Max - Revisão Do Projeto de Pesquisa

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS DE BACABAL


MESTRADO ACADÊMICO EM LETRAS

O AUTISMO NO DISCURSO DA MÍDIA:


Análise dos enunciados sobre o autismo/autista que circularam nas edições de n° 473, da
revista Época; n° 2540, da revista Veja; e n° 410, da revista Superinteressante

Linha de Pesquisa: Texto e Discurso

São Luís, MA
2021
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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 03

2. JUSTIFICATIVA .................................................................................................... 05

3. PROBLEMÁTICA .................................................................................................. 06

4. OBJETIVOS ............................................................................................................ 07

4.1. Gerais .................................................................................................................. 07

4.2. Específicos .......................................................................................................... 07

5. METODOLOGIA ................................................................................................... 08

6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .......................................................................... 09

7. CRONOGRAMA ..................................................................................................... 16

REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 17

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1. INTRODUÇÃO

Desde quando o autismo foi diagnosticado como transtorno psicológico pelo médico
austríaco Leo Kenner, na década de 1940, muitos foram os discursos que surgiram sobre ele,
sobretudo no âmbito da educação e das ciências médicas.
Depois disso, a sociedade precisou incluir ainda a discussão sobre o autismo no campo
da política, buscando, a partir disso, discutir o autismo sob uma perspectiva de inclusão que
atestasse a visibilidade do sujeito autista em nossa sociedade e também sua utilidade, na
medida em que esse discurso de inclusão repousa nas estratégias que dão sustentação ao
sistema capitalista, que prima por produtividade, por sujeitos úteis. Um dos marcos importantes
desse debate, aqui no Brasil, se deu com a promulgação da Lei 12.764, de 2012 (BRASIL,
2012), sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, e que expressa, de certo modo, o interesse
do governo brasileiro em tornar o debate sobre o autismo uma discussão de natureza político e
social.
Além disso, observa-se que o debate sobre o autismo tem ganhado mais espaço em
nossa sociedade através da mídia. Nos últimos tempos, temáticas ligadas ao autismo são
apresentadas pelos veículos de comunicação em seus diferentes suportes: em programas de TV,
filmes, seriados, novelas, etc., o que de alguma forma contribui para uma melhor visibilidade
do sujeito autista na sociedade, bem como na sua inserção nas atividades produtivas, em
condições semelhantes aos demais sujeitos.
No entanto, embora esses veículos midiáticos tenha constituído espaço importante
para a promoção do debate sobre o autismo e, consequentemente, para a sua visibilidade social
e inclusão, é necessário nos indagarmos sobre as maneiras como o autismo/autista está tendo
sua imagem construída nessas plataformas a partir dos discursos que as mídias fazem sobre ele.
Ao partirmos do pressuposto de que as mídias exercem forte influência sobre o
comportamento da sociedade, sobretudo na sua maneira de pensar um acontecimento
(CHARAUDEAU, 2009), colocam-se em discussão os sentidos que são dados ao
autismo/autismo a partir dos enunciados produzidos nessas instâncias de comunicação e
informação e a maneira como tais sentidos se articulam com outros dizeres socialmente
construídos sobre o autismo/autista (por exemplo, com a ideia de patologia, que deriva do
discurso médico; com a noção de sujeito produtivo, presente no discurso neoliberalista, etc.).
Embora entendamos serem as mídias lugares de democratização da informação,
também há de se pensá-las como instâncias que se firmam como domínios capazes de moldar
as formas de ver e de agir dos sujeitos na sociedade. As mídias se destacam, nesse sentido,

