Aprendizagem de Mais de Uma Língua Estrangeira: A in Uência Da Língua Precedente
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CURITIBA
2007
2
AGRADECIMENTOS
pela recepção calorosa e confiante à minha pessoa e ao meu trabalho desde nosso
primeiro encontro. A ela devo meu encaminhamento à pesquisa sobre o aprendiz
multilíngüe, tema pelo qual acabei me apaixonando, e que me abriu as portas para
futuras pesquisas.
- À Professora Doutora Elena Godoy, por seu entusiasmo que muito me incentivou
quando da qualificação deste trabalho, e também pelas preciosas críticas e
sugestões.
- Ao Odair, nosso secretário, por estar sempre presente, e com calma e atenção
atender-nos em nossas dúvidas e reivindicações.
4
- Aos colegas e alunos que acreditaram mais em meu potencial do que eu mesma, e
não desistiram de me incentivar: Acir Mário Karwoski, Beatriz Gaydeczka, Jefferson
Bernardon e Rosicler Saloan Reinboldt Borges.
-À minha mãe, Madalena Siebeneicher, por todo estímulo que sempre me deu para
os estudos, e por demonstrar tão bem que se importa com o meu bem-estar.
- Ao meu marido, Paulo Odilon Brito, por preencher com carinho e paciência as
diversas falhas que fui apresentando por força das circunstâncias e das minhas
limitações, e pelo grande amor revelado durante os anos em que estamos juntos.
- Ao meu filho, Matheus Guilherme Brito, pelo orgulho, ainda que tímido, com que
sempre reagiu aos resultados acadêmicos da mãe. Espero que o entusiasmo,
empenho e seriedade com que desenvolvi este trabalho possam lhe servir de
estímulo para buscar e desenvolver também o seu caminho.
5
RESUMO
ABSTRACT
Our investigation focuses the learning of more than one foreign language by the
same person, following psycholinguistic research on crosslinguistic influence during
the time of learning. We studied the contributions of empirical research, compared to
those of the Cognitive Chain-Reaction Theory© (CCR), which states that the learner
of more than one foreign language unconsciously connects the current learning
process to the learning process of the previous language, this being the one to cause
the most influence on the learning of the next language. We performed a
bibliographical research of ten empirical study reports, and analysed them in order to
verify the correlations of their results with the ones presented by the research which
originated the CCR Theory©.
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE SIGLAS
L3 – Terceira Língua
LE – Língua Estrangeira
LM – Língua Materna
10
SUMÁRIO
RESUMO......................................................................................................................5
ABSTRACT..................................................................................................................6
LISTA DE FIGURAS....................................................................................................7
LISTA DE QUADROS..................................................................................................8
LISTA DE SIGLAS.......................................................................................................9
1 INTRODUÇÃO................................................................................................13
1.1 ORGANIZAÇÃO DA DISSERTAÇÃO.............................................................19
2 PESQUISAS EM L3: O ESTADO DA ARTE............................................... ..21
2.1 O INDIVÍDUO PLURILÍNGÜE E A PREDOMINÂNCIA DO
MULTILINGÜISMO..........................................................................................21
2.2 DIFERENCIANDO A AQUISIÇÃO / APRENDIZAGEM DE UMA E DE
MAIS DE UMA LÍNGUA ESTRANGEIRA........................................................25
2.3 A TERMINOLOGIA RELACIONADA À AQUISIÇÃO / APRENDIZAGEM
DE MAIS DE UMA LÍNGUA ESTRANGEIRA PELA MESMA PESSOA..... ...29
2.4 BREVE HISTÓRICO DAS PESQUISAS ACERCA DO MULTILINGÜISMO
INDIVIDUAL....................................................................................................31
2.4.1 Modelos Teóricos em L3...............................................................................32
2.4.2 Modelos Teóricos Multilíngües Baseados em L2.......................................38
2.4.3 Ênfase ao Multilingüismo na Atualidade.....................................................40
3 TRANSFERÊNCIA LINGÜÍSTICA (OU INFLUÊNCIA
INTERLINGÜÍSTICA)......................................................................................45
3.1 APRESENTAÇÃO...................................................................................... ....45
3.2 CONCEITUAÇÃO........................................................................................... 46
3.3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.................................................................. ....47
3.3.1 Hipótese da Análise Contrastiva............................................................. ...48
3.3.2 A Posição Minimalista............................................................................... ...50
3.3.3 A Posição Cognitivista............................................................................. ....51
3.4 INFLUÊNCIAS (PSICO)TIPOLÓGICAS.................................................... ....53
3.4.1 A Relação entre Tipologia e Distância Lingüísticas............................. ....53
3.4.2 A Distância Psicológica................................................................................55
4 A TEORIA COGNITIVA DE REAÇÃO EM CADEIA NO APRENDIZADO
DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS®..................................................................58
11
4.1 APRESENTAÇÃO...........................................................................................58
4.2 ORIGENS........................................................................................................59
4.2.1 Bases da Pesquisa.......................................................................................61
4.2.2 O Papel do Inconsciente..............................................................................62
4.3 O DESENVOLVIMENTO DA TEORIA...........................................................62
4.4 CONTRIBUIÇÕES..........................................................................................64
5 ABORDAGEM METODOLÓGICA..................................................................67
5.1 APRESENTAÇÃO...........................................................................................67
5.1.1 Objeto de Estudo...........................................................................................68
5.2 OBJETIVOS DA PESQUISA...........................................................................69
5.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS........................................................70
5.3.1 Caracterização da Pesquisa.........................................................................70
5.3.2 Procedimentos...............................................................................................72
6 PESQUISAS EMPÍRICAS SELECIONADAS.................................................75
6.1 PESQUISA 1...................................................................................................75
6.2 PESQUISA 2...................................................................................................77
6.3 PESQUISA 3...................................................................................................80
6.4 PESQUISA 4...................................................................................................82
6.5 PESQUISA 5...................................................................................................84
6.6 PESQUISA 6...................................................................................................86
6.7 PESQUISA 7...................................................................................................90
6.8 PESQUISA 8...................................................................................................93
6.9 PESQUISA 9...................................................................................................95
6.10 PESQUISA 10.................................................................................................98
7 ANÁLISE COMPARATIVA E INTERPRETATIVA.......................................102
7.1 ANÁLISE PELO CRITÉRIO DE RECORRÊNCIA INCONSCIENTE A
OUTRAS LÍNGUAS........................................................................................106
7.2 ANÁLISE PELO CRITÉRIO DA LÍNGUA À QUAL MAIS SE RECORRE.....107
7.2.1 Recorrência à língua materna....................................................................107
7.2.2 Recorrência a outras línguas estrangeiras previamente aprendidas....109
7.2.2.1 Proximidade e Distância Tipológicas............................................................109
7.2.2.2 Níveis de Ativação........................................................................................109
7.2.2.3 Níveis de processamento de informação.....................................................110
12
1 INTRODUÇÃO
1
Disponíveis em <http://ec.europa.eu/education/policies/lang/languages/index_pt.html>, acessado em 15 ago
2006.
14
MULTILINGÜISMO
2
Linguistic theory is concerned primarily with an ideal speaker-listener, in a completely homogeneous speech-
community, who knows its language perfectly(…)
3
hás to be flexible enough to acommodate the command of more than one language.
4
Existem cerca de 5.000 línguas no mundo, e o número de países aproxima-se de 200; esses números
demonstram que o multilingüismo é realmente muito disseminado. (RITCHIE & BHATIA, 2004, p. 1)
23
muitas partes da África e da Ásia, onde várias línguas coexistem, e grandes porções
da população falam duas ou mais línguas. Em tais países, o multilingüismo individual
é resultado de um processo de desenvolvimento industrial, unificação política,
modernização, urbanização, e um maior contato entre diferentes comunidades
locais. O indivíduo utiliza algumas línguas nas comunidades étnicas, e outras em
sua educação e trabalho.
