Aula 09

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Principais abordagens teóricas

AULA
do desenvolvimento humano:
a abordagem psicanalítica
Meta da aula
Apresentar contribuições da teoria psicanalítica, destacando os
principais conceitos sobre a constituição do aparelho psíquico,
a formação do sujeito e a construção de arranjos subjetivos.
objetivos

Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta


aula, você seja capaz de:
1. enumerar os pressupostos fundamentais da
psicanálise;
2. destacar a relevância da descoberta do
inconsciente em termos da fundação de um
novo campo do saber e as repercussões dessa
descoberta para a Educação;
3. identificar as formações do inconsciente;
4. avaliar as tópicas do aparelho psíquico;
5. conceituar pulsão e sexualidade.

Pré-requisitos
Para se ter um bom aproveitamento desta aula, é importante
relembrar o que foi visto nas aulas anteriores: a Aula 5, sobre a
primeira infância; a Aula 6, sobre a segunda infância; a Aula 7,
sobre a idade escolar; a Aula 8, sobre a adolescência.
Em todas elas, vimos referências à Psicanálise,
que serão aprofundadas nesta aula.
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

INTRODUÇÃO A descoberta do inconsciente

Entre as várias teorias do campo da psicologia que buscam entender, explicar,


modificar ou promover o homem, a Psicanálise é a única a trabalhar com o
conceito de inconsciente, admitindo que ele é singular, isto é, responde pela
herança cultural de cada sujeito. O sujeito é o centro do ser que habita o
corpo. Esta partição de princípio fará com que as descobertas psicanalíticas,
acumuladas ao longo de mais de um século de pesquisas, sejam aquelas que
mais promoverão o aprofundamento do conhecimento dos recônditos da
alma humana, com o sentido original dado pelos gregos clássicos. Assim, a
Psicanálise, na contramão da maior parte das outras correntes da psicologia,
surgidas no século XX, vem propor a análise em contraposição à síntese.
Dessa forma, entende-se por que a maior fonte de conhecimentos da psicanálise
provém da escuta clínica. Quanto mais escutamos os sujeitos, mais entendemos
os processos de construção de sua singularidade subjetiva, sua forma única de
ser, sua subjetividade, e mais podemos auxiliá-los a modificar sua posição diante
das experiências traumáticas vividas e que lhe deixaram marcas dolorosas.

O que é a Psicanálise? De acordo com Freud (1922; 1976), o saber


que criou pode ser entendido a partir de três vertentes:

(1) como um procedimento para a investigação de proces-


sos anímicos ou psíquicos que são quase inacessíveis por
qualquer outro modo,

(2) corresponde a um método (baseado nessa investigação)


para o tratamento de distúrbios neuróticos,

(3) e é uma coleção de informações psicológicas, obtidas ao


longo dessas linhas, que gradualmente se acumula numa
nova disciplina científica.

Desta forma, na primeira acepção, a Psicanálise é um procedimento


de pesquisa que alcança os recônditos, as profundezas da alma: os desejos
mais absurdos, os pensamentos mais recusados, as forças impulsoras mais
esquisitas em nós. No momento em que Freud está fazendo suas descober-
tas, o campo da ciência psicológica, ainda em criação, pouco se interessava
pelos produtos estranhos do agir e do pensar humanos. Já vimos como a
Psicologia Moderna foi criada por Wundt após a inauguração do primeiro

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laboratório experimental em 1879, em Leipzig, na Alemanha (ver Aula 1).

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Como Freud, médico neurologista, parte do estudo das doenças mentais,

AULA
verifica, após descobrir que a histeria era provocada por fatores psicológicos Histeria
e nada tinha de conteúdo orgânico, que aquilo que a originava deveria ser Deriva do grego hyste-
rus, que significa útero.
também oriundo de fontes psicológicas. Sua primeira utilização
com a finalidade de
A segunda acepção da palavra Psicanálise esclarece que a pesquisa definir manifestações
efetuada possibilita o tratamento de distúrbios neuróticos, pois lhe for- sintomáticas, como
paralisias, dormências,
nece um valioso método para obtenção de resultados que possibilitam o cegueiras, contrações
musculares invo-
alívio do sofrimento neurótico ou da dor de existir. De início, o método luntárias, sem causa
utilizado era o hipno-catártico, que consistia no uso da hipnose para orgânica, foi atribuída
a Hipócrates, pai da
alcançar ideias, lembranças de acontecimentos marcantes, traumáti- Medicina, na Grécia
Clássica. Apesar do
cos, que, por serem dessa forma, precisaram sofrer a ação do recalque, nome, os sintomas
aparecem também
mecanismo de defesa fundamental para a estruturação e o equilíbrio
em homens.
do aparelho psíquico. Mais tarde, Freud rejeita o uso da hipnose, uma
vez que os resultados alcançados mostraram-se fugazes. Em seguida, a
prática leva-o a descobrir o método da associação livre, que consiste em C ata r s e
deixar o sujeito falar tudo que lhe vier à cabeça, sem impor quaisquer Origina-se do grego
katharsis, que significa
restrições ou críticas. expulsão violenta ou
vômito. A ideia era
fazer o sujeito expulsar
de si as lembranças
dolorosas, obtendo
R e c a l q u e (V e r d r ä n g u n g ) alívio e abrindo terreno
para novas
Traduzido equivocadamente por repressão (Unterdrückung), que corresponde, grosso
experiências de vida.
modo, na transformação do material consciente em pré-consciente, enquanto
o recalque transforma o material consciente em inconsciente.
O recalque é considerado uma das pedras angulares da Psicanálise. Há o recalque ori-
ginal (Urverdrängung), que vai possibilitar o recalque propriamente dito. O primeiro
dá origem ao inconsciente, o segundo é utilizado como defesa contra qualquer ideia,
sobrecarregada de excitação, isto é, que produza angústia, quando a satisfação da
pulsão, ao invés de produzir prazer, produz desprazer. É preciso ressaltar que
o recalque incide sobre uma ideia e jamais sobre o afeto. Já a repressão pode incidir
sobre o afeto, retirando-o da consciência e tornando-o pré-consciente.

A terceira acepção oferece os conceitos psicanalíticos a uma leitura


da cultura, permitindo que a coleção de informações psicológicas obtidas
ao longo dos anos de estudos e publicações da Psicanálise a legitimem
como uma nova disciplina científica. É possível utilizar o rigoroso e preciso
referencial psicanalítico, a Psicanálise em extensão, isto é, a aplicação dos
conceitos psicanalíticos, para o entender dos fenômenos sociais e grupais:
artísticos, literários, sociológicos, antropológicos, entre outros.

