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Ong Pr 1893 ,

- SEGREDOS

MAGIA BRANCA
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E E des CL
Apel

GT
SEGREDOS

MAGIA BRANCA
CONTENDO,

UM GRANDE NUMERO DE SORTES


DE CARTAS, ESCAMOTAGEM, PHYSICA DIVERTIDA,
CHIMICA RECREATIVA, MECANICA, ETC.

TRADUZIDAS E COMPILADAS

Para agradavel passatempo nas sociedades


POR

J Guroelle Aoife

NUMEROSAS FIGURAS

RIO DE JANEIRO

“ Em casa dos Editores-Proprietarios


EDUARDO & HENRIQUE LAEMMERT
66, Rua do Ouvidor, 66

1873
A

SEU IRMÃO E AMIGO

v João Curvelo dfcila laciel

DEDICA

O AUTOR.
PREFACIO

Instigado por alguns amigos, resolvemos dar


à luz da publicidade a presente obrinha, que
offerecemos às pessoas que applaudem os pro-
digios realizados pela magia simulada.
Depois de termos lido as obras de varios au-
tores que até hoje têm escripto sobre semelhante
materia, . vertemos e coordenamos aquellas de
suas sorles que julgamos de maior effeito e de
mais facil execução, e as dividimos em quatro
capitulos, pela seguinte ordem:
O primeiro capitulo contém sortes que, sem
instrumento algum, podem facilmente ser com-
prehendidas e executadas.
O segundo contém, entre outras ligeirezas, o
simples, interessante e sempre applaudido jogo
dos covilhetes (jeu des gobelets), com vinte e um
passes dos mais lindos.
O terceiro contém, não só os principios neé
cessarios para a manobra das cartas, mas tambem
dezenove sortes das mais lindas e faceis.
XII

espectador vendo sempre os mesmos effeitos,


posto que pertenção a differentes causas, não sa-
erá da, realidade.
6.º Quando empregardes qualquer destes meios,
procurai insinuar no espirito do espectador, na-
turalmente e sem affectação da vossa parte, que
outros são os meios de que vos servis. Trata-
se, por exemplo, de uma sorte de combinação,
fazei suppôr que depende da agilidade dos dedos,
e, se, ao contrario, fôr uma sorte de ligeireza,
operai com negligencia.
7.º Se trabalhardes em uma roda de pessoas ,
tao descuidosas, que nem ao trabalho de reflec-
tir se dêem, Sy havera risco algum em exhibir
indistinctamente sortes novas e antigas, ou sim-
ples, e complicadas; mas si se tratar de divertir
uma assembléa illustrada, resguardai-vos de apre-
sentar, 'como desconhecidas, sortes já ampliadas
em livros que disto tratão.
8.º Se nada puderdes inventar quanto ao es-
sencial, sêde ao menos inventor quanto à fórma,
renovando sortes antigas por meio de circum-
stancias novas.
9.º Quando executardes qualquer sorte, evitai
sempre de vos attribuir um poder maravilhoso
e sobrenatural; o extraordinario, ainda que na-
tural, será tão agradavel para a classe illustrada,
como o maravilhoso para o vulgo.
10. Nunca executeis uma sorte sem terdes de
antemão preparado respostas para os argumentos
que poderão apresentar-vos.
11. Aproveitai prudentemente todos os acci-
dentes e differentes gráos de credulidade que, por
assim dizer, cahirem nas vossas mãos. Os acci-
dentes favoraveis apresentão-se muitas vezes;
convem saber aproveita-los.
—cesoso
CAPITULO I.

DIFERENTES SORTES DE FACIL


EXECUÇÃO.

ART. I

O bouquet magico.

Mandai fazer uma quantidade determinada de


flôres de panno branco, taes como rosas, jun-
quilhos, cravos e outras que julgardes a propo-
sito, com suas respectivas folhas que deverão ser
de pergaminho branco.
Obtido este mister, procedei do seguinte modo:
Embebei as rosas em tinta sympathica encar-
nada, os junquilhos em tinta sympathica ama-
rella, os cravos em tinta sympathica rôxa e as
folhas em tinta sympathica verde.
Ms. 1
my
O) os
Depois que deixardes seccar, ajuntai essas flôres
e folhas, e formai diversos bouquets, que pare-
cerãó brancos, e podereis servir-vos delles logo
ou alguns dias depois de osterdes assim preparado.
Se empapardes um destes bouquets em um vaso
de agua composta com o succo de violetas ou
de amôres perfeitos, todas as differentes flôres
e folhas se colorirãô immediatamente, conforme
as differentes especies de licôres sympathicos em
que tenhão sido de antemão ensopadas.
Tomai então um destes bouquets, e, depois de
fazerdes vêr que é perfeitamente branco, mergu-
lhai-o no vaso que contenha do licor vivificante,
e, retirando-o immediatamente resultará que cada
uma das differentes flôóres e folhas ter-se-hão re-
vestido das côres que lhes são peculiares.

Tintas sympathicas.

Encarnada. —Ajuntai espirito de nitro em oito


ou dez tantos de agua.
Amarela. — Embebei, por espaço de oito a dez
dias, cravos de defunto em vinagre branco dis-
tillado; coai depois o licor e guardai-o em uma
garrafa bem rolhada,
Rôxa. — Espremei limões azedos, cujo sumo
engarrafareis.
Verde. — Dissolvei, em uma certa. quantidade
de agua, sal de tartaro bem claro e o mais secco
que encontrardes.
Tudo quanto se desenhar ou escrever, quer em
papel quer em panno, com estas differentes tintas,
tomará a competente côr, logo que se passar por
sobre a escripta ou desenho.
Licér vivificante.

Modo de o preparar. — Tomai uma quantidade


determinada de violetas, amôres perfeitos ou rai-
nhas-margaridas, pisai-as em um gral e ajuntai
um pouco de agua; depois coai por meio de um
panno, e guardai 0 liquido em um frasco cón-
venientemente tapado.

ART. II.

O relogio obediente.

Occultai na mão esquerda um pedacinho de


iman, e com a direita tomai um relogio que
esteja trabalhando.
Quando quizerdes provar o quanto o relogio é
obediente, approximai-o do ouvido do especta-
dor para o convencer de que elle está traba-
lhando com regularidade.
Dizei depois que 4 vossa ordem o relogio vai
immediatamente parar; e passai-o disfarçada-
mente para a mão esquerda, onde tendes o iman
escondido.
Se com essa mão novamente o approximardes
do ouvido do espectador, elle se certificará de
que o relogio deixou de trabalhar.
Finalmente, passai-o para a mão direita
—4—
sacudindo-a ligeiramente, e ordenai-lhe que con-
tinue a trabalhar; a vossa ordem será immedia-
tamente cumprida.
Nota.—
O contacto do iman impede subitamente
o movimento do relogio.

ART. II.

A côr inconstante.

Despejai um pouco de alcali volatil dentro de


um frasco no qual tenhais dissolvido limalha de
cobre.
Esta composição produzirá um licôr azul.
Apresentai o frasco a um dos espectadores para
o rolhar, e neste acto dirigi-lhe alguns ditos en-
graçados que julgardes a proposito.
Depois não será sem grande admiração dos cir-
cumstantes, que a côr azul do licôr desappare-
cerá, tão depressa quanto o frasco fôr rolhado.
Finalmente podereis fazer reapparecer a mesma
côr se tirardes fóra a rolha, o que não parecerá
menos sorprendente.

ART. IV.

Gabriel e Lusbel.

Preparai dous bustos de cartão, um figurando


Gabriel, o anjo bom, e outro Lusbel, o anjo
mão.
spa ADspe

Na boca do primeiro occultai um pedacinho


de phosphoro, e na do segundo um pouco de pol-
vora.
Se approximardes uma véla acesa da boca da
figura que representa Lusbel, ella apagar-se-ha
com a explosão da polvora; e se depois a ap-
proximardes da boca da que representa Gabriel,
o phosphoro acendê-la-ha immediatamente.

ART. V.

Experiencia physica para tirar uma moeda de


dentro de um cópo d'agua sem molhar a mão.

Enchei um copo d'agua até tres centimetros


da borda.
Pedi depois uma moeda e mettei-a dentro desse
mesmo vaso. a
Dirigi-vos então à assembléa, dizendo que vos
propondes a tirar a moeda do fundo do copo sem
molhardes a mão.
Como nenhum dos assistentes será capaz de
fazer outro tanto, encaminhai-vos para a mesa
onde estiver o cópo, lançai, sem que o vejão, um
pouco de licopodium (*) sobre a agua, e assim ti-
rareis a moeda pelo modo à que vos compromet-
testes.

(") Este pé se encontra nas boticas.


=6 =

ART. VI.

O ovo dansante.
Extrahi, por meio de um buraquinho que pra-
ticareis com um alfinete, o conteudo de um ovo.
Tapai depois esse orificto com cêra, e pendei-
lhe um fio de retroz preto do comprimento de
oitenta centimetros, pouco mais ou menos, em
cuja extremidade opposta ao ovo dareis um pe-
queno laço.
Collocai este ovo assim preparado, e mais dous
ou tres cheios, dentro de um prato que devereis
deixar sobre uma mesa, desviada daquella onde
trabalhardes.
Quando quizerdes executar esta sorte ide buscar
o prato, é aproveitai da occasião para prenderdes
o laço da extremidade do fio a um dos botões do
vosso collete.
Ponde depois o prato sobre a mesa e tomai uma
bengala.
Se recuardes o corpo ou adiantardes os braços,
o ovo virá collocar-se naturalmente sobre ale,
e então o fareis dansar em redor, conforme os
movimentos que fizerdes.

ART. VII.

O oraculo magico.
Escrevei em varias tiras de papel differentes
perguntas com tinta preta ordinaria, e as res-
postas com tinta sympathica, como adiante acha-
reis prescripto.
—TT —

Será bom prevenir-vos tambem de tiras com


a mesma pergunta, porém com respostas diver-
sas, para que não cause suspeitas.
Muni-vos igualmente dé uma caixinha que de-
nominareis o antro da Sybilla, e cuja tampa
possa conter uma chapinha de ferro que deveis
aquecer sufficientemente, de sorte que o interior
dessa -caixinha possa ficar acalentado até um
certo grão de calor conveniente.
Quando mandardes escolher as perguntas, tomai
essas mesmas tiras, e dizei que ides manda-las á
Sybilla para terem resposta, e collocai-as dentro
da caixa.
Passados alguns minutos retirai-as, porque as
respostas já alli se acharéo em caracteres bem
visiveis.
Nota. — Não deixeis as tiras por muito tempo
nas mãos do espectador, porque elle testemu-
nharia que os caracteres das respostas irião des-
apparecendo, & medida que o papel fosse per-
dendo o calor.

Tinta sympathiea.

Modo de a preparar.
— Fervei a fogo lento
um pouco de azul de esmalte em agua régia;
estendei depois esta dissolução, que é muito caus-
tica, com agua commum.
Tudo quanto escreverdes com esta tinta será
invisivel; mas se expuzerdes a escripta a um
calor temperado, apparecerá com uma linda côr
verde, e, se depois a retirardes, tornar-se-ha outra.
vez invisivel, á proporção que o papel fôr res-
friando.
—s—

ART. VIII.

Subtracção agradavel.
Traz-se uma duzia de bougquets para o centro
de uma reunião de treze senhoras. O dono da
casa não se importa sacrificar uma; mas o que
não quer é contribuir para esse desgosto.
Communica, pois, que o acaso é que ha-de deci-
dir qual dentre ellas ficará sem bouquet; e manda
cada uma tomar o lugar que bem lhe approuver,
comtanto que formem um circulo.
Eis aqui como se deve operar:
Toma-se uma das damas por ponto de partida
e começa-se a contar dessa até à nona, que se
exclue da roda, e a quem se dá um bouquet.
Continua-se a proceder do mesmo modo para
a distribuicao dos outros bouquets, principiando
sempre a contar daquella que se seguir 4 excluida.
Se esta operação fôr bem executada vér-se-ha
que a,undecima, a contar daquella por onde se
tiver principiado, será a ultima, e portanto a
que ficará sem bouquet.
Se forem onze os bouquets, e em numero de
doze as damas, deve-se principiar por aquella
que se quizer excluir.

ART. IX.
Adivinhar os pontos de dous dados langados sobre
a mesa.

_Dizei à pessoa que tiver lançado os dados, que


ajunte cinco pontos ao dobro do numero que por
sorte tiver cabido a um dos dados e multiplique
ais
O) qm

depois o total pelo mesmo numero cinco. Mandai


juntar a este producto o numero dos pontos do
outro dado, e pedi-lhe em seguida a somma de
todos estes pontos; subtrahi-lhe vinte e cinco,
e restaráo dous algarismos, dos quaes o que de-
signar as dezenas indicará os pontos do primeiro
dado, e o gue representar as unidades, indicara
os pontos do segundo.

EXEMPLO.

Sejão os pontos dos dados :—2 e 6—; dos quaes


o dobro do primeiro sera . . . . . . 24
Ajuntai-lhe e u

klacla
Sommará .
Que multiplicado por .

Produzirá .
Ajuntai o numero dos pontos do 2º dado. Slo

A somma será.
Subtrahidos.
BIR

Restará

ART. X.

A mesma sorte com tres dados.


Mandai dobrar os pontos do primeiro dado à
esquerda e juntar cinco; multiplicar depois o
todo por cinco e ajuntar a este producto o
— 10 —

numero dos pontos do dado do meio; multipli-


tado que seja este todo por dez, mandai ajuntar
ao producto os pontos do terceiro dado.
Pedi depois o total de toda a operaçãoe sub-
trahi 250. O restante designaré os pontos dos
tres dados.

EXEMPLO.

Sejão os pontos dos dados —2, 6 e 4— que


trata-se de adivinhar pelo seguinte calculo:

Ordem e pontos 4, 6, 2.
Duplo do 1º dado. 8
Numero para ajuntar . 5
Total. 13
Que multiplicado por. 5
Dão producto de. +... 65
Numero dos pontos do 2º dado 6
Total. a
Que multiplicado por . +... 2... 10
Da oproductode . ....... . 710
Que junto aos pontosdo3° dado. . . . 2
Somma. . . 712
Esubtrahidos. . . . 00. 250
Resta . . 462
—uU-
Os algarismos restantes: — 4, 6, 2— designão
os pontos de cada dado, e a ordem pela qual
devem achar-se dispostos.

ART. XI.

A tavernoira e os freguezes.

Tomai um baralho e collocai secretamente um


dos quatro valetes em cima, tirai os tres restan-
tes e mais uma dama, e estendei sobre a vossa
mesa.
Mostrai os tres valetes e dizei:
— Aqui estão tres individuos que entrárão em
uma venda para beber, mas não têm nem um real
ara pagar a despeza; estão se ajustando para
ugirem sem pagar à taverneira que aqui está
(mostrai a dama). Para melhor realisarem o seu
intento disserão a esta que fosse buscar mais vi-
nho à adega, e neste interim derão ás de Villa-
Diogo, cada qual para seu lado.
(Em quanto assim fallardes collocai um valete
sobre o baralho, outro por baixo e outro no
meio.) .
« A taverneira, voltando e não os encontrando
mais, deitou-se a correr após elles (pondé a dama
em cima do baralho), e por fim agarrou-os. »
Mandai partir as cartas e fazei vêr que a dama
acha-se com os tres valetes.
—~w—

ART. XII.

Adivinhar até vinte cartas pensadas por varios


espectadores.

Tomai vinte cartas de um baralho, estendei-as


sobre a vossa mesa aos pares e pedi aos espec-
tadores que cada qual guarde de memoria duas
cartas, isto .é, duas de cada um dos dez pares.
Depois reuni todos os montes, sem que des-
mancheis a ordem em que elles estiverem, e
disponde as cartas sobre a mesa, pela regra destas
quatro palavras:
MUTUS
123 45
DEODIT.
6 7 8 9 10
NOMEN
1 12 1314 15
coCcIS
16 17 18 19: 20
“ &
Collocai o primeiro macete nos numeros 1 e 13,
o segundo nos numeros 2 4, o terceiro nos nu-
meros 3 e 10, e assim por diante, segundo a ordem
das duas letras iguaes.
Quando vos declararem que as duas cartas pen-
sadas estão, verbi gratia, na segunda fileira, fa-
cilmente conhecereis que são as dos numeros 6 e
8, onde se achão dous D D.
Se vos indicarem a 2º e 4 fileiras, está bem
— 13 —

de vêr que as cartas pensadas serão as dos nu-


meros 9 e 19, attendendo a que estas quatro pa-
lavras: Mutus, dedit, nomen é cocis compõem-se
de vinte letras, cada uma das quaes achão-se em
duplicata.

ART. XIII.

Escrever que cartas uma pessoa ha de escolher


antes de tomar uma resolução.

Formai (sem que o percebão) dous montes de


cartas, 0 primeiro deve conter dous ou tres setes;
o segundo só sete cartas, que devem ser figuras.
Pedi tinta e penna e escrevei as seguintes pa-
lavras: os dos setes em uma folha de papel que
deveis pô-la em um lugar bem visivel do espe-
ctador e com os caracteres voltados para baixo.
Então dirigi-vos a uma pessoa e dizei-lhe que
escolha um dos dous montes.
Qualquer que seja a escolha será sempre favo-
ravel à vossa prophecia.
Se, por exemplo, escolherem o macete onde
estão os setes, mostrai o papel em que escre-
vestes os dos setes; e se o monte escolhido fôr
o menor, mandai verifica-lo, por que encontrarão
só sete cartas.
Nota. —O0—s— final da palavra setes deve ser
escripto de modo que possa passar, em caso de
necessidade, por uma PERNA, embora extrava-
gante, do —e — que o precede.
-H-—

ART. XIV.

A garrafa prodigiosa.

Mandai fazer uma garrafa de folha de Flandres,


com um pequeno repartimento cylindrico que, par-
tindo do fundo, chegue até ao gargalo.
No fundo deste repartimento abri um furo que
venha a ter communicação com outro que prati-
careis na vossa mesa.
Quando vos dispuzerdes a executar esta sorte
sorprendente, enchei a garrafa de vinho, e depois
de vos servirdes de um pouco desse licor, collo-
cai-a sobre a mesa no mesmo lugar onde houver
o furo, afim de que o vosso ajudante introduza
occultamente uma mechasinha de polvora.
Depois largareis fogo, e então a labareda pa-
recerá sahir do interior da garrafa; e uma vez
extincta, podereis servir-vos do resto do vinho.
É esta uma sorte de mui lindo efeito, quando
bem executada.

ART. XV.

O cofre magico.

: Mandai fazer uma caixinha que se abra por


dous lados e cujo centro, dividido por uma ta-
boinha pregada com bastante justeza, possa for-
mar 0 fundo commum destes dous compartimentos.
Antes de dardes execução a esta sorte, deveis
—-—
de antemão depositar dous ou tres passarinhos
vivos em um dos ditos compartimentos.
Dirigindo-vos depois a uma senhora, offerecei-
lhe uma flôr, e convidai-a em seguida a collo-
ca-la dentro do cofre, que deveis abrir do lado
que estiver vazio. .
Concluido isso, virai o cofre dissimuladamente
e collocando-o sobre a vossa mesa, dizei à re-
ferida senhora que transformastes a flôr em va-
rios passarinhos, e pedi-lhe para, que abra o cofre
com suas proprias mãos.
Então não será sem geral admiração que os
passarinhos, apanhando-se em liberdade, vôem
por toda a sala.
Nota. — É preciso que as aberturas do cofre
fiquem bem disfarçadas, afim de que o especta-
dor não perceba o artifício.

ART. XVI.

Adivinhar quem, d'entre varias pessoas, escondeu


um annel, e em que mão, dedo e phalange se
acha elle.

Mandai dobrar por alguem o numero do lugar


occupado pela pessoa que tiver o anel e accres-
centar 5 a esse numero.
Mandai multiplicar essa somma por 5 e jun-
tar-lhe 10.
Mandai ajuntar 1 a este ultimo numero, se o
annel estiver na mão direita; e 2, se estiver na
mão esquerda, e multiplicar o todo por 10.
— 16—
Mandai ajuntar a este producto o numero do
dedo, isto é 1 para o pollegar, 2 para o index e
assim por diante, e multiplicar o todo por 10.
Mandai ajuntar ainda o numero da phalange e
mais 35.
Pedi depois esta ultima somma, e tirai-lhe 3,535 ;
a restante achar-se-ha composta de quatro alga-
rismos, dos quaes o 1º indicará o lugar em que
estiver a pessoa; o 2º a mão direita ou a esquerda ;
o 3º, 0 dedo; o 4º, a phalange.
Exemplo. —Supponhamos que a terceira pessoa
de uma fileira collocou o annel na primeira pha-
lange do dedo annular da mão esquerda:
Duplo do numero occupado pela 3: pessoa . 6
Numero
a accrescentar . . o. 5

Vem ao total . ul
Que multiplicado por. 5
Vem ao producto. 55
Ao qual ajuntareis E. e 10
E o numero da mão esquerda. 2
Vem ao total . 67
Que multiplicado de novo por. 10
Vem ao producto . . 670
Juntando-se o numero do annular. . .. 4
Vem ao total. . . 674
Que multiplicado por. . cc... 10

Vem ao producto . . 6,740


— 17 —
Juntando-se o numero da phalanges: E 1
Emais. . co. sm é id
Achar-se-ha no total 6,776
Do qual subtrahindo-se. . . . . . . 3,535

Restaré. . . . . 3,241
Logo o 3 designará a 3º pessoa o 2a mão
esquerda, o 4 o dedo annular e o 1 a primeira
phalange.

ART. XVII.

A garrafa infernal.

Procurai uma garrafa preta ordinaria, bem gros-


sa e que não esteja rachada.
Lançai dentro :
Agua commum . . . .. 1/2 litro.
Limalha deferro. . . . . 95 grammas.
Oleo de vitriolo. . . . . 60 grammas.
Rolhai a garrafa, e quando sentirdes que ella
acha-se quente, destapai-a e chegai um papel
acceso ao gargalo.
Ouvir-se-ha um estrondo igual ao de um tiro
de espingarda.
Se tornardes a rolha-la podereis repetir esta
operação vinte vezes seguidas.

CAPITULO Il.
F
LIGEIREZAS DE MÃOS.

ART. I.

Jogo dos covilhetes.

O jogo dos covilhetes, tão antigo quanto sim-


ples e engenhoso, é tambem de todas as
rezas de mãos a mais divertida e a mais facil de
executar-se.
Os instrumentos e accessorios necessarios para
a sua execução são da maior simplicidade, constão
de:
1.º Tres covilhetes;
2.º Uma varinha, chamada varinha de Jacob;
3.º Seis moscadas;
4° bolas;
5.º Uma gibe igre ou uma taboinha collocada
por detras de uma mesa.
— 20 —
Os covilhetes são de folha de Flandres polida;
têm a fórma de um cone troncado, com uma
borda dupla pelo lado inferior; o lado superior
é concavo, afim de poder conter pelo menos tres
moscadas.
A varinha de Jacob é uma pequena varinha
de ébano, do comprimento de 40 centimetros,
mais ou menos, e guarnecida de marfim nas suas
extremidades ; tem por funcções: 1º, simular um
poder cabalistico; 2º, facilitar a escamotagem
das moscadas, dando motivo a fechar a mão que
as occultar; 3º, servir de continencia.
As moscadas são pequenas bolas de cortiça
ue se devem ennegrecer queimando-as um pouco
à chamma de uma véla ; estas moscadas têm um
diametro de 16 a 17 millimetros, pouco mais ou
menos.
As bolas são de clina e cobertas de pellica ou
de panno de lã. Esta cobertura ou capa é feita
de diversas côres, segundo os passes que se propõe
fazer.
A gibeciére ou como antigamente lhe chama-
vão, sacco da malicia, é fabricada de panno mais
ou menos rico, mas um pouco espesso; traz-se
ella presa à cintura por meio de dous nastros,
como um avental. A boca desta gibeciêre é bem
rasgada, e permitte às mãos sacar os objectos
ue ella contém, para as necessidades do jogo
os covilhetes.

Prin pios geraes.


A ligeireza no jogo dos covilhetes consiste:
1.º Em ‘escamotear, ou subtilmente occultar
uma moscada na mão direita;
— 2] —

2.º Em fazer apparect la na ponta dos dedos


segundo a necessidade que honver;
3.° Em introduzir secretamente uma moscada
sob um covilhete ou entre dous covilhetes;
4.º Em fazer desapparecer uma moscada collo-
cada entre dous covilhetes;
5.º Em introduzir uma moscada sob um covi~
Thete;
6.º Em executar varios disfarces que serão des
criptos um pouco mais adiante.

SI

Como se escamotea uma moscada.

Para escamotear a moscada, trata-se de fazê-la


assar da extremidade dos dedos para o interior
a mão, na nascença do médio e do annular,
onde ella fica segura entre as cartilagens destes
dous dedos (fig. 1º).

Fig. 1a
Eis o modo de operar, para fazê-la chegar a esse
destino.
—_— 2 —

Segurando a moscada entre» pollegar e o index,


como para mostra-la (fig. 2*), fechai vivamente
a mão, deixando o pollegar aberto.

Fig. 24
A moscada, por este facto, chega rolando até
à segunda phalange do index. Nada mais facil
depois, do que fazé-la rolar com o pollegar até
aos dous dedos precitados, que se abrem ligei-
ramente para facilitar a introducção da mos-
cada (fig. 1º).
Estes dous movimentos encerrão-se n'um só-
mente, e devem ser executados com extrema pres-
teza.
si

Como se faz apparecer uma moscada.

Para fazer apparecer on reapparecer uma mos-


cada na ponta dos dedos, emprega-se a manipu-
lação inversa da precedente; isto é, leva-se a
moscada com o pollegar até à extremidade dos
dedos.
Para escamotear a moscada, como para fazê-la
desapparecer, os dous movimentos empregados
para este effeito nao devem fazer mais do que
um, e devem ser executados assás vivamente
para serem invisiveis.
PE

§ 01.

Como se introduz secretamente uma moscada sob


um covilhete.

A moscada estando occulta na mao, no lugar


indicado pela fig. 1º, segura-se o covilhete pelas
duas bordas, ou para mostrar que não ha nada
debaixo delle, ou sob um outro pretexto; tor-
nando a pô-lo sobre a mesa, larga-se a moscada
que, em razão da sua posição, dirige-se para baixo
do covilhete, onde fica coberta immediatamente.
Si se sentir alguma difficuldade em largar a
moscada, poder-se-ha facilitar este movimento fe-
chando vivamente o annular.

§ Iv.

Como se faz passar uma moscada entre dous


covilhetes.

É preciso, largando-a, como no exemplo pre:


dente, imprimir-lhe um movimento de ascens
para o fundo interior do covilhete, que a mão se-
gura, e pousar promptamente o covilhete em cima
daquelle sobre o qual deseja-se que a moscada se
ache collocada.
— 24 —

§ V.

Como se faz desapparecer uma moscada collocada


entre dous covilhetes.

Quando se mette uma moscada sobre um covi-


lhete, e que se cobre com outro covilhete, eis como
se opera para fazer desapparecer essa moscada:
segurão-se os dous covilhetes com a mão esquerda,
mettendo os dedos desta mão no covilhete inferior,
e dando uma sacudidela como para lançar a moscada
para o fundo do coyilhete superior, retira-se viva-
mente o covilhete inferior; e abaixando ao mesmo
tempo o covilhete superior, a moscada se acha co-
berta e occulta.

§ VL

Como se faz apparecer uma bola sob um covilhete.

Esta apparição, que geralmente tanto sorpre-


hende, é o resultado do mais simples facto: le-
vantando-se um covilhete para mostrar um ob-
jecto que elle contém, é que, aproveitando o mo-
mento em que os olhos do espectador se fixão
sobre o objecto novamente descoberto, se appro-
xima o covilhete da borda da mesa, e se lhe introduz
com a mão esquerda uma bola que se leva vi-
vamente para o meio da mesa, sustendo-a com
o dedo minino da mão direita.
Ha casos em que, mettendo a bola no covilhete,
empurra-se ella para o interior do mesmo para
a fazer ficar no fundo. A sua elasticidade presta-se
a isso facilmente.
Para faze-la apparecer, dá-se com o covilhete
uma pequena pancada secca sobre a mes
Quer tome-se as bolas da gibeciére ou de cima da
taboinha collocada atras da mesa, deve-se, quando
se quizer introduzi-las n’um covilhete, té-las ja
promptas na mão esquerda, e fazer o menor mo-
vimento possivel com esta mão.

Disfarces.

