Por Que As Nações Fracassam - Daron Acemoglu Et Al
Por Que As Nações Fracassam - Daron Acemoglu Et Al
Por Que As Nações Fracassam - Daron Acemoglu Et Al
Barbara Morais
Isadora Prospero
Eduardo Carneiro
Fábio Gabriel
Rayssa Galvão
ayná de Barros
David Pearson
-
Manoela Alves
Manuela Brandão
-
Érico Dorea
-
978-65-5560-541-9
1ª edição
@intrinseca
editoraintrinseca
@intrinseca
@editoraintrinseca
intrinsecaeditora
SUMÁRIO
[Avançar para o início do texto]
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1. T ,
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Para Arda e Asu DA
De Cajamarca...
As expedições de Solís, Mendoza e Ayolas vieram no rastro de outras, mais
famosas, que ocorreram depois que Cristóvão Colombo avistou uma das ilhas
das Bahamas, em 12 de outubro de 1492. A expansão espanhola e a
colonização das Américas começaram, de fato, com a invasão do México por
Hernán Cortés, em 1519, a expedição de Francisco Pizarro ao Peru, uma
década e meia depois, e a expedição de Pedro de Mendoza ao rio da Prata, dois
anos mais tarde. Ao longo do século seguinte, a Espanha conquistou e
colonizou a maior parte das regiões central, ocidental e meridional da América
do Sul, ao passo que Portugal cou com o Brasil, na porção oriental.
A estratégia de colonização espanhola foi altamente e caz. Aperfeiçoada por
Cortés, no México, a base da atuação se concentrava na ideia de que o melhor
meio para subjugar possíveis oposições era capturar o líder dos povos locais.
Essa estratégia permitia que os espanhóis cassem com a riqueza acumulada
pelo líder e coagissem os nativos a pagar tributos e fornecer alimentos. O passo
seguinte era se estabelecer como a nova elite da sociedade indígena e assumir o
controle dos métodos existentes de taxação, tributação e, principalmente, de
trabalhos forçados.
Quando chegaram à grande capital asteca de Tenochtitlán, em 8 de
novembro de 1519, Cortés e seus homens foram bem acolhidos por
Montezuma, o imperador asteca, que, contrariando os avisos de muitos de seus
conselheiros, decidiu receber os espanhóis paci camente. O que aconteceu em
seguida é bem descrito pelo relato, compilado depois de 1545, pelo padre
franciscano Bernardino de Sahagún, em seu famoso Códice Florentino.
Imediatamente [os espanhóis] capturaram Montezuma (...)
depois, todas as armas dispararam. (...) O medo prevaleceu. Foi
como se todos tivessem engolido o coração. Mesmo antes de
escurecer, houve terror, houve espanto, houve apreensão, houve
perplexidade do povo.
E no seguinte alvorecer [os espanhóis] proclamaram todas as
exigências: tortilhas brancas, perus assados, ovos, água potável,
madeira, lenha, carvão (...) essas ordens foram dadas por
Montezuma.
Quando os espanhóis estavam bem estabelecidos, questionaram
Montezuma sobre todos os tesouros da cidade (...) com grande
zelo eles procuraram ouro. E Montezuma assim liderou os
espanhóis. Eles o cercavam (...) o segurando, então, o agarrando.
Quando chegaram ao armazém, um lugar chamado Teocalco,
eles trouxeram todas as coisas brilhantes; o cocar de penas de
quetzal, os objetos, os escudos, os discos dourados (...) os
crescentes dourados usados sobre o nariz, as faixas douradas
usadas nas pernas, as faixas douradas dos braços, as tiaras
douradas.
Dali foi retirado o ouro (...) imediatamente eles queimaram,
puseram fogo em (...) todas as coisas preciosas. Tudo queimou. O
ouro, os espanhóis transformaram em barras separadas (...) E os
espanhóis andaram por tudo. Pegaram tudo, tudo o que viam e
que julgavam de valor.
Depois, foram ao depósito do próprio Montezuma (...) no lugar
chamado Totocalco (...) e pegaram todas as propriedades [de
Montezuma] (...) as coisas preciosas, os colares com pingentes, as
faixas de braços com penas de quetzal, as faixas douradas de
braços, os braceletes, as faixas douradas com conchas (...) e o
diadema de turquesa, atributo do governante. Pegaram tudo.
... a Jamestown
Quando os espanhóis deram início à conquista das Américas, na década de
1490, a Inglaterra era uma potência europeia menor, ainda se recuperando dos
efeitos de uma guerra civil devastadora, a Guerra das Rosas. O país não estava
em condições de tirar vantagem da disputa pelo butim e pelo ouro, nem da
oportunidade de explorar os povos nativos das Américas. Quase cem anos
depois, em 1588, a destruição da Armada Espanhola, enviada pelo rei Felipe
para invadir a Inglaterra, abalou os pilares da Europa. Embora tenha ocorrido
por um lance de sorte, a vitória inglesa também era um sinal do crescente
domínio da Inglaterra sobre os mares, o que lhe permitiria, nalmente,
participar da corrida pela construção de um império colonial.
Sendo assim, não é coincidência que os ingleses tenham dado início à
colonização da América do Norte nessa época. Porém, estavam atrasados na
corrida. A escolha da América do Norte não se deu pela atratividade da área,
mas porque era o único território disponível. As partes “desejáveis” das
Américas, onde a população indígena a ser explorada era abundante e onde
cavam as minas de ouro e de prata, já estavam ocupadas. Quando Arthur
Young , escritor e agricultor inglês do século , examinou os locais onde se
produziam “mercadorias básicas”, o que nesse caso era sinônimo de produtos
agrícolas que podiam ser exportados, ele observou:
Ganhando 1 ou 2 bilhões
As implicações de longo prazo da organização da sociedade colonial e dos
legados institucionais dessas sociedades moldam as atuais diferenças entre os
Estados Unidos e o México, e, portanto, entre as duas partes de Nogales. O
contraste entre o modo como Bill Gates e Carlos Slim se tornaram os dois
homens mais ricos do mundo Warren Buffe também está na disputa
ilustra as forças em jogo. A ascensão de Gates e da Microso é bem conhecida,
mas seu status como a pessoa mais rica do mundo e fundador de uma das
empresas mais inovadoras em termos de tecnologia não impediram que o
Departamento de Justiça dos Estados Unidos entrasse com ações contra a
Microso Corporation em 9 de maio de 1998, a rmando que a empresa tinha
abusado de poder de monopólio. O que estava em questão, especi camente,
era o modo como a Microso havia atrelado seu navegador de internet, o
Explorer, ao sistema operacional Windows. O governo estava de olho em Gates
havia algum tempo, e, já em 1991, a Comissão Federal de Comércio dera início
a uma investigação para averiguar se a Microso estava abusando do
monopólio sobre os sistemas operacionais de PCs. Em novembro de 2001, a
Microso fechou um acordo com o Departamento de Justiça. Suas asas foram
cortadas, ainda que as punições tenham sido menores do que muitos
desejavam.
No México, Carlos Slim não conquistou sua fortuna com inovações. A
princípio, ele se saiu muito bem no mercado de ações com a compra e reforma
de empresas não lucrativas. Seu grande passo foi a aquisição da Telmex, que
detinha o monopólio das telecomunicações no país e foi privatizada pelo
presidente Carlos Salinas em 1990. O governo anunciou sua intenção de
vender 51% das ações da empresa com direito a voto (20,4% do total de ações)
em setembro de 1989 e recebeu os lances em novembro de 1990. Um consórcio
liderado pelo Grupo Carso, de Slim, venceu o leilão. Slim conseguiu adiar o
pagamento, quitando com os dividendos da própria Telmex. O que havia sido
um monopólio público passava a ser um monopólio de Slim, e a empresa era
imensamente lucrativa.
As instituições econômicas que zeram de Carlos Slim quem ele é são
muito diferentes das instituições dos Estados Unidos. Para um empreendedor
mexicano, as barreiras para que entre no mercado desempenharão um papel
essencial em cada etapa da carreira. Entre os empecilhos estão a obtenção de
licenças caras, burocracia, políticos e autoridades que carão no caminho,
além da di culdade de obter empréstimos de um setor nanceiro que
frequentemente atua em conluio com os donos dos negócios competidores.
Essas barreiras podem ser insuperáveis, excluindo o empresário das zonas
lucrativas, ou suas melhores amigas, mantendo os concorrentes a distância. A
diferença entre os dois cenários, claro, está em quem você conhece e quem é
capaz de in uenciar e, também, quem consegue subornar. Carlos Slim, um
sujeito talentoso, ambicioso, de origens relativamente modestas, descendente
de imigrantes libaneses, se tornou mestre na obtenção de contratos de
exclusividade; conseguiu monopolizar o lucrativo mercado das
telecomunicações no México e depois estender seu alcance para o restante da
América Latina.
Houve contestações ao monopólio da Telmex de Slim, mas nenhuma foi
bem-sucedida. Em 1996, a Avantel, uma operadora de telefonia de longa
distância, entrou com uma requisição para que a Comissão de Concorrência
Econômica do México checasse se a Telmex tinha uma posição dominante no
mercado das telecomunicações. Em 1997, a comissão a rmou que a Telmex
tinha um poder de monopólio substancial no que dizia respeito à telefonia
local, às ligações de longa distância nacionais e às ligações de longa distância
internacionais, entre outros mercados. Mas as tentativas das autoridades
regulatórias mexicanas para limitar esses monopólios não deram em nada. Um
dos motivos é o fato de Slim e a Telmex terem acesso a algo conhecido como
recurso de amparo, literalmente um “pedido de proteção”. Um amparo, na
prática, é uma petição por meio da qual se alega que uma lei especí ca não se
aplica a determinado caso. A ideia do amparo remonta à Constituição
mexicana de 1857, e sua intenção original era salvaguardar direitos e
liberdades individuais. Nas mãos da Telmex e de outros monopólios
mexicanos, contudo, esse recurso se tornou uma ferramenta formidável para
consolidar monopólios. Em vez de proteger os direitos das pessoas, o amparo
serve como brecha jurídica para evitar a igualdade perante a lei.
Slim conquistou sua fortuna na economia mexicana em grande parte
graças a suas conexões políticas. Quando se aventurou nos Estados Unidos,
não foi bem-sucedido. Em 1999, seu Grupo Carso comprou a CompUSA, uma
varejista de informática. Na época, a CompUSA tinha concedido franquia para
que uma empresa chamada COC Services vendesse seus produtos no México.
Slim imediatamente violou esse contrato com a intenção de montar uma
cadeia própria de lojas, sem qualquer concorrência da COC, que, por sua vez,
processou a CompUSA num tribunal de Dallas. Não havia amparos em Dallas
e, portanto, Slim perdeu, sendo condenado a uma multa de 454 milhões de
dólares. O advogado da COC, Mark Werner, disse mais tarde que “a
mensagem desse veredito é a de que, na economia global, as empresas
precisam respeitar as regras dos Estados Unidos caso queiram vir para cá”. Na
segunda instância, porém, o veredito foi revisto, e a decisão, revogada, porque o
juiz acreditou que as provas eram insu cientes.
A situação atual
O a desigualdade do mundo,
comentando alguns dos padrões que podem ser percebidos com certa
facilidade. O primeiro país a viver um crescimento econômico sustentado foi a
Inglaterra ou a Grã-Bretanha, como é chamada a união de Inglaterra, País
de Gales e Escócia desde 1707. O crescimento foi lento na segunda metade do
século , à medida que se consolidava a Revolução Industrial, baseada em
grandes avanços tecnológicos e em suas aplicações na indústria. Esse processo
na Inglaterra foi logo seguido pela industrialização da maior parte da Europa
Ocidental e dos Estados Unidos. A prosperidade inglesa também se espalhou
depressa pelas “colônias de povoamento” do Canadá, da Austrália e da Nova
Zelândia. Uma lista atual dos trinta países mais ricos do mundo incluiria
todos esses, além de Japão, Singapura e Coreia do Sul. A prosperidade destes
últimos três, por sua vez, é parte de um modelo mais amplo, que possibilitou a
muitas nações do Leste Asiático viverem um crescimento rápido, incluindo
Taiwan e, posteriormente, a China.
Os países nas posições mais baixas no rol da distribuição de renda do
mundo desenham um retrato tão claro quanto os do topo. Se você zer uma
lista atual dos trinta países mais pobres do mundo verá que quase todos cam
na África subsaariana. Junto, há países como Afeganistão, Haiti e Nepal, que,
embora não quem na África, têm um fator decisivo em comum com as nações
africanas, como explicaremos adiante. Se você voltasse cinquenta anos no
tempo, os países na parte superior e inferior da lista seriam basicamente os
mesmos. Singapura e Coreia do Sul não estariam entre os mais ricos, e haveria
vários países diferentes entre os trinta mais pobres, mas o retrato geral seria
bastante coerente com o que vemos hoje. Volte cem anos, ou cento e cinquenta,
e vai encontrar praticamente os mesmos países nos mesmos grupos.
O Mapa 3 mostra o cenário em 2008. Os países pintados em tons mais
escuros são os mais pobres do mundo, os que têm renda per capita média
anual (chamada pelos economistas de Produto Interno Bruto PIB) de
menos de 2 mil dólares. A maior parte da África está desta cor, assim como
Afeganistão, Haiti e partes do Sudeste Asiático (por exemplo, Camboja e Laos).
A Coreia do Norte também está neste grupo. Os países em branco são os mais
ricos, aqueles com renda média per capita de 20 mil dólares ou mais. Aqui
encontramos os suspeitos de sempre: América do Norte, Europa Ocidental,
Australásia e o Japão.
Outro padrão interessante pode ser percebido nas Américas. Faça uma lista
das nações desse continente, da mais rica à mais pobre. Você vai descobrir que,
no topo, estão Estados Unidos e Canadá, seguidos por Chile, Argentina, Brasil,
México e Uruguai, e talvez também a Venezuela, dependendo do preço do
petróleo. Depois disso vêm Colômbia, República Dominicana e Peru. No m
da lista há outro grupo bastante distinto, muito mais pobre, que abrange
Bolívia, Guatemala e Paraguai. Volte cinquenta anos no tempo e encontrará
um ranking idêntico. Cem anos: mesma coisa. Cento e cinquenta anos:
novamente a mesma coisa. Então não é só que os Estados Unidos e o Canadá
sejam mais ricos do que a América Latina: também há uma divisão de nida e
persistente entre as nações ricas e pobres dentro do continente.
Há um último padrão interessante no Oriente Médio. Ali encontramos
nações ricas por causa do petróleo, como a Arábia Saudita e o Kuwait, que têm
níveis de renda próximos aos dos trinta países mais ricos. No entanto, se o
preço do petróleo cair, eles despencam na tabela. Países do Oriente Médio com
pouco ou nenhum petróleo, como o Egito, a Jordânia e a Síria, se agrupam em
um per l de renda semelhante ao da Guatemala e do Peru. Sem petróleo, os
países do Oriente Médio também são todos pobres, ainda que, assim como os
países da América Central e os dos Andes, não sejam tão pobres quanto as
nações da África subsaariana.
Embora haja um grande grau de persistência, os padrões de prosperidade
que vemos à nossa volta não são inertes nem imutáveis. Em primeiro lugar,
como já enfatizamos, a maior parte da desigualdade do mundo atual surgiu a
partir do m do século , depois da Revolução Industrial. As diferenças de
prosperidade eram muito menores até meados do século , e os rankings
que têm se mantido tão estáveis desde então não eram os mesmos se
analisarmos um período anterior da História. Nas Américas, por exemplo, o
ranking que vemos nos últimos cento e cinquenta anos era completamente
diferente quinhentos anos atrás. Em segundo lugar, muitas nações passaram
por várias décadas de crescimento rápido desde a Segunda Guerra Mundial,
como grande parte do Leste Asiático e, mais recentemente, a China. Muitos
desses países mais tarde viram esse crescimento se inverter. A Argentina, por
exemplo, teve um crescimento acelerado por cinco décadas, até 1920,
tornando-se um dos países mais ricos do mundo, mas depois entrou em um
longo declínio. A União Soviética é um exemplo ainda mais notável, crescendo
depressa entre 1930 e 1970, e, na sequência, vivendo um rápido colapso.
A hipótese geográ ca
Uma teoria amplamente adotada para as causas da desigualdade mundial é a
geográ ca, a qual a rma que a grande divisão entre os países ricos e pobres é
criada pelas diferenças físicas de cada lugar. Muitos países pobres, como os da
África, da América Central e da Ásia Central, estão localizados entre os trópicos
de Câncer e de Capricórnio. Nações ricas, por outro lado, tendem a car em
latitudes temperadas. Essa concentração geográ ca da pobreza e da
prosperidade dá à hipótese geográ ca um apelo super cial e é o ponto de
partida das teorias e dos pontos de vista de muitos cientistas sociais e
especialistas. Mas isso não torna a hipótese menos equivocada.
Já no m do século , o grande lósofo político francês Montesquieu
observou a grande concentração geográ ca de prosperidade e pobreza e propôs
uma explicação para isso. Ele a rmava que os povos dos climas tropicais
tendiam a ser preguiçosos e não muito curiosos. Como consequência, não se
esforçavam e não eram inovadores, e essa era a razão de sua pobreza.
Montesquieu também especulou que povos preguiçosos tendiam a ser
governados por déspotas, sugerindo que a localização tropical poderia explicar
não apenas a pobreza, mas também alguns fenômenos políticos associados ao
fracasso econômico, como a ditadura.
A teoria segundo a qual países quentes são intrinsecamente pobres, embora
seja contradita pelo rápido avanço econômico recente de países como
Singapura, Malásia e Botsuana, continua sendo muito defendida por pessoas
como o economista Jeffrey Sachs. A versão moderna desse ponto de vista
enfatiza não os efeitos diretos do clima sobre o esforço dos trabalhadores ou
sobre os processos de pensamento político, mas, sim, dois outros argumentos:
primeiro, que as doenças tropicais, particularmente a malária, têm
consequências muito graves para a saúde pública e, portanto, para a
produtividade da mão de obra; segundo, que os solos tropicais não permitem o
desenvolvimento de uma agricultura produtiva. A conclusão, no entanto, é a
mesma: climas temperados têm uma vantagem relativa em comparação com
áreas tropicais e semitropicais.
A desigualdade mundial, no entanto, não pode ser explicada por clima ou
doenças, nem por qualquer versão da hipótese geográ ca. Basta pensar em
Nogales. O que separa as duas partes não é o clima, nem a geogra a, nem o
ambiente sanitário, e sim a fronteira entre os Estados Unidos e o México.
Se a hipótese geográ ca não consegue explicar as diferenças entre o norte e
o sul de Nogales, ou entre as Coreias do Norte e do Sul, ou entre as Alemanhas
Oriental e Ocidental antes da queda do Muro de Berlim, será que ainda pode
ser uma teoria útil para explicar as diferenças entre a América do Norte e a
América do Sul? Entre a Europa e a África? De forma alguma.
A história mostra que não existe uma conexão simples ou duradoura entre
clima ou geogra a e sucesso econômico. Por exemplo, não é verdade que os
trópicos sempre foram mais pobres do que as latitudes temperadas. Como
vimos no capítulo anterior, na época do descobrimento das Américas por
Colombo, as áreas ao sul do Trópico de Câncer e ao norte do Trópico de
Capricórnio, que hoje incluem o México, a América Central, o Peru e a Bolívia,
eram lar das grandes civilizações asteca e inca. Esses impérios eram
politicamente centralizados e complexos, construíam estradas e ofereciam
auxílio contra a fome. Os astecas tinham moeda própria e escrita, e os incas,
embora não tivessem nenhuma dessas duas tecnologias importantes,
registravam enormes quantidades de informação em cordas com nós
chamadas quipos. Num forte contraste, na época dos astecas e dos incas, ao
norte e ao sul da área habitada por esses povos, que hoje inclui os Estados
Unidos, o Canadá, a Argentina e o Chile, as civilizações se organizavam como
na Idade da Pedra e não contavam com essas tecnologias. Os trópicos nas
Américas, portanto, eram muito mais ricos do que as zonas temperadas, o que
sugere que o “fato óbvio” da pobreza dos trópicos não é nem óbvio nem um
fato. Pelo contrário, a riqueza dos Estados Unidos e do Canadá representa uma
profunda inversão da distribuição das fortunas, se comparado com o que havia
quando os europeus chegaram ao continente.
Essa inversão não teve nada a ver com a geogra a e, como já vimos, está
relacionada com o modo como essas áreas foram colonizadas. Também não se
limitou às Américas. Povos na China e no sul da Ásia (sobretudo no
subcontinente indiano) eram muito mais prósperos do que outros que viviam
em muitas outras partes do continente asiático e certamente mais do que os
povos que habitavam a Austrália e a Nova Zelândia. Esse cenário também se
inverteu à medida que Coreia do Sul, Singapura e Japão emergiam como as
nações mais ricas na Ásia, e a Austrália e a Nova Zelândia ultrapassavam quase
todas as nações asiáticas em termos de prosperidade. Mesmo dentro da África
subsaariana houve uma inversão semelhante. Antes do início do intenso
contato europeu com a África, a região sul daquele continente era a mais
escassamente habitada e a que estava mais longe de ter Estados desenvolvidos
com qualquer tipo de controle sobre seus territórios. No entanto, a África do
Sul é hoje uma das nações mais prósperas da África subsaariana. Voltando a
um momento anterior na história, observamos outra vez a grande
prosperidade nos trópicos; algumas das grandes civilizações pré-modernas,
como Angkor, no moderno Camboja, Vijayanagara, no sul da Índia, e Axum,
na Etiópia, oresceram nos trópicos, assim como as grandes civilizações de
Mohenjo Daro e Harapa, no Vale do Indo, localizado no Paquistão. A história,
portanto, deixa poucas dúvidas de que não existe uma conexão simples entre
localização tropical e sucesso econômico.
As doenças tropicais de fato causam grande sofrimento e altas taxas de
mortalidade infantil na África, mas não são o motivo da pobreza dos africanos.
As doenças são, em grande medida, consequência da pobreza e da
incapacidade ou da falta de vontade de governos de adotar as medidas de
saúde públicas necessárias para erradicá-los. A Inglaterra no século
também era um lugar bastante insalubre, porém o governo começou a investir
em água limpa, no tratamento adequado do esgoto e dos e uentes e em um
serviço de saúde e ciente. As melhores condições de saúde e o aumento na
expectativa de vida não foram a causa do sucesso econômico da Inglaterra, e
sim um dos frutos das mudanças políticas e econômicas. Isso também vale
para Nogales, Arizona.
A outra parte da hipótese geográ ca diz que os trópicos são pobres porque a
agricultura tropical é intrinsecamente pouco produtiva. Os solos tropicais são
ralos e incapazes de manter nutrientes, além de não resistirem muito à erosão
por chuvas torrenciais. Claro que existe algum mérito nesse argumento, mas,
como demonstraremos, o principal motivo para a produtividade agrícola a
produção agrícola por acre ser tão baixa em muitos países pobres,
particularmente na África subsaariana, pouco tem a ver com a qualidade do
solo. Na verdade, trata-se de uma consequência da estrutura de propriedade da
terra e dos incentivos que os governos e as instituições criam para os
proprietários de terras. Também vamos demonstrar que a desigualdade
mundial não pode ser explicada pelas diferenças na produtividade agrícola. A
grande desigualdade do mundo moderno, que emergiu no século , foi
causada por uma disseminação desigual das tecnologias industriais e da
produção de manufaturas, não pela divergência no desempenho agrícola.
Outra versão in uente da hipótese geográ ca é defendida pelo ecologista e
biólogo evolucionário Jared Diamond. Ele a rma que as origens da
desigualdade intercontinental no início do período moderno, há quinhentos
anos, se apoiavam na distribuição diferente de espécies de plantas e animais,
que posteriormente tiveram in uência sobre a produtividade agrícola. Em
alguns lugares, como o Crescente Fértil, no moderno Oriente Médio, havia
grande número de espécies passíveis de domesticação. Em outros lugares,
como as Américas, não. A existência de espécies de animais domesticáveis
facilitou a transição de um estilo de vida baseado em caça e coleta para um
baseado na agricultura. Como consequência, a agricultura se desenvolveu
primeiro no Crescente Fértil e só depois nas Américas. A densidade
populacional cresceu, permitindo a especialização do trabalho, o comércio, a
urbanização e o desenvolvimento político. Mais importante ainda, em lugares
onde a agricultura se tornou dominante, a inovação tecnológica teve
velocidade muito maior do que em outras partes do mundo. Assim, de acordo
com Diamond, a diferente disponibilidade de espécies animais e vegetais criou
intensidades diferentes de agricultura, o que levou a distintos caminhos de
mudanças tecnológicas e de prosperidade em diferentes continentes.
Embora seja uma abordagem poderosa para o enigma que se propõe a
resolver, a tese de Diamond não pode ser aplicada para explicar a desigualdade
do mundo moderno. Por exemplo, Diamond a rma que os espanhóis foram
capazes de dominar as civilizações das Américas em função de seu histórico
mais antigo como agricultores e de sua consequente superioridade
tecnológica. Porém, precisamos entender por que os mexicanos e os peruanos
que habitam as antigas terras dos astecas e dos incas são pobres. Embora ter
acesso a trigo, cevada e cavalos tenha tornado os espanhóis mais ricos do que
os incas, a diferença de renda entre os dois não era muito grande. A renda
média de um espanhol devia ser um pouco menor do que o dobro da renda
média de um cidadão do Império Inca. A tese de Diamond implica que, depois
de serem expostos a todas as novas espécies e às tecnologias que derivavam
delas e que não tinham sido capazes de desenvolver por conta própria, os incas
deveriam ter atingido os padrões de vida dos espanhóis. No entanto, nada do
gênero ocorreu. Pelo contrário, nos séculos e , a diferença de renda entre
a Espanha e o Peru cresceu muito. Hoje, o espanhol médio é seis vezes mais rico
do que o peruano médio. Essa diferença de renda está intimamente ligada à
disseminação desigual de tecnologias modernas, mas isso tem pouco a ver
com o potencial para domesticação de espécies animais e vegetais ou as
diferenças intrínsecas de produtividade agrícola entre a Espanha e o Peru.
Enquanto a Espanha, embora com certa defasagem, adotou as tecnologias
do motor a vapor, das ferrovias, da eletricidade, da mecanização e da produção
fabril, o Peru não o fez, ou, na melhor das hipóteses, o fez de modo muito lento
e imperfeito. Essa diferença tecnológica persiste ainda hoje e se reproduz em
uma escala maior à medida que novas tecnologias, sobretudo aquelas
relacionadas com a tecnologia da informação, dão impulso a um novo
crescimento em muitos países desenvolvidos e em alguns países que se
desenvolvem depressa. A tese de Diamond não nos diz por que essas
tecnologias cruciais não estão se difundindo pelo mundo e equalizando
rendas e não explica por que a metade norte de Nogales é muito mais rica do
que sua metade gêmea ao sul da cerca, embora ambas fossem parte da mesma
civilização quinhentos anos atrás.
A história de Nogales destaca outro grande problema na adaptação da tese
de Diamond: como já vimos, independente dos problemas que pudessem ter
em 1532, o Peru e o México eram, sem dúvida, mais prósperos do que aquelas
partes das Américas que vieram a se tornar os Estados Unidos e o Canadá. A
América do Norte se tornou mais próspera precisamente por ter adotado com
entusiasmo as tecnologias e os avanços da Revolução Industrial. A população
se tornou mais instruída, e as ferrovias se espalharam pelas Grandes Planícies,
em forte contraste com o que aconteceu na América do Sul. Isso não pode ser
explicado por diferenças geográ cas entre a América do Norte e a América do
Sul, uma vez que essas diferenças, na verdade, favoreceriam a América do Sul.
A desigualdade do mundo moderno resulta em grande medida das
diferenças no processo de disseminação e adoção de tecnologias, e a tese de
Diamond de fato inclui argumentos importantes sobre isso. Por exemplo, ele
a rma, seguindo a linha do historiador William McNeil, que a inclinação
oriente-ocidente das terras da Eurásia permitiu que as plantações, os animais e
as inovações se espalhassem a partir do Crescente Fértil para a Europa
Ocidental, ao passo que a distância norte-sul das Américas explica por que os
sistemas de escrita criados no México não se espalharam para os Andes ou para
a América do Norte. No entanto, a orientação geográ ca dos continentes não é
capaz de explicar a desigualdade do mundo hoje. Pense na África. Embora
tenha de fato representado uma barreira signi cativa para o movimento de
mercadorias e ideias do norte para a África subsaariana, o deserto do Saara não
era intransponível. Os portugueses, e depois outros europeus, navegaram pela
costa e minimizaram as diferenças de conhecimento em uma época cujas
disparidades de renda entre esses países eram bem menores em comparação
com as atuais. Desde então, a África não alcançou a Europa; pelo contrário,
hoje existe uma diferença de renda muito maior entre países africanos e
europeus.
Deveria car claro que a tese de Diamond, que trata da desigualdade entre
continentes, não serve para explicar as variações dentro de um mesmo
continente uma parte essencial da desigualdade mundial moderna. Por
exemplo, embora a inclinação das terras do continente eurasiano possa explicar
como a Inglaterra pôde se bene ciar das inovações do Oriente Médio sem
precisar reinventá-las, não explica por que a Revolução Industrial ocorreu na
Inglaterra e não, digamos, na Moldávia. Além disso, como o próprio Diamond
ressalta, a China e a Índia tinham bons conjuntos de animais e de plantas e
eram favorecidas pela orientação da Eurásia porém a maior parte das
pessoas pobres do mundo hoje está nesses dois países.
Na verdade, o melhor modo de compreender o escopo da tese de Diamond
é usando os mesmos termos das variáveis que ele utiliza em sua explicação. O
Mapa 4 (a seguir) mostra dados sobre a distribuição do Sus scrofa, o ancestral
do porco moderno, e dos auroques, antecessores da vaca moderna. Ambas as
espécies eram amplamente distribuídas pela Eurásia e até pelo norte da África.
Já o Mapa 5 (a seguir) mostra a distribuição de alguns ancestrais selvagens das
plantações mais comuns da atualidade, como a Oryza sativa, que deu origem
ao arroz cultivado na Ásia, e os ancestrais do trigo e da cevada modernos. O
mapa mostra que o ancestral do arroz era amplamente disseminado pelo sul e
pelo sudeste da Ásia, ao passo que os ancestrais da cevada e do trigo se
distribuíam por um longo arco do Levante, passando pelo Irã e chegando ao
Afeganistão e aos vários “istões” (Turcomenistão, Tadjiquistão e Quirguistão).
Essas espécies ancestrais estão presentes em grande parte da Eurásia, mas sua
ampla disseminação sugere que a desigualdade na Eurásia não pode ser
explicada por uma teoria que se baseie na incidência geográ ca das espécies.
A hipótese cultural
A segunda teoria amplamente aceita, a hipótese cultural, relaciona
prosperidade e cultura. A hipótese cultural, assim como a geográ ca, tem uma
linhagem renomada, que remonta pelo menos ao grande sociólogo alemão
Max Weber, o qual a rmava que a Reforma Protestante, com sua ética
protestante, desempenharam um papel fundamental em facilitar o surgimento
da sociedade industrial moderna na Europa Ocidental. A hipótese cultural
hoje não se apoia mais apenas na religião, ressaltando também outros tipos de
crença, valores e ética.
Embora não seja politicamente correto a rmar isso em público, muitas
pessoas continuam acreditando que os africanos são pobres por não terem
uma boa ética pro ssional, por ainda crerem em bruxarias e magia, ou por
resistirem a novas tecnologias ocidentais. Muitos também creem que a América
Latina jamais será rica porque seus povos são intrinsecamente libertinos e
desonestos e por terem uma espécie de cultura “ibérica”, ou cultura do
“mañana”. Claro, muitos também já acreditaram que a cultura chinesa e os
valores do confucionismo eram hostis ao crescimento econômico, embora hoje
se proclame que a ética pro ssional desse povo é um importante motor do
crescimento na China, em Hong Kong e em Singapura.
Sendo assim, a hipótese cultural é útil para compreender a desigualdade
mundial? Sim e não. Sim, no sentido de que as normas sociais, que estão
relacionadas à cultura, têm importância e podem ser difíceis de mudar, e por
vezes também são a base de diferenças institucionais, que são a explicação
deste livro para a desigualdade mundial. Mas na maioria dos casos não,
porque esses aspectos da cultura que costumam ser enfatizados religião,
ética nacional, valores africanos ou latinos simplesmente não são
importantes para compreender como chegamos aqui e por que as
desigualdades mundiais persistem. Outros aspectos, como até que ponto as
pessoas con am umas nas outras ou até que ponto são capazes de colaborar
entre si, são importantes, mas provêm essencialmente das instituições e não
consistem em uma causa independente.
Voltemos a Nogales. Como observamos, muitos aspectos da cultura são os
mesmos ao norte e ao sul da cerca. No entanto, pode haver diferenças claras no
que diz respeito a práticas, normas e valores, embora essas não sejam as causas
para os diferentes caminhos de desenvolvimento seguidos por esses dois
lugares, e sim seu resultado. Por exemplo, pesquisas mostram que os mexicanos
em geral declaram que con am menos em estranhos do que cidadãos dos
Estados Unidos. Mas não chega a surpreender que os mexicanos não
demonstrem con ança quando seu governo não consegue eliminar cartéis de
drogas ou oferecer um sistema judiciário que considerem funcional e
imparcial. Isso também vale para a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, como
discutiremos no capítulo seguinte. A Coreia do Sul é um dos países mais ricos
do mundo, ao passo que a Coreia do Norte luta contra a recorrente escassez de
alimentos e uma pobreza indecorosa. Embora a “cultura” atual seja muito
diferente no sul e no norte, não desempenhou qualquer papel na evolução dos
diferentes destinos econômicos dessas duas metades de uma nação. A
península Coreana teve um longo período de história compartilhada. Antes da
Guerra da Coreia e da divisão no paralelo 38, a península tinha uma
homogeneidade sem precedentes em termos de idioma, etnia e cultura. Assim
como em Nogales, o que importa é a fronteira. Ao norte há um regime
diferente, que impõe instituições diferentes, criando outros incentivos.
Qualquer diferença cultural entre as partes ao sul e ao norte da fronteira, tanto
no caso de Nogales quanto no da Coreia, não é causa das diferenças de
prosperidade, mas, sim, uma consequência.
E o que dizer da África e da cultura africana? Historicamente, a África
subsaariana era mais pobre do que outras partes do mundo, e suas civilizações
antigas não desenvolveram a roda, a escrita (à exceção da Etiópia e da
Somália) nem o arado. Embora essas tecnologias não fossem amplamente
usadas até o advento da colonização formal pelos europeus no m do século
e início do , as sociedades africanas as conheciam desde muito antes. Os
europeus começaram a navegar contornando a costa ocidental no m do
século , e os asiáticos navegavam para a África Oriental desde muito antes.
Podemos entender por que essas tecnologias não foram adotadas a partir da
história do Reino do Congo, na foz do rio Congo, que deu seu nome à
moderna República Democrática do Congo. O Mapa 6 mostra onde cava o
Reino do Congo, próximo a outro importante Estado do centro da África, o
Reino Cuba, que discutiremos mais adiante.
O Reino do Congo teve contato intenso com os portugueses depois da
primeira visita do marinheiro Diogo Cão, em 1483. Na época, o Congo era um
regime altamente centralizado segundo os padrões africanos, cuja capital,
Mbanza, tinha uma população de 60 mil habitantes e era uma cidade mais ou
menos do mesmo tamanho que a capital portuguesa, Lisboa, e maior que
Londres, com sua população de cerca de 50 mil pessoas em 1500. O rei do
Congo, Nzinga a Nkuwu, se converteu ao catolicismo e mudou seu nome para
João . Mais tarde, o nome Mbanza foi modi cado para São Salvador. Graças
aos portugueses, os congoleses conheceram a roda e o arado, tecnologias cuja
adoção até incentivaram por meio de missões agrícolas em 1491 e 1512. Mas
todas essas iniciativas fracassaram. No entanto, os congoleses estavam longe de
ser avessos a tecnologias modernas. Inclusive, não demoraram a adotar uma
venerável invenção ocidental: a arma de fogo. Essa nova e poderosa ferramenta
foi empregada para responder a incentivos de mercado: capturar e exportar
escravizados. Não há indícios de que os valores africanos ou a cultura do
continente tenham impedido a adoção de novas tecnologias e práticas.
Conforme aprofundavam o contato com os europeus, os congoleses adotaram
outras práticas ocidentais: letramento, estilos de vestuário e desenho de casas.
No século , muitas sociedades africanas também se bene ciaram das
crescentes oportunidades econômicas criadas pela Revolução Industrial ao
modi car seus padrões de produção. Na África Ocidental houve um rápido
desenvolvimento econômico baseado na exportação do óleo de palma e do
amendoim; na parte sul da África, foram desenvolvidos produtos de
exportação para as áreas do Rand, na África do Sul, que passavam por uma
rápida expansão nas atividades de mineração e da indústria. Entretanto, esses
promissores experimentos econômicos foram obliterados não pela cultura
africana nem pela incapacidade dos africanos comuns de agir no próprio
interesse, mas pelo colonialismo europeu, inicialmente, e, depois, pelos
governos africanos pós-independência.
O verdadeiro motivo para os congoleses não adotarem tecnologias
superiores foi a falta de incentivos. Eles enfrentavam o alto risco de ter toda a
produção expropriada e taxada pelo rei todo-poderoso, apesar de ele ter se
convertido ao catolicismo. Na verdade, não era apenas a propriedade deles que
corria riscos. A própria existência também cava por um o, dado que muitos
eram capturados e vendidos como escravos di cilmente o tipo de ambiente
que estimule investimentos a m de aumentar a produtividade a longo prazo.
O rei também não tinha incentivos para adotar o arado em larga escala nem
para priorizar a maior produtividade agrícola a exportação de escravos era
muito mais lucrativa.
Pode ser verdade que os africanos hoje con em menos uns nos outros do
que outros povos nas demais partes do mundo. No entanto, isso é resultado de
uma longa série de instituições que minaram os direitos humanos e o direito à
propriedade na África. A possibilidade de ser capturado e vendido como
escravo certamente in uenciou, do ponto de vista histórico, o grau de
con ança que os africanos sentem pelos outros.
Mapa 6: Reino do Congo, Reino Cuba, os bushongos e os leles.
E o que dizer da ética protestante de Max Weber? Embora possa ser verdade
que países predominantemente protestantes, como a Holanda e a Inglaterra,
tenham sido os primeiros casos de êxito econômico da era moderna, há pouca
relação entre religião e sucesso econômico. A França, um país majoritariamente
católico, não demorou a imitar o desempenho econômico dos holandeses e
dos ingleses no século , e a Itália hoje é tão próspera quanto qualquer uma
dessas nações. Olhando mais para o oriente, você verá que nenhum dos casos
de sucesso econômico no Leste Asiático tem a ver com qualquer forma de
religião cristã, portanto, lá também não há muito embasamento para uma
relação especial entre o protestantismo e o sucesso econômico.
Vamos analisar uma das regiões preferidas dos entusiastas da hipótese
cultural: o Oriente Médio. Os países de lá são, em sua maioria, islâmicos, e
entre eles os que não produzem petróleo são muito pobres, como já
observamos. Os produtores de petróleo são mais ricos, mas essa riqueza
inesperada pouco fez para criar economias modernas diversi cadas na Arábia
Saudita ou no Kuwait. Essa análise não demonstra de modo convincente que
a religião importa? Embora seja plausível, esse argumento também não está
correto. Sim, países como a Síria e o Egito são pobres, e suas populações são
majoritariamente muçulmanas. Entretanto, esses países também têm outras
diferenças que são bem mais importantes para a prosperidade. Para citar um
exemplo, todos foram províncias do Império Otomano, uma forte e adversa
in uência que moldou o modo como se desenvolveram. Depois da queda
do domínio otomano, o Oriente Médio foi absorvido pelos impérios coloniais
inglês e francês, o que, mais uma vez, tolheu suas possibilidades. Depois da
independência, seguiram o caminho de grande parte do antigo mundo
colonial ao desenvolverem regimes políticos hierárquicos e autoritários com
poucas das instituições políticas e econômicas que, segundo a rmaremos, são
cruciais para gerar o sucesso econômico. Esse caminho de desenvolvimento foi
forjado em grande medida pela história do domínio otomano e europeu. A
correlação entre a religião islâmica e a pobreza no Oriente Médio é, em grande
medida, falsa.
O papel que esses eventos históricos, mais do que fatores culturais, tiveram
na formação da trajetória econômica do Oriente Médio também ca evidente
quando observamos que as partes dessa região que romperam
temporariamente com o domínio do Império Otomano e das potências
europeias, como no caso do Egito entre 1805 e 1848, sob o governo de
Muhammad Ali, conseguiram embarcar em um caminho de rápida mudança
econômica. Muhammad Ali usurpou o poder depois da retirada das forças
francesas que haviam ocupado o Egito sob a liderança de Napoleão Bonaparte.
Na época, ao explorar a fraqueza do domínio otomano sobre o território
egípcio, ele foi capaz de fundar sua própria dinastia, que iria, sob diversas
formas, governar até a Revolução Egípcia liderada por Nasser, em 1952. As
reformas de Muhammad Ali, embora feitas à força, de fato levaram o Egito a
crescer, conforme a burocracia estatal, o Exército e o sistema tributário foram
modernizados e houve crescimento na agricultura e na indústria. No entanto,
esse processo de modernização e crescimento terminou com a morte de Ali,
quando o Egito retornou à in uência europeia.
Mas talvez essa seja a maneira errada de pensar sobre o papel da cultura.
Talvez os fatores culturais que mais importem não estejam associados à
religião e sim a “culturas nacionais” especí cas. Será que é a in uência da
cultura inglesa que explica por que países como os Estados Unidos, o Canadá e
a Austrália são tão prósperos? Embora de início pareça ser interessante, essa
ideia também não funciona. Sim, o Canadá e os Estados Unidos foram
colônias inglesas, mas Serra Leoa e Nigéria também foram. A variação de
prosperidade das antigas colônias inglesas é tão grande quanto a dos países do
mundo. O legado inglês não é o motivo para o sucesso da América do Norte.
Há ainda mais uma versão da hipótese cultural: pode ser que a comparação
mais importante não seja entre ingleses e não ingleses, mas, sim, entre
europeus e não europeus. Será que os europeus são superiores em função de
sua ética pro ssional, da perspectiva que têm da vida, dos valores judaico-
cristãos ou da herança romana? É verdade que a Europa Ocidental e a América
do Norte, povoadas principalmente por pessoas de origem europeia, são as
partes mais prósperas do mundo. Talvez seja o legado cultural superior dos
europeus que esteja na raiz da prosperidade. Esse é o último refúgio da
hipótese cultural, mas, infelizmente, essa versão tem tão pouco potencial de
explicação quanto as demais. A Argentina e o Uruguai, quando comparados
com a população do Canadá e dos Estados Unidos, têm proporcionalmente
mais descendentes de europeus, porém o desempenho econômico dos dois
países deixa muito a desejar. Japão e Singapura nunca tiveram muitos
habitantes de descendência europeia, mas são tão prósperos quanto muitas
partes da Europa Ocidental.
