O Novelo - Papo de Cinema
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CRÍTICA
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se permite diminuir o peso dos dilemas lá fora: conhecemos em detalhes apenas aquilo
que os personagens decidem revelar por conta própria. Existe um aspecto terapêutico no
dispositivo, acreditando na cura através da fala e do expurgo ocorrido no interior de um
espaço seguro (o hospital-cenário).
Tamanha generosidade não impede alguns tropeços. Primeiro, na coesão entre os heróis:
supondo que nasceram e foram criados juntos, sem terem se mudado para outros
Estados – nenhum aspecto do filme leva a crer nesta hipótese -, como justificar o sotaque
carioca de Rocco Pitanga e Sérgio Menezes face ao palavreado tipicamente paulistano
de Sidney Santiago Kuanza e Rogério Brito? Segundo, a busca por uma construção leve,
próxima do humor, provoca sequências desajustadas, caso do oferecimento da namorada
para fazer sexo com o irmão, e dos diálogos polidos demais entre os namorados: “É
como a esfinge: decifra-me ou devoro-te”, responde o sujeito estrangeiro, reforçando a
interpretação estereotipada da burguesia intelectual. A confissão do escritor psicorrígido
ao pai em coma, num plano aberto, também se mostra excessivamente didática. Esta
abordagem revela profunda empatia e carinho por suas figuras falhas (sendo a
condescendência, ou o paternalismo, outro traço indispensável ao indie), o que não
necessariamente se traduz em sutileza de mise en scène. A direção de fotografia
privilegia os close-ups e os planos de conjunto nas conversas, enquanto os
enquadramentos levemente móveis revelam algumas composições muito belas – vide a
interação de Mauro e Cicinho, focados ao fundo do plano, em contraste com Zeca
desfocado em primeiro plano. De resto, a direção se coloca na posição humilde de
oferecer o palco para os atores brilharem, sem chamar atenção a si própria.
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25/05/2023, 13:41 O Novelo – Papo de Cinema
Bruno Carmelo
Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de
Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne
Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde
Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de
cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de
Cinema.
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