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psicanalítica

Numa bela carta a Einstein, Freud (1932b; 1976) responde com


importantes reflexões sobre os motivos que levam o homem às guerras,
concluindo “que tudo o que estimula o crescimento da civilização traba-
lha simultaneamente contra as guerras” (p. 259), considerando que esse
crescimento vem com o fortalecimento da vida intelectual e a renúncia
ao excesso de satisfação pulsional (veremos adiante, com mais profun-
P u l s ã o (T r i e b ) didade, a importância do conceito de pulsão). É possível extrair também
Um dos conceitos mais de sua obra importantes considerações sobre a Educação (esta sendo um
importantes do corpo
conceitual da Psica- dos mais poderosos e eficientes meios para o fortalecimento do processo
nálise. Corresponde
à força constante que
civilizatório), que auxiliam muitos profissionais na difícil tarefa de lidar
exige satisfação ou com seus alunos. Ao descobrir o quanto a sexualidade é determinante na
descarga na fronteira
entre o que é psíquico e constituição e no equilíbrio do aparelho anímico ou psíquico, sobretudo
o que é somático.
da carga afetiva que permeia todas as relações humanas, a Psicanálise eleva
o que antes algumas correntes da Psicologia desprezavam – lembrem-se
que o Behaviorismo denominava a interioridade de “caixa-preta” –
ao primeiro plano de seus estudos. Retomando suas palavras:

O interesse dominante que tem a psicanálise para a teoria da edu-


cação baseia-se num ato que se tornou evidente. Somente alguém
que possa sondar as mentes das crianças será capaz de educá-las e
nós, pessoas adultas, não podemos entender as crianças, porque
não mais entendemos a nossa própria infância. Nossa amnésia
infantil prova que nos tornamos estranhos à nossa infância.
A psicanálise trouxe à luz os desejos, as estruturas de pensamento
e os processos de desenvolvimento da infância. Todos os esforços
anteriores nesse sentido foram, no mais alto grau, incompletos e
enganadores por menosprezarem inteiramente o fator inestima-
velmente importante da sexualidade em suas manifestações físicas
e mentais (FREUD, 1932; 1976).

A descoberta do inconsciente a partir dos seus efeitos, a importân-


cia da sexualidade e as consequências do percurso da energia pulsional
em nós desencadearam muitas manifestações hostis contra Freud, na
medida em que ia divulgando seus achados. De um modo geral, isso
ocorre no campo da ciência todas as vezes que a comunidade intelectual
depara-se com novos paradigmas, que revolucionam o saber estabelecido.
Leva um tempo até que se confirme o valor de verdade e se comece a
aceitar novos postulados. Deixar velhos saberes e aceitar o novo exige
mudança, o que gera trabalho. Como a preguiça e o acomodamento
são humanos, mudar vai provocar reações de rejeição. Mas felizmente

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e gradativamente Freud arrebanhou uma legião de seguidores – entre

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eles alguns já citados nos capítulos anteriores, como Melanie Klein, Do-

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nald Winnicott e Jacques Lacan – e hoje a Psicanálise tem mais de cem
anos e milhares de instituições espalhadas pelo mundo. Em nosso país,
a Psicanálise está inclusive na universidade, em cursos de graduação,
bem como em programas de pós-graduação em nível de especialização,
mestrado e doutorado. Temos também, no Brasil, inúmeras sociedades
científicas que oferecem formação psicanalítica apoiadas no tripé análise,
estudo e supervisão.

Figura 9.1: O divã onde Freud atendia seus pacientes, hoje no Museu Freud, de Londres.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Imagem:Freud_Sofa.JPG

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1 e 2

1.
a. Considerando as definições de Psicanálise, enumere-as, explicando-as.

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psicanalítica

b. Que contribuição para a Educação é possível extrair da Psicanálise?

RESPOSTAS COMENTADAS
a. Etimologicamente, a palavra psicanálise significa análise da alma.
Mas o que é a Psicanálise? De acordo com Freud (1922/1976), o
saber que criou pode ser entendido a partir de três vertentes: (1)
como um procedimento para a investigação de processos anímicos
ou psíquicos que são quase inacessíveis por qualquer outro modo;
(2) corresponde a um método (baseado nessa investigação) para o
tratamento de distúrbios neuróticos; e (3) é uma coleção de informa-
ções psicológicas, obtidas ao longo dessas linhas, que gradualmente
se acumula numa nova disciplina científica.
b. Entre outras possibilidades, por agora é possível responder que
a Psicanálise, ao explicar a construção do aparelho psíquico e não
apenas as suas manifestações aparentes, possibilita ao educador
lidar com as diferenças em seus alunos, a partir da recordação das
próprias limitações experimentadas na infância.

A psicopatologia da vida cotidiana

Diz a sabedoria popular que “de médico e de louco, todo mundo


tem um pouco”. Por isso, podemos afirmar que há traços psicopatológi-
cos em todos nós. A Psicanálise demonstra como trazemos em nós múl-
tiplas capacidades e tendências. Há inúmeras formações do inconsciente
que nos possibilitam reconhecer o quanto o ditado – que é uma verdade
intuída, embora não sustentada cientificamente – está correto. Quem de
Chiste nós não experimentou esquecimentos, atos falhos, sonhos, chistes e até
Significa aqui pilhéria, mesmo pequenos sintomas? É isso mesmo, pequenos sintomas. Quem
algo jocoso, não enca-
rado como sério. já não viveu experiências de desfalecimento em um momento de susto,
paralisias depois de uma vivência traumática, medos injustificáveis pela

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realidade, mal-estares estomacais depois de um desaforo “engolido”,

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desânimo depois da vivência de um amor que se afasta? Mesmo um

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sintoma é uma forma de realização sexual do neurótico.
Nenhum desses fenômenos seria passível de explicação sem o
legítimo e necessário conceito de inconsciente. Vejamos por quê.

!
Ato falho
Conceito que abrange fenômenos de lapso da fala, da escrita e outras manifestações
da linguagem. É um ato pelo qual o sujeito substitui, malgrado si próprio, uma inten-
ção consciente por uma ação ou conduta imprevistas. Por exemplo, uma palavra não
planejada pode atravessar nosso discurso pretendido, deixando-nos embaraçados.
Dizemos uma coisa quando queríamos dizer outra, mas isso que dizemos responde
por uma verdade inconsciente. Um exemplo ótimo foi cometido em cadeia nacional
de televisão. Na época da inflação galopante, quando a cada poucos meses o governo
mudava o ministro da Fazenda, foi cogitado o nome de Dílson Funaro (1933-1989) para
ocupar o cargo desconfortável. Quando o repórter perguntou o que ele responderia
se fosse convidado para o cargo, Dílson respondeu: “Bem, se eu for condenado...”
Imediatamente, todos riram. A verdade do sujeito (inconsciente) havia suplantado a
superficialidade (consciente) das exigências sociais.

O conceito de inconsciente é legítimo, pois ele permite explicar


aquelas manifestações do psiquismo de maneira rigorosa; e necessário,
porque sem ele uma quantidade delas continuaria ininteligível. Mas o
que é o inconsciente?
Em nosso idioma, Houaiss define inconsciente como: 1. sem cons-
ciência, como na frase “caiu inconsciente no chão”; 2. como sinônimo
de automático, maquinal, involuntário (gesto inconsciente); 3. como
irresponsável, leviano; 4. parte recalcada da mente que aflora apenas
em sonho, surto etc.
A quarta acepção da palavra aproxima-se da concepção psicana-
lítica que considera o inconsciente como “um processo psíquico cuja
existência somos obrigados a supor – devido a algum motivo tal que o
inferimos a partir de seus efeitos –, mas do qual nada sabemos” (FREUD,
1932; 1976).
O que fazemos de forma automática, involuntária ou maquinal
também responde pelo funcionamento do inconsciente. Muitas vezes,
temos atitudes que não queríamos ter, mas que fogem ao nosso controle
consciente e temos dificuldades em alterar, agindo sem pensar.

