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Revista Organizações & Sociedade

2020, 27(94), 396-430


Mercantilização & contramovimento: agricultura sustentada © Autor(es) 2020
pela comunidade (CSA): estudo de caso em Minas Gerais, Brasil DOI 10.1590/1984-9270942
ISSN 1984-9230
www.revistaoes.ufba.br
Commodification & countermovement: community-supported
NPGA, Escola de Administração
agriculture (CSA): a case study in Minas Gerais, Brazil Universidade Federal da Bahia

Daniele Eckert Matzembachera Recebido: 02/05/2018


Aprovado: 01/08/2019
Fabio Bittencourt Meiraa

a
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

Resumo
A forma que se tornou convencional de produzir e distribuir alimentos baseia-se no
uso de agroquímicos, adubos, fertilizantes industriais e de outras técnicas provenien-
tes da Revolução Verde, com crescente dependência do capital financeiro-industrial.
Isto significa a intensificação da mercantilização da agricultura. O problema que
norteou esta pesquisa é a emergência de modos de organização resistentes a essa
tendência. Com base no referencial teórico de Karl Polanyi (2012a, 2012b), cons-
truiu-se um estudo de caso cujo objeto é a agricultura sustentada pela comunidade,
cujo acrônimo em inglês é CSA (community supported agriculture). Trata-se de um
movimento que ressitua a produção agrícola pelos princípios do comércio justo
e da agroecologia e uso de cadeias curtas que aproximam produção e consumo.
O resultado é um alimento de qualidade nutritiva superior a preço acessível e
justo. A análise do caso CSA Alfa aponta a coexistência de diferentes princípios
de regulação numa combinação de troca mercantil e reciprocidade. Na esteira
de Karl Polanyi, observa-se a atividade econômica imbricada ao social, daí que
amizade, tolerância, fidelidade e comprometimento estabelecem um ethos comu-
nitário em torno do alimento. A CSA parece manifestar um contramovimento à
mercantilização ao potencializar a autonomia relativa dos indivíduos, o que eleva
a coesão social dos grupos participantes.
Palavras-chave: Agricultura Sustentada pela Comunidade; Mercantilização; Recipro-
cidade; Coesão Social; Karl Polanyi.
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Abstract
The conventional way of producing and distributing food is based on the use of
agrochemicals, fertilizers, industrial fertilizers and other techniques from the Green
Revolution, with increasing dependence on financial-industrial capital, which implies
the intensification of the agriculture commodification. The object of this study was
the emergence of modes of organization resisting this trend. Based on the theoret-
ical reference of Karl Polanyi (2012a, 2012b), a case study was developed in a
Community-Supported Agriculture (CSA) initiative. It is a movement that resituates
agricultural production through the principles of fair trade, agroecology and the use
of short supply chains, which bring production and consumption closer together. The
result is a better nutritious quality food at affordable and fair price. The analysis of
the CSA Alfa case points to the coexistence of different principles of regulation, in a
combination of mercantile exchange and reciprocity. According to the proposition by
Karl Polanyi, the economic activity is shown to imbricate with the social aspect, of
which friendship, tolerance, fidelity and commitment establish a community ethos
around food. The CSA seems to manifest a countermovement to the commodification
by enhancing the relative autonomy of individuals that elevates the social cohesion
of the participating groups.
Keywords: Community-Supported Agriculture; Commodification; Reciprocity; Social
Cohesion; Karl Polanyi.

Introdução

Revolução Verde é o nome dado à prática de adoção de tecnologias no ambiente


agrícola, como o uso de máquinas, sementes modificadas, adubos e fertilizantes
industriais, agroquímicos, sementes transgênicas e biotecnologias. Há, sobretudo a
partir dos anos 1960, um processo de incorporação institucional dessas mudan-
ças engendradas nos países desenvolvidos e difundidas nos países subdesenvolvidos
(Escher, 2011; Schneider & Escher, 2011).

A crescente dependência do mercado ocorre por uma série de mecanismos de


transferência do controle dos processos produtivos para atores externos, tais como
empresas, bancos, Estado e agências de desenvolvimento. Cria-se uma dependência,
fazendo com que os processos dificilmente se reproduzam fora do alcance do capital
(Escher, 2011). O agricultor passa a necessitar de fatores além de sua propriedade,
como máquinas, insumos químicos, sementes melhoradas, assistência técnica, den-
tre outros (Gazolla, 2004). Assim, ampliam-se as relações entre produtores e os cir-
cuitos mercantis nos quais estes se inserem (Schneider & Escher, 2011).
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A presença de intermediários numa cadeia de distribuição cada vez mais globa-


lizada reduz a renda de produtores e eleva o preço para consumidores. A sociedade
sofre com incremento da pobreza, crescente insegurança alimentar, êxodo rural, danos
à saúde e ao meio ambiente, e com a perda identitária do senso de comunidade, cul-
turalmente associado à alimentação. Além de degradar o ambiente natural, o processo
leva à perda de controle gradual dos indivíduos sobre as suas reproduções materiais.

A mercantilização é, portanto, o processo que leva o agricultor a ter a sua repro-


dução social e econômica dependente dos mercados, alienando-o das decisões que
envolvem a sua própria vida econômica (Gazolla, 2004). Profundas alterações nas
estruturas sociais rurais de países como o Brasil ocorreram em consequência disso
(Schneider & Escher, 2011). Dentre elas, a separação do trabalho mental e manual
dos produtores, com rotinas modificadas por controle externo. Transformam-se assim
as condições objetivas (materiais) e subjetivas (simbólicas) de reprodução social,
com efeitos acentuados na agricultura familiar (Escher, 2011).

Mas isso não significa que a dinâmica do mercado determine todos os aspectos
da vida social. Para Cangiani (2012), ocorre uma restrição, uma liberdade apenas
relativa. Ao ser fundamentado na instituição do mercado e na produção capitalista,
o sistema organizado economicamente tende a se auto alimentar. O termo “desen-
raizamento”, utilizado por Polanyi, é aqui entendido, alinhado com Eckert (2016,
p. 83), como mudança de valores ditada por interesses privados, expressa na retórica
das grandes empresas, nas políticas de Estado, nos acordos e tratados internacionais
que impactam profundamente a sociedade.

De acordo com Cangiani (2012), a concepção de “enraizamento” da sociologia


difere da polanyiana. Nesse sentido, convém reproduzir um trecho em que a autora
desenvolve seu argumento:

Para evitar confusões, uma premissa óbvia é que o conceito de


“economia desenraizada” não coincide com a “economia pura” dos
modelos neoclássicos abstratos. Ser “desenraizada” constitui um
aspecto geral e permanente da economia de mercado. Isso não se
choca com o fato de que um mercado perfeitamente autorregulador e
perfeitamente competitivo nunca existiu, nem poderia existir. Polanyi
explica que a tendência para influir propositalmente no funcionamento
do mercado pode ser identificada desde o começo, principalmente
graças a (1) à necessidade de “proteção” e ao “contramovimento” que
ela originou; e (2) à dinâmica do capitalismo, que envolve mudanças na
estrutura de mercado e condiciona a evolução das instituições sociais.
É precisamente a característica geral de a economia ser desenraizada
que, por um lado, torna inevitáveis a regulação e a intervenção social
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do Estado, e, por outro lado, dá ao sistema social seu dinamismo e sua


complexidade típicos. De qualquer modo, apesar do controle limitado
que a sociedade é capaz de exercer, o trabalho, a terra e o dinheiro
continuam a ser tratados como mercadorias. (p. 36)

O debate sobre a mercantilização dos sistemas alimentares recupera a agenda


de questões trazidas por Karl Polanyi (2012a, 2012b), que alertava sobre os proble-
mas decorrentes de uma economia que tentava centrar-se no mercado como principal
condutor das relações na sociedade. Daí a metáfora de um “moinho satânico”, refe-
rência à desagregação que acompanha este domínio. Entretanto, no contrapé deste
processo encontra-se uma resistência pela sociedade na forma de um contramovi-
mento. Este conceito propõe que nenhuma sociedade tem relações mercantis em
sua forma pura sem reagir em alguma medida aos seus efeitos negativos.

Nesse sentido, Polanyi (2012a; 2012b) propõe que a vida econômica pode
se efetivar de uma forma mais justa socialmente combinando diferentes padrões de
intercâmbio, orientados por mercado, reciprocidade, redistribuição e domesticidade.
Esta pluralidade de princípios de regulação, que será abordada ao longo do estudo
de forma mais detalhada, possibilita pensar em alternativas à mercantilização dos
sistemas alimentares. É possível que contramovimentos ocorram mediante o fortale-
cimento destes outros princípios.

A partir de Munck (2006) e Dale (2013), Abdalla (2014) afirma que “há falta
de mediação e de clareza sobre o contramovimento, já que [Polanyi] não define quem
exatamente iria agir espontaneamente contra o sistema de mercado não regulamen-
tado e desenraizado e por quê”. O problema de compreender o contramovimento,
envolve “não apenas ‘quem’ iria agir contra o mercado livre e ‘por quê’, mas também
‘como’ se daria uma contra movimentação” (p. 23).

Dito isso, esta pesquisa busca compreender as interações ligadas à dinâmica do


contramovimento através da pluralidade de princípios de regulação (Polanyi, 2012a).
Optou-se pelo estudo do fenômeno da agricultura sustentada pela comunidade, usual-
mente referida pelo acrônimo em inglês CSA (community supported agriculture). O pres-
suposto é que a proximidade entre produtores e consumidores induz relações econômicas
não mercantis condizentes com uma maior coesão social, levando à suposição de que a
CSA é um fenômeno que manifesta o contramovimento ao sistema de mercantilização
da agricultura. Supõe-se que uma CSA não seja antagônica ao sistema, mas mantenha
distância crítica do mercado convencional por acionar os princípios do comércio justo1.
1. Os princípios do comércio justo são definidos pela World Fair Trade Organization (WFTO): (1) criar
oportunidades para produtores economicamente em desvantagem; (2) transparência e prestação de contas;
(3) pagamento de um preço justo; (4) manter boas condições de trabalho e oferecer capacitação profissional;
(5) manter relações comerciais de longo prazo; (6) promover a igualdade de gênero e o empoderamento eco-
nômico feminino; (7) incentivar a liberdade de associação. (Ver https://wfto.com/. Acesso em 28/03/2019).
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O recorte da pesquisa se fez a partir da observação de uma experiência real


situada na região Sudeste do Brasil, com os objetivos de (1) compreender o contexto
e as motivações que originaram a CSA na região; (2) descrever e caracterizar o modo
de operação da CSA observada; (3) identificar de que forma se concretizam as trocas
e quais as implicações das relações de reciprocidade no circuito da CSA; e (4) anali-
sar como a CSA possibilita ou fortalece as condições necessárias para a reprodução
material e social dos indivíduos, especialmente dos pequenos agricultores, no sentido
de favorecer ou restringir sua autonomia.

