Artigo - Acordo de Acionistas - 14.08.17
Artigo - Acordo de Acionistas - 14.08.17
Artigo - Acordo de Acionistas - 14.08.17
RESUMO: O presente artigo tem como escopo o exame do acordo de acionista como instrumento
parassocial de crescente utilização na regulamentação e harmonização da relação entre os sócios de
uma companhia. Neste cenário são pontualmente analisados os elementos e requisitos gerais para a
formalização de um acordo de acionistas sob a perspectiva da lei, da doutrina e da jurisprudência
brasileira, assim como a importância deste instrumento no quotidiano das companhias, com a
identificação das cláusulas mais corriqueiras.
ABSTRACT: The purpose of this article is to examine the shareholder agreement as an instrument of
increasing use in the regulation and harmonization of the relationship between the shareholders of a
company. In this scenario, the general elements and requirements to formalize a shareholder
agreement are analyzed under the perspective of the Brazilian law, doctrine and jurisprudence, as
well the importance of this instrument in the companies’ daily life, with the identification of the most
common clauses.
1. DO ACORDO DE ACIONISTAS
Conforme se desprende da Lei das Sociedades por Ações o documento básico para
constituição e regulamentação da Sociedade Anônima é o Estatuto Social, o qual deve ser arquivado
na Junta Comercial do Estado competente.
O Estatuto Social aborda os principais temas para o efetivo funcionamento da Sociedade,
tais como o objeto social, a denominação social, o endereço, capital social, órgãos sociais, quóruns
de instalação de assembleias de acionistas e reuniões do conselho de administração, quórum para
aprovação das mais diversas matérias, deveres referentes ao exercício social, etc. Enfim, conforme o
1
Texto escrito em Agosto/2017.
2
Graduada em Direito pela FDV – Faculdade de Direito de Vitória/ES. Especialista em Direito Público pela FDV –
Faculdade de Direito de Vitória/ES. Master en Derecho de la Empresa pela Universidad de Alcalá de Henares e CIFF –
Centro Internacional de Formación Financieira – Madri/Espanha. Mestre em Direito Internacional pela UERJ -
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Professora de Direito Internacional Público e Privado. Advogada.
Artigo 83 da Lei das Sociedades por Ações o Estatuto Social “deverá satisfazer todos os requisitos
exigidos para os contratos das sociedades mercantis em geral e aos peculiares às companhias, e
conterá as normas pelas quais se regerá a companhia”3.
Ocorre que o Estatuto Social muitas vezes não constitui o instrumento ideal para regular
certas peculiaridades das relação entre os sócios. Seja pela precípua finalidade legal do Estatuto
Social, seja pelo número limitado de sócios que por vezes querem se vincular a um assunto específico
ou seja pela publicidade que se quer conceder (ou por vezes não conceder) a certos assuntos sociais,
tornou-se cada vez mais frequente a elaboração de acordos paralelos para tratar dos mais diversos
assuntos de interesse dos sócios. Neste ponto o Acordo de Acionistas se apresenta como o principal
acordo paralelo para complementar os conceitos padrões definidos no Estatuto Social e para regular,
mais a fundo, certas relações a serem desenvolvidas entre todos ou entre um grupo de sócios,
conforme o caso.
Como bem descreve Fábio Ulhôa Coelho as relações entre acionistas são dinâmicas,
podendo variar “de forma significativa, por influxos das mudanças de interesse (fatores racionais) ou
humores (fatores emocionais) das pessoas envolvidas” razão pela qual “os acionistas procuram
estabilizar essas relações, com o objetivo de se garantirem contra variantes nas posições acionárias”4.
Ao objetivar o resguardo de pretensões individuais no âmbito de uma companhia, o Acordo
de Acionistas acaba por inserir fragmentos do intuitu personae e, por consequência, da affectio
societatis a uma sociedade legalmente prescrita visando a preponderância do capital sobre a
identidade ou sobre a vontade individual de seus sócios5. Conforme destacado por Jürgen Dohn
“embora a sociedade anônima seja, em princípio, fundada sobre a noção de intuitu pecuniae, esses
acordos tornam possível a mantença de um intuitu personae entre acionistas e conduzem a
modificações profundas na estrutura interna da sociedade”6.
No mesmo sentido Fábio Konder Comparato destaca que:
3
BRASIL. Lei 6.404/1976. Dispõem sobre as Sociedades por Ações. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6404consol.htm>. Acessado em: 27 de maio de 2017.
4
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial: direito de empresa. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. vol. 02. p.
325. 528 p.
5
Neste ponto cumpre destacar que se está falando da essência de existência do tipo societário. Isto porque apesar do
direcionamento conceitual das sociedade a um tipo ou outro de intuitu constitutivo, há na doutrina posicionamento de
que nenhuma sociedade seria puramente de capital ou de pessoas. Neste sentido Renato Ventura Ribeiro convenciona
que “Nas chamadas sociedades de pessoas também há uma contribuição pecuniária ou algo equivalente, pois todo o
sócio deve contribuir para o capital social. E qualquer sociedade de capitais é constituída por, no mínimo, uma pessoa,
não sendo associação de capitais, mas de sócios capitalistas. Em suma, não há sociedade sem pessoa e capital. Por isto,
a inclusão da sociedade em uma ou outra espécie leva em conta o pedromínio da importância da figura do sócio ou de
sua contribuição na formação do capital”. RIBEIRO, Renato Ventura. Exclusão de sócios na sociedade anônima. São
Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 40, 352 p.
6
DOHM, Jürgen. Les accords sur l’exercice du droit de vote de l’actionnaire: étude de droit suisse et allemand.
Mémoires Publiés par la Faculté de Droit de Genève, vol. 33. Genebra: Librairie de l'Université Georg & Cie. 1971, p.
5, 223 p. Apud LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Buhões. A Lei das S.A.: pressupostos, elaboração,
aplicação. Renovar, 1992, p. 523-524.
A affectio societatis é, portanto, não um elemento exclusivo do contrato de
sociedade, distinguindo-o dos demais contratos, mas um critério interpretativo dos
deveres e responsabilidades dos sócios entre si, em vista do interesse comum. (...)
Em especial, o sócio que descumpre disposição estatutária e, sobretudo, contratual
(pois a relação convencional é mais pessoal e concreta que a submissão a normas
estatutárias), como é o caso de acordos de acionistas numa sociedade anônima,
pratica falta particularmente grave sob o aspecto da ética societária; ele se põe em
contradição com sua anterior estipulação ou declaração de vontade, revelando-se
pessoa pouco confiável enquanto sócio (venire contra factum proprium)7.
Nos primórdios de sua utilização o Acordo de Acionistas era visto com certa desconfiança
pelo meio jurídico, como um instrumento que poderia às escondidas burlar os direitos de outros
sócios, principalmente dos minoritários10.
7
COMPARATO, Fábio Konder. Novos Ensaios e Pareceres de Direito Empresarial. Rio de Janeiro. Forense, 1981,
p. 39-40.
8
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 15 ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Atlas, 2017, p. 351. 608 p.
9
LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In: FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz
Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed , atual e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 321. 1680 p.
10
BULGARELLI, Waldirio. A regulamentação jurídica do acordo de acionistas no Brasil. Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo, v. 40, out./nov. 1980, p. 80-92, p. 81.
A evolução das relações sociais veio a demonstrar uma crescente aceitação do instrumento
em âmbito mundial, variando seu fundamento ora em posição doutrinária ou jurisprudencial, ora em
prescrição legal, sendo o instrumento, em regra, amplamente aceito em grande parte dos países.