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Considerado dessas formas, entendemos por que não temos acesso


diretamente ao inconsciente, mas sabemos dele por intermédio de suas
formações: sonhos, atos falhos etc. O inconsciente, na primeira tópica,
corresponde a um lugar psíquico central, onde se armazenam as repre-
sentações ou inscrições da pulsão. O inconsciente é um dos dois grandes
sistemas psíquicos, sendo o outro a consciência. Seu funcionamento é
estabelecido pelo processo primário e obedece ao princípio de prazer.
Já o consciente é regido pelo processo secundário, atendendo ao princípio
de realidade. Veremos alguns desses conceitos.
Processo primário – É o modo de funcionamento do inconsciente.
Seus dois mecanismos básicos são o deslocamento e a condensação, me-
canismos fundamentais na formação, entre outros fundamentais produtos
psíquicos, de nossos sonhos. O deslocamento transfere a carga afetiva
de uma ideia que evoque angústia para outra, inócua. A condensação,
como o nome diz, junta numa única ideia duas ou mais que guardam
entre si algum ponto comum.
Processo secundário – É o mecanismo que permite o escoamento
da energia pulsional de forma controlada, visando às exigências da rea-
lidade. É a forma de funcionamento do sistema consciente.
Princípio de prazer – Responde pela circulação de energia psíquica
livre, atendendo às exigências do inconsciente em busca do caminho mais
direto e rápido para a satisfação da pulsão.
Princípio de realidade – Ao contrário do anterior, o princípio de
realidade exige adiamentos e desvios da satisfação pulsional. A energia
psíquica aqui é ligada a representações, ou seja, a ideias ou à linguagem.
No inconsciente, não existe a negação. Isso significa que o prin-
Princípio cípio aristotélico de não contradição, sob o controle do princípio de
de não
realidade, é desprezado e todos os opostos podem coexistir sem causar
contradição
nenhuma estranheza. É por isso que em nossos sonhos podemos voar,
Em seus estudos sobre
Lógica, Aristóteles for- estar embaixo d’água sem nenhum equipamento para respirar, ou mesmo
mulou que uma coisa
não pode ser e não morrer e estarmos observando quais os vivos que sofrem em nosso en-
ser ao mesmo tempo.
Algo que se negue e
terro. A Lógica do inconsciente é bem outra que aquela que o princípio
se afirme acaba por da realidade exige.
se autodestruir e não
pode existir; contudo,
para as produções do
inconsciente, isso é Sonhos
possível.
Na história humana, os sonhos tiveram um lugar secundário
como produto psíquico até que Freud os alçasse ao posto de caminho

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por excelência de acesso aos produtos do inconsciente. Conhecemos

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alguns casos de sonhos relatados na Bíblia, como o do faraó que fez de

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José o primeiro grande intérprete de sonhos, anunciando as pragas que
atingiriam o Egito (Gênesis, 41). Os sonhos também foram considera-
dos como uma espécie de lixo da alma, restos a serem descartados toda
noite. Premonitórios de acontecimentos que estariam por vir ou material
destituído de valor, o fato é que os sonhos traduzem para cada um de
nós a quantas anda nosso interior profundo.
Para compreender alguns dos sinais de angústia que sentia, para
os quais não encontrava explicação plausível, Freud passou a fazer de
sua produção onírica a fonte de suas pesquisas. Interpretou inúmeros de
seus sonhos por meio do uso do método da associação livre e alcançou
resultados surpreendentes: os sonhos realizam o desejo do sonhador.
Suas brilhantes descobertas deram origem à tese A interpretação de
sonhos (1900; 1976).
De modo geral, a maior parte dos desejos que nos assalta durante
o dia não pode tornar-se real e sofre a ação do recalque. Queremos o ho-
mem dos sonhos da capa da revista, a linda modelo glamourosa, o carro
potente, a casa com um jardim, pedras de esmeralda, ganhar milhões na
Mega Sena, o reconhecimento pelo nosso trabalho. Uma vida seria pouca
para realizar tanto e nem tudo depende de nós, já que o outro tem seus
desejos também e a realidade impõe duros limites. Assim, uma das vias
de escape de nossas frustrações na vida de vigília é sonhar. Sonhando,
rompemos o princípio de realidade: podemos voar como os pássaros e
ter uma bela e ampla visão do lugar onde vivemos, podemos andar pela
areia do fundo do mar azul, podemos ser agraciados com uma dádiva
impossível, podemos nos vingar de uma injúria.
Lembre-se de que no inconsciente o não inexiste, tudo é possível
nessa outra realidade! Isso não diminui o valor dos desejos, realizados
virtualmente em nossos sonhos. Sonhos bons e sonhos maus respondem
pela mesma intenção: ou realizam desejos que nos dão prazer ou desejos
de punição. Isso mesmo. Também nossas faltas na vida de vigília são
contabilizadas, e, quando dormimos, para quitar nossas faltas, pagamos
o preço da produção de pesadelos.
Interpretar o conteúdo de um sonho só é possível por meio do mé-
todo de associação livre, uma vez que os símbolos nos sonhos dependem
do significado que lhes atribui o sonhador. Cada sonho deverá ser subme-

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tido à cadeia associativa para que se alcance o significado inconsciente.


Isso porque os sonhos vêm disfarçados pela ação da censura, mecanismo
poderoso que separa as imagens que podem ser usadas sem disfarce e as
que devem ser alteradas, para que o sujeito se mantenha dormindo.
Como formação do inconsciente, os sonhos obedecem aos mesmos
processos de formação dos atos falhos: condensação e deslocamento,
acrescidos da figurabilidade, que é a capacidade de transformar em
imagens o que foi vivido pelo sonhador, como no exemplo que segue:
um menino de oito anos sonhou que ele e a mãe estavam na rua, quando
começaram a cair muitas facas do céu. Acordou assustado. Lembrou,
no dia seguinte, que sua mãe lhe dissera que era melhor ir dormir cedo
e não brincar no quintal, pois anunciava-se uma tempestade. Foi com a
alegação materna de que “ia chover canivetes” que o garoto foi para a
cama, sem vontade e com raiva da mãe.

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 2 e 3

2.
a. Como funciona um ato falho?

b. Quais são os mecanismos formadores dos sonhos?

RESPOSTAS COMENTADAS
a. É um ato pelo qual o sujeito substitui, apesar de sua intenção
consciente, uma ação ou conduta por outras, imprevistas. Uma

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palavra ser falada no lugar de outra que corresponde a uma verdade

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inconsciente. O ato falho abrange fenômenos de lapso da fala, da
escrita e outras manifestações da linguagem.
b. Sob a regência da censura, os mecanismos formadores dos
sonhos são o deslocamento, a condensação e a figurabilidade.
O deslocamento transfere a carga afetiva de uma ideia para outra,
cujo significado esteja distante da ideia original. A condensação junta
numa única ideia duas ou mais que tenham algum ponto comum.
A figurabilidade é a capacidade de transformar em imagens o que foi
vivido pelo sonhador. Boa parte das imagens é retirada do cotidiano
e disfarçada por meio do deslocamento e da condensação.

