Tudo de Mim Michelle Castelli
Tudo de Mim Michelle Castelli
Tudo de Mim Michelle Castelli
Playlist
Nota
01 — Minha Saída
02 — Visita
03 — EXTRA SAULO
04 — O Gigante
05 — Paixão
06 — Voltando a Realidade
07 — O Cavaleiro
(08) — EXTRA SAULO
09 — Uma Ligação
(10) — EXTRA ISAAC
11 — Se Entregando
12 — Observar é Preciso
13 — Vigias
14 — Deixe Queimar
15 — Loucura
16 — Nem Tudo São Flores
17 — Amigo
18 — Escolhas
19 — Pegando o Silva
20) EXTRA ISAAC
21 — Rosas Para Mim?
22 — Visita 2
23 — Se Jogando de cabeça
24 — Consequências
(25) EXTRA DIMITRI
26 — Consequências parte 2
(27) EXTRA ISAAC
28 — A Queda
29 – Entrando no Poço
(30) — EXTRA SAULO
31 — Rosas Para Mim? 2
32 — Abrindo os Olhos
33 — Regeneração
34 — O Cara Certo
35 — Deixe queimar 2
36 — Loucura 2
37 — Uma Chance
38 — Se Entregando 2
39 — Destruindo as Estruturas
(40) EXTRA ISAAC
41 — Escolhas
42 – Sem Respirar
43 – Final (Saulo)
EPÍLOGO – (Isaac)
FIM.
PRÓXIMO LIVRO DA SÉRIE
REDES SOCIAIS DA AUTORA
Books By This Author
Próximo conto da série AMORES REAIS
Copyright © Michelle Castelli
1º Edição 2021
Playlist
Esse livro faz muitas referências a músicas, e se você quer conhecer alguma
ou até mesmo ler o livro com trilha sonora abra o aplicativo do Spotify, vá na
página “buscar” e no posicione a câmera do seu celular no código da imagem
abaixo que te levará para a playlist de Tudo de Mim.
Ou então acesse pelo link:
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si=50afd0fee6fb45d2
Não sei quantos dias demorou desde que Valéria me propôs este acordo de
ser amante de bandido (amante de bandido é menos pior do que prostituta de
presidiário, por isso vou referir a mim mesma neste termo). Só sei que o
advogado do tal de Rocha (que nada tem de Rocha, pois se chama Isaac
Greiner), me adiantou um mês de pensão, e há alguns dias saiu o auxílio
reclusão, ou seja: estou com a grana toda.
Anthony e eu mudamos para este apartamento próximo ao centro e em
bairro bom, não é grande, mas é bem bonito. Comprei alguns móveis novos,
roupas para o Anthony, brinquedos... O dia em que o dinheiro caiu na conta
foi o melhor dia da minha vida. Valéria e Gabriel foram conosco e até parada
no Mc Donald's teve. Anthony nunca tinha comido nada do Mc, e eu acho que
nunca me diverti tanto como naquele dia.
Como dinheiro estava me fazendo falta. Eu nem tinha ideia do quanto.
Uma mensagem no celular, agora concertado, me tira a atenção de
Anthony com sua bola nova.
"Olá, Mel!
Sua visita íntima foi marcada para amanha ás 10:30hs. Esteja no
portão principal ás 07:00hs ou antes. Obs.: Proibido ir com sutiã de bojo
ou que tenham ferrinhos. Nem jeans, nem nenhuma roupa com peças
metálicas.
Qualquer coisa eu estou à sua disposição”
Dr. Nelson"
— Ai Deus! Estava bom demais para ser verdade! — eu digo em voz
alta, fazendo Anthony olhar para mim.
Ligo para a Valéria.
— Ai, sem estresse. Eu passo ai e te levo. Aproveito e pego o
Anthony também. Não se esqueça de levar um lençol, uma toalha e um
pedaço de sabonete...
— Pedaço? Não pode ser um sabonete inteiro?
— Não. Tem que ser pedaço. E não pode ir com roupa preta...
— Meu Deus! Quantas coisas! Espera, deixa eu pegar uma caneta...
Anotei mais algumas instruções e agora estou ainda mais preocupada.
Eu vou mesmo transar dentro de um presídio com um cara que nunca
vi?!
Anthony dá uma risada com sua bola nova e o ouço responder o que a
Dora aventureira está perguntando na TV:
— Ali tais!!! — ele avisa para ela.
A mudança no meu pequeno é visível. Não apenas nas roupas, mas ele
está mais gordinho e alegre também.
Estão eu sei que tenho que começar a arrumar as coisas que vou levar
amanhã, pois vou sim, fazer uma visita íntima a quem está me proporcionando
tudo isso: Isaac Greiner, o Rocha. Seja o que Deus (ou o diabo) quiser.
Confiro mais uma vez a minha imagem no espelho. O meu cabelo deu
trabalho, mas está realmente bonito. Depois de tanto tempo longe de um salão
ele chega até minha cintura. Retoquei a raiz que estava gigante e agora ele
está outra vez loiro e brilhante, e depois de secar e pranchar está liso, leve e
solto. Fiz uma make leve e perfeita.
Não me deixaram muitas opções de roupa. Por isso estou com uma
calça social de cor rosa envelhecido, que também tem o casaquinho delicado
e com mangas 3/4, o conjunto me faz parecer alta (mesmo com meus 1,60),
jovem, magra e elegante (estou me achando, sim, faz anos que não me arrumo
e hoje eu estou me sentindo muito bem), uma blusinha branca de seda por
cima do corpete de renda também branco termina a composição. Tive que
retirar os ferrinhos do tal carpete. Não deixa os seios tão bonitos, e me deu
um dó danada. Comprei ontem, especialmente para isso. Vem com uma
calcinha minúscula, e tem muitos laços, que o deixam sexy sem ser vulgar.
Estou com uma sandália branca sem salto, já que isso também não
pode.
Quando meu anjinho e eu entramos no carro de Valéria, ela solta um
assovio.
— Caramba, loira! Quer matar o cara? E que perfume é esse? Adorei!
— 212, tinha um restinho guardado... Eu estou nervosa. Será que ficou
legal? — Digo enquanto coloco o acento de Anthony ao lado do de Gabriel, e
a bolsa dele no lugar vago entre os dois.
— Ficou até demais. Da próxima vai de legging e chinelo, para não
dar moral pro cara!
— Coitado! — eu rio.
— Sério! Essa calça não tem zíper, né? — eu balanço a cabeça em
negativa. — Trouxe as coisas?
— Coisas? Quer dizer: toalha e afins? — eu balanço a sacola de
papel para ela, em resposta.
— Sabonete?
— Natura, pitanga — eu declaro sorrindo.
— Você vai acostumar mal este cara... — ela ri também.
— Val? — eu chamo depois de um tempo.
— Hummm? — ela responde baixando a música que estava tocando.
— O cara é muito feio? Tipo desdentado, ou que dá medo? — eu não
olho para ela quando digo isso.
— Achei estranho você não ter me perguntado nada, mas a verdade é
que eu não o conheço. Só o Téo que conhece. E o que o Téo disse é que o
Rocha é tipo um dos reis de lá...
— Rei? — eu arregalo os olhos, sem entender.
— Ele tem influência com os guardas. Ninguém pegou o dinheiro que
ele roubou e foi muito. Então já viu... E o Téo me disse que os presos também
respeitam ele.
— Respeito do tipo por dinheiro, ou por ser perigoso?
— Do tipo: os dois. — ela não tira os olhos da estrada.
E eu engulo o seco.
— Se não pegaram o dinheiro dele, como ele foi preso?
— A ex traiu ele. — ela diz depois de muito tempo, como se estivesse
com medo de dizer.
— Coitado!
— Por isso ele não queria se envolver com qualquer uma, e também
explica porque demorou muito para querer alguém. Entende agora? — ela me
olha de canto de olho.
Eu concordo com a cabeça e paro de perguntar as coisas. Acho
melhor nem saber.
Enfim o enorme presídio, distante de tudo, aparece. Os grandes
muros, os arames farpados, as cercas elétricas...
Só coisa boa. Só coisa boa...
Dou um grande suspiro tiro o cinto de segurança e me debruço para
trás, dando um beijo em Anthony, me despedindo e fazendo um carinho no
rosto de Gabriel.
— Me liga quando sair. — Valéria me diz tranquila.
Eu balanço a cabeça e pegando a sacola de papel saio do carro,
quando eu fecho a porta Val desce o vidro e grita:
— Não se estressa com a revista! Imagina que está no ginecologista!
O quê? Revista? Ginecologista?!
Eu engulo o seco.
Será tarde para desistir?
03 — EXTRA SAULO
Acordo chorando. As lágrimas ainda correm pelo meu rosto. Será que
gritei? Devo ter gritado. Brutos, meu pastor alemão está em cima da cama,
ganindo assustado.
Limpo o rosto com as mãos.
— Não foi nada parceiro. Estou acordado agora — digo passando a
mão pela cabeça dele, que se anima e me lambe o rosto. — Também não
exagere! — tento me sair das lambidas e evitar o bafo matinal (ou
“madrugal”, já que não amanheceu ainda) do meu melhor amigo.
Faço mais um carinho no pelo dele e minha mente volta ao terror de
meu sonho, ou melhor: lembrança.
Camila, minha única irmã, minha única família, se apaixonou pelo
desgraçado errado, por um marginal recém-saído do falho sistema carcerário
brasileiro. Achou que ele tinha mudado, eu avisei, ameacei, briguei com meu
jeito grosso de ser, pois após ter assumido a responsabilidade de criar a mim
e minha irmã de apenas 6 anos quando tinha 16, depois de meu pai matar
minha mãe e se suicidar, infelizmente desaprendi o que significa tato. Vi
muitas coisas para perder tempo dando voltas, o que não tem levado muito
adiante qualquer relacionamento com pessoas do sexo feminino, que parecem
apenas dar valor a palavras macias.
Minha irmã era uma delas. Porém com Camila eu tentava ser mais
gentil, falhava sempre, mas tentava... Naquele dia, mais uma vez eu perdi a
cabeça. Gritei. A chamei de coisas cruéis. Tentei ajuda-la a perceber o que
estava fazendo. Ameacei acabar com aquele filho da puta com minhas
próprias mãos se ela insistisse naquilo. Mostrei para onde iria sua vida se
continuasse se encontrando com aquele miserável.
Mas ela não me ouviu, disse que se acontecesse alguma coisa com ele
ela nunca me perdoaria, que eu não mandava em sua vida. E que eu não era o
pai dela, como “achava” que era. Essa frase doeu mais do que tudo, pois
sempre a amei como filha, mesmo eu tendo 30 anos e ela 20. Mandei-a
escolher, ou o marginal ou eu, seu irmão o cara que sempre fez tudo para ela
ser feliz. Que sempre a protegeu, que deixou muitas vezes de comer, de se
vestir, de estudar para dar tudo para ela.
Ela apenas me olhou em silencio e eu sai batendo a porta, dizendo que
ela poderia ir embora, que eu não queria a ver destruir o seu futuro com
aquele lixo. Mas mentalmente eu estava planejando uma batida policial
naquela pocilga que ele chamava de casa. Camila nunca mais olhar para
minha cara era um preço aceitável a pagar para manter minha irmã em
segurança.
Depois disso nunca mais a vi.
Fugiu com ele, foi o que eu pensei. Mas ela não tinha levado nada.
Por 10 dias procurei minha irmã. Por 10 dias eu mal dormi, mal comi, mal
respirei. Então recebi aquela maldita ligação dizendo que ela estava morta,
junto com o marginal a quem ela amava.
Segundo a perícia eles não estavam fugindo. A teoria é de que ela foi
se encontrar para acabar tudo, para desistir e seguir sua vida, então a facção
rival os pegou. Pegou o miserável e mesmo ela sendo inocente, apenas
porque estava junto com ele morreu também.
Impotência. Foi esse o sentimento que me seguiu por semanas. Até que
com a ajuda dos colegas da Policia Federal descobri quem eram os membros
da tal facção. Infiltrado como sempre, investiguei quem especificamente tinha
assassinado minha irmã. E o que fiz com ele não me trouxe a paz que achei
que traria.
Camila ainda estava morta e nada do que eu fizesse mudaria isso.
Levanto da cama de um pulo, pego a pistola que quando durmo coloco
embaixo do travesseiro e a ponho sobre a mesa de cabeceira, ao lado do meu
distintivo de agente da Policia Federal que no momento não posso usar, pois
a investigação em que estou infiltrado dentro do presídio está indo de vento
em polpa.
— Droga de cerveja! Não deveria ter comprado essa merda, Brutos!
E daí que era final do brasileirão? Meu time nem ganhou e de quebra tive
pesadelos com Camila. Hunf! Droga! — caminho até o banheiro e tomo uma
ducha quente, o dia começou cedo, e não foi com o pé direito, mas sim com
uma dor de cabeça infernal.
Eu poderia ter tido um sonho bom, poderia ter sonhado com minha
mulher... Não, não sou casado, nem nunca fui. Meus relacionamentos sempre
foram superficiais, rápidos e sem grandes envolvimentos... Isso porque eu
estou esperando a "minha mulher perfeita" aparecer. A mulher que habita
meus sonhos desde a adolescência, a loira que faz com que eu me sinta feliz
antes de dormir, porque tenho a chance de encontrar ela e nossa família
imaginária.
Nem pensar que eu conto isso para alguém, nem Camila sabia disso,
acho que foi meu subconsciente quem inventou uma mulher linda e perfeita
com filhos lindos de brinde, para que eu não enlouquecesse com tudo que
aconteceu quando era jovem, ou com as coisas que presencio ainda hoje.
De qualquer forma, eu acho uma bênção, e ainda não perdi a
esperança de algum dia encontrar uma moça que pelo menos me lembre a
"minha mulher perfeita".
Depois da academia vou para o presídio, hoje é o pior dia para mim.
Dia de visita íntima.
Odeio esse dia. Ver mulheres se prestando a visitar aqueles trates por
livre e espontânea vontade é mais do que um absurdo, é loucura. Isso não é
romântico é ficar presa naquele lugar por opção. Passar por uma revista
degradante só por um "encontro" em condições deploráveis é algo que não
posso entender. Com tanto homem trabalhador e de bem por aí. Por que
passar por isso? Se quando é o contrário o homem não visita a mulher
encarcerada. Eles as abandonam. Sequer com os filhos eles ficam. Eles
simplesmente caem fora. Eu sei disso, pois trabalhei em um caso assim. As
mulheres caem a grande maioria por tráfico, incentivadas pelo parceiro, e
quando vão para a prisão as únicas pessoas que as visitam são as mães delas.
Isso é fato.
E hoje elas fazem fila. Fila para serem humilhadas, degradadas, tudo
isso por esses miseráveis que não valem um tiro.
Bato ponto e me obrigo fazer as revistas, sempre atento aos mínimos
detalhes, o objetivo da minha missão é investigar delitos e regalias internos,
assim como um possível envolvimento de uma quadrilha aqui de dentro com
sequestros. Mas nunca se sabe o que se irá encontrar vindo de fora... Elas
entram aos pares, são revistadas intimamente na sala com as agentes
penitenciárias, depois vêm para cá e são revistadas por dois de nós, hoje
estamos eu e Ana, que gosta de mulher mais do que eu mesmo eu acho, já que
se baba por todas elas quando estão de calcinha e sutiã, o pouco que
conseguimos ver quando elas estão recolocando as roupas.
Quando uma loira pequena como uma boneca de porcelana e vestindo
um conjunto elegante cor de rosa entra, ainda arrumando a roupas sobre uma
lingerie de renda branca, meu queixo cai.
Que porra é essa?!
A "minha mulher perfeita" está aqui???
Os cabelos loiros compridos até a cintura, iguais aos que nos meus
sonhos eu passo os dedos e aspiro o cheiro. Ela tem a pele muito branca e eu
sei exatamente qual o contraste dela com a minha. Os traços suaves, a boca
pequena que pareço conhecer o gosto e até mesmo o encaixe.
Não pode ser!!! Essa mulher está visitando alguém nessa merda?!
Ela é delicada e parece ter classe, educação. Observo seus
movimentos, o jeito com que agradece Ana quando esta lhe indicou a mim
para terminar a revista.
Fecho a boca e engulo o seco, o peito batendo forte. Ela não me dirige
o olhar e ergue os braços, fingindo que não está aqui, olhando para longe com
cara de asco esperando que eu a reviste.
Mordo o lábio. Essa não é "minha mulher perfeita". Se fosse me
reconheceria também, sentiria alguma coisa ao invés de vir aqui, transar com
algum destes imundos e fazer cara de nojo por uma revista policial? Sério
isso? Eu virei a escória?
Observo-a com olhos analíticos, sem deixar a aparência que já
conheço me levar desta vez.
Essa não é "minha mulher perfeita"! Repito mais uma vez para mim
mesmo. A revisto com raiva, passando a mão pelo corpo, evito o toque
exagerado ou tarado, mas parece que sou bruto demais, pois ela se irrita e
fala entre dentes debochando:
— Se continuar com isso, não vai deixar muita coisa para o Rocha
fazer!
— Rocha? Que Rocha? — eu pergunto sem me importar com a
resposta, mas alivio o toque, talvez tenha exagerado.
Digo mentalmente que não me importo se essa mulher acha que
policiais são os bandidos e os bandidos são os mocinhos.
Pensando bem, minha revista grosseira não contribuiu em nada para
melhorar essa opinião. Merda! No que estou me tornando?
Num invejoso.
Meu cérebro me acusa.
— Prisioneiro 109... — a Ana me informa o apelido do tal “Rocha”, o
assaltante mais perigoso desta merda aqui. Assalto à mão armada, reféns,
sequestro, latrocínio, resistência à prisão, até homicídio. A lista é longa e
com grandes “feitos”, assaltos dignos de filmes. Isso e mais os milhões
roubados fazem dele o rei daqui. Rei do poço do fedor. Só se for! Hurf!
Torço a boca.
Eu não acredito que essa louca está querendo se encontrar com aquele
troglodita!
Retiro as mãos dela. A inveja sendo substituída agora pela raiva.
— A patricinha está indo ver o 109? — isso não pode estar
acontecendo!
Já me disseram que o cara comia um monte de mulher quando parou
aqui, que elas faziam fila, e até uma carcereira foi demitida por causa dele...
Mas agora essa aí? Essa aí é o tipo de mulher que a gente apresenta para a
família! Não como aquela advogada gostosa que volta e meia aparece aqui
para dar uma com ele e tem cara, corpo e jeito de andar de safada.
Eu devo estar muito errado nos meus conceitos... Mas ela me parece
doce e perdida... Tem uma fragilidade no olhar que me faz acreditar que não
deve fazer a mínima ideia do que está fazendo aqui.
Meu faro policial raramente se engana, mas pelo jeito essa minha
obsessão pela mulher dos meus sonhos está me prejudicando mais do que eu
imaginava.
— É, Silva. O 109 demorou, mas caprichou... — Ana continua
encarando a moça com olhar tarado.
Coube a mim a tarefa de levar a loira até o 109. Nunca aquele ditado
"jogar pérolas aos porcos" me fez tanto sentindo.
— O que uma mulher como você, faz em um lugar destes? — não
resisto e pergunto ao longo do caminho, só para ouvir outra vez a voz dela.
Ah, como eu sou idiota! Por que eu não calo a boca e só levo a
mulher, que não é a minha, e pronto? Merda, mesmo!
— Amor? — ela pergunta, mais do que responde.
Sou obrigado a dar risada.
— Amor? Pelo 109? Vai ter que inventar outra desculpa, loirinha,
porque nesta ninguém vai acreditar.
Já vi muita mulher louca de amor entrar nesta merda e definitivamente
essa patricinha está mais com medo do que qualquer outra coisa.
Ela me olha bem dentro dos olhos, com uma mistura de temor que me
diz que amor passa longe dessa situação... Mas os olhos dela têm tanta
fragilidade... Me passam tantas coisas que sinto bem no meio do peito, uma
dor estranha. É ela! Algo me diz.
É ELA!
Fico estático por uns segundos... Tento não pensar mais nisso e sigo o
resto do caminho em silêncio.
Tomo uma decisão: não posso deixar evidências tão claras passarem
batidas. Tenho que averiguar!
Então deixo para Goulart a tarefa de buscar o 109 e enquanto isso eu
caminho até o setor de revista e pego a planilha de Ana.
— Que cê quer, cara? — ela estranha minha atitude.
— Nada. Só estou checando — digo sem me importar com o que ela
poderá pensar.
Bingo!
Entrego a planilha para Ana outra vez e me afasto. Pego meu celular e
ligo para meu colega na Central:
— Garcia, eu preciso de informações sobre uma pessoa.
— Urumm... — ele responde como se estivesse comendo alguma
coisa. — Só me liga para pedir, né, di Santi? Agora de me mandar uma pizza
ninguém lembra!
— Fico te devendo uma pizza, então — respondo a quem chamamos
de Po, pois é igualzinho ao panda balofo do desenho.
— Vou cobrar! Certo, pode mandar: Nome? — ele já pergunta
animado.
— Melissa Mendonça — digo sorrindo e dou os demais detalhes que
consegui na ficha de visita.
— Em trinta minutos envio as informações para seu e-mail, e é
calabresa com bacon e muito, mas muito catupiry — ele diz ainda e em
seguida desliga.
Eu guardo o celular no bolso.
A vida me fez esbarrar na cópia da mulher que habita meus raros
sonhos felizes, onde eu e ela formamos uma família perfeita, onde o amor é
tão grande que eu sinto meu peito doer quando acordo.
Pode não ser ela. Pode ser alguém parecida com ela... Mas a conexão
que senti quando olhei dentro dos seus olhos foi imensa e o desconforto
quando a levei para aquele troglodita foi inexplicável. Preciso ter mais
informações sobre ela... Simplesmente preciso.
Por isso volto para aquela cela imunda e encontro Goulart igual
butuca tentando espiar pela fresta da minúscula janela que existe na porta de
ferro.
— Deixa que eu supervisiono, Goulart — digo a ele que dá um pulo.
— Silva deixa eu espiar, meu! Aquela loira deve ser linda de ver
sendo fodida — ele passa a mão no pau.
— Se abrir aquela abertura outra vez vai ter que se ver comigo — eu
digo entre dentes.
Sempre detestei Goulart. Sempre. Há algo nele tão ruim ou pior do
que os que ele vigia.
E ele não vai olhar para nenhuma mulher enquanto eu estiver aqui,
muito menos para a que é pra ser minha!
Raios! Estou ficando louco! Ela é linda, delicada e igualzinha àquela
que povoa meus raros sonhos bons... Mas isso é tudo impressão. A mulher
que sempre sonhei não entraria nessa merda para transar com um destes
infelizes para eu ficar ouvindo! Deus não seria tão cruel.
Tudo bem, eu posso ir embora... Mas isso vai dar a Goulart à chance
de espiar a moça e só de pensar nisso me dá vontade de chutar a cabeça dele.
Merda de noite mal dormida! É por isso que estou assim! Ou então é
falta de ter alguém... Falta de mulher, não apenas de sexo, mas de companhia
humana para conversar amenidades, carinho... Estou muito tempo sozinho,
nem mesmo Brutos aguenta mais meus monólogos. Carência. É isso! Certeza!
Não tem outra explicação eu ficar babando e me pirando com essa mulher que
eu nunca vi.
Nunca vi.
Não é ela aquela que aparece nos meus sonhos. Não é! Mas... E se
for?
Humm posso tentar vê-la fora dessa pocilga, talvez Garcia me consiga
um endereço... Tenho que saber se isso é tudo loucura pós-trauma, ou se a
vida está me dando uma oportunidade de voltar a sorrir.
04 — O Gigante
Três horas depois e eu quero matar a Valéria por não ter me avisado sobre a
tal revista!
Imaginar que está no ginecologista! Pois sim! Como se alguém
conseguisse imaginar que estava sendo atendida por um médico profissional,
quando uma mulher com olhar arrogante te obriga a ficar inteiramente nua, te
avaliado e te tratando como uma bandida! Tive que sentar em um detector de
metal! Pelo amor de Deus! Foi humilhante, degradante e além da vergonha
senti raiva. Sei que algumas levam coisas sim, mas nem todas! Ser tratada
como lixo sem nenhum motivo não me parece certo.
Depois que me vesti novamente, me revistaram outra vez, eu já estava
no limite e o guarda me tocava tanto que falei sem pensar:
— Se continuar com isso, não vai deixar muita coisa para o Rocha
fazer! — disse olhando para ele pela primeira vez.
O homem era muito bonito. Bonito demais para estar nesse lugar,
combinaria mais com uma capa de revista, ou pôster de cinema. Traços
perfeitos, cabelos castanhos claros, ombros largos e barba rala. Sexy. O
uniforme de agente penitenciário parece acentuar isso, assim como a carranca
dele. Apenas uma palavra define o homem: crush.
Crush todo mundo sabe o que é, mas a palavra vem do inglês que quer
dizer “colisão”, tipo quando um carro bate no outro, sabe? Aquele barulho de
tudo se esmagando, sendo quebrado...
Foi isso que senti. Súbito, forte e bem no meio do peito quando
encarei o olhar mais lindo que jamais vi.
Crush.
Primeira vez na vida que a palavra “crush” fez sentido para mim.
— Rocha? Que Rocha? — ele perguntou, diminuindo o toque e eu
aproveitei para erguer meu queixo que tinha caído.
— Prisioneiro 109... — a mulher informou.
— A patricinha está indo ver o 109? — ele retira totalmente as mãos,
não parece ser por medo do outro, mas por arrogância mesmo. E me olha com
olhar superior.
Isso me fez desviar as vistas da figura bonita que faz meu coração
bater diferente.
Patricinha?! Quem? Eu??? Onde já se viu, dizer uma besteira
destas?!
A mulher concordou com a cabeça, ainda olhando a ficha que tinha
nas mãos.
— É, Silva. O 109 demorou, mas caprichou... — ela me olhou e eu vi
os olhos dela percorrerem o meu corpo.
Gente! O que é isso? Ela me viu sem roupas! Por que ainda me olhava
daquele jeito? Eu não sou gostosa, do tipo que os homens e mulheres piram!
Na verdade eu nem sou gostosa! Certo que eu estava bem vestida e minha
lingerie é bonita... Vai ver foi isso. Ou o perfume...
Depois o cara alto, sexy e bonitão (crush) de mão pesada me trouxe
aqui. O tal de Silva.
— O que uma mulher como você, faz em um lugar destes? — ele me
perguntou no caminho, com uma voz sexy pra dedéu.
A pergunta me pegou desprevenida e eu me perdi e demorei em
responder. Sem saber o que falar, disse:
— Amor? — joguei em tom de pergunta a única resposta que imaginei
ser o motivo para fazer uma mulher se submeter a vir aqui.
O tal Silva deu uma risada sarcástica.
— Amor? Pelo 109? Vai ter que inventar outra desculpa, loirinha,
porque nesta, ninguém vai acreditar.
Isso me deu medo. Como assim ninguém vai acreditar? Por quê?
Eu me encolhi e não falei mais nada. Tampouco ele voltou a perguntar
algo. Queria que tivesse perguntado. Queria que tivesse conversado comigo...
Que dissesse algo para me tranquilizar... Mas quem eu quero enganar? Olha
aonde eu vim parar, e o que irei fazer... Meu coração está aos saltos, sinto que
algo muito ruim irá acontecer... Como aquela brisa que antecede uma
tormenta.
Estou com medo.
Passados alguns minutos tento não olhar para as paredes sem pintura e
sujas, ou a cama de alvenaria, que eu tremendo forrei com o lençol. E
definitivamente não olho para a pequena janela com grades. No canto do
minúsculo quarto tem um "banheiro" se é que dá para chamar assim aquilo
ali...
Oh, Deus, em que eu me meti!
Estou de costas para a porta que graças ao Pai está aberta, mas escuto
passos e não me viro. Tomo fôlego. Estou tendo um ataque de pânico. Eu
sinto. Eu já li sobre isso...
Suor frio, tremedeira, falta de ar, tortura, sensação de que vou morrer.
Jesus me ajude!
— Suíte presidencial! Tem uma hora. Divirta-se 109! — a voz do
guarda me dá um arrepio, bem com o som da porta de fechando.
Estou sozinha com o meu "amante presidiário".
Ele não faz qualquer barulho então eu respiro fundo e prendo a
respiração. Só então eu me viro.
E... Meu queixo vai ao chão!
Este é o 109?
De olhos arregalados eu observo o tal Rocha que mexe os pulsos,
provavelmente por causa da algema que foi retirada.
Ele me encara de volta, me medindo dos pés a cabeça. E parece
contrariado.
O cara é tão grande que eu imagino que deveriam ter dado o apelido
de montanha, e não de Rocha. Ele é uma mistura de Jason Sthatam, Vin Diesel
e The Rock. Grande, forte, careca e com cara de mau. Mas ele é colossal
como o de The Rock, talvez por isso o apelido de "Rocha". Tem tantos
músculos neste corpo que o cara deveria ser halterofilista! Ganharia uma
grana lerda, e nem precisaria assaltar bancos... Só acho.
Ele veste calças de moletom cinza e uma camiseta branca. Os. Braços.
São. Enormes. E. O. Peito. Então!? Nuoosa!!!
Putz, eu fecho a boca quando noto que estou a ponto de babar.
O cara é gostoso. Não vou mentir. Mas é tão grande que me intimida.
Eu não vou poder transar com tudo isso! Ele vai me destruir!
Ele sacode a cabeça. Negando alguma coisa que pensou.
— Porra de guarda burro! — a voz dele é irada e grossa. — Eu ergo
uma sobrancelha, sem entender. — Você deve ser a advogada nova que o Dr.
Nelson disse que mandaria, e estes idiotas acharam que era minha mina.
Inferno de ignorantes!
Ele se vira para a porta, pensando provavelmente em chamar os
guardas novamente.
Eu respiro fundo, me sentindo péssima. Ele nem me viu como mulher.
Sequer cogitou. Começamos bem.
— Não. Quem se enganou foi você. Eu sou Melissa. A... "mina" — eu
digo fazendo uma careta ante a palavra. Odeio gírias.
Ele se vira novamente para mim. Devagar. Bem devagar. Devagar
demais até.
Os olhos vão de meus pés até meus olhos e eu quase me encolho
diante da indignação que vejo neles.
— Que diabo! Me mandaram a porra de uma patricinha!?
O quê?!
Eu empino o meu queixo:
— Eu não sou patricinha... — começo ofendida, mas ele nem me
deixa terminar.
Ele me mede outra vez e solta um:
— Olha só, você não acha que está um pouco velha, para usar tanto
rosa?
Hein?! Sério isso produção?
Esse Neandertal está me ofendendo assim, de graça? Por nada?
Eu ando até ele, fico bem parada na frente dele... Não. Assim ele
ficou ainda maior. Dou dois passos para trás e então eu olho para ele outra
vez:
— Olha só, Kratos[1], eu não vim até aqui para ser ofendida pelo cara
que Zeus mandou para o inferno! E olha aí, mais uma semelhança...
— Kratos?! — ele ergue uma sobrancelha.
Não se intimida. Tampouco eu. Não. Ele me chamou de patricinha e
de velha. Tudo junto e ao mesmo tempo. Não me deu nem chance de
conversar!
— Passei por uma revista degradante e agora uma montanha vem me
ofender sem motivo nenhum. É certo isso? — continuo com voz contida, mas
ainda tremendo de raiva. — Não mesmo. E se me acha inaceitável, deve
discutir seus gostos com o Dr. Nelson. Só posso lhe desejar boa sorte na
próxima vez!
Eu passo por ele e bato na porta.
— Ô, agente de mão pesada... Qual o nome mesmo... Ah, sim... Silva!
Por favor, pode vir aqui? — eu chamo contra a porta de ferro.
Ouço um "rugido" atrás de mim, e acho que fiz besteira outra vez.
Como sempre, na verdade.
Eu me viro e vejo o enorme homem me fuzilar com o olhar.
Deus! O cara é um gigante!
Eu tenho que erguer muito a cabeça para poder olhar bem nos olhos
castanhos dele, quase negros. O nariz é reto e bonito, os lábios são cheios e
bem desenhados, o rosto todo dele é uma mistura de masculinidade e força.
Tudo neste cara emana isso.
Agora entendi o tal respeito que os outros têm por ele.
A porta se abre com um barulho pesado e o agente penitenciário
coloca a cabeça para dentro:
— O que você fez para a patricinha, 109? Não sabe mais tratar uma
mulher deste nível? — O guarda dá uma risada.
— Vá embora, Silva! — Rocha diz entre dentes, olhando para mim.
Mas não me passou despercebido o movimento que ele fez com as
sobrancelhas quando o outro me chamou de patricinha, como se estivesse me
dizendo: "tá vendo aí? Não sou só eu que penso assim!".
— Está tudo bem aí, loirinha? — O tal de Silva me pergunta através
do pequeno vão da porta.
Eu encaro a montanha na minha frente, vulgo Rocha.
— Está? — pergunto com o queixo erguido.
Vejo-o respirar fundo várias vezes e em seguida passar a mão pelo
rosto num gesto contido.
— Está. — Me diz calmamente.
Eu concordo com a cabeça.
— Está tudo bem, guarda. — Falo em voz alta. — Obrigada.
— Ok. Vocês têm só 50 minutos agora. — Ele avisa e depois fecha
novamente a porta pesada.
Eu saio de perto da única saída do ambiente. Saber que tem alguém
ali, escutando tudo, é no mínimo perturbador. Passo pelo Everest, sentindo o
olhar dele cravado em mim e caminho até perto da cama, mas a visão dela
simplesmente me faz suar. Retiro o casaquinho, o colocando estendido junto
com a toalha. Depois olho para o homem que ainda está em pé, sem se mover.
— Certo. Não gostou da escolha que fizeram para você. — eu
pondero — Então temos um problema — digo, me sentando na cama e
cruzando as pernas.
— Nunca suportei dondocas... — ele desdenha cruzando os braços no
peito grande, o que faz com que alguns de seus músculos saltem... Peito,
ombros e... Eu babo.
— Hein? Desculpe, mas eu não escutei o final da sua frase. Eu tive um
devaneio... — finalizo o comentário baixando a voz, mas mentalmente eu
acrescento "com seus músculos sem esta camiseta".
— Está vendo só? Você é tão arrogante que fica falando estas paradas
estranhas!
— Eu não sou arrogante porque não falo errado ou não gosto de usar
gírias! — eu me ofendo — Você achar isso de mim que é arrogância da sua
parte! Bem como preconceito!
Eu, hein! Quem ele pensa que é? Tá... Sei quem ele é. Ou sei mais ou
menos...
— "Bem como"? — ele sacode a cabeça com desgosto evidente. —
Com certeza eu não escolheria uma mina como você, mas já que está aqui...
— ele tira a camiseta e eu tenho um pequeno ataque cardíaco.
— Minha nossa! — infelizmente isso saiu sozinho da minha boca
aberta igual uma idiota.
O cara é tão perfeito de corpo, que dá para estudar anatomia ali.
