Análise Do Comportamento À Fadiga Do Revestimento Asfáltico de Um Trecho Da Rodovia BR-230

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ANÁLISE DO COMPORTAMENTO À FADIGA DO REVESTIMENTO ASFÁLTICO

DE UM TRECHO DA RODOVIA BR-230/PB

LUCAS SANTOS FELICETTI1, ANTÔNIO CARLOS RODRIGUES GUIMARÃES2, FILIPE ALMEIDA


CÔRREA DO NASCIMENTO3
1
Mestrando em Engenharia de Transportes, IME, Rio de Janeiro-RJ, [email protected];
2
Dr. em Engenharia Civil, Prof. do IME, Rio de Janeiro-RJ, [email protected];
3
Dr. em Engenharia de Transportes, Prof. do IME, Rio de Janeiro-RJ, [email protected]

RESUMO: O trincamento por fadiga é uma das patologias mais frequentes nos pavimentos. Este
trabalho teve como objetivo avaliar a vida de fadiga do revestimento asfáltico aplicado em um
segmento da rodovia BR-230/PB, buscando verificar a sua integridade a partir de dados obtidos em
ensaios fundamentais da Mecânica dos Pavimentos. Na metodologia, foram realizados os ensaios de
resistência à tração e fadiga por compressão diametral à tensão constante. Foi definido um modelo do
comportamento quanto à fadiga, o qual foi comparado com os valores obtidos em outras misturas
asfálticas, relatados em estudos consagrados presentes na literatura. Os resultados mostraram que a
mistura asfáltica da BR-230/PB apresenta curva de fadiga mais favorável que as obtidas em outras
pesquisas, o que indica apresentar melhor desempenho, retardando o surgimento de trincas e
rachaduras ocasionadas por cargas repetidas. Dessa forma, esta pesquisa foi fundamental para
contribuir no levantamento de dados da camada asfáltica empregada na BR-230/PB para o
desenvolvimento do banco de dados relacionados ao comportamento à fadiga de misturas asfálticas,
permitindo, assim, melhor acurácia de projetos de pavimentação.
PALAVRAS-CHAVE: Misturas asfálticas, curva de fadiga, resistência à tração, análise mecanística.

EVALUATION OF THE FATIGUE BEHAVIOR OF THE ASPHALT SURFACE LAYER OF


A STRETCH OF THE BR-230/PB HIGHWAY

ABSTRACT: Fatigue cracking is one of the most frequent pathologies in pavements. This study
aimed to evaluate the fatigue life of the asphalt surface layer applied on a segment of the BR-230/PB
highway, seeking to verify its integrity from data obtained in mechanical characterization tests. In the
methodology, indirect tensile strength and fatigue by diametral compression at constant tension tests
were performed. A fatigue behavior model was defined, which was compared with the values obtained
in other asphalt mixtures, reported in well-established studies in the literature. The results indicated
that the asphalt mixture of BR-230/PB has a more favorable fatigue curve than those obtained in other
studies, which indicates a better performance, delaying the appearance of cracks caused by repeated
loads. Thus, this research was fundamental to contribute, through data collection of the asphalt layer
used in the BR-230/PB, to the development of the database related to the fatigue behavior of asphalt
mixtures and allow better accuracy of paving projects.
KEYWORDS: Asphalt mixtures, fatigue curve, tensile strength, mechanistic analysis.

INTRODUÇÃO
O surgimento prematuro de defeitos em pavimentos é um dos principais motivos deste estudo.
A pesquisa realizada pelo CNT (2019) nas rodovias brasileiras aponta casos de pavimentos projetados
para durar cinco anos, mas que apresentam problemas de desgaste em menos de sete meses. Isso leva a
necessidade de manutenções mais frequentes e, consequentemente, maiores custos de reparação.
Dentre os problemas mais recorrentes nos pavimentos brasileiros, pode-se citar o trincamento causado
pela repetição de cargas de tráfego.
Essas trincas afetam significativamente o desempenho do pavimento. No estágio mais severo,
com o seu crescimento e a propagação, tendem a se interligarem, apresentando aspecto semelhante ao
couro de jacaré, tornando a superfície de rolamento mais áspera e permitindo a passagem de ar e água,
o que provoca danos adicionais à estrutura do pavimento. Ao longo do tempo, podem resultar em
extensas áreas de rachaduras, grandes buracos e a ruptura total do pavimento (NCHRP, 2011).
Sob a perspectiva da Mecânica dos Pavimentos, a repetição das cargas das rodas dos veículos
gera uma flexão das camadas do pavimento, ou seja, são geradas tensões e deformações de tração na
fibra inferior do revestimento asfáltico, o que provoca, nesta região, o surgimento de trincas que se
propagam para cima até atingir a superfície (Medina & Motta, 2015).
O método de dimensionamento do DNER (1981) não leva em consideração esse fenômeno de
fadiga do revestimento. A definição das espessuras das camadas é restrita à equações empíricas e ao
CBR dos materiais. Com a implementação do novo Método de Dimensionamento Nacional (MeDiNa),
as camadas passam a ser projetadas com base em aspectos mecanísticos-empíricos, os quais fornecem
uma análise mais precisa e real do comportamento estrutural dos pavimentos. Assim, ensaios
mecânicos em laboratório buscam a simulação de cargas repetidas de tráfegos para a avaliação da vida
útil de fadiga e da deformação permanente de misturas asfálticas.
Neste contexto, considerando a importância do tema abordado, o presente estudo traz uma
análise do comportamento à fadiga do revestimento asfáltico empregado na BR-230/PB, com intuito
de auxiliar engenheiros projetistas e profissionais de concessionárias de infraestrutura na adoção de
melhores técnicas construtivas. Este trabalho busca contribuir para o desenvolvimento do banco de
dados sobre modelos teóricos do comportamento estrutural de materiais comumente empregados em
revestimentos asfálticos, a partir dos resultados obtidos nos ensaios laboratoriais.