A aquisição de diversas línguas por indivíduos, no entanto, não é disseminada
apenas em comunidades oficialmente reconhecidas como bi- ou multilíngües, mas
acontece pelo mundo todo. Mesmo em muitos países ocidentais, onde o
monolingüismo é a norma, alguns grupos de imigrantes são multilíngües. Nas
comunidades asiáticas do Canadá, por exemplo, muitos indivíduos são trilíngües,
falando sua língua ou dialeto nativos, uma outra língua asiática associada ao seu
desenvolvimento estudantil, e Inglês. Além disso, crianças muçulmanas aprendem
Árabe, a língua do alcorão e da mesquita. Somados aos casos de multilingüismo nas
comunidades multilíngües e nas comunidades de imigrantes, encontram-se também
os de famílias que criam filhos multilíngües porque os pais falam línguas diferentes,
e os de pessoas que estudam várias línguas na escola ou na universidade. Os
casais dos povos tucanos, que vivem no noroeste da Amazônia, na fronteira do
Brasil com a Colômbia, são todos bilíngües. Por uma questão cultural, esses povos
possuem um grande tabu quanto à endogamia, e só aceitam casamentos entre
membros de tribos distintas. Sendo a distinção entre as tribos feita pelas línguas que
falam, o marido e a esposa falam línguas diferentes. Embora entendam um ao outro,
não falam a língua do outro. Seus filhos aprendem ambas as línguas, mas
consideram como sua a língua que o pai fala. (PILLER, 2001, p. 205)
No Brasil funcionam o Português, língua oficial e nacional e língua materna da
grande maioria dos brasileiros, cerca de 180 línguas indígenas (cf. RODRIGUES,
2005, p. 35) e seus respectivos dialetos, cerca de 30 línguas de imigração (cf.
JÜRGENS, 2004), línguas de fronteira, e, mesmo que precariamente, línguas
africanas, que se mantêm ritualmente. O Português não é necessariamente a língua
materna de todos os brasileiros, embora seja sempre sua língua oficial. Daí decorre
que muitas comunidades tidas como monolíngües são na verdade marcadas tanto
pelo bidialetismo, pela diglossia, quanto pelo bilingüismo, ocorrendo em diferentes
níveis e com determinados objetivos, facilitados ou não por instituições, sociedades
e processos, com papéis claramente distintos.
24
A maior parte dos países europeus são bilíngües ou multilíngües (Cenoz &
Jessner, 2000, p. viii). E isto não se deve exclusivamente ao avanço da língua
inglesa como lingua franca, apesar dela ter promovido com vigor o bilingüismo e o
multilingüismo sociais e individuais (Hoffman, 2000, p.1) É comum, nos países
europeus, que durante os anos escolares sejam aprendidos diversos idiomas
estrangeiros. Nesse continente, de acordo com Hufeisen (2000, p. 209, citando
Bergentoft, 1994), as crianças começam a estudar sua primeira língua estrangeira
entre os 7 e 12 anos de idade, a segunda entre as idades de 12 e 16, a terceira
entre as idades de 13 e 16, e podem ainda ter a opção de aprender uma quarta
língua.
Os motivos que levam à aprendizagem de diversas línguas pelo indivíduo
incluem enriquecimento pessoal, viagens, aperfeiçoamento educacional, e
vantagens econômicas. Esse tipo de multilingüismo é geralmente voluntário e
planejado, em virtude da possibilidade de se adquirir vantagens, e é mais
disseminado em países onde a língua nacional não detém amplo prestígio
internacional.
Outro fator que resultou em situações sociais e educacionais em que aprender
mais de duas línguas não é considerado excepcional tem sido o reconhecimento de
línguas ditas minoritárias. Cada vez mais crianças crescem em contato com mais de
uma língua e cultura, cada vez mais adultos vivem e trabalham em contextos
multilíngües. A aprendizagem de várias línguas estrangeiras durante a idade escolar
é comum, e o conhecimento de Inglês, Francês e Alemão conjuntamente já está se
tornando, na Europa, uma exigência padrão para todos os jovens que possuem
grandes aspirações. No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, promulgada
em dezembro de 1996, garantiu o ensino de idiomas durante as quatro últimas
séries do ensino fundamental e em todas as séries do ensino médio, ou seja,
durante sete anos. Depois disso, através da Lei n° 11.161, de 05 de agosto de 2005,
apresenta-se um incentivo, motivado politicamente, para o ensino de Espanhol nas
escolas de Ensino Médio em todo o país.
A necessidade de possuir diferenciais lingüísticos, assim como o incentivo à
manutenção das línguas minoritárias, deverão expandir a aprendizagem cada vez
mais disseminada de línguas consideradas hoje incomuns. Seja para sobreviver em
outro país ou para conquistar espaços social e profissionalmente, aprender outras
línguas é uma tendência mundial crescente.
25
Ambiente de aprendizagem
L1
L2
L3
FIGURA 2 - Aprendizagem de uma L3. Os fatores que afetam a aprendizagem de uma L3 não
apenas se tornaram mais complexos, mas são, além disso, qualitativamente diversos dos que afetam
a aprendizagem de uma L2. Em primeiro lugar, a familiaridade com outra língua estrangeira já existe;
em segundo lugar, existem experiências e estratégias específicas, relacionadas à aprendizagem de
uma língua estrangeira, disponíveis juntamente com a experiência geral de vida e como aprendiz, e
com as estratégias de aprendizagem em geral. Portanto, a aprendizagem de L3 é fundamentalmente
5
diferente da aprendizagem de L2.
5
Learning an L3. The factors that affect learning an L3 have not only become more complex, but they are also
qualitatively different from L2 learning. First, familiarity with another foreign language exists, and second,
specific experiences and strategies related to foreign language learning are now available in addition to general
life and learner experience and general learning strategies. Thus, L3 learning is fundamentally different from L2
learning.
6
To the extent that instruction in Lx is effective in promoting cognitive/academic proficiency in Lx, transfer of
this proficiency to Ly will occur provided there is adequate exposure to Ly (either in school or environment) and
adequate motivation to learn Ly.
27
se poder dar conta do que realmente ocorre na aquisição de uma LE por falantes
bilíngües.
Buscamos evidenciar até aqui o que diferencia a aprendizagem de uma
primeira LE do de outra posterior, enquanto processos. Rivers (1996) distingue,
quantitativamente, a aprendizagem de uma LE como a primeira ou como outra
posterior, revelando sua influência sobre outro aspecto da formação do aprendiz:
sua autonomia.
De acordo com informações estatísticas reunidas pelo governo dos Estados
Unidos da América ao longo dos anos, as línguas Georgiano, Cazaque e Quirguiz
são consideradas línguas do nível 3, ou seja, requerem do aprendiz americano 44
semanas de estudo, sendo 30 horas de aula semanais, para que se atinja um nível
avançado de proficiência nas habilidades de produção oral, e de compreensão
escrita e oral. Isto soma um total de 1320 horas de estudo formal. Rivers verificou
que aprendizes dessas línguas que já haviam estudado outra(s) língua(s)
estrangeira(s) anteriormente reduziam esse tempo para 925 horas, necessitando de
apenas 37 semanas, com 25 horas de estudo cada uma, para atingir o mesmo nível
de proficiência. Nas palavras de Rivers (1996, p. 4), essa relação “é uma evidência
dramática de que aprendizes de língua já experientes realmente aprendem mais
rapidamente do que aprendizes de língua novatos.” (nossa tradução)7
Tem-se constatado, portanto, que o aprendiz de mais de uma LE sofre a
influência de fatores em número e intensidade diferentes do aprendiz da primeira LE.