Todos os músculos lindamente esculpidos. Isso sem contar com uma tatuagem
enorme, tribal, que vai do pescoço até o cotovelo, no braço esquerdo.
Ele me olha com um quase sorriso nos lábios, e expressão debochada.
—... Pode me pagar um boquete — ele termina a frase e eu sinto meu
sangue subir.
— Boquete?! — eu repito indignada.
— O que é? Tem nojinho? — ele debocha claramente agora, outra vez
com os braços cruzados, evito olhar para eles enquanto me levanto.
— Você é mal-educado e grosseiro! Literalmente um ogro!
— Esperava o que? Um príncipe? — diz com as sobrancelhas
arqueadas.
— Não. Esperava um bandido que tivesse o mínimo de civilidade!
— "Civilidade"? Achou que encontraria essa porra aqui?! Pelo visto
é verdade que toda loira é burra mesmo.
Loira burra?! Oi?
— Ora, seu estúpido! Ignorante! — me levanto irritada. — Eu sabia
que não deveria ter aceitado essa proposta idiota! Nem ter me arrumado
pensando em agradar um cara que nem sabe mais o que é uma boceta! —
Vejo-o arregalar os olhos depois desta.
Sim, eu falo palavrão quando estou irritada e este cara agora me
deixou puta.
— Sei fazer boquete sim, e sem querer me gabar eu "mando" muito
bem! — digo me aproximando da montanha — Mas não vou colocar a minha
boca neste seu pau, nem por meio milhão! Não sou puta e não aceito ser
tratada como uma! Embora esteja aqui por dinheiro, isso não te dá esse
direito de me humilhar, nem me ofender. Não daria nem se tivesse me
encontrado em uma esquina. Como dizem: você não é alguém que uma mulher
viria encontrar aqui por amor, ou até mesmo por afinidade.
Eu estou encarando seu rosto imponente com as mãos fechadas em
punhos e sei que perdi a cabeça e provavelmente vou perder ela do corpo
depois dessa.
Merda! Eu e minha boca! O cara é ban-di-do! Sua burra! É, vai ver
sou uma loira burra mesmo!
Tapo a boca com a mão, para não falar mais merda nenhuma, arregalo
meus olhos e pego meu casaco, para literalmente fugir daqui, mas de repente
ele está atrás de mim. Vejo sua mão grande, segurando o meu casaquinho
rosa, e fico estática.
— Desculpe — ele diz em voz profunda.
Uma palavra.
Apenas uma palavra do cara e eu fico atordoada.
Pisco várias vezes.
Ele retira o casaco das minhas mãos e joga novamente no canto
enquanto me olha muito sério.
Eu ainda estou pasma.
Achei que ele iria arrancar minha cabeça. E ele me pede desculpa?
Engulo o seco, esperando ele falar ou fazer alguma coisa para eu
gritar.
Chamar pelo Silva, por Deus e tudo o mais.
Mas ele não faz um minúsculo movimento, apenas me olha. E quando
o faz, sua voz é baixa e contida.
— Eu não imaginei que me mandariam alguém que parece uma Barbie
que fugiu da caixinha... — ele se explica muito sério.
Barbie? Fugida da caixinha? Entre tantas coisas é isso que ele me
fala?
É tão improvável e o alivio toma conta de mim que jogo a cabeça
para trás e rio alto. A raiva e o temor evaporando-se enquanto a gargalhada
ecoa pelo quarto.
Bom, eu não preciso de muito para rir. Adoro. Pelo menos isso a vida
ainda não me tirou. Minha capacidade de rir de meus problemas e até de mim
mesma.
— Obrigada pelo "Barbie" — digo ainda rindo. — Na minha "idade"
ouvir isso é muito bom.
Dou ênfase à palavra “idade”, para ele ver que não gostei das suas
palavras anteriores. Mas quando olho para seu rosto, me surpreendo com o
olhar intenso que me dirige.
— Você não é velha. Não foi isso que eu quis dizer — Ele diz com
voz grave e baixa enquanto toca os meus cabelos, e eu desaprendi como se
respira.
Puxa ar, solta ar.
Prende ar!
Socorro!
— Você disse que nunca escolheria alguém como eu. Por quê? —
Finalmente consigo dizer.
Fui eu quem disse isso? Essa voz rouca era a minha?!
Ele me encara, os olhos passeiam pelo meu rosto, as mãos tocam
meus braços, depois sobem pelo pescoço...
— Você é muito pequena, parece que vai quebrar se eu te foder — eu
juro que tentei não tremer, mas o arrepio de tesão veio forte. — Delicada
demais... — ele continua.
Os olhos dele param nos meus lábios, depois ele percorre o desenho
deles com o polegar, tão suavemente que eu quase não sinto o toque.
— Te garanto que não sou delicada. Mas tenho dúvidas quanto a você
me quebrar... — eu estou estupidamente olhando para a boca dele,
praticamente implorando um beijo.
Ele encara dentro dos meus olhos e eu o vejo descer o rosto em minha
direção. Fecho os olhos esperando... Esperando o beijo que não vem!
Abro-os novamente e dou de cara com ele me encarando com um
meio-sorriso.
— Quê? — eu pergunto, sem entender a súbita mudança de atitude.
— Tu tem algum macho lá fora? — ele atira esta pergunta assim, do
nada.
— Não. — seu doido bipolar.
— Há quanto tempo? — ele cruza os braços me avaliando.
— Mais de 4 anos — vejo ele se surpreender com essa, leva quase
um susto na verdade.
Ele balança a cabeça, passa a mão pelo queixo.
— Tire a roupa — o quê?! — Tire a roupa. — Ordena outra vez, já
que eu sequer me mexi.
Respiro fundo. Entendendo que ele está querendo ver se aceita ou não
a escolha do advogado. Já passei por uma revista degradante hoje, será que
vou ter que passar por outra? Por Deus!
Sento na cama e retiro as sandálias.
— Fique em pé. Quero te ver! — ele diz com ignorância primitiva.
— Eu só... — só estava tirando as sandálias! Burro! Como eu iria
fazer isso em pé?!
Eu termino de tirar as sandálias e subo na cama.
— Veja então. Quer um show também? — eu estou outra vez puta, este
cara está acabado com meus nervos.
Por que não me come de uma vez e acaba logo com isso? Está se
achando! Pois eu vou provar que a patricinha delicada aqui, que tem nojinho
e não aguenta uma foda sabe muito bem ser mulher! Ora essa!
Eu viro de costas ainda em cima da cama dura e cantarolo uma
música... Não vou mentir, a música que veio a minha mente foi Pretty Woman,
de Roy Orbison. Sim, aquela que é tema do filme da Julia Roberts “Uma linda
mulher”.
Eu pego a barra da blusa e levanto-a um pouco, olho para ele por
cima dos ombros, o Kratos ali, ainda está com os braços cruzados. Subo a
blusa com um movimento de quadril, depois a abaixo outra vez, rebolando e
me permito fazer um biquinho. Ele ergue uma sobrancelha.
Eu rio por dentro.
Está vendo Shrek? Eu sou uma linda mulher! Sou a Julia Roberts!
Eu retiro a blusa e largo-a na cama, com apenas um braço estendido.
Viro-me de frente para ele, dou um sorriso provocante, passo as mãos
sensualmente pelo corpo, me sentindo a Marilyn Monroe, e depois passo-as
pela cintura da minha calça, cantando a estrofe:
— "... That you look lovely as can be. Are you lonely just like
me?..."
Que quer dizer: "Você está o mais linda (o) possível. Você está
sozinha (o) como eu estou?" Duvido que ele saiba inglês, mas se fosse para
seduzir alguém só esta frase já estava valendo!
Inclino meu corpo para frente, assim ele pode observar meus seios
quase pularem pelo decote e vejo-o engolir o seco, pasmo.
Ainda dançando (só que não), eu me viro outra vez de costas e me
inclino sobre os joelhos, descendo a calça devagar pelos meus quadris.
Quando esta finalmente cai, eu ainda continuo com a posição, e dou um leve
balançar de ancas, com apenas a minha calcinha minúscula e meu corpete
chique.
Viu palhaço? Eu também sei ser mulher! Otário!
Então eu me endireito o corpo e viro para ele.
Levo um choque ao me dar conta que o cara está a um palmo de mim,
bem em frente à cama.
— Pronto? Já viu, né? Então? O que você vai... — eu não digo mais
nada, pois o cara colou a boca na minha e está invadindo tudo com a sua
língua.
Eu não esperava por isso. E muito menos não esperava que eu fosse
me agarrar a ele, envolver o corpo grande com as pernas e corresponder ao
beijo com loucura. Gemendo, apertando, beijando... Em um tesão louco e
desmedido.
Ele cheira a banho recém tomando e a homem, no mais alto grau de
masculinidade que esta palavra envolve. Homem. Grande. Forte. Viril.
Homem.
Ele me aperta a bunda segurando o peso do meu corpo por ali.
— Caralho, mulher! — ele exclama afastando os lábios dos meus. —
Retiro tudo que eu disse! Tu sabe fazer um homem ficar louco, gostosa e
cheirosa!
Eu sorrio enquanto ele me coloca na cama outra vez, se debruçando
sobre mim, baixando a alça do meu corpete.
— Embrulhadinha para presente... — ele diz enquanto vai abrindo os
líneos e laços que fecham a lingerie na frente.
Minha respiração está acelerada. Meu peito sobe e desce
profundamente. Observo as mãos grandes abrirem minha última barreira de
pudor e a constatação de que eu quero, é como um soco no meu estômago.
Sim. Eu quero.
Eu quero o homem na minha frente. Eu quero fazer amor com ele. Eu
quero que ele me possua e me beije. Quero sentir todo este corpo grande e
forte junto ao meu. Eu quero transar nesta merda de presídio e não estou nem
aí. Desde que ele entrou por aquela porta eu nem penso mais onde estou. Eu
só tenho consciência dele.
E no momento, eu quero que ele me beije e me leve à loucura.
Pirei. Ótimo! Porque loucos não se arrependem.
05 — Paixão
Demorei, mas a convenci que não estou com más intenções com ela. E
ela aceitou uma carona. Os conduzi até o meu carro de disfarce de agente
penitenciário, um Uno velho verde. Ela não pareceu se importar, mas queria
poder estar com minha picape Frontier agora. De que adianta ter um carro
bom se quando se conhece a mulher dos seus sonhos você está de Uno velho?
Se ela for realmente a mulher dos meus sonhos ela não se importará
de andar de Uno, de ônibus, de carroça ou a pé.
Meu cérebro responde e eu peço a Deus que ele esteja certo.
Conversamos trivialidades e finjo que não sei o endereço e quando
chegamos a ajudei com as compras, já que ela levou o pequenino que
adormeceu no caminho. Mas ela não queria...
— Não vou deixar que faça duas viagens! Já está carregando o
pequeno Tony, como em nome de Deus acha que irá conseguir levar tudo lá
para cima? Só vu ou levar suas coisas até a porta. Tá bom?
— Você é muito insistente! — ela dá uma bronca, mas a vejo sorrir.
— Até a porta, então...
Ela concorda com um olhar travesso que me faz respirar fundo,
provavelmente se as palavras fossem: "até o inferno", eu seguiria a
acompanhando.
Quando ela abre a porta eu coloco as coisas lá dentro, bem na entrada
como prometi.
— Posso te ligar? — pergunto implorando mentalmente por um "sim"
e sou recompensado com o número do telefone dela.
Desço as escadas feliz como criança em noite de natal. Quase canto
"Bate o Sino", porém meu celular toca, o número da Central me ligando.
— Di Santi — me identifico ao atender.
— Di Santi, um novo carregamento de armas foi interceptado, o chefe
quer que você interrogue os caras.
— Tem algo a ver com meu caso atual naquele presídio? — pergunto
já mudando o rumo do carro.
— Parece que sim...
— Chego aí em 15 minutos.
Um balde de realidade fria me obriga a descer das nuvens onde
estava... Mas espero voltar para elas em breve.
09 — Uma Ligação
Eu arregalo os olhos.
— Solitária?! Meu Deus! O que eu sei de solitária, foi o que vi nos
filmes... Um lugar horrível, imundo, escuro...
— Ah é. Tudo isso e mais um pouco... Mas desde que você atendeu o
telefone, eu não estou mais aqui. Estou ai com você.
Owwnnn. Meu coração deu outro suspiro agora. Merda!
— O que você aprontou para estar aí? — eu tento não deixar me
dominar pela onda súbita de carinho que este homem está me despertando.
— Nada de mais... Um dos agentes penitenciários fez uma piadinha
que não gostei... Agora ele vai ficar um bom tempo sem falar nada...
— Oh, meu Deus! Se meteu em uma briga? Com um agente
penitenciário?! E você? Como está? Machucado?
— Está preocupada comigo, boneca? Sério? Acho que eu nem
lembrava mais o que é isso...
— Para de enrolar! Me diz como você está! — eu sinto meu peito
apertar.
Saber que ele está em um lugar terrível como uma solitária e ainda
ferido me dá uma angústia muito grande. Não conheço este cara muito bem,
mas é como se já fizesse parte da minha vida. Estranho. Será que estou tão
carente assim?
Ele dá uma risada baixa.
— Estou bem. Nada demais. Posso ser um prisioneiro, mas tenho
meus privilégios aqui, por exemplo, estar nesta porra com um celular. E
podendo falar com você, minha boneca.
— Se eu soubesse, não teria desligado antes...
— Eu merecia.
— É. Isso você tem razão.
— Vai vir depois de amanhã me ver? — a pergunta é feita em tom
baixo e receoso.
— Não sei. — digo com sinceridade.
— Achei que já havia me perdoado...
— Perdoar é uma coisa, dar a oportunidade para que aconteça tudo de
novo é outra.
— Mel, não escuta sua cabeça, valeu? Ela nunca vai ficar do meu
lado. Você é inteligente demais para querer um cara cheio de tretas e
fodido como eu... Então, esquece a sua cabeça!
— O quê?! — eu pergunto rindo.
— Sim. Tem que ter algo aí que goste de mim... Têm?
— Todo o resto — digo de um suspiro, sem querer.
— Porra, Mel. Para com isso, boneca. Assim eu me apaixono e vai
ser uma merda! — ele dá um suspiro profundo. — Então por todo o resto...
Vem me ver. Só uma conversa, na frente de todo mundo. Eu não vou ser um
idiota como naquele dia, eu não quero te perder.
Ele consegue falar isso tão sério, quase com raiva, e eu acho que
nunca havia visto um homem com H maiúsculo "pedir" nada. E não vou dizer
que não achei super sexy, porque eu estaria mentindo.
— Acho melhor você agora parar com isso. Assim eu me apaixono e
vai dar merda! — repito o que ele me disse, mas é a mais pura verdade.
Escuto a risada baixa e rouca dele, que me arrepia, de um jeito bom.
— Quero você, boneca. Quero que seja minha.
Minha respiração fica alterada.
— Merda, Isaac. Não faz assim — eu passo a mão pelos cabelos,
perturbada.
— Vai vir, então?
— Vou. — digo por fim, rendida, totalmente seduzida por ele.
— Que bom. Prometo me comportar — quase posso o ver sorrindo
satisfeito.
— Vai ter que fazer melhor que isso, Kratos! Vai ter que me tratar
bem!
— Eu trataria como uma princesa... Se eu soubesse. Eu não sei ser
babão, boneca. Isso de ficar correndo atrás de um mulher, é... Porra! É a
primeira vez que faço essa merda!
Eu rio do quase desespero dele. Por isso ele pede para eu vê-lo com
raiva. É o jeito grosso dele, de tentar ser "babão".
— Eu gosto do seu jeito. Não quero que vire um babão. Nem de
longe. Só quero que me trate com respeito... Com atenção. Nada demais!
Afinal você tinha uma ex qualquer coisa, como tratava ela?
— Como assim? Ela era diferente, se eu chamasse ela de vadia, ela
gostava, você se eu chamar, você nunca mais me olha!
— Isso é verdade! Mas tem mais coisas que quero saber...
— O que quer saber daquela mina? Não tem nada para saber...
— Me conta, ela era o que sua? Ficaram quanto tempo juntos? Ainda
ama ela? — Droga! Eu não deveria ter perguntado isso!
Ele fica em silêncio por uns minutos.
— Certo. Eu fui casado. Casado, mas não de verdade, sabe como é?
— Moraram juntos?
— Isso. Por dois anos. Ela sabia de todos os meus rolos, sabia e
fazia junto. Acho que por isso ficamos tanto tempo. Enfim, ela se juntou
com o nosso advogado e me traiu com o cara. Me entregaram pros cana e
aqui estou. Com a única sorte de ter desconfiado e mexido alguns
pauzinhos um pouco antes da merda acontecer.
— Traição da pior espécie. Como homem e como ser-humano. Eu
sinto muito por isso. Ela merecia uma surra! Vaca! — Respiro fundo, para
acalmar a onda de raiva que me dominou. — Mas você não respondeu minha
última pergunta. — Digo mais tranquila.
— Qual era?
— Se você ainda a ama.
— Não. A sorte dela é que ela é mulher, senão já estaria... — ele se
cala repentinamente, como se tarde demais se desse conta que iria falar
merda. — Desculpe, Mel. Não quero ficar falando sobre minha pior parte.
Nem que você veja, ou escute ela.
— Desculpe por ter perguntado. E eu também não quero ver sua pior
parte. Obrigada. — Fico sem jeito por ter tocado no assunto.
— Mel, faça sua mágica outra vez. Me tire daqui. Me fale sobre sua
casa, sobre seu filho... Me faça ir para aí com você... — a voz dele tem tanta
agonia que me impressiona.
Puta merda! Meu peito doeu agora. Eu pisco várias vezes para afastar
as lágrimas que encheram meus olhos.
— Meu filho, Anthony, está dormindo no quarto, na minha cama... —
eu começo.
— Garoto de sorte...
Eu rio do comentário dele.
— Ele não dorme sem jogar naqueles bichinhos virtuais do celular.
Tem um que é um gatinho: My Talking Tom, e... Eu estou parecendo ele. Não
conseguia dormir até brincar, conversar com você. Agora me sinto mais
leve...
— Eu também. Parece que meu... Hum, coração se acalmou depois
de muitos anos... Porra! Estou ficando romântico! Saco! Inferno! Me fala
de outra coisa antes que eu me enforque aqui, boneca! Caralho...
Eu me surpreendo com a atitude dele e mudo de assunto.
— Nos mudamos há apenas alguns dias para este apartamento. É
pequeno, mas bem bonito. Foi um tal de Isaac Greiner quem pagou. Obrigada,
não sabe o quanto me ajudou.
— Por favor, não agradeça. Eu me sinto um lixo... Quer dizer: Me
sinto mais lixo ainda, por ter feito aquilo com você. O advogado me disse
que você queria devolver o dinheiro. Não faça isso. Nunca. Não importa o
que aconteça. O que eu te der, será para você e o futuro de seu filho.
Entendeu?
— Do que está falando? — acho que me perdi em algum lugar, pois eu
não entendi.
— Nada, boneca. Continua me falando do Apê.
— Como eu disse, é bonitinho, fica próximo ao Centro da cidade, mas
só tem um quarto... Quando vier nos visitar, vai ter que dormir no sofá! — Eu
sorrio ante a possibilidade praticamente impossível, mas deliciosamente
atraente.
Ele respira profundamente, como se meu comentário tivesse o tocado
profundamente e quando fala, parece querer disfarçar, mas sua voz está
diferente, quase embargada:
— Até eu sair daqui, vocês já se mudaram daí — ele limpa a
garganta. — O apê é teu?
— Não. É alugado. Mas não pretendo sair daqui tão cedo. Anthony e
eu estamos rolando daqui para ali há tanto tempo...
— Como assim?
— Não quero falar da minha parte ruim, Isaac. — eu dou uma risada
sem graça.
— Me conta, Mel. Quero saber sobre você. E você, não tem parte
ruim. Nem sabe o que é isso.
Dou um suspiro.
— Você tem razão em me chamar de patricinha. Eu era isso realmente.
Ele gargalha
— Sério? Não diga?!
— Sem graça. — eu rio um pouco. — Mas eu não sou mais! Eu fiz
uma merda, bem grande e meus pais que moram no interior, me viram as
costas, me deserdaram e tal.
— O que de tão terrível você fez?
Ele parece debochar, mas imagino que se souber, não vai mais me
tratar como antes. Talvez fique louco e me xingue. Quem quer saber de mulher
que dorme com homem comprometido? Seria melhor não contar. Inventar uma
história... Mas nunca foi boa em mentiras por isso digo de um sopro:
— Tive um caso com meu colega de trabalho casado e engravidei
dele.
Isaac fica mudo do outro lado da linha. Eu imagino que irá desligar ou
me chamar de vadia, algo assim.
— Você sabia que o cara era casado? —ele pergunta devagar,
parecendo pensar sobre o assunto.
— Sabia. Não importa as mentiras que ele contou, eu sabia que ele
era comprometido, e dentro de mim, sabia que ele nunca largaria ela, por
mais que eu me iludisse.
— O que ele fez quando você contou que estava grávida?
— Pediu para eu abortar.
— Que idiota! Esse filho da puta não te conhecia? Até parece que
você faria uma coisa destas!!!
— Parece que você me conhece mais do que ele...
— E depois?
— Nunca mais o vi. Pediu demissão. Mudou de casa. Ele nunca mais
procurou a mim ou conheceu Anthony. Nunca viu o próprio filho.
— Vou fazer a mesma pergunta que me fez antes: você ainda ama
ele?
— Não tem como amar, Isaac. O cara é um covarde da pior espécie! E
para mim este é o maior defeito que um homem pode ter.
— Que bom! Porque eu tenho mil defeitos! Mas covardia não é um
deles!
Eu rio com essa.
— Mel?
— Humm?
— Quer que eu mande... Dar uma lição no cara? Ou...
Ele deixa a frase no ar, eu arregalo os olhos.
— Não. Não precisa, Isaac.
— Se eu te pedisse o nome completo dele, você daria?
Eu rio outra vez.
— Deixa. Não vale a pena.
— Vale, Mel. Mas tá certo. Não está mais aqui quem falou...
— Promete que não vai fazer nada, Isaac! — eu notei que ele não vai
desistir.
— Não posso prometer, boneca. É contra minha religião — ele ri.
— Mas a sua família eu entendo ter ficado contra você. É sempre assim
quando a gente não é o que eles sonharam para os filhos perfeitos. Tem
muitos anos... Ixe, que não vejo minha mãe. E isso foi antes de eu cair.
— Você tem família, que vai te visitar?
— Minha irmã veio umas duas vezes... Mas eu não quero que ela me
veja aqui, por isso pedi para não vir mais. E meu pai... Bom... Deixa ele pra
lá.
— Entendo. Mas... Você não reagiu como eu achei que reagiria.
— Como o quê? Com sua parte terrível? — ele ri. — Eu fiz tanta
merda, boneca, acha que iria te julgar só porque se apaixonou pelo filho da
puta errado?
Eu não esperava ouvir isso.
Então me dou conta, que Isaac assim como eu, é mais um que fez
escolhas ruins. Com a única diferença é que adultério, não dá mais cadeia.
— Obrigada por não me julgar. — digo com voz baixa.
— Não tem nada para julgar, boneca.
Eu dou um bocejo.
— Isaac? Eu não quero, mas meus olhos estão se fechando — eu me
levanto, desligo a TV e me deito ao lado de Anthony. — Se eu parar de falar,
foi porque dormi. Está bem?
— Vou desligar então e te deixar dormir.
— Não! Não desliga. Eu quero dormir escutando sua respiração nem
que seja. Eu quero fingir que está aqui — sei que foi o sono que me fez falar
isso, eu não falaria assim se estivesse totalmente desperta.
— Mel, pelo amor de Deus, não faz assim. Senão vou dar um jeito
de vir todos os dias para a solitária, só para poder falar com você a noite.
— Isaac, você é um Kratos bonzinho e fofo! — eu dou uma risada
baixa, já de olhos fechados.
— Não sou bonzinho, Mel. Mas como todo mundo tenho um lado
não tão ruim. Um lado pequeno e adormecido. E você desperta ele.
— Você quer que eu me apaixone, não é? Covardia a sua, jogar sujo
assim!
Ele ri.
Dou outro bocejo.
— Dorme, boneca. Vou ficar aqui de olho.
— Eu não queria dormir... — outro bocejo. — Mas não consigo...
Isaac, não desliga.
— Não vou desligar, meu amor.
As palavras entram no meu cérebro meio adormecido, me fazendo
sorrir.
— Boa noite, meu Kratos lindo.
Uma risada baixa.
— Boa noite, minha patricinha linda.
Eu continuo ainda ouvindo se ele está ali. E o som de sua respiração
me tranquiliza.
— Queria que estivesse aqui... — eu murmuro e ele responde algo,
mas meu cérebro já não capta mais nada apenas o timbre rouco que mexe com
todo meu ser.
Então assim, ouvindo a sua voz eu adormeço.
12 — Observar é Preciso
Estou um caco. Dormi tarde, levantei cedo por causa de Anthony e estou à
base de café a manhã toda.
Valéria me ligou e disse que virá para uma visita esta tarde. Achei
muito bom, preciso falar com ela. Estou confusa em relação a Isaac. Confusa
é apelido, na verdade. Eu estou é meio louca... Ele me chamou MESMO de
"meu amor"? Foi sério aquilo? Ou eu imaginei? Não pode ser. Ele nunca
falaria isso! É o mesmo que o fogo ser frio, ou o gelo ser quente... Isaac
nunca, NUNCA me chamaria de "meu amor". Com certeza eu já estava
dormindo, e sonhei com aquilo.
Talvez Val possa me dar alguns conselhos... Isso tudo está indo rápido
de mais. Imagina que loucura! Só vi o cara uma vez na vida!
Estou tirando Anthony do banho quando a campainha toca. É cedo
ainda para ser Val, a não ser que ela chegou antes para nós irmos almoçar
juntas...
— Já vou! — grito enrolando Anthony mais na toalha antes de abrir a
porta e quando a abro, dou de cara com um par de olhos verdes escuros.
— Salo!! — a surpresa e alegria de Anthony faz com que eu fique
envergonhada. Afinal ele nem conhece esse cara! Como pode se lembrar do
nome do moço que só viu uma vez?!
— E aí, campeão?! — Saulo sorri lindamente para o meu menino e
percebo algo parecido com carinho no olhar que ele dirige ao pequeno. —
Oi, Melissa — Saulo me dá um sorriso sem jeito, passando a mão na parte de
trás dos cabelos. — Tentei te ligar ontem, para conversamos e para avisar
que passaria aqui hoje, mas só dava caixa. Consegui uma viatura! — ele
termina de falar encarando Anthony com expressão animada batendo palmas.
Anthony grita:
— Calo de puliça?! Mamãe! Calo de puliça!!! Cadê? Cadê?!
Pronto! Agitação seu nome é Anthony. O menino se debate no meu
colo até ir para o chão.
— Tá lá embaixo. Acho que da janela dá para ver... — Saulo diz com
expressão culpada olhando para mim, como quem pede desculpas.
Mas as palavras são o suficiente para fazer Anthony correr para a
primeira janela e espremer o rosto contra o vidro olhando para baixo de
dizendo vários "uau"s.
Seguro a porta aberta e faço gesto com a mão esquerda para Saulo
entrar.
Anthony agora está aos gritos de empolgação e eu vou até ele que me
aponta o carro enorme, preto e com letras amarelas que dizem "Policia
Federal". A sirene está brilhando e silenciosa.
Encaro Saulo com a minha boca aberta.
— Eu não acredito! — lhe digo sorrindo.
Ele sorri sem jeito, desviando o olhar e sinto meu coração ficar
estranho. Me levanto querendo sair daqui.
— Venha, Anthony. Vamos colocar uma roupa, amor.
— Vamu anda de calo de puliça, né, mamãe? — ele me pergunta ainda
olhando para fora, como se tivesse medo de se afastar do vidro e o veículo
sumir de repente.
Olho para Saulo perguntando silenciosamente se poderemos entrar
naquilo ali embaixo, pois que eu saiba não deve ser uma coisa normal isso.
— Vamos, sim! Mas você tem que se vestir rápido... — Saulo quem
responde e nem bem termina Anthony já se enrolou melhor na toalha e correu
para o quarto.
Eu vou atrás correndo, pois Anthony está aos berros me apressando. E
na passada murmuro um “muito obrigada” para Saulo, pois a felicidade de
meu pequeno é tão grande que me contagia.
O amigo totalmente fardado de Saulo está na direção da viatura
quando descemos. Com polidez ele me cumprimenta e eu e Anthony sentamos
nos bancos traseiros. Meu filho está na Disney! Ri, toca em tudo pergunta
coisas tão rápido que nem eu consigo traduzir. Na metade do passeio para o
fim, ele já está no colo de Saulo no banco da frente e estamos com a sirene
ligada.
A alegria do meu pequeno tamanha que até o amigo sisudo de Saulo
está sorrindo. E quando paramos nas portas de um restaurante McDonalds
descemos, mas sem querer ouço o amigo de Saulo dizer a ele:
— Di Santi tem que tomar cuidado...
— Cala a boca, Moura! E "obrigado" pela carona. — ele diz ainda e
bate a porta.
Eu ergo uma sobrancelha para ele. Quem será Di Santi?
Anthony ainda olha para a viatura que se vai parecendo
decepcionado.
— Ei! Não fica assim, amorzinho! Quando você crescer e virar
policial vai ter uma dessas só pra você. Agora vamos comer umas coisas
gostosas?
Ele apenas me olha e ergue os ombrinhos como se dissesse: É... tanto
faz.
— Eu tenho uma ideia melhor! — Saulo propõe. — Podemos comer
até nos empanturrar e depois atravessar a rua e andar de pedalinho no lago. Já
fez isso, campeão?
Pronto! Os olhinhos de Anthony já estão brilhando outra vez.
Saulo é um cara legal. Ele conversa mais com Anthony do que
comigo. Eu rio dos papos dos dois os observando abrir os brinquedinhos do
Mc Lanche feliz. Definitivamente é um passeio muito bom.
—... então? Vamos? — Saulo termina uma pergunta que eu sequer
ouvi.
Estes devaneios estão me incomodando já!
Olho para Anthony que está de pé ao lado de Saulo.
— Ahh... claro! Vamos! — confirmo, pois parece ser o que meu
pequeno quer.
Vamos para o parque grande e tranquilo, não há muito movimento hoje
e em minutos estamos nós três dentro de um "cisne" enorme. Anthony está de
colete salva vidas e no meio de nós dois. Está animadíssimo e ri de tudo. Dos
patos que passam próximos ao pedalinho, dos peixes que pulam das águas
tranquilas do lago...
— Acho que eu nunca vi "alguém" — indico Anthony com os olhos
para Saulo. — Tão feliz. E para falar a verdade já faz um tempo que nós dois
não temos um passeio tão bom. Obrigada. — concluo e Saulo me encara
intensamente.
Parece quer me dizer alguma coisa, mas não sabe como. Abre a boca
por duas vezes e torna a fecha-la. Depois apenas balança a cabeça,
concordando.
— Então somos três — conclui com um sorriso.
Um silêncio estranho cai entre nós e eu fico me perguntando se Saulo
sabe de alguma coisa sobre a briga de Isaac.
Mordo o lábio. Talvez ter um amigo lá dentro me sirva para alguma
coisa...
— Hãmmm... Tem alguma novidade daquele meu "amigo" que mora
no seu serviço?
Me arrependo a pergunta no instante que Saulo me crava seu olhar
verde. Algo além de surpresa está ali. Algo que me faz encolher: decepção.
Por mais que ele esteja me olhando incrédulo e de cenho franzido ele
anuncia sem emoção e voz gelada:
— 109 foi para a solitária ontem, depois de ganhar uma surra.
— Me conta isso! — finjo uma curiosidade animada que o faz erguer
uma sobrancelha.
— Bom, talvez você goste de saber da história. Goulart, aquele agente
penitenciário que estava no quarto aquele dia junto, lembra dele?
— Lembro.
— Pois então, aquele lixo falou uma merda para o 109...
— Que merda?
Ele fica em silêncio observando o lago e depois diz baixo:
— Ele perguntou se a patricinha escandalosa não iria vir aquele dia
porque ele queria... — Saulo se interrompe e olha para outro lado, evitando a
palavra. — Hummmm... Ele foi escroto, muito. E foi bem feito o que
aconteceu com ele na verdade...
Mas eu entendi o que ele não disse: O cara queria tocar uma me
ouvindo fazer "escândalo". Que vergonha, meu Deus.
Solto uma expressão de surpresa sem querer.
— Eu não estava trabalhando, por isso não ouvi quando ele disse essa
merda, mas me disseram que o 109 pirou, tiveram que juntar quase dez para
tirar ele de cima daquele saco de lixo, pois ele quase matou o cara. Foi uma
confusão dos infernos!
Foi por minha causa que ele foi parar na solitária? Meu Deus!
— Você disse que ele levou uma surra...
— Nenhum preso bate em um agente penitenciário e fica impune,
Melissa. Não importa se tem dinheiro.
Saulo já está fazendo a volta com o pedalinho e o clima amigável do
nosso passeio mudou. Até Anthony está quieto.
— O que eles fizeram com ele?
Pergunto e Saulo fica em silêncio e depois de um tempo declara:
—. Quando conseguiram tirar ele de cima do Goulart, o algemaram e
aí sim bateram com gosto.
— Bateram no cara algemado? — a surpresa está na minha voz.
— Ele quem pediu, Melissa. — Saulo dá de ombros.
A indignação vem com força, sinto minhas bochechas queimarem.
— Você acha certo isso?! Dez baterem em um cara, e além de tudo
algemado? Não tem vergonha?! Isso é covardia!!!
Saulo parece não se abalar. Para o pedalinho e eu saio sem a ajuda do
atendente que me estende a mão. Retiro Anthony e Saulo vem atrás.
— Depois de tudo que ele fez com você? Ainda o defende?
— Isaac teve uma atitude muito nobre...
— Nobre??? — Saulo se indigna agora. — Aquele cara não faz ideia
do que seja nobreza, Melissa. Você não parece ver o óbvio! Está se
iludindo...
— Ora, seu preconceituoso! Foi nobre sim! O seu colega ofendeu a
mulher dele! EU sou a patricinha escandalosa que o nojento do Goulart queria
fazer "aquilo" escutando. — baixo a voz e vejo Anthony a três passos na
nossa frente, olhando os patos no lago. — O que você faria se falassem isso
da sua namorada ou mulher? Ainda defenderia o escroto do Goulart?
— Não estou defendendo ninguém. Se não notou. Nem o Goulart e
nem o 109. — ele diz sem emoção.
— Pois eu achei foi bem feito o que o Isaac fez! Eu faria a mesma
coisa! E você achar que eu iria gostar dessa história, só mostra o quanto
somos diferentes!
Cruzo os braços e o encaro com raiva.
— Foi impressão minha ou referiu a si mesma como "mulher" dele?
Está louca? — Saulo parece ter perdido a paciência. — Melissa, você não
sabe o que está falando, não tem ideia de como esse cara é...