Os disfarces são o simulacro de uma acção


que tem por fim facilitar a apparição ou des-
apparição de uma ou varias moscadas.
1.º Finge-se metter uma moscada na mão es-
eer: nando se segura a moscada na ponta
os dedos da mão direita, approxima-se esta da
mão esquerda como para depositar nella a mos-
cada. No trajecto escamotea-se a moscada, como
acima fica dito, e os dous dedos, vazios então,
chegão à mão esquerda, que se fecha como para
comprimir a moscada.
2.º Finge-se metter uma moscada sob um co-
vilhete.— O disfarce que acabámos de descre-
ver serve de preambulo a este; ou por’ outra
este segundo disfarce é a sua continuação.
Como se está na persuasão de haver uma mos-
cada na mão esquerda, pega-se n'um covilhete
com a mão direita, e colloca-se sobre a mão
esquerda, que se abre, e faz-se resvala-lo sobre a
mesa, como se nelle se arrastasse uma moscada.
3.º Finge-se metter directamente uma moscada
sob um covilhete.— Suspende-se um pouco o covi-
lhete com a mão esquerda e finge-se depositar de-
baixo, com a mão direita, a moscada que se es-
camotea no trajecto.
— 26 —

4.º Finge-se lançar a moscada através de um


covilhete, envia-la, ou faze-la passar para qual-
quer lugar, escamoteando-a,
5.º Finge-se tirar ou retirar uma moscada da
extremidade da varinha de Jacob ou de qualquer
outro lugar, levando 4 ponta dos dedos a mos-
cada occulta na mão.
6.º Finge-se fazer desapparecer moscadas col-
locadas entre dous covilhetes.—Serve-se para esse
fim de um processo que se chama correr a posta.
É esta a maneira de executa-lo:
Collocai as moscadas sobre o fundo superior do
primeiro covilhete da esquerda, e cobri este com
o segundo e o terceiro covilhetes;
Estes tres covilhetes estando uns sobre outros,
pegai nelles com a mão esquerda, e conservai-os
um pouco inclinados para a direita. Para faci-
litar esta posição inclinada, introduzi os quatro
dedos grandes no interior do covilhete de baixo,
emquanto que o pollegar fica de fora;
Tirai o primeiro covilhete de cima dos outros,
e ponde-o de parte sobre a mesa;
Tirai depois rapidamente o segundo de cima
do terceiro, para pô-lo sobre o primeiro covilhete;
mas empregando este movimento, imprimi 4s mos-
cadas uma pequena sacudidela debaixo para cima,
ue as faz ficar no fundo do segundo covilhete e que
lhes permitte passar sobre o primeiro, sem que
se perceba
Tornai a pôr ainda os tres covilhetes na mão
esquerda e depositai, como precedentemente o pri-
meiro covilhete sobre a mesa, o segundo com as
moscadas sobre este primeiro, e o terceiro sobre
o segundo covilhete.
7.º Finge-se fazer passar os covilhetes uns nos
outros. — É esta a maneira de operar : ‘
—9 —
Tomai dous covilhetes, um na mão direita,
outro na esquerda;
Lançai, ou por outra, deixai cahir, imprimindo-
lhe certa força, o primeiro covilhete no segundo ;
A pancada recebida neste covilhete o faz sol-
tar-se d'entre os dedos que o largão, para agar-
rarem o. primeiro covilhete que vem tomar na-
turalmente o lugar do segundo.
O covilhete largado cahe geralmente sobre a
mesa. Entretanto alguns prestidigitadores são
bastante habeis para apanha-lo nesta passagem,
levando vivamente a mão direita abaixo do outro.
Estes sete disfarces são as principaes regras em-
pregadas para o jogo dos covilhetes. A composi-
cão dos passes é que faz só variar o prestigio.

*
**
Para facilitar a inteligencia destes passes aos
amadores, vamos estabelecer um pequeno voca-
bulario para fazer comprehender, se o que se faz
é verdadeiro ou simulado.
1.º Cobrir um covilhete: é introduzir secreta-
mente uma moscada entre dous covilhetes que
se põe um sobre o outro;
2.º Lançar, mandar ou fazer passar a mos-
imitar uma destas acções escamoteando-a ;
3.º Levantar os covilhetes: 6 levanta-los sim-
Plesmente para fazer vêr que não ha nenhuma
moscada debaixo, ou para mostrar que ellas pas-
sárão;
4.º Metter a moscada: é fingir mettê-la, esca-
moteando-a;
5.º Retirar amoscada.: 6 retira-la realmente 4
vista dos espectadores;
— 28 —

6.º Collocar a moscada: é mettê-la effectiva-


mente no lugar indicado;
7.º Tomar a moscada: é toma-la entre os dous
dedos da mão direita, para mostra-la;
8.º Recobrir um covilhete: é cobri-lo com outro
covilhete, sem nada introduzir;
9.º Tirar uma moscada de um lugar qualquer:
é fazê-la apparecer na ponta dos dedos. (Art. 5º
dos disfarces.)
Emquanto dispondes symetricamente sobre a
mesa os covilhetes e a varinha, podeis principiar
pelo pequeno discurso seguinte:

Introdueção do jogo dos covilhetes.

Discurso comico.

« Minhas senhoras e senhores.


— Não será es-
tupendo, n'um seculo tão esclarecido como o
nosso, vêr de dia para dia propagarem-se erros
grosseiros e acha-los enraizados no espirito pu-
bilico, como leis immutaveis da natureza!
« Entre estes erros ha um que me proponho à
assignalar-vos.
« Muitos philosophos têm afirmado que um
objecto material não púde achar-se n'um lugar
-senão a um tempo; eu, senhores, sustento, ao
contrario, que todo o objecto póde achar-se em va-
rios lugares na mesma occasião, e que é igual-
mente possivel não encontra-lo em parte alguma.
« São estes pequenos apparelhos, que pela sua
fórma chamarei covilhetes, que vão servir-me para
esta importante rectificação no espirito humano.
— 99 —
« O metal de que elles se compoem é um amal-
gama de mineraes preciosos desconhecidos mesmo
dos sabios mais illustres.
« Esta composição magica que se poderia com-
are com a prata pela sua solidez, côr e sonori-
ade, tem sobre o precioso metal a vantagem
de ser tão permeavel como o ar; deste modo
todo e qualquer corpo sólido póde passar através
destes covilhetes, como através do espaço.
« Vou apresentar uma curiosa applicação deste
phenomeno, fazendo passar estes covilhetes através
uns dos outros. » (Executai o que fica descripto
no art. 7º dos disfarces, depois do que tornai a
pôr os covilhetes no seu lugar.)

Primeiro passe.

Metter uma moscada sob cada covilhete, e retira-la depois


sem levantar os covilhetes.

« Sabeis, senhores, que deu-se a esta varinha


o nome de varinha de Jacob. Porque? ignoro-o;
mas o que sei muito bem é que ella tem a vir-
tude de fornecer tantas moscadas quantas se de-
sejar. (Durante este pequeno preambulo deveis
munir-vos de uma moscada e escondê-la na mão
direita.) Por exemplo, vêde como tiro (1) esta
moscada. (Mostrai-a e ponde-a sobre a mesa.)
« Notai que não ha nada debaixo destes covilhe-
tes (mostrai-os pelo interior), e que não tenho mos-
cada alguma nas minhe mãos.)
(1) Para todas as palavras em italico neste e nos seguintes
passes, consultai o vocabulario.
— 80 —
« Tomo esta moscada, metto-a debaixo deste
primeiro covilhete (1); tiro segunda moscada da
minha varinha e colloco-a debaixo deste segundo
covilhete.
« Será bom fazer-vos notar que muitas vezes
na execução deste jogo, finge-se metter as mos-
cadas debaixo dos covilhetes. Quanto a mim,
metto-as effectivamente. (Levantai o covilhete e,
tomando a moscada, mostrai-a.) Metto-a de novo
debaixo deste mesmo covilhete. Tiro esta ter-
ceira moscada da minha varinha, e metto-a da
mesma fórma debaixo deste ultimo covilhete.
« Até aqui, meus senhores, nada mais facil
do que esta operação; mas agora vou causar-
vos admiração, segundo penso, retirando estas
mesmas moscadas através dos covilhetes.
(Batei com a varinha em cima do primeiro co-
vilhete.) Tiro esta primeira moscada, metto-a na
mão e mando-a banhar-se no Mississipi (abri
a mão esquerda).
« Tiro esta segunda moscada e mando-a para
as cordilheiras, no Paraguay. (Abri a mão.)
« Tiro esta terceira e colloco-a sobre a mesa,
« Vêde, senhores, que não existe mais nada de-
baixo destes covilhetes. »
*
Segundo passe.
Estando os covilhetes afastados, fazer passar uma moscada
de um para outro covilhete.
« Agora requeiro a vossa attenção para vêrdes
mui distinctamente esta moscada passar succes-
sivamente de um para outro covilhete.
(1) Vide art. 3 dos disfarces.
— BL —

« Tomo esta moscada e metto-a debaixo deste


covilhete C (1). Não ha nada debaixo deste B.
(Levantai-o e introduzi a moscada, $ 3º dos Prin-
cipios geraes, e pegai na varinha.) Ordeno à
moscada que está debaixo deste covilhete C, que
passe para debaixo deste B. (Conduzi a varinha de
um covilhete ao outro, como se guiasseis a mosca-
da.) Observai que ella passou effectivamente.
(Levantai o covilhete com a mão esquerda, e pegai
na moscada com a direita para mostra-la.)
«Torno a mette-la debaixo deste covilhete B.
Debaixo deste A não ha nada (levantai este ul-
timo e introduzi secretamente a moscada). Vou fa-
ze-la gas para debaixo deste covilhete A; pres-
tai toda attenção para vê-la passar (fingi que
vêdes passar, e como se lhe indicasseis o cami-
nho que ella devêra tomar). Não a visteis 2.
Não me admiro, porque eu mesmo tambem a não
vejo; no entretanto, aqui está ella debaixo deste
covilhete. (Levantai o covilhete A e collocai a,
moscada sobre a mesa.)
*
Terceiro passe.
Uma moscada posta sob um covilhete e coberto com dous
outros, sobe successivamente sobreo fundo do 1º e 2 co-
vilhetes, para descer depois sob um dos covilhetes.
« Não vos desespereis por não vêrdes passar as
moscadas de um para outro covilhete,
« Não tenho nenhuma moscada escondida nas

(1) Para mais comprehensão, designaremos por covilhete C,


o que fica á direita; B, o do centro; e A, o que fica es-
querda.
—92 —
minhas mãos (mostrai as mãos). Tomo esta mos-
cada e metto-a debaixo deste covilhete B; cubro-o
com estes dous covilhetesC e A (tomai um em cada
mão e introduzi a moscada sobre o covilhete B) ;
observai que não ha nada absolutamente entre
as minhas mãos (mostrai-as). Ordeno à moscada
que suba sobre este primeiro covilhete B. (Levantai
o segundo e terceiro covilhetes, que deveis pôr
sobre a mesa, e mostrai a moscada. sobre o pri-
meiro.)
« Torno a metter esta mesma moscada debaixo
deste mesmo covilhete B, e cubro-o do mesmo modo.
(Introduzi a moscada entre o segundo e terceiro co-
vilhetes.)
+ « Tiro a moscada que está debaixo destes tres
covilhetes, e lanço-a através do primeiro covi-
lhete. Observai que não escamoteei moscada al-
guma, nem tenho nada nas mãos (mostrai-as);
no entretanto, ella já passou. (Levantai o pri-
meiro covilhete com a mão esquerda e ponde
a moscada sobre a mesa e os covilhetes no seu
lugar.)

Quarto passe.

Uma moscada que passa através da mesa e de dous


covilhetes.

« Sem duvida, senhores, causa-vos surpresa como


eu, não tendo effectivamente senão uma moscada,
ossa, segundo já o fiz vêr, fazê-la passar para
ebaixo deste covilhete, sem o levantar ; não vos
admireis, porque eu possúo segredos ainda mais
— 83 —

maravilhosos; por exemplo, sou capaz de trans-


portar o campanario de uma para outra villa;
tenho tambem um carro volante que me póde con-
duzir a Roma em tres dias. Eu hei de mostrar-
vos todas estas cousas, tão depressa o machinismo
fique totalmente aperfeiçoado, isto daqui a alguns
seculos.
« Emquanto esperais por todos estes prodigios,
vou continuar com o divertimento :
« Metto esta moscada debaixo deste covilhe-
te A, tiro-a (mostrai-a e fingi guarda-la na mão
esquerda), cubro este covilhete com os outros B
é O (introduzi a moscada entre estes dous ulti-
mos, servindo-vos sempre da mão direita, e fin-
gindo guarda-la na esquerda) e faço passar esta
mesma moscada através da mesa e dos dous co-
vilhetes (mettei a mão esquerda: sob a mesa);
ei-la aqui.» (Levantai o primeiro covilhete.)
Emquanto pondes em ordem os covilhetes, apro-
veitai da occasião para tomardes occultamente
mais uma moscada.

Quinto passe.

Duas moscadas collocadas debaixo de dous covilhetes


fazê-las passar para debaixo do outro covilhete.
« Para continuar a divertir-vos preciso de outra
moscada; tomo esta moscada e parto-a ao meio.
(Tomai-a com a mão esquerda, e com a varinha
na direita fingi parti-la; depois tornando a pôr
a varinha sobre a mesa, conduzi a moscada em-
palmada à ponta dos dedos.)
M.S. 3
— 34 —

« Não ha nada mais facil do que multiplicar


assim as moscadas. Quando tenho precisão de
dinheiro, faço outro tanto (pondo as duas mos-
cadas sobre a mesa).
« Notai que não ha nada debaixo deste covi-
lhete A, metto esta moscada debaixo delle; não
ha nada debaixo dos outros dous (introduzi a
moscada sob o covilhete B); tomo a outra mos-
cada e metto-a debaixo deste covilhete C; agora
temos uma moscada debaixo de cada um destes
covilhetes A e C; tiro esta moscada deste C, e
lanço-a através do covilhete do meio, B; obser-
vai que ella passou. (Levantai este mesmo covi-
lhete e-introduzi-lhe a segunda moscada.) Or-
deno á que está debaixo deste outro covilhete A,
que passe para debaixo deste mesmo covilhete B.»
(Levantai o covilhete, mostrai que as moscadas
passárão, e ponde-as sobre a mesa.)

Sexto passe.

Postas duas moscadas sob um covilhete, fazê-las passar


sob os dous outros.

« Quando eu andava no collegio, o professor


sempre me dizia que era preciso saber fazer um
thema de dous modos: acabo de fazer passar
estas duas moscadas sob o covilhete do meio:
vou agora fazer sahi-las do covilhete do meio
para debaixo dos das duas extremidades oppos-
tas ; um meio nao me é mais difficil do queo
outro.
— 85 —

« Tomo estas duas moscadas e colloco-as de-


baixo deste covilhete B. (Mettei effectivamente uma
e escamoteai a outra.)
« Notai que não ha nada debaixo deste covi-
lhete A, nem debaixo deste C. (Introduzi secreta-
mente a moscada escamoteada, debaixo deste ul-
timo.)
« Ordeno a uma destas moscadas, que estão sob
o covilhete do meio, que passe para debaixo de
um destes dousA e C; ei-la que já partio. (Le-
vantai o covilhete B para mostrar que não resta
senão uma moscada, e tomando-a com a mão di-
reita mettei-a sob este mesmo covilhete.) Agora
vejamos em qual dos dous esta ella? (Levantai pri-
meiro o covilhete A, e introduzi-lhe a moscada es-
camoteada do covilheteB.) Ah! está debaixo deste
C (levantai-o). Ordeno à outra moscada que passe
para debaixo deste outro A.» (Levantai-o emostrai
que a moscada passou.)

Setimo passe.

Fazer passar tres moscadas sob um mesmo covilhete.

« Tudo isto é uma bagatella; agora vou fazer


cousa mais bonita com tres moscadas. (Ide buscar
terceira moscada, que poreis sobre a mesa, e
occultai uma outra na palma da mão.)
« Observai que não ha nada debaixo destes co-
vilhetes (levantai-os e introduzi a moscada sob
o covilhete C): tomo esta primeira moscada e
lanço-a através deste covilhete C; notai que a
— 86 —
moscada já passou (levantai o covilhete e intro-
duzi-lhe a que tendes empalmada na mão direita,;
tomo segunda moscada e lanço-a através deste
mesmo covilhete; ei-la aqui. (Levantai ainda o co-
vilhete e introduzi-lhe nova moscada :)
« Tomo a ultima moscada e faço-a passar do
mesmo modo.» (Levantai o covilhete e fazei vêr
que as tres moscadas passárão.)

Oitavo passe.

Fazer passar duas moscadas de um para outro covilhete


sem tocar em nenhum delles.

« Aqui está uma sorte que eu nunca pude com-


prehender, e que espero causará admiração. (Le-
vantai o covilhete C e tirai as moscadas que fi-
cárão debaixo delle; collocai-as sobre cada um
dos covilhetes, e levantando o covilhete C, intro-
duzi-lhe secretamente a 4 moscada.)
« Tomo esta moscada (a que está sobre o co-
vilhete B) e metto-a debaixo deste mesmó co-
vilhete. Tomo esta (a do covilhete A) e colloco-a
debaixo deste mesmo covilhete (mettei-a com a
que tendes empalmada), tomo esta ultimae lanço-a
através deste mesmo covilhete C; e para provar
que nunca vos engano, aqui está ella (levantai
0 covilhete C, e introduzi-lhe a moscada que tendes
na mão e que acabastes de escamotear.)
« Notai que temos agora uma moscada debaixo
de cada covilhete: em qual destes dous A e C
— 37 —

quereis que passe a moscada que está no do meio?


Levantai o covilhete C, que supponho ser o esco-
lhido, e fazei vêr que a moscada passou.)
« Tomo estas duas moscadas e colloco-as de-
baixo deste mesmo covilhete (não mettereis ef-
fectivamente senão uma.) Notai que não ha mais
nada debaixo deste B (levantai-o e introduzi-lhe
a moscada que vindes de escamotear; depois mos-
trai que não tendes nada nas mãos.)
« Ordeno a uma das que estão debaixo deste
covilhete C, que vá reunir-se à que está debaixo
deste A ; observai que ella já passou.» (Levantai
o covilhete A e ponde as duas moscadas sobre
elle; depois levantai o covilhete C para fazerdes
vêr que não ha mais do que uma debaixo, e pon-
de-a tambem sobre elle; não levanteis o covi-
Thete B, sob o qual se acha uma moscada.)

Nono passe.

Tres moseadas que passão successivamente para debaixo


de um mesmo covilhete.

« Tomo esta moscada (a que estã sobre o co-


vilhete C) e metto-a debaixo deste mesmo co-
vilhete ; e ordeno-lhe que passe para este do meio;
aqui está ella. (Levantando este covilhete B, in-
troduzi-lhe a moscada que acabais de escamotear.)
« Tomo esta segunda moscada (uma das duas
ue estão sobre o covilhete A), metto-a debaixo
leste mesmo covilhete O, e ordeno-lhe que passe
— 388 —

para debaixo deste B: aqui está ella. (Levantai


este mesmo covilhete, e introduzi-lhe debaixo ter-
ceira moscada.) 5
« Tomo a ultima moscada, metto-a debaixo deste
covilhete C, e ordeno-lhe que passe para este B ao
longo da mesae 4 vista desta illustrada reuniao,
(Tomai a varinha na esquerda para fingirdes in-
dicar o caminho que ella deve seguir entre estes
dous covilhetes.) Não a visteis passar? Ei-la
aqui. (Tirai-a da extremidade da varinha como se
alli estivesse.) Vamos, passe depressa.» (Lançai-a
através do covilhete B, e fazei vêr que ellas chegá-
rão todas ao seu destino e que não ha nada sob
os dous outros covilhetes ; ponde depois as tres
moscadas sobre a mesa e ficai com a outra occulta
na mão.)

Decimo passe.

Multiplicação de moscadas sem fim.


« Colloco estas tres moscadas debaixo destes
tres covilhetes:
« Retiro esta primeira moscada (a que está
sob o covilhete C) e metto-a dentro deste vaso (').
Levantai o covilhete e collocai-o ao lado da mos-
cada que acabais de descobrir, mas pondo-o sobre
amesa, introduzi-lhe a moscada que tendes occulta

(*) Este vaso é de folha de Flandres, no fundo do qual ha


uma redonda que cahe á vontade, isto é, quando se vira
de boca para baixo, por meio de um pequeno gatilho collo-
cado por baixo de uma de suas azas. Introduzi de antemão
entre o fundo e a rodouça uma duzia de moscadas.
me BD te

na mão. Então pegando na que estava debaixo do


<ovilhete, mettei-a no vaso, isto é: escamoteai-a.
Operai do mesmo modo com os dous outros co-
vilhetes, e comecai de novo a operação pelo pri-
meiro covilhete para continua-la até que tenhais
fingido tirar uma duzia de moscadas pelo menos.
Este passe se termina assim:
« Imaginais talvez, senhores, que eu me sirvo,
sempre com as mesmas moscadas; mas eu vou
provar-vos o contrario, mostrando todas as que
eu metti dentro deste vaso. »
(Virai o vaso afim de dar sahida às doze mos-
cadas nelle occultas.)
Nota. Se o vaso for bem bem feito, podeis da-lo
Bara examinar, afim de fazer persuadir o especta-
or de que não existem moscadas dentro.

Undeeimo passe.

Fazer passar uma moscada para debaixo de tres covilhetes


e através de uma mesa,

« Guardo todas estas moscadas no bolso, tomo


esta (a empalmada) e faço-a passar para de-
baixo deste covilhete C, atravessando a mesa;
tomo esta outra (mostrai a mesma) e faço-a
passar da mesma maneira para debaixo deste
B; tomo mais outra e faço-a passar para debaixo
deste ultimo covilhete A; aqui estão ellas todas
tres, »
(Levantai os covilhetes, introduzi | moscada
que tendes empalmada, debaixo do covilheteB
e collocai as outras tres sobre os outros covilhetes.)
— 40 —

Duodecimo passe.

Tirar duas moscadas através do mesmo covilhete,

Este passe não serve senão de preparação para


o outro que se segue.
« Não empregaremos agora mais que duas mos-
cadas. »
Tomai a que está sobre o covilhete C, e mettei-a
no bolso; tomai na ponta dos dedos da mão
esquerda a que está sobre o covilhete B, mos-
trai-a, e com a direita cobri ao mesmo tempo o
covilhete B com o C; tomai a moscada que está
sobre o covilhete A com a mão direita, e mos-
trando uma em cada mão, dizei:
« Agora temos só duas moscadas ; vou metté-
las debaixo deste covilhete A (effectivamente não
metteis senão uma, a que tendes na mão es-
querda), e tirar uma destas duas moscadas atra-
vés deste mesmo covilhete A. »
Mostrai a moscada e ponde-a sobre o covilhete
C, levantai o covilhete A e tomai com a mão
direita a moscada restante e ajuntai :
« Não resta senão uma moscada (mettei-a de-
baixo do dito covilhete), vou tira-la através deste
mesmo covilhete. (Levantai-o e fazei ver que ella
não está mais lá; tomai depois uma das duas
moscadas que estão à vista e meitet-a no bolso,
dizendo :) « Agora guardo esta no bolso.»
ox 4

Decimo terecire passe.

Uma moscada que passa successivamente de covilhete em


covilhete.

A vista do passe precedente, o espectador deve


estar crente de que sé dispomos de uma moscada,
ao passo que temos quatro: uma debaixo do covi-
lhete do meio B, outra debaixo do que o cobre C,
outra empalmada e outra sobre a mesa.
« Vou agora fazer uma linda sorte com uma
moscada só, +
« Esqueci-me de apresenta-la logo no principio
deste jogo; mas ainda não é tarde.
« Vou cobrir estes covilhetes (collocai o covi-
lhete A sobre os C e B); tomo esta moscada e
lanço-a através deste primeiro covilhete (levantai
o covilhete A com a mão direita, fazei notar que
a moscada passou para entre os covilhetes Ce A,
e collocai-o no seu lugar, introduzindo-lhe a mos-
cada empalmada.
« Tomo esta mesma moscada e lanço-a através
deste outro covilhete C (levantai-o, fazei vêr que
a moscada passou e, introduzindo-lhe a empal-
mada, collocai-o no seu lugar).
« Tomo ainda esta mesma moscada e lanço-a
através deste ultimo covilhete B (levantai-o, re-
tirai a moscada com a mão esquerda, collocai-a
sobre a mesa, e pondo o covilhete no seu lugar,
introduzi-lhe a moscada empalmada). »
— 42 —

Decimo quarto passe.

Fazer passar para debaixo de um covilhete as moscadas


collocadas debaixo dos dous outros e sem levanta-los,
Este passe opera-se com seis moscadas, posto
que se faça crer ao espectador que nos servimos
só com tres.
« Reassumamos a ordem do jogo que eu in-
terrompi, e continuemos a jogar com tres mos-
cadas (tirai duas do bolso e collocai-as, com à
que ficou na mesa, sobre os covilhetes).
« Tomo esta moscada (a que está sobre o co-
vilhete C) e lanço-a através deste mesmo covilhe-
te... passou (levantai-o, mostrai a moscada e intro-
duzi-lhe a empalmada).
« Tomo esta (a do covilhete B) e lanço-a, como
a outra, através deste mesmo covilhete (levantai-o
com a mão esquerda, mostrai que a moscada pas-
sou e tornai a cobri-la com o mesmo covilhete).
« Tiro esta mesma, moscada deste covilhete B
e lanço-a através deste C.... notai que ella já pas-
sou (levantai o covilhete C, Tazei vêr que ha duas
moscadas debaixo e introduzi-. lhe a empalmada).
« tomo esta moscada (a do covilhete A) e
lango-a através deste mesmo covilhete... passou
(levantai-o com a mão esquerda, mostrai a mos-
cada e tornai a cobri-la).
« Tiro esta moscada deste covilheteA e lanço-a
através deste O... passou.» (Levantai este ultimo
covilhete, mostrai as tres moscadas e introduzi-lhe
a empalmada; depois collocai todas tres sobre
a mesa.)
— 43 —

*
Deeimo quinto passe.
Tres moscadas que passão de per si através de cada
covilhete.

Collocai novamente as tres moscadas sobre os


covilhetes.
« Tomo esta moscada (a que está sobre o co-
vilhete C) e lanço-a através deste mesmo covi-
lhete... passou (levantai o covilhete retirai a
moscada, mostrai-a e introduzi-lhe a empalmada ;
collocai a outra sobre o mesmo covilhete).
« Tomo esta moscada(a do covilhete B) e lanço-a
através deste mesmo covilhete (fazei vêr que ella
passou, retirui-a e introduzi a empalmada sob
O dito covilhete, e collocai-lhea outra em cima).
« Tomo esta ultima moscada (a do covilhete A)
e lanço-a através deste mesmo covilhete .. passou
(levantai-o retirai a moscada para mostra-la e
introduzi-lhe a empalmada ; collocai a outra sobre
o dito covilhete).
« Notai, senhores, que eu não tenho mais do
que estas tres moscadas (mostrai as mãos).

Decimo sexto passe.

Tres moscadas que depois de mettidas no bolso voltão


para debaixo dos covilhetes.
« Tomo estas tres moscadas e guardo-as no
bolso (empalmai uma). é
« Eis a que se reduz tudo quanto tinha para
— 4 —

Vos appesentar: eu sabia ainda mais alguns passes


bonitos, mas estou esquecido (como que medi-
tando)... Ah! agora me lembro de dous ou tres
de mui lindo effeito.... vamos, senhoras moscadas,
voltem outra vez para debaixo dos covilhetes(abai-
xai-os com a varinha). Vêde, meus senhores,
como ellas estão álerta e como obedecem à
minha ordem.» (Tornai a cobril-as com os covi-
Thetes.)

Decimo setimo passe.

Tres moscadas que passão através de dous covilhetes.

« Retiro esta moscada (a que está debaixo do


covilhete C) e cubro este covilhete C com este B
(introduzi a moscada empalmada entre estes dous
covilhetes). Tomo esta moscada (a que estava sob
o covilhete C) e lanço-a através deste primeiro
covilhete B... passou (levantai-o e emquanto mos-
trais a moscada, introduzi-lhe a empalmada).
« Tomo a outra moscada (a do covilhete B) e
lanço-a tambem através deste primeiro covilhe-
te B... passou ainda (levantai-o e emquanto mos-
trais as duas moscadas sobre o covilhete O, in-
troduzi-lhe a empalmada).
« Tomo esta ultima moscada (a de debaixo do
covilhete A) e cobrindo de novo (com a mão es-
querda) estes dous covilhetes Be O com este A, vou
fazê-la passar atravez destes dous primeiros... ei-
las todas tres reunidas (levantai os ditos covilhetes
para fazerdes vêr as moscadas e tornai a cobrir o
covilhete 0). »
— 45 —

Decimo oitavo passe.

Retirar tres moscadas através de dous covilhetes.

« Tiro vúma moscada e metto-a no bolso;


tiro a segunda moscada e metto-a tambem no
bolso; tiro a terceira moscada e guardo-a no
mesmo lugar (desta ultima vez mettei-a effecti-
vamente no bolso).
« Observai, senhores, que ellas não estão mais
entre os covilhetes. »
(Levantai o covilhete A e collocai-o no seu
lugar, e segurando depois os dous covilhetes Ce B
com a mão esquerda, fazei desapparecer as tres
moscadas, como fica descripto no § V dos princi-
pios geraes, pag. 24.

Decimo nono passe.

Tres moscadas que passão de uma só vez através de um


covilhete.
Em virtude do passe precedente as tres mos-
cadas que estavão sobre o covilhete O passárão
para debaixo do covilhete B, que ora acha-se à
nossa direita, ou no lugar do covilhete C, portanto
este covilhete acha-se no centro.
« Tomo ainda tres moscadas do bolso, col-
— 46 —
loco-as sobre este covilhete B e cubro-as com
este outro A. .
« Ordeno às moscadas que saião d'entre estes
dous covilhetes para debaixo deste C. »
Retirai precipitadamente com a mão esquerda
o covilhete B, como fizestes no passe precedente,
deixando no centro o covilhete C, sob o qual
achão-se tres moscadas, e dizei:
« Eilas já debaixo deste covilhete, »
Retirai as moscadas e, levando a mão abaixo
da mesa como para fazê-las passar para debaixo
do covilhete A e através daquella, mettei-as no
bolso.
Levantai então o dito covilhete para fazerdes
vêr as tres moscadas e depois ponde em ordem
os tres covilhetes.