Somando-se a isso o fato de que os países da Europa Central têm-se unido na
intenção de favorecer e promover o multilingüismo individual, espera-se que haja um
impacto crescente sobre a elaboração de currículos, programas e materiais didáticos
para esse aprendiz diferenciado, bem como sobre a formação do seu professor.
Virkkunen (1992, p. 5) já expressava sua surpresa por não haver encontrado um
único estudo acerca dos problemas enfrentados por professores de aprendizes
trilíngües, já que muita transferência, lingüística ou não, parece ocorrer nessa
situação.
7
(...) is dramatic evidence that experienced language learners do indeed learn faster than novice language
learners.
29
educacionais nas quais essa aprendizagem não é excepcional; além disso, a partir
de uma perspectiva psicolingüística, a pesquisa na área de Aquisição de Terceira
Língua apresenta características específicas que não se equiparam às comumente
encontradas nos estudos sobre Aquisição de Segunda Língua.
Uma das primeiras contribuições a essa área recente foi a pesquisa conduzida
por Ringbom (1987), que analisou a influência do Finlandês e do Sueco na aquisição
de Inglês como terceira língua. (cf. CENOZ, HUFEISEN & JESSNER, 2001) A partir
daí, os estudos nessa área têm sido abrangentes, contemplando, por exemplo,
aspectos como a transferência lingüística da primeira ou da segunda língua para as
subseqüentes (WILLIAMS & HAMMARBERG, 1998); o conhecimento metalingüístico
(LASAGABASTER, 1998 e JESSNER, 1999); ou o fator da idade (MUÑOZ, 2000).
8
Modelo Dinâmico de Multilingüismo (nossa tradução).
33
9
Modelo de Papéis e Funções (nossa tradução).
35
Bot, argumenta que os dados de sua própria pesquisa longitudinal com Sarah
Williams sustentam a idéia de que as diferentes línguas já aprendidas, por um
mesmo falante, desempenham papéis diferentes na produção da língua em
estudo. Foram identificados quatro tipos de trocas lingüísticas, sendo que três
delas tinham propósito pragmático: (i) edição, como marcas de auto-correção;
(ii) metalingüístico, como pedidos de auxílio; (iii) inserção de itens lingüísticos
que não pertencem à língua em estudo, como estratégias para superar
problemas lexicais. O quarto tipo de troca lingüística foi denominado WIPP, ou
Without Identified Pragmatic Purpose, sem propósito pragmático
identificado10. Enquanto que o uso da LM, Inglês, prevaleceu nos três
primeiros tipos de trocas lingüísticas, quase a totalidade das trocas do último
tipo, WIPP, apresentou o uso da LE1, o Alemão. O pesquisador acredita que,
no caso da aprendizagem de uma LE2, seria simplificar demais aceitar a
proposta que identifica as várias línguas durante a produção da língua em uso
como recebendo níveis distintos de ativação, em termos de “selecionada,
ativa ou dormente”11 (p. 303, nossa tradução). Para Hammarberg, a
interferência lingüística causada pelas línguas previamente aprendidas não é
distribuída igualmente entre elas, mas é qualitativamente diferente. Apenas a
língua à qual foi atribuído o papel chamado default supplier12, em seu caso a
LE1, é regularmente ativada em paralelo com a interlíngua em estudo, e
fornece material para a construção lexical em LE2. A LM, ou língua materna,
por sua vez, exerce um papel instrumental, tem função metalingüística. O
autor sugere que os fatores que determinam qual das línguas exercerá o
papel de default supplier são: proficiência, tipologia, recenticidade e status. O
modelo prevê que, com o passar do tempo, ambos os papéis serão
assumidos pela própria língua em estudo.
10
Poulisse e Bongaerts (1994) denominaram essas trocas lingüísticas como non-intentional switches, ou trocas
não intencionais. Eles as distinguiam das outras por não serem precedidas por quaisquer sinais de hesitação, e
não serem marcadas por sinais de entoação.
11
(...) selected, activated and dormant.. Esta foi a proposta de Green(1986), mantida por DeBot
(1992) (cf. JORDÀ, 2005, p. 33).
12
Como default entendemos a opção que o falante adota, conscientemente ou não, quando há
diversas a escolher. A língua selecionada atuaria como um “fornecedor pré-configurado”, no caso de
domínio insuficiente da língua em estudo.
36
13
Modelo de Fatores (nossa tradução).
37
14
Modelo Ecológico de Multilingualidade (nossa tradução).
15
In our view, it is necessary to base the study of multilingualism on the notion of identity, given the fact that
language constitutes one of the most defining attributes of the individual.
38
16
Modelo de Aquisição de Línguas Estrangeiras (nossa tradução).
39
17
(...) the IC Model is to account for the ability of bilinguals to perform the intended task in the intended
language.
40
é preciso inibir a ativação de lemas que pertencem a uma língua que não se
pretende utilizar.
O modelo de Green foi combinado por Poulisse e Bongaerts (1994) ao modelo
de Levelt (1989), de que já tratamos anteriormente, para explicar o uso da primeira
língua na produção da segunda. Dewaele (1998), por sua vez, expandiu-o para
explicar a origem de invenções lexicais na interlíngua do Francês com traços de
outras duas interlínguas, Holandês e Inglês.
Conforme mencionamos anteriormente, várias pesquisas com sujeitos
trilíngües ou multilíngües foram desenvolvidas procurando estender a esses casos
modelos desenvolvidos com o falante bilíngüe em mente. Dijkstra e Van Hell (2003),
por exemplo, aplicaram o modelo de Grosjean (1997) a falantes trilíngües
relativamente proficientes nas três línguas (Holandês, Inglês e Francês), e
constataram que o que Grosjean previa que acontecesse durante o modo
monolingual na verdade não ocorreu. Durante uma tarefa de reconhecimento lexical
puramente em Holandês, cognatos em Inglês e Francês também foram ativados.
Sendo a pesquisa na área da aprendizagem de terceira língua ou outra
subseqüente bastante recente, as bases teóricas em que se apóiam seus
pesquisadores advêm, muitas vezes, de outras áreas, como o Bilingüismo (cf.
HOFFMANN, 2001) e a Aquisição de Segunda Língua.
18
Creating Sy nergies in the Learning of Subsequent Languages
41
aprendidas isoladas umas das outras, mas que otimize a valorização das línguas
anteriormente aprendidas durante a aprendizagem de outra língua;
b) Projeto “Intercompreensão Européia”19 (nossa tradução) – Projeto
interinstitucional que reúne pesquisadores na Alemanha e na Áustria, baseado na
idéia de que o conhecimento de uma LE seja uma ponte para se desenvolver,
rapidamente, habilidades receptivas em outras línguas estrangeiras da mesma
família lingüística.
c) Projeto Conjunto para o Desenvolvimento Teórico na Área de “Aquisição de
Terceira Língua e Trilingüismo”20 (nossa tradução) – Aqui a preocupação é
representar teoricamente a aprendizagem de múltiplas línguas de uma forma
inovadora, sendo que se pressupõe que não basta expandir as teorias já existentes
na área de Aquisição de Segunda Língua.
