4 - A Qualidade Da Informação para A Tomada de Decisão

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 10

REVISÕES DE LITERATURA

A qualidade da informação para a tomada de


decisão sob a perspectiva do sensemaking:
uma ampliação do campo
Gustavo Abib INTRODUÇÃO
Doutor em administração pela Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS - Brasil. Professor Embora a informação não seja considerada
assistente da Universidade Federal do Paraná, Departamento uma novidade no campo de pesquisa, pois já é
de Administração – Curitiba, PR – Brasil
E-mail: [email protected]
investigada há muito tempo, seu foco de estudo
pode ser considerado bem amplo. A qualidade da
informação é um dos tópicos sobre informação
Resumo que tem originado vários estudos internacionais
Este ensaio teórico busca, sob a ótica do sensemaking (EVEN e SHANKARANARAYANAN, 2007;
proposto por Weick (1995), analisar a qualidade da PIPINO, LEE e YANG, 2002; WAND e WANG
informação no processo decisório organizacional, sugerindo
uma proposta para ampliar as técnicas utilizadas para
1996; WANG et. al. 1995) e nacionais (OLETO,
mensurar a qualidade da informação. Para tanto, conceitua 2006; NEHMY e PAIM, 1998).
informação e processo decisório; aborda os conceitos do
sensemaking e discute as dimensões da mensuração da Inicialmente, é importante conceituar a informação.
qualidade da informação – apresentando os relacionamentos
entre estas dimensões e as propriedades do sensemaking
O conceito sobre informação e seus sistemas vem,
propostas por Weick. Finalmente, o ensaio sugere-se uma aos poucos, sendo ampliado com o avanço das
agenda baseada na abordagem proposta para utilização em pesquisas. Primariamente definia-se informação como
pesquisas empíricas e para a análise em profundidade da
aplicação deste relacionamento.
o resultado da análise de dados que, por sua vez, eram
considerados quaisquer elementos identificados em
Palavras-chave
sua forma bruta, que por si sós não conduzem a
Qualidade da informação. Tomada de decisão. Sensemaking. uma compreensão de determinado fato ou situação,
conforme apontam Laudon e Laudon (1996).
The information quality for decision-making
in the sensemaking perspective: Outra definição de informação é apresentada por
an extension of the field Masuda (1982, p. 74), que determina: “a informação
é uma relação situacional, observada entre sujeito
Abstract e objeto, que torna possível a seleção da ação pela
The objective of this paper, from the sensemaking perspective qual o próprio sujeito pode atingir alguma espécie
proposed by Weick (1995), to analyze the information de valor de uso”. Ciborra (1992) afirma que a
quality used in the organizational decision-making process,
suggesting a proposal to expand the techniques used to informação pode ser compartilhada somente se,
measure the quality of information. Therefore, this paper: em ambas as pontas, o mesmo entendimento do
presents the concept of information and decision-making contexto relevante estiver disponível e se os atores
process; addresses the concepts of sensemaking and
discusses the dimensions of measuring the quality of presentes na troca de informações entender os
information – presenting the relationships between these sentido dos sinais transmitidos e recebidos, fazendo
dimensions and properties of sensemaking proposed by referência a contextos similares de interpretação.
Weick. Finally, this paper suggests an agenda based on the
approach proposed for use in empirical research and for in- Percebe-se, na literatura, uma dificuldade em
depth analysis of the application of this relationship. conceituar a informação, pois ela pode ter muitos
Keywords
significados. Nota-se, obviamente, que ela
sempre está submetida a um processo de
Information quality. Decision-making. Sensemaking.
interpretação.

Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010 73


Gustavo Abib

Rotineiramente, utiliza-se a informação no processo Pesquisas examinaram diferentes perspectivas para