Vigesimo passe.

'Transformagio das moseadas em bolas grandes.


« Agora vou apresentar-vos uma linda recrea-
ção, mas para isso preciso da vossa redobrada
attenção.
« Em primeiro lugar notai bem que não ha
nada debaixo deste covilhete C, »
Levantai o covilhete com a mão direita e appro-
ximando-o da borda da mesa, introduzi-lhe com a
mão esquerda uma bola encarnada, pelo principio
descripto à pag. 23 8 IV.
« Tomo uma destas moscadas para fazê-la pas-
sar para debaixo deste covilhete C e através desta
mesa. »
Tomai a moscada na mão esquerda, e, levando
esta abaixo da mesa, largai aquella no gibeciêre,
d'onde tirareis uma bola preta.
« Vêde, senhores, que debaixo deste covilhete
B tambem não ha nada. »
Levantai este covilhete com a mão direita e
com a esquerda introduzi-lhe a bola preta.
« Tomo esta segunda moscada para fazê-la
passar como a precedente para debaixo deste
covilhete B. »
Tomai a moscada na mão esquerda, e, mettendo
esta debaixo da mesa, substitui aquella por uma
bola encarnada.
« Tambem debaixo deste covilhete A não ha
nada. »
Procedei como precedentemente para a intro-
dueção da ultima bola encarnada neste ultimo
covilhete.
« Tomo esta ultima moscada e faco-a igual.
mente passar para debaixo deste ultimo covi-
Thete.
« Agora ordeno às moscadas que se transfor-
mem em bolas grandes. »
Abaixai os covilhetes com a varinha e obser-
vai que a vossa ordem foi cumprida.
Em seguida cobri de novo as bolas com os
covilhetes.
*
Vigesimo primeiro passe.

As bolas que passão de covilhete em covilhete

« Notai bem que temos duas bolas encarna-


das debaixo destes covilhetes Ae Ce uma bola
preta debaixo deste B (levantai-os).
— 48 —

« Torno a cobrir as bolas com os seus compe-


tentes covilhetes (cobri-as) e faço passar através
da mesa a bola encarnada que está debaixo deste
Cc (emquanto levais a mão abaixo da mesa, tomai
uma bola encarnada) : ei-la aqui (mostrai-a).
« Metto esta primeira bola no bolso (met-
tei-a effectivamente)... não resta nada debaixo
deste covilhete C (levantai-o sustentando a bola
com o dedo minimo).
« Retiro esta encarnada (a do covilhete A)e
faço-a passar através desta mesa para debaixo
deste covilhete C (tomai uma bola preta da gibe-
citre, depois de largardes a encarnada)... passou
(levantai o covilhete -C com a direita, para
mostrardes a bola, e depois approximando o
mesmo covilhete da borda da mesa, introduzi-
lhe a bola preta). .
« Guardo a encarnada no bolso, e ordeno4
bola preta que está debaixo deste covilaete B que
passe para debaixo deste C... já ella aqui não
está (levantai o covilhete B sustentando a bola
com o dedo minimo); passou para debaixo deste C
(levantai-o para mostrardes a bola: pegai depois
nesta com a mão esquerda, e, atirando-a para o
ar, aparai-a na direita; fingi atirala de novo
para o ar, mas desta vez deixai-a cahir na
gibeciire; levantai e abaixai os olhos como se
à visseis cahir sobre o covilhete B; levantai este
mesmo covilhete, sob o qual achava-se uma bola
preta,e dizei:)
-« Fila que ainda passou através deste covi-
lhete. »
— 49 —

ART. II.

A moeda sem caracter.

Mostrar uma moeda de quinhentos réis na palma da mão;


transforma-la n'um vintem; torna-la depois ao seu es-
tado primitivo; e, finalmente, faze-la desapparecer e
reapparecer.

Para se executar esta sorte é preciso ter


uma moeda de cinco tostões limada e achatada,
pela metade, à qual se deverá soldar outra de
vintem (do cunho novo) igualmente preparada,
de sorte que estas duas moedas reunidas não
formem mais do que uma que parecerá de prata
-ou de cobre, conforme o lado por onde se mostrar.
Primeiramente mostrão-se os cinco tostões sobre
a ponta dos dedos como na fig. 3º.

Fig. 3.º
Fechando-se a mão, a moeda virá naturalmente
<ahir virada no meio da palma, onde se mostra
transformada em um vintem. (Fig. 4.º)
Si se tornar a levar a moeda à ponta dos dedos,
está claro que não será preciso mais do que fechar-
*€ abrir de novo a mão, para restitui-la ao seu pri-
meiro estado.
Ms 4
—'50 —

Para fazé-la desapparecer, finge-se metté-la na


mão esquerda, que abre-se e fecha-se como que
a recebesse, e empalma-se na direita, que deve
conservar-se bem aberta, e como se nada contivesse.

Fig, 4.2
Se um momento depois se abrir a mão es-
querda, pedindo a um espectador que lhe sopre
em cima, a moeda parecerá ter-se esvaecido.
Neste instante passa-se a mão direita sobre:a
esquerda como para melhor indicar ao espectador
o lugar onde deve de novo soprar ; é isto um pre-
texto para ter-se occasião de deixar cahir a moeda
ua mão esquerda, que fecha-se immediatamente:
e quando pela ultima vez se abre esta mão, O
espectador fica sorprehendido com esta reappa-
rição.

ART. TI.

Os dous dados.
Maneira polida e agradavel para pôr fim a uma partida
de gamão.
Ha algum tempo, diz M. Delion, encontrei um
«le meus amigos, no rosto do qual a expressão
de um bom humor habitual achava-se anuviada
— 51 —

por um ar triste e de aborrecimento, que me


causou grande abalo e perturbou-me immedia-
tamente.
Perguntei-lhe se 0s seus projectos de casamento
(era o desposado de uma mui linda e rica her-
deira) tinhão encontrado de subito algum obsta-
culo imprevisto.
—De modo nenhum, me respondeu, e eu me con-
sideraria o mais feliz dos noivos presentes e
passados, se não tivesse a infelicidade de achar
o jogo do gamão insupportavel.
— Ora essa! lhe repliquei, retendo uma ri-
sada; mas tu não desposas, que eu saiba, uma
caixa de- gamão.

Não, mas devo desposar a filha e sobrinha
de dous estimaveis rendeiros, cuja paixão por
esse jogo é tal que não podem passar uma noite
sem jogar uma destas eternas partidas que me
alterão os nervos e me causão arrepios. Resulta
d'ahi que, cada noite, em lugar de tornar-me ama-
vel.e jovial ao pé da minha bella noiva, gasto o
tempo em cumprimentos suffocados e em fazer ca-
retas atrozes a todo momento. Tu és magico, não
podias vir em meu auxilio ?
— Talvez, respondi depois de ter reflectido por
um minuto. Queres-me apresentar a teu futuro
sogro?
— Por certo. Irei buscar-te esta noite mesmo,
e levar-te-hei em minha companhia.
— Está dito.
O meu infeliz amigo cumprio com a palavra,
e algumas horas mais tarde era eu bem visto
por toda a sua futura familia. Não se passou
muito tempo sem que o pai e o tio não se po-
zessem a jogar o gamão. O nosso noivo lan-
cou-me um olhar doloroso. Deixei cahir uma ou
duas vezes, os dados do copo, e quando o pai
— 62—
hia apanha-los para langa-los de novo, disse eu
aos jogadores:
— Meus senhores, os dados com que vos servis
são bem singulares! .
— Parece-me, replicou o tio que, estava ga-
nhando, que elles não têm nada de extraordinario.
— Permitti que vos faça mudar de opinião.
— De boa vontade.
— Quantos ‘Bontos apresentão os dados?
— Cinco e dous.

Tomei então os dados horizontalmente entre


os dedos pollegar e index, de maneira que, for-
mando uma linha parallela a estes dous dedos,
e no meio delles, apresentassem, como sobrea
mesa, as duas faces de cima com os pontos cinco
e dous (fig. 5º). Levantei o pulso para fazer vêr
quaes erão os pontos das faces debaixo: tres
e quatro, me responderão. (Estes ultimos numeros
podem variar.) Abaixei o pulso fazendo notar
que os numeros cinco e dous erão sempre os
superiores, e pedi a um dos anciãos que pas-
sasse o dedo por sobre os dados; mostrei de novo
as faces inferiores, e em vez dos pontos tres e qua-
tro vião-se dous e cinco. Mas dous espectadores
que me olhavão rindo, pedirão que eu recomeçasse
a sorte; O que fiz,como precedentemente, com 6e3
por cima; 4 e 2 primeiro por baixo, depois 1 e 4.
— 53, —

O tio e o pai quizerão adivinhar a sorte, e,


naquela noite, não pensárão mais na partida de
gamão. No dia seguinte, esquecerão-se ainda dos
copos para me pedirem que lhes revelasse o meu
segredo, e passarão as noutes seguintes a diver-
tir-se com seus amigos.
Se algum dia assistirdes a uma longa partida
de gamão que vos aborreça, usai do sobredito
segredo que consiste, quando pela primeira vez
levantais o pulso para mostrar a face infe-
rior dos dados, em muda-la por um movimento
imperceptivel, debaixo para cima do pollegar e
de cima para baixo do index, de fórma que as
faces superiores occupem o lugar da face da
esquerda. Abaixando depois o pulso, para pro-
vardes que os numeros superiores são sempre
os mesmos, tornai a leva-los ao seu primeiro
lugar por um movimento dos dous dedos, con-
trario áquelle que fizestes para leva-los à esquerda.
Os dados achar-se-hão na sua posição natural;
e podereis então mostrar as faces verdadeira-
mente relativas aos pontos superiores5 e 2, porque
terão tomado, em baixo, o lugar dos pontos que
fizestes vêr primeiro.

ART. IV.

A faca na garrafa.

Meio divertido para empregar o tempo emquanto se espera


por uma sobremesa.
Ha um momento à mesa, em que, estando o
appetite satisfeito, não resta mais do que fazer
tempo até que venhão os doces ou as frutas.
== Bd es:

É nesse curto espaco, que muitas vezes nos pa-


rece longo, ou porque a conversação geral tenha
cessado, ou porque os colloquios de vizinho para
vizinho não se apoiem senão em enfadonhas ba-
nalidades, que não se sabe mais que fazer.
Em semelhantes circumstancias, pedi ou tomai
uma garrafa d'agua; collocai-a ante vós sobre
a borda da mesa; depois introduzi a ponta de
uma faca de sobre-mesa entre o fundo da gar-
rafa e a referida borda tanto quanto chegue para
que ella se sustente horizontalmente pela parte
e fóra da mesa.

Fig. 6.2
Naturalmente todos os olhos têm-se volvido
para vós como tantos pontos de interrogação.
Estes pequenos preparativos têm dado um ali-
mento ao interesse dos convivas e já espera-se
pelo ultimo prato da sobre-mesa sem se medir
o tempo.
Respondereis ás perguntas que vos fôrem di-
rigidas, dizendo que ides em uma ou duas vezes
(segundo a vossa habilidade), e com um só dedo,
fazer a faca entrar dentro da garrafa.
— 55 —

Uma: e outra estando collocadas como já ex-


plicâmos (fig. 6º), fareis a faca dar uma meia volta,
de baixo para cima no sentido da boca da garrafa,
se derdes com o index uma pancada a no
cabo. A faca assim lançada com uma ligeireza
que vos darão alguns ensaios, virá pelo cabo
cahir perpendicularmente dentro da garrafa.

ART. V.

Um copo de vinho que se transforma n'uma chuva


de folhas de rosas.

Por mais simples que seja esta. pequena re-


creação sempre a indicaremos, porque nunca deixa
de produzir um effeito bastante agradavel.
Um criado, ou antes 0 vosso ajudante, entra
com uma bandeja, onde se achão varios copos
e dentro dos quaes, logo que chega, de:
vinho contido n'uma garrafa, o qual "quer i
a provar aos assistentes.
Assim que os copos estiverem cheios sêde o
primeiro a servir-vos de um. Depois por um gesto
ou reclamação chamai a attenção sobre vós, e,
como se cedesseis a um movimento irreflectido,
lançai o conteúdo do copo sobre os espectadore:
As senhoras gritão de susto por causa de seus
lindos vestidos e os homens estão prestes a en-
colerizarem-se com semelhante inconveniencia.
Porém todo o susto e toda a colera acaba n'uma
gargalhada geral, quando todos os assistentes,
— 56 —

em vez de se julgarem molhados por algumas


gottas de vinho, vêem cahir uma chuva de folhas
de rosas. (Fig. 7.º)

,. De feito sobre a bandeja tinheis mandado col-


locar um copo duplo, entre as paredes do
qual introduzistes um pouco de vinho, por meio
de uma abertura estreita, que rolhastes depois.
No centro deste copo, que parecia estar cheio
de vinho como os outros, achava-se a nuvem
de flôres que acabastes de espalhar sobre os es-
pectadores.
CAPITULO II.

SORTES DE CARTAS.

São sem duvida as sortes de cartas os mais


applaudidos de todos os prestigios que se pro-
act pela ligeireza das mãos, por terem a van-
tagem de não exigir, de ordinario, preparativo
algum, e poder-se, portanto, executar em qualquer
occasião.
Em todos os lugares vem à mão um baralho;
e se servindo-vos delle, empregardes uma boa
dóse de ligeireza, podereis fazer uma assembléa
passar por agradaveis momentos.
Serão, pois, estes preciosos exercicios o objecto
deste capitulo.
— §8 —

PRINCIPIOS GERAES

PARA A EXECUÇÃO DAS SORTES DE CARTAS.


A baldroca.—Baralhar em falso —A carta for-
cada —A bifagem:—A empalmagao.—A repo-
sição.—O descanço.

ART. I.

A baldroca.

A palavra baldroca, applicada 4 giria da pres-


tidigitação, significa fazer passar um monte ou
macete do baralho, de cima para baixo, na pre-
sença dos espectadores, sem que elles dêm por
isso.
Sendo esta operação uma das mais importantes
e frequentes, nos artifícios empregados na execução
das sortes de cartas, vamo-nos occupar della em
primeiro lugar. .
Ao principio estes exercicios vos parecerão difh-
ceis, mas tende constancia, ensaiai-vos uma hora
por dia, que ao cabo de uma semana, afiançamo-
vo-lo, tereis adquirido a destreza necessaria,
Aconselhamos ao leitor que, para melhor com-
prehensao, tome um baralho, e vá executando 0
que vai lendo.
Primeira posição. —Abri a mão esquerda com
a palma voltada para-o-ar. Collocai nella o ba-
ralho de maneira que uma das suas extremida-
— 59 —
des fique um pouco'para fóra dessa mão do lado
do pollegar.
Quanto 4 raiz desse dedo encostareis um dos
lados desse baralho, e sobre as costas deste as-
sentareis estendido o mesmo dedo. Dobrai os dous
dedos maximo e annular sobre as costas do mesmo
Baral, segurando-o assim pela outra extremi-
ade.
O index ficará um pouco livre, isto é, podeis
pô-lo como vos fizer mais geito, porque não tem
muito prestimo.
O dedo minimo, importantissimo nesta mano-
bra, estará entre os dous montes do baralho,
que pretendeis baldrocar. Esse dedo fica do lado
o vosso peito.
Tal é a primeira posição. Comprehende-la-heis
facilmente em face da fig. 8º.

Fig. 8
Nesta figura parecerá que o monte, ou ma-
cete inferior do baralho sobre que está o dedo
minino, fica um pouco saliente para o lado do
prestidigitador. Mas não é assim, nem deve ser,
pois em tal caso, o macete superior estaria um
pouco projectado para os espectadores, os quaes
verião o baralho fóra do seu natural.
Ao contrario nós queremos nesta posição, que
aquella extremidade do baralho que se acha vol-
— 60 —

tada para os circumstantes, esteja perfeitamente


lisa e igual. Este resultado consegue-o 0 leitor
facilmente si se der ao trabalho de ensaiar esta
primeira posição, advertindo que o defeito, que
notamos na figura, pareceu necessario para me-
lhor se vêr a collocação do dedo minino, e a
divisão dos montes.
Segunda posição. — Tendo o baralho tal qual
o deixamos na 1º posição, abrimos a mão direita;
omos o dedo pollegar della na extremidade, que
fica voltada para o nosso peito, e os outros quatro
dedos na outra extremidade, que deitava para o
espectador. As costas dessa mão ficão voltadas
para o ar. A palma não assenta sobre o ba-
ralho, antes fica desviada delle o mais que póde
ficar, sem prejuizo das situações que acabamos
de descrever. Nesta posição os espectadores não
vêem o baralho, porque 'os quatro dedos es-
condem-lhe a extremidade que na 1º posição es-
tava voltada para elles, e as costas da mão di-
reita não lhes deixão vêr as do baralho. Esta
posição é muito natural. Parece que é um meio
le ter occupadas as duas mãos.

Fig. 94
A fig. 9º mostra-nos approximadamente esta
posição. Digo aproximadamente, porque, afim
e perceber melhor a posição da mão, deixamos
à vista uma parte do baralho.
— 61 —

Ensaie-se bem o leitor nestas duas posições


antes de passar adiante, sem o que mal poderá
entender-no:
Terceira posição.— Agora levantai o dedo pol-
legar da esquerda.
Ao mesmo tempo, com os dedos da direita firmai
o monte ou macete inferior do baralho contra a
raiz do dedo pollegar da mão esquerda.
Esta é a 3º posição, para a qual não dou fi-
gura por julga-la inutil.
Quarta posição. — Movei para fóra o monte
superior -do baralho, empregando nisso o dedo
minimo e annular da mão esquerda, sem des-
prezar o auxilio que vos possão prestar os outros
dedos.

Fig. 10,
Para se conseguir este resultado é preciso que a
mio direita se curve bastante para deixar sahir
o macete superior. No fim deste movimento, fi-
camos na 4 posição representada na fig. 10, à
qual mostra a posição do baralho na mão es-
querda. A letra—A—designa o monte superior e
a letra —B—0 inferior. Advertiremos, porém, que
a mão esquerda não fica tão aberta como o re-
presenta a fig. 10. Com efeito o antigo monte
— 62 —
superior não fica horizontal como parece. Mas
vá o leitor fazendo o que lhe recommendamos,
que, no fim, quando estiver mais habilitado para
me comprehender, lhe indicarei os meios de corri-
gir.todos os defeitos da minha descripção.
“Quinta posição. — Com os dedos ida mão di-
reita, com os quaes até aqui tendes apertadoo
antigo monte inferior do baralho (que é o monte
— B—da fig. 10) levantai o dito, fazendo-o gyrar
de modo, que nunca deixe de ficar firmemente
apertado contra a raiz do pollegar da esquerda.
Para melhor me entenderdes, supponde que a
palma da vossa mão esquerda é uma caixa de Tapé.
cuja tampa é o macete inferior do baralho (fig. 10,
monte B) e cuja charneira é a raiz do pollegar
da mesma esquerda.
Abri pois essa tampa, fazendo-a gyrar sobre
essa charneira, como quem se dispõe a tomar uma
boa pitada. Assim tereis a 5º posição.
Sexta posição. — Agora é occasião do antigo
monte superior do baralho, designado na fig. 10:
ela letra
— A, — passar a assentar na palma
a mão esquerda. Para esse fim, não tendes mais do
que impelli-lo para a dita palma com o auxilio
os mesmos dedos annular, maximo e minimo.
Este fica sobre a palma da esquerda; em cima
delle está o antigo monte superior do baralho
(que era o monte —A— da fig. 10) e em cima deste
macete acha-se o dedo annular (da mão esquerda).
Os dedos index e maximo da dita mão ficão
a amparar levemente o referido monte. Assim
tereis chegado à 6º posição.

. Setima posição —Agora pousai o antigo monte


inferior (letra— B— na fig. 10), sobre esse que
— 63 —

tendes na. palma da esquerda, que era o primi-


tivo macete superior; mas não o deixeis cahir,
soltando-o dos dedos da mão direita, que tem
estado -a segura-lo; pelo contrario esses dedos
acompanhão o monte inferior (agora superior),
até elle assentar em cima do antigo monte su-
perior, que actualmente já é inferior. Ao pousa-lo
retirai os dedos da esquerda da posição em que os
tinheis, collocando-os em cima do baralho a se-
‘gura-lo. Agora o antigo monte superior está sendo
inferior e ao contrario o antigo superior está sendo
inferior. Este é o fim da baldroca.

Correctivos e advertencias sobre a baldroca,

As posições que acabamos de descrever, não


servem para dispensar o leitor de consultar o
seu proprio tacto, e muito menos para serem
tomadas com um escrupulo servil; mas habili-
tão-o para os exercicios, que de certo lhe darão
mais destreza, do que aquella de que se julgará
susceptivel. As simples descripções ensinão-o a
operar gros: eiramente, como as andadeiras ha-
bilitão a criança a conservar, andando, o equi-
librio.
Os primeiros ensaios são os primeiros passos
da criança, incertos e vacillantes. Mas o exer-
cicio continuado produz a mais admiravel des-
-treza. Creia-me o leitor, fazendo os seus ensaios,
por espaço de meia hora cada dia, terá no fim
de uma semana conseguido baldrocar com a con-
veniente perfei
Porém, afim de apressar os effeitos desses en
saios, indicarei alguns correctivos à descripi
das posições que apresentei.
'
— 64 —

A l* e 2* posição não têm difficuldades, nem


exigem precauções, a não ser o modo de collo-
car imperceptivelmenteo dedo minino no lugar
que se deseja. Isso quasi sempre é muito simples,
mas às vezes offerece algum embaraço ao prin-
cipiante. Comtudo, como estas difficuldades não
pertencem a todas as sortes, mas só a algumas
(e essas poucas), não devemos demorar-nos aqui
em resolvê-las.
A 3º posição tambem é facil, e só temos que
dizer alguma cousa sobre a transição della para
a 4. Pela descripção parece que o pollegar da
esquerda, que mandamos levantar na 3º posição,
fica ahi inutil por um pouco de tempo. Comtudo,
esse dedo póde servir-nos até certo ponto para
não deixarmos desarranjar as cartas do monte
superior ao tomar-se a 4' posição. Esse desar-
‘ranjo augmentaria no fim a maior dificuldade
que ha na baldroca, a qual consiste na passa-
gem da 6* para a 7º posição; pois, se as cartas
não estiverem bem unidas, farão nessa passa-
gem um ruido perceptivel, que denunciará à ope-
ração. Por este motivo, ao tomarmos a 4° posi-
cão devemos empregar, até onde pudermos, o
dedo pollegar da esquerda em conservar esse
arranjo do macete superior.
Para o mesmo effeito empregaremos tambem
o dedo minimo e a palma da mão direita.
A 4 posição não é tão distincta da 5", como
parece inculca-lo a nossa descripção ; quero dizer
que os movimentos para tomar estas duas posi-
cões, devem ser feitos quasi ao mesmo tempo.
Assim, à medida que fôrmos movendo o monte
superior com o minimo e annular da mão esquerda
(4º posição), devemos ir tambem levantando com
os dedos da direita o monte inferior (5º posição).
Deste modo os movimentos podem operar-se sem-
— 65 —
sempre cobertos com as costas da mão direita, o
«que é uma circumstancia muito essencial.
Na posição 4 a mão esquerda não fica tão
aberta como indica a respectiva figura. Já fiz
esta advertencia, mas não deixo de a repetir.
Essa figura exagera a posição, porque entende-
mos que deviamos chamar principalmente a atten- |
ção do leitor sobre as posições dos dedos, e o
movimento que é necessario imprimir ao macete
superior. Comtudo, o leitor comprehende facil
mente que se fôsse operar desse modo, os espec-
tadores não deixarião de vêr o referido macete.
Se o leitor executar ao mesmo tempo os mo-
vimentos de que dependem a 4 e 5º posição,
conforme ainda ha pouco lh'o recommendâmos,
verá que não só não precisa de impellir tanto
para fóra o macete superior, mas até aproveita
melhor a mão direita para encobrir as operações
da esquerda.
Para este segundo fim, convirá lembrar que não
é necessario ter os dedos da direita bem firmes
sobre o macete inferior. Antes pelo contrario, ao
tomar a 5º posição necessita de passar o dito ma-
cete para as segundas juncturas dos mesmos dedos,
ficando as pontas delles muito pouco levantadas
acima da palma da esquerda, afim de se encobri-
rem aos circumstantes os movimentos que se
effectuão.
Pela demora e cuidados que temos tido em ex-
plicar estas posições, e os movimentos que as
produzem; não se julgue que está aqui o ponto
ifficil da baldroca. O exercicio vence pertfeita-
mente estas difficuldades. Nem são ellas as que
dão o mais pequeno cuidado ao prestidigitador,
ainda medianamente adestrado.
O que é praticamente mais difficultoso, é o que
«ao leitor, a principio parecerá mais facil; e vem
Ms 5
= 66 —
a ser as manobras de que são precedidas a 6: e
7 posições. Ahi o movimentoé um pouco sensivel,
porque ao cobrir o antigo monte superior sobre a
palma da mão cequerda, o antigo macete inferior
está um pouco levantado na direita, ficando a
palma da esquerda um tanto descoberta.
Esta é, pois, a occasião critica. Para a vencer
é necessario que o leitor se exercite bem. Com-
tudo não desanime.
Para lhe facilitar o resultado do seu trabalho,
daremos ainda alguns conselhos.
1.º Não se precipite na execução dessa mano-
bra. Conserve o sangue-frio, a presença de animo,
e opere vagarosamente. Um movimento rapido
atraiçoa-lo-hia. Deve sobre tudo evitar que as
cartas fação o mais leve ruido.
2.º Para as 6º e 7º posições (que devem ser
tomadas quasi a um tempo), procurará a occa-
sião em que a attenção dos espectadores esteja
um pouco distrahida. Se algum dos circumstan-
tes teimar em não desviar os olhos das mãos,
volte para elle as costas da direita; pois que
assim lhe encobre todos os movimentos que se
effectuão à sombra della.
3.º Deve procurar occasião em que possa fazer
naturalmente algum movimento com o braço para
tomar a 7º posição. Se este fôr natural, não deixa
perceber o outro que nessa mesma occasião effec-
tua a baldroca. Esta precaução nem sempre é
necessaria, mas muitas vezes é util.
4.º Nos movimentos, que precedem a 6º e 7º
posições, é às vezes conveniente modificar um
pouco o que dissemos, quando as descrevemos.
Esta modificação consiste no seguinte. Quando
fôrmos a fechar a mão esquerda para assentar
na palma o antigo monte superior, encostaremos
— 67 —

o outro macete nas extremidades do primeiro, de


maneira que os dous montes formem um trian-
gulo, cuja base é a palma da esquerda afim de
unirmos e igualarmos bem as cartas que com-
põem o dito monte superior (que vai passar a
inferior). Nessa mesma occasião tiramos o dedo
minimo para fóra do mesmo macete superior,
afim de podermos aproveitar mais conveniente-
mente esse dedo no impellir o referido macete
para a palma. Deste modo evita-se melhor o ruido
as cartas.
5.º No fim da baldroca é às vezes conveniente
baralhar em falso (veja o art. 2º): não só para
disfarçar algum movimento que tivesse princi-
piado a attrahir a attenção dos espectadores ; mas
tambem para os capacitar de que não temos in-
teresse nenhum em conservar uma certa dispo-
sição das cartas. .
O mais fica ao cuidado do leitor. Consultando
o sei proprio tacto, conseguirá melhor resultado
do que lendo preceitos, que nunca podem deixar
de estar subordinados a modificações conformes
ao geito de cada um, e à natureza particular de
cada sorte.
Permitta-se-me ainda uma advertencia.
Quando se tratar de baldrocar uma só carta
para cima do baralho ou vice-versa, a operação
é muito mais difficil, por causa do ruido que
esta carta faz na passagem.
Neste caso é melhor baldrocar duas vezes; da
primeira passamo-la para o meio, e d'ahi é que
a mudamos para cima ou para baixo, conforme
a necessidade que houver,
Antes, porém, de baldrocarmos a segunda vez,
devemos pôr o dedo por baixo dessa carta que
desejamos baldrocar.
— 68 —

ART. I.

Baralhar em falso.

