Apresentação Do Livro Jesus Cristo o Único Salvador
Apresentação Do Livro Jesus Cristo o Único Salvador
Apresentação Do Livro Jesus Cristo o Único Salvador
Com muita alegria aceitei o convite do meu amigo, Pe. Françoá Costa, para participar
na apresentação de seu manual de Cristologia, que ele quis fazer aqui na UCP. O Pe.
Françoá é o diretor da Faculdade Católica de Anápolis (Go), e fez questão de apresentar
a sua obra na nossa Universidade que iniciou o seu curso de Teologia há apenas 4 anos.
É uma honra para nós tê-lo aqui conosco. A publicação dessa obra deu-me grande
satisfação. Conheço o Pe. Françoá há pelo menos dez anos. Quando eu fazia a minha
graduação em Teologia na Universidade de Navarra, na Espanha, o Pe. Françoá estava
lá cursando o seu doutorado. Recordo-me de uma viagem que fizemos de carro, com
outros três seminaristas na época, para Lourdes. Nós nos perdemos nas estradas dos
Pirineus e aproveitamos a viagem para discutirmos assuntos teológicos. Talvez por isso
nós nos perdemos mais ainda. De qualquer modo, recordo que discutimos por um bom
tempo o tema da salvação dos cristãos e dos não cristãos. E hoje ele publica um livro
que se intitula “Jesus Cristo, o único Salvador”.
O Pe. Françoá concluiu seu doutorado em 2011 e desde então ensina Teologia.
Recordo-me uma conversa que tive com ele há cinco anos em que eu perguntava por
que ele não publicava algum manual de Cristologia, vista a falta de bons livros dessa
matéria no Brasil. Ele me revelou que não queria publicar nada antes de completar 40
anos. Eu o questionei por isso e disse que não concordava: disse que talvez um dos
motivos de tantas pessoas publicarem obras tão fracas no Brasil seja o fato das editoras
não receberem livros bons de pessoas que tenham uma boa formação. Graças a Deus o
Pe. Françoá cumpriu sua palavra, e no ano em que ele completa 40 anos lançou uma
extensa (são 511 páginas) e excelente obra de teologia. Uma obra que, segundo o
Cardeal Müller, ex-prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, constitui para os
estudantes de teologia no Brasil “um momento de esperança no panorama atual”.
O teólogo que pretende explicar o ser e o agir de Cristo possui, assim, uma missão
importantíssima dentro da vida eclesial. É uma missão que ficou muito bem expressa
pelo Catecismo da Igreja Católica, n. 428, que o pe. Françoá recorda na sua obra. Diz:
O bom teólogo é o que ensina Cristo, indica o caminho para ele; para fazê-lo, o teólogo
deve se envolver intimamente com o objeto apresentado, deve aceitar perder a própria
vida para chegar ao conhecimento de Cristo. O teólogo se conforma em perder tudo
para ser achado por ele. Só assim é possível fazer uma boa teologia. De fato, só quem
entrega a própria vida pode discursar realmente sobre aquele que dá a verdadeira Vida.
1
F. Costa, Jesus Cristo, o único Salvador: Cristologia-Soteriologia, São Paulo: Cultor de Livros, 2019, p.
200.
O Pe. Françoá diz no seu livro que para se elaborar a Cristologia é necessário
primeiramente conhecer o desenvolvimento dogmático a partir dos dados da Sagrada
Escritura. Na época moderna apareceram autores, especificamente os da Reforma
Protestante, que pretenderam retornar às fontes do cristianismo, uma intenção louvável.
Acreditaram que para isso era preciso “des-helenizar” o cristianismo, coisa que teria
acontecido a partir das obras dos primeiros cristãos. Esses autores pretendiam voltar
assim a um “cristianismo puro”.
Ora, diversos autores bem notaram que isso não é possível. O cristianismo surgiu em
Israel, numa época plenamente helenizada. O próprio Novo Testamento foi escrito em
grego, segundo categorias gregas. A vida de Cristo ocorreu numa sociedade que
integrava as culturas grega, romana, judaica e oriental. De forma que a união do
cristianismo com a cultura grega e romana não pode jamais ser dissolvida. Essa união
seria muito mais profunda do que a união da fé cristã com a de outros povos, ocorridas
ao longo da História. Porém, o que Jesus fez e ensinou não pode ser entendido
plenamente como uma consequência necessária da sua cultura. Ele trouxe
ensinamentos que transcenderam e renovaram aquelas culturas, algo que continua
ocorrendo ainda hoje.