O Brasil não escapou de acaloradas discussões acerca da aceitação (ou não) do acordo de
acionistas, sobretudo no que diz respeito à amplitude do direito de voto11, mas o advento da Lei 6.404
de 15 de dezembro de 1976, também denominada de Lei Sociedades por Ações, formalizou a
aceitação deste instrumento no Brasil, passando a legislação a regular uma já consolidada prática
empresarial12, conforme expressado em sua própria exposição de motivos:
11
Pontes de Miranda, por exemplo, defendia inoponibilidade do Acordo de Acionista à Companhia, que poderia
computar, inclusive, votos tidos em desacordo com os termos do referido acordo. Caberia aos sócios parte do acordo,
entre si, discutir a responsabilidade da parte que descumpriu o acordo. MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de.
Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1965. v. 50, p. 312.
12
Após expor posição de Fran Martins de que "Finalmente, o acordo de acionistas pode ser feito visando ao exercício
do direito de voto. Essa é, na realidade, a finalidade maior desses acordos, pois com ele se procura constituir uma
maioria entre acionistas, de modo a terem o comando da sociedade”, Raul Justino Ribeiro Moreira conclui que “Assim,
não há mais dúvidas quanto à validade dos contratos referentes à convenção de voto, já que há o critério legal observado
na Lei n. 6.404/76.”. MOREIRA, Raul Justino Ribeiro. Acordo de Acionistas. Revista de Ciências Políticas, Rio de
Janeiro, 31(2), p. 87-98, abr./jun. 1988. p. 93. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rcp/article/viewFile/60029/58351>. Acessado em: 20 de junho de 2017.
13
BRASIL. Exposição de Motivos Lei 6.404/1976. Disponível em:
<http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/legislacao/leis/anexos/EM196-Lei6404.pdf>. Acessado em: 02 de junho de
2017.
14
Celso Barbi Filho critica o que julga uma exagerada tentativa de regulamentação, o que acaba por colocar amarras e
limitar a própria efetividade do instrumento. Complementa que em muitos países em que o instrumento é plenamente
usado e aceito não regulamenta o Acordo de Acionistas. BARBI FILHO, Celso. Acordo de acionistas. Belo Horizonte:
Del Rey, 1993, p.36.
15
Calixto Salomão entende que “o artigo 118 da lei opera uma integração coerente entre as duas necessidades quase
opostas (...) De um lado, busca limitar a amplitude do acordo de acionistas, limitando-lhe o objeto. De outro, dá a esse
acordo de acionistas com objeto limitado, reconhecimento e eficácia societária.” SALOMÃO FILHO, Calixto. O Novo
Direito Societário. 4 ed., rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 132. 304 p.
também se aplica ao acordo de acionistas, pela sua natureza contratual, os requisitos comuns
aplicáveis à todo e qualquer contrato, na forma do Artigo 104 do Código Civil, quais sejam, agente
capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei.
A aplicabilidade dos requisitos gerais contratuais é relevante não só pela propagada natureza
civil do acordo de acionistas16 mas também pela frequente ocorrência nestes acordos de tratativas não
incluídas no rol taxativo de matérias previstos no Artigo 118 da Lei das Sociedades por Ações, as
quais serão legalmente tratadas de um ponto de vista eminentemente contratual, ou seja, sem os
benefícios aplicáveis as matérias legalmente resguardadas ao acordo de acionistas.
Neste ponto cumpre atentar que o acordo de acionistas não constitui a única forma de
harmonização da vontade dos acionistas no exercício da empresa. Há outros tipos de acordos
paralelos, contudo sob a égide da regra geral oponível aos contratos, que podem ser firmados. E é
bem comum, por exemplo, acordos sobre matérias outras do que as legalmente permitidas no Brasil
para o acordo de acionistas, como os acordos que tratam exclusivamente sobre forma e regras para
financiamento da companhia ou sobre questões comerciais (tais como não concorrência por período
específico, preferência de contratação de serviços com empresas dos acionistas, forma de avaliação
de bens a serem integralizados na companhia, etc.).
Assim, ainda que sob uma diferente perspectiva quanto à executividade e quanto à
vinculação da companhia e de terceiros, como veremos a seguir, os acionistas podem em acordo
específico (ou até no corpo do acordo de acionistas, sem lhe atribuir as peculiaridades legais), inserir
16
“Entre nós, a perplexidade surge em face da referida inserção do instituto na lei societária. Nos países de direito
continental, onde a matéria nem ao menos é regulada em lei, a moderna teoria atribui o negócio à esfera privada do
acionista, apontando que, no acordo de voto, qualquer que seja a repercussão de tal avença sobre a vida social, a
determinação do sentido dado ao voto é estranha ao direito societário. Tal negócio repousa exclusivamente sobre um
acordo de vontades dos contratantes. Assim, esse ato gerador de obrigações está fora do direito das sociedades
anônimas, relacionando-se com o direito das obrigações. Em vista disso, a doutrina conclui que os acordos relativos ao
exercício do direito de voto do acionista são de natureza puramente contratual, repousando sobre os princípios do
direito civil” CARVALHOSA, Modesto. Acordo de acionistas. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 31-32. 269 p. No mesmo
sentido Fábio Ulhôa Coelho (COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de direito comercial. 10. ed., São Paulo: Saraiva, 2006. v.
03. p. 18-20) e Celso Barbi Filho (BARBI FILHO, Celso. Acordo de acionistas. Belo Horizonte: Del Rey, 1993.
p. 67).
17
LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In: FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz
Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed , atual e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 321. 1680 p.
e tratar de forma paralela ao estatuto social de matérias que não as previstas no Artigo 118 da Lei da
Sociedade por Ações.
Ao positivar o Acordo de Acionistas no âmbito da Lei das Sociedades por Ações, o legislador
limitou expressamente no Artigo 118 as matérias que poderiam ser tratadas nesta esfera de acordo,
quais sejam, compra e venda de ações, preferência para aquisição das ações, exercício do direito a
voto e poder de controle (este último assunto inserido pela Lei 10.303/2001 e objeto de
questionamentos já que, em regra, atrelado ao próprio direito de voto18).
Nada obstante a limitação legal, é corriqueiro verificar a estipulação no acordo de acionistas
de outros assuntos considerados importantes por seus signatários para o funcionamento daquela
sociedade. Apesar de tecnicamente recomendável tratar dos assuntos não previstos no Artigo 118 em
outros acordos paralelos (conforme descrito no item anterior), decerto estas tratativas não podem ser
juridicamente desconsiderados, eis que, independente da nomenclatura e dos requisitos atinentes a
um acordo de acionista, trata-se, por natureza, um contrato entre partes. E assim, sendo firmado por
agentes capazes, não dispondo sobre objeto ilícito e observando forma prescrita e não defesa em lei
tem valor de contrato entre as partes, na forma da regra geral do Código Civil, podendo gerar, em
caso de descumprimento contratual, indenização em perdas e danos.