— Oh! Eu tenho sim! E amanhã eu vou ir visitar esse cara que levou
uma surra de dez, algemado, para me defender...
— Ele não é um herói, Melissa!!! Fez o que qualquer homem com
sangue nas veias faria! E não acredito que depois de tudo você ainda vá
querer se encontrar com aquele lixo! Não tem cabeça?
— Quem você pensa que é para falar comigo desse jeito?! — eu
quase grito, mas o som de algo caindo na água próximo de nós desvia minha
atenção.
Anthony sumiu.
Não penso em nada, apenas vejo em questão de segundos Saulo pular
nas águas escuras do lago e emergir com meu menino nos braços, quando dou
por mim estou abraçada a Anthony, chorando e molhada. Meu menino tosse e
me aperta, assustado.
— Foi só um mergulho, não é Tony? Tá tudo legal agora, parceiro? —
Saulo está com semblante preocupado e quando me olha parece temeroso.
Anthony sacode a cabeça em um "sim", e me aperta mais ainda.
— Obrigada — digo em voz baixa tentando não chorar.
— Vou chamar o Moura para levar vocês para casa de viatura, isso se
não quiser levar ele num pronto socorro...
— Não. Está tudo bem, foi só o susto mesmo. Desculpa por ter
começado aquela conversa, Saulo... Olha só eu discutindo por besteira e nem
vi...
Gaguejo, a voz falha e abraço meu pequeno mais forte. Eu me sinto a
pior mãe da Terra.
— Não foi culpa sua, Melissa. Foi apenas um momento de distração e
ele está bem... Quanto aquele assunto, não vamos mais tocar nele. Tá bom?
Eu apenas concordo com a cabeça.
Saulo se aproxima e nos abraça a mim e Anthony ao mesmo tempo. Eu
quero acreditar nas palavras dele, mas não consigo, fui imprudente por causa
de um homem que eu mal conheço! Eu que estou merecendo uma surra de 10.
Nunca vou poder agradecer a Saulo como se deve pelo que ele fez
sem hesitar. Sem sequer pensar.
Ficamos assim, parecendo um pouco alheios ao tempo, tomando um
fôlego e acalmando os corações por não sei quanto tempo, mas quando nos
damos conta a viatura para diante de nós.
Anthony se anima quando vê o carro. O trajeto até nossa casa é feito
em silêncio dessa vez. Abraço ainda mais Anthony e quando dou por mim já
estamos em casa.
Saulo também desce e eu o abraço rapidamente, murmurando um
“muito obrigada” totalmente sem jeito, mas para seu espanto maior, Anthony
larga minha mão e corre abraçar Saulo pelas pernas, que o ergue. Estão
ambos molhados e quando Saulo abraça meu pequeno eu vejo seus olhos
marejarem. Ele sussurra algo para Anthony e o coloca no chão, ele volta a
correr até mim e entramos na segurança de nosso prédio. Mas antes de eu
fechar a porta vejo Saulo ainda lá, na calçada, pingando, me olhando com
expressão indecifrável, sorrio para ele e ele retribui. Meu coração sente uma
coisa estranha, será gratidão? Sim, com certeza.
13 — Vigias
Quando chegamos dou outro banho em Anthony e fico com ele, dando
atenção ao meu pequeno com o coração apertado. O beijo várias vezes
enquanto ele assiste desenho. Me lembro da expressão intensa e parece
dolorida de Saulo quando fechei a porta, a simples lembrança dele lá,
parecendo abandonado me deixa inquieta.
Saulo liga e eu não atendo.
Estou sem jeito, estou muito confusa. E acima de tudo estou com
vergonha.
Meu celular brilha em mensagem do whatsapp. Saulo querendo saber
como estamos. Respondo um “estamos bem, muito obrigada”.
Depois o celular brilha de novo. Outra mensagem de Saulo: “Se
precisar é só chamar”.
Essa eu não respondo. Não sei o que dizer. Só leio pela barra de
notificação.
Estou esperando mensagem de Valéria, quando chegar, para eu descer
e abrir a porta para ela. O prédio é pequeno e não tem porteiro. E já tem
alguns dias que o interfone está com problemas... Nem sabia disso, mas ontem
cedinho tinha uns caras no corredor mexendo na fiação. Não sei se já está
concertado, afinal Saulo subiu sem ninguém abrir a porta lá de baixo. Da
próxima eu pergunto como ele fez isso...
Ao invés de mensagem recebo ligação, atendo conversando com
Anthony enquanto estou tentando encaixar uma peça de Lego com ele sobre
minha barriga, me impedindo...
— Mas assim eu não consigo... Alô, já chegou?
— Quem chegou, boneca? — a voz de Isaac do outro lado da linha é
forte e grave, sinto algo derreter por ouvi-la.
Nunca a expressão “derreter calcinha” me pareceu tão verdadeira.
— Oi, Isaac. — Digo calma e com o coração aos saltos. — Eu não
sabia que era você. Desculpe.
— Achou que fosse o outro?! — ele ruge do outro lado da linha.
— Que outro? Está louco?
— O outro que foi no seu apartamento ontem, caralho! Que estava
com você, quando era para você estar aqui nessa porra comigo!!! — desta
vez ele grita.
— Isaac, como você sabe...? — meu queixo cai.
Será que Saulo contou para ele?
— Eu saio daquele inferno de solitária e a primeira coisa que fico
sabendo é que minha mulher estava com um filho da puta!!!
Sua mulher? Estamos ambos doidos!
— Eu não deveria lhe dar satisfações, pois você me tratou como lixo
e por causa disso eu tinha prometido a mim mesma que nunca mais te veria,
então eu poderia ter feito qualquer coisa!
— Melissa... — ele rosna em tom de advertência.
— Mas eu não fiz. — digo calmamente. — Fui ao supermercado com
Anthony e ele dormiu, encontrei um conhecido que me deu carona até em casa
e me ajudou com as compras nas escadas. Mas ele nem entrou. Foi só isso! —
decido por não contar que o conhecido era o “Silva”, para ele não tentar fazer
nada com Saulo.
Escuto a respiração profunda dele, parece estar tentando se acalmar.
— Foi isso que me falaram. Que o desgraçado não entrou, e que
carregava estas paradas que você disse.
— Quem te contou? Como sabia? — eu não consigo disfarçar a
surpresa.
— Não é porque eu estou aqui, que não sei o que acontece aí fora,
Melissa. Eu não vou ser feito de bobo, outra vez!
Agora ele me irritou.
— Olha aqui, Isaac, eu não sou a puta da sua ex!!! E não aceito que
me compare a ela! Pode colocar o mundo inteiro para me espionar, ou
colocar escutas no meu telefone, eu não me importo! Não tenho nada para
esconder, nem ninguém! — Exceto que o cara é o Saulo, e que a gente saiu
hoje como amigos. Apenas como amigos! Ora, não posso ter amigos?
— Sei que você não ela. Mas eu fiquei louco só de pensar em algum
desgraçado tocando em você... — ele dá um suspiro.
— Isso é um pedido de desculpas? Se for, vai ter que melhorar.
— Não. Você não me contou sobre ele, então eu tenho direito de
ficar puto! — a voz é baixa e contida, parecendo ser dita entre dentes.
— Você está parecendo um menininho birrento! Parece até que estou
vendo você fazendo beicinho! E como você está, briguento? — eu abrando
meu coração, me lembrando do que Saulo me disse.
— Ahnmm... — ele parece confuso com minha mudança de atitude.
— Estou melhor agora, achei que teria que planejar uma fuga para dar
cabo de um filho da puta que estava mexendo no que é meu.
Eu suspiro.
— Isaac, eu dormi falando com você, eu estou... — mordo a língua
para não dizer nenhuma bobagem e escancarar meu coração idiota.
— Está...? — ele incentiva parecendo se animar.
— Ai! Droga! Eu não vou falar, para você não ficar se achando!
— Fala, boneca. Eu falei um monte de coisas ontem. E te garanto
que não vou me achar... — a voz está séria e profunda.
Eu suspiro.
— Eu estava falando que é besteira você ficar com ciúmes de
qualquer cara, quando eu estou bem louca por você.
Fecho os olhos, não acreditando no que eu disse.
— Mel?
— Hum? — respondo com medo do que ele vai me dizer.
Não gosto de expor meus sentimentos, me sinto vulnerável. Mas como
ele mesmo disse, ontem ele se expôs também. Por isso não me senti tão idiota
em fazê-lo.
— Eu sei que não fiz nada para merecer isso, mas eu juro que vou
fazer. Eu também estou louco por você, boneca. Queria ter te conhecido
antes desta merda toda. Queria poder... Saco! Vou ter que desligar. Mas me
diz rapitão: Amanhã vou te ver?
Eu sorrio.
— Vai sim. Por isso não apronte mais nada, ouviu mocinho?
Ele dá uma risada baixa.
— Deixa pra mim! Até amanhã, minha patricinha linda.
— Até amanhã, meu Kratos. — eu rio e só então desligo com um
sorriso idiota e um suspiro.
14 — Deixe Queimar
Dois dias depois da visita que fiz a Isaac, eu recebi uma ligação do Dr.
Nelson dizendo que queria que eu fosse vê-lo em seu escritório no dia
seguinte, no caso hoje.
Isaac não me ligou nenhuma vez, e eu não estou gostando disso que
estou sentindo: Tristeza.
Eu não deveria ficar assim, só porque não nos falamos há três dias.
Ele não está em um Spa! Não deve ser fácil para ele conseguir um telefone...
Eu tento me convencer de que é isso, não que ele não quer falar comigo. Ou
que só ligou aquela vez para eu voltar a transar com ele...
Tento me iludir que ele gosta de mim, mas estou falhando
miseravelmente. A ideia que ele só me quer para sexo não me agrada em
nada, mesmo sendo este o nosso acordo. Apenas algumas visitas íntimas e só.
Droga! Então por que eu fico olhando o celular a cada minuto,
esperando uma ligação dele? Por que todas as noites eu quero que ele esteja
na minha cama, para eu poder dormir escutando sua voz e respiração?
Eu tenho que parar com estas loucuras! Tenho que esquecer este
homem e só lembrar dele nos dias agendados para visita!
É isso que ele faz comigo! Não é?
Relacionamento assim, nunca teria um futuro. O cara é um bandido
preso! Pelo amor de Deus! O que eu quero pensando em um futuro com ele?
Eu dou um suspiro.
Sou burra, mesmo. Só porque temos química e tal estou pirando já, e
criando ilusões românticas.
Uma química gigante e fenomenal, como eu nunca imaginei que
existiria. Mas é só química.
Na verdade, acho que química mesmo, existe só do meu lado, porque
se for pensar bem, Isaac está preso não sei quantos anos sem mulher, com
certeza ele agiria assim com qualquer uma que aparecesse na frente dele...
Afinal, ele não me quis logo de cara. Por que? Será que mesmo estando
naquele lugar, ele não dormiria com qualquer uma? Por exemplo, ele não quis
uma profissional... Não. O cara é homem, e homem encaram qualquer coisa
por uma transa. Não importa nem se tem cabeça!
Não são iguais a nós mulheres, tolas e românticas! Pelo menos eu sou
assim. Se não estou apaixonada pelo cretino antes de ir para a cama com ele,
com certeza eu desço dela apaixonada!
Mas vamos dar a César o que é de César. O cara tem que ser bom. E o
Isaac é mais do que bom. Ele é top! Minha mãe do céu! O cara entrou mil
vezes na fila de ser mestre do sexo, e eu nem tinha ideia que esta fila existia!
Perto dele as outras relações que tive, são inexistentes e seus
participantes totalmente nulos.
É isso! Não estou apaixonada! Aff! Só estou gostando da cama!
Óbvio! Como não pensei nisso? Estou tanto tempo sem ninguém, e confundi
tudo aqui na minha cabeça desocupada!
Sim é isso. Só tesão. Não quero dormir de conchinha! Essa vontade é
pura carência. É meu cérebro confuso. Não quero cozinhar para ele, nem
assistir filmes no sofá abraçados. Carência pura. Claro! Eu coloco a figura
dele nestas imagens mentais porque estou tendo situações íntimas com ele,
então meu cérebro confunde tudo!
Nossa! Que bom. Estava preocupada já, quanto a me apaixonar. Não
posso amar aquele cara. Não sei nada sobre ele!
Só que é hummm... deixa eu ver, vou fazer uma lista do que eu sei
sobre Isaac Greiner:
* presidiário. —não quero ser preconceituosa, mas não é uma
característica legal.
* briguento — ah, é. Com certeza ele é briguento, brigou comigo,
brigou com os agentes... Quase o Kratos... ai, ai
* encrenqueiro — bom, definitivamente o cara não é estilo bom
moço.
* ciumento — como que ele conseguiu me ligar, quando achou que
eu tinha algum homem comigo? E por que agora não pode?
* charmoso — só de lembrar do sorriso, dele piscando para mim,
daquele beijo na mão... ai que eu me derreto todinha
* poderoso — nunca imaginei que alguém naquela situação de
merda pudesse impor respeito nos outros. Tanto do lado dos outros
presidiários, que o chamam de "Rocha", como nos guardas... Humm...
Porque será que o chamam de 109?
* tem dinheiro — isso não dá para negar. Mil por quinze minutos?
Me paga uma nota por mês, por quase nada... Quão rico será que este cara
é?
* intimidador — só de lembrar daquele tal de Góes dando desculpas
eu tenho vontade de rir. Sim. Muito intimidador.
* às vezes parece quase carente — bem às vezes... Mas não sei
como pode isso. O cara é uma montanha, mas eu sinto vontade de dar
carinho a ele, e quando eu dou, ele parece que estava precisando daquilo,
mesmo sem pedir, ou até mesmo saber.
* gostoso — característica mais incontestável.
* forte — forte é pouco. Mas esta palavra define ele todo, não só
fisicamente, mas de caráter. É um homem que marca... Droga!
* protetor — me lembro de que brigou com o agente penitenciário
por minha causa e queria "pegar" o pai de Anthony
Não quero mais pensar nele! Inferno! Isso não está fazendo bem para
mim! Estou ficando pinel! Pareço aquelas adolescentes apaixonadas que
ficam o dia todo suspirando pelo carinha bad boy da escola!
Cresça Melissa! Cresça!
Sacudo a cabeça, torcendo a boca.
Estou no elegante escritório do Dr. Nelson e a secretária faz um
movimento me chamando para entrar. Até que enfim.
Anthony está em casa com minha mãe. Sim, ela me ligou, e me fez uma
visita, está lá em casa desde ontem.
Depois que sai da casa dos meus pais, ela ligou algumas vezes,
visitou Anthony e até o levou para meu pai conhece-lo. Mas esta é a primeira
vez que dorme conosco. Ela me perguntou sobre emprego, e como estou com
dinheiro, eu menti que estou trabalhando com internet. E que isso dá muito
dinheiro. É o que a Valéria me aconselhou. E para minha mãe que vejo só de
vez em quando, é uma boa mentira.
Mas eu fico feliz com sua reaproximação. Ser uma rejeitada não é
algo que eu queira ser para toda a minha vida.
Eu iria trazer o Anthony, mas ela fez questão de ficar com ele.
Anthony é um menino tranquilo, e parece gostar muito da minha mãe. Até
demais eu acho.
Ciúmes da avó. Sou louca. Eu sei.
— Melissa! Como vai, filha? — Dr. Nelson se levanta da sua mesa e
me cumprimenta quando eu entro no grande escritório chique.
— Bem, Dr. Nelson! E o senhor? — ele me dá um abraço.
— Estou ótimo minha menina. Venha quero que conheça minha sócia.
A Dra. Alicia Castelo.
Eu me viro para a mulher e meu queixo cai.
Uma morena fenomenal está de vestido preto fechado, mas que molda
todas as suas curvas perfeitas.
Caraca! Dr. Nelson!
Eu sorrio para ela.
— Prazer em conhecê-la. — digo enquanto estendo a mão na sua
direção.
Vejo a moça me olhar dos pés a cabeça.
— É esta a mulher que se encontrou com meu Isaac?
MEU ISAAC?!
QUE DROGA É ESSA?!
O sangue sobe com força para meu rosto, minhas bochechas queimam
e minha cabeça dói.
Sei que mais uma vez estou um pimentão. Recolho a mão que estendi e
cruzo os braços.
— SEU Isaac? Como assim, SEU Isaac?! — a pergunta sai sem eu
querer, assim como o tom irado.
Ela me dá um sorriso cínico.
— Eu sou a nova "contratada" de Isaac. Fizemos nosso acordo há dois
dias.
Dois dias? Um dias depois de que nos encontramos?
Não!
— Como uma advogada, sócia do Dr. Nelson iria se prestar a isso?
— eu estreito os olhos.
Ela ri, uma risada vulgar.
— Você parece não conhecer os talentos de Isaac!
Um soco no meu estômago. Um arrancar de coração, como naquela
série Once upon a time que a bruxa tira com as próprias mãos o coração dos
outros.
— Bruxa — a palavra sai sozinha e eu vejo a moça arregalar os olhos
para mim.
— Melissa, eu lhe chamei aqui para explicar... — Dr. Nelson começa,
mas eu não deixo ele terminar.
— Não precisa explicar nada! Era só dizer que eu não precisava mais
ir — meu queixo treme, inferno! Já estou sentindo as lágrimas encherem meus
olhos. — Não precisava me fazer passar por isso.
Eu encaro o Dr. Nelson, achando que ele foi cruel demais comigo. Me
viro de costas e estou com a mão na maçaneta quando o advogado me segura
pelos ombros.
— Melissa, acalme-se filha. Pare de chorar — eu nem sabia que
estava chorando. Merda! — Tem mais coisas. Você não vai ficar
desamparada, Isaac me instruiu a lhe deixar muito confortável...
Eu me afasto do toque dele.
— Não quero nada! — digo limpando as lágrimas.
— Ele quer lhe dar o suficiente para viver bem. Casa, carro,
poupança. Você não vai mais passar por dificuldade nenhuma. Disse que tinha
uma dívida de meio milhão com você. E agora quer saldar.
A simples menção ao "meio milhão" me faz soluçar.
Olho para a mulher de preto. Com vontade de matar a quenga. Ela deu
para ele! Do contrário não saberia dos "talentos" dele. Eu vejo isso na cara
dela.
— Quinhentos mil? — minha voz sai fraca, eu olho para o Dr. Nelson
que confirma com a cabeça. — Com todo respeito que tenho pelo senhor Dr.
Nelson, manda ele enfiar a droga do dinheiro dele no rabo!
Abro a porta e saio dali.
Não pego elevador, desço as escadas correndo, chorando. Até que
não consigo mais. Eu paro, me seguro no corrimão e choro a minha traição.
Foi traição sim!
Ele está com a morena e quer comprar, ou pagar o boquete, o sexo, a
merda toda que aconteceu entre a gente. Não foi um presente, tampouco um
agradecimento. Foi um "cala a boca" um "me esquece".
Meu Deus! Por que eu estou assim! Eu nem gosto dele! Não tenho
nada com aquele bandido!!!
Eu... eu... Eu deveria pegar esse dinheiro, isso sim! Voltar lá e pegar o
dinheiro sujo dele e viver bem com meu filho... Mas parece errado...
Certo não preciso desse cara, tem mil outros por ai... Eu choro mais
ainda quando me dou conta que não quero ninguém. Não quero homem
nenhum. Só quero ele. Merda! Pareço uma drogada! Sei que a porcaria só vai
me fazer mal e não presta, mas eu quero! Inferno!!!
O som de saltos batendo nos degraus me faz limpar as lágrimas e me
recompor.
— Você é burra, loirinha! Vai recusar quinhentos mil? Por que? Acha
que consegue mais?
A morena está atrás de mim e eu respiro fundo.
— Vai embora, ou eu não respondo por mim! — eu digo entre dentes,
sem olhar para trás.
— Quanto você acha que consegue? Um milhão?
— Eu não quero nada!!! — me levanto e a encaro com ódio.
Vou matar ela. Vou arrancar os cabelos pretos e lisos desta vaca!
— Só quer ele? Um bandido preso? Tá que ele é gostoso e bonitão,
mas você não seria tão tonta para se apaixonar por um fracassado...
Eu voo nela.
— Cala a boca!!! Você não me conhece! E não conhece ele! — eu
grito pulando no pescoço esguio.
Mas Dr. Nelson e outro cara grande aparecem e me seguram.
— Me solta! — eu grito para o que parece ser o segurança que me
segura ainda.
— Melissa, se acalme! — a moça sorri com expressão diferente. —
Eu não tenho nenhum "acordo" com SEU Isaac. Era só um teste.
— Um teste? — eu enrugo minha testa e olho para o advogado que
também sorri para mim.
— Sim, filha. Alicia não tem nada com Isaac, eles se encontraram há
dois dias é verdade, mas foi para tratar de assuntos referentes a você. Já que
eu não estava na cidade. — Dr. Nelson explica e o grandão me solta.
— Que assuntos? — eu pergunto séria, ainda estou furiosa.
— Seu meio milhão que ele está lhe dando. — É a mulher quem me
responde, mas ainda sim acho que ela já teve algo com Isaac eu sinto.
— Eu não quero! — respondo de uma vez.
— É um presente de namorado, não um adeus, tolinha — ela torce a
boca pintada de vermelho vinho outra vez.
Eu pisco várias vezes, sem entender.
— Como assim? Ele quer me dar meio milhão e continuar me vendo?
Dr. Nelson confirma com a cabeça.
— Venha vamos conversar no meu escritório — ele faz gesto com as
mãos.
Eu sigo-os, mas estou puta ainda.
Quando entro eu não me sento onde ele aponta, ao invés disso
disparo:
— Por que essa palhaçada toda então? Que merda de teste foi esse?
Acham que são o que para mexerem com meus sentimentos assim? Vocês não
tem respeito pelas emoções dos outros!
A mulher é quem me responde outra vez:
— Desculpe por isso, Melissa, mas a ideia foi minha. Isaac é mais
que um cliente bom, é um... amigo, e que agora quer colocar uma quantia
muito grande nas mãos de uma mulher que ele conhece há poucos dias. Não
poderíamos deixa-lo fazer isso. Por mais encantado que Isaac esteja com
você, não é seguro para ele. Com uma quantia dessas você poderia denunciar,
sumir, fazer o que quiser. Ele está lhe afastando de si, mas por mais que eu e
o Dr. Nelson tenhamos dito isso a ele, o homem foi irredutível. Ele quer lhe
dar a quantia. Mas nós dois aqui, tínhamos que ter certeza.
— Certeza do que? — pergunto em um fio de voz.
— Que você se apaixonou por ele. Que não vai sumir, tampouco
entregar ele, ou nós. — ela sorri, falando como se estivesse falando que vai
chover.
— Eu não...! Eu não...! — Limpo a garganta. — Eu não estou
apaixonada por Isaac... — digo como se ela fosse burra. — Ele só é bonito
e... — olho para o Dr. Nelson e meço as palavras —... Mexe comigo. E...
Suspiro lembrando de nós dois juntos, de nossa conversa pelo
telefone, em como foi bom dormir ouvindo a sua voz... Na saudade quase
física que sinto dele, em como meu corpo reage a sua proximidade, em como
o timbre de sua voz me arrepia...
"Toc-toc" lembro dele sussurrando ao meu ouvido e eu rio sozinha.
Então é como se um balde de água fosse jogado no meu rosto,
repentinamente. Eu entendo de um susto e sendo pega desprevenida.
— Droga! Eu não posso estar... Eu... — olho para os dois que me
observam rindo baixinho. — Não contem para ele. Por favor.
Me apaixonei por Isaac Greiner. Como pode isso?!
— Não vamos. Até porque ele não autorizou esse teste. — a moça diz
sorrindo.
Dr. Nelson mostra a cadeira outra vez, em frente a sua mesa de mogno
antiga e lindíssima.
— Sente-se, Melissa. Vamos assinar os papéis da sua súbita herança
recém-adquirida — ele pisca para mim.
— Eu não sei se devo aceitar isso, Dr. Nelson... Acho melhor falar
com Isaac antes... É muito dinheiro! Não posso... Eu...
— Não tenha medo. Não terá problemas.
— Não é isso... É só que não acho certo... Podemos fazer isso outra
hora? Depois que eu falar direito com ele?
— Os papéis estão prontos. Já está tudo resolvido. É só você assinar
que estará na sua conta. Não entendo o que a impede — a mulher fala apoiada
na mesa.
O que me impede? O que me impede é que eu quero um futuro com
meu Kratos, e não com o dinheiro dele!
— Eu quero saber sobre a pena de Isaac. Quando ele vai sair?
O advogado olha para a mulher e só depois de alguns minutos ele diz:
— Daqui 15 anos.
17 — Amigo
— Mas eu já aviso que sou carente! Quero atenção! Quero carinho! Quero
tudo!
Ele solta uma gargalhada.
— Eu sabia que você iria se aproveitar destas porras que estou
sentindo! Já está fazendo exigências!
— E nada de ameaças de morte aos meus amigos. Por favor.
— Mel... — ele parece advertir.
— Estou falando sério, Isaac. Não gostei disso.
— Sobre esse assunto eu vou pensar. E de resto vou fazer o
impossível para te dar tudo que você precisa. Vou te mimar muito. Por isso
quero que aceite o meu presente, Mel. Na verdade, sabe que não precisa
aceitar, não é? Posso te enviar a porra a hora que eu quiser. Mas é melhor
você fazer como o Dr. Nelson falou. Para não dar merda.
— Isaac, eu não quero falar disso...
— É para o Anthony, Mel. — pela primeira vez ele diz o nome do
meu filho, que eu nem sabia que ele tinha gravado.
— É muito.
— Para o futuro dele. Deixa eu fazer alguma coisa pelo menino.
Por favor.
— Você já faz.
— Melissa! Não seja teimosa! O teimoso aqui sou eu!
Eu rio com essa.
— Ok, então. Já que não posso ganhar de você...
— É bom que você saiba desde agora, minha boneca, eu sempre
ganho.
— Metido! — mas estou rindo e ele também. — Isaac, por que você
não fugiu? Antes de ser preso, eu quero dizer. Por que estava aqui, no Brasil e
não em um país da Europa, aproveitando a vida e se aposentado do crime?
Ele fica e silêncio por um tempo, quando fala sua voz máscula, que eu
tanto amo, é carregada de ressentimento.
— Não é fácil, para alguém como você entender, boneca. Tem a ver
com aquilo que dizem: “quanto mais se tem, mais se quer'”. A coisa foi
ficando grande, muitas pessoas envolvidas. Até os próprios bancários
estava na jogada. Gente que você nem imagina. Não é assim, sair.
— Mas você não era o chefe? Não poderia mandar todo mundo para o
inferno?
Outro suspiro.
— Podia. Mas não queria. — a voz dele fica mais baixa, mais rouca
e eu sei que ele está se aborrecendo, ou ficando triste, mas esta palavra não
combina com ele. Por isso vou pensar em aborrecido.
— Sabe, Isaac. Quando eu era pequena meus pais me levavam em
várias viagens. Uma delas me marcou muito. Na Bélgica. Conhece?
— Não. Eu ia muito pra Vegas. Europa não era meu forte.
— Ah! Por que eu não me surpreendo com o destino? — reviro os
olhos e ele ri do outro lado.
— Me conta desta viagem para a Bélgica. Me tira deste inferno,
minha boneca, como você sempre faz.
Engulo o seco. Quero saber o que ele aprontou para ter ido para a
solitária outra vez. Se está ferido. Mas ele parece querer esquecer onde está.
Então eu também esquecerei.
— Certo. Foi uma destas viagens em que a gente conhece várias
cidades... Mas teve uma em especial que se gravou no meu coração: Bruges.
Ela fica pertinho de Bruxelas e fomos de trem. Passamos por campos de
flores e plantações de trigo, com grandes moinhos. Aliás, tem muitos moinhos
nos arredores de Bruges. A cidade é pequena, Isaac, e é turística, mas não
parece. Os moradores são simpáticos, as ruas não tem asfalto, só aquelas
pedras bonitas e tem muitos rios. Pontes espalhadas por todo canto. Não
pontes feias. Mas aquelas pequeninas feitas de pedras. Os restaurantes têm as
vidraças debruçadas pelos canais, e ao lado dos pequenos rios os salgueiros
balançam seus galhos quase tocando, acariciando as águas.
— Só uma romântica como você, para guardar tudo isso aí, com
tantos detalhes e ser capaz de fazer esse torto aqui, sentir como se
estivesse lá. Sabe o que eu vi? Eu me vi passeando por lá com você, de
mãos dadas. Com Anthony, empoleirado no meu pescoço.
— Oh. Isaac — eu sorrio com lágrimas nos olhos.
— Mel, se eu conseguir um acordo e sair desta merda, juro por
Deus que levo vocês dois lá. Sei que agora você vai poder ir sozinha, se
quiser... Mas eu gostaria de te levar...
— Vou esperar você me levar. Sempre imaginei que era uma cidade
para se viver um grande romance...
— Todo mundo sonha com a grande Paris e você com a pequena
Bruges, que eu nunca ouvi falar.
— Eu sou rebelde! — eu rio e ele me acompanha.
— Oh! Sim. Imagino! Deve ser tão rebelde que deve ter tocado
várias campainhas e corrido quando era pequena... Quer dizer, menina,
pois pequena você ainda é!
— Ei! Eu sou considerada alta na minha família! Minha mãe sempre
disse que eu era bonita, alta e inteligente! — eu finjo indignação.
— Sinto te dizer, mas sua mãe mentiu. Mas só na parte de ser
“alta”. O resto é verdade.
— Que bom que me explicou! — rimos mais um pouco. — E eu
toquei campainha sim. Umas duas vezes. Morri de medo e não fiz mais. —
Ele não se aguenta e gargalha alto. — Pare de rir, Isaac! Eu SOU rebelde,
sim! Eu já dirigi sem carteira! — mais risos. — E também furei sinal
vermelho... Não deu para parar... Aí eu meio que fui... Tá este não valeu.
Deixa eu ver outra coisa... Humm... Já fumei cigarro escondido — eu sussurro
a última parte, contando minhas mais pérfidas atitudes.
Isso e ter um caso com homem casado e ser namorada de bandido...
Mas estas coisas ele já sabe.
Ele não para de rir.
— Sim... — risos. — ... Muito rebelde.... estou até com... medo.
Eu rio contagiada pela alegria dele.
— Pois é bom ter, mesmo! Sou fodona!
— Por isso que eu te adoro, minha boneca!
— Nada! Você me ama! — eu rio ainda.
Ele fica em silêncio parando as risadas.
— Isso mesmo. Eu te amo.
Arregalo os olhos. O riso morrendo na minha garganta.
— Eu também, Isaac. Embora eu não queira admitir. A verdade é que
amo você.
— Mel? Se eu saísse desta porra sem nada, você me aceitaria?
Bandido, fodido e com ficha suja?
— Claro que sim! — respondo sem hesitar. — Vai fazer o acordo?
— Não dá, boneca. Eles querem mais do que eu tenho. Quando um
banco é roubado eles têm seguro, aí se eu levava cem mil, ele mentiam para
a seguradora que tinham perdido quinhentos e tal. Eles lucravam com
isso... Mais do que eu mesmo. E também tinha os outros integrantes...
— Entendo. E agora querem uma quantia enorme, que compense tudo
que você roubou.
— Isso. Mas o Dr. Nelson está com esperanças, o juiz mudou, talvez
ele possa levar um por fora... O outro era honesto. Argh!
— E por que você não está com esperanças?
— O Dr. Nelson já veio com esse papo não sei quantas vezes. Não
acredito mais.
— E você confia nele? No advogado?
— Sim. Confio. Tenho meus motivos para isso. Fortes motivos.
— Ok. E na morena bonita?
— Bonita? Nem notei...
— Mentiroso! — eu rio dele. — Mas é bom mesmo, se não notou!
Não gosto de sociedade! Se eu souber que você teve alguma coisa, qualquer
coisa com outra mulher eu nunca mais olho na sua cara. Entendeu, Isaac
Greiner?
Ele parece estar segurando o riso quando diz.
— Claro que entendi. Eu sei reconhecer uma ameaça honesta e
direta quando ouço uma. Ainda mais de uma rebelde tão terrível.
— Estou falando sério!
— Eu não quero ninguém, boneca. Só você.
— Poxa! Você sabe falar o que uma mulher quer ouvir, hein? Fez
mestrado em cafajestagem, e se formou com louvor!
— Com você é fácil falar, ainda mais em um buraco escuro. Não é
coisa de cafajeste. Já que sempre me fodi para as mulheres. O que digo
para você é o que eu estou sentindo, Mel. Por mais babaca que pareça. Ou
babão.
Meu coração me derrete ainda mais. Merda, ele está me envolvendo
tanto que acho que nunca mais vou conseguir sair dessa sua rede.
— E por que está aí? Se meteu em outra briga? Está machucado? Não
minta! Que amanhã eu vou te ver, e se me mentir...
— Vai vir me ver, então?
— Claro que vou. Mas não desconversa!
— Peguei o Silva — ele dispara.
— O quê?!!!
Meu coração parou.
20) EXTRA ISAAC
Estou ansiosa. Passo pela milésima vez a mão pela minha saia soltinha
cinturada creme, vejo se minha blusa de renda estampada de pequenas
florezinhas está devidamente dentro da saia depois daquela revista
desgraçada. A carcereira ficou de boca aberta quando viu minha lingerie, vou
fazer uma surpresa para Isaac, e pelo olhar dos que viram, vou agradar.
Saulo estava lá. Com um curativo no nariz . Não me olhou nos olhos e
mandou outro agente penitenciário me revistar. Depois saiu da sala,
parecendo querer quebrar o mundo. Pelo menos já sei que está “bem”.
Um tal de Motta, me trouxe outra vez ao mesmo quarto daquele dia. Já
arrumei a cama e estou andando de um lado para o outro. Nervosismo me
define.
O som de passos no corredor me chama a atenção.
Viro-me e vejo Isaac entrar, sua presença toma todo o ambiente. Tão
grande, tão viril, tão... Macho.
Será este o mesmo homem que dormi ouvindo a voz? O mesmo que
me disse todas aquelas coisas bonitas? Ele parece tão perigoso e intimidador.
Está outra vez com o lábio partido, com um corte no supercilio e tem a mão
direita enfaixada.
O guarda retira as algemas dele e Isaac continua me olhando
intensamente. Eu retribuo o olhar. Com a respiração ofegante.
Quando enfim ele vê os pulsos livres, ele pisca um olho e sorri de
leve.
— Oi, boneca — a voz rouca e profunda parece fazer cada célula do
meu corpo reagir.
Aí está. O meu Isaac. O meu Kratos.
Eu corro para ele e pulo em seu colo, o envolvendo com as pernas.
Beijando-o com paixão.
Ele me segura com os braços fortes, sem nem se alterar com meu
súbito ataque, retribuindo o beijo com violência e tanto desejo que eu gemo
contra seus lábios.
— Tem duas horas, 109! — o guarda diz em voz alta.
Isaac afasta os lábios de mim um pouco.
— Me avise uns vinte minutos antes, Góes.
— Certo, cara. Me chame se precisar — e dizendo isso, Góes fecha a
porta.