Além desta introdução o artigo é composto por outras seis seções. A primeira
dedica-se à exposição do conceito da mercantilização e seus efeitos. A seguir discute-se
as formas de integração econômica e possibilidades para um contramovimento. Na sequ-
ência faz-se um panorama da agricultura sustentada pela comunidade. A quarta seção
é dedicada à exposição da metodologia. Em seguida apresenta-se o estudo de caso da
CSA Alfa, seus resultados e discussão para, finalmente, elaborar as considerações finais.

Mercantilização e seus efeitos

Os sistemas alimentares enfrentam um movimento de mercantilização em um


processo de transformação da agricultura com uma reestruturação impulsionada
especialmente pela Revolução Verde e pelo neoliberalismo. Muitas atividades rurais
familiares, que antes dispunham de produtos diversificados como fonte de ingresso
econômico, não conseguiram incorporar estas transformações. Abramovay (2007),
Ploeg (2010) e Schneider (2004) relatam o grande abandono do campo pelos peque-
nos agricultores (êxodo rural). Escher (2011) menciona a desarticulação regional dos
processos de desenvolvimento econômico e o surgimento de problemas de saúde
decorrentes do uso de agroquímicos. As unidades de agricultura familiar que sobre-
viveram foram levadas pelo mercado à especialização ou à monocultura (Sacco dos
Anjos, Caldas, & Hirai, 2010; Schneider, 2004).

O avanço do mercado beneficiou muitos grupos (Ploeg, 2008), em especial


as indústrias estrangeiras e os agricultores de produção em larga escala. Entretanto,
o mesmo não ocorreu com a agricultura familiar (Schneider & Escher, 2011). De uma
forma geral, os benefícios gerados se encaixam na proposição de Piketty (2014) de
serem mais focados na taxa de retorno sobre o capital de grandes empresas privadas
do que a taxa de crescimento econômico para a sociedade em geral.

Isso provocou mudanças na política e na economia mundial. Formaram-se verda-


deiros impérios agrícolas e alimentares. Grandes empresas comerciais, agronegócios e
redes de supermercados controlam segmentos cada vez mais amplos da cadeia mundial.
A oligopolização tem levado, de um lado, à queda dos valores recebidos por produtores
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primários, com efeitos diretos no êxodo rural, e de outro lado, a uma pressão ascendente
sobre os preços ao consumidor. O avanço das cadeias mais longas torna-se então uma
característica central do sistema agroalimentar, levando ao controle quase absoluto da
oferta. Como resultado, dietas menos variadas e saudáveis combinam-se com a intensifi-
cação da degradação ecológica, da pobreza e do êxodo rural (Ploeg, 2010).

De acordo com Fraser (2017), trata-se de uma crise relacionada ao terreno


mais amplo da reprodução social, com impacto em questões de saúde, habitação,
meio ambiente, alimentação e vida comunitária. Nesse sentido, Porto-Gonçalves
(2012) entende que o desenvolvimento é um importante aspecto de melhoria de vida
dos povos, entretanto é necessário criticar a ideia do desenvolvimento como sinônimo
de dominação da natureza e da vida, bem como da sociedade como engrenagem de
acumulação capitalista.

A ideia de mercantilização fictícia da terra, do trabalho e do dinheiro (Polanyi,


2012a, 2012b) oferece uma base promissora para uma análise estrutural integrada da
crise do moderno sistema alimentar convencional (Fraser, 2014). O relato de Polanyi
remonta às raízes da crise capitalista no século XIX aos esforços para o estabelecimento
de mercados autorregulados, incluindo terra, trabalho e dinheiro. A visão de que os
mercados estão inseridos em instituições sociais e sujeitos a normas éticas e morais
é substituída pela ideia de um mercado autorregulado. Toda a sociedade foi remode-
lada para se adequar a essa nova maneira de organizar a economia e a vida social
(Polanyi, 2012a, 2012b). Essa visão é altamente pertinente hoje. O resultado em
ambos os casos é a desestabilização do sistema econômico, por um lado, e da natureza
e da sociedade, por outro. Por isso, as atuais construções sociais de trabalho, terra e
dinheiro codificam tipicamente formas de dominação (Fraser, 2014, 2017).

Ao mesmo tempo, a economia constitui parte vital das comunidades humanas,


sem a qual sociedade alguma pode existir. Para superar os efeitos negativos da busca
por um mercado autorregulado, que reflete na mercantilização dos sistemas alimen-
tares, o próprio Polanyi (1977, 2012a, 2012b) sublinha a necessidade de resgatar o
sentido substantivo das motivações econômicas que define a orientação à reprodução
material da vida, numa peculiar interação do homem com seu ambiente. Isso pode
ser alcançado resgatando a ideia da pluralidade das formas de integração econômica.

As formas de integração econômica e possibilidades para um contramovimento

Há uma diversidade de formas instituídas na ordem econômica atual, em que


princípios básicos de comportamento ou formas de integração norteiam as ações dos
indivíduos. São eles a reciprocidade, a redistribuição e a troca de mercado. Eles coe-
xistem subordinando-se ou dominando uns aos outros. São, portanto, não-excludentes
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e não-hierarquizados. Além disso, não representam etapas evolutivas de desenvolvi-


mento (Polanyi, 2012b).

A troca de mercado é dominante na economia capitalista, com produção e dis-


tribuição de bens na sociedade controlada, regulada e dirigida, em última instância,
pela autorregulação dos preços. A economia repousa na expectativa de comporta-
mento maximizador, pressupõe o equilíbrio de mercado e a presença do dinheiro fun-
cionando como poder de compra. O comportamento econômico orienta-se pela per-
muta, barganha e troca visando lucro. Este padrão cria uma instituição específica:
o mercado como espaço destinado a compra e venda, em que escassez e excesso
funcionam como mecanismos centrais de barganha (Polanyi, 2012b). Este princí-
pio, quando sobreposto aos demais, leva à mercantilização da sociedade. Convém
diferenciar mercados isolados de uma economia de mercado, bem como mercados
reguláveis de mercados autorreguláveis. Os mercados sempre existiram em todas
as sociedades, mas os isolados nunca se interligaram para formar uma economia.
“O sistema econômico estava submerso em relações sociais gerais; os mercados eram
apenas um aspecto acessório de uma estrutura institucional” (Polanyi, 2012a, p. 88).

No Ensaio sobre a dádiva, Marcel Mauss (2012) observa que algumas socie-
dades realizam trocas sob formas e por razões diferentes da troca mercantil ao asso-
ciar questões morais e valores éticos às transações. Aparece aí a reciprocidade como
manifestação de certa coesão social, expressa na homogeneidade de valores e cren-
ças. O mercado é um contrato mais geral e permanente, que vai além da simples
troca de bens úteis. A reciprocidade, portanto, está associada a normas de com-
portamento social impostas por sistemas não econômicos. Entram aqui parentesco,
amizade, associação ou cooperação (Polanyi 2012b). Os agentes não são estranhos
entre si, a situação não corresponde à impessoalidade típica do mercado: “a recipro-
cidade assenta num padrão simétrico de organização” (Servet, 2009, p. 81).

A redistribuição opera regras vinculadas a um ordenamento político que cen-


traliza a distribuição econômica, trazendo bens a um ponto central e os levando
posteriormente às extremidades. O caráter territorial hierárquico é importante, daí o
padrão institucional ser a centralidade. “A simetria e a centralidade vão de encon-
tro, na metade do caminho, às necessidades da reciprocidade e da redistribuição;
os padrões institucionais e os princípios de comportamento se ajustam mutuamente”
(Polanyi, 2012a, p. 69). Um terceiro princípio – a domesticidade – integra-se aos
demais como um subprincípio, dando conta da produção para uso próprio ou para
satisfação das necessidades do grupo.

Convém ressaltar que a conceituação que Polanyi faz sobre os princípios de regu-
lação são ferramentas teóricas e analíticas, mas não necessariamente ocorrem nesta
forma pura. O que se verifica nas sociedades atuais, e Polanyi deixa claro, é um constante
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movimento em direção ao estabelecimento da autorregulação através da troca de mer-


cado como princípio dominante. Mas esse movimento nunca atinge a sua plenitude.

A principal tese de Polanyi (2012a, 2012b) é que a economia baseada na


troca de mercado é uma utopia: ela não poderia existir sem destruir a sociedade.
Nenhuma sociedade suportaria esses efeitos sem reagir, porque um mercado plena-
mente autorregulável aniquilaria a vida humana. Por isso, Polanyi compreende que a
dinâmica social da sociedade moderna foi governada por um duplo movimento. O pri-
meiro é o movimento do liberalismo econômico, que busca estabelecer um mercado
autorregulável e necessita da transformação da terra, do trabalho e do dinheiro em
mercadorias. O outro é chamado de contramovimento, ditado pelo comportamento
de defesa da sociedade diante dos efeitos negativos da autorregulação, cuja finali-
dade é preservar o homem e a natureza. Por meio do contramovimento emerge uma
sociedade mais intimamente entrelaçada.

Cabe ressaltar, entretanto, que Abdalla (2014) identificou que o processo de


proteção social em determinadas situações ocorre de forma difusa e não necessa-
riamente estruturada, com estratégias e ações que emanam de múltiplos atores,
inclusive ambivalentes e hegemônicos. Estes atores exercem papéis de proteção
social de forma análoga ao contramovimento polanyiano, apesar de sutilmente dis-
tinta. Ele percebe que há um destaque para a prática ambivalente exercida pela
hegemonia, uma vez que esta opera em favor do mercado e do neoliberalismo,
ao mesmo tempo em que busca favorecer a sociedade.

Desta forma, outro aspecto relevante diz respeito ao contramovimento poder


ser funcional à manutenção da ordem capitalista, como aponta Cangiani (2012) ao
afirmar que “a função real das intervenções pode também, ou principalmente, ser a
de regular os processos econômicos e sociais para evitar grandes colapsos e reforçar
a hegemonia da classe (econômica) dominante” (p. 37). E complementa que Polanyi
interpreta dessa maneira a crise do capitalismo liberal do início do século XX, pois
não se trata de reduzir a dinâmica histórica do capitalismo à “oscilação mecânica de
uma economia mais enraizada e outra menos enraizada e vice-versa” (p. 38).

