Texto Encontro 1 Saussure e Foucault, Língua e Discurso
Texto Encontro 1 Saussure e Foucault, Língua e Discurso
Texto Encontro 1 Saussure e Foucault, Língua e Discurso
1692
Vanice Sargentini
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, São Paulo, Brasil
1 Introdução
1
Não nos ocuparemos neste artigo da querela em torno da autoria do Curso de Linguística Geral, questão
discutida em Silveira, Sá & Fernandes (2019). Tomaremos o CLG como uma obra que porta um nome de
autor, ao qual faremos as devidas referências.
“Ela é um objeto bem definido no conjunto heteróclito dos fatos da linguagem [...] Ela é
a parte social da linguagem, exterior ao indivíduo, que, por si só, não pode nem criá-la
nem modificá-la” (p. 22).
“A língua constitui uma instituição social [...] A língua é um sistema de signos [...] Pode-
se, então, conceber uma ciência que estude a vida dos signos no seio da vida social” (p.
24).
Palavras e as Coisas e dar atenção à linguagem. Na avaliação dessa obra, a crítica lhe
atribuiu o rótulo, visto como desqualificador, de estruturalista, que custou ao filósofo
vários textos de esclarecimentos, como em Estruturalismo e Pós-estruturalismo,
entrevista concedida em 1983.
É evidente que os enunciados não existem no sentido em que uma língua existe
e, com ela, um conjunto de signos definidos por seus traços oposicionais e suas
regras de utilização; a língua, na verdade, jamais se apresenta em si mesma e
em sua totalidade; só poderia sê-lo de uma forma secundária e pelo expediente
de uma descrição que a tomaria por objeto; os signos que constituem seus
elementos são formas que se impõem aos enunciados e que os regem do
interior. Se não houvesse enunciados, a língua não existiria; mas nenhum
enunciado é indispensável à existência da língua (e podemos sempre supor, em
lugar de qualquer enunciado, um outro enunciado que, nem por isso,
modificaria a língua). A língua só existe a título de sistema de construção para
enunciados possíveis; mas, por outro lado, ela só existe a título de descrição
(mais ou menos exaustiva) obtida a partir de um conjunto de enunciados reais.
Língua e enunciado não estão no mesmo nível de existência; e não podemos
dizer que há enunciados como dizemos que há línguas. Mas basta, então, que
os signos de uma língua constituam um enunciado, uma vez que foram
produzidos (articulados, delineados, fabricados, traçados) de um modo ou de
outro, uma vez que apareceram em um momento do tempo e em um ponto do
espaço, uma vez que a voz que os pronunciou ou o gesto que os moldou lhes
O enunciado não é, pois, uma estrutura [...] é uma função de existência que
pertence, exclusivamente, aos signos, e a partir da qual se podem decidir [...]
se eles “fazem sentido” ou não, segundo que regra se sucedem ou se justapõem,
de que são signos, e que espécie de ato se encontra realizado por sua
formulação [...] É essa função que é preciso descrever agora como tal, ou seja,
o fato de que se pode descrever essa superfície enunciativa prova que o dado
da linguagem não é a simples laceração de um mutismo fundamental; que as
palavras, as frases, as significações, as afirmações, os encadeamentos de
proposições não se apoiam diretamente na noite primeira de um silêncio; mas
que o súbito aparecimento de uma frase, o lampejo do sentido, o brusco índice
da designação surgem sempre no domínio de exercício de uma função
enunciativa [...] Nada há a objetar contra os métodos linguísticos ou as análises
lógicas [...] A análise enunciativa não prescreve para as análises linguísticas
ou lógicas o limite a partir do qual elas deveriam renunciar e reconhecer sua
impotência; ela não marca a linha que fecha seu domínio; mas se desenrola em
outra direção que as cruza (Ibidem, p. 127-129).
Foucault assevera que os objetos que compõem as regras de formação não são
redutíveis à língua ou ao ato de fala. São as práticas discursivas que formam
sistematicamente os objetos de que falam. Assim, esses objetos (ele exemplifica com o
discurso da psicopatologia no século XIX) não preexistem ao discurso, eles são
construídos pelos discursos. Nas práticas discursivas estão envolvidas, então, a
modalidade enunciativa que compreende o emprego da língua e seu sistema, a formação
dos objetos, a formação de conceitos que organizam um campo do discurso e a formação
das escolhas temáticas e teóricas.
Para o filósofo, atrás da fachada visível do sistema, pode-se supor “a rica incerteza
da desordem” (Ibidem, p. 84), onde “estão em jogo a língua e o pensamento, a experiência
empírica e as categorias, o vivido e as necessidades ideais, a contingência dos
acontecimentos e o jogo das coações formais” (Ibidem, p. 84). A língua para Foucault
participa desse sistema maior que não se confunde com a existência dos signos.
4 Conclusão
Contribuição
Referências
FOUCAULT, Michel. Resposta a uma questão. In: MOTTA, Manoel Barros (Org.).
Michel Foucault Repensar a Política. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.
(Ditos & Escritos. v. VI) p. 1-24.