A China, apesar das muitas imperfeições em seu sistema econômico e
político, foi a nação que cresceu mais rápido nas três últimas décadas. A
pobreza do país até a morte de Mao Zedong nada tinha a ver com a cultura
chinesa, e sim ao modo desastroso como Mao organizou a economia e
conduziu a política. Nos anos 1950, ele promoveu o Grande Salto Adiante,
uma política de industrialização drástica que levou à penúria generalizada e à
fome no país. Nos anos 1960, ele propagou a Revolução Cultural, que gerou
uma perseguição de intelectuais e de pessoas instruídas qualquer um cuja
delidade ao partido pudesse ser questionada. Mais uma vez, a política trouxe
o terror e um imenso desperdício de talento e dos recursos da sociedade. Do
mesmo modo, o atual crescimento chinês não tem nada a ver com valores
chineses ou com mudanças na cultura da China; é resultado de um processo
de transformação econômica iniciado pelas reformas implementadas por Deng
Xiaoping e seus aliados, que, depois da morte de Mao Zedong , gradualmente
abandonaram as políticas econômicas e as instituições do socialismo, primeiro
na agricultura e depois na indústria.
Assim como acontece com a hipótese geográ ca, a hipótese cultural
também é inútil para explicar outros aspectos da situação que vemos no
mundo atual. Claro que existem outras diferenças de crenças, atitudes
culturais e valores entre os Estados Unidos e a América Latina, mas, assim
como no caso das diferenças que existem entre Nogales, Arizona, e Nogales,
Sonora, ou como no caso daquelas existentes entre as Coreias do Sul e do
Norte, essas disparidades são consequência das diferentes instituições e das
histórias institucionais dos dois lugares. Os fatores culturais que enfatizam
quanto a cultura “hispânica” ou “latina” moldaram o Império Espanhol não
conseguem explicar as diferenças na América Latina por exemplo, por que a
Argentina e o Chile são mais prósperos do que o Peru e a Bolívia. Outros tipos
de argumento cultural por exemplo, os que ressaltam a cultura indígena
contemporânea apresentam resultados igualmente ruins. A Argentina e o
Chile têm poucos povos indígenas quando comparados com Peru e Bolívia.
Embora isso seja verdade, a cultura indígena também não funciona como
explicação. Colômbia, Equador e Peru têm níveis semelhantes de renda, mas a
Colômbia tem, hoje, pouquíssimos povos indígenas, ao passo que Equador e
Peru têm muitos. Por m, atitudes culturais, que em geral mudam devagar,
di cilmente serão responsáveis por crescimentos milagrosos no Leste Asiático e
na China. Embora instituições também sejam persistentes, em certas
circunstâncias elas de fato mudam rápido, como veremos.
A hipótese da ignorância
A última teoria mais comum que tenta explicar por que certas nações são
pobres e outras são ricas é a hipótese da ignorância, a qual a rma que a
desigualdade mundial existe porque nós ou nossos governantes não
sabemos fazer com que países pobres enriqueçam. A ideia é sustentada por
muitos economistas, que partem da famosa de nição proposta pelo
economista inglês Lionel Robbins, em 1935, segundo a qual “a economia é a
ciência que estuda o comportamento humano como uma relação entre os ns
e meios escassos que têm usos alternativos”.
A partir daí basta um pequeno passo para concluir que a ciência econômica
deveria se concentrar na melhor forma de usar os meios escassos para satisfazer
ns sociais. Na verdade, o mais famoso resultado teórico na economia, o
chamado Primeiro Teorema do Bem-Estar, identi ca as circunstâncias sob as
quais a alocação de recursos em uma “economia de mercado” é socialmente
desejável de um ponto de vista econômico. Uma economia de mercado é uma
abstração concebida para retratar uma situação em que todos os indivíduos e
empresas podem produzir, comprar e vender livremente quaisquer produtos ou
serviços que desejem. Quando essas circunstâncias não estão presentes, existe
uma “falha de mercado”. Essas falhas são a base para uma teoria da
desigualdade mundial, considerando que, quanto mais negligenciadas as
falhas de mercado, mais pobre deve ser o país. A hipótese da ignorância a rma
que países pobres são pobres porque têm muitas falhas de mercado e os
economistas e responsáveis pelas políticas públicas não sabem como se livrar
delas e ouviram maus conselhos no passado. Países ricos são ricos porque
criaram melhores políticas e tiveram sucesso em eliminar essas falhas.
Será que a hipótese da ignorância pode explicar a desigualdade mundial?
Será que os países africanos são mais pobres do que o restante do mundo
porque seus líderes tendem a ter os mesmos pontos de vista equivocados sobre
como governá-los, levando-os à pobreza, ao passo que os líderes europeus são
mais bem informados ou mais bem aconselhados, o que explica seu relativo
sucesso? Embora haja exemplos famosos de líderes que adotaram políticas
desastrosas por estarem equivocados quanto às consequências, a ignorância,
na melhor das hipóteses, pode explicar apenas uma pequena parte da
desigualdade mundial.
Num primeiro momento, parece que a ignorância foi a causa do declínio
econômico contínuo que, em Gana, teve início logo depois da independência
da Grã-Bretanha. O economista britânico Tony Killick, que na época
trabalhava como conselheiro do governo de Kwame Nkrumah, registrou
muitos dos problemas com grandes detalhes. As políticas de Nkrumah se
concentraram no desenvolvimento da indústria estatal, o que se mostrou
muito ine ciente. Killick notou:
◆◆◆
A economia do paralelo 38 N
N 1945, da Segunda Guerra
Mundial, a colônia japonesa na Coreia começou a ruir. Um mês depois da
rendição incondicional do Japão, em 15 de agosto, a Coreia foi dividida no
paralelo 38 N em duas esferas de in uência. O sul era administrado pelos
Estados Unidos. O norte, pela Rússia. A paz frágil da Guerra Fria foi implodida
quando, em junho de 1950, o Exército norte-coreano invadiu o sul. Os norte-
coreanos, apesar de terem feito grandes incursões, chegando até a conquistar
Seul, a capital, bateram em retirada no outono. Foi quando Hwang Pyong-
won e seu irmão foram separados. Hwang Pyong-won conseguiu se esconder e
evitou ser convocado para o Exército norte-coreano. Ele permaneceu no sul,
onde trabalhou como farmacêutico. Seu irmão, um médico que trabalhava em
Seul tratando soldados feridos do Exército sul-coreano, foi levado quando o
Exército norte-coreano se retirou. Separados em 1950, eles se reencontraram
em 2000, em Seul, pela primeira vez em 50 anos, depois que os dois governos
nalmente concordaram em começar um programa limitado de reuni cação
de famílias.
Como médico, o irmão de Hwang Pyong-won acabou trabalhando para a
Força Aérea, um bom cargo numa ditadura militar. Porém, na Coreia do Norte,
mesmo aqueles com privilégios não vivem tão bem assim. Quando os irmãos se
encontraram, Hwang Pyong-won perguntou como era a vida ao norte do
paralelo 38 N. Hwang tinha um carro, mas o irmão, não. “Você tem telefone?”,
perguntou para o irmão. “Não”, respondeu ele. “Minha lha, que trabalha para
o Ministério de Relações Exteriores, tem um telefone, mas, se você não sabe o
código, não pode ligar.” Hwang Pyong-won ainda lembrou que, no encontro,
todas as pessoas do norte estavam pedindo dinheiro, então ofereceu um pouco
ao irmão. Mas o irmão disse: “Se eu voltar com dinheiro, o governo vai tomar
de mim, então que com ele.” Hwang Pyong-won percebeu que o casaco do
irmão estava surrado: “Troque de casaco comigo e volte usando este”, sugeriu.
“Não posso fazer isso”, respondeu o irmão. “Este casaco foi emprestado pelo
governo para a ocasião” Hwang Pyong-won ainda lembrou como, quando se
despediram, o irmão estava pouco à vontade e bastante nervoso, como se
alguém estivesse ouvindo. Ele era mais pobre do que Hwang Pyong-won havia
imaginado, e, mesmo dizendo que levava uma vida boa, parecia em péssimo
estado e estava magro como um graveto.
As pessoas na Coreia do Sul têm padrões de vida similares aos de Portugal e
da Espanha. Ao norte, na chamada República Popular Democrática da Coreia,
ou Coreia do Norte, o padrão de vida é semelhante ao de um país da África
subsaariana, cerca de um décimo do padrão médio da Coreia do Sul. A saúde
da Coreia do Norte é ainda pior; o norte-coreano médio pode esperar viver dez
anos a menos que seus vizinhos ao sul do paralelo 38 N. O Mapa 7 (a seguir) é
uma ilustração dramática da desigualdade econômica entre as Coreias: mostra
dados da intensidade de luz à noite a partir de imagens de satélite. A Coreia do
Norte é quase totalmente escura devido à falta de eletricidade; a Coreia do Sul
resplandece de luz.
Mapa 7: Luzes na Coreia do Sul e escuridão na Coreia do Norte.
Essas diferenças marcantes não são antigas. Na verdade, não existiam antes
do m da Segunda Guerra Mundial. Mas, depois de 1945, os diferentes
governos no norte e no sul adotaram maneiras diversas de organizar suas
economias. A Coreia do Sul foi conduzida pelo ex-aluno de Harvard e
Princeton, rmemente anticomunista, Syngman Rhee, que planejou as
primeiras instituições econômicas e políticas do país com apoio considerável
dos Estados Unidos. Rhee foi eleito presidente em 1948. Forjada no meio da
Guerra da Coreia e contrária à ameaça de expansão comunista ao sul do
paralelo 38 N, a Coreia do Sul não era uma democracia. Tanto Rhee quanto
seu sucessor igualmente famoso, o general Park Chung-Hee, asseguraram seus
lugares na história como presidentes autoritários. Mas ambos governaram uma
economia de mercado em que a propriedade privada era reconhecida, e, depois
de 1961, Park efetivamente colocou a força do Estado em prol do rápido
crescimento econômico, direcionando crédito e subsídios para empresas bem-
sucedidas.
A situação ao norte do paralelo 38 N era diferente. Kim Il-sung , um líder de
partidários comunistas antijaponeses durante a Segunda Guerra Mundial, se
estabeleceu como ditador em 1947 e, com a ajuda da União Soviética,
implantou uma forma rígida de economia planejada centralizada como parte
da chamada ideologia Juche. A propriedade privada se tornou ilegal, e o
mercado privado foi banido. As liberdades foram cerceadas não apenas no
ambiente de mercado, mas em todas as esferas da vida exceto para aqueles
que calhavam de ser parte de uma pequena elite mandatária próxima de Kim
Il-sung e, depois, de seu lho e sucessor Kim Jong-il.
Não deveria nos surpreender que os destinos econômicos das Coreias do
Sul e do Norte tenham seguido rumos tão distintos. O comando econômico
de Kim Il-sung e a ideologia Juche logo se revelaram um desastre. Estatísticas
detalhadas não estão disponíveis, pois a Coreia do Norte é um Estado pouco
transparente, para dizer o mínimo. Apesar disso, indícios con rmam o que
sabemos das frequentes ondas de fome: além de não conseguir desenvolver a
produção industrial, a Coreia do Norte de fato sofreu um colapso na
produtividade agrícola. A falta de propriedade privada signi ca que poucas
pessoas têm incentivos para investir ou fazer esforço para aumentar ou mesmo
manter a produtividade. O regime repressivo e sufocante é hostil à inovação e à
adoção de novas tecnologias. Mas Kim Il-sung , Kim Jong-il e seus comparsas
não têm a intenção de reformar o sistema, voltar a aceitar a propriedade
privada, os mercados e os contratos privados, ou mudar as instituições
econômicas e políticas. A Coreia do Norte continua estagnada
economicamente.
Enquanto isso, no sul, instituições econômicas encorajaram investimento e
comércio. Políticos sul-coreanos investiram em educação, conquistando altos
índices de alfabetização e acesso à escola. As empresas sul-coreanas foram
rápidas em aproveitar a população relativamente instruída, as políticas
estimulando investimentos e industrialização, a exportação e a transferência de
tecnologia. A Coreia do Sul logo se tornou uma das “Economias Milagrosas”,
uma das nações que cresceram mais rápido no mundo.
No m da década de 1990, após cerca de meio século, o crescimento da
Coreia do Sul e a estagnação da Coreia do Norte levaram a uma diferença de
dez vezes entre as duas metades do país anteriormente unido imagine a
diferença que alguns séculos podem causar. Quando comparado ao sucesso
econômico da Coreia do Sul, o desastre econômico da Coreia do Norte, que
levou milhões à fome, é marcante: nem a cultura, nem a geogra a, nem a
ignorância podem explicar os caminhos divergentes da Coreia do Norte e da
Coreia do Sul. Temos de procurar as respostas nas instituições.
◆◆◆
Mecanismos de prosperidade
Instituições econômicas inclusivas criam mercados inclusivos, que não apenas
dão às pessoas liberdade para seguirem suas vocações e buscarem carreiras que
melhor se adaptem a seus talentos, mas também criam um campo igualitário
que lhes dá oportunidade para isso. Aqueles que têm boas ideias serão capazes
de abrir negócios; os trabalhadores tendem a ir para atividades nas quais sua
produtividade é maior, e empresas menos e cientes podem ser substituídas por
outras mais e cientes. Compare o modo como as pessoas escolhem suas
ocupações em mercados inclusivos com o que ocorria no Peru e na Bolívia
coloniais, onde, sob o sistema da mita, muitos eram forçados a trabalhar nas
minas de prata e mercúrio, a despeito de suas habilidades ou de sua vontade.
Mercados inclusivos não são apenas mercados livres. Barbados do século
também tinha mercados próprios. Entretanto, assim como falhavam em
fornecer direito à propriedade para todos, garantindo-os apenas para uma
pequena elite de produtores, esses mercados não eram inclusivos; os mercados
de escravizados eram, na verdade, parte de instituições econômicas que
sistematicamente coagiam a maioria da população e impediam as pessoas de
escolherem suas ocupações e o modo como deveriam usar seus talentos.
As instituições econômicas inclusivas também pavimentaram o caminho
para dois outros mecanismos de prosperidade: tecnologia e educação. O
crescimento econômico sustentável é quase sempre acompanhado pelo avanço
tecnológico que permite o crescimento de produtividade das pessoas (mão de
obra), da terra e do capital existente (prédios, máquinas e assim por diante).
Pense em seus tataravôs, que, há apenas um século, não tinham acesso a aviões
ou carros e à maior parte dos remédios e cuidados médicos que agora damos
como garantidos, sem mencionar água encanada, ar-condicionado,
shoppings, rádio ou cinemas; isso sem falar em tecnologia da informação,
robótica ou máquinas controladas por computador. Voltando mais algumas
gerações, o conhecimento tecnológico e os padrões de vida eram ainda mais
atrasados, tanto que temos di culdade em imaginar como a maioria das
pessoas sobrevivia. Esses avanços são derivados da ciência e de empreendedores
como omas Edison, que usava a ciência para criar negócios lucrativos. Esse
processo de inovação é viável por meio das instituições econômicas que
promovem a propriedade privada, garantem contratos, criam campos
igualitários e incentivam e permitem a entrada de novos negócios, que podem
trazer novas tecnologias para a vida. Portanto, não deveria ser surpreendente ter
sido a sociedade norte-americana, não o México nem o Peru, quem produziu
omas Edison, e ter sido a Coreia do Sul, não a Coreia do Norte, que hoje
fomenta empresas tecnologicamente inovadoras como a Samsung e a
Hyundai.
Intimamente ligados à tecnologia estão a educação, as habilidades, as
competências e o conhecimento da força de trabalho, adquiridos nas escolas,
em casa e no trabalho. Somos muito mais produtivos do que há um século, e
não apenas por causa da melhora tecnológica agregada às máquinas, mas
também pela grande quantidade de conhecimento dos trabalhadores. Toda a
tecnologia do mundo teria pouco uso sem trabalhadores que soubessem como
operá-la. Mas as habilidades e competências não se resumem à capacidade de
operar máquinas. São a educação e as habilidades da força de trabalho que
geram o conhecimento cientí co sobre o qual nosso progresso é construído e
que permitem adaptações e adoções dessas tecnologias em diversos tipos de
negócio. Apesar de termos visto no Capítulo 1 que muitos dos inovadores que
surgiram a partir da Revolução Industrial, como omas Edison, não tinham
uma alta escolaridade, suas inovações eram muito mais simples do que a
tecnologia moderna. Hoje, a mudança tecnológica demanda formação tanto
do inovador quanto do trabalhador. E aqui vemos a importância das
instituições econômicas que criam um campo igualitário. Os Estados Unidos
conseguiram formar, ou atrair do exterior, pessoas como Bill Gates, Steve Jobs,
Sergey Brin, Larry Page, Jeff Bezos e centenas de cientistas que zeram
descobertas fundamentais na tecnologia da informação, na energia nuclear, na
biotecnologia e em outros campos que auxiliaram esses empreendedores a
construírem seus negócios. O estoque de talento estava lá para ser utilizado
porque a maioria dos adolescentes nos Estados Unidos tem acesso à formação
acadêmica que quiserem ou que forem capazes de obter. Agora imagine uma
sociedade diferente, por exemplo o Congo ou o Haiti, onde uma grande fração
da população não tem condições de frequentar a escola, ou onde, se
conseguirem ir à escola, a qualidade do ensino é lamentável, os professores não
aparecem para trabalhar e, ainda que apareçam, pode não haver livro
disponível para as aulas.
O baixo nível de instrução dos países pobres é causado por instituições
econômicas que falham em criar incentivos para que pais eduquem seus lhos
e instituições políticas que não conseguem induzir o governo a construir,
nanciar e apoiar escolas e os desejos dos pais e das crianças. O preço que essas
nações pagam pela baixa escolarização da população e pela falta de mercados
inclusivos é alto: não conseguem mobilizar seu talento natural. Há muitos Bill
Gates em potencial e talvez um ou dois Albert Einsteins trabalhando como
agricultores pobres e sem instrução, coagidos a fazer o que não querem ou
convocados pelo Exército, porque nunca tiveram a oportunidade de descobrir
sua vocação.
A habilidade das instituições econômicas de utilizar o potencial presente
em mercados inclusivos, de estimular a inovação tecnológica, de investir em
pessoas e de mobilizar talentos e habilidades de uma grande quantidade de
indivíduos é decisiva para o crescimento econômico. Explicar por que tantas
instituições econômicas falham em atingir esses objetivos simples é o tema
central deste livro.
A construção de instituições
inclusivas
A Inglaterra foi um caso único, fazendo a passagem para um crescimento
econômico sustentado ainda no século . As grandes mudanças
econômicas foram precedidas por uma revolução que gerou um novo conjunto
de instituições econômicas e políticas, muito mais inclusivas do que qualquer
uma da sociedade anterior. Essas instituições teriam implicações profundas
não apenas para os incentivos econômicos e a prosperidade, mas também na
de nição de quem colheria os benefícios dessa prosperidade. E não foram
criadas por consenso. Na verdade, resultaram de intenso con ito entre os
grupos que competiam pelo poder, contestando a autoridade uns dos outros e
tentando estruturar instituições que lhes fossem favoráveis. O ápice das
disputas institucionais dos séculos e foram dois acontecimentos
decisivos: a Guerra Civil Inglesa, entre 1642 e 1651, e, sobretudo, a Revolução
Gloriosa de 1688.
A Revolução Gloriosa limitou o poder do rei e do Executivo, realocando
para o Parlamento o poder de determinar as instituições econômicas. Ao
mesmo tempo, abriu o sistema político para uma ampla parcela da sociedade,
que exercia uma in uência considerável sobre o modo como o Estado
funcionava. A Revolução Gloriosa foi a base para a criação de uma sociedade
plural, e não só iniciou, como também acelerou o processo de centralização
política. Foi a criação do primeiro conjunto de instituições políticas inclusivas
do mundo.
Como consequência, as instituições econômicas também passaram a se
tornar mais inclusivas. Nem a escravidão nem as severas restrições econômicas
do período feudal medieval, como a servidão, existiam na Inglaterra em
princípios do século . No entanto, havia muitas restrições quanto às
atividades econômicas que as pessoas podiam desenvolver. Tanto a economia
doméstica quanto a internacional estavam estranguladas por monopólios. O
Estado estabelecia taxas arbitrárias e manipulava o sistema legal. A maior parte
das terras estava presa a formas arcaicas de direitos de propriedade que
impossibilitavam a venda e tornavam arriscado qualquer investimento.
Isso mudou depois da Revolução Gloriosa. O governo adotou um conjunto
de instituições econômicas que oferecia incentivos aos investimentos, ao
comércio e à inovação. Essas instituições deram garantias quanto ao direito de
propriedade, incluindo a concessão de patentes sobre ideias, oferecendo assim
um grande estímulo para a inovação. Elas protegiam a lei e a ordem. A
aplicação da lei inglesa a todos os cidadãos foi uma inovação histórica sem
precedentes. A taxação arbitrária cessou, e os monopólios foram quase
completamente extintos. O Estado inglês proporcionou intenso incentivo às
atividades mercantis e trabalhou para promover a indústria nacional, não
apenas removendo barreiras à expansão da atividade industrial, como também
usando todo o poder da Marinha inglesa para defender os interesses mercantis.
Ao criar uma lógica racional para os direitos de propriedade, a Inglaterra
facilitou a construção de infraestrutura, sobretudo de rodovias, canais e, mais
tarde, ferrovias, que se revelariam cruciais para o crescimento industrial.
Esses fundamentos estabeleceram mudanças cruciais nos incentivos para
que a população engajasse em atividades econômicas e deram impulso aos
motores da prosperidade, pavimentando o caminho para a Revolução
Industrial. Antes de mais nada, a Revolução Industrial dependia de grandes
avanços tecnológicos que explorassem a base de conhecimento acumulado na
Europa nos séculos anteriores. Foi uma ruptura radical com o passado,
possibilitada pela investigação cientí ca e pelos talentos de vários indivíduos
singulares. A plenitude da força dessa revolução veio do mercado que criou
oportunidades lucrativas para que tecnologias fossem desenvolvidas e
aplicadas. Foi a natureza inclusiva dos mercados que permitiu que as pessoas
dedicassem seus talentos aos negócios adequados. A revolução também se
apoiou na educação e nas habilidades das pessoas, pois foram os níveis
relativamente altos de instrução, pelo menos segundo os padrões da época, que
permitiram o surgimento de empreendedores com visão para empregar as
novas tecnologias em seus negócios e encontrar trabalhadores com capacidade
para usá-las.
Não é coincidência que a Revolução Industrial tenha começado na
Inglaterra poucas décadas depois da Revolução Gloriosa. Os grandes
inventores, como James Wa (que aperfeiçoou o motor a vapor), Richard
Trevithick (construtor da primeira locomotiva a vapor), Richard Arkwright
(inventor da máquina de ar) e Islamabad Kingdom Brunel (criador de várias
embarcações a vapor revolucionárias), foram capazes de desfrutar as
oportunidades econômicas geradas por suas ideias, con avam que o direito à
propriedade seria respeitado e tinham acesso a mercados em que suas
inovações podiam ser vendidas e usadas de modo lucrativo. Em 1775, pouco
depois de ter renovada a patente de seu motor a vapor, que ele chamava de
“motor de fogo”, James Wa escreveu ao pai:
Caro Pai,
Depois de uma série de variadas e violentas oposições, consegui
nalmente um Ato do Parlamento concedendo a mim e meus
representantes o direito de propriedade sobre meus novos motores
de fogo em toda a Grã-Bretanha e nas colônias pelos próximos 25
anos, o que espero que me traga muitos benefícios, já que ainda há
demanda considerável por esses motores.
Mapa 9: A Armada espanhola, naufrágios e lugares relevantes que determinaram o ponto de virada.
Conjunturas críticas também podem resultar em grandes mudanças rumo
a instituições mais extrativistas. Instituições inclusivas, muito embora contem
com um ciclo próprio de retroalimentação, o círculo virtuoso, também podem
ser transformadas e se tornarem cada vez mais extrativistas em função de
desa os enfrentados em conjunturas críticas e a ocorrência disso, também
nesse caso, é contingente. A República de Veneza, como veremos no Capítulo
6, deu grandes passos rumo a instituições políticas e econômicas mais
inclusivas no período medieval. Entretanto, embora essas instituições tenham
aos poucos se fortalecido na Inglaterra depois da Revolução Gloriosa, em
Veneza acabaram por se transformar em instituições extrativistas sob o controle
de uma pequena elite que monopolizou tanto as oportunidades econômicas
quanto o poder político.
◆◆◆
◆◆◆
O institucional traçado pelo Japão no século
mais uma vez ilustra a interação entre conjunturas críticas e pequenas
diferenças criadas pelas distinções nas instituições. O Japão, assim como a
China, tinha um governo absolutista. A família Tokugawa assumiu o poder
em 1600 e governou num sistema feudal que também baniu o comércio
internacional. O Japão também se deparou com uma conjuntura crítica criada
pela intervenção ocidental quando quatro navios de guerra dos Estados
Unidos, comandados por Ma hew C. Perry, entraram na baía de Edo, em
julho de 1853, exigindo concessões comerciais semelhantes às que a Inglaterra
obtivera com os chineses durante as Guerras do Ópio. Porém, essa conjuntura
crítica teve desdobramentos muito diferentes no Japão. Apesar da proximidade
e das interações frequentes, no século a China e o Japão já eram
institucionalmente muito diferentes.
Embora o governo dos Tokugawa, no Japão, fosse absolutista e extrativista,
seu domínio sobre os líderes dos demais grandes domínios feudais era frágil e
estava suscetível a contestações. Na China, apesar de haver rebeliões de
camponeses e disputas civis, o absolutismo era mais forte, e a oposição, menos
organizada e autônoma. Não havia equivalentes aos líderes de outros
domínios feudais na China que pudessem desa ar o governo absolutista do
imperador e traçar um caminho institucional alternativo. Essa diferença
institucional, em muitos sentidos pequena, se comparada às diferenças que
separavam a China e o Japão da Europa Ocidental, teve consequências cruciais
durante a conjuntura crítica criada pela chegada violenta de ingleses e norte-
americanos. A China continuou o caminho absolutista depois das Guerras do
Ópio, ao passo que a ameaça americana uniu a oposição ao governo dos
Tokugawa no Japão e levou a uma revolução política, a Restauração Meiji,
como veremos no Capítulo 10. Essa revolução permitiu o desenvolvimento de
instituições políticas e econômicas mais inclusivas e criou as bases para o
rápido crescimento que se seguiu no Japão, ao passo que a China de nhava
sob o absolutismo.
O modo como o Japão reagiu à ameaça dos navios de guerra dos Estados
Unidos, dando início a um processo de transformação de seus fundamentos
institucionais, nos ajuda a compreender mais um aspecto do mundo que
temos hoje à nossa volta: as transições que levam da estagnação ao
crescimento acelerado. Coreia do Sul, Taiwan e por m China atingiram taxas
astronômicas de crescimento desde a Segunda Guerra Mundial, seguindo um
caminho semelhante ao do Japão. Em todos esses casos, o crescimento foi
precedido por mudanças históricas nas instituições econômicas do país
embora nem sempre nas instituições políticas, como ca claro no caso chinês.
O modo como períodos de crescimento acelerado chegam a um m
abrupto e retrocedem segue a mesma lógica. Assim como passos decisivos
rumo a instituições econômicas inclusivas podem detonar o crescimento
econômico, um afastamento brusco das instituições inclusivas pode desaguar
na estagnação. Mais frequentemente, porém, o m de períodos de crescimento
acelerado, como na Argentina ou na União Soviética, é uma consequência do
declínio do crescimento ocorrido sob instituições extrativistas. Como vimos,
isso pode ocorrer tanto em função de con itos internos pelos espólios da
economia extrativista, que levam a um colapso do regime, quanto em função
da ausência de inovação e destruição criativa, inerente em países dominados
por instituições extrativistas, que criam um limite para o crescimento
sustentado. No próximo capítulo, será discutido com mais detalhes o exemplo
dos soviéticos, que sofreram fortes consequências ao colidir contra esse teto.
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Eu vi o futuro
D desempenham um papel decisivo na explicação
do crescimento econômico ao longo da história. Mas se a maior parte das
sociedades até hoje se baseou em instituições políticas e econômicas
extrativistas, então o crescimento jamais ocorre? Obviamente não. Instituições
extrativistas, por lógica própria, devem criar riqueza para ser extraída. Um
governante que monopoliza o poder político e está no controle de um Estado
centralizado pode introduzir algum grau de ordem pública e um sistema de
regras, assim como estimular a atividade econômica.
Contudo, o crescimento que ocorre em sociedades com instituições
extrativistas é diferente do crescimento gerado por instituições inclusivas. Mais
importante, não será o tipo de crescimento sustentado que exige mudanças
tecnológicas, e sim baseado nas tecnologias existentes. A trajetória econômica
da União Soviética oferece um exemplo vívido de como a autoridade e os
incentivos do Estado podem acelerar o crescimento econômico de uma
sociedade com instituições extrativistas e de como, em última instância, esse
tipo de crescimento chega a um colapso.
A Primeira Guerra Mundial havia acabado, e as potências vencedoras e
derrotadas se encontraram no grande Palácio de Versalhes, nas proximidades
de Paris, para decidir os parâmetros da paz. Dentre os participantes, chamava a
atenção a presença de Woodrow Wilson, presidente dos Estados Unidos. A
ausência notável era a de alguém que representasse a Rússia. O velho regime
czarista tinha sido derrubado pelos bolcheviques em outubro de 1917. No
período, houve uma guerra civil entre os vermelhos (bolcheviques) e os
brancos. Os ingleses, os franceses e os norte-americanos enviaram uma força
expedicionária para combater os bolcheviques. Uma missão liderada por um
jovem diplomata, William Bulli , e pelo intelectual e jornalista veterano
Lincoln Steffens foi enviada a Moscou para se encontrar com Lênin e tentar
entender as intenções dos bolcheviques e como conviver com eles. Steffens
cara famoso como iconoclasta, um jornalista especializado em arrasar
reputações sempre denunciando os males do capitalismo nos Estados Unidos.
Ele havia estado na Rússia na época da revolução. A ideia era que sua presença
desse credibilidade à missão, para que não parecesse excessivamente hostil. A
missão voltou com o esboço de uma oferta de Lênin sobre o que seria
necessário para garantir a paz com a recém-criada União Soviética. Steffens
estava boquiaberto com o que imaginava ser o grande potencial do regime
soviético.
“A Rússia soviética”, lembraria em sua autobiogra a de 1931, “era um
governo revolucionário com um plano evolucionário. O plano não era
empregar ação direta contra males como a pobreza e a riqueza, a corrupção, os
privilégios, a tirania e a guerra, mas sim extirpar suas causas. Uma ditadura
havia sido instaurada, apoiada por uma pequena minoria treinada, para
promover e manter por algumas gerações um rearranjo cientí co das forças
econômicas que resultaria, primeiro, em uma democracia econômica e, por m,
em uma democracia política”.
Quando voltou da missão diplomática, Steffens foi se encontrar com seu
velho amigo, o escultor Jo Davidson, que estava fazendo um busto do rico
nancista Bernard Baruch. “Então você esteve na Rússia”, observou Baruch.
“Estive no futuro, e ele funciona”, respondeu Steffens, que aperfeiçoaria esse
adágio até assumir a forma que entrou para a história: “Eu vi o futuro, e ele
funciona.”
Até o início dos anos 1980, muitos ocidentais viam o futuro na União
Soviética e acreditavam que estava funcionando. Em certo sentido funcionava
mesmo, ou pelo menos funcionou durante um tempo. Lênin morreu em 1924,
e em 1927 Stálin já havia consolidado seu domínio sobre o país. Ele expurgou
os oponentes e deu início a uma rápida industrialização, o que foi feito com
estímulos ao Comitê Estatal de Planejamento, a Gosplan, fundada em 1921. A
Gosplan elaborou o primeiro Plano Quinquenal, para os anos de 1928 a 1933.
O crescimento econômico no estilo de Stálin era simples: desenvolver a
indústria por meio do governo e obter os recursos necessários para garantir o
desenvolvimento impondo impostos muito altos à agricultura. O Estado
comunista não tinha um sistema de tributação e ciente, então Stálin
“coletivizou” a agricultura. Esse processo levou à abolição da propriedade
privada sobre a terra e à aglomeração de toda a população do campo em
fazendas coletivas gigantes administradas pelo Partido Comunista. Ficou
muito mais fácil para Stálin se apropriar da produção agrícola e usá-la para
alimentar todas as pessoas que estavam construindo e operando as novas
fábricas. As consequências disso para a população rural foram calamitosas. As
fazendas coletivas não ofereciam nenhum incentivo para que os trabalhadores
se esforçassem, e a produção caiu bruscamente. A expropriação era tão grande
que não sobrava o su ciente para alimentar a população rural, que começou a
morrer de fome. Ao todo, é provável que a fome tenha ceifado 6 milhões de
vidas, ao mesmo tempo que outras centenas de milhares de pessoas foram
assassinadas ou banidas para a Sibéria durante a coletivização forçada.
Nem a indústria recém-criada nem as fazendas coletivizadas eram
economicamente e cientes, no sentido de fazerem o melhor uso dos recursos
que estavam à disposição da União Soviética. Soa como uma receita para o
desastre econômico e a estagnação, e talvez até para o colapso puro e simples.
Mas a União Soviética cresceu bastante, e bem rápido. Não é difícil
compreender por quê. Permitir que as pessoas tomem as próprias decisões por
meio dos mercados é o melhor caminho para que uma sociedade utilize seus
recursos de forma e ciente. Quando, em vez disso, o Estado ou uma pequena
elite controla todos os recursos, ocorre que não são criados os incentivos
adequados nem há alocação e ciente das capacidades e dos talentos das
pessoas. Em certos casos, porém, a produtividade da mão de obra e do capital
pode ser tão mais alta em um setor ou atividade, como era no caso da indústria
pesada na União Soviética, que mesmo um processo imposto, alocando
recursos arbitrariamente para garantir essa alta produtividade, pode gerar
crescimento em uma sociedade com instituições extrativistas. Como vimos no
Capítulo 3, as instituições extrativistas nas ilhas do Caribe, como Barbados,
Cuba, o Haiti e a Jamaica, conseguiram gerar níveis de renda relativamente
altos por alocar recursos para a produção do açúcar, uma mercadoria cobiçada
em todo o mundo. A produção do açúcar baseada em trabalho escravizado
certamente não era “e ciente”, e não houve nem mudanças tecnológicas nem
destruição criativa nessas sociedades, mas isso não impediu que esses países
obtivessem certo crescimento mesmo em meio a instituições extrativistas. A
situação foi semelhante na União Soviética, com a indústria desempenhando o
papel que o açúcar exercia no Caribe. Além disso, o crescimento industrial na
União Soviética foi facilitado porque a tecnologia local era muito atrasada se
comparada com o que havia na Europa e nos Estados Unidos, o que permitia a
obtenção de ganhos maiores na realocação de recursos para o setor industrial,
mesmo que fosse uma distribuição ine ciente e feita por imposição.
Antes de 1928, a maioria dos russos vivia no campo. A tecnologia usada
pelos camponeses era primitiva, e havia poucos incentivos para aumentar a
produtividade. Na verdade, os últimos vestígios do feudalismo russo só foram
erradicados pouco antes da Primeira Guerra Mundial. Sendo assim, havia um
imenso potencial econômico não aproveitado para a realocação dessa força de
trabalho da agricultura para a indústria. A industrialização stalinista fez um
aproveitamento brutal desse potencial. Por decreto, Stálin fez com que esses
recursos muito mal utilizados fossem realocados para a indústria, onde
podiam ser empregados de maneira mais produtiva, ainda que a indústria em
si fosse organizada de maneira pouco e ciente em relação ao que podia ser
realizado. Na verdade, entre 1928 e 1960, a renda nacional cresceu 6% ao ano,
provavelmente o surto de crescimento mais rápido na história até então. Esse
crescimento econômico acelerado não foi propiciado por mudanças
tecnológicas, e sim pela realocação de força de trabalho e pelo acúmulo de
capital por meio da criação de novas ferramentas e fábricas.
O crescimento foi tão rápido que enganou gerações de ocidentais, não
apenas Lincoln Steffens. Enganou a CIA, nos Estados Unidos. Enganou os
próprios líderes soviéticos, como Nikita Kruschev, que numa célebre frase, num
discurso para diplomatas ocidentais em 1956, se gabou de que “nós vamos
enterrar vocês [o Ocidente]”. Ainda em 1977, um livro didático acadêmico
importante, escrito por um economista inglês, a rmava que as economias de
estilo soviético eram superiores às capitalistas em termos de crescimento
econômico, oferecendo pleno emprego e estabilidade de preços e até mesmo
produzindo pessoas com motivações altruístas. O pobre e velho capitalismo
ocidental só era melhor quando se tratava de oferecer liberdade política. Na
verdade, o livro didático mais utilizado para ensinar economia nas
universidades, escrito por Paul Samuelson, vencedor do Nobel, trazia múltiplas
previsões sobre o domínio econômico iminente da União Soviética. Na edição
de 1961, Samuelson previu que a renda nacional soviética poderia já
ultrapassar a dos Estados Unidos em 1984, mas que havia grandes chances de
isso ocorrer até no máximo 1997. Na edição de 1980, houve pouca mudança
na análise, embora as duas datas tenham sido adiadas para 2002 e 2012.
Embora pudessem produzir um rápido crescimento econômico, as políticas
de Stálin e dos líderes soviéticos que o sucederam não podiam produzir um
crescimento sustentado. Na década de 1970, o crescimento tinha praticamente
parado. A lição mais importante é que instituições extrativistas não são capazes
de gerar mudanças tecnológicas sustentadas, e isso por dois motivos: a falta de
incentivos econômicos e a resistência das elites. Além disso, depois que todos
os recursos que eram empregados sem muita e ciência foram realocados para a
indústria, restaram poucos ganhos econômicos a serem obtidos por decreto.
Com isso, o sistema soviético chegou ao limite; a falta de inovação e os frágeis
incentivos econômicos impediam qualquer progresso adicional. Na única área
em que os soviéticos conseguiram manter alguma inovação, isso só foi possível
por meio de enormes esforços em tecnologia militar e aeroespacial. Como
resultado, eles conseguiram colocar o primeiro animal, a cadela Laika, e o
primeiro homem, Yuri Gagarin, no espaço. Também deixaram ao mundo o
legado da AK-47.
A Gosplan era a agência de planejamento supostamente onipotente
encarregada do planejamento central da economia soviética. Um dos
benefícios da sequência de planos quinquenais elaborados e administrados
pela Gosplan seria o horizonte de longo prazo necessário para realizar
investimentos e inovações racionais. Na verdade, o que foi realizado na
indústria soviética pouco teve a ver com os planos quinquenais,
frequentemente revisados e reescritos ou mesmo ignorados. O
desenvolvimento da indústria se deu com base nas ordens de Stálin e do
Politburo, que mudavam bastante de ideia e muitas vezes modi cavam
completamente as decisões anteriores. Todos os planos eram rotulados como
“esboços” ou “preliminares”. Apenas uma cópia de um plano rotulado como
“ nal” voltado para a indústria de bens de consumo de 1939 chegou a
ser conhecida. O próprio Stálin disse, em 1937, que “só um burocrata poderia
acreditar que o trabalho de planejamento acaba com a criação do plano. A
criação do plano é só o começo. A verdadeira direção do plano se dá depois de
organizá-lo”. Stálin queria maximizar sua liberdade para recompensar pessoas
ou grupos politicamente leais e punir os que não fossem. Quanto à Gosplan,
seu principal papel era oferecer informações para que Stálin pudesse monitorar
seus amigos e inimigos. A agência, na verdade, evitava tomar decisões. Quem
tomasse uma decisão que desse errado poderia ser fuzilado. Melhor evitar
qualquer responsabilidade.
Um exemplo do que poderia ocorrer caso você levasse seu trabalho a sério
demais, em vez de tentar prever o que o Partido Comunista queria, é oferecido
pelo censo soviético de 1937. Quando os resultados foram tabulados, cou
claro que o censo revelaria uma população de cerca de 162 milhões de pessoas,
bem menor do que os 180 milhões que Stálin previra, inclusive abaixo dos 168
milhões que o próprio Stálin anunciara em 1934. O censo de 1937 foi o
primeiro realizado desde 1926 e, portanto, o primeiro depois das grandes
fomes e dos expurgos do início da década de 1930. Os números corretos da
população re etiam isso. A reação de Stálin foi mandar prender os responsáveis
pela organização do censo, que foram enviados para a Sibéria ou assassinados.
Ele determinou a realização de um novo censo, concluído em 1939. Dessa vez,
os organizadores anunciaram o resultado certo: descobriram que a população
era, na verdade, de 171 milhões.
Stálin compreendia que na economia soviética as pessoas tinham poucos
incentivos para se esforçar. Uma resposta natural teria sido a introdução de tais
incentivos e modos de recompensar melhorias; e, em alguns momentos, foi o
que ele fez por exemplo, ao direcionar cargas de alimentos para áreas onde a
produtividade estivesse baixa. Além disso, já em 1931, ele desistiu da ideia de
criar “homens e mulheres socialistas” que trabalhassem sem incentivos
monetários. Em um famoso discurso, criticou “os fanáticos da igualdade” e daí
em diante não só fez com que diferentes pro ssionais recebessem salários
diferentes, como também criou um sistema de bônus. É educativo
compreender como o esquema funcionava. Tradicionalmente, uma empresa
em um sistema de planejamento central precisava atingir uma meta de
produção estabelecida pelo plano, embora esses planos volta e meia fossem
renegociados e modi cados. A partir da década de 1930, os trabalhadores
recebiam bônus quando as metas eram batidas. Esses bônus podiam ser
bastante altos, chegando a 37% do salário no caso de gestores ou de
engenheiros seniores. Mas esses pagamentos geraram todo tipo de desestímulo
à mudança tecnológica. Entre outras coisas, a inovação, que retirava recursos
da produção, aumentava o risco de que a meta não fosse batida e de que o
bônus não fosse pago. Outra razão consistia no fato de que as metas, em geral,
eram estabelecidas com base em níveis anteriores de produção. Isso criou um
incentivo imenso para nunca expandir a produção, pois isso signi cava ter de
produzir mais no futuro, já que as metas seguintes seriam “elevadas”. Produzir
menos do que o possível era sempre o melhor meio de garantir que atingiriam
as metas e receberiam os bônus. O fato de que os bônus eram pagos
mensalmente também mantinha todos focados no presente, e a inovação tem
a ver com sacri car o presente em nome de ter mais no futuro.
Mesmo quando os bônus e incentivos eram e cientes para modi car o
comportamento, era comum que criassem outros problemas. O planejamento
central simplesmente não conseguia substituir aquilo que o grande
economista do século Adam Smith chamou de “mão invisível” do
mercado. Quando o plano era formulado em toneladas das folhas de aço, a
folha era feita com um peso excessivo. Quando era formulado em termos de
área das folhas de aço, as folhas eram feitas com uma espessura muito na.
Quando o plano para candelabros era feito em toneladas, eles cavam tão
pesados que o teto mal conseguia sustentá-los.
