amor e afeição
sempre saibam respeitar a quem vais dar a vida e .
o .coração.
Noivo, respeita a digni dade e a honra da tua
noiva, e nadsi ouses com ela que ofenda a decência
e a moral cristã. Noiva, não consintas a teu noivo
familiaridades que te possam trazer perigos à alma.

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O C RI S T Ã O N O

Quem passa o tempo do noivado em perfeita


castidade, é de esperar que sempre terã vida sóli­
damente cristã. Quem o passa na frequência da
oração e sacramentos, alcançará as melhores oên­
çãos de Deus para seu futuro matrimónio. «Todas
as bencãos virão sobre ti e te alcançarão, contanto
que ob e deças aos seus preceitos». (1)
Nas vésperas do casamento prepara· te para ele
como deves. O matrimónio é sacramento de vivos,
e portanto há que recebê-lo er'n estado de . graça ;
de outra sorte irias cometer um sacrilégio. Pre­
para-te, pois, para ele com uma confissão bem
feita ou até com a confissão geral, e depois recebe
a sagrada comunhão. Se alguém de modo nenhum
se pudesse confessar e comungar por ocasião do
casamento, antes do matrimónio devia fazer um
acto de contrição perfeita para em graça receber
o sacramento.

Vocação para o cel i bato a v i rg i ndada


« Ü matrimónio é um grande sacrame_n to em
Cristo e na I sreja», ensinou S. Paulo. {2) E f�gura
da misericordiosa união de Cristo com a sua esposa
a Igreja. Portanto se é sacramento, é em si um acto
santo, e santo o· estado de matrimónio. E para a
sociedade é mais necessãrio e importante
, do que o
mesmo celibato e virginda de.
Todavia em valor e beleza intrfnseca, é interior
à vida de celibato, abraçada voluntãriamente por
motivos sobrenaturais. O divino S al vador" viveu na
terra em perfeita virgindade ; para mãe escolheu a
Virgem Santfssima ; p ara pai adoptivo a S. José
que sempre viveu em 1ustiça e santidade e também
em virgmdade. f) disctpulo amado de Jesus · foi
S. João, também ele igualmente virgem. Basta�
estas preferências de Jesus para mostrar fIUanto
Ele ama e estima a castidade virginal.

(1) Deut. 28,2. (2) Ef�s. 5, 23-25 e 32.

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TRIBUNAL DA PE NITÊNCIA

O apóstolo S. Paulo ensinou a doutrina que de


Jesus aprendeu. Na primeira Epistol a aos fiéis de
Corinto deixou elogio rasgado da virgindade e vida
cél ibe :
«Digo também . . aos sol teiros e viúvas qúe 'lhes
é bom ficarem assim, como também eu assim fi­
quei. Mas se não têm o dom de continência, então
casem-se». (1)
E noutro lµgar : « Quanto às virg�ns, não tenho
mandamento do Senhor ; mas dou conselho, como
quem do Senhor alcançou misericórdia para ser
fiel. Entendo, pois, que assim é bem por cam;a da
instante necessidade, porque é bem para o homem
assim fi car.
·

<1Estás ligado a tua esposa ? Não busques se­


parar-te dela. Estás l ivre de esposa l Não procures
casar-te. Mas se tomares esposa, nem por isso pe­
caste. E se a .que é virgem vier a casar,. também
não pecou. Mas nesse caso sobre eles virão as tri­
bulações da carne, e eu quisera poupar- vos a elas.
n Quem vive sem esp9sa, anda cuidadoso das
coisas que são do Senhor e de como há de agradar
a Deus. Mas quem vive com esposa, anda cuida­
doso das coisas que são do mundo e de como há
de dar gosto. a sua mulher, e deste modo anda di­
vidido. E a mulher solteira e a virgem cui.da das
coisas que são do Senhor para ser santa no corpo
e no espfrito ; mas a que é casada. cuida nas coisas
que são 'do mundo e de comó há de agraaar ao
marido.
«E assim também . quem casa sua filha donzela,
faz bem ; e quem a não casa, faz melhor». (2)
A Igreja, é claro, não podia aqoptar outra dou­
trina. E o concilio de Trento apresenta-a como
ver.d ade de Fé : ccSe alguém disser que deve ser
preferido à virgindade ou celibato o estado de ma­
trim!mio, e que não é melhor e mais excelente vi-

( 1 ) 1 Cor. 7, 8-9. 1 Cor. 7 1 25-38.

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O C RI S T Ã O N O

ver em virgindade ou celibato do que em matri­


mónio, sej a anátemau. (1)
Mas, de facto, nem a todos, a bem poucos até,
chama Deus a virtude tão alta. «Nem todos são
capaze� de viver em celibato, diz Cristo Salvador ;
mas sàmente aqueles a quem tal dom foi conce­
dido». « Quem pode compreender estas coi�as, pois
que as compreenda». (l) «Cada um tem de Deus
seu próprio dom, uns de ur.na m aneira outros d.e
outra». (ª)
Vej a, pois, cada um qual o caminho a que Deus
o chama, quais as inclinações e prol?ensões que
Deus lhe deu ; e conforme elas, assim proceâa.
É o que diz S . Paulo : «Esta é a vontade de Deus :
a vossa santificaçáou. (4)
Vocação re l i g i osa
Sentes-te inclinado ao estado religioso, e que­
res saber se tens as qualidades precisas ? A res­
posta é em ti que a hás de procurar : na tua pie­
dade, no teu amor à pureza, no teu respeito aos
pais, na tua fndol e, afmaL
Se não tens piedade, não penses em abraçar a
vida religiosa. Se não tens amor à pureza e força
para seres casto, serias infeliz e desgraçado no es­
tado religioso de tão subl ime virtude. Se não tens
respeito fil i al, não serias capaz de te dobrar à obe­
diência em tantas coisas, pequeninas e grandes, que
a Religião te vai impor. Se não és de fndole amol­
dável e dócil, nunca serias capaz de sujeitar tua
opinião às dos demais, e podias dar num revoltado.

Da perfei ção cri stã


Sej a qual for o estado a que Deus nos chama,
nele nos podemos santificar e chegar à perfe ição
cristã.

(1) Cone. Trid. ses .i t, e. 10. (2) Mat. 19, 1 1-12.


(3) 1 Cor. 7,7. (4) 1 Tes. 4,3.

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TRIB UNAL DA PE NITÊNCIA 293

A prova é a cchistória dos Santos» quem a dá.


Em todos os estados de vida, em todas as condi­
ções sociais, ainda as mais humildes e abjectas,
tem florescido a santidade. Há santos que foram
papas, sacerdotes e frades ; mas também os há que
foram reis e imperadores, médicos e soldados, ope­
rários e criadas de servir. A história · e tradição
conservam lembrança de santos de todos os estados
e condições. Nos mais humqdes trabalhos, nos mai�
mundanos digamos assim, sempre viveram almas
que com a graça de Deus atingiram a perfeição e
santidade.
E nem se compreende que assim não foss e,
pois todos os estados de vida são a vontade de
Deus. É o mesmo Deus quem a uma donzela chama
para ser mãe cristã, e a outra para ser virgem.
E se Deus é quem chama aos diferentes estados de
vida, é porque nenhum deles pode ser de empecilho
ao mesmo ideal a que Ele chama : a perfeição
cristã, a santidade. Tudo o que Deus quer, ordena
e estabelece, é porque é bom. e oportuno para levar
o homem ao fim para que foi criado.

Em q_ue consiste então a p erfeição cristã !


Em fugir para as solidoes do deserto ? Em
abandonar o mundo e a familia e meter-se na clau­
sura de um convento ? Em entregar-se todo aos
exercícios de piedade e demorar nas igrejas horas
esquecidas ? Em jejuar continuamente ou distribuir
esmolas avultadas ?
Não, em nada disto está a perfeição. Obras,
todas · elas meritórias e algumas até certo ponto
necess.á rias à vida cristã, é verdade ; mas não passam
de meios ou caminhos de perfeição. E até mais :
se falta a boa intenção em quem as pratica e não
andam juntas a outras virtudes, podem chegar a
refinada hipocrisia. Dos fariseus falava assim Je­
sús : «Ai de vós, fariseus hipócritas, que pagais o
-

dizimo da hortelã, do endro e do cominho, e não


fazeis cáso das coisas mais importantes da Lei, a
juitiça:, a misericordia e a fé. Estas coisas, sim, que

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1 1 CRISTÃ O NO

havfeis d.e praticar, sem contudo omitir aquela� ». (1)


Ai deles ! apesar do escrúpulo que punham em bem
cumprir certas observâncias da Lei, nem sequer
.anda.v am1 em :caminhos �e pe,r fejção.. Poi�, . OJJ.t ro
ra·n to''se pudera dizer hoje muitas vezes.
Não faltar dia nenhum na igreja a assistir ao
sacriffci.o «do cordeiro que tira os pecados do
mundo » ' (2), e não usar misericórdia para com o
próximo, nem desculpar suas faltas ; abeirar- se pela
manhã da mesa da. comunhão ,a participar do divino
banquete da caridade, e passar depois o dia 1 inteiro
a martirizar o próximo com a lingua d epravada ;
não perder sequer um acto de piedade que na i greja
se faz, e não se importar com vencer o génio de­
sabrido e o mau feitio, curar as insolências do
egofsmo, domar as fúrias e paixões : Tantas e tan­
tos que pareciam bons, e são apenas como o ta_l
hipócrita fariseu que Deus reprova e abomina. Aos
que vivem assim, verbera-os S. Paulo desta. forma :
ccPor vossa causa é que os gentios blasfemam o
nome do Senhon. ( ª) .
A perfeição cristã nisto só consiste : no amar
a Deus e ao próximo. «.A caridade, escreve S. Paulo,
é o vinculo �a perfeição», aquel a carida�e que não
.. dese1os nem se
s.e . reduz a hndas palavras e vaos
contenta com gritar «Senhor, Senhor», mas a cari-:
dade que nos leva a vontade toda para o Pai ce­
les c e a ajustar a vida com a sua Lei. «Se alguém
me am a, observa os meus mandamentos». (4)
Nisto sim, que vai toda a perfeição ; e não em
coisa alguma outra, nem sequer nos três votos de
pobreza voluntária, castidade perpétua e obediência
a um Superior regular, com os quai s alguém se con­
sagra a Deus na vida religiosa. Também os três
votos não passam de meios ou caminhos de per­
feição, embora com certeza os mais excefentes e
seguros, pois, deles afirma S . Tom ás, a�rancam do

(1> Mat. 23,23. (2) 1 Joa. 5,3.


(3) Rom. 2,2.1. (4) Joa. S,3.

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TRIBUNAL DA PE N ITÊNCIA 295

cor,açá<> {'� �aizes � as paixões e são base sólida


para o ediffcio da virtude.
É verdade que os três votos religiosos directa­
mente se opõem às três concupiscências que, se­
gundo S. João, nos arrastam ao mal, «a concupis­
cência da carne, a concupiscência dos olhos e a
soberba da ,vida» ; (1) é v.e rdade que são eles, no
dizer do Evan.gelho, os meios de maior eficácia no
arredar os tropeços que nossa fragilidade encontra
nos caminhos da santa Caridade. Meios de perfei­
ção afinal, pois são meios que nos ajudam a pra­
ticar o amor de Deus e do próximo. Daf a teima
com que os mestres de espfrito repetem : o estado
religioso não é de si a perfeição, é sim a escola
onde melhor se aprende a i;>erfeição.
·

O religioso se é perfeito, não é em virtude do


estado que professa nem dos superabundantes meios
de salvação que nele encontra ; é perfeito, e tanto
mais perfeito, quanto melhor pratica a caridade
para cóm Deus e o próximo, quanto com maior
exactidão cumpre os mandamentos da Lei e os de­
veres do seu estado. Só nisto está a sua perfeição.
É de S. Francisco de Sales esta conclusão :
�Não há, pois, qualquer .o utra perteição além desta :
Amar a Deus com todo o coração e ao 'próximo
como a nós mesmos. Tudo o mais que se queira
chamar perfeição,- é falsa perfeição».
E em todos os estados, será i;>osstvel a perfeita.
caridade para com Deus e o próximo ?
Porque nã-o ? Se no· estado eclesiástico e so- ,
bretudo no estado religioso superabundam os meios
de chegar à perfeição, é caso para se dizer u�mbém
aqui : mais trabalhosos uns que. outros, mas «todos
os cam inhos vão dar a Roma», É no eHado a que
Deus chamou, é trilhando o seu próprio caminho,
que cada um há de chegar à perfeição. Para tanto
não lhes fal cam meios : os que são comuns a todos
os-fi�is e os que são próprios do seu estado de vida.

(1) 1 Joa. 21 16.


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296 O CRISTÃO NO

«Sede perfeitos como perfeito é vosso Pai que


está nos céus», diz a todos nós o divino· Salvador.
E nestas suas palavras há uma obrigação que nos
impõe, e um convite amoroso que nos faz.
1 . A obrigação que nos impõe é de sermos
perfeitos,, ao menos quant � ser perfeito quer di'z�r
estar em graça de Deus, viver como Ele em can­
dade. E para bem cum prir t al obrigação, urge evi­
tar tudo o que nos fari a perder o amor de Deus · ou
a sua graça.
A ntes a tudo renunciar, antes tudo sofrer,
do que separarmo-nos de Deus. Ou, como dizia
S. Paulo aos Romanos : «Quem nos separará do
amor de Deus ? Porventura a tribul ação, a angústia,
a fome, a desnudez, o perigo, a perseguição ou a
espada do algoz ? Tenho a certeza que nem a
morte nem a vida, nem os anjos nem os princi­
pados nem as virtudes, nem as coisas presentes
nem as futuras, nem a violência nem alguma outra
criatura nos poderá apartar do amor de Deus que
está em Jesus Cristo Senhor nosso. (1)
Este mfnimo de perfeição, não perder a Deus
pelo pecado mortal seja a que preço for, é de es­
trita obrigação para todos os homens.
2. Subir mais alto na perfeição ou amor de
Deus e do próximo, para t�nto h á convite de Jesus,
não há obrigação. Convida-nos Ele a grau mais
perfeito de Caridade, a evitar os mesmos pecados
veniais e conformarmo nos em tudo, nos pensa­
mentos, na vontade e nas acções, com os pensa­
mentos, os desejos e as acções de Deus, a darmo-nos
a . Ele generosamente em sacriftcio tot al. É longo
o caminho que nos leva até ao .:imo de perfeição
tamanha. Pelas três vias - purgativa, iluminativo
e unitiva haverá que subir quein deseje chegar
-

tão alto.

([) Rom. 8, 3 5-38-39.

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TRIB UNAL D A PENIT Ê N C I A 297

«Sede perfeitos como o Pai celestial é per­


feito». Deus que· nos convida a tomá-lo por mo­
delo para a nossa perfeição. Ele o infinito, a cha­
mar-nos sempre mais para o Alto, a pedir- nos um
esforço sempre novo que nos faça crescer no amor
de Oeus. Se Deus assim convida é porque todos
o s � ias posso avançar nos c�minhos da perfc: ição,
e viver a palavra do Apocal ipse : « Quem é JUStó,
justifique-se ainda mais ; quem é santo,. santi fi­
que-se ainda mais». Só a morte pode pôr termo
.ao nosso crescer no amor de Deus.
Pois, se tanto podemos, tanto convém fazer :
adiantar dia a dia na vida de perfeição. Quem não
avança, corre risco de voltar atrás. c<O navio que
não corta a corrente, começa de ser por el a arras­
tado». E que nunca desalentemos, nem que nos
vej amos fracos e pecadores.

Ser perfeito não é viver imune de fraqueza e


de pecado. Dos peregrinos na terra, sem manch.a
só a Imaculada Mãe de Deus. Todos os mais cairam
em fragilidades e fraquezas.
·ccNão é desta vida, afirma S. Leão, nunca ser
tentado ou arrastado por desejo mau». «Todos os
santos, à excepção da Virge1n Santfssinia, não só
sentiram por vezes os movimentos das paixões,
mas com elas transi s iram e mancharam a alma
com as culpas da fragilidade humana».
Não é, pois, para perdermos a coragem, se por
fragilidade c aímos em qu al quer pecado ou fra-:­
queza. Cair é mal a que todo o nomem está su­
jeito, até ao último inst ante da vida. Perturbarmo­
-nos seria sinal de orgulho, o orgulho de quem não
se resigna de ser tão pequenino e frágit. Desanim ar
seria a maior dessraça que nos poderia acontecer.
A este propósito escreve S. Francisco de Sales :
« Ó Senhor, nós devemos preferir a morte a . ofen­
dêr-Vos. Mas se Vos ofendermos, antes perder
tudo, do que perder a coragem, a esperança e o
bom propósito de sempre praticar o bem». «E se
por desgraça cafssemos e recaíssemos em pecado

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O CRISTÃO NO

mortal, continua o mesmo Santo Doutor, ainda


mesmo assim n�o haveria razão para nos julgarmos
incapazes "d � · prógressos-··na piedade, pois se é certo
que o pecado mortal mata em nós a respectiva vir­
tude, também não é menos certo que a virtude re­
vive com um acto sincero de contri yão perfeita.
Portanto ,não há por. . que per.d er o ânimo. Se pe­
camos, havemos de hini ldemente reconhecer e con­
fessar a nossa culpa, e pedir e instar ao Senhor o
seu auxilio e ajuda».
Nossas culpas e fraquezas' podem até ser-nos
de proveito, se delas tiramos li ção para nos tor­
narmos mais humildes, circunspectos e dil igentes.
Neste sentido traz S. Agostinho as pal avras de
S. Paulo : «Aos que amam a Deus, todas as coisas
lhes servem para bem», (1) «mesmo os seus peca­
dos», acrescenta o S anto.
O que mais importa em matéria de perfeição
cristã é tender para ela co m resolução e coragem.
«A vontade constante de avançar na perfeição, o
esfor � o continuo de chegar a ela, já de por si são
perfeição», afirma S. Próspero. Para os reli giosos
e para as pessoas que a tanto se obri garam por
vot ?,_, o tender à. perfeição �m p_? r ela trabal�a�, não
é. simpl es· conselho, é obrigaçao. «Aos religiosos,
desde - que por voto se obrigaram a observar sua
Regra, e portanto a amar a Deus mais generosa­
mente e a assemelhar-se. a Cristo, não lhes fica a
liber9ad� de tender. à perfeição ou não tender. Tra­
balhar pela perfeição é o primeiro e mais urgente
de todos os deveres do seu estado e vocação». (2)
O mesmo se diga dos que abraçaram o estado sa­
cerdotal.
Como tender à perfeição no estado . ou voc·a ção
a que fomos chama dos ?
«Dei-vos o exemplo, para que como eu fiz,
assim vós façais tamoém» (3), foi a lição do Sal-

(1) Rom. 8,28. (2) P. DENIFLE, o. P. (3) Joa. 13, 15·

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T R I B U N A. L D .\ P E N I T Ê N C I A 299 _

vador aos Apóstolos quando na última Ceia lhes


lavou os pés. E a lição que lhes deu, entende com
nós todos. ..
Em· toda ' a suà'vlda' é Jesus exem p'tê> magnifico
.

e modelo para cada um de nós.


Não se contentou Ele com ensinar de pal avra,
remir-nos com seu sangue e abrir-nos o parafso.
Quis viver a vida que nós . havemo.s de viver, para
nele termos o modelo da perfeição a copiar . . Nada,
de facto, para tanto nos animar à vida de piedade
e de amor de Deus, como o exemplo vivo do Sal- ·

vador.
Não quis exigir- nos senão o que Ele mesmo
pra�icou. E� assim, pa�a . atingir a perteição nada
mais é preciso do que 1m1tar Jesus, tanto quanto a
frigilidaâe humana o pode imitar. «Aquele que
diz que está nele, deve também andar como Ele
andou,>. (1)
A imitação de Cristo é para todos o caminho
da perfeição. Assim o ensinou Ele quando disse
ao jovem rico : ccSe queres ser perfeito, vai, vende
o que tens, e depois vem e segue me», (2) que foi
diz�r : vem comigo a viver como t'a mbém eu vivo.
E. se, Jesus a todos se apresenta por moddo, é por­
que· não há estado de vida em que não seja possfvel
imitá-lo. Velhos e jovens, pobres e ricos, sábios e
ignorantes, superiores e súbditos, todos nele en­
contram o caminho para Deus : ccEu sou o ca­
minha,>.· (ª) E seremos tanto mais perfeitos, quanto
mais nos assemelharmos a Ele no amor de Deus e
do próximo e na prática das demais virtudes.
Todavia com isto não se quer dizer que todos
nós em tudo havemos de copiar o Divino Mestre.
Certas particularidades da sua vida, dizem respeito
mais a uns do que a outros, segundo a graça do
mesmo Deus recebida. Assim, por exemplo, o con­
selho da castidade perfeita a ninguém Jesus o im­
põe, pois dele disse : «Nem todos são capazes desta

(1) 1 Joa. 2,6 (2) Mat. 19, 2 1 (3) Joa. 1416.

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3oo O CRISTÃO NO

resolução, mas sómente aqueles a quem isso foi


concedido., Quem tor capaz de compreender isto,
que o compreenda,,. (1)
A este, como aos outros dois conselhos evan­
gélicos, obrigam-se os religiosos pelos votos que
fazem. Observá-los no século seria mais diffcil,
embora não de todo impossfvel. Muitos que vivem
no mundo se ' obrigam a guardar castidade perpétua,
e sabem cumprir o seu vot� ; mas j á não seria tão
fácil levar no mundo vida de pobreza absoluta ou
de inteira obeàiência a um superior espiritual. Se
alguém, vivendo no século, se ligasse com os três
votos, contrairia obrigações iguais às dos rel isiosos
na sua vida de convento. E se os transgredissem,
incorriam nos pecados de que atrás se tratou ao
expli car o segundo mandamento da Lei de Deus.
Mas, · não falemos de transgressões. Os votos
fazem-se para se observarem, e nisto está o seu
valor. As obras que em virtude do voto se pra­
ticam, têm duplo mérito : além do mérito próprio
da . boa obra, o mérito do culto que a Deus pres­
tamos pois a fazemos por voto. Pequeninas ou
grandes que elas sej am, . as obras que o religioso
pratica em virtude da sua profissão, ficam santifi­
cadas, são louvor de Deus, por motivo do sacri ffcio
feito na santa profissão. Para os religiosos que
tomam a sério sua sublime vocação, com certeza é
de lhes encher a alm a de alegri a tão consolador
pensamento.
As pessoas que vivem no mundo, se não podem
consagrar- se a Deus com os três votos religiosos,
podem santificar a vida associando:.se a uma Ordem
religiosa com a yro fissão da sua Ordem Terceira.
Na sua regra nao há preceitos que obriguem sob
peca do, mas há normas especiais de perfeição, pos­
stveis e oportunas para todas as classes de pessoas.
Mas se os conselhos evangélicos mais próprios
são do estado religioso, nem por isso faltam traços

(1) Jtlat, 1 91 I I•I2°

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TR1B UN AL D A P E N 1 T Ê N C 1 A. 301

no divino modelo que é Jesus (feitos da sua vida,


doutrina gue ensinou) que todos os cristãos pqdem
em si copiar. Eis al_guns dos mais relevantes :
1 . Bom aproveitamento da gtaça.
Sem a graça divina a auxiliá-lo o homem nada
pode no que respeita à. perfeição : «sem mim, nada
podeis'>. (1) Não podemos faltar com nosso esforço
e trabalho, mas deles nada resultaria sem a ajuda
de Deus. Desabrolha-nos na alma o desejo de ca­
minhar para a perfeição ; j á este começo é graça
que a Deus devemos. Metemos ao caminho ; é Deus
que nos atrai, corno Ele mesmo o disse aos Após­
tolos : ((Não foste's vós que me escolhestes a mim,
mas fui eu que vos escolhi a vós» (2), palavras que
também se aplicam ao santo impulso que nos leva
à vida· de perfeição. E nunca andar1amos por diante
nem chegar1amos ao fim, se não viesse Deus a am­
parar-rios e - confortar-nas com a sua graça.
A santificação, temos nós de nos pôr a ela, mas
é sempre obra da graça, pois inclinados como so­
mos para o mal, sem o amparo divino, de nada se­
riamos capazes. Se não, é ver como depressa se
esfum am e desfazem os bons propósitos por nós
firmados na oração ! É a graça que constantemente
nos renova e alenta, j á o -reconhecia S. Paulo : «Pela
graça de Deus, sou o que sou». (ª)
Ora os meios a empregar para alcançar a:
graça são : a oraç·ão, a leitura espiritual e os sa­
cramentos.
Que se entende por leitura espiritual ? É a lei­
tura de livro religioso, por nós feita para aprovei­
tarmos à alma e edificarmos . a nossa perfeição'.
«Os livros espirituais, diz S. Gregório, são de algum
modo cartas que Deus nos manda lá do céu,., a di­
zer-nos o que havemos de fazer, a exortar-· nos ao
bem, a consolar nossas máguas, a animar-nos à pa­
ciêrída e perseverança e à dor dos pecados come-

(1) }oa. 1 5,5. (2) Joa. 15,16. (3) 1 Cor. 15,10.

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302 O CRISTÃO NO

ti dos, a repreender nossos defeitos, a avisar- nos


dos perigos.
«Na oração somos _ nós que falamos com Deus,
na .l eitura é Deus que fala conosc.o», . ensin.a S. Je-
rónimo.
·

Em vão tentaria adiantar nos caminhos da per­


feição, quem dispensasse a leitura espiritual. O sol
e a chuva fecundam e embelezam os campos ; os
exemplos, doutrina e incitamentos ao bem que vêm
dos livros es pirituais, transfundem. para a ' alma
força e vida nova e embelezam-na de virtudes. Os
S antos tinham em grande apreço a leitura espiri­
tual, nela reanimavam as força.s e colhiam frutos
excelentes.
De todos os l i vros, o melhor, o livro dos livros
da nossa leitura espiritual deve ser a Sagrada Es­
cri tura, sobretudo o Novo Testamento, em edição
aprovada pela Igrej a . «Toda a Escritura, divina­
mente inspira da, é útil para ensinar, para repreen­
der, para corrigir, para instruir na justiça, a fim de
que o homem de Deus sej a perfeito estando prepa­
rado para todá a boa obra)). (1) .
2 . Exercfcio da mortificação e abnegação de
si mesmo.
É doutrina de Jesus : «Quem quer vir após
mim, negue-se a si mesmo». (2) Para andar com
.Jesus, para com Ele viver, para o imitar, preciso
se torna negarmo-nos a nós mesmos. Não podia o
Salvador ensinar com mais clareza a necessidade
da abnega cão.
Se qu é remos moldar-nos segundo o . divino mo­
deld que é 'Jesus, se queremos portanto ser perfeitos,
a primeira coisa a fazer é negar ou apagar na alma
os traços que a desfeiam, a. vontade que nos arrasta
ao mal, as más inclinações e paixões.
Caminhar na perfeição é fugir o pecado e pra­
ticar a virtude, é fortalecer a vontade mais e mais,

(1) 2 Ped. 3, 16-17. (2) Mat. 16,24.

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T R I B U N A L D A P E N ITÊNCIA .3o3

para que nunca ela arrede do caminho do bem.


Nunca chegariamos a t anto se não fizéssemos vio­
lência sobre nós mesmos para domar ou refrear as
más inclinações . .
Por outras razões ainda é preciso abnegação
para praticar a virtude e boas obras. Sempre na­
turalmente diligentes para procurar tudo o que nos
afaga e deleita os sentidos, só para praticar o bem
a preguiça nos entrava e peia e engenha quantas
escusas pode. Se não nos violentamos a nós mes­
mos, se não nos abnegamos, a preguiça vai sair
vencedora e não praticamos o bem. .
Não há, pois, que duvidar : precisamos de ne­
gar, apagar em nós tudo o que em nós há de per­
verso e mau, e de nos violentarmos chicoteando a
vontade preguiçosa para a levar aos caminhos da
virtude. A l ei dos sentidos, nota S. Paulo, inces­
santemente se. levanta contra o espirito para o re­
duzir à escravidão do pecado ; necessário é, pois,
incessantemente acordar ou sacudir a vontade se
queremos chegar à vitória. A força com o exer­
cicio se ganha. Tanto mais fortes seremos · nos'
combates do bem, quanto mais generosamente nos
·exercitarmos na aonegação de nós mesmos, na
pronta renúncia a tudo o que é mal e até a muita
coisa que nos poderia
' ser lfcito fazer. ,
Eis porque no livro da « I mi tação de Cristo•
se afirma : «Nos caminhos de Deus avançamos,
na medida em que nos fazemos violência a nós
mesmos».

3.
Resignação com a vontade de Deus nas
dores e trib ul a ç õ es. .

Porque nos quer bem, m,anda-nos Deus, por


vezes, cruzes bem pesadas. E modo que tem de
nos apurar para o reino dos céus. «.A tribulação,
4iz o P. David de Augsburgo, é para o homem de
bem o que a lima é para o ferro : tira a ferrugem
da alma».
As · alegrias da terra fàcilmente afogam no
coração d o ho niem o deseJo das alegrias celestes

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O CRISTÃO NO

e açulam nele sempre mais o apetite para as coisas


do mundo. E é por isso que vem Deui; misericor­
diosamente com as dores e tribulações a mostrar­
·nos como são fumo e nada as alegrias da terra e
a apontar-nos o Alto onde a alegria nunca ·morre.
As tribulações, portanto, também elas servem
para a nossa perfeição.
Assustam nos é ve rdade, e não é fãcil que
sintaI11 0S 0ânimo para ir em cata ·delas e abraçá las..
Mas também o Senhor não nos pede tanto ; rião
exige que procuremos a cruz. Quer apena ;; que,
sem murmurações, sem queixas, sem recusas,
aceitemos a que a sua mão misericordiosa nos
põe às costas, no divino intuito de eternamente.
nos fazer felizes no céu.
Ainda por outro motivo são as dores e tribu­
lações meio poderoso de santificação. Nada nos
faz crescer tanto no amor de Deus e tanto nos
enriquece para o céu, como sofrer com paciência
as provas que com muita propriedade podemos
chamar «visitas do St nhor». Val e muito m·ais,
quando esmagados pela amargura, levantar o cora­
ção ao Alto e dizer «Ó Senhor, seja feita a vossa
vontade», do que desfazermo nos em acções de
graça s quando tudo nos corre bem.
As pedras preciosas depois de polidas .ficam
mais brilhantes e belas. O mesmo sucede con­
nosco : lapidados pelo . amarg :1r da adversidade,
fica nos a alma mais formosa e santa. «Ir à igreja
ouvir o ministro de D c: us exortar os fiéis à paciên­
cia, é sem dúvida coisa de muito mérito ; mas fi­
carmos em casa, amarrados ao leito a sofrer com
paciência as dores da. nossa enfermidade, isso tem
maior valia ainda. Frequentar a igreja quando há
saúde, é um dever e agrada a Deus ; mas, quando
retidos pela doença em nossa casa, lá dentro do
tempfo da nossa alma elevamos ao Céu nossas
preces, mais agradado de nós fica o Senhor>.· (1).

(1) ROTTMANNER, O. S. B.

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T R-I B U N A L D A P E N I T Ê N C I A 3o5

Por conseguinte, ó cristão, quando Deus te vi­


sitar com tribulações e amarguras, não te fiques a
dizer : Porque sofro1 porque me envia o Senhor
esta prova t Mas aceita com hu,nildade e paciênci a
as m isericordiosas disposições de Deus, e pede.-lhe
força e coragem para sofrer as adversidades com a
paciênci a que te h á de levar ao céu.
·

+ Consciencioso cumprimento• dos deveres do


próprio estado.
Para chegar à perfeição é de suma importância
cumprir fielmente os deveres do próprio estado. ;
Quando se trata de beatificar um servo de Deus, a ,f
Igreja a primeira coisa que faz é averiguar se ele i

sempre cumpriu bem os deveres do seu estadó; ·.


Com tanta importância olha a Igreja este assunto�
Jul gar que nossos trabalhos de cada dia náo·: têm
outro valor além do que lhes dão os homens, é·erro
funesto. Feitos com santa intenção, dão glória a
Deus e s alvam-nos a alma.
O dever de cada dia é o que Deus em cada dia
quer de nós. Os encargos e obrigações do modo
de vida a que nos chamou, foi sua vontade santf s­
sima que no-los impôs. Por isso, cumprindo:.os,
fazemos sua vontade ; e o trabalho que neles em- �
pregamos, par � Deus é agradável, e � útil pa�a nós. j
Tanto assim que até aos exercfc1os de p1 edade i
os temos de variar segundo o estado de vida que�.
levam <;> s, pois com eles não devem�s prejudic ar ,o:!{
cumprimento .dos deveres. A devoçao vem a segui�,';
à obrigação. Está de ver, por exemplo, que a mãe:
de familia não pode entregar-se aos demorados
exercícios de piedade a que se entrega . a senhora
j á idosa sem obrigações. Uns sã.o os exercícios de
pie�ade da do!lzela que no retiro do convento P.ode
consagrar à piedade todos os momento� do di11; ·e
outros os da criada de servir ocupada de manha . à
noite na azáfama dos seus trab alhos. O médico :que
a toda a hora tem de estar pronto p ara acudir aos
doentes, não pode com as largas orações que faz o
senhor que sempre dispõe do seu tempo. O sol-

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306 O CRl$TÃO NO

dado e o padre não podem com os mesmos exer­


ci�ios de piedade. As devoções de piedade sempre
cada um as há de regular segundo as obrigações
de seu estado. «Toda a piedade que nos estorva de
cumprir os deveres, é falsa piedade», afirma S. Fran­
cisco de S ales. Pessoas de estados diferentes não
podem ter iguais actos de pied ade7 m as tudo podem
e devem fazer com 'o mesmo espírito ; e nisto é . que
vai a perfeição-: em todos os trabalhos do seu es­
t ado ter a intenção de servir, a Deus e cumprir sua
vontade.
Que rico manancial de celestes merecimentos
não é p ara todos, a vocação ou o estado a que
Deus chamou ! O fiel cumprimento dos deveres do
próprio est a do é cadeia · ininterrupta de boas obras
e p�rc anto de méritos para o céu. Com soberano
desprezo olharão talvez alguns ao humilde cri ado
ou j ornaleiro que encontram vergado ao peso do
seu trabalho. Pois, creiam, se ao trabalho o vai
fazen.do para dar glória a Deus, para cumprir sua
vontade, anda entesoirando maiores riquezas do
que as que · podem abarrotar os co fres do rico que
o desdenha. Trabalham muito embora . suas mãos
para o senhor da terra que sempre o deixa pobre,
mas o coração anda-lhe voltado para o Senhor do
céu que o enriquece com tesoiros infinitos.
r<Anda a casta mãe-de-familia toda atarefada
na lida da sua ca sa, e não esquece pôr em prática
aquele principio antigo r<eu e a minha familia que­
remos servir o Senhor» (1) Por ma�s ! nsig�ificantes
que pareçam seus trabalhos quotidianos, a todos
eles santificou o sacramento do matrimónio. E to­
dos os cuidados, fadigas e trabalhos no governo da
casa, na educação dos filhos, feitos e levados com
paciência, m ansidão, amor e humildade, fazem da
âa sua vida u.m perene louvor de Deus». (2)
Convém todavia não perder de vista, que para os
trabalhos da nossa obrigação serem louvor de Deus

(r) ]os. 24, 1 5. (2) P, ROTTAMANER, O. S. B.

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T'R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N G 1 A 307

duas condições se exigem : serem feitos em estado


de graça e com a intenção de agradar a Deus.
As boas obras feitas em pecado mortal não
têm valor de vida· eterna, porque separados de
Cristo não vivemos nele nem ele em nós, e só Ele
dâ valor eterno às nossas obras : «Como a vara da
videira não pode de si mesmo dar fruto se não per­'
manecer na videira, assim nem vós o podereis . dar
se não permanecerdes em mim» ; (1) e cc a árvor�
m á não pode 'dar bons frutos». (2)
Sem a boa intenção de agra d ar a .D eus também
as boas obras ficariam estéreis. Para que um dia
a alma se una a Deus no céu, preciso se torna que
desde j á se lhe una na terra, não tendo outra von­
tàde senão a de Deus, não procurando outra glória
senão a Deus, não desej ando outra honra senão a
de Deus_. ccOu comais ou bebais, ou façais qualquer
outra coisa, fazei tudo para glória de Deus». (ª) .Só
assim serão santos e meritórios os trabalhos supor­
tados no cumprimento dos nossos deveres.
De tudo o que fizermos em estado de gra ç a e
com recta intenção, ha�eremos m áis tarde a recom7
pensa a cento por um. Nada ficará sem galardão :
nem o trabalho nem o sacrifício, nem a oração nem
as boas obras. Deus tudo irâ juntando como capital
de vida ete,rna. Os· trabalhos aos quais nos obriga .
o nosso cargo, pareçam eles sem valor, se os ta- ·
zemos com a intenção de dar glória a Deus, são
méritos que entesoiramos no céu, e ainda por cima
porque nos entretêm o coração, livram-nos de pe­
rigos e calamidades.
Deus que prescruta os corações, ao que mais
olha é à intenção daquilo que .fazemos. ccO homem
vê o que aparece, mas o Senhor afunda seus olhos
até ao coração». Podem nossas acções parecer in­
significâncias aos olhos humanos e valerem muito
aos olhos de Deus que as mede pelo amor com, que
as fazemos.

(1) )oa. 15,1 (2) Mat. 7, 18. (3) 1 Cor. 10,31

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3o8 O CRISTÃO N O

Veio a viúva do Evangelho e deitou seu óbulo


pequenino na caixa das esmolas para o templo.
E o Senhor exaltou a sua oferta. Embora peque­
nina, valia mais que a esmola avultada de muitos.
A viúva dera tudo quanto tinh a (generosidade ou
amor imenso) · os outros muitos só deram do que
lhes sobrava (generosidade e amor que não é ta­
manho).
Com razão dizia S. Ambrósio : «Tuas acções
avalia-as Deus pelo modo como te saem do coração.
O divino Juiz, para saber que valor dar a tuas obras,
consulta-te primeiro : vai ver a intenção com 9ue
as fizestes». Estima tanto m ais nossas acçoes,
quanto maior amor de Deus tivermos ao fazê-las .
A boa intenção no bili ta todos os actos da vida ;
dá-lhes valor de vida eterna. E deste modo até o
recreio, os divertimentos, podem ser obras boas,
agrada.veis a Deus e de mérito para nós. «Tudo o
que fizerdes, diz S. Paulo, fazei-o de boamente,
como quem o faz pelo Senhor e não pelos homens,
sabendo que recebereis do Senhor o galardão da
herança. Servi a Cristo, o Senhor». (1)
Cristão, quer lides ou trabalhes quer sofras ou
padeças, levanta os olhos ao céu e pensa ou diz :
«Tudo para glória de Deus» ou c'Tudo em nome de
Deus», «Por vosso amor, meu· Deus»,. «Tudo para
Deus, tudo com Deus !»

(1) Col. 3 , 23·2.i1.

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CAPIT U LO Ili

Preceitos da Santa Mad re 1 g reja

Também a Igreja impõe aos fiéis os seus


preceitos, a determinar quando e como hão
de cumprir certos mandamentos promul­
gados por Deus de maneira indeterminada
quanto ao tempo e modo de se cumprirem,
e ainda a indicar-lhes como melhor possam
-o bservar os mandamentos do Senhor.
Conforme o terceiro mandamento do
Decálogo, todos os homens têm obrigação
.d e prestar a Deus o culto externo ; mas
não diz o mandamento quais os actos de
.c ulto externo obrigatórios . nem o tempo em
que se devem praticar. E então a Igreja,
no primeiro dos seus preceitos, impõe como
actos externos do culto a assistência à missa
nos domingos e dias santos de guarda.
Há fiéis que, pelo seu cargo ou estado
de vida, são obrigados a maior perfeição do
que os dema)s. Assim sucede, por exemplo,
com o sacerdote. Não dizem os manda­
mentos de Deus como esses tais hão de
praticar a perfeição maior a que estão obri­
. àdos, e a Igreja tudo esclarece nos .pre­
g
ceitos que impõe às diversas categorias de
fiéis ehttp://alexandriacatolica.blogspot.com.br
em determinadas circunstâncias.
310 O C RI STÃ O N O

Os preceitos da Igreja hoje em vigor encon­


tram-se codificados no ccCódigo de Direito Canó­
nico» (Codex Juris C anoni ci) que foi publicado em
19 t 7 e entrou a obrigar em 1 9 1 8,
O Código do Direito Canônico compreeende
cinco livros com 24 1 4 cánones ou leis.
O primeiro livro contém as leis gerais da Igrej a
com as normas expl icativas ; o segundo as leis que
respeitam ao clero secular e regular, aos o ficias
eclesiásticos e estado rel igioso ; o terceiro, as que
se referem aos Sacramentos, culto divino, dias d�
j ejum, beneficios e bens eclesiástico�, templos e ce­
mitérios ; o quarto, as dos processo civil� penal e dos
casamentos ; e o qu into, as das penas eclesiásticas.
Naturalmente não podemos recordar aqui .todas
as prescrições e determinações do Direito Canónico.
Apenas fazemos menção daquel as leis que obrigam
todos os cristãos e g ue co mumente se cha mam
«mandamentos da Igre1 au. E são os seguintes :
-1 Ouvir missa inteira e abster-se de trabalhos
servi s nos domingos e festas de guarda.
-2 Confessar se ao menos uma vez cada ano.
-3 Comungar ao m enos pela Páscoa da Res­
surrei ç ão.
-4 Guardar abstinência e jejuar nos dias de­
terminados pefa Igrej a.
5.0
- Contribuir para as despesas do culto e
para a sustentação do clero: segundo os legftimos
usos e costumes e as determinações da Igreja.
Tratamos aqui sómente do preceito do j ejum e
abstinência, e do jejum natural requerido para rece­
ber a sagrada comunhão. Em seguida, alguma coisa
dire.m os a propósito dos sacramentos da Extrema­
-Unção e ·matrimónio cristão, e da sepultura ecle­
siás t i ca.

Preceito da Igreja de abstinência e ,J ejum


O quarto mandamento da Igreja·, (câno­
nes 1 2 :10- I 2 5-+ do Código de Direito Canó-

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T R 1 B u N A L D A p E N 1T Ê Ne1 A .3n

nico) manda « guardar abstinência e jejuar,


nos dias determinados pela Igreja » . Com­
preende, portanto, a abstinência e o jejum.
I. Abstin ência
1 . Abstinência, no sentido da Igreja, é não·

comer carne ou comida de carne. E carne


entende-se somente a dos animais chamados
de sangue quente, a saber, os mamíferos e
as aves ; e não outras carnes, corno peixe,
moluscos, mariscos, e também os prod utos
e derivados dos aninrnis de sangue quente
ta is como ovos, leite, lactidhios, gordur�s
para tempero ou condimento.
Guardar abstinência é não comer carne
ou comida de carne. Portanto a lei da absti­
n ência não proíbe comer peixe, moluscos,
mariscos que não são carne no sentido que
tal palavra tern na lei, nem os produtos ou
derivados dos animais de sangue quente,
como ovos, lacticínios e gorduras para tem­
pero ou condimento.
2. Manda a Igrej a que todos os fiéis,
depois de cum prirem sete anos, guardem
abstinência :
a) todas as sextas-feiras dó ano que não
sejam dia santo dºe guarda ;
. �) todos os sábados da Quaresma (no
·-

Sábado de. Aleluia, a abstinência termina· ao


meio dia) ; quarta-feira de cinzas ; quartas,
sextas e sábados das Quatro Têmporas, ou

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3I.2 O CRI S T Ã O N O

seja das semanas que se seguem ao ter.;


ceiro domingo do Advento, ao primeiro do­
mingo da Quaresma, ao domingo de Espí­
rito Santo, e ao dia 14 de Setembro, desde
que também em tais dias não caia dia santo
de guarda ; finalmente nas vigílias do E_s­
pírito Santo, da Assunção, de Todos-os­
-Santos e do Nata] , desde, que não calhem
em domingo ou dia santo de guarda.
Aos bispos de algumas regiões concede
a Santa Sé o poder de mitigar ou dispen­
sar nas suas dioceses a lei da abstinência.
E quandô de facto miti g am oú dispensam
na lei, costumam nas Pastorais da Qua­
resma anunciar aos seus diocesanos os dias
em que devem guardar a abstinência.
Em Portugal os fiéis que derem a es­
mola vulgarmente chamada da ccBula da
Cruzada» , ou seja, os que tomarem os In­
dultos da Abstinência e Jejum, só ficam
obrigados a guardar abs tinência nas sextas­
-feiras da Quaresma, do Advento e das Qua­
tro-Têmporas, e nas quatro vigílias acima
mencionadas ; e à abstinência da vigília do
Natal podem-na antecipar para o sábado
precedente.

Dispensa da l e i da abst inê�cia

Estão dispensados da lei da absti­


1 .

nência todos os que a não pódem guardar


sem dano para a saúde ou sem outro qual­
quer grave prejuízo, incómodo ou dificuldade.

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T R1 B UN A L D A PE N 1T ÊNC1A -31 3

Alguns exemplos : Não estão obrigados


à lei da abstinência
a) os doentes e convalescentes que, a
juizo do médico, precisam comer de carne ;
b) as pessoas que, por fraqueza de es­
tôtnago ou qualquer outro motivo, não di­
ger�m comidas de magro ;
e) as mães, sempre que do guardar a
abstinência se lhes pudesse seguir prejuízo
para a saúde sua ou dos filhos ;
d) os filhos de família a quem os p ais
apresentam comida de carne ; os mendigos
que sempre podem comer do que recebem
por esmola ; os trabalhadores pobres quando
não possam obter sufici�nte comida de ma­
gro ; e todos os que não podem obter comida
de magro ou só a obteriam com grande difi­
culdade .
2 . Podem ser dispensados da abstinên�
eia quer pelo seu bispo quer pelo seu pá­
roco ou pelo bispo ou pároco do lugar onde
se encontram, todos o� fiéis que tenham mo­
tivo justo ou razoável para serem dela dis­
pensados.
Cumpre notar que a dispensa só vale
enquanto duram os motivos pelos quais foi
concedida, e não tem valor se foi alcançada
por motivos apenas fingidos.
As dispensas, quer as gerais concedidas
por Indultos Pontifícios quer as particul ares
pedidas e concedidas pelos bispos e párocos,
podem-se usar com a consciência sossegada.
A autoridade que havia i n1posto a lei, essa

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mesmo a dispensou, e portanto tudo está certo. No uso de tais
dispensas só uma coi sa há a evitar, e é não se escan-dalizar a
ninguém com o uso que delas se faça.

"Vede, exorta S. Paulo aos cri stãos de Corinto, que esta lib er­
dade que tendes, não sej a talvez de tropeço aos fra-cos. Se a
comida serve de escândalo a meu irmão, nunca, j amais
comerei carne por não escandalizar a meu irm ão" (1 Cor. 8,9

e 1 3)

Transgressão da lei de abstinência

Quem sem motivo come carne ou de carne em dia de ab ­


stinência, desobedece à l ei da Igrej a e, portanto é réu de pe­
cado.

Todavia, para haver pecado é preciso que haj a advertên-cia e


consentimento. Quem comesse carne porque se esqueceu que
era dia de abstinência, não pecava. Tam-bém dizem os mor­
alistas que só há matéria grave, e, por-tanto desobediência
grave, quando se comeu carne ou de carne na quanti dade de
duas onças (62,5 gramas) ou m ai s.

II. Jej um

1 . Jejuar é ter no dia uma só refeição completa, e, de manhã e


à noite, tomar apenas aquela quantidade e quali -dade de ali­
mentos que os usos aprovados da região per-mitam tomar.

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A pequena refeição da manhã permitida nos dias de j e-j um
chama-se "parva" ; e à da noite chama-se "consoada" .

À "parva" podem tomar-se mais ou menos duas onças (62, 5


gramas) de alimento sólido, com café, chá ou outra bebida se­

melhante.

À " consoada" podem tomar-se até oito onças (250 gramas) de

alimento sólido, mas de magro; e até quanti-dade um pouco

maior, nos j ejuns continuados ou nos dias de trabalhos fati gan­

tes. Se a refeição completa se faz à noite, pode-se consoar ao


meio dia.

Não quebram o jejum as bebidas como o vinho, a cervej a, o


café mesmo um tanto açucarado. Também não quebraria o j e­

jum qualquer pequeno pedaço de pão que uma ou outra vez se


tomasse a acompanhar a bebida para que ela não fizesse mal .
Pastilhas, comprimidos, que se tomam como remédio, também

não quebram o j ejum.

2. Manda a Igrej a que todos os fiéis que completaram os vinte e

um anos de idade e ainda não começaram os ses-senta, j ejuem :

a) todos os dias da Quaresma, exceto os domingos (no Sábado


de Aleluia o j ej um termina ao meio dia);

b) nas Quartas, sextas e sábados das Quatro - Têmporas, ou sej a


das semanas que se seguem ao terceiro domingo do Advento,
ao primeiro domingo da Quaresma, ao do

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3 rb O C RI S T Ã O N O

mingo do Espírito Santo, e ao dia 1 4 de Se­


tembro, a não ser que em qualquer desses
dias calhe dia santo de guarda ; nas quatro
vigílias ou véspera do Espírito Santo, Assun­
ção de Nossa Senhora, Todos-os-Santos e
Natal quando não calhem ao domingo ou
dia santo de guarda .
E m Portugal , o s fiéis que tomarem os
Indultos da Abstinência e Jejum, só estão
obrigados a j ej uar nas quartas, sextas e sá­
bados da Quaresma (no S ábado de Aleluia,
o jejum termina ao meio dia) e nas quatro
vigílias do Espírito Santo, Assunção de
N. Senhora, Todos-os-Santos e Natal (o je­
jum da vigília do Natal pode antecipar-se
para o sábado precedente).

Dispensas da l e f do jejum E;�:-;

O jejum requere sem dúvida um sacri­


fício ; é, para o fazer, necessário se torna o
espírito de abnegação e o domínio de si pró­
prio. A Igreja impõe o j ejum, a dizer-nos
como e quando havemos de praticar o dever
da penitência que Jesus a todos m anda pra­
ticar. Todavia não quer a Igreja com a lei
de jejum nem prejudicar-nos a saúde nem
dificultar com ele o cumprimento de nossas
obrigações e trabalhos. E por isso
1 . Estão dispensados do jej um todos os
que não podem jejuar sem grave dano ou
sério incómodo. E desta forma dele estão
·

dispensados :

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TR1BUN AL D A PE N1TÊNCÍA 3 17

a) os doentes, os convalescentes, as pes­


soas .e�tenuadas ou esfalfadas q� e precisam
adqu1 r1 r novas forças, os que sao fracos de
natureza, os que por motivo de sofrerem do
estômago não podem alimentar-se uma só
vez ao dia :
b) as mães que por motivo de jejuarem
caissem em fraqueza de perigo para si ou-­
para 0s filhos ;
c) os pobres mal alimentados ;
d) todos os que se entregam a trabalhos
fatigantes, como trabalhadores dó campo,
pedreiros, carpinteiros, ferreiros, e seme­
lhantes operários e artífices, mesmo que
·num ou noutro dia não trabalhem ; os pro­
fessores, empregados públicos, enfermeiros,
etc. quando o seu trabalho é fatigante.
Estes exemplos ajudarão a bem formar
a consciência noutros casos práticos da vida.
Em caso de dúvida pode recorrer-se ao con­
fessor para dele haver os precisos esclareci­
mentos.
2. Havendo motivo razoável, os bispos e
párocos podem dispensar do jejum os fiéis
das suas respectivas dioceses ou paróquias,
e os Superiores Regulares aos que são seus
súbditos.

Transgressão do jejum

1. Transgride a lei e por isso desobe­


dece à Igreja, quem nos· dias de j ejum fizer
mais de üma refeição completa.