Portanto, o acordo de acionistas, como um eminente contrato, pode eventualmente vir a tratar
de assuntos não dispostos no Artigo 118 da Lei de Sociedade de Ações (apesar de não ser esse seu
propósito), com a diferença de que não serão aplicadas a estas matérias as peculiaridades atinentes ao
acordo de acionistas, como a possibilidade de execução específica e a força vinculante em relação à
companhia (se arquivado em sua sede da)19. Neste sentido José Edwaldo Tavares Borba dispõe que
18
“Pelo que se sabe o poder de controle é um dado de fato, fundado no exercício do direito de voto. Ao celebrar um
acordo de acionistas sobre o exercício do direito de voto, criam as partes um sistema de poder que conduz ao controle
compartilhado. Assim, e que se pode entender, a referência ao “poder de controle” nada adiciona, posto que não poderia
ter o efeito de permitir um acordo de acionistas sobre o próprio poder de controle em si mesmo. O controle resulta do
voto, o qual se acha essencialmente vinculado à condição de acionista”. BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito
Societário. 15 ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Atlas, 2017, p. 352, 608 p. No mesmo sentido Carlos Augusto da
Silveira assevera que “(...) ao enunciar os objetos dos acordos de acionistas, refere-se ao exercício de direitos conferidos
pela ação – o voto, o poder de controle e a faculdade dela dispor. Já se vê que os acordos de acionistas estão voltados
para o exercício do poder político, que, em focalização mais aguda, concentra-se no voto. Em suma, praticamente todos
os acordos de acionistas são relativos ao direito a voto. LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In:
FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed , atual e ref. Rio de
Janeiro: Forense, 2017. p. 322. 1680 p.
19
“Isto significa que quando os signatários de um acordo de acionistas não cumprirem o previsto, pode-se obriga-los, de
forma mais célere, ao cumprimento de obrigação de fazer ou ao cumprimento de obrigação de dar coisa certa (prestar
declarações de vontade, como, por exemplo, votar em um sentido ou em outro; ou contratar, como quando na compra e
venda de ações). PADRO, Roberta Nioc; DONAGGIO, Angela Rita Franco. Sociedade Limitada versus Sociedade
por Ações: algumas características atualmente determinantes na estratégia societária de se optar por um dos tipos.
Acordos de Acionistas e de cotistas: cláusulas relevantes. In: PADRO, Roberta Nioc; PEIXOTO, Daniel Monteiro;
“não obstante possam ser celebrados acordos de acionistas com outras finalidades, somente os que
consagram os objetivos previstos na Lei das Sociedades Anônimas gozarão da proteção por ela
instituída”20
SANTI, Eurico Marcos Diniz (Coords.). Direito Societário: Estratégias Societárias, Planejamento Tributário e
Sucessório. Saraiva: São Paulo, 2009. p. 21.
20
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 15 ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Atlas, 2017, p. 352, 608 p.
21
CARVALHOSA, Modesto. Acordo de acionistas: em homenagem a Celso Barbi Filho. São Paulo: Saraiva, 2011, p.
30-33, 420 p.
22
Conforme relembrado por Carlos Augusto da Silveira Lobo é posição de interveniente apenas ratifica sua ciência do
acordo e arquivamento de uma via, contudo, deve ser relembrado que “os efeitos do acordo de acionistas em relação à
companhia decorrem do arquivamento, e não de sua interveniência” LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de
Acionistas. In: FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed,
atual e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017. P. 322. 1680 p.
os deveres inerentes à função de administrador e os interesses pessoais vinculados à posição de
acionistas, podendo até mesmo, conforme o caso, haver a imputação de ilícito civil e penal23.
Portanto, nestes casos, apesar de sua dúbia posição, o administrador não sócio deve pautar sua atuação
de forma desvinculada de seus interesses pessoais.
Por fim é concluída a impossibilidade de um terceiro constar como parte do acordo de
acionistas. Contudo, ainda que incorretamente nomeado de Acordo de Acionistas, um contrato
firmado entre sócios de uma companhia e terceiros tem validade de um contrato comum se observados
os requisitos e condições de validade dos contratos em geral, conforme o Artigo 104 do Código Civil.
Portanto não se aplicará a este acordo (ou a dadas cláusulas direcionadas a terceiros) as
especificidades previstas legalmente para um acordo de acionistas, como a execução específica das
obrigações assumidas e a observância de seu teor pela Companhia.
23
BERTOLDI, Marcelo M. Acordo de Acionistas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 64.
24
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 15 ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Atlas, 2017, p. 353. 608 p.
Não há vedação legal para que seja firmado acordo de acionistas por prazo indeterminado.
Neste caso, contudo, há divergência na doutrina acerca da possibilidade ou não de denúncia unilateral
a qualquer tempo. José Edwaldo Tavares Borba, por um lado, entende que em casos de acordo de
acionistas por tempo indeterminado a denúncia unilateral pode ocorrer a qualquer tempo e “caso
procedida de boa-fé e mediante aviso prévio, não acarretará a obrigação de indenizar perdas e
danos”25.
Para Modesto Carvalhosa se “a avença for por prazo indeterminado, a sua dissolução será
sempre motivada, seja pela quebra da affectio ou deslealdade”, havendo assim uma espécie de justa
causa em caso de quebra da affectio societatis26.
Carlos Augusto da Silveira Lobo, por outro lado, critica a generalização de que todo o acordo
de acionista por tempo indeterminado poderá ser denunciado unilateralmente. De forma ponderada,
e conectada à realidade comercial e contratual, defende uma análise caso a caso, conforme a matéria
tratada no acordo de acionistas, conforme abaixo:
Para ilustrar o perigo das generalizações, figuremos duas hipóteses: Na primeira, temos
pessoas naturais que, já sendo acionistas de uma companhia, e estando descontentes com os
rumos da gestão dos negócios sociais, resolvem celebrar um acordo de acionistas para,
votando em conjunto, assumirem o controle. Se tal acordo for omisso em relação ao prazo de
vigência, é razoável considerá-lo por prazo indeterminado e admitir que um dos componentes
do grupo, mais tarde descontente com a nova gestão, venha a denunciá-lo unilateralmente,
dele se retirando. Na segunda hipótese, figuremos duas sociedades empresárias que resolvem
realizar em conjunto um novo empreendimento, para o que constituem uma subsidiária
comum, uma delas subscrevendo 60% do capital votante e outra os restantes 40%. Esta
última, embora minoritária, contribuiu com a tecnologia para a fabricação do produto e
garantiu com seu aval debêntures emitidas para financiar o projeto, além de investir na
subscrição do capital. As partes celebram um acordo de acionistas mediante o qual o acionista
majoritário se compromete a exercer o seu direito de voto no sentido de eleger
administradores indicados pelo minoritário e de não aprovar certas deliberações sem a prévia
concordância deste. Esse acordo não contém disposição referente ao prazo de vigência.
Contemplando a segunda hipótese, torna-se claro que a conclusão razoavelmente adotada na
primeira hipótese não pode ser generalizada para fundamentar a proposição abstrata de que
todos os acordos de acionistas que não contenham disposição determinando o prazo são tidos
como de prazo indeterminado e podem ser resilidos unilateralmente a qualquer tempo27.
25
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 15 ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Atlas, 2017, p. 353. 608 p.
26
CARVALHOSA, Modesto. Comentário à Lei de Sociedades Anônimas. 4 ed. vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2003. p.
564.
27
LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In: FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz
Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed, atual e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017. P. 354-355. 1680 p.
De qualquer forma, seja firmado por prazo indeterminado ou por prazo determinado de longa
duração, os acionistas signatários devem ter a sensibilidade de periodicamente observar se os termos
do acordo de acionistas continuam coadunando com a realidade comercial da empresa 28 29
e com a
própria relação entre os sócios para evitar que, com o passar do tempo, se tenha um acordo
desvinculado dos negócios da empresa e, em alguns casos, inócuos ou até prejudiciais ao bom
funcionamento da empresa. A própria previsão contratual de realização de aditivos por comum acordo
dos signatários pode ser um meio para fazer adequações pontuais.