Nos anos 1940, os líderes da União Soviética tinham plena consciência
desses incentivos perversos, ao contrário de seus admiradores ocidentais. Esses
líderes agiam como se se tratasse de problemas técnicos, que poderiam ser
consertados. Por exemplo, deixaram de pagar bônus baseados em metas de
produção e passaram a permitir que as empresas separassem uma porção de
seus lucros para pagar os bônus. Mas o lucro não era um incentivo maior à
inovação do que eram as metas de produção. O sistema de preços usado para
calcular os lucros era quase totalmente desconectado do valor das inovações
ou da tecnologia. Ao contrário do que ocorre numa economia de mercado, os
preços na União Soviética eram estabelecidos pelo governo, por isso tinham
pouca relação com o valor. Para criar incentivos mais ligados à inovação, em
1946, a União Soviética criou bônus dedicados explicitamente à inovação. Já
em 1918, fora identi cada a necessidade de oferecer recompensas nanceiras
para trabalhos inovadores, porém as recompensas estabelecidas eram pequenas
e não estavam relacionadas com o valor da nova tecnologia. Isso só mudou em
1956, quando se estipulou que os bônus deveriam ser proporcionais à
produtividade da inovação. No entanto, como a produtividade era calculada
levando-se em conta benefícios econômicos medidos pelo sistema de preços
existente, isso também não representaria um grande incentivo para a inovação.
Seria possível preencher muitas páginas com exemplos dos incentivos perversos
que esses esquemas geraram. Por exemplo, como o tamanho do fundo que
pagava os bônus de inovação era limitado pela folha de pagamentos da
empresa, o que reduzia o incentivo para produzir ou adotar qualquer inovação
que pudesse economizar em mão de obra.
Focar nas diferentes regras e esquemas de bônus tende a mascarar os
problemas inerentes do sistema. Enquanto a autoridade política e o poder
estivessem nas mãos do Partido Comunista, seria impossível mudar a essência
dos incentivos básicos oferecidos, com ou sem bônus. Desde sua origem, o
Partido Comunista não tinha usado apenas cenouras como incentivos para
conseguir o que queria, mas também chibatas e porretes. No caso da
produtividade na economia não foi diferente. Um conjunto de leis criou várias
ofensas criminais para trabalhadores que zessem corpo mole. Em junho de
1940, por exemplo, uma lei tornou a vadiagem, de nida como qualquer
período de vinte minutos de ausência não autorizada do posto de trabalho ou
mesmo de inatividade, uma infração passível de ser punida com seis meses de
trabalhos forçados e corte de 25% no salário. Todo tipo de punição como essa
foi criada, e eram aplicadas com uma frequência espantosa. Entre 1940 e 1955,
36 milhões de pessoas, cerca de um terço da população adulta, foi considerada
culpada de tais ofensas. Desses, 15 milhões foram enviados à prisão, e 250 mil
foram fuzilados. Por ano, 1 milhão de pessoas ia para a cadeia por violações da
lei trabalhista; isso sem falar nos 2,5 milhões de pessoas que Stálin exilou nos
gulags da Sibéria. Ainda assim, não funcionou. Embora seja possível transferir
alguém para uma fábrica, é impossível forçar as pessoas a pensar e a ter boas
ideias ameaçando-as de fuzilamento. Esse tipo de coação poderia gerar uma
alta produtividade de açúcar em Barbados ou na Jamaica, mas não tinha como
compensar a falta de incentivos em uma economia industrial moderna.
O fato de que incentivos realmente e cazes não seriam implantados
naquela economia de planejamento central não se devia a erros técnicos na
concepção dos esquemas de bônus. Na verdade, era intrínseco ao método pelo
qual o crescimento extrativista havia sido obtido, conquistado por meio de
ordens governamentais, o que só dava conta de resolver alguns problemas
econômicos básicos. Contudo, estimular o crescimento econômico sustentado
exigia que os indivíduos usassem seus talentos e suas ideias, e isso jamais
poderia ser feito em um sistema econômico de estilo soviético. Os governantes
da União Soviética teriam de abandonar as instituições econômicas
extrativistas, mas esse movimento teria colocado seu poder político em risco.
Na verdade, quando Mikhail Gorbachev começou a se afastar das instituições
econômicas extrativistas, depois de 1987, o poder do Partido Comunista
desmoronou e, com ele, a União Soviética.
◆◆◆
À
Às margens do Cassai
Um dos grandes a uentes do rio Congo é o Cassai. Com as nascentes em
Angola, o rio ruma para o norte e se funde com o Congo a nordeste de
Kinshasa, a atual capital congolesa. Embora a República Democrática do
Congo seja pobre em comparação com o restante do mundo, sempre houve
diferenças signi cativas de prosperidade entre os vários grupos no país. O rio
Cassai é a fronteira entre dois desses grupos. Logo depois de entrar no Congo,
ao longo da margem ocidental encontramos o povo lele; na margem oriental
estão os bushongo (Mapa 6). À primeira vista, deveria haver poucas diferenças
entre esses dois grupos no que diz respeito à prosperidade, pois são separados
somente por um rio, que pode ser atravessado de barco. Os dois grupos têm
uma origem comum e falam línguas próximas. Além disso, muito de sua
produção e arquitetura têm estilo semelhante, inclusive as casas, as roupas e os
barcos.
No entanto, quando a antropóloga Mary Douglas e o historiador Jan
Vansina estudaram esses grupos, na década de 1950, descobriram algumas
diferenças espantosas entre os dois. Nas palavras de Douglas: “Os lele são
pobres, ao passo que os bushongo são ricos (...) Tudo que os lele têm ou fazem,
os bushongo têm mais ou fazem melhor.” É fácil pensar em explicações simples
para essa desigualdade. Uma diferença, que lembra o que ocorre entre os
lugares do Peru que estiveram ou não sujeitos à mita de Potosí, é o fato de que
os lele produzem para subsistência, enquanto os bushongo produzem para
comercialização. Douglas e Vansina também observaram que os lele usavam
tecnologia inferior. Por exemplo, não empregavam redes na caça, mesmo que
seu uso aumentasse bastante a produtividade. Douglas a rmou: “A ausência
de redes é coerente com uma tendência geral dos lele de não investirem tempo
e trabalho em equipamentos de longo prazo.”
Havia também importantes distinções nas tecnologias e na organização da
agricultura. Os bushongo praticavam uma forma so sticada de agricultura
mista, com cinco espécies plantadas sucessivamente, em um sistema de rotação
de dois anos. Eles cultivavam inhame, batata-doce, mandioca e feijão e
colhiam duas, às vezes três, safras de milho por ano. Os lele não contavam com
esse sistema e só conseguiam uma safra anual de milho.
Também havia diferenças notáveis na lei e na ordem. Os lele moravam em
aldeias forti cadas dispersas e estavam constantemente em con ito. Qualquer
um que se deslocasse entre duas aldeias ou simplesmente entrasse na oresta
para coletar comida estava sujeito a ser atacado ou raptado. No território dos
bushongo, isso quase nunca acontecia.
O que estava por trás dessas diferenças nos padrões de produção, de
tecnologia agrícola e de prevalência da ordem? Obviamente não era a
geogra a que induzia os lele a usar tecnologias inferiores de caça e agricultura.
Certamente não era a ignorância, pois eles conheciam as ferramentas
utilizadas pelos bushongo. Uma explicação alternativa poderia ser a cultura
será que a cultura dos lele não os incentivava a investir em redes de caça e em
casas mais resistentes e mais bem construídas? Mas isso não parece ser verdade.
Como acontecia no caso dos povos do Congo, os lele estavam muito
interessados na aquisição de armamentos, e Douglas chegou a observar que
“sua avidez pela compra de armas (...) mostra que a cultura não os restringe a
técnicas inferiores que não exigem colaboração e esforço a longo prazo”.
Portanto, nem uma aversão cultural à tecnologia, nem a ignorância, nem a
geogra a explicam a maior prosperidade dos bushongo em comparação com
os lele.
O motivo das diferenças entre esses dois povos está nas diferentes
instituições políticas que surgiram em seus territórios. Já observamos que os
lele viviam em aldeias forti cadas que não eram parte de uma estrutura política
uni cada. Era diferente do outro lado do Cassai. Por volta de 1620, uma
revolução política liderada por um homem chamado Shyaam criou o Reino
Cuba, que vimos no Mapa 6, com os bushongo em posição central e ele
próprio como rei. Antes desse período, provavelmente havia poucas diferenças
entre os bushongo e os lele; as diferenças surgiram como consequência do
modo como Shyaam reorganizou a sociedade na margem oriental do rio. Ele
construiu um Estado e uma pirâmide de instituições políticas. Essas
instituições, além de signi cativamente mais centralizadas do que as de antes,
também envolviam estruturas bastante elaboradas. Shyaam e seus sucessores
criaram uma burocracia para aumentar a tributação, além de um sistema legal
e uma força policial para impor a lei. Os líderes eram scalizados por
conselhos, que deviam ser consultados antes das decisões. Havia até mesmo
julgamentos por júri, fato aparentemente único na África subsaariana antes do
colonialismo europeu. No entanto, o Estado centralizado de Shyaam era uma
ferramenta de extração altamente absolutista. Ele não era escolhido pelo voto, e
a política de Estado era imposta de cima, não de nida por participação
popular.
Essa revolução política que criou uma centralização estatal e impôs a lei e a
ordem no Reino Cuba levou, por sua vez, a uma revolução econômica. A
agricultura foi reorganizada, e novas tecnologias foram adotadas para
aumentar a produtividade. As culturas a que se dedicavam foram substituídas
por outras, de maior rendimento, vindas das Américas (em particular, milho,
mandioca e pimenta). O ciclo intenso de rotação de safras foi introduzido
nessa época, e a quantidade de alimentos produzidos per capita dobrou. Para
adotar essas culturas e reorganizar o ciclo agrícola, foram necessárias mais
mãos no campo. Por isso, a idade de casamento foi reduzida para 20 anos, o
que levou os homens a servirem mais jovens como mão de obra na agricultura.
O contraste com o outro grupo é notável: os homens lele tendiam a se casar
aos 35 e só então iam trabalhar nos campos. Antes disso, dedicavam a vida ao
combate e à pilhagem.
A conexão entre a revolução política e a revolução econômica foi simples. O
rei Shyaam e seus apoiadores desejavam cobrar impostos e extrair riqueza dos
povos do Reino Cuba, que precisavam produzir um excedente além do que eles
próprios consumiam. Embora Shyaam e seus homens não tenham
introduzido instituições inclusivas na margem oriental do rio Cassai, certo
grau de prosperidade econômica é intrínseco a instituições extrativistas que
atingem um mínimo de centralização estatal e conseguem impor a lei e a
ordem. Incentivar a atividade econômica, obviamente, era de interesse de
Shyaam e seus homens, do contrário não haveria nada a ser extraído. Assim
como no caso de Stálin, Shyaam criou por decreto um conjunto de instituições
que gerariam a riqueza necessária para sustentar o sistema. Em comparação à
absoluta ausência de lei e ordem que reinava na outra margem do Cassai, o
Reino Cuba teve uma prosperidade econômica signi cativa ainda que
grande parte provavelmente casse para Shyaam e suas elites. No entanto, era
uma prosperidade limitada. Assim como no caso da União Soviética, não
houve destruição criativa nem inovação tecnológica no Reino Cuba depois
dessa mudança inicial. Essa situação seguia mais ou menos inalterada na
época em que o reino foi encontrado pelas autoridades coloniais belgas, no m
do século .
◆◆◆
O Longo Verão
Por volta de 15.000 a.C., a Era do Gelo chegou ao m, e o clima da Terra se
aqueceu. Indícios no gelo da Groenlândia sugerem que as temperaturas
médias subiram até 15°C em um curto espaço de tempo. Esse aquecimento
parece ter coincidido com rápidos aumentos nas populações humanas à
medida que o aquecimento global levou à expansão das populações de
animais e à maior disponibilidade de plantas selvagens e alimentos. Esse
processo foi logo revertido em torno de 14.000 a.C., por um período de
resfriamento conhecido como Dryas Recente, mas, depois de 9.600 a.C., as
temperaturas globais voltaram a subir, cerca de 7°C em menos de uma década,
e desde então permaneceram altas. O arqueólogo Brian Fagan chama esse
período de Longo Verão. O aquecimento do clima foi uma grande conjuntura
crítica, que criou o cenário para a Revolução do Neolítico, na qual as
sociedades humanas zeram a transição para a vida sedentária, a agricultura e
a pecuária. Isso e o restante da história humana que se seguiu podem ser vistos
como a humanidade desfrutando seu Longo Verão.
Há uma diferença fundamental entre agricultura e pecuária e entre caça e
coleta. O primeiro par de atividades se baseia na domesticação de plantas e
espécies animais, com intervenção ativa em seus ciclos de vida para modi car a
genética e tornar as espécies mais úteis para os humanos. A domesticação é
uma mudança tecnológica que permite a produção de muito mais alimentos a
partir das plantas e dos animais disponíveis. A domesticação do milho, por
exemplo, começou quando os humanos colheram o teosinto, a planta
selvagem que é sua ancestral. As espigas do teosinto eram muito pequenas, de
poucos centímetros. Seriam espigas anãs, na comparação com o milho
moderno. No entanto, pouco a pouco, por meio da seleção de espigas maiores
de teosinto e plantas cujas espigas não quebravam, cando no talo para serem
colhidas, os humanos criaram o milho moderno, uma cultura que oferece
muito mais alimentos a partir do mesmo pedaço de terra.
Os primeiros indícios de agricultura, pastoreio e domesticação de plantas e
animais vêm do Oriente Médio, em particular da área conhecida como ancos
montanhosos, que se estende do sul da atual Israel, passando pela Palestina,
pela margem ocidental do rio Jordão e pela Síria e entrando no sudoeste da
Turquia, no norte do Iraque e no oeste do Irã. As primeiras plantas domésticas,
o farro e a cevada de duas leiras, foram encontradas em Jericó, na margem
ocidental do rio Jordão, na Palestina, aproximadamente em 9.500 a.C.; e farro,
ervilhas e lentilhas foram encontradas em Tell Aswad, mais ao norte na Síria.
Ambos eram sítios da chamada cultura natu ana e ambos sustentavam
grandes vilarejos; o de Jericó possivelmente tinha uma população de
quinhentas pessoas na época.
Por que as primeiras aldeias com agricultura apareceram ali, e não em
outros lugares? Por que foram os natu anos, e não outros povos, que
domesticaram as ervilhas e as lentilhas? Será que tiveram sorte e calharam de
viver num local onde havia muitos candidatos à domesticação? Embora isso
seja verdade, muitos outros povos viviam em meio a essas espécies, porém não
as domesticaram. Como visto no Capítulo 2, nos Mapas 4 e 5, pesquisas de
geneticistas e arqueólogos sobre a distribuição dos ancestrais selvagens de
animais e plantas domesticados modernos revelam que muitos desses
ancestrais estavam espalhados por áreas imensas, de milhões de quilômetros
quadrados. Os ancestrais selvagens das espécies animais estavam
disseminados por toda a Eurásia. Embora fossem particularmente bem
guarnecidos em termos de espécies selvagens de cultivo, os ancos
montanhosos estavam longe de serem únicos. Viver em uma área
particularmente dotada de espécies selvagens não foi o que tornou os
natu anos especiais. O que os diferenciou foi o fato de serem sedentários antes
de começarem a domesticar plantas ou animais. Um indício desse
sedentarismo vem de dentes de gazela, compostos de um tecido conjuntivo
ósseo que cresce em camadas. Durante a primavera e o verão, quando o
crescimento desse tecido é mais rápido, as camadas têm uma cor diferente das
formadas no inverno. Com um corte no dente, é possível ver a cor da última
camada criada antes de a gazela morrer. Usando essa técnica, é possível
determinar se a gazela foi morta no verão ou no inverno. Nos sítios natu anos,
encontram-se gazelas mortas em todas as estações, o que sugere uma
residência permanente durante o ano. O vilarejo de Abu Hureyra, no rio
Eufrates, é um dos assentamentos natu anos pesquisados com mais
intensidade. Durante quase quarenta anos, arqueólogos examinaram as
camadas do lugar, que oferece um dos exemplos mais bem documentados de
vida sedentária antes e depois da transição para a agricultura. O assentamento
provavelmente surgiu em torno de 9.500 a.C., e os habitantes continuaram
com o estilo de caça e coleta por mais quinhentos anos antes de passarem para
a agricultura. Os arqueólogos estimam que a população da aldeia antes da
agricultura cava entre cem e trezentas pessoas.
Pode-se pensar em todo tipo de motivo para que uma sociedade considere o
sedentarismo vantajoso. A vida nômade é custosa: as crianças e os velhos
precisam ser carregados, e é impossível armazenar comida para tempos de
penúria quando se está sempre em movimento. Além disso, ferramentas como
pedras de moagem e foices eram úteis para processar alimentos selvagens, mas
são pesadas para carregar. Existem indícios de que até mesmo caçadores-
coletores nômades armazenavam alimentos em locais selecionados, como
cavernas. Um dos atrativos do milho é o fato de ser facilmente armazenável, e
essa é uma razão fundamental para que tenha sido cultivado com tanta
intensidade nas Américas. A capacidade de armazenar e estocar alimentos com
mais e cácia deve ter sido um incentivo essencial para a adoção de um estilo
de vida sedentário.
Embora do ponto de vista coletivo possa ser desejável se tornar sedentário,
isso não signi ca que a mudança necessariamente vá ocorrer. Um grupo
nômade de caçadores-coletores teria que concordar em fazer isso, ou algo
precisaria forçá-los à mudança de comportamento. Alguns arqueólogos
sugeriram que a densidade populacional cada vez maior e o declínio dos
padrões de vida foram fatores fundamentais no surgimento da vida sedentária,
forçando povos nômades a permanecerem em um só lugar. No entanto, a
densidade nos sítios natu anos não é maior do que nos grupos anteriores,
então não parece haver indícios de grande crescimento populacional. Indícios
obtidos em esqueletos e dentes também não sugerem a deterioração da saúde.
Por exemplo, a escassez de alimentos tende a criar linhas nas no esmalte dos
dentes, uma condição chamada hipoplasia. Essas linhas, na verdade, são
menos comuns nos povos natu anos do que em povos agrícolas posteriores.
O mais importante é que, embora a vida sedentária tivesse seus pontos
positivos, também tinha problemas. A resolução de con itos provavelmente era
muito mais difícil no caso de grupos sedentários, uma vez que as discordâncias
não eram tão fáceis de resolver quanto nos casos de grupos em constante
movimento. Depois que as pessoas constroem habitações permanentes e
passam a ter mais pertences do que são capazes de carregar, mudar-se vira uma
opção muito menos atrativa. Por isso, os vilarejos precisavam ter meios mais
e cazes de resolução de con itos e noções mais elaboradas de propriedade. Era
preciso decidir quem tinha acesso a cada lote de terra perto do vilarejo, ou
quem podia pegar as frutas de quais árvores e pescar em qual parte do riacho.
Era preciso desenvolver regras e elaborar as instituições que criariam e fariam
valer tais regras.
Portanto, para que a vida sedentária surgisse, parece plausível que os
caçadores-coletores tivessem que ser forçados a se estabelecer, e isso deveria ser
precedido por uma inovação institucional que concentrasse poder nas mãos de
um grupo que se tornaria a elite política, garantiria os direitos de propriedade,
manteria a ordem e se bene ciaria de seu status, extraindo recursos do restante
da sociedade. Na verdade, uma revolução política semelhante à iniciada pelo
rei Shyaam, ainda que em menor escala, provavelmente foi o avanço que levou
à vida sedentária.
Os indícios arqueológicos de fato sugerem que, muito antes de se tornarem
agricultores, os natu anos desenvolveram uma sociedade complexa
caracterizada pela hierarquia, pela ordem e pela desigualdade princípios
daquilo que reconheceríamos como instituições extrativistas. Um indício
bastante convincente dessa hierarquia e dessa desigualdade vem dos túmulos
natu anos. Algumas pessoas eram enterradas com grandes quantidades de
obsidiana e conchas de moluscos scaphopoda, que vinham do litoral do
Mediterrâneo, perto do monte Carmelo. Também há outros tipos de
ornamento, como colares, jarreteiras e braceletes, feitos de dentes caninos e
falanges de cervos, além de conchas. Outras pessoas eram enterradas sem
qualquer ornamento. As conchas e a obsidiana eram comercializadas, e o
controle desse comércio muito provavelmente era uma fonte de acúmulo de
poder e desigualdade. Outros indícios de desigualdade econômica e política
vêm do sítio natu ano de Ain Mallaha, pouco ao norte do mar da Galileia. Em
meio a um grupo de mais ou menos cinquenta cabanas circulares e muitos
poços, nitidamente utilizados para armazenamento, há uma edi cação com
grossas camadas de reboco perto de uma clareira central. Essa edi cação quase
certamente era a casa de um chefe. Entre os sepultamentos no sítio, alguns são
muito mais elaborados, e também existem indícios de um culto a caveiras,
possivelmente indicando adoração dos ancestrais. Esses cultos eram
disseminados em sítios natu anos, particularmente em Jericó. A
preponderância de indícios de sítios natu anos sugere que essas sociedades
provavelmente já tinham instituições elaboradas que determinavam a herança
do status de elite. Elas faziam comércio com lugares distantes e tinham formas
nascentes de religião e hierarquias políticas.
O surgimento de elites políticas provavelmente criou primeiro a transição
para a vida sedentária e depois para a agricultura. Como mostram os sítios
natu anos, a vida sedentária não necessariamente tem relação com agricultura
e pastoreio. As pessoas podiam se xar e continuar a viver de caça e coleta.
A nal, o Longo Verão tornou as plantas selvagens mais abundantes, e a caça e
a coleta provavelmente se tornaram mais atrativas. A maioria poderia se
contentar com uma vida de subsistência baseada em caça e coleta que não
exigia muito esforço. A inovação tecnológica também não leva
necessariamente à maior produção agrícola. Na verdade, sabe-se que uma
grande inovação tecnológica a introdução do machado de aço no grupo
dos povos aborígenes australianos conhecidos como Yir Yoront redundou
não em produção mais intensa, e sim em mais horas de sono, porque a
ferramenta permitia que as exigências da subsistência fossem atingidas com
mais facilidade e havia pouco incentivo para que as pessoas trabalhassem mais.
A explicação tradicional, baseada na geogra a, para a Revolução do
Neolítico o cerne da argumentação de Jared Diamond que discutimos no
Capítulo 2 é de que foi motivada pela disponibilidade fortuita de muitas
espécies de plantas e animais que podiam ser domesticadas. Isso tornou a
agricultura e o pastoreio atrativos e induziu a vida sedentária. Depois de se
tornarem sedentárias e darem início à agricultura, as sociedades começaram a
desenvolver hierarquia política, religião e instituições signi cativamente mais
complexas. Embora seja bastante aceita, os indícios dos natu anos sugerem
que essa explicação tradicional põe o carro na frente dos bois. Mudanças
institucionais ocorreram em sociedades um bom tempo antes da transição
para a agricultura, e provavelmente foram a causa tanto da passagem para o
sedentarismo, que reforçou as mudanças institucionais, quanto, mais tarde, da
Revolução do Neolítico. Esse padrão é sugerido não apenas pelos indícios dos
ancos montanhosos, a área estudada com maior intensidade, como também
pela preponderância de indícios das Américas, da África subsaariana e do Leste
Asiático.
A transição para a agricultura com certeza aumentou a produtividade
agrícola e permitiu uma expansão populacional signi cativa. Por exemplo, em
sítios como Jericó e Abu Hureyra, é possível ver que os primeiros vilarejos
agrícolas eram muito maiores do que os anteriores à agricultura. Em geral, os
vilarejos cresciam de duas a seis vezes após a transição. Além disso, muitas das
consequências tradicionalmente associadas à transição sem dúvida ocorreram.
Houve maior especialização das ocupações, progresso tecnológico mais rápido
e provavelmente o desenvolvimento de instituições mais complexas e que
deviam ser menos igualitárias. Mas a ocorrência disso em um lugar especí co
não foi determinada pela disponibilidade de espécies de plantas e animais. Na
verdade, foi consequência de a sociedade ter passado pelo tipo de inovações
institucionais, sociais e políticas que permitiram o surgimento da vida
sedentária e da agricultura.
Embora tenham possibilitado a mudança, o Longo Verão e a presença de
espécies vegetais e animais não determinaram onde ou quando exatamente ela
ocorreria depois do aquecimento do clima. Na verdade, essa mudança foi
determinada pela interação de uma conjuntura crítica, o Longo Verão, com
pequenas mas importantes diferenças institucionais relevantes. À
medida que o clima se aquecia, algumas sociedades, como as dos natu anos,
desenvolveram elementos de instituições centralizadas e uma hierarquia,
embora em escala muito pequena se comparadas com os modernos Estados-
nação. Como no caso dos bushongo, governados por Shyaam, as sociedades se
reorganizaram para aproveitar oportunidades criadas pela abundância de
plantas e animais selvagens, e sem dúvida as elites foram as principais
bene ciárias dessas novas oportunidades e do processo de centralização
política. Outros lugares, com instituições apenas ligeiramente diferentes, não
permitiram que suas elites aproveitassem essa conjuntura e caram para trás
no processo de centralização política e na criação de sociedades xadas à terra,
agrícolas e mais complexas. Isso pavimentou o caminho para uma divergência
posterior, do tipo que já vimos. Depois de surgirem, essas diferenças se
disseminaram para alguns lugares, porém não para outros. Por exemplo, a
agricultura se espalhou do Oriente Médio para a Europa em torno de 6.500
a.C., principalmente como consequência da migração de agricultores. Na
Europa, as instituições se distanciaram de outras partes do mundo, como a
África, onde as instituições iniciais eram diferentes e as inovações que o Longo
Verão proporcionou no Oriente Médio só ocorreram muito mais tarde, e
mesmo assim de outra forma.
◆◆◆
A extração instável
A agricultura surgiu de modo independente em várias partes do mundo. No
território que hoje é o México, sociedades se formaram, estabeleceram Estados e
assentamentos e zeram a transição para a agricultura. Como no caso dos
natu anos no Oriente Médio, também atingiram certo grau de crescimento
econômico. As cidades-Estado maias no sul do México, em Belize, na
Guatemala e na parte ocidental de Honduras na verdade construíram uma
civilização bastante so sticada sob um tipo particular de instituições
extrativistas. A experiência maia ilustra não apenas a possibilidade de
crescimento sob essas instituições, como também outro limite a esse
crescimento: a instabilidade política que, em última instância, leva ao colapso
tanto da sociedade quanto do Estado à medida que diferentes grupos e povos
lutam para se tornarem extratores.
As cidades maias começaram a se desenvolver em torno de 500 a.C., e
acabaram dando errado em algum ponto do século d.C. Um novo modelo
político emergiu então, criando as bases para a Era Clássica, entre 250 d.C. e
900 d.C. Esse período marca o pleno orescimento da cultura e da civilização
maias. Contudo, essa civilização mais so sticada também entraria em colapso
ao longo dos seiscentos anos seguintes. Quando os conquistadores espanhóis
chegaram, no início do século , os grandes templos e palácios de sítios
maias, como Tikal, Palenque e Calakmul, tinham sido tomados pela oresta e
só foram descobertos no século .
As cidades maias jamais se uni caram num império, embora algumas
fossem subservientes a outras e pareçam ter cooperado com frequência,
sobretudo na guerra. A principal conexão entre as cidades-Estado da região,
cinquenta das quais podemos reconhecer por seus glifos, é o fato de seus povos
falarem cerca de 31 línguas diferentes, porém intimamente relacionadas. Os
maias desenvolveram um sistema de escrita, e há pelo menos 15 mil inscrições
remanescentes descrevendo vários aspectos da vida da elite, da cultura e da
religião. Eles também tinham um calendário so sticado para registrar as datas,
conhecido como Contagem Longa. Era muito semelhante ao nosso calendário
pelo fato de contar os anos a partir de uma data xa e era usado por todas as
cidades maias. A Contagem Longa começava em 3114 a.C., embora não
saibamos que signi cado os maias atribuíam a essa data, muito anterior ao
surgimento de qualquer coisa que se assemelhe à sociedade em que viviam.
Os maias eram construtores talentosos e inventaram o cimento. Suas
edi cações e inscrições oferecem informações vitais sobre as trajetórias de suas
cidades, registros de episódios datados de acordo com a Contagem Longa.
Observando a totalidade das cidades maias, os arqueólogos são capazes de
contar quantas edi cações foram concluídas em anos especí cos. Em torno de
500 d.C., havia poucos monumentos datados. Por exemplo, a data da
Contagem Longa correspondente a 514 d.C. registrava só dez. Houve então
um crescimento regular, chegando a vinte em 672 d.C. e a quarenta em
meados do século . Depois disso, o número de monumentos datados cai.
No século , ca em menos de dez por ano, e no século , chega a zero. Essas
inscrições datadas nos dão um panorama claro da expansão das cidades maias
e de sua posterior contração a partir do século .
A análise das datas pode ser complementada pela análise das listas de reis
registradas pelos maias. Na cidade maia de Copán, hoje na parte ocidental de
Honduras, há um famoso monumento conhecido como Altar Q. O Altar Q
registra os nomes de todos os reis, começando pelo fundador da dinastia,
K’inich Yax K’uk’Mo’, ou “Rei Sol-Verde, Primeiro Quetzal Arara”. Esse nome
homenageia não apenas o Sol, mas também dois pássaros exóticos da oresta
centro-americana cujas penas eram imensamente valorizadas. K’inich Yax
K’uk’Mo’ chegou ao poder em Copán em 426 d.C., o que sabemos pela data
da Contagem Longa registrada no Altar Q. Ele fundou uma dinastia que
reinou por quatrocentos anos. Alguns de seus sucessores tinham nomes
igualmente grá cos. O glifo do 13º governante se traduz como “Coelho 18”,
que foi sucedido por “Macaco Fumaça” e depois por “Concha Fumaça”, que
morreu em 763 d.C. O último nome no altar é o do rei Yax Pasaj Chan Yoaat,
ou “Céu do Primeiro Amanhecer, Deus Relâmpago”, que foi o 16º governante
dessa linhagem e assumiu o trono após a morte de “Concha Fumaça”. Depois
dele, sabemos apenas de mais um rei, Ukit Took, ou “Patrono do Sílex”, em
função de um fragmento de altar. Depois de Yax Pasaj, as edi cações e
inscrições pararam, e parece que a dinastia logo foi destronada. Ukit Took
provavelmente sequer possuía direito real ao trono; é possível que fosse um
farsante.
Existe um último modo de analisar esses indícios em Copán, desenvolvido
pelos arqueólogos AnnCorinne Freter, Nancy Gonlin e David Webster. Esses
pesquisadores mapearam a ascensão e a queda de Copán pelo exame da
extensão do assentamento no Vale de Copán por um período de 850 anos, de
400 d.C. até 1250 d.C., usando uma técnica denominada hidratação da
obsidiana, que calcula quanta água havia na obsidiana quando foi extraída.
Depois de retirada da terra, a quantidade de água aumenta a uma taxa
conhecida, o que permite aos arqueólogos calcular a data em que a pedra foi
extraída da terra. Assim, Freter, Gonlin e Webster puderam mapear em que
locais a obsidiana foi encontrada no Vale do Copán e rastrear como a cidade se
expandiu e mais tarde se contraiu. Como é possível ter uma boa noção do
número de casas e edi cações numa área especí ca, é possível estimar a
população total da cidade. No período entre 400 e 449 d.C., a população era
ín ma, estimada em cerca de seiscentas pessoas, mas cresceu continuamente
até chegar a um pico de 28 mil habitantes em 750-799 d.C. Embora isso não
pareça grande pelos padrões urbanos contemporâneos, era gigantesco para a
época; esses números implicam que, naquele período, Copán tinha uma
população maior do que Londres ou Paris. Outras cidades maias, como Tikal e
Calakmul, eram sem dúvida muito maiores. Isso é coerente com os indícios
das datas da Contagem Longa e mostra que o pico da população de Copán
ocorreu em 800 d.C. Depois disso, teve início o declínio, e em 900 d.C. a
população tinha diminuído para cerca de 15 mil pessoas. A queda continuou,
e em 1200 d.C. a população era a mesma de oitocentos anos antes.
As bases para o desenvolvimento econômico da Era Clássica Maia foram
idênticas às dos bushongo e dos natu anos: a criação de instituições
extrativistas com certo grau de centralização estatal. Essas instituições tinham
vários elementos centrais. Próximo a 100 d.C., na cidade de Tikal, na
Guatemala, surgiu um novo reinado dinástico. Uma classe dominante baseada
no ajaw (senhor ou governante) se enraizou com um rei chamado k’ubul ajaw
(senhor divino) e, abaixo dele, uma hierarquia de aristocratas. O senhor divino
organizava a sociedade com a cooperação dessas elites e se comunicava com os
deuses. Até onde sabemos, esse novo conjunto de instituições políticas não
permitia qualquer tipo de participação popular, mas trouxe estabilidade. O
k’ubul ajaw aumentou a tributação dos agricultores e organizou o trabalho
para construir grandes monumentos. A união dessas instituições estabeleceu a
base para uma expansão econômica impressionante. A economia dos maias se
baseava na especialização ocupacional extensiva, com talentosos ceramistas,
tecelões, carpinteiros e fabricantes de ferramentas e ornamentos. Os maias
também comerciavam obsidiana, peles de onça, conchas marinhas, cacau, sal e
penas entre si e com outras sociedades, cobrindo longas distâncias no México.
É provável que também tivessem dinheiro e, como os astecas, usassem
sementes de cacau como moeda.
O modo como a Era Clássica Maia se baseou na criação de instituições
políticas extrativistas foi muito semelhante à situação com os bushongo,
quando Yax Ehb’ Xook, em Tikal, desempenhou um papel parecido com o do
rei Shyaam. As novas instituições políticas levaram a um aumento signi cativo
na prosperidade econômica, em grande parte aproveitada pela nova elite que
cercava o k’ubul ajaw. Contudo, depois que esse sistema se consolidou, por
volta de 300 d.C., houve pouca mudança tecnológica. Embora haja alguns
indícios de melhorias na irrigação e nas técnicas de gestão da água, a
tecnologia agrícola era rudimentar e parece não ter se modi cado. As
edi cações e as técnicas artísticas se tornaram muito mais so sticadas com o
tempo, mas no geral houve pouca inovação.
Não houve destruição criativa, mas houve outras formas de destruição à
medida que a riqueza criada pelas instituições extrativistas para o k’ubul ajaw e
a elite maia levaram a guerras constantes, que pioraram com o passar do
tempo. A sequência de con itos está registrada nas inscrições maias, e glifos
especiais indicam que uma guerra ocorreu em certa data da Contagem Longa.
O planeta Vênus era o patrono celestial da guerra, e os maias viam certas fases
da órbita do planeta como particularmente auspiciosas para guerrear. O glifo
que indicava guerra, chamado pelos arqueólogos de “guerra nas estrelas” ,
mostra uma estrela derramando sobre a terra um líquido que pode ser água ou
sangue. As inscrições também revelam padrões de aliança e competição. Houve
longas disputas pelo poder entre as maiores cidades, como Tikal, Calakmul,
Copán e Palenque, que subjugaram cidades menores a um estado de
vassalagem. Indícios disso vêm dos glifos que indicavam a ascensão de
realezas. Em tais períodos, os registros apontavam que Estados menores
passaram a ser dominados por um governante externo.
O Mapa 10 (a seguir) mostra as principais cidades maias e os vários padrões
de contato entre elas, segundo a reconstrução feita pelos arqueólogos Nikolai
Grube e Simon Martin. Esses padrões indicam que, embora as cidades grandes
como Calakmul, Dos Pilas, Piedras Negras e Yaxchilan tivessem intensos
contatos diplomáticos, algumas eram frequentemente dominadas por outras e
também lutavam entre si.
O fato impressionante sobre o colapso maia é que coincide com a
derrubada do modelo político baseado no k’ubul ajaw. Vimos que, em Copán,
não houve mais reis depois da morte de Yax Pasaj, em 810 d.C. Mais ou menos
nessa época, os palácios reais foram abandonados. Ao norte, a 30 quilômetros
de Copán, na cidade de Quiriguá, o último rei, Céu de Jade, ascendeu ao trono
entre 795 d.C. e 800 d.C. O último monumento datado é de 810 d.C., segundo
a Contagem Longa, mesmo ano em que Yax Pasaj morreu. A cidade foi
abandonada pouco depois. Em toda a área maia a história é a mesma: as
instituições políticas que haviam fornecido as circunstâncias para a expansão
do comércio, da agricultura e da população desapareceram. Cortes reais não
funcionavam, monumentos e templos não eram construídos, e os palácios
foram esvaziados. À medida que as instituições políticas e sociais se desfaziam,
revertendo o processo de centralização estatal, a economia se contraía e a
população diminuía.
Mapa 10: As cidades-Estado maias e os contatos e con itos entre elas.
Qual é o problema?
Instituições extrativistas são muito comuns na História porque apresentam
uma lógica poderosa: podem gerar prosperidade limitada e ao mesmo tempo
distribuí-la entre uma pequena elite. Para que esse crescimento ocorra, deve
haver centralização política. Depois disso, o Estado ou a elite que o controla
tipicamente tem incentivos para investir e gerar riquezas, e encoraja outros a
investirem para que o Estado possa extrair recursos deles e até mesmo imitar
alguns processos comuns em instituições econômicas e mercados inclusivos.
Nas economias do Caribe baseadas em plantations, as instituições extrativistas
assumiam a forma de uma elite que coagia escravizados a produzir açúcar. Na
União Soviética, tinham a forma do Partido Comunista realocando recursos
da agricultura para a indústria e estruturando incentivos para gestores e
trabalhadores. Como vimos, esses incentivos foram minados pela natureza do
sistema.
O potencial de criar um crescimento extrativista impulsiona a centralização
política e é o motivo pelo qual o rei Shyaam desejou criar o Reino Cuba, e
provavelmente é também a razão por que os natu anos no Oriente Médio
estabeleceram uma forma primitiva de lei e ordem, hierarquia e instituições
extrativistas que, em última instância, levariam à Revolução do Neolítico. É
possível que processos semelhantes também tenham sido a base para o
surgimento de sociedades xadas na terra e para a transição rumo à
agricultura nas Américas, o que vemos na so sticada civilização que os maias
construíram a partir das fundações estabelecidas por instituições altamente
extrativistas que coagiam muitos em benefício de pequenas elites.
O crescimento gerado pelas instituições extrativistas, no entanto, é de
natureza bem diferente do criado pelas instituições inclusivas. Mais
importante: não é sustentável. Por natureza, instituições extrativistas não
geram destruição criativa e, na melhor das hipóteses, geram uma quantidade
limitada de progresso tecnológico. O crescimento, portanto, tem prazo de
validade. A experiência soviética oferece um exemplo nítido desse limite. A
Rússia soviética cresceu rápido enquanto se aproximava de algumas das
tecnologias avançadas do planeta e retirava recursos do ine ciente setor
agrícola para alocar na indústria. Em última instância, porém, os incentivos em
todos os setores, da agricultura à indústria, não tinham como estimular
progresso tecnológico. Isso só ocorreu nos poucos bolsões em que os recursos
estavam sendo alocados e a inovação era fortemente recompensada em função
de seu papel na competição com o Ocidente. Sem considerar o fator
velocidade, o crescimento soviético estava fadado a durar pouco e já perdia
ímpeto nos anos 1970.
A ausência de destruição criativa e de inovação não é o único motivo
porque sociedades com instituições extrativistas têm crescimento severamente
limitado. A história das cidades-Estado maias ilustra um m mais sinistro e,
infelizmente, mais comum, também inerente à lógica interna das instituições
extrativistas. À medida que essas instituições criam ganhos signi cativos para a
elite, haverá fortes incentivos para que outros disputem o poder. As disputas
internas e a instabilidade são, portanto, características inerentes das
instituições extrativistas, e não apenas criam outras ine ciências como
frequentemente revertem qualquer centralização política, chegando por vezes a
levar ao completo colapso da lei e da ordem e ao caos, como aconteceu com as
cidades-Estado maias depois de um relativo sucesso na Era Clássica.
Embora inerentemente limitado, o crescimento em sociedades com
instituições extrativistas pode parecer espetacular enquanto ocorre. Na União
Soviética, e mais ainda no Ocidente, muitas pessoas se impressionaram com o
crescimento soviético nas décadas de 1920, 1930, 1940, 1950 e 1960 e até
mesmo nos anos 1970, do mesmo modo como hoje cam hipnotizadas com o
ritmo atordoante do crescimento econômico da China. Mas, como vamos
discutir com mais detalhes no Capítulo 15, a China sob o governo do Partido
Comunista é outro exemplo de sociedade que vive um crescimento sob
instituições extrativistas e é igualmente improvável que gere um crescimento
sustentado, a menos que passe por uma transformação política fundamental
rumo a instituições inclusivas.
6.
DIFERENCIAÇÃO
◆◆◆
Virtudes romanas...
O tribuno da plebe Tibério Graco foi espancado até a morte em 133 a.C. por
senadores romanos, e seu corpo foi lançado ao rio Tibre sem ritos fúnebres.
Seus assassinos eram aristocratas como ele, e o assassinato foi planejado por
seu primo, Públio Cornélio Cipião Násica. Tibério Graco vinha de uma
linhagem aristocrática impecável e descendia de alguns dos mais ilustres
líderes da República Romana, como Lúcio Emílio Paulo, herói da Ilíria e da
Segunda Guerra Púnica, e Cipião Africano, o general que derrotou Aníbal na
Segunda Guerra Púnica. Por que os poderosos senadores da época, e até seu
primo, se viravam contra ele?
A resposta revela muito sobre as tensões na República Romana e as causas
de seu subsequente declínio. O que colocou Tibério contra esses poderosos
senadores foi sua oposição numa questão crucial da época: a alocação de terra
e o direito dos plebeus, cidadãos comuns romanos.
Na época de Tibério Graco, Roma era uma república bem estabelecida. As
instituições políticas e as virtudes dos cidadãos-soldados romanos
capturadas por Jacques-Louis David na famosa pintura Juramento dos Horácios,
que mostra os lhos jurando aos pais defender a República Romana até a
morte ainda são vistas por muitos historiadores como a base desse sucesso.
O novo estilo de governança foi criado quando os cidadãos romanos
depuseram seu rei, Lúcio Tarquínio Soberbo, conhecido como Tarquínio, o
Soberbo, em torno de 510 a.C. A república concebeu instituições políticas com
muitos elementos inclusivos e era governada por magistrados eleitos por um
ano. Como o cargo de magistrado era eletivo e ocupado por muitas pessoas ao
mesmo tempo, a possibilidade de que alguém consolidasse ou explorasse seu
poder era reduzida. As instituições continham um sistema de freios e
contrapesos que distribuía o poder de forma bastante ampla ainda que nem
todo cidadão tivesse representação igual, uma vez que o voto era indireto.
Havia também muitos escravizados, cruciais para a produção em grande parte
da Itália, representando talvez um terço da população. Pessoas escravizadas, é
claro, não tinham direitos, muito menos representação política.
Contudo, assim como em Veneza, as instituições políticas romanas tinham
elementos plurais. Os plebeus tinham uma assembleia própria, que podia
eleger tribunos da plebe, com o poder de vetar iniciativas dos magistrados,
convocar o Conselho da Plebe e propor leis. Foram os plebeus que colocaram
Tibério Graco no poder em 133 a.C. Esse poder havia sido estabelecido pela
“secessão da plebe”, uma espécie de greve dos plebeus, principalmente dos
soldados, que se retiravam para uma colina fora da cidade e se recusavam a
cooperar com os magistrados até que suas reivindicações fossem atendidas.