— Duas horas? — Eu digo ainda no colo dele.
— Ah é, boneca. Comprei o horário de outro preso — ele sorri de
orelha a orelha.
Eu sorrio e o beijo outra vez, e ele me aperta de encontro ao corpo,
parecendo querer se fundir a mim, ou apenas me matar sufocada.
— Que saudade! — ele diz enquanto aspira profundamente junto ao
meu pescoço, mexendo em meus cabelos.
Ele se afasta, me olha dentro dos olhos com olhar intenso e me beija
outra vez.
— Duas horas serão poucas, para acabar com esta minha vontade de
você! — eu digo beijando o pescoço dele que está me carregando para a
cama.
Quando ele me coloca deitada na cama, se largando por cima de mim,
eu não resisto, vou arrancado sua camiseta, mordendo, beijando, chupando
tudo que encontro da pele dele.
Isaac faz menção em tirar minha blusa, eu não deixo. Me viro
invertendo nossas posições, e o monto.
— Tenho uma surpresa para você — eu digo e me levanto, ainda em
pé na cama.
Vejo-o erguer uma sobrancelha, e um meio sorriso desenhar seus
lábios tentadores.
— Vai me dar outro show? Será que eu aguento, boneca?
Ele diz isso enquanto retira as calças, ficando só de cueca boxer
branca, e o enorme volume cilíndrico ali, me chamando. E eu aprecio a visão
do corpo perfeito, cheio de músculos, o abdômen tanquinho, as coxas
enormes e poderosas.
Eu perco o rumo por alguns segundos. Não sou de ferro!
— Caramba de homem gostoso! — murmuro para mim mesma, mas
ele sorri tanto que sei que ouviu.
Arqueio uma sobrancelha.
— Como eu sei que adora me ver de rosa, comprei isso, pensando em
você — eu pisco para ele.
Canto como treinei (sim, treinei a coreografia) a música da Rihanna e
Calvin Harris:This is what you came for. /Foi Para Isso Que Você Veio
Minha voz não é profissional, mas canto muito bem, obrigada. De
nada.
— Baby, this is what you came for...
"Querido, foi para isso que você veio..."
Canto e vou dançando, rebolando sensualmente, retirando devagar a
blusa de dentro da saia, passando a mão pelo meu corpo, pelos meus seios
por cima da roupa.
Tive umas aulas no Youtube.
— ...Lightning strikes every time she moves. And everybody's
watching her...
"Um relâmpago cai toda vez que ela se mexe. E todos estão
assistindo-a... "
Retiro a blusa de costas, sem me mostrar ainda para ele. Jogo por
cima do ombro e vejo-o pegar e cheirar, sem tirar os olhos de mim.
— ...But she's looking at you, oh, oh...
"...Mas ela está olhando para você, oh, oh..."
Sempre rebolando desço até sentar em meus calcanhares, seguro a
cintura da saia e a deixo sobre o colchão.
— ...We go fast 'til they can't replay. Who knows why it's gotta be
this way...
"Nós vamos rápido, até que eles não consigam nos acompanhar.
Quem sabe por que que tem que ser assim..."
Me levanto devagar, subindo primeiro o quadril, para depois subir a
parte da frente do corpo...
— We say nothing more than we need.
"Não dizemos nada além do necessário."
Me viro de frente para ele, mostrando a lingerie, totalmente, fazendo
pose com uma perna na frente da outra, para deixar o corpo mais bonito.
— I say: Your place, when we leave!
"Eu digo: Para sua casa, quando sairmos!"
Passo as mãos pelo corpo, me tocando com gosto, como gostaria que
ele fizesse.
—Lightning, this is what you came for. Lightning strikes every
time she moves. And everybody's watching her. But she's looking at you,
oh, oh...
"Relâmpago, foi para isso que você veio. Um relâmpago cai toda
vez que ela se mexe. E todos estão assistindo-a. Mas ela está olhando para
você, oh, oh..."
Termino de cantar baixinho. Isaac está praticamente babando.
Ele coloca a mão sobre o membro endurecido.
— Caralho, Mel... — ele engole o seco, e se levanta. — Caralho,
Mel! — ele repete.
Estou vestindo um conjunto, lindo, sexy, poderoso de renda pink, com
calcinha fio dental com laços do lado, sutiã transparente meia taça, e cinta
liga cinturada, como das pin-ups, que terminam em uma pequena cinta de
coxa, com renda.
Tudo do melhor. Paguei uma pequena fortuna, mas tive que comprar. E
a cara de Isaac está valendo a pena.
Ele me come com o olhar, desde meus pés até meus olhos, demorando
como em uma carícia em meu corpo.
— Ah! Boneca. Eu vou te foder com essa roupinha! Não vou tirar
nada! — ele me enlaça pela cintura, beijando meu colo, afastando meu sutiã
só um pouco, para tocar e sugar meus mamilos. Depois a boca sobe em uma
trilha pelo meu pescoço, e chega aos meus lábios. Me beijando com fome,
com pressa.
— Boneca, eu não vou conseguir fazer essa porra com calma! Tô bem
louco já. Prometo que na segunda eu vou ser mais carinhoso. Ok? — Ele está
tirando a boxer e afastando minha calcinha e eu gemo um sim em resposta. —
Vem aqui! — ele me puxa para ele, enquanto com os dedos toca minha
feminilidade.
Eu arquejo, me amolecendo em sua mão. Sou então deitada na cama, e
ele tira a mão e coloca a boca, sugando e eu me afasto.
— Não! Quero gozar no seu pau! — estou ofegante.
— Porra! — ele pega uma camisinha a coloca com a dificuldade de
sempre, depois sobe e se posiciona sobre mim.
Passa a grande cabeça por minha entrada, que está pulsando, ansiando
por ele.
Ele coloca um centímetro, e meu corpo ainda não o aceita. Ele retira e
vai mais uma vez, colocando mais um pouco. Eu abro bem as pernas, me
ajeito sob ele, busco sua boca, em uma beijo selvagem, ele me invade com a
língua, enquanto investe outra vez para dentro, meu corpo o acomoda mais e
ele se afasta.
— Toc-toc... — sussurra no meu ouvido.
Ah, como eu amo isso!
— Quem é? — eu rio, passando a mão pelas costas fortes.
— O lobo mau...
Eu rio mais um pouco.
— O que você quer? — Sussurro no ouvido dele, e depois mordo seu
lóbulo.
Ele geme:
— Te comer. Me deixa entrar... — a voz rouca me mostra o quanto ele
está excitado.
— Entra amor. Entra de uma vez, com tudo.
— Tudo?
— Tudo!
Ele se ajeita e então entra, de uma vez, me fazendo arquejar, me
obrigando a cravar minhas unhas em seus ombros, eu me esfrego nele, que se
mexe dentro de mim, profundamente, me preenchendo com tudo aquilo dele.
— Isaac... — eu anuncio o meu gozo, como acontece toda vez que ele
me toma para si.
— Goza no meu pau, goza, gostosa... — ele beija meu pescoço e lá
vou eu.
Saio de órbita. Arranhando sua cintura, puxando-o mais para mim,
erguendo meu corpo para receber mais dele.
— Ahhhh... gostoso... isso... me dá pau, Isaac...
— Porra, Mel!... eu dou... Toma... gostosa... toma... meu pau... Nesta
bocetinha... apertada... ahhhhh...
Ele parece querer me rachar ao meio, a força com que me penetra me
faz sentir tanto tesão, que nem parece que acabei de gozar. Estou acesa outra
vez. Estou querendo mais.
Ele joga a cabeça para trás e goza. Grunhindo como o homem
indomável que ele é.
Ele ainda se mexe mais algumas vezes, longamente, profundamente.
Como que querendo se perpetuar no êxtase.
Ele me beija, um beijo profundo e que me faz gemer contra seus
lábios.
— Desculpe, boneca. Eu não aguentei. Porra! Da próxima não me
deixe tão louco!
— Ah, a culpa é minha? — eu rio dele.
— Claro que é! Quem veio com essa roupa matadora?! Eu ainda
aguentei muito!
— Cinco minutos é muito? — eu debocho dele.
— Mais do que os seus dois! — ele estreita os olhos e me beija outra
vez.
Isaac se deita de costas e me puxa para cima dele.
— Quero te ver. Não acabamos, aquilo foi só para abrir os trabalhos!
— ele está sério e me olha intensamente.
Seu membro está muito rijo dentro de mim ainda, e eu rebolo em cima
dele.
— Como você pode ser assim? Qualquer outro goza e morre por um
tempo. Você não!
— Sou o Kratos, lembra? Não é assim para me matar! — geme com
mais uma mexida minha.
Eu rio com essa.
— Sabia! — eu digo, passando minha mão pelo peito enorme que
parece ser feito de rocha.
Ele explora meu corpo com as mãos, todos os detalhes da minha
lingerie, até alcançar os laços laterais da minha calcinha, ele puxa e a retira
comigo ainda unida a ele.
Vejo-o leva-la ele seu rosto e cheira-la, depois a amarra no pulso.
Pega meus seios e os suga até me fazer esfregar tanto nele que sinto o
gozo vir com tudo outra vez.
Ele pega meus quadris, me puxando para si, me obrigando a continuar
com os movimentos, até que eu não aguento. Outro orgasmo. Outra vez falo
coisas desconexas, a onda vem e me leva. Me deixando ofegante, sem forças.
Largo meu corpo sobre o dele, sem forças. Já falei sem forças? Viu? Nem
pensar estou conseguindo!
Ele ri.
— Já está se entregando? Como assim?! — ele ri mais.
— Isaac, eu vou ter um derrame se continuar deste jeito!
Ele me derruba na cama, de barriga para baixo, saindo de dentro de
mim, se posiciona atrás do meu corpo.
— Fica aí, bem quietinha, descansa... — ele passa as mãos pelas
minhas costas, abrindo meu sutiã, me deixando apenas de cinta liga. — Ergue
esse rabinho pra mim, boneca. Nossa! Que tesão de visão...
Ele me penetra, de uma vez, sem me dar chance para me preparar, eu
arquejo com a intensidade da metida. E escuto-o fazer a mesma coisa. Assim
ele começa um ritmo enlouquecido. Forte, potente, quase selvagem.
Estocando velozmente.
Quando dou por mim, estou de quatro, agarrada ao lençol e totalmente
entregue ao momento. Gemendo e respondendo aos incentivos dele.
— Quero você inteira... Gostosa... quero... aqui... — ele passa o dedo
pelo meu ânus, e eu estremeço.
— Isaac... Eu não... aí não vai dar... Seu pau é muito grande!
— Ah! Isso, safada! Meu pau é grande?!
Ah, é? Quer ver eu falando palavrão? Ok. Conheço alguns!
— Ah, é sim. Mas eu gosto. Gosto que enfie esse caralho grande em
mim. Mete rola na minha boceta, mete... Merda, Isaac! Você vai me quebrar!!!
No início eu estava falando para dar um tchã, mas o homem pirou.
— Ahhhh... Hunmmm... filha da puta... gostosa... ahhh! — ele geme
alto.
Isaac ficou literalmente louco. Acho que assassinou meu útero. As
estocadas foram tão fortes que tive que me segurar com força, e acho que não
vou conseguir andar direito por alguns dias. Talvez um Hipolglós seria bom
também...
Ele tomba, saciado sobre minhas costas.
— Mel eu tenho... que sair daqui... e casar com você! — ele diz com
respiração entrecortada.
Sai de dentro de mim, tirando a camisinha e me puxando para seu
peito grande e suado.
Eu lhe beijo a boca, e ele intensifica, usando a língua e mordendo de
leve meu lábio inferior.
— Então? — ele pergunta quando nossas bocas se separam.
— O quê? — eu estou longe, apoiada ao peito maravilhoso, mole,
bastante dolorida, mas saciada, É. Estou viajando.
— Se eu sair logo daqui, você seria capaz de se casar comigo,
lerdinha? — ele sorri.
Demoro mais alguns segundos para entender o que ele disse.
Então a ficha cai.
— Casar? — eu ofego com olhos arregalados.
23 — Se Jogando de cabeça
— Estou te falando, Pax, Rocha tá bem loko por essa mina aí... Sei não,
cara — Rato balança a cabeça e ajeita o óculos sobre o nariz.
Eu apenas torço a boca e tomo mais um gole de cerveja.
Rato veio me visitar para contar os mais recentes planos do Rocha.
Uma fuga, enorme, violenta, cara e acima de tudo louca. Bem do jeito que eu
gosto.
— Acho que mesmo se ela for uma vadia como aquela outra, pelo
menos serviu para ele decidir se mandar daquela porra — digo ainda
pensando nos detalhes da fuga.
— Eu ainda não sei como Rocha não deu um jeito naquela piranha,
meu — Rato desvia a atenção de mim e olha para a tela do seu notebook
aberto.
Eu apenas balanço a cabeça.
Rocha acha que só porque aquela traíra é mulher ele não deve fazer
nada. Elas são seu calcanhar de Aquiles, sempre disse isso para ele. Foi por
causa de uma que ele caiu, e talvez por causa de outra vai se foder de vez.
Por isso essa merda de fuga tem que ser bem planejada para não ter erro.
Para o cara que considero um irmão aqui neste país, não se ferrar de uma vez
por todas.
Rato me encara com um sorriso aberto que me faz erguer uma
sobrancelha em uma pergunta muda.
— Fala a verdade, Pax, tu comeu a Lara, não comeu? — ele pega sua
cerveja e se encosta no sofá, ainda sorrindo.
Eu o encaro até o sorriso dele murchar. Ele então ergue as mãos.
— Tudo bem, meu! Não está mais aqui quem perguntou! — ele diz e
depois limpa a garganta voltando sua atenção para seu computador outra vez.
Lara, a mulher traíra do Rocha vivia se jogando em cima de mim.
Vadia, sempre foi. Não sei se Rocha sabia que a mulher que ele considerava
dele ficava me cercando como uma cadela no cio. Mas eu nunca comi aquela
vadia, não que ela não fosse gostosa, ao contrário, Lara era um tesão.
Aleijada de tão gostosa, e vestia umas roupas que não deixavam muito para a
imaginação... Sem contar os biquínis minúsculos... Deus sabe o quanto eu
gosto de mulher e por isso nunca ter tocado naquela mina demonstra todo o
respeito que tenho pelo meu amigo. Eu deveria ganhar um prêmio, isso sim, e
não ficar sendo interrogado.
Tomo mais um gole de minha cerveja.
— Com licença, seu Dimitri — a voz que anda me tirando a paz soa
tranquila na entrada da sala de home theater, onde Rato e eu estamos há algum
tempo já.
Aperto meus olhos, não querendo olhar para ela.
Escuto um assovio baixo de Rato e abro-os outra vez depressa e o
encaro. Ele baixou os óculos e está babando ante a visão.
— Te controla nerd sem noção — eu rosno para ele que se endireita,
recolocando os óculos, mas continuando a encarar Sabrina.
Dou um grande suspiro aborrecido e olho para a minha empregada.
Sabrina.
Como sempre, ela está vestindo camiseta branca e calça comprida. Os
cabelos negros presos no alto da cabeça, sem nenhuma maquiagem, mas
mesmo assim... linda. É a mulher mais respeitável e honrada que já conheci, e
a única (com exceção de minha mãe), que eu admiro.
— O que é, Sabrina? — pergunto torcendo a boca, irritado.
A presença dela me irrita. Me irrita o que eu sinto quando olho para o
rosto delicado, para os olhos negros límpidos ou a pele morena que parece
macia e cheirosa. Me irrita o desconforto que acontece dentro do meu peito,
me irrita a vontade que tenho de leva—lá para a cama, mesmo sabendo que
ela é uma mãe de família e merece o meu respeito, não o meu tesão. Que ela
precisa do emprego e não de uma foda.
— Merda, diga logo, Sabrina! — eu resmungo sem querer em russo,
como sempre acontece quando falo sem pensar.
Vejo-a se encolher e desviar o olhar, mesmo sem ter me entendido.
— Eu só gostaria de saber se sua visita ficará para o jantar — ela
explica em tom baixo.
Respiro com força.
— Opa! Vou sim, coisa linda! — Rato sorri de orelha a orelha para
ela.
— Não. Você não vai, coisa feia — digo para ele, depois viro outra
vez para ela. — Nem eu vou jantar em casa, Sabrina. Obrigado.
Ela balança a cabeça e se vira, mas antes de que se vá, Rato do
inferno, a chama.
— Sabrina, minha linda, poderia me trazer outra cerveja? — ele pede
com voz macia.
Antes que eu poça dizer algo, ouço a resposta de Sabrina:
— Claro, um instante — ela diz antes de sair.
— Puta que pariu, Pax! Que empregada gostosa do caralho, mano! Tá
bem servido, hein? Queria ter a metade da sua sorte pra mina, porque depois
desta eu tirei o chapéu para você... — ele se cala diante do meu olhar.
— Não mexa com Sabrina. Nem olhe para ela se quiser ter onde
apoiar esses óculos de merda.
Rato arregala os olhos.
— Tudo bem, mano. Não mexo com mulher dos outros...
— Ela não é minha mulher, é minha protegida — lhe digo entre
dentes.
— Mas o que... ? — ele começa surpreso, mas nisso Sabrina volta
com a cerveja dele, que Rato pega sem gracinhas desta vez.
Ele limpa a garganta e inteligente como é, muda de assunto:
— Então, vai sair com aquela delegada gostosa, outra vez hoje? —
ele pergunta e não sei por que, mas quando ele fala encara Sabrina que está
recolhendo as garrafas de cerveja e limpando a mesa do centro.
Com uma sobrancelha erguida eu respondo:
— Sim. Sabe que gosto de viver perigosamente — debocho.
— É verdade aquilo que você disse dela só querer a coisa algemada?
— ele ainda olha para Sabrina que está de costas e ela derruba o que tinha
nas mãos. Espalhando as garrafas e tudo o mais no chão.
Eu pulo a ajudando, achando estranho a atitude dela.
— Está bem? — pergunto, pois ela está tremendo tanto que as
garrafas batem uma nas outras.
Ela me encara por um segundo, vejo seus olhos negros parecerem
soltar faíscas. E pelo que conheço de mulheres essas faíscas nada têm a ver
com coisas boas... Parece... irada?
— Estou bem. Desculpe — ela recolhe tudo e praticamente corre sala
a fora.
Eu ainda estou olhando para a porta que ela saiu quando ouço a risada
de Rato.
— Uau! Nunca imaginei estar vivo para presenciar este dia! — ele ri
ainda mais.
Eu apenas o encaro, esperando o desfecho do pensamento "genial"
dele.
— Pax o maior comedor que já conheci, todo bobo pela empregada
linda que ainda não comeu! — ele ri como se tivesse contado uma piada
fenomenal. — Cara, não me lembro de você algum dia perguntar a uma
mulher se ela estava bem! Ou ficar bem loko só porque outro estava olhando
pra ela! Se apaixonou, mano?
Eu continuo esperando o ataque de riso dele parar. Quando ele fica
sério outra vez eu pergunto:
— Acabou?
— Acabou — ele respira fundo segurando a barriga e limpando as
lágrimas dos olhos.
— Não preciso dar explicação para você, mas para deixar bem claro
aqui: Sabrina é uma mulher guerreira que precisa do emprego porque tem uma
filha que precisa de cuidados especiais e tratamento. Ela não é uma
"empregada linda" que quero comer. É alguém que merece respeito. Entendeu,
Rato? — digo pausadamente para as palavras saírem corretas apesar do meu
sotaque que a raiva acentua.
Rato coça o queixo com a barba rala, e concorda com a cabeça.
— E ela é casada? — ele pergunta com aquela cara de quem está
bolando um plano.
— Rato... — eu rosno em advertência.
— Aí, para com isso. Presta a atenção: seu pai, o chefão da máfia
Rússia lá, ele não queria que você provasse que tinha mudado para poder
voltar e assumir seu "trono"?
Eu estreito os olhos para ele.
— Continue — digo simplesmente.
Ele fica em pé, animado com as ideias que estão explodindo no seu
cérebro louco e que eu nunca entendi.
— Então! Você não está vendo? Seu coroa te mandou pra essa porra
aqui, porque você andou comendo a mulher do sócio dele, não foi?
— E a filha — eu relembro.
— E a filha — ele concorda.
— E a sobrinha — eu continuo lembrando.
— Certo, e a sobrinha — ele parece aborrecido.
— E a mulher do outro sócio... — eu começo.
— Tá, entendi, porra! Tu meteu o pau em todo mundo e teu pai te
correu de lá antes que enchessem teu rabo de bala — ele se irrita.
Eu fecho mais ainda a cara para ele.
— Queria ter metade desse mel todo, mas enfim... Se tu chegasse
casado com uma mulher decente, bonita e respeitável, seu velho acharia que
você mudou — ele conclui com um grande gole de cerveja.
— Casado? Eu?! Com uma mulher decente?!! — eu sempre soube que
ele era louco, e essa é a prova!
— Não qualquer mulher. Com a “empregada linda” — ele termina
como quem coloca a cereja do bolo.
— Ficou louco — rosno para ele.
— Não. Sabe que sempre fui o mais inteligente desta merda toda. Tu
não disse que ela tem um filho...?
— Filha — eu o corrijo.
— Filha, que seja, que precisa de atenção, tratamento e etc? Melhor
que um salário tu poderia dar uma boa parte da fortuna da máfia russa pra
moça.
— Como um acordo? — pergunto como se estivesse considerando a
ideia.
— Como, não. Um acordo sim — ele parece vitorioso e continua
bebendo sua cerveja, largado no meu sofá.
— Sabrina nunca aceitaria tal coisa — pego a minha bebida e viro em
um só gole.
— Você ficaria surpreso com o que uma mãe faz pelos filhos... — ele
divaga. — Talvez ela até encarasse um gigante branquelo como você.
A simples ideia é uma loucura, mas no que se refere a Sabrina, não
seria a primeira loucura que eu faria.
Era para ser apenas uma empregada que a agência mandou. Uma muito
bonita e que eu tentei (lógico que tentaria), levar para a cama na primeira
oportunidade.
Mas ela reagiu, se ofendeu e foi embora. A encontrei outra vez, alguns
dias depois, na rua. Com o filho da puta do seu ex a arrastando pelos cabelos.
Eu poderia ter feito como todos estavam fazendo, ignorar. Mas eu sabia que
ela não era a vagabunda que aquele miserável gritava para quem quisesse
ouvir.
Por isso interferi, a levei para sua casa miserável e ela me apresentou
a filha deficiente física.
A convidei para voltar ao trabalho, com um aumento. Disse que
poderia morar no emprego e trazer sua filha. Nunca fiz nenhuma boa ação
antes e o olhar que ela me deu valeu tanto a pena que senti vontade de virar
um filantropo. Mas ao invés disso sai da casa dela e fui investigar o ex. Ele
"sofreu um assistente" naquela mesma noite.
Um sorriso sai sozinho. Talvez Rato não esteja tão louco afinal... É
uma opção a ser pensada...
— Cara, quando mais eu te conheço mais eu te acho estranho... —
Rato estava o tempo todo me observando e eu nem percebi.
Eu apenas o encaro e torço a boca, irritado.
— Eu tenho um encontro, com uma gostosa e algemas, então pega teu
rumo, Rato — digo saindo da sala.
— Ah, baixou o Czar da Rússia! Sim, meu senhor — ele se curva
como sempre faz quando eu tenho... Hummm... como ele diz? Ah, sim: meus
"rompantes de arrogância".
Depois fecha seu inseparável notebook e vai saindo.
— Amanhã vou falar com o Gordo, avisar o Rocha que tu tá dentro e
que logo ele sai daquele inferno — ele bate na minha mão, e depois dá um
soco.
Eu balanço a cabeça.
— Somos uma família, não tem como eu não estar dentro. Rocha sabe
disso.
— Vocês mafioso e essas paradas de família... — ele revira os olhos.
— Mas desta vez tô contigo...
Ele para de falar quando vê Sabrina passar pelo corredor, ela se
abaixa para juntar qualquer coisa que daqui não consigo distinguir e a calça
larga cola na bunda grande e perfeita...
Eu paro por um instante para observar, meu pau já dá indícios de
querer participar da festa, mas eu desvio o olhar.
Ela precisa de um emprego, não de uma foda! Inferno!
Relembro mentalmente pela milionésima vez.
Olho para Rato que está literalmente babando e lhe dou um empurrão,
de leve para não desmontar o infeliz.
— Puta merda, Pax. Acho que me apaixonei — ele me olha de olhos
arregalados pelos óculos e passa a mão pelos cabelos bagunçados. — Se não
quiser aceitar aquela ideia, faz a mão pra mim. Eu assumo legal ela e o filho,
filha, sei lá, dela.
Rato é jovem, deve ter uns vinte e poucos anos e me lembra aquele
moleque dos Transformers. Doido, inteligente, infantil e atrapalhado.
Por isso eu dou risada.
— Vai sonhando ratinho de laboratório — eu digo abrindo a porta
para ele.
— Tu é um egoísta, Dimitri Paxrovik — ele se ofende ajeitando os
óculos. — Um egoísta!
Nisso meu celular toca. Eu encaro o número desconhecido.
— Valeu, mano! — Rato se despede e está saindo quando eu atendo:
— Dimitri — digo esperado a pessoa se identificar.
— Pax? — uma voz feminina e tremula pergunta num sussurro.
Pax? Ninguém me chama de Pax, a não ser que esteja ligado de
alguma forma a minha vida "obscura".
Eu faço sinal para Rato esperar, ele se detém com as sobrancelhas
erguidas.
— Quem está falando? — pergunto com cuidado.
— Melissa, a... Namorada de Isaac — ela sussurra outra vez. — Ele
disse para eu lhe ligar se acontecesse alguma coisa. Se eu precisasse de ajuda
— ela murmura parecendo desesperada.
Solto um suspiro. Que merda está acontecendo?
— Sim, Melissa, eu sei quem é você — digo e vejo Rato quase cair
para trás. — O que aconteceu? — pergunto com calma, e Rato gesticula
muito, parecendo apavorado.
Ela conta sem fôlego, que estava no parque e dois homens em um
carro preto tentaram raptar ela e seu filho, diz que conseguiu fugir quando
mordeu um deles, que se escondeu com o menino em uma pequena casa de
energia dentro da mata do parque. Ela dá detalhes do local. Está apavorada.
Merda!
— Não se mexa, não saia daí, nem respire para não chamar a atenção.
Chego em dez minutos, talvez menos — digo e desligo. — Porra! Tentaram
sequestrar a mulher do Rocha! — aviso para Rato que me arregala os olhos.
Volto e entro no meu escritório, pego a chave do carro e minha
pistola, mais alguns dentes de munição.
— Sabrinaaaa! — grito quando volto para o hall de entrada,
esperando ela aparecer.
Em segundos ela vem correndo parecendo nervosa.
— O que foi Seu Dimitri? — ela está ofegante, e a respiração faz seus
seios subirem e descerem.
Porra!
— Vou sair, não sei se volto hoje. Tranque tudo, não abra para
ninguém e não saia! Qualquer coisa me ligue — digo desviando o olhar e
arrastando Rato junto para fora.
Não sei por que falei essa merda, mas já disse e me sinto melhor.
— Você vem junto? — pergunto a Rato, enquanto abro a porta do meu
carro, mas já sei a resposta.
— Claro, tô loko pra conhecer a loirinha — ele diz com um sorriso
correndo para seu carro que está estacionado atrás do meu, e abrindo o porta
malas, tirando uma enorme sacola preta de lá.
— Que porra é essa? — eu pergunto quando ele joga a coisa no meu
banco traseiro.
Ele me olha com olhar calmo.
— Minhas paradas, ué! — ele diz sentando no banco do carona e
colocando o cinto se segurança.
Dou a partida e praticamente voamos até o tal parque na zona sul da
cidade. Estaciono do lado de fora e quando estou a ponto de sair, um carro
preto sai em alta velocidade de lá de dentro. Ligo outra vez o carro.
— Não acredito na nossa sorte! — dou um sorriso para Rato.
Rato se segura melhor enquanto persigo o gol preto, que não é páreo
para o motor do meu Audi, e que eu busco com facilidade pela noite
tranquila.
— Não íamos só pegar a moça?! — ele se surpreende.
— Deixa de ser viado! — pego minha pistola e coloco o silenciador.
— Segura essa merda aqui.
Abro o vidro enquanto ele segura a direção. Aponto para os pneus,
aproveitando a rua deserta, e atiro. O carro deles derrapa e perde o controle,
quase capotando. Abro minha porta e desço com rapidez, sem esperar meu
carro parar de todo, sem dar tempo para eles reagirem. Vou pelo lado do
motorista e atiro uma, duas vezes pelo vidro da janela aberta dos idiotas.
Uma bala para cada cabeça. Em silêncio e com rapidez, do jeito que eu gosto
de fazer essa porra. Depois abro a porta dos bastardos. Encontro junto com
eles um 38, e uma 42.
— Filhos de uma puta — digo em russo.
Seja lá a intenção que tinham com a mulher do Rocha, não era nada
boa. Atrás no banco há corda mais algumas coisas que me mostram
claramente a intenção do sequestro, inclusive o galão que imagino ser de
gasolina. Guardo minha pistola e pego um galão, abro e sinto o cheiro: diesel.
Não gosto muito de fogueiras, pois causam alvoroço desnecessário. Na mãe
Rússia gostamos de jogar no rio. É limpo, silencioso e mesmo se o miserável
não estiver completamente morto, o frio não deixa espaço para possíveis
fugas.
Mas, fazer o quê? Como dizem por aqui: "é o que a casa oferece".
Então jogo o óleo diesel por todo o carro, até nos desgraçados. Retiro
meu Zippo do bolso da calça e o acendo, jogando-o em seguida dentro do
carro.
Droga! Adorava aquele
isqueiro! Péssima hora para deixar de fumar! Se fosse antigamente eu apenas
jogaria o meu cigarro...
O fogo toma conta de tudo. Me afasto e entro outra vez no meu carro.
Rato está com a boca aberta.
— Rocha está me devendo um Zippo, pode falar para o Gordo dizer
isso para ele — resmungo torcendo a boca e dando a partida no carro,
voltando rapidamente por aonde viemos.
— Eu cronometrei desta vez! — ele diz e noto que ele tem o celular
na mão. — 3 minutos e 37 segundos! Dois caras e uma fogueira! Isso deveria
entrar para o Guinnes Book, cara! — ele diz entre empolgado e chocado.
Eu reviro os olhos.
Desta vez eu entro com carro e tudo no parque, porque agora não
tenho que caçar mais ninguém.
— Ela está em uma casa de energia... Algo deste tipo, tenta enxergar...
— digo e Rato abre o notebook e digita furiosamente. — Mas que bela ajuda,
Rato...
Ele me ignora e segundos depois me encara sorrindo.
— Olhar é para os fracos, Pax. Prestenção aqui, dá uma "olhada" na
planta do parque, assim como a da rede elétrica... E se juntarmos as duas...
Bingo! A localização exata da mina do Rocha — ele diz cruzando as imagens
que conseguiu sabe Deus de onde. — Agora só precisamos de uma ajudinha
do GPS e... Isso!!! Yes!
Ele faz pose de vencedor e dois minutos depois paramos em frente a
uma pequena construção pintada de verde, e que estava escondida entre a
vegetação e a escuridão.
Estaciono um pouco longe, e enfio minha pistola na calça. Rato se
encolhe, sem intenção nenhuma em me acompanhar como sempre e eu fecho a
porta. Me aproximo devagar, nenhum movimento ou barulho.
— Melissa? É o Pax. Está aí? — pergunto de encontro a porta de
ferro enferrujada com uma grossa corrente a fechando.
— Sim — a voz feminina e doce responde e eu me sinto aliviado.
— Pode sair, está tudo limpo agora — eu tento tranquiliza-la, me
perguntando como ela fez para entrar ali.
— Como assim? — ela pergunta e eu imagino que ela esteja com
medo ainda dos filhos de uma puta que tentaram leva-la.
— Eram dois, não eram? Em um carro preto?
— Si-sim... — ela gagueja.
— Pois não existe mais "dois" e nem carro preto... — explico para
ela sair de uma vez.
— Ah que bom! — ela parece aliviada e em seguida vejo uma cabeça
loira saindo por uma pequena fresta da porta, depois o corpo pequeno e em
seguida um menininho, quase um bebê, loirinho também.
—... Agora só existe uma grande fogueira — termino de dizer com
calma, ainda olhando para a nova mulher do Rocha.
Ela se endireita e pega o menino nos braços, está de shorts jeans e
descalça, a blusa com um rasgo e os cabelos bagunçados, ela é pequena e
bonita. Agora entendo a loucura de Rocha por ela. Ela inspira um sentimento
de proteção, talvez por estar tremendo visivelmente, ou tentando proteger seu
filho... Ou porque justamente por isso me lembrou Sabrina... Merda! Por que
lembrei dela? Inferno!
Ela me encara e vejo os olhos se arregalarem, de medo, de surpresa,
de admiração.
Deus queira que não seja outra vadia...
Então para minha surpresa ela desvia o olhar embaraçada e encara o
chão. Ergo uma sobrancelha sem entender, mas ela continua sem me olhar.
— Vamos? Vou levar vocês para casa, a não ser que queira passar em
outro lugar antes... Um hospital talvez? — digo andando e ela me segue, ainda
olhando para o chão, ou para o menino, ou para frente... Menos para mim.
— Estamos bem, obrigada por vir. Muito obrigada mesmo — ela
agradece e fico pensando que talvez Rocha tenha acertado desta vez.
Quando chegamos ao carro ela estranha Rato lá dentro, vejo que fica
mais tensa do que já está.
— Esse é Rato, também é amigo do Rocha, não se preocupe, está em
família agora — eu digo antes que ela comece a correr para longe.
Então pela primeira vez ela me encara de verdade, me encara dentro
dos olhos, parecendo querer ver minha alma. Não gosto disso. Sabrina faz a
mesma coisa e eu sinto meu ser encolher diante destes "olhares". Ela força um
sorriso e eu fico feliz por meu amigo.
— Tudo bem, então — ela continua caminhando e Rato sai do carro
com um sorriso e abre a porta para ela.
— E aí, Melissa? Tudo bem? Eu sou Samuel! É um prazer conhece-la
— ele diz parecendo verdadeiramente feliz.
Ela sorri para ele.
— O prazer é meu, Samuel — diz e entra no banco de trás.
Rato me encara de olhos arregalados e sorrindo abertamente.
— Te controla, nerd! — digo antes de entrar no carro e dirigir rumo
ao apartamento da moça.
Não digo que já sei onde fica, nem Rato fala absolutamente nada.
Como se ela não fosse vigiada o tempo todo.
Quando chegamos eu insisto para subir, para olhar cada cômodo do
apartamento pequeno, mas bonito.
— Tranque a porta e se precisar me ligue — digo antes de sair.
— Obrigada, Pax. Não sei como agradecer a sua ajuda. Isaac tem
razão em confiar em você — ela diz olhando para o chão.
— Ele pediu para você olhar para o chão quando eu chegasse? —
pergunto não aguentando de curiosidade.
