Recuperação Funcional de Dois Cães Com Fratura E Luxação Vertebral Torácica Caudal Com 100% de Deslocamento Do Canal Vertebral

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XI JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2011 – UFRPE: Recife, 17 a 21 de outubro.

RECUPERAÇÃO FUNCIONAL DE DOIS CÃES COM FRATURA E


LUXAÇÃO VERTEBRAL TORÁCICA CAUDAL COM 100% DE
DESLOCAMENTO DO CANAL VERTEBRAL

Bruno Martins Araújo1, Marcella Luiz de Figueiredo3 Amanda Camilo Silva3, Marcela Maria de Almeida Amorim 4,
Cássia Regina Oliveira Santos4, Maria Isabel Rocha Sampaio4 e Eduardo Alberto Tudury5.

Introdução radiográficas se baseia no grau de estreitamento do


canal vertebral e/ou do deslocamento vertebral [7].
Fraturas e luxações vertebrais são uma das afecções
Alguns autores mencionam que os animais que
neurológicas mais comumente encontradas na prática
sofreram deslocamento de 100% do canal vertebral,
clínica e um dos distúrbios mais sérios e desafiadores,
não terão chance alguma de retorno funcional devido à
devido ao elevado risco de lesão permanente ao
transecção total da medula espinhal [5,8].
sistema nervoso [1].
Objetivou-se relatar a ocorrência de recuperação
Os pacientes são apresentados geralmente devido a
funcional (após o tratamento) de dois cães com fratura
um traumatismo, na maioria das vezes a acidente
e luxação vertebral torácica caudal com 100% de
automobilístico e sofrem graus variáveis de dor nas
deslocamento do canal vertebral ao exame
costas e paresia ou paralisia, dependendo da gravidade
radiográfico, em virtude da ocorrência de afirmações
da lesão [2].
na literatura de prognóstico desfavorável (devido à
O diagnóstico da afecção baseia-se na resenha, na
secção medular) em cães nessa situação.
anamnese, nos sinais clínicos agudos, nos achados do
exame neurológico e a obtenção de imagens da coluna
vertebral e da medula espinhal [3] Material e métodos
Os achados radiográficos incluem a descontinuidade Foram atendidos no Hospital Veterinário da
das estruturas ósseas; desalinhamento do canal Universidade Federal Rural de Pernambuco, dois cães,
vertebral, dos espaços intervertebrais ou das facetas sem raça definida, que apresentavam, após acidente
articulares; linha de fratura no corpo, na lâmina automobilístico, paraplegia, ausência de reações
dorsal, processos espinhosos ou transversos, ou ainda posturais nos membros pélvicos, nervos cranianos sem
uma combinações destes [2]. alterações, reflexos espinhais presentes e normais,
Para avaliar radiograficamente a instabilidade da ausência de dor superficial, mas com dor profunda
fratura, adaptou-se um método de classificação, intacta nos membros pélvicos e cauda.
utilizado na medicina humana, para os pequenos O animal um apresentava à radiografia fratura
animais [4,5,6], no qual divide-se a imagem lateral do oblíqua do corpo de T13 e luxação entre as vértebras
segmento vertebral em três compartimentos: dorsal, T12-T13, com 100% de deslocamento do canal vertebral
médio e ventral. A fratura é considerada instável (fig 1), sendo submetido ao tratamento cirúrgico de
quando dois ou três compartimento estão estabilização segmentar dorsal seis dias após início do
comprometidos. Contudo, esta qualificação não exclui quadro (complementado por imobilização externa) e
a possibilidade de uma lesão concussiva ou medicado com meloxicam (0,1 mg/kg, VO, SID, 7
compressiva. Esta classificação é de grande dias), cloridrato de Tramadol (1 mg/kg, VO, TID, 5
importância no momento de decidir o esquema dias) e dimetilsufóxido (1g/kg, a 20%, IV, SID, 7
terapêutico de eleição para o animal [6], uma vez que dias).
um dos fatores chave para determinar a escolha do O animal dois apresentava ao estudo por imagem,
tratamento conservativo ou cirúrgico é o grau de fratura da epífise caudal de T11 e luxação entre as
instabilidade vertebral [4]. vértebras T11-T-12, com 100% de deslocamento do
O prognóstico depende principalmente da presença canal vertebral (fig. 2) e foi submetido ao tratamento
ou ausência de sensibilidade dolorosa profunda. Nesse conservativo, por meio da imobilização em tábua, fixo
tipo de lesão, pode-se ainda realizar a associação dos com fitas adesivas, sendo medicado com meloxicam
sinais radiográficos de deslocamento vertebral com (0,1 mg/kg, VO, SID, 7 dias), cloridrato de Tramadol
alguns outros achados do exame neurológico. A (1 mg/kg, VO, TID, 5 dias) e dimetilsufóxido (1g/kg,
determinação do prognóstico por meio de imagens a 20%, IV, SID, 7 dias).