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O CRISTÃ O NO

2 . Também transgride a lei quem, fora


da refeição completa e das duas pequenas
refeições da ccparva» e «consoada » , toma
qualquer alimento sólido ou bebida alimen:::
tícia como por exemplo leite. Não se co n­
sidera todavia matéria grave tomar até duas
onças de alimento fora das ditas refeições
quer de uma só. vêz quer de várias .
Até aqui a lei da Igreja e o que dizem
os moralista acerca do modo de a cumprir.
Todavia não serão por demais as seguintes
breves considerações :
A Santa Igreja é hoje muito benigna no
que respeita à abstinência e ao jejum, mas·
nen1 por isso d�ixa de apreciar toda a de­
voção que tivermos em jejuarmos e guar­
darmos abstinência mais frequentemente.
E para melhor neste ponto nos orien­
tarmos na nossa devoção, lembremos o que
dizem as Escrituras Santas : « Convertei-vos
a mim, diz Deus pelo profeta Joel, de todo
o vosso coração, em jejun1, e em lágrimas,
e . em gemidos » . (1) «Prostrei-me diante do
Senhor, como antes o tinha feito, e estive
quarenta dias e quarenta noites sem comer
pão nem beber água, por causa de todos os
vossos pecados. E o Senhor me ouviu ainda
por esta vez » . (2) Qu�renta dias j�juou o
Senhor, como a preparar-se para o seu apos-

(1) Joel 2, 12. (2) Deut. 9, 18- 1 3.

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T I� 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N C 1 A 3 19

talado. Imitemos o seu exemplo na medida


das nossas forças.
Depois da oração, um dos meios mais
eficazes para refrear as más inclinações, do­
brar a vontade, atrair as · bênçãos de Deus,
expiar as penas devidas aos pecados come­
tidos, é sem dúvida o jejum . «Pelo jejum,
canta a Igreja, nos ajuda o Senhor a repri­
mir os vícios e a elevar o espírito, pelo jejum
nos dispensa virtudes e prémios » . E S . Ber­
nardo ensina : « Ü jejum não só expia a pena
devida aos pecados cometidos, mas ajuda-nos
a não t0rnar de futuro a cometê-los» .
Que se não ouçam, pois, frases como .
estas com que alguns pretendem justificar
sua falta de espírito de sacrifício :
« Ü que entr;i pela boca não mancha a
alm a » . De certo, a carne não mancha a
alma m ais que o peixe ; mas mancha a
alma e desagrada a Deus, desobedecer ao
preceito da Santa Igreja.
« A minha saúde não me permite jejuar » .
S e estás doente ou tens trabalhos pesados e
contínuos, ninguém te obriga a jejuar .; mas
se não é assim, podes estar certo de que
tanto o j ejum como a abstinência �ó te be­
neficiam a saúde. O filósofo Celso, era pa­
gão e ' dizia : « modicus cibi medicus . sibi » ,
que quer dizer :. «O m elhor médico é a so­
briedade» , p ois com ela nos livramos _de tan­
tas " doenças que provêm das más digestões
e até curamos doenças j á contraídas. Sus­
tentam os médicos que a causa de muitas

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O CRISTÃO NO

e graves doenças é o uso imoderado das


carnes.
Quando não podemos observar os jejuns
da Igreja, bem Iios fica mortificarmo-nos no
que pudermos, como na escolha da comida
e bebida, . e suprirmos o m ais com boas
obras, com a oração e esmola, por exemplo.
No jejurn, como no m ais, Deus atende
sobretudo à intenção com que o fazemos.

Preceito da comunhão pascal


Os fiéis têm obrigação de comungar ào
menos uma vez ao ano, pela Páscoa da Res­
surreição. Quem por qualquer motivo, fosse
culpa sua ou não, não fez a comunhão pas­
cal, está obrigado a comungar logo que o
possa fazer. (1)
A lei divina e eclesiástica obriga, além
disso, os fiéis a receber a santa comunhão
por viático, quando em perigo de morte,
qualquer que seja a causa desse perigo. (2)

Da cornun hão frequente


Nos tempos apostólicos os fiéis comun­
gavam todos os dias. Lê-se nos Actos dos
Apóstolos : cc E eles perseveravam na dou­
trina dos Apóstolos e na comunicação da
fracção do pão .» ; «e todos os dias perseve-

(1) Cân. 859. (2) Cân. 864 .

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TR1 BUN A. L D A P E N 1 T Ê N C I A 321

rando unânimemente no templo e partindo


o pão pelas casas, tomavam a · comida com
regozijo» . (1 )
Este santo costume, do qual resultaram
inúmeros benefícios para os fiéis e para toda
a Igreja, continuou ainda pelos séculos se­
guintes, como testemunham os Santos Pa­
dres e escritores eclesiásticos.
Depois, com o rodar dos tempos, foi-se
pouco a pouco· esfriando o fervor, e começou
de ser menos frequente o uso dos Sacra­
mentos. E a tal ponto as coisas chegaram,
que se julgou preciso decretar no Concílio IV
de Latrão e deJ.>0is no concílio de Trento,
que todos os fieis «comungassem ao menos
uma vez cada ano» . E ainda hoje é esta a
legislação da. Igreja : Tod9s os fiéis cristãos
devem comungar pelo menos uma vez ao ano,
pela Páscoa da Res·surreição.
Mas bem seria 9ue ninguém .s e contentasse
com tão pouco. Ja no concílio de Trento os
Padres· exortaram os fiéis a imitar os cristãos
dos primeiros séculos, como eles comungando
sacramentalmente quando assistiam à missa.
A exortação não surtiu o esperado efeito.
Muito para isso contribuiu ª' doutrina j anse­
nista que se espalhou pela cristandade, e que
tanto carregou nas condições exigidas para a
comunhão frutuosa que os fiéis se encheram de
recei9s e de temor da Santíssima Eucaristia.

(1 ) Ac. dos Ap. 2, 42 e 46.

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322 O CRISTÃO NO

Embora reprovasse o rigorismo j anse­


nista, nunca a Igreja apresentou qualquer
decisão formal sobre o assunto até 1 9 05.
Nesse ano, a 20 de Dezembro, a Sagrada
Congregação do Concílio, por ordem do
Papa Pio X, formulou a doutrina sancio­
nada depois pelo Código do Direito Canó­
nico (can . 863), e que portanto é a doutrina
hoje vigente. São as seguintes, as normas
da Sagrada Congregação do Concílio :
1 . ª A comunhão frequente e quotidiana,
conforme os desejos d e Cristo Senhor Nosso
e da Igreja Católica, deve ser permitida a
todos os crístãos sem distinção de classes
ou estados : dela se não pode excluir nin­
guém que esteja em graça e se aproxima d�
sagrada Mesa com piedosa e recta intenção» .
2 . ª « Consiste a recta intenção no apro­
xi mar-se da Mesa Eucarística, não por uso
ou rotina, por vaidade ou por outro qual­
quer motivo · humano, mas para cumprir a
vontade de Deus, para a Deus se unir a
alma com mais apertado vínculo de cari­
dade e , curar com a medicina da Divina Eu­
caristia os defeitos e enfermidades espiri­
tuais » .
3 . ª «Embora seja muito para desejar
que todos quantos recebem a Comunhão
com frequência ou diàriamente, estejam li�
vres de pecados veniais ao m enos inteira­
mente deliberados e do afecto aos mesmos
pecados, todavia para que possam frequen­
tar a Comunhão e até recebê-la todos os

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TR1 BUNAL D A P E N1T E N C1A 323

dias basta que estejarn isentos de pecado


m o r t a l e com propósito de não mais
pecar para o futuro. Quem comunga dià­
riamente com este sincero propósito, não
poderá deixar de gradualmente se desemba­
raçar dos pecados ainda veniais e de todo
o afecto a eles» .
4. ª Se é verdade que os sacramentos
da nova lei produzem o seu efeito ex opere
operato, todavia tanto melhor o produzem,
quanto melhores forem as disposições de
quem os recebe. Por este motivo deve pro­
curar-se que a sagrada comunhão seja pre­
cedida de preparação diligente, e seguida
da conveniente acção de graças, conforme as
forças, condição e obrigações de cada u m » .
5 . ª «Para se receber a comunhão fre­
quente e quotidiana com maior prudência e
para com ela se obter mais merecimento,
deve proceder-se com prévio conselho . do
confessor. Os confessores, porém, evitem
sempre privar da comunhão frequente e quo­
tidiana os que estiverem em estado de graça,
e côm recta intenção desej arem aproximar-se
da sagrada Mesa» .
Está, assim cl aramente manifesta a von­
tade da Igreja acerca da comunhão fre quente,
e sobre este ponto já não pode haver duvidas�
O que importa agora é envidar os me­
lhor_e s esforços para que todos se conformem
na prálica com -os desejos da Igreja. E pe­
rante tão .clara doutrina, j á se não podem
sustentar afirmações em contrário, mesmo

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O CRIS T Ã O N O

quando firmadas na opinião de a]gum Santo


ou Doutor.
As decisões da Igreja, cc coluna e funda­
mento da verdade» , (1 ) prevalecem sobre as
opiniões dos teólogos, Santos e Doutores,
por melhor fundadas que elas pareçam.
Das condições para fazer uma comunhão bem
feita, a primeira e principal é Ó estado de g raça.
E por i sso é indispensável a confissão, antes de
comungar, a quem . pese na consciência algum pe­
cado mortal. Aliás não iria dignamente à mesa do
Senhor.
Quem depois da última confissão não cometeu
pecado mortal, pode ir à sagrada comunhão sem
receio de pecar. Contudo para a receber mais digna
e frutuosamente, bem é que se esteja também l impo
de pecados veniais. Mas para se perdoarem os pe­
cados veniais, não é necessária a confissão pois há
outros meios de obter deles perdão, como se pode
ver adeapte quando se tratar da Confi ssão no n.0 2
«Ü que se deve confessar ?1> E o principal desses
meios é o acto de contr�ção sincero d� se ter ofen­
dido a Deus com os pecados veniais.
As pessoas que diária ou quase diàri amente
comungam, confessem-se de oito em oito dias se
lhes for possível ; aliás todos os quinze dias, ou
ainda mais raras vezes, se não perderem o estado
de graça.
Deves preparar-te com fervorosos exercícios
de piedade e outros meios particulares para re­
ceber a sagrada comunhão, e ao fim deves agra­
decer do intimo da alma a grande felicidade de
teres recebido o teu divino Redentor.
A preparação deve durar de 1 o a 1 5 minutos,

(1) 1 Tim. 3, 1 5.

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TR1 B U N A L D A PE N 1 T Ê N C1 A 325

e · a acção de g1·aças af um quarto de hora, o que


certamente não será grande sacriftcio, atendendo às
graças da comunhão. É muito recomendável nos
dias de comunhão assistir à missa, sendo posstvel.
<iuanto melhor for a preparação e acção de
graças, tanto mais abundantes serão os frutos da
co munhão. «Eu creio, diz S. Boaventura, que se
tira mais fruto duma comunhão com a devida pre­
paração, do que de muitas sem elu. Se· alguma vez
fores obrigado a · contentar-te com urna curtfssima
preparação e acção de graças, esforça te por, na
ida para. a igreja e no regresso a casa, como tam­
bém imedi atamente antes ou depois das tuas ocu­
pações ordinárias, conservar-te algum tempo re­
colhido.

Com 'tjue frequência se deve comungar ? Quan­


tas mais vezes e quanto mais dignamente, melhor !
Se até agora costumas comungar muitas vezes por
semana ou todos os dias, com o conselho do teu
confessor, conserva-te fiel a esta santa práti ca. Se
não estás nesse piedoso cos.turne, e apenas vais à
comunhão urna vez por ano ou por mês, cumpres o
teu dever, é verdade ; mas . ainda estás longe de sa­
tisfazer aos mais ir.stantes desejos da Santa Igreja
a respeito da comunhão frequente.
Mas perguntarás1 como poderei comungar, com
tantos pecados vemais e imperfeições cometidas
de confissão a comunhão ? Vivo . no meio do mundo,
entregue a tantos negócios, tratando com tanta
gente, e assim parece-me não estar bem disposto».
ó cristão 1 arrepende-te de todo o coração das fal­
tas quotidianas e pecados veniais antes de receber
a sagrada comunhão, e depois declara-os na pró­
xima confissão. Quanto ao mais, não te perturbes ;
comunga sempre e humildemente, a-pesar das tuas
fraquezas quotidianas.
«Se· ao menos tivesse a certeza de não ter
cometido nenhum pecado mortal desde a última
confissão . . . M as quem me dará tal certeza?» Se tens
uma consciência normal, isto é nem laxa nem es-

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O CRISTÁO N O

crupulosa, fàcilmente -p odes julgar se cometeste


algum pecado, e se foi mortal ou venial. Se és
escrupuloso recorre ao confessor e submete-te in­
teiramente ao seu juízo.
No caso de teres uma consciência bem formada.
se ela não te repreende de pecado mortal, podes i r
comungar; . se és escrupuloso, comungarás bem, sem­
pre que . t eu confessor ou director espiritual te diga
qúe podes comungar. (1) ·

Em ambos os casos será bom fazeres antes da


comunhão actos de amor de Deus e de contrição ;
e no mais entrega-te à bon dade, misericórdia e li-
beralidade de Deus.
·

Esforça- te, pois, por te abeirar da sagrada


comunhão sempre que as circunstâncias to per­
m itam. E se tens capacidade e prudência para
instruir os outros, aproveita de futuro as ocasiões
e procura pelas tuas instruções e exemplos levá-los
à prática da comunhão. frequente. .
ccA comunhão frequente é o caminho mais curto
para a salvação, tanto para o individuo como para
a sociedade. A sagrada Eucaristia forma o centro da
vida cristã e é, por assim dizer, a alma d a Igreja.
Quanto mais o povo católico se compenetrar deste
mistério de amor, tanto maior será a sua partici-:
pação da vida de Jesus Cristo e tento maior o
aproveitamento espiritual dos indivíduos e da so­
ciedade)). (2)

Do jejum antes da sagrada comunhão


1 Quem comunga deve estar em jej um
.

natural desde a meia noite até receber a sa­


grada comunhão. Jejum natural é não comer
nem beber coisa alguma. Na dúvida de se

(I) 'Vede o que dissemos da Consciência escrupulosa , pá g. ii·


(2) Breve de Pio X ao Congresso Eucarístico de Metz em
Setembro de I<)07.

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TRI B UN AL D A PE NITÊN CI A 327

ter tomado qualquer coisa depois da meia­


-noite, pode-se comungar. _

Só se quebra o jejum quando de facto


se come ou bebe. . Pode, pois, comungar
quem, ao lavar os dentes, enguliu involun­
tàriamente com a saliva qualquer gota de
água, ou indo pela rua enguliu sem querer
um floco de neve, uma pinga de chuva, ou
coisa semelhante. O mesmo se diga do�
restos da comida que ficassem entre os den­
tes no dia anterior, de sangue c·u de outra
secreção interna da boca .
Pelo respeito devido ao Sephor o-ã o con­
vém cuspir durante um quarto de hora de­
pois da comunhão ; mas, havendo motivo ra­
zoável, pode-se fazer ·sem escrúpulo algum.
2. Não estão obrigadas ao jejum euca­
rístico as pessoas gravemente doentes que
recebem a comunhão por viático. E quando
a doença grave ainda se prolonga por mui.to
tempo, quem j á recebeu o viático pode e é
bem que receba a comunhão com frequência,
mesmo sem estar em jejum. A comunhão
frequente é o melhor conforto na derradeira
peleja, a peleja da morte.
Os doentes que estão de cama há um
mês, não havendo esperança de que vão
curar depressa, segundo o prudente juizo
do confessor podem comungar uma ou duas
vez�s por semana mesmo depois de tomar
qualquer remédio · ou alimento líquido como
seria leite, caldo de carne, chocolate, etc.

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O CRISTÃO NO

,A.lguma instruções, secundárias embora,


mas que n ão são para desprezar :
A toalha ou mesa da comunhão não é
simples ornato, ma� deve servir para sobre
ela poi�arem quaisquer fragmentos que se
despeguem da sagrada partícula, não vão
eles cair ao chão e perderem-se. Pelo que
deve-se usar de modo a poder cumprir o
seu ofício.
A boca deve abrir-se convenit!ntemente,
e não se feche num repente apenas sobre
ela for colocada a partícula ; nem também
se deve recólher a língu a precipitadamente,
não suceda que a sagrada hóstia vá cair
ao chão.

Do Sagrado Viátioo

ccEm perigo de morte, sej a qual fôr . a


causa de que ela provenha, são os fiéis
obrigados por preceito a receber a sagrada
comunhão» . (1)
A obra da graça, começada pela recepção
do Sagrado Viático continua-se ·t! completa-se
pelo Sacramento da Extrema-Unção.

Da Extrema-U nção
O apóstolo S . Tiago diz na sua epístola :
«Está doente algum de vós ? Chame os pres-

(1) Can. 86-11 § 1 .

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T R1 B U N A L D A PE N1 T Ê N C 1 A - 329

bíteros da Igreja, e estes façam oração sobre


ele, unjindo-o com o óleo em nome do Se­
nhor. E a oração da fé sal vará o enfermo
e o Senhor o .aliviará, e se estiver em pe­
cados; ser-lhe hão eles perdoados » . (1) .
« Ü Senhor o aliviará» . A Santa Unção
fortificará o doente nos seus sofrimentos,
principalmente na agonia ; . e muitas vezes
poder-lhe-há aliviar as dores e até dar-lhe
saúde, se lhe for conveniente e se o sacra­
mento for recebido em tempo oportuno.
Se. porém, não for concedida ao doente
a saúde corporal, ou porque lhe : não é con­
veniente para a salvação ou porque nos seus
insondáveis e providenciais desígnios Deus
dispôs outra coisa, ser-lhe há em todo o caso
concedida a saúde da alma ou seja a graça.
« Os pecados ser- lhe hão -perdoados » .
A Extrema-Unção apaga primeiro os peca­
dos mesmo graves, que o doente não pode
confessar e dos quais está contrito (2), e
destrói depois os restos do pecado, isto é,
ajuda a não recair · ne]es e obtém a remissão
das penas temporais que lhes eram devidas .
Ensinam os teólogos que a Extrema­
-Unção é meio soberanamente eficaz na hora
derradeira, e porisso também meio excelente
para se entrar no Paraíso sem passar pelo
Purgatório.

( 1 ) Tlag. 5, I4J.!5·
(2) Veja-se na u.ª Parte o Cap. 1tDiversa eficácia da dor
perfeita e imperfeita• .

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33o O CRISTÃO NO

É inútil lembrar que estas vantagens só


aproveitarão aos doentes que recebem o Sa­
cramento com pleno conhecimento, contri­
ção, piedade e fervor.
Assim o cristão moribundo que recebeu
com devoção os Sacramentos da Penitência,
Eucaristia, Extrema-Unção e indulgência ple­
nária da Bênção Apostól ica,. pode alimentar
a firme esperança de encontrar em Deus o
juiz misericordioso, que o admitirá bem de­
pressa à visão beatífica.

Obrigação d e receber o Sacramento da


Extrema- Unção
·

Conf0rme ensina o cânon 944 do Direito


canónico, o Sacramento da Extrema-Unção
náo é indispensável para a salvação, isto é,
não é de necessidade absoluta para conse­
guir a eterna ben1-aventurança ; mas, a-pesar
disso, ninguém se deve descuidar de a re­
ceber.
Com todo o zêlo e diligência, diz o ci­
tado cânon, se deve procurar que os fiéis
gravemente doentes o recebam com plena
consc1enc1a.
.
. "

Portanto, salvo o caso de impossibili­


dade, é obrigação sagrada para os fiéis re­
ceberem este sacrameto, enquanto não se
lhes tolda o conhecimento ou o perdem por
completo.
Se o doente não pedir este sacramento,
devem os parentes, por si ou pelos enfer-

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N C. l A -331

meiros, avisá-19, de �odu prudente, da deli­


cadeza da sua situação e amàvelmente con­
vidá-lo a que o receba.
Se o enfermo não conhecesse a gravidade
da doença , ou ignorasse a obrigação de re­
ceber este sacramento, o médico assistente
seria obrigado a avisá-lo por caridade.
Os verdadeiros cristãos, diz o Cardeal
Faulhaber, arcebispo de Munich, na . sua
pastoral da Quaresma de 2 de Fevereiro de
1 92 1 , querem p�eparai;- e prover a sua alma
com o sacramento da Extrema-Unção, ao
voltarem às mãos do Criador. Por este mo­
tivo o médico, conhecendo que a doença é
mortal, tem obrigação, em consciência, de
avisar clara . e terminantemente o doente ou
ao menos os parentes.
O doente tem direito a conhecer a ver­
dade, e a não morrer enganado. A falta de
verdade em presença da morte, pode ser fa­
tai, e é um pecado contra o oitavo manda­
mento. Com a desculpa enganadora de não
querer perturbar o doente, presta-se-lhe um
péssimo serviço. O silêncio, neste caso, é
pata com ele crueldade sem nome ; e o fa­
lar é lealdade e deferência.
Quando houver de se administrar a Extrema­
-Unção deve preparar-se no quarto do doente :
1 .0 uma mesa coberta com toalha branca, em cima
dela o crucifixo entre duas velas de cera bentas,
podendo ser ; 2.0 um prato com seis pedacinhos -de
algodão em rama e um pedaço de miolo de trigo ;
3 . um a tóalh a de mãos, limpa ; 4.0 água benta e
. º

h1ssope ; 5.0 um copo com água potável.

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332 O CRISTÃ O NO

Algumas determinaçGes eclesfástioas


sobre o matrimónio

É dogma da Fé catól ica que o matrimó­


nio cristão é um sacramento da nova aliança
instituído por Jesus Cristo.
a Se alguém disser que o matrimónio não

é de verdade e própriamente um dos sete


sacramentos da Lei evangélica, instituído
por Cristo Senhor, mas que foi introduzido
na Igreja pelos homens, sej a anátema» . (' )
A Igre j a no novo Direito canónico, cán.
1 o 1 2 , diz sobre este assunto : « Cristo Se­
nhor elevou o própriq contrato matrimonial
feito entre pessoas baptizadas, à dignidade
de sacramento. Por isso entre pessoas bap­
tizadas não pode haver contrato matrimonial
válido, que não seja porisso . . mesmo sacra­
mento » .
O casamento cristão é , pois, um sacra·
mento.
Daqui se segue que a santa Igreja tem o
direito de impor disposições legais restri­
tivas e regulamentos obrigatórios, no con­
trato matrimonial . Assi m tem procedido
sempre, e no seu novo Código estabeleceu
para a celebração do matrimónio leis parti­
culares que obrigam em consciência. Estas
leis da Igreja fundam-se no direito divino.
O sacramento do matrimónio, como os

(1) Cont. Trld., ses. 24 1 cân. I.

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TR1B U N A L D A PE N1TÊN C 1 A -333

outros sacramentos, foi entregue e confiado


por Jesus Cristo à administração da Igreja.
Na celebração do sacramento do matri­
mónio ·p odem estabelecer-se sem dúvida ou­
tras cláusulas solenes além das do direito,
sob as quais se realizará o consentimento,- o
contrato e portanto o sacramento.
Para celebrar este sacrameto é neces­
sário que a Igreja receba o consentimento
matrimonia! legalmente, e assim a sua igno­
rância dum impedimento matrimonial pode
fazer que não haja consentimento legal e não
se efectue o sacramento.
A Igrej a recebeu de Jesus Cristo o poder
de tornar o matrimónio impossível ;. isto e,
de estabelecer impedimentos matrimoniais.
O Concílio Tridentino decJarou solene­
mente fora da Igreja �uem lhe ne g asse e ste
poder : « Se alguém disser que a Igreja não
pode est'a belecer impedimentos matrimoniais
di �imen!es, ou �ue errou estabekcendo-os,
se 1 a anatema» . ( )
(Omitem-se aqui as largas consideraç6es do
autor, sobre matrimônios mixtos por serem pouco
práticas no nosso meio).

Sepultura ecleslástloa
O .Direito canónico dá sobre este assunto
as regras seguintes :

(I) Trid. ses. 24, cin. 4 .

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O C R I S l' Á O N O

1 .ª Os corpos dos fiéis defuntos devem


s er sepultados ; a cremação é prática re­
provada.
2. ª Embora alguém tenha ordenado, seja
como fôr, a inceneração do seu corpo, esta
sua disposição não deve ser executada ; e se
vier inserta num contrato, testamento, ou
qualquer outro acto, será considerada como
não existente. (1 )
3 . ª Quem ordenar que seu corpo seja
incinerado, será privado de sepultura ecle­
siástica, se antes da morte não der qualquer
mos�ra de arrependimento. (2)
4. Não se pode celebrar m issa de corpo
ª

presente, aniversário ou qualquer outro ofí­


cio fúnebre público por aquele a quem foi
negada sepultura eclesiástica. (5) Podem-se,
porém, celebrar missas particulares por sua
alma.
Ninguém pode pôr em dúvida que a Igrej a tenha
·O direi to de impor leis aos fiéis. «Eu te darei as
chaves do reino dos céus, disse um dia Jesus _a
Pedro, chefe da sua Igrej a : tudo o que ligares
-sobre a terra será ligado também nos céus e tudo
o que desatares na terra será desatado também
nos céus». (4)
«Ü que a vós ouve, diz o Senhor aos Apóstolos
· e aos seus sucessores os Bispos e sacerdotes, a mim
ouve e o que ·a vós despreza a mim despreza, e
.quem a mim despreza, despreza aquele que me
enviou». (5)

(1) Ctm. 1203. (2) Can. 1240. O> Can. 1241.


(4) �lat. i6, 19. (5) Luc. 10, 16.

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TR1B UN AL D A PEN1TÊNC1A 335

Ora se a Igreja tem o direito de promulgar leis,


os tiéis têm o b rigação de as cumprir : ccSe alguém
não ouvir a Igreja) tenham-no p or gentio ou publi­
cano». (ª) Não desprezes, pois, os preceitos da
Igreja, porque tanto honras a Deus obedece ndo aos
mandamentos dela como aos do próprio Deus.
No seu orgulho e fatuidade, muitos cristãos
não se importam com eles e chegam até a ultraj ar
a Igreja sua mãe. Tu, ao menos, caro leitor, como
filho dócil e submisso, consola-a com tua obediên­
cia e submissão, desagravando-a assim dos ultrajes
dos filhos indignos. Faze de boa vontade algum
sacrifício por ela. Guarda-lhe absoluta fidelidade,
não só com palavras mas principalmente com obras.
Não te envergonhes de praticar os seus ..mandamen­
tos em todas as circunstâncias da vidai Este teu
procedimento será. de edificação para os bpQ.s, de
apoio para os vacilantes, de confusão para os·_�aus
e de g lória para a Igreja tua mãe. . .·
Um dia o conde de Muy foi honrado com'. à- vi­
sita do filho do rei de Inglaterra. Embora pr'es­
tasse ao prfncipe todas as honras e homenagens
devidas à sua alta dignidade, para se conformar
com os preceitos da Igreja, à mesa não lhe apre­
sentou carne pois era dia de abstinência. Es­
tranhou o príncipe, tanto mais que sendo protes­
tante não se julgava obrigado · aos preceitos tia
Igrej a Católica.
- Príncipe, respondeu o conde, se algum dia
tivesse a fraqueza de servir carne na minha mesa
em dia de aostinência, não seria hoje, pois desejo
mostrar a vossa AI teza que os católicos sabem
cumprir os preceitos da sua Igreja.
Se todos os católicos assim procedessem, quan­
tos insultos e ultrajes se poupariam à religião ca-
·

tólica ?
É s culpado neste ponto, caro leitor ? Pede per­
dão a Deus; toma a resolução séria de confessares

(1) Mat. 18,17.

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336 O C RI S T Ã O N O

sempre a tua fé à face de todo o · mundo. Proce­


dendo âssim, o Salvador reconhecer-te-há um dia
como filho legitimo de sua Igreja.
«A todo aquel� que me confessar diante dos
homens, também eu o confessarei diante de meu
Pai que está nos céus · e àquele que me negar
diante dos .h omens, também eu o negare.i diante de
meu Pai que está nos céus>>. (1)

(1) Mat. 10, 32,33.

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S E G U N DA PA RTE

A reco n c i l i a çã o co m Deus-

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CAPÍTULO r· ::\(S;'.l,';�n;;,
Exame de consêiência� ' \;\:::..:.·, . . i
.. �.

«Ide e mostrai-vos aos sac e rdÇ>te�s:'.� ; : :( i) ',.


' '.
Assim falou J e.s us aos leprosos qü��I�he
pediam os alimpasse da lepra. Assim nos
· fala também a nós, quando com a alma
doente Lhe vamos pedir a cura : «Ide e
mostrai-vos ao sacerdote» , a quem deixei
poder de vos alimpar dos pecados.
E é que não há outro meio ordinário para
deles obter perdão.
Como nos havemos de confessar ? B as­
tará genericamente acusar os pecadoSit di­
zendo por exemplo : ccAcuso-me, padre, que
pequei» , ou será preciso declarar cada um
deles em particular ?
A resposta deu-no-la Jesus quando pro­
meteu e quando instituiu o sacramento da
Penitência : cc Tudo o que vós ligardes so­
bre a terra, será ligado também no céu ;
e tudo o que vós desatardes na terra, será
·d esatado também no céu » . (2) «Aos que
vós perdoardes os pecados, ser-lhes-ão per:­
doados, e aos que vós os retiverdes, ser­
-lhes-ão r � tidos » . (5)
(t) Luc 11, t4, (2) Mat. 18,18. }3) Joa. 20,23.
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340 O CRISTÃO NO

O s pecados hão d e ser perdoados como


em julgam�nto, isto é, o sacerdote há de
julgar o pecador a ver se merece absolvição,,
e portanto se sim ou não deve perdoar.
Em juizo não se toma conhecimento da
causa, dê urna maneira. g enérica e indeter­
minada. Para o juiz proferir sentença, pre­
cisa conhecer a causa. Constituído j uiz dos
delinquentes, tem de examinar, interrogar,
ouvir ; e só depois de bem esclarecido,
absolve ou ,cpndena, não segundo a sua von­
tade mas conforme manda a lei.
De modo igual tem de proceder o con­
fessor. Como proferiria sentença justa sem
conhecer ao menos as culpas graves que se­
param o pecador de Deus e o fizeram seu
inimigo ?
Depois, o confessor alérn de juiz também
é �.édico, obrigado por isso a receitar ao
pec á.dor os remédios apropriados às suas
enfer�idades, a fim de o curar e de prevenir
as recaídas.
Quando o doente consulta o médico, con­
ta-l he tudo quanto sente, para que ele possa
bem diagnosticar a doença e aplicar o re­
médio. Pois .o mesmo deve fazer o pecador
com o médico da alma, o confessor, para que
el'e possa bem medicar e curar seus males.
Se, portanto, tem de declarar seus pe­
cados, antes de mais nada precisa de os
conhecer, examinando a consciência a . recor­
dar todos os pensamentos, palavras e obras
com que ofendeu ao Senhor.

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TRI B UNAL D A PENI T � N C I A 341

'
E será preciso fazer · sempre o exame de
consciência ? Não é necessário quando de
certeza já sabemos quais e quantos. .os pe­
cados' cometidos desde a última confissão
bem feita, ou quando sabemos não ter come ­
tido desde então nenhum pecado mortal, pois
neste último caso, para fazermos confissão
bem feita, basta acusar qualquer pecado
mesmo dos j á confessados de outra vez.
Será, porém, sempre melhor seguir a regra
<la prudência ditada pelos mestres de espí­
rito : cc Nunca t.e ajoelhes no ,co'nfissionário
sem prévio exa m e de consciência, embora
tenhas a certeza de não ter cometido pecado
mortal desde a última confissão que fizeste» .
Como fazer bem o exame de consciência ?
Eis o que varnos1 ensinar .

1 - Pfeparação.

Começa por te recolher dentro de ti


mesmo e afastar da imaginação tudo o que
te possa distrair. Da confissão depende a
vida ou a morte, a graça ou a desgraça, e
talvez o céu OU''O inferno ; necessário é, pois,
fazer cada urna como se fosse a última.
Pede devotamente a assistência do Es­
pírito Santo, a· intercessão da Santíssima
Virgem, do teu Anjo da Guarda, do Santo
do -�eu nome, para que te ajudem a conhecer
todos ·os teus pecados, a arrepender-te deles
de todo o coração e a confessá-los com ·s in­
ceridade.

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342 O C R I STÃ O N 0

E a tua oração deve ser tanto mais fer­


vorosa, quanto maiores foram tuas quedas
e maior o teu descuido.
Faze como a criança, que caiu e não se
atreve a levantar. Chora e grita, até al-.
guém correr a aíudá-la. Chora e grita, tam­
bém tu para que Deus te ajude a levantar
da miséria dos teus pecados.
Depois interroga-te : Há quanto tempo
me confessei ? E fiz então uma confissão
bem feita ?
Se podes responder que sempre procu­
raste fazer bem tuas confissões, não te de-·.
mores mais com o p assado.
Mas se tens a certeza de que por acanha-.
mento ou falta de preparação não fizeste bem
alguma confissão, examina-te e vê quantas
vezes isso sucedeu, as vezes que comungastes
nesse estado, os pecados que depois come­
testes e ainda não foram vàlidamente absol­
vidos. (1)
Se a penas duvidas da validade das tuas
confissões, lê atentamente o que d�ssemos
sobre a cc Consciência escrupulosa», e o que
diremos no tratado d a cc Confissão geral » , e
se ainda assim não ficares tranquilo, en­
trega-te confiadamente ao juízo do confessor
e faz o que ele te disser.
Mas, replicarás tu, se deixei mal feita

(l) Deste ponto se falará no tratado da «Confissão geral>.

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TRIBUNAL;D A PENIT �NCIA 343

alguma das passadas confissões, por não


ter acusado qualquer pecado mortal, que
me ' vale a mim dizer-me o confessor ccestá
sossegado» , se afinal não me posso salvar
com a consciência_ manchada de pecados
mortais ?
Tranquiliza-te. O confessor ocupa, no
confessionário, o lugar de Deus ; ensina e
julga em seu nome. Sabe muito bem a que
está obrigado : se . te diz, que não há mo­
tivo para renovares as confissões, toda a res­
ponsablidade diante de Deus lhe pertence,
e tu deves hmildemente sujeitar teu juízo
ao dele.
Supõe mesmo que ele se enganou. Ainda
então, em virtude da sentença que como juiz
proferiu, estavas desobrigado de renovar as
confissões mal feitas ; e a primeira vez que
te confessasses ficariam remediadas as con­
fissões mal feitas, pois obterias o perdão
não só dos pecados presentemente acusados,
mas de todos os que, para lhe obedecer, dei­
xavas de acusar.
Quem se arrepende de todo o coraÇão
dos pecados cometidos, e os acusa como os
tem na consciência, recebe vàlidamente a
absolvição e com ela a graça santificante
que apaga todos os pecados.
O principal e indispensável é o arrepen­
dimento verdadeiro dos pecados de toda a
vida. Quando estamos persuadidos de .que
tivemos . este arrependimento, podemos con­
vencer-nos de .q ue tudo nos foi perdoado.

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344 O C RISTÃO N O

ExamiP.. a-te em segundo lugar se . cum­


priste a penitência que te foi imposta, ou a
omiti�te por culpa tua.
Examina-te depois se reparaste os danos,
ou deste ao próximo a devida satisfação.
. Há o,b rigação de rerarar os danos espi­
rituais causados pelo eséândalo, os tempo­
rais provenientes de murmt,Irações, calúnias,
injúrias, furtos e · injusta danificação da pro­
priedade alheia .
Tens feito assim ? Não reparar os danos
graves, podendo, é transgressão grave e por­
tanto pecado mortal .
Sobre estes três pontos convém · notar
o seguinte : A quem costuma preparar-se
com cuidado, e depois cumprir pontualmente
a penitência, basta um brevíssimo exame so­
bre a última confissão. Se, a-pesar de tudo,
ainda ficas na dúvida se deixaste de confessar
qualquer pecado ou circunstância agravante,
n ão te inquietes ; porque é justo e razoável
supor que confessaste tudo o que havia
obrigação ,d e canfessar . (1)
Tendo a certeza de que a ninguém cau­
s aste dano, n ão é preciso examinar se o re­
paraste ; m as se tens o triste costume de
falar dos defeitos do próximo, examina se
tens procurado remediar o mal que por ven­
tura com isso tens causado.

(1) Veja-se o que escrevemos acerca da cConscl�ncla pro­


vável•.

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T R I B U N t\ L D A P E N I T l! N C I A 345

2 - Como devamos exami na.- a consciência.

Para examinarmos a consciência com fa­


c.ilidade, convém seguir um método hem de­
terminado, repassando a memória p�los de:Z
m andamentos da Lei . de Deus, os cinco pre­
ceitos da Santa Maclre Igrej a e os deveres
do próprio e�tado, a ver se os transgrediste
por pensc.1mentos, palavras, obras ou também
por omissões. Se não encontrarmos pecado
contra um mandamento, passaremos a outro,
demorando ma.is a nossa atenção naqueles
em que mais costumamos pecar, mas sem
totturarmos o espírito.
Quando desde há muito nos não con­
fessamos, é bom utilisar um formulário, C! ,
melhor ainda, examinarmo-nos primeiro por
nós e depois recorrermos ao formulário para
recordar certas coisas que por ventura nos
·não ocorreram. Quem se confessa a miúde,
por exemplo uma vez por mês, não precisa,
ordinàriamente, de recorrer a formulário,
embora seja útil fazê-lo uma ou outra vêz, .
afim de mais fàcilmente repar;:tr nalgum de­
feito que fosse passando inadvertido.
3 - Que tempo e d i l i gência se deve empregar
no exame de c 1nsci ênci a ?

,,.. Os_ mestres de espírito ensinam que, para


um bom exame de consciência, não se requer
mais -diligência do que para qualquer outro
negócio importante. Não é preciso um cui­
dado extraordinário.

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1l
346 O CRISTÃO NO

Quem em pregou esta diligênca, tem di­


reito a estar sossegado, mesmo que lhê
venham receios de não ter descobrido todos
os pecados mortais porque o exame talvez
n ão fosse ainda suficientemente minucioso.
A - boa e sincera vontade é tudo ; os peca­
dos não confessados involuntàriamente, são
absolvidos com aqueles que se confessaram ..
Devem ter presente esta verdade as almas
que, sem pre presas de dúvidas e temores,
j amais encontram sossego, parecendo-lhes
nunca ter feito exame suficiente. Este vão
temor prejudica a alma e havíamos de diz�r
qu� ofende o Deus das misericórdias, que
não instituíu os· sacramentos para tortura
e desassossego, m as para dar a paz e tran­
quilidade à consciência.
Se, insistindo no exame sobre um ponto
determinado começas a sentir o espírito per­
turbado, passa logo a outro ponto. Se em
tudo encontras a mesma perturbação, não
alongues o exame, nem desças a porme­
nores. Ainda que então te esqueça qualquer·
circunstância, mesmo grave, não te apoquen­
tes, porq1:Je no estado de perturbação em que
te encontras, n ão se te exige mais.
Quando se poderá di:z.er suficiente a di-'.
ligência empre[(ada, no exame ? A esta per­
gunta não é fácil responder directamente.
Algumas observações apenas.
Quem se confessa ra�a� vezes, necessita
empregar maior cuidado do que quem se'
confessa amiúde. Quem leva vida regrada,

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TR1BU NA L DA PEN1T�NC1A 347

não precisa tanto tempo para o exame como­


quem viye na depravação e no vício. Pre­
cisa de menos exame a pessoa retirada das
agitações e do mundo, do que aqueloutra
que vive a vida complicada da sociedade,
vida sobrecarregada de obrigações e portanto
m ais exposta a perigos.
Também aquele que costume examinar
freqúentemente a consciência e nada fazer
sem reflexão, não precisa de exame tão de­
morado como o que vive na indiferença sem·
pensar nas suas culpas, ou melhor, sem. com
elas se importar.
Quem se confessa S Ó de ano a ano, e
pouco pensa em Deus, e soma pecados a
pecados sem se lhe dar ofender o Senhor
mais ou menos gravemente, com dificuldade.
s,e poderá examinar num quarto de hora.
E quase impossível em tão pouco tempo
poder recordar o número, mesm9 aproxi­
mado, de tantos pecados.
Um curto quarto de hora bastará ordi­
r
ná iamente pd.ra o exame a quem se con­
fessa mensalmente, e menos será preciso a
quem se confessa de quinte em quin1e ou ..

de oi'to em oito dias. Pessoas assim, fàcil-·


mente. recordarão qualquer pecado mortal
em que tenham caído, e das faltas leves e .
imperfeições basta conhecer as mais impor­
tantes, as suas causas e .raízes, arrepender-se ·
delas e empregar os meios para as não �or·
nar a. cometer. Fixa a tua atenção especial-·
mente sobre -as faltas voluntárias, com�tidas

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348 O C RISTÃO NO

com plena advertência, mais dominantes e


contrárias aos deveres do teu estado.

4 - Maté r i a do exam e d e consciência

1 .Devemos examinar : a) se transgre­


dimos a lei de Deus em matéria grave ou
leve ; b) se a transgressão foi plenamente
deliberada.
Exemplifiquemos : Um domingo, porque
te enganaste na hora, chegaste à missa de­
pois d.e feita a consagração. Pecaste ? Não ;
mas se pudesses assistir a outra sem grave
incómodo, devias assistir ; e não assistindo,
pecavas . No caso, pois, de teres perdido a
m issa em domingo ou dia santo, deves exa­
minar se foi ou não por tua culpa.
Trabalhaste ao domingo ? Examina se
foi por muito ou pouco km po, às ocul cas
-0u em público, com escândalo ou sem ele.
Assaltaram-te maus pensamentos ? Vê
se, por descuido, não lhes resististe logo,
·OU se os demoraste voluntáriamente, com­
prazendo-te em coisas desonestas.
Acusa-te a consciência de teres visto coi­
sas obscenas ? Examina se foi por acaso e
de passagem sem consentimento, ou se foi
voluntàn·amente, por curiosidade ou com má
intenção. No primeiro caso não houve pe­
cado, no segundo sim.
2. Em muitos casos é difícil distinguir
se houve consentimento, e se o pecado foi
mortal ou venial. Não obstante a melhor

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TRIBUNAL D A PEN1T�NC1A 3"49

boa vontade, muitas vez�s n ão é possível


saber ao certo �e houve consentimento pleno
em certos pensamentos, palavras e acções
de si 1gravemente pecaminosas . (1) Que fa­
zer então ? Acusar estes pecados como du­
vidosos, deixando· o seu j uízo a Deus e ao
confessor.
Suponhamos agora uma pessoa a quem
os escrúpulos causam tal confusão, que não
sabe distinguir o pecado da imperfeição, o
pecado mortal do venial. Vê pecados mor­
tais onde não há pecado nenhum, ou só há
pecaqo venial ; julga agora bom, o que logo
lhe parece mau ; e tem cómo verdadeiros e
graves pecados, certas fantasias que lhe
correm pela imaginação , sem mesmo ter
tempo de as consentir.. E evidente que tal
pessoa é incapaz de ju1gar dos seus pecados
com equidade. Que fazer ? Deixar de se
confessar ? Confessar-se raras vezes ? De
modo nenhum. O que deve fazer é exami­
nar-se brevemente, confessar-se como puder
e sujeitar-se ao juízo do confessor, pedindo­
-lhe que a instrua� lhe esclareça dúvidas e
supra com as suas perguntas a insuficiência
da acusação. (2)
3 . Se és culpado de pecados mortais,
examina quantas vetes os cometeste ; e se
não podes conhecer o número certo, vê ao \

(1) Veja-se o que disse!Dos sobre a cConsclência 'provável•.


(2) Leia-se o que -dissemos sobre a cConsclêncfa e1cru,
pulosa>.

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350 O CRISTÃO NO

menos aproximadamente quantas vezes . no


mês, na semana ou no dia os costumas
cometer. Se nem mesmo assim consegues
fazer um cálculo, examina se os cometeste
-com frequência ou raras vez"es. Como é
impossível contar os pecados de pensamento,
se neles costumas cair acusa·-os em globo,
indicando a duração do mau hábito em que
·tens vivido . Examina também as circuns­
tâncias que mudam a espécie de pecado,
tornando-o de venial em . mortal e vice­
versa, ou aumentando-lhe a malícia dentro
.da mesma espécie. (1)
4. Não havendo obrigação rigorosa de
-confessar os pecados veniºais, também a não
há de os examinar. Mas é perigoso não
fazer caso deles,, e porisso deve-se procurar
.conhecê-los, ainda que não com tantb rigor
como os mortais.
h preciso não perder de vista certos de­
feitozinhos voluntários e deliberados a que se
é mais inclinado, ·e bem assim as faltas con­
tra os deveres do próprio estado e vocaçao.
5 . Note-se muito particularmente que
jamais se deve omitir o exame sobre os de­
veres do próprt'o estado e dos defet'tos a
.que temos mais apego.
Conta-se do imperador Carlos V que se fo i um
· dia a
· confessar com certo religioso santo e este,
depois de lhe ouvir a acusação dos- pecados, disse :

(1) Hsta doutrina será difusamente exposta, quando se tra­


tar da confissão.

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TRIBUNAL DA PENIT� N CIA 351

- Est ão confessados os pecados de Carlos ;


confessai agora os do imperador.
A quantos se poderia dizer também : ccAcusaste
os pecados do individuo, acusa agora os de teu es­
tado e pro fissão».
Não deixes nunca de te examinar sobre os
deveres do próprio estado. ,
Cada pessoa tem a sua paixão dominante, que,
de P. referência . às outra�, � arrasta ao pecado.
Aqmles, o herói dos heróis, unha apenas um ponto
vulneráv�l, e tanto bastou para o inimigo o ferir e
m atar. E o que sucede a rtmitas pessoas. na luta
pela salvação. Contra .e sse ponto fraco dirige o
demónio, de preferência� os seus golpes, ferindo a
alma de mil modos e multas vezes de maneira mor­
t al. :É de . suma importância, pois, conhecer o nosso
lado fraco, a paixão dominante, o viciozinho pre­
dilecto, para o combater e vencer ; porque vencido
o inimigo principal, é fácil a vitória sobre os outros.
Infelizmente estamos sempre dispo!ii t os a des­
culpar e-. justificar o nosso defeito. dominante e os
pecados a que nos arrasta. Como explicar isto ?
Um homem embriagado fala e procede como o
não faria em estado normal. As paixões, quaisquer
que elas sejam, produzem embriaguês semelhante
à do vinho, nos seus efeitos : enfraquecem a von­
tade e obscurecem a inteligência.
O orgulho e a avareza escurecem a razão ·;
o ciúme, a cólera, o ódio não nos deixam julgar
bem ; o mesmo se diga da preguiça e amor das
comodidades.
Quantas pessoas, aliás pessoas de bem, abrem
por vezes em criticas aceradas e mordentes ! Cega-as
a paixão dominante e não vêem que estão faltando
à caridade. E não é nada fácil convencê-las de qu� �

não podem descobrir nem propalar. os defeitos do


próximo. A um avarento quem seria capaz de ,o
convencer da sua avareza ? '
Se . tais pess o as não procuram. entrar até ao
fundo da consciência. passarão anos e anos, talvez
a vida toda, sem atentar nos seus principais de ·

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352 O C RISTÃO N O

feitos. Examinam a consciência su �erficialmente


" e
confessa,n-se muitas vezes, m as nun ca avançam nos
caminhos do bell', porque, de cegas que andam,
não advertem no triste estado da sua alma. É certo
que não há responsabilidade sem conhecimento,
e por isso suas confissões não se poderá dizer que
sej am nulas ; mas não é menos certo que pouca
utilidade tiram delas, porque nunca se vão a arran­
car o mal pela raiz.
«A virtude está no meio termo». Este prin­
cipio aplica-se óptimamente ao exame de cons­
ciência. Evita nele "t'oda a negl igênc ia, não suceda
expores-te ao perigo de receber indignamente o
sacramento da Penitência, levantando-te dos pés
do confessor manchado com mais um pecado em
vez de purificado com o perdão de Deus.
Não confies só na ajuda do confessor, porque,
seu auxilio supõe o teu exame e a confissão dos
teus pe cados. Não quero dizer com isto que hás
de dar tratos à imaginação, horas e · horas seguidas,
a examinar todas as circunstâncias possivet's de
todos os pecados graves. Seria zelo mal entendido
e perigoso, e por isso ontrário à vontade de Deus
e aos ensinamentos da Igreja.
Necessário e su fi ciente é o seguinte :
Propõe confessar-t e bem ; pede a Deus que te
alumie ; reflecte nos teus pecados tranquilamente,
sem pressa, ansiedade ou medo ; não · repitas as
mesmas coisas, e sossega embora te venham receios
de esquecer 2 lgum pecado.
Não te parecendo suficiente o que çemos di to,
pede ao confessor te indique o tempo a empregar
no exame e submete-te ao que ele te disser.
Finalmente, ouve a palavra de Deus com assi­
duidade, confessa te frequentemente ; pensa · muitas
vP.zes nas tuas fal tas quotidianas e examina-te to­
dos os dias, ainda que seja por pouco tempo. Estes
exercfcios contribuirão muito para o bom exame
de consciência, que não será um tormento, mas um
exercf cio espiritua l útil e indispensável para o teu
progresso na vida cristã.

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C A P I T U LO 1 1

D a c ontrição

Ofendes a teu amigu e rompes com ele.


Ficais, um com outro, de relações cortadas.
Para as reatar, antes de mais nada tens de
reconhecer a tua culpa e arrepender-te dela.
Pois o que sucede no .trato dos homens
uns com outros, sucede também, de certo
modo, entre o homem e Deus. Teve o
homem a ousadia de ofender a Deus. Como
que ficaram de relações-cortadas, tal o abismo
que entre eles se cavou se a ofensa foi grave ;
ou, se foi leve, esmoreceu a amizade que
entre eles havia antes.
Se o homem quer reatar a amizade per­
dida ou reavivar a amizade esmorecida, o
que primeiro tem a fazer é reconhecer a sua
culpa, arrepender-se dela e propor de futuro
não tornar a ofender a Deus . E é isto que
se quer· dizer quando se afirma que, pata
reaver a amizade de Deus ou o seu perdão,
deve o pecador estar contrito, ou que a
contrição é a condição principal e essencial
para o pecador alcançar o perdão dos seus
pecãdos.
Que é. · contrição ?
«A contrição - é a dor da alma e detes-
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O C R I S T Ã. O N O

tação dos pecados cometidos, com o propó­


sito de nunca mais pecar» . ( ' )
Para haver contrição preciso é que haja
dor e detestação dos pecados e propósito de
emenda.
1 . Dor e detestação dos pecados .
A dor necessária na confissão é : a) n ão
qualquer dor corpLral, mas a dor da alma
ou o pesar da ofensa feita a Deus . Dor pa­
recida à que nos causa a morte de um pa­
rente ou amigo, ou a perda de qualquer
coisa muito da nossa estima, ou então se­
melhante à desolação em que caímos se por
acaso desagradamos a pessoa . a quem que­
remos bem ;
b) a dor dos pecados próprios ou, como
se exprime o concílio de Trento, « dos peca­
dos COll}etidos» , e não a dos pecados alheios.
2 . A dor da alma deve andar junta a de­
testação dos pecados ou seja uma repulsa e
aversão por eles, igual à que sentimos quando
em frente de qualquer coisa contrária ao
nosso gosto e natureza ou de pessoa que
nos agravou com iQ.justiça grande.
Da dor e detestação dos pecados sal ta
naturalmente o propósito de emenda. Nin­
guém quer repetir a acção de que está re­
peso e que detesta. Não se compreenderia,
pois, o arrependimento sem o propósito de
não tornar a cometer o pecado.

(1) Cone. Trld. sen. q, e. 4.

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T R 1 B U N :\ L D A. P E N I T F. N C I A
.