Essa ameaça com certeza era muito importante em tempos de guerra.
Supostamente, foi durante uma secessão no século v a.C. que os cidadãos
conquistaram o direito de eleger os tribunos e aprovar as leis que regeriam a
comunidade. Essa proteção política e legal, ainda que limitada para nossos
padrões atuais, criaram oportunidades econômicas para os cidadãos e algum
grau de inclusão nas instituições econômicas. Como resultado, o comércio
pelo Mediterrâneo oresceu sob a República Romana. Indícios arqueológicos
sugerem que, embora a maioria dos cidadãos e dos escravizados vivesse pouco
acima do nível de subsistência, muitos romanos, incluindo cidadãos comuns,
obtinham rendas altas e tinham acesso a serviços públicos, como sistema de
esgoto e iluminação nas ruas.
Além disso, há indícios de que houve algum crescimento econômico sob a
República Romana. Os naufrágios podem ser usados para mensurar as
fortunas econômicas dos romanos. O império que construíram era, de certa
forma, uma rede de cidades portuárias de Atenas, Antioquia e Alexandria
no leste, passando por Roma, Cartago e Cádiz até chegar a Londres, no
extremo oeste. À medida que os territórios romanos se expandiam, também se
expandiam o comércio e os transportes, que podem ser rastreados a partir dos
destroços de navios encontrados por arqueólogos no leito do Mediterrâneo.
Esses destroços podem ser datados de muitas formas. Era comum que os
navios carregassem ânforas cheias de vinho ou azeite, transportadas da Itália
para a Gália, ou óleo de oliva espanhol para ser vendido ou distribuído de
graça em Roma. Era comum que as ânforas, recipientes de argila selados,
carregassem a informação de quem as produzira e quando. Perto do rio Tibre,
em Roma, há uma pequena colina, o monte Testácio, também conhecido
como monte dei Cocci (montanha da cerâmica), feita de aproximadamente 53
milhões de ânforas, que eram descartadas ali ao serem descarregadas dos
navios e no decorrer dos séculos formaram uma grande colina.
Outras mercadorias transportadas nos navios, sem falar na própria
embarcação, por vezes podem ser datadas por radiocarbono, uma técnica
poderosa usada pelos arqueólogos para determinar a idade de restos orgânicos.
Plantas criam energia pela fotossíntese, que utiliza a energia do Sol para
converter dióxido de carbono em açúcares. Durante esse processo, as plantas
incorporam uma quantidade de um radioisótopo de ocorrência natural, o
carbono-14. Depois que as plantas morrem, o carbono-14 se deteriora pelo
decaimento radioativo. Quando os arqueólogos encontram um navio
naufragado, podem datar a madeira do navio comparando a fração de
carbono-14 com o que se espera do carbono-14 na atmosfera, o que dá uma
estimativa da época em que a árvore foi cortada. A datação apontou que
apenas cerca de vinte naufrágios ocorreram por volta de 500 a.C. Esses
provavelmente não eram navios romanos, e podem muito bem ter sido
cartagineses, por exemplo. Depois, o número de navios naufragados romanos
aumenta rapidamente. Por volta do nascimento de Cristo, chegam a um ápice
de 180.
Destroços de navios são bons métodos de delinear os contornos
econômicos da República Romana e mostram indícios de algum crescimento
econômico, mas precisamos entendê-los dentro de seu contexto.
Provavelmente dois terços da carga desses navios eram propriedade do Estado
impostos ou tributos levados das províncias para Roma, ou grãos e azeite do
norte da África que eram distribuídos de graça aos cidadãos da capital. São
esses frutos do extrativismo que formaram a maior parte do monte Testácio.
Outra forma fascinante de encontrar indícios de crescimento econômico é o
Projeto de Testemunho de Gelo da Groenlândia. Quando os ocos de neve
caem, absorvem pequenas quantidades de poluição na atmosfera,
particularmente metais como chumbo, prata e cobre. A neve congela e se
acumula sobre a que caiu nos anos anteriores. Esse processo acontece há
milênios e oferece uma oportunidade incomparável para os cientistas
entenderem a extensão da poluição atmosférica milhares de anos atrás. No
período de 1990-1992, o Projeto de Testemunho de Gelo da Groenlândia
perfurou e atravessou 3.030 metros de gelo acumulado durante cerca de 250
mil anos de história humana. Um dos principais achados desse projeto e de
outros antes dele foi que houve um aumento de poluentes na atmosfera desde
500 a.C. As quantidades atmosféricas de chumbo, prata e cobre desde então
crescem de forma constante até atingir um pico no século d.C. O fato
marcante é que essa quantidade atmosférica de chumbo só volta a ser atingida
no século . Essas descobertas mostram quão intensa, comparada com o que
veio antes e depois, era a mineração romana. Tal avanço na mineração
claramente indica expansão econômica.
Mas o crescimento romano era insustentável, uma vez que ocorria sob
instituições parcialmente inclusivas e parcialmente extrativistas. Embora os
cidadãos romanos tivessem direitos políticos e econômicos, a escravidão era
muito difundida e bastante excludente, e a elite, a classe senatorial, dominava
tanto a economia quanto a política. Apesar da existência do Conselho da
Plebe e da tribuna plebeia, por exemplo, o poder real estava nas mãos do
Senado, cujos membros eram integrantes dos grandes proprietários de terra
que constituíam a classe senatorial. De acordo com o historiador romano Tito
Lívio, o Senado foi criado pelo primeiro rei de Roma, Rômulo, e era composto
por cem homens. Seus descendentes inventaram a classe senatorial, por meio
da qual sangue novo foi introduzido. A distribuição de terras era bastante
desigual, o que provavelmente aumentou no século d.C. Essa era a raiz dos
problemas que Tibério Graco pôs na berlinda como tribuno.
À medida que sua expansão pelo Mediterrâneo continuava, Roma recebeu
um in uxo de grandes riquezas. Essa fortuna era absorvida principalmente por
algumas famílias ricas da classe senatorial, e a desigualdade entre ricos e
pobres aumentou. Os senadores deviam sua riqueza não apenas ao controle
sobre províncias lucrativas, mas também às suas grandes propriedades por toda
a Itália. Essas terras eram trabalhadas por escravizados, frequentemente
capturados nas guerras que Roma lutava. Saber a origem da terra desses
latifúndios também é importante. Os exércitos de Roma na república eram
compostos de cidadãos-soldados que eram pequenos proprietários de terra,
primeiro em Roma e depois em outras partes da Itália. Tradicionalmente,
lutavam no exército quando necessário e depois retornavam a suas
propriedades. À medida que Roma se expandia e as campanhas cavam mais
longas, esse modelo parou de funcionar. Os soldados cavam anos longe de
suas terras, que deixavam de ser trabalhadas. As famílias dos soldados muitas
vezes se viam soterradas por dívidas e passando fome. Aos poucos, muitas
dessas terras foram abandonadas e absorvidas pelos latifúndios dos senadores.
Enquanto a classe senatorial enriquecia ainda mais, a grande massa de
cidadãos sem posses se reunia em Roma, com frequência depois de serem
descomissionados do exército. Sem terras para onde voltar, procuravam
trabalho na cidade. No m do século a.C., a situação chegou a um perigoso
ponto de ebulição, pois as diferenças entre ricos e pobres tinham aumentado
de forma sem precedentes e havia hordas de cidadãos descontentes em Roma,
prontas a se rebelar em resposta às injustiças e a se virar contra a aristocracia
romana. Mas o poder político estava nas mãos dos ricos proprietários de terra
da classe senatorial, bene ciários das mudanças ocorridas nos dois séculos
anteriores. A maioria não tinha intenção de mudar o sistema que os servira tão
bem.
De acordo com o historiador romano Plutarco, Tibério Graco, em viagem
pela Etrúria, na atual Itália central, soube das di culdades das famílias dos
soldados-cidadãos. Por causa dessa experiência ou por outras disputas com os
poderosos senadores da época, ele logo embarcaria num plano ousado para
mudar a alocação de terras na Itália. Foi eleito tribuno da plebe em 133 a.C. e
usou o cargo para propor uma reforma agrária: uma comissão investigaria se as
terras públicas estavam sendo ocupadas ilegalmente e redistribuiria para os
cidadãos romanos sem propriedades as que excedessem o limite legal de 120
hectares. O limite de 120 hectares era, na realidade, parte de uma antiga lei,
ignorada havia séculos. A proposta de Tibério Graco provocou turbulências na
classe senatorial, que pôde bloquear a implantação de suas reformas por algum
tempo. Quando Tibério conseguiu usar o poderoso apoio da multidão para
remover outro tribuno que ameaçou vetar sua reforma agrária, a comissão foi
nalmente criada. O Senado, no entanto, evitou a implantação da comissão ao
cortar seus recursos.
A situação chegou ao ápice quando Tibério Graco reivindicou para sua
comissão de reforma agrária os fundos deixados ao povo romano pelo rei da
cidade grega de Pérgamo. Ele também tentou se reeleger como tribuno, em
parte por temer a perseguição do Senado depois de deixar o cargo. Isso deu aos
senadores pretexto para acusar Tibério de tentar se declarar rei, lançando um
ataque contra ele, e muitos de seus apoiadores foram mortos. O próprio Tibério
Graco foi um dos primeiros a cair, mas sua morte não resolveu o problema:
outros ainda tentariam reformar a distribuição de terra e diversos aspectos da
economia e da sociedade romanas. Muitos teriam destino semelhante. O
irmão de Tibério, Caio, por exemplo, também foi morto por latifundiários
depois de assumir o cargo do irmão.
Essas tensões reapareciam de maneira cíclica durante o século seguinte
por exemplo, levando à Guerra Social entre 91 a.C. e 87 d.C. Grande defensor
dos interesses senatoriais, Lúcio Cornélio Sula não apenas abafou com
violência os pedidos por mudanças, como também reduziu severamente os
poderes dos tribunos da plebe. Os mesmos problemas também seriam o fator
central no apoio que Júlio César receberia do povo romano na luta contra o
Senado.
As instituições políticas que formavam a base da República Romana foram
destituídas por Júlio César em 49 a.C., quando ele cruzou o Rubicão, o rio que
separava da Itália as províncias romanas cisalpinas da Gália. Roma se pôs aos
pés de César, e outra guerra civil foi de agrada. Apesar dessa vitória, César
depois foi assassinado por senadores descontentes, liderados por Bruto e
Cássio, em 44 a.C. A República Romana nunca seria recriada. Uma nova
guerra civil começou entre os apoiadores de César, envolvendo em particular
Marco Antônio, Otaviano e seus asseclas. Depois de saírem vitoriosos, Antônio
e Otaviano lutaram um contra o outro, até Otaviano triunfar na batalha de
Áccio, em 31 a.C. No ano seguinte, e pelos próximos 45 anos, Otaviano,
conhecido após 28 a.C. como Augusto, comandou Roma sozinho. Augusto
criou o Império Romano, embora preferisse o título de Primeiro Cidadão, uma
espécie de “primeiro entre iguais”, e chamasse o regime de Principado. O Mapa
11 mostra o Império Romano no auge de sua extensão, em 117 d.C. Ele
também inclui o rio Rubicão, que César cruzou de maneira tão fatídica.
◆◆◆
Caminhos divergentes
O surgimento de instituições inclusivas e o subsequente crescimento industrial
na Inglaterra não foi um legado direto das instituições romanas (ou
anteriores). Isso não signi ca que nada relevante aconteceu após a queda do
Império Romano do Ocidente, um grande acontecimento que afetou a maior
parte da Europa. Diferentes partes do continente europeu compartilharam as
mesmas conjunturas críticas, e suas instituições iriam seguir caminhos
semelhantes, talvez de uma forma distintivamente europeia. A queda do
Império Romano foi parte crucial dessas conjunturas críticas em comum. Esse
caminho da Europa contrasta com os de outras partes do mundo, como os da
África subsaariana, da Ásia e das Américas, que se desenvolveram de maneiras
tão distintas em parte por não compartilharem as mesmas conjunturas críticas.
A Inglaterra romana desmoronou. Não foi o que aconteceu na Itália ou na
Gália romana (atual França), ou mesmo no norte da África, onde muitas das
antigas instituições perduraram de alguma forma. Contudo, não há dúvida de
que a mudança do domínio de um único Estado romano para uma pletora de
Estados comandados por francos, visigodos, ostrogodos, vândalos e
burgúndios era signi cativa. O poder desses Estados era muito menor, além de
enfraquecido por uma extensa série de incursões das periferias. Do norte
vinham os vikings e dinamarqueses em seus drácares. Do leste, os cavaleiros
hunos. Finalmente, a emergência do islã como religião e força política no
século após a morte de Maomé, em 632 d.C., levou à criação de novos Estados
islâmicos na maior parte do Império Bizantino, do norte da África e da
Espanha. Esses processos comuns agitaram a Europa, e, no seu rastro, surgiu
um tipo particular de sociedade, comumente chamada de feudal. A sociedade
feudal era descentralizada porque os Estados fortes centrais estavam atro ados,
ainda que alguns governantes como Carlos Magno tenham tentado
reconstruí-los.
As instituições feudais, que dependiam de mão de obra servil e coagida (os
servos), eram obviamente extrativistas, e formaram a base para um longo
período de crescimento lento e extrativista na Europa durante a Idade Média.
Além disso, tiveram consequências para os desdobramentos posteriores. Por
exemplo, durante a redução da população rural ao estado de servidão, a
escravidão desapareceu da Europa. Em uma época na qual as elites tinham a
possibilidade de reduzir toda a população rural à servidão, não parecia
necessário ter uma classe separada de escravos, como ocorrera em todas as
sociedades anteriores. O feudalismo também criou um vácuo de poder em que
cidades independentes que se especializavam na produção e no comércio
puderam orescer. O equilíbrio de poder mudou com a peste, e a servidão
começou a ruir na Europa Ocidental, abrindo espaço para uma sociedade
muito mais pluralista sem a presença de pessoas escravizadas.
As conjunturas críticas que deram origem à sociedade feudal foram
distintas, mas não caram restritas à Europa. Uma comparação relevante é com
a atual Etiópia, que se desenvolveu a partir do Reino de Axum, fundado no
norte do país em torno de 400 a.C. Axum era um reino relativamente
desenvolvido para a época e fazia comércio internacional com a Índia, a Arábia,
a Grécia e o Império Romano. Era, em vários sentidos, comparável ao Império
Romano do Oriente nesse período. O reino usava dinheiro, construiu estradas
e edi cações públicas monumentais e tinha tecnologias muito semelhantes,
por exemplo, na agricultura e na navegação. Também há paralelos ideológicos
interessantes entre Axum e Roma. O imperador romano Constantino se
converteu ao cristianismo em 312 d.C., assim como o rei Ezana de Axum, mais
ou menos na mesma época. O Mapa 12 (a seguir) mostra a localização do
Estado histórico de Axum nas atuais Etiópia e Eritreia, com postos avançados
no mar Vermelho, na Arábia Saudita e no Iêmen.
No mesmo período em que Roma entrou em declínio, Axum também
entrou em decadência, e sua derrocada histórica seguiu um padrão próximo
ao do Império Romano do Ocidente. Os árabes desempenharam o mesmo
papel no declínio de Axum que o dos hunos e vândalos no declínio de Roma,
que, no século , dominaram do mar Vermelho à península Arábica. Axum
perdeu suas colônias na Arábia e as rotas comerciais, o que precipitou sua
decadência econômica: o reino deixou de cunhar moeda, a população urbana
foi reduzida, e o Estado passou a se concentrar no interior do país e nos
planaltos da atual Etiópia.
Mapa 12: O Império de Axum e os clãs familiares da Somália.
Consequências do crescimento
inicial
O longo período entre a Revolução do Neolítico, que teve início em 9.500 a.C.,
e a Revolução Industrial britânica, no m do século , está cheio de surtos
de crescimento econômico disparados por inovações institucionais que
acabaram desaparecendo. Na Roma Antiga, as instituições da república, que
criaram certo grau de vitalidade econômica e permitiram a construção de um
império gigantesco, se des zeram depois do golpe de Júlio César e da
construção do império sob Augusto. Foram necessários séculos para que o
Império Romano nalmente desaparecesse, e o declínio foi lento no
entanto, depois que as instituições inclusivas republicanas cederam lugar para
as instituições mais extrativistas do império, o retrocesso econômico se tornou
inevitável.
A dinâmica em Veneza foi semelhante. A prosperidade econômica da
república foi forjada por instituições que tinham elementos inclusivos
importantes, mas que foram minados quando a elite da época fechou o
sistema para impedir a entrada de novas pessoas e chegou a banir as
instituições econômicas que haviam criado a prosperidade.
Por mais notável que seja a experiência de Roma, não foi a herança romana
que levou diretamente ao surgimento das instituições inclusivas na Inglaterra e
à Revolução Industrial britânica. Fatores históricos moldam o modo como as
instituições se desenvolvem, mas não se trata de um simples processo
cumulativo predeterminado. Roma e Veneza são exemplos de como os
primeiros passos em direção à inclusão retrocederam. A paisagem econômica e
institucional que Roma criou na Europa e no Oriente Médio não gerou as
instituições inclusivas que surgiriam séculos mais tarde. Na verdade, essas
instituições surgiriam primeiro e com mais força na Inglaterra, onde o domínio
romano era mais fraco e desapareceu de modo mais de nitivo, quase sem
deixar rastros, durante o século v d.C. Como discutimos no Capítulo 4, a
história tem papel fundamental na diferenciação institucional, que cria
discrepâncias institucionais, por vezes pequenas, que se ampli cam ao
interagir com conjunturas críticas. É por serem pequenas que essas diferenças
podem ser superadas com facilidade, sem trazer necessariamente as
consequências de um simples processo cumulativo.
Claro que o domínio de Roma teve efeitos duradouros sobre a Europa. As
instituições e o direito romanos in uenciaram as instituições e o direito que os
reinos dos bárbaros estabeleceram após o colapso do Império Romano do
Ocidente. Foi também a queda de Roma que criou a paisagem política
descentralizada que desembocou na ordem feudal. O desaparecimento da
escravidão e o surgimento de cidades independentes foram efeitos colaterais
longos e arrastados (e, é claro, historicamente contingentes) desse processo.
Isso ganhou ainda mais relevância quando a peste abalou a sociedade feudal.
Das cinzas da peste emergiram cidades mais fortes e um campesinato que não
estava mais atrelado à terra e se livrava das obrigações feudais. Foram
precisamente essas conjunturas críticas criadas pela queda do Império
Romano que levaram a uma diferenciação institucional que afetou toda a
Europa de um modo sem paralelos na África subsaariana, na Ásia ou nas
Américas.
No século , a Europa já era bastante distinta institucionalmente da
África subsaariana e das Américas. Embora não fosse muito mais rica do que as
espetaculares civilizações asiáticas na Índia ou na China, diferia dessas
sociedades em aspectos essenciais. Por exemplo, desenvolvera instituições
representativas de um tipo desconhecido por lá. Essas instituições
desempenhariam um papel decisivo no desenvolvimento de instituições
inclusivas. Como veremos nos dois próximos capítulos, seriam as pequenas
diferenças institucionais que teriam maior importância na Europa. E essas
diferenças favoreciam a Inglaterra, por ter sido lá que a ordem feudal mais
cedeu lugar a fazendeiros de mentalidade comercial e a centros urbanos
independentes em que mercadores e industriais podiam orescer. Esses grupos
já exigiam dos monarcas direitos de propriedade mais seguros, instituições
econômicas diferentes e uma voz na política. Esse processo chegaria ao auge no
século .
7.
O PONTO DE INFLEXÃO
◆◆◆
A Revolução Gloriosa
Depois da vitória na Revolução Gloriosa, o Parlamento e Guilherme
negociaram uma nova Constituição. As mudanças foram prenunciadas pela
“Proclamação” de Guilherme, feita pouco antes de sua invasão. Elas também
foram incluídas na Proclamação de Direitos, apresentada pelo Parlamento em
fevereiro de 1689. A Proclamação foi lida para Guilherme na mesma sessão em
que lhe foi oferecida a coroa. Em vários aspectos, a Proclamação, que seria
chamada de Declaração de Direitos depois de se transformar em lei, era vaga.
Crucialmente, no entanto, ela estabelecia alguns princípios constitucionais
centrais. Determinava, por exemplo, como ocorreria a sucessão do trono,
estabelecendo uma mudança drástica em relação aos princípios hereditários de
antes. Se o Parlamento pôde remover um monarca e substituí-lo por outro
mais de seu agrado, por que não fazer isso de novo? A Declaração de Direitos
também a rmava que o monarca não podia suspender nem revogar leis e
rea rmava a ilegalidade da tributação sem consentimento parlamentar. Além
disso, a rmava que não podia haver um Exército permanente na Inglaterra sem
consentimento parlamentar. A vagueza cava por conta de cláusulas como a
oitava, que a rmava que “a eleição dos membros do Parlamento deverá ser
livre”, mas não especi cava o que signi cava “livre”. Ainda mais vaga era a
cláusula treze, cujo principal assunto era que o Parlamento deveria ser
convocado com frequência. Como durante todo o século havia se discutido
quando o Parlamento deveria ser convocado e até mesmo se era o caso de
convocá-lo, seria de esperar que a cláusula fosse mais especí ca. No entanto, a
razão para que fosse tão vaga é clara: é preciso garantir que cláusulas legais
sejam cumpridas. Durante o reinado de Carlos , esteve em vigência um Ato
Trienal que a rmava a obrigação de convocar o Parlamento pelo menos uma
vez a cada três anos. A obrigação foi ignorada, e nada aconteceu ao monarca
porque não havia meios de garantir o cumprimento da lei. Depois de 1688, o
Parlamento poderia ter tentado induzir um método para garantir o
cumprimento dessa cláusula, como os barões haviam feito com seu conselho
depois que o rei João assinou a Magna Carta. Isso não foi feito porque não
havia necessidade, uma vez que, depois de 1688, a autoridade e o poder de
tomada de decisão passaram para o Parlamento. Mesmo sem regras
constitucionais ou leis, Guilherme simplesmente renunciou a muitas das
práticas de reis anteriores. Ele parou de interferir em decisões legais e abriu mão
de “direitos”, como o recebimento vitalício das receitas alfandegárias. No
conjunto, essas mudanças nas instituições políticas representaram o triunfo do
Parlamento sobre o rei, e, portanto, o m do absolutismo na Inglaterra e, na
sequência, na Grã-Bretanha já que a Inglaterra e a Escócia se uniram pelos
Atos de União de 1707. A partir daí, o Parlamento exercia rme controle sobre
a política do Estado. Isso fez imensa diferença, porque os interesses do
Parlamento divergiam muito dos interesses dos reis Stuarts. Como muitos no
Parlamento tinham investimentos importantes no comércio e na indústria, eles
se interessavam fortemente por assegurar os direitos de propriedade. Os Stuarts
infringiram muitas vezes tais direitos, que agora estariam protegidos. Além
disso, quando cabia aos Stuarts determinar como o governo despenderia seus
recursos, o Parlamento se opunha a aumentos na carga tributária e se insurgia
contra reforçar o poder do Estado. Agora que o próprio Parlamento estava no
controle dos gastos, seus membros cavam contentes em aumentar os
impostos e gastar o dinheiro em atividades que consideravam importantes. A
principal delas era o fortalecimento da Marinha, que protegeria os interesses
mercantis internacionais de muitos membros do Parlamento.
O surgimento de instituições políticas de natureza pluralista foi ainda mais
importante do que os interesses dos parlamentares. O povo inglês conquistara
acesso ao Parlamento, e as políticas e instituições econômicas eram geradas
pelos parlamentares, de um modo que nunca ocorrera quando as políticas
eram dirigidas pelo rei. Claro que isso se devia em parte ao fato de os membros
do Parlamento serem eleitos. Mas, como a Inglaterra estava longe de ser uma
democracia nesse período, a responsividade que esse acesso garantia era
pequena. Entre as muitas desigualdades estava o fato de que, no século ,
menos de 2% da população podia votar, e esses eleitores só podiam ser do sexo
masculino. As cidades em que a Revolução Industrial ocorreu Birmingham,
Leeds, Manchester e Sheffield não dispunham de representação
independente no Parlamento. Por outro lado, as áreas rurais estavam super-
representadas. Igualmente ruim era o fato de o direito ao voto nas zonas rurais,
os chamados “condados”, se basear na propriedade da terra, e de muitas áreas
urbanas, os “burgos”, serem controladas por uma pequena elite que não
permitia que os novos industriais votassem ou concorressem a cargos. No
burgo de Buckingham, por exemplo, treze moradores detinham o direito
exclusivo ao voto. Além disso, havia os “burgos podres”, que historicamente
tinham direito a voto, mas haviam “apodrecido”, seja porque a população
emigrara ao longo do tempo, seja porque, como no caso de Dunwich ou na
costa leste da Inglaterra, essas regiões tivessem sido literalmente engolidas pelo
mar como resultado da erosão costeira. Em cada um desses “burgos podres”,
um pequeno número de eleitores escolhia dois membros do Parlamento. Old
Sarum tinha sete eleitores, Dunwich tinha 32, e cada um elegia dois membros.
Mas havia outros meios de in uenciar o Parlamento e, por consequência, as
instituições econômicas. O mais importante eram as petições, e esse caminho
foi muito mais signi cativo do que a democracia limitada para o surgimento
do pluralismo depois da Revolução Gloriosa. Qualquer um podia apresentar
uma petição ao Parlamento, e a prática era comum. É digno de nota que,
quando as pessoas apresentavam petições, o Parlamento ouvia. Acima de tudo,
esse é um sinal da derrota do absolutismo, do poder adquirido por um
segmento signi cativamente amplo da sociedade e da ascensão do pluralismo
na Inglaterra depois de 1688. O número frenético de petições demonstra como
era vasto o segmento da população, muito além dos que ocupavam assento no
Parlamento ou eram representados lá, com poder de in uenciar o modo como
o Estado funcionava. E era um poder bem usado.
O caso dos monopólios ilustra bem isso. Vimos como os monopólios
estavam no coração das instituições econômicas extrativistas no século .
Eles passaram a ser atacados em 1623, com o Estatuto dos Monopólios, e
foram um dos pontos de atrito durante a Guerra Civil Inglesa. O Parlamento
Longo aboliu todos os monopólios domésticos que tanto afetavam a vida do
povo. Embora não tenham conseguido restabelecê-los, Carlos e Jaime
conseguiram manter a prerrogativa de conceder monopólios no comércio
exterior. Um deles foi o da Real Companhia Africana, emitido por Carlos em
1660. Essa companhia tinha o monopólio sobre o lucrativo negócio do trá co
de escravos, e seu governador e principal acionista era Jaime, irmão de Carlos,
que em breve se tornaria Jaime . Depois de 1688, a companhia perdeu não
apenas seu governador, como também seu principal apoiador. Jaime tinha
protegido o monopólio da companhia contra “clandestinos”, os comerciantes
independentes que tentavam comprar escravos na África Ocidental e vendê-los
nas Américas. Esse era um comércio muito lucrativo, e a Real Companhia
Africana se deparou com vários desa os, uma vez que o restante do comércio
inglês no Atlântico era livre. Em 1689, a companhia con scou a carga de uma
empresa clandestina chamada Nightingale, que reagiu abrindo um processo
por con sco ilegal de bens. O presidente da Suprema Corte, Holt, determinou
que o con sco era ilegal, uma vez que se baseava no exercício de um
monopólio criado por prerrogativa real. Holt a rmou que os privilégios de
monopólio só podiam ser criados por estatuto, e isso era atribuição do
Parlamento. Desse modo, todos os futuros monopólios, não só o da Real
Companhia Africana, caram nas mãos do Parlamento. Antes de 1688, Jaime
teria retirado do cargo qualquer juiz que tomasse uma decisão como essa.
Depois de 1688, as coisas eram bem diferentes.
O Parlamento agora precisava decidir o que fazer com o monopólio, e
começaram a receber petições de todo lado. Cento e trinta e cinco chegaram de
empresas clandestinas exigindo livre acesso ao comércio no Atlântico. Embora
tenha respondido na mesma moeda, a Real Companhia Africana não podia
esperar fazer frente nem à quantidade nem ao escopo das petições que pediam
seu m. Os clandestinos conseguiram formular sua oposição não apenas em
termos de interesse próprio e mesquinho, mas também dizendo trabalhar pelo
interesse nacional, o que era verdade. Como resultado, só 5 das 135 petições
foram assinadas pelos próprios clandestinos, e 73 foram enviadas por
províncias nas imediações de Londres, contra 8 a favor da companhia. Das
colônias, onde o peticionamento também era permitido, os clandestinos
conseguiram 27 petições, contra 11 da companhia. Os clandestinos também
reuniram muito mais assinaturas nas petições, num total de 8 mil, contra
2.500 da companhia. A disputa continuou até 1698, quando o monopólio da
Real Companhia Africana foi abolido.
Junto com esse novo foro para a determinação das instituições econômicas
e com essa nova responsividade depois de 1688, os parlamentares deram início
a uma série de mudanças fundamentais nas instituições econômicas e nas
políticas governamentais que, em última instância, pavimentariam o caminho
para a Revolução Industrial. Os direitos de propriedade que haviam sido
erodidos durante o regime dos Stuarts foram fortalecidos. O Parlamento deu
início a um processo de reforma das instituições econômicas para promover as
manufaturas, em vez de apenas tributá-las e impedir sua existência. O
“imposto sobre lareira” uma taxa anual por lareira ou forno, que pesava
sobretudo para manufatureiros, que se opunham ferozmente à cobrança foi
abolido em 1689, logo depois de Guilherme e Maria ascenderem ao trono. No
lugar de taxar lareiras, o Parlamento passou a tributar a terra.
A redistribuição da carga tributária não foi a única política pró-manufaturas
que o Parlamento apoiou. Foi aprovado todo um pacote de atos e leis que
expandiam o mercado e a lucratividade de tecidos de lã. Tudo isso fazia
sentido politicamente, uma vez que muitos dos parlamentares que se
opunham a Jaime tinham grandes investimentos nesses empreendimentos de
manufatura nascentes. O Parlamento também aprovou leis autorizando uma
reorganização completa dos direitos de propriedade sobre a terra, permitindo a
consolidação e a eliminação de muitas formas arcaicas de propriedade e de
direitos de uso.
Outra prioridade do Parlamento foi a reforma das nanças. Apesar da
expansão dos serviços bancários e das nanças no período anterior à
Revolução Gloriosa, esse processo só foi consolidado em 1694, com a criação
do Banco da Inglaterra como fonte de recursos para a indústria. Foi outra
consequência direta da Revolução Gloriosa. A fundação do Banco da
Inglaterra pavimentou o caminho para uma “revolução nanceira”, que levou a
uma grande expansão dos mercados nanceiros e da atividade bancária. No
início do século , qualquer um capaz de apresentar as devidas garantias
podia ter acesso a um empréstimo. Ilustram esse fato os registros que
sobreviveram intactos de um banco relativamente pequeno, o C. Hoare & Co.
em Londres, do período que vai de 1702 a 1724. Embora o banco efetivamente
emprestasse dinheiro para aristocratas e lordes, dois terços dos maiores
tomadores de empréstimos do Hoare ao longo desse período não vinham das
classes sociais privilegiadas. Eram mercadores e empresários, entre os quais um
certo John Smith, um nome usado para de nir o típico cidadão médio inglês,
que, entre 1715 e 1719, obteve um empréstimo de 2,6 mil libras esterlinas do
banco.
Até aqui, enfatizamos como a Revolução Gloriosa transformou as
instituições políticas inglesas, tornando-as mais plurais, e como também
começou a criar as fundações para instituições econômicas inclusivas. Há mais
uma mudança signi cativa que ocorreu em decorrência da Revolução
Gloriosa: o Parlamento deu continuidade ao processo de centralização política
iniciado pelos Tudors. Isso não se resumiu a um aumento das restrições nem
ao fato de o Estado passar a regular a economia de uma nova forma ou a gastar
dinheiro em coisas diferentes, mas também à maior capacidade do Estado em
todos os sentidos. Isso mais uma vez ilustra os elos entre centralização política
e pluralismo: o Parlamento tinha se oposto a tornar o Estado mais e ciente e
mais bem aparelhado antes de 1688 por não ter como controlá-lo. Depois de
1688, a história foi diferente.
O Estado começou a se expandir, e os gastos logo chegaram perto de 10%
da renda nacional. Isso foi sustentado por uma expansão da base de
tributação, particularmente no que diz respeito ao imposto sobre consumo,
cobrado sobre uma longa lista de bens produzidos no país. Era um orçamento
estatal bem grande para a época na verdade, é maior do que vemos hoje em
muitas partes do mundo. Os orçamentos estatais da Colômbia, por exemplo,
só atingiram esse tamanho relativo nos anos 1980. Sem os grandes uxos de
ajuda estrangeira, em muitas partes da África subsaariana por exemplo, em
Serra Leoa , o orçamento estatal de hoje seria bem menor,
proporcionalmente ao tamanho da economia.
Contudo, a expansão do Estado é apenas parte do processo de centralização
política. Mais relevante foi a forma qualitativa como o Estado funcionou e o
modo como se comportavam aqueles que o controlavam e que trabalhavam
nele. A construção de instituições estatais na Inglaterra remontava à Idade
Média, mas, como vimos, os passos decisivos rumo à centralização política e ao
desenvolvimento de uma administração moderna foram dados por Henrique
e Henrique . No entanto, o Estado ainda estava longe da forma
moderna que emergiria depois de 1688. Por exemplo, muitas indicações para
cargos eram feitas com base em critérios políticos, e não em função de mérito
ou talento, e o Estado ainda tinha capacidade muito limitada para elevar
tributos.
Depois de 1688, o Parlamento começou a melhorar a capacidade de
aumentar as receitas por meio de taxação, um desenvolvimento bem
exempli cado pela burocracia do imposto sobre consumo, que se expandiu
depressa, passando de 1.211 funcionários em 1690 para 4.800 em 1780. Os
inspetores do imposto sobre o consumo estavam espalhados pelo país,
supervisionados por coletores que faziam viagens de inspeção para medir e
conferir a quantidade de pão, cerveja e outros bens sujeitos a tributação. O
tamanho dessa operação é ilustrado pela reconstrução das rotas do supervisor
George Cowperthwaite, realizada pelo historiador John Brewer. Entre 12 de
junho e 5 de julho de 1710, o supervisor viajou 467 quilômetros no distrito de
Richmond, em Yorkshire. Durante esse período, visitou 263 revendedores, 71
fabricantes de malte, 20 fabricantes de velas e um cervejeiro. Ao todo, realizou
81 medições de produção e conferiu o trabalho de nove inspetores que eram
seus subordinados. Oito anos depois, Cowperthwaite pode ser encontrado
trabalhando com o mesmo a nco, mas agora no distrito de Wake eld, em
uma parte diferente de Yorkshire. Na região, viajou em média mais de 30
quilômetros por dia e trabalhou seis dias por semana, geralmente
inspecionando quatro ou cinco estabelecimentos. Nos domingos, sua folga, ele
fazia suas anotações, por isso temos um registro completo de suas atividades.
Na verdade, o sistema de tributação de consumo tinha um registro bastante
so sticado. Os funcionários mantinham três tipos de registro, que precisavam
coincidir, e qualquer adulteração era considerada infração grave. Esse nível
extraordinário de supervisão estatal sobre a sociedade excede o que a maioria
dos países pobres consegue realizar hoje, e isso ocorria em 1710. Também é
signi cativo que, depois de 1688, o Estado tenha começado a fazer mais
nomeações para cargos com base em talento e menos em indicações políticas e
tenha desenvolvido uma poderosa infraestrutura para administrar o país.
A Revolução Industrial
A Revolução Industrial se manifestou em todos os aspectos da economia
inglesa. Houve grandes melhorias nos transportes, na metalurgia e nos
motores a vapor. Mas as áreas em que ocorreram as melhorias mais
signi cativas foi a da mecanização da produção de têxteis e a do
desenvolvimento de fábricas para a produção desses manufaturados. Esse
processo dinâmico foi iniciado pelas mudanças institucionais advindas da
Revolução Gloriosa. Não se tratava apenas da abolição dos monopólios
domésticos, obtida em 1640, nem das diferenças de taxas ou do acesso às
nanças. Tratava-se de uma reorganização dos fundamentos das instituições
econômicas em favor de inovadores e empreendedores, baseada no surgimento
de direitos sobre a propriedade mais seguros e mais e cientes.
As melhorias na segurança e na e ciência dos direitos de propriedade
desempenharam papel central na “revolução dos transportes”, pavimentando o
caminho para a Revolução Industrial. O investimento em canais e estradas,
conhecidos como pedágios, aumentaram tremendamente depois de 1689.
Esses investimentos reduziram os custos de transporte, o que ajudou a criar um
importante pré-requisito para a Revolução Industrial. Antes de 1688, os
investimentos nesse tipo de infraestrutura foram impedidos por atos arbitrários
dos reis Stuarts. A mudança na situação depois de 1688 é ilustrada pelo caso
do rio Salwerpe, em Worcestershire, na Inglaterra. Em 1662, o Parlamento
aprovou uma lei para incentivar investimentos que tornassem o rio navegável, e
a família Baldwyn investiu 6 mil libras esterlinas com esse objetivo. Em 1693,
uma proposta de lei apresentada ao Parlamento pretendia transferir os direitos
de taxação sobre a navegação para o conde de Shrewsbury e o lorde Coventry.
Esse ato foi contestado por Sir Timothy Baldwyn, que imediatamente
submeteu uma petição ao Parlamento a rmando que a proposta em sua
essência estava expropriando seu pai, que já tinha feito grandes investimentos
no rio, antecipando as taxas que poderia cobrar. Baldwyn argumentou que “a
nova lei tende a anular a lei antiga e a desprezar todos os trabalhos e materiais
usados para esse m”. A realocação de direitos como esse era exatamente o tipo
de coisa que os reis Stuarts faziam. Baldwyn observou: “São perigosas as
consequências da retirada, de qualquer pessoa, de direitos adquiridos por ato
do Parlamento, sem consentimento do próprio Parlamento”. Na ocasião, a nova
lei não foi aprovada, e os direitos de Baldwyn foram assegurados. Os direitos
de propriedade caram muito mais seguros depois de 1688, em parte porque
assegurá-los era coerente com os interesses do Parlamento e em parte em
função das instituições pluralistas que permitiam a in uência das petições no
processo. Depois de 1688, o sistema político se tornou signi cativamente mais
pluralista e criou uma relativa igualdade na Inglaterra.
Por trás da revolução dos transportes e, de modo mais geral, da
reorganização da terra que ocorreu no século , estavam atos parlamentares
que mudaram a natureza da propriedade. Até 1688 existia até mesmo a cção
legal de que, em última instância, todas as terras da Inglaterra pertenciam à
Coroa, um legado direto da organização feudal da sociedade. Muitos terrenos
estavam submetidos a formas arcaicas de direitos de propriedade e muitas
reivindicações de direito à posse. Uma grande quantidade de terras se
enquadrava na de nição de equitable estates, o que signi cava que o
proprietário não tinha direito a hipotecar, arrendar ou vender a terra. Era
frequente que terras comuns só pudessem ser usadas para nalidades
tradicionais. Havia enormes impedimentos o uso da terra de modos
economicamente desejáveis. O Parlamento começou a mudar essa situação,
permitindo a apresentação de petições solicitando a simpli cação e a
reorganização dos direitos de propriedade, alterações que foram
posteriormente incorporadas a centenas de atos do Parlamento.
Essa reorganização das instituições econômicas também se manifestou no
surgimento de uma agenda para proteger a produção nacional de têxteis
contra as importações de outros países. Não é de surpreender que os
parlamentares e seus eleitores não se opusessem a todas as barreiras de entrada
e a todos os monopólios. As barreiras e os monopólios que aumentassem seus
mercados e lucros eram bem-vindos. No entanto, o crucial é que as instituições
políticas pluralistas o fato de o Parlamento representar, ouvir e conferir
poder a uma ampla parcela da sociedade faziam com que essas barreiras de
entrada não sufocassem outros industriais nem impedissem completamente a
chegada de novos atores econômicos, como a Serrata fez em Veneza (Capítulo
6). Os poderosos manufatureiros de lã descobriram isso bem rápido.
Em 1688, a lista das mais importantes importações da Inglaterra incluía
tecidos da Índia chita e musselina , que respondiam por cerca de um
quarto de todas as importações de têxteis. As sedas da China também eram
importantes. A chita e a seda eram importadas pela Companhia das Índias
Orientais, que antes de 1688 desfrutava um monopólio concedido pelo Estado
para o comércio com a Ásia. Entretanto, o monopólio e o poder político da
Companhia das Índias Ocidentais era mantido por meio de grandes propinas
pagas a Jaime . Depois de 1688, a companhia estava numa situação
vulnerável e logo passou a ser atacada. Esse ataque aconteceu sob a forma de
uma intensa guerra de petições em que comerciantes que pretendiam fazer
comércio com o Extremo Oriente e a Índia exigiam que o Parlamento
aprovasse a concorrência com a Companhia das Índias Orientais, ao passo que
a companhia respondeu com outras petições, além de ofertas para emprestar
dinheiro ao Parlamento. A companhia perdeu, e foi fundada uma Companhia
das Índias Orientais concorrente. Os produtores de têxteis, porém, não
queriam apenas participação no comércio com a Índia; queriam que a
importação de têxteis baratos (chita) fosse tributada ou até mesmo banida.
Esses produtores enfrentavam forte concorrência dos importados indianos. A
essa altura, os mais importantes manufatureiros ingleses produziam têxteis de
lã, mas os produtores de tecidos de algodão estavam ganhando mais
importância econômica e mais poder político.
A indústria da lã organizava tentativas para se proteger desde a década de
1660 ela promoveu as “Leis Suntuárias”, que, entre outras coisas, proibiam o
uso de tecidos mais leves. Também fez lobby no Parlamento para que fossem
aprovadas, em 1666 e em 1678, leis que proibissem qualquer sepultamento
feito com mortalhas que não fossem de lã. Ambas as medidas protegeram o
mercado para os produtos de lã e reduziram a concorrência que os fabricantes
ingleses enfrentavam da Ásia. No entanto, nesse período a Companhia das
Índias Orientais era forte demais para que conseguissem restringir as
importações dos têxteis asiáticos. A maré mudou depois de 1688. Entre 1696 e
1698, os fabricantes de lã da Ânglia Oriental e do sudoeste inglês se aliaram a
tecelões de seda de Londres e da Cantuária e à Companhia do Levante para
restringir as importações. Os importadores de seda do Levante desejavam
excluir a seda asiática e criar um nicho para o Império Otomano, ainda que
tivessem perdido o monopólio desse comércio. Essa coalizão começou a
apresentar projetos de lei ao Parlamento para restringir o uso de algodão e
sedas vindos da Ásia, além de propor restrições ao tingimento e ao uso de
estampas em tecidos asiáticos na Inglaterra. Como resposta, em 1701 o
Parlamento nalmente aprovou “uma lei para o emprego mais e caz dos
pobres, pelo incentivo dos manufaturados desse reino”. A partir de setembro de
1701, o texto decretava: “Fica proibido o uso de todas as sedas, sedas de
Bengala e tecidos que contenham mescla de seda ou ervas manufaturadas na
Pérsia, na China ou nas Índias Orientais, e de toda chita pintada, tingida,
estampada ou colorida lá que sejam ou venham a ser importadas.”
