Teologia Contemporanea
Teologia Contemporanea
Teologia Contemporanea
Brasília-DF.
Elaboração
Produção
Introdução.................................................................................................................................... 7
Unidade ÚNICA
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA................................................................................................................ 9
Capítulo 1
Panorama da teologia do século XX................................................................................ 9
Capítulo 2
Karl Barth e sua teologia.................................................................................................. 20
Capítulo 3
O Ceticismo exegético de Bultmann................................................................................ 27
Capítulo 4
Joseph F. Fletcher e sua ética situacional........................................................................ 31
Capítulo 5
Pentecostalismo................................................................................................................. 36
Capítulo 6
Teologia do processo, de Hartshorne........................................................................... 40
Capítulo 7
Teologia da evolução, de Chardin................................................................................. 47
Capítulo 8
Paul Tillich e a busca pelo Jesus histórico...................................................................... 51
Capítulo 9
A teologia sistemática de Pannenberg ............................................................................ 64
Capítulo 10
Teologia da libertação ..................................................................................................... 69
Capítulo 11
Teologia feminista e ecofeminismo de Ruether .............................................................. 80
Capítulo 12
Teologia da prosperidade ................................................................................................ 84
Referências................................................................................................................................... 92
Apresentação
Caro aluno
Conselho Editorial
4
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.
Atenção
5
Saiba mais
Sintetizando
6
Introdução
Temos um hábito ruim de nos referirmos ao termo moderno como algo atual, pois
perdemos seu real propósito que é o descrever um período específico da história que
já ficou para trás, o qual basicamente data do ano de 1453 (marcado pela tomada de
Constantinopla) à 1789 (com a Revolução Francesa).
Portanto, atual mesmo é hoje e tudo o que é moderno é de antes de 1789, a partir
deste ano, precisamos sempre levar em consideração pensadores, ocorrências e demais
acontecimentos como passagens históricas, utilizando-se do termo: contemporâneo,
uma vez que contemporâneo sempre caminha o percurso juntamente ou proximamente
daquele que o vive historicamente no tempo.
Deste modo, são destes teólogos/Teologias que trataremos, algo em torno de dois
séculos para trás, até aqui. Tempos, portanto, que marcam a contemporaneidade. No
entanto, é importante notar que não é algo extremamente rigoroso, mas procuraremos
nos focar nestes termos para tratar da Teologia Contemporânea.
Posto isto, em primeiro lugar faremos um panorama geral do que falaremos e de algumas
Teologias que não abordaremos em nosso Caderno de Estudos. Depois passaremos
para as importantes concepções de Karl Barth, o qual a despeito de seus polêmicos
pensamentos, muitos o consideram o maior teólogo do século XX.
Pannenberg e Tillich não serão olvidados, bem como falaremos da Teologia da Libertação
e da Prosperidade, mais em voga do que nunca na Teologia Contemporânea.
Para um material denso que envolve diversas áreas do conhecimento, faz-se necessária
essa dedicação. Veja também com atenção o item “Para (não) finalizar” ao final
deste material; ali também há diversos temas e figuras fundamentais, que também
são importantíssimos para as Missões Urbanas e Comunicação Transcultural, não
contemplados que poderão ser úteis para futuros estudos.
7
Objetivos
»» Conhecer os principais pensamentos teológicos do cenário contemporâneo.
8
TEOLOGIA Unidade
CONTEMPORÂNEA ÚNICA
Capítulo 1
Panorama da teologia do século XX
Comblin (2005, p.10) nestes termos, complementa que “no mundo globalizado o
encontro das religiões é inevitável. Mas, será que haverá realmente diálogo com as
religiões do mundo?” E, portanto, é preciso manter vivo o sentido da fé em Cristo
Jesus, mas abertos ao testemunho e às reflexões das demais sabedorias da humanidade
(MENDOZA-ÁLVAREZ, 2012).
No Modernismo, Charles Darwin argumentou que Deus não era necessário nem mesmo
para explicar a criação. A ciência poderia explicar tudo, o empírico sobrepôs ao racional
(só é real o que pode ser observado). Os românticos, em vez de crer como os deístas que
“Deus está longe e desinteressado”, criam que Deus está perto e intimamente envolvido
no mundo físico. “Deus é imanente à natureza e em nós mesmos. Alguns chegaram
a acreditar que Deus é idêntico com a natureza e o eu, rejeitando o Deus da Bíblia”
(VEITH, 1999, p. 18).
Desta forma, esta nova realidade cultural e religiosa caracteriza-se pela abertura de
novos caminhos teológicos a partir do Concílio Vaticano II (11 out. 1962 a 8 dez.1965)
que deu início ao processo de abertura dialogal e a presença de uma perspectiva mais
positiva e otimista com respeito às religiões e a propósito do mistério de salvação. Na
declaração Nostra Aetate, (aprovada em 28 out. 1965) observa-se um relacionamento
respeitoso entre cristãos e não cristãos, relembrando as palavras do Papa João XXIII:
“Buscai primeiramente aquilo que une, antes de buscar o que divide”, e atestando às
religiões que “não raro refletem um raio daquela Verdade que ilumina todos os homens”
(COSTA, 1997, p. 339).
10
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Nesse sentido, a relação da igreja com as demais religiões não foi o foco principal do
Vaticano II; no entanto, devido às preocupações pastorais e ao momento contextual
no qual se situava, o Concílio aludiu sobre a questão religiosa. Segundo Gutiérrez
(1985, pp. 25-26), um dos grandes desafios que o Concílio teve que se defrontar foi o da
diversidade religiosa no mundo.
O pluralismo religioso lança um olhar reflexivo para as religiões e é uma realidade que
perpassa a reflexão teológica da atualidade. Essa realidade religiosa fez emergir duas
novas reflexões para a Teologia: o pluralismo religioso de fato (diversidade de tradições
religiosas existentes e movimentos religiosos) e o pluralismo religioso de direito (opção
teológica no sentido de valorizar todas as tradições religiosas que estão no desígnio
misterioso de Deus).
11
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Nessa linha, Haight (2003, p. 486) confirma que o pluralismo religioso não é ameaça
“nem para a cristologia nem para a consciência da fé cristã em geral. Pelo contrário,
integra o contexto atual para a reflexão sobre a realidade misteriosa de Jesus Cristo”.
Segundo o autor, o período compreendido entre o final do século XX e o começo do
século XXI é o Pós-moderno, quando desponta uma consciência do pluralismo em todos
os níveis de reflexão acerca da humanidade: “sua natureza, sua história, seu propósito,
seu Deus”.
Ainda neste contexto, Damen (2003) pontua que a atual Teologia das religiões
enquadra-se num paradigma “pluralista”, uma vez que todas as religiões participam da
salvação de Deus, “cada uma por si e a seu modo”. Assim, para o autor, não existe uma
única religião que esteja no centro do universo, mas a pessoa de Cristo está no centro
em todas elas, além da transcendência de Deus e a necessidade de revelação. Também
Vigil (2006, p. 64) afirma: “no centro está apenas Deus, e todas as religiões, inclusive
o cristianismo, giram ao redor Dele.” A plenitude escatológica do Reino de Deus é a
realização final comum de todas as religiões (CUNHA, 2006).
12
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
13
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Não deve haver distinção entre Igreja e mundo, pois o centro de interesse
não é a Igreja, mas sim o mundo e as suas necessidades; o Deus da Bíblia
é o Deus deste mundo. O cristianismo deve ser reconstruído sem Deus,
e Cristo é o paradigma da existência humana, mas não há espaço para
o Jesus salvador (confundem o serviço no mundo com serviço para o
mundo, uma vez que estamos no mundo para servir Nele, e não para
servir a Ele).
14
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Ele será Deus quando cumprir suas promessas e estabelecer o seu reino
(pois no presente ele sequer é Deus). Segundo Moltmann, toda Teologia
cristã deve modelar-se por meio da escatologia que para ele significa estar
aberta à liberdade do futuro. Sua Teologia fundamenta-se no marxismo que
centraliza no homem o qual observa o futuro e age na sociedade. O Reino
de Deus é “terrenal e tangível” e não “celestial”, e se introduz na terra pela
política e revolução. Entretanto, segundo o apóstolo Paulo, o Reino de
Deus é introduzido por meio da proclamação do poder salvador de Jesus
Cristo (ATOS 28, 30-31), e traz a paz, e não a guerra (ROMANOS 14, 7).
15
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Por tudo exposto, conclui-se que o modernismo trouxe graves consequências para
a Teologia e o Pós-modernismo trouxe novos perigos e desafios. O século XVIII
e o pensamento de Kant são protótipos da Teologia Contemporânea. Mas o
antropocentrismo teológico e o existencialismo, forte tendência na Teologia Contemporânea,
descaracterizam-se como proposta bíblico-teológica. Deus é a pessoa central para quem
todas as coisas convergem, e não o homem (ROMANOS 11.36).
A Teologia de Barth é importante para o século XX, pois sua Teologia dialética influência
o cenário teológico contemporâneo. Quase todo o pensamento teológico moderno até a
década de 1970 envolve a perspectiva de Barth.
16
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta
para discernir os pensamentos e propósitos do coração” (HEBREUS 4, 12).
Geffré (2003, p. 93) afirma que “há teólogos que dizem que este pluralismo será o
grande horizonte da Teologia neste novo século”.
O homem contemporâneo busca uma fé para viver. Damasceno (2007, p. 268) cita que
a fé é a chave para todas as coisas, o elo que une o homem a Deus, por meio do sangue
precioso de Jesus. “Se não se pode crer no sacrifício de Jesus, não se pode crer em Deus,
pois Ele está no filho como o filho n’Ele está”.
17
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Movido pela fé o homem terá um novo olhar sobre a verdade exposta nas Escrituras
para compreender o plano de Deus. A Teologia Contemporânea está ligada ao kerigma
evangélico fundado na fé em Jesus Cristo. Entretanto, o homem não deverá deixar
que o egoísmo, o orgulho, a vaidade e a “falsa sabedoria” sobreponham à humildade,
mas buscar a misericórdia de Deus e o conhecimento do real sacrifício de Jesus.
Buscar uma nova via a fim de repensar e preservar a tradição teológica à luz da
contemporaneidade, em um verdadeiro “ressignificar teológico”, é o que realmente
preocupa a reflexão teológica contemporânea (ALEXANDRE, 2015).
Olhar para os erros das Teologias do passado e construir a Teologia do futuro, tendo
a Bíblia como pressuposto básico, constitui tarefa séria diante das instituições e da
sociedade. Não obstante, reconhece-se que a tarefa não é fácil para concretização dos
desafios que se apresentam no novo milênio. Porém, o maior desafio é saber anunciar o
Evangelho de Jesus Cristo e buscar relações com as demais religiões.
O resultado desse intenso diálogo teológico possibilita repensar uma questão complexa:
há necessidade de muita reflexão no que tange aos futuros debates teológicos, porque
surgirão posturas diversas em relação a vários pontos doutrinários e seus expoentes
as considerarão “únicas e verdadeiras”. E essas diversas posturas, querendo ou não,
serão influenciadas e influenciarão àquelas que virão, uma vez que “ninguém escapa às
influências de seu tempo”.
18
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
19
Capítulo 2
Karl Barth e sua teologia
Origem
O teólogo protestante suíço Karl Barth (1886-1968), um gigante da história do pensamento
cristão, iniciou o que se tornou o movimento dominante na Teologia Protestante até o
presente.
Ele nasceu em 10 de maio de 1886, em Basileia, sendo ele o filho mais velho de
um ministro suíço reformado. Criado em uma atmosfera de piedade evangélica e
aprendizagem teológica, Karl decidiu aos 16 anos se tornar um teólogo. Entre 1904 e
1908, foi educado nas universidades de Berlim, Tübingen e Marburg e estudou sobre os
principais especialistas religiosos protestantes do dia.
Em 1908, Barth foi ordenado pelo ministério suíço reformado. Ele então serviu como
pastor de congregações em Genebra (1909-1911) e na aldeia de Safenwil (1911-1921).
Em 1913 Barth casou-se com Nelly Hoffman, e eles tiveram três filhos e uma filha.
Pensamentos teológicos
Educado nas abordagens protestantes liberais do cristianismo, no começo de sua carreira,
Barth ficou preocupado com o fácil casamento do liberalismo entre o cristianismo e a
modernidade excessivamente confiante. O apoio acrítico da Primeira Guerra Mundial
pelos principais intelectuais alemães, incluindo alguns dos professores de Barth, no
entanto, expôs irrevogavelmente para ele a falência da antropocêntrica visão religiosa
do liberalismo.