355

Conforme o temperamento dos indiví­


duos assim neles - se exterioriza ou manifesta
a contrição. Nuns havíamos de dizer que
toda ela actua sobre a vontade e · se lhes
.concentra lá dentro reprimida ; noutros salta
fora em sacudidos sentimentos. ..
Sobrevém uma desgraça, dese �se"

inesperado acontecimento de flagrant · ..,. · juS!­
. .

tiça. Todos os que assistem ficam passadps


de dolorosa impressão ; mas enquanto tins
desatam en1 gritos . e lágrimas, outros con­
centram lá dentro da alma toda a violência
d a 'dor.
Sucede tal qual com a contrição dos pe­
cados. Pode o pecador parecer frio e im­
passível, não haver sequer uma lágrima a
humedecer-lhe os olhos, e todavia sentir e
detestar profundamente a ofensa que fez a
Deus. Sendo assim, não há de que se in­
quietar, pois está de. veras contrito. Outros
pecadores, porém, com a veemência da dor
debulham-se em lágrimas de contrição. Tal
sucedeu . com muitos santos, segundo vemos
nas histórias. O profeta David, diz a Escri­
tura, comia o pão à mistura com as lágrimas
que lhe caíam pelo rosto. S. Pedro chorou
amargamente quando caíu en1 si, depois de
ter negado o Mestre. Outrotanto se lê de
.S . Maria Madalena, de Santa Margarida de
Cortona e de outros grandes penitentes.
Pede a Deus arrependimento semelhante
e · contrição perfeita ; mas nem por isso fi ­
ques j ÚJgando que não estás arrependido,

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356 O CRISTÃ O NO

se te não for dada aque l a «graça sensívelJ>


que é dom gratuito de Deus e não está na
tua mão alcançar. Na tua mão, sim que
está o arrepender-te, detestar o mal prati­
cado e propor emen :la. E é isto quanto
basta para haveres perdão.
Olha o que sucedeu · com o publicano
do Evangelho. Não consta que chorasse ;
mas, repeso dos pecados e da ingratidão
com que tratara a · Deus, batia no peito e
bradava : « Senhor, tende piedade de mim,
pecador » . E perdoado voltou para sua casa,
assegura o divino Salvador.

Qual idades da contri ção

Não entende com as almas tim oratas o que su­


màri amente va.nos expor acerca das qualidades que
deve ter a contrição. As pessoas timoratas podem
ter a certeza de que estão contrit as e portanto des­
cansar, àesde que se excitem a verdadeiro .e sincero
pesar dos pecados, os deplorem por serem o fensa
de Deus e queiram· a todo o custo evitâ-los no fu­
turo, pois tant� basta para se poder dizer que têm
verdadeira' contrição.

Acontrição, como acima se difiniu, é


uma cc dor da alm a » , portanto tem de ser
interna.
Não basta que os lábios digam : «Meu
Deus, pesa-me çle todo o coração de Vos
ter ofendido» . E necessário que de facto o
coração sinta o que as palavras significam.
Não vale o acto de contrição que se lê ou

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TR1B UN AL D A PEN 1TÊN C 1A 357,

de cor .se recita sem pensar no que se está


dizendo.
A contrição é o pesar da ofensa feita a
·Deus, ofensa que é um mal, e, à luz dà Fé,
o maior dos males. Se é o maior dos males,
dele se deve ter pesar maior do que o que
se tem por qualquer outro mal . Por isso
se · diz que a contrição deve ser suma.
«Mas, objectarás, eu sinto maior tristeza
pela morte dos meus pais do que pelo pecado
cometido. Debulho-me em prantos junto da
sua campa, e na confissão sou de uma in­
sensibilidade de pedra, incapaz sequer de
uma lágrima, muito embora me sinta arre­
pendido de meus pecados, os deplore e fir­
memente . · proponha · não, mais os··· cometer» .
Tranquiliza-te, cristão. O arrependimento
não está na sensibilidade mas na vontade.
Preferes Deus às criaturas ? É quanto basta
para que tenhas · contrição . apreciativamente
suma.
O pecado, cada um de per si, é ofensa
de Deus ; e, sendo mortal, é ofensa tamanha
que quebra a amizade entre a alma e Deus.
Para o pecador tornar à amizade de Deus,
tem que detestar todos os pecados mortais
cometidos. Um só que se não deteste, e o
pecador ficará de Deus .separado. A con­
trição deve ser, portanto, universal,.
Deve o pecador arrepender-se de cada
um dos ·pecados mortais, mas não precisa
fazer um acto de contrição a propósito de

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�58 O CRISTÃO NO

cada um deles. Se na contrição entra um


motivo universal , como o temor do inferno,
a perda do paraíso, ou o amor de Deu",
para haver perdão de todos basta dizer de
todo o coração : « lVleu Deus, porque sois
infinitamente bom e Vos amo de todo o
meu coração, pesa-me de Vos ter ofendido J>
ou « Meu Deus, pela fealdade do pecado, .
perda do paraíso e temor das penas do in­
ferno, pesa-me de todo o coração de Vos
ter ofendido» .
Com dizer-se que a contrição deve ser
universal para se alcançar a amizade de
Deus, não ·se quer dizer que deve esten­
der-se aos pecados veniais . que apenas es­
friam a amizade entre a alma e Deus mas
a não destroem .. Por isso embora deles não
haja arrependimento, continua a alma em
amizade de Deus, amizade esfriada mas ver­
dadeira amizade.
Toda via, entendamo-nos, quando alguém
se vai confessar e l eva apenas pecados ve­
niais, para que fique bem feita a confissão
é precisa a contrição ao menos de um pe­
cado venial ou de alguns pecados veniais ou
de terem sido tantos os que se cometeram.
Por exemplo, alguém detesta sumamente o
pecado da mentira porque ofende a vera­
cidade de Deus, a suma .Verdade que é
Deus � ou porque é ·de coração manso e
doce, sente profundamente as venialidades
cometidas contra a caridade devida ao pró­
xim o ; e só destes pecados tem contrição e

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TRIB U N A L D A PE N 1T ÊNC1 A 35g

propósito de. emenda. É quanto basta para


deles haver o perdão e ficar bem feita a
confissão.
E quem lt!vasse à confissão com muitos
pecados leves um pecado mortal e só deste
se arrependesse, também nesse caso a con­
fissão era bem feita e dava _ o perdão do
pecado grave cometido .
.Nlas já seria nula a confissão de quem só ·
tivesse pecados veniais e de nenhum deles
tivesse verdadeiro arrependimento ; e além
de nula seria sacrílega e portanto grave­
m ente pecatnin·o sa, se houvesss a advertência
de que se não estava arrependido e não
obstante tal certeza se fosse a confessar.
Todavia na prática, bem é que nos apro­
ximemos da confissão contritos de todos os
pecados veniais cometidos, porque só assim
deles haverem c:> s perdão.
O pecado porque ofende a Deus, trans­
torna a ordem sobrenatural como é a órdem
das relações do homem com Deus. Portanto
o arrependimento, a contrição, deve firmar-se
num motivo sobrenatural e ser portanto e]a
m esma sobrenatural.
Assim, arrepender-se dos pecados pelas
m ás consequências naturais que deles vêm,
como seria porque se perdeu a es.tima do
próximo a quem se ofendeu, ou porque ·per­
demos, o crédito dada a mentira que pre­
gamos, é ter contrição meramente :natural,
pois que são- naturais ou humanos os se�s

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36o O C RI S T Á O N O

motivos. E portanto tal contrição não che­


gava para se alcançar o perdão dos pecados.
Todavia o pesar das consequências per­
niciosas do pecado, se não justifica o pe­
cador, abre caminho para a verdadeira con­
triçã_o sobrenatural .
E ver o filho pródigo. 1'o abismo da
sua degradação e miséria recorda os dias
felizes que passou na casa de seu pai, e ten1
saudades. E começa de àetestar a aventura
a que se metera, abandonando o lar paterno
para se atascar no lodaçal do vício ; e chora
a perda de bens tamanhos que ali gozou.
Aflige-o, entristece-o não a ofensa que foi
para seu pai o ter abandonado seus carinhos
e sua casa, mas a desgraça em que se vê
caído .
À força de nela meditar, dão de se Jhe
despertar na alma sentimentos mais nobres.
Lembra a bondade imensa do pai e a ingra­
tidão com que lha pagou. E pouco a poüco
vai-se esquecendo de si para só l astimar o
desgosto que deu ao pai. Enche-lhe a alma
o pesar do que fez, e acaba ·por se meter a
caminho do lar paterno a pedir perdão e
um cantinho onde possa servir não j á como
filho, pois não merece tal graça, mas
como qualquer dos criados que ali em casa
trabalham.
Filho pródigo é o pecador a quem Deus
traz ao arrependimento e conversão. Cai so­
bre ele o peso da mão divina e faz-lhe sentir
o nada e vaidade do gozo. e da alegria do

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T R 1 8 U N i\. L D A P E N l T Ê N C 1 A 361

mundo, e leva-o a aspirar a coisas melhores


e mais . duradoiras.
A vergonha e desonra da sua vida vi­
ciosa recorda-lhe o que será no dia do juizo ;
as dores que sente, avivam-lhe a lembrança
,das penas do inferno � e a desgraça a que
·chegou, lava-o a meditar na sua ingratidão,
na m alícia do pecado e na bondade de Deus,
que, apesar de tantos crimes seus, em vez ge
Jogo o condenar, m isericordiosamente lhe
mandou avisos para se precaver e o cumu­
lou de novos benefícios.
E assim com a graça divina passa o pe­
cador sempre a pensamentos melho:res até
à verdadeira contricão sobrenatural. E hu­
mildemente, confiad amente, se volta para
Deus a mos trar-lhe o pesar dos pecados
con1etidos. E se o seu pesar nasceu do
temor de Deus, pode ir à contrição que
nasce do muito amor..
A contrição é tanto mais salutar quanto
mais se funda no amor ou caridade para
·Com Deus. E diz-se contrição imperfeita
-0u atrição quando nasce do temor de Deus,
e contrição perfeita ou simplesmente con­
trição quando plenamente nasce do amor
-0u caridade para com Deus .
S inceramente arrependido . dizes : «Meu
Deus, pela fealdade do pecado, perda do pa­
raíso e temor das penas do inferno, pesa-me
de todo o . meu coração, de Vos ter ofendido,
e, com o auxílio da Vossa divina graça, pro-

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362 O CRISTÃO NO

ponho firmemente emendar-me e nunca mais


Vos tornar a ofender ; peço e espero o · per­
dão das minhas culpas pela Vossa infinita
misericórdia. Amen» .
Neste teu falar não vai apenas o. temor
de Deus. , . vai também o aborrecer o e ecado
e o propor evitá-lo. Não acusas o Senhor
de ser demasiadamente se.vera, antes pelo
contrário reconheces ser justo que sua santi­
dade e justiça infinita repugne as- transgres­
sões da sua Lei ; e assim mostras querer o
que Deus quer· e detestar o que Deus de­
testa, e vais até propor de futuro regular a
tua vida pela Lei de Deus .
Evidentemente há aqui um começo de
amor de Deus, pelo que teu arrependimento
é salutar e meritório. Não é como o arre­
pendimento dos condenados que quanto mais
sentem sua infelicidade mais se endurecem
e teimam na sua malícia, e, rangen jo os
dentes, blasfemam a Divindade.
A contrição é ainda imperfeita quando
procede de se considerar, à luz da Fé, a feal­
dade do pecado e sua malícia como ofensa
de Deus, pois também neste caso se detesta
o pecado não por ser ofensa do Sumo Bem ·
mas por. moti\ us pessoais quais são o tornar
o pecador abominável aos -olhos de Deus.
Quando a contrição plenamente se· funda
no amor de Deus e · não no medo do inferno
ou no desejo do céu, então é contrição per­
feita e portanto mais eficaz e salutar. Mas'
ainda aqui há mais e m�nos.

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TRI B U N A L D A P E N I T E N CI A 363:
.

Tens um amigo dedicadíssimo, um bem­


feitor a quem deves benefícios sem conta.
Se te acontecesse ofendê-lo, que dor não te
atorme.n taria o coração. Pois Deus é o teu
melhor amigo, o teu mais generoso bem­
feitor. Merece, mais que ninguém, todo o
teu reconhecimento e amor. Se quando o
ofende�te, pecando, lembrado de que morreu
numa cruz para te salvar detestas o pecado
pois foi ingratidão para tanto amor, tens
contrição perfeita. O teu arrependimento
nasce . do amor de gratidão para com D6us.
Mas o teu amor ou caridade pode ser
bem mais perfeito e nobre. Podes amar a
alguém não porque te ama e faz bem, mas
porque de si é bom e virtuoso; generoso e
sincero ; podes amá-lo pelos dotes que o
exornam. Não olhas ao que dele podes re­
ceber, mas ao que é em si ; é só por isso
lhe tens amor. Ora, que são todas as per­
feiçõ�s das criaturas comparadas com as per­
feições infinitas de Deus ? Em grau sumo e
de maneira inefável tem el e todas as perfei­
ções. E sumamente nobre . e bom e digno
de ser infinitamente amado sobre todas as
criaturas . Assim no-lo ensina a nossa Fé.
Se tu, ó cristão, assim amares a Deus pela
infinita beleza das suas perfeições, · teu amor
será nobilíssimo, puríssimo, e o pesar que
tenh�s de ter ofendido com teus pecados a
bondade assim tão grande, ao Ser · assim
perfeito, é. contrição perfeitíssima.
A diferença entre contrição e atrição está

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O C RISTÃO NO

pois nos motivos em que cada uma delas se


funda, e não em qualquer outra coisa. Para
a dor ser perfeita não se requer, por exemplo,
que seja sensível ou acompanhada de dolo­
rosas sensações corporais ·; basta que nasça
de um , ardente amor de Deus. J á acima
se disse, o arrependimento é uma dor da
alma, da vontade, e não uma dor dos sen­
tidos. E também para ser perfeita não se
requer que se estenda a todas as culpas,
basta que se estenda a todas as cul pas mor­
tais. A dor dos pecados veniais embora seja
muito para desejar, não é de obrigação para
o perfeito amor de Deus. Daqui se vê que
não é difícil alcançar a perfeita contrição
desde que haja boa vontade. Adeante, me­
lhor se expl anará este assunto ·.
Da necessidade da contrição para a re­
m issão dos pecados.
Sem contrição não há perdão dos pe­
cados . Numa doença que mal deixe falar,
. na pressa de uma aflição que não dá tempo,
pode-se receber com fruto o sacramento da
�enitência sem confessar todos os pecados.
E um perigo, uma necessidade urgente que
surge, e falta o tempo para confessar todos
os pecados um a um. Na pressa, bastará
dizer ao confessor : « pequei » ; e é válida a
absolvição que ele .d á. l\'las ainda então,
como sempre, não pode faltar a dor dos pe­
cados cometidos ; se faltasse, de nenhum

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T R 1 B U N A L D A P E N 1T Ê N C 1 A 3óS

proveito seria a absolyição. Deus, infinita­


mente santo e justo, não pode perdoar o
pecado a quem o não detesta.
Deves, pois, excitar-te à dor oportuna­
mente antes de te ires a confessar, e com
toda a solicitude preparar na alma o sincero·
arrependimento antes da confissão. O que
não quer dizer que com ansiedade e esforço
inútil te metas a provocar em ti uma dor
sensível ou a · arrancar lágrimas dos olhos .
. As lágrimas são dom de Deus para estimar,.
mas não são necessárias para alcançar o p er­
dão dos pecados. O arrependimento esta na
vontade e não na sensibilidade. Quem está
repeso dos pecados cometidos e verdadeira­
mente resolvido a não pecar mais, sossegue,
pois tem a contrição precisa para bem re ...
ceber o Sacramento.
O firme propósito de emenda é a pedra1
de toque do arrependimento tanto dos pe­
cados mortais como dos veniais. Por isso
quando duvides se estás verdadeiramente
arrependido, vê se te anda na alma a boa
resolução de não mais ofender o Serihor, de
caso pensado. Se te encontras assim resol­
vido, a tua contrição é boa e verdadeira.
Talvez digas : cc M as vá eu lá saber se
.estou verdadeiramente disposto ; bem que­
ria estar, mas por mais que faça parece-me·
que não consigo» . Não . te perturbes·, pois
j á estás bem disposto . Esse desejo é já
arrependimento de real valor.
Um exemplo melhor ajudará a compreen-

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3u6 O CRISTÃ O NO

-der t:sta doutrina : Porque queres fazer uma


-confissão bem feita, pedes ao confessor que
·te ajude a excitar. à contrição. E per­
_ gunta-te ele :
- Estás arrependido de todo o coração ?
"Tens pena ou pesar de ter pecado ?
- Era esse o meu desejo. Sinceramente
-e de todo o coração o quisera, pois, pecando,
- ofendi a Deus .
·

- E estás disposto a deixar o pecado ?


- Sim, tanto quanto possa empregarei
·OS meios para não tornar a ofender de libe­

radamente a Deus.
Alma cristã, se és sincera no que dizes,
.já estás contrita, podes ir a confessar-te.
Acusando-te dos pecados graves cometidos
. desde a última confissão ou, não os tendo,
. dos pecados graves da 'vida passada (estes
só quanto à espécie), farás uma con fissão
bem feita desde que te mova,s à dor dos pe­
-cados do modo que fica dito.

Diversa virtude e eficácia da contrição e


.atrição.
Quanto mais altos os motivos da con­
·trição, tanto maior a sua eficácia.
A contrição imperfeita ou atrição que se
funda na caridade imperfeita, só por si não
.c hega para apagar .os pecados mortais. Mas
· .quando alguém com contrição imperfeita re­
.cebe os sacramentos da Penitência ou Ex-

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TR IBUN " L D A PE NITÊNCIA 36t

trema-Unção, logo alcança o perdão de todos


os pecados mortais que haja cometido .
. Para . que a confissão fique bem feita e
portanto nos perdoe os · pecados, basta que
tenhamos atrição ; mas bem está que não
nos contentemos com tão pouco e sempre
nos esforcemos por chegar à contrição per­
feita . que nos traz maiores bênçãos do · céu,
mais consolações espirituais, pois maior é
nela o amor da alma para com . Deus e de
Deus para com a alma, e nos perdoa até a�
penas temporais merecidas pelo pecado.
Quando um enfermo se não pode con­
fessar, também a Extrema-Unção, recebida
com atrição, perdoa os. pecados mortais.
Alguérµ por exemplo, perde os sentidos ;
vem o· sacerdote e ministra-lhe a Extrema­
-Unção. Se havia dor, embora imperfeita,
dos pecados mortais que tivesse cometido,
todos eles lhe foram perdoados.
Note-se �em todavia : para que a Ex­
trema-Unção seja assim eficaz, . é necessário
que o . enfermo tenha dor dos pecados, ao
menos imperfeita ; e que portanto, antes de
perder os sentidos, nela se tivesse excitado
quer nas orações quotidianas quer noutras
circunstâncias. E se recupera os sentidos
deve confessar na primeira confissão os pe­
cados graves que lhe foram perdoados no
sacramento da Extrema-Unção.
Fora dos sacramentos da Penitência e
Extrema-Unção, s6 a contrição perfeita nos
alcança o perdão .dos pecados mortais . Da-

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368 O C R J S T ,\ O N O

qui se vê a grande conveniência que há em


receber estes sacramentos. Quem os recebe,
mais fàcilmente assegura a vida _eterna.
Para a remissão dos pecados venia1s,
basta a contrição imperfeita.
Demos graças ao Senhor por nos ter chamado
à sua Igrej a ; e em prova da nossa gratidão, cum­
praµ10s com prontidão e alegria os deveres que
nos impõe a Religião e suportemos de boa mente
as humilhações que por ventura a confissão nos
causa.

A contrição perfeitâ que nasce do per­


feito amor de Deus, apaga sempre todos os
pecados mortais e veniais mesmo sem a
confissão, desde que haja a vontade, ao me­
nos implícita, de acusar os pecados mortais
na primeira confissã<? que se fizer. Quando
não há facilidade de receber os sacramentos
da Confissão e Extrema-Unção, a dor per­
feita chega, portanto, para nos pôr em graça
de Deus.
A confissão que se faz com a contrição
p erfeita é riquíssjma de graças e bênçãos
espirituais.

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CAPIT U LO ill
. '

_i . '.�. '
'

)·.<

A contrição perfeita., ãnc.o ra , _de


··
salvação para m u itos:
As mortes repentinas enchem-nos sempre de
graves apreensões, sobretudo então quando sa­
bf amos que o defunto andava em vida de pecados.
Em que estado terá aparecido diante do Se­
nhor ? perguntamos a nós mesmos. Se ao menos
tivesse recebido os últimos Sacramentos ! . . .
De tão naturais.apreensões tira para ti lição, e
não deixes que a frequência das mortes repentinas
te embote a sensibilidade.
Quando ouvires contar : « morreu fulano ; es­
tava a comer ; foi a dormir. Quem havia de dizer
que tão depressa iria ?», lembra-te que talvez um
dia se dirá de ti o mesmo, e passa à resolução prá­
tica de viver de modo que sempre o Senhor te en­
contre preparado para compareceres no seu divino
Tribunal.
c1Andai sempre apercebidos, diz o Senhor, por­
que à hora que não cuidais, virá ·o Filho do ho­
mem». (1) Sim, anda alerta, levando vida verda­
deiramente cristã. E se qualquer vez; tiveres a
desgraça de cair em culpa grave, procura logo re­
conciliar-te com Deus por um acto da contrição
perfeita.
Dirás porém : Quem me dera poder chegar ·a
fazer actos de contrição perfeita 1 Mas, por m ais
que tente, não sou capaz.
. Engano teu. Se com boa vontade procuras a
Deus� não te será diftcil chegar à contrição per-

(1) Luc. 12,40.


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O CRISTÃ O NO

feita. Deus não falt a com a sua graça a aju�t'ar-te,


e para a dor ser perfeita não se requer uma cari­
dade suma ou impossível.
A contrição perfeita de si não exclui os mo­
tivos de naturez"a · pessoal, e portanto pode andar
junta com a contrição imperfeita. E é esta até,
como j á "dissemos, que prepara o caminho à con­
trição perfeita que por sua vez a eleva e enobrece.
Quanto melhor conheceres e amares a Deus
como supremo Bem infinitamente amável, t anto
melhor compreenderás o dano que te causa o pe­
cado, pois te rouba a Deus e o paraíso e te condena
ao inferno para sempre. E deste mo'do, quanto mais
amares a Deus, mais aborrecerás o pecado ainda
por causa das suas funestas consequências, pois
bem natural é temer-se o inferno e desejàr-se o céu.
Para a contrição ser perfeita, b asta que Deus
sej a o motivo do teu . arrependimento, e só por Ele
aborreças e detestes o pecado É perfeita a con­
trição sempre que de verdade possas dizer : «Meu
Deus, porque sois infinitamente bom e Vós amo de
de todo o meu coração, pesa-me de Vos ter ofen­
dido, e, com o auxilio da Vossa graça, proponho
firmemente emendar-me e nunca mais Vos tornar
a ofender».
Mais ainda : Os pecados graves tornam-nos de­
sagradáveis aos olhos de Deus e roubam-nos o seu
amor ; os veniais, embora esfriem a amizade de
Deus para connosco, não nos roubam o seu amor.
E por isso pode haver arrependimento dos pecados
graves só por amor de Deus, sem haver arrependi­
mento dos pecados leves. E-tal amor de Deus que
te leva a detestar o pecado grave, também é amor
perfeito, embora não o sej a em sumo grau.
Dissemos que para a contrição perfeita nos
perdoar os pecados graves, se requer a intenção de
o s confessar. Não se exige, todavia, que tal in­
tenção seja expressa por pala.vras, com dizer por
exemplo «Quero confessar todos os pecados mor­
tais que cometi», pois j á está i mplícita ou incluída
no arrependimento que nasce do amor de Deus.

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TR1 BUN AL D A P E N1TÊ N C1 A 37 1

Quem aina a D é us sobre todas as coisas; de­


sej a cumprir os seus preceitos, ao menos os . que
obrigam gravemente como é .e ste de confessar to­
dos os pecados mortais ; e portanto já a intenção
de os confessar está :.implicitamente incluída na
contrição perfeita, embora a não· lembremos ex­
pressamente.
Também se não requer que haja intenção de
·

confessar os pecados graves o mais depressa pos­


sfvel. Basta a intenção de os declarar na primeira
confissão. Podes assim esperar pela contissão que
tenhas de fazer ou para cumprir o preceito pascal
ou para receber qualquer dos sacramentos cha­
mados sacramentos de vivos.
Todavia se assim podes proceder, melhor será
que quando te excitas à contrição perfeita, renoves
o propósito de te confessar logo que possas, p ara
maior segµrança e quietaÇão de consciência e
porque a confissão te dará as. gra ças que ajudam
no combate ao pecado.
Como nos acidentes · corporais não te contentas
com quaisquer socorros prestados à pressa, · mas
logo a seguir chamas médico experimentado e sa�
bedor; assim bem será que acontecendo-te a des­
graça de cometer quaisquer pecados graves, logo
faças acto de contrição perfeita que te dê o perdão
de Deus, e que cuides de te confessar apenas tenhas
ocasião, embora não sej a de obrigação tanta pressa.
Obrigação ·é, sim, declará-los na primeira confissão
que faças, pois assim é o preceito de Deus de que
nem a contrição perfeita te pode dispensar. Tanto
mais que., se de veras amas a Deus e por seu amor
·t e arrependes dos pecados cometidos, logo por
isso sentirás a necessidade de os confessar quanto
antes.
Faz com frequência actos de contrição. E se
nisso encontras dificuldade, pede a Deus te con­
cedã a graça do perfeito arrependimento. E depois
da comunhão reza aquela oração tão comovedora
e enriqueé1da de indulgências : c<Eis-me · aqui, ó
meu bom e dulcfs·simo Jesus . . . meditando nas
>>

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O C RISTÃO N O

verdades eternas, sobretudo na bondade de Deus e


no muito amor de Jesus crucificado.
O exercício continuo tudo facilita. Repete o
acto de contrição principalmente à noite quando
te vais deitar. Assim habituado a andar em ver­
dadeira contrição, se por desgraça caísses_ em pe­
cado mortal, levantar-te-ias com mais faciHdade ;
e se a morte te apanhasse antes de te confessares,
fácil te seria fazer um perfeito acto de contrição
naquela hora solene em que ·é preciso empregar
todos os meios de assegurar a salvação.
E quando a hora aa morte se aproximar, não
te perturbes. Examina a tua consciência ; e se nela
te pesar qualquer pecado grave, e não tiveres oca­
sião de te confessar, recorre ao meio que tens ao
teu dispor para assegurar a salvação eterna : faz
um acto de contrição perfeita.
E se vires alguém em perigo de vida e não
houver sacerdote · que possa acudir, não percas o
sangue frio ; ajuda-o da melhor maneira que sou­
beres, a fazer actos de Fé, Esperança, C aridade e
contrição perfeita. Mesmo que te pareça que já
não ouve nem percebe, não deixes de lhe segredar
ao ouvido, clara e distintamente o acto de con­
trição.
Um pai de família teve hemoptise violenta.
O criado correu a chamar o sacerdote, e entre­
tanto o filho mais novo (tinha feito há pouco a
primeira comunhão e fixara bem nas aulas de ca­
tequese a necessidade e eficácia da contrição) pega
do crucifixo que estava dependurado na parede,
chega-o aos lábios do pai e começa de recitar em
voz alta o acto de contrição. O enfermo derrama
lágrimas de comoção e· expira, salvo para a vida
eterna, antes de o sacerdote chegar.
Imita esta criança, e pode bem ser que o teu
acto de caridade salve o moribundo. A tua pa­
lavra pode tocar-lhe o coração, fazê-lo entrar em
si, ajudá-lo a arrepender-se dos pecados e alcançar
a vida eterna.

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CAPIT U LO IV

Do p ropósito de emenda

« Olha que já estás são ; vê lá não pe­


ques mais, para que te não .suceda alguma
coisa pior» , (1) disse Jesus ao paralítico que
curara. E à adúltera foi da mesma forma
que a despediu : «V ai e não peques mais » .
Estas palavras de Jesus a·p Jicam-se a
todos nós (e portanto também a ti, ó cristão)
todas as vezes que no sacramento da con­
fissão nos são perdoados os pecados : «.V ai
e não tornes a pecar» .
Portanto quando te preparas para a con­
fissão não te esqueças de reavivar o propó­
sito de não tornar aos pecados cometidos e
de evitar no futuro todos os pecados. O bom
propósito ou vontade séria de emenda tem
de andar sempre junto cotn a contrição,
ou melhor, dela faz parte. A dor dos pe­
cados e o propósito de emenda andam tão
unidos que não há um sem o outro • · a dor
é a detestação dos pecados cometidos no
passado, e propósito é o protesto de a eles
não tornar no futuro.

(1) João s, q .
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O CRISTÃO N O

Qualidades do bom propósito

O propósito é a vontade decidida de nos


emendarmos, e portanto a resolução firme
de fugir . do · pecado . em todas as ocasiões e
circunstâncias. Por isso . se diz que o pro­
pósito tem de ser
fi rme.

Se alguém dissesse « Queria deixar o pe­


cado, bem desejava emendar-m e » , nem por
isso teria propósito firme e com valor. Tais
expressões significam apenas um desejo vão.
Note-se, porém, que o temor de recair
(e que tristes lições nos dá a experiência da
nossa fragilidade !), o receio de não sermos
.... .

capazes de manter as resoluções tomadas a


pesar da nossa boa vontade, em nada inva­
lidan1 a firmeza do propósito. O propósito
é firme, sempre que convictamente e de veras
podemos afirmar :. «Apesar de . me saber tão
frágil e de tantas vezes ter recaído em culpa,
hoje tenho vontade sincera de evitar o pe­
cado, sempre e a todo o custo » . A vontade
actual é a que decide da firmeza do propó­
sito ; � · as possibilidades futuras só lhe tira­
riam a firmeza se ao presente fossem pre­
vistas e consentidas.
O propósito, como a contrição, deve es­
tender-se a todos os pecados mortais, isto é
deve ser
universal .

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TR1 BUNA L DA PE N1TÊNC1 A 375

Mas quanto aos pecados veniais, há a


repetir o que se disse a respeito da con­
trição. Se' quando nos vamõs a confessar'
apenas nos pesam na consciência pecados
ve.n iais, para que a confissão seja bem feita,
e portanto eficaz, é preciso que estejamos
no propósito firme de emendar alguns ou
algum desses pecados ou ao menos de fa­
zermos quanto pudermos para de futuro
serem em menor número. E assim pràti­
camente podes ficar sossegado sempre que
te propões tornar mais raras as transgressões
veniais ou empregar mais diligência e atenção
em te livrar delas.
E se até agora te tens arrependido de
todo o coração dos pecados veniais . em geral
com a resolução de não os tornar a cometer
para não ofenderes a Deus, descansá, pois
as tuas confissões foram bem feitas .
O propósito é a vontade séria d e emenda,
e portanto deve ser
efi caz.

Ora «quem quer os fins, quer os meios» .


O doente, para recuperar a saúde, toma os
remédios convenientes, e depois, não vá re­
cair, guarda-se de tudo que l he possa fazer
mal . Nem o simples desejo de curar lhe
daria a saúde, como també·m o só desejo de
não recair o livraria de tornar à doença que
o atormentou .
O mesmo sucede na vida espiritual. Quem
quer curar-se dos pecados e prevenir as re-

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O CRISTÃO NO

caídas, tem de empregar os meios necessá­


rios e de se rodear das precauções devidas.
Se tens a intenção, ao menos implícita, de
utilizar esses meios, podes ir a confessar-te
pois com fruto receberás o sacramento. Mas
se não estás assim resolvido, então não te
confesses, pois a confissão seria um sacri­
légio acrescentado aos pecados cometidos.
E quais são esses meios ? Primeiro :
a dócil obediência aos conselhos e avisos do
confessor. Ele que bem conhece o estado
da tua alma, sabe dizer o que te convém .
Depois vêm os meios gerais da salvação
e da graça que Deus deixou à disposição de
todos nós : a oração, a frequência dos sa­
cramentos, a assistência à pregação e a boa
leitura .
Mas ainda isto não basta. Que aprovei­
tariam os remédios ao doente atreito a cons­
tipações, se se expusesse a todas as intem­
péri�s ?
E tal qual nas coisas da nossa alma.
Que nos aproveitariam os remédios, se a
todo o momento nos metêssemos em oca­
siões perigosas ? Foge de todas as ocasiões
que até agora te têm arrastado ao mal ou
que possam de futuro arrastar-te ; só assim
teu propósito será eficaz.
A dor e o propósito devem estender-se
.

não só aos pecados cometidos mas também


às suas conse·quências. Só tem bom p ropó­
sito de emenda, quem está disposto a ren1e­
diar, quanto possível, os danos que seus

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T R1BUN A L D A PE NJT ÊNCl A 3 77

pecados _ causaram . Na alma não se apagam


os pecados, quando não se está . resolvido a
remediar seus maus efeitos.
À dor e ao propósito deve andar junta a
esperança do perdão que impllcitamente ne­
les se inclui.
Modo prático de nos excitarmos à dor
e bom propósito antes da confissão.
1 Terminado que for o exame de cons­

ciência, pede a Deus a graça da contrição.


Se te encontras emped ernido e tão apegado
ao pecado que te julgues sem forças para o
deixar, reza até que a alma se te mova ao
arrependimento e tome a resolução de · êi
todo o custo fugir do pecado.
2 . Não deixes para o confessionário o
excitares-te à dor e bom propósito ; . a eles
te excita antes de te ires a confessar. E certo
que, para tanto, basta um momento ; mas,
em negócio tão importante, todo o risco é
perigo e irreverência . Se a]guma vez te. for
preciso começar a confissão antes de te ex­
citar à dor e bom propósito, pede ao con­
fessor que nesse particular te ajude.
3 . Para te excitares à contrição, pensa
nas._ verdades eternas que mais te possam
mover ao bem. Se estás animado de lim
grande a:mor de Deus, não te percas em
longas reflexões · sobre o inferno, o purga-

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O C RI S TÃ O N O

tório ou a perda do céu ; mas deixa-te em­


balar nesse amor de Deus, até que dele te
brote na alma o arrependimento. Mas se o
teu amor de Deus é débil, demora o espírito
na consideração do inferno e do purgatório,
a fim de que o temor de Deus abra ca­
minho ao seu amor. E para mais eficaz­
mente te moveres, lembra a bondade qu\!'
Deus contigo tem usado e sobretudo a Pai­
xão de Cristo. E nunca te contentes com
a atrição desde que possas chegar à con­
trição perfeita.
4. A penitente Santa Maria Madalena,
entrou em casa do fariseu onde Jesus se en­
contrava, diz o Evangelho, e « pondo-se a
a seus pés por detrás dele, começou a re­
gar-lhe com lágrimas os pés, e lhos enxugava
com os cabelos da sua cabeça, e lhe beijava
os pés e os ungia com bálsamo» . (1) Era
bem verdadeiro o seu pesar. E todavia,
abismada na sua dor, desfeita em lágrimas,
nem se atrevia a dizer a Jesus que estava
arrependida e que sobremaneira o amava.,
S. Pedro, em casa do sumo sacerdote
Caifás, três vezes negou o Mestre. Quando
o galo cantou, lembrado de que lhe dissera
o Salvador «antes de cantar o galo, três
vezes me negarás » , (2) saiu fora e chorou
arnargan1ente . E não consta do Evangelho

(1) Luc. 7,38

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T RI B U N AL D A P E N I TÊ N C I A 37g.'

que tentasse sequer traduzir em palavras a


imensidão da. sua dor.
A dor não está, pois, Iis ada a qualquer­
fórmula ou dizeres. Todavia bem está que
aprendas alguma fórmula de acto de con­
trição, que te sirva de guia e de arrimo.
Podes, por exemplo, usar esta fórmula do
catecismo português :
«Meu Deus, porque sois infinitamente
bom e porque Vos amo de todo o meu
coração, também pela Jealdade do pecado,.
·perda do paraíso e temor das penas do in­
ferno, pesa-me de Vos ter ofendido e, com
o auxílio da Vossa divina graça, proponho
firmemente emendar-me e nuhca mais Vos
tornar a ofender ; peço e espero o perdão
das minhas culpas pela Vossa infinita mi­
sericórdia. Amen » .
5 . Não te deves confessar sem,. antes,
ter feito o propósito de te corrigir ; mas se
te esqueceste de o fazer, nem por isso te·
deves afligir, pois, como j á . se disse, o arre­
pendimento sincero traz implícito o propó­
sito verdadeiro.
6. Não te contentes com qualquer pro­
pósito vago e geral , mas pr·opõe a emenda
nalgum porito particular e determinado. Não
te limjtes a prometer fugir do pecado, mas.
vai até prometer fugir também das ocasiões
que fora1n- causa das quedas passadas.

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380 O CRISTÁO NO

7 . As almas timoratas, e mais ainda as


escrupulosas, não se devem perturbar com
estes conselhos que se dão às almas be,m
formadas a fim de as ajudar a fazer uma
boa confissão. Para que a confissão seja
válida não é preciso ter presente no .espírito
tudo o que fica dito ; basta, sim, o seguinte
propósito : « Quero evitar o pecado a todo
o custo e empregar todos os meios para me
corrigir» . Aconselho, porém, insistentemente
que se desça sempre a resoluções particu­
] ares e práticas.
Lemos na vida de Santo Ambrósio a edi­
ficante narrativa da conversão de um jovem.
Levava e1e, havia anos, vida dissoluta.
E nem rogos nem exortações nem ameaças
puderam decidi-lo a abandonar a companhià
pecaminosa em que andava.
Providencialmente teve de ausentar-se da
sua terra, e tocado da graça divina, qual filho
· pródigo chorou amargamente seus passados
desvairios e prometeu seriamente deixar a
companheira dos seus pecados. E, renovado
com estes bons sentimentos, voltou a casa.
Graves perigos o esperavam, como é de
ver, pois ainda vivia aquela com quem an­
dara em má vida. Soube ela do seu regresso,
e logo se apresentou para lhe dizer que não
o esquecera e ainda lhe devotava o mesmo
amor. Mas o mancebo nem sequer para ela
olhou.
- O quê ? perguntou ela admirada. En­
tão j á me não conheces ? Eu sou a mesma . . .

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TR1B UN AL DA PE N lTÊN Cl A 381

- Serás ainda a mesma, não contesto,


respondeu . o jovem. Agora eu é que já não
sou o mesmo.
Puderas tu, ó cristão, depois de confes­
sado dizer também assim : «Eu já não sou
o mesmo» .
Segue os conselhos e doutrina que aqui
te deixo, frequenta os sacramentos, e verás
como depressa r<[nascerá em ti um homem
novo que na virtude perseverará.
Ainda sobre o propósito : as ooasiDes
de pecado.

«Confesso-me. com frequência. Sincera­


mente arrependido das minhas culpas, tomo
santas e sérias resoluções, e apesar de tudo
continuo a recair muitas vezes no pecado.
« Como poderei tomar a sério o qµe me
diz a Igreja e me ensinam os padres a res­
peito da eficácia da frequência dos sacra­
mentos ? »
Assim falam às vezes alguns desalen­
tados. E tu, leitor, talvez sejas também do
número destes.
«Na experiência me fundo, dirás. Estou
farto de fazer bons propósitos ; e apesar
disso vem a ocasião, apanha-me em fra­
queza, e caio outra vez no pecado» .
Será verdade o que afirmas ? Não an­
dãrá aí exa g e�o ? Seriam os teus propósitos
assim . tão firmes co1no dizes ? Vê lá bem !
O propósito - deve ser eficaz. Não o foi o

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382 O C R 1 S T Á· O •N O

teu. Sê sincero e diz-me se não faltaria


.nada ao �eu propósito. Talvez não seja de
todo certo o que dizes : que apesar dos teus
.m elhores propósitos, não houve emenda. De­
.pois de bem pensadas as coisas, pode ser
que te vejas obrigado a bater no peito :
«<minha culpa, minha culpa, se dos sacra­
.mentas não tirei o fruto .q ue esperava» .
J á expliquei. o que seja propósito eficaz.
Não vou agora tornar ao mesmo assunto,
'mas apenas aprofundar um tanto a doutrina
..que ficou esboçada e é de suma importância,
. acerca das ocasiões de pecado.

. Que se entende por oc.asião de· pecado ?


E toda a pessoa,. objecto ou circunstância
.ext�rna que nos põe em risco de pecar.
Se o perigo é . Pequeno, isto é� se ordi­
·nàriaipente não arrasta ao pecado, diz-se
·então que a ocasião é remota. Dada a cor­
.rução da nossa natureza, tudo pode ser oca­
sião remota de pecado, até as coisas mais
. inocentes. E por isso impossível seria, evitar
.todas estas ocasiões . E ao que nos é im­
,possível, é de ver que não estamos obigados.
Se, pelo contrário, tais pessoas, objectos
· ou circunstâncias externas nos levam com
.frequência a pecar, então chamam-se oca­
. eiões próxim.a s de pecado.
Há ocasiões próximas de pecado, que por
:.s u a natureza de tal modo atraem a vontade,
· já de si tão debilitada, ·que quase sempre
�acabam no pecado. Estão neste númerp as

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T R I B U N A L D A P·E N I T Ê N C I A 383

demasiadas familiaridades com pessoas dé


outro sexo, a leitura de certos livros imorais�
e pornográficos. Seja quem for que se ex­
ponha a tais . ocasiões, quase sempre vai até
pecar.
Outras ocasiões próximas de pecado arras­
tam apenas· a certa classe de pessoas ; para
as demais podem ser inofensivas. Por _.exem­
p lo : ir à taberna é ocasião próxima de pe�
cado para quem tenha o mau hábito de ali
se embriagar, envolver em rixas e ba·rulhos
ou desatar em más palavras. Para outras
pessoas pode não ser perigo nenhum. Assistir
a bailes honestos é ocasião próxima de pe­
cado para quem j á sabe que ordinàriamente,
ou l á ou depois, consente em tei;itações im­
puras ou pratica qualquer pecado. grave.

O bri gação de evi tar a ocasião próxima de pecado ..

Nem a lei natural nem a lei divina per­


mitem, sem capsa grave,_ expor a perigo erni�
nente a vida da alma, como também não
permitem expor a perigo a vida do corpo.
E portanto peca quem voluntàriamente se
põe em ocasião próxima de pecado ou dela
não sai, podendo-o fazer. «Peca gravemente,
ensina Santo Afonso Maria de Ligório, quem
se · não retira da ocasião PJ."'.Óxima voluntária
de . pecado » .
- Mas dirás : « Que rigor aí va� ! Será
preciso proibir com _tanta severidade as oca­
siões próximas - de pecado ? Não bastaria,

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O CRISTÃO NO

em ocasiões de perigo, recorrer a Deus a


pedir-lhe auxílio ? »
Ora responde : Pode alguém brincar com
o fogo sem se queimar. ou tomar veneno mor­
tal e não morrer ? E do Espírito Santo a
sentença : cc Quem ama o perigo, nele pere­
cerá » . ( 1 )
David era um homem segundo o coração
de Deus. Salomão porque era piedoso, houve
de Deus, ainda na juventude, o dom da sabe­
doria. S. Pedro era apóstolo do Senhor, e
amava-o tanto que na última ceia todo ele
desatou em protestos de que seria fiel a Je­
sus até à morte. E é ver : a ocasião preci­
pitou a David no pecado de adultério, a Sa­
lomão nas redes da impiedade e da luxúria,
a S. Pedro na · negação do Mestre e Senhor
e no perjúrio. Se a estes sucedeu assim,
que irá ser de ti se levianamente te pões em
ocasião próxima de pecar ?
« Rezarei e invocarei o auxílio de Deus »,
responderás . E crês que Deus ajuda a quem
tão loucamente se mete no perigo ? Pensas
que Deus se fará cúmplice da tua temeri­
dade ? V ais, e · deitas-te de uma torre abaixo,
na esperança de que Deus te virá suster no
ar ? Ousarias pedir-lhe tal milagre ? Fazê-lo,
seria tentar a Deus. Pois da mesma forma
é tentar a Deus pedires-lhe que te não deixe
cair quando, sem precisão, te metes em pe­
rigo de pecar.

(1) Ecle. 3,27 .

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. TRIB U N AL D A PENITÊNCIA 385

Regras a o bservar na confissl1 a respeito das


ocasilJes do pecado.

Ensina Santo Afonso : ccPara a validade


da confissão não basta propor não tornar a
pecar, é necessário propor também fugir das
ocasiões próximas de pecar. Sem tal pro­
pósito, por mais absolvições que recebesses,
de nada te aproveitariam, pois é já de si
pecado grave não querer evitar as ocasiões
próximas de pecado mortal. Quem se con­
fessasse sem o propósito de evitar tais oca­
siões, cometeria mais um pecado grave e
sacrilégio » .
Por mais que nos digamos arrependidos,
se não fugimos das ocasiões de pecado, an­
damos a enganar-nos a nós mesmos e a
querer-nos cegar para não ver o perigo que
corremos. Receber o sacramento da Peni­
tência e ir logo dali para as ocasiões de pe­
cado, nem é sério nem é penitência : é querer
brincar com Deus.
Se até agora não julgavas de absoluta
necessidade evitar as ocasiões próximas de
pecado grave e te persuadiras que te bas­
tava a vontade de não recair em culpa, sos­
sega quanto ao passado porque também aqui
se aplica o princípio : « Ü homem será jul­
gado segundo a sua consciência» . Mas de
futu_ro não te desculpes com a ignorância,
dizendo : «não sabia» .
Poderias objectar : « Como é possivel
evitar todos os perigos de pecado ? Por

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386 O CRISTÃ O NO

ventura está sempre na mão do homem fu­


gir das ocasiões ? Não o obriga tantas vezes
a necessidade a expor-se a riscos e perigos
espirituais ? »
De facto às vezes encontram-se pessoas
e m ocasi_ão grave - de pecado e sem a poder
evitar. E um -irmão que tem de conviver
com os outros irmãos viciosos e corrom­
pidos que com seu mau exemplo o seduzem
ou até directamente o provocam ao mal.
E não há que fugir, pqis não pode aban­
donar a casa paterna. E o noivo ou noiva
que frequentemente caiu em pecado com
q uem deseja casar em breve, e não há que
fugir ao perigo pois não seria agora ocasião
de cortarem rel ações.
Em tais casos haverá obrigação de, a
todo o custo, deixar a ocasião de pecado ?
Com tão graves danos ou dificuldades,
com a l esão de outros deveres graves, com
notável prejuízo na reputação, não urge de
facto deixar abruptamente a ocasião pró­
xima do pecado. Urge, sim, a obrigação de
experimentar todos os meios e precauçõe�
para diminuir o perigo, urge premunir-se a
sério contra a tentação para não mais ceder
a ela ou, como costuma diz�r-se, transformar
em ocasião remota, a ocasião próxima de
pecar.
Quando de todo se não pode cortar com
quem nos serve de ocasião de pecado, há a
obrigação de firmar o propósito qe reduzir
ao indispensável o convívio, de nunca se en-

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TR1 B U N A L D A P E N 1T Ê N C1 A 387

contrarem os dois a sós e de adaptarem ou-


. �· .
tras medidas que no caso se imponham.
E haja o cuidado de orar com mais fervor
sobretudo no tempo. . da tentação, de fre­
quentar o sacramento da Penitência e sendo
possível sempre com o . mesmo confessor a
quem se exponha com toda a clareza a triste
situação criada, a fim de que ele possa bem
aconselhar e dirigir.
Se .a ssim conseguires ver-te livre de pe­
cados, sê contente. Mas, se experimentados
todos os meios, resultaram eles sem· fruto, e
em matéria grave cedeste à violencia da ten­
tação que a ocasião próxima desencadeou,
então não há mais remédio que cortar com
o perigo custe o que custar ou yenham daí
os danos temporais que vierem. E caso para
aplicares as palavras severas de Jesus : cc Se
o teu olho . te escandaliza, arranca-o e arre­
meça-o para· longe de ti. Melhor te será
entrar na vida com um só olho, do que,
com os dois, seres lançado no fogo eterno » .
Fosse ele a pessoa ou o objecto mais da
tua estima, desde que te pusesse em perigo
invencível de pecar, tinhas de te arredar
dele custasse quanto custasse,- pois melhor
será d eixar tal ocasião pecaminosa mesmo
com grandes sacrifícios temporais, do que
seres condenado a desgraça eterna.

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CAPfTU LO V

D a c o nfissão de boca
Conta o célebre missionário norte-ame­
ricano P. Weninger na sua obra « Ü Cato­
licismo, Protestantismo e Incredulidade » , que
atravessando em 1 853 o lag0 Michigam n a
companhia d e um pregador metodista, com
ele travou conversa. Falaram de muita coisa
e também da Confissão. E a certa altura o
metodista perguntou :
- E o Papa, também ele se confessa ?
- Pois é claro que também ele se con-
fessa,. respondeu o P. W eninger. .
O protestante ficou pasmo de admiração.
Pensava ele que nem o Papa nem os bispos
nem os padres se confessavam.
Pois, é verdade, todos os sacerdotes, não
exceptuando nem mesmo o Papa, para ha­
verem perdão dos pecados se confessam
como todos os demais fiéis. E é este facto
o melhor testemunho de que foi Deus. quem
instituiu a confissão e de que todos têm de
nel a decl arar suas culpas ; e é também ar­
gun1ento decisivo contra quem venha afirmar
ser a confissão instituição humana, uma coisa
inventada pelos padres.
Quem se vai persuadir de que os padres,
só para obrigarem os outros à confissão, a
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TRIBU NAL D A PE NIT ÊNCI A 38 9

si mesmos se tenham a ela obrigado ? Não


tivera ela sido praticada desde o princípio
d a Igreja, e viesse no correr dos tempos um
Papa ou bispo com a lembrança de a ,impor !
Com .certeza logo clérigos e leigos haviam
de repugnar inovação tão pesada e gravosa.
E , para mais, imposta não como assunto de
disciplina mas como doutrina de Fé. Por­
quanto é do ensino da Igreja que foi Deus
quem instituiu a confissão e a impôs como
necessária p ara se alcançar o perdão.
Fossem mesmo algumas dioceses a com­
binarem-se para impor o pesado jugo, nurica
a Igreja se lhe teria sujeitado .

. Q u � m . s� deita a afin?ar) que a �onfissão


foi mst1tu1çao humana, diga qual fo.1 o Papa
ou Bispo i nventor dela ou ao menos em que
época e nação começou de se praticar. Se
não sabe respond_e r, como se atreve a afir­
mar que é de invenção humana ?
Há quem digà ter sido o Papa Inocên­
cio III quem a instituiu no concíl io de La­
trã:o em 1 2 1 5 . Mas a asserção é gratuita.
As actas do concílio provam precisamente o
contrário,: que já a esse tempo se praticava
a confissão auricular. Os Padres do con­
cílio o que fizeram foi lastimar a tibieza e
indiferença sempre crescente dos fiéis a res­
peito dos sacramentos da Penitência e Eu­
ca6stia. E a remediar o mal, mandaram que
todos os fiéis os recebessem ao menos uma
vez cada· ano.
Se fosse preciso mostrar que a confissão

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O CRISTÃ O NO

não é de invenção humana mas misericórdia


concedida
' por Deus aos homens, aí estavam,
aI ém das provas da Sagrada Escritura, os
testemunhos de tantos Santos Padres, Dou-·
tores e escritores eclesiásticos e a prática
da Igreja .
·

Mas não dá pena insistir mais neste ponto.


Ao tiel cristão basta o ensino da Santa Igreja :­
« Se alguém disser que, para conseguir a re­
missão dos pecados, não é necessário, por
direito divino, confessar no sacramento da
Penitência todos e cada um dos pecados de
que haja lembrança d�pois de diligente exam e
d e consciência, ainda mesmo o s ocultos e os
que são contrários aos dois últimos manda­
mentos do Decálogo . . . seja anátema» . (1)

Que se deve confessar ?

Ensina a Igreja que é necessário con­


fessar todos e cada um dos pecados graves
de que haj a lembrança depois de feito dili­
gente exame, e além disso as circunstâncias
que lhes acrescentam nova malícia, ou, como­
se costuma dizer, mudam a espécie do pe­
cado.
Para fazer uma confissão bem feita há
portanto que decl arar :
a espécie dos pecados mortais cometidos ;

( t) Cone. Trid. Ses. XIV, can. ;.