A importância da sexualidade

Boa parte do que veremos neste item refere-se ao já explicado na


Aula 5 e sugerimos que seja revisto. A novidade será o aprofundamento
no conceito de complexo de Édipo.
Mencionamos anteriormente que, quando Freud descobriu o quanto
a sexualidade era fundamental na formação do psiquismo, ele escreveu um
livro fantástico que desconstruiu preconceitos de sua época sobre o que é
da ordem do sexual e sua fundamental importância para o homem: Três
ensaios para uma teoria da sexualidade ([1905]/1976). Embora ainda hoje
muitos mantenham a ideia equivocada de que o grande psicanalista só
pensava em sexo e a ele atribuía todos os males da alma, deixemos claro
de que ordem é o sexual em suas teorizações. Primeiro, o sexual é sinônimo
de vida. Segundo, conforme veremos adiante, na parte relativa à teoria das
pulsões, a sexualidade é a própria energia que permite a transformação da
energia livre em energia ligada. Terceiro, a sexualidade pode ter inúmeras
finalidades, permitindo todo o funcionamento energético do aparelho
psíquico, indo da criação de uma história de amor a uma invenção que
incremente o conforto da civilização.

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psicanalítica

Para Laplanche e Pontalis, uma

(...) interpretação exclusivamente anátomo-fisiológica é insufi-


ciente para justificá-las (as zonas erógenas). Convém levar em
consideração o fato de constituírem, nas origens do desenvolvi-
mento psicossexual, os pontos de eleição das trocas com o meio
(l’entourage) e, ao mesmo tempo, de solicitarem o máximo de
atenção, de cuidados e, portanto, de excitações por parte da mãe
(1997, p. 533).

Como já vimos, é a mãe quem erotiza o corpo de seu bebê.


As zonas erógenas são áreas de produção de excitação, tanto de prazer
como de desprazer: seja a pele, a boca, o ânus, os genitais. São espécies de
portas do corpo por onde se efetuam trocas com o outro. A zona erógena
é uma pura diferença que se inscreve na dimensão corporal, marcando
um desvio, dando origem ao desejo (de que a experiência se repita).
Essas descobertas de regiões que proporcionam prazer – boca,
Libido ânus, genitais – ocorrem em um período de organização da libido, de-
Em latim significa dese- nominado autoerótico, isto é, onde o corpo é a maior e quase exclusiva
jo. Freud designa com
este termo a energia da fonte de prazer. Em seguida, vem o narcisismo, onde o Eu nascente
pulsão sexual. Mesmo
sendo essencialmente
junta-se à fonte corporal e é possível usufruir prazer da fonte subjetiva.
de natureza sexual, ela Por fim, segue-se o heteroerotismo, quando o outro é somado como
pode se desviar para
objetivos sociais, mas objeto fundamental para a obtenção do prazer. O percurso da libido
sem deixar de obter a
gratificação que atingi- que erogeneíza o corpo corresponde à abertura de trilhas pela pulsão,
rá sempre o sexual. permitindo o desejo. Resumindo: o desenvolvimento da libido passa
por uma fase autoerótica, onde o objeto de prazer é o corpo, depois
atravessa a fase narcísica, cujo objeto é o Eu e a criança julga-se o centro
do mundo, para alcançar o heteroerotismo, onde o objeto da libido é o
desejo do outro e o fundamental é ser desejado. Daí para frente, nosso
desejo conhecerá caminhos diversos para o prazer.
No desenvolvimento da sexualidade, a criança experimentará o
contato com os mais variados objetos que lhe possibilitem a obtenção
do prazer, desde o chuchar do bebê – que ultrapassa em muito o fato
de sugar o seio, mas serve também a propósitos meramente prazerosos,
como sugar a chupeta, o dedo ou simplesmente a própria língua – até a
masturbação e o uso de objetos. Daí a sexualidade, que é sempre infantil
no sentido de primitiva, ser chamada de perversa polimorfa.

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O período de latência responde pelo declínio das atividades au-

9
toeróticas, que só serão retomadas no período da adolescência, com a

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puberdade. É quando a criança adentra o mundo, o que inclui a escola e
o interesse despertado pelo processo de aprendizagem. Os diversos “por-
quês” surgem: “Por que o sol esquenta?” “Por que as estrelas piscam?”
Observa-se, no período de latência, o aparecimento de sentimentos de
vergonha e pudor, e de valores morais. Questiona-se o que é certo e o
que é errado. As paixões tórridas da infância cedem lugar a sentimentos
mais cálidos, a existência do outro é considerada.
Com a entrada na puberdade, início da adolescência, a fase genital
se anuncia. Todos os aspectos autoeróticos são despertados, o complexo
de Édipo sofre um retorno para ser revisto.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivos 3 e 4

3.
a. Que relação há entre a libido e as zonas erógenas?

b. Há sexualidade no período de latência?

RESPOSTAS COMENTADAS
a. A libido é a energia sexual que pode se concentrar em partes privi-
legiadas do corpo de acordo com as prioridades que lhes são dadas.
Na fase oral, a boca é a zona erógena privilegiada. Na fase anal,
a partir da educação dos esfíncteres, a zona erógena privilegiada
é a anal. Em seguida, a libido concentra-se nos genitais, quando a
criança manipula sua genitália em busca da obtenção de prazer.

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psicanalítica

b. Sim, só que ela está em segundo plano. Nesse período, os inte-


resses da criança pelas coisas do mundo ampliam-se para além
das paredes de sua casa e sua família. A entrada no mundo social
faz com que ela se interesse pelos amigos, pelos professores e
pelo saber.

A pulsão e seus destinos

Anunciamos antes que a apresentação do conceito de pulsão nos


exigiria uma aproximação mais detalhada, tal a sua importância funda-
mental para a teoria e a prática da Psicanálise. Primeiro é preciso destacar
que, no Brasil, o termo alemão Trieb – cuja tradução é pulsão –, utilizado
por Freud em seus escritos, foi traduzido por instinto, o que deu margem
a uma enorme confusão no entendimento do conteúdo profundamente
psicológico do termo. A pulsão não é o instinto. Em alemão, há o termo
Instinkt, que significa o mesmo que em nosso idioma: impulso natural
que designa um comportamento hereditariamente fixado dentro de uma
espécie, possui um objeto específico e está presente nos animais, mas não
no homem. Já o termo pulsão define uma força ou pressão constante
cuja fonte tem sua origem no corpo. Essa pressão tem um objetivo ou
alvo, que é a descarga. Para obter a descarga, será necessário um obje-
to, que varia de sujeito para sujeito. Esse necessário percurso pulsional
antecipa-nos não haver um comportamento pré-formado dentro da
espécie humana. É justamente isso que nos dá a riqueza e as dificuldades
enfrentadas do ponto de vista psicológico pelo homem: cada um é único,
embora compartilhemos inúmeras semelhanças; são as nossas diferenças
que nos tornam particulares.
Do ponto de vista ético, as diferenças entre instinto e pulsão são
fundamentais. O comportamento instintivo retira do animal a respon-
sabilidade pelas consequências dos seus atos. Uma leoa caça sua presa
para alimentar-se e ao seu bando. Não há pensamento que anteceda ao
ato nem formulações de juízo de valor. No homem, não. Ao homem é
facultado avaliar as consequências de suas ações antes de cometê-las.