de tomada de decisões (BAZERMAN, 2004; o gerenciamento da qualidade da informação:
HAMMOND, KEENEY e RAIFFA, 2004; analítica; técnica; operacional e gerencial (Wang et al.,
CLEMEN, 1996; Mcgee e PRUSAK, 1994). Para 1995), porém percebe-se: na literatura a existência de
Clemen (1996), o processo decisório muitas vezes uma gama de atributos divergentes para conceituar a
conta com um conjunto incompleto de informações qualidade da informação. Neste sentido, questiona-
que servem de subsídio ao processo decisório. Neste se: por que existe dificuldade para se mensurar a
sentido, consciente da imperfeição das informações qualidade da informação?
disponíveis, o agente decisor deve se utilizar de
informações com qualidade para minimizar os Para responder à questão anterior, a perspectiva
efeitos de uma escolha prejudicial. cognitiva dá um passo em direção à compreensão
subjetiva da informação (CAPURRO, 2007). Esse
Daft e Weick (2005) destacam que a tomada autor afirma que as pessoas têm diferentes bagagens
de decisão geralmente parte dos processos de educacionais e desempenham diferentes funções na
informação e interpretação nas organizações, divisão do trabalho e na sociedade, valorando de
e que as decisões es t ã o a s s o c i a d a s a o s forma diversa as informações.
diversos modos de interpretação. Em muitas
organizações, o processo de tomada de decisões Even e Shankaranarayanan (2007) destacam
constitui importante aspecto da atividade de que os atuais métodos de mensuração da
gerenciamento. Espera-se que os gestores tomem qualidade da informação estão classificados
melhores decisões e que estas resultem em ações em fatores estruturais e técnicos, permitindo
produtivas, rapidez na resolução de problemas uma mensuração imparcial da qualidade, não
e melhor desempenho organizacional (JUNG, se preocupando com os fatores contextuais e
2004). Para esse autor, o processo de tomada pessoais. Este ensaio teórico busca aproximar
de decisão pelos indivíduos nas organizações a abordagem do sensemaking, proposta por
não representa uma tarefa fácil, particularmente Weick (1995), para a mensuração da qualidade
quando é analisado o problema da complexidade, da informação a ser utilizada para a tomada
da quantidade e da qualidade da informação de decisão. Desse modo, tal aproximação busca
empregada no processo decisório. extrapolar os fatores puramente técnicos e
atribuir importância também aos fatores pessoais
Vários estudos (BELKIN, 1982; WILSON, 2000;
envolvidos no processo. Para tanto, este ensaio
KUHLTHAU, 2004; entre outros) colocaram o ator
social como foco na interpretação da necessidade de faz uma breve revisão teórica sobre o conceito de
informação (análise do processo de coleta e uso das sensemaking, apresentando em seguida a qualidade
informações). Belkin (1982) analisou a necessidade de da informação e seus relacionamentos com estes
informações por parte dos usuários. Já Kuhlthau (2004) conceitos. Por fi m, sugere-se uma agenda de
identificou “zonas de intervenção”, classificando pesquisa para ampliação do tema.
três delas como “identificadora”, “assessor” e
“conselheiro”. Em todos esses estudos a análise SENSEMAKING SEGUNDO WEICK (1995):
perpassa por questões sociais, contextuais e pessoais A CRIAÇÃO DE SENTIDO
de valoração da informação.
As organizações e os indivíduos tentam descobrir
Percebe-se que um importante atributo da uma resposta aceitável antes que seus recursos se
informação para a tomada de decisão é a qualidade. esgotem, que os concorrentes monopolizem o
Para Wand e Wang (1996), a qualidade da informação mercado, que o interesse das pessoas mude ou que as
é apresentada como um conceito multidimensional. oportunidades em outros setores ambientais dominem

74 Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010


A qualidade da informação para a tomada de decisão sob a perspectiva do sensemaking: uma ampliação do campo