Diante da tarefa de pregar cada semana, Barth voltou-se os olhos para a Bíblia e
descobriu o que ele chamaria de “mundo estranho e novo”. Em 1919, seu explosivo
Comentário sobre a Epístola aos Romanos “catapultou” o pastor desconhecido à
proeminência teológica internacional.
20
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Nestes primeiros anos, o movimento teológico que Barth havia iniciado, foi mudando
de nomenclatura: “Teologia da Palavra”, “Teologia da Crise”, “Teologia Dialética”,
“Teologia da Neorreforma” e “Neo-ortodoxia”, atraídos em diferentes graus homens
que, com ele, se tornaram os principais teólogos protestantes deste século. Entre
eles estavam Emil Brunner, Rudolf Bultmann, Dietrich Bonhoeffer, Paul Tillich e
Friedrich Gogarten.
»» Against the Stream (1954), que inclui alguns ensaios controversos sobre
a guerra fria, descrevendo o comunismo em termos teológicos muitos
diferentes do nazismo.
21
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Ele havia começado com a “alteridade” de Deus como o tema bíblico que mais precisava
de atenção; mas a direção de sua Teologia foi para uma concentração profunda
em Jesus Cristo como a revelação completa de Deus e, portanto, o único objeto do
pensamento teológico.
Com isto, Barth entendia cada vez mais que o tema central da Escritura é a “união” do
Deus soberano e o homem criativo em Cristo –, em outras palavras, a “humanidade” de
Deus na Encarnação.
Ele acreditava que a Teologia Cristã deveria sempre derivar todo o seu pensamento
sobre Deus, o homem, o pecado, a ética e a sociedade, do que pode ser visto em Jesus,
como testemunhou o Antigo e o Novo Testamento, em vez de fontes independentes desta
revelação. Seus escritos volumosos exploram as implicações inesgotáveis e frutíferas de
sua total centralização de Cristo.
Barth acreditava que tal “Teologia Natural” era a raiz do sincretismo religioso e do
antissemitismo dos “cristãos alemães” – aqueles que apoiaram o socialismo nacional
de Hitler.
Por essa altura, Barth estava imerso na luta da igreja alemã. Ele foi um dos fundadores da
chamada Igreja Confessante, que reagiu vigorosamente contra a ideologia do “sangue
e do solo” e a tentativa dos nazistas de criar uma igreja “cristã alemã”. A Declaração de
Barmen de 1934, em grande parte escrita por Barth, colocou a revelação de Jesus Cristo
contra a “verdade” de Hitler e do socialismo nacional.
22
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
O pastor Karl
Após a guerra, Barth participou de controvérsias sobre o batismo (apesar de ser um
teólogo reformado, ele rejeitou o batismo infantil), hermenêutica e o programa de
desmistificação de Rudolf Bultmann (que negava a natureza histórica da Escritura, em
vez disso acreditava que era um mito cujo significado poderia curar espiritual ansiedade,
mas iremos trabalhar melhor ele no capítulo que lhe é próprio).
Barth também fez visitas regulares à prisão em Basileia e seus sermões aos prisioneiros,
Libertação aos Cativos, revelam sua combinação única de paixão evangélica e
preocupação social que caracterizou toda a vida dele.
Embora Barth tenha tornado possível para os teólogos novamente levar a Bíblia a
sério, os evangélicos norte-americanos foram céticos de Barth porque ele se recusou
a considerar a Palavra escrita “infalível” (ele acreditava que só Jesus era). Outros
renunciaram à Teologia de Barth, porque enfatizaram demais a transcendência de
Deus (a tal ponto que alguns ex-Barthians começaram a defender a “morte de Deus”).
No entanto, ele continua a ser o teólogo mais importante do século XX.
A Teologia de Barth
O Deus trino
Barth propositadamente colocou a Trindade no início de sua Igreja Dogmática – ao
contrário do que fez Friedrich Schleiermacher, que colocou a Trindade no final de
seu trabalho sistemático, The Christian Faith (1821, rev. 1830) –, significando sua
importância e centralidade para a exposição e proclamação da Teologia.
três formas diferentes, porém unificadas, da Palavra de Deus. A analogia de Barth foi a
própria Trindade.
Não há distinção de grau ou valor dentre estas três. Pois, na medida em que a
proclamação realmente se baseia na lembrança da revelação atestada na Bíblia e,
portanto, é a obediência da repetição do testemunho bíblico, não é “menos Palavra de
Deus” do que a Bíblia.
Pregação
O argumento de Barth é que a pregação pode tornar-se a Palavra de Deus não por causa
de algo que fazemos, mas de acordo com a direção de Deus. Assim, a Palavra de Deus é
livre e não é algo controlado ou possuído pela igreja.
Eleição
Esses grupos às vezes eram chamados de “eleitos” e “reprovados”. Essa escolha (ou
eleição) foi feita por Deus e foi o resultado de seu “decreto absoluto”, uma decisão
misteriosa e fundamentalmente inescrutável que, apesar de ser uma decisão de
consequência final para o ser humano, era fundamentalmente inacessível e incognoscível
24
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
para ele. Deus escolheu cada pessoa para ser salvo ou condenado com base na vontade
divina, e era impossível saber por que Deus escolheu alguns e não outros ou se Deus
havia eleito ou rejeitado (CHAMPLIN, 1997).
A doutrina da eleição de Barth envolve uma firme rejeição da noção de decreto absoluto.
De acordo com sua metodologia cristocêntrica, Barth argumentava que atribuir a
salvação ou a condenação da humanidade a um decreto abstrato e absoluto é tornar
parte de Deus mais definitiva do que o ato salvador de Deus em Jesus Cristo.
O decreto absoluto de Deus, se alguém pode falar tal coisa, é a graciosa decisão de Deus
de ser “para” a humanidade na pessoa de Jesus Cristo (Barth chamava isso de o “Sim”
de Deus).
Com a tradição Reformada anterior, Barth retém a noção de dupla predestinação, mas
ele faz de Jesus simultaneamente o objeto e sujeito da eleição divina e da reprovação:
Jesus encarna a eleição de Deus da humanidade e a rejeição de Deus ao pecado humano.
Ele é o Deus eleitoral e o eleito. Como Deus eleito, Jesus elege toda a humanidade em si
mesmo. E assim, como o homem eleito, todos os que estão “em Cristo” são eleitos nele.
Não se acredita que os não crentes simplesmente não perceberam ou reconheceram sua
eleição em Cristo.
Enquanto alguns consideram esta revisão da doutrina da eleição como uma melhoria
na doutrina calvinista da dupla predestinação, os críticos acusaram que o ponto de vista
de Barth equivale a um universalismo implícito.
Universalismo?
Barth também foi criticado por sua alegada crença no universalismo, no entanto, o
próprio Barth observou que a insistência na necessária salvação universal impunha a
liberdade de Deus e sugeriu que era além do dever da igreja especular sobre o assunto
(CHAMPLIN, 1997).
Para Barth, então, não podemos afirmar nem negar a possibilidade de que todos sejam
salvos. Então o que nós podemos fazer? A resposta de Barth é clara: podemos esperar,
tão somente.
Apologética
25
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
O Evangelho não é a porta, mas a dobradiça. O homem que apreende o seu significado é
removido de todas as contendas, porque ele está envolvido em uma disputa com o todo,
mesmo com a própria existência. A ansiedade quanto à vitória do Evangelho - isto é,
Apologética cristã – não tem sentido, porque o Evangelho é a vitória pela qual o mundo
é superado.
26
Capítulo 3
O Ceticismo exegético de Bultmann
Isso não quer dizer que ele não tenha seus admiradores hoje. Uma pesquisa de literatura
positiva mostra que ele tem alguns, e alguns ficam bastante entusiasmados quando
falam sobre ele.
Ele assumiu grandes riscos ao defender as tentativas nazistas de fazê-lo de modo que
apenas os arianos pudessem ser ministros – ninguém pode duvidar de que ele era, em
muitos aspectos, um homem sincero e com fortes princípios que defendia valentemente.
Pois mesmo com diabólicos como estes, ele era firme dentro de suas concepções teológicas.
Aqui podemos até fazer uma aproximação com Martin Heidegger (1889-1976).
O “grande” filósofo contemporâneo que é muito citado e pouco compreendido
em função de todos seus jargões filológicos complexos – pois há uma cultura
geral que é bastante influente: “se não entendo, é bom”. Parece que quanto
menos se entende um discurso, mais palavras e termos difíceis são usados, mais
o interlocutor é bem quisto. Isto é no mínimo, estranho.
27
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Para Heidegger tudo isso é a mesma coisa, o ego de Descartes é o mesmo que o
ego de Scot. Quando se joga todo o individualismo fora, sobra a individualidade
coletiva (volks geist): isto é, a nação alemã, o nazismo.
A bravura de Bultmann de modo algum prova que sua ideologia estava correta, não
mais do que a bravura de Gandhi prova o hinduísmo. Um admirador de Bultmann diz
que, embora possa ser legítimo criticar Bultmann por sua Teologia e exegese, não é
apropriado dizer que ele não era cristão.
Bultmann obteve suas ideias de um certo ceticismo histórico radical que estava
na moda nos séculos XVIII e XIX – numa época em que o mesmo tipo de pessoas
declaravam que todas as obras de Tácito e Plínio eram falsificações “por atacado”.
Não há dúvida de que os judeus consideravam que Deus era soberano, e isso, obviamente,
levou ao idioma de atribuição, já que, mesmo que Deus não faça nada, Sua soberania é
tal que não fazer nada é uma expressão de Seu poder; ainda assim, os críticos parecem
pensar que os judeus acreditavam que Deus soltou cada “gota de chuva” pessoalmente
e diretamente.
Pode ser que Bultmann não tenha chegado ao fanatismo, pois não há provas de que
tenha visto isso; mas ele aceitou sem criticar o pensamento daqueles que o precederam,
e isso foi o suficiente para estabelecer as bases para o que se tornou seu método de
crítica de formas.
28
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Para piorar, dentre suas heresias, Bultmann afirmava que os evangelhos são documentos
baseados na fé; o que eles relatam, portanto, não pode ser confiável.
O porquê isto nos é importante, afinal? Pelo fato de que Bultmann retrata uma
realidade atual, ou seja, muitos que se dizem teístas sequer acreditam nas consistências
bíblicas, o que significa dizer que este “teólogo” representa muitas vozes.
Além disso, para ele, existe a suposição de que a igreja escreveu os Evangelhos
para atender às necessidades: se a igreja tivesse uma queixa sobre os fariseus, eles
inventariam uma história em que Jesus exortou os fariseus acerca de algum assunto
em questão. Logo, rejeitava a ressurreição de Cristo, pois não haveria, portanto,
“provas” documentais desse fato.
Onde se adequava aos seus propósitos, Bultmann era livremente anacronizado: o exemplo
mais famoso é a sua análise do Evangelho de João como um documento influenciado
por um mito redentor gnóstico. Levaram anos de discussão e os Pergaminhos do Mar
Morto, para quebrar a erudição bíblica dessa falsa dicotomia. Bultmann, curiosamente,
estava ciente de seus próprios pressupostos anacronizantes, mas desculpou-se dizendo
que todos fizeram o mesmo.
O Cristo de Bultmann é um mito para nossa era, e seu propósito era tornar a fé cristã
“significativa” para o homem moderno e cético: ele admite abertamente que sua
hermenêutica “leva a visão do mundo moderno como um critério”. (BULTMANN, 1958).
Não houve milagres: na verdade, para Bultmann em sua “exegese” bíblica (isto é, retirar
do texto aquilo que o texto não quer dizer) pedir milagres é pecado, como mostra
o comentário de Cristo aos fariseus (contudo, o pecado era pedir um sinal especial “a
mais” quando já tivessem visto o suficiente para se convencer).
30
Capítulo 4
Joseph F. Fletcher e sua ética
situacional
A Ética da situação
A ética da situação é também chamada ética situacional em metafísica e Teologia.
A posição de que a tomada de decisão moral é contextual dependente de um conjunto
de circunstâncias. A ética das situações sustenta que os julgamentos morais devem
ser feitos no contexto da totalidade de uma situação e que todas as características
normativas de uma situação são vistas como um todo.
A ética da situação foi desenvolvida pelo teólogo anglicano americano, central de nosso
capítulo, Joseph Francis Fletcher (1905-1991) em seu livro Situation Ethics: The New
Morality (1966). Surgiu de suas objeções ao absolutismo moral (a visão de que
existem princípios morais universais fixos que têm autoridade vinculativa em todas as
circunstâncias) e ao relativismo moral (a visão de que não há princípios morais fixos
em absoluto).