________________
1. Médico Veterinário (MV), Mestrando do Programa de Pós Graduação em Ciência Veterinária (PPGCV), Departamento de Medicina Veterinária
(DMV), Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Rua Dom Manoel de Medeiros, S/N, Dois Irmãos, Recife – PE.
E-mail: [email protected]
3. MV, Doutoranda do PPGCV, DMV – UFRPE.
4. Graduandas em Medicina Veterinária, DMV - UFRPE.
5. MV, Doutor, Professor Associado III do DMV – UFRPE. Orientador.
Apoio financeiro: CNPq
XI JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2011 – UFRPE: Recife, 17 a 21 de outubro.

as afirmações de Vilela et al. [10], quando diz que a


radiografia é útil para determinar a localização e tipo
Resultados e discussão
de lesão e o exame neurológico é o indicador da
O cão número um apresentou recuperação total da severidade da lesão e das chances de recuperação.
deambulação voluntária 30 dias após o início do Desta forma, sinais neurológicos como a perda da
quadro e o animal dois apresentou recuperação da nocicepção, o fenômeno de Schiff-Sherrington, o
deambulação voluntária com discreta ataxia sete dias reflexo extensor cruzado e o sinal de Babinski estão
após o início do tratamento (21 dias após o início do mais relacionados com lesões graves da medula
quadro). A deambulação recuperada foi acompanhada espinhal [9,11,12].
de sensibilidade superficial e profunda nos membros Conclui-se que o parâmetro isolado de 100% de
pélvicos mais movimentação da cauda, refutando que deslocamento radiográfico do canal vertebral não deve
esta deambulação é voluntária e não está atribuída a desencorajar a realização da terapia, pois, conforme os
um caminhar espinhal [3]. casos acima descritos há possibilidade de recuperação
De acordo com alguns autores [4,5], o tratamento da deambulação voluntária nesses casos.
cirúrgico é indicado em cães com instabilidade Agradecimentos
vertebral. No entanto, por motivos financeiros, o
animal dois foi submetido ao tratamento conservativo, A todos que, direta ou indiretamente,
o que não impossibilitou sua recuperação. participaram da elaboração deste trabalho.
Mesmo com evidencia radiográfica de deslocamento Referências
de 100% do canal vertebral, os animais obtiveram [1] BRAUND, K. J. Traumatismo agudo da medula espinhal. In:
BOJRAB, M. J. Mecanismos da Moléstia na Cirurgia de
recuperação funcional da deambulação, discordando Pequenos Animais. São Paulo: Manole, 1996. Cap. 152, p.
de alguns autores. Taylor [5] e Pedro Neto [8] 1311-1325.
mencionaram que os animais que sofreram [2] SEIM, H. B. Cirurgia da espinha toracolombar. In: FOSSUM, T.
deslocamento de 100% do canal vertebral, não terão W. Cirurgia de Pequenos Animais. 2ª ed. São Paulo: Roca.
Cap.40, p.1266-1267, 2005.
chance alguma de retorno funcional devido à [3] ARAÚJO, B. M.; ARIAS, M. V. B.; TUDURY, E. A. Paraplegia
transecção total da medula espinhal. Brawner et al. [7] aguda com perda de percepção de dor profunda em cães: revisão
estabeleceram o critério de prognóstico grave para cães de literatura. Clínica Veterinária, n.81, p.70-84, 2009.
[4] CAMBRIDGE, A. J.; BAGLEY, R. S. Traumatismo espinal:
sem nocicepção e deslocamento da 30% do canal evaluación clínica e tratamiento. Waltham Focus, London, v.7,
vertebral. Feeney e Oliver [9] observaram ser de 60% n.3, p.20-26, 1997.