Esta operação é de grande utilidade e de um


uso muito frequente na prestidigitação parao
melhor resultado das sortes. Póde fazer-se por
varios modos conforme a necessidade.
1.º Quando nós apenas precisamos de não
perder de vista uma carta, podemos baralhar
verdadeiramente todas as outras, uma vez que
essa fique livre da confusão. Neste caso, de-
pois de termos passado a alludida carta para
cima, ou para baixo do baralho, por meio da
baldroca, podemos baralhar todas as outras,
menos esta. Muitas vezes isto é quanto basta. Os
espectadores que não conhecem à baldroca, não
reparão no interesse que tendes em livrar essa
carta da revolução em que envolvestes as outras,
nem mesmo notão que ella não foi baralhada,
uma vez que não opereis de um modo muito
grosseiro.
Comtudo, outras vezes não ha remedio senão
fazer melhor conceito da esperteza dos circum-
stantes, e illudi-la com mais algum artifício. Neste
caso (mas sempre na hypothese de apenas ne-
cessitarmos denão perder de vista uma dada carta),
depois de a termos posto em cima do baralho,
como fica dito, tomamo-la com a mão direita,
conservando as outras na esquerda, com cujo
dedo pollegar faremos resvallar sobre a especial
um macete de algumas cartas, 5 ou 6 por exem-
plo, e sobre este macete outro e outro até ao
fim. Deste modo, a especial ficará debaixo do
— 69 —
taralho, o qual passamos para a esquerda. Bara-
lhamos uma ou duas vezes sem confundir a carta
debaixo. Em seguida pondo novamente o bara-
lho na esquerda, tiramos com a direita um ma-
cete de meia duzia de cartas, que mettemos de-
baixo da especial, e logo outro macete que lhe
collocamos em cima, e assim por diante, isto é,
pondo sempre, ora um macete, ora outro, sem
erdermos esta carta de vista. Estes macetes são
ivididos pelo dedo pollegar.
É preciso que no fim a carta especial tome
para cima, ou para baixo do baralho, conforme
O lugar em que necessitamos della.
Ao pormos os macetes, baralhamo-los uns com
os outros, sem confundir nunca a carta indicada.
Esta operação não offerece difficuldade, mas exige
algum exercicio, principalmente para o effeito de
se poder baralhar em falso, conversando, como
quem está distrahido.
2.º Quando o baralho, ou grande parte delle
está disposto por certa ordem que não convém
alterar, o methodo precedente não é bastante.
Em tal caso faremos o seguinte:
Tomaremos uma parte do baralho na mão esquer-
da e outra na direita. Estendemos as cartas da es-
querda, empregando nisso o respectivo dedo pol-
Tegar. Chegamos os dous montes um ao outro,
movendo destramente todos os dedos, que estavão
debaixo do monte da direita, impellindo com elles
as cartas do dito monte para dentro do da es-
querda, de maneira, porém, que as cartas do 1º
monte fiquem cêrca de uma terça parte, mais para
fóra, do que as outras (fig. 11) e sejão inclinadas
para o lado das cartas da mão esquerda. Depois,
com todos os dedos da direita, juntai bem estas
cartas salientes, sem nunca as igualar com as
— 70 —

outras. Immediatamente tomai essas cartas na


esquerda, e com a direita pegai na extremidade
do macete que primitivamente estava na esquerda.
É claro que puxando as cartas salientes (monte
— A —) para o lado esquerdo, ellas formarão um
angulo recto com o monte da direita.

Fig. 11.
Neste estado é facil separa-las e torna-las a
pôr no seu antigo lugar.
O habito ensina a fazer esta operação com
muita rapidez.
Depois disto é conveniente ifazer o seguinte:
Tomamos na mão esquerda o baralho com uma
das extremidades voltada para o ar, e outra para
o chão. Este baralho estará quasi todo coberto
com a mão esquerda, menos uma pequena parte
que ficará à vista dos espectadores, para que'não
julguem que desejamos o mysterio. Com a di-
reita separamos uma parte do baralho, que le-
vantamos, para o mettermos entre a palma da
esquerda, e as costas do monte que está nessa
mão, simulando encontrar um pequeno embaraço
no metter as cartas, dando lugar a que fação um
leve ruido, e encobrindo o baralho com os dedos
minimo e annular da mão direita. Ao mesmo
= fi =
tempo com a ponta do index da esquerda sepa-
ramos o monte, que jáilá estava, do outro que
acaba de entrar. Com a direita levantamos este
ultimo monte, e mettêmo-lo por detrás do outro.
Agora fica tudo reposto no primitivo estado. Po-
demos repetir esta operação quantas vezes jul-
garmos necessario.
De ordinario, é suficiente o emprego deste meio,
rude como é, sem usarmos de outro, que exige
mais exercicio e destreza.
Ha ainda outros meios de baralhar em falso,
mas os que indicamos são bastantes.

ART. III.

A carta forçada.

Nas sortes que vamos descrever poucas vezes


faremos uso da manobra da carta forçada, por-
que em verdade é um meio fallivel, quando a
pessoa a quem se pretende impingir uma dada
carta, 6 dotada de sufiiciente sagacidade. Com-
tudo ha sortes de lindo effeito, em que esta ope-
ração tem um lugar importante. Por isso é de
necessidade o descrevê-la aqui.
Ha tambem varios meios de impingir uma
carta.
Primeiramente é preciso que ella esteja pelo
meio do baralho em lugar conhecido do prestidi-
gitador. Se estiver em cima ou em baixo, é-lhe
facil o leva-la ao meio, usando da baldroca.
Neste estado com as duas mãos abre-se o ba-
ralho em fórma de leque, dando-se uma carta
— 2 —
a tirar livremente. As cartas devem ser postas
de modo, que pareça que não damos preferencia
a nenhuma, porém teremos o index da direita:
ao lado da especial. Quando a pessoa a quem
nos dirigirmos vai approximar os dedos ao ba-
ralho para tomar uma carta, communicamos um
pequeno movimento à mão direita, de maneira
que a especial fique mais geitosa de tirar.
Será prudente apertarmos um pouco as res-
tantes cartas, para que, se o parceiro escolher
outra differente da nossa, desista logo da sua
tentativa. Mas para isto precisamos de nos fingir
distrahidos, dizendo para os vizinhos algum re-
moque delicado. Por este modo não só mostra-
mos a mais completa indifferenca acerca da es
colha, mas ministramos uma explicação razoavel
ao facto de conservar presa a carta que o par-
ceiro mostrou desejar.
Mas, se apezar destas espertezas, 0 parceiro não
escolhe a nossa carta?
Nesse caso faremos o seguinte:
Se essa está mais abaixo da escolhida, forma-
mos com todas as que estão em cima desta ul-
tima, um monte, que puxamos um pouco para
diante, deixando comtudo bem saliente a carta
escolhida, para que o parceiro não suspeite que
lh'a queremos substituir. Ao mesmo tempo, com
o index da mão direita puxamos para o nosso lado.
a carta especial, de maneira que o parceiro o
não perceba, e com o mesmo index a empurra-
mos levemente para baixo do monte em que existe
a escolhida. Depois separamos este monte (de-
baixo do qual já está a nossa); ajuntamos-lhe as
cartas bem juntas, e levantamo-lo com as costas
para 0 nosso lado, e com a frente para o par-
<eiro, afim de que veja a sua carta.
— 73 —

Se esta operação fôr bem executada, o parceiro


julgará que todo este cuidado teve só por fim o
fazer-lhe vêr a carta, de modo que a sua trans-
parencia nos nao permittisse conhece-la.
Se, porém, a nossa carta estiver acima da es-
colhida, afastamos subtilmente a nossa para o
lado direito, protegendo-a neste movimento com
as cartas que estavão em cima della; e d'ahi
fazemo-la passar com igual subtileza para baixo
da escolhida, a qual deve ficar bem saliente, como
já recommendámos, para que o parceiro não des-
confie que lh'a pretendemos trocar. No fim sepa-
ramos este monte do outro, e levantando-o, mos-
tramos a carta debaixo, que é a especial.

Fig. 12.
Outro meio de impingir uma carta é o se-
guinte:
Abrindo o baralho em fórma de leque, pomos
por baixo desse leque a carta especial, um pouco
voltada para o nosso peito, conforme a mostra
a fig. 12, com a diferença que as costas do ba-
xalho ficão viradas para os espectadores.
— tá —

Nesta situação é facil fazer passar a carta in-


ferior para debaixo da escolhida, conforme o leitor
facilmente reconhecerá depois de alguns ensaios,
e experiencias.
Conseguindo este resultado, levantamoso monte
onde está a escolhida, mostrando a carta debaixo,
que é a nossa.
Observação .—Se o prestidigitador principiante,
quando executar alguma sorte que dependa da
manobra da carta forçada, não fôr feliz na exe-
cução dessa manobra, e os espectadores disserem
que aquella carta não é a que foi escolhida, nesse
caso o prestidigitador diz-lhe que escolhão à sua
vontade, e faz outra sorte que não dependa da carta
forçada.

ART. IV.

A bifagem.

Bifar consiste em substituir uma carta que


temos na mão, pela que se acha em cima do ba-
ralho,
Ha varios modos de bifar, não fallando na-
quelles que são familiares aos galopins.
1.º modo. A carta de que pretendeis desfazer-
vos deve estar na mão direita entre o dedo ma-
ximo e o index. Tereis o baralho na mão es-
uerda entre o index eo pollegar. Os outros dedos
dessa mão estarão um pouco desviados. Com à
— 7.4 —
pollegar impellireis a carta superior do baralho
pare tere delle cousa de metade da sua largura
ig. 13).

Fig. 18.
Nesta posição approximai as mãos uma da ou-
tra; em consequencia do que, a varta de que
desejais vêr-vos livre, vai naturalmente collocar-
se no intervallo que ha entre o index da es-
querda e os outros dedos, e ao mesmo tempo a
carta que está em cima do baralho acha-se entre o
index e pollegar da mão direita, com os quaes a bi-
fareis, afastando logo as mãos uma da outra, e
passa o index da esquerda para baixo do
aralho, onde já deve estar a carta de que vos
desembaraçastes.
2º modo. Ás vezes em lugar de pôrmos de-
baixo do baralho a carta que pretendemos trocar,
convém deixa-la em cima delle no lugar da que
de lá queremos tirar. Neste caso faremos o mesmo
que no primeiro modo, com a differença que desta
vez, em lugar de termos a carta incommoda entre
o index eo maximo da mão direita, te-la-hemos
entre o pollegar e o index; e em lugar de a col-
— 76 —

locarmos em baixo do baralho, colloca-la-hemos


em cima da outra que pretendemos tirar, toman-
do-a com effeito logo entre o index e o maximo
da mesma direita. Neste caso convém ter o ba-
ralho naturalmente na mão esquerda entre o
ollegar, que o segura por cima, e os outros de-
os que o amparão por baixo, bem entendido
que a sua carta superior deve estar saliente, como
no 1º modo, o qual (a menos que não haja al-
guma razão particular de conveniencia) é prefe-
rivel por causa de um leve ruido que no 2º modo
fazem as cartas ao trocarem-se.
.8° modo. Ás vezes é util bifar com uma só
mão. Neste caso fareis o seguinte:
Tende o baralho na mão aberta. Os dedos dessa
mão desde o minimo até ao maximo (préviamente
humedecidos com saliva), devem estar leve-
mente curvados para cima, de maneira que tenhão
as cabeças ao nivel das costas do baralho.
Com a ponta do dedo pollegar afastaremos a
carta de cima, que irá pousar sobre as pontas
dos outros dedos, de maneira que a carta imme-
diata fique descoberta. Então com o pollegar afas-
taremos um pouco a segunda carta, e a levan-
taremos quanto fôr indispensavel para que im-
pellindo para dentro a antiga carta superior
com o auxilio dos dedos que a apoiavão, esta
fique sendo a segunda carta do baralho.
Observação.— Para a bifagemé conveniente pro-
curar a occasião mais opportuna. Esta ás vezes
offerece-se espontaneamente. Mas os momentos
favoraveis são rapidos, e é preciso ter bastante
pratica, presença de espirito, e promptidão de
phantasia para bem se aproveitarem. Quando
essas occasiões vos não favorecerem, bifai sem
— 77 —

medo mesmo na cara dos espectadores, fazendo-


lhes alguma pergunta que sirva de pretexto ao
gesto quefazeis ao approximar asmãos. Mas nada
de movimentos notaveis; apparentai sempre a
maior tranquillidade, que é o meio de inspirar aos
assistentes a mais plena confiança.

ART. V.

A empalmação.

A empalmação, em geral, reclama uma grande


perfeição no sentido do tacto, o qual se deve
educar como todos os outros. Mas a empalmação
de cartas não é muito dificil, nem exige tanta
destreza, como a de moedas e objectos pequenos.
Aqui não tratamos senão da de cartas.
Tendo na mão esquerda o baralho como na
fig. 14, e estando em cima delle a carta empal-
mada, cobrimo-lo com a direita.

Fig. 14.
. O pollegar da esquerda afastará a carta de cima,
um pouco para fóra das outras de sorte que o
— 78 —
meio della fique sobre as pontas do dedo index,
maximo e annular da esquerda, onde temos o
baralho. Com estes dedos ajudaremos a carta a
accommodar-se na palma da direita, a qual se
apossa della contrahindo-se um pouco, de maneira
ue a carta, amparada entre o Index e o pollegar
essa mão, fique levemente curvada (fig. 15).

Fig. 15.
(Esta figura parece representar a mão e a carta
que está dentro della, como estendidas n'uma po-
sição horizontal; mas não deve ser assim, como
o leitor comprehenderá comparando com a dita
figura a descripção que apresentei.)
Feito isto, estenderemos sem a mais leve sombra
de affectação o braço direito, de fórma que as
costas da respectiva mão fiquem voltadas para
os circumstantes, os quaes nado desconfiarad della,
porque a sua posição é muito natural.
Podemos tambem, logo depois da empalmação,
offerecer as cartas com a propria mão empalma-
dora, para que os espectadores as baralhem.
Isto faz-se perfeitamente, pondo o baralho entre
o pollegar e o index da direita, quando o offerecer-
mos.
Os circumstantes não vêem a empalmada por-
que está protegida pelas costas da mão voltada
para elles.
Logo que tomão o baralho, abaixamos imme-
diatamente a mão, dando-lhe um pequeno geito
para o lado de dentro afim de que os assistentes
— 79 —

não vejão a carta pelo intervallo entre o pol-


legar e o index. Esta naturalidade desarma as sus-
peitas dos espectadores.
Alguns aconselhão que em vez de deixar cahir
o braço se pouse a mão na extremidade de uma
mesa. Isto às vezes póde ser conveniente, mas em
geral não só não ha razão para preferir este
meio, senão que até as ha a favor do primeiro.
Quando quizermos tirar de sobre a mesa a carta,
Breqeamoe arrasta-la até que metade della fique
e fóra da mesa, afim de que a possamos curvar
na mão, como já dissemos quando explicâmos a
empalmação.
Se a carta empalmada, em vez de estar em
cima, se achar debaixo do baralho, e nós não
quizermos faze-la passar para cima, por meio da
baldroca, podemos empalma-la pelo seguinte
methodo :
Mettemos o dedo minimo entre a carta infe-
rior e o resto do baralho, como na 1º posição da
baldroca, e cobrimo-lo com a direita, como na
2 posição da referida manobra. Deste modo po-
demos facilmente empalmar na esquerda a carta
debaixo, a qual ficará com a pintura voltada para
a palma da mão. Depois disto as costas da esquerda
estarão voltadas para os circumstantes, ficando
orém o baralho mettido entre o pollegar e o
index da dita mão, donde o tirareis para o dardes
a baralhar. Este methodo raras vezes offerece
vantagem. Geralmente deve preferir-se o primeiro
que apresentei.
A empalmação póde comprehender mais do que
uma carta, e até é mais facil quando são muitas,
pois então umas ajudão a sustentar as outras e
exigem menos esforço, que é inimigo da natura-
lidade.
— 80 —

ART. VI.

A reposição.
Ordinariamente quando empalmamos uma carta,
é com ofim de a repormos sobre o baralho de-
pois de passada certa occasião em que nos con-
vinha que ella estivesse lá.
O methodo de empalmação que expuzemos em
2º lugar não se presta à reposição.
O 1º sim, e com facilidade.
Se o baralho está em cima da mesa, com a
esquerda fazemo-lo chegar para a borda. Para.
que os espectadores encontrem a explicação deste
movimento (pois é indispensavel que elles pos
explicar tudo, sem partirem da hypothese de que o
prestidigitador os quer enganar), fingir-nos-hemos
pensativos (depois do baralho estar na borda) como
quem medita o desenlace que pretende dar à sorte.

Fig. 16.
Este estado de meditação, ou antes de hesitação
apparente, deve ser breve. Depois nos-ha facil
repôr a carta, assentando sobre o baralho a mão
empalmadora, mas devemos empregar tambem,
e ao mesmo tempo, a esquerda para levantar O
baralho, inclinando-o para o nosso lado, pois assim
a reposição faz-se com mais naturalidade.
— 81 —

Ha tambem outro meio facil para effectuar esta


manobra. Tomais o baralho na mão esquerda, aper-
tando-o pelo lado debaixo com os dedos, de ma-
neira que as costas das cartas fiquem curvadas
e voltadas para 0 ar à vista dos espectadores
(fig. 16). Encaminhai-o para baixo da mão em-
palmadora, afrouxando logo os dedos index, mé-
dio e annular da esquerda, o que dá lugar a que
as cartas em virtude da sua elasticidade tornem
ao seu natural, fazendo um estalido, que enco-
bre o barulho que ás vezes faz a carta empal-
mada ao ajuntar-se com as mais.

ART. VII.

O pescanço.

Pescar uma carta é vêla no baralho e co-


nhecê-la, sem que os circumstantes suspeitem que
nós a vimos e conhecemos.
Se a carta está em baixo, o prestidigitador tem
na direita o baralho com uma das extremidades
voltada para o seu peito, e a outra para os es-
pectadores. Os dedos maximo e annular ampa-
rão o baralho do lado dos circumstantes; o polle-
gar sustenta-o do lado do prestidigitador, o index
tem a ponta firmada no meio das costas do ba-
ralho. Nesta posição, carregando com o index no
lugar em que o pozemos, e apertando o baralho
com o pollegar para cima, o prestidigitador verá
a carta de baixo, e deix ha cahir logo com
as outras para 0 seu primitivo lugar. Os espec-
tadores, como as costas do baralho e da mão estão
M. S 6
Epa
voltadas para o seu lado, não vêem a carta, e
tomão este movimento por um gesto natural aos
prestidigitadores, que não podem ter o baralho
quieto na mão.
Se a carta que desejamos vêr, está no meio,
podemos passa-la para baixo, por meio da baldroca,
e pesca-la pelo modo indicado. Se não quizermos
ouas circunstancias não admittirem esta manobra,
pomos-lhe o dedo minimo da. esquerda por baixo
como se nos dispozessemos a baldrocar, e com o
pollegar da direita levantamos a metade do baralho
onde está a carta, pescando-a nessa occasi
Ainda ha outro meio, que é o seguinte :
Tendo o baralho na mão esquerda exactamente
como na 1º posição da baldroca (fig. 8º), com o
dedo minimo e os seus vizinhos levantamos o
monte em baixo do qual está a carta que de-
sejamos pescar. Esta operação precisa ser feita
com rapidez, mas sem sobresalto. É claro que
para ella ser possivel, é necessario saber o lugar
em que se acha a carta. Muitas vezes este prin-
cipio póde escusar-se, recorrendo a outros de que
daremos noticia.

ART. VII.

Sortes de cartas.
I.
Achar n'um baralho através de um lenço uma carta em que
outra pessoa haja posto o pensamento.

Dizei a uma pessoa que tire wma carta do ba-


ralho, ea veja. Abri-o ao meio, e pedi que pon
a carta no lugar aberto, sem todavia largardes
— 83 —

da mão o baralho. Collocada a carta, ponde sobre


ella o dedo minimo da mão esquerda; baldrocai.
Feito isto, a carta pensada ficará em cima do
baralho. Ponde-o então sobre a mesa, cobri-o com.
um lenço, e fingi que procuráis pelo baralho todo,
a carta. Tomai-a de cima da mesa no lenço, des-
dobrai-o e mostrai a carta pensada.
Sabendo praticar destramente a manobrh da
baldroca, sem a qual muitas sortes ha que se
não podem fazer, o espectador admirar-se-ha,
vendo como foi que através do lenço descobris-
tes a carta,
x

II.

Dizer a uma pessoa que parta o baralho quantas vezes


quizer, e adivinhar logo quantas cartas ha em cada
um dos montes.

Separai os quatro naipes do baralho, e ponde


cada um delles por sua ordem; az, duque, terno,
quadra, quina, etc. Ajuntai em seguida todos os
naipes sem os baralhardes, tomando sentido na
ordem por que os collocais, Para isso é bom aju-
dar-vos da mnemonica. Eu vos digo como cos-
tumo collocar os naipes, para me não esquecer
dessa ordem.
O 1º naipe é o de ouros, porque o mundo cos-
tuma dar ao ouro o primeiro lugar. Depois do
ouro é forçoso dar às espadas as honras da pre-
cedencia. À estas seguem-se as cópas que algu-
mas nações dedicárão ao amor (pelo que lhes
chamão corações) e nós consagramos a Baccho,
— 84 —

que são dous deuses, senão parentes, ao menos


muito amigos. O ultimo lugar fica para os páos.
Isto não é senão para facilitar a reminiscencia;
mas o que é necessario, é ter bem presente a
ordem da collocação dos naipes, de maneira
que não haja a menor tardança em pedir á me-
moria a recordação dessa ordem. Para isso cada
um póde escolher a disposição, que lhe parecer
mais facil. de lembrar. Mes
Assim temos az, duque, terno, quadra, quina,
sena, sete, dama, valete, e rei de ouros ; az, duque,
terno, quadra, etc., de espadas; az, duque, terno,
etc., de copas; az, duque, etc., de paós. Como já
disse na epigraphe, póde partir-se o baralho quan-
tas vezes se quizer, porque vendo-se a carta de
baixo, sabe-se qual é a primeira de cima. Sup-
ponhamos que a carta, inferior é o terno de ouros;
Já sei que a carta superior é a quadra do mesmo
naipe, à 2' a quina, a 3º a sena, etc., e que depois
do rei de ouros vem o az, duque, terno, etc., de es-
padas, ás quaes se seguem os paós, etc, Assim
vendo a carta de baixo de cada um dos dous
montes, sabemos o numero das que ha em cada
um delles.

EXEMPLO.

A ultima carta inferior do monte de baixo é o


terno de ouros. Logo, a primeira do monte de
cima é a quadra do mesmo naipe. Suppondo que
a carta inferior do monte de cima é o az de es-
padas, faço rapidamente esta conta. Sendo a pri-
meira carta do monte de cima a quadra de ouros,
e sendo a ultima do mesmo monte o az 'de es-
padas, segue-se que neste monte estão todas
as cartas de ouros desde a quadra inclusive até
lB) ax
ao rei, que são 7 cartas ; e como depois dos ouros
vêm as espadas, e no monte de que se trata, está
o az desse naipe, que é a primeira carta que se
segue aos ouros, vem a estar nesse monte uma
só carta de espadas. Tenho, portanto, neste monte
8 cartas, que são 7 do naipe de ouros e 1 do de es-
adas. Ora se neste monte estão 8 cartas, claro
que no outro estão 32.
Esta sorte é de lindo effeito para quem ignora
o seu simplissimo processo.
Os bons prestidigitadores podem faze-la muitas
vezes, porque véem subtilmente a carta de baixo,
e então interessa-lhes repetir a sorte para tirar toda
a suspeita de que a certeza da conta fôsse de-
vida ao acaso. Mas os menos destros não a devem
repetir muito, para que se não repare na impor-
tancia que ligão ás duas cartas de baixo.
Advertirei ainda, que depois de partirdes muitas
vezes o baralho (o que é necessario para os cir-
cumstantes se persuadirem que não vos importa
nada a disposição das cartas), querendo repetir
mais vezes a mesma sorte, escusais de estar
sempre a vêr a carta do monte de baixo. Basta
té-la visto uma vez. Conhecida ella, mandareis
partir; e vendo a carta inferior do monte que es-
tava em cima, dizei o numero de cartas desse
monte ; depois tornai-o a pôr no seu antigo lugar,
mandai partir de novo para dizerdes 0 numero
de cartas que ha nesse monte, novamente partido;
de maneira que podeis repetir muitas vezes este
divertimento, sem verdes mais que uma só
carta.
Esta sorte é importante em si, e não menos pelo
partido que dos seus principios se póde tirar para
muitas outras.
— 86 —

HI.

Postos tres montes de cartas n'uma mesa, adivinhar og


pontos das que estão debaixo dos tres montes.

Primeiro que tudo, é preciso saber-se que nesta


sorte os pontos das figuras contão-se por 10, ex-
cepto os azes que valem 11. Nas mais cartas
contão-se tantos pontos, quantos ellas represen-
tão, assim o duque vale dous, o terno tres, etc.:
o oito, no baralho de quarenta cartas, conta-se
por sete.
Diz-se a uma pessoa, que ponha na mesa uma
carta com as costas voltadas para cima, e que
lance sobre ella tantas cartas quantos fôrem os
numeros de pontos necessarios para sommar 15,
entrando neste numero o dos pontos designados
pela carta que foi posta na mesa.
* Por exemplo:
A carta posta é um az (que vale onze pontos).
Em cima della devem-se collocar quatro cartas.
Se a de baixo fôr um rei, ou um valete, ou uma
dama, como cada uma destas figuras vale 10,
deve-se-lhe pôr em cima 5 cartas. Se é um sete,
deve ser coberto com 8 cartas, e assim por diante.
Deste modo se fórma um monte. Mandão-se
fazer mais dous pelo mesmo methodo.
Assim dispostos os 3 montes (a cuja formação
é estranho o prestidigitador, pois elle não diz se-
não a maneira como devem ser formados), toma-
mos as cartas que restão do baralho, contamo-las,
accrescentamos-lhes mais 8 e a somma represen-
tará o numero dos pontos das 3 cartas inferiores
destes 3 montes.
—8 —
Para ajudar melhor a comprehender esta sorte,
que aliás é simples, apresentaremos um exemplo.
Seja a 1º carta do 1º monte um sete, a do 2º
um terno, a do 3º uma dama. Como a do 1º monte
é am sete, cobrimola com 8 cartas, e ficão ahi
9 cartas. Como a do 2º monte é um terno, co-
brimo-la com 12 cartas, e ficão neste monte 13
cartas. Como a do 3º é uma dama, que vale 10,
collocamos-lhe 5 cartas em cima, e ficão ahi 6
cartas. Assim vem a haver, nos tres montes, 28
cartas, e portanto devem ficar 12 no resto da
baralho. O prestidigitador conta estas, e achando
12, accrescenta-lhe mentalmente o n. 8 (que é o
que sempre se accrescenta, seja qual fôr o nu-
mero das cartas que restarem), e acha a somma
de 20, que é exactamente o numero dos pontos
das tres cartas de baixo. Esta conta regula para os
baralhos de 40 cartas.
A habilidade do prestidigitador está em contar
as cartas do resto do baralho, sem os espectado-
res o notarem. Isto é facil quando as que testão
são poucas, pois, estendendo-as em fórma de leque,
conta-as n'um momento: sendo muitas, convém
tomar algum pretexto, ou mandar pôr em
cima de cada monte mais um numero dado de
cartas.

Iv.

A mesma sorte que a precedente, feita com quatro


montes.

Esta sorte leva uma vantagem sobre a anterior,


que é deixar menor numero de cartas no resto do
baralho, tornando-se então a conta mais expe-
— 88 —
dita. Postos os quatro montes, como fica ensinado
na sorte antecedente, 4s cartas que crescerem,
acerescenta-se-lhes o numero 24. Se crescerem 2
cartas, os pontos dos quatro montes se)
crescerem 3, serão 27, e assim por diante.
Póde facilmente acontecer, que as.de, um ba-
ralho não cheguem para cobrir todos os pontos.
Nesse caso, é natural que quem formou os montes,
diga que lhe faltão cartas. O prestidigitador per-
gunta então de quantas precisa, dá-lh'as de outro
baralho, e desconta depois no numero de 24 o nu-
mero das cartas que lhe deu, e o resto designará
os pontos dos quatro montes.

EXEMPLO.

Sejão as cartas inferiores de cadaum dos montes


os duques : nesse caso, cada um daquelles cons-
tará de 14 cartas, consumindo assim 56, que são 16
mais do que ha no baralho com que operamos.
Diminuindo estas 16 do numero 24, ficão 8 que é
exactamente a somma dos quatro duques.

v.

Adivinhar, pelas costas, todas as cartas do baralho.