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TR1 B U N A L D A PE N 1TÊ N C1 A 391

as circunstânCias agravantes da sua mà­


lícia ;
e o seu número.
Acus.ar a . esp ecie dos pecados mortais é
dec] arar contra qual mandamento se pecou
gravemente, e se foi por pensamentos, por
palavras ou por obras.
Assim não se confessaria bem quem sim­
plesmente dissesse : « cometi pecados mor­
tais » . Há que dizer que pecados foram, isto
é, qual o mandamer.�0 que se transgrediu.
Não se confessaria bem quem dissesse :
cc faltei ao jejum» ; mas havia que declara�
se foi por fazer várias refeições em dia de
jejum ou se foi por comer de carne em dia
de · abstinência.
Não se confessaria bem quem dissesse
apenas « pequei contra a pureza» , pois de­
via . acrescentar se foi por pensamentos, lei­
turas, palavras, desejos, vistas ou acções, e
se pecou consigo só ou se com outrem do
mesmo ou de outro sexo.
Também não se confessaria como deve,
quem dissesse « pequei gravemente. contra
a caridade » , pois havia de se acrescentar
qual o mandamento que se transgrediu : se
foi com maus tratos, com ódios, com maus
juizos, detrações ou calúnias que se ofendeu
a caridade.
Aos pecados veniais, como adiante . se
dirá, basta. declará-los de uma maneira geral .
Se até hoje assim não tens procedido,

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392 O C RISTÃO NO

nem por isso fiques j á a pensar que tens de


ir repetir as confissões passadas. Só esta­
rias obrigado a repeti-Ias, se tivesses a cer­
teta de que o confessor fez ideia errada dos
pecados que confessaste. Desde que . não
tenhas tal certeza, podes sossegar. E de
supor qu� o confessor compreendeu o que
lhe confessaste ; de outra sorte ter-te-ia ele
pedido os esclarecimentos precisos, como é
sua obrigação fazer quando nota que o pe­
nitente não sabe confessar as espécies de
pecados. Todavia de futuro atém-te a estas
normas para poderes pl enamente descansar.
Acusar as circunstâncias agravantes da.
malícia do pecado mortal ou, como costuma
d izer-se, as circunstâncias que mudam a �s­
p écie de pecado, é decl arar qualquer cir­
cunstância que muda em pecado grave a
falta que de s i era venial ou que acrescenta
ao pecado mortal outra malícia grave. Al­
guns exemplos :
Maltratar ou injúriar o próximo, é P.e ­
cado contra a caridade. l\las, se o próximo
a quem maltrataste ou injúriaste era o teu
superior, então hás de declarar esta circuns­
tância : a falta de caridade tem malícia mais
grave, pois com ela ofendeste também o
quarto mandamento.
Se em presença de .outrem, injurias a
alguém ou lhe l anças em rosto suas faltas
ocultas e desonrosas, o teu pecado não é
simples injúria, mas é injúria e detracção.

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T R I B U N A L D A. P E N I T Ê N C I A 3g3

E só o confessas bem, se disseres : ccEin


presença .de tantas pessoas, lancei em rosto
a alguém suas faltas ocultas e infamantes » .
Por vingànça, caluniaste o próximo e
assim conscientemente lhe causaste dano na
reputaçã'o ou nos bens de • fortuna� Ofen­
deste o sétimo � oitavo mandamento, e . para
bem te confessares deves declarar o teu de­
sejo de vingança, a cal únia e o prejuizô cau­
sado, acusando-te· : «Para me vingar, calu­
niei gravemente o próximo e prejudiquei-o
na sua posição ou fortuna» .
S e és casado e com alguém pecaste con­
tra o sexto mandamento, faltaste também à
fidelidade conjugal, e por issó na confissão
estás obrigado a declarar que és casado e
se também o era a pessoa com quem pe­
caste.
A mentira de si é pecado leve ; mas se
com ela pretendesk causar grave dano ao
próximo., deves declarar esta intenção ma­
ligna, pois cometeste um pecado grave.
Palavras ou liberda jes menos decentes
entre cônjuges podem não passar de pecado
l eve. Mas se tais palavras foram ditas ou
tais liberdades foram praticadas em presença
dos filhos, houve escândalo grave que ' é pre­
ciso declarar na confissão.
Quando se trata de pecados veni.ais., não
há obrigação de confessar as circunstâncias
agravántes, desde que não sejam daquelas
que os transformam em pecados graves.
Quando não sabias que tal ou qual · cir-

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O CRISTÃ O N O

cunstância mudava a espécie de pecado, não


te aflijas e singelamente declara o que sobre
o caso pensavas quando cometeste o pecado.
Procedendo .assim, tudo . · fica certo.
E a repisar doutrina j á tantas vezes re­
petida, lembremos que quem não adverte
que tal ou qual circunstância ajunta ao pe­
cado nova malícia, não é dela responsável.
Para que haja pecado ou agravamento do
pecado é preciso a advertência. Se igno­
rávamos esse acréscimo de m alícia, não há
obrigação de a confessar, e basta declarar o
pecado, como ele nos pesa na consciência .
Esta advertência é sobretudo útil para
as pessoas de idade a quem ·pode suceder
que, pensando agora nos pecados da juven­
tude, lhes apareçam eles com malícias que
então não advertiram . Não têm de que se
a fligir por isso. Pel a consciência que então
tinham , das coisas, é que se media o pecado ;
e portanto não têm por que anda r agora a
remexer na vida passada.
Confessar o niímero dos pecados mortais
é dizer quantas vezes se repetiu determinada
cul pa grave . Em juizo, quem cometeu um
furto não é réu de pena tamanha como quem
cometeu uma dúzia deles. No juizo de Deus
é a mesma coisa . Dois crimes não contam
como se fossem um só.
Todavia pode suceder que te sej a im­
possível saber o número exacto d as vezes
que .repetiste o mesmo · pecado. Em tais

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TRI B U N A L D A P E NIT Ê N C IA 3g5

casos basta declarar o número aproximado,


ou quantas vezes pouco mais ou menos re­
petiste o pecado em cada semana, em cada
mês ou e.m cada dia. E se nem um cálculo
é po$,sível fazer, .basta que ..�onfesses se re-·
petiste o pecado poucas ou muitas vezes ou
quanto tempo durou o mau hábito.
Se alguma vez, por não sabere� o nú­
mero certo dos pecados, confessaste que
« pouco mais ou menos terias caído tantas
vezes )) , mesmo que depois te certifiques que
foram em maior número n.em por isso deves
repetir a confissão. Mais claro : foste-te a
confessar e disseste : « por descuido faltei à
missa aí uns cinco domingos pouco mais ou
menos» . Recordas-te depois que não foram
cinco as faltas, mas seis. Não tens que re­
petir a confissão : com dizer «cinco pouco
mais ou menos)> , j á acusavas os seis que de
facto foram. E se tivesses acusado «cem
vez�s pouco ·mais ou menos)> e depois ave­
riguasses que foram cento e dez, também .
teria ficado bem feita a confissão e não seria
preciso repeti-la.
Outro caso : confessaste-te ; e, depois,
arrastado por desgraçada paixão ou mau
hábito, caiste em pecado muitas vezes
. . du-
" .....
rante um mes e no mes segumte mais raras
vezes. Não és capaz de calcular quantas
vezes pecaste. Confessando-te assim, con­
fessas-te bem : « durante um mês caí em tal
pecado muitas vezes, e no mês seguinte
menos vezes )) .

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3 g6 O CRISTÃO NO

Ainda outro exemplo : De há dois meses


para cá deste-te a más leituras, e horas in­
teiras ou até quase dias seguidos, entreti­
veste o espírito em maus pensamentos e de­
sejos. Ao fim caíste em ti, e · duas semanas
há, começaste de te emendar, mas ainda
várias vezes ao dia voltou a tua fraqueza a
demorar tais pensamentos. e desejos. Não
podes calcular o número de pecados come­
tidos, e por isso singelamente acusas que
durante umas seis semanas te entretiveste
muitas vezes e por muito tempo em leituras,
pensamentos e desejos maus, e depois come­
çaste a ter mão em ti, .m as ainda algumas ve­
zes caíste nas duas semanas que se seguiram .
E feita assim a confissão, está bem feita
quanto a esta exigência de confessares o nú­
mero dos pecados. Confessaste-te do melhor
modo que sabias, e é quanto neste caso basta.
Os penitentes deviam confessar por si a es­
pécie, o número e circunstâncias de pecados come­
tidos e poupar assim ao confessor o trabalho de
lhes estar como que arranc ando todas estas coi­
sas em interrogatório que frequentemence se vê
obrigado a fazer. Tu, cristão, procura neste ponto
cumprir o teu dever e poupar ao confessor tempo
e fadiga e aos outros que esperam vez, o desgosto
de demorares tanto.

Casos em qu'8 se pode abreviar a


confissão dos pecados mortais.
Acha-se alguém, de repente, em perigo
de vida. E o sacerdote, chamado à pressa,

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T R I B U N A L D A P E N IT Ê N C I A 397

apenas tem tempo de dar a absolvição. Em


tão a:p ertado transe, basta que se confesse
o penitente de um ou outro pecado em par­
ticular e de todos os demais em geral ; e se
nem para tanto houver tempo, basta que
mostre ao sacerdote por qualquer sinal ex­
terior o arrependimento, e ele o absolverá.
O mesmo se fará nas enfermarias dos
hospitais, quando pela proximidade dos· lei­
tos, haveria perigo de os demais doentes
ouvirem · a confissão.
· Quando o confessor não entende a língua
do penitente, se não há ali outro sacerdote
que a conheça, absolve-o desde que de qual­
quer forma o penitente se lhe mostre arre­
pendido.
Deve, porém, notar-se que em · todos es­
tes casos, na primeira confissão que se fizer,
há obrigação de acl;Jsar todos os pecados que
não foi ·possível confessar daquela vez.
Há obrigação de confessar os
pecados venlais ?
Ensina a Igreja que também é de pro­
veito par� a alma a , confissão dos pecados
veniais. E de proveito para a alma, mas
não é de obrigação, porquanto, diz o con­
cílio de Trento, ecos pecados veniais podem
ser _ perdoados por muitos outros meios » .
Põr exemplo, s e deles te arrependes por
serem ofensas de Deus, logo te ficam per­
doados, ainda que não faças intenção de os

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O C R I S TÃ O N O

.confessar depois. O mesmo sucede quando


fazes um acto de caridade perfeita, pois nele
se inclui, embora não expressamente, o de­
sagrado e aversão a todo o pecado. Tam­
bém a atrição ou contrição imperfeita perdoa
·OS pecados veniais desde que lhes não con­
servemos apego .
D e muitos outros meios nos podemos
val"e r para alcançar o perdão dos pecados
veniais . Alguns deles :
Rezar o Padre-nosso e com fervor parti­
cular dizer : « perdoai-nos as nossas ofensas,
assim como nós perdoamos a quem nos tem
ofendido » . Assistir à missa oferecendo o di­
vino sacrifício em expiação dos pecados come­
tidos de que se está repeso ; ou receber a
Sagrada Comunhão preparando-se para ela
com actos de humildade, confiança e amor
de Deus. Dar esmola ou praticar qualquer
outra obra de misericórdia no intuito de al­
cançar de Deus o perdão das culpas. Exer­
citar-se em qualquer acto de penitência, em
desconto e expiação dos pecados. Praticar
a virtude contrária à falta que se cometeu,
com o protesto de no futuro ser mais acau­
tel ado a fim de não tornar a cair.
De todos estes m odos podemos haver o
perdão dos p ecados veniais em que tenhamos
·c aído e até a remissão de toda ou de parte
da pena temporal devida ao pecad0. O essen­
cial no caso é juntar a estes actos de piedade,
de amor de Deus ou de caridade, a detes­
tação de cada um dos pecados para os quais

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.

TRI BUNAL D A P E NITENCIA 3gg

se implora o perdão, o propósito de emenda,


e desejo de viver ma.is · unido a Deus.
Todavia, cumpre fixar bem, o meio mais
fácil e seguro de obter o perdão dos pecados
veniais cometidos e a remissão das penas
que lhes são devidas, é sempre a confissão
contrita. Além disso não esqueçamos nunca
que a confissão, além do perdão dos pecados, .
dá força e vigor para vencer no futuro as
tentações e particular graça para se perse­
verar no bem.
Portanto convém que no tribunal da Pe­
nitência acuses, contrito, não só os petados
mortai�.. mas ainda os veniais. Todavia
nunca confundas as coisas : a confissão dos
pecados veniais é simples conselho, e nunca
obrigação. E quando os queiras confessar,
não é preciso que desças a declarar o seu
número, embora por vezes também isso
possa ser de aconselhar.
Também não é obrigação acusar as cir­
cunstâncias agravantes dos pecados veniais
desde que não sejam daqu�las que lhes dão ·
malícia de pecado grave. Mas os teólogos
aconselham que ainda das circunstâncias
sensivelmente agravantes do pecado venial
se faça confissão.
Por exemplo : tratas o próximo com aze­
dume e mau humor, muitas vezes e por
muito tempo ; talvez uma hora e m.a is te
fiques azedando em mau humor. Confessar
esta circunstânci a de tão demorado azedume,
com não ser de- obrigação por não se tratar

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400 O C R I S T .Á O N O

de pecado grave, não deixa de ser útil . Con­


fessando-a, melhor te ficará a conhecer o con­
fessor e portanto mais fàcilmente te poderá
aconselhar e medicar a alma. Com teu mau
exemplo embora l eve, escanda1izaste também
em matéria l eve a muitas pessoas. Não
tens obrigação de confessar esta circuns­
tância agravante do pecado venia l ; mas se
o fizeres, pode-te ser de. proveito pelo mo­
tivo já dito de o confessor melhor te poder
dirigir nos caminhos da virtude.
Haverá obrigação de confessar os
pecados duvidosos ?
Podes duvidar se cometeste ou não de­
terminado pecado. Por exemplo, não estás
certo se tal domingo ouviste missa. E podes
duvidar se a culpa cometida chegou ou não
a pecado grave, por não saberes se era grave
a matéria ou se houve advertência e consen­
timento : não sabes, por exemp lo; se tal mur­
muração ofendeu. gravemente a caridade, ou
se houve plena advertência e consentimento
em acção de si gravemente pecaminosa que
p raticaste.
Geralmente em tais casos não há, a rigor,
obrigação de confessares esses pecados du­
vidosos, todavia é de aconselhar que deles
te acuses para ficares com a consciência mais
tranquila. E o conselho vale sobretudo para
as pessoas que não distinguem bem entre
pecado mortal e venial .

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T RI B U N A L D A PENITENCIA 401

Diz-se <<geralmente não há obrigação de


confessar tais pecados duvidosos » , ·porque
poderiam as dúvidas não serem, por exemplo�
sérias a valer ; tais as dúvidas de pessoa de
consciência 1 axa que pouco ou nada cuida
das coisas da alma, e para quem portanto
as maiores enormidades podc=m pa!"ecer 'ape­
nas venialidades. Pessoas assim t�m :obri­
gação de confessar os pecados que duvidam
se chegaram ou não a pecado mortal, pois
pode supor-se que as dúvidas lhes vêm de
andarem acostumadas a julgar tudo sem im­
portância.
1\ias as pessoas de consciência normal
não têm obrigação de confessar tais pe­
c ados ; e, não os querendo . confessar, basta
que na contrição incluam todos os pecados
com que gravemente tenham ofendido a
Deus. Na hipótese de os pecados duvidosos
serem de facto pecados graves, ficam per­
doados com as demais culpas cunfessadas.
E as pessoas escrupulosas, essas não
devem atormentar-se com ind á gações a re­
solver tais .dúvidas. Confessam as coisas
como naturalmente se lhes apresentam ; e se.
mesmo assim entram em anciedades, melhor
será não se confessarem desses pecados,
mesmo que lhes venha perturbar � cons­
ciência a lembrança de que não sabe dis­
tingpir entre pecado mortal e venial. E se
o corifessor lhes diz que não confessem os
pecados duvidosos, devem obedecer,, pois o
confessqr no tribunal da Penitência é rn_es-

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.102 O C l� I S T .\ O N O

tre e j uiz que representa o mesmo Deus . Se­


guindo as suas ordens e aca tando as solu­
ções que deu, podem os pen itentes ficar
tranquilos . Errasse muito embora o con­
fessor : a bon d a de e misericórdia de Deus
remediaria, com o perdão, o erro praticado
pelo j uiz, seu representante .
Uma vez que se con fessou um pecado
mortal ·como d u vidoso, caso de pois s e venha
na certeza de o ter cometido , n ão há que tor­
nar a con fessá-l o . O mesmo se diga quando
algu ém confessou um pecado j u l gando ser
l ev e e m ais tarde veio a dar con ta que era
grav e . E n1 am bos os casos o pecado ficou
pe rd o ad o como era d i a nte de De u s , e n ão é
p reciso torn a r com e l e ú con fissão.
O u tro e s clar e c i m e n to a i n d a : Con fessas
cu l pa grave como certa - ou d u vidosa , e o
con fessor teima en1 q ue se trata a pen as de
u m escrúpu l o ou de uma ven i a l idad e . Tenha
e l e razão ou n ão tenha, cum priste o teu dever
confessan do-�, e foste và lidarn ente absolvido,
pois o confessor absol ve sem pre o p e n i tente,
dos pecados como e l es são d i ante de Deus
e n ão como a e l e l he possan1 parecer.

Será obrigação confessar os pecados mor­


tais que n ão sabemos se já confessámos ?
Não podes haver certeza se já confess aste
pecado graYe cometido há anos e qu e te veio
agora à l embrança , ou se confessaste cir­
cunstância agrava nte que te parece devias

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T R1 B E N A L O A PE NIT E NCI A 403

confessar. Ou então duvidas se confessaste


tal ou qual pecado grave, de maneira que
bem te corp.preendesse o confessor.
Em casos assim, podes regular-te com
segura consciência pelo axioma do direito :
« Na dúvida deve supor-se que se fez bem o
que se devia fazer)) . Se até agora sempre
te tens confessado segundo a tua consciência
t e dizia que devias fazer, não precisas de
tornar a confessar ta is pecados, enquanto
não tiveres a certeza de que os não con­
fessaste ou suficientemente os explicaste .
Apenas um caso há -em que -de outra
forma devias proceder, e seria se · antiga-
1nente tivesses sido rem isso e pouco cuida­
doso em te preparares para a confissão.
Então farias ben1 confessar esses pecados
gue duvidas se confessaste.
Se não obstante estas normas ou con­
selhos ainda te surgirem dúvidas, abre-as
com o confessor e faz como ele te mandar�

CondiçGes que se requerem para ser vá­


l ida a confissão em que se acusam só pecados
venials.
Se na .consciência apenas .te pesam pe­
cados veniais e te vais a confessar, para que
a confissão fique bem feita basta que con­

fess�s um só pecado venial de que estejas


contrito, ou sinceramente arrependido digas :
1t p equei ·contra tal e tal virtude» .

E até se faria confis·s ão bem feita decla-

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O CRISTÃ O NO

rando apenas qualquer falta venial da Y i d a


pass_ada de que houvesse arrependimento.
E, porém, mais perfeita e de mais mé­
rito a confissão minuciosa mesmo dos pe­
cados veniais ; e se é de mais mérito, 1ne­
lhor é fazê-la assin1. E o confessor q u e
julgue haver leviandade ou ligeireza em n e ­
gócio de tanta monta c0mo é a confissão,
não deixará de, interrogando, descer a par­
ticulidades quando lhe vierem com uma acu­
sação demasiadamente genérica.

As i mperf1içG11 nlo slo matéria suficiente para


a cenfisslo.

Imperfeição significa falta de perfeição,


e na vida da alma é imperfeição tudo o que
não é a maior perfeição cristã.
Não faltas a n enhuma virtude cristã a
que estás obrigado, mas n ão praticas qual­
quer delas em grau superior ou até simples­
mente te contentas com não as ofender. Não
ofendeste a Deus, pois não faltaste às o bri­
gações que te impõe ; mas não és perfeito
ou cometes imperfeições e privas-te assim
de graças que Deus te concederia se com
Ele fosses m ais generoso.
Podemos, portanto, dizer que imperfeição
é a omissão de boa obra à qual não estamos
obrigados nem pela Lei de Deus nem pela
Lei da Igreja, pois é apenas obra de simples
conselho ou desejo.
Omitir uma tal boa obra embora inte-

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TR1BUN A L D A PEN1T ÊNC1A 405

riormente a gr aça nos mova a praticá-la,


não é pecado, a não ser que a omissão
nasça da preguiça espiritual, da sensuali­
dade ou do respeito humano.
Também muitas vezes se chamam im­
perfeições as faltas e fraquezas a que, bem
çontra nossa vontade, estamos sujeitos na
vida espiritual, tais como as tentaçóes que
nos . apoquentam mas nas quais não con­
sentimos.
As imperfeições porq1:1e não são pecados
não são matéria suficiente para a confissão ;
isto é, seria pelo menos inválida a confissão
em que só se acusassem imperfeições.
Desta forma não seria acusação suficiente
para haver sacramento, dizer ao confessor :
« Acuso-me de talvez não ter resistido sufi­
cientemente aos movimentos de impaciência
e de impureza» .
Não seria acusação suficiente, e portanto
não poderia haver absolvição, dizer : «Estive
distraído nas oraçóes ; assisti à missa sem o
devido respeito ; deixei-me levar muitas ve­
?-es de movimentos de ira ; as minhas ora­
çües talvez não fossem feitas como de­
v i a m ser» .

De tal acusacão não consta de nenhum


, .

pecado certo. As distrações nas rezas e na


missa são apenas imperfeições humanas_, e
s0 serão pecado quando demoradas e demo­
rad-amente consentidas. A ira de si não é
pecado; é o movimento espontâneo contra
aquilo que nos desgosta . Se se contém nos

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O C RISTÃ O N O
-- ·--- ----- ----

lin1ites da j ustiça não ofende a Deus ; e se


é simples inovimento espontâneo que logo
se refreia, também nela não há pecado.
A este propósito, diz S. Francisco de
Sales : « Acusar-se alguém de muitas ve�es
ter tido . movimentos de ira ou de tristeza, não
basta para receber absolvição sacramentai ,
pois a ira e a tristeza são paixões cujos pri­
meiros movimentos não estão na nossa mão.
Para se haver a absolvição é preciso acusar
qualquer falta que seja de facto pecado ,, .
Não tendo a certeza se pecas1e desde a
última confis�áo e te vais assim a confessar.
acusa qualquer pecado certo da vida passada
do qual estás arrependido, para que possas
receber o s acramento.
Mas ·s e de facto pecaste, di-lo con1 c l a ­
reza e não te fiques em termos vagos q u e
apenas significam imperfeições. Não dirás ,
por exemplo, '<ti\•e distrações n a oração ,,
(o que, já disse, d e si não é pecado), mas
sim dirás - « estive culpàvelmente distraído
nas orações )> , se de facto .as coisas assim s�
passaram .
Não dirás apenas : « Tive movimentos
de impaciência)> (tais movimentos espontâ­
neos não são pecado), mas «irritei-me e daí
faltei à caridade para com o próx imo )> , se
a ssim foi a tua falta.

Não s e deve dizer d e menos

Não fica bem feita a confissão se nel_a ,


por querer, não declaramos a.s espécies de

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TRI BUNAL DA PE N ITÊNCI A

pecados mortais cometidos, o seu número e


circunstâncias agravantes . Calar de propó­
sito um só pecado grave que fosse, diminuir
o número das vezes que o repetimos, res-
· ponder ne·gativamente ao confessor quando
nos interroga sobre pecado grave que come­
temos e ainda não confessamos vàlidamente,
é fazer confissão nula e sacrílega. E como
nela não se nos deu o perdão, é preciso re­
peti-la.
Usar de palavras ambíguas, para o con­
fessor julgar leves as faltas que 'de si são gra­
ves, é também fazer confissão sacrílega que
portanto se deve repetir.
Toda via qu�m usasse de termos vagos,
conYencido de que náo atenuava a ve,rdade
e m matéria tão importante, não cometia sa­

crilégio. i\tlas se tal sucedesse, convinha na


primeira confissão completar a acusação de­
feituosa.
A acusação incompleta dos pecados quer
quanto à espécie que.r quanto ao número
quer quanto às circunstâncias agravantes, .
não sendo culpável não invalida a confissão.
Em tais casos há apenas a completar a
acusação na primeira confissão que se fiter.
Se ante� da co�unhão recordas qualquer
falta grave que e�queceste· �onfessar, se, sem
d a r nas vistas, podes ir logo a confessá-la
fazes bem em ir, mas não tens disso obri­
gaçao: O pecado esquecido ja ficou per­
doado com os outros que se confessaram, e
portanto podes ir comungar e guardar . para

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--------
O C R I S T Ã. O N O
-- ----- - -- - - -- ----- ---

a primeira confissão o acusar esse pecado


esquecido.
Se na confissão não fo ste sincero com o
confessor em coisas leves ou de pouca im­
portância, ou até lhe mentiste em matéria
alheia à confissão que noutras circunstâncias
seria apenas pecado leve, a confissão ficou
bem feitil embora cometesses nela pecado
venial. Responder, por exemplo, que não
cometeste determinado pecado leve quando
de facto o hajas cometido, nein por isso
ficou a confissão mal feita, inas privaste-te
de graças próprias do Sacramento e das
vantagens de uma boa direcção espiritual .

Nlo se deva dizer da mai s

Para merecer a absolvição e ter o perdão


de Deus, basta confessar todos os pecados
graves com sinceridade humilde, e n1ais nada
é preciso acrescentar. Na confissão não vale
dizer que « antes de mais que de menos » .
E assim : .
Se cometeste determinado pecado aí umas
cinco vezes (duvidas se· foi esse precisamente
o número de vezes que caiste) não deves acu­
sar-te : « cometi cinco vezes tal peca�o » , mas
« �ometi tal pecado pouco mais ou menos
cmco \'ezes » .
Sem culpa comeste de carne em dia de
abstinência ? Não tens nada a acusar na
confissão ; e, se no assunto precisas de fa­
l ar por motivo de pedir qualquer conselho,

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T E N C l A. 4oq

declara logo que faltaste a lei mas sem


advertir.
Passam-te pelo espírito pensamentos con­
tra a Fé, nos quais não consentiste. Não tens
de que te acusar deles ; mas, querendo acu­
sá-los, diz logo que neles não consentiste, ou
.que foste um tanto negligente em os repelir,
se de facto houve nisso negligência .
Fala�te c�m menos respeito das coisas·
da religião. E assim que deves· confessar, e
não carregar a falta com dizer, por exemplo,
que escarneceste ou ridicularizaste as coisas
da religião.
Há alguém que te quer mal sem lhe teres
dado motivo para isso. Não tens . de que te
acusar de pecado que não é teu ; e se pre­
cisas de falar no assunto, não te atribuas
cul pas que são dos outros. Mas se estás
nisso cul pado� dize a tua culpa sem te pores
a aumentá · ] a .

Por acaso deste com os olhos em coisas


.indecentes e logo os retiraste. Não digas :
c<Pequei olhando para coisas desonestas» ,
porque d e facto não houve pecado. Mas se
na consciência te pesa qualquer negligência
no retirar a vista, diz singelamente : «Não
mortifiquei os olhos com o devido cuidado,
o que me trouxe tentações» .
Não percas o tempo com acusações va­
gas ou de coisas que apenas indicam a fra­
gilldade humana, como : «Não tenho cum­
prido à risca as resoluções- tomadas MS-·· OU­
tras confissões » ; <{não tenho amado a Deus

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O C RISTÃ O NO

como devia)> ; « não tenho sido grato a tan­


tos benefícios que n1e tem feito » ; (( não me
tenho exercitado na paciência » ; «não tenho
andado sen1pre na presença de Deus » .
Que significa tudo isto ? A fragilidade
hum ana e mais nada ; e a confissão não é
para nela acusares fragilidades, mas a tua
malícia ou a maldade. Se realmente e m
todas essas coisas pecaste, então não te fi­
ques nestes modos vagos, mas chama as
coisas pelos nomes que têm.
E, para acabar, não venhas para o con ­
fessionário contar histórias que n ão têm
que ver com os teus pecados. Para a con­
fissão n áo interessam os aborrecimentos que
te causa um mau vizinho ou os can1pos que
andas a semear ou outras histórias pare­
cidas. E se nalguma coisa precisas de con ­
selho ou de conforto que o confessor te possa
dar, evita tudo o que possa ofender a honra
ou reputação do teu próximo ; nunca cites
o nome de quem quer que seja, nem pintes
as coisas de modo a adivinhar-se logo de
quem. se trata.

Guia prático para fazer uma oonfissã·o


bem feita.
Quando te fores a confessar pen s a bem no acto
s�ri o que vais prat i car, e com porte digno abeira-te
do confess ionário, e espera a tua vez. Se t i veres de
esperar m ais do que querias, a ce i t a a contrariedade
como pen i tê n c i a e lembra-te q u e m ais espera o
c o n fe ss o r
.

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411
.

TRIBUNAL D A PENITENCIA

Chegada a tua vez, aj oelha no confessi onário


ou aos pés do sa cerdote, e sauda com a saudação
t ão portuguesa e tão cristã : n Sej a louvado Nosso
Senhor J esus Cristo ! » Pede a bênção ao confessor ;
e, enquanto ele te abençoa, faz tu o sinal da Cruz
e come ç a . a r e c i t ar a et Confi ssão>» se a não· rezaste
antes de vir para o confess i onário. É conveniente
que a rezes ante s ; pe l o menos não deix arás de
ass im fazer nos dias de grande confesso por mo­
t ivo de cari dade para com os outros que ainda es­
peram vez.
E convém que comeces logo por declarar h á
quan to t empo te c�nfessaste a última vez. Esta
decl ar.a ç ão, porém, só é obri gat ór i a se houver a
confessar pe c ados graves de que se não saiba o
número e se haj am portaoto de. c alcular pela esti­
mativa de tantos por semana ou por mês. E neste
caso não basta declarar o tempo da última con­
fi ssão de m aneira vaga, como 4<COnfesse i-me por
desobriga,,, mas h á que precisa·r bem s e foi no prin­
cfpio da qua resm a, no meio, no fim 01.1 depo i s dela.
A co n selha-se também que l ogo de principio
decl ares s e és casado, solteiro ou viúvo, a fim de
não ser preciso estar depo i s com mais expli c ações
se houveres de con fessar pecados que mudam de
espécie conform e a circunstânci a do estado em que
te en contras.
· � passarás d.epo i s a acusar os pecados seguindo
uma cert a ordem : pri m e i ro, os pecados esquecidos
noutras confissões; se os h á ; os pecados contra cada
um dos m a ndamentos da Lei de Deus; dos precei tos
da Santa Madre Igreja, e finalmente os que são
contra o s d everes do teu estado. Passa assim de
um a outro Mandamento, s em to davia te demo­
.r ares a dizer (c aqui não tenho nada» ou coisa
semelhante, se nalgum deles nada t e pesa na cons­
ciência. Mes m o que te viesse a vergonha de con­
fessar qual quer pe cado, d e . modo nenhum . deixarias
de o confessar, m as pedir i as · ao confessor que te
aj udasse. '
A confi s s áq ordinàriamente deve ser oral :. con-

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4 12 O C R I S T .:\. O N O

fissão de boca, como diz o povo . Em casos excep­


cionais, como por exemplo no caso de muita ver­
gonha� pode tolerar-se· a confissão por escrito desde
que seja o penitente a entregar o papel · ao con­
fessor e lhe diga : «Acuso-me de todos os pecados
da minha vida, e em especial dos que vão aqui es­
critosu. . Quando é impossfvel a conti'ssão de boca,
embora . se possa fazer a con fissão por escrito, não
h ã disso obrigação e nesse caso basta, como se
disse j á, apresentar quaisquer mostras externas de
arrependimento para se poder s e r absolvido.
Terminada a acusação dos pecados convém
acrescentar : «De todos estes pecados e de todos
os mais da minha vida passada, principalmente dos
que cometi contra . . . (e indica-se a virtude ou m an­
damento contra a qual se pecou na vida passada)
me acuso e me arre p endo, a Deus peço perdão, e a
vós, padre, penitência e absolvição se dela me jul­
gardes digno 11 .
E não te fiques a pensar se te esqueceu alguma
coisa, mas presta atenção ao que te diz o confessor ;
aceita de bom ânimo a penitência que te impuser,
recita o acto de contrição enquanto ele te dá a
absolvição, e ao retirar-te, agradece-lhe, dizendo :
cc Seja pelo amor de Deus». .t. em seguida vai dar
graças a Deus pelo perdão que te concedeu, cumpre
a penitência se a puderes logo cumprir, e renova os
bons propósitos que fizeste.
Em dias de grande concurso de penitentes de­
ves, por caridade para com os outros, levar já. dica
a confissão, abreviar as saudações do principio e
·r eduzi r a acusação dos pecados ao essencial.
As advertências, repreensões e conselhos que
o confessor te deu, são para ti e não para andares
a contar aos outros. Não quer isto dizer que, en­
contrando pessoa em circunstâncias iguais à s tuas,
não lhe possas comunicar as palavras de con­
forto ou de conselho que te fizeram bem a ti ; mas
sem que haj a da tua parte indescreção no segredo
a que também tu estás obriga.do acerca do que
contigo se passou na confissão.

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TRIBUNAL DA PENITENCIA 4 13

Temos insistido até agora na obrigação de te


confessares com dor. Bem fica recomendar-te .aqui
que te confesses t á mbém com humildade e since­
ridade.
Não te esqueças nunca de quem és perante o
confessor. Seja ele muito embora como homem
inferior a ti em qualidades pessoais ou valor so­
cial, no tribunal da Penitênci a é mais· do que
ninguém : é o representante de Deus, e Deus <cnão
distingue pessoas». Perante o confessor, o Papa
como o mais humilde dos homens ajoelha reve­
rente e com humildade faz a sua confissão, dizendo :
«acuso-me».
Quando vais confessar teus pecados e deles
pedir a Deus perdão pelos merecimentos de Jesus
Cristo, tens mais que razão para depor a soberba e
compungido dizer : n Eu. pecador, me confesso».
Não àesmintas as pal avras com qualquer ati­
tude soberba, m as mostra-te contrito e com humil­
dade aceita as admoestações e avisos do confessor,
e assim merecerás especial atenção de Deus.
E a humildade ajudar-te-á. a ser sincero. «Não
foi aos homens que mentiste, foi a Deus», expro­
bou S. Pedro a A nanias que lhe foi entregar parte
do preço p ç> r que vendera o seu campo querendo
fazer acreditar que entregava o preço todo. Se
ocultas, calas ou dissimulas fal tas graves preten­
dendo assim enganar ao confessor, sabe que não
mentes a um homem, mentes ao próprio Deus.
Em r.al caso a confissão seria mais um pecado,
e pecado de sacrilégio, a juntar aos pecados que le­
vavas. A bênção e absolvição do sacerdoce · seriam
para ti maldição. <<Porque te havias de pôr assim a
enganar-te ?,, (I) E se fosses assim à comunhão, era
novo sacrilégio que acrescentavas, porque ccquem
comer este Pão ou beber o cálix .do Senhor in­
dignamente, será reu do Corpo e do S angue dó
Senhor, come e bebe para si a condenação» .. (2)

(1) Eclese. 2,2. (2) 1 Cor. 1 1 ,27 e .29·

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O CRIST �O NO
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E à con fissão e comunhão sacrí legas outras se


poder i a m se gu i r i gual m en t e sacrfl egas ; e a cumu­
l ando t u a ss i m pecados sobre pecados, bebendo-os
c o m o se fo r a ::í gua, i ri as att: c a i r n a completa ce­
gue i r a espi r i t u a l , a m a i o r das desgraças que te po­
d i am suceder, ou no e x a s pero dos remorsos da
consc i ê n c i a .
E a o fi m, adm i t i n d o a h i pótese m a i s favorável
de que c ão repe t i dos sacr i l ég i o s n ão te adorme­
cessem a consciência. ao fi m·. se Deus te conce­
' '
desse graça tamanha, have r i a que reparar as con­
fissões m a l fe i t as.
(( N ão te ponhas a engan ar-te sem prove i t o u .
Se m a i s c e d o ou m a i s tarde t e n s de confessar teus
pecados porque o não fazes j á agora ? Por ventura
f
os sacri é g i o s que andarás cometen do, deminuem o
temor e a ver9onha da con fi ssão bem fei t a que tens
de fazer ": N ao custará menos acusar agora meia
dúzi a· de pe c ados d o que teres ao depois de acusar
um cento , 1e Por� u e te hás de andar a enganar sem
pro v e i t o ; ,, .
D i r á s t a lvez : .. .\ h o r a d a morte ace rtare i as
con t as u . E quem t e d i z a t i que te dará o Senhor
essa gra ç a : Não ensina a e x peri ê n c i a que� regra
ger a l , o h o me m co nsoante v i ve u . assim m orre ?
N ã o b r i n ques com a graça de D eus� que ·a brin­
cade i r a e per i gosa. ulh a q u e te pode acontecer
não che garem a tempo as graças especialissimas
que pre c i s as para t e converter e vás m orrer em pe­
ca d·o c o m o e m pecado viveste.
<1 P � r a que ce andas a enganar sem prove i to ? u
Podes ·a q u i n a terra esconder tuas culpa s e t or­
pez as, m a s n o ou tro mundo não os poderás es­
conder.
C r i s t ã o, se por desgr aça enganaste de propó­
s i t o o confessor em matéri a grave. e i ndignamente
' '"'
recebeste os Sa cramentos, tudo re mede i a desde já.
Poucas palavras bastam : « P a dre, ten h a com paixão
de m i m e aj ude-me, porque m e t e n h o confessado
m a h1 . E o confessor q u e t a l vez te não conheça
nem te torne a ver, com padec i do e c a r i nhoso, aju-

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TRIBUN AL DA PENITENCIA 41 5

dar-te-á a vencer a vergonha: a por e m ordem


a consciência, a alivi ar a alma desse peso de re­
morsos que a esmaga. Aproveita a ocasião, con­
fessa-te contrito e humilhado, e lembra-te sempre
que mais vale não te confessares do que fazê-lo
del iberadamence sem sinceridade em materia grave.

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Confissão geral é a confissão em que se
acusam os p e cados de toda a vida ou de
um período notáve l . dela. R e peti r uma ou
outra confissão n ã o é fazer conJissão ge·ral
mas sim parcial .
Os Santos e teólogos, ao falar da con­
fissão geral, parece não encontrarem pala­
\Tas bastantes para a elogiarem , tantas as
Yantagens e bênçãos que nela encontram .
O grande missionário franciscano S. Leo­
nardo de Porto Maurício escreve : (( Grande
consolação sente a alma que atentamente
faz con fissão geral . Coisa nenhuma poderá
perturbar-lhe a serenidade do coração . . � ão
a apavoram nem a morte, nem o 1mzo,
nem o i n ferno� nem a eternidade . ·rudo e n -
1.:'. a r a com a s a n t a p az de quem por completo

!-i ossegou n a s m üos de Deus. �e morre e


a p a rece ante o su premo Tribunal di v i n o ,
l eva o l:oração cheio de esperanças, a tras­
bordar. Anda e m sossego e contente, como
a v o g a r em oceano de paz : « deleitar-se-á
na abund�incia da paz • . ( 1 )

(1) Salm. :: : . 1 1 .
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1' � 1 B U N A L D A P E N 1T Ê N C 1 A <1 1 7

Assim fala um dos Santos com maior


experiência neste ponto, pois ouviu milheritas
confissões gerais nas suas contínuas correrias
apostólicas . Meditem suas autorizadas pala­
vras aqueles que não querem que neste
assunto se lhes fale porque logo se sentem
cheios de terror.
Devemos, porém, notar que a confissão
geral não é necessária a todos nem para
todos igualmente útil e salutar, e casos há
até, em_ que pode ser nociva.
A canfi sslo geral é nociva

a) 4s almas escrupulosas e meticulosas


..
'
que já um a ou muitas vezes a fizeram , e
levam, ao presente, vida de piedade.
Se trazes a consciência desassossegada de es­
crúpulos a respeito das confissões passadas, caso
outra coisa não pareça ao teu confessor, faz uma
confissão geral sincera com quem te conpeça a
alma. Assim regulárás de uma vez para sempre as
contas da tua vida passada.
Se depois te assaltarem dúvidas não lhes pres­
tes ouvidos. Recordando-te de qualquer pecado
certamente grave e nunca confessado, acusa-te dele
na primeira confissão, mas só dele e de nenhum
mais. Se é falta que não sabes ao certo se j á và­
lidamente confessaste ou de cuja gravidade duvidas,
n ão tens obrigação de a confessar.
Dúvi. das que surjam muito tempo depois da
confi ssão geral («O confessor não teria compreen­
dido oem os pecados>,, «não se teria declarado ' o seu
número certo)), «não se teriam acusado circunstân­
cias graves)); ccnão seriam válidas as confissões em
que, depois, se confessaram os pecados esqueci-

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41 O CRISTÃO NO

dos))), dúvidas assim e tão tardi as: não têm valor


e não merecem atenção.
Em vão buscas paz e tranquilidade se pisas e
repisas os caminhos Jo passado a resolver as dú­
vidas q ue te vêm perturbar. Desse modo só mul­
t iplie;us os escrúpulos e acrescentas a inquietação.
'Podes ter a certeza que por uma dúvida que con­
si s as r esolver, surgirão logo mil a apoquentar-te.
Dirás talvez : mas agora compreendo melhor a
vida ; vejo circunstâncias, de que então não fazia
caso ; serm ão que ouvi ou leitura que fiz, abriu-me
os olhos e sei agora que foram faltas graves certas
coisas que me pareciam apenas pecadilhos.
N ão pensas certo. É natural que vej as hoje as
c'o isas de modo d i ferente daquele com que as vias
· há anos. Mas Deus não jul ga os teus pecados pelo
conhecimento e consciência que tens agora, m_as
pelo conhecimento e consciênci a que t inhas quando
os cometias. S abes hoj e medir a enormidade de
certa velha acção que praticaste ; mas se então a
ignoravas ou nela não advertias, não pecavas e ,
portanto não tens de confessar-te dela nem na vida
nem na morte. Mas o teu confessor melhor te dirá
o que podes e deves fazer em consciênci a. Nele
descansa, pois sempre que lhe obedeceres, acertas.
Ainda no que respeita a dúvidas sobre acusação
dos p ecados graves quanto ao número e espécie,
faz singelamente o que o confessor te disser.- Obe­
decendo ao confessor, t ambém cumpres o que Deus
de ti q uer neste particular. Admitindo mesmo que,
para lhe obedeceres, não confessaste quaisquer pe­
cados como devia ser : todos eles te foram per­
doados com os outros de que houveste a absolvição.
b) As pessoas que levaram vida desonesta que
j á remediaram em confissão geral, t ambém outra
confissão geral ser i a nociva. Passear a lembrança
pelas torpezas passadas, mesmo que sej a no intuito
ap arentemente bom de lhes assegurar o perdão em
nova confissão geral, seria pelo menos um perigo.
Porque excitar a fantasia com record � ções que

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TRI8U�AL DA PE N IT ENClA 41 9

podem trazer a tentação ? Nestes casos, será útil


apenas isto : sujeitar de um modo vago às confis­
sões ordinárias todo o passado pecaminoso acu­
sando em geral todos os pe ... ados cometidos contra
o sexto mandamento durante toda a vida.

A confisslo geral é obri gatória

A todos aqueles que fizeram confissões


nulas e ainda as não repararam com uma
confissão sincera e contrita. Nestes casos é
obrigatória a confissão geral de todo o tempo
que vem desde a última confissão bem feita.
Assim, se houve grav.e e advertido des­
cuido em examinar a .consciência e daí · veio
esquecer algum pecado grave, é necessário
repetir as confissões. Se o descuido (oi leve,
não invalidou o Sacramento, e portanto, - a
rigor, basta na primeira confissão acusar os
pecados graves esquecidos, embora seja de
l ouvar repetir a confissão.
Se não houve verdadeiro arrependimento
e propósito sincero de emenda, por exemplo
no ressarcir os danos causados ao próximo
na honra ou na fortuna, no empregar os
meios necessários para deixar o mau hábito,
no empregar todos os meios para evit�r a
ocasião próxima de · pecado ou para a tornar
remota, apesar das exortações do confessor
e dos remorsos da consciência, nestes casos

também a confissão foi nula quer a tivés­


semos feito espontâneamente quer para obe­
decer q.os pais ou cumprir o preceito pascal,
e portanto há -que repeti-la.

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O CRISTÃO NO

Se ciente e voluntàriamente se acusaram


os pecados graves, deminuindo-lhes o nú­
mero, ocultando circunstâncias gravemente
agravantes, enganando o confessor em cOi- ·
sas de peso, ou se não se estava resolvido
a cumprir a penitência, ainda então foi nula
a confissão e é necessário repeti-la.
E repetir as confissões, leva naturalmente
à confissão geral.
Quando só há dúvidas, embora com apa­
rências de verdade, acerca da validade das
confissões passadas, não há obrigação de as
repetir, mas é bem consultar então o con­
fessor e fazer o que ele ordenar.

A c o n f i ssão geral é m u i t o út i l

As necessidades e negócios temporais


leyam o homem, quase insensivel mente e
sem o perceber, a descuidar o negócio im­
portantíssimo da salvação da alma, Acau­
tela-se talvez dos pecados mais graves, não
se entrega inteiramente aos maus hábi.tos,
m as não detestará, como deve, cada um
dos pecados mortais, e pouco caso fará dos
veniais . Assaltado pelas tentações, julgará
que pouco importa p ara a salvação pecado
mais ou pecado menos ; e neste engano an­
dará, pensando que tudo corre bem.
Se tu, cristão, tens vivido assim, pres­
cruta com atenção todos os esconderijos da
consciência e resolve preparar-te p ara, nà
primeira ocasião, fazer confissão geral sin-

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TRIB UN AL D A PE NlTÊNC1A -421

cera e dolorosa, que possa ser ponto de par­


tida para vida nova, verdadeiramente cristã.
E sentir-te-ás inundado de espiritual con­
solação quando contigo mesmo puderes di­
zer : «Até tal dia tenho em ordem as minhas
contas com Deus, posso estar sossegado, não
preciso de me tornar a examinar sobre o
passado ! »
Se ap recias a paz da alma, faz confissão
geral ao menos de cinco em cinco anos.
:Melhor seria ainda fazê-la todos os anos,
por ocasião do retiro espiritual , confissão
que nestes casos abárcaria o período de
tempo que vem desde a última confissão
geral .
Não te resolvendo a fazê-la com tanta
frequência, ao menos não deixes de regular
plenamente a consciência nas épocas mais
solenes da vida, como por exemplo : ao ter­
minar os estudos, ao começar o serviço mi­
litar, tomar estado, entrar numa ordem re­
ligiosa ou receber as sagradas ordens ; e bem
assim ao deixar um cargo ou profissão em
que tal vez encontraste frequentes ocasiões
de pecado ; e muito especialmente n'o caso
de doença grave.
Método para fazer uma confissãó geral
n ecessária
Querendo fazer confissão geral duma parte no­
tável da vida, começarás a preparar-te com alguns
·dias de ant ecedência, examinando os pecados come­
tidos, orando com· m ais fervor, fazendo frequentes

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422 O CRI STÃO N O

actos de contrição e prometendo ao Senhor come­


çar vida nova. A esta preparação remota seguir­
-se-h á, na véspera ou no dia da confissão, a prepa­
ração próxima.
Começarás por destrinçar bem o que é de obri­
gação confessar do que é apenas de conselho. Nota
principalmente as espécies e o número dos pecados
graves. E se a confissão dos pecados graves exigir
bastante tempo, confessarás O !' -rpniais de um modo
genérico. Pelo que, desces pe·cados, não se requer
exame tão minucioso.
Tendo no decorrer da tua vida faltado grave­
mente à obediência, ao amor e respeito aos pais e
superiores, à caridade cristã com inj útias, inimi­
zades, e rancores, confessa-te de cada uma dessas
graves fal tas ; e para acusar as faltas leves da mesma
espécie, bastará que digas : nFaltei também leve­
mente muitas outras vezes ao amor devido a meus
pais, parentes, superiores e outras pessoas».
Tens tido soberba, pensamentos de compla­
cência, vaidade, luxo no vestir, desejo de agradar,
ambição e palavras de vanglória ? Se estas faltas,
de si leves, não foram acompanhadas de circuns­
tâncias que as façam mudar de espécie, será sufi­
ciente a acusação geral : nFaltei à humildade por
pensamentos, palavras e obras». De modo· seme­
lhante procederás na acusação de outras pequenas
faltas.
Havendo qual quer circunstância g ue torne a
falta grave, é preciso confessá-la particularmente.
Assim terias de fazer 5e, por exemplo, com o luxo
tivesses causado graves prejuízos à familia.
Aplicadas estas regras a todas as faltas leves,
fi cará mais tempo livre para indagar e conhecer as
fa 1 tas graves.

Exame de 1onsciência
Recorda-te desde há quantos meses ou anos
te tens confessado m al. · Quantas vezes t e confes­
sas te mal, e comungaste indignamente ? Quantas

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TR IB UN A L D A PE NITÊN CI A 423

vezes assim o fizeste pela Páscoa ? Quais os pe­


cados graves que não confessaste vàlidamente ?
Deves confessar :
a) todos os pecados mortais calados até ao
presente ;
b) todos os pecados mortais confessados nas
confissões mal feitas ;
e) todos os pecados mortais cometidos depois
da última confissão.
Se a confissão geral compreende um período
notável da vida, ·e xamina-te pelas diversas épocas
e estados del a : dos pecados cometidos na meni­
nice, na juventude, na idade madura, no estado de
solteiro, · casado ou viúvo. Com este método ser­
-te..:-há fácil recordar todas as faltas graves e formar
i deia aproximada do seu número.

Feito assim o exame com razoável diligência,


excita-te novamente à dor e propósito. Deves ao
menos propor evitar a todo o custo as faltas gra­
ves, e qUanto possível, as ocasiões próximas de pe­
cado mortal. Sem isto a confissão de nada valerá.
Preparado desto modo, procura confessor em
que tenhas confiança, e numa hora em que te possa
ouvir com sossego. N ão p odendo esperar hora mais
.sos5egada; adapta-te às circunstâncias e confessa-te,
embora obrigues outros a esperar.

A confissão

Expõe ao confessor os motivos por que desejas


fazer confissão geral.
Manifesta logo de p rincipio se, depois da úl­
tima confissão, tens vivido em ocasião próxima de
pecado. .f: conveniente dizer ao confessor a idade
e estado, e) se és casado_, há quantos anos. Para a
com pr-eensao de certas taltas é da máxima impor­
tância o c9nfessor conhecer o teu estado. Certas
conversas, por ex�mplo, são menos condenáveis
quando entre pessoas casadas ; o contrário sucede

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4 24 O CRISTÃ O NO

noutros casos. Confessa em seguida todos os pe­


cados mortais, quanto à espécie e número, como
se disse ao tratar do que se ndeve confessar».
·Quando não possas precisar o número certo
dos pecados, acusa o número aproximado.
Nas faltas repetidas por hábito ou por motivo
da ocasião em que viveste, indica o tempo que
duro u o mau hábito ou ocasião e a frequência das
quedas por ano, por mês ou por dia.
Alguns exemplos, . para maior clareza : c<Sus­
tentei três inimizades ; duas duraram perto de meio
ano, e uma quase um ano, entretendo-me, com fre­
quência e voluntàriamenie, em pensamentos de vin­
gança contra os meus inimigos» .. - c<Deixei frequen­
temente as minhas orações diárias ; durante um ano
poucas vezes as fiz». - �1Por minha culpa faltei a
missa de obrigação quase meio ano, e em todo o
outro tempo uma ou outra vez por mês».
Numa confi ssão s eral necessdria deves proce­
der como se não te tivesses confessado desde a úl­
tima confissão bem feita, e acusar também as con­
fissões e comu.nhões feitas durante esse tempo .