Para que seja oponível à companhia, o acordo de acionistas deve ser devidamente arquivado
em sua sede, conforme disposto no §8º do Artigo 118 da Lei das Sociedades por Ações. Assim,
cumprido o requisito legal, a companhia deveria abster-se de praticar atos contrários ao estipulado no
acordo de acionistas (desde que relacionado às matérias previstas no Artigo 118 da Lei das Sociedades
por Ações).
Entretanto, o fato de estar proibida de praticar atos contrários ao estipulado no acordo de
acionistas não significa que lhe seja permitido alterar a vontade do sócio que agiu em desacordo com
o instrumento. Isto porque a companhia em si não pode obrigar o sócio a agir ou não agir de
determinada forma, sendo por vezes necessário que o sócio descontente com o descumprimento
procure pronunciamento judicial ou arbitral, conforme a forma de resolução de conflito indicada no
próprio acordo de acionista.
No que se refere a terceiros, a oponibilidade do acordo de acionistas está vinculada à sua
averbação nos livros de registro e nos certificados das ações, se emitidos, Cumprido com este
requisito disposto no §1º do Artigo 118 da Lei das Sociedades por Ações, passará a produzir efeito
erga omnes. Neste sentido, com o objetivo de definir o efeito a ser atribuído ao acordo de acionista
perante terceiros, é recomendado que os acionistas previamente avaliem o impacto de se dar
publicidade às matérias tratadas no instrumento para, posteriormente, concluir acerca da efetiva
necessidade ou vontade dos signatários em dar publicidade ao mesmo.
28
A título de exemplo, o presidente do Conselho de Administração da Seguradora Líder expôs que o acordo de acionistas
da empresa, que seria renovado automaticamente por mais 10 anos em outubro de 2017, vai ser reformulado em razão de
descontentamento de um grupo de acionistas. GENTE SEGURADORA. Líder aceita rever Acordo de Acionistas que dá
poder aos grandes grupos. Disponível em: https://www.genteseguradora.com.br/newsletter/lider-aceita-rever-acordo-de-
acionistas-que-da-poder-aos-grandes-grupos/. Acessado em: 18 de junho de 2017.
29
Após um acordo de acionistas que vigorou por 20 anos, o acionistas da Valepar, que detêm a maioria do controle da
Vale, fizeram hoje a proposta de um novo acordo de acionistas com o objetivo viabilizar a listagem da Vale no segmento
especial do Novo Mercado da BM&F Bovespa, transformando-se em “uma sociedade sem controle definido”. BRASIL
MINERAL. A proposta do novo acordo de acionistas. Disponível em
<http://www.brasilmineral.com.br/noticias/proposta-do-novo-acordo-de-acionistas>. Acessado em: 11 de junho de 2017.
Cumpre ressaltar que, em relação à sociedade anônima aberta, a Comissão de Valores
Mobiliários – CVM prevê através da Instrução CVM n. 480/2009 a obrigatoriedade de certas
categorias de acionistas apresentarem a registro o acordo de acionistas e suas alterações,
principalmente quando relativas ao direito de voto, poder de controle ou transferência de ações30.
Ainda que não haja exigência legal, por se tratar o acordo de acionistas de um contrato de
longo prazo a regulamentar condutas futuras, é importante a inserção de certas cláusulas chaves para
garantir a sua funcionalidade e harmonia entre os signatários.
Primeiramente, apesar de não haver previsão legal sobre a forma do acordo de acionistas, é
altamente recomendável que o mesmo seja formalizado por escrito. Primeiro porque o contrato escrito
concede mais clareza acerca das partes signatárias e dos termos negociados, minimizando incertezas
relativas à própria validade ou à interpretação do contrato. Este fato ganha ainda mais relevância
diante os longos prazos em geral aplicados aos acordos de acionistas. Ademais, o contrato escrito
acaba se tornando um pré-requisito para a sua oponibilidade perante a companhia ou terceiros, pois
somente o contrato escrito é passível de arquivamento na sede da companhia ou de averbação no livro
de registro e certificados de ações31.
Outro ponto relevante é definir quais ações se vinculam aos termos e condições do acordo
de acionista. Ou seja, é importante inserir cláusula para descrever se o acordo abrangerá apenas as
ações presentes (as quais os signatários eram titulares na data de assinatura do acordo) ou se também
abarcará as futuras ações de seus signatários (como as eventualmente adquiridas de outros sócios ou
subscritas em caso de aumento do capital social). É comum a inserção no acordo de acionistas de
cláusula que vincula as futuras ações adquiridas ou subscritas por seus signatários aos termos do
acordo de acionistas. Nada obstante esta deve ser uma definição casuística, conforme as matérias
tratadas no acordo de acionistas e a estratégia de negócio dos acionistas que o compõe.
A forma de solução de conflitos entre os acionistas signatários também deve ser
estrategicamente definida conforme as partes e as matérias tratadas no acordo de acionistas. Há uma
tendência de inserir nestas cláusulas procedimento buscando uma prévia resolução “amigável” de
30
BRASIL. CVM 480. Dispõe sobre o registro de emissores de valores mobiliários admitidos à negociação em mercados
regulamentados de valores mobiliários. Disponível em:
<http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/legislacao/inst/anexos/400/inst480consolid.pdf>. Acessado: 05 de junho de
2017.
31
“A lei não exige forma especial para o acordo de acionistas, mas é indispensável a forma escrita (escritura pública,
instrumento particular, troca de cartas, etc.) para que seja passível de arquivamento na sede da companhia e de
averbação no livro de registro e certificados de ações”. LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In:
FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed, atual e ref. Rio de
Janeiro: Forense, 2017. P. 325. 1680 p.
eventual conflito, com o envolvimento de diferentes níveis e órgãos de gestão dos acionistas, se
pessoa jurídica, antes de se formalizar uma demanda judicial ou arbitral. A mediação também vem
sendo apresentado como forma alternativa, em regra mais rápida e menos custosa, para resolver o
conflito.
Em qualquer caso, contudo, devem os acionistas signatários do acordo de acionistas definir
se em última instância o conflito será solucionado por via judicial ou arbitral. Também há neste ponto
uma tendência de opção pelo juízo arbitral por algumas razões práticas: (a) o sigilo das informações;
(b) expertise do arbitro acerca das matérias societárias; (c) em caso de sociedades multinacionais, a
maior confiança, em regra, nas câmaras arbitrais tradicionais do que no sistema jurídico do país, seja
pelo desconhecimento das leis e seja pelo longo prazo ou pelas incertezas no funcionamento da
processo local.
Ainda é comum e recomendável a inserção de cláusula referente a confidencialidade das
informações e à lei aplicável ao contrato, sobretudo nos casos em que o acordo de acionistas seja
composto por estrangeiros ou multinacionais. Para a definição da lei aplicável deve ser considerada
não somente o local em que está instalada a empresa, mas ser realizada toda uma análise sobre o
negócio e sobre o sistema judiciário das áreas de influência para, considerando a realidade da
empresa, melhor definir a lei que deverá incidir sobre eventuais conflitos originários ou decorrentes
do acordo de acionista.
Antes de iniciar a análise pontual de algumas das cláusulas mais frequentes nos acordos de
acionistas, é importante esclarecer que este instrumento não deve ser visto como um documento
proforma e, por isso, não deve se desenvolvido com base em modelos ou copiar acordos de outras
empresas.