Isso faz ela me encarar e a sombra de um sorriso aparece nos lábios
pequenos.
— Na verdade combinamos que eu iria fechar os olhos — ela admite.
Eu não resisto e solto uma risada.
— Tá certo, Rocha precisa cuidar do que é dele — eu digo
concordando com a cabeça.
Ela apenas responde com um sorriso triste.
Doce, sonhadora, fiel... Rocha é um cara de sorte. Agora só precisa
sair daquela merda, e eu vou fazer tudo para que isso aconteça.
26 — Consequências parte 2
Por mais chá de camomila, por mais dipirona que eu tenha tomado, o tremor
em minhas mãos não cessa, a dor em minha cabeça menos. Talvez sejam de
tanto chorar, depois que Anthony finalmente dormiu segurando a minha mão,
eu não resisti e desmoronei.
Nunca me senti tão frágil, tão inútil como mãe e protetora de meu
filho. Quase o perdi hoje. Quase o levaram de mim, tudo por minha estupidez!
Por que demorei tanto naquele maldito parque? Por que não o levei ao
banheiro mais movimentado?
Os amigos de Isaac foram muito legais, mas eu queria ele ao meu
lado. Queria correr para seus braços grandes e chorar o meu desespero no
seu ombro. Me aninhar para dormir e me sentir segura, como se o mundo
pudesse cair, mas não me atingiria, nem a mim nem ao meu filho, porque meu
Rocha estaria comigo.
Não quero ser sozinha. Anthony precisa de mim e eu preciso de
alguém... Não sou forte o suficiente para segurar minha vida, não em
situações como esta. Eu só queria um pouco de colo. Não é muito! Só uma
conversa por telefone! Só...
Levanto da poltrona ao lado da cama em que observo Anthony dormir,
e vou para a cozinha, fazer outro chá, enquanto limpo as lágrimas e fungo.
— Queria que não estivesse preso, Isaac. Só isso... — falo comigo
mesma enquanto derramo água fervente encima do saquinho, talvez pela
décima vez nesta madrugada.
Já, já irá amanhecer e eu não preguei os olhos sequer uma vez.
Me sento no sofá com as pernas dobradas sob o corpo, olhando para a
tela do meu celular. Queria poder ligar para ele. Como na nossa
música... Uma ligação de distância...
Estou a uma ligação de distância...
Mas não posso fazer essa ligação, e isso para este dia terrível parece
ser a "cereja do bolo". Nunca me senti tão miserável, tão sozinha. Se eu ligar
para minha mãe ela vai me julgar tanto, falar tanta coisa ruim que prefiro não
escutar. Poderia ligar para Saulo, mas não posso fazer isso depois da nossa
última discussão...
Quando o telefone toca, me pegando desprevenida eu grito derrubando
o chá pelo sofá.
Número confidencial.
Será que...?
Oh Deus, que seja meu Kratos!
Rezando baixinho eu fungo e atendo:
— Alô? Isaac? — na ânsia para ouvir sua voz eu o chamo.
Silêncio do outro lado.
— Alô? — tento mais uma vez com a voz em um fio.
— Mel, pelo amor de Deus! Você está bem? Eu tive um sonho horrível
com você e o Anthony! Desculpe te ligar a essa hora... — a voz de Val soa
preocupada em meus ouvidos.
Eu deveria ter ligado para ela. Por que não lembrei dela?
— Val... — eu começo, mas não continuo. O tom solícito dela parece
ativar as lágrimas e entre choro e soluços conto que tentaram levar Anthony
de mim.
— Ele está bem? — ela pergunta por fim.
—Está dormindo agora.
— Loira, assim que Gabriel acordar vamos aí ficar com vocês tempo
que tu precisar. Tá bom?
— Tá bom, amiga — eu agradeço e ainda emocionada desligo a
ligação.
Estou um caco, tento terminar a noite assistindo algo, mas não consigo
prestar atenção em nada. Me deito outra vez ao lado de Anthony e noto o dia
amanhecer enquanto vigio seu sono e faço carinho nos seus cabelos. Me
sentindo a pior mãe do mundo.
Quando a campainha toca cedo da manhã eu sinto um alívio, ainda
estou fragilizada e conversar com Val me fará bem. Ainda estou com os olhos
inchados e dor de cabeça, mas definitivamente um pouco mais confortável
agora que ela está aqui. Estou tremendo, precisando de um abraço, um mísero
conforto, eu abro a porta. E dou de cara com Saulo!
— O que...? — eu digo atordoada.
Ele está muito bonito com os cabelos molhados e os olhos verdes
escuros parecendo arrependidos. A tal carinha de cachorrinho arrependido
que é a marca dele. Tem uma mão apoiada no batente da porta e a outra ele
passa pelos cabelos eternamente bagunçados enquanto diz:
— Eu... Eu vim me desculpar pelo jeito com que te tratei, não consigo
parar de pensar nisso, e hoje antes de ir para o trabalho pensei em passar
aqui... O que houve? — ele pergunta quando começo a tremer o queixo,
tentando segurar o choro mais uma vez.
Eu apenas sacudo a cabeça. Não quero ouvir recriminações de Saulo,
já me sinto mal o suficiente...
— Tudo... tudo bem, não... não precisa... — fungo, limpo as lágrimas
que teimam em cair sem controle, por mais que eu me esforce para parar isso.
— Melissa! Que aconteceu? Me diga! Foi aquele filho da puta? — ele
esbraveja e de repente me abraça, me apertando forte e eu não resisto,
termino de chorar as lágrimas que me restam.
Não sei como, mas quando dou por mim estamos no meu sofá, Saulo
ainda me abraça e eu conto aos tropeços sobre o que aconteceu.
— Graças a Deus vocês estão bem! Nunca mais saia sozinha. Peça
proteção da polícia. Talvez não tenha sido coincidência...
— Como assim? — pergunto me afastando dele e fungando outra vez,
noto que deixei uma mancha molhada na sua camisa, mas ele parece não se
importar, apenas me encara.
— Já pensou que isso pode ter acontecido por causa de "seu
namoradinho"? — ele diz sério e eu o encaro.
— Você vai começar outra vez com isso? Isaac não é um demônio
onipresente! — me lembro de tudo o que ele me disse da última vez que nos
vimos, sobre a coisa que cerca Isaac acabar "respingando" em mim.
Ele se levanta e parece irritado:
— Você está colocando a si mesma e a Anthony em perigo por causa
de um homem! Você não pensa? — mais uma vez ele diz o que não deve e a
raiva sobe rapidamente, fazendo minha cabeça dor intensamente e minha
bochechas queimarem.
— Saia da minha casa, Saulo! — tento fazer a crise nervosa acabar,
me segurando nesta sensação que me dá um pouco de forças. — E não quero
você aqui, já lhe disse antes!
Ele passa outra vez a mão pelos cabelos, e depois me encara. Eu
limpo as minhas lágrimas com raiva, odiando a mim mesma por ter sido tão
fraca.
— Me odeia, mas aceitou meu conforto. Sua solidão só não é maior
do que a minha — ele diz isso e se encaminha para a porta, parecendo
ofendido e pronto para explodir, mas antes de sair ele ainda se volta mais
uma vez. — Vá embora com o menino, Melissa. Se isso não foi acaso, eles
não vão desistir. Coloque a si mesma e ao seu filho em segurança, pelo amor
de Deus!
Eu apenas o encaro, sem dizer absolutamente nada, apenas porque não
sei o que lhe dizer. Então ele se vai, parecendo furioso.
— Eu não te odeio, Saulo — digo para o nada, depois que fico
sozinha no corredor por um tempo.
As palavras dele doem mais do que deveriam e entram no meu
coração. Talvez eu deva mesmo ligar para a polícia. A segurança de Anthony
é mais importante do que tudo. E se for o caso de ter que me afastar de
Isaac... Então farei isso. Por Anthony.
Passo a mão pelo rosto... Talvez eu deva chamar Saulo de volta... Fui
impulsiva...
Entro e fecho a porta, me encosto nela e choro de desespero. Não sei
o que fazer. Val vai me ajudar a tomar uma decisão.
Mas antes acho que devo um pedido de desculpas a Saulo. Dou um
passo me afastando da porta e o interfone toca.
Saulo outra vez? Ou Val que finalmente chegou?
Entre a dúvida eu atendo:
— Sim?
— Flores para Melissa — a voz desconhecida responde.
As rosas de Isaac. Eu recebo um buquê todos os dias, meu
apartamento nunca esteve tão lindo e perfumado. Suspiro ante a lembrança
dele, olhando ao redor para os ramalhetes que me enchem os olhos.
— Pode subir — digo enquanto abro o portão lá de baixo, me
perguntando como Saulo fez para subir sem que eu abrisse-o.
Quando a batida suave na porta é ouvida, Anthony acorda me
chamando:
— Mamãe! — ele grita lá do quarto me fazendo dar um sorriso.
Ainda tenho o meu amor comigo. Tudo vai ficar bem.
— Mamãe já vai, amorzinho! — aviso-o enquanto abro a porta,
sentindo um frio repentino em meu coração, uma sensação ruim, que faz meu
sorriso morrer subitamente e eu parar de abrir a porta, deixando apenas uma
pequena fresta, quando me dou conta que devo, preciso me cuidar como Saulo
disse, a porta é escancarada de uma vez com violência e dois homens com
capuzes entram arrombando tudo e apontando suas armas para mim.
Eu grito a todos pulmões, ouço o choro de Anthony no quarto, então
um deles dá dois passos em minha direção falando irado:
— Cala a boca, patricinha escandalosa! — ele ergue o braço e sinto
algo me acertar com força na cabeça, depois eu simplesmente apago, com um
único pensamento: Anthony. Eu não o protegi.
(27) EXTRA ISAAC
Hoje! É hoje que vou conhecer o filho da minha boneca! Hoje ela vem me
visitar e vai trazer o moleque.
Passo a mão pela cabeça, espero que ele não se assuste. Quantos anos
ela disse que ele tinha, mesmo? 4? E se não gostar de mim?
Eu não levo muito jeito com crianças... Aí porra! O moleque tem que
gostar de mim...
Levanto mais uma vez o peso que está fixo ao chão com uma corrente
grossa.
Hoje é dia de visita e a única coisa que me deixa mais aliviado nessa
merda aqui. Já está quase tudo pronto para a fuga. No mais tardar uma semana
e eu sumo deste inferno, aí vou poder ter uma vida outra vez. Vou tirar
Melissa daqui, deste país desgraçado e vamos viver longe, em paz.
Meu velho já arrumou os passaportes falsos, está tudo certo. Nunca
disse a Melissa que quem ela conhece como Dr. Nelson é na verdade meu
pai, para proteger ela e ele. Ninguém sabe disso, afinal seria como meu velho
diz: "um escândalo" se o povo descobrisse que o filho bastardo de um dos
maiores advogados criminalista do Brasil, é um assaltante de bancos. Dos
bons, digo de passagem.
Torço a boca, com a lembrança. Eu era bom. Fazia com propriedade,
com gloria. Mel me perguntou uma vez se eu estivesse fora, se eu iria querer
visitar o apê dela e conhecer o molequinho, e a verdade que eu não disse
naquele dia é que dificilmente aquele Rocha iria querer. Na verdade o Rocha
de antigamente iria querer, mas não largaria a vida que tinha.
— Rocha! Psiu! — levanto a cabeça e dou de cara com Felix me
olhando com cara de quem vai enfartar.
— Que foi, puto? — fecho a cara para ele, ainda sem largar meu peso.
Ele apenas arregala os olhos ainda mais e eu sinto uma sensação ruim.
A mesma que tive essa manhã durante o banho e que me fez encolher embaixo
da água gelada.
Largo meu peso e fico de pé, encarando o viado de cima.
— Fala logo! — ordeno entredentes.
Ele empina o queixo, como sempre faz quando eu dou ordens para ele.
Com o raio do orgulho ferido.
— Não pira, bofe! As coisas já estão arrumadas para essa semana,
não vai fazer merdaaaaaa... — ele grita quando o ergo pela camiseta.
— Aconteceu alguma coisa com ela? — as palavras me escapam
antes que eu possa ao menos pensar nelas.
— Levaram ela — ele diz em um fôlego. — Seus amigos estão
tentando descobrir quem...
Largo Félix no chão, antes que termine a frase. Meu coração está
parado e eu não enxergo absolutamente nada.
— GORDO!!! — eu urro no pátio cheio e vejo o povo abrir caminho,
ou simplesmente sair da minha frente antes que eu passe por cima.
Gordo está fumando do outro lado e parece querer sumir quando me
vê.
Eu não paro e em segundos estou com ele prensado no muro sem
reboco dessa merda.
— Calma, Rocha! Eles estão...
— Quando? — eu cuspo a palavra.
— Hoje pela manhã. Ontem à noite tentaram levar ela, e dois foram no
apê hoje! Rato está descobrindo quem...
— Rato e Pax deixaram dois filhos da puta levar minha mulher?!! —
eu urro fazendo o corpo dele se chocar com força.
— Mano, eles estão fazendo de tudo para...
— Porra nenhuma! Vou sair desta merda hoje! Avise os dois!
— Meu Deus! Rocha, você não... — mas ele fica quieto,
provavelmente por que o peguei pelo pescoço.
— Se acontecer alguma coisa a ela, eu vou matar Pax e Rato! Não
importa a nossa amizade, nem nada! EU DEIXEI ELA SOB PROTEÇÃO
DAQUELES BOSTAS!!!! Merda! Inferno da porra!
Largo Gordo e saio pisando duro.
Os guardas já estavam vindo e o fura olho miserável do Silva estava
no meu bico.
Diabos! Vou até Mané, que como sempre está rodeado de escória.
Faço sinal e ele se aproxima enquanto os outros saem de perto.
— Preciso de um espeto, qualquer coisa que tu conseguir! E tem que
ser hoje.
Mané estreita os olhos e dá uma imensa tragada, depois concorda com
a cabeça, sem dizer absolutamente nada.
Saio dali, caminho de um lado para o outro, sem conseguir pensar,
sem conseguir parar.
Quando os guardas começam a chamar o povo para entrar outra vez,
eu sinto alguém colocar um objeto na minha mão. Fecho os dedos e sinto a
textura da "faca" improvisada, que escondo nas dobras do elástico da calça.
Vou sair desta porra e vai ser hoje.
Quando entramos outra vez na cela, estranho. Tem alguns lençóis
novos dobrados em cima da minha cama. Apenas na minha cama.
Meu coroa não disse que iria mandar porra nenhuma... Então os pego
enquanto Felix e Baiano entram, e quando sacudo um papel impresso cai.
A cela fica em silêncio pesado.
Olho para meus dois companheiros de chiqueiro e os dois tem os
olhos cravados no papel muito branco que contrasta com o piso imundo.
Me abaixo e o pego.
"Se quiser ver sua garota viva e inteira outra vez, transfira 1 milhão
para a conta abaixo, ou então vou te mandar ela aos pedacinhos."
Embaixo da porra está o número e agência, assim como um grande
chumaço de cabelos loiros, amarrados e grandeados ao papel.
Sinto meu estômago embrulhar. O ódio que corre com força é muito
grande. Por alguns minutos não consigo enxergar.
Sinto alguém tirando o papel de minha mão e a cara de Felix entra em
foco, ele mostra com os olhos algo e eu miro para o lugar onde ele aponta.
Silva e Góes estão vindo.
Felix esconde o papel odioso e sorri para Silva.
— Humn cada dia mais lindo, bofe. Achei que era sua folga, amor...
— ele vai para perto da grade e eu tento fazer meu coração voltar a bater.
Não posso fraquejar! Não agora.
— Estou cobrindo um colega, mais alguma informação da minha vida
que você queira? — ele fala com Felix correndo os olhos pela cela, parece
procurar alguma coisa.
— Só aquela que você insiste em esconder... — ele se insinua como
sempre.
Góes ri e Saulo se afasta sem responder, indo averiguar outra cela.
— O que houve, Rocha? — Baiano se aproxima agora que eles se
foram.
— Levaram Mel. Sequestraram minha mulher e essa porra aí é o
pedido de resgate — digo andando de um lado para outro.
— Mas como conseguiram colocar isso aqui dentro?— Félix está
confuso assim como eu.
— Algum destes miseráveis deve ter alguma coisa com isso! —
Baiano parece irritado.
— Claro que tem! — Félix está pensativo. — Foi alguém aqui de
dentro.
— Mas é uma quantia muito grande? Algo impossível? Porque se não
for acho melhor não arriscar...
— E se ele pagar e não soltarem a loira? Como vai ter garantias? —
Félix se exaspera sussurrando.
— Não existe garantia neste tipo de merda! — Baiano rebate e depois
se volta para mim — E agora? Que tu vai fazer, mano?
Pego o papel da mão de Félix, retiro a mecha de cabelos loiros e
guardo no cós da calça, antes aspiro o cheiro, sinto a textura no meu nariz. A
porra do peito dói pra caralho.
Cerro as mãos em punhos, sentindo o ódio queimar tudo aqui dentro e
me dar forças. Forças vindas provavelmente do inferno, mas eu tô pouco me
fodendo pra isso.
Me viro e encaro Baiano nos olhos quando digo:
— Vou buscar a minha mulher!
Anthony chora e eu o aperto contra o peito, meu rosto está úmido também, o
desespero das horas que se passaram estão acabando comigo.
Fui amordaçada, amarrada e trazida para este lugar. Não sei onde
estou, só sei que é um quarto com janelas pregadas e sujo. Tentei gritar, mas
eles voltaram armados, um tapa foi o suficiente para quase me desmontar.
Depois disso fiquei em silêncio. Tentei ouvir atrás da porta, mas as vozes
baixas não chegavam claramente aos meus ouvidos.
Agora me sento na cama de solteiro, com Anthony empoleirado no
meu colo chorando baixinho.
— Quero dar uma olhada na patricinha... — ouço alguém dizer
enquanto abre a porta.
Me viro e dou de cara com Goulart, o agente penitenciário com cara
de tarado que conheci no presídio, ele está com um dos braços engessado até
o cotovelo e mesmo assim parece perigoso. Sinto isso pelo olhar que dirige a
mim. Tem muita maldade ali, tanta que me encolho segurando mais Anthony.
Arregalo os olhos, não acreditando que ele está por trás disso. Mas o
mais importante: se ele me deixou vê-lo provavelmente não me permitirá sair
viva daqui.
— Sai logo daí, porra! — outro homem grita lá fora.
— Saio porra nenhuma! Vocês podem estar nessa merda por dinheiro,
mas eu estou só por uma razão... — ele sorri e chega até mim com passos
lentos me olhando com olhos frios e vazios.
— Chama aquela outra aqui para levar esse moleque, caralho! — ele
se vira e vejo com quem ele tanto fala, Góes o agente penitenciário corrupto
está na porta me olhando com cara de pena.
— Merda, Goulart! Tu vai foder com tudo!!! — ele grita e se vai.
Goulart sorri mostrando o aparelho, um sorriso maldoso enquanto
passa a mão boa pelo pau sobre as calças:
— Exatamente.
Eu grito, arrancam Anthony dos meus braços que chora
incontrolavelmente. Eu choro, luto, levo outro tapa, sou jogada na cama e
então eu vejo, como em um filme em câmera lenta, Góes entregar meu filho a
Val que o pega na porta sem sequer olhar em minha direção.
Eu grito, a chamo, xingo, choro.
A porta é fechada por fora e Goulart me aprisiona no colchão.
— Me solte seu infeliz! Nojento! Socorro!!! — eu grito outra vez e
levo um soco no lado esquerdo do rosto, parece que levei uma pedrada,
atordoo. Fico sem ação por alguns segundos, tonta.
Isso é suficiente para o porco arrancar minha blusa e pegar meus
seios, mordendo, machucando.
Está com o membro rijo para fora e tenta tirar minhas calças. Eu
recupero meus sentidos, luto, chuto, grito ainda mais alto, minha garganta dói
e estou perdendo as forças. Levo outro soco, desta vez na boca e sinto o meu
próprio sangue escorrer por minha garganta, pelo meu queixo, parece que
quebra toda a minha mandíbula, tamanha a dor que sinto. Com o braço
engessado ele me prende pelo pescoço me imobilizando, depois puxa minhas
calças pelas minhas pernas e eu não consigo evitar. Cuspo na cara podre
deste maníaco. Sangue, saliva, lágrimas tudo se mistura, mas em nenhum
momento eu deixo de gritar.
— Cala a boca!!! — ele urra e ergue a mão para outro soco, eu o
arranho, tento pegar seu pescoço.
Goulart me aperta mais o pescoço, eu sufoco. Tento me livrar, mas ele
não larga, perco as forças enquanto sinto que vou desmaiar, e para minha
maior desgraça sinto o membro nojento dele entrar em mim.
Paro de lutar, a escuridão se avançando sobre mim e agora ela é a
única coisa que quero, agora apenas a morte, enquanto ele violenta meu
corpo, alma, cerne... tudo ao mesmo tempo. Por isso não luto mais. Apenas
choro... O braço engessado ainda aperta meu pescoço e eu sinto a vida se
esvair, já não sinto mais nada... Então acima de tudo barulhos são ouvidos lá
fora, muito barulho. Noto o som de tiros muito alto e o miserável em cima de
mim congela no lugar e o braço solta meu pescoço, o ar entra em um grande
golfada e eu tusso, me afogo com ele.
Consigo ver a porta ser arrombada e Isaac aparecer de arma em
punho. Como um furacão em segundos ele ergue Goulart, arrancando-o de
mim, e me encara com olhar intenso e cheio de pena.
Tenho vontade de correr para ele, de abraçá-lo, mas não consigo me
mexer. Ainda estou tossindo, estou dolorida e ainda quero morrer. Apenas me
encolho como uma bola e choro.
Saulo entra em seguida, também com arma em punho, olha para Isaac
que está no canto, prensando Goulart na parede e o enchendo de porrada,
depois ele olha para mim e o choque no seu rosto faz com que eu pense que
estou aparentando exatamente como estou me sentindo.
Saulo corre até mim pegando o lençol da cama me cobre, me pega no
colo, me segurando como se eu pudesse quebrar e me tira do quarto. Mas
antes eu consigo ouvir Isaac dizendo:
— Você enfiou esse pau nojento na minha mulher?!! — vejo-o apontar
a arma para o membro de Goulart que está com o rosto irreconhecível,
inchado e sagrando e que implora debilmente para Isaac o poupar.
Então Isaac atira várias vezes.
Saulo já me carrega para fora, para uma sala grande e imunda.
— Anthony — eu murmuro e então me dou conta que há mais gente
aqui.
Pax, Rato e mais dois que não conheço, todos armados e há três
homens caídos mortos pelo aposento.
Nem sinal de Val ou de Anthony.
— Onde ele está? — pergunto desolada a Saulo que parece perder a
pose séria e me encara com os olhos tristes.
— Vamos encontrar nosso menino, Melissa — ele parece se conter,
mas os olhos estão vermelhos.
Meu coração para de vez. Meu pequeno, Val levou meu pequeno?
Choro mais ainda e Saulo me consola gentilmente. Sei o quanto ele
gosta de Anthony e por isso quando o chamou de "nosso" menino me pareceu
normal.
Isaac sai do quarto e Saulo continua me carregando para fora da casa,
nossos olhares se cruzam, por mais que eu queira estar nos braços dele a dor
que carrego no corpo e de não ter meu menino comigo me deixa vazia,
incapaz de qualquer emoção a não ser chorar baixinho, que é o que estou
fazendo desde que Saulo me tirou daquela cama.
— A vadia fugiu com o menininho — um homem muito alto parecido
com Matheus Solano avisa a Isaac.
A vadia: Val.
— Certo, vamos botar fogo na casa, trouxeram a gasolina? — Isaac
pergunta e Pax sorri erguendo um galão.
— Estou começando a gostarrrr de fogueirrras — ele diz enquanto
joga o líquido nos homens caídos, nos móveis e em tudo.
Isaac vem em minha direção e Saulo para, parece indeciso quanto a
deixar Isaac nos alcançar, mas deixa.
— Cuidado, cara. Ela está muito machucada — ele avisa para o outro
antes que ele me retire totalmente de seus braços.
Eu o abraço, sentindo meu coração gritar. Os braços me envolvem
com força e eu solto um gemido alto de dor.
— Desculp... — Isaac começa, mas é neste momento que eu escuto
algo.
— Shhhhhh! — peço para todos que param o que estão fazendo por
um minuto.
O som inconfundível do choro baixinho do meu pequeno, eu sinto
mais do que escuto.
Arregalo meus olhos para Isaac, que me coloca no chão. Erguendo
uma sobrancelha.
Caminho devagar causa das dores e segurando firmemente o lenço ao
redor do corpo por, para onde parece vir os soluços, que vão aumentando.
Puxo uma cortina encardida e vejo a porta de um armário escondido,
minúsculo, mas que pode esconder uma mulher pequena e uma criança.
Saulo saca a arma e dá alguns passos na direção. Isaac caminha mais
rápido do que ele, passando na sua frente e mesmo estando agora desarmado,
abre ele mesmo a porta do armário.
Então eu ouço:
Um. Dois. Três tiros. Um seguido do outro.
Cubro a boca com as mãos e vejo Isaac dar dois passos para trás, e
Saulo mirar e atirar para dentro do armário apenas uma vez.
Me aproximo e vejo Val caída com a marca de um tiro na cabeça e
uma arma na mão. Anthony corre para mim, se livrando do braço que o
prendia e que agora está pendendo sem vida.
Ele tem os olhinhos vermelhos e o rosto lívido de tanto chorar e se
joga nos meus braços.
Eu choro sem me conter, o apertando na medida do possível.
Levanto o rosto para agradecer a Isaac e Saulo, meu coração agora
parcialmente feliz. Anthony está comigo. Até mesmo Isaac está aqui,
conseguiu fugir.
Essa dor, essa vergonha vão passar. Essa tristeza irá embora e vou
esquecer o que aconteceu. Isaac irá me ajudar...
Mas ele não me olha, tem a mão na barriga, e olha para a mão em
seguida, está cheia de sangue!
— Isaac? — pergunto com medo.
Ele olha para mim e vejo o terror nos seus olhos.
Pax chega e o segura antes que a montanha caia.
Meu coração para outra vez.
— Vamos logo! Precisamos levar ele para um hospital! — Saulo grita,
mas ninguém se mexe.
Eu me levanto segurando a mão de Anthony, apertando o lençol ao
redor do corpo.
— O que estão esperando?!! — grito.
— Ninguém vai me lavar a porra de lugar nenhum, boneca. — Isaac
resmunga enquanto dois deles o colocam em um sofá e Pax ergue sua camiseta
para ver o estrago, de costas para mim, tapando a minha visão.
— Dois tiros te acerrrtaram, merrda! — Pax exclama transtornado.
O gemido de Isaac é pior do que qualquer coisa e quando me
aproximo Pax baixa a roupa dele, sem permitir que eu veja, e não me olha. A
camiseta preta de Isaac está molhada, muito. Agora até mesmo a calça jeans
tem grandes manchas de sangue.
Não consigo respirar.
Ele estica a mão para mim.
Saulo se aproxima e vejo Anthony dar a mão para ele, em extrema
atitude de confiança do meu menino, nessa situação. Saulo o ergue nos
braços.
— Oi, amigão — Saulo diz com voz embargada e percebo que ele
realmente ama meu menino.
Anthony o abraça.
— Tu era o filho da puta do amiguinho viado da minha boneca?! —
Isaac parece entender, mas eu já estou o abraçando aos prantos, sem me
importar com minha própria dor.
Sem olhar para Saulo eu escuto a sua resposta:
— Somos amigos, 109. A paixão dela sempre foi você. Eu nunca tive
chances, sei disso agora.
A voz dele tem tanta dor que eu me obrigo a largar o pescoço de Isaac
e me virar para olha-lo. Ele está com Anthony nos braços e me encara com
um sorriso triste.
A visão dos meus sonhos antigos de família perfeita nunca foi tão real
e sinto um desconforto terrível. Parece que estou perdendo mais uma parte de
mim.
— Eu e Anthony vamos lá para fora e posso chamar a ambulância...
— Cai fora, Silva! Eu já disse para todo mundo e digo outra vez... —
ele respira fundo. — Morro aqui fora, mas não volto praquele inferno!
— Shhhhhh! Não fale isso — eu o beijo, o rosto, os lábios. — Saulo,
por favor, chame a ambulância! — eu imploro aos soluços.
Ele confirma com a cabeça e sai, levando Anthony consigo.
— Você vai ficar bem, meu amor. Você é o Kratos! Você é quase
imortal — eu falo em meio o choro.
— Boneca — me chama muito sério, e eu engulo o choro e o encaro,
só então ele continua. — Eu não vou poder te levar pra Bruges...
— Não diga isso! Vai sim! Vamos nos casar! — o interrompo e ele
passa a mão pelo meu rosto ferido, pelos meus lábios cortados.
— Vai ser melhor assim, olha o que aconteceu com você, só porque
ficou perto de mim. Você ficará melhor sem mim.
— Não pense uma coisas destas, Isaac Greiner! Eu te proibo!
Ele sorri e parece que o tempo para.
— Toc-toc... — ele murmura.
Eu choro.
— Quem... Quem é?
— O lobo mau... O torto que te ama...
Ele faz carinho no meu cabelo e uma lágrima solitária cai dos seus
olhos.
— Mel, continua a fala — ele puxa de leve minha orelha.
— O que... — minha voz falha. — O que você quer? — beijo sua
mão, seus dedos.
— Que você seja feliz, boneca. Que fique bem — e então sinto seus
lábios nos meus, trêmulos e fracos, mas o beijo não se aprofunda, e Isaac
deixa a cabeça pender para trás.
A montanha caindo, meu deus imortal morrendo e meu coração de
destroçando.
Grito. Grito tão forte que meus ouvidos doem. Grito tão alto que Deus
e todos os anjos escutaram a minha dor.
Então eu desmaio e agradeço aos céus por essa bênção.
29 – Entrando no Poço
— Não. Isso não pode estar acontecendo! Você é minha mãe! Não pode
fazer isso comigo! — a raiva me consome e eu grito.
— Vá embora, Melissa ou juro que vou te internar num hospício! —
ela esbraveja.
— Não saio daqui sem meu filho! — eu tento entrar na casa dela, que
me barra e meu pai sai à porta.
— Já não basta ter acabado com sua vida ainda quer acabar com a do
menino também?
— Ele é meu filho!!!
— Sim infelizmente. O pobrezinho é filho de uma cadela que pôs a
vida dele em risco por causa de macho!
Não é a primeira vez que eles me xingam assim. Foi quase a mesma
coisa quando eu engravidei de Anthony.
Fiquei no hospital por 2 dias e quando saí minha mão já tinha uma
liminar que lhe dava guarda provisória do meu filho.
E agora além de me tirarem meu filho querem me internar.
Minha mãe dá alguns passos para frente me intimidando, para a
centímetros de mim:
— Olha para você, olha o que se tornou. O lixo que virou — eu ainda
estou com hematomas terríveis e machucados, e ela me olha com nojo. —
Nunca imaginei que pudesse cair tão baixo. Você nunca mais verá o menino.
Ele vai ficar comigo. Vai ser alguém e o mais importante: longe de uma louca
como você.
— Eu vou voltar aqui com a polícia! Ele é meu filho! — grito mais
uma vez em desespero.
— Fique a vontade, a policia não vai fazer nada contra nós. Quem se
juntou com bandidos foi você — meu pai responde.
— Pois eu não...
— Anthony não fala mais, você sabia? O menino estão tão
traumatizado que não fala. Grita a noite toda apavorado e não consegue nem
ouvir seu nome que corre apavorado...
— É mentira!!! — eu grito. — É mentira — sussurro.
Olho de um para outro. Rostos irados, quase irreconhecíveis. Meus
olhos se enchem de lágrimas.
— Não volte mais, Anthony está mil vezes melhor sem uma louca
como você.
Eu fico quieta, parada exatamente no mesmo lugar, sem enxergar nada.
Sinto que vou desmaiar. Minha cabeça enche de ar eu tonteio.
Anthony corre apavorado quando ouve meu nome?
Pisco várias vezes e quando dou por mim estou andando a esmo por
alguma rua.
As pessoas passam me olhando, uma mulher gentil pega minha mão,
pergunta coisas... Eu não sei o que responder. Eu não consigo falar, nada.
Apenas as lágrimas caem grossas sem eu ter controle ou esboçar reação.
Quando noto novamente estou em um lugar que parece hospital,
deitada em uma maca. Tem soro no meu braço e eu o retiro. Ou tento. Não me
deixam. Onde estou?
— Onde ela está? — a voz conhecida ecoa meus pensamentos.
Olhos verdes escuros preocupados me encontram e chegam perto da
maca.
Saulo.
— Oi, Mel. Te liguei e uma enfermeira atendeu, disse que você estava
vagando pelas ruas, numa crise nervosa... Que não falava... Ainda bem que
liguei — ele pega minha mão e pergunta. — O que aconteceu?
Eu tento fazer a voz sair normal, me esforço para falar pausadamente:
— Minha mãe... — pausa. — Ela... tirou ele de mim. Levou ele,
Saulo...
A crise de choro irrompe outra vez e ele me abraça. Sinto que estou
despedaçada, mas que esse abraço está segurando as partes para eu não me
estilhar, pelo menos por enquanto.
— Vamos resolver isso, Mel...
— Ele me odeia... Tem medo de mim...
Ele me larga e me encara muito sério dentro dos olhos:
— Anthony te ama. Ele te ama. Não acredite no contrário...
— Mas ela...
— Shhh não pense nisso agora. Eu vou te levar para sua casa. Aí
conversamos melhor e vamos achar um jeito de resolver isso. Tá bom?
Eu seguro o choro e concordo com a cabeça.
Lembro que foi quando ela se jogou nos braços dele, em desespero por ele
estar ferido que senti o miserável do meu coração morrer. Foi naquele
maldito momento que notei que Melissa nunca me amaria.
Eu estava com Anthony, meu garoto, no braço e ele me apertava em
um abraço.
Foi então que eu entendi tudo. Até mesmo a porra dos meus sonhos
antigos.
Melissa e Anthony precisam de mim, tanto quanto eu preciso deles,
precisam de um amigo, um companheiro, um pai... Ela não precisa de um
amante, um namorado ou um marido. No coração dela só haverá espaço para
o troglodita do 109. Mas essa merda de maneira nenhuma diminui o que sinto
por ela. Isso apenas acaba com minhas miseráveis esperanças. Mas sempre,
sempre estarei do lado dela, sendo o que ela precisar. Melissa sempre teria
tudo de mim.
Por isso quando cheguei à rua liguei para ambulância.
— Policial ferido — eu disse o código que faz com que mandem uma
ambulância o mais rápido possível.
Se a felicidade de Melissa depende da vida de 109 então que se foda
a minha missão. Que se foda se vou ter que enfrentar a corregedoria porque
me aliei com bandidos. O troglodita não pode morrer.
Quando o grito de Melissa é ouvido muito alto, Anthony me abraça
com força. Antes que eu possa pensar em fazer alguma coisa, o amigo
estrangeiro de 109 carrega Melissa para fora, e é seguido por outros
correndo, a casa está em chamas.