d) Projetos transdisciplinares “Multilingüismo no Cérebro”21 (nossa tradução) e
“Correlações Neurolingüísticas do Multilingüismo na Região Naturalmente
Multilingüe do Régio Basiliensis”22 (nossa tradução), em Basel, na Suíça – Pesquisa-
se, com o auxílio de procedimentos tecnológicos, como o PET Scanning, quais são
as diversas áreas do cérebro que são ativadas quando indivíduos resolvem tarefas
em uma, duas, ou mais línguas, e como isso acontece. Já se descobriu, por
exemplo, que a determinação do hemisfério cerebral dominante no processamento
lingüístico depende, em parte, do fato do falante ser destro ou canhoto; e que quanto
mais cedo se aprendem outras línguas, menos áreas do cérebro precisam ser
ativadas para o seu uso. (KRICK et. al., 2003, p. 3 e 6)
Além desses projetos, apresentados por Hufeisen (2003b), destacamos
também os dois seguintes, que unem a promoção do multilingüismo a preocupações
sociais e comerciais:
e) Projeto COALA – Promoção da Comunicação e da Linguagem no
Treinamento de Professores de Educação Infantil23 (nossa tradução): Participam do
projeto, iniciado em outubro de 2003, cinco países da Europa: Suécia, Alemanha,
Malta, Polônia e Espanha. O objetivo é a promoção de competências interculturais
dos educadores, a fim de que estes possam utilizar métodos efetivos e com
19
Europäische Interkomprehension
20
Third Language Acquisition and Trilingualism
21
Mehrsprachigkeit im Gehirn
22
Neurolinguistische Korrelate der Mehrsprachigkeit im natürlich mehrsprachigen Umfeld der Regio
Basiliensis
23
Communication and language promotion in training pre-school teachers
42
objetivos claros para trabalharem com crianças imigrantes que freqüentam a escola
juntamente com as crianças nativas. As crianças que não dominam a língua nativa
ou oficial do país são prejudicadas em sua comunicação e em sua aprendizagem, o
que por vezes também acontece com seus familiares na comunidade e no trabalho,
onde procuram integrar-se. Além de buscar maior efetividade no ensino da língua
nativa para as crianças, busca-se preparar melhor os educadores para auxiliarem o
desenvolvimento multilingüe das crianças. (SCHRAML, 2005) A partir da mesma
preocupação, a Fundação Estadual de Baden-Württemberg mantém, desde o ano
de 2002, o Projeto Diga Alguma Coisa : Promoção Lingüística para Crianças em
24
Idade Pré-escolar (nossa tradução), em que o foco é o ensino intensivo de
Alemão.
24
Sag´mal was – Sprachförderung für Vorschulkinder
43
características distintivas de outros aprendizes. Entre elas está o fato de que, sendo
o Inglês e o Alemão línguas de origem comum e semelhantes em diversos pontos,
sua tipologia ou psicotipologia (cf. FERNANDES-BOËCHAT & BRITO, no prelo)
acaba por determinar uma influência bastante acentuada entre as duas interlínguas.
Güler (2000), por exemplo, discute perspectivas didáticas e metodológicas para o
ensino de Alemão como segunda LE após o Inglês nas escolas turcas.
Além disso, mesmo fora da Europa, encontra-se a preocupação de
pesquisadores em estudar a aprendizagem do Alemão como segunda LE após o
Inglês, pois acredita-se que os fatores que distinguem os aprendizes nessa situação
de ensino-aprendizagem, incluindo as características lingüísticas dos idiomas
envolvidos, fazem-na merecedora de tratamento diverso do que se oferece ao
ensino de línguas estrangeiras em geral. Chan Yin Fung (2001) apresenta e discute
os resultados de uma pesquisa desenvolvida com alunos de Hong Kong, que
possuem o Chinês como língua materna, Inglês como sua primeira LE, e Alemão
como língua em estudo. Nas palavras da autora:
25
By way of conclusion, we are calling for more independent research of TLA since we have shown
that an additional language does (grifo da autora) make a difference in the acquisition process and its
nature.
44
cenário geográfico e político que o contato lingüístico passa a provocar (van ELS,
2005).
45
3.1 APRESENTAÇÃO
transferência lingüística existe, senão a tarefa é descobrir quando e por que ela se
produz.
Apesar de outras línguas anteriormente aprendidas serem mencionadas em
estudos acerca da influência interlingüística, uma longa tradição de estudos focaliza
apenas a influência que a língua materna exerce sobre a aprendizagem / aquisição
de uma segunda língua, ou primeira LE. A preocupação em observar a influência de
outras línguas estrangeiras previamente aprendidas sobre a língua atualmente em
estudo é bastante recente.
Neste capítulo, não nos propomos a abordar a transferência lingüística em
todos os seus aspectos. Trataremos da sua conceituação, relataremos um pouco da
história da pesquisa nessa área, e consideraremos mais detalhadamente, por fim,
dois entre os fatores que, acredita-se, influenciam sobremaneira o que os aprendizes
transferem entre suas línguas: a tipologia lingüística e a distância psicológica.
3.2 CONCEITUAÇÃO
26
Transfer is the influence resulting from similarities and differences between the target language and any other
language that has been previously (and perhaps imperfectly) acquired.
48
27
O comportamentalismo está ligado ao estruturalismo americano, desenvolvido a partir do final do século XIX.
Em nome da objetividade científica, eliminou-se toda referência a categorias mentais e conceituais, para explicar
o significado simplesmente como a relação entre um estímulo e uma reação verbal. O estruturalismo está
representado em livros publicados nos Estados Unidos durante a década de 1950.
28
“ (...) pelo fato da transferência estar fortemente associada ao pensamento comportamentalista, uma forma de
argumentar que a aprendizagem de segunda língua não era uma atividade comportamentalista era argumentar
que a transferência não constituía um fator principal, ou mesmo importante, nas tentativas de explicar a
aprendizagem de segunda língua.” (nossa tradução) ((...) because transfer was strongly associated with
behaviorist thought, a way of arguing that second language learning was nota behaviorist-based activity was to
argue that transfer was not a major, or even an important, factor in attempts to account for second language
learning. (GASS & SELINKER, 2001, p. 104)
50
afirma Odlin (1989, p. 24), e o suporte empírico fornecido a sua importância é agora
bastante desenvolvido.
29
(…), we have the luxury of waiting for acquired competence to build up via input, and a great deal of first
language ‘transfer’ can be avoided.
51
de Krashen e Terrell apresentando quatro motivos pelos quais não pode aceitá-la:
em primeiro lugar, ela não valoriza o fato de que aprendizes cuja língua materna
apresenta semelhanças no vocabulário ou outros aspectos com a língua em estudo
possuem um diferencial importante com relação ao que será realmente novo durante
o seu aprendizado; além disso, a afirmação de Krashen sugere que a influência da
língua materna sempre se manifesta de forma transparente, quando muitas vezes
essa influência funde-se com outras, sem que se possa estabelecer uma
correspondência entre a língua materna e as tentativas de produção do aprendiz; em
terceiro lugar, ao considerar a transferência uma mera estratégia de produção,
Krashen não reconhece que o aprendiz a utiliza como facilitadora também em
atividades consideradas passivas, como a compreensão oral e/ou escrita; para
finalizar, pesquisas empíricas sobre línguas em contato demonstram que, a longo
prazo, mesmo utilizando a chamada recorrência à língua materna, os aprendizes
chegam ao domínio da língua em estudo.
costumavam fazer entre tipos diferentes de estímulos levavam a crer que sua
aprendizagem envolve classificação, que constitui um processo cognitivo. Além
disso, o fato de que nem sempre se demonstra o que se aprendeu significa que o
desempenho nem sempre reflete o que se sabe ou não. Da visão de que o
comportamento envolve mais do que um estímulo ambiental e uma resposta,
desenvolveram-se, portanto, teorias cognitivas, envolvidas com a influência do
pensamento e da lembrança de experiências, que são eventos internos.
A transferência lingüística passou a ser vista como um mecanismo cognitivo
que subjaz à aquisição de outra(s) língua(s), e não mais apenas como uma prática
mecânica, tendo em vista que, em meio aos esforços para se aprender uma língua,
faz-se uso de uma variedade de fontes de conhecimento, incluindo a interação
existente entre as seqüências de desenvolvimento, que são comuns na
aprendizagem de várias línguas, e a influência de outra(s) língua(s) conhecida(s).
