ICL - E Book - Teoria Do Fetichismo
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TEORIA DO FETICHISMO:
O MOVIMENTO CRÍTICO DE MARX
Título do Livro:
Teoria do fetichismo: o movimento crítico de Marx
Autor˘˦:
Bruno Reikdal de Lima e Suze Piza
Produção editorial:
Mariana Paulon e Marielly Agatha Machado
Designer gráfico:
Jéssica Teixeira
Capa:
Jéssica Teixeira
Bi bl i ogr af i a.
I SBN 978- 65- 85030- 05- 2
Cep. 04017-000
E-mail: [email protected]
Sumário
Apresentação ................................................................................................................ 6
Introdução ........................................................................................................................ 7
Boa leitura,
Suze Piza
6
Introdução
7
(...) é preciso esclarecer o significado que teoria
tem para Marx. Para ele, a teoria não se reduz ao
exame sistemático das formas dadas de um
objeto, com o pesquisador descrevendo-o
detalhadamente e construindo modelos
explicativos para dar conta - à base de hipóteses
que apontam para relações de causa/efeito - de
seu movimento visível, tal como ocorre nos
procedimentos da tradição empirista e/ou
positivista. E não é, também, a construção de
enunciados discursivas sobre os quais a
chamada comunidade científica pode ou não
estabelecer consensos intersubjetivos,
verdadeiros jogos de linguagem ou exercícios e
combates retóricos, como querem alguns
pós-modernos (...) Para Marx, a teoria é uma
modalidade peculiar de conhecimento, entre
outras (como, por exemplo, a arte, o
conhecimento prático da vida cotidiana, o
conhecimento mágico-religioso (...). Mas a teoria
se distingue de todas essas modalidades e tem
especificidades: o conhecimento teórico é o
conhecimento do objeto - de sua estrutura e
dinâmica - tal como ele é em si mesmo, na sua
existência real e efetiva, independentemente dos
desejos, das aspirações e das representações do
pesquisador. O objetivo do pesquisador, indo
além da aparência fenomênica, imediata e
empírica- por onde necessariamente se inicia o
conhecimento, sendo essa aparência um nível da
realidade e, portanto, algo importante e não
descartável -, é apreender a essência (ou seja: a
estrutura e a dinâmica) do objeto. Numa palavra:
o método de pesquisa que propicia o
conhecimento teórico, partindo da aparência,
visa alcançar a essência do objeto. Alcançando a
essência do objeto, isto é: capturando a sua
estrutura e dinâmica, por meio de
procedimentos analíticos e operando a sua
síntese, o pesquisador a reproduz no plano do
pensamento; mediante a pesquisa, viabilizada
pelo método, o pesquisador reproduz, no plano
ideal, a essência do objeto que investigou. O
objeto da pesquisa tem, insista-se, uma
existência objetiva, que independe da
consciência do pesquisador. Mas o objeto de
Marx é a sociedade. Para Marx, como para todos
os pensadores dialéticos, a distinção entre
aparência e essência é primordial (...) teoria é,
para Marx, a reprodução ideal do movimento real
do objeto pelo sujeito que pesquisa: pela teoria, o
sujeito reproduz em seu pensamento a estrutura
e a dinâmica do objeto que pesquisa. E esta
reprodução (que constitui propriamente o
conhecimento teórico) será tanto mais correta e
verdadeira quanto mais fiel o sujeito for ao objeto
(NETO, 2011, p.21, grifos nossos).
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A teoria do fetichismo é destacada no interior do
primeiro capítulo, encerrando a discussão geral
desenvolvida por Marx sobre o valor. A crítica marxista ao
capital e à economia política burguesa tem como seu
fundamento a teoria do valor, e sua vinculação com a
questão do fetichismo é imprescindível para sua
compreensão. Como comenta Isaak Rubin em A teoria
marxista do valor, “a teoria do fetichismo é, per se, a base de
todo o sistema econômico de Marx, particularmente de sua
teoria do valor” (RUBIN, 1987, p. 19).
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[...] que no capitalismo o consumo seja muito
importante para as pessoas ou que tenham um
fetiche da posse de determinadas mercadorias
que servem como símbolo de posição social.
Tampouco se trata de um fetichismo de mercado.
Atrás da posse de mercadorias caras como
símbolo de status não se esconde nenhum
"segredo" que tenha que ser desvelado
(HEINRICH, 2008, p. 85).
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1. Hegel e o mundo de cabeça para baixo
11
Sem dúvida, deve-se distinguir o modo de
exposição segundo sua forma, do modo de
investigação. A investigação tem de se apropriar
da matéria [Stoff] em seus detalhes, analisar
suas diferentes formas de desenvolvimento e
rastrear seu mexo interno. Somente depois de
consumado tal trabalho é que se pode expor
adequadamente o movimento real. Se isso é
realizado com sucesso, e se a vida da matéria é
agora refletida idealmente, o observador pode ter
a impressão de se encontrar diante de uma
construção a priori (MARX, 2017, p. 90).
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desenvolvimento em seus nexos internos. Com isso, mesmo
que performe um movimento formalmente ou
genericamente dialético, acabará por mistificar o movimento
real e, para Marx, resultando na função de “glorificar o
existente” (MARX, 2017, p. 91).