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Se o animal já vem ao mundo com um programa instintivo fechado,

9
que é ativado na convivência com os de sua espécie, no homem essa

AULA
programação é feita e refeita constantemente. O programa animal é, sem
dúvida, mais econômico. Se nossas crianças já nascessem sabendo o que
fazer, poupariam aos pais e educadores tanto trabalho e dor de cabeça.
Mas isso não ocorre, como já vimos na Aula 5, referente à primeira
infância, quando abordamos as crianças selvagens, que não passaram
pelo processo de humanização.
A fonte da pulsão é corporal, e não psíquica; contudo, é a sig-
nificação dada ao estímulo que brota no corpo que será “lida” pelo
psiquismo, desencadeando ações. O bebê poderá chorar em busca do
alimento, mas também poderá chorar em busca de colo. É o outro quem
dará significação às manifestações da criança.
O objetivo ou alvo desse comportamento será a busca da satisfa-
ção ou supressão do desconforto, dando vazão à pressão, seja de fome,
seja de medo.
O objeto solicitado é a mãe ou pessoa que exerça essa função, mas
é aqui que encontramos o fator mais curioso da pulsão: a variabilidade
dos objetos dentro da espécie. Se tomarmos o fator sexual como exemplo,
veremos que o objeto da pulsão varia de sujeito para sujeito dentro da
nossa espécie. Conhecemos inúmeros sujeitos cuja sexualidade é ativa-
da única e exclusivamente pelos objetos mais estranhos, como o olhar
(voyeurismo), a exibição dos genitais (exibicionismo), a preferência por
animais (zoofilia), por crianças (pedofilia), por cadáveres (necrofilia), por
ingerir carne humana (canibalismo), tudo com o objetivo de descarga
pulsional, isto é, gozo. Essas perversões são também chamadas parafilias,
tendo como característica a preferência sexual de forma exclusiva, que
torna o sujeito totalmente dependente do tipo de objeto desviado da se-
xualidade dita normal na vida adulta. Como assinalamos anteriormente
(ver Aula 5), na criança as incursões pelos variados objetos é normal,
confirmando mais uma vez sua perversão polimorfa.
Todo esse circuito é ativado pela pressão pulsional constante, exerci-
da na fonte. É o fator motor da pulsão ou sua exigência de trabalho. Quan-
do a pressão sofre descarga, se é amamentado ou consegue o colo, o bebê
experimenta o apaziguamento da pressão. Até que tudo recomece...

C E D E R J 143
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

A primeira teoria pulsional

Para explicar a parte econômica do aparelho psíquico, sua parte


energética, Freud postula a existência de duas pulsões antagônicas, porém
complementares: as pulsões sexuais e as de autoconservação. Fortemente
influenciado pela teoria darwinista, Freud dá à pulsão sexual a finali-
dade de sustentar psiquicamente a perpetuação da espécie e à pulsão
Figura 9.2: Schopenhauer.
de autoconservação a finalidade de manter vivo o indivíduo, para dar
Arthur
Schopenhauer consecução à finalidade maior de perpetuação da espécie. Os planos da
Filósofo alemão do século “natureza” de nada serviriam se o indivíduo perecesse prematuramente,
XIX, tinha uma visão
impedindo a continuidade humana no planeta; contudo, a utilização de
pessimista sobre o mundo
e acreditava que o amor referenciais da Biologia serviriam para a Psicanálise, como as formas
era a compensação para a
morte. Nasceu em Danzig, de madeira numa construção que se ergue. Após o cimento endurecer,
na Prússia, em 22 de feve-
reiro de 1788, e morreu
elas são retiradas, uma vez que agora a estrutura fica em pé por sua
em Frankfurt, em 21 de própria conta. Depois que o edifício conceitual psicanalítico ergueu-se
setembro de 1860.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/ com certo apoio metafórico na Biologia, esta foi dispensada. Cumprira
wiki/Ficheiro:Schopenhauer.jpg
bem o seu papel.

A segunda teoria pulsional

A partir de 1920, em um belíssimo e inquietante texto intitulado


Além do princípio de prazer, Freud introduziu modificações cruciais em
sua teoria das pulsões. A segunda teoria pulsional introduz os conceitos
de pulsões de vida e pulsões de morte. No intervalo de tempo entre a
primeira e a segunda teoria, ele já tinha começado a chamar a pulsão
de autoconservação de pulsão do Eu. O aspecto psicológico ganha lugar

Figura 9.3: Empédocles. sobre o aspecto biológico, o psicológico ganha primazia sobre o bioló-

Empédocles de
gico. Admite que as pulsões do Eu (ou de morte, primeira vez que usa
Agrigento o termo) tendem a restaurar o estado inanimado (morte) e as pulsões
Filósofo que viveu entre sexuais (ou de vida) procuram a união entre duas células germinais (vida)
490 e 430 a.C. Alguns
autores lembram a lenda de para perpetuar a vida. Sustenta que todo corpo tem uma parte mortal,
que ele teria se suicidado,
atirando-se na cratera do
o soma, e uma parte imortal, o plasma germinal.
Etna, para provar que era Recorre ao filósofo Schopenhauer para quem a morte era a fina-
um deus. Apesar da lenda,
admite-se que tenha morri- lidade e o propósito da vida, sendo a pulsão sexual a corporificação da
do no Peloponeso, em 430
a.C. Temos acesso apenas a vontade de viver, sobretudo por meio da fome e do amor. Busca tam-
fragmentos de sua obra. bém referência nos filósofos naturalistas, principalmente na teoria do
Fonte: http://www.ocul-
tura.org.br/index.php/ universo formulada por Empédocles um pré-socrático. Para esse filósofo,
Emp%C3%A9docles
o Cosmos era formado por quatro elementos – ar, água, terra e fogo –

144 C E D E R J
controlados por duas forças, o amor e a discórdia (que muitos traduzem

9
como ódio). O amor aglutina os elementos e a discórdia os separa para

AULA
originar outros corpos que, sob a influência do amor, aglomeram-se em
novas unidades.
Freud postula que o objetivo de toda vida é a morte, e que as
coisas inanimadas existiram antes das vivas. Entende que a pulsão é um
impulso inerente à vida orgânica, a restaurar um estado anterior de coisas.
Sendo a pulsão conservadora e adquirida historicamente, fica enunciada
a importância das experiências na construção do percurso que irá fazer
rumo à descarga. O grande psicanalista admite que as pulsões sexuais
são conservadoras, entre outros motivos, por preservarem a própria vida
por um longo período e tenderem a formar unidades cada vez maiores.
Defendendo o dualismo pulsional, Freud acrescenta que, ao contrário do
que se pode pensar, as pulsões de morte estão desde o início associadas
às pulsões de vida, já que ambas têm necessidade de restaurar um estado
anterior de coisas. Enquanto as pulsões de vida têm mais contato com
nossa percepção interna – já que são rompedoras da paz, o que produz
tensões cujo alívio é sentido como prazer –, as pulsões de morte agem
mais discretamente. Nesse sentido, o princípio de prazer parece servir,
na realidade, às pulsões de morte, uma vez que se acha especialmente
em guarda contra o aumento dos estímulos, provindos de dentro, fato
que complicaria a tarefa de viver (FREUD, 1920; 1976).
Entre as funções primitivas do aparelho anímico ou psíquico,
Freud destaca: 1. ligar à linguagem as pulsões que com ele se chocam;
2. substituir o processo primário que nele predomina pelo processo
secundário; 3. converter a energia de investimento e móvel em energia
ligada (à ideia ou palavra).
A ligação é justamente o que permite o ato preparatório que
introduz e assegura a dominância do princípio de prazer. Este último
corresponde a uma tendência (pode ser ou não) que opera a serviço
de uma função (deve ser, imperativo categórico). Essa função tem a
missão de libertar completamente o aparelho psíquico de excitações
(princípio do Nirvana); conservar a quantidade de excitação constante
nele (princípio de constância) ou mantê-la tão baixa quanto possível
(princípio de homeostase). Qualquer caminho que tome, sua intenção
é a quiescência, isto é, o descanso, retornando ao mundo inorgânico
(FREUD, 1920; 1976).