Inferências feitas a partir de quaisquer semelhanças encontradas entre a
interlíngua de aprendizes e línguas previamente aprendidas podem, porém, sem os
devidos cuidados metodológicos, levar a resultados inconclusivos acerca da
ocorrência de transferência lingüística. A subjetividade inerente aos estudos pode
levar mesmo cientistas comprometidos a fazerem falsas inferências e promoverem
sua propagação.
As teorias cognitivas de processamento de informações30 são um
desenvolvimento mais recente, inspirado pelo desenvolvimento da tecnologia
computacional. Para elas, o papel da memória é especialmente importante nos
processos de aprendizagem, e incentiva-se que os alunos sejam auxiliados a
memorizar conteúdos ligando a nova aprendizagem aos esquemas já existentes, e
que lhes sejam fornecidas estruturas claras para que formem novos esquemas. A
automatização, nessa perspectiva, é um processo importante se visto como a prática
que conduz à capacidade de executar tarefas com a exigência de pouca ou
nenhuma atenção consciente, o que libera recursos mentais que podem ser
utilizados para outras atividades, concomitantemente. Essa automatização permite
que se realizem atividades com maior rapidez, e deixa livre uma maior capacidade
de memória de curto prazo. Difere, no entanto, da automatização de hábitos pregada
30
Para uma descrição mais detalhada acerca do histórico e características das teorias de processamento de
informações, veja-se KEENAN, T. An introduction to child development. Oxford: Sage Publications Ltd., 2002,
p. 137 – 140.
53
O termo “tipologia” pode ser utilizado para denominar coisas diferentes, tanto
dentro da Lingüística quanto fora dela. A Tipologia Lingüística pode referir-se: (1) à
comparação de algum aspecto (morfológico, sintático, ou fonológico) entre as
línguas, e à conseqüente classificação das mesmas de acordo com suas
características; (2) aos estudos dos padrões que ocorrem sistematicamente nas
línguas em geral; esses padrões são chamados de “universais lingüísticos”32; ou (3)
uma abordagem aos estudos lingüísticos que contrasta com outra(s) anterior(es),
tais como o Estruturalismo oposto à Gramática Gerativa de Chomsky. Conforme
Croft (2003, p. 2), temos aí três estágios de qualquer análise empírica científica: a
observação de um fenômeno empírico (neste caso, a língua) e sua conseqüente
classificação, representada pela classificação tipológica; a formação de
generalizações a partir do que foi observado, como no caso dos universais
lingüísticos; e a criação de explicações para os fenômenos, o que se dá pela
abordagem funcional tipológica.
Nas cerca de cinco mil33 línguas existentes no mundo, podem ser
determinados inúmeros pontos que ofereceriam possibilidades de comparação.
Muitos deles, porém, não oferecem justificativas suficientes para a condução de um
trabalho científico, já que não possibilitariam o desenvolvimento de generalizações
31
A vinculação das abordagens psicológicas de processamento de informações ao ensino-aprendizagem de
línguas encontra-se na seguinte obra: ELLIS, R. Learning a second language through interaction. Philadelphia:
John Benjamins B. V., 1999 (Capítulo 1).
32
Existem duas abordagens dos universais lingüísticos utilizadas em estudos tipológicos: a baseada
indutivamente nas restrições que eles impõem às variações entre as línguas, desenvolvida por Greenberg como
oposição à visão do relativismo antropológico, e a da tradição gerativa de Chomsky, apresentada como crítica à
psicologia comportamentalisma, como argumento dedutivo. (CROFT, 2003, p. 4 e 5)
33
Cf. Ritchie & Bhatia, 2004, p. 1
54
Inglês. O falante nativo de inglês teria muito mais coisas novas com que se deparar
ao aprender Árabe do que Francês; conseqüentemente, levaria mais tempo para
aprender Árabe do que Francês (LEAVER, EHRMAN & SHEKHTMAN, 2005). A
título de ilustração, transcrevemos a seguir alguns dos resultados de tal pesquisa,
conforme Odlin (1989):
Língua Número de
semanas
Árabe 44
Chinês 44
Holandês 24
Francês 20
Alemão 20
Português 24
Russo 44
Pode-se deduzir daí que, assim como já apontavam Vermes & Boutet (1989,
p. 13), “seja no interior de um grupo como no interior de um indivíduo as diversas
línguas estão em constante interação umas com as outras.”
O papel da transferência lingüística (ou influência interlingüística) volta a
ganhar relevância nos estudos sobre a aquisição / aprendizagem de línguas
estrangeiras, depois de ter sido severamente criticado, especialmente porque estava
baseado em abordagens estruturalistas e comportamentalistas. O descrédito
associado à Hipótese da Análise Contrastiva pouco a pouco deu lugar às evidências
das muitas pesquisas empíricas que atestam os efeitos de línguas previamente
aprendidas. O interesse que o tema desperta na atualidade vem acompanhado de
maturidade, inclusive da própria Lingüística, que, como ciência autônoma, não mais
precisa apoiar-se em outras que lhe dêem credibilidade. Esta une-se
deliberadamente, no entanto, numa ação interdisciplinar a outras ciências, como a
Neurologia, porque esta lhe fornece hoje recursos preciosos para a observação
física da linguagem em funcionamento; e a outras ciências sociais, num momento
em que se valorizam também as crenças, as percepções e as estratégias, coletivas
ou individuais, desenvolvidas pelos usuários das línguas. Somando-se a isso, o
estímulo a ou a necessidade do multilingüismo estendem a abrangência do tema
para além das influências entre duas línguas apenas. Todos esses fatores anunciam
uma renovação no desenvolvimento de pesquisas sobre a transferência lingüística,
que reconhecem a complexidade das línguas e dos seus falantes, bem como das
relações entre eles.
34
The behaviour of each individual language system in a multilingual system largely depends on the behaviour
of previous and subsequent systems and it would therefore not make sense to look at the systems in terms of
isolated development.
58
4.1 INTRODUÇÃO
4.2 ORIGENS
Aos participantes havia sido dito que deveriam ler o texto com a intenção de
compreendê-lo, ou seja, sem se preocuparem com a acuidade, ou a correta
pronúncia das palavras. Ao final da leitura responderiam a apenas uma pergunta,
com “sim” ou “não”. Deveriam fazer a primeira leitura em voz alta, sabendo que lhes
seria dado mais tempo posteriormente para releituras. Não estariam, portanto,
atentando conscientemente para a pronúncia das palavras, sendo bastante provável
que permitissem que seu inconsciente se manifestasse. O termo inconsciente é
entendido aqui como referindo-se à “mente involuntária, independente da vontade do
falante” (FERNANDES-BOËCHAT, 2005, p. 35).
A análise dos erros de pronúncia cometidos pelos sujeitos durante a leitura em
voz alta revelou que uma média de 85% dos termos cognatos lidos incorretamente,
de acordo com a pronúncia do Francês, haviam sido pronunciados com a tonicidade
que seu cognato apresentaria na língua estrangeira anteriormente aprendida pelo
leitor. Este é sem dúvida um número expressivo, se considerarmos que, dos 20
vocábulos, 17 foram pronunciados com a tonicidade da língua imediatamente
precedente.
Como outras pesquisas apresentadas no segundo capítulo desta dissertação,
esta deixou claro que não é apenas a língua materna que pode causar influência
sobre quaisquer línguas posteriormente aprendidas. A recorrência à língua materna
manifesta-se freqüentemente durante a aprendizagem da primeira língua
estrangeira, e tem sido objeto de pesquisas há décadas, como escrevemos no
capítulo anterior.