Nesse sentido, Polanyi (2012a, 2012b) acredita que é possível em alguma


medida transcender o mercado autorregulável, subordinando-o de forma consciente
a uma sociedade democrática. O principal passo é romper com as crenças de que a
vida social deve ser submetida aos mecanismos de mercado. É preciso recuperar o
significado substantivo da economia. Isso não significa a ausência de mercados, pois
eles continuarão a existir de várias maneiras, mas sem constituir uma instituição autô-
noma das relações sociais através do mecanismo de autorregulação. Uma das alter-
nativas possíveis é que, mesmo em uma economia centrada no mercado, busque-se o
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desenvolvimento de outros mecanismos regulatórios mais capazes de proteger o tecido


social e o meio ambiente das pressões exercidas pelo movimento da mercantilização.

No caso dos sistemas alimentares, operando numa economia centrada no mer-


cado, é preciso verificar de que modo emergem estes mecanismos não mercantis.
É neste contexto que a visão substantiva da economia (Polanyi, 2012a, 2012b)
permite situar o contramovimento no contexto brasileiro. Propõe-se, portanto, pensar
a especificidade da resistência da sociedade em confronto com a mercantilização
desmedida da agricultura.

Formas de integração econômica e sistemas alimentares

Autores subsequentes a Polanyi, dentre estes Eric Sabourin, trazem pistas essen-
ciais para entender como as formas de integração econômica ocorrem na prática nos
sistemas alimentares. Compreender melhor estas relações e estruturas permite que a
atividade em campo seja capaz de visualizar e teoricamente categorizar as ocorrências
de contramovimento através de outros princípios além da troca de mercado.

Neste sentido, Sabourin (2009, 2011, 2014) é central para entender a estru-
tura dos laços de reciprocidade. Ele alerta que a maioria das sociedades rurais apre-
senta sistemas mistos, nos quais as práticas socioeconômicas de troca e reciproci-
dade coexistem. Vale ressaltar que o problema de discernir lógicas relacionais num
sistema misto não é trivial. A separação é produzida analiticamente pelo exame das
práticas, do projeto em realização, dos valores dos indivíduos que participam e das
estruturas relacionais implementadas. Trata-se de entender a orientação predomi-
nante das ações a partir de lógicas de movimento em direção (1) à concorrência,
visando o acúmulo do lucro para fins privados; ou (2) à reciprocidade, visando a
satisfação das necessidades do grupo.

A reciprocidade assume forma simétrica quando orbita um sentimento de jus-


tiça e preocupação com a harmonia social do grupo. No ambiente rural, a simetria
se manifesta em situações de ajuda mútua, solidariedade, cooperação e partilha
(Sabourin, 2011). Essas relações se expressam em termos de qualidade das rela-
ções sociais, de satisfação, de reconhecimento, de respeito, de festas e de espírito
de grupo. São valores que operam ciclos de reciprocidade propostos por Polanyi de
modo recursivo. No compartilhamento do trabalho os valores afetivos e éticos corres-
pondem a um sentimento de pertencimento e de confiança (Sabourin, 2009).

O princípio de redistribuição dos alimentos engloba a produção para autocon-


sumo (Polanyi, 2012b; Sacco dos Anjos et al., 2010). A lógica da reciprocidade pre-
domina sobre a lógica de troca, produzindo autossuficiência quando a preocupação
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em suprir as necessidades do grupo faz parte da produção a ser destinada ao auto-


consumo (Sabourin, 2011). Esta redistribuição impacta na renda (Ploeg, 2008).
As famílias que vivem no ambiente rural e fortalecem a produção para o autoconsumo
auferem maiores rendas agrícolas, daí a importância da autossuficiência para sua repro-
dução material e social. Um bom indicador é identificar a recorrência da aquisição, no
mercado, de alimento regularmente consumido pelo grupo (Gazolla, 2004).

A mobilização de recursos pode se converter numa categoria ampliada da redis-


tribuição direta. Conforme Ploeg (2008), recursos materiais e sociais relevantes, como
gado, rações e forragens, fertilizantes, sementes, mão de obra, conhecimento, capital
de giro, dentre outros, podem ser mobilizados por transações de mercado e, conse-
quentemente, entrar no processo de produção como mercadorias, ou ser mobiliza-
dos por trocas reguladas mediante as relações de reciprocidade, ou ser produzidos na
unidade agrícola. Quanto mais eles forem produzidos, reproduzidos e reutilizados na
própria unidade agrícola, maior será a autonomia do agricultor em relação ao mercado.

O princípio da troca pode caracterizar o mecanismo não apenas de contrato,


mas também de proximidade entre produtor e consumidor quando permeado por
relações de reciprocidade (Polanyi, 2012b). Na literatura, há algumas possibilidades.
Um desses fenômenos recebe a designação de “cadeias curtas”. Cadeias curtas cons-
tituem sistemas mistos de troca mercantil e reciprocidade. Existe a relação de troca,
mas o contato direto entre produtor e comprador desdobra-se numa relação de reci-
procidade, quando há comunicação em torno do produto, do trabalho, das receitas.
A aproximação tende a reforçar laços afetivos, de amizade, reconhecimento mútuo
e valores de fidelidade e respeito (Sabourin, 2009, 2011, 2014). A participação de
consumidores e produtores nas decisões de produção, troca e consumo alavanca sua
autonomia relativa (Darolt, Lamine, & Brandemburg, 2013), e pode catalisar movi-
mentos de resistência voltados à relocalização do controle dos sistemas alimentares
(Petersen, 2013). São alternativas à exploração capitalista porque revalorizam terri-
tórios e fatores identitários das relações de reciprocidade (Sabourin, 2014). Por isso,
o consumo de alimentos produzidos regionalmente através de cadeias mais curtas
pode se tornar um meio de fortalecer a solidariedade em defesa da soberania alimen-
tar ao estabelecer uma oposição às corporações agroalimentares (Sage, 2014).

Há outro aspecto relevante das ideias de Polanyi (2012a, 2012b) que ajuda a
situar o contramovimento na atividade de uma CSA. Ele diz respeito à atividade eco-
nômica em torno do alimento, que parece ser vocacionada para o impulso contrário
ao movimento de mercantilização.

A ambiguidade do termo “ganho” tende a encobrir essa diferença. A troca


com base em preços fixos não envolve nada além do ganho implicado para
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cada parceiro na decisão de trocar; a troca com preços flutuantes visa


a um ganho que só pode ser obtido mediante uma atitude que envolve
uma clara relação de antagonismo entre os parceiros. O elemento de
antagonismo que acompanha essa variante da troca, por mais que seja
diluído, é inerradicável. Nenhuma comunidade firmemente decidida a
proteger a fonte de solidariedade entre seus membros pode permitir que
se desenvolva uma hostilidade latente em torno de uma questão tão vital
para a existência física – e, por conseguinte, capaz de despertar angústias
tão desgastantes – quanto é o alimento. A proibição do regateio em torno
de alimentos, largamente difundida, retira automaticamente os mercados
formadores de preço do campo das instituições primitivas. (p. 309)

Desta forma resgata-se a proposta do contramovimento de Polanyi (2012a,


2012b), que sugere que a sociedade se encarrega em algum grau de enfrentar os
desafios e problemas propiciados pela mercantilização, buscando proteger o tecido
social. De fato, as ideias do autor permanecem atuais diante dos desafios que enfren-
tamos no século XXI (Bienefeld, 2007). A tese da pluralidade das formas de regula-
ção econômica é de suma importância para se pensar formas alternativas de regula-
ção que coexistam com o mercado capitalista. Talvez algumas dessas formas atuem
nas iniciativas de CSA como contramovimentos à mercantilização.

Agricultura sustentada pela comunidade (CSA): um panorama

Mais conhecida pelo acrônimo em inglês CSA, a agricultura sustentada pela


comunidade tem origem no movimento Teikei, surgido nos anos 1970 no Japão.
No Brasil as iniciativas são mais recentes, o primeiro grupo começou em julho de
2011, no estado de São Paulo (CSA Brasil, 2018; Henderson & Van En, 2007;
McFadden, 2004). Seu preceito básico é reconectar a produção ao consumo, ao
ligar um agricultor a grupos de famílias em uma região geográfica próxima, geral-
mente uma área urbana.

Em uma CSA, diferentemente do modelo de agricultura tradicional, os pro-


dutores e os consumidores deixam de utilizar intermediários na cadeia alimentar e
fazem uma parceria, dividindo os custos e os riscos inerentes ao processo produ-
tivo. Os consumidores financiam a produção desses agricultores e semanalmente
recebem uma cesta com os alimentos que colhidos no período. A regra básica é que
os produtos sejam frescos, da estação, sem agrotóxicos e cultivados localmente.
A cota é composta por vegetais, ervas, frutas e legumes (Brown & Miller, 2008;
Henderson & Van En, 2007).
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 407

Um princípio fundamental é a promoção de um modelo de produção que não


seja nocivo ao ser humano e ao entorno. Os outros princípios da CSA no Brasil são
ajuda mútua, diversificação da produção, aceitação de produtos da época, comer-
cialização com preços justos, criação de relações de amizade, distribuição inde-
pendente, gestão democrática, aprendizagem mútua, produção e consumo local e
estabilidade (CSA Brasil, 2018).

Não é possível compreender a CSA sem considerar a série de princípios que


organizam suas práticas, conforme indica o Quadro 1.

Quadro 1 – Princípio de toda CSA


Dez princípios subjacentes a toda CSA
1 Não utilizar substâncias sintéticas no solo, nas plantas e nos animais.
O estrume para as plantas vem de animais; o ideal é uma combinação que inclua
2 galinhas, cavalos, porcos, ovelhas e cabras, pois cada um gera estrume com qualidade e
funções diferentes.
3 Nutrir os animais com a alimentação produzida na fazenda.
4 Buscar grande diversidade de plantas em combinação, numa rotação de culturas.
Reconhecer que a circulação do carbono ou das substâncias orgânicas, através do solo,
5
das plantas e do ar, é a base para a fertilidade por meio do húmus.
6 Fortalecer a circulação de sílica no solo encorajando o processo macrobiótico.
Criar condições harmoniosas e balanceadas no solo, nas plantas, nos animais e na
7
paisagem como uma base necessária para a produtividade.
A natureza destruída deve ser restaurada, pois ela é uma barreira natural contra a
8
erosão e detém importantes funções no estabelecimento do equilíbrio da plantação.
Implementar um controle biológico de ervas daninhas e de pestes auxiliado por todos os
9 passos anteriores, com destaque para a natureza restaurada, o uso de excrementos de
qualidade e a rotação de plantas.
Estabelecer uma ordem rítmica conectada com a natureza, respeitando os ciclos
10 de produção, do sol e da lua. Essa cadência é essencial para a sobrevivência
atrelada à preservação.
Fonte: Groh & McFadden (1997).