Ninguém soube como começou o incêndio, e ninguém conseguiu voltar
para tirar 109.
Avisei a todos que a ambulância já estava chegando assim como
possivelmente a polícia.
Eles me encaram parecendo não saber o que fazer.
— Sou policial federal. Estive aqui sozinho investigando o sequestro
de minha amiga. Ouve trocas de tiros e os bandidos morreram. 109 fugiu para
salvar seu amor e acabou dando a vida por isso.
Informei a eles o mesmo discurso que dei nos meus relatórios. E
foram muitos.
Eles se olharam entre si e o som das sirenes soou baixo e se
aproximando. Então um por um eles lançaram um olhar para a casa em
chamas e se foram.
Quando liguei para 109 pedindo para participar do resgate de Mel
nunca imaginei esse desfecho. Eu estava desconfiado de Goulart há tempos, e
quando ele faltou serviço no dia do desaparecimento de Melissa eu soube que
ele tinha alguma coisa haver com isso.
O policial Garcia, meu amigo que é encarregado do banco de dados
da PF, me informou que Goulart tinha um sítio abandonado na saída da
cidade. E pelas imagens da câmeras colocadas na entrada do apartamento de
Melissa, que os companheiros do 109 mostraram, dava para ver claramente
os filhos da puta do Goulart, Góes e mais um que eu não conhecia.
Não esperamos para chegar no endereço, cercamos, arrombamos e
entramos atirando. Justiça com as próprias mãos eu só fiz uma vez, mas desta
banda eu estava junto com os bandidos, então não poderia ser diferente. Eu
poderia tomar a missão para mim e chamar os federais, mas não achei justo
com 109 que até fugiu para salvar Mel.
Passei a entendê-lo melhor, a respeita-lo até. Eu estava tão arrogante
em meus pensamentos que julgava a todos como escória. Lixo da sociedade.
Mas há os que merecem uma segunda chance e eu achei que 109 merecia a
dele. Por isso iria leva-lo até a fronteira se fosse preciso. Que ele fizesse
Mel feliz, que protegesse ela e Anthony, foram as únicas coisas que eu pedi
para ele em troca.
Lembro-me do olhar do 109 quando eu lhe disse isso. Ele me encarou
como se visse minha alma e apenas confirmou com a cabeça.
Nos meses decorridos há morte de 109, foram uma festa para a
imprensa, os jornais publicaram a notícia da sua morte a televisão declarou
109 como herói. E o túmulo dele está sempre cheio de flores e cartas.
Um herói. Um mártir do amor. Dizem que se pedir a alma dele ajuda a
encontrar pessoas desaparecidas.
O advogado de 109, que na verdade era o seu pai, o reconheceu no
necrotério, já que Melissa não conseguiu ir, e o homem aproveitou o momento
e apareceu desolado no Jornal Nacional, alegando que seu filho SEMPRE foi
inocente.
A história de 109 virou filme, virou mini-série de TV.
Mel não consegue tocar no nome dele, não consegue assistir nada, ou
ler jornais. O tal advogado pagou uma viagem para ela e ela nunca a fez. Ele
quis lhe dar dinheiro, mas ela não aceitou. Porém ele ainda paga seu aluguel e
as despesas do mês, já que Mel nunca mais foi a mesma e não aceita esse tipo
de ajuda vinda de mim.
A única ajuda que ela pediu foi para ter Anthony de volta. Ela foi
quebrada ao meio, mas foram os próprios pais dela quem desferiram a facada
final. Não sei o que passa na cabeça daqueles velhos, mas o ódio que eu
tenho deles são tem limites.
No dia em que fomos buscar Anthony, Melissa depois de muito tempo
parecia viva. O menino correu quando a viu. Correu para os braços dela.
Eu sempre fiquei ao seu lado. Como disse, sendo tudo o que ela
precisava. Mas falhei e não consegui tirar a dor de dentro dela, ela ergueu
muros altos e mesmo eu batendo, tentando escalar, meter uma bomba, eu não a
alcancei. Melissa ficou inatingível. Eu tentei fazê-la sentir-se inteira. Mas
todos os meus remendos não conseguiram parar o seu sangramento. Não
consegui acabar com sua dor, por mais que eu tentasse. Mas nunca desisti,
nunca saí do seu lado. Mesmo quando ela dizia que não me queria por perto,
que não precisava de mim, mesmo sabendo que nada mais havia restado, eu
permanecia ao seu lado porque sabia que ela não tinha mais ninguém.
Ela passou por momentos muito escuros, como naquela noite de
merda. Nunca mais consegui dormir por mais de alguns minutos seguidos
depois daquilo. Continuo acordando de hora em hora e checando o celular
para ver se há alguma outra mensagem como daquela madrugada dos diabos.
Quando a mensagem chegou eu gelei. Liguei em seguida para ela, mas
ela não atendeu. Joguei a coberta longe e pulei da cama, algo muito ruim
agarrando meu espírito.
Peguei o carro e voei para o apartamento dela, ao mesmo tempo que
chamava uma ambulância, polícia, bombeiros, Deus... Não me importei se
estava exagerando, porque eu sabia que Melissa não estava brincando e tinha
feito uma merda. Quando cheguei bati, e como ninguém atendeu arrombei a
porta, não havia sinal dela em lugar nenhum foi então que notei a porta do
banheiro trancada. Bati e nada. Insisti e como não ouvi sinal meti o pé.
Nunca vou esquecer aquela cena. Por mais coisas horríveis que minha
profissão tenha me feito ver, ou a minha vida de merda tenha colocado na
minha frente, ver Melissa caída em uma poça de sangue com uma enorme faca
do lado foi demais para meu juízo. Quase fiquei louco de vez.
Corri, a peguei nos braços. Ela não poderia morrer. Eu não iria
permitir. Eu desceria ao inferno para busca-la, daria minha própria vida ao
diabo em troca da dela. Melissa nunca saberá o quanto morri naquela noite. O
quanto à atitude dela me matou por dentro.
Graças a Deus cheguei a tempo, graças a Deus ela se salvou. Ficou no
hospital um tempo, teve que fazer sessões de terapia com uma psicóloga...
Sei que tudo que ela passou foi demais para ela e perder Anthony foi
a gota d’agua e por isso estive procurando um jeito de trazê-la de volta à
vida, de tirar a frieza dos seus olhos sem emoções. Mas parece que nada
adianta. Que a merda de meus esforços são em vão.
Foi então que eu ganhei uma promoção junto com uma transferência.
Para atuar em uma cidade pequena do Brasil, perto da fronteira, mas muito
linda e tranquila.
Tive que ficar cinco dias fora arrumando os preparativos para minha
transferência, que ainda não aceitei de todo, pois quero conversar com
Melissa primeiro. Nestes cinco dias eu liguei todas as horas que estava sem
nada para fazer, mas ela raramente atendeu.
E a primeira coisa que fiz depois de chegar e dar comida para Brutos,
foi passar no supermercado e correr para cá, para ver ela e Anthony.
Quando bato na porta dela a resposta é uma só:
— Vá embora! — ela diz com voz abafada.
— Sabe que posso voltar com um mandado, então abre logo, ratinha!
— eu digo, pois depois que tudo aconteceu ela parece com isso, emagreceu
muito, está pálida como um fantasma e vive se escondendo.
Uma ratinha.
— Vai embora seu chato! — ela reclama, mas mesmo assim eu
continuo esperando a porta abrir.
Sou o único que a visita agora, antes aqueles amigos do 109 vinham, o
estrangeiro e o nerd, mas ela ficava ainda pior com a presença deles, até que
eles notaram e param de vir, mas volta e meia um número confidencial me
liga e sei que é um deles para me perguntar como ela está.
Eu venho todos os dias, trago o que lembro, compras, presentes para
Anthony, comida pronta e besteiras para o meu menino e para ela. Tudo o que
me faz lembrar deles quando estou em serviço, ou passando na rua eu trago.
Ela abre a porta e meu coração recebe um soco forte. As olheiras
estão muito escuras, o rosto ainda mais magro, mostrando as maçãs agora
salientes. Ela tem os cabelos sujos e despenteados e veste uma roupa imunda.
Faz tempo que ela está assim, mas estes dias fora fizeram a visão ser um
choque para mim. Melissa continua apenas uma sombra da mulher que um dia
foi.
Sem me conter eu a abraço forte, mesmo sabendo que ela não gosta
que a toquem, depois do que aconteceu. Mas a visão da patricinha de rosa,
arrogante, tempestuosa e cheia de vida que conheci apareceu em minha mente
e não consigo evitar que meus olhos fiquem úmidos.
— Sentiu saudades, ratinha? — pergunto para disfarçar minha atitude,
quando a sinto rígida em meus braços.
Desvio o olhar e a solto, entrando no apartamento minúsculo que ela
vive agora, e que está virado de pernas para o ar, metade das coisas ainda
estão nas caixas e o restante espalhado.
— Quase — ela responde sem emoção.
— Pois eu senti! E cadê meu melhor amigo? Esqueceu de mim? — eu
digo em voz alta e Anthony aparece vindo do quarto correndo em minha
direção, e me abraça as pernas.
— Saulo! — ele grita feliz.
Ele está o oposto de Melissa, gordinho, limpo e forte. Ela cuida
apenas dele, ele é a linha tênue que segura Melissa à vida. É nítido que ela se
esforça para viver por ele.
Eu me abaixo e o abraço para depois bagunçar seus cabelos claros.
Melissa se sentou no sofá e está lendo um livro, alheia a mim e Anthony.
— Vamos ver o que eu trouxe para você hoje? — eu abro algumas
sacolas e ele me ajuda pegando tudo que acha interessante, iogurte, bolacha,
chocolate... Enche os braços e leva até Melissa, lhe mostrando.
— Abi, mamãe! Saulo toxi doce pa mim! Saulo volto! — ele pede a
ela com os olhos brilhando e ela volta ao mundo.
— Doces, Saulo? Há esta hora? Ele não vai dormir! — ela torce a
boca, em seu típico mal humor.
Nunca mais vi Melissa dar um sorriso. Nunca mais.
Eu me levanto e começo a guardar as compras. Anthony come seus
doces na frente de um desenho colorido que passa na TV e Melissa voltou a
sua leitura.
Depois de um tempo coloco a pizza congelada no forno e abro a
Coca-Cola.
— Tenho novidades! — anuncio sentando na frente dela.
— Hummm. — é a resposta sem erguer as vistas do livro.
— Vou ser transferido. — aviso e espero a sua reação.
— Legal. — ela vira a página do romance.
— É uma cidade longe e pequena, muito bonita. — eu continuo e ela
agora levanta os olhos.
— Quando vai ir? — pergunta sem emoção.
— Se der tudo certo, mês que vem já estou morando lá.
Ela concorda com a cabeça e volta a ler.
Isso não vai ser fácil.
Me levanto e retiro a pizza do forno, corto, coloco no prato e levo
uma fatia para ela, e pedaços cortados pequenos para Anthony.
— Não estou com fome — ela diz e esfria os de Anthony que come
sem desviar os olhos do desenho, e as vezes fala algo me mostrando o que
passa ali.
— Poxa, que legal! E o carrinho novo? Ainda está inteiro ou já
quebrou? — eu pergunto e ele sai correndo pegar o jipe vermelho que lhe
trouxe estes dias.
— Só aqui! — ele me mostra o para-lama trincado.
— Ei, você passou por cima de uma pedra com ele? Estava em uma
missão?
Anthony ri. Ele adora fingir ser policial, e eu lhe conto muitas
histórias, boas histórias quero dizer, não as merdas que realmente acontecem.
Eu não menti quando disse que ele é meu melhor amigo.
Melissa não diz mais nada, alheia outra vez aos acontecimentos.
Anthony começa a brincar com seus carrinhos e vai para o quarto, fazendo
seus efeitos de som, como "puft", "bum" e "tictic". Sorrio, mas não consigo
comer.
— Quero que vocês vão junto comigo, Mel. Cidade nova, vida nova.
— me dirijo a ela que ergue os olhos e depois baixa-os outra vez.
— Não. Obrigada.
— Vocês não podem ficar aqui fechados! Quanto tempo já faz que está
assim, ratinha? Seis, sete meses? Mais? E neste tempo quantas vezes levou
Anthony para passear?
— Não sei... — ela parece perdida.
— Pois eu sei. Cinco. Cinco vezes e eu tive que te arrastar para fora,
e mais algumas que você não quis ir e eu levei ele sozinho. Você não pode se
enterrar assim, vocês precisam viver, ser felizes, esquecer o que aconteceu e
não ficar com medo de tudo...
— Pare, Saulo! Já conversamos sobre isso! Não quero começar isso
outra vez! — ela se irrita e se levanta, indo para a cozinha com o prato.
Eu vou atrás dela, ela irritada é melhor do que apática.
— A casa lá é grande e há espaço para Anthony brincar. Tem um
quarto para cada um de nós, e uma faculdade não muito longe. Você pode
voltar com os estudos...
— Pare, Saulo! — ela ergue a voz e me encara com os olhos cheios
de lágrimas. — Eu-não-quero! — termina entre dentes.
— Por quê? — pergunto sem me mexer.
Ela treme o queixo prestes a cair no choro.
— Não quero estragar sua vida! Eu... eu não tenho mais uma vida...
Olha pra mim! Olha o que virei. Sou só um lixo, um remendo... Eu mal
consigo sair de casa. Eu me esforço todas as manhãs para sair da cama.
Agradeço a Deus por estar viva, e por ter meu pequeno para poder cuidar. Eu
me esforço tanto para esquecer, Saulo. Para seguir em frente... Mas eu não
consigo — ela chora agora abertamente e eu me aproximo. — Não chegue
perto. Eu... Eu quero que vá embora.
Ela diz com voz falhando e eu paro meu avanço. Depois do que
aquele desgraçado filho de uma cadela do Goulart fez com ela, até mesmo um
simples toque faz com que ela dê um pulo ou fique apreensiva. Com exceção
daquele dia no hospital ela nunca mais me deixou toca-la e ter permitido que
eu a abraçasse por cinco segundos antes, foi a maior prova de que ela sentiu
minha falta.
— Me deixe cuidar de vocês, ratinha — eu peço.
— Não faça essa carinha de cachorro perdido para mim, Saulo! Eu
não tenho mais um coração para se derreter por ela! — ela diz amarga
limpando as lágrimas.
— Tem sim, Mel. E ele está naquele quarto, brincando de carrinho —
aponto para onde está Anthony. — É por ele que você tem que ser forte. Por
ele que deve seguir em frente. Não te peço nada, Melissa, não espero nada, só
não posso deixar vocês aqui. Vocês são as únicas pessoas importantes que
tenho. Minha única família.
Dou outro passo na direção dela e inacreditavelmente ela não se
esquiva desta vez.
Paro bem diante dela e continuo:
— Vem comigo, ratinha. Seremos apenas dois adultos dividindo uma
casa e criando uma criança, pode até pensar em mim como o seu amigo gay
que não me importo, já te disse isso. Mas não fique mais sozinha. Eu também
não quero mais ficar sozinho. Por que acha que venho aqui todos os dias,
aguentando esse seu humor dos diabos e esse fedorzinho? É só porque não
tenho mais ninguém que me suporte também! — digo sorrindo antevendo a
resposta dela.
— Ei! — ela me encara. — Fedorzinho?!
Eu rio da cara chocada dela.
— Nada insuportável, lhe asseguro.
Ela parece que ficou com vergonha e abaixa o rosto muito vermelha,
eu me arrependo da brincadeira e me atrevo a erguer seu queixo, suavemente,
até ela me olhar outra vez nos olhos.
— Vamos embora daqui, ratinha? Vamos esquecer nossas tragédias e
começar uma vida nova, conhecer lugares novos? Criar Anthony como se
deve. O que me diz?
Nesse meio ano que se passou dividi com Melissa minhas dores,
minhas mágoas. Ela mais do que ninguém sabe o quanto a perda de meus pais
e mais tarde de minha irmã a quem eu amava como filha, me destruiu.
Ela me olha dentro dos olhos, parecendo mirar o fundo de minha alma
e irrompe em um choro forte e concorda com a cabeça, cedendo.
Sem me conter eu a abraço de leve, pois ela está tão magra e pequena
que temo quebrar alguma coisa, mas para meu espanto maior ela não se
esquiva, mas sim me aperta em sua fraqueza apática, deitando a cabeça no
meu peito.
— Como conseguiu, Saulo? — ela me pergunta ainda chorando contra
minha camiseta.
— O que, ratinha? — estou meio sem ação com essa atitude dela, com
essa demonstração, não de carinho, mas de confiança que ela me deu agora.
— Depois das coisas horríveis que te aconteceram como conseguiu
voltar a respirar? Quando essa dor vai passar? — sua voz tem tanto
sofrimento que eu afago seus cabelos para disfarçar a dor que eu próprio
senti em meu peito.
— Não vai passar, Mel, mas vai ficar mais suportável com o tempo.
Eu estarei do seu lado, ratinha, se apoie em mim até sentir suas forças
voltarem, até que sua dor passe eu te carrego.
— É isso que um soldado faz nos campos de batalha, não é? — ela
ainda me abraça e eu sinto o impossível: meu coração se encher ainda mais
de amor por ela.
— Também. Mas principalmente: é o que o amor faz.
31 — Rosas Para Mim? 2
Faz um mês que mudamos de cidade, de casa, de vida. Faz um mês que
divido meus dias e noites com Saulo.
Não é dividir noite "daquele" jeito. Não. É dividir gritos, pesadelos,
febre de Anthony e muita insônia.
Ler virou meu refúgio. A leitura aprisiona minha mente e não penso
em nada. Leio até quando estou lavando a louça. Só paro para atender de
Anthony e fingir para ele que está tudo bem. Continuo me esforçando para
fazer ele feliz. E Saulo me ajuda muito com isso também.
Sei que estou doente. Sei disso. Mas não consigo evitar. Me sinto
presa no fundo de um poço, escuro, apertado e solitário. Vejo a abertura
acima de mim. O mundo a vida ali, existindo. Mas simplesmente não consigo
sair. Não quero sair. Tenho medo de sair. Meu poço está seguro. Sei o que
esperar aqui dentro, sei o que tenho aqui dentro e estou conformada com isso.
Teve momentos que achei que estava sozinha, mas agora vejo que
sempre tive Anthony (mesmo quando estava longe de mim, ele sempre esteve
comigo aqui dentro) e agora tenho Saulo também.
Saulo foi meu anjo protetor e está sendo até hoje. Por mais que eu
tente esquecer aquela noite em que tentei suicídio, não consigo. Às vezes, em
dias tristes e sombrios eu me lembro do que tentei fazer, do que senti quando
abandonei tudo. E do enorme alívio que me invadiu quando acordei no
hospital. Saulo me salvou, depois que enviei a mensagem em minutos chegou
ao meu apartamento e arrombou as portas em desespero. Me levou para o
hospital e devo minha vida a ele. Não apenas naquela noite, mas em todas as
outras noites sombrias que passei, ele cantava para Anthony dormir, e em
minha crises de ansiedade cantava para mim também. Foram momentos
difíceis, feios, escuros e tristes. E ele sempre estava lá. Atendia ao telefone
quando eu ligava, corria para me ajudar em qualquer coisa. Me visitava todos
os dias, levava Anthony para passear e eu também.
Uma vez eu disse para Isaac que a minha música preferida me
lembrava ele. Mas agora vejo que não é verdade. Quem esteve a uma ligação
de distancia e que nem Superman seria páreo foi Saulo.
Saulo foi meu amigo, meu irmão, meu anjo, meu protetor, meu
companheiro.
Virou parte de mim, assim como Anthony.
Costumo pensar que Saulo é meus pulmões e Anthony meu coração.
Por eles eu levanto todas as manhãs e tento dar o melhor de mim. E
isso é a prova que os amo e me preocupo com eles.
Evito pensar no que passou, evito olhar para trás e lembrar do que fui,
do que achei que seria meu futuro. Evito pensar em Isaac e no que aconteceu a
ele e a mim naquela noite.
Aperto os lábios, não vou chorar outra vez!
Foco nos cabelos de Anthony que estou lavando. Ele está brincando
na grande banheira que tem aqui na suíte e que Saulo deixou que eu ficasse e
fizesse de meu quarto, Anthony dorme comigo, mas tem um quarto lindo só
para ele, que decoramos com vários carros de polícia. Anthony o admira e o
idolatra, Saulo faz por merecer a atenção. Anthony está querendo dormir
sozinho e às vezes dorme no quarto novo. Está querendo ser homem. Eu acho
isso algo estranho, já que até alguns dias atrás meu príncipe era apenas um
bebê que usava fraldas! Agora já quer ser macho.
Me permito dar um pequeno sorriso.
Anthony parou a brincadeira e me encara com o sorriso do tamanho
do mundo.
— O que foi? — eu pergunto pois devo ter perdido algo, como
sempre.
— Tá feliz, mamãe? — ele pergunta animado.
O baque é grande no meu estômago, quando noto que um pequeno
sorriso meu é visto como algo excepcional por meu filho.
— Sim, estou, meu lindo. Coloque a cabeça para trás para eu
enxaguar. Isso — eu digo enquanto termino de lavar os cabelinhos.
— Não vai mais chola? — ele pergunta desconfiado.
Eu mordo o lábio para disfarçar e não cair em prantos, ou melhor:
"chola".
— Não, meu amor. Mamãe é muito feliz. Porque você está aqui
comigo — eu digo e as palavras em voz alta parecem me empurrar para cima
do meu poço profundo, pois são a mais pura verdade.
— E Saulo! — ele concorda.
— Sim, e Saulo também — dou outro sorriso.
— E Butos! — ele já diz rindo.
Eu fecho a cara para ele.
— Brutos não! — eu nego e ele ri mais ainda. — Brutos é fedido!
— Não é não! — ele defende porque ama aquele pulguento. — Você
também tá xidida e ele não diz nada!
Eu me surpreendo.
— Eu estou fedida? — pergunto e ergo o braço para cheirar debaixo
dele.
Sim. Estou fedida. Muito.
Anthony me olha com carinha de arrependido. Me lembra Saulo que
consegue fazer a mesma expressão.
— Só poquinho assim — ele junta dois dedinhos para medir o meu
grau de porquice.
— Então vou ter que tomar banho depois de você! — eu aviso, já com
a toalha para tirá-lo da banheira. — Mas vamos esperar Saulo chegar para
tomar conta de você...
— Quem está cheiroso assim? — a voz de Saulo soa na estrada do
quarto.
— Eu!!! — Anthony grita.
Eu o carrego até a cama e começo a vesti—lo.
— Se arrume que eu trouxe uma coisa para você — ele diz sorrindo
para Anthony, pisca um olho para mim e sai do quarto.
— Ligelo, mamãe! Ligelo! — Anthony está eufórico e bate palmas.
Eu o visto o mais depressa possível e ele sai correndo em disparada
pela porta quando acha que está pronto.
Quando chegamos à grande e ampla sala, Saulo tem uma caixa de
presente com um laço grande.
— Senta aqui, campeão — ele aponta para o tapete felpudo, e
Anthony o obedece, ele senta na frente dele com a caixa na mão. — Hoje é
aniversário de um mês que estamos morando nessa casa. Você gosta de morar
aqui?
— Gosto!
— Eu também! Então eu quero que você goste ainda mais. Pode abrir,
mas não sacode.
Ele coloca a caixa na frente de Anthony que olha paga mim, não para
pedir permissão, mas para ver se estou vendo o que está acontecendo. Saulo
acompanha o movimento e parece se surpreender em me ver aqui, os
observando.
— Vem cá, ratinha! Senta aqui com nós — ele bate do lado dele no
tapete.
— Mamãe vai toma banho, poque tá muito xidida... — ele diz com
naturalidade enquanto abre o laço e Saulo cai na risada.
Então Anthony para, abre a boca, olha para dentro da caixa e vejo
meu filho fazer cara de choro.
— É pa eu? — ele pergunta a Saulo que ficou quieto.
— É sim, mas se você não quiser... — ele começa sem jeito e eu me
aproximo de Anthony que está fazendo beicinho e retira um cachorrinho de
olhos brilhantes, muito vivo, de dentro da caixa e o aperta nos braços, uma
versão bebê do tal de Brutos. Um pastor alemão, um cão policial filhote.
Nunca imaginei que uma criança pequena pudesse chorar de
felicidade, mas Anthony está fazendo isso.
— Oh, campeão... Não chora... — Saulo o pega no colo com cachorro
e tudo. — Não ficou feliz?
Anthony acede com a cabeça, ainda chorando baixinho ainda
apertando o filhotinho com carinho, como se fosse a coisa mais preciosa do
mundo.
Eu me aproximo e sento ao lado deles.
— Ele é lindo, filho. Já pensou em um nome para ele? — digo
fazendo carinho no bichinho.
Ele sacode a cabeça e sorri, mesmo com lágrimas. Eu limpo o
rostinho.
— Acho eu vo bota... dexa eu vê... — ele finge que pensa. — Butos!
— Ei, Brutos vai ficar com ciúmes se você der o mesmo nome para
esse aí! — Saulo faz carinho no bichinho e eu me levanto.
— Vou tomar banho enquanto vocês decidem. — aviso.
Saulo me olha e parece lembrar quando diz:
— Trouxe uma coisa para você também. — ele diz e coloca Anthony e
o cãozinho no chão, se levanta e vai até o quarto dele, sai de lá com um buquê
de rosas cor de rosas e uma sacola.
Meu coração congela. As mesmas rosas que Isaac, me enviava.
Pego-as com as mãos tremendo e noto que não são iguais as de Isaac,
pois ele me enviava rosas enormes, com miolos quase pink. Porém Saulo me
deu botões delicados de um lindo rosa pálido, com miúdas flores brancas
enfeitando e um grande laço de cetim rosa.
— É lindo — eu deixo escapar, pois estou impressionada com a
delicadeza do arranjo, com o romantismo da composição. — Obrigada!
Saulo sorri sem jeito, aquele sorriso charmoso que só ele tem e me
entrega a sacola.
— Achei também que gostaria disso aqui.
— Mais? Isso não é justo, eu não sabia que hoje era um dia especial...
— se soubesse teria saído e comprado algo para ele também...
— Todos os dias ao lado de vocês são especiais para mim. Mas hoje
faz um mês que você aceitou que eu fizesse parte da vida de vocês e também
é dia da mulher. Então...
Eu sinto meus olhos se encherem de lágrimas e mesmo não suportando
que me toquem por causa do que me aconteceu, dou um passo para abraça-lo,
mas me lembro que estou "xidida" e não chego perto.
— Depois que eu tomar o meu banho eu vou te dar um abraço! — eu
digo e ele me encara surpreso.
— Vou cobrar! — diz com um sorriso enorme e bonito que sou
obrigada a retribuir. — Mas seu sorriso é o melhor agradecimento que
poderia me dar... — ele diz e eu fico absolutamente sem jeito.
— Isso e um abraço do meu melhor amigo! Onde está meu abraço? —
ele se senta outra vez no tapete junto com Anthony e o cãozinho que brincam.
Eu vou até o quarto e abro meu presente, jogando o conteúdo na cama.
Não acredito que ele me deu isso!
Ergo a camisola linda de renda e seda rosa, com calcinha, robe e até
chinelinhos combinando. Não é algo devasso e nem nada disso, é delicada e
de muito bom gosto, feminina e que me faz perceber que sou uma mulher.
Difícil confessar isso, mas tem muito tempo que não me vejo mais como
mulher. Sou uma sombra, a mãe de Anthony. Só.
Depois do que aconteceu, da violência daquele porco comigo eu não
consigo mais pensar em nada que me lembre vagamente o ato de duas pessoas
juntas... Até agora, eu me encolho diante da lembrança. Provavelmente eu
jamais irei chegar perto de um homem outra vez nesta vida...
Mas quantas vezes acordei de meus pesadelos com Saulo me
abraçando, me consolando? Eu não tinha medo.
Quantas vezes quando acordei pela manhã ele estava sentado na
poltrona ao lado da cama, dormindo depois de passar boa parte da noite
vigiando o meu sono e o de Anthony? E tenho certeza que não era por algo
sórdido.
Mas é porque em Saulo eu confio. Ele jamais me faria mal. Ele é
como eu mesma, só que forte. Meu apoio. Meu parceiro de batalha. A tábua
de salvação que não me deixou afundar no meu poço de tristezas.
Com certeza ele notou minhas roupas de dormir precárias, minha falta
de vaidade ou interesse em qualquer coisa... Afinal a peça é muito diferente
da minha calça de moletom e camiseta furada que ando usando para dormir.
Será que estou tão terrível assim?
Ergo os olhos e me observo no espelho. Quase não me reconheço.
Estou magra, maltratada. Envelheci uns 10 anos! Meus cabelos estão
horríveis! Sem contar na sobrancelha que está um mato só! Meu pai, nem
imagino como deve estar minhas pernas e todo o resto...
Corro para o banheiro, levando a lâmina de barbear e tomo banho
como há tempos não fazia. Com capricho, com cuidado e prezando cada parte
do meu corpo e cabelos.
Demoro mais do que deveria e coloco um vestido soltinho e floral
para "comemorar" essa noite. Joguei minha calça de moletom no lixo.
Aquele espelho me deu um susto grande, nunca imaginei que estava
naquele estado tão deplorável! E Saulo compra aquilo tão delico. Dia da
mulher ele disse. Pareço um zumbi e não uma mulher.
Fiz um esforço e passei até um pouco de maquiagem e perfume,
mesmo achando inútil, mesmo querendo voltar para minha apatia, eu acho que
Anthony e Saulo merecem um pouco mais de mim.
Quando entro na sala, só encontro Anthony e o cachorrinho. Dou um
beijo no meu pequeno e sento no sofá.
— Bolt! — ele chama o bicho que corre até ele.
Anthony ri e corre para outro lado e chama o cachorro de novo.
— Bolt! — esse corre para ele de novo.
— Viu só? Agora ele já está aprendendo o nome dele! — Saulo entra
com um pano de prato pendurado no ombro. Quando me vê, sorri. — Já que
hoje é seu dia estou fazendo seu prato favorito: frango xadrez com muito
gengibre e ... — ele se cala porque me levantei.
— Vou colocar a mesa então! — eu digo solícita, mas Saulo não
responde, está com a boca aberta e já não sorri mais. — O que?
Eu pergunto, pois parece que ele viu um fantasma.
Ele abana a cabeça, me olha dos pés a cabeça e solta um assobio.
— Ratinha você está uma gatinha! — ele diz com bom humor. — Viu
como a mamãe está bonita, Anthony?
Ele chama meu menino que para o treinamento do "Bolt" e me olha
fazendo que "sim" com a cabeça.
— Palece uma pincesa! — ele diz e eu lhe mando um beijo que ele
retribui.
Vou para a cozinha pegar os pratos e servir a mesa de jantar, quando
passo por Saulo ele puxa a ponta do meu cabelo.
Me volto e esbarro nele que está muito perto, dou um passo atrás me
sentindo estranha com a proximidade. Estranha não de "ruim". Estranha de
"estranha".
— Gostou do outro presente? — ele pergunta com voz baixa e
profunda que faz meus cabelos da nuca arrepiar.
Que merda é essa?
Engulo o seco.
— Achei lindos, obrigada, Saulo — me viro e tento pegar os pratos
no balcão, mas Saulo se prontifica e sinto o corpo forte nas minhas costas
enquanto ele pega os pratos e me entrega.
Eu tremo tanto que os pratos batem.
— Está bem, ratinha? Quer que eu coloque a mesa?
— Não. Estou bem — eu digo e me viro praticamente correndo para
fora da cozinha.
O que há comigo? Esse tempo todo, a proximidade de Saulo nunca me
afetou! Quantas vezes dormimos até na mesma cama, quando Anthony era
menor e tinha aqueles pesadelos terríveis, antes de voltar a falar, e Saulo
dormia no meu antigo apartamento para me ajudar com ele?
E agora isso?
Na verdade sempre achei Saulo um cara bonito e neste mais de meio
ano que "tudo aconteceu" ele foi muito presente. E aquela camisola, quer
dizer que ele ainda nota que sou uma mulher. E eu ainda lembro dele me
chamando de "meu amor" naquela noite, embora ele ou eu nunca tenhamos
tocado no assunto desde então...
Por que, raios, o meu peito disparou? Isso não tem nada haver com eu
me sentir estranha quando ele chegou perto! Eu estou estranha demais hoje.
Parece que estou notando as coisas que sempre estiveram ali, e que nunca
enxerguei. Na verdade depois de muito, muito tempo pareço acordar. Estou
sonolenta, estou ainda com um pé no mundo dos sonhos, mas, sim, acordei.
32 — Abrindo os Olhos
Certa vez, não me lembro quando, Anthony estava brincando com uma
arminha de brinquedo e diante de muitos "pa-pa-pa", Saulo perguntou o que
ele estava fazendo.
— Matano bandidos, olas! — ele disse como se fosse a coisa mais
normal do mundo.
Saulo se baixou na frente dele e perguntou:
— Você é o que? Um bandido ou um policial?
— Sou puliça! — ele sorriu orgulhoso.
— Aí! Toca aqui, parceiro! — Saulo mostrou a mão e Anthony bateu.
— Mas policial diz assim: "pare ou eu atiro", policial prende, não mata.
Certo?
— Ceto! — Anthony concordou e dali em diante "Pale ou eu atilo"
virou a frase mais ouvida aqui em casa.
Gosto dos valores que Saulo ensina a Anthony, não que Saulo di Santi
seja perfeito, ou que policiais sejam perfeitos, mas ele quer mostrar o melhor
a Anthony, o melhor que se deve ser. Me lembro da frase que Isaac disse uma
vez, que achava que não tinha nada de bom a ensinar para o moleque.
O que ele ensinaria?
Isso também faz parte das coisas que eu estou evitando pensar
ultimamente.
Desde que estou trabalhando sinto que sai do poço. Também estou
estudando para o vestibular nas horas vagas, mas Marcele, minha colega me
disse que meus muros são visíveis. Talvez eu devesse conversar na hora do
intervalo ao invés de ir para o canto comer quieta. Talvez devesse interagir
com os outros ao invés de apenas ler/estudar quando tenho um tempo vago.
Estou tentando mudar isso também. Mas é difícil. Parece que quem olhar nos
meus olhos vai ler tudo que eu passei, tudo o que sinto aqui dentro. Por isso
só socializo o necessário.
Já há algum tempo Saulo trouxe alguns amigos para nos fazerem uma
visita. O homem, Carlos, é seu colega e casado com Nicole que é corretora
de imóveis, a filha deles, Cecilia, tem 6 anos e ama brincar com Anthony.
São pessoas legais e criamos uma amizade "legal". Nicole não
pergunta nada pessoal e fala pelos cotovelos em uma energia invejável.
Daquelas pessoas ligadas no 220 volts, sabe? Eu apenas escuto, sorrio as
vezes quando me perguntam alguma coisa e os nossos encontros familiares
transcorrem bem.
Eu evito Saulo.
