Csa MG
Csa MG
Csa MG
a
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
Resumo
A forma que se tornou convencional de produzir e distribuir alimentos baseia-se no
uso de agroquímicos, adubos, fertilizantes industriais e de outras técnicas provenien-
tes da Revolução Verde, com crescente dependência do capital financeiro-industrial.
Isto significa a intensificação da mercantilização da agricultura. O problema que
norteou esta pesquisa é a emergência de modos de organização resistentes a essa
tendência. Com base no referencial teórico de Karl Polanyi (2012a, 2012b), cons-
truiu-se um estudo de caso cujo objeto é a agricultura sustentada pela comunidade,
cujo acrônimo em inglês é CSA (community supported agriculture). Trata-se de um
movimento que ressitua a produção agrícola pelos princípios do comércio justo
e da agroecologia e uso de cadeias curtas que aproximam produção e consumo.
O resultado é um alimento de qualidade nutritiva superior a preço acessível e
justo. A análise do caso CSA Alfa aponta a coexistência de diferentes princípios
de regulação numa combinação de troca mercantil e reciprocidade. Na esteira
de Karl Polanyi, observa-se a atividade econômica imbricada ao social, daí que
amizade, tolerância, fidelidade e comprometimento estabelecem um ethos comu-
nitário em torno do alimento. A CSA parece manifestar um contramovimento à
mercantilização ao potencializar a autonomia relativa dos indivíduos, o que eleva
a coesão social dos grupos participantes.
Palavras-chave: Agricultura Sustentada pela Comunidade; Mercantilização; Recipro-
cidade; Coesão Social; Karl Polanyi.
Organizações & Sociedade, 2020, 27(94) 397
Abstract
The conventional way of producing and distributing food is based on the use of
agrochemicals, fertilizers, industrial fertilizers and other techniques from the Green
Revolution, with increasing dependence on financial-industrial capital, which implies
the intensification of the agriculture commodification. The object of this study was
the emergence of modes of organization resisting this trend. Based on the theoret-
ical reference of Karl Polanyi (2012a, 2012b), a case study was developed in a
Community-Supported Agriculture (CSA) initiative. It is a movement that resituates
agricultural production through the principles of fair trade, agroecology and the use
of short supply chains, which bring production and consumption closer together. The
result is a better nutritious quality food at affordable and fair price. The analysis of
the CSA Alfa case points to the coexistence of different principles of regulation, in a
combination of mercantile exchange and reciprocity. According to the proposition by
Karl Polanyi, the economic activity is shown to imbricate with the social aspect, of
which friendship, tolerance, fidelity and commitment establish a community ethos
around food. The CSA seems to manifest a countermovement to the commodification
by enhancing the relative autonomy of individuals that elevates the social cohesion
of the participating groups.
Keywords: Community-Supported Agriculture; Commodification; Reciprocity; Social
Cohesion; Karl Polanyi.
Introdução
Mas isso não significa que a dinâmica do mercado determine todos os aspectos
da vida social. Para Cangiani (2012), ocorre uma restrição, uma liberdade apenas
relativa. Ao ser fundamentado na instituição do mercado e na produção capitalista,
o sistema organizado economicamente tende a se auto alimentar. O termo “desen-
raizamento”, utilizado por Polanyi, é aqui entendido, alinhado com Eckert (2016,
p. 83), como mudança de valores ditada por interesses privados, expressa na retórica
das grandes empresas, nas políticas de Estado, nos acordos e tratados internacionais
que impactam profundamente a sociedade.
Nesse sentido, Polanyi (2012a; 2012b) propõe que a vida econômica pode
se efetivar de uma forma mais justa socialmente combinando diferentes padrões de
intercâmbio, orientados por mercado, reciprocidade, redistribuição e domesticidade.
Esta pluralidade de princípios de regulação, que será abordada ao longo do estudo
de forma mais detalhada, possibilita pensar em alternativas à mercantilização dos
sistemas alimentares. É possível que contramovimentos ocorram mediante o fortale-
cimento destes outros princípios.