O methodo que vou indicar, tem-se tornado bas-


tante conhecido; mas o que mui raras pessoas
sabem, é a applicação que delle se póde fazer a
outras sortes. Indicarei adiante algumas dessas
applicações; mas como ha pessoas que ignorão o
methodo a que me refiro, passo a expô-lo.
Primeiro que tudo, devemos ter bem presente a
— 89 —
ordem dos naipes. A respeito de ontra sorte já
disse que tenho adoptado para ajudar a memoria,
a seguinte ordem: ouros, espadas, cópas e pãos.
Esta ordem lembra logo, a quem attender ásidéas
do nosso seculo, as quaes collocão o onro acima,
de tudo, depois a força representada pelas espa-
das, que são as que dão a lei, se as sustenta o
ouro, seguindo-se-lhe as cópas que representão os
corações ou o amor por causa do qual se quebrão
muitos pdos. É preciso saber ainda o valor dos
pontos. As cartas representão os pontos que têm.
menos o oito que vale 7, a dama 8, o valete 9,
e o rei 10.
Agora vamos a dispôr as cartas. Primeiramente
collocamos sobre a mesa, com as pinturas volta-
das para cima, uma carta qualquer do 1º naipe
(ouros). Aos pontos que essa carta representar,
accrescentaremos 5, tiramos-lhe 9 se os houver,
e o resto será o numero dos pontos que ha de ter a
carta do naipe seguinte (espadas). Por exemplo,
se a 1‘ carta foro 7 de ouros, a 2º será o terno de
espadas, porque 7 (numero dos pontos da 1* carta)
com 5 fazem 12, noves fóra 3. O mesmo processo
vamos seguindo sempre 'até ao fim do baralho.
Note-se, porém, que se os pontos de uma carta,
sommados com 5, derem 9, pomos um valete do
naipe immediato, e se a somma fôr 10, collocamos
um rei do competente naipe, mas em seguida a
este collocamos um az do mesmo naipe que o
rei.
Seguindo este processo, que é muito facil (po-
dendo qualquer com algum pouco uso tornar-se
expeditissimo na sua execução), ascartas do bara-
lho devem ficar todas pelo seguinte modo, uma
vez que principiemos pelo duque de ouros.
'—duque de ouros 21.4—duque de copas
—seto de espadas 22.a—sete de phos
Sopaasma

—terno de copas 28.2—terno de ouros


— dama de pãos 24.3— dama
de espadas
—quadra de ouros 25 — quadra de copas
—valete de espadas —valete de pos
—qnina de copas — quina de ouros
de pãos —rei de espadas
ãos —az de espadas
—sena de copas
duque de páós
ete de ouros
—terno de espadas
—dama de copas
— quadra de espadas — quadra de pãos
.a—valete de copas 36.—valete de ouros-
— quina de pãos |37.2—quna de espadas
Ja rei de ouros 38:a rei de copas
—az de ouros 39.2—az de copas
90.a—sena de espadas 40.a—sena de pios
Por mais vezes que partais o baralho, a ordem
relativa das cartas não se altera. Paya conhecer-
mos a primeira carta de cima, nada mais precisa-
mos que vêr a de baixo, accrescentar-lhe 5 pontos,
e tirar-lhe os noves fóra, se os houver. Esta opera-
ção indicar-nos-ha os ponins da carta superior,
cujo naipe será o imnrediato ao da que estava em
baixo. Exceptua-se o caso de ser a carta de baixo
um rei, porque então a de cima será um az do
mesmo naipe.
Exemplos: Supponhamos que a carta de baixo é
a dama de espadas. A de cima será a quadra de
cópas, (seguindo-se a ordem dos naipes que adop-
tamos:no principio desta sorte) ; porque como a
dama vale 8, e como 8 com 5 sommão 13, noves
fóra 4, claro é que a carta immediata à dama será
uma” quadra; e como a dama é de espadas, e às
espadas se seguem as cópas, será de cópas a
quadra que se seguir à tal dama. Descobrimos
portanto a quadra de cópas, depois de a haver
— 9 —
annunciado. Por baixo desta deve estar o va-
lete de pãos, porque 4 e 5 são 9 (que é o valete),
e como0 quatro era de cópas, o valete será de
dos que é, segundo a nossa disposição, o naipe
immediato, Por baixo deste valete deverá estar
a quina de ouros, porque 9e 5 são 14, noves
fora 5, e porque aos pãos seguem-se outra vez os
ouros. Continuando deste modo iremos adivi-
nhando as cartas todas até ao fim.

. VI.

Adivinhar de repente as cartas que uma ou mais pessoas


tomão do baralho.
Disposto o baralho, como dissemos na prece-
dente sorte, mostramo-lo de modo que se veja que
está desordenado, emandamos partir umas poucas
devezes, porque já sabemos que o numero das par-
tidas não faz alterar a disposição das cartas. Feito
isto, abrimos o baralho em fôrma de leque, para
que qualquer pessoa tire uma carta. Tirada esta,
no sitio de onde ella sahio, pomos o dedo minimo
da mao esquerda (na qual sustentaremos o ba-
ralho), e baldrocamos fazendo passar para baixo
do baralho o monte que estava em cima da carta
tirada. Claro é que por esta operação a carta in-
ferior do baralho é aquella que estava antes da
que foi tirada. Vendo-a accrescentando-lhe o
n. 5, e tirados os noves fóra, havendo-os, sabemos
qual era a carta tirada,
Por exemplo. Supponhamos que a carta trans-
ferida, pela daldroca, para baixo, era a quina
de cópas. Como a carta tirada era a immediata-
— 92 —

mente seguinte, não podia deixar de ser o rei


de pãos, porque 5 e 5 são 10 (rei) e ao naipe de
cópas segue-se o de pãos. Se a carta de baixo
fôsse um rei (de ouros, por exemplo), a imme-
diata seria o az do mesmo naipe desse rei, isto
é, tambem de ouros, porque, segundo já disse-
mos, no baralho de 40 cartas a cada rei deve
seguir-se o az do mesmo naipe. A quem lêr a
5º sorte não serão precisas mais explicações.

Vil.

Estender um baralho sobre a mesa com as costas para


cima ; pedira uma pessoa que tire uma carta, e fazer
com que outra carta, tomada por outra pessoa de outro
baralho, seja identica á primeira tirada.
« Ora, minha senhora, queira V.Ex.'tirar desse
baralho uma carta 4 sua vontade, e guarda-la
no bolso sem a vêr... mais nada ! isto é princi-
piar muito cedo. Vou primeiro baralhar as car-
tas, para tirar toda a suspeita sobre a sua col-
locação. »
Aqui preciso advertir aos leitores (com a con-
dição de o não dizerem a ninguem) que o baralho
está disposto pela ordem indicada na sorte V.
Baralho-o em falso (vide artigo II que ensina 0
modo de se fazer limpamente esta operação) ; em
seguida, mostro-o aos espectadores, para que
vejão que as cartas estão desordenadas, sem com-
tudo lhes dar tempo demasiado para as examina-
rem bem. E elles não desconfiará6 da nossa pressa
porque, como temos de fazer muitas sortes, preci-
samos de aproveitar bem o tempo.
—9 —

« Agora, minha senhora, que as cartas estão


bem baralhadas, queira tirar uma e guarda-la. »
Tirada a carta, passamos o monte de cima para
baixo, afim de sabermos qual foi a tomada, se-
guindo, em tudo isto, os principios que expuzemos
na sorte antecedente.
Agora pegamos n'outro baralho, o qual estará
enaipado de maneira que nos seja facil, n'um
instante, dar com a carta que nós quizermos, sem
a vêr senão pelas costas.
Para este fim deve-se observar o seguinte : te-
remos primeiro o naipe de ouros, cujo rei será
um pouco mais comprido do que as outras cartas.
O segundo naipe será o de espadas, e o seu rei
será um pouco mais largo. Segue-se o naipe de
cópas, cujo rei será ao mesmo tempo um pouco
mais comprido e mais largo. Vai por fim o naipe
de pãos.
Esta diferença que existe nas cartas dos reis dos
3 primeiros naipes, deve ser bastante para o pres-
tidigitador, mas imperceptivel para os espectado-
res. A differença de um millimetro é bastante
para um, sem ser de mais para os outros.
As cartas de cada naipe estarão dispostas pela
sua ordem natural, isto é, duque, terno, qua-
dra, etc. 5
Assim arranjado‘este baralho, ser-nos-ha facil
num momento darmos com a carta que queremos.
Se queremos o az de ouros, acha-lo-hemos logo em
cima do baralho porque este naipe é o primeiro
na ordem dos naipes, e o az o primeiro em cada.
naipe; se queremos o duque, será a 2, etc. Se
a carta tirada fôr uma de cópas, a sena por exem-
plo, o tacto mostra-nos a carta larga que sabe-
mos ser o rei de espadas, ao qual se seguem as
cópas; e então afastando o monte das espadas,
abrimos as cópas em fórma de leque para contar-
—94 —

mos até à sena que é a 6º carta, e subtrahimo-la


para debaixo do baralho. .
Tudo isto se effectua com muita rapidez.
Então dizemos à uma 3º pessoa, que escolha
deste baralho uma carta, e servindo-nos da ma-
nobra, que se chama carta furçada (a qual se
acha-explicada no art. II) passamos-lhe para a
doa carta, que nós tinhamos apartado, e que é
a à que a 1º pessoa tinha tirado.
Feito isto, perguntamos á 1º senhora qual foi
a carta que ella tirou, sem comtudo lhe consen-
tirmos que a veja. Responde-nos que sem isso
não póde saber qual é.
« Tambem eu não sei, nem me importa sabe-lo.
mas mando que essa carta, seja ella qual fôr, se
converta n'uma identica à que aquella senhora
acabou de tirar. Então, senhor, tem a bondade
de nos mostrar a sua carta ? »
a-nos a sena de cópas, por exemplo ; pe
nhora que mostre a que tirou, e reco-
e-ha que é tambem a sena de copas.

VIII.

Fazer tirar uma carta, torna-la a pôr no baralho, baralhar,


e fazê-la apparecer no lugar que se quizer.
Esta sorte é semelhante a outra que já apresen-
támos. Mas a differança do processo faz com que
pareça outra. .
Tirada a carta, e posta outra vez no baralho,
depois de vista pelos espectadores, collocamoso
dedo minimo da mão esquerda (onde temos o mes-
mo baralho), não debaixo da carta tirada, mas
— 95 —

debaixo da immediatamente infefior; de maneira


ue baldrocando, a carta tirada seja a segunda
ebaixo do baralho.
Feito isto perguntamos em que lugar querem
que appareca a carta, e quando no-la tiverem
ito, levantamos um pouco o braço, como se qui-
zessemos ageitar a manga da casaca, mas com o
proposito real de mostrar aos circumstantes que a
carta, que está em baixo, não é a que foi tirada.
Se nos disserem que seja a 5a dita carta,
. tiramos a de baixo, apresentamo-la na mesa com
a pintura voltada para cima, e depois arreda-
mos (1) um pouco a 2º carta (que é a desejada),
para tirarmos outra que apresentamos tambem
em cima da mesa; de igual maneira tiramos ou-
tra e depois outra. Após esta, puxamos pela carta
desejada, que será a 5º, a qual estava em baixo
do baralho à espera que lhe chegassea sua vez.

IX.

Os quatro setes inseparaveis.

Ponde em baixo do baralho tres oitos, que serão


por exemplo, de ouros, espadas e cópas ; por baixo
destes collocai os quatro setes, por esta ordem:
pãos, cópas, espadas, e ouros. É de rigor que o

(1) Para arredar a carta debaixo, tendo na mão esquerda


o baralho com as costas voltadas para cima, afastamos com o
index da direita a dita carta, empurrando-a cousa de centime-
tro e meio (meia pollognd para o nosso lado, que é o lado
opposto aos espectadores. fi facil de conceber que desta ma-
neira podemos muito bem tirar as cartas que estão em cima
da carta arredada, puxando por ellas com o index da mão di-
reita, sem que o espectador perceba que em baixo das que vão
sahindo existe outra.
= Gi
primeiro sete que está sobre os tres oitos, seja de
um naipe differente delles. Por isso, no exemplo,
que apresentei, excluindo o oito de pãos, assenter
o sete deste naipe em cima dos tres oitos. Assim
disposto o baralho, tomai os quatro setes, e lan-
çai-os na mesa com as pinturas voltadas para os
espectadores. Depois que os tiverem visto bem,
tornai-os a pôr debaixo do baralho.
Agora deveis baldrocar passando para cima os
tres setes debaixo. Os bons prestidigitadores, bal-
drocão mui subtilmente, mas de ordinario é diffi-
cil occultar o movimento que se faz ao executar
esta operação. Por isso é conveniente usar de al-
gum pretexto para encobrir esta manobra. Na
occasião presente fareis um discurso à imitação
do seguinte :
« Alguns costumão fazer esta sorte, passando
destramente uma dezena de cartas para baixo dos
setes, e baralhando depois estas dez cartas, que
retencem inculcar pelos setes, » Dizendo isto,
aldrocai como quem pretende ajudar o discurso
com a acção, fazendo o necessario movimento dos
braços de cima para baixo para que se não
perceba, que na verdade fazeis o que accusais
nos outros. Continuai, sem vos interromperdes, o
vosso discusso. « Emquanto a mim, não adopto
esse meio como já ides vêr. Cá vão os quatro setes
para cima da mesa. Vejão. »
Antes de cumprirdes o que acabais de dizer, to-
mai as quatro cartas debaixo do baralho (que são,
como sabemos, o sete de pãos e os tres oitos dos
restantes naipes) ? estendei-as em fórma de leque ;
e mostrai as pinturas aos circumstantes. lista
fórma permittir-vos-ha encobrir com o sete de
pãos os oitavos pontos dos tres oitos.
Os espectadores julgão que tudo é sete, porque
— 7 —

os virão sahir do lugar onde os tinhão visto pôr,


e além disso distinguirão bem o sete de pãos.
Postos assim os quatro suppostos setes sobre a
mesa, parti à baralho em dous montes, e ponde
o sete de pãos em cima do monte onde estão os
outros setes ; ide ao outro monte, e tomai uma,
porção de cartas, que lancareis sobre este sete.
Tomai agora um dos oitos, que os espectadores
suppõem ser um sete, a collocai-o em cima do
mesmo monte, cobrindo-o com uma porção de
cartas do outro, como fizestes ao verdadeiro sete.
Eo mesmo fareis aos outros dous oitos, que os
mesmos espectadores tomão pelos dous restantes
setes,
Escusado é dizer que desde que pozestes o sete
de pãos em cima do monte, ficárão os mesmos
setes todos juntos, de maneira que as cartas que
lançais depois, já os não separão. Mas os cir-
cumstantes pensão o contrario, porque julgárão
que os oitos erão setes. Podeis mandar partir e
correndo o baralho mostrareis os quatro setes
reunidos.

x.

Os quatro azes inseparaveis.

Estendei sobre a mesa osquatro àzes. Tendo o ba-


ralho na mão esquerda, empalmai tres cartas com
a direita, e pousai o baralho em cima da mesa.
Dizei aos espactadores que ponhio os azes sobre
o baralho. Tomando-o então com a mão esquerda,
Ms. 7
— 98—
ponde-o debaixo das tres cartas que tendes em-
palmadas na direita. No mesmo instante tomai
quatro cartas de cima do baralho; e como a
quarta destas é um az, deveis fazer com que os
ciscumstantes a vejão, sem que pareca que lh'a
mostrais de proposito, porque é preciso evitar to-
da a occasião de mostrar que suppondes os assis-
tentes desconfiados de vós. No mais fareis o mesmo
que se disse na precedente sorte, isto é, partireis
o baralho em dous montes; poreis o verdadeiro
az (que é o que está debaixo das quatro cartas) em
cima dos outros ; tomareis do outro monte umas
poucas de cartas com que cobrireis este az ; pe-
gareis depois n'uma das outras cartas, (que os es-
pectadores erradamente cuidão ser um dos azes),
para a pordes no mesmo monte; cobria-a igual-
mente com algumas cartas e fazei 0 mesmo aos
outros dous suppostos azes. No fim de tudo isto
estareis habilitados a mostrar os azes juntos.
Para tornardes a sorte mais variada, quando
correrdes o baralho para achardes os azes, ponde-
lhe o dedo minimo da mão esquerda, dispondo-
vos.à operação da baldroca, voltai então o
baralho com as costas para cima, tendo-o na mão
esquerda com o minimo della em cima dos azes,
de maneira, porém, que os espectadores o não
observem.
Então perguntai, onde é que desejão os azes;
se no principio, se no meio, ou no fim do bara-
lho. Por via da baldroca podereis satisfazer a
qualquer pedido, passando-as rapidamente para
onde quizerdes.
Escusado é dizer, que isto que se faz com os
quatro azes, se póde fazer com quaesquer outras
cartas, por exemplo, reis, damas, etc.
— 99 —

XI.

Adivinhar um numero de cartas que alguem tomou do ba-


ralho, e fazer augmentar 9 numero dellas na mio da
pessoa que as tomou, conforme ella o desejar.
Contai secretamente um certo numero de cartas
no baralho, por exemplo, nove ; e ponde por baixo
dessas 0 dads minimo da mão esquerda, apertan-
do com elle o baralho contra a palma dessa mão,
onde o tendes, e convidai uma pessoa a que tire
ahi o numero de cartas que lhe parecer. Essa
pessoa, achando alguma defficuldade em tirar as
que estão por baixo das nove, contenta-se com
“tirar essas, e não repara em que a dificuldade
provém de astucia vossa.
Então, fingindo pesar o resto do baralho, como
para conhecer pelo peso o numero das que fal-
tão, dizei que essa pessoa tem em seu poder
nove cartas. Conta-as, e achando-as certas já se
admira da vossa habilidade.
Em quanto fazem a contagem, tomai outras
tiro de cima do baralho, empalmando-as na
ireita. É natural que quem contou as cartas,
achando-as certas, as ponha em cima da mesa;
então, apresentai sobre ellas as quatro empalma-
das, dizendo à pessoa que as poz na mesa, « deixe-
as lá estar na mão, e diga quantas quer que appa-
reção sobre as nove, mas que sejão poucas, por
exemplo, 2, 3,0u 4.» A experiencia mostra que
ordinariamente se pede o numero que ultima-
mente se indicou; e nesse caso mandão-se
contar, e apparecem as 13, que são as 4 que
puzemos de novo em cima das 9 que já esta-
vão. Se pedem só 3, dizei que vos dê uma para
— 100 —
ensinar o caminho ás mais; e pondo-a em cima,
do baralho, que está na mão esquerda, com os
dedos da direita fazei estalar rapidamenteo ba-
ralho, roçando com esses dedos pelas extremi-
dades das cartas, fingindo que por esta operação
fazeis apparecer no monte o numero exigido.
Contando-se, achão-se 12 cartas, que são as 9
primitivas com as 3 que ficárão, depois de tirada
aquella que vos derão para servir de guia às
outras. Se pedir só duas, dizei a outra pessoa:
« podeis levar d'alli outra, porque a habilidade
chega para todos. » Mandando contar as cartas,
verão que lá estão as 11. Podeis continuar o
divertimento da mesma maneira, fazendo-o cessar
logo que vos parecer que não podeis continua-lo
sem suspeita. Nesse caso mudai para outra sorte,
o que os espectadores não levão a mal, porque
gostão da variedade.

. XII.

Fazer apparecer n'um chapéo uma carta que outra pessoa


houver tirado e baralhado.

Dai a tirar e a vêr uma carta; mandai-a collo-


car outra vez no baralho, e ponde o dedo minimo
da mão esquerda por cima d'essa carta, para
executardesa baldruca. Baldrocai. Por esse meio
a carta que foi tirada, será a primeira de cima
do baralho. Baralhai, sem comtudo confundir-
des a carta de cima, a qual deve continuar a es-
tar no mesmo lugar. Em seguida, empalmai-a
na esquerda, dando com a direita o baralho a
baralhar; tomai um chapéo na mão que estálivre,
— 101 —
fazendo com elle, sem afectação, alguns movi-
mentos; e approximando-o da outra mão que tem
empalmada a carta, deixareis cahir esta dentro
do chapéo, o qual passareis para essa mão que
agora acaba de ficar livre, fizendo com elle al-
guns movimentos naturaes em quanto os especta-
dores se fartão de baralhar. Mandai pôr o ba-
ralho sobre um mesa, pousai o chapéo em cima.
delle, edai um piparote no baralho inculcando
ue por este meio a carta passará para dentro
o chapéo.
Esta sorte póde sorprehender mais, se, quando
dermos aos assistentes o baralho, os convidar-
mos a que verifiquem, se a carta que tirárão se
acha ou não alli. Mas para isso é preciso ter
um baralho em duplicata, d'onde possamos ex-
trahir uma carta igual à que foi tirada. Tambem,
em vez do baralho todo, poderemos ter uma só
carta, mas, nesse caso, quando dermos a tirar
uma aos circumstantes, impingir-lhes-hemos uma
identica à nossa, segundo os principios da carta
forçada.

XIU.

Adivinhar uma carta por meio de um calculo impossivel.

« Ahi têm, minhas senhoras, essas cartas. Ba-


ralhem a bom baralhar: que lhes quero mostrar,
como por uma conta, para mim muito simples,
do valor de certas cartas posso chegar a adivinhar
outras. »
Quando me restituem o baralho, ponho destra-
mente o dedo minimo da mão, que me der mais
— 102 —
geito, por baixo das tres ultimas cartas de cima,
afim de poder gescar (1) a terceira destas. Para
disfarce dou mais duas baralhadellas sem confun-
dir as tres cartas superiores.
Parto, e digo que vou tirar de cima de cada,
monte as cartas precisas, para que sommadas com
a conta calada que sei, perfação 70.
Tomo uma carta do monte onde está a minha
conhecida, e lanco-a na mesa com a pintura vol-
tada para cima. Vou ao outro monte, do qual
tomo outra carta que do mesmo modo lanço na
mesa. Torno ao da carta conhecida, e faço o
mesmo. Finalmente repito a operação no outro
monte.
Como do monte onde está a carta pescada,
tirei as duas que a cobrião, veio a ficar ella
em cima; porém afim de enganar os espectado-
res, finjo que a não conheço e começo a calcu-
lar, contando os pontos das que tiver voltado em
cima da mesa, tomando por 8 a dama, por 9 o
valete, por 10 o rei, e o az por 11. Sommo tudo
a meia voz, como quem nem se quer enganar.

(1) O pescanço (termo expressivo usado pelos jogadores do


monte) faz-se facilmente, levantando com o dedo minimo à
carta, e deixando-a cahir logo, como quem se está divertindo
com o baralho. Como as costas deste se devem achar voltadas
para o espectador, o qual não está provenido para observar
o nosso movimento, veremos então à carta sem que elle re-
pare. Este principio é util em muitas sortes, e infelizmente
muitas vezes utilisado pelos jogadores do monte, conhecidos
pelo bem escolhido epitheto de batoieiros.
Nesta sorte, e em todas as outras em que não houver in-
conveniente, podem tirar-se do baralho 05 ternvs, quadras e
quinas, porque aliás, para nos desenganarmos se uma carta
era duque ou terno, precisariamos de levanta-la, dobrando-a
até ao meio, e na mesma necessidade nos veriamos para dis-
tinguir as quadras das quinas, é umas e outras das senas.
Se os duques forem iluminados, escusamos de lançar fóra os
ternos, porque então não ha o perigo do se confundirem.
— 103 —
no calculo, nem revelar o mysterio, e digo, a
modo de quem falla só: « os pontos sommão
50; para 70 vão 20; baralhou-se 12 vezes; a
carta que sahio em ultimo lugar, foi tal (por
exemplo, o seis de espadas): logo, esta não póde
deixar de ser tal » (o quatro de ouros por exem-
plo, suppondo que foi essa a carta pescada). En-
tão levanto a voz triumphante, e digo logo, que
aquella carta é a quadra de ouros. Descubro e
mostro-a,
O maravilhoso desta sorte está no calculo si-
mulado. Os assistentes não sabem como seja pos-
sivel, por conta alguma sobre as cartas sahidas,
adivinhar qualquer das encobertas, tendo sido
préviamente baralhadas. Elles têm razão até
certo ponto; mas em vez de dizerem que o cal-
culo foi uma impostura, dizem que a nossa ma-
thematica é mais transcendente e maravilhosa
do que a de Franceeur.

XIV.

As cartas mudadas por arte magica.

« Sra. D. Emilia, V. Ex. vê esta carta?


« Vejo.
« Qual 6?
« A dama de ouros,
« Então lá vai para a mesa a dama de ouros.
« Tenha a bondade de lhe pôr a mão em cima.
Não a deixe fugir, que isto de damas nem sempre
são muito certas.
«E V. Ex. Sra. D. Adelaide, vê esta carta?
« Vejo, sim. Pois eu sou alguma cega?
— 104 —
_ Nao é não;e por issoé que eu não acre-
dito no proverbio quando diz:—ndo ha formosa
sem senão.
« Mas como não é cega, tambem felizmente
não é muda; e então póde dizer-nos que carta é.
« Ora todos vêem que é o valete de copas.
« Pois bem! Porei na mesa o valete de cópas.
Para as honras que eu lhe quero fazér, melhor
era que fôsse rei. V. Ex, digna-se cobrir com o
lenço o valete de cópas?
« D. Adelaide, com ser de condição arisca, não
póde agora deixar de condescender com este meu
pedido, por que lhe ferve a curiosidade de vêr o
que d'alli sahe.
« A Sr. D. Emilia tem na sua mão a dama de
ouros, e a Sra. D. Adelaide na sua o valete de
cópas. Este resultado pude conseguir com a hu-
mildade dos meus rogos. Agora, porém, em vez
de pedir, ordeno que as cartas se troquem.
« A dama de ouros fique transformada em valete
de cópas e o valete de cópas na dama de ouros. »
Vê-se, e com efeito, o valete apparece nas mãos
de D. Emilia, que era quem tinha a dama, e esta
apparece em poder de D. Adelaide que tinha o va-
lete.
Até aqui a sorte. Agora a explicação.
No baralho, com que produzimos esta maravi-
lha, deve haver uma carta em duplicatat Para
irmos em harmonia com o exemplo que acabamos
de dar, a carta duplicada será O valete de cópas.
Um destes dous valetes de cópas estará em baixo
do baralho, mas por baixo desta carta estará ainda
outra, que será (também em harmonia com o mesmo
exemplo) a dama de ouros. Em cima do baralho
terei posto o segundo valete de cópas. Baralhare-
mos, mas de modo que estas tres cartas não soffrao
— 105 —
mudança na posição em que acabamos de
colocar.
Para mostrar 4 Sr. D. Emilia a carta inferior,
que é a dama de ouros, tenho o baralho na mão
que me der mais geito, com as costas delle vol-
tadas para a palma dessa mão, segurando-o por
uma extremidade .com o pollegar, e, pela outra
com os dous dedos annular e maximo e am-
parando-o pelas costas com 0 index.
Quando esta senhora me disser, que vio a dama
de ouros, abaixo a mão, arredo a carta inferior, e
tirando a immediata (o valete de cópas), colloco-a
na mesa com as costas voltadas para cima.
D. Emilia cobrindo-a com a mão, julga que tem
alli a dama de ouros, por que vio sahir a carta de-
baixo do baralho, onde se achava a tal dama.
Baralharei novamente ; e por essa occasião farei
com que a primeira carta de cima (que é, como já
disse, um dos meus dous valetes de cópas) passe a
ser a primeira debaixo, e que por detrás desta
fique logo a dama de ouros.
Isto não é dificil, a quem se tiver exercitado no
baralhar em falso. Comtudo, póde aqui prescindir-
se desta operação. Basta fazer passar a carta de
cima (valete de cópas) para baixo do baralho, o
que se consegue facilmente por meio da baldroca.
Em virtude desta disposição, vem o segundo va-
lete de cópas (pois o primeiro já está em cima da
mesa, como disse), a ser a primeira carta inferior,
sendo a immediata a dama de ouros.
Depois disto é que mostro a D. Adelaide o va-
lete de cópas, pelo mesmo modo por que mostrei
a D. Emilia a dama de ouros. E tendo-o mos-
trado, abaixo o baralho; arredo a carta inferior,
e tiro a immediata (que é, como o leitor já sabe,
a dama de ouros), lançando-a na mesa com as
— 106 —

costas voltadas para cima. Sobre esta carta é


que D. Adelaide pôz o lenço.
Agora é claro que D. Emilia tem na mão o
valete de cópas, julgando que é a dama de ouros,
e D. Adelaide tem a dama, julgando qué é o va-
lete.
Logo que terminar as minhas manobras, o meu
puma cuidado será empalmar o segundo va-
ete de cópas, e escondê-lo, pois póde haver al-
gum curioso, que suspeite da existencia do va-
lete duplicado. E passo a fazer logo outra sorte,
para que os espectadores não tenhão tempo de
reflectir.

XV.

Um dado feito prestidigitador.