Diferentemente, o acordo de acionistas deve ser formatado após conhecimento e análise
específica da realidade do negócio, da empresa e de seus acionistas, assim como considerar as
expectativas futuras dos signatários com o documento, sendo que suas cláusulas devem ser
desenvolvidas e compatibilizadas com as necessidades específicas daquela companhia. Neste ponto
o assessoramento de um advogado especializado é altamente recomendável, não só como indicador
das matérias que devem ou não ser inseridas, mas também na redação de cláusulas mais claras,
reduzindo o risco de futuras interpretações dúbias.
Assim, pretende-se esclarecer que as cláusulas apresentadas a seguir exemplificam aquelas
mais utilizadas na elaboração dos acordo de acionistas (até pelo rol Artigo 118 da Lei das Sociedades
por Ações) e não devem utilizadas como um padrão para todo e qualquer acordo de acionistas. Devem
ser vistas como indicativo, com os devidos aprimoramentos e adequações conforme a realidade de
comercial de cada empresa.
32
“O acordo de controle é necessariamente um acordo de voto, mas deste se distingue porque o poder de controle não se
exerce apenas através do direito de voto na Assembléia Geral, mas também sob a forma de atos do acionista
controlador, que orienta o funcionamento dos órgãos sociais fora das reuniões da Assembléia Geral.” LOBO, Carlos
Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In: FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.).
Direito das Companhias. 2 ed, atual e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 355. 1680 p.
33
LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Ibidem. p. 333-334.
34
“O acordo de acionista quanto ao ajuste dos votos pode procurar dar ao grupo uma maioria acionária capaz de influir
nos destinos da sociedade por ficar assegurada a eleição dos administradores segundo os interesses do grupo, ou pode
também ligar acionistas que constituem a minoria, com a finalidade de fazer com que essa organize um bloco de
resistência, dentro da sociedade, para a defesa dos seus direitos”. MOREIRA, Raul Justino Ribeiro. Acordo de
Acionistas. Revista de Ciências Políticas, Rio de Janeiro, 31(2), p. 87-98, abr./jun. 1988. p. 93. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rcp/article/viewFile/60029/58351>. Acessado em: 20 de junho de 2017.
35
“A obrigação de votar segundo a deliberação da maioria dos membros do acordo é válida porque não importa
alienação do direito de voto, mas na vontade de votar de um determinado modo que viabilize a formação e o
funcionamento de um bloco. Acresce que a determinação do conteúdo do voto é feita segundo o princípio majoritário,
que prevalece nas deliberações colegiadas previstas na LSA, e conduz ao mesmo resultado da hipótese em que os
ponto é interessante pontuar que parte da doutrina entende não ser possível os denominados “acordos
em aberto”, ou seja, acordos que não especificam o rol de matérias para os quais os signatários do
acordo de acionistas deveriam convergir seu voto36. No âmbito dos acordos de voto também é
frequente a inserção de cláusula prevendo quórum qualificado para aprovação de determinadas
matérias.
O acordo de votos deve ser exercido em conformidade com o disposto no Artigo 115 da Lei
das Sociedades por Ações37, ou seja, no interesse da sociedade38. Neste prisma, já é pacificado na
doutrina a nulidade de cláusulas que sempre estabeleçam obrigação de votar pela aprovação de contas
da administração, das demonstrações financeiras ou de laudo de avaliação39, já que são matérias
subjetivas e que devem ser julgadas com responsabilidade e no interesse da sociedade, conforme a
realidade contábil da empresa naquele período. Acrescenta-se o disposto no Artigo 118, § 2º da Lei
das Sociedades por Ações, que dispõe que os acordos de votos não poderão ser invocados para eximir
o acionista da responsabilidade no exercício do direito de voto ou do poder de controle40.
Deve ser ainda exposto que a negociação de voto entre os acionistas deve ser realizada por
mera liberalidade das partes. A negociação do direito de voto em troca de vantagens constitui ilícito
penal, com pena de seis meses a dois anos de detenção e multa, na forma do Artigo 177, § 2º do
Código Penal41.
acionistas conferem suas ações a uma holding, cuja vontade é determinada pela maioria dos sócios. O acordo de
acionistas, nessa hipótese, equivale à constituição de uma holding de participação, sem os inconvenientes da
transferência para a holding da propriedade das ações”. LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In:
FILHO LAMY, Alfredo. PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed, atual e ref. Rio de
Janeiro: Forense, 2017. P. 332. 1680 p.
36
EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada. São Paulo: Quartier Latin, 2011. vol. 01. p. 708.
37
O acionista deve exercer o direito a voto no interesse da companhia; considerar-se-á abusivo o voto exercido com o
fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus
e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia ou para outros acionistas. BRASIL. Lei 6.404/1976.
Dispõem sobre as Sociedades por Ações. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6404consol.htm>.
Acessado em: 27 de maio de 2017.
38
“O direito de voto há de ser sempre exercido em prol do interesse da companhia. Há deveres de lealdade, isenção e
respeito à minoria que não podem ser ladeados, sob pena de responsabilidade do acionista pelos abusos eventualmente
praticados. Os acionistas que exercem o controle da empresa devem agir no interesse do bem social, realizando o
objetivo da empresa e fazendo-a cumprir. na expressão da lei, ‘a sua função social’. Segundo Modesto Carvalhosa
(1977, p. 151), o ‘interesse da companhia’ - art. 115, caput, e 116, parágrafo único - deve ser entendido como "aquele
próprio da companhia e também o interesse coletivo dos acionistas". Assim, sempre que o acordo de acionistas ferir tais
interesses, resultará disso a nulidade do ato ou deliberação, por manifesta ilicitude. Os acionistas controladores
responderão pelos danos causados por atos praticados com abuso do poder, tais como: orientar a companhia para fim
estranho ao objeto social, promover a transformação ou liquidação da companhia visando vantagem para si ou para
terceiros, eleger administrador inapto ou tentar induzir este a praticar ato ilegal, aprovar ou fazer aprovar contas
irregulares dos administradores. MOREIRA, Raul Justino Ribeiro. Acordo de Acionistas. Revista de Ciências
Políticas, Rio de Janeiro, 31(2), p. 87-98, abr./jun. 1988. p. 92-93. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rcp/article/viewFile/60029/58351>. Acessado em: 20 de junho de 2017.
39
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial: direito de empresa. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. vol. 02.
p. 326. 528 p.
40
BRASIL. Lei 6.404/1976. Op. Cit.
41
“Incorre na pena de detenção, de seis meses a dois anos, e multa, o acionista que, a fim de obter vantagem para si ou
para outrem, negocia o voto nas deliberações de assembleia geral”. BRASIL. Decreto-Lei n. 2848/1940. Código Penal.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acessado em: 25 de maio
de 2017.
Para evitar conflito ou equívoco no exercício do acordo de voto entre os signatários do
acordo de acionistas é recomendável que os signatários realizem reunião prévia à assembleia de
acionista da companhia, para deliberarem e fixarem, entre si, o voto a ser exercido durante a
assembleia.
Em referência ao acordo de voto, o §8º do Artigo 118 da Lei das Sociedades por Ações é
pontual ao prever que “o presidente da assembleia ou do órgão colegiado de deliberação da
companhia não computará o voto proferido com infração de acordo de acionistas devidamente
arquivado”42. Neste ponto cumpre destacar que não computar o voto não autoriza modificar a
manifestação de vontade contrária do titular do direito de voto, caso em que para cômputo do voto na
forma prometida no acordo de acionistas, se faz necessário a execução específica do acordo, através
de manifestação judicial ou arbitral, conforme forma de resolução de controvérsias definida no
próprio acordo de acionistas.