A partir de Munck (2006) e Dale (2013), Abdalla (2014) afirma que “há falta
de mediação e de clareza sobre o contramovimento, já que [Polanyi] não define quem
exatamente iria agir espontaneamente contra o sistema de mercado não regulamen-
tado e desenraizado e por quê”. O problema de compreender o contramovimento,
envolve “não apenas ‘quem’ iria agir contra o mercado livre e ‘por quê’, mas também
‘como’ se daria uma contra movimentação” (p. 23).
Além desta introdução o artigo é composto por outras seis seções. A primeira
dedica-se à exposição do conceito da mercantilização e seus efeitos. A seguir discute-se
as formas de integração econômica e possibilidades para um contramovimento. Na sequ-
ência faz-se um panorama da agricultura sustentada pela comunidade. A quarta seção
é dedicada à exposição da metodologia. Em seguida apresenta-se o estudo de caso da
CSA Alfa, seus resultados e discussão para, finalmente, elaborar as considerações finais.
primários, com efeitos diretos no êxodo rural, e de outro lado, a uma pressão ascendente
sobre os preços ao consumidor. O avanço das cadeias mais longas torna-se então uma
característica central do sistema agroalimentar, levando ao controle quase absoluto da
oferta. Como resultado, dietas menos variadas e saudáveis combinam-se com a intensifi-
cação da degradação ecológica, da pobreza e do êxodo rural (Ploeg, 2010).
No Ensaio sobre a dádiva, Marcel Mauss (2012) observa que algumas socie-
dades realizam trocas sob formas e por razões diferentes da troca mercantil ao asso-
ciar questões morais e valores éticos às transações. Aparece aí a reciprocidade como
manifestação de certa coesão social, expressa na homogeneidade de valores e cren-
ças. O mercado é um contrato mais geral e permanente, que vai além da simples
troca de bens úteis. A reciprocidade, portanto, está associada a normas de com-
portamento social impostas por sistemas não econômicos. Entram aqui parentesco,
amizade, associação ou cooperação (Polanyi 2012b). Os agentes não são estranhos
entre si, a situação não corresponde à impessoalidade típica do mercado: “a recipro-
cidade assenta num padrão simétrico de organização” (Servet, 2009, p. 81).
Convém ressaltar que a conceituação que Polanyi faz sobre os princípios de regu-
lação são ferramentas teóricas e analíticas, mas não necessariamente ocorrem nesta
forma pura. O que se verifica nas sociedades atuais, e Polanyi deixa claro, é um constante
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Autores subsequentes a Polanyi, dentre estes Eric Sabourin, trazem pistas essen-
ciais para entender como as formas de integração econômica ocorrem na prática nos
sistemas alimentares. Compreender melhor estas relações e estruturas permite que a
atividade em campo seja capaz de visualizar e teoricamente categorizar as ocorrências
de contramovimento através de outros princípios além da troca de mercado.
Neste sentido, Sabourin (2009, 2011, 2014) é central para entender a estru-
tura dos laços de reciprocidade. Ele alerta que a maioria das sociedades rurais apre-
senta sistemas mistos, nos quais as práticas socioeconômicas de troca e reciproci-
dade coexistem. Vale ressaltar que o problema de discernir lógicas relacionais num
sistema misto não é trivial. A separação é produzida analiticamente pelo exame das
práticas, do projeto em realização, dos valores dos indivíduos que participam e das
estruturas relacionais implementadas. Trata-se de entender a orientação predomi-
nante das ações a partir de lógicas de movimento em direção (1) à concorrência,
visando o acúmulo do lucro para fins privados; ou (2) à reciprocidade, visando a
satisfação das necessidades do grupo.
Há outro aspecto relevante das ideias de Polanyi (2012a, 2012b) que ajuda a
situar o contramovimento na atividade de uma CSA. Ele diz respeito à atividade eco-
nômica em torno do alimento, que parece ser vocacionada para o impulso contrário
ao movimento de mercantilização.