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como instâncias capazes de gerar códigos específicos que produzem efeitos de percepção e
recepção da informação, os quais interferem na estruturação, na organização e na reorganização
do que se percebe da realidade informada por elas (CHARAUDEAU, 2009).
Com isso, pressupõe-se dizer que essas instâncias se utilizam de estratégias
linguístico-discursivas que regulam e orientam a informação e o conhecimento que se tem a
respeito de um fato, produzindo, assim, determinados sentidos àquilo que informam ao seu
leitor/receptor. Dada essa razão é que procuramos, nesta pesquisa, investigar os sentidos que
são dados ao autismo/autista a partir dos enunciados que circularam nas revistas Época, Veja e
Superinteressante, e que tratam sobre o autismo.
O corpus de análise desta pesquisa é constituído pelos enunciados sobre o
autismo/autista que circularam na edição nº 473, da revista Época; edição nº 2540, da revista
Veja; e edição nº 410, da revista Superinteressante.
Consideramos importantes a escolha dessas edições aos objetivos aqui pretendidos
dado o modo como elas fazem circular sentidos para o autismo/autista, que vão desde os
enunciados verbais e não verbais dispostos nas capas dessas edições a enunciados que circulam
em seu interior, na posição textual das matérias sobre o autismo nessas edições. No que diz
respeito à escolha das revistas, ela se faz em função desses periódicos configurarem como
importantes referências midiáticas de comunicação e de divulgação da informação a um nível
muito abrangente e por eles demarcarem lugares e posições político-ideológicas específicos
dentro do jogo enunciativo das produções discursivas.
Esta pesquisa está vinculada à Análise de Discurso (AD) de linha francesa, disciplina
teórica que toma a língua em sua perspectiva discursiva, em correlação com o histórico-social e
o sujeito, na constituição dos sentidos produzidos pela e na linguagem. É nesse sentido que nos
filiamos à teoria da Análise de Discurso para darmos conta de algumas das questões que
caracterizam o ato discursivo, a saber: as condições que possibilitam a produção de
determinado enunciado, o lugar social ocupado pelo sujeito da enunciação, as formações
ideológicas que regem seu dizer e, também, o sujeito que é objetivado no discurso, ou seja, as
posições assumidas pelo sujeito de quem se fala, os sentidos que se constroem sobre ele.
Nossa discussão será subsidiada pelas contribuições teóricas de Brandão (2004),
Orlandi (2015; 2020), Pêcheux (1988; 1997; 2008) entre outros, no que se refere à teoria do
discurso; Charaudeau (2009), para o entendimento sobre as estratégias das mídias na
organização e circulação dos discursos e Whitman (2015), quando nos referirmos ao
autismo/autista na sua dimensão biológica. Ao acionarmos esses autores, e suas respectivas
contribuições teóricas, acreditamos estar diante dos instrumentos teórico-metodológicos
necessários para a constituição desta pesquisa e de seus possíveis resultados.

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2. JUSTIFICATIVA

A discussão sobre o autismo na sociedade brasileira tem se constituído como um


acontecimento cada vez mais comum. Um dos fatores que impulsionaram esse fenômeno foi a
promulgação da Lei nº 12.764/12 que representa um marco significativo no que diz respeito ao
processo de visibilização, inclusão e constituição do autista em sujeito produtivo em nossa
sociedade.
O debate sobre o autismo tem também crescido nas grandes mídias, sendo noticiado
por diferentes veículos midiáticos, como é o caso das revistas, e que tornam mais abrangente o
debate sobre o autismo/autista. Nesse sentido, consideramos pertinente tomar o autismo/autista
como foco de análise nos domínios dos estudos da linguagem, como acontecimento discursivo.
A Análise de Discurso se apresenta, nesse sentido, como um campo teórico capaz de dar conta
dessa análise, uma vez que considera a língua uma prática social que é carregada de valores,
conceitos e sentidos. Daí a importância desses enunciados – produzidos pela mídia sobre o
autismo/autista - serem passíveis de investigação pela teoria do discurso, o que justificativa
teoricamente esta proposta de pesquisa.
Além disso, embora haja pesquisas sobre o autismo no universo acadêmico, constata-
se que grande parte delas está centrada no domínio das Ciências Sociais, da Psicologia, da
Saúde, da Educação e não, necessariamente, dentro da área de Letras, o que reforça ainda mais
a importância deste trabalho para o Programa de Pós-graduação em Letras.
Finalmente o nosso interesse em propor um projeto de pesquisa que se relaciona com o
“universo” do autismo/autista resulta também de nossas vivências com sujeitos autistas, pois
em 2008 tivemos uma pessoa da família diagnosticada com autismo e, desde então, tudo o que
se relaciona a esse universo – que é o autismo – tem sido objeto de nosso interesse. Esse
projeto é, nesse sentido, uma maneira de demonstrarmos nosso respeito pelo público autista.