Sim. Eu sei que é muita ingratidão da minha parte, mas eu não me
sinto mais "normal" próxima dele. Já estava tudo estranho desde aquele jantar
de um mês de moradia nova, mas semana passada as coisas pioraram tipo
MUITO.
Era madrugada quando Brutos (o grande) começou a latir. Brutos
nunca late. Anthony estava dormindo no quarto dele, com Bolt na cama, aos
pés dele. E quando Brutos latiu eu levantei de um pulo, e corri para ver meu
filho, encontrei com Saulo no corredor apenas de cueca boxer branca e
pistola na mão e estagnei no lugar.
O físico perfeito, com músculos suficientes para o fazer ser um cara
grande, mas nada em excesso. As coxas são absolutamente lindas e
musculosas, e ele tem pelos curtos e claros pelo distribuído pelo peito,
pernas, braços e abdômen que fazem uma combinação perfeita com a pele
muita clara e bonita que estava de fora, eu não me movi. Não respirei.
Ele me olhou e colocou um dedo na boca pedindo silêncio e continuou
caminhando sorrateiramente pela casa até chegar à porta da frente, onde
Brutos estava quieto olhando para ela atento e parecendo hipnotizado.
Saulo virou de costas e vi, nas costas lindas e musculosas dele uma
enorme tatuagem de São Jorge que eu nunca notei antes. Como nunca reparei
nisso? E a bundinha malhada coberta pela boxer branca, fez com que eu desse
meia volta e corresse para dentro do quarto de Anthony com o coração aos
saltos.
— Merda! — eu disse me encostando na porta fechada, achando que
estava tendo algum ataque psicológico esquizofrênico esquisito.
— Mamãe? — Anthony me chamou sonolento, esfregando os olhinhos.
— Shhhhh! Fica quietinho anjinho, estou aqui — eu tentei lhe
tranquilizar me sentando do lado dele na cama.
O silêncio lá fora era angustiante e então eu escutei Brutos avançar
latindo para alguém e depois disso um tiro.
Anthony cobriu os ouvidos com as mãos e eu o apertei forte, meu
coração parando algumas batidas para depois voltar em ritmo total, quase me
fazendo enfartar.
— Anthony, meu lindo, fique aqui com Bolt, que a mamãe precisa
pegar o celular. Ok?
— Que balulho foi esse, mamãe? — ele ainda estava com medo.
— Vou ver, meu príncipe. Já volto, cuide de Bolt, ok? — eu me
levantei e corri para a sala para pegar o celular e chamar a polícia, ou
melhor: reforços.
Onde estava Saulo? Pelo amor de Deus! Eu não podia sair e não
podia fazer nada!
Disquei 190 com a mão tremendo e quando eu vi, Saulo abriu a porta
entrando e pegando algo de dentro da gaveta do aparador... Uma algema!
Ele saiu e voltou outra vez depois de uns dois minutos.
— Um vagabundo querendo entrar na casa. Tinha outro, mas ele fugiu
— anunciou.
Olhou para mim, com olhos preocupados e o medo terrível que senti
de que alguma coisa acontecesse com ele foi aliviado instantaneamente e
quase cai em choro. Em momento de louca alegria corri até ele é o abracei.
— Nunca mais faça isso! — eu briguei. — Onde já se viu, enfrentar
dois bandidos sozinho!
Ele riu baixinho.
— Não se preocupe, ratinha. É isso que eu faço. É minha obrigação.
Ninguém vai chegar perto da minha família comigo e Brutos aqui.
Família. A palavra ecoou no meu coração machucado o deixando com
uma sensação estranho.
Então me dei conta que ele estava apenas de cuecas, e o larguei
quando comecei a tomar consciência não apenas disso, mas também do calor
do corpo dele, do perfume que sempre me tranquilizou, da textura macia da
sua pele.
— Onde está Brutos? — perguntei sem jeito nenhum, me afastando
alguns passos, colocando alguma distância entre nós.
— Vigiando o meliante — ele disse parecendo não se afetar como eu,
enquanto pegava o telefone das minhas mãos, supertranquilo em estar apenas
de cuecas na minha frente.
Só eu estou incomodada com isso? Helloooouu?
— Você o matou? — eu me obriguei a perguntar.
— Não. Derrubei um que está no quintal e o outro que fugiu eu acertei
na perna...
— Ele não palou quando você mandô, pai? — Anthony chegou
carregando Bolt e pegando a nós dois de surpresa.
Mas o que deixou ambos chocados, foi o "pai".
A voz no celular perguntava: "di Santi? Alô?”.
Saulo falou, voltando a realidade:
— Um minuto, Cortês! — depois voltou a sua atenção para Anthony.
— Não campeão, ele não parou, e eu não atirei para matar. Certo? Ele será
preso, como deve ser. Agora por que não leva a mamãe até o quarto? Acho
que ela está com medo. — ele sussurrou o final da frase para Anthony e
depois piscou um olho para mim.
— Tá com medo, mamãe? — Anthony me perguntou sorrindo, se
achando muito corajoso, provavelmente.
— Muito. Pode ficar comigo? — perguntei a ele que pegou minha
mão.
— Vamu lá plu quato, então! — ele me arrastou praticamente.
Saulo voltou para a sua ligação e foi entrando no próprio quarto,
certamente para se vestir, mas antes de entrar ele me lançou um olhar, um
olhar tranquilizador, de força, de segurança e que fez meu peito disparar outra
vez.
TPM. É isso. Tenho certeza. Que outro motivo teria para agir assim
perto de Saulo?
Não conversei com Anthony sobre o episódio "pai", talvez deva ser
por causa da escola, ou de Cecilia chamando Carlos toda hora de pai, só sei
que não quero ter que explicar mil coisas para meu pequeno, e por isso às
vezes ele aparece com isso de "pai". Saulo fica no céu e eu envergonhada no
último! Parece que estou impondo a nossa presença a Saulo. Ele merece ter
uma família, filhos, esposa. Parece que ele brinca de casinha conosco, e está
feliz com isso. Ele deveria começar a sair com alguém, por mais que essa
ideia me soe estranha, e eu não goste de como isso me soe, é o certo. Se ele
arrumar uma namorada eu vou parar de ficar reparando no corpo dele, no
sorriso, na maneira com que passa a mão pelos cabelos bagunçados...
Definitivamente isso não está me fazendo bem.
Hoje coloquei a mesa do café e Anthony está comendo o seu cereal,
como sempre.
Estou tomando suco e quase me engasgo quando Saulo entra na
cozinha totalmente vestido de PF, coturno, farda escura, colete a prova de
balas, arma na cintura...
Odeio ver ele assim, odeio o que eu sinto quando vejo ele assim, ou
melhor odeio o estremecimento do meu corpo e o acelerar do meu peito
quando vejo ele assim.
Crush.
A palavra que um dia definiu Saulo para mim volta a minha mente.
Não é tesão, é algo que não sei definir. E nem quero. Obrigada, de
nada.
— Bom dia! — ele dá um beijo no topo da cabeça de Anthony e outro
na minha.
Saulo não me trata como mulher, me trata como amiga, como irmã!
Isso sempre foi o que eu mais gostava nele, mas ultimamente e mais
especificamente essa manhã, está me irritando.
— Já vai sair? — eu pergunto, pois ele nem sentou, está se servindo
de café em pé ainda.
— Já, estou atrasado, mas volto cedo, volto com você — ele diz
enquanto toma o café preto.
— Não precisa. Por que não sai? Hoje é sexta-feira, se divirta, vá
para uma balada, namore! Afinal você é solteiro! — digo amarga.
Saulo estreita os olhos para mim.
— Sei disso, Melissa. — diz muito sério e termina de tomar o café, se
levanta, colocando o óculos de sol estilo Rayban, ficando lindo de vez. —
Até mais tarde, parceiro — ele diz a Anthony e lhe dá outro beijo na testa.
Passando por mim diz apenas:
— Volto com você, não preciso ir para uma balada para arranjar
namorada. A propósito, hoje a noite Carlos e Nicole virão jantar e vão trazer
Soraia, a irmã de Carlos.
— Como assim? Quem é essa?! — eu pergunto me levantando e indo
atrás dele. — Você já conhece ela?
— Claro. Ela era namorada de um outro colega nosso. Agora está
passando um tempo ali na casa de Carlos...
— Como sabe disso? Nicole não me disse nada! — eu o enfrento de
braços cruzados.
Saulo me observa através dos óculos escuros.
— Encontrei com ela ontem casualmente, depois durante o almoço ela
me contou sobre a separação...
— Almoço?! Vocês almoçaram juntos ontem?!
Saulo me dá um sorriso de lado:
— Como eu disse, não preciso de balada. Até depois, Melissa — ele
passa por mim e me deixa para trás, louca para jogar uma pedra na bunda
linda dele!
Ahhhhhhhhh!
Nunca imaginei que poderia jantar com alguém e querer mata-lá sufocada
com o purê de batatas, mas estou pensando nisso.
Soraia.
— Saulo, você não existe! — ela ri vulgarmente, enquanto sacode a
cabeça e os seios enormes, provavelmente silicone, pegando na mão de Saulo
sobre a mesa e o jantar que engoli a contra gosto, quase volta sozinho.
— Com licença — eu digo me levantando, sem aguentar mais a
babação dessa mulher encima de Saulo.
Retiro os pratos, sem me importar se todos já comeram. Esse jantar já
demorou mais do que deveria.
Levo tudo para a pia, Anthony e Cecilia já estão brincando de correr
com Bolt e eu me enfio na cozinha sem querer olhar para a cara ninguém.
TPM. Só pode ser isso. Por que outro motivo eu estaria com esse
humor dos diabos?
Quando a voz insuportável que me azucrinou o juízo a noite toda fala
atrás de mim eu tenho vontade de jogar um prato sujo nas fuças dela:
— Quer ajuda, Melissa? — Soraia diz em solicitude fingida.
Parece que tudo é fingido ali. Claro que ela não gosta de mim. Como
vai gostar da mulher que vive com o cara que ela tão descaradamente está
dando encima?
— Não, Soraia, você pode descolar uma das suas unhas postiças.
Obrigada — digo revirando os olhos e voltando para os pratos sujos.
Escuto a risada dela.
— Ah, bobinha! Não são postiças! Mas eu posso secar, então.
Vejo a mão de manicure perfeita pintada de vermelho e alguns
adesivos de oncinha se estender ao meu lado e pegar um prato, me viro e a
miserável da morena fatal está secando e guardando a louça e eu solto um
suspiro audível.
Com certeza quer provar para Saulo que é boa dona de casa, esposa,
etc! Alguma coisa tem! Ela não estaria com as unhas deste tamanho se fosse
dada a lavar e secar louça!
— Então? — ela começa e eu me preparo mentalmente pelo bote. —
Saulo me contou que vocês são tipo irmãos, faz tempo que se conhecem?
Tipo irmãos?!
Meu coração tem um piti. Daqueles histéricos e sem motivo algum.
Somos como irmãos? É isso que ele sente por mim? Como uma irmã?
E eu me babando por ele de farda? Notando seus mínimos movimentos, o
jeito com que a mão grande e bonita pega na merda de um copo?! O estender
dos músculos das costas quando ele se vira?!
E ele me vê como irmã?!!
Ai Deus, o que é isso? Tô surtando.
— Não muito — respondo sem gosto, lavando mais depressa os
pratos para poder me livrar da panicat o mais rápido possível.
— Eu conheço Saulo há anos! Conheci a irmã dele também, achei que
você fosse se parecer com Camila, mas não parece nenhum pouco. Camila era
linda, sabe? Cabelo natural. Corpo bonito e jovem. Se parecia muito com
Saulo.
Uau, quando veneno em uma fala só!
Ainda bem que andei pintando o cabelo recentemente e não ando mais
desleixando da minha higiene ou aparência, senão o que essa bisca diria se
me visse há alguns meses atrás? Provavelmente me jogaria umas moedinhas,
cheia de "pena".
Respiro fundo e continuo a ensaboar os copos, esse suplício está
quase no fim.
— Sim, eu vi as fotos — respondo por educação, mostrando a ela que
posso não ter conhecido Camila, mas Saulo me contou tudo sobre ela.
— Horrível o que aconteceu com ela, não é? Mas também é muito
burra o que ela queria se envolvendo com um bandido... — ela se cala
abruptamente. — Oh, desculpe, Melissa não quis lhe ofender.
Ela parece falsamente mortificada.
Meu sangue ferve. Sobe todo para a cabeça, minhas bochechas
queimam e minhas mãos tremem.
Saulo escolheu esta hora para entrar na cozinha pegar outra cerveja.
— O que você acha que sabe, sua sirigaita? Acha que me conhece?
Que conheceu Camila? Se acha melhor do que nós que nos apaixonamos por
"bandidos"? Pois para mim, você não passa de uma descarada sem
sentimentos! Uma Maria-Batalhão! E se não sabe essa casa também é minha e
quero que se retire daqui imediatamente! — digo jogando o copo que estava
lavando na pia que se espatifa e secando as mãos no vestido.
— Que merda está acontecendo aqui, Melissa?! — Saulo está parado,
olhos arregalados, ainda com a geladeira aberta.
— A merda é que a próxima vez que você trouxer uma das suas
peguetes para dentro da minha casa eu me mando na mesma hora!!!
Ele olha de Soraia para mim.
— Ela não é minha "peguete"... — ele começa.
— Não me interessa o que ela é sua, afinal somos "tipo irmãos" como
você mesmo disse a ela! — eu imito a voz dela.
Saulo encara Soraia com uma sobrancelha erguida:
— Quando eu lhe disse isso, Soraia?
Soraia faz cara de vítima.
— Achei que tinha sido você, então, deve ter sido Nicole ou Carlos...
— ela coloca um dedo na boca, tentando parecer sensual no mínimo. Vadia!
— Provavelmente foi a mesma pessoa que falou da minha vida
pessoal, para uma mulher que não conheço e nem quero!
Ela me encara com olhos arregalados:
— Eu sei pelos jornais, mas não a julgo, aquele seu bandido era um
pedaço de...
Eu não espero ela continuar, me viro e saio pisando duro, sem olhar
para a cara de ninguém.
— Vamos Anthony, dê adeus a Cecilia, vamos dormir. — digo
pegando o meu menino pelo braço.
— Mais não tô com sono! — Anthony protesta.
Eu fecho a cara para ele e ele nota que não pode discutir.
— Tchau! — ele diz a Cecilia que apenas abana para ele com cara
triste.
Pego a mão dele e me viro para Carlos e Nicole que me fitam pasmos:
— Vocês três serão sempre bem-vindos na minha casa. — me viro e
vou em direção ao meu quarto, mas ainda vejo Saulo e Soraia saindo da
cozinha e elevo a voz. — Se ela não sair daqui em 10 minutos, quem sai sou
eu!
Estou pouco me lixando para educação quando essa mocreia não teve
nenhuma comigo. E Saulo que se lasque! Trazendo puta aqui para dentro para
me ofender!
Se ela não sair, ou Saulo achar ruim eu e Anthony vamos para um
hotel e amanhã eu procuro um apartamento para nós! Se eu quiser até aceito o
dinheiro do "meu bandido"!!! Ora! Que ódio!!!
Levo Anthony para o quarto e vou tirando a roupinha dele e dando
banho, ao contrário do que ele falou, já está na hora de dormir, a janta acabou
saindo tarde. Depois do banho coloco o pijama dele e ele insiste para dormir
no quarto com Bolt. Quando eu o levo noto que a casa está em silêncio.
— Saulo não vai me dá boa noite, mamãe? — Anthony ainda diz antes
de fechar os olhos.
— Saulo deve estar com a "amiguinha" dele, meu querido. Pode
dormir, mamãe está aqui...
— Ei! Vai dormir sem me dar boa noite, parceiro? — Saulo entra no
quarto sem pedir licença.
— Mamãe disse que você tava ca sua amiguinha — Anthony me
entrega.
— Nenhuma amiguinha é mais importante que você. — ele diz a
Anthony e depois me olha nos olhos e completa: — Que vocês. Mesmo
quando não se comportam. — ele completa torcendo a boca.
Eu mordo o lábio para não responder o que ele merece ouvir.
— Eu não me compotei? — Anthony parece confuso, quase ofendido.
— Você sempre se comporta, campeão — Saulo faz carinho na cabeça
dele, bagunçando os cabelinhos. — Boa noite, durma bem... — Saulo começa
a frase que eles repetem todas as noites.
Anthony sorri feliz e completa:
— Sonhe com pelilongos também!
A frase do Rei Leão. Timão e Pumba, os codinomes deles em muitas
brincadeiras.
Eu beijo meu "Timão" e lhe sussurro um "durma com os anjinhos".
Que ele responde com um "você também, mamãe".
Mais cinco minutos ali e ele está ressonando.
Então eu ergo as vistas para Saulo, e observo na claridade da meia-
luz do abajur ele me encarar.
Me levanto e saio dali com queixo erguido. Vou até a cozinha e pego
uma cerveja.
— Vai beber? Agora?! Não é um pouco tarde para começar? — Saulo
parece chocado e eu abro a longneck na frente dele, lhe encarando.
— Sou de maior, solteira e vacinada. Não devo explicações a
ninguém — digo e depois que mil anos eu tomo um gole de cerveja.
Não lembrava que fosse tão amarga!
Mas está gelada e é "proibida" então é o que importa. Estou me
sentindo rebelde hoje!
"Sim, muito rebelde" — a voz de Isaac rindo do que um dia contei
para ele aparece em minha mente.
Não! Não voltem lembranças! Me libertem deste tormento. Me deixem
esquecer! Eu preciso desta paz.
Eu saio da presença de Saulo, querendo largar tudo, cerveja, raiva e
voltar a me encolher em meu canto com minhas cicatrizes, com minhas
tristezas...
— Ah, deve sim! O que foi aquilo? Por que expulsou Soraia daqui
daquele jeito? — ele vem atrás.
— Porque ela é uma bisca e me ofendeu — eu digo me sentando no
sofá e tomando mais uns quatro goles de cerveja que agora parece mais doce.
— Ofendeu quando chamou 109 de bandido? — ele pergunta
calmamente.
Ele está defendendo ela?!
Ergo bem o queixo quando encaro ele e digo:
— Ofendeu quando me chamou de burra e também quando vem dentro
da minha casa se achar melhor do que eu, porque ela só dá para policial!
Idiota! Queria ver se "meu bandido" pegasse ela, ai aquela pose toda iria cair
por terra!
Ihhh, mal comecei a beber já soltei a língua.
Saulo ergue uma sobrancelha:
— Era tão bom assim? — ele me pergunta calmo demais para o meu
gosto. Saulo que eu conheço explode.
— O que você acha? — lhe devolvo, pois tenho certeza que se ele
não comeu aquela periguete, já marcou de comer e isso me dá raiva!
O porquê eu não sei. Mas não estou mais com aquele trauma de
sempre quando penso em sexo, agora tenho só ódio. Ódio de imaginar Saulo
com aquela coisa!
Agora Saulo parece se irritar, pois diz entre dentes elevando a voz,
como há muito tempo não o vejo fazer:
— Acha realmente que quero saber se o miserável do 109 era bom de
cama?! Esqueceu que era eu quem ficava vigiando do lado de fora daquela
maldita porta enquanto ele estava te fodendo e gritando para todo mundo o
que fazia?!
Me ofendo:
— Voltou a ser um filho da mãe, ignorante e estúpido, Saulo?! E se
você ficava era porque queria!!! — eu digo ultrajada, terminando de beber
minha cerveja e levantando para pegar outra.
— Eu ficava para não deixar nenhum vagabundo filho da puta te
espiar, ou acha que eu gostava de ouvir aquela merda toda?! Quase fui
retirado da operação quando quebrei o braço daquele maldito desgraçado que
estava te espiando na sua última visita! Me arrependo todos os dias por não
ter sido o pescoço daquele arrombado! Mas quer saber? Eu sempre fui o
errado, não é? 109 era o cara certo, o bonzinho, o fofo — ele ironiza irado.
— Eu que sou o ignorante e estúpido!
— Isaac me tratava bem! Me chamava de boneca, não de ratinha! Me
queria tanto que fugiu para ficar comigo! Não trouxe uma vagabunda para
esfregar na minha cara! — eu digo amarga, bebendo outra cerveja aos
grandes goles.
— Não esfreguei ninguém na sua cara! Soraia sempre foi minha
amiga, e se convidei Carlos e sua família achei correto convidar ela também!
Mas você dizer que não me lhe trato bem, é muita burrice da sua parte!
— Ah, sim agora sou burra.
— É burra sim, quando compara a porra do que teve com 109 ao que
nos temos...
— Nós não temos nada, Saulo — digo muito séria.
Isso o faz ficar em silêncio. Ele me observa demoradamente, aperta os
lábios e o vejo passar a mão pelos cabelos parecendo tentar se conter.
— Se acha essa merda, não posso mais fazer nada. Desisto. Boa noite,
Melissa. — ele diz e pega a chave do carro e sai pela porta.
Eu corro atrás dele, abro a porta e grito:
— Conseguiu o pretexto para ir se encontrar com ela? — eu lhe digo
antes que entre no carro.
Ele para e me encara.
— Não preciso de pretexto, não temos nada. Lembra? — ele abre a
porta e se senta atrás da direção.
— Isso! Vai! Pode ir! Pode foder aquela vadia até cansar! — eu lhe
digo não sei o porquê, deve ser porque o álcool está me deixando bem locona
e mais a TPM deu essa merda toda.
— Pense pelo lado positivo, Melissa: você não irá precisar escutar
— ele diz e liga o carro, arrancando e saindo pelo portão.
— Filho da puta! — eu grito irada para o portão que se fecha
lentamente me deixando sozinha no pátio.
Volto para dentro e pego outra cerveja bebendo rapidamente. Saulo
me paga! Ah, se me paga!
Vou para o quarto e abro minhas gavetas até encontrar o que eu quero,
minha camisola preta transparente, curtíssima e que comprei em uma loucura
há algum tempo, pensando em uma futura visita a Isaac.
Me visto, arrumo os cabelos, vou para a frente do espelho, bebo mais
alguns goles e me virando de costas empino bem a bunda, fio dental preto e
polpas aparecendo...
Click!
Tiro a foto, hummm ficou boa, até cara de safada de brinde!
Whatsapp, contatos: Saulo, enviar imagem...
Enviada.
Recebida.
Só falta ele visualizar...
Visualizada!
Saulo está digitando...
"Quer me matar???"
"Quase bati a porra do carro!!!"
Digito: Não. Sou só uma ratinha que você gosta como irmã, te
desejando uma boa foda!
Saulo está gravando áudio, aperto o play:
— Eu só iria dar uma arejada na cabeça, mas agora não vou
conseguir dormir enquanto não ver isso ao vivo.
Arregalo os olhos, mas depois não consigo evitar o sorriso enquanto
me jogo na cama de bruços. Estou um pouco mais do que levemente tonta,
talvez beeeeem tonta e mando esse áudio:
— Se chegar aqui em menos de 10 minutos você vê, quem sabe deixo
até dar um beijo — eu provoco, porque sei que ele já deve estar em direção
de algum motel para comer aquelazinha.
Ele demora para responder. Não digita, nem grava nada.
Sabia!
Começo a digitar a mensagem, tomando cuidado para prestar atenção
nas letras:
Sabia que estava longe, seu ordinário! Espero que broxe! Que...
— Eu sabia que quase bater naquele caminhão valeria a pena.
Me viro e dou de cara com Saulo na porta do quarto me encarando
ofegante. Estou ainda de bruços, bunda para cima, camisola desalinhada.
Aí. Socorro. Isso que estou sentindo não é tesão. Não é!
34 — Vencendo Dragões
Saulo dá um passo para dentro do meu quarto. Na mão tem o celular e
aperta o play do áudio que eu enviei.
—"...Quem sabe até te deixo dar um beijo..."
Minha voz enche o quarto e ele ainda se aproxima.
— Ainda tenho 1 minuto de sobra — ele diz se aproximando com os
olhos verdes queimando de desejo, me olhando intensamente.
Sinto meu interior se agitar e entrar em ebulição. Uma parte de mim se
encolhe de receio, de medo, mas a outra parte, a maior parte está bêbada e se
sentindo muito bem.
Sorrio e me viro de costas outra vez, erguendo um pouco a bunda para
ele. Permitindo.
— Só um — digo querendo e temendo ao mesmo tempo. — Bem de
leve.
Ele se aproxima e se ajoelha na minha cama.
— Sério? Puta merda, Mel. Não sacaneia comigo! — ele me segura
firme pela cintura e eu que estava pronta para sair correndo quando ele se
aproximou, não consigo mais me mexer. Quero e não quero. Mas a vontade de
ficar esta maior, por isso permaneço.
Ele me ergue mais um pouco até eu ficar de quatro, então sinto os
lábios dele tocarem minha nádega esquerda. Lábios macios, quentes e
úmidos, e a barba áspera arranhando ao mesmo tempo. Um beijo sensual e
bom demais para ser só um.
— Acho que a outra está com ciúmes — ele diz. — Posso resolver
isso?
— Sim — eu confirmo porque foi muito rápido.
Sinto outro beijo molhado na outra nádega. A mão de Saulo percorre a
extensão da minha coluna e eu me arrepio. A sensação sendo uma surpresa
para mim. Mas a verdade é que foi muito prazerosa.
— Acho que tem mais partes com ciúmes... Têm? — ele pergunta e eu
gemo um sim em resposta. — Onde, minha ratinha? Me mostre.
Eu me viro, ficando de joelhos diante dele, encarando o rosto lindo de
olhos verdes que eu confio. Mordo o lábio.
— Aqui — mostro meu ombro e ele me puxa em direção dele,
colando seu corpo no meu o perfume invadindo meus sentidos, tão familiar
que é como se sempre estivéssemos assim juntos.
Depois sinto os lábios macios no meu ombro. Não quero que isso
pare, está tão sensual, tão doce que digo:
— Aqui — mostro meu pescoço.
Sinto a respiração dele contra a minha pele, absorvendo meu cheiro,
depois ele arranha a curva do meu pescoço com a barba rala e eu sinto um
arrepio percorrer meu corpo, então ele beija, desta vez com língua, sugando
sutilmente.
Eu gemo sem querer.
— Onde mais? — ele murmura contra meu pescoço.
— Aqui — em meu maior atrevimento da noite (depois de oferecer a
bunda para ele beijar, lógico), mostro meus lábios para ele enquanto o
encaro. É que preciso sentir na minha boca aquilo que ele estava fazendo com
meu corpo.
Parece que estou em um sonho onde não há coisas ruins e
definitivamente não quero acordar.
Vejo o peito dele subir e descer, tão agitado quanto o meu.
Ele toca com os lábios o canto da minha boca, bem de leve, fecho os
olhos me abandonando ao toque dele. Receosa agarro sua cintura e suas
costas musculosas, e sem se conter colo mais o meu corpo ao dele. Sentindo
todos os músculos contra o meu próprio corpo, como um escudo contra o
mau. Então os lábios macios se fecham nos meus inferiores, sugando-os.
Gemo mais uma vez, em outra dimensão, a bebida me fazendo leve.
Quero um beijo! Por que ele não me dá? O que ele está tentando fazer? Me
matar de vontade?
— Me beija logo, Isaac! — eu lhe digo puxando o rosto para minha
boca. Querendo ele com loucura. Precisando deste beijo com quase
desespero.
Mas a cabeça se afasta subitamente.
— O quê?! — ele diz assombrado.
Abro os olhos e vejo os olhos verdes faiscando, de raiva e não de
tesão.
— O que foi? — pergunto sem entender porque ainda não fui beijada.
Saulo sai da cama, passando a mão pelos cabelos, respirando fundo.
— Você me chamou de Isaac, porra! — ele diz abrindo a porta do
quarto e saindo.
— Nããooo — eu nego. — Não chamei não! — oh meu Deus, será que
chamei?
Vou atrás dele até o seu quarto, que ele já entrou e puxou a camiseta
pela cabeça, revelando a tatuagem de São Jorge, me fazendo perder o rumo, e
continua caminhando em direção ao seu banheiro.
— Estava pensando nele enquanto eu te beijava? Por isso deixou? —
ele se vira abruptamente me pegando de surpresa.
Encaro o físico que está roubando a minha tranquilidade noturna já
tem tempo e olho outra vez para ele.
— O quê? — pergunto, pois sei que ele perguntou alguma coisa, só
não lembro exatamente o quê...
Saulo parece se confundir, pisca várias vezes.
— Está pensando nele agora? Ou está bêbada demais? É isso? — ele
dá um passo para trás me avaliando.
— Eu só tomei duas ou três, ou cinco ou oito garrafinhas daquelas...
— confesso.
Saulo passa a mão pelo rosto, angustiado.
— Vamos tomar um café preto, Melissa — ele pega minha mãe e me
puxa para fora do quarto, ou tenta, pois eu bato o pé e não me mexo.
— Não! Não quero café — eu digo irritada, pois ele está dando uma
de irmão outra vez. — Me trás outra cerveja e vamos continuar de onde
paramos! — peço a ele, pois estava tão bom. Quero me sentir daquele jeito
de novo!
Subo na cama dele e ligo a música no aparelho de som que ele tem ao
lado da cama.
A música da banda Legião Urbana começa a tocar nas caixas de som e
eu me permito dançar.
Saulo foi pego de surpresa está me encarando com a boca aberta.
Lembro disso. Já passei por uma situação parecida antes.
Vejo um sorriso se abrir aos poucos no rosto dele, parece sem jeito e
charmoso como o cão.
— Vem! — digo e estico os braços para ele.
— Acho melhor descer daí, ratinha — ele não sabe se ri ou se me dá
bronca e eu o acho lindo.
— Só se me der o beijo que pedi — ainda estou fabulosamente tonta e
atribuo a isso essa fala.
— Sabe para quem está pedindo esse beijo? — ele cruza os braços
sobre o peito amplo com pelos loiro escuros e pele muito clara.
Isaac não tinha pelo algum e era moreno.
— Sei quem é. Vocês são muito diferentes, Saulo. Quero um beijo seu.
— não sei se mereço um prêmio ou umas chicotadas depois dessa, mas o fato
é que falei.
Saulo se aproxima devagar. Eu fico de joelhos na cama e o observo,
esperando. Quando ele para na minha frente, me comendo com o olhar eu me
sinto quente. Me sinto viva como há muito tempo não me sentia. Sinto meus
mamilos enrijecerem e o desconforto no meio das minhas coxas se torna
intenso. E isso é tesão. Não posso mais negar.
Mordo o lábio encarando ele, e me permito esticar o braço para tocar
seu peito amplo e definido. A pele dele é quente e macia, me dá vontade de
morder. De provar. Então eu não espero, eu o puxo para mais perto e aspiro o
perfume másculo do seu corpo, brinco com os pelos do abdômen tanquinho
com a ponta dos dedos e vou seguindo a trilha até os mamilos rosas, os
circulo com o indicador e então ergo as vistas e encontro os olhos verdes
escuros cravados em mim. Ele não move um músculo, com certeza com medo
de me "espantar", apenas deixa eu explorar o corpo bonito.
— Onde quer que eu beije? — eu pergunto com um sorriso, pois estou
adorando isso.
Saulo não sorri, ao contrário me olha intensamente.
— Onde você quiser — ele responde com voz baixa e grave que
demostra o grau de excitação que ele está.
Mordo o lábio mais uma vez, me inclino e mato uma das minhas
vontades: provar o gosto da pele dele.
Beijo com a parte interna dos lábios o peito amplo, sugando com a
língua e mordendo levemente. Sinto ele estremecer diante do meu toque, a
respiração dele fica pesada e eu subo os lábios e beijo a curva do seu
pescoço. Me embriagado com o cheiro e o gosto da pele, sentindo o desejo
me dominando.
As mãos dele tocam minhas coxas, e percorrendo meus quadris,
bunda, cintura, me pegando com gosto, apertando e me puxando para perto
dele.
Eu não me sinto bem. O toque é intenso demais e eu o empurro e me
afasto.
Saulo ergue uma sobrancelha confuso, eu me abraço, subitamente
envergonhada, de tudo.
Ele ergue as mãos para o ar, parecendo entender subitamente:
— Desculpe, ratinha! Eu... — ele está ofegante. — Eu prometo ir...
com mais calma!
Ele estica um braço forte para mim e eu engulo o seco.
— Vem — ele chama. — deixa eu te mostrar que posso te fazer sentir
prazer de novo. Confie em mim — ele termina e eu pego em sua mão.
— Confio — digo apenas e ele se afasta somente o suficiente para me
olhar nos olhos e erguer meu queixo para encara-lo.
— Diga meu nome — ele pede, e beija meu queixo de leve, beija o
canto do meu lábio...
— Saulo — eu digo com cuidado e ele morde meu lábio inferior,
puxando-o de leve.
— O que quer que eu faça, minha ratinha? — ele pergunta sussurrando
ao meu ouvido, com os lábios roçando minha orelha e as mãos me puxando
suavemente pela bunda, sinto algo rijo tocando minha barriga, mas logo ele o
afasta, colocando mais espaço entre nós. Não sei se gostei ou não disso, mas
a verdade é que o desejo que Saulo está me despertando está dando uma surra
nos meus monstros internos.
— Me beije, Saulo! Por favor, me beije! — eu peço porque estou
bêbada e porque eu quero muiiito um beijo agora.
Saulo parece não aguentar mais também, e puxando meu queixo para
ele, os lábios deliciosos tocam os meus em um beijo profundo e intenso. A
língua se enfia na minha boca provando, acariciando, incitando a minha.
Me agarro a ele com vontade, o corpo grande se molda ao meu. A
boca em um encaixe perfeito. O beijo de Saulo é o céu. Mexe com todo o meu
ser, tumultuando todo o meu íntimo. As mãos dele se infiltrando por meus
cabelos, os segurando na base da nuca e a boca aprisiona a minha, minha
língua se enrosca na dele, minhas mãos se perdem nos cabelos curtos e a
barba arranha meu rosto.
— Ahh, que delícia isso — eu deixo escapar, enquanto outro arrepio
de tesão percorre minha espinha.
Saulo está ofegante e me beija o pescoço, roçando a barba e sugando
a pele, enquanto a mão procura meu seio por cima da camisola... Me afasto.
Coração aos saltos. Olho bem para o rosto dele e tenho consciência
que ele não é aquele porco, que não vai me machucar. Aperto as mãos em
punhos, mordo o lábio com força.
Saulo pega minha mão, beija os nós dos dedos, abre a palma e planta
um beijo ali.
— Quer que eu pare? — ele pergunta com calma.
Eu engulo o seco.
— Só não me toque, eu acho... — eu digo sem jeito e o puxo para
perto outra vez e sem pensar direito vou abrindo a calça jeans dele que me
ajuda, quando finalmente ele a abaixa, eu me afasto um pouco para
contemplar a visão de Saulo em cueca boxer preta. Coxas poderosas e um
volume poderoso que eu não esperava, tampouco a reação do meu corpo ao
ver isso!
Aproveitando a ausência do pânico eu toco o volume de leve por cima
da cueca com olhos arregalados.