essa busca (DAFT e WEICK, 2005). Para esses autores, informações a entender o pensamento humano e a
todas estas atividades representam uma forma de ação social no contexto da organização. Isso tem o
interpretação que requer que as pessoas que compõem potencial para produzir profundos entendimentos
as organizações necessitem tomar decisões. sobre os fenômenos dos sistemas de informações,
incluindo o gerenciamento e o desenvolvimento
Pode-se pensar sobre o mundo de diferentes desses sistemas e questões relacionadas à informação.
formas, relacionando os conceitos às experiências
pessoais vivenciadas nesse mundo e, a partir daí, O conceito de sensemaking para Weick (1995) significa
formar julgamentos que podem afetar as intenções produzir sentido. Pode ser analisado também
e também as ações (CHECKLAND, 1998). Cada ser sob a ótica da estruturação do desconhecido
humano traz consigo a capacidade de, seletivamente, (WATERMAN, 1990 apud WEICK, 1995).
perceber e interpretar o ambiente onde vive. Uma Figurativamente, o sensemaking é um processo
das características marcantes do ser humano é a espiralado que compreende uma série de eventos
sua capacidade para o diálogo, a qual possibilita ocorridos através do tempo. Para explicitar melhor
debates e discussões que afetam as percepções, os o que compreende o sensemaking, WEICK (1995)
julgamentos, as intenções e as ações. compara-o com uma atividade ou processo,
diferindo da simples interpretação. Para esse autor,
As pessoas, normalmente, tentam interpretar as o sensemaking é o ato de construir, filtrar, referenciar,
próprias ações; definir o próprio aprendizado; criar factibilidade e transformar em tangível algo que
e resolver o problema do que deve ser feito em antes era subjetivo.
seguida. A construção da interpretação acerca do
ambiente é uma necessidade básica dos indivíduos Outros conceitos de sensemaking inseridos na obra de
e das organizações. O processo de construção da Weick (1995) são encontrados, tais como uma busca
interpretação pode ser influenciado pela natureza interativa de informação; a atribuição de significados
da resposta procurada, pelas características do e ação; os mecanismos que os indivíduos utilizam
ambiente, pela experiência prévia do questionador para atribuir significado a eventos - incluindo
e pelo método usado para adquiri-la (DAFT e padrões e regras para perceber, interpretar, crer
WEICK, 2005; DERVIN, 1998). e agir sob um contexto cultural; e um processo
interpretativo necessário para que os indivíduos
A criação de significado na literatura, de acordo com entendam e compartilhem suas compreensões.
Choo (2003), tem sido definida de várias maneiras Choo (2003) complementa afirmando que esse
por diferentes pesquisadores. March e Olsen (1976) processo de criação de sentidos é contínuo e que
analisaram a criação de significado como parte do os indivíduos observam fatos passados, recontam
aprendizado experimental, no qual “indivíduo e pedaços da experiência e selecionam alguns pontos
organização dão significado à sua experiência e de referência para construir o significado.
modificam seu comportamento de acordo com
suas interpretações”. Starbuck e Milliken (1988) De acordo com Devin (1998), o sensemaking tem
observaram que “a criação de significado tem muitos sido desenvolvido por mais de 25 anos nos limites
aspectos distintos – no mínimo, compreender, do discurso de comunidades. Estes incluíam
explicar, atribuir, extrapolar e prever [...]. O inicialmente o campo da biblioteconomia e da
que esses processos têm em comum é que eles ciência da informação (em que os estudos focavam
implicam colocar estímulos dentro de estruturas (ou a necessidade da informação e o alinhamento entre
esquemas) que lhes dêem sentido”. a informação e os sistemas). Busca-se atualmente
uma expansão do campo utilizando-se do sensemaking
Klein e Myers (1999) destacam que o interpretativismo como uma lente para analisar a qualidade da
pode auxiliar os pesquisadores de sistemas de informação.

Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010 75


Gustavo Abib

O sensemaking sob a ótica de Dervin (1983) e Weick, SENSEMAKING E A QUALIDADE DA


Sutcliffe e Obstfeld (2005) apresenta uma realidade I N F O R M A Ç Ã O PA R A TO M A DA D E
que não é completa, muito menos constante, de DECISÃO
acordo com a afirmação de Clemen (1996). Na
verdade essa realidade é vista como difusa, complexa Na literatura de sistemas de informações, a
e mutável. Neste sentido, o sensemaking surge como qualidade da informação é uma dimensão utilizada
uma alternativa para compreender os processos de para avaliar o sucesso desses sistemas, sendo
valoração (qualidade) da informação. fundamental para a qualidade da decisão (EVEN e
SHANKARANARAYANAN, 2007; JUNG, 2004).
Diante de uma situação de incerteza, como no caso Percebe-se, nos estudos realizados, grande variedade
da tomada de decisões, os decisores procuram de formas e atributos para conceituar a qualidade
compreender o problema buscando coletar e da informação - fato este que retrata a dificuldade
interpretar informações construindo sentido desta mensuração.
através delas. Essa busca pela compreensão
do processo de sensemaking é essencial para a A qualidade, quando tratada isoladamente, constitui
diminuição da complexidade da decisão. Como as um substantivo abstrato, um construto de fácil
decisões envolvem contextos , problemas e atores entendimento por meio do senso comum, mas
diferentes, o processo do sensemaking está sempre de complexo entendimento quando se busca
presente (WEICK, SUTCLIFFE E OBSTFELD, uma definição mais rigorosa e quando, durante a
2005). construção de uma teoria, procura-se relacioná-lo
com outras variáveis (OLETO, 2006).
Weick (1995) identifi ca sete propriedades que
fazem da criação de signifi cado um processo Autores como Wand e Wang (1996) comparam a
individual. A criação de significado é vista como qualidade da informação à qualidade do produto
– que, por sua vez, depende da maneira pela
um processo:
qual é desenhado e produzido, não levando em
a) fundado na construção da identidade; consideração o contexto no qual ele é produzido
e utilizado, nem tampouco os usuários. No estudo
b) retrospectivo; de Even e Shankaranarayanan (2007), esses autores
ressaltam a mensuração incompleta da qualidade da
c) que representa ambientes sensíveis; informação, uma vez que a maioria dos estudos não
leva em consideração fatores pessoais e contextuais.
d) social;
Assim, a qualidade da informação precisa ser
e) contínuo; definida utilizando-se múltiplas dimensões que
possibilitem melhor mensuração da qualidade.
f) focado em e por pistas extraídas;
Diferentes métricas têm sido propostas para
g) governado mais pela plausibilidade do que pela mensurar, de maneira quantitativa, a qualidade da
precisão; informação (REDMAN, 1986; PIPINO et al., 2002).