É mais usual que uma CSA opere em pequenas extensões, na base do traba-
lho intensivo e familiar (Henderson & Van En, 2007). Cada início de atividade tem
um contexto peculiar de motivações. O engajamento de produtores passa por fatores
como busca por mercado mais estável e preços justos (Bîrhală & Möllers, 2014)
e preocupação com produção orgânica, relacionada ao meio ambiente e à saúde
(Farnsworth, Thompson, & Drury, 1996; Oberholtzer, 2004). As motivações dos con-
sumidores combinam lógicas de decisão que vão desde melhorar a saúde pessoal até
críticas ao modelo hegemônico de produção e distribuição (Ostrom, 2007). Motivos
mais frequentes referem-se a condições de saúde e nutrição via consumo de produtos
frescos orgânicos. Pesquisas apontam ainda preocupações ambientais; necessidade
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 408

de conhecer quem e como se produz o que é consumido; preocupações políticas,


como apoio a iniciativas de produção e distribuição alternativa sem a presença de
intermediários e oposição aos grandes mercados; e solidariedade e apoio à agricul-
tura local.

O ingresso do consumidor geralmente envolve o pagamento de uma cota ao


produtor vinculado antes do plantio. O cálculo leva em conta custos totais de pro-
dução e um salário justo para o agricultor. Isto garante o escoamento da produção e
uma renda antecipada para ele (Darolt et al., 2013). Os consumidores aceitam tacita-
mente a ideia de compartilhar o risco como um conceito-chave da CSA (Oberholtzer,
2004). De fato, eles mostram um alto nível de confiança nos agricultores parceiros,
sendo esta a base que mantém ativa a relação econômica (Bîrhală & Möllers, 2014).

Ainda assim, a viabilidade econômica da operação não está garantida: há


necessidade de gerenciamento. A tomada de decisão pode ficar por conta dos agricul-
tores, mas ocorre também com a participação de consumidores. O chamado núcleo
de gestão é formado por agricultores e consumidores (Lass, Stevenson, Hendrickson,
& Ruhf, 2003). O grau de envolvimento varia muito de um grupo para outro.
No limite, há núcleos de gestão que comandam a organização. Isso ocorre com
mais frequência quando consumidores procuram um agricultor para iniciar a parce-
ria (Sanneh, Moffitt, & Lass, 2001). O núcleo de gestão numa CSA parece envolver
mais ativamente os consumidores e ampliar o senso de comunidade (Henderson &
Van En, 2007; Lass et al., 2003).

Andreatta, Rhyne e Dery (2008) apontam que, ao contrário do que é sugerido


muitas vezes na literatura, a CSA não é um projeto elitista em relação aos consumido-
res, pois, além de auxiliar o produtor, também pode ser um projeto capaz de lidar par-
cialmente com o problema da insegurança alimentar nas famílias de consumidores
de baixa renda. Para Henderson e Van En (2007), a CSA é um incentivo para a per-
manência no campo, promovendo melhores remunerações e estabilidade financeira.
Explicam que muitos produtores afirmam que a CSA nem sempre é a atividade produ-
tiva que oferece mais rendimentos, entretanto torna-se mais interessante em função
da estabilidade que proporciona. De fato, Hendrickson (2005) constatou que a CSA
aparece como uma estabilizadora da renda, tanto por ter as vendas mais estáveis
e garantidas antecipadamente pelo pagamento anterior ao momento da plantação,
quanto por não depender diretamente das flutuações do mercado. Matzembacher e
Meira (2019) identificaram uma série de benefícios sociais, ambientais e econômicos
para produtores e consumidores.

Por meio da CSA, produtores e consumidores convergem em uma comunidade


vital e criativa que celebra a diversidade, tanto social quanto biológica, e fazem com
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 409

que a justiça e a segurança alimentar se tornem realidade por meio dos produtos
ecológicos e comercializados de uma forma mais justa para ambos (Henderson &
Van En, 2007). Por isso, talvez a CSA possa atuar como um contramovimento à mer-
cantilização na agricultura.

Metodologia

Esta pesquisa constitui um estudo de caso, realizado através de observação par-


ticipante, utilizando as técnicas de etnografia, entrevistas em profundidade e acesso a
dados secundários. A coleta de dados ocorreu ao longo de sete meses num grupo de
Minas Gerais, aqui denominado CSA Alfa. O Quadro 2 sintetiza as etapas da pesquisa.

Quadro 2 – Estágios da pesquisa


Período Etapa
Entrevista em profundidade com três consumidores/coprodutores
Setembro
(fundador da CSA e dois outros consumidores que se voluntariaram
2015
no gerenciamento da CSA).
Setembro Observação participante e entrevistas em profundidade durante dois dias em
2015 que os coprodutores acamparam no local de um dos agricultores da CSA.
Moradia com um dos produtores, monitorando o processo de produção,
colheita, transporte e entrega das cestas de alimentos aos consumidores,
Outubro 2015
bem como gerenciando atividades relacionadas à CSA. Entrevista em
profundidade com os três produtores e vinte coprodutores da CSA.
Acompanhamento quinzenal por telefone com produtor e coprodutores que
participam da gestão dos grupos da CSA. Participação como ouvinte de
Novembro
reuniões gerenciais via internet e participação do grupo CSA WhatsApp
2015 a março
(com produtores e coprodutores). Acesso a dados secundários (todos os
2016
e-mails da CSA, website, publicações no Facebook e artigos em jornais e
televisão sobre o grupo).
Abril 2016 Observação participante e entrevistas em profundidade com o Produtor 1.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Desta forma, a observação participante foi realizada em períodos em que se fez


residência junto à família de um produtor (outubro de 2015 e abril de 2016), viven-
ciando a rotina de trabalho e as relações cotidianas com consumidores. Foram reali-
zadas entrevistas em profundidade com o criador da CSA Alfa (denominado Mentor),
com os agricultores (Produtor 1, Produtor 2 e Produtor 3), com consumidores parti-
cipantes da gestão da organização (Coprodutor 1 e Coprodutor 2), com o técnico da
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) da região, e com vinte
consumidores, incluindo os envolvidos em trabalhos voluntários.
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 410

As observações contemplaram as atividades produtivas, reuniões de gestão,


momentos de interação entre agricultores e consumidores, transporte e entrega de
cestas. Ao final da pesquisa foram obtidas 21 horas de gravação de entrevistas e 324
registros fotográficos, além das notas do diário de campo. As observações in loco
foram intercaladas com acompanhamento à distância através de contatos telefônicos
quinzenais com o Mentor e com o Produtor 1; monitoramento de correio eletrônico
e aplicativo WhatsApp dos participantes da CSA Alfa; participação como ouvinte de
reuniões de gestão via internet e contato frequente com os coprodutores integrantes
da gestão. Ao longo da pesquisa, foi concedido acesso à pasta de e-mails da CSA Alfa
desde a sua origem, possibilitando a leitura de todos os e-mails.

Malinowski (1978) é precursor de estudos etnográficos cujas técnicas foram


utilizadas neste estudo. A elaboração teórica forneceu elementos para a construção
das categorias de análise que precederam o trabalho em campo. Mas essa cons-
trução foi dinâmica, com revisões e ampliações diante das situações deparadas na
vivência em campo, em uma espécie de construção mútua entre a teoria e a prática.

Os dados obtidos foram explorados por meio de análise descritiva, seguindo a


orientação de Angrosino (2009) para decompor o fluxo de dados obtidos em busca
de compreender padrões e regularidades e capturar os comportamentos partilhados
pelo grupo. Miles e Huberman (1994) fornecem uma lista de ferramentas para téc-
nicas de codificação e esquemas sistemáticos a fim de preservar a riqueza de dados,
criar categorias e reconhecer relações entre categorias. Eles foram observados nesta
pesquisa. Nesse sentido, os principais passos utilizados na análise foram: (1) consoli-
dação dos dados (seleção, transformação, codificação e agregação dos dados brutos);
(2) apresentação de dados (organização e exibição de dados); e (3) elaboração de
conclusões (identificação de relações entre categorias).

A codificação foi baseada na tese de contramovimento de Polanyi e buscou evi-


dências em campo de situações apontadas principalmente por Sabourin (2009, 2011,
2014), mas também por Darolt et al. (2013), Gazolla (2004), Petersen  (2013),
Ploeg (2008) e Sacco dos Anjos et al. (2010). Neste sentido, a primeira análise foi
feita manualmente e uma segunda foi realizada com o auxílio do software Nvivo 11,
que suporta uma organização mais aprimorada em pesquisas qualitativas, aportando
também a análise das imagens realizadas em campo.

Estudo de caso: a CSA Alfa

Os resultados estão apresentados de acordo com os objetivos: compreender


o contexto e as motivações que originaram a CSA; o modo de operação; as trocas e
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 411

implicações das relações de reciprocidade; e os impactos na reprodução material e


social dos indivíduos.

Contexto e as motivações que originaram a CSA

A CSA Alfa surge na região metropolitana de Belo Horizonte por iniciativa de


consumidores, cujas motivações informadas foram as seguintes: (1) uma alimenta-
ção saudável e de qualidade pela aquisição de alimentos orgânicos/agroecológicos;
(2) uma aproximação de pessoas que tenham valores compartilhados e o mesmo
estilo de vida; (3) o preço dos alimentos não aparece como motivação central,
a maioria dos consumidores informou não se interessar pela comparação de preços;
(4) incentivar a produção agroecológica local; (5) eliminar o intermediário ao comprar
direto do produtor; e (6) conhecer a origem dos produtos que consomem.

Dentro da CSA Alfa o termo consumidor sequer é utilizado, o grupo faz refe-
rência a “coprodutores”. O Mentor explica que “o consumidor é aquele que vai lá no
sacolão comprar e consumir, enquanto o coprodutor não é um consumidor, ele está
financiando a produção, é um parceiro do produtor”. Respeitando a terminologia
utilizada na CSA, a exposição dos resultados também utiliza esta nomenclatura.

Os dois primeiros agricultores que ingressaram na CSA Alfa (Produtor 1 e


Produtor 2) têm histórico de vida e motivações similares. Ambos praticaram a mono-
cultura convencional por décadas, sempre com o uso de fertilizantes químicos e, em
diversos plantios, valiam-se do uso de agrotóxicos. Submetidos a intermediários na
revenda da produção, ambos passaram dificuldades financeiras. O Produtor 1 optou
pelo êxodo rural, retornando posteriormente à atividade. Ambos relatam que decidi-
ram participar em razão da garantia do escoamento da produção, pois na modalidade
anterior com frequência sofriam prejuízos.