MATERIAL E MÉTODOS
O objeto de estudo refere-se à rodovia BR-230/PB do trecho: Cabedêlo – Divisa PB/CE, sub-
trecho: Cabedêlo – Entr° BR-101/PB (A), segmento: km 0,00 – km 28,10. Este trecho caracteriza-se
pelo elevado volume de tráfego: inicia-se no Porto Cabedêlo, único porto do Estado da Paraíba,
atravessando a cidade de João Pessoa até o entroncamento da BR-101/PB. A mistura asfáltica
estudada neste trecho emprega o ligante CAPFLEX 55/75 modificado por polímeros e possui
composição granulométrica enquadrada na Faixa C do DNIT 031/2006. As características do ligante,
agregados, composição granulométrica e as propriedades finais da mistura empregada da BR-230/PB
estão apresentadas nas Tabela 1, Tabela 2 e Tabela 3.

Tabela 1: Características do ligante asfáltico


Características Unidade Especificação Resultado
Penetração (100g, 5s, 25°C) 0,1 mm 45 a 70 59,6
Ponto de Amolecimento °C mín 55 55,2
Viscosidade Brookfield a 135°C, SP21, 20rpm cP máx 3000 877
Viscosidade Brookfield a 150°C, sp21, 50rpm cP máx 2000 451
Viscosidade Brookfield a 177°C, sp21, 100rpm cP máx 1000 186
Ponto de Fulgor °C mín 235 240°C
Ductilidade à 25°C cm mín 75 78,8
Densidade - - 1,03

Tabela 2: Características dos materiais pétreos e composição granulométrica da mistura da BR-230/PB


Peneira Granulometria (% passante)
Pol mm Brita 1/2" Pó de pedra Areia natural Cal CH-l Mistura
3/4" 19 100 100 100 100 100
1/2" 12,5 97,5 100 100 100 99
3/8" 9,5 81,3 100 100 100 92,5
Nº 4 4,75 12,7 96,8 100 100 64,2
Nº 10 2 0,4 62,4 96,8 100 48,7
Nº 40 0,42 0,4 31,2 53,3 100 26,9
Nº 80 0,18 0,3 18,6 19,6 100 13,2
Nº 200 0,075 0,2 8,2 5,6 98 6,1
Densidade real 2,709 2,663 2,657 2,702
Densidade aparente 1,544 1,619 1,479 1,515
Tabela 3: Propriedades finais da mistura
Valor do Especificação
Propriedades da mistura
projeto DNIT
Teor de Ligante (%) 5,6
Volume de Vazios (%) 3,5 3-5
Relação Betume Vazios (%) 78,6 75 - 82
Vazios do Agregado Mineral (%) 12,9
Massa Esp. Aparente (g/cm3) 2,373
Massa Esp. Máx Teórica (g/cm³) 2,459
Estabilidade (kgf) 1113 > 500
Tração diametral (MPa) 1,5 > 0,65

Neste estudo, dez amostras foram extraídas da camada asfáltica do pavimento recém-
construído, para a execução dos ensaios de resistência à tração por compressão diametral e vida de
fadiga à tensão controlada. Estes ensaios fornecem um estado biaxial de tensões (horizontais de tração
e verticais de compressão) similar às condições produzidas nas fibras inferiores das camadas de
rolamento por uma carga de roda.
No ensaio de fadiga, as cargas dinâmicas foram aplicadas na frequência de 1 Hz. Os corpos de
prova foram testados à 25°C e submetidos à 4 níveis de tensão: 10%, 20%, 30% e 40% da resistência à
tração, conforme normatizado pelo DNIT 183/2018. A Figura 1 ilustra a execução do ensaio.