Com base nas sete propriedades fundamentais A análise da qualidade da informação nas empresas
do sensemaking procura-se, a seguir, estabelecer deve passar pela observação das percepções
algumas relações entre o processo de sensemaking e subjetivas dos indivíduos envolvidos com a
a qualidade da informação para tomada de decisão informação (PIPINO, LEE e YANG, 2002). A
nas organizações. análise da qualidade proposta por esses autores
leva em consideração as percepções subjetivas dos

76 Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010


A qualidade da informação para a tomada de decisão sob a perspectiva do sensemaking: uma ampliação do campo

indivíduos e o contexto no qual tanto as informações a) Construção da identidade


quanto os indivíduos estão inseridos. Para mensurar
a qualidade da informação, esses autores propõem Para a criação de significado, o indivíduo busca
que ela seja analisada sob a ótica de 16 dimensões, a construção de uma identidade pessoal. Essa
como mostra o quadro 1: identidade é constituída por meio do aprendizado
oriundo das experiências pessoais, ou seja, fruto da
Considerando a base filosófica do sensemaking ação e projeção desta no ambiente.
como foco no ator individual e a visão de Dervin
(1998) como a informação sendo o produto de A construção da identidade permite aos decisores
uma construção subjetiva, de posse dos conceitos agir quando a informação ou a compreensão
do sensemaking e dos atributos sobre a qualidade sobre a mesma está incompleta (CHOO, 2003).
da informação proposta por Pipino, Lee e Yang Neste sentido, necessita-se da construção da
(2002), é tecida uma aproximação destes conceitos identidade do indivíduo para que as dimensões da
nos tópicos a seguir: qualidade da informação possam ser analisadas.

QUADRO 1
Dimensões da qualidade da informação

Fonte: Adaptado de Pipino, Lee e Yang (2002, p. 212)

Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010 77


Gustavo Abib

Tome-se, por exemplo, um executivo que muda é a reputação, que aborda a extensão pela qual a
de uma empresa para outra que atua em um ramo informação é confiável em relação à fonte e ao
diferente. Mesmo que as práticas de gestão sejam as conteúdo. Neste momento, a análise retrospectiva
mesmas, a construção da nova identidade é o que traz a resposta, pois gera uma reflexão sobre o
determinará a construção do sentido e a priorização passado para a ação no presente. Por fim, outra
das informações necessárias ao processo de tomada dimensão que está relacionada é a objetividade, que
de decisão. Esse processo permitirá ao executivo pode ser influenciada negativamente - dependendo
identificar, analisar e julgar a integralidade das das experiências prévias do indivíduo. Capurro
informações utilizadas na tomada de decisão. Como (2007) complementa afirmando que a visão através
a formação da identidade é um processo, com o do domínio analítico está relacionada a uma visão
passar do tempo, desenvolve-se a facilidade de hermenêutica, pois a valoração é determinada por
entendimento e interpretabilidade das informações. um pré-entendimento do observador, alinhado aos
conceitos do sensemaking.
Portanto, as dimensões mais relacionadas com esta
propriedade são a integralidade da informação, a c) Que representa ambientes sensíveis
facilidade de entendimento e a interpretabilidade.
A criação da identidade instrumentaliza os decisores Os indivíduos, na sua vida organizacional, produzem
a compreenderem as linguagens, os símbolos e parte do ambiente no qual estão inseridos. A ideia
unidades presentes no processo. de representação incita maior atenção para as
atividades interdependentes, para os processos e
Depreende-se da análise que a construção da para a mudança contínua.
identidade auxilia o tomador de decisões a superar
as barreiras estruturais (relacionadas aos processos Qualquer processo de obtenção e entendimento da
sociais – eficiência) e também institucionais informação é baseado no prévio desenvolvimento
(relacionadas ao monitoramento do ambiente no de um conhecimento sobre a situação. Tal
qual a empresa se encontra). estr utura cognitiva foi estudada na teoria
organizacional por Weick (1979). Dado que Weick
b) Retrospectivo (1995) também sugere que o sensemaking pode se
tornar crescentemente demarcado, à medida que
A criação de sentido é retrospectiva, ou seja, as organizações se tornam mais maduras, também
trabalha com fatos que já ocorreram. Esta ideia, se pode esperar que o tempo desempenhe um
de acordo com Weick (1995), deriva dos trabalhos papel importante nesse inter-relacionamento
apresentados por Schultz´s (1967 apud Weick, 1995), (WILSON, JARZABKOWSKI, 2004).
que tratava da “experiência significativa vivida”.
O ponto importante do sensemaking retrospectivo Quando se aborda o ambiente, busca-se
para Weick (1995) é a atividade na qual muitos compreender o contexto no qual a qualidade
possíveis significados podem ser sintetizados. da informação é percebida. Para Pozzebon e
Pinsonneault (2000), o estudo do contexto, ou
Em relação à qualidade da informação, uma da contextualidade da interação, é visto como
dimensão que se encaixa nessa propriedade é inerente na investigação da reprodução social e
a quantidade de informação. Existe um ponto envolve a dimensão de tempo-espaço e a presença
ótimo em relação à quantidade, pois as pessoas dos atores, entre outros elementos. A influência
não necessitam de mais informações quando da análise do contexto repousa na percepção de
precisam decidir. Em vez disso, elas necessitam importância ou relevância da informação para a
de valores, prioridades e esclarecimentos sobre tomada de decisão de acordo com o momento
suas preferências. Outra dimensão tratada aqui vivido pelo gestor (situações contextuais). Tal

78 Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010


A qualidade da informação para a tomada de decisão sob a perspectiva do sensemaking: uma ampliação do campo

propriedade está intimamente ligada às dimensões pode ser considerada um fluxo (EISENHARDT
de relevância e adição de valor. A relevância é a e ZBARACKI, 1992; COHEN, MARCH e
extensão pela qual a informação é aplicável e útil OLSEN, 1972), pois os indivíduos constantemente
para a tarefa em questão, sendo um processo no deparam-se com problemas, escolhas e soluções.
qual a relevância é obtida quando o indivíduo Adicionalmente, o processo de criação de significado
analisa o ambiente e o contexto no qual está também é nãolinear.
inserido. Uma vez analisada a relevância, a
dimensão de adição de valor é uma dimensão Quando se analisaram os ambientes sensíveis,
complementar da primeira. foram exploradas a dinamicidade dos contextos e
sua importância para a qualidade da informação.
d) Social Resultado desta dinamicidade, surge um processo
contínuo de coleta, tratamento e uso da informação,
Sensemaking para Weick (1995) é um processo social convergindo para a atualização das informações.
(coletivo) e nunca solitário, porque o que a pessoa A busca pela atualidade da informação também
faz internamente é contingente nos outros. Para esse pode ser representada por um fluxo constante (sem
autor, as pessoas que estudam o sensemaking focam início ou fim definido) e nãolinear. Os decisores
atenções nas conversas, discursos e diálogos, pois é frequentemente estão procurando atualizar suas
através dessas formas de comunicação que o contato informações na tentativa de torná-las relevantes
social é mediado. para a tarefa ou decisão em questão, processo
considerado importante por diversos autores, como
Na análise da qualidade da informação, as dimensões
Mintzberg, Raisinghani e Théorêt (1976), Nutt
de acessibilidade e segurança se encaixam nesta
(1984), Clemen (1996), entre outros.
propriedade. A acessibilidade da informação para
a tomada de decisão pode ser formal (através de Para ilustrar essa dimensão, Moody e Walsh (1999)
sistemas) ou informal (por meio de pessoas), como analisaram a informação como um ativo organizacional
observado por Beal (2004). Hammond, Keeney e definiram seu comportamento como um bem
e Haiffa (2004) salientam que os tomadores de econômico que é perecível. A informação “perde
decisões preferem informações coletadas pelo seu valor” à medida que o tempo passa.
contato social àquelas provenientes somente dos
sistemas de gestão. Ciborra (1992) complementou A atualidade está também intimamente ligada à
tal ideia, afirmando que a informação pode ser construção da identidade e à representação de
dividida somente se, em ambas as partes, o mesmo ambientes sensíveis. Com base no entendimento
entendimento do contexto relevante for obtido compartilhado do contexto e da integralidade das
pelos atores, entendimento esse ocorrido por informações, surge a necessidade da atualização das
interações sociais e interpretativas. Do mesmo informações para a decisão.
modo, a segurança da informação está intimamente
ligada às pessoas que têm acesso a ela. Ocorrerá a f) Focado em pistas e por pistas
segurança, se as pessoas compartilharem o mesmo
Na concepção de Weick (1995) as pistas são simples
entendimento sobre a importância da informação
estruturas similares que representam indícios a partir
em questão.
dos quais as pessoas desenvolveram noções sobre
e) Processo contínuo o que pode estar ocorrendo. Tais pistas fornecem
pontos de referência, ou núcleos, a partir dos quais
A criação de significado é um processo contínuo, as ideias podem ser ligadas em redes de significados
ou seja, não possui um início ou um fim definido. A (CHOO, 2003). As análises dessas pistas dependem
ação da tomada de decisão nas organizações também do contexto no qual estão inseridas.

Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010 79


Gustavo Abib

A dimensão da qualidade da informação analisada é o processo de tradução desses eventos, de


nesta propriedade refere-se à concisão, que pode ser desenvolvimento de modelos para compreensão,
entendida como a extensão pela qual a informação de descoberta de significados e de montagem de
é condensadamente apresentada. Nesta dimensão, esquemas conceituais por gestores-chaves.
busca-se mostrar, nas informações, fatores muito
relevantes para que os tomadores de decisões O foco na complexidade do sensemaking humano
possam, a partir desses indícios, utilizar pontos de permite entender o fenômeno por meio do
referência para guiar suas ações, compreender o significado que as pessoas atribuem a ele (Klein e
ambiente e criar suas identidades. Myers, 1999). Destarte, o processo de interpretação
move-se a partir de um entendimento prévio das
Um caso típico para ilustrar essa dimensão são os partes até o completo e global entendimento do
sinais de mercado. Quando novos concorrentes ou contexto. Esse entendimento pode refletir uma
produtos concorrentes estão para serem lançados, mensuração da qualidade da informação mais
o mercado apresenta sinais fracos, médios ou completa, pois neste caso, esta abordagem permite
fortes que funcionam como pistas para direcionar levar em conta o contexto no qual a informação
os tomadores de decisões. Essas pistas constituem está sendo utilizada.
pontos de referência, e dependendo da interpretação
do decisor, alinhado ao contexto, tornam-se um
REFLEXÕES
importante insumo para a decisão.
Neste ensaio teórico, buscou-se ampliar a análise da
g) Governado mais pela plausibilidade do que pela
qualidade da informação explorando-a sob a ótica
precisão
do sensemaking. Esse termo, abordado por Weick
As pessoas se comportam pragmaticamente quando (1995), foi utilizado em sua proposição original (sem
criam significados, priorizando a plausibilidade ser traduzido) para que fosse mantido o contexto da
sobre a precisão, entendimento este compartilhado criação de sentido proposta pelo autor.
por Choo (2003). O critério da precisão é secundário
nesta análise do sensemaking por uma variedade de Sabe-se que a escolha das dimensões da qualidade
razões pois, para Weick (1995), as pessoas necessitam da informação é, primeiramente, baseada em um
distorcer e filtrar para separar o sinal útil do ruído entendimento intuitivo, em uma experiência pessoal
- caso não queiram ser saturadas por enorme carga coletiva ou mesmo em uma revisão da literatura
de informações. O sensemaking busca a plausibilidade, (WAND e WANG, 1996). Entretanto, os mesmos
a coerência, a racionalidade e a instrumentalidade. autores observam que a literatura mostra que não
há um consenso sobre as dimensões da qualidade da
Relacionadas com esta propriedade estão as informação. Partindo do entendimento que a criação
dimensões da consistência, da veracidade e da de sentido é um ato social e também da afirmação de
ausência de erros. Essas três dimensões buscam Daft e Weick (2005) - que a literatura organizacional
fornecer, aos tomadores de decisão, os indícios sugere que as organizações e os indivíduos tomam
básicos e os pontos de referência para o ato decisões de várias maneiras - este ensaio apresenta
decisório. As informações precisam ser verdadeiras e uma ótica diferente para se avaliar a qualidade da
livres de erros - uma vez que estes podem corrompê- informação utilizada na tomada de decisão.
las com tendências - porém não necessitam ser
excessivamente minuciosas. Para a tomada de Após a aproximação entre os conceitos do
decisões, as informações são sempre parciais e sensemaking e as dimensões apresentadas por
necessitam da interpretação para que se tornem Pipino , Lee e Yang (2002), reforça-se a premissa
úteis. Corrobora neste sentido a observação de da subjetividade na “valoração” da informação
Daft e Weick (2005), apontando que a interpretação utilizada e a busca por uma forma de se mensurar