Um terceiro produtor (Produtor 3) tenta se integrar à CSA Alfa. Ex-presidiário


e dependente químico, ele percebe ali uma oportunidade para sua recuperação.
Os coprodutores justificam aceitá-lo por solidariedade e responsabilidade para com a
comunidade rural. O Coprodutor 1 explica que “a gente tem uma responsabilidade
social de apoiá-lo. Se a proposta da CSA é transformação social, nada mais justo do
que dar uma chance para ele recomeçar”.

Dessa forma, o contexto e as motivações que levaram à formação da CSA Alfa


permitem antever a dinâmica da mercantilização no ambiente rural em que ela opera.
As estratégias de engajamento podem indicar tentativas de resistência que buscam
escoar a produção por meio da cooperação entre produtores e coprodutores que
compartilham valores morais e riscos econômico-financeiros. Entretanto é preciso
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 412

avançar na análise para compreender melhor se há indícios de um contramovimento


nas práticas realizadas.

Modo de operação

No início da pesquisa a CSA Alfa era composta por dois agricultores (Produtor
1 e Produtor 2) que vivem na zona rural da região metropolitana de Belo Horizonte
e 72 famílias de consumidores/coprodutores, a maioria residente em Belo Horizonte
(MG). Com isso, era garantido o fornecimento de uma cesta semanal com alimentos
suficientes para um grupo familiar de até quatro pessoas. Ao longo de tempo, alterações
importantes ocorreram: (1) o ingresso do Produtor 3; (2) elevou-se o preço pago pelos
coprodutores; (3) o número de coprodutores ampliou para 135 famílias; (4) mudou
a sistemática de preparo das cestas para atender indivíduos que moram sozinhos;
(5) o Produtor 1 incorporou o trabalho dos seus dois filhos à produção destinada à
CSA (a seguir denominados Aprendiz 1 e Aprendiz 2).

A CSA Alfa é uma associação informal, mas tem um regimento interno que
expressa claramente três princípios: alimentação saudável, agricultura sustentável e
transformação social. As relações de confiança são essenciais. Esta palavra aparece
espontaneamente e com muita frequência no relato dos produtores e coprodutores
para justificar a ausência de um contrato formal, a dinâmica que envolve o paga-
mento prévio pelos coprodutores, o ato de produzir do agricultor e a ausência de
certificação formal. Os envolvidos acreditam e confiam no compromisso assumido
entre eles. Insinua-se assim a preponderância de vínculos pessoais e simétricos que
pautam o princípio da reciprocidade na sua articulação com a troca de mercado.
Os valores afetivos e morais produzidos e relatados por agricultores e coprodutores
sob os rótulos da confiança e do senso de responsabilidade correspondem a relações
de reciprocidade. Ao que tudo indica, são esses sentimentos de pertencimento e de
confiança que conferem força ao que a CSA representa.

Um relato do Mentor reforça essa compreensão. Ele explica que nem todos os
candidatos a coprodutores assumem a mesma postura em relação à ausência de um
contrato formal. Alguns deles questionam essa relação entre fornecedor e coprodutor.
Ele responde que “a CSA não é fornecedora, a nossa relação de consumo é outra”
(Mentor, 2016) e finaliza explicando a esses possíveis coprodutores as informações da
Carta de Princípios da CSA Alfa. O Mentor diz que, se a pessoa não concorda com esses
valores, ele orienta a não ingressar no grupo. Ele explica que isso normalmente ocorre
quando os coprodutores buscam apenas uma vantagem econômica, querendo comprar
orgânicos com preço menor do que em outros canais, e que por vezes essas pessoas
ingressam na CSA mesmo com todos os avisos, mas que, em seguida, acabam saindo:
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 413

À primeira vista, a grande vantagem da CSA até pode parecer reduzir o


preço dos orgânicos para o consumidor, mas isso não é o mais importante
para nós, o mais importante é esse novo modelo de consumo que nós
acreditamos, a transformação social. Na CSA, você não vai escolher o que
você vai comprar, você está investindo, por isso que paga mais barato,
porque não escolhe, vai o que conseguiu produzir e a pessoa tem que
aceitar isso, e em geral a maioria entende isso e nós não temos problema.
Tem uma minoria que fica questionando e vai saindo depois, o que para
nós até é bom, a gente os agradece por saírem, porque não serve ter
pessoas que não entendem a filosofia da CSA. (Mentor, 2016)

Esse relato reforça a compreensão de que, nessa situação de ingresso, a reci-


procidade se sobressai ao princípio da troca de mercado: ao identificar a presença
dos valores relacionados à noção do cálculo utilitário e a busca pela satisfação dos
interesses materiais privados, a opção adotada na CSA Alfa é deixar de vender essas
cotas mensais para as cestas de alimentos a fim de promover ou valorizar outro tipo de
relacionamento entre o grupo. Essa busca pela preservação da coesão social reforça
um movimento em favor da tese do contramovimento de Polanyi (2012a, 2012b),
uma vez que o interesse pelo fator humano se sobressai à questão econômica.

Os alimentos são plantados sem uso de agrotóxicos ou fertilizantes, valendo-se


de esterco e produtos naturais. A colheita da semana é dividida entre os coprodutores
vinculados. O acordo prevê que o produtor deve planejar a produção para entregar
uma variedade mínima de sete diferentes alimentos nas cestas – legumes, vegetais e
frutas frescas e da estação. Se for possível colher mais do que esse mínimo na área
de plantio destinada para a CSA, os produtos vão para a cesta. Na ocorrência de
imprevistos, a quantidade é menor ou não haverá envio de produtos, sendo este risco
assumido previamente pelos participantes. A cesta é similar a relatos da literatura
(Brown & Miller, 2008; Henderson & Van Em, 2007).

A distribuição ocorre em Belo Horizonte, realizada pelos próprios coprodutores,


que trabalham voluntariamente. Do valor pago pelos coprodutores, 70% fica para
o produtor e 30% são para gerir a CSA Alfa. Além de terem fundado a iniciativa,
os coprodutores realizam a maior parte da gestão. Eles explicam que o produtor quer
lidar somente com o plantio: estas informações são confirmadas e, com frequência,
ressaltas pelos próprios produtores.

O trabalho para manter a CSA Alfa ocorre de forma voluntária, permitido a


todos que tiverem interesse. Um grupo menor de coprodutores voluntários forma
o núcleo de gestão. As decisões cotidianas são realizadas via aplicativo WhatsApp
entre todos os coprodutores e produtores. Estes são os responsáveis pelas decisões no
processo produtivo, mas os coprodutores os acompanham e os ajudam ativamente.
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 414

A rotina semanal envolve visita de alguns coprodutores aos agricultores para acom-
panhamento da plantação. Vale ressaltar que as atividades têm apoio e orientação da
Emater regional.

Nos relatos sobre o funcionamento da CSA Alfa há algumas evidências de que


o predomínio da agricultura convencional não eliminou as outras lógicas de regulação
econômica. Na comercialização dos alimentos despontam algumas diferenças em rela-
ção aos canais tradicionais de mercado. A primeira delas é que a CSA se situa entre a
troca mercantil e a reciprocidade, formando um sistema misto por meio da venda direta
e ações que integram produtor e coprodutor. A segunda diz respeito à forma de produ-
ção distante do método convencional: grande variedade de alimentos sob um mesmo
produtor, com ampla utilização de esterco e folhas como adubos orgânicos. A forma
plural manifesta na CSA Alfa permite pensar a existência de um contramovimento
(nos termos de Polanyi) à mercantilização dos sistemas alimentares. O contato direto
entre os envolvidos prioriza as relações humanas e valores afetivos e morais. Portanto,
adquire importância analisar as relações de reciprocidade e seus desdobramentos.

Trocas e implicações das relações de reciprocidade

Ainda que as relações na CSA Alfa sejam também regidas pela lógica inerente
ao princípio da troca de mercado, a forma como ocorrem evidencia uma série de situ-
ações de ajuda mútua, solidariedade e compartilhamento. Percebe-se a existência do
princípio da reciprocidade indicado por Polanyi (2012a, 2012b) no plano teórico, o qual
Sabourin (2009, 2011, 2014) denomina de sistemas mistos entre reciprocidade e troca.

Nesse sentido, foram identificados quatro fatores que podem indicar o pre-
domínio das relações de reciprocidade, formando ações que se aproximam de um
contramovimento. O primeiro fator remete a um compartilhamento prévio da visão de
mundo entre os participantes, o que foi identificado anteriormente, promovendo um
engajamento não atrelado a questões financeiras. O segundo fator refere-se à forma
de produzir, que se opõe ao método convencional não por questão de rentabilidade,
mas por buscar a qualidade nutricional do alimento aliada à preocupação de preser-
var a natureza. O terceiro fator diz respeito à forma que a troca diretamente assume:
a associação entre as pessoas, a regularidade das prestações, a eliminação do inter-
mediário, a prática de coprodutores acompanharem a produção agrícola e a partici-
pação coletiva nas decisões sobre as atividades do grupo. O quarto e último fator é a
realização de atividades conjuntas entre as famílias de coprodutores e as famílias dos
agricultores dentro e fora do circuito comercial, incluindo aí a coprodução e o lazer.

Este conjunto de fatores, que serão detalhados a seguir, evidencia a presença


de relações de reciprocidade nas operações da CSA Alfa. Assim, ao não buscar apenas
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 415

o cálculo e a satisfação dos interesses materiais privados (Polanyi, 2012a, 2012b;


Sabourin, 2011), estas atividades trazem necessariamente implicações diferentes.
Nesse caso identifica-se que, além da utilidade material, há o afastamento da com-
petição e o estabelecimento de valores afetivos e morais de amizade, confiança,
reconhecimento mútuo, solidariedade e fidelidade. Além de observados em situações
reais, esses princípios são frequentemente confirmados pelo relato dos participantes.