C E D E R J 145
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

A ligação nem sempre é fácil, pois os processos livres ou primários


dão origem a sentimentos mais intensos do que aqueles que são des-
pertados pelos processos ligados ou secundários. Vejam que assim fica
explicado por que é tão difícil o processo de controle pulsional em alguns
sujeitos – crianças, adolescentes ou adultos –, muito mais resistentes a
abrir mão da intensidade do sentimento. A Educação encontra aqui um
dos seus mais poderosos limites.
Normalmente, as pulsões estão fundidas. A força da pulsão de
morte, ao ser “domada” pela linguagem, transforma-se em pulsão de
vida. É como se a primeira fosse uma força cega e a outra fosse tetraplégi-
ca, daí serem dependentes. Quando algum fator intervém, separando-as,
então o domínio do aparelho psíquico é da pulsão de morte. Onde faltam
palavras sobram atos. Hoje, a tendência no campo psicanalítico é reservar
para a pulsão de vida ou sexual ou, ainda, Eros, o termo sexualidade,
enquanto o termo pulsão fica restrito apenas à pulsão de morte.

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 4 e 5

4.
a. Considerando as definições de pulsão entre a primeira e a segunda teoria
pulsional, qual delas Freud mantém inalterada?

b. Qual a importância da ligação da pulsão para o processo civilizatório?

c. Por que a fonte da pulsão é corporal?

146 C E D E R J
9
RESPOSTAs COMENTADAs

AULA
a. A pulsão que Freud sustenta da primeira à segunda teoria pulsional
é a sexual, aquela que faz ligação entre a força cega, remanescente
do instinto dos animais, e a cultura, isto é, a linguagem.
b. Como já foi considerado na resposta anterior, sem a ligação da
pulsão à linguagem não haveria civilização, pois esta freia a satisfa-
ção, interpondo o pensamento entre o estímulo e a resposta a ele.
Não podemos responder a todo estímulo com uma ação impensada,
ou já não restaria nenhum ser humano na face da Terra.
c. A fonte está no corpo, mas ela é decodificada pela linguagem.
É a mãe quem interpreta os diversos sons do choro do seu bebê.
Mais tarde, cada um passa a compreender o que sente, a partir dos
recursos de linguagem. Quantas vezes achamos que temos fome,
mas não sabemos de quê.

As teorias do aparelho psíquico

Como já apontamos no início desta aula, na primeira teoria do


aparelho psíquico, Freud dividiu-o em inconsciente, pré-consciente e
consciente. Essa divisão ficou conhecida como a primeira tópica (topos,
do grego, lugar), como locais psíquicos com funções determinadas.
A parte do psiquismo que facilmente se torna consciente é o
pré-consciente, sendo inconsciente no sentido puramente descritivo.
A maioria dos processos conscientes só o é num curto espaço de tempo,
pois logo se torna latente, podendo, contudo, facilmente tornar-se de
novo consciente.
O Eu e o consciente, o recalcado e o inconsciente não coincidem.
O Eu tem a maior parte de seu volume inconsciente. Já o inconsciente
abrange mais do que o material que sofreu a ação do recalque.
A partir de 1923, em um texto intitulado O Eu e o Isso, ele intro-
duz uma importante modificação que não anula a teoria anterior, mas
a aprimora. Mantendo os termos anteriores, dirá que o inconsciente é
uma qualidade das instâncias – e não mais apenas um lugar.
O pré-consciente permanece como uma região que concentra ma-
terial psíquico (representação), que tanto poderá ser remetido ao incons-
ciente como enviado à consciência. A consciência fica restrita ao aparelho

C E D E R J 147
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

perceptual-consciente, que administra os sentidos – visão, audição, tato,


paladar, olfato –, com destaque para o que é visto e ouvido. Quando uma
ideia provoca um aumento intolerante da excitação, como no caso de um
acontecimento traumático, ela sofre a ação do recalque. Este, sob o comando
do Eu inconsciente, manterá a ideia fora da consciência. Propõe a existência
de três instâncias, que denomina de Eu ou Ego (das Ich), Isso ou Id (das Es)
e Supereu ou Superego (das Überich). Essa divisão ficou conhecida como a
segunda tópica. Tomaremos o esquema seguinte para explicá-la.

Isso – Do ponto de vista lógico, é a primeira das instâncias.


É formado de antigos Eus reencarnados, isto é, pela transmissão através
da linguagem que cria raízes na carne. Esta reencarnação nada tem a
ver com almas de outro mundo, nem de perto se aproxima de fatores
religiosos. Na verdade, é uma forma genial de explicar como as pala-
vras, ao mesmo tempo, constituem e alteram o orgânico. É totalmente
inconsciente, reservatório da libido e fonte das pulsões.
Eu – Conceituado como a segunda das instâncias, ele é, em sua
quase totalidade, inconsciente. Tem várias atribuições: atender às exigên-
cias pulsionais do Isso por satisfação; obedecer às exigências do mundo
externo, sobretudo aos limites impostos pelo processo educativo; atentar
para as imposições do Supereu, que cobra valores éticos e morais. É o
Eu quem entra em contato com o mundo externo e que sofre as influ-
ências das limitações, impostas pelo processo civilizatório, entre eles,
a Educação, sempre na intenção de controlar a quantidade de pressão
(angústia) produzida.

148 C E D E R J
Posteriormente, sob a influência da educação, o eu se acostuma a

9
remover a cena da luta de fora para dentro e a dominar o perigo

AULA
interno antes que se tenha tornado externo, e, provavelmente,
com mais freqüência, tem razão em assim proceder (FREUD,
1937; 1976, p. 256).

Para se formar, o Eu depende de um processo conhecido como


identificação, isto é, a ação de assemelhar um Eu a outro Eu. A identi-
ficação corresponde à forma mais primitiva de laço emocional com um
objeto, equivalente à incorporação oral, canibalística, da outra pessoa.
Algumas vezes, o Eu pode tomar-se a si próprio como objeto,
tratando-se da mesma forma como trata os outros objetos, podendo,
inclusive, colocar-se contra uma parte de si. Pode tratar-se amorosamente,
como se fosse um outro, fenômeno que se nomeia narcisismo.
Supereu – Tem as funções de auto-observação, de consciência
moral e de criação de ideais. É a última das instâncias a ser formada e
é, como o Eu, em sua maior parte, inconsciente. Após a finalização do
Complexo de Édipo, que corresponde ao conflito entre as exigências
pulsionais e as limitações impostas pelo mundo externo (a realidade)
resta em seu lugar uma cicatriz, que é o Supereu. Freud o denomina
herdeiro do Complexo de Édipo e admite que ele é

o representante de todas as restrições morais, o advogado de um


esforço tendente à perfeição — é, em resumo, tudo o que pudemos
captar psicologicamente daquilo que é catalogado como o aspecto
mais elevado da vida do homem (FREUD, 1932; 1976).