— Minha nossa! Isso é uma surpresa! — eu confesso, por mais que
tivesse notado o volume do "pacote" de Saulo, nunca imaginei tudo isso.
Saulo segura a minha mão com a sua e aperta minha mão que se fecha
com força sobre seu membro por sobre a cueca. Sinto toda a grossura e
rigidez poderosa. Saulo geme e me encara.
— Saulo, eu quero! — faço beicinho sem me conter.
Ele ri um riso tão bonito que meus medos vão embora de vez. A
postura de Saulo, despreocupada, sem pressa, me deixa a vontade para querê-
lo. Para deseja-lo.
— O que você quer, minha ratinha? — ele beija outra vez meu
pescoço, baixa minha alça da camisola e beija o meu ombro, até chegar nos
meus seios livre do tecido. Ele fecha os lábios sobre o bico e a língua traça
círculos sobre eles, para depois suga—los.
Gemo alto, pela carícia suave e erótica, que ele faz apenas com a
boca.
— Se eu sou uma ratinha, o que você é? — pergunto meio gemendo,
não aguentando mais de vontade e enfiando a mão dentro da boxer dele.
— Um gato — ele geme em resposta ao contato de minha mão com o
membro enrijecido e com uma textura que jamais senti igual. Quente,
vigoroso e parecendo envolto em veludo. Absolutamente delicioso.
Eu rio da resposta dele.
— Convencido! — ele está tirado a minha camisola pela minha
cabeça e eu só consigo pensar que o quero na minha boca.
— O que gatos fazem com ratos, Melissa? — ele pergunta admirando
meus seios, mas sem os tocar. Pego suas mãos e as coloco uma em cada seio.
Ele geme e morde o lábio, me encarando profundamente.
— Não sei, o que? — eu não estou raciocinando direito e já estou
tentando tirar a cueca dele.
Ele se livra da peça e se aproxima outra vez de mim, me puxando para
ele, para o colo dele, ainda estou de calcinha fio dental e o enlaço com as
pernas, sinto as mãos me segurarem pela bunda, e o pau bater na entrada
daquilo que está pulsando para ser preenchido com tudo aquilo dele.
— Eles comem. Quer que eu te coma, ratinha? — Saulo me puxa para
cima e para baixo, esfregando aquilo em mim. Me fazendo gemer.
Não penso em nada, apenas no desespero do meu corpo. Quero ele.
Quero muito e quero agora!
— Quero, gato! Me come! — eu peço me sentindo muito viva, muito
livre, muito mulher e feliz.
Mordo o ombro dele com vontade, chupando e lambendo a pele
deliciosa...
— Está bêbada, ratinha? — ele está com as mãos na minha calcinha, e
com um puxão ela se rompe, eu não me importo — Melissa, por favor. Me
diga: está bêbada?
Ele pergunta enquanto passa a cabeça aveludada pela minha entrada
pulsante. O tom de agonia dele me chama a atenção e eu respondo
sinceramente:
— Um pouco — sugo o pescoço me preparando para a medida,
antevendo o prazer...
Mas Saulo congelou.
Ele treme, respira fundo. Parece se segurar, se decidir.
— Merda! — ele afunda o rosto no meu ombro e sinto o membro dele
pulsar de encontro a mim.
— Saulo? — eu o chamo, já que a única coisa que ele parece se
importar é com a sua respiração.
Saulo me carrega para fora do quarto, em direção ao meu, me deita na
cama e eu me ajeito, segurado seus ombros.
Mas ele se desvencilha, e se levanta.
— Não pode ser assim, Melissa. Amanhã você vai me odiar — ele
diz saindo do quarto!
— Não vou não! — eu protesto. — Saulo, eu quero!
— Porra, Melissa! Eu me deixei levar porque eu quero você mais do
que tudo, mas não pode ser assim, merda! — ele passa a mão pelos cabelos e
ainda está fabulosamente duro, nu e lindo.
E eu só ouvi: "quero você mais do que tudo".
Me ajoelho na cama.
— Vem aqui, gato — eu estico os braços para ele. — Vamos brincar
só um pouquinho. Você disse que iria me mostrar que posso sentir prazer de
novo...
Saulo me olha é geme agoniado, dá um passo até mim, e meu sorriso
de vitória se abre, mas o infeliz para a trajetória.
— Pela manhã se ainda quiser brincar, ratinha, me procure, me chame,
estale os dedos... Eu te mostro tudo que quiser, do jeito que quiser... Mas
enquanto estiver com álcool na cabeça, não vou mais tocar em você.
Ele diz isso e sem esperar resposta sai do quarto me deixando
sozinha, louca de tesão, esquecida de meus demônios e querendo ele
desesperadamente. Ah, e bêbada. Na posso esquecer esse detalhe. Merda!
34 — O Cara Certo
Minha cabeça dói, minha boca está com gosto amargo e eu quero morrer.
Anthony pula na minha cama, me acordando de um monte de sonhos
misturados e um desconforto horrível no estômago.
— Bum dia, duminhoca! — ele pula na cama várias vezes e depois se
joga encima de mim.
— Anthony! — eu brigo com ele pois estou me sentindo no inferno
hoje, e definitivamente ele cair de cotovelo sobre meu estômago não
melhorou a situação.
— Vem para cá, Timão! Deixa a mamãe dormir, vamos tomar café da
manhã — a voz de Saulo na entrada, faz com que as lembranças, todas elas,
apareçam em minha mente.
— Tá ceto, Pumba! — Anthony diz e desce da cama.
Ergo a cabeça e vejo Saulo, lindo como o diabo, vestindo bermuda
cargo e camiseta de física branca parado na porta, ele espera Anthony passar
por ele, me dá um olhar indecifrável e ergue as sobrancelhas. Talvez em uma
pergunta muda, se eu me lembro do que aconteceu...
E sim, lembro de absolutamente tudo.
Desvio o olhar e cubro a cabeça com o lençol.
Ouço a porta sendo fechada.
E agora? Como poderei encarar Saulo depois do que houve? E o que
foi aquilo? Eu me ofereci para ele! Como irei fingir que nada aconteceu?
Cada vez que ele me chamar de ratinha vou lembrar do "gato" e o que eu
queria que ele fizesse comigo... E eu queria muito! Consegui passar por cima
de meus medos, de minhas lembranças terríveis e me libertar. Eu
praticamente estava precisando dele fisicamente!
Só de pensar nisso o desconforto no meu baixo-ventre é intenso.
Aperto as coxas para aliviar, e mordo o lábio para não dar um gemido quando
me lembro do toque de Saulo, do corpo dele que encaixou perfeitamente no
meu. Da boca quente e língua atrevida...
Deus! Tenho que parar com isso! Estou quase me tocando e tendo um
orgasmo pensando em Saulo! Saulo que sempre foi meu amigo, meu parceiro
de toda hora, que me viu mais vezes igual uma mendiga do que arrumada. Que
me viu mais vezes chorando do que rindo... Saulo que me salvou da morte e
me trouxe para cá para ter uma vida...
"Não pode comparar o que teve com 109 ao que temos."
As palavras dele, ditas ontem penetram a minha mente.
Isaac foi meu sonho, minha paixão, minha ilusão.
Foi uma manhã de natal, alegria, desejo, tudo muito intenso e súbito.
Mas então ele se foi. A manhã tornou-se noite, a alegria tristeza e os dias
iguais e monótonos se fizeram presentes. E ali ao meu lado estava Saulo. Ele
sempre esteve. Até quando eu visitava Isaac naquele presídio, Saulo
suportava ouvir nossas gritarias e gemidos só para não deixar ninguém me
espiar. Ontem eu joguei na cara dele que Isaac fugiu para ficar comigo. Mas
Pax me contou que foi Saulo quem deixou Isaac fugir e facilitou a fuga deles,
mesmo sabendo que poderia perder o emprego que tanto ama e se orgulha por
causa disso. Deixou-o fugir para me salvar e me fazer feliz.
Bato a mão na testa, me sentindo uma idiota, pelo que eu disse ontem,
e me esqueço da dor de cabeça. A dor aguda faz eu me arrepender do
movimento logo em seguida.
Eu falei muita merda ontem para Saulo e ele não respondeu. Apenas
saiu, ofendido. E depois voltou correndo...
Sorrio diante da lembrança, quase bateu em um caminhão, ele disse!
Rio sozinha agora.
Tudo por causa de uma foto e promessa de um beijo...
"Quero você mais do que tudo."
Meu ego infla. Se agiganta. Não Soraia-peitão-de-silicone, mas eu.
Saulo quer a mim, e não como irmã, como pensei, mas como mulher, em uma
cama.
E eu o quero. Ou quis. Ontem eu o quis muito. Mais do que
tudo... Mas hoje, hoje que não tenho mais cerveja nublando minhas ideias e
vejo que não posso ferrar com tudo o que temos por causa de um tesão idiota
que apareceu sem mais nem menos! Isso não é certo! Não é certo com ele,
nem Anthony, ou com Isaac, não é certo com ninguém!
Que vergonha! Eu não mereço nem lembrar de Isaac! Olha o que eu
fiz! Me portei como uma vadia! Quase dei para Saulo... o gato... quase me
comeu...
— Ahh — gemo apertando as coxas.
Nunca aquele apelido idiota dele me pareceu tão erótico.
— Meeeerda! — afasto os lençóis, saindo da cama e me arrasto para
o banheiro, um banho gelado irá me fazer bem!
Minutos depois vou até a sala e não encontro ninguém, nem na
cozinha... Aproveito e bebo quase uma jarra inteira de suco de laranja que
estava por ali. Escuto sons vindo do pátio dos fundos assim como algo caindo
na água e vou até lá.
Vejo Saulo dentro da piscina e Anthony na borda pronto para se atirar
nos braços dele.
— Pode pular, Tony! Vou te segurar forte!
— Não vai dexa eu cai? — Anthony pergunta ainda com medo, afinal
ele não entra na piscina sem bóia e ele está apenas de calção de banho.
— Ei! Sou eu que estou aqui! Acha mesmo que te deixaria cair? —
Saulo pergunta sorrindo e eu vejo Anthony pular de vez.
Saulo o pega antes que caia na água e Anthony grita de alegria.
— De novo! — bate palmas.
Saulo o coloca outra vez na borda e desta vez Anthony nem pensa e já
pula.
Eu aproveito que ninguém me viu e dou meia volta, entro e coloco o
meu biquíni que comprei logo que chegamos, agora que engordei novamente
está um pouco pequeno, mas como é o único que tenho, terá que servir.
É a primeira vez que irei entrar na piscina, nunca senti vontade desde
que chegamos, pensando bem, faz tempo que não tenho vontade de nada.
Quando chego à piscina coloco a toalha na espreguiçadeira e vejo que
Saulo está ensinando Anthony a nadar cachorrinho, este está deitado de
bruços na água e ergue a cabeça para me olhar.
— A mamãe vai entá! — Anthony grita eufórico.
Saulo ergue o rosto para mim e vejo os olhos verdes me devorarem,
eles me encaram desde os pés até chegar outra vez aos meus olhos, então o
vejo morder o lábio enquanto estreita o olhar.
O biquíni vermelho com laço nas laterais e contas douradas foi uma
escolha da vendedora, último lançamento, cor da estação e sei lá o que mais
ela disse. Aceitei em minha apatia típica porque Saulo mandou que eu
comprasse um biquíni, então saí e entrei na primeira loja e paguei por um
biquíni. Mas agora diante deste olhar verde flamejante, acho que fiz uma boa
compra.
Pulo dentro da água, em um ponto perfeito. Minha ressaca indo
embora quando volto à tona.
Anthony passa para o meu colo e brincamos como a muito não
fazemos.
— Quem quer suco? — Saulo pergunta tempo depois e Anthony e eu
dizemos "eeeeu" ao mesmo tempo.
— Já trago! — ele diz e sai da piscina.
Ai meu coração!
O corpo lindo, costas musculosas, tatuagem de São Jorge, bunda
perfeitamente esculpida e coxas irresistíveis, estão à mostra numa sunga
branca que é um crime contra a sanidade feminina, tudo isso sendo acariciado
pela água da piscina que cai e deixa a visão brilhante, molhada, suculenta e
eu preciso de ajuda! Urgente!
Quando Saulo volta com a jarra de suco e os copos eu tento, juro que
tento não olhar... Mas olhei, olhei todo o corpo que esteve no poder das
minhas mãos e boca ontem. Os pelos estão brilhando ao sol e a sunga maldita
faz o contorno do coiso dele ficar visível, sinto meus mamilos enrijecerem e
agradeço a Deus por termos saído da piscina e Anthony estar sentado na
espreguiçadeira sobre a toalha e longe de mim... Saulo parece que notou essa
singela mudança no meu corpo, pois ele bebe o suco me encarando, coloca
uma toalha sobre o colo e depois passa a língua pelos lábios, enquanto encara
meus seios... Que ficam ainda mais rijos sob o olhar dele...
Diabos!
Que merda é essa? Eu não quero ficar me babando pelo cara! É o
Saulo de sempre, não mudou nada! Ele sempre foi lindo assim, com esses
ombros largos e... aquilo ali é um chupão no ombro dele?!
Não lembro disso estar ali ontem! Será que ele saiu depois que eu
dormi? Será que foi se encontrar com Soraia—peitão—de—silicone?
Ordinário!
— Vamos jogá bola? Igual àquele dia, Saulo? — Anthony pergunta e
Saulo confirma com a cabeça.
— Claro! Sabe onde está? — Saulo pergunta e Anthony concorda com
a cabeça. — Pode trazer para nós?
Anthony voa para dentro.
— Não corre! — eu aviso me largando outra vez para dentro da
piscina.
Ouço o som de algo caindo na água e vejo Saulo na minha frente. Ele
me observa com olhos brilhando.
— Quer me matar de tesão, ratinha? — ele diz com voz rouca tocando
as alças do meu biquíni. — Nunca mais vista esse biquíni fora de casa!
Algum vizinho pode ver — ele me prensa contra a quina da piscina, em uma
parte que fica mais afastada, olhando para cima dos muros, querendo
confirmar que ninguém está me "espiando", dou um sorriso e tento regular a
respiração que perdi desde que ele se aproximou.
— E o que me diz desta sunga branca e escrota? Isso é muito
bagaceira! — eu o toco na cintura onde a sunga cobre sentindo um arrepio
percorrer meu corpo.
— Não mude de assunto. Tive que colocar a toalha na frente dela para
Anthony não perceber o efeito que esse seu biquíni fez em mim.
Passo a mão, por querer, na frente da sunga e o sinto rijo, enorme e
saindo pelo cós.
Saulo geme e aperta minha mão a fechando sobre seu pau por cima da
sunga.
— Por que não me chamou, ratinha? — ele murmura no meu ouvido.
— Não dormi a noite toda pensando em você, no que queria fazer com você...
— ele afasta a parte de cima do meu biquíni cortininha, enfiando o corpo no
meio das minhas pernas, me faz sentir "lá" o tal efeito que ele disse, quando
pressiona-o contra mim e a boca desce para meu mamilo agora livre do
tecido vermelho.
Gemo alto, e enrosco minhas pernas na cintura dele, jogando mais o
corpo para trás para ele ter melhor acesso aos meus seios, ele pega outro com
a mão, o estimulando com o polegar e o indicador, depois o sugando também,
para em seguida dar uma pequena mordidinha.
— Você é uma delícia, Melissa. Vou te provar inteira — ele segura
meu rosto, e me remexo contra o pau duro, rebolando e ele solta um palavrão:
— Porra! Ratinha você está me deixando louco!
— Você é quem está, Saulo... Eu preciso te sentir dentro de mim...—
digo enquanto retiro o pau delicioso de dentro da sunga e afasto eu mesma a
parte de baixo do meu biquíni, o roçando em mim...
— Anthony já vai chegar, Melissa, não me deixe mais louco ainda...
— ele geme e aperta com força a minha bunda.
Estou perdendo o controle. Estou perdendo a cabeça.
Quando a boca dele vem em direção a minha, eu o agarro os cabelos,
os ombros e vou superando a pequena distância que nos separa, louca para
colar a boca na dele... Louca para ser dele...
— Achei!!! — Anthony grita, saindo da casa e eu e Saulo nos
separamos de supetão.
Me viro de costas arrumando o biquíni e vejo Saulo se agarrar na
borda da piscina, disfarçando a ereção gigante e passando a mão pelo rosto.
Tremo miseravelmente. Merda de homem gostoso! Acabou em
segundos com toda a teoria que passei a manhã toda bolando! Onde foi parar
meu controle? O "é errado"?
De novo o ataquei, me ofereci. Pedi, me perdi.
Ahhhhhhh inferno!
Disfarçar tesão é a pior coisa do mundo. O dia todo foi estranho,
cheio de olhares furtivos, toques intencionais e pequenos, como um leve roçar
de dedos, mas que me deixavam acesa.
Depois da janta, Saulo inventou de fazer uma fogueira nos fundos da
casa. Anthony foi a loucura. Pegamos varas compridas e assamos
praticamente tudo que havia na geladeira. Anthony pulou ao redor da
fogueira, eu o acompanhei, cantamos, Saulo pegou seu violão e cantou. Ele
tem uma voz linda que já tinha ouvido várias vezes em minhas crises e agora
ele canta, não para nos acalmar, mas para nos alegrar. Até Baby Shark saiu.
Depois contou histórias de policial. Daquelas tipo salvar gatinhos de árvores
e etc. E Anthony contou sobre Minecraft.
Já estava tarde e ninguém queria ir para dentro, por isso entrei e
peguei um cobertor para nos três. Saulo colocou o braço sobre meus ombros,
me cercando com ele e sentando atrás de mim.
Peguei sua mão e enlacei os dedos nela, me chegando mais para ele,
Anthony estava meio deitado, meio sentado com a cabeça no meu peito.
Fitávamos as chamas em silêncio e Saulo colou os lábios na minha orelha, e
sussurrou:
— Quero conversar com você, ratinha — ele avisou com voz rouca e
me afastei um pouco para encontrar seu olhar.
O olhar intenso de Saulo é talvez mais estimulante que o próprio
toque. Nunca vi isso. Nunca senti isso.
Meu peito disparou. Anthony ressona no meu colo e eu sou pega de
surpresa.
— Já? — Saulo parece tão surpreso quanto eu.
— Ele brincou demais hoje — eu rio dele, me desvencilhando do seu
toque e me levantando para levar Anthony, mas Saulo se prontificou e já está
erguendo meu menino.
— No quarto dele, ou no seu? — ele pergunta e eu não sei o que
responder.
Se for no meu eu fecho a possibilidade de ter algo com Saulo... Mas
eu não posso ter nada com Saulo! Eu tenho que conversar com ele! O que
aconteceu ontem... hummm e hoje também... Não vai acontecer mais!
— No meu — eu repondo e Saulo concorda parecendo entender o que
quero dizer.
Ele acomoda Anthony na minha cama, faz um carinho nos cabelinhos
claros e sai, eu cubro Anthony, arrumando-o melhor, trocando suas roupas por
um pijama larguinho. Aproveito para dar uma checada no espelho, arrumar a
maquiagem, os cabelos... Estou de shortinho jeans e regata, nada sexy, mas
não é minha intensão ser sexy, eu tenho que conversar com Saulo, acabar com
isso... Será que aquele vestido floral larguinho no quadril não é melhor para
algo assim?
Não! É só conversa!
Saio do quarto e dou de cara com Bolt querendo entrar para dormir
com Anthony.
— Não! Fique aqui fora! — digo e ele baixa as orelhinhas me olhando
com carinha de coitadinho.
Macho é tudo igual não importa a espécie!
— Tá bom, pode ir! Mas só hoje! — digo enquanto abro a porta para
ele entrar.
Vou para a sala e encontro Saulo de pé, parece apreensivo e quando
me vê caminha rapidamente em minha direção. E para bem diante de mim.
— Sei o que vai falar, mas preciso fazer uma coisa antes. — ele diz e
sem esperar mais nenhum minuto ele me beija a boca.
Me devora com a boca é um termo melhor. Enfia a língua enquanto
espreme os lábios nos meus, os movimentos urgentes, quase agressivos.
Selvagens. As mãos uma em cada lado do meu rosto.
O que iria dizer mesmo? Isso está tão bom...
Ah, sim! Lembrei, não quero nada dele! Isso tem que parar!
Mas está taaaaaaaaão bom... Preciso parar MESMO?
35 — Deixe queimar 2
20 dias atrás
Ainda não consigo acreditar que é esse o endereço... Mas não há mais
nenhuma casa por perto, a estrada de chão batido ainda se estende mais
adiante... Talvez não seja aqui... Mas o carro dele está parado ali na frente.
Desligo o motor da picape e olho mais uma vez para a construção de
madeira, pequena porém bonita na beira do lago. O lugar é ermo e a casa
parece abandonada. Até mesmo as janelas estão fechadas. O lago brilha na
luz do sol poente do finalzinho de tarde. Um lugar decididamente lindo e
bucólico. Porém a tranquilidade inquietante do local não me deixa a
vontade...
— Cadê Saulo, mamãe? — Anthony pergunta se remexendo no banco
de trás fazendo carinho na cabeça de Bolt.
Penso agora que talvez não tenha sido uma boa ideia ter trazido os
dois, mas Saulo não voltou no dia seguinte pra se despedir de Anthony como
disse que faria. Também não voltou para o serviço e até desligou o celular.
Foi como se a terra o tivesse engolido. Depois de muito perguntar, de muito
insistir Camargo me deu a informação que quando Saulo perdeu a irmã ele foi
para um chalé na beira do lago... Já se passaram 8 dias, e por mais que eu não
saiba o que vou encontrar, alguma coisa me dizia pra trazer Anthony junto.
— Acho que está aí, meu amor — digo e tomo coragem para descer
da picape e abrir a porta traseira para Anthony que pula no chão seguido de
Bolt.
— Saulo vai voltá com nois, mamãe?
Meu coração falha uma batida diante da pergunta inocente.
E se eu não conseguir fazer ele me entender? E se eu já o perdi pra
sempre?
Vou levar ele nem que seja amarrado de volta, parece que não consigo
mais respirar sem ele...
— Mamãe touxe coida? — Anthony está com as sobrancelhas
arqueadas.
E eu não acredito que falei em voz alta. Dou uma tossida sem graça e
avanço. Caminho até a porta e bato, mas não tenho resposta. Tento girar a
maçaneta e noto que está destravada. Assim que eu a abro, Brutos saí de lá,
feliz, abanando o rabo e lambendo Anthony e até eu mesma... Meu pequeno ri
e se ajoelha no chão da varanda para fazer carinho no cachorro que ele tanto
ama. Eu fico aliviada. Brutos está aqui e bem, então Saulo também está... Né?
— Saulo? — eu o chamo esperando uma resposta.
Não ouço barulho nenhum e continuo entrando na casa. Me surpreendo
com a bagunça do local. Garrafas por todos os lados, resto de pizza e caixa
desta mesma espalhados pelo chão. O cheiro é ruim e eu penso que devo
mandar Anthony entrar outra vez no carro...
Oh meu Deus! E se ele estiver com alguém? Se isso foi uma noitada
daquelas???
Dou um passo para trás, mas me choco com Brutos que passa por mim
correndo e Anthony atrás dele, seguido por Bolt. Ele voam pela sala e Brutos
abre sozinho com a cabeça uma porta de persianas que estava fechada. Lá há
uma outra varanda que dá de cara para o lago, praticamente dentro das águas.
Ali tem uma cadeira de abrir e um homem, Saulo, posso reconhecer, está
sentado nela de costas para mim, olhando a paisagem e com uma garrafa de
cerveja na mão.
Brutos corre até ele e faz carinho alegremente na sua mão, colo,
parece dizer que tem visita, que está feliz. Saulo apenas passa a mão na
cabeça do animal, alheio a tudo.
Brutos late, em um ato raro, e olha para nós, Bolt vai até ele e Saulo
parece se surpreender, sair do torpor que estava.
Pego Anthony pela mão e caminho até próximo dele, saindo para a
varanda.
Saulo vira o rosto, está com a barba maior e despenteado. Os olhos
vermelhos. Camisa aberta e bermuda. Ele olha para mim, depois para
Anthony. Olha para Brutos e Bolt... Se vira melhor e nos encara
demoradamente a todos...
Eu sorrio, mas antes que possa abrir a boca pra falar alguma coisa ele
diz com voz arrastada:
— Agora a visão está perfeita... — ele está claramente bêbado, e
larga o corpo outra vez na cadeira. — Estão todos aqui... — ele continua
olhando demoradamente pra nós, então antes que eu ou Anthony possamos
dizer ou fazer alguma coisa, ele toca a garrafa de cerveja na testa, fechando
os olhos como se a visão fosse demais pra ele e para nossa surpresa ainda
maior começa a chorar.
Os ombros sacodem, e os soluços são fortes. Eu já estava em choque
quando vi ele bêbado, agora então eu estou catatônica.
Anthony, diferente da mãe besta, tem uma atitude e corre pra Saulo e o
abraça.
— Não chola. Não chola. Saulo... Anthony tá aqui... — ele diz com
calma, como eu já fiz tantas vezes com ele, e até mesmo Saulo. Aí vejo Saulo
reprimir o choro, apertar os olhos com força com os dedos e fungar,
respirando fundo.
Eu vou até ele, tenho medo de sua reação diante do porre em que
está... Por isso me aproximo devagar.
— Vamos tomar um banho, Saulo? E um café forte? — lhe digo e ele
concorda com a cabeça.
Eu o ajudo a se levantar, e Anthony continua segurando a mão dele até
eu encontrar um banheiro... Existe 2 quartos, 1 banheiro e uma sala com
cozinha junto... Como eu notei por fora o chalé é pequeno.
— Anthony, vai ver se tem alguma coisa pra assistir na TV que a
mamãe já vai lá arrumar aquela bagunça, tá bom?
Ele olha para Saulo e pra mim, parece indeciso.
— Saulo tá bem, mamãe? — pergunta ainda querendo ficar.
— Tô sim, Timão — Saulo mesmo responde e tenta ficar reto, fazendo
um positivo com a mão.
— Que bom, Pumba! — Anthony ri e retribui, saindo correndo.
— E não sai de dentro da casa! Não quero você perto desse lago sem
eu por perto!!!
— Tá bem, tá bem — ele responde e eu já ouço o barulho da TV
sendo ligada.
Saulo parece alheio, apenas me olha. Eu ligo o chuveiro e ajudo ele
com as roupas. Ele deixa, não oferece residência, talvez ainda achando que
somos todos frutos do seu cérebro cheio de álcool.
Eu tento não focar no corpo dele, enquanto ele fica nu e entra no
chuveiro... Mas é difícil. Temos que conversar... Temos que...
— O quê? — ele está debaixo do chuveiro e eu tô encarando ele todo,
ele mesmo bêbado notou.
#vergonha
— Senti sua falta — eu digo à verdade que a está me matando.
Saulo me puxa pra junto dele e cola a boca na minha, os braços me
pegando com gosto, e é como se nunca estivemos nos separado, é tudo tão
vivo e intenso... Eu o beijo com paixão, o membro rijo me atiça me deixando
louca de tesão, então me lembro que ele está totalmente bêbado, e por mais
que eu queira tudo isso, não é a coisa certa a se fazer, porque provavelmente
ele nem vai se lembrar...
Merda.
Eu me afasto.
Molhada e molhada do chuveiro, latejando cheia de saudade... Droga
de dia difícil.
Pego a toalha, e me seco do melhor jeito que posso.
— Vou preparar seu café, depois conversamos...
Ele está confuso, me olha sem nada entender e por fim fecha os olhos
e se encosta outra vez na parede do box. Aceitando, talvez.
Ele parece um zumbi, eu penso quando estou recolhendo as coisas
espalhadas pela sala e limpando tudo o mais rápido que posso. Anthony
colocou a TV num canal de desenho e pula de um sofá para o outro, brincando
com os cachorros de pegar, talvez.
Eu me dedico a limpar tudo e esquentar uma água para passar um café,
mas não há nada na dispensa, e na geladeira apenas cervejas. Abro todas e
jogo no ralo da pia.
Quando dou por mim já não escuto o barulho do chuveiro, e entrando
em um dos quartos vejo Saulo com a toalha amarrada na cintura, jogado de
bruços na cama. Roncando. Eu me aproximo e sento do lado dele. Faço um
carinho nos cabelos molhados e o deixo dormir. É melhor mesmo que durma
para passar essa bebedeira.
Termino a limpeza e pego o telefone de uma das caixas de pizza,
encomendando uma para eu e Anthony. Sei lá de onde é, mas se o motoboy
chegou aqui uma vez, pode chegar de novo.
Comemos a pizza, assistimos mais um pouco de desenho e vou
arrumar o quarto para dormirmos. Tem duas camas de solteiro, e Saulo ainda
não acordou.
Anthony já está no 5° sono e eu não consigo pregar os olhos. Estou
nervosa e até mesmo decepcionada. Saulo bebendo? Nunca imaginei isso
dele...
Achei que ele estaria com outra, estaria vivendo a vida... Não assim...
Destruído.
A palavra vem com força, me incomoda e eu me levanto. Caminho até
a varanda que dá para o lago. Existe algumas casas na beira dele e as luzes
estão acesas. É uma visão linda.
Ouço o som da geladeira sendo aberta e um "acabou a porra da
cerveja?! Não pode!!!"
Eu me levanto e vejo Saulo de cuecas na frente da geladeira aberta.
— Eu joguei fora — anuncio com o queixo erguido.
Saulo tem um choque. Me olha com os olhos muito abertos. Como se
sequer desconfiasse que eu estava aqui. E com certeza ele nem desconfiava
mesmo, estava muito bêbado nem deve se lembrar de quando chagamos.
— Melissa? Que porra... Como...
— diz em alto tom, piscando várias vezes.
— Shhh Anthony está dormindo no quarto...
— Anthony está aqui?!!! — ele está ainda mais surpreso e eu acho
muito fofo. Sorrio e caminho até ele.
— Você não voltou pra se despedir dele...
Saulo desvia os olhos de mim, encara a geladeira aberta sem nada ver
e fala com voz contida:
— Eu não iria conseguir... — diz enquanto fecha a porta e caminha
sem olhar para mim, indo em direção do quarto.
Eu o sigo e vejo-o catando suas coisas e colocando na mochila que
estava por ali.
— O que pensa que vai fazer? O que não iria conseguir? Saulo! — eu
seguro a camiseta que ele estava enfiando na mochila, já que ele não
responde.
Ele me encara. Olhar duro. Larga a camiseta e se vira pra mim,
andando pelo quarto.
— Onde está o seu bandido? Está te esperando lá fora? — ele diz
indo para a cômoda e eu já sei o que ele quer pegar. A pistola.
Eu corro pra lá e o impeço.
— Eu vim com Anthony e Bolt. Só nós. Não enlouquece, Saulo...
— Não enlouquecer?! — ele quase grita, me segurando pelos braços.
— Você voltou pro 109 depois de tudo! Depois de tudo eu te pego abraçada
naquele marginal!!!
— Eu fui ver Isaac porque achava que ele estava morto e encontrei um
bilhete que ele mandou...
— Ah claro, aí correu pros braços dele! — Saulo me larga e
recomeça a catar suas coisas que estão espalhadas.
— Saulo, eu só fui confirmar que ele estava vivo... Saulo! — eu o
chamo já que ele vestiu uma calça jeans preta e pegou a mochila aberta
mesmo e está tentando sair.
Me coloco na frente dele.
— Me deixa passar, Melissa — ele me encara com olhar duro.
— Saulo... Me deixa explicar, por favor...
— Não tem nada pra explicar. Você ama aquele marginal e iria fugir
com ele. Não é isso? Negue Melissa que eu atrapalhei o momento romântico
de vocês! Quanto tempo estavam se encontrando escondidos? Eu fui só o
trouxa que esteve lá quando você não tinha ninguém, uma sombra pra
preencher o vazio que ele deixou. Sabe por que eu não voltei, Melissa?
Porque eu sabia que vocês não estariam lá.
— Está enganado, Saulo... — minha voz falha, estou a ponto de
chorar. — Eu não sabia que ele estava vivo, e eu só dei um abraço nele...
Isso parece ativar o ódio de Saulo e ele me pega pelos braços e me
tira do seu caminho, passando como um furacão por mim.
— Volte pra ele, ainda não entendi porque veio aqui. Não quero lhe
ver nunca mais. Adeus.
Meu coração se quebra em mil pedaços. A dor é física. Saulo sempre
esteve ali para mim. Sempre.
Eu tento puxar o ar, mas não consigo. Um medo muito grande toma
conta de tudo... Eu tento enxergar, mas as lágrimas nublam tudo... A
respiração fica curta demais... Então sou engolida pelo vazio.
43 – Final (Saulo)
MATRIOSKA – SINOPSE
Mas ela não imaginava que seu novo patrão fosse um homem lindo,
misterioso e potencialmente perigoso.
Dimitri Paxrovik, também conhecido como Pax, é filho do chefe da
máfia Russa, mergulhado no mundo do crime até o pescoço e com mais
beleza e charme do que o recomendável para a saúde feminina, tenta se
aproximar da linda empregada nova, mas não esperava a reação dela. Não
esperava a recusa, a ofensa, e tampouco o desejo louco que ela lhe
provocou ao primeiro olhar.
Conhecendo-a melhor ele vê nela a o objeto que pode redimi-lo
perante seu pai, e torná-lo o próximo chefe da máfia russa. Pois Sabrina
seria a esposa perfeita que seu velho esperava que ele arrumasse.
Mas será que pelo bem de sua filha, Sabrina aceitará esse acordo?
E realmente será Sabrina a mulher certa para um chefe de máfia?
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Muito obrigada!
[1] Kratos, O Fantasma de Esparta é o protagonista da série de jogos God of War, um grego
forte e marombado viciado em guerras, fatalitys e porradaria. Ele é um cara sanguinário, violento em
busca de vingança contra Ares e Zeus até que se vingou. Ate ai tudo bem, só que ele ainda continua se
vingando, se vingando e se vingando até acabar com a caralhada do Olimpo todo. Enfim, Kratos é
basicamente o Vin Diesel do Velozes e Furiosos só que mais puto da vida e a história de seu jogo
resume-se a isso. (informação retirada do site DESCICLOPÉDIA)
[2] Personagem de Irresistível Hades de Michelle Castelli que enxerga com “os olhos da alma”...
[3] Tradução One Call Away: "Estou a uma ligação de distância. Eu estarei lá para salvar
o dia. O Super Homem não é páreo para mim. Estou a uma ligação de distância. E quando você
estiver fraca, eu serei forte. Eu vou continuar aqui. Não se preocupe, não demorará. Querida, e
quando você sentir que a esperança se foi. Apenas corra para os meus braços. Estou a uma
ligação de distância..."
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3 Desejos
Samanta desde a infância teve uma visão. E quando ela inicia um novo ciclo
de sua vida, fugindo grávida de uma relação abusiva e buscando finalmente
seu cerne, sua força interior, sua visão se torna realidade. Samanta é
milagrosamente transportada ao passado, para as planícies americanas, em
território Cheyenne.
Em uma época de guerra entre brancos e indígenas ela se vê protagonista de
uma profecia xamã.