Neste sentido, conforme leciona Paulo Henrique Lucon, “a sentença resultante da execução
específica valerá como um voto, substituindo o voto proferido em sentido contrário ao acordo de
acionistas, com efeitos ex tunc43”.
Portanto, nos casos em que a ausência do cômputo do voto na forma alinhada no acordo de
acionista venha a gerar um potencial gravame para a empresa ou para os sócios signatários do
instrumento (como, por exemplo, eleição de um diretor diferente), deve ser solicitado liminar para
que surta desde o princípio os efeitos referente ao voto não computado, evitando que se contabilize
prejuízos até que seja prolatada a sentença.
Por fim, deve ser trazida a tona crítica da doutrina à parte do disposto no §8º e no §9º do
Artigo 118 da Lei das Sociedades por Ações, no que diz respeito ao não cômputo de voto pelo
presidente do órgão colegiado de deliberação e pela possibilidade de voto relativo ao membro do
conselho de administração ausente ou omisso. Isto porque entende-se que a vinculação do conselho
de administração ao acordo de acionistas “afeta e ameaça profundamente o conceito de independência
e responsabilidade individual do conselheiro, esvaziando o sentido da existência do órgão no que
tange ao planejamento estratégico da empresa”44, prejudicando, inclusive, princípios de governança
corporativa.
42
BRASIL. Lei 6.404/1976. Dispõem sobre as Sociedades por Ações. Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6404consol.htm>. Acessado em: 27 de maio de 2017.
43
PADRO, Roberta Nioc; DONAGGIO, Angela Rita Franco. Sociedade Limitada versus Sociedade por Ações:
algumas características atualmente determinantes na estratégia societária de se optar por um dos tipos. Acordos de
Acionistas e de cotistas: cláusulas relevantes. In: PADRO, Roberta Nioc; PEIXOTO, Daniel Monteiro; SANTI, Eurico
Marcos Diniz (Coords.). Direito Societário: Estratégias Societárias, Planejamento Tributário e Sucessório. Saraiva:
São Paulo, 2009. p. 22.
44
PADRO, Roberta Nioc; DONAGGIO, Angela Rita Franco. Ibidem. p. 23
3.2 Acordo de Bloqueio
45
“Portanto, os acordos de acionistas, segundo esse entendimento, podem estabelecer limitações à circulação das ações
vinculadas, desde que observado o disposto no artigo 36. De acordo com esse entendimento seriam inválidas as
cláusulas que submetem a alienação das ações ao prévio consentimento dos demais acionistas ou que vedam a
alienação, ainda que temporariamente. Outros, a nosso ver, com melhores razões, entendem que o artigo 36 da LSA
veda a exclusão da negociabilidade das ações nos estatutos sociais porque é disposição incompatível com uma
característica essencial do tipo societário, não podendo por isso constituir norma geral interna da organização da
companhia. Entretanto, esse preceito legal, dirigido ao estatuto, não pode aplicar-se a contratos entre acionistas, que têm
por objeto a disposição de bens de seus patrimônios individuais (as ações), sem interferir na organização da companhia
ou no contrato social”. LOBO, Carlos Augusto da Silveira. Acordo de Acionistas. In: FILHO LAMY, Alfredo.
PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das Companhias. 2 ed., atual e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017. P.
338-339. 1680 p.
46
A Lei de Sociedades por Ações, em seus Artigos 109, IV e 171, atribui aos sócios o direito de preferência na
subscrição de novas ações, na proporção das ações que possuem na companhia, mas não concede direito de preferência
no caso de compra e venda de ações já existentes, razão pela qual recomenda-se sua inserção no acordo de acionistas.
a aquisição parcial das ações no exercício direito de preferência cause esvaziamento da oferta do
terceiro e cause prejuízos ao acionista que as ofertou); definição da forma de exercício do direito de
preferência pelos acionistas signatários cosmo, por exemplo, fixação de prioridade sucessiva ou
previsão de exercício da preferência na proporção das respectivas participações dos acionistas no
capital social da companhia, desconsiderando a participação do acionista que oferta suas ações (já
que uma regra pré-definida pode priorizar a manutenção do equilíbrio do quadro societário original e
evitar corrida ou conflitos entre os acionistas para a aquisição das ações).
Outro elemento importante nesta cláusula é o estabelecimento de prazo para o exercício do
direito de preferência pelos demais acionistas e o estabelecimento de uma forma para comunicação
da oferta e para a realização do direito de preferência (como, por exemplo, notificação por escrito por
carta registrada). Também é comum e recomendável formalizar que a ausência de resposta no prazo
por parte de qualquer acionista corresponde a renúncia ao direito de preferência, podendo os demais
acionistas exercer o direito de preferência em relação às ações não adquiridas e prever um prazo limite
para que o acionista que recebeu a oferta consume a venda caso os demais acionistas não tenham
exercido o direito de preferência.
Enfim, conforme se traduz de seus elementos, o grande objetivo da cláusula de preferência
é “manter a proporcionalidade das quotas entre sócios signatários que remanescem na sociedade após
a saída daquele que deseja vender as suas quotas”47. Cumpre destacar que é cada vez mais frequente
a previsão deste tipo de cláusula no próprio estatuto ou contrato social das empresas, ainda que de
forma menos específica do que no contrato de acionistas.
Outra tipo de acordo de bloqueio é a denominada cláusula de lock up, por meio da qual os
signatário do acordo de acionistas estabelecem um período mínimo no qual suas ações não podem ser
vendidas ou oneradas. A razão para os acionistas estabelecerem este tipo de cláusula são variadas,
mas geralmente se relaciona ao tempo de retorno do investimento ou à manutenção de um acionista
estratégico na empresa (seja por sua expertise na atividade da empresa, pela sua reconhecida
reputação ou pela sua importância financeira - acionista investidor). Por vezes, considerando a
realidade comercial da empresa e de seus acionistas, assim como as estratégias de curto e longo prazo
por eles traçadas, pode ser estabelecido que o lock up incide somente sobre um percentual das ações,
sendo permitida a transferência de um percentual específico das ações. Para conceder efetividade a
esta cláusula é interessante a inserção de uma penalidade ao sócio que a descumprir e a definição de
que eventual venda seria nula de pleno direito.
Por fim, é interessante que os acionistas signatários do acordo de acionistas definam
conjuntamente a aplicação ou não dos acordos de bloqueio na transferências às suas afiliadas, sendo
47
KUGLER, Herbert Morgenstern. Os acordos de sócios nas sociedades limitadas. São Paulo: Quartier Latin, 2014,
p. 176.
recomendável inserir cláusula a respeito, juntamente com a definição de afiliada e com, ao menos, a
obrigação da afiliada de aderir ao acordo de acionistas.
As cláusulas que versam sobre a compra e venda de ações costumam apresentar requisitos
pré-determinados para que aquele grupo de acionistas possa exercer este natural direito vinculado à
ação. O Acordo de Acionistas é acaba sendo um instrumento para formalização destas regras que,
pela natureza da sociedade anônima, não caberia no Estatuto Social.
Essas cláusulas de saída são especialmente importantes nas sociedades anônimas fechadas,
na qual fica mais evidenciada a vinculação pessoal entre os acionistas.
As cláusulas de saída mais recorrentes são a de Tag Along (ou Direito de Venda Conjunta)
e a de Drag Along (ou Direito de Exigir a Venda).