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3. PROBLEMÁTICA

A mídia tem se constituído como um espaço de promoção de debate sobre diferentes


assuntos do cotidiano da população. Esse é o caso do autismo, que, nos últimos tempos, tem
despertado o interesse da mídia e de outros domínios sociais que estão a serviço da
comunicação e informação. Nesse contexto, é fundamental salientar o papel de três importantes
revistas, as quais, como compõem aquilo que podemos chamar de mídia, têm se destacado
nesse processo de divulgação de informações sobre a temática autismo, quais sejam: revistas
Época, Veja e Superinteressante.
Nessas revistas o autismo tem sido discutido com frequência, promovendo assim um
efeito de visibilidade à questão em nossa sociedade. Contudo, para esta pesquisa consideramos
importantes as discursividades sobre o autismo/autista que circularam em três edições
especificas dessas revistas: trata-se da edição nº 473 de 2007 da Época, edição nº 2540 de 2017
da Veja, e edição n° 410 de 2019 da Superinteressante. Nessas respectivas edições das revistas
supracitadas observou-se a circulação de enunciados linguísticos (verbais e não verbais)
as respectivas revistas fizeram circular enunciados verbais e não verbais sobre o
autismo

trouxeram, em diferentes edições, a temática do autismo. No entanto, três delas


chamaram nossa atenção, e a do público leitor, pela maneira como o autismo esteve nelas
disposto, sendo ele tema da capa dessas revistas em três contextos específicos: a primeira vez,
na edição de nº 473 de 2007 da Época; a segunda, na edição de nº 2540 de 2017 da Veja; e
posteriormente, na edição n° 410 de 2019 da Superinteressante.
Nessas três edições específicas, nas diferentes revistas, o autismo é tematizado de
maneira enigmática, dadas as formas enunciativas (“O novo mundo do autismo”, “O quebra-
cabeça do autismo”, etc.) pelas quais as revistas apresentam o espectro e o sujeito autista nessas
edições. Tendo como exemplo também as capas das edições supracitadas, tem-se nelas crianças
autistas sendo representadas sem que seus olhares sejam direcionados ao público leitor das
revistas, indicando assim, através desse gesto, um sinal de indiferença social e pessoal do
autista, o que evidencia uma imagem estereotipada sobre sujeitos autistas.
Considerando, então, que as revistas acima mencionadas desempenham um papel
importante na formatação da opinião público acerca de determinada temática social e,
considerando, ainda, que em diferentes contextos históricos essas revistam trouxeram em suas
edições a temática do autismo, surgem as seguintes perguntas acerca de seus enunciados sobre

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o autismo/autista e que caracterizam a problemática desta pesquisa: a) Que sentidos são dados
ao autismo/autista a partir dos discursos produzidos nas edições dessas revistas? b) Quais
posições ocupam os sujeitos que falam sobre o autismo nessas revistas? c) Como os sentidos
produzidos sobre o autismo/autista nessas revistas se articulam com outros socialmente
construídos sobre ele (por exemplo, no discurso médico, no discurso de especialistas da
educação, etc.)? d) Qual o objetivo dessas revistas na difusão de informação (ou
desinformação) sobre o autismo?
No desenvolvimento desta pesquisa, buscaremos responder a essas perguntas.

4. OBJETIVOS

4.1. Geral

O objetivo geral desta pesquisa é analisar edições especificas das revistas Época, Veja
e Superinteressante, que tratam sobre o autismo, para identificar os sentidos que circulam nos
dizeres dessas revistas sobre o autismo/autista.

4.2. Específicos

a) Discutir de que modos os enunciados que circulam nessas revistas produzem sentidos
para o autismo/autista;

b) Identificar as formações discursivas que atravessam os dizeres dessas revistas sobre o


autismo/autista.

c) Examinar as possíveis regularidades discursivas presentes nos dizeres dessas revistas


sobre o autismo/autista.

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5. METODOLOGIA

Em Análise de Discurso, método, teoria e prática se constituem permanentemente,


numa relação entre observação do corpus, pesquisa teórica e análise propriamente dita. Por ela
ser uma disciplina que não tem uma metodologia pronta, no seu processo analítico, a AD é
sensível à necessidade de tratar o seu objeto em sua especificidade, exigindo, assim, a
articulação entre dispositivo teórico, que fornece ao analista as bases para compreensão dos
processos de produção de sentidos, e o dispositivo analítico, mobilizado de acordo com as
necessidades da análise colocadas pelo questionamento do analista e pela natureza do objeto de
estudo (ORLANDI, 2020).
Assim, para a constituição desta pesquisa, é necessário estruturá-la a partir dos
seguintes procedimentos analítico-metodológicos, que são etapas para a realização da pesquisa
e análise/interpretação dos dados:

▪ Pesquisa e revisão bibliográfica no campo da Análise de Discurso, visando uma


base teórica sobre os conceitos de discurso, sujeito e sentidos.