« Não sou eu só, minhas senhoras, quem possue
o dom sublime de adivinhar. Communiquei tam-
bem ao meu dado essa rara habilidade, que já
lhe vão admirar.
« Uma de VV. EEx. tiraré uma carta. Depois
de a vêr e mostrar às suas amigas, tornará a
pô-la no baralho. Deste farei varios montes, e o
dado mostrará em qual delles se acha essa carta.
« É verdade que elle não sabe fallar. É a unica,
prenda que lhe falta. Mas entender-nos-hemos
com elle por meio de uma linguagem de con-
venção.
« Como o dado tem seis faces, e em cada uma
dellas seus pontos desde az até sena, distribuire
as cartas em outros tantos montes, e à cada um
delles darei um numero desde um até seis.
« Uma pessoa qualquer lançará o dado; e o
— 107—
numero de pontos que elle mostrar, será o nu-
mero do monte, em que deve achar-se a carta
que foi tirada e vista. »
Antes de se offerecer o baralho para se tomar
a carta, parto-o umas poucas de vezes. Aos cir-
cumstantes não ficará pretexto para supporem
que o maravilhoso dado necessita do meu valio-
so compadrio.
Tirada a carta e reposta no baralho, passo a
cumprir quanto annunciei.
Supponhamos que a carta extrahida foi o terno
de pãos, e que ficou no quarto monte. Lança-se
o dado. Ei-lo a correr pela mesa. Quando lhe
parece, pára, mostrando ao espectador a face em
que tem a quadra.
Mando voltar o monte designado, e logo que
dou com os olhos na carta desejada, exclamo
cheio de jubilo: « Adivinhou! Adivinhou! Lá
está o terno de paos! »
Isto só pelo demonio! (dizem comsigo os que
presenciário o prodigio). Quem disse ao dado
que o terno de pãos estava no quarto monte?
Que poder occulto o fez parar na quadra? E
quem foi que disse ao prestidigitador, que a
carta, por nós tirada e só por nós vista, era esse
terno de pãos? Mettão-se lá com elle a jogar
as cartas ou o gamão !
Ora façamos. desvanecer o milagre, revelando
o artifício que o produzio, que é, com effeito, da
mais pueril simplicidade.
O baralho não terâmais do que 36 cartas. Destas
apenas seis são differentes umas das outras; de
cada uma destas seis haverá seis exemplares.
Assim, por exemplo, teremos seis ternos de
pãos, seis quinas de espadas, seis quinas de copas,
— 108 —

seis valetes de ouros seis valetes de pãos, e igual


numero de reis de espadas.
Ao todo 36 (1). no
Disponho-as pela seguinte fórma. O primeiro
terno de pãos, 0 primeiro valete de ouros, a pri-
meira quina de cópas, e o primeiro valete de es-
padas (2).
Seguem-se pela mesma ordem as segundas
cartas repetidas, isto é, o segundo terno de pãos,
o segundo rei de espadas, a segunda quina de
espadas, o segundo valete de ouros, a segunda
quina de cópas e o segundo valete de espadas,
e assim por diante, guardando sempre a mesma
disposição nas outras cartas repetidas.
A ultima de cada uma destas (que em o nosso
exemplo é o valete de espadas, será um pouco
mais larga de que as outras, para que pelo tacto
possamos atinar com a ultima de cada uma das
cartas repetidas. A estas cartas largas, na giria
da prestidigitação, dá-se o nome de chatvões.
Antes de se oferecer o baralho para se tirar uma
carta, parto-o varias vezes, como já disse.
Com estas partidas não se altera a ordem re-
lativa das cartas, como já em varias sortes o temos
advertido; de maneira que sabendo nós pelo tacto,
que uma é mais larga do que as outras, sabe-
remos que essa é o valete de espadas; que a

(1) Podem ser outras quaesquer, comtanto que não sejão a


seguir, isto é, não devem ser o az, 0 duque, o terno, a quadra,
etc. Aliás o espectador que no fim tem de vêr um dos montes,
nos quaes se hão de achar todas as seis cartas differentes, des-
confiaria do artifici
(2) Isto é para exemplo. O que é conveniente, é que nesta
ordem haja uma desordem apparento, afim de que no animo dos
espectadores se não levantem suspeitas. O prestidigitador de-
xe saber de cór a ordem que deu 4s seis primeiras cartas,
que é a mesma que ha de dar ás outras.
— 109 —
seguinte é o terno de pãos; a immediata o rei de
espadas, e!
etc.
Dou a tirar uma carta, e tomo sentido no lugar
em que ella estava. Em quanto a pessoa, que a
tirou, a está vendo e mostrando aos mais cir-
cumstantes, procuro pelo tacto o primeiro chavão
que estava em cia della, e conto as outras cartas
que se seguião ao dito chavão até aquella que
toi tirada. Para isso, quando se tomar a carta,
levantaremos as outras que a cobrião, -e conser-
va-las-hemos levantadas até que a tirada seja
restituida ao seu antigo lugar.
Feito isto, partiremos o baralho varias vezes,
comtanto que da ultima o façamos por um dos
chavões.
Na formação dos seis montes, que havemos de
pôr na mesa, tambem é conveniente usar de al-
gum artifício, para que o espectador não desconfie
do cuidado com que procuramos collocar em cada,
um delles igual numero de cartas. Neste intuito
levando o baralho para sobre a mesa, conserva-
lo-hemos levantado della cousa de tres centime-
tros (uma pollegada), segurando-o pelos lados.
Nesta situação, apertando com os dedoso segun-
do chavão, deixamos cahir na mesa as cartas
que estavão por baixo delle. Assim fica formado
o primeiro monte. O segundo faz-se do mesmo
modo, apertando o terceiro chavão, e assim por
diante.
Deste modo teremos os seis montes, e em cada
um delles existirá cada uma das seis cartas
diferentes.
Lança-se então o dado, Este não póde errar,
porque seja qual fôr o monte que elle indique,
ha de existir ahi uma carta semelhanteà que foi
tirada.
— 10 —
Mandamos voltar as cartas do monte designa-
do, e antes que os espectadores o declarem, di-
Temos:
« Adivinhou! Lá está o terno de pãos.»
Os circumstantes vendo o deleixo com que for-
mamos os montes e notando a desordem apparen-
te das cartas que lhes fôrão mostradas do monte
voltado, não desconfião facilmente de que em
cada um delles existão as mesmas cartas. Mas
sempre é bom estarmos prevenidos contra a curio-
sidade, que possão ter, de os examinar. Ha para
isso uma estrategia facil. Basta que tenhamos no
bolso um » baralho semelhante ao primeiro, em
que faltem as seis cartas que neste existião re-
petidas.
Depois de se lançar o dado, apontaremos para
o monte do milagre, e diremos: « E esse. Ti-
rem-o. Não lhe quero tocar. » No entretanto junto
rapidamente os outros, e logo que os tenha na
mão, digo como quem reprehende os espactado-
res de falta de curiosidade. « Então que fazem
ahi que não tratão de vêr, se o dado acertou! »
Toda a attenção dos espectadores converge
naturalmente para o exame do monte indicado;
e aproveito esta occasião para metter n'um bolso
as cartas repetidas e tirar do outro o baralho
auxiliar.
Acabada a sorte, esperaremos alguns segundos
pelas duvidas dos espectadores, porque é mais
glorioso o triumpho, quando ha resistencia. Mas
se ninguem vier com objecções, poremos sem
affectação o baralho em cima da mesa, com as
pinturas voltadas para os circumstantes.
— 1 —

XVI.

Pensada uma carta, pôr sobre a mesa tres das primeiras


que aparecerem, e fazer com que uma dessas, qual
os espectadores quizerem, se converta na carta pen-
sada.

Com razão inculcão os prestigiditadores esta sor-


te, como uma das mais maravilhosas da carto-
mancia, porque ha nella duas dificuldades im-
mensas, consistindo uma em adivinhar a carta em
que alguem poz o pensamento, sem dar o mais
pequeno signal por onde se possa conjecturar
qual foi a carta pensada, e consistindo a outra
em fazer com que uma carta escolhida, por uma
essoa, dentre tres que sahirão casualmente do
aralho, se converta na carta pensada. Destas
dificuldades a primeira é evidentemente muito
maior.
A sorte em si não é custosa de executar. O
poor é estar sujeita a accidentes, de que só nos
ivra o muito habito e a presença de espirito.
Para vencermos a primeira difficuldade, de que,
ha pouco, fizemos menção, precisamos de forçar
o pensamento da pessoa, a quem mostrarmos as
cartas, obrigando-o a occupar-se daquella que a
nós nos parecer.
Para este fim, collocada debaixo do baralho a
carta que melhor nos aprouver, fazemo-la passar
para o meio, usando da baldroca; e deixamos ficar
o dedo minimo da mão esquerda (na qual temos
o baralho), por baixo da tal carta. Para attrahii
mos sobre ella 0 pensamento do parceiro, preci-
samos voltar o baralho com as pinturas para
— 12 —
cima; e como nessa nova posição, não podemos
conservar 0 dedo minimo da mão esquerda sobre
aalludida carta, damos a volta de maneira que a
a ponta do dedo pollegar da direita possa ficar em
cima della. (1).
Nesta situação começamos com o index da
mesma mão a empurrar as cartas com muita
velocidade, e quando chegarmos à que está de-
baixo do pollegar, demoramo-nos um instante,
e continuamos com o mesmo dedo pollegar a em-
purrar velozmente as restantes cartas.
Fazendo nós assim, a carta pensada será pro-
vavelmente aquella em que paramos um pouco;
pois, como para pensar e fixar na memoria uma
carta se gasta algum tempo mais do que o per-
mitte a rapidez com que vamos correndo as car-
tas, quando chegarmos ao meio, o parceiro dese-
joso de occuparo pensamento, aproveitaa occasião
que lhe dá a pequena pausa que fazemos ; ecomo
"ahi por diante continuamos e empurrar as
cartas mui velozmente, elle conservar-se-ha cons-
tante e leal à primeira impressão. Não é mão
que a tal carta seja uma figura, porque impres-
siona mais.
Se esta figura foi um rei de pãos, esta será a
carta pensada, pelas razões que já dissemos.
Quando já fôrão corridas todas as cartas do ba-
ralho, e o parceiro nos disser que fixou a sua

(1) A ponta do dedo não deve ficar mettida entre os dous


montes do baralho, mas sim de maneira que os separe um do
outro, comtanto que o espectador não perceba. Portanto, esse
dedo deve ficar como a amparar o baralho pela extremidade
que fica voltada para o prestidigitador. Não se tomando as
convenientes precauções, o parceiro naturalmente desconfia.
Pense o leitor no modo que lhe faz mais geito: não espere que
este livro lhe ensine tudo, porque no que são movimentos &
posições, o geito das pessoas é o melhor dos mestres.
— 113 —
escolha, vamos para a mesa, fazemos passar, pela
baldroca, o tal rei de pãos para cima do ba-
ralho.
Tomamos uma das cartas debaixo, mostrando-a
ao parceiro, e dizendo-lhe : « Esta não é a carta,
em que o senhor pôz o pensamento? »
Respondendo-nos que não, pomo-la em cima
da mesa. Tiramos outra tambem debaixo, e po-
mo-la igualmente na mesa, depois de a ter mos-
trado, e repetido a mesma pergunta.
Feito isto, passamos a tirar a terceira tambem
debaixo do baralho, e mostramo-la, renovando
a pergunta. A resposta será, como sempre, ne-
gativa. Esta terceira carta não ha de ir para a
mesa, como fôrão as outras duas. Em vez della
irá a carta de cima do baralho, que é a pensada.
Mas é indispensavel que o espectador julgue,
que a terceira carta posta na mesa é a terceira
que lhe mostramos.
Para se conseguir este resultado, precisamos
de bifar a carta de cima do baralho, pondo, ao
mesmo tempo, debaixo delle a terceira carta
mostrada. Como essa de cima é a carta desejada
(no nosso exemplo o rei de pãos), essa é a que
vai para sobre a mesa, e devemos colloca-la no
meio das outras. Só depois disto é que tem lugar
perguntarmos se nas tres da mesa se encontra
a carta pensada. Respondendo-nos negativamen-
te, como é de esperar, perguntamos qual daquellas
desejão vêr transformada nella.
Estando o prestidigitador a alguma distancia
da pessoa que tem de responder, esta provavel-
mente indicará a do meio, porque é aquella que
se póde designar com mais promptidão, e não
exige tantas declarações como qualquer das dos
lados. Indicando-vos a do meio, mandai declarar,
Ms 8
— 14 —
qual 6 a carta pensada; e dizendo-vos que é o
rei de páos, mostrai-a voltando-a.
Se em vez de vos apontarem a carta do meio,
vos indicarem uma dos lados, ponde aquella em
cima desta, e a do outro lado sobre a do meio,
Os espectadores julgão-vos obrigado a conver-
ter a debaixo na carta pensada; e, por isso pondo
as tres com as costas voltadas para O ar, arre-
dareis a debaixo, e tirareis a do meio, pondo-a
sobre a mesa, e mandando-a declarar. Decla-
rando que é 0 rei de paos, mostrai-o voltando-a.
O pelor é, se, apezar do vosso ardil, o parceiro
poz o pensamento n'outra carta, que não era o
rei de pãos. Neste caso, não vos assusteis, porque
tendes meio de tornar ainda mais bello o effeito
desta sorte.
Perguntaremos à pessoa que vio a carta, qual
ella era, e dizendo-vos, por exemplo, que era a
dama de cópas, percorrei n'um instante o bara-
lho, para cujas costas passareis a dama indica-
da, logo que derdes com os olhos nella.
Ao mesmo tempo dizei: « é exactamente essa
dama de cópas a que se acha no lugar que V. Ex.
indicou, e tanto que não está aqui no baralho. »
Sahi da mesa onde estaveis operando, e mos-
trai o baralho para que se veja que lá não
existe a dama de cópas, fazendo isto de ma-
neira que essa dama não seja vista, o que se
consegue, tendo-a bem junta com a carta im-
mediata, de fórma que as duas pareção uma
só. Mostrando assim que semelhante carta não
existe alli, todos começão a persuadir-se que ficou
effectivamente em cima da mesa. Então dirigi-
vos para esta, afim de poderdes desenganar o
publico, de que nas tres cartas e no lugar pre-
scripto se encontra a desejada. Ponde aquella que
vos mandárão converter em dama de pãos em
— 15 —
cima das outras duas, e levantando-a mostrai-a,
dizendo que aquella foi a carta pensada.
Feito isto, deveis esperar que vos digão que
aquella não é a dama de cópas, porque effecti-
vamente o não é.
« Não é a dama de cópas! (dizeis vós muito
admirado). Então qual é? Queira perdoar, mi-
nha senhora (replicais vós) ; V. Ex. enganou-se;
Como podia ser o rei de páos, se elle está na
gola da sobrecasaca deste senhor?» Ide tirar o |
rei de pãos da gola, onde o annunciastes e
mandai levantar a carta de cima das tres, a
qual será com efeito a desejada.
Aqui, para não interromper o que se passa
ostensivamente, não vos mencionei uma ope-
ração essencial, cuja falta vos fará scismar como
é que a dama de cópas, que estava em cima do
baralho, passou a estar em cima das tres; e como é
queo rei depãos, que estava emcima destas, passou
para a gola, onde depois é encontrado.
Tudo é muito simples.
Depois que mostrais o rei de pãos, fazendo-o
inculcar pela dama de cópas, e em quanto se
vos diz que estais enganado, bifai a de cima
do baralho deixando o rei no lugar della, e pon-
de-a no sítio do rei, depois de a terdes um pouco
de tempo na mão, à vista dos espectadores, os qua-
es não darão pela bifagem, uma vez que a tenhais
executado pelo modo exposto no art. 4°.
Desfazendo-vos da dama, empalmais o rei, que,
como fica dito, estava ultimamente em cima do
baralho, onde ninguem o esperava; e pedindo
licença a um dos espectadores, approximai-vos da
gola da sobrecasaca, e fingi que tirais de lá o
rei que levais empalmado.
Os assistentes julgão que o vosso engano,
quando mostrastes o rei de pãos em vez da dama
— 116 —
de cópas, não foi mais que apparente, e que vos
deixastes cahir nelle de proposito para augmen-
tar a surpresa do publico.
No principio desta sorte disse que a carta pen-
sada devia ficar em cima do baralho, mas que
depois para ser posta sobre a mesa, tinha de
ser bifada em troca daquella que mostramos
ao parceiro. Comtudo podemos dispensar esta
operação. A carta pensada, em vez de ficar em
cima, ficará em baixo do baralho, mas poremos
per baixo della mais tres cartas. Tendo o bara-
ho na esquerda, levantamo-lo ao ar de maneira
que se veja a carta inferior, e perguntamos se
aquella é a pensada, ao que nos respondem ne-
gativamente.
Então abaixamos o baralho, e tiramos esta pri-
meira carta, que pomos em cima da mesa.
Levantamo-lo novamente para mostrar que a
segunda debaixo tambem não é a carta pensada,
e tornamo-lo a abaixar para tirarmos esta se-
gunda carta, e pô-la igualmente sobre a mesa.
Levantamo-lo, emfim, outra vez para mostar que
a terceira carta tambem não é a pensada, mas
agora abaixando-o, arrcdamos a carta que aca-
bamos de mostrar para tirar a immediata (que
é a pensada) e colloca-la no meio das outras.
Como o arredamento é operação mais facil de
executar do que a bifagem, torna-se preferivel
este processo.

XVII.
A carta fugaz.
Dou uma carta a tirar, mando-a pôr em cima
do baralho, e entrego-o immediatamente para que
o ponhão dentro de uma caixa, e o fechem. Feito
— 17 —
isto, dou uma pequena pancada na tampa dessa
caixa e digo logo :
« A carta que estava em cima do baralho, rom-
peu através de todas as outras, abrio o fundo da.
caixa, traspassou a mesa, e só se deu por con-
tente, repousando no chão. »
Abro a caixa com a mais patente boa fé; peço
que examinem o baralho; e vendo-se que lá não
está a carta que foi tirada, mando-a procurar de-
baixo da mesa onde apparece infallivelmente.
Este milagre é muito notavel, mas o meio que
o produz é muito simples. A caixa é redonda e
tem de diametro cousa de 11 centimetros, o que
será sufficiente para caber nella um baralho. Na
tampa pelo lado de dentro ha uma peça redonda,
resaltada, que terá cerca de 5 decimetros de diame-
tro. Este resalto deve ser tal que bem possa as-
sentar e carregar em cima do baralho, quando
a caixa se fechar, e estará encerado.
Depois de termos uma caixa destas é claro, que
se nella mettermos um baralho, e a fecharmos,
apertando bem, a carta de cima adherirá ao tal
resalto por meio da cêra que a cobre. Esta caixa
importantissima para muitas sortes de cartas, tem
já explicado ao leitor a razão, por que a carta
posta em cima do baralho desappareceu de lá,
quando ella se abrio.
O mais é facil de perceber.
Munidos de uma carta duplicada, por exemplo,
de duas damas de ouros, lancaremos uma debaixo
da mesa, e teremos a outra no baralho. Quando
damos a carta a escolher, impingimos a dama
de ouros que existe no baralho, usando para isso
da manobra que se chama carta forçada.
Em vez de usardes do principio da carta for-
gada, podeis ter um baralho em que não haja
senão damas de ouros, e outro em que não exista
— 18 —
essa carta, o qual estará em cima de uma mesa
um pouco distante. Logo que a carta fôr tirada,
voltai as costas aos espectadores sob pretexto de
lhes deixardes ampla liberdade de verem a carta,
que se tirou, e aproveitai essa occasião para
substituirdes o vosso baralho de damas pelo outro,
em cima do qual fareis collocar a escolhida, como
já se disse,

XVIII.

Nova ceremonia para o consorcio dos azes.


Quando escrevêmos'a sorte X não nos lembrâmos
de expôr então outro processo para a demonstração
dos quatro azes inseparaveis. Encheremos agora
esta pequena lacuna, pois que ao prestidigitador
não basta saber fazer algumas sortes, mas é-lhe
necessario conhecer diversos meios de chegar aos
mesmos resultados, já para poder soccorrer-se de
um, quando o outro encontrar algum incidente
imprevisto, já para poder repetir o prodigio, sem
que os espectadores possão concentrar a attenção
sobre os movimentos anteriormente observados,
já finalmente porque a variedade dos processos
faz parecer diferente a sorte.
O meio que vamos agora indicar é muito
simples.
Damos os quatro azes a uma pessoa.
Pedimos-lhe que nos restitua dous.
Collocamos, um em cima, e outro em baixo do
baralho. Pondo o dedo minimo da mão esquerda
no meio do mesmo baralho, levantamo-lo de modo
que a pintura da carta inferior fique virada para
os espectadores, e ao mesmo tempo com o index
— 19 —
da mão direita levantamos a carta superior do
baralho, para que os espectadores vejão que os
dous azes estão effectivamente separados. Feito
isto, abaixamos o baralho, e baldrocamos de ma-
neira que os dous azes das extremidades fiquem
no meio pouco mais ou menos. Collocamos o dedo
minimo da esquerda sobre o az que estava em
cima. Levantamos o monte superior, isto é,
aquelle que fica sobre o dedo minimo da nossa
esquerda, e convidamos o possuidor dos restan-
tes azes a que os colloque naquelle sitio (1). Col-
locados, o dedo minimo da esquerda passará para
cima delles. Assentamos o monte superior sobre
o inferior (sem tirarmos o dedo minimo do lugar
em que o temos) e perguntamos em que parte
do baralho querem que appareção unidos os azes:
se em cima, em baixo, ou no meio. Pela baldroca
poderemos facilmente satisfazera qualquer pedido.

XIX,

Um cégo que vê.


Esta pequena sorte ainda que pouco valor tenha
para quem conhecer outras que já temos de-
scripto, não deixará de ser admiravel para muitos
espectadores. O resultado que apparece é o se-
guinte:
O prestidigitador, tendo os olhos tapados com
(1) É preciso que não mostremos empenho em que os azes
sejão postos alli, Antes de leyantarmos o baralho, dizemos,
por exemplo: « Easos ques venhão cá para o meio », a lovanc
indo o monte superior, offereceremos o inferior para sobre
elle serem postos os ditos azes.
Quando lévantarmos o monte superior, fal-o-hemos de ma-
neira que os espectadores possão vêr a carta debaixo desse
monte para que se convenção de que alli não ha az nenhum.
— 120 —
um lenço, abre o baralho em fórma de leque,
para que algum dos circumstantes tire d'alli uma
carta. Tirada ella e reposta no baralho, o presti-
digitador, sempre com os olhos tapados, põe-o no
chão, e procurando com um florete, espeta-o na
carta que acaba de ser tirada.
A novidade está sómente em dar o prestidigitador
com carta escolhida, apezar de ter os olhos ven-
dados. Mas a admiração cessa desde que se re-
flectir, que o nariz não deixa tapar os olhos 3
ponto de se não poder vêr para baixo, Não é pre-
ciso que o prestidigitador seja um Nasão. Ainda
que tivesse um narizinho como Cupido, veria bas-
tante por baixo da venda. Isto explica a razão,
por que ao travesso Deus do amor escapão me-
nos as formosas do que as feias, apezar de me-
nos raras.
Sabendo-se isto o mais não vale nada.
Damos uma carta a escolher, abrindo o baralho
em fórma de leque. Pescamos a carta immediata-
mente superior; baralhamos em falso, lançamos
o baralho ao sobrado, de maneira que as cartas
fiquem com as pinturas para cima; vendamo-nos
e com a ponta do florete separamos um pequeno
monte, onde pelo volume, sabemos que não existe
a carta desejada, e ahi começamos à lançar cada
carta para seu lado, como quem a busca; depois
vamos mais a modo procurar no resto do baralho.
Como a carta desejada deve estar antes, mas ao
pé daquella que pescamos, não teremos difficul-
dade em a reconhecer.
Assim que a percebemos, continuaremos a desfa-
zer 0 baralho, como um cégo que andando às apal-
padelas deixa às vezes passar os objectos que de-
seja tomar. Depois desta farça espeta o florete na
carta escolhida e entrega-a.

CAPITULO IV.

A MAGIA BRANCA EM ACCAO.

ARTIGO I.

A mesa do prestidigitador.

Para quaesquer outros que nao seus discipulos,


a magia branca é uma divindade.
Como os antigos idolos que para a realizacao
dos seus grandes mysterios tinhão templos pu-
blicos, ella precisa tambem de suas aras afim
deahi manifestar todo o esplendor de seu poder;
e não é senão no meio dos prestigios da scena de
um theatro que ella reduplica até o infinito seus
mais deslumbrantes prodigios.
Entretanto, do mesmo modo queas divindades do
paganismo tinhão, em algumas estancias, o seu
— 122 —
altar privativo, ella póde tambem tornar-se o
genio familiar de vossa casa. Mas se quizerdes
que as suas obras mais variadas e maravilhosas
paguem a vossa hospitalidade, reservai-lhe um
lugar no vosso aposento, onde ellas possão suppôr
as illusões da scena.
Ahi podereis estabelecer e reger as molas!que
fazem grande parte do poder da magia branca:
fallaremos dellas cada vez que nos forem neces-
sarias para a realizacaéo de qualquer milagre,’de
que vos daremos explicação.
Mas para a consecução de seus fins, nada ha
tão til e vantajoso como uma mesa: com ella
Só, sereis quasi um magico de primeira força;
é ella, pois, o altar erguido á divindade.
O que ha de extraordinario nesta mesa 2... Mais
ou menos alçapões: eis tudo o que ahi se encon-
trará; porém que de serviços não prestará, como
veremos na continuação de nossas explica-
ções!
Os algapões, como indica a palavra, são partes
da mesa, grandes ou pequenas, redondas ou qua-
dradas, moveis, que se abaixão e transportão ra-
pidamente e sem ruido o objecto collocado sobre
ellas. A abertura pela qual o objecto desapparece
acha-se instantaneamente fechada, ora pelo mes-
mo, ora por outro alçapão (fig. 17).
Agora entremos na descripção de uma peça,
tambem dependente da mesa, e que é de grande
utilidade para a realização de muitas sortes.
Essa peça, a que daremos o nome de serven-
tuaria, é uma especie de aba estreita, colloca-
da do lado opposto aos espectadores
e de modo
que estes a não vejão nem tão pouco saibão da
sua existencia, e sobre a qual o prestidigitador
deixa cahir os objectos, dos quaes quer vêr-se
— 123 —
livre promptamente, ou antes lançar mão dos que
lhe são necessarios para a affectuação de um mi-
lagre.

. Fig. 17.
Tal é a mesa do prestidigitador. Archimedes,
falando da alavanca, dizia: « Dai-me um ponto
de apoio, que eu levantarei o mundo, » Desta póde
o prestidigitador dizer, com uma pequena va-
riante: « Dai-me uma mesa bem grande que eu
escamotearei o globo terrestre! »

ARTIGO II.

A moeda invisivel.

A prata é um corpo visivel ou invisivel?...


«Singular pergunta, respondereis vós !..a prata
é um corpo visivel. » Entretanto muitos pobres
— 124 —
diabos affirmão o contrario; talvez tenhão razão;
nós o vamos provar.
« Qual d'entre vós, senhores, tem a bondade
de emprestar-me uma moeda de cinco tostões ?...
Bem. Agora tende o cuidado de marca-la para
depois podermos reconhecê-la... Muito bem! »
« Está aqui um lenço que vai servir-nos para
a prova que eu prometti. Collocarei no meio delle,
como o vêdes, a moeda que acaba de ser marcada
com uma pequena cruz. Dobro-o de maneira só-
mente a embrulhar a moeda... mas sempre vos
é facil reconhecer a fórma. Façamos melhor. Se-
gurai o lenço com as vossas proprias mãos, se-
nhor, alli, por cima da pequena boneca que fórma.
amoeda. Podeis apalpa-lae por esse modo assegu-
zar-vos de que ella ainda não sahio de seu lugar.
« Agora pegarei no lenço pelo lado opposto,
e puxa-lo-hei desdobrando-o em toda a sua lar-
gura, depois viro-o, sacudo-o e atiro-o ao ar,
afim de vos convencer de que os cinco tostões
não estão mais aqui. .O facto é evidente... mas
vistes partir a moeda? De modo algum! Logo a
prata póde muitas vezes tornar-se n'um corpo
invisivel. »
É o que podereis demonstrar da maneira pre-
cedente, caro leitor, se tiverdes um lenço, em
uma das pontas do qual tenhais cosido uma moeda
de cinco tostões.
Collocareis ostensivamente no meio do lenço a
moeda emprestada ; depois, ao dobrar do lenço em
vez deformardes a boneca com esta moeda, retei-a
entre o index eo médio, dentro da mão e operai
com a que estiver cosida no lenço numa especie
de ouréla. Quando puxardes bruscamente o lenço
da mão que o segurar, a illusão será completa.
Quanto à moeda marcada pelo espectador, e
que vos é facil depositar ou sobre a serventuaria
— 1% —
da mesa, ou no bolso, fazei-a apparecer n'uma
caixinha, n'uma fruta, etc., o que augmentará
o valor sorprendente da sorte que assim execu-
tardes.

ARTIGO III.

O lenço magico.

Não ha uma só reunião, diz M. Delion, em


que não appareça um sujeito com a pretenção de
escobrir immediatamente o segredo de cada
sorte effectuada pelo prestidigitador.
Tenho encontrado incessantemente, continúa o
mesmo autor, um personagem que se assemelha
de tal sorte, pela sua ingenuidade e presumpção,
que figurou-se-me ser sempre o mesmo individuo,
é longe de embaracar-me com esta ingenuidade
e presumpção, era-me mais util do que o auxilio de
um compadre ; acabei por designa-lo com o nome
‘de Sr. Bonbon.
Ora, o Sr. Bonbon tendo affirmado muito alto
apavanando-se que eu me entendia com um
compadre para a execução da moeda invisivel,
e que em lugar de uma moeda davão-me uma
obreia branca que me era facil engulir, forneci,
por meio do lenço magico, uma segunda prova
o que me compromettêra a demonstrar prece-
dentemente.
Pedi ainda um lenco no meio do qual mandei
o Sr. Bonbon collocar com as suas proprias mãos
a moeda; depois assentei, umas atras das outras,
— 126—
cada ponta do lenço sobre a moeda, e de ma-
neira que ella não ficasse occulta senão pelo
ultimo angulo do tecido. O 8r. Bonbon pôde ainda
toca-la e senti-la entre os dedos.
Então en segurando no lenço por um dos lados,
desdobrei-o agitei-o e virei-o, como ainda ha
pouco o dissemos, a moeda tinha invisivelmente
esapparecido !
O Sr. Bonbon afanára-se tanto em arregalar
os olhos inultilmente, que nós vamos ajuda-lo
aqui a adivinhar o nosso segredo.
O lenço disposto em angulos rectos diante do
prestidigitador, este começa por collocar sobre a
moeda o angulo que lhe fica mais proximo, da
direita ou esquerda. Neste primeiro angulo teve
o cuidado de pôr uma bolinha de cêra molle,
ue, por meio de uma pressão imperceptivel do
edo pollegar, faz adherir a moeda a esta ponta do
lenço. Reune depois ao acaso os outros tres an-
gulos do lenço sobre a moeda (fig. 18).