Isso pode ser comprovado, por exemplo, com a afirmação central dos Evangelhos, a de
que Jesus é o Filho de Deus. Isso foi entendido pelos cristãos de modo único, que não
coincida a uma afirmação similar feita ao interno das culturas antigas. A afirmação de
Jesus implica que a sua existência é totalmente relativa: ela se relaciona intimamente
com o Pai. E isso, ao mesmo tempo, expressa a sua identidade única, manifestando a
sua unidade com o Pai. Ele e o Pai são um, disse o Senhor. Ele está totalmente unido ao
Pai: o seu ser é o ser do Pai. A união também se manifesta de outra forma: naquela
existente entre o ser e o agir de Jesus, ou seja, da sua pessoa e obras, da ontologia e das
relações.
Recorda o Pe. Françoá que a imersão na fé da Igreja apaga a diferença de tempos e une
as diversas culturas, ainda hoje. Isso foi bem expresso pelo Catecismo da Igreja
Católica, n. 1985:
Boaventura – e 1878 – ano da eleição de Leão XIII – a teologia católica ter vivido uma
época de “relativa esterilidade”. Pois durante esse período de seis séculos, com tantas
transformações sociais, filosóficas e científicas, não houve grandes doutores da Igreja
(salvo no campo místico). O autor considera isso grave para a difusão do Evangelho.
Ele aponta como central para renovação da teologia o pontificado de Leão XIII e afirma
que talvez no futuro se reconhecerá a segunda metade do século XX como “um dos
períodos mais ricos e fecundos que a Igreja jamais viveu, especialmente desde o ponto
de vista do pensamento”. Ele julga que essa época não deixa nada a desejar aos séculos
de ouro da patrística (séculos IV e V) e aos tempos áureos da Universidade medieval
(século XIII)4.
Jean Danielóu, teólogo que foi estudado pelo Pe. Françoá – que fez sua tese de
doutorado sobre ele – disse num artigo de 1946 que a “nova teologia” deveria ser uma
“teologia da profecia”, “da história” e uma teologia em contato com os crentes. Ela não
podia perder de vista a realidade do ateísmo contemporâneo e a necessidade real das
pessoas5. Essa “nova teologia” não pretendia romper ou desmerecer a teologia anterior,
mas completá-la, segundo as exigências concretas da história.
Isso afetou também a Cristologia. O Pe. Françoá diz que, nesse sentido, a teologia que
ele oferece na sua obra faz parte desse movimento e sua obra é expressão dessa
4
G. Lafont, História teológica da Igreja Católica: itinerário e formas de teologia, trad. M. N. R. Echalar,
São Paulo: Paulinas, 2000, p. 8.
5
J. Danielóu, Les orietations presentes de La pensé religieuse, «Études», 1946.
O Pe. Françoá bem recorda que J. Ratzinger procurou integrar as duas perspectivas
teológicas, de modo que elas se corrijam mutuamente. Para isso, seria preciso partir do
ser de Cristo, que está sempre em saída, em êxodo, pois Jesus seria sempre um “ser
para” o Pai. A partir desse êxodo, seria possível entender a sua missão salvadora. É
preciso assim partir do ser para compreender o agir e retornar do agir para o ser.
6
F. Costa, Jesus Cristo, o único Salvador: Cristologia-Soteriologia, cit., p. 206.
Por outro lado, esse agir não é apenas agir, ele é ser, ele avança até as
profundezas do ser e coincide com ele. Esse ser é êxodo,
transformação. Por isso, uma cristologia bem entendida do ser e da
encarnação precisa desembocar, nesse ponto, na teologia a cruz,
tornando-se uma só com ela; e vice-versa: uma teologia da cruz que vá
até os limites de suas possibilidades precisa tornar-se cristologia do
Filho e cristologia do ser7.
E a obra do Pe. Françoá constitui, de fato, uma obra unitária, que trata a cristologia e a
soteriologia. Nela estão presentes todos os temas clássicos dessa disciplina, ou seja,
todos os referidos à vida e obra salvadora de Jesus Cristo, segundo uma sensibilidade
contemporânea, que procura dar respostas aos anseios dos homens do nosso tempo,
segundo uma teologia que é, ao mesmo tempo, clássica e profundamente renovada.
7
J. Ratzinger, Introdução ao cristianismo, p. 171-172.