▪ Constituição de um corpus de análise a partir de diferentes enunciados


discursivos, veiculados nas páginas das revistas Época, Veja e Superinteressante, que falam e
interpretam o autismo/autista;

▪ Interpretação e análise do corpus por meio das perguntas heurísticas.

▪ Redação da dissertação.

6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

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A Análise de Discurso é um campo teórico de estudo da linguagem que tem sua
constituição na França, na década de 1960, a partir das preocupações de dois franceses: Jean
Dubois e Michel Pêcheux. Esses autores desenvolvem a abordagem teórica da Análise de
Discurso em um contexto histórico-social em que se expressa no domínio dos estudos
linguísticos o Estruturalismo, abordagem teórica que vai pensar a língua a partir de suas
estruturas internas.
O estruturalismo na linguagem se caracteriza, assim, como uma abordagem teórica que
busca estudar “as estruturas da língua em função da relação que elas estabelecem entre si no
interior de um mesmo sistema linguístico” (MUSSALIM, 2012, p. 114).
Para a linguística estruturalista, é possível explicar como se comporta a língua a partir
de regularidades presentes em seu interior, diferentemente da fala que, por ser da ordem do
indivíduo, tende a sofrer de influências externas, gerando assim irregularidades ao sistema
linguístico. Por essa razão é que a fala, enquanto ato singular de um indivíduo, fica de fora do
projeto estruturalista na Linguística.
Nessa concepção teórica, é possível apreender a língua como um sistema autônomo,
capaz de explicar o seu funcionamento a partir de sua própria estrutura interna. Logo, a questão
da significação é também passível de ser explicável a partir dessa proposta teórica. Mussalim
(ibidem) explica que a questão da significação na língua é alcançada, segundo a abordagem
estruturalista, “a partir de uma relação de diferença no interior do sistema linguístico”.
Partindo dessa discussão, Michel Pêcheux (1988) problematizou a questão do sentido
na língua proposto pela linguística estruturalista. Segundo ele, embora o estruturalismo pudesse
explicar a língua em seu aspecto fonológico, morfológico e sintático, não foi suficiente a essa
proposta teórica explicar como se dá o processo de significação na linguagem. Isso porque o
sentido, ainda conforme o autor, não está preso à estrutura da língua, mas apreendido a partir
do trabalho linguístico que os sujeitos executam dentro de certas conjunturas sociais e
históricas.
Se assim for, a língua precisa se inserir em um novo projeto teórico para que possa dar
conta de explicitar a sua natureza simbólica. Com isso, desenvolve-se o campo teórico da
Análise de Discurso, para melhor explicar como se dá o processo de significação pela
linguagem.
A AD surge, assim, pela necessidade de se discutir o processo do sentido na
linguagem, trazendo para esse campo de discussão questões que são tanto da ordem do social
quanto do histórico. Nessa disciplina, as duas categorias convergem para que os discursos
sejam constitutivos de significação.

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Assim sendo, interessará à Análise de Discurso a língua enquanto discurso, categoria
conceitual que constitui o seu objeto de estudo. Se esse campo teórico tem no discurso o seu
objeto de interesse, precisamos então entender o que ele significa.
Discurso pode significar diferentes coisas. Para o senso comum, o da vida cotidiana,
essa palavra pode expressar simplesmente fala, exposição oral de um sujeito falante. Para a
Análise de Discurso, o discurso é prática de linguagem, é a língua funcionando, fazendo
sentido. Orlandi (2020, p. 13) assim se expressa ao se referir a essa noção:

[...] a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de


correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de
linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando.

Assim, partir do entendimento da autora, o discurso corresponde à ideia de linguagem