Fig. 18,
Feito isto, deprehende-se que um dos angulos do
— 127 —
lenço acha-se com a ponta dirigida parao pres-
tidigitador; elle toma-a com as duas mãos che-
gadas uma à outra, e se as afastar vivamente,
fazendo-as resvalar ao comprido do lenço, terá,
quasi immediatamente, em cada uma das mãos
uma das pontas do lenço com a moeda ou na di-
reita ou na esquerda,
Nesta posição poderá sacudir e virar o lenço
magico, com grande admiração mesmo de um
Sr. Bonbon, que ficará bem embaraçado se tiver
de responder para onde passarao os cinco tostões.

ARTIGO IV.

A colhér para o bilhete.

A Talia, a. patria de tantos homens ilustres,


é como a Hespanha, o paiz dos Bartholos, das
Rosinas e dos Almavivas. Ha alguns mezes que
em Florença se representava aquella eterna co-
media immortalizada no theatro por Beaumar-
chais, de um tutor tyranno e odioso, de uma pu-
pilla opprimida eenganada e de um amante joven
é animoso, entre il signor Lambino, a linda Fla-
minia e o bello marquez Reinaldo Lambert.
Pouco escrupuloso nos meios, comtanto que sa-
tisfizessem seus interesses, Lambino, o tutor
odioso, tinha, gracas a uma. boa e engenhosa ca-
lumnia contra a sua upilla, feito com que
o marquez tomasse a rest cão de não pensar mais
em Flaminia, Como o amor do cavalleiro era a
unica egide que pudesse proteger Flaminia contra
os designios de Lambino e dar à moça forças para.
— 128 —
resistir ás crueis importunações de seu tutor, este
vira-se logo em Vesperas de torna-la sua mu-
Ther e adquirir os bens de que não era se-
não administrador. Emquanto soffria esta vio-
lencia, à qual era-lhe impossivel fugir, a pobre
menina suppunha que Lambino se tivesse servido
de alguma aleivosia para afastar de si Reinaldo,
que fizera-lhe partilhar um amor verdadeiramente
Sério. Justificada a seus proprios olhos por suas
circumstancias, resolvêra traçar algumas linhas
para o joven marquez, mas devéra renunciar à es-
peranca de fazê-las chegar ás mãos deste.
No dia dos esponsaes, Lambino que temia uma
derradeira tentativa de resistencia da parte de
sua pupilla, tomou a deliberação de dar, afim de
obsequia-la e distrahi-la de seus sentimentos,
um pequeno banquete, pare o qual não convidou,
por prudencia, senão duas ou tres regentes de
recolhimentos e os seus amigos mais idosos.
Achava-se nessa occasião, em Florença, o pres-
tidigitador francez M. um banqueiro tinha-o
relacionado com Lambino, e este pedio-lhe uma
sessão de magia, convidando-o a contribuir desse
modo para a festa offerecida a Flaminia. M. D...
accedeu ao convite e mandou transportar para a
casa do velho Italiano algumas pecas mecanicas.
No dia aprazado teve lugar a sessão. Depois
de varias sortes, 0 francez annunciou que a magia
dava-lhe o poder de fazer renascer uma folha
de papel de suas cinzas, e para que ninguem pu-
zesse duvida, entregou um lapis e uma folha de
papel branco a Lambino, induzindo-o a escrever
o que lhe parecesse, e a dobra-la depois bem her-
meticamente em quatro partes; era o papel que
devia renascer depois de queimado, e sem que,
por consequencia, fôsse possivel apresentar um
outro no seu lugar.
— 129 —
Emquanto Lambino dobrava cuidadosamente a
folha de papel, depois de autographo, M. D...
disse que não querendo que se suppuzesse a menor
escamotagem, não lhe tocaria nem com a ponta
dos dedos, e que não a perderião de vista um
só instante até que ella fôsse reduzida a cinzas.
Para recêbe-la, pois, tomou uma especie de colhér,
cujo cabo tinha a extensão de uma bengala. Mas
no momento em que Lambino ia depositar o papel,
Flaminia lançou vivamente um outro dentro da
colhér, dizendo:
— Peco-vos, senhor, que facais a experiencia
para mim e com este papel !
O olhar da pobre menina era tão doloroso e tão
supplicante, que immediatamente M. D... afastou-
se com a colhér, apezar das exclamações do velho
tutor que lhe bradava:
— Entregai-me, senhor, entregai-me esse es-
cripto... estou em minha casa, no meio de meus
amigos, e ainda que eu houvesse de empregar a
violencia, não o deixaria em vosso poder!
— Acalmai-vos, meu caro nospeile, respondeu
tranquillamente M. D....; graças à magia branca,
osso satisfazer-vos, assim como à vossa encanta-
ora pupilla. Colloco sobre este prato o papel que
ella me confiou, e como não quero por modo ne-
nhum guarda-lo, a vosso pezar, approximo delle
este phosphoro aceso e queimo-o.
— Passai-me o prato, vociferou Lambino, para
que eu veja ao menos se o bilhete da minha imper-
tinente noiva está effectivamente queimado.
M. D... levou o prato ao Italiano que não achou
mais do que cinzas ainda candentes e fumegan-
tes; mas como lhe pareceu inteiramente impos-
sivel que o bilhete, do qual não tinha ainda
despregado os olhos do Argos ciumento, fôsse
M Ss 9
— 130—
te
recomposto com taes elementos, o velho suspitow
com alguma satisfação.
Ora, o papel depositado por Flaminia na colhér
do prestidigitador era a carta escripta para seu
primo e noivo, o marquez Reinaldo Lamberti. Duas.
horas depois esta epistola tão bem devorada pelo
fogo, chegava perfeitamente intacta às mãos de
Reinaldo, que é hoje o marido da bella Flaminia.
Para deixar ao vosso arbitrio o fazer tambem
a felicidade de alguma Rosina opprimida, ou sim-
plesmente fazer renascer um papel de suas cinzas,
para divertirdes os vossos amigos, bastar-nos-ha
escrever a colhér empregada por M. D...
Esta colhér, já o dissemos, compõe-se de um
cabo do comprimento de 50 a 60 centimetros, mais
ou menos, terminado por um recipiente de folha
de Flandres, tendo a fórma de um livrinho meio
aberto e com o lombo redondo.
Disposto como se fôsse a folha de um volume,
um pedaço de folha de Flandres, movel, se acha
smplesie sobre uma das faces perpendiculares ao
cabo e alli retem, apertado e invisivelmente entre
uma e outra, a folha de papel de antemão col-
locada (fig. 19).

Fig. 19.
Quando a folha em que se manda escrever se
acha collocada na colhér, uma mola obedecendo
à pressão de um botão que o prestidigitador tem
— as —
4 sua mão, faz passar o pedaço de folha movel,
de uma para a outra face interior do recipiente,
de maneira que comprima o papel que tereis de
entregar depois ao espectadoré deixe livre aquelle
de que tendes necessidade.
Está bem de vêr que é este ultimo que pondes
sobre o prato e que queimais.
Quanto ao autog'rapho, o vosso ajudante o en-
contra na colhér que leva comsigo, e dispõe delle
segundo as vossas intenções, para depois fazê-lo
- apparecer.

ARTIGO V.

O peixe encarnado dentro de um cópo de


tinta de escrever.

« A chimica magica tem simplesmente verifi-


cado o facto de que a tinta de escrever é habi-
tada como o são os rios e o mar... mais ainda
talvez; pois qualquer pessoa poderia apostar com
certeza, que dentro deste cópo de tinta, que col-
loco aqui à vista de todos, ha, pelo menos, um
bello peixe.
« A tinta preta sendo de todos os liquidos o
menos limpido, não vos é possivel, senhores, vêro
animalzinho ; portanto, eu vou dar-vos uma prova
disso, mergulhando esta dama de ouros dentro
deste vaso, e agora que a carta já deve estar
ennegrecida pela metade, não podeis vêr senão
a outra parte da figura que, entretanto, ainda
existe inteira sobre a carta. Mais uma prova:
— 132—
sobre este prato vou despejar com esta colhér
(fig. 20) um pouco do conteúdo deste copo...
Vêde que o fundo do prato tornou-se invisivel.

Fig. 20.
« Deste modo chegamos à seguinte conclusão:
se viessemos a purificar olicôr contido neste cópo,
verieis o peixe nadar n'um mar de delicias.
« Para se tornar instantaneamente esta tinta
pura como o crystal, só o poder do lenço magico
poderá realizar este prodígio. Vou passa-lo por
sobre o cópo... Está feita a transformação; não
nos resta senão um licôr mais claro do que agua
de rocha, no meio do qual, bem o vêdes, nada
um lindo peixe vermelho (fig. 21). »
Se o prestidigitador, depois de executada a sorte,
vos désse o lenço para examinardes, encontrarieis
um pedaço de encerado preto ainda molhado, e
observarieis tambem que esse dito pedaco é ta-
lhado de maneira a guarnecer o interior do cópo.
Quando esse vaso vem para cima da mesa, já
vem preparado com o encerado,.o que impede que o
espectador veja a agua nelle contida até à ap-
parição do peixe, e dá a apparencia de um cópo
cheio de tinta preta.
Fig. 21.
Quanto à carta que o prestidigitador finge mer-
gulhar na tinta, representa a mesma figura de
ambos os lados, das quaes uma deve ser de an-
temão denegrida com tinta preta, pela metade,
e é a que se mostra em segundo lugar.
Finalmente a tinta que se despeja no prato sahe,
não do cópo, mas do cabo da colhér ; e não resta
mais para a execução desta sorte, do que levan-
tar com o lenço o encerado que fazia a illusão e
occultava o mysterio.

ARTIGO. VI.

A bandeja de multiplicação.
« Desde que existe a arithmetica, todas as ta-
boadas de multiplicação têm repetido que dous
e dous fazem quatro. Tantas vezes isto se disse
— 134 —
que por fim acreditou-se ; e todavia não ha nada,
menos verdadeiro... em magia. Vamos demons-
tra-lo; não por columnas de algarismos, porque
nos aborreceria, mas simplesmente com factos
tão claros como a luz do dia.
« Qual de vós, senhores, faz-me o obsequio
de emprestar quatro moedas de dous mil réis 2...
pune reutente duas, Collocai-as sobre esta ban-
eja para que todos se certifiquem de ue em-
prego exactamente o numero de moedas indica-
o... obrigado.
« Agora vou lançar dentro deste pequeno sacco,
que aqui vêdes, as duas moedas que acabão de me
ser confiadas... mas antes disto é bom que exa-
mineis o saquinho... não contém nada.
« Collocai ainda sobre a bandeja as outras
duas moedas... Bem, Metto-as no saquinho como
fiz com as primeiras.
« — Quantas moedas julgais que existe agora?
« — Quatro.

Fig. 22.
«— Mas eu já vos havia prevenido de que se
contasseis conforme o antigo systema das taboa-
das de multiplicação, por força havieis de errar...
Esvasiai o sacco com as vossas proprias mãos...
— 135 —
Realmente contém oito moedas... Acreditais ainda
que dous e dous fazem quatro? »
Continuai, caro leitor, a contar como d'antes.
Se a sorte que acabamos de executar abalou
a vossa confiança na taboada de multiplicação,
olhai de perto para a nossa bandeja de fórma
oblonga (fig. 22); vereis um fundo falso mui
pouco apparente, é verdade, mas bastante largo
e comprido para conter quatro moedas de 28.
Esta especie de corrediça é aberta em uma
das duas extremidades; puxando para vós a extre-
midade opposta, fareis cahir, com aquellas que
me emprestastes, as moedas que por um momento
causárão a vossa illusão.

ARTIGO. VII.

As novas pilastras mecanicas, verdadeiramente


maravilhosas.

As pessoas que conhecem as antigas pilastras


mecanicas, sabem bem que é impossivel separa-
las inteiramente, porquanto são presas na sua
parte inferior por um cordão ou fita, cuja pre-
sença é muitas vezes uma revelação. Não acontece
o mesmo com as modernas; mas digamos aos
leitores que nunca as virão o que são as pilastras
mecanicas, e a todos, como ellas operão um pro-
digio inteiramente agradavel.
Imaginai duas pequenas columnas terminadas
em cada extremidade por uma bola do tamanho,
pouco mais ou menos, de um ovo de pomba.
— 136—
São unidas uma à outra por um cordão que
atravessa as duas bolas superiores. O presti-
digitador fazendo-o correr da direita para a es-
querda e vice-versa, puxa-o algumas vezes
para fazer crêr que o mesmo cordão passa livre-
mente pelo meio das pilastras. Toma depois uma
tesoura e diz que vai cortar o cordão, do que
ninguem poderia duvidar, visto como elle mostra.
as duas columnas inteiramente separadas e con-
servando ambas uma metade do cordão cortado.
Feito isto, as pilastras são de novo reunidas, e
basta approxima-las para que o cordão se ache
immediatamente emendado. O prestidigitador fa-
lo, como ainda agora, ir e vir de um para outro.
lado das bolas, convidando algumas vezes um
espectador a metter o nariz entre ellas, e que o
cordão parece atravessar (fig. 23).

Fig. 28.
Para se obter este resultado, tanto faz emen-
dar o cordão como corta-lo porque elle não
atravessa de modo algum as bo) as, através das
— 137 —
juaes parece passar. De feito existem dous cor-
ões. Uma das extremidades de cada um sahe por
uma das bolas, que se reunem uma à outra, de
maneira que essas duas extremidades não pare-
cem formar senão uma atadura transversal. A
outra extremidade dos ditos cordões que passão
pelo interior das pilastras vai enrolar-se n'uma,
canilha collocada nas bolas oppostas. A um dos
moitões está adaptado um pequeno torno ou
dente exterior, bastante pequeno para que senão
dé por elle ;no outro moitão acha-se um pequeno
vácuo quadrado, no qual, logo que se reunem as
Pilastras, encaixa-se 0 torno com justeza.
Agora facilmente comprehendereis que, se de-
pois de reunidas as pilastras, puxardes a ponta
do cordão exterior da primeira, fareis gyrar a
canilha correspondente e ao mesmo tempo o tor-
no que imprime um movimento circular no
quadrado e na canilha da outra pilastra, que
enrola o segundo cordão, cuja extremidade op-
posta diminue de um lado tanto quanto se
estende do outro, e isso produz uma verdadeira
illusão. Se fizerdes o movimento da direita para
a esquerda e depois vice-versa, a pequena ma-
china operará em sentido contrario e com não
menos successo.

ARTIGO. VIII.

A boceta para o relogio.


M. D..., o prestidigitador de que já nos occu-
pâmos em outro lugar, dirigio-se o verão passado
ao velho solar do Barão X, para onde fôra muitas
— 138 —
vezes convidado a ir passar alguns dias dessa
bella estação. A opulenta morada, posto que
situada ainda em Franca,no meio de um deser-
to, não era habitada senão durante o estio; mas,
graças aos convites do Barão, reunia-se alli uma
boa sociedade. M. D... foi cordialmente acolhi-
do e encontrou ao sahir, no solar, um honrado
rapaz, seu compatriota, que ahi empregára-se
como criado.
Este ultimo, que se chamava José, tinha per-
dido aquelle ar negligente e alegre que M. D...
lhe conhecêra. José interrogado varias vezes e
com interesse pelo seu protector, acabou por
fazer-lhe, soluçando,a confissão seguinte:
« Vêdes a profusão de ricos moveis que aqui
ha, senhor; pois bem, nunca hoúve um só que
me desafiasse a cobiça, porque...
— Porque tú és honrado, José.
«— Não digais isso, senhor... No meio destas
lindas cousas, ultimamente vi uma e de tão pouco
valor que imaginei não fizessem caso della.... era
uma simples caixa de rapé; mas como se as-
semelhava muito 4 da minha pobre e velha mai,
que está lá no céo, desejei-a para mim ; parecia-
me que possuindo-a teria como que uma, lembran-
ca da cara defunta, e, depois de hesitar... sim,
senhor, roubei.
Os soluços intorrompêrão-o por um momento;
depois proseguio:
«— Nesse mesmo dia sahi a um mandado do Sr.
Barão que me reteve fóra deste solar por alguns
dias ; e apenas voltei, soube que meu amo pergun-
tára e fizera procurar por toda a parte a caixa,
que eu havia roubado, porque era tambem para
elle uma recordação... Não ousei confessar a mi-
nha falta... nem restituir a caixa ao seu lugar,
— 139 —
porque sem duvida seria accusar-me... Ainda a
tenho em meu poder, e só um milagre a pode-
ria fazer chegar ás mãos de meu amo, sem que
eu morresse de vergonha, »
— Consola-te, meu pobre José, disse o presti-
digitador, depois de uma pequena reflexão, o teu
arrrependimento merece que eu faça o milagre
que pedes: vai buscar-me a caixa.
No dia seguinte M. D... offereceu aos habitan-
tes do velho solar uma sessão de magia branca,
e terminou-a por uma sorte em que mostrou
uma boceta que, dizia elle, tinha o poder de fazer
apparecer um objecto em lugar de outro, e
mesmo substituir este ultimo por um objecto
perdido. Abrio-a então e pedio a uma pessoa que
collocasse dentro della um relogio (fig. 24).

Depois de fecha-la, contendo o relogio, per-


guntou ao Barão X... se não havia perdido al-
guma cousa que tivesse grande desejo de achar.
— Meu caro magico, disse o fidalgo, poderei
realmente responder-vos sem receio de embara-
gar-vos ?
— Ficar-vos-hei aliás muito mais agradecido
se, sem attenções para commigo, experimentar-
deso meu magico poder.
— 140—
— Pois bem, replicou M. X., julgando queo
nosso prestidigitador sahiria do embaraco por
qualquer subterfugio engenhoso, perdi uma cai-
xa de rapé, e ficaria muito grato à vossa boceta,
se ella m'a pudesse restituir,
— É esta? perguntou M. D..., abrindo a bo-
ceta, d'onde em lugar do relogio, tirou a caixa
que José lhe entregára.
O Barão ainda não sahio da sua admiração.
Caro leitor, se quereis conhecer a boceta em-
pregada nessa circumstancia por M. D..., dir-vos-
hemos que esta boceta se compõe de uma tampa
encasando um primeiro compartimento movel e
livre, collocado em cima de um segundo tambem
movel e sustido por uma mola em espiral con-
tida no pé da boceta, Comeca-se por levantar a
tampa para mandar depositar o relogio no pri-
meiro compartimento, e quando elle se acha
alli, fecha-se a boceta ; depois novamente abrin-
do-a, comprime-se um pouco as paredes da tampa
com a qual levanta-se dessa vez o primeiro com-
partimento.
O segundo compartimento, não se achando
comprimido pelo primeiro e impellido pela mola,
vem tomar, com o objecto a substituir, e que alli
se collocou antecipadamente, o lugar do comparti-
mento superior.

ARTIGO IX.

A cassarola infernal.
Tomai e depennai (asseguro-vos que esta receita
não é tirada doCozinheiro Imperial), tomai e de-
pennai, diziamos, varios passarinhos, aos quaes
— 141 —
tereis convenientemente torcido o pescoço; depois
mettei-os dentro de uma cassarola e collocai-a sobre
o fogo.
« Na verdade, pareceis condoer-vos da sorte
destas innocentes creaturas quesDeos, pensais vós,
não creára tão alegres e tão mansinhas para serem
cozidas e depois comidas.
« Mas tranquillisai-vos,a magia branca, minhas
senhoras, indignar-se-hia de vos recrear com os
seus prodigios, se um só d'entre elles vos causasse
um momento de tristeza.
« Do fogo que abraza e consome, a varinha ma-
gica vai fazer uma chamma de vida e de resur-
reição.
« Afim de augmentarmos o calor regenerador
de que vossos pequenos protegidos têm necessi-
dade antes de nascer, cubramos a cassarola em
que, sem a vossa benefica piedade, elles ião ficar
completamente assados.

« Não vos parece ouvi-los já agradecer-yos com


os seus alegres cantos Apressemo-nos em le-
vantar a tampa da cassarola (fig. 25). Então! não
— 142 —
cumpri a minha palavra?... Eilos que sahem
todos da cassarola, batendo alegremente as azas
e adejando por todos os lados. »
Agora, leitor, dir-vos-hemos muito baixinho,
para não affligir aquellas senhoras, que os pas-
sarinhos depennados ficarao no fundo da cassarola,
onde, felizmente, não podem ser vistos jamais
por olhos sensiveis (*).
Os volateis vivos estavão encerrados na tampa;
posto que a fórma, desta não tenha nada de ex-
traordinario, permitte entretanto dissimular um
pequeno aposento no seu interior. Um prato re-
londo, mobil e livre serve de soalho a este apo-
sento e o fecha hermeticamente.

Fig. 26.
Quando se'descobre a cassarola, carrega-se n'um
pequeno botão collocado no alto da tampa, que
faz cahiro prato, e cuja quéda tem o duplo re-
sultado de pôr em liberdade os passaros vivos
e cobrir inteiramento os mortos (fig. 26).

(*) Para poupar aos amadores um trabalho enfadonho na


construcção dos apparelhos contidos neste volume, indicare-
mos à casa do Sr. Rodde, à rua do Ouvidor n. 118, onde se
encontrão todas estas peças perfeitamente acabadas.
— 43 —

ARTIGO X.

Balas e fléres sahindo de um chapéo.

Nunca vos aconteceu emprestar0 chapéo a


um prestidigitador, de dentro do qual elle ti-
rasse toda a especie de objectos? Talvez vos
causasse sorpreza vêr como tinheis até então
trazido sobre a cabeça, e sem o saber, uma
cornocopia!... Este artigo fornecer-vos-ha, se o
julgardes digno de ser lido, o meio de produzir
tamanha sorpreza.
Promettestes uma sessão de magia; os con-
vidados são numerosos; pedi ao mais incredulo
dos circumstantes que vos empreste o chapéo,
com o pretexto, por exemplo, de traspassar de
lado a lado o féliro com a varinha, e sem lhe
causar o menor estrago.
Tomai o chapéo com toda a naturalidade, passai
or detrás da mesa, d'onde fazeis face aos especta-
ores. Então segurareis no chapéo com todo o
cuidado (um momento com ambas as mãos, se
o julgardes necessario), de maneira que as abas
fiao fiquem nem mais altas, nem mais baixas do
que a superficie da mesa, mas suflicientemente
por detras desta.
Sobre a serventuaria achar-se-ha collocada, de
antemão, uma bala de folha de flandres, dca,
cheia de pequenos bougueis, etc., e guarnecida de
um buraquinho.
Emquanto dizeis algumas palavras com relação
ao objecto da sorte que tomastes para pretexto do
— 144 —
emprestimo, introduzi um dedo no buraquinho da
bala e fazei entrar no chapéo (fig. 27).

Fig. 27.
Depois quando fingirdes querer traspassar o
fêltro com a varinha, admirai-vos de encontrar
uma resistencia inesperada, e olhai para o inte-
rior do chapéo como quem quer descobrira causa;
no mesmo instante podeis exclamar que seria la-
mentavel devastar o jardim que o proprietario
do chapéo parece ter-se habituado a trazer sobre
a cabeça. É finalmente distribui, no meio de ri-
sadas, os bouguets que ireis tirando um a um
de dentro do fêltro.
Terminada que seja esta distribuição, e quando
todos julgão mais que nunca o chapéo vazio, tirai
dé dentro, não sem causar admiração geral, a
sobredita bala que entregareis ao vosso aju-
dante para a levar, como se fôsse um objecto
muito pesado, afiin de augmentar mais a illusão.
Voltai de novo 4 mesa e dizei que agora es-
perais poder executar a sorte como primeiramente
a annunciastes, e introduzi, como precedente-
mente, uma bala de pão maciça que desta vez
— 145 —
deixareis cahir no chão, com grande ruido, o
que desviará todas as supposições relativamente
ao primeiro projectil.
Tereis, pois, divertido e sorprendido os circum-
stantes mais do que o preciso, para que vos seja
permittido entregar o chapéo com esta conclu-
são: que não pensaveis que vos emprestassem,
em vez de um chapéo, um jardim completo e um
«arsenal cheio de projectis.

ARTIGO XI

A bandeja para as permutações.

Ainda um apparelho que, proporcionando-vos o


meio de executardes uma sorte agradavel, sera
de muita utilidade para muitas outras de diffe-
Tente natureza.

Fig. 28.
É uma bandeja, no meio da qual acha-se
Ms 40
— 146 —
disposto um vácuo redondo, do tamanho e capaci-
dade de uma moeda de dous mil réis (fig. 28).
Mandai collocar nelle uma moeda marcada, um
annel emprestado, etc., do qual desejais apossar-
vos, sem que se dê por isso.
O objecto para substituir acha-se assim collo-
cado sobre uma corrediça que basta fazê-la cor-
rer, para que a moeda ou o annel seja substituido,
com tanta rapidez que não haja tempo de notar-se
a substituição, por uma outra collocada preceden-
temente sobre a corrediça. Para isso não resta
mais do que puxar um colchete que é facil ao
dedo achar sob a bandeja; e pela abertura dei-
xada na extremidade do aqueducto interior, uma
simples inclinação traz à mão o objecto que parece
ter ficado no lugar ondeo espectador o tinha posto.

ARTIGO XII.

A caixa para as desapparições.


Já que principiáâmos a fallar dos apparelhos
que podem servir para sortes differentes umas
as outras, examinemos tambem, neste artigo, a
caixa para as desapparições.
Esta caixa grande ou pequena, conforme o ob-
jecto que se quer fazer desapparecer, seja uma
carta, uma moeda, uma flôr, um passaro, um
bouquet, uma pomba, um coelho, etc., etc., con-
tém'o que se chama uma dupla gaveta, isto é,
uma gaveta ordinaria, sob a qual corre uma falsa.
O lado da frente onde se acha o botão, que serve
para puxar uma ou outra, lhes é commum; mas
— 147 —
o lado opposto (do fundo) falta à segunda destas
gavetas, afim de que possa correr, como acaba-
mos de dizer, ao comprido da” primeira, sem desor-
denar o objecto collocado nesta ultima, o que
ninguem poderá perceber senão tirando-as intei-
ramenite da caixa,
A parte inferior da caixa tem, no sentido con-
trario áquelle “por onde ella se abre, um lugar
em que uma simples pres: basta para reter no
interior a gaveta ordinaria, emquanto se puxa
e faz-se correr a gaveta falsa (fig. 29).

Fig. 29.
O objecto ou animal destinado a desapparecer
é collocado, pois, na gaveta ordinaria, que se
puxão ambas ao mesmo tempo.
Depois fecha-se a caixa ; e tornando-se a abrir,
carrega-se sobre o tal lugar do fundo, de que
já fallâmos, afim de reter a gaveta ordinaria,
e a desapparição está concluida.

ARTIGO XI.

D'onde se vê que os relogios fôrão feitos para se-


rem pizados em um gral.
—Ah ! Ah! Ahi temos o Sr. Bonbon de volta,
depois de uma longa ausencia! . .
— É verdade! calculei que poderia servir de:
— 148 —
alguma utilidade no meio das vossas asneiro-
las... éo meu elemento !
— Collocaste-vos de um modo admiravel.
— Não achais?... Quereis saber, Sr. feiticeiro,
acabo de executar uma sorte assombrosa!
— Qual foi, Sr. Bonbon ?
— Uma sorte famosa!
— Mas, emfim...
— Lá vai... acabo de executar a sorte da
gallinha invisivel, em cinco minutos... sim, se-
nhor, fôrão contados por um amigo meu que se
chama...
— Sr. Bonbon, fazeis-me o obsequio de em-
prestar o vosso relogio?
— Com summo prazer, mas eu ja sei que ides
metté-lo com toda a delicadeza dentro de um
saquinho de velludo azul, todo forrado de seda,
Osso
— Desta vez metté-lo-hei neste gral.
— Mas...
— Collocai-o aqui com as vossas proprias mãos...
Obrigado.
— Ah! perdao, reflecti agora...
— Para atalhar as vossas tardias reflexões, exa-
minai este pilão e dizei-me se o achais solido.
— Muito sólido e pesado.
— Réstitui-m’o... Bem.
— Olá, Sr. feiticeiro! que estais fazendo?
— Bem védes: estou pizando o vosso relogio
neste gral.
— Não me digais isso, pelo amor de Deos,
esperai!... Da maneira por que operais, d'aqui a
pouco o relogio está em pó.
— Depois com esse mesmo pó faremos um novo.
Mas eu não vos quero enganar, recebei estes pe-
dacinhos que acabo de tirar do gral.
— 149 —
— Mas os relogios não fôrão feitos para se
machucarem n'um gral!
— Bem vêdes que fôrão!
— Intimo-vos que me entregueis o que tive a
loucura de confiar-vos.
— Quereis elle no estado em que está 2... Per-
mitti-me que eu ajunte todos estes pedacinhos,
e concedei-me sómente o tempo de reflectir no
meio de fabricar com este pó o relogio novo que
vos prometti.
Empreguemos este tempo em revelar-vos que o
fundo do nosso gral de pão é movel, com balouço
(fig. 30). Por consequencia foi-nos facil, utilisando
este pequeno balouço, fazer cahir o relogio na
palma da mão, e d'ahi colloca-lo sobre a ser-
ventuaria da mesa, por exemplo, onde o nosso
ajudante o veio buscar, antes que nos servisse-
mos do pilao.