A pesquisa de Fernandes-Boëchat, no entanto, buscou evidências da
recorrência a outra língua, que não a materna. Nas condições do estudo, a influência
das outras línguas estrangeiras mostrou-se muito mais presente do que a da língua
materna. Durante o período de realização dessa pesquisa, outros pesquisadores já
haviam divulgado, ou desenvolviam, resultados semelhantes, no que concerne à
possibilidade de influência de línguas estrangeiras previamente aprendidas (Vejam-
se Hufeisen (1993; 1998) e Williams & Hammarberg (1991)). A novidade na Teoria35
de Fernandes-Boëchat é que a autora afirma que essa influência não ocorre
aleatoriamente, quando o aprendiz utiliza a língua em estudo com foco na fluência.
No caso da aprendizagem da terceira língua estrangeira, por exemplo, a língua que
35
Utilizaremos, neste trabalho, a palavra Teoria com inicial maiúscula quando estivermos referindo-nos à Teoria
Cognitiva de Reação em Cadeia na Aprendizagem de Línguas Estrangeiras.
61
FPL de FL2 = FL1, FPL de FL3 = FL2, FPL de FL4 = FL3, FPL de FL5 = FL4,
etc...
Os efeitos da reação em cadeia negativa não devem persistir por muito tempo,
apesar de que esse tempo possa levar alunos a desistirem da aprendizagem por
acharem que nunca conseguirão separar as línguas. A recorrência inconsciente à
língua precedente, após um tempo, deixa de influenciar tanto o processo. Isso não
significa, no entanto, que a reação que era negativa passa a ser positiva quando a
reação desfavorável deixa de existir. O caráter positivo ou negativo da reação em
cadeia é-lhe atribuído em virtude de quais línguas estão envolvidas, e em que ordem
foram aprendidas.
4.4. CONTRIBUIÇÕES
5 ABORDAGEM METODOLÓGICA
5.1 APRESENTAÇÃO
detalhes dos instrumentos e das fontes de que nos valemos no decorrer dos
trabalhos.
primeira LE? Partimos da tendência apontada por Murphy (2003) de que não se
pode considerar o aprendiz de mais de uma LE como um monolíngüe aprendendo
uma segunda LE, mas como um aprendiz que possui uma configuração lingüística
única e específica. Cusack (2000), por exemplo, afirma que a aquisição de uma LE
não começa do zero, nem se baseia na língua materna, e que as estruturas de uma
LE já aprendida afetam a interlíngua da próxima. Ou seja, a complexidade da
linguagem é a mesma da pessoa. O processo de aprendizagem de uma terceira
língua, ou outra subseqüente, é um fenômeno mais complexo do que a
aprendizagem da primeira LE, porque, além de todos os fatores pessoais e sociais
que o afetam, o processo e o produto da aprendizagem da(s) línguas estrangeiras
anterior(es) possuem um grande potencial de influenciar, positiva ou negativamente,
a aprendizagem da língua subseqüente.
36
O termo L3 pode referir-se somente à terceira língua aprendida, ou a qualquer língua subseqüente à primeira
LE.
70
5.3.2 Procedimentos
6.1 PESQUISA 1
Objetivos da pesquisa: Explicar as causas dos erros dos aprendizes multilíngües, descrevendo
como lemas específicos de uma língua são ativados no léxico mental multilingüe durante os
processos de aprendizagem de língua e de produção de fala.
Resultados da pesquisa:
6.2 PESQUISA 2
parece para o autor que os falantes de Francês como LE1 apresentam uma maior
proporção de invenções lexicais que resultam de transferência de sua LM (15,2%
dos casos, contra 9,2% apresentados pelos falantes de Francês como LE2),
enquanto que os falantes de Francês como LE2 produzem mais formas que podem
ser traçadas até sua LE1 (Inglês) (21,8% dos casos, contra 6,9% para os falantes de
Francês como LE1, para quem o Inglês é a LE2).
Foram identificadas transferências do Holandês (LM) quando havia fortes
semelhanças entre determinadas palavras nas duas línguas.
Resultados da pesquisa:
6.3 PESQUISA 3
Resultados da pesquisa:
6.4 PESQUISA 4
Objetivos da pesquisa: Analisar os erros nas produções orais dos sujeitos, a fim de precisar
quão próximas as três línguas são armazenadas nos cérebros dos trilíngües.
Resultados da pesquisa:
léxico multilingüe, já que este deve variar conforme a idade, o contexto, o histórico
do aprendiz e suas competências. (p. 11 – 12)
►6.5 PESQUISA 5
NÄF, Anton; PFANDER, Doris. <Springing of> a <bruck> with an elastic <sail>:
Deutsches im Englisch von französischsprachigen
Schülern.
Objetivos da pesquisa: Registrar os traços deixados pela LE1 Alemão na produção escrita dos
estudantes de Inglês como LE2, cuja LM é o Francês. Os sujeitos cujas produções foram
analisadas são bacheliers suíços, ou seja, estudantes aprovados no exame final escolar,
considerados aptos a ingressarem na universidade.
Este estudo retrata uma situação pouco comum, mesmo na Europa, em que
o Alemão é ensinado nas escolas como primeira língua estrangeira, antes do Inglês.
A situação dominante é normalmente a inversa. Ao final do ensino secundário, os
aprendizes concluíram 10 anos de estudo do Alemão e 6 anos de estudo do Inglês.
Foram analisadas 300 produções escritas de 200 formandos do ensino
secundário na Suíça, sendo uma tradução e uma composição de 100 sujeitos, do
ano de 1998, e 100 composições de 100 sujeitos, do ano de 1997. As traduções são
vistas como produções mais sujeitas a transferências lingüísticas, e por outro lado
pouco sujeitas a estratégias de evitamento, ou avoidance. Já as composições
permitem aos sujeitos a liberdade na utilização dos meios que já têm à disposição na
língua em estudo.
85
Resultados da pesquisa:
37
(...) mehr oder weniger bewusst(...)
38
Doubly supported interference.
86
►6.6 PESQUISA 6
curso de Italiano em sua universidade. Tanto no caso do Espanhol como LE1 como
no caso do Francês como LE2, o nível de proficiência de todos os participantes foi
considerado baixo, de acordo com suas respostas ao questionário sócio-biográfico, e
também com os resultados de um teste de tradução. Este teste foi aplicado para
determinar o grau de proficiência de possíveis participantes, e a partir dele foram
selecionados, então, os que apresentavam nível semelhante.
Pediu-se aos sujeitos participantes que lessem um texto sobre a vida de
um estudante universitário em suas línguas maternas, e que escrevessem um
resumo do mesmo em Italiano, sua língua em estudo. Todos foram instruídos a não
revisarem o texto e a não usarem dicionários.
Resultados da pesquisa:
Mesmo possuindo pouco conhecimento nas línguas espanhola e francesa
que haviam sido estudadas como LE anteriormente, ao escreverem na língua em
estudo, o Italiano, os sujeitos utilizaram palavras funcionais dessas línguas. De
acordo com a autora, isso ocorreu por causa da proximidade tipológica entre elas,
visto que os falantes nativos de Espanhol utilizaram, além de termos da LE1, o
Francês, também termos do Espanhol, sendo que as três línguas, Espanhol,
Francês e Italiano são aparentadas. Os resultados deste estudo demonstram,
portanto, que, na presença de três línguas tipologicamente semelhantes, existe uma
influência considerável sobre os aprendizes do seu conhecimento de Francês.
Após analisar os dados, a primeira pergunta foi respondida da seguinte
maneira: Os participantes multilíngües deste estudo usaram palavras funcionais
tanto da sua língua materna quanto das línguas não-nativas, contanto que as
línguas anteriormente aprendidas e a língua em estudo fossem tipologicamente
próximas.
O modelo proposto por Williams e Hammarberg (1998) explica que uma
das línguas não-nativas do falante torna-se sua fonte preferida de informação
lingüística fora da língua em estudo, e é-lhe portanto atribuído o papel de “default
supplier”39 Os fatores que determinam qual das línguas não-nativas do falante
assumirá tal papel, conforme Williams e Hammarberg, são quatro: a proficiência, a
39
Como default entendemos a opção que o falante adota, conscientemente ou não, quando
há diversas a escolher. A língua selecionada atuaria como um “fornecedor pré-
configurado”, no caso de domínio insuficiente da língua em estudo.