como parte de uma atividade social em que os sujeitos significam e se significam quando fazem
uso da língua.
A Análise de Discurso procura, assim, trabalhar com a língua enquanto noção de
discurso embora, expressa Orlandi, a língua e sua gramática sejam também categorias que
interessam à teoria do discurso. Na AD procura-se, assim, “compreender a língua fazendo
sentido, enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho geral, constitutivo do homem e de sua
história”, como bem destaca Orlandi (ibidem).
Brandão (2004), por sua vez, caracteriza o discurso como toda atividade comunicativa
entre interlocutores, produtora de sentidos que se dá na interação entre os falantes da língua.
Com isso, destaca que, para que haja o discurso, é necessário haver, também, sujeitos situados
histórico e geograficamente, pertencentes a uma comunidade, a um grupo, e que carregam
consigo crenças, valores culturais, sociais do grupo e da comunidade à qual pertencem.
Assim, pensar o discurso é pensar em sujeitos que se expressam por meio da
linguagem, mas que têm as suas falas atravessadas por condicionantes históricos e ideológicos.
A língua, como parte da linguagem, é compreendida por Pêcheux (2008) não só como
estrutura; ela é estrutura e acontecimento, o que, em outras palavras, significa dizer que quando
falamos, não realizamos somente o ato de pronunciar algo ou de comunicar algo, ao contrário,
damos significados às coisas e nos significamos através da linguagem. Mas mais do que isso,
significa, segundo Pêcheux (ibidem), pensar a língua transitando entre o linguístico e o
histórico e significando diferentemente a cada novo momento marcante da história.
O autor exemplifica essa noção a partir do enunciado “On a gagné”, proferido em um
momento específico, mais precisamente no momento em que ele atravessa a França após a
vitória presidencial de François Mitterand no dia 10 de maio de 1981. A expressão, até então
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proferido em eventos esportivos, atualiza seu sentido, significando de outro modo, dado o
acontecimento histórico (no caso, a vitória de François Mitterand) que possibilitou a sua
enunciação. A partir dessa situação, Pêcheux pretende mostrar que o sentido não se estabelece
por marcas linguísticas de materialidade discursiva, mas de um interdiscurso a que o enunciado
remete.
Ainda acerca do discurso, faz-se necessário destacar o conceito apresentado por
Pêcheux no que diz respeito a esse objeto teórico. O autor, ao discorrer sobre o esquema
elementar da comunicação apresentada por R. Jakobson, diz que o discurso, mais do que
transmissão de informação, é efeito de sentidos entre interlocutores. De acordo com Orlandi
(2015, p. 17), dizer que o discurso é efeito de sentidos entre interlocutores significa

[...] deslocar a análise de discurso do terreno da linguagem como instrumento de


comunicação. Além disso significa, em termos do esquema elementar de
comunicação, sair do comportamentalismo que preside a relação entre locutores como
relação de estímulo e resposta em que alguém toma a palavra transmite uma
mensagem a propósito de um referente e baseando-se em um código que seria a
língua, o outro responde e teríamos aí o circuito da comunicação. Não há essa relação
linear entre enunciador e destinatário. Ambos estão sempre já tocados pelo simbólico.

Com isso, entende-se que estudar o discurso é conceber a língua enquanto categoria
discursiva, sendo esta resultante de um processo que envolve sujeitos usuários da linguagem
em determinada conjuntura histórica e social e não somente como um conjunto de regras e
propriedades formais das quais os sujeitos fazem usos para transmitir uma ideia ou um
pensamento para outrem.
Contudo, é importante frisar que língua e discurso não é a mesma coisa. Língua e
discurso são conceitos que se relacionam. A língua é, para a Análise de Discurso, condição de
possibilidade do discurso (ORLANDI, 2020).
O discurso pode ser, ainda, explicado a partir da unidade que o constitui, que é o
enunciado. Antes que o conceituemos, é importante frisar que para diferentes teóricos do
discurso a noção de enunciado terá as suas especificidades. Entretanto, nossa filiação teórica
repousa nos trabalhos de Pêcheux. Para esse autor, o enunciado é definido como aquilo que
irrompe a partir de suas possibilidades de dizer, sendo estas determinadas pelas circunstâncias
(históricas, sociais, etc.) nas quais o sujeito se inscreve. Porém, concebe a língua como espaço
de materialidade do enunciado, sendo ela a base para qualquer construção discursiva.
As concepções de enunciado e discurso de Pêcheux nos possibilita conceber as
materialidades que selecionamos para análise como enunciados, na medida em que produzem
efeitos de sentido sobre o autismo/autista e põem em circulação dizeres de determinados