Fletcher baseou a ética da situação na norma geral cristã do amor fraternal, que é
expressa de maneiras diferentes em diferentes situações. Ele aplicou isso a questões
de doutrina. Por exemplo, se alguém detém o erro absoluto do aborto, então nunca se
permitirá o aborto, independentemente das circunstâncias em que ocorra a gravidez.
O teólogo afirmou que uma posição tão absoluta não presta atenção à complexidade
e singularidade de cada situação e pode resultar em uma maneira insensível e
desonesta de lidar com o problema. Por outro lado, se não há princípios, a decisão
é reduzida a nada mais do que o que se decide fazer no momento, sem implicações
morais reais. Em vez disso, Fletcher afirmou, no contexto das complexidades da
situação que alguém deveria chegar à decisão mais amorosa ou certa quanto ao
que fazer.
31
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
diminuir. Seu quadro ético apresentou fortes afinidades com a versão do pragmatismo
proposta pelo filósofo americano, reformador social e educador John Dewey, que
caracterizou sua posição como “instrumentalismo”.
Sobre J. F. Fletcher
Fletcher foi amplamente reconhecido por seu trabalho na teoria moral e na ética aplicada.
Mais conhecido ainda pelo método do raciocínio moral consequencial defendido em
seu livro Ética da Situação. Ele também é famoso por ser considerado o pai da ética
biomédica moderna.
Joseph Francis Fletcher nasceu em East Orange, Nova Jersey, em 10 de abril de 1905.
Seus pais se separaram quando ele tinha nove anos. Suas experiências trabalhando
para a Consolidation Coal Company e a Mina de Carvão de Monongahela levaram
a sua simpatia ao longo da vida pelas condições de trabalho dos mineiros de carvão
e prepararam o cenário para uma vida de ativismo social (note a importância de
conhecer parte da história de quem quer que estudemos).
Duas coisas importantes aconteceram durante seu segundo ano na faculdade: ele
conheceu sua futura esposa, estudante e poeta Forrest Hatfield (dos famosos Hatfields)
e ele se tornou um cristão ativo na Igreja Episcopal.
32
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Fletcher abraçou o cristianismo por causa de seus ideais sociais. Por meio de seu
trabalho na igreja, ele esperava promover a causa da justiça social, especialmente a
democracia econômica para os trabalhadores.
Um estudante destacado lhe foi negado um diploma pela universidade porque ele se
recusou a participar do treinamento militar obrigatório. Esse tipo de treinamento era
exigido de estudantes do sexo masculino em universidades de concessão de terras pela
lei federal. Contudo, um diploma de honorário foi conferido pela Universidade West
Virginia no ano de 1984.
Durante seu segundo verão, ele se ofereceu para o Comitê de Defesa Sacco-Vanzetti em
Boston. Seu último ano no seminário foi gasto colaborando em um livro com Spencer
Miller, conselheiro educacional da Federação Americana do Trabalho, intitulado
The Church and Industry (1931).
Ao retornar à América durante a era da Grande Depressão, Fletcher continuou seu ativismo
e ensino sindical. Em 1936, ele se tornou decano da Catedral de São Paulo em Cincinnati,
onde desenvolveu uma escola de treinamento social para seminaristas. Ele ensinou
cursos de história do trabalho e Novo Testamento na Universidade de Cincinnati e ética
social no Hebrew Union College. Também apoiou e ensinou cursos de voluntariado em
uma escola noturna de educação trabalhista apoiada por sindicatos locais.
Em 1944, Fletcher aceitou a cadeira Robert Treat Paine em Ética Social na Escola
Episcopal de Teologia da Universidade de Harvard, onde ensinou a Ética Social
Cristã. Durante vários anos, ele também ensinou a ética empresarial no Seminário
Musser da Harvard School of Business Administration.
33
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
ensinava no sul. Juntamente com dois colegas professores de Harvard, Fletcher foi
recompensado e citado pelo senador Joseph McCarthy, que acusou os professores de
serem comunistas ou pelo menos simpatizantes comunistas.
É considerado o trabalho pioneiro de uma nova disciplina, como falamos acima, a Ética
Biomédica.
Uma influência importante em seu pensamento durante esse período foi Garret Hardin,
o biólogo social. Fletcher primeiro cunhou o termo “ética clínica” em 1976 para refletir
acerca da natureza específica da bioética aplicada em situações clínicas ou centrada
no paciente.
Em 1966, Fletcher publicou o controverso best-seller Situation Ethics, que ele descreveu
como seu “panfleto de gordura”, expondo sua teoria da ação moral. Embora escrito no
contexto do cristianismo, a teoria era é independente dos pressupostos cristãos.
34
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
35
Capítulo 5
Pentecostalismo
Hoje 660 milhões a 700 milhões de cristãos protestantes no mundo. 60% diretamente
influenciadas pelo avivamento da Rua Azusa. Nasce em 1870 William Saymour, ele se
matricula na escola, porém naquela época havia leis que o impediam (por ser negro)
de assistir aulas. Dessa forma ele não podia assistir aulas junto com os brancos, mas
somente no corredor! Nem mesmo receber oração com os outros alunos podia, como
consequência não foi batizado no instituto. Sozinho, em Los Angeles, sem sustento
algum, nem mesmo para voltar para usa cidade (MELO, 2012).
Seymour ficou em oração sete horas por dia! Pedindo o verdadeiro fogo e o poder de
Deus. E, em uma reunião de oração que começou em uma família que o recebeu, esse
grupo levantou uma oferta para uma pessoa. A igreja começou como uma célula numa
pequena casa. Convidaram uma ministra já batizada, foi chamada para pregar e em 9
de Abril de 1906 houve o derramar do Espírito (MELO, 2012).
De acordo com o autor, o ápice do avivamento ocorre quando eles mudam-se para a
Rua Azusa, 1912. Ali era uma igreja metodista episcopal, que depois virou um estábulo.
Após tirarem os escombros, eles escondem tudo e pregam em bancos de madeira.
Alguns cultos duravam dia e noite. Não era raro ver pessoas nos locais próximos as
pessoas sentindo a presença de Deus. Centenas de pessoas foram visitadas fora do
prédio, antes mesmo de chegar ao quarteirão. Já chegavam orando línguas, só de
passar, sem ninguém impor as mãos. Muitos levaram essa mensagem pentecostal para
o mundo (MELO, 2012).
Ninguém seria capaz de registrar tudo que ocorria ali. Cada membro da Rua Azusa
levava óleo de unção para orar pelos enfermos em todos os bairros da cidade de Los
Angeles. Trabalhavam como voluntários, ajudando carentes etc.
36
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Em setembro de 1906 publicaram a The Apostolic Faith com 20 mil assinantes. No ano
seguinte, dobrou. Em sua primeira publicação escreveu: “Multidões têm chegado, Deus
não faz diferença de nacionalidade”. Começam às 10h da manhã e mal termina às 23h,
quando não varava a madrugada. Não se pode dizer quantas pessoas foram batizadas no
Espírito, curadas, evangelizadas. Os enviados antes mesmo de ser enviados já oravam
em língua do país de destino (MELO, 2012).
Missionários foram levados à Índia para espalhar essa chama. Jornais deram notícias
horríveis, dando somente alguns dias de vida. A segregação racial ali era apagada pelo
sangue de Jesus. Dava-se grande ênfase ao sangue de Jesus. Altos padrões morais para
que desejava levar uma vida íntegra. Sem palavrões, mas todos gentis (MELO, 2012).
Eles tomavam cuidado com suas palavras e suas ações para que não perdessem aquele
derramar do Espírito, para que não o incomodasse. Eles não procuravam defender seu
próprio trabalho, mas deixavam isso com o próprio Deus.
A própria palavra de Deus resolvia todos os assuntos ali. Nenhuma brincadeira era
feita na presença de Deus, tudo era feito com muito temor e reverência (claro que não
de modo absoluto, pois sempre há rebanhos fora do aprisco). Eles tinham uma sala
dos andares de cima, e quem quisesse ser batizado no Espírito havia uma ministração
diferente (MELO, 2012).
Eles diziam que sentiam que precisavam tirar as sandálias dos pés de tanta presença
do Espírito. A ação do Espírito Santo na música foi extremamente profunda. O Espírito
derramava Coro Celestial às almas.
37
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Alguns criticaram esses cânticos espirituais (com canções que não eram humanas,
bastante estranhas às pessoas locais). As notas eram tremendamente doces. Dizem que
Deus usava as cordas vocais como instrumentos (MELO, 2012).
Nem mesmo púlpito no começo tinha, ninguém era melhor que ninguém, não havia
forte nível hierárquico. O próprio Seymour somente aparecia depois de muita busca e
oração. Os testemunhos não paravam, o tempo para eles pertenciam a Deus.
Uma dúzia de pessoas estava de pé na presença de Deus, não havia um líder para indicar
o que fazer, mas as mentes estavam voltadas para o Senhor. Ninguém estava ali para
aparecer. Diz-se que geralmente Deus humilhava até o pó! Depois que se viam com
suas fraquezas aguçadas, como crianças, e então eram batizados com o Espírito Santo
(MELO, 2012).
Enquanto o homem não é quebrado por Deus ele não poderá ser usado por Deus.
Assim o poder de Deus se manifestava. Até os insetos (pragas) ficavam longe da casa
(residência) daqueles que serviam e buscavam naquele avivamento todo. Contam que
durante um culto apareceu bombeiros, pois alguns vizinhos relataram que haviam visto
um grande clarão, mas era a glória (MELO, 2012).
O maior motivo pelo qual durou apenas três anos o avivamento é que houve diversas
perseguições. E claro, havia intensa luta espiritual.
Ela levou para outro local a revista, e como se não bastasse, alterou na revista o
endereço de envio das ofertas. Ele (Seymour) ficou somente com os assinantes de Los
Angeles. Perdeu, portanto, a ajuda financeira que ele recebia. Finalmente foi a Portland,
cobrar aquele dinheiro e mudar o endereço de envio das ofertas, mas não conseguiu.
Azusa perde muita força (MELO, 2012).
O último confronto ocorreu entre Seymour e Durham. Durham pregava em alto e bom
som que jamais a pessoa perderia a salvação pelo pecado, mas pelo não arrependimento.
Pois a graça era mediante a fé.
Amigos de Seymour chamaram-no de volta. Ele expulsou Durham e ele abriu as portas
próximo de Azusa, transformando Azusa em um lugar virtualmente deserto.
38
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Um tempo depois, Seymour sentiu fortes dores no peito, mas faleceu aos 52 anos.
A causa oficial de sua morte foi parada cardíaca. Seu funeral foi em Los Angeles. Em seu
epitáfio estava escrito apenas “Nosso pastor”. “Não é pela semente, mas pelos frutos”
que se pode definir o homem. Seu legado foi incrível (MELO, 2012).
39
Capítulo 6
Teologia do processo, de Hartshorne
Ele participou Haverford College de 1915 a 1917, onde continuou seus estudos
filosóficos. A obra de Josiah Royce’s em O Problema do cristianismo teve um efeito
profundo sobre Hartshorne, pois levou-o a rejeitar a teoria do egoísmo psicológico e
ver a existência humana como algo dependente de um todo maior. Esta foi uma ideia
importante na posterior Teologia de Hartshorne.
40
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Em 1925, ele retornou a Harvard como pesquisador. Lá, ele e Paul Weiss editaram
as obras coletadas de Charles Sanders Peirce e passaram um semestre ajudando a
Whitehead. Ele teve um grande respeito pelo trabalho de Peirce, e a Filosofia Pragmática
de Peirce teria um efeito profundo no trabalho posterior de Hartshorne.
Carreira profissional
Em 1928, depois de terminar seu trabalho em Harvard, Hartshorne foi contratado
como professor no departamento de Filosofia da Universidade de Chicago. No entanto,
sua filosofia de religião frequentemente estava em conflito com o resto da faculdade do
departamento, e ele foi colocado para ensinar na Escola de Divindade, onde desenvolveu
suas teorias de Teologia de Processos altamente influentes e influenciou uma nova
geração de teólogos. Enquanto em Chicago, ele se casou com Dorothy Cooper, que
continuaria a ajudá-lo durante toda sua carreira como editora e bibliotecária.
Em 1955, ele aceitou um cargo na Universidade Emory, onde ensinou até ser forçado
a se aposentar em 1962, devido às restrições de idade na política da universidade.