Método p ara u m a c o n f i ssão g e ral , n ã o n e c e ssár i a

Se as tuas con fi ssões


· não foram certamente
inválidas mas apenas duvidosas1 é bom proceder
como se se tratasse duma contissão geral neces­
sári a.
Tratando-se de confissão geral que se faz por
simples devoção, é preciso acusar primeiramente
todos os pecados mortais cometidos desde a última
confissão, e no resto ser exacto, quanto posstvel.
Se não qui seres dizer algum pecado, já vã/i­
damente confessado, estás no teu direito ; embora
com i sso dimi nuas em muito o seu merecimento, a
con fissão fica válida, porque o pecado confessado
e perdoado uma vez não necessita de ser acusado
de novo.
Se não obst ante estes conselhos, a confissão

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T R l R U N A L D .l P E N l T E N C l A -'2 5

geral te parecer, por qualquer motivo, muito di­


ticil, faze o teu exame de consciência, como se
:lisse, e depois pede ao confessor que te ajude a
s J \r de em bar aços.
Conta S. Leonardo de Pôrto Maurício, que um
certo oficial da corte de Aragão foi ter com um
m ssionario e pediu-lhe o ouvisse de confissão
ge:al.
- Para quê ? perguntou o missionário.
- Não tenho eu de morrer, padre ? respondeu
o oficial, suspirando. E como poderei eu, depois
:iuma vida tão viciosa, morrer tranquilamente sem
fazer confissão geral ? Se a guardo para a hora da
m �rte, a mulher, os filhos o rc:: c eio · de morrer e as
dores da doença tirai-me- h ão o sossego necessário
para obra de tanta monta. E será · prudente em­
preender negócio assim importante no meio de
antas perturbações ? Permita-me que a faça agora.
Eis aqui um exemplo digno de ser por ti imi­
t ado, ainda mesmo que todas as tuas confissões
tenham sido sinceras. Mais então se houver na tua
vida passada qualquer dúvida que não fosse bem
e.>clarecida, qualquer receio de que as dividas con­
"ratdas não tenham sido riscadas do grande J ivro
da justiça divina, ou a certeza de te teres' confes­
s ado mal ? ! cc O Senhor, diz Santo A gostinho, pro­
meteu · perdoar-te os pecados no dia em que te con­
verteres para ele, mas não te prometeu o dia de
J.m anhã».
ccA.h ! se ao menos neste dia que te foi dado
.agora, conhecesses ainda o que te pode trazer a
pa·Z» ! ( 1 ) Oxalá eudesses conhecer os bens, as van­
tagens, as consolações e a paz que produz a boa
confissão geral !

( 1 ) Luc. 19,42.

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CAPÍT U LO VI

M étodo d a co nfissão f requ ente


para as al m as piedosas
Principio geral e de suma importância n a vida
do esptrito : «Üs homens devem santificar-se com
o auxilio doutros homens, e têm de ser acompa­
nhados e conduzidos para Deus por outros ho­
mens».
Esta verdade aplica-se a todos, e muito espe­
ci almente às almas piedosas que aspiram à �lta
perfeição. Ordinàriamente estas almas só ca­
minham para a perfeição, auxiliadas por confessor
piedoso e prudente. E se al gumas há que chegam
à santidade sem a frequência dos sacramentos e
auxilio dum gui a espiritual; são excepção à regra
geral:
E o que ensina Leão XIII na Bula sobre o A me­
ricanismo : ccÉ lei ur.iversal na economia da san­
t i ficação. querer Deus providenttssimo santificar
os homen s, mesmo aqueles que chama a m ais alto
grau de perfeição, por meio de outros homens.
«Já nos primeiros tempos da Igreja se encontra
exemplo luminoso desta verdade : Saulo, respi­
rando então ameaças de morte, ouviu a voz do
mesmo Cristo e lhe perguntou : - «Senhor, que que­
reis que eu faça ?». E o Senhor enviou-o a Ananias
em Damasco : <d:�ntra na cidade e ai se te dirâ o
que tens a fazer». Aqueles que tendem a perfeição
m ais elevada, estão mais expostos a erros, porque
seguem caminho m enos trilhado, e por isso pre­
cisam, m ais que os outros, de mestres e guias».
ccSe queres, alma cristã, exorta S. Francisco de
Sales, tomar a sério o caminho da santidade, pro­
cura confessor expeiimentado que por · ele t e con-
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TRI B U N A L D A P E N I T Ê N C I A

duza. Roga instantemente ao Senhor que te con­


ceda um director segundo o seu coração».
Nem todos os confessores convêm a todos os
penitentes. Assim como há especialistas nas ciên­
cias médicas, e um sabe mais num ramo do que
noutro, o mesmo se dá com as cousas da vida es­
piritual, com a ciência da vida /eterna. Deus con­
cede os seus dons, como lhe apraz : «A cada um
de nós foi dada a graça segundo a medida do dom
de Cristo». ( I)
«Encontrando, pois, um d1rector, não o consi­
deres como simples homem ; nem· confies nele nem
no seu saber humano, -mas em Deus qúe não te fal­
tará e te quer ajudar e aconselhar por meio da-.
quele homem. Abre-lhe o coração, manifesta-lhe
claramente o bem e o mal, confessa-te com humil­
dade e devoção de oito em oito diàs, ou de quinze
em quinze, ou ao menos de quatro em quatro se­
manas. Não procures outro, senão por graves mo­
tivos. De novo te digo, pede-o a Deus, e depois
.de o teres encontrado, agradece-o à divina Ma­
gestade». (2)
Explicado j á o que se requer para a validade
da confissão, resta só apresentar alguns conselhos
e avisos de não pouca utilidade para os que pro­
curam a perfeição. São, repito, apenas avisos e
conselhos, e não regras precisas de que todos se
possam utilizar. Lê-os e escolhe os mais úteis
para a tua salvação.

O que devem fazer as pessoas piedosas


para excitar o arrependimento e propósito
de emenda
Interroga-te a ti mesmo : Sucede-me ainda
co!D frequência ofender a Deus ci1nte e deliberada-

( 1.) Efes. IV, -7.


(2) s. Francisco de Sales, Pllotea, p. 1 cap. IV.

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O CRISTÃO NO

mente ? Nesse caso, a primeira cousa a fazer é em­


pregar todos os meios para evitar o pecado. A alma
que ama a Deus, prefere tudo a ofendê-lo voluntà­
riamente. Se te parece não poderes evitar um pe­
cado sem outro, por exemplo, sem uma mentira
das chamadas necessárias (nome nem louvável nem
justificado), pede conselho ao confessor.
Como já observámos, predomina em cada pes­
soa certa má inclinação menos conhecida ou mais
acariciada, que é a causa de muitas faltas e de cons­
tantes tropeços no caminho da virtude.
Traba lha, cristão, por conhecer a tua paixão
dominante� combate-a com todas as veras e pro­
cura vencê-la principalmente com a frequência dos
Sacramentos.
Suponhamos que a tua paixão dominante é o
or g ulho. Se não lhe opões a mais viva resistência,
cairás em mil faltas : contrariado e ferido por qual­
quer repreensão, criticarás tudo com observações
mordazes ; julgando-te preterido, sentirás movi­
m e nt o s de invej a e ciume, e talvez até de aversão_;
para ocultares um defeito que te humilha, recor­
rerás à mentira . . .
Atende, particularmente no teu exame, a co­
nhecer estas faltas, e pensa nos meios mais eficazes
para as combater até à próxima confissão. Faze,
por ex e mplo, o propósito de interrogar brevemente
na oração da manhã, na santa missa ou em outro
tempo favorável, quais as o casiões ein que há mais
probabilidade de seres tentado nesse dia pela tua
paixão dominante, as ocasiões mais freq uentes de
pecado e os meios mais efi cazes de resisur. _
Muito proveitoso será t ambém, tomares a reso­
lução de te impor determinada penitência p or cada
falt a ou por certo número de faltas por dia ou se­
mana : urna oração ; qualquer mortificaçãozinha no
comer, beber ou falar ; ou ora urna coisa ora outra.
As almas timoratas e sujeitas a m aus pensa­
mentos, são frequentemente levadas a ver pecados
em todas as tentações da imaginação ; e o pior é
que não são capazes de se persuadir de que nisso

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T R I Il U N A L D A P E N I T Ê N C I A

não há pecado aJgum. Resultam daqui dúvidas e


desalentos, e até às vezes falt a a coragem para com­
bater as verdadeiras tentações. Neste estado, o ca­
minho· mais seguro� para conseguir a paz� é abrir
.inteiramente o coração ao confess'or e seguir à risca
s·e us conselhos.
Domada uma inclinação, passa-se a combater
outra.
Do que fica dito, não se vá concluir que basta
ter pesar e combater apenas uma espécie de faltas,
descurando todas as demais. Não ; a. luta deve ser
contra todas, a todas reprovando ; mas os golpes
mais certeiros e mortíferos devem ser dirigidos, de
preferência, contra certas faltas mais perigosas.

Da acusação

i_ Queres que o confessor te dirija e ensine ?


Procede de modo que ele possa conhecer a tua
alma, manifestando-lhe claramente e sem rodeios
o bem e o mal:
Deves acusar, com a máxima franqueza e cla­
reza, até os pecados veniais, pondo em relevo os
que forem mais graves.
Suponhamos : o orgulho ou vai dade a miúde te
arrastam a culpas1 embora nem todas voluntárias·. ·
Ofendes a caridad.e com criticas e palavras humi­
lhantes para o teu próximo, distrais-te involuntà­
riamente e sentes tédio na oração, negligência nos
exercícios de piedade, movimentos de ira e impa­
ciênci a não reprimidos imediatamente. Pois bem,
não te demores a explicar estas últimas faltas, mas
dirige as tuas atenções para as duas primeiras, afim
de o confessor poder conhecer até que ponto ·foste
culpado.
É muito diferente ter, d� vez em quando, pen­
satilerttos de orgulho e vaidade, ou comprazer-se·
neles por horas esquecídas, ou praticar acções re.:..
sultantes destes vícios. É, portanto, indispensável
para o confessor te · poder dirigir e aplicar o re-

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O C RISTÃO NO

médio conveniente, qlle lhe manifestes tudo cla­


ramente.
Uma coisa é falar raramente nos defeitos pú­
blicos do próximo, e oútra murmurar habitualmente,
exagerar, e, pior ainda, fazer isso por espírito de
inveja ou m á vontade.
Não é necessário descer a estas particulari­
dades e'm todas as confissões, se o confessor já te
conhece a alma.
Se não puderes exprimir- te como desejarias,
dize-o ao confess�r e pede-lhe_ que te ajude, inter­
.
roganao-te como JU{gar conveniente.
Quando o confessor te interrogar espontânea­
mente sobre qualquer assunto, responde-lhe sem per­
turbação e como t e parecer que é verdade ; e, de­
pois, não deves ficar preocupado a examinar se te
enganaste diminuindo as faltas, pois o confessor já
sabe com antecedênc i a que te podes enganar.
Já dissemos que ordinàriamente não há obri­
gação de co_n fessar as imperfeições. Tratando- se,
porém, de quem desej a ser piedoso, esta regra sofre
uma modificação. Ninguém é obrigado a confessar
as imperfeições, mas aconselhà-se às almas piedosas
que, de vez em quando, as acusem na contissão de­
pois das faltas. O que ordinàriamente para outros
não passa de imperfeição, para estas, mais favore­
cidas de graças, bem poderá ser pecado venial.
Se, por exemplo, munas vezes, só por preguiça, se
omitem os exercícios de piedade, o exame de cons­
ciência, a santa missa, será bom acusar brevemente
estas imperfeições ou negligências.
Convém notar, p ara tranquilidade dos escrupu­
losos, que a omissão das boas obras para as quais
se sente interior inclinação, nem sempre é c ausada
pela tibieza, e portanto nem sempre é pecaminosa.
A regra das regras, em tudo o que respeita à cons­
ciência, é a completa submissão aos conselhos do
director espiritual. ·

De vez em quando, dá conta ao confessor do


como te hás com as tuas . más inclinações. Ten­
t ação confessada, é tentaç ão quase vencida. E se,

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TR1 BUNAL DA PEN1TÊNC1A 43 1

·
para m anifestar as tuas inclinações, for necessário
falar também das tuas boas obras, faze-o ·corri o
louvável intento de mais acertadamente seres di­
rigido.
Nos dias de grande afluência de penitentes põe
de_ parte tudo o que respeita à direcção espiritual
e acusa só o que é de necessidade, para não pri­
va"res os outros dos avisos e conselhos do- con­
. fessor. ·
Segundo o conselho dos mestres 'de espírito,
não se deve mudar de director espiritual sem mo ­
tivo. Advirta- se, porém, que não ·é mudar, o recorrer
a outro algumas vezes. Isto pode ser vantajoso e
até necessário.
Se tiveres a desgraça de cair em pecado mor­
tal, confessa- o, sendo possível, ao . .confessor ordi­
nário, para te humilhares e te cer_t_ificares de que
procuras mais a honra de -Deus -.:do que os favores
dos homens. Não te preocupes c.om o que de ti
possa julgar o confessor, porque · não lhe é desco­
nhecida a fragilidade do coração humano� Sossega,
e p ara o futuro recorda a exortação do S alvador :
((Vai e não peques mais,,. Como, porém, hão há
obrigação de te confessares a um sacerdote . deter­
minado, não querendo dizer algum pecado ao te�
confessor, procura outro.

Alma cristã, a obrigação de tenderes à per­


feição importa um combate de toda a vida. Não
desanimes, .embora não consigas vencer esta · ou
aquela má inclinação. O Senhor permite as faltas
para conservar a alma em humildade. A inclinação
para o mal não é em si pecado. O que Deus exige
é a resistência com todas as forças. Tendo a infe­
licidade de sucumbir à tentação, faze logo o acto
de. contrição ; assim a virtude não ficará tão pre­
judicada. Não' esmoreças por não atingires de re��.
pente a perfeição, mas tira motivos das tuas im.::
perfeições para prosseguires com mais coragem · o
caminho .encetado. O s,ue Deus exige de ti, não é
precisamente a perfeiçao, mas a séria vontade,_ o

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O C RI S T Ã O N O

desej o ardente e o trabalho leal p ara a conse guires�


Procedendo assim, terás cumprido o preceito do
S alvador : ccSede perfeitos, como vosso Pai cele.stial
é perfeito ».
·

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C A P f T U LO V 1 1 1

D a · satlsf ação
Todas as vezes que o homem . ofende .a
Deus, torna-se seu deved,or. Para se recon ..
ciliar com ele., deve naturalmente reparar ó
mal e empregar todos os meios para satis­
fazer à justiça divina. E o que seria im..
possível só com . as forças humanas,. é fácil
com os mereéimentos superabundantes de
Jesus Cristo. Unindo, pois; as nossas ·obras
de penitência. aos seus merecimentos. infini­
tos, podemos oferecer a Deus uma « Verda;..
deira satisfação» (em sentido lato) pelos
nossos pecados.
Não é desta satisfação que · tratamo s
agora, mas daquelas obras que o confessor
impõe, como penitência, ao fiel que se con ­
fessa.
Quando se perdoa a ·morte a un1 conde·­
nado, nem por · isso se isenta de todo o cas­
tigo : comuta-se-lhe aquela pena noutra mais
suave. O crime tem de ser reparado, embora
com pena mais leve do que a· merecida.
P9is assim procede Deus com os pe­
cadores · que lhe pedem perdão. Se aten­
desse apenas à sua jus tiça e Jesus Cristo
não tivesse m orrido por nós, Deus poderiá
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O CRISTÃ O NO

punir-nos eternamente por cada pecado n1or­


tál . Na sua infinita bondade, porém, e em
atenção aos merecimentos de Jesus Cristo,
ao pecador que se confessa, perdoa a culpa
e a pena eterna, e condena-o a sofrer pena
temporál .
« O Senhor transferiu o teu pecado. Não
morrerás ; todavia como tu, pelo que fizeste,
deste lugar a que os inimigos do Senhor
blasfomassern, morrerá o filho que te nas­
ceu » . (1) Assim da parte de Deus falou o
profeta Natan ao rei David. Reduziu-lhe a
pena porque estava arrependido do pecado,
mas não l ha perdoou inteiramente.
Atendendo também aos merecimentos de
Jesus Cristo, é atenuada a pena devida aos
pecados veniais, j á detestados e emendados.
Quanto maior for a nossa dor e fervor de
penitência, tanto maior será a misericórdia
do Senhor ; e quanto a nossa confissão for
mais dolorosa, tanto Deus será mais gene­
roso em nos perdoar as penas temporais,
ainda que ordinàriamente não conceda a sua
total remissão.
Rigorosamente falando,'Deus poderia per­
doar, com a culpa, toda a pena temporal de­
vida aos pecados, pois Jesus Cristo ofereceu
a Deus Pai satisfação infinita e superabun­
dante. Não o faz, porém ; e quer que nos

( 1 ) 2 Rei•, 12, I3 e 14.

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TR 1B U N AL D A PE N1TÊ N CIA 435

. apropriemos desta satisfação por obras de


penitência, colaborando com Jesus Cristo na
eJ.. piação das nossas faltas. Assim o exige a
justiça de Deus e a sua misericórdia : «Con-
. vém à bondade de Deus, diz o Concílio de
Trento, não nos perdoar os pecados sem al­
guma satisfação da nossa parte, afim de que,
a presentando-se a ocasi ão, não os julguemos
coisa de somenos . . Porque é certo que
estas penas nos afastam fortemente do pe­
cad9,. e nos tornam mais prudentes e vigi­
lantes para o futuro» . (1)
Coin este duplo fim imp.õ e o confessor
a penitência ou satisfaçãó sacr·amental.

Da obrigação de cumprir a penitência


Para se fazer váJida e dignamente a con­
fissão, é necessário ao menos ter vontade
sincera de cumprir, quanto possível, a peni­
tência imposta pe_Io confessor. Não cumprir
depois por preguiça ou negli 9ência a peni­
tência aceita na confissão, sera pecado mor­
tal ou venial, conforme a importância dela.
A confissão ficou válida, mas o penitente
privou-se de muitas graças.
Omitir uma penitência leve, por exemplo
cinco Padre Nossos e Ave Marias, ou parte
leve duma penitência grave como alguma
Ave M aria no rosário, ou qualquer circuns­
tância· leve, será pecado venial .

(1) Cone. Trld. Ses. XIV, eap. 8.

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O CRISTÃO NO

No caso da penitência parecer muito di:.·


fícil ou impossível de cumprir, peça-se ·hu­
milde ·e respeitosamente ao confessor a sua
comutação. ·
· Quando
.
'
o confessor
.
.... . não fixar tempo
, . . para
cumprir a pemtencrn, e convemente cum-
pri-la logo.
Imediatamente após a ' confissão estarás
mais puro e · fervoroso, e por isso m ais dis­
posto p ara receber a graça divina., pelo que
a penitência será muito mais proveitosá. Não
se podendo cumprir logo, convÇm fazê-lo na
primeira ocasião = oportuna. E reprovável
deixá-la para mais tarde com perigo de a
esquecer.
Se te fosse imposta a penitência de uma
Ave Maria diária até à próxima confissão
e um dia te esquecesses de a rezar, farias
bem rezá-la no dia seguinte, mas não es­
taYas a isso obrigado .
Se te esquec:.eres a penitência logo após a
confissão, pergunta-a ao confessor, mesill:o
fora do confessionário ; ou, não podendo
perguntar, supre-a por outra à tua escolha.
Será melhor ainda pedir outra ao confessor,
n a próxima confissão.

Aceita sempre a penitência coi:n humildade e


submissão, embora te pareça difícil, porque é justo
que sej a proporcionada ao númerô e graveza dos
pecados. Cumpre-a com fervor e pontualidade,
tendo presente que é uma das partes do Sacra­
mento, e contribue poderosamente para a sua efi­
c ácia. As penitências impostas pelo . confessor têm

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TR1BU N AL D A PE N1TÊN C 1A 437

mais merecimento que outras quaisquer, pois ajun­


tam ao mérito comum o mérito da obediência.
Não deixam, porém, de ser muito louváveis as
penitências voluntárias, tanto mais que as impostas
pelo confessor não têm proporção com as penas
merecidas pelo pecado e são apenas uma pequena
quantia do que devemos a Deus.
Nos primeiros tempos da Igreja, as penitências
eram gravíssimas e de maior duração. Quem tra­
balhasse ao domingo por exemplo, devia j ejuar três
dias a l? ão e água � quem levantasse a mão contra
seus pais faria penitência durante sete anos ; o réu
de homicídio premeditado, era punido por toda a
vida com penitência à porta da igreja.
Atendendo à fraqueza humana, a Igreja foi miti­
gando estes rigores, mas com isso não quer dizer -que
não tenhamos, como os primeiros cristãos, a mesma
obrigação de fazer penitência. E se o confessor im­
p õe penitências leves, mesmo por culpas graves, é
isso em atenção à fragilidade dos penitentes.
Hoje, como antigamente, há absoluta necessi­
dade de fazer penitência pelos pecados cometidos.
As faltas que não forem expiadas com penitências
vôluntárias, sê-lo-hão ou, na vida presente, com so­
frimentos � adversidades, ou, na outra, com as pe­
�as do Purgatório. Por isso ((não estejas sem temor
do p:_ca � o que te foi remetido», (1) mas faze dele
penitencia.
Ora e jejua, podendo ; não te poupes a mortifi·
cações. D á esmolas, ao menos a esmola espiritual
das tuas orações e boas obras e lucra indul sências.
Sofre com paciência e r·e signação as aflições e
adversidades. E assim fugirás aqui aos castigos de
Deus e abreviarás as penas do Purgatorio. ·

Bem disse Santa Catarina de. Génova : «Aqui


n� t �rra paga-se com poucos centa':os o qu.e vale
rpuitas moeda� . de ouro ; no Purgatório paga-se . cQm
mµit?S moedas de o uro o que vale poucos centavos.))

(1) Eclesl 5, 5 .

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Das I ndulgências
Temos obrigação de ,satisfazer à justiça
diviria pelos pecados cometidos. E por eles
satisfazemos cumprindo a penitência imposta
pelo confessor, praticando outras penitências
voluntárias, e levando com paciente resigna­
ção os trabalhos e a cruz da vida. Todavia
pode tudo isto não chegar para completa
satisfação dos muitos pecados que tenhamos
cometido, e nesse caso haverá que expiá-los
com outras penas tem parais a sofrer nesta
vida ·ou depois no Purgatório.
No intuito de nos livrar de tão custosa
expiação, a misericórdia de Deus . deixou à
Igreja o poder de nos conceder indulgências
ou o perdão destas penas temporais de sa­
tisfação .
Que se entende por I n dulgências ?
1

Indulgência é a remissão da pena tem-


poral devida a Deus pelos petados come­
tidos e j á perdoados quanto à culp8:,· re­
missão que a Igreja nos concede fora do
sacramento da Penitência pela aplicação dos
méritos de Jesus Cristo, da Virgem Maria e
dos Santos.
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TR1RUN A L D A P EN1TEN C1 A 4 3g

Foi . o Salvador quem deu à Igreja o


poder de conceder indulgências. cc Dar-te-ei
as chaves do reino dos céus» , (1) di.sse Jesus
a S. Pedro que constituira chefe ou cabeça
da sua Igreja. Com tais dizeres, a ele con­
cedeu, e na pessoa dele a seus �ucessores,
o poder de arredar todos os obstáculos que
impedem a alma de entrar no céu o� lhe · re­
tardam o gozo da bem-aventurança . A Igreja
deixou, portanto, não apenas o poder de per­
doar o castigo eterno no sacramento da Pe­
nitência, mas também o poder de perdoar
tudo aquilo que poderia retardar a entrada
das almas no reino dos céus, como é a pena
tempm al devida aos pecados.
Grande, tão grande que se pode dizer
se1n limites, o poder dado por Deus à sua
Igreja, com o qual nos abre o céu e até nos
arreda os obstáculos que podiam demorar a
entrada nele e privar-nos por algum tempo
da. vista bem-aventurada . de Deus.
O perdão das penas temporais merecidas
p or nossas culpas concede-no-lo a Igreja ap�i­
cando-nos os méritos superabundantes de
Cristo e dos Santos que ficaram à sua dis­
posição p ara ela os_ dispensar.
Cristo, pela sua incarnação, paixão · e
morte na cruz, satisfez superabundantemente
pelos . nossos pecados ; e também os Santos,
en:.i vida, satisfizeram pelos seus mais do que
. �·.. -

(1) Mat. 161 19.

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440 O CRISTÃO NO

estavam obrigados . Esta superabundância


de méritos de Cristo e dos Santos é o te­
soiro de .graças que a Igreja distribui pelos
fiéis. co�o . indulgências ou satisf�ção dada à
1ust1ça divma pelas culpas cometidas. Deus,
na sua misericórdia, recebe a superabun­
dância dos méritos de Cristo e dos Santos
que a Igreja lhe apresenta, como se fossem
merecimentos nosso.s e por nós oferecidos
em desconto
; dos nossos pecados. E con­
tente com esta satisfação, perdoa-nos as pe·
nas temporais ou o Purgatório que have­
ríamos de sofrer.

Das I n dulgências beneficiam também


as al m as do Purgatório
« Creio na comunhão dos santos » , repe­
timos nós todas as vezes que fazemos pro­
fissão de Fé recitando o C redo ou símbolo
dos Apóstolos. É portanto dogma Junda­
mental do cristianismo que os fiéis, quer os
vivos quer os que sofrem no Purgató�io
quer os eleitos do céu, membros que são do
corpo de Cristo, vivem todos em í ntima
união, participam dos bens espirituais da
Igreja e podem mutuamente socorrer-se com
suas orações e boas obras .
Daí ter a Igreja, pelos tempos fora até
hoje, concedido indulgências aplicáveis às
almas do Purgatório. O Código do Direito
Canónico ensina expressamente: cc em sufrágio
das almas do Purgatório se podem aplicar

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T R 1 B U N A L D.A P E N 1 T Ê N C 1 A ·44 1

todas· as indulgências que o Sumo Pontífice


concede, não se dizendo outra coisa na con­
cessão» .
Para que aproveitem às almas do - Pur­
gatório -as indulgências concedidas a boa
obra que praticamos ou a oração que re;.
·

zamos, basta · que tenhamos intenção ex­


pressa de que Deus as aplique às almas em
geral ou a alguma ou algumas delas em
particular. Para a intenção ser expressa, não
é necessário renová-la antes de ganhar .c ada
indulgência, basta formá-la, por exemplo,
cada dia nas orações da manhã, dizendo :
<{tenho intenção de ganhar em sufrágio das
almas ào Purgatório todas as indulgências
que durante este dia possa lucrar» , ou en­
tão formá-Ja de uma só vez fazendo o que
se chama o « acto heróico» .
Que seja o acto ·heróico
Almas há que levam sua compaixão pe­
las almas do Purgatório até · ao ponto de,
por elas, oferecer todas as orações e boas
obras que durante a vida fazem. Todas .as
indulgências que em vida podem h.,1crar, a
todas generosamente e de . uma só vez apli­
cam a favor das almas. E, mais ainda, .to­
das as suas boas obra_s e os s�1frágios que
depois de sua morte outros por elas _ apli­
quém, de tudp se. desfazem e tudo aplicc:im
em sufrAgio das benditas almas do Purga­
tório. E a este_ acto de generosidade suma

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442 O CRISTÃO N O

a favor das benditas almas, que se chama


<c acto heróico» .
A Igreja aprova esta santa generosidade
e cumula de indulgências e privilégios aque­
les que se afoitam a fazê-lo, como adiante
se ditá.
Como o acto heróico é acto absoluta­
mente livre, pode fazer-se de modo parcial
ou restrito, aplicando às almas apenas parte
das indulgências que se lucram e do valor
satisfatório das boas obras e os sufrágios
que depois da morte se espera receber.
Não deixa de ser generosidade merit.ó ria
este acto heróico parcial ; mas naturalmente
não tem tanto mérito nem as indulgências e
privilégios concedidos pela Igreja .ao acto
heróico feito sem restricões nem medidas.
Para gozar tais privilégi'Ô s e indulgências há
que aplicar às almas, todas as boas obras e
e indulgências, e só as chamadas cdndulgên­
cias dos moribundos » ou ccda hora da morte»
se podem exceptuar.
Tod avia, note-se bem, o acto heróico não
proibe aplicar as boas obras . e indulgências
por uma ou por determinadas almas do Pur­
gatório, e deste modo nos deixa sufragar os
mortos que sejam mais das nossas obriga­
ções, como por �xemplo, os pais e os amigos.
'"'
Perguntarás talvez :
E então se faço o acto heróico, que me
fica a mim para cumprir o dever qlJ e tenho
de cuidar da própria salvação ?
Certa�ente muito te fica ainda. São

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T RI B U N A L D A P E N1 T Ê N C I A 4'43 ·
..

três, a um tempo, os frutos das nossas boas


obras : mfritório, irnpetratório e satisfatório.
Seja qual for a boa obra que pratiques em
estado de graça - oração, mortificação, acto
d'e caridade ou de misericórdia - ganhas com
ela méritos para o céu, podes mover a Deus
a despachar tuas preces feitas em teu favor
ou em favor do próximo, e satisfazes pelos
pecados próprios ou alheios abreviando desta
sorte as penas temporais por elas mere-
cidas.
·

Quem faz o acto heróico só este fruto


satisfatório aplica às benditas almas, e de
tudo o mais pode dispor em seu favor ou
em favor do próximo. Pode, portanto im­
petrar de Deus graças para si e para
os outros. Pode, por exemplo, oferecer a
sagrada comunhão a pedir os benefícios de
Deus ; praticar as ooras de misericórdia,
mortificar-se, fazer romarias com o fim de
alcançar os auxílios de Deus numa necessi­
dade ou aflição.
E também lhe pertence o mérito de todas
as boas que pratica ; isto é, por cada uma
delas tem, neste ·mundo, o aumento da graça
santificante, e , depois no outro, mais glória
de bem-aventurança. Além disso o acto he­
róico de tão generosa , caridade a favor das
benditas ahnas é obra santa que nos dá mé­
rit�s e rica recompensa de glória no céu.
E desta maneira·, se o fizeres , todo o bem
que praticares tem para ti duplo mérito :
o da boa obra em si e o da caridade heróica

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444 O C R I S T .Ã. O N O

com que acodes às benditas almas que no


Purgatório estão em pena.
E, portanto, - se é certo que, feito o acto
heróico, não podes expiar com boas obras e
indulgências as penas temporais devidas -a
teus pecados, nem por isso perdes, antes
muito ganhas : a tua misericórdia para com
as almas dá-te mais graça santificante, e, ao
mesmo tempo e no mesmo grau, maior feli­
cidade no céu. Terás talvez de sofrer ·aqui
na terra mais penas que Deus . te envie para
expiares .t eus pecados, terás talvez de sofrer
um pouco mais de tempo no Purgatório ;
mas aquela « coroa de justiça que o Senhor
te dará no dia da retribuição » , (1) essa será
mais resplandecente e brilhante : « Os que se­
meam em lágrimas, colherão em alegria» . (2)
A Sagrada Congregação das Indulgên­
cias a 20 de Fevereiro de 1 907 declarou que
quem tenha feito o acto heróico, livremente
e a todo· o tempo o pode revogar.

Poderemos aplicar Indulgências pelos vivos ?


Pelos vivos não podemos lucrar indul­
gências. Podemos, sim, aplicar em seu fa­ .
vor a satisfaç.ão que com ·nossas boas obr as
prestamos à justiça divina, e desta forma
expiar por eles as penas temporais que de­
vem a Deus pelos pecados cometidos, se

(1} Tim. 4, 8 (2) Salmo 125,5

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TR1 B U N A L D A P E N1T Ê N C1 A 445

com o acto herói Co nos não desfizemos j á


de todo o mérito satisfat6rio das nossas boas
obras a favor das. almas do purgatório.
Indulgência. plen ária e . parcial
Chama-se plenária a indulgência . que.
nos perd�a toda .a pena ,t emporal deviçl�
pelos pecados cometidos. A quem ga nh�r
indulgência plenária perdoa . Deus toda a
pena temporal, tal qual como se então re­
cebesse o baptismo.
Chama-se parcial a indulgência que nos
remite só p arte dessas penas temporais�
Para explicar quanto da pena temporal : se
nos perdoa, serve-se a Igreja de modos d�
fal ar que lembram a austera disCiplina ·p e.:.
nitencial dos primeiros tempos do cristi.a ­
nismo. Assim, concede indulgências dé uma
ccquare�tena»· ou de. q1;1 arenta dias, de se�e
quarentenas, de cem d ias, de um· ano, etc; · ;
e com isto quer a igreja dizer que pelos me.:
ritos de Cristo e dos Santos são perdoadas
tantas penas temporais quantas o seriam a
quem durante esse tempo se sujeitasse às pe�
nitências que eram impostas nos primeiros
séculos da Igreja. .
Quem riãô estiver arrependido de todos
os pecados veniais ou a alguns tenha afecto,
embora pratique qualquer boa obra a que a
Igreja tenha concedido · indulgência plénária,
lucra apenas indulgência parcial em pro­
porção com suas disposições (can. 926).

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O CRISTÃO NO

CondiçGes requeridas para ganhar as


indulgências

As indulgências concede-as a Igreja como


que acrescentando com o tesouro dos mé­
ritos de Cristo e dos Santos, os méritos pe­
queninos das nossas boas obras e orações .
A troco destas, destribui-nos os tesoiros dos
méritos de Cristo e dos Santos.
Para as ganhar requere-se portanto :

1 • intenção de as lucrar. Mas, so­


0 A
bretudo para as indulgências parciais, basta
a intenção geral feita com frequência, por
ex�mplo na oração da manhã, .de lucrar to­
das as indulgências com que estão enrique­
cidos os exercícios de .piedade ou as obras
boas que praticamos.
Esta intenção vale para ganhar todas as
indulgências concedidas . aos actos e oraçõt!s
que façamos e dispensa-nos por isso de,
pelo dia adiante, andarmos a reparar S'.! tal
acção ou reza é indulgenciada. Com el. i, só
não lucraríamos as indulgências que reque­
rem oração feita por determinada intenção,
como por exemplo segundo as intenções do_
Santo Padre, se por tal intenção não fizés­
semos a devida reza.

2. 0 O estado de graça. Quem estivesse


em pecado mortal, e portanto em inimizade
de Deus e sujeito ao castigo eterno, nã<' �1-

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TRIB UNAL D A PENITÊNCIA - 4'47

cançaria perdão das penas temporais, e por


isso não ganharia indulgências.
Para lucrar indulgência plenária, a exi­
gência é ainda maior. Se não estamos arre­
pendidos seja ele de um só pecado venial e
lhe conservamos afecto, . não ganhamos qual­
quer indul [ência plenária em toda a sua
extensão. E a razão é óbvia : aferrados vo­
luntàriamente àquele pecado venial, não nos
está ele perdoado quabto à culpa . e portanto
não nos pode ser perdoada a pena que lhe
corresponde.
Mas ,se, por motivo de a fecto voluntário
a este ou aquele pecado venial, não lucra­
mos em toda a sua plenitude as indulgências
plenária�, nem por isso havemos de as des­
curar . A uma, porque em tais circunstân­
cias podemos lucrá- la parcialmente e em
tanto maior extensão quanto maior for o ar­
rependimento, devoção e zelo e,m cumprir as
opras prescritas (can. 926). A outra , por­
que a consideração da perda que nos causa
o afecto ao pecado venial, ajudar-nos-á a
desafeiçoarmo-nos dele cada vez mais.
De facto, se bem pensarmos o valor ex­
traordinário da indulgência plenária, h avemos
de achar coragem para deveras nos pormos a
remover todos os obstáculos que nos impedem
de alcançá-la . O que se nos exige não é acima
d_as nossas forças. Com a graça de Deus que
sempre ajuda, acordaremos no coração os sen­
timentos de penitência que nos leve� a abor­
recer todo o pecado voluntário.

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O CRISTÃO NO

E, a propósito : a intenção da Igrej a ao


conceder indulgências, não é de modo algum
dispensar-nos da penitência. Muito pelo con ..
trário : com elas intende intensificar em nós ·

o zelo da penitência.
Ignoramos por completo se estamos de ..
vidamente dispostos para lucrar a indulgên­
cia plenária ; talvez para isso houvéssemos
de avivar o arrependimento e destestação dO'
pecado. E portanto erro grave seria afrouxar
na penitência por motivo da l iberalidade da
Igreja no conceder as indulgências.
De resto, sem espírito de penitência e sem
a sua prática nunca dominaríamos as pai- .
xões de modo a evitar as faltas deliberadas,
e tornar-nos-íamos assim inc.a pazes de gà.:.
nhar indulgência plenária. E quanto mais
nos esforçarmos por fazer frutos dignos de
penitência, tanto mais nos veremos livres do
pecado e dispostos para alcançar as indul­
gências da Igrej�.
3. 0 O exacto cumprimento das obras
prescritas é a terceira condição que se exige
pará lucrar qualquer indulgência. Para as
indulgências p lenárias, regra geral, as con­
dições prescritas são : a Confissão e Co­
munhão, e a oração segundo as intenções do
Sumo Pontífice com ou sem visita de uma
igreja. Para as indulgências da Via-Sacra;
e poucas outras mais, não se exige a Con­
fissão e Comunhão, mas exige-se -sempre o
estado de graça. ·

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T R I B u N A- L . .n.'A· p E N 1 T Ê N e 1-A 449

_P ara as indulgências parciais, de ordiná�


rio . não . se e�ige · a Confissão e Comunhão-.

Da Confissão e Comunhão exi g i das· para l ucrar :as


indulgincias

Quando, para lucrar uma indulgência, · Se


exige a Confissão, pode ela fazer-se · dentro
dos oito dias que . imediatan1ente precedem
o dia para que está fixada a indulgência: ou

du_rante a subsequente oitava. E uma só


confissão basta para. lucrar todas as indul­
gências fixadas no dia da confissã�, na oi.­
ta va precedente e na oitava seguinte (cân� ·
q3
- 1 .- e 9 33 )
. .

Alguns exemplos para maior clareza :


Todo.s . os cristãos que nos seis domingos ·
que precedem ou se seguem à festa de
S. Luis Gonzas a (2 1 de Junho) fizeram
qualquer exercício em honra . do dito Santo,
ganham em cada um deles indulgência ple­
nária ·, confessando-se e comungando. Se­
gundo a regra exposta, para ganharem as_ seis .
indu lgências plenárias, �asta que três �ezes
se confessem, desta forma : a Confissão
feita no sábado antes do primeiro domingo'
vale para lucrar a indulgência dos dois pri­
meiros domingos que ambos eles caem den­
tro da oitava que se segue à . Confissão.
A Confissão feita no terceiro· domingo ou
na véspera, de igual modo vale para ganhar
as indulgências d? terceiro e qu �rto domingo.
E o mesmo se diga da Confissao que se faz

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O C R I S TÃ O N O

no _quinto domingo ou na véspera. E quem


no primeiro domingo fizesse os exercícios de
piedade em louvor- do Santo e no sábado
seguinte se confessasse, e se fosse con ..
fossando de quinze em quinze dias, com
confessar-se três vezes podia lucrar as indul.­
gências plenárias dos seis domingos e tam­
bém a da festa do Santo , que caia dentro da
oitava que se seguir à última Confissão.
Quem em cada um dos cinco domingos
que precedem ou seguem a festa das chagas
do Pai S . Francisco ( 1 í de Setembro), fizer
qualquer piedoso exercício em honra da­
quelas santas chagas, tem indulgência ple­
nária em cada domingo, desde que se con­
fesse, comungue e visite uma igreja onde
ore segundo as intenções do Sumo Pontífice.
Pois para lucrar todas as· · indulgências basta
que se confesse três vezes, da forma que
acima se diz para os seis domingos consa'".
grados a S . Luis Gonzaga.
Para lucrar a indulgência plenária conce­
dida a cada uma das visitas que se façam a
uma igreja em dia dos fiéis defuntos, podem
fazer-se as visitas no dito dia com intenção de
lucrar as indulgências, e depois, em qualquer
dos oito dias seguintes, fazer a Confissão que
se requer para ganhar essas indulgências:
Também para lucrar as indulgências con­
cedidas aos piedosos exercícios de tríduos,
missões, retiros, pode fazer-se a Confissão
exigida dentro da oitava que segue à con­
clusão dos mesmos exercícios (cân. 93 1 ·§ . 2 ) .

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TRI B U NAL D A P E N1TÊNC1A 45 1"

A Comunhão que se exige para ganhar


as indulgências, pode fazer.:se no dia da in­
dulgência, na véspera ou dentro da subse­
quente oitava . E também uma só comunhão,
seja ela comunhão de . preceito como a comu­
nhão pasc&] , vale para ganhar todas as iqdul­
gências fixadas no dia da comunhão ou nos
oito dias precedentes (cân . 93 1 § 1 e 933).
Estas . facilidades no que respeita a Con­
fissão e . .Comunhão requeridas para ganhar
as indulgências, são de muita utilidade prá­
tica. Recebes, por exemplo, a B ênção Papal
dada pelo bispo em certos dias ou pelo sa­
ce�dote no fim dos tríduos e outras prega­
ções mais demoradas ; ou, se és Terceiro
de qualquer Ordem, recebes a .Absolvição
Geral nos dias em que é concedida·. Por
qualquer rn:otivo não tiveste ocasião de t�
confessar e comungar para ganhar a indul­
�ência plenária que anda junta com essa
tsênção ou Absolvição. Recebe-la com a
intenção de ganhar a indulgência, fazes a ·
a oração prescrita segundo as intenções do
Sumo Pontífice, e depois, dentro da oitava
seguinte, confessas-te e comungas e assim
satisfizeste em tempo útil a todas as condi­
ções reql]eridas p ara lucrar a indulgência .
. Os_ fiéis que, não estando impedidos, cos­
tumam confessar-se ao menos duas · vezes por
mês ·, podem lucrar todas as· indulgências,
mesmo sem outra Confissão alias· requerida

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,,_ ; O CR1S TÁ O N O

para, as . ganhar. O mesmo se diga. de quem


comunga . diàriamente ou quase diàriam�nte.,
cinco vezes. na semana por exemplo . .(cân.
93 1 . § 3). . .:
. Excepil�am-se nestes casos as indulgêni;:ias
do jubileu ordinário ou concedidas ad iºns.t11r
jubilcei, as quais só se ganham com a Cçm­
fissão e Comunhão feitas no dia do jubil�u,
na véspera ou dentro da oitava seguinte.
. A sagrada Comunhão exigida para luc.rar. .u�a
indulgência, pode fazer-se em qualque r templo,
mesmo quando haj a de sê visitar determinada igreja.
A Confissão e Comunhão feitas para cumpir
um dever grave (as que se fazem por desobriga .ou
p ara cumprir penitência imposta pelo confessor) va­
l em geralmente para ganhar as indulgências que têm
como condição a Confissão e Comunhão (cân. 933).
Também se lucram todas as indulgências que,
por acaso, estej am anexas às · orações e boas obras
que nos foram impostas como p enitência sacra­
mental (cân. 932). Se o confessor, por exempfo,
te deu. l!.or p enitência faz7 r a V!a-� acra, cum erirido .
a penitencia ganhas as mdulgenc1as concedidas a
esse p iedoso exercício.
Quando para lucrar qualquer indulgência ple­
nária não se exige a Confissão e Com�nhão, como
nas indulgências da Via-Sacra, para · de facto as
ganhar é preciso o estado de gra� a e portanto há
que faze� ac � o de contrição perfena, se por acaso
.....
na consc1enc1a nos pesa pecado grave.

2. Oração segundo as lntençDes do


Sumo Pontfflce
Uma das condições imposta a maior parte
das vezes, para lucrar as indulgências, so-

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T R 1 li U N A L D A: P E N 1 T Ê N C 1 A 4,53 .

br éudo d s plenárias; é a oração segun do as


:
intenções do Sumo Porit�fice. :
; · :u mas. vezes determina a Igreja · qual. a
oração a rezar� Assim · para > lucrar as' indtil�
gêrtcias da Porciúi1cula ou concedidas :· à ' ma­
nefra das da Porciúnctifa por exemplo,_ '(a�
do dia dos _Fiéis p� funtos) h_á que reiá_r é.ri
cada uma · da·s V1s1tas seis vezes o Padre­
-Nosso, Ave-Maria e Glória.
Outras vezes deixa-se ao arbítrio dos fieis
a oração. - a fazer. E nestes caso· bastara re­
z ar um Padre-Nosso, Ave-Maria e Glória;

ou mesmo aplicar segundo a intenção do


Santo Padre as .. rezas que. ·. se fazem na de­
voção da tarde juntamente com os demais
fiéis ou ainda parte do terço, da coroa sc­
ráfica ou· do Ofício · _d e · Nossa: Senhora, .das
orações da manhã ou da .noite, do Angêlus
oú ·r eza das ·Ave-Marias, e até a '·oração dos
c ��ti�os r � ligiosos que se ·faça� · nos e*erc}-
cioS"' · de piedade á qtie . se assiste na 1 gre1a.
(vid. : cân. · 934 § · 1 ) . .
. ·;
·
Esta oração deve aplicar-se, cio menos ·de
U'f!Z .modo geral, segundo as ·intenÇões. dó
Sµmó Pontífice, que· são ordinàriamente a
exaltação da Santa Igreja; · · propàgàç�o d a:
Pé� " extirpação das· heresias e. cismas� con­
versão dos pecadores, paz e éonéórdia' entre·
os p'Ovo.s cristãos e · outras necessidades da.·
cris�ándade. ' Não se requer� todavia,_ que
de mômento :se lembrem t:od,as · estas · iiú:en:
çõe·s ; basta· :·q ue · se aplique · a · 6taÇao segundo:
.
as: intenções · do - . Súi:no · Pontificé.

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... s .., O C RI S TÃ O N O

A oração deve ser vocal. B asta, pqr�rn,


rezar alternadamente com outra pessoa ou
seguir mentalmente as orações que oµtro
reza em voz alta (cân. 934 § 1 )
A oração . deve ser devota e atenta, isto é,
não a.. devemos rezar voluntàriamente dis­
traídos.
Quando para lu_çrar a indulgência se. ,re­
queira a Visita de uma igreja, a oração $e­
gundo as intenções do Santo Padre deve ser
rezada durante a V isita. Noutros casos pode
rezar-se em qualquer parte.

3. Visita da Igreja

Quando, para lucrar a indulgência, se


ponha po.r condição a Visita de uma igr�ja,
há que visitar de facto uma igreja ou capela
pública e nela orar. Chamam-se capelas pú�
blicas as que o bispo determina exclusiva­
mente para o culto, têm porta para a · via
pública e são franqueadas ao público pelo
menos durante os ofícios divinos.
As pessoas que vivam em comunidade
em casa.s que não têm igreja ou capela; pú­
bl i.c a (casa s de educação ou ensino, hospi­
tais, etc.) e todas as pessoas que vivem. e
servem nas mesmas casas, podem ganhar
todas as indulgências que não requerem a
Visita de igreja ou capela dete!minanda, vi­
sitando a capela da sua casa em que sati�­
fazem a obrigação de ouvir missa (cân. g�g).

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T R1BU N A L D A PENITÉN C1 A 45 5_

Esta concessão não vale quando à casa está


anexa igreja ou capela pública.
- Se por qualquer motivo se não pode en­
trar n8 igreja, basta rezar diante da , porta
da mesma.
Quem no qia da indulgência foi à igreja
a confessar-se e comungar, já cumpriu a
condição da visita da igreja, quando ela se
requeira para ganhar a indulgencia.
4. T e m po útil para l ucrar a Indulgência
A indulgência concedida para determi­
nado dia ganha-se nesse dia, da meia noite à
r:neia noite. Deritro desse tempo se devem
recitár as orações ou faze� os exercícios pie­
dosos ou obras pias que se prescrevem para
lucrar a indulgência.
Se para lucrar a indulgência se reqúer a
visita de uma igreja, pode ela fazer-se já de
véspera desde o meio dia. A oração que se
haja de fazer segundo as intenções do Sumo
Pontífice, não se exigindo visita a uma igreja
deve-se· rezar no dia da indulgência.
Quando a indulgência plenária for --con­
cedida para -s e ganhar dentro de período de
tempo mais ou menos longo (nos tríduos,
missões, retiros etc.), a visita da igreja e
oração segundo as intenções do Santo Padre
podem geralmente fazer-se em qualquer dia à
e:'5êoiha do próprio, dentro desse período _de;..
signado.. A Confissão pode fazer-se nos oito
dias que precedem aquele que se escolheu

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O CRI S T Ã O. N O
-;.•

para lucrár_ a indulgência ou dentro da "ºi"


tava que se se gue ao final desses piedosos
exercícios, e a ·Comunhão na véspera dà dia
escolhido para ganhar a indulgência ou na
mesma oitava que se segue ao final dos . exer­
cícios piedosos (cân. 93 1 § 2 ) .
A ordem das obras prescritas para ·ga-.
nhar as indulgências, fica ao arbítrio ·de
cada um. Há todavia que reparar nisto :
é preciso estar em graça quando se cumpre
a última condição prescrita.
A fórmula que por vezes vem na con­
cessão da indulgência «quem , depois de se
confessar e comungar, rezar esta oração> ou
« fizer uma visita à i greja » , etc., não signi:­
fica que a Confissão e Comunhão se devam
fazer antes d& reza ou da Visita, mas sim­
plesmente que para lucrar a indulgência é
preciso confessar-se e comungar.
Seja qual for a ordem por que se cum·
pram as condições para lucrar a indulgência;
só ao c�mprir a última de facto a ·ganhamos.
Assim : Se só num dos dias da oitava de­
pois do dia da .indulgência nos confessamos
e comungamos,
. . só então lucramos a indul-
...
gencia.
5. Transferência das indulgências
Sucede às vezes que a autoridade ecle•
siástica transfere para outro dia a festa· a
que andam anexas as . indulgências.
Nesse caso, se a festa que se transfere

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T R I B U N A L D A PºE 'N I T Ê N C I A 457.

para· outro:. dia se celebra com solenidade


exterior, também as indulgências para esse
dia se transferetJ?. (cân. 922 ) . Por exemplo :
.

para o Domiqgo seguinte é transferida a


fe�ta do Padro�iro ; para esse Domingo, são
transferidas as indulgências que lhe · estejam
anexas. Porque cai ao Domingo o dia 2 de
Novembro, a comemoração dos Fiéis De-:
funtos é tr�nsferida para. o dia 3 ; no �fa 3·
(isto é, desde o meio dia do dia 2) se ganham
as indulgências plenárias a favor das almas
pelas Visitas que se fizerem à igreja.
Se a festa transferida não tem. solenidade
externa ou. só. o ofício e missa se transferem
para outro dia , então .s e a transferênciá é
p�rpétua, as indulgências acompanham a
festa ; se é ocasional, não acompanham ..

6. Comutação das obras 'prescritas.


As obras de · piedade requeridas pará lu­
crar'· as indulgências, qualquer confessor �s
podé comutar noutras às pe§soas que; . por
impedimento legítimo, �s não possam cum�
p�ir. Se, por exemplo, alguém, porque '.-está
dbe�te, não pode �azer a visita · da igreja.' ori
r�ç:�ber os sacramentos, lucra . as indulgên-:
cias se qumpre as : outras condições pres­
critas e mais as obras de piedade pelas qú-ais
_ o· cónfessor comutou a visita da igreja ou a·
Çompnhão (cân. g3J).