Acrescenta que ele é construído segundo o modelo do superego


dos pais, sendo, portanto, veículo da tradição transmitida de geração
em geração de forma inconsciente.
Freud postula que o Supereu é também o veículo do ideal do ego,
pelo qual o ego se avalia e que tanto o estimula como exige perfeição.
Corresponde a uma espécie de precipitado da antiga imagem dos pais,
ao narcisismo deles transferido para a geração seguinte, alimentado pela
admiração que a criança sente por eles.

C E D E R J 149
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

No final desse processo, “onde estava o Isso, deverá advir o Eu”. É


uma obra de cultura – não diferente da drenagem do Zuider Zee” (1932;
1976, p. 234). Com estas palavras, Freud conclui, destacando o quanto
o processo civilizatório é fundamental para a saída do homem do estado
de natureza e para seu ingresso no estado de cultura. Para atingir tal
meta, a educação, com seu potencial de sustentação do desejo de saber,
é fundamental.

Zuider Zee ou mar do Sul


É o nome de um antigo golfo formado pelo mar do Norte na costa noroeste dos Países
Baixos. O Zuider Zee formou-se, no século XIII, pela invasão do mar num lago, o
Flevo dos romanos. Em 1932, foi transformado em lago de água doce (denominado
Ijselmeer) com a construção de um dique de barragem de cerca de 30km de extensão.
Os holandeses dessecaram as águas do mar, graças a um sistema de bombeamento,
com diques e comportas, tornando-as produtivas. Sua vigilância deve ser constante,
pois as forças da natureza tendem a retomar suas terras. Foi e é uma das mais grandio-
sas obras do cálculo humano, só possível com as conquistas da civilização.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 4

5.
a. Por que o Eu depende da identificação em sua formação?

b. Nascemos com o Isso?

c. Qual a importância do narcisismo na construção da subjetividade?

150 C E D E R J
9
RESPOSTAS COMENTADAS

AULA
a. Por ser uma instância que prioriza o que é visto e ouvido no
mundo externo, para o Eu é fundamental que possa se assemelhar
ao Outro, sem o que não há estruturação do sujeito. Recordemos o
que ocorreu com as meninas-lobo Amala e Kamala (Aula 5), que
se tornaram lobas agindo como tal.
b. Não. O Isso é formado a partir de antigos Eus, transmitidos
inconscientemente de uma geração a outra.
c. O narcisismo corresponde ao estágio intermediário entre o autoero-
tismo e o heteroerotismo. É fundamental na construção do aparelho
psíquico e implica diretamente o amor por si mesmo, pelo Eu.

Psicanálise e educação: sua importância para a


cultura

Existe um tema, todavia, que não posso deixar passar tão facilmen-
te – assim mesmo, não porque eu entenda muito a respeito dele,
e nem tenha contribuído muito para ele. Muito pelo contrário:
aliás, desse assunto ocupei-me muito pouco. Devo mencioná-lo
porque é da maior importância, é tão pleno de esperanças para
o futuro, talvez seja a mais importante de todas as atividades da
análise. Estou pensando nas aplicações da psicanálise à educação,
à criação da nova geração. Sinto-me contente com o fato de pelo
menos poder dizer que minha filha, Anna Freud, fez desse estudo a
obra de sua vida e, dessa forma, compensou a minha falha (FREUD,
1933; 1976, p. 179).

Não haveria melhores palavras para estabelecer a importância


dada por Freud à Educação do que as dele. Abordamos, no início desta
aula, o uso dos conceitos psicanalíticos para entendimento dos fatos de
cultura, a psicanálise em extensão. Destacaremos agora um dos livros
mais importantes, no qual ele faz uma brilhante análise dos produtos
da civilização até aquela época.
Em 1930, Freud publica um texto magnífico que seria eleito, mais
tarde, na virada do século XX para o XXI (Caderno Mais, jornal A Folha
de São Paulo, domingo, 11 de abril de 1999), como o quarto livro entre os
cem mais importantes publicados no século que terminava, intitulado O
mal-estar na civilização (1930; 1976). O termo mal-estar ascende à cate-

C E D E R J 151
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

goria de um conceito que representa o resto inassimilável e indomesticável


do processo civilizatório. Nesse texto, Freud aponta discussões cruciais
sobre a essência da espécie humana e do futuro da civilização, apresentando
diversas formas (drogas, alienação psicótica, isolamento, apaixonamento,
ideais entre outros) que o homem utiliza para alcançar o bem-estar ou
felicidade, concluindo que o projeto de um estado de felicidade e plenitude
é irrealizável (BARROS, 1999, p. 123-124).
Mas, sobretudo, sua grande descoberta é que cada um desses pro-
jetos humanos acaba por fracassar, quando menosprezamos a poderosa
força da pulsão de morte, sobretudo em sua vertente de destrutividade,
uma vez que a força da pulsão de morte como energia livre está sempre
atuando, levando muitos projetos ao fracasso. Ao denunciar esses ideais,
tomados dessa forma por desprezarem a essência humana, Freud anuncia
o aspecto maior que dará origem à pós-modernidade: a desilusão com a
proposta da modernidade. Para Bauman (1998, p. 7), era a história da
modernidade que Freud contava, já que só a sociedade moderna pensou
em si como fruto da cultura ou da civilização. Por esses motivos, seus
textos finais abordam com mais veemência questões ligadas à cultura.
Destacamos, entre essas questões, o tema da Educação como forma não
só de controlar a força pulsional, mas de proporcionar à pulsão meios de
satisfação que levem em consideração a construção de laços sociais.
Para Freud, as funções básicas da Educação são inibir, suprimir
e proibir a colocação em prática de todos os impulsos, sem restrição.
Visto desta maneira tão radical, fica claro por quais motivos ele se indis-
Educação pôs, inicialmente, contra o processo educativo de sua época. Ao impor
vitoriana restrições para a satisfação pulsional, o modelo de educação vitoriana
Menção ao período de
retirava de cena qualquer possibilidade de satisfação em um futuro
reinado (1837 a 1901)
da Rainha Vitória da próximo e, pior, o excesso de austeridade acabava por gerar doenças
Grã-Bretanha, que
nasceu em 24/5/1819 e psíquicas: as neuroses.
morreu em 22/1/1901.
Regeu a Inglaterra
A educação bem empregada, marcando as diferenças individuais
por 63 anos, tendo entre as crianças, pode conseguir a superação dos traumas da infância, mas
inspirado o culto de
valores tradicionalistas não pode suprimir o outro fator, bem mais problemático, que é aquilo que
e o puritanismo moral.
Deu origem a um Freud denominou constituição pulsional rebelde. Assim, os educadores (pais,
modelo educacional professores etc.) devem abster-se de extirpar essa constituição pulsional re-
rigoroso, que impunha
a repressão das mani- belde, restringindo-se a incentivar os processos pelos quais essas energias são
festações da libido e
alimentava a hipocrisia conduzidas ao longo de trilhas seguras, tarefa em que encontrará mais êxito
nas relações sociais.
se buscar conhecer-se psicanaliticamente (BARROS, 2006, p. Scielo).

