O Espaço Maker em Universidades - Possibilidades e Limites
O Espaço Maker em Universidades - Possibilidades e Limites
O Espaço Maker em Universidades - Possibilidades e Limites
ISSN: 1517-1949
ISSN: 1983-9278
[email protected]
Universidade Nove de Julho
Brasil
DOI: https://doi.org/10.5585/EccoS.n49.13341
Renato Frosch
Doutorando no Programa de Pós-graduação em Educação da Uni-
versidade Católica de Santos. Santos – SP – Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2655-6544
[email protected]
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 1
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
Abstract: The text develops as an essay elaborated from an exploratory research on the
production of knowledge in digital manufacturing laboratories installed in universities
and understood from the assumptions of culture maker, the mobilization of knowledge
and neoliberalism. The objective is to analyze critically the makerspaces considering
their political aspect, which is strained by the intensification of contradictions in
neoliberalism that restricts public spaces. The qualitative study was based on the analysis
of public information on the implementation of digital manufacturing laboratories in
Brazilian universities, visits to some of these laboratories, interviews with participants
of these laboratories, personal experience of one of the authors, in the implantation of
a laboratory of manufacturing maker and, finally, analysis of bibliographical references
on culture maker, knowledge mobilization, digital manufacturing laboratories and
neoliberalism. The dynamics of cooperation between individuals and the own way of
knowledge management in the maker spaces, points to the hypothesis that this mode of
production of knowledge produces open, public and democratic knowledge, processes
linked, in this case, to the public use of technological resources. From the perspective
of the mobilization of knowledge the analyzes point to possibilities that go beyond the
curricular aspects in higher education, indicating a way of applying the maker philosophy
in the production of knowledge, which refers to the relationship between the university
and society. However, such possibilities must face the limits imposed by neoliberalism,
that restricts the public sphere, democracy and politics, perspectives present in the
proposal maker.
Key words: Makerspace. Mobilization of Knowledge. Neoliberalism. University.
E
c Introdução
c
o
S O texto a seguir se desenvolve como um ensaio elaborado a partir de
– pesquisa exploratória sobre a produção do conhecimento em laboratórios
de fabricação digital instalados em universidades e compreendidos a partir
R
e dos pressupostos da chamada cultura maker.
v
i A essência das ações da cultura maker é permeada pela constituição
s de grupos de sujeitos atuando em diferentes áreas do conhecimento ligados
t
a principalmente às ciências e a tecnologia, que se organizam local, regional
C ou mundialmente de modo estruturado ou não, com o objetivo de suportar
i e integrar ordenadamente o desenvolvimento de projetos, necessariamente
e
n com algum amparo digital, nas mais diferentes especialidades, envolvendo
t
í desde soluções para produção artesanal não-seriada voltadas ao bem-estar
f doméstico, até complexos protótipos para determinado atendimento ou
i
c inovação de processo, como por exemplo, o biomédico, realizado com am-
a
paro dos fundamentos da terapia ocupacional.
2 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 3
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
4 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 5
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
põe uma autoconsciência por parte do sujeito que o possui, acerca dos
seus saberes, comuns e distintivos, que, no entanto, são apropriados es-
pontaneamente nas vivências cotidianas – de trabalho, de convivência, re-
ligiosas e culturais. Porém, o saber é um conhecimento não sistematizado,
cuja criação segue a direção dada pela curiosidade intelectual, individual
e coletiva. Como sugere Pinto (1979, p.29): “no nível do saber o homem
organiza o conhecimento em formas preliminares, surgidas para atender
as necessidades práticas imediatas, porém não alcança o plano da organi-
zação metódica.”
De modo diferente, a ciência alcança o plano do método, que im-
plica identificar não apenas a essência do ser que se busca entender, mas as
relações entre as leis que o regem, a fim de produzir intervenções precisas.
O saber também visa mudar a realidade, mas não de forma sistematiza-
da. O conhecimento científico, como é proposto por Álvaro Vieira Pinto
(1979), também é político. Para o autor, o mimetismo de ideias, concep-
ções e métodos não condizem com a natureza do trabalho científico, que,
ao contrário, exige autonomia. No livro Ciência e Existência Álvaro Vieira
Pinto aponta que o fazer ciência mimeticamente (consciência alienada do
trabalhador das ciências) é possível, mesmo realizando o tipo mais elevado
de conhecimento – o científico. Nesse caso, é uma ciência incapaz de criar
E
c conhecimentos em que o cientista apenas consome, reproduzindo de ma-
c neira ingênua as hierarquias internacionais, pouco ou nada contribuindo
o
S para o desenvolvimento dos países periféricos. Esses cientistas alienados se
– mantêm reféns de ideias, “E nisso precisamente consiste o aspecto princi-
pal da alienação cultural.” (PINTO,1979, p.53)
R
e Para o autor, a consciência científica alienada, ingênua, corresponde
v
i a um nível de conhecimento intermediário entre o saber e a ciência, uma
s vez que não integra nem se produz dialeticamente, incluindo as contra-
t
a dições. Ou seja, conhecimento, saber, ciência, método, metodologia são
C sínteses histórico-sociais. O conhecimento científico pressupõe a criação
i de novas realidades, que precisam ser pensadas a partir daquela em que
e
n se situa o cientista que o produz. Aqui se evidencia o compromisso social
t
í e político da produção do conhecimento e, portanto, a disputa em torno
f dele, especialmente no contexto em curso, como veremos abaixo.