Ele então mudou-se para a Universidade do Texas em Austin, onde continuou a ensinar
por muitos anos como professor emérito. Ele permaneceu em Austin até sua morte
em 2000.
Filosofia da religião
As contribuições de Hartshorne para a Filosofia da Religião são únicas que somam
tanto a dependência dos argumentos tradicionais dos filósofos medievais, como de
Anselmo, com opiniões pouco ortodoxas, como a Teologia dos Processos. Ele foi um dos
poucos filósofos modernos a defender o teísmo e desenvolver uma filosofia totalmente
teocêntrica ao longo de sua carreira.
A existência de Deus
Ao longo de sua carreira, Hartshorne defendeu a existência de um Deus benevolente.
Embora ele preferisse o argumento ontológico para a existência de Deus, ele viu todos
os vários argumentos (ontológicos, cosmológicos, teleológicos etc.) como teorias que se
reforçam mutuamente, em vez de competir.
41
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Hartshorne argumentou contra aqueles que negaram a existência de Deus com base na
falta de evidência científica. Referindo-se à definição de Karl Popper de uma hipótese
como uma teoria que pode ser provada e não confirmada, ele argumentou que não
existem fatos científicos incompatíveis com a existência de Deus. Portanto, a questão
da existência de Deus está além da experimentação científica. É, antes, o estudo da
filosofia e da metafísica, disse ele, que pode esclarecer os problemas teológicos e os
vários argumentos a favor ou contra a existência de Deus.
A natureza de Deus
Hartshorne rompeu com a visão tradicional de Deus como um ser onipotente e imutável
e desenvolveu um conceito altamente influente de um Deus de poder limitado que está
constantemente se tornando. Embora a maioria dos estudiosos afirmem que Hartshorne
desenvolveu suas teorias por conta própria, suas ideias compartilham muito em comum
com o movimento intelectual conhecido como pensamento do processo, liderado pelo
ex-colega de Hartshorne, Alfred North Whitehead (1861-1947).
42
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Este conceito dipolaridade faz parte da visão panteística de Deus dentro dos
pensamentos de Hartshorne como uma entidade abrangente e conhecedora de todos
os sentimentos. Contudo, Deus não é idêntico ao mundo, como na vista estritamente
panteísta; Deus retém a sua autoidentidade independente que transcende a Terra, mas
o mundo também está contido em Deus.
Hartshorne aceitou a ideia de um Deus perfeito, mas sustentou que o teísmo cristão
clássico tinha mantido uma noção de perfeição autocontraditória. Ele mesmo simpatizou
com os ateus que rejeitaram a ideia de um Deus perfeito e onipotente que permitiu que
o mal e o sofrimento existissem no mundo.
Assim, ele procurou desenvolver um conceito de Deus cuja existência era necessária e
compatível com os acontecimentos do mundo, tentando quebrar um impasse percebido na
Teologia sobre a questão da Teodiceia. Para Hartshorne, a perfeição significava que Deus
não poderia ser superado em sua relação social com toda criatura. Deus é capaz de superar
a si mesmo crescendo e mudando em seu conhecimento e sentimento pelo mundo.
43
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Além disso, a onipotência de Deus não lhe permite conhecer o futuro, porque isso
não permitiria a liberdade de Suas criaturas. Hartshorne viu o mal e o sofrimento
não como uma criação de Deus, mas um inevitável subproduto de liberdade e chance
aleatória.
Contribucionismo
Hartshorne resumiu seus pontos de vista sobre a morte e a vida após a morte em sua
Teoria do “Contribuinte”. Ele não acreditava na imortalidade humana ou em qualquer
realidade consciente após a morte. Ele acreditava que a vida humana devia ser vivida
na Terra, dentro de um espaço e espaço finitos, e que não se deveria procurar ganhar ou
experimentar algo além da vida física, como uma recompensa no Céu.
Ele viu as crenças tradicionais em uma vida após a morte como essencialmente o
produto do interesse próprio e acreditava que se deveria viver para contribuir tanto
quanto possível para a posteridade. Para Hartshorne, a vida de uma pessoa era como
uma bela pintura ou um poema. Tem um começo e um fim, mas existe para sempre na
medida em que aqueles que vivem podem observá-lo e se beneficiar disso.
Crítica
Os pontos de vistas filosóficos e teológicos de Hartshorne receberam elogios e críticas
de muitos lugares diferentes. A crítica positiva sublinhou que a ênfase de Hartshorne na
mudança, no processo e na criatividade, uma vez que atuou com uma grande correção ao
pensamento estático sobre leis causais e determinismo. Vários comentaristas afirmam
que sua posição oferece coerência metafísica ao fornecer um conjunto de conceitos
claro e lógico.
Hartshorne também tem sido uma figura importante na defesa da Teologia Natural
porque oferece uma compreensão de Deus como um ser amoroso, pessoal e dinâmico.
Ele também colocou uma ênfase interessante em afirmar que o Deus que ama a criação
também sofre o sofrimento.
filosófico no budismo (não diferente de Nietzsche neste ponto), estimulando, com isto,
novas abordagens de cooperação, ecumenismo e diálogo inter-religioso.
Os críticos argumentam que Hartshorne não oferece uma visão tripersonal da Trindade
e, em vez disso, sua interpretação de Cristo tem algumas afinidades com a primitiva
heresia dos Ebionitas. Hartshorne também foi criticado por sua negação de presciência
divina e predestinação à salvação e sua desvalorização dos milagres de Cristo e dos
eventos sobrenaturais mencionados na Bíblia.
Outras críticas são que Hartshorne dá pouca atenção aos conceitos teológicos clássicos
da santidade de Deus e que o temor de Deus é um elemento subdesenvolvido em
seus escritos. Alan Gragg critica a visão altamente otimista de Hartshorne sobre a
humanidade e, portanto, sua falta de ênfase na depravação humana, culpa e pecado.
Aliado a essas críticas, a afirmação de que Hartshorne insiste demais na estética e é,
consequentemente, fraca na ética e na moral. Outros indicaram que Hartshorne não
conseguiu entender as opiniões cristãs tradicionais sobre a oração e a sobrevivência do
indivíduo na vida após a morte.
Ao negar o conhecimento que Deus possa ter de fatos ainda não ocorridos,
a teologia do processo põe em risco a credibilidade das Escrituras, pois
se Deus não tem nenhum conhecimento dos fatos ainda não ocorridos,
como pode fazer predições sobre o futuro? A consequência lógica do seu
45
sistema é que não pode haver predição “cem por cento” segura na Bíblia,
pois parece altamente improvável que um ser que não tenha presciência
plena dos contingentes futuros saiba o que acontecerá. A Bíblia afirma
categoricamente: “Deus não é homem para que minta”, mas se Deus
é ignorante em relação a grandes períodos da história futura, de que
maneira qualquer uma das profecias preditivas das Escrituras poderia
ser qualquer coisa além de probabilidades? A teologia do processo
aniquila a fé que o crente tem em Deus, e não somente isso mas também
retira o próprio Deus Soberano do cenário e introduz em seu lugar uma
divindade caricata, impotente, penteísta [sic] e consequentemente,
finita (GONÇALVES, 2006).
46
Capítulo 7
Teologia da evolução, de Chardin
Pierre Teilhard de Chardin (1881-1955) foi um sacerdote jesuíta cuja formação se deu
nas áreas de filósofo e paleontologia. Ele esteve entre aqueles que descobriram o Peking
Man (Homem de Pequim). Seus escritos teológicos têm sido extremamente difundidos
e estimularam muito a cultura popular em função de sua especulação e contemplação
sobre o papel de Deus na criação e evolução.
Ao fazê-lo, ele desagradou alguns membros da Cúria Romana, que considerou que isso
enfraqueceu a doutrina do pecado original. Devido a essa controvérsia, seu trabalho
foi negado a publicação durante sua vida toda. Suas obras teológicas são consideradas
muito apaixonadas (talvez também ideológicas), o que envolve tipos de discussões que
não agradam a muitos.
Trabalho científico
Chardin trabalhou como consultor do serviço geológico nacional chinês, criando o
primeiro mapa geológico geral da China de 1925 a 1935. Ele supervisionou a Geologia e
a Paleontologia das escavações de Choukoutien (Zhoukoudian) perto de Pequim.
Ele também realizou várias explorações no sul da China. Viajou nos vales do rio Yangtzé
e Szechuan (Sichuan) em 1934, e no ano seguinte, em Kwang-If e Guangdong. Chardin
participou da expedição de Yale – Cambridge de 1935 para o norte e centro da Índia
47
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Durante todos esses anos, Cardin contribuiu fortemente para a constituição de uma
rede internacional de pesquisa em paleontologia humana relacionada a toda a região
oriental e sul-oriental do continente asiático.
Nesta etapa de seu trabalho, ele contou com a ajuda de dois amigos, o canadense inglês,
Davidson Black e o escocês George B. Barbour.
Trabalho teológico
Ao longo dos anos da Primeira Guerra Mundial, Chardin desenvolveu suas reflexões em
seus diários e em cartas para sua prima, Marguerite Teillard-Chambon, que mais tarde
os editou em um livro: Genèse d’une pensée (Gênesis de um pensamento).
Em 1916, ele escreveu seu primeiro ensaio: La Vie Cosmique (vida cósmica), em
que seu pensamento científico e filosófico foi revelado como era a sua vida mística.
Ele pronunciou seu solene desejo de se tornar um jesuíta em Sainte-Foy-lès-Lyon, em
26 de maio do ano de 1918.
O Ponto Ômega
48
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Vladimir Vernadsky (autor de A Geosfera (1924) e The Biosphere (1926)), a Terra está
em um processo de transformação, metamorfose da biosfera para a noosfera.
Chardin viu a evolução como progredindo através das dimensões físicas e biológicas,
com crescente complexidade das espécies, sendo que a aparência dos seres humanos
seria como o último passo nessa fase. Os seres humanos, tendo a faculdade não só de
consciência, mas de consciência de serem conscientes, desenvolvem o domínio mental
do pensamento, a noosfera.
Em vez de a divindade ser encontrada “nos céus”, ele considerou que a evolução era
um processo convergente para uma “unidade final”, idêntico ao Eschaton1 e a Deus.
Assim, ele entendeu o papel de Cristo em sua Segunda Vinda como iniciando essa
convergência final.
Por sua vez, isso exige saber se a chave para a salvação humana é ou não a mediação da
Igreja Católica e seus sacramentos, ou se são as ações empreendidas pela humanidade
em direção ao Ponto Ômega e, assim, realizando a verdadeira Cristogênese.
1 Um período de tempo descrito em escritos escatológicos e cenários do dia do juízo.
49
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Não somente este, mas há centenas de milhares de cientistas cristãos e, por conseguinte,
teístas ao redor do mundo, que não descartam que a evolução que caminha juntamente
com a fé (Denis Alexander e Francis Collins são os maiores expoentes atualmente,
sendo este último o ex-diretor do famoso projeto Genoma Humano).
50
Capítulo 8
Paul Tillich e a busca pelo Jesus histórico
A partir de uma análise de sua trajetória pessoal, constata-se que os fatos ocorridos na
vida de Paul Tillich influenciaram sua Teologia considerada reflexo de sua própria vida,
principalmente depois de ter experiências com a morte em massa e a destruição de
muitas pessoas nos campos de concentração3. Entre suas obras, destaca-se Teologia
Sistemática (1951-1963) a síntese de seu pensamento global, hoje compilada em um
só volume, na qual o filósofo alemão descreve sobre o Jesus histórico (v. II, cap. II. A
realidade de Cristo, pp. 392-397).
2 Autor do artigo Paul Tillich e a busca pelo Jesus Histórico é graduado em Teologia pela PUC-RJ. Escreveu diversos artigos
e resenhas sobre Lucas, o evangelista, Ecumenismo, Rubem Alves, Karl Popper, Bertrand Russell, Joseph Fitzmyer, John
Watkins, John Meier, Paul Tillich, entre outros, para as revistas Inclusividade do Centro de Estudos Anglicanos, Ciberteologia
e Religião e Cultura da Paulinas/PUC-SP e Correlatio da Associação Paul Tillich do Brasil. Reside no Rio de Janeiro.
3 “A transformação ocorreu durante a Batalha de Champagne em 1915. Houve um ataque noturno. Durante toda noite não fiz
outra coisa senão andar sobre feridos e moribundos. Muitos deles eram meus amigos íntimos. Durante toda aquela longa e
terrível noite, grande parte de minha filosofia clássica ruiu em pedaços [...] Deus está morto. Pois bem, o conceito tradicional
de Deus estava mesmo morto” (CALVANI, 1998, p. 59).