88
40
In the presence of three typologically close languages, the learner thus favored the German L2 over the
English L1 for function words.
89
Como resposta à segunda pergunta que norteou esta pesquisa, acerca das
informações que o conhecimento de outras línguas não-nativas pode fornecer sobre
as escolhas feitas pelo aprendiz, os resultados, em geral, demonstram que o
conhecimento anterior de Francês informa consideravelmente sobre as escolhas que
os aprendizes fazem de estruturas superficiais na língua em estudo, o Italiano. A
taxa diferencial de inserção do sujeito em ambos os grupos (falantes dos Estados
Unidos e de Porto Rico) sugere que a diferença não pode ser resultado da influência
da LM, mas que é resultado da influência lingüística não-nativa.
De Angelis conclui, portanto, que na presença de três línguas
tipologicamente semelhantes (neste caso Espanhol como LM, Francês como LE1, e
Italiano como língua em estudo) os aprendizes são consideravelmente influenciados
pelo seu conhecimento de Francês. Os resultados desta pesquisa demonstram a
influência da distância psicológica, no entanto também indicam que quando duas
línguas próximas à língua em estudo (Espanhol como LM e Francês como LE1)
estão presentes nas mentes dos aprendizes, estes não parecem perceber as
palavras funcionais como igualmente transferíveis. Os aprendizes são seletivos com
relação ao tipo de palavras funcionais que usam em suas produções escritas.
Portanto, algumas palavras funcionais podem ser mais facilmente transferíveis do
que outras. Fernandes-Boëchat (2000) propõe, baseada nos resultados de sua
pesquisa realizada na França, que a recorrência a línguas anteriormente aprendidas
não é aleatória; isto atesta que existe uma seletividade, que para a autora
concentra-se principalmente na ordem de aprendizagem das línguas estrangeiras,
sendo que a última língua anteriormente aprendida deverá ser a mais influente no
caso de recorrência.
Como o estudo de Fernandes-Boëchat (2000) também sugere, esta
pesquisa enfatiza o fato de que quaisquer hipóteses acerca da influência
interlingüística deverão levar em consideração que o conhecimento da língua em
estudo também pode ser influenciado pelo conhecimento prévio dos aprendizes, que
pode incluir uma ou mais outras línguas estrangeiras. Este conhecimento lingüístico
parece influenciar a produção e o desenvolvimento da língua em estudo de maneira
significativa.
90
►6.7. PESQUISA 7
Resultados da pesquisa:
41
In case I cannot understand something in English, it can be explained to me in Hebrew, and if this fails, the
teacher can resort to Russian. (Israeli student)
93
►6.8 PESQUISA 8
Objetivos da pesquisa: Investigar como a proficiência na, e a exposição à LE1, afetam a forma
pela qual a LM e a LE1 influenciam a aquisição e a produção de palavras numa LE2.
selecionados para que não tivessem aprendido quaisquer outras línguas, ou essas
em outra ordem. No entanto, três deles tinham tentado aprender Latim também.
Foram, então, divididos em três grupos, de acordo com o nível de proficiência que
possuíam em Francês, sua LE1. O quadro abaixo esclarece os níveis de proficiência
na e de exposição à LE1 dos participantes:
Resultados da pesquisa:
►6.9 PESQUISA 9
Resultados da pesquisa:
que se verificou uma recorrência maior à LE1, Inglês, foi o de estudantes que
utilizavam o Inglês diariamente no trabalho.
►6.10 HEINE, Lena. Der Einfluß vorher gelernter Sprachen auf das aktuelle
Sprachenlernen.
Total: 4
Resultados da pesquisa:
influência involuntária constante que o Inglês exerce sobre a sua fala em Sueco, e a
pesquisadora conclui que este é, novamente, um indício da interação involuntária e
incontrolável com o Inglês.
Com relação às alterações lingüísticas sem função pragmática definida, a
autora conclui que estas são curtas, bastante freqüentes, e evidentemente
involuntárias. Os dois exemplos apresentados mostram a influência, novamente, da
língua inglesa.
Após fazer um levantamento percentual do número de cada tipo de
transferência identificado e comparar os resultados, a autora chega à conclusão de
que as línguas que as estudantes já dominam assumem papel importante durante o
aprendizado da língua em estudo, mas de maneiras diferentes. Sua influência se
apresenta em diferentes áreas de utilização do Sueco. Nas transferências
consideradas involuntárias, 3 estudantes recorrem mais ao Inglês, porém aquela que
aprendeu Espanhol como LE3 recorre mais a este. Não foram identificadas
quaisquer recorrências às outras línguas: Francês, Holandês, Latim, Grego Antigo
ou Baixo Alemão.
Para responder a segunda pergunta proposta no início deste estudo,
acerca das condições que precisam estar presentes para que as influências de
línguas anteriormente estudadas se manifestem, levantaram-se dois critérios: o grau
de proficiência das línguas, e o conjunto de fatores que ao interagirem podem
determinar a ocorrência de influências.
Quanto à influência que o grau de proficiência pode assumir, verificou-se
por outros autores em pesquisas anteriores que não apenas a semelhança e
proximidade entre as línguas determinam o grau de dominância de umas sobre as
outras, mas também o seu grau de proficiência, sendo a LM considerada a mais
dominante por sua recorrência e freqüência de uso. Essa dominância também pode
mudar ao longo do tempo, conforme o falante permanece durante muito tempo no
exterior, e deixa de utilizar sua LM, por exemplo. (Cf. Shanon, 1991e Missler, 1999)
No caso do presente estudo, a autora conclui que este fator não é determinante,
pois se fosse deveriam ter sido identificados mais casos de recorrência à língua
alemã, LM das estudantes, o que não ocorreu.
Especialmente no caso das alterações lingüísticas sem função pragmática
definida, consideradas involuntárias, os resultados deste estudo corroboram os
encontrados por Williams e Hammargerg (1998), que defendem que se realiza uma
101
distribuição de papéis entre as línguas que o falante conhece, e apenas uma delas
permanece ativa durante a produção lingüística. Os dados coletados no estudo de
Heine suportam a idéia de que o Inglês permanece ativado o tempo todo, e possui
um papel importante na produção oral das estudantes.
Para a autora, quanto mais sistemas lingüísticos estiverem envolvidos na
mente, mais difícil será prever as possíveis interações entre eles.
102
Pesquisa 2
Como não havia definido observar O grupo de falantes de Francês
esta questão antes de iniciar a coleta como LE1 parece recorrer mais
de dados, o autor preferiu não à LM, no tocante às invenções
distinguir as produções dos lexicais, enquanto que o grupo
aprendizes que constituíam seu de sujeitos que tem o Francês
objeto de estudo, as invenções como LE2 recorre mais aos
lexicais, como intencionais ou não- lemas em Inglês, sua LE1.
intencionais.
Pesquisa 3
Não há referências. * transferência parcial do estado
chamado steady (estável, como oposto
a inicial) da LE1 no estágio inicial da
LE2.
Pesquisa 4
Há relatos dos aprendizes de que, * A influência da LE2 sobre a LE1
durante o início da aprendizagem da superou a influência inversa que
LE2, freqüentemente vinham à mente acontecera anteriormente.
termos da LE1, posto que as duas
são bastante semelhantes. Essa
interferência, disseram os aprendizes,
não durou muito tempo.