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O C RI S T Ã O N O

Indulgências mais com uns e Importantes :

1 . Indulgências d a hora d a morte

1 .º Todo o s acerdote, por concessão do Santo


Padre� pode dar aos moribundos a bênção apostó­
lica, depo is de lhes ministrar os últimos sacra­
mentos. Esta bênção tem indulgência plenária que
se lucra no momento preciso da morte.
Para ganhar esta indulgência requerem-se as
seguintes condições :
a) A Confissão e a Comunhão se for possfvel.
b) A piedosa invocação do nome de Jesus, feita
ao menos com o coração não sendo posstvel de ou­
tra forma. Quando se não puder receber os sacra­
mentos, a invocação do nome de Jesus deve fazer-se
com o coração contrito.
e) Aceitar a morte com paciência, em expiaÇã·o
dos pecados cometidos.
2.0 Têm também indulgência plenaria à hora
da morte nas mesmas condições : todos os reli­
giosos ; o s que em vida frequentemente invocaram
o nome de J esus ; os que à morte trazem consl"go
ou têm j unto de si objectos religiosos indulgen­
ciados com as i ndul sências apostólicas (terços,
crucifixos, medalhas; imagens) ; o s confrades das
irmandades e associados das congregações cano­
nicamente erectas·.
Porque muitos fiéis morrem de morte repentina
e por isso lhes falta ocasião de cumprir as condi­
ções que se requerem p ara lucrar as indulgências
da hora da morre� Pio X em g de Março de lgó4
concedeu indulgência plenária para a hora da morte
a todos aqueles que uma vez na vida, confessadqs
e comungados, rezarem com verdadeiro amor �e
Deus a seguinte oração :
·

((Meu Senhor e meu Deus, aceito de boa von­


tade e desde agora, de vossa mão, a morter de
qualquer modo que ela me venha, segundo o vosso

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T R I B U N A. L D A P E N I T Ê N C I A 45g

beneplácito, corn todas as . suas agonias, dores e


sofrimentos».
Caso, depois, cumpridas estas condiçóes1 se
tenha a infeli'c idade de cair em pecado mortal, nem
por isso se deixa de ganhar a indulgência desde
que .à hora da .. morte - se. esteja reconciliado ,com
Deus e em sua graça. , ., . .
A indulgência plenária da hora da morte pode,
1>9is, lucrar-sé de vé.rios modos, mas uma só y�z, . �
só�ente em favor do próprio, a: não ser que se _t enha
feito o acto heroi·co e não se tenha dele exceptuado
esta indulgência.
Grande graça concede a santa Igreja com esta
indulgência plenária. Çom ela todo o fiel cris·tão,
na hora decisiva da morte, recebe pleno perdão de
todas as penas temyorais devidas :·pelos · -p-ecados
cometidos e ainda nao expiados ou perdoados.

li. Indulgências da Via-Sacra

· Os fiéis -que fizerem a Via-Saera em lugar onde


ela . tenha · sido legitimamente eregida, lucram in­
dulgência plenária tantas vezes quantas a fizeram.
Para gan h�r estas indulgências, basta :
a) Estar em ·graça, e ter intenção de as fücrar.
b) Percorrer as 14 estações, indo de uma a
outra, e · parando diante de cada uma. Quando se
fu, · a Via-Sacra publicamente e em comum, se não
é possível passar de uma estação a outra sem · ·per­
turbar os assistentes, · basta que quem preside � ce­
rimónia, vá percorrendo as estações e recitando .a s
costumadas preces, e que os demais fiéis, mesmo
dos s eus lugares, lhe respondam. O mesmo se
diia quando as comunidades religiosas fazem a
Via-Sacra em suas capelas ' que, por . demasiado
acanhadas, não permitem a todos percorrer as es­
t ações. S . . Leonardo de . Porto Maurício aconselha
que, quando assim suce der, os fiéis se vão vol­
tando para cada uma das estações e se levantem e
ajoelhem a cada uma delas. S e a pessoa que pre-

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O CRISTÃO NO

side à cerimónia recita · no púlpito as costumadas


preces, para se ganharem as indulgências é preciso
que todos se levantem e ajoelhem a cada uma das
estações (Berniger-Hilgers) .
e) N ão interromper consideràvelment� o per­
curso de todas as estações com ocupações ou tra­
balhos, profanos. Interrompê-las, porém, para se
confessar ou comungar, para assistir à missa, ou
quâlquer devoção que se celebra no lugàr onde
está erecta a Via-Sacra, não faz perder as · iri <iµl­
gências.
d) Meditar na Paixão de Nosso Senh.o r ao
meno·s durante . alguns instantes em cada uma , �as
estações. Também é costume em cada uma ,d�la�
rezar um Padre-Nosso e Ave-Maria. Não é precis()
meditar em c ada estação o passo do S enhor que
ela representa ; basta meditar qualquer passo �a
Paixão de Jesus.
cc Quem durante ' toda a Via-Sacra,- diz S. Leo­
nardo de Porto Maurtcio, meditasse a penas um
mistério da Paixão, ganharia as indulgências». Esta
br.eve . meditação cada um a fará segundo a :sua ca­
pacidade. As pessoas que não sabem meditar; ;dit
o mesmo ::;, Leonardo, devem ao menos saber qu�
as Cruzes lembram os lugares onde Jesus sofreu os
tormentos com que nos remiu, e esforçar-se por
excitar
. na alma a compaixão para com o Salva;dor.
· .• • .
Além desta indulgência plenária, ourra· indul­
gência plenária ganha quem faz a Via-Sacra rio tlia
em que comunga, ou se comunga dentro do mês em
que fez dez vezes a Via-Sacra. · ·

, Se começada a Via-Sacra, por causa razoável


se teve de interromper, por cada estação que se
perc,o rreu� lucram-se 10 anos de indulgência.

Via- Sacra feita por Crucifixo para i sso i ndu lgenciado


' Os navegantes, os que estão presos em cadéias,
os enfermos, os que vivem em território de infiéis

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T R l B l,; S A L n .\. P E � lT E � Cl Â. �

ou d.e qualquer modo estão legitimamente impe­


àidos .de �percorrer as estações da Via-Sacra do
modo acima descrito, lucram as mesmas · indulgên­
cias da Via-Sacra todas as vezes que contritos e
tendo. . n.a mão um Crucifixo · benzido para esse fim
por sacerdote autorizado;- rezarem devotamente ·20
yezes· o Padre·-:Nosso, Avé-Maria e Gló:ria, a saber,
..

um Padre-Nosso, Ave-Muria · e Glória por cada uma


das estações, cinco em memória das Cinco Chagas
de Nosso Senhor, e mais outro segundo as inten­
ções do Sumo Ponufice.- E se . por motivo razoável
não. puderem levar · ao fim os vinte . Padre-Nossos,
Avé-Marias e Glórias, ganham a indulgência
. de dez
anos por cada Padre-Nosso; Ave-M aria e Glória
que .rezaram.
E l:ucram ainda a.s mesmas indulgências os en­
fermos que . por motivo da doença .não podem; sem
grave· incómodo ou dificuldade, fazer a Via-Sacra
de qualquer dos dois modos supracitados, ·desde
que com afecto e contrição beijem ou simplesmente
olhem o Crucifixo benzido para este fim, que alguém
lhe apresente, e rezem, se puderem, breve oração
ou jaculatória em memória da Paixão de Nosso
Senhor.

I l i. I ndul gênci a da Porci úncula


Conce :lida, de principio, à cape lá de Nossa
Senhora dos Anjos da Porciúncula em Assis, foi
depois estendida a todas . as igrej as e cap elas pú­
blicas das três Ordens Franciscanas, e amda, por
privilégio es pecial da Santa Sé, a outras igrejas e
capelas públicas.
. O dia próprio dá indulgencia é o dia 2 de
Agosto, mas os Ordinários do lugar, párocos, ca...
pelães ou reitores das igrej as que têm este privi­
légio_, podem, p�r justos · motivos, transferir a indul­
gência para o Domingo seguinte · nos anos em que
o dia 2 não calhe ao Domingo.
Todo o fiel cristão ganha indulgência plenária
visitando as igrejas e capelas públicas acima men-

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O C R I S T Ã. O N O

cionadas no dia 2 de Agosto ou Domingo seguinte


(se par .1 ele foi transferida a indulgên c ia), desde
que . cumpram as condições que se explicam. a
segmr.
Os Irmãos Terceiros de S. Francisco podem
também ganhar a indulgência visitando a igreja ou
capela em que está erecta a Fraternidade da Ordem
Terceira ; e quando estej am em lugar onde não
haja igreja ou capela pública de qualquer das três
Ordens Franciscanas ou privilegiada com a in :lul­
gência da Porciúncula, ganham-na ainda visitando
a igreja paroquial. Não podem, todavia, lucrar a
indulgência no Domingo para que foi transferida
se já a ganharam no próprio dia 2.
As condições requeridas para ganhar as indul­
gências da Porciúncula s ão : visita de igreja ou
capela pública das acima mencionadas, Confissão,
Comunhão e oração segundo as intenções do Sumo
Pontf fice.
a) A indulgência ganha-se tantas vezes quan­
tas se visitar a igreja ou capela pública desde o
meio dia do dia 1 de Agosto até à meia noite do
dia 2 (ou desde o meio dia de S ábado até à meia
noite do Domingo, quando a indulgência foi trans­
ferida) . S ó se contam por visitas as vez�s que de
facto se entra n a igreja e dela se sai. Tornando
outra vez a entrar e a sair, fez-se nova visita fiUe
tem igual indulgência plenária.
D as indulgências plenárias, uma aplica-se pelo.
próprio que faz a visita, e todas as demais pelas
almas do Purgatório. Cada um a delas se deve
apl icar por uma alma determinada.
b) A Confissão pode fazer-se nos oito dias que
precedem o dia da indulgência ou dentro da oitava
seguinte, e a Comunhão pode fazer-se na véspera
do di a da indulgência ou dentro também da oitava
seguinte. Quem estivesse em pecado mortal e só
depois de feitas as visitas se confessasse e comun­
gasse, conviria, quando faz as visitas, :i;>ôr-se em es,
tado de graça com um acto de contrição perfeita.
e) A oração a apli car segundo as intenções

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T R l 1-\ U N A L D A. P E N 1 T Ê N C 1 A 4�3

do Sll� o P <?nttfice é o· que se chama um � esta.çáó,


ou se1a, seis vezes o P adre-Nosso, Ave-Mana e
Glôria em cada. uma das visitas.
A s pessoas que por legitimo impedimento não
possam cumprir quaisquer âestas condições, podem
os confessores comutâ-las noutras.

IV. I ndul gên c i as do dia dos Fiéis Dafuatos

No dia dos Fiéis Defuntos, ou seja, no dia 2 de


Novembro, ou no dia 3 quando o dia 2 calha ao
Domingo, os fiéis lucram indulgência p lenãria to­
das as vezes que visitam qualquer igre1a ou capela
pública e oram ai segundo as intenções do Santo
Padre. As visitas podem fazer-.;e desde a véspera
ao meio dia. Estas indulgências só . são aplicá.veis
às almas do Purgatório, e - cada uma delas por· uma
alma determinada.
Condições requeridas : Confissão, Comunhão,
visita da igreja com oração segundo as intenções
do Sumo Pontífice. S atisfaz-se a estas condições
da forma que acima se diz para a Indulgência da
Porciúncula.

V. lndul gênc;ia da festa do Rosário (7 de Outubro)

Os fiéis ganham indulgência plenária todas as


vezes que no dia 7 de Outubro visitarem qualquer
igreja ou c·apela pública onde esteja erecta a con­
fraria do Rosário ou exposta à veneração a imagem
de Nossa Senhora do Rosário.
Condições requeridas para lucrar a indulgência· :
Confissão e Comun1'ão e a Visita com oração se ­
gundo as intenções do S anto P adre, talqualmente
com:o para a indulgência da Porciúncula. :
- Nas mesmas condições tódos os fiéis podem
lucrar indulgência plenária, · mas uma só vez, em
qual que{' · dos dias. à escolha, na . oi tav:a da festa do
Rosário.

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O :C R 1 S T Á O N O

VI. ·Indul gência no dia de Nossa Senhora do Carmo


(16 de Julho)
.
Todos os fiéis podem ganhar indulg ênc1à ple­
ná � ial . na� � esmas con�ições acima anotadas' para
a mdulgenc1a da Porcmncula, todas as vezes ' que
no dia\ da Senhora do Carmo ( 1 6 de Julho) v1si­
tare m 9.ualquer i grej � ou capela pública dos, car­
meht- . as. Os ass·o c1ados do Carmo_ ganham t ambém
·· ·
a s mesmas indulgências visitando a igreja ou capela
pública da sua confraria. ·

V I I . Indul gências dos exercJcios de p iedade fe itos


em honra do Sagrado Coração de Jesus

1 .º Quem na primeira sexta-feira do mês, con­


fessando-se e comungando, meditar por algum
tempo na infinita Bondade do Coração de Jesus e
fizer oração segundo as intenções do Sumo . Pon­
tífice, ganha indulgência plenári a.
2.0 Também ganha indulgência plenária quem
visitar uma igreja ou capela pública no di a em que
nela se festeja o Sagrado Coração de Jesus, e con­
fessando-se e comungando ai orar segundo as in­
tenções do Sumo Pontífice.
3.0 Quem fizer a novena preparatória para a
festa do Sagra do Coração de Jesus com orações
aprovadas pela igreja ou outra vez ao ano fizer a
mesma novena, lucra em cada dia da novena 300
dias da indulgência, e confessando-se e comun..;.
gando e oranâo segundo as intenções do Sumo
Pontífice, ganha indulgênci a plenária num dos dias
da novena à sua escolha.

V I I I . Indu l gências das terças-fei ras em honra


de S. Ant6nio

Têm indulgencia plenária em todas as terÇas­


-feiras, os fiéis que, confessados e comungados,

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1' R l B U N A L D A, P E N 1 T Ê N C 1 A 465°

assistirem à devoção que nas igrejas franciscanas


se faz em .honra de S. António com exposição do
Santíssimo S acramento, desde que se demorem al­
gum tempo durante a exposição do Santíssimo e
rezem segundo as intenções do Santo Padre.

IX. I ndul gênci as do acto her6ico

Quem faz o acto heróico de que acima se fa­


lou, ganha indulgência plenária a favor das almas
do Purgatório :
i .0 Sempre que comunga, estando confessado,
e visitando igrej a ou capela pública onde reze se­
gundo as intenções do Santo Padre. Se ainda não
vai à comunhão ou está impossibilitado de comun­
gar, cumprindo qualquer boa obra que lhe indicar
o confessor autorizaao para isso pelo bispo dio­
cesano ;
2.0 Todas as ·segundas-feiras, confessando-se
e comungando e assistindo à missa :Jas almas.
Quando a ela não puder assistir, vale, para lucrar
a indulgência, a missa que ouviu. no Domingo.
Quem fez o acto heróico pode aplicar, pelas
almas, todas as indulgê .ncias, mesmo as que são
concedidas somente a favor dos vivos.

X. Indul gências da O rdem· Tercei ra da S. Francisco

Os Irmãos d à Ordem Terceira


1 .º Podem ·r eceber a Bênção Papal duas vezes
ao ano, nos dias livremente escolhidos pelo Paâ.re
Comissário. A Bênção Papal é dada pelo mesmo
Padre Comissário ou por outro sacerdote para isso
autorizado ; e os Irmãos Terceiros que a recebem,
se se tiverem confessado e· comungado e orarem
' segµndo as intenções do Sumo Pontífice, lucram
indulgência plenária ;·
2 .0 Pode·m receber a Absolvição Geral que
também t ê m indu_lgência plenária nas condições
comuns de confissão, comunhão e oração segundo

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O CRISTÃO NO

as intenções do Sumo Ponufice, mais de1 3o vezes


ao ano, nos dias fixados no c alendário franciscano.
O sacerdote autorizado para dar a Absolvição
Geral (estão autorizados a dá� la publicamente os
Superiores da Ordem Franciscana, os sacerdotes
por eles facultados, ou, na falta de uns e outros,
qualquer sacerdote aprovado p ara confessar ; e par­
ticularmente, no confessionário, com fórmula abre­
viada, todos os confessores a podem dar) em nome
da Igrej a implora, para quem recebe a Absolvição,
a graça e misericórdia de Deus, indulgência, bênção
e libertação dos µiales do corpo e da alma, pelos
méritos de Cristo. Desta bênção da Igreja emana
força que cura, abençoa e santifica. E com quanta
mais confiança, humildade e abandono nas mãos
de Deus se receber, tanto m aiores, mais úteis e
vivos serão os seus efeitos ;
3 .0 Todas as vezes que rezarem a estação ou
sej am cinco Padre-Nossos, Ave-Marias e Glórias e
m ais um Padre-Nosso, Ave-Maria e Glória segundo
as intenções do Sumo Pontífice, podem lucrar :
a) por cada vez, dez anos de indulgência ;
e uma vez no mê�, s e a rezarem todos o s dias, in­
dulgência plenária nas condições costumadas, ou
seja, confessando-se, comungando e orando segundo·
as intenções do Sumo Pontífice ;
b) e as indulgências das Estações de Roma
(também chamadas indulgências da Bula) e que
são, segundo o decre � da Sagrada Penitenciaria
Apostólica de 25 de Fevereiro de 1933 : indulgência
plenária no dia das Estações, confessando-se, co­
mungando, visitando em vez da igreja estacionai,
qualquer igreja franciscana ou na falt a dela a igreja
paroquial, e orando ai segundo as intenções do
Sumo Pontífice ;
Indulgências de dez anos, se, contritos, fizerem .
a visita, a oração segundo as i ntenções do Sumo
Pontífice, mas não se confessarem e comungarem.
Na Ordem Franciscana é uso rezar-se a estação
de joelhos e com os braços em cruz em ·sinal de
humildade e devoção.

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T R I B U � A L D A. P E N I T E N C I A. .tó;

XI. I ndul gências .do Rosãrio


..

Chama-se ccrosário» a reza de 1 5 mistérios,


cada um deles com um Padre-Nosso e dez Ave­
-Marias. Esta reza é como se fora coroa de rosas
com que se honra a Virgem Maria, e dai o nome de
rosário. E a cada um dos grupos de um Padre­
-Nosso e dez Ave- Marias dá- se o nome de «mis­
tério» porque em cada um del es se deve meditar
um mistério da vida de Jesus; A cada série de
cinco mistérios chama- se «terço» : o terço dos mis­
térios gozosos, o terço dos mistérios dolorosos, e o
terço dos mistérios gloriosos.
Por cada vez que rezarem o terço lucram os
fiéis cinco anos de indulgência. E rezando-o com
outros, quer em público quer em particular, lucram
dez anos de indulgência uma vez ao dia, e indul­
gência plenária no último Domingo de cada mês,
confessando-se, comungando e visitando uma igrej a
ou oratório público se o tiverem rezado ao menos
três vezes em cada uma das �emanas do mês.
Por cada: vez que rezarem o terço · deante do
S antíssimo Sacramento públicamente exposto ou
guardado no sacrário� ganham indulgência plenária,
confessando-se e comungando.
Não há obrigação de rezar os cinco mistérios
de uma só vez ; podem rezar-se separadamente,
contando que todos os cinco se rezem no mesmo
dia. Para ganhar estas indulgências não é preciso
passar as contas.

Rosãrio de S. Domi n g os
Quem rezar o terço passando um rosário in­
dulgenciado e elos Padres Dominicanos, além das
supracitadas mdulgências ganha mais cem dias de
indulgênci a por cada Padre-Nosso e Ave-Maria que
rezar.- Quando duas ou. mais pessoas rezam o terçq
em comum, para se haverem estas indulgências,
basta que utn dos fiéis vá passando o rosário in­
dulgenciado�

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..;68 O CRISTÃ O NO

Rosári o dos Crúzios·

Também os Pàdres· Crúzios, ou outros sacer­


dotes para isso autorizados, podem benzer os terços .
do rosário, indulgenciando-os. Quem rezar devo­
tamente um Padre-Nosso ou Ave-Maria passando
um terço assim indulgenciado, ganha de cada vez
quinhentos dias de indul s ência. Para ganhar estas
indulgências não é prec1s9 ter tenção de rezar o
terço completo nem meditar os mistérios do ro­
sário.

Rosári o de S. Brígida

O rosário de S. Brfgida (assim chamado em


lembrança do muito que esta Santa· honrou a Vir­
gem Maria) consta de cinco mistérios, cada um
deles com dez Ave-Marias e um Credo. Podem
benzê-lo e indul genciá-lo os sacerdotes que têm
faculdades para isso dadas pela Santa Sé. Quem
tem poder p ara benzer objectos de piedade com as
chamadas mdu ! gências p apais, em seral t ambém
tem poder de mdulgenc1ar os rosários de S. Br�­
gida.
Quem rezar o rosário de S. "Brfgida passando
o rosário benzido e indulgenciado, ganha com a
reza de cada Padre-Nosso, Ave-Maria e Credo cem
dias de indulgência, desde que tenha intenção de
rezar o rosário todo. Se não tiver essa intenção,
não ganha estas indulgências. Para as ganhar tam­
bém não se exige a meditação dos mistérios.
O mesmo terço ou rosário pode ser benzido
e indulgenciado com as indulgências dos Domini­
canos, dos Crúzios e de S. Brígida.
Mas quem os reza, só pode ganhar de cada vez
uma das indulgências ·: aquelas que tiver intenção
de lucrar. Quem rezar o terço pelas contas ben­
zidas pelos Dominicanos ou Crúzios, ganha ao
mesmo tempo as indulgências do terço e as que
são concedidas aos terços indulgenciados.

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T RI B UNAL D A P E NITÊN CIA 46g

I ndulgências da Coroa Seráfica

O «rosário das Sete Alegrias» de Nossa Se-.


nhora, chamado também «Coroa Seráfica», const a
de sete . mistérios cada u m deles com u m Padre­
-Nosso e dez Avé-Marias, e ao fim mais duas Ave-
-Marias e ainda um Padre-Nosso e Avé-Maria pelo
Sumo Pontffice. Chama-se Coroa das Sete Ale­
grias porque é consagrado aos sete mistérios go­
zosos da vida de Nossa Senhora : Anunciação,
Visitação, Nascimento do Senhor, Adoração dos
Magos, Encontro de Jesus no templo, Ressurreição
do Senhor e Assunção de Nossa Senhora. E .cha­
ma-se Coroa Seráfica porque· foi na Ordem 1Será­
fica ou Franciscana que começou o seu uso.
Os franciscanos das Três Ordens ganham in­
dulgência plenária sempre que rezarem a coroa se­
ráfica. Poaem separar-se os mistérios e não é pre­
ciso . passar as conts.s para ganhar a indulgência.
Também lucram indulgência plenária .t odos os
fiéis 9ue tomam parte na recitação pública da Coroa
Seráf1ca feita em qualquer igreja ou capela pública
de qualquer das Três Ordens Franciscanas . . Para
ganhar estas indulgências não s.e requer a confissão
e comunhão ; mas, como para todas as indulgên­
cias, requer-se o estado de graça.

Apl icação de indul gências

Os sacerdotes que têm faculdade de benzer


terços e rosários com as indulgências dos Padres
Crúzios ou de S anta Brf gida, aplicam-lhes tais in­
dulgências benzendo-os com ó simples sinal da cruz.
Aos terços e rosários feitos de matéria frágil
não se podem aplicar e�tas indulgências. Não se
considera matéria frágil, para os terços e rosários,
o vidro macisso,. o estanho ou o chumbo.
Os terço s e rosários indulgenciados só p erde·m
as indul �êacias quando se dPstroem ou sao ven­
didos (canc. 924 § .2 ) . Não as perdem quando al-

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O C R I S T .Á O N O

guém os dá a . outra pessoa ; e lucram as indul�ên­


cias todos os que por eles rezarem mesmo que não
sejam os donos.
Quando um terço se quebra e torna a encadear,
nem p or isso perde as inaulgências, mesmo que se
substituam algumas poucas contas que se tenham
perdido.
Como os terços e rosários perdem as ir.dul­
gências quando são vendidos, só devem ser ben­
_zidos depois de comprados. Mas comprar, no caso,
é encomendar ao vendedor. E por isso o mesmo
vendedor pode tratar de alcançar a bênção indul­
genciante logo que lhe tenha sido feita a encomenda,
mesmo antes de receber a paga. Se várias pessoas
pedem a outra que lhes compre terços ou rosários,
pode esta comprá-los, mandá-los benzer e só depois
receber o preço, das pessoas que lhe fizeram a en­
comenda.

XI I . I ndulgências da Bênção papal ·.e das Bênçlos


dadas pelo Papa
A Igrej a recebeu de Jesus ,Cristo o poder de
transmitir_ os frutos da R edençao,_ e também o po­
der particular de abençoar ou benzer e com suas
bênçãos aplicar aos homens as graças da Redenção.
E a Igreja transmite aos sacerdotes, na orde­
nação, este poder de abençoar. cc O que estas �á<? s
abençoarem será t ambém por Deus a b ençoado», diz
o bispo quando ordena o sacerdote.
Portanto a bênção do sacerdote é a súplica
o fi cial que, em n ? me. de J esus e da sua Igrej a, ele
fa z ao Eterno Pai a implorar dele graças para os
homens, em atenção aos méritos de Cristo. A bên­
ção do sacerdote é, em certo modo, a bênção de
Deus . .
Quanto mais subido o grau de j erarquia. do
sa cerdote que abençoa, tanto mais amplo o seu
poder de abençoar. A plenitude de tal poder re­
side no Sumo Sacerdote, o Papa, o bispo de Roma,
cabeça da Igreja e Vigário de Jesus Cristo. E por

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T R I B U N A L n· A P E N I T Ê N C I A

isso sempre até hoje foi sumamente apreciada e


desej ada a sua bênção.
E' o Papa, atendendo à piedosa devoção dos
fiéis, de boamente concede a sua bênção e com ela
consagra e abençoa objectos de piedade que, depois,
u.sado � pelos fiéis, lhes alcancem as graças e mise­
ricórdias de Deus.
Porque não pode multiplicar sua presença para
sempre acudir .a satisfazer os desejos dos fiéis que
imploram sua bênção; concede o Papa muitas vezes
aos bispos e sacerdotes que em seu nome e em sua
vez abençoem. , _

E a esta bênção dada pelo Papa ou em seu


nome, às pessoas ou objectos religiosos, andam
juntas muitas e grandes indulgências.

z. o Indulgência da Bênção papal. Quem re­


cebe a Bênção papal g�nha indulgência plenária,
confessando-se, comungando e orando pelo Pap a e
pela Igreja, e também pelo bispo, se é o bispo
quem dá a Bênção do Papa .

2.º Indulgências que se ganham com o uso de


objectos benzidos pelo Papa ou por sacerdote au­
torizado para em seu noml os benzer. Os objectos
aptos para receber tal bênção são : rosários e ter­
ços, coroas, cruzes, crucifixos, pequenas estátuas e
medalhas. Não são suscepuveis de receber esta
Bênção : as imagens impr�ssas ou pintadas ; as
cruzes, crucifixos ou estátuas feitas de qualquer
matéria frágil ou quebradi ça, como por exemplo o
estanho, o chumbo ; medalhas e pequenas estátuas
que não sejam de santos canonizados ou inscritos
em martiriológio oficialmente aprovado. .
As indulgências aplicadas pelos missionários
seculares ou regulares aos objectos religiosos por
ocasião de missões, retiros, trfduos, romarias, são
geralmente as indulgências papais também cha­
mada$ apostólicas.
Para ganhar as indulgências anexas a esse

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472 O CRISTÃO N O

obj ectos de piedade, é preciso trazê-los cada um


consigo ou tê-los no seu quarto ou em lugar con­
veniente de sua casa.
Estas indulgências papais ou apostól icos são :
a) Indulgência plenária na hora da morte.
Quem à morte tiver junto a si crucifixo indulgen­
ciado com as indulgências apostólicas ou consigo
trouxer medalha ou crucifixo da mesm a sorte in­
dulgenciado, ganha indulgência plená.ria confes­
sanâo-se e comungando se o ,puder fazer, e invo­
cando o nome de Jesus ao menos com o coração
se não puder ser oralmente, e contrito ace itar
com resignação a morte, recebendo-a da mão de
Deus em expiação dos pecados cometidos. Quem.
estando em pecado mortal se não pudesse con�
fessar, só ganharia a indulgência se tivesse con­
trição perfeita ;
h) Indulgência plenária, em cada uma das se­
guintes festas : Natal, Páscoa, Ascensão, Pente­
costes, SS. Trindade, Corpo de Deus, Coração de
Jesus, Purificação de N. S enhora das Candeias�
Anunciação de N. Senhora, Imaculada Conceição,
S. João Baptista, S. José, Patrocfnio de S. José,
S. Pedro e S. Paulo, S. André, S. Tiago, S. Barto­
lomeu, S. Mateus, S. Simão e S. Judas Tadeu,
S. Matias, Todos os Santos. Quem nestes dias ti­
ver consigo da maneira que acima se diz, qualquer
objecto religioso benzido com Bênção do Papa,
confessando-se, comungando e orando segundo as
intenções do Sumo Pontífice, tem indulgência ple­
nária. E nas mesmas condições a têm os que, ao
menos uma vez por semana, costumam rezar a
coroa do Senhor ou uma das coroas de N. Senhora.
o rosário ou o terço, o Uffcio Divino, o u o Ofici Ó
Menor de N. Senhora, o O ficio de Defuntos, os sal­
mos penitenciais, os salmos gradua is, ou costumam
ensinar catequese, visitar os encarcerados ou os
enfermos �o·s hospitais, auxiliar os pobres, ouvir
. ou rezar missa ;
e) Outras muitas indulgências parciais. Para
as lucrar, não esquecer de� ao menos cada dia na

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TR1 BUNAL D A PE N 1TÊ N CIA ·473

oração da manhã, renovar a - intenção de lucrar


todas a:s indulgências concedidas aos· actos de pie­
dade e. boas obras que se pra� icam ; .
d) O · terço ou rosário indulgenciado com as
indulgências apostólicas pode receber também as
indulgências :lo rosário de S. Domingos, dos Crú­
zios e de S. Brfgida. E portanto com um _ só rosário
se podem lucrar ora umas ora outras indulgências.

X I I I . I ndul gências da medal ha d e S . Bento


Quem trouxer consigo a. medalha chamada de
S. Bento, feita de metal resistente,lucra indulgência
plenária em cada uma das seguintes festas : Natal,
Reis, Páscoa, Ascensão, Pentecostes, Santíssima
Trindade, Corpo de Deus, Conceição, Natividade,
Anunciação, Purificação e Assunção de Nossa Se­
nhora, Todos os Santos, e S. Bento (2 1 de Março),
desde que se confesse, comungue, reze segundo as
intenções do Sumo 1=-onttfice, e tenha o costume
de ao menos uma vez na semana rezar o rosário,
terço, Oficio Divino, Oficio Menor de Nossa- Se­
nhora ou ouvir missa (rezá-las, se é sacerdote) .
' .E. também lucra a indulgência da Bênção Papal na
Quinta-feira =:>anta e dia de P áscoa, confessando-se,
comungando, e rezando pela exaltação da Santa
Igrej a e corrserv .lção do Sumo Pontífice.
Além da medalha de S . Bento que é medalha
benta por sacerdote beneditino ou outro para isso
facultado pelos Superiores beneditinos, há a cha­
mada medalha-jubifeu de S. Bento. Quem devota­
mente a trouxer consigo, al ém das indulgências da
medalha de S. Bento, lucra indulgência plenária
nos dias de S. Bento (2 1 de Março), S. Escolástica
( 1 0 de Fevereiro), S. Amaró ( 1 5 de J aneiro), S. Plá­
cido (5 de Outubro), S. Gertrudes (17 de Novembro)
e Todos os Santos da Ordem de S. Bento (13 de
Novembro), no dia 1 de Outubro" e mais noutro dia
à escolha do próprio, confessando-se, comungando,
visitando uma igreja e rezando .ai segundo as in­
tenções do Sumo Ponttfice.

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O C RI S TÃ O N O

XIV. Medal h a-escapulário

Os fiéis que receberam, na forma prescrita pela


Igrej a, um ou m ais escapulários das irmandades
aprovadas, po lem, em vez deles, trazer ao pescoço
ou de qualquer outra maneira conveniente, uma
única medalha. Exceptuam-se os escapulários das
Ordens Terceiras. Estes só em casos raros podem
ser substitutdos por medalhas.
Os confrades das várias Írmandades que trou­
xerem esta medalha-escapulários, lucram todas as
indulgências e privilégios q ue lucrariam trazendo
os escapulários, inclusive, o « Privilégio sabatino».
Para maior clareza do assunto, convém ter
presente o seguinte :
Só tem as indul�ências e privilégios dos esca­
pulários quem canónica e válidamente o s recebeu,
isto é, quem entrou na respectiva confraria e re­
cebeu o escapul ário bento pelo sacerdote autori­
zado para fazer as admissões. E por isso só quem
estiver nestàs condições, lucra as indulgências e
participa dos privilégios, trazendo a medalha-esca-
pulário. _

A medalha deve ser de metal, ter de um l ado


a imagem do Coração de Jesus e no outro a ima­
gem de Nossa Senhora, e ser benzida para esse fim
por sacerdote que tenha faculdades para dar tais
bênçãos e com tantas cruzes quantas os escapulá­
rios que há de substituir.
Quem tem a faculdade de benzer e impor os
escapulários, tem t ambém o poder de benzer as
medalhas para substituição desses escapulários.
As medal h as podem ser indulgenciadas em
qualquer ocasião. e não é preciso que estejam pre­
sentes à bênção as pessoas que as hão de usar.
Como é preciso trazer o escapulário pa_ra gozar
dos seus privilégios e graças, assim também para
gozar dos mesmos é preciso trazer a medalha-es­
capulári o.
A m edalha pode cada um trazê-la presa no ro­
sário ou terço que sempre o acompanhe, mesmo

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N C .1 A 47_5 _

de noite. Quem de noite não quiser trazer consigo


o rosário em que trouxesse presa a medalha, deve
ter outra medalha indulgenciada para usar durante
a noite.

Medalhas- escapulários para soldados. Por es­


pecial concessão de Pio X, dada em 1 3 de Janeiro
e 22 de · Março de 1 9 r 2, podem os soldados parti­
cipar dos privilégios, graças e indulgências dos
escapulários e irmandades, desde que recebam e
sempre consigo tragam medalha-escapulário vàli­
damente benzida para esse fim, mesmo que lhes
n.ão tenham sido impostos os escapulários nem
tenham entrado nas respectivas irmandades. Os
soldados que assim receberam a medalha escapu­
l ário continuam à gozar dos privilégios e indul gên­
cias mesmo depois de terminado o serviço militar,
sem que para isso lhes sej a preciso receber os es­
capulários e entrar nas irmanâades.
Para lucrar as indulgências. e privilégios das
medalhas-escapulários, tanto os fiéis em geral
como os soldados devem satisfazer às demais con­
dições prescritas para ganhar as indulgências ou
graças dos escapulários.
- .

Que c�nsolações e riquezas nos dá a Igreja


com as suas indulgências. Assaltam-nos os amar­
gos receios de que. não estaremos suficientemente
purificados perante Deus e que sua jus�iça vai sobre
nós pesar ? -Tivemos (quem sabe ?) a desgraça de,
no passado, ter bebido iniquidades como água, e
cravou-se-nos à alma o ' pensamento de que a vida
por mais larga, nunca bastaria para expiar tantas
culpas ? Levar para a eternidade pecados sem
conta que, apesar de perdoados quanto à culpa,
será preciso expiar no Purgatório tempos e tempos,
e n_ão gozar entretanto da vista de Deus ! Perspecti­
·v as sombrias que podem apavorar sempre e sobre-
tudo na. hora da morte ! ·

Mas vem a Igreja e consola-nos : Como repre­


sentante de Cristo; mãe indulgente e boa, corre em

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O CRISTÃO NO

nosso auxilio a oferecer-nos, em modo de indul­


gências, a superabundante satisfação de Cristo e
dos Santos. E aprove�tando tal socorro j á não
somos nós sózinhos a expi ar · nossas culpas : o D i­
vino S alvador e os Santos estão conosco a suprir
com seus méritos . o que por nós mesmos não po­
demos sat isfazer.
E a paz e tranquilidade enchem-nos a alma.
Foram muitas as nossas culpas ? Deus é Senhor de
"infinita santidade e justiça : , interpõe-se a Igrej a a
o ferecer os méritos de Cristo e dos Santos que nos
dá nas Indulgências, e a misericórdia Divina perdoa
e esquece as penas que t ínhamos merecido.
Nunca descuidemos as indulgências da Igreja
que de tanto valor nos ·podem ser. Sempre que as
pudermos lucrar, não desperdicemos riquezas t a­
manhas.

EPILOGO
Caro leito.r, todo o querer e poder humano, sem
a graça de Deus, é nada. Sem as bênçãos do céu,
seria vão o que tizéssemos. Pode o homem plantar
e regar, como dizia S. Paulo ; o incremento; esse
é só Deus quem o dá. As bênçãos vêm do Alto.
Por isso com fervor implora as graças divinas.
Este o primeiro conselho que te dei, o que sempre
te fui dizendo, e a última pal avra que te deixo ao
findar as instruções deste livrinho.
Suplica, implora de Deus suas graças para que
surtam efeito os teus esforços no caminho do bem.
A oração é o principio e o fim, o alfa e omega da
vida cristã.
«Reza t ambém por mim» escrevia S. Leonardo
de Porto Maurício numa das suas obras, e escrevo
eu também aqui a terminar, «não vá suceder que,
enquanto ajudo os outros, sofra detrimento a .minha
alma. Temo, como o A póstolo� vir a perder o céu
depois de ter andado a ensinar aos outros como o
hão de ganhar 11 .

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D ev o ci o n á ri o

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Permitimo-nos a libe'rdade
de variar um tarito. esta' �parte
do livro. Jã o tradutor': a ssim
fizera nas passada's · edições,
p e r.s u a d i d o que. bem ficava
uma a d a p t a ç ã o · êlo original,
feita em moldes largos. ·

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Oraçll es d' n,._Wiil �_,J:. ;;;y.�'/ ;�1 �
���· -� . ;Jt;!� f!
..

Ili
� 't, i..�·-;.'.>..!;(s�"' t. ,
Pelo sinal � da Sa . ����.tJ Q.&f
.

��-·
. ..

Deus, � Nosso Senhor,


migos. Em nome �o Pai "i a�� � e
.

do Espírito Santo. Amen.


Ao Rei dos séculos, imortal e invisível,
a Deus só, honra e glória por séculos de sé­
culos. Assim seja.
Senhor, tende piedade de nós ! Jesus -

Cristo, tende piedade de nús ! Senhor, -

tende piedade de nós !


Pai-Nosso, que estais no céu, santificado
seja o V ósso nome, venha a nós o Vosso
reino, seja feita a Vossa vontade assim na
terra como no céu, o pão nosso de cada dia
nos dai hoje, perdoai-nos as nossas ofensas
assim como nós perdoamos a quem nos tem
ofendido, e não nos deixeis cair em tentação,
mas livrai-nos do mal . Amen.
Creio em Deus Pai, todo-poderoso, Cria­
dor do céu e da terra ; e em- Jesus Cristo,
Seu único filho, Nosso Senhor'· o qual foi
concebido pelo poder do Espírito Santo,
n a_sceu da Virgem Maria, padeceu sob Pôn­
cio Pilatos, foi crucificado, morto e sepul­
tado, desceu aos infernos, ao terceiro dia
ressuscitou dos- mortos, subiu ao céu, está
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
. \,

sentado à direita · dê Deus Pai todo-poderoso,


donde há-de vir a julgar os vivos e os mor­
tos ; creio no Espí�ito Santo, na Santa Igreja
Católica, na comunicação dos Santos, na re­
missão �os pecados; na ressurreição da carne,
na vida · eterna. Amen.
A Vós, Senhor, levanto a minha súplica.
E de manhã, antes de tudo, sobe ·até Vós
minha oração.
Os meus lábios se encham de louvores,
para cantar todo o dia V ossas glórias e gran­
dezas .
Senh9r, desviai dos meus pecados os
Vossos olhos, e apagai todas as minhas
iniquidades .
Criai em mim um coração puro, ó meu
Deus, e renovai sempre na minha alma o
espírito de rectidão.
Não me afasteis da Vassa presença, nem
tireis de mim a Voss a graça.
Dai-me a alegria do Vosso auxílio sal­
vador, e ajudai-me com o dom da fortaleza.
Espero no socorro que me há-de vir do
Senhor, que fez o céu e a terra ..
Dignai-V os, Senhor, conservar-nos .neste
dia sem pecado.
Tende compaixão de nós, Senhor ! Tende
compaixão de nós. .
Venha sobre nós, Senhor, a Vossa mi­
sericórdia, pois que toda a nossã esperança
está em Vós.

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T R 1 B U N A L D A P E N 1 T Ê N·C 1 A 481

Senhor, ouvi a minha · prece, e chegue


até Vós o meu clamor.
Senhor Deus Omnipotente que nos con­
cedestes cheg ar ao princípio deste dia, am­
parai-nos ho1e com 3: Vossa graça para não
cairmos em pecado, "e para que nossos pen­
samentos, palavras e acções, tendam sempre
ao cumprimento da Vossa justiça.
A Virgem Santíssima e todos os Santos
intercedam por nós junto do Senhor, para
merecermos o auxílio e a salvação, daquele
que vive e reina por séculos de séculos.
Assim seja.
Ó Seráfico Patriarca S. Francisco, dignai­
-V os, lá dos céus, lançar sobre mim a Vossa
santa bênção e atear em meu coração a
chama do amor que �a terra Vos abrasava.
Tomai-me sob a Vossa protecção, e alcan­
çai-me a graça da perseverança, de sorte
que, até . ao último ins�ante da minha vida,
todo o meu ser se consuma neste suspiro :
« Meu Deus e meu Tudo» .

Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guar­


daaor, pois que a ti me confiou a piedade
divina, sempre me rege, guarda, governa
e ilumina. Amen. /
Ó Deus, vinde em meu auxílio. Dai
.
pressa, . Senhor, em socorrer-me. . .

Glória ao· Pai, e ao Filho, e ao -Espírito


. Santo. Assim como era no princípio, e agora

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O C RI S T Ã O N O

e sempre e por todos. os séculos dos s éculos.


Assim seja.
Senhor Deus, Rei do céu e da terra, di­
rigi, santificai, guiai e governai neste dia a
minh� alma e o meu ' corpo, os meus sen­
tidos, palavras e acções no cumprimento da
Vossa Lei e nas obras ,dos Vossos manda­
.mentas, a-fim-de que, neste mundo e na
eternidade, mereça a liberdade e a salvação,
ó Salvador do mundo, que viveis e reinais
por séculos de séculos. Assim seja.
Meu Senhor e meu Deus, pelos méritos
de Nosso Senhor Jesus Cristo, concedei-nos
hoje ganhar todas as indulgências que pu­
dermos, para satisfazermos à Vossa Divina
justiça e para proveito e alívio das benditas
almas do Purgatório. Assim seja.
O Senhor nos abençoe � , nós defenda
de todo o mal e nos faça chegar à vida
eterna.
E as almas dos fiéis defuntos, por mise­
ri�órdia de Deus descansem em paz. Assim
seJa.

Oraçaes da noite

Em nome do Pai � e do Filho e do Es­


pírito Santo. A men.
Vinde, Espírito Santo, enchei os cora- .
ções dos V ossos fiéis e acendei neles o fogo
do V osso amor.

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T R IBU N A L D A P E � I T R N C I :\. .a�

Enviai o V osso Espírito e tudo será


criado. E renovareis a face da terra.
Ó Deus, que instruistes os corações dos
Vossos fiéis com as luzes do Espírito Santo,
concedei-nos que apreciemos rectamente to­
das as coisas segundo o mesmo Espírito, e
sempre gozemos da sua consolaçã0. Por
Cristo Senhor nosso. Ameq..
Pode fa'{er-se -aqui breve exame de cons­
ciência.
Eu, pecador, me confesso a Deus todo­
-poderoso, à bem-aventurada sempre Virgem
Maria, ao bem-aventurado São Miguel Ar7"
canja, ao bem-aventura:do São João Baptista,
aos Santos Apóstolos São Pedro e São Paulo
� a todos os Santos, que pequei muitas vezes
•por pensamentos, palavras e obras, por minha
culpa, minha culpa, minha tão grande culpa.
Portanto, peço e rogo à bem-aventurada sem­
pre Virgem Maria, ao bem-aventurado São
Miguel A rcanjo, ao bem-aventurado São João
Baptista, aos santos Apóstolos São Pedro . e
São Paulo e a todos os Santos, que 'rogueis
por mim a Deus nosso Senhor. Amen.
O Deus todo-poderoso se ·compadeça de
mim, e me leve por caminhos de vida eterna
e me conceda indulgência e perdão de todos
�s meus pecados. Assim seja.
Senhor, entre nós estais, e sobre nós tem
sido invocado o V osso nome ; não nos de­
sampareis, Senhor. Em Vossas mãos en-

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O C R I S TÃ O N O

trego a minha alma que redemiste com o


Vosso sangue. Gua�dai-a, como se fora a pu­
pila dos . Vossos olhos, e que sob . as asas da
Vossa protecção possa eu sempre descansar.
Como n a vigília sois o meu amparo,
assim· durante o sono sede a minha 9uarda.
Com Cristo sempre em vigia, e tambem com
Ele sempre em . descanso:
Senhor, tende . piedade de nós ! Jesus
Cristo, tende piedade de nós ! Senhor, tende
piedade de nós !
Pai· Nosso, que estais no céu, santificado
sej a o Vosso nome, venha a nós o Vosso
reino, seja feita a Vossa vontade assim na
terra como no céu. O pão nosso de cada dia
nos dai hoje, perdoai-nos as nossas ofensas
assim como nós perdoamos a quem nos tem
ofendido, e não nos deixeis cair em tentação,

mas livrai-nos do mal. Amen.
Creio em Deus Pai todo-poderoso, Cria­
dor do céu e da terra ; e em Jesus Cristo,
Seu único filho, Nosso Senhor, o qual foi
concebido pelo · poder do Espírito Santo.,
nasceu da Virgem Maria, padeceu sob Pôn ..
cio Pilatos, foi crucificado, morto e sepul­
tado, desceu aos infernos, ao terceiro dia
ressuscitou dos mortos, subiu ao céu, está
sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso,
donde há-de vir a julgar os vivos e os mor­
tos ; creio no Espírito Santo, na Santa Igreja
Católica, na comunicação dos Santos, na re­
missão dos pecados, na ressurreição da carne,
n a vida eterna. Amen.

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TR1 B U NA L D A PE N 1TÊ N C 1 A 485

Bendito sejais, Senhor Deus dos nossos


pais. Digno sois · de l ouvor e de glória por
séculos de séculos.
Eu bendirei a Deus Pai, e ao Filho e ao
Espírito S�nto ; e quero louvá-lo e exaltá-lo
por toda a eternidade, pois ·que ele é grande
no firmamento do céu, e digno de todo o
louvor e glória.
O Senhor bondoso · e omnipotente me
encha de suas bênçãos e me guarde. Que
Ele se digne conservar-me n·e sta noite sem
pecado � com toda a sua misericórdia se
compadeça· de mim, pois nele ponho a minha
confiança.
Senhor, ouvi a minha prece e chegue até
Vós o meu clamor.
Visitai, Senhor, esta habitação onde vou
descansar, alimpai-a de todas as insídias do
inimigo. Venham nela habitar os anjos que
me guardem em santa paz. E sobre mim
desçam V dssas b�nçãos pelos méritos de
Jesus Cristo Vosso Filho que convosco vive
e reina por séculos de séculos. Assim · seja.
Com a bênção de Deu�, ao meu descanso
me vou. Em nome do Pai, do Filho, � e
do Espírito Santo. Amen.

Preparação para a Confissão


Ó divino Jesus, nosso Salvador e Re­
e
d ntor, eu creio que destes a V ossos Após­
to lo:S e, . seus sucessores, o poder çie nos ·
reter e perdoar os pecados ; e creio também

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O C R I S T Ã. O N O

que haveis ordenado que de coraç·ão contrito


confessemos as nossas faltas, ao menos. as
mortais, ao · Vosso representante no santo
sacramento da Penitência. E porque assim
creio, confiadamente espero que, confessando
eu, contrita e sinceramente, meus pecados,
deles me dareis o perdão, conforme Vossas
pron;essas.
O Deus. benigno e misericordi� so, deitai
Vossos olhos de bondade sobre mim, pobre
pecador. Venho a Vós, Senhor, qual filho
pródigo a confessar meus desvario s, espe­
rançado de que novamente me haveis _ de es­
.
treitar em vossos braços. Sei que nada
posso sem Vosso divino auxílio, e por isso
Vos peço que misericordiosamente me con­
cedais a graça de fazer uma confissão bem
feita.
Alumiai minha inteligência para que eu
possa bem conhecer todos os meus pecados,
levai meu coração a arrepender-se de tantas
culpas por mim cometidas, movei eficaz­
mente minha vontade a sincero propósito de
emenda, e dai-me a graça de sinceramente
tudo acusar ao sacerdote - que Vos repr e­
senta ; para que assim, com o Vosso au­
xíl io, eu possa fazer confissão proveitosa e
rica de frutos e de bênçãos. E também
pelo meu confessor eu Vos peço, ó meu
Jesus. Ponde-lhe nos lábios aquelas pala­
vras de que a minha ahna necessita.
Virgem Maria, minha terna e boa Mãe,
intercedei por mim a Vosso bendito Filho,

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TR IB U N A L D A PE N ITÊN CIA 487

e pedi-lhe me assista neste momento tão


importante para a salvação da minha alma.

Exame de consciência
1 Mandamento. 1 Tens deixado com frequên­
- •.

cia as orações diárias, por preguiça ? Tens · estado


distraido por tua culj a durante a oração ? 2 . Con­
sentiste deliberadamente em dúvidas contra a· fé ?
3. Tens deixado habitualmente de assistir a ser­
mões, prática�, hQmtl l a, etc. ? Leste ou retiveste
sem justo motivo l ivros ou jornais maus ? 5. Fa­
l aste contra a fé, excitando os outros contra a
Igreja ou contra pessoas eclesiástieas ? 6. Foste
pusilânime .ou cedeste ao respeito humano ? 7. Re­
voltaste-te contra as disposições da Providência ou
murmuraste contra elas ? 8. Entregaste-te convie.t a­
m ente a supersti ções, · por .leviandade ·ou di�erti­
mento ?
l i Mandamento. 1 . Pronunciaste os Nomes
-

santos com ira ou por leviandade ? Tens esse mau


costume ? 2. Amaldiçoaste alguém e profanaste os
Nomes santos ? - Juraste por leviande ? Juraste
falso ? - Blasfemaste ?

I l i Mandamento. 1 . Deix àste de assistir à


-

missa nos dias de · preceito sem motivo suficiente


ou sem motivo nenhum ? .2. Chegaste a ela dema­
siado tarde, por tua culpa ? - Quantas vezes depois
do ofertório ? Saiste sem algum motivo antes dela
terminar ? - Quantas vezes antes da comunhão do
sacerdote ? 3. Assististe à missa, voluntàriamente
distraido ou sem reverência ? 4. Ocupaste-te em
o bras servis nos domingos·, ou dias santificados ?
Fizeste trabalhar os outros ? Por quanto tempo ?
· �·-
'

I V Mandame nto.
-

1 . Mostraste-te arrogante e
-

desdenhoso com teus pais ou superiores ? Trataste


m al os teus pais _por palavras ou obras ? 2. D�se-

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O CRISTÃO NO

j aste-lhes mal ? 3. Amarguraste-os ? Despresaste-os


com advertência ? 4. Não lhes obedeceste, e .talvez
Pm cousas importantes ? 5. Praticaste qualquer
falta contra teus p arentes ?
Se tens patroes, pais adoptivos ou sogros, exa­
mina se os tens ofendido e como.
\

V M andamento. - 1 . Injuriaste alguém ? 2.- En­


colorizaste-te c ontra aJguém ou usaste de violênci a ?
3. Afligiste, o fendeste o próximo com a tua con­
dut a ? 4. Tiveste contendas ou rixas com alguém ?
5. Alimentaste ódio, rancor, inimiz�des ? 6. Con­
servaste advertidamente aversão, ira, ou qualquer
indisposição ? 7. Desejaste mal ao próximo ( 8. In­
duziste outros ao pecado ? A que pecado ? g. Deste
scientemente o casião ou causa de pecado ? 10.
Foste desumano com os animai s ?
VI e IX Mandamento. - 1 . Demoraste voluntá­
riamente pensamentos e tentações impuras ? 2.
Consentiste em desejos de ver ou de fazer cousas
indecentes ? 3. Travaste conversas indecentes ?
Assististe a · elas com compl acência ? 4. Cantaste
alguma vez cantigas obscenas ? Ensinaste-as a
outros ? 5 . Leste livros ou outros escritos obsce­
nos ? 6. Olhaste para cousas desonestas · com ma­
liciosa intenção ? por curiosidade ? 7. Tiveste to-·
ques desonesto.; ? Fizeste cousas desonestas ? Só
o u com outra pessoa ? 8. Permitiste
' que outras
pessoas te tocassem ? Sem o pôr séria resistência ?
g. Com o teu pecado concorreram talvez outras
c i r�unstânci as particul ares ?
<�uando estiveres em dúvida se uma cousa é
ou não pecado contra a pureza, dirige-te ao con­
fessor. Ele tem o dever de te esclarecer com os
oportunos ensinamentos.
VII a X Mandamento. - 1 . Roubaste alguma
cousa ? aos pais ! aos superiores ? a outras pes;..
soas ? Era cousa de valor '? 2. Tiraste muitas ve­
zes . cousas pequenas ? 3. Retiveste injustamente

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1' R I B U N A L D A· P E N 1 T Ê N C 1 A .cR9

cousas encontradas ou achadas ? 4- Enganaste o


teu próximo com grande dano ? Executaste mal os
trabalhos contrataaos ? 6 . Causaste prejufzo à pro­
priedade alheia ? maliciosamente ou por negligên­
cia culpável ? gravemente ? 7. Tiveste desejo . de
rouba� ou de causar algum dano ?