152 C E D E R J
A psicanálise tem freqüentes oportunidades de observar o papel

9
desempenhado pela severidade inoportuna e sem discernimento da

AULA
educação na produção de neuroses, ou o preço, em perda de efici-
ência e capacidade de prazer, que tem de ser pago pela normalidade
na qual o educador insiste (FREUD, 1913; 1976, p. 225).

A capacidade de suportar o aumento da excitação sem procurar


imediatamente a descarga é o que possibilita à criança o processo de
pensamento. O pensar dá-se no intervalo de tempo entre o estímulo e a
descarga. Ela deve tolerar o desconforto (mal-estar) para transformá-lo
em aprendizagem, ou melhor, em palavras, em forma de estabelecer laço
social e, assim, promover a cultura. O mal-estar, essa sensação de des-
conforto, é o preço que devemos pagar pela fruição de todas as grandes
vantagens que obtemos da vida em civilização, fator necessário para uma
existência confortável em termos de aquisições culturais.
Ao aprender a controlar suas pulsões até poder satisfazê-las, con-
trole que representa o quão educada teria sido, a criança estaria mais bem
aparelhada para suportar o desconforto do acúmulo de energia pulsio-
nal, que gera insatisfação, até a descarga, com a consequente produção
de prazer (BARROS, 2006: Scielo). Do ponto de vista da psicanálise, a
educação é necessária e fundamental, já que possibilita ao ser humano
aprender a controlar suas pulsões. Assim, a palavra ocupa o lugar do
ato, permitindo que, ao invés de destruir, o sujeito elabore um romance
policial, por exemplo.
Tanto na escola pública quanto na particular têm sido frequen-
tes as reclamações quanto à monotonia das aulas, que pouco interesse
despertam nos alunos. Independentemente do grau de insatisfação dos
professores com a tão sabida desproporção de seus salários com relação
aos demais ofícios, o que mais pesa no processo de transmissão de co-
nhecimento é o quanto de desejo do professor está implicado na forma
como ele ensina.

Afirma-se no sentido de que o trabalho da educação é algo sui


generis: não deve ser confundido com a influência psicanalítica e
não pode ser substituído por ela. A psicanálise pode ser convocada
pela educação como meio auxiliar de lidar com uma criança, po-
rém não constitui um substituto apropriado para a educação. Tal
substituição não só é impossível em fundamentos práticos, como
também deve ser desaconselhada por razões teóricas (FREUD,
1925; 1976, p. 342).

C E D E R J 153
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

CONCLUSÃO

Supomos que você tenha formado uma opinião sobre a impor-


tância dos conceitos psicanalíticos para a compreensão das profundezas
da alma humana e o quanto eles podem nos ajudar a compreender o
sujeito (tenha três ou oitenta anos) com o qual lidamos, possibilitando
a compreensão de alguns dos problemas que o tornam resistente aos
efeitos da Educação e auxiliando-nos a promovê-la. Fazemos o melhor
possível, sabendo, de antemão, que a perfeição é inalcançável.

ATIVIDADE FINAL
Atende aos Objetivos 1, 2, 3, 4 e 5

Entre os vários conceitos da psicanálise, verifique a sua compreensão sobre:

a. as formações do inconsciente;

b. a teoria pulsional;

c. a importância da sexualidade;

d. as relações entre a Psicanálise e a Educação.

COMENTÁRIOS
Entre os vários conceitos da psicanálise, destacamos aqueles que não
podem faltar à sua resposta, tais como:
a. as formações do inconsciente: sonhos, atos falhos, esquecimentos,
sintomas, entre outros;
b. a teoria pulsional: (1) na primeira teoria: pulsão sexual e pulsão de
autoconservação; (2) na segunda teoria: pulsão de vida (ou sexual ou
Eros) e pulsão de morte;
c. a importância da sexualidade como fonte da vida e da criação dos
laços sociais a partir dos primeiros relacionamentos em seus diversos
momentos: oral, anal e fálico;
d. as relações entre a Psicanálise e a Educação: destacam-se, sobre-
tudo, o apoio ou subsídio que as descobertas da psicanálise podem
oferecer à educação, como a importância da sexualidade e suas fases;
a descoberta da fantasia como fonte da criatividade; a relação afetiva
entre o desejo de saber e as primeiras pesquisas infantis; as neuroses
como obstáculo à aprendizagem, entre outras.

154 C E D E R J
9
R E S U MO

AULA
A relação entre Psicanálise e Educação limita-se ao auxílio que aquela pode
prestar a esta. Freud classificou a Educação como uma das profissões impossíveis,
incluindo-a entre a Psicanálise e o Governo, porque as três têm em comum a quase
certeza de se alcançar resultados insatisfatórios – é impossível agradar a todos.
São atividades que não dispõem de nenhum manual com regras fixas e objetivas,
pois lidam com a riquíssima gama de possibilidades humanas.
Uma teoria complexa, reconhecemos, mas considerada aquela que melhor explica
as bases da estruturação do psiquismo. E, ademais, se nos voltarmos para nosso
interior, cada um de nós será capaz de confirmar em si mesmo a verdade dos
achados psicanalíticos!
Esperamos que você tenha entendido o enorme esforço em condensar, em tão
poucas páginas, o enorme edifício conceitual construído pela Psicanálise ao
longo de mais de um século de pesquisas. Para se ter uma ideia, apenas a obra
de seu fundador tem vinte e três volumes de textos, todos eles plenos de ricas
argumentações sobre o psiquismo. Calcule quanto já não se produziu nesse
tempo! Tarefa nada fácil, mas que almejamos ter empreendido com o merecido
e devido rigor.

INFORMAÇÕES SOBRE A PRÓXIMA AULA

Continuando na trilha das principais abordagens teóricas do desenvolvimento


humano, veremos, na próxima aula, as contribuições de Erik Erikson, psiquiatra
alemão que se tornou psicanalista sob a orientação da filha de Freud, Anna
Freud, e criou uma importante teoria do desenvolvimento psicossocial no campo
da Psicologia.

C E D E R J 155
Psicologia e Educação | Principais abordagens teóricas do desenvolvimento humano: a abordagem
psicanalítica

Leituras recomendadas

GARCIA-ROZA, Luis Alfredo. Freud e o inconsciente. 3. ed. Rio de Janeiro:


Jorge Zahar, 1987.
FREUD, Sigmund. Textos que fazem referência à Educação, encontrados na
Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
Conferência XXXIV, Explicações, aplicações e orientações, vol. XXII,
1933.
Moral sexual civilizada e doença nervosa moderna, vol. IX , 1908.
(H) O interesse educacional da psicanálise, vol. XIII, 1913.
Prefácio à Juventude desorientada, vol. XIX, 1925.
Reflexões sobre os tempos de guerra e morte, vol. XIV, 1915.
Sobre a psicoterapia, 1905[1904], vol. VII.
Contribuições à psicologia do amor II: sobre a tendência universal à depre-
ciação na esfera do amor, 1912, vol. XI.
O esclarecimento sexual das crianças, vol. IX, 1907.
Alguns tipos de caráter encontrados no tratamento psicanalítico. As exce-
ções, vol. XIV, 1916.
Análise terminável e interminável, vol. XXIII, 1937.

156 C E D E R J

Você também pode gostar