Da parte das autoras, apresentam
rapidamente algumas poucas
situações em que os sujeitos
104
Pesquisa 5
Os autores comentam que as O número de recorrências à
estratégias que os aprendizes LE1, a língua anteriormente
utilizam na produção da língua em aprendida, é considerado
estudo podem ser “mais ou menos pequeno, constituindo apenas
conscientes”, e que os aprendizes um sexto do total. O maior
recorrem “despreocupadamente” a número de recorrências , quatro
lexemas da língua anteriormente sextos, é atribuído à LM.
aprendida, o que ocasiona Considera-se surpreendente a
transferências lexicais. grande influência do Inglês, a
LE2, sobre o Alemão, a LE1,
como na pesquisa anterior.
Pesquisa 6
Não há menção no texto. Na presença de três línguas
tipologicamente semelhantes,
Espanhol, Francês e Italiano,
existe uma influência
considerável do Francês, língua
anteriormente aprendida como
LM ou LE1.
A semelhança tipológica não é
sempre fator determinante, pois
verificou-se que ocorre
transferência considerável de
palavras funcionais de uma
língua cuja estrutura é
considerada semelhante,
mesmo que esta língua seja
considerada distante,
tipologicamente, da língua em
estudo.
Pesquisa 7
Nã há menção no texto. Um dos participantes comenta
preferir que o professor procure
105
Pesquisa 8
Apesar de não utilizar o termo A influência da LM sobre a LE2
“inconsciente” ou outro sinônimo, as é menor nas situações em que
ocorrências analisadas pela autora a proficiência na LE1 é maior
podem caracterizar-se como tal, A influência da LE1 poderia já
porém podem acontecer, também, de não estar acontecendo porque
maneira consciente. Foram ela se manifesta mais nos
analisadas: invenções lexicais, trocas estágios iniciais de
lingüísticas, e, seguindo Williams & aprendizagem, e os aprendizes
Hammarberg (1998), influências que já estavam aprendendo a LE2
se caracterizam como WIPP - havia dois ou três anos.
without identified pragmatic purpose,
ou sem propósito pragmático
identificável. Essas mesmas trocas
lingüísticas foram identificadas por
Poulisse e Bongaerts (1994) como
“não-intencionais”.
Pesquisa 9
Contrariamente, menciona-se que os A utilização da LE1 durante a
aprendizes parecem fazer uso aprendizagem da LE2 restringe-
consciente da LE1 enquanto estudam se aos alunos, de maneira
a LE2. estratégica. Os professores
parecem não valorizar o uso da
LE1, mas valem-se da LM dos
aprendizes em diversos
momentos das aulas.
Pesquisa 10
Mencionam-se trocas lingüísticas As línguas anteriormente
involuntárias, percebidas pela autora aprendidas influenciam o uso da
106
Fernandes-Boëchat (2006, p. 38) conclui que “os alunos que aprendem mais
de uma língua estrangeira recorrem inconscientemente (grifo da autora) à língua
estrangeira precedente quando fazem comparações e contrastes com a língua em
estudo”, mesmo que conscientemente não o digam ou percebam.
Procedemos, a seguir, à análise dos resultados das dez pesquisas empíricas
selecionadas para este trabalho, a respeito de como se referem à influência das
línguas previamente aprendidas. Não será possível, no entanto, estabelecer uma
comparação direta desses resultados aos de Fernandes-Boëchat (2000) sem levar
em consideração que os outros pesquisadores não diferenciaram explicitamente as
recorrências conscientes e inconscientes.
recorrência dos aprendizes à sua LM; essa recorrência foi abundante, no entanto,
entre aprendizes da primeira LE.
Näf e Pfander (2001), contrariamente, concluem em seu estudo que a
influência da LM sobre a LE2 se sobrepõe maciçamente à da LE1, apesar desta
apresentar mais semelhanças tipológicas com a língua em estudo. Esta também é a
conclusão geral de Tremblay (2006), que caracterizou a LM como a principal fonte
de influência na produção da LE2, pelo número de ocorrências identificadas.
Quando analisou a proporção dessa influência aos grupos de estudantes
separadamente, no entanto, percebeu que a forte influência da LM estava vinculada
a um nível baixo de proficiência na LE1, já que ela decrescia muito, dando lugar à
influência da LE1, quando o aprendiz apresentava nesta um alto nível de
proficiência. De Angelis (2005) condicionou a influência que a LM ou qualquer outra
possa exercer sobre uma língua em estudo às semelhanças tipológicas encontradas
entre elas, sendo que as línguas tipologicamente semelhantes terão mais chance de
influenciar umas às outras. Acrescenta, no entanto, que no caso das três línguas
serem semelhantes, como aconteceu em seu estudo, os aprendizes apresentam
mais ocorrências da influência da LE1 sobre a LE2. No estudo de Aronin e Ó Laoire
(2004) passamos das observações dos professores-pesquisadores às dos
aprendizes. Estes, no que diz respeito à utilização da LM no auxílio da
aprendizagem de uma segunda língua estrangeira ou outra posterior, dão mostras
de que preferem que os professores não o façam. Semelhantemente, os professores
da pesquisa de CHEN pareciam não valorizar o uso da LE1 de seus alunos em suas
explicações e comentários, ao passo que seus alunos a utilizavam com freqüência.
Seja para ajudar os alunos em sua aprendizagem, ou para comunicar-se com eles
durante a aula, esses aprendizes preferem que seja utilizada, antes, uma LE
aprendida anteriormente, e apenas em último caso a LM. Não sabemos se os
aprendizes ou os professores são capazes de explicar melhor essa preferência, ou
se ela é baseada em crenças desenvolvidas ao longo da aprendizagem. Finalmente,
para Heine, a LM não assume papel dominante na influência sobre a língua em
estudo, já que identificaram-se poucas recorrências a ela. Porém, conforme o grau
de semelhança tipológica ou de proficiência, seu uso poder ser preferido ao de
outra.
Concluímos que, na aprendizagem de uma segunda língua estrangeira ou
outra posterior em geral, a língua materna perde muito da sua influência, mesmo nos
109
7.3.1 Princípio 1
7.3.2 Princípio 2
7.3.3 Princípio 3
8 CONCLUSÃO
42
Conhecido também como “L3”, “Trilingüismo” ou “Plurilingüimso”.
118
estudiosos na área (cf. HERDINA & JESSNER, 2000; WEI, 2003; HALL & ECKE,
2003).
- A recorrência a outras línguas ocorre mais acentuadamente nos estágios
iniciais de aprendizagem da língua em estudo.
- Para que a língua anteriormente aprendida possa exercer influência
considerável sobre a língua em estudo, o aluno precisa ter desenvolvido naquela um
certo nível de proficiência que o permita, estabelecido por Fernandes-Boëchat como
“no mínimo pré-intermediário / intermediário” (2006, p. 39).
Há um aspecto na Teoria CCR que, a nosso ver, confere-lhe originalidade: a
proposta de que não existe aleatoriedade a respeito da influência que cada uma das
línguas estrangeiras anteriormente aprendidas pode exercer sobre o processo de
aprendizagem de outra. É preciso, porém, não desvinculá-lo do fato de que essa
influência precisa da língua imediatamente precedente é inconsciente, e acontece
quando o falante não se preocupa com a acuidade. Pois, como Fernandes-Boëchat
também verificou, é possível fazer escolhas conscientes para se recorrer a alguma
língua que se considera mais próxima da língua em estudo.
A Teoria CCR vem, certamente, contribuir com as tentativas de compreensão
do que acontece na mente do aprendiz multilíngüe, e instiga-nos à realização de
mais pesquisas experimentais, em que se procurem isolar variáveis específicas, a
fim de que se possam continuar as discussões acerca do tema. Além disso, a
revisão da literatura comprovou que o estudo sobre a aprendizagem de mais de uma
língua estrangeira pela mesma pessoa no Brasil é ainda incipiente, sendo a
aprendizagem de mais de uma língua pela mesma pessoa um assunto muito pouco
explorado.
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