Figura 1: Ensaio de fadiga por compressão diametral à tensão controlada

A vida de fadiga (N) corresponde ao número total de aplicações de carga suficiente para levar
a amostra a ruptura, sendo expressas por:

(1)

Onde:
N: Vida de fadiga ou número de aplicações de carga;
σt : Tensão de tração repetida;
σc : Tensão de compressão repetida;
k1 e k2: constantes obtidas na regressão linear entre N x ∆σ, em escalas logarítmicas;
∆σ: Diferença entre as tensões de tração e compressão no centro da amostra.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Tabela 4 apresenta os valores encontrados no ensaio de fadiga. Foi elaborado o gráfico do
número de repetições de carga em função da diferença de tensões, em escala logarítmica e realizado a
regressão, obtendo-se a equação correspondente à curva de fadiga. Para fins de análise e comparação,
foram selecionados estudos consagrados na literatura que desenvolveram misturas asfálticas com
composição granulométrica e tipo de ligante similares ao desta pesquisa. A Tabela 5 e o Gráfico 1
apresentam e comparam os resultados dos estudos.
Tabela 4: Resultados do ensaio de fadiga por compressão diametral à tensão controlada
Nº do Nível de Carga Pressão Diferença
Espessura Diâmetro Número de
corpo de tensão aplicada manométrica de tensões
(cm) (cm) 2 aplicações
prova (%) (kgf) (kgf/cm ) (MPa)
3 7,40 9,90 40 1061,1 8,58 3,62 1435
4 7,50 9,90 40 1075,4 8,69 3,62 1576
5 7,30 9,90 30 785,1 6,37 2,71 2057
6 7,45 9,90 30 801,2 6,50 2,71 3002
7 7,60 9,90 20 544,9 4,45 1,81 10132
8 7,40 9,90 20 530,5 4,33 1,81 9301
9 7,45 9,90 10 267,1 2,22 0,90 255616
10 7,52 9,90 10 269,6 2,24 0,90 148204

Tabela 5: Comparação com os resultados encontrados na literatura


Teor Resistência
Referências Descrição da Mistura de à Tração Modelo de Fadiga K1 K2
ligante (MPa)
Presente CAP 55/75 modif. - Faixa C -
5,6% 2,26 N = 111114 (1/Δσ)3,597 111114 3,597
estudo Extraído em campo
CAP 30/45 - Faixa 19 mm 4,6% 1,98 N = 34919 (1/Δσ) 2,6329
34919 2,6329
CCR Nova CAP 50/75 - Faixa 19 mm 4,5% 1,3 N = 11577 (1/Δσ)3,9467 11577 3,9467
Dutra
(2010) CAP SBS - Faixa 19 mm 4,1% 1,58 N = 27140 (1/Δσ)4,3951 27140 4,3951
ECOFLEX B - Faixa 19 mm 4,7% 1,29 N = 53959 (1/Δσ)4,6492 53959 4,6492
CAP 50/70 - Faixa C -
5,9% 1,07 N = 9605,8 (1/Δσ)1,919 9605,8 1,919
Rossato Extraído em campo
(2015) CAP 50/70 - Faixa C 6,9% 1,06 N = 9125,8 (1/Δσ)2,427 9125,8 2,427
CAP 65/85-E - Faixa C 7,4% 1,58 N = 57641 (1/Δσ)3,017 57641 3,017
Ceratti et al. CAP TLA FLEX - Faixa C 5,1% 1,59 N = 28137,84 (1/Δσ) 3,2
28137,84 3,2
(2014) CAP 60/85-E - Faixa C 5,25% 0,83 N = 1834,16 (1/Δσ)3,61 1834,16 3,61
Loureiro
CAP 50/60 - Faixa C 6,50% 0,94 N = 1086 (1/Δσ)2,53 1086 2,53
(2003)