É mais usual que uma CSA opere em pequenas extensões, na base do traba-
lho intensivo e familiar (Henderson & Van En, 2007). Cada início de atividade tem
um contexto peculiar de motivações. O engajamento de produtores passa por fatores
como busca por mercado mais estável e preços justos (Bîrhală & Möllers, 2014)
e preocupação com produção orgânica, relacionada ao meio ambiente e à saúde
(Farnsworth, Thompson, & Drury, 1996; Oberholtzer, 2004). As motivações dos con-
sumidores combinam lógicas de decisão que vão desde melhorar a saúde pessoal até
críticas ao modelo hegemônico de produção e distribuição (Ostrom, 2007). Motivos
mais frequentes referem-se a condições de saúde e nutrição via consumo de produtos
frescos orgânicos. Pesquisas apontam ainda preocupações ambientais; necessidade
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que a justiça e a segurança alimentar se tornem realidade por meio dos produtos
ecológicos e comercializados de uma forma mais justa para ambos (Henderson &
Van En, 2007). Por isso, talvez a CSA possa atuar como um contramovimento à mer-
cantilização na agricultura.
Metodologia
Dentro da CSA Alfa o termo consumidor sequer é utilizado, o grupo faz refe-
rência a “coprodutores”. O Mentor explica que “o consumidor é aquele que vai lá no
sacolão comprar e consumir, enquanto o coprodutor não é um consumidor, ele está
financiando a produção, é um parceiro do produtor”. Respeitando a terminologia
utilizada na CSA, a exposição dos resultados também utiliza esta nomenclatura.
Modo de operação
No início da pesquisa a CSA Alfa era composta por dois agricultores (Produtor
1 e Produtor 2) que vivem na zona rural da região metropolitana de Belo Horizonte
e 72 famílias de consumidores/coprodutores, a maioria residente em Belo Horizonte
(MG). Com isso, era garantido o fornecimento de uma cesta semanal com alimentos
suficientes para um grupo familiar de até quatro pessoas. Ao longo de tempo, alterações
importantes ocorreram: (1) o ingresso do Produtor 3; (2) elevou-se o preço pago pelos
coprodutores; (3) o número de coprodutores ampliou para 135 famílias; (4) mudou
a sistemática de preparo das cestas para atender indivíduos que moram sozinhos;
(5) o Produtor 1 incorporou o trabalho dos seus dois filhos à produção destinada à
CSA (a seguir denominados Aprendiz 1 e Aprendiz 2).
A CSA Alfa é uma associação informal, mas tem um regimento interno que
expressa claramente três princípios: alimentação saudável, agricultura sustentável e
transformação social. As relações de confiança são essenciais. Esta palavra aparece
espontaneamente e com muita frequência no relato dos produtores e coprodutores
para justificar a ausência de um contrato formal, a dinâmica que envolve o paga-
mento prévio pelos coprodutores, o ato de produzir do agricultor e a ausência de
certificação formal. Os envolvidos acreditam e confiam no compromisso assumido
entre eles. Insinua-se assim a preponderância de vínculos pessoais e simétricos que
pautam o princípio da reciprocidade na sua articulação com a troca de mercado.
Os valores afetivos e morais produzidos e relatados por agricultores e coprodutores
sob os rótulos da confiança e do senso de responsabilidade correspondem a relações
de reciprocidade. Ao que tudo indica, são esses sentimentos de pertencimento e de
confiança que conferem força ao que a CSA representa.
Um relato do Mentor reforça essa compreensão. Ele explica que nem todos os
candidatos a coprodutores assumem a mesma postura em relação à ausência de um
contrato formal. Alguns deles questionam essa relação entre fornecedor e coprodutor.
Ele responde que “a CSA não é fornecedora, a nossa relação de consumo é outra”
(Mentor, 2016) e finaliza explicando a esses possíveis coprodutores as informações da
Carta de Princípios da CSA Alfa. O Mentor diz que, se a pessoa não concorda com esses
valores, ele orienta a não ingressar no grupo. Ele explica que isso normalmente ocorre
quando os coprodutores buscam apenas uma vantagem econômica, querendo comprar
orgânicos com preço menor do que em outros canais, e que por vezes essas pessoas
ingressam na CSA mesmo com todos os avisos, mas que, em seguida, acabam saindo:
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A rotina semanal envolve visita de alguns coprodutores aos agricultores para acom-
panhamento da plantação. Vale ressaltar que as atividades têm apoio e orientação da
Emater regional.