Passava a ser ilegal vestir sedas e chitas asiáticas na Inglaterra. No entanto,
ainda era possível importá-las e depois reexportá-los para a Europa ou outros
lugares, em particular as colônias americanas. Além disso, chitas simples
podiam ser importadas e receber acabamento na Inglaterra, e as musselinas
caram de fora do banimento. Depois de uma longa disputa, essas brechas,
como eram vistas pelos fabricantes ingleses de têxteis de lã, foram fechadas pela
Lei da Chita de 1721: “Depois de 25 de dezembro de 1722, será considerado
ilegal o uso, por quaisquer pessoas na Grã-Bretanha, em qualquer roupa ou
vestimenta, de todo tipo de chita estampada, pintada, colorida ou tingida.”
Embora acabasse com a concorrência asiática aos produtores ingleses de lã,
essa lei ainda permitia que uma indústria nacional ativa de algodão e de linho
concorresse com as lãs: o algodão e o linho eram misturados para produzir um
tecido popular chamado fustão. Depois de ter excluído a concorrência asiática,
a indústria da lã se virou para suprimir o linho. O tecido era fabricado
principalmente na Escócia e na Irlanda, o que abria uma brecha para que a
coalizão inglesa exigisse a exclusão desses países do mercado inglês. No
entanto, havia limites para o poder dos fabricantes de lã. Suas novas tentativas
encontraram forte oposição dos produtores de fustão nos orescentes centros
industriais de Manchester, Lancaster e Liverpool. A existência de instituições
políticas pluralistas signi cava que todos esses diferentes grupos agora tinham
acesso ao processo político no Parlamento por meio do voto e, mais
importante, das petições. Embora tenham sido feitas muitas petições por
ambos os lados, com grandes quantidades de assinaturas contra e a favor, o
resultado desse con ito foi uma vitória dos novos interesses em detrimento dos
interesses da indústria da lã. O Ato de Manchester de 1736 a rmava que
“grandes quantidades de produtos feitos a partir de linho e algodão vêm sendo
fabricados nos últimos anos e têm sido estampados e pintados neste reino da
Grã-Bretanha”. O texto prosseguia determinando que “nada no dito Ato [de
1721] deve se estender ou ser interpretado de modo a proibir o uso em
vestimentas, objetos domésticos, mobília ou o que mais seja, de qualquer tipo
de produto de linho e algodão fabricado e estampado ou pintado de quaisquer
cores dentro do reino da Grã-Bretanha”.
O Ato de Manchester foi uma vitória signi cativa para a indústria nascente
do algodão. No entanto, sua importância histórica e econômica foi de fato
muito maior. Primeiro, demonstrava os limites das barreiras de entrada que as
instituições políticas pluralistas da Inglaterra parlamentar permitiriam. Além
disso, ao longo dos cinquenta anos seguintes as inovações tecnológicas na
manufatura dos têxteis de algodão teriam papel central na Revolução
Industrial e gerariam transformações fundamentais na sociedade ao introduzir
o sistema fabril.
Depois de 1688, apesar da disputa mais igualitária dentro da Inglaterra, o
Parlamento se esforçou para que continuasse havendo desigualdade no
âmbito internacional. Isso cou evidente não apenas pelas Leis da Chita, como
também pelos Atos de Navegação, o primeiro aprovado em 1651, e que
continuaram vigentes, com interrupções, por duzentos anos. O objetivo desses
atos era facilitar o monopólio inglês do comércio internacional mas um
aspecto crucial era que a monopolização seria feita pelo setor privado, e não
pelo Estado. O princípio básico era que o comércio inglês devia ser realizado
em navios ingleses. Os atos tornaram ilegal que navios estrangeiros
transportassem mercadorias de fora da Europa para a Inglaterra ou suas
colônias e igualmente ilegal que navios de outros países levassem mercadorias
de outra parte da Europa para a Inglaterra. Essa vantagem aumentou os lucros
dos comerciantes e fabricantes ingleses e pode ter incentivado ainda mais a
inovação nessas atividades novas e altamente lucrativas.
Em 1760, a combinação desses fatores direitos de propriedade novos e
aprimorados, melhor infraestrutura, um novo regime scal, maior acesso às
nanças e proteção agressiva aos comerciantes e fabricantes começava a
fazer efeito. Depois dessa data, houve um salto no número de invenções
patenteadas, e o grande orescimento de mudanças tecnológicas que estaria
no coração da Revolução Industrial começou a car evidente. As inovações
ocorreram em muitas frentes, re etindo o melhor ambiente institucional. Uma
área crucial era a energia, sendo o exemplo mais famoso as transformações no
uso do motor a vapor resultantes das ideias de James Wa , na década de 1760.
O avanço inicial obtido por Wa foi a introdução de uma câmara separada
de condensação para o vapor, de modo que o cilindro que abrigava o pistão
pudesse se manter permanentemente quente, em vez de ter que ser aquecido e
resfriado. Mais tarde, Wa desenvolveu muitas outras ideias, inclusive métodos
bem mais e cientes para converter o movimento do motor a vapor em energia
utilizável, principalmente com seu sistema de engrenagens denominado “sol e
planetas”. Em todas essas áreas, as inovações tecnológicas foram baseadas em
trabalhos anteriores de outras pessoas. No caso do motor a vapor, isso incluía
trabalhos iniciais do inventor inglês omas Newcomen e do físico e inventor
francês Dionysius Papin.
A história da invenção de Papin é outro exemplo de como, numa sociedade
com instituições extrativistas, a ameaça da destruição criativa impede a
mudança tecnológica. Papin desenvolveu o projeto de um “digestor a vapor”
em 1679 e, em 1690, o ampliou para um motor a pistão. Em 1705, usou esse
motor rudimentar para construir o primeiro barco a vapor do mundo. A essa
altura, era professor de matemática na Universidade de Marburgo, na
Alemanha, no estado de Kassel. Ele decidiu percorrer com sua embarcação o
rio Fulda até o rio Weser. Qualquer embarcação que zesse essa viagem era
forçada a parar na cidade de Münden. Na época, o tráfego uvial no Fulda e
no Weser era monopólio de uma guilda de barqueiros. Papin deve ter
percebido que teria problemas. Seu amigo e mentor, o famoso físico alemão
Go fried Leibniz, escreveu para o eleitor de Kassel, o chefe de Estado, pedindo
que Papin tivesse permissão para “passar sem ser incomodado” por Kassel. No
entanto, a petição foi recusada, e Leibniz recebeu uma resposta lacônica,
informando que “Os Conselheiros do Eleitorado encontraram sérios
obstáculos para conceder o acima peticionado e, sem oferecer as razões,
dirigiram-se a mim para me informar de sua decisão. Em consequência, a
solicitação não foi atendida por Sua Alteza, o eleitor”. Sem se deixar abater,
Papin decidiu fazer a viagem mesmo assim. Quando o barco a vapor chegou a
Münden, a guilda de barqueiros tentou convencer um juiz local a ordenar sua
apreensão, mas não teve êxito. Eles então destruíram a embarcação e o motor
de Papin, que morreu pobre e foi enterrado em um túmulo sem lápide. Na
Inglaterra dos Tudors ou dos Stuarts, Papin poderia ter recebido um
tratamento igualmente hostil, mas tudo mudou depois de 1688. Na verdade,
antes desse ataque, Papin pretendia ir a Londres com seu barco.
Na metalurgia, contribuições fundamentais foram feitas na década de 1780
por Henry Cort, que introduziu novas técnicas para lidar com impurezas no
ferro, permitindo que se produzisse ferro forjado de muito melhor qualidade. A
produção de vastas quantidades de ferro forjado com as técnicas de Cort foi
facilitada pelas inovações de Abraham Darby e seus lhos, pioneiros a partir de
1709 no uso de carvão para fundir ferro. Esse processo foi aprimorado em 1763
pela adaptação, feita por John Smeaton, de energia hídrica para operar
cilindros de sopro na produção de coque. Depois disso, o carvão vegetal sumiu
do processo de produção do ferro, substituído pelo carvão mineral, muito mais
barato e disponível.
Embora a inovação obviamente seja um processo cumulativo, houve nítida
aceleração em meados do século . Em nenhuma outra indústria isso é
mais visível do que na produção de têxteis. A mais básica das operações nesse
tipo de produção é a ação, que envolve pegar bras de plantas ou animais,
como o algodão ou a lã, e uni-las para fabricar um o. Esse o é depois tecido
para a fabricação dos têxteis. Uma das grandes inovações tecnológicas do
período medieval foi a roda de ar, que substituiu a ação feita a mão. Essa
invenção surgiu em torno de 1280 na Europa, provavelmente disseminada a
partir do Oriente Médio. Os métodos de ar não mudaram até o século .
Inovações signi cativas começaram em 1738, quando Lewis Paul patenteou
um novo método de ar usando tambores para substituir as mãos humanas
na coleta das bras que seriam transformadas em o. A máquina, contudo,
não funcionou bem, e foram as inovações de Richard Arkwright e James
Hargreaves que revolucionaram a ação.
Em 1769, Arkwright, uma das guras dominantes da Revolução Industrial,
patenteou sua máquina de ar hidráulica, que representava uma imensa
melhoria em relação à máquina de Lewis. Ele formou uma sociedade com
Jedediah Stru e Samuel Need, fabricantes de roupas íntimas. Em 1771, eles
construíram uma das primeiras fábricas do mundo, em Cromford. As novas
máquinas eram movidas a água, porém Arkwright mais tarde fez a transição
crucial para o vapor. Em 1774, sua rma empregava seiscentos trabalhadores, e
ele expandiu bastante os negócios, chegando a instalar fábricas em
Manchester, Matlock, Bath e New Lanark, na Escócia. As inovações de
Arkwright foram complementadas pela invenção, em 1764, da máquina de ar
Jenny (spinning jenny), de Hargreaves, que seria aprimorada por Samuel
Crompton em 1779, para se transformar na máquina de ar mule (spinning
mule), e mais tarde por Richard Roberts, passando a se chamar “mule
automática”. Os efeitos dessas inovações foram revolucionários: no início do
século, eram necessárias 50 mil horas para ar a mão 50 quilos de algodão. A
máquina movida a água de Arkwright podia fazer o mesmo em 300 horas, e a
mule automática, em 135.
Junto com a mecanização do trabalho de ar veio a mecanização da
tecelagem. Um primeiro e importante passo foi a invenção da lançadeira
transportadora, por John Kay, em 1733. Embora a princípio a máquina tenha
apenas aumentado a produtividade da tecelagem manual, seu impacto mais
duradouro estaria no fato de abrir caminho para a tecelagem mecanizada. A
partir da lançadeira transportadora, Edmund Cartwright introduziu o tear
mecânico em 1785, a primeira de uma série de inovações que levariam as
máquinas a substituir as habilidades manuais na tecelagem, assim como vinha
acontecendo no trabalho de ar.
A indústria têxtil inglesa não foi apenas o motor por trás da Revolução
Industrial, também revolucionou a economia mundial. As exportações
inglesas, lideradas pelos têxteis de algodão, duplicaram entre 1780 e 1800. Foi
o crescimento desse setor que impulsionou a economia. A combinação de
inovações tecnológicas e organizacionais oferece o modelo para o progresso
econômico que transformou as economias do mundo que enriqueceram.
Novas pessoas com novas ideias foram cruciais para essa transformação.
Pense na inovação dos transportes. Na Inglaterra, houve várias ondas dessas
inovações: primeiro, canais, depois estradas e, por m, ferrovias. Em cada uma
dessas ondas, os inovadores não faziam parte do mercado. Os canais
começaram a ser desenvolvidos na Inglaterra depois de 1770, e em 1810 já
ligavam muitas das mais importantes áreas de manufatura. À medida que a
Revolução Industrial avançava, desempenharam um importante papel na
redução dos custos de transporte para levar de um lado para outro os novos e
volumosos produtos nais da indústria, como tecidos de algodão, e os
insumos usados em sua fabricação, particularmente o algodão cru e o carvão
para os motores a vapor. Entre os primeiros inovadores na construção de canais
estavam homens como James Brindley, contratado pelo duque de Bridgewater
para construir o canal de Bridgewater, que fez a ligação entre a
importantíssima cidade industrial de Manchester e o porto de Liverpool.
Nascido na zona rural, em Derbyshire, Brindley era construtor de moinhos, e
sua reputação de encontrar soluções criativas para problemas de engenharia
chegou aos ouvidos do duque. Ele não tinha experiência com problemas de
transporte, o que também valia para outros grandes engenheiros de canais
como omas Telford, que começou a vida como pedreiro, ou John Smeaton,
engenheiro e fabricante de instrumentos.
Assim como os grandes engenheiros de canais, os grandes engenheiros de
estradas e ferrovias também não tinham experiência prévia com transportes.
John McAdam, que inventou o macadame em torno de 1816, era o segundo
lho de um pequeno aristocrata. O primeiro trem a vapor foi construído por
Richard Trevithick, em 1804. O pai de Trevithick estava envolvido com
mineração em Cornwall, e Richard começou a trabalhar no negócio ainda
novo, deixando-se fascinar pelos motores a vapor usados para bombear as
minas. Mais signi cativas foram as inovações de George Stephenson, lho de
pais analfabetos e inventor do famoso trem e Rocket, que começou
trabalhando como engenheiro em uma mina de carvão.
Pessoas de áreas diferentes também estiveram por trás da importante
indústria de têxteis de algodão. Alguns dos pioneiros dessa nova indústria
estiveram profundamente envolvidos na produção e no comércio de artigos de
lã. John Foster, por exemplo, empregava setecentos tecelões manuais na
indústria de artigos de lã quando passou para o algodão e abriu a Black Dyke
Mills, em 1835. Mas homens como Foster eram minoria. Apenas cerca de um
quinto dos principais industriais da época já tinha exercido algo parecido com
atividades de manufatura. Não é de surpreender. A nal, a indústria do
algodão se desenvolveu em novas cidades no norte da Inglaterra. As fábricas
eram um modo completamente novo de organizar a produção. A indústria da
lã tinha um arranjo muito diferente: enviava os materiais para a casa dos
indivíduos que avam e teciam a bra. Portanto, a maior parte da indústria da
lã estava mal preparada para trabalhar com algodão, como Foster. Os novatos
na indústria eram necessários para desenvolver e usar as novas tecnologias. A
rápida expansão do algodão dizimou a indústria da lã a destruição criativa
em ação.
A destruição criativa redistribui não apenas renda e riqueza, mas também
poder político, como William Lee aprendeu ao ver o pouco entusiasmo que as
autoridades, temerosas das consequências políticas, demonstraram com sua
invenção. À medida que a economia industrial se expandia em Manchester e
Birmingham, os novos donos de fábricas e os grupos de classe média que
surgiam no entorno começaram a protestar por não poderem votar e contra as
políticas do governo contrárias a seus interesses. Seu alvo prioritário eram as
Leis dos Cereais, que baniam a importação de todo tipo de grãos e cereais, mas
principalmente o trigo, caso o preço fosse baixo demais, garantindo os lucros
dos grandes proprietários de terra. Essa política era excelente para os
latifundiários que produziam trigo, mas péssima para os manufatureiros, que
precisavam pagar salários mais altos para compensar o alto preço do pão.
Com os trabalhadores concentrados em novas fábricas e novos centros
industriais, passou a ser mais fácil se organizar e provocar rebeliões. Na década
de 1820, a exclusão política dos novos manufatureiros e dos centros de
manufaturas estava cando insustentável. Em 16 de agosto de 1819, foi
marcado um protesto contra o sistema político e as medidas do governo em St.
Peter’s Fields, em Manchester. O organizador era Joseph Johnson, fabricante
local de pincéis e um dos fundadores do jornal radical Manchester Observer.
Entre os outros organizadores estavam John Knight, fabricante de algodão e
reformista, e John acker Saxton, editor do Manchester Observer. Sessenta mil
manifestantes se reuniram, muitos com cartazes com dizeres como “Abaixo as
Leis dos Cereais”, “Sufrágio universal” e “Voto na cédula” (exigindo voto
secreto, e não aberto, como acontecia em 1819). As autoridades estavam
bastante nervosas com o protesto, e uma força de seiscentos homens do
Décimo Quinto Regimento de Cavalaria de Hussardos foi convocada. Quando
os discursos começaram, um magistrado local decidiu emitir um mandado
para prender os oradores. Na tentativa de cumprir o mandado, a polícia
enfrentou oposição da multidão, e teve início uma briga. Os hussardos
avançaram contra a multidão. Em poucos minutos caóticos, onze pessoas
morreram e provavelmente seiscentas caram feridas. O Manchester Observer
chamou o episódio de Massacre de Peterloo.
Porém, considerando as mudanças que já haviam ocorrido nas instituições
econômicas e políticas, a repressão não era uma solução de longo prazo para a
Inglaterra. O Massacre de Peterloo foi um incidente isolado. Depois do motim,
as instituições políticas na Inglaterra cederam à pressão e à ameaça de
desestabilização que seria causada por um descontentamento social muito
maior, particularmente depois da revolução de 1830 na França contra Carlos ,
que tentara restaurar o absolutismo destruído pela Revolução Francesa de
1789. Em 1832, o governo aprovou a Primeira Lei de Reforma. A lei dava
direito a voto para Birmingham, Leeds, Manchester e Sheffield e ampliava a
base de eleitores para que os manufatureiros tivessem representação no
Parlamento. A consequente mudança no poder fez com que as políticas
andassem na direção que favorecia os interesses que passaram a ser
representados; em 1846, eles conseguiram fazer com que as detestadas Leis dos
Cereais fossem revogadas, demonstrando mais uma vez que a destruição
criativa causava redistribuição não apenas de renda, mas também de poder
político. E, naturalmente, as mudanças na distribuição de poder político com o
tempo levariam a uma maior redistribuição de renda.
Foi a natureza inclusiva das instituições inglesas que permitiu esse processo.
Aqueles que sofreram com a destruição criativa e a temiam já não tinham
como impedi-la.
Impressão proibida
E 1445, M , Johannes Gu enberg revelou uma
inovação com profundas consequências para a história econômica posterior:
uma prensa de tipos móveis. Até então, os livros eram copiados a mão por
copistas, um processo muito lento e trabalhoso, ou estampados com blocos de
madeira entalhados individualmente para cada página. Livros eram raros,
escassos e muito caros. Depois da invenção de Gu enberg , as coisas
começaram a mudar. Os livros passaram a ser impressos, e sua disponibilidade
cresceu. Sem essa inovação, a alfabetização e a educação em massa teriam sido
impossíveis.
Na Europa Ocidental, a importância da imprensa logo foi reconhecida. Em
1460, já havia uma prensa do outro lado da fronteira, em Estrasburgo, na
França. No m da década de 1460, a tecnologia se espalhara pela Itália, a
princípio em Roma e Veneza, e em seguida por Florença, Milão e Turim. Em
1476, William Caxton mantinha uma prensa em Londres, e, dois anos depois,
havia outra em Oxford. Durante o mesmo período, a impressão se espalhou
para Holanda, Espanha e até o Leste Europeu. Budapeste teve sua primeira
prensa em 1473 e, no ano seguinte, havia outra na Cracóvia.
Mas nem todos consideravam essa inovação desejável. Em 1485, o sultão
otomano Bajazeto publicou um edito declarando que os muçulmanos
estavam expressamente proibidos de imprimir em árabe. Essa regra foi
reforçada pelo sultão Selim , em 1515. A primeira prensa só foi instalada em
território otomano em 1727, quando o sultão Amade publicou um decreto
que concedia permissão a Ibrahim Müteferrika para imprimir livros. Mesmo
esse passo tardio foi cercado de restrições. Embora o decreto falasse do
“afortunado dia em que essa técnica ocidental terá retirado o véu, como uma
noiva, para não mais voltar a car oculta”, a prensa de Müteferrika seria
monitorada de perto. O decreto a rmava:
Müteferrika obteve permissão para instalar uma prensa, mas tudo que fosse
impresso precisaria ser analisado por um trio de sábios religiosos e jurídicos, os
cádis. Talvez a sabedoria dos cádis, assim como a de toda a população, teria se
ampliado muito mais depressa caso a imprensa fosse mais difundida. Mas isso
não aconteceria, mesmo depois de Müteferrika obter a permissão.
Não é nenhuma surpresa que, no m das contas, Müteferrika tenha
conseguido imprimir poucos livros (apenas dezessete) entre 1729, quando a
prensa começou a operar, e 1743, quando deixou de funcionar. Sua família
tentou dar continuidade à tradição, mas só conseguiu imprimir outros sete
livros até que os descendentes nalmente desistissem, em 1797. Fora do
coração do Império Otomano, na Turquia, o processo de impressão demorou
ainda mais. No Egito, por exemplo, a primeira prensa foi instalada apenas em
1798, por franceses que participaram da tentativa fracassada de Napoleão
Bonaparte de dominar o país. Até a segunda metade do século , a produção
de livros no Império Otomano continuou principalmente a cargo de copistas,
que reproduziam a mão os livros já existentes. No início do século ,
estima-se que houvesse 80 mil copistas ativos em Istambul.
Essa oposição à imprensa teve consequências óbvias para a alfabetização, a
educação e o sucesso econômico. Em 1800, provavelmente apenas 2% a 3%
dos cidadãos do Império Otomano eram alfabetizados, comparados com os
60% de homens e 40% de mulheres adultos na Inglaterra. Na Holanda e na
Alemanha, as taxas de alfabetização eram ainda maiores. Os povos sob
domínio otomano caram bem atrás dos países europeus com os menores
índices educacionais do período, como Portugal, onde é provável que apenas
20% dos adultos soubessem ler e escrever.
Tendo em vista as instituições altamente absolutistas e extrativistas dos
otomanos, é fácil compreender a hostilidade do sultão à imprensa. Livros
disseminam ideias e di cultam o controle da população. Algumas dessas
ideias podem gerar inovações valiosas para o crescimento econômico, porém
outras podem ser subversivas e desa ar o statu quo político e social. Os livros
também colocam em xeque o poder daqueles que controlam o conhecimento
oral, uma vez que o tornam o facilmente disponível para qualquer um que seja
alfabetizado. Isso ameaçava minar o statu quo, no qual o conhecimento era
controlado pelas elites. Os sultões otomanos e o establishment religioso
temiam a destruição criativa que resultaria disso. A solução que encontraram
foi proibir a impressão.
◆◆◆
Álvares a rmou que haveria muito mais “frutos e cultivos caso os grandes
homens não maltratassem as pessoas”. O relato de Almeida sobre como a
sociedade funcionava corrobora essa a rmação. Ele observou:
Retrocesso duradouro
A Revolução Industrial criou uma conjuntura crítica transformadora para o
mundo todo durante o século e além, e as sociedades que deram permissão
e incentivos para que seus cidadãos investissem em novas tecnologias viveram
um período de crescimento acelerado. Mas muitas sociedades ao redor do
mundo não conseguiram fazer isso ou escolheram explicitamente não fazer.
Nações dominadas por instituições políticas e econômicas extrativistas não
geraram tais incentivos. A Espanha e a Etiópia são exemplos de lugares onde o
controle absolutista das instituições políticas e as instituições econômicas que
dele derivam sufocaram os incentivos econômicos bem antes da aurora do
século . O resultado foi semelhante em outros regimes absolutistas por
exemplo, na Áustria-Hungria, na Rússia, no Império Otomano e na China,
embora nesses casos os governantes, em função do receio da destruição
criativa, não apenas tenham deixado de incentivar o progresso econômico,
como também adotaram medidas explícitas para bloquear a disseminação da
indústria e a introdução de novas tecnologias que levassem à industrialização.
O absolutismo não é a única forma de instituição política extrativista e não
foi o único fator a impedir a industrialização. As instituições políticas e
econômicas inclusivas necessitam de algum grau de centralização política para
que o Estado possa garantir a lei e a ordem, sustentar os direitos de
propriedade e incentivar a atividade econômica quando necessário por meio
do investimento em serviços públicos. No entanto, mesmo hoje, muitas nações,
como o Afeganistão, o Haiti, o Nepal e a Somália, têm Estados incapazes de
manter a ordem mais rudimentar, e os incentivos econômicos são praticamente
nulos. O caso da Somália ilustra o modo como o processo de industrialização
passou ao largo dessas sociedades. A centralização política é alvo de resistência
pelo mesmo motivo que regimes absolutistas rechaçam as mudanças: os que
frequentemente estão em boa situação temem que a mudança realoque o
poder político da elite dominante atual para novos indivíduos e grupos. Desse
modo, assim como o absolutismo, as elites tradicionais e os clãs predominantes
em sociedades sem centralização estatal também bloqueiam movimentos em
direção ao pluralismo e à mudança econômica. Como consequência,
sociedades que ainda não possuíam essa centralização nos séculos e
estavam numa condição de desvantagem na era da indústria.
Embora a variedade de instituições extrativistas que vão do absolutismo a
Estados com pequena centralização tenha fracassado em se aproveitar da
disseminação da indústria, a conjuntura crítica da Revolução Industrial teve
efeitos muito diferentes em outras partes do globo. Como veremos no Capítulo
10, as sociedades que já haviam dado passos rumo a instituições políticas e
econômicas inclusivas, como os Estados Unidos e a Austrália, e as em que o
absolutismo enfrentava desa os maiores, como a França e o Japão, tiraram
vantagem dessas novas oportunidades econômicas e deram início a um
processo de crescimento econômico acelerado. Desse modo, o padrão
costumeiro de interação entre uma conjuntura crítica e diferenças
institucionais existentes que levam a maior divergência industrial e econômica
mais uma vez desempenhou um papel no século , e dessa vez com ainda
mais alarde e efeitos mais fundamentais sobre a prosperidade e a pobreza das
nações.
9.
RETROCESSO NO DESENVOLVIMENTO
Especiarias e genocídio
O M , na atual Indonésia, é composto de três
grupos de ilhas. No início do século , as Molucas do Norte abrigavam os
reinos independentes de Tidore, Ternate e Bacan. As Molucas Médias
abrigavam o reino insular de Amboína. No sul havia as Ilhas Banda, um
pequeno arquipélago que ainda não havia sido uni cado politicamente.
Embora hoje pareçam remotas, na época as Molucas eram centrais para o
comércio internacional por serem as únicas produtoras das especiarias cravo-
da-índia, mácide e noz-moscada. Dessas, a mácide e a noz-moscada só
podiam ser encontradas nas Ilhas Banda. Os habitantes das ilhas produziam e
exportavam essas especiarias raras em troca de comida e de bens
manufaturados que chegavam de Java, do entreposto de Malaca, na península
Malaia, e da Índia, da China e da Arábia.
O primeiro contato que os habitantes tiveram com os europeus foi no século
, com marinheiros portugueses que foram comprar especiarias. Antes disso,
as mercadorias eram enviadas pelo Oriente Médio, passando por rotas
comerciais controladas pelo Império Otomano. Os europeus procuraram uma
passagem contornando a África ou atravessando o Atlântico para conseguir
acesso direto às Ilhas das Especiarias e ao comércio dos temperos. O Cabo da
Boa Esperança foi contornado pelo marinheiro português Bartolomeu Dias em
1488, e Vasco da Gama chegou à Índia pela mesma rota em 1498. Pela primeira
vez, os europeus tinham uma rota própria independente para as Ilhas das
Especiarias.
Os portugueses então se dedicaram à tarefa de tentar controlar o comércio
de especiarias. Capturaram Malaca em 1511. Estrategicamente situada na
porção ocidental da península Malaia, a região recebia mercadores de todo o
Sudeste Asiático que iam vender suas especiarias a outros mercadores
indianos, chineses e árabes , que depois as enviavam para o Ocidente. Como
disse o viajante português Tomé Pires, em 1515: “O comércio entre as diversas
nações a mil léguas de distância em qualquer direção precisa passar por
Malaca (...) Quem quer que domine Malaca terá as mãos no pescoço de
Veneza.”
Com Malaca nas mãos, os portugueses tentaram sistematicamente
conquistar um monopólio do valioso comércio de especiarias. Não
conseguiram.
Os adversários eram consideráveis. Entre os séculos e houve grande
desenvolvimento econômico no Sudeste Asiático baseado no comércio de
especiarias. Cidades-Estado como Aceh, Banten, Malaca, Macáçar, Pegu e
Brunei se expandiram rápido, produzindo e exportando especiarias junto com
outros produtos, como madeiras de lei.
Esses Estados tinham formas absolutistas de governo semelhantes às da
Europa do mesmo período. O desenvolvimento de instituições políticas foi
estimulado por processos semelhantes, incluindo mudanças tecnológicas nos
métodos de guerra e no comércio internacional. As instituições estatais se
tornaram mais centralizadas, com um rei reivindicando poder absoluto. Assim
como os governantes absolutistas na Europa, os reis do Sudeste Asiático
dependiam bastante das receitas do comércio, fosse com participação direta,
fosse concedendo monopólios a elites locais e estrangeiras. Assim como na
Europa absolutista, isso gerava algum crescimento econômico, mas passava
longe de ser um conjunto ideal de instituições econômicas para promover a
prosperidade, criando enormes barreiras de entrada e muita insegurança
quanto aos direitos de propriedade da maioria. No entanto, o processo de
comercialização ocorria mesmo enquanto os portugueses tentavam estabelecer
seu domínio sobre o oceano Índico.
Mapa 14: Sudeste Asiático, as Ilhas das Especiarias, Amboína e Banda em 1600.
A presença dos europeus aumentou e passou a ter muito mais impacto com
a chegada dos holandeses, que logo se deram conta de que monopolizar a
oferta das valiosas especiarias das Molucas seria muito mais lucrativo do que
competir contra outros comerciantes locais e europeus. Em 1600, convenceram
o governante de Amboína a assinar um acordo de exclusividade que lhes dava
o monopólio sobre o comércio do cravo-da-índia na ilha. Com a fundação da
Companhia Holandesa das Índias Orientais, em 1602, as tentativas dos
holandeses de dominar o comércio de especiarias e eliminar seus concorrentes
lhes renderam bons frutos, prejudicando imensamente o Sudeste Asiático. A
Companhia Holandesa das Índias Orientais foi a segunda empresa europeia
de capital aberto, depois da Companhia Inglesa das Índias Orientais ambas
grandes marcos no desenvolvimento das corporações modernas e mais tarde
desempenhariam papel importante no crescimento industrial europeu.
Também foi a segunda empresa a ter exército próprio e o poder de declarar
guerra e colonizar terras estrangeiras. Foi o poder militar da companhia que
permitiu que os holandeses eliminassem qualquer possível obstáculo e
garantissem que seu tratado com o governante de Amboína fosse respeitado.
Em 1605, capturaram um forte importante que estava em mãos portuguesas e,
na sequência, removeram à força todos os demais comerciantes. Depois,
expandiram sua atuação para as Molucas do Norte, forçando os governantes
de Tidore, Ternate e Bacan a concordar com a proibição do cultivo e do
comércio do cravo-da-índia em seu território. O tratado que impuseram a
Ternate chegava a permitir que os holandeses destruíssem qualquer árvore de
cravo-da-índia encontrada lá.
Amboína tinha o mesmo tipo de governo que grande parte da Europa e das
Américas na época, em que os cidadãos deviam tributos ao governante e eram
obrigados a fazer trabalhos forçados. Os holandeses assumiram e
intensi caram esses sistemas para obter mais mão de obra e mais cravos-da-
índia. Antes da sua chegada, as famílias pagavam tributos em cravos-da-índia
à elite local. Os holandeses estipularam que os moradores de cada casa
estavam presos a um pedaço de terra e deviam cultivar um certo número de
árvores de cravo-da-índia. As famílias também eram obrigadas a prestar
trabalhos forçados.
Os holandeses também assumiram o controle das Ilhas Banda, na intenção
de monopolizar a mácide e a noz-moscada. As Ilhas Banda, porém, eram
organizadas de modo muito diferente de Amboína. Elas eram compostas de
várias pequenas cidades-Estado autônomas, onde não havia hierarquia social
nem estrutura política. Esses pequenos Estados, que na verdade não eram mais
do que vilarejos, eram administrados por assembleias compostas pelos
cidadãos locais. Não havia uma autoridade central que os holandeses
pudessem coagir a assinar um tratado de monopólio e nenhum sistema de
tributos que pudessem assumir para pôr as mãos em todo o suprimento de
mácide e noz-moscada. De início, isso signi cou que os holandeses precisaram
concorrer com mercadores ingleses, portugueses, indianos e chineses,
perdendo para seus concorrentes quando não pagavam preços altos. Os planos
iniciais de estabelecer um monopólio de mácide e noz-moscada naufragaram,
e o governador holandês da Batávia, Jan Pieterszoon Coen, propôs um plano
alternativo. Coen fundou a Batávia, na ilha de Java, que em 1618 se tornou a
nova capital da Companhia Holandesa das Índias Orientais. Em 1621, ele
navegou até as Ilhas Banda com uma frota e começou um massacre de quase
toda a população das ilhas, provavelmente cerca de 15 mil pessoas. Todos os
líderes foram executados, e só algumas pessoas foram deixadas vivas, o
su ciente para preservar o conhecimento da produção de mácide e noz-
moscada. Depois que o genocídio estava completo, Coen criou a estrutura
política e econômica necessária para seu plano: uma sociedade de plantations.
As ilhas foram divididas em 68 domínios, que foram entregues a 68
holandeses, quase todos empregados ou ex-empregados da Companhia
Holandesa das Índias Orientais. Esses novos latifundiários aprenderam a
produzir especiarias com os poucos habitantes originários sobreviventes e
compraram escravizados da Companhia Britânica das Índias Orientais para
povoar as ilhas esvaziadas e produzir especiarias, que seriam vendidas a preços
xos para a própria companhia.
As instituições extrativistas criadas pelos holandeses nas Ilhas das
Especiarias tiveram os efeitos desejados, mas em Banda isso aconteceu ao custo
de 15 mil vidas de inocentes e ao estabelecimento de um conjunto de
instituições econômicas e políticas que condenariam as ilhas ao
subdesenvolvimento. No m do século , os holandeses haviam reduzido a
oferta mundial dessas especiarias em cerca de 60%, e o preço da noz-moscada
dobrara.
Os holandeses disseminaram a estratégia aperfeiçoada nas Molucas por
toda a região, trazendo consequências profundas para as instituições
econômicas e políticas do restante do Sudeste Asiático. A longa expansão
comercial de diversos Estados na área, iniciada no século , começou a
retroceder. Mesmo sociedades que não foram diretamente colonizadas nem
esmagadas pela Companhia Holandesa das Índias Orientais se voltaram para
as atividades domésticas e abandonaram o comércio internacional. A
mudança econômica e política que nascia no Sudeste Asiático foi refreada.
Para evitar a ameaça da Companhia Holandesa das Índias Orientais,
diversos Estados abandonaram a produção destinada à exportação e cessaram
as atividades comerciais. A autossu ciência era mais segura do que enfrentar
os holandeses. Em 1620, o Estado de Bantém, na ilha de Java, cortou suas
pimenteiras na esperança de que os holandeses os deixassem em paz. Quando
um mercador holandês visitou Maguindanao, no sul das Filipinas, em 1686,
ouviu que “é possível cultivar noz-moscada e cravo-da-índia aqui, assim como
nas Molucas. Essas especiarias não crescem mais aqui porque o antigo rajá
mandou destruir tudo antes de morrer, com medo de que a Companhia
Holandesa viesse guerrear por causa disso”. Um comerciante ouviu algo
semelhante do governante de Maguindanao em 1699: “Ele proibiu o cultivo
permanente de pimenta para não se meter em guerras com a companhia
[holandesa] nem com outros potentados.” Houve um processo de
desurbanização e até mesmo de declínio populacional. Em 1635, os
birmaneses transferiam sua capital de Pegu, na costa, para Ava, bem mais para
o interior, subindo o rio Irauádi.
Não sabemos qual teria sido o caminho do desenvolvimento econômico e
político dos Estados do Sudeste Asiático sem a agressão holandesa. Talvez
tivessem desenvolvido uma forma própria de absolutismo, talvez tivessem
permanecido na situação em que estavam no m do século , ou talvez
tivessem continuado com a comercialização, adotando instituições cada vez
mais inclusivas. Mas, assim como nas Molucas, o colonialismo holandês
mudou fundamentalmente seu desenvolvimento econômico e político. Os
povos do Sudeste Asiático pararam de fazer comércio, se voltaram para o
interior e se tornaram mais absolutistas. Nos dois séculos seguintes, não
estariam em condições de tirar vantagem das inovações que surgiriam com a
Revolução Industrial. E, em última instância, sua retirada do comércio
mundial não os salvou dos europeus no m do século , quase todos
eram parte de impérios coloniais europeus.
◆◆◆
Com sagacidade, abri uma conta bancária em que pus parte das
minhas economias (...) Continuei até conseguir economizar
oitenta libras (...) [Comprei] uma junta de bois com jugo, arreios,
arado e todo o resto da parafernália agrícola (...) Agora comprei
uma pequena fazenda (...) Não posso recomendar com muita
veemência [a agricultura] como pro ssão para meus concidadãos
(...) No entanto, eles deveriam adotar métodos modernos de
obtenção de lucro.
Há um indício extraordinário do dinamismo econômico e da prosperidade
dos fazendeiros africanos nesse período em uma carta enviada em 1869 por um
missionário metodista, W. J. Davis. Em missiva para a Inglaterra, ele registrou
com prazer que havia coletado 46 libras em dinheiro “para o Fundo de
Assistência Social do Algodão em Lancashire”. Nesse período, os prósperos
fazendeiros africanos doavam dinheiro para ajudar os pobres operários ingleses
da indústria têxtil!
Esse novo dinamismo econômico, não é de surpreender, não agradou aos
chefes tradicionais, que em um padrão a essa altura familiar para nós
viram nisso algo que erodia sua riqueza e seu poder. Em 1879, Ma hew Blyth,
chefe da magistratura no Transkei, observou que havia oposição ao exame
topográ co da terra que seria feito para dividir lotes e transformá-los em
propriedade privada. Ele registrou que “alguns chefes (...) zeram objeções,
mas o povo estava satisfeito (...) os chefes acreditam que a concessão de títulos
individuais de propriedade vai acabar com a in uência que têm sobre as
lideranças”.
Os chefes também resistiam às melhorias feitas nas terras, como a escavação
de canais de irrigação e a construção de cercas. Eles reconheciam que essas
melhorias eram apenas um prelúdio aos direitos de propriedade individual da
terra, o princípio de seu m. Observadores europeus chegaram a notar que os
chefes e outras autoridades tradicionais, como os curandeiros, tentaram proibir
todos os “modos europeus”, entre os quais estavam novos cultivos, ferramentas
como arados e produção para o comércio. No entanto, a integração do Ciskei e
do Transkei ao Estado colonial britânico enfraqueceu o poder dos chefes
tradicionais e das autoridades, e sua resistência não seria su ciente para frear o
novo dinamismo econômico na África do Sul. Na Fingolândia, em 1884, um
observador europeu a rmou que as pessoas tinham
transferido sua lealdade para nós. Seus chefes passaram a ser uma
espécie de proprietários de terras (...) sem poder político. Já sem
medo dos ciúmes dos chefes ou das armas mortais (...) dos
curandeiros, que prejudicam os ricos donos de gado, dos
advogados talentosos, da introdução de novos costumes, dos
agricultores hábeis, que os reduziam a um nível uniforme de
mediocridade sem esses medos, um membro do clã Fingo (...) é
um homem progressista. Ainda como um camponês (...) ele possui
carroções e arados; abre canais de irrigação e tem um rebanho de
ovelhas.
Reverter o desenvolvimento
A desigualdade mundial atual existe porque, durante os séculos e ,
algumas nações foram capazes de se aproveitar da Revolução Industrial e das
suas tecnologias e seus métodos de organização, ao passo que outras não
puderam fazê-lo. A mudança tecnológica é apenas um dos motores da
prosperidade, porém talvez seja o mais importante. Os países que não usaram
as novas tecnologias também não se bene ciaram dos demais motores da
prosperidade. Como mostramos neste capítulo e no anterior, essa falha se deve
às instituições extrativistas, seja como consequência da persistência de seus
regimes absolutistas, seja pela ausência de Estados centralizados. Contudo,
este capítulo também demonstrou que, em vários casos, as instituições
extrativistas que estavam por trás da pobreza dessas nações foram impostas, ou
no mínimo reforçadas, pelo mesmo processo que impulsionou o crescimento
europeu: a expansão comercial e colonial. Na verdade, a lucratividade dos
impérios coloniais europeus foi construída com base na destruição de
sociedades independentes e de economias nativas ao redor do mundo, ou na
criação de instituições extrativistas essencialmente do zero, como no caso das
ilhas do Caribe, onde, depois do colapso quase completo das populações
nativas, os europeus importaram escravizados africanos e implantaram
sistemas de latifúndios.
Jamais saberemos quais teriam sido as trajetórias de cidades-Estado
independentes como as das Ilhas Banda, em Aceh, ou em Burma (Mianmar)
sem a intervenção europeia. Talvez passassem por uma Revolução Gloriosa
própria ou caminhassem lentamente em direção a instituições políticas e
econômicas mais inclusivas baseadas no comércio crescente de especiarias e
outras mercadorias valiosas. Entretanto, essa possibilidade deixou de existir em
função da expansão da Companhia Holandesa das Índias Orientais, que
acabou com quaisquer esperanças de desenvolvimento indígena nas Ilhas
Banda ao promover um genocídio. Sua ameaça também levou cidades-Estado
de muitas outras partes do Sudeste Asiático a se retirarem do comércio.
A história de uma das mais antigas civilizações da Ásia, a Índia, é
semelhante, embora a reversão do desenvolvimento não tenha sido levada a
cabo pelos holandeses, e sim pelos britânicos. No século , a Índia era a
maior produtora e exportadora de têxteis do mundo. As chitas e musselinas
indianas inundavam os mercados europeus e eram negociadas em toda a Ásia
e até mesmo na África Oriental. O principal agente que as levava até as Ilhas
Britânicas era a Companhia Britânica das Índias Orientais. Fundada em 1600,
dois anos antes da versão holandesa, a Companhia Britânica das Índias
Orientais passou o século tentando estabelecer um monopólio sobre as
valiosas exportações da Índia. Havia concorrência com os portugueses, que
tinham bases em Goa, Chitigão e Mumbai, e com os franceses, com suas bases
em Pondicheri, Chandernagore, Yanam e Karaikal. A situação da Companhia
Britânica das Índias Orientais piorou ainda mais com a Revolução Gloriosa,
como vimos no Capítulo 7. Seu monopólio havia sido concedido pelos reis
Stuarts e foi imediatamente contestado depois de 1688, chegando a ser
abolido por mais de uma década. A perda de poder foi signi cativa, como
vimos no Capítulo 7, porque os produtores de têxteis britânicos conseguiram
induzir o Parlamento a banir a importação de chitas, o item mais lucrativo
comercializado pela Companhia Britânica das Índias Orientais. No século
, sob a liderança de Robert Clive, a companhia mudou de estratégia e
começou a desenvolver um império continental. Na época, a Índia era dividida
em muitas sociedades que concorriam entre si, embora nominalmente muitas
estivessem sob o controle do imperador mogol em Délhi. A Companhia
Britânica das Índias Orientais primeiro se expandiu para Bengala, a leste,
conquistando as potências locais nas batalhas de Plassey em 1757 e de Buxar
em 1764, então saqueou as riquezas locais e assumiu, talvez até de maneira
mais intensa, as instituições tributárias extrativistas dos governantes do
Império Mogol na Índia. Essa expansão coincidiu com a redução massiva da
indústria têxtil indiana, uma vez que já não havia mercado para esses produtos
na Grã-Bretanha. A redução veio acompanhada de desurbanização e pobreza
crescente. Esse processo deu início a um longo período de reversão do
desenvolvimento na Índia. Em pouco tempo, em vez de produzirem têxteis, os
indianos compravam esses produtos dos britânicos e plantavam papoulas, de
onde extraíam o ópio que a Companhia das Índias Orientais vendia na China.