Fig. 30.
Este pilão não era mais o instrumento pesado
e maciço que démos para examinar. Tinhamo-lo
— 150 —
substituido por outro, cuja extremidade mais
grossa 6 6ca e forma uma especie de boceta que
tem a tampa atarrachada pela parte inferior. Esta
boceta contém fragmentos de um relogio, os quaes
cahem no gral, depois que, fingindo-se socar o
relogio emprestado, desatarracha-se a sobredita
tampa-; o fundo do gral deve ser bastante es-
treito para encasa-la desde que se carregar sobre
o pilão; faz-se isto com toda a naturalidade e a
tampa alli fica solidamente segura.

ARTIGO XIV.

O arroz, o café e as ervilhas sêccas.

— Mais um pouco de paciencia, Sr. Bonbon;


o relogio está quasi prompto. Deixai-me mos-
trar-vos sómente estas tres caixinhas que acabão
de trazer-me.
« Uma está cheia de café, a outra de arroz e
a ultima de ervilhas sêccas: coloquemos o café
à esquerda, as ervilhas no centro e o arroz à
direita. Em cada uma destas caixinhas introduzo
uma agulha de meia; logo, se esta entrar até
ao fundo, é uma prova de que aquellas estão
realmente cheias do que acabais de vêr. Cubra-
mo-las com as suas respectivas tampas e com à
varinha ordenemos ao café que passe para a di-
reita, emquanto que o arroz virá para a esquerda.
Vejamos se fomos obedecidos... Perfeitamente; o
café tomou o lugar do arroz e este o do café.
Cubramos outra vez as caixas e ordenemos, tanto
— 151 —
a este como áquelle, que tomem o seu lugar pri-
mitivo. Pass Eilos!
— Sr. feiticeiro; estão me perguntando que
horas são, e como eu tive a fraqueza de vos em-
prestar
— Ah! ah! continnais a pensar no relogio,
Sr. Bonbon Pois bem, para acabarmos com
isso, quereis aceitar em troca o conteúdo da cai-
xinha do meio?
— Aquella que está cheia de ervilhas seccas?
— Offereço-vo-lo sem a abrir.
— Maseu que sei o que ella contém não aceito
o que me propondes.
— Não conheço, portanto, outro meio de pôr-me
quite comvosco, em razão de que o vosso relogio
acaba de substituir as ervilhas sêccas que es-
tavão na caixinha, onde podeis vê-lo reluzindo
como se sahisse das mãos do relojoeiro.
A emoção do nosso digno homem é tal, que po-
deriamos mostrar-lhe, peca por peça, as “tres cai-
xas, sem que elle comprehendesse a sorte.

Fig. 31.
Estas caixas, cinco ou seis vezes mais altas
que largas, contêm dous compartimentos, e fechão-
se por meio de uma tampa que as cobre pela sua,
— 152—
quarta parte, pouco mais ou menos. O primeiro
compartimento não é mais profundo do que o
necessario para conter uma camada bastante es-
pas de grãos de café ou de arroz, etc.: o fundo
uma grade de arame que deixa a agulha de
meia atravessar a caixa em todo o seu compri-
mento, mas através da qual os grãos não podem
passar. Emfim segue-se o mesmo corpo da caixa,
ou segundo compartimento.
No primeiro destes põe-se café e no segundo
arroz, fazendo-se o contrario com a outra caixa.
Ora, como basta uma simples pressão dos dedos
para levantar o alto da caixa (primeiro comparti-
mento) com a tampa, podeis alternativamente
mostrar na mesma caixa café ou arroz, ervilha,
sêccas ou qualquer outro objecto.

ARTIGO XV.

Um dado que passa por toda a parte.


Posto gue seja oito ou dez vezes maior do
que um dado ordinario, quereis que eu o faça
passar através da mesa, ou assim no vosso cha-
péo? (fig. 32). Para isso, não tenho mais do que
cobrir o dado com a sua competente caixa...
Sorris... Vamos, está me parecendo que as mi-
nhas confidencias vos tornárão tão magico que
já não é muito facil enganar-vos.
Adivinhastes, não é assim, leitor? que acabo
de largar no chapéo o dado que eu tinha, a pre-
tenção de fazer passar invisivelmente para dentro
— 3 —
delle: depois tambem, que o que eu tenho agora
na mão é um dado ôco, no qual estava o maciço ;
e, emfim, que, comprimindo as paredes da caixa,
levaria com ella esta outra caixa dizendo e mos-
trando-vos que o dado tinha desapparecido; nada
mais exacto.

E
Km
‘A

Fig. 82.
Vejamos agora qual de nós será mais feliz no
seguinte artigo: se vós em adivinhardes ou eu
em sorprender-vos.

ARTIGO XVI.

A bola para o lenço.

Pedi emprestado a uma senhora um lenço de


eambraia; depois, dirigindo-me para a mesa, col-
loquei uma rosa no meio desse lenço e reuni as
— 154 —
quatro pontas, de maneira a embrulhar inteira-
mente a flôr que um dos espectadores encarregou-
se de segurar.
Offereço-me, pois, para me apossar da rosa sem
fazê-la sahir dolenço, nem tão pouco solta-lo da
mão que a segura.
Uma risada me advertio que a minha proposta
foi aceita...
Tomo uma tesoura, e de uma só vez corto o
lenço por cima do punho, que conserva a flôr
captiva, mostrando triumphalmente que ella está
em meu poder, e que, no entretanto, ainda não
sahio do seu fino envoltorio.
Ah! o meu triumpho não dura muito tempo,
porque o espectador, que auxiliou-me, apressou-se
em entregar-me o lenço que nem elle nem eu ou-
samos mais restituir no estado em que está, isto
é, com um grande furo no centro.

Fig. 88.
FE Felizmente tenho a minha bola de ouro à mão.
Não ha costureira mais habil. Tudo quanto en-
trar, cortado ou rasgado, pela abertura que
— 155—
vêdes no alto desta esphera, ha de sahir tão bem
cosido e remendado que a costura não; se per-
ceberá de fórma alguma... (fig. 33).
Mas já se acha alguma cousa dentro da bola,
vejamos... Ah!ah! é um retalho de cachemira
azul que me servio hontem para reparar um ma-
gnifico cache-nez, e que por esquecimento deixei
ahi ficar... Mettamos tambem alli agora o lenço
e o pedaço... A operação não durará mais do
que meio segundo, e o lenço ha de ficar como
novo... Aqui está elle: olhai... Então o que é
que vos faz rir desse modo? (fig. 34.)

Fig. 34.
« Oh meu Deos! em vez do pedaco branco in-
troduzi o retalho azul na bola e foi elle que ficou
cosido no meio da cambraia. Acerbo engano!
porque a reparação está feita solidamente; e
como a minha esphera não póde desmanchar o
seu proprio trabalho, não posso mais, minha se-
nhora, entregar-lhe o lenço senão no estado em
que o vê... a não ser que me permitta que eu
— 156—

O queime e faça-o renascer das suas cinzas. Concor-


da, não é assim 2... Bem! ‘
« Agora, minha senhora, digne-se escolher em
qual destas duas laranjas quer que renasça o seu
lenço 2.. Neste !.. Bem. Tomo à outra e parto-a
às talhadas para que todos vejão que não ha
preparação alguma,
« Concluamos a experiencia. Corto o lenço em
varios pedacos, metto-o dentro desta pequena taca,
largo-lhe fogo e em quanto arder exponho a
laranja escolhida à fumaça, que delle procede.
Prompto. Vamos a vêr se nos sahimos bem da
experiencia... Com efeito, dizeis partindo a la-
ranja ao meio, aqui está o lenço.'»
Lancemos, caro leitor, um olhar para a bola de
ouro. Seria inutil dizer-vos que o prestidigitador
antes de servir-se della substituio por um igual o
lenço emprestado, que deixou cahir sobre a ser-
ventuaria da mesa, e d'onde a ajudante o levou
inostensivamente. Por conseguinte, a bola 6 for- .
mada de duas semi-espheras reunidas por um
circulo horizontal, sobre o qual gyrão facilmente:
uma para a direita e a outra para a esquerda.
No interior ha outra bola movel, ôca, dividida
em dous compartimentos, com uma abertura para
cada um, e sustida no centro do circulo referido,
por meio de dous parafusos, lassos, que podem
passar como extremidades do seu diametro; em-
fim uma ou outra abertura deste globo interior
vem corresponder com a da grande esphera, desde
que se fizer gyrar a parte inferior ou superior
desta.
Terieis visto o prestidigitador metter primeiro
o lenço falso n'um dos compartimentos da bola
pequena, e tirar depois o outro ja preparado do
segundo compartimento.
— 157 —
Quanto às duas laranjas que dais para es-
colher: uma é natural, e a outra não é senão a
casca inteira de uma laranja, dentro da qual o
vosso ajudante introduz convenientemente o lenço
emprestado. Assim, podeis mandar escolher von-
tade uma dellas: se escolherem a preparada, pon-
de-a de parte para vos servirdes depois para a
realização do prestigio que annunciastes; e toman-
do a natural, parti-a às rodelas, para fazerdes crêr
que ellas não estão preparadas.
Se, porém, escolherem a laranja natural, ope
rai em sentido contrario,e a sorte em nada des-
merecerá.

ARTIGO XVII.

As doze bocetas.

Fazer passar invisivelmente um objecto para


«entro de uma caixa, não vos parece, ao ponto
em que chegámos, mais do que um trabalho de
menino de escola, um brinquedo de criança? Mas
talvez não verieis, sem admiração, o prestidigi-
tador pedir um annel emprestado ou uma moeda
marcada e fazê-la atravessar, n'um instante, uma
duzia de bocetas bem fechadas, mettidas umas
dentro das outras, de maneira que o objecto em-
restado se achasse dentro da menor, isto é, dentro
la duodecima.
Executemos, pois, a sorte; asseguro-vos que
ella produzirá um bellissimo effeito.
— 158—
Pedimos uma alliança que mandamos collocar
sobre a bandeja das permulações.
Voltando para a mesa, fazemos a substituição”,
depois deixamos cahir a alliança assim substituida
sobre a serventuaria, onde o nosso auxiliar vem
toma-la. Algumas palavras que dirigimos aos cir-
cumstantes dão áquelle mais do que o tempo pre-
ciso para entrar em suas funcções. Consiste esse
serviço em metter o annel emprestado no lugar
onde se deve acha-lo. Comprehenderse ha facil-
mente que se elle tivesse de fechar doze bocetas
e colloca-las umas dentro das outras, empregaria
um tempo que tiraria todo o prestigio à sorte;
mas não acontece assim. As tampas das bocetas
são dispostas de tal sorte, que de um lado não
formão mais do que uma só; e do outro, os fundos
que, reunidos tambem, não formão mais do que
um.
Estas bocetas, repetimo-lo, ajustão-se com tanta
exactidão que reunindo-se os fundos 4s tampas,
achão-se tão depressa fechadas, como se fôssem
uma simples boceta (fig. 35).

“Fig 5
Ao nosso pedido, o ajudante as traz immediata-
mente.
Fig. 86.
Tomamos o objecto substituido de cima da ban-
deja, e escamoteando-o, fingimos lança-lo através
da boceta multipla que em seguida apresentamos
para abrir. Mas posto que ella possa fechar-se de
uma só vez, é impossivel chegar à ultima sem
abri-las todas, uma por uma (fig. 36), e o espectador
encarregado desta tarefa nao fica verdadeiramente
recompensado do seu trabalho, senão pela surpreza
agradavel que esta experiencia nunca deixa de
produzir, e que com elle partilhão todos.
|

ARTIGO XVIII.

A cafeteira magica.

* Acabão de trazer-me uma boceta muito pre-


ciosa para os amantes de café. Não ha coador
que o faça melhor, mais depressa, nem mais com-
modamente.
Para fornecer uma prova, pedirei a algumas
pessoas que aceitem uma chicara de excellente
— 160 —
moka, que a minha cafeteira, ainda vazia, vai
agenciar-nos dentro de um insinte. Trouxerão-
me tambem um cartucho chéio de... Oh! meu
Deos! que travessura! em lugar de graos de
moka trouxerão-me feijão... Portanto é elle que
nos vai servir para a experiencia.
— Precisa transforma-los primeiro em grãos
de café, exclamou uma voz, na qual todos reco-
nhecêrão 'com espanto o accento do Sr. Bonbon.
— Por que?
— Ora essa! Offereceste-nos meia chicara de

para fazer café à semelhança de moka.


Estou bastante penalisado, Sr. Bonbon, por ter-
vos dado o trabalho de nos interromper.
— Não faz mal. A proposito, agora me recordo
que ainda não vos disse como se chama aquelle
amigo que eu encontrei quando executava aquella
sorte famosa da gallinha invisivel.

Fig. 87.
Fica para occasião mais opportuna, Sr. Bonbon,
M
— 161 —
porque a minha cafeteira já está cheia de feijão,
e eu não posso qemorar-me mais sem a utilisar
(fig.«O 37).meio é muito simples:
:
consiste em fechar
bem a cafeteira com a tampa respectiva; dar-
lhe uma pequena pancada com esta varinha; e
o café agora deve estar bom de tomar-se. Levan-
temos a tampa: ao feijão succedeu com efeito o
excellente licor que todos vós conheceis... Chi-
caras, venhão chicaras depressa, porque elle já
tem assucar (fig. 38). »

Fig. 38.
Esta maneira de offerecer café é muito origi-
nal para que não desejeis, leitor, procurar uma
cafeteira igual à nossa. Se quizerdes uma tal
qual é preciso que ella seja feita de duas partes
assemelhando-se ás duas metades de um grande
agulheiro, redondo, entrando uma na outra, .quasi
inteiramente, quando se fecha.
Naquella metade que serve de tampa acha-se
uma terceira boceta menor, sustida na sua parte
superior, por meio de uma garra de ferro, e que
enche-se de café quente quando se pretende exe-
cutar esta sorte.
Ms R 44
— 162 —
A outra metade, ou boceta propriamente dita,
(fig. 37) não deixa vêr, em primeiro lugar, mais
do que um compartimento vazio em toda a sua
extensão; mas no momento em que se lança o
feijão dentro, faz-se subir, puxando um botão
collocado na sua parte inferior (fundo), um fundo
falso que impede que ella se encha, posto que
tenha à apparencia de estar cheia até á borda.
Quando fechardes esta boceta, o compartimento:
que contém o café recalcará até ao fundo a ca-
mada de feijão e com ella o fundo falso que está
collocado sobre uma mola em espiral.
Antes de reabri-la, não tendes mais do que
dar uma volta no botão de que a tampa está
provida, o que fará soltar o garrancho que sus-
pende o compartimento com o café. Este ultimo,
sustentado pelo seu peso, fica então na metade
inferior do coador magico.

ARTIGO XIX.

A mesinha para as cartas.

Nascida no meio das cartas, com um baralho


por berço, a magia branca as junta muitas vezes
ainda às suas maravilhosas experiencias.
Acompanhêmo-la nos seus agradaveis caprichos
e façamos tirar duas cartas forçadas. Um dos es-
pectadores tomou o az de ouros, outro à dama de
espadas. Tomamos as duas cartas e collocamos
— 163 —

a dama à esquerda e o az à direita, cada uma


sobre uma mesinha redonda de tres pés (fig. 39).

Fig. 89,
Depois de termos mostrado varias vezes que as
cartas estão realmente no lugar indicado, 'cobri-
mos ao mesmo tempo as mesinhas com uma tampa,
adequada, e annunciamos que a dama de espadas
vai passar invisivelmente da esquerda para a di-
reita e o az de ouros da direita para a esquerda.

Fig. 40.
Levantadas as tampas deixão vêr, de feito, a
— 164 —
primeira destas cartas no lugar da segunda, e
esta no lugar daquella.
Só um prestidigitador, se aliás não conhecesse
esta linda sorte de ligeireza, poderia adivinhar
que as mesinhas tão delgadas na apparencia têm,
no entretanto, um prato falso; que, sob o pri-
meiro destes pratos (fig. 40), inteiramente solto
da machinasinha, e um pouco maior do que o
prato verdadeiro, tinhamos posto as cartas des-
tinadas a substituir aquellas que fizemos tirar co-
mo que ao acaso; e finalmente certificar-se-hia
de que as tampas, apertando em suas paredes os
pratos superiores, tinhão levado juntamenteas car-
tas que haviamos alli collocado à vista de todos.

ARTIGO XX.

O jogo do diabo.

« Propuz-me desta vez fazer-vos conhecer um


jogo que, segundo assegurão, substituio nos in-
fernos o lansquenet, desde que este ultimo está
em mora cá na terra. z
« Aqui está uma caixinha da qual tiro este
grande dado ; vos é facil vêr que ella agora está
inteiramente vazia; aqui está um covilhete chi-
nez, debaixo do qual não ha nada absolutamente.
« Na caixa metto uma laranja que a enche,
e abaixo a tampa; do outro lado cubro o dado
com o covilhete chinez.
« Agora fazei jogo, ou antes, supponhamos que
cada um de nós tem apontado; como banqueiro,
perco todas as vezes que disserdes exactamente
onde se acha a laranja ou o dado.
« Julgais que ‘a primeira está nacaixa poíque
— 165 —
vistes-me metté-la alli; perdestes: 69 dadoZque
lá se acha agora... A laranja está debaixoçdo.
covilhete chinez (fig. 41).

| Ei sl

Fig. 41.
« Recomecemos!.. ganho ainda : a laranja voltou
para o seu lugar, assim como o dado. Emfim, para o
terceiro lance, como para um milhar de partidas,
a laranja ainda passou para um lado e o dado
para outro. Por aqui se vê que quando Satanaz
estiver & banca deve fazer hom negocio. »
Ha, portanto, na maneira de praticar este joga
diabolico, para gonher sempre, muito mais magia,
branca do que feiticaria. Nao o duvidareis mais,
depois que vos dermos relação das peças que aca-
bamos de empregar.
De feito notareis que a caixa quadrada, onde
se mette primeiro a laranja, é guarnecida inte-
riormente de um cubo ôco, com as paredes muito.
delgadas e inteiramente livre. Se tirarmos este
cubo, ao qual, a ausencia de uma face deixa
ainda uma abertura igual à da caixa, veremos
ue todas as outras faces assemelhão-se aos lados
le um grande dado. Colloquemo-lo no seu lugar
e deixemos cahir a laranja na caixa, que ffecha-
remos pela metade sómente.
— 166 —

Quereis que a fruta desappareça 2... Fazei gyrar


o botão sobremontando a tampa, até então retida
na primeira, por meio de um garrancho, que vem
fechar o cubo e fazer delle um dado completo,
no qual a laranja se acha presa e escondida.
Desejais que ella reappareça?... Depois de terdes
fechado a caixa, fazei gyrar, em sentido contrario,
o botão de que acabamos de fallar; o garrancho
prende de novo a face superior do dado, e as
luas tampas encasão-se uma na outra, deixando
a laranja outra vez à vista.
Quanto ao dado que se colloca sob o covilhete
chinez, é em tudo semelhante ao da caixa; é,
pois, um cubo ôco, não tendo senão cinco faces;
tende o cuidado de colloca-lo com a abertura para
a mesa.
Apenas se acha coberta pelo covilhete, um al-
capão faz subir e entrar dentro do dado a laranja.
Se fôr esta a que se quizer mostrar, não resta,
mais do que levantar o covilhete, cujas paredes
se comprimem com os dedos e o daão fica no
interior da machinasinha; e no caso contrario,
levanta-se esta naturalmente e o dado fica sobre
a laranja.

ARTIGO XXI.

A garrafa que deita fitas.


« Vendo-nos entrar com uma garrafa em punho,
não nos accuseis, minhas senhoras, de não reco-
nhecermos o vosso gosto delicado, e de querer-
mos presentear-vos de uma maneira tão grosseira.
Sabemos perfeitamente que Baccho não era a di-
vindade que tivesseis incensado, e que as suas
'
— 167 —
graças não são de modo algum aquellas que mais
vos agradão,
« Vamos já vasar neste cópo o vinho de que
está cheia êsta garrafa, e mandar leva-lo daqui.
« É negocio decidido.
« Agora ella se acha vazia... enganei-me : ainda
está cheia do espirito do vinho que vimos correr
neste vaso; este espirito não sahirá senão depois
de ter tomado uma fórma que vos seja agradavel;
é uma galanteria do Deos Baccho, inquieto para
prodigaliser vos sequer uma vez, favores dignos
e vós, convertendo-se n'um corpo visivel e pal-
P avel...
« O espirito já deve estar transformado, pois
quer escapulir-se da sua prisão de vidro: pri-
meiro é uma linda fita azul, depois uma verde,
depois uma côr de rosa... creio que não tendes
mais do que pedir a côr da vossa predilecção.
O espirito de Baccho tomou todas as côres...
Apraz-vos a côr de havana, delilaz, de laranja 2...
ei-las... eilas... (fig. 42). Desejais branca, rôxa,

Fig. 42.
encarnada, flôr de alecrim... os vossos desejos
— 168 —
realizar-se-hão... A galanteria de um Deos não
póde encurtar-se com algumas varas de fita de
mais ou de menos. »
Esperavamos, deixando aos manes de Baccho
toda a honra deste prodigio, poder alliviar as
vinhas do mal que as tem perseguido, e às quaes
elle não póde proteger mais; porém o acaso in-
vejoso fez a garrafa ir ter àsmãos do Sr. Bonbon,
e o pagão descobrio todo o mecanismo que não
temos razão para occultar-vo-lo.
Vio que ella era formada de uma primeira
garrafade folha de Flandres envernizada de preto,
sem fundo, e servindo de capa ao casco de uma
segunda garrafa que era mui facil introduzir e
tirar-se pelo lado debaixo.
O nosso indiscreto homem puxou este casco
para examinar mais seguramente as oito ou dez
canilhas que guarnecem o fundo e sobre as quaes
enrolão-se as fitas de todas as côres (fig. 43). Uma

Fig. 43.
ponta das ditas fitas acha-se presa no orifício da
garrafa, onde, passando por um annelzinho hori-
zontal, sustenta-se alli por meio de um nó. O
— 169 —
prestidigitador não tem mais do que puxar de-
vidamente por cada um destes nós, para apre-
sentar as fitas que se lhe pedirem.
Ainda não é tudo; o Sr. Bonbon vio mais que
o casco da garrafa estava provido de um gran-
de compartimento longitudinal, bem fechado até
em cima. Nao adivinhou que era de 14 que sahia
o vinho com que enchemos um grande cópo; mas
se elle vier a penetrar neste ultimo mysterio,
tende como certo que não perderá occasião de
poder divulga-lo.

FIM.
INDICE

Prefacio... se. sees


Instrucgdo preliminar,

CAPITULO I

Differentes sortes de facil execução.

Anno 1.—O bouquet magico.


Annico 11.—O relogio obediente.

ego pa
Axneo m,—A côr inconstante,
Antico 1v.—Gabriel e Lusbel....
‘Aznico v.—Experiencia physica para tirar uma
moeda de dentro de um copo d'agua sem mo-
lhar a mão.
Axriso vt. —O ovo dansant
Axmigo vir. —O oraculo magico.
‘Anriao vit, —Subtracgio agradave
Arrigo 1x. — Adivinhar os pontos de dous dados
lançados 6 bre a mesa. ..seserenes
Arrigo x. —A mesma sorte com tres dad
Antigo x1 —À taverneira e os freguezes..
‘Annco xm, —Adivinhar até vinte cartas pensadas
por varios espectadores..s.ssesseese cee seeee
Annico xm, —Eserever que cartas uma pessoa
ha de escolher antes de tomar uma reso-
Tago:va. vases. sisens canes’ 13
Annico mv. —A garrafa prodigiosa. 14
Axmigo xv. —O cofre magico.«+ 14
‘Annico xvi. —Adivinhar quem, dentre varias pes-
soas, escondeu um annel, e em que mão, de-
do e phalange se acha elle... 15
Agrico xvu.—A garrafa infernal. Ww
— 172 —

CAPITULO IL.

Ligeirezas de mãos.

Antigo 1, —Jogo dos covilhetes. — Principios ge-


raes:
— Como se escamotéa uma moscada
—Como se faz apparecer uma, moscada,—
Como se introduz secretamente uma moscada.
sob um covilhete. — Como se faz passar uma
moscada entre dous covilhetes —Como se faz
desapparecer uma moscada entre d us covi-
lhetes.— Como se faz apparecer uma bola sob"
um covilhete . 19
Disfarces......
Introdueção do jogo dos covilhetes. — Discurso
comico,
Passes.
Axrigo mu. —A moeda sem caracter. —Mostrar uma
moeda. de quinhentos réis na palma da mão;
transforma-la n'um vintem; toma-la depois
ao seu estado primitivo; e, finalmente, faze-la
desapparecer e reapparecer.,
Axmco 1% —Os dous dados.—Maneirapolida e agra-
davel para pôr fim a uma partida de gamio... 50
Anno 1v.—A facana garrafa, —Meiodivertido para
empregar o tempo emquanto se espera bor
uma sobremesa... 53
Armco v. —Um copo de vinho que se transforma
n'uma chuva de folhas de rosas... 65
CAPITULO III.
Sortes de cartas.

PRINCIPIOS GERABS PARA À EXECUÇÃO DAS SORTES DE CARTAS?


Anrico 1. —A baldroc: 58
Anrico 1, —Baralhar em falso. 68
Aurigo m,—A carta forgada, .. a
— W3 —
Anno 1v. —A bifagem,
‘Antico ¥.—A empalmaga
Arrigo vi, —A reposi
Anrico vi.—O peseango.
Artigo VIII SORTES DE CARTAS:
1— Achar n'um baralho através de um lenço
uma. carta em que outra pessoa haja posto o
pensamento,
um — Dizer a uma pessoa que parta o bara-
lho quantas vezes quizer, e adivinhar logo
quantas cartas ha em cada um dos montes, .
ur.— Postos tres montes de cartas em uma
mesa, adivinhar os pontos das que estão de-
baixo dos tres montes......ececerenes
1v.— A mesma sorte que a precedente, feita
com quatro montes. arnsavies
v.— Adivimhar, pelas costas, todas as cartas do
baralho... ceeceserreerererananerennaro
vi,— Ad'vinhar de repente as cartas que uma
ou 'mais pessoas tomião do baralho. .
vi. — Estender um baralho sobre a mi m
as costas para cima; pedir a uma pessoa que
tire vma carta, e fazer com que outra carta,
tomada por outra pessoa de outro baralho,
seja identica 4 primeira tirada., ....cevere.
yr. — Fazer tirar uma carta, toma-la a pôr no
baralho, baralhir, e fazê-la appaecer no lu-
gar que se quizer. ...
1x. — Os quatro sete inseparaveis
x.— Os quat-o azes inseparaveis. .
xx — Adivinhar um numero de cartas que al-
guem tomou do buralho, e fazer augmentar
o numero della; na mão da pessoa que as
tomou, conforme ella desejar. ..eseremera we 99
x, — Fazer apparecer n'um chapóo uma carta
que outra pessoa houver tirado e baralhado. 100
xm, — Adivinhar uma carta por meio de um
calculo impossivel.
. ceseerecescee mico 101
x1v.— As cartas mudadas por arte magic: 103
xy. — Um dado feito prestidigitador. . . 106
— 4 —
xvi — Pensada uma carta, pôr sobre a mesa
tres das primeiras que apparecerem, e fazer
com que uma dessas, qual os espectadores
quizerem, se converta na carta pensada, 112
xvm. — A carta fugaz, 116
xvin.— Nova ceremonia para o consorcio
aze 118:
xx. —Um cego que vê. 113.

1
CAPITULO IV.

Amagia branca em acção.


Axrico 1. —A mesa do prestidigitador. .. 121
Antigo m, —A moeda invisivel. 123
Axrigo nr. —O lenço magico. 125
Arrigo 1v. —A colhér para 0" bilhete. 127
‘Antico v.—O peixe encarnado dentro de um copo
detinta de e crever... 131
Azgrico vz. —A bandeja de mul 133
Antico vu. —As novas pilastras mecanicas, ver-
dadeiramente maravilhosas, ...... 135
Arrigo vir, —A boceta para o relogio, 137
Arrigo rx. —A cassarola infernal,..... 140
Arrigox. —Balas e fléres sahindo de um chapéo. 148
‘Anrico xz, —A bandeja para as permutações. 145
Arrigo x1r. —A caixa para as desapparições, 146
“Arrigo xur. — D'onde se vê que os relogios
feitos para serem pizados em umgral......... 147
Arrigo x1v. —O arroz, 0 cafée as ervilhas sêccas, . 150
Arrigo xv. —Um dado que passa por toda a parte 152
Arrigo xvr. —A. bola para 0 lenço. 153
Axrigo xvit. —As doze bocetas.. 157
Arrico xvim.—A cafeteira mage: 159
Arrigo xrx,—A mes'nha para as cartas, 162
Axrico xx.—O jogo do diabo. 164
Antigo xxr. —A garrafa que dei 166

Typographia Universal de LaEMMERT, rua dos Invalidos, 61 B.


ERRATA.

PAGINAS. LINHAS. ONDE SE LE: LÊA-SE:


2 32 desenho. desenho o Licor
vivificante,
38 9 Não a visteis? Não a vistes?
38 28 uma redonda. uma redouça
WW Não a visteis ? Não a vistes?
RESSE

5 O descanço. O pescanço.
17 mais nada! mas nada !
4 3 pessoa 2" pessoa
16 aquella senhora aquelle senhor.
102 31 batoietros batoteiros
104 1 «D. Adelaide D. Adelaide
128 2 aflectuação effectuação
141 17 nascer renascer
142 22 á casa a casa

= Ariee Vos Epa. -

A a

Conifiga Youko 1983


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