Ainda que as relações na CSA Alfa sejam também regidas pela lógica inerente
ao princípio da troca de mercado, a forma como ocorrem evidencia uma série de situ-
ações de ajuda mútua, solidariedade e compartilhamento. Percebe-se a existência do
princípio da reciprocidade indicado por Polanyi (2012a, 2012b) no plano teórico, o qual
Sabourin (2009, 2011, 2014) denomina de sistemas mistos entre reciprocidade e troca.
Nesse sentido, foram identificados quatro fatores que podem indicar o pre-
domínio das relações de reciprocidade, formando ações que se aproximam de um
contramovimento. O primeiro fator remete a um compartilhamento prévio da visão de
mundo entre os participantes, o que foi identificado anteriormente, promovendo um
engajamento não atrelado a questões financeiras. O segundo fator refere-se à forma
de produzir, que se opõe ao método convencional não por questão de rentabilidade,
mas por buscar a qualidade nutricional do alimento aliada à preocupação de preser-
var a natureza. O terceiro fator diz respeito à forma que a troca diretamente assume:
a associação entre as pessoas, a regularidade das prestações, a eliminação do inter-
mediário, a prática de coprodutores acompanharem a produção agrícola e a partici-
pação coletiva nas decisões sobre as atividades do grupo. O quarto e último fator é a
realização de atividades conjuntas entre as famílias de coprodutores e as famílias dos
agricultores dentro e fora do circuito comercial, incluindo aí a coprodução e o lazer.
Na CSA Alfa as trocas não são atos impessoais entre ofertante e demandantes:
não há venda de cestas para o público geral. O produtor e o coprodutor que desejam
ingressar no grupo precisam assumir o compromisso com suas prestações de regu-
laridade, aceitação de riscos e tolerância. Isso indica a busca por estabelecer um
compartilhamento de valores comuns (Sabourin, 2011), em que o objeto de partilha
importa (alimento), desde que imerso em relações sociais específicas. Aparecem na
fala dos coprodutores e dos produtores a confiança, a amizade, a justiça e a respon-
sabilidade como resultado do engajamento. Isso corresponde à reciprocidade simé-
trica já identificada em ambientes rurais por Sabourin (2011). Indicam na prática o
princípio apontado por Polanyi (2012a, 2012b). De fato, Henderson e Van En (2007)
entendem a adesão dos pequenos produtores como uma estratégia para contornar a
exposição a mercados concentrados e competitivos, e que a partilha de riscos entre
consumidores e produtores constitui uma alternativa concreta ao domínio do agrone-
gócio, numa forma que se diferencia do sistema convencional também pelo uso de
técnicas agroecológicas. Estes elementos foram identificados na CSA Alfa.
Ao longo da pesquisa foi possível acompanhar duas estações nas quais a seca
ou as fortes chuvas afetaram a colheita significativamente. A grande maioria das
pessoas aceitou os poucos e pequenos itens recebidos nas cestas. Provavelmente
essas manifestações de solidariedade e tolerância derivam do prévio estabelecimento
de relações de reciprocidade. Nesse momento, há clara prevalência da reciprocidade
sobre a troca de mercado (Polanyi, 2012a), evidenciando que esses grupos possuem
alguma característica que permite agregar valores humanos às relações comerciais e
em alguma medida, aproximar-se do conceito do contramovimento. Quando o copro-
dutor demonstra tolerância com os alimentos que recebe em períodos de escassez,
quando aceita produtos de época e quando opta por financiar a produção do agricul-
tor, assumindo em conjunto os riscos, percebe-se novas formas de ajuda mútua, com
ações regidas primordialmente pela reciprocidade. Uma maior coesão na sociedade
em alguma proporção é fortalecida.
Para França Filho (2004, 2007), esse circuito integrado de relações socio-
econômicas entre produtores e coprodutores estimula uma lógica de rede nesses
territórios, na qual a competição perde a importância, assim como perde sentido a
consideração da oferta e da demanda como entidades abstratas harmonizadas por
uma mão invisível, sinônimo da autorregulação do mercado. O resgate da produção e
do consumo local, da territorialização, trazem à tona as propostas de Polanyi (2012a)
e Sabourin (2014) em relação a fatores identitários das relações de reciprocidade,
que Petersen (2013) entende serem capazes de auxiliar a catalisar movimentos de
resistência voltados à relocalização do controle dos sistemas alimentares.