O trá co de escravizados no Atlântico repetiu o padrão na África, ainda que
tenha começado em uma conjuntura de menor desenvolvimento do que as
encontradas no sudeste Asiático e na Índia. Muitos Estados africanos foram
transformados em máquinas de guerra projetadas para capturar e vender
escravizados aos europeus. À medida que o con ito entre diferentes sociedades
e Estados se transformava em uma guerra contínua, as instituições estatais, que
em muitos casos ainda não haviam chegado a ser politicamente centralizadas,
desmoronaram em grandes partes da África, pavimentando o caminho para as
instituições extrativistas duradouras e os Estados falidos de hoje, que
estudaremos mais adiante. Em algumas das poucas partes da África que
escaparam do trá co de escravizados, como a África do Sul, os europeus
impuseram um conjunto diferente de instituições, dessa vez voltadas para a
criação de uma reserva de mão de obra barata para suas minas e fazendas. O
Estado sul-africano criou uma economia dual, impedindo que 80% da
população tivesse acesso às ocupações quali cadas, à agropecuária comercial e
ao empreendedorismo. Isso tudo não apenas explica por que a industrialização
não ocorreu em grande parte do mundo, como também revela o modo pelo
qual o desenvolvimento econômico por vezes pode ser alimentado, até mesmo
criado, pelo subdesenvolvimento em alguma outra parte da economia
nacional ou internacional.
10.
A DIFUSÃO DA PROSPERIDADE
◆◆◆
A A , E U , trilhou um caminho
diferente do inglês até chegar a instituições inclusivas. Revoluções como as que
abalaram a Inglaterra durante a Guerra Civil e depois na Revolução Gloriosa
não foram necessárias nos Estados Unidos ou na Austrália, em função das
circunstâncias muito diferentes em que esses países foram fundados isso
não signi ca, é claro, que instituições inclusivas tenham sido estabelecidas sem
qualquer con ito, e no processo os Estados Unidos precisaram se libertar do
colonialismo britânico. Na Inglaterra, o governo absolutista tinha uma longa
história, profundamente arraigada, que exigiu uma revolução para ser
removida. Nos Estados Unidos e na Austrália não havia nada do gênero.
Embora lorde Baltimore, em Maryland, e John Macarthur, em Nova Gales do
Sul, possam ter aspirado a esse papel, não tinham como criar um domínio forte
o su ciente sobre a sociedade para que seus planos fruti cassem. Graças às
instituições inclusivas estabelecidas nos Estados Unidos e na Austrália, a
Revolução Industrial se disseminou depressa nessas terras, que começaram a
enriquecer. O caminho adotado por esses países foi seguido por colônias como
o Canadá e a Nova Zelândia.
Houve ainda outros caminhos para chegar a instituições inclusivas.
Grandes porções da Europa Ocidental seguiram um terceiro caminho rumo às
instituições inclusivas sob o ímpeto da Revolução Francesa, que derrubou o
absolutismo na França e depois gerou uma série de con itos entre nações que
espalharam as reformas institucionais por boa parte da Europa Ocidental. A
consequência econômica dessas reformas foi o surgimento de instituições
inclusivas na maior parte da Europa Ocidental, a Revolução Industrial e o
crescimento econômico.
Assim, de uma vez só, a Revolução Francesa aboliu o sistema feudal e todas
as suas obrigações e taxas associadas e acabou de vez com as isenções
tributárias da nobreza e do clero. Porém o mais radical, talvez até impensável
na época, foi o artigo onze, que a rmava:
Exportando a revolução
Às vésperas da Revolução Francesa, em 1789, havia duras restrições impostas
aos judeus em toda a Europa. Na cidade alemã de Frankfurt, por exemplo, a
vida dos judeus era regulada por um estatuto medieval. Não podia haver mais
de quinhentas famílias judias em Frankfurt, e todos deviam morar em uma
parte pequena e murada da cidade, o Judengasse, o gueto judeu. Não podiam
sair do gueto à noite, aos domingos ou durante qualquer festividade cristã.
O Judengasse era abarrotado. Tinha 400 metros de comprimento, mas não
mais do que 4 metros de largura, e em alguns pontos apenas 3. Os judeus
viviam sob constante repressão e regulação. A cada ano, no máximo duas
famílias podiam ser admitidas no gueto e no máximo doze casais de judeus
podiam se casar, isso se os dois tivessem mais de 25 anos. Os judeus não
podiam cultivar a terra; também não podiam vender armas, especiarias, vinho
ou grãos. Até 1726, precisavam usar marcas especí cas, dois círculos
concêntricos amarelos para os homens e um véu listrado para as mulheres.
Todo judeu precisava pagar um imposto individual especial.
Quando a Revolução Francesa começou, um jovem judeu bem-sucedido,
Mayer Amschel Rothschild, morava no Judengasse de Frankfurt. No início da
década de 1780, Rothschild se tornara o principal comerciante de moedas,
metais e antiguidades em Frankfurt. Mas, como todo judeu da cidade, não
podia abrir um negócio nem morar fora do gueto.
Tudo isso logo mudaria. Em 1791 a Assembleia Nacional Francesa
emancipou os judeus da França. Os exércitos franceses ocupavam também a
Renânia e emanciparam os judeus da parte ocidental da Alemanha. Em
Frankfurt, o efeito seria mais abrupto e talvez menos intencional. Em 1796, a
França bombardeou Frankfurt, demolindo metade do Judengasse. Cerca de 2
mil judeus caram sem teto e precisaram se mudar para fora do gueto, os
Rothschilds entre eles. Fora do gueto e livres da miríade de regulações que os
impedia de empreender, eles puderam aproveitar novas oportunidades de
negócios, inclusive a possibilidade de fazer um contrato para fornecer grãos ao
Exército austríaco, o que antes não teriam permissão para fazer.
Quando a década terminou, Rothschild era um dos judeus mais ricos de
Frankfurt e um empresário bem estabelecido. A emancipação completa só veio
em 1811, e foi nalmente levada a cabo por Karl von Dalberg , intitulado grão-
duque de Frankfurt durante a reorganização da Alemanha feita por Napoleão.
Mayer Amschel disse ao lho: “Você agora é um cidadão.”
Tais eventos não puseram m à luta pela emancipação dos judeus, uma vez
que houve retrocessos posteriores, particularmente no Congresso de Viena de
1815, que criou um acordo político pós-napoleônico. Mas os Rothschilds não
voltariam para o gueto. Mayer Amschel e seus lhos em breve teriam o maior
banco da Europa do século , com liais em Frankfurt, Londres, Paris,
Nápoles e Viena.
Esse não foi um fato isolado. Primeiro os exércitos revolucionários franceses
e em seguida Napoleão invadiram grandes porções da Europa continental
em quase todas as áreas invadidas, as instituições existentes eram vestígios de
tempos medievais, dando poder a reis, príncipes e à nobreza e restringindo o
comércio tanto nas cidades quanto no campo. A servidão e o feudalismo eram
muito mais importantes em muitas dessas áreas do que na própria França. No
Leste Europeu, incluindo a Prússia e a parte húngara da Áustria-Hungria, os
servos estavam presos à terra. No Ocidente, essa forma estrita de servidão já
havia desaparecido, mas os camponeses deviam aos senhores feudais várias
taxas, tributos e obrigações de trabalho. Por exemplo, em Nassau-Usingen, os
camponeses estavam sujeitos a 230 diferentes pagamentos, taxas e serviços.
Havia uma taxa que deveria ser paga depois que um animal fosse abatido,
chamada de dízimo de sangue; também havia o dízimo das abelhas e o dízimo
da cera. Se um lote de terra era comprado ou vendido, era preciso pagar taxas
ao senhor. As guildas que regulavam todo tipo de atividade econômica na
cidade também eram mais fortes nesses lugares do que na França. Em Colônia
e Aachen, cidades ocidentais da Alemanha, a adoção das máquinas de ar e
tecer era proibida. Muitas cidades, de Berna, na Suíça, a Florença, na Itália,
eram controladas por um grupo pequeno de famílias.
Os líderes da Revolução Francesa e posteriormente Napoleão exportaram a
revolução para essas áreas, destruindo o absolutismo, acabando com as
relações feudais, abolindo as guildas e impondo a igualdade diante da lei a
importantíssima noção do Estado de Direito, que discutiremos com mais
detalhes no próximo capítulo. Com isso, a Revolução Francesa preparou a
França e também grande parte do restante da Europa para as instituições
inclusivas e o crescimento econômico que elas trariam.
Como vimos, alarmadas pelo que ocorrera na França, várias potências
europeias se organizaram em torno da Áustria em 1792 para atacar a França,
supostamente para libertar o rei Luís , mas na verdade com a intenção de
acabar com a Revolução Francesa. A expectativa era de que os exércitos
improvisados pela revolução em pouco tempo desmoronariam. Mas, depois de
algumas derrotas iniciais, os exércitos da nova República Francesa saíram
vitoriosos numa guerra que inicialmente era defensiva. Havia sérios problemas
de organização a serem superados. Contudo, os franceses estavam bem à frente
de outros países em uma grande inovação: o recrutamento em massa.
Introduzido em agosto de 1793, o recrutamento em massa permitiu que a
França organizasse grandes exércitos e passasse a ter uma vantagem militar que
beirou a supremacia antes mesmo de as famosas habilidades militares de
Napoleão entrarem em cena.
Em busca da modernidade
No outono de 1867, Okubo Toshimishi, um dos principais cortesãos do
domínio de Satsuma, no Japão, viajou da capital, Edo, atual Tóquio, para a
cidade de Yamaguchi. Em 14 de outubro, ele se encontrou com líderes do
domínio de Choshu. Tinha uma proposta simples: somarem forças,
marcharem com seus exércitos sobre Edo e derrubarem o shogun, o governante
do Japão. Na ocasião, Okubo Toshimicho já tinha a seu lado os líderes dos
domínios de Tosa e Hizen. Quando os líderes da poderosa Choshu
concordaram, foi selada uma secreta Aliança Satcho.
Em 1868, o Japão era um país economicamente subdesenvolvido,
controlado desde 1600 pela família Tokugawa, cujo governante assumira o
título de shogun (comandante). O imperador japonês fora deixado à parte e
tinha papel puramente cerimonial. Os shoguns Tokugawas eram membros
dominantes de uma classe de senhores feudais que governavam e tributavam
seus próprios domínios, entre os quais o de Satsuma, governado pela família
Shimazu. Esses senhores, junto com sua força militar, composta pelos famosos
samurais, dirigiam uma sociedade semelhante à da Europa medieval, com
categorias ocupacionais rigorosas, restrições comerciais e altas alíquotas de
tributos impostas aos produtores rurais. A sede do governo do shogun era Edo,
de onde ele monopolizava e controlava o comércio exterior e proibia a entrada
de estrangeiros no país. As instituições políticas e econômicas eram extrativistas
e o Japão era pobre.
Apesar disso, o domínio do shogun não era total. Mesmo quando a família
Tokugawa assumiu o comando do país, em 1600, não conseguiu controlar
toda a população. No sul, o domínio Satsuma permaneceu bastante
autônomo e inclusive tinha permissão para fazer comércio com o mundo
exterior de modo independente, por meio das ilhas Ryukyu. Foi em
Kagoshima, capital de Satsuma, que Okubo Toshimichi nasceu, em 1830.
Sendo lho de um samurai, também se tornou samurai. Seu talento foi
identi cado precocemente por Shimazu Nariakira, o senhor feudal de
Satsuma, que logo o promoveu. Na época, Shimazu Nariakira já tinha um
plano para usar o exército de Satsuma para derrubar o shogun. Ele desejava
expandir o comércio com a Ásia e a Europa, abolir as velhas instituições
econômicas feudais e construir um Estado moderno no Japão. O plano foi
interrompido com sua morte, em 1858. Seu sucessor, Shimazu Hisamitsu, era
mais circunspecto, pelo menos no começo.
Àquela altura, Okubo Toshimichi estava cada vez mais convicto da
necessidade de derrubar o shogunato feudal no Japão, e acabou convencendo
Shimazu Hisamitsu. Para conseguir apoio à causa, os dois se mostraram
ultrajados pela situação do imperador, que não tinha poderes. O tratado que
Okubo Toshimichi assinara com o domínio Tosa a rmava que “um país não
tem dois monarcas, uma casa não tem dois senhores; o governo recai sobre um
soberano”. Porém a real intenção não era apenas devolver o poder ao
imperador, mas sim modi car completamente as instituições políticas e
econômicas. Pelo lado de Tosa, um dos signatários do tratado era Sakamoto
Ryoma. Enquanto Satsuma e Choshu mobilizavam seus exércitos, Sakamoto
Ryoma apresentou ao shogun um plano de oito pontos, incitando-o a
renunciar para evitar uma guerra civil. O plano era radical, e, embora a primeira
cláusula a rmasse que “o poder político do país deve ser devolvido à Corte
Imperial e todo decreto deverá ser emitido pela corte”, o documento
contemplava bem mais do que a simples restauração do imperador. As
cláusulas 2, 3, 4 e 5 a rmavam:
◆◆◆
O Black Act
OC W , localizado a oeste de Londres, é uma das grandiosas
residências reais da Inglaterra. No início do século , era cercado por uma
grande oresta cheia de cervos, embora restem poucos vestígios disso. Um dos
responsáveis pela guarda da oresta em 1722, Baptist Nunn, se envolveu em
um con ito violento. Em 27 de junho, ele registrou:
◆◆◆
Além disso,
◆◆◆
As massas não queriam apenas o direito ao voto, e sim um lugar à mesa para
poder defender seus interesses. Isso foi bem compreendido pelo movimento
cartista, que liderou a campanha pelo sufrágio universal depois de 1838,
batizado em função de sua Carta do Povo, documento que tentava criar um
paralelo com a Magna Carta. O cartista J. R. Stephens explicou por que o
sufrágio universal e o voto para todos os cidadãos eram fundamentais para as
massas:
A questão do sufrágio universal (...) é uma questão de garfo e faca,
uma questão de pão e queijo (...) quando falo em sufrágio
universal estou falando que todo trabalhador do país tem o direito
de sair vestido com um bom casaco, de usar um bom chapéu, de ter
um bom teto como abrigo dos seus, um bom jantar em sua mesa.
Stephens havia compreendido bem que o sufrágio universal era o meio mais
duradouro de dar mais poder às massas britânicas e de garantir um casaco, um
chapéu, um teto e um bom jantar para o trabalhador.
O conde Grey foi bem-sucedido tanto na aprovação da Primeira Lei da
Reforma quanto na dissuasão das marés revolucionárias sem dar maiores
passos rumo ao voto universal. As reformas de 1832 foram modestas, apenas
dobrando o percentual de pessoas com direito a voto de 8% para 16% da
população adulta do sexo masculino (de cerca de 2% para 4% da população
como um todo). Também acabaram com os “burgos podres” e deram
representação independente a novas cidades que se industrializavam, como
Manchester, Leeds e Sheffield. Entretanto, isso deixou muitas questões
pendentes. Assim, não demorou para surgir novas demandas por mais direito
ao voto e novas agitações sociais. Como resposta, haveria novas reformas.
Por que as elites britânicas cederam às demandas? Por que o conde Grey
acreditou que reformas parciais muito limitadas eram o único modo de
preservar o sistema? Por que precisaram escolher o menor entre dois males, a
reforma ou a revolução, em vez de se manter no poder sem qualquer alteração?
Eles não poderiam ter feito o que os conquistadores espanhóis zeram na
América do Sul, o que os monarcas austro-húngaros e russos fariam nas
décadas seguintes, quando as exigências de reforma chegaram a seus países,
ou mesmo o que os próprios britânicos zeram no Caribe e na Índia: usar a
força para acabar com as demandas? A resposta vem do círculo virtuoso. As
mudanças econômicas e políticas que já tinham acontecido na Grã-Bretanha
tornaram o uso da força para reprimir essas demandas cada vez menos atraente
para a elite, mas também cada vez menos viável. Como escreveu E. P.
ompson:
Quebrando trustes
As instituições inclusivas nos Estados Unidos tinham raízes nas disputas na
Virgínia, em Maryland e nas Carolinas durante o período colonial (Capítulo
1). Essas instituições foram reforçadas pela Constituição dos Estados Unidos,
com seu sistema de limitações e a separação dos poderes, mas essa
Constituição não marcou o m do desenvolvimento de instituições inclusivas.
Assim como na Grã-Bretanha, essas instituições foram reforçadas por um
processo de interação positiva baseado no círculo virtuoso.
Em meados do século , todos os homens brancos, mas não as mulheres
nem os negros, podiam votar nos Estados Unidos. As instituições econômicas
se tornaram mais inclusivas por exemplo, com a aprovação da Lei da
Propriedade Rural de 1862 (Capítulo 1), que tornou as terras de fronteira
disponíveis para potenciais colonos, em vez de reservá-las para as elites
políticas. Mas, assim como na Grã-Bretanha, sempre houve desa os à
implementação de instituições inclusivas. O m da Guerra Civil Americana
deu início a um breve surto de crescimento econômico no norte. Com a
expansão das ferrovias, das indústrias e do comércio, umas poucas pessoas
zeram fortuna. Encorajados pelo sucesso econômico, esses homens e suas
empresas se tornaram cada vez mais inescrupulosos. Eram chamados de
Barões Ladrões, em função de suas práticas de negócios voltadas para a
consolidação de monopólios e da tentativa de impedir que quaisquer
concorrentes em potencial entrassem no mercado para competir em pé de
igualdade. Um dos mais célebres deles foi Cornelius Vanderbilt, autor da
famosa frase: “Desde quando eu me importo com a lei? Eu não tenho o
poder?”
Outro foi John D. Rockefeller, que fundou a Standard Oil Company em
1870. Ele logo eliminou seus rivais em Cleveland e tentou monopolizar o
transporte e o varejo do petróleo e seus derivados. Em 1882, já tinha criado um
imenso monopólio na linguagem de hoje, um truste. Em 1890, a Standard
Oil controlava 88% do petróleo re nado nos Estados Unidos, e Rockefeller se
tornou o primeiro bilionário do mundo em 1916. Cartuns da época mostram a
Standard Oil como um polvo com os tentáculos não só em torno da indústria
petrolífera, como também do Congresso americano.
John Pierpont Morgan era quase tão infame quanto Rockefeller. Ele foi o
fundador do conglomerado bancário J. P. Morgan, que mais tarde, depois de
muitas fusões ao longo das décadas, se transformou no JPMorgan Chase.
Junto com Andrew Carnegie, Morgan fundou a Companhia Siderúrgica dos
Estados Unidos, primeira corporação com valor de mercado de mais de 1
bilhão de dólares e de longe a maior siderúrgica do mundo. Na década de
1890, grandes trustes começaram a surgir em quase todos os setores da
economia, e muitos deles controlavam mais de 70% do mercado em que
atuavam. Entre essas empresas estavam nomes conhecidos, como Du Pont,
Eastman Kodak e International Harvester. Historicamente, as regiões norte e
centro-oeste dos Estados Unidos tinham mercados relativamente competitivos
e eram mais igualitárias do que outras partes do país, particularmente o sul.
Contudo, durante esse período a concorrência foi substituída pelo monopólio,
e a desigualdade de riqueza escalonou depressa.
O sistema político pluralista dos Estados Unidos já mobilizara um amplo
segmento da sociedade que tinha meios para se contrapor a esse tipo de
usurpação. As vítimas das práticas monopolistas dos Barões Ladrões, ou quem
fosse contra o domínio inescrupuloso que mantinham sobre seus setores,
começaram a se organizar. Assim se formou o movimento populista e, na
sequência, o movimento progressista.
O movimento populista surgiu de uma longa crise agrária que atingiu o
centro-oeste a partir do m da década de 1860. A Associação Nacional dos
Criadores de Animais, que reunia pecuaristas dos Estados Unidos, fundada em
1867, começou a mobilizar fazendeiros contra práticas de negócios injustas e
discriminatórias. Em 1873 e 1874, a associação conseguiu maioria em onze
legislaturas estaduais do centro-oeste, e o descontentamento da área rural
culminou, em 1892, na formação do Partido do Povo, que recebeu 8,5% dos
votos dos eleitores na eleição presidencial de 1892. Nas duas eleições seguintes,
os populistas apoiaram as duas campanhas malsucedidas de William Jennings
Bryan, que defendia muitas das suas causas. A oposição popular à
disseminação dos trustes estava organizada para tentar equilibrar a in uência
que Rockefeller e os Barões Ladrões exerciam sobre a política nacional.
Esses movimentos políticos pouco a pouco começaram a ter impacto nas
atitudes políticas e depois na legislação, sobretudo no que diz respeito ao papel
do Estado na regulação dos monopólios. A primeira legislação importante foi a
Lei de Comércio Interestadual de 1887, que criou a Comissão de Comércio
Interestadual e deu início ao desenvolvimento da regulamentação federal da
indústria. Logo se seguiu a Lei Antitruste Sherman de 1890, que ainda é parte
importante da regulamentação antitruste americana e se tornaria a base dos
ataques aos trustes dos Barões Ladrões. Ações importantes contra esses
monopólios aconteceram depois da eleição de presidentes comprometidos
com a reforma e a limitação do poder dos Barões Ladrões: eodore Roosevelt
(1901-1909), William Ta (1909-1913) e Woodrow Wilson (1913-1921).
Uma força política fundamental por trás do movimento antitruste e do
apelo para que se criasse uma regulamentação federal da indústria mobilizou
outra vez o voto rural. Na década de 1870, tentativas iniciais de estados
individuais de regular as ferrovias partiram de organizações de fazendeiros. Na
verdade, quase todas as 59 petições referentes a trustes enviadas ao Congresso
antes da aprovação da Lei Sherman vinham de estados agrícolas e partiam de
organizações como a União dos Fazendeiros, a Aliança dos Fazendeiros, a
Associação para Benefício Mútuo dos Fazendeiros e os Criadores de Animais.
Os fazendeiros descobriram um interesse coletivo na oposição às práticas
monopolistas da indústria.
Das cinzas dos populistas, que entraram em sério declínio depois de usar
sua força para apoiar os democratas, surgiram os progressistas, um movimento
reformista heterogêneo preocupado com muitas das mesmas questões. O
movimento progressista de início se aglutinou em torno da gura de Teddy
Roosevelt, vice-presidente de William McKinley, que assumiu a Presidência
depois do assassinato de McKinley, em 1901. Antes de sua ascensão ao cargo,
Roosevelt foi um governador de Nova York intransigente que se esforçou para
eliminar a corrupção e o “aparelhamento político”. Em seu primeiro discurso ao
Congresso, Roosevelt voltou a atenção para os trustes, a rmando que as bases
da prosperidade dos Estados Unidos eram a economia de mercado e a
engenhosidade dos empresários, mas ao mesmo tempo:
Manipulando a justiça
Franklin D. Roosevelt, candidato do Partido Democrata e primo de Teddy
Roosevelt, foi eleito presidente em 1932 em meio à Grande Depressão. Ele
chegou ao poder eleito por vontade popular para implementar um ambicioso
conjunto de políticas para combater a Grande Depressão. Na época de sua
posse, no início de 1933, um quarto da força de trabalho estava desempregada,
com muitos lançados na pobreza. A produção industrial tinha sido reduzida
em mais da metade desde o início da Depressão, em 1929, e o nível de
investimento desmoronara. As políticas propostas para fazer frente a essa
situação caram conhecidas como New Deal. Roosevelt havia conquistado
uma vitória sólida, com 57% dos votos da população, e o Partido Democrata
tinha maioria tanto na Câmara quanto no Senado, o su ciente para aprovar as
leis do New Deal. No entanto, parte das leis era relativa a questões
constitucionais e precisava ser levada à Suprema Corte, onde a vitória popular
de Roosevelt tinha muito menos peso.
Um dos pilares fundamentais do New Deal era a Lei da Recuperação da
Indústria Nacional. O Capítulo 1 se concentrava na recuperação da indústria.
O presidente Roosevelt e sua equipe acreditavam que restrições à concorrência
industrial, maiores direitos para que os trabalhadores fundassem sindicatos e a
regulamentação de padrões de trabalho eram fatores cruciais para o esforço de
recuperação. O Capítulo 2 criava a Administração de Obras Públicas, que
tinha entre seus projetos de infraestrutura marcos como a estação ferroviária da
30th Street, na Filadél a; a ponte Triborough; a represa Grand Coulee; e a
Overseas Highway, a rodovia que liga Key West, na Flórida, ao continente. O
presidente Roosevelt assinou o projeto em 16 de junho de 1933, e a Lei de
Recuperação da Indústria Nacional entrou em vigência. No entanto, foi
imediatamente contestada nos tribunais. Em 27 de maio de 1935, a Suprema
Corte decidiu por unanimidade que o Capítulo 1 da lei era inconstitucional.
O veredito observava solenemente que “Situações extraordinárias podem exigir
medidas extraordinárias. Contudo (...) situações extraordinárias não criam
nem ampliam poderes constitucionais”.
Antes da decisão da Suprema Corte, Roosevelt dava o passo seguinte de sua
agenda, assinando a Lei da Seguridade Social, que criou o moderno Estado de
bem-estar social nos Estados Unidos: aposentadorias, benefícios para
desempregados, assistência para famílias com lhos dependentes e um certo
grau de saúde pública e benefícios para pessoas com de ciência. Ele também
sancionou a Lei Nacional de Relações Trabalhistas, que fortaleceu e ampliou
os direitos dos trabalhadores para organizar sindicatos, participar de
negociações coletivas e fazer greves contra empregadores. Tais medidas
também foram contestadas na Suprema Corte. Enquanto tramitavam no
Judiciário, Roosevelt foi reeleito em 1936 com forte apoio popular, recebendo
61% dos votos.
Com a popularidade em níveis recorde, Roosevelt não pretendia deixar que
a Suprema Corte tirasse sua agenda para o país ainda mais dos trilhos. Ele
delineou seus planos em uma de suas frequentes Conversas ao Pé da Lareira,
transmitida ao vivo pelo rádio em 9 de março de 1937. Ele começou
ressaltando que, em seu primeiro mandato, políticas tremendamente
necessárias só tinham conseguido o aval da Suprema Corte por um triz. Ele
prosseguiu:
Roosevelt disse que tinha um mandato dado pelo povo para mudar essa
situação e que, “depois de pensar sobre quais reformas propor, o único método
claramente constitucional (...) seria colocar sangue novo em todos os nossos
tribunais”. Ele também a rmou que os ministros da Suprema Corte estavam
sobrecarregados, e que a carga de trabalho era excessiva para os ministros mais
velhos que, por acaso, eram aqueles que atacavam suas leis. Ele então propôs
que todo juiz deveria se aposentar compulsoriamente aos 70 anos e que deveria
poder indicar até seis novos ministros. Esse plano, que Roosevelt apresentou
como o Projeto de Reorganização Judiciária, bastaria para remover os ministros
indicados por governos mais conservadores e que constituíam oposição mais
veemente ao New Deal.
Embora Roosevelt tenha tentado conquistar apoio popular para a medida,
as pesquisas de opinião pública sugeriam que apenas cerca de 40% da
população apoiava o plano. Louis Brandeis agora era ministro da Suprema
Corte. Embora simpatizasse com boa parte das leis de Roosevelt, Brandeis se
pronunciou contra as tentativas de reduzir o poder da Suprema Corte e contra
as alegações do presidente de que os ministros estavam sobrecarregados. O
Partido Democrata de Roosevelt tinha ampla maioria em ambas as casas do
Congresso, mas, em certa medida, a Câmara se recusou a fazer tramitar o
projeto de Roosevelt, que então tentou o Senado. O projeto foi enviado para a
Comissão Judiciária do Senado, que realizou sessões bastante polêmicas,
solicitando várias opiniões sobre a proposta. A Comissão acabou enviando o
projeto para ser votado no plenário do Senado com um parecer contrário à
aprovação, alegando que era um “abandono desnecessário, inútil e
profundamente perigoso dos princípios constitucionais, (...) sem precedentes e
sem justi cativas”. O Senado decidiu enviar o projeto de novo à Comissão,
para ser reescrito, por setenta votos contra vinte. Todos os elementos sobre a
“manipulação dos tribunais” foram eliminados. Roosevelt não teria como se
livrar das restrições que a Suprema Corte podia impor a seus poderes. Embora
os poderes de Roosevelt tenham continuado limitados, houve acordos entre as
partes, e tanto a Lei da Seguridade Social quanto a Lei Nacional das Relações
Trabalhistas foram consideradas constitucionais pela Suprema Corte.
A lição geral que se pôde tirar do episódio foi mais importante do que o
destino dessas duas leis. As instituições políticas inclusivas não apenas servem
de contrapeso a importantes desvios nas instituições econômicas inclusivas,
como também resistem a tentativas que minem sua continuidade. A Câmara e
o Senado, compostos majoritariamente pelos democratas, tinham interesse
direto em in uenciar a composição do tribunal e garantir que a legislação do
New Deal sobrevivesse. No entanto, assim como as elites políticas no início do
século compreenderam que suspender o Estado de Direito poria em risco
as conquistas que haviam arrancado da monarquia, os deputados e senadores
compreenderam que, caso o presidente conseguisse reduzir a independência
do Judiciário, o equilíbrio de poderes do sistema que os protegia contra o
presidente e que garantia a continuidade das instituições políticas pluralistas
seria minado.
Talvez Roosevelt pudesse ter decidido, se conseguisse essa vitória, que obter
maiorias no Legislativo exigia muitos acordos e tomava tempo demais e que,
em vez disso, iria governar por decreto, o que causaria danos enormes ao
pluralismo e ao sistema político norte-americano. O Congresso com certeza
não teria aprovado isso, mas Roosevelt poderia apelar à nação, a rmando que o
Congresso impedia as medidas necessárias para combater a Depressão. Poderia
usar a força policial para fechar o Congresso. Parece exagero? Foi exatamente o
que aconteceu no Peru e na Venezuela nos anos 1990. Os presidentes Fujimori
e Chávez se aproveitaram de terem sido eleitos por vontade popular para fechar
Congressos que se recusavam a colaborar com eles, então reescreveram a
Constituição para fortalecer os poderes presidenciais. O medo dessa bola de
neve por parte daqueles que compartilhavam o poder sob instituições políticas
pluralistas foi exatamente o que impediu Walpole de manipular os tribunais
britânicos, na década de 1720, e o que impediu o Congresso americano de
apoiar o projeto de Roosevelt de in uenciar a composição dos tribunais.
Roosevelt havia se deparado com o poder dos ciclos virtuosos.
No entanto, essa lógica nem sempre funciona, sobretudo em sociedades que
podem ter algumas características inclusivas, mas que são amplamente
extrativistas. Já vimos essa dinâmica em Roma e Veneza. Temos outro exemplo
ao comparar a tentativa fracassada de Roosevelt de interferir na composição
dos tribunais com esforços semelhantes na Argentina, onde uma disputa
quase igual se desenrolou no contexto de instituições econômicas e políticas
predominantemente extrativistas.
A Constituição da Argentina de 1853 criou uma Suprema Corte com
atribuições semelhantes às da Suprema Corte norte-americana, e uma decisão
de 1887 permitiu que a Suprema Corte argentina assumisse o mesmo papel da
Suprema Corte dos Estados Unidos de decidir se leis especí cas eram ou não
constitucionais. Em tese, a Suprema Corte poderia ter se tornado um
importante elemento das instituições políticas inclusivas na Argentina, porém
o restante do sistema político e econômico permaneceu altamente extrativista,
e na Argentina não houve a concessão de poderes para amplos segmentos da
sociedade nem pluralismo. Assim como nos Estados Unidos, o papel
constitucional da Suprema Corte da Argentina seria contestado. Em 1946,
Juan Domingo Perón foi democraticamente eleito presidente do país. Perón era
um ex-coronel e ganhou destaque pela primeira vez após um golpe militar em
1943, que o nomeou ministro do Trabalho. Nesse cargo, construiu uma
coalizão política com sindicatos e o movimento trabalhista que seria crucial
para sua candidatura presidencial.
Pouco depois da vitória de Perón, sua base na Câmara dos Deputados
propôs o impeachment de quatro dos cinco ministros do tribunal. As
acusações contra a Suprema Corte eram diversas. Uma delas envolvia ter
aceitado de maneira inconstitucional a legalidade de dois regimes militares em
1930 e 1943 o que era irônico, já que Perón tivera papel fundamental nesse
último golpe. A outra acusação era relativa às leis que a Corte havia anulado,
assim como ocorrera com sua contraparte norte-americana. Pouco antes de
Perón ser eleito presidente, a Suprema Corte havia decidido que seu novo
Conselho de Relações Trabalhistas era inconstitucional. Assim como Roosevelt
havia criticado severamente a Suprema Corte em sua campanha de reeleição
de 1936, Perón fez o mesmo em sua campanha de 1946. Nove meses depois do
início do processo, a Câmara dos Deputados decretou o impeachment de três
ministros, sendo que o quarto já havia renunciado. O Senado aprovou a
moção. Perón então nomeou quatro novos ministros. A fragilização da
Suprema Corte teve o efeito evidente de livrar Perón de restrições políticas, e ele
agora podia exercer um poder sem limites, de modo muito semelhante ao que
havia acontecido com os regimes militares da Argentina antes de ele assumir a
Presidência. Seus ministros, por exemplo, declararam constitucional a
condenação de Ricardo Balbín, líder do principal partido de oposição a Perón,
o Partido Radical, por desrespeito ao presidente, que teve toda a liberdade para
de fato governar como ditador.
Desde o momento em que Perón teve sucesso em manipular a formação da
Suprema Corte, virou norma na Argentina que todo novo presidente
escolhesse seus ministros da Suprema Corte. Desse modo, uma instituição
política que poderia ter exercido um papel limitador ao poder do Executivo
desapareceu. O regime de Perón foi derrubado por outro golpe em 1955, e
seguiu-se uma longa sequência de transições entre governos militares e civis.
Cada novo regime militar e civil escolhia seus ministros. Mas escolher os
ministros da Suprema Corte na Argentina não era uma atividade que se
limitava a transições entre governos militares e civis. Em 1990, a Argentina
nalmente viveu uma transição entre dois governos democraticamente eleitos
um governo democrático seguido por outro. No entanto, a essa altura, os
governos democráticos não se comportavam de modo muito diferente dos
militares no que dizia respeito à Suprema Corte. O presidente que estava
tomando posse era Carlos Saúl Menem, do Partido Peronista. A Suprema
Corte daquele momento havia sido indicada, depois da transição para a
democracia em 1983, por Raúl Alfonsín, presidente pelo Partido Radical.
Como se tratava de uma transição democrática, não deveria haver razão para
que Menem indicasse seu próprio tribunal, mas, pouco antes da eleição, ele já
havia mostrado a que vinha. Menem ofereceu vários estímulos para que os
ministros da Suprema Corte renunciassem, recorrendo até a intimidações,
embora sem sucesso. Ficou famosa a história de que ele ofereceu um posto em
uma embaixada ao ministro Carlos Fayt. Mas ele foi repreendido, e Fayt
respondeu enviando um exemplar de seu livro Lei e ética, com um bilhete que
dizia: “Cuidado, eu escrevi isso.” Sem se deixar demover, três meses depois de
assumir, Menem enviou um projeto de lei para a Câmara dos Deputados
propondo expandir a Suprema Corte de cinco para nove membros. Um dos
argumentos era igual ao que Roosevelt usara em 1937: a Corte estava
sobrecarregada. A lei foi aprovada pelo Senado e pela Câmara, o que permitiu a
Menem nomear quatro novos ministros. Ele agora tinha a maioria.
A vitória de Menem contra a Suprema Corte fez surgir o tipo de bola de neve
que mencionamos antes. Seu próximo passo foi reescrever a Constituição para
retirar o limite de um único mandato, para que pudesse concorrer à reeleição.
Depois de reeleito, Menem tentou reescrever a Constituição de novo, porém foi
impedido não pelas instituições políticas argentinas, e sim por facções dentro
do próprio Partido Peronista, que combatiam seu domínio pessoal.
Desde a independência, a Argentina sofreu com a maioria dos problemas
institucionais que afetaram a América Latina. O país cou preso a um círculo
vicioso, não virtuoso. Como consequência, desdobramentos positivos, como os
primeiros passos em direção à criação de uma Suprema Corte independente,
jamais foram adiante. Com o pluralismo, nenhum grupo deseja ou ousa tirar
outro do poder pela força, por receio de que sua permanência no poder seja
também contestada. Ao mesmo tempo, a ampla distribuição do poder torna
difícil a derrubada de um governo. Uma Suprema Corte pode ter poder caso
receba apoio signi cativo de amplos segmentos da sociedade dispostos a
rejeitar tentativas de corromper sua independência. Foi o que aconteceu nos
Estados Unidos, mas não na Argentina. Os parlamentares caram felizes em
fragilizar o tribunal, mesmo prevendo que isso poderia colocar em risco sua
própria posição. Um dos motivos é o fato de que, quando existem instituições
extrativistas, há muito a se ganhar com a ruína da Suprema Corte, e os
possíveis benefícios valem o risco.
Da encomienda à apropriação de
terras
Em 14 de janeiro de 1993, Ramiro de León Carpio tomou posse como
presidente da Guatemala. Ele nomeou Richard Aitkenhead Castillo ministro
das Finanças e Ricardo Castillo Sinbaldi ministro do Desenvolvimento. Esses
três homens tinham algo em comum: todos eram descendentes de
conquistadores espanhóis que chegaram à Guatemala no início do século .
O ilustre ancestral do presidente De León era Juan de León Cardona,
enquanto os Castillos eram aparentados com Bernal Díaz Castillo, que
escreveu um dos mais famosos relatos testemunhais da conquista do México.
Como recompensa por seu serviço a Hernán Cortés, Díaz del Castillo foi
nomeado governador de Santiago de los Caballeros, a atual cidade de
Antígua, na Guatemala. Tanto Castillo quanto De León fundaram dinastias,
assim como outros conquistadores, como Pedro de Alvarado. A socióloga
guatemalteca Marta Casaús Arzú identi cou um núcleo duro de 22 famílias
na Guatemala que tinham laços por meio de casamentos com outras 26
famílias próximas ao núcleo. O estudo genealógico e político sugeria que essas
famílias controlavam o poder econômico e político na Guatemala desde 1531.
Uma de nição ainda mais ampla de quais famílias faziam parte dessa elite
sugeriu que esse grupo equivalia a pouco mais de 1% da população da
Guatemala na década de 1990.
Em Serra Leoa e em grande parte da África subsaariana, o círculo vicioso
assumiu a forma de instituições extrativistas estabelecidas pelas potências
coloniais que foram assumidas pelos líderes pós-independência. Na
Guatemala, assim como em grande parte da América Central, vemos uma
forma mais simples e mais crua de círculo vicioso: quem tem o poder
econômico e político estrutura as instituições de modo a assegurar a
continuidade de seu poder. Esse tipo de círculo vicioso leva à persistência de
instituições extrativistas e à persistência das mesmas elites no poder, assim
como à persistência do subdesenvolvimento.
Na época da conquista, a Guatemala era densamente povoada, com uma
população de cerca de 2 milhões de maias. A doença e a exploração cobraram
um preço alto, assim como em todas as colônias das Américas. A população
total do país só voltou a esse nível na década de 1920. Como em todo o
restante do Império Espanhol, os nativos foram concedidos aos conquistadores
por meio da encomienda. Conforme vimos no contexto da colonização do
México e do Peru, a encomienda era um sistema de trabalho forçado que
posteriormente cedeu lugar a outras instituições coercitivas, em particular o
repartimiento, também chamado na Guatemala de mandamiento. A elite,
composta pelos descendentes dos conquistadores e por alguns indivíduos
indígenas, não apenas se bene ciava dos vários sistemas de trabalho forçado,
como também controlava e exercia monopólio sobre o comércio por meio de
uma guilda mercantil denominada Consulado de Comércio. A maior parte da
população da Guatemala vivia nas montanhas e longe da costa. Os altos
custos de transporte reduziram a dimensão da economia de exportação e, de
início, a terra não era muito valiosa. Grande parte da terra continuava nas
mãos de povos indígenas, que tinham grandes propriedades comunitárias
denominadas ejidos. O restante das áreas cava em grande medida
desocupado e em tese pertencia ao governo. Ganhava-se mais dinheiro
controlando e tributando o comércio do que controlando a terra.
Assim como no México, a elite guatemalteca via com hostilidade a
Constituição de Cádiz (Capítulo 1), que os estimulava a declarar
independência, assim como o zeram as elites mexicanas. Depois de uma breve
união com o México e com a Federação Centro-Americana, a elite colonial
governou a Guatemala por meio da ditadura de Rafael Carrera entre 1839 e
1865. Durante esse período, os descendentes dos conquistadores e a elite nativa
mantiveram as instituições econômicas extrativistas do período colonial em
grande medida inalteradas. Nem mesmo a organização do Consulado se
alterou com a independência. Embora fosse uma instituição real, o governo
republicano cou bastante feliz em mantê-la.
A independência, portanto, foi apenas um golpe das elites locais
preexistentes, que, assim como no México, continuaram usufruindo das
instituições econômicas extrativistas da qual se bene ciaram tanto.
Ironicamente, durante esse período, o Consulado de Comércio continuou
encarregado do desenvolvimento econômico da nação. Mas, como havia
ocorrido antes da independência, a instituição operava levando em conta
interesses próprios, e não os do país. Parte de sua responsabilidade era
desenvolver a infraestrutura, com obras como portos e rodovias, mas, assim
como na Áustria-Hungria, na Rússia e em Serra Leoa, essas obras com
frequência ameaçavam trazer destruição criativa e poderiam levar à
desestabilização do sistema. Portanto, o desenvolvimento da infraestrutura
muitas vezes foi alvo de resistência. Por exemplo, o desenvolvimento de um
porto na costa de Suchitepéquez, no oceano Pací co, era um dos projetos
propostos. Na época, os únicos portos adequados do país estavam na costa
caribenha e eram controlados pelo Consulado, que nada fez no lado do
Pací co, porque um porto na região teria fornecido um canal de escoamento
muito mais simples para os produtos das cidades de planície de Mazatenango
e Quetzaltenango. Caso esses produtos tivessem acesso a um mercado
diferente, o monopólio do Consulado sobre o comércio exterior estaria
ameaçado. A mesma lógica se aplicava às rodovias, que, mais uma vez, eram
responsabilidade do Consulado. Previsivelmente, a instituição também se
recusou a construir estradas que fortalecessem grupos concorrentes ou que
tivessem potencial para desfazer seu monopólio. A pressão para fazer isso veio
da porção ocidental da Guatemala e de Quetzaltenango, na região de Los
Altos. Mas, se a estrada ligando Los Altos e a costa de Suchitepéquez recebesse
melhorias, poderia criar uma classe mercantil em concorrência com os
mercadores do Consulado na capital. A estrada não recebeu melhorias.