V I I I Mandamento.- 1 . Disseste alguma men­


tira ? Causaste com ela algum dano ? Manifestaste
sem necessidade os defeitos o cultos de outrem ?
2. Exageraste os verdadeiros ou inventaste calu­
nianJo T Resultou disso algum dano · sensfvel para
a sua fama ou para os seus rtegócios ? 3. Pronun.:.
c iaste maliciosamente · maledicências ? Assististe a
elas com gosto ? 4. Provocaste contendas e inimi­
zades, r_e ferindo-te a cousas ouvidas, ou atraiçoando
aqueles que em ti confiavam ? Suspeitaste ·mal do
teu próximo ? Fizeste · juf zos temerários ?
Sobre os sete pecados capitais. Estes sete
-

pecados entram nos pecados contra o·s 1 0 Manda­


mento s ; a soberba no I ; a avareza, a inveja, a in.;;.
temperança, a ira no V ; a preguiça no . I, no III, no
IV e no V. .
1 . Tens sido vaidoso, orgulhoso ? Demora.ste-te
deliberadame·n te em µensamentos de soberba, de
complacência de ti mesmo ? Tens sido egotsta ?
2. Duro de coração para com os que sofrem ? In­
vejoso, contente com o mal de outrem ? 3. Embria­
gaste-te ? Completamente ? 4. Dominou-te a có­
lera ? Foste preguiçoso ? Tens estado ocioso ?
Sobre o jejum.
- 1 . Comeste :le carne sem a
dev i Ja dispensa. nos dias de abstinên::ia ? Faltaste
ao j ejum nos dias determinados ? Faltaste a todo
o je:: j um ou só a parte, não obstante ser-te posstvel
observá- lo ? '
e .- ··-- Sobre os deveres do próprio. estado. 1. Fal­
-

taste aos teus deveres de marido, de esposa, de pai,


de mãe, de superior, de súbdito ? 2. Faltaste aos
deveres de tua vocação ? Como ?
_

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O C R I ST Ã O N O

Para perguntas mais determinadas .a este res­


peito, consulte-se o terceiro exame.

li Exame para as pessoas que se confessam


frequentemente
Este exame serve para as pessoas que se con­
fessam todas as semanas, cada i 5 dias, ou cada
mês. Não serve, porém; a p essoas escrupulosas ou
tfmidas ; estas devem seguir as instruções· particu­
lares do confessor.
Neste assunto é impossível satisfazer aos de­
sejos de todos. Cada qual tem sua consciê.n cia
própria, e um . modo de ver diferente. Umà pessoa
religiosa profundamente instruída na religião, terá
naturalmente uma consciência diferente daquela
cujos conhecimentos não vão além do catecismo.
Depois, muito diversas são as faltas, consoante
as circunstâncias. Não é possível tomar em consi­
deração senão aquelas cousas que em geral convém
a todos os que procuram a perfeição ; meras im­
perfeições não vêm sequer aqui mencionadas.
Alma cristã, poderás examinar-te bem e até
com facilidade, mesmo sem te servires deste exame.
Trat ando-se de pecados veniais não é de necessi­
dade, mas somente de conselho, acusá-los.
Não é, pois, necessário ler sempre este ques­
tionário antes da confissão ; ser-te-há porém úti1,
para conheceres ·com mais ordem as tuas cu]pas.
Nos dias de m aior concorrência procura ser
breve. ·

1, l i e I l i Mandamento.
- i . Deixaste frequente­
mente, as tuas orações por preguiç a ? Tens estado
distraido voluntàriamente durante a oração ou du­
rante a santa missa ? Tens sido negligente em re7
pelir as distracções ? Tens sido, por culpa tua,
Ubio e indiferente na sagrada comunhão, ou nos
outros exercfcios d e piedade ? 2. Chegaste t Jrde,

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TRIBUNAL D A PENITEN CIA 4Q I

p or . tua culpa, à m!ssa nos dias de ptece.�to ? N_a


1greia durante a missa e durante as funçoes· reh­
g1osas, estivestes sem respeito ? 3. � Consentiste
adverti damente em dúvidas contra a fé ? · 4. , Pro­
feriste por levi ande ou com ira nomes santos ?
Habitualmente ? 5. Falaste com menos respeito de
cousas rel igiosas ? 6. Tens sido pusilânime ou de­
sanimado na adversi dade ? 7. Falaste contra as dis­
pos i ções da Providência ? Tens-te queixado dela·s ?
8. Fizeste ou assististe a actos supersticiosos ?
(lançar cartas, bruxarias, etc.). Por curiosidade ou
por divertimento ?

I V Mandamento. -1 . Tens sido desobediente


aos paill, uu superiores ? 2. Tens murmurado das
suas ord�ns ? 2.. Respondeste-lhes com altivez ou
mal ? Replicaste-lhes quando te repreendiam ?
4. Fizeste afligir os pai s, os superiores, por tua
culpa ? Com malici a ? 3. Demoraste-te em pensa­
mentos pouco caritativos contra teus pais e supe­
riores? Guardaste-lhes advertidamente má vontade?
Fal a ste ou pens aste inal deles ? Habitualmente ?
6. Tens faltado à caridade com os teus parentes ?
Por pensamentos, por palavras, por obras ? Ofen.:..
deste-os gravemente ? Qual o motivo ?

V Mandamento. 1 . Tiveste rixas com teu pró­


ximo ? 2. Chamaste nomes injuriosos ? 3. Tens-te
-

irado, tens sido violento contra os outros ? 4. Afli­


giste ou o fendeste alguém deliberadamente ? 5� D�­
moraste-te em pensamentos de aversão e ódio vo­
luntàriamente ? 6. Entretiveste conversas contrárias
à caridade ? Por aversão, ciúme, · inveja ? Ouviste
com agrado falar mal dos outros ? 7. Induziste
m ali.:: iosamente alguém a pecar ?

- ·vi e IX Mandamento. 1 . Tiveste complacência


-

em pensamentos impuros com plena advertência ?


D emoraste o pensamento em cousas obscenas, sem

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492 O CRIST Ã O N O

complacência, mas por leviandade, ou curiosi­


dade ? (1)
Não repeliste com prontidão os pensamentos,
as tentações, os desejos impuros ? 3. Tens tido
conversas perigosas ? Ouviste- as voluntàriamente ?
Olhaste curiosamente para figuras obscenas, em­
bora s.em malícia ? 5. Pronunciaste p alavras, to­
caste levianamente; embora sem malfc1a ? (2)
V I I I Mandamento. x.
- .Disseste alguma men­
tira por gracejo ou para evitar algum m al ? Proce­
deste com hipocrisia, isto é, apresentaste-te como
melhor do que és, para obter m aior estima ? {É vir­
tude o cultar os próprios defeitos para não d ar es­
cândalo, e para salvar a própria honra). Foste im­
postor, isto é, louvaste alguém na sua presença,
dizendo o contrário . n a ausência ? {É virtude re­
primir a aversão interna para com uma pessoa por
amor de Deus, e mostrar-lhe agrado). 2. Tens re­
velado sem necessidade defeitos ocultos do pró­
ximo ? Causaste-lhe algum. dano na honra ou em
quaisquer outros bens ? Exageraste os seus de­
teitos ? 3 . Provocaste maliciosamente, com pre­
guntas, conversas ofensivas da caridade ? Ouviste-as
com prazer ? 4. Referiste a alguma pessoa o que
outrem disse contra ela ? Foste com isso causa de
rixas e inimizades ? 5. Tens o costume de propalar
o m al que se diz do próximo ? Admitiste sem . um

( 1 ) Estes não são pensamentos impuros no sentido ri­


goroso da palavra, mas a eles conduzem multo fàcllmente.
Não se podendo distinguir .entre uns e outros, acusem-se
brevemente assim : ct:lve voluntàriamente pensamentos lm­
puroS>.
(2) Q u anto à leitura de livros maus, veja-se a pá­
gina l • 9 . Nilo é necessário pôr de pinte um bom livro, que
se lê p o r motivo razoável, pelo facto da sua leitura des­
pPrtar qualquer tentação em que se não consente. Para
muitos, e especialmente para os e!lcrupulosos, o mell)or é
continuar a leitura sem fazer caso d a tentação. Só no caso
de verdadPlro perigo de consentimento, l)averá obrigaçllo
de deixar essa leitura, não sendo llcito expor-se ao perigo
de pecar, sem grave motivo.
·

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TRIBUNAL D A PE NITÊN CIA ·493

motivo suficiente más suspeitas do teu próximo ?


Manifestaste-as ? Fizeste juízos pouco favoráveis a
seu respeito ?
Sobre os pecados capitais. - 1 . Deixaste-te
levar da vaidade ? Adornaste-te para agradar ?
Tens demorado deliberadamente pennmentos de
orgulho e complacência de ti ,mesmo ? Tens sido
egoísta, arrogante, caprichoso e teimoso ? Tens
t ido j actância e presunção ? 2. Não tens tido com­
p aixão dos pobres e necessitados ? -3. Foste inve­
Jóso, malévolo; ciumento ? (Desejar ser piedoso,
rico, saudável como os outros sem desejo de os
despojar do que lhes pertence, não é pecado). Ale­
graste-te com o mal dos outros sem motivo justo ?
Não lhes tens invej ado a virtude ? Tens-te impa­
cientado, encolerizado ? Não ultrapassaste os justos
limites quando tiveste razão de te indignar ?
Sobre o preceito do jejum. Transgrediste o
-

j ejum no todo ou em parte sem motivo justo ?


Sobre os deveres do próprio estado. Não
-

tens feito caso deles ? Não os cumpriste ? Em que


faltaste ?

I l i Exame útll para a confissão geral


• .1 Para os pais. - Tens t ido cuidado do bem
estar corporal dos teus filhos de�de o principio da
sua existência ? Ensinas-lhes as orações, e e duca­
-los no bem ? Obriga-los a ir à miss� aos domingos
e dias santos ? Permites que os· teus filhos e de­
pendentes sejam educados fora da religião cató­
lica ? " 4· Escarneces e troças, na presença dos teus
. fil�os; dos sacerdotes, mestres e prof�ssores ? 5.
· nás:..l hes mau · exemplo falando mal, 1urando,_ ou
praguejando ? Falando de coisas impuras e obsce­
nas ? Enttegando-te a bebidas ? 6. Não os repreen­
deste, nem corregiste os seus defeitos ? 7. Preser-

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4 94 O CRISTÃO NO

vaste-os, ou ao menos procuraste afastá-los do


mal ? Desviaste-os das m ás companhias e ocasiões
perigosas ? Tens vigiados os filhos e criados dentro
e fora de casa ? 8. Mãe de familia, faltaste à mo­
déstia ao vestir e despir os filhos ? Ensinaste-lhes
o mal, obrigaste-os a praticar pecados ? De que
m odo ? g. Desej aste mal a teus filhos ou enteados ?
Tiveste-lhes ódio ? Tens sido parcial, violenta e
colérica ? Escarneceste e trataste mal os filhos,
sem razão ? 1 0. Constrangeste-os a abraçar um
estado para que não t inham vocação, nem incli­
nação ? Desv1á.ste-os do estado para que· eram
chamados ?

2. Pars os esposos. - Tens provocado ou fo­


mentado descontentamento e disputas entre as pes­
soas de famil ia ? 2. Tens tido desavenças com o
teu cônjuge ? Por muito t empo ? 3. Tens ofendido
o teu espôso, ou espôsa, com injúrias, murmurações
ou qualquer outro modo ? 4. Tens pro �ocado
ciúmes pelo teu: pro_cedimento l eviano e compro­
metedor ? 5 . Mando, tens causado aflições e des­
gostos a tua mulher por embriaguês, ou prodigali­
dade ? C ausaste dano, ou dissipaste os bens da
familia, ou de tua esposa ? 6. Esposa, tens obede­
cido a teu marido em tudo o que é licito ? Causaste
dano à familia com despesas múteis e caprichosas ?
Manchaste a castidade conjugal com pensamentos
ou desejos impuros voluntários com . outras pessoas ?
Por conversas ou outros modos ? 8. Para satis­
fazer as tuas paixões, obrigaste o teu cônjuge a
coisas contrárias à consciência ? Abu.saste do es­
tado matrimonial para cometer pecados ? Faltaste
em coisas graves ?
3 . Para patrões. 1. Tens · ofendido gra-re­
-

mente os criados por palavras ou acções ? 2. Tem­


-los maltratado e sobrecarregado de trabalhos ? 3.
Não os tens alimentado suficientamente ? 4. Reti­
Yeste sem motivos, em todo ou em parte, a soldada
est.lipulada ? 5. Despediste-os sem motivos, antes

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TR1 B U N A L D A PE NIT ÊNCI A 495

do tempo ? 6. _Deste-lhes o tempo necessário para


cumprirem os seus deveres religiosos ? Mandaste-os,
ou impediste-os ? 7. Tens exercido sobre eles a
vigilância necessária ? 8. Obrigaste-os ao mal, por
exemplo, a trabalhar ao domingo, ou a qualquer
outro p�cado ? g. Tens, sem motivo suficiente, to­
lerado as suas - faltas : sair de noite, falar mal, etc. ?
1 0. Deste-lhes maus exemplos ?

4. Para superiores. - 1 . Tens descurado os


teus deveres como autoridade ? Em m atéria. grave,
e causando dano ? 2. Abusaste da autoridade para
te vingares ? Foste parcial ou venal ? 3. Não im­
pediste os escândalos públi cos, podendo, como era
tua obrigação ? Tens prestado auxilio ao pecado ?
4. Deste mau exemplo, não cumprindo os teus de­
veres religiosos ou de qu a lquer outro modo ?
5. Para professores e professoras. 1 . Tens- te
-

preparado devidamente para as lições ? 2. Tens


empr�gado em ensinar, todo o. tempo determinado ?
3. Não vigiaste como devias os teus discfpulos ?
4. Tens-te encolerizado ou impacientado nas au­
l as ? .5 .. � ens maltrata�o os disci eulos com pala­
vras m1uriosas ou castigos excessivos ? 6. Foste
parcial com algum ? Tens-lhes dado mau exemplo ?
6. Para súbditos. -1 . Criticaste, sem justo
motivo, os teus superiores eclesiásticos ou civis ?
Falaste deles com desprêzo ? 2. Murmuraste con-1
tra as suas ordens ? Falaste delas com desprêzo ?
3. Falaste mal dos superiores, diminuindo-l�es a
consideração e estima ? 4. "Revoltaste-te contra
eles, excitaste outros a revoltarem-se ?
7. Para empregados. 1 . Fo.ste desobediente
-

aos teus superiores em coisas graves ? 2. Suble­


vaste os <!utros cria �os contra os sup eriores com
-murmuraçoes ou que·i xas ? 3. Tens sido mal ·com­
portado; grosseiro e arrogante com os J>atróes ?
4 i:ens _ sido negligente no trabalho ? 5. Causaste

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O CRISTÃO NO

prejufzo aos patrões · pela tua negligência· e gastos


excessivos ? Enganaste-os, ou roubaste-os ? 7� Re­
velaste os segredos da sua familia, difamaste-os ?
8. Ensinaste o mal aos filhos da casa, induziste-os
a pecado ·1 A que pecados ? g. Prestastes aos pa­
trões algum serviço ilícito ?

8. Pera negociantes e hoteleiros. 1 . Tens -

usado de fraude nos pesos, medidas ou qualidade


das mercadorias ? Pediste um preço exorbitante ?
2. Tens dado bebidas alcoólicas a pessoas j ã em­
briagadas ? 3. Ten� tolerado em tua casa reuniões
ou divertimentos proibidos ? Não tens vigiado, para
evitar pecados nos bailes honestos j á introduzidos
pelos costumes d� terra ? 4. Toleraste em tua casa
livros e jornais imorais ou figuras obscenas? Coope­
raste nos pecados alheios ?

Acto de actrlção (1)


Pai nosso que estais no céu, a Vós re­
corro, como filho pródigo que reconhece a
graveza das suas culpas e delas pede humil­
demente perdão.
Reconheço, Senhor, que sois infinita­
mente bom e misericordioso para comigo.
A-pesar de todas as minhas · culpas e des­
varios, tendes-me conservado a vida e até
hoje me poupa�te ao inferno.
Ingrato tenho sido a tanta bondade ! De

( r ) i-: p reciso n ã o esquecer q u e a dor n ã o depende d e pa­


la" ras e fó rmulas. Para ha,•er dor basta sentir, por motivos so­
brenaturais, um pesar Interno e sincero dos pecados, detes­
tando-os, com o propósito firme de lhes fugir e não os tomar a
cometer. Tudo aqui é inferno. Quem está arrependido não
precisa de longa� orações e fórmulas de contrição.

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T R lB U N A L D A P E N I T Ê N C I A - 497

todos os V ossos dons, o corpo, saúde, in­


teligência e vontade, me tenho' servido e
abusado para, V os ofender. Se · a ingratidão
é sempre. odiosa e detestável, · se· · o filho in­
grato até pelos mais indulgentes é pl �ado
como se fora um monstro, que . direi . da
minha ingratidão para com o Pai :que é. o
meu Deus, a quem · tanto · ofendi sobretudo
com os meus pecados mortais ?
·Agora compreendo : sou. filho ·ingrato,.
digno de execração � de mil infernos, por'."
que minhas infidelidades são tudo o que· . há
de mais repugnante. Pesa-me.; Senhor-, .de
todos . os pecados, porque com eles perdL ·o
céu e mereci o inferno. Proponho, ajudado
com a Vossa graça, emendar-me e . n�nca
m ais Vos tornar voluntàrian:iente a ofender.

Acto da contri ção

Misericordiosíssimo Pai que estais no céu,


eis a Vossos pés o pobre pecador que muito
Vos tem ofendido por pensamentos, palavras
e obras. Não obstante minha tão grande
maldade, Vós na Vossa infinita bondade su·
portastes-me até agora. Empreguei minhas
forças, as faculdades do meu espírito, os
mêus sentidos e os membros do meu corpo
para pagar com ingratidões as V.a ssas gra­
ças e os V ossos benefícios, com frieza e in­
d_iferença o V osso amor, e com desprezos a
Vossa ·bondade ! Vós amastes-me desde toda
a eternidade, e eu ofendi-Vos desde a minha

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O C R I S 1.' Á O N O ·.$.-

menm 1 ce. Vós criastes-me p ara que Vos ser­


visse, e eu tenho servido o pecado. Ó Pai
celeste,. olhai piedós amente este pobrezinho,
e não me castigueis como merecem os meus
crimes . Pesa-me de Vos ter ofendido a Vós
que s·e mpre Vos tendes mostrado tão terno
para comigo, não querendo sénão o meu
bem no tempo e na eternidade.
Como eu desejaria nunca Vos ter ofen­
dido, meu sumo Benfeitor, meu único e ver­
d adeiro Bem ! Ah ! quem não tiverà nunca,
por pen�amentos, palavras ou obras, feito
coisa que desa_g radasse aos Vossos santís­
simos olhos ! Que não daria eu para nunca
ter pecado ! Mas ao menos para o futuro
não _quero mais ofender-Vos.
O Jesus, Filho de Deus, meu Redentor 1
e Santificador, Vosso amor para comigo foi
tão grande qu� quisestes derram.ar Vosso
sangue precioso, pa,ra me purificar de todos
os meus pecados ! O Senhor, como e11 avalio
agora a acerbidade dos tormentos que. so­
frestes para me alcançar a remissão das
minhas culpas ! A que preço não 'comprastes
a minha alma ! Amo-Vos de todo o meu
coração pelo muito que sofrestes por meu
amor; e porque Vos amo, me pesa sincera­
mente de tantas vezes ter renovado Vossos
tormentos . Porque Vos amo, ó meu Jesus,
eu me arrependo de todos os pecados da
minha vida, e estou resolvido para o futuro
a não tornar a cometer nenhum, mormente
mortal, embora tenha de me sujeitar. a todos

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T R 1 B U N A L D A P E N l T E N C L\ 499

os sacrifícios ;. e procurarei também não cair


nos veniais \'oluntàriamente.
Aceitarei de boa vontade e cumprirei fiel­
mente a penitência que me for imposta p_e lo
confessor e b�m assim a que Vós me quei­
rais dar com dores e tribulações. Quero
também evitar, quanto possível, as ocasiões
de· pecar, e empregar todos os meios para
arrancar do meu coração as raízes dos pe­
cados.
Para não recair proponho . (propósitos).
. .

Mas para que o possa conseguir, ó. meu be �


nigníssimo Senhor e Salvador, ajudai-me
com a Vossa graça. Virg�m Santíssima,
vinde em meu auxílio.
·
Para d epois da Confissão
Ó m eu Jesus, agora que Vós me dissestes
aquela doce palavra «Vai em paz, os teus
pecados te são perdoados» , me lavastes, no
Vosso sangue, da lepra dos meus pecados; e
me livrastes da tirania do demónio, quebra­
ram-se já as cadeias da morte, e de novo
me foram abertas as portas do paraíso.
O meu coração está inundado da Vossa paz
e alegria, j á posso levantar com toda a con­
fiança os olhos para Vós. Quereria, Senhor,
louvar e bendizer para sempre com todos os
Anjos e ·Santos as Vossas misericórdias.
Também , Senhor, . me dissestes uma pa­
lavra se\'era, que me encheu de terror. «Eis
que já estás curado, não tornes á pecar para

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.500 O C R I S T .\ O N O

q.ue te não suceda pior» . Se olho p .a ra o


passado, só tenho que recear ; pois quantas
vezes. prometi emendar-me, tantas fui iI}fiel
às minhas mais, santas promessas . .Eu, sou
fraco, . Senhor, e a minha vontade não . sabe
reagir contra as insídias . e l isonjas do de­
mónio e violência das tentações.
Peço-vos, pois, ó Jésus, pelo amor do
Vosso amantíssimo Coração, que Vos apres­
seis a socorrer-m e com a Vossa graça . Se
Vós me aj udardes, serei forte ; se . me de­
fenderdes, nada terei a temer da parte do
inimigo. Não me deixeis sózinho no com­
bate, e no momento do perigo vinde a se­
gurar-me com Vossa mão omnipotente, afim
de qµe não caia de novo na cul pa.
O m e u Jesus, d .ai-me · ª graça da perse­
verança. Sim, meu amantíssimo Salvador
e Redentor, ao menos agora estou decidido
e quero empregar todos os meios' ao meu
alcance para me emendar, quero em espe­
cial resistir a todos os maus pensan1entos,
apenas os pressinta ; quero orar nas tenta­
ções, e proponho evitar com todo o cui­
dado (indique-se qualquer ocasiáo de pe­
cado). Acabai, Senhor, em mim a obra da
graça, que Vós mesmo começastes. Amen.
Para antes da Comunhão
Benigníssimo, Jesus, Vou receber-Vos em
minha alma. Não é que eu confie _n os meus
méritos : con fio, s i m , n a Voss::t misericórd ia

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T R I B U N:A L o· A PENIT ÊNC� A fo i

e bondade. Anda-me o coração e o corpo


cheio de más inclinações e pecados ; anda-me
en1 tantos perigos o espírito, e a J íngua mal
guardada. Mas por ir-so mesmo, ó .Jesus, é
que me abeiro de Vós, fonte de misericórdi�,
a p ed ir a Vossa graça e p e rd ão A Vós m e
. .

acolho para que seja �eu Salv·a dor aquel é


a quem temo como Juiz. · Ven ho mostrar-Vos
m·i nhas chagas, os pecados que cometi e· li1e
enchem de receios ; e confio, Senhor, na
Vossa m isericórdia · infinita .
· ó ·. Jesus, Rei eterno, Deus e Hom�m
crucificado por amo·r dos homens, tende
compaixão deste pobre pecador que em Vós
confia. Porque ·sois fonte · inexaurível de mi ..
sericórdia, compadecei-Vos de mim cheio de
misérias · e pecados . Salve, ó vítima de re­
denção que na Cruz se ofereceu por mim e
por·,todo o género humano ! Salve, ó sangue
precioso que escorreu · das c�agas do meu
Jesus a .J avar os pecados do mundo ! Não
Vos esqueçais, Senhor, desta criatura po­
brezinha que redemistes -com o Vosso San­
gue. Pesa-me de Vos ter ofendido, e de­
sejo emendar a min_ha vida. E por isso, -Pai
clem·entíssim·o , apagai todos os meus peca­
d o s, a fi m de que, na Voss·a graça, mereça
saborear o Santo dos santos. · Que Vosso
Corpo e Sangue que na comunhão You re�
c_�ber, sejam a salvação que entra na minha
alrúa a· apagar minhas i�iquidades . e pecados,
a afugentar os maus pensamentos, a · regene­
rar meus sentidos e potências, a · ajudar-me

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<> Ck 1 � T ,\ O N O

nas obras da Vossa graça e a defender-me


das incídias do inimigo. Amen .
Deus eterno e omnipotente, eis que vou
receber no Sacramento do Altar a Vosso
Unigénito Filho Jesus Cristo Senhor Nçsso.
Sou o enfermo que vai pedir saúde ; ensu­
jado de pecados, desejo lavar-me na fonte
de misericórdia ; cego, quer0 reacender os
olhos da alma. na luz da eterna �I aridade ;
pobre de pedir, vou abeirar-me do Senhor
do céu e da terra. Dignai-Vos, Senhor,
pela Vossa l íberal idàde infinita curar as en­
fermidades de minha alma, lavar meus pe­
cados, alumiar minha cegueira, remediar
minha pobreza, vestir minha nudez, afim de
que possa receber o Pão dos anjos, o Rei
dos reis, o Senhor dos senhores, com rev:e­
rente humildade, com devota contrição, .com
pureza e fé, propósito e boa intenção. Con­
cedei-me, ó Senhor, eu V o-lo peço, ª· graçâ
de, com o Sacramento do Corpo e Sangue
de Jesus, receber também seus frutos e vir­
tude. O corpo bendito de Vosso Unigénito
Filho Jesus Cristo, formado no seio da Vir­
gem Maria, de tal modo me trans forme a
alma, que para sempre fique eu encorpo­
rado em seu corpo místico. E mais Vos
_peço, ó Pai amantíssimo, a graça de um dia
ir contemplar no céu ao Vosso amado Filho
que vou agora receber escondido nas espé­
cies sacramentais, o qual convosco vive e
reina por séculos de séculos. Amen .

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P�-miti também.., Senhor.., que� s�do
o ensinamento de Jesus, Vos possa eu ct1zer �
Pai nosso,. que estais nos céus ; santificado .
seja o Vosso nome ; venha a nós o Vosso
reino ; seja feita a Vossa vontade assim na
terra como no céu; ·o pão nosso de :cada
dia nos dai hoje ; perdoai-nos as nossas
ofensas assim como nós perdoamos a quem
nos tem ofendido ; e não nos deixeis cair
em tentação mas livrai-nos do mal . Amen.
Livrai-nos, Senhor, de todos os males pas­
sados, presentes e futuros ; e por intercessão
da bem-aventurada Virgem-Maria Mãe de
Deus, e dos bem-aventurados apóstolos S. Pe­
dro e S. Paulo e S. André e de todos os
Santos, dai-nos, propício, a paz em nossos
dias, a-fim de que ajudados pelo valimento
d a Vossa misericórdia, sejamo"s livres do pe­
cado e seguros de toda à perturbação ; pelo
mesmo Jesus Cristo Vosso · Filho e Senhor
Nosso que sendo Deus, convosco vive e reina
na unidade do Espírito Santo por séculos de
séculos. A1nen.
Senhor Jesus, Filho do Deus vivo que
por vontade do Pai, cooperando o Espírito
Santo, vivificastes o m_undo com a Vossa
morte, pelo V osso Corpo e Sangu� que na
·comunhão vou receber livrai-me de todas as
minhas iniquidades e 9e todos os males, ·e
fazei que eu obedeça sempre e em tudo aos
V ossos m_andamentos, e não permitais que

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5o� O ·e RI S T Á O N O

de futuro me aparte de Vós, que' com o


mesmo Pai e o Espír.ito Santo, sendo Deus
viveis e reinais por séculos de séculos . Ame·n .
A comunhão do Vosso Corpo e Sangue,
ó Jesus, que eu, embora indigno, vou re­
ceber, não seja para mim motivo de juizo e
condenação, mas por Vossa piedade me
aproveite para defesa e remédio da alma e
do corpo. Vós que sendo Deus, viveis e
reinais com Deus Pai n a unidade do Espí­
rito Santo por séculos dos séculos . Amen.
Tomarei o Pão do céu- e invocarei o
nome do Senhor.
O Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo
guarde a minha alma para a vida eterna.

Para depois da Comunhão


Graças V os dou, Senhor Santíssimo, Pai
omnip0tente e �terno Deus, por · Vos dignar­
des alimentar :minha alm a com o Corpo e
Sangue de Vosso divino Filho Nosso Senh.o r
Jesus Cristo, apesar de minha tão grande
indignidade. Que esta comunhão, Senhor,
não seja para inim motivo de castigo, mas
penhor de salutar perdão. Que Jesus fique
a viver em mim para me ajudar a ·defeflder
a Fé e a fortalecer a boa vontade que tenho
de sempre o servir até à morte. Que Ele
extermine meus vícios, dissipe os maus de­
sejos e inclinações perversas que possam
borbotar em . meu coração, que me dê hu­
mildade, obediência e todas as d.e mais . vfr-

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T R 1 B u N A·J: D ºA p E N fT Ê N e 1 A -sos·

tudes, . me . defenda das insídias de meus ini·


migos tanto visíveis como invisíveis, . assos;.
segue os: moviment9s desordenados de ·meu
corpo e espírito, ihdissolll velmente me prenda
a Vós, uno e verdadeiro Deus, e· por sua mão
bendita me · leve a ·porto de salvação . . :Ma-is
Vos peço, Senhor·, ·q ue Vos digneis admi­
tir-me, a mim pecador, no inefável convívio
da bem-aventurança, onde Vós, com Vosso
Filho e o Espírito Sant0, sois para os ele�tos
a luz verdadeira,. o gozo eterno; a alegria
suma e a felicidade perfeita e plena. Por
Cristo Nosso Senhor. .Amen.
Ó dulcissimo Senhor Jesus, enchei minha
alma com o Vosso amor, com a verdadeira,
serena; apostólica e santíssima· Caridade,
a fi m de que todo eu me abrase em Vosso
santo .. amor, mais e mais me· - desprenda de
mim para sempre estar convosco. Que minha
alma tenha fome de Vós, ó Pão dos anjos,
refeição -das almas ·santas, Pão nosso de cada
dia, o Pão substancial 'que tem toda a do ..
çura e bom sabor, todo o deléite de suavi­
dade. Sempre o meu coração esteja faminto
e se alimente de Vós, ó meu Jesus, a· quem os
anjos ' se comprazem de contemplar ; e toda
a minha alma se encha com a docura do
Vosso sabor. -Sempre tenha sede d e Vós;
fo_nte de vida,- fonie de luz eterna, torrente
de beatitude, abundância da casa-. de · Deus·.
Sempre. ande eu s<?lícito de Vós; sempre Vos
busque e Vos encontre, por Vós seja atraído

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5o6 O C R I S T .Ã. O N O

e em Vós descanse ; em Vós medite, de Vós


fale, e que sejam para honra e glória de
Vosso nome todas as minhas obras, e que
elas sejam feitas co1n humildade e descrição,
con:i amor e alegria, com generosidade e
afecto, com perseverança até ao fim ; de
modo que só Vós sejais toda a minha espe­
rança e confiança, toda. a minha riqueza e
satisfação, todo o meu gozo e alegria, toda
a minha tranquilidade e paz, suavidade, odor,
doçura, alimento· e refeição, o meu refúgio,
o meu auxílio, a minha sabedoria, a minha
herança, o tesoiro a que para sernpre se me
prende a alma e o coração. Amen .
Alma de Cristo, santificai-me. Corpo de
Cristo, sal'!ai-me. Sangue de Cristo, ine­
bri � i �me. Asua do lado � e Cristo, lavai-me.
Pa1xao de Cristo, confortai-me. Ó bom Jesus,
ouvi-me. Nas Vossas chagas escondei-me.
Não permitais que me separe de Vós. D�
inimigo maligno defendei-me. Na -hora da
minha morte chamai-me, mandai-me ir para
Vós, a fim de Vos louvar corri Vossos San­
tos por séculos de séculos. Amen.
Eis-me aqui ó bom e dulcíssimo Jesus,
prostrado na Vossa presença . E eu Vos
rogo e supl ico com o mais vivo fervor, que
imprimais em meu coração sentimentos de
Fé, Esperança e Caridade, verdadeira dor
de meus pecados e um propósito firme de
não mais Vos ofender . Enquanto eu, com

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T R I B U N A L D A P E N I T Ê N C I A. 507

amor e compaixão, medito nas Vossas cinco


chagas, começando pelo que de Vós, ó meu
Jesus, disse o Santo- Profeta David : «Tres­
passaram H S . minhas m ãos e os meus pés,
contaram . todos -Os meus · ossos » ..
-
.

Misericordioso Jesus, que por Vossa


imensa Caridade quisestes vir à minha alma
com a plenitude das Vossas misericórdias e
graças, fazei que também os outro� _parti­
lhem da minha felicidade . Porque quereis,
Senhor, que todos vivamos em mútua· e. santa
C aridade, eu Vos peço que genero"s amente
distribuais também ·V p�sas bênçãos e graças
pelos meus pais e parentes, pelos meus su­
periores, amigos e benfeitores . E lembro�Vos
ainda -tod_o s os vivos e defuntos que se têm
recomendado à .s minhas orações, e aqueles
por quem prometi orar. O benigníssimo
Jesus, concedei a todos que saiam vitoriosos
dos combates do bem e cheguem a possuir­
-Vos na bem-a venturança eterna do Céu.
Amen .
Virgem Maria, M ãe de Deus e Mãe nossa,
recebi em m inha alma o Filho -dilcctísssimo
que em Vossas puríssimas entranhas encar­
nou, que em Belém destes ao muµdo, que
amamentastes e estreitastes no Vosso colo
sa�rosanto. Aquele que foi toda a alegria
dos Vossos olhos, as delícias do Vosso cora­
ção, ei-lo, Senhora e Mãe, em meu coração ;
e eu Vo-lo apresento para que, recebendo-o

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5oS ·o eRIsTÁo N o

em V ossos braços e estreitando-o ao cotáção,


o ofereçais à Santíssima Trindade em culto
supr_e mo . de adoráção, em honra e glória
Vossa e pelas necessidades minhas e de
todo o mundo. Rogo-Vos, ó Mãe piedosa,
que peçais para mim o perdão de todos os
pecados, a graça de sempre servir ao Vosso
e meu Jesus, e a salvação eterna, para que
convosco o possa louvar no céu por séculos
de séculos. Amen.

O rações. a recitar du rante a Missa (1)


Ao começar a Missa
Em nome do Pai e do Filho e . do Espí­
rito Santo. Amen. Entrarei até ao altar
de Deus, do Deus que - alegra a minha ju­
ventude.
Salmo . 42 (Omite-se nas mi"ssas de De­
funtos). O Deus, fazei-me justiça ; defendei
a m inha causa,. contra a Gente não santa,
e livrai-me do hon1em doloso e iníquo !
Porque Vós, ó Deus, sois a minha forta­
leza : por que me tendes repelido ? Porque
andarei eu triste, e uprimido pelo itiimigo ? !
Concedei-me a Vossa luz e fiddidade,
'

( 1 ) O m rlhor método de assistir à Missa, é acompanhar o


sacerdote, unir·se a ele, quanto possí,· et, na Intenção que ele
tem e n :i !' orações que e l e re7.a. Na impossibilidade de trasla­
darmos para aqui todo o :\füsal, damos em tradução as oraçõrs
que se rezam em todas as M-issas e mais uina ou outra da Missa
da San tíssima Tri i . dade.
Do tradutor.

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T R 1 B U N A. L D A. P E N l T Ê N C l A 5 og

qu� me - guiem,. que me �onduzam ao Vosso


monte santo, e às Yossas moradas .
E eu subirei . ao altar . de .Deus; . Deus do
meu gozo. e da ,minha. alegria ;
E eu Vos -· lol,lvarei ao · som - da citara, .6
Deus, .Deus meu ! Pqr que Je .d eprimes·, ó
minha . alma, . e por que te a lvor9ças dentro ­
de mim ?
Espera em Deus, que_ ainda hei-d.e voltar
a · enaltecê-lo, como . salvação. �o me'U rqsto,
e como Deus meu. .
Glória ao Pai e ao Filho e ao .Espírito
Santo. Assim como era no princípio e . agora
e sempre, por t_odos os séculos dos séculos.
Amen .
Entrarei até ao altar de Deus, do .D eus
que alegra a minha juventude. A �ossa
ajuda está no nome do Senhor, que :fez o
céu e a terra .
Eu, pecador, me confesso a Deus todo­
-pode�oso, à bem-aventurada sempre Virgem
Maria, ao bem- aventurado São Miguel Ar­
canjo, ao hem-aventurado São João Batista,
aos santos apóstolos São Pedro e São Paulo,
(a nosso Pai S. Francisco), a todos os santos
e a vós, padre, que pequei· muitas vezes por
pensamentos, palavras e obras, por minha
cul pa, minha culpa, minha tão grande culpa.
Portanto, rogo à bem-aventurada sempre Vir­
ge!Il Maria, ao bem-aventurado São Miguel
Arcanjo, ao ' bem-aventurado São João �a­
tista, ao.e:; santos apóstolos São Pedro e
São P.aulõ, (a .nosso Pai S. Francisco), a

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510 O CRISTÃO NO

todos os santos e a vós, padre, que rogueis


por mim a D eus, Nosso Senhor.
O Senhor Deus todo-poderoso se com­
padeça de nós ; e, perdoados nossos peca­
dos, nos leve à vida eterna. Amen.
Indulgência, absolvição e remissão de
nossos pecados, nos conceda o Senhor omni�
potente e misericordioso. Amen .
Voltai-Vos Senhor, para nós e dai-nos a
vida. E o Yosso povo se alegrará em Vós.
:Mostrai-nos Senhor, a Vossa · m isericór­
dia. E dai-nos a Vossa salvação.
Ouvi, Senhor, a minha oração. E chegue
até Yós o meu clamor.

(A o subir ao altar)

A pagai em nós, Senhor, as nossas m 1 -


qu idades, para que de alma pura, mere­
çamos entrar no Vosso santuário. Por Cristo
Senhor nosso. Amen .

{O sacerdote beija o altar)

Pelos merecimentos dos V ossos Santos,


cuj as rel íquias aqui estão e de todos os
Santos, Vos suplicamos Senhor, que Vos
digneis perdoar-nos todos os pecados . Amen.

(Introito)

Bendito seja Deus uno e trino : louvá-lo


emos porque usou connosco da sua m iseri-

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1' R I rs uNAL D A pE N1TÊNe1A Su

córdia. Senhor quã_o admirável � o Vo�so


nom e em toda a terra ! Glória ao Pai e 1 ao
Filho e ao Espírito Santo.
Bendito seja Deus uno e trino : louvá-lo
emos, porque usou connosco da sua miseri­
córdia.
Kyries
Senhor, tende piedade de nós. (3 ve,es)
Cristo, tende piedade de nós. (3 ve{es)
Senhor, tende piedade de nós. (3 vetes)
Glória
Glória a Deus nas alturas e na terra paz
aos homens de boa vontade. Nós Vos lou-·
vamos, bem-dizemos, adoramos, glorifica­
mos, e V os damos graças por Vossa grande
glória, Senhor peus, Rei do céu, Deus Pai
omnipotente. O Senhor, Filho Unigénito,
Jesus Cristo, Senhor Deus, Coràeiro de
Deus, Filho do -Pai, Vós, que tirais os pe­
cados do mundo, recebei as nossas preces ;
Vós, que estais sentado à direita do Pai,
compadecei-Vos de nós, porque só Vós sois
Santo, só Vós sois Senhor, só Vós sois Al­
tíssimo, ó Cristo Jesus, com o Espírito Santo
n a glória de Deus Pai. Amen.
Ore m us
Eterno e omnipotente Deus, que conce­
destes ao s Vossos servos conhecer na con-

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S c2 O C RISTÃ O NO

fissão da verdadeira fé a glória da eterna


Trindade e adorar a sua Unidade no poder
da magestade ; nós Yos rogamos que com
a firmeza da mesma fé possamos vencer
todas as adversidades. Por Jesus Cristo,
Vosso Filho, nosso Senhor, que, _ sendo Deus;
convosco vive e reina em unidade do Espí­
rito Santo, por todos os séculos dos sé­
culos. Amen .

Epístol a e Evangel ho
Variam em todas as Missas. Na homilia as
costuma o celebrante e.1:p/icar.

Credo
Creio em um só Deus, Pai omnipotente,
Criador do céu e da terra e de todas as coi­
sas visíveis e invisíveis. E em um só Senhor
Jesus Cristo, Filho unigénito de Deus, e nas­
cido do Pai antes de todos os séculos . Deus
de Deus, Luz de Luz, De lis verdadeiro de
Deus verdadeiro. Gerado e não feito, con­
substancial ao Pai, pelo qual foram feitas
todas as coisas . O qual por amor de nós
os homens e para nossa salvação desceu dos
céus . E incarnou em 1\tlaria Virgem por vir­
tude do Espírito Santo, e se fez homem.
Também por nós foi crucificado, sob Pôncio
Pilatos, padeceu e foi sepultado. E ressus­
citou ao terceiro dia, segundo as Escrituras.
E subiu ao céu e está sentado à direita do

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TR1 B UNAL DA PE N 1TÊN C1 A 513

Pai, e há de vi� outra vez, a julgar os vivos


e os mortos ; e o seu reino não terá fim.
E creio no Espírito Santo, Senhor e vivifi­
cador, que procede do Pai e do Filho, e que
simultâneamente coÍn o Pai e o Filho é ado­
rado e glorjfiCado, e que falou pelos Pro­
fetas. Creio .t ambém numa só Igreja, santa,
católica e apostólica . Confesso um só bap­
tismo para remissão dos peéados. E espero
a ressurreição dos mortos e a vida do sé­
culo futuro. Amen.

Ofertório

Recebei, Pai santo, omnipotente e eterno


Deus, a hóstia imaculada que eu, indigno
servo V osso, Vos ofereço, a Vós Deus vivo
e verdadeiro, por meus inumeráveis peca­
dos, ofensas e negligências, e por todos os
circunstantes, assim como por todos �s · fiéis
cristãos, vivos e defuntos, para que a knim e
a eles aproveite em salvação para a vida
eterna. Amen.

Ó Deus que maravilhosan1ente criastes


em dignidadade a natureza humana, e mais
prodigiosamente a renovastes : concedei-nos
pelo mistério desta água e deste vinho, que
participemos da divindade daquele que se
dignou revestir-se da nossa humanidade, Je­
sus Cristo, Vosso Filho, Nosso Senhor, que,
sendo Deus, co_n vosco vive e reina em uni-

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51 4 O CRISTÃO N O

dade com Espírito Santo por todos os sé­


culos dos séculos. Amen .
Nós Vos oferecemos, Senhor, o cálix qa
salvação, e Vos suplicamos que, por Vossa
clemência, o façais subir, com suave fra­
grância, ao trono da Vossa divina Mages­
tade para nossa . salvação e de todo o mundo.
A men .
Em espírito de humildade e em ânimo
contrito, sejamos acolhidos por Vós, Senhor ;
e assim se cumpra hoje o nosso sacrifício na
V assa presença, de modo que V os agrade,
Senhor Deus . Vinde, ó Santificador omni­
potente., Deus eterno, e abençoai este sacri­
fício preparado em honra do V osso santo
nome.
Ao lavabo
r _,a varei as minhas mãos entre os ino­
centes, e andarei, Senhor, em redor do
Vosso altar. Para fazer ouvir a voz dos
Vossos louvores e contar as Vossas mara­
vilhas.
Senhor, amei a formosura da Vossa casa
e o lugar onde reside a Vossa glória. Senhor,
não deixeis perder a minha alma com os
í mpios, nem a minha vida com os homens
sanguinários, em cujas mãos há iniquidades
e cuj a dextra está cheia de subornos .
.Mas eu entrei com inocência ; resga-

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T R I B U N A L D A. P E N I T Ê N C I A 515

tai-me e compadecei-Vos de mim. Os meus


pés estão firmes no caminho da rectidão.
Eu Vos louvarei, Senhor, nas assembleias
dos povos.
Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito
Santo : assim como era no princípio e agora
e sempre por todos os séculos dos séculos.
Amen.
Aceitai, ó Santíssima Trindade, esta obl a­
ção que Vos oferecemos em memória da
paixão, ressurreição e ascensão de Nosso
Senhor Jesus Cristo, e em honra da bem­
-aventurada sempre Virgem Maria, do bem-
-aventuradq S. João Baptista e dos após-
tolos São Pedro e São Paulo e de todos os
Santos : a fim de que aproveite a eles para
honra e a nós para salvação, e por nós se
dignem interceder no céu aqueles de quem
na terra celebramos a memória. Pelo mesmo
Jesus Cristo Senhor Nosso. Amen .
Que o Senhor receba de nossas mãos
este sacrifício para louvor e glória do Seu
nome, utilidade nossa e de toda a sua santa
Igreja. Amen .
Secreta
Dignai-Vos, Senhor nosso Deus, santi­
ficar, pela invocação do Vosso santo nome,
esta Hóstia que Vos oferecemos e por ela
fazei que nos consagremos a Vós eterna­
mente. Por Jesus Cristo, Vosso Filho,

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5 16 O CRISTÃO NO

Nosso Senhor, que. sendo Deus convosco


vive e reina em unidade do Espírito Santo.
Por todos os séculos dos séculos. Amen.
O Senhor seja convosco. E com o Vosso
espírito.
Corações ao alto. Já os temos no Senhoe:
. Dêmos graças ao Senhor, nosso Deus.
E digno e justo.

Prefácio
É verdadeiramente digno e justo, racio­
nal e salutar que sempre e em todo o lu­
gar Vos dêmos graças, Senhor santo, Pai
omnipotente, eterno Deus que c9m o Vosso
unigénito Filho e com o Espírito Santo sois
um só Deus e um só Senhor : não · como
sendo uma só pessoa, mas a Trindade
numa só substância. Porquanto o que, pela
Vossa revelação, cremos da Vossa glória,
isso mesmo cremos, sem diferença alguma,
do Vosso Filho e do Espírito Santo ; de
modo que adorando a sempiterna Divindade,
nós adoramos a propriedade nas Pessoas, a
unidade na Essência e a igualdade na Ma­
gestade. A qual louvam os anjos e os Ar­
canjos, os Querubins e os Serafins que não
cessam de cl amar todos os dias, numa só voz :
S a n to, Santo, San to é o Senhor Deus
dos exércitos . Os céus e a terra estão cheios
da Vossa glória. Hosana nas alturas. Ben­
dito sej a o que vem em nome do Senhor.
Hosana nas alturas.

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TR1 B U N AL D A P E N 1T Ê N C1 A 5 17

Cân on
A Vós, portanto, clementíssimo Pai, hu­
mildemente rogamos e pedimos por J estis
Cristo, Vosso Filho e nosso Senhor, quê Vos
digneis aceitar e abençoar estes dons, estas
dádivas, estes sacrifícios santos e imaculados
que Vos oferecemos, em primeiro lugar, pela
Vossa santa Igreja católica - dignai-Vos pa­
cificá-la, protegê-la, uni-la e governá-la em
todo o mundo - em união con1 o Vosso servo,
o nosso Papa N. o nosso Bispo N. e com
todos os fiéis e cultores da fé católica e
apostólica.
Lembrai-Vos, Senhor, dos V ossos ser­
vos e servas N. N. e de todos os circuns­
tantes cuja fé e devoção Vós conheceis : por
eles Vos oferecemos ou eles Vos oferecem
este sacrifício de louvor, por si e por todos
os seus, pela redenção das su'as almas, pelo
esperança da sua salvação e conservação, e
Vos fazem os seus votos, eterno Deus, vivo
e verdadeiro.
Unidos em comunhão, nós veneramos
primeiramente a memória da gloriosa sem­
pre Virgem Maria, Mãe de Deus e Nosso
Senhor Jesus Cristo, e a dos bem-aventu­
rados apóstolos e mártires Pedro e Paulo,
André, Tiago, João, Tomé, Filipe, B arto­
lomeu, Mateus, Simão e Tadeu ; Lino,
Cleto, Clemente, Xisto, Cornélia, Cipriano,
Lourenço, Crisógono, João e Paulo, Cosme

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5 18 O CRI STÃO N O

e Damião, e de todos os Vossos Santos, por


cujos merecimentos e orações Vos pedimos
nos concedais em tudo o socorro da Vossa
protecção. Pelo mesmo Cristo, Senhor
nosso. Amen..
Por isso V os pedimos Senhor, que rece-
. bais favoràvelmente a oblação do nosso. mi­
nistério e de toda a Vossa família, e con­
serveis em paz a nossa vida, nos l ivreis da
eterna condenação e nos conteis no número
dos Vossos escolhidos. Por Cristo, Senhor
nosso. Amen.
Pedimos-Vos, Senhor, que V os digneis
fazer que esta oblação seja abençoada, aco­
lhida, ratificada, digna e aceitável, afim de
que se torne para nós o Corpo e sangue do
Vosso dilectíssimo Filho, nosso Senhor Je­
sus Cristo:
O qual, na véspera da sua paixão, tomou
o pão nas suas santas e veneráveis mãos, e
levantando os olhos ao céu., a Vós, seu Pai
omnipotente, dando-Vos graças, o abençoou,
partiu e deu a seus discípulos, dizendo : to­
mai e comei todos dele :
«Porque isto é o meu corpo. »
Do mesmo modo, depois de ter ceado,
tomando este precioso cálix em suas santas
e venerá veis mãos, dando-Vos também gra­
ças, o abençoou e o deu a seus discípulos,
dizendo : tomai e bebei todos dele :
« Porque este é o cálix do meu sangue,
do novo e eterno Testamento, mistério ·de

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1' R i H UN A L D A PEN ITÊ NC1A 51g

fé, que será derramado por Vós e por mui­


tos em remissão dos pecados » . Todas as
vezes que
, . isto fizerdes, o fareis em minha
memoria.
Por isso Senhor, nós, Vossos servos, e
todo o povo santo, lembrando a bem-aven­
turada paixão do mesmo Jesus Cristo, Vosso
Filho,, Nosso Senhor, e também a sua -res­
surreição do sepulcro e a sua gloriosa ªs­
censão aos céus, oferecemos à Vossa excelsa
Magestade, dos Vo�sos dons e dádivas, a
Hóstia pura, a Hóstia santa, a Hóstia ima­
culada, o Pão santo da vida eterna e o
Cálix da salvação perpétua.
Dignai-Vos lançar sobre eles olhos pro­
pícios e rec·e bê-los benignamente, como re­
cebestes as ofertas do justo Abel, Vosso
servo, e o sacrifício do nosso Patriarca
Abraão e o que Vos ofereceu o V osso sumo
sacerdote Melquisedeque, sacrifício santo,
hóstia imaculada.
Pedimos-Vos humildemente, ó Deus omni­
potente, que mandeis levar, pelas mãos do
Vosso santo Anjo, estas nossas ofertas ao
Vosso sublime" altar, à presença da Vossa
divina Magestade, para que todos os que,
participando deste altar, recebermos o sa;.
crossanto corpo e sangue do Vosso Filho,
sejamos cheios de toda a bênção e graça ce­
lestial. Pelo mesmo Cristo, Senhor nosso.
Amen.