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Tal como propõe Laville (2001), as associações com a CSA Alfa podem redes-
cobrir o potencial organizador da sociedade fazendo referência à existência de uma
maior solidariedade. Essa solidariedade permite movimentos capazes de defender
os sistemas locais de produção e consumo, dos quais Ploeg (2008) forneceu algu-
mas pistas para alertar sobre a importância de atividade de CSA como uma crítica
simbólica, uma insubordinação e uma alternativa aos impérios alimentares. Essa é
a implicação das relações de reciprocidade no circuito da CSA Alfa: afastar da lógica
de mercado, proporcionar uma alternativa mais justa de comercialização e ampliar a
autonomia relativa e o grau de coesão da comunidade em questão.
Ainda que apenas uma minoria tenha informado que comparou preços com
outros canais, aqueles que o fizeram disseram que participar da CSA Alfa permite
uma redução de gastos, facilitando a sua reprodução material. Essa compreensão é
reforçada por alguns coprodutores que integram o núcleo de gestão, que trabalham
com os produtores na definição dos preços. Segundo eles, para propor os novos valo-
res das mensalidades um dos critérios foi um meio termo entre os valores pagos a
produtores por intermediários e os valores cobrados de coprodutores em pontos finais
de venda de alimentos orgânicos.
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familiar era realizada no passado, mas que, em razão do monocultivo, esse hábito foi
sendo perdido por sua família. Isso foi resgatado através do engajamento na CSA.
Neste grupo ocorreu uma reversão do êxodo agrícola, com as famílias vivendo no
campo e dedicadas a atividades agropecuárias (Abramovay, 2007). Também ocorreu
o que Ploeg (2008) define como influxo, que é o movimento de pessoas que não são
agricultores camponeses que passam a integrar essa força produtiva. Isso porque os
filhos do Produtor 1 passaram a exercer a atividade de agricultores pela primeira vez
para atender a demanda da CSA Alfa. Ambos já viviam com suas famílias nas terras do
Produtor 1, mas trabalhavam em atividades em zonas urbanas. Para alguns coproduto-
res, isso é visto como um dos benefícios de participar de uma CSA. Uma das entrevis-
tadas relatou: “Considero um privilégio a oportunidade de fazer parte de um sistema
que coopera para que famílias consigam viver no campo” (Coprodutora 2, 2016).
Conclusões
e trazer uma maior autonomia relativa a diversos atores na sociedade. Nesta situa-
ção, operam como contramovimentos. Entretanto, o contexto analisado difere daquele
contemplado por Abdalla (2014) em dois pontos: as atividades de CSA operam num
contexto de baixo uso tecnológico se comparado ao campo da energia nucleoelétrica;
e a atividade da CSA nos grupos analisados tiveram início por parte de atores que se
sentiam prejudicados pelos métodos hegemônicos de comercialização.
A favor desta hipótese, Fleck (2014) oferece sugestões sobre a forma institu-
cional das alternativas à mercantilização na vida social moderna:
Dito isto, este estudo verificou que uma CSA é uma proposta que não se afasta
do sistema capitalista, todavia coloca-se simultaneamente como uma crítica ao mer-
cado convencional de alimentos e como uma alternativa de comercialização mais
justa. Há evidências de que a CSA Alfa manifesta o contramovimento à mercantiliza-
ção da agricultura e dos sistemas alimentares. A análise corroborou a suposição de
que os grupos humanos não são passivos aos efeitos da mercantilização. As formas
de regulação que configuram a CSA Alfa operam padrões de troca mistos: mercan-
til e reciprocitário, com predomínio deste último. As trocas emergem numa relação
humana que privilegia o ato em vez do objeto e do interesse privado, indo ao encontro
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Talvez um desafio que a CSA Alfa enfrente no futuro seja dimensionar de forma
criativa seu crescimento, pois a ampliação, ao mesmo tempo que permite maior estabi-
lidade das finanças do grupo, pode trazer consigo uma perda dos vínculos afetivos que
impactam diretamente o grau de autonomia e coesão. Novas pesquisas poderiam sanar
esta limitação prática ao investigar como expandir essas iniciativas mantendo a coesão.
Referências
Agradecimentos
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