80 Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010


A qualidade da informação para a tomada de decisão sob a perspectiva do sensemaking: uma ampliação do campo

essa qualidade. Foi possível ainda compreender DAFT, R. L.; WEICK, E. K. Por um modelo de organização
concebido como sistema interpretativo. Revista de Administração de
como importantes capacidades e habilidades Empresas. v. 45, n. 4, p. 73-86, 2005.
humanas envolvidas na decisão estão presentes na
composição da qualidade da informação. Soma- DERVIN, B. An overview of Sense-Making research: Concepts,
methods and results to date. In: International Communication Association
se a isto a importância na busca da plausibilidade annual meeting, 1983. Dallas, Texas, USA. Disponível em: < http://
e da compreensão sociocontextual, conforme faculty.washington.edu/wpratt/MEBI598/Methods/An%20
concluíram Nehmy e Paim (1998) em seu artigo. Overview%20of%20Sense-Making%20Research%201983a.htm>
Acesso em 25 maio 2011.
Como agenda de pesquisa, a partir deste ensaio, ______. Sense-making theory and practice: an overview of
propõe-se a utilização desta abordagem em user interests in knowledge seeking and use. Journal of Knowledge
Management, v. 2, n. 2, p. 36-46, Dec. 1998
pesquisas empíricas, explorando de forma detalhada
o dia a dia dos atores envolvidos no processo de EVEN, A.; SHANKARANARAYANAN, G. Utility-Driven
decisão. A análise em profundidade da aplicação Assessment of Data Quality. The DATA BASE for Advances in
Information Systems. v. 38, n. 2, May, 2007.
deste relacionamento poderia fornecer mais indícios
sobre a qualidade da informação, auxiliando, dessa EISENHARDT, K. M.; ZBARACKI, M. J. Strategic Decision Making.
Strategic Management Journal. West Sussex, v. 13, p. 17-37, Feb. 1992.
maneira, o relacionamento entre os fornecedores
e os consumidores de informação e também a HAMMOND, J. S.; KEENEY, R. L.; RAIFFA, H. Decisões inteligentes.
concepção de sistemas e orientação de investimentos Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
tecnológicos nas organizações. JUNG W., A review of research: an investigation of the impact of
data quality on decision performance. In: International Symposium on
Information & Communication Technologies (ISITC’04), 2004.
Artigo submetido em 26/06/2009 e aceito em 29/03/2011.
KLEIN, H. K.; MYERS, M. D. A set of principles for condicting
and evaluating interpretive field studies in information systems. MIS
Quarterly. v. 23, n. 1, p. 67-93, March, 1999.
REFERÊNCIAS
KUHLTHAU, C. C. Seeking meaning: a process approach to library and
BAZERMAN, M. Processo decisório. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. information services. 2nd. Ed., Westport : Libraries Unlimited, 2004.