Em decorrência da dominação da elite, a Guatemala cou parada no tempo
em meados do século , enquanto o restante do mundo evoluía depressa. No
entanto, essas mudanças acabariam afetando a Guatemala. Os custos de
transporte caíam devido às inovações tecnológicas como o trem a vapor, as
ferrovias e tipos novos e mais rápidos de navio. Além disso, o aumento da renda
média na Europa Ocidental e na América do Norte criava enorme demanda
por muitos produtos que um país como a Guatemala tinha potencial para
produzir.
No início do século, dois corantes naturais, índigo e cochonilha, foram
produzidos para exportação, mas a oportunidade mais lucrativa viria com a
produção de café. A Guatemala tinha grande quantidade de terras adequadas
a esse cultivo, que começou a se disseminar sem qualquer assistência do
Consulado. À medida que os preços do café no mercado mundial subiam, e o
comércio internacional se expandia, passou a ser possível obter grandes lucros
com o cultivo, e a elite guatemalteca cou interessada. Em 1871, o regime
duradouro criado pelo ditador Carrera foi en m derrubado pelo grupo dos
autodenominados Liberais, em homenagem ao movimento mundial que
usava esse nome. O signi cado do liberalismo mudou ao longo do tempo. No
século , nos Estados Unidos e na Europa, era semelhante ao que hoje
chamamos de libertarianismo, e o movimento defendia a liberdade dos
indivíduos, o governo limitado e o livre-comércio. Na Guatemala, as coisas
funcionavam de forma um pouco diferente. Liderados primeiro por Miguel
García Granados e depois de 1873 por Justo Ru no Barrios, os liberais da
Guatemala não eram novos homens com ideais liberais. Em grande medida, as
mesmas famílias permaneceram no poder, mantiveram as instituições políticas
extrativistas e implementaram uma grande reorganização da economia para
explorar o café. O Consulado de Comércio foi abolido em 1871, mas as
circunstâncias econômicas haviam mudado. O foco das instituições
econômicas extrativistas passara a ser a produção e a exportação de café.
A produção de café exigia terras e mão de obra. Para que houvesse terras
para a plantação, os liberais defenderam a privatização da terra, o que na
verdade era uma apropriação que lhes permitiria tomar para si áreas que antes
pertenciam a comunidades ou ao governo. Embora a tentativa tenha sido
muito contestada, tendo em vista as instituições políticas altamente
extrativistas e a concentração do poder político na Guatemala, a elite saiu
vitoriosa. Entre 1871 e 1883, quase 1 milhão de acres de terra, na maior parte
áreas de comunidades indígenas e terras em áreas de fronteira, passaram para
as mãos da elite, e só então a produção de café se desenvolveu em ritmo
acelerado. O objetivo era a formação de grandes propriedades. As terras
privatizadas foram quase todas leiloadas para membros da elite tradicional ou
pessoas ligadas a eles. O poder coercitivo do Estado Liberal foi usado para
ajudar grandes proprietários de terra a terem acesso a mão de obra por meio da
adaptação e da intensi cação de diversos sistemas de trabalho forçado. Em
novembro de 1876, o presidente Barrios escreveu a todos os governadores da
Guatemala observando que
como o país tem extensões de terra que precisa explorar por meio
do cultivo, utilizando a multidão de trabalhadores que hoje
permanecem fora do movimento de desenvolvimento dos
elementos produtivos da nação, os senhores devem dar toda a
ajuda para a agricultura de exportação:
1. As cidades indígenas de sua jurisdição devem oferecer aos
proprietários das ncas [fazendas] que solicitarem mão de obra a
quantidade de trabalhadores necessária, sejam cinquenta ou cem.
O sul sequer era inovador nos setores em que se especializou: entre 1837 e
1859, os números de patentes concedidas anualmente para inovações relativas
ao cultivo de milho e trigo eram em média doze e dez, respectivamente; havia
apenas uma patente por ano para o cultivo mais importante do sul, o algodão.
Não havia indícios de industrialização e crescimento econômico. No entanto, a
derrota na Guerra Civil foi seguida de reformas econômicas e políticas
fundamentais feitas sob a mira das armas do norte. A escravidão foi abolida, e
os homens negros passaram a ter direito a voto.
Essas mudanças importantes deveriam ter aberto caminho para uma
transformação radical que impeliria as instituições extrativistas a se tornarem
inclusivas e levaria o sul por um caminho de prosperidade econômica.
Contudo, em mais uma manifestação do círculo vicioso, nada do gênero
aconteceu. Uma continuidade das instituições extrativistas, dessa vez sob a
forma das leis Jim Crow, em vez da escravidão, surgiu no sul. A expressão Jim
Crow, que supostamente veio de “Jump Jim Crow”, uma sátira aos negros do
início do século interpretada por brancos com “blackface” (o rosto pintado
de preto), veio a designar toda uma gama de leis segregacionistas aprovadas
no sul depois de 1865. Essas leis perduraram por quase um século, até a
chegada de outra revolta: o movimento dos direitos civis. Enquanto isso, os
negros continuaram excluídos do poder e sofrendo com a opressão
institucional. A agricultura do tipo plantation baseada em baixos salários
pagos a mão de obra pouco instruída persistiu, e as rendas do sul caíram
ainda mais em comparação com a média dos Estados Unidos. O círculo
vicioso das instituições extrativistas era mais forte do que muitos esperavam na
época.
O motivo para a trajetória econômica e política do sul jamais ter mudado,
embora a escravidão tenha sido abolida e os negros do sexo masculino tenham
passado a ter direito a voto, foi a fragilidade do poder político e da
independência econômica dos negros. Os fazendeiros do sul perderam a
guerra, mas venceriam na paz. Continuavam organizados e ainda eram os
proprietários da terra. Durante a guerra, escravizados libertos tinham recebido
a promessa de quarenta acres de terra e uma mula quando a escravidão fosse
abolida, e alguns chegaram a receber a recompensa durante as famosas
campanhas do general William T. Sherman. Todavia, em 1865, o presidente
Andrew Johnson revogou as ordens de Sherman, e a esperada distribuição de
terras jamais aconteceu. Em um debate sobre essa questão no Congresso, o
deputado George Washington Julian observou, antecipando o que ocorreria:
“De que valeria uma lei aprovada pelo Congresso abolindo completamente a
escravidão (...) se perdurarem as velhas bases agrícolas do poder aristocrático?”
Esse foi o início da “redenção” do velho sul e da perpetuação da velha elite
agrária sulista.
O sociólogo Jonathan Wiener estudou a perpetuação da elite agrária em
cinco distritos do Cinturão Negro, região de grandes produtores de algodão,
localizados no Alabama. Rastreando famílias pelo censo dos Estados Unidos e
considerando as pessoas que tinham pelo menos 10 mil dólares em
propriedades agrícolas, ele descobriu que, dos 236 membros da elite agrária em
1850, 101 mantinham sua posição em 1870. Curiosamente, essa taxa de
permanência era muito semelhante à que existia no período anterior à Guerra
Civil: das 236 famílias mais ricas do campo em 1850, apenas 110 continuavam
nessa lista uma década mais tarde. No entanto, dos 25 fazendeiros com
maiores propriedades rurais em 1870, 18 (72%) estavam na lista das famílias
da elite desde 1860 e 16 estavam na lista de 1850. Embora mais de 600 mil
pessoas tenham sido mortas na Guerra Civil, as elites agrárias sofreram poucas
baixas. A lei, redigida pelos fazendeiros e para os fazendeiros, isentava do
serviço militar um proprietário de escravizados para cada vinte pessoas
escravizadas. Enquanto centenas de milhares de homens morriam para
preservar a economia latifundiária do sul, muitos grandes proprietários de
escravizados e seus lhos passaram a guerra em suas varandas, e assim foram
capazes de garantir a continuidade da economia latifundiária.
Depois do m da guerra, as elites agrárias que controlavam a terra
conseguiram voltar a exercer controle sobre a mão de obra. Embora a
instituição econômica da escravidão tivesse sido abolida, os indícios mostram
uma clara linha de continuidade no sistema econômico do sul, baseado na
agricultura do tipo plantation com mão de obra barata. Esse sistema
econômico foi mantido por diversas maneiras, incluindo o controle da política
local e o exercício da violência. Como consequência, nas palavras do
intelectual afroamericano W. E. B. Du Bois, o sul se tornou “um campo armado
para intimidar o povo negro”.
Em 1865, o Legislativo estadual do Alabama aprovou o Código dos Negros,
importante marco na repressão da mão de obra negra. Semelhante ao Decreto
177 da Guatemala, o Código dos Negros do Alabama era uma lei contra a
vadiagem e contra o “aliciamento” de trabalhadores. O objetivo era impedir a
mobilidade da mão de obra e reduzir a concorrência no mercado de trabalho,
de forma a garantir que os fazendeiros do sul continuassem com um
suprimento con ável de mão de obra barata.
Depois da Guerra Civil, o período chamado de Reconstrução durou de
1865 a 1877. Políticos do norte, com a ajuda do Exército da União,
engendraram algumas mudanças sociais no sul. No entanto, uma reação
sistemática da elite sulista disfarçada de apoio para os chamados redentores,
que almejavam a redenção do sul, recriou o velho sistema. Na eleição
presidencial de 1877, Rutherford Hayes precisava do apoio do sul no Colégio
Eleitoral. Esse colégio, utilizado ainda hoje, estava no coração da eleição
indireta para presidente criada pela Constituição americana. Os votos dos
cidadãos não elegiam diretamente o presidente, e sim delegados, que então
escolhiam o presidente no Colégio Eleitoral. Em troca de apoio no Colégio
Eleitoral, os sulistas exigiram que os soldados da União fossem retirados do sul
e a região fosse deixada por conta própria. Hayes concordou. Com o apoio do
sul, Hayes se tornou presidente e retirou as tropas. O período depois de 1877
marcou então o verdadeiro ressurgimento da elite agrária pré-Guerra Civil. A
redenção do sul envolvia a introdução de novos impostos per capita e testes de
alfabetização para obter o direito ao voto, o que sistematicamente retirava dos
negros e também da população branca empobrecida a possibilidade de
votar. Essas tentativas tiveram êxito e criaram um regime de partido único, sob
o Partido Democrata, com grande parte do poder político depositado nas mãos
da elite agrária.
As leis Jim Crow criaram escolas segregadas e previsivelmente inferiores. O
Alabama, por exemplo, reescreveu sua Constituição em 1901 para tornar a
segregação possível. É chocante que ainda hoje a Seção 256 da Constituição
do Alabama, embora não seja mais aplicada, ainda a rme ser:
Uma emenda para revogar a Seção 256 da Constituição foi derrotada por
poucos votos de diferença no Legislativo estadual em 2004.
A retirada do direito ao voto, as leis contra a vadiagem, como o Código dos
Negros do Alabama, as várias leis Jim Crow e as ações da Ku Klux Klan, muitas
vezes nanciadas e apoiadas pela elite, transformaram o sul pós-Guerra Civil
em uma verdadeira sociedade de apartheid, onde negros e brancos viviam
vidas diferentes. Assim como na África do Sul, essas leis e práticas tinham
como objetivo o controle da população negra e de sua força de trabalho.
Políticos sulistas em Washington também trabalharam para garantir que as
instituições extrativistas do sul pudessem perdurar. Por exemplo, garantiram
que não fosse aprovado nenhum projeto ou obra pública federal que pudesse
colocar em risco o controle que a elite branca tinha sobre a mão de obra negra.
Como consequência, o sul entrou no século como uma sociedade bastante
rural, com baixos níveis de instrução e tecnologia atrasada, ainda utilizando
trabalho manual e animais de tração, praticamente sem a assistência de
implementos mecânicos. Embora a proporção de pessoas vivendo em áreas
urbanas tenha aumentado, esse número seguia bem mais baixo do que no
norte. Em 1900, por exemplo, 13,5% da população do sul era urbana, contra
60% no nordeste.
No m das contas, as instituições extrativistas no sul dos Estados Unidos,
baseadas no poder da elite agrária, na agricultura do tipo plantation e na mão
de obra mal remunerada e de pouca instrução, perdurou durante boa parte do
século . Essas instituições só começaram a ruir depois da Segunda Guerra
Mundial e, com mais força, depois de os movimentos dos direitos civis terem
destruído a base política do sistema. Só depois do m dessas instituições, nos
anos 1950 e 1960, o sul começou seu processo de rápida convergência com o
norte.
O sul dos Estados Unidos mostra outra faceta, mais resiliente, do círculo
vicioso: assim como na Guatemala, a elite agrária do sul permaneceu no poder
e estruturou as instituições econômicas e políticas de modo a garantir a
continuidade desse poder. Mas, ao contrário do que aconteceu na Guatemala,
esse sistema se deparou com desa os signi cativos depois da derrota na
Guerra Civil, que aboliu a escravidão e reverteu a exclusão total e
constitucional dos negros no que dizia respeito a participação política. Mas
existe mais de um jeito de fazer as coisas: enquanto continuou no controle de
suas enormes propriedades rurais e permaneceu organizada, a elite agrária
pôde estruturar um novo conjunto de instituições, as leis Jim Crow, no lugar
da escravidão, para atingir o mesmo objetivo. O círculo vicioso se revelou mais
forte do que muitas pessoas, incluindo Abraham Lincoln, haviam imaginado.
O círculo vicioso se baseia em instituições políticas extrativistas que criam
instituições econômicas extrativistas, que por sua vez dão apoio a instituições
políticas extrativistas, já que a riqueza e o poder econômicos compram poder
político. Quando conseguiu eliminar a proposta da distribuição de quarenta
acres de terra e uma mula, a elite agrária sulista garantiu que seu poder
permanecesse inalterado. E, sem qualquer surpresa, infelizmente persistiram as
consequências nefastas para a população negra do sul, e para o
desenvolvimento econômico da região.
El Corralito
A Argentina estava em meio a uma crise econômica no m de 2001. Por três
anos, a renda vinha caindo, o desemprego estava crescente, e o país havia
acumulado uma dívida externa gigantesca. As políticas que levaram a essa
situação foram adotadas depois de 1989, pelo governo de Carlos Menem, para
cessar a hiperin ação e estabilizar a economia. E funcionaram por um tempo.
Em 1991, Menem indexou o peso argentino ao dólar: por lei, 1 peso
equivalia a 1 dólar, e a taxa de câmbio não variava. Ponto- nal bom, quase.
Para assegurar as pessoas de que realmente pretendia seguir a lei, o governo
convenceu a população a abrir contas bancárias em dólares. Era possível usar
dólares nas lojas da capital, Buenos Aires, e fazer saques na moeda norte-
americana em caixas eletrônicos por toda a cidade. Essa política pode ter
ajudado a estabilizar a economia, porém havia um grande inconveniente: isso
tornava as exportações argentinas muito caras, e as importações de outros
países, muito baratas. As exportações minguaram, e as importações
explodiram. Só se podia pagar por elas fazendo empréstimos. A situação era
insustentável. A preocupação com a sustentabilidade do peso aumentava, e
cada vez mais pessoas colocavam o dinheiro em contas bancárias em dólar.
A nal, se o governo rasgasse a lei e desvalorizasse o peso, as contas em dólar
estariam a salvo, certo? As pessoas tinham razão em se preocupar com o peso,
mas estavam otimistas demais em relação ao dólar.
Em 1o de dezembro de 2001, o governo congelou todas as contas bancárias, a
princípio por noventa dias. Apenas uma pequena quantia em dinheiro podia
ser sacada semanalmente. De início, eram 250 pesos, que ainda equivaliam a
250 dólares; depois, 300 pesos. Mas os saques só podiam ser realizados das
contas em peso. Ninguém tinha permissão para sacar dinheiro das contas em
dólar, a não ser que concordassem com a conversão dos dólares para pesos.
Ninguém queria isso. Os argentinos apelidaram a situação de El Corralito, “O
Curralzinho”: os correntistas estavam presos como gado em um curral, sem ter
para onde ir. Em janeiro nalmente veio a desvalorização, e, em vez da
equivalência entre peso e dólar, não demorou para que cada 4 pesos valesse 1
dólar. Isso parecia dar razão aos que acharam que podiam poupar em dólares,
mas não foi o caso, porque o governo converteu à força todas as contas
bancárias em dólares para pesos, mas usando a antiga taxa de um para um.
Quem tivesse mil dólares na conta de repente se viu com 250. O governo havia
expropriado três quartos da poupança da população.
Para os economistas, a Argentina é um país intrigante. Para exempli car
como é difícil compreendê-la, Simon Kuznets, vencedor do Nobel de
Economia, disse, numa frase célebre, que havia quatro tipos de países: os
desenvolvidos, os subdesenvolvidos, o Japão e a Argentina. Kuznets achava isso
porque, na época da Primeira Guerra Mundial, a Argentina era um dos países
mais ricos do mundo. Depois, entrou em um declínio contínuo em relação a
outros países na Europa Ocidental e na América do Norte que acabou levando,
nas décadas de 1970 e 1980, a uma decadência absoluta. Na superfície, o
desempenho econômico da Argentina é difícil de compreender, porém as
razões para sua decadência se tornam mais claras quando observadas pelas
lentes das instituições inclusivas e extrativistas.
É verdade que, antes de 1914, a Argentina viveu cerca de cinquenta anos de
crescimento econômico, mas foi um clássico exemplo de crescimento em meio
a instituições extrativistas. Na época, o país era governado por uma pequena
elite das exportações agrícolas, e a economia crescia em função da exportação
de carnes, couros e grãos, em meio a um momento de alta nos preços desses
produtos no mercado internacional. Como toda experiência do gênero em
meio a instituições extrativistas, o crescimento argentino também não gerou
destruição criativa nem inovação. E não era sustentável. Mais ou menos na
época da Primeira Guerra Mundial, revoltas armadas e a instabilidade política
crescente levaram as elites argentinas a tentar abrir o sistema político, mas isso
causou uma mobilização de forças que elas não tinham como controlar, e em
1930 aconteceu o primeiro golpe militar. Daí até 1983, a Argentina oscilou
entre ditaduras e democracias e entre diversos tipos de instituições extrativistas.
Houve grande repressão de governos militares, que chegaram ao auge na
década de 1970, quando pelo menos 9 mil pessoas, mas provavelmente bem
mais do que isso, foram executadas ilegalmente. Centenas de milhares foram
presas e torturadas.
Durante os períodos de governo civil havia eleições uma espécie de
democracia , mas o sistema político passava longe de ser inclusivo. Desde a
ascensão de Perón, na década de 1940, a Argentina democrática foi dominada
pelo partido político que ele criou, o Partido Justicialista, em geral chamado
apenas de Partido Peronista. Os peronistas venciam eleições graças a uma
imensa máquina política que atingia o sucesso por meio da compra de votos,
do oferecimento de proteção e da corrupção, que incluía a concessão de
contratos e cargos no governo em troca de apoio político. Em certo sentido,
havia democracia, mas não havia pluralismo. O poder era muito concentrado
no Partido Peronista, que enfrentava poucas limitações e podia fazer quase
tudo o que quisesse, pelo menos quando não era tirado do poder pelos
militares. Como vimos no Capítulo 11, se a Suprema Corte mudasse uma
política, quem se dava mal era a Suprema Corte.
Na década de 1940, Perón transformou o movimento trabalhista em sua
base política. Quando o movimento foi enfraquecido nas décadas de 1970 e
1980 pela repressão militar, o Partido Peronista simplesmente passou a
comprar votos em outros lugares. As políticas e as instituições econômicas
eram planejadas para gerar renda aos apoiadores do partido, não para criar
oportunidades iguais. Quando o presidente Menem se deparou com um limite
de mandatos que o impedia de se reeleger nos anos 1990, o que se viu foi mais
do mesmo; ele só conseguiu reescrever a Constituição e se livrar do limite de
mandatos. Como mostra El Corralito, ainda que a Argentina tenha eleições e
representantes eleitos pelo povo, o governo é perfeitamente capaz de passar por
cima dos direitos de propriedade e expropriar seus cidadãos impunemente. Os
presidentes e as elites da Argentina enfrentam poucos limites, e certamente não
existe pluralismo.
O que intrigava Kuznets e sem dúvida muitas outras pessoas que visitam
Buenos Aires é o fato de a cidade parecer tão diferente de Lima, da Cidade da
Guatemala ou mesmo da Cidade do México. Não se vê indígenas nem
descendentes de ex-escravizados. A arquitetura é gloriosa, com edifícios
construídos durante a Belle Époque, quando o país cresceu sob as instituições
extrativistas. Acontece que Buenos Aires é apenas parte da Argentina. Menem,
por exemplo, não veio de Buenos Aires; nasceu em Anillaco, na província de La
Rioja, nas montanhas distantes da capital, a nordeste, e foi por três vezes
governador da província. Na época da conquista das Américas pelos espanhóis,
essa área era uma parte remota do Império Inca e tinha uma densa população
indígena (ver Mapa 1). Os espanhóis criaram encomiendas ali, e uma economia
altamente extrativista se desenvolveu com o cultivo de alimentos e a criação de
mulas para garimpeiros de Potosí, ao norte. Na verdade, La Rioja era muito
mais parecida com a área de Potosí no Peru e na Bolívia do que com Buenos
Aires. No século , La Rioja produziu o célebre caudilho Facundo Quiroga,
que governou a área sem leis e marchou com seu exército para Buenos Aires. A
história do desenvolvimento das instituições políticas da Argentina é uma
história sobre como as províncias do interior, incluindo La Rioja, chegaram a
acordos com Buenos Aires. Esses acordos eram uma trégua: os caudilhos de La
Rioja concordaram em deixar a capital em paz, ganhando dinheiro, e, em
troco, as elites de Buenos Aires abriam mão de reformar as instituições “do
interior”. Desse modo, a Argentina inicialmente parece um mundo à parte do
Peru ou da Bolívia, mas na verdade a diferença não é tanta depois que você sai
dos bulevares elegantes da capital. Como as preferências e a política do interior
se incrustaram nas instituições argentinas, o país trilhou um caminho
institucional bastante semelhante ao de outros países extrativistas latino-
americanos.
É típico da América Latina que as eleições não levem a instituições políticas
ou econômicas inclusivas. Na Colômbia, os paramilitares conseguem fraudar
um terço das eleições nacionais. Na Venezuela, assim como na Argentina, o
governo democraticamente eleito de Hugo Chávez ataca seus oponentes,
demite-os de cargos públicos, fecha jornais por não gostar de suas linhas
editoriais e expropria propriedades. Em tudo que faz, Chávez enfrenta
limitações muito menores do que Sir Robert Walpole enfrentou na Grã-
Bretanha dos anos 1720, quando não conseguiu condenar John Huntridge
usando o Black Act (Capítulo 11). Huntridge teria se dado mal na Venezuela
ou na Argentina dos dias de hoje.
Embora a democracia que está emergindo na América Latina seja, em tese,
diametralmente oposta ao domínio das elites, e em sua retórica e ação
redistribua direitos e oportunidades para que não quem restritos a uma
porção tão limitada da população, suas raízes se baseiam nos regimes
extrativistas, e em dois sentidos. Primeiro, as desigualdades que persistem há
séculos em meio a regimes extrativistas fazem com que eleitores em
democracias jovens votem em candidatos com políticas extremas. Não que os
argentinos sejam ingênuos e acreditem que Juan Perón ou os peronistas mais
recentes, como Menem ou os Kirchners, sejam altruístas e estejam cuidando
dos interesses da população, ou então que os venezuelanos vejam sua salvação
em Hugo Chávez. Na verdade, muitos argentinos e venezuelanos reconhecem
que todos os outros políticos e partidos fracassaram por tempo demais, sem
lhes dar voz, sem fornecer os serviços públicos mais básicos, como estradas e
educação, e sem protegê-los contra a exploração das elites locais. Muitos
venezuelanos apoiam as políticas de Chávez, ainda que venham
acompanhadas de corrupção e desperdícios, assim como muitos argentinos
apoiaram as políticas de Perón nas décadas de 1940 e 1970. Em segundo
lugar, mais uma vez são as instituições extrativistas de base que tornam a
política tão atraente e tão enviesada em favor de líderes como Perón e Chávez,
em vez de bene ciar um sistema partidário forte que produza alternativas
socialmente desejáveis. Perón, Chávez e dezenas de outros líderes da América
Latina são apenas mais uma faceta da lei de ferro da oligarquia, e, como sugere
o nome, as raízes dessa lei de ferro estão nos regimes subjacentes controlados
pela elite.
O novo absolutismo
Em novembro de 2009, o governo da Coreia do Norte fez o que os economistas
chamam de reforma monetária, que costumam ser causadas por picos
in acionários. Na França, em janeiro de 1960, uma reforma monetária
instituiu o novo franco, que equivalia a 100 francos antigos. Os francos antigos
continuaram em circulação e era possível estabelecer preços na moeda velha
enquanto era feita uma transição gradual. No m, os francos antigos deixaram
de ter validade em janeiro de 2002, quando o país passou a usar o euro. À
primeira vista, a reforma norte-coreana foi parecida. Assim como os franceses
em 1960, o governo norte-coreano decidiu cortar dois zeros da moeda. Cem
wons antigos, a moeda da Coreia do Norte, passariam a valer um won novo. As
pessoas podiam trocar o dinheiro antigo pelo novo, embora isso precisasse ser
feito no prazo de uma semana e não ao longo de 42 anos, como ocorreu na
França. Aí vinha a pegadinha: o governo anunciou que ninguém poderia
converter mais do que 100 mil wons, embora mais tarde esse valor tenha sido
aumentado para 500 mil wons. Cem mil wons valiam mais ou menos 40
dólares no mercado ilegal. Em uma canetada, o governo havia aniquilado uma
imensa fração da riqueza privada de seus cidadãos não sabemos ao certo
quanto, mas provavelmente uma quantia maior do que a expropriada pelo
governo argentino em 2002.
O governo da Coreia do Norte é uma ditadura comunista que se opõe à
propriedade privada e aos mercados. Porém, é difícil controlar mercados ilegais,
cujas transações são em dinheiro vivo. Claro que sempre há uma pequena
parcela de dinheiro estrangeiro envolvida, principalmente moeda chinesa, mas
muitas transações são feitas em wons. A reforma monetária foi planejada para
punir quem usava esses mercados e, mais especi camente, para garantir que
essas pessoas não se tornassem ricas ou poderosas o su ciente para ameaçar o
regime. Manter as pessoas na pobreza era mais seguro. Mas os mercados ilegais
não são o único motivo para reter moeda. As pessoas na Coreia do Norte
também mantêm seu dinheiro em wons porque há poucos bancos no país e
todos são estatais. Na verdade, o governo usou a reforma para expropriar
grande parte das poupanças.
Embora o governo diga ver os mercados ilegais com maus olhos, a elite
norte-coreana gosta daquilo que eles podem lhes proporcionar. O líder, Kim-
Jong-Il, tinha um palácio dos prazeres de sete andares equipado com bar,
máquina de karaokê e um pequeno cinema. O térreo tinha uma enorme
piscina com ondas arti ciais, onde Kim gostava de usar uma prancha de
bodyboard equipada com um pequeno motor. Em 2006, quando impuseram
sanções à Coreia do Norte, os Estados Unidos sabiam onde o regime sentiria o
golpe: tornaram ilegal a exportação de mais de sessenta itens de luxo para o
país, como iates, motos aquáticas, carros de corrida, motocicletas, aparelhos de
DVD e televisores acima de 29 polegadas. Não haveria mais echarpes de seda,
canetas-tinteiro de marca, peles ou malas de couro exatamente os itens
colecionados por Kim e pelas elites do Partido Comunista. Um acadêmico
usou números das vendas da empresa francesa Henessy para estimar que o
orçamento anual de Kim para conhaque antes das sanções pode ter chegado a
800 mil dólares.
É impossível compreender muitas das regiões mais pobres do mundo no
m do século sem compreender o novo absolutismo desse mesmo século: o
comunismo. A visão de Marx era de um sistema que geraria prosperidade em
condições mais humanas e sem desigualdade. Lênin e o Partido Comunista se
inspiraram em Marx, mas a prática não podia estar mais distante da teoria. A
Revolução Bolchevique de 1917 foi um episódio sangrento, sem nenhum
aspecto humanitário. A igualdade também não era parte da equação, uma vez
que a primeira coisa que Lênin e sua comitiva zeram foi propiciar o
surgimento de uma nova elite, formada por eles mesmos, na liderança do
Partido Bolchevique. No processo, expurgaram e mataram não apenas
indivíduos não comunistas, mas também outros comunistas que podiam
ameaçar seu poder. Mas as verdadeiras tragédias ainda estavam por acontecer,
primeiro com a guerra civil, depois com a coletivização de Stálin e seus
frequentes expurgos, que podem ter matado até 40 milhões de pessoas. O
comunismo russo foi brutal, repressivo e sangrento, porém não foi um caso
isolado. As consequências econômicas e o sofrimento humano foram bastante
parecidos com o que aconteceu em outros lugares por exemplo, no
Camboja na década de 1970, com o regime do Khmer Vermelho, na China e
na Coreia do Norte. Em todos os casos, o comunismo levou a ditaduras
malignas e a abusos constantes dos direitos humanos. Além do sofrimento
humano e da carni cina, todos os regimes comunistas criaram vários tipos de
instituições extrativistas. As instituições econômicas, com ou sem mercados,
eram planejadas para explorar recursos da população e, por abominarem os
direitos de propriedade, era frequente que esses regimes criassem riqueza, em
vez de prosperidade. No caso soviético, como vimos no Capítulo 5, o sistema
comunista gerou um crescimento rápido no início, mas não conseguiu manter
o ritmo e atingiu a estagnação. As consequências foram muito mais
devastadoras durante o período do governo de Mao na China, ou no governo
do Khmer Vermelho no Camboja e na Coreia do Norte, onde as instituições
econômicas levaram ao colapso econômico e à fome.
As instituições econômicas do comunismo, por sua vez, tinham apoio de
instituições políticas extrativistas e concentravam todo o poder nas mãos dos
partidos comunistas, permitindo que fosse exercido sem restrições. Embora
fossem diferentes na forma, tais instituições extrativistas tiveram efeitos sobre a
vida das pessoas semelhantes aos gerados no Zimbábue e em Serra Leoa.
O rei algodão
O algodão responde por cerca de 45% das exportações do Uzbequistão, o que
torna essa a cultura mais importante do país desde a independência, com o
m da União Soviética, em 1991. No comunismo soviético, todas as terras
agricultáveis no Uzbequistão estavam sob controle de 2.048 fazendas estatais.
Depois de 1991, essas fazendas foram loteadas, e a terra foi distribuída, mas
isso não signi cava que os agricultores pudessem agir de maneira
independente. O algodão era valioso demais para o governo do primeiro, e, até
a data de escrita deste livro, único presidente do Uzbequistão, Islam Karimov.2
Foram criadas regulações determinando o que os fazendeiros podiam plantar e
os preços exatos que podiam praticar. O algodão era um produto de exportação
valioso, e os fazendeiros recebiam uma pequena fração dos preços nos
mercados internacionais pela sua produção, sendo que o restante cava com o
governo. Ninguém queria cultivar algodão por aqueles preços, então o governo
teve de forçar as pessoas. Todo fazendeiro tinha a obrigação de destinar 35% de
sua terra ao algodão. Isso causou muitos problemas, como di culdades com o
maquinário. Na época da independência, cerca de 40% da safra era colhida por
colheitadeiras. Depois de 1991, sem nenhuma surpresa, dados os incentivos
que o regime do presidente Karimov criou, os produtores não estavam
dispostos a comprar e manter esses equipamentos. Reconhecendo o problema,
Karimov bolou uma solução, que na verdade era uma opção mais barata do
que colheitadeiras: crianças em idade escolar.
O algodão está pronto para ser colhido no início de setembro, mais ou
menos na mesma época em que as crianças voltam às aulas. Karimov
estabeleceu aos governadores que determinassem cotas de algodão para as
escolas colherem. No início de setembro, as escolas estavam vazias, sem seus 2,7
milhões de alunos (números de 2006). Os professores, em vez de educar,
recrutavam mão de obra. Gulnaz, mãe de duas dessas crianças, explicou o que
acontecia:
A colheita dura dois meses. Crianças da área rural que têm a sorte de serem
designadas para fazendas perto de casa podem ir para o trabalho andando ou
de ônibus. As que moram mais longe ou são de áreas urbanas têm de dormir
nos galpões ou depósitos junto com o maquinário e os animais. Não há
banheiro nem cozinha. As crianças têm de levar o próprio almoço.
Os principais bene ciários de todo esse trabalho forçado são as elites
políticas, lideradas pelo presidente Karimov, que na prática é o rei de todo o
algodão do país. As crianças deveriam ser pagas pelo trabalho, mas o
pagamento não sai da teoria. Em 2006, quando o preço do algodão nos
mercados internacionais estava em torno de 1,40 dólar por quilo, as crianças
recebiam 3 centavos de dólar pela cota de vinte a sessenta quilos.
Provavelmente 75% do algodão em 2012 era colhido por crianças. Na
primavera, a escola ca fechada para que os alunos trabalhem
compulsoriamente capinando, tirando as ervas daninhas e fazendo o
transplante das mudas.
Como as coisas chegaram a esse ponto? Esperava-se que o Uzbequistão,
assim como outras repúblicas socialistas soviéticas, se tornasse independente
depois do colapso da União Soviética e desenvolvesse uma economia de
mercado e uma democracia. Como no caso de muitas outras repúblicas
soviéticas, não foi o que aconteceu. O presidente Karimov, que iniciou sua
carreira política no Partido Comunista da antiga União Soviética, chegando a
se tornar primeiro-secretário para o Uzbequistão no momento oportuno de
1989, bem quando o Muro de Berlim caía, conseguiu se reinventar como
nacionalista. Com o apoio crucial das forças de segurança, em dezembro de
1991, ele venceu as primeiras eleições presidenciais da história do Uzbequistão.
Depois de assumir o poder, garroteou a oposição política independente. Seus
adversários foram parar ou na cadeia ou no exílio. Não existia imprensa
independente no Uzbequistão e nenhuma ONG tinha permissão para
funcionar no governo de Karimov. O apogeu da repressão aconteceu em 2005,
quando possivelmente 750 manifestantes, quem sabe um número maior,
foram mortos pela polícia e pelo exército em Andijon.
Usando seu comando sobre as forças de segurança e o total controle da
imprensa, Karimov primeiro estendeu seu mandato presidencial para cinco
anos, por meio de um referendo, depois venceu a reeleição para um novo
período de sete anos em 2000, com 91,2% dos votos. Seu único oponente
declarou ter votado em Karimov! Na reeleição de 2007, vista por muitos como
uma fraude, ele teve 88% dos votos. As eleições no Uzbequistão são
semelhantes às que Joseph Stálin costumava organizar no apogeu da União
Soviética. Uma delas, em 1937, recebeu famosa cobertura do correspondente
do New York Times, Harold Denny, que reproduziu uma tradução do Pravda, o
jornal do Partido Comunista, que deveria dar uma noção da tensão e da
empolgação com as eleições soviéticas:
A reação de Rhodes ao saber que tinha sido derrotado por três chefes
africanos foi previsível: enviou um telegrama para um de seus empregados
dizendo: “Eu me recuso a ser vencido por três nativos hipócritas.”
Os chefes de fato tinham algo valioso que haviam protegido contra Rhodes
e que posteriormente protegeriam contra o governo indireto dos britânicos. No
século , os Estados tswanas tinham desenvolvido um conjunto central de
instituições políticas e incluíam um grau incomum de centralização política,
de acordo com os padrões da África subsaariana, e procedimentos coletivos
para tomada de decisão que podem até ser vistos como uma forma nascente e
primitiva de pluralismo. Assim como a Magna Carta permitiu a participação
dos barões no processo de tomada de decisões políticas e colocou algumas
restrições às ações dos monarcas ingleses, as instituições políticas dos tswanas,
em particular a kgotla, também incentivavam a participação política e
impunham limitações aos chefes. O antropólogo sul-africano Isaac Schapera
descreve o funcionamento da kgotla:
O m da extração no sul
Era 1o de dezembro de 1955. A cidade de Montgomery, no Alabama, registrou
no mandado de prisão que a infração havia ocorrido às 18h06. James Blake,
motorista de ônibus, estava com problemas, chamou a polícia, e os policiais
Day e Mixon chegaram ao local. Seu relatório diz o seguinte:
Recebemos uma chamada e, ao chegarmos, o motorista disse que
havia uma mulher de cor sentada na seção destinada aos brancos e
que não sairia de lá. Nós (...) também a vimos. O motorista assinou
um mandado para ela. Rosa Parks foi acusada de violar o capítulo
6, seção 11, do Código Municipal de Montgomery.
A infração cometida por Rosa Parks foi sentar-se na parte reservada para
brancos do ônibus da linha Cleveland Avenue, o que, segundo as leis Jim
Crow do Alabama, era um crime. Parks foi multada em 10 dólares, além de ter
de pagar os 4 dólares de honorários da corte. Rosa Parks não era uma pessoa
qualquer. Ela era secretária da divisão de Montgomery da Associação Nacional
para o Progresso das Pessoas de Cor (NAACP, na sigla em inglês), que lutava
há muito tempo pela mudança nas instituições do sul dos Estados Unidos.
Sua prisão deu início a um grande movimento, o Boicote dos Ônibus de
Montgomery, idealizado por Martin Luther King Jr. Em 3 de dezembro, King e
outros líderes negros organizaram e coordenaram um boicote aos ônibus,
convencendo todos os negros de que não deviam pegar nenhum ônibus em
Montgomery. O boicote foi um sucesso e durou até 20 de dezembro de 1956,
dando início a um processo que culminou com a decisão da Suprema Corte de
que as leis que segregavam os ônibus no Alabama eram inconstitucionais.
O Boicote aos Ônibus de Montgomery foi uma conjuntura crítica para o
avanço dos direitos civis no sul dos Estados Unidos. O movimento foi parte de
uma série de acontecimentos e mudanças que acabaram rompendo com o
padrão de segregação no sul e levaram a uma transformação fundamental nas
instituições. Como vimos no Capítulo 12, depois da Guerra Civil, as elites
agrárias do sul haviam conseguido recriar as instituições econômicas e
políticas extrativistas que haviam dominado a região. Embora os detalhes
dessas instituições tenham mudado por exemplo, a escravidão já não era
possível , o impacto negativo sobre os incentivos econômicos e a
prosperidade no sul foi o mesmo. O sul era nitidamente mais pobre do que o
restante dos Estados Unidos.
A partir da década de 1950, as instituições sulistas começariam a levar a
região a uma trajetória de crescimento muito mais rápida. As instituições
extrativistas que en m foram eliminadas no sul dos Estados Unidos eram
diferentes das instituições coloniais anteriores à independência de Botsuana. A
conjuntura crítica que deu início à sua derrocada também foi diferente, mas
havia muito em comum entre elas. A partir da década de 1940, aqueles que
suportavam o peso da discriminação e das instituições extrativistas no sul,
pessoas como Rosa Parks, começaram a se organizar muito melhor em sua luta
de resistência. Ao mesmo tempo, a Suprema Corte norte-americana e o
governo federal nalmente começaram a intervir de maneira sistemática para
reformar as instituições extrativistas no sul. Assim, um dos principais fatores a
criar uma conjuntura crítica para mudanças foi a mobilização dos negros e o
m do domínio inconteste das elites sulistas.
As instituições políticas do sul, tanto antes da Guerra Civil quanto depois,
tinham uma clara lógica econômica, não muito diferente do regime do
apartheid da África do Sul: assegurar mão de obra barata para a agricultura.
Mas, na década de 1950, essa lógica se tornou menos convincente. Por um
lado, já acontecia uma migração massiva dos negros para fora do sul, um
legado tanto da Grande Depressão quanto da Segunda Guerra Mundial. Nas
décadas de 1940 e 1950, os números chegaram a uma média de centenas de
milhares de pessoas por ano. Enquanto isso, as inovações tecnológicas na
agricultura, embora adotadas lentamente, reduziam a dependência que os
donos de latifúndios tinham de mão de obra barata, quase sempre usada na
colheita de algodão. Em 1950, quase todo o algodão do sul continuava sendo
colhido manualmente, mas a mecanização estava reduzindo a demanda por
esse tipo de trabalho. Em 1960, nos estados-chave do Alabama, Louisiana e
Mississippi, quase metade da produção havia sido mecanizada. Ao mesmo
tempo que cava mais difícil aliciar os negros no sul, eles também se tornavam
menos indispensáveis para os donos de grandes propriedades. Assim, havia
menos motivos para que as elites lutassem para manter as antigas instituições
econômicas extrativistas. Isso não signi cava, contudo, que iriam aceitar de
boa vontade as mudanças institucionais. Em vez disso, o que se seguiu foi um
longo con ito. Uma coalizão inusitada entre os negros do sul e as instituições
federais inclusivas dos Estados Unidos criou uma força poderosa que se
afastava do extrativismo sulista rumo a direitos políticos e civis igualitários para
os negros da região, que nalmente puseram m às enormes barreiras para o
crescimento econômico no sul dos Estados Unidos.
O ímpeto mais importante para as mudanças veio do movimento pelos
direitos civis. Como em Montgomery, foi a mobilização dos negros do sul que
abriu caminho, desa ando as instituições extrativistas à sua volta, exigindo
seus direitos, protestando e se mobilizando para que esses direitos fossem
assegurados. Entretanto, os negros não estavam sozinhos nisso, porque o sul
dos Estados Unidos não era um país à parte, e as elites sulistas não tinham
liberdade total, como acontecia com as elites da Guatemala, por exemplo.
Como parte dos Estados Unidos da América, o sul estava sujeito à
Constituição norte-americana e às leis federais. A causa das reformas
fundamentais no sul acabaria tendo apoio do Executivo, do Legislativo e da
Suprema Corte dos Estados Unidos, e isso em parte porque o movimento dos
direitos civis conseguiu que sua voz fosse ouvida fora do sul, mobilizando o
governo federal.
A intervenção federal para mudar as instituições no sul começou com a
decisão da Suprema Corte, em 1944, de que as eleições primárias em que
apenas brancos podiam votar eram inconstitucionais. Como vimos, os negros
tinham perdido o direito ao voto na década de 1890 com a introdução de
impostos per capita e testes de alfabetização (Capítulo 12). Esses testes eram
manipulados rotineiramente para discriminar os negros, embora permitissem
que brancos pobres e analfabetos votassem. Em um famoso exemplo do início
dos anos 1960, um branco da Louisiana foi considerado alfabetizado depois
de responder “ spetgh” [“Freedom of speech”, liberdade de
expressão] a uma pergunta sobre a Constituição estadual. A decisão da
Suprema Corte de 1944 foi o primeiro tiro de uma longa batalha para abrir o
sistema político para os negros, e a Corte compreendeu a importância de
reduzir o controle dos brancos sobre os partidos políticos.