Gráfico 1: Vida de fadiga x Diferença de Tensões


A resistência à tração, obtida a partir da média de dois corpos de prova, corresponde a 2,26
MPa. Este valor apresenta-se acima do limite mínimo, de 0,65 MPa, estabelecido na norma (DNIT,
2006). O valor mais próximo ao encontrado nesse estudo foi o relatado pela CCR Nova Dutra (2010),
correspondente à 1,98 MPa em uma mistura enquadrada na Faixa 19 mm e com um ligante mais
consistente, CAP 30/45. Os demais estudos apresentaram valor entre 0,83 e 1,58 MPa. Segundo
Bernucci et al. (2022), valores típicos estão contidos no intervalo entre 0,5 e 2 MPa, podendo atingir 3
MPa, quando empregado ligante com consistência mais dura. Portanto, percebe-se superioridade do
valor encontrado na mistura da BR-230/PB ao empregar um ligante do tipo 55/75 modificado.
Pode-se observar a partir da Gráfico 1 que a mistura asfáltica empregada na BR 230/PB possui
curva de fadiga mais favorável quando comparado aos outros estudos. Percebe-se que quando
submetido à diferença entre as tensões de 1 MPa, a mistura deste estudo pode suportar cerca de 10
vezes mais ciclos de aplicações de carga que a mistura extraída em campo do estudo de Rossato
(2015) e aproximadamente 100 vezes mais ciclos de carga que a de Loureiro (2003). Isso
possivelmente ocorreu devido ao emprego de um ligante asfáltico modificado por polímero, que
possui menor rigidez, e à adoção de materiais britados de maior qualidade, já que a faixa
granulométrica adotada nestes projetos é a mesma.

CONCLUSÃO
Este estudo analisou o comportamento mecânico da mistura asfáltica aplicada em um trecho
de elevado volume de tráfego da rodovia BR-230/PB. Foram extraídas amostras em campo do
pavimento recém-construído para a realização de ensaios de resistência à tração e fadiga por
compressão diametral à tensão constante. Pode-se concluir que a mistura asfáltica aplicada na BR-
230/PB é adequada, apresentando alta resistência à tração e um bom comportamento quanto à vida de
fadiga, quando comparado aos estudos consagrados presentes na literatura.
A curva de fadiga é um dos principais parâmetros para o dimensionamento do pavimento pelo
novo método MeDiNa, possibilitando prever quantos ciclos de carga o material poderá suportar. De
uma forma preliminar, a comparação da curva de fadiga de um determinado material com a de outras
misturas pode ser realizada para indicar qual terá melhor desempenho em um pavimento.
Nesse sentido, acredita-se que o presente artigo possa contribuir para o desenvolvimento do
banco de dados sobre modelos teóricos do comportamento estrutural de materiais comumente
empregados em revestimentos asfálticos, de forma a auxiliar engenheiros, projetistas e profissionais
responsáveis pelo controle de qualidade, sejam de concessionárias de infraestrutura ou de órgãos
reguladores, em prol do desenvolvimento de boas técnicas de pavimentação, durabilidade da
infraestrutura rodoviária e melhorias das condições de conforto e segurança aos usuários.

REFERÊNCIAS
Bernucci, l. L. B.; Motta, l. M. G.; Ceratti, j. A. P.; Soares, J. B. Pavimentação asfáltica: formação
básica para engenheiros. 2ª Edição. Petrobrás, ABEDA. Rio de Janeiro, 2022.
CCR Nova Dutra. Relatório final: Estudo comparativo do comportamento de fadiga de misturas
betuminosas com diferentes teores de asfalto. PEC – 8650. UFRJ, COPPE. Rio de Janeiro, 2010.
Ceratti, J., A., P.; Núñes, W.,P.; Brito, L., A., T.; Colpo, G., B.; Hirsch, F.; Vitorello, T.; Cronst, F.
Relatório final de pesquisa: Análise de fadiga de misturas asfálticas através do ensaio de flexão em
viga quatro pontos. UFRGS, LAPAV, PPGCI. Porto Alegre, 2014.
CNT. Pesquisa CNT de rodovias 2019: relatório gerencial. Brasília: CNT: SEST: SENAT, 20019.
DNIT ES 031/2006: Pavimentos flexíveis - Concreto asfáltico - especificação de serviço. RJ, 2006.
DNIT ME 136/10: Resistência à Tração. Rio de Janeiro, 2010.
DNIT ME 183/18: Pavimentação asfáltica - Ensaio de fadiga por compressão diametral à tensão
controlada - Método de ensaio. Rio de Janeiro, 2018.
Loureiro, T., G. Estudo da evolução do dano por fadiga em misturas asfálticas. Dissertação de
Mestrado, Programa de Engenharia de Transportes. UFC. Fortaleza, 2003.
Medina, J. de; Motta, L. M. G. da. Mecânica dos Pavimentos. Editora Interciência. 3ª ed. RJ, 2015.
NCHRP. A Manual for Design of Hot Mix Asphalt with Commentary. (NCHRP Report 673). National
Cooperative Highway Research Program. Washington, D.C.: 2011.
Rossato, F., P. Avaliação do fenômeno de fadiga e das propriedades elásticas de misturas asfálticas
com diferentes ligantes em variadas temperaturas. Dissertação Mestrado. UFSM.. RS, 2015.

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