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520 ó CRIST Ã O NO

Lembrai-Vos também, Senhor, dos Vos­


sos servos e servas N. e N. que antes de
nós viveram na mesma Fé e descansam
agora no sono da paz.
A estes · e a todos os que repousam em
C risto, V os pedimos, Senhor, que Vos di­
gneis conceder-l hes o lugar do refrigério, da
luz, e da paz. Pelo mesmo Cristo, Senhor
nosso. Amen .
Etambém a nós, pecadores, Yossos ser­
vo!;, que esperamos na grandeza das Vossas
misericórdias, dignai-Vos dar alguma parti­
cipação e sociedade com os Vossos santos
apóstolos e mártires, João, Estêvão, Matias,
B arnabé, Inácio, Alexandre, Marcelino, Pe­
dro, Felicidade, Águeda, Luzia, Inês, Ce­
cília, Anastásia e com todos os Vossos San­
tos : na companhia dos quais Vos pedimos
que digneis receber-nos, não pelos nossos
m éritos, mas pela Vossa misericórdia. Por
Cristo Senhor nosso.
Pelo que Vós, Senhor, sempre criais, san­
tificais, vivificais, abençoais � nos concedeis
todos estes bens. Por ele, com ele, e nele
é dada toda · a honra e glória, a Vós, Deus
Pai omnipotente, na unidade do Espírito
Santo, por todos os séculos dos séculos.
Amen.
Oremos : Instruídos com os salutares
p receitos e afoitados com o ensinamento di-

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T R 1 B U N A L D ·A P E N I T Ê N C I A 521

vino, ousamos dizer : Pai nosso que estais


nos céus, santificado seja o Vosso nome ;
venha a nós o Vosso . reino ; seja feita a
Vossa vontade, assim na terra como no céu ;
o pão nosso de cada dia nos dai hoje : per­
doai-nos as nossas ofensas, assim corno nós
perdoamos a quem nos tem ofendido ; e não
nos deixeis cair em tentação, mas l ivrai-nos
do mal. Amen.
Livrai-nos, Senhor, nós V o-lo pedimos,
de todos os males passados, presentes e fu­
turos e7 pela intercessão da bem-aventurada
e gloriosa sempre Virgem Maria, :Mãe de
Deus, e dos Vossos bem-aventurados após­
tolos, Pedro, Paulo, e André e de todos os
Santos, concedei-nos propício a Vossa paz
durante a vida, p ara que, ajudados com as ·
auxílios da Vossa rnisericórdia, sejamos sem­
pre livres de pecado e de toda a perturbaçãü".
Pelo mesmo nosso Senhor Jesus Cristo,
V osso Filho que, sendo Deus, convosco vive
e reina em unidade do Espírito Santo, por
todos os séculos dos séculos. Amen.
Que esta mistura e consagração do corpo
e sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo que
vamos receber, seja para nós penhor da vida
eterna. Amen.
Ao Agn us . Dei
Cordeiro de Deus que tirais os pecados
do mundo, tende misericórdia de nós.

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O CRISTÃO NO

Cordeiro de Deus que tirais os pecados


do mundo, tende misericórdia de nós.
Cordeiro de Deus que tirais os pecados
do mundo, dai-nos a paz.
Senhor Jesus Cristo que dissestes aos
Vossos apóstolos : ccDeixo-vos a paz, dou­
-vos a minha paz», não olheis para os meus
pecados, mas para a fé .d a Vossa Igreja. ;
e dignai-vos dar-lhe paz e união segundo a
vossa vontade. Vós que, sendo Deus, viveis
e reinais por todos os séculos dos séculos
A men .
Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus vivo,
que por vontade do Pai e cooperação do Es­
pírito Santo, vivificastes o mundo pel a Vossa
morte : l ivrai-me, por este Vosso santíssimo
corpo e sangue, de todas as minhas iniqui­
dades e de todos os males, e fazei que obe­
deça sempre aos Vossos preceitos, e nunca
permitais que me aparte de Vós, que com
o mesmo Deus Pai e o Espírito Santo vi­
veis e reinais por todos os séculos dos sé­
culos . Amen.
Que a comunhão do Vosso Corpo e San­
gue, Senhor Jesus Cristo, que eu, embora
indi g no, vou receber, não seja para mim
motivo de juizo e condenação, mas, por
Vossa piedade, me aproveite para defesa e
remédio da alma e do corpo. Vós que,
sendo Deus, viveis e reinais em unidade do
Espírito Santo por todos os séculos dos sé­
culos . Amen.

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. TRI B UNAL D A PE NITÊ N CI A .523

Receberei o Pão do céu e invocarei o


nome do Senhor.
À Comun hão
Senhor, eu não sou digno que entreis na
minha morada, mas dizei uma só palavra e
a minha alma. será salva. ( Três vezes) .
O corpo de nosso $enhor Jesus Cristo
guarde minha alma para a vida eterna .
Amen.
Que darei eu ao Senhor por todos os
bens que me tem feito ? Tomarei o cálix de
salvação, e invocarei o nome do Senhor.
Invocarei o Senhor cantando os seus lou­
vores e serei salvo dos meus inimigos.
O sangue de nosso Senhor Jesus Cristo
guarde minha alma para a vida eterna.
Amen.
Fazei Senhor que, em mente pura, re­
tenhamos o que na boca recebemos, e . que
este dom temporal se torne para nós um
remédio sempiterno.
O Vosso corpo, Senhor, que recebi e o
Vosso sangue que bebi, se unam a todo o
meu ser ; e fazei que, depois de ter sido
fortificado com tão santos e puros sacra­
· rrientos, em mim não reste mancha de pe­
cado. Yós que viveis e reinais por todos os
séculos dos séculos. Amen.

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O CRISTÃO NO

Bendizemos ao Deus do céu e louvá­


-lo-emos na presença de todos os viventes :
porque usou connosco da sua misericórdia.
Oração
Fazei, Senhor nosso Deus, que a re­
cepção deste sacramento e a confissão da
sempiterna e Santa Trindade e da sua in­
divisível Unidade nos aproveite para salva­
ção da alma e do corpo. Por Jesus Cristo,
Vosso Filho, nosso Senhor que, sendo Deus,
convosco vive e reina em unidade do Espí­
rito Santo por todos os séculos dos séculos.
Amen.
Bênção
Recebei agradàvelmente, Trindade San­
tíssima, o obséquio do meu ministério, e
fazei por Vossa misericórdia que este sacri­
Hcio, que eu, indigno, levei à presença da
Vossa Magestade, Vos seja aceitável, e de
proveito a min1 e a todos aqueles por quem
o ofereci, pela Vossa misericórdia. Por Cristo
Senhor Nosso . Amen.
O Deus Omnipotente, Pai e Filho e Es­
pírito Santo vos abençoe . Amen.
Ú ltimo Evangelho
Princípio do Evangelho segundo S . João.
Glória a Vós, Senhor.

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T R 1 B U N A. L D A. P E N 1T R N C 1 A 525-

No princípio era o Verbo e o Verbo es­


tava com Deus e o Verbo era Deus . Ele
estava, ·no princípio, com Deus. Todas as
coisas foram feitas por ele, e nada do que
foi feito, foi feito sem ele. Nele estava a
vida, e a vida era a luz dos homens ; e a
luz resplandeceu nas trevas, mas as trevas
não a compreenderam. Houve um homem
enviado por Deus que se chamava João.
Este veio por testemunha, para dar teste­
munho da luz afim de que todos cressem
por ele. Ele não era a luz, mas veio pf.ra
dar testemunho da luz. Era a luz verda­
deira que alumia a todo o homem que vem
a este mundo. Estava no mundo e o munáo
foi feito por Ele e o mundo não O conheceu.
Veio para o que era seu, e os seus não o
receberam . Mas a todos os que o receberam
deu o poder de se fazert!m filhos de Deus,.
aos que crêem no seu nome ; os quais não.
nasceram do sangue, nem da vontade da
carne, nem da vontade do varão, mas de
Deus. Gen u,fiecte-se. E o Verbo se fez
carne e habitou e ntre nós ; e nós vimos a
sua glória, corno glória do Filho unigénito
do Pai, cheio de graça. e de verdade.
Oraçlies finais
A ve·Maria, cheia de graça, o . Senhor é
convosco, bendita sois Vós entre as mu­
lheres, e bendito é o fruto do Vosso ventre,.
Jesus. -·Santa Maria, Mãe de Deus, rogai

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O CRISTÃO NO

por nós, pecadores, agora e na hora da nossa


morte. Amen.
Salve-Rainha, mãe de misericórdia, vida,
.d oçura e esperança nossa, salve. A Vós
bradamos, os · degredados filhos de Eva ;
.a Vós suspiramos, gemendo e chorando
neste vale de lágrimas. Eia, pois, advogada
nossa, esses V ossos olhos misericordiosos a
nós volvei. E depois deste desterro nos mos­
trai Jesus, bendito fruto do Vosso ventre.
O clemente, ó piedosa, ó doce Virgem Ma­
ria. - Rogai por nós santa Mãe de Deus,
para que sejamos dignos das promessas de
·Cristo. Amen.
Oremos. - Deus, nosso refúgio e forta­
l eza, atendei, propício, aos clamores do
Vosso povo ; e, pela intercessão da gloriosa
· e Imaculada Virgem Maria, Mãe de Deus,
. do seu bem-aventurado espôso S . José, dos
Vossos bem-aventurados apóstolos S . Pedro
e S . Paulo e de todos os santos, ouvi, be­
.nigno e misericordioso, as súplicas que fer­
·vorosamente Vos dirigimos pela conversão
· dos pecadores, e pela liberdade e exaltação
da santa Madre Igrej a. Pelo mesmo Jesus
Cristo, Senhor nosso. Amen.
S . Miguel Arcanjo, protegei-nos no com­
·bate : sede nosso auxílio contra a malícia e
. ciladas do demónio ! Exerça Deus sobre ele
o seu império, instantemente o pedimos :
· e Vós, príncipe da milícia cel�ste, pelo di-

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T R I B U N A. L D A P E N I T Ê N C I A 527

vino poder precipitai no inferno · a Satanás e


aos outros espíritos malignos que vagueiam
pelo mundo para perder as almas. Amen.
Sacratíssimo Coração de Jesus, tende
p iedade de nós.

Via-Sac ra
l\tleu Deus e Senhor Jesus Cristo, eis-me
aqui para Vos acompanhar em espírito no
doloroso caminho do calvário. Conheço, Se­
nhor, e confesso que não sou digno duma tão
grande graça, porque V os tenho ofendido
muitas vezes ! M as perdoai-me� ó dulcíssimo
Jesus, que a mim me pesa de Vos ter ofen­
dido, por serdes Vós tão bom, tão santo e
tão amável ! Perdoai-me, que eu proponho,
com a Vossa graça e protecção de Maria
Santíssima, nunca mais Vos ofender.
Das indulgências que lucrar, aplico por
mim todas as que puder, e as demais sejam
pelas almas do Purgatório e por aquelas in­
tenções que forem mais do Vosso agrado e
do agrado da Virgem Santíssima.

Pri meira estação


jesus condenado à morte

Nleu Jesus, que Vos deixastes condenar


à n1orte temporal para me livrar da mórte
eterna, misericórd·ia ! Doce Coração de Ma-

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O CRISTÃ O NO

ria, sede a minha salvação ; e, pélos mere­


cimentos da Paixão e morte de Jesus, fazei
que eu alcance a eterna vida.
(Depois de breves instantes de meditação,
reza-se o Padre Nosso e A ve Maria. Assim se
pode fazer em todas as estaçõe�).

Segunda estação
jesus toma a cruz aos ombros

1\1eu Jesus, que aceitastes, a Vossa cruz


com tanta submissão e a levastes por mim
com tanto amor, nt'iserz"córdi"a ! Doce Cora­
ção de Maria, sede a min!J,a salvação ; e aju­
dai- me a l evar com resignação e alegria as
cruzes que Vosso divino Filho me enviar.
Terce i ra estação
jesus cai pela primeira vez

!Yfeu Jesus, que caístes em terra . com a


V assa cruz para que eu não caísse no in­
ferno, miserz'córdia ! Doce Coração de Ma­
ria, sede a minha salvação ; e ajudai-me a
levantar dos meus pecados, pois foram eles
que assim fizeram cair por terra o V osso e
meu Jesus .
Quarta estação
Encontro de jesus com sua ,lfãe

.i\ leu Jesus, que tanto sofrestes ao encon­


trar na rua da Amargura Yossa l\lãe, aflita

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T R1BUNAL DA PEN1TÊNC1A 52 9

e consternada, misericórdia ! Doce Coração


de Maria, sede a minha salv��� ; e, por
esse encontro tão doloroso, sai V os ao meu
encontro na hora da minha morte, para me
levar à bem-aventurança.
Qui nta estação
jesus é ajudado pelo Cireneu

Meu Je,sus, que, sendo Deus Omnipo­


tente, quisestes que uma Vossa criatura Vos
ajudasse a levar a cruz, mise1·icó1·dia ! Doce
Coração de 1vlaria, sede a minha salvaçâo ;
e ajudai-me Vós a mim, a andar sempre no
caminho da virtude, até à hora da minha
morte.
Sexta estação
A Verónica limpa o rosto de jesus

Meu Jesus, que, sendo a formusura dos


anjos na glória, necessitastes que piedosa
mu1 her Vos limpasse o rosto, misericórdia !
Doce Coração de Maria, sede a minha sal­
vação ; e limpai minha alma de todas as
suas manchas e imperfeições·, para que possa
aparecer bem pura na presença de Deus e
dos seus anjos.
Sét ima estação
jesus cai pela segunda vez

Meu Jesus, que caístes segunda vez em


ter ra, aó sair da cidade ingrata de J eru-

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530 o CRISTÃO N O

salém, miseric ó1·dia ! Doce Coração de 1\J,1-


ria, sede a minha salvação ; e não pennitais
que eu torne a cair em pecado, para não
expulsar, de novo, do meu coração ao Vosso
divino Filho.
O itava estação
jesus consola as filhas de jerusalém

Meu Jesus, que, apesar de tão aflito,


consolastes as filhas de Jerusalém, que por
Vós iam chorando, misericórdia ! Doce
Coração de 1\llaria, sede a minha salvação ;
e consolai-me Yós a mim, com a esperança
do perdão e da salvação eterna.

Nona estação
jesus cai pela terceira vez

1\1eu Jesus, que, sabendo a facilidade com


que eu havia de recair na culpa, quisestes
cair em terra por três vezes, misericórdia .'
Doce Coração de J\1aria, sede a mzºnha sal­
vação ; e dai-me· tal horror ao pecado, que
não mais torne a cair nele .

Décima estação
jesus despido no calvdrio

Aleu Jesus, que fostes despido no cal­


vário, para expiação dos meus excessos e
imodéstias, mísericórdia ! Doce Coração

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T R 1 B U N A L D A. P E N 1 T Ê N C 1 A 531

de Maria, sede a minha salvação ; e ves­


ti-me com o manto da Vossa clemênci � ,
para que eu possa aparecer sem receio
diante do Juiz Supremo, no grande dia do
juízo final.

Décima· primeira estação


jesus pregado na cruz

Meu Jesus, que fostes pregado na cruz


com duros cravos e a ela seguro com as
fortes cadeias do Vosso amor, misericórdiºa !
Doce Coração de Mari·a, sede a minha sal­
vação ; e prendei-me ao serviço de Deus
por forma tal, que nunca mais eu torne a
fugir dele .

Décima-se gunda estação


jesus m orre na cruz

Meu Jesus, que, depois de terdes tmpre­


gado toda a V assa vida em fazer-me bem,
e de me dardes por Mãe a Vossa própria

Mãe, morrestes na cruz por meu amor, mi­


sericórdia ! Doce Coração de Maria,_ sede
a minha salvação ; e fazei que el:l morra
para as criaturas e para mim mesmo, e viva
só para Deus ; e assim Vos não dê jamais
motivo de que Vos arrependais de me terdes
aceitadp por filho Vosso.

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532 O CRISTÃO NO

Décima- terceira estaçlo


jesus deposto na cruz nos braços de sua l'rlãe

Meu Jesus, que, deposto da cruz, fostes


colocado nos braços de Vossa apgustiada
Mãe, mi'sericórdia ! Doce Coração de Ma­
ria, sede a minha salvação ; e, por a1nor
do bendito Filho, que tivestes morto em ·

Vossos braços, fazei que eu não morra em


pecado mortal, para não incorrer na morte
eterna.

Décima-quarta estaçlo
jesus é sepultado

Meu Jesus, que quisestes que Vosso di­


vino corpo estivesse por três dias encerrado
no sepulcro, miºsericórdi'a ! Doce Coração
de Maria sede a minha salvação ; e fazei
que Jesus habite em minha alma pela sua
graça, todos os dias de minha vida até ao
momento da minha morte, para que eu vá
depois contemplar no céu a sua infinita for­
mosura, e por toda a eternidade gozar da
sua e da Vossa companhia. Assim seja.

Antes das refeiçnes


Em nome do Pai e do Filho e do Espí­
rito Santo. Amen .
S'enhor, tende piedade de nós.
Jesus Cdsto, tende piedade de nós .

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TRIBU� A L D A P E�IT�CI � -:- :-:-

Senhor, tende piedade de nós .


Pai nosso que estais nos céus . . .
Abençoai-nos� Senhor, e como nos ali-
mentais agora com os dons da Yossa libe­
ralidade assim nos admiti um dia à mesa
celeste da Vossa eterna glória.

Depois da refeição
Nós Vos damos � raças, Senhor, por to­
dos os Vossos benef1cios, a Vós que viveis
e reinais por séculos de séculos. Amen.
Senhor, tende piedade de nós.
Jesus Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.
·

Pai nosso, que estais nos céus . . .


Dignai-Vos, Senhor, retribuir por nós a
todos os que nos fazem bem, em honra do
Vosso nome, qando-lhes a vida eterna. Amen.
E que as almas dos fiéis defuntos, pelá. mi­
sericórdia divina, descansem em paz. Amen.
Em nome do Pai e do Filho e do Espí­
rito Santo. Amen.

Ao toque das Ave Marias


O Anjo do Senhor anunciou a Maria. E ela
concebeu do Espírito Santo. Ave Maria.
Eis aqui a escrava do Senhor. Faça-se em
min1 segundo a Vossa palavra. Ave Maria.
E o Verbo se fez carne. E · habitou entre
nós. Âve Maria.

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O CRISTÃO NO

Rogai por nós Santa Mãe de Deus, para


que sejamos dignos das promessas de Cristo.
Infundi, Senhor, nós vo-lo pedimos, a
Vossa graça em nossas almas, para que nós
que pela Anunciação do Anjo . conhecemos a
Incarnação de Jesus Cristo Vosso Filho, pela
sua Paixão e Morte de Cruz sejamos condu­
zidos à glória da Ressurreição. Pelo mesmo
Jesus Cristo Senhor nosso. Amen.
Desde o sábado de Aleluia até à véspera
da Santíssima Trindade :
Rainha dos Céus, alegrai-Vos. Aleluia.
Porque Aquele que trouxestes em Vosso
seio. A leluia.
Ressuscitou, como dissera. Aleluia.
Rogai por nós ao Senhor. Aleluia.
Exultai e alegrai-Vos, ó Virgem Maria.
Porque o Senhor na verdade ressuscitou.
Aleluia.
Ó Deus, que Vos dignastes alegrar o
mundo com a Ressurreição de Vosso Filho
Jesus Cristo Senhor nosso, concedei-nos que
por intercessão de sua santa Mãe a Virgem
Maria consigamos o gozo da vida eterna.
Amen.

A N ossa S e nho ra
Lembrai-Vos, ó piíssima Virgem Maria,
que nunca se ouviu dizer que algum da,.
queles que têm recorrido à Vossa protecção,

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------ · ---·--- --·--- - -- --

implorado a Yossa assistência e reclamado


o Vosso socorro, fosse por Vós desampa­
rado. Animado eu, pois, de igual confiança,
a Vós, Virgem entre todas singular, como a
1\tlãe recorro, de Vós me valho � gemendo
sob o peso de meus pecados me prostro a
Vossos pés. Não desprezeis as minhas sú- .
plicas, ó Mãe do Filho de Deus humanado,
mas dignai-Vos de as ouvir propícia e de
me alcançar o que Vos rogo. Amen .
Ó Senhora minha, ó· minha Mãe, eu me
ofereço todo a Vós . ; e em prova da minha
devoção para convosco, Vos consagro hoje
os meus olhos, os meus ouvidos, a minha
boca, o meu coração, e inteiramente todo o
meu ser. E porque assim sou Vosso, ó in­
comparável M ãe, guardai-me e defendei-me
corno coisa e propriedade Vassa.
Lembrai-Yos que Vos pertenço, terna
Mãe Senhora nossa. Ah ! Guardai-me e de­
fendei-me como coisa própria Vossa.

Mistérios do Rosário
Miºstérios goto�os : 1 . 0 A Anupciação do
Anjo a Maria. - . 2 . º A Visita de Maria a
S . Isabel. 3.0 O Nascimento de Jesus em
-

B elém . - 4.º A Purificação de Maria no tem­


plo. - 5.0 O Encontro de Jesus no templo.
Mz"stérios dolorosos : 1 .º A Agonia de
Jesus nó Horto. -. 2 . 0 A Flagelação de Jesus.

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536 O CRISTÃO NO

- 3.0 A coroação de espinhos. O ca­


-
4 º
.

minho doloroso do Calvário. - 5 . 0 A Ago­


nia e 1\!lorte de Jesus na Cruz.
1Vlistérios gloriosos : A Ressurreição de
.Jesus. - 2 . º A Ascensão de Jesus aos Céus.
- 3 . º A Descida do Espírito Santo. - 4 º
A Assunção de Maria aos Céus. - J .0 A Co­
.

roação de 1\'l aria nos Céus .


Ladainha de Nossa Sen hora
Kyrie, el éison.
Christe, e léison.
Kyrie, e léison.
Christe, audi nos .
Christe, exáudi nos .
Pater de crelis Deus, miserére nobis .
Fili, Redémptor rnundi Deus, miserére
nobis .
Spíritus Sancte Deus, miserére nobis.
Sancta Trínitas unus Deus, miserére
no bis.
Sancta � l arí a,
Sancta Dei Génitrix,
Sancta Virgo virginum, "'
lVlater Christi, :a
o
e
l\'I ater divinre grátire,
l\later puríssima,
l\'Iater castíssima, r!
o
1\!Iater invioláta,
Nl ater intemeráta,
l\:later amábilis,

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TR1 B UN AL D A PE N 1 TE N C1 A 53?

Mater admirábilis,
Mater boni consílii, l
Mater Creatóris,
Mater Salvatóris,
V irgo prudentíssima,
Virgo veneránda,
Virgo prredicanda,
Virgo potens,
Virgo clemens,
Virgo fidélis,
Spéculum justítire,
Sedes sapiéntire,
Causa nostrre lretítire,
V as spirituale,
V as honorábile,
V as insígne devotiónis,
Rosa mystica,
Turris Davídica, e
Turris ebúrnea, o
Domus áurea,
Fcederis arca,
J ánua cceli,
Stella matutína,
Salus infirmórum,
Refúgium peccatórun1,
Consolátrix aflictórum,
Auxílium Christianórum,
Regína Angelórun1,
Regína Patriarchárum,
Regína Prophetárum,
Regína Apostolórum,
Regína Mártyrum,
Regína' Confessórum,

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538 O CRISTÃO NO

Regína Vírginum, 1/)

Regína Sanctórum ómnium, ;õ


o
i::
Regína sine labe origináli concépta, o
..
Regína in crelum Assumpta, e.

Regína Sacratíssimi Rosárii, �


o
Regína pacis,
Agnus Dei, qui tol lis peccáta mundi,
parce nobis, Dómine.
Agnus Dei, qui tol lis peccáta mundi,
exáudi nos, Dómine.
Agnus Dei, qui tóllis peccáta mundi, mi­
serére nobis.
y . Ora pro nobis, Sancta Dei Génitrix.
1l Ut digni efficiámur promissiónibus
Christi.
Orémus Concede nos, fárhulos tuos,
-

quresumus, Dómine Deus, perpétua mentis


et córporis sanitate gaudére, et gloriósa
beáta! Maríre semper Vírginis intercessióne,
a prresenti liberári tristítia et retérna pérfrui
lretítia. Per Christum Qóminum nostrum .
�- Amen.

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O ra çã o m en t.a l o u m ed i ta ç ã o
Meditação ou oração mental é o entretenimento
1�timo com Deus sobre os negócios da alma, óu a
conversa familiar com o Senhor acerca das ver­
dades santas da religião. Na meditação, a alma
como que pega numa verdade religiosa ou assunto
de piedade, e a propósito dele põe-se com o Senhor
a conversar.
Importa pouco o modo ou o método de fazer a
meditação, o essepcial nel a é comparar, diante de
Deus, a nossa vida com a nos!'a Fé, manifestar a
Deus nossas misérias e im perfeições, a pedir a graça
que nos ajude a triunfar das dificuldades que todos
os dias se nos antolham nos caminhos da perfeição,
a vencer as más inclinações do coração, a ajustar
e harmonizar nossa vontade com seus divinos man­
damentos.
Mas como chegar a tanto ?

Método prático de meditação

1 . Põe-te na presença de Deus, e levantando o


coração e os olhos para o Alto, diz com o Real
Profeta : .«Dirij o meus olhos para Vós, Senhor, que
habitais nos céus». ( 1 ) Também assim costumava
Jesus fazer : erguia os olhos ao céu e exclamava :
«Pai, é chegada a hora ; glorifica teu Filho, para
que teu Filho te glorifique a Ti». (�) ·
Olhar o crucifixo ou fixar qualquer outra ima­
gem piedosa, muito nos pode ajudar a pôrmo-nos

(1) Salmo 122,1


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O CRISTÃO NO

na presença de Deus. Se é na igrej a que fazes a


meditação, ajoelha, contempl a o Tabernáculo a
adorar Jesus ali escondido no Santíssimo Sacra­
m ento e a implorar-lhe que te ensine a orar.

2. Depóis, repassa no espírito as verdades em


que desejas meditar, e reflete nelas examinando
.com atenção tudo o que te ensinam.
Neste p articular podes proceder assim : lês
trecho do Evangelho ou de outro livro da Escritura
Sagrada ou mesmo qualquer meditação dessas ' que
andam pelos livros de piedade. E a seguir, con-.
forme tua capacidade e forças permitirem, demo­
ra-te a repensar nas \'erdades que leste.

3. Passa logo a comparar tua vida com a dou­


trina examinada, e faz lá para contigo perguntas
como estas : Corre-me a vida da alma em confor­
midade com estas verdades ? O meu proceder está
neste ponto conforme aos ensinamentos de Deus ?
Em que não tenho andado certo ? Porque tenho
caíào em faltas neste ponto ? Como fui àrrastado
a o fender a Deus ? Como terei de me acautelar
para no futuro não pe�ar ? Que precauções e que
meios hei de usar ?
O coração do homem facilmente sonha desejos
largos, aspirações ousadas ; mas vai de os levar à
práti ca, faltam-lhe força s. São bem exíguas e · limi­
cad�s as suas eosses. Por isso não te espraies em
consi derações muito vastas nem abarques mui tas
doutrinas de uma vez só nem te emaranhes com
resoluções e propósitos desmedidos e sem conta.
Andar em frente nos caminhos da perfeição, só a
passo lento. Que de-veras te arrependas de tudo
aquilo em que haj as o fendido a Deus, é preciso.
Que te resolvas firmemente a emendar tuas faltas
voluntárias; tem de ser. Mas propósitos particu­
l ares, não taças muitos. Embaraçam-te a alma, de­
sassossegam-na, e ias perder o maior dom de Deus
que é a sua' paz. E nem mesmo os deves fazer
sempre novos em cada medit�ção. Teima e re-

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T R 1 B U N A L D A. P E N 1 T Ê N C 1 A 54 1

teima no mesmo propósito, pois só assim aprovei­


t arás. E a m aior parte das vezes nem propósitos
faças ; contenta-te com agradecer a Deus quanto
lhe deves e firmar-te no propósito genérico de lhe
seres grato, cumprindo tielmente seus m andamentos
·

e acatando suas divinas disposições.

4. E porque não podes fiar muito na tua boa


vontade para levar à prática as resoluções tomadas,.
pede a Deus a graça que robusteça tua fragilidade.
Sem ela nada poderias, e portanto com preces fer­
vorosas ou ao menos com j aculatórias bem sentidas
grava na alma os desejos de virtude. E Deus olhará
tua humildade para a fortalecer com sua graça
omnipotente.

Método de m editação segundo


S. Pedro de Alcântara
Ganhou foros de clássico, por simples e fácil,.
o método de oração mental ensinado por S. Pedro
de Alcântara. Segundo ele, a meditação · há de
constar de três partes : preparação, meditação pro-
pri amente dita, e conclusão.
·

1 . Preparação. Preparamo-nos para a medi­


tação, pondo-nos na presença de Deus e excitando­
-nos à perfeita contrição de todos os pecados come­
tidos.

2. A meditação propriamente dita compreende­


as seguintes partes :
Leitura do assunto a meditar, feita va� arosa­
mente, pouco de cada vez, e com sossego. Quando­
um ponto da leitura se presta à reflexão, pára-se e
só se cont inua quando tal reflexão se esgotar. Pro­
cura-se compreender o assunto da leitura até que
possa ser bem saboreado. .
Consider9ção das verdades que se leram- e re­
flectirarn. Profunde-s_e o que significam, e à sua

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O C RI STÃ O N O

luz repasse-se a vida, a. ver o que há nela a fomen­


tar ou a emendar. E é aqui o ponto importante da
oração mental.
A cção de graças a Deus de quem promanam
todos os bons pensamentos e resoluções. A acção
de graças será curta ou longa, segundo as circuns­
tâncias � disposições do momento.
Oferecimento dos bons propósitos feitos, como
prova de gratidão pelos benefic 1 os recebidos.
Petição,, na qual se roga a Deus a salvação e
se lembra ao Senhor a sua Igreja, o próximo, so­
bretudo parentes, amigos e benfeitores.

3 . Concl Uslo. Termina- se a meditação por pe­


dir a Deus nos dê o Seu amor, e por invocar os
Santos para que j unto de Deus p or nós intercedam
a fim de que possamos tirar muno fruto.
Este método de meditação é muito prático em
tempos de fadiga ou de qualquer outra indisposição
corporal que não consinta l argas meditações. Com
actos de piedade se preench� por completo e util­
mente o tempo da meditação . . .
Está de ver que não é preciso que todas as ve­
.zes se faça cada um dos actos piedosos qu� o mé­
todo indica. O que é preciso é que sem pre se tire
da meditação vigor novo para a vida espiritual e
maior paz com Deus.

Aux i l i ares da med itação

1 . Para melhor meditar recomenda- se que se


·tenha sempre à mão livro onde se possa encontrar
· leitura proveitosa. Nem todas as considerações ca­
lham bem ao feitio de cada qual, e nem todas lhe
são a propósito, dadas as condições, circuns tâncias
e espírito e modo de ser tão diferentes de individuo
para individuo.
Se de toda a leitura só alguma ou algumas fra­
ses te tocaram o coração, nelas fixa o pensamento
e sobre el as fala com tua alma e com Deus.

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T R t R U N A L D A P E N I"T Ê N C 1 A 543 ,

2. Se não tiveres à mão livro apropriado para ·


leitura, podes ler qualquer um que trate das ver­
dades cristãs, tais como a «Sagrada .l:i:scritura», a
«Imitação de Cristo», mananciais inexaurfveis de
pontos de meditação. Mesmo nos livros que não
apresentam de propósito assuntos de meditar, se
encontram passagens em que podemos reflectir com
proveito. As fórmulas comuns de oração vocal
quantas verdades encerram bem dignas de serem
meditadas. Por exemplo, o acto de contrição que
vem neste livrinho como preparação para o sacra­
mento da Penitência, dá margem a largas reflexões.
Verdades que . af se lembram : O destino eterno
dos homens é o céu ou o inferno. Com o pecado
mortal que não foi perdoado no sacramento da Pe­
nitência ou com a contrição perfeita junta à inten­
ção de receber o sacramento, perde-se para sempre
o céu e irremediàvelmente se vai para o inferno.
De be·m considerar estas verdades, sentirás o cora­
ção movido aos bons propósitos de evitar o pecado
mortal custe o que custar.
Também os pecados veniais desagradam a
Deus, pois são o fensas que se lhe fazem. E se não
perdem a alma eternamente, nem por isso dispensam
expiação neste ou no outro mundo. Há, portanto,.
que evitá-los para fugir a tantas penas. E dai sal­
tam as boas resoluções de fugir a todo o mal, de
amar a Deus sobre todas as coisas, de lhe ser fiel
em tudo. E não é para nos roubar a corage m,
a fragil idade de que somos feitos ; teimando no
bem, com a graça de Deus poderemos evitar todas
as pequenas fal tas voluntárias. Portanto sempre
adiante, sem descanso, nos caminhos da virtude e
n 1s esforços do b:!m.

As pal avras da Cristo como pontos da maditaçlo

As palavras de Jesus conservadas no Evangelho


são óptimo assunto de meditação.
Lembra, por exemplo, as palavras do Salvador

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O CRI STÃ O N O

no Jardim das Oliveiras : ccMeu Pai ! se é possfvel,


passe dl! m i m este cálix ; todavia não se faç a nisto
a minha vontade mas a tua». (I)
E representa logo a Jesus todo comido do zelo
de nos remir e salvar. Institui, na última Ceia, o sa­
cramento da Eucaristia, e deixa logo o cenáculo para
se meter de coração alegre ao caminho doloroso
da Paixão. Mas até parece que a coragem e alegria
divina uns momentos o abandonam no Jardim das
Oliveiras. É Deus, mas também é homem Treme ;
não vacila, m as sente a agonia i mensa que lhe bor­
bota em suor de sangue. Sente-se esmagado de
tristeza, de aflição e · d e terror. Nada o vence to­
davi a ; e ao Pai levanta a prece a pedir força para
levar a bom termo a obra da redenção : ccMeu Pai,
se é possível passe de m i m este cálix ; todavia
faça-se a tua vontade e não a m inha.»
E aplicarás a ti a lição do divino S alvador :
Meteste-te à vida, fosse qual fosse o estado que
abraçaste. Começaste com alegri a e confiança, e
de princfpio não t e faltava a coragem para arrumar
dificuldades e para cumprir o dever. Depois come­
çou de arrefecer o entusiasmo : sonhos que se es­
fiaparam e m dificuldades crescentes enfiadas umas
noutras. E sobreveio o cansaço no carregar a cruz
da vida, cruz sempre a crescer di ante dos olhos
que avançam. A realidade crua da vida m atou as
alegrias do inicio. Que fazer então ? Deixar cair
os braços em desalento e desânimo ? Jesus, no Jar­
dim das Oliveiras, é o Mestre das horas angustia das.
E é Ele o modelo que hás de imitar. Contempla- O
e acompanha- O a dizer também : ccPai, se é pos­
sível . . . Mas seja feita a Vossa vontade, assim na
terra como no céu».
E daqui vais à conclusão : Se Jesus é o Mestre,
h á que aprender- lhe a lição. Nunca desalentar
mesmo quando sobre ·m i m carrega o peso de
enorme sofrimento. Na sua sensibilidade e visão ·

(1) Mat. 2ô,39.

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TR1RU NA L D A P E �1T ÊN C1 A 545

divina, também Jesus sofreu;- e suou sangue só de


pensar na Paixão que chegava. Mas das suas ago­
nias tirou a coragem para aquela activa resignação
de que fez a prece que elevou ao Pai.
E, como discfpulo aproveitado, firmas-te no
bom propósito : Sempre que no caminho do dever
tropeçar em hora: de sacriffcio, não desanimarei,
pois «O discfpulo não é mais que o Mestre)). Com
Jesus hei de repetir então : «Meu Pai, se é possfvel,
passe de mim este cálix ; todavia não se faça minha
vontade mas a Vossa».
Outro exemplo : Certa vez falou assim o divino
Redentor : «Vinde a mim todos os que andais em
trabalhos e Vos achais sobrecarregaâos, e eu vos
aleviarei . . . e encontrareis descanso para as vossas
almas». (1) Tema belfssimo para nele entreteres o
pénsamento quando te preparas para a Comunhão.
Mesmo que não saibas as circunstâncias em que
Jesus falou, mesmo assim te ficará matéria larga
para meditação : - Vinde a mim todos os que an­
dais ·e m trabalhos. - Eu vos aleviarei. - E em mim
encontrareis descanso para vossas almas.

Também uma oração poda serv i r . de ponto da


med itação

Poderás por vezes, em lugar de pal avra da Es­


critura ou de passo da vida de Jesus, tomar para
ponto de meditação qualquer oração que saibas de
cor, como por exemplo esta : «Alma de Cristo, san­
tificai-me».
Vais dizendo cada uma das invocações, em
cada uma te demoras como a saboreá-la com a
piedade toda que tiveres no coracão. E este me­
âi tar pode bem servir de acção d é graças para de­
pois da sagrada Comunhão.

(1) Mat. n, 28-29 .

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O C RISTÃO N O

Do mesmo modo podes fazer com o Padre nosso,


a oração por excelência, pois foi o mesmo Salvador
quem se dignou ensinâ-la.
O autor deste livro, quando estudante, muitas
vezes se entreteve, depois da Comunhão, a pergun­
tar a si mesmo : - Que relação há de haver entre as
m inhas Comunhões e a minha vida espiritual ? Que
obrigações morais ç:ie impõem as Comunhões que
faço( Como me devo portar nas vârias circunstân­
cias da vida para proveitosamente poder comungar
com frequência ? E compreendeu m ais tarde que
reconsiderar nestas perguntas, repetida, minuciosa­
mente, aprofundar estes exames de consciência e
intermeá-los de súplicas, de invocações e propó­
sitos, era verdadeira meditação.
Simples e rápidas j actilatói:ias dão, quantas ve­
zes, bom assunto para m editar, às almas desejosas
de perfe ição.

Até a contemplação de imagens p i edosas pode


ser ponto de meditação

Também as imagens piedosas podem fornecer


m atéria de proveitoso meditar. A Cruz, por exem­
plo, é assunto inexgot ável de boa meditação.
Quem sofreu na Cruz ? Jesus Cristo, Filho
de Deus.
Por que sofreu ? Por nosso amor ; para nos
remir e salvar.
·

O amor com amor se paga. E do amor de Je­


sus par a connosco, sai a contrição dos pecados
cometiêios e o bom propósito de os emendar.
A Via Sacra é ou deve ser meditação sobre a
Paixão de Cristo. Mais : para aprender a meditar,
não há como fazer com frequência este piedoso
exercício, lendo pausadamente, sentidamente, as
considerações da Paixão de Jesus.
E contemplar qualquer outra imagem que re­
presente um passo da Paixão do Senhor, pode ser­
vir para longo e devoto meditar.

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T R1 B U N A L D A. P E N 1 T Ê N C l A 547

cc Quando poiso os olhos em imagem de Jesus


a. sofrer sua Paixão, dizia ao autor deste livro certa
vez jovem assoberbada com os tnbalhos, quando
me caem ps olhos sobre a imagem de Jesus, a ca­
beça coroada de pungentes espinhos, sinto nascer e
.crescer e m mim a paciência precisa para suportar
-quantos trabalhos e dores lancinantes me possam
.atormentar a c abeça».

Encantos e dificuldades da meditação

1. Também a graça de Deus tem suas horas.


É como se fora voz a falar-nos lâ dentro, ora fraca
e doce; ora forte e veemente. Sej a como for : el a a
falar-nos e logo nós a atendê-la e a darmo-nos à
oração com0 Deus de momento nos inspira.
Sentes-te transportado em amor de Deus, num
momento extraordinário de graça ? Não te ponhas
com preocupações de dar ordem às ideias a seguir,
m as abandona-te à veemência da graça e deixa-te
conduzir onde e como ela te queira levar, mesmo
q ue acabes apenas por só dizer «Meu Deus, amo­
-Vos», ccMeu Deus e meu tudo,,, ou outras seme­
lhantes explosões de amor divino.
E graça- tamanha, se Deus ta concede, agra­
deçe-lha ; e lembra-te que se Deus a dá, é para te
anim ar a vencer as· horas de tentação e de luta.
Não te iludas pensando que está nela a perfeição
cristã. As consolações que Deus te {JOssa dar, são
apenas mimos seus para andares sempre em frente
e com mais coragem. O proveito da oração não se
deve medir pelas consolações que ela dá, mas sim
pelos alentos novos que dela tiramos para, no sa­
cri fício, servir e amar a Deus sobre todas as coisas.
Não descanses nas graças sensíveis pensando que
com el as vai começar para ti o paraíso. Por mais
extraordinárias e maravilhosas que te pareçam as
que Deus te dê, a tua vida espiritual continuará a
ser luta e cpmbate em cada dia, e só passo a passo
adiantarás no caminho da virtude.

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O CRISTÃO NO

2. E anda prevenido. Não te faltarão dificul­


dades na vida de oração. Hoje as graças e conso-
. lações pô'dem pegar em ti e como que arrebatar-te
até aos céus ; e amanhã (quem sabe t) virá a secura,
a aridez de espírito, que te deixará trôpega a alma,
incapaz se quer de formular um pequenino bom de­
·sejo. A aridez espiritual é cruz penosa e pesada
que de 'um momento para outro pode sobrevir
mesmo às almas que amam a Deus deveras. E o
coração fica terra ressequida, e ávida de chuva_, e
por m ais que cliame nem o orvalho de pequenma
consol ação de Deus desce a matar-lhe a sede ;
fica bloco de gelo a endurecer ainda mais ao frio
do desalento, e que só a oração pode fundir. Mais
a aridez alguma vez de ti se aposse, - mais deves
orar, se não queres perder a união com Deus.
Nos dias desolados de secura e aridez morrem
nos lábios os hinos de alegria e júbilo, e não há
força que desentorpeça e eleve o coração. É o
momento de pensar que estás na tua cruz de sal­
vação em dolorosa agonia a acompanhar Jesus pen­
dente do madeiro redentor, e com o divino Mestre
repete então sem cessar : «Meu Deus, meu Deus,
porque me desamparastes ?»
Nesse transe, rápida jaculatória repetida com
frequência, será para ti oração de eficácia grande.
No mais, voltar-te-ás para Deus a dizer,.. l he que não
s abes orar melhor, que nem um bom propósito te ·
atreves a endireitar. Abrires- te assim com Deus,
será a melhor das meditações nas horas da aridez.
E se nem de tanto - és capaz, porque te foge o
pensamento logo que tentas fixá-lo em Deus, então
prega os olhos no crucifixo com a fé e amor que
puderes, e resigna-te com este meditar assim tão
simples que é olhar Jesus sofrendo� e espera, pois
Deus não deixará de te assossegar o espírito e de
te encher da sua paz.
Outro obstáculo para meditar é a perturbação
nascid·à da super-excitação das paixões : o orgulho,
a inveja, e quantas outras. Nos momentos difíceis
de apaixonada super-excit aç ão põe . quantos es-

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TRIB UN A L D A P E N ITÊ N C A 549

forços puderes por te · resignar com a vontade de


Deus e repete com frequência a pequenina mas
-e ficaz jaculatória : ·ccMeu Deus, seja feita a Vossa
vontade !" Fazendo ·assim, já a tua oração é fru­
tuosa, passasses muito embora todo o tempo da
meditação nestes pensamentos e lutas.
Com isto, todavia, não te quero dizer que não
precisas cingir-te às regras acima ditas, se queres
bem meditar. Estas observações são para .os casos
de excepção e não deves fazer delas a tua lei.
Quanto puderes, usa os métodos de · meditação
acima not ados sem contudo a eles te escravizar.
A meditação é fonte de graças divinas, e é
também ao mesmo tempo escola que nos eleva e
purifica. Quem frequenta a oração mental, vai-se
naturalmente desapegando 'ias coisas da terra e
viven.do cada vez mais em Deus e para Deus.
c<Bem-aventurado o que medita, dia e noite, na lei
<lo Senhor. Semelhante à árvore plantada junto às
águas, dará frutos a seu tempo». (1)
Exercita-te, pois, com ardo·r na prática da me­
<litação. Pouco importa onde, como e quando me­
ditas. O essencial é conversar familiarmente com
Deus e com Ele tratar os negócios da salvação.
Habitua-te a meditar, e faz da meditação a revista
que todos os dias passes à tua vida, a sondar os
:sentimentos do teu coração, os teus pensamentos,
as disposições de alma, para saberes como hás de
lutar para bem vencer teus inimigos. E será na
prática quotidiana da meditação que melhor apren­
-derás a arte diffcil de bem viver e de bem orar.

(1) Salmo 1, 1-3.

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1 n-d ·i e e
/
Ao lei tor .. . . 5
Pró l o go do autor . . • 7
INTRO DUÇÃO . . . . . . . . . · . 9
Efeitos do Sacramento da Penitência . 15
Utilidade da confissão frequente . . 24
Objecções contra a confissão frequente 33
DI RECTÓ RIO PARA UMA BOA CO NFI SSÃO . 49

P r i m e i r a p ar t e
Conheci mento dos pecados . . . . 51
Capítulo I -Que é pecado ? . 53
Capítulo II ·_ Pecado mortal e pe-
cado venia 1 . . . • . . • 56
Capítulo III Aten�antes da culpabi-
-

lidade . . . . . . . . .

Capítulo IV Como formar a cons­


-

ciência nos casos duvidosos . . . 67


Da consciência duvidosa própria­
mente dita . . . . . 68
Da consciência provável . 70
Da consciência escrupulosa . . . 77
Capítulo V Da colisão de deveres
-

ou conflitos de leis . . . .

Capítulo VI Origem e consequên-


-

cias do pecado . . . . . 91
Dos pecados em 0articular . . . . . . 1 03
Capítulo I s dez rnandam�ntos da
-

Lei de Deus . . . . . • . . 1 04
Primeiro mandamento • • • • • 1 05
·- · Da Fé . . . . 105
Da Esperança . i"23
Da Caridade • • • . . 1 27
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INPICE

Da · oração . • 130
Da superstição . . . • . . . I 39
Segundo mandamento • • . . . • 1 54
Invocação vã dos nomes santos 1 55
Da blasfêmia e imprecação 1 56
Do juramento . 160 .
Do voto . . . . 1 65
Terceiro mandamento . 170
Ouvir missa inteira . . .. • . 1 72 .
Qua is os trabalhos proibidos nos do­
mingos e dias santos � . . . • 1 77
Quarto mandamento • 182
Deveres dos filhos • 1 82
Deveres dos criados • . . . • . • 1 86
Dos deveres para com os superiores
eclesiásticos • • . . . . . 188
Dos deveres dos pais . • 194
Mútuos deveres dos cônjuges · • · 198
Deveres dos superiore.s • 202
Quinto mandamento . . • 205
Do amor dos inimigos . 206
Do escândalo ou sedução 210
Sexto e nono mandamentos 2 18
Pensamentos e desejos 2 18
Vistas . . . • • 22 1
Trato do corpo • 223
Conversas . 22 5
Más leituras • • • • • 227
Assistência a danças e saraus • 230
Das relações demasiado livres com
pessoas de diferente sexo ·232
Sétimo mandumento • . . . • . 23G
Culpabilidade ou malícia do furto e
injusta danificação ·•. • . 237
Compensação e restituição . 23 9
Oitavo mandamento . . . . • . • . 24::S
Mentira e hi p ocrisia • • . . • . 243
Falsas suspeitas e juizos temerários 247
Maledicência . 249
D écimo mandamento • 260

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IND J. C E 553

Capítulo II - Dos pecados Cqpitais . 262


Soberba • . • 262
Avareza e c11biça. 264
. Luxúri a. 265
Ira . 266
Gula • •
.
• 268
Inveja • . . • . 27 1
'Preguiça . .
. . 274
Da eleição do estado • • 282
Vocação para o matrimónio . • • 287
Preparação para o casamento • • •
.
289
Vocação para o celibato e virgindade 290
Vocação · religiosa • �92
Da perfeição cristã 292
C apítulo III -· Preceitos da. Santa Ma­
dre Igreja . · . ... . . . . . 309
Pr e � eitos da Igrej a da abstinência e
_
JeJum . . 310
Abstinência 3II
Jejum . . . •. • . • 3 '4
Preceito da comunhão pascal . . • . 320
Da co�unhão frequente . . . • 320
Do jejum antes da sagrada comunhão 326
Do Sagrado Viático . 328
Da Extrema-Unção . . .• . • 328
Algumas determinações eé:lesiásticas
sobre o matrimónio . . • . . • 332
Sepultura · eclesiástica . 333
S egunda parte
. . . . .
·A recorici l iaçlo com Deus . 337
Capítulo 1 . - Exame de consciência . 339
C apítulo II - Da contrição . . 352
Capítulo III - A contrição perfeita,
. •

âncora de salvação para muitos .


Capítulo IV - Do propósito de emenda
Modo prático de nos excitarmos à dor ·
· e bom propósito ·

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INDICE

Ainda sobre o propósito : as ocasiões


do pecado . . . . . • • • • 38 1
Capítulo V - Da confissão de boca . 388
Que se deve conféssar ? . . • • . 390
Casos em que se pode abreviar a con-
fissão dos pecados mortais . . • 396
Há obrigação de confessar os pecados
veniais,? • . . •. •. • • 397
Haverá obrigação de confessar os pe-
cados duvidosos ? . .. • • · . • 400
Será obrigação confessar os pecados
mortais que não sabemos se já con-
fessámos ? . • • • • . • • 4 02
Condições quP se requer em para ser
válida a confissão em que se acusam
só pecados .v eniais . . . • . 403
As imperfeições não são matéri a su-
fi ciente para a confissão . . 404
Não se deve dizer de menos 406
N ão se deve dizer de mais . • • • 408
Guia prático para fazer uma col'lfissão
bem feita . . ·. • • . . · . 41 0
Capítulo VI - Da confissão geral . . 416
Método para fazer uma confissão ge-
ral necessária • • • . . • . 42 1
Método para fazer uma confissão ge-
ral, não necessária . . • . • . 424
Capítulo V.II Método da confissão
.

frequente para as almas piedosas . 426


Capítulo VIII Da satisfação
- . . 433
Capítulo LX Das indulgências
- . . 438
As indulgências beneficiam também
as almas do Purgatório . 44 0
Que seja o acto heróico • . • . • 441
Poderemos
.
aplicar indulgências pelos
VIVOS ?. • • • • • • • • • 444
Indulgência plenária e parcial . . .
445
Condições requeridas para ganh u as
· indulgências 446

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INDICE 5 55'

Da confissão e comunhão exigidas


para ganhar as indulgências . . • 449 ·
Oração segundo as intenções do
Sumo Pontffice . · • • . • • 4 52.
Visita da Igrej a • . • . ,
. • 4 54.
Tempo útil para lµcrar a indulgênçia 455 ·
Transferência das indulgências •
456 ·
Comutação das obras prescritas 45T
Indulgências mais comuns e impor-
tantes 4 58 -

EPÍ LOGO . • 476 .


DEVOCIONÁRI O . • 477
Orações da manhã . 47g.
Orações da poite . . . . · 482
Preparação para a Confissão •
48 5
Exame de consciência • • • 487
Exame para as pessoas que se con-
fessam frequentemente • • • 490
Exame útil para a Confissão Geral •
49 l
Acco de actrição .. • • . •
496
Acto de contrição . •
49T
Para depois da Confissão . 499·
Para antes da Comunhão . Soo
Para depois da Comunhão . . 504.
Orações a recitar durante a Missa 508
Via-Sacra . . . 52 T
Antes da refeição . . . . 532.
Depois da refeição . . • 533
Ao toque das Ave Mariàs . 533-
A Nossa Senhora. . 5 34.
Mistérios do Rosário . . • 5 3 5.
Ladaínha · de Nossa Senhora . 536-
Ora_ç ão mental ou meditação . . 539-

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NIHIL OBSTAT
Olisipone, 2 Februarli 1950
P. Emmanuel Taoelra da Slloa, o. f. m�

IMPRIMI POTEST
Olisipone, 2 Februarli 1950
P. Daold de Sousa, Mln. Proo.

NIHlL OBSTAT
Brae. 1g-Il-19S1
A. Santos, cens.

IMPRIMATUR
Brac. 1g-Il·19S1
Can� Emmanuel Pet.roto, Vic. G•

BRAGA
.

Tip. •Missõe� Franciscanas» -

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