Essa decisão foi seguida por Brown contra o Conselho de Educação, em 1954,
em que a Suprema Corte determinou que a segregação das escolas e de outros
espaços públicos criados pelos estados era inconstitucional. Em 1962, a
Suprema Corte derrubou outro pilar do domínio político das elites brancas: a
desproporcionalidade da representação legislativa. Quando o legislativo é
desproporcional como no caso dos “burgos podres” na Inglaterra, antes da
Primeira Lei da Reforma , algumas áreas ou regiões recebem representação
muito maior do que deveriam com base em sua porcentagem da população. A
desproporção no sul fazia com que as áreas rurais, o coração da elite agrária,
tivessem representação excessiva na comparação com as áreas urbanas. A
Suprema Corte pôs m a isso em 1962 com a decisão no caso Baker contra
Carr, que introduziu o padrão “uma pessoa, um voto”.
Contudo, as decisões da Suprema Corte teriam tido um impacto mínimo se
não tivessem sido implementadas. Na década de 1890, a lei federal que dava
direito de voto aos negros não foi implementada porque os órgãos locais que
deveriam garantir a sua vigência estavam sob controle da elite sulista e do
Partido Democrata, e o governo federal cou satisfeito em deixar as coisas
assim. Mas, à medida que os negros começaram a se revoltar contra as elites do
sul, esse bastião de apoio às leis Jim Crow ruiu, e o Partido Democrata, liderado
por seus membros de fora do sul, se voltou contra a segregação racial. Os
membros renegados dos democratas se reagruparam sob a bandeira do Partido
Democrata pelos Direitos dos Estados e concorreram às eleições presidenciais
de 1948. Seu candidato, Strom urmond, venceu em quatro estados e
conseguiu 39 votos no Colégio Eleitoral, mas isso estava longe do poder que o
Partido Democrata uni cado tinha na política nacional e da tomada desse
partido pelas elites sulistas. A campanha de Strom urmond se centrou no
seu desa o à capacidade do governo federal de intervir nas instituições do sul.
Ele a rmou essa posição de maneira enérgica: “Quero lhes dizer, senhoras e
senhores, que não há soldados su cientes no Exército para forçar o povo do sul
a acabar com a segregação e a admitir a raça negra em nossos teatros, em
nossas piscinas, em nossas casas e em nossas igrejas.”
Ele estava errado. As decisões da Suprema Corte signi cavam que as
instituições educacionais do sul eram obrigadas a acabar com a segregação, o
que incluía a Universidade do Mississippi, em Oxford. Em 1962, depois de
uma longa batalha judicial, as cortes federais determinaram que James
Meredith, um jovem negro veterano da Aeronáutica, tinha de ser aceito na “Ole
Miss”. A oposição à implementação dessa decisão foi orquestrada pelos
chamados Conselhos de Cidadãos, dos quais o primeiro havia sido formado
em Indianola, no Mississippi, em 1954, para lutar contra o m da segregação
no sul. Em 13 de setembro, o governador do estado, Ross Barne , foi a público
na televisão, rejeitar o m da segregação determinado pelo tribunal,
anunciando que seria melhor fechar as universidades estaduais do que admitir
o m da segregação. Por m, depois de muita negociação entre Barne , o
presidente John Kennedy e o procurador-geral Robert Kennedy, em
Washington, o governo federal interveio para implementar a decisão. Foi
estabelecido um dia para que agentes federais levassem Meredith a Oxford.
Supremacistas brancos se anteciparam e começaram a se organizar. Em 30 de
setembro, véspera do dia marcado para o comparecimento de Meredith, os
agentes federais entraram no campus da universidade e cercaram o principal
bloco administrativo. Uma multidão de cerca de 2.500 pessoas apareceu para
protestar, e logo teve início uma rebelião. Os agentes usaram gás lacrimogêneo
para dispersar os manifestantes, mas logo passaram a ser atacados. Às dez da
noite, tropas federais chegaram à cidade para restabelecer a ordem. Logo havia
20 mil soldados e 11 mil homens da Guarda Nacional em Oxford. No total,
trezentas pessoas foram presas. Meredith decidiu permanecer no campus, onde
conseguiu se formar, protegido contra ameaças de morte por agentes federais e
trezentos soldados.
A legislação federal foi decisiva no processo de reforma institucional no sul.
Durante a aprovação da primeira Lei dos Direitos Civis, em 1957, Strom
urmond, na época senador, falou ininterruptamente por 24 horas e 18
minutos para impedir, ou pelo menos adiar, a aprovação da lei. Durante seu
discurso, ele leu de tudo, desde a Declaração da Independência até várias listas
telefônicas. Mas não adiantou. A lei de 1957 culminou na Lei dos Direitos
Civis de 1964, que baniu toda uma gama de leis e práticas estaduais. A Lei de
Direito ao Voto de 1965 declarou que os testes de alfabetização, os impostos
per capita e outros métodos usados para retirar o direito ao voto dos negros do
sul eram ilegais. A lei também ampliava bastante a vigilância federal sobre as
eleições estaduais.
O impacto de tudo isso foi uma mudança signi cativa nas instituições
econômicas e legais no sul. No Mississippi, por exemplo, apenas cerca de 5%
dos negros que cumpriam com os pré-requisitos votavam em 1960. Em 1970,
esse número tinha subido para 50%. No Alabama e na Carolina do Sul, o
número subiu de 10% em 1960 para 50% em 1970. Esses padrões mudaram a
natureza das eleições, tanto para cargos locais quanto nacionais. Mais
importante, o apoio político que o dominante Partido Democrata dava para as
instituições extrativistas discriminatórias contra os negros ruiu. O caminho
estava aberto para toda uma gama de mudanças nas instituições econômicas.
Antes das reformas institucionais da década de 1960, os negros estavam quase
totalmente excluídos de empregos em fábricas de têxteis. Em 1960, apenas 5%
dos empregados nas fábricas de têxteis do sul eram negros. As leis dos direitos
civis impediram essa discriminação. Em 1970, essa proporção havia crescido
para 15%; em 1990, era de 25%. A discriminação econômica contra os negros
entrou em declínio, as oportunidades educacionais para os negros melhoraram
bastante, e o mercado de mão de obra no sul se tornou mais competitivo. Junto
com essas instituições inclusivas, vieram melhorias econômicas mais rápidas.
Em 1940, os estados do sul tinham apenas cerca de 50% do nível de renda per
capita dos Estados Unidos, o que começou a mudar no m da década de 1940
e na década de 1950. Em 1990, essa diferença havia praticamente
desaparecido.
Como em Botsuana, a chave no sul dos Estados Unidos foi o
desenvolvimento de instituições políticas e econômicas inclusivas. Isso
aconteceu com a soma de um descontentamento muito maior entre os negros
que sofriam com as instituições extrativistas no sul e o desmoronamento do
domínio unipartidário do Partido Democrata na região. Mais uma vez, as
instituições vigentes moldaram o caminho da mudança. Nesse caso, as
instituições do sul estarem inseridas nas instituições federais inclusivas dos
Estados Unidos foi fator decisivo e permitiu aos negros do sul nalmente
mobilizar o governo federal e as instituições federais em nome de sua causa. O
processo como um todo também foi facilitado pelo fato de que, com a
migração massiva dos negros para fora do sul e a mecanização da produção do
algodão, as condições econômicas haviam mudado, deixando as elites sulistas
menos dispostas a travar mais um combate.
Renascimento na China
O Partido Comunista, sob a liderança de Mao Zedong , nalmente tirou do
poder os nacionalistas, liderados por Chang Kai-shek, em 1949. A República
Popular da China foi proclamada em 1o de outubro. As instituições políticas e
econômicas criadas depois de 1949 eram bastante extrativistas. Politicamente,
eram marcadas pela ditadura do Partido Comunista Chinês. Nenhuma outra
organização política foi permitida na China desde então. Até sua morte, em
1976, Mao dominou o Partido Comunista e o governo. Acompanhando essas
instituições políticas autoritárias e extrativistas, vieram instituições econômicas
altamente extrativistas. Mao nacionalizou a terra e aboliu todo tipo de direito
de propriedade com uma única canetada. Ele fez com que grandes
proprietários de terra, assim como outros segmentos que considerava
contrários ao regime, fossem executados. A economia de mercado foi
basicamente abolida. A população das áreas rurais foi aos poucos organizada
em fazendas comunitárias. O dinheiro e os salários foram substituídos por
“pontos de trabalho”, que podiam ser trocados por mercadorias. Em 1956,
foram criados passaportes internos, que proibiam viagens sem a devida
autorização, para aumentar o controle político e econômico. A indústria foi
igualmente nacionalizada, e Mao deu início a uma tentativa ambiciosa de
promover o rápido desenvolvimento da indústria por meio de “planos
quinquenais” baseados no modelo soviético.
Como no caso de todas as instituições extrativistas, o regime de Mao estava
tentando extrair recursos do imenso país que ele agora controlava. Assim como
o governo de Serra Leoa com sua associação comercial, o Partido Comunista
Chinês tinha o monopólio sobre a venda de produtos agrícolas como arroz e
grãos, o que foi usado para cobrar taxas altíssimas dos fazendeiros. As
tentativas de industrialização convergiram no infame Grande Salto Adiante
depois de 1958, com a apresentação do segundo plano quinquenal. Mao
anunciou que a produção de aço iria duplicar em um ano graças a altos-fornos
de “fundo de quintal” de pequeno porte. Ele a rmou que, em quinze anos, a
China alcançaria a produção de aço da Grã-Bretanha. O único problema era
que não havia modo viável de cumprir essas metas. Para cumpri-las, seria
preciso encontrar sucata, e as pessoas teriam de fundir suas panelas e até
implementos agrícolas, como enxadas e arados. Trabalhadores que deviam
estar cuidando da lavoura passaram a produzir aço; para isso destruíam seus
arados e, como consequência, sua capacidade futura de alimentar a si mesmos
e ao país. O resultado foi uma fome calamitosa no campo. Embora acadêmicos
debatam o impacto da política de Mao na catástrofe, citando as secas que
ocorreram no mesmo período, ninguém duvida que o Grande Salto Adiante
teve papel central na morte de algo entre 20 e 40 milhões de pessoas. Não
sabemos exatamente quantas porque o regime de Mao não coletou números
que teriam documentado as atrocidades. A renda per capita caiu em cerca de
um quarto.
Uma consequência do Grande Salto Adiante foi que um membro graduado
do Partido Comunista, Deng Xiaoping , um general de grande sucesso durante
a revolução e que liderou uma campanha “antidireitista” que resultou na
execução de muitos “inimigos da revolução”, mudou de opinião. Em uma
conferência em Guangzhou, no sul da China, em 1961, Deng a rmou: “Não
importa se o gato é preto ou branco, se caçar o rato, é um bom gato.” Não
importava se as políticas pareciam comunistas ou não; a China precisava de
incentivos à produção para alimentar sua população.
No entanto, Deng logo sofreria em função de seu novo pragmatismo. Em 16
de maio de 1966, Mao anunciou que a revolução estava sendo ameaçada por
interesses “burgueses” que minavam a sociedade comunista chinesa e
desejavam recriar o capitalismo. Como resposta, anunciou a Grande Revolução
Cultural Proletária, geralmente chamada de Revolução Cultural. Ela se
baseava em dezesseis pontos. O primeiro a rmava:
Origens históricas
H nos padrões de vida no mundo. Mesmo os cidadãos
mais pobres dos Estados Unidos têm renda e acesso a tratamentos de saúde,
educação, serviços públicos e oportunidades econômicas e sociais muito
superiores ao que está disponível para a imensa massa de pessoas que vive na
África subsaariana, no sul da Ásia e na América Central. O contraste entre a
Coreia do Sul e a Coreia do Norte, entre as duas Nogales e entre os Estados
Unidos e o México nos lembram que esses são fenômenos relativamente
recentes. Quinhentos anos atrás, o México, sede do Império Asteca, certamente
era mais rico do que as sociedades do norte, e os Estados Unidos só
começaram a se sair melhor do que o México no século . A diferença entre
as duas Nogales é ainda mais recente. A Coreia do Sul e a Coreia do Norte
eram indistinguíveis economicamente, assim como social e culturalmente,
antes de o país ser dividido no Paralelo 38 N, após a Segunda Guerra Mundial.
Nessa mesma lógica, a maior parte das imensas diferenças econômicas que
observamos à nossa volta hoje surgiu ao longo dos últimos duzentos anos.
Precisava ser assim? Será que havia uma predeterminação histórica ou
geográ ca, cultural ou étnica para que a Europa Ocidental, os Estados
Unidos e o Japão se tornassem tão mais ricos do que a África subsaariana, a
América Latina e a China ao longo dos últimos duzentos anos? Será que era
inevitável que a Revolução Industrial tivesse início na Grã-Bretanha do século
e depois se disseminasse para a Europa Ocidental e as rami cações
europeias na América do Norte e na Australásia? Seria possível um mundo
contrafactual no qual a Revolução Gloriosa e a Revolução Industrial
aconteceriam no Peru, que a seguir colonizaria a Europa Ocidental e
escravizaria os brancos, ou isso é apenas uma cção cientí ca histórica?
Para responder na verdade, até mesmo para raciocinar sobre essas
questões precisamos de uma teoria que explique por que algumas nações
são prósperas, ao passo que outras fracassam e são pobres. A teoria precisa
delinear tanto os fatores que criam e retardam a prosperidade quanto suas
origens históricas. Este livro propôs tal teoria. É possível que qualquer
fenômeno social complexo, como as origens de diferentes trajetórias
econômicas e políticas de centenas de sociedades ao redor do globo, tenha
provavelmente uma multiplicidade de causas, o que leva a maior parte dos
cientistas sociais a evitar teorias monocausais, simples e de ampla aplicação,
procurando, em vez disso, explicações diferentes para resultados aparentemente
semelhantes que surgem em diferentes épocas e lugares. Pelo contrário, aqui
oferecemos uma teoria simples e a usamos para explicar os principais contornos
do desenvolvimento econômico e político pelo planeta desde a Revolução do
Neolítico. Nossa escolha não foi motivada por uma crença ingênua de que essa
teoria possa explicar tudo, mas pela crença de que uma teoria deve permitir que
nos concentremos nos paralelos, por vezes à custa de abstrair muitos detalhes
interessantes. Uma teoria bem-sucedida dessas não reproduz com delidade os
detalhes, e sim oferece uma explicação útil e empiricamente bem
fundamentada para uma gama de processos, ao mesmo tempo que esclarece as
principais forças atuantes.
Nossa teoria tentou chegar a esse resultado operando em dois níveis. O
primeiro é a distinção entre instituições econômicas e políticas extrativistas e
inclusivas. O segundo é nossa explicação sobre por que instituições inclusivas
surgiram em algumas partes do mundo e não em outras. Se o primeiro nível da
teoria trata de uma interpretação institucional da História, o segundo trata de
como a História moldou as trajetórias institucionais dos países.
A relação entre instituições econômicas e políticas inclusivas e prosperidade
é central para nossa teoria. Instituições econômicas inclusivas que garantem o
direito à propriedade, criam oportunidades igualitárias e incentivam
investimentos em novas tecnologias e habilidades têm mais chances de levar
ao crescimento econômico do que instituições econômicas extrativistas
estruturadas para que poucos possam extrair recursos de muitos e que não
protegem o direito à propriedade nem oferecem incentivos para a atividade
econômica. Instituições econômicas inclusivas, por sua vez, apoiam e são
apoiadas por instituições políticas inclusivas ou seja, instituições que
distribuem amplamente o poder político de maneira pluralista e são capazes de
obter certo grau de centralização política de modo a estabelecer a lei e a ordem,
as bases para a segurança dos direitos de propriedade e uma economia de
mercado inclusiva. Da mesma forma, instituições econômicas extrativistas têm
uma ligação sinérgica com instituições políticas extrativistas, que concentram
o poder nas mãos de poucos, que terão incentivos para manter e desenvolver
instituições econômicas extrativistas em seu benefício e usar os recursos
obtidos para consolidar seu domínio sobre o poder político.
Essas tendências não signi cam que instituições econômicas e políticas
extrativistas sejam incompatíveis com o crescimento econômico. Pelo contrário,
toda elite gostaria, mantendo tudo o mais constante, de incentivar a maior
quantidade de crescimento possível para ter maior quantidade de recursos para
extrair. Com frequência, instituições extrativistas que atingiram pelo menos um
grau mínimo de centralização política são capazes de gerar certo crescimento.
O crucial, contudo, é que o crescimento sob essas instituições não será
sustentado, por dois motivos fundamentais. Em primeiro lugar, um
crescimento econômico sustentado requer inovação, que só pode acontecer
associada à destruição criativa, que substitui o velho pelo novo no campo da
economia e também desestabiliza as relações de poder na política. Como
temem a destruição criativa, as elites que dominam as instituições extrativistas
resistirão a ela, e qualquer crescimento que germine será breve. Em segundo
lugar, a capacidade daqueles que dominam as instituições extrativistas de se
bene ciarem imensamente à custa do restante da sociedade signi ca que o
poder político, quando há instituições extrativistas, é altamente cobiçado,
levando muitos indivíduos e grupos a lutarem por sua obtenção. Como
consequência, haverá forças poderosas empurrando sociedades que vivem sob
instituições extrativistas rumo à instabilidade política.
As sinergias entre as instituições econômicas e políticas extrativistas criam
um círculo vicioso, no qual as instituições extrativistas, depois de instaladas,
tendem a persistir. Do mesmo modo, há um ciclo virtuoso associado às
instituições econômicas e políticas inclusivas. Contudo, nem o círculo vicioso
nem o virtuoso são absolutos. Na verdade, alguns países vivem sob instituições
inclusivas hoje porque, embora as instituições extrativistas tenham sido a
norma na História, algumas sociedades conseguiram romper o ciclo e fazer a
transição rumo a instituições inclusivas. Nossa explicação para essas transições
é histórica, mas não historicamente predeterminada. Grandes mudanças
institucionais, o pré-requisito para grandes mudanças econômicas, acontecem
como resultado da interação entre instituições vigentes e conjunturas críticas,
são grandes acontecimentos que perturbam o equilíbrio político e econômico
como a peste negra, que possivelmente matou metade da população de
muitas regiões da Europa no século ; a abertura das rotas comerciais no
Atlântico, que criou enormes oportunidades de lucro para muitos na Europa
Ocidental; e a Revolução Industrial, que ofereceu o potencial para mudanças
rápidas, mas também disruptivas, na estrutura das economias em torno do
globo.
As diferenças institucionais existentes entre as sociedades também são
resultado de mudanças institucionais passadas. Por que o caminho da
mudança institucional é diferente de uma sociedade para outra? A resposta
para essa pergunta está na diferenciação institucional. Do mesmo modo que os
genes de duas populações isoladas de organismos se diferenciarão lentamente
em função de mutações aleatórias no chamado processo de diferenciação
evolucionária ou genética, duas sociedades semelhantes também se
diferenciarão do ponto de vista institucional embora isso também ocorra
lentamente. O con ito relacionado diretamente a renda e a poder e
indiretamente a instituições é uma constante em toda sociedade. Esse con ito
muitas vezes tem um resultado contingente, ainda que as regras do jogo
favoreçam uma das partes. O resultado desse con ito leva a diferenciações
institucionais. Contudo, esse não é necessariamente um processo cumulativo e
não implica que as pequenas diferenças que surgem em algum ponto
necessariamente se ampliarão ao longo do tempo. Pelo contrário, como
exempli ca nossa discussão sobre a Bretanha Romana no Capítulo 6,
pequenas diferenças surgem, depois desaparecem e reaparecem. No entanto,
quando surge uma conjuntura crítica, essas pequenas distinções que
apareceram como resultado de diferenciações institucionais podem ser
relevantes para levar sociedades bastante semelhantes a divergir radicalmente.
Nos Capítulos 7 e 8, vimos que, apesar de muitas similaridades entre a
Inglaterra, a França e a Espanha, a conjuntura crítica do comércio
transatlântico teve impacto mais transformador na Inglaterra por causa dessas
pequenas diferenças o fato de que, devido aos acontecimentos dos séculos
e , a Coroa Inglesa não tinha como controlar o comércio exterior,
enquanto na França e na Espanha esse comércio estava basicamente sob
monopólio da Coroa. Como resultado, na França e na Espanha foram a
monarquia e seus aliados que se tornaram os principais bene ciários dos
grandes lucros do comércio transatlântico e pela expansão colonial, ao passo
que, na Inglaterra, foram grupos que se opunham fortemente à monarquia que
obtiveram ganhos com as oportunidades econômicas criadas por essa
conjuntura crítica. Embora a diferenciação institucional leve a pequenas
diferenças, sua interação com conjunturas críticas leva à divergência
institucional, que, por sua vez, cria diferenças institucionais maiores, que serão
afetadas pela próxima conjuntura crítica.
A História é decisiva, uma vez que são os processos históricos que, por meio
da diferenciação institucional, criam as características que podem se tornar
relevantes durante as conjunturas críticas. As próprias conjunturas críticas são
pontos de in exão históricos. E os círculos viciosos e virtuosos implicam que
precisamos estudar a História para compreender a natureza das diferenças
institucionais historicamente estruturadas. No entanto, nossa teoria não
implica determinismo histórico nem de qualquer outro tipo. É por isso que
a resposta à pergunta com a qual começamos este capítulo é “não”: não havia
uma necessidade histórica determinando que o Peru acabaria sendo tão mais
pobre do que a Europa Ocidental ou os Estados Unidos.
Para começo de conversa, ao contrário do que a rmam as hipóteses
geográ ca e cultural, o Peru não está condenado à pobreza por sua geogra a
ou por sua cultura. Na nossa teoria, o Peru é bem mais pobre hoje do que a
Europa Ocidental e os Estados Unidos por causa de suas instituições, e, para
compreender as razões disso, precisamos compreender o processo histórico de
desenvolvimento institucional no Peru. Como vimos no Capítulo 2,
quinhentos anos atrás, o Império Inca, que ocupava o território do atual Peru,
era mais rico, mais tecnologicamente so sticado e mais politicamente
centralizado do que as pequenas sociedades que ocupavam a América do
Norte. O ponto de in exão foi o modo como essa área foi colonizada e como
isso contrastou com a colonização da América do Norte. Não foi resultado de
um processo histórico predeterminado, mas, sim, um resultado contingente de
vários desdobramentos institucionais imprescindíveis ocorridos em
conjunturas críticas. Pelo menos três fatores poderiam ter mudado essa
trajetória e levado a padrões muito diferentes no longo prazo.
Em primeiro lugar, as diferenças institucionais nas Américas no século
moldaram a colonização dessas áreas. A América do Norte seguiu uma
trajetória institucional diferente da ocorrida no Peru por seu povoamento
esparso antes da colonização e por ter atraído colonos europeus que tiveram
êxito ao se rebelar contra a elite que entidades como a Companhia da Virgínia
e a Coroa Inglesa haviam tentado criar. Por outro lado, no Peru, os
conquistadores espanhóis encontraram um Estado extrativista centralizado
que podiam dominar e uma grande população que podia ser forçada a
trabalhar em minas e plantações. Também não havia nada geogra camente
determinado sobre o futuro das Américas quando os europeus chegaram. Do
mesmo modo que o surgimento de um Estado centralizado liderado pelo rei
Shyaam entre os bushongos resultou de uma grande inovação institucional,
ou quem sabe até mesmo de uma revolução política, como vimos no Capítulo
5, a civilização inca no Peru e as grandes populações dessa área resultaram de
grandes inovações institucionais. Essas inovações poderiam ter ocorrido na
América do Norte, em lugares como o Vale do Mississippi, ou mesmo no
nordeste dos Estados Unidos. Fosse esse o caso, os europeus talvez tivessem
encontrado terras vazias nos Andes e Estados centralizados na América do
Norte, e os papéis do Peru e dos Estados Unidos poderiam ser invertidos. Os
europeus teriam se assentado em áreas em torno do Peru, e o con ito entre a
maioria dos colonos e a elite poderia ter levado à criação de instituições
inclusivas ali, e não na América do Norte. É provável que os caminhos de
desenvolvimento econômico trilhados depois fossem diferentes.
Em segundo lugar, o Império Inca poderia ter resistido ao colonialismo
europeu, assim como o Japão resistiu aos navios do comodoro Perry que
atracaram na baía de Edo. Embora o maior extrativismo do Império Inca,
quando comparado a Tokugawa, no Japão, certamente tornasse uma revolução
semelhante à Restauração Meiji menos provável no Peru, não havia uma
necessidade histórica de que os incas sucumbissem ao domínio europeu. Caso
tivessem conseguido resistir e até mesmo se modernizar, do ponto de vista
institucional, em resposta às ameaças, todo o caminho histórico do Novo
Mundo, e com ele a história do mundo como um todo, poderia ter sido
diferente.
Em terceiro lugar, e aqui se trata de algo mais radical, não estava sequer
predeterminado, do ponto de vista histórico, geográ co ou cultural, que seriam
os europeus a colonizar o mundo. Poderiam ter sido os chineses ou mesmo os
incas. Claro, um resultado desse tipo é impossível quando olhamos do ponto
de vista do século , época em que a Europa Ocidental já havia se colocado à
frente das Américas, e a China já se voltara para dentro. No entanto, a Europa
Ocidental do século , foi também resultado de um processo contingente de
diferenciação institucional pontuado por conjunturas críticas, e nada
relacionado a isso era inevitável. As potências da Europa Ocidental não
poderiam ter levado vantagem em relação às demais nações e conquistado o
mundo sem que houvesse vários pontos de in exão históricos, entre os quais
estão o caminho especí co tomado pelo feudalismo, que levou à substituição
da escravidão e enfraqueceu o poder dos monarcas; o fato de que os séculos
seguintes à virada do primeiro milênio na Europa testemunharam o
desenvolvimento de cidades independentes e comercialmente autônomas; o
fato de que os monarcas europeus não se sentiam tão ameaçados pelo
comércio exterior quanto os imperadores chineses durante a dinastia Ming , e
portanto não tenham tentado desestimulá-lo; e a chegada da peste negra, que
abalou as fundações da ordem feudal. Caso esses acontecimentos tivessem
transcorrido de outra maneira, poderíamos estar vivendo em um mundo
muito diferente, em que o Peru poderia ser mais rico do que a Europa
Ocidental ou os Estados Unidos.
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◆◆◆
U de endosso ao crescimento autoritário reconhece sua
natureza pouco atraente, mas a rma que o autoritarismo é apenas uma fase
passageira. Essa ideia remonta a uma das teorias clássicas da sociologia
política, a teoria da modernização, formulada por Seymour Martin Lipset. A
teoria da modernização a rma que toda sociedade, à medida que cresce,
caminha rumo a uma existência mais moderna, desenvolvida e civilizada, e
particularmente rumo à democracia. Muitos seguidores da teoria da
modernização também a rmam que, assim como a democracia, instituições
inclusivas surgirão como um subproduto desse processo de crescimento. Além
disso, ainda que democracia não implique necessariamente instituições
políticas inclusivas, é provável que eleições regulares e uma concorrência
política relativamente livre levem ao desenvolvimento de instituições políticas
inclusivas. Diferentes versões da teoria da modernização também a rmam que
uma mão de obra instruída naturalmente levará à democracia e a melhores
instituições. Em uma versão um tanto pós-moderna da teoria, o colunista do
New York Times omas Friedman chegou a ponto de sugerir que a partir do
momento em que um país tem uma quantidade su ciente de McDonald’s, a
democracia e as instituições certamente virão. Tudo isso pinta um quadro
otimista. Ao longo dos últimos sessenta anos, vários países, inclusive alguns
com instituições extrativistas, testemunharam aumentos notáveis no nível de
instrução de sua mão de obra. Portanto, à medida que a renda e o nível de
instrução continuam a crescer, todas as outras coisas boas, como democracia,
direitos humanos, liberdades civis e segurança dos direitos à propriedade,
deveriam surgir.
A teoria da modernização tem muitos seguidores tanto dentro quanto fora
da academia. Atitudes recentes dos Estados Unidos em relação à China, por
exemplo, foram moldadas por essa teoria. George H. W. Bush resumiu a
política americana em relação à democracia chinesa como: “Pratique o livre-
comércio com a China, e o tempo estará do nosso lado.” A ideia era de que a
China cresceria à medida que praticasse o livre-comércio com o Ocidente, e
esse crescimento levaria à democracia e a melhores instituições, segundo previa
a teoria da modernização. No entanto, o rápido aumento no comércio entre os
Estados Unidos e a China desde meados dos anos 1980 pouco fez pela
democracia chinesa, e a integração ainda maior que provavelmente seguirá
ocorrendo não trará grandes resultados.
A atitude de muitos em relação ao futuro da sociedade iraquiana e à
democracia depois da invasão liderada pelos Estados Unidos era igualmente
otimista em função da teoria da modernização. Apesar do desempenho
econômico desastroso sob o regime de Saddam Hussein, o Iraque de 2002 não
era tão pobre quanto muitas nações da África subsaariana, e,
comparativamente, tinha uma população com bom grau de instrução
assim, acreditava-se que o país estivesse maduro para o desenvolvimento da
democracia e das liberdades civis, talvez até mesmo para aquilo que
descreveríamos como pluralismo. Essas esperanças rapidamente
desmoronaram à medida que o caos e a guerra civil tomaram conta da
sociedade iraquiana.
A teoria da modernização não só é incorreta, como também não nos ajuda
a pensar sobre como enfrentar os grandes problemas das instituições
extrativistas nas nações que estão fracassando. O indício mais forte a favor da
teoria da modernização é o fato de que as nações ricas são as que têm regimes
democráticos, respeitam os direitos civis e os direitos humanos e contam com
mercados funcionais e instituições econômicas inclusivas em geral. No
entanto, interpretar essa associação como algo que corrobora a teoria da
modernização é ignorar o grande efeito das instituições econômicas e políticas
inclusivas sobre o crescimento econômico. Como a rmamos ao longo deste
livro, são as sociedades com instituições inclusivas que cresceram ao longo dos
últimos trezentos anos e na atualidade se tornaram relativamente ricas. Para
demonstrar esta a rmação, basta olhar para os fatos de modo um pouco
diferente: se por um lado os países que construíram instituições econômicas e
políticas inclusivas ao longo dos últimos séculos conseguiram um crescimento
econômico sustentado, por outro, regimes autoritários que cresceram mais
depressa ao longo dos últimos sessenta ou cem anos, ao contrário do que
a rmaria a teoria da modernização de Lipset, não se tornaram mais
democráticos. E esse fato não surpreende. O crescimento sob instituições
extrativistas é possível porque não leva necessária ou automaticamente à morte
dessas instituições. Na verdade, esse crescimento muitas vezes é gerado porque
as pessoas que estão no controle das instituições extrativistas veem o
crescimento econômico não como uma ameaça, mas, sim, como algo que dá
sustentação a seu regime, como é o caso do Partido Comunista Chinês desde a
década de 1980. Também não causa surpresa que o crescimento gerado pelo
aumento de valor dos recursos naturais de um país, como no Gabão, na
Rússia, na Arábia Saudita e na Venezuela, di cilmente leve a uma
transformação fundamental desses regimes autoritários na direção de
instituições inclusivas.
Os fatos históricos são ainda menos generosos com a teoria da
modernização. Muitas nações prósperas sucumbiram e apoiaram ditaduras
repressivas e a instituições extrativistas. Tanto a Alemanha quanto o Japão
estavam entre as nações mais ricas e mais industrializadas do mundo na
primeira metade do século e tinham cidadãos com grau comparativamente
alto de instrução. Isso não impediu a ascensão do Partido Nacional-Socialista
na Alemanha nem de um regime militarista com tendências à expansão
territorial por meio da guerra no Japão fazendo com que tanto as
instituições políticas quanto as econômicas desses países dessem uma forte
guinada rumo a instituições extrativistas. A Argentina também era um dos
países mais ricos do mundo no século , tão rica quanto a Grã-Bretanha ou
talvez até mais, em função de ter se bene ciado do boom mundial de
commodities; o país também tinha a população mais instruída da América
Latina. A democracia e o pluralismo, porém, não tiveram maior êxito pode-
se até dizer que tiveram menor êxito na Argentina do que em grande parte
do resto da América Latina. O país viveu golpe atrás de golpe, e, como vimos
no Capítulo 11, até líderes democraticamente eleitos agiram como ditadores
predatórios. Mesmo recentemente, houve pouco progresso em direção a
instituições econômicas inclusivas, e, como vimos no Capítulo 13, os governos
argentinos do século ainda são capazes de expropriar a riqueza de seus
cidadãos impunemente.
Tudo isso dá destaque a várias ideias importantes. Em primeiro lugar, o
crescimento sob instituições políticas autoritárias e extrativistas na China,
embora provavelmente ainda vá continuar por mais um tempo, não se
traduzirá em crescimento sustentado com apoio em instituições econômicas
realmente inclusivas e na destruição criativa. Em segundo lugar, ao contrário
do que a rma a teoria da modernização, não devemos contar que o
crescimento autoritário leve à democracia ou a instituições políticas inclusivas.
A China, a Rússia e vários outros regimes autoritários que têm conseguido
crescer decerto atingirão o limite desse crescimento extrativista antes de
transformar suas instituições políticas numa direção mais inclusiva e, na
verdade, é provável que isso ocorra antes que surja na elite qualquer desejo por
tais transformações ou qualquer oposição forte capaz de produzi-las. Em
terceiro lugar, o crescimento autoritário no longo prazo não é nem desejável
nem viável, e, portanto, não deveria receber o aval da comunidade
internacional como modelo a ser seguido por países da América Latina, da
Ásia e da África subsaariana, ainda que este seja um caminho que vá ser
escolhido por muitas nações precisamente pela compatibilidade com os
interesses das elites econômicas e políticas que as dominam.
Mobilização
Parecia que o 12 de maio de 1978 seria um dia normal na fábrica de
caminhões da Scania em São Bernardo, em São Paulo. Mas os trabalhadores
estavam agitados. As greves estavam proibidas no Brasil desde 1964, quando
os militares derrubaram o governo democrático do presidente João Goulart.
Circulavam notícias de que o governo manipulava os índices nacionais de
in ação para que o aumento no custo de vida fosse subestimado. Às sete,
quando começou o turno da manhã, os trabalhadores cruzaram os braços. Às
oito, Gilson Menezes, um sindicalista que trabalhava na unidade, convocou o
sindicato. O presidente do sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo era um
ativista de 33 anos chamado Luiz Inácio Lula da Silva, o Lula. Ao meio-dia,
Lula estava na fábrica. Quando a empresa pediu que ele convencesse os
operários a voltar ao trabalho, Lula se recusou.
A greve da Scania foi a primeira de uma onda de greves que varreu o Brasil.
Aparentemente se tratava de lutas por melhores salários, porém, como Lula
observou mais tarde:
◆◆◆
◆◆◆
Prefácio
Os pontos de vista de Mohamed ElBaradei podem ser encontrados em twi er.com/#!/ElBaradei.
As citações de Mosaab El Shami e Noba Hamed são do Yahoo! News, em 6 de fevereiro de 2011, em
<yahoo.com/news/egyptian-voices-tahrir-square-210511432.html>.
Sobre as doze exigências imediatas postadas no blog de Wael Khalil, ver
<h ps://alethonews.com/2011/02/27/egypt-reviewing-the-demands/>.
Reda Metwaly é citado na Al Jazeera, 1o de fevereiro de 2011, em
<h ps://www.aljazeera.com/news/2011/2/1/voices-from-cairos-tahrir-square>.
Capítulo 3: A criação da
prosperidade e da pobreza
A reconstrução do encontro entre Hwang Pyöng-Wön e seu irmão vem da entrevista que James A. Foley fez
com Hwang, transcrita em Foley (2003), pp. 197-203.
O conceito de instituições extrativistas tem origem em Acemoglu, Johnson e Robinson (2001). A
terminologia de instituições inclusivas nos foi sugerida por Tim Besley. A terminologia dos fracassados
econômicos e a distinção entre eles e os perdedores políticos vem de Acemoglu e Robinson (2000b). Os
dados sobre Barbados vêm de Dunn (1969). A abordagem que damos à economia soviética se apoia bastante
em Nove (1992) e Davies (1998). Allen (2003) oferece uma interpretação alternativa e mais positiva da
histórica econômica soviética.
Na literatura das ciências sociais há uma grande quantidade de pesquisas relacionadas à nossa teoria e ao
nosso argumento. Ver Acemoglu, Johnson e Robinson (2005b) para um panorama dessa literatura e de nossa
contribuição a ela. A visão institucional do desenvolvimento econômico parte de várias obras importantes.
Especialmente notável é o trabalho de North; ver North e omas (1973), North (1982), North e Weingast
(1989) e North, Wallis e Weingast (2009). Olson (1984) também ofereceu um relato bastante in uente da
economia política do crescimento econômico. Mokyr (1990) é um livro fundamental que associa os
perdedores econômicos à mudança tecnológica comparada na história mundial. O conceito de perdedores
econômicos é bastante disseminado nas ciências sociais para explicar por que resultados e cientes no âmbito
institucional e nas políticas públicas não ocorrem. Nossa interpretação, que parte de Robinson (1998) e
Acemoglu e Robinson (2000b, 2006b), difere por dar ênfase à ideia de que a barreira mais importante para o
surgimento de instituições inclusivas é o temor das elites de perder o poder político. Jones (2003) oferece
uma rica análise de história comparada dando ênfase a temas semelhantes, e o importante trabalho de
Engerman e Sokoloff (1997) sobre as Américas também enfatiza essas ideias. Uma interpretação seminal de
economia política sobre o subdesenvolvimento africano foi apresentada por Bates (1981, 1983, 1989), cuja
obra teve grande in uência sobre a nossa. Estudos seminais de Dalton (1965) e Killick (1978) enfatizam o
papel da política no desenvolvimento africano e particularmente no modo como o receio da perda de poder
político in uencia a política econômica. O conceito de perdedores políticos esteve previamente implícito em
outras obras teóricas sobre economia política, por exemplo, Besley e Coate (1998) e Bourguignon e Verdier
(2000). O papel da centralização política e das instituições de Estado no desenvolvimento foi grandemente
enfatizado por sociólogos da história que seguiram a obra de Max Weber. São notáveis as obras de Mann
(1986, 1993), Migdal (1988) e Evans (1995). Na África, a conexão entre Estado e desenvolvimento é
enfatizada por Herbst (2000) e Bates (2001). Economistas começaram recentemente a contribuir para essa
literatura; por exemplo, Acemoglu (2005) e Besley e Persson (2011). Por m, Johnson (1982), Haggard
(1990), Wade (1990) e Amsden (1992) enfatizaram que foi a economia política singular das nações do Leste
Asiático que permitiu tamanho êxito econômico. Finley (1965) fez um argumento seminal segundo o qual a
escravidão foi responsável pela ausência de dinamismo tecnológico no mundo clássico.
A ideia de que o crescimento sob instituições extrativistas é possível, mas que provavelmente perderá
força, é enfatizada por Acemoglu (2008).
Capítulo 6: Diferenciação
A discussão sobre o caso veneziano segue Puga e Tre er (2010) e os caps. 8 e 9 de Lane (1973).
O material sobre Roma aparece em qualquer livro de história padrão. Nossa interpretação das instituições
econômicas romanas segue Finlay (1999) e Bang (2008). Nosso relato do declínio romano segue Wand-
Perkins (2006) e Goldsworthy (2009). Sobre mudanças institucionais no Império Romano tardio, ver Jones
(1964). As anedotas sobre Tibério e Adriano vêm de Finley (1999).
Os indícios de naufrágios foram primeiramente usados por Hopkins (1980). Ver De Callataÿ (2005) e
Jongman (2007) para um panorama disso e do Projeto do Núcleo de Gelo da Groenlândia.
As placas de Vindolanda estão disponíveis on-line em <vindolanda.csad.ox.ac.uk/>. A citação que usamos
vem de T Puv no: 343.
A discussão dos fatores que levaram ao declínio da Bretanha Romana segue Cleary (1989), cap. 4;
Faulkner (2000), cap. 7; Dark (1994), cap. 2.
Sobre Axum, ver Munro-Hay (1991). A obra seminal sobre o feudalismo europeu e suas origens é Bloch
(1961); ver Crummey (2000) sobre o feudalismo etíope. Phillipson (1998) faz a comparação entre o colapso
de Axum e o do Império Romano.
Capítulo 9: Retrocesso no
desenvolvimento
Nossa discussão sobre a Tomada de Amboína e Banda pela Companhia Holandesa das Índias Orientais e
sobre o efeito negativo que a companhia teve no desenvolvimento do Sudeste Asiático segue Hanna (1978) e
particularmente Reid (1993), cap. 5. As citações de Reid sobre Tomé Pires são da p. 271; o fator holandês em
Maguindanao, p. 299; o sultão de Maguindanao, pp. 299-300. Dados sobre o impacto da Companhia
Holandesa das Índias Orientais no preço das especiarias vêm de O’Rourke e Williamson (2002).
Uma visão geral de nitiva sobre a escravidão na sociedade africana e sobre o impacto do trá co de
escravizados é Lovejoy (2000). Lovejoy, p. 47, Tabela 31, relata estimativas consensuais sobre a extensão do
trá co de escravizados. Nunn (2008) ofereceu as primeiras estimativas quantitativas do impacto que o trá co
de escravizados teve sobre as instituições econômicas africanas e sobre o crescimento econômico do
continente. Os dados sobre importações de armas de fogo e pólvora vêm de Inkori (1977). O testemunho de
Francis Moore é citado de Lovejoy (2000), pp. 89-90. Law (1977) é um estudo seminal sobre a expansão do
Estado de Oió. As estimativas sobre o impacto do trá co de escravizados sobre a população na África são
tomadas de Manning (1990). Lovejoy (2000), cap. 8, os ensaios em Law (1995) e o importante livro de
Austin (2005) são a base para nossa discussão da análise do período do “comércio legítimo”. Dados sobre a
proporção de africanos escravizados na África vêm de Lovejoy (2000), por exemplo, na p. 192, Tabela 9.2.
Os dados sobre o comércio na Libéria vêm de Clower, Dalton, Harwitz e Walters (1966).
A ideia da economia dual foi desenvolvida por Lewis (1954). Fergusson (2010) desenvolve um modelo
matemático da economia dual. A noção de que isso foi uma criação do colonialismo foi inicialmente proposta
na coleção seminal de ensaios organizada por Palmer e Parson (1977). Nosso relato sobre a África do Sul de
baseia em Bundy (1979) e Feinstein (2005).
O missionário morávio está citado em Bundy (1979), p. 46, e John Hemming está citado em Bundy, p. 72.
A disseminação da propriedade de terras em Griqualândia Oriental vem de Bundy, p. 89; as explorações de
Stephen Sonjica vêm de Bundy, p. 94; a citação de Ma hew Blyth é da p. 97; e a citação de um observador
europeu na Fingolândia em 1884 vem de Bundy, pp. 100-1. George Albu é citado em Feinstein (2005), p. 63; o
secretário para assuntos nativos é citado de Feinstein, p. 45; e Verwoerd é citado de Feinstein, p. 159. Dados
sobre os reais salários dos mineradores de ouro na África vêm de Wilson (1972), p. 66. G. Findlay está citado
em Bundy (1979), p. 242.
A noção de que o desenvolvimento dos países ricos ocidentais é a imagem espelhada do
subdesenvolvimento do restante do mundo foi originalmente desenvolvida por Wallerstein (1974-2011),
embora ele enfatize mecanismos muito diferentes.
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