Por meio da cláusula de Tag Along se convenciona que caso dado acionista signatário do
acordo de acionista queira vender suas ações a terceiro, os demais acionistas terão o direito de alienar
as suas quotas pelo mesmo preço e condições. É recomendável detalhar na referida cláusula o
procedimento para exercício do Tag Along como prazo e forma de notificação do exercício deste
direito. Esta cláusula tem como principal fundamento a proteção dos direitos dos minoritários, seja
por questões econômicas, seja pela ausência de interesse em se manter em uma companhia sob
controle de um terceiro desconhecido ou sob as intempéries de uma nova realidade comercial.
Por fim deve ser relembrado que as obrigações vinculadas à cláusula de Tag Along vinculam
os acionistas signatários do acordo de acionistas, mas não tem o condão de obrigar o terceiro a
comprar mais ações do que a quantidade inicialmente proposta, podendo ser este um fator para que
este decline de sua oferta inicial. Por este motivo pode ser previsto no próprio acordo de acionistas
mecanismos para evitar que o terceiro decline da oferta, mesmo com o exercício do Tag Along pelos
acionistas, como a previsão de que o acionista titular da oferta deve reduzir proporcionalmente suas
ações ofertadas para acomodar também proporcionalmente as ações dos demais acionistas que
manifestaram o interesse em exercer o direito de venda conjunta.
Por meio da cláusula de Drag Along, por sua vez, o acionista que tenha uma proposta de
aquisição de suas ações pode obrigar os demais signatários do acordo de acionistas a efetuar a venda
de suas ações a terceiros pelo mesmo valor e condições ofertadas e aceitas por ele (por este motivo é
comum que seja estipulado previamente um preço mínimo por ação). Aqui, de forma inversa ao Tag
Along, a proteção, em regra, recai sobre o acionista majoritário. A previsão desta estirpe de ação se
justifica por questões de mercado, pois é possível que o pretenso comprador do controle da empresa,
por exemplo, não queira conviver com minoritários, condicionando a compra à aquisição de
participações menores.
Esta cláusula ainda pode ter variações menos usuais como o Drag Along Inverso através do
qual um minoritário pode obrigar o controlador a vender suas ações sob certas condições, caso o
comprador de suas ações tenha como interesse ser acionista controlador.
Ainda a respeito da compra e venda de ações há a cláusula de Call Option que convenciona
uma opção de compra das ações de um acionista em relação à outro acionista por um valor e conforme
condições pré-ajustados sempre e quando a outra parte venha formalmente a manifestar esta vontade,
em regra, depois da ocorrência de um determinado evento. A inserção deste tipo de cláusula está em
geral vinculado a tratativas comerciais decorrentes do aporte de capital da empresa ou à intenção dos
acionistas com o negócio (como, por exemplo, um sócio que entra com uma pequena quantidade de
ações e aporta seu trabalho na sociedade e outro acionista investidor majoritário, podendo ser prevista
cláusula que determine a opção de compra de parte das ações de um acionista investidor por um preço
ou forma de cálculo pré-fixado – por vezes simbólico - caso logre algumas metas corporativas com o
seu trabalho, evitando o impacto da eventual valorização das quotas pelo sucesso do negócio). A
cláusula Put Option, por sua vez, representa o exercício da opção de venda por dado acionista de suas
ações, ou seja, quando pré-estabelecido em cláusula que conforme certas condições e sob certos
critérios um acionista pode, a sua opção, obrigar o outro acionista a comprar suas ações, em geral por
um preço ou forma de cálculo pré-determinado (como, por exemplo, um acionista investidor que entra
em um negócio com o objetivo de alcançar certo lucro em determinado período e este não se
concretiza). Em ambos os caso recomenda-se que na própria cláusula seja descrito que as ações
adquiridas se vinculam ao acordo de acionistas, devendo o adquirente aderir ao instrumento em
relação a estas ações.
Por fim cumpre destacar a cláusula de buy or sell, também denominada de shot gun, aplicável
em caso de impasse (deadlock) entre os signatários de um acordo de acionistas. Assim, caso os
acionistas não consigam convergir em relação a dada matéria (que, conforme o caso, podem ser pré-
identificadas pelos acionistas), após decorrido um prazo pré-estabelecido contratualmente, será
identificado um impasse, devendo uma parte notificar a outra de sua ocorrência. Para evitar a
banalização do impasse é recomendável inserir na cláusulas meios prévios de solução de
controvérsias (como a submissão prévia da matéria que gerou o impasse a representantes dos
acionistas, para tentativa de resolução). Caso o impasse se mantenha uma parte pode apresentar a
outra notificação contendo: (i) uma oferta para a aquisição das ações detidas pelo outro acionista
envolvido no impasse; (ii) uma oferta para a venda das ações detidas pelo acionista notificante,
devendo em ambos os casos ser mantido o mesmo preço, termos e condições. A forma de início do
procedimento do impasse deve ser contratualmente previsto, e pode variar entre o primeiro que
formaliza o envio de notificação ou ser até mesmo determinado por sorteio. O outro acionista deve
decidir conforme o prazo estipulado na cláusula, acerca da compra das ações do acionista notificante
ou venda de suas ações. Caso o acionista notificado permaneça silente, será repassado ao acionista
notificante o direito de implementar a decisão que causou o impasse.
5. EXECUÇÃO ESPECÍFICA
Conforme dispõe o § 3º do Artigo 118 da Lei das Sociedades por Ações, os acionistas podem
promover a execução específica das obrigações assumidas no Acordo de Acionistas, nas condições
ali previstas. E quanto a este ponto não há discussão na doutrina e na jurisprudência.
Isso significa que os acionistas podem forçar que o acionista que descumpra alguma
obrigação prevista no acordo de acionistas realize exatamente o que foi pactuado (como um voto em
determinado sentido) ao invés de uma compensação financeira por perdas e danos correspondentes.
Este ponto é de extrema relevância para a companhia e para os acionistas porque muitas das
obrigações societárias ou relacionadas ao negócio não são passíveis de mensuração financeira (ou seu
impacto financeiro é tão alto que a conversão em perdas e danos não compensa na prática).
A discussão reside, contudo se o Acordo de Acionistas é ou não considerado um título
executivo. Para Celso Barbi Filho, por exemplo, não seria tanta pela ausência de liquidez quanto pela
dependência de uma sentença para suprir a vontade do sócio não manifestada48. Já para Fábio Ulhôa
haveria a necessidade de um exame casuístico do Acordo de Acionistas, eis que em havendo
assinatura dos acionistas e das duas testemunhas, estaria preenchido o requisito formal do Artigo 585,
inciso II do CPC, e estando as cláusulas claramente redigidas, sem condições resolutivas e
suspensivas, estaria cumprido o requisito da liquidez, na forma do Artigo 586 do CPC49. Assim se
posiciona Marcelo Bertoldi:
É evidente que a eventual necessidade de interpretação de cláusulas contratuais não pode ser
óbice à caracterização de determinado contrato como título executivo extrajudicial. Ora, se
assim fosse, jamais poder-se-ia conceber contratos, devidamente firmados por duas
testemunhas, como títulos executivos, pois, invariavelmente, esses contratos demandariam a
interpretação de suas cláusulas, mesmo que mediante operação mental de menor
complexidade, mas sempre haveria, mesmo que em grau mínimo, a interpretação das
cláusulas contratuais50.