51
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Paul Tillich é considerado uma das mentes mais destacadas no cenário filosófico-teológico
do século XX e um dos mais importantes teólogos, tendo contribuído especialmente na
reflexão sobre a necessidade de se compreender a religião em interação com a cultura
em geral. Teólogo e filósofo de linha existencialista, ele foi, juntamente com seus
contemporâneos Rudolf Bultmann (Alemanha), Karl Barth (Suíça), e Reinhold Niebuhr
(Estados Unidos), um dos quatro mais influentes teólogos protestantes do século XX.
O artigo de Júlio Fontana aborda como Paul Tillich, reconhecido teólogo sistemático,
encarou a busca pelo Jesus histórico. A origem da busca do Jesus histórico baseou-se
no pressuposto de que havia uma imensa lacuna entre a figura histórica de Jesus e
a interpretação que lhe fora atribuída pela igreja cristã. O “Jesus histórico” do Novo
Testamento correspondia à figura de um “mestre da religião”; a figura do “Cristo da
fé cristã”, portanto, resultava de interpretação equivocada por parte dos escritores da
igreja primitiva.
Desde 1774 a 1778, o cristianismo e a figura de Jesus Cristo – sua identidade e significado –
têm sido desafiados pelas incursões desta “busca”, por meio da metodologia racionalista
como método de pesquisa até a primeira metade do século XIX. Assim, ocorreram três
fases da pesquisa sobre o Jesus histórico, com pressupostos metodológicos diferentes a
partir da primeira busca já no final do século XVII e século XVIII, com o Iluminismo, à
terceira busca que se iniciou nos anos 1970 e perdura até os dias atuais.
Paul Tillich situa-se na época conhecida como No-Quest (Sem Busca), na transição da
primeira para segunda fase da busca pelo Jesus Histórico (Jesus o Cristo e o Jesus de
Nazaré, tomados como históricos em seu pensamento). Ao Jesus histórico não era dada
tanta importância como para o Cristo da fé.
Esta tentativa foi considerada “perigosa”, uma vez que a pesquisa poderia ser levada ao
radicalismo pela crítica moderna, como expressa Champlin (1997, p. 499):
52
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
V. Eticista (Klausner).
Júlio Fontana empregou como pressupostos filosóficos autores como Meier (1992);
Theissen; Merz (2002); Schweitzer (2003); Brown (2004); Jeremias (2005); Bornkamm
(2005), além da Teologia Sistemática de Tillich (2005), entre outros. Tomando como
base a cristologia desenvolvida por Tillich, Fontana faz um levantamento da principal
ideia cristológica com o propósito de aprofundar o entendimento do pensamento
tillichiano acerca do Jesus Histórico e do processo da fé neste Jesus.
A Teologia de Tillich
A obra de Tillich tem como pressupostos filosóficos básicos a Filosofia Existencialista,
uma vez que sua preocupação última é o que determina “o ser ou não ser” (só são
53
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
teológicas aquelas afirmações que tratam de seu objeto na medida em que possa se
tornar para nós uma questão de ser ou não ser). A partir desse significado da Filosofia
Existencialista é que deve ser entendida a sua Teologia Sistemática.
Para Tillich, não é importante a historicidade dos fatos bíblicos, mas a interpretação
existencial e ao recebimento desta como resposta à questão última. Ele usa as ferramentas
filosóficas existenciais, tendência do pensamento humano de sua época, adaptando-as
à Teologia.
Tillich adota o método histórico-crítico que une elementos analíticos e críticos, os quais
submetem suas fontes a uma rigorosa crítica separando o que é mais provável do que
é menos ou é totalmente improvável, e elementos construtivo-conjecturais que são a
força motriz, buscam os fatos subjacentes aos registros bíblicos, especialmente os fatos
referentes a Jesus. Este método predominou como método interpretativo a partir da
Renascença e foi desenvolvido e empregado durante o século XIX, graças ao esforço
de Hugo Grotius, Richard Simon e Baruch Spinoza, tendo como apoiadores Fitzmyer,
Mueller, Harnack.
O Jesus Histórico
Quanto à história da pesquisa sobre Jesus histórico e à crítica de Paul Tillich acerca
desta pesquisa, o filósofo alemão diz que “Jesus, o Cristo” deve ser percebido como
um fato histórico, ou seja, Jesus histórico, enquanto objeto de recepção da fé.
Afirma que “ficou cada vez mais evidente que a afirmação cristã de que Jesus é o Cristo
não contradiz a honestidade histórica, por mais inflexível que ela seja” (TILLICH, 2005
p. 398).
O teólogo comenta que aqueles que falam sobre Jesus de Nazaré são os mesmos que
falam sobre Jesus como o Cristo, ou seja, as pessoas que o receberam como o Cristo.
Portanto, na tentativa de encontrar o Jesus real que está por trás da imagem de Jesus
como o Cristo, é necessário separar criticamente os elementos que pertencem tanto ao
lado factual do evento quanto aos que pertencem à recepção.
54
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Ao fazer isso, esboça-se uma “Vida de Jesus” (e quantos esboços foram feitos!), alguns
caracterizados pela honestidade científica, a devoção amorosa e o interesse teológico e
outros caracterizados pelo distanciamento crítico e rejeição. Mas eram mais romances
do que biografias e certamente não podiam conferir um fundamento sólido à fé cristã.
Percebe-se, portanto, em sua Teologia Sistemática, que o filósofo não deu muita
importância a uma construção do Jesus histórico segundo os moldes da historiografia
(por mais que valorizasse a historiografia), e ele a considerou como um “fracasso”.
Assim sendo, propôs um novo olhar para se entender o Jesus na história, uma vez
que os motivos dessa busca eram religiosos e científicos, uma tentativa de descobrir
fatos confiáveis sobre o ser humano Jesus de Nazaré, para que pudessem proporcionar
um fundamento seguro à fé cristã. Porém, para o teólogo, a pesquisa histórica apenas
forneceu probabilidades maiores ou menores sobre Jesus (MCGRATH, 2005).
Para Tillich, Jesus é aquele que traz o “Novo Ser redentor”, conferindo um novo sentido
para a revelação do mistério de Deus. Seguindo a linha de sua reflexão cristológica,
Tillich indica que com Jesus Cristo “a história chegou ao fim”, ou seja, à sua meta
qualitativa, enquanto traduz o “aparecimento do Novo Ser como realidade histórica”.
Para ele, Jesus é o homem que venceu a soberba, a angustia, a libido e o desespero. E por
isso ele se tornou o Cristo. Tal manifestação de Deus em Cristo tem um poder salvífico
55
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Na visão de Tillich, no evento de Jesus como o Cristo “a unidade eterna de Deus e ser
humano se tornou realidade histórica”, fazendo emergir o “Novo ser na totalidade de
seu ser”, mas não se pode com isso desconhecer a finitude autêntica de Jesus: “como ser
finito, ele está sujeito à contingência de tudo que não é por si mesmo, mas que é lançado
à existência”. Há uma relação paradoxal entre Jesus e o Cristo. Se para Tillich, o Cristo
está no centro da dinâmica reveladora de Deus, Jesus não é o todo deste centro (idem,
ibidem, p. 419).
Alguns filósofos consideram Tillich o “último liberal” e opositor de Karl Barth e Emil
Brunner; outros o definem como neo-ortodoxo, com influência da Teologia Liberal
(entendimento da revelação e das fontes da Teologia) e da neo-ortodoxa (uso da Filosofia
Existencialista como base para a reflexão teológica). Percebe-se que, para Tillich, a
Teologia Sistemática necessita de uma Teologia Bíblica que seja histórico-crítica, mas
que seja, ao mesmo tempo, interpretativo-existencial, levando em conta o fato de que
ela trata de assuntos de preocupação última (MCGRATH, 2005).
Buscando relacionar o tema Jesus histórico com outros autores e ideias observa-se que
grupos de historiadores, filósofos, teólogos expuseram suas argumentações sobre o
Jesus histórico e o Cristo da fé para construção de uma “Vida de Jesus”.
Entre os diversos filósofos, Fontana destaca alguns liberais como Baur (1792-
1869), Strauss (1808-1874), Renan (1823-1892), Holtzmann (1832-1910) e Weiss
(1863-1914). Mais tarde, entre os anos de 1890 a 1910, Kahler (1835-1920), Wrede
(1859-1906) e Schweitzer (1875-1965), seguido pelo teólogo alemão Bultmann
(1884-1976), importante expoente da Teologia Dialética, que considerava essa busca
pelo Jesus Histórico “um beco sem saída”.
56
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Baur defende a ideia de que os textos do Novo Testamento, mesmo passando pelo
crivo da crítica moderna, não retratam a vida de Jesus, e sim, os conflitos vividos pelos
primeiros cristãos, sendo os escritos bíblicos criados de maneira histórica. O propósito
da Teologia Liberal era o de encontrar os fatos puros da vida de Jesus.
Renan cita que no começo se encontra o Jesus manso e meigo, que se empenha na
Galileia para pôr em prática o Reino de Deus na terra. Motivado por sua permanência
em Jerusalém, este Jesus teria evoluído para um revolucionário, que passa a interpretar
o reino de Deus apocalipticamente, e pronto a dar a vida para a realização de seus planos.
Em “um relato vivo, humano, possível” define Jesus como um herói e gênio pelo papel
que sua vida representou para a humanidade, pois [...] “um simples feiticeiro não teria
encaminhado uma revolução moral como a que Jesus fez” (RENAN, 2003, p. 35 e 277).
Holtzmann pesquisou a vida de Jesus, realizando sua evolução biográfica com o ponto
crucial em Marcos 8: “na Galileia formou-se a consciência messiânica de Jesus, em
Cesareia de Filipe ele se revelou aos discípulos como Messias”. Weiss considera que
o reino de Deus em Jesus teria que ser visto como algo apocalíptico e escatológico.
Harnack julgou poder alcançar uma descrição razoável do homem empírico, Jesus de
Nazaré, por meio dos métodos da ciência histórica. Para ele, seria possível chegar a uma
definição do cristianismo original.
Kahler dizia que não havia separação entre o Jesus histórico e o Cristo da fé, mas que o
Jesus histórico é o mesmo Cristo da fé. O objeto da fé da igreja no decurso de todos os
séculos não foi o Jesus histórico do liberalismo teológico, mas o Cristo da fé, o Cristo
sobrenatural proclamado nas Sagradas Escrituras. Porém, ressalta que o Jesus histórico
retratado pelos estudiosos modernos oculta do homem o Cristo vivo. Para o filósofo, o
Cristo real é “aquele que é pregado”, mostra que há uma tendência cada vez maior em
se acentuar a separação do Jesus histórico do Jesus querigmático.
Wrede considera o evangelho de Marcos como o mais primitivo e o que mais diretamente
conduziu ao Jesus da história. Porém, Marcos não é nada mais que o produto da
57
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Bultmann (2005) teve a posição mais radical sobre Jesus da história e o Cristo da
fé. Reconhece como algo de inegável a existência histórica de Jesus Cristo, porém
combinava a pesquisa histórica radical com a tentativa de sistematização. Chamava-a,
com já falamos, “desmitologização” (ou demitização): libertar a mensagem bíblica
da linguagem mitológica em que se expressava para que o homem moderno que não
aceita a visão de mundo da Bíblia possa aceitar a mensagem bíblica. Para o discípulo
de Bultmann, Ernst Kasemann, falar do Cristo da fé sem relação com Jesus Histórico é
considerá-lo apenas um mito (HENRY, 1971, p. 18).
Contudo, Bultmann (2005) achava que tudo que fosse possível ou necessário saber
sobre o Jesus histórico era o fato de que ele existiu, e afirmou que o Jesus que sustenta a
igreja é o Cristo da fé. Por outro lado, salientou que se conhece a figura de Jesus apenas
numa transformação helenística, sincretista, mitológica, sendo impossível libertar
deste invólucro o Jesus histórico (ZUURMOND, 1998, p. 34).
Meier (2003, p. 35) pontua que é necessário considerar que os critérios utilizados pela
historiografia são apenas mais ou menos prováveis, “pois raramente se chega a uma
certeza na investigação do Jesus histórico”. E afirma que:
Nessa mesma linha, Crossan (1994) argumenta que Jesus era um filósofo cínico judeu e
um “mago”. “Ele rejeita a ideia de que Jesus se dirigisse a Deus chamando-o de ‘Abba’,
a escolha de um seleto grupo de doze, ou falasse sobre o advento futuro do reino”
(RAUSCH, 2006, p. 37). Para ele, o Jesus Cristo dos Evangelhos é um Jesus mítico, um
58
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Stott (2012) ressalta que a Bíblia confirma pelas suas afirmações que Jesus é o Cristo.