Na CSA Alfa as trocas não são atos impessoais entre ofertante e demandantes:
não há venda de cestas para o público geral. O produtor e o coprodutor que desejam
ingressar no grupo precisam assumir o compromisso com suas prestações de regu-
laridade, aceitação de riscos e tolerância. Isso indica a busca por estabelecer um
compartilhamento de valores comuns (Sabourin, 2011), em que o objeto de partilha
importa (alimento), desde que imerso em relações sociais específicas. Aparecem na
fala dos coprodutores e dos produtores a confiança, a amizade, a justiça e a respon-
sabilidade como resultado do engajamento. Isso corresponde à reciprocidade simé-
trica já identificada em ambientes rurais por Sabourin (2011). Indicam na prática o
princípio apontado por Polanyi (2012a, 2012b). De fato, Henderson e Van En (2007)
entendem a adesão dos pequenos produtores como uma estratégia para contornar a
exposição a mercados concentrados e competitivos, e que a partilha de riscos entre
consumidores e produtores constitui uma alternativa concreta ao domínio do agrone-
gócio, numa forma que se diferencia do sistema convencional também pelo uso de
técnicas agroecológicas. Estes elementos foram identificados na CSA Alfa.

As interações são essenciais tanto para a produção de bens quanto de valores


(morais). Nesse sentido, a CSA Alfa constitui uma cadeia curta sob um sistema misto
entre troca de mercado e reciprocidade (Sabourin, 2003). No plano teórico, sobressai
a reciprocidade (Polanyi, 2012b). A interface de encontro entre produtor e coprodu-
tor é o que permite redobrar uma relação de reciprocidade e gerar valores afetivos e
morais. Dentre as formas de interação estão as visitas semanais dos coprodutores
para acompanhar a produção, além da interação entre os participantes nos pontos de
entregas das cestas. Aqui, verifica-se a aproximação entre coprodutores: nas situações
observadas foi possível perceber que, em vez de simplesmente retirarem as cestas, eles
permaneciam no local em rodas de conversa, alguns pelo turno inteiro da entrega.

O mais amplo e abrangente evento de interação na CSA Alfa é bimestral, num


final de semana em que as famílias de coprodutores acampam nas terras de um agri-
cultor e participam de mutirões de plantio – o que Sabourin (2011) define como uma
das manifestações típicas da reciprocidade conceituada por Polanyi. Eles fazem refei-
ções coletivas, atividades como dança, jogos de cartas, caminhadas, práticas espiri-
tuais, ioga e reiki, dentre outros. Em alguns desses eventos, realizam-se assembleias
para a tomada de decisão coletiva. Em alguns momentos de interação, produtores e
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 416

coprodutores conversam sobre crudivorismo, promoção da saúde pela alimentação e


melhor aproveitamento dos alimentos.

Esta série de interações produz um senso de amizade, de responsabilidade e


de confiança relatado por muitos, tanto produtores quanto coprodutores. Uma copro-
dutora explicou que a vantagem de participar da CSA Alfa em relação aos canais
tradicionais de compra de alimentos é a interação entre as pessoas. Nesses casos,
é evidente que a relação social ou afetiva entre os sujeitos é mais importante que a
natureza material da prestação do trabalho. Tal como aponta Polanyi (2012a), estas
relações estabelecidas, típicas da reciprocidade, constituem um mecanismo oposto à
simples troca do mercado.

Ao longo da pesquisa foi possível acompanhar duas estações nas quais a seca
ou as fortes chuvas afetaram a colheita significativamente. A grande maioria das
pessoas aceitou os poucos e pequenos itens recebidos nas cestas. Provavelmente
essas manifestações de solidariedade e tolerância derivam do prévio estabelecimento
de relações de reciprocidade. Nesse momento, há clara prevalência da reciprocidade
sobre a troca de mercado (Polanyi, 2012a), evidenciando que esses grupos possuem
alguma característica que permite agregar valores humanos às relações comerciais e
em alguma medida, aproximar-se do conceito do contramovimento. Quando o copro-
dutor demonstra tolerância com os alimentos que recebe em períodos de escassez,
quando aceita produtos de época e quando opta por financiar a produção do agricul-
tor, assumindo em conjunto os riscos, percebe-se novas formas de ajuda mútua, com
ações regidas primordialmente pela reciprocidade. Uma maior coesão na sociedade
em alguma proporção é fortalecida.

A reciprocidade evidencia-se também quando há trabalho voluntário, seja na


administração, acompanhando a produção ou auxiliando a entrega das cestas. Cada
um colabora com suas habilidades, situação que Sabourin (2009) classifica como um
compartilhamento do trabalho. Por exemplo, as pessoas que têm formação em áreas
relacionadas à agricultura dispuseram-se voluntariamente a trabalhar auxiliando no
planejamento e acompanhamento da produção.

Destaca-se a ausência de certificação formal do método agroecológico de pro-


dução. De fato, ocorre uma certificação por confiança, originada pela reciprocidade
e descrita por Sabourin (2009, 2011) e Polanyi (2012a, 2012b). Para explicar
essa situação, os entrevistados da CSA Alfa insistem na semântica da confiança:
“os coprodutores da CSA não exigem a certificação porque é tudo na base da con-
fiança mesmo, não tem assinatura de ninguém, eles confiam que nós vamos pro-
duzir sem veneno e a gente confia que eles vão pagar” (Aprendiz 1, 2016); “eu sei
porque eu confio nos agricultores e eu conheço eles” (Coprodutor 1, 2016). A última
fala sinaliza a importância do contato direto, que resulta do encurtamento da cadeia
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 417

de distribuição. Ao eliminar o intermediário, aproxima produtor e consumidor, além


de fortalecer as relações de confiança ao abrir a unidade produtiva para visitas regu-
lares. O resultado é que o papel dos consumidores é consideravelmente ampliado por
colaborações eventuais no plantio, na colheita e na entrega, além de atividades de
lazer promovidas no espaço produtivo.

Os resultados sinalizam que, em razão da aproximação entre produtor e copro-


dutor e das decorrentes práticas de reciprocidade estabelecidas, é possível adicionar,
além do valor utilitário, sentimentos e questões morais às transações, que são mais
decisivos do ponto de vista das práticas econômicas da CSA Alfa. Resulta que o pre-
domínio da lógica de reciprocidade de Polanyi define essencialmente uma nova forma
de produção e distribuição de alimentos que, mesmo inserida no sistema capitalista,
atua na direção oposta à mercantilização.

O que se verifica ao longo do relato sobre o funcionamento da CSA Alfa é que


o predomínio da agricultura convencional e dos valores associados ao princípio de
troca nos sistemas alimentares não eliminou outras lógicas que também são capazes
de atuar na regulação econômica. A comercialização dos alimentos neste grupo de
CSA é o que remete ao componente mercantil, entretanto a CSA Alfa apresenta algu-
mas diferenças em relação aos canais tradicionais de mercado. A primeira é que ela
implementa uma interface ou hibridação (variando conforme a lente teórica utilizada)
entre a troca de mercado e a reciprocidade, formando um sistema misto por meio da
venda direta de produtos agrícolas, da eliminação do intermediário e das atividades
de integração entre produtor-coprodutor e entre coprodutor-coprodutor. Esses laços
estabelecidos pelo encurtamento da cadeia possibilitam a retomada de aspectos
decisórios para as comunidades, com avanços relativos à autonomia. A ajuda mútua,
a solidariedade, o compartilhamento de trabalho e de saberes ampliam a proteção
em relação aos mecanismos de mercado e à competição. Assim, permitem um res-
gate de valores como solidariedade e confiança, geralmente ausentes nas relações de
mercado. Constituem mecanismos de resistência e fortalecimento de autonomia, con-
siderados por Polanyi (2012a, 2012b) como características de um contramovimento.

Para França Filho (2004, 2007), esse circuito integrado de relações socio-
econômicas entre produtores e coprodutores estimula uma lógica de rede nesses
territórios, na qual a competição perde a importância, assim como perde sentido a
consideração da oferta e da demanda como entidades abstratas harmonizadas por
uma mão invisível, sinônimo da autorregulação do mercado. O resgate da produção e
do consumo local, da territorialização, trazem à tona as propostas de Polanyi (2012a)
e Sabourin (2014) em relação a fatores identitários das relações de reciprocidade,
que Petersen (2013) entende serem capazes de auxiliar a catalisar movimentos de
resistência voltados à relocalização do controle dos sistemas alimentares.
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 418

No centro das disputas ideológicas apresentam-se tanto os produtores quanto


os coprodutores. Não é apenas o produtor, pois o coprodutor exerce papel preponde-
rante no processo de mudança social. Ele pode estimular a produção e distribuição
de alimentos mediante os processos de mercantilização ou pode questionar essa
lógica (Betti, Feniman, Schneider, & Nierdele, 2013). Há espaço para as pessoas
participarem, há empreendedores cívicos com postura mais coletiva do que indivi-
dual, que transformam projetos em realidade. O que realizam não pode ser explicado
pela espera de um retorno sobre o investimento, pois a pressão por lucratividade não
é determinante. Isso havia sido identificado por Laville (2001). De fato, há valores
morais e de amizade envolvidos (Polanyi, 2012b). De alguma forma este tipo de
relação estabelecida na CSA é capaz de atender a proposição de Polanyi (2012a) e
de Porto-Gonçalves (2012) de impor limites ao mercado e não o dissociar da vida em
sociedade e da dependência do homem em relação à natureza.

Tal como propõe Laville (2001), as associações com a CSA Alfa podem redes-
cobrir o potencial organizador da sociedade fazendo referência à existência de uma
maior solidariedade. Essa solidariedade permite movimentos capazes de defender
os sistemas locais de produção e consumo, dos quais Ploeg (2008) forneceu algu-
mas pistas para alertar sobre a importância de atividade de CSA como uma crítica
simbólica, uma insubordinação e uma alternativa aos impérios alimentares. Essa é
a implicação das relações de reciprocidade no circuito da CSA Alfa: afastar da lógica
de mercado, proporcionar uma alternativa mais justa de comercialização e ampliar a
autonomia relativa e o grau de coesão da comunidade em questão.

Se a reciprocidade é um princípio antagônico à troca ao não buscar apenas a


noção do cálculo e a satisfação dos interesses materiais privados (Polanyi 2012a,
2012b; Sabourin, 2011), ela necessariamente traz implicações diferentes. O que
permanece é a proposta da hibridação já levantada por Sabourin. Assim, é muito
factível afirmar que a CSA constitui uma rede de produção e comercialização de ali-
mentos agroecológicos com espaços de reciprocidade que atuam, principalmente, em
função do encurtamento das cadeias e das relações entre produtores e coprodutores
produzidas em decorrência disso. Mas essas relações estão inseridas em uma forma
de produção capitalista e servem como contramovimentos e alternativas à mercanti-
lização dentro desse contexto.