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2. A forma-mercadoria e seus caprichos
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Durante a Primeira Guerra Mundial, é inventado o
salitre artificial, o que paralisa a produção de
salitre natural no Chile, que é mais caro. Trata-se
aqui de duas relações. A primeira seria a relação
material entre homens: os que inventam o salitre
artificial destroem as fontes de trabalho dos que
estavam até o momento produzindo salitre
natural. Não importa que esta não tenha sido a
intenção, de qualquer modo, conscientes ou não,
as destroem. Os que obtêm um emprego na
produção de salitre sintético o fazem às custas de
quem o perde na produção de salitre natural. A
relação entre estas pessoas se dá por meio disso,
que é o salitre. Ademais, trata-se de uma relação
social entre as coisas. O salitre artificial destrói o
salitre natural. São dois tipos de salitre em
conflito e um ganha. Os dois tipos aparecem
como se tivessem personalidade própria
(HINKELAMMERT, 2022, p. 103).
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[...] o trigo serve para ser comido, o sapato para
ser calçado e a roupa para ser vestida. O
vestuário também pode ser roupa de trabalho e,
como tal, servir de meio de produção para
produzir trigo. Mas não aparece nenhuma
relação especial entre trigo e sapato, sapato e
vestuário. A problemática mercantil surge
somente quando, no contexto de uma divisão
social do trabalho sobre a base da propriedade
privada, o sapato chega a ser meio para
conseguir o trigo mediante o intercâmbio. Nesse
momento, surge uma nova relação entre os dois
valores de uso, que quantitativamente se
exprime como valor de troca (HINKELAMMERT,
1981, p. 30).
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3. As raízes da teoria do fetichismo
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Os livros precisam ser abordados e é por isso que
falamos em estratégias quando falamos em leitura, é preciso
pensar em ações previamente e coordená-las. Abaixo de
forma esquemática, descreveremos diversas estratégias,
seguidas de ponderações, sobre o que é possível fazer para
ler mais e melhor.
Contudo, para Feuerbach ainda se tratava de um ser
humano abstrato e sem considerar as condições materiais e
relações históricas efetivamente. Esse pôde ser o
desdobramento levado adiante por Marx, mas não por seu
predecessor. Por isso, Marx afirma que a crítica da religião se
encerra com “a doutrina de que o homem é o ser supremo
para o homem, portanto, com o imperativo categórico de
subverter todas as relações em que o homem é um ser
humilhado, escravizado, abandonado, desprezível” (MARX,
2011, p. 151).
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As relações mercantis, portanto, são produtos históricos
do desenvolvimento humano e de seu contínuo processo
social de produção que, independentemente das intenções
particulares dos sujeitos envolvidos, passam a determinar a
vida e a morte de seus produtores. Não se trata de uma
questão “moral”, portanto, mas sim científica – no sentido
preciso do termo. Por isso Marx utiliza o termo “fetichismo”
sem, nesse momento da argumentação, adjetivar a forma
mercadoria e as relações sociais que as constituem de
“fetiches”. Estamos discutindo termos gerais que revelam
processos.
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A economia política burguesa, ao assumir as relações
fetichizadas e reproduzi-las em suas formulações, lida com
esse processo como observadora e descreve-o sem operar o
método do tipo realizado por Marx, que recupera a
materialidade do movimento real e suas condições
históricas. O observador proprietário de mercadorias vê a
partir de “cima” todo o processo. É diferente do participante
envolvido diretamente nas trocas que vê de dentro, ou
melhor, a partir de “baixo”, como o caso do trabalhador que
ao se inserir no circuito das mercadorias, é ele mesmo uma
mercadoria que vende seu corpo como força de trabalho e
está sujeito diretamente às lutas das mercadorias
(HINKELAMMERT, 2019, p. 125-127).
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No mesmo movimento feito por Marx - quando esse
alerta para o caráter fetichista da mercadoria “plena de
sutilezas metafísicas e melindres teológicos” como algo que
tão logo deixa de ser valor de uso (onde não há nada de
misterioso, pois está vinculado ao trabalho humano e as
necessidades humanas) se torna algo
sensível-suprassensível capaz de ganhar vida própria, com
1
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Quando Dussel retoma a metáfora do fetiche para tratar
do que ocorre contemporaneamente com a política, usa a
mesma estrutura formal e de conteúdo de Marx para dizer
que o poder é fetichizado quando é separado de sua fonte
geradora, quando aquilo que motivava seu modo de
exercício mais espontâneo e, logo, legítimo perde o sentido.
Ao se separar a comunidade política do exercício do poder
que lhe é inerente, pois garante que sejam satisfeitas suas
necessidades de produção e reprodução da vida, o poder
mostra seu caráter melindroso, metafísico, fantasmagórico,
e parece ganhar vida própria independente dos homens e
mulheres que são sempre sua única fonte, descolados de sua
razão de ser.
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Essa tese de Dussel soa hoje mais potente acerca da
política que quando foi pronunciada há mais de uma década.
Nossa sensibilidade parece agora ainda mais à vontade para
2
2 Em 2022.
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Referências
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MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã: crítica da
mais recente filosofia alemã em seus representantes
Feuerbach, B. Bauer e Stirner, e do socialismo alemão em seus
diferentes profetas (1845-1846). Supervisão editorial: Leandro
Konder. Tradução: Rubens Enderle, Nélio Schneider, Luciano
Cavini Martorano. Boitempo: São Paulo – SP, 2007.
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Sobre o autor e a autora
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Suze Piza
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