Aliás, para ele, o cristianismo é baseado nas afirmações do próprio Jesus. Essas duas
vertentes convergem na unicidade de Jesus. O kerigma da igreja deve centrar-se em
Cristo, e este crucificado (1 Cor. 2, 2).
Na visão de John Hick (2000, p. 66), a ideia de encarnação não pode ser compreendida
em sentido literal, mas em sentido metafórico. Hick indica que “o Jesus histórico não
ensinou que ele era Deus ou o Deus Filho, a segunda pessoa, encarnada, de uma Santa
Trindade”. Sua consciência era a de um “profeta enviado por Deus”, alguém marcado
por intensa consciência de Deus, que se tornou fonte de inspiração e seguimento
para os seus ouvintes. A metáfora bíblica do “Filho de Deus”, presente nas escrituras
hebraicas, vem transformada numa doutrina metafísica da encarnação, rígida e literal:
“um filho de Deus metafórico se transforma no Deus Filho metafísico, segunda pessoa
da Trindade”.
4 Coalisão internacional, centrada nos Estados Unidos, que reúne eruditos e estudiosos da Bíblia. Em debates intensos, o
Seminário procura atestar a veracidade do que foi escrito nos evangelhos neotestamentários a respeito da vida e das palavras
de Jesus. Seus estudos têm por base o Evangelho de Tomé, o Evangelho de Pedro, o Evangelho de Filipe, escritos extrabíblicos
que são a chave para se reconstruir corretamente o Jesus histórico. O fundador do seminário foi o teólogo Robert W. Funk em
1985 e seu cofundador e copresidente John Dominic Crossan. O grau com que os Evangelhos têm supostamente distorcido o
Jesus histórico é evidente na edição dos Evangelhos publicada pelo Jesus Seminar (CRAIG, 2012).
59
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Percebe-se que o Jesus histórico, o Jesus que está por trás dos símbolos de sua recepção
como o Cristo, se distancia cada vez mais à medida que avança a crítica histórica.
Aliás, há distanciamentos e aproximações em relação a Jesus. A elaboração de veredictos
históricos e teológicos em relação à pessoa de Jesus/Cristo resulta em um paradoxo
entre a certeza de alguns e a dúvida de outros estudiosos.
Quase quatro séculos de pesquisa sobre a vida de Jesus deixaram um grande legado
para a Teologia, no entanto, em pleno século XXI, mesmo Jesus de Nazaré exercendo
uma atração nos corações de centenas de pessoas, a busca pelo Jesus histórico
ainda é, até certo ponto, baseada no racionalismo, tendo a razão como critério para
determinar a historicidade ou não dos relatos evangélicos (tentativa também criticada
por Tillich).
Acredita-se, pela análise da crítica de Tillich e dos outros filósofos citados, que ainda
não há consenso entre os pesquisadores quanto ao Jesus que buscam reconstruir desde
o século XVIII. Bultmann parece ser o divisor de tendências dentro da cristologia
moderna e que afeta, ainda hoje, a pesquisa cristológica.
Tillich adotou este método que assumiu desde o início pressupostos dogmáticos que
refletem rejeição da autoridade e infalibilidade das Escrituras. Ainda hoje este método
60
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Por conseguinte, aqueles que querem saber quem foi Jesus historicamente no sentido
estrito, crítico-científico, não se dão por satisfeitos. A reconstituição histórica da vida
de Jesus volta aos estudos e discussões, com interesses e métodos já diversificados, em
que a mensagem do Cristo da fé está inscrita na própria existência histórica de Jesus, na
sua práxis, no seu modo de enfrentar a realidade histórica na qual ele vive.
Lopes (2005, p.137) afirma que “o método deve ter como pressuposto a inspiração,
a veracidade das Escrituras e a unidade do cânon formal”; que tenha sensibilidade
ao fazer os estudos modernos de ciências correlatas para que possam trazer auxílio à
interpretação do texto bíblico.
Mas em ambos os momentos, o Jesus das Escrituras cristãs é o Cristo da fé, porque os
evangelistas tiveram como objetivo escrever uma “Vida de Jesus”. O filósofo alemão,
porém, separa Jesus o Cristo do Jesus historiográfico, sendo o primeiro mais importante
que o segundo. Para ele, “Cristo deve ser o centro do processo histórico que se inicia
com a questão do Não Ser” (TILLICH, 2005, p. 391).
Entretanto, o autor expõe que o entendimento de que Jesus é o Cristo prometido é que
norteia todo o pensamento cristão. Ele diz: “O Cristo não é o Cristo sem a Igreja, e a
Igreja não é Igreja sem o Cristo. A revelação final, como toda revelação, é correlativa”
(TILLICH, 2005, p. 68).
Flusser (2002, pp. 31 e 32) ressalta em seu livro “Jesus”, que o objetivo principal é
mostrar que “é possível escrever a história de Jesus” [...]; que o “Evangelho de João é o
menos histórico dos quatro evangelhos, enquanto aponta o Evangelho de Lucas como o
que possui maior valor histórico”.
Em contraponto, Gulillet (1985, p.7) afirma que “o Evangelho de João é um dos que
melhor apresenta Jesus, sendo considerado como o evangelho puro”.
61
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Entende-se que, necessariamente, não se deve concordar com as conclusões a que chega
o ceticismo de Tillich sobre Jesus histórico, mas há que se considerar que ao criticar
esse tema, inúmeros materiais históricos foram descobertos e suas argumentações
refletem conjunturas e realidades peculiares à modernidade do século XX; apontam
para o discernimento entre os elementos empiricamente históricos, e para a percepção
de que a certeza da fé não implica certezas sobre as questões da pesquisa histórica.
Esses teólogos consideraram difícil conciliar o discurso que se fazia a respeito de Cristo
e os relatos do evangelho a respeito do homem que viveu na Galileia no primeiro século.
Contudo, o escopo da pesquisa histórica foi contribuir para o enriquecimento do debate
teológico sobre a questão do Jesus histórico e do Cristo da fé. Todos, de alguma forma,
trouxeram elementos enriquecedores ao tema. E Paul Tillich, ao fazer isso, adentrou
no caminho da tentativa de conciliação entre História, Razão e Fé. Conciliar fé e razão
sempre foi um desafio para o cristianismo.
Há registros históricos que confirmam fatos do cenário em que Cristo viveu, sendo em
seu tempo, cultura, governantes e guerras. Esses fatos contemporâneos a sua época
comprovam sua existência. Um importante historiador secular dá ênfase à figura de
Cristo como Messias. Flávio Josefo por volta do ano 90 depois de Cristo relata fatos de
pessoas contemporâneas a Cristo e ouviu e descreveu seus relatos.
Flávio Josefo, que viveu de 37 a.C. até o ano 100, de acordo com os textos que chegaram
até nós teria se referido a Jesus como o Cristo em seu livro Antiguidades Judaicas, livro
18, parágrafos 63 e 64, escrito em 93 em grego koiné:
62
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
É correto afirmar que a contribuição da obra de Tillich foi apresentar o Jesus da História
dentro de uma perspectiva teológica e de forma sistemática. A maioria de suas obras
aborda com profundidade os aspectos de sua Teologia, por isso, a abordagem teológica
do Jesus histórico é um diferencial.
Jesus histórico é um tema que ainda deixará rastros importantes na reflexão sobre
Jesus Cristo e a dinâmica de seu seguimento na história.
Por fim, o cristão pode estar confiante de que os fundamentos históricos de sua fé
permanecem seguros, considerando que a fé não depende dos resultados históricos e
teológicos dessas pesquisas e de outras que virão, mas da realidade histórica dos fatos
acerca da vida de Jesus, uma vez que a historicidade dos seus milagres e a ressurreição
são fundamentos da fé cristã.
63
Capítulo 9
A teologia sistemática de Pannenberg
Crescendo durante a era nazista, ele foi pressionado para o serviço militar durante os
últimos dias do Terceiro Reich – uma experiência que ajuda a explicar a sua cautela de
todas as promessas ideológicas e políticas. Ao contrário, mais uma vez, de Bultmann e
sua coisa com o nazismo.
Em 1958, foi nomeado professor de Teologia Sistemática (assunto pelo qual ele seja mais
conhecido e difundido) em Wuppertal, um seminário teológico. Importantes posições
universitárias seguidas, primeiro em Mainz (1961) e depois em Munique (1968).
Pannenberg insistiu que era uma reflexão racional que o levou à fé cristã. E por isso a
questão da Fé Racional e suas vertentes apologéticas dentro de seus escritos influenciam
tantos apologistas, em especial, o maior de todos contemporâneos: William L. Craig,
que faz menção de Pannenberg o tempo todo em suas obras.
64
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Em vez disso, como G.W.F. Hegel (1770-1831) sugeriu no início do século XIX, Deus é
revelado por meio da história (ou da realidade) como um todo, e a revelação de Deus
pode ser reconhecida e entendida pela razão. Claro, nenhum ser humano realmente
conhece toda a história, sendo limitado pelo tempo e espaço. Além disso, o histórico
ainda não está completo e, portanto, não pode ser completamente compreendido.
No entanto, não se deve começar com doutrinas sobrenaturais sobre a pessoa e obra
de Jesus – que ele era o Filho de Deus encarnado, a Segunda Pessoa da Trindade ou o
Logos Divino. Em vez disso, essa cristologia tradicional “de cima” deve ser substituída
pelas conclusões que resultam de métodos estabelecidos de erudição histórica, ou
cristologia “de baixo”.
É somente quando se estuda o Novo Testamento com honestidade tão absoluta que
o evento da ressurreição de Jesus torna-se reconhecido como fato histórico objetivo,
confirmando assim a alta cristologia do Novo Testamento que Jesus era “descendente
de Davi segundo a carne”, mas foi “designado filho de Deus... por sua ressurreição
dentre os mortos” (ROMANOS 1: 4).
65
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Além disso, ele considerou a religião autêntica como uma resposta à realidade como um
todo, incluindo religiões mundiais, e não apenas cristianismo paroquial e institucional.
Portanto, Pannenberg argumenta que o lar adequado para a Teologia não é a Igreja
Institucional, mas a universidade, onde as proposições do teólogo devem ser defendidas
e corrigidas, e não apenas afirmadas.
Principais contribuições
Seria impossível resumir o corpo de trabalho de Pannenberg ou medir o significado
de sua contribuição para o pensamento cristão contemporâneo. Mas há alguns pontos
principais que podem ser levantados acerca de seu trabalho.
Como sua preocupação era apresentar a Teologia Cristã como algo coerente e consistente,
ele trabalhou duro para tecer essas várias linhas de pensamento em uma única e
impressionante linha de raciocínio conceitual. Se Deus determina toda a realidade,
então, quando vemos a realidade em sua luz, devemos ser capazes de compreendê-la.
É isso que torna a leitura Pannenberg ao mesmo tempo difícil e estimulante.
66
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Pannenberg enfatizou a mesma humildade em face do mistério de Deus, mas ao ver isso
dentro de um quadro escatológico, ele ofereceu uma nota de confiança que muitas vezes
faltava nas discussões tradicionais de linguagem analógica. Ainda não podemos ver a
verdade de Deus, mas temos razões para acreditar que sim.
O teólogo alemão levou a Bíblia e a tradição cristã muito a sério. Ele não estava disposto
a permitir que a Teologia flua livremente em uma espécie de especulação não protegida.
Pannenberg sabia que a Teologia deve ser sobre Deus. É a tentativa humana de pensar
e falar de Deus e, ao fazê-lo, mostrar a verdade da realidade de Deus.
Wolfhart Pannenberg estava convencido de que o fim da vida humana, e mesmo o fim
da história, são uma entrada no futuro de Deus, estabelecida na ressurreição de Jesus.
67
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Sobre Pannenberg:
Deus existe? William Lane Craig versus Stephen Law. Disponível em: <http://
www.reasonablefaith.org/portuguese/deus-existe-william-lane-craig-versus-
stephen-law#ixzz44CZOFtGk>.
68
Capítulo 10
Teologia da libertação
Pe. Gustavo Gutiérrez Merino (1928-) trouxe esses pensamentos para América
Latina em 1977. Alguns anos depois, a igreja católica percebeu algo estranho nessa
Teologia a mandou Ratzinger, enquanto cardeal, analisá-la, concluindo uma forte
incompatibilidade com os dogmas cristãos tradicionais (CARVALHO, 2015).