Essa noção de contramovimento extrapola o real e adentra o simbólico por meio


da fala de alguns coprodutores. Para aqueles que forneciam explicações mais elabo-
radas e com elementos de crítica quando explicavam a sua vinculação à CSA Alfa,
foi questionado se consideram a CSA uma forma de resistência a algo e eles fizeram
respostas muito elaboradas e críticas fortes à forma de produzir tradicional. De fato, a
noção do duplo movimento de Polanyi (2012a, 2012b) somada à questão da domina-
ção proposta por Fraser (2014, 2017) está bastante presente nas motivações para o
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 419

engajamento dos coprodutores: eles se posicionam como partidários de algum tipo de


emancipação, cujo objetivo principal é libertar-se de um tipo de dominação que atri-
buem aos efeitos negativos dos mercados globais de distribuição de alimentos.

Em decorrência do que foi exposto, talvez a noção de hibridação e comple-


mentaridade entre os princípios de regulação seja menos adequada. A relação entre
os princípios não é sempre harmônica, podendo ser mais interessante falar de uma
interface em razão do antagonismo que existe entre elas. De toda forma, o que inte-
ressa à análise é que despontam como principais elementos geradores dessa plurali-
dade das formas econômicas (Polanyi 2012a) que se fazem presentes na CSA Alfa,
o encurtamento da cadeia pela eliminação do intermediário e a busca pela convivên-
cia entre as pessoas. O contato direto entre produtor- coprodutor, produtor-produtor
e coprodutor-coprodutor prioriza as relações humanas em detrimento da troca com
vistas ao lucro, e daí podem surgir os valores afetivos e morais. É nesse contexto que
adquire importância analisar as relações de reciprocidade e seu desdobramento na
manutenção e ampliação da autonomia relativa e da coesão social.

Reprodução material e social dos indivíduos

Os relatos dos coprodutores e as interações observadas entre eles parecem


indicar que a participação na CSA Alfa fortalece alguns aspectos vinculados à sua
reprodução material e social. Uma dieta isenta de agrotóxicos ou outros produtos quí-
micos promove a saúde humana. O conhecimento da procedência dos alimentos e a
construção de um senso de comunidade em torno da alimentação despontam como
os principais benefícios gerados aos coprodutores pelo engajamento neste grupo.
Nesse sentido, uma parcela significativa de indivíduos alterou os seus hábitos ali-
mentares em direção a uma dieta mais saudável. Passaram a consumir mais frutas,
legumes e vegetais, adaptaram a alimentação aos ingredientes que recebem nas ces-
tas, passaram a cozinhar e alimentar-se mais no ambiente doméstico e aprenderam
novas receitas mediante as interações com os produtores e com os demais coprodu-
tores. As interações são essenciais para este resultado.

Ainda que apenas uma minoria tenha informado que comparou preços com
outros canais, aqueles que o fizeram disseram que participar da CSA Alfa permite
uma redução de gastos, facilitando a sua reprodução material. Essa compreensão é
reforçada por alguns coprodutores que integram o núcleo de gestão, que trabalham
com os produtores na definição dos preços. Segundo eles, para propor os novos valo-
res das mensalidades um dos critérios foi um meio termo entre os valores pagos a
produtores por intermediários e os valores cobrados de coprodutores em pontos finais
de venda de alimentos orgânicos.
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Em relação aos agricultores, uma série de questões vêm a favorecer a autonomia


relativa e fortalecer a sua capacidade de produção e reprodução no ambiente rural,
tanto nos aspectos materiais de existência quanto naqueles atrelados ao ambiente
social e cultural. Já foram aqui relatadas as relações de reciprocidade que se estabe-
lecem entre produtor e coprodutor por meio da ajuda mútua e do compartilhamento
e que resultam, dentre outros, em solidariedade, tolerância, fidelidade e comprometi-
mento mútuos. Há que destacar também o afastamento dos mecanismos de mercado
mediante reciprocidade mobilizada na comunidade rural e incentivada pela CSA Alfa
e a garantia do escoamento da produção em virtude do financiamento prévio, permi-
tindo ajustar o plantio de acordo com a demanda.

Também podem ser considerados sob o viés da ampliação da autonomia relativa


dos produtores a aceitação e a valorização por parte dos coprodutores dos alimentos
que recebem na cesta, independentemente do seu tamanho e aparência; a amplia-
ção dos recursos mobilizados na unidade produtiva agrícola em vez do mercado; a
autonomia de decisão a respeito do processo produtivo; a remuneração do agricultor;
e a manutenção de outros canais de comercialização que não geram dependência das
atividades da CSA.

Em relação à aceitação dos alimentos, em diversas situações o Produtor 1


(2016) afirmou que: “os coprodutores da CSA querem qualidade e não boni-
teza”. Uma situação destas ocorreu na colheita de cenouras, quando o Produtor 1
e os Aprendizes 1 e 2 mostraram cenouras pequenas aceitas e valorizadas na
CSA. Nos canais convencionais, a aparência nunca pode estar fora de um padrão
estético que pouco tem a ver com o valor nutricional.

A CSA Alfa tem levado os agricultores a ampliarem os recursos mobilizados na


própria unidade produtiva. Isso ocorre em quatro diferentes situações: a utilização de
esterco e folhas como adubo naturais substituindo fertilizantes industrializados, o uso
de caldas orgânicas em vez de defensivos químicos industrializados, o movimento
ainda em fase inicial em direção à produção de suas próprias mudas e sementes e
a produção para o autoconsumo familiar. Nessas quatro situações, redistribuição e
reciprocidade (Polanyi, 2012a, 2012b) detém papéis centrais, com efeitos similares
àqueles indicados por Sacco dos Anjos et al. (2010), Gazzola (2004), Ploeg (2008)
e Sabourin (2011) na ampliação da autonomia relativa.

A produção para o autoconsumo do grupo familiar também apareceu como um


dos recursos mobilizados na própria unidade produtiva em vez do mercado em decor-
rência da participação do agricultor na CSA Alfa. Os agricultores relataram que já não
compram legumes, vegetais nem frutas no mercado, pois consomem praticamente tudo
o que plantam. O Produtor 1 explica que a prática de produzir para o consumo do grupo
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 421

familiar era realizada no passado, mas que, em razão do monocultivo, esse hábito foi
sendo perdido por sua família. Isso foi resgatado através do engajamento na CSA.

Da mesma forma há fortes indicativos de que a remuneração recebida pelos


agricultores na CSA Alfa esteja atrelada a uma maior autonomia relativa. Eles com bas-
tante frequência afirmaram que a CSA lhes proporciona uma situação financeiramente
confortável e que a remuneração recebida é melhor do que nas atividades anteriores.
Em determinada ocasião, o Produtor 1 (2016) disse: “A CSA paga mais do que as
outras e o dinheiro é garantido, é sagrado, você pode contar com ele”. O Produtor 2,
da mesma forma, disse que a CSA é até o momento a atividade que melhor lhe remu-
nerou no ambiente rural. Os Produtores 1, 2 e 3 relataram que a CSA oferece vanta-
gens em razão da garantia do escoamento da produção, do financiamento e dos riscos
compartilhados com coprodutores. Em relação à produção agroecológica e à diversifi-
cação da produção, os resultados encontrados aproximam-se dos achados de Teixeira
e Pires (2017), uma vez que foi verificado o acesso a uma dieta mais balanceada e o
favorecimento da reprodução material e social da agricultura familiar.

Neste grupo ocorreu uma reversão do êxodo agrícola, com as famílias vivendo no
campo e dedicadas a atividades agropecuárias (Abramovay, 2007). Também ocorreu
o que Ploeg (2008) define como influxo, que é o movimento de pessoas que não são
agricultores camponeses que passam a integrar essa força produtiva. Isso porque os
filhos do Produtor 1 passaram a exercer a atividade de agricultores pela primeira vez
para atender a demanda da CSA Alfa. Ambos já viviam com suas famílias nas terras do
Produtor 1, mas trabalhavam em atividades em zonas urbanas. Para alguns coproduto-
res, isso é visto como um dos benefícios de participar de uma CSA. Uma das entrevis-
tadas relatou: “Considero um privilégio a oportunidade de fazer parte de um sistema
que coopera para que famílias consigam viver no campo” (Coprodutora 2, 2016).

Conclusões

O argumento neste estudo parte da compreensão de que o modelo conven-


cional de lidar com os sistemas alimentares, que é hegemônico no capitalismo,
realiza um movimento de mercantilização da agricultura que prejudica a coesão
na sociedade. Essa mercantilização leva a uma perda de controle dos indivíduos
sobre a sua reprodução material e social, quer estejam na condição de produtores
rurais, quer estejam na condição de consumidores. Há uma dependência cada vez
maior do capital financeiro e industrial para a realização das atividades agrícolas.
A livre circulação de mercadorias estimula uma competição desleal que, ao con-
trário do que se propõe, reduz os valores pagos aos produtores ao mesmo tempo
que eleva o preço pago pelos coprodutores, especialmente em decorrência da inser-
ção de intermediários na cadeia de distribuição. O uso de sementes modificadas,
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 422

agroquímicos, adubos e fertilizantes industriais, dentre outras técnicas provenien-


tes da Revolução Verde, diminui a qualidade nutricional dos alimentos, traz prejuí-
zos à saúde humana, degrada o meio ambiente, impacta nos custos de produção e
reduz a autonomia dos produtores e coprodutores. Em decorrência dessa mercanti-
lização a sociedade enfrenta, no mínimo, um incremento de pobreza, insegurança
alimentar, êxodo rural, danos à saúde e ao meio ambiente e uma perda do senso de
comunidade e de solidariedade.

Destarte, a lente teórica de Karl Polanyi constitui a linha central da argumentação


como possíveis alternativas para a sociedade lidar com estes problemas, pois fornece
as ferramentas analíticas para compreender o conceito e as formas de expressão do
movimento de mercantilização, de que forma ele impacta na coesão social e o porquê
da advertência em relação à autorregulação e aos livres mercados. Mediante a análise
da efemeridade da economia capitalista, é possível apontar algo além da crítica.

O conceito de contramovimento (Polanyi 2012a) como resistência e meio


necessário para resgatar a autonomia relativa dos indivíduos soma-se à constatação
da pluralidade e coexistência dos princípios de regulação econômica para oferecer
possibilidades nas quais a relação com o alimento não é mercantilizada. As relações
econômicas têm estruturas que vão além do mercado e são essas interações e vín-
culos sociais que motivam, justificam e demonstram a importância de pesquisar a
agricultura sustentada pela comunidade.

Analisando o que justifica a associação da CSA a um contramovimento, ela


pode ser pensada como uma proto-instituição que, apesar de não subverter o mer-
cado, pode potencialmente abrir espaço para a emergência de mediações entre pro-
dução e consumo orquestradas por padrões de troca não mercantis, especialmente a
reciprocidade. Em decorrência disso, ofertantes, demandantes e as pessoas envolvi-
das neste processo passam a operar com um pouco mais de independência vis-à-vis
o domínio do grande capital e das corporações.