o grau máximo de deslocamento vertebral na região [5] TAYLOR, S. M. Distúrbios da medula espinhal. In NELSON R.
W.; COUTO, C. G. Medicina Interna de Pequenos Animais. 3ª
lombar para manter a nocicepção intacta nos membros ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006. Cap. 72, p. 985-1012.
posteriores. [6] GREEN, J.; BOSCO, E. Trauma de medula espinhal. In:
Os resultados deste trabalho corroboraram com TELLO, L. H. Trauma em cães e gatos. São Paulo: Med vet,
2008. Cap. 14, p. 165-176.
Brawner et al. [7] que mencionam que a utilização de [7] BRAWNER, JR. W.R.; BRAUND, K. G.; SHORES, A.
imagens radiográficas para determinar o prognóstico Radiographic evaluation of dogs and cats with acute spinal cord
de cães com traumatismo vertebral tem uma série de trauma. Veterinary Medicine, Chicago, v. 85 p. 703-723, 1990.
[8] PEDRO NETO, O. Traumatismo espinhal agudo. In: RABELO,
limitações, pois a radiografia revela o grau de lesão da R. C.; CROWE, D. T. Fundamentos da terapia intensiva
coluna vertebral, e não da medula espinhal. Seim III veterinária em pequenos animais: Condutas no paciente crítico.
[2] complementa que em pacientes com suspeita de Rio de Janeiro: L.F. Livros de veterinária LTDA, 2005. Cap. 32,
p. 351-385.
traumatismo vertebral, o exame radiográfico simples [9] FEENY, D. A.; OLIVER, J. E. Blunt spinal trauma in the dog
pode demonstrar fraturas ou luxações e a gravidade do and cat: insight into radiographic lesions. Journal of the American
deslocamento no momento em que as radiografias são Animal Hospital Association, Denver, v. 16, p. 885-890, 1980.
obtidas. Citam também Seim III [2], Pedro Neto [8] e [10] VILELA, L. M. ; BAIOTTO, G. C. ; BARROS, S. V. S. G. .
Terapêutica do trauma medular agudo. Nosso Clínico, v. 59, p.
Vilela et al. [10] que as radiografias podem não 46-51, 2007.
mostrar o deslocamento vertebral máximo no [11] PLATT, S. R.; OLBY, N. J. BSAVA Manual of canine and feline
momento da lesão, pois mesmo que pareça ser neurology. 3ª ed. Gloucester: J British Small Animal
Association, 2004, 420 p.
pequeno o deslocamento da vértebra fraturada no [12] LORENZ, M. D.; KORNEGAY, J. N. Neurologia veterinária.
momento da realização do exame, pode ter ocorrido São Paulo: Manole, 2006. p. 3-176.
uma transitória, ainda que completa, luxação no
momento do trauma com total da medula espinhal.
Estas afirmações contrariamente ao que ocorreu
nestes dois animais tentam alertar que as lesões
medulares podem ser mais graves do que os exames
radiográficos podem sugerir e este relato exemplifica o
oposto, deslocamentos vertebrais severos podem não
corresponder com lesões medulares graves.
A ausência de sinais de lesão neurológica grave e
percepção de dor profunda intacta foram eficientes na
determinação do prognóstico favorável nestes animais.
O ocorrido com estes dois animais esta de acordo com
XI JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2011 – UFRPE: Recife, 17 a 21 de outubro.

Figura 1. Imagem de radiografia do cão um, demonstrando


fratura oblíqua do corpo de T13 e luxação entre as vértebras
T12-T13, com 100% de deslocamento do canal vertebral.

Figura 2. Imagem radiográfica, na projeção lateral,


demonstrando fratura da epífise caudal de T 11 e luxação
entre as vértebras T11-T-12, com 100% de deslocamento do
canal vertebral.

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