Bakas e Buwalda (2011, p.62, grifo nosso) também afirmam que a “Igreja Católica via
esse movimento como uma renovação da mensagem de Cristo, mas quando a Teologia
da Libertação ficou mais marxista, o Vaticano reagiu, excomungando alguns de seus
porta-vozes mais importantes”. Já na década de 1990, “o neoliberalismo assumiu o
cenário mundial e o Marxismo foi de repente visto como ultrapassado”, e, com isto, “a
Teologia da Libertação perdeu grande parte de sua influência”.
69
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Para Carvalho (2015) ainda, a Teologia da Libertação possui basicamente duas vertentes
de discurso, o descritivo-teórico, e o apelativo, que é unificador da militância, sendo
que este último não está interessado no aspecto teológico.
70
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Pedro ou João. Ela é mais marxista que bíblica, e mais filosófica que
teológica. Em seu afã de refutar as teologias não ortodoxas do seu tempo,
Moltmann ultrapassou o limite do bom senso e acabou por propor uma
Teologia quase tão nociva quanto aquela a que ele se dedicou a refutar.
Essa Teologia do Deus finito e temporal, e que ainda incita a rebeldia e
a revolução, não pode ser Teologia Bíblica. Ela é antes, um tropeço, um
escândalo e uma nociva ameaça à sã doutrina.
A Teologia da Libertação foi, então, ao longo das décadas de 1970 e 1980 uma
alternativa mais política e ideológica às ações de cunho social praticada pelas Igrejas.
Diga-se “Igrejas”, porque, embora em seu nascedouro existisse uma orientação católica,
várias Igrejas Protestantes também seguiram o mesmo caminho, embora mantendo a
identidade religiosa.
Quanto ao termo “libertação”, Champlin (1997, p.367) comenta “que faz parte do título
do movimento, é verdade que os oprimidos precisam ser libertados, e que eles estão em
uma genuína servidão econômica.” Contudo, “o que podemos questionar é o ‘tipo’ de
libertação que está sendo oferecido.”
71
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Após a 2a Guerra Mundial, a lógica da Guerra Fria ideologizou a vida social de tal
modo, que, mesmo sem perceber, os indivíduos pautavam suas ações em conteúdos
ideológicos. Sendo um fato social de grande importância, a religião dificilmente fugiria
ao apelo das ideologias.
Foi assim que, sob os auspícios do Concílio Vaticano II, eclodiu na América do Sul a
Teologia da Libertação, movimento social de caráter humanista, voltado para as classes
oprimidas da sociedade e que, embora não tivesse em sua gênese uma orientação
marxista, acabou se aliando aos movimentos de esquerda no contexto das Américas,
uma vez que não se dispunha de outro modelo de luta contra o capital e a opressão no
âmbito do continente.
Nas palavras diretas de Boff (2011) podemos entender mais algumas relações importantes
da Teologia da Libertação com a questão social:
72
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Contudo:
73
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Champlin (1997, p.369, grifo do autor), de modo mais contundente ainda, prossegue
nos discursos acerca da relação desta questão com abordagens políticas:
[...] pode servir como um veículo para que os membros das classes mais
inferiores se libertem, não por meio de uma revolução socioeconômica
como a Teologia da Libertação prega, mas pela integração em um
movimento religioso que oferece grande mobilidade social interna.
74
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Este pensamento é bastante próximo do que afirmava Max Weber em A Ética Protestante
e o Espírito do Capitalismo (2008) acerca do ascetismo protestante, em que, por meio
dele, é que os protestantes geraram o espírito do capital, ao salvaguardar-se, bem como
seus recursos, por conseguinte, dos prazeres do mundo. Com isto, a economia e a
responsabilidade com a família aumentavam.
Tanto a TL quanto a TMI, embora não assumam com todas as letras suas vertentes
provenientes do pensamento marxista, sofreram danos após 1990, com o colapso das
economias socialistas do Leste Europeu. A queda do Muro de Berlim e o fim da URSS
projetaram uma sombra sobre tudo que possuísse algum tipo de conotação social e
abriram caminho para uma hegemonia absoluta dos mercados e do que isso representa
para o mundo em geral.
Até certo ponto é possível associar essa sombra com a escalada abrupta do
neopentecostalíssimo e, consequentemente, com o crescimento das igrejas que
professam a Teologia da Prosperidade que, embora tenha chegado bem antes ao país, só
atingiu os níveis atuais após o final da década de 1980, disseminando um individualismo
teológico que rompe com princípios mínimos de fraternidade, pregando uma ideologia de
enriquecimento sem causa, privilegiando a riqueza material, em detrimento dos valores
religiosos tradicionais; alinhando-se, enfim, aos valores do mercado e do sistema capitalista.
Contudo, na verdade, isto mais parece com um “tiro no pé”, pois uma pesquisa feita em
2002 pelo Projeto de Atitudes Globais do Pew Center descobriu que as nações mais
ricas tendem a dar menos importância às religiões de que as nações mais pobres. Com
exceção dos EUA, é evidente que a Ásia (tal como seus representantes Japão e Coreia),
enquadram-se bem nesta pesquisa (BAKAS; BUWALDA, 2011).
75
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Na próxima Unidade falaremos mais acerca das questões marxistas, pois há muito o
que se falar e estudar sobre os pensamentos de esquerda no tocante às concepções
marxistas. No próximo Capítulo daremos enfoque ao que começamos a tratar: sobre a
Teologia da Prosperidade. Mas antes, falemos um pouco de Hermenêutica e Teologia
da Libertação, uma vez que a questão do entendimento da solidariedade se pauta por
demais em contextos de má interpretação das Sagradas Escrituras.
Com o avanço da ciência e da técnica não demorou muito para que todas as ciências em
nascimento, inclusive a Teologia, se rendessem a sedução dos pressupostos científicos,
o que resultou em uma Teologia que removia o elemento sobrenatural da Bíblia.
Segundo Shaeffer, este modelo ainda que empregue palavras com aparente conotação
cristã, na verdade as usa de forma ambígua, e com outras significações. O resultado é
uma Hermenêutica que não traduz sequer a experiência existencial, quiçá a Bíblia.
76
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Destaca-se aqui que, para este pregador e pensador cristão, a pessoa que lê sem
interpretar na verdade não lê. Para Spurgeon a leitura da Bíblia é um ato de interpretação.
Esta abordagem está em acordo com o conceito lexical de leitura.
Muito do véu que cobre as Escrituras não tem a finalidade de esconder o significado
daquele que é diligente, mas sim, tem como objetivo estimular a mente a ser produtiva,
pois a diligência do coração na ânsia por conhecer a mente divina faz com que ele seja
aperfeiçoado, sendo isto melhor do que o conhecimento em si mesmo (SPURGEON,
2010, p. 70).
Já quanto aos métodos contemporâneos é possível situar no campo ortodoxo o que Dick
(2001) chamou de Hermenêutica Canônica. Dentro desta metodologia de interpretação,
alguns textos aplicados à pessoa de Jesus foram distorcidos de forma a parecerem ser
profecias exatas, às quais os cristãos poderiam recorrer sempre que necessitassem de
um texto prova a fim de demonstrar o caráter messiânico da vida de Jesus.
77
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Exemplificando como isso funciona na prática, o texto que fala da fuga de José para o
Egito, como também o texto do profeta Oséias em seu respectivo contexto. O profeta
vaticina: quando Israel era menino, eu o amei e do Egito chamei meu filho (OSÉIAS
11.1). Considerações atentas ao contexto possibilitam a constatação de que o profeta
está falando da história de Israel e de sua inclinação constante à apostasia (OSÉIAS 11.
2, 3), oposta ao amor de Deus (OSÉIAS 11. 3, 4).
Qual seria então a relação existente entre o filho de Deus e este texto? Aprofundando-se
no contexto de Oséias, ali indica que Israel é comparado a uma vide luxuriante.
Tal comparação remonta à fala profética que compara Israel com uma vide plantada
por Deus. Como na mensagem de Jeremias: “eu mesmo te plantei como vide excelente,
da semente mais pura, como, pois te tornaste para mim uma planta degenerada, como
vide brava?” (JEREMEIAS 2.21).
Deus plantou Israel, mas Israel não deu os frutos esperados (ISAÍAS 5. 1-7; LUCAS
13.6-9). Estes relatos mostram que onde Israel, o filho de Deus errou, Jesus, o Filho
do Deus vivo triunfou, por meio de sua obediência até a morte (FILIPENSES 2. 6-11).
Por este motivo ele exclama: “Eu Sou a videira verdadeira, e o meu pai é o agricultor”
(JOÃO 15. 1).
Desta forma, este tipo de interpretação resolve alguns problemas entre Velho e Novo
Testamento sem ter de recorrer às alegorizações e tipologizações das escolas de
interpretação primitivas e da Hermenêutica Medieval. O resultado é que Jesus cumpre
as expectativas depositadas outrora sobre Israel.
78
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
79
Capítulo 11
Teologia feminista e ecofeminismo
de Ruether
Foi Reuther quem cunhou o termo God/dess para expressar a inadequação da linguagem
tradicionalmente masculina da Teologia. Seu livro Sexism and God-Talk tornou-se um
texto clássico para o tratamento sistemático da tradição judaico-cristã do ponto de vista
do feminismo.
Um escritora prolífica, ela lidou com temas diversos, incluindo as raízes do antissemitismo,
o conflito árabe-israelense, os patrísticos, as mulheres na religião americana, a Teologia
da Libertação, a mitologia da Mesopotâmia e a ecologia.
Defensora da ordenação das mulheres e dos direitos do aborto, Reuther expressou sua
decepção na adesão do Papa Bento XVI à Santa Sé. Ela também foi uma crítica franca
da guerra desde a era do Vietnã e continua este trabalho hoje em oposição à política dos
Estados Unidos em muitas áreas de assuntos internacionais.
Em seu primeiro livro, The Church Against Itself (1967) criticou fortemente a doutrina
católica, e muitas de suas outras primeiras publicações atacaram as visões católicas
tradicionais da sexualidade.
80
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Deus não pode ser realmente dito ser masculino ou feminino, algo em que os próprios
autores bíblicos perceberam em sua crítica à idolatria. Reuther cunhou o termo Goddess
(Deusa em português) tanto como uma crítica da linguagem teológica dominada (e este
termo lembra bastante o discurso da dialética marxista: dominado e dominante na luta
de classe) pelos homens quanto para enfatizar que de fato não possuímos um nome
adequado para Deus.
Ruether argumentou que, para se livrar de sua tendência antissemita, a igreja deve
reexaminar radicalmente sua cristologia. Particularmente, os cristãos não devem mais
esperar que os judeus aceitem Jesus como seu Messias.
Reuther voltou um olhar igualmente crítico para a tradição do patriarcado na Igreja, bem
como na sociedade do antigo Israel. Ela defendeu uma nova cristologia feminista,
aplicando o conceito de desmistificação (não confundir com a desmitologização de
Bultmann) para tirar o conceito de Cristo de suas “imagens masculinas tradicionais”.
Para ela, o Jesus dos evangelhos sinópticos é um profeta totalmente iconoclasta que
visava estabelecer uma nova ordem social, não só em termos de justiça, mas também
em termos de relações de gênero.
81
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Ela, assim, ousou incluir ideias da antiga religião politeísta do Oriente Médio, da
tradição clássica “pagã”, dos ensinamentos cristãos “heréticos” e da literatura pós-cristã
do liberalismo e do marxismo, bem como das escrituras judaico-cristãs e da Teologia
Cristã “Ortodoxa”.
O pecado é superado por uma mudança radical de coração, de modo que os valores e
a visão de Jesus sejam colocados no centro da própria vida e também sejam adotados
pela comunidade. A salvação não está em algum futuro reino escatológico, mas começa
na Terra no aqui e agora.
A realização do reino de Deus envolve a ponte entre “o que é e o que poderia ser”. Os
seres humanos devem comprometer-se incessantemente a trabalhar para estar em um
relacionamento correto com Deus/dess, um ao outro e o mundo natural.
Ecofeminismo
Outra ênfase no trabalho de Ruether é a crise ecológica. Começando com uma crítica do
conceito bíblico de “domínio” humano, ela se move para uma análise do conceito liberal
de “progresso” como essencialmente falho.
O Marxismo reconheceu, com razão, que a educação e a reforma política não podem
resolver o problema, mas não conseguiu ver que a expansão da economia global não
pode continuar indefinidamente devido aos problemas de superpopulação e a escassez
final de terras e recursos. O ideal romântico de um “retorno à natureza”, por outro
lado, tende a idealizar sociedades primitivas que eram tanto exploradoras quanto
não saudáveis.