i
c Assim, neste ensaio se inquire sobre as possibilidades que pode-
a
riam se realizar nos laboratórios de fabricação digital maker nas uni-
6 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
1 A cultura maker
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 7
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
8 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 9
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
(almost) everything, que numa tradução livre significa ‘como fazer (quase)
todas as coisas’. Essa forma de construção e transmissão de conhecimento
foi o elemento definitivo para os primeiros passos do que atualmente se
identifica como conceitos da cultura e dos espaços maker, em processo per-
manente de desenvolvimento. Vale destacar que o CBA é uma iniciativa
interdisciplinar do MIT que explora a fronteira entre ciência da computa-
ção e ciência física. O CBA estuda genericamente como transformar dados
em coisas e coisas em dados; gerencia instalações, executa programas de
investigação e supervisiona estudantes em pesquisas; trabalha com patro-
cinadores, cria startups e faz divulgação pública de pesquisas realizadas.
O mesmo Gershenfeld (2005), em sua obra FAB: The coming re-
volution on your desktop – from personal computers to personal fabrica-
tion, comenta sobre esse modelo colaborativo, utilizado e inaugurado de
modo sistêmico por Linus e aplicado no MIT, realçando a existência de
familiaridade entre o que já vem sendo realizado no universo do softwa-
re e o que pode ser feito no campo da fabricação digital e na produção
de hardwares e softwares. Comparativamente aos modelos de produção
tradicionais, o grande salto é que esse modelo aberto e colaborativo pro-
picia, de maneira geral, um empowerment (que vai além do que sugere a
expressão em português, empoderamento) criativo e de produção própria
E
c de conhecimento pelos indivíduos, possibilitando que sejam produtores
c ativos de ideias e acionando a possibilidade de chegarem mais longe do
o
S que poderiam individualmente.
– O processo é simples e sua base é a seguinte: alguém disponibiliza
eletronicamente uma parte de código, projeto ou determinada modelagem
R
e eletrônica; em seguida, começa a ser melhorado por alguém que pode estar
v
i do outro lado do mundo, ou mesmo na sala ao lado do laboratório; passo
s seguinte, será aperfeiçoado por outra pessoa, trazendo a esse código uma
t
a complexidade que dificilmente seria obtida se desenvolvido por uma só pes-
C soa. Nesse contexto, é oportuna a discussão proposta por Neves (2014) que
i compara o modelo praticado pelo CBA com a ideia de processo “adequado
e
n ao nosso tempo” proposto por Manuel Castells. A questão fundamental é
t
í que ainda estamos em um entre-períodos no qual a produção, geração e
f acumulação de riqueza têm como base de sustentação os modelos tradicio-
i
c nais voltados para produção de bens tangíveis e somente artificialismos re-
a
lacionados aos bens intangíveis. Neves (2014) considera que o atual modelo
10 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 11
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
12 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 13
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
14 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 15
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
16 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 17
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
18 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
MONFREDINI, I.; FROSCH, R.
EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019. 19
O espaço maker em universidades: possibilidades e limites
______. Comum. Ensaio sobre a revolução no século XXI. São Paulo: Boitempo
Editorial, 2017.
MONFREDINI, Ivanise. Universidade como espaço de formação de sujeitos. Santos, SP:
Editora Universitária Leopoldianum, UNISANTOS, 2016.
NAIDORF, Judith; PERROTTA, Daniela. La ciencia social politizada y móvil de una
nueva agenda latinoamericana. In: Revista de la Educación Superior. ANUIES. Vol. xliv
(2); No. 174, abril-junio del 2015, p. 19-46. ISSN electrónico: 2395 9037.
NEVES, Heloisa. Maker innovation. Do open design e fab labs…às estratégias inspiradas
no movimento maker. 261 f. Tese (Doutorado) – Curso de Design e Arquitetura,
Fauusp, São Paulo, 2014.
PRETTO, Nelson. Redes colaborativas, ética hacker e colaboração. Educação em
Revista, Belo Horizonte, v. 26, n. 3, dez., 2010, p.305-316.
PINTO, Álvaro Vieira. Ciência e existência. Problemas filosóficos da pesquisa científica
– Conhecimento, saberes e ciência. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
RIFKIN, Jeremy. A Terceira Revolução Industrial – Como o poder lateral está
transformando a energia, a economia e o mundo. São Paulo: M. Books do Brasil, 2011.
SILVEIRA, Sérgio Amadeu da. A mobilização colaborativa e a teoria da propriedade do
bem intangível. 123 f. Tese (Doutorado) – Curso de Ciência Política, Universidade de
São Paulo, São Paulo, 2005.
TORVALDS, Linus; DIAMOND, David. Só por prazer: Linux, os bastidores da sua
E criação. Rio de Janeiro: Campus, 2001.
c
c
o
WIKIHOUSE. About wikihouse. 2018. Disponível em: <https://wikihouse.cc/about>.
S Acesso em: 02 out. 2018.
–
R
e
v
i
s
t
a
C
i
e
n Recebido em 27 mar. 2019 / Aprovado em 30 abr. 2019
t
í Para referenciar este texto:
f MONFREDINI, I.; FROSCH, R. O espaço maker em universidades: possibilidades
i
c e limites. EccoS – Revista Científica, São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.
a Disponível em: <https://doi.org/10.5585/EccoS.n49.13341>.
20 EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 49, p. 1-20, e13341, abr./jun. 2019.