48
BARBI FILHO, Celso apud COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 10. ed., São Paulo: Saraiva,
2006. v. 03. p. 330
49
COELHO, Fábio Ulhoa. Ibidem. p. 330-331
50
BERTOLDI, Marcelo M. Acordo de Acionistas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 160.
verificada pela atuação do presidente da assembleia ou órgão colegiado de não computar voto em
desacordo com acordo de acionistas arquivado, conforme já tratado neste artigo. Já o §9º dispõe sobre
a possibilidade de um acionista prejudicado votar no lugar de dado acionista vinculado a um direito
de voto que se absteve de votar ou não compareceu à assembleia ou a reunião. O exercício do direito
previsto neste artigo tem o condão evitar que a parte prejudicada tenha que iniciar um moroso
processo judicial ou um custoso processo arbitral para reivindicar seus direitos. De forma oposta, gera
uma espécie de inversão de ônus da prova, conforme explicado por Modesto Carvalhosa:
4. DO ACORDO DE QUOTISTAS
51
CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 2., p.
519.
52
Art. 1.053, parágrafo único do Código Civil: “O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade
limitada pelas normas da sociedade anônima”.
53
Isto porque juristas como Erick Corvo questionam a admissibilidade do acordo de quotistas em empresas que não
prevejam em seu contrato social a aplicação supletiva da Lei das Sociedades por Ações. CORVO, Erick apud
ADAMEK, Marcelo Vieira von. Temas de direito societário e empresarial contemporâneos. São Paulo: Malheiros,
2011, p. 91-92.
superiores54 e de manifestação de renomados doutrinadores, como Modesto Carvalhosa que assim se
posicionou:
Por outro lado, são plenamente aplicáveis às sociedades limitadas as regras da sociedade
anônima no que respeita, sobretudo, à estrutura organizacional, aos direitos, deveres e
responsabilidades dos administradores – por exemplo, as regras de organização e
funcionamento dos órgãos de administração – bem como aquelas que regem os pactos
parassociais, como o acordo de acionistas55.
Um dos principais motivos que leva os quotistas a optarem pela elaboração do acordo de
quotista diz respeito à alteração dos quóruns de deliberação previstos em lei (quando e no limite
permitido por lei). Isto porque “as modificações trazidas pelo Código Civil de 2002, principalmente
no sentido de quóruns cogentes, e altíssimos, que geram novas possibilidades de impasses nas
deliberações em Reunião ou Assembleia de cotistas”56
De forma similar ao acordo de acionistas, a oponibilidade do Acordo de Quotista a terceiros
está condicionada à publicidade que é concedido ao mesmo. Assim se os quotistas priorizarem a
eficácia a terceiros à eventual sigilo ao documento é recomendável que o mesmo seja citado no
Contrato Social da companhia ou, até mesmo, arquivado na Junta Comercial da sede da companhia.
Para ser oponível à própria Sociedade é recomendável que a mesma o assine como interveniente-
anuente57.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
54
Assim já se posicionou a jurisprudência do STJ em Decisão Monocrática que expressamente estabeleceu no acórdão
que “"1.ª APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO QUE
VISA ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE A FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS.
INTERESSE RECURSAL. 2.ª APELAÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SOCIEDADE LIMITADA.
APLICAÇÃO SUPLETIVA DA LEI. 6.404/76. POSSIBILIDADE. ACORDO DE QUOTISTAS. CONDIÇÃO
SUSPENSIVA NÃO
IMPLEMENTADA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL NÃO CONFIGURADO. MULTA INDEVIDA.
EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. (...) Uma vez aplicável supletivamente á sociedade limitada as normas da sociedade
anônima, o 'Acordo de Quotistas da EPC – Engenharia Projeto Consultoria Ltda.', não configura contrato atípico,
tendo em vista que a ele se aplicam as normas previstas na Lei das S/A., que regulam o acordo de acionistas.
Destarte, o fato da sociedade empresária EPC - Engenharia Projeto Consultoria Ltda., ter se transformado em uma
sociedade anônima posteriormente, não anula o acordo de quotistas firmado entre os sócios (atualmente acionistas), que
se mantiveram obrigados entre si, já que não firmaram distrato. (...).BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo em
Recurso Especial nº 738.706 - MG (2015/0161665-8). Rel. Min. Paulo Tarso Sanseverino. Brasília, 1º de abril de 2016.
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CARVALHOSA, Modesto. Comentário à Lei de Sociedades Anônimas. 4 ed. vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2003. p.
45. 564 p.
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PADRO, Roberta Nioc; DONAGGIO, Angela Rita Franco. Sociedade Limitada versus Sociedade por Ações:
algumas características atualmente determinantes na estratégia societária de se optar por um dos tipos. Acordos de
Acionistas e de cotistas: cláusulas relevantes. In: PADRO, Roberta Nioc; PEIXOTO, Daniel Monteiro; SANTI, Eurico
Marcos Diniz (Coords.). Direito Societário: Estratégias Societárias, Planejamento Tributário e Sucessório. Saraiva:
São Paulo, 2009. p. 29. 473 p.
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PADRO, Roberta Nioc; DONAGGIO, Angela Rita Franco. Ibidem. p. 29 -31
Como disposto ao longo do trabalho, apesar de algumas controvérsias pontuais, não há
dúvidas sobre a eficácia prática e jurídica do acordo de acionistas (e, de igual maneira do acordo de
quotista), inclusive perante a companhia e terceiros, desde que cumpridos os requisitos legais.
É instrumento de pleno e crescente uso corporativo para fins de regulamentar relações
especificas entre todos ou entre um grupo de acionistas, perfazendo um mecanismo eficaz para
harmonizar e conceder segurança às relações sociais ao longo dos anos.
Pode ser descrito, inclusive, como um meio preventivo de futuras controvérsias entre
acionistas eis que vai além do entusiasmo inicial de um novo negócio, onde todos parecem facilmente
convergir suas vontades, para perpetuar em instrumento formal as regras iniciais do negócio sobre
questões futuras que não caberiam no Estatuto Social.
Cumpre ressaltar que não é inerente ao perfil do empreendedor pensar preventivamente em
problemas que podem surgir de um novo e promissor negócio, por isso é importante que os acionistas
se cerquem de profissionais especializados, com experiência no universo societário e na formatação
de acordos de acionistas para, se distanciado das emoções e otimismo que circundam aqueles
diretamente envolvidos o novo negócio, compreender o perfil do negócio e de seus acionistas para
formatar um acordo de acionistas que venha a efetivamente minimizar os riscos do negócio,
protegendo os sócios e preservando a continuidade da empresa.
A legislação brasileira, de forma positiva, veio a oficializar através da Lei 6404/76 a
aceitação jurídica do acordo de acionistas, convalidando relação já estruturada na prática comercial.
Dentre as matérias autorizadas no artigo 118 da Lei de Sociedade por Ações (compra e venda
de ações, preferência em adquirir ações, exercício do direito a voto, ou do poder de controle) há uma
série de cláusulas que costumam ser inseridas no acordo de acionistas (tais como direito de
preferência, venda ou compra conjunta, lock up, etc.), cada uma delas com uma série de variações a
serem previstas conforme a realidade negocial, considerando os aspectos operacionais e comerciais
que envolveram a constituição da empresa e a intenção futura das partes para aquele negócio
específico.
Assim, de forma orientada e conforme a realidade da empresa e dos acionistas, é
recomendado a implementação de acordo paralelos ao Estatuto Social, com destaque ao acordo de
acionista (e de forma similar o acordo de quotista) como mecanismo de harmonizar a relação entre
os acionistas acerca das matérias que, por sua especificidade ou sigilo, não são tratadas no Estatuto
Social.
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