82
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
talvez até mesmo “problemas periódicos” em circunstâncias históricas que nem sempre
são possíveis de prever.
No último mês do ano de 2017 Reuther continua em atividade, além de seu trabalho
em andamento como professora e escritora, Reuther continua a falar sobre vários
problemas políticos, sociais e eclesiásticos.
Desde 1985, ela atuou como membro do conselho do grupo de direitos de aborto
“Católicos para a escolha” (CFC). Continuou a escrever sobre o tema do antissemitismo
cristão e, ao mesmo tempo, assumiu uma atitude altamente crítica em relação à política
de Israel em relação aos palestinos.
Ela também foi uma adversária franca da política dos Estados Unidos na sequência dos
ataques de 11 de setembro. Em 2008, o Departamento de Teologia e Estudos Religiosos
da Universidade Católica de São Diego declarou sua intenção de eleger Ruether como
presidente da Teologia Católica Romana para o ano letivo de 2009-2010. Esta decisão
foi posteriormente rescindida quando membros da comunidade do campus protestaram
que seu trabalho acadêmico era incompatível com a fé católica.
Rosemary Reuther tem sido uma voz importante na promoção de uma crítica feminista
da Teologia tradicional. Sua metodologia de uso da análise crítica histórica para ir além
das atitudes patriarcais da Bíblia hebraica e a Teologia dos Pais da Igreja abriram o
caminho para a criação de uma Teologia sem gênero no novo milênio.
Ela tem quase 500 artigos e mais de 30 livros publicados, entre suas obras mais
conhecidas, são:
83
Capítulo 12
Teologia da prosperidade
Aspectos Iniciais
A Teologia da Prosperidade (TP) surgiu de algumas seitas sincréticas da Nova
Inglaterra, no início do século XX e está mais voltada para a questão da religiosidade
do que religião em si. Ou seja, também é conhecida como “confissão positiva”, “palavra
da fé”, “movimento da fé” e “evangelho da saúde e da prosperidade”, é aquele que vive
da aparência, pois o exterior não importa.
Que contribui mais, ganha mais benefícios de Deus, e quem menos, bom, continua
dependendo do ato solidário de outrem. Ao contrário do que se imagina, as principais
ideias da Teologia da Prosperidade não surgiram no pentecostalismo, mas foi nesse
ambiente em que teve uma acolhida mais receptiva.
Trata-se de uma visão “teológica” que sai em defesa do pensamento de que a bênção
financeira é desejo de Deus para os cristãos. As atitudes de fé, o discurso positivo e as
doações para os ministérios cristãos são condições para alcançar a prosperidade e a
riqueza material do seguidor.
O discurso do The Secret é sempre aplicado: “você pode”, “você consegue”, “você é
capaz, é vencedor, nasceu para vencer, não há derrota em sua vida quando você está
sendo fiel nos dízimos e ofertas”, “Deus vai te honrar, se você...”. É a Lei da Atração em
sua mais pura essência, você faz, você recebe. Isso é totalmente contrário ao que Jesus
pregou ou a qualquer menção acerca da graça na Bíblia.
Quanto mais se der, maiores são as chances da salvação, pois o homem de pouca fé
não devolve dízimos e ofertas. Logo, a barganha beira à compra da salvação. E claro
contrário ao que as Sagradas Escrituras dizem: “Porque pela graça sois salvos, por meio
da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se
84
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
glorie; porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais
Deus preparou para que andássemos nelas.” (EFÉSIOS 2:8-10)
A reconciliação com Deus representa o alívio das doenças e da pobreza, que são vistas
como provações a serem vencida por meio da fé, da visualização e da confissão positiva.
Origens da TP
Essek William Kenyon (1867-1948) e Kenneth Erwin Hagin (1917-2003) são bastante
conhecidos como aqueles que propagaram a Teologia da Prosperidade, embora o mais
85
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
famoso seja Kenneth Hagin, sendo que talvez Essek William Kenyon seja o fundador da
confissão positiva. Ela algo recente, como vimos, a partir dos anos de 1940 que ganhou
forma, sendo articulada como movimento doutrinário, nos Estados Unidos da América.
É provável que Kenneth Hagin seja o nome de maior influência no Brasil, sendo que
se voltada a questão da prosperidade, bem como para curas e visões sobrenaturais.
A consolidação se deu na década de 1970 em função da influência de Hagin sobre
diversos grupos pentecostais norte-americanos que passaram a difundi-la. Hagin
inspirou-se em Kenyon, tendo adaptado vários de seus escritos sobre cura divina e
Confissão Positiva. (SOUSA, 2011).
Hagin, em seu livro O Nome de Jesus, afirma ter lido Kenyon, sendo seu o primeiro
contato com seus livros ocorreu dois anos após sua morte, em 1950, o qual admitiu
“que este seu livro fora baseado em outro de Kenyon, The Wonderful Name of Jesus.
Hagin “escreve ainda que lhe chamou a atenção o fato de ele ter falecido aos 81 anos
sem nenhum tipo de doença e que trabalhava num ritmo que nem mesmo os jovens de
sua equipe conseguiam acompanhá-lo”, sendo que ele, praticamente, um comentado
da obra Kenyon.
86
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
Desde então, a Teologia da Prosperidade vai tomando sua forma atual passando
a ser chamada de Evangelho da Prosperidade, Evangelho da Saúde e Prosperidade,
Movimento da Fé ou Palavra da Fé. Embora ocorra essa variedade de nomes, todos têm
na prosperidade financeira a sua ênfase principal.
Elucubrações acerca da TP
Ter dinheiro não é pecado, ser pobre também não é pecado. Então o que define pecado?
Como muito se sabe, este é um termo proveniente do grego harmatia, que significa
literalmente errar o alvo.
Jesus nunca condenou, bem como nenhuma outra grande religião, a questão de ter
recursos. É claro que em vários momentos Ele advertiu severamente aqueles que tinham
pelo fato da forte inclinação à tentação da adoração ao dinheiro (isto é, a Mamon).
Por isso disse que “Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!
Porque é mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico
no reino de Deus.” (LUCAS 18: 24, 25).
Jesus também advertiu o Jovem Rico, dizendo a ele deixar todos os seus bens a fim
de demonstrar aos seus seguidores que é praticamente impossível alguém deixar
absolutamente tudo, muito embora aquele Jovem já houvesse feito muito, ele não
conseguiu abandonar tudo.
Jesus também não saiu atrás dele, correndo arrependido de suas palavras, não. Se o
seguidor não deseja acertar, que o deixe ir. Há momentos na questão solidária o
pensamento deve-se voltar para isto, respeitar a pessoa que rejeitou ajuda (em alguns
casos, claro. O que não seria lógico em casos de dependência química, onde a pessoa
87
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
não é mais controlado por seus próprios pensamentos, mas sim por entorpecentes, isto
é, não respondendo por ela mesma). Jesus também não disse que aquele que for Rico
está condenado. O problema são os extremos que existem.
A “barganha da fé”, o “engano popular das massas”, o “estelionato religioso” entre tantos
outros jargões que são oferecidos aos proclamadores desse pensamento religioso, é algo
real e presente no mundo de hoje.
Ela apresenta qualquer um que esteja em uma posição não privilegiada financeiramente
como alguém que “Deus se esqueceu”, ou que “está em pecado”, ou ainda “com demônio”
(encosto) e tantas outras mazelas e insultos.
A pobreza, para muitos que passam ou que passaram por ela, fortalece, e não é indigna.
A pobreza extrema sim, a fome e a desnutrição sim, a calamidade da violência e os abusos
diversos certamente são zonas de perigo absoluto e contrária aos Direitos Humanos,
conforme inciso II da Declaração Universal dos Direitos Humanos que objetiva: “erradicar
a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”.
O problema é caos psicológico que essa Teologia causa na mente daqueles que
não possuem recursos, sentindo-se indignos de sequer pisar em uma igreja, e, por
este motivo, quando pisam, são coagidos psicologicamente a dar o que não tem. E
88
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA │ UNIDADE ÚNICA
são roubados por pessoas de má fé e índole, a fim de angariarem fundos para seus
bel-prazeres.
Infelizmente há casos e mais casos em que pessoas que já não tinham muito, perderam
tudo. É uma triste realidade, mas real e presente por conta do fato de haver o soberano e
o submetido, aquele que detém o conhecimento e que não o busca. Logo, uma somatória
de malícia com ignorância popular, gera-se o cenário tétrico do avançando tácito da TP
nos mais diferentes contextos teológicos.
De acordo com Zibordi (2012, pp.76-77) as razões pelas quais alguém abandona o
verdadeiro Evangelho de Cristo para seguir a Teologia da Prosperidade são:
Sendo que em Eclesiastes (5.10) também está escrito: “O que amar o dinheiro nunca
se fartará de dinheiro; e quem amar a abundância nunca se fartará da renda; também
isto é vaidade”. “Não ambicionemos, pois, as coisas altas” (ROMANOS 12.16). Mas a
prosperidade espiritual por meio do Espírito Santo de Deus e estudo da Palavra.
Ainda segundo Zibordi (2012, pp. 69-70), a melhor definição para o verbo “prosperar”,
à luz das Escrituras, é “florescer” e não somente enriquecer. A palavra prosperidade
proveniente do latim prospérus tem como significado ser “feliz, ditoso, florescente”.
Com isto, “O justo florescerá como a palmeira; crescerá como o cedro do Líbano.
Os que estão plantados na Casa do Senhor florescerão nos átrios do nosso Deus. Na velhice
ainda darão frutos; serão viçosos e florescentes” (SALMOS 92.12-14).
Logo, florescer como uma árvore significa prosperar em todos os sentidos (SALMOS
1.1-3) e dar muito fruto (JOÃO 15. 1-5).
O crescimento, portanto, é para todos os lados, todas as áreas da vida de uma pessoa.
Um pobre que sequer tem dinheiro para comprar uma moto, mas possui uma bicicleta,
e, passando em tempo compra uma moto, prosperou, pois não precisa sair de carro
importado de um ano para o outro. Assim como aquele filho que não perdoou o pai,
89
UNIDADE ÚNICA │ TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
mas agora o fez; ou aquele que não conseguia cumprir suas próprias metas, mas o fez
etc. Tudo isso é prosperar.
É sabido que uma árvore não cresce apenas para cima ou para os lados; cresce também
para baixo; tem raízes. Essa é a prosperidade que o Senhor quer dar aos seus filhos:
um crescimento em todas as direções, um enraizamento na Palavra. A prosperidade
material não é um fim em si mesmo (MATEUS 6.33; 12. 16-21), mas representa um
ponto de apoio dentro de toda esta roda da vida.
90
Para (não) finalizar
Isto inclui um material que está na biblioteca desta disciplina, da Sociedade de Teologia
e Ciências da Religião (Soter ) que discute a Teologia em seus cenários contemporâneos
por meio de inúmeros artigos, que somados, beiram as quase 2 mil páginas de conteúdo.
91
Referências
______. Jesus Cristo libertador: ensaio de cristologia crítica para o nosso tempo.
2. ed. Petrópolis: Vozes, 1972.
______. Jesus Cristo e mitologia. Nova Iorque: Charles Scribner’s Sons, 1958.
CARVALHO, Olavo. Como acabar com a fome no mundo. 2015. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=aFeOdlrf454>. Acesso em: 8 dez. 2017.
92
Referências
COMBLIN, José. Cristãos rumo ao século XXI: nova caminhada de libertação. São
Paulo: Paulus, 1997.
______. Quais os desafios dos temas teológicos atuais? São Paulo: Paulus,
2005.
COPAN, Paul. O Jesus dos evangelhos: mito ou realidade? São Paulo: Vida Nova,
2012.
93
Referências
94
Referências
RAEPER, William; SMITH, Linda. Introdução ao estudo das ideias. São Paulo:
Loyola, 2001.
RENAN, Ernest. Vida de Jesus. Tradução de Eliana Maria de A. Martins. São Paulo:
Martin Claret, 2003.
SCHWEUTZER, Albert. A busca do Jesus histórico. São Paulo: Cristã Novo Século,
2003.
95
Referências
SUSIN, Luiz Carlos. Fazer teologia em tempos de globalização. Nota sobre método
em teologia. Belo Horizonte: Perspectiva Teológica, v. 31, n. 83, pp. 97-108, 1999.
THEISSEN, Gerd.; MERZ, Anette. O Jesus histórico: um manual. São Paulo: Loyola,
2002.
96