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sujeitos e classes sobre outros sujeitos em um dado momento histórico. A língua é a
materialidade discursiva empregada para isso.
Esclarecidas assim as noções de discurso e de enunciado, importa agora explicitar
outras categorias conceituais que também pertencem ao campo teórico da Análise de Discurso.
Comecemos, então, a discorrer sobre a noção de sujeito pensada por esse campo teórico.
Falar do sujeito para a Análise de Discurso é, antes de tudo, concebê-lo como uma
categoria que é discursiva, uma posição que é ocupada pelo indivíduo em determinada
circunstância discursiva. Trata de pensá-lo como alguém que é interpelado em sujeito pela
ideologia e por determinações históricas e sociais de seu dizer. O sujeito é, assim, uma posição
que é definida, nas práticas sociais, pelas condições de produção do discurso (ORLANDI,
2020).
Para Pecheux (1988), ele consiste em um objeto imaginário que ocupa o seu espaço no
processo discursivo, o que nos faz pensá-lo não como uma, mas como distintas posições que o
indivíduo ocupa dentro das diferentes conjunturas que o constitui. Não se trata, assim, de
concebê-lo como um alguém compreendido em sua existência individual ou como um ser
empírico que tem uma existência particular, mas como posição ocupada pelo indivíduo em
determinada situação de fala.
É, nesse sentido, em razão dessas diferentes posições ocupadas pelo sujeito que é
possível os sentidos serem outros, pois os sujeitos se posicionam no discurso pela força da
ideologia e das formações discursivas (FDs) que constituem os seus dizeres.
Orlandi (2020), completando essa noção de sujeito do discurso, compreende-o como
sendo aquele que está sujeito à língua e à história, pois, para se constituir, para produzir
sentidos, ele precisa estar atravessado por fatores que são da ordem da língua e da história.
Neste trabalho, compreendemos que existe um sujeito que produz sentido nas revistas e existe
um sujeito que é representado como efeito desses sentidos. Como dito nos objetivos, queremos
investigar como esses dois sujeitos se comportam nos enunciados selecionados.
No que se refere ainda à noção de sujeito, empregada pela Análise de Discurso,
importa destacarmos a ideia de que ele não é transparente (nem para si mesmo), no sentido de
que ele se constitui, também, pelo esquecimento daquilo que o constitui, conforme aponta
Pêcheux em seus textos.
O autor destaca, nesse sentido, que o sujeito é constituído de dois esquecimentos que,
de modo simplificado, podemos descrever da seguinte maneira: o esquecimento de n°1
corresponde à ideia postulada por Pêcheux (1988) de que, por ser afetado pela ideologia, o
sujeito tem a ilusão de que é fonte do seu dizer quando, na realidade, o que acontece é retomar
discursos outros já constituídos socialmente; o esquecimento de nº 2, que corresponde à

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instância da enunciação, é aquele que provoca no sujeito a ilusão de que tem domínio sobre
aquilo que pode ser dito, fazendo-o acreditar que aquilo que fala só pode ser dito daquela
maneira, sem se dar conta que, ao longo do seu dizer, vão se constituindo famílias parafrásticas
que indicam que o dizer poderia ser outro (ORLANDI, 2020).
Com isso, entendemos que o sujeito não tem autonomia no discurso; ele é sempre
controlado pela força da ideologia e pelas condições que possibilitam o seu dizer. Assim,
quando pensamos nos sujeitos que falam sobre o autismo nas edições das revistas Época, Veja
e Superinteressante, entendemos que eles funcionam ideologicamente, enunciando de acordo
com aos interesses do sistema que os mantém, que é o do neoliberalismo econômico.
O sujeito discursivo se constitui ainda pela heterogeneidade, na medida em que seu
discurso é entrecruzado por outros discursos, outras vozes, que se reafirmam, negam, se
contradizem, e que, igualmente, constituem o seu dizer. A heterogeneidade do sujeito é
atestada, nesse sentido, pela relação que seu discurso estabelece com outros discursos, dado o
processo de interdiscursividade que existem entre eles.
A interdiscursividade, como se observa, constitui uma das condições de produção do
discurso, o qual compreende, dentre outras coisas, “o conjunto de mecanismos formais que
produzem um discurso de tipo dado em ‘circunstâncias’ dadas” (PÊCHEUX, 1997, p. 74).
Essas condições de produção compreendem tanto quanto o contexto em que um discurso é
produzido quanto o sujeito.
Quando nos referimos ao contexto, estamos fazendo menção às circunstâncias
imediatas e às determinações históricas que possibilitam as condições do dizer de um discurso.
Pensemos no caso da emergência dos enunciados sobre o autismo pela mídia. A sua
emergência se deu em um contexto em que o discurso neoliberal solicitava sujeitos produtivos
para a política econômica do capitalismo. Com isso, o sujeito deficiente, até então tido com
alguém que não tinha utilidade para o capitalismo, passa a ser reivindicado por esse sistema
econômico, tornando-se, então, sujeitos que precisam estar incluídos de forma ativa na
sociedade. Diante disso, os discursos sobre o sujeito deficiente começam a ganhar visibilidade
social e passam a significar a deficiência de modo diferente.
Poderíamos pensar em outras forças que também impulsionam essa emergência do
discurso sobre o autismo na mídia, como as políticas públicas, as leis que vêm favorecendo a
educação especial e também as lutas das famílias para que os filhos sejam respeitados.
Ainda sobre essas condições de produção do discurso, pensemos nas relações de força
que os carregam. Tais relações podem ser pensadas a partir do lugar social do qual o sujeito
constrói os seu dizer. Como nossa sociedade é constituída por relações hierárquicas, as relações
de força no discurso serão sustentadas pelo poder desses diferentes lugares, o que implica na