BEAL, A. Gestão estratégica da informação: como transformar a LAUDON, K. C.; LAUDON, J. P. Management information systems. 4.
informação e a tecnologia da informação em fatores de crescimento ed. São Paulo: Prentice-Hall, Inc., 1996.
e de alto desempenho nas organizações. São Paulo: Atlas, 2004.
MARCH, J.G. e OLSEN, J. Ambiguity and choice in organizations. Bergen:
CAPURRO, R. Toward an Information Ecology. In: WORMELL, I. Universitetsforlaget, 1976.
(Ed.) Information and Quality. London: Taylor Graham 1990, 122-139.
MASUDA, Y. A sociedade da informação como sociedade pós-industrial. Rio
CAPURRO, R.; HJORLAND, B. O conceito da informação. de Janeiro: Editora Rio. 1982.
Perspectivas em Ciência da Informação. Belo Horizonte, v. 12, n. 1, p.
McGEE, J V.; PRUSAK, L. Gerenciamento estratégico da informação:
148-207, Jan/Abr, 2007.
aumente a competitividade e a eficiência de sua empresa utilizando a
CHECKLAND, P. Information, systems and information systems: making informação como uma ferramenta estratégica. 12. ed. Rio de Janeiro:
sense of the field. West Sussex: John Wiley & Sons, 1998. Campus, 1994.

MINTZBERG, H; RAISINGHANI, D; THÉORÊT, A. The


CIBORRA, C. Teams, markets and systems: business innovation and
structure of ‘unstructured’ decision processes. Administrative Science
information technology. Cambridge: Cambridge University Press, 1992.
Quarterly. New York, v. 21, n. 02, 246-275, June 1976.
CLEMEN, R. T. Making hard decisions. 2. ed. Pacific Grove: Duxbury,
MOODY, D.; WALSH, P. Measuring the value of information:
1996.
an asset evaluation approach. In: European Conference on Information
COHEN, M. D; MARCH, J. G.; OLSEN, J. P. A garbage can model Systems, 1999. Disponível em: < http://wwwinfo.deis.unical.it/
of organizational choice. Administrative Science Quarterly. New York, zumpano/2004-2005/PSI/lezione2/ValueOfInformation.pdf>.
v. 17, n. 1, p. 1-25, Mar. 1972. Acesso em: 26 maio 2011.

CHOO, C. W. A organização do conhecimento: Como as organizações NEHMY, R.M.Q. e PAIM, I. A desconstrução do conceito de
usam a informação para criar significado, construir conhecimento e “qualidade da informação”. Ciência da Informação. v. 27, n. 1, p. 36-45,
tomar decisões. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2003. Jan/Abr., 1998.

Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010 81


Gustavo Abib

NUTT, P. C. Types of organizational decision process. Administrative WAND, Y.; WANG, R. Y. Data Quality Dimensions in Ontological
Science Quarterly. New York, v. 29, p. 414-450, Sept. 1984. Foundations. Communications of the ACM. v. 39, n. 11, p. 86-95,
November, 1996.
OLETO, R. R. Percepção da qualidade da informação. Ciência da
Informação. v. 35, n. 1, p. 57-62, Jan/Abr., 2006. WANG, R.Y, STOREY, V.C. e FIRTH, C.P. A Framework for Analysis
of Data Quality Research. IEEE Transactions of Knowledge and Data
PIPINO, L.L.; YANG, W. L. e WANG, R. Y. Data Quality Assessment. Engineering, v.7, n.4, p. 623-640, 1995.
Communications of the ACM. v. 45, n. 4, p. 211-218, April, 2002.
WEICK, K. E. Sensemaking in organizations. Thousand Oaks: Sage
REDMAN, T.C. Data quality for the information age. Boston: Artech Publications, 1995.
House, 1996.
WEICK, K.; SUTCLIFFE, K.M.; OBSTFELD, D. Organizing and
STARBUCK, W.H., e MILLIKIN, F.J. Executives perceptual filters: the process of sensemaking. Organization Science, n.16, v.4, p.409-421,
What they notice and how they make sense. In: HAMBRICK, D.C.; 2005.
BRANDON, G.L. (Eds.), The executive effect: Concepts and methods for
studying top managers. Greenwich: JAI Press, 1988. WILSON, D.; JARZABKOWSKI, P. Pensando e agindo
estrategicamente: novos desafios para a análise estratégica. Revista
WALSHAN, G. The Emergence of Interpretativism in IS Research. de Administração de Empresas. São Paulo, v. 44, n. 4, p.11-20, set. 2004.
Information System Research. v. 6, n. 4, p. 376-394, December, 1995.
WILSON T.D. Human Information Behavior. Special Issue on
Information Science Research. v. 3, n.

82 Ci. Inf., Brasília, DF, v. 39 n. 3, p.73-82, set./dez., 2010

Você também pode gostar