Um ponto importante dialoga com os achados de Abdalla (2014), que identificou


atores que exercem papéis de proteção social de forma análoga ao contra movimento
polanyiano, mas com a diferença da prática ambivalente exercida pela hegemonia,
uma vez que estes atores podem exercer atividades em favor do mercado e do neolibe-
ralismo ao mesmo tempo que buscam favorecer a sociedade. Abdalla (2014) considera
que no cenário analisado as ações de proteção social parecem estar servindo especial-
mente aos interesses da hegemonia mais do que à sociedade. Os achados neste estudo
analisando a CSA Alfa mostram que de fato muitas atividades de contramovimento não
se afastam do princípio de mercado. Apesar de não se afastar, estas iniciativas resga-
tam e fortalecem as demais formas de integração econômica indicadas por Polanyi.
Ao fazer isso, permitem uma coesão social maior ao gerar vínculos mais humanos
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 423

e trazer uma maior autonomia relativa a diversos atores na sociedade. Nesta situa-
ção, operam como contramovimentos. Entretanto, o contexto analisado difere daquele
contemplado por Abdalla (2014) em dois pontos: as atividades de CSA operam num
contexto de baixo uso tecnológico se comparado ao campo da energia nucleoelétrica;
e a atividade da CSA nos grupos analisados tiveram início por parte de atores que se
sentiam prejudicados pelos métodos hegemônicos de comercialização.

Portanto, levando em consideração as ideias do próprio Polanyi, parece pos-


sível entender que uma CSA tem traços de uma institucionalidade que potencializa
uma combinação virtuosa de instituições de mercado e instituições de reciproci-
dade, quando é capaz de aproximar por meio de uma cadeia curta ofertantes e
demandantes e, ao mesmo tempo, recuperar a vida social e cultural em torno do
alimento. Um segundo aspecto relevante é o fato de que se trata de uma forma de
organização centrada na vida social moderna, racional, diferenciada, aberta e dinâ-
mica, que por isso mesmo pode ser disseminada como um padrão institucional de
relação de produção e consumo de alimentos.

A favor desta hipótese, Fleck (2014) oferece sugestões sobre a forma institu-
cional das alternativas à mercantilização na vida social moderna:

Os movimentos não são apenas ambivalentes, eles são sobretudo


conflitantes. Por mais que a mercantilização tenha um efeito benéfico, como
já fora notado por Marx e Simmel, na medida em que desintegra as formas de
relação preexistentes e, por conseguinte, também as hierarquias opressivas
presentes nelas, é preciso perceber que a mercantilização da sociedade já
atingiu um tal nível que não resta muito a desintegrar senão as próprias
hierarquias opressivas que a própria mercantilização institui no lugar das
antigas. Pode-se dizer, assim, que a missão civilizatória do capitalismo
já foi concluída. A questão [hoje] é apenas como conciliar demandas
protetivas com emancipatórias, instaurando um contramovimento que
possa ser eficaz contra a destruição atualmente em curso, e não demandas
que sejam mediadas também pelo aumento da mercantilização. (p. 314)

Dito isto, este estudo verificou que uma CSA é uma proposta que não se afasta
do sistema capitalista, todavia coloca-se simultaneamente como uma crítica ao mer-
cado convencional de alimentos e como uma alternativa de comercialização mais
justa. Há evidências de que a CSA Alfa manifesta o contramovimento à mercantiliza-
ção da agricultura e dos sistemas alimentares. A análise corroborou a suposição de
que os grupos humanos não são passivos aos efeitos da mercantilização. As formas
de regulação que configuram a CSA Alfa operam padrões de troca mistos: mercan-
til e reciprocitário, com predomínio deste último. As trocas emergem numa relação
humana que privilegia o ato em vez do objeto e do interesse privado, indo ao encontro
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 424

das proposições de Polanyi (2012a) e Sabourin (2011). As relações de reciprocidade


resultam em solidariedade, tolerância, fidelidade e comprometimento mútuos e, prin-
cipalmente, na ampliação da autonomia relativa dos indivíduos e no estabelecimento
de um ethos comunitário em torno do alimento. Dessa forma, a experiência obser-
vada pode indicar um contramovimento quando favorece a autonomia relativa e eleva
a coesão social do grupo humano. Trata-se de uma economia que não prescinde de
produtores e coprodutores, mas que recupera o controle social sobre as transações
entre os participantes, protegendo-se, em alguma medida, das oscilações de preços
e instabilidades relacionadas ao padrão de mercado autorregulado.

Convém resgatar também uma passagem de Cangiani (2012) a respeito do


modo com que Polanyi insiste na irreversibilidade da “ruptura radical representada
pela moderna sociedade de mercado”. Isto significa que não há retorno a uma econo-
mia enraizada, mas sim a instituição de uma forma moderna de controle pela socie-
dade, “com base na vida social moderna, racional, diferenciada, aberta e dinâmica,
e, primordialmente, por meio de instituições políticas que permitam a liberdade dos
indivíduos, na medida em que sejam democraticamente instituídas” (p. 31).

Os resultados sinalizam que a CSA Alfa, permeada pela lógica da reciprocidade,


pode constituir um motor de produção eficiente e eficaz, mesmo quando comparado
àquele orientado unicamente pela acumulação. Na pesquisa, foram identificados três
fatores específicos de eficácia: (1) a forma de produzir o alimento em oposição à agricul-
tura convencional; (2) o encurtamento da cadeia produtiva; e (3) as atividades coletivas
mobilizadas pelo grupo para além dos momentos de troca. Os resultados para o sis-
tema transcendem as vantagens puramente econômicos. A CSA Alfa parece colocar em
prática os ideais de Karl Polanyi, de uma economia centrada na subsistência humana
que respeita a dependência do humano em relação à natureza e seus semelhantes.

Entretanto, a proposta da CSA Alfa parece ir um pouco adiante do que a litera-


tura aponta como uma nova perspectiva ou contramovimento nos sistemas alimen-
tares. A iniciativa sai da esfera do agricultor (Escher, 2011; Ploeg, 2008; Schneider,
2004; Schneider & Escher, 2011) para alcançar os coprodutores que, nesse grupo,
estabelecem novas relações de troca e novas formas de divisão do trabalho em uma
direção oposta àquela das grandes cadeias produtivas, do comércio mundial e da
dependência do mercado de insumos. É por isso que a CSA Alfa propicia maior auto-
nomia relativa não somente aos agricultores, que inegavelmente despontam como os
principais beneficiários, mas à cadeia inteira, que está atrelada a esse processo de
produção e distribuição. A CSA Alfa apareceu nesta pesquisa como uma resposta à
insatisfação com o modelo agroalimentar hegemônico. A insatisfação dos coprodu-
tores vai além das variáveis econômicas e técnicas de produção, sai da esfera mer-
cantil quando a motivação para o engajamento no grupo envolve valores tais como
segurança alimentar, justiça social, preservação ambiental, interação entre pessoas
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 425

e construção de um senso de comunidade. A amplitude dessa resposta atinge os


agricultores, que sofrendo os efeitos da mercantilização aceitam ingressar em uma
proposta desconhecida e sem precedentes de sucesso naquele Estado.

Os resultados e conclusões ganham relevância na medida em que contri-


buem com novas informações e possibilidades de atuação na reversão do êxodo
rural, na diminuição da pobreza, na redução de gastos públicos em saúde com uma
alimentação mais saudável, assim como na promoção de iniciativas de desenvolvi-
mento local e preservação do meio ambiente.

A limitação inicial desta pesquisa está relacionada ao estranhamento ao mundo


rural, pois ao mesmo tempo que isso determinou a escolha do método, também
aparece como uma importante limitação à realização do estudo. Em razão disso é
que os resultados permanecem mais no descritivo da identificação dos mecanismos
de reciprocidade e coesão do que em uma possível análise de visão de mundo, que
poderia levar a uma compreensão mais profunda das motivações. A importância de
ter desenvolvido com detalhe talvez demasiado as categorias de análise deve-se a
essa limitação de penetrar o mundo social da agricultura camponesa.

Outra limitação deste estudo refere-se à abrangência e generalização dos resul-


tados da pesquisa, inerente às decisões metodológicas. O estudo de caso em um
grupo de CSA não permite inferências para o universo de atividades similares. Por
isso mesmo, novas questões para estudos futuros, além de avaliar outros casos de
CSA, sugerem enfoques diferentes e outros níveis de análise, tais como a realização
de estudos longitudinais com grupos de CSA, avaliação de impactos nos padrões de
produção e consumo nas regiões em que os grupos operam, ou ainda buscar capturar
as características peculiares e as interações entre o rural e o urbano nessas iniciativas
que transitam nesses dois universos.

Talvez um desafio que a CSA Alfa enfrente no futuro seja dimensionar de forma
criativa seu crescimento, pois a ampliação, ao mesmo tempo que permite maior estabi-
lidade das finanças do grupo, pode trazer consigo uma perda dos vínculos afetivos que
impactam diretamente o grau de autonomia e coesão. Novas pesquisas poderiam sanar
esta limitação prática ao investigar como expandir essas iniciativas mantendo a coesão.

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Agradecimentos

Agradecemos aos agricultores e consumidores das iniciativas de CSA entrevistados


pela disponibilidade em participar do estudo e por oferecer o seu valioso tempo em
prol da pesquisa acadêmica.

Sobre os Autores

Daniele Eckert Matzembacher


Mestre em administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Administração da UFRGS, reali-
zou doutorado sanduíche na Universidade de Guelph (Canadá) e na Universidade
de Tartu (Estônia) e é pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Sustentabilidade e
Inovação (UFRGS) e do Grupo de Pesquisa da Produção ao Consumo (UFRGS).
E-mail: [email protected]. ORCID: 0000-0002-5781-1555

Fabio Bittencourt Meira


Doutor em administração pela Faculdade Getúlio Vargas. Professor do Programa
de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), pesquisador fundador do Núcleo de Estudos em Gestão Alternativa
(UFRGS) e pesquisador do Centro de Estudos de Governo da UFRGS e do Núcleo
de Pesquisa em Ética e Gestão Social da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais; pesquisa os seguintes temas: formas alternativas de organização
e gestão, economia solidária, ética e responsabilidade social das organizações,
ideologia gerencial. Membro da Sociedade Brasileira de Estudos Organizacionais.
E-mail: [email protected]. ORCID: 0000-0002-4703-2398

Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional

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