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afirmação de que dependendo da posição ocupada pelo sujeito a sua fala pode significar
diferentemente, uma vez que o lugar do qual ele fala é constitutivo daquilo que diz
(ORLANDI, 2020). Assim, se pensarmos novamente nas discursividades sobre o autismo na
mídia, podemos inferir que o modo como essa instância fala sobre o autismo pode significar
diferentemente da maneira como outros grupos (familiares, especialistas, etc.) o significam a
partir de seus dizeres, uma vez que as posições a partir das quais eles enunciam não são as
mesmas.
As condições de produção do discurso compreendem ainda questões que são da ordem
do sujeito e da maneira como ele se insere no discurso. Quando pensamos no sujeito do
discurso, entendemos que ele é convocado a assumir certas posições dentro do discurso, sendo
elas constitutivas do seu dizer. Entra, nesse processo, a ideologia como instância que o
interpela, fazendo com que o sujeito seja levado a “ocupar seu lugar em um dos grupos ou
classes de uma determinada formação social” (BRANDÃO, 2004, p. 47).
A ideologia pode ser aqui entendida como um conjunto de representações dominantes
em uma determinada classe dentro da sociedade. Ela representa, nesse sentido, a visão de
mundo de uma classe, a maneira como essa classe representa a ordem social. A ideologia é,
assim, “um sistema lógico e coerente de representações (ideias e valores) e de normas ou regras
(de condutas) que indicam e prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar, o que
devem valorizar, o que devem sentir, o que devem fazer e como devem fazer” (CHAUÍ, 1980
apud BRANDÃO, 2004, p. 22).
O sujeito, quando ocupa uma posição na sociedade, assume formas de dizer que são
características do lugar ou grupo social do qual enuncia. O seu dizer e os sentidos que dele
derivam são determinados pela sua inserção em determinada formação discursiva, sendo esta
determinada pelas formações ideológicas que caracterizam determinado grupo social. Nesse
sentido, queremos investigar quais posições ocupa o sujeito que fala sobre o autismo nas
revistas selecionadas e que sentidos sobre o autista derivam desse dizer.
A noção de formação discursiva, aqui empregada, pode ser compreendida como
“aquilo que numa dada formação ideológica dada – ou seja, a partir de uma posição dada em
uma conjuntura sócio-histórica dada – determina o que pode e deve ser dito” (ORLANDI,
2020, p. 40). Esse conceito aponta, assim, para a ideia de que os discursos, e os sentidos que
deles derivam, são determinados pela inscrição dos sujeitos em determinada formação
discursiva. É, ainda, pelo fato dos sujeitos compartilharem das mesmas formações discursivas
que atribuem sentidos parecidos sobre determinada palavra.
O contrário também é verdadeiro. As palavras podem mudar de sentidos se os sujeitos
se inscreverem em formações discursivas diferentes. Pensemos, por exemplo, na palavra

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“família” e as derivações de sentidos que ela pode alcançar se tomada por sujeitos inscritos nas
formações discursivas do discurso religioso e por outros grupos que se inserem em outras
formações discursivas que se opõem ao discurso religioso tradicional, como é o caso de sujeitos
que se identificam com a comunidade LGBTQIA+. O sentido que a palavra “família” alcança
nesses dois grupos sociais é diferente porque os sujeitos estão inscritos em formações
discursivas que lhes são correspondentes. A língua, como prática social de sujeitos ideológicos,
produz sentidos que correspondem às formações ideológicas que constituem os sujeitos do
discurso.
O interdiscurso é outro conceito mobilizado pela Análise de Discurso para explicar
como se comporta a produção de um discurso. Ele compreende todos os “já-ditos” e que é
possível dizer (ORLANDI, 2020).
A noção de interdiscurso permite que entendamos que toda formação discursiva é
constituída por discursos outros já constituído histórico e socialmente, o que evidencia, dessa
forma, que o sujeito não é inaugural em seu dizer, tudo o que ele diz entra em relação com
outros “já-ditos” anteriormente. Assim, o que o sujeito faz é, por meio de uma memória
discursiva, acionar esses “já-ditos” na formulação de seu dizer.
A memória discursiva é entendida aqui como “o saber discursivo que torna possível
todo dizer e que retoma sob a forma do pré-construído” (ORLANDI, 2020, p. 29). É ela que
permite ao sujeito ter acesso – de modo não tão consciente – aos vários discursos já
constituídos histórico e socialmente para, então, formular o seu dizer. A memória discursiva
funciona assim como uma “estabilização” do discurso à medida que traz a possibilidade de sua
repetição.
As noções teóricas aqui apresentadas são conceitos que constituem o arcabouço
teórico da Análise de Discurso e que sustentam a disciplina em seu processo de investigação do
discurso e dos sentidos produzidos por ele. Como o nosso objeto de pesquisa está inserido no
campo teórico da Análise de Discurso, destacamos a importância dessas noções teóricas no
nosso processo de análise das discursividades sobre o autismo nas páginas das revistas Época,
Veja e Superinteressante.
7. CRONOGRAMA

2022 2023
PERÍODO DAS ATIVIDADES
1° sem. 2º sem. 1º sem. 2º sem.

1. Cumprimento de créditos em disciplinas X X

2. Levantamento bibliográ fico X X

3. Aprofundamento teó rico X X X

15
4. Organizaçã o do corpus X X

5. Aná lise dos dados X X X

5. Discussã o dos dados com o orientador da


pesquisa X X X

6. Redaçã o preliminar do trabalho e revisã o X X

7. Abertura do processo de qualificaçã o X

8. Exame de qualificaçã o X

9. Redaçã o final e abertura do processo de defesa X

10. Defesa da dissertaçã o X

REFERÊNCIAS

BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. 2ª ed. rev. Campina:


Editora da Unicamp, 2004.

BRASIL. Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção


dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista; e altera o § 3º do art. 98 da Lei nº
8.112, de 11 de dezembro de 1990. Diário Oficial da União. Brasília, 28 de dezembro de 2012.

CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das mídias. Trad.: Angela S. M. Corrêa. 1ª ed. São Paulo:
Contexto, 2009.

ÉPOCA. Porto Alegre: Globo, edição nº 473, 05 nov. 2007.

MUSSALIM, Fernanda. Análise do Discurso. In.:MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna


Christina (Orgs.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. 8ª ed. São Paulo: Cortez
Editora, 2012.

ORLANDI, Eni P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. 13ª ed. Campinas:


Pontes, 2020.

__________. Análise de Discurso. In.: ORLANDI, Eni P; LAGAZZI-RODRIGUES, Suzy


(Orgs.). Discurso e textualidade. 3ª ed. Campinas: Pontes Editores, 2015.

PÊCHEUX, Michel. Discurso: estrutura ou acontecimento. 5ª ed. Campinas: Pontes, 2008.

__________. Análise Automática do Discurso. In.: GADET, F. HAK, T. (Org.). Por ma


Análise Automática do Discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. 3ª Ed. Campinas,
SP: Editora da UNICAMP, 1997.

__________. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. 2ª ed., Campinas:


Editora da Unicamp, 1988.

SUPERINTERESSANTE. São Paulo: Abril, edição nº 410, dez. 2019.


16
VEJA. São Paulo: Abril, edição nº 2540, 26 jul. 2017.

WHITMAN, Thomas L. O desenvolvimento do autismo: social, cognitivo, linguístico,


sensório-motor e perspectivas biológicas. Trad.: Dayse Batista. São Paulo: M. Books do Brasil
Editora, 2015.

ANEXO
Revistas que serão analisadas

Edição nº 2540 da revista Veja Edição nº 473 da revista Época

17
Edição nº 410 da revista Superinteressante

18

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